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FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO

PRIMEIRA PARTE – APRESENTAÇÃO............................................................. 1

Apresentação...........................................................................................................

Programa ................................................................................................................

Princípios (1952) ....................................................................................................

A Verdadeira Religião (1952) .................................................................................

Carta Aberta a Todos (1933) ...................................................................................

SEGUNDA PARTE – A EVOLUÇÃO ESPIRITUAL (1932) .......................... 23

Premissa .................................................................................................................

I – Os Caminhos da Libertação ...............................................................................

II – A evolução Espiritual na Ciência e nas Religiões ..............................................

III – O Reinado do Super-Homem ..........................................................................

IV – Experiências Espirituais ..................................................................................TERCEIRA PARTE – VISÕES ..........................................................................106

O CANTO DAS CRIATURAS (1932) ....................................................................

TRÍPTICO (1928) ..................................................................................................

CÂNTICO DA DOR E DO PERDÃO (1933) .........................................................

TRÍPTICO (1934) ..................................................................................................

QUARTA PARTE – O PROBLEMA DA EDUCAÇÃO.....................................118

O PROBLEMA DA EDUCAÇÃO (1939)...............................................................

A PSICOLOGIA DA ESCOLA – IMPRESSÕES (1933)...........................................

A ARTE DE ENSINAR E DE APRENDER (1934).................................................

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QUINTA PARTE – PROBLEMAS ATUAIS......................................................138

A HORA DE NAPOLEAO (1939) .........................................................................

O PROBLEMA AGRÁRIO (1939).........................................................................

O PROBLEMA RELIGIOSO (1939) ......................................................................URBANISMO E RAÇA (1939) ..............................................................................

A EVOLUÇÃO E A DELINQUÊNCIA (1939) ......................................................

SEXTA PARTE – PROBLEMAS ESPIRITUAIS .............................................166

AUTO-OBSERVAÇÃO DA MEDIUNIDADE (1933) ...........................................

CONSCIÊNCIA E SUBCONSCIÊNCIA (1930) .....................................................POR UMA VIDA MAIOR (1930)..........................................................................

A RECONSTRUÇAO DO TÚMULO DE SÃO FRANCISCO ................................

O PROBLEMA DA VIDA E DO ALÉM NO “FAUSTO” DE GOETHE (1931)...... 198

GÊNIO E DOR (1935) ...........................................................................................

SÉTIMA PARTE – NOVELAS............................................................................212

EM BUSCA DA JUSTIÇA – TRÍPTICO (1953) ........................................................

I. A JUSTIÇA ECONÔMICA ................................................................................

II. VERDADEIRO AMOR .....................................................................................

III. O ENCONTRO CONSIGO MESMO ...............................................................

Vida e Obra de Pietro Ubaldi ( Sinopse) ..........................................................................

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 1

PRIMEIRA PARTE

APRESENTAÇÃO

APRESENTAÇÃO

Apresento-me como homem.A entidade que me inspira mediunicamente e sobre mim exerce autori

no pensamento e na ação, deve ter um representante terreno, alguém qusuma todo o peso da luta e da responsabilidade; alguém que se lance totate, moral e fisicamente, aos perigos de uma realização novíssima, ao inevtrabalho exigido por toda grande conquista e todo progresso, à necessárisão para ultrapassar todos os obstáculos.

Assim sou e assim me coloco hoje, ao ingressar na vida pública. Nada possuo além do meu trabalho para viver e da minha obra para tri

no bem. Dentro de mim e acima de mim, porém, vibra uma voz que inrespeito, a qual me arrasta e arrastará a todos irresistivelmente. Escuto ese devo obedecê-la.

Já não é mais o momento de dizer: o tempo virá, mas sim de afirmar: otempo chegou. Chegou a hora da grande ressurreição espiritual do mundo.Eis o que sou: o servo desta potência, o servo de todos, a serviço de t

para o bem de todos. Nada mais me pertence, nem alma nem corpo; perao bem da humanidade. Deverei ser o primeiro no trabalho, na dor, na fadno perigo. Nesse caminho, serei o primeiro e, nele, esgotarei até a últimade minhas energias, até o último espasmo de meu lamento, até a última esão de minha paixão.

Sou fraco, culpado e indigno, porém não tenho mais força para sufocavoz, que deseja explodir e falar ao mundo, arrastar os povos, abalar os posos, convencer os doutos e conduzir todos a uma vida de bem e de feliciSerei considerado louco, bem o sei. MasSua Voz tem um poder ao qual nãmais sei resistir. E eu, o último dos homens, falarei ao mundo com palnovas, num tom altíssimo, de coisas grandes e tremendas, em nome de De

Estremeço e choro ao escrever estas palavras. É o sinal positivo deEle, o espírito que me assiste, está junto de mim e me faz escrever coisasão incríveis.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 2

Não obstante as almas simples, com um sentido que a ciência não tnunca terá, sentem por intuição de afetos e por penetração de amor a comnaturalidade e a perfeita credibilidade destas coisas incríveis.

Tão intensamente profunda é essa intuição, que a alma juvenil dos pov

outro hemisfério a sentiu rápida, vibrante e espontaneamente, num reconmento que dizia:“eu sei!”, contrastando com a demorada, duvidosa e soficada análise científica da velha Europa. É que a ciência analisa, toca e mmas não tem alma, e, somente com o cérebro, nada se pode“sentir”.

Brasil, terra prometida da nova revelação, terra escolhida para a primcompreensão, terra abençoada por Deus para a primeira expansão de lumundo! Já um incêndio lá se levanta. A compreensão foi instantânea efunda; foi um reconhecimento sem análise, de quem sabe porque sentquem tem certeza porque vê. Os humildes, não solicitados, compreenderse afirmaram os primeiros, sem provas e sem discussões, num terreno noa ciência, que tudo sabe, nunca cessa de exigi-las.

A profunda emoção que me invade ao vos falar, o espasmo de paixãome arrebata, o arroubo de meu coração a cada palavra não se podem mnem calcular; mas vós o sentis, embora a tão grande distância de tempoespaço! As lágrimas que me comovem enquanto escrevo e caem sobre papel, ressurgirão destas palavras e cobrirão vossos olhos quando as leE direis irresistivelmente:“É verdade”. Assim, através dos anos, convencerão e arrastarão outras almas, que ao lerem-nas, como vós, também irresistivelmente:“É verdade”.

Porque a força que me arrebata também vos arrasta, a paixão que me ma também vos incendeia e nos une a todos num só esforço, numa só tentrabalho comuns, em favor do bem. Como é grande e bela esta felicidade tada de nos sentirmos todos irmãos, profundamente irmãos, diante dess

ravilhosa voz que do infinito nos alimenta a todos! Como é doce, dianteensarilhar as tristes armas da rivalidade e da competição, que pesam sobre nos amarguram a vida. Que grandioso é nos sentirmos todos unidos numhumanidade, como um compacto organismo, e não mais como pobres solitários num mundo inimigo; que maravilha é nos sentirmos cidadãos dgrande universo, onde cada ato tem um alvo, onde toda vida constitui mis

A Voz me arrebata neste momento e senhoreia-se de minha mão, comfaz sempre que deseja falar por meu intermédio. Eu a sigo, pequenino, cso, maravilhado por imensas visões.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 3

Agora, ela me apresenta o planeta envolto numa faixa de luz e me fazressurgindo das ruínas da geração de hoje, uma humanidade mais feliz esábia, à qual pertenceremos, e quem houver semeado colherá. Acima dque, lutando e sofrendo, semeamos, uma falange de espíritos puros est

nos os braços, encorajando-nos e ajudando-nos. Somos os operários dgrande trabalho, do maior trabalho que o mundo jamais realizou: a fundda nova civilização do Terceiro Milênio.

Mãos à obra! Levantai-vos. É chegado o momento. A palavra deSua Voz encerra uma força misteriosa e intrínseca, que, invisível, mas poderosa ponderável, mas irresistível, avança por si mesma, sabendo escolher os humanos, solicitando-os a todos, convidando à colaboração todos os hode boa vontade. Ela avança e atinge os corações, persuade e convencesuindo e ofertando de si mesma, a cada momento, uma prova evidente: inegável de sua automática divulgação.

Mãos à obra! Espera-nos a todos um tremendo trabalho, mas tambémimensa vitória. Somente sob a direção de um chefe sobre-humano o m poderia empreender uma obra tão gigantesca. Temos um chefe no Céu. Eltraz senão a paz, o amor, o respeito a todas as crenças. Nada tem Ele a dedo que seja terreno e a ninguém Ele agride. Não toca a forma, que não ésencial: Ele encara a substância. Nada tem para modificar do que seja teneste mundo: Ele quer vivificar tudo com uma chama de fé, quer aquececom uma nova paixão de amor puro – o amor de Cristo, há tanto esquecido.

Nada têm a temer as autoridades nem os organismos humanos. É tão e inútil o expediente de modificar as organizações! Não mais as sempre criações dos mesmos velhos sistemas, mas sim a criação do homem noqual tem origem no íntimo, onde está a alma, e não no exterior. Toda orzação é boa, quando o homem é bom, e é má, quando o homem é mau.

O novo reino não é deste mundo, do qual jamais tocará nada do qu pertence. Não está surgindo um novo organismo humano, com chefes bordinados, com cargos e funções, com propriedades e direitos. Não. Alutamente nada disso. Trata-se, eu vos digo, do Reino de Deus, do reinoo mundo ainda espera, que o mundo ainda invoca:“Veniat Regnum Tuum1”.É um reino de almas, de amor e de paz; não possui sedes nem riquezas. mais tem senão a tarefa do dever, o amor do bem, a paixão do sacrifíc

1 “Venha o Teu Reino” uma das petições da oração dominical. (N. do T.)

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 4

grandeza do martírio. E quem for o primeiro nesse caminho será o mnesse reino de Deus.

Almas distantes que no Brasil tudo compreendestes – distantes pelo espaçomas muito próximas no coração – possa o meu abraço vos chegar forte, pr

fundo e imenso como eu o sinto agora, nesta solidão montanhosa de Gúbmais alto silêncio da noite, com minha alma nua diante de Cristo, cujo olharme penetra, me envolve e me vence.

Humildemente, como o último dos homens que sou, eu vos suplico,compaixão que pode inclinar-vos para o mais frágil e abatido dos seres: ame a compreender este mistério tremendo que em mim se processa, ajuda cumprir esta obra imensa, cujos limites não alcanço.

Gúbio (Itália), na noite de 6 de fevereiro de 19

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 5

PROGRAMA“Ama a teu próximo como a ti mesmo”

Depois do escrito anterior, Apresentação , importa de imediato precisar o

conceitos, para evitar mal-entendidos, falsas interpretações, transposiçãmetas e de princípios.O conceito deSua Voz é claro e exato. Aqui o exponho com o menor num

ro possível de palavras, cristalino e adamantino, qual o sinto explodir em para que resista a todo choque e a qualquer desvio.

O princípio e o conteúdo do movimento são estrita e exclusivamente gélicos. Tudo aquilo que não pode permanecer no Evangelho de Cristo pode igualmente permanecer neste movimento. Não é possível distorcenenhum sentido estas palavras.As consequências são de igual modo simples e evidentes.

O movimento e quantos dele participam devem manter-se dentro do p pio fundamental do Evangelho: “ Ama a teu próximo como a ti mesmo ”. Nãoexiste outro caminho possível. Quem não puder assimilar este princípio etual naturalmente estará excluído.

O movimento, assim como o Evangelho, é apolítico e supranacionsimplesmente humano em sua universalidade. É interior e espiritual, nãterno nem material, a não ser em suas últimas e inevitáveis consequênciquais não tocam de modo algum as normas humanas, absolutamente foseus objetivos e de qualquer discussão.

Assim sendo, o movimento é também suprarreligioso, pois não atingnhuma expressão religiosa, mas as respeita todas, reconhecendo-as anttudo, tanto que as envolve todas num único amplexo. Faz, portanto, dodido pensamento humano uma potência de concepção unitária; faz das

radas e multiformes crenças um ímpeto concorde de fé, de esperança paixão para um Deus que deve ser o mesmo para todos e para uma veque deve ser a mesma para todos.

Como tal, o movimento convoca todos para que se unam em colaborEis porque não existirão, como já se disse no precedente escrito, chefe bordinados, cargos, funções, propriedades, direitos, sedes ou riquezaedificação deve efetuar-se, para cada um, no intimo da própria alma,obra e construção sua. Indistintamente, todos são chamados à colabor para que cada um seja o criador, no próprio coração, do Reino de Deus.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 6

Os meios humanos estão, portanto, todos excluídos, porque não sãocessários. O novo reino deve nascer não nas organizações humanas, mano coração dos homens. E cada um deve realizar essa criação antes deem si mesmo, tornando-se melhor.

Não é, pois, preciso outro chefe senão Deus, nem outro comando excvoz justa da consciência. Dir-me-eis, porém: Isto não basta para fazerreligião. E eu vos digo: Não se trata de uma religião, mas de uma forçadeve reavivar todas as religiões existentes.

Para quem discordar, não existe qualquer dispositivo de coerção comnormas humanas, mas apenas a perda automática da posição privilegiadseguidor de Cristo – a perda da proteção da lei justa de Deus. Isso signiuma rendição à feroz lei terrestre da luta e da força sem justiça. A lei Dsempre presente no interior das coisas e dos seres, não admite mentirasquanto é imanente na consciência; não admite violações nem fugas, positua no mais íntimo do espírito humano.

Eis a absoluta novidade deste movimento na história de todas as expecias humanas. Dele são excluídos comando, riqueza e força. Ele é consteterna e não pode, por isso, usar senão materiais eternos. Cada empreendto é uma construção cuja durabilidade depende dos materiais utilizados. usar da espada pela espada perecerá, quem usar da violência pela viol perecerá, pois os meios usados como causa recaem depois, por força deterna, inexoravelmente, como efeito, sobre seu agente.

Se o movimento não atender a estes princípios, será ilusório e caducomo todas as coisas humanas. E qualquer elemento humano que nele intzirdes ser-lhe-á como um caruncho destruidor, uma força lenta continuamem tensão para a destruição.

Como movimento social, inspira-se, portanto, em princípios nunca us

pelo homem na história do mundo. Por estas características, reconhecque ele vem do Alto, de um mundo não vosso, porque nenhum elementoso é introduzido nem está nele contido, mas, ao contrário, é cuidadosamexcluído.

Como imediata consequência prática desta claríssima tomada de podiante do mundo conclui-se que, se todos são admitidos, contanto que puhonestos de coração, automaticamente são excluídos aqueles que não oDepuração, portanto, por força íntima da realidade.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 7

Vós, da Terra2, acostumados como sois a vos mover constantemente nmundo de imposição e de força, nada podendo obterdes sem estes meioscilmente vos inteirais da intervenção de quão sutis forças, invisíveis e ín poderosíssimas e invioláveis, seja feito este movimento. Destes princ

aqui enunciados, emana imediatamente esta consequência prática e evidnão podem tomar parte neste movimento os inaptos.Por ser ele alicerçado sobre tais princípios, os gananciosos de riquez

mando, de glória e de poder, sempre à espera, prontos para fazer especude tudo, até das coisas de Deus, não encontrarão alimento algum, não aco mínimo ponto de apoio e, por si mesmos, se afastarão.

Obtém-se, então, automaticamente, sem demora e sem gasto de energafastamento da primeira ameaça que surge em qualquer movimento huma possibilidade de desfrute. Evita-se que o mal possa aninhar-se nele tém-se ainda sua imediata eliminação. Vede qual potência contém o imderável fator moral também nas organizações humanas. Esse poder é ta pode substituir esplendidamente, se genuíno, todos os vossos exércitovossas complexas transações econômicas, todo esse tremendo equipamde obrigações e vínculos, que demonstram não vossa força, mas vossaqueza. E, por caminhos assim tão simples, conseguireis vantagens e perfeição que nenhuma organização humana pode alcançar. Aqui não tem atritos, pois não há luta nem força, como também não pode haverção, porquanto não existe mentira. O inimigo é externo: o mal; porém onão se vence com outro mal, mas sim com o bem.

As rodas sobre as quais avança este organismo são: altruísmo (e não emo), pobreza, dever, amor, sacrifício e, se necessário for, o martírio. A perfume destas grandes coisas, as almas perversas fogem; numa atmoassim rarefeita, os indignos sufocam e rapidamente se afastam para nunca

se aproximarem. Eis as bases. Eis o tesouro que vos dará alimento e podo exército que vos defenderá.Esta é, pois, uma cruzada de homens honestos, simplesmente honestos

importam ciência, riqueza ou poderio. Disso não temos necessidade. Atr justo existe uma força tremenda: a lei Divina, que o protege. Não vos pr peis se não perceberdes essa lei. Ela é a mais profunda realidade da vida

2

Aqui, o pensamento da entidade espiritualSua Voz se substitui imprevistamente ao do aut(N. do A.)

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 8

temais se esta realidade permanecer sufocada em vosso baixo mundo deencoberta pela vossa densa atmosfera de culpa. Cada homem a sente nofundo de sua consciência, como um instinto incoercível. Mas o justo, tãohaja alcançado os mais altos níveis de vida, a encontra de imediato e a

com absoluta confiança, reconhecendo-se seguramente amparado por ela.Esta cruzada de homens novos é hoje realizada no mundo para a salvdeste. Seus componentes serão recrutados em todas as classes, em todcrenças, em todos os países.

Não se trata de vãs utopias. São possibilidades lógicas e reais, basead bre forças concretas, embora sejam para vós imponderáveis.

Uma só coisa basta: ser honesto. E basta sê-lo para sentir-se irmão e uaos irmãos honestos. Não vos reconhecereis por sinais exteriores, mas som por essa íntima sensação, que vos lançará irresistivelmente uns nos braçooutros. Não vos fatigueis, como sempre tendes feito, a escavar abismos vós em todos os campos, mas lutai para reencontrar-vos todos nesta unsubstancial de espíritos. Ela é urgente, porquanto são iminentes e tremendtempos, que a impõem como questão de vida ou de morte.

◘ ◘ ◘ Nestas palavras, não minhas, mas deSua Voz , tudo é construtivo. Elas ja

mais atacam e, se há alguma coisa para destruir, elas não se preocupamisso, mas apenas a deixam em abandono, para que caia por si. Não existeativo agente de destruição de coisas inúteis do que um novo organismoem funcionamento.

Se um corpo é velho e moribundo, por que vos afadigaríeis em destruO que é verdadeiramente inútil cairá por si mesmo, sem necessidade de sonar uma causa de destruição violenta, que recairia depois inexoravelmsobre quem a movimentou. Pensais, acaso, que a Lei não contenha em

meios para afastar aquilo que não tem razão de ser? Acreditais que, parmolir as inutilidades, seja mesmo indispensável a intervenção do homem este seja capaz de guiar e escolher com segurança? Como podeis crer quseja possível num organismo totalmente regido por um perfeito equilcomo é o universo?

A condição para ser admitido neste movimento é um simples examconsciência perante Deus. Coisa simples, profunda e imensa, fácil e tremMas isto não é nada, dirá o mundo. Entretanto isto é tudo, diz o espírito. rimentai seriamente e sentireis que é verdade. É esta coisa simples e trem

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 9

que o homem deve fazer hoje, à margem do abismo onde, se não se decairá de maneira terrível.

E se vós, almas sedentas de ação exterior, de movimento e de sensaquereis evadir-vos desta íntima vida do espírito, para ingressar em voss

terior realidade humana e trabalhar, clamar, conquistar e vencer tambémos braços e com a ação, então vos digo: “Saí, saí de casa; ide ao vosso ii-go mais cruel, àquele que mais vos tem traído e torturado e, em nomCristo, perdoai-o e abraçai-o; ide àquele que mais vos tem roubado eapenas cancelai-lhe o débito, mas também entregai-lhe quanto possuísàquele que mais vos insultou e dizei-lhe, em nome de Cristo: Eu te ammo a mim mesmo, porque és meu irmão”.

Direis: Isso é absurdo, loucura, desastroso; é impossível sobre a Terradeposição de armas. Mas eu vos digo: Vós sereis homens novos somente do usardes métodos e recursos novos. De outra forma, não saireis nunca do ciclodas velhas condenações, que eternamente punirão a sociedade das suas prculpas. Pela mesma razão pela qual Cristo se ofereceu na cruz, a humandeve hoje sacrificar-se a si mesma por esta sua nova, profunda, absoluta enitiva redenção. Porque, sem sacrifício, nunca haverá redenção.

O mundo louco arma-se contra si mesmo, com perspectivas sempre desastrosas, de recursos tremendos em face dos atuais progressos cientíUma conflagração bélica não deixará mais nenhum homem salvo sobre ara, se a loucura humana não se detiver a tempo. Onde o homem assim pronão existe senão uma extrema defesa: o abandono de todas as armas.

Dizeis: Mas nós temos o dever de viver.E eu vos digo: Quando vós, com ânimo puro, disserdes: “Em nome de

Deus” – então a Terra tremerá, porque as forças do universo se moverãoquando fordes verdadeiramente justos e inocentes, a violência vos ferir, triun

fando momentaneamente, o infinito precipitar-se-á aos vossos pés, pardar a vitória e vos levantar ao Alto, na condição de triunfadores na eterni bem longe do átimo de tempo em que a violência venceu.

◘ ◘ ◘ Eis os princípios queSua Voz me transmite – desta vez não mais sob form

afetuosa, e sim com sua potência de conceito.Eis o queSua Voz pede à alma do mundo. Sua alma coletiva, una e l

como uma alma individual, pode escolher, e dessa escolha dependerá o fuSua Voz afasta-se em silêncio de quem não a segue.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 10

Eis o queSua Voz pede, primeiramente ao Brasil, escolhido para a primafirmação destes princípios no mundo. E esta afirmação deve ser um imamplexo de amor cristão. Será a primeira centelha de um incêndio qudeve inflamar de bondade, para dissolver o gelo de ódio e rivalidade que

de, esfomeia e atormenta o mundo.Este é o espírito dos novos tempos. Somente quando virmos este espvoltar à vida dos povos, poderemos dizer então que Cristo voltou outra está presente entre nós.

Gúbio (Itália), na noite de 12 de fevereiro de 19

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 11

PRINCÍPIOS (1952)

O primeiro dever de uma revista que nasce é orientar claramente seusamento e declarar com sinceridade seus objetivos, estabelecendo uma

de conduta segundo princípios aos quais, depois, deverá permanecer fielO escopo desta revista é operar a transformação desses princípios emvivida, isto é, ajudar a nascer, do homem de hoje, um tipo biológico maievolvido, representado pelo novo homem do Terceiro Milênio.

Este movimento inicia-se no Brasil, tendo lambem em vista sua fgrandeza como nação.

Enunciar um princípio aqui significa, pois, vivê-lo.Antes de iniciar o argumento, faz-se necessária uma premissa.O signatário pede desculpas se algumas vezes tiver de pronunciar a paeu. Por essa razão, é bom esclarecer e estabelecer, desde o princípio, qu

nada pede jamais para si e não quer absolutamente ser chefe de coisa algQuis, por isso, que a denominação ABAPU (Associação Brasileira dos gos de Pietro Ubaldi) fosse substituída pela de ABUC (Associação Brasda Universalidade de Cristo)3, para que a ideia se antepusesse a qualquer psonalismo. E este é já um princípio geral para ser vivido.

Há também outro princípio geral, segundo o qual o que importa não pessoa, mas sim a ideia.

Estes princípios já definem a posição do subscritor, que deverá ser sem primeiro a aplicá-los, vivendo-os. Sua posição é de oferecer, apenas ofeo produto de sua inspiração. Isto ele já tem feito ao mundo.

O Brasil, em primeiro lugar, compreendeu e aceitou esta oferta.O signatário deseja apenas uma coisa: que isto seja para a grandeza des

ção, que ele agora aprendeu a amar imensamente. Sua posição – assim ele quer

– deve ser apenas esta: a de quem serve, e não a de quem é servido; a de quese põe a serviço dos outros, e não a de quem os subordina ao próprio orgulhdomínio ou egoísmo; é a posição de quem obedece, e não a de quem coman

Ele serve ao próximo e obedece a Deus – outro princípio geral para sevivido.

Cada ato de nossa vida deve ser inspirado por estes princípios e peloexporemos depois.

3 Associação instituída em Campos. RJ, no Natal de 1949. (N. da E.)

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Aquele que está em posição mais elevada não somente mais deverá los, mas também mais será responsável diante de Deus e dos homens.

Com tudo isto, estamos recordando que todos nós temos o dever do e plo – o primeiro dever – somente através do qual se podem pregar quaisq

princípios, demonstrando antes com fatos, e não com palavras, que eles pser vividos. De outra maneira, não se tem o direito de pregar. Eis assim princípio geral.

O leitor vê como, desde a primeira enunciação, os princípios aqui se sentam não teóricos e abstratos, mas numa forma vivida ou para viver.

Quem quiser buscar-lhes a justificação sistemática e racional poderá fundar-se em seu estudo nos volumes do subscritor, também oferecidmundo, para dar àqueles que amam o conhecimento a possibilidade de aprrem e, assim, saciarem a inteligência. Ele apenas oferece, por uma convespontânea, sem jamais impor.

Eis-nos diante de outro princípio geral para ser vivido: nunca impor adade, mas somente oferecê-la. Eis o patrimônio espiritual de cada consci Nunca introduzir-se na alma alheia com a violência da argumentação, guerra de ideias, para subjugar o semelhante; antes, procurar todos os mecomunicação que conduzem à compreensão.

É lei vital que a época dos absolutismos, dos dogmatismos, dos impermos ideológicos, vá sendo hoje superada e eliminada.

A nova era é da bondade na compreensão recíproca, da convicção de no seio de um mesmo Deus; é a era do amor. O princípio é procurar o que evitar o que divide.

Sendo dever nosso viver tudo isto, conclui-se que, aqui, será sempre edo o espírito de polêmica, pois este é considerado como expressão da plogia de um tipo biológico atrasado, que está sendo cada vez mais superad

pela evolução. Nosso método, portanto, jamais oferece aos ávidos de polêmica a rescia de outra polêmica, que é o mau exemplo de luta e guerra.

Que o método do Evangelho seja o nosso método.Enquanto este é o método dos evoluídos, o outro é o método que r

imediatamente o involuído, biologicamente atrasado. O método do Evané o único que vence, pois, enquanto ambas as partes se dilaceram na lutnhando apenas em ferocidade e perversidade, já o antagonista, deparan

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com tal método, não encontra alimento para seu espírito de agressão e, mesmo, desarma-se e cede.

Como se vê, os nossos princípios não contêm nenhuma novidade, porto são os conhecidíssimos princípios do Evangelho. Propomo-nos ape

vivê-los seriamente, convencidos de que disso pode nascer hoje o homevo e, com ele, uma nova geração e uma grande nação.Este deve ser o método a ser usado, pois o método empregado rev

própria natureza, o próprio tipo biológico evoluído ou involuído, a prsuperioridade ou inferioridade.

A ideia de vencer esmagando o adversário revela imediatamente o invdo. Ainda quando isto se faça em nome de verdades absolutas e assim sefique, exprime na realidade, biologicamente, instintos de agressão.

Compreendamos que a verdade é relativa e progressiva, portanto nosem seu aspecto absoluto. Nós, relativos, não podemos possuí-la senão pogressivas aproximações.

Segue-se a este então um outro princípio: sejamos sempre construtivosé, operemos somente em sentido positivo, unitário, como é o bem, e jasejamos destrutivos, isto é, nunca ajamos em sentido negativo, separacomo é o mal.

Tudo o que é agressividade é satânico. O Evangelho jamais agride.Seja nossa obra todo um amplexo ao mundo, um amplexo unicamen

amor.Guerra jamais, a ninguém e por nenhuma razão. A vitória estável e v

deira obtém-se apenas com a bondade, o amor, o exemplo, a convicção.Que o Evangelho, tão pouco vivido até hoje, transforme-se na forma d

da do homem novo, num novo método de viver; que ele penetre cada atoso e demonstre nossa natureza evoluída, manifestando-se com nosso exe

a cada momento.Que no terreno filosófico, político e religioso isso signifique tolerâMas não aquela tolerância raivosa, na atitude de quem suporta com desderro alheio, e sim aquela tolerância que, pelo contrário, busca os pontcontato, os pontos comuns, e se alegra quando pode dizer: “Mas, então,n-cordamos em muitas coisas! Não estamos, pois, tão distanciados quant parecia. Podemos entender-nos um pouco, não havendo, portanto, necesde de contenda”.

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Em sua saudação, repetida em quase todas as conferências no Brassignatário afirmou seus dois princípios fundamentais:universalidade e im-

parcialidade . Que significam eles?

São o emblema do homem novo.Sua Voz , já na primeira Mensagem do Natal , em 1931, estabelecia este princípios fundamentais, que são depois desenvolvidos em toda a obra:

“Falo hoje a todos os justos da Terra e os chamo de todas as partes do n-do, a fim de unificarem suas aspirações e preces numa oblata que se elecéu. Que nenhuma barreira de religião, de nacionalidade ou de raça os d porque não está longe o dia em que somente uma será a divisão entre omens: justos e injustos... Minha palavra é universal... Uma grande transfção se aproxima para a vida do mundo...”. Brevemente, o mundo se organizará sobre um princípio novo, que nãodado por um imperialismo religioso, no qual se tem a vitória de uma reque, por absolutismo, imponha-se a todas as outras. Não é por este camque se chegará à unidade, onde há um só rebanho e um só pastor.

O único pastor será Cristo, e o único rebanho será formado por ummanidade em que as várias religiões não mais se combatam e não macondenem reciprocamente, mas, pelo contrário, compreendam-se e conem-se, fazendo dos homens todos filhos diante de um único Deus, uDeus, pai de todos.

Esta compreensão e coordenação é a primeira forma em que se revelamor em sua era, que está para surgir na nova civilização – o Reino de Deus.

Como aplicaremos este princípio? Fraternizando. Se os outros conde perdoemos e amemos.

Como respondeu Cristo aos agressores? Que o seu método seja o n

método. Aos ataques, às polêmicas e às condenações, respondamos coexemplo da compreensão. Demonstremos com os fatos que o homem possui um novo método de vida e abandonemos o velho método ao hodo tipo do passado.

Este vive mais no exterior que no interior. Suas inclinações se dirigem preferência, às manifestações exteriores da fé, resumindo-se a seguir detnada escola, igreja ou grupo e a dar-se a certas práticas visíveis.

Aquele que compreende e tem a força de renunciar às manifestações, pensáveis aos primitivos, recolha-se o quanto puder na religião de substâ –

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que é interior – sozinho e quando for necessário, para eliminar os ataqudissídios da religião de forma, que é exterior.

A maioria não sabe pensar senão fisicamente, com movimentos do coda boca. O evoluído, porém, sabe que a religião de substância, mãe de tod

religiões, está acima da forma e de toda manifestação sensória. Trata-uma religião mais profunda, sentida e vivida; uma religião na qual todreligiões encontram lugar, feita de alma e de ação, e não de práticas mater

Esta, verdadeiramente, é a religião.As religiões têm três fases. A primeira, a mais antiga, é a fase do terro

ta de um Deus vingativo, que se faz obedecer inexoravelmente, punindo clei de talião. A segunda, mais recente, é a ético-jurídica, feita de uma codção de normas de vida.

É o evolver da natureza humana inferior que pode permitir uma manição de Deus e fazer transparecer cada vez mais Sua bondade.Somente hoje, a maturação humana pode permitir que, sem o perig

abusos, antes temíveis, seja possível passar à terceira fase, feita de compsão, na qual as religiões são livres e convictas, cada vez mais transformadas forma, onde lutam os interesses, em substância, que é amor.

Elas se sucedem, não porque sejam sancionadas por penalidades (infemas porque vai-se compreendendo que significam o nosso bem.

Nesta terceira fase, cai e perde a significação o terror de um Deus vingaAssim, por evolução, do conceito de um Deus todo força, o senhor c

azorrague, como era o homem com seus escravos, árbitro absoluto deconforme seu capricho, passa-se ao Deus justo, que respeita completamelei estabelecida por Ele próprio, tal como o homem moderno deve respeileis que ele cria para si mesmo no Estado.

Desse modo, por evolução, passa-se agora ao conceito de um Deus n

justo, mas também bom, que nos ama para a nossa felicidade, como o hocivilizado e compreensivo de amanhã amará seu próximo nas grandes udes sociais do futuro. Assim, por lenta transformação, o terror, através dgressiva reabsorção do mal, operada pela evolução, desfaz-se na justiça, se aperfeiçoa e se enriquece no amor.

Hoje se passa da segunda à terceira fase. Ainda se funde e se confunde com a verdade. O interesse predomina, porque predomina a forma. O reb para ser apascentado, condição a que tanto aspiram as religiões, tem sido formado muitas vezes em rebanho para mungir, propriedade do pastor.

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Pelo princípio das grandes unidades, a evolução leva à unificação e gu je o mundo em todos os campos – logo, no religioso também – à fase orgânica,na qual não há luta de rivais, mas sim colaboração de irmãos. Penetra-fase do amor. O mundo se distancia cada vez mais da primitiva fase caót

a ordem se faz sempre mais compreendida, convincente, espontânea.O Brasil, dentre todas suas características, tem, sobretudo, a qualidadtolerância recíproca: ausência de intransigência, de absolutismos, de racEle é, pois, acima de tudo, a terra do amor, ainda que este se encontre, mvezes, apenas em suas manifestações mais elementares. E, por já ser a pode subir.

Assim como representa a fusão das raças, ele também representa a cadade de fusão de ideias. Esta capacidade do Brasil, de amar em todos oveis, se for desenvolvida em direção ao espírito, poderá amanhã fazer dosil a nação mais capaz de compreender, representar e divulgar no mundo lo que aqui chamamos religião, ou seja, a religião de substância, que é agião do exemplo, da bondade e do amor.

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A VERDADEIRA RELIGIÃO (1952)

Encontrei-me, viajando pelo mundo, em todos os ambientes.Achei-me entre católicos e os observei. Muitos deles eram sinceros e

victos e viviam aplicando realmente os princípios de sua religião. Sua vdeira fé me encheu de admiração. Outros deles, porém, embora verbalmse confessassem e, nas práticas religiosas, se manifestassem perfeitamortodoxos, não viviam inteiramente seus princípios, demonstrando, cofatos, que, na realidade, não acreditavam neles de modo absoluto. Issencheu de tristeza.

Achei-me, depois, entre os protestantes e os observei. Muitos deles sinceros e convictos e viviam aplicando realmente os princípios de suagião. Sua verdadeira fé me encheu de admiração. Outros deles, porém, emverbalmente se confessassem e, nas práticas religiosas, se manifestassemfeitamente ortodoxos, não viviam inteiramente seus princípios, demonstrcom fatos, que, na realidade, não acreditavam neles de modo absoluto. Isencheu de tristeza.

Achei-me, também, entre os espíritas e os observei. Muitos deles eramceros e convictos e viviam aplicando realmente os princípios de sua douSua verdadeira fé me encheu de admiração. Outros deles, porém, embor balmente se confessassem e, nas práticas formais, se manifestassem adeà sua doutrina, não viviam inteiramente seus princípios, demonstrando,fatos, que, na realidade, não acreditavam neles de modo absoluto. Issencheu de tristeza.

Achei-me, depois, entre os teosofistas, os maçons, os maometanos, odistas etc., e observei o mesmo fenômeno.

Encontrei-me até entre ateus, materialistas convictos. Não obstante,

eles, encontrei muitos que procuravam viver segundo superiores princde retidão. Senti respeito por eles. Qualquer convicção vivida com remerece respeito. O que me encheu de tristeza foi ver o ateu materialianimalescamente involuído, animado somente por instintos egoístas prejudicar o próximo.

◘ ◘ ◘ Observando-os todos, perguntei a mim mesmo então: a real e verda

divisão é aquela entre os homens de cada religião, doutrina ou crença, antes, aquela entre os homens sinceros e honestos e os homens falsos e

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nestos, que se encontram no seio de todas as religiões, doutrinas e creApesar das várias divisões humanas, sempre encontrei em cada uma esta outra divisão universal entre bons e maus.

Perguntemos então a nós mesmos: não será esta a verdadeira distin

muito mais real que a outra, na qual tanto se insiste? Pertencer ao primtipo de homem, antes que ao segundo, não será muito mais importante cisivo do que pertencer a um determinado agrupamento religioso? Qu porta pertencer a esta ou aquela religião, quando não se é sincero nem hto? Não é isto o fundamental em qualquer campo? E não é, então, esta aimportante entre todas as divisões humanas, muito mais do que a atualmaceita? Não será essa a divisão mais assinalada por Deus, de preferênoutra, onde a diferença, mais do que à bondade do homem, refere-se aosresses humanos que em torno dela se agrupam?Qual é o fato mais decisivo para a edificação do homem (isso constiobjetivo de todas as crenças): conhecer os pormenores dogmáticos e dourios na ortodoxia da letra ou haver compreendido o simplicíssimo princíp bem e do mal – princípio universal, existente em todas as religiões, inscritespírito humano – e, sobretudo, viver esse princípio?

A verdadeira distinção, nesse caso, não é entre católicos, protestante píritas, teosofistas, maçons, maometanos, budistas etc., como vigora mente em nosso mundo, mas sim entre justos e injustos. Esta é a distsubstancial, cujo valor se estabelece diante de Deus, muito mais imporque a outra, a qual pode ser apenas formal. Pode-se mentir na segunda, fictícia, mas nunca na primeira, que é real.

Por que, então, tantas lutas religiosas e doutrinárias? Além da defesa dtrimônio conceptual do grupo e dos interesses que dele dependem, nãotodas elas outro valor? Por que, então, não reduzir todas as crenças a ess

denominador comum, que é a sua substância, na qual todas se encontram,de todas as divisões? E por que não achar nessa substância a ponte que atodas numa característica comum, em vez de procurar as especulaçõesque podem dividi-las? Por que não parar então e insistir no que importa ade tudo: a bondade e a evolução do homem?

Tudo isso é importantíssimo para a fusão das almas no caminho da ucação, que é o futuro do mundo em todos os campos. Daí nasceria um grespeito recíproco, uma nova possibilidade de compreensão, um supespírito de fraternidade. O cioso amor à ortodoxia, justificável em o

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tempos, excitado até ao ponto de preferir a letra ao espírito, pode signuma satânica falsificação da fé na psicologia farisaica, enfermidade de os tempos e de todas as religiões. Pode, então, acontecer que se faça dagião o que sempre se tem feito do amor à pátria, que, embora santo e

transforma-se em agressividade e guerras contra outras pátrias. Ora, como esse tipo de amor nacional, hoje em vias de desaparecimento, es perado pela vida, que caminha para a unificação social, também será sudo nas religiões o espírito de absolutismo e a intransigência, pois a vidirige para a unificação religiosa.

É necessário, assim, abandonar o espírito separatista de domínio em nomabsolutismos, a fim de abraçar uma verdade que, na Terra, para o homem pode deixar de ser relativa e progressiva em função de sua capacidade evol

A vida, hoje, caminha para a colaboração por compreensão em todocampos, e os imperialismos, políticos ou religiosos, pertencem a fasesestão sendo superadas. Os imperialismos espirituais retardam a unificque, situando-se justamente no campo das convicções e das consciências pode ser obtida com o espírito de absolutismo e de domínio.

◘ ◘ ◘ Qual é, pois, a religião de substância em que poderão pacificar-se tod

distinções humanas, encontrando-se em seu denominador comum?A religião de substância é somente uma. A ela pertencem todos os hon

que creem sinceramente e vivem suas crenças, sejam católicos, protestaespíritas, teosofistas, maçons, maometanos, budistas etc.

Estão, ao contrário, fora da religião todos os falsos, os injustos, os queriormente não creem (embora formalmente em seus lugares), os que não vsuas crenças, sejam eles católicos, protestantes, espiritistas, teosofistasçons, maometanos, budistas etc. Todos estes, então, igualam-se, pois repr

tam a traição à ideia que professam. Na “Mensagem de Natal” de 1931, dizSua Voz : “... não está longe o di em que somente uma será a divisão entre os homens: justos e injustos” NaTerra, em todos os campos, existem sempre dois tipos humanos: o evoluo involuído, que se encontram em todas as filosofias, governos, relighierarquias e povos.

O involuído vive sempre no nível animal e é animado pelo espírito dminação, sendo, por isso, intransigente e agressivo. Fecha-se na forma prezando a substância. É mais ligado à Terra que ao céu. Considera-se

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todos os campos, sempre com a posse da verdade e da parte de Deus, julgtodos os outros como situados no erro e da parte de Satanás. Tende à egtrica monopolização da Divindade.

O evoluído tem características opostas. Vivendo num nível mais al

animado pelo espírito de fraternal compreensão. Tolera e auxilia; fala atdo exemplo que ele mesmo dá, e não dominando. É mais aderente à substque à forma, mais unido ao céu que à Terra. Não julga nem condena. Tenanular seu eu em Deus e no amor ao próximo. Não se faz paladino da ve para exigir virtude dos outros, mas começa por praticá-la ele mesmo. Reas consciências, por isso nunca impõe, mas ilumina. Não pretende ser o que tem Deus consigo. Não identifica com o mal tudo que está fora de sedo seu grupo ou hierarquia, nem condena em defesa própria. Não se faz rsentante de Deus para dominar com sua personalidade, mas reconhecDeus o Pai de todos.

O homem está evoluindo, e a religião dos justos será a religião unitária todos entrelaçará. O estado até hoje vigente corresponde à fase caótimundo. Ele caminha, porém, para a fase orgânica, na qual os relativos pde vista, em todos os campos, coordenar-se-ão numa verdade universal.

A religião una será a substancial, a religião do bem e dos bons, que se preenderão, por serem evoluídos. Para essa compreensão, os involuídos não estão maduros, pois só podem crer que a salvação depende apenas dação a esta ou aquela forma da verdade, sem cuidar da substância, que estar em todas as formas. Tudo isso, porém, será fatalmente superado.

É lei de evolução que o dualismo no qual se dividiu nosso universo reconstituindo gradativamente, em todos os campos, na sua originária unida qual o espírito caiu na cisão, na forma, na matéria. É fatal lei de evoque chegue finalmente à Terra a tão esperada realização do Reino de Deu

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CARTA ABERTA A TODOS (1933)

Completam-se hoje dois anos, desde queSua Voz começou a falar. É Noitde Natal, e eu me afasto por um momento da reunião familiar, para med

escrever.Este é um exame público de consciência, que efetuo na hora solenque se aguarda para comemorar uma vez mais o nascimento do Salvadmundo.

Não sei quão imenso espanto me invade nesta hora solene, na qual mem é vencido pela maravilhosa voz de Cristo. Extasio-me na visão dmundo regenerado por essa voz e nela detenho-me, buscando descansonoite encantada, na qual o grande signo do amor adquire realidade tamsobre a Terra. Cristo está aqui conosco nesta noite, para nossa paz.Amanhã terei de volver a empreender a caminhada sozinho, exausto,uma imensa visão na alma, uma febre incessante no coração, um estalid paixão em cada pensamento. Sinto-me oprimido pela minha debilidade eimensidão do programa. Quem sou eu para me atrever a tais tarefas? Halguém mais aterrorizado e mais aniquilado do que eu? Cumprirei totalmcom o meu dever e haverei de cumpri-lo no futuro? Terei forças sufici para fazê-lo? Vou mendigando um consolo a todas as almas boas, para qusirvam de apoio à minha debilidade. SeSua Voz me abandonasse, eu me sentria completamente arruinado.

Entretanto hoje se completam dois anos que essa voz retumba no munque o mundo a escuta. Nada jamais me havia causado tanto assombro esta afirmação decisiva, sem preparação nem vontade alguma de minha num mundo onde, com frequência, as coisas mais sabiamente preparamais intensamente desejadas não obtém êxito.

Como pode avançar tudo isso com a abstração da minha debilidade e tação? Como pode produzir efeito e arrastar meu pensamento, que deversua causa? Que força convincente reside naquelas palavras escritas improdamente, sem que delas eu me desse conta, para conseguir o assentimentantos? Que sensação de infinito desperta e abala os espíritos?

Tremo e, no entanto, avanço. Quisera resistir por um instinto de objetide, e me vejo arrastado. Quem é, então, que me guia? E quem, por mimnhece a estrada e o futuro? Sofro desalentos terríveis, no entanto, apesar tudo prossegue do mesmo modo. Que sou eu diante do imenso torvelin

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 22

forças que me rodeiam? Que outro imenso mundo existe além deste, que veem e creem ser o único?

Parece indubitável que meu trabalho faça parte de um grande programrenovação mundial, o qual ignoro e que não pode deter-se. Rebelar-me o

cilar seria em vão. Isto já é toda a minha vida. Não conheço o futuro, mmuito bem que todo movimento iniciado não pode deter-se, a menos que completado sua trajetória.

Nesta Noite de Natal, todos vós, homens de boa vontade, que sentis uviva, uma paixão de bondade, uma alma aberta às palavras de Cristo – nãoimporta como a sintais e a manifesteis, desde que essa paixão arda dentvós em substancia – ajudai-me a orar junto ao berço, para que o Santo Mennos faça compreender esta sublime maravilha que desceu do céu sobre a To amor fraternal. Parece-me ver o Grande Rei, que veio à Terra por amor, ir mendigand porta em porta, em meio a este nosso triste mundo, implorando-nos pordade, pelo amor de Deus, um pensamento de bondade para os nossos slhantes.

Perusa (Perugia, Itália). Vigília do Natal de 19

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SEGUNDA PARTE

A EVOLUÇÃO ESPIRITUAL (1932)

PREMISSA

Tratarei, nesta monografia, da evolução espiritual. Fá-lo-ei em forma de logia, com o objetivo de dar equilibro e proporção à estrutura conceptunexo lógico ao desenvolvimento do tema, tratando: I – Concepção ; II – Os

Meios ; III – A Realização da Evolução Espiritual . A necessidade de tratar numa única monografia um argumento tão v

que não poderia esgotar-se em muitos volumes, impôs-me uma síntesconcluirá sem poder se deter nas intermináveis particularidades de uma se, sem poder completar-se com o desenvolvimento de questões colaterque tive de renunciar inexoravelmente.

Não obstante este contínuo esforço de condensação de pensamento, atidão do tema nos fará percorrer os campos mais diversos dos conhecimhumanos, desde as concepções da ciência moderna à história comparad

religiões; desde o conteúdo espiritual destas e do pensamento dos gracampeões da humanidade até ao estudo psicológico da introspecção, qulevará às misteriosas profundidades do espírito. De maneira que, mquando se queira considerar este escrito somente sob o ponto de vista cral, não duvido que ele possa interessar às mentalidades maduras, convdo-as ao exame de argumentos ultramodernos, interessantes e importa porquanto constituem o campo inexplorado ao redor do qual trabalhfilosofia, as religiões, a ciência e as artes; o campo dos futuros descobritos e das criações intelectuais e morais.

Este escrito, porém, não é tão-somente um ato de estudo e investigaçapenas um trabalho mental, mas também um trabalho de sentimento e dxão. Nisto reside sua maior importância. Não se trata da mentira literárcostume, com que frequentemente um escritor prefere mascarar mais dorevelar seu próprio espírito. É coisa bem rara, especialmente hoje, um agrande sinceridade.

Os conceitos que exporei, buscados ansiosamente durante vinte anos dtudo (pois que à vida não deve interessar tão somente a solução dos prob

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econômicos, senão também o intelectual e moral), foram captados no ambdas correntes espirituais da humanidade passada e presente, e não extrdos trabalhos de outrem. Achei-os e reconheci-os, qual uma estranha recção, nos arcanos insondáveis de meu espírito. São, para mim, a revelaç

uma recôndita personalidade própria; diria quase de um oculto eu interior, quevive e obra além dos limites da vida e da morte.Estes conceitos manifestaram-se para mim gradualmente, como por

interna revelação, que, a cada choque da vida, a cada recôndita dor da eriência, tornou-se mais clara. Assim foi aumentando, completando-seorganismo ideológico, solidificando-se sob o fogo das provas. Depolargo aprendizado na escola da experiência, em contato com a realidadvadiram minha psique racional e humana e agora, depois da total assição, dominam-na, conferindo-lhe, ante os mais graves e intrincados prmas do pensamento humano, a segurança que somente a visão direta outorgar. Não mais, pois, vãs ideologias, mas sim a sabedoria expressaluta e pela dor, a experiência provada e concluída com objetividade, mquando pessoal, controlada e direta; não mais uma abstração, mas sim – oque é mais interessante – um caso vivido.

O leitor se encontrará, portanto, diante da realidade de um drama e psenti-lo, se lograr ler profundamente, ultrapassando o sentido superficialco e racional que precisei escolher para a demonstração e o desenvolvimda tese. Um drama sobretudo verdadeiro; um drama que, sem dúvida, etambém em muitos espíritos, perdurando ainda em muitos outros, se bemencoberto pelo silêncio. Um drama que, embora talvez seja o maior que manidade conheça, poucos vivem intensamente e percebem com clarezadrama que deverá ser desenvolvido pela nova filosofia, pelas novas relig pela nova ciência, pela nova arte do futuro, e que poderá ser expresso n

por uma série de argumentações racionais, mas também pela magnificêncsimbolismo e do rito, pela concatenação de fórmulas matemáticas, pel pressão pictórica ou poética das sensações do subconsciente (ai onde efuturo da alma e da arte), ou ainda através da orquestração sinfônica, tal foi concebida por Wagner.

Demonstrando a universalidade destas concepções, Wagner as vinculo pensamento coletivo, concedendo-lhes uma importância que excede a mcontribuição pessoal.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 25

Publico-as, induzido por um misterioso e indefinível mandato interioa atração das correntes psíquicas coletivas em via de rápida condensaçãoa sensação da madureza dos tempos, que invocam e reclamam intérpretessó é percebido pela alma que se preparou no silêncio e na solidão, so

num mundo espiritualmente ausente e alucinado por outras miragens. Grtempestades íntimas, filhas do mistério, junto ao umbral do infinito, deseram-se silenciosamente sob a forma exterior da indiferença, em meio mundo superficial e absolutamente incapaz de admitir e compreender tatos, que representam sem dúvida um esforço enorme. Uma luta agônicqual o homem se encontra sozinho frente a frente com os maiores mistéri

Se tudo isto reduz o indivíduo a uma vida aparentemente insignific pois o afasta de toda a afirmação exterior e absorve suas melhores ene privando-o das vitórias que os outros podem alcançar, termina, contudoacumular nele tamanho caudal de força moral, que um dia lhe criará umanova, iluminada numa explosão de luz, como uma ressurreição.

Assim, esta monografia poderá interessar também como estudo de um psicológico e de um determinado tipo de personalidade humana.

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I – OS CAMINHOS DA LIBERTAÇÃO

Delineamos na primeira parte deste estudo a existência de uma evolespiritual, que se manifesta especialmente no atual momento histórico, c

resultado de dois fenômenos: a madureza psíquica do organismo humanosuperando a animalidade, conduz à transformação biológica do homemsuper-homem, e a maturidade do pensamento coletivo da humanidade queascende, através da evolução das religiões, para uma consciência universa

Duas madurezas: madureza de órgãos psíquicos, que determina a capade de concepções, e madureza de produtos conceptuais do pensamento cvo. Duas madurezas que se pressupõem reciprocamente, ajustam-se e suse mutuamente, para erguer a humanidade ao plano da linha de evoluçãoritual, conduzindo-a a um novo e mais elevado estado de consciência. Nceira e última parte deste escrito, veremos qual é esta consciência. Antchegar a este ponto, observemos, nesta segunda parte, quais são os camque conduzem à realização da evolução espiritual.

Denominei-os, ex-professo4, “caminhos da libertação”, para indicar dequantas qualidades humanas e subumanas devemos, como almas em eção, libertar-nos antes de alcançarmos o reino do super-homem. Granascensão humana, que, partindo do inferno da animalidade (o mundo data), atravessa o purgatório da dor, que redime (o mundo humano), para cao paraíso da realização do divino (o mundo super-humano). A lembrantrilogia dantesca e da fé na ascensão espiritual – que não pertence somente a poeta, mas a toda a Idade Média e à maior religião do Ocidente – nos faráuma boa companhia neste estudo, que pretende ser uma demonstração rnal do espiritualismo. Trata-se de demonstrar aquela mesma fé, porémacordo com os conceitos da ciência e da psicologia modernas; de solid

os fundamentos desta eterna e imprecisa aspiração da alma para o Altotendo-a sobre a bigorna da observação objetiva; de elevar, ao mesmo temmaterialismo ao espiritualismo, continuando o primeiro, para completá justificando racionalmente o segundo. Não mais ecletismo, mas sim entre estes dois extremos do pensamento humano, inconciliáveis tão-somna aparência e apenas transitoriamente. Porém, mais do que fusão, trata-fecundação, porquanto, desta união, nasce uma criatura nova, um espi

4 Como quem conhece a fundo a matéria ou assunto; magistralmente.

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lismo científico, que é a verdade mais completa do futuro. Não sendo malismo nem espiritualismo, os partidários de ambas as escolas ficarão infeitos, porém não importa. Com isso, projeta-se uma luz nova sobre osnos problemas, agregando-se algo às filosofias do passado. Uma fé viva

não está fossilizada nas mentiras convencionais a que hoje ficaram reduas mais altas idealidades; uma fé mais próxima da nova psicologia dos pos, que exerce forte pressão; uma fé da qual, para aqueles que, como possuem, é mister dar o testemunho.

Voltemos aos conceitos com que iniciamos este estudo, os quais deixno meio da primeira parte, para estudar a evolução das religiões. A minsistência sobre esta ordem de ideias poderia fazer taxarem-me de materino entanto agi assim deliberadamente, porque julguei isto necessário parçar bases mais sólidas ao edifício do espírito e, daí, libertar-me num impevoo para as mais altas ascensões humanas. Delinearei, desta maneira, naspectos da evolução espiritual.

Existe na Terra, sem necessidade de ir buscá-lo em outras partes, um no constituído pelo mundo animal e subumano, no qual tomam parte a behomem de raça inferior e, amiúde, também o chamado civilizado. Este m possui a sua lei, e os instintos ferozes destes seres são os artigos escritoformas de vida daquela lei. Aí reina, como valor supremo, a força. Cadauma arma, um assalto contínuo, uma ameaça incessante para todos os dseres. Cada vida não pode existir aí senão impondo-se a todas as demaiforça, como uma extorsão. O indivíduo, para afirmar-se, deve semear atruição ao seu redor; para viver, deve matar. Resulta disso um estado de asividade e violência, de incerteza e de luta sem descanso, sendo esta ainvoluída na história da vida, na qual as distintas formas ainda não se orzaram em simbiose e, assim, lançam-se desordenadamente à conquista d

domínio. O próprio homem, desde há muito tempo, empreendeu esta lutvenceu, cabendo-lhe então, como vencedor, organizar em nosso planetaforma de vida diferente, sobre a base de coordenação, e não de agressão.tudo a recordação é muito recente e os baixos instintos são ainda muito fde modo que, geralmente, ele vive naquele mundo selvagem que desapagar. Submerso em seu próprio egoísmo, não enxerga mais além do qespaço que ocupa, e sua miopia psíquica o faz acreditar ser possível sepseu próprio bem-estar do bem-estar coletivo. Tão-somente o interesse deseu desejo, dispondo-o à ação; a miragem do lucro o impulsiona, lançand

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conquista. Deste modo, ele projeta, ensaia, exercita e tempera suas forçasgredindo quando vence e sucumbindo quando perde. É o sistema da selque premia o mais forte, graduando a recompensa em proporção à força. te uma justiça também nos mundos inferiores, de modo que, mesmo qu

seja por meios ferozes, dignos por certo de quem os escolhe, também osdeste nível podem realizar um progresso.Há, pois, uma lei e, nesta lei, uma série de princípios: da involução de

ignorância; da ignorância, o egoísmo; do egoísmo, o sistema da força; dça, a seleção e o progresso, de um lado, e, de outro, o mal e a dor.

Este mundo de leis naturais não conhece a justiça, que é um conceito de um mundo mais elevado. A força, frente à lei moral, é violação e injuEntretanto esta injustiça, que parece não possuir limites, porquanto a pode tudo e tudo poderia destruir e usurpar, impondo-se desmedidamenteem sua própria lei um freio, dado pela força que se desencadeia dos egoílimítrofes numa tentativa de equilíbrio, buscando um rudimento de juque, mesmo tomando por unidade de medida a injustiça da força, garacada ser o que lhe corresponde e, através do equilíbrio de tantas injusconsegue uma espécie de justiça primitiva, sendo esta a máxima conce possível naquele nível de vida.

Num mundo em que devorar-se reciprocamente é uma necessidade prdialmente orgânica e os vários graus de evolução são uma necessidade ló poderá parecer difícil perguntar-se como conseguiu nascer e afirmar-se oceito de altruísmo, bondade e justiça, tão prejudicial para o eu, tão anti porquanto se estriba no abandono de todas as ofensas e defesas; um conde vida que revoluciona todos os valores anteriores e que significa umcompleta negação de tudo quanto pode ardentemente apetecer a natureque tal conceito representa na economia da vida poderia até parecer abs

no entanto, em seu nome, alguns homens atreveram-se a rebelar-se contrao que significa vida em nosso planeta, vivendo fora das leis da animalisem sucumbir, mesmo quando se haviam despojado das armas de ataqdefesa, antes triunfando, já que eles foram gênios e santos. Qual era, poisforça que os sustentava? Existirá, então, uma força ainda mais sutil e potente, mais “forte” do que aquela indispensável para a vida, capaz de im-se a todos, mesmo renunciando à luta?

Normalmente, de acordo com a lei da força, que domina a Terra, o sisde altruísmo, bondade e justiça vale menos do que um escrúpulo inútil. É

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dadeira passividade, é gravame que trava e, pior ainda, é sinal de debilique preludia a derrota. Aquele que renuncia agredir e defender-se, aqueloferece a outra face às ofensas, como quer o Evangelho, aquele que se recafundar suas garras na carne alheia, para alcançar uma vantagem e, por p

pio, não quer obter pela força todos os infinitos prazeres da vida, é derroreduzindo-se a uma existência de dor, limitada na expansão, é um vencmargem da lei, um desterrado do mundo, uma nulidade que se destrói. Aque segue os ideais superiores, observado pelo reino da força e com a psgia da força, parece inerme, indefeso, ridículo. É facilmente assaltado, alado sem esforço, quase por gracejo. Entretanto o vencedor, nesse mesmtante, assim como os que crucificaram Cristo, sente naquela derrota, nadebilidade, o mistério de uma força maior, que surge de longe, como umtrondo de trovão, despertando um eco terrível nas profundidades do espUm relâmpago arroja um facho de luz em sua alma cheia de trevas, reveo ignoto, e ele pressente a realização de vidas mais vastas, intuindo o justo. Assim, o vencedor, no mesmo instante de sua vitória, experimesensação da derrota. Então, num calafrio de espanto, treme e foge, ou m permanece e venera. O vencido olha do alto como um vencedor, e de fat pois descobriu e revelou uma forma de vida mais elevada, na qual ele triu

As forças naturais emudecem, desconcertadas, ante este estranho ser semas, que proclama uma assombrosa lei nova e parece pertencer a outro mQual é esta força tão inexorável, esta nova lei ante a qual o mundo natural e se dobra? Existem, por acaso, dois sistemas de vida possíveis, duas leismundos próximos e em luta, entre os quais oscila a vida do homem?

Querer concluir sem levar em conta a importância da força na economvida, seria, quando menos, apressado. Foi a força bruta quem realizou e realizando a seleção no reino animal. Este é também um modo de prog

um tipo de técnica evolutiva, mesmo quando implica a gênese da doraspecto da grande lei de ascensão, se bem que nos graus mais baixos. A ça divina – equilíbrio universal – também se manifesta nela, já que, no chque de forças inimigas em processo de contínua agressão, a ação e a reaçneutralizam. O desequilíbrio do pormenor se equilibra no conjunto, e desoma de injustiças resulta – como dissemos antes – uma primeira forma d justiça. Nele, a força encontra dentro de si mesma uma primeira limitAdemais, foi a força bruta que cumpriu a grande função, na história dmem, de levá-lo a afirmar-se como primeiro campeão do reino animal.

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prepotência – carência de escrúpulos e de piedade – que criou os povos dominadores e vitoriosos. A força, pelo menos nas circunstâncias em que esencontravam em seu primeiro período de desenvolvimento, era-lhes necria e, sem dúvida, muito criou. Observamo-lo na antiga Roma e na Am

de nossos dias, pela seleção dos indivíduos mais ousados, mesmo qumenos escrupulosos, daqueles mais ricos de energias ativas e construtivque da perfeição moral tão ambicionada pelas velhas civilizações. Porémforça criou muito, também destruiu muito, e um mundo que se fundassmente na força acabaria por se destruir a si mesmo. Junto a todo vencedsempre um vencido que lembra, melhor do que aquele, esta destruição. Tas experiências da vida são gravadas na alma humana. As impressões nam na raça e o instinto recorda, formando-se assim, a par com o sentimde admiração e respeito pela força, também um sentimento de repugnânde ódio, porquanto, no vórtice humano, que se renova incessantemenvencedor se transforma amiúde no vencido, e todos experimentam qudores acarreta a força, quando utilizada em vantagem própria.

São assim as raças velhas, que, por terem vivido muito, cansaram-se dta até à neurose; são elas que mais detestam e querem eliminar o uso da Este ódio, este desejo de suprimi-la, nasce da necessidade e do interesscada um possui em eliminar o exercício daquela por parte dos demais,conservá-lo tão-somente para si. Sendo de todos em particular, converem desejo da coletividade, e a repressão da força se generaliza a tal pque se torna hábito, convertendo-se primeiro em lei religiosa e, depois, civil dos povos. A humanidade cumpre desta maneira uma espécie de cefim de expulsar de seu seio aquela audácia, à qual ela deve tanto e que égue de seu sangue, afastando-a paulatinamente, circunscrevendo-a cadmais e contendo-a por todos os meios ao seu alcance. É deste modo que

timos a um espetáculo bem estranho, em que a força, através do uso, teeliminar-se a si mesma. Ela, à medida que a civilização organiza a sociehumana, tornando-a mais homogênea, vai perdendo cada vez mais sua imtância, manifestando-se somente nos indivíduos atrasados, o que é sinretrocesso, assim como o seu desaparecimento o é de maturidade. Tudo a excluí-la. Os ideais de justiça e liberdade se fazem sempre mais necessA diferenciação dos tipos humanos, produto da evolução da vida, a espezação para as aptidões psíquicas, outorgadas por acumulação de experiêntraria o afastamento dos vínculos e a desagregação social, se não os ap

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masse outra necessidade e outra força não reorganizasse estes especializem um organismo coletivo mais vasto, onde a atividade de cada um seglinhas de maior rendimento, dado pelo trabalho no campo das faculdadequiridas. Esta força são os ideais, que, em oposição à violência, constitu

cimento precioso que amalgama os instintos egocêntricos e exclusivistaum organismo coletivo maior e mais potente. É assim que os ideais, enqsatisfazem uma necessidade e alcançam um benefício, abrem passagem duzem-se em realidade. Eis aqui uma segunda restrição que a força encem si mesma. Ela é um fator de evolução que se manifesta para destruou, em outros termos, é um fator transitório na grande rota da libertaçforça possui um valor imenso em determinadas circunstâncias de vida e biente, mas conserva seu domínio apenas enquanto o exijam as supremacessidades do progresso. A série dos abusos e das violações tende, atravum mecanismo de reações e choques, a alcançar um estado de equilíbriofirme e mais perfeito, cumprindo-se assim, por evolução, o milagre da formação da força em justiça. Prova evidente da relatividade e da mobilcontinua de todas as posições da vida. Prova de um transformismo ascenal de tudo e de todos. Prova de que a vida é possível em formas e em ndistintos, a cada um dos quais corresponde um organismo de leis e todmundo. Um mundo que se transforma em outro sem destruir-se, do qualvem tomar parte à medida que afloram nele as aptidões para saber viver nas faculdades de sabê-lo sentir.

