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MEU MARIDO, MEU INIMIGO Bianca nº31 Copyright: Rachel Lindsay Título original: "Unwanted wife" Publicado originalmente em 1960 (1978) Digitalização/ Revisão: m_nolasco73 Tanya foi morar na casa do marido fingindo ser sua criada! Que terrível segredo a fazia sofrer tanta humilhação? Resumo: Tanya casou-se aos dezoito anos com Adrian, um homem rico, forte, de olhos azuis perturbadores. A lua-de-mel foi uma doce loucura, cheia de amor e paixão. Mas depois Adrian a abandonou! Anos mais tarde, Tanya foi procurá-lo. Nova desilusão! Ele a desprezou dizendo que estava noivo de outra mulher! Mas Tanya não ia desistir; apesar de humilhada, decidiu lutar pelo marido. Logo percebeu que ele a desejava, mas ela queria maIs do que isso: queria amor, muito amor!

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MEU MARIDO, MEU INIMIGO Bianca nº31

Copyright: Rachel LindsayTítulo original: "Unwanted wife"

Publicado originalmente em 1960 (1978)Digitalização/ Revisão: m_nolasco73

Tanya foi morar na casa do marido fingindo ser sua criada! Que terrível segredo a fazia sofrer tanta humilhação?

Resumo: Tanya casou-se aos dezoito anos com Adrian, um homem rico, forte, de olhos azuis perturbadores. A lua-de-mel foi uma doce loucura, cheia de amor e paixão. Mas depois Adrian a abandonou! Anos mais tarde, Tanya foi procurá-lo. Nova desilusão! Ele a desprezou dizendo que estava noivo de outra mulher! Mas Tanya não ia desistir; apesar de humilhada, decidiu lutar pelo marido. Logo percebeu que ele a desejava, mas ela queria maIs do que isso: queria amor, muito amor!

Este livro faz parte de um projeto sem fins lucrativos.Sua distribuição é livre e sua comercialização estritamente proibida.

CAPÍTULO I

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Adrian Chesterton pegou a caneta, inclinou-se para a frente e começou a assinar a última carta. A luz do abajur realçava o brilho de seu cabelo escuro e dava à sua pele, geralmente pálida, um tom mais escuro.

- Pronto. - Sorrindo, ele fechou a pasta e a entregou ao secretário. - Não pode se queixar de que eu deixo o serviço atrasar.

- O senhor trabalha demais. Não sei como iria se arranjar se não existissem gravadores. - Eu teria de conseguir mais um secretário, bom como você. Se é que isso é possível - ele

respondeu, levantando-se e caminhando para a porta. Adrian era um homem alto e magro, de trinta e poucos anos, com uma postura que fazia

lembrar seus antepassados militares. Suas feições nobres mostravam que os boatos sobre o relacionamento bastante íntimo de um príncipe da Escandinávia com uma Chesterton podiam muito bem ser verdadeiros. Um observador atento notaria que seu belo físico era cheio de contrastes. As sobrancelhas arqueadas, tão bem-feitas que pareciam esculpidas, contrastavam com a boca sensível; os cílios espessos diminuíam a frieza dos olhos azuis e o queixo quadrado de um homem de ação se opunha à testa larga de um pensador.

Quando chegou à saleta de estar, ele encontrou a mãe à sua espera, para tomarem o aperitivo de costume, antes do jantar. A sra. Chesterton, uma mulher de cabelos grisalhos e ar imponente, estava sentada em uma confortável poltrona, olhando os anúncios de casamento no The Times. Só levantou a cabeça quando o filho lhe entregou o copo de sherry.

- Nigel Lockheed vai se casar com a filha de Bruce Cardley. Isso explica por que ele ficou sócio do banco de Cardley, no ano passado.

Adrian cruzou a sala para ligar o rádio. Mal ele começou a ouvir as notícias, sua mãe falou, com impaciência:

- Desligue isso. Preciso falar com você, - Não vai me falar sobre Diana de novo, vai? - Impaciente, ele abaixou o volume do rádio, mas

não o desligou. - Não sei o que há com vocês dois. Estão noivos há quatro meses e ainda não marcaram a data

do casamento. - Não temos pressa. - Qualquer um diria que você não quer se casar.- Isso é bobagem. Claro que eu quero. - Você pode provar isso marcando a data. Ou é Diana que está hesitando? - Nenhum de nós está hesitando - ele falou, com calma. - Acontece que nós não estamos com

pressa. Sua mãe franziu a testa. - Vocês já estão vivendo juntos? Por um instante, o filho não se manifestou. Depois, sorriu forçado. - Não, mamãe, não estamos. Mas, mesmo que estivéssemos, isso não tornaria o casamento

desnecessário. - Mas explicaria a falta de pressa. - O silêncio dele não desanimou a sra. Chesterton. - Você está

solteiro há tanto tempo, que vai acabar virando um monge. Já é tempo de se casar e formar uma família.

- Vamos marcar a data, depois da eleição. Mas não vai ser um casamento luxuoso, mamãe. Afinal, não é o meu primeiro casamento.

- Mas é o primeiro de Diana, e ela tem o direito de esperar alguma coisa especial. Quanto ao seu outro casamento... bem, você sabe o que eu penso daquilo. Um negócio feito às escondidas com uma estrangeira que...

- Mamãe! - Desculpe, Adrian, mas toda vez que eu penso no modo como ela agiu... - Tanya não teve escolha. - Ainda com o copo na mão, ele caminhou para a porta. - Tenho mais

algumas coisas para fazer. Eu a vejo no jantar. Rapidamente, Adrian voltou para a biblioteca, um lugar grande e retangular, com móveis de

mogno. Era o lugar onde se sentia melhor. De pé em frente da janela, ele olhou para o gramado bem cuidado, pensando nos enormes campos e pastagens que ficavam além dele. Era tudo seu e ele amava cada centímetro daquilo. Também amava o povo que trabalhava ali e pelo qual era responsável. Em uma coisa sua mãe estava certa: precisava de uma mulher para compartilhar tudo aquilo; precisava de filhos que crescessem sentindo a mesma coisa que ele, e que continuassem seu trabalho, quando estivesse velho demais para isso.

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A imagem de Tanya, a garota alta e esbelta com quem tinha se casado oito anos atrás, surgiu em sua mente. Naquela época, Tanya tinha dezoito anos, era tímida e nervosa, com cabelos cor de mel, pele dourada e olhos violeta. Adrian nunca pensara que alguém pudesse ter olhos daquela cor, e quando os viu pela primeira vez, achou que refletiam a cor de seu vestido. Depois percebeu que não era assim, pois fosse qual fosse a cor de suas roupas, os olhos dela continuavam com aquele tom violeta-escuro, tão raro.

Como tudo estava distante! Aqueles oito anos pareciam uma vida inteira. Quando se lembrava do rapaz que fora naquela época, tinha a impressão de estar pensando em um estranho. Mas, sem dúvida, aquele rapaz tinha uma certa semelhança com o homem sério e maduro de agora, que pedira demissão de seu emprego no Ministério do Exterior para tomar conta das terras de seu pai. O homem que logo ia se casar com a filha de Lord Biddell.

Adrian tentou voltar seus pensamentos totalmente para o presente, mas não conseguiu. A imagem de Tanya, como a tinha visto pela primeira vez, tomou conta de sua mente.

Ele trabalhava na Embaixada da Inglaterra em Rovnia, e naquele lindo dia de verão participava pela primeira vez de um festival rovniano. Junto com alguns amigos foi até o centro da cidade observar o Carnaval das Rosas, uma festa tão antiga, que ninguém mais se lembrava de seu significado. Não que alguém se importasse com isso. Para a juventude de Rovnia, qualquer desculpa para se divertir era boa.

O povo dançava nas ruas, brindando com vassi, um vinho doce e leve da região, e aplaudindo animadamente os carros alegóricos que passavam por ali, carregados de rosas de todas as cores e tipos.

Foi só depois que o décimo carro passou que Adrian viu a garota alta e esbelta, junto com um bando de jovens, do outro lado da praça. Ela estava com o traje tradicional de Rovnia, uma saia rodada e uma blusa bordada em tons alegres. Não estava cantando e acenando para todo mundo, como as amigas. Pensativa, observava os carros que passavam. Se a moça estivesse mais perto, ele teria ido até lá para tentar descobrir por que ela estava tão triste, quando todos em volta estavam tão felizes. Mas no momento em que esse pensamento passou-lhe pela cabeça, a multidão se moveu e a garota desapareceu de vista.

Mais tarde, depois que ele e os amigos comeram e beberam à vontade, Adrian não quis se juntar às pessoas que dançavam na rua e decidiu voltar para casa. As ruas estavam superlotadas e freqüentemente as pessoas o paravam, tentando convencê-lo a se divertir com elas. Foi depois que ele recusou o quinto convite e estava abrindo caminho na direção da rua que levava à embaixada, que viu a garota loira de novo. Ela estava com um grupo de jovens e parecia se divertir bastante. Logo depois, eles começaram a dançar de um modo cada vez mais animado e Adrian percebeu que ela estava achando difícil acompanhar os outros, e tentava em vão sair da roda. Num impulso, Adrian estendeu os braços e a segurou pela cintura, quando ela passou por ele, retirando-a da roda.

- Você está bem? - perguntou, mostrando logo que era estrangeiro, pelo modo como falava o rovniano.

- Estou sim, obrigada. Foi muito gentil me tirando da roda. Fez um movimento para ir embora, e ele deu um passo à frente, barrando seu caminho. Adrian

ficou surpreso com seu gesto, pois não era um rapaz impulsivo. Mas havia alguma coisa naquela garota que fazia com que tivesse vontade conhecê-la melhor.

- Conheço um restaurante calmo, aqui perto. Vamos até lá tomar um aperitivo? - Percebeu a hesitação dela e disse: - Meu nome é Adrian Chesterton e trabalho na Embaixada da Inglaterra.

- Eu sou Tanya Kovacs. Estendeu a mão com timidez e ele a apertou sorrindo. - Agora que nos apresentamos - Adrian continuou -, espero que concorde em tomar um

chocolate gelado comigo. Isso foi o começo de uma amizade, que logo se transformou em um sentimento mais profundo.

Inteligente e bem-educada, Tanya não era liberada como as outras moças. Seus pais já eram de meia-idade, quando ela nasceu, e a garota tinha um modo de pensar diferente do das amigas, o que às vezes a fazia se sentir uma estranha no meio delas.

- Mas eu não mudaria nada na minha vida - Tanya confessou. - Meu pai é um historiador e eu aprendi mais com ele do que com qualquer outra pessoa. Para ele, o passado é tão real quanto o presente. Às vezes acho que é até mais real, e sinto medo por ele.

Adrian não precisou perguntar o que ela queria dizer com essas palavras pois sabia qual era a política de Rovnia. Aqueles que se lembravam do passado, cheio de liberdade, não podiam deixar de compará-lo com o presente, onde até os pensamentos eram controlados.

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Mas naqueles dias quentes de verão, a situação política de Rovnia não era a coisa mais importante na cabeça de Adrian. Ele só conseguia pensar em uma coisa: fazer de Tanya sua esposa. Para sua surpresa, o embaixador não tentou obrigá-lo a mudar de idéia, e o governo de Rovnia não fez nenhuma objeção ao casamento de uma moça dali com um estrangeiro. É claro que o fato do pai de Tanya ser um historiador famoso no mundo inteiro teve muito a ver com isso. Mas, para Adrian, ele podia ser um camponês, que não ia fazer nenhuma diferença. Era Tanya que ele amava. Era com Tanya que ele queria passar o resto de sua vida.

Quando eles estavam em lua-de-mel, a situação política do país piorou. Houve um golpe de Estado, o primeiro-ministro foi deposto e um ditador tomou conta do governo. Adrian foi chamado de volta para a Inglaterra e, dez dias depois do seu casamento, Tanya despediu-se dele no aeroporto.

- Logo estaremos juntos, querido - ela sussurrou. - Meu passaporte vai ficar pronto em uma semana.

- Vou ficar contando as horas. - Adrian abraçou-a com força. Nenhum deles podia imaginar que nunca mais iam se ver.

No início, Tanya não foi para a Inglaterra porque seu pai foi preso e ela não quis deixar a mãe sozinha. Adrian lhe implorou para deixar Rovnia enquanto ainda podia. Falou com ela duas vezes pelo telefone, mas Tanya se tornou cada vez mais reticente e ele teve que aceitar seu silêncio. Logo depois ela lhe escreveu, contando que tinha pedido permissão para levar a mãe para a Inglaterra. Mas a alegria do rapaz durou pouco; a permissão foi negada, e pior ainda, a de Tanya cancelada.

Várias vezes ele foi à embaixada em Londres, mas sempre conseguia a mesma informação: eles estavam entregando suas cartas para Tanya, e se ela não respondia era porque não queria. Adrian se recusou a acreditar nisso e continuou a lutar pela libertação da esposa, mesmo sem receber uma palavra dela. Então, um dia antes de completarem dois anos de casados, o governo de Rovnia anunciou que todos os seus cidadãos casados com estrangeiros tinham pedido a anulação de seus casamentos.

- Não acredito que minha mulher tenha feito isso de livre e espontânea vontade - Adrian explodiu com o funcionário da Embaixada de Rovnia: - Ela deve estar sendo forçada.

Adrian continuou a amolar o pessoal da embaixada, e só quando seu chefe no Ministério do Exterior o avisou de que ele podia estar prejudicando Tanya com sua atitude, foi que percebeu que talvez estivesse colocando a vida dela em perigo.

Não foi fácil para o rapaz aceitar que seu casamento acabara, e com o tempo ele começou a imaginar se o silêncio dela, naquele primeiro ano, fora deliberado. Talvez Tanya não quisesse sair de Rovnia. Se quisesse, teria dado um jeito de escapar. Aos poucos, Adrian se convenceu disso e seu amor por Tanya começou a desaparecer.

Quando seu pai morreu, ele pediu demissão de seu emprego e voltou para casa, esquecendo seu casamento desfeito. Gradualmente, o rapaz se estabeleceu como fazendeiro, reencontrando a paz e a tranqüilidade que pensava ter perdido para sempre.

Os anos se passaram e seis meses atrás ele decidiu que não só tinha que cuidar de sua herança, como também conservá-la para o futuro. Por isso, pediu Diana Biddell em casamento. Ela era uma garota de cabelos escuros e maneiras frias e elegantes. Adrian a conhecia desde a infância; eles gostavam um do outro e seu casamento seria baseado em interesses de ambas as partes.

Logo depois, o representante daquele distrito no Parlamento morreu, e pediram a Adrian para se candidatar ao lugar. Como estava muito interessado nas fazendas da região, aceitou. Sabia que ia ter que lutar muito para vencer seu oponente, Roger Poulton, um rapaz ruivo, cuja família vivia na vila há muitas gerações. Poulton tinha trabalhado para poder estudar, e agora era professor na universidade do distrito.

- Eu não vou ser membro do Parlamento apenas nas horas vagas - Poulton costumava repetir, insinuando que Adrian estava muito preocupado com seus próprios problemas como fazendeiro, para se preocupar com o dos outros.

Adrian tentou desmentir, mas Poulton sempre repetia o ataque. Enquanto pensava isso, bateram à porta. Um rapaz forte e atarracado entrou. - Estou amolando você, Adrian? - De jeito nenhum. Venha beber alguma coisa. Como vai o pessoal? Dick Tufton, que era seu cunhado e administrador da fazenda, sentou-se numa poltrona, com as

pernas estendidas. - Grant está reclamando do telhado, de novo. Já mandamos arrumá-lo duas vezes, este ano.

Acho que todas as noites o velho sobe nele, para fazer buracos.

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Adrian riu. - É melhor mandar arrumar novamente. - Você é muito mole - Dick comentou. - Aquele homem é uma peste. - Com oitenta anos de idade, ele tem o direito de ser até duas pestes! Mais alguma novidade? - Não. - Fez uma careta. - E agora sua irmã deu para reclamar que não acontece nada por aqui. - Ela deve estar aborrecida. Por que não a leva para jantar fora, esta noite? - Estou muito cansado. E Betty também estaria, se trabalhasse o dia inteiro. Adrian não disse nada. Ele sabia que Dick não gostava de viver com a família da esposa, mas

achava que isso era uma coisa que eles tinham que resolver sozinhos. - Vamos tomar um aperitivo - Adrian convidou, para mudar de assunto. Dick o acompanhou até

a porta. - Diana vem para cá, esta noite? - Já deve estar aqui. Adrian abriu a porta da sala de estar. Diana e sua mãe estavam sentadas no sofá e a garota

olhou sorrindo para ele, que se inclinou para beijá-la no rosto. Como Diana estava bonita, naquele vestido azul-marinho tão simples! - pensou.

- Que tal uma volta de carro, depois do jantar? - ele murmurou, excitado com o aroma do perfume que ela usava.

- Seria ótimo. Se você... - Diana se interrompeu, quando o mordomo entrou e parou ao lado de Adrian.

- Desculpe-me, sr. Chesterton, mas tem uma moça aí, querendo falar com o senhor. - A esta hora da noite! - sua mãe reclamou. - Quem é, Hamford? - Adrian perguntou. - Ela não quis dizer o nome. Só disse que precisa ver o senhor. - Bem, é melhor mandá-la entrar. - O mordomo saiu e ele falou para a noiva: - Deve ser alguma

eleitora. A porta se abriu e uma mulher, usando um casaco preto deselegante, entrou. Seus cabelos

despenteados estavam cobertos por um lenço estampado de azul e calçava sapatos sem saltos. Em uma das mãos, carregava uma bolsa desengonçada e na outra uma sacola já bem gasta, que pousou sobre o tapete.

Por um momento, as três pessoas que estavam na sala olharam fixamente para a desconhecida. Depois, Adrian deu um passo à frente.

- A senhora quer falar comigo? - perguntou, com cortesia. A mulher olhou-o e a luz suave de um abajur caiu sobre suas feições magras e angulosas. A cor

acinzentada de seu rosto mostrava que isso era devido à falta de alimentação, e não a um tipo físico. Era difícil adivinhar sua idade, mas Adrian percebeu que, com uma boa alimentação e alguns cuidados, ela poderia adquirir um ar bem mais jovem.

- Adrian! - Seu nome saiu dos lábios dela, com um som claro que cortou o ar como se fosse um raio laser.

Ele franziu a testa. - Acho que não... - A horrível suspeita que se infiltrou em sua mente fez com que se

interrompesse. Continuou olhando fixamente para a moça, como se esperasse que a intensidade de seu olhar a fizesse sumir. Mas aquela criatura magra, de idade indeterminada, usando roupas pretas humildes, não desapareceu. O que mais o impressionou foram as mãos dela, calejadas e vermelhas de tanto trabalhar, com as unhas quebradas, movimentando os dedos de um modo convulsivo. Foi avista daqueles dedos que despertou nele o senso de responsabilidade.

- Tanya! - ele murmurou. - Não... Não pode ser você, Tanya! Ouvindo-o dizer seu nome, a mulher soltou um soluço áspero e jogou-se em seus braços.

Desajeitadamente, Adrian começou a dar tapinhas nos ombros dela, olhando por sobre sua cabeça para Diana e sua mãe, que o fixavam horrorizadas. Mas nada podia se comparar ao horror que ele mesmo sentia.

- É... minha... é Tanya - disse alto. - Ela deve ter escapado... e veio diretamente para cá. - Oh, meu pobre Adrian! - A voz de sua mãe se ergueu. - O que é que nós vamos fazer?

CAPÍTULO II

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Por mais que vivesse, Tanya nunca se esqueceria da primeira vez em que ficou sozinha com Adrian, na casa dele.

Depois da pergunta horrorizada de sua mãe, Adrian levou a moça para uma sala menor e mais íntima, que de certo modo restaurou sua confiança. Mas essa confiança diminuiu com rapidez, quando ele se afastou e lhe indicou uma cadeira, sentando-se a alguma distância.

- Devia ter me avisado de sua chegada - ele disse. - Foi... um choque ver você. - Fez uma pausa, como se não soubesse como continuar, depois falou: - Veio diretamente de Rovnia?

