09. análise de fundações

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 Análises de Fundações Utilizando Estacas de  Diferentes Comprimentos Maurício Martines Sales Escola de Engenharia Civil/UFG, Goiânia-GO, Brasil, sales.mauricio@gma il.com Douglas Magalhães Albuquerque Bittencourt Escola de Engenharia Civil/UFG, Goiânia-GO, Brasil, [email protected] RESUMO: Historicamente é usual a hipótese de se usar estacas similares em comprimento e diâmetro num mesmo grupo de estacas (bloco de estacas). Desta forma imagina-se conseguir uma distribuição mais “homogênea” entre as cargas das estacas. Com o conhecimento atual e um maior domínio das ferramentas numéricas é possível estimar com maior precisão a carga transferida às estacas nas diferentes posições do grupo. A rigidez da estaca, os fatores de interação entre as mesmas e a rigidez do bloco fazem com que a distribuição das cargas nas estacas seja bem diferente da hipótese inicial até hoje assumida, principalmente nos grandes grupos. Atualmente, embora os edifícios apresentem um número cada vez maior de pavimentos e de subsolos, a evolução da tecnologia dos concretos possibilita aos projetistas estruturais lançar um número menor de pilares  para o corpo do prédio. Com isto a maioria das estruturas atuais concentra muita carga em poucos  pilares e quase sempre numa região central da edificação. Esta situação tem resultado um grande aumento no número de fundações “associadas”. Desta forma, a necessidade de grandes grupos de estacas é cada vez maior, e assim mais se distancia da hipótese histórica de estacas iguais com cargas uniformes. O presente artigo explora o emprego de estacas com diferentes comprimentos num mesmo grupo como forma de se alcançar uma melhor distribuição de carga entre as estacas vizinhas. Este artifício pode resultar também numa economia durante o dimensionamento, uma vez que reduz os esforços internos. Tal proposta vem sendo empregada nos últimos anos em edifícios de grande porte nas cidades de Goiânia e Brasília e tem mostrado bons resultados. PALAVRAS-CHAVE: Estacas, Grupo de Estacas, Análise Numérica. 1 INTRODUÇÃO A análise de fundações estaqueadas pode ser feita por meio de vários métodos. Alguns destes são considerados bastante simplificados e suas  principais hipóteses são: assumir uma distribuição homogênea da carga vertical nas estacas e não considerar o contato do bloco com o solo. Os resultados obtidos são bons para as situações que apresentam blocos sobre poucas estacas suportando apenas um pilar. As abordagens tradicionais analisam a capacidade de carga de cada estaca, não considerando o funcionamento em conjunto. Além disto, impõem um Fator de Segurança específico, igual a 2 em muitos países, para a estaca mais carregada. Isto eleva o custo da fundação, já que as demais estacas trabalham  com cargas inferiores e que não se considera a  participação do bloco no desempenho do sistema.  No entanto, nas edificações atuais tem-se verificado cada vez mais a exigência de fundações complexas, requerendo grandes quantidades de estacas. Nestes casos, é imprescindível que se trate o sistema de fundação de modo mais detalhado, com abordagens mais rigorosas. Nesta situação é fundamental considerar o comportamento do conjunto de estacas e a sua interação com o solo e com o bloco que une as estacas.  Na análise das fundações estaqueadas mais complexas faz-se necessário o uso de técnicas matemáticas específicas. Para isso, é importante que se utilize ferramentas numéricas adequadas, de tal modo que se possa avaliar o problema de forma global. Neste contexto, podem ser aplicados diversos métodos numéricos, como o COBRAMSEG 2010: ENGENHARIA GEOTÉ CNICA PARA O DESENVOLVIMENTO, INOVAÇ ÃO E SUSTENTABILIDADE. © 2010 ABMS. 1

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COBRAMSEG 2010: ENGENHARIA GEOTCNICA PARA O DESENVOLVIMENTO, INOVAO E SUSTENTABILIDADE. 2010 ABMS.