Tudo isto demonstra a contemporânea existência de dois mundos distide duas leis: a força e a justiça, o reino da besta e o reino do super-homentre os quais o homem oscila e se debate, cumprindo um passo que sigtransformação e criação biológica.

A fim de não me estender demasiadamente, delineei as duas leis sob

pecto de força e justiça, que constituem sua característica essencial. Emsentido mais vasto, a primeira compreende o mal, o vício, a violência,que na evolução significa atraso e no homem recorda a besta, enquantogunda compreende todo o edifício das virtudes que as religiões e as leesforçam por inculcar no coração do homem. As duas leis são o bem e oO mal é o passado, e o bem é o futuro. A passagem cumpre-se por evolda qual nasce o conflito, que é contínuo, entre as duas formas. Portanto o o bem são relativos ao indivíduo, à raça, ao grau de evolução. Isto anconceito de culpa, a menos que por culpa se entenda a ignorância, que no

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preferir a desvantagem de retroceder ou retardar a evolução, obstruindo aca de uma forma mais completa de felicidade. Estes conceitos éticos bases racionais e científicas afastam-se muito das normas dos códigos preligiosos e civis, os quais, ainda que resultem explicáveis em sua gênes

mo reação e como defesa, carecem de significado no mundo superior da ça e devem ser relegados ao campo do egoísmo e da força.Quantas vezes, observando a alma humana, perguntei a mim mesmo co

possível a existência contemporânea de duas normas de vida tão difercomo podem estas pretender impor-se simultaneamente, e o porquê desteflito, desta coexistência de afirmações opostas, desta contradição no prcoração do homem. Eu sentia seu duplo imperativo em cada ato, e em cadhavia uma luta. De um lado, o sonho do ideal, tão belo, tão puro, tão perfede outro, o proveito imediato do utilitarismo. De uma parte, a equidade cgrada oficialmente por todas as leis religiosas e civis, e, de outra, coroadaêxito e apreciada incondicionalmente em privado, a força, como tal, sem pulos. Na prática (o que é escusável às vezes, se for levado em conta a opdas necessidades materiais, as exigências da vida e a miragem de uma utimais tangível por estar mais ao nosso alcance) eu via que os ideais, os p pios, a utilidade maior, porém mais remota, eram tidos em menor conta, uma realidade desagregável, que se desvanece no mundo dos sonhos. Vvezes, acender-se a luta, mas quase sempre para optar pelo útil, releganideal entre as belas formas de retórica, entre as indiscutíveis verdades, julcomo mentiras convencionais, um vínculo do qual, na prática, é mister gar-se como de uma posição desvantajosa. Via o anjo alado, de fronte radsempre em luta com a fera audaz e selvagem. Em cada ato, dois camopostos, uma teoria e uma prática, um modo de dizer e outro de agir, umatira muito cômoda e uma realidade muito árdua para seguir. Não compre

como era possível, para o mesmo indivíduo, existir contemporaneamendois mundos opostos e cumprir duas leis contrárias. A explicação do absomente me poderia ser oferecida pela teoria evolucionista: uma dupliccontemporânea de leis somente é possível num regime de evolução, comosito de uma para outra fase. Somente o ocaso de um período e o alvorecoutro podem produzir tais contrastes. Somente o homem os conhece, não a animalidade inferior, que descansa satisfeita na plenitude de sua fase.

O homem vive, pois, em formas de transição, em níveis distintos segos diferentes casos, que vão da besta ao super-homem. Vive em parte no

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sado e, em parte, projeta-se para o futuro, ensaiando e explorando o passoformas mais elevadas.

Restaram de tudo isto vestígios nas oscilações seculares das religiõesfilosofias, das leis, das instituições; oscilações que poderiam parecer in

zas, mas que são evolução. Normas e imperativos que, embora quisesseabsolutos e perfeitos, eram aproximações progressivas de perfeições cadmaiores. Este passo é uma superação biológica, a transformação do homesuper-homem, o maior acontecimento da época moderna. Realizar esta mé a necessidade mais viva, o objetivo supremo da vida individual e colApressá-la, se for possível, para alcançar uma felicidade mais estável e pleta, é a mais profunda aspiração da alma humana.

A busca dos meios para realizar e acelerar esta passagem constitui o ovo deste capítulo.Temos estudado a evolução espiritual no homem, primeiro como evolde seu organismo psíquico, em seguida como desenvolvimento de concena evolução dos ideais. Observamo-la agora em seu aspecto mais univegrandioso, como uma sucessão de mundos e organismos de leis, onde mem vive progressivamente a sua gloriosa ascensão.

Esta marcha, da qual queremos estudar os aspectos, as leis e os resultaum fenômeno susceptível de um estudo positivo, porquanto admite a obsção e a experimentação. É um fenômeno natural, no sentido de que se re por si só, de modo espontâneo, diria quase automaticamente, por um joforças irresistíveis e fatais, porque é a vontade das grandes leis e a necessmais potente do ser; porque o mover-se em movimento ascendente é a íessência do universo.

Este processo pode, porém, produzir-se também racionalmente, sendmeiramente compreendido e depois desejado e conduzido pela intelig

humana, sem que tenhamos de estranhar esta intervenção do homem na cta e na utilização das leis naturais. A inteligência humana é por si mesmaforça criadora, e das mais poderosas. Pode, portanto, não somente entrcombinação fecunda com as outras forças, mas também, até certo pontsumir sua direção. Tais forças movem-se de acordo com leis que, embo jam algo adiantadas, não alcançaram totalmente a perfeição, achando-se tas ao esforço do ensaio e ao perigo do erro, mesmo quando corrigido e pensado. Se o equilíbrio se restabelece de pronto e o progresso se manem seguida, a prova, por sua vez, contém sempre um desgaste que a inte

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cia pode evitar, estudando o mecanismo das leis pelas quais tudo é regido precisão matemática e orientando as energias, para dirigir o esforço no sede obter um rendimento maior. Deste modo, o homem pode progredir no conduzir-se em meio ao grande oceano de forças que é o universo, para c

guir, em vez de dano, vantagem. O ignorante, por não saber mover-se no delas e desconhecer o efeito de seus próprios atos, pede o que o equilíbriversal não pode e nem quer absolutamente dar e, assim, choca-se contmente contra reações dolorosas, crendo ser possível, pela violência, forçleis, para iludi-las. Tentando substitui-las pelo impulso insignificante d própria vontade, rebela-se contra a corrente de todo funcionamento orgdo universo, mas a corrente o arrasta. O sábio, ao contrário, pede harmomente só aquilo que é lícito pedir, e o obtém. Deste modo, pode-se reracionalmente, com o máximo rendimento e a maior aceleração possívascensão de um mundo a outro.

É bem certo que, por outro lado, estas coisas são tão velhas como o hoRepito-as numa forma nova de objetividade analítica, mais verdadeira e palpitante, para que recuperem a vida da qual pareciam haver se afastadreligiões, as filosofias e todo o pensamento humano acumulado no paconcordam com a crença moderna mais evoluída. As maiores inteligênassim como a alma amorfa das grandes massas humanas, elaboraram-nascando e experimentando todos os dias, através de vários sistemas, em todlugares da Terra, com todas as aproximações e resultados possíveis.

É mister explicar e afirmar aqui a existência de um organismo de leiacordo com as quais, e jamais ao acaso, movem-se todas as forças do unso, leis que são uma vontade e um conceito e constituem a alma da criSeu imperativo expressa-se sempre nas coisas reais da vida e é semprfenômeno em ação, o qual encontramos invariavelmente como elemen

gado à matéria, tal como a alma ao corpo. Manifestado tão-somente emúltimas consequências, o conceito existe detrás das coisas, oculto na prdidade do mistério e é por sua vez também vontade e ação, assumindo asonalidade do eu que pensa, quer e age, como divindade invisível, ponipotente e onipresente. Esta concepção naturalista não diminui nem amas sim agiganta o conceito da Divindade. Poder-se-ia expressar, comesmas palavras da gênese bíblica, o conceito antropomórfico: “o hocriou Deus à sua imagem e semelhança”. É natural que, com o progressabedoria humana, este conceito se engrandeça. Cada profeta, cada fun

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de religiões, já nos proporcionou uma aproximação maior. Portanto, cevolução da ciência, que continua a evolução das religiões, a alma huvai cada dia sondando e decifrando um novo artigo da Lei, cumprindo rvamente a si mesma uma contínua e progressiva revelação da divindad

evolução, elevando do âmbito de uma lei para outra mais alta, cumpredia no ser uma progressiva realização da divindade.Encontramo-nos, pois, perante uma grande transformação que o ho

pode executar em si mesmo, dirigindo-a racionalmente, em harmoniatodo o funcionamento orgânico do universo. O trabalho de compreendeainda maior, de realizar o complicado fenômeno tendem, por certo, a utilidade final, obrigando-nos a perguntar qual pode ser esta. Falei de utde que justifique o esforço – compensando-o e, assim, fazendo-nos decidiintentar a difícil prova – porquanto sei, por experiência, que o prêmio e o jetivo final de tudo isto não é uma quimérica idealidade, um vão espiritmo, mas sim uma real vantagem, que permite alcançar a mais completa fdade. Trata-se de um eterno problema que nós outros vamos encarando blema real e fascinante, emanado de uma necessidade imperiosa do espde um instinto misterioso, que outorga ao homem o direito de pretendecerteza de obter, ainda que num futuro distante, uma satisfação absoluta problema que estamos estudando, embora seja o mais difícil, é tambmais radical e o mais positivo para alcançar a meta desejada, porquantse estriba em sobrepor exteriormente a si mesmo todos os possíveis dome possessões transitórios e ilusórios, mas sim em transformar a maneiser, numa profunda e definitiva renovação do eu. Trata-se de fugir dmundo inferior, de transformar a sua lei, de libertar-se, enfim, de toddores que o povoam. Aquele que vive no nível da lei subumana permaisolado em seu egoísmo e deve lutar sem descanso contra todos, porém

cendendo ao âmbito da lei super-humana, já não necessita lutar e esforçsendo-lhe possível, coisa absurda no mundo inferior, evangelicamente das armas de ataque e defesa, com as quais deixa também a angústia da iteza e da derrota, porquanto existe uma força mais poderosa, sob cuja pção se colocou e pela qual é espontaneamente protegido. Ele se encontmeio da corrente, e a corrente o leva. Sua lei é a grande lei, sua vontadgrande vontade. Já não lhe é necessário o esforço para impor-se como ção, pois vive harmonicamente com a vida universal. Sua sorte convenum equilíbrio estável, que tende a permanecer estável em forma espont

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 36

porquanto não é produto da força, precário e combatido. Desce umaimensa sobre todo o ser, um gozo difícil de compreender e de expressaré, porém, o mais profundo que o homem conhece. A alma humana, inv pela atual febre de trabalho e riqueza, exige resultados menos efêmero

cessitando, para satisfazer-se, de valores indestrutíveis, algo que, atravtempo, não mude e nem se desvaneça como uma ilusão. Dada a transitode de todas as coisas humanas, somente a evolução, no vórtice de um isante transformismo pulsante de vida e de morte, constitui o que jamaisdestruído. O tempo mede, porém não toca este transformismo, que se na forma e, renovando-se sempre, sem perder nada na substância, vibritmo grandioso de sua ascensão. Esse movimento incessante, que no minferior é destruição e tormento, é deste modo guiado para a felicidadeconverte em meio de conquista de afirmações eternas.Se os resultados são esplêndidos, o atalho é áspero e difícil de acharmandando enorme esforço. Porém não há grandes conquistas sem graesforços. Aqui, o homem deve medir-se em uma luta titânica, não mais cos seus semelhantes, mas sim contra as poderosas leis naturais, invisívtenazes, que estão dentro dele e são a sua própria personalidade, a quadeve, por sua vez, destruir e reedificar, matar e ressuscitar. Esta destruiçsi mesmo é o primeiro sofrimento que lhe incumbe enfrentar. Não discerde imediato o verdadeiro caminho, o impulso do homem para a felicidaem geral, cego e recai sobre si mesmo, inutilmente. Acreditando poder agla em forma estável, usurpando-a com uma violação de equilíbrio, ele c possível, num mundo de leis naturais, o absurdo de se obter o que não semerecido. A força é um atalho cômodo que produz efeitos imediatos,também equilíbrios instáveis, que prontamente cedem à reação natural. acervo das desilusões humanas; riqueza de energias, porém grande mi

Estimulada pela sede dos gozos – enquanto somente a minoria preferiu a trada mais longa e escabrosa, porém mais segura – a maioria se consome e srevolve na lama, a fim de pedir aos prazeres do mundo subumano um pmais de felicidade, numa luta encarniçada em redor de resíduos mesqui Não só insatisfação, mas sempre novas derrotas na inexorável balança daça. Quem, em vez disso, trabalha na senda do bem, vai acumulando créde modo que, um dia, daquela mesma lei, lhe manará espontaneamente acidade. Não se atendendo a este equilíbrio, não se ouvindo a misteriosa vconsciência, que nos admoesta, não se compreendendo o furacão de re

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que as forças da Lei podem desencadear, algo vai sendo sacrificado cadmais ao destino inexorável. A cadeia transmite-se de geração a geraçãodéficit acumula-se até nos esmagar. Então, no fundo de um céu tempestuaparecem os profetas bíblicos, que convocam à penitência. Estalam cat

mos que são como banhos de dor, e a humanidade sai purificada, como mente na dor pudesse readquirir seus direitos e somente através de tão teassalto voltasse a encontrar a possibilidade de retornar ao caminho interrodo de sua evolução.

Eis aqui a função da dor. Ela, no carma – destino inexorável – provê aquem saldou as dívidas do passado, individuais e coletivas, as quais é imcindível haver expiado, antes de se poder iniciar a ascensão para uma felde maior. A dor, portanto, não é somente um fenômeno de reação orgân psíquica, pois corresponde também a uma lei de equilíbrio moral. Elevaexpiação a renúncia, é um meio para a conquista da felicidade, é o instrumda grande transformação, é o caminho da libertação que nos conduz ao msuper-humano. Eis a reabilitação pela dor, que purifica e equilibra, que elavança, que cria acima do instante fugaz.

Observamos as condições de vida nos baixos níveis de evolução, parcontrar aí a origem da dor. Este é o último elo da cadeia: involução, igncia, egoísmo, força, luta, seleção – cadeia que, se por um lado termina na drepresenta também um lento caminho ascendente, no qual o homem se forma em super-homem, a força em justiça, o mal em bem, realizando a eção e destruindo as condições de vida inferior, onde nascia a dor. Em otermos, transmuda-se também a dor em felicidade. Assim como a força, cuso, tende à sua autoeliminação e desaparece, quase reabsorvida em si mmudando-se em justiça, da mesma forma a dor, com a evolução, tende avanecer-se, porquanto também ela, como o regime da força, é um fator t

tório, inerente a uma fase de evolução, destinada a ser vencida. As leis duniverso no qual a dor e a maldade fossem incondicionais e definitivas poderiam ser tidas como correspondentes a um conceito de equilíbrio e juA existência seria um delito, se não contivesse, junto com aquelas, uma para destruí-las. Esta força é a maior de todas: a evolução, destinada a formar o mal e a dor – que são simplesmente involução – em bem e felicidadeProcesso espontâneo e inexorável; lento se efetuado com a defeituosa téda tentativa, do erro e da emenda, porém rápido se, ao contrário, conscida rota e das forças, tratamos de acelerá-lo, guiando-o.

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A dor nasce do regime de força e de luta necessário para a seleção e ogresso nos mundos inferiores. Não esperemos até nos vermos compelidoesses estímulos, mas esforcemo-nos para progredir até onde nos seja posanulemos a fase subumana e humana, impondo-nos formas mais elevad

vida, e teremos eliminado a dor.O valor prático e tangível da evolução, o significado deste conceito delução que temos elaborado até agora, reside todo nesta anulação. Estas suções de formas de vida, de fases de progresso, são vitórias sobre a dor. O blema da evolução converte-se, então, em problema de felicidade, e astemos de conceber. Nossa meta será a destruição da dor. Todos os meiosvés dos quais se realiza a evolução conseguirão esta destruição, que siglibertação. Na evolução está, portanto, a libertação. Assim, em tudo o q presente um meio de evolução, temos de ver um caminho para a libertaçãOs caminhos da libertação são múltiplos; estudemo-los rapidamente.

É mister, em primeiro lugar, uniformizar-se à lei do mundo superior qdeseja alcançar e ter, portanto, como princípio a retidão em todos os atosalcançar a nobre finalidade da vida, acelerando, mediante o esforço da vde, a realização em si mesmo de uma lei mais elevada. É necessário intelcia para a compreensão da vida, da missão e do trabalho que nos correspÉ necessário vontade para seguir o que a mente viu, e não o que o interes prazer quiseram. Não se requer grandes heroísmos, mas sim a disputa constante e quiçá mais heroica das provas cotidianas, aquelas que vão cavna alma o sulco de novos hábitos. Estes, uma vez assimilados no instintomarão uma nova personalidade. É necessário o esforço, o trabalho da eção, especialmente no princípio, para passar do mal-estar à adaptação e pelo costume, à necessidade do novo estado. Desta maneira, eliminamtentativa e o erro, que engendram a inacabável série das decepções huma

constituem o sofrimento maior e mais penoso com que a Lei, em sua reimpõe o progresso. Queira-se ou não, a evolução é a lei, dura porém justmister cumpri-la. Esta é a corrente da vida, que arrasta a todos e arrebarebeldes. Esta é a vontade suprema. A Lei reage contra aquele que resistfligindo-lhe a dor como castigo e acicate. Para quem a segue, lutando ecendo, a dor vai desaparecendo gradualmente. A felicidade, se é uma nedade absoluta e um direito sagrado de todos, tem de ser conquistada com lho, e este trabalho é uma ordem. As leis da vida não admitem ócios, usurpe nem arrivismos, dando a cada um o seu justo salário. Mais vale aceita

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satisfação a sua parte proporcional de trabalho do que aguardar que ele noimposto duramente. A evolução é um trabalho tremendo, mas cria em tromaiores valores, o homem e a sua felicidade, conseguindo algo incrível: truição da dor, desde que se trabalhe adequadamente. É necessário reali

justiça com a retidão, e a justiça somente pode ser criada com o esforço hu Não pode ser reforma social se antes não for reforma pessoal e íntima.A renúncia é outro meio de evolução e outro caminho de libertação.

retidão é a afirmação da nova forma de vida, a renúncia significa o abanda velha forma que se deseja vencer. Para esta antecipação da nova vid – onascimento do super-homem – é mister que se acabe a natureza inferiormister que pereça o homem com tudo quanto de baixa animalidade hajaTranse laborioso, luta tremenda do espírito para separar-se da matéria evar-se à vida autônoma. Não é um conceito novo este da renúncia, já exte nas religiões, que altamente o proclamaram, sem, no entanto, secuncom aquela explicação que a moderna psicologia científica requer e qutamos de dar. A renúncia pela renúncia é um aniquilamento insensato dasonalidade, não se justificando como meio de evolução, que tende à deção da dor e ao ressurgimento da felicidade. É melhor, entretanto, deixao desenvolvimento destes conceitos para a Parte III, quando estudaremingresso do homem no reino super-humano, onde a dor desapareceu e priu-se a criação do novo ser.

A libertação da dor pode ser obtida também em uma forma que parimpossível à maioria, por falta de penetração intelectual nas causas prras, que não ultrapassa o cego instinto de evitar aquilo que desagrada. Aé vencida por meio da dor; é destruída pela sua aceitação, assim comdobra um inimigo abraçando-o. Por uma lei universal de equilíbrio ação e reação, em um mundo onde nada se cria e nada se destrói, també

campo das sutis qualidades morais, não se neutraliza um efeito senão rduzindo-o à causa, para que aí encontre a sua compensação. Não se uma qualidade, se esta não for reabsorvida pela vida. A dor somente desaparecer com a única condição de se ter saldado o débito à eterna l justiça. Seja no campo moral, social, histórico, econômico, físico ou qco, é sempre a mesma Lei, a mesma vontade, o mesmo Deus. Somentenorância pode pretender o absurdo de enganá-la, esquivando-se à sua re Não se defrauda a Lei, e, quando se pecou, é melhor neutralizar o mai pressa possível a reação, sofrendo e pagando, pois esta, mesmo que fuj

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sempre nos alcançará, onde quer que estejamos. A fim de não agravar sequilíbrio, nunca devemos rebelar-nos, para não excitar a assim chamadivina, evitando um mais rude contragolpe, pois a elasticidade da Lei vina misericórdia), cuja grandeza contém todo o livre arbítrio humano, a

baria por nos vencer com um destino inexorável.A dor, pois, eliminando a reação pela quitação da dívida, opera a prosiva harmonização e efetivação da Lei no eu, determinando assim a evolVimos também que ela não apenas existe nos estados inferiores como cquência do regime de luta e de força, mas também pode ser eliminada, rando-se aqueles estados. A evolução a elimina. Paralelismo de ações eções, de cuja mútua penetração surge a criação de uma forma mais elevavida, baseada na destruição da dor por meio da própria dor. Eis aqui co possível considerá-la como um dos principais meios de libertação. Eis a progresso e a dor estreitamente ligados. Eis aqui explicada a utopia do sacio e do martírio. Cristo, que morre na cruz, redimindo com a sua paixhumanidade, é o símbolo grandioso que resume este conceito.

Sem este conceito da evolução espiritual, a dor é um crime, como no pessimista caos schopenhauriano. Enquadrada, porém. neste conceito, elevinstrumento de criação e de redenção, como na visão deOs Miseráveis , deVítor Hugo.

Concebo a dor como a reação de uma lei que tende a restabelecer o líbrio perturbado pelo erro; uma lei que, respondendo a um supremo conde justiça, possui a função de, por meio de reações, ensinar ao homem bem que respeitando a sua liberdade, os verdadeiros caminhos da vidhomem possui um instinto seguro que o guia para a felicidade e que é ocador de sua meta. Ele ensaia todos os caminhos; primeiro aqueles masurdos, através da força e da violação, os quais conduzem ao gozo imed

não merecido, mas os encontra todos fechados pela reação natural daque lhe inibe o passo. Até que o destino o obrigue, por meio de infinitatativas e erros, a tomar o único atalho possível, que está no seu própriogresso. Em outros termos, é necessário harmonizar-se com a Lei, para enar cada vez mais a reação constituída pela dor, até que, nos graus supres, ela se transforme em renúncia voluntária, numa aceitação livre do tlho ao qual a evolução nos obriga.

Quando a unificação do eu com a Lei é perfeita, desaparece toda a possilidade de reações e a dor é vencida. Concebo a dor como um mal trans

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que se esgota em sua função, existindo para devorar-se a si mesmo, assimmo a discordância é um instrumento para conseguir a harmonia, um meiocativo, um acelerador da evolução, um sábio mecanismo pelo qual a libedo ser se vê forçada a integrar-se no progresso. Assim entendida, a dor

uma abjuração, mas pode ser um grande triunfo, máxime se soubermos ula como instrumento de ascensão. Mesmo em suas formas materiais, com maior evidência, parece uma derrota, como no mundo orgânico, pode desempenhar função criativa, como é lógico em um universo onde possui um significado e um valor para alcançar o bem. Um mal físico temção criativa no mundo moral, porque, destilado, transforma-se em instrumde renúncia e de ascensão. É a insuspeita função biológica do patológico.

Eu digo aos que sofrem: Valor! Porque o vencido da vida é amiúdegrande batalhador. As horas mais dignas e mais fecundas são as da dortodos os seus graus, ela revela o máximo esforço do ser humano; eleva-omina-o e outorga-lhe o direito de olhar a face de Deus.

Eis a minha concepção da dor, em oposição à negativa subtração daque é o Nirvana budista; em oposição, sobretudo, a essa fuga vergonhossignifica a concepção utilitarista moderna. A dor é energia, luta e criaçãoaceita para ressurgir numa felicidade maior.

O conceito de dor segundo o moderno materialismo científico, que cona base psicológica de nossa civilização, é muito diferente. No materialisdor não pode possuir funções superiores, sendo considerada um inimigomal, contra os quais a única posição possível é a de defesa. Esta defesahabilmente organizada pela ciência e pelo trabalho, que são armas podermas de concepção unilateral e insuficiente. Não obstante a luta contra seja levada a uma tensão limítrofe do terror, a sua ameaça é incessante eoculta atrás das grandezas do nosso progresso. A espantosa série de tod

experimentos sociais e econômicos não conduz a nada; o homem, ante a parição fatal e angustiosa de todas as suas aspirações e ilusões, conservseu olhar o sonho vão da felicidade jamais alcançada, escondida em umadade mais profunda, que ele não vê.

Entretanto nunca foi mais ardente a ânsia de viver do que agora. A cinos faz entrever a possibilidade de um paraíso sobre a Terra. Nunca htensão coletiva mais frenética para o prazer. O homem, que invoca e etodas as liberdades, ignora os caminhos da libertação. Busca a felicidad baixo, aumentando seus atributos exteriores, e não as qualidades inter

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Não! A dor não é um acontecimento acidental, efeito de causas próximsuprimível com estas, mas possui raízes profundas em um mundo aondeência ainda não chegou, e responde a funções fundamentais de equilíbreconomia da vida.

Sendo base do progresso humano, a dor está enxertada na vida como utor de importância excepcional. É o trabalho necessário da evolução, quessência e a razão de ser da existência. No equilíbrio exato das leis, a indispensável à vida do universo. A mentalidade moderna, absolutamennorante de tudo isto, faz o irrisório jogo da supressão das causas próximdor. Homens, classes sociais e nações barganham entre si este lastro peque circula entre eles e permanece sempre igual, porque ninguém o absTal como um cogumelo maléfico, a dor volta sempre a brotar sob novamas, apesar de tanta riqueza, tanta civilização e tanto progresso.É mister um jogo mais complexo para suprimir a dor e conquistar a fdade. É necessário subir com Cristo à cruz e refazer sobre outras bases aindividual e coletiva. É preciso encontrar na dor uma força amiga, cuja fuse compreenda e se utilize para a própria ascensão. O que interessa nacumular poderes, mas fazer o homem. É inútil pregar; não se pode forhistória e a evolução. É inútil pedir à alma coletiva uma consciência imee previdente, o que somente as grandes dores e provas poderão fazer amrecer. Tão-somente quando este nosso sistema nervoso – que é o substrato dum organismo mais profundo: a alma – desenvolver-se a um ponto no qualmáquina animal, para este serviço, converta-se em cárcere para o homflanqueando-o com suas barreiras,então ele “perceberá” também as leis mo-rais, assim como hoje, com suas descobertas, começa a vislumbrar as lematéria. As leis morais existem, mas estão ainda à espera de um Newtoas demonstre. Um dia, a vida do justo será uma necessidade universal, p

derivará de uma lei demonstrada e palpável, de efeitos insuprimíveis esuas sanções comprovadas, razão pela qual governará na realidade a sendo imposta como uma obrigação a todo ser racional. Então se terá cotado a educação da besta humana. Não será mais necessário este pobre eco meio de que hoje se dispõe para domar o homem inferior, que é o terrsobrenatural e do mistério, onde se utiliza a ideia de uma divindade qvinga e castiga, a cujo poder os fortes se atrevem a desafiar e os débecurvam por medo, enganando-a com os subterfúgios de uma consciacomodatícia. Então se verá claramente a Lei, sábia e implacável em su

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xorabilidade, porque despojada dos véus e do mistério; surgirá um Deuvo, mais próximo e real, porque estará dentro de nós mesmos, em todcausas, contra o qual não é possível a rebelião nem a felonia.

Na civilização moderna, contudo, já se está levando a cabo um intens

balho de progresso, ainda que com uma orientação e concepção da vida pletamente diferente. Trata-se da ciência e do trabalho, instrumentos de eção que também devem ser incluídos no rol dos caminhos de libertação.

Que valor possui o frenético bulício da vida, palpitante de problemaslutas, ansioso de conquistas, triunfante com suas descobertas científicas, bordante de energia tão juvenil e de uma fé tão diversa, sem dúvida che beleza, ainda que primitiva e brutal? Ao som deste grito, a alma madufarta de tudo isto, não sentirá ter encontrado a vida em outras partes?

O leitor me perdoará se corto e abrevio, pois me impus ser conciso.Encontramo-nos diante de dois conceitos opostos. O primeiro se dnesta vida e neste mundo, onde pretende realizar um paraíso, que é sua meta. Com a ciência, estuda detidamente os meios e, com o trabalho, coos em prática. É todo um fervor de investigações e de ação, um assalinteligência às leis ignoradas da criação, para submetê-las ao seu próprioe ao seu próprio egoísmo. Um esforço de vontade, para dominar o mexterior e convertê-lo em um meio para o seu bem-estar. Este conceito te plasmar o ambiente de acordo com uma ideia e, efetivamente, transforde maneira assombrosa, para torná-lo a morada imperial do homem. Pse transforma a Terra, não transforma o homem. Se faz progredir tudocuida o valor maior, que, permanecendo ignorado, é subjugado pelo progmaterial, o qual, em vez de meio, tornou-se fim. O espírito triunfa somatéria, porém há, no perfeito equilíbrio das leis, uma espécie de desdaquela, que, mesmo cedendo o seu poder, absorve toda a atividade do e

to, escravizando-o, pois o prazer que experimenta para a satisfação dos jos é efêmero, desvalorizando-se com o hábito, e somente consegue aumas necessidades, que converteram o homem em máquina de trabalho. O estar material é uma arma de dois gumes, a qual, se facilita a vida, é tamuma cadeia que a oprime. Depois de haver pedido o sacrifício da maiatividade, que cria os valores morais, tão indispensáveis para a vida, deespírito no vácuo, desorientado pela carência de paz interior, que só dericonsciência de uma finalidade. Mas, sobretudo, não destrói a dor, cuja aça permanece mais perceptível do que antes.

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O progresso material pode, pois, ter o seu valor, mas somente quandosiderado como necessário ao progresso espiritual. Do contrário, os camda libertação se tornam caminhos da escravidão.

O outro conceito, inconciliavelmente hostil à vida presente e ao mundo

rior, aparta-se destes como de um mal irremediável, que se toma em consção para ser evitado. Descuida do ambiente exterior e não se preocupa emlhorá-lo, considerando-o não mais a realização de um desejo próprio, manas uma necessidade para harmonia universal. Alheia-se, assim, da exteride do mundo, sonhando com uma vida diferente e distante, numa aparên passividade. Sua alma vigilante percebe e sente outra realidade, encontrannovos poderes e uma percepção mais vasta; domina forças sutis, mais potcria os valores morais que regem o mundo; realiza uma expansão e umamação, perante a qual todas as afirmações exteriores resultam irrisórias.Duas concepções diferentes, que correspondem a duas evoluções: a datéria e a do espírito. A primeira é a conquista científica, a conquista econca, o aperfeiçoamento das relações sociais, o progresso lento da coletivitrabalho grandioso de organização e de cooperação, cuja importância néscio negar. A outra é conquista interior, que aperfeiçoa um único valconsciência humana; sistema radical para quitar os males da vida; sistemduo, reservado a poucos espíritos de vanguarda.

Duas riquezas e duas misérias: a miséria econômica, que pode ser lmente compensada por uma grande riqueza espiritual, e a miséria moralriqueza alguma conseguira remediar.

Seria exclusivismo querer valorizar mais uma coisa do que outra, execo progresso econômico, que pode, por sua vez, constituir o primeiro passoo espiritual. Seria visão incompleta apreciar apenas o lento e complicadogresso da grande alma coletiva, que se projeta mais para o exterior do que

o interior do indivíduo. Cada um, por si, é elemento insuficiente para o coto da vida. Trata-se de elementos complementares. Duas formas de evolu progresso material e o espiritual, que se complementam e se condicionamdendo a duas criações distintas: uma exterior e outra interior, as quais se vzam mutuamente, quase se sustentando reciprocamente, para ascender jun

A hipertrofia de um e a atrofia de outro, como acontece na sociedadesente, correspondem ao mesmo índice de desequilíbrio.

Se os dois conceitos parecem excluir-se por um inconciliável antagondevido à inversão dos valores, na realidade eles não são mais do que

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metades de um mesmo conceito, dois polos do pensamento humano: a masculina (concepção ativa e positiva da vida) e a alma feminina do universo(concepção passiva e negativa), destinadas a uma complementação fecundA própria humanidade parece distribuída como em um equilíbrio de p

segundo as duas metades deste pensamento. Possuímos no mundo doisde civilizações: a Ocidental e a Oriental. Possuímos presentemente o moOcidente europeu-americano, ativo, rico e poderoso, mas oco espiritualme o antigo Oriente asiático, inerte e pobre, mas forjador de religiões, de ffias e de crenças: a luz do mundo. Ė como se a humanidade tivesse desolhar contemporaneamente a vida em duas direções opostas, uma para zar tudo no presente, ignorando o mais além, e outra adiando toda a realização de felicidade para o futuro. Contudo existe um trabalho, pois, seguLei, todo progresso e todo bem-estar tem de ser ganho mediante um esadequado. Para que a matéria evolua, é necessário o trabalho. Para que orito evolua, é mister a dor, que, no fundo, nada mais é senão um trabalhorente, assim como o trabalho é na verdade uma espécie de dor. O deus urio da civilização Ocidental impõe um trabalho diário, assim como o espiritual do Oriente impõe todos os dias uma renúncia.

A verdade aparece dividida em dois aspectos, que são as duas metadTerra, mas nenhum deles sozinho esgota todo o pensamento nem satistodas as necessidades humanas. Unificados, porém, são uma só aspiraçascensão para a felicidade. O Oriente já não vive mais aqui em baixo,aguarda e prepara-se. Como um enorme tentáculo projetado no mistérmais além, respira ébrio de sonho outra vida mais distante. Esta ideia da ção evolutiva da dor, da criação espiritual através do isolamento, não p brotar senão nos povos maduros. A última flor e, talvez, a mais bela da vQuando se atingiu certa altura, parece que o ambiente terrestre já não

mais responder ao grau alcançado; desta impossibilidade de adaptação um desdém pela vida presente, uma necessidade de superação e de elev para encontrar no outro lado uma vida mais pura. A iminência de uma reção maior sugere, então, o pressentimento da vida nova, invisível para omais. Declinando e desaparecendo neste mundo, a alma lança o grito dressurreição. Uma vida maior, em convivência com diferentes organismoambiente extraterrestre, cuja existência a astronomia começa a vislumtalvez no mistério da subconsciência e do supranormal. Nossa civilizaçãodental, com suas máquinas, suas riquezas e sua moral materialista, cho

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com as velhas civilizações asiáticas, sem compreendê-las. Estas se cansde todas as experiências, a ponto de já ter perdido a esperança de uma fdade terrena. Aquela transborda de dinamismo e de ingênua fé. Esta in preensão de ideais da raça provocará choques formidáveis, dos quais bro

a compreensão e a unificação que compendiarão todo o progresso humanoResumindo, os caminhos da libertação são, antes de tudo, de ordem ma retidão, que conduz à justiça; a renúncia, que leva ao isolamento e à sução; a dor, que, expiando, neutraliza a reação da Lei e conduz à feliciSecundariamente, são de ordem material: a ciência e o trabalho, que tendedomínio material do mundo.

Estes são os meios da evolução espiritual.Este artigo – um desabafo de paixão ajustado a um desenvolvimento ra

nal – aproxima-se de seu fim. Desentranhando conceitos em contínua tformação da exposição preliminar dos princípios gerais, acercamo-noconclusões. Seguimos o fenômeno da evolução espiritual como um imdrama, através do qual a humanidade ascende da força à justiça, da dor àcidade, do mal ao bem, da matéria ao espírito, do ódio ao amor, do infercéu. Assistimos às cenas finais. Está por se resolver o grande fenômeno etual. Atravessa-se o momento crítico da superação biológica, pela qual o hentrará em uma nova vida. Quem sabe ler mais profundamente perceberáescrito, junto às argumentações que se coordenam em uma tese, algo maiuma declaração de fé, uma confissão ou, porventura, um testamento espiTrata-se do relato de outro drama tempestuoso e vívido, que culmina na monde tudo o que é humano se funde. Minha alma aflora sangrando, porém,madura, parte ao próximo impulso, ao qual chamo “Ressurreição”.

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II – A EVOLUÇÃO ESPIRITUAL NA CIÊNCIA E NAS RELIGIÕE

Sintetizo alguns conceitos fundamentais, a fim de enquadrar o argumem minha concepção cosmogônica. Não é agora a oportunidade de entr

explicações e, muito menos, em demonstrações, que nos poderiam muito longe.Tudo quanto podemos perceber no universo resume-se a três elem

fundamentais: matéria , que é a sua estrutura esquelética, o universo físico dinamismo mecânico que o sustém;vida , um dinamismo mais complexo, cocebida, porém, num sentido imensamente mais vasto, desde o mineral amem, existente também em outros corpos celestes; pensamento , um dinamis-mo ainda mais elevado, representado pelo psiquismo humano através dovos, cérebro e espírito.É difícil separar um elemento do outro, pois a passagem se efetua porlução, sem solução de continuidade. No fundo, trata-se de uma mesma tância, cuja maneira de existir é o transformismo evolutivo contínuo e por isso, manifesta-se sob formas distintas. Se a consideramos em sumeira fase, que vai da nebulosa à origem da vida, percebê-la-emos cmatéria ; em sua segunda fase, que parte do início da vida e vai até ao nmento do psiquismo humano, considerá-la-emosvida ; em sua terceira fasena qual este psiquismo se torna autônomo e cria um novo ser e uma novavida, concebê-la-emos como pensamento .

O universo, desta maneira, manifesta-se-nos uno e, ao mesmo tempo, posto. São três universos concêntricos que se compenetram e se enconintimamente ligados um ao outro, pois não apenas sustentam-se mutuam para elevar-se um sobre o outro – a vida sobre a matéria, o espírito sobrevida – mas também encontram-se em relação de filiação ou gênese suces

por evolução.Assim concebido, pode-se definir o universo como um fisio-dína psiquismo. Se indicarmos com M a matéria, com V a vida, com P o pensmento e com S a substância, poderemos explicar este conceito também cseguinte equação:

( M = V = P ) = S para indicar que estes três elementos, transformando-se por evolução uoutro, equivalem-se como formas sucessivas da mesma e única substância

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Sem nos determos em convalidar este conceito com argumentações cficas, comparando-o com a ideia da “Trindade-Una”, que se encontra emmuitas religiões, interessa-nos agora destacar uma circunstância fundatal: a forma de existência única e indestrutível é, e não pode ser outra

progressivo e incessante transformismo, quase uma irresistível necessinerente à própria natureza.Chegamos assim ao conceito de evolução; evolução da matéria, evol

da vida, evolução do espírito. Eis-nos aqui ante a evolução espiritual, qunosso tema.

Observemo-la, agora, mais de perto, relacionando-a com a evolução nica, tal como esta foi exposta por Darwin, de que já se falou bastanconceito da evolução da vida, lançado por Darwin, foi logo ampliado, c bendo-se uma evolução (cósmica, geológica, química) da matéria. Nãcessitamos voltar a estes conceitos, já aceitos pela ciência, os quais novirão de ponto de partida para proceder ao exame de uma nova evoluçã – aespiritual – ignorada em grande parte pela ciência ou, quando menos, anão admitida oficialmente por esta.

O fenômeno da evolução espiritual somente se manifesta no último esdo reino animal – que, no conjunto, encontra-se muito distante dela – sendoobservado unicamente no homem. Assim como um microcosmo, o horeflete em si a construção do universo e éuno em sua personalidade num oganismo tríplice, composto de uma estrutura óssea (matéria), de um conmuscular (organismo vital) e de um sistema nervoso-cerebral (organismquico), três partes que se sustêm e se erguem uma sobre a outra. Interessele não tanto pelo que representa seu passado, mas sobretudo por haver ddo, em razão de encontrar-se no alto da escala da evolução, de construcomo matéria e como vida, para, na sua fase atual, obrar e criar no cam

evolução espiritual.Com efeito, a evolução orgânica em nosso planeta superou o períodmaior impulso de novas criações e permanece estável, tal como, antemente, já se havia estabilizado a evolução geológica. Estabilizar-se sigequilibrar-se em formas quase definitivas, que não tendem a novas tranmações radicais, pois alcançaram a forma de maior rendimento. Assim cum dia, os grandes movimentos da massa terrestre detiveram-se e a cros planeta solidificou-se em forma quase definitiva, a evolução orgânica, clizando-se nos organismos da individualidade alcançada, tal como ho

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vemos, e tendo cumprido seu enorme trabalho para chegar ao homem, bém se deteve. Deteve-se? Mas o transformismo ascensional é inere própria existência. Os seres continuaram e continuam existindo. Existinifica progredir. Mas onde? Se não é possível que a evolução se dete

qual a nova forma a assumir, especialmente para o homem, que se encno ponto mais elevado da escala?Darwin demonstrou ao mundo científico a evolução orgânica do m

animal até ao homem. Com isso, ilustrou todo o passado, toda a histórorganismo humano. Mas, e depois? Atingindo o homem, Darwin calou-sse atrevendo a olhar o futuro, não sentindo e nem intuindo mais nada aléevolução orgânica já cumprida pelo homem.

Sem embargo, se existe um caminho ascensional já empreendido enão se pode deter, é lícito inquirir qual forma tenha de assumir a continudeste caminho, deste incoercível e progressivo transformismo ascensque é a evolução. Sobre que parte do organismo humano, então, há de isificar preferentemente sua ação evolutiva, esta grande elaboradora demas que é a vida?

A ciência moderna já considerou como insuficiente o sistema darwinde matar a vida para estudá-la, pois percebeu a necessidade de examinanimais não como cadáveres dissecados anatomicamente, como partes dorganismo morto, mas sim como seres vivos e em função, com o propde observá-los sob outro ponto de vista, analisando-os mais profundam para descobrir seus instintos e penetrar no mecanismo quase psíquico qanima e os vivifica, intuindo que tudo isso constitui uma forma de vida mmais importante do que a orgânica.

Se esta mudança de observação foi necessária para com os animais inres, que devemos inferir para com o homem, que os supera a todos? P

homem, o estudo anatômico dos órgãos poderá revelar-nos seu passadonão sua verdadeira natureza e o segredo do seu futuro. Sua natureza e seuro estão num psiquismo em desenvolvimento, cada vez maior, que tenlibertar-se cada vez mais de todo o suporte orgânico.

Se o sistema nervoso e cerebral é ainda seu órgão principal, este é le pelas condições da vida moderna, tão distinta da primitiva, a funcionartal prevalência sobre todos os órgãos e, portanto, a elaborar-se com tal dez, que há de prontamente invadir todo o campo da vida. Resultará da psiquismo tão intenso e preponderante, que em breve dominará todo o

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revestindo e definindo toda a sua individualidade, constituindo-lhe uma fde existência nova, refazendo-o e transformando-o em um ser diferentecomo se fosse uma nova potência espiritual, capaz de existir e evoluir seda, independente de seu último sustentáculo material, dado pelo sistema

voso e cerebral. Portanto, se este psiquismo, por um lado, terá como bassistema que é, por sua vez, o produto mais alto de toda a anterior evoorgânica, tenderá, por outro lado, a separar-se cada vez mais deste sistiniciando uma nova evolução autônoma e típica: a evolução espiritual.

Se queremos, pois, buscar no futuro a continuação da evolução orgâcumprida no passado, se queremos definir a forma da futura evolução humdevemos dizer que esta, logicamente, não poderá ser senão psíquica: evoespiritual, continuação lógica da evolução orgânica.

A vida do homem moderno já não tende mais, através da luta e da exência, a construir órgãos físicos. Com a sensibilidade nervosa e psíquicassimilará novas ideias, que, depois, serão inatas, formando novos háos quais hão de se transformar em atitudes morais, elaborando este novganismo psíquico humano que é a personalidade. Será ainda possível,dúvida, uma transformação orgânica que somente intente algum primesboço de psiquismo, não mais, porém, como fenômeno principal, e simnas como fenômeno subordinado, com efeito de caráter secundário, ddente da evolução psíquica, que há de guiá-la como dona, considerancomo meio para seus fins.

Deste modo, vivendo, o homem elabora a construção de sua alma, desevendo uma alma sempre mais complexa e potente, sentido no qual a almaser considerada um produto da vida. Um organismo novo tende a adquiriautonomia cada vez maior, que se cria continuamente e aumenta a cadaenriquecendo-se com todas as experiências pelas quais atravessa. Certame

o mais alto produto da vida, o qual representa o futuro da raça humana.Chegamos, assim, ao conceito da evolução espiritual, que foi aqui deldo. Observemo-lo ainda mais de perto em suas características.

Pouco ou nada se tem falado no passado com referência à evolução etual, porque o homem ignorou e nunca, anteriormente, viveu coletivamem vasta escala este fenômeno. O passado não registra movimentos espais de massa que possam ser comparados com os atuais, não tendo conhsenão casos esporádicos de seres intelectual e moralmente adiantados, piros do futuro, que viveram isolados e, apenas muito tarde e incompletam

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foram compreendidos. Somente os tempos presentes conhecem o despem massa da alma humana, sendo esta justamente sua característica prinPor isso pode-se considerar a evolução espiritual como um fenômeno emtemente moderno e, indubitavelmente, o fenômeno do futuro.

Tenho a mais viva sensação de que a humanidade está hoje ensaiand primeiros esboços de novas formas do ser; formas de personalidade que as individualidades espirituais do futuro. Voltou-se com ardor e firmeelaboração destes novos organismos, dotados de uma constituição totalmdistinta, obedecendo a mesma lei que forçou a natureza a ir buscar, atravrepetidos ensaios, nos albores da vida, as primeiras formas orgânicas,desaparecidas, mas reveladas pela Paleontologia: Pelicossauros (PermiPterossauros (Jurássico, Cretáceo), Plesiossauros, Ictiossauros, Dinossaos mais gigantescos, entre eles o famoso Brontossaurus. Eram formas de vida estranhas, mastodônticas, incompletas, destinadesaparecer rapidamente, através da luta pela seleção, para estabilizareem outras formas, com novos equilíbrios. Presentemente, tenho a sende uma igual efervescência de luta, de um mesmo fervor de criação, demesma rapidez na aparição e na desaparição das formas intentadas: monosidades grotescas, organismos espirituais anormais, almas estranhas, damente eliminadas pela seleção.

Sem dúvida, a evolução humana passa hoje por um período crítico. Alução, em sua primeira forma de manifestação – a matéria (seja cósmica, nhistória do sistema solar; seja geológica, na história do planeta; seja quína estequiogênese dos elementos) – completou-se, tendo alcançado seus gramáximos. A evolução orgânica, ato fundamental na história da vida snosso planeta, também quase completou-se e deteve-se. Em sua forma etual, a evolução inicia hoje um novo caminho com a criação de novas

cies psíquicas, individualizadas e distintas pelas características morfolóde natureza prevalentemente psíquica. Este representa o fato fundamenthistória da humanidade.

Classificá-lo-emos – num sentido mui lato – como fenômeno biológico porquanto a evolução espiritual, não sendo senão a continuação da orgânsempre vida, se bem que em forma diferente. Este fenômeno aguarda hohomem de ciência e de fé que o divulgue e o demonstre, assim como Dfez com a evolução orgânica; aguarda o apóstolo que o defenda e o gêni

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o revele, não já com os métodos da intuição, patrimônio de alguns eleitossim com os métodos racionais da ciência moderna, acessíveis a todos.

Sem dúvida alguma, a alma humana, que começou a despertar depoum sono de quase vinte séculos, consolidando hoje as suas primeiras con

tas nas grandes unidades nacionais, está colocada em contato com uma realidade, criada pelos assombrosos descobrimentos da ciência moderncontrando-se no ponto de afirmar-se definitivamente como organismo nomo. Isto, que podemos chamar a gênese do psiquismo, representa um tecimento novo na história do nosso planeta e da vida; um fato que recem sua grandiosidade, a primeira condensação da matéria nas formas plarias e o aparecimento das primeiras individualidades orgânicas da vida.

Trata-se de uma grande revolução da ordem, daquelas que explodem ntureza quando um fenômeno alcançou sua madureza, depois de um lentoodo de incubação silenciosa. Trata-se de uma revolução biológica, onde a criação, por evolução, de um novo ser; de uma superelevação da vidformação em massa de seres mais evoluídos, até constituir uma nova shumanidade do futuro.

O homem nada mais foi no passado – espiritualmente falando – senão umacriança em sua grande maioria, e isto é demonstrado pelo fato de que a hnidade, até agora, nunca enfrentou a solução dos grandes problemas do ccimento de forma racional, mas apenas acreditou no que os grandes, isolamais adiantados, haviam visto por si sós e revelado. Somente hoje a almmana ousou caminhar sozinha, coordenando os esforços de todos, com dos externos acessíveis a todos, em vez daqueles revelados nos arcanos mriosos dos templos; somente hoje ela passou a elevar-se em massa paravida autônoma, constituindo-se em coletividade consciente e independent

Estas últimas observações nos revelam um novo aspecto da evolução

ritual. Depois de tê-la estudado como evolução de órgãos e capacidadequicas, apercebo-me que posso considerá-la também sob um ponto de distinto, observando-a como a evolução de pensamentos e ideais. Tratase de um fenômeno sumamente interessante e, sobretudo, de igual mação, iminente no atual momento histórico, é mister não descuidá-lo,chegar ao fundo da questão.

Suspendamos, pois, por um momento – voltaremos a este tópico mais adante, na segunda parte (Métodos de Realização) – o estudo da evolução espirtual, considerada como superação biológica e gênese do psiquismo, e o

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vemo-la sob outro ponto de vista, examinando-a como desenvolvimen pensamento coletivo da humanidade.

Chegamos assim às portas de uma nova ordem de conceitos, que nos ferirá para um campo totalmente diverso: o estudo comparado das relig

Com efeito, o pensamento coletivo do passado está, em grande parte, conas religiões. Para traçar a evolução espiritual sob seu aspecto de “evoluç pensamento” é mister seguir a evolução das religiões. Encontraremos uconjunto de relações entre elas, todas concatenadas quanto ao mesmo fiseu desenvolvimento, que nos será dado ver e reconstruir a evolução dconceito único e constante, o qual permanece fundamentalmente idênticoda quando cresce e se aperfeiçoa continuamente, até alcançar, nos tempodernos, uma madureza de grandes proporções.

Poderemos desta maneira observar os antecedentes históricos que preram a atual maturidade espiritual, até ao triunfo da ciência de nossos dialigarmos este estudo ao outro, anterior e paralelo, o conceito de evoluçãoritual, esclarecido sob seus distintos e vários aspectos, parecer-nos-á completo e colocará um termo à primeira parte. Na segunda parte, voltarao ponto de vista anterior, para desenvolvê-lo ainda mais, tratando-o matalhadamente; falaremos então dos métodos para realizar e acelerar este nsimo fenômeno da época moderna, que é a transformação do homem em per-homem e a passagem para uma ordem de vida e de leis superiores.

A importância das religiões, como expoentes do pensamento coletivo pode ser posta em dúvida. As religiões são as grandes filosofias coletivúnicas nas quais tomaram parte as massas humanas, dando-se as mãos e do-se como se fossem a ciência progressiva da humanidade. O pensamdelas se enriquece, adquirindo potência e profundidade, à medida que, ada evolução, aumentam a capacidade e o poder da alma humana. Intuiçõe

gressivas da verdade, em forma sempre mais vasta e completa, relações dmens com o divino por obra de alguns eleitos e clarividentes, foram comudas por revelação a uma humanidade que compreendeu e pôs em prática lhe foi possível, mas que, absolutamente ignara em relação às concepçõ pranormais do subconsciente, aceitou-as na forma psicologicamente passfé cega, a única forma possível, dado o nível espiritual da coletividade.

Seguindo através da história das religiões o desenvolvimento deste ceito único e fundamental, encontraremos uma religião muito mais vúnica e universal, da qual seguiremos sua evolução, que é a evolução do

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samento humano. Religião que vai desde o vedantismo ao bramanismBuda, difunde-se pelo Egito, chega ao mosaísmo, para dilatar-se no crnismo e alcançar a ciência moderna. Avança em vagalhões, como um ocem tempestade, agitado e impelido pelo sopro do Eterno. Sobre esta

espumosa das ondas, relampejam pensadores, mártires e profetas de todtempos e de todos os povos. Cada uma de suas formas é um esforço dosamento humano para evoluir; é uma aproximação maior da verdade; étentativa da alma humana para erigir-se em um tipo de espiritualidade vez mais perfeita. Não é possível, neste escrito, seguir detalhadamente tória de todas as religiões da humanidade; será mister fazê-lo sinteticamlimitando-nos apenas às principais.

A evolução espiritual da humanidade pode dividir-se em três grande pas: o budismo, o cristianismo e a ciência moderna. Na antiquíssima Índia, o bramanismo, filho da sabedoria védica, havilizado – ainda que pelo sistema de iniciação secreta – a ciência do espíritoseguindo métodos de meditação e de disciplina ascética, chamados Ioga profundidades do mundo interior, descobrira alguns grandes conceitos, cquais havia resolvido os mais vastos problemas do conhecimento. Tudo porém, em uma humanidade ignorante, havia quedado necessariamente privilégio de uma casta e segredo de poucos iniciados. Somente com B – última flor do gênio hindu, surgida quando a civilização bramânica, esmasob o peso de seu passado, começava a cansar-se e a declinar – realizou-se publicamente o que o bramanismo havia realizado em segredo, e lançoumundo, fazendo-a pela primeira vez patrimônio de todos, a mais profundasofia da vida. Este foi o primeiro passo.

O budismo divulgou dois grandes conceitos, tão grandes que ainda hojse extinguiu o seu eco na moderna Europa. Estes conceitos são: reencarna

carma. Reencarnação significa uma série de vidas humanas sucessivas pamesma personalidade espiritual. Carma significa encadeamento, sucessãgica dessas vidas, seu desenvolvimento no tempo de acordo com uma lcausalidade, que, com perfeita justiça, cria o destino individual. Foi assimatravés do budismo, começou a formar-se na consciência coletiva esta gideia da evolução espiritual.

Afirmada a existência desta evolução com os conceitos de reencarnacarma, o budismo começou a realizá-la, seja através da renúncia, como de libertação e ascensão, seja através dos métodos de introspecção e an

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por intuição. Os misteriosos poderes do espírito – que ainda hoje permanecemvivos e vitais em um mundo tão diferente – conduzindo a novas formas dvisão psíquica e percepção espiritual, revelando e aperfeiçoando, voltinfluir até entre os pregadores do materialismo científico, causando per

dade ao homem moderno, acostumado a perceber tão-somente com os sene a investigar exclusivamente com a observação e a experimentação.O cristianismo dá um passo ainda mais gigantesco. Se o budismo v

evolução espiritual a fase da destruição da animalidade (supressão do drenúncia), o cristianismo observou a sua fase sucessiva, a reconstrução d per-homem; se Buda disse: “a evolução espiritual existe (reencarnação,r-ma); buscai-a em vós mesmos (introspecção)”, somente Cristo traçou, no m- po desta evolução, a realização completa de nosso progresso. Porém a dcia que separa o cristianismo do budismo se evidencia toda no problemdor. As religiões, realizando a evolução, não são mais do que formas dcontra esta grande inimiga, já que a missão da evolução é suprimi-la, emela constitua instrumento de felicidade, de progresso e até de bem-estar.

No fundo, Buda e Cristo partiram da observação desta lei atroz e prda animalidade, definida por Darwin como “a luta pela seleção do maisr-te”, da qual o homem não está isento e a qual não conhece piedade. No das formas inferiores de vida, a luta é uma necessidade inevitável, qugendra, como mal irreparável, a dor. Buda, movido por uma imensa piefoi o primeiro que expôs o problema de sua supressão e buscou um sisque cortaria o mal pela raiz, com o afogamento do desejo na aniquilaçvida e, por último, numa renúncia completa, que culmina no Nirvana, nabsoluta da libertação. Uma fuga da vida, para libertar-se dos males qusão próprios; uma negação global das dores e prazeres, estacionando n blime imobilidade.

Assim, a luta, que é a causa da dor, é atacada no desejo, sua primeira plantada no coração do homem. Sem dúvida, com ele, o problema da enfrentado com toda a energia.

O cristianismo, mesmo quando segue e completa o mesmo conceito, cmuito mais longe. O problema é exposto e resolvido de uma forma distmais radical. Se o budismo, para destruir a causa da dor, conforma-se – medi-ante a supressão do desejo – com o aniquilamento da natureza inferior no mem, o cristianismo, conduzindo-o completamente a outro nível biológicele ressurgir em um mundo novo, onde a lei atroz da luta pela seleção do

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forte – lei bestial da injustiça e da força – é superada, conseguindo desse modque a dor seja definitivamente vencida. Se o budismo se limita a explic justificá-la, chegando, através da introspecção, aos conceitos de reencar e carma, e ensina o modo de evitá-la através da renúncia, o cristianismo

zendo paixão, redenção e ressurreição, ensina a utilizá-la e amá-la como u precioso instrumento, que serve de alavanca para evoluir e edificar-se emvida mais elevada.

No cristianismo, a dor já não é a ameaça e o terror do homem, o inicontra o qual se luta, conquanto seja, por assim dizer, domesticada e cotida em força amiga e útil, para realizar a evolução espiritual, levando aaproximação cada vez maior da felicidade. Para tal inimigo do homem n pode vibrar golpe mais rude.

A transformação da dor, de instrumento de pena em um meio de felicinão só é uma concepção nova na história do pensamento humano, mas bém uma estrepitosa vitória, a maior revolução moral que jamais existiu.isto não é senão a boa nova predicada por Cristo. Nesta valorização da reside o significado do cristianismo, que é a apoteose da dor e baseia-se a vida do Cristo: o poema da paixão. Buda não teve paixão; ele adormtranquilamente no Nirvana. Eis aqui o profundo significado do drama daelevação, até aos mais altos graus dos valores humanos, de tudo o que havmais abominável – a dor. A cruz então se converte em símbolo de uma rgião, santificando o que o homem havia temido e odiado.

Vencer a dor, abraçando-a e amando-a e, ao mesmo tempo, utilizancomo o mais ativo fator de evolução, como um meio sempre ao alcancmão, para fazer do homem um ser novo, que vive uma vida mais elemais santa, mais feliz – este é o significado da redenção e da ressurreiçcristã. O budismo, embora o grande caminho já percorrido, não podia de

do algum chegar a uma tão profunda interpretação da vida; moveu todforças da inteligência, porém somente o cristianismo movimentou todforças do coração. Somente o Cristo ressurge. O cristianismo é uma elevimensa e cálida para a vida, entendida em uma forma mais digna. As pahumanas não são destruídas senão em sua forma inferior, subsistindoelevando para um nível mais alto; o paraíso cristão não é somente o descque deriva da negação da dor e do mal, mas é uma nova forma de vidqual o homem se expande depois de sua reconstrução espiritual, que é ressurreição e sua redenção.

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Isto, porém, não significa que devemos conceber um antagonismo entrdismo e cristianismo. Haverá, no máximo, contradição nas formas, extmente, porém, na realidade, não se trata de uma verdade colocada à frenum erro. Nenhuma religião constitui um erro, se ocupa o seu lugar. O cr

nismo é, simplesmente, mais evoluído e mais completo do que o budconsistindo na sua continuação lógica. Trata-se da evolução de um mconceito que, uma vez iniciado, avança e consegue uma perfeição maiouma relação entre o menos, que prepara o mais, e o mais, que pressupõe nos; uma complementação recíproca de elementos, indispensável para fouma religião completa. Temos assim um cristianismo explicado pelo budnaquelas partes (reencarnação e carma) que o cristianismo esqueceu emcaminho, e um budismo completado pelo cristianismo (redenção atravdor). Duas concepções não contrárias entre si, pois a maior compreende nor em seu seio; dois métodos, sendo o segundo mais completo do que meiro; duas filosofias progressivas, que marcam duas etapas no caminhevolução espiritual da humanidade; dois graus na mesma escala do proghumano; duas revelações aparecidas em distintos momentos históricosquais a humanidade se encontrava em diferentes graus de madureza; doiais de diferente potencialidade, que se subseguem no mesmo caminho.

Deixei de mencionar, por brevidade, as outras religiões do passado qudem vincular-se a estes dois troncos principais, como ramos laterais demesma árvore: seja a egípcia, que possui muita afinidade, em suas conceda vida, com a antiga civilização da Índia, seja a religião de Israel, que senão a preparação do terreno em que devia nascer o cristianismo. Estasgiões auxiliaram-se e sustentaram-se mutuamente, confiando-se a custódgrandes conceitos que deviam-se conservar, maturar e assimilar, transmitos, para que, uma vez cumprida sua própria função histórica, fossem ap

çoados ainda mais. Assim, profetas e povos foram elaborando, pouco a pcomo a construção de um grande edifício, a trama de uma religião mais levantada sobre os alicerces de uma verdade única, que se manteve conatravés das mais diferentes formas ao longo dos tempos e lugares, manifdo-se cada vez mais luminosamente.

Não falo da antiga Grécia, fenômeno espiritual mais complexo, qu por um lado contém e transmite os germes conceptuais do Oriente aodente, pode, por outro lado, ser considerado – na perfeita realização conseguida do divino no humano, na mais harmônica fusão alcançada entre o

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rito e a matéria – como um descenso daquele nesta e uma pausa no camida evolução espiritual. Especialmente se vincularmos o helenismo à aRoma (que careceu de conceitos espirituais, pois não podia possuí-los eideal de domínio material do mundo, conseguido pelo sistema da orga

ção da força), encontraremos nele a elaboração de um conceito distintqual, mais tarde, devia nascer o materialismo utilitarista moderno. Trade um materialismo primeiramente helênico, depois romano e, em segmoderno; uma concepção pagã da vida, que difere das concepções religdo ciclo examinado na evolução espiritual, porquanto – diferentemente daquelas – não se propõe a realizar a felicidade pelo desenvolvimento no mdo interno, mas sim dominando o mundo e a natureza com a inteligêncforça. Estes são os dois extremos do pensamento humano: espírito e ma paganismo e cristianismo, Ocidente e Oriente. O Oriente permanece inrente ante o mundo exterior, esquivando-se ao seu contato, para dedicexclusivamente ao aperfeiçoamento da personalidade humana, enquanOcidente, que triunfa hoje na moderna civilização europeia-americana, o ideal oposto. As duas concepções, no Oriente e no Ocidente, tambémse encontram frente a frente: o alcance da felicidade através da evoluçãmundo interior e exterior, cada uma apegando-se sempre mais a seu resvo ideal. Em outros termos, trata-se de dois métodos: renúncia e conqdor e trabalho; são dois adversários que se excluem, mas que, talvez, esdestinados a se unirem e a colaborarem. Levar-nos-ia muito longe, porexplicação das complexas funções destas forças colaterais que atuam ncivilizações de tipo distinto. Não nos cabe falar das ramificações mais rtes, que se diferenciam do cristianismo tão-somente em pormenores. Rnemos, então, ao argumento interrompido.

