1 preparação do material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · os aços de construção naval devem ser...

60
1 1 Preparação do Material Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de passarem à face de elaboração dos caldeireiros navais. Com efeito o material ao sair da siderurgia sofre deformações resultantes dos arrefecimentos desiguais a que está sujeito após a laminagem. Posteriormente e por mais cuidado que haja com o seu transporte e manipulações, outras deformações acontecem, pelo que é necessário desempená-lo. Por outro lado está cada vez mais aceite a ideia de se submeter previamente o aço a uma decapagem e pintura com primário, que assegura a protecção do material durante o tempo que dura a construção até que a aplicação das demãos definitivas de pintura. Efectivamente o tratamento da superfície do casco apenas no final da construção tem inconvenientes e preços tão elevados que hoje em dia é inconcebível projectar um estaleiro moderno sem uma instalação de decapagem e pintura. Estas instalações são normalmente automatizadas, compondo-se duma primeira fase em que as chapas são elevadas com água doce e secas em estufas. De seguida são decapadas com granalha que é projectada em ambas as faces simultaneamente. Dispositivos de sopragem, aspiração removem a granalha que é limpa para ser reutilizada. As chapas limpas são imediatamente cobertas com uma camada de primário, conforme mostra a (fig.12). A tinta a utilizar alem de proteger o aço durante a fabricação, mantém a superfície em condições para levar as demãos finais de pintura sem necessidade de nova decapagem. Além disso deve ter uma composição que evite a libertação de gases tóxicos durante a soldadura ou aquecimento das chapas na enformação a calores. Descrevem-se a seguir os processos mais significativos utilizados no desempeno de chapas.

Upload: duongxuyen

Post on 02-Dec-2018

218 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

1

1 Preparação do Material Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de passarem à face de elaboração dos caldeireiros navais.

Com efeito o material ao sair da siderurgia sofre deformações resultantes dos arrefecimentos desiguais a que está sujeito após a laminagem. Posteriormente e por mais cuidado que haja com o seu transporte e manipulações, outras deformações acontecem, pelo que é necessário desempená-lo.

Por outro lado está cada vez mais aceite a ideia de se submeter previamente o aço a uma decapagem e pintura com primário, que assegura a protecção do material durante o tempo que dura a construção até que a aplicação das demãos definitivas de pintura. Efectivamente o tratamento da superfície do casco apenas no final da construção tem inconvenientes e preços tão elevados que hoje em dia é inconcebível projectar um estaleiro moderno sem uma instalação de decapagem e pintura.

Estas instalações são normalmente automatizadas, compondo-se duma primeira fase em que as chapas são elevadas com água doce e secas em estufas. De seguida são decapadas com granalha que é projectada em ambas as faces simultaneamente. Dispositivos de sopragem, aspiração removem a granalha que é limpa para ser reutilizada.

������������

As chapas limpas são imediatamente cobertas com uma camada de primário, conforme mostra a (fig.12). A tinta a utilizar alem de proteger o aço durante a fabricação, mantém a superfície em condições para levar as demãos finais de pintura sem necessidade de nova decapagem.

Além disso deve ter uma composição que evite a libertação de gases tóxicos durante a soldadura ou aquecimento das chapas na enformação a calores.

Descrevem-se a seguir os processos mais significativos utilizados no desempeno de chapas.

Page 2: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

2

1.1 Desempeno na Fieira A fieira é um processo mais importante no desempeno de chapas. Trata-se duma máquina composta por duas séries de rolos, por onde as chapas são obrigadas a passar, sofrendo deflexões alternadas.

Utilizando-se em construção naval chapas de grande espessura, estas máquinas terão de ter grande capacidade e potência para apenas numa passagem as desempenarem em toda a sua dimensão (fig.13).

�������� �����

As chapas são comprimidas pela pressão dos rolos superiores e empurradas pela força de tracção dos rolos inferiores que são accionados independentemente um do outro.

A precisão consegue-se evitando qualquer flexão entre os rolos, pelo que estes estão apoiados em contra-rolos que por sua vez estão apoiados em vigas muito robustas.

1.1.1 Fundamento da fieira

Se houver uma chapa com curvaturas em ambos os sentidos, ao passar entre os rolos 1,2 e 3 indicados na fig.14, a pressão exercida entre os rolos é tal que o limite elástico da chapa é ultrapassado, pelo que esta fica com curvatura apenas num sentido, embora variável de geratriz para geratriz. Quando em seguida é forçada a dobrar entre os cilindros 2, 3 e 4, ao ser ultrapassado o limite elástico a chapa fica com curvaturas em sentido oposto, mas agora uniforme.

Page 3: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

3

Finalmente ao passar entre os rolos 3, 4 e 5 dá-se uma nova curvatura em sentido oposto ao da última, mas agora a deformação existente para além da forma plana corresponde à forma elástica, ou seja igual e oposta ao “efeito de mola” que resulta da cessação das forças aplicadas.

A chapa fica então plana. Do exposto conclui-se que a fieira terá no mínimo cinco rolos. Nas chapas muito finas, o desempeno faz-se em fieiras tendo mais rolos.

1.2 Desempeno por estancação Uma mossa ou cova numa chapa fina pode resultar da sua martelagem sobre um bigorna em passes sucessivos e decrescentes do centro para a periferia, conforme mostra a fig.15. Na zona martelada, a espessura da chapa diminui

ligeiramente ao mesmo tempo que aumenta a superfície, impedida de se estender os bordos pelo resto da chapa não martelada.

Forma-se assim uma mossa que será tanto maior quanto mais se martelar a zona central.

������� �

É a esta compressão local muito intensa que se designa por estancação, e o seu efeito pode ser aproveitado no desempeno.

Para anular a mossa, torna-se necessário alongar a chapa em volta da mossa. Esse alongamento terá de ser nulo no centro, crescendo depois para a periferia da zona deformada e mantendo-se uniforme na chapa não martelada inicialmente (fig.16).

Fig. 16 Fig. 17

Para alongar, ou seja martelar a zona não deformada inicialmente, vários processos são possíveis:

- Por passes circulares (fig.17).

Page 4: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

4

É um método difícil de aplicar correctamente quando existem deformações múltiplas e principalmente em chapas rectangulares.

- Por passes radiantes (fig.18)

Neste método, indispensável à execução correcta do desempeno de chapas finas, uma vez que se exigem passes intermédios e alternados como mostra a figura.

Fig. 18

Fig. 19 - Por passes paralelos (fig.19)

Este é o método que dê melhores resultados. Na zona da mossa os alongamentos devem ser cada vez menores espaçando os golpes de martelagem e reduzindo a sua intensidade.

No entanto há um cuidado a ter qualquer que seja o método. Nunca se deve martelar junto ao bordo da chapa, devendo os passes parar pelo menos a 10mm do extremo, como mostra a fig.20.

Fig. 20 Fig. 21

Tudo o que ficou dito se aplica ao caso de deformações múltiplas (fig.21), incluindo os bordos distendidos que podem ser considerados como mossas cortadas ao meio e assinalado na figura com a letra D.

O método dos passes em todas as zonas muito alongadas.

Se necessário faz-se uma segunda série de passes, segundo uma direcção perpendicular à precedente e assim sucessivamente até ao desempeno perfeito.

Page 5: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

5

O desempeno da curvatura de chapas espessas também pode ser feito pelo processo de estiramento. Neste caso aplicam-se golpes de marreta ou prensa no lado côncavo da chapa, conforme mostra a fig.22.

��������

1.3 Desempeno por estiramento O desempeno por estiramento é praticamente só usado nas siderurgias. Consiste em dar à chapa uma deformação plástica provocada por uma tracção.

A chapa é fixada por mordentes nos topos e submetida a um esforço de tracção que ultrapassa o limite de elasticidade, primeiro nas zonas planas, e à medida que o comprimento aumenta, também as zonas deformadas se vão endireitando até ficarem também elas planas.

A deformação plástica deve ser feita de modo a que fiquem tensões iguais em todas as secções e assim ao ser retirada a força aplicada, a chapa permaneça plana.

1.4 Desempeno por processos térmicos Neste processo há duas variantes a distinguir:

1.4.1 Calores à meia espessura

O desempeno por calores à meia espessura fundamenta-se numa deflexão provocada por tensões de origem térmica, quando se provoca o aparecimento de uma variação de temperatura na direcção da espessura pelo aquecimento rápido da chapa feita de um só lado, seguido de arrefecimento.

Assim se numa chapa plana, fizermos um aquecimento rápido de uma das faces, criam-se nessa face tensões internas de compressão devido à dilatação do material junto a essa face ser contrariada pelo material que não aqueceu. Se o aquecimento for suficientemente rápido haverá deformação plástica por compressão do lado da face aquecida; se seguidamente, a peça arrefecer aparecem tensões inversas (porque as partículas do material do lado quente ficaram mais curtas, devido à deformação plástica sofrida) e maiores que as anteriores, visto que as tensões máximas que se podem atingir correspondem ao limite elástico e este é maior a frio do que a quente.

Devido a isto a chapa é forçada a flectir, como se mostra na fig.23.

Aqui a chapa era inicialmente plana, e no fim, ficou flectida. É claro que se inicialmente a curva fosse no sentido inverso, a chapa teria ficado plana.

Page 6: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

6

Fig. 23

É o que se fez aplicando calores pontuais (ventosas) no lado convexo da chapa quando se pretende desempená-la (fig.24).

Como se verá mais à frente, em certos casos é vantajoso a aplicação de calores lineares à meia espessura em vez de ventosas.

Fig. 24

1.4.2 Calores a todo a espessura

Este processo é de certa forma, inverso do processo de estancação e fundamenta-se num aumento de espessura e consequente redução de superfície, resultante da deformação plástica por compressão a que fica sujeita a região duma chapa que seja aquecida e não possa dilatar-se livremente por as regiões frias da chapa a constrangerem.

