1. o moderno estado de direito democrático e social estado ... · tem liberdade negativa caso...

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Apontamentos Direito Fiscal 1. O Moderno Estado de Direito democrático e Social Como leccionado em Introdução ao Direito, um Estado de Direito é um Estado ou uma forma de organização político-estadual cuja actividade é determinada e limitada pelo direito que o legitima. Portanto, o Estado de Direito, significa que nenhum indivíduo, presidente ou cidadão comum está acima da lei. O Direito não é objecto do Estado (como acontece nos regimes totalitários ou fascistas em que o Direito é ditado pelo Estado), em contrário, o estado será o objecto do Direito, sobre o qual ele irá incidir de forma que todas as decisões estaduais sejam legitimadas (segundo o Direito) Pois sabemos que o fim último do Estado de não Direito é obter a eficiência (nomeadamente económica) não havendo aqui a noção da dignidade da pessoa humana plasmada no art. 1.º da CRP uma vez que o Homem é visto como um meio para atingir um fim Num estado de Direito é impossível haver uma dissociação entre políticas sociais/económicas e a inviolável dignidade da pessoa humana e respectivos direitos E, a este propósito, porque os indivíduos não podem ser mais vistos como meros meios para se atingirem fins (como acontece num estado fascista), mas um fim neles próprios princípio categórico de Immanuel Kant É esta enorme panóplia de direitos e obrigações ditadas pelo Direito (Dever-ser e não um Ter de ser) que vão legitimar e tornar possível uma convivência em sociedade pois só assim seremos realmente livres só assim o Homem respeitar-se-á realmente. Não esqueçamos que segundo Pinto Bronze, o Homem é incompleto devido à prematuridade com que vem ao mundo e por isso precisa de um conjunto de indicações que ditem como deve agir (nomeadamente o que é correcto e o que é errado). Se assim não fosse cada decisão que o Homem tomasse, teria que ponderar todos os prós e contras e fazer uma sucessão de todas as cadeias causais que daí adviessem o que é impossível na prática. Por isso surge o Direito como forma de completar esta lacuna do Homem.

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Apontamentos Direito Fiscal

1. O Moderno Estado de Direito democrático e Social

Como leccionado em Introdução ao Direito, um Estado de Direito é um Estado ou uma forma

de organização político-estadual cuja actividade é determinada e limitada pelo direito que o

legitima.

Portanto, o Estado de Direito, significa que nenhum indivíduo, presidente ou cidadão comum

está acima da lei.

O Direito não é objecto do Estado (como acontece nos regimes totalitários ou fascistas em que o

Direito é ditado pelo Estado), em contrário, o estado será o objecto do Direito, sobre o qual ele

irá incidir de forma que todas as decisões estaduais sejam legitimadas (segundo o Direito)

Pois sabemos que o fim último do Estado de não Direito é obter a eficiência (nomeadamente

económica) – não havendo aqui a noção da dignidade da pessoa humana plasmada no art. 1.º da

CRP – uma vez que o Homem é visto como um meio para atingir um fim

Num estado de Direito é impossível haver uma dissociação entre políticas sociais/económicas e

a inviolável dignidade da pessoa humana e respectivos direitos

E, a este propósito, porque os indivíduos não podem ser mais vistos como meros meios para se

atingirem fins (como acontece num estado fascista), mas um fim neles próprios – princípio

categórico de Immanuel Kant

É esta enorme panóplia de direitos e obrigações ditadas pelo Direito (Dever-ser e não um Ter de

ser) que vão legitimar e tornar possível uma convivência em sociedade – pois só assim seremos

realmente livres – só assim o Homem respeitar-se-á realmente. Não esqueçamos que segundo

Pinto Bronze, o Homem é incompleto devido à prematuridade com que vem ao mundo e por

isso precisa de um conjunto de indicações que ditem como deve agir (nomeadamente o que é

correcto e o que é errado). Se assim não fosse cada decisão que o Homem tomasse, teria que

ponderar todos os prós e contras e fazer uma sucessão de todas as cadeias causais que daí

adviessem – o que é impossível na prática. – Por isso surge o Direito como forma de completar

esta lacuna do Homem.

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O Estado de Direito pressupõe que a lei e, portanto, o direito seja a norma que vise a Justiça

No entanto o que aqui se verifica é que falta algo ao Estado de Direito (o Direito apenas incide

como forma de se efectivarem um conjunto de Direitos e obrigações, não incidindo sobre a

forma como são escolhidos os governantes) - a legitimação democrática do poder.

Verifica-se também outra diferença defendida por muitos autores – A de liberdade negativa e

liberdade positiva1.

A liberdade negativa consiste na ausência de coerção (obrigação). Neste sentido, um indivíduo

seria livre desde que ninguém o forçasse a agir ou o proibisse de agir de certa maneira. Já

liberdade positiva consistiria num controle efectivo da própria vida. Um alcoólico, por exemplo,

tem liberdade negativa caso ninguém o obrigue a beber, mas ainda assim não tem liberdade

positiva.

Segundo esta perspectiva:

O Estado de direito e democracia correspondem a dois modos de ver a liberdade.

No Estado de direito concebe-se a liberdade como liberdade negativa, ou seja, uma

«liberdade de defesa» ou de «distanciação» perante o Estado. É uma liberdade liberal

que «curva» o poder.

Ao Estado democrático seria inerente a liberdade positiva, isto é, a liberdade assente no

exercício democrático do poder.

Robert Dahl – fala da democracia

O Estado constitucional carece da legitimidade do poder político e da legitimação desse mesmo

poder. O elemento democrático não foi apenas introduzido para «travar» o poder (to check the

power); foi também reclamado pela necessidade de legitimação do mesmo poder.

1 Noções criadas por Isaiah Berlin (1909-1997)

A tributação e a sociedade:

Falar de cidadania, no dealbar do terceiro milénio, é, forçosa e irremediavelmente, aludir à

necessidade de os cidadãos interiorizarem, com carácter prioritário, o inafastável dever de pagar

impostos.

Onde houver sociedade haverá tributos, sem tributos fica postergado qualquer projecto social

global, de tal modo que não subsistirá qualquer comunidade politicamente organizada em dado

território.

A constituição como fonte do Direito Fiscal dita um conjunto de trâmites ou princípios que este

deverá cumprir de forma a que efectivamente se verifica uma sociedade justa, livre e solidária (o

“sonho de Abril”) assente na dignidade da pessoa humana – Tratada no art. 1.º da CRP e

presente em tantos outros artigos da mesma.

Tendo em conta a dignidade da pessoa humana, a tributação não é possível (ou é

inconstitucional) quando o visado - o sujeito passivo – não detenha, no seu património, sequer o

mínimo económico-financeiro imprescindível a uma vida condigna.

Ao não terem senão bens além do estritamente necessários a sobreviver, alguns cidadãos auto-

excluem-se e são excluídos da tributação. Num Estado de Direito Democrático e Social não se

tributa quem não tem o mínimo imprescindível a uma vida condigna.

Também subjacente aqui um certo principio de igualdade?

De igual modo, todos os cidadãos são tributados mas não de forma igual, já que seria, no fundo

e sempre, uma afirmação desigual de estatutos cívicos diferenciados que, em boa verdade,

inexiste, já que todos são iguais perante a lei.

Deste modo o princípio da igualdade está assente em tratar de forma igual o que é igual e de

forma desigual o que não é igual – Só assim se verifica uma justiça efectiva

Temos como exemplo desta justiça as taxas progressivas de IRS, em que a taxa vai aumentando

conforme aumenta o rendimento auferido pelo individuo

Podemos afirmar, de certa forma, que este princípio da dignidade da pessoa humana é como a

barreira ou limite máxima(o) e intransponível do Direito Fiscal, na medida em que não pode

simplesmente encarar a pessoa como mero meio de obter tributos. A pessoa possui direito a uma

vida condigna com qualidades mínimas de modo a que não seja ferida a sua dignidade enquanto

ser humano.

É por sua vez este princípio (dignidade da pessoa humana) que fundamenta o salário mínimo

nacional – exactamente de forma a garantir que todos os cidadãos inseridos no mercado de

trabalho tenham o direito de auferir um valor mínimo capaz de proporcionar uma vida condigna

e satisfatória.

Ora, tendo em conta esta linha de pensamento, se fosse permitido tributar o património dos

indivíduos que não têm o mínimo de possibilidades financeiras para uma vida condigna, o

salário mínimo nacional não faria qualquer sentido – esta forma de estabelecer um mínimo

capaz de proporcionar uma vida satisfatória seria quebrado, uma vez que esse valor seria

tributado e o mínimo que ele estabelece não seria cumprido.

O salário nacional é a barreira mínima que dita condições de vida que têm em conta a dignidade

da pessoa humana

E como a lei não pode ser contraditória, os tributos não podem ser devidos a quem não tem

esses mínimos.

Desta forma a grande maioria das políticas económicas têm que obrigatoriamente estar assentes

neste princípio que ditará a sua legalidade e conformidade com a constituição

A família é também vista com especial tratamento no que refere à tributação – podemos aqui

designar por discriminação positiva em sede de tributação.

Art. 67.º CRP – Temos o caso concreto da criação do Imposto sobre o rendimento singular

(IRS) em que há uma certa consciência, digamos assim, das despesas face ao rendimento

auferido pelas famílias

Em que o Estado permite que determinadas despesas sejam deduzidas ao montante total de

rendimentos auferidos – Assim (como se assemelha ao IVA) se a despesa ultrapassar o

rendimento, há imposto a receber do Estado. Caso aconteça o contrário, há imposto a pagar ao

Estado.

O que ilustra a frase célebre do nosso professor de Direito Fiscal, quando afirma que não

compensa ser rico em Portugal – Temos é que ser pobres

Pois realmente é a classe alta que tem vindo a suportar (não de forma tão difícil como na classe

baixa e média) a maior parte das grandes taxas contributivas.

E na óptica do IRS, raramente as famílias de classe alta possuem imposto a receber do Estado,

uma vez que, economicamente os gastos, por exemplo em bens essenciais, têm um menor peso

no seu rendimento, enquanto os gastos em bens supérfluos aumentam – Lei de engel(?).

Segundo esta lógica faz sentido tributar mais os ricos e menos os pobres – Há que haver uma

redistribuição igualitária de rendimentos para que não aconteça que uns tenham tudo e outros

absolutamente nada – contraste que se verifica também nos países menos desenvolvidos (ou em

vias de desenvolvimento) e nos países desenvolvidos – Há pessoas a morrer sobrebnutridas nos

países desenvolvidos e pessoas a morrer subnutridas nos países mais pobres.

Uma ironia demasiado dura e incompreensível

E isto não acontece só a nível global. Também há casos destes no nosso pequeno país, em que

existe um grande número de famílias no limiar da pobreza e outras que simplesmente gastam a

maior parte dos seus rendimentos em bens desnecessários – Aqui é pertinente formular a

questão: Onde está os fundamentos desta sociedade livre e solidária?

Por mais que as políticas fiscais se esforcem para uma redistribuição justa dos rendimentos, esta

será sempre uma Utopia apartir do momento em que cada individuo não interiorizar um espirito

de entreajuda e tomar consciência que faz parte de um todo integrante e que a pobreza de uns

influenciará negativamente (por causa dos impostos) ou positivamente (preços mais baixos

associados a menor poder de compra/menor procura) os mais ricos.

A tributação por sua vez também obedece ao princípio da legalidade tributária - “no taxation

without representation” – art. 8.º da LGT

Quantas mais necessidades estiverem incumbidas ao Estado de cumprir, maior será a

necessidade de impostos e mais robusta será a “maquinaria administrativa”. As mutações

industriais, urbanas e proletárias implicaram um engrandecimento e enriquecimento das funções

estaduais.

O Estado passou a ter uma palavra a dizer ao nível da repartição do rendimento e da diminuição

das desigualdades sociais.

Isto porque há um conjunto de Direitos sociais que se traduzem em obrigações estaduais (ou

seja, cabe ao Estado assegurar o cumprimento desses Direitos). Nomeadamente o Capitulo II, III

– Parte I, da CRP, referente aos direitos e deveres sociais

Para além do art. 9.º da CRP

Ora o Estado apenas consegue realizar todas estas obrigações através do designado “contrato

social” entre cidadãos e o Estado – Assim há contribuições pecuniárias (relativas a dinheiro) em

“contrapartida” de um conjunto de serviços/garantias prestados(as) pelo Estado

Esta quase “contraprestação” – que não é correcto afirmar porque não faz parte das

características do imposto, uma vez que o imposto é unilateral e não bilateral (não se traduzindo

por isso em qualquer contrato, não existindo por isso contraprestações)

É sinónimo de uma certa justiça social – é através desta perspectiva que muitos cidadãos

encaram positivamente a tributação do seu património particular – pois acham justo o seu

património ser empregado na satisfação de necessidades sociais (que economicamente resultam

da nossa vida em sociedade e por isso cabe ao estado garantir a sua satisfação) – Há como que

um retorno dos tributos para onde eles foram tirados, ou seja, da sociedade e para a sociedade

(ou seja, os tributos foram exigidos a cada cidadão inseridos na sociedade para depois

retornarem para a mesma sob a forma de diversos apoios sociais)

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Ora, tal fenómeno nem sequer seria preocupante se, na verdade, os recursos económico-

financeiros e os níveis de produtividade económica e a criação de riqueza estivessem em

crescimento (o que não esta a acontecer com a actual crise). Só que, também aqui, como noutras

áreas do comportamento humano, o excesso de exigências tributárias tem o condão de, directa

ou indirectamente alimentar o desânimo económico, o desinvestimento na economia e o

regresso de uma comunitária, e aparentemente aceite, evasão fiscal.

Quer isto dizer que há um limite benéfico da tributação. Ultrapassado este limite a tributação

assume contornos excessivos e acaba por ser nefasta para a economia – reduzindo o poder de

compra das famílias, empresas e por sua vez diminuindo o consumo. Há por sua vez uma

assimetria entre os tributos que se destinam ao apoio social e os tributos que se destinam a

alimentar a economia, injectando dinheiro na mesma, a fim de que o sistema económico comece

a gerar rendimento novamente.

Ora, entretanto o que se verifica é que a falta de consumo provoca uma diminuição da produção

que originará, inevitavelmente, uma redução de postos de trabalho (uma das políticas mais

utilizadas pelas empresas como forma de combater a crise). A taxa de desemprego sofre assim

um aumento, repercutindo-se num acréscimo de verbas destinadas a apoios sociais como o (RSI,

etc.) – há assim um aumento dos gastos suportados pelo Estado que exigem um aumento da

tributação.

Associado ao desemprego de longa duração surge a falta de segurança provocada pelo aumento

da criminalidade (quase encarada como a única forma de obter algum rendimento). O número

de portugueses no limiar da pobreza aumenta drasticamente uma vez que os apoios do Estado

não conseguem (nem nunca conseguirão) ajudar toda a população carenciada.