Anlises de Fundaes Utilizando Estacas de Diferentes ComprimentosMaurcio Martines Sales Escola de Engenharia Civil/UFG, Goinia-GO, Brasil, [email protected] Douglas Magalhes Albuquerque Bittencourt Escola de Engenharia Civil/UFG, Goinia-GO, Brasil, [email protected] RESUMO: Historicamente usual a hiptese de se usar estacas similares em comprimento e dimetro num mesmo grupo de estacas (bloco de estacas). Desta forma imagina-se conseguir uma distribuio mais homognea entre as cargas das estacas. Com o conhecimento atual e um maior domnio das ferramentas numricas possvel estimar com maior preciso a carga transferida s estacas nas diferentes posies do grupo. A rigidez da estaca, os fatores de interao entre as mesmas e a rigidez do bloco fazem com que a distribuio das cargas nas estacas seja bem diferente da hiptese inicial at hoje assumida, principalmente nos grandes grupos. Atualmente, embora os edifcios apresentem um nmero cada vez maior de pavimentos e de subsolos, a evoluo da tecnologia dos concretos possibilita aos projetistas estruturais lanar um nmero menor de pilares para o corpo do prdio. Com isto a maioria das estruturas atuais concentra muita carga em poucos pilares e quase sempre numa regio central da edificao. Esta situao tem resultado um grande aumento no nmero de fundaes associadas. Desta forma, a necessidade de grandes grupos de estacas cada vez maior, e assim mais se distancia da hiptese histrica de estacas iguais com cargas uniformes. O presente artigo explora o emprego de estacas com diferentes comprimentos num mesmo grupo como forma de se alcanar uma melhor distribuio de carga entre as estacas vizinhas. Este artifcio pode resultar tambm numa economia durante o dimensionamento, uma vez que reduz os esforos internos. Tal proposta vem sendo empregada nos ltimos anos em edifcios de grande porte nas cidades de Goinia e Braslia e tem mostrado bons resultados. PALAVRAS-CHAVE: Estacas, Grupo de Estacas, Anlise Numrica. 1 INTRODUO participao do bloco no desempenho do sistema. No entanto, nas edificaes atuais tem-se verificado cada vez mais a exigncia de fundaes complexas, requerendo grandes quantidades de estacas. Nestes casos, imprescindvel que se trate o sistema de fundao de modo mais detalhado, com abordagens mais rigorosas. Nesta situao fundamental considerar o comportamento do conjunto de estacas e a sua interao com o solo e com o bloco que une as estacas. Na anlise das fundaes estaqueadas mais complexas faz-se necessrio o uso de tcnicas matemticas especficas. Para isso, importante que se utilize ferramentas numricas adequadas, de tal modo que se possa avaliar o problema de forma global. Neste contexto, podem ser aplicados diversos mtodos numricos, como o

A anlise de fundaes estaqueadas pode ser feita por meio de vrios mtodos. Alguns destes so considerados bastante simplificados e suas principais hipteses so: assumir uma distribuio homognea da carga vertical nas estacas e no considerar o contato do bloco com o solo. Os resultados obtidos so bons para as situaes que apresentam blocos sobre poucas estacas suportando apenas um pilar. As abordagens tradicionais analisam a capacidade de carga de cada estaca, no considerando o funcionamento em conjunto. Alm disto, impem um Fator de Segurana especfico, igual a 2 em muitos pases, para a estaca mais carregada. Isto eleva o custo da fundao, j que as demais estacas trabalham com cargas inferiores e que no se considera a

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Mtodo das Diferenas Finitas, o Mtodo dos Elementos de Contorno e o Mtodo dos Elementos Finitos. O conceito de radier estaqueado, no qual todas as interaes estaca-solo-bloco so consideradas, pode ser estendido para a anlise de blocos de estacas em geral. A rigidez da estaca, aqui considerada como a razo entre a carga suportada e o recalque resultante (inclinao da curva carga-recalque) depende da geometria e das propriedades da estaca, bem como das propriedades geotcnicas do solo. Num grupo de estacas a rigidez de uma estaca isolada pode ser alterada atravs da insero de dispositivos que controlem a rigidez da estaca (espcies de molas colocadas na cabea das estacas POULOS, 2005), ou ento pela variao da geometria da estaca. No presente trabalho sero apresentadas trs anlises de fundaes com blocos de 9, 25 e 49 estacas em que se buscou avaliar o desempenho destes sistemas quando se combinam estacas de diferentes comprimentos (e rigidezes) em um mesmo bloco. As anlises comparam, principalmente, os resultados de cargas nas estacas, momentos internos no bloco e comprimento total de estaqueamento. Por fim, feita uma aplicao em um caso real, onde se utilizou um bloco sobre 45 estacas para suportar cinco pilares. As anlises foram feitas com a utilizao de uma ferramenta numrica. 2 FERRAMENTA NUMRICA: GARP