Este processo pode ser utilizado na supressão mossas, aplicado uma série de ventosas a toda a espessura e em número variável segundo a importância da deformação conforme indicado na fig.25.

Fig. 25

��� �� ���������� ���������� ��������� �� �������� ������������������������������������������������������ ���!�����"�����������#����������#�����������$�%��������&�����������������������

Page 7: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

7

2 Elementos Informativos Como já foi visto noutra disciplina, a traçarem é o conjunto de tarefas executadas pela sala do risco, para traduzir em linguagem oficial, os elementos informativos referentes ao casco.

Os elementos informativos oficinais podem dividir-se basicamente em dois tipos:

• Elementos destinados ao corte: Moldes e Cérceas

• Elementos destinados à enformação: Cérceas e Carcaças

2.1 Elementos informativos destinados ao corte Estes elementos permitem fazer a marcação à escala natural, o que é feito assinalando directamente sobre as chapas os pontos notáveis com auxílio dum punção.

Para se obter a forma da peça, os pontos são então unidos, o que normalmente é feito pelo batimento das linhas a giz.

Os moldes são utilizados para a marcação de peças pequenas. São normalmente feitos de cartão hidráulica, uma vez que as peças representam são regra geral direitas e de pequenas dimensões. O traçado dos moldes é feito a lápis por construção geométrica sobre o cartão.

As cérceas destinam-se à marcação de chapas do costado, de superestruturas ou de cavernas como indicada na (fig.26).

Nestes casos dadas as grandes dimensões das peças, não é prático o uso de cartão hidráulico, pelo que se constróem molduras de tábuas que cubram as áreas pretendidas. Estas molduras são devidamente travadas e nelas se inscrevem todas as linhas a marcar nas chapas. Para permitir um ajustamento perfeito do punção, são as cérceas furadas nos pontos notáveis, com uma broca de diâmetro ligeiramente

superior ao punção a usar.

Fig. 26

2.2 Elementos informativos destinados à enformação Consistindo a enformação em transformar uma superfície plana numa determinada superfície curva, os elementos informativos dados aos caldeireiros navais devem permitir a definição dessa superfície curva.

As cérceas de enformação são construídas de forma idêntica às de marcação e destinam-se à definição de chapas simples como sejam as chapas cilíndricas. Nestes casos a enformação consiste em dar à chapa uma

Page 8: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

8

curvatura constante para o que se usa calandra ou a quinadeira como se verá mais à frente. Um exemplo de cércea deste tipo é a que contém o contorno de várias balizas iguais que se ligam à mesma chapa na zona cilíndrica dum navio.

Há casos em que a enformação duma chapa é definida por um conjunto de cérceas, como seja o caso duma chapa cónica. Neste caso há também que fornecer aos caldeireiros os diedros (ângulos) que definem os planos das balizas com a superfície da chapa, para que as respectivas cérceas possam ser devidamente posicionadas.

A fig. 27 indica uma cércea, pertencente a um conjunto de cérceas, definindo a enformação duma chapa quilha.

Mas as superfícies enformadas mais complexas são definidas através das carcaças que consistem numa armação de madeira (a três dimensões) e que materializa à escala natural, essa superfície.

�������� � �������'�

Para tanto são fixadas entre si e respeitando as distâncias e ângulos devidos, uma série de cérceas que fornecem os contornos dos troços das balizas correspondentes à chapa a considerar.

Uma carcaça define a respectiva superfície na ossada e contém ainda as marcações indispensáveis que devem ser transportadas para a chapa após a enformação, e que permitam não só o corte do seu contorno, como as operações seguintes de montagem.

A fig.28 mostra a carcaça que define uma chapa na zona do encolamento.

A realização das cérceas ou das carcaças faz-se obtendo elementos do plano geométrico.

�������������(�

No caso dos perfis, os elementos informativos necessários resumem-se à marcação por medição para o corte e à sua utilização de cérceas ou um simples virote para o caso da enformação.

Page 9: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

9

3 Corte Seguindo a trajectória do material ao longo da oficina de construção naval, as chapas e perfis depois de marcados, são cortados.

O corte pode ser feito basicamente por dois meios:

- Térmicos

- Mecânicos

3.1 Corte térmico )������������!���������������� ������!����������������#� �����&����������*�"�����+������������������������,�

3.1.1 Oxicorte

O oxicorte é o processo mais importante de corte em construção naval. A sua utilização é no entanto restringida aos aços com baixo teor em carbono. O princípio do oxicorte assenta na combustão localizada do aço. Para isso utilizam-se os chamados maçaricos de corte que consomem acetileno ou propano, e oxigénio.

A operação faz-se em dois tempos:

a) Aquecimento da chapa a cerca de 1300ºC com uma chama de

aquecimento, regulada pelas torneiras A e B indicadas na fig. 29.

b) Projecção dum jacto de oxigénio concentrado que queima o metal a sua passagem, realizando como que uma sangria por oxidação. A pressão do oxigénio regulada pela torneira indicada com a letra S, facilita a expulsão do óxido.

O bico do maçarico possui um orifício central por onde passa um jacto de corte, rodeado pela chama de aquecimento.

Deslocando-se continuamente o maçarico, o corte prossegue, conseguindo-se cortar chapas com espessuras desde 1mm até 150 mm.

A título indicativo, mostram-se no quadro 1 as características do processo de oxicorte com acetileno:

Page 10: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

10

Espessura do aço

(mm)

Pressão do Oxigénio (Kg/cm²)

Litros de Acetileno/m

Litros de Oxigénio/m

Velocidade de corte

(m/h)

3

5

10

20

30

40

50

1,5

2,5

3

3,5

4

5

5,5

10

12

17

25

40

50

60

55

75

120

225

350

450

600

22

20

18

15

12

10

8

Quadro 1

A pressão de Oxigénio e de Acetileno para a chama de aquecimento é normalmente de 1Kg/cm² para cada um.

O oxicorte pode ser realizado

manualmente ou com máquinas semi-

automáticas, conforme

mostra a (fig.30), em que um pequeno carro eléctrico se desloca sobre umas guias, permitindo cortes rectos perfeitos.

Quando se pretende cortar um grande número de peças iguais como que sejam esquadros para a construção dum navio, há vantagem em utilizar máquinas automáticas que com auxílio dum sensor e dum pantógrafo cortam uma peça com dimensões copiadas dum molde (fig.3). Com estas máquinas obtém-se grande produtividade.

Existem ainda outros tipos de máquinas de oxicorte em que o seu comando pode ser numérico (computarizado) ou por leitura óptica em desenho apropriado.

Page 11: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

11

�������� ����������

Em algumas máquinas podem cortar-se os dois bordos paralelos duma chapa, o que equilibra as deformações de origem térmica.

Montando dois ou três maçaricos desfasados na cabeça duma máquina automática, podem obter-se numa única passagem chapas cortadas e chanfradas, conforme mostra a (fig.32).

3.1.2 Corte por plasma

Como por oxicorte apenas se podem cortar aços com baixo teor em carbono, o corte térmico dos aços inoxidáveis, alumínio e ferros fundidos faz-se por outros processos como é o caso do corte por plasma.

Consiste num corte por fusão em que num maçarico especial, normalmente chamado tocha se mistura um gás composto de árgon e hidrogénio sob a acção dum arco eléctrico, formando o plasma que incidido sobre uma chapa desenvolve temperaturas muitos altas e que podem atingir os 20 000 ºC (fig.33).

Com esta técnica, que é dispendiosa, podem-se cortar espessuras até um máximo de 100 a 150 mm.

��������

Page 12: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

12

3.1.3 Corte por arco eléctrico

Outro processo é o corte por arco eléctrico com eléctrodos de carvão (o chamado “abrir o carvão “).

O metal é fundido sob a acção dum arco eléctrico entre a peça e o eléctrodo de carvão, sendo em seguida soprado por um jacto de ar comprimido. Esta técnica dá cortes imperfeitos, pelo que é raramente usada, com excepção da reparação de cordões de soldadura onde tem grande utilização.

3.2 Corte mecânico O corte por meios mecânicos tem vindo a cair em desuso nos estaleiros navais, embora ainda se use para pequenas peças.

Descrever-se-ão a seguir os tipos de máquinas mais importantes.

3.2.1 Tesoura – Guilhotina

As tesouras guilhotinas utilizam-se no corte de bainhas direitas.

Para isso têm lâminas compridas, sendo o corte feito num único movimento ao longo de todo o comprimento. A sua capacidade pode ir, em certas

Fig. 34

máquinas, até chapas com comprimentos de 5m e espessuras de 50mm.

Conforme mostra a fig.34, a chapa é fixada por grampos ou macacos hidráulicos que a impedem de rodar quando é pressionada pela lâmina superior móvel. O corte é feito pelo desenvolvimento de tensões tangenciais entre as duas lâminas, que ultrapassam a tensão de rotura.

Para que o esforço seja mais concentrado de modo a que as tensões (carga por unidade de superfície) sejam maiores, a lâmina superior é normalmente inclinada (fig.35).

Page 13: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

13

��������

O esforço necessário para efectuar o corte é dado pela fórmula:

-��.!/�01��

���α�

Em que:

P- Carga aplicar na lâmina superior

E – Espessura da chapa a cortar

Rm – Tensão de rotura da chapa

x- Ângulo formado pelas lâminas de corte

Para evitar qualquer interferência entre as duas lâminas, existe uma folga entre elas, assinalada na figura pela letra S e que não deve ser superior a 0,4

mm. As faces de corte das lâminas são também inclinados para evitar qualquer atrito com bordos da chapa após o corte.