O cristianismo não se detém no caminho da evolução espiritual. A

de Cristo sobre a redenção do homem apenas se lançou na história do do. Em dois mil anos, a humanidade assimilou somente uma sua peq parte, permanecendo pagã e politeísta como antes. Fixaram-se soment – enem sempre em forma estável – alguns conceitos nas instituições que hoconstituem o patrimônio da civilização moderna: a civilização cristã. mos ainda longe da realização completa da ideia de Cristo, aquela quevangelhos chamam de“a vinda do Reino dos Céus”. Para realizá-la, serianecessário que a moral de Cristo saturasse totalmente as instituições; qformasse uma humanidade organizada sobre bases radicalmente difere

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sobretudo nos instintos, nas normas de vida, na fé dos indivíduos. A eção espiritual tem, pois, um grande caminho a percorrer.

Entretanto um fato novo surgiu neste último século: a ciência. Ela reprta, depois do budismo e do cristianismo, um novo grande passo a fren

caminho da evolução espiritual. A ciência moderna – se bem que, em seu começo, tenha-se excedido no afã de concluir, arrastada pelo entusiasmo d primeiro aparecimento e também por uma natural reação corretiva do aque as religiões praticaram; se bem que, tão logo nasceu, tenha-se fundimaterialismo, infectando o mundo de utilitarismo e fazendo o homem reder àquela animalidade na qual unicamente o havia estudado, produzindomo última repercussão) desastres coletivos dos quais a Europa ainda irá drar para se refazer – constitui um acontecimento novo na história da almamana. Se a necessidade de se afirmar a levou a exagerar desde o prinengendrando a atual civilização utilitária, necessariamente truncada e unral, este esforço de pensar por si mesma, com o qual a humanidade demter ultrapassado para sempre a menoridade da fé na revelação, é, no enmaravilhoso. Até então, a verdade – como já disse antes – era oferecida já plasmada pelos grandes solitários, os quais, tendo-a intuído com meios prios e excepcionais, comunicavam-na em seguida a uma humanidadesendo incapaz de encontrá-la por suas próprias forças, aceitava-a passivate. A humanidade, hoje, rechaça esta forma primitiva de conhecimento, odo, unicamente com suas próprias forças, olhar de frente o mistério. Éhumanidade em marcha para a sua idade adulta, que deseja olhar o mundoseus próprios olhos. Progresso! Este é o grande passo a frente que a hudade realiza hoje no caminho de sua evolução espiritual, porquanto todoadmitidos na investigação, na qual colaboram com métodos novos: a obsção e a experimentação. Todos aqueles que desejam e sabem, podem con

o seu grão de areia na construção do grande edifício da verdade, o que torresultados acessíveis a todos, através das formas de vulgarização do sabedemocratização dos conhecimentos anteriormente ignorados.

Isto há de conduzir a humanidade à sua madureza intelectual, para qu possa continuar, sem antagonismos, o caminho empreendido pelo budis pelo cristianismo. Sem antagonismos, pois, se os teve e todavia os possusão transitórios e relativos. O objetivo fundamental da verdadeira ciêncimesmo que o das religiões: a busca da verdade. E é justamente à força decar a verdade que esta ciência terá de chegar necessariamente onde jamai

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peitaria chegar: a demonstração da ideia de Cristo. É natural que ambos nhos se encontrem na meta, pois esta é a mesma, sendo distintas somenrotas seguidas para alcançá-la; por uma parte, a revelação; por outra, a ovação. A verdade, que é una, não pode variar pelo fato de ser alcançad

vias diferentes. É justamente esta – e não a realização de seu atual fim utilirio, que possui como meta apenas a realização de uma felicidade materi – afunção histórica da ciência moderna. Este é o seu significado como nova na estrada da evolução espiritual do homem: a demonstração das verdadeentão somente conhecidas por revelação, contidas nas religiões.

Estas perderão seu aspecto misterioso e inacessível, que tanto fatiga a talidade moderna. Suas lacunas serão preenchidas; seus antagonismos exres e aparentes, bem como suas discrepâncias entre as várias filosofias, parecerão. Adquirirão, com a demonstração cientifica, a evidência e a talidade que hoje as atormentam e se imporão – por assim dizê-lo – a todo serracional. Assim, a ciência moderna, seguindo a estrada e completando ado budismo e do cristianismo, assinalará a chegada do Reino dos Céus, cendo-nos o super-homem espiritualizado do futuro, com o qual realizaráfase ainda mais avançada da evolução espiritual.

Resumindo: ao budismo corresponde o mérito de haver primeiramafirmado a existência da evolução espiritual; ao cristianismo, o de havernado os meios para realizá-la. Corresponderá à ciência o de demonstrá-lvulgá-la e, em seguida, realizá-la.

Observamos de fato, em nosso mundo civil, um acontecimento sintoco de primordial importância para a história da evolução espiritual. Na E pa moderna, cadinho das ideias do mundo – em um período febril que quasraia ao neurótico, em um momento espiritualmente critico como o atuaqual parecem agitar-se as grandes ideias da história e das correntes esp

ais da humanidade – encontramos reunidas as três grandes formas do penmento humano: o budismo, o cristianismo e a ciência. O budismo anressurgido no moderno movimento teosófico, representa a ideia de reenação e carma; o conhecimento de métodos para encontrar uma consciinterior através das escolas do pensamento; uma primeira forma de purção espiritual por intermédio da renúncia. Estes conceitos profundos daga sabedoria hindu são necessários para explicar e completar a filosofiatã, que os estava perdendo no decorrer dos séculos. À teosofia neobuestá, desta maneira, confiada uma grande missão na reconstrução espi

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da Europa moderna. O cristianismo, nas formas de catolicismo, protestmo e outras religiões afins, representa a ideia da dor como função criano mundo espiritual; a missão de reconstruir a humanidade, reconstruinindivíduo; o conhecimento dos métodos de evolução das paixões e do

tintos, tendendo a realizar através destes métodos a transformação bioldo homem no super-homem, para fazer aparecer o novo homem espirituciência, em suas infinitas ramificações, representa a função de demonracionalmente as verdades reveladas e, com isto, divulgar as ideias connas religiões, para realizar na vida os postulados das mesmas; a fecunddas ideias dos grandes solitários mediante o esforço da série infinita ddivíduos; a missão de realizar a evolução espiritual.

Se, porém, cada uma destas três grandes forças espirituais representaideia, uma tarefa, um trabalho próprio, as três juntas tendem a um fim mmaior, que é conseguir fundir todas as concepções em uma concepção únmais ampla, fusão na qual se dará a unificação espiritual de religiões, filoe ciência, numa síntese de todo pensamento humano, para a nova religiãfuturo, na qual todas as sucessivas e diversas aproximações da verdadequistada paulatinamente pelo homem, encontrarão seu lugar, completandfundindo-se numa só verdade universal.

Temos notado, através do desenvolvimento da ideia religiosa da humade, a presença de um pensamento constante, mesmo quando este vai-se formando no tempo em um conceito único e universal, se bem que plasdiferentemente pelos distintos temperamentos dos povos. Existem, porapesar das distâncias de tempo e espaço, uma concordância de princípiodamentais, uma relação de partes, um aumento contínuo do mesmo n primitivo que não deixam lugar para nenhuma dúvida.

Ainda que, aparentemente, estas três grandes forças espirituais se en

trem em conflito, num contínuo estado de luta, tendendo a se excluíremdevemos nos alarmar com as aparências. Elas lutam pela necessidade urgente, que é afirmarem-se a si mesmas, se bem que separadamente, ddendo antes de tudo a sua própria existência. Sentindo-se cada uma delaelemento vital, indispensável ao futuro do pensamento humano, defendedesesperadamente, como se tivessem o terrível pressentimento de que se prio fim poderá prejudicar a reorganização futura dos mais altos destinespírito humano. Este instinto de conservação individual é natural e provcial, pois, no fundo, se as três forças se chocam entre si, isto ocorre tam

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para que se conheçam melhor, porquanto, na realidade, buscam-se pararem-se e sentirem-se, a fim de encontrar um encaixe que lhes permita adia a fusão. Se a preocupação pela própria integridade e conservação é, no indivíduo, a mais pertinaz, aquela outra, de conseguir achar um meio

uma fusão futura, se bem que menos visível, não é, porém, menos viva. três princípios, o budismo, o cristianismo e a ciência, acabarão por funna Europa moderna, transbordante de ideias, que continua sendo o cérebmundo, se bem que esteja bastante cansada pelo muito que lutou e viveu.

Nesta Europa ultramadura, a civilização fartamente avançada, antes quva iniciar sua regressão para extinguir-se, deseja brindar o mundo com a criação do pensamento humano: a religião sintética do futuro. Outros povOcidente americano, mais jovens e mais aptos para a luta, herdarão, comvêm herdando toda a nossa civilização, a nova grande fé e a viverão, parala mais adiante. Todavia, mesmo que a Europa tivesse vivido tão-somenterealizar esta criação, não teria vivido inutilmente.

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III – O REINADO DO SUPER-HOMEM

Ressurreição! O homem, libertado, ressurge. A evolução espiritual se pre. A grande lei da vida triunfa. Percebo o rugido da maré que avanç

mais profundos abismos e impele os seres a uma corrida desenfreada de asão. É o hálito da vida. Sinto a grande lei, princípio e força que anima overso, apressar, com o movimento lento e fatal de todo o seu complexo nismo de formas e de conceitos, este momento supremo, no qual todo o formismo fenomênico converge para este ponto culminante, que é a supe biológica, a transfiguração do humano no super-humano. Toda a vida seempenhada no esforço de forjar seu produto mais elevado no grande trada última síntese. De um mundo de luta e de dor, a alma renasce em luz nrespira a atmosfera rarefeita das grandes alturas.Antes de empreender o grande voo, há um ponto neutro do transformno qual a alma se retarda em vacilação e incerteza. A vida se desenvolvtão, como um canto cheio de nostálgica tristeza, formada por todos os sdispersos no vazio do nada, e, como folhas murchas do outono, caemapós outra as ilusões e as miragens. O canto morre em nostalgia sem napagando-se num calafrio quase mortal. Extraviada num deserto desolsem fim, a voz retumbante do eu se desvanece numa canção lamuriansonho. Com a entonação doce e triste da recordação, a alma canta descondamente. Seu canto é triste como um suspiro e, gemendo, afasta-se da Teeco distante dos amores perdidos ainda vibra no ar solitário, como músicce dos sentidos que se extinguiram para sempre. Recordação dolorosa. Nangústia mais profunda, que transborda do mistério, o último adeus à vidtua largamente, como que suspenso no vazio; em seguida, lentamente, para desvanecer-se num aniquilamento que já não possui voz, mas

somente um latejo de vibração interna. A vida humana dissolveu-se insneamente: eis o nada. Algo se delineia naquele vazio, como uma nebulovai-se dilatando, transbordando em outro esplendor. Uma estranha vida rce nas profundezas; uma sensibilidade anímica, num novo meio de perceabre par a par as portas ao eu esmagado, que vislumbra uma visão semelhaa um sonho. Eis aqui o supranormal inexplorado, em cujo umbral a almsoma estupefata e sobre o qual se manifestam as pseudoneuroses incompdidas do gênio e do santo. Eis aqui o super-homem solitário e sofredor, etiado dos ídolos das multidões, aturdido pelo bulício da vida, abstraído e

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to porque seu espírito nada faz senão escutar atentamente a canção semque se levanta de seu interior e sobe ao encontro do infinito. Na sua hipesibilidade torturante reflete-se o tormento sagrado da criação, em que senuda a beleza luminosa da alma. Estranho sonhador, absorto nos ócios f

dos que amadurecem sua ânsia interna invisível, padece uma paixão quse endereça mais ao homem, mas sim ao universo. Arcar com o peso degrande ideia – este peso que esmaga, assusta e oprime com uma sensaçãdesproporção e de miséria – é heroico.

Como se poderia calcular o custo destas conquistas, como descrever oma terrível que vivem estes espíritos doridos, que levam dentro de si a âncriação? Enquanto nós outros gozamos os frutos humanos, que aplacam persam as forças do espírito, eles se reconcentram, para intentar o esforç bre-humano; vivem de coisas imensas, de esperanças e desalentos inconveis, empenhados em lutas titânicas contra forças titânicas; pedem à vidalo quase impossível, que é a realização do ideal, sem descansar em prafáceis, sem qualquer possibilidade de jamais se conformar com a mediode, empurrados como num turbilhão por um trabalho incessante de evolComo descrever o terror de quem se assoma sozinho ao abismo dos grmistérios e percebe, sobre o limiar do supranormal, a visão de novas realisem limites? Como conceber a sensação de vertigem que dão certas altunatureza humana e como expressar a triste solidão da alma diante da desmrada inconsciência das massas, mercê da insuficiência de um mecanismosorial e cerebral que não consegue agarrar a parte mais verdadeira e maifunda da vida? Depois, a luta para ascender sozinho; a desvinculação atrolaços da animalidade, que, com frequência, constituem integralmente a vesforço, às vezes perigoso e malogrado, para forçar a aceleração do proevolutivo. Atrás de cada vitória, a vertigem de uma altura maior, até que

reça um novo mundo de grandiosidade arrebatadora. Dores e angústias re pensadas não mais pela humanidade, mas pelas forças biológicas. Dorecessárias para a criação de valores maiores: os espirituais.

Depois do exame da evolução espiritual como conceito, desde o ponvista científico até ao religioso; depois do estudo dos meios para realizá-lo ponto de vista social e espiritual, consideremo-la, agora, com um ritmorápido e vibrante, como um impulso de paixão, na plenitude de sua realizCompletaremos, desta maneira, mudando continuamente de perspectiquadro desta concepção, que é uma filosofia universal e completa da vida

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Vimos que os caminhos da libertação nos conduzem ao reino do shomem, onde se efetua a superação biológica e a cujos umbrais chegamnascimento do super-homem pressupõe a morte do homem, implica um mento e uma luta. Trata-se do isolamento do mundo inferior e da luta en

espírito e a matéria, entre o ser novo que, libertando-se, ressurge e a anidade que não deseja, mas deve morrer. Na desvinculação entre espírito e ria, na libertação deste novo ser que, impulsionado pela lenta maturaçãtempo, surge estranhamente num mundo novo, com novos sentidos, insticonceitos, existe todo um esforço de ascensão, toda uma laboriosidade dto, uma ânsia de criação, e isso somente depois de uma incubação milenáforça de acumular experiências e aptidões, crescendo e aperfeiçoando-seo trabalho da vida. Há neste processo algo que recorda, se bem que muitginquamente, o glorioso nascimento da vida no mundo orgânico – uma grandeconquista depois de um imenso trabalho e prolongado esforço.

Tendo já chegado ao máximo da evolução terrestre, o homem, avança mais além, apartando-se da animalidade que lhe era própria, para supetotalmente, com novas e mais vastas aptidões, até revolucionar a vida.

O espírito, aprisionado pela matéria já antes de nascer, no período pedo ensaio, debate-se dentro do organismo corpóreo insuficiente e preguicomo entre paredes de um cárcere. Urge-lhe crescer, mas o mecanismo srial já não responde mais à crescente vontade de perceber e de viver. novo organismo que é a alma deseja romper a carcaça, para expandir-luz do sol; deseja superar o passado e abrir-se nas rotas da vida, ressurno júbilo de uma renovada juventude. Este é o significado íntimo dos menos metapsíquicos, que tendem a normalizar-se, e das manifestaçõesvez mais claras do subconsciente na realidade cotidiana. Existe dentro dmesmos, e vai-se definindo cada vez mais, uma personalidade ansiosa de

própria. Grita sempre mais forte e golpeia desesperadamente o nosso intcomo se este fora a porta cerrada de um cárcere. É cada dia mais cast pela estreiteza dos limites do mecanismo sensorial e, naturalmente, expse cada vez mais, buscando lançar-se fora nas realidades novas e mais v para a conquista de uma vida independente.

Encontramos esta luta e este esforço perfeitamente descritos em muitasagens psicológicas da literatura mística, como, por exemplo, no sonho rdo no Capítulo XXV de I Fioretti , de São Francisco, para demonstrar que “santos”, seres biologicamente “adiantados”, viveram realmente este d

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íntimo, no qual o espírito ensaia voos e cai, mas depois se purifica e reforças através de outras provas, para volver a reiteradas tentativas, cainensaiando de novo até que, finalmente, consegue o voo vitorioso.

O espírito sofre na longa espera, mas o futuro lhe pertence. A matéria

naz em sua opressão, mas, como filha do passado, fenece com este.O homem atual oscila entre as duas fases contíguas, num dualismformas de vida que evidencia o transformismo ascendente. Observamodualismo em todos os valores humanos e agora voltamos a encontrá-homem. Apresenta-se-nos, assim, uma duplicidade de organismos emúnico ser, conexos e distintos ao mesmo tempo; juntos, mas não funddistanciados por uma rivalidade que é uma guerra sem quartel, para contar todo o campo da vida. No caminho da evolução, corpo e alma, matespírito – assim como força e justiça, dor e prazer, mal e bem – representamsimplesmente o passado e o futuro. Não importa se a existência do espí – essência destilada de todas as experiências da vida, que tudo concenconserva eternamente – por ser este uma entidade sutil e impalpável, é neda; não importa tampouco se, em muitos casos, a alma silencia, devido bilidade do seu componente físico. Trata-se para outros de uma realcontínua, evidente e indiscutível. Se ainda não é possível, para a sua demtração, executar uma exata anatomia espiritual, isto se deve tão-somefalta de meios sutis de investigação. Quem busca provas racionais parcontrar a alma atesta a sua própria involução. A alma, como Deus, ndemonstra; é sentida e alcançada dentro de nós mesmos, por intuição, por um esforço exterior de raciocínio.

Em alguns seres avançados, nos quais o espírito sente-se maduro uma vida própria e reclama a sua afirmação, em contraste com um organque não quer ceder seu campo e perecer, a luta pode chegar a ser terr

Aquele organismo, embora esteja destinado à eliminação, para ser inevelmente vencido com o tempo, resume toda a animalidade, constituincristalização de um passado que representa, pela sua massa, uma força impulso imensos. À chama ardente do espírito a matéria opõe a inércigrandes massas, agarrando-se como pesado lastro ao anjo alado, que se na impaciência do voo.

Podemos imaginar a vida não mais como um ponto, e sim como um que vai crescendo até cobrir um bom trecho do caminho da evolução. O eto é o seu limite extremo avançado, a locomotiva em marcha que devor

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tâncias, o chefe que vê, guia e manobra. A matéria é a massa que, emborvitando por inércia, garante a estabilidade; é um corpo que, mesmo dificdo, também assimila, fixa e conserva as conquistas realizadas, apesar estender ao limite oposto, do qual a vida vai-se afastando cada vez ma

espírito, que marcha à frente, em processo de contínua e progressiva criansioso por viver “mais além”, tem a seu cargo todo o trabalho da masendo o inimigo natural de tudo quanto vem arrastando atrás de si. A maem compensação, é um organismo animal, feito para abastecer-se a si me não às criações espirituais; é um organismo cujas células estão constr para as trocas comuns, e não para suportar as tempestades do espírito.organismo é o inimigo natural do espírito, que, para afirmar-se a qualqueto, impõe-lhe um trabalho pesado, chegando até mesmo a agredi-lo, comtenta-se matá-lo, a fim de libertar-se dele. Daí esse desequilíbrio que seincluir no patológico, mas que é somente um deslocamento do centro deum sintoma exterior de um intenso trabalho de criação. Dentro da vida etram-se o enorme trabalho do renascimento e a dor da morte. O espírito organismo em crescimento contínuo, que, no seu incessante renovar-smatando cada vez mais a besta no homem. Cada segundo é uma fraçãtransformismo evolutivo, na qual uma parte do ser morre e volta a nascermomento desloca a vida para dá-la ao espírito, subtraindo-a à matérianhuma criação é possível sem trabalho e sem dor. Uma parte de nós oudada a autoridade da Lei, que é um impulso irresistível de evolução, dev parar-se para ser abandonada e substituída por outra forma. A natureza inestá obrigada a este trabalho típico de reparação do mundo de hábitos e itos que foi seu, o qual deve extinguir-se. Isto não quer dizer que ela, sentse desfazer pelo ímpeto da borrasca, não resista por instinto de conservanão se rebele para não perecer. Apertada numa engrenagem que a vai e

gando cada vez mais, presa por uma sensação de asfixia e de terror da mela luta desesperadamente. Daí essa batalha interior, verdadeiramente éque é a maior de todas as glórias humanas. Drama laborioso e fecundo, atravésdo qual resplandece a função evolutiva da dor.

Existe um duplo trabalho: por um lado, o florescimento do espírito, ónovo que intenta alcançar cada vez mais solidamente as futuras formasoutro, o sofrimento e a morte de um organismo que, estando limitado emexpansões máximas, foi formado e afirmado solidamente nos séculos vivsob a presidência da mesma lei que agora o mata. Esta morte daquela pa

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 68

nós mesmos, que é em geral a mais sólida, pois data da herança dos insmais antigos, é o maior tormento. É o justo preço da conquista da evoluç

Não há dúvida que o caminho da superação, por ser feito de renúnciacaminho da tristeza e causa horror, encerrando, todavia, uma alegria que

pensa. Tais restrições não são sofridas pela totalidade do ser, mas som pelo organismo inferior, o único que grita, enquanto a parte mais nobre goza e se alegra ao vislumbrar nova e ilimitada expansão.

Encontramo-nos, também aqui, frente a dois conceitos inversos e commentares na função da dor, que, no mundo animal, é destrutiva e, no mespiritual, inverte-se em função criadora. O que, para os instintos infersignifica terror e morte é, pelo contrário, gozo e vida para o espírito. A eção se impõe sempre dentro de perfeito equilíbrio de justiça; não é poesquivar-se de um sofrimento, assim como não se pode recusar uma alQuem se entrega aos gozos do espírito deve sofrer o tormento da carne. Qse entrega aos prazeres da matéria sofre um contínuo desassossego, commorso da consciência, que não é possível abafar, pois despertará quando ilusão. Parece impossível uma posição de ócio, porque a evolução é lei irável, que nos impõe a conquista de nossa felicidade.

Espírito e matéria representam duas formas de vida tão diferentes, quenão pode contê-los ao mesmo tempo, sem dar a um deles a primazia comnoscabo do outro. Dois amos, dizia Cristo, aos quais não se pode servmesmo tempo: Deus e o Diabo.

A natureza do espírito é positiva, ativa, criadora. Sua necessidade supé dar e doar-se. Seu gozo é o altruísmo, o sacrifício.

A matéria, ao revés, é negativa, passiva, inerte; para suster-se, necessiceber e absorver continuamente do mundo exterior. Acumular constitugozo primordial. Cega e muda por natureza, não pode viver se não for f

dada e plasmada pela potência do espírito e reanimada incessantementseu abraço vivificador. Daí o egoísmo, a avidez de sua pobre vida refleinsaciável desejo de posse e de domínio. Se o espírito é tão inesgotavelmrico, que pode dar sempre sem se acabar jamais, a matéria é tão pobrenada pode dar sem sentir-se morrer. Sempre sedenta e famélica, ela é todras para pegar, feita para agarrar e entesourar, pois, nos mundos inferiordar importa em diminuição e autodestruição.

Disto nasce a sua atitude contraditória. O que, para o espírito, represelibertação, a separação dos vínculos de um mundo inferior, é para a mat

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desesperação da morte. Ela agarra-se ao espírito, disputando-lhe qualqucensão e sempre intentando sujeitá-lo aos seus fins. Estabelece-se desta mra, entre os dois, uma luta pela vida, contenda que será tanto mais árdua to mais forte e atrasado for o nosso eu inferior.

Não atendamos à sua voz desesperada. Heroicamente, deixemo-lo gr perecer, para vencermos assim a resistência que aperta cada vez mais as cas de nossa escravidão. Se soubermos superar o primeiro esforço, que é pre o mais penoso, experimentaremos no espírito, de imediato, uma sende bem-estar, uma alegria em nossa consciência, que irá aumentando à mque avançamos para o progresso, até que se forme em nós o hábito do mandA cada vitória, a matéria, mais debilitada, afrouxará o seu apertão, e o mento perderá cada vez algo mais de sua intensidade. Embora seja dolmatar a natureza inferior, este é o único meio para matar também a dorcomo vimos, desaparece com a libertação, pois a pena da separação dtotalmente da natureza inferior, não existindo para o espírito que se ten bertado desta. O sofrimento reside todo na imperfeição, na impotência limitações, que são inerentes à matéria, enquanto, para o espírito, esta é radiante da redenção e da vida.

O fenômeno da superação biológica, que nos conduz ao reinado do shomem, assume, pois, a forma de uma luta entre o futuro e o passado, enespírito e a matéria, efetuando-se mediante a renúncia, que poderíamdefinir como o processo de realização do transformismo evolutivo. O blema transfigura-se de superação em luta, de luta em renúncia. A renmanifesta-se sob dois aspectos distintos. Para o ser ignorante e passivonão se move senão sob o empuxo da Lei, há uma renúncia forçada, iminexoravelmente pela evolução através da dor, que é o caminho das gramassas inconscientes, lento mas inevitável, o caminho de libertação, q

examinamos. Mas há também a renúncia voluntária, caminho rápido, coente e livre, reservado para aquele que sabe e, espontaneamente, sem adar imposições, lança-se na corrente da evolução, seguindo-a ativam para acelerar o seu curso, buscando-a e utilizando-a como um instrumencaminho da libertação, ao qual aludimos e que estudaremos aqui. Duas las diferentes de progresso, igualmente necessárias, das quais não se esa não ser para sair de uma para a outra. Ou a dor ou a renúncia. Eis a excia da evolução, e a evolução é a vida.

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Dor e renúncia, portanto, nada mais são do que duas fases desta operTocam-se como fenômenos contíguos, que, partindo de pontos diferentesdem a um mesmo fim: a libertação. Retornemos ao problema da dor, parcomo esta se transforma gradualmente, até resolver-se no problema da r

cia. Chegaremos assim à explicação do significado deste conceito da renúo qual se torna absurdo e inadmissível, se o separarmos daquele da evolque a utiliza como instrumento de superação e ascensão. Estudaremosquestão mencionada anteriormente, referente à renúncia como meio de lição. Veremos como deve ser usado este meio, observando o dinamismo dfuncionamento, que nos conduz ao reinado do super-homem, onde, finalmrealiza-se a tão amplamente preparada evolução espiritual.

Deixei de enumerar entre os caminhos da libertação os sistemas da escola de pensamento e desenvolvimento espiritual, a ciência Oriental dalução, não só porque este estudo nos levaria demasiado longe, mas tam porque estes sistemas são adequados especialmente aos que podem vivisolamento monástico. Limitamo-nos deliberadamente à ordem das ideientíficas ocidentais e chegaremos à realização buscada pela Ioga com os da nossa própria psicologia.

A dor, contra a qual de nada valem a riqueza, a ciência e o poder, inexoravelmente em todos os lugares e sabe fazer-se sentir também naqque ignoram sua função evolutiva, impondo-se incondicionalmente a tEm contato com ela, o eu, saturado do mundo exterior, sente-se sacudsuas fibras mais íntimas por uma sensação estranha. A dor oprime, cerdas as vias de expansão para o exterior, obriga o impulso da vida a retiem ordem sobre si mesmo, para buscar novos refúgios em outras direusando rumos inexplorados. As forças, que de outro modo se dispersacaso se lançassem para o exterior, acumulam-se e concentram-se, para

compensação, dilatar-se interiormente, numa expansão diferente. O proso e a conquista de bens são os primeiros instintos da vida e a felicidaque o homem necessita. Tudo que os limita lhe causa pena, pois toda a nuição de si mesmo é dor. Encontrando-se rodeado pela dor, sofrendoeu agita-se freneticamente sob o apertão que o sufoca e assim, preso asespero pela necessidade insatisfeita, vê-se induzido a intentar outros m para realizar aquela expansão, que é a sua própria vida. Se está madurosofrimento e pelo conhecimento, então, ao defrontar a inexorável baque o destino opõe ao seu fácil crescimento externo, rebela-se com um

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premo esforço contra tudo o que é do mundo exterior, buscando outro nho em si mesmo. O impulso da vida toma assim outra direção, segu para o interior. A expansão encontra outra maneira de igualmente realizmas para uma realidade de outra ordem, saltando por cima das várias lis

e gozos. Assim, o sofrimento da dor se modifica em um mal benfeitorquanto, sem o seu aguilhão, não teríamos buscado o novo caminho. Umorientada neste rumo, a personalidade traça então um novo itinerário. Açando gradualmente, descobre que a vida humana não é a vida integral lumbra, mais além da mesma, um mundo imenso. Ocorre um fato estrancada golpe que parece acarretar a ruína, algo ferve e emerge do mais fdo eu. Cada vez que a dor aperta e parece reduzir a vida, algo se reconqnuma forma diferente, que, em compensação, a engrandece. Percebemoa dor nos separa e nos livra de um invólucro denso de apetites e sensaçõmedida que nos vamos despojando da animalidade, sentimos que a almlevanta para um mundo maior, dilatando-se numa potência mais vas percepção, numa forma de vida mais intensa, numa realidade cada vez profunda. Do mistério do ser afloram novas faculdades na consciência porque uma vida de provas pode conter grandes compensações no munespírito e, como recompensa, estimular essas grandes criações interioresna arte, na fé e na ciência, nascem sempre de uma grande dor. Seu valomo instrumento de evolução provém deste seu poder de penetrar e revonar, de provocar uma reação. A dor é, desta maneira, um grande estimue excitador de reações nas quais a vida espiritual se revela.

No mundo subumano, ali onde a dor é derrota sem piedade, o ser sofsombra, cheio de ira, em estado de absoluta miséria de consolo, de luzvida. É a dor do condenado sem esperança. O homem é sempre livre parasob sua própria responsabilidade, as forças naturais, podendo retroceder a

abismo, se não quiser esforçar-se pessoalmente para realizar sua libertSomente no mundo humano, o eu se reconcentra em si mesmo e pondera.As experiências se acumulam, o instinto as registra, hábitos melhore

assimilados, aptidões e capacidades espirituais são criadas, a alma comesim a sua expansão. No mundo humano, o espírito pressente uma recompuma libertação, levando consigo um raio de esperança. É a dor tranquiquem expia e sabe. Mesmo quando submetida ainda a uma aspereza extealma encontrou uma rocha aonde aquela não chega, outro mundo onde segiar. Domina assim a arte de saber sofrer conscientemente, vencendo a

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Deste modo, a dor recebe um valor totalmente novo, porque a mente a anadescobriu as suas causas e estudou as suas leis. Consciente de sua funçãolutiva, achou-a justa. Assim, num ato livre e voluntário, em vez de evaceita-a. Conhece a sua finalidade e utiliza-a. Sabendo que ela nada mais

não um trabalho mais intenso e fecundo, converte-a em instrumento de rção. Estamos num mundo novo, onde as leis biológicas se transformaramdor, o terrível inimigo, perdeu muito da sua virulência.

Passamos, assim, ao mundo super-humano, onde a dor, de fator negatmaléfico, transforma-se em prazer de criar, em amiga querida dos grandealavanca poderosa que regenera o mundo, em uma corrida para a vida. hino da redenção. Felizes os que choram. Aqui, a dor não é mais dor. A permanece, mas é a lei santa do sacrifício. O conceito de “dor -mal” e “dor -dano” transforma-se no de “dor -redenção”, “dor -trabalho”, “dor -útil”, “dor -gozo”, “dor - bem”, “dor - paixão”, “dor -amor”, por gradações sucessivas, numcontínua ascensão, até ao aparente absurdo do martírio, até uma Santa Tum São Francisco, um Cristo. A dor, então, transfigura-se. Parece esfumna mais profunda sensação da Lei, como um eco de mundos inferiores, qem cima, na glória da alma, não pode chegar.

Através da evolução, realizou-se o milagre da superação da dor. O e e aLei uniram-se em harmonia perfeita, sem possibilidades de violações, dções e de dor. Esta já não existe então como mal ou expiação, mas somcomo trabalho livre e consciente, transbordante de prazer, que é criar ummaior: o homem e sua felicidade.

É neste ponto que a dor se torna renúncia, a fase mais elevada da superAgora poderemos compreender o significado deste conceito, do qual está a vida dos“santos”. Aqui está como a renúncia deve ser incluída no rolcaminhos da libertação, porquanto significa isolamento da vida inferior,

desta maneira uma condição para ascender até um mundo melhor.Como tudo se transforma subindo a escala da vida! Como sofrem diftemente os seres nos mais variados graus de evolução, cada um à sua maeste, maldizendo; aquele, expiando; esse outro, bendizendo e criando!

Depende de nós o saber ascender para vencer a dor, o saber sofrer redo na forma mais elevada, para extrair do tormento da vida o proveito mmo do espírito. Saber reagir, aí está o segredo. Certamente é mais fácilmar-se e vencer no mundo mediante uma reação de força e de ódio, mas justiça e o amor são as reações dos grandes. Se o ser inferior não sabe r

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senão manifestando a sua baixeza, quem possui uma alma responde comreação que é um impulso para levá-lo além dos confins da vida Este, emsozinho contra todos, é grande.

É uma experiência – e nela está a eterna filosofia da vida – que nos ensina

a vencer a dor seguindo a evolução, superando as formas inferiores, afado-nos daquele centro de atração de todos os nossos desejos e paixões, o mundo exterior, ao qual o inexorável transformismo evolutivo se opõmo um furacão, convertendo-o em abdicação de formas transitórias e efras, para enriquecer o próprio eu com uma realidade mais profunda, concreta, mais estável. A criação dos valores será definitiva, o resultadtangível e invulnerável. Conquista-se uma fortaleza dentro do própriorefúgio supremo para as dores da vida, onde tudo, finalmente, encontra- paz. Tudo isto é uma atrevida exploração no mundo ignoto das forças profundas do ser humano. Não se trata de fácil aventura espiritual, mas stransformação da consciência, temerosamente transportada para além dano supranormal. Pode parecer fuga e destruição, e de fato é, mas é fugasubir mais acima e destruição para reconstruir melhor. Pode parecer um pécie de mutilação de aspirações e de vontade, uma supressão das senergias ativas num estado de passividade vazio do fecundo fermento dxão, como acontece na atormentada degeneração neurótica de algumas rões do Oriente. Mas é de fato sublimação da vida numa forma de açãoenérgica e mais viril do que o desgaste inútil da comum agressividade dganizadora, numa forma de ação mais ativa, porque consciente das fnaturais em meio às quais opera.

Meu ideal humano não é o super-homem de Nietzsche, figura primitivherói da força, mas o super-homem em que a vontade do dominador, a igência do gênio, a hipersensibilidade do artista e, sobretudo, a bondad

santo tocam-se e fundem-se. O lutador sobre-humano que se digna lutasomente contra as forças biológicas, e as vence. Um ser que é quase deraça nova. É o lutador da justiça, o senhor de todas as forças de sua pr personalidade, com o auxílio das quais sabe lutar conscientemente p bem individual e coletivo.

Existe no mundo o ideal do sacrifício, da dor voluntária e jucunda, acomo instrumento de grandes criações espirituais, ideal formidável que r peja no budismo e no cristianismo, acima do árido conglomerado de dogcatalogação de atos que, embora, para o vulgo, sejam uma necessidade

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para quem se eleva, cárcere da consciência. Este ideal me diz: sofre paramorre na matéria para renascer no espírito, age sozinho e grande, preso asagrada paixão de evoluir, divino dom, raro entre os homens. É o concefelicidade perfeita exposto em I Fioretti de São Francisco, repetido como m

xima das mais profundas filosofias, desde Cristo para cá, em todas as foconceito que, por ser incompreensível para a mentalidade moderna, inapresentar novamente, usando os termos do positivismo materialista.

Tenho a confirmação daquele fato indiscutível que é a experiência vcom poderosa fé por esses homens de vanguarda, os santos, que seguirammétodo para realizar suas ascensões, glorificadas pelo assentimento dos e pela veneração dos séculos. Se tudo isto não é uma utopia, se a santnão é uma aberração, se a humanidade não está louca e se, para venerar, jamos antes de tudo compreender, então esta concepção sintética é indisável. A santidade pode existir também no mundo moderno. Se esta chamvida espiritual assumiu nos séculos passados a forma religiosa monást base de isolamento e contemplação, nas ferozes condições da época, queam necessárias essas fugas; se hoje, para a nossa mente, aquela santidanos afigura uma utopia, por estar cristalizada em formas que já não se uela, entretanto, não morreu. Como fenômeno eterno, indestrutível, terásubsistir invariável em sua substância, mesmo quando mude de formaacordo com o progresso e a mentalidade moderna. Uma santidade nova, consciente, direi quase científica; uma santidade que, libertada das estfórmulas medievais, surja à luz do dia no meio de nossa turbulenta socieUm santo novo é necessário no mundo moderno, o super-homem, síntesedos mais elevados conceitos, surgido do budismo, do cristianismo e da cia, consciente de todos os valores morais que compendia, de sua força bgica, de sua função evolutiva; um santo que, superando a forma, liber

passado e dono do futuro, volte a lutar em nossa vida, com nossa psico“dominador” em perfeito equilíbrio entre tantas forças diferentes, e supheroicamente o choque das almas rebeldes e jovens. Se hoje o emble“força”, que se ja a força superior do espírito, seja a beleza espiritual quanima a manifestar-se viva no mundo, como um desafio, para que o muse não as compreender, dilacere-se e, dilacerando-se, aprenda.

Vimos o processo genético da santidade, o vasto processo de transfoção que conduz o homem até aos umbrais do reino do super-homem. Ena realidade, este momento crítico em que, depois de uma larga maturaç

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um novo psiquismo, o ritmo fenomênico se precipita na fase típica da espiritual: a conversão. Um “quid” novo, nascido do trabalho profundo espírito, está pronto. O transformismo evolutivo, com a sua marcha invvel, medida pelo compasso do tempo, chegou. Instante decisivo do des

mento de equilíbrios, quando a indecisão entre os dois mundos, o humansobre-humano, já não é mais possível. Este momento psicológico, que ponto crítico no qual se resolve o fenômeno espiritual, não é, por certoconceito novo. As escolas de pensamento chamaram-no “umbral”; as religi-ões ocidentais,“a graça”. Termos imaginativos para descrever, o primeum ingresso em um novo mundo, ingresso impedido pelas paixões e insdo passado, que, erigidos em vontade autônoma, funcionam como seres vcomo guardiões, e, o segundo, um descenso do sobrenatural no humano,de levá-lo num abraço fecundo para o alto.Os estados psicológicos característicos deste momento que preludia nascimento da superconsciência parecem estranhos. Depois da grandetoda a vontade parece ter-se acabado no ser. Então, extraviada a razão, dída a consciência e esgotada toda energia vital, preso a um total decaimnum estado de passividade que parece inércia, mas que é apenas o grau hsensível alcançado pela receptividade, o eu mais profundo da superconscdesperta e se manifesta.

É surpreendente a mudança (tal como uma criança que se converte emmem) verificada nesse tipo de consciência, que, entre as sensações de mrenasce tão diferente. Surpreende pelo fato de contrariar todos os cânonciência médica, pois, justamente durante o seu descenso vital, um organque parece finar-se revigora-se e sensibiliza-se, aguça-se e dinamiza-seceptivamente, engrandece-se espiritualmente, tal como se nutrisse a si mem mananciais de energia de natureza extraorgânica. Todo o mundo das

sações reaparece, mas tão fora do habitual e tão incontrolável a princípioassume as aparências incertas de sonho. Então a percepção, antes inseincompleta e, às vezes, errônea como no recém-nascido, vai-se precisfazendo-se mais luminosa e consciente. Período de controle, como uma lagem destes novos meios de percepção à realidade externa. Período no qconsciência, ao mesmo tempo que se alegra por sua acrescentada potendade, por outra lado se assombra com estranhos extravios, provocadodeslocamentos de sensibilidade, que constituem o seu maior tormento,sente que perde neles tudo quanto havia conquistado. Vislumbrar por um

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tante um mundo novo e, em seguida, como cego, não ver mais nada; que possui novas faculdades perceptivas e, de chofre, não saber mais uster provado o êxtase e senti-lo desvanecer; tudo isto é característico período de transição, que possui toda a incerteza da tentativa e toda a v

tuosidade do desenvolvimento.Todavia, gradualmente, a percepção anímica vai-se estabilizando, e o orienta. A mudança de consciência se afirma, e o novo eu, dono de novosmeios, retorna à direção da vida em forma diferente, já sem forçar a vonnum estado de sinceridade absoluta, como um eu diferente, que já nãmais eu, porque se integrou no todo; que não possui órgãos sensoriais eentanto, tudo sente; que carece de organismo material, contudo vive eque não possui voz, porém fala; que não raciocina com a lógica humantardada e analítica, mas conclui instantaneamente, através desta facumais rápida, profunda e sintética que é a intuição. Um eu que já não se d bra em um comando de vontade, nem se consome num esforço de enemas que “é” imediatamente tudo o que quer. A percepção, então, reali-setotalmente em forma de vozes e visões, por sensações que, ao invés do eor, vêm do interior e, seja impressionando o nível sensório dos centros nsos, seja elevando-os a uma ordem superior e própria jamais alcançadaqueles meios, dominam a consciência sempre com tal força, que as sções transmitidas pela via fisiológica-nervosa-cerebral do mundo extcomo que ofuscadas, passam para segundo plano. Daí a diminuição da bilidade e, algumas vezes, aquela invulnerabilidade à dor que muitos actam milagrosa; daí o sentido profético, telepático, as visões, os êxtasessem dúvida encerram um mistério não suficientemente explicado pelas teses patológicas. Estes estados escapam por certo à analise objetiva,somente se chega a eles pela introspecção. Não se trata de um fato exte

ser analisado, que se possa submeter à observação, mas de uma mudanconsciência, ou seja, do próprio instrumento de investigação. Deparamcom a falência da psicologia analítica, racional, exterior, que é considerarma de compreensão universal. Dir-se-ia que a superconsciência reprazão para o seu mundo exterior, porquanto já não lhe é mais necessáriatamos diante de uma forma de consciência, uma faculdade de juízo, que sabiamente a vida, se bem que com meios e sensações diferentes. Sabsomente que é algo que brota do íntimo mistério da personalidade, uma ciência que é independente do mundo exterior e possui a sensação de sob

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ver-lhe como consciência da vida eterna. Vive-se então diante da revelaçrealidades insuspeitas, mais profundas, além da forma, em contato comsência das coisas. É a visão apocalíptica da palingênese.

Superado este momento crítico – crise interna que existe na vida do gênio

do místico e que a moderna psicologia reconstruirá para compreender, açando assim algo que não podia ser feito pela mentalidade de outros tem – a consciência se estabiliza em um novo estado, numa atmosfera de grandde mistério que nos enche de espanto. Realizando um último esforço, façuma mirada audaz na alma do gênio e do santo, para penetrar o enigma dvida interior, sentir com eles a potência das forças motrizes de suas ativinão comuns, observar não mais o lado humano, lânguido e moribundo, mlado divino da vida. Veremos a glória dos triunfos interiores, o júbilo davas expansões, grandezas de conquistas e labaredas de paixões novas.mais veremos o aspecto negativo, de destruição e morte, mas sim o posde ressurreição e afirmação da personalidade. Olharemos com a coragemnos confere a necessidade de venerar e com a mesma fé dos grandes, quando a ousadia de havermos desejado compreender e imitar não nos servido para mais nada senão tornarmos a cair, numa vã tentativa de voo,dolorosamente ao solo e quedar aí mudos e assombrados, olhando ao lcom a nostalgia no coração, o cume inacessível do reino do super-homem

Como descrever os estados de superconsciência, a psicologia do suprmal? Aí, a normalidade retrocede com uma sensação de vertigem e de saterror. Como descrever estes estados de contemplação interior, em que otério do universo e o mistério da alma se olham e se compreendem? O aprofunda-se na íntima causalidade fenomênica. O fracionamento da realentre os obstáculos de espaço e de tempo é superado durante o estado supdo espírito que descansa na visão global do todo, êxtase com o qual o sa

recompensado amplamente da perda de todas as coisas humanas, de toddores e renúncias que impôs a si mesmo para alcançá-lo; arroubo subaonde o tormentoso torvelinho das ilusões humanas não chega, onde o deso é absoluto, o poder é imenso e a vida, que se multiplica em nova percanímica, corre caudalosamente ao encontro do infinito. É completo o goespírito que aceita o beijo divino, que se inclina para ele em labareda de Amores incompreensíveis, que abalam e quebram a débil tessitura humdemasiado frágil para suster seu ímpeto. O centro da vida se desloca, seuse eleva na hipersensibilidade própria do supranormal e parece nutrir-s

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mananciais exclusivamente espirituais, mediante um intercâmbio que se eem meio a forças de uma ordem especial, desconhecidas por nós.

A alma possui a visão da Lei, a sensação de seus atos, submerge-se ncorrente, respira a música que emana das harmonias da criação e se alim

deste respiro. Que vibrações do Cosmos encontrou e como as absorve? Dmodo sintoniza com essas vibrações do infinito?Os estados supranormais foram descritos diferentemente pelos místico

tamente porque essas sublimações de personalidade, assim como as filossão distintas segundo o tipo de temperamento de cada um. Resultam, porlução, de um longo passado. Possuem, no entanto, um fundo comum, elinhas gerais convergem sempre, de qualquer tempo e lugar que elas derinão deixando motivos para dúvidas. A superconsciência é sempre consecia da dor criativa da renúncia, é sempre o último termo de uma evoluçãinstintos, dos desejos e das paixões.

Há uma classe de temperamentos – os sensitivos ou psíquicos – à qual pertence o místico e na qual se pode incluir o poeta, o artista, o músihomem de ciência, o gênio e o santo. Aí, onde as qualidades espirituaimanas tenham se desenvolvido em alguma forma e a natureza humanaalcançado as suas faculdades mais elevadas, existe sempre um super-hoA humanidade compreende e exalta esta condição, que se encontra maisluída e posta em maior evidência pela oportunidade ou pelo ambiente,todas elas possuem pontos de contato entre si e coexistem mais ou mlatentes no mesmo ser. As qualidades de raciocínio, apesar de não smais do que luz fria, pois, mesmo quando clareiam o atalho, nada sabemlizar por si só, frequentemente movem-se em paralelo – prontas para excitálas – às do coração, despertando a paixão que obra e cria. Se os intelecagem num campo com as forças analíticas da mente, os emotivos e os

xonados constroem em outro campo, com a força intuitiva do sentimedo amor. Fecundidades distintas, porém necessárias e todas grandes, poa vida precisa igualmente de luz e de calor.

Frequentemente, o intelecto abre a rota, para, em seguida, arrastar atrsi o coração. Há quem chegue através do largo caminho da análise, há qufaça pelo atalho da intuição, mas sempre se alcança a criação de um tipsuper-homem.

Tratemos de delinear as características mais salientes da psicologia d per-homem, entidade de raciocínio e de paixão, qualidades fundamenta

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natureza humana, que não se destroem, mas se aperfeiçoam e se equiliem forma mais seleta.

Antes de tudo, uma racionalidade mais perfeita. A conquista da verdacompletou. A consciência move-se em plena luz. Não mais uma ver

subdividida, fracionada em tantas pequenas verdades particulares, incomtas e em luta, buscando a unificação, mas uma verdade universal que, rando-as, admite todos os pontos de vista dos indivíduos, dos temposcrenças e das religiões. Eliminada essa nulidade lógica, a consciência jnega mais nada, porque conhece tudo. Não mais essas zonas obscuras, ploradas, dentro e fora de si, essas grandes zonas de trevas que são os mrios. O mistério, necessidade da mente inferior e involuída, desaparecese luz até nas coisas íntimas. A Lei evidencia-se integralmente, tantograndes linhas como nos pormenores.Paralelamente, uma sensibilidade mais profunda. Um feixe de sentimnovos, que poderíamos chamar “percepção anímica”, permite o gozo de belezas, frequentemente despercebidas. Junto às harmonias da arte, do hoe da natureza revelam-se as harmonias mais profundas da estética moraldivina que, em vez da superficial beleza grega da forma, possui a mais ele íntima beleza do espírito. Mais do que a contemplação de uma ideiarealização em si da perfeição superior e da harmonia universal. É a conqde valores imperecíveis; é a criação de um organismo espiritual de eternaza, ao qual a vida tudo sacrifica – juventude, força, saúde, poder e tudo quande transitório a Terra ostenta. A consciência possui a sensação desta binterior, síntese de arte superior, e esta sensação constitui um prazer. Umva capacidade de penetração psíquica, que poderíamos chamar de inturevela sem sombras o mistério da alma. O organismo espiritual de todseres mostra-se desnudo; espontaneamente se manifesta a causa daquelas

teriosas atrações e repulsões chamadas simpatias ou antipatias, que são dades ou antagonismos, extrato de toda a história da personalidade huma bem certo que a alma sempre se reflete no corpo, através do qual se transparente, esforçando-se, todavia, para sair dele, a fim de se expressvremente. Mas o homem, com demasiada frequência, pretende construcorpo uma falsa imagem da alma. A intuição penetra sem esforço atravtoda a aparência, demolindo toda a astúcia. A superconsciência, que não te mentiras para si, não as tolera nos demais. Se as faculdades anímicas crem superioridade na luta cotidiana, combatem, deste modo, da forma

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aristocrática. A vida perderá por certo muitas das doces ilusões, mas, comtodos os seus erros e desenganos. A sociedade humana, vista claramenque é, e não no que pretende ser, aparecerá como espetáculo muito tristenem por isso resplandecerá nela com menos potência a justiça divina, nem

menos suave e perfeita sua harmonia.A consequência de tudo isto é um conceito diferente da vida, um estaânimo novo para com as coisas humanas. O conhecimento das grandes vdes, a solução das últimas interrogações, confere uma grande calma inter paz de quem viu a meta, termo último aspirado pela alma. Deste conhecto das verdades universais deriva o da própria verdade espiritual, do prdestino. O super-homem é consciente de toda a sua personalidade, da orde cada um dos seus instintos, que descobre no seu passado eterno, na hidaquele germe espiritual que, vivendo e tornando a viver, vestido de diferorganismos, adaptando-se, absorvendo, assimilando, sempre adquire umaqualidade em cada prova vencida, conservando eternamente dentro de frutos espirituais da vida. O super-homem conhece a sua história, larga ria, tecida de férrea logicidade, na qual nada se cria e nada se destrói, masse transforma e nenhum valor se perde. Sobre estas bases, na mesma flogicidade do passado e na indestrutibilidade das faculdades morais, antecseu futuro, prepara-o e deseja-o. Daí o domínio de todas as forças do preu, o saber comportar-se em meio aos grandes choques da vida, com umsão muito ampla e segura das grandes extensões das coisas cotidianas.superconsciência é, sobretudo, um fato espiritual, como tal repercute e s põe também na realidade exterior, dominando-a. Encontramos, assim, juuma sublime calma interior, a consciência de um poder dominador.

Nem por isso o furacão das coisas humanas deixa de açoitá-lo, mas fimitado à superfície. A consciência não sofre, porque se reconhece autôn

muito diferente e não mais identificada com o mundo vencido, podendogiar-se naquela parte do ser pertencente à vida eterna, fortaleza inexpugque guarda com segurança o tesouro de maior valor. Não sofre porque que a tormenta existe somente na aparência, que o caos é contraste transe que a grande realidade é o equilíbrio, o qual porá fim a toda desordem. equilíbrio, desaparece aquela estridente dissonância lógica, o tormento mdo espírito, que é não compreender o ambiente e pedir sem obter, pois seo absurdo. No mar de dissonâncias, isola-se num oásis de harmonia, ovida é mais linda. A profunda visão das coisas, mostrando também os

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mais vastos e mais distantes do problema humano, oferece em cada csensação da mais exata justiça, a grande fé e o otimismo absoluto, mesmfrente da dor. Toda posição social, por injusta e penosa que seja, aparece pre como a melhor. Via de regra, antes de inquirir que faltas individua

coletivas se está expiando (todos possuímos uma culpa por expiar, comovíduos, como classe social, como nação e como humanidade) e antes de preender a dor, remontando-se às fontes do mal, reage-se com atos de rebde ira, de inveja e de inútil ferocidade. O homem superior, ao contráriomente tem uma reação de benéfica atividade em reparar o mal, de reconstsilenciosa e consciente, realizando sozinho, sem transferir a responsabilidoutrem, o tremendo dever que lhe compete, porque sabe que o sofrimetrabalho fecundo de conquistas espirituais e, assim, muda cada pena em lho cotidiano, nobre e compensador, para o êxito. Então, o espírito, vivem relação com os mais distantes momentos do grande esquema de seu prio progresso, sobrepõe-se às misérias imediatas; a vida se transforma harmonia contínua, um canto de gratidão que é a música mais profundespírito. As dores humanas não desaparecem, mas diverso é o choque quferem a mente encouraçada e desprezível a sua força de penetração no esdefendido pelo conhecimento profundo, possuidor da virtude de se refug paraíso distante, aonde não chega a dor. É felicidade difícil e árdua, madúvida muito grande, a única que resiste à investida das duras provas da surgindo delas ainda mais bela! A harmonia interior – essa paz que provém dsentir-se sempre em relação e de acordo com o funcionamento orgânicuniverso, de achar-se sempre na melhor posição, qualquer que seja ela, odo coração da harmoniosa voz da consciência, de viver nessa fé, na lógica bondade do todo, nessa luz do espírito, como na própria atmosfera vivific – é saciedade de alma contente, equilíbrio de compensação psíquica, de

nasce a ventura superior e invulnerável.A libertação realiza tudo isso. A personalidade que se formou na vidarior já não é mais arrastada pelo torvelinho de todas as correntes do muntendo conquistado a independência das condições exteriores, converte-scentro de uma realidade própria e autônoma. O super-homem emerge doe a tempestade já não o envolve. Venceu o mundo, que já não pode mais vsua liberdade, deter seu trabalho nem alterar a realização da sua vontade.isso, ele não se ausenta de nossa vida, mas nela irradia luz nova, demonstque existe para todos o meio de remissão e também a possibilidade de a

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der. Apesar de todas as desigualdades humanas, há uma igualdade absemanante da eterna justiça, da qual somos todos obreiros no campo da prdiferenciação, sob as mais diversas formas.

Tudo quanto temos dito não basta para circunscrever totalmente o cic

personalidade humana, que, junto às exigências viris da mente, contém agências de ordem feminina, da paixão e do sentimento. A evolução, que cte e transfigura a personalidade humana em todas as suas qualidades, tforma, acrisola e enaltece também as paixões, sem destruí-las.

Existe uma evolução do desejo, uma evolução dos instintos, uma evodas paixões. Seria insensato condenar aprioristicamente e em absoluto ade existir, a ânsia da vida, que é o desejo. Ele é a mola de todo progresestímulo necessário para toda conquista, o antecedente daquela exteriorina qual, experimentando, a alma se engrandece. É a chama da ação, da lda prova indispensável à evolução. É mister conduzir o desejo para uma nua elevação, de modo a transformar todo o organismo dos instintos e a leza das ideias inatas, conduzindo o homem para as modalidades superiovida e de perfeição moral, que são as virtudes, as quais, ao longo do incestrabalho das civilizações, são concebidas e assimiladas. A vida social, agiões e as leis possuem a função de educar o homem, ainda selvagem iormente, penetrando em sua consciência, impondo-lhe a evolução dos inse das paixões, que são forças diretrizes da vida.

Observemos uma única paixão, a maior – o amor – que, presidindo à conservação, encerra mais profundamente o misoneísmo de raça e parece renitente à evolução, para vermos como esta paixão se sublima na persodade humana que estamos delineando.

Se o amor no mundo animal é função quase exclusivamente orgânicaquire no homem, enriquecido de novas faculdades pela evolução, quali

de ordem nervosa e psíquica. O fenômeno do amor complica-se; à fuanimal, que biologicamente foi a principal, sobrepõe-se, como um crescimou uma incrustação, um feixe de funções novas, que transformam todo nômeno, tornando a sua estrutura mais completa, e, como sempre aconteevolução, ampliam seu campo de ação. Para maiores poderes, porém, ma perigos, o que os seres menos evoluídos ignoram. Observando neste camcorrentes que a evolução abre dentro da massa humana, vemos hoje a tecia no amor para aperfeiçoar-se e sensibilizar-se, tendência que, aspiranoutra forma de superamor espiritual, oferece simultaneamente o perigo d

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der-se em degradação neurótica, em erotismo sexual. A humanidade encose defronte do dilema: ou bem materializar, mais do que elevar, o amor, cem formas de prazer nervoso mais intenso, porém de baixo erotismo antou bem dominar a sua paixão e guiá-la, orientando a evolução para as fo

de amor espiritual do super-homem.Esta característica tendência atual do amor para sublimar-se, revela-forma evidente na atitude da psicologia corrente e da literatura em vogata, sem dúvida, em matéria de amor, sabe ser às vezes de um psiquismonado, como nunca o fora em épocas passadas. Predomina nela o elemnervoso e sutil, tudo o que é fascinação, simpatia, graça, arte, música, vção e estados de alma, tudo o que é poesia e perfume do amor. Encontrnos indubitavelmente nos mais altos graus do amor humano, onde se aca parte espiritual. A voluptuosidade não é mais a turva orgia dos sentiaspira transformar-se em límpido êxtase de alma. Um passo mais, e o humano será superado. A humanidade está às portas do novo reino e ennele, se souber perseverar na tensão do progresso para a nova fase espie realizar o esforço supremo e decisivo de concentração de energias subir o último degrau, além do qual está o amor místico e divino. Estforma como os santos o conceberam, viveram-no e gozaram-no em êsupremo, não é a agradável digressão de romântico sentimentalismo, pomais tempestuosa das conquistas, na qual há que se empenhar todas as fda vida. É duvidoso que hoje se realize este trabalho, pois toda criaçãmanda mui áspera luta, na qual o espírito se tempera e se exercita, semzer e sem descanso. Dispersam-se as energias. A nova sensibilidade, ao de ascender, retrocede; ao invés de espiritualizar-se, torna-se neurótica cai. De sorte que o amor, na sociedade atual, mesmo quando alcança os elevados graus da finura, a ponto de parecer quase chegar à espiritual

do misticismo, recolhe-se sobre si mesmo e, antes de elevar-se de nívena a baixar, envenenado pela sua própria potencialidade. As novas facdes psíquico-nervosas, ao invés de serem utilizadas para progredir, sã ploradas para um maior gozo, última consequência da ruinosa concematerialista da vida. O cérebro e o espírito são postos a serviço do prChega-se, com tais critérios, a fazer misticismo sensualizado e falsifienervante e enfermiço, mediante artificiosas complicações e refinadas eorizações, enquanto impera no espírito o vazio e a desolação. Uma evoàs avessas, a mais completa prostituição da alma.

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Observemos, entretanto, na evolução do amor, as sucessivas aproximado superamento realizado pelo explorador do supranormal. Esta concepçamor divino como sentimento limítrofe, derivado por evolução do amomano, dá-nos a explicação lógica da sua origem. O fenômeno psicológic

tão, que existiu e pode existir, adquire uma base racional, de outro modoxistente. O amor divino proveio por continuidade (como em todo fenômdo amor humano e é semelhante a este, tendo conseguido, através de suvas provas e elevações, que somente demoliram a sua parte mais involaperfeiçoar-se e purificar-se. Ascensão de paixão, que faz parte da evoluç personalidade, na qual todas as qualidades se transfiguram numa psicoloordem superior. Poderemos desta maneira delinear uma gradação das fode amor. Cada ser, desde o animal até às raças humanas inferiores, deshomem inculto das classes sociais mais baixas até ao intelectual, ao santode maneira diferente, segundo sua qualidade ou perfeição alcançada. O sofre transformações profundas paralelamente ao desenvolvimento destdeia de tipos humanos. Sendo a maior força do universo, não pode deixarachar em todos os níveis da vida. O progresso é assinalado por uma revede amor cada vez mais ampla. Suas funções, desde as mais simples – nos seresinferiores, a multiplicação da espécie – desenvolvem-se com a infinita potecialidade do germe, complicam-se com novas atribuições que se subse por evolução, aumentando sempre o seu reino. A fêmea transforma-se emlher; o macho, em homem. A simples atração sexual cresce no amor matfilial, familiar, nacional, humanitário, para chegar à beneficência e ao almo, culminando na abnegação suprema do martírio. A mulher transformem anjo e o homem em santo.

Nesta progressão das formas evolutivas do amor, vemos exteriorizarecada vez mais energicamente, todas as defesas da vida, pois é função do

criar, conservar e proteger. As forças destruidoras do egoísmo são absorvanuladas gradualmente, num crescimento de altruísmo e de sacrifício, forças criadoras do amor. O altruísmo universal, que abraça todos os slhantes, nasce, não obstante isto possa parecer hoje uma utopia, do altrufamiliar, que é dele um esboço. Trata-se de uma força em evolução, qutempos melhores, será o cimento indispensável dos organismos sociaisgressivamente homogêneos, pois, quanto maiores são as concessões qvida de cada um se outorguem à vida dos demais, ou seja, quanto maiortruísmo, tanto mais forte é a sociedade e mais individualizada e conscien

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alma coletiva. A absorção do egoísmo no amor, esta inversão de forças crias, uma na outra, nada mais é senão um momento do processo de convdo mal em bem, da dor em felicidade, que já vimos efetuar-se por evol possuindo, assim, outras funções além da defesa da vida. O raio de aç

egoísmo, constituído de separatismo, é estreito e tende ao isolamento,suindo um campo limitado de penetração e de gozo. Não obstante parcaminho mais rápido para o prazer, contém, ao invés, uma força de inibiç próprio gozo. Se, em compensação, o amor, espiritualizando-se, transfornuma dedicação cada vez mais completa e gratuita, que parece a negaçã prazer, tudo o que perde, por não ser egoísta, ele ganha em profundidasensação, em potência de penetração, em pureza de percepção e de açãonhando por fim em realização de felicidade, porquanto a evolução do não é senão a revelação gradual de ilimitada capacidade de prazer. Estmenta e torna-se estável. Ao invés de satisfação precária, ligada a funçõgânicas, sujeitas a se cansarem com muita rapidez devido ao desgaste, e bra-se numa satisfação nervosa e psíquica, cuja nascente mais imaterial naltera e dificilmente se esgota. Nos fenômenos da matéria existe algo qcansa mais rapidamente. A imaterialidade elimina os desgostos que desmzam e confere estabilidade a tudo, tornando tudo mais real. Nela, em vlimitada sensibilidade do corpo, vibra a mais ampla e profunda sensibilda mente e do coração, órgãos capazes de sensações mais firmes e inteindependentes das condições físicas do ambiente.