- Vim. Não o avisei, porque não tive tempo. Foi tudo tão rápido! - Teve sorte em escapar. - Sua voz era sem expressão. - Poucas pessoas conseguiram. - Muitos querem sair de lá. Você conhece meu povo, Adrian. Sabe como eles odeiam aquele

governo. - Mas eles vivem com esse governo há oito anos! - Oito anos de luta. Ainda há muita resistência. - Eu li a esse respeito. Mas a gente nunca sabe se é verdade ou não. - É tudo verdade! - ela disse com veemência. - Fiz parte da resistência. - Tanya parou,

imaginando por que estavam falando nisso, quando tinham tantos outros assuntos para discutir. Estava com Adrian, seu marido, o homem que amava de todo o coração. Seus olhos examinaram o rosto dele, vendo como o tempo o tinha mudado. O rapaz que se despedira dela no aeroporto era um homem, agora. O ar de desafio tinha sido substituído por um ar de comando e a voz macia era firme. Mas, basicamente, continuava o mesmo. No entanto, era óbvio que ele não achava o mesmo dela. Adrian a olhava como se nunca a tivesse visto antes.

- Quando saiu de Rovnia? - Há três dias. Mas, mesmo depois que atravessei a fronteira, tive que ser cuidadosa. Fiquei

escondida vinte e quatro horas, e depois me puseram em um trem. - Quais são os seus planos? - Meus planos? - Olhou para ele, sem entender. - Que planos eu devia ter? Vim encontrá-lo.

Você é meu marido. - Não sou mais. Você se divorciou de mim há seis anos. - O quê? - Tanya ficou em pé de um salto. - Não é verdade! Você está mentindo! - Não estou, não. Há seis anos, o seu governo avisou que todos os rovnianos casados com

estrangeiros tinham se divorciado. - Você devia saber que eu nunca faria uma coisa dessas.- Como eu poderia saber? - Ela cambaleou e uma onda de piedade fez com que ele se

aproximasse e a ajudasse a se sentar de novo, com delicadeza. - Não a culpo, Tanya. Sei que não teve escolha...

- Eu não sabia de nada. Tudo que sabia é que você nunca respondia a minhas cartas... e eu nunca consegui entrar em contato com você, por mais que tentasse. Era como se estivesse morto. Ninguém me disse nada sobre o divórcio. Todo o tempo que estivemos separados, só vivi para o momento em que o veria... em que o encontraria de novo...

Tanya explodiu em soluços e Adrian começou a bater em seu ombro, desajeitadamente. - Não chore. Agora você está a salvo, na Inglaterra. Sinto muito, se a recebi de um modo meio

frio, mas foi um choque ver você, de novo. Um choque. Se Adrian não estivesse falando dela, Tanya teria rido. Não só era uma estranha

num país estranho, como também o homem que ela amava não a queria mais. E pior ainda, durante seis anos ele pensara que ela não o queria mais.

Cuidadosamente, examinou o rosto dele, tentando descobrir o que estava pensando. Mas Adrian não demonstrou nada, e ela se sentiu como se olhasse para um estranho. No entanto, ele não era um estranho. Ainda era o homem com quem tinha se casado, o homem de quem usava a aliança.

- É claro que vai ficar aqui, até decidir o que quer fazer. Se eu puder ajudar em alguma coisa... - Não quero nada de você! - ela explodiu. - Nada! - Só está dizendo isso porque está aborrecida. Ainda me sinto responsável e quero tomar conta

de você. - Não quero que tome conta de mim - exclamou. - Quero amor. - Acho que nenhum de nós pode falar de amor. Faz oito anos que não nos vemos, e mudamos

muito nesse tempo. - Eu não - Tanya falou com amargura. - Sou a mesma. Você já se esqueceu do passado? Me ver

de novo não faz você se lembrar do que sentiu por mim? - Não, não faz - ele disse, virando-lhe as costas. - Há seis anos você se divorciou de mim e isso

mudou meus sentimentos. Sinto muito, Tanya, mas não existe motivo para eu esconder a verdade.

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Tanya tentou ficar indiferente às palavras dele, mas elas a atingiram de um modo doloroso e devastador.

- Está querendo dizer que não me ama mais? - Estou dizendo que somos duas pessoas diferentes do rapaz e da garota que se casaram há

oito anos. Nós não quisemos nos separar, mas isso aconteceu e... e agora não podemos fazer o tempo voltar atrás.

Por algum tempo ela ficou em silêncio, girando a aliança no dedo. - É por que eu deixei de ser bonita que você não me ama mais? - Meu Deus! - As palavras saíram forçadas. - Isso não tem nada a ver com a sua aparência! - Tem sim. Agora sou uma estranha para você. Eu sei. - Tanya ficou em pé de novo, e olhou-se

no espelho que ficava em cima da lareira de mármore. - Quando olho para mim mesma, vejo o rosto de uma velha. Fiquei velha antes do tempo. - Caminhou para a porta. - Não precisa dizer mais nada. Vou embora.

- Para onde? - Para Londres. Tenho medo de ir até a Embaixada de Rovnia, mas deve existir uma pensão... - Que absurdo! Vai ficar aqui, até pensarmos em alguma coisa. Sei que não é o que você

esperava, mas... mas vamos ser sensatos. - Sensatos - ela repetiu. - Você repete demais essa palavra. Pois bem, Adrian, qual é a coisa

sensata que quer que eu faça? - Agora, quero que vá para a cama. Está parecendo exausta. - Não durmo desde que saí de Rovnia. - Então eu... minha mãe vai lhe mostrar um quarto. Depois de uma boa noite de sono, tudo vai

ficar diferente. Vamos adiar nossa conversa para amanhã. - Muito sensato. - Tanya falou com calma, e se Adrian percebeu a ironia, não demonstrou. - Vou mandar levar seu jantar para o quarto. - Não estou com fome, obrigada. - Pode ser que sinta vontade de comer alguma coisa, depois que tomar um banho e descansar

um pouco. Sem responder, Tanya o acompanhou até o hall. Não conseguiu entrar na sala de estar de novo

e ficou na soleira da porta, enquanto Adrian falava com a mãe. Eles estavam muito longe, para ouvir o que diziam, mas Tanya percebeu a ansiedade da mulher, quando ela se levantou e caminhou para a porta.

- Acho que Adrian está certo, querendo que vá para a cama. Deve estar muito cansada, depois de viajar tanto.

Tanya concordou com a cabeça e subiu a bonita escada, atrás da sogra. Mas a mulher que caminhava tão ereta na sua frente não era mais sua sogra, ela não era mais a esposa de Adrian. Era uma estranha, numa casa estranha. Não era querida e sabia disso. Quanto mais cedo saísse dali, melhor seria.

O sol da manhã iluminou o quarto e, recostada nos travesseiros, Tanya examinou o quarto. Um tapete verde-claro cobria o chão, ressaltando as cortinas floridas, que se destacavam alegremente contra as paredes cor de creme. Em cima de uma mesinha de pau-rosa, ao lado da cama, estava uma bandeja com os restos do jantar que Adrian lhe mandara, na noite anterior.

Adrian... Não conseguia pensar naquele homem sério da noite anterior como o mesmo homem com quem se casara. Nunca se esqueceu dele, durante os longos anos de sua separação, mas o passado deixou de existir, quando se viu frente a frente com a realidade.

Será que era porque esperava que ele continuasse o mesmo homem de quem tinha se despedido? Não, ela estava preparada para encontrá-lo mudado, mais velho e mais sério. O que não esperava é que o Adrian de hoje fizesse o de oito anos atrás parecer um completo estranho.

De que modo frio Adrian olhou para ela! O horror tinha sido disfarçado rapidamente, mas a incredulidade não. E a indiferença com que ele segurou seus ombros, sem nenhum sinal de amor!

Tanya pulou da cama e examinou sua imagem no espelho da penteadeira, vendo um rosto magro, de olhos enormes. A pele não tinha cor e o cabelo estava tão opaco, que parecia acinzentado. Não podia culpar Adrian por não tê-la reconhecido. Às vezes, ela mesma mal se reconhecia. Suspirando, começou a se vestir.

Estava saindo do banheiro, quando uma criada entrou, com o café da manhã. - Bom dia, senhorita. - Colocou a bandeja em cima da mesinha, ao lado da cama. - Dormiu bem? - Dormi, sim. Obrigada. - Tanya olhou para o café e os bolinhos. - Prefiro tomar o café lá

embaixo.

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- O sr. Chesterton me pediu para trazê-lo aqui. Também disse que gostaria de vê-la na biblioteca, logo que puder descer.

- Vou agora. - Tanya começou a andar, mas a garota fez um gesto com a cabeça. - Não precisa ter pressa. Tome seu café primeiro. Vai lhe fazer bem. Tanya hesitou, mas reconhecendo que a moça tinha razão, sentou-se na beirada da cama e

começou a se servir. Tudo estava delicioso, mas ela não conseguiu comer com apetite, pensando na conversa que ia ter com Adrian. Gostaria que já estivesse tudo resolvido. Forçou-se a tomar outra xícara de café, depois caminhou até a penteadeira e, sem atenção, passou um pente pelos cabelos.

Só naquele ambiente elegante é que Tanya percebeu como suas roupas estavam velhas e fora de moda. A saia preta de brim chegava quase até seus tornozelos, e a blusa fora lavada tantas vezes, que o bordado de cores brilhantes desbotara. Mas não havia nada que pudesse fazer para melhorá-las e, depois de prender o cabelo num coque baixo, na nuca, foi para a biblioteca.

Adrian se levantou, quando ela entrou. - Dormiu bem? - ele perguntou, com polidez. - Muito, obrigada. - Sentou-se, sem esperar pelo convite dele. - Acho que não temos muita coisa

para discutir. Quando mais cedo eu for embora, melhor. - A coisa não é tão simples assim. Já recebi um telefonema de uma pessoa da vila, indagando se

você chegou bem. - Como? - Você perguntou a várias pessoas como podia chegar até aqui. Acontece que uma delas é a

fofoqueira da vila... e tem uma memória de elefante. Ela se lembrou de que fui casado com uma garota estrangeira e...

- Adivinhou que eu era a sua esposa? - Tanya interrompeu, com a respiração suspensa. - Isso não. Mas, se fizermos qualquer coisa suspeita, ela pode muito bem somar dois mais dois.

No momento, essa mulher acha que você veio até aqui para... para... - Parou, como se estivesse achando difícil dizer o que queria. Depois disse: - Não tenho vergonha de ter casado com você, Tanya. Quero que acredite nisso.

- Se você diz... - Digo, sim. - Pela primeira vez, havia emoção em sua voz. - Eu a amei muito e gostaria que as

coisas tivessem sido diferentes. - Obrigada. Fico contente, ouvindo isso. Durante vários segundos eles se olharam fixamente, depois Adrian piscou, como se estivesse

tentando afastar o passado. - Preciso lhe dizer mais uma coisa - ele continuou. - Estou concorrendo para o Parlamento e, se

espalharem por aí que tenho uma esposa e uma noiva ao mesmo tempo, pode ser um desastre para mim.

- Por quê? Afinal, não sou mais sua esposa. - Não tenho muita certeza disso. O nosso divórcio foi dado pelo seu governo e não significa que

seja válido nesse país... principalmente porque nós nos casamos na Embaixada Inglesa. - Tenho certeza que vai conseguir arranjar as coisas do modo mais conveniente para você,

Adrian. Ele concordou, sem comentar a ironia dela. - Não vai haver nenhum problema. Pretendo arrumar tudo, assim que a eleição terminar. - Ainda não consegui entender por que a minha vinda pode prejudicá-lo. Meu pai foi aprisionado

e assassinado, porque não concordava com o regime. E eu tive que sair às escondidas do país, pelo mesmo motivo.

- As pessoas inteligentes sabem disso, mas nem todas são inteligentes e bem informadas. - Essa é a única razão que tem, para esconder minha identidade? Eu posso não falar muito bem

a sua língua, mas não sou retardada. E ontem à noite percebi que não foi só por isso que ficou tão aborrecido com a minha chegada.

- Se estou escondendo alguma coisa - ele disse rapidamente -, é para não magoá-la. - Estou acostumada a ser magoada. Pode falar. - Você se lembra da moça que estava sentada no sofá, com a minha mãe? - ele falou, depois de

uma pausa. - Uma de cabelos escuros? Pensei que fosse sua irmã. - Não, minha irmã não tinha descido. A moça que você viu era... é minha noiva. Tanya engoliu em seco. - Como pode estar noivo, se acabou de me dizer que não tem certeza se estamos divorciados? - Já lhe disse, é só uma questão de legalizar a situação.

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- Que pena que não fez isso há seis anos! Hoje eu não o estaria aborrecendo! - Você não me aborrece. Já foi minha mulher e tenho o dever de cuidar de você. - Prefiro ir embora. Estou acostumada a me defender. Minha mãe esteve doente muitos anos,

depois que meu pai morreu, e as autoridades criaram muitas dificuldades para mim. Mesmo os amigos tinham medo de nos ajudar e tive que aprender a sobreviver sozinha.

- Por que não tentou escapar antes? - Não podia deixar minha mãe lá, sozinha. Adrian corou. - Desculpe. Eu devia saber. Mas agora que está aqui, gostaria que ficasse até... - Até a eleição terminar? - É. Todo mundo na vila já sabe que você está aqui e, se for embora, vão ficar imaginando por

que partiu tão depressa. - Diga-lhes que eu era uma nova criada e que não servi para o lugar. - Ele corou e ela olhou-o

com dureza. - É isso que... que você quer que eu finja ser? - Não, isso não. Quero que finja ser a babá de meus sobrinhos. Minha mãe sugeriu essa saída.

Você pode ficar aqui, até eu lhe arrumar uma coisa mais apropriada. - Vou ficar, mas é só porque não quero prejudicar sua carreira. Não desejo nada de você. - Vamos falar sobre isso mais tarde. - Evitou os olhos dela. - Está sendo muito compreensiva,

Tanya. - Não me agradeça. Quem está na minha situação não pode ficar escolhendo. E eu não posso

escolher, mesmo na casa do meu próprio marido. - Não diga isso! Ignorando a angústia que havia na voz dele, pois a sua era muito maior, Tanya fugiu dali.Sozinha no hall, ela olhou em torno, depois empurrou a porta que estava na sua frente e entrou

na sala em que estivera, na noite anterior. Ali havia a mesma elegância discreta do resto da casa. Vasos enormes de flores perfumavam o ar e as janelas francesas, abertas de par em par, davam para um terraço com piso em pedras. Ela caminhou para lá e só parou quando chegou ao fim da escada que levava ao jardim. Ele era exatamente como imaginava que um jardim inglês devia ser: bem-cuidado, cheio de flores e verde. Mais adiante, Tanya viu um laguinho, rodeado de folhagens prateadas. Seus olhos se encheram de lágrimas, diante de tanta beleza, mas ela se dominou. Não podia se entregar a sentimentalismos e autopiedade. Precisava pensar que tudo ia ser diferente do passado. Podia não ter o amor de Adrian, mas pelo menos tinha sua liberdade.

O galho de uma árvore roçou em seu cabelo e ela levantou a cabeça, deslumbrando-se com a beleza das flores da cerejeira. Não conseguiu evitar uma exclamação de alegria e, puxando um ramo para baixo, encostou o rosto nas flores.

- Elas são maravilhosas, não são? Tanya virou-se e viu uma garota simpática, de cabelos castanhos, mais ou menos da sua idade. - Você deve ser Tanya. Eu sou Betty Tufton, a irmã de Adrian. - Adrian já me falou de você - Tanya disse. - Acho que vou tomar conta dos seus filhos. - É só para evitar falatórios - Betty explicou rapidamente. - Se bem que, por mim, eu diria logo a

verdade. - A verdade pode prejudicar Adrian. - Não concordo. Infelizmente, aqui ninguém liga para mim. Betty não parecia aborrecida por isso e Tanya teve a impressão de que ela não se perturbava

por qualquer coisa. - Acho que não podemos culpar Adrian por não querer que nada diminua suas chances na

eleição - Betty continuou -, mas também acho que é demais ele querer que você tome conta dos meus filhos.

- Eu vou tomar conta dos seus filhos - Tanya disse com formalismo. - É o que Adrian quer. - Você sempre fazia o que ele queria? - Betty perguntou, depois riu, embaraçada. - Não precisa

responder. - Seu irmão e eu não ficamos juntos tanto tempo, para eu poder responder a essa pergunta. - Eu me esqueci que, quando Adrian veio embora, vocês estavam praticamente em lua-de-mel.

A separação deve ter sido horrível. - Os últimos oito anos de minha vida não foram mesmo muito agradáveis. Acho melhor a gente

não falar neles. -É bom colocar essas coisas para fora. - Às vezes é mais seguro não falar nelas.

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- Você quer dizer menos perigoso, não é? - Betty Tufton olhou-a longamente. - Quando você sorriu para mim, agora há pouco, pude ver a garota com quem Adrian se casou. Durante o primeiro ano, depois que voltou de Rovnia, ele só sabia falar no quanto você era linda.

- Isso acabou. Hoje eu sou feia. - Tanya olhou para sua roupa deselegante e as mãos deformadas pelo trabalho. - É difícil, para mim, aceitar que não sou mais a esposa dele. Eu não tinha a menor idéia do divórcio.

Betty estava surpresa. - Você deve ter sentido um choque, quando Adrian lhe contou. - Senti mesmo. Mas isso também já acabou e agora eu sou apenas a babá de seus filhos. - Se eu estivesses no seu lugar acho que daria um bom pontapé em Adrian. - Se você estivesse no meu lugar, teria aprendido o quanto é importante esconder os seus

verdadeiros sentimentos, Betty. Em silêncio, elas continuaram a caminhar pelo jardim, em direção à casa. - Sabe, você ainda é bonita - a moça inglesa falou de repente. - Só precisa engordar um pouco e

comprar umas roupas decentes. - Não me importo com essas coisas. - Pois devia. Você é livre, agora, e não há nenhum razão para continuar andando por aí, como

se tivesse fugido de um campo de concentração. - Mas eu fugi. - Mais uma razão para se esquecer disso. Somos mais ou menos do mesmo tamanho e vou

arrumar alguma coisa decente para você usar. - Não posso aceitar sua caridade. - Não existe caridade entre cunhadas. E até Adrian legalizar o divórcio, é isso que nós somos.

Portanto, pode parar de discutir. Sorrindo de leve, Tanya encolheu os ombros, concordando. - Você não tem uma casa sua? - Tanya perguntou. - Não. Eu moro aqui. Quando me casei, Adrian ainda trabalhava no Ministério do Exterior e

mamãe não podia ficar aqui sozinha. Dick e eu mudamos para cá, temporariamente, e acabamos ficando até hoje.

- Não gostaria de viver em sua própria casa, com seus filhos e seu marido? - Já nem penso mais nisso. Além de ser bom não ter que cozinhar. - É a sua mãe que cozinha? Betty riu. - Mamãe não sabe nem cozinhar um ovo. Nós temos uma cozinheira. Mas venha, Tanya, vamos

começar sua transformação. E foi exatamente o que Betty fez. Com um bom xampu, devolveu ao cabelo opaco o tom

dourado e brilhante. Depois, cortou algumas mechas na frente, trançando o resto do cabelo em torno da cabeça de Tanya.

- Você tem alguma coisa contra maquiagem? - Betty perguntou, e sem esperar resposta, começou a maquiar Tanya.

Ela era muito habilidosa e quando Tanya se olhou no espelho, mal conseguiu se reconhecer. O vestido de Betty disfarçava bem sua magreza, chamando a atenção para a curva suave de seus seios, ao mesmo tempo que escondia a base do pescoço, muito magra. A saia rodada encobria os quadris ossudos, realçando a cintura fina. Mas o rosto é que tinha mudado mais. Ficou quase com a mesma aparência de antigamente! E Tanya percebeu que podia voltar a ser bonita de novo, se lhe dessem uma chance.

As maçãs salientes do rosto foram realçadas com um leve toque de ruge, e as olheiras disfarçadas com base mais clara. Os olhos não foram pintados, mas o rímel passado nos cílios fazia com que brilhassem como as enormes violetas que cresciam nas colinas de sua terra natal.

- Sua aparência vai melhorar mais ainda, depois que você engordar um pouco. Já está mil vezes melhor do que ontem à noite. Adrian não vai reconhecê-la.