Com o mesmo princípio de funcionamento, outros tipos de tesouras são usadas nos estaleiros navais:

Quando se pretendem cortes com formas sinuosas, utilizam-se tesouras circulares que em vez das lâminas direitas, utilizam dois rolos rotativos (fig.36) que rolando em sentido inverso um do outro e estando em contacto com a chapa apenas numa pequena área, permite que esta ao mesmo tempo que é cortada seja deslocada por

forma a seguir o traçado de corte desejado . O manuseamento destas máquinas exige pessoal altamente��������������

� ������/

No corte de chapas finas (até 3mm) é usual utilizarem-se tesouras alternativas (tipo Pullmax).

Page 14: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

14

Estas máquinas são caracterizadas pelas dimensões reduzidas das suas lâminas (30 a 50 mm de comprimento) e pelo seu movimento alternativo rápido (1000 a 2000 golpes por minuto) e de fraca amplitude. A mesa tem a forma duma ferradura com uma abertura (garganta) de 1 a 1,5 m de profundidade, o que lhe permite fazer cortes direitos, embora a sua maior utilidade seja o corte de figuras irregulares. A sua velocidade de corte é cerca de 3 a 4 m /minuto, uma vez que em cada curso a chapa é cortada num comprimento igual ao das suas lâminas.

3.2.2 Plaina

Uma máquina também importante em estaleiros de construção naval é a plaina, que permite um acabamento perfeito das bainhas e topos duma chapa, quer o bordo seja recto ou chanfrado.

É constituída por uma mesa onde as chapas são posicionadas e fixadas com o auxílio de macacos ou grampas hidráulicas. Dispõe então de um carro que se desloca ao longo da mesa e onde é montado o ferro de corte que permite fazer os chanfros (fig.37) ou espartilhados, também conhecido por (dente) (fig.38). Nas plainas modernas, o carro dispõe também de um disco de corte, o que permite na mesma máquina fazer o corte das bainhas.

����������������'�� ������(�

3.2.3 Outras máquinas de corte mecânico

Além das referidas, outras máquinas são utilizadas, embora em escala mais reduzida, como sejam as prensas saca-bocados, que dispondo duma mesa onde podem ser montadas matrizes de formas variadas, bem como os respectivos punções na corrediça ou porta-punções, permitem obter o corte duma peça numa única operação.

Embora a sua capacidade esteja limitada a pequenas peças, com a sua utilização obtém-se grande número de cortes repetitivos.

Page 15: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

15

4 ENFORMAÇÃO

4.1 Definições e Princípios Gerais A enformação mecânica é o conjunto de operações que permitem transformar uma superfície plana numa superfície curva pretendida, forçando o material a mover-se por deformação plástica.

O trabalho de enformação deve ser norteado por duas regras fundamentais:

- boa produtividade

- eliminação das tensões internas do material

A primeira regra é suficientemente simples, dispensando explicações, além de que a forma final das chapas obtida na oficina tem de ser muito aproximada da pretendida, uma vez que qualquer correcção a bordo origina grandes problemas.

A eliminação de tensões residuais no material prende-se com a resistência deste para resistir aos esforços a que vai sendo sujeito e principalmente com os esforços de fadiga, que nem sempre sendo previsíveis, podem em determinadas condições provocar o aparecimento de fissuras e até mesmo a rotura dos materiais.

A enformação de chapas pode dividir-se em dois grandes grupos:

- enformação de superfícies planificáveis

- enformação de superfícies não planificáveis

Uma superfície diz-se planificável quando pode ser gerada por uma linha recta, ou seja, colocando uma régua sobre um ponto qualquer dessa superfície é sempre possível encontrar uma posição em que a régua está em contacto com a superfície em todo o seu comprimento.

Por exemplo, as geratrizes de um cilindro direito ou oblíquo são linhas rectas (Fig. 39).

A enformação destas superfícies é relativamente fácil de obter por enrolamento ou quinagem na calandra ou quinadeira, como se verá mais à frente.

Qualquer superfície gerada por uma linha quebrada ou curva não é planificável, tais como as calotes esféricas e as chapas em flecha (Fig. 40).

Page 16: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

16

Estas superfícies podem ser obtidas por estancação, por estampagem, meios térmicos ou outros e regra geral a sua execução apresenta dificuldades bem maiores que as planificáveis.

Depois de enformada é praticamente impossível dar a uma chapa não planificável a sua forma e dimensões iniciais, pois normalmente a sua manufactura é acompanhada de modificações sensíveis na superfície e na espessura.

Descrever-se-ão a seguir os principais efeitos conseguidos com a aplicação de esforços mecânicos, com a aplicação de calores e com a aplicação de ambos, tendo como objectivo reuni-los posteriormente em métodos operatórios de enformação.

4.1.1 Solicitações Mecânicas

Os processos de enformação a frio têm como base a deformação do material provocada por cargas que podem atingir centenas de toneladas. A fim de se conseguir um rendimento de trabalho aceitável é necessário conhecer bem a forma de distribuir as deformações sobre a chapa, de tal maneira que uns efeitos não contrariem os outros. Há ainda que contar sempre com a recuperação elástica (efeito de mola) que o material sofre, sendo conveniente ultrapassar a deformação pretendida a fim de que a chapa depois de aliviada a carga, reduza a deformação ficando com a forma final pretendida.

As solicitações mecânicas que intervêm na enformação são de três tipos:

- tracção

- compressão

- flexão

a) A tracção resulta do efeito de duas forças contrárias que tendem a alongar

uma peça, obtendo-se em toda a secção tensões uniformes de tracção.

Como se viu no estudo dos materiais, a tensão é dada por:

SP=σ

em que S é a área da secção considerada (Fig. 41).

Page 17: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

17

Este tipo de esforço é pouco utilizado isoladamente, uma vez que a resistência à deformação oposta pela peça é muito grande e o início da deformação plástica apenas se dá quando for ultrapassado o limite elástico, o que equivale a uma aproximação da tensão de rotura, pelo que ao menor descuido o processo é difícil de controlar, podendo dar-se a rotura da peça.

No entanto, conforme se viu no § 3.3, as siderugias utilizam este tipo de esforço no desempeno por estiramento.

b) A compressão tende a aproximar os topos da peça em carga e tem efeitos iguais aos de tracção ou ainda maiores se se tiver em conta o perigo de flambagem, embora este só se ponha para peças altas e finas (Fig. 42).

O efeito de compressão é utilizado no desempeno por estancação, conforme se viu no § 3.2.

c) Outro efeito e este largamente utilizado, é o da flexão. Como as deformações por flexão são muito mais sensíveis que as deformações por tracção ou compressão, o processo é mais fácil de controlar circunscrevendo-se a uma zona bem definida. Efectivamente, aplicando uma carga sobre uma barra apoiada nos extremos, obtêm-se tensões variáveis em espessura e ao longo da barra (Fig. 43).

Aumentando a carga até que o limite elástico seja atingido nos extremos da secção, iniciar-se-á uma deformação plástica que no caso dos metais dúcteis, como é o caso do aço, progride lentamente do exterior para o

Page 18: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

18

interior. Cessando a aplicação da carga, a peça embora recupere o efeito de mola, já não volta à posição inicial devido à deformação plástica que sofreu e a fizeram aumentar de comprimento na face inferior e encurtar na superior (Fig. 44).

As tensões de flexão podem ser controladas não só variando a carga aplicada, como também variando a distância entre os apoios da peça. Qualquer destes processos é largamente utilizado na enformação mecânica, como é o caso da calandra.

d) A flexão pode aparecer combinada com a tracção ou compressão. A configuração destes efeitos acelera a deformação plástica. Com efeito, a aplicação de uma força de tracção a uma barra flectida provoca na face inferior tensões de tracção muito altas que ultrapassam o limite elástico, dando-se um estiramento do material nessa zona. Na face superior as tensões de compressão são baixas, não bastando para o material se deformar plásticamente (Fig. 45).

Se a sobreposição for de compressão com flexão, as tensões mais elevadas atingem-se na face superior, sendo neste caso de compressão. Dá-se, portanto, o estancamento do material nessa zona, enquanto na face inferior não se atinge o limite elástico (Fig. 46).

Page 19: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

19

Estes efeitos são muito aplicados na estampagem, em que na primeira fase o material é estirado por acção da função e finalmente é estancado no fundo da matriz. Em linguagem oficinal o estancamento é conhecido por “prender o material”. Mas a estampagem será tratada mais em pormenor noutro capítulo.

e) Um último tipo de solicitação mecânica é a torção, que nos estaleiros navais praticamente só é aplicada a alguns perfis.

4.1.2 Aplicação de Calores

A enformação a calores utiliza o calor localizado como forma de reduzir o limite elástico do material e consequentemente o esforço necessário para efectuar a deformação pretendida.

Em regra utilizam-se os calores a meia-espessura para obter o efeito de quinagem, enquanto que o calor dado a toda a espessura conduz a uma contracção do material na zona onde é aplicado.

Neste tipo de enformação podem ser aplicadas solicitações mecânicas, mas apenas com o fim de reforçar e orientar a acção dos calores, como é o caso da utilização da prensa para corrigir pequenos defeitos locais.

Far-se-á em seguida uma análise dos diferentes efeitos do calor:

a) Pontos de calor (ventosas)

Fazendo incidir a chama de um maçarico verticalmente sobre uma chapa, forma-se um círculo aquecido em que a temperatura é máxima no centro e onde as tensões de compressão, que se geram nas fibras dilatadas e impedidas de se expandir pelo material circundante que permaneceu frio, podem ultrapassar o limite elástico (Fig. 47).

Ao dar-se o arrefecimento inicia-se a recuperação elástica do material, reduzindo-se progressivamente as tensões de compressão até o seu valor se anular. A partir de então a contracção das fibras prossegue, estabelecendo-se entre elas tensões de tracção à medida que a temperatura desce, acabando o material por ficar deformado (Fig. 48).