Nesta ampliada capacidade de desfrutar, também satisfazem-se deseafirmam-se paixões de outra natureza. O desejo de posse e de domíniohumanamente insaciável, será satisfeito quando, por termos renunciadegoísmo, que nos separa de tudo o que nos rodeia, pudermos possuir e dnar o todo, aproximando-nos das coisas sem vontade de tomá-las e conse

do-as com o desprendimento do mais completo altruísmo. Deste modo s plica a renúncia e a pobreza daquele grande rico e enamorado que foFrancisco. Possui-se tudo então, riquezas sem limites, quando se sabe desta maneira a todos, com aquele amor perfeito que nada pede.

Estas são as maiores paixões que tanto dilatam a existência, vividassuper-homem e, a seu turno, pelas humanidades futuras. Para o homefuturo, certamente, as grandes satisfações serão de ordem espiritual. Ele rá por nós, talvez, o mesmo asco que sentimos por um animal mergulhadgrosseiros prazeres dos sentidos, semelhante ao que nós experimentamos

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distantes orgias romanas. Rir-se-á das nossas ânsias de riquezas e das n paixões, próprias de homens primitivos, pois valorizará, ao contrário, asfações proporcionadas pelo pensamento e pela arte, assim como outras,refinadas, infundidas pela criação nas belezas da vida. Entretanto é a

época, e não as passadas, que sente o afã dos superamentos e está elaborasua nova alma. Uma expressão manifesta da multiplicação do espírito mno vemo-la na evolução da música, índice dos sentimentos humanos, adeseja expressar atitudes interiores cada vez mais complexas e, fugindcediço argumento do ódio e do amor, elevar-se à descrição de todos os esda alma humana e da natureza, buscando novos rumos. Não mais a simmelodia que acaricia o ouvido, porém a harmoniosa arquitetura do canorquestração majestosa, tal como na forte concepção wagneriana. Músicaritual que se dirige não só aos sentidos mas também à alma, numa vozexpressa sensações de ordem superior.

Com esta evolução dos sentimentos e paixões, transita-se assim do humano ao amor divino. Para os não sensitivos, parece que a paixão, aoritualizar-se, desaparece no vazio, além de toda percepção, contudo elanas se desmaterializa. O superamor do santo é para ele uma satisfação elevadíssima, a ponto de recompensar-lhe toda a heroica renúncia. Éalegria totalmente interior, tão diferente das alegrias humanas, que, mmais do que uma atitude de espírito, constitui para todo o ser uma transração na qual o super-homem, através da negação de todo o seu eu inferior,reafirma-se e ressurge num mundo superior.

Este amor tão diferente é estranho ao nosso sexualismo, aparta-se dest por ser assexual, mas sim porque é supersexual, não podendo encontrmundo o seu termo de complemento, o qual deve buscar além da vida, nodas grandes forças cósmicas, no isolamento relativo e aparente, prelúd

seu regresso ao mundo de amor universal. Na solidão dos silêncios sem fsanto ama; sua alma hipersensível abre-se a todas as vibrações do infnum arranco impetuoso e frenético para a vida de todas as criaturas iEmbora nos pareça solitário, ele está com o invisível, a quem estende oços no êxtase de um supremo e vastíssimo abraço. Algo lhe responde dconcebível, algo o inflama e o nutre, num incêndio que reduziria a cqualquer outro ser humano. Crepita nele o amor que abrasa todo o universo. Num mistério de sobre-humana paixão, Cristo, sofrendo, abre de par em braços na cruz, e São Francisco, no Alverne, abre seus braços a Cristo.

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Estas são as grandes possibilidades da psicologia do super-homem cser de raciocínio e paixão. Uma observação mais, antes de terminar. O shomem, que é um tipo psíquico excepcional e, segundo o critério do nmundo, transborda as unidades de medida comum, foi sumariamente deg

do para o anormal. Devido à sua aparente neurose, foi grosseiramente codido com o patológico. Absolutismo e simplismo de sabor lombrosiano, dsiado primitivo para identificar e distinguir estas formas de pseudoneurosquais o patológico, se existe, existe transitoriamente, não como uma notafinada, mas como aparência exterior de uma íntima febre de ascensão, sistema do esforço de superamentos biológicos. Pretende-se incluir no antodo aquele que se excetua à maioria dos casos e à mediocridade geral dhumano mais comum, de valores duvidosos. Este julgamento apressadoduz ao erro de equiparar e confundir, colocando-os igualmente fora da subnormal e o supranormal, fenômenos que são sensivelmente opostos.

De acordo com o que fizemos notar, quando delineamos o fenômenevolução espiritual, hoje se torna cada vez mais frequente o desdém potipo humano que tende ao supranormal, extremamente nervoso e genial, que de genialidade atormentada. Será ele, por acaso, um enfermo ou um nerado? Como julgá-lo? A própria ciência, desorientada pelo fato de nãcontrar nos clássicos elementos de juízo a explicação deste moderníssimnômeno, vislumbrou nele uma enfermidade tão atípica, de uma ordem ctão indefinível, que se viu obrigada a considerá-la apenas como uma form personalidade. Observemos as suas características. Inteligência e ativicom uma nota predominante de intenso psiquismo; ágil mobilidade do es na ânsia de criação incessante; inquietude e fuga de todas as formas de innum constante desequilíbrio de concepção da vida. Moralmente, uma del percepção do verdadeiro, do belo, do bom; uma retidão que demonstra p

realmente os altos ideais de virtude, honestidade e altruísmo, que são a bavida social e indicativo de elevado grau de evolução, conceitos cuja elaboé o custoso e último produto de toda civilização, condição que a mediocrnormal está longe de ter alcançado. Quanto à sensibilidade, o sistema neé levado ao máximo da agudeza e da potência. Organicamente, o tipo geral resistente e de longa vida. O aspecto patológico revela-se no esgotato da energia nervosa, debilitamento da vontade, inconstância no esforço,tividade por demais acentuada, estados afetivos inexplicáveis e incuráEste é o quadro de muitos casos de neurastenia, enfermidade nova e est

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que, se às vezes é obscura e sem as características comuns, compõe-searistocratas da neurose, da mistura de sofrimento e inteligência, assoccompensadora e inexplicável num organismo que apresenta sintomas de dência. Que mistério se encerra nestes caprichos do patológico?

Dir-se-á que, na natureza, onde tudo tem a sua razão de ser, esta senszação dolorosa e espiritual não é mais do que o esforço de novas adaptaa rebelião e o tormento de um organismo ainda não preparado para satisas exigências da alma nova, que geme sob o peso de violenta criação bgica. Como seria possível explicar num sentido de enfermidade aspectocomparticipam de superioridade? Como explicar, a não ser com a hipóteuma pseudoneurose, sob a qual se esconde um labor incessante de criaçãessa intensificação de capacidades nervosas, mentais e morais? Então, interpretar esta inopinada dilatação de potencialidade anímica senão cteoria da evolução espiritual?

Sem pretender aprofundar a questão, demasiado vasta para este estudmário, das relações entre neurastenia e evolução psíquica, a fim de colocacomo elemento precursor daquela – um sintoma – encontramo-nos, na realidade, ante um tipo de personalidade que representa, por refinamento moral perior intelectualidade, a assimilação já efetuada dos mais altos valores esptuais, a formação completa do tipo para o qual a humanidade tende em sesenvolvimento. Encontramos nele todos os sinais de nobreza racial, de acracia, os quais encerram o acme da perfeição que a humanidade jamais aconquistar. Em sua própria lassidão e emotividade demasiado intensa, natação de sua inteligência e sensibilidade dolorosa, existe algo ultrarrefcomo de uma raça que, por estar excessivamente madura, agoniza e morremais um organismo físico predominante que impõe necessidades e sensao seu sistema nervoso, instrumento de sua vida, mas um organismo ne

preponderante, que absorve tudo para si, condiciona o funcionamento orge acaba por dominá-lo, transcendendo-o numa tentativa de quase criar puma forma própria de vida. A pesquisa no supranormal, o ensaio de novtados de consciência e a delicada espiritualidade deste tipo humano signiuma antecipação do futuro. Socialmente pode representar, se suas energirem orientadas para a utilização das suas qualidades raras, um precioso feto de sensibilidade e atividade, um raio de luz no meio da massa trevosmedíocres, dos sãos e dos normais, nos quais predominam a inércia e asções animais, pois, para estes, o mais alto ideal é a reprodução e a nutrição

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Existe, indubitavelmente, uma neurose patológica, mas, com abundfrequência, pretendeu-se atribuir-lhe uma série de fenômenos que perteao supranormal, desvalorizando-se desta maneira o tipo humano, que pouma função na economia da vida social e cuja multiplicação seria um in

de profunda transformação evolutiva da humanidade em nossa época. C bendo muitos casos de neurose como um desequilíbrio transitório, inerefase de conquistas biológicas, evitaremos a incompreensão que impede acia de cumprir o seu dever, que é estudar e valorizar todas as forças da Uma das conclusões do presente estudo é que a ciência se proponha a alcdois objetivos: nos casos de neurose patológica, se não se encontra a verdra terapia, que se realize então a prevenção profilática mediante a concrção de uma consciência eugenética; nos casos de pseudoneurose, auxitransformismo biológico, aliviar as dores que o acompanham, estendenmão piedosa e benévola aos seres que lutam sozinhos, talvez para criarraça nova, da maior importância para a progressiva domesticação da bestmana. A ciência deveria compreender que esta tendência à neurose, num do de leis que, sem dúvida alguma, obram com inteligência e suprema psão, pode possuir uma função no equilíbrio da vida. Deveria, portanto, trando nas profundidades do subconsciente, anatomizando o supranormadar a nascer e crescer este novo organismo psíquico que é a alma humana

Esta teoria da evolução espiritual pode ser uma ótima hipótese de trabA ciência deveria investigar nesse campo, que, contendo os mais inacessímisteriosos segredos da vida, promete os mais memoráveis descobrimen ciência deverá um dia, quando houver compreendido todas as leis da assumir sua mais alta missão, que é dirigir a seleção humana, fazendo-sedeste imenso fenômeno da evolução. Neste campo, o homem está até ho jeito cegamente, como um bruto, a leis naturais que ignora. Existem na

dade humana indivíduos indesejáveis pelas suas qualidades antissociais. a coletividade sadia deveria cuidar de sua higiene moral, impedindo o nmento desses seres em seu seio. Considerando a vida como imigração espal do além, não se deveria permitir à debilidade mental sua vinda, atraído personalidades afins, ao nosso ambiente pelo mecanismo da reproduçãogando-se-lhes um lugar entre nós. Há existências construídas de uma formque não constituem mais um prazer, e sim um tormento; vidas que, lonserem um dom, são uma condenação, e renová-las é um crime. Somentenova sensibilidade moral e consciência, que ainda não existem, basead

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visão de remotíssimas vantagens raciais e compensações individuais devida mais vasta do que a atual, podem realizar, nestes dolorosos casos ecionais, o necessário ato de abnegação, que não conta com nenhum apoopinião pública. Importa que o homem adquira uma consciência eugenét

finalmente, assuma a direção das forças naturais, que contêm os fundamda felicidade do indivíduo e da raça. Seleção principalmente psíquica, sede personalidade. Se os remotos antecedentes, obras ou crimes, estão ngredo do carma individual, as causas próximas e manifestas acham-se nrança fisiológica e amadurecem naquele primeiro templo de educação qu é oseio materno, onde a alma que está para nascer, em estado de passividademáxima receptividade, recebe impressões que são logo desenvolvidas cintensidade de sugestões pós-hipnóticas, como premissas indiscutíveis da

Por último, pedimos à ciência que nos dê o conceito científico de virtunos diga o que devemos elevar ou rebaixar na escala dos valores morais, tando-nos o que é detestável e punível, pois estão extintas ou em vias de ção nossas inadequadas virtudes tradicionais e convencionais, que corredem a posições espirituais já demasiado afastadas das nossas. Pedimomais a demolição, pois é muito fácil demolir, e sim a revalorização mais ciente e mais completa das velhas virtudes intuitivas, uma síntese e umafé para a nossa alma. Sentimos a vida em desacordo com os nossos paieixo do mundo se desloca do antigo centro ao redor do qual girou durantlênios, completamente modificado nestes últimos vinte anos5.

Definimos como racional, passional e pseudoneurótico este tipo compde personalidade que é o super-homem. Não obstante tudo quanto temosele poderá ainda parecer um tipo estranho, submetido a uma inútil exaltParece incompreensível, mas, se é certo que treme sozinho no umbral darose, de abismos e de terrores, pode por sua vez, ultrapassando os limit

sensibilidade comum, aventurar-se por esse maravilhoso mundo que entodos os êxtases, ignorado pela maioria. Esta, por certo, encontra-se a salalguns terríveis sofrimentos interiores, entretanto não pode gozar das sações do supranormal, mistério longínquo e fascinante, ao qual a animalhumana aspira, sem sabê-lo, cheia de desejo e de ansiedade.

Parece estranho que tal tipo não ponha o dinamismo de sua própria ção psicológica a serviço do bem-estar material e tangível; que não emp

5 Considerar que este trabalho foi escrito em 1932. (N. da E.)

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as suas próprias capacidades nervoso-cerebrais na defesa da vida, da q para a qual nasceu, utilizando-as para uma vantagem imediata, mas conse em instrumento antivital, quase de ofensa e de destruição de si me pois olha demasiado longe, vislumbra e deseja uma vida mais vasta.

inversão de todos os valores, este deslocamento de aspirações, este sacrdo real ao irreal, do presente ao futuro, do corpo ao espírito, esta imolaçhipotético e ao invisível é ato aloucado para quem não possui o sentidcertas realidades profundas.

Certamente, para aquele que vive no mundo superior do espírito e comende tudo isto, também é muito grave sentir, em seu próprio centro, nãcérebro aliado e amigo, que o ajude na luta árdua contra tudo e todos, macérebro que lhe faz guerra e, longe de secundar, ataca a vida, transformtodo o trabalho, complica os obstáculos e aumenta as penas, agregando oenorme do drama interior às dificuldades do mundo exterior, já por si suftes para esmagar um homem. Que terrível problema se tornará uma vida asuspensa entre a luta exterior e a interior, ambas sem trégua?

Contudo a ordem do espírito é irresistível. Se representa um peso, con por sua vez, um sagrado orgulho de si mesmo, uma consciência supremoutros não possuem. O organismo se gasta e se desfaz, mas não importa,seja como for, o fim, para ele, mais ou menos prolongado, é sempre o msendo que o valor da vida se estriba somente em dar-lhe um conteúdo eO super-homem ressurge em uma nova forma, que é sua, e somente ele, adquiriu, poderá gozá-la. Sabe que há uma continuação da vida na eternionde todos os males e todos os delitos se justificam e se compensam. possuir, acima de tudo, uma personalidade e um destino próprios, indepete da raça familiar, nacional e humana. O super-homem parecerá um absmas não o é menos a herança comum de ilusórios e fugazes prazeres, a

dade de trabalhos e dores tenazes, somente para chegar à morte. Todo proso foi utopia também; a utopia de hoje poderá ser a verdade de amanhãtemperamento de vanguarda que prepara, com risco próprio, as verdadesras. Se hoje ele trabalha e sofre sem ser compreendido, acumula dentrofaculdades e forças espirituais que um dia o admitirão entre os futuros nadores do mundo. Aos satisfeitos do presente, desta nossa vida tão hormente mesquinha e imperfeita, aos normais equilibrados no ciclo das fuanimais, que gozam e descansam, muito afastados das tormentosas lutas etuais, caberá, por seleção natural, a função de servos.

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No entanto não terá sido inútil – assim esperamos – esta excursão terras inexploradas do espírito, para descobrir nelas tantas esperançasterá sido inútil esta tentativa de reestruturação, por meio da psique e dda psique moderna, dos mais altos conceitos éticos, na procura de um

mais franca e mais sentida. Tentativa talvez malograda, mas que se jus por sua sadia intenção. Malograda talvez, mas que importa? Nenhumderivará para quem não persegue finalidades humanas, sentindo-se recom- pensado e satisfeito somente por preferir uma verdade já intuída; para conseguiu perceber as forças do eterno; para quem vive de uma chama na que nenhum sopro humano poderá jamais apagar. Mesmo quandogrito de uma alma se perde no vazio, sem encontrar nenhuma ressonnos espíritos, a evolução e a Lei não desistem, continuando o seu trabsem se precipitarem e sem jamais se deterem.

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IV – EXPERIÊNCIAS ESPIRITUAIS

Assim como se experimenta no laboratório científico, pode-se experimen-tar no campo espiritual e moral. Os elementos de que dispomos aqui p

investigação fenomênica, os fatores que se combinam, são fornecidos p personalidade humana e pelas condições de ambiente. Entre aquela e produzem-se contatos, choques, reações e combinações não mais de camolecular e sim moral, com as características de resistência, consumo dinâ-mico e, sobretudo, de desenvolvimento lógico, que obedece a uma lei supre-ma de equilíbrio, própria do mundo químico. Aqui, o fenômeno se eleva aum grau altíssimo e desenvolve-se como se fora um drama guiado por su prema lei de justiça.

Aquele que não vive tão-somente a sua própria existência vegetativatambém esta segunda e maior vida, que é a vida do espírito, realiza dentsi, continuamente, tais experiências espirituais. Seu material de observao próprio eu, que se agita nas infinitas circunstâncias da vida. É difícil obvar e experimentar sobre os demais, seja porque quase todos vegetam n perfície e não perquirem a vida no seu verdadeiro significado, seja poraras vezes, é possível penetrar no íntimo da alma alheia. É mister, portaauto-observação. Isto, porém, não basta, pois são casos de caráter partou relativos a uma pessoa, a determinado tipo de personalidade humanrestrito momento de sua vida e no desenvolvimento de seu destino. A rede não é nunca uma abstração de caráter geral. Em compensação, o fenôé “ver dadeiro”, ou melhor, existiu e foi vivido. É um fato concreto. Mesmquando se apresente como um fato “pessoal”, pode interessar como acoi-mento susceptível de investigação a uma determinada ordem de pessoadendo-se deduzir do mesmo consequências e conclusões de ordem geral.

Do relativo ao particular, podemos alcançar a melhor compreensão dauniversais, que tudo regem, pois sempre as veremos resplandecer, aindsejam nas menores experiências espirituais do mais obscuro entre os hom

Este prólogo era necessário para explicar que, ao desejar relatar aqui riências de ordem espiritual, não posso falar com a certeza de quem viu evou a não ser as minhas experiências pessoais. Trata-se de um caso “vivido”que pode tornar-se extensivo a casos parecidos e afins. O leitor tratará dcontrar nele algo de sua personalidade e compará-lo com as suas próprializações espirituais. Poder-se-á, por último, inferir do mesmo uma ded

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importante, no sentido de que as coisas mais simples da vida podem asum aspecto distinto e um significado muito maior, quando observadas emfundidade, relacionando-as com os infinitos elementos de que se compvida do espírito, imensamente mais vasta.

Vejamos o fato – nada importante, por certo, se considerado superficiexteriormente, como em geral se observam as coisas, mas de grande vaanalisado interiormente – tal como eu o vi e como, agora, passo a expô-lo.

Aos 43 anos de idade6, eu compilava por fim, como último termo e fecde um largo período de árdua investigação, a “minha” síntese da vida, a “mi-nha” visão universal, que me brindava com a solução dos grandes problfilosóficos e com a paz. Tinha de buscar e encontrar a minha verdade,quistar a minha fé. Sintetizei-a rapidamente, num artigo. Era a minha prsa inicial, inaceitável para mim sem um conceito, sem um ideal, apoiadanas em instintos, interesses, prazeres e ilusões, como o é para muita gPara concluir com conhecimento, devia primeiramente investigar e sabere assim o fiz. Foram vinte anos de estudo e de lutas, especialmente de de dor, pois tão-somente a luta e a dor nos proporcionam uma síntese comta. Fruto da vida, nela me reintegrava para viver. Não era uma abstrata trução ideológica. Eu nada havia perdido do juvenil “instante fugidio” emansiado por todos os humanos. Nunca tive que me afligir, porquanto aí, muitos encontram, na sua madureza, na culminação das realizações sonhno fundo das coisas, a sensação da transitoriedade do resultado e a presudo esforço, eu, em troca, havia descoberto uma vida que não teme a moacumulado valores imperecíveis, que nenhum ato de vontade humana e asidade alguma, jamais me poderiam arrebatar.

Dos princípios por mim identificados, uma das conclusões deduzidamais imediatamente correspondia à realidade da vida era a de que o home

desejasse viver segundo a justiça, não podia viver senão do seu próprio lho. Este era o meu dever. Na fase de atuação prática, sucessiva à da inveção, surgia bem nítida a impossibilidade de usufruir os bens hereditáriosas necessidades da vida, mesmo quando reduzidas às mais indispensávfim de deixar o maior lugar possível às necessidades do espírito. Aos trabde ordem espiritual, ignorados pela maioria, que justificavam em mimatitude, tinha que acrescentar aqueles demandados pela necessidade de g

6 Em 1929.

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a vida e buscar os meios. Não era loucura. São Francisco tinha ido muitoalém, levando as coisas ao extremo de reduzir-se à mais completa pobrez

Eu queria demonstrar a mim mesmo que esta concepção, consideradanosso mundo moderno como absolutamente utópica e irrealizável, era po

pô-la em prática, pelo menos em parte.Como Zaratustra, eu baixava do Olimpo dos meus estudos. Seria posenxertar, na férrea engrenagem econômica da vida moderna, um ser abtamente “self -made”7, ausente da vida concebida pelo mundo, dotado muitas preciosas qualidades, mas praticamente inúteis por não serem cociais nem lucrativas? O problema pode ser exposto em termos mais vaQue possibilidades sociais oferece hoje a humanidade civil a um intele puro, conhecedor tão-somente dos problemas espirituais, armado para menda luta pela vida somente de bondade e de justiça, ou seja, completate desarmado por estas?

Nenhuma possibilidade. Eis a resposta.Suas concepções projetam-se séculos à frente, estando muito além da p

logia atual para poder estar em contato com ela. A sua hipersensibilidaddunda toda em prejuízo. A sociedade moderna somente admite quem saibuma roda da máquina coletiva. Expulsa do seu seio, colocando-o à mar junto com os enfermos, os idiotas e os anormais, todo aquele que não drendimento concreto e imediato. A sociedade exige a normalidade; equipexceção destoante à insuficiência evolutiva. Vive do presente, e os valorrendimento distante escapam à sua orientação psicológica.

Há indivíduos cujo ambiente espiritual é o supranormal, cuja atividadirige para o inexplorado e que sentem estar no mundo somente de passa para realizar ideais que quase não interessam a ninguém. Percebendovida muito mais vasta, não podem absolutamente tomar a sério os instint

interesses e as paixões que hoje agitam o mundo. Hipersensitivos quevivem de cálculos e de raciocínios, mas de intuição, contendo em si todextremos de luz e de trevas, onde sofrem e ardem de uma febre de crcontínua; indivíduos que não fazem cálculos e nem tiram proveito de seu prio trabalho. Estes desafortunados pioneiros de um mundo futuro estãogados sob o peso de um ideal, sustentam sozinhos, sem que ninguém

7

“self-made man”- expressão inglesa que designa aquele que se fez por si mesmo, pessoalcançou determinada posição pelo próprio esforço. (N. do T.)

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enxugue uma lágrima, todo o trabalho da semeadura e passam incompredos, presos à visão interna que os espicaça inexoravelmente e lhes abtodas as suas energias, tirando-lhes toda recompensa material. Estes desdos, aos quais cabe na vida missão muito diferente daquela de ser hom

máquina, a sociedade os põe à margem! Não são admitidos, como pretenderia a atual sociedade humana, manão é tudo.

O que é esta pequena psicologia humana diante das forças imensauniverso? Sem que o saiba, são estas as forças às quais obedece a pcoletiva. O empuxo mais ativo, pelo qual são determinados os acontecitos humanos, deriva sempre dos imponderáveis. Estes nascem e desacem, não se sabe como. É um erro grave dos assim chamados homenação o desconhecimento das forças invisíveis e imponderáveis da vidaquais são dependentes. Nosso mundo percebe somente as causas próxmas as crises e os revezes nascem de causas remotíssimas, que correspoa um maravilhoso mecanismo de leis, ainda ignoradas e não levadas emta pelo homem. É pueril acreditar na possibilidade de sucesso, seja ele tivo ou individual, através de uma preparação imediata e próxima. Tudo ponde a uma lei, a um equilíbrio, a uma justiça. O destino de todas as csegue um caminho lógico, que não é possível improvisar.

Eis aí, então, como este tipo de homem também pode entrar em comção com o mundo humano, não porque este o admita, mas pela imposiçuma força superior. Aqui intervém um fator novo. O homem verdadeirate justo e realmente espiritual, qualquer que seja a sua fé, dispõe para ajuda de forças muito poderosas, pertencentes ao mundo invisível, que tram e governam tudo. Estas forças podem realizar o milagre de fazer vosa uma vida que também é baseada sobre a luta, mas luta que não utili

energias do indivíduo para agir de forma humana, pois tais energias posoutro endereço. Assim é o homem justo. Para ele, não existem margensatalhos. Estaria destinado frequentemente ao fracasso, se aquelas forçainterviessem em seu auxílio.

Não há de interessar ao leitor conhecer qual tenha sido a forma exteriluta sustentada por mim através dessa atividade mecânica do corpo e date, que hoje se chama“trabalho”.Preferirá conhecer minha visão internaobservação do fenômeno realizada por mim sob ponto de vista bastante lito, situado nas profundidades do meu eu, penetrando as profundidades d

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coisas. Interessa-lhe o testemunho, que aqui lhe outorgo, da contínua sção por mim experimentada acerca da presença dessa força e da maneirmo, incessantemente, ela me guiou; a visão claramente percebida da desta grande lei de equilíbrio e de justiça, que nunca se me havia manife

mais patente, que nunca se me afigurara de tamanha missão interventoresultado tangível foi, para mim, uma posição econômica conquistada breve período de tempo, depois de vencer grandes dificuldades com mabsolutamente inadequados para a luta. Mas a imprevisível e de todo inrada sucessão de acontecimentos, tendentes em massa para o resultado ob poderia ser um simples caso fortuito. O que me surpreendeu, e isso nãoser considerado acaso, foram as previsões realizadas, a estrada que mconstantemente assinalada sob a forma de inspiração, orientando-me nminho a seguir. A lei que, na ação, converte-se em força (aquilo que cmente se chama Deus, Divina Providência, etc.) assumia no meu caso a fde personalidade, ou seja, de consciência inteligente e volitiva, da qu percebia a aproximação, graças a uma espécie de tato psíquico ou espirEu sentia a sua presença não mais ao lado, mas sim dentro da minha coência. Nascia em mim a ideia que devia desenvolver – a inspiração. Essa personalidade me fazia companhia, dava-me valor, muito mais do que quaamigo ou pessoa querida deste mundo, com a qual a união espiritual nucompleta, enquanto a nossa fusão era íntima e perfeita. Nos momentos dvos, quando urgiam a ação e a decisão, essa personalidade agia e falavmim que, abatido e desalentado, comportava-me como um autômato. Mfestou-se-me, por último, em forma de uma voz interior que eu escutavcessantemente e com a qual sustentava colóquios e discussões, uma vesempre desejei discutir racionalmente todo ato, sem jamais me abandonfanatismo. E eu discutia. Mas, quando me recusava a obedecer, porque

zão e o bom-senso assim me aconselhavam, então a voz se tornava mai pida e forte. O conselho se convertia em ordem, a ponto de não me deix paz até obedecê-la. Em seguida, acontecimentos imprevisíveis davamrazão. Como sensação, não era uma voz sonora que impressionasse o o por meio de ondas acústicas, mas uma voz de pensamento, que chega aorito por meio de ondas psíquicas. Estas sensações da alma não se percsegundo nossos sentidos corporais, mas se manifestam numa só palavratir. Com firme convicção, dizia-me: “Atenção. Dentro de um ano ocorreisto; nesta data te encontrarás em tal situação”. Para aquele que, como e

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logo realizar-se tudo aquilo que, algumas vezes, parecia impossível comsonho, este pressentimento do futuro não deixa de ser impressionante. Pdemais, não posso oferecer outra prova além da sinceridade de minhas vras, aliada à ausência em mim de qualquer outro fim exceto a investig

desinteressada, com o objetivo de fazer possivelmente o bem. A minha pria convicção transluz na franqueza com que redijo este escrito. Ofertodos o que prometi: observar o fenômeno refletido na minha consciência

Examinemos juntos, mais intimamente, as características destas mantações.

Aquela força, concretizada sob a forma de uma personalidade, exteriova-se e interferia tão-somente quando urgia uma necessidade suprema efinalidade de bem. Portanto, nada de supérfluo ou superficial, nem simcuriosidade de experimentação. Manifestava-se e intervinha em circunstâgraves, na urgência imperiosa, na extrema necessidade. Somente então innha, deixando-me, no restante, livre com as minhas abundantes forças hnas. Devia encontrar-me em perigosa encruzilhada do meu destino, nateriam que se decidir, através das minhas pequenas vicissitudes humacontecimentos importantes, concernentes à minha vida maior (como a ttodos) na eternidade. Era preciso o perigo que, por minha ignorância e ddade, pudesse comprometer meu futuro nos séculos. Então, na luta titentre o bem e o mal, aquela força intervinha para restabelecer o equil Nestes momentos de perigo, em que a luta, por ser superior às minhas fameaça esmagar-me, sou libertado delas e, como todos, devo carrear a mcarga de deveres com a mais completa responsabilidade.

Essa força somente se me manifestou com finalidade de bem. A sua venção tendeu sempre à prática do bem. Fazem-me o bem e impõem-msua vez, o mesmo procedimento.

Onde existe o mal, ela jamais se encontrará; e quem obra o mal nuncanhecerá nem a possuirá.Por estas características, que a convertem em algo inerente à vida e às sua

contingências, vemos que esta força desaparece, tornando-se impossíveservá-la, quando nos aproximamos dela com a mentalidade imbuída decientificismo ou, pior ainda, com a curiosidade do “diletantismo”. Tr ata-se defenômenos novos, para o estudo dos quais é necessária uma nova ciênciaentre os elementos utilizados para gerar a observação do fenômeno, inclufator hoje incrível: nada menos do que a pureza de intenções e a elevação

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ral do investigador. Se essa força nega-se a manifestar-se com o objetivo de experimentação, surgindo tão somente nos grandes momentos críticalgumas vidas, infere-se que resulta ser quase impossível observá-la à vo Não se pode prefixar artificialmente o fenômeno nas investigações cientí

Trata-se, portanto, de fenômenos susceptíveis de observação, quando seduzem espontaneamente, mas não sujeitáveis à experimentação.A manifestação dessa força responde, pois, a um princípio de necess

e, portanto, a um princípio de bem. Observemos agora a sua maneira conduzir.

A sensação de sua presença nem sempre era nítida em mim. O atomento do organismo, a percepção mais viva das coisas próximas e imeda preocupação do meu espírito, que tomava parte ativa no esforço datiravam-me a tranquilidade e perturbavam as faculdades receptivas doser, impedindo-me frequentemente de sentir. Então, aos períodos de luz, duma alegria extraordinária, da sensação de força e expansão que me infuessa nova faculdade sensorial do meu espírito, seguiam-se períodos de camento, de solidão desconsolada e de abandono às minhas paupérrimaças humanas, das quais sempre duvidei muito. Naquela ocasião, tudo padestruir-se, como se meu espírito não resistisse ou não pudesse mantlongamente naquele estado de sensibilidade especial, mas apenas por amomentos. A força, entretanto, não se afastava de mim, pois, mesmo que voltasse a senti-la diretamente, eu percebia a sua presença nos efeitsua obra, num acontecimento predisposto, num problema inesperadamresolvido, numa dificuldade repentinamente vencida, num fato que advoa meu favor. Em seguida, a voz retornava, às vezes confundida com o parecidas, que, embora fingissem aconselhar-me, eram frívolas, falsas evadas. Desmascaradas por isto, fugiam logo. Somente o bem atrai a voz

dadeira. O bem é necessário à minha consciência, para que esta não pesua limpidez, como um estado habitual, uma capacidade de sutis vibraindispensáveis para perceber estas coisas. Essa força me deixava sozinhmomentos, não por minha culpa ou incapacidade, mas porque a sua inteção devia limitar-se às ocasiões necessárias. Nunca representou para muma ajuda supérflua ou um convite à indolência, tendo sempre cuidadnada fazer por mim, quando eu podia fazê-lo com minhas próprias força

Algumas vezes, permaneci como se estivesse perdido, sujeito às finimigas, que pareciam satisfazer-se em destruir. Por que essa força, que

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ria salvar-me, conforme me havia assegurado, me abandonava? Por quetão, a sentia dentro de meu ser dizendo-me:“Oh homem de pouca fé!”? Por que, durante toda a minha vida, assim que o perigo se tornava realmentve e minha barca parecia a ponto de se afundar, aquela força voltava e, c

por encanto, a tempestade se acalmava?Que são, pois, estes tremendos dramas interiores, estes turbilhões de sções extremamente invisíveis, estas angústias e estes triunfos no mundsuprassensível? E o que desejava de mim essa força?

Desejava não somente o êxito daquele determinado acontecimento,também e principalmente meu esforço, todo o meu esforço. Desejava quacostumasse a dar todo o meu quinhão, tão necessário para temperar espírito, plasmá-lo em qualidades mais elevadas, indispensáveis à mascensão. Impunha-me luta contínua, sem possibilidades de descanstriunfos não merecidos. Eis aqui a vida concebida como uma série de prirreais no mundo exterior, reduzido a um cenário em contínua mutaçãoreais no espírito, onde se gravam eternamente, em formas de novas quades. Provas que sucedem, investindo terrivelmente, como um furacãoque desaparecem espontaneamente, tão logo as tenhamos vencido. O segestá todo em não recusá-las, mas aceitá-las, tratando de aproveitá-las pnosso progresso espiritual.

Que nova concepção da vida nos proporcionam estas observações, e se modificam radicalmente as nossas mais costumeiras apreciações das cA própria luta, encontrada em todos os setores, nota dominante da vida hna, sofre uma revolução. Frequentemente, ela nos torna malvados, armnos uns contra os outros, como lobos famintos, e nos oprime como maldQuando concebermos a vida fora dos estreitos limites do mundo humanosuas realizações pueris e ferozes, então as nossas perspectivas, como cri

que desafiam o tempo, serão mais vastas e, para alcançá-las, não será necrio que apelemos para todos os mesquinhos meios da agressividade e dação, dos quais o homem lança mão para assegurar o prazer de um dia. remos viver e vencer sem lutar de modo tão baixo, agindo de comum acom a grande lei de justiça no caminho do triunfo.

Sei bem que é difícil aceitar uma luta tão áspera. A Lei pode parece princípio, um peso oneroso, mas logo se torna uma força imensa à noss posição. A lei de justiça nos ata as mãos, impondo-nos o comedimenvitória e a manutenção constante do equilíbrio, que nós, fazendo sem

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 101

melhor uso possível das nossas forças, não devemos alterar, animadosvantagem imediata. É uma amarra que nos coloca em passividade. Por ihomem justo, que jamais agride ou atraiçoa, aparece em nosso mundo um ingênuo, um inerme, destinado a ser rapidamente vencido. O justo

desarmado, enquanto que o forte sem escrúpulos, aguerrido e agressivoga mais rapidamente à meta. Porém este, abusando da sua liberdade, continuamente a ultrapassar os limites da grande lei de equilíbrio e, mquando goza das vantagens imediatas, está usurpando, porque lança antecipadamente de seu futuro. Os adiantamentos somam-se nodébito , quevai aumentando a cada dia e terá inexoravelmente de ser saldado. Antede justiça, o mal é um peso moral que gravita sobre a personalidade, ditando a ascensão do espírito para o Alto, onde se encontram a libertaçã paz. Por sua vez, o justo sustenta, tolera, sofre e, praticando o bem toddias, vai acumulando em seucrédito , atraindo para si as forças do bem, quirresistivelmente, o elevarão, assim como farão descer aquele que é domdo pelo mal. Por uma lei inviolável e fatal, o bem retorna sempre, comova de bênçãos, sobre aquele que o praticou, e o mal recai sobre o seu acomo chuva de maldições. São créditos e débitos cujo balanço a grandde justiça, que é Deus, não pode deixar de conferir. E deve fazê-lo, a fim denão se contradizer a si mesma, de não violar o equilíbrio, que é a sua ecia, de não desviar a corrente segundo a qual todo o universo se move.“Hu-milha-te e serás exaltado”, “Os primeiros serão os últimos”. Cristo mesmoenunciou a lei de equilíbrio. Praticai o bem! Este será o único seguro e lhor investimento dos nossos capitais humanos. A força tremenda do inofensivo será somente esta: a sua justiça. Sutil na sua elevadíssima pcialidade, que esmaga um Napoleão e faz de Cristo um deus nos sécEsta é a força que pode realizar o inacreditável, o absurdo social da vi

em nosso mundo de violências e abusos, daquele que não luta no sehumano. Esta é a força que nos pode auxiliar a realizar o milagre da susão da luta brutal, o milagre do superamento da animalidade, ou seja, o gre da redenção. Se o homem pudesse compreender que peso tremendo cem sobre a realização dos acontecimentos humanos estes impulsos quedo invisível, geralmente não levados em conta, por certo tremeria. Impinvisíveis, mas tão poderosos, que irresistivelmente dobram indivíduforçam acontecimentos. Podem penetrar, porque são invisíveis, e fazemvar, como se fossem palhas, os chamados“for tes”da vida.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 102

De tudo isto, podemos obter uma importante conclusão: a luta pela vidforma brutal usada pela sociedade civil moderna, não é de nenhum modolei inflexível da natureza. As guerras, as rivalidades comerciais, a compeindividual e coletiva de todas as espécies não são mais do que a consequ

da baixa lei animal, sempre preferida pelo homem, dada a sua psicologia. Não é verdade que seja necessário toda a coletividade compreender e suma lei mais elevada, para tornar possível cada indivíduo realizá-la. Asempre existirá, e mesmo quando apenas um a siga, ela está sempre prontlhe manifestar, ainda que toda a humanidade a ignore.

A observação destas minhas experiências espirituais proporciona-me consideração. Quando penso de quão intrincadas séries de fatos, contingêe fatores – entre estes os psíquicos, imponderáveis e mais imprevisíveis – sur-ge um acontecimento humano, não posso crer que a nossa vontade, porforte que seja, ou a nossa inteligência, mesmo quando agudíssima, possauma participação preponderante e decisiva em sua preparação. Não! Nocessos humanos, em todas as contingências da vida, existe um imensom- ponderável” que cobre três quartas partes do problema e nos escapa quascompleto. E este “imponderável” não é o acaso, o caos, a desordem, maum novo e mais profundo equilíbrio, que eu percebo e que possui suas nates distantes, na estrutura do nosso próprio destino, tal como nós o forjcom as nossas obras. É este o maior drama que vi através desta minha úexperiência espiritual. Esta é a visão que se me revelou durante a minhaMinha vida – um momento do meu destino – é consciente de sua relação coa eternidade em que estou vivendo, dando-me conta de todo o seu signifiDas minhas observações não se deduz a importância do meu destino, maa possibilidade, por mim entrevista, de contemplar a estrutura de qualquetino no tempo, ou seja, de prever o futuro.

Quando digo“prever o futuro”, refiro-me não a um futuro genérico universal, mas sim a um caso determinado, uma vida ou destino partiEstou convencido de que, num universo onde tudo é lei, equilíbrio e oronde cada fenômeno se desenvolve de acordo com uma proporção exacausas e efeitos e onde nada acontece por acaso, também o destino humnão pode estar sujeito à sorte, mas somente a uma férrea e matemática ctenação de ações e reações, em equilíbrios constantes. O fenômeno da com todas as suas alternativas materiais ou espirituais, desloca-se e avcontinuamente, mas sempre mantendo-se em equilíbrio. Nestas condiçõ

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 103

ele não ocorre por uma casualidade, mas de acordo com uma lei, então, do se conhece essa lei, pode ser previsto. O destino, tal como o é no preestá todo contido no passado e, tal como será no futuro, está embrionariate contido no presente, no estado de causa. Se soubéssemos observá-lo

poderíamos ler nele, rapidamente, todos os elementos de seu próximo dvolvimento. É aí, aliás, que reside a dificuldade. Quem se conhece a simo? Para um estranho, resultará muito mais difícil penetrar, de fora, nasfundezas desse “si mesmo”. Quem conhece a lei do próprio destino, ou sejasua natureza, a sua tendência dominante, o seu tipo? Cada homem traz cgo, com determinado modelo de personalidade e uma dada espécie de dea tendência para certas provas, perigos, triunfos, alegrias e dores. Mas ifacilmente tudo quanto para o seu próximo vai resultar em torturantes blemas. Para conhecer tudo isto, seria necessário tomar em consideraçãtras causas, que hoje o homem, a sua ciência e as religiões ignoram. Cseria possível conhecer tudo isso num mundo onde os problemas da perlidade humana apenas começam a ser estudados, onde muitos creem qvida termina com a morte física, onde muitíssimos ignoram que, antes dnascimento físico, tiveram um passado, que é justamente o que devem rdar e meditar, pois encerra a chave do presente e do futuro? Somente qutivermos sob as nossas vistas uma parte considerável da nossa vida ma pretérita, que se perde na eternidade, tomaremos posse dos elementos predeterminarão o futuro. Eu o digo a todos, impulsionado pela voz inda qual vos falei, que estes são os únicos e os verdadeiros problemas doro, aqueles aos quais se dirigirá a mente humana nos próximos séculos, solução redundará no real e no mais autêntico progresso. Muitas outrassas, que parecem mais importantes, não o são na realidade. Todos gozou sofremos, felizes ou desgraçados, sem saber por quê. Opomos à do

ções inconscientes. Somos uns pobres míopes, porquanto nada vemos dda morte e semeamos a esmo o bem e o mal. No passado eterno, que igmos, moram as causas do presente. Nossos próprios atos semearam as que sofremos. Pelo bem que praticamos seremos recompensados. Conmos no passado, livres e responsáveis, a nossa personalidade atual, cominstintos, tendências e aspirações, boas ou más. Assim como o caracol trói a sua carapaça, nós nos construímos um determinado tipo de destinose nos adere como vestimenta. Este é o“fardo”, nosso fardo particular, invencível, tirânico. No lento transcurso dos séculos, repetimos os nossos ato

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 104

similamo-lhes as consequências, até que se tornam irresistíveis e fataisram obra nossa e, com justiça, hoje gravitam em torno de nós mesmos. Nobra hoje é lei de divina justiça e não pode ser modificada. Contrastandoo campo de determinismo absoluto, criado pela trajetória percorrida e

todos os atos do passado, estão o nosso presente e o nosso futuro – um campode livre arbítrio absoluto – onde a vontade age, tornando possível a correçcontínua e o endireitamento da rota no sentido que livremente desejarmoação combinada de todos os nossos atos do passado, já fixados em nós, ta contínua retificação que nos é possível fazer, resulta o futuro, o nossoro, que é deste modo constituído por dois elementos: um fixo, já cristalie outro móvel, devido à nossa vontade, que continuamente se sobrepõe le, modificando-o. Da influência recíproca destas duas forças, uma passoutra ativa, resulta a trajetória do futuro, que, desta maneira, pode ser ccido, devido também ao fato de que, em parte, podemos querê-lo e criá-l

Hoje, porém, quem se rege por esta ordem de ideias? Para poder efetuvestigações introspectivas tão profundas, é necessário uma grande limpidespírito e um poder muito forte de visão interior. É mister mover-se nummosfera espiritual elevada, ser iluminado por uma luz interior, que não seimprovisar, nem explicar ou ensinar, porquanto somente a compreende qu possui. É preciso uma contínua retidão na prática e pureza de consciê porquanto somente neste estado os órgãos da percepção anímica se refinaalcançar a sutileza e a sensibilidade necessárias para perceber certas delisensações interiores. Tesouros imensos, revelações inauditas, faculdades diosas encontram-se em nosso espírito. Nada, entretanto, é tão pouco apado para no-los mostrar como os sistemas turbulentos, prepotentes e matda nossa moderna civilização. Certos fenômenos não se dominam com a da mente, mediante hipóteses engenhosas e habilidades cerebrais. Frequ

mente, o mistério não abre as suas portas a não ser àquele que, humilde fundamente, ama, mas ama no sentido mais alto e espiritual.Conclusão. Com este escrito deixo o meu testemunho. Tive que obede

minha voz interior, sob cujo ditado escrevi rapidamente, sem refletir, a pde não saber se me compete referendar este artigo com a minha assinatura

Torno a afirmar a objetividade das minhas observações, a sinceridadminhas palavras. Sempre concebi a vida como uma experiência espirituatende a uma conquista moral. Este conceito, levado agora ao mundo prda luta pela vida, proporciona-me ótimos resultados. Estas experiências

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rituais, que acabo de expor, reafirmaram a minha fé. Sinto que somenalmas puras e justas, onde quer que se encontrem no mundo, poderão preender-me. A elas, o convite para ensaiar estas maravilhosas experiêespirituais, que comprovam o triunfo do bem. Para elas, a esperança q

seu destino, pelas ações do passado, contenha as mesmas forças, que delevá-las cada vez mais. Para elas, o meu cumprimento fraternal e o voque a aquiescência que nelas possa suscitar a palavra de fé que me anresulte-lhes em consolo e ajuda no terrível momento da luta e da dor, todos, igualmente, nos espera.

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TERCEIRA PARTE

VISÕES

O CANTO DAS CRIATURAS (1932)

Caminhava só, em uma hora de folga, pela campina extensa. Não sabia como fazer-me companhia e, por isso, atentava nas coisa

me cercavam.Olhava-as com sentimento de amor, e elas me respondiam com senti

to de amor. Lentamente, o meu olhar se transformava em olhar de soenquanto a minha alma, que no silêncio aflorava, reencontrava e sentiama das coisas. Além da maravilhosa harmonia da forma, eu percebia na ve-getação a vida.

Oh! A minha alma vê. Cada pequenina planta possui a sua expressão de eu a sinto viver, vejo-a olhar-me. Maiores, as árvores são fortes e sevmas todos são seres simples e bons, que desconhecem a ferocidade dosmais. Por isto, a sua companhia irradia tão grande sentimento de paz... M

amo os pequeninos vegetais, as plantinhas tenras e jovens, que oferecemfrescura, desabrochadas do mistério à luz do sol, com uma dedicação tão com- pleta, com uma tão feliz ignorância de todos os horrores da vida, que eu jaria abraçá-las, tal como se deseja abraçar a criança ingênua que vem àcheia de alegria; desejaria beijá-las como almas irmãs.

Também elas me amam e confiam-me o segredo de suas vidas: “Não pedi-mos senão morrer para que a tua mais alta vida animal floresça. Nós somhumildes servas da tua superior vida orgânica, tão completa e tão com para nós. Nossa ambição é nos sacrificarmos por ti, a fim de possibilitar-tvida orgânica da qual sabes criar uma atividade ainda mais elevada, tão eda para nós, a vida do espírito. Apanha-nos e mata-nos. Não lutamos e nãvingamos. Também nós temos grande missão no equilíbrio da vida. Messacrifício e a morte possuem uma grandeza e representam uma vitória”.

A ternura me invade, quando olho esta humilde vida vegetal, plena dabundante e elevada finalidade, que desejaria quase adorá-la.

Sem este traço intermediário que une a vida do mineral (também essamais abaixo eu a sinto) à vida do homem, como poderia completar-se o

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de permutas na superfície terrestre? Quem transformaria o solo, o ar, os rais em substâncias orgânicas assimiláveis?

Sem toda esta maravilhosa cadeia de transformações e de contatos qumineral alcança o homem, como seria possível o mais alto fenômeno da

que é aquele da criação dos eternos valores do espírito?Pequenina e humilde planta, também tu trabalhas no funcionamentgrande organismo!

Não o sabes na forma de consciência reflexa que o homem possui, mmesmo instinto que pulsa em ti eu o encontro no meu ser, numa idêntica ligem fundamental, expressão do pensamento da vida. Como eu, nasces, cremorres; como o meu corpo, sentes calor ou frio, umidade ou secura, a vigío sono. Permutamos entre nós um respiro inverso. O calor do perfume daflores, que na primavera me invade, conta-me que amas e que amas ardentete. As tristezas outonais dizem-me que também envelheces e morres. Qu padecimentos, oh! Pequeno e humilde ser, humildemente suportas, obedecObedeces e amas. A nossa vida é uma só. Sentimo-nos e amamo-nos.

A visão não é da Terra e proporciona ao coração um êxtase que nãoTerra. Toda a criação, plantinhas e árvores, inclusive os escolhos nus e ros, cantam-me na sua voz a grandiosa sinfonia da vida.

Escuto e não sei mais onde me encontro, tão mudada está a Terra, vissim na sua essência interior.

Todos os seres me olham, cercam-me e falam-me: “Quem és tu que final-mente vês? Tu, que não és cego entre os homens? Vem, olha, escuta, qute falamos”.

E cada um levanta a sua voz distinta conforme a sua natureza.A rocha é severa e brame. A grande voz da terra é um troar do enorme

mido distante. As velhas árvores em meditação repousam cansadas; as p

mais jovens cantam nas flores, nos rebentos, nas folhas; as plantinhas sodelicadamente, como as crianças, na alegria de viver. E ri a pequeninaanimal, escondida e esparsa em redor, num trinado de felicidade. Tambcéu imenso e o mar na sua vastidão distante possuem as suas vozes e sorou murmuram, ou cantam, ou choram, ou rugem; também o deserto é plevida, onde tudo pulsa, vibra e freme. E, com todos, o meu ser sintonizaque toda vitalidade é a mesma vida.

Vejo agora abrir-se o abismo dos céus, faiscante de vidas. Quantas, aonito, no espaço infinito; e cada uma possuindo uma voz, uma luta, uma

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rança, uma meta, um destino, uma dor, uma alegria. E todas me falam: “Oque me vês, olha e escuta”.

A sinfonia é imensa, vasta como o tempo e o espaço; é música compostoda a harmonia do universo.

É isto Deus? É Deus isto que eu vejo? Porventura está Ele naquela haniosa lei que rege toda esta ordem, o grande EU, centro do grande organlampejante de ideia, vontade e ação?

E este EU és TU, SER SUPREMO, que não sou digno de mencionar?Então me ponho de joelhos e oro. Então todas as criaturas irmãs se c

inclinam-se e rezam. Então, de todo o universo, sobe o canto do amor, e tluz e alegria, contentamento e triunfo. E, ao canto de amor do universo, canto supremo responde: “Volve para mim, oh! criatura que conquistei,aramim que te criei”.

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TRÍPTICO (1928)

A Noite

Condensam-se sobre a terra vapores estranhos, subindo levemente cuma maré. A Lua branca resplandece no céu, criando-nos fantasias.Do alto de Assis, observo a noite, olho com os olhos profundos da a

olho as estrelas vivas, e o seu frêmito puro proporciona-me grande nostalVejo a terra adormecida embaixo; parece também cheia de pureza na

longa. Está inteiramente envolta em diáfanos véus e parece que repousacente, como na aurora da vida. Parece que aguarda ainda a sua criação; pque, no afluxo ascendente dos vapores estranhos, dormem ainda as formaseres, e tudo se recolhe, quase tremendo, num silêncio sacro, para veneragrande mistério da vida nascitura.

Distante, na névoa, perdem-se os perfis das coisas, que ondulam commas que lentamente saem do nada.

Parece que vagueia no ar uma até então indecisa forma de existir e, ncerteza do ser ou não ser, afigura-se-nos que as coisas tentam exteriorizar

Sob a luz suave da Lua, estranhos fantasmas endireitam a fronte nas ne, depois, dissolvem-se aflitos. Formas que se vão.

Formas que se vão em longa fila, procurando a vida. Tão logo nasceevolução, num relance, lhes põe o dilema e a morte, acossando-lhes se para mais alto, sem dar trégua.

Em paz, as estrelas do céu observam o grande apocalipse e sorriem tralas, sem se admirarem, porque, para elas, o espetáculo, tantas vezes virevisto, já é velho.

A eternidade não se perturba mais.

A Aurora

Aproxima-se o amanhecer. Tênues luzes tremem no oriente, enquanthorizonte oposto, desce lentamente a Lua, vencida pelo dia nascente. As las puríssimas ainda observam do alto e possuem a cor do céu. Das temergem os coloridos, e outra vez o arco-íris se tinge na aurora da luz.

Desperta a vida lá embaixo na planície extensa, e invade-me imensa te pelo homem e por seus padecimentos.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 110

Saio de uma noite insone, e o amanhecer surpreende-me ainda despedecidido a perseguir a ideia.

A meditação profunda não tem a noção de tempo e é intensa como umaOh! A vigília do pensamento. Benditas sois vós, desejaria gritar, alma

des, mudas ao misterioso encanto da terra e do céu, benditas porque pviver sem saber e sem perguntar.O mistério me persegue e não me dá trégua.O que é, no infinito, este meu espírito que não tem paz? Para onde m

pele o turbilhão dos séculos? Para onde me leva, para onde nos conduznunca saciada vontade de viver? Em noite de insônia, num turbilhão, vi de espanto a esfinge revelada, olhando-me suavemente no rosto para apocume distante.

Destruir-me-á o corpo, não importa, mas morrerei contente, porque quistei uma vida ainda maior.Por que deverão ser extintas as grandes forças biológicas que, em mi

de anos, plasmaram a forma da vida material? Não. A evolução sempre surge de baixo e sempre avança em direçã

mais altas formas, em movimento incessante; não pode parar e então prgue em um nível mais elevado, o nível humano da psique.

Também em mim, a evolução pôs o dilema do ser ou não ser, prosseou findar.

Procurei compreendê-lo, e o misterioso turbilhonar dos séculos comefermentar dentro do meu espírito.

O meu passado elevava-se como ondas, e surgiam rápidas as lutas e avas superadas; por fim, eu estava mudado e maduro para a grande revelaç

Vi a minha eternidade; um amadurecimento lento, culminando num esdo como o raio na estrada de Damasco.

Cheguei. Assim, transpus o limiar e vivi uma nova forma de vida.O universo tremeu dentro de mim, no entanto tudo seguia igualmente ce sem perturbação.

Quando a evolução criou a primeira asa ou guiou o primeiro olhar à leternidade não se alterou.

A vida opera, sem encher-se de admiração, grandes milagres de macompletamente natural, com a paz eterna de quem sabe e, sem pressa, alc

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 111

O Dia

Que coisa, lá embaixo, emerge da névoa matutina, como estranho mmento voltado para o céu? Ruínas de Tebas antiga, ou muros de castelos

anos no vale do Ganges, ou a glória de Paris pelas planícies do Sena? Nãolinda cúpula de Vignola, que surge ao sol. Desejaria também que a ideia criou resplandecesse ao sol.

São Francisco, a tua bela imagem está tão distante; não mais te compdemos!

Homem, ergue-te e vive; segue as pegadas dos grandes na longa estradlibertação; levanta-te e edifica a ti mesmo, plasma em ti o super-homemteu futuro reino durante as vigílias, miragem bela como uma visão. Ponão o conheces? Por que demoras na estrada do teu progresso? Tu que, tantos seres, venceste na Terra a grande luta da evolução e, agora, tendogado ao ápice da vida animal, dominas o planeta, por que ainda tardas em prosseguir? A evolução biológica está completa. Aguarda-te a evoespiritual. Supera o animal do qual ainda és feito; torna-te grande na alma

Observa quanto a natureza percorreu para produzir em ti a sua obra mma. Parece que tentou todas as formas para uma única mais excelsa: o hoQuanto esforço nas tentativas, quanto imenso trabalho de formas aban para trás, a fim de deixar sobreviver uma única maravilha para o futuro:mem! Observa, nos tipos vegetais e animais, as imagens deixadas no meestrada desta nunca saciada vontade de te criar. Elas se inclinam para ti ece que te apoiam, para te manter no alto.

Por que vacilas ainda em superar a vida? Não sentes fermentar na alhistória dos séculos vividos; não sentes subir a maré das lutas e das psuperadas; não sentes, vinda do túmulo, a voz dos mártires e dos grande

te chamam para uma espiritualidade mais elevada?Homem! Também em ti a evolução pôs o dilema do ser ou não ser, açar ou findar. Não sabes que não se pode jamais parar? Se é da própria reza do universo o movimento e o progresso, pretendes tu mesmo, ohquenino homem, barrar a grande corrente? Acima da tua vontade, segdecisivas as grandes leis e surge a dor: a sua própria sanção. Qual novoclismo esperas, que novo sofrimento te obrigará a evolver, até que sinfulgor do raio da estrada de Damasco e tu, constrangido, transponhas a ra do reino do super-homem?

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 112

A minha sede de ascender vertiginosamente, a anelante ânsia de conminha alma, a luta para vencer e superar a fase das paixões e repousar dna consciência liberta, tu não a sentes!

Não, tu não desejas o entendimento. Amas viver na brutalidade, amas

ra e satisfazes as tuas paixões para viver. Deixas-te guiar pelo instinto, sato com isto, não tentando compreender aquilo que fazes.A revelação divina e a ciência humana, dando-se as mãos, entenderam

harmonizaram-se para os que quiseram aceitá-las. Os mártires de todas agiões deram o exemplo para os menos inclinados ao entendimento. O hoainda não entende. Pobre homem!

Falará a dor, último recurso da Lei, justa e boa, para conduzir o cegosua estrada fatal, do seu bem e do seu progresso; a dor abalará a inércia. homem! Vejo-te desanimado e deprimido.O meu corpo choca-se contra uma enorme muralha de tantas e tantas tes iguais, inertes, satisfeitas em viver a sua vida miserável. Eu, só e esgoTu não me escutas.

Fecho

A aurora transformou-se em dia. A planície, adormecida lá embaixofumegante sob a aurora. Do lento vaguear da névoa, parece que se despvoragem do tempo. A manhã está feliz, alegre e cheia de juventude; no ae calmo, vibra a promessa de vida.

Mas, com o dia, dissipa-se a pureza das horas matutinas; não mais o para baixo as estrelas sorridentes e calmas. E, enquanto morre a última dade da aurora, dentro de mim um eco me repete: ser ou não ser, evolvfindar.

E vejo na dor a estrada da evolução.Somente na dor, livremente amada, vejo a estrada do ser, a única forçtorna a alma grande.

Então, no desejo intenso de prosseguir sem repouso, grande sede de qsofrer me assalta. Eu apelo para a dor com os braços abertos, e o eco reme ainda:“ou sofrer ou morrer”.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 113

CÂNTICO DA DOR E DO PERDÃO (1933)

No silêncio da noite imensa, eu escuto o cântico de minha alma, um câque vem de muito longe e traz consigo o sabor do infinito.

As coisas dormem, e a voz canta.Estou desperto e escuto; parece que a noite escuta comigo.O mistério que está em mim é o mistério das coisas: dois infinitos ol

se, sentem-se e compreendem-se.Lá embaixo, pelas margens distantes, além da vida, o canto respond

sombras despertam e, das profundezas, todos os seres estendem-me os b“Não temas a dor, não temas a morte, a vida é um hino que jamais tem fim

Observo-os e perdoo à sarça a inocente ferocidade de seus espinhos, àsua garra, à dor sua investida, ao destino seu assédio, ao homem sua oinconsciente.

“Perdoa e ama”, diz o meu cântico. Eis que ele apresenta uma estranha magia: todos os seres me olham

nados. Cai o espinho, a garra, a ofensa.Devagar, devagar, ignaros e cheios de espanto, são vencidos pela mag

lentamente, recomeçam comigo o cântico; a harmonia dilata-se, difunderessoa em todo o Criado.

Sobre cada espinho nasce uma rosa; sobre cada dor, uma alegria; sobreofensa, uma carícia de perdão.

Abro meus braços ao infinito, e falanges de seres me estendem seus br“Canta, canta”, falam-me, “cantor do infinito, nós te escutamos. O teu cn-

tico é a grande lei, é a grande festa da vida. O teu cântico é luz da qual o óa dor fogem. Canta, canta, cantor do infinito”.

E eu canto.

Meu corpo está cansado, e eu canto; meu corpo sofre, e eu canto; meu po morre... e eu canto.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 114

TRÍPTICO (1934)

Novembro

Adeus bosque solitário, que tanto amei.Como é amargo teu hálito nesta tarde, enquanto te olho dizendo adeus.O inverno te cinge no seu sono, a voz queixosa da chuva lenta doceme

adormece.Repousa entre as névoas o vento; repousa no silêncio a grande voz da

no abandono lento das folhas mortas, repousa a expressão de ser das árvoTriste e doce mês de novembro, em que tudo morre lentamente por c

ço, dá-me o teu repouso.Caminha, caminha minha alma sem parar. Donde vens, para onde vaeternidade, oh! alma filha do mistério? Anda, anda! Quão longe está a me

infinito!Quanta paz, oh! bosque, neste teu recolhimento em silêncio, nesta

obediência às leis da vida, nesta tua tranquila expectativa da ressurreiç primavera.

Como este sentido de morte tranquila se harmoniza suavemente em tcores esmaecidas, nos mínimos sons, nas calmas profundas!

Alguma coisa se apagou no sol, no céu, no ar; o frêmito da vida acalmem vagarosa sonolência. Algo se extingue em mim com um longuíssimmento; uma dor se desalenta, porque é a dor do mundo, um pranto qu pranto da vida.

Observo e relembro.A festa do verão, os divinos colóquios com a alma misteriosa da natu

os êxtases dos silenciosos arcanos e a solene quietude na qual repousa

bilhão do tempo. Na voz das coisas mais humildes, ouvia tremer o mido infinito.E tu, bosque, doce criatura que és, olhava-me, escutando comigo a

sinfonia dos ocasos. Então a sinfonia se desenvolvia suave, de luz em ludesaparecer o último esplendor nas trevas, qual uma voz que morre no silê

A terra, em paz, falava-me calmamente, à luz da tarde que se esvai, da pensão da luta, do repouso da vida exausta, dizendo-me como o dia, já ao anoitecer, era mais sábio por tê-la vivido.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 115

Adeus bosque solitário, pensativo como eu; adeus caminho que vai pocaso; adeus árvores amigas que tanto amei.

Agora, o entardecer é frio e lívido; o teu perfume, oh! Terra, tem um sde pranto.

O teu respirar esgotado, que eu sinto nas mãos, parece que me resptristemente: adeus!O inverno já te abala com um arrepio de frio. O uivo do vento sumir

teu meio, em longas ululações, sibilando na tenebrosa tempestade da noitPobre árvore amiga, adeus! Sofrendo, irei para outras plagas, levando

lembrança querida; do vento, receberei as tuas notícias e a ele confiareiti, as minhas.

O vento me trará da primavera distante o afago de tuas novas frondesfolhá-las-ei com o meu sopro, para que minha carícia te enlace lá de longAdeus!

O bosque responde-me: Paz!