O prazer de Tanya sumiu. Na companhia amigável de Betty, tinha se esquecido de sua verdadeira posição. Não conseguiu controlar as lágrimas e, chorando, fugiu para seu quarto, jogando-se na cama.

Como poderia viver com essa família e fingir que Adrian, o dono da casa, era um estranho para ela? Como poderia esquecer aquelas poucas semanas de amor, que tinham gozado juntos?

Mas precisava esquecer, pois se não o fizesse, acabaria com a vida de Adrian. - Meu Deus, dê-me forças para ficar - ela murmurou, com as mãos juntas, num gesto

implorante. - E depois, dê-me forças para eu ir embora daqui.

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CAPÍTULO III

Com o passar dos dias, os efeitos de uma boa alimentação e descanso começaram a aparecer em Tanya. Não precisava mais de rouge para colorir suas faces e seu corpo começou a readquirir os contornos arredondados de antigamente.

Depois das primeiras dificuldades, começou a se integrar no ambiente da casa. Ela e as crianças de Betty se deram bem desde o início. Sua preferida ficou sendo Emma, uma menininha de cinco anos de idade, com cachos louros e um rostinho solene, que fazia Tanya se lembrar dela mesma, naquela idade. Tim, de três anos, era bem diferente. Vivo e muito inteligente, ele usava essas qualidades para conseguir o que queria, e era muito difícil de manejar. Mas Tanya gostava do trabalho que Tim lhe dava, pois impedia que pensasse em seus próprios problemas e se entregasse à tristeza.

A família a tratava muito bem, e apesar dela querer fazer as refeições com as crianças, Adrian não permitiu.

- Mas eu prefiro ficar com as crianças - ela protestou. - E eu prefiro que você coma conosco. No fim, chegaram a um acordo: Tanya concordou em comer com eles, quando Adrian estivesse

ali. Quando ele estivesse fora, ela comeria com as crianças. Tanya gostava mais das refeições que fazia com as crianças. Na sala de jantar dos adultos,

estava sempre consciente da polidez fria da sra. Chesterton e dos esforços de Adrian para fingir que eram amigos, tentando se esquecer que, um dia, tinham sido muito mais do que isso.

Betty e DiCk eram sempre naturais e teriam prazer em levá-la com eles, quando iam ao cinema local ou visitar amigos. Mas Tanya nunca aceitava, pois seria muito estranho eles saírem com sua suposta babá. Os dois acabaram concordando com ela e a deixaram em paz. Aos poucos, os outros fizeram o mesmo.

Até Adrian, ocupado com sua campanha eleitoral, não insistia mais para ela jantar com a família, quando ele estava em casa. Eles só se encontravam no almoço de domingo, do qual as crianças também participavam.

O tempo passou e uma noite de verão, depois de pôr as crianças para dormir, Tanya foi dar um passeio no jardim, respirando o ar fresco e perfumado com prazer. Sentou-se na beirada do laguinho, que era seu lugar favorito, e mergulhou os dedos na água. Inclinou-se para a frente e seu rosto se refletiu na superfície lisa.

- Não a reconheci, quando a vi chegar - Adrian disse atrás dela. Assustada, ela se virou e o viu caminhando em sua direção. - Você está diferente - ele continuou, percorrendo com os olhos o corpo envolto em um vestido

de linho cor-de-creme, as pernas bronzeadas e usando sandálias vermelhas. - Mudei tanto assim? - Mudou. Está diferente da garota que encontrei em Rovnia e da mulher que chegou aqui. - Você também mudou. Adrian não respondeu e ela olhou de novo para o lago, vendo seu reflexo na água límpida: uma

figura alta e esbelta. De repente, Tanya estremeceu e se afastou dele. - Preciso ir ver as crianças. Elas ficam inquietas, com esse calor. - Não precisa levar seu trabalho tão a sério. Você é uma babá só para os estranhos. Para a

família você ainda é... Ele parou, embaraçado. Tanya não tinha nenhuma vontade de ajudá-lo, e ficou olhando

fixamente para ele, que estava cada vez mais sem graça. - Você sabe o que eu quero dizer - Adrian continuou. Tanya concordou. - Mas não estou interessada no modo como sua família me considera. - Só no modo como eu a considero? - É. Mas não estou zangada com você por causa disso. Eu entendo que a minha chegada tornou

as coisas muito difíceis para você. Se eu soubesse disso, teria continuado em Rovnia. Infelizmente, não posso voltar para lá.

- Quer dizer que você voltaria, se pudesse? Pensei que odiasse seu governo. - E odeio. Mas, pelo menos, em Rovnia eu estaria com o meu povo. Aqui, sou uma estranha. - Você logo vai fazer amigos. É jovem e bonita e vai se casar de novo. Tanya deu um passo para trás, abruptamente.

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- O meu futuro não é da sua conta. - É, sim. - Você imagina isso porque está com a consciência pesada. - Pode ser. - Ele mordeu o lábio inferior. - Eu encontrei a sra. Parks... a mulher que toma conta

do correio... e ela me perguntou pela nova babá de Betty. Queria saber se você era amiga da minha esposa.

- O que as pessoas da vila acham que aconteceu com a sua esposa? - Eles sabem que ela se divorciou de mim. - Então, você não precisa se preocupar. - Você faz as coisas parecerem tão simples! E não acredita que eu tenha consciência. - Consciência? O que aconteceu com ela, quando eu estava em Rovnia? - Maldição! Eu tentei tirar você de lá, mas foi impossível. Não pode imaginar o que eu passei -

ele continuou. - Sei que é duro para você, mas se pudesse enxergar as coisas do meu ponto de vista... Nós dois amadurecemos, nesses oito anos. Vimos coisas diferentes, vivemos vidas diferentes e nos afastamos um do outro. Quando a sua embaixada notificou que você tinha se divorciado de mim, decidi esquecê-la. Disse para mim mesmo que era inútil pensar no passado, quando havia tanta coisa para ser feita no futuro. Eu me obriguei a deixar de lado o amor e...

- Como pode dizer isso, quando está noivo de outra mulher? - ela exclamou. - Ou está me dizendo que não a ama também?

- O que sinto por Diana é diferente do que senti por você. Ela entende de política e vai ser uma ótima esposa para mim.

- Mas você a ama? Você a quer? Adrian ficou em silêncio por tanto tempo que Tanya desistiu de ouvir sua resposta. De repente,

ele disse: - Diana e eu temos muita coisa em comum. Ela não é uma mulher exigente e tem muitos

interesses próprios. - Se esse é o tipo de casamento que vai fazê-lo feliz - Tanya disse com amargura -, você fez

uma tolice, casando-se comigo. Foi bom você ter deixado de me amar, Adrian. Vejo, agora, que nunca seríamos felizes juntos.

- Se tivesse vindo para a Inglaterra comigo, tudo seria diferente. Mas uma pessoa não pode viver de lembranças, e quando a gente tenta reconstruir a vida, automaticamente toma um caminho diferente do primeiro. Mesmo que a gente não queira, isso acontece. Sei que é duro para você, Tanya, mas precisamos tirar o melhor partido da situação.

- Esses sentimentos são muito ingleses para mim. Não consigo tirar o melhor partido de uma situação que odeio. Não quero continuar aqui, Adrian. Quero ir embora da sua casa... quero construir outra vida para mim, num lugar onde não precise mais ver você.

- Logo que for seguro para você ir embora, eu... - Seguro para mim! - ela o interrompeu. - Não está querendo dizer seguro para você? Só está

pensando em uma pessoa, Adrian. Você mesmo! Uma onda de sangue invadiu o rosto dele, fazendo com que parecesse mais novo. - Estou pensando nas pessoas que querem me eleger para o Parlamento. Se não fosse por eles,

eu nunca teria lhe pedido para ficar. Mas já que você não suporta ficar aqui, vou levá-la para Londres e deixá-la em um hotel. Como já lhe disse, você ainda é de minha responsabilidade, esteja onde estiver.

- Você está tornando a minha ida impossível. Se eu sair daqui e você perder a eleição, vou me sentir culpada.

- Você não podia saber o que estava acontecendo, quando veio para cá. Mas se Roger Poulton descobrir quem é você, vai usar isso para me prejudicar.

- Por quê? Eu odeio a ditadura de Rovnia. Por que você não pode lhes dizer isso? - E o meu noivado com Diana? O que você acha que os jornais vão dizer? Um homem com uma

esposa e uma noiva! Isso ia me deixar muito bem mesmo, perante meu eleitorado! - Talvez, se você conversasse com o sr. Poulton e explicasse a situação... - Ele faria qualquer coisa para sujar o meu nome. - Ele é tão maldoso assim? - Isso não tem nada a ver com maldade. Estamos disputando uma eleição e ele vai usar tudo

que puder para me derrotar. - Você faria a mesma coisa? - Não. Mas eu não sou tão fanático por política quanto Poulton é. - Então, por que quer tanto vencer? - Porque dei a minha palavra.

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Os olhos de Tanya se encheram de lágrimas e ela se lembrou de outra vez, em que ele dera sua palavra: quando os dois ficaram lado a lado na Embaixada da Inglaterra e trocaram os votos de casamento.

- Gostaria que as coisas pudessem ser diferentes - Adrian disse, com voz rouca. - Nunca quis feri-la, Tanya. Por favor, acredite nisso.

Tanya correu para a casa, sem conseguir responder. Daí em diante, tomou muito cuidado para não encontrar Adrian de novo. Não havia mais nada que pudessem dizer um ao outro. Precisava se esquecer do homem com quem se casara e encará-lo como a um estranho.

Agora, todos na vila a aceitavam como babá dos filhos da sra. Tufton. Até mesmo a sra. Parkins, a fofoqueira que tinha obrigado Tanya a ficar ali, a aceitava e dizia que, se ela quisesse arrumar um emprego mais bem pago, poderia ajudá-la. Mas a moça sabia que, se saísse da casa de Adrian, não ficaria mais em contato com as pessoas dali.

Uma tarde, Tanya deixou as crianças com Betty e aproveitou para ficar sozinha. Era a primeira vez que o sol brilhava, depois de quase uma semana de mau tempo, e ela resolveu fazer um pouco de exercício. Automaticamente, dirigiu-se para os bosques, como se seu ar sombrio combinasse com seus pensamentos.

De agora em diante, ia pensar de um modo mais positivo. O fato de seu inglês ter melhorado aumentou muito sua autoconfiança. A tímida refugiada rovniana tinha desaparecido, para dar lugar a uma mulher esbelta e encantadora, que não despertava piedade em mais ninguém.

Virou-se e já ia voltando, quando viu um homem caminhando em sua direção. Seu cabelo vermelho brilhava ao sol e seus olhos muito azuis se destacavam no rosto magro.

- Que dia lindo, não? - ele disse com gentileza. Tanya o cumprimentou sorrindo e já estava indo embora, quando ele a deteve. - Você não é desta região, não é mesmo? Está passando as férias aqui? - Eu moro em Park Gates. Sou a babá da sra. Tufton. - Ah, sei. Já ouvi falar de você. Eu sou Roger Poulton. - Meu nome é Tanya Kovacs. - Começou a andar e ele a acompanhou. - Você é que é o

oponente de Adrian Chesterton, na eleição, não é? - Sou, sim. Então, já ouviu falar em mim? - Na verdade, desde que cheguei, só ouço falar nessa eleição. - Não duvido. E quem você acha que vai vencer? Tanya pensou um pouco, antes de responder. - Acho que vai ser um páreo duro. - Vai mesmo. Mas acho que as eleições aqui são bem calmas, comparadas com as do seu país. No meu país não existem mais eleições - ela disse com amargura. - Mas, um dia, ainda vamos

ser livres. - Tenho certeza que vão. - Seu tom de voz era compreensivo. - Como conseguiu escapar?

Chesterton ajudou? - Eu me arrumei sozinha - ela respondeu, de modo evasivo. - E por que resolveu vir para a Inglaterra? - Porque na Inglaterra as pessoas não fazem perguntas. - Mereci essa resposta - Roger respondeu sorrindo. - Mas não é só curiosidade. Estou mesmo

interessado. Por favor, desculpe-me. - Está desculpado - disse, com seriedade. - Mas agora, com licença, que preciso voltar para

casa. Tanya continuou a caminhar, pensativa. No futuro, não iria mais passear nos bosques. Era o

único jeito de não se encontrar com Roger Poulton. No entanto, alguns dias mais tarde, Tanya e as crianças estavam olhando a vitrina de uma

confeitaria, discutindo as qualidades dos diversos tipos de balas, quando ouviram a voz dele, atrás delas.

- Se fosse vocês, eu compraria as balas toffee - ele aconselhou: - Duram mais. Tanya não pôde deixar de rir. - Ouviram isso, crianças? É melhor fazer como o sr. Poulton diz. - Eu quero balas toffee e balas de goma - Emma disse.- Não temos dinheiro para comprar as duas. - Mas eu quero, eu quero as duas! - Tim gritou. Roger interveio rapidamente: - Tenho uma idéia muito melhor. Por que vocês não compram balas toffee e depois vão comigo

tomar um sorvete? Tim parou de chorar na hora.

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- Agora - exigiu. - Agora - Roger concordou e olhou para Tanya. - Vamos? - Como eu posso recusar, sem causar uma verdadeira revolução? Compraram as balas e depois

foram para a sorveteria, onde se sentaram a uma mesinha, saboreando os sorvetes. - Você entende mesmo de crianças - Tanya comentou. - Claro! Eu tenho quatro irmãs e três irmãos! - E vocês vivem todos juntos? - Tenho duas irmãs casadas, que já saíram de casa. - Você é casado? - Não tive folga para isso. A política ocupa todo o meu tempo. - Sua família deve ter muito orgulho de você. - Gosto de pensar que eles têm. E se eu vencer esta eleição... - Tanya! - Tim gritou, de repente. - Quero outro sorvete. - Um é o suficiente, querido. Além disso, prometi a sua mãe comprar uns selos. Roger Poulton foi com eles até o correio e lá Emma falou que ficaria com ele, enquanto Tanya

entrava, para comprar os selos. - Você não se importa? - Tanya perguntou-lhe. - Ser visto com crianças faz bem para a minha imagem pública. - Sorriu e despenteou o cabelo

de Emma, enquanto Tim e Tanya desapareciam no interior do edifício. Depois, disse para a garotinha: - Você é uma senhorita estragada por mimos, mas é tão bonita, que faz a gente se esquecer disso.

- Eu não sou estragada por mimos. Tanya disse que sou muito boazinha. Ela nunca fica zangada comigo.

- Puxa, que bom, hein? - Mas às vezes ela chora - Emma declarou. - Não é porque nós somos levados. Acho que a

Tanya sente saudade da mãe dela. - Então, vocês devem ser muito bonzinhos para ela. - Nós somos, mas não adianta. Ela chora assim mesmo. Roger estava a ponto de fazer um comentário, quando Tanya voltou, com Tim carregando um

envelope de selos, que Emma imediatamente tentou tomar dele. Mais uma vez Roger interveio, embora desta vez levasse alguns minutos para restaurar a paz.

- Eu me sinto culpada, por estarmos nos impondo a você - Tanya disse. - Não se preocupe. Já lhe disse: é bom para minha imagem pública. Pergunte a Adrian e vai ver

como ele concorda comigo. - Eu não converso com o sr. Chesterton sobre a eleição. Roger ergueu as sobrancelhas, mas não comentou nada. Logo eles se despediram. - Espero que aceitem tomar sorvete comigo, qualquer dia destes, de novo - Roger falou. - Vai nos deixar mal acostumados - Tanya protestou. Rapidamente, ela levou as duas crianças embora. Não viu a expressão confusa de Roger, que os

observou até eles desaparecerem no caminho que levava à magnífica casa de Adrian Chesterton.

CAPÍTULO IV

Desde a noite de sua chegada, Tanya só tinha visto de longe a noiva de Adrian. Ela gostaria de saber se a moça estava fazendo isso por vontade própria, ou porque Adrian pedira. Tanya sabia que eles estavam sempre juntos, pois a noiva o estava ajudando em sua campanha. Mas Diana nunca jantava com eles e seu nome raramente era mencionado.

Por isso, Tanya ficou surpresa quando entrou na sala de estar uma tarde e encontrou Diana sentada em uma poltrona, perto da janela.

- Des... desculpe - Tanya gaguejou e fez menção de se retirar. - Eu não a vi. - Não precisa ir embora - a outra respondeu. - Estou esperando por Adrian, mas ele ainda vai

demorar um pouco. Não quer se sentar e conversar comigo? - Acho que não temos nada para dizer uma à outra. - Não sei por quê. Mesmo que não possamos ser amigas, podemos não ser inimigas. Tanya estava confusa. Como os ingleses eram estranhos! Como encaravam as coisas de modo

prático e frio!

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- É difícil, para mim, ser amigável com você - respondeu. Estava tão nervosa, que mal conseguia falar inglês. - Está noiva de Adrian e eu... eu estou casada com ele.

- Do modo como você diz, parece horrível! - De que outro modo posso falar? O que eu disse é apura verdade. - Eu sei, mas não é bem assim. Você e Adrian estão divorciados, e... e vocês eram tão jovens,

quando se casaram! - Mas nós nos casamos - Tanya declarou asperamente - e nos amávamos realmente - Tenho certeza que sim - Diana disse com delicadeza. - E sei que você esta numa posição

desagradável. Mas é ruim para mim também. Você sabe disso, não é? - Eu acho que você não tem coração. - Não tenho coração? - Se você amasse mesmo Adrian, não conseguiria ser delicada comigo. Você me odiaria. - Mas não tenho motivos para odiá-la. Aquela resposta calma foi muito pior para o amor-próprio de Tanya do que uma resposta

zangada seria. Diana estava certa em se sentir segura. Afinal, ela conhecia o Adrian de agora; e o Adrian de agora não poderia nunca amar uma mulher como Tanya.

- Não quero ser grosseira - Diana continuou -, mas acho que é tolice nós não encararmos os fatos como eles realmente são.

- Tem razão - Tanya disse com dificuldade. - Você não tem motivos para ter ciúmes de mim. Mas mesmo assim, acho que se estivesse apaixonada por meu... por Adrian, sentiria ciúmes.

- Eu amo Adrian - Diana disse com frieza - e entendo por que ele não a mandou embora. Se houvesse um escândalo agora, seria o fim de sua carreira.

Parou de falar, pois Adrian estava chegando. - Desculpe o atraso, Diana - ele começou, mas parou abruptamente, quando viu Tanya. Corou

um pouco. - Oi, Tanya. Não sabia que você estava aqui. - Já estou de saída. - Não precisa sair por nossa causa. Diana e eu já vamos embora. Tanya encolheu os ombros e foi até uma mesinha, onde pegou uma revista e fingiu estar

interessada na leitura. Ouviu-os se despedindo, mas não levantou a cabeça até eles saírem. Depois, não conseguiu evitar de ir até a janela, observar os dois caminhando para a saída. Como eles eram frios um com o outro, pensou. Será que se cumprimentavam sempre com um casual "Desculpe o meu atraso"? Os casais ingleses não deviam ser todos assim. Então, Tanya se lembrou de como Adrian era apaixonado quando estavam juntos. Ele não podia ter mudado tanto! Devia haver um motivo para essa sua atitude.

Como se tivesse percebido que Tanya os observava, Diana de repente segurou o braço de Adrian e se encostou nele. À vista dos dois juntinhos, Tanya sentiu um ciúme tão grande, que foi quase como um dor física. Para fugir dessa visão, ela se virou e cobriu o rosto com as mãos. Como estava errada, achando que tinha superado seu amor por ele! Agora, amava-o mais do que nunca.

Sabendo que se ficasse sozinha acabaria chorando, ela correu para o quarto das crianças. Betty acabara de dar banho nelas e estava sentada no tapete, pronta para ler uma história.