Este calor pode ser aplicado de diversas formas, quer conseguindo uma distribuição homogénea em espessura, quer apenas junto a uma das faces e obtendo-se consequentemente efeitos diversos, conforme já foi visto no § 3.4 sobre desempeno a calores.

Page 20: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

20

b) Linhas de calor

Há uma diferença fundamental entre pontos de calor e linhas de calor, no que respeita ao comportamento do material. Enquanto que com pontos de calor a zona de trabalho é circunscrita, opondo a chapa grande resistência à deformação, com linhas de calor a deformação é mais sensível e consequentemente mais controlável, muito especialmente se o aquecimento for aplicado de extremo a extremo da chapa.

As alterações da forma que uma linha de calor provoca sobre uma chapa plana, resultam da acção de contracção do material junto da superfície de aquecimento, conduzindo a um efeito duplo de quinagem e encolhimento longitudinal ao longo da linha de calor. Deste efeito de conjunto resulta em geral uma enformação “em concha” (Fig. 49).

As deformações do material devidas às tensões térmicas de aquecimento são muito inconvenientes por reduzirem o efeito de enformação.

Com efeito, se o aquecimento for rápido e a chapa não estiver presa, o material pode dilatar-se no sentido oposto ao pretendido, provocando um aliviamento de tensões e uma maior dificuldade em ser atingido o limite elástico no compressão, necessário para se obter o efeito de quinagem (Fig. 50).

Há então todo o interesse em manter a chapa plana durante o aquecimento, para o que se pode recorrer a pesos, calços e grampos (Fig. 51), aplicando um aquecimento lento e um arrefecimento rápido.

Page 21: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

21

A orientação da contracção longitudinal, que aparece juntamente com a quinagem, depende da posição do eixo neutro da chapa, que de uma forma simplificada se pode considerar passando pelo seu centro de gravidade.

Se a linha de calor está situada superiormente ao eixo neutro, como é o caso da chapa plana, o momento-flector originado confere-lhe a forma de concha (Fig. 52).

No caso da linha de calores ser inferior ao eixo neutro obtém-se a enformação em sela (Fig. 53). E logicamente não existe deformação longitudinal quando a linha de calor passa pelo eixo neutro (Fig. 54).

No entanto, a deformação provocada pela contracção longitudinal é bastante inferior à conseguida pelo efeito de quinagem.

Uma forma de reduzir a contracção longitudinal é aplicar as linhas de calor de forma descontínua, ou seja, em segmentos isolados, embora o efeito de quinagem também seja menor.

O enrolamento de uma chapa pode ser conseguido utilizando linhas de calor paralelas distribuídas ao longo da superfície e conduzindo normalmente a um efeito de concha pouco pronunciado (Fig. 55).

Uma distribuição de linhas de calor maior na periferia que no centro da chapa, favorece o efeito de concha (Fig. 56), enquanto que uma distribuição maior no centro conduz ao efeito contrário, ou seja, de sela (Fig. 57).

Page 22: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

22

Porém, nem sempre os enrolamentos são variáveis da baínha para o centro da chapa, a que conduzem aquelas distribuições de calor. É então conveniente aplicar linhas contínuas nas baínhas e descontínuas no centro para chapas em concha ou contínuas no centro e descontínuas nas baínhas para chapas em sela.

Ao efectuar o aquecimento de linhas paralelas, este deve ser dado sempre no mesmo sentido sob pena de aparecerem deformações variáveis e inconvenientes, que derivam da sobreposição das temperaturas de aquecimento das linhas de calor contíguas.

A profundidade da zona aquecida condiciona substancialmente o estado final de tensões atingido. Se essa zona se localiza junto à superfície, as fibras do material dessa zona ao ultrapassarem o limite elástico ficam reduzidas no seu comprimento, uma vez que a zona resistente (fria) tem grandes dimensões e não se deforma. Ao dar-se o arrefecimento da zona aquecida obtém-se o efeito de quinagem.

Se, porém, a profundidade de aquecimento for muito grande, haverá uma altura em que a secção resistente é insuficiente para suster a dilatação da zona aquecida, dando-se uma deformação contrária à pretendida e que já não é recuperada no arrefecimento.

Nas linhas de calor a aplicação de calores deve, portanto, estar limitada a meia espessura.

c) Calores em V

Os calores em V são calores a toda a espessura, com a forma que o próprio nome indica (Fig. 58).

Aplicam-se normalmente nas baínhas das chapas, quando se pretende que estas se contraiam.

O seu princípio de funcionamento é o mesmo das ventosas a toda a espessura: a chapa da zona aquecida, impedida de se dilatar livremente pela zona fria, deforma-se plasticamente, pelo que ao dar-se o arrefecimento provoca a contracção da bainha.

A sua aplicação não é muito controlável, provocando frequentemente o aparecimento de gelhas na zona que foi aquecida.

Os calores em V utilizam-se principalmente em conjugação com os métodos de enformação mecânica como, por exemplo, a obtenção de uma chapa em concha a partir de uma cilíndrica enformada na calandra.

Page 23: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

23

Tanto as ventosas como os calores em V, provocando tensões internas e tratando termicamente o aço, conduzem à sua fragilização reduzindo a sua resistência, pelo que a sua utilização se deve limitar aos casos estritamente necessários.

4.2 Enformação mecânica

4.2.1 Processos de enformação mecânica de superfícies planificáveis.

Descrever-se-ão a seguir as principais máquinas utilizadas na enformação de chapas e perfis que constituam superfícies planificáveis.

4.2.1.1 Calandra

Uma das máquinas mais importantes na enformação de chapas é a calandra. Ela é a rainha das máquinas-ferramentas dos estaleiros navais sendo, ainda hoje, um dos elementos descritivos da sua capacidade.

É, normalmente, constituída por três votos principais: dois inferiores, motores, que traccionam a chapa e um terceiro situado acima do plano dos primeiros, tendo num movimento regulável segundo a vertical. O maior ou menor afastamento entre os rolos permite variar o raio de curvatura a obter na chapa, o qual não pode ser inferior ao raio do rolo superior (fig. 59).

Figura 59

O rolo superior e, por vezes, também os inferiores podem ser deslocados seguindo a horizontal para facilitar determinadas operações de dobragem (fig.61).

Os rolos principais movimentam-se apoiados noutros mais pequenos, destinados a aumentar a sua resistência à deformação (fig. 60).

Estas máquinas têm capacidade que pode ir até chapas com 14,4m x 45mm, como é o caso da existência no estaleiro de Gotaverken na Suécia.

Baseiam-se no efeito de flexão em que, fazendo entrar a chapa no domínio plástico com alongamento das fibras inferiores e encurtamento das superiores, se obtém uma deformação permanente.

Page 24: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

24

Figura 60

Page 25: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

25

Quando a chapa sai da calandra verifica-se uma certa recuperação elástica (efeito mola) em relação à imposta pela calandra, que será tanto maior quanto maior for o limite elástico do material.

Um problema que surge com a utilização da calandra é a dobragem da parte inicial e final da chapa.

Isto pode ser resolvido ou deslocando os rolos inferiores da calandra relativamente ao superior (fig. 61) ou recorrendo à quinadeira e fazendo dobragens sucessivas (fig. 62).

Figura 61 Figura 62

Quando a linha de torcimento (geratriz) é paralela às bainhas, a chapa pode ser trabalhada facilmente, pois a secção da chapa que suporta o seu peso próprio é suficientemente resistente, mas o mesmo não acontece quando as linhas de torcimento são paralelas aos topos, em que é conveniente a utilização de meios de suspensão auxiliar sob pena da chapa “quebrar”.

Em certas calandras, além de chapas cilíndricas, podem-se obter chapas cónicas. Para isso colocam-se os três rolos com eixos concorrentes. Como cada rolo é cilíndrico, esta operação de dobragem em clone implica escorregamento da chapa em relação aos rolos. Devido a isso a operação é difícil de controlar, pelo que se costumam traçar sobre a chapa, geratrizes da superfície cónica pretendida, de modo a poderem ser feitos os necessários acertos.

A dimensão das chapas enroladas está nas calandras normais limitada a meias-virolas. No entanto, em alguns estaleiros existem calandras verticais que permitem um enrolamento complexo. Nesses casos a saída das virolas faz-se pelo topo dos rolos.

4.2.1.2 Quinadeira

A quinadeira é uma prensa constituída por duas mesas: uma inferior fixa onde apoia a matriz normalmente com forma em V e que serve de apoio à peça em trabalho e outra superior, com movimento vertical e que suporta a ferramenta superior (punção) de forma paralelipipédica com a face inferior em cunha, que serve para estancar a chapa contra a matriz.

Page 26: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

26

Figura 63

Estas máquinas são, normalmente, de accionamento electro-hidráulico, conforme se mostra na fig. 63.

Tem, geralmente, comprimento para dobrar de um só golpe as chapas no sentido do comprimento, podendo em alguns casos quinar-se chapas com 5m de comprimento e 30 mm de espessura.

O fundamento da quinadeira é a flexão a que se adiciona a força de atrito entre a chapa e a matriz resultando num estiramento das fibras exteriores a que se segue a compressão de punção contra a matriz e provoca o estancamento e prisão do material na forma desejada e evitando a recuperação elástica.

Para não causar rotura no material e evitar ângulos vivos, o raio interior de quinagem está limitado aos seguintes valores:

- Aços macios – 2 a 3 vezes a espessura - Alumínio – 3 a 4 vezes a espessura

Com a quinadeira conseguem-se trabalhos de enformação muito variados, como sejam a curvatura das extremidades da chapa (fig. 64), a canelagem (fig. 65) e a quinagem para manufactura de perfis (fig. 66).

Figura 64 Figura 65 Figura 66

Page 27: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

27

Figura 67

A título de curiosidade, mostram-se na fig. 67, alguns tipos de perfis que são possíveis de executar com uma quinadeira.