combina os Mtodos dos Elementos Finitos, aplicado ao radier, com o de Contorno, aplicado ao conjunto estacas-solo. Para a sua utilizao necessrio o clculo prvio dos fatores de interao entre estacas. 3 ESTACAS DE DIFERENTES RIGIDEZES EM UM MESMO BLOCO Nos projetos tradicionais, com os chamados blocos sobre estacas, busca-se o emprego de blocos rgidos com o intuito de se reduzir os recalques diferenciais dentro de um mesmo bloco. Nos grupos no simtricos a partir de cinco estacas as configuraes adotadas fazem com que as estacas perifricas absorvam mais carga. Assim, nas anlises convencionais a quantidade mxima de carga que pode ser aplicada ao grupo fica condicionada ao valor da carga nas estacas de extremidade, uma vez que se busca atender um fator de segurana (FS) mximo para todas as estacas. Esta prtica ainda comum em muitos pases, mas em outros j se aceita que os fatores de segurana sejam verificados na fundao como um todo e no apenas numa parte dela (estaca mais carregada). Pode-se adotar para algumas estacas especficas um comprimento ou um dimetro menores e, com isso, diminuir a rigidez das mesmas, fazendo com que a carga no suportada por elas seja redistribuda s demais estacas. Nesta redistribuio de carga a rigidez do radier exerce importante papel. Burland et al (1977) comentaram que, em vrios casos, o fator limitante no dimensionamento das fundaes seria sua deformabilidade excessiva, e que as estacas deveriam, nestes casos, ser consideradas como elementos redutores de recalques. Com isto, algumas estacas podem ser solicitadas at a sua carga ltima sem que a estabilidade e a segurana do sistema de fundao sejam comprometidas. Em uma fundao estaqueada, a rigidez da estaca interfere na quantidade de carga a ser suportada pela mesma. Quanto mais rgida a estaca, mais carga ela ir suportar. Assim, ao se definir as estacas do sistema de fundao, podese adotar estacas de rigidezes diferentes a fim de se obter uma distribuio de cargas mais

O dimensionamento de fundaes estaqueadas a partir do conceito de radier estaqueado constitui-se em uma tarefa mais complexa, pois esta soluo envolve a associao de elementos que possuem mecanismos de transferncia de carga distintos e fatores de interao particulares entre os mesmos. Sendo assim, o uso de uma ferramenta numrica que mitigue estas dificuldades, com preciso adequada e em um tempo aceitvel recomendvel (BITTENCOURT; SALES, 2009). Para o desenvolvimento das anlises neste trabalho foi empregado o programa GARP Geotechinical Analysis of Rafts with Piles (SMALL; POULOS, 2007). Esta ferramenta constitui-se em um programa hbrido que

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homognea, o que pode favorecer o seu desempenho e proporcionar economia no custo da fundao (BITTENCOURT; SALES, 2009). 4 ANLISES