- Também veio ouvir Peter Pan? - Betty perguntou sorrindo. - Sempre gostei dessa história. Eu a sei de cor. - Esses monstrinhos também, mas insistem que eu a leia para eles. - As crianças gostam da segurança que a repetição lhes dá. - Os adultos também - Betty comentou. Depois, percebendo a expressão triste de Tanya,

continuou: - Você está com cara de quem precisa de um pouco de animação. - É por isso que vim ouvir a história de Peter Pan. Nesse momento bateram na porta. Era uma criada, que tinha ido avisar que estavam chamando

Tanya ao telefone. - Tem certeza que é para mim? - Tanya perguntou admirada. - Não conheço ninguém por aqui! - É um homem, mas ele não deu o nome. Confusa, Tanya desceu as escadas. Será que era alguém da Embaixada de Rovnia, tentando

obrigá-la a voltar para lá? Mas seus pais estavam mortos e não havia mais nada que os opressores pudessem fazer para obrigá-la a voltar. Mesmo sabendo disso, suas mãos estavam úmidas de nervoso, quando ela levantou o fone do gancho.

- Alô. - Alô, Tanya - Roger Poulton respondeu. - Estava começando a pensar que você não ia atender. - Eu estava com as crianças. - O que acha de sair comigo para jantar? Sei que estou lhe avisando em cima da hora, mas só

soube que estava livre esta noite, agora. Posso pegá-la dentro de uma hora.

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- Uma hora? - ela repetiu, sem saber o que responder. - É. Podemos ir até o Dragão Alegre. A comida é boa e é permitido dançar. Você sabe dançar,

não é? Tanya hesitou. Será que era certo ela sair com outro homem, quando ainda era esposa de

Adrian? Mas, num ímpeto, respondeu que sim. Combinaram a hora e se despediram. - Acha que está certo? - Betty perguntou, quando ficou sabendo. - Afinal, Roger é o rival político

de Adrian. - Mas isso não os torna inimigos. - É claro que não. Quando crianças, eles costumavam brincar juntos. Mas essa eleição não é

brincadeira e... bem, Adrian pode não gostar. - Adrian tem feito muitas coisas que eu também não gosto - Tanya replicou e percebeu, pela

expressão de Betty, que a conversa tinha acabado. Enquanto se trocava, Tanya pensou melhor e. se soubesse onde encontrar Roger, teria lhe

telefonado para dizer que mudara de idéia. Nervosa, desceu a escada e foi para o hall, ansiosa para ver Roger chegar. Desse modo, podia

impedi-lo de apertar a campainha e, com um pouco de sorte, evitar que a família visse com quem estava saindo.

Mas afinal de contas, que importância tinha que Adrian ficasse sabendo? Ele não se importava com o fato dela não gostar que ele saísse com Diana. Mas Tanya sabia que as duas coisas não eram iguais e já estava com dor de consciência, quando o carro escuro parou no caminho de cascalho, do lado de fora da casa. Desceu a escada, para cumprimentar o rapaz.

Roger tinha uma aparência estranha, com um terno escuro e o cabelo penteado para trás, e Tanya se sentiu um pouco embaraçada. Este homem era um desconhecido. Tomar um sorvete com ele, acompanhada das crianças, era uma coisa, mas passar a noite em sua companhia podia até ser perigoso. Mas afinal, tudo estava saindo diferente do que ela esperava. Suspirou e acomodou-se melhor no carro.

- Desculpe o convite em cima da hora - ele disse, lançando-lhe um rápido olhar. - Estou muito contente, por você ter vindo.

- Eu não tenho uma agenda cheia de compromissos. - Tenho certeza que poderia ter, se quisesse. Você é uma moça linda. Tanya não pôde deixar de ficar contente com o cumprimento dele. - Melhorei muito, nos últimos meses. - Não se pode melhorar o que é perfeito. - Todas as mulheres melhoram com roupas bonitas e a maquiagem certa. - Está me dizendo que não tinha isso em Rovnia? - Há muitas coisas que não temos, em Rovnia. Mas o que mais nos faz falta é a liberdade. - É por isso que tantos rovnianos têm fugido de lá. Existe uma legião de vocês em Londres,

sabia? - Não, não sabia. Mas acho que... que não gostaria de entrar em contato com eles. - Por que não? Tanya ficou em silêncio, arrependida do que tinha dito. Era bem provável que alguns de seus

compatriotas soubessem que era filha do professor Kovacs e se lembrassem de que fora casada com um diplomata inglês. Daí, era fácil lembrar o nome dele, principalmente se isso fosse parar nos jornais. Mas ela não teve coragem de dizer isso para Roger e procurou um modo de acabar com sua curiosidade.

- Não é bom para um refugiado ficar junto com outros refugiados. Se a gente não se desliga completamente do passado, não consegue construir uma nova vida.

- Isso acontece mesmo que você tenha odiado a vida em seu país? - Eu não odeio o meu país - ela disse com dignidade. - Só os governantes atuais. - É claro. Eu disse uma tolice. Desculpe-me.- Não foi nada. Roger diminuiu a velocidade, quando chegaram a um trevo, e tomou a estrada que levava a

Londres. Logo avistaram o Dragão Alegre. Era um restaurante de construção moderna e, apesar de ainda ser cedo, já havia muitos carros estacionados do lado de fora.

Tanya esperava encontrar um lugar de decoração berrante com música alta e ficou surpresa com a decoração sóbria e elegante, e as pessoas bem vestidas que avistou, quando entraram no restaurante.

- Que tal tomarmos um aperitivo no bar, antes de jantarmos? - Roger sugeriu. - Eu não agüento muita bebida. Com um copo de vassi, já fico alta - ela se desculpou.

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Eles foram conduzidos a uma mesa isolada o suficiente para que pudessem conversar à vontade, sem ter que gritar, mas de onde podiam observar os pares que dançavam. Assustada com a enorme variedade de pratos, Tanya pediu a Roger para escolher um prato, o que ele fez, depois de lhe perguntar se gostava de peixe.

- Mas você é que vai escolher a sobremesa - Roger disse, quando o garçom se afastou com seu pedido.

- Se eu já não estiver satisfeita, vou escolher alguma coisa com creme. - Está falando exatamente como a Emma. - Às vezes, eu me sinto mesmo uma criança - admitiu -, mas outras vezes... - Não! - Ele se inclinou e segurou a mão dela. Era a segunda vez que ele fazia isso naquela

noite, e Tanya se sentiu estranhamente reconfortada. - Não, o quê? - perguntou. - Não fique com essa expressão triste. Dá sempre para saber quando você está pensando no

passado. E agora, só deve pensar no futuro. - O futuro pode ser muito triste também. - O seu não vai ser. É bem jovem e pode fazer o que quiser. - Nem sempre isso é possível. - Olhou-o com curiosidade. – E você? Que vai fazer, se perder a

eleição? - Não vou perder. Tanya ficou abismada com a segurança dele. - Adrian também é um homem muito inteligente. Ele pode derrotá-lo. - Duvido muito. - Examinou-a com atenção. - Você sempre o chama pelo nome de batismo? - Claro que não. Por que está perguntando? - Estava assustada. - Porque você falou o nome dele com tanta naturalidade, que fiquei imaginando... - Pois não precisa imaginar nada - ela o interrompeu. - As crianças falam dele com freqüência e

estou acostumada a ouvir seu nome. Tanya ficou aliviada, quando viu o garçom se aproximando com o primeiro prato, e mudou de

assunto com determinação. Mas, quando estavam comendo o suculento filé que Roger pedira, ele se referiu a Adrian de novo, com tanta naturalidade, que ela não teve motivos para suspeitar de nada.

- Mesmo quando éramos crianças, estávamos sempre em lados contrários - contou Roger. - E eu sempre soube que seria assim, quando nos tornássemos adultos: eu lutando pelos pobres e oprimidos, ele pelos grandes negócios.

- Ele também luta pelos pobres. Ele se preocupa com os fazendeiros e os trabalhadores rurais, tanto quanto você.

- Você fala como se Adrian estivesse fazendo discursos para você. - Ele é um homem muito ocupado, para se preocupar com a babá da irmã. - Deus, ele deve ser mesmo muito esnobe. - Acho que estou lhe dando a impressão errada. O que quis dizer e que... é que, para ele, sou

apenas mais uma pessoa na casa. - Como um capacho. - Por que tem tanta antipatia por ele? - E por que você o defende? Já o conhecia, antes de vir para cá? - Que pergunta tola! Como poderia? - Não sei. Foi algo que Emma me disse. - Emma? Esteve tentando conseguir informações de uma criança? - Tanya estava tão zangada,

que não conseguiu deixar de levantar a voz, e Roger olhou-a surpreso. - Claro que não. Mas, quando eu estava esperando por você, do lado de fora do correio, ela

disse uma coisa que me deu a impressão de que vocês já se conheciam, antes. E ele morou em Rovnia, durante algum tempo.

- Isso foi há muitos anos. - Tanya percebeu que seus lábio tremiam e apertou-os com força. - Não foi há tanto tempo assim. Oito ou nove anos. - Eu era uma menina nessa época. Tinha dezoito anos. - Tão pouco?! Você é tão séria, que estou sempre pensando que é mais velha. - Isso não é um elogio. - É, sim - Roger falou rapidamente, depois fez uma paus como se estivesse procurando a

palavra certa. Afinal, continuou: - Você é serena. Não consigo imaginá-la como uma adolescente turbulenta.

- Nunca fui turbulenta - ela admitiu. - Cresci numa casa de gente muito séria.

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- Então, já é tempo de parar de ser tão séria. Está num país novo e precisa aprender a ser mais alegre. - Empurrou a cadeira para trás. - E vamos começar agora.

- Aqui? - Tanya perguntou, assustada. - Dançando um pouco. - Já me esqueci de como se dança. Faz tanto tempo que dancei pela última vez! - Eu a ensinarei. Confiante, por causa do vinho a que não estava acostumada, ela se sentiu de repente

despreocupada e abandonou-se à música, nos braços de Roger. Ele dançava muito bem e logo seus passos se tornaram mais complicados.

- Você está se saindo muito bem - ele disse. - É por sua causa. - Inclinou a cabeça e riu. Mas o riso morreu em sua garganta, quando ela

avistou Adrian e Diana sentados em uma mesa próxima. A garota cumprimentou-a com uma leve inclinação de cabeça, mas Adrian a olhou friamente. - O que foi? - Roger perguntou. - Adrian está aqui. Com Diana. - E daí? Não há lei nenhuma que nos impeça de vir até aqui. - Apesar do seu tom

despreocupado, Roger também parecia estar mais pálido. Mas isso podia ser apenas um efeito de luz.

De mútuo acordo, voltaram para seu lugar. Os garçons já tinham tirado a mesa e Roger pediu para trazerem o carrinho de sobremesas. Com medo de que Roger se referisse a Adrian, Tanya disse a primeira coisa que lhe passou pela cabeça.

- Conhece Diana Biddell, também? - Conheço, sim. Costumávamos brincar juntos, quando crianças. Já ouviu falar do pequeno Lord

Fauntleroy? - Já - respondeu, confusa -, mas o que isso tem a ver com... - Bem, Diana era a pequena Lady Fauntleroy. Às vezes conseguia escapar de sua governanta e

ia até a minha casa. Meu Deus, isso devia ser o mesmo que ir a uma favela, para ela! - Vocês não são mais amigos? - Não. Faz muitos anos que não nos vemos mais. Eu fui para universidade, com uma bolsa de

estudos, e ela foi para uma dessas escolas caras. - Roger amarrotou o guardanapo. - Quando eles vão se casar?

- Não sei. Roger... gostaria de ir para casa... Estou com dor de cabeça. - Não tem que ir embora por causa daqueles dois - ele disse com aspereza. - Não é por causa deles. Minha dor de cabeça é real. Na mesma hora Roger pediu a conta. Depois, segurando o braço dela de leve, levou-a para a

saída. No caminho, passaram pela mesa de Adrian, que fez um movimento para se levantar. Tanya ficou surpresa e assustada com o olhar de profunda antipatia que Diana lhe lançou.

- Diana não gostou de nos ver juntos - murmurou, quando já , estavam no carro. - Pode ser que não ache certo uma babá freqüentar os mesmos lugares que ela. - Acho que não é isso, não. - Talvez ela esteja com ciúmes de Adrian, por sua causa. - Não diga isso. - Tanya virou-se com violência para ele. - Por que não? Você é bonita e Adrian é um homem... - Que está noivo de Diana. - Tem razão. Você sempre tem. Esqueça o que eu disse. Tanya concordou, mas continuou tensa, até que ele parou o carro em frente à casa de Adrian.

Roger ignorou seu comentário de que não precisava sair do carro, desceu e abriu a porta para ela. Depois, acompanhou-a até a porta da frente.

- Quer sair comigo de novo, Tanya? - Só se você não falar sobre... - Adrian? - ele terminou. – Dou-lhe minha palavra de honra que não vou falar. - Então, podemos nos encontrar de novo. Tanya entrou rapidamente e ficou parada no hall, esperando Roger ir embora. Depois, foi para o

jardim. Estava muito tensa para dormir e se dirigiu para seu lugar favorito, o laguinho. A lua se refletia na superfície da água e iluminava os lírios brancos, tornando-os cor de prata. Como aquele lugar era lindo! E tão cheio de paz! Se pelo menos sua vida continuasse a mesma! Por muito tempo, ela ficou parada ao lado da água, pensativa. Depois voltou para casa lentamente, imaginando que nunca conseguiria ter paz, se não saísse daquela casa.

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Só quando entrou no hall é que viu a luz brilhando por baixo da porta da biblioteca, e percebeu que Adrian já voltara. Com o coração batendo forte e tentando pisar de leve, correu para a escada. Mas, quando estava no primeiro degrau, a porta da biblioteca se abriu e ele a chamou.

Vagarosamente, Tanya se virou. Adrian estava na soleira da porta, com o ar bem-arrumado de sempre. No entanto, quando ele deu um passo para a frente, ela percebeu que seus cabelos estavam despenteados, como se tivesse passado os dedos por entre eles várias vezes. Parecia perturbado. Os músculos ao lado da boca estavam tensos, dando-lhe um ar mais agressivo.

- Entre aqui, por favor. Preciso falar com você. Nervosa, Tanya passou por ele e entrou na biblioteca. Adrian fechou a porta e se aproximou

dela, examinando-a em silêncio por um tempo tão longo que pareceu a ela interminável. Mas a moça agüentou firme e retribuiu seu olhar, decidida a não falar em primeiro lugar.

- Há quanto tempo você conhece Roger Poulton? - ele perguntou, finalmente. - Há uns quinze dias. - Saiu com ele antes? - Já me encontrei com Roger algumas vezes, quando eu estava com as crianças, mas hoje foi a

primeira vez que saí com ele sozinha. - Você se esqueceu de quem ele é? - Não. - Então, por que diabos saiu com ele? Sabe muito bem que ele é o meu concorrente. Sua raiva era tanta que por um momento Tanya se sentiu feliz. Mas logo se lembrou que ele

estava zangado porque Roger era se inimigo político, o que não tinha nada a ver com seus sentimentos por ela.

- E por que eu não deveria sair com ele? Estou vivendo aqui como babá da sua irmã e você não tem nada a ver com o que eu faço no meu tempo livre.

- Você já foi minha esposa - ele disse de modo breve. - Legalmente, ainda é. Se isso não significa nada para você, então...

- Para mim? - Tanya exclamou, surpresa e zangada. - Eu vim para a Inglaterra atrás de você. Você é que não me quis e me mandou embora.

- Eu não a mandei embora. - Não está sendo honesto. Se não fosse pela sua sagrada eleição, teria me mandado embora,

imediatamente. Mas, em vez disso, você me implorou para ficar. Nunca parou para pensar em como eu me sentia. Tudo que lhe importava era sua preciosa carreira.

- Nunca pensei que ficar na minha casa fosse tão duro para você, Tanya - ele disse baixinho. - Então você é um tolo. Desesperada, Tanya correu para a porta, sabendo que se ficasse ali mais um minuto ia dizer

coisas de que se arrependeria mais tarde. Mas quando seus dedos tocaram a maçaneta, Adrian a segurou pelos ombros, fazendo com que se voltasse de frente para ele.

- Não pode sair assim. Eu não quis magoá-la. Nunca quis. Mas nenhum de nós tem culpa do que aconteceu.

- Eu não o culpo pelo passado. - As lágrimas escorriam pelo rosto de Tanya. - Só pelo modo como você está se comportando, agora. Eu realmente quero sair da sua vida e reconstruir a minha.

Não conseguiu continuar. As lágrimas corriam mais rápido, e ela tampou os olhos com as mãos. Adrian se descontrolou com esse gesto infantil e a abraçou, acariciando seus cabelos.

- Não chore, Tanya. Por favor, não chore. A voz dele era a mesma voz delicada de que ela se lembrava em seus sonhos. A mesma voz

que sussurrava palavras de amor, quando se deitavam juntos, e que lhe tinha jurado nunca beijar, nunca tocar, nunca pertencer a mais ninguém. Tanya sabia que devia se afastar dele, que ficar ali era se aquecer num fogo que podia destruir sua alma. Mas não tinha forças para tanto. Estava sendo abraçada pelo homem que amava e esta seria uma nova e preciosa lembrança.

- Gostaria que as coisas tivessem sido diferentes - Adrian disse, com voz rouca. - Tentei esquecer o passado... era a única maneira de continuar vivendo... mas, desde que você voltou...

Tremendo, começou a beijá-la de leve, roçando os lábios em seu rosto. Lábios úmidos, quentes, que quando tocaram os dela pareceram se derreter e fundir com eles. Não havia nada de estranho nos braços que a seguravam, no cheiro dele ou na voz que repetia seu nome, entre beijos. Os anos de separação desapareceram, como se nunca tivessem existido, e um respondeu ao outro com uma paixão cada vez maior.

As mãos dele desceram pelas costas de Tanya, aproximando-a mais de seu corpo rijo. - Tanya... como eu a desejo. Eu quero você agora, Tanya, agora... Essas palavras a emocionaram e ela colocou as mãos no pescoço dele, emaranhando os dedos

no sedoso cabelo escuro. Seus lábios se abriram e a língua de Adrian, doce e macia, explorou sua

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boca, tornando-se mais ousada quando percebeu que ela estava enlouquecida pela mesma paixão. Era como se tivessem feito amor todas as noites, tão grande e instantânea era a necessidade mútua. A boca de Adrian sabia como excitá-la, suas mãos sabiam acariciar e, apesar dela tentar se reprimir, um langor sensual invadiu seu corpo.

Desde o momento em que Adrian se despedira dela no aeroporto, oito anos atrás, Tanya nunca mais permitiu que outro homem a tocasse. Noite após noite, deitara-se em sua cama, lembrando-se do breve paraíso que fora seu casamento, sabendo que continuaria sozinha enquanto não se reunisse com o homem que amava. À medida que os anos passaram, começou a imaginar quais seriam suas reações quando finalmente o encontrasse de novo. Sentia medo de que o desejo, adormecido por tanto tempo, custasse para despertar.

Mas no momento em que sentiu o corpo adorado contra o seu, ela o desejou com loucura, sentindo que sem Adrian ela era um relógio sem ponteiros, um lago sem água, um mar sem praia!

De repente Tanya caiu na realidade: Adrian pertencia a outra mulher e deixá-lo continuar a abraçá-la era o mesmo que roubar o que pertencia a Diana. A lembrança de ter sido rejeitada por ele acabou com seu desejo, dando-lhe forças para afastá-lo.

- Como pode me tratar assim - Tanya gritou. - Não sou uma boneca, que você pode pegar e beijar sempre que sentir vontade. Sou uma mulher, Adrian, e quero amor... não apenas desejo. Se está tão desesperado para satisfazer seu desejo, procure Diana.

- Tanya, eu... Sem esperar para ouvir o que ele queria dizer, Tanya fugiu dali. Só quando chegou ao topo da

escada é que parou e olhou para trás. Mas, se esperava que Adrian a seguisse, ficou desapontada, pois o hall estava escuro e a porta da biblioteca fechada. Ele tinha tomado suas palavras ao pé da letra. E era ótimo que não pudesse ouvir o que o coração de Tanya gritava, porque era assim que as coisas tinham que ser, e fingir que a realidade poderia ser diferente era uma tolice.

CAPÍTULO V

Adrian ficou onde estava, completamente apático, por muito tempo depois que Tanya se foi. Mas, gradualmente, suas emoções voltaram. Não o desejo que tinha feito com que perdesse o autocontrole, mas uma profunda vergonha por ter agido como agiu.