O Sino dos Mortos

Soa melancolicamente um sino ao entardecer. É a voz dos ciprestes etúmulos, um som triste de pranto, um lamento que se perde ao longe pcampinas e, entre as folhagens mortas, plangentemente morre.

O ar repousa. A neve inerte se condensa em gotas de ramo em ramo. Eneste entardecer uma sensação de grande abatimento na vida, e a terraestranhamente absorta. Parece que se recolhe para meditar sob o manneve sempre igual.

No silêncio imenso, não escuto senão o pulsar do meu pensamentodesce profundamente, de região em região, para despertar não sei onde,

o limiar do mistério.Olho dentro da terra, e ela me parece desejosa de oferecer-me o ampque tantas vezes lhe pedi com os braços estendidos, chamando-me para rsar entre os seus torrões.

Amei tanto as suas belezas, penetrei tanto em seus segredos, vivi tanmisterioso palpitar da sua vida, trocando amores, como almas amigas.

Uma tristeza comum nos domina e nos aproxima neste entardecer.E como tu, oh! terra, te demoras nesta tepidez outonal, quase retroced

para recordar o verão, e tão afável e melancólica és nesta tua recordaçã

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 116

sim também eu me demoro no meu outono e, melancólico e afável, volsem mágoa a recordar a vida.

Dá-me o abraço, oh! terra, que tantas vezes pedi para ter repouso.E parece que a terra me olhou e me escutou, abrindo-me o seu seio. E

go-te o meu corpo. O drama da vida está findo. O que aconteceu ao conturbilhão das paixões, às tormentosas tempestades do pensamento? Serádisperso como folhas ao vento o tremendo trabalho de uma vida?

Tudo está acabado. Em lenta paz, o corpo se dissolve.Repousa a sua vida, adormecida em longa sonolência.As estações passarão, e aquela vida se transformará em corpos, docem

golpeada através dos torrões, ora por um calafrio de gelo, ora pela umidachuva, ora pela tepidez das tardes ensolaradas.

Todavia não morrerá; sentindo-se mudar, cantará em si as grandes notcada sensação. Apertada no amplexo tenaz da terra, nela mergulhará vibrfundindo-se na sua alma potente.

Daquela minha vida que se dá, os seus braços subterrâneos sustentargrandes árvores amigas que tateiam no escuro para sorver vida; o seu gespírito pensativo exigirá sob a terra aquilo que da terra o corpo tomou erestituir ao ciclo das coisas.

E surgirá lenta, pelos braços subterrâneos, a força da minha vida, reto pelas árvores amigas, para levá-la ao sol, onde reviva lá em cima.

A morte ressuscita.Toma. Os meus despojos dou-te sem mágoa. Retoma, ser irmão, tu qu

conheces outra vida a não ser esta, aquilo que me deste por um dia, para nha missão. A minha é outra vida. A minha alma, renascida na dor, desde fugir da crisálida, sonha com os espaços imensos de uma vida mais va

Distante, em outras plagas, que tu não conheces, eu aporto.

O túmulo é a minha ressurreição.Soa sempre lá em baixo o sino dos mortos, não mais como lamentomorre entre as folhas mortas. É o hosana da vida que ressurge.

Já sorriem no alto para mim as estrelas na doce e suave luz matutina. outro mundo, não mais de formas que vão lançadas no turbilhão. Elas secomo um canto imenso, equilibrando-se em ciclos alternados de vida e mavançando para o bem e para a felicidade; seguem criando, mesmo nauma alegria maior, contida e construída numa única força: amor.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 117

Ressurreição

Ressuscita alma, a tua dor está vencida.Sorriem distantes as árvores na doce primavera; sorri na sua liberda

meu espírito, que ressurge, assim como a vida ressuscita dos despojos mdo inverno.Morta entre as coisas mortas está a tua dor, lá embaixo, inútil utensíli

rado ao longe, nas plagas desertas de uma triste vida. Mas o seu frutoaqui, e a alma o vê: trabalho, criação e glória.

No infinito, o universo canta: ressuscita, a tua dor está vencida. Numa nuvem de espíritos em hosanas, eu vejo resplandecer Cristo.A sua cruz é luz, a dor é redenção. Pelo calvário, elevamo-nos ao Céu

cruz, a Deus.Ressuscita. Aquela dor inimiga é agora a tua força e a tua grandeza. Orito a amava como suave amiga, sentindo a sua libertação. A mesma lei qoprimia, agora te salva e te eleva. A meta está atingida, e o mal – instrumentodo bem – cai; a pequena desordem temporária é reabsorvida na imensa osuprema.

Triste e longo é o caminho de lágrima e sangue; mas, superada a prodestino atinge a meta.

A dor, que tanto amaste com teu olhar voltado ao Cristo, não é negatreva, mas criação e luz. A cruz não é uma condenação da vida, mas simmaior força; não é punição ou vingança, mas sim uma festa da alma e bênção de Deus.

Vejo no alto o resplandecer do CRISTO.Um raio me atinge, uma beatitude me domina, e eu, em êxtase, grito:e-

nhor, agradeço-te por isto que é a maior maravilha da vida; que a minh

seja a tua bênção”.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 118

QUARTA PARTE

O PROBLEMA DA EDUCAÇÃO

O PROBLEMA DA EDUCAÇÃO (1939)

A educação é o ato no qual a geração madura se volta sobre a geraçãvem que a sucede, para transmitir-lhe todo o fruto do seu conhecimeexperiência. É este o ato através do qual se forma aquela continuidade desamento que se prolonga na história, num desenvolvimento cujos termunem, sucedendo-se por contato e derivação. Esta cessão de experiêncgeração que vai à geração que vem, esta semeadura de uma semente espique, ao lado da semente orgânica, revive e prolifera, parece natural na ude imposta pela lei da vida. Os jovens são de fato um espelho no qual treproduzido, pois são construídos para serem, nesse período de vida, acimtudo, intuitivos e receptivos, como esponjas destinadas a absorver. Elesorvem e assimilam tudo, prontos a traduzir em termos de vida aquilo qmaduros dão como produto de sua existência. A educação é, pois, um

meno instintivo, universal e automático de captação, por parte da psique pre renascente, dos produtos da psique que, cansada, retira-se da vida. fenômeno que não pode morrer, pois transmite-se por lei natural, abrangtoda a produção espiritual de um povo. A educação desejada, sistemátdiríamos também artificial, nada mais é senão um momento particular e xo deste tão vasto fenômeno de educação natural, que está na lei da vidaqual todos, quer queiram quer não, consciente ou inconscientemente, docentesou discípulos, tomam parte.

Sobre o problema da educação, neste sentido restrito e particular, ponhfoco hoje o meu pensamento. Um problema imenso. Seria necessário qgeração madura fizesse um severo exame de consciência antes de deciditransmitir o seu pensamento, prestando conta daquilo que sabe e, sobredaquilo que não sabe, antes de voltar-se para as novas vergônteas da vidasoprar-lhes o hálito da própria alma. A luta universal, que tudo invade, mvezes pode transformar a educação, em vez de num ato de amor e de deção, num ato de imposição daqueles já instalados na vida sobre os joinexperientes. Querendo primeiro viver toda a sua vida, os maduros n

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 119

decidem facilmente a fazer o seu testamento e, mesmo devendo fazê-loveem senão um prolongamento da própria vontade, que continua a agir p própria. A educação se transforma, desta maneira, numa luta na qual a geração tenta imprimir-se sobre as jovens, mesmo nos seus erros e fraqu

por um instinto de conservação própria, reproduzido e continuado, de qno fundo, não ama senão a si mesmo. Na educação, pode reaparecer o annismo entre os que se vão indo e os que vêm vindo na disputa pelo espavida, porquanto os velhos não deixam facilmente a presa aos jovens, á por substituí-los, expulsando-os. Estes possuem uma personalidade já feinstintos, vontades e desejos, um tipo preexistente à educação, um eu inddente, que o educador também possui. Então o ato da educação não é umcífica transmissão de experiências, mas, sobretudo, uma contenda pelaquista de um lugar na vida, que os jovens disputam aos velhos.Esta íntima forma do ato educativo é atingida naturalmente com uma atde materialista, na qual o homem se reduz somente aos seus primordiaimentos biológicos, ao seu puro substrato animal. Para que aquele ato se eé necessário infundir-lhe um hálito novo, repleto de espiritualidade, o eleto ideal, que desloca o baricentro dos interesses e do egoísmo animal psuperior finalidade coletiva, na qual se esquece a vantagem imediata do prevalecem os elementos do amor supersexual e da consciência, que abrmais amplos horizontes no tempo. O fenômeno educativo, entendido no do restrito do qual temos falado, sofre então uma transformação evolutivqual se espiritualiza e se aprofunda, perdendo gradativamente em coaçãimposição egoísta, em antagonismo de rivalidade aquilo que conquistaltruísmo, em consciência, em penetração psicológica. O ato educativtransforma assim cada vez mais em amplexo da alma, em função coleticonservação e construção, em ato de solidariedade entre aqueles que nasc

aqueles que morrem. O grau de evolução de um povo pode, deste modo, rese neste índice educativo, que é a forma pela qual se exprime o contato varias gerações. A educação, então, vai continuamente perdendo em cruelem imposição, em rivalidade e contraste, para conquistar compreensão, cocação, colaboração e unificação. Chegamos assim ao extremo oposto, ontem a forma suprema do ato educativo, que é a mais completa e espontânmunhão de espíritos numa unidade de sentimento e de pensamento.

Percorrendo assim a estrada da evolução, o procedimento do educador sespiritualiza, depositando as suas escórias ao longo do caminho do seu

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 120

gresso. Desse modo, ele conquista sempre mais amplo direito de educqual lhes está verdadeiramente reservado somente nas últimas fases.

Depois de haver, desta forma, orientado biologicamente o problema tro da fenomenologia universal e tê-lo bem amadurecido na minha m

quis aplicá-lo, neste sentido, na minha experiência cotidiana de educque, pondo-me em contato com extenso número de jovens, permite-metrolar experimentalmente as teorias e aprofundar este importante lad problema psicológico que é o ato educativo. O meu precedente compmento sintético se desloca aqui ao extremo oposto, que é essencialmentelítico. A visão restringe-se, mas, em compensação, aproxima-se de umalidade sempre mais concreta.

Na minha atividade pedagógica cotidiana, quis realizar esta transformevolutiva do ato educativo, para conquistar plena e substancialmente, na mconsciência, o direito de educar, elevando o ensino ao nível de missão. Dsempre esquecer o meu eu, para observar melhor o eu dos jovens, que mos desenvolver. O meu trabalho, com esta atitude, perdeu progressivamas qualidades coativas e disciplinares, para conquistar a qualidade de peção psicológica. Lutei extenuantemente para ser sempre mais o profesmenos o domador. Posição difícil, trabalho árduo e transformação compque, para mim, nada mais é senão um momento da minha evolução indivna qual está o significado da minha vida.

Não importa o que um homem ensina. O professor, entre os jovens, é pre um centro de irradiação espiritual. Qualquer coisa que ele diga é seum discurso íntimo e substancial entre docente e discípulos e atinge a prdeza do eu, fato este anterior à educação, a qual surge como um ato postque se sobrepõe, quando não se contrapõe, à sua personalidade. Esta prinstintivamente a própria integridade, rebelando-se a toda imposição. A f

a disciplina não são senão atos de superfície, de valor prático, um meio lativo valor pedagógico, mas nunca a substância de um ato educativo. Edado pela profundidade de penetração psicológica, o que é uma coisa difínecessário ter uma grande alma, possuir a coragem e a força de abri-la de par, ser dotado de uma potência de irradiação que penetre e, ao mesmo tede uma fineza psicológica que saiba guiar aquela potência. Conheço bemdificuldade. O nível evolutivo da personalidade da maioria dos jovens, qusão senão homens em formação, em geral não é muito alto. O professor possuir a força de saber exigir tudo de si mesmo.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 121

Eis uma classe. São quarenta meninos e meninas dos 13 aos 16 anos pequeno mar de cabeças, um pequeno mundo de instintos, cargas nervrivalidades, pensamentos e sentimentos. Eles representam a vida. Emfisionomias estão impressos o cansaço, a fadiga, a força, a fraqueza, a gr

za da estirpe e tudo que foi anteriormente gravado naquelas almas, qu pouco sabem falar em termos reflexos da consciência, demonstram, emmos instintivos da subconsciência, já saber muito. Se neles a palavra é do olhar é, ao contrário, rico, o gesto é fervoroso, o eu salta a todo o momde dentro para absorver tudo pelas rápidas e vastas vias da intuição. Nefervescência interior destes espíritos vivacíssimos, ainda presos à curiode pela vida, para eles nova, e às maravilhas de suas sensações. Que sínimediatas, que rapidez de conclusões, mesmo sendo muito pouco alémcurto campo de suas consciências, mesmo sendo provisórias, para seremdepois completadas e corrigidas. Que peso para eles a lenta psicologia anca adulta, que nada resolve!

Observo aquele pequeno mar de cabeças e pergunto-me: quem são Todos iguais e, no entanto, tão diferentes! Existirá, no meio de tão monógrupo de indivíduos insignificantes, algum valor de exceção destinado alar-se? Muitos não se revelam imediatamente, pois algumas sementes dvolvem-se tarde e são, algumas vezes, as mais complexas e as mais replefrutos. Frequentemente, os mais brilhantes são superficiais, os precocesgotam. Quais são as leis que presidem ao desenvolvimento da inteligêOu nos encontramos diante de um fenômeno tão específico, que cada carealiza como tipo próprio, com lei particular? É preciso saber penetrar tamna exceção, intuí-la, farejá-la e achá-la, favorecendo o desenvolvimentotodos os meios. Os educadores precisam saber fazer exceção às regras tronais em relação à incompreensão da sagacidade do menino.

Observo o problema pedagógico, tão rico de aspectos, colocando-o dde mim. Estamos imersos no imenso fenômeno, em tal grau, que este, m para a ciência, apresenta-se denso de mistérios como fenômeno da vida, studo da vida do espírito, que é o lado mais complexo. É aqui que se podeo mais profundo e mais novo, o mais inexplorado e original estudo da perlidade humana. De preciso sabemos muito pouco neste campo. Somentsenso místico individual do espírito, digamos assim, pode nos guiar na prdidade misteriosa da personalidade. Todavia a unicidade do fenômeno vid

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 122

centralidade do seu princípio nos une numa solidariedade de trabalho qtambém a manifestação da compreensão, quer sejamos dirigentes ou dirig

Observo aquele pequeno mar de cabeças e sinto as vibrações íntimas dlas personalidades, que apenas transparecem da construção física. Viver, v

Os jovens ainda possuem em si o dinamismo concentrado do germe, do esivo que deverá se descarregar lentamente, para alimentar todos os esforçvida, no sentido de transformar a energia em experiência, a força em cona quantidade em qualidade. O dinamismo inicial da nebulosa cósmica é muito mais rico do que em nós adultos, mas deverão transformá-lo lentamem consciência, como nós o fazemos. Este é o significado da trajetória etiva da vida. Vive-se para experimentar em todos os campos. No fim, na perde. O resultado do nosso trabalho estará em nós mesmos, porque a esdestilada dos valores, expressa em nosso modo de ser, não morre.O educador deve conhecer estes sutis fenômenos psicológicos; deve t já enquadrados numa síntese universal; deve ter resolvido os grandes prmas, porque compreendeu o problema da alma; deve perceber toda a teleoda vida, caso contrário não saberá o que fazer. Deve saber distinguir na mo timbre de cada personalidade e adaptar-se a ela, porque, se não soubedular a própria onda psíquica em sintonia com os diversos tipos, não encrá jamais o meio de penetração. Trabalho de artista, pois representa uma de arte esta de modelador de almas. Ele lança a semente. O jovem não dmonstração, parece não se aperceber, mas guarda em si todas as impresque se desenvolvem depois e são o impulso das suas ações. Gravar no esé colaborar com a obra divina da criação. O homem não se convence peciocínio. A lógica, justamente porque é ato de reflexão, pode bem poucote das profundas vozes da vida, hereditárias e instintivas, que reagem concontágios psíquicos bons ou maus.

Trata-se de forças flexíveis, ávidas por receber e assimilar novos imp por sugestão, preferindo primeiramente as vozes afins.É esta a íntima técnica psicológica daquele ato que se sintetiza na frase: “i

ao encontro do povo”. Isto significa: “exemplo”. Onde existir uma classe dirigente, superior por qualidades intrínsecas,

apenas por atributos exteriores, mesmo sendo formada por homens obscque trabalham substancialmente, sem rumores de formas, aquela classe tdever heroico de caminhar em direção ao povo. Digo heroico porque é á principalmente se apenas acabaram de emergir da lama, pois nos obriga

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 123

locar as mãos naquilo que mais nos enoja, e isto para elevar também os oEstes são geralmente desprovidos de qualquer senso de compreensão e dtidão, acreditando somente no seu arrivismo pessoal. Não é lícito que sedisso um pretexto de demolição do melhor. O cargo de direção, basead

normas rígidas de disciplina, cabe a quem sabe mais. A vida é trabalhosaquem verdadeiramente se dirige ao povo; quem possui o comando tem o bastante árduo de manter a ordem. Não basta então dizer que a vida é m Não basta. É preciso possuir uma fé evidente, lógica, vivida na luz da mna paixão do coração, que nos faça lembrar a todo instante que a vida é mSomente então, o trabalho será estável, pois estará equilibrado, o que sigque a nossa dedicação aqui na Terra será compensada pelo céu, que sempradiará bênçãos, se estivermos aptos a pedir e formos dignos de receber.

Desta maneira, a obra de educação é verdadeiramente um ato de fratdade. O educador representa a força do bem, fazendo-se canal para descida desde o divino, mesmo quando a involução humana o constrinadotar formas de coação. A educação é bondade, mas não deve jamais ptir que a ignorância dos involutos satisfaça o seu mais forte instinto, qtransformar bondade em fraqueza, a fim de poder subjugar. Nestas cções, a bondade tem o dever de armar-se com as garras afiadas à mostraa sagrada proteção do bem. A culpa é somente da involução humanaimpõe à educação, para que esta afirme, os métodos fortes da disciplinsenvolvendo-se, desta maneira, a imensa luta do bem contra o mal. Estáspera e dura realidade do esforço pedagógico. Existe para cada alm peso específico inviolável, sempre pronto a manifestar-se, que escava mos inacessíveis e distâncias terríveis. Quem está por baixo agarra-se d peradamente, como quem se está afogando, àquilo que está no alto, parastá-lo à própria baixeza e fazê-lo afogar-se consigo.

Naquele pequeno mar de cabeças que é uma classe, sinto o problemeducação do povo e encontro o mundo nas suas notas fundamentais. Aq jovens estão todos ali a pedir força e bondade, sabedoria e paciência e, ainstante, valor e exemplo. Estão todos curvos, trabalhando como homensfazerem-se ao largo na vida.

Domina uma espécie de instinto para marchar contra a cátedra, num íto de atingi-la, pisá-la e destruí-la, a fim de permitir ao eu maior gritar lá decima. É a eterna história do homem. Sobre aquele pequeno mar de almdestacam estas notas dominantes da psicologia coletiva como “leitmo

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 124

que emergem da confusão dos menores motivos individuais. Naquela io instinto de subir é dominante, como é também o crescimento físico. Atureza estabelece logo uma graduação de valores entre os jovens, mutilizando critérios elementares, que, segundo as leis primordiais da sel

dão a supremacia ao mais forte por qualquer meio. Se os escolares, com povo, podem representar a explosão das forças elementares da natucompete ao educador, assim como ao chefe, enxertar naquele campo osmulos de ordem superior. Educador e classe, como chefe e povo, reprtam os dois extremos dos valores sociais, o máximo e o mínimo. O atocativo consiste em aproximar e fundir estes dois extremos, estes dois da vida moral, que são complementares, feitos para se unirem.

Cada aglomeração de seres humanos se comporta, por fenômeno de plogia coletiva, como um ser único, possuindo uma personalidade difedaquela dos seres componentes, uma personalidade própria, com muitos observadores, que sente as consequências daquilo que acontece em cadato seu. Ela tende a nivelar-se no plano dos menos evoluídos, que, mais ptentes, tentam tomar as diretrizes, porque existe na coletividade comouma tendência ao relaxamento de controle e um abandono de responsabde. Contudo aquela psicologia coletiva tende também a se fazer arrastareducador ou pelo chefe, se ele é o mais forte, o melhor e sabe se fazer substancialmente como tal. A verdadeira luta inicia-se então entre ele piores. A maioria flutua incerta para aderir ao vencedor. Estamos ainda fase biológica tão atrasada, que a justiça não se pode fazer valer senãoforça. Culpa dos homens, e não dos chefes. Uma classe, como um povo, preende primeiramente a força e, somente depois, em segunda plano, a ça. O progresso da civilização é dado pela mudança das relações entre fo justiça, ou seja, por uma progressiva extinção do primeiro valor e po

proporcional fortalecimento do segundo.Aquelas unidades psicológicas são sensíveis e podem ser educadas. seu instinto é este, assim é porque foi construído desta maneira na longa riência do passado. Compete ao educador enxertar novos estímulos naqinstintos, para transformá-los em qualidades superiores, que serão os insdo futuro. É maravilhoso observar com quanta rapidez se transmite a toorganismo a sensação de um golpe produzido em qualquer ponto. É destma que um exemplo dado por um único indivíduo atinge os demais.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 125

Cada indivíduo encontra a si mesmo em cada membro da coletividadetindo imediatamente, como própria, a sensação do prêmio ou da punição em qualquer dos seus componentes. No entanto, com a transferência da eção humana de sua fase orgânica para a fase psíquica, chega-se, enfim,

primeiro grau de aperfeiçoamento nervoso coletivo, que, no campo pedaco, indica adoçamento de métodos e aprofundamento de penetração psicoca. Então, o ato educativo se aperfeiçoa no cuidado dispensado ao indivícuja natureza específica encontra maneira de adaptar-se. Nestas condiquando a penetração psicológica se faz mais aguda, a separação entre o social e os melhores se torna mais rápida, e a estes, então, podemos deum cuidado mais especial, porque a missão do ato educativo não é obstzar, favorecendo as zonas parasitárias, mas sim secundar os estímulos nada seleção, que agora é, sobretudo, psíquica. O significado e o objetiveducação não é nivelar, mas sim selecionar. É descobrir o melhor e encor para utilizá-lo, e não mutilá-lo, reduzindo-o às proporções do medíocmaterialismo do último século criou e elevou como modelo o tipo do honormal, adaptado a uma pequena vida burguesa, calculada, utilitária, semsem aspirações. As resistências são grandes, porque este tipo tende a estzar-se pela lei do menor esforço. É biologicamente conveniente. Entreoutras leis biológicas estão de atalaia e prontas para varrer estes acomodatos parasitários que desejam deter o caminho da vida, paralisando a selElas arremessam a força da evolução contra a indolência dos estacionEstas forças evolutivas abalam tais equilíbrios cômodos, utilitários, de cniência, sem amanhã; resolve-os porque objetiva criações sempre mais Devemos voltar-nos ao povo para elevá-lo em massa, procurando, sobredesentranhar os melhores, somente aos quais pode ser confiado o futuro.

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A PSICOLOGIA DA ESCOLA – IMPRESSÕES (1933)

Um artigo de Camilo Viglino na “Revista Rosminiana” estimulou-me a ex por estas minhas impressões. Elas poderão interessar talvez, porque parte

um homem que ingressou no magistério no período de sua vida madura ecom a experiência das coisas humanas; um homem que vê e sente o probda escola através da psicologia, com a qual está habituado a enfrentar e ver os mais diversos problemas do pensamento e da vida.

Por escola entendo aqui a escola média, compreendida não como um blema teórico e orgânico, mas como um problema prático. Trata-se da lumestre no diuturno contato com a crua matéria cerebral dos jovens. Ele, fsamente, ara os campos virgens da inteligência obstinada, para atirar no traçado a semente do saber.Os dois termos da equação pedagógica são: professores e estudantes.tintos e opostos, com o desígnio de ensino mútuo, porque também os jo podem ensinar muito ao professor que souber observar, a fim de acumdepois uma preciosa experiência psicológica e conduzir o resultado na pdo seu apostolado.

Entre os dois extremos deveria, sem dúvida, estabelecer-se uma reapmação psicológica, para que vibre a centelha da comunhão espiritual, squal a transferência do saber não é possível. Eis, porém, como cada umsurgiu na sua diferente psicologia.

De um lado, o professor. A classe é a sua orquestra, dirigida por ele, ànão só transmite o impulso cultural que a faz avançar intelectualmentetambém infunde, com o contato contínuo, com o exemplo, com o méto própria personalidade, aquela personalidade humana que transparece de t proporciona o seu cunho no ambiente. Na irradiação de sua personalida

personalidades menores dos alunos – menores porque ainda não desenvolvdas, mas já prontas para receber – está o mais alto sentido da escola, está contínuo, com o exemplo e com o método, a própria alma, acima de todnecessidades formais, como esplendem todas as coisas elevadas, que acima das aparências do tempo e da vida. Aquela irradiação tende a algmaior, além da elevação das inteligências a um mais alto grau de erudTende a dar aos espíritos o sentido de uma vida mais completa e mais prda, na qual lampeja um ideal, mesmo que seja expresso na sua mais simforma de exata observância do dever. Aos olhos do professor, o problem

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ensino não pode ser tão-somente a mecânica transmissão do saber, codeseja nosso século de eruditos e de especialistas, ainda à procura da úsíntese, mas deve dilatar-se naquele problema muito mais vasto da compsão da vida, compreensão que a síntese cultural não pode dar, que nen

curso ensina e nenhum concurso controla, que não é tanto uma ideia absuma concepção, quanto um sentido de vida vivida, uma emanação que sote um espírito maduro e profundo pode irradiar, entregando-se totalmAbre-se então aos olhos do professor, a visão de uma tarefa superescolástconstrução de intelectos e, na transformação da pedra rude em esculturaceptual e bela, quase a infusão de um hálito da própria alma; a construçhomens, plasmando a personalidade, criando no espírito, com ato superido artista que se exprime na matéria e nela imprime o seu alento humano.

Desçamos agora da cátedra e atravessemos o fosso profundo que a sdos escolares. Fosso profundo sobre o qual se projetam pontes, como nasgas fortalezas. Transponhamo-las e observemos o outro extremo da realescolástica: os estudantes, na sua psicologia oposta.

Enquanto nós, idealistas do ensino, vagamos no céu da religião do espque faz da vida um ato de fé no campo das belas construções, filhas da maturidade, a maior ou menor turma dos escolares é toda concorde e seunida. Mostra-nos que, olhando do outro lado, o nosso conceito pode pauma utopia. O ponto de partida do rapaz, como toda a sua psicologia, é pletamente diverso. Todos os alunos estão ali com um único instinto, o inde suas idades: brincar, divertir-se sem preocupações, alcançar com o mesforço possível os resultados e as notas necessárias às promoções, paraassalto à vida. É a lei do menor esforço. Não tendo sofrido, ainda não coenderam, pois só a dor gera a reflexão. A vida, como ingenuamente penestá no seu irrefreável impulso para a alegria. Que lhes importa Cíce

Shakespeare, gramática ou álgebra? Abstrações difíceis, belezas e conc para os quais as suas almas ainda não estão e talvez nunca estejam amaddas. Que tristeza, que aborrecimento, que coisas indigestas e fastidiosasserem engolidas forçosamente! Enquanto o professor se arrebata por Gou por Ésquilo, o rapaz se entusiasma pela sua gaiatice, procurando avidate um momento de refrigério, no que é tão compreendido pelos colegas dintimidade! E que peso para o professor dever impor a atenção, falar a não o acompanha e que sabe e faz aparentar, por instinto, todos os mais rossímeis cansaços, a fim de fugir à aula. Que sentimento de rebelião

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energia os jovens apresentam para afirmar e impor o seu próprio eu, be bruto, nobre ou baixo, seja ele qual for! Para nos tornarmos interessantecessitamos descer continuamente aos seus níveis, reduzir o estudo a umagitado e rumoroso como uma partida de futebol, com explosões de sent

tos muitas vezes não elevados, suprimindo toda a ideia abstrata. Desta fornobre curiosidade do saber é uma exceção, a ponto de vir a ser considquase patológica naquela idade.

Para a compreensão perfeita, seria necessário abaixar todas as pontecher definitivamente o valado. Deste lado, porém, não existe apenas a irxão juvenil, mas também toda uma psicologia diferente da vida, impostainstinto; existe a luta pelos pontos, para a promoção, há todo um esgrimhoc”, toda uma realidade diversa, tão férrea, que submerge todas as outras. Oescolar ali se encontra a nos lembrar a cada momento a sua maneira de aum implacável“do ut des”8, e este é o melhor caso do jovem dito inteligenEle está ali a nos ensinar que tempo é dinheiro, que a energia psíquica é osa, que o melhor é quem, de qualquer maneira, chega primeiro. São as lvida, que todo o mundo respira, às quais ninguém sabe se esquivar, nemmo, de todo, o idealista. Tudo é luta na vida. Com tal psicologia, o joafronta a escola com os critérios da vida, mostrando-nos eloquentementena verdade, não se trata de uma conversa. Através de quão angustiosas didades devemos exaustivamente preparar a estrada para a luz do pensamen

Concluindo, a minha impressão é que, posto o problema nestes terconforme se me apresenta, a habilidade do professor – uma verdadeira arte – consiste em saber abaixar sobre o fosso o maior número possível de potodas em definitivo, abolindo-o, se possível. Não é, porém, uma arte Certos estados de calma e de ordem nas salas de aulas são produtos do tnão da compreensão, mantendo as pontes levantadas. O certo é que, n

contro entre duas tendências opostas, o choque é inevitável, sendo a soimposta pela disciplina. É a realidade da vida, que não se pode e não sesegue deixar totalmente fora do limiar sagrado do templo das formaçõesrituais, a qual nos acompanha e entra conosco mesmo onde não desejamnossa arte, entretanto, está ali. Saber circunscrever a coação, para afagradativamente, tendendo para a sua eliminação, de modo a não restar seideia, a imagem do constrangimento ao estudo e ao dever, tornada hab

8 Do ut des – expressão latina: “dou, para que dês”. (N. do T.)

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depois, como coisa natural e subentendida, mas que esvoaça no ar, invaa atmosfera local como um pressuposto que não possui mais a necessidaconcretizar-se em fatos. Então, se não a convicção, ao menos a sugestãordem e dever descerá ao espírito do jovem; um novo hálito lhe será fi

para formar o germe de um mais nobre instinto no adulto. E a nossa artede em habituar os jovens, simultaneamente, à compreensão e à comunicestá em abrir as suas almas à confiança, despertando-lhes o interesseestudo. Nesta arte está a evolução da educação, que tende das formas ande punições materiais às formas de orientação baseadas na comunhão etual. À medida que a sensibilidade se aperfeiçoa, o constrangimento se za e desaparece, transformando-se no elemento convicção, que suprimdesperdício de energia. É menos oprimente para o aluno, é mais lucrativoo ensino. O constrangimento não se compatibiliza com o uso do pensamque, por sua natureza livre e espontânea, somente se nutre do contatooutro pensamento livre e espontâneo.

A revolução no mundo é hoje revolução moral. O conceito biológico dda-luta será substituído por este imensamente mais alto e potente de missão; o conceito de trabalho-vantagem individual será substituído pel balho-função coletiva. O ideal não será mais a palavra abusiva e vazia dtrora, mas sim a suprema verdade e centelha de ação. Será a potência qudo mundo vacilante uma nova civilização. Esta ideia introduz na vida dovos elementos novos e pode ser considerada a base de uma nova fase delução biológica. Para quem vê com a grandeza da alma as grandes coiscoisas imensas do destino e da eternidade, não é exagero observar nisto plosão de uma força moral de ordem cósmica. E, se o ideal deverá entrvida, com o ímpeto de uma avalanche, isto se realizará primeiramente nala, porque ela é, por sua natureza e tradição, o núcleo e o canal de irrigaç

templo das mais altas missões espirituais.

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A ARTE DE ENSINAR E DE APRENDER (1934)

Uma boa e despretensiosa conversa. Um retrospecto repousante, numra tarde tranquila, sobre coisas observadas por experiência direta, sobre

ceitos emanantes desta nossa vida de missionários do ensino, conceitoressurgem aqui, por um momento, naquele aspecto particular em que se sentam e como eu os sinto. Conversa rápida, feita laconicamente e comfranqueza pessoal, como é do meu feitio em todas as sensações e interpções da vida. Isto é devido ao meu instinto irrequieto, que deseja camintodo custo fora dos caminhos batidos, numa procura anelante de uma dade mais profunda do que a aparente e, todavia, sempre concreta e imados fatos vividos.

Não é verdade que as coisas, mais do que em si mesmas, interessam d pelas vibrações que despertam em nós? Não é verdade que elas, mais d pelas suas pulsações intrínsecas, interessam pelas sensações que fazem bem nossas almas? As coisas do mundo, inertes e iguais para todos, estãseu lugar. Parece que são animadas somente pelo nosso olhar e que se to belas apenas quando vistas não na sua nua realidade objetiva, mas sim rdas no tormento de nossa alma viva. Neste espelho, parece que se revesteuma beleza nova. A interpretação de quem as sentiu profundamente nos em face das coisas mais simples e comuns, a uma sua nova interpretinesperada, que possui a magia de lhes dar uma nota que, embora reconh por nós, não sabíamos achar.

Quantas vezes nas breves pausas – e quem ensina sabe muito bem como s breves – transigindo com a áspera tensão nervosa de quem se senta à cátao perpassar os olhos na pequena multidão de cabeças irrequietas, parei pensar, com o olhar perdido ao longe, nos tantos problemas com que no

frontamos e agitamos na escola! Eles parecem pequenos, reduzidos comtão nas fórmulas de um regulamento ou de um conceito esquemático prea uma atividade às vezes quase mecânica. Entretanto são os grandes e tredos problemas da vida e da personalidade, imensos na sua substância, extantes do saber humano, insolúveis pela ciência moderna. Naquelas peqcabeças travessas pulsam as milenárias leis biológicas, exatas, fatais, absna sua tão vasta elasticidade, entrelaçando-se aos mais árduos problem psicologia. A alma das crianças, livre ainda – pela graça de Deus – da consci-ência reflexa que a educação proporciona, esconde sob o belo manto da m

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ra a sua inocência, os seus movimentos e ímpetos; todas as flexões deraros repousos ocultam a efervescência de sua primeira explosão. Revelanos, com a rapidez da intuição, todos aqueles problemas psicológicos, tãdentes e tangíveis aos olhos que sabem ver profundamente para alcançá-l

Como é feita, então, esta alma humana a ser educada? Por qual camin pensamento a penetra? Quais as reações que a despertam? Como funaquele complexo organismo psíquico? Surge diante de mim, mesmo nas ples e pequenas coisas da escola, além de todas as tarefas e dos trabalhodagógicos, este formidável problema da personalidade humana, o problemsociedade porvindoura, na nova e mais elevada ciência do futuro.

Psicologia individual e psicologia coletiva, afeto e disciplina, diferençtemperamento e de adaptação, ensino em massa e contato individual, miísmo escolástico, sobrevivência de critérios superados que, todavia, não pmorrer no meio de tantos duelos e tantas formas! Tudo se agita neste conde forças e de correntes, que, embora pareçam quase irreais, por não s perceptíveis, regem tudo e ressurgem em toda parte, em cada momento, c potência animadora que somente as causas invisíveis parecem poder ter.

Não desejo dizer nada de preciso, não quero conclusões. Desejo nestaversa agitar somente um pouco estes conceitos, na expectativa de que dmovimento nasça um choque, uma reação, alguma ideia talvez útil e novaconduza a outras ideias.

A psicologia coletiva da classe é sempre muito inferior, como acontectodos os fenômenos dessa espécie, à psicologia individual. Decai nela deto o nível de educação de cada um: um jovem na massa ousa aquilo que jfaria sozinho, isolado diante de sua consciência. Esta se abandona na coldade a uma inconsciência ou consciência mais elementar e mais baixa. É que o professor tem diante de si na sua cátedra, exigindo dele sistemas d

mador. Vencida e domada, porém, esta menos evoluída alma coletiva, comeios menos refinados que ela exige, o professor poderá depois fazer ress pouco a pouco, as superiores personalidades individuais. Aqui se inicia balho de distinção, fazendo sobressair prontamente os diferentes tipos, confundidos no conjunto: o tímido, o sensível, o franco, o inteligente, o so, o improvisador, o mentiroso. Quantos matizes! Encontramos aí a sociinteira, porque nestes pequenos existe a alma humana que se arroja nacom todas as suas ilusões, fraquezas e belezas. O espetáculo merece ser Quantas diferenças de estilo e de atitudes apresentam os jovens, quando

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rogados um a um! Começa, então, nesta segunda e mais íntima fase do co psíquico, um trabalho de penetração mais profundo, que conduz o olh professor à alma de cada jovem. Da soma e fusão destes olhares indivisurgirá depois um olhar mais profundo de conjunto, que abrangerá toda a

se. Então, e somente então, o professor conhece e possui de fato em suas toda a classe. Somente neste ponto nasce aquela comunhão de espírito a q pode verdadeiramente chamar de obra educativa. Esta posse da alma indal do aluno pode ter uma influência sobre a sua vida, iniciando aquele trade compreensão, aquela obra de ascensão, que deixa vestígios mais profudo que a pura erudição. Então, à fase da luta, que implica no duelo pelostos, fazendo o jovem mentir e afastar-se do professor, que lhe parece ummigo, segue-se a fase mais elevada, na qual a fadiga inútil e o atrito do chrecíproco e contínuo desaparecem e o aluno se torna um filho que trabalacordo e com a mesma fé do pai.

Agora, o nosso olhar se desvia dos escolares para aquela figura qumove na cátedra, sobre a qual vemos as grandes imagens e os símbolosvenerandos. O que se move naquela figura: alma, corpo, paixão? Se todtrabalhos humanos pudessem ser reduzidos ao conceito de puro utilitaré certo que o trabalho de ensinar e de educar é o mais inadaptado a esta ção. Mas, se esta redução, qualquer que seja, puder ser transformada emsão por um espírito nobre, sabendo ver e exaltar o lado moral, nenhumaexcede em grandeza a esta do educador. Obra superior a toda classifichumana e reconhecimento exterior. Fixa o peso específico da pessoa mcolocando-a no seu plano, em sua altura, na qual se equilibra, permavive e vence espontaneamente.

Eis o verdadeiro espírito da escola, o conceito vivificador que, no meiáridas noções, faz nascer um ímpeto de conhecimento e de superamento.

vibração profunda que tudo mantém e vitaliza, sem a qual tudo se torna márido, frio, mecânico, insuportável e inútil. Então a aula, antes fria, se aqDaquela atmosfera feita de muralhas, de cátedra, de bancos, tão árida e p para os jovens, floresce uma espécie de milagre de emoções, que são talvúnicas de todo o trabalho de escola que recordamos com alegria e que reInfeliz de quem fizer da cátedra um instrumento mecânico sem alma, msendo perfeita a execução dos regulamentos e das formas burocráticas. Mna que funciona somente objetivando manter em pé uma posição e um pêndio! O ideal, se bem que invisível, imponderável, é uma força tão sub

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cial na vida, que, sem ele, como acontece a todo corpo sem alma, tudo s brunha e morre. O princípio hedonista do “do ut des”, base do mundo eô-mico, não pode em alguns casos, sobretudo neste, bastar. Em torno destada vida social que é a escola, não é suficiente mover-se apenas com a psi

gia, ainda que honesta, de trabalho, é necessário também uma paixão bem. De outra maneira, traímos e matamos a alma humana.Esta paixão de superamentos espirituais pode ter outra manifestação i

ante, além do âmbito educativo da escola, num campo ainda mais vasto, le no qual o professor se julgue parte integrante e construtiva das forças rais e espirituais da nação. Não é esta missão ainda mais alta? A quem portanto, confiado o trabalho das criações do pensamento e das funçõeslectuais de um povo, senão a esta elite que justamente se aparta do furluta econômica, do comercio e dos negócios? Que coisa mais bela do figura de um professor modesto que, terminado o trabalho de educador vens, retempera o seu espírito em missão mais grave de educador de homRepousa nesta atmosfera de conceitos e passa as noites insones, pela alegse sentir vivendo, ainda que seja como uma gota, no oceano vivo e constrdo pensamento da nação em marcha. Não é talvez a mais nobre alegria hna e a mais evoluída das fases da vida terrestre, esta em que o mais alto cdas sensações emotivas e vitais é transportado do nível vegetativo e pas para o de pensamento e criações conceituais?

Desta maneira, a nossa conversa nos leva longe, a outro problema, que fere a estudar e aprender, para depois criar no pensamento. Qual é a técnicateriosa desse processo? Neste ponto, a turba escolar já desapareceu. O probé mais íntimo e mais elevado. A mente adulta o observa em si mesma, pa pois tirar deduções que iluminem também a comunicação do saber, que é blema escolástico.

No estudo e na aprendizagem, apegamo-nos às formas mais empírAcreditamos que esta arte consiste em ler, repetir e reter, aplicando esttema de ensino aos jovens. Mas quão complexo é o entrelaçamento de vções do qual os fenômenos psíquicos são a síntese, se considerados nessência? Seja no colóquio ou na conferência, nos quais a ideia sobe da vra à psique, seja no estudo silencioso e solitário, no qual a ideia emerleitura, capacitamo-nos, mas de quais interferências de onda, de quais cções subconscientes e, em alguns casos, de quais imersões em correntequicas a nossa mente é susceptível? Será que, seja ensinando ou estud

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atiramos à mente um alimento que ela assimila por si, sabe-se lá como?diferente do que se suspeita, o pensamento for, como tenho razões parouma vibração elétrica em ondas ultracurtas, de comprimento da ordem dmícron? A que revoluções, aplicações, métodos psíquicos, didáticos e

lásticos poderia tudo isto nos levar! E se a ciência abrir as portas deste mrio constituído pela psique humana, que coisa será o estudo e a escola n2.000 ou 3.000? Fantasias pueris e distantes? Não creio.

Trata-se de um fato verificado, para quem possua o hábito da criaçãolectual, que esta não resulta absolutamente das vias da cotidiana conscinormal, cuja atuação nos é tão útil nas necessidades e correlações da Parece que o progresso da racionalidade consciente e reflexa encontra-s penso, porque, para as construções superiores, um mecanismo mais ínticomplexo deve ser posto em movimento, sendo confiado a uma parte profunda do nosso eu, onde a consciência e a vontade chegam apenasluta ou absolutamente não chegam. Estas coisas não são novíssimas e nhas, mas sim velhas como o homem. Somente não foram ainda analicientificamente. Há muito que os poetas possuem as suas musas, assim os músicos contam com sua inspiração. Wagner, no seu diário de vida veana, falava de um louco – o seuTristão : “Aquele louco me surgiu claramenteu o transcrevi rapidamente, como se o conhecesse há muito, de memória”Perosi diz que compor é para ele uma necessidade impulsiva de temperato. Chopin compunha numa espécie de êxtase. Não serão os artistas tantenas sensibilíssimas, estendidas no infinito, aptas a registrar vibraçõesteriosas? E não são eles todos assim? Penso então em Mussorgsky, RimKorsakov, Stravinsky, Ibsen, Dostoievski etc., sem saber por que eles meà mente justamente nesta hora. De fato, todas as mentes, sejam elas de tas, cientistas ou mesmo santos, cada uma em seu campo, quando se pr

ram ao alto, para arrebatar uma nesga do grande mistério das coisas – comoverdadeiros tentáculos que a evolução, em antecipação, atira ao encontdesconhecido – adotaram um meio desconhecido pela racionalidade comque parece coisa pedestre, de uma dimensão inferior, condenada por sua reza a nunca se elevar acima do plano no qual se move, num infinito trade análise, sem esperança de síntese.

A minha audácia reside em considerar que este método, até agora de ção, deverá tornar-se “normal” por evolução. Não nos temestes cinquentaanos de materialismo provado e ensinado a evolução orgânica darwinian

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estes milênios de vida das religiões não nos ensinaram a ascensão espirUnamos estes dois conceitos e teremos uma evolução única, psíquica, criação biológica. A linha da evolução se delineia, no começo, através dtativas, em casos esporádicos, por acenos embrionários, a princípio supe

mais, com uma tendência lenta, gradual e tenaz nas suas exceções às noTratar-se-ia, ao mesmo tempo, de um método de indagação radicalmente completamente diferente daquele dedutivo e indutivo, que o precedeu eutilização tanto criou em toda a ciência moderna; passar-se-ia ao métodotivo, que revolucionaria o pensamento humano. Fantasias, dir-se-á. Se a cia deseja decisivamente penetrar no íntimo mistério das coisas, é necesum veículo mais rápido, um instrumento mais agudo, que não seja a razãoque deveríamos crer que a ciência nada mais saberia nos dar senão prodmecânicas? Por que a inspiração deve limitar-se unicamente às formas acas e poéticas? Por que não poderá ser ela uma inspiração nova, filosmatemática, social, moral, científica, numa condição normal, e não maicepcional como até agora? Por que esta arte de sentir por via imediata nãderá se tornar por evolução o método normal de investigação em todos ocampos do saber? Neste psiquismo superior, o pensamento é mais potenasce espontâneo, sem trabalho e sem fadiga! Que poderá, então, aflormistério das coisas? É audaciosíssimo, mas não absurdo, pensar na generção futura do método intuitivo, hoje excepcional.

E quem sabe se, dentro de alguns séculos, não estudaremos e aprenmos utilizando métodos de sintonização? Ou se a fadiga dos livros será tituída pela harmonização vibratória do ambiente? Já possuímos os recres de radio e televisão. Sabe-se que a matéria, no fundo, é energia e q pensamento também é energia, transmitindo-se por ondas. Não é absurdse possa, sondando o mistério do subconsciente, alcançar a transmissã

pensamento por sintonia.A sua assimilação se dará não com a fadiga do estudo, mas sim por rção de um transmissor, que funcionará como distribuidor e recomposit pensamento por via conceptual direta, sem forma de língua ou palavra.

Este método da intuição teria, segundo o testemunho dos que não pocriar senão pela inspiração, a enorme vantagem de suprimir a fadiga. Aautomatismos do pensamento já são de experiência comum e utilizáveis bém como método didático. Quem já não observou que tudo quanto lemestudamos à noite ressurge facilmente diante de nossa mente pela ma

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Existe, pois, ao que parece, a possibilidade de se confiar ao subconscuma tarefa a cumprir, independente tanto da vontade como da consciên portanto, livre de qualquer esforço. O subconsciente parece ser uma máobediente, à qual se pode confiar a execução de uma tarefa quando, po

processo autossugestivo, tenha sido dada a ela uma ordem. Poder-se-ia maneira pensar uma ideia e, depois, abandoná-la, porque aquela parte dque independe da consciência continua a desenvolvê-la sem fadiga, amrece-a sem atenção, desenvolve-a e, mais tarde, leva-a completa e amacida à consciência. Isto não é absurdo, porque, sem dúvida, o eu é mmais vasto do que a consciência, tendo uma grande parte sua existinagindo além dela. Há, fora do poder desta, um grande reservatório de sque não aflora senão em casos especiais; um vasto armazém, onde as imsões se elaboram, quem sabe por que processo! Não são todas as nossasções orgânicas – respiração, pulsações cardíacas, movimentos peristáltietc. – confiadas ao subconsciente, ou seja, a uma consciência que não chrei inferior, mas sim pré-formada, na qual estes funcionamentos já estãfinitivamente fixados por automatismos?

Poderíamos levar isto ainda mais adiante. Suponhamos que a consciêenquanto for vontade e fadiga para formação de automatismo, não seja pamente a consciência e que a tendência da sua evolução, assim como o tado do seu funcionamento, consista num estado de estabilização no qual os produtos conquistados no trabalho concluído se fixam por automattransformando-se de tarefa a executar, de obstáculo a superar e de meta aquistar em qualidade adquirida, ideia inata e instinto inerente à personalidnela indestrutível. A que deduções, seja no campo do estudo individualno do ensino, pode conduzir o conceito desta fixação, por assimilação noconsciente, de todas as experiências, noções e impressões da vida; deste

cesso de estratificação da personalidade, em contínuo desenvolvimento ecimento por dilatação da consciência; desta absorção na própria psique, parte de si mesma e de forma indelével, de tudo o que a alcança! Se a cisoubesse encontrar a via para lançar as impressões no subconsciente, como encontrou os meios para penetrar na estrutura atômica, não poderia bém – da mesma forma como, na desintegração do átomo, alcançou a enem abundância – realizar o aprendizado sem fadiga?

Poder-se-ia deduzir ainda, como outra observação, que o estudo não deser somente um processo todo exterior de aquisição de noções. Para acu

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noções de fatos, que significa simples erudição, já não bastam os meiregistro mecânico, a começar pelas bibliotecas? Sendo assim, por que p bar a psique? Isto é tanto mais verdadeiro quando parece que, muitas vezciência que se aprende na escola nada é levado para a vida, depois que fo

despejada pelo estômago cheio do aluno. O estudo deveria ser, sobretuarte de orientação no saber, o trabalho de formação da mente e da conscia maturação substancial da capacidade cultural, e não mera colagem dções. Em outros termos, deveria ser um exercício destinado à formaçãautomatismo do pensar, à transformação do ato de pensar – tão exaustivo, in-certo e imperfeito nos menos evoluídos, como acontece na maioria domens-crianças – em ato automático, espontâneo, instintivo. Tornar-se-iaato sem fadiga e cheio de alegria, uma irresistível necessidade, como ssua satisfação todos os instintos, uma vez verdadeiramente fixados na coência. Explicam-se assim certas paixões raras, mas que existiram e existecuriosidade no saber. Casos em que o pensamento representa uma funormal e instintiva, uma necessidade vital, e não uma exaustão. Parece, eque o centro da vida se desloca do nível vegetativo orgânico das paixõeso nível da concepção e do pensamento. Aí, a personalidade vive espontmente, sem aquele esforço do qual tentam fugir, como diante de um sofrto, todos os dias e com tanta tenacidade os nossos alunos.

Esta minha palestra nos levou longe, ao mundo para onde convergecampos mais complexos e novos da ciência, o qual aguarda os audazeselevados, que buscam investigar, descobrir e concluir. São coisas distatalvez menos do que se crê, mas coisas do amanhã. Lá se encontra o futu pensamento humano e também da escola. Entretanto a humanidade camA psicotécnica, digo-o sem ironia, talvez não seja apenas uma palavra como frequentemente se usa na ciência, para denominar velhas noções

tam-se de expressões necessárias e naturais, porquanto os movimentos pcos, em todos os campos, são transformações biológicas. Estes são os farealidade é que este movimento mundial tomou pulso e arrasta o pensamdo mundo com uma força e uma velocidade sem precedente na história.

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QUINTA PARTE

PROBLEMAS ATUAIS

A HORA DE NAPOLEÃO (1939)

Um recente volume,Vida de Napoleão , escrita por ele mesmo, tradução itliana da edição inglesa de Murray, de 1817, convida-me a colocar mais emente em foco o meu pensamento sobre este grande homem e seu destinoé também o destino de um povo e de uma revolução. Isto encerra, em síos acontecimentos de um continente, de um período histórico, de uma ideia social, tão vasta, que ainda caminha.

Deixo aos historiadores os pormenores dos fatos, que não valeriam arepetir. Agrada-me, entretanto, investigar por trás deles, a fim de descobfio sutil com o qual o destino entretece a vida dos homens e dos povos. Nleão foi um homem de exceção, por isso, nele, o destino foi constrang falar com mais evidência. Cada vida possui uma lei, mas em tais vidas, ealíssimas, fala a história.

Não me interessa a pesquisa de estudiosos de coisas napoleônicas, se oé de seu punho ou obra de intérpretes. O sabor napoleônico naquele esti busto, nervoso e concreto existe, e isto me basta para sentir-lhe, atrav palavra, a figura e o pensamento. Naquele estilo vibram a vontade e a de palpita a potência do homem habituado à ação e à vitória. Por este motivvolume de um fôlego, e eis que, tão logo o concluí, nasceu em mim escrito. Poucos livros sabem excitar em mim tais reações e poucos tenho etrado assim densos de vida e de conceitos.

◘ ◘ ◘ Li nas profundezas da vida grande e trágica deste homem os ensinam

da história! A moleza do reinado enfraquecido de Luís XV, filho degenedo Rei Sol, perde até a sua última justificação de graça na bondade démíope do pobre Luís XVI, vítima da força. A tempestade de sangue se dcadeia, e, do terreno ainda vermelho, nasce uma epopeia heroica e trágicaa qual é chamado como protagonista um desconhecido e humilde corso.

Ele é feito para a guerra, e o destino, que parece saber disto, constrana fazê-la e vencê-la. Com a revolução às costas, é colocado em situaçã

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não mais poder retroceder. Desta maneira, envolve-se de forças que smam às forças dos acontecimentos, cujo desejo é valorizar a sua indiscautoridade no meio de uma sociedade que renova a sua construção, ascondições e os seus quadros. O corpo social que nasce da revolução m

sua estrutura. Abaladas as velhas organizações, há um esforço de reestrução na procura de novas e estáveis posições num terreno livre, exigindmens novos. Sobre o vazio gerado pela revolução quanto a cabeças coroa história podia escrever: procura-se um chefe. Aguardava-se, todaviaum chefe se revelasse. Em oportunidades mais naturais do dinamismo sonde as posições estão bem protegidas, e não completamente desmante por revoluções, a história não teria a iniciativa de chamar à valorização va as qualidades desse homem, fossem elas as mais extraordinárias. terreno não estivesse livre e a história não se encontrasse em expectativleis da vida não concederiam excelsas valorizações ao indivíduo, nem puros objetivos de afirmação pessoal.

Sem exagerar em sentido algum, creio que, no duelo entre o homem e tória, reina, mais do que a guerra, uma suprema e divina harmonia que oloca tempestivamente lado a lado para maior rendimento de ambos. A leversal do menor esforço está presente também no campo social.

No fundo da ferocidade que havia manchado de sangue o primeiro suruma ideia nova, havia alguma coisa de verdadeiro, de justo e de potente. o sentimento de renovação, a explosão primaveril dos renascentes imp biológicos, que investiam com decisão e diretamente contra a decrépita do velho regime, agora vazio de sua potência substancial e sobrecarregaincômodas superestruturas seculares.

Evidentemente, a revolução francesa continha princípios. Se estes, ncio, manifestaram-se sob a forma mais baixa, isto era porque o objetiv

destruição estava confiado àquele período primordial. Superada a fase necria da limpeza do terreno, Napoleão pôde começar a construir. No fundo, não se trata senão de uma longa e lenta revolução secular,

qual a organização social se aperfeiçoa continuamente, ascendendo à julevando, com princípios de igualdade sempre mais amplos, para um núsempre maior de cidadãos, o direito à vida coletiva. Os incidentes de entviolências e as incompreensões passam, mas o princípio permanece. aquele movimento ascensional lento e constante, embora acidentado, damadas inferiores sociais, que sobem, demonstrando conter as mais fecu

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reservas de vida, que aflora assim à superfície da história, sempre renonestas obscuras sementeiras.

◘ ◘ ◘ A história, impregnada das criações graciosas do século XVIII, experi

tava um período de guerra e de poderio, exigindo de um Napoleão a forçvontade para disciplinar a nova ordem, que ameaçava naufragar na rivalentre as nações, primeira e natural consequência do sistema representativum povo não antecipadamente preparado. A vida produz em Napoleão nota de força necessária para a sinfonia dos seus desenvolvimentos, utiliza no momento oportuno, a fim de completar o seu concerto com as demai

Delineiam-se aqui os dois momentos da vida de Napoleão: aquele emexecuta a sua missão, estando de pleno acordo com as exigências da históaquele no qual ocorre o reverso. Há lógica na troca de posição da vida dhomem e no desenvolvimento de um fenômeno social. Não se pode discde que, enquanto Napoleão sintetizou o esforço de um povo para fixarideia no mundo, as forças da vida não o abandonaram. A ideia revoluciovoava com as águias contra os velhos sistemas decadentes da Idade M Napoleão resume em si o duelo imenso que se travava entre a França e odo civil de então. Não havia na realidade senão uma luta universal de iduma tentativa de expansão, como verificamos ainda hoje, em proporções res. A coligação da Europa e a França representavam dois princípios em“Napoleão devia completar a revolução, dando-lhe característica legal, a fimde torná-la reconhecida e legitimada pelo direito público da Europa”. Enqn-to batalhou pela aceitação de princípios novos e elevados, o destino lhfavorável. Assim aconteceu porque os chefes, conforme acredito, não sãonas servidores e artífices da evolução, o que já seria grandioso, mas, sobdo, instrumentos momentâneos e ativos do pensamento de Deus. De a

com o mesmo princípio, a história afasta os seus grandes homens quandservem mais aos seus fins. Inutiliza-os quando eles não querem ou não pmais servi-la. Ai, portanto, daquele que atraiçoa a sua própria missão, pverá abandonado pelas mesmas forças que o elevaram à posição de coman

◘ ◘ ◘ Aqui se inicia a segunda fase da vida de Napoleão. Por motivos muito

fundos, a força na qual ele havia acreditado o abandonou. A sua vontadevimentara outros impulsos em seu destino, que, como qualquer outro, nãfatal e inelutável, mas consequência de um feixe de forças sensível ao n

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desejo. Ele havia confundido a sua própria pessoa com a sua missão e ada revolução. O triunfo aparente da força pareceu-lhe a substância, a finde do poder, quando era apenas um recurso precário. Cansada pelo esforrevolução, a França desejava refazer-se sob a proteção da sua espada, n

tanto, após tanta guerra, demasiada guerra – a guerra pela guerra – acabou porse esgotar. Exaurida a sua função de expandir a ideia, o instinto dos pnegou-lhe cooperação. A semente atirada não exigia, para germinar, tão dante sacrifício de sangue.

Cristo, que venceu e vence sem a força, em maiores proporções, devsido, com certeza, um enigma para Napoleão. Existe, portanto, uma leigeral, segundo a qual um princípio de vida sabe encontrar todos os meiosafirmar-se, quando deve fazê-lo, porque se encontra na estrada da evoluçã

Em dado momento, apresentou-se ao seu destino uma empresa temeEle, todavia, escolhera a lei da força, que não admite acomodações co planos da Lei. A força, com a mesma natureza inexorável e desapieagiu contra o próprio Napoleão. Por isto, revivendo o seu caso com mexperiência nos tempos modernos, sente-se por instinto que o espírito, quanto a força, é elemento necessário de afirmação e de solidez em todempreendimentos humanos.

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O PROBLEMA AGRÁRIO (1939)

Ao iniciar esta série de artigos, eu me propus abordar pontos mais vita problema social de hoje. Portanto não se estranhe que me ocupe també

agricultura, pelo menos em linhas gerais, uma vez que ela coopera na inficação do nosso amor à terra.Para quem chegou, por caminhos próprios, àquela unidade de conce

sintética que falta à ciência moderna, é fácil a passagem do problema mésanitário, de que falei em artigos precedentes, ao problema agrário, umque ambos se apoiam na mesma base biológica e derivam da mesma raiz penetra nas camadas profundas da vida.

O problema técnico agrário é, antes de tudo, um problema de orientaçãral, sem a qual a experimentação não possui princípio nem guia. Tambémte campo, surpreendemos o materialismo, que chamarei de doença psicoldo século, nas suas últimas consequências e prosseguimos na mesma canha em prol da obra de ressurreição, desejada sempre no campo especificada problema particular. Por este motivo, cada um destes artigos soa um toque de alarme, para que eles sejam escutados e compreendidos. Sabque a orientação materialista do último século, cujas últimas consequê práticas em todos os campos ainda vivemos, pode constituir, conforme sserva, um perigo para a saúde humana e representar também um atentadoa fecundidade da terra.

Quando a concepção unilateral do materialismo chegou ao terreno dalizações (a passagem é fatal e rápida) e, com o seu simplismo mecânico rimental, ignorante dos aspectos mais profundos dos problemas, invacampo biológico, não podia, na sua pretensão de impor-se às leis da vidnão provocar uma reação delas, porque são leis invioláveis.

Assim como, nas construções, é necessário conhecer a resistência dos riais, a fim de não os submeter a um esforço superior às suas resistênciascificas, também no terreno biológico o material vivo possui um campo dxibilidade e resistência, o qual permite suportar apenas momentaneamendeterminado trabalho, estabelecendo um valor limite além do qual a eladade biológica não se mantém. Ultrapassados estes limites naturais, o serhomem, animal ou vegetal, adoece e a terra, que é viva também, torna-seril e depauperada, como um verdadeiro doente.

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Este é o resultado do choque de uma diretiva errada segundo as leis da Trata-se de uma psicologia de violências, que pretende impor-se e forç princípios do funcionamento orgânico do nosso mundo. Se estes sistemrem mantidos por longo tempo, perguntamos à ciência quais serão os re

dos em todos os terrenos onde o homem encontra a vida? Os problemsaúde, assim como o da fertilidade, são problemas lentos, vastos, hereditque abraçam várias gerações.

Entremos particularmente no âmbito agrário. Neste campo, aquelas prsas psicológicas instauraram um regime de prepotência por parte do homemesforço por parte do subjugado mundo orgânico. Este regime, que deu lu princípio, a uma superprodução, não deixa agora, como resíduo do seu sup balho, senão uma subprodução, filha do depauperamento. Expliquemo-nos

A orientação científica da agricultura incorreu em três erros, que são perigos; o erro econômico, o erro mecânico e o erro químico.A industrialização agrária trabalha fazendo prevalecer os critérios econ

cos. O proprietário rural já é um contador que calcula a sua renda, devfazê-lo instigado por várias causas estranhas à agricultura, tais como o riscolocação da produção, a concorrência dos mercados mundiais, as oscilde cambio, a dependência em relação aos países estrangeiros para obtmatérias primas necessárias à indústria de adubos, etc. Estas pressõesviolar o equilíbrio dos fenômenos naturais. Esquece-se de que, nestes cios, o processo econômico não se pode isolar, porque se intromete no prso vital, que é fundamental. Se o ignorarmos, se o violentarmos, destruirtambém o resultado econômico. Trata-se de material vivo, o qual, pormotivo, impõe exigências que a industrialização agrária tende a ignoradescuidar, trazendo consequências com as quais se deve arcar. São fenômvitais, onde se trabalha com organismos, e todo o solo é um organismo

possui vida. Nesta existe alguma coisa de imponderável, algo que, senorigem espiritual, foge a toda orientação materialista. Um trabalho agrdepende de fenômenos biológicos que vão da unidade coletiva de morganismos, que compõe o húmus, até às plantas, que vegetam, aos anique se nutrem, e ao homem, que vive da terra. Busca-se hoje transformarenos, plantas, animais e homens em problema aritmético. A tendência aconsiderar a terra como uma equação química de elementos nutritivos, sdo a qual terreno subnutrido mais adubos é igual a terreno mais produTrata-se de uma concepção simplista, fechada numa visão econômica un

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ral, na qual se negligência fatores demais para que a equação corresponrealidade. Isto sucede também com a pecuária. Uma vaca não é um mecan para transformação de forragem em leite e carne. Com esse critério, os nismos animais são forçados à produção intensiva, sob a pressão de um re

alimentar também intensivo. A natureza suporta pouco o trabalho excesSobrecarregada assim, qual máquina, desorganiza-se, e o animal “inexplica-velmente” se enfraquece, tornando-se estéril. A terra perde a sua capacida produtiva; os animais nascem mal e doentes, organicamente tarados, aprtando partos difíceis, tuberculose, aborto epizoótico9, esterilidade. O critérieconômico nos fez esquecer o supremo equilíbrio da natureza, as leis prdas que fixam os limites de cada existência. A exploração indevida defunção somente se pode obter à custa da depressão de outra função. O anão é uma máquina de produção e de renda. Por mais agnóstico que se qser, não se pode violar as imprescritíveis finalidades da vida.