Muitas das famílias portuguesas para fazer face a dívidas contraídas e devido a falta de meios

para as pagar, recorrem a financiamentos bancários, endividando-se de tal forma que já nem têm

dinheiro disponível para gastos na alimentação.

Há assim a massificação da recorrência a instituições de caridade, nomeadamente o banco

alimentar contra a fome, que não consegue prestar auxílio a todas as famílias carenciadas.

E por fim, surge a indignação do povo português, o mais afectado pelas más decisões políticas

(nomeadamente o excesso de tributação)

A diminuição das prestações sociais, por parte do Estado de Direito Democrático e Social

português, leva à interiorização, por parte de alguns grupos da população, de uma certa ideia de

“aparente normalidade de não pagar tributos”, chegando-se mesmo, em não poucas ocasiões, à

conclusão de que a má gestão dos “dinheiros públicos” deslegitima qualquer cobrança de

tributos.

Proporcionalmente, ao aumento de funções incumbidas ao Estado, seguiu-se um decréscimo de

recursos económico-financeiros e, por isso, uma nova necessidade de aumento de tributação.

Assim, cada nova função que o Estado é chamado a desempenhar, uma nova exigência tributária

vem a caminho.

O certo é que, enquanto existir sociedade (ubis societas), haverá que continuar a cobrar

impostos, sob pena de todo o aparelho organizacional estatal ruir ou se paralisar – o poder de

tributar os cidadãos e as suas propriedades é algo de imprescindível e essencial para todo e

qualquer Estado

Quer isto dizer que a sociedade não pode simplesmente deixar de pagar impostos. Isto traria

repercussões ainda mais nefastas do que as originadas pelo pagamento excessivo de impostos.

A sociedade sem impostos, não é sociedade, não é um conjunto de indivíduos com finalidades

comuns – para o cumprimento de objectivos individuais, o Homem sente a necessidade de

interagir com outros indivíduos, pois está inevitavelmente dependente destes para conseguir

alcançar as suas metas pessoais, e por isso se formam as sociedades.

Que não mais passam de uma mera camuflagem do nosso egoísmo existencial

O estatuto de “cidadãos livres” (ou seja de autonomia, e por conseguinte de dignidade humana)

traz acoplado a necessidade de uma responsabilidade “nas cousas da civitas” – nos assuntos da

cidade

Se somos livres e autónomos então é possível ser-nos imputadas determinadas obrigações (por

isso é que em matéria penal, um indivíduo com (por exemplo) problemas mentais não pode ser

responsabilizado pela gravidade dos seus actos, e por isso muitas vezes os advogados recorrem

a este tipo de defesa dos respectivos clientes.

Assim cada membro da sociedade é chamado a responsabilizar-se pela mesma, daí que, onde

existe uma sociedade, existem tributos.

A lógica é quase como: se o individuo usufrui de determinados benefícios por estar inserido

numa sociedade, também tem, em contrapartida determinados deveres – só assim, entre este

jogo de direitos e deveres, é que uma sociedade politicamente organizada sobrevive.

Os impostos são assim, o preço que temos que pagar pela (concreta, hic et nunc – “aqui e

agora”) sociedade que temos ou que pretendemos possuir.

Os tributos são o “correspectivo” por tudo aquilo que o cidadão, reunido em uma dada

sociedade, abdica, quer em termos da sua liberdade, quer em termos do seu património ou

propriedade.

E falando em termos de liberdade, está prevista no art. 27.º da CRP

Quanto menores forem as prestações fornecidas pelo Estado, aos seus cidadãos, maiores serão

os estímulos para um não cumprimento dos deveres tributários.

Verifica-se, nesta matéria, como que uma lei tendencial: quanto maiores forem as prestações

sociais fornecidas pelo Estado, maiores serão os estímulos à entrega dos tributos; quanto menor

forem as prestações sociais, menores serão os estímulos ao cumprimento das obrigações

tributárias.

Nisto assenta o grande dilema do sistema fiscal, em saber como se devem dividir ou repercutir

os sacrifícios, na esfera dos cidadãos e das empresas. A tributação pode funcionar,

simultaneamente, como um meio de controlo do consumo, de fomento da produção económico-

empresarial e de promoção da igualdade, sem, no entanto, nunca deixar de ser um proveitoso

mecanismo de arrecadação de receitas tributárias.

1.1 A legitimação constitucional da tributação

Interessa-nos saber onde nasce, como se forma e como se revela aos particulares o direito fiscal.

Encontramo-nos assim perante o problema das fontes do direito fiscal.

Como fontes do direito fiscal devem ser indicadas: a constituição, a lei, o decreto-lei e o

regulamento.

A estas fontes acrescem os tratados e em certas circunstancias os costumes, a doutrina e a

jurisprudência.

Apesar da aparente diversidade das fontes de direito fiscal, a lei em sentido amplo (lei e

decretos-lei, incluindo em certos casos os tratados), surge como a principal fonte de Direito

Fiscal

No Estado Português vários são os órgãos com poder legislativo e diversos os processos através

dos quais as leis são elaboradas. Entre as formas de lei estabelece-se um escalonamento ou

hierarquia – hierarquia das leis; visando o princípio da unidade do sistema jurídico e o princípio

da não contradição, o qual tem por principal consequência:

As leis de hierarquia inferior não podem contrariar ou contradizer leis de hierarquia superior,

têm de se conformar a elas; e ainda, as leis de hierarquia superior podem contrariar ou

contradizer leis de hierarquia igual ou inferior (a lei mais recente revoga a mais antiga).

Assim a hierarquia estabelece-se normalmente do seguinte modo:

→ A Constituição (arts. 103°, 104°, 165°, 227° e 238° da CRP)

A Constituição é a lei suprema do país. Consagra os direitos fundamentais dos cidadãos,

os princípios essenciais por que se rege o Estado português e as grandes orientações

políticas a que os seus órgãos devem obedecer, estabelecendo também as regras de

organização do poder político.

Demos

em IDDT

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Por outras palavras, estabelece a estrutura do Estado e define as competências dos

principais órgãos de soberania (Presidente e Assembleia da República, Governo e

Tribunais), regulando a forma como estes se relacionam entre si.

→ O direito comunitário

→ As convenções internacionais

→ As leis

Temos aqui dois conceitos importantes:

Lei formal – Definida nos pontos 1 e 5 do art. 112.º CRP

Entende-se por lei em sentido formal, toda aquela que é proveniente de um órgão

constitucionalmente incumbido do poder legislativo, cumprindo o procedimento

regulamentar.

Ou seja, é toda a lei que é escrita e que vem do poder legislativo

Aqui destaca-se (está previsto no art. 112.º da CRP):

Assembleia da República:

Lei constitucional;

Lei

Governo:

Decreto-Lei

Assembleias legislativas regionais:

Decretos legislativos regionais

Atenção: não são leis em sentido formal:

Outros instrumentos normativos públicos:

É composta por todos os deputados eleitos que

representam os cidadãos

Governo: portarias, despachos normativos

PR: decretos

Municípios: posturas

Fontes infra-legais: se contrariarem a lei são inválidas

(Caso do teste-modelo: código da estrada e portaria)

Lei material: caracterizada pela generalidade e abstracção

Estas contêm, não raramente, normas singulares ("lei formal" ou "ato normativo de

efeitos concretos").

→ Decretos-lei

O DL não tem valor em si porque tem de ter uma lei de autorização que fixe esses

elementos essenciais.

Se o DL não respeitar a lei, então é inconstitucional, por falta de poder.

→ Decretos Regionais

→ Os regulamentos

→ Os contratos

→ A jurisprudência

→ A doutrina

Nota: O costume, doutrina e os usos não são fontes de direito fiscal

A constituição como fonte do Direito Fiscal:

A lei constitucional ocupa, compreensivelmente, lugar de particular relevo na hierarquia das

fontes de Direito em geral.

(…) - incompleto

O Estado Social

A tributação, face à ideia de republicanismo cívico liberal, implica o reconhecimento da

dignidade da pessoa humana, da liberdade de todos os cidadãos, bem como a promoção da

“coisa pública” (res publica) e do bem comum de toda a comunidade.

Todos os cidadãos têm algo a dizer em matéria tributária, já que lhes é pedido que cumpram

todos os seus deveres cívicos republicanos e interiorizem uma responsabilidade ética e

democrática que os incentivará, enquanto imperativo democrático-liberal, a não desrespeitar

todo o projecto “social e global” da República, da sociedade em que acreditam e pela qual,

diariamente, lutam.

O pagamento de impostos é um dever jurídico(-tributário) universal e igual (artigos 12.º e 13.º,

da CRP 1976) que se inscreve no anverso dos direitos de que beneficiam os cidadãos.

Todos os cidadãos são chamados a serem responsáveis em matéria tributária e, para isso, urge-

lhes, penitentemente, de certo, cumprir todos os seus deveres tributários, sob pena de, com isso,

menosprezarem todo o projecto societário ou comunitário vinculado na sociedade portuguesa e

na qual, por isso, se inscrevem como cidadãos contribuidores e beneficiários.

A justiça ou justeza do sistema fiscal ou tributário afigura-se essencial à sua própria legitimação

democrática, já que um sistema fiscal justo recolherá adesão, ao passo que um sistema fiscal

injusto dinamizará convulsão social e resistências.

Daí que (como já leccionado em Introdução ao Direito) a melhor forma de efectivar o

cumprimento de determinados deveres é não imputá-los através da força, mas demover a

população para a sua compreensão. Porque a compreensão leva à aceitação do dever, o que

facilita o seu cumprimento uma vez que o individuo se identifica com o mesmo.

Ademais, também se relembra que a justiça do sistema fiscal é inato ao “contrato social”, já que

ele tenderá a harmonizar as exigências de prestações sociais com o custo económico-financeiro

da sua realização ou concretização, ou seja, com os benefícios práticos da aplicação dos tributos

arrecadados através do sistema fiscal

Podem identificar-se várias concepções fiscais que vão desde aquela que concebe o imposto

como um “imposto-preço”, id est, a contraprestação genérica pelos serviços recebidos do

Estado (“prestações sociais fornecidas pelo Estado”) e essoutra que o vê como “imposto-

dever”, em que o imposto surge no contexto do conjunto de obrigações recíprocas que vigoram

entre os cidadãos – como o dever da vivência em sociedade.

O Estado deve, em matéria de tributos, em contexto de “republicanismo”, usar de instrumentos

não coercivos (não deve impor determinada pena) nas relações entre os Estados e os cidadãos,

de tal modo que o imposto nos há-de surgir como uma técnica cujo uso fica autorizado para a

alteração da estrutura dos incentivos aos indivíduos (individual ou familiarmente conformados)

ou ao tecido empresarial, mediante prévia abdicação de qualquer medida coerci[ti]va sobre os

visados.

Há, todavia, que evitar que, pela via do sistema fiscal, se introduzam irremediáveis distorções

na actividade económico-financeira que signifique, no fundo, uma perda ou ausência de ganho

de produtividade, senão mesmo um desincentivo ao investimento (como já tratado

anteriormente).

Daí que a constituição estabeleça que determinadas políticas fiscais devem ser aplicadas se não

houver outras hipóteses possíveis – ver melhor

Face a isto, pode concluir-se que o sistema fiscal ou parafiscal pode, validamente, ser utilizado

como um instrumento de política económica e social, mas sempre com um apurado e aturado

estudo das possíveis perversões, e, por isso, com a consciencialização da introdução de

inegáveis limitações (não é a política mais eficaz para dinamizar a economia) em tal uso

“programador” da economia e desenvolvimento social.

Quer isto dizer que os impostos podem ser utilizados como entrave por exemplo a uma prática

demasiado consumista, evitando assim, de certa forma, o aumento da taxa de inflação.

Os impostos, desde que ponderados os possíveis efeitos colaterais, podem ser utilizados como

mecanismos de retracção ou de propulsão da economia – No entanto, más políticas fiscais,

traduzem-se em danos perversos e anestesiadores para a economia

O sistema fiscal “exasperado” pode matar, à nascença, qualquer possibilidade ou viabilidade de

desenvolvimento económico-social.

A evolução de ideia de Estado

A evolução da ideia de Estado passou por diversas fases históricas cujas características

diferenciadoras foram sempre bem vincadas. Ao longo da história identificaram-se as fases do

Estado patrimonial, do Estado de polícia, do Estado de Direito e, mais recentemente, do Estado

Social.

O Estado Social tem a sua origem no século XIX, vindo a alastrar e a afirmar-se, por toda a

Europa, logo após as duas Grandes-Guerras.

Quando alude-se a “Estado Social” está-se a reportar uma concepção de um Estado que pretende

fazer face a novas necessidades societárias [da sociedade] derivadas de um desenfreado

processo de industrialização (temos o exemplo da época em que o Homem era visto como uma

máquina), urbanização, que origina uma nova classe de cidadãos que “vendem a sua força de

trabalho” – o proletariado – com vista a sobreviverem.

Nesta relação (muitas vezes opressora e aniquiladora dos Direitos Humanos) encontramos os

detentores dos meios de produção e, do outro lado, os que somente possuem a sua força de

trabalho.

Esta nova realidade originou largos efeitos menos benéficos no que tange à dignidade da pessoa

humana – efeitos que ainda hoje se mantêm nos países mais pobres

Temos o caso da exploração infantil, do não cumprimento de horas mínimas de trabalho,

assimetria entre força de trabalho e salário – em que os salários são muito baixos e não

permitem uma vida condigna do trabalhador – a dita mão-de-obra barata. Temos também

condições de trabalho desumanas.

Estas realidades tornaram imperante uma melhorada concepção de Estado que abarcasse novos

direitos.

Com este estado de coisas surgem novos desafios aos poderes públicos, quer em termos de

satisfação das necessidades das populações “urbanizadas”, quer em nome da contenção dos

conflitos sociais e laborais em níveis minimamente aceitáveis.

Os modernos Estados Sociais vêem-se, no dealbar do Século XXI, confrontados já não apenas

com um Estado social, mas com um “Estado Ambiental”, que se quer ecologicamente são e

equilibrado, quer perante um “Estado Informativo-Comunicacional” em que a “vitrificação”, em

demasia, dos cidadãos surge como um problema de direitos fundamentais e um inegável

desafio.

2. O PAPEL DO DIREITO (“CONSTITUCIONAL”) FISCAL NA CRIAÇÃO DE UMA

SOCIEDADE JUSTA, LIVRE E SOLIDÁRIA – pg. 26 apontamentos

Falar de cidadania, no dealbar do terceiro milénio, é, forçosa e irremediavelmente, aludir à

necessidade de os cidadãos interiorizarem, com carácter prioritário, o inafastável dever de pagar

impostos.

Nenhuma sociedade ou comunidade, politicamente organizada, pode sobreviver sem tributos,

foi assim no passado, é assim nos nossos dias e tememos que assim o venha a continuar a ser

nos tempos vindouros para as gerações futuras.