Não era de admirar que Tanya tivesse se zangado. Mas a raiva dela não era nada, comparada com a que sentia por si mesmo. Pensou em ir atrás dela e pedir desculpas, mas depois resolveu não fazer isso. Ambos estavam ainda muito emocionados para ele se arriscar a despertar de novo a paixão que os consumira de um modo tão perigoso.

Adrian deu a volta na escrivaninha e se sentou na cadeira. Pela primeira vez, em muitos anos, tinha se descontrolado e não estava nem um pouco contente com isso. Mas havia muitas outras coisas de que não gostava, naquela situação. E esse é que era o "x" da questão. Afinal, era do seu próprio comportamento que não estava gostando.

No entanto, quando pediu a Tanya que ficasse ali, não vira nada de errado nesse pedido. Só agora, encarando a situação pelo lado dela, é que percebeu que tinha sido o máximo da crueldade querer que uma mulher que o amava, que cruzara meia Europa atrás dele, ficasse em sua casa, sabendo que ele ia se casar com outra.

Será que era tão ambicioso assim, a ponto de pisar nos sentimentos dos outros? Nunca tinha feito isso, antes. O rapaz que se casou com Tanya jamais poria os negócios na frente dos sentimentos pessoais, da satisfação pessoal. Mas depois que saiu de Rovnia, Adrian nunca mais conseguiu se sentir satisfeito. Só nos últimos seis meses é que experimentara um pouco de paz. Uma paz que a chegada de Tanya tinha destruído, e que ele sabia que não recuperaria, mesmo depois que ela se fosse.

Por mais desagradável que fosse, essa era a verdade e precisava aprender a encará-la de frente. Mesmo depois que Tanya partisse, não conseguiria esquecê-la. Soltando uma exclamação de raiva, ele empurrou a cadeira para trás e caminhou até a janela. O luar prateado banhava o jardim, e a beleza do cenário era tão grande que ajudou a diminuir um pouco a dor que seus pensamentos lhe causavam. Se pelo menos pudesse fazer o tempo voltar! Mas voltar até onde? Para a época em que Tanya chegou à Inglaterra, ou para o dia em que a conhecera? Será que gostaria que nunca tivessem se encontrado? Lembrando-se da meiguice dela, do corpo jovem, quente e dócil, que respondeu de um modo tão ardente a suas carícias, Adrian soube qual era a resposta para essa pergunta.

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Com o punho fechado, deu um murro na janela. O barulho espantou os pássaros que faziam ninho nas trepadeiras que cobriam as paredes externas da casa, e eles piaram baixinho, quase que com desaprovação. Com um suspiro, Adrian se afastou dali. O fato de não estar em paz não lhe dava o direito de perturbar a paz de outras criaturas. Refletindo sobre as ironias da vida, apagou a luz e foi para seu quarto.

Mas lá também não conseguiu sossego, pois era fácil imaginar Tanya a poucos metros dele, dormindo com os cabelos soltos e espalhados em torno de seu rosto, como uma teia dourada. Como gostaria de envolver seu corpo neles, aprisionando-se fisicamente, como um dia aprisionara Tanya. Naquela época, ambos tinham sido prisioneiros de seu amor, sem imaginar que ainda poderiam querer escapar desse momento.

Na verdade, Adrian sabia que Tanya nunca quisera isso, e que tinha continuado a amá-lo, através dos longos anos de sua separação. Era esse conhecimento que fazia com que se odiasse, por ter decepcionado a esposa.

No entanto, naquela noite, ele sentira ciúmes de Tanya, em vez de ficar contente por ela, estar fazendo novos amigos. Como podia sentir ciúmes de uma mulher, quando estava comprometido com outra? Será que era um homem tão possessivo, que queria sempre conservar o que já tinha sido seu? Esse era um pensamento inquietante, mas que precisava ser encarado. Tentou analisar Tanya objetivamente, mas não conseguiu. A garota do passado e a do presente se misturavam, formando uma só imagem.

Inquieto, Adrian acendeu o abajur. Era melhor ler do que tentar dormir, sem ter sono, ou ficar acordado na escuridão, pensando em coisas que era melhor esquecer. Ia enfrentar uma luta política dura e precisava poupar todas as suas energias. Mais tarde, quando a vitória fosse sua, teria tempo de pensar em sua vida particular. Vitória... Que palavra vazia! Com outro suspiro, ele se concentrou firmemente no livro que tinha à sua frente.

Tanya e Adrian fizeram o possível para se evitar, durante o resto da semana. Ela continuou a tomar suas refeições com as crianças, e só ia até a sala de jantar para o almoço, aos domingos. Nenhuma referência a Roger foi feita, e esse assunto só foi mencionado quando Tanya se encontrou com Diana, uma tarde.

- Já faz tempo que estou querendo falar com você - Diana disse, atravessando o hall na direção de Tanya. - É sobre Roger Poulton.

- Não quero falar sobre isso - Tanya respondeu. - Ele é meu amigo e pretendo continuar a vê-lo. E não acredito que Roger vá prejudicar Adrian.

- É claro que ele não vai fazer isso. Mas não é em Adrian que estou pensando. É em você. - Em mim? - É. Roger pode magoá-la. Ele só tem uma preocupação na vida: atingir seu objetivo o mais

rápido que puder. Não está interessado em nada. - Como Adrian. - Roger não é como Adrian. Existe uma enorme diferença entre eles. Se não consegue enxergar

isso, então é melhor pararmos por aqui.Batendo os saltos dos sapatos com força no chão de madeira, Diana entrou na biblioteca e

bateu a porta, deixando Tanya sozinha no hall. Confusa, a moça foi para seu quarto. Diana não tinha nenhum motivo para gostar dela e muito menos para se importar com o fato de Roger feri-la ou não. Então, por que estava tão preocupada com a amizade deles?

Essa pergunta a perseguiu o resto da tarde, e só quando foi procurar as crianças, na hora do chá, é que conseguiu afastá-la de sua cabeça.

- Pensei que lhe tivesse dito para tirar o resto do dia de folga - Betty falou, quando Tanya entrou no quarto dos pequenos.

- Gosto de ficar com as crianças. Desse modo, tenho o que fazer. - Também fico aborrecida, se não faço nada. - Você devia estar cuidando da sua própria casa. - Tanya tapou a boca com a mão, aborrecida

com sua franqueza. - Desculpe, não devia ter dito isso. - É verdade, você tem razão. - Mas você não gosta de cuidar de casa. - Por que diz isso? Só por que não cuido desta casa? Mamãe teria um ataque, se eu fizesse

qualquer coisa por aqui. - Então mude daqui. Monte sua própria casa. - É o que Dick diz. Mas já me acomodei aqui e deixo as coisas correrem. Você devia ficar me

amolando para fazer isso. Aí, que sabe... - Não gosto da idéia de ficar amolando você.

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- Por que não? Você é a coisa mais próxima de uma irmã que tenho e... - Betty parou ao ver os olhos de Tanya se encherem lágrimas. - Oh, Deus, não quis fazer você chorar.

- Não estou chorando de tristeza. - Tanya procurou o lenço e enxugou os olhos. - Essa é a coisa mais bonita que alguém já me disse, desde que cheguei à Inglaterra.

Betty abraçou Tanya, olhando rapidamente para Emma e Tim, que observavam a cena de olhos arregalados.

- Vamos até meu quarto um pouco, Tanya. As crianças podem ficar brincando sozinhas. Tanya seguiu Betty e se sentou numa poltrona, enquanto a outra se encostava na cama,

observando-a. - Você não estava chorando por causa do que eu disse. Ficou aborrecida com alguma coisa, não

foi? - De certo modo, sim. É tolice minha, mas...- Tem alguma coisa a ver com Roger Poulton? Tanya concordou, com um gesto de cabeça. - Todo mundo diz que é errado eu continuar a vê-lo. - Eu não disse isso. - Mas concorda com eles, não? - Não. Você nunca contaria a Roger alguma coisa que pudesse prejudicar Adrian, nem Roger

esperaria isso de você. Pessoalmente, acho que deve sair com ele todas as noites, se é isso que quer. Não deixe minha família dominá-la, Tanya. Eles são bem capazes de fazer isso, se você deixar.

- Eu me sinto desleal - Tanya confessou. - Se Adrian não tivesse... perdido a calma, quando falou comigo sobre Roger, eu teria concordado em fazer tudo o que ele me pedisse.

- Graças a Deus você não concordou. Ele está muito acostumado a conseguir tudo o que quer. Vocês estão casados só por causa de uma questão legal. Não deve se esquecer disso. - Vendo a surpresa surgir nos olhos cor de violeta, Betty encolheu os ombros. - Não estou sendo uma irmã desleal, só estou tentando ser honesta...

- Você é muito boa. - Numa rara demonstração de emoção, Tanya se levantou de um pulo e beijou o rosto da cunhada. Depois se afastou rapidamente, quando a viu corar. - Agora vou dar banho nas crianças, para que possa ler uma história para eles.

- Antes, vai prometer ir ao cinema comigo e com Dick, esta noite. Não quero mais vê-la triste, andando pelos cantos da casa.

Tanya concordou e engoliu o nó que se formara em sua garganta. Desde sua briga com Adrian, seus nervos estavam à flor da pele, e qualquer emoção a descontrolava.

- Gostaria muito - respondeu com voz rouca. - Ajuda a melhorar o meu inglês. Estava em seu quarto se trocando, quando Roger telefonou. Não querendo ir até o hall, para

não ser vista por Adrian, foi atender no quarto de Betty. - Você parece estar a quilômetros de distância - Roger comentou, quando ela começou a falar. - É porque estou falando de uma das extensões. - Então, vou ser rápido. Quer ir jantar com a minha família, manhã à noite? - Não conheço a sua família. - Tanya entrou em pânico. – E ela é tão grande! Vou me sentir

embaraçada. - Não vai se sentir assim, quando os conhecer. - Roger riu. - Eu lhe garanto. - Então, vou gostar muito de ir. Não venha me pegar. Quero andar um pouco. Roger ficou em silêncio e ela percebeu que ele não estava acreditando. - Está certo - o rapaz murmurou. - Mas se estiver chovendo e quiser uma carona, não deixe de

me chamar. Felizmente o tempo estava bom, na noite seguinte, e Tanya caminhou contente até a vila.

Encontrou Roger logo na entrada, esperando por ela. Estava um pouco excitada, quando entrou na casa dele, construída no meio de um enorme jardim, que parecia estar cheio de verduras e legumes.

- Essa é a resposta que minha mãe dá à inflação. Roger sorriu, quando a viu olhar uma enorme couve-flor. Depois, empurrou-a através de um hall

estreito, para dentro de uma sala de jantar, que parecia estar abarrotada de gente. Eles logo se apresentaram como irmãs, irmãos e cunhados de Roger. A mãe dele sentou-se à cabeceira da mesa, servindo a todos com alegria.

- Quer mais um pouco de cozido, Tanya? - ela perguntou, colocando mais uma porção da deliciosa carne no prato da moça. - Parece estar precisando comer mais um pouco. Eles lhe dão bastante comida, lá na casa dos Chesterton?

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- Mais que o suficiente - Tanya garantiu. - Mas isto está mesmo delicioso. E eu sempre ouvi dizer que as comidas inglesas são ruins!

- Acho que comida em lata é mais gostosa que a fresca - berrou Brian, de doze anos de idade, o membro mais novo da família, que tinha nascido seis meses após a morte do pai. - Quando a gente mesmo faz a comida, o gosto é sempre diferente. Mas quando é enlatada, é sempre o mesmo

- A mesma porcaria - Roger disse, e ergueu as sobrancelhas fingindo desespero. - Já viu um garoto mais horroroso?

Tanya sorriu. - Tim e Emma são iguaizinhos. Gostam de comer as piores coisas que a gente possa imaginar. Todos riram e uma das irmãs de Roger começou a perguntar sobre as crianças e se ela gostava

do emprego. Tanya respondeu de um modo bem discreto e se sentiu aliviada, quando Roger as interrompeu para anunciar que ia fazer um comício em Tipton e levar Tanya com ele.

- Você e a sua eleição - a mãe dele comentou. - Tanya ia se divertir muito mais se ficasse aqui conosco, fofocando. Ela vai se aborrecer, ouvindo seu discurso.

Tanya ficou surpresa, vendo a sra. Poulton falar assim. A mãe de Adrian tratava a eleição como se fosse uma coisa sagrada. Mas toda a família Poulton era diferente dos Chesterton.

- Vou gostar muito de ir com Roger - garantiu. - Nunca o ouvi falar. Foi uma risada só, em torno da mesa. - Você o tirou do sério, então - comentou a irmã mais nova de Roger. - Nós não conseguimos

fazer com que ele pare de falar. Roger sorria, quando se levantou, e Tanya o seguiu até o carro. Depois, acenou para a família,

que tinha se reunido no jardim, para vê-los sair. - Você tem uma família maravilhosa - comentou, quando se afastaram. - Eles não são maus - Roger respondeu, e Tanya se espantou, mais uma vez, com a frieza dos

ingleses. Era óbvio que existia um afeto muito profundo entre os Poulton; no entanto, quando alguém elogiava um deles, só recebia uma resposta casual.

Tanya suspirou e imaginou se se acostumaria a viver na Inglaterra. Pensou nisso de novo, mais tarde, quando estava ouvindo Roger discursar. Algumas pessoas da

audiência não concordavam com ele e o interrompiam continuamente, mas os outros não ligavam, e quando o comício acabou, os dois partidos se juntaram e foram tomar cerveja no bar mais próximo.

- Isso nunca aconteceria no meu país - ela comentou. - As pessoas que fazem parte de partidos políticos diferentes não se misturam, de jeito nenhum.

- As coisas estão ficando assim aqui também - Roger disse. - Mas só nas cidades grandes. - Se você vencer a eleição, vai ter que morar em uma cidade grande. - Quer que eu vença? - ele perguntou sorrindo. - Você merece vencer. Seu discurso foi excelente. Naquela noite, deitada em sua cama, ela pensou em Roger e sua família e percebeu que, por

mais que gostasse deles, não queria que o rapaz vencesse. A poucos passos dali, separado dela por quatro paredes, mas muito mais distante mentalmente, estava o único homem que queria que vencesse: Adrian, seu marido.

Será que ele ainda dormia com um braço sobre a cabeça? Durante a breve semana que durou seu casamento, Adrian sempre colocara o outro braço sobre o corpo dela, como se tivesse medo de que o abandonasse, enquanto dormia. No entanto, pensou com amargura, ele é que a tinha deixado, e quando ela veio atrás dele, não a quis mais.

Não, não era verdade. Adrian ainda a queria. Demonstrou isso quando a beijou. Mas querer não era amar e Tanya não estava arrependida por ter se recusado a ele. Só lamentava ter correspondido ao seu beijo, pois isso tinha acordado todos os seus desejos adormecidos, que agora queimavam sem parar, dentro dela. As carícias dele transformaram as brasas quase apagadas no fogo ardente da paixão. Não foi preciso mais do que um breve contato, para que se visse agora quase implorando por seus beijos, querendo que ele acalmasse o profundo desejo que torturava seu corpo.

Meu amor!, sussurrou silenciosamente. Meu único e verdadeiro amor!

CAPÍTULO VI

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Na tarde do dia seguinte, Roger voltou para casa cansado e desanimado. Tinha feito um comício numa parte da cidade que apoiava Adrian Chesterton e quase tudo que disse foi contestado. Se Tanya estivesse lá, teria visto que os políticos da Inglaterra não eram tão diferentes assim dos de Rovnia.

Jogando seu chapéu no suporte que havia na parede, caminhou para a sala de estar, mas parou quando ouviu vozes lá dentro. Reconheceu uma delas como sendo de sua mãe, mas a outra era desconhecida. Ele endireitou a gravata, abriu a porta e parou subitamente, quando viu a garota esbelta, de cabelos escuros, que estava sentada no sofá. Em nome dos céus, o que Diana Biddell estava fazendo ali?

- Boa tarde - ele disse com frieza. - Oi, Roger. - A voz dela era calma. - Como vai? - Bem, obrigado. E o tempo também está muito bom. Por um momento, Diana deu a impressão de estar desconcertada. A sra. Poulton se levantou. - Vou deixar vocês conversando um pouco, enquanto acabo de passar umas peças de roupa. - Não precisa sair - Roger disse de modo breve, passando os olhos dos sapatos de Gucci e

vestido de St. Laurent, de Diana, para o avental de algodão da mãe. - Seja o que for que a srta. Biddell queira me dizer, pode ser dito na sua frente.

- Pode ser. - A sra. Poulton caminhou para a porta. - Mas preciso mesmo passar algumas roupas. Roger apertou os lábios e ficou em silêncio, até que a porta se fechasse. - Muito bem - disse. - Faz muito tempo que você não nos honra com a sua visita. Desde quando

você tinha uns quinze anos, não? Antes que seus preconceitos começassem a se manifestar. - O fato de eu não vir mais aqui não tem nada a ver com preconceito. Eu estava fora,

terminando meus estudos, e você estava na universidade. Não podíamos mesmo nos ver muito. - E as férias? - Roger perguntou, com voz sem expressão. - Poderia ter vindo me ver, se

quisesse. Mas não a culpo por não ter vindo. Os plebeus Poulton nunca estiveram na lista de convidados de seu pai.

- Prefiro não discutir o meu pai. - É um prazer. - Ele enfiou as mãos nos bolsos. - Por que veio até aqui? Diana hesitou e Roger percebeu que ela entrelaçava os dedos, com nervosismo. - Eu... foi por causa de Tanya. - Parou, como se estivesse esperando que ele dissesse alguma

coisa, mas Roger continuou a olhá-la, implacável. - Você não está tornando as coisas fáceis para mim, não é?

- Já teve gente demais tornando as coisas fáceis para você. Continue o que estava dizendo. - Como já lhe disse... é sobre Tanya. Não sei o que espera ganhar, saindo com ela. Por um momento, Roger ficou mudo. Depois respondeu, zangado: - E o que um homem espera ganhar, saindo com uma linda mulher? Não sou da sua classe

social, srta. Biddell, mas, fisicamente, não existe diferença entre o esnobe do seu noivo e eu. - Está me interpretando mal, de propósito - Diana respondeu com frieza. - Sabe muito bem que

Tanya está vivendo na casa de Adrian e não pode evitar de ser envolvida pelos acontecimentos. E como ele é o seu rival, nessa eleição, pensei que a implicação disso fosse evidente.

- E essa implicação é que estou saindo com Tanya por motivos escusos, não é? - Roger falou com suavidade, mas qualquer um que o conhecesse bem teria sido avisado de seu nervosismo, pela linha branca que apareceu em torno de sua boca. - Não tenho dúvidas de que é desse modo que as pessoas do seu círculo agiriam, mas nós, trabalhadores, temos um pouco mais de auto-respeito.

- Precisa falar sempre como um estudante marxista? - Diana explodiu. - Não pode ser um pouco educado comigo, enquanto estou em sua casa?

- Posso dizer o mesmo para você. Que negócio é esse de vir até aqui me insultar? Diana mordeu o lábio. - Sinto que pense assim. Esperava que pudesse convencer Tanya de que ela está se

prejudicando. Se fosse depois da eleição, não teria importância. - Não tem importância agora. Você está se comportando como Tanya tivesse conhecimento de

algum segredo de Estado. Está tão cega pelos seus preconceitos que não é capaz de enxergar o ponto de vista de ninguém mais.

Zangada, ela se levantou e passou por ele, os olhos bem aberto sem piscar, como se o mais leve movimento das pálpebras pudesse causar uma torrente de lágrimas. Roger murmurou qualquer coisa e levantou a mão. Seus dedos roçaram o ombro da garota, que deu um pulo para trás, como se a mão dele estivesse em brasa.

- Está com medo de que eu a suje? - zombou.

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- Precisa interpretar mal tudo que falo e faço? - ela sussurrou. - Não o considero um inimigo, Roger. Nunca considerei.