Se o erro econômico grava todo o negócio agrário, o erro mecânico ero químico gravam, sobretudo, a terra. A máquina, usada para a superpção e para a obtenção de um custo menor, proporcionou, como veremos,vantagem momentânea pela adubação química. Nada se rouba da natuapenas se antecipa o usufruto mais rápido das reservas naturais. Os redos da industrialização e da mecanização da agricultura levaram a uma ide lucros, altos a princípio, depois estáticos e, finalmente, decrescent ponto de impor o uso progressivamente maior de adubos químicos e a nsidade de um trabalho sempre mais intenso. Delineia-se, assim, uma fase negativa da lei que regula os lucros, exigindo um esforço e uma decada vez maiores, para vencer a tendência da terra a produzir cada veznos. Aumentam as doenças das plantas, diminuindo, como nos animai perprotegidos, as resistências orgânicas. Repete-se aqui a mesma conse

cia da excessiva proteção bacteriológica usada pelo homem.Encontramo-nos diante dos últimos resultados das premissas materialunilaterais e ignorantes dos sábios equilíbrios da vida. O método da agriccientífica, técnica e mecânica, depois de ter oferecido um resultado imedefêmero, alcançou um limite além do qual o rendimento se detém, e a nza, mais providencial do que o homem, nega-se a trabalhos forçados. Es

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Epizootia: Doença, contagiosa ou não, que ataca numerosos animais ao mesmo tempmesmo lugar.

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nômeno se revelou, com evidência, na adubação química destruidora dastérias necessárias à vitalidade do terreno. Não propomos que ela deva serlida, mas sim usada com o necessário bom senso, para que se evitem gdanos. Cedo a palavra às vozes autorizadas. Que não me acusem també

visão unilateral. Ehrenfried Pfeiffer escreve no seu livro A Fertilidade da Ter-ra : “É notável o efeito imediato da adubação química sobre o cresciment plantas, aumento de produtos, arbustos túrgidos, particularmente quanempregam adubos artificiais azotados. Tais resultados tornam os adubosmicos preferidos pelos agricultores. Abarrotando os mercados consumidociência afirma que, com tal prática, balanceiam-se os elementos deficiEntretanto duas conclusões vão se impondo com frequência aos práticovivem e trabalham em contato com a terra: uma é que, para manter a prodno mesmo nível, é necessário aumentar de ano para ano a quantidade de bos químicos, e a outra é que a estrutura do terreno se transforma no sentmencionado do endurecimento e da incrustação. Por que motivo as nosscolas de agricultura e as nossas estações experimentais se calam diante fenômeno, observado pela maior parte dos práticos? Fala-se tanto do imento da produção, mas muito pouco da alteração do terreno. Não possas estações experimentais, para as pesquisas comparativas, áreas de terrcondições que permitam o estudo de tais transformações?”.

Para quem só admite uma verdade quando sabe que ela é sustentadanomes autorizados, citarei Tallarico, Suessenguth, Niklewsky, Ienny HFippin, Elmer O, Dreidax, Berlese, Bartsch etc. Com eles, esboça-se umsão mais exata do uso dos meios químicos no campo da agricultura.

Os seus perigos são mais três: 1) Aumento não proporcional de renda erelação ao custo do adubo. 2) Esterilização do terreno. 3) Perigo para a saúdedos animais e dos homens que se nutrem daqueles produtos.

Eis o que diz Chimelli a este respeito: “As regiões de nova conquista m- preendem geralmente os terrenos ricos de húmus acumulados há séculovegetação espontânea. Se o húmus não for reintegrado com suficientes aorgânicos e com processos de formação natural, ele será destruído em pemais ou menos longo, e então sucedem, inevitavelmente, os fenômenos ovados por todos os agricultores que tenham trabalhado com adubos químou seja, a mudança da estrutura normal para o excessivo endurecimenterreno, a formação de crostas na superfície, o aparecimento de manchas

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reis nos campos, a deficiência de capilaridade e, por consequência, a dimção de disponibilidade hídrica e a regressão da fertilidade etc.”.

“Com os nossos métodos de cultivo intensivo”, acrescenta Pfeiffer, “i-cularmente com o uso abundante de exclusiva adubação química, criamo

condições, que as propriedades físico-químicas do terreno predominamatividades orgânico-biológicas caem em depressão. A mineralização da além de ocasionar o desaparecimento das minhocas, acarreta a formaçuma crosta na superfície durante o período de seca. Este fenômeno deverconsiderado pelo agricultor como sinal de “tempestade”, denunciada pelo ba-rômetro do seu terreno. Uma vez arruinada, a reconstrução da saúde dterreno é um trabalho lento e laborioso”.

Referindo-se à saúde dos animais e dos homens, assim se exprime o céfisiologista Abderhalden: “Com muita frequência e emdiversos lugares, determinadas doenças dos animais e dos homens foram atribuídas ao métoadubação das plantas alimentícias. Não se pode ainda afirmar com segurmas é admissível que importantes substâncias sejam elaboradas pelas bacdo terreno; devemos refletir bastante se é certo destruir a vida e a ativsutil dos micro-organismos, introduzindo azoto sob a forma de nitrato dtássio, cálcio, ácido fosfórico, que perturbam e impedem o desenvolvimdos organismos vivos e provocam dificuldades futuras”.

Assim diz, enfim, o Dr. V. Ratto, emSaneamento Médico : “Os casos sempremais frequentes de trombose, câncer, arteriosclerose e diabetes fazem sus(aos médicos dotados de respeito à biologia em geral – vegetal, animal e humana) que a causa desta série não totalmente nova, mas de peso crescente de ças humanas, esteja ligada aos métodos de cultivo adotados, isto é, depeníntima qualidade minimamente e imperceptivelmente venenosa dos alimdos animais e do homem e dos remédiosusados contra os parasitos”.

Problemas delicados, problemas novos. É necessário, para compreenagricultura, um senso religioso da natureza, da qual ela faz parte; senti-sua realidade palpitante em relação a todo o cosmo. Como coisa viva qtorna-se absurdo reduzi-la, nas abstrações de gabinete, ao artifício da exmentação absurda, divorciando-a da harmonia universal. A planta possuisensibilidade e vontade individual, instintos que não se podem contrariterra é uma unidade vital coletiva com estas mesmas qualidades e, comoage, reage, escolhe, defende-se e possui uma consciência íntima das coisalhe pertencem, podendo recusar ofertas. Não se lhe aplique um sistema m

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nico de química orgânica. Quando fornecemos o adubo artificial, a pla prova e percebe que ele pertence a um ciclo de vida diverso do seu; sedistância que o separa de si e a falta de afinidade; recusa-o porque se ach possibilitada de admitir sem prejuízo, no círculo do seu recâmbio, aquilo

por atávica experiência, lhe é estranho. Somente o adubo natural, por ser bacteriológica e quimicamente afim, e por estar no mesmo plano orgâ pode ajudar e ser assimilado. Em outros termos, poucos são os pontos detato entre o mundo orgânico e o inorgânico para que o primeiro possa seabrir as portas ao segundo, a fim de aceitá-lo no seu metabolismo. A desta maneira, assimila e digere bem somente os produtos orgânicos, de que, se não a nutrirmos com um alimento sadio e apropriado, ela adoececom ela, tudo quanto nasce dela ou dela dependa.

Chega às minhas mãos, quando estou para terminar, um opúsculGnecco, de Gênova: Exposição de um sistema racional, prático e econômico para aumentar a fertilidade do solo , onde se comentam os resultados já exprimentalmente obtidos pelo sistema da “Vegetina”, com uma orientação msemelhante à nossa.

Problemas delicados, problemas novos. O estudo profundo destas quedevia levar-nos a uma visão global da vida, sem deixarmos de parte o limcampo técnico. A visão sintética e unitária não podia deixar de nos guiar renovamento de visão e de conceitos diretivos, que não permitem mais a tência numa técnica agrária exclusivamente química, impondo-nos acrescàquela técnica processos biológicos e dinâmicos, próprios da terra. É necrio, também neste campo, superar a matéria e recordar que a agricultuapoia no fenômeno vida, contendo em si algo de espiritual, justamente co parte responsável e diretora. A agricultura implica também o senso de ade intuição clínica que se exige do médico. Torna-se indispensável aque

pírito de colaboração, que é fundamental na natureza, perfeita em sua mlhosa harmonia. Pode parecer estranho, mas o fator espiritual é tão vaíntimo em todas as coisas, que não se pode menosprezá-lo sem prejuízomesmo no que se refere ao problema da produção, tido e havido como meno exclusivamente econômico, industrial e mecânico. Em que pese aolitaristas, outra orientação deve agir qual novo impulso, até nos pormedos problemas técnicos. Este princípio concebe a sociedade humana ctotalidade orgânica e não pode deixar de encarar a natureza senão como

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 148

totalidade harmônica. Alcançamos deste modo uma interpretação socialexata da solidariedade de todas as formas da vida.

Amemos a terra conjuntamente com a nossa pátria e a nossa família; mos a terra, viva como nós e como nós criatura que adoece e se cansa. S

mos conservar-lhe a saúde física para as futuras gerações. Ela é mãe de as coisas, sobre ela se reveza o ciclo da vida e da morte. No seu ventre pco, no seu húmus, que é campo da morte, renasce a vida vegetal e animamo renasce também a nossa vida. Esta terra não é somente um compostomico, mas sobretudo um organismo vivo, rejuvenescido pelas irradiacósmicas que a atingem, pelos micro-organismos que a purificam, pelosmes que a fecundam, por todo o trabalho vegetal e animal que lhe poventranhas e a superfície. A terra é útero que recebe, protege, fecunda e reDepositária da vida, conservadora dos germes, princípio feminil de defeespera e de reprodução, eletricamente negativa, armazenadora de vibrcósmicas, expande-se ao ritmo das irradiações solares, passiva somentemelhor agir no silencioso trabalho interior; a terra contém toda a potêncconstrutiva do amor, que perenemente regenera, preenchendo os vaziomorte. Sobre o dorso desta criatura irmã, que não é máquina, soerguetodos os fenômenos sociais. Retribuirá o nosso amor dando-nos o fruto dseio. Porém, se a maltratarmos, violentando-a, ela se fechará em si mtristemente, e nos negará os seus favores, porque, sem amor, não há criaç

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 149

O PROBLEMA RELIGIOSO (1939)

No equilíbrio da vida existem dois aspectos, os quais, integrando-se procamente por serem complementares, originam-se dos dois extremo

delimitam o âmbito dentro do qual oscila o movimento da vida: espírito téria. Eles apresentam-se como poder espiritual e poder temporal, como e Estado. Observamos, em todos os agrupamentos humanos, a existênccasa de Deus e da casa do chefe, a catedral e o paço municipal.

Numa civilização equilibrada, a dissonância da luta entre os dois pr pios é evitada, alcançando-se a harmonia. O Estado é o princípio viril, vvo, que afirma, possuindo a função concreta da ação, da organização guerra. A Igreja é o princípio materno, afetivo, de conservação, de sacri possuindo a função intuitiva da fé, do esforço espiritual, das lutas e contas interiores. Assim como a Igreja, numa civilização completa, não viver na Terra sem a anuência do Estado, este não deve viver sem a direspiritual da Igreja.

A religião que rege a civilização europeia há dois milênios é o cristianE, uma vez que a civilização europeia pode ser considerada a alma do mseria absurdo não reconhecer a força daquela instituição.

Entretanto o cristianismo, por sua vez, dividiu-se em dois aspectos diftes, embora complementares. Aparentemente, é uma divisão de almas, substancialmente, constitui apenas uma divisão de trabalho, uma especição por atitudes diversas, uma separação tendente a reconstruir a unidade

A Igreja latina, talvez justamente pela função pedagógica que lhe foi aída, assumiu prevalentemente a forma de organismo concreto de homnormas, teologicamente racionalizante e mundanamente legisladora. A anglo-germânica, ao contrário, aprofundou preponderantemente o lado i

or, pessoal, intuitivo.É inútil discutir a realidade. Os povos possuem hábitos diversos eacordo com estes, preenchem as suas funções, escolhendo cada um as adaptadas ao próprio temperamento. A Europa subdividiu assim a sua treligiosa, lançando-a desta forma ao mundo. Os latinos aprenderam dadade o aspecto transcendente, o conceito, a racionalidade, a objetividcolocando-se, deste modo, em condições de continuar e desenvolver osamento dos grandes filósofos gregos, assimilando os produtos do pensato individual e coletivo. Os anglo-saxões extraíram da verdade o asp

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 150

imanente, o senso íntimo da Divindade, a intuição, o subjetivismo. É evtemente unilateral o insulamento na atitude exclusiva da transcendêncda imanência. As leis da vida nos mostram contínuos exemplos desta plementariedade, atravessando fases de contrastes para alcançar a uni

uma unidade múltipla e complexa, mas completa. Estes dois princípiode fato necessários: tanto o absoluto, do conceito, como o infinito, da iração. É necessário que se compensem mutuamente, pois, isoladamentegarão ou a um extremo, no materialismo religioso, ou ao extremo opostlivre-exame anarquizante. Dois perigos igualmente graves.

Tais ameaças, embora sutis, certamente não atingem a grande massa,esta, que não gosta de pensar, cede a própria responsabilidade e executamecanicamente, com o menor esforço. No entanto são problemas gravesos espíritos profundos, que pensam. Se o imanentismo encerra o perigdispersão, o transcendentalismo conserva o perigo da cristalização. A raclização da verdade pode matar a vitalidade espiritual interior. A definiçãnormas concretas arrisca expulsar a atividade religiosa e perder o senso íe profundo da Divindade, acarretando a diminuição do esforço moral, noestá o único itinerário do espírito que deseja chegar a Deus.

Este é o grave perigo que pesa sobre o cristianismo latino: ausência deritualidade, como consequência da solidez da organização humana. A nedade de se impor aos homens pela coação da lógica, de normas e de san partindo do exterior, foi certamente uma dura necessidade histórica. Nculpa a ninguém se a vida ainda rudimentar do homem exige semelhantecessos. Com certeza, hoje, lamenta-se muito o indiferentismo, que é, na dade, a ausência do fator espiritual.

A experiência interior de muitos e a minha própria experiência místicsinam que não se pode – perdoem-me a frase – encontrar Deus somente po

que o procuramos; o trabalho e a responsabilidade da pesquisa da verestão no tormento próprio, na maturação própria, na luz que se deve bcom a alma inteira, e não se realizam senão através da luta e da dor, que nelevam além do plano das ilusões dos sentidos. Materializamos antropoficamente a Divindade quando procuramos alcançá-la pelas vias da rafora de nós mesmos, no plano sensório, ao invés de buscá-la pelas viintuição, dentro de nós, no plano intuitivo. O primeiro, por certo, é o cnho mais cômodo, porque foge ao burilamento da alma, mas somenteúltimo pode guiar o espírito para Deus.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 151

Vemos, com frequência, que se dá maior importância à discussão do qfé, aos conceitos que devem habitar a nossa mente do que aos ímpetodevem explodir em nosso coração. Preferimos a via da erudição, mais cômmais esplêndida e mais vã, à via do sacrifício, mais áspera e silenciosa, p

mais produtiva. Desta maneira obtemos uma luz esplendente e fria; oracalor, não se constroem almas. O momento atual tem mais necessidade dmens de paixão, que saibam sofrer, do que de intelectuais que saibam pe porque nos falta não o esforço cerebral, mas sim o esforço moral. Acim pensamento está o espírito, acima da razão está a fé. Se, no último séconda materialista, que a igreja também experimentou, conduziu-nos aracionalização da religião, a onda atual, incipiente, nos levará à espiritução. É preciso saber viver ambos os momentos, que são complementarsimples racionalização disseca todos os sentimentos e promove a discuque é sestro de antagonismo e de afirmação, e não ideal de amor e de abção. Por este motivo, alguns espíritos verdadeiramente angélicos esquivse a priori da via do saber, mesmo teológico.

O espírito completa assim o seu contínuo trabalho, variando as suas des. “Et multum laboravi quaerens Te extra me, et Tu habitas in me”10 (SantoAgostinho). Não é este talvez o aspecto mais sublime e mais intenso queo cristianismo nas suas origens? E por que não desejar que o cristianismno se aproveite da cisão anglo-saxônica, nascida precisamente de um exde transcendentalismo, para completar-se com o retorno ao imanentismo al? Reentrar em si para Deus; intuição,“intus itio”11. “Est Deus superior sum-mo, interior intimo meo”12 (Santo Agostinho).

Isto não é acusação, mas sim voto de nova ascensão – da letra que mata aoespírito que vivifica – para que o cristianismo possa cumprir plenamente a divina missão. Existe uma multidão de almas honestas, ardentes e sinc

que sentem nos tentáculos do ateísmo o peso e a ameaça do polvo materie de sua filosofia aparente, dissimulada através da ciência destruidora de

10 “Muito me esforcei pr ocurando-Te fora de mim, e, no entanto, é dentro de mim que Tves”. (N. do T.) 11 Intuição, “intus itio”. Do latim “intuitio” (Caldas Aulete). De “intus” (adv.): interiorno interior. (Saraiva Dicionário); e “itio” (itio, onis, de “ire”): ação de ir, passos (Idem; ibidem). Assim, pois, intuição: ação de ir para o interior, para dentro de si mesmo. (N. do T12

“Exteriormente, Deus está nas supremas alturas, mas, interiormente, está também ncoração”. (N. do T.)

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cípios. Tais almas estão prontas a sofrer, numa unidade de fé, para que orito ressurja, uma vez que ele, em todos os sentidos, é a única força que rque pode salvar a nossa civilização.

Trata-se de salvar e de criar a verdadeira civilização. Há necessidad

homens novos, decididos e convictos, que operem com métodos espiri pois é necessário viver na substância do cristianismo. Isto não se pode rezar acusando os outros, mas apenas ofertando-nos. Portanto menos tra para adaptar o Evangelho às nossas comodidades cotidianas, refugiandatrás de justificações artificiosas e de argumentações de intelectualidadciocinante, com brilhantes e eruditas escapatórias à lei simples e subOferta real de renúncia e dedicação, por amor ao próximo; tensão intluta sem trégua, de conceito e de obra, para a preparação na Terra do Rdos Céus. Isto está longe do método retórico e das exterioridades, que penetram nas almas. Não se trata de discursar ou de aparentar. Levediariamente estampado em nossa alma, o ideal cristão, sem transigênUrge personificar e testemunhar o sacrifício como cristão, mesmo na prça das incompreensões e das condenações. Cumpre saber trabalhar semda, sem reconhecimento e sem apoio. Urge sofrer pelo bem e servir, ma quem nos condene. Substitua-se a palavra e a forma pela própria alm própria dor. Oferte-se, diante do espetáculo vazio da piedade exterior, aceridade e a piedade da alma. À religiosidade rumorosa é preciso contrasacrifício, o Evangelho vivido, que edifica e penetra, sem rumor, sublimcada ato da vida. Vamos começar por nós mesmos, a fim de barrar realmas injunções humanas, cômodas, burguesas e utilitárias.

Estamos excessivamente habituados às convenções de um Evangelhosigente, a uma forma de fé segundo a qual nos iludimos de poder alcanCéu sem demasiado sacrifício. A religião deve consistir numa realização

pleta, incidindo nos costumes, e não numa série de práticas exteriores, qunada modificam os atos e a vida. Não acuso, choro, porque é triste, pois contra Cristo quando se faz da cruz uma espada para agredir o próximovirtude um pretexto de economia de amor fraterno. Dirijo-me, sobretudhomens de boa vontade e com a finalidade do bem. O inimigo é aguerrtrabalha com armas de ferro. Não se pode responder com armas de papelIdade Média era feroz na Terra, mas julgava conhecer o Céu, buscando-lances frenéticos de paixão. Hoje nós dormimos; somos utilitários porqmaterialismo nos penetrou. Não nos restou senão um Céu pintado com es

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dores dourados e voos retóricos de anjos. É preciso enfim superar esta fédente, cômoda e dourada do século XVIII. Precisamos do desprendimenqueremos sobreviver amanhã. A hora é dura e intensa. Sigamos o exempCristo, no caminho da cruz.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 154

URBANISMO E RAÇA (1939)

Regressando à minha pátria de eleição, a pequena Gubbio – cidade do si-lêncio – depois de visitar cidades rumorosas, propus-me analisar a sens

viva e contrastante de duas tão diversas formas de existência. O homeséculo XX escolheu um modo de viver artificial e distante das leis sadinatureza, como se dá no caso das megalópoles.

O urbanismo é problema de saúde ou doença, de sanidade de espíritoraça. É, portanto, um problema fundamental, constituindo um dos aspect problema da raça e da sua defesa. Falar sobre ele significa versar o probda educação das massas.

O urbanismo possui a virtude de nos mostrar, como num campo de cuintensiva entre tantas pragas modernas, os males que o homem criou ccivilização.

Vive-se ali contra a natureza, em mastodônticos reagrupamentos de mhumanas. Afortunadamente a nossa Itália, devido a complexos equilíbriotóricos, não produziu e não sofre de tais tumores sociais, destas hipertdemográficas, monopólios que vivem à custa das áreas restantes, reduzitributárias. Desconhece, por conseguinte, a desolação desses estados conatureza, as misérias que se verificam nas metrópoles europeias, asiátiamericanas. Na América do Norte, de todas as cidades da Itália se fariaimensa e monstruosa metrópole, de sete ou oito milhões de habitantes, peem todos os seus serviços centrípetos e centrífugos, com monstruosidadtodos os gêneros – do arranha-céu ao subterrâneo – completamente inferna para a vida, deixando o resto do país desabitado.

A questão, devido à intervenção de eventuais acidentes históricos, é mgrave entre nós. O problema demográfico pôde topograficamente resolv

segundo a natureza, não deixando, todavia, de existir. Nos estados novísde além Atlântico, a máquina agiu mais profunda e rapidamente, violentanatureza e armando amplas ciladas à vida do homem da civilização precte, ainda não preparado para resistir.

Nestes ambientes de produção intensíssima, onde a vida e a máquinsumiram um ritmo de febre, sem silêncio e sem descanso, a saúde da rasujeita aos mais graves atentados, não obstante os melhoramentos higiênVerificado que a tendência da concentração demográfica parece uma carrística de nossos tempos, pergunto-me que dimensões atingirão tais hip

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 155

fias e qual a entidade ameaçadora para a saúde da raça. Se é fácil, por ples ato de multiplicação, fantasiar a respeito das maravilhas mecânicagrandes cidades do futuro, é também fácil, pelo mesmo processo, imaquanto poderão elas tornarem infernais as condições de vida de seus hab

tes. Cabe, em nosso país, à sensibilidade da política dirigente pressenafastar todos os perigos.Observemos com os olhos ainda desacostumados a tais espetáculos.

acontecer que o bom senso, a voz da natureza, a voz da saúde moral e fcontrariem a opinião da vantagem imediata e do aparente bem-estar.

De fato, a grande cidade, parecendo reunir todos os aperfeiçoamentosralmente não é senão imundície, pelo menos em algumas zonas), atraiirresistivelmente a massa alucinada, que se precipita atrás da miragem busca do melhor. É muito discutível que a perda da intimidade com a naza seja compensada pelos artifícios criados pelo homem. A grande c parece feita para se ver, não para se habitar. Inúmeras coisas, íntegras etuitas no estado natural, são, entretanto, mais ou menos adulteradas e csas nos grandes centros, onde tudo se monopoliza e se industrializa. Mo que foi dado com fartura e generosidade pela natureza não chega na csenão como artefato adulterado, distribuído com o fim de lucro e de neg Não se sabe se o provinciano que vai à cidade para tornar-se menos fazendo holocausto do patrimônio de sua alma virgem e da sua saúde inseja compensado pela economia conquistada e pela indiferença de espadquirida no turbilhão citadino.

“Nas grandes cidades das infinitas gaiolas de concreto armado de mandares”, diz o Dr. Enrico Gilardoni numa exposição sobre o probleme-mográfico, publicada na revista A Força , de dezembro de 1935, “o ar é cor-rompido pelos miasmas dos carburantes, pelo pó dos veículos e das fáb

pelos vapores dos termossifões e das máquinas, de onde uma ameaça cnua para as vias respiratórias, sobretudo para os seus delicadíssimos vibráteis, que, conquanto deveriam constituir a nossa maior defesa pulmcontra a tuberculose, acham-se já enfraquecidos nas suas preciosas funda acidose ou da hiperalcalose de origem saprofitária e alimentar. Nas des metrópoles, o barulho aturde incessantemente, os perigos surgemtoda a parte; por isso não são mais possíveis a meditação e o recolhimenespírito. Trabalha-se e vive-se quase mais com a luz elétrica do que cluz solar. Trabalha-se e vive-se em completo isolamento do magnetism

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 156

restre. Não falo, por brevidade, dos problemas alimentares, todos por rver, tanto a alimentação moderna se deformou na oficina industrial e, dena cozinha particular, tudo à base de caixas, de empacotamentos, de fertos, de açúcares, de condimentos, de excitantes, de pasteurizações, de e

lizantes, de frigoríficos, agravada, enfim, pelo alcoolismo do vinho, daveja e dos licores, além do alcaloidismo do café, do chá, do cacau, dos tivos, do fumo e das infalíveis gotas reconstituintes. Alcoolismo e alcdismo a que nem mesmo as mulheres fogem... Não me refiro aos cosméidiotas; aos perfumes asfixiantes, às aparências hipócritas, aos disfarcedosos de tudo quanto é simulação nas pessoas e às roupas absurdas. Dtodavia, mostrar os enormes danos da difusão entre o povo dos remsensibilizantes como as fenacetinas, os calmantes, as aspirinas e similarao alcance de todos, a fim de fugir vilmente à dor, ou seja, ao santo griadvertência e de revolta da natureza, menosprezada, e ao necessário meexpiação e de purificação que a natureza exige para nos curar. Devo, ousim, acentuar os deletérios efeitos daquelas antinaturais terapias à ba produtos opoterápicos13, de soros e de vacinas, que presunçosamente a Esla de Medicina Oficial vai sempre incrementando por via oral, hipodérendovenosa e, até, endorraquidiano”.

Somente quem está ainda imune do contagio psíquico e continua a v por convicção, afastado dos grandes centros sente, ao chegar a uma metróqualquer que seja, o absurdo do seu sistema de vida. O novato precisa detrabalho de adaptação para poder suportar e depois avaliar esta substituiçnatural pelo artificial, do substancial pelo fictício, do necessário pelo sfluo. É indispensável certa dose de adaptação para renunciar às grandes rzas da vida, como o sol, o espaço, a paz, gratuitamente distribuídos a como elementos de vida, a fim de ir disputá-los depois, numa luta em q

homem quase se destrói.Os elementos fundamentais de saúde física são também bons desinfetmorais; o sol e o espaço afastam o contágio psíquico e reforçam o ambfamiliar, harmonizando todas as expressões da natureza. Ao entrar num d pátios, para os quais se abrem inúmeras janelas de residências popularedernas, não pude deixar de sentir uma sensação de opressão. Graças amoderníssima caixa, apertam-se como sardinhas em lata inúmeras fam

13 Opoterapia: Tratamento de doença mediante o uso de extratos de órgãos animais.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 157

de modo que a forma física e moral de cada uma é modelada por contato pressão pela forma física e moral da outra, o que me lembra os amontocristalinos nos quais o eu de cada indivíduo, cristal, perde-se no amalcoletivo da rocha. Humanidade em filões, estratificada por peso especifi

valor econômico. Estratificação de carne e de coisas, de dores e de alemisturados e estranhos, amontoados amorfos, organismos sem alma.O dinamismo físico das multidões vibra pelas ruas. Ordem exterior, c

zação de rodas e de passos. Interiormente, o caos. A grande máquina e carga – o homem – vivem em regime de recíproca necessidade, vinculaentre si como dois calcetas14. Em certas multidões, dominam a cor e o o psíquico das fossas. A miséria moral é imensa, triste e piedosa. Submesufocado nesta atmosfera, eu me perguntava com sentimento de angúsque se poderá fazer com esses restos de civilização para reabilitar o ho proporcionando-lhe espaço, luz, saúde do corpo e do espírito?

Somente a posse de tais riquezas pode extinguir a obcecante alucinaçãlo ouro. Uma fé nos renovará e nos salvará. Mas a quem podemos peUma fé sem a grandeza do amor não é senão respeito fingido pelo temdano e pela inferioridade da força. Não basta a máquina do dinheiro, q procurado por todos e utilizado somente para se comprar a mesma mque se quis vender. O dinheiro circula; que percentagem de poluição cicom ele? Será tal quantia a medida da civilização e da felicidade de um p

A produção e o consumo direto nos meios menores eliminam os intermários, os desfrutadores, as adulterações comerciais dos alimentos, protegesimplificando a vida com um saneamento automático de todas estas praga

Além da reconstituição da saúde moral, o contato com as forças e as lenatureza opera a reconstituição da saúde física. A nossa vida, não mais ce pelas feras e pela espada, é hoje cercada pelas substâncias tóxicas da ind

alimentar e por todos os outros artifícios da civilização.Parece que a civilização do urbanismo deseja realizar uma seleção às sas, destruindo com os seus sistemas protetores os poderes defensivos coquais a natureza arma o organismo para lutar e vencer sozinho. Desta mao homem se enfraquecerá e acabará por ter que viver numa campânula ddro. “Os débeis”, diz Carrel no seu livroO Homem, Esse Desconhecido : “são

14

Calceta: argola de ferro fixada no tornozelo do prisioneiro, ligada à cintura dele, ou aoutro prisioneiro, por uma corrente de ferro.

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conservados, assim como os fortes, e a seleção natural não serve mais.guém poderá prever qual será o futuro de uma raça assim protegida pelassas médicas”. Prefiro, como treinamento físico, o frio natural, suportadoresistência e com paciência, o frio que Deus nos manda em harmonia co

leis da vida. Prefiro a fadiga física, que nos ensina a lição da necessidadeCom o tempo, as reservas válidas da raça encontrar-se-ão somentecampos, onde a pobreza adestra-se na resistência, tempera-se nas dificuldonde o organismo não está viciado e inutilizado para a defesa por proartificial e complicações antivitais. Nas grandes cidades, tudo coopera p perda da grande riqueza: a vida simples, aquela riqueza superior e inalieque consiste em saber viver desde pequeno por nossa própria conta. A gcidade exalta os valores fictícios, especialmente os prejudiciais, raramenúteis. Surge assim grande miséria nas altas classes sociais, as mais atin pelos males do bem-estar. Miséria orgânica e miséria moral.

A ciência moderna praticou o crime de destruir, na doença e na dor, plendida compensação moral através da qual, pagando-se os danos na c bilidade divina, que tudo salva quando tudo parece perdido, a naturereequilibra. O materialismo fez da saúde uma conquista mecânica, obsedo-lhe somente o lado físico. As consequências de tal rumo agnósticomutila o fenômeno nas suas interdependências, são pagas com as nossa bulações. A saúde é um equilíbrio entre forças antagônicas, assistidasfator moral, do qual o materialismo prescinde. É piedoso o contraste realidade com a medicina, que deseja se impor à natureza, forçando o nismo, esquecendo que não se pode vencer senão respeitando as leis da Estas fazem da saúde um fenômeno hereditário, preparado diariamentgeração em geração, com a nossa ética alimentar e o regime costumeirode o fator espiritual e moral possui peso decisivo.

Poderá compreender tudo isto a nossa humanidade embriagada de veloce toda presa à mania aerodinâmica? O urbanismo é cópia febril desta psicoDesarticulemos a grande cidade, que é a praga do nosso século. Salv

nos de todas as suas aberrações. A sociedade atual não possui sequer o dos seus perigos. Existe uma única crise verdadeira: a crise da consciêExiste apenas um peso imenso que grava o mundo: a nossa ignorância. Tapenas uma coisa a fazer: libertemo-nos urgentemente, porque os povos bém morrem por falta de consciência.

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Se olho para o alto, buscando uma força auxiliar que já tenha iniciadoobra e possa dar garantias de continuá-la no campo da ideia e da ação, nãosenão a sabedoria providencial e salvadora de uma lei: a lei divina da vida.

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A EVOLUÇÃO E A DELINQUÊNCIA (1939)

Os mesmos atos que, para o homem civilizado, entram no campo da dquência, eram, na fase de vida do homem primitivo, atos normais, lícito

gundo as leis da natureza. Roubar e matar ainda são para os selvagens a etânea expressão das leis fundamentais da luta pela vida e da seleção doforte. O valor do indivíduo, naquele plano da evolução, somava-se no tecapacidade para o mal. O inepto – o menos mau – era inexoravelmente repudado. A natureza, que procura alcançar contínua e impiedosamente as posocupadas pelos valores intrínsecos, não sabia se exprimir, naquela fase inída, numa forma de justiça mais completa.

Numa sociedade primitiva, o indivíduo não existe senão para si mesmunidade, a consciência, a função coletiva são elementos que ainda não apram e não se desenvolveram no germe da vida. As correlações sociais etram-se no estado caótico; as sementes da convivência se chocam sem piedna sua fase primordial, antes de encontrar a via da coordenação. As céluldividuais não sabem ainda organizar os seus movimentos e funções em reà finalidade superindividual, que encerra vantagens e realizações mais alta

Existe, todavia, um grande impulso interior na vida, uma espécie de tade e de sabedoria latente que fazem pressão de dentro para fora, a fiatingir com mais evidência o campo das manifestações. Deste mistériocujas profundezas reside Deus, emerge a evolução, incessantemente acdora e eternamente construtora de formas de vida sempre mais altas. Dmodo, a primeira e mais feroz expressão da lei de justiça, regida por e brios rudes e violentos, adelgaça-se e aperfeiçoa-se. A natureza retocompleta o impulso primordial da seleção e eleva a sua lei a um plano elevado, pois a tendência, objetivamente verificada no fenômeno da e

ção, é a da passagem de um estado de desordem para um estado de orde processo da civilização, que se encontra no âmbito daquele fenômeno,siste na harmonização e na organização, tendendo à transformação dooriginário num organismo coletivo. O homem alcança a percepção do meno da delinquência somente quando se congrega em sociedade e cono interesse coletivo, que dá origem então à função social da circunscdos atos lesivos à ordem pública. Não é mais lícita ao indivíduo a ignordo interesse de seu semelhante. A ordem pública regula-se por uma coência nova, antes ignorada, porque ainda não nascida. Na consciência c

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va, todos os indivíduos se encontram a si mesmos, fiscalizando-se mmente. A medida de civilização é dada pelo grau de transformação do pulsos caóticos primordiais, que integra o indivíduo e suas funções no nismo social, aperfeiçoando-se a forma de luta como elemento da seleçã

As suas raízes são de ordem biológica. A natureza quer alcançar os fins supremos: a conservação do indivíduo e da raça. Se encontrar obstáno seu caminho, procurará desembaraçar-se deles com violência. Se lhe o necessário para atingir estes fins, ela procurará obtê-lo através de quameio. O trabalho é dividido entre o macho e a fêmea, em duas formas inve complementares. O primeiro é feito para a luta, estando encarregado doter da reprodução e da conservação, pelos quais se arrisca e morre, se nerio; a segunda é feita para a maternidade, somando em si as finalidades produção e da conservação, pelas quais também arrisca a própria vida ere. Ambos possuem o seu heroísmo inverso e complementar.

Estes dois sustentáculos da vida, quando degeneram, tornam-se fatordelinquência. Quem passa por cima da lei e deseja alcançar a satisfaçãofraude e pelos atalhos mais cômodos, é criminoso na sociedade hodiernala-se a lei da justiça quando o macho se esquiva ao trabalho e quando a fse furta ao dever da maternidade. Algumas vezes, tal criminalidade nasinjustiça social, que oprime algumas classes e impede a expansão das leturais. A mesma insaciabilidade humana que faz o homem aspirar latentete a ser o dono do mundo e a mulher a ser a rainha de todos os amores, imtambém a planta e o animal, que desejariam, se não fosse a limitação dotáculos, cobrir com a sua espécie toda a superfície da Terra. As mulhereshomens são os próprios vigias das expansões das outras mulheres e dos ohomens; daí nasce a virtude, que, no fundo, nada mais é senão o ciúme d pria expansão. As funções de ordem pública são confiadas ao instinto e

cem deste primeiro controle de polícia natural. A reação do interesse de sobre o indivíduo completa os seus instintos. Se, primeiramente, ele comendeu que o dinheiro é útil e, em seguida, procurou obtê-lo de qualquer maprendeu depois, através das sanções sociais, que o dinheiro não é verdramente útil, se for roubado. De modo semelhante se disciplina o instinamor, que, sujeito à fiscalização coletiva, aprende a não se satisfazer s para proliferar. Assim, o campo social contém em si mesmo, como degeção e correção, os elementos da evolução de sua vida.

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É vão tentar a compreensão e a solução de tais problemas por simconstruções ideológicas e por sistematizações filosóficas. A expressão das questões sociais e, sobretudo, do fenômeno da delinquência não se obter senão cavando até às raízes biológicas, colocando-nos em relação

a fenomenologia universal, para a qual é necessário orientar o própriosamento. É naquela profundidade biológica que encontramos a realidadconceito diretivo dos fenômenos, e não nas destilações cerebrais dos erudistantes da vida. Somente poderemos compreender a substância dos faos observarmos em função desta força evolutiva íntima, que transformatinuamente a natureza. A evolução animal, antes exclusivamente orgâ propensa à construção de formas físicas, encontra-se no homem atualmna fase complementar, afeita à construção de formas psíquicas. Neste caestamos ainda no período paleontológico, de explosões passionais violede construções ideológicas monstruosas. Ao defrontar-se com a discideste novo mundo do espírito, nos seus atuais esboços iniciais de civilizo homem se encontra oscilando entre duas leis, correspondentes a duas a da animalidade e a da super-humanidade, numa posição de transiçãque aquelas duas formas de vida disputam o campo. A delinquência perà primeira fase, involuída, da incompreensão e da ferocidade, que atamente retorna e sobrevive em desacordo estridente com o ambiente atuqual luta para destruí-la.

Unicamente este conceito de transição e de oscilação entre as duas diversas nos explica o contraste, a luta e o fenômeno da delinquência. Somen-te este conceito nos esclarece a evolução de formas que tendem a um apçoamento, até se extinguirem. Explica-nos como o mesmo ato homicidaé punido como supremamente antissocial quando explode no âmbito inde uma sociedade, é, ao invés, considerado heroico e merecedor de pr

quando surge na defesa de uma sociedade contra outro grupo social. Istmonstra o quanto é absurdo invocar neste campo os princípios abstrat justiça e como a punição penal corresponde, sobretudo, a um princípdefesa e de interesse coletivo.

Esta é a primeira base jurídica, a primeira legitimação da ação do di penal, porquanto a natureza impõe, para realizar os seus objetivos supercertos deveres à vida, que garantem a defesa desta e de tudo quanto lhetence. As ideologias são neste campo superconstruções a posteriori. Não sediscute a necessidade de defesa. Unicamente esta base possui a solidez

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creta das razões biológicas. Isto legitima a defesa e transforma-a gradamente em direito.

O código penal do indivíduo isolado, no estado primitivo, está nos braços. Ele se defende como pode, o melhor que pode contra todos. O c

penal de uma sociedade evoluída é um sistema de normas no qual aquelasa é disciplinada em virtude da finalidade que promove o interesse individuma necessidade mais vasta e mais complexa.

O conceito da evolução da criminalidade se complica e se completa cconceito da evolução do direito penal. Falo sempre em evolução, porqdestas raízes biológicas que os fenômenos sociais recebem a seiva da qunutrem; é preciso vê-los como eles são, ou seja, não como conceitos estátimóveis em categorias fixas, mas sim como um dinamismo, um transform perene, um contínuo turbilhonar. Portanto a evolução da criminalidade pode mais estar dissociada da evolução do seu antídoto social. Ataque e sa, em técnica bélica, relacionam-se mutuamente e evoluem juntos. A crilidade varia no tempo e no espaço, como todos os fenômenos sociais; com a evolução da psique humana, que participa da evolução biológicaimpulso primordial e comum, que faz tudo avançar, até a ciência e as relimodifica continuamente a forma de ação criminal e, paralelamente, a formseu corretivo: o direito penal.

A delinquência tende a aperfeiçoar-se psiquicamente, passando da zoviolência e da ferocidade para a zona da astúcia; tende a apoiar-se, parmente ao fenômeno guerra, em recursos sempre mais complexos, inteligeorgânicos. As condições mais refinadas da vida moderna, criadas pela cie pela máquina, tornam mais sutil a forma de expressão do mesmo infundamental. A forma reagirá, todavia, sobre a substância, modificandcaracterísticas do instinto. Esta mudança de forma é então o primeiro

para a evolução da psicologia criminal.O direito penal prevê e segue esta transformação. Os códigos, quandacompanham a evolução da forma de expressão dos delitos, deixando modificarem em relação a estes, tornam-se obsoletos. À medida que a rsocial evolui e melhora, os códigos se modificam, tendendo a operar magica e substancialmente, para agir em profundidade, dirigindo-se sempraízes psíquicas do fenômeno da delinquência.

Destarte, ação e reação tendem ambas a se deslocarem no campo psíqO encontro de dois antagonistas em luta se dá em zonas sempre mais pr

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das. O choque tende a perder a sua nota de brutalidade à proporção que ase torna menos física e mais psíquica. O criminoso torna-se astuto para sdir; a norma punitiva toca uma sensibilidade mais sutil, que exige tratamdiverso. Compreende-se, então, a inutilidade das penas cruéis; aprende-s

a ferocidade dos sistemas punitivos é mais efeito dos tempos do que apropriado ao objetivo de suprimir a criminalidade. As formas mais violcomo as torturas, a pena de morte e as supressões cruéis, caem por terrdesuso ao longo da via do progresso, como folhas mortas, escórias abandas no passado. As normas do direito tornam-se então fatores ativos na trução dos instintos humanos, os quais se adaptam a novos hábitos. E o hé transmissão ao subconsciente, gerando, através do automatismo de reanovas qualidades da natureza humana. Daí se conclui que a verdadeirmais substancial função de um direito penal inteligente é educar o homfunção mais importante e elevada do que o mal – todavia necessário – contidona legítima defesa da coletividade. Trata-se de uma função preventiva e cva, que nada mais é senão uma fase do mais vasto processo no qual se dvolvem todas as instituições de um povo, com a transformação da forç justiça no processo evolutivo da harmonização geral. Trata-se, em resumum sistema de domesticação da fera humana, de um imenso trabalho educque é operado pela coação pedagógica, inteligentemente aplicada, do pmento das células sociais mais evoluídas às camadas mais baixas da socie

O contraste entre ataque e defesa tende progressivamente a esmorecedireito penal encontra nisto a sua mais alta justificação ética. A evoluçãmum realiza a obra da pacificação e da civilização interna. Somente ddesse conceito, a missão ética e primordial do direito encontra a sua plentificação. O jus15 que permanece no campo utilitário, deixando de assumifunções de ascensor para as mais altas formas de vida individual e col

não pode, mesmo sendo socialmente útil, chamar-se legítimo diante dada vida. Perante estas, a justificação nasce das necessidades da evoluçãote modo, o direito penal ascende da reação individual vingativa à funçãotiva de proteção preventiva, até atingir a função universal ética e educaTorna-se menos reivindicatório, mais eficiente protetor da ordem e legimpulso evolutivo. É sempre menos força, arbítrio, violência; sempre justiça, ordem, pacificação. Verifica-se assim a progressiva elevação do d

15 Jus (do latim jus, juris - ou ius, iuris:) direito. (N. do T.)

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penal ao campo ético, a posse cada vez mais ampla de valores morais e dativa harmonização ascensional do mundo social.

A primitiva justiça, grosseira no seu direito de defesa, evolve para a juque permite a justificação do direito de punir. Quanto mais a balança da j

substitui a espada da vingança, tanto mais pesa a responsabilidade morculpado e tanto menos vale a própria tutela egoística. Na sua evolução, de punir penetra mais a substância das motivações, e o legislador incli para o culpado em ato de compreensão, a fim de enriquecer a função socdefesa com funções preventivas e educativas, porquanto o dever dos dirigé o de auxiliar o homem involuído na sua ascensão.

As duas ferocidades – a da culpa e a da punição – abrandam-se; os dois extremos, aproximando-se, harmonizam-se no seu choque. Antes de invectinvoluído, devemos ajudá-lo a evolver, antecipando desta maneira a deção dos focos de infecção, agindo sobre as causas antes de tiranizar sobefeitos, prevenindo antes de reprimir. Há no balanço social um tributo de condenados, segundo uma lei que as estatísticas exprimem. É prcompreender esta lei e depois extirpá-la até as raízes. Existem os desercujo crime foi terem sido marcados, no nascimento, pelas taras hereditOutros são os falidos na luta pela vida, frequentemente com a mesma plogia e valor moral dos vencedores. A delinquência é um fenômeno de lução. É necessário demolir todos os fatores coadjuvantes dela. A socie possui um dever bem mais alto do que apenas defender-se e isolar-se egurança; tem o dever de fazer progredir consigo, de arrastar na sua mascensional, as suas células mais jovens e atrasadas. A alma coletivatambém as suas tarefas e a sua missão. A posição primitiva satisfazia ao rialismo de outros tempos, mas não pode jamais satisfazer e bastar à maicivilização do futuro.

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SEXTA PARTE

PROBLEMAS ESPIRITUAIS

AUTO-OBSERVAÇÃO DA MEDIUNIDADE (1933) Desenvolvimento espiritual e elevação moral

como fatores de uma alta mediunidade

Sou de parecer que, em certos momentos críticos, o progresso da ciênccança a maturação, enfrentando e resolvendo problemas que podem facilmser enfrentados pelos métodos experimentais ou pela observação, mas cde diferentes processos para a solução de outros.

Deparamo-nos com fatos que não podem ser explicados quando somesua aparência superficial é analisada.

Para atingirmos a profundeza das coisas, devemos empregar a alma instrumento de pesquisa, ou melhor, substituir o pensamento e a razão – meioanalítico – pela intuição.

Uma das formas substanciais desse método é caracterizada pela m

nidade.Acredito que a mediunidade é fruto de um desenvolvimento natural, açado pelo cérebro humano na sua evolução. A vida, sem dúvida, atinge ptinamente formas mais grandiosas, visando cada vez mais a perfeição. Omem do futuro tornar-se-á extremamente sensível e será normalmente umdium, com outros e mais apurados sentidos, que lhe traçarão uma nova e rosa diretriz de pesquisa, com a qual, sozinho, ele poderá fazer grandiosacobertas, utilizando-se da aptidão do espírito para uma investigação dafastada e independente dos órgãos dos sentidos.

As pessoas que alcançaram este alto nível de desenvolvimento veemvem, sentem e atingem o seu ser interior verdadeiro, o que não é possív portadores de sentidos normais. A recepção de altas revelações indepcompletamente dos sentidos.

Alguns acontecimentos desta espécie foram considerados neurose ourastenia, sendo tidos como casos patológicos. Na maioria das vezes, somse apresentaram como revelações individuais, definindo a constituição dnovo tipo de ser humano.

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A mediunidade é, no meu parecer, uma assimilação da verdade, claramrecebida e altamente desenvolvida, por seres psíquicos dotados de novaracterísticas sensitivas.

Sou de parecer que isto abrange um desenvolvimento natural e que, c

correr dos tempos, os demais seres lá chegarão, porque este fenômeno se za de um modo geral. A humanidade deve alcançar a alta maturação, pondo um por um os degraus da preparação através das provas, que são lutamente necessárias para tal fim.

Concebi esta teoria através do estudo e da auto-observação, durante umnoso trabalho de mais de vinte anos.

Estou presentemente com 46 anos. Aos vinte e dois anos recebi meu dma de advogado na Universidade de Roma e, com insaciável sede de ição, comecei a aprofundar-me desorganizadamente em todos os ramos dnhecimento humano. Quando concentrei meus esforços no sentido de prouma grande síntese, para enfeixamento dos conhecimentos adquiridos,que tudo isto não representaria nada, se eu não vivesse numa nova criaçãome elevasse à positividade.

Esta nova criação deveria ser caracterizada por um desenvolvimento etual. Senti ao mesmo tempo a falta deste novo tipo humano, que já previraqual eu devia me transformar, para provar a minha teoria no campo da prObservei que este desenvolvimento se realizava em todo o lugar, na ciêncreligião, na filosofia, na medicina etc., e que a evolução é a grande lei da

Eu havia escrito bastante e queria agora realizar experimentações e pr para verificar a veracidade da teoria. Observei então que a mediunidaencontra no fim de uma contínua purificação da alma e no desenvolvimenmeu ser intrínseco, como natural e necessário produto desta conduta.

Precisei admiti-lo, como todo ser humano tem que admitir o seu des

Neste caminho, transformei-me num homem totalmente novo. O meu pdimento evolutivo era para a ciência um enigma, e eu não poderia enconela nenhum auxílio. Infortunadamente, isto representa um dos erros dacia moderna, porquanto não reconhece a grande significação da moral fator predominante. Trabalho agora numa autopurificação progressiva eas experiências geralmente no laboratório das percepções humanas. Os instrumentos foram o mal e o bem, a alegria e o sofrimento. No decorreacontecimentos do meu destino, que também possui a sua lei, descobinvés de uma lei insignificante, as grandes leis da existência.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 168

Comecei a aprofundar-me sempre mais e surpreendi-me ao descortinarnovo mundo de vida intensa, forte, estranha e de infinitas possibilidadesevoluir nesta vida, precisei despojar-me das alegrias da minha vida antAo término desse desenvolvimento autoimposto, descortinei, no Nat

1931, o primeiro degrau de acesso a um objetivo cujo fim é uma mediunexperimental maravilhosa.Minha mediunidade é dupla, visual e auditiva. Ouvia uma voz em mim

cialmente de mensagens natalinas e, posteriormente, de mensagens de Páas quais eram elevadas e repletas de bons ensinamentos e pensamentos.

Tentarei a seguir descrever-lhes os meus descobrimentos. Ao contdaqueles que só gostam de fazer observações superficiais e nos outrossuo a vantagem da minha própria experiência e da observação interiomim mesmo. Não sou sujeito a aparições físico-mediúnicas. Senti que não as poder portar, pois eram violentas demais para mim. Não caio totalmente em trVejo claramente os pensamentos (geralmente abstratos) que escrevo, confvão sendo registrados. Eu os vejo como se fora numa despreocupada lesem coação.

Enquanto os vejo, não reconheço neles a beleza, a ordem e o sentido, nsignificado ou o objetivo da mensagem visual. Todavia não me preocupoisso e aguardo o desenvolvimento até ao fim. Sou somente um assistentesivo e inconsciente.

Logo que volto perfeitamente a mim mesmo, vejo ainda estes pensamecomo se fossem vistos por olhos internos e profundos. No entanto isto algo visual ou propriamente uma visão. É uma voz que eu vejo, é uma imque eu posso ouvir. É um sentido do pensamento dentro do meu ser; nãideias relembradas ou assuntos já discutidos. E isto independe do idioma.

Sinto intimamente que isto não é do conhecimento diário da vida. completamente ausente, sem qualquer impressão do ambiente humano emvivo, podendo, porém, retornar a qualquer momento ao estado anterior. Ade estar desacordado, não me acho precisamente inconsciente do mundterno, o qual distingo, embaçadamente, à distância.

Obedeço a uma espécie de comando íntimo, que me obriga a escrevernenhum preparo prévio, fazendo-me acompanhá-lo numa espécie de efebril, sem alterações ou interrupções.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 169

Quando a comunicação termina, repouso e leio mais tarde aquilo qucrevi. Só então compreendo o inteiro significado da comunicação e achdo fácil, agradável. Sem necessidade de correção alguma, entendo os pmentos, que, sendo-me completamente novos, jamais foram do meu c

cimento. Toda a operação se efetua por si mesma, sem a minha interfere sem o meu controle, como se trocasse a minha personalidade. Meus dos, ao iniciar o estado mediúnico, ficam como se o centro da sensibilse tivesse voltado completamente para esse meio de pesquisa. Esse novotro situa-se nas profundezas do meu íntimo, possuindo sentidos incomravelmente grandes e sinteticamente reunidos. Esta minha personalidadterna é independente do espaço e do tempo. Experimentei perscrutar camais longínquos e descortinei os acontecimentos que viriam depois. essa voz como se fora outra personalidade, que me é agradavelmente fame que, proporcionando-me conselhos úteis, protege-me inúmeras veze perigo, como se fora um amigo vivo e inseparável.

Apesar dessa espécie de amizade, concordamos em nos separar de vequando.

Vejo também, ao meu redor, outros seres, que não são notados pelos semelhantes. A minha mediunidade cresce continuamente em estreita ligcom os conhecimentos adquiridos e com a moral da minha personalidadeé notável, mas a ciência nunca levou em consideração o valor moral cfator decisivo para qualquer revelação espiritual. Esta correlação é de tal forte, que um lapso moral me traria a perda irremediável da mediunidade.

A minha condição de médium é, no meu parecer, o último degrau daspirado descobrimento espiritual e moral, porquanto encontrei um entrmento entre esta nova sensibilidade e a prática de uma vida limpa e virtmostrando-me a exigência absoluta da reciprocidade entre o ser espiritua

fala e o médium que registra as vibrações psíquicas que lhe são enviQuanto mais eticamente alto for o transmitente, tanto mais pura deve ser ado médium. As ondas transmitidas devem ser da mesma espécie daqueladas recebidas pelo receptor.

Eu, como ser humano, preocupo-me com grande paixão em acompanhaltos seres espirituais nos seus ideais. A minha personalidade humana coende a entidade por intermédio da inteligência. Na abstração dos sentidoralmente, uma personalidade mais alta se apossa de mim, e assim vejo enheço diretamente o ser de um outro ponto de vista.

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Possuo, na maioria das vezes, dois pensamentos em mim: um inferiomum e humano; outro elevado, que transporta para uma nova vida de suendentes experiências. A alta personalidade vê geralmente o íntimo do se

As minhas melhores manifestações não foram realizadas nas salas de v

onde se reúnem pessoas fúteis para palestrar, mas sim nos hospitais, onsofrimento purifica a alma humana e a torna capaz de receber o auxílio mmaterial da parte dos altos seres espirituais que operam por meu intermédi

Relatarei oportunamente mais fatos referentes à evolução da minha mnidade16, deixando aqui apenas estas ligeiras observações.

16

No livro As Noúres , escrito quatro anos mais tarde, o autor desenvolve amplamentetema. (N. da E.)

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CONSCIÊNCIA E SUBCONSCIÊNCIA (1930)

Em campo algum a desigualdade humana é tão profunda como naquelvalores espirituais íntimos, que distinguem a personalidade. Se olharm

alma, despojada dos ouropéis da educação e das convenções sociais; se iso-larmos, observando em profundidade, o tipo individual de todos os acessque habitualmente o escondem, encontramos homens da mais irredutíve paridade psíquica, ainda que a pátria, as condições e a família sejam as memas. Eles vivem sob semelhantes aparências exteriores, sob as mesmasociais, passam pelos mesmos lugares e nas mesmas circunstâncias, no eto ocultam na profundidade invisível um modo diverso de ser, de sentirreagir, uma estrutura espiritual diferente: a personalidade. Um eu com suascaracterísticas turbilhona sob a máscara igual e niveladora da forma, mada substância. Ao lado de quem vegeta na sua beatitude orgânica, esququalquer fadiga de conhecimento e a qualquer risco de ação, outros se a por um incessante tormento de criação e, não podendo viver sem a conscia do todo, não sabem mover-se sem que cada ato seu seja uma nota na de sinfonia da vida. Há os que se saciam de pequenas coisas imediatas, otremem sob o peso das concepções poderosas. Aqui, um espírito embrioquase inconsciente, que não sabe viver senão externamente. Lá, uma hipertrófica, que sente o universo se agitar dentro de si e é esmagadavórtice de sensações. Sob a aparência de igualdade existem distâncias culáveis, uma substancial diversidade de vida e de destino, que tornam possível qualquer nivelamento.

Entretanto o desejo de nivelamento nasce, surgindo num mundo queser uma corrida para a evolução, não admite igualdade. Este desejo não senta senão o esforço dos inferiores para alcançarem a qualquer custo os

riores. A teoria da igualdade foi sempre a teoria da equiparação do maimenor, a teoria do rebaixamento do primeiro a favor do segundo. Foram pre as classes moralmente menos evoluídas as mais ansiosas pelos nivelatos sociais, pelo rebaixamento de todos os vértices e pela supressão de todistâncias. Se olham com desprezo para o alto, sua maior aspiração na rede é imitar, é fazer-se por elevar-se. A eterna lei do progresso incita o hocom seu impulso irresistível. A insuprimível necessidade de elevação espal que arrasta mesmo os mais retardados, arrebanha também os mais in porque, um dia, toda paralisação e toda satisfação chegam à fase de saci

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 172

e enjoo. A que tenderia esta universal aspiração de multiplicar necessidde refinar hábitos, de complicar a vida, lutando às vezes mais pelo supédo que pelo necessário, para realizar e experimentar tudo, senão à conquiformas de vida mais complexas, nas quais se alcança maior desenvolvim

da consciência? Nada parece interessar tanto à vida quanto este procescrescimento da personalidade. Parece que não se sabe dar outro conteúdtro objetivo, à existência senão esta expansão do eu, que deseja conquistar universo, senão esta fadiga de criação, esta necessidade tormentosa da que anseia pelo supranormal. Então as grandes necessidades da vida hunão são mais exclusivamente a conservação e a reprodução (conservaçraça), mas também o aumento da consciência.

Quando dizemos consciência, personalidade, alma, espírito, psique, nãnhecemos exatamente qual seja a estrutura deste organismo, que é sem dalguma coisa muito complexa, a qual não podemos definir a não ser de vago e genérico. Há na personalidade dois organismos concêntricos, divmente desenvolvidos e amoldados segundo os vários indivíduos, ou sejaconsciências: a consciência e a subconsciência.

A primeira é exterior, direi quase de superfície, aquela que comumendos adotam no estado de vigília, na vida cotidiana, nas correlações com biente em que é plasmada, do qual e para o qual é feita. Nada nos autotomá-la como unidade de medida das coisas. Muitos fatos nos deixamque ela não esgota toda a realidade e que deixa ainda inexplorada uma rainda mais vasta, uma vez que não possui outros órgãos senão os sentudo o que esta consciência abraça, apanha e possui, ela o faz por via sria. Embora seja precisa e concreta, é, no entanto, limitada. Por ser posiativa, projeta-se apenas para o exterior, que é seu todo e único campo de É a consciência da vida e morre com ela.

A subconsciência é outro modo de ser e de sentir, é uma projeção difedo eu, em direção oposta, para o interior, onde se encontra uma realidade to mais extensa. É como uma vastíssima consciência de sonho, incertanescente, vizinha do mistério. Trata-se de outra consciência, situada nooposto do ser. O eu oscila entre os dois extremos, entre as duas consciêncontíguas, em dois mundos limítrofes, um externo e outro interno. Duas ciências que, como o dia e a noite, a vida e a morte, são inversas e commentares, equilibrando-se, assim, como duas metades de um todo. A subciência é uma consciência profunda, um organismo mais íntimo, o ser in

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 173

a verdadeira personalidade, não herdeira nem filha do ambiente. É o eu comtoda a sua capacidade, instintos, aspirações e a trajetória do seu destino; que se oculta nas profundezas do ser e que, sendo bem pouco visível, rarate se revela no tipo comum. Ela contém e resume todo o passado vivido,

periência cotidiana de inumeráveis vidas. Das inúmeras provas experimdas através do organismo sensório da consciência cerebral, algo comoessência destilada desce em profundidade ao íntimo e se transmite por autismo ao subconsciente sob a forma de hábitos, qualidades, atitudes, instideias inatas. A descida das experiências da vida exterior para a conscimais profunda, que as absorve, as assimila e as conserva eternamente, redo assim à transitoriedade das coisas mortais, é um fenômeno maravil porque valoriza na eternidade cada ato da vida, dando a tudo um signif profundo. No subconsciente reside o nosso eu verdadeiro e indestrutível, aqulo que de nós não perece com a morte.

Se a função da consciência cerebral e mortal é ser o órgão externo daconsciência imortal, um meio para esta tomar contato com o mundo da m – como instrumento necessário à produção e à assimilação de experiênciaadquiridas, primeira condição para o acréscimo de aquisições – a realidademais profunda de nosso ser encontra-se no subconsciente. Aquele crescimque observamos ser uma das grandes necessidades da vida é o enriquecimdo subconsciente. O eu eterno se veste de milhares de consciências relativdiferentes e transitórias, que morrem em milhares de existências. O que pnece indestrutível, o que recolhe os resultados da vida e, assim, avulta-se eta-se é o subconsciente, somente o subconsciente. Tudo o mais, por estar to à lei do transformismo fenomênico, que tudo arrasta, é transitório e mudar de forma tanto mais rapidamente quanto mais nos debruçamos pexterior, do espírito para a matéria. Das células dos órgãos físicos, ao si

sensório nervoso cerebral, até à consciência e à subconsciência, há umagressão seriada de veículos ou corpos que se entrosam uns nos outros.O subconsciente não morre. Aquele que pode encontrar, através da m

ção e da introspecção, o próprio subconsciente, reconstruindo-lhe as sções, descobre o seu eu eterno e, quem sabe, as impressões de sua vida além. Todas as vezes que, das profundezas daquele mistério escondidnosso íntimo, aflora alguma coisa à superfície da consciência, temos indícum mundo distante e inexplorado, de outra vida, de uma vida oculta que mos. Mas nem todos somos iguais. Em alguns, o subconsciente é tão d

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volvido, as sensações do espírito são tão potentes, que a vida interior é evte, razão pela qual eles já vivem na Terra a vida que está além da morteternidade. Outros, cujo subconsciente é apenas um esboço embrionárioencontrando dentro de si nenhuma sensação ou traços de vida interior, n

naturalmente tudo o que não podem compreender, porque toda a sua ativconsciente se desenvolve no mundo exterior. A sua alma rudimentar nãoreger-se sozinha e morre, como consciência, na morte do corpo. Outro posição intermediária, que é de criação e de conquista, tentam sondagensarcano íntimo, onde cintilam clarões de luzes, revelações parciais, que alçam o ser com profundas emoções. Os contatos fugazes com o invisível,ladores do subconsciente, são às vezes estados de sonho, ou movimentotintivos, ou inspiração. Aquele aparece então com meios e funções próprconsciência cotidiana, exorbitando os limites da percepção anímica, tipicate superior à normal. No subconsciente, se o sabemos sentir, gravou-se gredo da nossa vida, traçou-se a trajetória do nosso destino, oculta-se o pdos nossos acontecimentos, vibra a lembrança do nosso eterno passadomanece a sensação daquilo que fomos antes de nascer e daquilo que serdepois da morte. No subconsciente, se o soubermos encontrar, reside o seda identificação de nossa individualidade eterna, a bagagem de sensaçõeque sobreviveremos.“Conhece-te a ti mesmo ”. Fato estritamente pessoal, colóquio íntimo do ser que se interroga a si mesmo – “vedado aos estranhos” experiências que não se podem ensinar nem demonstrar a quem não saibcançá-las por si mesmo. Não é fácil ser lúcido no subconsciente, saber funcionar esta consciência profunda, explorar por meio de uma sensibiltão diferente um mundo tão móvel e tão vasto, que parece fugir ao controqualquer indagação, e relatar a lembrança de tudo isto à consciência exter por isto que se evita a utilização do subconsciente na vida prática. Não

mos confiar-lhe um trabalho intelectual, que resultaria sem fadiga e semsumo de energia nervosa. As duas consciências, sendo inversas, eliminaa subconsciência não aparece enquanto a consciência está em funcionam Não é fácil suprimir todas as sensações exteriores, transferir-se para a parte do nosso ser e saber descobrir este eu mais profundo que, em silêncivive em nós outra vida. Aquele, porém, que muito progrediu, sabendo casubconsciente, não viverá mais a limitada vida terrestre, mas a vida maieternidade e desconhecerá a morte. Esta é a grande recompensa, a grandequista para a qual conduz o desenvolvimento espiritual.