Os impostos são o preço que temos que pagar por termos a (concreta, hic et nunc – aqui e agora)

sociedade que temos ou que pretendemos ter.

O sistema fiscal assume grande importância na criação de um modelo de sociedade justa, livre e

solidária – que influenciará, inevitavelmente o sistema tributário e as politicas a ele adjacentes.

A legitimação de qualquer sistema tributário passa pela ideia de que não deve existir tributação

sem um mínimo de representação democrática, ou seja, os cidadãos devem poder participar na

eleição dos seus representantes políticos e, assim, de forma directa ou indirecta, na conformação

do modelo democrático do sistema tributário legitimado que vigorará numa dada sociedade

democrática e social, como é a portuguesa, por um certo período de tempo.

A tributação tem obrigatoriamente que obedecer a determinados valores, bens e direitos

fundamentais, nomeadamente a eminente dignidade da pessoa humana, que dita um mínimo de

sobrevivência que nos declara aptos a viver condignamente – daí a tributação ser proibida

quando o visado (sujeito passivo), não detenha, no seu património, sequer o mínimo económico-

financeiro imprescindível a uma vida condigna.

Também aqui subjacente, de certa forma, um certo princípio de igualdade que permita a que

todos os indivíduos tenham acesso à satisfação de necessidades primárias imprescindíveis a uma

vida digna que nos forma enquanto pessoas, com direito à vida, à segurança e todo um conjunto

de direitos plasmados na Constituição que devem ser assegurados pelo Estado de Direito

Democrático e Social

Por outro lado, a tributação aplica-se a todos os cidadãos, mas não é aplicada de forma idêntica,

já que isso, contrariamente ao que poderia parecer, a uma primeira aproximação (que nos levaria

a considerar que se tratava de justiça tributária), seria, no fundo e sempre, uma afirmação

desigualitária de estatutos cívicos diferenciados (associados a remunerações também ela

diferenciadas, externalidades, etc.) que, em boa verdade, inexiste, já que todos são iguais

perante a lei.

Desta forma, não se tributa da mesma forma aquele que não tem proventos ou réditos

económicos ou aquele que os tem em excesso.

Tal traduzir-se-ia numa tributação desproporcionadamente gravosa, sem qualquer

progressividade (que se adapta à capacidade contributiva do visado), diferenciação a partir do

rendimento real ou de um certo tipo de consumo de bens (como por exemplo, através da lei de

Engel, as famílias com um maior rendimento, os gastos em bens de luxo tendem a aumentar), já

para não dizer num total afastamento de uma qualquer ideia de justiça distributiva.

De igual modo, a família leva a uma discriminação positiva em sede de tributação, já que o

legislador – artigo 67.º, n.º 2, alínea f), da CRP 1976 – constituinte assim o determinou e o

legislador ordinário assim não o pôde desrespeitar e, por isso, o reconheceu e adoptou em sede

de tributação de Imposto sobre o Rendimento Singular – Na medida em que permite deduzir à

colecta determinadas despesas relacionadas com o agregado familiar (como por exemplo:

despesas de saúde; consumo de material escolar, etc.).

2.1.1. A matriz republicana liberal, democrática e social assente na eminente

dignidade da pessoa humana e no exacerbamento da protecção mais elevada dos direitos

fundamentais – pg. 20

Encontra-se, ainda, por cumprir – em nosso entender o “sonho de Abril”, essa dita «sociedade

justa, livre e solidária» - art. 1.º CRP

De igual modo, também ainda – em nosso modo de ver – não se atingiram os níveis mais

elevados de protecção dos direitos fundamentais, subjugados, actualmente, a uma visão política

estéril caracterizada pela ausência de qualquer compromisso com a sociedade e com a “res

publica” – “coisa pública”.

O que se verifica é que, com o aumento das constantes obrigações encarregues a este Estado de

Direito Democrático e Social que protagoniza um papel importante em matéria do pacto social,

torna-se inevitável aumentar a carga tributária para que a “robusta máquina” Estatal consiga

fazer face à engrandecida despesa pública (que surge da satisfação das necessidades colectivas).

Ora, tal fenómeno nem sequer seria preocupante se, na verdade, os recursos económico-

financeiros e os níveis de produtividade económica e a criação de riqueza estivessem em

crescimento.

Só que, também aqui, como noutras áreas do comportamento humano, o exaurimento tributário

tem o condão de, em directa ou indirecta perversão, alimentar o desânimo económico, o

desinvestimento na economia e o regresso de uma comunitária, e aparentemente aceite, evasão

fiscal (ligada a uma certa ausência de justeza).

Nisto, a diminuição das prestações sociais, por parte do Estado de Direito Democrático e Social

português, leva à interiorização, por parte de algumas franjas da população, de uma certa ideia

de “aparente normalidade de não pagar tributos”, chegando-se mesmo, em não poucas ocasiões,

à conclusão de que a má gestão dos “dinheiros públicos” deslegitima qualquer cobrança de

tributos.

Embora tudo isso, em certa medida, seja verdade, o certo é que, enquanto existir sociedade (ubis

societas), haverá que continuar a cobrar impostos, sob pena de todo o aparelho organizacional

estatal ruir ou se paralisar e como consequência a própria sociedade deixar de poder coexistir.

O que na prática faz todo o sentido uma vez que, não podemos, pela simples mal aplicação dos

“dinheiros públicos”, recusar pagar tributos. Aliás, todos nós possuímos uma certa

responsabilidade nessa má gestão, uma vez que estamos num Estado Democrático que

caracteriza a responsabilidade conjunta de escolher os “representantes do povo”.

Óbvio que para além disso, os indivíduos encarregues de administrar a “res publica” deveriam

possuir certos preceitos morais que os incentivassem a encarar o povo não como simples meio

de enriquecimento, mas como pessoas com uma inviolável dignidade ética – nisto o direito não

pode demover as inspirações que nos caracterizam, daí se afastar em larga medida da moral.

Mas para essas ocasiões, existe a o carácter sancionatório da ordem jurídica que pune, de acordo

com certas medias, estes actos condenáveis que violam a estabilidade societária.

O Estado de Direito Democrático português sofreu a erosão pela via das suas necessidades

tributárias, já que atingiu níveis de desequilíbrio que contrastam com a ausência de equilibrados

níveis de prestações sociais.

O estatuto de “cidadãos livres” traz acoplado a necessidade de uma responsabilidade “nas

cousas da civitas” (uma vez que a liberdade em si, vem ligada à responsabilidade que apenas

pode ser exercida através da capacidade jurídica2 - daí os indivíduos com falta desta, por

exemplo, com determinados problemas mentais não podem, em âmbito do direito penal, ser

responsabilizados por determinados crimes) – nos assuntos da cidade –, de tal modo que os

membros, desta sociedade, politicamente organizada, em redor do “Estado”, clamam por

prestações sociais – o dito Estado Social.

Todas essas prestações sociais são o “correspectivo” por tudo aquilo que o cidadão, reunido em

uma dada sociedade, abdica, quer em termos da sua liberdade, quer em termos do seu

património ou propriedade.

Assim, quanto menores forem as prestações fornecidas, maiores serão os estímulos para um

não-cumprimento dos deveres tributários. Verifica-se, nesta matéria, como que uma lei

tendencial: quanto maiores forem as prestações sociais fornecidas pelo Estado, maiores serão os

estímulos à entrega dos tributos; quanto menor forem as prestações sociais, menores serão os

estímulos ao cumprimento das obrigações tributárias.

Os cidadãos são livres e iguais, entre si, de tal modo que, de comum vontade, “edificaram” um

2 Em direito, capacidade juridica de uma pessoa física ou jurídica é a possibilidade de ela exercer pessoalmente os atos da vida civil

Estado “justificado por um certo contrato social” e por uma soberania popular (a soberania vem

do povo) que lhe dá a sua “legitimação democrática”.

Depois das duas Grandes Guerras, os Estados precipitaram uma outra configuração do “contrato

social”, já que nele reentraram novas exigências e reivindicações, por parte dos cidadãos. As

mutações industriais, urbanas e proletárias implicaram um engrandecimento e enriquecimento

das funções estaduais.

O Estado passou a ter uma palavra a dizer ao nível da repartição do rendimento e da diminuição

das desigualdades sociais – antes apenas se preocupava com garantia da segurança, propriedade

e autogoverno democrático dos cidadãos e da (sua) liberdade.

Assim, o Estado sem tributação é como um corpo sem mãos e sem pernas. O poder de tributar

os cidadãos e as suas propriedades é algo de imprescindível e essencial para todo e qualquer

Estado. O grande dilema do sistema fiscal é saber como se devem dividir ou repercutir os

sacrifícios, na esfera dos cidadãos e das empresas.

A tributação pode funcionar, simultaneamente, como um meio de controlo do consumo, de

fomento da produção económico-empresarial e de promoção da igualdade, sem, no entanto,

nunca deixar de ser um proveitoso mecanismo de arrecadação de receitas tributárias.

Todos são iguais, todos devem igualmente, pelo facto de serem cidadãos desta Res-Publica,

cumprir as suas obrigações tributárias, sem prejuízo de existir ou se dar relevância à

conveniente dimensão de proporcionalidade ou progressividade da tributação atentos os

rendimentos de cada um dos cidadãos visados.

O pagamento de impostos é um dever jurídico tributário) universal e igual (artigos 12.º e 13.º,

da CRP 1976).

A justiça ou justeza do sistema fiscal ou tributário afigura-se essencial à sua própria legitimação

democrática, já que um sistema fiscal justo recolherá adesão, ao passo que um sistema fiscal

injusto dinamizará convulsão social e resistências – o que comprando em matéria de normas

jurídicas, estas devem adaptar-se à sociedade de forma a garantir a estabilidade. Daí, também

ser imperativo a adaptação da tributação às necessidades e possibilidades da sociedade de forma

a seja aceite.

Ademais, também se relembra que a justiça do sistema fiscal é “conatural” (inata) ao “contrato

social”, já que ele tenderá a harmonizar as exigências de prestações sociais com o custo

económico-financeiro da sua realização ou concretização.

À luz do princípio republicano, podem identificar-se várias concepções fiscais que vão desde

aquela que concebe o imposto como um “imposto-preço”, ou seja, a contraprestação genérica

pelos serviços recebidos do Estado (“prestações sociais fornecidas pelo Estado”) e essoutra que

o vê como “imposto-dever”, em que o imposto surge no contexto do conjunto de obrigações

recíprocas que vigoram entre os cidadãos e o Estado – p.ex: o Estado tem a obrigação das

prestações sociais no âmbito do Estado social e para isso a população tem o dever de pagar os

impostos.

É óbvio que esta relação não é directa uma vez que o imposto é um acto unilateral que não exige

nenhuma contraprestação. Daí as prestações sociais serem obrigatórias nos termos do Estado

Social que atenda às variadas exigências e necessidades sociais.

O Estado deve, em matéria de tributos, em contexto de “republicanismo”, usar de instrumentos

não coercivos (ou seja, não deve usar a força, não deve obrigar) nas relações entre os Estados e

os cidadãos, de tal modo que o imposto nos há-de surgir como uma técnica (“liberal”)

Aliás se o Estado obrigasse a população a pagar impostos, as respectivas sanções de, por

exemplo, fuga aos impostos não faria sentido algum, uma vez que, por um lado perderíamos a

liberdade de escolha e por outro só teríamos um caminho a escolher: a aceitação do tributo e o

seu pagamento – óbvio que este tipo de políticas, como temos visto, ao longo do tempo, através

dos estados de não direito, acaba inevitavelmente por desaparecer através de revoltas populares.

Há, todavia, que evitar que, pela via do sistema fiscal, se introduzam irremediáveis distorções na

actividade económico-financeira que signifique, no fundo, uma perda ou ausência de ganho de

produtividade, senão mesmo um incentivo ao investimento.

Face a isto, pode concluir-se que o sistema fiscal ou parafiscal3 pode, validamente, ser utilizado

como um instrumento de política económica e social, mas sempre com um apurado e aturado

estudo das perversões que daí podem advir e, por isso, com a consciencialização da introdução

de inegáveis limitações em tal uso “programador” da economia e desenvolvimento social.

A evolução da ideia de Estado passou por diversas fases históricas cujas características

diferenciadoras foram sempre bem vincadas. Ao longo da história identificaram-se as fases do

Estado patrimonial, do Estado de polícia, do Estado de Direito e, mais recentemente, do

Estado Social.

Quando se alude a “Estado Social” está-se a reportar a uma concepção de um Estado que

pretende fazer face a novas necessidades societárias derivadas de um desenfreado processo de

industrialização e urbanização, que origina uma nova classe de cidadãos que “vendem a sua

força de trabalho” – o proletariado – com vista a sobreviverem.

Com este estado de coisas surgem novos desafios aos poderes públicos, quer em termos de

satisfação das necessidades das populações “urbanizadas”, quer em nome da contenção dos

conflitos sociais e laborais em níveis minimamente aceitáveis – um dos principais objectivos do

Direito (?).

Os modernos Estados Sociais vêem-se, no dealbar do Século XXI, confrontados já não apenas

com um Estado social, mas como um “Estado Ambiental”, que se quer ecologicamente são e

equilibrado, quer perante um “Estado Informativo-Comunicacional” em que a “vitrificação”

(alta de privacidade), em demasia, dos cidadãos surge como um problema de direitos

fundamentais e um inegável desafio.

3 A classificação “Parafiscal” fora designada à apreciação de determinados tributos que ora actuavam como impostos, ora como taxas e às vezes como um misto destas duas categorias.

2. O PAPEL DO DIREITO (“CONSTITUCIONAL”) FISCAL NA CRIAÇÃO DE UMA

SOCIEDADE JUSTA, LIVRE E SOLIDÁRIA – pg. 26

O Direito Fiscal tem uma palavra a dizer na criação de um modelo de sociedade justa, livre e

solidária.

A Constituição da República Portuguesa de 1976, à semelhança das suas anteriores (e)

congéneres, não ignorou a importância de que os fins (constitucionais) do sistema fiscal

estivessem escolhidos, plasmados e consagrados em coerência com a matriz de Estado de

Direito Democrático e Social.

Assim, os objectivos do sistema fiscal e os meios de os atingir estão, desde logo, sob primária

ou originária “reserva de Constituição”

Muito embora a denominada “Constituição Fiscal” se encontre espraiada por vários normativos,

há que sublinhar que duas específicas normas (LGT e a CRP) edificam os fins e meios

principais do actual sistema fiscal.

Nesse contexto, urge atentar nos artigos 103.º e 104.º, da CRP 1976. O artigo 103.º, n.º 1, da

CRP 1976 não deixa dúvidas já que, de forma lapidar, reitera que o sistema fiscal visa, por um

lado, «a satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas» e, por

outro lado, «uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza».

Densificando estas ideias, a Lei Geral Tributária (LGT), no seu artigo 5.º, n.º 1 (Fins da

Tributação), veio esclarecer que a tributação visa, por um lado, «a satisfação das necessidades

financeiras do Estado e de outras entidades públicas» e, por outro lado, «promove a justiça

social, a igualdade de oportunidades e as necessárias correcções das desigualdades na

distribuição da riqueza e do rendimento».