- Mas também não me considera um amigo. - Eu pensava que você fosse meu amigo, antes. - Quando éramos crianças. - Impulsivamente, ele segurou-lhe a cabeça e colocou seus lábios

nos dela. Por um segundo ela ficou imóvel, surpresa demais para resistir. Depois afastou-se dele e olhou-

o zangada. - Por que fez isso? - Para lembrar a você o quanto sou suscetível a mulheres bonitas. - Sua voz era zombeteira. -

Não vai me esbofetear? - Anda lendo muitas novelas baratas. O que não me surpreende nem um pouco. Antes que Roger pudesse pensar numa resposta adequada, Diana se foi. Ele passou a mão por

entre os cabelos, depois foi até a cozinha, onde sua mãe ainda estava passando roupa. - Diana já foi? - E quando ele acenou que sim: - Pena. Eu ia fazer um pouco de chá. Não tem

importância. Vou fazer para nós. Coloque a chaleira no fogo, Roger. - Duvido que ela aceitasse tomar chá a esta hora do dia - Roger disse, enquanto fazia o que a

mãe tinha pedido. - Sempre toma chá às cinco, exatamente. - Tenho certeza de que ela gostaria de ter tomado chá às cinco e meia. - A sra. Poulton usou o

mesmo tom de voz que usaria para falar com Brian. - Ela é uma boa menina e você enxergaria isso, se não implicasse tanto com o pai dela. Não é culpa de Diana que ele seja um velho tolo e rico.

- Mas é culpa dela, se é uma moça rica e tola. Não faz nada na vida! - Importa-se se pararmos de conversar? Tenho um comício esta noite e preciso pôr a camisa

que a senhora ainda está passando. A sra. Poulton acabou de passar a camisa e entregou-a para o filho. - Quando estiver vestindo-a em frente ao espelho, dê uma boa olhada em você mesmo - disse. -

Pode ser que não goste do que vai ver. - Com isso, ela saiu da cozinha, deixando-o a olhar para ela, surpreso e confuso.

Roger não contou a Tanya que Diana tinha ido vê-lo, mas começou a se sentir constrangido. Chegou a imaginar que Tanya também achava que ele estava saindo com ela por motivos escusos. Para esclarecer logo tudo, resolveu falar abertamente com ela.

A moça o ouviu em silêncio, observando-o com os lindos olhos esverdeados tão cheios de inocência, que lembravam os de uma criança. Mas não havia nada de criança nela. Havia nela uma maturidade tão grande, que às vezes o surpreendia. Era sempre capaz de enxergar o "X" do problema, sem sentimentalismos. A seu modo, Tanya já o tinha ajudado muito, analisando suas idéias. Era estranho que conseguisse falar tão abertamente com ela. Embora Diana pensasse que estava saindo com Tanya para descobrir o que Adrian estava fazendo, ele nunca chegou a pensar que Tanya pudesse estar fazendo o mesmo como espiã de Adrian.

- Nossa amizade está causando muito falatório - Tanya falou, interrompendo os pensamentos dele. - Mas o que me importa é a minha consciência, não a dos outros.

- Mas os outros podem tornar as coisas difíceis para você. - Roger estava sério. - Com você como meu amigo, passo encarar as dificuldades. - Você fala como se eu fosse seu único amigo. - Olhou-a com curiosidade. - E os Chesterton?

Você veio diretamente de Rovnia para cá, não veio? Já devia conhecê-los. Fazia tempo que ele não mostrava curiosidade sobre sua vida em Park Gates, a casa de Adrian,

mas Tanya estava preparada para responder a suas perguntas. - Betty deixou seu nome com uma das agências de refugiados - falou com firmeza -, e eu gostei

da idéia de trabalhar no campo, enquanto resolvia o que fazer da minha vida. - Não vai passar muito tempo sendo babá dos filhos dos outros, não - ele disse com certeza. -

Logo vai se casar e ter os seus filhos. - Não vou me casar de novo. - De novo? Já foi casada antes? Ela se recuperou rapidamente do choque que teve, quando percebeu o que tinha dito e

respondeu: - Foi só... como se diz... modo de falar. - Mas se nunca foi casada - ele sorria -, por que é tão contra o casamento? - Já vi muitos casamentos infelizes. - Vai mudar de idéia, quando encontrar o homem certo. - Está falando como sua mãe. - Tanya riu. - Não me diga que ela teve a mesma conversa com você.

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- Ela só estava tentando me fazer ver que homem maravilhoso você é. - Roger estava tão embaraçado que Tanya riu de novo. - Não se preocupe com isso. Consegui convencê-la de que somos apenas amigos.

Ele ficou em silêncio por um bom tempo, antes de falar. - Deve me achar um sujeito estranho. Você é linda e desejável e eu ainda não tentei fazer amor

com você. Não é que eu não queira. Só não quero estragar o que temos e acho que... que a promiscuidade pode... Oh, droga, estou falando como alguém que saiu da ar de Noé.

- Está falando como um homem sincero e charmoso - a garota comentou com sinceridade. - Para mim, ter a sua amizade é muito mais importante do que ter os seus beijos.

- Um dia, vai ter ambos de um homem. Amizade e amor. - E um dia você os terá de uma mulher. - Não. - Foi positivo. - Tenho anos de trabalho na minha frente. Se não vencer esta eleição, vou

lutar por outra coisa. Vou estar muito ocupado, para pensar em casamento. Tanya se lembrou disso, quando vigiava as crianças que brincavam no jardim, no dia seguinte.

Não era natural que alguém tão cheio de vida como Roger se contentasse em levar a vida de um solteirão. Por instinto, ela sabia que ele estava ou estivera apaixonado por alguém. Tão apaixonado, que estava amargurado demais para pensar em outro relacionamento desse tipo.

Seus olhos percorreram o gramado que se estendia até a casa. A porta da frente estava aberta e Tanya viu Adrian sair e caminhar para seu carro. Ele estava longe demais para ver que ela o observava, mas desviou os olhos assim mesmo. Depois, chamando-se de tola, continuou a olhar para ele. Como era alto e distinto! Mesmo a essa distância, não se podia deixar de ver sua aparência de homem orgulhoso e indiferente. Mas era uma indiferença superficial. No fundo, ele era bom e gentil. E apaixonado também. Apesar de seu ar sério, era um amante excitante e inventivo.

O que teria acontecido, se tivesse cedido, naquela noite? Será que ele teria terminado seu noivado com Diana, ou depois que tudo tivesse passado, teria se odiado por deixar a paixão tomar conta da razão? Tanya nunca saberia a resposta a isso e, a menos que quisesse que a imagem dele a acompanhasse pelo resto da vida, precisava parar de fazer essas perguntas.

Uma bola enorme caiu em seu colo e ela deu um pulo, assustada, rindo quando Tim se jogou em cima dela.

- Venha brincar com a gente, Tanya - ele gritou feliz. Contente por ter outros pensamentos ocupando sua cabeça, Tanya concordou e se levantou de

um salto.

Dois dias mais tarde, ela foi visitar a sra. Poulton. Betty e o marido levaram as crianças para passar o dia à beira-mar. Eles a convidaram para ir junto, mas Tanya decidiu que seria melhor o casal sair sozinho com os filhos. Podia até ser que Betty criasse coragem e resolvesse montar sua própria casa, em vez de morar na da mãe.

Seu dia foi passado alegremente, ajudando a sra. Poulton a engarrafar quase cem litros de geléia. Isso fez com que se lembrasse de outros dias felizes, quando ajudava a mãe a fazer o mesmo. Mas não disse nada, pois sabia que se fizesse isso, ia chorar. De vez em quando a sra. Poulton olhava com atenção o rosto de Tanya e imaginava o porquê das enormes olheiras dela, mas era muito discreta para fazer qualquer comentário a respeito.

Só quando estavam sentadas, descansando um pouco, foi que a mulher falou sobre o filho e a amizade de Tanya por ele.

- Você tem sido uma boa influência para ele, Tanya. Gostaria que vocês se casassem. - Nós não nos amamos. Somos bons amigos, apenas. - É pena, você seria um encanto de nora. - Tenho certeza de que ele vai lhe arrumar uma logo. - Meu filho sempre teve muitas mulheres atrás dele, mas nenhuma delas fez com que o que

Roger tem de melhor se manifestasse... como você fez. Com Diana, por exemplo, ele parece um urso ferido.

Tanya estava surpresa. - Não sabia que eles ainda se viam. - E não se vêem. Pelo menos, não com freqüência. Costumavam ser como unha e carne, quando

pequenos. Adrian Chesterton, também. Agora, não são nem mesmo amigos. - É sempre assim na Inglaterra? - É assim em toda parte do mundo. Até mesmo maridos e esposas podem se afastar um do

outro, que dirá dos amigos.

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Até mesmo maridos e esposas... Tanya achou bom a sra. Poulton não saber o que significavam, para ela, aquelas palavras ditas de um modo tão casual. Algum dia ainda lhe contaria sobre Adrian mas no momento não tinha coragem.

- Você vê sempre Diana? - a sra. Poulton perguntou. - Não. O sr. Chesterton fica muito tempo fora de casa e... e Diana está sempre com ele. - Eles formam um casal muito unido? - Não, pelos padrões de Rovnia. Os ingleses são muito fechados. - Eu não diria isso - a sra. Poulton começou a responder, mas foi interrompida por Brian, que

entrou correndo e pedindo chá. Logo o resto da família chegou e eles se sentaram em torno de uma mesa onde havia presunto, salada mista e vários potes de geléia recém-feita. Roger foi o último a entrar e sentou-se ao lado de Tanya.

- O que acha do nosso jantar plebeu, comparado com o dos Chesterton? - Não creio que possa fazer uma comparação - ela respondeu vagarosamente. - A gente gosta

das coisas com que está acostumada. Na minha terra, por exemplo, temos um almoço com muitos pratos, que levamos muitas horas para comer... duas, pelo menos. Depois, à noite, temos carne fria e salada, ou queijo, vinho e café. Mas já estou me acostumando com o modo de vocês comerem... e estou gostando.

Todos riram e a sra. Poulton olhou para Roger com ar caçoísta. - Aí está, filho. A seu modo, Tanya está dizendo exatamente o que eu disse, aquele dia em que

Diana esteve aqui. Não podemos separar os tipos de pessoas, como você quer. Os costumes e as tradições, sejam do campo ou das classes superiores, estão caindo mais rápido do que você pensa.

- O que é uma boa coisa - disse Louise, a irmã mais nova de Roger. Tanya estava ouvindo distraída, preocupada com o fato de Diana ter estado ali há poucos dias.

Era estranho Roger não ter mencionado isso. A menos que Diana tivesse vindo por razões pessoais. Olhou para Roger e viu que ele a observava, como se soubesse o que ela estava pensando.

Mas antes que um deles pudesse falar, o telefone tocou. Marjorie, a filha mais velha da sra. Poulton, fora levada às pressas para o hospital para dar à luz, um mês antes do previsto. A novidade afastou qualquer outro pensamento de suas cabeças.

- Preciso ir para lá imediatamente - a sra. Poulton disse, com uma mão na garganta. - Não precisa ficar tão preocupada - Roger a acalmou. - Peter disse que ela está muito bem. - Mas eu quero ir para lá. - Quer que eu vá com a senhora? - Tanya perguntou. - Vou também - Louise declarou. - Não, não vai não. Você tem aulas à noite - a mãe disse com firmeza - e Betty precisa ficar com

Brian. Não gosto de deixá-lo em casa sozinho, à noite. Ainda falando, a sra. Poulton atravessou apressada o jardim, até o carro de Roger. Os três se

acomodaram e partiram para o hospital, que ficava numa cidadezinha chamada Little Compton. - Vai correr tudo bem - Tanya disse. - Deve ser um garotinho impaciente por nascer. Isso não acalmou a sra. Poulton nem um pouco. Sua ansiedade só diminuiu quando, às onze e

meia da noite, Peter Júnior nasceu. Tanya teve que fazer força para não chorar, quando olhou para os bebês dentro do berçário,

através do vidro. Era nessas horas que se sentia mais solitária e deslocada naquele país. - Vamos para casa. Você está precisando ir para a cama - Roger murmurou, pegando no braço

dela. - Por que as mulheres sempre choram, quando nasce um bebê? Tanya riu e o momento de tristeza evaporou. Roger manteve uma conversa leve, no caminho de

volta para casa. Mas depois que sua mãe desceu do carro e ficou sozinho com Tanya, ele se referiu a Diana.

- Você deve estar imaginando por que ela veio me ver, não? - Já tinha me esquecido disso - Tanya respondeu com sinceridade. - Foi por nossa causa? - Foi. - Adrian também não gostou de sairmos juntos. Ficou bravo comigo.- Quer que nos separemos, até a eleição acabar? - Não. - Ótimo. - Roger brecou o carro do lado de fora do Park Gates. - Gostaria que nos

apaixonássemos um pelo outro, Tanya. Seríamos um casal formidável. Tanya sabia que já era muito tarde, quando entrou na casa e, em silêncio, correu para seu

quarto. Estava quase lá, quando viu Adrian sair do dele. Tentou se esconder em um canto, mas ele a viu e caminhou até ela, alto e sério em um roupão azul-marinho.

- Está atrasada. Estávamos preocupados com você. - Quem?

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- Eu. - Fez uma pausa. - Você nunca ficou fora até tão tarde. Estava com Poulton? - Estava com Roger e a família dele. - Tanya acentuou a última parte da frase, mas a expressão

dele não se suavizou. - Uma das filhas da sra. Poulton teve um nenê e eu fui com ela ao hospital. - Ela tem várias filhas que podiam ter lhe feito companhia. - A sra. Poulton queria a minha companhia. - Olhou-o desafiante. - Acha isso tão difícil de

entender... que alguém me queira?O rosto dele se entristeceu. - Por que insiste em discutir comigo? Não acha que para mim também é difícil ter você aqui? - Não sei o que você pensa - respondeu, desanimada. - É um estranho para mim. Mas Tanya sabia que não estava sendo honesta. Ali, tão perto dele, não podia deixar de se

lembrar das emoções que Adrian tinha despertado nela. Sem perceber o que fazia, inclinou-se um pouco na direção dele, mas logo se endireitou, envergonhada de sua fraqueza. Adrian só viu o modo como Tanya se afastou dele.

- Gostaria que não me odiasse tanto - disse baixinho. - Eu não o odeio. - Afastou-se mais um pouco. - É tarde, Adrian. Vou para a cama. Ele caminhou com ela pelo corredor e parou na frente da porta de seu próprio quarto. - Já decidiu o que vai fazer, quando sair daqui? - Nos últimos anos, aprendi a dar um passo de cada vez. E sair daqui já vai ser um passo bem

grande. - Não há motivo para você ir embora - Adrian disse de repente. - Pode muito bem ficar. - Depois que você se casar com Diana? - O ciúme a levou a continuar: - Quer que eu seja a babá

de seus filhos? Adrian corou. - Que cafajeste você deve achar que eu sou. Não sei por que eu disse isso. Mas estava

pensando em não deixar que você fique sozinha. - Não vou ficar sozinha. - Que quer dizer? Tanya tinha respondido sem pensar, mas agora, zangada, decidiu magoá-lo. - Estou dizendo que não tenho a intenção de sofrer por você o resto da minha vida. Você não é

o único que vai se casar de novo e encontrar a felicidade. - Roger Poulton - ele murmurou. - Não levou muito tempo para se apaixonar por outro homem,

não é, Tanya? - Devia estar feliz por mim. Pelo menos, não vou ficar pesando na sua consciência. - Você nunca incomodou a minha consciência. O que aconteceu conosco estava fora do nosso

controle. Pode culpar o seu governo... ou você mesma, por não ter deixado seus pais e me seguido. Mas, honestamente, não acho que possa me culpar.

Tanya concordava com ele e sua zanga começou a desaparecer, sendo substituída por um enorme desânimo.

- Tem razão, Adrian. Acho melhor não conversarmos mais a esta hora da noite. Nós dois dizemos coisas das quais nos arrependemos mais tarde.

- Não me arrependo de ter me casado com você - ele continuou, com voz suave. - Só lamento não ter dado certo.

Rapidamente, Tanya saiu dali, desejando que ele não tivesse dito aquilo. Suas palavras a perseguiram a noite inteira, não a deixando dormir. Quando o dia amanheceu, Tanya se levantou e sentou ao lado da janela, onde ficou observando o céu se tornar cada vez mais claro, iluminando os campos verdes. Aquela era a terra de Adrian, onde seus filhos seriam criados e ele viveria ao lado de sua amada esposa.

Esse pensamento a encheu de uma dor profunda demais para causar lágrimas e, de olhos secos, continuou olhando pela janela.

CAPÍTULO VII

Por mais que tentasse, Roger achou impossível parar de pensar em Diana. A visita dela a sua casa tinha despertado lembranças adormecidas há muito tempo, de tempos felizes que partilharam, quando eram crianças. As idéias que a moça adquiriu, antes de ir para a universidade, é que o separaram dela. Era uma pena que, ao ficarem adultas, algumas pessoas assumissem outro código de comportamento, que nem mesmo era delas. Geralmente eram obrigadas a aceitar

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esse outro código... como era o caso de Diana. Não havia dúvida de que o pai dela, um velho mandão e avarento, exercia muita influência em sua vida.

Adrian continuou seu amigo por muito mais tempo e só as carreiras tão diferentes que escolheram é que acabaram afastando os dois. Com Diana não foi assim. Roger tinha a impressão que, quase da noite para o dia, ela havia deixado de ser a garotinha que implorava para brincar com ele e com Adrian, para se transformar na adolescente tímida e reservada. O que mais doía é que ela não fez nada para encontrá-lo, quando saiu de sua escola na Suíça. No entanto, Diana continuou a ver Adrian. Isso o magoava muito, mesmo.

Sem perceber, parou de andar e só quando o sol começou a queimar seu rosto, é que viu que tinha parado em frente a um atalho, que levava à propriedade de Lord Biddell. Balançando a cabeça, continuou a caminhar. Não era seu costume andar pelos bosques àquela hora do dia, mas de repente tinha sentido necessidade de ficar sozinho, de escapar do telefone que não parava de tocar.

Ao longe, viu a figura de uma mulher que se aproximava e, como não queria companhia, entrou numa parte mais fechada do bosque. Infelizmente, ela teve a mesma idéia e, como já não dava mais para fugir, Roger a cumprimentou, quando a moça passou por ele.

- Oi, Diana. Não vai falar comigo? - Já falamos o suficiente, na última vez em que nos vimos. - É sobre isso que queria falar com você. Eu lhe devo um pedido de desculpas. - Obrigada. - Tentou continuar, mas ele se colocou na sua frente. - Por que tanta pressa? - Apontou para um tronco caído, a poucos passos dali. - Sente-se um

pouco, para descansar. Em silêncio, Diana o seguiu até o tronco. - Não sei por que me descontrolei daquele modo com você - ele continuou abruptamente. -

Minha única desculpa é que sua visita me pegou de surpresa. - Você demonstrou isso muito bem. É claro que nunca lhe passou pela cabeça que não era fácil,

para mim, continuar a vê-lo, depois que cresci. - Sei que seu pai não teria aprovado, mas... - Meu pai não tem nada a ver com isso. - ela o interrompeu. - Era você. - Eu? Mas como? - Você é cinco anos mais velho do que eu. Isso não tinha importância, quando éramos crianças,

mas depois que você foi para a universidade, tudo mudou. - Mas não fez nenhuma diferença na sua amizade com Adrian. Você continuou a vê-lo. - Porque nossas famílias são amigas. - Olhou-o de lado, mas desviou rapidamente o rosto. -

Você sempre esteve tão ocupado com seu trabalho e a política, que me fez perceber o quanto eu era infantil.

Roger estava surpreso porque nunca tinha pensado nisso. - Não me importo se você acredita ou não - Diana continuou, interpretando mal o silêncio dele. -

Você sempre gostou de pensar o pior de mim. - Não vamos discutir de novo. Minha mãe já puxou minhas orelhas, por eu ter tratado você

daquele modo. - Ela sempre detestou maus modos. - Diana sorriu de leve. - E ainda detesta. Lembra-se daquela

vez em que eu fiz você subir na macieira do velho Jenkins, para apanhar maçãs? - Nunca vou me esquecer da surra que ela lhe deu, quando descobriu. - Mas você subia em árvores melhor do que eu. - Roger sorriu. – Tinha pernas mais longas. -

Olhou para as pernas de Diana, que corou e puxou mais a saia. - Não precisa escondê-las. Ainda são lindas. São a única parte de você que não mudou.