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A morte não é igual para todos. Igual pode ser somente o processo dcomposição orgânica. Diante, porém, da sobrevivência, somente um subciente desenvolvido não perde a consciência, isto é, não se anula como sção no após-morte. Muitos dos homens atuais, demasiado próximos da

perdem realmente, na morte, a sua consciência. Outros morrem sem perlimpidez e a potência de vida, porque nem todos sobrevivem igualmente.O progressivo desenvolvimento da sensibilidade, a que nos conduz a e

ção humana, não sendo senão uma contínua revelação do subconscienconsciente, um conhecimento cada vez maior das misteriosas potências índa alma, equivale a uma contínua conquista da imortalidade, até que um eu tudo saiba. A consciência, hoje tão limitada, dominará inteiramente oconsciente, coincidirá com ele, e aquele mundo, ainda tão incerto, das peções anímicas será claro e evidente. Nesse dia, o homem terá vencido a mo

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POR UMA VIDA MAIOR (1930)

É possível, mesmo em condições de ambiente mais simples e vulgar, além dos terrenos restritos das pequeninas coisas que nos cercam, num

do imensamente mais vasto. Não importa tanto a grandiosidade exterioacontecimentos que vivemos, quanto a profundidade com que os sent Não nos detenhamos à superfície; é necessário penetrar a substancia dassas vicissitudes. Então, os fatos mais comuns da vida cotidiana, as inf particularidades, imperceptíveis para muitos, revelar-nos-ão a ação das des forças do universo, o desenvolvimento do nosso destino e a grande distante, que vai além da vida, numa férrea logicidade e justiça. Poderedesta maneira, não só transcender livremente à vida comum, mas vagueum mundo vasto e rico de novas sensações e emoções, expandindo-nos vida maior. Existe, além das aparências, uma realidade mais profunda nos máximos como nos mínimos fatos. Há na interpretação comum dasas um sentido que se expande através das causas e se esconde no mis Nos bastidores da vida está uma realidade mais sutil, mais verdadeiraencerra o porquê de todas as coisas. É a realidade do espírito, a verdadeeterna realidade da vida. Lá se movem os fios que condicionam os granos pequenos acontecimentos dos povos e dos indivíduos. Lá está o podas nossas alegrias, triunfos, dores e derrotas. Pode-se desta maneira dafatos mais simples horizontes infinitos. Na simplicidade interior vive-eterno e em contato com o divino.

Como encontrar esta realidade mais profunda e esta vida maior? Nas ões do espírito. Ela é um produto espontâneo, oriundo do subconsciente; éclarão da revelação interior, que ilumina tudo com uma luz nova. Tradem dulcíssima revelação de paz, em majestosa sensação de infinito, na

templação de um panorama imenso. Entramos em colóquio com a almcriado, privilégio dos artistas; surgem percepções novas de todas as finfinitas da vida, fortalecendo a alma para a luta; surpreendem-nos confoalegrias espontâneas. Os silêncios povoam-se de vozes; as solidões, de mmentos. As dissonâncias se desfazem em harmonias; o sofrimento, em alEntão, as portas do mistério se abrem; a nossa pequena vida se dilata namaior, e olhamos o seu interior estupefatos e inebriados. Vemos agoraonde iremos, a última etapa da nossa meta. A alma nos responde e advnos com aquela sua voz de segurança que jamais mente. Esta voz possu

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timbre todo particular que a identifica. Então, o espírito articula uma prequal, em vez de invocar um Deus externo, para acudir a um interesse prómais ou menos imediato, sente um Deus interior, ao qual se ama sem reserve se compreende, numa fusão completa.

Eis alguns aspectos individuais da vida maior. O fator psíquico e espié conduzido aos primeiros planos, para que nos seja proporcionada a enção de toda a existência. Quantos caminhos, porém, para alcançar a compsão destes estados de ânimo; quão profunda educação psicológica, moartística é necessária! Posições inadmissíveis para muitos. Entretanto, o da vida é este, estas são as formas buscadas pelo progresso coletivo e pelalução individual. O progresso do mundo não é somente mecânico, nem csomente a perfeição mecânica. Além deste se encontra um progresso mmais substancial, que é o progresso espiritual e moral. As conquistas matnão podem deixar de reagir sobre o espírito. Quanto mais a civilização pde, mais o homem se apercebe de que, além, existem outros problemas; qmais se apura, mais sente a urgência da solução. Quando um dia a humantiver resolvido, de forma universal, o problema econômico, com o domíniforças naturais, então se disporá a lutar seriamente e em escala mais a pelo problema intelectual e moral, que é hoje apenas um pressentimenfuturo do mundo não é, como o concebeu Wells, a hipertrofia do progmecânico, mas sim a afirmação dos valores do espírito na coletividade.

Hoje se luta; lutamos todos, mais do que os nossos avós. AmamoOdiamo-nos. Porém, seja qual for a circunstância ou o objetivo, abraçnos. A alma coletiva quer nascer. Permanentemente nos sentimos incompdiante da necessidade de elaborar esta alma. Quanto mais evoluímos, nos sentimos sintonizados e mais procuramos no próximo o nosso commento. Somos compelidos a incluir em nossa vida uma dose sempre mai

altruísmo, pois temos necessidade uns dos outros, se bem que o egoísmvico nos divida. Todos sentimos falta de alguma coisa, que pedimos. T possuímos alguma coisa, que devemos dar. Esta compreensão de almas cessária ao futuro da humanidade; do caos hodierno nascerá um verdaorganismo. Somente da compreensão pode nascer a coordenação, e destfuncionamento orgânico. Não se trata somente de uma questão de psiqude intelectualidade, de saber. O que tem importância na evolução do msão os fatos interiores, dos quais depende todo o funcionamento social.tam poucas ideias simples, mas sentidas e vividas em larga escala. O qu

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 178

porta são os sentimentos de bondade e retidão que cimentam e consolidrelações sociais. As formas exteriores das convenções coletivas não se param aos imperativos morais. Tudo converge para o mesmo ideal: o proso mecânico nos liberta do trabalho material e embrutecedor; a cultur

torna mais espirituais; a finura das hodiernas condições de vida sensibilnosso sistema nervoso, que é a base da alma. Uma sensibilidade nova, thipertrófica e mórbida na impetuosidade do seu nascimento, assenhoredo mundo e irá revolucioná-lo. Assim como nenhum ser humano, hoje, staria os sistemas penais fundados na tortura, um dia também não haveráinteresse ou vantagem, por mais forte que seja, que obrigue a humanidfazer uso das guerras. Estas não desaparecerão graças a acordos internnais, que não modificam a mentalidade humana, mas somente em virtunova sensibilidade que dará ao homem civil o terror por qualquer ato delência. A ciência, por seu lado, aumentará a tal ponto o poderio de destruque o homem será constrangido a desistir da violência, a qual redundará pre em dano coletivo e total. A luta subirá, então, para o plano de probmais elevados, ainda não pressentidos hoje.

Eis alguns aspectos coletivos da vida maior. Individual e coletivamtodos somos construtores; o verdadeiro trabalho da vida é a preparaçãum mundo maior para os nossos filhos. Esta preparação é fadiga e lutata-se de um trabalho demorado, que absorve energias e exige sacrifíciosque dá os resultados mais seguros. Somos filhos das nossas ações. Parlher, é necessário semear. O problema da felicidade torna-se sempre complexo, e é urgente prever. Se a nossa sociedade se sente cheia de pr pações e tão insegura nos seus prazeres, é porque a maior parte das nalegrias é de origem precária, filha do egoísmo, e lesa as leis do equiluniversal. Aquilo que começamos a fazer livremente, depois circunda

liga-nos e escraviza-nos, seja para cima ou seja para baixo, até às últconsequências. A vida é um caminho; cada volta é uma prova. Cada atosui seu valor moral, e cada acontecimento tem seu significado recôncomo parte de um esquema maior, que se projeta na eternidade. Ningneste mundo, encontra-se sempre no posto exato de maior rendimentrelação às suas qualidades. A maior parte das energias se desperdiça nostos da luta, razão pela qual o que interessa não é a utilização imediata d pacidade adquirida, mas sim a criação e a aquisição de novas qualidatravés de novas experiências. Se olharmos mais profundamente, verem

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 179

que nos encontramos no melhor posto, aquele de melhor rendimento ddo futuro. A verdadeira construção não está mais no efêmero triunfo dsultados exteriores, mas sim em nossa alma, como qualidade adquirida mo produto eterno. Esta é a vida maior. Ela não significa obtenção de v

gens e de prazeres. Seus fins e limites são mais vastos, contendo umgrama de criação espiritual que se estende na eternidade. Além do áevanescente e fugidio, ela conquista a realidade imperecível, lutando etando-se por uma única finalidade: a realização de um ideal.

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A RECONSTRUÇAO DO TÚMULO DE SÃO FRANCISCOUm grande erro psicológico(1930)

Revi hoje a nova cripta do túmulo de São Francisco. O olhar espiritua

bituado a localizá-lo naquele ambiente onde o mundo o viu durante cem ficou surpreso e desorientado. Não se trata de discutir aqui as linhas arqunicas, as proporções, o estilo, as cores ou coisas semelhantes. Sob o ponvista artístico e segundo os conceitos atualmente em voga, não se teria, ta podido desejar nada de melhor. Harmonizou-se o estilo da cripta sagradao de todo o imenso edifício das duas igrejas. A sinfonia arquitetônica dotemplos, sobrepostos como três vozes presas no hino da rocha emergenteo céu, é magnífica. O simplismo oitocentista, com a sua ingenuidade artde querer inserir o estilo clássico no coração de uma basílica trecentista, dissonância que fere a nossa mais refinada sensibilidade estética.

Tudo isto é indubitavelmente verdadeiro. Embora eu me sentisse omente predisposto – não obstante a recordação do traçado da igreja, já obvado com satisfação outras vezes – provei uma desilusão diante da realidada cripta refeita. Por quê?

Uma primeira sensação – digamos de óptica – exterior de vastidão e de solidão nasce das seguintes razões.

A cripta é maior, o que diminui a importância da coluna central onde etúmulo, reduzindo-lhe a imponência. As paredes, diferentes das antigas, se aproximam pela cor escura e pelo material de construção (pedra) da comaterial da coluna central, de que resulta menor realce ao túmulo.

Mas estas impressões de óptica podem ser colocadas em segundo planante da sensação principal, a mais forte, de caráter espiritual, a sensaçfrio, de vazio, de desolação.

Com a interposição desse estilo anacrônico, demolimos e perdemos irdiavelmente uma riqueza preciosa: a aura psíquica do santuário. Lá onespírito sentia calor, agora sente frio. Lá onde havia a enchente de sensaagora está a vazante, ainda mais sensível devido ao atual maior espaço mal. Lá, onde nos sentíamos irresistivelmente arrebatados por um ímpeto agora encontra-se palidez e desolação.

Eu sei que tudo isto é sutil e evanescente, impalpável para alguns, edeveria parecer desprezível em nossos tempos práticos e concretos. Dist

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 181

cuidam comissões de arte ou de arquitetos, naturalmente porque assim o nosso século.

A culpa, portanto, não é de ninguém em particular. Mas não justifica oor erro psicológico na reconstrução do túmulo de São Francisco. A fé

fenômeno psicológico. Todas as vezes que desejamos retocar um lugar natureza, é necessário tomar em consideração, sapientemente, as compledelicadas leis deste fenômeno, a fim de evitar danos irreparáveis, tal ocorreria caso alterássemos, sem atentarmos para as finíssimas delicaacústicas, a forma do Scala de Milão ou o feitio de um precioso estradiváriofé, como todos os fenômenos, possui as suas leis, e estas devem ser respeitadas

Tirou-se ao túmulo de São Francisco a sua característica mais precimais bela, ou seja, a alma do lugar, aquele imponderável e invisível que atrao mundo. O próprio ruído de demolição e reconstrução em torno do túmuSanto já foi uma profanação.

Duas considerações importantíssimas foram menosprezadas: 1) Um sagrado é mais do que um recinto de arte; qualquer dissonância artísticaser largamente compensada por uma harmonia de fé; 2) A grandeza drecinto de fé é absolutamente independente da arquitetura ou da suntuose, muitas vezes, está na razão inversa destas. Frequentemente, alcançefeitos indesejáveis com muitas reconstruções, ampliações e embelezamde recintos sagrados. Conforme demonstrou Cristo, e depois São Francifé reside na intimidade do templo do coração e das obras e, somente pomo, nos majestosos edifícios.

Na reconstrução do túmulo de São Francisco, tudo foi sabiamente exedo no que se refere à arte, ao trabalho e ao que, enfim, o dinheiro pode zar. Porém foram destruídos os aspectos ligados ao sentimento do santuque nos convidava a orar e abrir a alma a Deus.

É certo que modificar alguns lugares santos, onde a alma humana se re para encontrar a si mesma e, no milagre da fé, penetrar o mistério com do artista ou do gênio, é assunto para arrepiar os cabelos de qualquer homconsciencioso, pois se trata de um problema que sobre-excede em importqualquer questão de arte.

Num santuário há algo mais do que as linhas arquitetônicas, os precafrescos ou quaisquer tesouros de ouro e gemas. Alguma coisa o torna dite de um recinto de arte, a qual, fazendo-o ser muito maior do que poss

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 182

encontrar alhures e valer mais do que tudo, basta por si só, para fazer dlugar a que convergem as gerações.

Este “quid” imponderável forma-se lentamente com os séculos e é mcomplexo do que a chamada pátina do tempo, que se deposita igualmen

bre os edifícios profanos. Para formá-lo, é necessária a visitação das mulgenuflexas, transmitindo e acumulando numa dada ordem as vibraçõequais se manifestam na ação sugestiva do lugar.

Ao transpor a nova cripta, senti que todo aquele perfume espiritudesvanecera. A bela pedra esquadrejada e sabiamente disposta podemolocá-la em qualquer subterrâneo; é uma pedra ainda muda e assim permcerá até que gerações e gerações a consagrem, dando-lhe uma voz quenquanto lhe falta.

Perguntei a mim mesmo se os afrescos poderiam modificar a impreImitar ricamente vale tanto quanto imitar pobremente. No hodierno retorestilo trecentista predominam as imitações, que, quando exageradas, fazolhar do observador desejar outros estilos.

O estilo trecentista é lindo, mas apenas no seu respectivo século. Exedas agora, em pleno século vinte, tais construções de estilo trecentista, quando os materiais e as necessidades eram tão diferentes, são um anacmo. Não sei o que dirão os pósteros desta imitação, que demonstra a incadade de criar, como todos os séculos o fizeram, um estilo próprio.

Respeitemos, veneremos o estilo antigo, restaurando, retocando e, sobdo, conservando. Abandonemos a ideia de poder fabricá-lo hoje como quer produto industrial. Se certas pinturas e arquiteturas nos atraem hojzendo-nos andar entre elas à procura de uma fé perdida, isto se deve à mlha do tempo que as dignifica, um período histórico denso de paixões.

Agradam-nos, por certo, linhas que pareceriam ingênuas e primitiv

executadas hoje. Se isto, no geral, é verdade, de capital importância será para os lugares sagrados, onde a exigência artística está subordinada a utor muito mais importante: o fator psicológico. Repito: o que torna gransantuários não é tanto o vulto, a beleza das construções, a perfeição damas sim a presença deste imponderável acumulado, alimentado pela cdos povos, reservatório de onde lhes emana a fé.

Este imponderável será inconsciente e irremediavelmente prejudicadotes casos, ainda quando obedeçamos às melhores intenções e aos critéritísticos mais perfeitos.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 183

OS IDEAIS FRANCISCANOS DIANTE DAPSICOLOGIA MODERNA (1927)

Seja-nos permitido falar de São Francisco não como fenômeno históri

religioso, mas unicamente do Santo de Assis como fenômeno espiritual, fato psicológico daquilo que não é lenda, erudição ou culto, mas sim dda alma, tremenda realidade interior, que transcende os limites do ambhistórico no qual se manifestou. Trata-se de uma realidade sempre preseatual e vital, fenômeno que supera o tempo e situa-se na eternidade. Pochegar a São Francisco utilizando-se, além dos meios usuais da análise rica e do sentimento coletivo da religião, a via inusitada da intuição pesso

São Francisco não é de fato filho exclusivo de seu século, mas sim ddos os tempos; ele vive também hoje, entre nós, sem anacronismo. Se jamos entendê-lo não como pessoa, mas sim como conceito, sentiremoEle é permanente e atua em nosso meio como força social, cuja função rica não se exaure jamais. Existem, na intercadência das perecíveis forelativas, postulados eternos e absolutos, que superam a morte e nunesgotam completamente. Há movimentos psicológicos, individuais ou cvos que volvem em ciclos, como se fossem fases da vida coletiva, com possuíssem um significado biológico, como se fizessem parte integranmovimento harmonioso e equilibrado das leis evolutivas da grande vidhumanidade. São Francisco, assim considerado, é um fenômeno atual, qacha sob as nossas vistas e que podemos observar diretamente. À semelhde Cristo, ele é um conceito que jamais morre. Não morre nunca, porqideal faz parte integrante da vida humana, que tende, através dos séculfazer-se cada vez mais espiritual.

Se o materialismo floriu e a civilização mecânica frutificou, eles não

aram a nossa alma, que, cheia de fome e de nostalgia, esmola entre as vmuralhas o perfume de uma fé que parece perdida para sempre. A humade tem fome de ideais e está presa pela preocupação econômica e mecâ Não é lícito, nem mesmo por inconsciência, esquecer que as leis da vidacuram um equilíbrio e que qualquer abuso é logo corrigido com uma reO premente mistério da vida ensinou também que a alma individual e cva, para viver, têm necessidade destas inelutáveis aspirações, sem as elas não se governam, não caminham e não podem enfrentar confian problema do futuro. A riqueza e a vertiginosa atividade dos nossos te

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 184

dissimulam uma dolorosa miséria interior, uma espécie de impotência etual para a elevação moral. Todos afogam-se num imenso pântano de malismo, onde jazem mortas as grandes alegrias da alma. O nosso progrealeijado, constituindo hipertrofia econômica e mecânica, que não compe

atrofia espiritual, o grande mal dos nossos tempos. Diante desse mal agvoltamos as nossas vistas para a fé dos tempos distantes e tenebrosos dade Média, para as austeras e antigas catedrais, que parecem, somente depositárias de algum segredo. Triste e bela a humilde e nostálgica proda fé em séculos mais bárbaros que o nosso. Tornamos a exumar avidam para interrogá-las, as desajeitadas figuras trecentistas, formas toscas, de uma técnica primitiva, de cujo estilo talvez nos ríssemos, se não houtanta fome de fé. Interrogamos a história e os documentos para reconstreviver aquilo que perdemos. À misteriosa alma distante do Santo de pedimos, sobretudo, o segredo da sua paz, que há muito não possuímos.

A figura de São Francisco, assim concebida, não no limitado fundo hico do seu século, mas no fundo apocalíptico da história da humanidadeuma grandiosidade imponente.

Na intimidade desse fenômeno psicológico, sente-se o drama do espíridividualmente vivido, sobretudo pelo Santo de Assis, que, num paroxism paixão, sozinho, elevou à onipotência a alma humana, fortalecendo a mo coração. Seja-nos permitido observá-lo como fato individual, em seu prro e excelso representante, assim como nas tentativas e reproduções indais dos sectários e imitadores. Permita-se-nos perguntar, com aquela franque os nossos tempos exigem, sem os ornamentos da retórica e o peso ddição, que significado teria, na alma do Santo, a sua psicologia de excecomo o entenderá aquele que intente imitá-lo.

A figura de São Francisco representa, por outro lado, um fenômeno p

lógico coletivo; transforma-se em conceito que supera o tempo e é seatual; torna-se símbolo de ideias e tendências da sociedade humana, faz parte das leis do progresso. Em suma, constitui uma força biológica evona história da humanidade.

Este exame será conduzido por meio de conceitos absolutamente mode científicos, tratando-o como fenômeno eterno e permanentemente verdro, embora “traduzido” na linguagem diferente da psicologia moderna. Son-te assim poderemos atingir o alvo que colimamos: reviver na atualidade

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 185

pitação de um fato distante, misturando o fenômeno psicológico da vida ior de um santo com a nossa vida interior, individual e coletiva.

Para isto, é necessário um trabalho de apuração. É preciso abolir por ummomento os sete séculos que nos distanciam do drama real; séculos que

servaram, interpretaram e sentiram diversamente. A nossa interpretaçãomais rude, mais franca; porém, sem dúvida, mais profunda. O clarão rápigênio foi assimilado durante longos séculos pela alma coletiva. A tradiçliteratura e a religião, partindo de pontos de vista diferentes, construíramedifício cujo peso a força de um só homem não poderia jamais suportaçamos por um momento uma abstração de tudo isto, porque o monumgrandioso e de imenso valor nos impede de ver a nudez do conceito origiimpede-nos de ver com nossos olhos, de sentirmos com a nossa alma e dgarmos com a nossa mente, por inadaptação às necessidades dos nossos pos. Se examinarmos a psicologia do Santo de Assis com um olhar mais trante do que o dos séculos passados, talvez sintamos em nossa própria aarrepio de um drama que, posto a nu, será mil vezes mais verdadeiro e mSão Francisco não será um fenômeno histórico ultrapassado, mas constum ser que vive conosco, palpitando com os tormentosos problemas da alma e resolvendo-os. Observemos a paradoxal negação dos instintos hnos, o radical trasbordamento de valores que, seguindo as pegadas do Cfoi São Francisco. Aquilataremos, então, sua influência revolucionarialmas individuais e na alma coletiva.

◘ ◘ ◘ Quando São Francisco, reeditando o Cristo, aconselhava a pobreza, a

dade e a obediência, ele punha neste ideal a negação absoluta dos instfundamentais da vida, instintos que não foram livremente inventados pelmem para si, mas que lhe são herança da longa evolução biológica. Trata

instintos naturais, estabelecidos por uma lei da natureza, constituindo cul baixezas das quais o homem deve-se despojar para ascender. São Fransubstituiu por três renúncias, por três votos e por três negações o programvida secular, universalmente pregado em todos os tempos, em nosso mPor que tão radical e sistemática destruição da natureza humana? Podrevogar, sejam elas quais forem, as leis da vida em nosso planeta? Aondeseja chegar com isto, e o que se poderá colocar no lugar daquilo que negou? Quem é o Santo, e o que pretende ele das grandes massas hum

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 186

inertes como montanhas? O que representa na história da humanidade a deste pioneiro do ideal, que caminha na vanguarda do futuro?

Estas são perguntas que o homem de outros tempos não sentiu necessde responder, mas que nós nos fazemos angustiosamente. Certamente, é n

sário um esforço para sair do dilema da interpretação dos séculos. A figuSanto forra-se da nebulosidade do misticismo e das concepções tradicionfé, distante da vida no mundo objetivo e positivo das leis biológicas. Par por um conceito novo, é sempre necessário construir desde os alicerces. Tse evidentemente de vias desconhecidas, de vias perigosas, no entanto sãnovas, audazes e mais profundas, que terminam na eterna apoteose do Sa

Firmemo-nos em critérios e conceitos cientificamente objetivos, a fique a nossa fé não seja uma sentimentalidade pessoal e evanescente, masua, ao contrário, as bases sólidas da razão e da indagação positiva.O século dezenove criou, com Darwin, a teoria da evolução, demonsdo-a no campo biológico. O cristianismo já havia afirmado este fenômemundo espiritual, falando-nos da escola da dor e fazendo como objetivvida o aperfeiçoamento moral. Os dois conceitos que, no último meio séforam considerados opostos e inimigos, constituindo pomo de discórdiaduas escolas de pensamento que se guerreavam, o materialismo e o espilismo, nada mais são do que o mesmo conceito de progresso, tão espone instintivo, que se nos imprimiram no corpo e na alma. Biologicamenhomem é o resultado de longa evolução animal. Espiritualmente se afdo mundo animal, do qual emergiu graças ao sistema nervoso, à psiquespírito, à alma. Compondo o quarto reino – depois do mineral, vegetal animal – ele estabeleceu o reino espiritual, uma raça que possui em si o no, que, embora ainda não emancipado da animalidade, luta desespemente, todos os dias, por esta emancipação, e somente por ela.

Basta isto para integrar em nossa mentalidade cientifica a concepção dnômeno da santidade. Ainda que pese a Lombroso ou à medicina modersanto é um ser superior, e não um anormal ou um doente às voltas com arose, não um expulso da vida, um pária diante da normalidade medíocre,inepta, que se julga no direito de decretar as leis da conduta humana. Talceito é antivital, constituindo um monumento à imbecilidade humana. O é o supremo ideal, o pioneiro do futuro, uma antecipação no tempo, umafeição ainda não alcançada pela mediocridade humana, mas somente maravilhosos e singulares seres de exceção, já no ápice da escala evolutiv

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 187

santo é um herói e um mártir, porque sacrifica todas as suas alegrias e tsua vida para realizar de forma concreta as instintivas antecipações do fuque são os ideais; arrasta, não com palavras vãs, mas sim com o exempum caso vivido, as grandes massas humanas ignorantes, vis e inertes, pe

dolorosa e luminosa do aperfeiçoamento e do progresso. O santo é um gHá os especializados no campo do pensamento abstrato, da arte, da ciêgrandes, mas unilaterais, incompletos. O santo é grande no campo éticonde se alcança a última síntese de todas as aspirações humanas individucoletivas, o ideal que mais interessa à humanidade e comove os séculosque é o resumo de todas as conquistas humanas na peregrinação para o A

O santo apresenta-se-nos na ribalta da vida, levando consigo uma coção própria. Vimos o que é o santo em si. Observemo-lo agora em reàqueles que são chamados, individualmente, de seus semelhantes; vejamem relação aos homens que estudam esta nova e estranha psicologia. Arando-se por não encontrarem igual ressonância da lei dentro de si mechamam-no de louco e, primeiro, escarnecem dele, para depois ficarem atos e maravilhados, terminando sempre na veneração. O santo combate os instintos e tudo renega para reafirmar-se no mundo superior, obedienova natureza e segundo uma nova lei maior e mais livre. O santo ousa,nho, rebelar-se contra as tremendas forças constituídas pelas leis da natuas leis da animalidade, que ainda não foram vencidas e superadas. Ele, sentido, é o maior lutador e triunfador, porque não escolhe para inimihomens, como fazem os lutadores da Terra, mas sim as forças cósmicas.quista não os povos, e sim muito mais: as leis biológicas. É reformador elucionário porque revolve, destrói e reedifica a própria natureza humanalibertador no sentido biológico, o único verdadeiro; é o redentor da humade. O Evangelho do Cristo e a vida de São Francisco nada mais são do

código e a experiência deste superamento biológico da redenção.A virtude representa a norma desta redenção, o artigo do novo testameda nova lei que conduz à vida superior. Enquanto o santo realiza-se, a hudade, indolentemente, prefere vencer distâncias incalculáveis por camerrados. Nele, a lei atroz e feroz do egoísmo e da luta pela vida é substi pela lei da bondade e da justiça.

Não mais a força, e sim a justiça como irresistível necessidade da almmana. Não nos damos conta da negação cotidiana que a realidade opõe aal. O ideal existe e vive na forma de espírito, potente e indestrutível. Nã

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 188

preocupamos se a prática desvirtua o significado da virtude. Onde domamarga lei do mais forte e as aspirações são muito vãs, cada um exige vno próximo, porquanto a negação e a renúncia constituem nele um estadebilidade, o que, para o mal, é um estado útil à sua expansão. No triste

do da realidade humana o bem é útil; faz-se da virtude do próximo um para agredi-lo e obter melhor proveito, e não um meio de ascensão espiConforta-nos a esperança da transformação do bruto presente. A divina jumesmo no mundo inferior, reina em perfeito equilíbrio; a despeito de tuesforço individual para evolver é sempre possível, e isto basta.

As virtudes franciscanas são três: pobreza, castidade e obediência. Sãtrasbordamento de todos os valores humanos, a renúncia completa, oantes de ser redenção e reconstrução do super-homem, é a negação absdo homem. Fazem um vácuo pavoroso lá onde se move toda a psicohumana e se agitam os mais profundos instintos. O santo pode não severtigem desse vácuo, mas o que não sentirá o homem comum? Este, à slhança da raça animal, utiliza-se dos instintos da fome e do sexo e, canimal, luta pela nutrição (continuação da vida individual) e pelo amor tinuação da espécie). A sua escola é a psicologia do egoísmo; a sua feroz e desapiedada luta pela seleção do mais forte, em nível de vida bque ele não imagina sequer poder superar. O homem, neste estado, é emamente lento na evolução. O pendor pelas coisas baixas e a ignorâncialtas o tornam indiferente diante dos problemas mais substanciais. Eisaparece o santo e sulca o céu como um meteoro luminoso, deixando atrsi um rasto de luz. Mas quem observa, quem compreende, quem jamaisimaginar uma fuga da Terra? O homem observa indiferentemente e voolhar para baixo, a fim de acariciar a matéria. O prato que a pastagem oce é, para a ovelha, todo o universo.

Então, entra em cena a dor, porque, no equilíbrio da vida, necessitávamuma força capaz de impulsionar a elevação humana. Dor sapiente, que tratodos os umbrais, penetra todos os corações, sem que a sabedoria, a riqueo poder possam resistir-lhe. Onde quer que surja, ela abala e destrói; a suala consegue amadurecer todos sem distinção, ponderadamente e segunforças de cada um! A dor, força providencial, impõe a todos um mínimogatório de aperfeiçoamento. Ela é a primeira prática da virtude, direi quasçada, impondo às alegrias materiais um mínimo de renúncia, que nos ennha à grande renúncia e ao grande superamento do ideal franciscano.

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Daquele mínimo obrigatório a este máximo voluntário, existe uma de lutas e de esforços em todos os níveis, com infinitas gradações de vdade e acelerações sobre o caminho da evolução. Há o que vai lentamenque tem pressa. Há o que desejaria voltar atrás, para revolver-se na lama

o que segue em marcha forçada, ardente, consumindo-se na avidez espirAlguns aspiram tanto ao Alto, que chegam quase a forçar as leis da vidachegar logo. Cada um executa o seu trabalho segundo as suas próprias rações e recursos.

Observemos um instante a fatigante ascensão do homem, curvado s peso da própria evolução. O espetáculo desta pobre raça humana, que, aada por milhares de necessidades, atormentada pelos próprios instintos iores e sujeita a uma implacável lei de feroz vigilância, deve por isso m purificar-se, inspira algumas vezes sincera piedade. Constrangido pela dhomem deve separar-se das tantas alegrias que, em suas mãos, tornam-ssões. Deve elevar-se, percorrendo de novo a via de glória, perdida num áde rebelião, tal qual o anjo soberbo no longo caminho dos milênios. Quecondenação ter na pupila o sonho de uma felicidade completa e senti-la pre imensamente distante. São Francisco, assim como Cristo, deseja auxhumanidade, a fim de elevá-la à redenção, e faz isso porque tem não apconhecimento da distância que separa o ideal da realidade, mas também ciência do imenso esforço requerido ao homem, tal como ele é. Este conentre o ardor da própria paixão e a resistência passiva da humanidade ine atrasada; este frenético e inútil embate da própria alma veemente conapática e cega alma das grandes massas humanas; esta humilhação do prespírito, humanamente cansado, no limiar da grande redenção, deve ter sverdadeiro drama de alma do Santo de Assis, durante a plenitude de sua o fervor do seu maior sacrifício. Somente quem viveu tais conceitos e b

ao vento, inutilmente, o grito de uma grande paixão incompreendida, conhecer a razão e sentir a impressão causada pelo drama espiritual aséculos distante de nós.

Existe, efetivamente, uma tão enorme distância entre a psicologia fracana, cuja finalidade é ensinar ao homem a conquista de si mesmo, e a plogia corrente, que a primeira parece utopia, tal o contraste que as sePodemos, todavia, perguntar o que representa a psicologia comum paragar-se o direito de infalibilidade, somente por ser produto da maioria. Pmos perguntar ainda se os seus conceitos não são, ao invés, muito relati

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discutíveis, ou pior, se não são, deveras, a codificação de instintos atrasuma norma de vida pouco nobre que somente o baixo nível de vida dmem pode considerar conveniente. No entanto todos duvidam disto e egam-se ao ceticismo, hoje em moda, destruindo a fé íntima para cair n

zio. Invade-nos, então, o terror do vazio e a necessidade de nos modimos. Permanecemos inertes e vencidos, a olhar de longe, desanimadrocha inacessível da santidade. Somente poucos espíritos gigantes comram a rebelião total e souberam reconstruir, realizando, num salto milago esforço titânico de superar as leis humanas e viver uma lei de ordem rior. Para nós, pobres mortais, o ideal é belo, uma fascinante miragem dte, que olhamos enlevados, emudecendo e suspirando. As férreas leis dtureza estão sempre prontas a nos arrastar em seu ciclo e a nos dispuangelitude. O homem vacila nesta bifurcação entre humanidade e divintenta o voo, mas cai dolorosamente na terra. Eis o grande drama psicoldo santo e o drama humano, triste e piedoso.

Os dois dramas se olham e se fundem na tremenda luta apocalíptica o bem e o mal, sintetizando o momento biológico do nascimento do anhomem.

As três virtudes franciscanas representam o ciclo da redenção, istodestruição completa do homem e a reconstrução total do super-homemdesejam, antes de tudo, destruir profundamente a animalidade humanaferindo-lhe um golpe mortal, a fim de eliminá-la. Pobreza, castidade e oência são para o homem comum uma espécie de morte, pois constitunegação absoluta dos instintos básicos da personalidade humana. Sobcinzas desta destruição inicia-se o longo trabalho de reconstrução. A abção é apenas transitória, um meio para alcançar a mais potente afirmaçeu. A renúncia não é senão a primeira fase, que preludia a perfeição. D

ser, com certeza, bem triste o vazio deixado por esta negação tão complesi mesmo em quem não possui no próprio temperamento os recursos etuais para preenchê-lo e substituir esta destruição da própria natureza in por algo melhor. Destruir sem saber reconstruir é criar dentro de si umcuo triste como a morte, que será ainda mais pavoroso se tentarmos pchê-lo com os mesmos instintos sobreviventes, adaptados pela hipocrissignificado da renúncia está todo na reconstrução. Reconstrução é a chavenigma; sem ela, o ideal franciscano é uma loucura. A grande dificuldadgrande triunfo residem em reconstruir mais alto.

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São Francisco, grande senhor de recursos espirituais, foi um mestre nconstrução. A concepção que ele viveu é completa; antes de ser crítica omolidora, é reedificadora. Muito mais que a negação do humano, é anafirmação do divino, um verdadeiro domínio da natureza. Ele teve a cor

heroica de viver a sua reconstrução de homem no meio de uma humanespiritualmente bárbara como a nossa; de viver a lei de ordem mais eleque os seus semelhantes não podiam compreender e julgavam loucura. nós, pobres mortais, devemos contentar-nos com insignificantes aproximaele obtém a plenitude da realização. Não desejou destruir no homem seque havia nele de baixeza e de animalesco; não combateu a atividade dosos instintos humanos, mas sim os seus abusos; não perdeu jamais de vobjetivo principal, que é a reconstrução de um homem melhor. Combaamor, mas apenas na sua mais baixa forma de sensualidade, deixando-o sviver e até mesmo fomentando-o como ímpeto de altruísmo em relação aoximo, como ímpeto de alma para Deus. Combateu do mesmo modo a riqua propriedade no seu sentido de cobiça, de avidez, como fontes de tantos e de tantas dores, mas jamais no sentido de trabalho. Desejou, antes de tuatividade fecunda e depois a distribuição dos bens com probidade e altruContrariou desta maneira a expansão da personalidade humana somente naspecto inferior de orgulho, de violência, de avidez por domínio, deixandem compensação uma afirmação muito maior e mais completa no campespírito. Desejou, em suma, a transfiguração do homem.

Eis a importância individual e o significado de cada uma das virtfranciscanas. Individualmente, elas significam progresso espiritual: o ramento da matéria; a libertação das formas de vida inferior; a emancipdo homem da animalidade e das suas leis cruéis e ferozes da luta pela sedo mais forte; a atividade num campo mais alto; a conquista de uma f

superior de vida mais completa, mais livre e mais intensa. Os ideais fracanos auxiliam a alma humana a sair da sua crisálida de animalidade, ela se encontra presa, debatendo-se dolorosamente, e guiam-na para o e real progresso, que tende para aquela felicidade superior, alcançada sote após dominar-se as forças inferiores, para uso e gozo de uma conscimais vasta e de uma paz mais profunda.

Tudo o que age no indivíduo não deixa também de produzir suas repesões no caráter coletivo. O benefício dos ideais franciscanos é grande atémo no campo social. As verdadeiras revoluções são as que partem do co

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de cada um; as que atingem a substância e deslocam a posição da alma indual; as que representam a soma da mudança íntima, individual. Para reeda coletividade, é preciso antes reedificar o homem. Que sociedade maravseria aquela em que o indivíduo fosse moralmente bem mais forte.

Participamos de uma grei que não pode oferecer nenhuma seguranalegria e nenhuma confiança à felicidade. Uma legalidade forçada, ma pressiva do que preventiva, não pode, senão relativamente, dominar a humana, onde está a fonte do bem e do mal. O indivíduo nada mais pcomo defesa contra todos senão o emprego das próprias energias para rear. Um instante de fraqueza pode fazê-lo perder, tornando tudo sujeicontingências da vida. Onde não há segurança, que bem pode ter valor? revolta do santo. Sabendo que unicamente o amor ao próximo valoriza as lindas e infinitas maravilhas da Terra, ele nos move para a conquista amor, base principal da estrutura social e condição imprescindível para tir um verdadeiro organismo coletivo.

Temos, então, no Santo de Assis o primeiro cavaleiro armado pelo aencabeçando uma nova cruzada, na qual o lema é a fraternidade, para contra o interesse, o egoísmo, a traição humana e tudo aquilo que conforça desagregante da sociedade. Ao lado do santo, o quadro de uma socifundada sobre princípios diferentes – o sonho realizado. O primeiro clarinterior é a necessidade de ser pobre, a necessidade de morrer também dme, para não ficar preso como escravo na engrenagem das atrações humO trabalhador do ideal, livre, afasta-se dos profanos, dos interesseirosnegocistas, dos produtores de dinheiro, que atropelam porque não veedelicadíssimas flores do pensamento e do sentimento. A necessidade de ade si a triste população agressiva e sem escrúpulos impõe-se ao homemlista, para que ele possa dar o fruto da sua vida. Amadurecido pelos torm

ele é um fruto que a humanidade colheu sem pagar ou pagou somenteglória póstuma. A grande batalha tem início contra a própria natureza hue contra a psicologia coletiva, por meio de um exemplo concreto, uma reção vivida pelo ideal. O mundo, a princípio, olha, depois despreza e, emguida, lentamente, compreende, liberta-se e, por fim, prepara-se para segexemplo. Esta assimilação do ideal por parte da alma coletiva é uma prolda luta secular, porque se traduz numa cadeia de grandes homens que se dmãos e sucedem-se, traçando a estrada. Há uma série de tentativas e de ços que a humanidade faz para concretizar o pensamento, lenta e arduam

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até à realização completa. A vitória pertencerá à humanidade futura. São cisco é ainda hoje o símbolo da sociedade em formação, representandotendência, uma esperança, uma expectativa, um trabalho a cumprir. Nestetido, ele está vivo ainda hoje, como estará sempre, entre os homens.

Pobreza é a virtude que tende a eliminar da alma humana, onde se entram as suas raízes, a rivalidade entre ricos e pobres, estimuladoras de testudos, de tantas tentativas de reformas econômicas, de tantas lutas polineficazes e estéreis. A pobreza franciscana é, antes de tudo, um ensinamde renúncia aos ricos, para o uso parcimonioso dos próprios bens, e não avo. Aos pobres, que nada mais são do que ricos sem dinheiro, aconselharenúncia. Não apenas nenhuma inveja, mas também muita paciência nas pções. Ensina a ambos a vitória sobre a avidez, que os separa e os armcontra os outros, com tanto dano comum; pede a abdicação dos baixos ape a formação de valores mais elevados, que alimentam, saciam e são gratAdvoga a destruição de uma fome vulgar e a geração de um desejo ma bre, possível de ser saciado.

Castidade é a virtude que tende a suprimir da alma humana os maisgradantes instintos, eliminando a explosão cega das forças naturais e tuque nivela o homem à besta. A castidade franciscana é, antes de tudo, dade no espírito, que confere ao indivíduo a posse de si mesmo, o domsobre as leis da natureza, o uso inteligente das forças biológicas. Esta vinão propende à destruição do amor, porquanto esta é a grande força desão que domina o universo. Não impõe a morte do amor, mas sim a purção de suas formas inferiores, para torná-lo mais consciente, mais elevmais profundo. Assim o amor perde a significação de função animal objetivo de reprodução, como ato individual de expansão egoística, paum ato consciente das finalidades da raça, consciente das exigências da

tividade, tornando-se um amor disciplinado, moral e subordinado a isuperiores. Sublimá-lo significa ainda mais: significa consciência das nsidades e das exigências alheias, respeito pela liberdade do vizinho, almo, amor ao próximo, fraternidade, coordenação da atividade individuao milagre da evolução do amor, força imensa de coesão social. Mas isto basta. Elevado ao máximo de altruísmo, de universalidade, de dedicaçãosacrifício, elevado aos mais altos vértices da perfeição, o amor é o ampda alma a todas as criaturas. Então deixa de ser a negação separatista r

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sentada pelo egoísmo, para torna-se a expansão completa do eu em tudo oque existe, a fusão da alma com Deus.

Obediência , no mais amplo sentido, é humildade; é a virtude que suprimexpansão exagerada do eu, a qual leva inevitavelmente à luta contra a exp

são da personalidade do próximo. Neste mundo, em que ninguém olha o prio semelhante como a um irmão, em que a infelicidade alheia possui emmedida da própria expansão, em que a agressividade inconsciente e mtende a expandir-se ao infinito, a virtude da humildade franciscana é o enérgico e salutar corretivo. Trata-se de um antídoto para toda a desortoda a insubordinação e todo o arrivismo, para canalizar o indivíduo aosdes da reciprocidade social. É um exercício que visa eliminar em cada uinstintos atávicos de agressividade, enfraquecendo-os cada vez mais, parnar o indivíduo mais coordenado com o organismo coletivo e mais adeq para viver na sociedade. As células tornam-se mais aptas a viver no orgacoletivo, conquistando maior coesão, a qual não seria possível sem aquemento psicológico dado pela consciência que o indivíduo tem da coletiviApenas a superior virtude franciscana nos pode dar a subordinação do aotodo, a extinção do fermento desagregante do egoísmo e a realização deconsciência coletiva. Um sistema não mais de agressão, e sim de coordenque é condição indispensável ao progresso social.

Eis o grande mérito das virtudes franciscanas na coletividade. Todastendem ao mesmo fim: a formação de uma mais harmoniosa e elevada esra social. Elas, antes de tudo, agem sobre o homem, melhorando-o, transfmando-o em cidadão de crescente dignidade para uma sociedade mais dAgem também desta maneira sobre a coletividade, transformando-se em de progresso social. O indivíduo, por sua vez, encontrará sempre mais mente a posição que corresponde às suas próprias necessidades e ao val

trínseco que ele representa, isto é, a uma porção sempre maior de feliciAs virtudes franciscanas, como tudo o que é progresso, conduzem à realideste grande sonho humano: a felicidade.

É consolador, diante da dolorosa realidade da vida, considerar esta coção de uma humanidade superior, bem mais civilizada e bem mais conscdona de si mesma e das forças que contém. Jamais devemos ser pessim pois o fato de ser vida um organismo complexo, que funciona sabiamalimenta-nos a esperança de ver realizada aquela concepção. A human pode e deseja subir. As leis biológicas o exigem. Havemos de subir, co

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sem São Francisco, em obediência a leis inflexíveis da vida. Em qualqutado social, em qualquer momento histórico, agora e sempre, somente novaremos através da experiência das virtudes franciscanas a nós legadas.

◘ ◘ ◘

Acabamos de analisar os ideais franciscanos de aperfeiçoamento morao ponto de vista individual e social, interpretando através da nossa mentalmoderna a sua grande psicologia de exceção, na qual encontramos umamação lógica, racional e profunda. Repousemos a nossa mente na conteção da sua grande beleza moral, como uma criação estética completa doto, ignorada pelo requinte grego. São Francisco é uma figura maravilhosate complexa, figura que resume em si todo o homem, feita de pensamesentimento, de cérebro e coração. Observemo-la com aquela paixão e a pureza próprias das almas simples.São Francisco é mente, São Francisco é coração. É profundeza de coné intensidade de paixão. Ele é a grandeza completa. Não é, como muitonios, unilateral e hipertrófico no intelecto ou no sentimento. O pensameluz fria que pode iluminar esplendidamente a estrada, mas, sozinho, opero calor do sentimento, que reconforta, aquece e consola.

São Francisco é intelecto. O seu idílio, o seu sonho, a sua paixão são bdos numa concepção profunda, potente, audaciosamente projetada no teEle foi, acima de tudo, um grande pensador, precisamente porque não stendeu pelas vias da análise, mas alcançou tudo rapidamente, pela intuiçãum prodígio do pensamento, justamente porque apanhou as conclusõesátimo. Das mesmas conclusões que a ciência moderna tarda muito para açar ele nos deu a síntese no início de sua vida. Para o exercício de suas edas missões, os santos, que são os trabalhadores do ideal, devem possucontrário da nossa ciência, a segurança e a rapidez das conclusões. A sabe

da intuição é a sabedoria simples e profunda das grandes almas, que resinocentemente e com a simplicidade de uma criança, os maiores problemvida, diante dos quais a ciência se cala e o homem abaixa a cabeça, desado. É grandioso agir desta maneira, sem ostentação e sem erudição, hummente e quase despercebido, ao enfrentar os problemas mais altos e maifundos. São Francisco, humildemente, apoderou-se dos problemas dos podos séculos; viveu conceitos universais; solucionou em relação à psicocoletiva questões de ordem moral, econômica e social, as quais, na prainda não foram definitivamente resolvidas pelos grandes homens. Tudo

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 196

São Francisco viu e sentiu, tendo-nos brindado com as suas conclusõequais, sobretudo, foram por ele vividas.

São Francisco é coração. Muito mais do que um grande conceito, uma grande paixão. O trabalho do cérebro precedeu claramente ao do

ção, especialmente no período juvenil da crise psicológica. Foi um trabintuitivo, rápido e conclusivo, uma breve síntese posta à frente de umade realizações. Quando tempos depois, numa triste tarde de inverno, che júbilo, entendia-se com aquela flor e assim, em toda a sua simplicidadese sem se dar conta, lançava a concepção mais ousada que a humaniconhece, ele também esboçava e explicava, numa forma sublime, a natda sua grande paixão de elevar-se e de amar, que, exaltada na sua veemêera capaz de consumir as forças insuficientes do seu organismo humano paixão lhe proporcionou a força tremenda para impor-se às leis inferiornatureza, para subordinar-se às necessidades de uma lei superior, mostranos realizada a altíssima concepção do ideal. Esta paixão o fez viver e rer, proporcionou-lhe o frenesi de elevar-se, tornou-o santo no sofrimenfez triunfar da dor – o grande terror dos homens – para depois consumir destruir seu débil arcabouço humano. Ele andou sempre a cantar o seu mento interior na forma mais doce e mais gentil de sua primorosa sensdade; perfez a sua vida dolorosa em nossa Terra cantando sempre. A suaxão era amor. Quando o amor é muito grande, as formas humanas nã bastam mais, então a alma rejeita com repugnância o ponto de vista coque não mais satisfaz. Tal amor procura abraçar todas as criaturas, mes bruto e até o inimigo; esforça-se por achar alegrias mais profundas, busuma união que somente pode ser completa se existir no amplexo supremalma com Deus. São Francisco levou sempre consigo este amor tão vatão novo, padecendo e esmolando de porta em porta um pedaço de pão

sentia, todavia, fome de pão, mas sim do amor puro e verdadeiro da que, para ele, existia em pequena dose sobre a Terra! Viveu com a suaxão num mundo repleto de ódios e cobiças, tão diferente das necessidadsua alma, que, num dia de sua juventude, deve ter-se-lhe afigurado veneou envenenado. Viveu num mundo frio e hostil, que não oferecia nenhoportunidade aos seus desejos mais ardentes. Mundo divorciado dele compreensivo, onde todos encontram facilmente apenas a si mesmos. Nmundo, não lhe restava outro trabalho a não ser o heroísmo do sacriFaminto de amor, com o qual revestia cada ato de sua vida, implorava-

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mildemente por esmola. Vestindo-se de pobreza, nutriu-se de renúncia apoteose do Alverne e ao sacrifício da vida, até à extrema abnegação e xima doação de si mesmo em êxtase sublime, no amplexo sobre-humanque a alma se funde com Deus.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 198

O PROBLEMA DA VIDA E DO ALÉM NO“FAUSTO” DE GOETHE ( 1931)

O encontro inesperado, em plena maturidade espiritual, com a gigan

visão goethiana, sentindo-a, com a alma vibrante da luta cotidiana, no se pecto mais profundo de ascensão espiritual, revivendo-a em seguida, ao çar por outras vias, como Fausto, todos os quadros da vida até à última sí – eis uma experiência tremenda que não mais desaparece da alma, à made todas as impressões que são eternas e infinitas.

Eu, que havia admirado, sem paixão, Shakespeare e Milton, mas queVítor Hugo, quase me cansara do estilo muito frondoso de retórica superdante, reencontrei em Goethe a emoção que somente Dante já me havia a vertigem das grandes alturas, porque a alma somente treme diante dearte que nos transporta às origens da vida.

A peregrina beleza do Fausto reside no fato de que a realidade profundavida, aquela vista e vivida apenas por raros espíritos, é elevada aos prim planos, como substância do drama. Goethe sentiu instantaneamente, por ção, a concepção filosófica da qual participaram Buda e Cristo, cuja comtação se realizará de forma dedutiva e analítica na síntese científica dos los futuros.

A tragédia de Fausto é a maior tragédia humana: a ascensão do ser, pnão mais aos níveis da evolução orgânica, e sim na sua manifestação elevada, como evolução espiritual. No Fausto , a vida se dilata na eternidade completando-se além dos limites humanos do nascimento e da morte, no ab-soluto, onde encontra a valorização do nosso mundo relativo e transitórvida neste drama é a vida do espírito no infinito. Deste seu elemento, o ito, desce ao finito, numa encarnação variável, onde a fantasia parece rea

se na forma e a irrealidade enquadrar-se no conceito; onde as ilusões de as nossas vicissitudes humanas são reduzidas ao seu verdadeiro valor, rsentando uma série de provas, logicamente ligadas, segundo um desenvmento que se chama destino, tendente a um objetivo situado além da para o qual ela ascende. Os quadros de Fausto são as experiências da existência; a eternidade os atravessa, tendo como finalidade o nosso apçoamento, razão pela qual Goethe concebeu as provas em forma de grade de progressões. Assim, no Fausto, esta forma da ascensão humana, que é prova, decorre mutável e progressiva, numa série de esplêndidas visões

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 199

expressar-se tão humanamente, como de fato acontece na vida, em seu tfinal, no ocaso da velhice. A concepção da vida é mais linda, mais profmente verdadeira, na sua forma de luta, incerta e susceptível de quedascapaz de vitória; na sua forma de conquista dinamicamente titânica pera

contraste apocalíptico entre o bem e o mal, do que na sua forma pacíficonclusão agradável, como o fez Manzoni, de modo tão cristãmente tran Não se trata somente desta particularidade; a prova é concebida segun psicanálise, com indagações sobre o subconsciente e sobre o desenvolvimda consciência em contato transitório com o ambiente. Certas posiçõeespírito, desde que se repitam, aprofundando-se do consciente no subcoente, geram por assimilação contínua do exterior novas capacidades, atitqualidades e potência do eu. Trata-se de um processo que é desenvolvimede consciência, formação e dilatação da personalidade, meta última de as ascensões, a única que pode, na vida, justificar o erro e a dor.

◘ ◘ ◘ Sobre a tela desta profunda tese filosófica, Goethe pinta sonhos ous

de vasta fantasia, usando consumada arte de poeta. O espírito viaja de vem visões, perseguindo as figuras de uma esplêndida fantasmagoria dedros. Todo o mágico poder de Mefistófeles nada mais é, no fundo, suma extraordinária capacidade criativa de representações interiores, quconduz desta maneira a pleno mundo astral. Faz-nos viver na parte maisfunda do eu, no subconsciente, onde a imagem é realidade dinâmica e como ocorre em toda visão profunda do espírito, realidade mais livre evel, como a lei do imaterial, desvencilhada de todos os férreos liames dada matéria. Os contatos com o além, que emerge da sombra, fazem-semais vivos e imediatos. No drama goethiano, transpomos este limiar. Nãcontudo, partida sem regresso. Todo o drama flutua além do mundo hum

no grande mistério do além, sem, todavia, abandonar a Terra. A cada pregressa à nossa vida e ilumina-a toda com a luz do eterno. Não se traabandonar a vida, ausentando-se dela, mas sim de interpelá-la e expli para agigantá-la no infinito. O além se adentra no drama para elevar o do das nossas vicissitudes até um significado altíssimo. O eterno desconcentra-se no átimo fugidio, que expressa e abraça todo o eterno. grandes aspectos complementares, como as duas metades de um todo;extremos da vida, que se fundem no amplexo de uma única visão. No dgoethiano a comunicação entre os dois mundos se efetua a todo instan

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 200

além, não mais velado e distante, aparece-nos próximo e palpitante. Étragicidade no supranormal o que mais impressiona e arrebata.

Se bem que, na época da lenda do Fausto, o mundo palpitasse ainda codiabólicos terrores medievais (o Fausto de Goethe descende diretamen

Doutor Faustus, de Cristopher Marlowe, cuja comédia foi levada da Ingl para a Alemanha no século XVII por artistas ambulantes) e Cagliostro esse próximo da ciência espiritualista, como noGeiterseher de Schiller; se bemque tal lenda confinasse com o charlatanismo e fosse amálgama de neurde fanatismo religioso; se bem que fosse ainda desconhecida a função ddiunidade, Goethe, entretanto, com o seu gênio, intuiu com clareza o asde alguns fenômenos como a desmaterialização, que é continuamente tracena, recordando a dissolução de Katie King, na obra de William CroAssim Euphorion e Helena se dissolvem, enquanto o Pudel torna-se um “fah-render Scholastikus”. Em cena, os atores parecem escolher o movimento vecal com a mesma desenvoltura com que os mortais se movem horizontalmdando-nos a impressão de uma quarta dimensão. Movendo-se os atores sote no espírito, a viagem de Fausto não se realiza no espaço.

“Afunda então! Mas poderei também dizer-te: sobe! Dá no mesmo”, diMefistófeles a Fausto, ao indicar-lhe a estrada do além, por onde eles v procura da bela Helena e de Páris. O mundo mitológico da Grécia cláestranhamente sonoro para nós, latinos harmoniosos, é todo revividosobrevivência no além, em áspero verso germânico. Multidões de espinvisíveis, sem outra manifestação a não ser um pensamento e uma vomam parte a todo instante no drama, que está repleto de personagens i póreos. Trata-se, para aqueles que possuem um corpo, de um constanterecer e desaparecer, de um contínuo concretizar-se e dissolver-se, de umcessivo fazer-se e desfazer-se da forma exterior. Os personagens, à gui

materializações espíritas, talvez em virtude do imenso poder mediúnicMefistófeles, despem com toda a desenvoltura as suas vestes corpóreafacilmente como se mudassem de roupa, e continuam declamando no aGoethe mostra-nos um tipo estranho de ator, que parece não ter corpque, mesmo o possuindo, não se preocupa em perdê-lo, pois sabe que, cfim deste, ele nada perde de sua parte mais verdadeira e mais profunda: personalidade. Sublime ingenuidade cênica, que esconde um profundoceito filosófico! É a identidade imutável do espírito, através de qualqueseja a mudança de forma; é o verdadeiro eu, que permanece inconfundível

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 201

inalterável através de todas as aparências humanas. Margarida morre, mseu espírito e a sua voz continuam. E, num doce apelo, ela chama: HenrHenrique! Estamos em pleno mundo mediúnico, sensível na veste palpdo drama, fundido com a mais profunda concepção filosófica.

◘ ◘ ◘ O conteúdo dramático do Fausto entretém não com choques de paixões humanas – como prevalentemente acontece, por exemplo, em Maria Stuart deSchiller – iluminadas por um conceito ascensional de redenção, mas sim um contraste imensamente mais vasto, dado pela luta apocalíptica entre asmaiores forças da vida: o bem e o mal. Ascendendo em Dante, rediminem Vítor Hugo e santificando-se em Cristo, Fausto é o símbolo do homemse agita entre estas duas forças, é o símbolo do homem que luta e, lutevolve até à última síntese. Mefisto é o espírito que nega:“Ich bin der Geiútder stets verneint! Ein Teil von jener Kraft, die stets das Böse will stetGute schaft” (“ Eu sou o espírito que sempre nega! Uma parte dessa face que

sempre quer o mal, mas da qual resulta o bem ”).Ele é a negação de tudo o qu possa ser bem, verdadeiro, belo, sublime, puro. É a antítese, a sombra doé a contradição que condiciona o triunfo do verdadeiro. Esplêndido contratreva, da qual nasce a luz. Em Goethe, os personagens são símbolos, são presentação de uma força cósmica. Mefistófeles sintetiza a mentira, a traidestruição. Externamente, é todo luzidio e refinado, cortês e atraente; inmente, é egoísmo, maldade, baixeza, um tipo que a sociedade humana co bem. Mefistófeles é uma força que, para demolir tudo, demole primeiramsi mesma. É um gigante que rapidamente contradiz a sua grandeza, tornanfalso e ridículo. É um herói, o mais fraco e o mais miserável dos heróisinspiraria piedade se não provocasse aversão. Mefistófeles não é a dor q boriosamente edifica no eterno, condição transitória de uma felicidade im

cível, mas sim a alegria fácil, usurpada, imerecida, que logo desaparececonduzir ao sofrimento. É um falso prazer, pronto a desagregar-se a cadtante e a transformar-se em dor. Estamos nas estradas da descida, da invo para a animalidade, em antítese à via ascensional, onde o espírito triunfa.

Do outro lado as forças do bem (ainda que não sejam tão estritamentracterizadas em Fausto como se apresentam em Mefistófeles as forças do mnão são, todavia, menos poderosas. Se são concebidas de maneira mais imsoal, isto visa exprimir a sua universalidade, para dizer que o bem é a reque o mal é a exceção. O que condiciona e limita o mal é o bem, lei univ

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O bem não se localiza, não se personifica, porque é o hálito de todo o unso, abraçando no seu âmbito todo o mundo do mal. Mefisto encontra osobstáculos e não pode transpô-los. Como princípio, é tolerado, mas, condição e como explicação, possui o seu campo limitado. No prólog

Céu, as duas grandes forças se olham face a face, por uns instantes, sem v“Der Herr. – So lang er auf der Erde lebt,So lange sei Dir's nicht verboten.

Es irrt der Mensch, so lang'er strebt.Und steh beschamt, wenn du bekennen musst

Ein guter Mensch in seinem dunkeln Dranges Ist sich des rechten Weges wohl bewusst.” (“Senhor. Durante a tua vida na Terra,Isto não te era proibido.O homem erra enquanto luta pelo progresso,Envergonhando-se quando é obrigado a confessar.Um homem bom está ciente do caminho certo,Mesmo quando os impulsos contrários o açoitam.”)

É o bem que abandona Fausto ao mal, porque este foi acolhido por elefisto, cônscio da sua posição subordinada, pede-lhe permissão: “Wenn Ilhr mirdie Erlaubnis gebt” (“Quantas vezes me dão permissão ”), para lançar seudesa-fio somente depois, e o desafio é tremendo. A voz do bem, pressentindo,via, a derrota final do mal, adverte-o e o confunde.

É surpreendente este conceito – indubitavelmente, se não no pormenor, s berano e dominante nas grandes linhas do funcionamento orgânico do uni – de um equilíbrio admirável, tão anti-schopenhaueriano, otimista e comque sobressai com evidência em Goethe. Esta devia ser a concepção filosda sua vida, que Fausto interpreta e resume. Revela-nos a ideia de Deu

organismo de leis absolutas e invioláveis, segundo as quais todas as forçuniverso se movem incessantemente no transformismo fenomênico, mergdas no seio de um equilíbrio espontâneo e supremamente justo. Como emso Dante imortal, o drama goethiano é o drama do universo. Que concom o: “To be, or not to be, that is the question”17, que pôs o problema, semresolvê-lo:“puzzles the will, and makes us rather bear those ills we have fly to others that we know not of.” (“confunde o desejo, e faz-nos antes supor-

17 “Ser ou não ser, eis a questão” (N. da E.)