A fim de se avaliar os efeitos da combinao de estacas de diferentes rigidezes em um mesmo bloco foram analisados neste trabalho trs casos de radier estaqueados com 9, 25 e 49 estacas, respectivamente. As fundaes suportam cargas verticais e momentos, considerados como aes permanentes. A quantidade de estacas no conjunto deveria suportar os esforos sem que nenhuma estaca apresentasse uma reao superior a sua capacidade de carga estrutural estabelecida pela NBR 6122 (1996). Em todos os casos utilizou-se um pilar com 0,25 m na direo horizontal e 1,25 m na direo vertical, cuja aplicao da carga no bloco foi de forma uniformente distribuda em sua rea. Nos exemplos apresentados as estacas foram consideradas como Hlice Contnua. Em todos os casos foi utilizado o dimetro de 0,50 m para as estacas, com espaamento eixo-a-eixo igual a 1,25 m. A rigidez das mesmas foi modificada com variaes no comprimento de cada estaca. Os mdulos de elasticidade do concreto das estacas e do bloco foram adotados de acordo com a recomendao da NBR 6118 (2003) para anlises elsticas. O fck adotado para o bloco foi de 25 MPa e 20 MPa para as estacas. Foram adotados coeficientes de Poisson para o solo e para o concreto iguais a 0,3 e a 0,2, respectivamente. Em Goinia, tem-se utilizado frequentemente uma tenso estrutural mxima de projeto de 5,5 MPa em estacas do tipo Hlice-Contnua, o que resultaria numa carga de projeto na ordem de 1080 kN para estacas com 0,50 m de dimetro. Considerando que a resistncia caracterstica do concreto (fck) destas estacas ser de 20 MPa e observando as especificaes da NBR 6122 (1996), que remete o clculo da tenso estrutural mxima de projeto NBR 6118 (2003), chegar-se-ia a 6,74 MPa adotando-se 1,8 para o valor de c. Alguns projetistas questionam o fato de se aceitar tenses superiores a 5 MPa. Tal diversidade de opinies provavelmente tem origem no item

7.8.9.9.1 da NBR 6122 (1996), que limita em 5 MPa a tenso no concreto simples de estacas escavadas com o uso de lama, mas em nenhum outro local da norma isto estendido a estacas Hlice Contnua. A proposta de reviso desta norma ir esclarecer que para a estaca Hlice Contnua o limite de 5Mpa se aplica apenas para o trecho no armado. A previso da capacidade de carga geotcnica das estacas foi feita a partir dos valores de ndices de resistncia penetrao NSPT, apresentados na Tabela 1. Nas anlises numricas considerou-se a posio do estrato indeformvel a 30 m abaixo do bloco.Tabela 1. Valores de NSPT dos casos analisados. Prof. Prof. (m) NSPT NSPT (m) 1.0 10 10.0 30 2.0 13 11.0 33 3.0 12 12.0 31 4.0 15 13.0 35 5.0 20 14.0 40 6.0 18 15.0 42 7.0 27 16.0 50 8.0 25 17.0 60 9.0 26 18.0 60

O mdulo de elasticidade do solo, um silte arenoso tpico da regio, foi considerado proporcional ao valor de NSPT, numa razo correspondente a 3,5 vezes (em MPa), relao esta j bastante difundida e empregada em Goinia (MAGALHES; CUNHA; SALES, 2006; SALES; PACHECO, 2006). Entretanto, vrios autores, como Sales (2000); Poulos (2001) e Mandolini (2003), reconhecem a retroanlise de provas de carga como uma das melhores forma de se estimar o mdulo elstico dos solos para anlise de fundaes. A partir do mtodo de Dcourt-Quaresma (1978) para a determinao da capacidade de carga geotcnica, as estacas superariam 1100kN com 14 metros de comprimento. Neste artigo empregou-se a nomenclatura grupo de estacas quando o contato bloco-solo foi desprezado, e radier estaqueado quando o mesmo foi considerado. Desta forma, a diferena no fator de segurana entre as solues est no incremento da capacidade de carga do radier estaqueado pelo contato blocosolo. Nas anlises algumas estacas do conjunto

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tiveram o seu comprimento reduzido para 8, 10 ou 12 metros. As previses numricas de carga nas estacas so comparadas ao mtodo clssico de previso manual de carga nas estacas, expressa pela eq. (1).Pi = V M y x i M x yi n x i2 y i2

(1)

onde :

V = carga vertical n = nmero de estacas no bloco Mx = momento na direo x My = momento na direo y xi , yi = coordenadas das estacas.