- Eu também não mudei, Roger. Você foi o único que mudou. - O garoto pobre se tornou alguém - ele comentou com amargura. - É isso que quer dizer, não

é? - Não é bem assim. Nunca senti pena de você, como você mesmo sentia. - Diana ouviu-o

prender a respiração e olhou-o com frieza. - Você sabe que tenho razão. É por isso que está sempre na defensiva comigo. Mas a única diferença que existe entre nós é que você se fez sozinho. Você é que ergueu as barreiras que nos separaram, Roger.

- Terminou? - Não. - Depois que começou, Diana parecia ter perdido todas as inibições. - Posso imaginá-lo,

daqui a dez anos, carregando uma pasta de ministro, mas ainda usando um terno velho e amarrotado, como prova de que não esqueceu suas origens humildes. Detesto as pessoas que acham que têm que ficar acenando com o passado delas na cara da gente.

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Roger abriu a boca para dizer alguma coisa, pensou melhor e fechou-a de novo, com os lábios bem apertados. O silêncio entre eles se prolongou e Roger chutou, de mau-humor, umas plantinhas ali perto.

- Por que estamos discutindo, Diana? Quando você era criança, costumávamos ser amigos. - Mas não sou sua inimiga, agora. - Estamos em lados diferentes. - Isso não me torna sua inimiga. - Pensa mesmo que estou saindo com Tanya, para ficar sabendo dos planos de Adrian? -

perguntou de repente. Desta vez foi Diana que ficou em silêncio por um longo tempo, antes de responder. - Parecia possível, há alguns dias. Mas agora não creio mais nisso - confessou. - Posso entender

por que gosta de sair com ela. Tanya é uma linda mulher. - E é muito compreensiva, também. - Está querendo dizer que eu não sou? - Não estou querendo dizer nada. - Virou-se para ela. - Por que sempre acha que estou atacando

você? - Porque sinto que está. - Talvez eu esteja me defendendo - Roger disse de repente, olhando-a fixamente. - Você é uma

mulher muito provocante. Diana ficou em pé de um pulo, mas ele se levantou ao mesmo tempo, ficando muito próximo

dela. - Está agindo como se estivesse com medo de mim - Roger disse com suavidade. - Por que eu teria medo de você? - Vou lhe mostrar - ele disse com voz rouca, puxando-a para seus braços. Seu beijo foi tremendamente apaixonado, como se o desejo que estava armazenado dentro

dele tivesse sido liberado pelos lábios da moça. Um toque que ele saboreou como um conhecedor, num restaurante de três estrelas. Vagarosamente, acariciou os ombros e as costas de Diana, pressionando seu corpo esbelto contra o dele e deslizando os lábios sobre os olhos, as faces e as têmporas da garota, inalando com prazer seu perfume.

- Diana - murmurou com voz trêmula. - Diana. Dócil, ela continuou em seus braços, sabendo que era inútil lutar com ele e sem forças para

tentar. Tentou ficar apática, mas seu corpo estava tremendamente consciente do dele, do peito rijo apertado contra seus seios, do rosto de pele áspera e quente encostado ao seu, do calor da respiração dele, misturando-se com a sua. Vagarosa e insidiosamente, o desejo por ele despertou em Diana, e a apatia que tomava conta de sua mente desapareceu, dando lugar a um sentimento intenso e estranho, que nunca tinha experimentado antes. Seus lábios moveram-se sob os de Roger, separando-se quando ele os mordeu de leve, cedendo depois inteiramente à pressão urgente da língua dele. Então, ela o empurrou com um grito. Roger resistiu ao movimento, mas Diana começou a bater no peito dele com os punhos e ele acabou por soltá-la, dando um passo para trás. No entanto, seus olhos continuaram presos: os dele, embaciados, como se ainda estivessem vendo a rendição da garota; os dela, cheios de desespero.

- Você não tinha o direito de fazer isso! - Diana murmurou. - E por que não? Um rato também pode olhar para uma rainha. - Não! - Diana gritou. - Por favor, Roger, não! Roger permaneceu onde estava, muito tempo depois que Diana fugiu dali, tentando, sem

sucesso, avaliar seus sentimentos. O que Diana tinha, que fazia com que se comportasse com tanta grosseria? Seria seu ar de "não-me-toque-não-me-rele", ou ela despertava nele algo mais profundo e primitivo? Ele não era assim, com as outras mulheres. Ao contrário, várias vezes fora acusado de ter muito auto-controle. Disso, Diana não poderia nunca acusá-lo. Desanimado, balançou a cabeça. Já estava devendo outro pedido de desculpas a ela. Mas quando pedisse desculpas de novo, não ia mais lhe dar motivos de queixa.

Naquela mesma noite, Tanya foi com Roger a um comício. Como sempre, ela sentou-se entre a audiência e depois lhe disse a impressão que seu discurso tinha lhe causado.

- Acho que falou melhor do que nunca - comentou, quando já estavam no carro. - Explicou muito melhor seu programa eleitoral e foi menos... menos...

- Agressivo, como diz minha família. Eles sempre me acusam disso. Mas não posso evitar. Sempre que as coisas me atingem profundamente, eu reajo de modo intenso.

- É melhor sentir as coisas profundamente, do que não sentir de jeito nenhum. Roger olhou-a de esguelha. - Está falando por experiência própria?

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- É melhor do que falar por ignorância. Ele riu. - Gostaria que todo mundo se lembrasse disso, inclusive eu. - Diminuiu a velocidade do carro. -

Que tal tomar alguma coisa? Estou começando a me sentir culpado. Cada vez que a convido para sair, eu a levo a um comício.

- Eu gosto de ouvi-lo falar, Roger. - O que acha de mim, comparado com Adrian? - Com o canto dos olhos, percebeu a reação de

susto dela e disse, rapidamente: - Esqueça esta pergunta. Eu não tinha nada que fazê-la. - Eu poderia responder a ela... só que nunca ouvi Adrian fazer um discurso. - Mas que coisa! Acho que ele tem certeza que você vai votar nele, ouvindo ou não seus

discursos. - Eu não voto. Não faz tanto tempo assim que estou aqui. Eles estavam rindo, quando entraram no bar Cap and Bells. Era a primeira vez que Tanya

entrava num lugar tão elegante, desde que chegara à Inglaterra, e ela olhou com curiosidade para as luzes baixas e a mobília de carvalho polida.

- É bonito aqui. Sempre pensei que os bares não tivessem tapetes no chão e fossem muito cheios de gente.

- Geralmente eles são assim. Mas existem bares como esse, mais quietos e bem mobiliados. Pode-se até encontrar uma princesa, aqui.

- Uma princesa? - Diana - Roger explicou, embaraçado. - Por que não gosta dela? - Eu gosto, mas ela é diferente de nós. - Ela respira, come e dorme como nós. - Entendo o que quer dizer. Mas Diana é tão diferente de nós quanto Adrian é. - Você não falaria assim, se vivesse no meu país. Qualquer pessoa que não aprova o governo

automaticamente é considerada um inimigo e levada para a prisão. Mas aqui, não importa de que lado vocês estejam, são todos livres.

- Daqui a pouco vai me dizer que não tem importância para quem a gente vote. - Não sei se tem importância ou não. Você e Adrian são ambos boas pessoas. - Não gosto de ser comparado com Adrian. - Por que não? - Tanya perguntou zangada. - Porque ele é prepotente e frio. - Adrian não é nada disso. Ele só esconde o que sente. - Ele não tem sentimentos. - Claro que tem. Acha que eu teria me casado com um homem que... Horrorizada, Tanya percebeu o que tinha dito. Era impossível apagar suas palavras, ao mesmo

tempo que era impossível negá-las. A verdade estava expressa em seu rosto. Desesperada, olhou para Roger, sabendo que tinha que obter sua promessa de silêncio.

- Por favor, Roger, esqueça o que eu disse - pediu. - Não posso revelar um segredo que não é só meu.

- Um segredo que não é só seu... - Sacudiu a cabeça, confuso. - Está dizendo que é a esposa de Adrian?

- Por favor. - Estava trêmula de medo. - Fale mais baixo. Ninguém pode saber disso. Vendo a expressão angustiada dela, a dele se suavizou. - Não acha que deve me contar a história toda, Tanya? É o mínimo que pode fazer. Tanya concordou e começou a pensar por onde devia começar. - Eu o conheci em Rovnia... - falou vagarosamente. - Era o dia do Carnaval das Rosas... Roger ouviu com atenção, mas sem qualquer sinal externo de emoção. Só quando ela contou

sua chegada a Park Gates, foi que sua zanga explodiu. - Mas que modo sujo de tratá-la! - As pessoas fazem coisas estranhas, quando estão presas em uma armadilha. - Isso não justifica o comportamento de Adrian! Você não deveria ter feito nunca o que ele

pediu! - Concordei porque... - Tanya parou e olhou por sobre o ombro. - O que foi isso? - O quê? - Tive a impressão de ouvir a porta se abrindo aqui do lado. Roger olhou por cima da cabeça de Tanya. - Não tem ninguém lá. - Virou-se para ela. - Ainda acho que foi uma loucura aceitar a proposta

de Adrian.

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- Mas eu entendo o problema dele. Não deve condená-lo porque se casou comigo e depois se arrependeu.

- Não é o fato dele ter se arrependido que me deixa tão zangado. É o modo como ele tentou se livrar de você... fingindo que é a babá da irmã dele! Droga, Tanya, Adrian merece tudo que lhe acontecer de ruim. Se você deixar que eu use essa informação, vou fazer com que ele perca a eleição.

- Não pode fazer isso. - Olhou-o horrorizada. - Eu dei minha palavra a Adrian de que guardaria segredo. Se ele descobrir que o traí... Oh, Roger, prometa que não vai dizer nada.

O rapaz estreitou os olhos azuis. - Se é o que quer, não posso dizer mais nada. Acho que está errada, mas respeito a sua

vontade. - Não quero que respeite a minha vontade. Quero que tente entender a situação. Sabe muito

bem que as pessoas mudam e não pode culpar Adrian por ele ter deixado de me amar. Afinal, ele pensou que eu tivesse me divorciado e...

- Não precisa arrumar desculpas para ele - Roger disse, abruptamente. - Já lhe dei minha palavra e não vou quebrá-la. - Esfregou a mão no queixo, com os olhos quase fechados. - Diana sabe quem é você?

- Sabe. - Então é por isso que ela me pediu para não sair mais com você. Ela também está numa

situação difícil. - Mas só até nosso divórcio ser arrumado de acordo com a lei. Depois eles estarão livres para se

casar. - Não entendo como você e Diana ainda podem defendê-lo. - O que você faria, se estivesse na situação de Adrian? Ele quer vencer a eleição tanto quanto

você e tem medo que use esta informação contra ele. - Não creio que agisse como ele - Roger disse, vagarosamente. - E nem teria ficado noivo de

outra mulher, sem antes verificar se estava legalmente divorciado. - Isso é só uma questão técnica - Tanya explicou. - Logo que a eleição terminar, Adrian vai

cuidar disso. - E o príncipe e a princesa viverão felizes para sempre. - É. - A voz de Tanya saiu forçada. - Diana é muito reservada, mas acho que ama Adrian. - Acha mesmo? - O tom de Roger era tão estranho, que Tanya olhou para ele. - Por quê? Você não acha? - perguntou. - Não sei o que Diana sente, mas ela não é tão reservada quanto finge ser. - Ele se levantou. -

Quer uma cerveja? Não sei como você está se sentindo, mas outro copo vai me fazer bem. Tanya recusou e ficou observando o rapaz se afastar. Roger estava sempre na defensiva,

quando falava de Diana, como se esperasse ser criticado. Será que achava que a garota era sua inimiga, só porque estavam em partidos políticos diferentes? E por que se importava tanto com isso? Tanya continuou a observá-lo, enquanto ele esperava pela bebida. Não era só a atitude de Roger em relação a Diana que era estranha, mas também a dela em relação a ele. Ainda se lembrava muito bem de como ela exigira que parasse de ver Roger. Na época, não tinha entendido a zanga da garota, mas agora começava a desconfiar. Será que Diana... e Roger... estavam brigando por uma coisa muito mais básica e emocional que a eleição? Será que estavam brigando por amor?

Era fácil acreditar nesta teoria tão fantástica. Tudo mostrava que era verdadeira. A agressividade de Diana com Roger; a amargura que o rapaz sentia por Adrian... Um sentimento que Tanya sempre achou que devia ter raízes mais profundas que suas diferentes opiniões políticas.

Roger voltou para a mesa com um copo de cerveja. Tomou um gole e sorriu para Tanya, mas o sorriso não atingiu seus olhos. Ela olhou para ele, como se o estivesse vendo pela primeira vez. E, de certo modo, era isso mesmo. Roger estava magro demais para sua altura e apesar de ser normalmente pálido, estava com uma cor acinzentada, como se tivesse passado muitas noites sem dormir.

- Por que está me olhando assim? Se está com medo que eu divulgue o segredo de Adrian, esqueça. Já prometi que não vou fazer isso.

- Não estava pensando em Adrian, mas em você e Diana. Ele parou com o copo a meio caminho da boca e o recolocou devagar sobre a mesa, como se

estivesse com medo de derramar o líquido, com a mão trêmula de nervosismo. - E o que estava pensando sobre mim e Diana? Com a franqueza de sua raça, Tanya respondeu: - Acho que vocês se amam.

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- Pelo amor de Deus! Isso é uma loucura tão grande, que nem vou me preocupar em negar. - Acho bom - Tanya disse, referindo-se à última parte de sua frase -, porque tenho certeza de

que estou certa. - As mulheres sempre acham isso - Roger disse, tentando fazer humor. - Quando um homem ama uma mulher, existe alguma coisa em sua voz que o denuncia,

quando ele diz o nome dela. Você pode admitir ou não, mas ama Diana. Eu... - Interrompeu-se de repente, quando a porta do bar se abriu e um homem grisalho, de meia-idade, entrou.

- Oi. Bob - Roger cumprimentou. - Acho que ainda não conhece a srta. Kovacs. Tanya, este é Bob Edwards, meu cabo eleitoral.

O homem a cumprimentou com um forte aperto de mão e sentou-se com eles à mesa. Durante meia hora ele e Roger conversaram sobre política e quando o relógio badalou, Tanya se levantou, dizendo que precisava ir para casa. Achava que estava sendo desleal com Adrian, ficando sentada ali e ouvindo seus rivais falarem com tanta segurança, em vencer a eleição.

- Não precisa me levar para casa. Deve ter muitas coisas para conversar com o sr. Edwards e... - Nossa conversa pode esperar. - Deu uma olhada para o cabo eleitoral. - Eu o vejo amanhã, no

salão do comitê. - Certo. - Não gosto muito do seu cabo eleitoral - Tanya comentou, quando já estavam no carro. - Não

me parece um homem honesto. - Não é mais desonesto que os outros. É que você não está acostumada com esse tipo de gente. - Pode ser. Só conheci professores e intelectuais... como meu pai. - Sente saudades da sua vida em Rovnia? - Roger perguntou, referindo-se pela primeira vez à

história que ela havia lhe contado, naquela noite. - Sinto saudades da vida que tinha quando era criança e no início de minha adolescência... mas

não da Rovnia de hoje. Roger resmungou alguma coisa, como se não soubesse ao certo o que dizer, e Tanya se sentiu

aliviada, quando desceu do carro. Não tinha medo de que ele quebrasse sua promessa, mas lamentava ter cometido o deslize que a obrigou a lhe contar toda a verdade.

Roger estava achando impossível esquecer o que Tanya lhe contara sobre Adrian. Apesar de seus pontos de vista diferentes, ele sempre respeitou o outro. Mas agora sentia um certo desprezo pelo homem que se comportava daquele modo com a mulher que, um dia, confessou amar e que ainda era sua esposa. No entanto, Tanya não podia ouvir uma palavra contra ele. Era evidente que ainda o amava e ele não conseguia entender como uma mulher podia se sentir assim, em relação ao marido. Mas as mulheres podem amar os homens que menos merecem isso. Como Diana, por exemplo. Se Tanya estivesse certa e Diana o amasse... - Mas era impossível. A alegria momentânea que sentiu foi substituída pela raiva e Roger apertou o acelerador, forçando o velho carro. Só quando chegou à vila e foi obrigado a diminuir a velocidade é que se lembrou de novo do que Tanya tinha dito sobre Diana. Mas isso era tolice! Ela não o amava mais do que ele a ela.

Com um ranger de freios, brecou o carro em frente de sua casa. Ele não amava nenhuma grã-fina de nariz para o ar, como Diana Biddell! Que idéia mais sem fundamento! Bateu a porta da frente com força, sem ligar para o adiantado da hora, todo o seu ser tentando negar o que Tanya tinha dito.

CAPÍTULO VIII

Dois dias mais tarde, Adrian entrou em casa zangado, batendo a porta com violência atrás dele. O barulho fez com que Diana saísse correndo da biblioteca, preocupada com esse comportamento que não era comum nele.

- Algo errado, Adrian? - Tudo. O país inteiro já deve estar sabendo que Tanya é minha esposa. - O quê? Quem... quem contou? - Quem você acha que foi? - perguntou irritado. - Poulton, é claro. - Não creio que Tanya tenha lhe contado. - Ela o ama. Por isso é que contou. - O que você vai fazer? - E o que posso fazer? Não posso negar que Tanya é minha mulher, mas o diabo me leve, se eu

a deixar continuar aqui. Ela pode fazer as malas e sumir.

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- Se a mandar embora, vai fazer o que Roger está querendo. - E o que sugere? Que eu a apresente como minha legítima esposa? - É o que deve fazer. Adrian estava surpreso. Não porque a idéia fosse nova. Tinha pensado naquilo no momento em

que soube da novidade. A verdade é que não esperava que Diana a sugerisse. - Você acha que eu devo admitir que ela é minha esposa, quando eu e você estamos noivos? - Não tem escolha - Diana comentou com calma. - E você, o que vai fazer? - Nada. Por enquanto, vamos ter que esquecer nosso noivado. É a única saída. Adrian olhou-a cheio de admiração. - Você teve uma atitude maravilhosa nessas últimas semanas, que foram tão difíceis, mas

nunca pensei que tivesse que... Maldição, eu poderia estrangular Tanya! - Isso seria entregar a eleição para Roger na palma da mão. - Sorriu de leve. - Teria sido melhor

se tivéssemos desfeito nosso noivado, quando Tanya chegou. - Está dizendo isso por causa da minha carreira, ou por que descobriu que não me ama? Diana estava levando tanto tempo para responder, que ele se aproximou dela e colocou a mão

em seu ombro. - Não me ama, Diana? Sei que tenho sido um noivo relapso, mas... - Eu também tenho sido assim - ela o interrompeu. - Quanto a amar você... não sei, Adrian.

Nunca falamos de amor antes. Ficamos noivos porque nós dois queríamos um lar e filhos. E você não pode dizer com sinceridade que sente por mim o mesmo que sentia por Tanya, quando se casaram.

Abruptamente, ele se afastou dela e alguns segundos se passaram, antes que respondesse. - Nunca mais vou sentir por uma mulher o que senti por Tanya. Não vou sentir aquilo de novo. - Está falando como se uma pessoa pudesse decidir se vai ou não se apaixonar. - E acho que pode. Talvez não, quando a gente é muito jovem, mas quando somos um pouco

mais velhos, sim... Quando já fomos feridos pelo amor. Sinto muito ter dito isso, mas não é justo você se casar comigo, esperando uma coisa que nunca poderei lhe dar.

- Por que não me disse isso, quando me pediu em casamento? - Na época, não achei que você pudesse querer um sentimento assim, da minha parte. Mas

agora não tenho certeza. Tinha me esquecido que você ainda é muito jovem e tem o direito de esperar isso da vida.