Além disso, o n.º 2 esclareceu que a «tributação respeita os princípios da generalidade, da

igualdade, da legalidade e da justiça material».

No que se refere aos meios de atingir os fins, antecipadamente elencados, há que sublinhar que

o sistema fiscal português começa por consagrar o princípio da reserva de lei em matéria

tributária [artigos 165.º, n.º 1, alínea i), e 103.º, n.º 2, da CRP 1976].

No que respeita à estruturação constitucional, do actual sistema fiscal, verifica-se que, por força

do artigo 104.º, da CRP 1976, que o mesmo tem uma estrutura tripartida a que correspondem

distintas categorias ou classes de impostos:

i) Tributação sobre o rendimento dos indivíduos e da empresas - assim levando à

densificação legislativa do IRS e do IRC – nos termos dos n.os 1 e 2, do artigo 104.º, da CRP

1976.

ii) Tributação do Património - artigo 104.º, n.º 3, da CRP 1976. P

iii) Tributação do consumo, consagrada no artigo 104.º, n.º 4, da CRP 1976.

A tributação do rendimento pessoal (ou das pessoas singulares – em sede de IRS, por exemplo)

tem de obedecer a determinadas directrizes:

1.º O Imposto sobre o rendimento pessoal deverá ser apto a diminuir as desigualdades;

2.º O Imposto sobre o rendimento pessoal deverá ser único;

3.º O Imposto sobre o rendimento pessoal deverá ser progressivo;

4.º O Imposto sobre o rendimento pessoal deverá ter em linha de conta as necessidades e os

rendimentos do agregado familiar.

No que respeita à tributação das empresas, o legislador veio sublinhar que ela deve

“fundamentalmente” incidir sobre o seu rendimento real.

Diferentemente, a tributação sobre o património tem por escopo contribuir para a igualdade

entre os cidadãos.

Por último, em matéria de tributação do consumo, refere-se que o mesmo tem por objectivo:

1.º A adaptação da estrutura do consumo à evolução das necessidades do desenvolvimento

económico (i) e da justiça social (ii);

2.º Tal tipo de imposto deve onerar os consumos de luxo.

Que princípios constitucionais são esses que modelam o actual sistema fiscal português? Há

uma multiplicidade de princípios constitucionais que valem salientar:

i) Logo nos artigos cimeiros do pórtico de entrada (artigos 1.º e 2.º, da CRP 1976) –,

encontram-se o princípio da (eminente) dignidade da pessoa humana e o princípio do Estado de

Direito Democrático, a partir dos quais se cultivem toda uma mole de outros princípios que urge

não desconhecer.

O princípio da universalidade:

O texto fundamental refere que: «Todos os cidadãos gozam dos direitos e estão sujeitos aos

deveres consignados na Constituição».

Dita que todos os cidadãos devem pagar impostos – pg. 29 apontamentos, ver outra vez

No entanto abrem-se algumas excepções, por força dos critérios da residência e da fonte, como

o facto de um cidadão não nacional, alvo de efectiva tributação em território nacional,

mormente por o ser em outro estado. O artigo 12.º, n.º 2, da CRP 1976, logo alerta para o facto

O princípio da igualdade:

Todos os cidadãos possuem a mesma dignidade social e são iguais perante a lei, de tal modo

que ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou

isento de qualquer dever em razão da sua ascendência, sexo, raça, língua, território de origem,

religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou

orientação sexual – artigo 13.º, da CRP.

Este princípio possui variadas implicações práticas, nomeadamente, princípio da igualdade

perante os encargos públicos - segundo o qual todos os custos do “contrato social” devem ser

repartidos por todos os cidadãos de acordo com um princípio da igualdade dos sacrifícios.

Sempre que se impuserem especiais sacrifícios, a um determinado ou determinável número de

pessoas, tal deverá ter um carácter excepcional e, além disso, levar a compensações especiais.

Obviamente que este princípio (da igualdade) encontra-se interligado com o princípio da

igualdade tributária.

Com tal princípio pretende-se significar, por um lado, que haverá que levar a cabo um

tratamento igual dos contribuintes que se situem em idênticos níveis ou escalões de

rendimentos, e, distintamente, por outro lado, haverá que diferenciar e não tratar igual ou de

forma especial, todos aqueles contribuintes que surgem em diferenciados e distintos escalões de

rendimentos.

Ou seja, tratar de forma igual o que é igual e de forma desigual o que não é igual, na medida da

desigualdade.

Para que se concretize uma verdadeira “igualdade (de tratamento) tributária(o)”, não poderá

desmerecer a devida atenção quer a ideia de tributação a partir da capacidade contributiva quer a

partir do rendimento real do sujeito passivo.

Assim, dever-se-á optar por uma tributação progressiva a partir de uma diferenciação das taxas

aplicáveis.

Um dos campos em que se pode verificar uma insuportável violação do princípio da igualdade

não é apenas na vertente positiva da tributação mas, de igual modo, na sua vertente negativa, ou

seja, quando o sujeito passivo de imposto é, de algum modo, alvo de uma isenção fiscal ou

beneficiário de quaisquer benefícios fiscais.

Estamos a reportar-nos a situações que são uma excepção à incidência do imposto e, por isso,

exigem-se especiais cuidados, já que, muito embora a constituição admita tratamentos

diferenciados, nem todo e qualquer tratamento diferenciado, se não forem justificados por dados

pessoais distintos, poderá implicar um juízo de conformidade de tal tratamento ao constitucional

princípio da igualdade.

A desigualdade de tratamento somente poderá ser admitida se a mesma for adequada, necessária

e não desproporcionada ao nível do objectivo perseguido.

Este tratamento diferenciado, em sede de tributos, sob pena de violação dos artigos 13.º e 18.º,

n.º 2, da CRP 1976, deverá ser alvo de uma justificação e fundamentação a partir dos valores,

princípios e demais critérios inscritos na Lei Fundamental. O que nos pode levar a concluir que

haverá violação do princípio da igualdade, em matéria de impostos, sempre que se atribua uma

isenção que não possua qualquer cobertura constitucional ou quando tal isenção devesse

igualmente ser atribuída a outros contribuintes que se encontram em situações de facto, pessoais

ou normativas, idênticas à daqueloutro sujeito alvo da referida isenção fiscal.

Na jurisprudência constitucional portuguesa – Acórdão do TC n.º 497/97 – formulou-se a ideia

de que não fica legitimada a interpretação que, a partir do artigo 13.º, da CRP 1976, defenda a

não tributação de alguém com base na argumentação de que outra pessoa, em igual situação de

incidência, não é alvo de tributação em virtude de dificuldades técnicas de aplicação da lei.

Parece, na verdade, como o sugerem alguns autores, que se afigura preferível, existindo

dificuldades técnicas de aplicação da lei, que não permitam tributar todos os contribuintes em

situação de igual incidência, que se recorra, sempre que tal se afigure possível, a outras vias de

tributação que permitam uma melhor realização do princípio da igualdade.

Assim elimina-se o sentimento de injustiça e discriminação em sede tributária.

Há que notar que a violação deste princípio é, inegavelmente, aquela que levará a níveis maiores

de indignação e, por isso, desmotivação do cumprimento do dever de pagar impostos pelos

demais cidadãos.

O princípio da necessidade tributária

Numa óptica de eficiência, nenhuma sociedade democrática (e social) pode viver sem um eficaz

e operativo sistema fiscal.

Os tributos são obrigatórios e necessários- Ainda que usufrua, de forma directa ou indirecta, de

muitas ou poucas contraprestações, o contribuinte terá sempre o mesmo nível de contribuição

tributária, daí ser diferente do conceito de taxas.

Neste contexto, alude-se à ideia de incondicionalidade do imposto, assim se pretendendo

significar que o mesmo, diferentemente das taxas, é exigível sem supor a existência de qualquer

específica contraprestação – daí o imposto ser unilateral.

As manifestações do princípio da necessidade tributária são diversificadas:

1.º Ao nível da existência de privilégios creditórios a favor da fazenda, por força da lei;

2.º A existência de um sistema eficaz de garantias, de onde se destacam:

2.1. A constituição de penhor ou hipoteca legal no caso de impostos sobre os bens;

2.2. O direito de retenção de mercadorias sujeitas à acção fiscal;

2.3. A possibilidade de providências cautelares para garantia do crédito tributário;

3.º A consagração do princípio do inquisitório no âmbito do procedimento tributário;

4.º A competência vinculada de cobrança do imposto por parte da Administração Tributária;

5.º O poder de execução administrativa prévia, ainda que sujeita à intervenção ex post dos

tribunais administrativos e fiscais;

6.º Enquanto fundamento de restrição dos direitos, liberdades e garantias dos contribuintes, tais

como:

6.1. Dos direitos de propriedade;

6.2. Do direito à privacidade

O princípio do respeito pelos direitos fundamentais e a sua “protecção mais elevada”

A ordem jurídico-tributária é atravessada, de lés a lés, de cá para lá, transversalmente, pelo

princípio do respeito pelos direitos fundamentais, sejam eles os “Direitos, Liberdades e

Garantias”, sejam eles os “Direitos Económicos, Sociais e Culturais” dos contribuintes, quer

para as pessoas singulares, quer para as pessoas colectivas.

Há uma primazia dos direitos fundamentais sobre todas as demais normas e actos do sistema

jurídico. O relacionamento do actual sistema tributário, com os direitos fundamentais, exige que

se tomem em linha de conta os seguintes aspectos:

1.º O sistema fiscal não pode, em caso algum, violar os direitos, liberdades e garantias;

2.º O sistema fiscal não pode violar os direitos económicos, sociais e culturais;

3.º O sistema fiscal deve financiar, adequadamente, a realização de todos os direitos

fundamentais;

4.º O sistema fiscal deve obstar à lesão de direitos fundamentais por via do mercado.

O princípio da legalidade tributária – pg. 35

Foi a Revolução Francesa que proclamou, pela primeira vez, conjuntamente, dois princípios

fiscais: o princípio da legalidade dos impostos e o princípio da igualdade tributária, que

posteriormente foram consagrados na maior parte das constituições políticas

Os impostos são criados e disciplinados nos seus elementos essenciais através de lei (da

Assembleia da República), é o que refere o artigo 103º, nº 2 da CRP.. É este o princípio da

legalidade fiscal enquanto corolário da via política e que se reflecte no princípio da reserva de

lei.

No que respeita ao princípio da legalidade tributária, ele assenta no princípio do consentimento

democrático-representativo (ou seja, tem que ser fundamentado na lei) em tema de tributação –

art. 103.º CRP n.º 2.

O que levaria a concluir que este princípio nos surge como um dos sub-princípios mais

marcantes do princípio do Estado de Direito Democrático. Não há Estado de Direito sem

inequívoca consagração de um princípio da legalidade.

A legalidade tributária significa, nesses termos, que não devem ser criados impostos sem que os

cidadãos avaliem do interesse público subjacente à sua criação e, em face a este (interesse

público), determinem a medida do sacrifício que cada um há-de suportar para o satisfazer,

prestando o seu consentimento à criação de impostos. Este consentimento será feito através dos

seus representantes (deputados), isto é, através da lei enquanto vontade deles.

Assenta este princípio na ideia de auto-tributação dos cidadãos e decorre da necessidade de

assegurar uma especial defesa dos seus interesses patrimoniais.

Os cidadãos, livres e iguais, na modelação dos contornos do “contrato social”, têm de identificar

os custos e o modo de repartição da tributação que permite financiar a gestão da “res publica”.

Do princípio da legalidade tributária decorre:

1.º A ideia de reserva de lei – subprincípio da legalidade pública;

2.º A exigência de conformação legal dos elementos modeladores do tipo tributário (definição

dos trâmites que compõem o imposto):

2.1. A incidência objectiva;

2.2. A incidência subjectiva;

2.3. A taxa;

2.4. Os benefícios fiscais;

2.5. As garantias dos contribuintes.

O princípio da legalidade tributária implica a sua sujeição ao princípio da tipicidade legal dos

elementos de cujo concurso resulte a modelação dos tipos tributários ou dos impostos, ou seja,

os elementos essenciais dos impostos.

O princípio da legalidade da Administração Tributária envolve três sub-princípios:

i) O princípio da prevalência da lei;

ii) O princípio da precedência de lei;

iii) O princípio da reserva de lei:

iii.i) Princípio da reserva da lei em sentido formal

iii.ii) Princípio da reserva material da lei

No que respeita ao princípio da prevalência de lei, ele pretende significar que a lei prevalece

sobre todos os regulamentos, actos administrativos e quaisquer outros actos ou omissões da

administração tributária.

O artigo 112.º, n.º 5, da CRP 1976, explicita que nenhum tipo de lei pode criar outras categorias

de actos legislativos ou conferir a actos de outra natureza, como será o caso dos regulamentos

ou mesmo das sentenças judiciais, o poder de, com eficácia externa, interpretar, integrar,

modificar, suspender ou revogar qualquer dos seus preceitos.

No reverso da criação encontra-se a extinção. Ora, também para a extinção ou derrogação de

actos normativos vale a proibição anteriormente exposta, já que «ela implica uma espécie de

suspensão tácita ad hoc». Compreende-se, assim, que se veja com maus olhos as denominadas

“circulares interpretativas” que vão “circulando” e andando por aí, um pouco por toda a

Administração Tributária, com uma errónea qualidade que não podem constitucionalmente

possuir.

Um segundo corolário do princípio da prevalência da lei liga-se à ideia da legalidade negativa4

ou princípio da proibição de contradição ou desvio, nos termos do qual nenhum acto da

administração, de natureza normativa ou não, pode ser contrário à lei ou contraditória à mesma.

À luz desta ideia nasce a tutela adjectiva da acção administrativa especial, com vista à

impugnação de normas e actos administrativos contrários à lei. Um terceiro corolário liga-se à

exigência de legalidade positiva5 ou dever de aplicação da lei. A administração tributária deve

emanar as normas necessárias à execução das leis e, além disso, praticar os actos

administrativos legalmente devidos.

Há que fazer uma análise quanto à legalidade do surgimento e da actuação de uma instituição,

passando-se, em seguida, ao monitoramento e discussão de sua legitimidade. Como é bastante

comum na literatura, sobretudo na literatura jurídica e política, legalidade e legitimidade não se

confundem, isto é, não são a mesma coisa, embora sejam conceitos intrinsecamente vinculados.

A legalidade refere-se, antes de tudo, a um rígido respeito à lei e ao direito, enquanto a

legitimidade decorre de um consenso social, ou seja, a legitimidade tem uma estreita relação

com o poder, melhor, a legitimidade é uma das qualidades do poder.

A legalidade não se confunde com a legitimidade, porém, não se pode negar que tudo o que é

legal seja, também, presumivelmente, legítimo.