4.1

Caso 1: Radier Sobre 9 Estacas

Analisando como radier sobre 9 estacas (FS=3,17), Caso 1B, a carga mxima chegaria a 1107 kN. Para melhor distribuir a carga entre as estacas encontrou-se a Soluo 1, onde a primeira e a terceira linhas de estacas (estacas A, B, C, G, H, I) de 14 m foram substitudas por estacas com 12 m de comprimento. Neste caso, com um FS=2,78, encontrou-se 1081 kN para a estaca mais carregada. A Tabela 2 mostra os principais resultados desta anlise com os valores de momentos internos no bloco (Mx e My), de recalques mximos, de comprimento total (L) e o custo do estaqueamento. O custo do estaqueamento refere-se apenas ao valor da escavao das estacas, R$ 50,00/m, e custo do concreto das estacas e do bloco R$ 215,00/m, praticados em Goinia (dez/2009).Tabela 2. Resultados da anlise do caso de 9 estacas. Mx My Rec. L Caso Custo (R$) (kN.m) (kN.m) (mm) (m) 1A 1386 1525 8.30 126 11619.11 1B 1394 1539 9.09 126 11619.11 Sol. 1. 1365 1542 9.61 114 10512.53

Na primeira anlise, o pilar aplica ao bloco, de 0,8m de altura, uma carga vertical de 8500 kN e um momento Mx igual a -1200 kN.m (segundo a Regra da mo direita). As estacas foram dispostas em trs linhas x trs colunas, com espaamento entre eixos das estacas de 1,25 m. Este espaamento tambm foi utilizado nos demais casos. A Figura 1 apresenta a disposio das estacas e pilar no bloco.

Assim, observa-se que, no caso de 9 estacas, para as condies de anlise, a combinao de estacas de diferentes rigidezes em um mesmo bloco pouco refletiu na distribuio dos momentos mximos e no valor mximo de carga nas estacas, mas conseguiu uma reduo no comprimento total do estaqueamento, o que traria uma economia de 9% no custo da fundao. 4.2 Caso 2: Radier Sobre 25 Estacas

Figura 1. Bloco sobre 9 estacas.

Para o grupo de 9 estacas da Figura 1 a eq.(1) prev que a estaca mais carregada suportaria 1104,44 kN. Na anlise numrica como grupo de 9 estacas com 14 m (FS=2,64), denominado Caso 1A, previu-se que a estaca mais carregada teria 1085 kN.

No segundo exemplo, o pilar aplica ao bloco de 1,6 m de altura uma carga vertical de 23000 kN e um momento Mx igual a -3400 kN.m. As estacas foram dispostas em uma malha quadrada 5x5. O Caso 2A (FS=2,71) corresponde ao grupo de 25 estacas com 14 m de comprimento. A configurao em radier estaqueado, Caso 2B, com as mesmas estacas, teria um FS=3,33. Nestes dois casos foi verificada acentuada heterogeneidade na distribuio de cargas nas estacas, principalmente na 1 linha de estacas, onde as mais carregadas teriam 1641 kN e 1674

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kN, respectivamente. O mtodo simplificado, eq. (1), prev uma carga mxima de 974,4 kN. Desta maneira, buscou-se a utilizao de estacas com menores comprimentos na regio perifrica, fazendo com que a carga no suportada por estas fosse reconduzida s estacas prximas, mais rgidas, propiciando uma melhor distribuio de cargas nos elementos verticais e provocando uma reduo na flexo do bloco, mas ainda mantendo um FS confortvel, acima de 2,5. Na Figura 2 apresentada a configurao adotada de comprimento das estacas para o projeto escolhido como Soluo 2 (FS=2,58), a qual levou estaca mais carregada o valor de 1137 kN.

1800 1700 2A 2B Sol. 2

Carga Vertical (kN)

1600 1500 1400 1300 1200 1100 1000 900 A B C

D

E

Estacas

Figura 3. Distribuio de cargas nas estacas da 1 linha.

A Tabela 3 apresenta os principais resultados obtidos nas anlises deste segundo caso. Desta maneira, com mais estacas no conjunto, pde-se verificar a importncia e a necessidade da realizao de uma anlise numrica. Com a substituio de estacas por outras de menor rigidez conseguiu-se otimizar a distribuio de cargas nas estacas e, com isso, conseguiu-se uma reduo no custo do estaqueamento de cerca de 20%, alm de uma economia na ferragem do bloco uma vez que se obteve uma reduo nos momentos internos de cerca de 5%, apesar de um pequeno aumento no recalque total.Tabela 3. Resultados da anlise do bloco de 25 estacas. My Mx Rec. L Custo Caso (kN.m (kN.m) (mm) (m) (R$) ) 2A 5283 5772 14.09 350 32275.30 2B 5296 5801 15.30 350 32275.30 Sol. 2 5054 5532 18.43 278 25635.81

Figura 2. Bloco sobre 25 estacas: distribuio dos comprimentos das estacas na Soluo 2.