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 203

tar os males que possuímos do que voar para outros que desconhecemos ”).Que impotência filosófica nesta incerteza que não conclui! Que distâncalma carducciana!18 É o eterno que transparece e lampeja a cada passo Goethe, mostrando-nos uma beleza substancial, que, sozinha, pode valor

esplendor das formas e nos dar a profunda poesia do conceito, unicamenqual reside a verdadeira arte.O Céu e a Terra assistem, no Fausto de Goethe, ao grande drama do bem

do mal e intervêm nas agitações das ascensões humanas. Os coros dos acontrastando com as falsas insinuações de Mefisto, acompanham todo oflito espiritual que turbilhona na alma de Fausto. Então surge a hora pave turva do mal, que ali, diferente da agonia do Getsêmani, encontra-se nnitude do seu efêmero triunfo. Nada se podia imaginar de mais tremendammacabro do que o vertiginoso pandemônio daWalpurgisnacht

19sobre o fundodo Brocken 20. Talvez somente a áspera lenda germânica, referta de bruxas

diabos, de terrores e de trevas, pudesse fornecer-lhe tais motivos. Nem Gque conhecia perfeitamente a Harzgebing e as regiões de Schierke e Elen poderia encontrar um fundo mais tétrico e desolado para a sua representaqual nosso Boito 21 reproduziria tão magnificamente depois, em forma musA festa agita-se nas danças sapateadas, sendo toda pompa e alegria, queminam num triunfo revelador de grandiosidade. É sem dúvida festa e trimas é, como tudo, alterado e falso, pervertido e ridículo! O brilho é tremúsica é fluxo de estridores; a multidão é estranha, sórdida e vil; o triuinsulto e zombaria. Que escumalha infernal de espíritos imundos e carrais! Que áspera e tétrica sinfonia aquela espantosa fila de bruxas nórdicfuga, todas nuas, cobertas de unguento, cavalgando vassouras pela pavcharneca de Brocken, enquanto a música louca do sabá, digna de Berliozo ritmo de uma satisfação feroz! O espírito que nega, nega antes de tud

18 Referência ao poeta italiano Carducci, Giosuè (1835-1907)19 Walpurgisnacht – “A Noite de Valburga” erana Alemanha medieval, segundo as crendi populares em voga, aquela em que se reuniam os espíritos malignos e as feiticeiras, noBrocken.20Brocken (ou Brock) – elevada e granítica montanha, na Alemanha, onde, conforme as sutições medievais, imperava o chefe das forças do mal, “o Senhor Uriano” (Herr Urian) nr-são do Fausto de Goethe.21Boito – Referência ao grande poeta e compositor italiano Arrigo Boito (1842 -1918

creveu libretos para “La Gioconda”, “Otelo” e “Falstaff” (estes dois últimos musicados poVerdi) A ópera mais famosa de Boito é justamente “Mefistófeles”. (N. do T.)

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 204

mesmo. Na festa de Walpurgisnacht existe a manifestação de uma força que anula na impotência, um aparato de glória que é todo ele um escárniotripúdio que é triste como uma condenação, um grito de satisfação que ulular de desespero. A Walpurgisnacht é a personificação das forças do mal

seu efêmero triunfo; é o mais desconjuntado canto da vida que submergedesprezo louco de destruição. É a involução, a descensão efetivada, o regrumo à animalidade; é o triunfo da besta feroz, é o inferno, onde o espíritmorto. É uma humanidade que, louca e embriagada, ávida e falsa, delira a nossa. Minha vontade seria rir com Goethe pela sátira esplêndida.

As forças da vida estão vivas em Fausto; agitam-se galopantes comomar tempestuoso; condensam-se num vórtice, para arrastar o homem e, darremessá-lo ao alto, para o Céu. O turbilhão desencadeado pelo mal temhora e deve resolver-se numa função do bem. A doce e ingênua Margauma das mais belas criaturas goethianas, encontra-se, enquanto ora no gtemplo gótico, em pleno poder do triste espírito que lembra traição:

“Böser Geist. Wie anders, Gretchen, war dir’s, Als du noch voll Unschuld Hier zum Altar tratst.” (“Espírito mau: como te sentiste meiga Margarida,Quando ainda completamente inocenteTe aproximaste deste altar.”)

Na alma desolada da aflita ressoa:“Dies irae, dies illa Solvet saeclum in favilla.” 22

Mas a crente, que havia rezado tanto: “Ach neige, Du SchmerzenreDein Antlitz gnädig melner Not!” (“Oh! vinde a mim, vós que sofrestes tanto,tende piedade do meu padecer! ”), volta-se moribunda para o supremo tribun

e uma voz do alto anuncia: “Ist gerettet!” (“ Está salva !”). A presa escapa, en-tão, das garras de Mefisto, que, desesperado, volta a reafirmar a Fausto poder. Mas também este se libertará. É sobre a sua cabeça que mais tredamente se desencadeia a tempestade. Já ia levar aos lábios o cálice fatalibertar-se do peso da vida, envenenando-se, quando ressoa o canto salvda ressurreição, no alegre repique prolongado da Páscoa:22 “O dia da ira, aquele dia em que (o Senhor) dissolverá o mundo em cinzas”. – Referência à

Justiça Divina, conforme várias profecias, em versos de um hino religioso atribuído meiro biógrafo de São Francisco, o frade Tomás de Gelano. (N. do T.)

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 205

“Christ ist erstanden! Selig der Liebende, der die betrübende, heilsamübende Prüfung bestanden” (“Cristo ressuscitou! Salve o Amado que foi sub-metido a tão triste e santa provação ”).

Fausto está salvo. Mas é logo cercado e preso nos enredos do mal,

concentra nele todas as suas forças. O pacto é firmado com sangue. Mentra rapidamente em ação com fantasmagóricas criações de vitóriasenfim se desfazem no erro. Qual é, todavia, o ponto fraco, a pilastra quruir todo o edifício? Quanta astúcia para negociar, quanto requinte psicoco para enlaçar sem ser notado, para fingir-se de santo e de homem hon(como o fez junto de Marta). Que artista da mentira e da traição é Mefissua habilidade reside na minúcia, a sua finíssima lógica é a mísera lógiastúcia, que edifica sobre o terreno inseguro da falsidade. A orientaçãseu sistema é errada, porque o egoísmo e a mentira são forças essencialmdesagregantes, desprovidas de capacidade coesiva e construtiva, enquaamor e o sacrifício, tão inermes e débeis na aparência, possuem a potendade dinâmica das grandes obras. Não é o amor, mas sim o prazer quGretchen; não é o trabalho, mas sim a especulação simbolizada na invede Papiergeld e semelhantes convenções financeiras que conduzem à rFausto, entretanto, oscilando de prova em prova e de ilusão em ilusãocende continuamente. A sua longa viagem foi no mundo espiritual. Nomo momento, quando, após rejeitar as propostas corruptas, ele pede um balho honesto e fecundo, Mefisto, sem suspeitar, consente o início da retação de Fausto: o diabo acaba sendo enganado. Pouco a pouco, o deserdesolação, simbolizados na Walpurgisnacht, transformam-se, por obrtrabalho e do amor, em estado de fecundidade e de bem-estar. Fausto entra finalmente a estrada das ascensões humanas e a libertação da dor mal. A estrada não estava nas alegrias fáceis da Averbach Keller, em L

zig, nem na riqueza, no poder ou na glória (vaidade napoleônica), maalém de tudo isto, além de todas as ilusões humanas, onde existe uma de pureza capaz de dessedentar todas as bocas:

“Das ist der Weisheit letzter Schluss: Nur der verdient sich Freiheit wie das Leben, Der täglich sie erobern muss.” (“Isto é a última conclusão da sabedoria:Somente aquele que conquista diariamenteA sua vida merece a liberdade.”)

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 206

Finalmente, o equilíbrio, temporariamente perturbado, restabelece-smal volta à sua prisão, Mefisto precipita-se em seu reino e Fausto ascensua apoteose:

“Gerettet ist das edle Glied

Der Geisterwelt vom Bösen:Wer immer strebend sich bemúht,Den können wir erlösen.” (“O nobre companheiro está salvo

Do mundo dos espíritos do mal: Aquele que sempre se esforça incansavelmente, Podemos libertá- lo para a sua ascensão.” )

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 207

GÊNIO E DOR (1935)

Os êxtases musicais, assim como a visão do místico e a contemplaçã pensador, são portas abertas ao infinito. Então a existência, quando o

cria, revela-se inegável, porque, naquele momento, ela se acha visivelmem ação. Escutamos estupefatos sua voz, que não possui timbre humanogindo do mundo do eterno. Nos arrebatamentos, o pensador sente a verdamístico, a bondade e o amor; o artista, a beleza. O arrebatamento, porsempre o mesmo e constitui a nota fundamental do mesmo fenômenosignifica ausentar-se da Terra e atingir outras esferas. Trata-se de manifções que, por serem super-reais, parecem sonhos irreais, mas que são verdras, pois a alma humana as tem admirado em todos os tempos, prendendelas irresistivelmente.Todas as elevadas revelações do espírito, por enquanto tidas pela cicomo anormais, somente porque são supranormais, e não produto da cinmediocridade, exercem indiscutivelmente fascinação mesmo no ser mais luído. São centelhas descidas diretamente do céu, sem o uso da razão. Aas reconhece e as absorve na sua avidez, pois servem-lhe de alimento.

A alma humana tem de ser analisada não no tipo medíocre, onde penece adormecida em estado embrionário, mas sim no gênio, que prepsua maturidade e a excede, ultrapassando muitas vezes os limites do c bível. Somente neste último, ela se manifesta em toda a sua plenitude,seguindo superar a vida orgânica, separar-se do corpo e enfrentar o aléassim que o gênio, seja ele artista, místico, pensador, musicista, santo, ou condutor, encontra-se, no momento em que age como tal, num estadativa e consciente mediunidade.

Quando Chopin compunha ao piano maiorquino os famosos prelúdio

Cartuxa de Valdemosa, com certeza via fantasmas vagando de cela em talvez os monges do velho convento. George Sand escreve: “Ao regressdez horas da noite, encontro-o pálido, de olhos cerrados e cabelos sobre adiante de seu piano. Era necessário algum momento para reconhecer-se próprio. Fazia esforço para sorrir e tocava coisas sublimes, que havia comdurante nossa ausência... Executava o seu prelúdio chorando. Quando noentrar, soltou um grito estranho e disse depois, com um ar confuso e tom mrioso: – Ah! Eu sabia perfeitamente que vocês estavam mortos!... Não dguindo mais o sonho da realidade, acalmou-se e quase adormeceu ao p

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persuadido de que também ele estava morto”. Na sua alma, o eco da tempestde dos elementos se transformava em tempestade de ideias e de sentim Naquele estado de transe, a sua alma alcançava as raízes da vida e a profdade dos fenômenos, onde se encontra a essência, onde o todo é UNO.

Quando Chopin improvisava, sempre em presença de um restrito púde amigos, mandava reduzir as luzes, recolhia-se e procurava a nota azu quese pode chamar a nota de sintonização entre a sua alma e as dos outros aredor.

Notava-se a paralisação do fenômeno inspirativo diante de um públicorogêneo e de estranhos não sintonizados, dos quais Chopin sempre fugia,meno esse semelhante ao do círculo mediúnico. Daí deveria resultar a mús

A mediunidade física é um estado de passividade diante das forças do que interferem quando e como desejam, dominando o fenômeno. A medade inspirativa é, ao invés, um estado de máxima atividade e consciêncrante tais forças, que ela penetra e domina. São os dois extremos. O méativo, consciente do próprio trabalho, dono das forças que governa ativamousa bater às portas do mistério para interrogá-lo. Elas não se abrem fretemente, a não ser diante de um apelo desesperado ou de uma paixão viocapaz de romper os segredos zelosamente defendidos pela Lei.

É necessário muitas vezes a coragem insensata, a vontade desesperaimpulso frenético de uma dor imensa, o ímpeto da fé que não mede a profdade do abismo. Apenas então as portas se abrem, as fronteiras do concapresentam dilatações repentinas, quase tímidas. Num gesto supremo, sofe vacilando na figura gigantesca, o gênio se levanta sobre as muletas da fixando o olhar no inconcebível, finalmente vê. Ele mesmo ignora a sua deza no átimo da concepção, porque se unificou com o todo. O seu gesto pte assaltou de improviso o coração do mistério, que estremeceu e respon

voz da dor e do amor. Então, um rasgo do infinito lampejou sobre a Terra.Desejaria passar em revista a vida de muitos gênios, para demonstrarneles, este tipo de mediunidade consciente e ativa, a mais alta e a mais vdeira, é normal. A maturidade avançada desses seres, não apenas reveladde a mais tenra idade, mas também explosiva no seu aspecto típico, semquer experiência ou exercício de preparação humana antecedente, mostrasua preexistência em outras formas de vida. Trata-se de períodos de formsem os quais nada se cria, condição que corresponde a uma lei de proporclidade entre o efeito e a causa. O atavismo é absolutamente insuficiente

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demonstrar tais florescências de exceção num campo de mediocridades. isso reforça o conceito e oferece a prova de que a vida não é senão a passda alma de algum plano de onde ela provém para outro plano. Os medínão conseguem encontrar estas provas, tão evidentes por si mesmas, p

eles, sendo verdadeiramente cidadãos da Terra, são suficientemente selve insensíveis para viver nela comodamente.Por que a vida dos gênios é frequentemente argamassada na dor? Por

destino se lhes apresenta como inexorável concatenação de provas convetes muitas vezes sobre o ponto mais vital do seu próprio gênio? Talvez peste é também o ponto de maior força, de provas maiores do que as mé para que a alma possa encontrar uma resistência adequada à sua grandeztestemunho proporcional à sua elevação. Provas específicas para que a alexercite pelo lado de sua maior potência. Certamente, não se alcançacompreensão através dos conceitos comuns de uma vida exterior que visanas o prazer. Mas somente assim podemos explicar a surdez de Beethovtuberculose de Chopin, a cegueira de Milton, um Leopardi disforme e sdor, um Schubert e um Mussorgsky atormentados, um Nietzsche e umloucos. Convido a ciência a explicar-me por que a moléstia, a deficiêncgânica, pode dar tanta força ao espírito, tanta fecundidade ao pensamentota saúde e potência à personalidade. Ou, em outros termos, por que ra patológico pode conter o supranormal. O conceito de uma crueldade do no, portanto blasfêmia contra a Divindade, ou de uma insuficiência diretide uma casualidade caótica é simplesmente pueril num organismo univtão preciso. No entanto, com este conceito muito mais amplo, tudo se exA dor é a estrada mestra de toda a ascensão espiritual, que não pode serquistada sem fadiga. A dor prepara o caminho às profundas introspeções;la o que se encontra além da superfície; desperta o espírito, que poderia,

mente, adormecer no bem-estar; submete-o a contínua ginástica, que lhsenvolve as melhores qualidades. Embora a natureza humana inferior sose revolte, a dor é salutar e fecunda maceração, que purifica e multiplica as forças do espírito. Somente a dor sabe desnudar a alma e arrancar-lhe le grito que não admite mentira. A reação à dor é certamente diferente emindivíduo, revelando-lhe sempre a natureza íntima.

Das três cruzes iguais sobre o Gólgota partiram três gritos diferente bruto, o grito é brutal; no grande, o grito é sublime. Então a dor é santa e çoada, porque revelou a beleza de uma alma.

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Desta maneira, a dor martela os espíritos gigantes com força gigantescra levá-los à ascensão gigantescamente pura. Ressonâncias profundas d produzir nestes hipertróficos do pensamento e do sentimento os golpes simos do destino. Evidentemente, suas obras foram criadas entre os espa

de uma grande dor. Por isso puderam dizer: “eu espero que a minha dor v porque somente ela me poderá arrancar o grito da alma”. Sentimos em tudo isso a força da criação, que tem na dor um açoite: fl

o espírito, impede qualquer repouso, excita-lhe as mais profundas reavaloriza-lhe o poder de ação. Assim se compreende a transumanização dor, e somente ela, possui. Para o gênio, a vida humana não é senão preção para uma vida mais alta; os mesmos clarões que o cegam, tambématingem a nós; a realização de sua vida não está aqui em baixo; para emorte não é o fim, mas libertação.Os gênios podem inverter os nossos conceitos humanos, porque pertea raças super-humanas, que não aparecem na Terra senão como exceção. o- bre Beethoven”, conforme escrevia ele sobre si mesmo, “este mundo n proporciona felicidade e somente nas regiões do ideal podes encontrar a pQue diferença entre o homem abençoado e o de sentimentos saciados.

Nós, homens comuns, possuímos e sentimos mais fortemente no planorior do mundo animal, feito de lutas cruéis e violentas. Carregamos a veatávica do corpo, a tão conhecida lei da natureza; somente secundariamecom esforço alcançamos a mais alta verdade do espírito, que é para os gêverdadeira e espontânea lei da natureza. Debatendo-se nas formas inferioatividade, o tipo médio, seja qual for sua condição humana ou sua riq poderá não apenas criar, mas também, por um momento, saciar-se de tvaidade que a sua inexperiência deseja, no entanto permanecerá sempre le condenado a essa vaidade, pois lhe ficará fechado assim o acesso à alta

ra do pensamento, da qual o gênio, por mais trespassado e crucificado qencontre, irá olhá-lo sempre com piedade. Quanto mais merecemos o céuto mais incapazes e infelizes somos sobre a Terra.

A dor, nos grandes, assume também a forma de renúncia, que é o sumento das formas inferiores. O destino a impõe com inúmeros dissaboresque se acelere a evolução espiritual e se opere a transformação do amor hno em amor divino. O calvário é a base natural do fenômeno da sublimdos grandes. A renúncia dos prazeres humanos nada mais é do que a exp

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dos horizontes espirituais. O destino não é cruel quando inflige a mortedar vida maior e luminosidade à alma.

“Durch Sturm empor” (“arrastado para o alto pelo vendaval”), dizia Beetho-ven no meio do furacão, sempre senhor do seu destino, mesmo no mais pr

do sofrimento. O homem somente é verdadeiramente grande e viril nascontra as forças titânicas do seu carma, nunca porém nas lutas contra ossemelhantes. O destino da grei humana é frequentemente incolor. Há no porém, destinos titânicos, que nos proporcionam o arrepio do infinito. Sãtinos que sobrepairam abismos onde se alternam regiões de terror, de paixde angústias, nos quais ribomba a tempestade de Deus. Destinos que os gtes souberam agarrar pela goela, para travar uma luta digna da sua grandez

Eles podem dizer: “Venha, oh! luta, para que eu possa bater -me e vencer”.

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SÉTIMA PARTE

NOVELAS

EM BUSCA DA JUSTIÇA – TRÍPTICO (1953) I. A JUSTIÇA ECONÔMICA

Era uma noite de chuva e de tempestade. No sono, a cidade imensa resava do seu febril trabalho diurno. A hora avançava; os quarteirões aristocos, mais demorados para adormecer, porque menos sedentos de repousocansavam em silêncio.

Ao longo de uma avenida arborizada, separando duas filas de residêde luxo, um homem esgueirava-se como sombra, revelando na desenvodo andar o hábito de saber esconder intenções suspeitas. Pode-se vê-lo junto ao ponto desejado. Não é a porta principal do jardim, mas outra, ju parede lateral, utilizada para serviço, a qual se encontra aberta. Ele a t põe e entra com desembaraço, como se estivesse regressando à sua casacha-a e atravessa o jardim.

Outra pequena entrada de serviço, no lado posterior da casa, está abeele passa por ela. Conhece a habitação, onde já estivera trabalhando paantigos proprietários, há muitos anos atrás. Com a cumplicidade de umempregados atuais, que viera a conhecer posteriormente, organizara um g

Como se vê, não existe aqui nenhum mistério policial, nenhum delitocabro, nenhuma caçada para apanhar um criminoso. Fugimos desta tão ddida psicologia de criminosos malogrados e, por isso, apresentamos ocomo simples e banalíssima tentativa de furto, arquitetada com as costumastúcias, muito conhecidas através dos cinemas e dos jornais. Ao viciadtor moderno, amante das emoções fortes e intoxicantes dos romances alos, isto parecerá qualquer coisa de insignificante e cansativa pela sua tridade, que não excita a curiosidade malsã com psicopáticas complicaçcerebralismos criminalóides. Provavelmente acharão estúpida uma hique não proporciona o arrepio do delito. Aqui, entretanto, conforme verdesejamos focalizar outros fatores psicológicos, de muito maior valor pertinentes à parte menos evoluída da sociedade humana. Esta, para satisao seu orgulho de parecer civilizada, enverniza os instintos bestiais c

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psicanálise, os complexos freudianos, o subconsciente e vários “elmos”n-tíficos, embora seja diabolicamente faminta de destruição. Está obrigaessa dissimulação até ao fundo, até à alma, pela chamada civilização, seem busca de psicopatias e de todas as perversões. A moral sã de fato n

criação artificial de uma religião, mas está escrita para todos nas leis daUma imprensa traidora, com finalidade de lucro, desfruta e alimenta taisrações, oferecendo aos instintos bestiais uma satisfação psicológica Desta forma, tudo vai sendo loucamente abalado. Prossigamos, contunossa história.

O indivíduo suspeito não somente conhecia a casa, onde penetrara cajuda do criado, mas também os hábitos do seu proprietário, um homem nho, que vivia solitário naquela rica mansão, desfrutando uma renda àfazia jus por direito de herança.Embora em ótimas condições de saúde e de riqueza, que lhe permitgozar a vida, este homem revelava costumes exóticos. Pela manhã, pas pensativo pelo jardim. Fazia as refeições sozinho. Consumia a tarde e aescrevendo. Parecia procurar em seu mundo, imensamente distante, quacoisa inatingível. O seu olhar mergulhava nos outros olhares, buscanalma, e se retraía com tristeza. Existia entre ele e os seus semelhantesespécie de barreira de incompreensão. No seu meio, era julgado como maco, sendo tolerado por ser inofensivo.

O ladrão, ali presente, considerava as coisas sob um ponto de vista inmente utilitário. Aquela casa e aquele homem se prestavam a um furto – meiorápido para ganhar sem trabalhar. Verdadeiro tipo involuído, agradava-risco, a aventura audaz, o golpe do aventureiro, e não o trabalho ordenadhomem acostumado a integrar-se no organismo social. Era um retardamais adaptado a viver com os selvagens, em guerra, entre as feras. Nada

fazer senão roubar. Ninguém o educara ou lhe ensinara a realizar algo meA civilização não lhe dera a bondade evangélica doama ao teu próximo , prin-cípio para ele situado no inconcebível, no entanto proporcionara-lhe ao malguma coisa, permitindo-lhe polir seus instintos, que ele refinou, assim as feras apuram os sentidos para melhor atacar e vencer na luta pela vidum artista do crime. Amava saquear sem causar danos físicos à vítima, ddo a alcançar a máxima utilidade com o menor aborrecimento e perigo pveis. Esta era a única modalidade de civilização que a sua natureza atrsoubera captar. Na guerra que as nações civis fazem entre si, ele se encon

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bem à vontade e seria talvez glorificado como herói. Mas não havia g para que ele pudesse explorá-la. Numa revolução, seria alguém e faricarreira. Contudo não havia revolução. Dadas as circunstâncias muito pcas que o ambiente lhe oferecia, fazia aquilo que podia.

Estes dois homens encontravam-se agora debaixo do mesmo teto, es prestes a se encontrarem com suas respectivas psicologias, julgamentos todos de vida. O ladrão subia as escadas cautelosamente. Conhecia todrecantos. Sabia que, no patamar superior, o patrão dormia no quarto à dirque, à esquerda, estava o quarto onde encontraria o dinheiro. O criado deas portas abertas, saindo para o seu dia de folga. Sabia também, por ter vcado da rua, que a luz do dormitório onde o dono frequentemente ficavadado até ao amanhecer, estava acesa. Sabia, ainda, que aquele homem ereno, razão pela qual este não o intimidava. Agia com segurança absolutaUma vez no patamar superior, entrou no quarto visado, sendo os seussos abafados pelos tapetes macios. Silêncio. Viu-se num escritório e nheceu a escrivaninha iluminada pela débil luz da rua, suficiente para trabalho. Aproximou-se e observou. Possuía as chaves das gavetas. Amissora devia ser a terceira ou a quarta à esquerda. Experimentou uma pois a outra, revolvendo o conteúdo. Não encontrava nada. Continuou tando ainda. Começou a sentir-se nervoso, porque ambicionava fugir seobservado. Mas não encontrava nada. Tentou aquelas do lado direito, abe revistando a segunda gaveta. Num gesto precipitado, derrubou algumsa, que caiu no tapete com um baque surdo. O ladrão imobilizou-se, assdo. Estaria o patrão realmente dormindo? Teria ele ouvido?

No aposento à direita, outro homem estava em outras lidas. Apagara pouco as luzes e procurava em vão adormecer, enquanto, num estadmeio sono, o seu espírito continuava a desenvolver a ordem dos conc

sobre os quais escrevera até àquela hora da noite. Preso aos seus pensatos, não prestou atenção ao ruído que viera do quarto vizinho. Tinha em te outras preocupações. De improviso, surgira a solução lógica de um blema – contraste de conceitos aparentemente sem saída – que o angustiavahavia dias. Então agora, repentinamente, da profundeza de si mesmo, quia abandonando-se ao sono e já não a buscava mais, aparecia a solução prevista, como se outro houvesse respondido. Sentia-se pasmo e ao mtempo entusiasmado pela beleza e logicidade da solução. Acabou despedo, acendeu a luz e levantou-se para ir logo registrar no seu escritório a

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cepção maravilhosa, antes que ela se dissipasse, materializando-a agorestava bem clara em sua mente, nas suas particularidades. Sabia que, se fixasse logo, ela se desvaneceria, reaparecendo depois deformada e estrEntrou no aposento contíguo e acendeu a luz. O ladrão ficou em pé, ge

em plena luz. Os dois homens se defrontaram.Olharam-se, mas com quão diferente olhar! Cada um projetou no ousua alma. O ladrão, aterrorizado pelo perigo iminente e o golpe fracas pensava agredir ou ser agredido. Esta era e lei do seu plano e do seu espírdono, perplexo pela presença de um estranho e aborrecido com fato impto, pensava no tesouro dos seus conceitos já em fuga, agora perdidos cincidente. Habituado ao autodomínio, rapidamente se refez para enfrennova situação. Olhou para o ladrão com piedade, enquanto este, que espuma atitude agressiva, ficou desarmado por aquele olhar e não agrediu.Os dois homens permaneceram frente a frente, olhando-se. Dois homduas classes sociais, dois extremos opostos, econômica e espiritualmentemundos. Aquele cruzamento de olhares já havia estabelecido uma ponteos dois. O proprietário foi o primeiro a dirigir a palavra:

“Amigo, não te atemorizes, compreendi tudo. Afirmo, não temas. Shóspede em meu lar, porque és meu semelhante e meu irmão. Não tenho desejo senão o de te fazer o bem. Não penses, portanto, em lutas e agresPoderás sair quando desejares, livre, protegido por mim”.

“Outra coisa, porém, me impele para te ajudar. Tu te arriscaste muitra vir buscar este dinheiro. É um trabalho errado, mas é também um tlho. Quanto a mim, não arrisquei nada, não lutei para ganhar dinheiro,que o herdei. Perante Deus estamos, talvez, nas mesmas condições, seque eu esteja protegido pelas leis e tu não. Dá-me a tua mão e dize-mque te posso auxiliar”.

Então estendeu a mão ao visitante, que a apertou automaticamente, prando compreender enquanto escutava. O dono da casa continuou: “Diz-meno que posso auxiliar-te, porque me escravizo a deveres que não posDiante de Deus, estamos exatamente nas mesmas condições. Em relaçãotenho uma agravante, pois não me encontro em necessidade. Talvez sejisso que nunca fui tentado a roubar, enquanto que a ti muitas coisas te ram, a ponto de te arriscares desta maneira. Todos nós temos não só o to, mas também o dever de viver. Sou eu, portanto, que estou em débitotigo e desejo saldá-lo agora”.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 216

O ladrão começava a compreender e não conseguia se refazer da surp No seu primitivismo, encerrado na estreita psicologia do egoísmo, suspa princípio que tais incríveis palavras poderiam esconder uma trama e adava o aparecimento de uma arma ou de um movimento de assalto. Mas

disso surgia. Como não se sentia ameaçado, foi esporeado pela curiosid pela esperança de poder receber dinheiro daquele louco, não obstante triste posição; continuou escutando, divertindo-se com a cena, mas seatento ao seu desenvolvimento.

Sentaram-se. O dono da casa prosseguiu: “Amigo! Suponho que sejaso-munista ou pelo menos simpatizante. Não imaginas que eu também omas, como vês, de maneira diferente da tua, numa forma que não enteQuero dizer-te que a justiça social é a grande ideia para a qual o mundo nha. Quem usa a espada morrerá pela espada, e quem usa a violênciadestruído. Os nossos dois comunismos são antípodas. O teu parte dos diro meu, dos deveres, dos quais não cogitas. Usas a violência e, por isto, aqui; eu uso a bondade. É verdade que nem todos os homens da minha csocial são como eu. Sabes disso, e isto te autoriza a violência. Verdade tens também deveres, mas não pensas senão nos direitos. Como é posuma sociedade que só alegue os seus direitos? Não seria um organismo,um bando de lobos que se entredevorariam. Por que não pensaste no devtrabalhar, de dar qualquer coisa à sociedade da qual exiges o necessárioque, antes de roubar ou exigir com a violência, não pensaste em ganhar ctrabalho? Eu mesmo trabalho, no campo do pensamento, mas trabalho. Anha vida dá fruto à sociedade. Tu és um parasita. Por que não aprenderespeitar o fruto do trabalho e da inteligência dos outros? Quem possuisempre é parasita, podendo às vezes ser um centro de atividade fecundamuitos. É tão bestial este ódio de classe, indiscriminado e agressivo, que

ca conquistar a riqueza pelas vias da violência, e não com o trabalho e aligência! Não sabendo respeitar o fruto das atividades alheias, como poesperar que, em idênticas condições, seja respeitado o fruto do teu trabalh

O larápio, sem se interessar em absoluto por tudo que estava ouvaguardava a conclusão do discurso. O dono da casa compreendeu que ido muito longe nas suas explicações teóricas e regressou aos limites psgicos do seu interlocutor, concentrando-se no problema próximo e pessdisse-lhe: “Concluindo, amigo, a ti não interessa se eu trabalho e se nmomento me libertarei das riquezas para mim supérfluas, ou se as conser

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 217

para que frutifiquem, sobretudo para o bem dos outros. Este é um asmeu. Interessa-te somente resolver o problema da tua vida. Quem possuimeios, mais inteligência e cultura, tem mais deveres. Sou eu, portanto, deve ir ao teu encontro. Desejavas apoderar-te do dinheiro que era gua

nesta gaveta. Não o encontraste porque estava sobre a escrivaninha, ondedeixara, depois de ter dado uma parte a outrem. Essa quantia já se destaos pobres. Portanto este dinheiro é teu. Estava diante dos teus olhos e pravas em outro lugar. Ei-lo, e que te ajude a viver. Emprega-o bem, par possas subir. Podes ir, és livre. Ninguém saberá que estiveste aqui”.

Enquanto assim falava, colocou o pacote de dinheiro em suas mãomesmo que o ladrão queria roubar. Desta maneira, o furto que poderia pum homem, transformou-se num auxilio capaz de redimi-lo. Foi assim padre Myriel salvou o forçado Jean Valjean emOs Miseráveis , de Vitor Hugo.O ladrão apanhou o dinheiro, obtido por uma via tão estranha e imprevistqualquer modo, tinha alcançado o seu objetivo. E isto era para ele a coisacipal. Se o outro era louco, não lhe importava: o dinheiro estava em seu b

O dono da casa o examinou por um instante, pôs uma das mãos sobre ombro e assim concluiu suavemente: “Agora vai, amigo. Quem sabe qumás lições recebestes? Utiliza esta advertência; que ela te acompanheauxilie a redimir-te. Vai, mas lembra-te de que estou aqui para continuauxiliar-te e assim completar a obra. Não esqueças o teu novo amigo. Anha casa está aberta. Volta quando desejares. Este dinheiro não durará pre. Entretanto procura lembrar tudo que te falei, mudando de vida. Se dres fazê-lo, volta e te ensinarei como viver honestamente do seu trabSomente quem não pode trabalhar tem direito à esmola. O teu direito dmem sadio está somente no trabalho. Vai, amigo. Estarei sempre às tuadens quando desejares vir espontaneamente”.

O ladrão compreendeu que desta vez passara sem castigo e que, tendo bolsado o dinheiro, nada mais tinha a fazer naquela casa. Balbuciou coqualquer coisa e, vendo o caminho livre, ganhou rápido as escadas. E pelas mesmas portas abertas, alcançou a rua num átimo e, a passos rápdeslizou por ali como uma sombra na noite.

Passaram-se meses e anos. Aquele senhor esperou. Mas o ladrão javoltou.

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II. VERDADEIRO AMOR

Era uma tépida e encantadora noite de luar. Nos jardins de um parqugrande cidade, se bem que em hora avançada, ainda se demoravam m

pessoas. Pares de namorados vagavam pelas alamedas. A hora, a estaçlocal, tudo parecia convidar ao amor. As estrelas olhavam do céu a sorrir.Um homem atravessava o parque pensativo e absorto. Talvez fosse o

mo que conhecêramos na história precedente. Ele havia resolvido dianDeus o seu problema econômico, colocando a sua riqueza a proveito doximo e dando à sociedade o seu justo tributo de trabalho, mas preparaagora para enfrentar outros graves problemas.

Enquanto andava por um caminho solitário, ele viu uma mulher sasombra, onde se escondera da luz do luar e dos lampiões do parque. Ovou-a vindo ao seu encontro, com acenos suspeitos. Ele a olhou. Tratade uma jovem, com um ar embaraçado, como de menina inexperientenão sabendo ainda oferecer-se a todos, não consegue fazê-lo senão comdor. Ele continuou a observá-la. Parecia que ela tinha medo e fome ao mtempo, e que a fome a induzia a vencer o medo. Ele, habituado a olhar nma, então compreendeu e sentiu que o seu coração era invadido por um ito sentimento de piedade.

Assim andaram juntos, sem falar. Ela, vendo-se aceita, seguia tímida, oente, em expectativa, enquanto ele pensava: “Há realmente injustiças soalém das injustiças econômicas. Não existem somente as vítimas das pobQuantas outras misérias que somente o amor ao próximo pode fazer desacer! Eis aqui uma vítima da prostituição, talvez já sacrificada no altar doísmo humano. Sou um homem que decidiu seguir as leis de Cristo. Darei oóbolo pessoal para atenuar a injustiça da miséria moral que é a prostituiç

mulher. Assim como, diante do pobre, é o mais rico que tem mais devediante do inepto, é o mais inteligente que tem mais encargos, também adiante da mulher, que é a parte mais fraca, quem tem mais obrigações é mem. A mulher deve ser sagrada, cabendo a culpa da prostituição ao egodo homem que se aproveita da fraqueza dela”.

Diante daquela infeliz, sentiu vergonha de seu sexo forte, que, assim csuga um fruto, para depois jogar fora a casca, usa a força para desfrutardébil que se lhe entrega. Naquela casca permanece uma alma desprezadespedaçada, que o homem, embora tenha o dever de elevar ao alto, at

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 219

do amor, acaba, ao invés, prostituiundo-a com o seu egoísmo. Rugiu no ção daquele indivíduo um sentimento de revolta contra um mundo tãdespertando nele outra virilidade, bem diferente daquela que apenas fecufêmea e depois a abandona. Olhou para o céu e dilatou o peito, sentin

homem forte e potente no espírito, como é de fato o macho integral, qaproxima da mulher para protegê-la, e não para desfrutá-la como instrumde prazer, que se une a ela para elevá-la e enobrecê-la, e não para afligiverdadeiro macho fecunda, sobretudo, o espírito. Então ele se decidiu. Dfazer o bem. Devia salvar aquela mulher.

Dirigiu-lhe a palavra. Palavras simples, para iniciar um conhecim“Menina, a primeira coisa de que tens necessidade é de restaurar -te. Vamoscear”. A mulher aceitou, porque isto fazia parte do ritual, e assim mataria afome. Entraram num salão resplandecente. Ela escolheu um canto mais ado, envergonhada de si e do seu vestido simples, sua única riqueza. Nãnhecia aquele mundo, que lhe pareceu maravilhoso. Admirava os espelhmesas bem arrumadas, as vestiduras finas das senhoras. Sentiu-se invadiduma onda de bem-estar e fechou os olhos como se sonhasse grande sonfelicidade. Desejava saboreá-lo, prolongá-lo, prendendo-se nele. Tudocontrastava com a triste realidade cotidiana do seu casebre, situado nos arres da cidade, onde não ouvia senão as vozes ásperas de seus familiares.música leve a embalava no sonho. Viver, gozar! Pobre criatura! Parecique ali todos eram felizes, porque ignorava a realidade; ainda não conhesutis venenos da vida, escondidos sob os esplendores mundanos.

Como pareciam satisfeitas aquelas senhoras! Possuíam vestidos, joias,respeitadas, servidas. Dentro em pouco, ela voltaria à rua. Não tinha dirnada, nem mesmo ao amor. Devia vendê-lo para comer. Aquelas dispunhatudo, também do amor. Damas ricas, talvez piores do que ela perante Deu

podem andar com a cabeça empinada, porque possuem recursos e armam posições formais legítimas, pelas quais são defendidas diante da socieestando juridicamente colocadas sob as instituições da propriedade e do mmônio, que lhes dão direito ao luxo e à liberdade no amor, condição dasabem tirar proveito, amparadas por defesas oportunas.

Então ela despertou do sonho. Intuía vagamente, sem poder precisar aação. De tudo aquilo que enchia seu olhos, nada era para ela, pobre vermdefeso no meio da estrada onde todos pisam. Fumegava à sua frente um suculento, de apetitoso aroma, que lhe avivou a fome. Começou a refe

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 220

Comia lentamente, procurando multiplicar o sabor com todos os acessórialcance de suas mãos, legumes, condimentos, para que a ceia se desdobSaciava o estômago habituado ao jejum. O amanhã era incerto. Seu conheiro não a perturbava, evitando conversar; parecia imerso não nas sens

elementares da jovem, mas num sonho diverso. Também ele observava amundo elegante, não com inveja, mas sim com piedade. Sabia quão tristlidade se ocultava atrás daqueles esplendores. Verificava que reina na Telei do mais forte e que não existe piedade para os fracos. Entre aquelas drespeitáveis e a jovem que ele havia recolhido na rua existia uma únicarença: as damas pertenciam à classe dos vencedores; a jovem, à dos vencSomente por este motivo ela não era respeitada; vendia-se porque tinha As outras eram respeitáveis; não se vendiam porque não tinham fome. Ptiam-se o luxo até de pregar a virtude. Como é fácil proclamá-la, exigiaos outros! Mas como é dura a virtude exigida de nós mesmos! Pregafáceis pululam pelo mundo. Em nome da virtude, podem satisfazer aosinstintos de agressividade contra o próximo, da condenação do qual faz pedestal para o próprio orgulho. Desta forma se conduz sobre o terreno dral a luta cotidiana pela vida, cada um procurando colocar-se em posiçsuperioridade, como juiz diante do pecador, para esmagar o rival. Uma m poderá esperar bem pouco de outra mulher.

É do homem vil que se espera o dever da redenção. Para ele, o amor incidente. Para a mulher, significa a vida. É ele que educa a mulher, atando-a a si mesmo. É a mulher que, por sua natureza, obedece e adapao homem. As leis, antes de perseguir a prostituta, que é o efeito, devatingir o homem, que é a causa. É a procura que cria a oferta. Todavinhum legislador jamais fará uma lei contra a vileza do seu sexo. Pelo faestar junto do homem, se este é um delinquente, a mulher tentará descer

sua delinquência; se é um santo, ela procurará subir até à sua santidadmulher é sempre a companheira menor do homem, fazendo tudo por eleque se sinta satisfeito. Ela é capaz do sacrifício de uma vida de desprezoabjeção. O grande egoísta esquece os seus deveres; o mais forte, que deajudar o mais fraco, procura apenas roubá-lo. Desta forma, o homem e para si a mulher, feita de astúcia e traição, armas necessárias para a sua sa. O verdadeiro amor, do verdadeiro macho, não explora a mulher pseu gozo, mas protege-a, educa-a, fazendo-a sua colaboradora no mais v potente trabalho da vida, que é ascender no bem para Deus.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 221

Assim pensava o nosso protagonista, enquanto lambiscava, tomadimensa piedade pela triste companheira. Deixou que ela se satisfizesse àtade, que aproveitasse a hora de ilusão. Diminuía o número de pessoas ntaurante, parecendo agora tudo mais calmo. A jovem, atenta ao ambiente

cercava, não aparentava surpresa diante de um interlocutor tão taciturno. Paté evitar este desperdício de tempo na conversação. Comia tranquilamenquanto vagamente intuía qualquer coisa que lhe dava um sentimento de ança. Em poucos instantes, sentiu esvair-se a sensação de desconfiança quhavia dado, a princípio, aquele vulto desconhecido. Sentiu-se protegida e fsurpreendida. Ele tomara uma decisão. Seus olhares encontraram-se.

Todavia, ele continua ainda calado. Diante dos seus olhos surgiu uma vVia a louca Herodíade que, odiando João, o Batista, por condená-la pelaralidade, instigava a filha Salomé a pedir a Herodes a morte daquele que tira à sua beleza. Viu-a recebendo da dançarina Salomé a bandeja com a ça de João. E quem diria que Herodíade havia de morrer pouco depois, vde um cancro na boca blasfema. Nessa época, o encontro do homem cmulher era brutal. O drama precipita-se num epílogo de destruição para aas partes. A adúltera era apedrejada. A Lei era então uma espada que simmente cortava e matava. Tempos violentos e ferozes, nos quais os princda Lei se proporcionavam à dureza dos homens.

A visão continuava. Cristo fala aos perseguidores da adúltera: “Aqueldentre vós esteja isento de pecado, atire a primeira pedra”. E depois, von-do-se para a mulher: “Ninguém te condenou? Pois bem,nem eu te condenoVai e não peques mais”.

Surge então uma nova cena: mulher famosa e pecadora, prostrando-s pés do Cristo, banha-os com as suas lágrimas, enxuga-os com os seus ca beija-os e unge-os com perfumes. Cristo lhe diz que as suas faltas eram p

adas porque muito amou. E acrescentou: “Aquele que menos perdoa, mama. Vai, perdoados são os teus pecados”. Neste encontro do homem com a mulher, aparece uma luz nova, uma

ritualidade antes ignorada, uma amplidão de vista e uma liberdade que não se podiam conceber. A reação à culpa é o perdão. Por uma lei mais eda – o amor, acima da justiça mecânica – pode-se fazer de uma pecadora umsanta: Maria Madalena. Não mais a punição, que lembra a vingança e prealma, e sim a bondade, que desponta como função salvadora e criadora

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 222

conduzi-la a Deus. Diante deste novo apelo lançado pelo Cristo em di positiva, a velha atitude do Batista parece qualquer coisa de estéril e nega

O nosso homem acorda de seu sonho. Durante o devaneio, firmara a dede não odiar o pecado, porque assim acabaria por odiar o pecador. Jamais

da virtude um direito para condenar ou um instrumento para perseguir. T bretudo piedade do pecado, para se apiedar do pecador. Com a força da bde, o exemplo da virtude e o próprio sacrifício, salvar aquele que pecou.

O nosso homem volta-se para a jovem e fala-lhe: “Não é possível amar seamor, como um animal. Continuarás o teu romance numa bela residênciaeu te deixarei, porque a tua casa deve ser muito longe, se é que tens Dormirás sozinha, com outro amor que eu te ensinarei e que te fará mais Amanhã me verás novamente; ensinar-te-ei outra vida, sem humilhaçãode alegrias verdadeiras”. Deixou-lhe o seu endereço. Então saíram, e eleconduziu para a casa de uma senhora amiga, que a hospedou.

No dia seguinte, acompanhada daquela senhora, a jovem voltou a prolo. Ele conseguiu achar um trabalho honesto para ela na residência de umfamília, a cuja amizade ela soube corresponder. Nesse novo lar, ele conta lhe falar sobre o verdadeiro amor, o amor fiel, o amor que existe somenalma, o único que resiste à desventura, à morte. Ela compreendeu tudo, cvida e grata. Mais tarde se casou, teve a sua família, o seu marido e osfilhos. Então nosso homem desapareceu, porque a sua obra estava termina

Não mais a viu. Perdeu-a de vista. Todos os anos, porém, pelo Natal, oteiro lhe trazia uma carta na qual liam-se estas poucas palavras: “Não o esque-cerei jamais. O senhor me ensinou o verdadeiro amor e salvou-me. Soucom a minha família e esta é a sua obra. Não o esquecerei jamais”.

Assim, em cada Natal, ele lia esta pequena carta, chorando de alegria. vez o ser a quem ele havia feito o bem compreendera e, por meio de uma

voltava todos os anos.

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 223

III. O ENCONTRO CONSIGO MESMO

O protagonista das duas histórias precedentes, ao pôr-se em contatoaqueles dois indivíduos tão diferentes, havia defrontado os problemas f

mentais do ser humano: o da fome e o do amor. Um dia encontrou-se comtro ser e com outros problemas. Encontrou-se consigo mesmo. Nada de ecional. É coisa que acontece a todos os homens inteligentes, assim quegem certo grau de maturidade. Não é, portanto, um caso extraordinário, eser interessante falar a seu respeito.

Este seu outro eu havia observado, calmamente, das profundezas do sser, seu pensamento e ação nos dois casos precedentes, julgando tudofalar. E agora, em hora de paz e de silêncio,tomava a palavra: “Amigo, soumais profundo de ti mesmo; surjo na tua consciência, vindo daquela in profundidade onde, distanciado imensamente da tua consciência normhomem, Deus está. Apresento-me porque, da superfície de tal consciêapta à vida cotidiana de relação, desejaste sondar o mundo das causas pondo-te perguntas, desejaste olhar de frente e pesquisar com coragem voroso abismo que está na profundeza de todos, do qual muitos desviolhar, espavoridos. Foi assim que me despertaste e sempre mais me desprás. Isto te custou muito trabalho, trabalho considerado inútil pelo muabsorto em utilitarismos imediatos. Realizaste grande feito, contudo, in preendido e condenado pelos homens, julgastes estar sozinho. Mas não estás asós. Das profundezas fala a voz de Deus, tanto mais clara e mais forte qmais souberes despertar conscientemente nesta profundidade. Escuta-atua grande amiga que te auxilia a maturação. Tem pena dos teus semelhque te desprezam, porque eles vivem de ilusões”.

O homem escutava, confortado. Conforto agradável em hora de esgota

to. Estava cansado. A sua natureza humana normal, porém, sofria e revose. Por que não gozar a vida? Por que lutar tanto e sofrer? Ninguém o pr por este motivo; era considerado um néscio. Por que andar assim contra rente geral? Por que renúncias? Quem lhe pagaria por tudo isto? Não eracura desperdiçar as suas economias? Não são loucuras a santidade, os ios heroísmos? Não é tudo isso, para a vida, um salto perigoso que o hom bom-senso deve evitar? De fato, o homem normal admira estas coisassomente como fábula e lenda, sem jamais suspeitar que todos podem e drealmente realizá-las. Por que continuava ele, ao contrário, fascinado e d

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va vivê-las? Não podia ter sido isto simplesmente a sugestão de exemploeram postos em destaque e utilizados por grupos, como bandeira? Onde jo homem faz alguma coisa sem esperar retribuição e exalta o seu semelsem um interesse próprio? Cansado e triste, depois dos maiores impul

sacrifícios, era às vezes atormentado pela dúvida.Sacrificar-se pelos outros é duro; todos abusam e desfrutam da bondcorrendo para onde existe o que tomar e somente para tomar. Por fazer otornou-se pobre e, como tal, foi desprezado. Precisava ganhar a vida nacotidiana, pois se colocara entre os necessitados. O mundo lhe mostravatamente a sua desaprovação, abandonando-o sozinho. Não era amadomundo, que via na sua simples presença, conduta e silêncio uma exprobe uma condenação. Se todos, desde que o mundo é mundo, tivessem como ele, que revolução não se teria realizado! Por que continuar sacrifdo-se pelo bem desta gente que não o sabia interpretar? Sabia que, em semelhantes, o reconhecimento não vem senão depois da morte, quanhomem superior não pode mais falar nem agir; somente então ele passa vir aos objetivos de grupos, transformado em bandeira, atrás da qual é fácil a defesa na luta pela vida. Se, na Terra, não conseguia nada, conquiele verdadeiramente valores absolutos? Onde estavam eles então? Sim! Oeu profundo falava bem. A sua voz vinha de longe, como se fora um senquanto a voz hostil do mundo e a dura realidade estavam bem próximeram claramente visíveis.

Tal é o contraste entre a natureza humana e a divina, contraste que nem cada homem quando esta última floresce nele e se faz progressivammais forte, até o dia em que o domine e tome a direção suprema. Vejem nosso protagonista como as duas naturezas falaram, cada uma povez. Ele havia saído de casa entristecido com uma prova de ingratidão

compreensão. Sozinho, subira até ao alto de uma colina de onde se enxva a cidade, e deste sítio contemplava o horizonte, a paisagem, aquelas cheias de vozes mil. E perguntava-se: “Por quê? Por que toda aquela gencorre, que miragens segue, o que realiza e conclui? Cada um possui umnalidade particular, mas para onde vão todos? Cada um possui o seu obj próximo, imediato, mas conhecerá porventura os grandes objetivos distda vida? Cada gota ignora a grande corrente na qual vão ter todas as gTodos fazem tantas coisas, acreditando alcançar outras depois. Mas qunifica tudo isto, qual o fim de tudo isto?”.

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A sua natureza humana voltava a falar nele. Valia a pena sacrificar-seste mundo indigno? Não seria o seu sacrifício inútil como uma gota deno oceano? Como podia a sua revolta abalar o mundo? Não era inútil esforço? Não era tudo isto uma ilusão? Ou, ao contrário, estaria o mund

dido ao seguir atrás de uma quimera somente para atrair mais dores? Ao de condená-lo, não poderiam os outros imitá-lo no dever de salvar a humdade? Não era o seu sacrifício um dever? Não havia outro mundo de juonde ele receberia o prêmio independentemente dos juízos humanos? Quamigos tinha ele, porém, que sabiam aproveitar e gozar este mundo! No eto ele nunca soubera se aproveitar de nada! Gozar, gozar, eis a grande gem. E ele a destruiu com as suas próprias mãos. Nascera rico e renuncia bens de herança, porque achava que o seu dever era viver apenas do prtrabalho, com o qual pagaria o seu tributo à sociedade. Por este motiv julgado imbecil. Utilizara a força econômica que a riqueza lhe proporcionão para a sua satisfação própria, mas para o bem dos outros. Foi considum imbecil. Jamais se aproveitara da fraqueza da mulher. Recusara o dinganho num jogo entre amigos, porque não era fruto de trabalho, jogo est posto pelos próprios companheiros, que o classificaram como imbecil. Jse utilizara da sua inteligência para aparecer em destaque no mundo, d posição social para dominar, da sua juventude para gozar, mas se desprede tudo isto pelo seu sonho de louco – fazer o bem ao próximo. Isolara-s porque se colocara fora do normal. Para que lhe servia tudo isto? Insensua acreditar que pudesse convencer os homens. Estes se riam dele e vvam-lhe as costas. Quando, com a sua simples e muda presença, mostrav provação com o seu exemplo, o mundo o condenava, respondendo-lherude exprobração. Qual dos dois tinha razão: o seu altruísmo ou o egoísmoutros, os homens cheios de direitos ou ele, todo cheio de deveres?

O nosso protagonista sentou-se. Estava cansado. Apoiou a fronte sobmãos e chorou. A luta o consumia. Entretanto, ele a amava; sentia brilhacentelhas de luz. Tão logo a calma retornou, o seu eu profundo falou-lnovo: “Amigo, atua fadiga é a mais proveitosa na vida, a única que profrutos eternos. Nesta maceração que te atormenta, tu te maturas e evolvedo, menos isto, acaba sendo destruído pelo tempo e pela morte. Não te arepousa. Fizeste o esforço tremendo para sair da baixa corrente do munfim de atirar-te numa outra, entre os braços de uma lei mais elevada. E prendeu entre as suas espirais, arrebatando-te. Abandona-te nela e de

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levar. Deus deixa ao homem a semeadura, no entanto cabe a Ele, comoSua, fazer crescer a semente. O bem que fizestes, tanto rodará nos circuitoforças cósmicas, que voltará a ti. O mal que o mundo faz, tanto rodarávoltará a ele, porquanto quem faz o bem ou o mal o faz a si próprio. A

reage conforme nós agimos, e o mal por nós feito retorna sobre nós meCoragem! Escolheste a vida mais dura, porém a mais elevada, a mais verdra. Deixa gritar o mundo dos inconscientes, que apenas creem nas vantimediatas, esperando a vitória, quando na realidade estão sendo derrotDeixa que os mortos sepultem os seus mortos. Os utopistas de fato, que vde ilusões, são os homens que creem somente nos poderes humanos e queza, coisas pelas quais são atraiçoados continuamente. Prossegue, pestás no caminho certo. Não voltes atrás. Não pares. O teu sonho jamatraiçoará. O teu sacrifício não proporciona o rendimento imediato e trario que dão as coisas do mundo. Os teus lucros, profundamente amadureno tempo, serão sólidos e estáveis. Esta é a verdade para ti e para quantcolheram a tua mesma estrada.

“Entre todas as batalhas, tu escolheste a maior da vida, aquela que emais audácia: a escalada para o céu. Escolheste a via íngreme e direta. tural que seja a mais cansativa. Tu te abrasas na jornada porque vives alução em síntese. Os outros a vivem diluída em longas experiências, çando e retrocedendo a cada passo, vítimas da ilusão em que desejam actar. Deixa-os na sua lenta experimentação de análise no labirinto das palaridades. Arrastas a tua rede e recolhes o pescado, enquanto os outros estão começando a tecer a deles. Um dia, após árduas refregas, que atenas duras angulosidades do seu egoísmo, eles também chegarão aí, lentate, descobrindo o roteiro. Tu és um arauto com a função biológica nãconservar o passado, mas sim de explorar o futuro, de vivê-lo como o

precursores, para fixar na Terra a nova lei do Evangelho, que, na práainda é desconhecida no mundo.“Vai. Cada um não podeviver senão segundo a sua natureza. No teu lon

passado, tu te construíste assim. Fizeste o teu destino com as tuas mãos era não podes desertar. É fatal que sofras ajudando o próximo, porque, sdo a Lei, quem mais possui mais deve dar. Tu mesmo não podes parar. Asede de subir te queima. É fatal esta tua posição. É fatal que os outros voltem e te condenem, que se sintam abalados com o teu exemplo, parassimilem algo e elevem-se um pouco. A condenação que te dão é o

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 227

que tu, mais avançado, tens o dever de pagar para a evolução deles. Esttua prova. O trabalho é, contudo, útil para os outros e para ti. Não se semear sem sacrifício, mas cada semente germinará numa nova. Que tencerteza disso. Cada criatura que beneficiaste, mesmo que não volte mai

ou ainda que te cubra de ingratidão, retornará um dia, porque cada pensato ou cada ato, após percorrer o circuito das forças cósmicas, retorna causa. Cada exemplo teu foi visto por muitos e permanece escrito no livvida; se foi condenado e afogado na incompreensão, não importa, ele rsenta um impulso indestrutível, que retornará a ti na mesma forma decom que o geraste. Exulta na dor; ajudando os outros a redimirem-se, redimindo a ti mesmo, criando o teu paraíso”.

O nosso homem agitou-se então, como se acordasse de um sonho, e erse. O lampejo vivo das profundezas da alma o havia iluminado. Nova lulhava nos seus olhos. Que potência era esta que existia na profundidadespírito, para emergir deste modo e transformar um homem? As suas dúdesvaneceram-se como névoas; reencontrara a sua própria consciência. Nsentiu mais sozinho, nem cansado, nem pobre, nem triste. Deus estava dele na pessoa do próximo, que ele queria auxiliar. Não sabia, contudo, car por que tanta alegria tinha, de improviso, invadido a sua alma, tantatanta força, tanta certeza. É árduo, a princípio, aplicar a máxima:“ Ama ao teu

próximo como a ti mesmo ”, mas, depois, o amor retorna de todos os ladrealizando o paraíso. Assim, o amor que ele, incompreendido e condehavia dado a todos, voltava-lhe agora como felicidade, porque esta é a Deus. Sentiu-se então unido ao todo, como operário na obra divina.

Levantou a cabeça e sacudiu-a. Reafirmou-se na sua decisão. Jamais daria. A potência do espírito vencera para sempre.

FIM

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 228

O HOMEM

Pietro Ubaldi, filho de Sante Ubaldi e Lavínia Alleori Ubaldi, nasceu ede agosto de 1886, às 20:30 horas (local). Ele escolheu os pais e a cidadeiria nascer, Foligno, Província de Perúgia (capital da Úmbria). Folignosituada a 18 km de Assis, cidade natal de São Francisco de Assis. Até hocidades franciscanas guardam o mesmo misticismo legado à Terra pelo g poverelo de Assis, que viveu para Cristo, renunciando os bens materiai

prazeres deste mundo.Pietro Ubaldi sentiu desde a sua infância uma poderosa inclinação pelociscanismo e pela Boa Nova de Cristo. Não foi compreendido, nem poderlo, porque seus pais viviam felizes com a riqueza e com o conforto propordo por ela. A Sra. Lavínia era descendente da nobreza italiana, única herdetítulo e de uma enorme fortuna, inclusive do Palácio Alleori Ubaldi. Assimtro Alleori Ubaldi foi educado com os rigores de uma vida palaciana.

Não pode ser fácil a um legítimo franciscano viver num palácio. Namente, ele sentiu-se deslocado naquele ambiente, expatriado de seu mespiritual. A disciplina no palácio, ele aceitou-a facilmente. Todos devseguir a orientação dos pais e obedecer-lhes em tudo, até na religião. Tide ser católicos praticantes dos atos religiosos, realizados na capela da Imlada Conceição, no interior do palácio. Pietro Ubaldi foi sempre obedient pais, aos professores, à família e, em sua vida missionária, a Cristo. Nemas obrigações palacianas lhe agradavam, mas ele as cumpriu até à sua to

bertação. A primeira liberdade se deu aos cinco anos, quando solicitou d

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 229

mãe que o mandasse à escola, e aquela bondosa senhora atendeu o pedifilho. A segunda liberdade, verdadeiro desabrochamento espiritual, aconno ginásio, ao ouvir do professor de ciência a palavra “evolução”. Outra gliberdade para o seu espírito foi com a leitura de livros sobre a imortalida

alma e reencarnação, tornando-se reencarnacionista aos vinte e seis anos por diante, os dois mundos, material e espiritual, começaram a fundir-sesó. A vida na Terra não poderia ter outra finalidade, além daquelas de seCristo e ser útil aos homens.

Pietro Ubaldi formou-se em Direito (profissão escolhida pelos pais, jamais exercida por ele) e Música (oferecimento, também, de seus genitfez-se poliglota, autodidata, falando fluentemente inglês, francês, aleespanhol, português e conhecendo bem o latim; mergulhou nas difercorrentes filosóficas e religiosas, destacando-se como um grande pencristão em pleno Século XX. Ele era um homem de uma cultura invejávque muito lhe facilitou o cumprimento da missão. A sua tese de formatuUniversidade de Roma foi sobre A Emigração Transatlântica, Especialmente

para o Brasil , muito elogiada pela banca examinadora e publicada numlume de 266 páginas pela Editora Ermano Loescher Cia. Logo após a ddessa tese, o Sr. Sante Ubaldi lhe deu como prêmio uma viagem aos EsUnidos, durante seis meses.

Pietro Ubaldi casou-se com vinte e cinco anos, a conselho dos pais, quelheram para ele uma jovem rica e bonita, possuidora de muitas virtudes educação. Como recompensa pela aceitação da escolha, seu pai transferiu pcasal um patrimônio igual àquele trazido pela Senhora Maria Antonieta nelli Ubaldi. Este era, agora, o nome da jovem esposa. O casamento não nos planos de Ubaldi, somente justificável porque fazia parte de seu destingirava em torno de outros objetivos: o Evangelho e os ideais francisc

Mesmo assim, do casal Maria Antonieta e Pietro Ubaldi nasceram três fVicenzina (desencarnada aos dois anos de idade, em 1919), Franco (mor1942, na Segunda Guerra Mundial) e Agnese (falecida em S. Paulo – 1975).

Aos poucos, Pietro Ubaldi foi abandonando a riqueza, deixando-aconta do administrador de confiança da família. Após dezesseis anos dlace matrimonial, em 1927, por ocasião da desencarnação de seu pai, eo voto de pobreza, transferindo à família a parte dos bens que lhe perteAprovando aquele gesto de amor ao Evangelho, Cristo lhe apareceu. para ele foi a maior confirmação à atitude tão acertada. Em 1931, co

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 231

01)Grandes Mensagens02) A Grande Síntese – Síntese e Solução dos Problemas da Ciência e do Esp03) As Noúres – Técnica e Recepção das Correntes de Pensamento04) Ascese Mística05) História de Um Homem06)Fragmentos de Pensamento e de Paixão07) A Nova Civilização do Terceiro Milênio08) Problemas do Futuro09) Ascensões Humanas10) Deus e Universo

Com este último livro, Pietro Ubaldi completou sua visão teológica, de profundos ensinamentos no campo da ciência e da filosofia. A Grande Sín-tese e Deus e Universo formam um tratado teológico completo, que se enctra ampliado, esclarecido mais pormenorizadamente, em outros volumes tos na Itália e no Brasil, a segunda pátria de Ubaldi.

O Brasil é a terra escolhida para ser o berço espiritual da nova civilizdo Terceiro Milênio. Aqui vivem diferentes povos, irmanados, independ

de raças ou religiões que professem. Ora, Pietro Ubaldi exerceu um miniimparcial e universal, e nenhum país seria tão adaptado à sua missão quanossa pátria. Por isso o destino quis trazê-lo para cá e aqui completar suafa missionária.

Nesta terra do Cruzeiro do Sul, ele esteve em 1951 e realizou dezenconferências de Norte a Sul, de Leste a Oeste. Em oito de dezembro do aguinte, desembarcaram, no porto de Santos, Pietro Ubaldi acompanhado posa, filha e duas netas (Maria Antonieta e Maria Adelaide), atendendo convite de amigos de São Paulo para vir morar neste imenso país. É opolembrar que Ubaldi renunciou aos bens materiais, mas não aos deveres para família, que se tornou pobre porque o administrador, primo de sua esdilapidou toda a riqueza entregue a ele para gerencia-la.

Em 1953, Pietro Ubaldi retornou à sua missão apostolar, continuou a rção dos livros e recebeu a última Mensagem, Mensagem da Nova Era , em SãoVicente, no edifício “Iguaçu”, na Av. Manoel de Nóbrega, 686 – apto. 92. Doisanos depois, transferiu-se com a família para o Edifício “Nova Era” (coincidn-cia, nada tem haver com a Mensagem escrita no edifício anterior), Praça

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Pietro Ubaldi FRAGMENTOS DE PENSAMENTO E DE PAIXÃO 232

janeiro, 531 – apto. 90. Em seu quarto, naquele apartamento, ele completsua missão. Escreveu em São Vicente a segunda parte da Obra, chamada leira, porque escrita no Brasil, composta por:11) Profecias

12)Comentários13)Problemas Atuais14)O Sistema – Gênese e Estrutura do Universo15)A G d B lh