Um acto do administrador público somente será legítimo se for legal, pois somente a lei é capaz

de dar legitimidade aos atos da administração pública.

4 O princípio da legalidade negativa é aquele do art. 5º, II da Constituição, e é o que é aplicável ao

particular

5 O princípio da legalidade positiva é o de observância obrigatória pelo administrador público, pelo qual

este só está autorizado a fazer o que a lei expressamente permitir.

A legalidade é, claramente, um pressuposto da legitimidade, ou seja, os nossos actos serão

legais, se forem legítimos.

Um outro princípio a tomar, em devida conta, é o da precedência da lei, segundo o qual toda a

actividade administrativa deve ter uma base legal anterior à sua actuação

Sempre que tal assim não ocorra poderá concluir-se que a Administração actuou “ultra vires” –

para “além dos poderes” – ou “fora da lei”.

Há, ainda, que aludir, neste contexto, ao denominado princípio da reserva de lei em sentido

formal, segundo o qual cabe à Assembleia da República a competência legislativa em matéria

tributária, sem prejuízo de alguns aspectos técnicos serem colocados a cargo da Administração

Tributária – Art. 165.º i) CRP

Este subprincípio do princípio da legalidade fiscal: a reserva de lei determina que a

Administração Pública só pode agir quando esteja habilitada por uma autorização

legal (que pode ser nacional ou comunitária).

Este mesmo aspecto de reserva de lei ganha particular relevo no campo do Direito Fiscal,

porquanto os impostos só podem ser criados e estruturados por lei. E trata-se de uma reserva de

lei em sentido formal, posto que a lei criadora dos impostos deve provir de um órgão com

competência legislativa normal (arts. 103º, 165º/1-i CRP).

O princípio da reserva de Lei da Assembleia da República (AR), em “matérias tributárias” - no

artigo 165.º, n.º 1, alíneas c), d) e i), da CRP 1976, tem implicações diversificadas. Perante isto,

temos duas possibilidades:

1.ª Egoisticamente, a Assembleia da República decide legislar em matérias tributárias –

pode e fá-lo – Reserva absoluta da lei (art. 164.º CRP)

2.ª Não egoisticamente ou com sentimento de partilha (reserva relativa – art. 165.º CRP)

– a Assembleia da República decide não legislar, directamente, em matérias tributárias, mas

autoriza o governo, mediante “emanação de Lei de Autorização”, a, nos estritos limites

legalmente fixados, adoptar um decreto-lei nessa matéria.

Nos termos do artigo 165º, n.º 1 alínea i) da CRP, a criação de impostos é matéria contida na

reserva relativa de competência da Assembleia da República. Só a Assembleia da República tem

o poder próprio e autónomo para criar impostos, embora, em alternativa a usar esse poder

directamente, ela possa autorizar o Governo a fazê-lo, através da Lei de Autorização.

Nessa Lei é mister que o Parlamento estabeleça, de modo firme, fechado e inequívoco, nos

“dizeres”, o objecto, o sentido, a extensão e a duração da autorização, fixando assim os limites,

em termos de legislação da tributação, que o Governo pode adoptar.

O não cumprimento dos requisitos, estabelecidos na Lei de Autorização, significa uma

(in)constitucional não legitimação (ou seja, uma inconstitucionalidade) da actuação

governamental que, desse jeito, abre uma censura constitucional a todo o edifício legislativo

tributário baseado no Decreto-lei emanado pelo Governo.

Ou seja, se o Decreto-Lei é inconstitucional, tudo o que dele advém também o é.

Assim, o Governo sem autorização da Assembleia da República, um Município, um Instituto

Público, outra qualquer entidade não podem criar impostos. E se os criarem, eles serão

inconstitucionais, ninguém sendo obrigado a pagá-los (cf. art. 103º, n.º 3 da CRP).

O Governo, dotado de uma Lei de Autorização, em matéria tributária, pode inovar e legislar

originariamente, mas o que não pode é fazê-lo para lá dos limites impostos pela Lei de

Autorização, seja desvirtuando-a, seja desrespeitando-a.

Ou seja, não se trata de uma aplicação mecânica da Lei de Autorização, em que o Governo

apenas se limita a aplicar na prática os trâmites que a Lei de Autorização propõe, este pode

inovar, atingir os objectivos propostos de variadas formas.

AR posteriormente, poderá, de modo perfeitamente natural e legítimo, proceder à apreciação

dos decretos-leis que houverem sido autorizados neste tipo de matérias – art. 169.º CRP

Outro aspecto a destacar, é que a Lei de Autorização está sujeita ao princípio da especialidade

das autorizações legislativas, que implica a presença de uma inequívoca definição parlamentar

da orientação da medida política a adoptar.

O princípio da tipicidade ou da reserva material de lei previsto no art. 103°, nº 2 da CRP, prevê

que “os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e

as garantias dos contribuintes”, exigindo que a disciplina essencial dos impostos seja regulada

por lei ou decreto-lei autorizado. Isto significa, desde logo, não só que a tipologia fiscal é

taxativa: no sentido em que só há impostos criados por lei e os impostos são apenas os que a lei

criou e que só são sujeitos passivos de imposto e facto gerador de impostos (incidência) os que a

lei fixar; como manifesta também que: os restantes elementos essenciais dos impostos devem

ser fixados na lei de forma suficientemente determinada, de modo a que não fique espaço para

desenvolvimento regulamentar nem para discricionariedade administrativa relativamente aos

elementos necessários à quantificação da prestação

Este implica a determinabilidade das normas fiscais: ou seja, que a regulamentação dos

impostos e dos seus elementos essenciais seja tão completa quanto possível.

Com efeito, a norma tributável deve conter em si mesma não só o fundamento da decisão, como

também o próprio critério de decidir.

Significa esta afirmação que quer os factos tributários quer os efeitos jurídicos decorrentes da

verificação dos factos são típicos, ou seja, têm que estar expressamente previstos na lei.

Em matéria de criação de impostos – o legislador tem de estabelecer os elementos essenciais

dos impostos, nos termos em que eles são indicados no artigo 103.º, n.º 2, da CRP 1976:

i) A incidência;

ii) A taxa;

iii) Os benefícios fiscais;

iv) As garantias dos contribuintes

Alguns autores relembram que o princípio da legalidade tributária surge como uma expressão

do princípio democrático da auto-tributação.

Não basta, porém, que os impostos sejam criados por lei para que possam ser cobrados, sendo

necessário, também, que anualmente no orçamento do Estado seja autorizada a sua cobrança,

isto é, têm que respeitar a uma legalidade genérica, na medida em que têm de obedecer às leis

em geral e têm que respeitar a legalidade específica (princípio da tipicidade qualitativa, ou seja,

relativa à natureza das receitas ou da autorização anual de cobrança)

Da regra constitucional da reserva absoluta de lei resultam claramente dois limites:

i) Um para o órgão legislador obrigado a legislar em matéria tributária nos termos de rigorosa

reserva absoluta;

ii) Outro para o órgão aplicador do direito na medida em que exclui o subjectivismo na

aplicação da norma o que pressupõe a proibição da analogia e da discricionariedade.

Visa-se, assim, proteger a segurança jurídica dos cidadãos, sendo que a salvaguarda do princípio

da segurança jurídica opera em dois planos: no da estabilidade do direito e no da protecção da

confiança”.

O primeiro pressupõe que o direito não esteja em constante mudança, levando a que possa haver

algum um grau de certeza quanto às normas legais em vigor, incumbência que hoje não é fácil

nem para os juristas quanto mais para o comum dos cidadãos.

O segundo pressupõe que as normas tributárias sejam elaboradas com clareza e rigor de forma a

permitir aos cidadãos compreender qual é o quadro das acções ou condutas que poderão causar

responsabilidades fiscais.

Importa fazer referência a que o princípio da legalidade fiscal não abrange a liquidação e a

cobrança dos impostos, estando estes momentos do imposto sujeito ao princípio da legalidade

da administração pública.

Do princípio da legalidade retiram-se, por seu turno, as seguintes conclusões:

1.º A prevalência de lei – a Administração Tributária deve actuar com estrita subordinação à lei

fiscal;

2.º O princípio da legalidade negativa – a proibição de a Administração Tributária se

contradizer na sua actuação (uniformidade de interpretações e actuações);

3.º O princípio da legalidade positiva – a Administração Tributária deve cumprir a obrigação de

regulamentação e execução “em conformidade à lei” (e, consequentemente, à constituição) (e,

subsequentemente, à “juridicidade” = princípios jurídicos que “pairam em redor da ordem

jurídico-constitucional portuguesa”).

No que concerne à reserva da lei em matéria de taxas, inversamente do que ocorre com a criação

de impostos, a reserva relativa de comptência da Assembleia da República abrange apenas o seu

regime geral (cf. CRP, art. 165º, n.º 1, alínea i), não tendo a criação de cada taxa específica (ou

seja, o regime especifico de cada taxa) que ser aprovada pela Assembleia da República ou pelo

Governo com autorização daquela (da AR).

Ou seja, só há reserva relativa em relação ao regime geral das taxas – pg. 43

Deste distinto regime de submissão ao princípio constitucional da legalidade resulta a

importância da distinção entre o imposto e a taxa:

Em termos essenciais, pode dizer-se que o imposto se distingue da taxa, porque aquele é

unilateral e esta bilateral – Quer isto dizer que as taxas são pagas em contrapartida de uma

determinada contraprestação.

Nas taxas, há assim, uma relação sinalagmática de um tendencial equilíbrio económico entre o

que se dá – a taxa – e o que se obtém (ou presta) – o bem, produto ou serviço. Ex: taxas

moderadoras da saúde

Com efeito, ao contrário do imposto, que não confere a quem o paga o direito a nenhuma

contrapartida directa e imediata, sinalagmaticamente ligada a esse pagamento, a taxa é sempre a

contrapartida individualizada de algo que se recebe em troca, seja um serviço concretamente

prestado, seja a utilização de um bem do domínio público, seja a remoção do limite legal ao

exercício de determinada actividade (cfr. art. 4º, n.º 2 da LGT).

Note-se bem, a taxa não tem que ter carácter voluntário. O serviço prestado ao particular que

está na sua origem pode não ser por este desejado (pense-se, por exemplo, no montante pago

pela emissão do Bilhete de Identidade, que os cidadãos são obrigados a requerer

independentemente da sua vontade).

O particular pode mesmo não apreciar ou até abominar o serviço que lhe é prestado (será

normalmente o caso da parte que perde uma acção judicial e que tem, por isso, que pagar a

chamada Taxa de Justiça). Mas se há um serviço individualmente prestado, aquilo que se paga

por esse serviço é uma taxa.

A taxa não se distingue do imposto por ser voluntária; distingue-se por ser bilateral.

Em qualquer caso, porém, a medida da taxa tem que assentar na sua proporcionalidade em

relação ao benefício específico proporcionado pelo serviço prestado ou ao custo suportado pela

comunidade com a utilização do bem do domínio público ou a remoção do limite legal ao

exercício da actividade do particular. Nunca em função da capacidade contributiva revelada por

quem a paga.

Contrariamente o imposto tem em conta a capacidade contributiva do visado, daí, por exemplo

existirem as taxas progressivas de IRS.

Se a um serviço essencialmente idêntico correspondem contrapartidas diferenciadas em função

da diferente capacidade contributiva revelada, então estaremos perante um imposto, não perante

uma taxa

Síntese entre a diferença de taxa e imposto:

Os impostos obedecem ao princípio da legalidade fiscal e ao princípio da capacidade

contributiva. (artigo 103.º da CRP)

As taxas pertencem à reserva relativa de competência da Assembleia da República

apenas quanto ao seu regime geral; (artigo 165, nº 1, alínea i) da CRP)

Obedecem ao princípio da proporcionalidade (analisada esta em função do confronto

entre a importância a pagar e o valor ou custo do serviço a prestar).

A principal distinção reside no carácter sinalagmático/unilateral da taxa contraposto

com o carácter unilateral do imposto

A taxa, enquanto espécie tributária, é uma prestação estabelecida pela lei, a favor de

uma pessoa colectiva de direito público ou a exercer funções públicas como

contrapartida de serviços individualmente prestados, da utilização de bens do domínio

público ou da remoção de um limite à actividade dos particulares

Vimos que a taxa surge, antes de mais, como um tributo pago por ocasião da prestação

de um serviço público; em função da natureza da actividade da administração as taxas

podem ser judiciais — como as custas, ou administrativas — em que se incluem, por

exemplo, as propinas escolares.

A taxa pode também resultar da utilização de um bem do domínio público A utilização

de bens do domínio público pode revestir a forma de uso comum, se a sua utilização é

permitida à generalidade das pessoas ou a uma categoria genericamente de limitada de

pessoas e de uso privativo, se a sua utilização não é concedida a uma generalidade de

pessoas mas apenas a uma ou algumas determinadas, com base num título jurídico

individual. O uso comum em regra é gratuito, o uso privativo dá lugar ao pagamento de

uma prestação patrimonial: a taxa.

A taxa pode ainda resultar da remoção de um limite jurídico à actividade dos

particulares, é o que sucede, por exemplo, com as taxas pagas como contrapartida do

licenciamento de actividades cujo exercício dele carece.

Relacionado com as taxas está subjacente um princípio do benefício

Proibição de referendo fiscal:

Um outro princípio importante, em matéria financeira e tributária, é o da proibição de referendo

fiscal, por força do disposto no artigo 115.º, n.º 4, alínea b), da CRP 1976. Qual é a razão de ser

de tal proibição? Porque não se podem efectuar referendos nacionais ou locais em matéria

fiscal? Há que indicar algumas dessas razões:

1.º O receio de “demagogia política” em favor do desagravamento fiscal – o referendo fiscal

conduz inevitavelmente ao desagravamento fiscal, uma vez que os indivíduos atribuem aos

impostos uma conotação negativa.

2.º O receio de “populismo” fácil em troca de dividendos políticos – com uma ênfase natural ao

combate aos privilégios fiscais.

Em sentido contrário, combatendo-se a ideia de que o referendo fiscal conduz, inevitavelmente,

ao desagravamento fiscal, refere-se:

1.º Tal possibilidade seria “relativizada”, em função da vontade da generalidade da população

de se opor ao desmantelamento do Estado social e respectivos direitos sociais – quer isto dizer

que a população se oporia ao aumento da carga fiscal em contrapartida da diminuição das

prestações sociais, gerando assim um determinado sentimento de justiça, ou equidade entre

estas “trocas” (que no fundo não são trocas, devido à unilateralidade do imposto).

2.º Tal proibição constitui um importante obstáculo à reforma fiscal e à eliminação dos

privilégios – Uma reforma fiscal que traduz a insatisfação da população quanto ao sistema fiscal

Em Portugal, como na maior parte dos países europeus e também no Brasil, as pessoas sentem-

se desiludidas e injustiçadas com o sistema fiscal. Não com a técnica legislativa, não com a

formulação desta ou daquela norma; é com as próprias ideias de justiça, de igualdade e eficácia

que deveriam estar presentes e subjacentes no sistema fiscal e que não estão.