4.3

Caso 3: Radier Sobre 49 Estacas

A Figura 3 mostra a distribuio de carga nas estacas da 1 linha (A a E), a mais carregada, para as trs alternativas em destaque. Nota-se a proximidade dos valores no caso Soluo 2. A considerao ou no do contato bloco-solo pouco alterou os valores de carga para este exemplo.

No terceiro caso, um pilar aplica ao bloco de 2,8 m de altura uma carga vertical de 45000 kN e um momento Mx igual a -6500 kN.m. As estacas foram dispostas numa malha 7x7. O Caso 3A (FS=2,71) refere-se ao grupo de 49 estacas e o Caso 3B (FS=3,37) refere-se ao radier sobre 49 estacas, ambos com todas as estacas com 14 m de comprimento. Novamente, foi verificada acentuada heterogeneidade na distribuio de cargas nas estacas, apresentando valores prximos a 30% a mais que a

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capacidade de carga estrutural em vrias estacas. As estacas mais carregadas nas anlises numricas dos Casos 3A e 3B suportariam 1497kN e 1531kN, respectivamente. Nota-se, tambm, uma expressiva diferena em relao ao valor estimado pela eq. (1), a qual prev uma carga mxima de 998kN. Na Figura 4 apresentada a configurao adotada de comprimento das estacas para a alternativa denominada como Soluo 3 (FS=2,76), o qual levou estaca mais carregada um valor de 1276 kN, abaixo da tenso estrutural mxima de projeto de 6,74 MPa de norma. Para algumas estacas perifricas o FS individualmente seria inferior a 2, mas a fundao como um todo atenderia com um FS de 2,76.

Carga vertical (kN)0D E F G K L M

400

800

1200

1600

Caso 3A Caso 3B Sol. 3

Estacas

N R S T U Y Z AA AB

Figura 5. Comparao de cargas nas estacas. Tabela 4. Resultados da anlise do caso de 49 estacas. My Rec. Mx L Caso (kN.m (mm Custo (R$) (kN.m) (m) ) ) 3A 11525 12428 8.47 686 63259.59 3B 11526 12448 9.76 686 63259.59 Sol. 3 11117 12122 11.25 566 52193.78

5Figura 4. Bloco sobre 49 estacas: distribuio dos comprimentos das estacas na Soluo 3.

APLICAO EM UM CASO REAL

A Figura 5 mostra a variao da distribuio de cargas nas estacas D, E, F, G, K, L, M, N, R, S, T, U, Y, Z, AA e AB. Observa-se uma tendncia de melhor distribuio das cargas, com uma maior equalizao das cargas nas estacas para a Soluo 3. A Tabela 4 apresenta os principais resultados obtidos nas anlises do Caso 3. Conseguiu-se uma reduo no custo do estaqueamento de mais de 17%, o que bastante expressivo para um bloco deste porte. Obteve-se, tambm, uma reduo dos momentos internos no bloco.

Com o intuito de se exemplificar e aplicar o procedimento de emprego de estacas de diferentes rigidezes em um mesmo bloco ser apresentado, de forma breve, um caso real em que o mtodo de clculo original resultaria em um comportamento inapropriado para a fundao. A proximidade dos pilares e os seus elevados nveis de carregamento resultaram na escolha de um sistema de fundao associada para cinco pilares. Com isso, buscaram-se as 40 sries de combinao de carregamento disponibilizadas pelo Projeto Estrutural a fim de avaliar as situaes mais crticas para a fundao como um todo. Dentre as combinaes de carga estudadas, a Tabela 5 apresenta os esforos atuantes numa das mais crticas. Os parmetros

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de deformabilidade adotados para o solo, estimados a partir das sondagens, so apresentados na Figura 6.Tabela 5. Esforos atuantes no bloco P6/7/9/14/22. Esforo Fz (kN) Mx (kN.m) P6 14650 8400 P7 1445 --P9 2470 --P14 3200 230 P22 12500 990

H (m) 2 41

4 2 4 4 10 20 Indeslocvel

(MPa) 42 58 84 55 100 40 45 60 100

Figura 6. Perfil do solo no exemplo analisado. Figura 7. Bloco sobre 45 estacas.