4.2.1.3 Prensa de Enformação

As prensas de enformação são prensas accionadas hidraulicamente, com princípio de funcionamento idêntico ao descrito para a quinadeira.

São máquinas universais pois permitem fazer qualquer tipo de trabalho de enformação a frio. Com efeito, dependendo apenas do punção e matriz

Page 28: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

28

instalados, conseguem-se gerar superfícies planificáveis (fig. 68-c, d, e), não planificáveis (fig. 68-a) e mesmo proceder a desempenos (fig.68-b).

Figura 68

A sua limitação está na profundidade da garganta, mas em alguns casos a sua capacidade pode ir até 1000 t de força e 2m de garganta.

4.2.1.4 Prensa de curvar perfis

Para curvar perfis, como por exemplo as balizas dum navio, utilizam-se prensas horizontais accionadas hidraulicamente e dispondo de mesas especiais que permitem apoiar directamente os perfis sem haver o perigo de enfolar a alma ou os banzos (fig. 69).

Page 29: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

29

Figura 69

A enformação produz-se pela pressão exercida entre as garras laterais accionadas por êmbolos e a garra central.

O princípio de funcionamento é o mesmo que o descrito para a calandra.

Se a capacidade da máquina o permitir, é vantajoso curvar simultaneamente duas balizas simétricas dispondo-as com as abas em sentido oposto.

A verificação da curvatura está facilitada porque o bordo do perfil que irá soldar a chapa fica sempre em posição exterior à máquina.

4.2.2 Processos de enformação mecânica de superfícies não planificáveis

Dos processos de enformação mecânica de superfícies não planificáveis, apenas a prensa tem grande utilização em construção naval. No entanto, descrevem-se a seguir sumariamente outros métodos.

4.2.2.1 Prensa de enformação

A prensa foi já descrita no ….6.2.1.3. Para que o seu aproveitamento seja conveniente, deve estar acompanhada de uma boa colecção de cunhos e matrizes que lhe permitam fazer as necessárias enformações, como sejam moldes para copar e ferramentas a enformação de chapas “em concha” e “em sela”. Também se recorre, normalmente, ao uso de calços e palmetas par obter uma boa distribuição de cargas ao longo da chapa.

No entanto, com a calandra é também possível obter superfícies não planificáveis. Com efeito se uma chapa, após ter sido encurvada transversalmente, for de novo passada à calandra no sentido longitudinal na campanha duma barra de aço com o mesmo comprimento e uma espessura

Page 30: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

30

ligeiramente superior à máxima deflexão transversal da chapa, obtém-se uma superfície que, consoante as posições relativas da chapa e da barra, é em concha (fig. 70-a) ou em sela (fig. 70-b).

Figura 70

4.2.2.2 Estampagem

A estampagem consiste em obter uma peça côncava a partir duma chapa metálica, sem alteração da espessura.

A enformação é obtida em prensas, onde as chapas são forçadas a ultrapassar o limite elástico, por deslocamento de um punção contra uma matriz, conforme mostra a fig. 71.

Para evitar o atrito, a folga entre a matriz e a punção é 10 a 30% mais larga que a espessura do material.

O fundamento da estampagem é o mesmo que o referido anteriormente para a quinadeira.

As peças de configuração complexa podem ser estampadas por fases sucessivas.

Figura 71

4.2.2.3 Torneamento plástico

O torneamento plástico também chamado “spin” é um processo de enformação aplicável apenas a pequenas peças em que utilizando tornos especiais, a chapa animada de movimento de rotação é forçada por um rolete ou outra ferramenta a deformação plasticamente até se adaptar perfeitamente ao molde (fig. 72).

Page 31: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

31

Figura 72

4.2.3 Tipos de chapas e sua enformação mecânica

Concluída a apresentação dos principais métodos de enformação mecânica, descrever-se-ão agora alguns modos de fabrico para diferentes tipos de chapas.

Para melhor compreender a descrição que se segue, definem-se alguns termos que vão ser referidos com frequência:

- Bainha – Lado maior da chapa, suposta rectangular - Topo – Lado menor da chapa - Linha de torcimento – Direcção característica de enformação duma zona

determinada zona de chapa, que no caso de superfícies planificáveis é uma geratriz. Uma linha de torcimento coincide ou é paralela com as linhas de calor ou de dobragem dessa zona.

- Torcimento duma chapa – Menor ângulo que as geratrizes da superfície cilíndrica imaginária a que a chapa pertence depois de enformada, fazem com a sua bainha ou com os seus topos. No caso dessas geratrizes serem paralelas à bainha ou aos seus topos, diz-se que a chapa não tem torcimento.

- Enrolamento – Curvatura obtida na chapa pela quinagem mecânica ou a calores, segundo as linhas de torcimento.

- Flecha – Curvatura segundo uma direcção perpendicular ao enrolamento, resultante normalmente duma contracção longitudinal.

Os tipos de chapas enformadas mais comuns em construção naval, são muito variados, sendo razoável distingui-los em:

- Chapas copadas - Chapas cilíndricas

a) sem flecha

b) com flecha

b1) em concha

b2) em sela

- Chapas em ventoinha - Chapas em telhado - Chapas cónicas

As chapas cilíndricas podem ainda dividir-se globalmente em:

Page 32: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

32

- Chapas sem torcimento - Chapas com torcimento

No entanto esta divisão tem importância no processo de enformação a calores, pelo que não será tida em conta na descrição que se segue:

Em grande parte, os modos de fabrico que se irão descrever não são rigorosamente mecânicos pois, como se verá, há vantagens em recorrer à enformação a calores como complemento dos meios mecânicos.

4.2.3.1 6.2.3.1 – Chapas copadas

Uma chapa copada apresenta uma curvatura praticamente uniforme, conforme se ilustra na fig. 73.

Os elementos informativos necessários à enformação duma chapa deste tipo são habitualmente moldes ou carcaças em madeira. Para se acompanhar a evolução do trabalho, podem também ser construídas cérceas japonesas ou de arame.

Figura 73

Dentro das chapas copadas, considerar-se-ão dois casos:

a) Se a fecha de enformação a obter na chapa for pequena, os elementos informativos podem limitar-se a um croquis.

A fase de trabalho da chapa pode então iniciar-se por uma passagem ligeira à calandra ou à quinadeira ao longo de linhas paralelas. Posteriormente, aplicam-se calores em V nas bainhas (fig. 58) de forma a contraí-las e obter a forma desejada.

b) Se a copagem for muito acentuada, os elementos informativos devem estar reunidos numa carcaça de madeira.

Figura 74

Neste caso, antes de iniciar a enformação devem-se referenciar sobre as chapas as bainhas, de tal forma que em cada verificação a carcaça seja apoiada sempre no mesmo local.

Page 33: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

33

As bainhas e a posição das balizas marcam-se sobre a chapa ainda plena, oscilando a carcaça sobre ela para um lado e para o outro (fig. 74).

Figura 75

Figura 76

O início da aplicação de enformação propriamente dita deve começar pelo estancamento com moldes na prensa junto a um dos cantos mas de forma que a chapa fique toda acompanhada inferiormente e progredindo de uma bainha para outra, de modo a que as sucessivas zonas enformadas se sobreponham significativamente (fig.75).

Uma vez atingida a zona próxima da outra bainha e sempre com a chapa toda apoiada no molde inferior de copar, avança-se longitudinalmente apenas o necessário para prosseguir o deslocamento em direcção à bainha de partida, com sobreposição das zonas batidas (fig. 76).

Esta operação deverá ser repetida tantas vezes quantas as necessárias até se conseguir uma forma próxima da pretendida.

De cada vez que se percorre toda a chapa com a ferramenta, deve fazer-se uma verificação ou com as cérceas de arame enquanto a flecha por ainda pequena ou com carcaças quando a chapa já estiver da forma definitiva.

A chapa deve ser mais estancada na zona de maior flecha, o que normalmente acontece próximo do centro, devendo reduzir-se o estancamento à medida que a zona de trabalho se aproxima das bainhas.

Para conseguir um estancamento progressivo de forma a evitar o aparecimento de covas, e quando não houver moldes de copagem suficientemente escalonados, podem-se utilizar bolachas em aço para reduzir o raio de curvatura no início do trabalho (fig. 77). Pode mesmo dizer-se que é o processo de trabalho mais produtivo (embora menos perfeito) uma vez que a substituição de moldes devido ao seu elevado peso é uma operação muito demorada.

Figura 77

4.2.3.2 Chapas cilíndricas

�� ���������

Page 34: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

34

As chapas cilíndricas sem flecha são as mais fáceis de emformar, utilizando-se para isso a calandra.

A única dificuldade estára na capacidade de enrolamento da calandra. Caso o raio curvaturo desejado seja inferior ao raio do rolo superior da calandra, é necessário recorrer à quinadeira onde o enrolamento é mais moroso.

Os elementos informativos para este tipo de chapas são em geral cérceas de madeira. Se a chapa tem torcimento, as cérceas devem ter inscritas as posições das banhas relativamente a cada linha de curvatura (fig. 78).

Figura 78

A primeira fase será então definir o torcimento da chapa e depois bater linhas a uma distância entre 5 e 10 cm a fim de obter as linhas de quinagem.

�� ���������

� �����������������

Em regra quando a flecha é muito grande, é conveniente efectuar uma copagem geral da peça, destinada a facilitar o trabalho subsequente. O enrolamento ou quinagem posterior deverá efectuar-se na prensa com um ferro curvo, a fim de evitar a formação de covas na zona de aplicação dos topos da ferramenta (fig. 79). Fig. 79

A quinagem reduz a flecha que a peça já possuísse da copagem, havendo então necessidade de efectuar operações alternadas para quinar e aumentar a flecha (fig. 80).