Ou seja, o problema é o próprio alicerce do sistema fiscal

O Estado é a máquina que cria os impostos para se alimentar das receitas. E quem está abaixo

do imposto, quem o suporta? São as pessoas.

Portanto, a história do imposto, para ser entendida, devia ser uma história do Estado e das

pessoas. Estado como autoridade, como criador de impostos; e das pessoas como sujeitos ao

imposto ou como seus autores – nisto assenta o conceito de auto-tributação que tem vindo a

desaparecer na constante fuga aos impostos.

O princípio da segurança jurídica e da protecção da confiança

Um dos [sub-] princípios mais importantes e integrantes do princípio do Estado de Direito

(Democrático), com vista à realização dos valores da garantia de estabilidade, previsibilidade e

calculabilidade, é o princípio da segurança jurídica e da protecção da confiança – a legítima

expectativa do individuo.

Uma reiterada e constante frustração das legítimas expectativas dos cidadãos, por parte do

Estado, acarreta custos económicos e custos de desmoralização, assim se verificando uma perda

de confiança em toda a actuação do Estado e, consequentemente, uma forte desmobilização de

toda a “sociedade civil” relativamente à “coisa pública”.

Este princípio ínsito na ideia de Estado de direito democrático, previsto no artigo 2.º da CRP,

limita a actuação do legislador em dois sentidos:

i) Proibição de normas retroactivas (desfavoráveis) – Art. 3.º, n.º 3 da CRP;

ii) Exclusão da livre revogabilidade e alteração das leis fiscais (favoráveis).

Não se pode negar que quando se alude ao princípio da segurança jurídica e da protecção da

confiança dos cidadãos também se parte do pressuposto de que as normas fiscais não possuem

natureza retroactiva, seja ela de forma directa, seja ela de forma indirecta ou “camuflada”.

O legislador consagrou, por isso, no artigo 103.º, n.º 3, da CRP 1976, o princípio da

irretroactividade ou não retroactividade das normas fiscais que criam (ou agravam os) impostos

ou, mais genericamente, os tributos.

Assim dica-se com a ideia fundamental que o legislador sempre projectará a sua atenção para o

futuro e não para o passado

No entanto, a título excepcional, registam-se situações em que se admite uma aplicação

retroactiva de normas jurídicas, desde que ela não seja totalmente proibida, de modo

inequívoco, e daí não advenha a violação de elementares princípios da ordem jurídico-

constitucional portuguesa.

Isto porque, nesta matéria, a doutrina e a jurisprudência se encontravam divididas, posto que uns

admitiam e outros não concebiam a possibilidade da existência de retroactividade.

O Tribunal Constitucional pronunciou-se mesmo pela não necessária inconstitucionalidade das

normas fiscais retroactivas, embora assim o entendesse sempre que a norma fiscal – com

eficácia retroactiva – violasse de forma gravosa, intolerável, arbitrária e desproporcionada, quer

o princípio da segurança jurídica, quer essoutro da protecção da confiança dos cidadãos.

O problema da proibição da retroactividade das normas fiscais deve ser analisado à luz dos

princípios da legalidade e da igualdade tributária. Há que notar que, modernamente, a gestão das

famílias e das empresas é “programada” à luz das leis fiscais em vigor, de tal modo que

alterações retroactivas podem introduzir desequilíbrios que impeçam quer a sobrevivência

económica das primeiras, quer a viabilização económico-financeira das segundas.

Nesta matéria distinguem-se os seguintes tipos de irretroactividade:

i) Retroactividade autêntica ou “retroactividade de consequência jurídica”

ii) Retroactividade não autêntica ou “inautêntica”, também conhecida como

“retrospectividade” ou “retroactividade de pressupostos de facto”

Na retroactividade autêntica ou “retroactividade de consequência jurídica”: Exclusão dos casos

em que os factos tributários regulados ainda não ocorreram inteiramente ao abrigo da lei antiga,

continuando a formar-se ao abrigo da lei nova – Ex impostos periódicos

Retroactividade imprópria: Ponderação à luz do princípio da segurança jurídica e da protecção

da confiança. Está assente em 2 condições:

i) A afectação de expectativas será intolerável quando constitua uma alteração da ordem jurídica

“surpreendente”, com a qual não se podia razoavelmente contar;

ii) Não existir necessidade de salvaguardar outros direitos ou interesses protegidos pela

Constituição e que devem ter-se por prevalecentes: ponderação à luz do princípio da

proporcionalidade

À luz do disposto no artigo 12.º, da LGT, tudo aponta para a não aceitabilidade de ambos os

tipos de retroactividade.

De facto, no seu n.º 1, tal normativo, dispõe que as normas tributárias se aplicam aos factos

posteriores à sua entrada em vigor, de tal modo que não podem ser criados impostos

retroactivos.

Não se pode estranhar que, também em matéria de leis interpretativas tributárias, deva vigorar o

princípio da irretroactividade – as normas interpretativas apenas podem ter efeitos no futuro

Na limitação ou exclusão da “livre revogabilidade” das leis relativas a benefícios fiscais está

em causa a tutela dos direitos adquiridos ou dos direitos subjectivos, essencialmente que

merecem especial protecção em relação aos interesses dos particulares na manutenção da lei

relativamente aos benefícios já atribuídos ou reconhecidos

O princípio da segurança jurídica aplica-se, ainda, em sede de deveres ou obrigações fiscais de

natureza acessória, como por exemplo os juros compensatórios ou os juros moratórios em que

se proíbe o agravamento retroactivo

Para o incremento do princípio da segurança jurídica e da protecção de confiança dos cidadãos

afiguram-se imprescindíveis à verificação de níveis adequados de publicidade, mormente das

denominadas normas fiscais. Não há Estado de Direito com medidas secretas e desconhecidas

dos cidadãos. O secretismo, aqui, é inimigo e incompatível do nosso actual modelo de Estado.

Em matéria tributária, no que respeita ao requisito da publicidade, exige-se que ela seja

devidamente ordenada, sistematizada e actualizada.

O que significa que, até 31 de Março, de cada ano civil, a Administração Tributária, por força

do disposto no artigo 59.º, n.º 6, da LGT, tenha de proceder à publicação, de forma integral e

actualizada, de todos os “códigos tributários”.

De igual modo, exige-se que, por força do artigo 59.º, n.º 3, da LGT, relativamente às

“circulares internas” e “orientações genéricas” de natureza interpretativa das normas tributárias,

no prazo de seis meses, elas devam ser publicadas, sob pena de as mesmas deverem ser

consideradas inoponíveis aos contribuintes.

Além da publicidade, também se exige a precisão, clareza e determinabilidade de todas as

normas tributárias. Na verdade, o princípio da segurança jurídica e da protecção da confiança

dos cidadãos cruza-se, com a exigência de legalidade tributária, no princípio da precisão, clareza

e determinabilidade de todas as normas e actos tributários, com especial relevo para aqueles

“factores” que se referem aos elementos essenciais dos impostos e outros que se demonstrem

pertinentes para tal efeito – Aqui subjacente a reserva da lei sem sentido material ou principio

da tipicidade tributária, visto que a lei tem que indicar todos os pressupostos ao imposto, para

que se garanta uma efectiva segurança jurídica e protecção da legítima expectativa dos

indivíduos.

Nisto, relembra-se que por força do disposto no artigo 103.º, n.º 2, da CRP 1976, os impostos

são criados por lei que determina «a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos

contribuintes».

Estando de certa forma explicito (subentendido) na parte de “as garantias dos contribuintes”, a

garantia do princípio da segurança jurídica

A CRP 1976 exige que a lei fixe os elementos constitutivos essenciais da obrigação de imposto,

de forma a proteger os direitos e garantias fundamentais dos contribuintes – Assim a lei fiscal

deve ser clara, precisa e determinada, de forma a garantir entendimentos/interpretações

objectivas e concretas, ou seja, não susceptíveis de dúvida.

No entanto, urge desmistificar o entendimento de que a lei fiscal, por ser muita precisa que seja,

em termos técnicos, nem sempre tal significará que, efectivamente, ela será mais clara, precisa e

compreensível - A excessiva precisão normativa pode constituir um sério obstáculo à

operatividade do sistema fiscal, assim podendo colocar-se em risco alguns outros princípios

constitucionais

De facto, a elevada precisão técnica das normas tributárias é, em não poucos casos, uma razão

da sua obscuridade, na medida em que a sua interpretação, nesses casos, suporá uma maior

posse de elevadas quantidades de informação que um especialista, em legislação tributária,

poderá ter dificuldade em abarcar ou “digerir”.

Haverá que notar que este princípio assenta no reconhecimento de que um sistema fiscal,

composto por normas demasiado imprecisas, vagas ou complexas, é inadministrável e

manipulável, assim se instigando valores da desigualdade, arbítrio, irracionalidade e ineficácia,

com a consequente instabilidade e imprevisibilidade que tal implicar.

Ou seja, abre mais hipóteses para o esmiuçar das variadas omissões ou interpretações

inconclusivas presentes na lei.

Do outro lado, verifica-se que um sistema fiscal, edificado sobre normas tributárias demasiado

precisas, nítidas e determinadas (bright line rules), pode levar a uma previsibilidade excessiva,

facilitando a alteração da natureza dos rendimentos, através da sua requalificação e

recategorização, abrindo as portas para a evasão fiscal (tax avoidance) e para a fraude fiscal (tax

evasion) – O que de certa forma, em matéria do Direito do Trabalho ocorria no caso dos

contratos de prestações de serviços que eram confundidos com contratos de trabalho.

Conclui-se assim que um eficiente Sistema Fiscal deverá possuir uma certa abertura e

generalidade para que assim se “encaixem” novas realidades e interpretações mais correctas,

para isso é importante as normas que olham à substância económica da realidade e não na sua

qualificação jurídica – O que acontecia novamente com o contrato de trabalho.

Importa sublinhar que o Tribunal Constitucional, no seu Acórdão n.º 127/04, esclareceu, nesta

matéria, que o legislador tributário deve utilizar conceitos na definição dos elementos essenciais

do imposto, tanto quanto possível, de sentido unívoco

Por outro lado, só é admissível o uso de conceitos indeterminados, na definição dos elementos

essenciais do imposto na medida indispensável para garantir a praticabilidade e a

operacionalidade do sistema e para promover a efectivação da igualdade tributária

O princípio da proporcionalidade – ver novamente

Para que uma decisão estatal ou uma lei seja considerada proporcional, exige-se que ela passe,

com sucesso, a “prova dos cinco”. Em que se traduz tal tipo de “prova” em tema de “leis

fiscais”?

1.º Teste – a legitimidade dos fins – O que significará que passará este teste toda a lei

tributária que concretize impostos que sirvam para a realização de interesses públicos com

relevância constitucional e legal.

2.º Teste – a avaliação da legitimidade prima facie dos meios – Haverá que, face à adopção de

uma lei tributária, investigar da existência de qualquer proibição expressa da utilização de um

determinado meio. Não passará este teste, a título exemplar, uma lei tributária que consagre

impostos regressivos sobre o rendimento ou essoutra que consagre uma legislação tributária

inequivocamente discriminatória e atentadora do princípio da igualdade e universalidade dos

impostos, atenta a capacidade contributiva e o rendimento real das pessoas e empresas.

3.º Teste – a averiguação da adequação dos meios aos fins pretendidos do ponto de vista das

relações empírico-racionais de causa efeito – Trata-se de uma análise nem sempre límpida, já

que não se pode ignorar que, ao sistema fiscal, preside uma multiplicidade de fins, sejam eles os

que se prendem com as necessidades económico-financeiras do Estado Português, sejam elas as

que se ligam ao incentivo do crescimento económico-financeiro do país, já que, entre todos

estes fins, se geram “tensões” e “pulsões” em direcções opostas, assim gerando um aparente ou

efectivo imobilismo e contracção económica, financeira, et pour cause, tributária.

4.º Teste – a averiguação da necessidade ou exigibilidade dos meios, a nível espacial, temporal,

subjectivo e objectivo – Perante este teste, vai chegar-se à conclusão se a tributação nos surge

como estritamente necessária para a promoção da satisfação das necessidades financeiras do

Estado e para a promoção da justiça tributária, com as inerentes exigências de universalidade e

igualdade. Há que verificar se o nível excessivo de tributação não é de molde a desencorajar a

actividade económica e, por isso, nessa franja, não sendo necessária para as necessidades

económico-financeiras do Estado, nos surgir como economicamente inoportuna e ineficiente.

5.º Teste – a proporcionalidade, stricto sensu, do meio a empregar com base numa análise de

custos e benefícios – O intérprete tem, agora, de investigar se os custos administrativos e

económicos, ligados à aplicação e cumprimento de uma dada norma tributária, têm, no reverso

da medalha, o surgimento de uma efectiva compensação dos cidadãos por meio dos benefícios

que lhe são proporcionados por tal tipo e nível de tributação.

Numa outra perspectiva, trata-se de sindicar do papel que o sistema tributário desempenha ao

nível de um efectivo progresso e justiça, nas várias vertentes, sejam elas a económica, sejam

elas a social. A doutrina indica, neste contexto, que a análise da razoabilidade e

proporcionalidade de um dado sistema fiscal, para a prossecução dos desideratos

constitucionalmente desenhados, leva a distinguir entre o critério da eficiência de PARETO e

essoutro da eficiência de KALDOR-HICKS. Modernamente, sob a influência de JOHN

RAWLS, alude-se ao princípio da diferença, enquanto critério de justiça, a ele se reconduzindo

a ideia de melhoria da posição dos menos desfavorecidos.

Urge notar que se retira, do princípio da proporcionalidade, em sentido amplo, a proibição da

aplicação de taxas excessivas, bem como a necessidade da busca da taxa óptima e ainda

compatível com a manutenção do rendimento tributável.

O princípio da protecção jurisdicional efectiva, “equitativa e em tempo útil” – pg. 53 – não

vi

Os contribuintes possuem o direito fundamental à tutela jurisdicional efectiva diante da

administração tributária, por força do disposto nos artigos 20.º, 103.º, 104.º, 202.º, 266.º e 268.º,

da CRP 1976.

Com este princípio, pretende-se traduzir a ideia de que os contribuintes possuem um efectivo

direito (ao acesso) à justiça tributária com vista a obterem a cabal e efectiva tutela plena de

todos os seus direitos ou interesses legalmente consagrados e protegidos.

O contribuinte tem de possuir, ao seu dispor, uma mole de instrumentos adjectivos que lhe

permitam impugnar e recorrer de todos os actos em matéria tributária que tenham aptidão para

lesar os seus direitos ou interesses legalmente protegidos.

O princípio da justiça distributiva – pg. 53

O princípio da justiça distributiva tem uma inegável dimensão material, como bem fica

esclarecido pela leitura do artigo 5.º, n.º 2, da LGT.