O projeto inicial previa a existncia de 45 estacas tipo Hlice Contnua com 0,50 m de dimetro e 20 m de comprimento sob o bloco. O comportamento da fundao com esta configurao no foi aceitvel. Foi estudada, ento, a soluo que se apresenta na Figura 7, em que se verificam as estacas A a G, L, R, S, AM e AP a AS com 12 m e as demais com 20 m. Para isso foi utilizada uma altura de 1,20 m para o bloco e as capacidades de carga ltima geotcnica das estacas de 20 e 12 m foram 2200kN e 1500kN, respectivamente. A substituio de estacas em posies estratgicas por outras de menor rigidez propiciou que a carga nas estacas fosse melhor distribuda, como se mostra na Figura 8. O recalque diferencial dentro do bloco foi diminudo e tambm as distores angulares. O momento mximo Mx diminuiu de 3873 para 3358 kN.m, enquanto que o My reduziu de 3613 para 3358 kN.m. Assim, como nos casos analisados anteriormente, houve um aumento nos recalques totais, passando de 25,6 mm para 29,2 mm.

2100

1 Situao

Carga Vertical (kN)

Soluo1400

700

0 D E F J K L P Q R

Estacas

Figura 8. Exemplo: modificao de cargas nas estacas.

6

CONCLUSES

O estudo dos casos apresentados neste trabalho, utilizando-se uma ferramenta numrica de anlise de fundaes estaqueadas, permitiu observar o comportamento dos sistemas de fundao nos quais so empregadas estacas com diferentes rigidezes em um mesmo bloco.

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COBRAMSEG 2010: ENGENHARIA GEOTCNICA PARA O DESENVOLVIMENTO, INOVAO E SUSTENTABILIDADE. 2010 ABMS.

A anlise de blocos de estacas utilizando o conceito de radier estaqueado, onde as diversas interaes estacas-solo-bloco so consideradas, mostrou-se necessria para grandes grupos de estacas e torna indispensvel o auxlio de ferramentas numricas. O conceito de Fator de Segurana em fundaes mistas necessita ser revisto e a fundao vista como um conjunto. A insistncia em se focar apenas na estaca mais carregada leva a solues mais onerosas e com um FS desnecessariamente elevado. O limite mximo do fck das estacas, arbitrado em 20MPa h mais de uma dcada pela NBR-6122 deveria ser repensado face a evoluo da tecnologia de concretos. Reforase, ainda, que para um engenheiro geotcnico dimensionar grandes blocos suportando mais de um pilar necessrio conhecer todas as combinaes de carga simuladas e no apenas os quadros resumidos com os valores mximos, pois os valores de Fzmax de cada pilar podem no ocorrer na mesma combinao de aes. Ao se incorporar estacas de menor rigidez, observando-se um Fator de Segurana mnimo, por exemplo 2,5, obtm-se um maior equilbrio na distribuio de cargas nas estacas do conjunto e, assim, possvel economizar em comprimento de estacas e ferragem nos blocos, apesar de um pequeno incremento de recalque total. Variar a rigidez das estacas atravs da diminuio do comprimento das estacas uma ao simples e vivel, bastando apenas um pouco mais de controle da execuo na obra. Tal prtica vem funcionando bem nas diversas obras j executadas. Mais estudos sobre grandes blocos devem ser conduzidos, principalmente os experimentais, para comprovar as previses das ferramentas numricas de anlise. AGRADECIMENTOS Os autores so gratos ao CNPq e Programa de Ps-Graduao em Geotecnia da UFG pelo apoio das pesquisas. Os agradecimentos tambm so estendidos s empresas ENGESOL e SETE pela contnua cooperao nas pesquisas de radier estaqueado.

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