��������������������������������������������

�������� ��� ����� ���������������������������

Page 35: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

35

Fig. 80

������ �

��������

O aumento da flecha poderá ser feito na prensa, com distensão do centro da zona trabalhada ou por estancação (fig. 81) ou por estiramento (fig. 82).����������������������������������������������������������������

Uma vez distendido o material por qualquer destes processos, as bainhas entram em carga e resistem ao prosseguimento do trabalho, sendo necessário aquecê-las com calores em V até à linha neutra da secção resistente e sob a acção dum esforço que amplie a acção dos calores (fig. 83).

Conseguida essa contracção e sem endireitar as bainhas a fim de aproveitar ao máximo as cargas de tracção introduzidas no centro da chapa, há que repetir a operação de estancação ou estiramento do centro e só depois corrigir os defeitos introduzidos nas bainhas pelos calores em V.

������ �O método operatório mais conveniente será então:

1- Aplicação de calores em V nas bainhas

2- Alongamento da zona central da chapa

3- Desempeno das bainhas.

Após uma sequência deste tipo convém corrigir o enrolamento perdido com os esforços aplicados na obtenção da flecha.

No caso das chapas terem uma secção resistente com um momento de inércia muito grande que dificulte o trabalho de enformação, torna-se conveniente cortar as abas a fim de tornar a operação mais fácil e soldando-as posteriormente (fig. 84).

O acabamento deste tipo de chapas é, em regra, um trabalho de eliminação cuidadosa de covas e gelhas, seguida de corte, pois estas chapas são enformadas com material em excesso.

������!�

Page 36: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

36

b2 - chapas em sela

Para se enformar uma chapa em sela, começa-se por a enrolar na calandra ou na guinadeira. Após essa operação, há que provocar o alongamento das bainhas, o que pode ser feito por calores em V nas bainhas conjugados com a aplicação duma carga ou por calores em losango no centro da chapa (fig. 85).

Fig. 85

Fig. 86

Por vezes e para pequenas correcções, também se empregam calores lineares no centro, destinados a obter um efeito de guinagem. Apesar de pouco activos, estes calores têm, no entanto, interesse por não provocarem defeitos (fig. 86).

A enformação de chapas em sela é mais fácil do que a de chapas em concha, uma vez que não há o perigo de flambagem (compressão instável) das bainhas.

É então conveniente fazer o alongamento das bainhas, corrigir os defeitos e prosseguir com o aquecimento do centro, repetindo esta operação até ser conseguido o efeito desejado.

O alongamento das bainhas é, normalmente, feito na prensa por estiramento, provocando o aparecimento de gelhas na bainha (fig. 87). Estas gelhas devem ser feitas, preferencialmente, com o material aquecido, a fim de facilitar a deformação plástica por redução do limite elástico.

Figura 87

O arrefecimento das gelhas deverá ser lento, evitando têmperas que dificultariam a aplicação de novos calores.

Na execução de gelhas, a chapa enforma em concha e só depois de desempenadas as bainhas é que toma a forma de sela (fig. 88).

Page 37: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

37

�"�������� ��"������

��������

Tal como referido para o caso das chapas enformadas em concha, quando a forma das chapas é muito resistente à enformação, torna-se necessário cortar as abas para facilitar o trabalho. Neste caso, porém, a soldadura posterior, tendo tendência a contrair a bainha, vai reduzir a flecha, pelo que é necessário fazer uma correcção final da peça.

O corte final da chapa, uma vez que ela é enformada com excesso de material, exige também uma correcção de enformação, pois há tendência para contracção das bainhas, contrariando o trabalho realizado.

4.2.3.3 Chapas em ventoínha

Designam-se com forma em ventoinha as chapas enformadas que apresentem torcimento dos topos muito acentuado (fig. 89).

��������#�

A primeira operação a efectuar é construir carcaças parciais em arame soldado a partir da carcaça global (fig. 90).

Figura 90

Page 38: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

38

Estas, depois de roladas sobre as chapas, permitem a definição das linhas de

torcimento variáveis de zona para zona (fig. 91).

Fig. 91

Fig. 92

É conveniente efectuar simultaneamente uma marcação a giz para referenciar a posição da carcaça de arame de cada vez que é necessário "apalpar" a forma da chapa (fig. 92).

A enformação deste tipo de chapas dever-se-á iniciar por um enrolamento das bainhas, destinado a facilitar o torcimento dos topos (fig. 93).

����� �"����������$���������������������������������������������

��"���������������������

�����# �

Segue-se o enrolamento segundo as direcções de torcimento definidas anteriormente.

O grande problema de enformação destas chapas reside no facto do torcimento variar de zona para zona e, portanto, a aplicação dum enrolamento pode vir alterar o anterior. Há, assim, necessidade de enrolar as chapas lenta e uniformemente, uma vez que um enrolamento localizado muito intenso dificulta o trabalho de todas as zonas vizinhas.

Fig. 94

Se a chapa possui um enrolamento longitudinal (topos curvos), a enformação ainda é mais complicada, pois a aplicação desse enrolamento implica uma diminuição da flecha (fig. 94).

Em regra, a enformação deste tipo de chapas não exige calores, sendo, no entanto, um dos mais difíceis de conseguir.

Page 39: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

39

Resta acrescentar que, não sendo este tipo de chapas planificável, a enformação tem de ser feita com material a mais, pelo que ao efectuar o corte para obter a forma definitiva, se altera ligeiramente a forma, havendo necessidade duma correcção final.

4.2.3.4 Chapas em telhado

Uma chapa diz-se em telhado quando é trabalhada ao longo de linhas de quinagem concorrentes (fig. 95).

A forma mais conveniente de enformar tais chapas é executar a quinagem gradualmente, uma vez que a resistência da chapa aumenta com progredir da operação.

�����2��

Se a chapa é muito aberta, a contracção é pequena e a aplicação de calores é reduzida, apenas se verificando ser necessária no final para corrigir a flecha (fig. 96).

Fig. 96

Fig. 97

Se a contracção a exigir é muito intensa, então os calores a empregar são em grande quantidade (fig. 97).

Os elementos informativos para este tipo de chapas tanto podem ser fornecidos por carcaças ou por cérceas.

Tal como noutras chapas não planificáveis, a chapa é enformada com material a mais, pelo que é necessário que seja cortada no final.

4.2.3.5 Chapas cónicas

As chapas cónicas podem-se considerar como um caso particular das chapas cilíndricas, pelo que se aplicará tudo quanto foi dito para esse tipo de chapas, com a única diferença das linhas de torcimento não serem paralelas nas chapas cónicas.

Page 40: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

40

4.3 Enformação a Calores

4.3.1 Processo de Enformação a Calores

Com a evolução e aperfeiçoamento das máquinas de enformação, a aplicação de calores com o mesmo fim tem vindo a perder a sua importância. No entanto, em alguns casos ela é ainda fundamental na obtenção das formas desejadas.

A enformação a calores é obtida pelo aquecimento das chapas com maçaricos oxiacetilénicos. Estes são, normalmente, montados em rodízios destinados a manter constante a distância do bico à superfície da chapa.

As chapas são colocadas nos chamados planos de enformação. Estes são superfícies perfeitamente niveladas e constituídos normalmente por grandes blocos de ferro fundido pouco sensíveis ao aquecimento e com capacidade para suportar grandes esforços. A intervalos regulares são furados para permitir a introdução de grampas, também denominadas cães, que permitem a fixação das chapas.

Em certos casos, em vez de planos de enformação utilizam-se berços para fixação das chapas. Os berços são estruturas feitas a partir de desperdícios de material, que reproduzem a superfície exterior da chapaa enformar (forro).

Os elementos informativos a utilizar são, como já se viu, cérceas e carcaças que reproduzem a superfície interior da chapa a enformar (ossada).

As chapas que vão ser enformadas a calores devem ser marcadas e cortadas com uma margem de 50 a 100 mm em cada topo.

A enformação, duma maneira geral, deve iniciar-se pela determinação da linha de torcimento, a fim de se obter a direcção em relação à qual as linhas de calor são paralelas. Para isso constroem-se as cérceas dos dois topos e posicionam-se sobre a chapa, acertando o plano de destorcimento (Fig. 98).

Se as linhas curvas definidas pelas cérceas forem ambas tangentes à superfície da chapa, os pontos de tangência definem a linha de torcimento.

Nas chapas do costado, o torcimento varia de baliza para baliza. Mas, para efeitos de enformação, admite-se que a variação é pequena ao longo da chapa sendo, portanto, aproximação suficiente para obter o torcimento entre as cérceas dos topos. Exceptua-se

Page 41: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

41

o caso das chapas cónicas em que o torcimento pode variar substancialmente duma baliza para outra.

Definido o torcimento há que marcar as linhas há que marcar as linhas de calor, geralmente paralelas. O intervalo mais utilizado entre linhas é de 30 cm.

Com o aquecimento consegue-se um enrolamento segundo a direcção longitudinal da chapa, quando esta não tem torcimento. Caso a chapa tenha torcimento obtém-se também um desvio angular entre os topos (torcimento dos topos).

Os efeitos de quinagem obtidos com a aplicação de calores, e que foram já basicamente estudados no § 6.1, podem ser ampliados pela aplicação de solicitações mecânicas. A acção destas está facilitada pelo facto do calor reduzir o limite elástico do material. Com esse fim utilizam-se várias ferramentas, das quais as mais importantes são: grampas, calços e pesos.

Com as grampas consegue-se fixar a chapa ao plano de enformação, funcionando essa fixação como um apoio de encastramento às solicitações mecânicas, dada a dificuldade que a chapa tem em rodar (Fig. 99).

Os calços destinam-se a manter a chapa afastada do plano de enformação (Fig. 99 e 100).

Em conjunto com os calços utilizam-se por vezes pesos.

O aquecimento altera as características do aço de construção naval, pelo que não é conveniente ultrapassar os 650ºC.