O sistema fiscal português combina a tributação do rendimento, património e consumo, através

de taxas progressivas, estabelecendo, além disso, que todos os impostos se encontrem, em maior

ou menor intensidade, vinculados à redistribuição do rendimento e à promoção da igualdade

entre os cidadãos.

Somente através de uma avaliação global, de toda a actividade estadual, mediante a combinação

dos impostos, taxas, subvenções, bens públicos, oportunidades sociais, económicas, culturais,

regulação dos mercados, entre tantos outros factores, permitiria uma avaliação adequada da

justiça tributária subjacente a uma dada sociedade.

As normas fiscais encontram-se inerentes ao próprio contrato social, tendo por objectivo

suportar os seus custos e, simultaneamente, preside-lhes uma intenção distributiva que surge

como conditio sine qua non da validade e legitimação de todo o contrato social.

Como devem os benefícios ser distribuídos na sociedade?

A este respeito temos diversas perspectivas:

i)Utilitarismo,

ii) A perspectiva não-consequencialista de John Rawls

iii) A visão, também, não consequencialista de Robert Nozick.

O princípio da “não expropriação” por via tributária do direito de propriedade: o

nível inultrapassável – o mínimo económico-financeiro imprescindível a uma vida

condigna (dignidade humana)

Para alguma doutrina, a tributação surgiria como uma efectiva restrição ao direito de

propriedade (art. 62.º CRP), na estrita medida em que imporia, de modo coercivo, uma

transferência de uma parte de tal valor.

Os indivíduos só estão dispostos a abdicar, no contrato social, de parte do seu

património particular se tiverem garantias (inequívocas) de que o contrato social suprirá

(por seu turno e em via substitutiva) as suas necessidades básicas.

Cumpre ao sistema tributário a garantia de uma contínua captação de fundos

económico-financeiros com vista a permitir a subsistência das várias instituições do

Estado que permitem uma efectiva organização da vida social e protecção dos direitos

dos cidadãos ou contribuintes.

Face a tudo isto, haverá que notar que a medida correcta da tributação vai levar

implicada a necessidade de uma efectiva concordância prática entre as necessidades

financeiras do Estado e as necessidades económicas e sociais dos particulares.

Face a isto, destaca-se o que se denomina por nível inultrapassável de tributação e que

se prende com o mínimo económico-financeiro imprescindível a uma vida condigna.

Na verdade, a partir da conjugação do princípio da dignidade da pessoa humana, da

proporcionalidade e do direito de propriedade (artigos 1.º, 18.º e 62.º, da CRP 1976),

afigura-se legítimo formular uma lei tendencial e que é a seguinte: quanto maior for o

nível de propriedade detido por um indivíduo, maior será a legitimação de um aumento

ou incremento da tributação sobre o mesmo.

Todavia, tal lei tendencial tem um limite, à partida, impostergável e que se prende com

o mínimo de propriedade – económico-financeira – imprescindível a uma vida

condigna.

Quem não tem bens, quem não tem qualquer propriedade não deve ser sujeito a

tributação, assim o mesmo devendo ocorrer com aqueles que possuem propriedade mas

a possuem em níveis tão diminutos ou baixos que a sua tributação seria empurrá-lo para

uma vida sem o mínimo económico-financeiro imprescindível a adquirir bens de

primeira necessidade para a sua sobrevivência o que, obviamente, chocaria com a

eminente dignidade humana, já que o Estado não tem legitimidade para, ainda que em

nome da restante sociedade, retirar ao cidadão, pela via tributária, aquilo de que o

mesmo necessita para sobreviver.

Os princípios “constitucionalmente implicados” para a realização de um óptimo e

eficiente sistema tributário

Para que um dado sistema tributário seja classificado como “óptimo” ou “eficiente” é

essencial que ele respeite vários princípios. A doutrina tem vindo a identificar, entre

outros, vários princípios fundamentais, de onde se podem destacar:

1.º O princípio da eficiência económica ou do não desperdício de recurso e não

sobrecarga desnecessária dos contribuintes;

2.º O princípio da simplicidade administrativa em prol da fórmula “acessível a todos os

cidadãos”;

3.º O princípio da flexibilidade ou não rigidez dos “procedimentos” administrativo-

tributários;

4.º O princípio da “accountability”;

5.º O princípio da justiça;

6.º O princípio da contabilização ou documentação contabilística.

O princípio da eficiência (não desperdício de recurso ou não sobrecarga

desnecessária dos contribuintes) económica

Há que dizer, desde já, em fórmula enxuta que ele significa que o sistema tributário não

pode ter efeitos “distorcionários” (ou de distorção ou desvio) – é o que se designa de

impostos fixos ou de taxa fixa (lump-sum taxes) – e, além disso, não deve interferir com

o funcionamento dos mercados, a não ser quando se constate existirem “falhas de

mercados” e estes não funcionem de forma eficiente, assim se justificando uma

“intervenção tributária correctiva ou de re-direccionamento” – externalidades negativas

e positivas.

Momento em que o sistema tributário poderá, de modo legítimo, ser usado para as

corrigir.

Um dos campos de especial aplicação da tributação correctiva prende-se com a

actividade económica envolvendo níveis de poluição, pois, mediante tal tributação

“correctiva”, permite-se que se obtenham receitas “compensatórias” (ou “inibidoras”)

do nível de poluição originado pelo agente económico – servindo como desmotivação à

poluição.

O princípio da simplicidade administrativa em prol da fórmula “acessível a todos

os cidadãos”

Um outro princípio a tomar em devida conta, para atingir um sistema de tributação

eficiente e “bom”, prende-se com o princípio da simplicidade administrativa (em prol da

fórmula “acessível a todos os cidadãos”).

Pretende-se traduzir a ideia de que o sistema tributário deve ser simples, ou seja, deve

estar organizado em termos singelos (mas eficientes) de modo a que tal sistema possua

baixos custos de administração (custos directos) e de cumprimento das obrigações

tributárias (custos indirectos).

Há, ainda, que somar os custos suportados pelos contribuintes:

1.º Os custos informacionais – obtenção de informação;

2.º Os custos temporais e administrativos – o tempo despendido com formalidades

inerentes ao cumprimento das obrigações tributárias;

3.º Os custos informacionais complementares – os custos com serviços prestados por

contabilistas, Técnicos Oficiais de Contas (TOC), Revisores Oficiais de Contas (ROC),

Advogados, etc.

Verifica-se, assim, que o desenho do sistema tributário tem de ser efectuado em moldes

que permita equacionar e diminuir todos estes custos. Importa notar que além dos

factores anteriores, outros há que podem igualmente contribuir para a afecção do nível

de custos. Entre eles urge destacar:

1.º O grau de complexidade do sistema tributário – para minimizar os custos, o sistema

tributário deve, tanto quanto possível, ser simples, assim se reflectindo tal factor em

sede de justiça do sistema tributário.

O princípio da flexibilidade ou da não rigidez dos “procedimentos”

administrativo-tributários

No que respeita ao princípio da flexibilidade ou de não rigidez dos “procedimentos

administrativo-tributários”, tal significa que o sistema tributário tem de ter suficiente

maleabilidade ou flexibilidade no sentido de lhe permitir, em cada momento, uma

efectiva, oportuna e rápida adaptação às circunstâncias económicas.

O que levará à constatação de que, quando nos encontramos em ciclos económicos

recessivos, se exige que o sistema tributário deva contribuir para o estímulo da

actividade económica, ao passo que, em ciclos expansionistas, exige-se-lhe um efeito

contraccionista ou de limitação dos efeitos inflacionistas.

O princípio da accountability

O princípio da accountability transporta-nos para a ideia de que o sistema tributário

deve ser transparente e de quem gere dinheiros públicos deve prestar contas por essa

gestão.

O que leva a que o poder executivo não deve procurar tirar vantagem dos cidadãos

menos informados, devendo ficar claro quem é que deve pagar as políticas públicas e

quem é que delas beneficia

Importa notar que o controlo financeiro é, em geral, exercido pelas Instituições

Superiores de Controlo Financeiro (ISC). Trata-se de órgãos públicos e independentes,

aos quais se exige que desenvolvam um controlo financeiro externo. Trata-se do

controlo mais efectivo que pode assumir várias formas:

1.º Tribunal de Contas – como ocorre entre nós e no Brasil;

2.º Auditores-Gerais – como ocorre no Reino Unido e Estados Unidos;

3.º Solução com órgãos de natureza mista de Tribunal de Contas + Auditores-Gerais –

como ocorre na Alemanha e na Holanda.

Cumpre ao Tribunal de Contas:

i) O controlo financeiro de verificação da legalidade e regularidade da gestão dos

dinheiros públicos;

ii) O controlo da avaliação do mérito da gestão pública, atendendo a critérios de

economia, eficiência e eficácia

O princípio da justiça

O princípio da justiça, em contexto de sistema tributário, somente pode significar que

ele tem de tratar de forma igual as pessoas que estejam em iguais circunstâncias – é o

que se denomina de igualdade horizontal –, e, além disso, que se imponham taxas mais

elevadas às pessoas que surjam com maior capacidade contributiva – é o que se designa

de igualdade vertical.

O princípio da contabilização ou documentação contabilística

Um factor importante, ao nível do sistema de tributação, para que ele se assuma como

bom e eficiente, é que ele assente sobre o princípio da contabilização ou documentação

contabilística dos sujeitos passivos – a contabilidade.

CAPÍTULO II – A AUTONOMIZAÇÃO DOGMÁTICA DO DIREITO FISCAL

FACE A OUTROS RAMOS DO DIREITO: ENTRE (IN)DIFERENCIAÇÃO E

COMPLEMENTARIEDADE – pg. 63

O imposto – pg. 66:

Para CASALTA NABAIS, haveria que identificar três tipos de elementos:

1.º Um elemento objectivo;

2.º Um elemento subjectivo;

3.º Um elemento teleológico (ou finalista).

Decompondo:

Em termos objectivos o imposto pode decompor-se em:

i) Uma prestação;

ii) Pecuniária;

iii) Unilateral;

iv) Definitiva;

v) Coactiva;

Em termos subjectivos o imposto pode decompor-se em:

vi) Uma prestação, com as características objectivas [i); ii); iii); iv); v)], exigida a (ou a

devida por) detentores (individuais ou colectivos) da capacidade contributiva;

vii) A favor de entidades que exerçam funções ou tarefas públicas.

O imposto é uma prestação unilateral – o que significa que não há qualquer

contraprestação específica, devidamente individualizada ou subjectivada, que se possa

identificar em benefício do contribuinte.

A distinção entre impostos e tributos bilaterais, sejam eles taxas ou outros, é,

precisamente, o facto de que há uma relação jurídica bilateral. A taxa exige, por parte do

Estado ou ente público, uma contraprestação específica, uma actividade desses mesmos

entes especialmente dirigida ao respectivo obrigado.

Em boa verdade, como o relembra o legislador no artigo 4.º, n.º 2, da LGT, «as taxas

assentam na prestação concreta de um serviço público, na utilização de um bem do

domínio público ou na remoção de um obstáculo ao comportamento dos particulares».

O imposto é uma prestação definitiva – trata-se de uma prestação que não dá lugar a

qualquer reembolso, restituição ou indemnização. O que leva alguma doutrina a indicar

que, “em certo sentido”, o imposto surgiria como uma prestação unilateral não só no

presente (unilateral stricto sensu), mas igualmente como uma prestação unilateral no

futuro (definitiva) – dado o facto de não haver reembolso (?).

O imposto é uma prestação coactiva (vem do verbo coagir – forçar através da lei) –

Pretende-se sublinhar que o imposto é uma prestação ex lege, ou seja, cuja origem ou

génese se encontra na lei, podendo-se concluir que é uma prestação coactiva imposta

por lei - É a lei que confere o poder de tributar.

A obrigação de impostos somente surge por força do «encontro do facto tributário ou do

pressuposto de facto do imposto com a lei» que se encarrega de lhe modelar as feições,

quer ao nível do seu conteúdo, quer ao nível dos demais aspectos de que depende.

Não intervém aqui a manifestação de vontade do contribuinte, pois a obrigação do

imposto resulta da verificação dos pressupostos do facto do tributário tipificados pela

lei. Nestes termos, o artigo 36, nº 1 e nº2 da LGT referem que a relação jurídica

tributária constitui-se com o facto tributário e os elementos essenciais não podem ser

alterados por vontade das partes.

Convém distinguir o imposto das restantes figuras afins:

1.º A multa criminal ou sanção pecuniária penal (cujo não pagamento a converte em

dias de prisão);

2.º A coima ou sanção pecuniária de índole contra-ordenacional;

3.º O confisco ou, melhor dito, a perda de bens, instrumentos ou produtos do crime –

sanção penal, cautelar ou final, traduzida na apreensão e correspondente perda a favor

do Estado do produto obtido e dos instrumentos utilizados na prática de um acto ilícito;

4.º Uma indemnização ou reparação do prejuízo ou dano causado a outrem através de

um acto ilícito, etc.

A doutrina tem assumido duas posições distintas ao nível da divisão dos tributos.

1.ª Uma divisão dicotómica, bipartida ou binária dos tributos

[impostos e taxas];

2.ª Uma divisão tripartida ou ternária dos tributos [impostos, taxas e contribuições ou

tributos especiais]

Taxas vs impostos – pg. 70

De facto, enquanto os impostos obedecem a um férreo princípio da legalidade fiscal e a

sua medida tem por base o princípio da capacidade contributiva, as taxas, por sua vez,

bastam-se com a reserva de lei parlamentar (Decreto-Lei parlamentarmente autorizado –

Lei de Autorização) do seu regime geral e a sua medida assenta no princípio da

proporcionalidade entre a taxa/prestação estadual proporcionada ou taxa/custos

específicos causados à respectiva comunidade.

Para se distinguir entre uma taxa e um imposto, haveria que realizar dois testes:

1.º O teste da bilateralidade;

2.º O teste da proporcionalidade.

1.º Estaremos perante um imposto se apenas puder ser medido ou aferido com base na

sua capacidade contributiva do contribuinte;

2.º Estaremos perante uma taxa se for susceptível de ser medida ou aferida com base na

ideia de proporcionalidade.

Além dos impostos e das taxas, numa perspectiva tripartida dos tributos, encontramos a

figura das contribuições especiais e contribuições financeiras – pg. 71

No que respeita às contribuições especiais a doutrina identifica duas categorias distintas:

1.ª As “contribuições de melhoria” – que se verifica naqueles casos em que é devida

uma prestação, em virtude de uma vantagem económica particular resultante do

exercício de uma actividade administrativa, por parte de todos aqueles que tal actividade

indistintamente beneficia;

2.ª As “contribuições por maiores despesas” – que ocorre naquelas situações em que é

devida uma prestação em virtude de as coisas possuídas ou de a actividade exercida

pelos particulares darem origem a uma maior despesa das autoridades públicas.

Fases da criação do imposto – pg. 74

O nascimento de um imposto implica a constatação da existência de uma relação

jurídico-complexa obrigacional. Independentemente dos vários momentos da vida de

um dado tributo, o certo é que podemos indicar duas fases distintas:

I – O momento do estabelecimento, criação, instituição ou incidência do imposto;

II – O momento da aplicação, efectivação, administração ou gestão do imposto.

No que respeita ao primeiro momento da DINÂMICA DO IMPOSTO, o que importa é

definir o se e o quanto (quantum) do imposto, assim se exigindo a definição normativa

dos seguintes elementos:

1.º O facto [pressuposto de facto, facto gerador ou facto tributário] – actividade ou

situação que dá origem ao imposto;

2.º Os sujeitos [contribuinte, responsáveis, substitutivos, etc.] – os sujeitos activos e

passivos da obrigação de imposto.

3.º O montante do imposto – o montante, por regra, sempre que inexista um imposto de

quota fixa, será definido através do valor sobre que recai (definição em abstracto da

matéria colectável), mediante a percentagem desse valor ou a quantidade por unidade a

exigir do contribuinte (a taxa ou alíquota) e, eventualmente, das deduções a fazer ao

valor assim apurado (no caso de deduções à colecta);

4.º Os benefícios fiscais – na medida em que “decidem” que não há lugar a imposto ou

há lugar a menos imposto, dos benefícios fiscais.

No que respeita ao segundo momento da DINÂMICA DO IMPOSTO, dá-se a

aplicação, efectivação, administração ou gestão do imposto, assim se exigindo a

definição normativa dos seguintes elementos:

1.º Lançamento – reconduz-se ao “lançamento subjectivo” e ao “lançamento objectivo”.

1.1. O lançamento subjectivo – Trata-se da identificação do(s) contribuinte(s);

1.2. O lançamento objectivo – Trata-se de determinar a matéria colectável (ou

tributável) e a respectiva taxa (havendo várias taxas).

2.º A liquidação – Reconduz-se à determinação da colecta aplicando-se a taxa à matéria

colectável. Tal “colecta” virá a coincidir com o imposto a pagar, a menos que haja lugar

a deduções à colecta, caso em que a liquidação também abarca esta última operação.

3.º A cobrança (ou pagamento se perspectivado do lado do sujeito passivo) – O imposto

vai dar entrada nos cofres do Estado, quer mediante cobrança voluntária – pagamento

espontâneo pelo contribuinte do montante liquidado – e cobrança coerciva – pagamento

é efectuado à custa da apreensão dos bens necessários à solvência do débito fiscal do

devedor.

Tudo isto configura o que se usa designar de procedimento fiscal – a sequência

funcional de actos conducentes à identificação do sujeito passivo e à determinação do

montante do imposto a pagar. Na verdade, os impostos possuem uma maior ou menor

complexidade “procedimental”, já que alguns têm subjacente uma liquidação assaz

complexa, como é o que ocorre em tema de IRS. A liquidação desdobra-se nas

seguintes operações:

1.º Apuramento do rendimento bruto por categoria;

2.º A dedução relativamente a cada categoria das despesas realizadas para a obtenção do

respectivo rendimento, tornando este uma categoria líquida;

3.º O englobamento dos diversos rendimentos líquidos apurados, obtendo assim o

rendimento líquido total,

4.º A aplicação do quociente conjugal no caso de contribuintes casados ou em união de

facto;

5.º A determinação da taxa aplicável;

6.º A aplicação desta ao rendimento colectável, apurando assim a colecta (a liquidação

em sentido estrito);

7.º As deduções à colecta, entre as quais justamente se contam as despesas de carácter

pessoal das famílias adstritas à realização dos direitos sociais à saúde, à educação, à

habitação e à segurança social, deduções que,uma vez realizadas, nos darão o montante

do imposto a pagar.

Depois, dá-se a fase do pagamento do imposto. Os momentos da vida dos impostos

são os seguintes:

1.º A instituição do imposto/incidência – momento legislativo;

2.º A verificação do facto gerador – actuação dos particulares (contribuintes);

3.º A aplicação do imposto – momento administrativo (cada vez mais “privatizado”);

3.1. Liquidação em sentido amplo:

– Lançamento – Subjectivo (identificação do contribuinte);

– Lançamento – Objectivo (determinação da matéria tributável e determinação da taxa);

– Liquidação em sentido estrito (aplicação da taxa à matéria tributável → colecta);

– Deduções à colecta.

3.2. Cobrança/pagamento

– Voluntária;

– Coerciva = Execução Fiscal (Administração Fiscal com a participação dos tribunais).

Pg. 77 até à 92 não estão nos apontamentos

uma vez que exclui

Ver os métodos para evitar a dupla tributação – pg. 87

A VARIEDADE DE IMPOSTOS E OS PRINCIPAIS CRITÉRIOS

CLASSIFICATÓRIOS POSSÍVEIS – pg. 93

O critério do princípio do fim: impostos directos e impostos indirectos:

Para a distinção entre impostos directos e impostos indirectos têm vindo a mobilizar-se,

quer critérios económicos, quer essoutros jurídicos

1.º O critério financeiro: atende ao objecto do imposto, (incidência do imposto) sendo

impostos directos aqueles que atingindo manifestações imediatas da capacidade

contributiva têm por pressuposto a existência de uma pessoa, de um património ou de

um rendimento (IRC; IRS; IMI). Seriam impostos indirectos aqueles que atingindo

manifestações mediatas da capacidade contributiva, tributam a despesa, a transferência

de bens ( IVA)

2.º Critério económico stricto sensu ou da contabilidade nacional: Tem em conta a

natureza económica dos impostos, ou antes se se integram ou não nos custos da

empresa, sendo impostos directos estes últimos e indirectos os primeiros. Os impostos

directos não integram o apuramento do produto e rendimento nacionais, ao passo que os

indirectos (consumo) são deduzidos ao produto nacional para apurar o rendimento

nacional.

3.º O critério de repercussão económica este tem em conta se os impostos são

repercutíveis ou não no consumidor ou no adquirente final de bens e serviços, sendo

indirectos os primeiros e directos os segundos. À luz deste entendimento, têm-se

considerado repercutíveis os impostos sobre o consumo e, por seu turno, irrepercutíveis

os impostos sobre o rendimento e sobre o património, pois enquanto nestes se verifica

uma identidade entre o contribuinte e o suportador económico do imposto, naqueles o

contribuinte não coincide com o suportador económico do imposto

II – No que respeita aos critérios jurídicos, há que salientar os seguintes:

1.º O critério do lançamento administrativo (O. MAYER) – À luz deste critério, haveria

que considerar impostos directos ou impostos com lançamento aqueles em cujo

procedimento fiscal houvesse lugar a um acto administrativo de lançamento ou acto

tributário. Por seu turno, os impostos indirectos ou impostos sem lançamento reportar-

se-iam àqueles em que esse acto administrativo inexistisse.

Crítica:

i) Havia impostos, por todos considerados indirectos, em que, na prática, havia lugar a

um acto administrativo (como o que ocorria com o despacho aduaneiro nos impostos

aduaneiros) e impostos tidos por directos em que esse acto estava de todo ausente.

ii) Acresce a dificuldade cada vez maior em encontrar o acto administrativo

crescentemente diluído no respectivo procedimento ou em verdadeiras constelações

encadeadas de actos;

iii) O facto de o acto tributário estar frequentemente dependente do cumprimento dos

importantes deveres de colaboração do contribuinte ou de terceiros;

iv) Haver lugar a autoliquidação ou a liquidação por terceiro, caso em que a

administração fiscal pura e simplesmente não participa no procedimento tributário.

2.º O critério do rol nominativo – À luz deste critério, seriam directos os impostos cujo

lançamento se baseasse na existência junto da administração fiscal duma lista ou rol

nominativo de contribuintes; e indirectos os impostos cujo lançamento não tivessem por

base essa lista ou rol.

3.º O critério do tipo de relação jurídica base do imposto – A distinção entre impostos

directos e impostos indirectos residiria no tipo de relação jurídica fonte da obrigação de

imposto, ou seja, na configuração instantânea ou duradoura do elemento temporal do

facto tributário.

Estaremos perante um imposto indirecto – se se tratar de uma relação desencadeada por

um facto ou acto isolado ou por factos ou actos sem continuidade entre si, isto é, de uma

relação de carácter instantâneo, que dá origem a uma obrigação de imposto isolada

(ainda que o seu pagamento possa ser realizado em parcelas ou prestações).

Distintamente, haverá imposto directo, sempre que a relação jurídica fonte da obrigação

de imposto tiver na base situações estáveis, situações que se prolongam no tempo,

mantendo-se ano após ano, dando origem, por conseguinte, a obrigações periódicas, a

obrigações que se renovam todos os anos.

O critério da periodicidade: impostos periódicos e impostos de obrigação única

Esta classificação tem em conta a natureza acidental ou permanente dos factos ou das

situações sobre que incidem os impostos: se o imposto incide sobre um facto que não se

repetirá— um acto isolado — o imposto é de obrigação única; se incide sobre situações

que permanecem periodicamente, o imposto é periódico. Esta distinção é igual à

referida no critério jurídico do tipo de relação jurídica base do imposto.

O critério do objecto: impostos reais e impostos pessoais – pg. 99

Nos impostos reais – atinge-se a matéria colectável objectivamente determinada,

fazendo-se abstracção portanto da concreta situação económica e social do contribuinte,

como ocorre com o IMI, IMT, no IVA e no IRC, etc.

Nos impostos pessoais – tem-se em consideração a concreta situação económica e social

do contribuinte, isto é, o valor da sua fortuna e dos seus rendimentos, por um lado, e o

montante dos encargos que tem obrigatoriamente de suportam, por outro, como ocorre

no IRS. Importa, ademais, notar que os impostos pessoais podem ser mais ou menos

pessoais consoante partilhem da generalidade das características dos impostos pessoais

ou apenas de algumas delas.

Entre tais características há que salientar as seguintes:

1.º Atendem ao rendimento global do contribuinte, o que constitui um verdadeiro

pressuposto da pessoalização do imposto, uma vez que, a não ser assim, não se pode

conhecer minimamente a situação pessoal do contribuinte;

2.º Excluem da tributação o mínimo de existência, ou seja, aquela quota de rendimento

necessária à satisfação das necessidades essenciais à salvaguarda da dignidade humana

do contribuinte e sua família;

3.º Têm em consideração os encargos com a família, abatendo-os à matéria colectável,

ou tendo-os em conta através de deduções à colecta;

4.º Sujeitam a matéria colectável a uma taxa progressiva.

O critério da quota ou percentagem: impostos de quota fixa e impostos de quota

variável

Tendo em conta a natureza das taxas do imposto esta pode ser fixa ou variável. Permite-

nos distinguir os impostos segundo a natureza das taxas que sobre eles se aplicam. O

imposto é de taxa fixa quando a lei fixa o montante do imposto a pagar igual para todos

os contribuintes, sem ter em conta qualquer matéria colectável. O imposto é de taxa

variável quando o montante da prestação é determinado em função da matéria

colectável.

O imposto de taxa variável pode revestir quatro modalidades:

f.l) proporcional — quando tem uma única taxa, uma taxa constante, como sucede, por

exemplo com o IRC. IMI;

f.2) progressivo — quando a taxa se eleva à medida que aumenta a matéria colectável

respectiva, como sucede, por exemplo com o IRS;

f.3) degressivo — quando tem uma taxa normal correspondente a certo valor de matéria

colectável e taxas mais baixas para a matéria colectável de valor inferior.

f.4) regressivo — quando a taxa aplicável diminui à medida que a matéria colectável

aumenta.

O critério da entidade (ou área) cobradora: impostos estaduais e impostos não

estaduais

No que respeita à diferenciação entre impostos estaduais e impostos não estaduais, há

que averiguar a titularidade activa dos impostos.

Serão estaduais aqueles cuja titularidade activa respeitar ao Estado. Serão não estaduais,

todos aqueles impostos cujo titular activa for um ente público territorial como será o

caso das regiões autónomas (impostos regionais), das autarquias locais (impostos locais

– municipais ou paroquiais) ou dos entes públicos não territoriais (impostos parafiscais)

O critério da (não) especialidade: impostos gerais e impostos especiais

Os impostos podem ser classificados em impostos gerais e impostos especiais. Os

impostos gerais estão previstos na lei de modo a aplicarem-se a toda uma categoria de

situações homogéneas. Os impostos especiais, apesar de dizerem respeito a factos ou

situações genericamente abrangidos nos primeiros, são objecto de uma disciplina

jurídica especial.

São exemplos de impostos gerais:

1.º Sobre o rendimento – o IRS e o IRC;

2.º Sobre o consumo – o IVA.

São exemplos de impostos especiais:

1.º Impostos especiais sobre o rendimento:

1.1. As contribuições especiais, face à tributação das mais-valias imobiliárias em IRS ou

IRC;

1.2. O Imposto de Jogo, face ao IRC;

2.º Os IEC´s face ao IVA configuram-se como impostos especiais sobre o consumo.

O critério da (não) complementaridade: impostos principais e impostos acessórios

No que respeita à classificação entre impostos principais e impostos acessórios, há que

constatar que a distinção passa por saber se os impostos existem por si ou dependem, na

sua existência ou nos seus elementos, da prévia existência de outros.

Os impostos acessórios podem assumir duas distintas modalidades:

1.º Os adicionamentos – se incidem sobre a matéria colectável dos impostos principais,

também designados por sobre taxas ou sobre impostos, como é o caso do adicionamento

(e não de um adicional como diz a lei) ao ISP, criado pela Lei do Orçamento do Estado

para o Ano de 2004;

2.º A derrama municipal – na actual Lei do Financiamento Local, cujo artigo 14.º,

incide até 1,5% sobre o lucro tributável dos contribuintes sujeitos a IRC que exerçam, a

título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola,

considerando ser desta natureza também a actividade de prestação de serviços;

3.º A derrama estadual – que incide, à taxa de 2,5%, sobre a parte do lucro tributável

superior a € 2.000.000, sujeito a IRC;

4.º Os adicionais – se incidem sobre a colecta dos impostos principais, como era o caso

das derramas municipais previstas na anterior Lei do Financiamento Local e incidentes

com uma taxa que podia ir até 10% sobre a colecta do IRC dos contribuintes acabados

de referir.

Da página 103 à 140 não vi

Impostos com incidência ambiental – pg. 135

3.º O Imposto sobre Veículos;

4.º O Imposto Único de Circulação;

5.º O Imposto sobre os Produtos Petrolíferos e Energéticos;

Os impostos prosseguem objectivos ecológicos por duas vias distintas: - pg. 137

1.º Directamente – Limitando a verificação dos factos geradores desses impostos;

2.º Indirectamente – Na medida em que essa via falhe, utilizando as receitas

proporcionadas pelos impostos para atenuar os efeitos anti-ecológicos provocados pela

verificação desses factos geradores.

Ver pg. 199!!! – substituição tributária