O arrefecimento com água não é, em regra, prejudicial, excepto para os aços de alta resistência onde um tal arrefecimento provocaria uma têmpora, fragilizando-os.

4.3.2 Tipos de chapas e sua enformação a calores

Como exemplo do referido para a enformação mecânica, poderão dividir-se as chapas enformadas mais utilizadas em construção naval nos seguintes tipos:

- Chapas cilíndricas

a) sem torcimento

a.1 – sem flecha

a.2 – com flecha

a.2.1 – em concha

Page 42: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

42

a.2.2 – em sela

b) com torcimento

b.1 – sem flecha

b.2 – com flecha

b.2.1 – em concha

b.2.2 – em sela

- Chapas em ventoínha

- Chapas cónicas

- Chapas semi-curvas

4.3.2.1 Chapas cilíndricas

Estas chapas podem imaginar-se como fazendo parte da superfície dum cilíndro, em que se distinguem:

- Chapas sem torcimento – em que as geratrizes são paralelas às baínhas ou aos

topos da chapa

- Chapas com torcimento – em que as geratrizes são oblíquas em relação às

baínhas ou topos.

a) Chapas sem torcimento

As marcações das linhas de calor estão neste caso facilitadas, pois são paralelas às baínhas ou aos topos.

As cérceas permitem, por simples montagem, verificar rapidamente se a chapa tem flecha e qual o seu tipo: se a distância máxima dos pontos da curva de enrolamento ao plano de destorcimento for maior para a zona central que para os topos, a chapa terá enformação em “concha”. Caso se verifique o contrário, a chapa terá enformação em “sela” (Fig. 101).

Depois de apoiadas e alinhadas sobre a chapa, as cérceas dão-nos a indicação das alturas e posição dos calços. As distâncias dos extremos das cérceas à chapa, que podem ser medidas relativamente ao plano de destorcimento, permitem obter a distância a que diversos pontos da linha de contorno deverão ficar do plano de enformação (Fig. 102).

Esta operação é de grande interesse, pois a chapa deve ser calçada correctamente em toda a periferia a fim de se poder controlar convenientemente a enformação.

Page 43: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

43

a.1) Chapas sem flecha

Embora o processo mais simples de enformação deste tipo de chapas seja mecanicamente na calandra, pode também enformar-se dando linhas de calor, conforme indicado na Fig. 103 – 1ª fase. No entanto, há quase sempre tendência para a formação

Page 44: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

44

de uma pequena flecha em concha, pelo que é necessário compensar esse efeito com pequenos calores aplicados na face convexa (Fig, 103 – 2ª fase). A aplicação desses calores implica, porém, uma pequena redução do enrolamento.

a.2) Chapas com flecha

As chapas com grande flecha não são bem enformadas unicamente a calores, pois as tensões internas a que a chapa fica sujeita após ter sido enformada a calores torna difícil conseguir uma nova enformação pelo mesmo processo.

Com efeito, as tensões térmicas induzidas pelo aquecimento vão-se adicionar às tensões internas do material já arrefecido de efeito contrário, o que dificulta a deformação plástica.

É preferível então a enformação mecânica, conforme se viu no § 6.2.3.2 – b), servindo neste caso a aplicação de calores como complemento daquela. No entanto, para pequenas flechas, a enformação a calor pode ser rentável.

a.2.1) Chapas em concha

Neste caso, para aumentar o efeito de concha é conveniente dar calores contínuos junto às baínhas e descontínuos no centro (Fig. 104).

Page 45: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

45

A utilização de pesos na zona central para acentuar a enformação não é praticável, pela necessidade de dar calores nessa zona restando o peso próprio da chapa.

Podem também utilizar-se calores em V para reforçar a contracção das baínhas embora, como já se viu, essa contracção provoque um engelhamento das baínhas sendo necessário o seu desempeno à prensa.

Se a flecha a obter for já razoável é conveniente iniciar a sequência pela aplicação de calores nas baínhas seguido então de linhas de calor ao longo das geratrizes. O processo é repetido tantas vezes quantas as necessárias, sendo interrompido apenas para se efectuar a reparação do engelhamento das baínhas à prensa.

a.2.2) Chapas em sela

Nas chapas em sela há que conseguir uma sobre-elevação da zona central relativamente aos topos, pelo que se solicita a chapa, conforme indicado na Fig. 105.

Além disso, se o enrolamento o permitir, poder-se-á utilizar o efeito de dar linhas contínuas no centro e descontínuas junto às baínhas.

As solicitações mecânicas devem ser elevadas, para o que pode ser conveniente fixar os topos com grampas, para que o material deforme plasticamente em toda a sua extensão, logo que a elevação de temperatura reduza o limite elástico. O alongamento das fibras conduz então à deformação pretendida.

O efeito de sela pode também ser conseguido com a aplicação de calores na face convexa da chapa, após a obtenção do enrolamento (Fig. 106). No entanto, os calores na face convexa fazem diminuir o enrolamento.

Page 46: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

46

b) Chapas com torcimento

As chapas com torcimento têm uma enformação idêntica às chapas sem torcimento. Verifica-se, no entanto, que como as secções feitas por planos perpendiculares à linha de torcimento têm áreas variáveis, a posição do centro de gravidade dessas secções varia de secção para secção. Na Fig. 107 a área das secções é crescente de A a FF’, mantém-se constante de FF’ a KK’ e é decrescente de KK’ a C. Nestas condições, o centro de gravidade para igual enrolamento (igual raio de curvatura) está situado tanto mais baixo quanto menor for a secção recta da chapa. Assim, para um enrolamento razoável, só a parte central da chapa poderá ter tendência para enformar em “sela”, enquanto que as restantes secções terão tendência para o efeito de “concha”. Esta é a razão pela qual quando se pretende uma enformação em “sela” de chapas com bastante torcimento é necessário solicitá-lo mecanicamente a fim de procurar atingir com cargas aplicadas a forma mais adequada para posterior enformação, fixando-se os topos da linha do torcimento com grampos e encurvando a chapa com calços nos cantos mais afastados da linha de torcimento.

Page 47: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

47

b.1) Chapas sem flecha

Aplicar-se-á tudo o que foi dito anteriormente para as chapas sem torcimento e sem flecha, com a única diferença de que, neste caso, as linhas de calor terão torcimento.

b.2) Chapas com flecha

b.2.1) Chapas em concha

As chapas em concha devem calçar-se na periferia, de forma a manterem-se afastadas do plano de enformação e fixando os topos da linha de torcimento (Fig. 108).

Tal como referido para as chapas sem torcimento, as linhas de calor devem ser descontínuas no centro e contínuas junto às baínhas. No caso de a flecha ser insuficiente há necessidade de utilizar calores em V nas baínhas e carregar com pesos o centro da chapa.

O efeito de concha será tanto mais pronunciado quanto maior for o mínimo de linhas de calor que intersectarem a baínha.

b.2.2) Chapas em sela

Practicamente tudo o que se disse em relação às chapas sem torcimento e com a forma em sela, se aplica a este caso.

Assim, também se deverão solicitar as chapas, mas agora o torcimento facilita a deformação, uma vez que a secção resistente nos cantos é menor.

Também aqui na primeira fase se deverão aplicar linhas de calor contínuas no centro e descontínuas junto às baínhas e, numa segunda fase, calores descontínuos na face convexa. Estes calores deverão ser perpendiculares à linha de torcimento de modo a reduzir ao mínimo a diminuição do enrolamento (Fig. 109).

Page 48: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

48

Estes calores na face convexa deverão ter uma distribuição tão homogénea quanto possível. Além disso, não se deverão aproximar dos topos, pois sendo esta zona livre, mais facilmente se desenrolará.

4.3.2.2 Chapas em ventoínha

A enformação de chapas em ventoínha torna necessária a torsão dos seus topos, exigindo o alongamento das baínhas uma vez que, enquanto a zona central se mantém praticamente sem deformação durante a operação, as baínhas tomando a forma de um hélice, esticam substancialmente (Fig. 110).

Em regra, a obtenção do torcimento neste tipo de chapas é difícil, mesmo entre duas balizas consecutivas. Trabalham-se então os topos da chapa independentemente um do outro até ao torcimento pretendido, utilizando linhas de torcimento inclinadas a 45º em relação às baínhas ou aos topos (Fig. 111). Esta inclinação corresponde ao torcimento máximo que, só por acaso, corresponderá ao torcimento da chapa a enformar. No entanto, solicitando a chapa com grampos e calços consegue-se obter a enformação pretendida.

Page 49: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

49

Mais complicado é o caso de chapas em ventoínha com grande flecha, uma vez que o torcimento dos topos aumenta grandemente a resistência da chapa à flexão, exigindo uma grande profusão de linhas de calor descontínuas na parte convexa.

Os calores utilizados para atingir a flecha pretendida contrariam o enrolamento exigindo, tal como nas chapas em sela, operações alternadas em cada uma das faces da chapa.

Neste tipo de chapa faz-se, por vezes, a aplicação de ventosas para contrair o material da zona central, com o que se consegue resultados análogos ao alongamento das baínhas. Esta utilização, devido à fragilização que introduz no material, é de evitar o mais possível.

4.3.2.3 Chapas cónicas

A enformação deste tipo de chapas é muito idêntica à enformação de chapas cilíndricas, sendo-lhe directamente aplicável o que foi dito para este último tipo de enformação, apenas com excepção na forma de obter as linhas de torcimento.

As chapas cónicas caracterizam-se por terem enrolamentos diferentes nos topos ou baínhas opostas ou, dito de outra forma, por apresentarem variação no raio das linhas de curvatura da chapa. O torcimento varia de inclinação, de uma baínha para outra ou de um topo para outro, concluíndo-se que as linhas de calor não são paralelas, variando o seu número de cércea para cércea e aumentando no sentido do maior enrolamento.

Se a conicidade é bastante pequena, pode utilizar-se uma simples enformação cilíndrica com linhas de calor paralelas e solicitando a chapa de forma a conseguir a deformação pretendida (Fig. 112).

Page 50: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

50

Nas chapas cónicas com enformação ligeira em “concha”, e no caso de uma das baínhas não ser intersectada por linhas de calor, será necessário aplicar nessa baínha calores em V (Fig. 113).

4.3.2.4 Chapas semi-curvas

Os tipos de chapas já considerados são os mais frequentes. No entanto, tem também interesse a análise das chapas semi-curvas.

Estas são chapas que tendo uma zona plana só são enformadas nos cantos (Fig. 114).

Page 51: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

51

A dificuldade de trabalho destas chapas provém da necessidade de contrariar o efeito de “sela” ou de “concha” da zona enformada sobre a zona plana.

Dois casos podem ser considerados: chapas com torcimento de pequena inclinação relativamente às baínhas (Fig. 115) e chapas com torcimento de grande inclinação relativamente às baínhas (Fig. 116).

No primeiro caso há tendência para a chapa tomar uma curvatura côncava nos topos, sob a acção do efeito de “sela” na zona enformada, provocando uma elevação nas baínhas (Fig. 117).

Page 52: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

52

Depois de completado o enrolamento deve trabalhar-se a face oposta, voltando a chapa e aplicando calores descontínuos paralelos à linha de torcimento (Fig. 118).

No caso em que o torcimento tem grande inclinação relativamente às baínhas, devido ao efeito de “sela”, a chapa tende a deformar as baínhas em concavidade e o topo oposto ao enformado em convexidade (Fig. 119). A aplicação de calores interrompidos, paralelos à linha de torcimento, impõe-se sobre a face convexa (Fig. 120).

Page 53: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

53

Resta acrescentar, como já foi referido anteriormente, que estas enformações têm de ser feitas com material a mais, pelo que ao efectuar o corte para obter a forma definitiva, altera-se ligeiramente a forma, havendo necessidade duma correcção final.

Page 54: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

54

5 Desempeno de Painéis

5.1 Princípios Gerais A soldadura provoca, como se viu no capítulo 7, um empeno de chapas. Embora deva haver o maior cuidado na prevenção dessas deformações, ela atinge por vezes valores inadmissíveis, que exigem se proceda ao seu posterior desempeno.

As Sociedades Classificadoras definem valores máximos, admissíveis para as flechas dos painéis e que se representam na Figura 138 pela letra f:

Localização Flecha Máxima

Convés e duplo-fundo 8 mm

Pavimentos da superestrutura:

- cobertos 12 mm

- expostos 8 mm

Pavimentos das cobertas 10 mm

Anteparas externas da superestrutura 10 mm

Anteparas e divisórias internas:

- revestidas 12 mm

- não revestidas 8 mm

Anteparas estruturais 10 mm

Bancos das longarinas e sicórdias 8 mm

Para determinar a flecha (f) deve usar-se uma régua com 1m de comprimento. A régua deve apoiar em dois pontos que distem pelo menos 30 cm, sendo os valores de f1 extrapolados para 1m (Fig. 139).

Page 55: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

55

O processo mais eficaz para corrigir essas deformações é a aplicação de linhas de calor, cujo princípio de funcionamento foi já estudado aquando da enformação a calores.

As chapas devem ser aquecidas a temperaturas que rondem os 600 a 650º C (rubro escuro).

Para isso utilizam-se maçaricos oxi-acetilénicos, providos de roletes, de forma a permitir um melhor controlo de velocidade e da distância à chapa.

Estudar-se-ão dois processos de desempeno, que dependem do tipo de maçarico utilizado.

5.2 Método “Tampo” Neste método utilizam-se os clássicos maçaricos com um único bico.

Na sua aplicação começa-se por aquecer um ponto e quando nessa zona se começa a atingir a temperatura desejada (ao rubro), continua-se o aquecimento em zig-zag conforme se indica na Fig. 140.

A largura da linha de aquecimento (l) depende da espessura da chapa:

Espessura da chapa Largura (l)

2 – 6 mm 12 – 17 mm

6 – 12 mm 18 – 25 mm

12 – 24 mm 26 – 35 mm

O efeito pretendido é o de quinadeira, pelo que os calores deverão ser do tipo de meia espessura, embora se obtenham efeitos mais rápidos se a profundidade de aquecimento atingir pontualmente a outra face da chapa.

Um exemplo de aplicação deste método é no desempeno de pavimentos. Supondo o indicado na Figura 141, começa-se por assinalar os reforços que estão soldados à face oposta da chapa. Deixando uma zona de 300 mm junto às anteparas ou outras

Page 56: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

56

superfícies perpendiculares, inicia-se o aquecimento aplicando as linhas de calor em zig-zag a uma distância de 35 mm dos reforços e de ambos os lados. Este aquecimento é feito junto a cada um dos reforços, seguindo-os de uma extremidade até à outra. Terminada esta operação deixa-se arrefecer para ver o resultado.

As zonas intermédias da chapa que apresentem ainda convexidades (curvaturas viradas para o operário) são então aquecidas pelo mesmo processo, dando uma série de calores, tal como assinalado na Fig. 142 pelo número 2.

Estes calores devem distar dos primeiros (1) cerca de 80 a 100 mm. Deixando arrefecer dá-se, caso seja necessário, uma última série de calores assinalada com o número 3 na Fig. 142.

Page 57: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

57

Normalmente depois da aplicação desta terceira fase, a chapa fica plana, não sendo necessário aplicar calores na zona que inicialmente estava côncava (com a curvatura para baixo, tratando-se de um pavimento). No entanto, por vezes há necessidade de aplicar alguns calores para corrigir as deformações remanescentes.

A rectificação do empeno dos cordões de soldadura a topo nas baínhas das chapas, deve ser feito entre a segunda e a terceira fase descritas anteriormente, com linhas de calor em zig-zag, conforme se indica na Fig. 143. Estas linhas de calor deverão ter uma largura de 15 mm aproximadamente.

5.3 Método Multi-Chamas Recentemente começaram a utilizar-se, no desempeno de painéis, maçaricos oxi-acetilénicos multi-chamas, normalmente com três bicos, conforme se mostra na Fig. 144.

Page 58: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

58

Com este método obtém-se um melhor efeito de desempeno, com superfícies mais lisas e limpas.

As linhas de calor são também dadas na face oposta aos reforços em comprimentos de 250 a 350 mm e espaçados de 100 mm.

Tal como nos maçaricos de uma chama, começam-se por aplicar os calores na zona dos reforços e só depois se trata a zona intermédia.

A posição das chamas relativamente ao reforço varia consoante o sentido de curvatura da chapa e se mostra nas figuras seguintes:

A Fig. 145-a) é o caso mais frequente, devendo a chama central correr oposta ao reforço.

Na Fig. 145-b), embora as deformações sejam de sentido contrário, a posição do maçarico deve ser idêntica, mas o calor deve ser mais prolongado por forma a atingir toda a espessura e ser conseguido o efeito de contracção em vez do de quinadeira, com que se obtém o primeiro caso.

Nos casos em que os empenos da chapa têm sentidos variados, o maçarico aplica-se deslocado lateralmente em relação aos reforços, como se mostra nas Figs. 145-c) e

Page 59: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

59

145-d), sendo importante para o prosseguimento do trabalho observar e ter em conta a deformação que a chapa toma junto ao reforço após um aquecimento.

O aquecimento da zona dos reforços deve ser feito simultaneamente em áreas o maior possível, para que não haja interferência das linhas de calor entre si, durante o processo de contracção.

Uma sequência recomendável é a indicada na Fig. 146.

Depois de desempenada a zona dos reforços, tratam-se as deformações que ainda permanecem nos vãos da chapa.

Como já se viu, em pavimentos começa-se o desempeno pelas deformações dirigidas para cima e nas anteparas pelas que estão viradas para fora.

Os primeiros calores dão-se no centro da deformação, com a sequência indicada na Fig. 147. Logo que arrefeçam aplicam-se linhas de calor na sua continuação (na figura assinaladas com o número 2). É importante que não se introduza novo calor sem que tenham arrefecido os anteriores.

Se os calores dados não forem suficientes para eliminar as deformações, dão-se novas linhas de calor deslocadas lateralmente (Fig. 148). Se o empeno é homogéneo entre reforços, aplicam-se calores laterais (tipo a) da figura), enquanto que se a deformação for limitada ao centro, os calores são dados de forma encaixada (tipo b)).

Page 60: 1 Preparação do Material - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Os aços de construção naval devem ser previamente preparados antes de ... o aço a uma decapagem e pintura com primário,

60

5.4 Observações Complementares Por vezes, auxilia-se o desempeno provocado pela acção dos calores, solicitando a chapa com prumos, macacos, grampas e cunhas. Mas, com o desempeno a calores procura-se evitar o uso da marreta. No entanto, casos há em que isso é necessário, devendo a martelagem efectuar-se quando a chapa estiver a temperaturas já baixas (da ordem dos 60ºc).

Na prefabricação, o desempeno só pode efectuar-se se o bloco estiver fixo de forma rígida para não se deformar globalmente, sob a acção do calor.

O desempeno das superestruturas deve efectuar-se de acordo com a sequência indicada na Fig. 149, iniciando-se pelo primeiro pavimento, tratando só depois as divisórias situadas abaixo e assim sucessivamente.

Por outro lado, só se deve começar o desempeno depois de estarem concluídos os trabalhos de soldadura.

No entanto, as formas de trabalho apresentadas são apenas uma base. Como as deformações dependem de diversos factores, como sejam a sequência e os processos de soldadura, nem sempre é possível aplicar de forma rígida o referido anteriormente. Por isso, para além da necessária experiência é, muitas vezes, conveniente introduzir alterações que conduzam ao êxito.