- E está me dizendo que só pode me oferecer um sentimento frio e sem amor, não é? Diana falou de um modo tão despreocupado, que o surpreendeu. Mas era melhor que ela

encarasse as coisas assim. - A sua opinião a meu respeito estava certa, Adrian. Eu sempre soube que você nunca sentiu

por mim o que sentiu por Tanya. Na verdade, eu não gostaria que sentisse, pois também nunca o amei apaixonadamente. Acho bom nós dois sabermos disso; teremos mais chance de sermos felizes. - Inesperadamente, seu lábio inferior começou a tremer e ela o mordeu com força. - Não acredito num amor tão grande que faça a gente se esquecer de todo o resto. Não quero minha vida de cabeça para baixo, por causa de uma emoção completamente desnecessária.

- Do que está com medo? - Adrian percebeu que suas palavras tinham um significado mais profundo. - As emoções não têm que ser, necessariamente, destrutivas. Podem nos dar muita satisfação .

- Você prefere viver sem elas! Acaba de me dizer isso! - Por que já fui muito ferido. - Acho que estou com medo de ser ferida, também. - Pode ser que esteja com medo da vida - ele corrigiu com gentileza. - Seu pai sempre teve

muita influência sobre você e... - Por favor! Você é a segunda pessoa a me dizer isso! Estou começando a me aborrecer com a

mania de dizerem que tenho fixação por meu pai! Adrian estava curioso para saber quem era a outra pessoa, mas decidiu não perguntar. - Gostaria de continuar conversando, mas preciso falar com Tanya. - Caminhou para a escada,

mas parou quando viu Tanya descendo, e falou com frieza: - Estava à sua procura. Acho que sabe por quê, não? - Tanya empalideceu e a raiva que ele estava tentando controlar explodiu. - O fato de ter dado sua palavra de honra não significa nada para você? Quer tanto que Poulton vença a eleição, que precisou quebrar a sua promessa?

- Eu não a quebrei - ela murmurou. - Ele descobriu por acaso. E jurou não contar nada a ninguém.

- Pois contou para todo mundo! Pensou mesmo que ele não fosse fazer isso?

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- Não creio que Roger tenha quebrado sua promessa - Diana interferiu. - Agora você também resolveu defendê-lo! - Adrian virou-se para a noiva, surpreso. - Vocês dois eram amigos, até tomarem partidos políticos diferentes. Deve conhecê-lo o

suficiente para saber que ele não faria uma coisa dessas. - Não estamos discutindo como éramos, mas o que somos agora. Você conhece os fatos tão

bem quanto eu. Ele ficou sabendo que Tanya é minha esposa e espalhou isso por aí. - Você está errado! - Tanya gritou e virou-se para sair. - Aonde vai? - Adrian perguntou. - Ver Roger. - Não pode. Não seja tola, Tanya. Mas ela não lhe deu atenção e correu para fora. Adrian chamou-a de novo, e com medo de que

ele a seguisse, Tanya desapareceu no meio das árvores. Chegou à casa de Roger encalorada e desarrumada, rezando para que o rapaz estivesse lá. Foi

ele mesmo quem abriu a porta e depois de dar uma olhada para o rosto transtornado da moça, levou-a para seu escritório.

- Já sabe? - perguntou. - Já. Como pôde fazer uma coisa dessas? - Não fui eu. Foi Bob Edwards. Lembra-se de quando estávamos conversando no Cap and Bells e

você achou que tinha ouvido a porta se abrir? - Quer dizer que era ele? - É. Ele queria falar comigo, mas quando viu você mencionar Adrian, parou e ficou escutando.

Depois esperou um pouco do lado de fora, antes de entrar. - Por isso ele estava agindo de um modo tão estranho. Não gostei dele e tinha razão. Roger riu sem alegria. - É, parece que a intuição feminina funciona mesmo. - Eu lhe devo um pedido de desculpas. Sinto muito se acreditei que tinha quebrado sua

promessa. - Esqueça. Qualquer um teria pensado a mesma coisa. - Diana não pensou. Roger esfregou o rosto com a mão, mas não deu nenhum sinal de ter ouvido o que Tanya disse.

A garota se sentou em uma cadeira, não porque fosse ficar ali muito tempo, mas porque suas pernas estavam moles demais para sustentá-la.

- O que estão dizendo, de Adrian e de mim? - Nada muito bom - Roger admitiu. - Sabem que você é de Rovnia e que Adrian a deixou, logo

depois que se casaram. - Ele não teve escolha. Foi mandado de volta para a Inglaterra e eu não pude vir junto. Adrian

nunca me abandonou. - Não precisa defendê-lo para mim - Roger disse com delicadeza. - Você me perguntou o que as

pessoas estão dizendo e eu lhe contei. Bob queria desacreditar Adrian e conseguiu. Temos que admitir que Adrian plantou o que está colhendo. Foi uma tolice muito grande esconder a sua identidade e fingir que você era a babá da irmã dele.

Tanya não pôde negar isso, apesar de ainda enxergar as coisas do ponto de vista de Adrian. Com um suspiro, levantou-se e caminhou para a porta.

- Às vezes chego a desejar nunca ter fugido de Rovnia. - Não deve falar assim. Logo vai se lembrar disso tudo como se fosse um sonho ruim. Tem toda

uma vida à sua frente, Tanya. Não deve deixar o erro que fez, quando era muito jovem, arruinar todo o seu futuro.

- Meu casamento com Adrian não foi um erro. Esse é que é o problema. Ele é que se arrependeu de ter se casado... não eu.

- Nunca vou entender as mulheres - Roger murmurou, caminhando com ela até o portão. Tinha se oferecido para levá-la de carro, mas Tanya não aceitou. - Acho que você devia desprezar Adrian, depois do modo como ele a tratou.

- Às vezes eu o desprezo. Mas isso não me impede de continuar a amá-lo. - O que vai acontecer agora? - Vou fazer o que ele quiser. Pelo menos isso eu lhe devo. - Não lhe deve nada. E se ele continuar a culpá-la pelo que aconteceu, arrume as malas e venha

para cá. Pode ficar conosco pelo tempo que quiser. - Se eu fizesse isso, estaria dando a Adrian uma boa razão para me odiar.

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Tanya despediu-se de Roger e voltou para Park Gates. Ouviu seu nome sendo mencionado quando passou pela sala de estar e percebeu que a família devia estar discutindo os últimos acontecimentos. De repente, a voz de Betty se levantou acima das outras.

- Acho que já é mais do que tempo de apresentá-la como sua esposa, Adrian. Ela tem tido uma atitude muito decente e...

- E eu já não posso dizer o mesmo, não é? - A voz de Adrian soou zangada. - Você é que disse, não eu. Se o seu casamento foi um erro, então desfaça esse erro. Mas de

um modo honrado. - Adrian! Betty! - a sra. Chesterton zangou. - Vocês não estão encarando a realidade. Logo que

a eleição acabar, Adrian pode... - A eleição que vá para o inferno! - Adrian exclamou. - Não pode querer que as pessoas

coloquem suas emoções de lado, enquanto resolvem sua vida profissional. - Isso é exatamente o que eu espero - sua mãe respondeu -, mas é o que você estava fazendo,

até a história do seu casamento se espalhar por aí. - O pior de tudo é o modo como me comportei - Adrian falou baixinho. - Não acho que Tanya

seja responsável pelo que aconteceu. Na verdade, a culpa é minha. Houve um silêncio momentâneo, depois Dick Tufton disse: - Venha, Betty. Vamos subir. Não querendo que a pegassem escutando atrás da porta, Tanya atravessou rapidamente o hall

e entrou na sala de estar. - Ah, você chegou - a sra. Chesterton falou. - Estávamos conversando a seu respeito. - Eu ouvi. - Tanya olhou para Betty e Dick, que estavam se retirando e voltou-se para Adrian: -

Diana estava certa. Roger não quebrou sua promessa. Foi Bob Edwards, o agente dele. Adrian olhou para a mãe. - Quer nos deixar sozinhos, por favor? - Depois que a mãe saiu, ele continuou: - Mas isso não

altera a situação em que estou. - Vou fazer o possível para ajudá-lo. - Vai mesmo? - Seus olhos eram tão azuis, que pareciam feitos de lápis-lazúli. - Vou. Ouvi-o dizer que não me culpa por nada, mas eu me culpo. - Não vamos falar em culpas - Adrian disse abruptamente. Depois parou, como se estivesse

achando difícil continuar. Tanya o teria ajudado, se pudesse, mas ela não sabia o que Adrian queria dizer e ficou quieta,

esperando. - Gostaria que você... que você assumisse seu lugar aqui como... como minha esposa. Podemos

dizer que conservamos a sua chegada em segredo, porque estávamos preocupados com a segurança das pessoas que a ajudaram a escapar de Rovnia. Esta é a única saída que pode funcionar.

- É, pode ser que dê certo. - Não parece muito entusiasmada. - Não está querendo que eu me importe com o sucesso da sua carreira, não é? Só estou

ajudando por que quero sair daqui de consciência limpa. - Está bem - ele respondeu com voz seca. - Pelo menos nós dois sabemos exatamente onde

estamos. A única coisa que eu quero esclarecer é que o meu comportamento quando você chegou não teve nada a ver com o fato de eu estar disputando uma eleição. Mesmo que a eleição não existisse, o meu noivado com Diana ainda seria um obstáculo entre nós. Só posso ficar contente por você ter aparecido antes do meu casamento com Diana.

Toda a zanga de Tanya evaporou e, com tristeza, ela reconheceu a verdade do que ele estava dizendo. Não foi sua carreira que os manteve separados, mas o noivado dele com outra mulher.

- Perdoe-me, Tanya - Adrian continuou, com expressão de remorso. - Estou sempre dizendo que não vou discutir de novo com você, mas então você diz alguma coisa que me tira do sério e eu... eu...

- Não se preocupe - ela o interrompeu. - Não gosto do que está acontecendo, mas... - Na vida, tudo muda. Isso é uma coisa que aprendi há muito tempo atrás. - Parece um provérbio de Rovnia. - E é. - Com um sorriso, Tanya saiu da sala. Adrian continuou ali muito tempo, olhando para a lareira apagada. Tanya tinha razão. Tudo

mudava. Pensou em seu casamento e, inexplicavelmente, no de seus pais, que nunca deixaram de se amar. Parecia que, se a gente tivesse bastante sorte, algumas coisas não mudavam. Afastando

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esses pensamentos, que levavam a outros que preferia evitar Adrian entrou na biblioteca, onde muito trabalho o esperava. Isso é que devia ter importância para ele: seu trabalho e suas terras.

E Diana, é claro. Não podia se esquecer de Diana.

CAPÍTULO IX

Apesar de oficialmente não estar mais noiva de Adrian, Diana vinha todos os dias até Park Gates e depois saía angariando votos para ele. Às vezes levava Tanya junto e, apesar de ela ficar muito embaraçada, Diana enfrentava todos os olhares com incrível dignidade.

Tanya não conseguia entender esse comportamento. Ou Diana queria tanto que Adrian vencesse a eleição, que era capaz de passar por cima de seus próprios sentimentos, ou ela não sentia nada por ele. Quanto mais pensava nisso, mais Tanya se convencia de que Diana não amava Adrian.

Tanya também começou a acompanhar Adrian aos comícios, e achava estranho ficar sentada na plataforma, ouvindo-o falar. Ele não tinha nada da eloqüência de Roger e seus discursos não eram tão inflamados, mas havia em suas palavras uma sinceridade tão grande, que ela achava emocionante. Ao contrário de Roger, que desarmava seus oponentes com perguntas inteligentes, ele usava o bom-humor para isso.

- Vou ficar contente, quando tudo terminar - Tanya comentou uma tarde para Diana, quando estavam sentadas no chão da biblioteca, separando panfletos. - Ainda não sei se prefiro Roger ou Adrian para vencer a eleição. Para mim, os dois dizem muitas coisas boas.

- Porque os dois são bons oradores. Tanya sentou-se nos calcanhares. - Acha que Adrian vai vencer? - perguntou. - Não tenho certeza. - Antes da minha chegada, as chances dele eram melhores? - Eram - Diana respondeu, sem graça. - Mas não se culpe por isso. São coisas que acontecem. Tanya estava maravilhada com o controle da outra, mas antes que pudesse fazer mais

perguntas, Emma e Tim entraram correndo. - Vamos brincar? - a menina gritou. - Nós não vemos mais você. - É que estou muito ocupada, ajudando seu tio Adrian. - Mas antes você não ajudava o titio. - Prometo brincar com vocês, sábado à tarde. Se fizer bom tempo, podemos dar uma volta por

aí. - Eu trouxe um presente para você. - Tim pegou a mão de Tanya e colocou nela um peixinho

dourado, mais morto do que vivo. - Timmy! - Tanya gritou, horrorizada. - Onde conseguiu esse peixinho? O coitadinho está quase

morto! Precisamos colocá-lo na água. Tanya correu para a escrivaninha, tirou as flores do vaso e colocou o peixinho na água. Na

mesma hora ele começou a nadar. - Ele tirou o peixinho do laguinho do jardim - Emma explicou. - Eu bem que disse que era

maldade, mas Tim não quis me ouvir. - Não foi maldade, eu não sabia! - Tim abriu a boca para chorar. Com a presença de espírito que só a experiência dá, Tanya pegou o menino no colo, segurou o

vaso e foi para o laguinho. Depois de jogar o peixe dourado na água, ela se sentou na grama e ficou olhando as crianças jogarem bola. Não se passou muito tempo, antes que os dois lhe pedissem para se juntar a eles. Tanya concordou, rindo, e as crianças se tornaram cada vez mais encantadas com o jogo, até que Adrian, saindo de trás de um arbusto, pegou uma das bolas que Emma lançou. Alto e elegante, ele caminhou na direção deles e deixou a bola cair na mão da sobrinha.

- Mais alguns lançamentos como esse, Emma - ele disse -, e vai estar jogando no time da Inglaterra.

As duas crianças começaram a lhe pedir, aos gritos, para entrar no jogo e, depois de uma ligeira hesitação, Adrian concordou. Daí em diante, Tanya jogou muito mal, consciente da presença de Adrian. Ele não estava nem um pouco embaraçado e correu por todo o gramado, parecendo anos mais jovem do que o homem sério e carrancudo, ao qual ela já tinha se acostumado. Como agora ele estava parecido com o rapaz por quem se apaixonara, há tantos anos atrás!

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Pararam de jogar, quando Betty gritou por eles, da janela do quarto das crianças. - Acho que a mamãe quer que vocês entrem, para tomar chá - Tanya disse para as crianças,

que se afastaram na direção da casa, com evidente má vontade.Adrian sentou na beirada do laguinho e enxugou a testa. - Estou fora de forma. Outro ano sem fazer exercício e vou acabar gordo como um barril. - Você não é desse tipo - Tanya respondeu e, consciente da proximidade dele, virou-se de lado e

fingiu estar interessada na beleza da água, que parecia um espelho. Adrian ainda estava acalorado pelo exercício e a garota podia sentir o calor que emanava de seu corpo.

Da sua parte, Adrian também estava consciente da presença de Tanya. Ela mudara tanto desde sua chegada! Parecia mentira que fosse a mesma criatura magra e mal vestida, que o tinha procurado, há alguns meses! Esta Tanya era a mesma garota com quem se casara: tinha o mesmo encanto, o mesmo corpo de um moreno dourado. Ela ainda estava virada de lado, e ele olhou com atenção a linha reta de seu nariz, a testa lisa, a curva cheia da boca, com o lábio superior curto e infantil. No entanto, aqueles lábios tinham se movido sob os seus, respondendo com a paixão de uma mulher.

Como se soubesse que Adrian a estava observando, Tanya se mexeu inquieta e a saia rodada esvoaçou em torno dela. O vestido era da mesma cor de seus olhos, e Adrian se lembrou de que, em sua lua-de-mel, ela também usara um vestido violeta. Era seu primeiro dia de casados; tinham ido caminhar pelas montanhas e se deitaram juntos, na grama. Mesmo sem fechar os olhos, ele ainda podia sentir o cheiro doce e suave dela.

- Vou te amar por toda a minha vida - tinha dito, enterrando o rosto no colo de Tanya. Olhando para ela agora, Adrian sentiu uma vontade quase irresistível de fazer o mesmo, de

abraçá-la bem forte e colar seus lábios aos dela. Piscou e endireitou o corpo com rapidez. O que estava acontecendo com ele? Devia estar perdendo o autocontrole, para pensar nessas coisas. Como podia desejar uma mulher, se estava noivo de outra? É claro que também podia se perguntar como podia estar noivo de outra mulher, quando ainda desejava a primeira. Sacudiu a cabeça. Precisava se vigiar, ou ainda ia fazer alguma coisa da qual se arrependeria mais tarde. Estava trabalhando muito e o cansaço muitas vezes levava uma pessoa a ter pensamentos bem estranhos.

De repente, ele disse: - Sabe que esta é a primeira vez que ficamos sozinhos, sem discutir? - Estou aprendendo a arte de fingir. - Não finja nunca, Tanya. Sempre a associei com honestidade. Tanya olhou-o por cima do ombro, involuntariamente provocante, com o sol iluminando seus

longos cílios. - Conte-me sobre seus pais - ele pediu. - Nunca mais ouviu falar no professor... depois que o

levaram embora? - Só fiquei sabendo que papai tinha morrido através de um amigo influente e recebi de volta

algumas de suas coisas: uma cigarreira e um alfinete de gravatas de ouro. - Sua voz era calma, se bem que triste. - São as coisas mais preciosas que tenho. Prefiro morrer de fome do que me separar delas.

- Tenho certeza que nunca vai ter que se separar delas. Tanya encolheu os ombros. - Se eu as vendesse, poderia conseguir um bom dinheiro. - Não vai precisar de dinheiro. Já lhe disse que vou tomar conta de você. - Não quero nada, depois que sair daqui - Tanya falou com firmeza. - Vou arranjar um emprego

e cuidar de mim mesma. - Não vai ter necessidade de trabalhar. - Vou sim. Depois que sair daqui, não quero mais pensar em você. Nunca mais. Adrian empalideceu. - Não sabia que me odiava tanto. Nestas últimas semanas, pensei que tivéssemos nos tornado

amigos. - Nós nunca poderemos ser amigos - Tanya respondeu com paixão. Este foi o momento em que

esteve mais perto de odiá-lo, em toda a sua vida. Como ele podia falar em amizade? Será que Adrian achava que seu amor por ele era tão fraco quanto tinha sido o dele por ela?

- Quando eu sair daqui, quero esquecê-lo completamente - reafirmou. - Se fosse possível pegar amnésia, eu iria até o consultório de um médico e lhe pediria para injetar em mim o vírus da amnésia. Quero me livrar de você. Quero me esquecer de que um dia o encontrei.

Com a saia esvoaçando, Tanya atravessou o gramado. Adrian esperou até ela desaparecer de sua vista, e começou a andar na direção oposta. Estava tão perdido em seus pensamentos, que nem viu para onde estava indo.

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A Tanya dos velhos tempos nunca teria explodido daquele modo com ele. Ela não era mais a garota meiga, com quem tinha se casado, mas uma "cospe-fogo". Tentou se lembrar de como Tanya era, mas a Tanya de agora não saía de seus pensamentos e, quanto mais ele tentava separar as duas, mais difícil isso se tornava. Até que, de repente, percebeu que a Tanya do passado e a do presente tinham se fundido, formando uma só mulher.

E, quando percebeu isso, Adrian descobriu também que ainda a amava. O que sentia por ela, há oito anos atrás, era o mesmo que sentia agora.

Seus pensamentos estavam tão confusos, que ele parou de andar, como se seu estado mental tivesse afetado seu estado físico. E tinha mesmo. Podia ver isso claramente, agora. Há seis anos, ficou tão magoado, quando soube que Tanya se divorciara dele, que usou toda a sua força de vontade para tirá-la de sua vida. Com isso, abafou suas emoções físicas, e achou que tinha deixado de amá-la. E conseguiu encará-la como se fosse uma estranha.

Mas desde que Tanya voltou para sua vida, sua apatia começou a diminuir e a parede de indiferença que tinha construído em torno dele mesmo começou a ruir. Sem querer, recomeçou a responder à presença dela, à beleza que o excitava e à gentileza que o emocionava. E, mais do que tudo, foi atraído pela nova maturidade e espírito de Tanya. Porém, já tinha se doutrinado tanto, que não percebeu exatamente o que estava lhe acontecendo, até ser quase tarde demais.

Quase, mas não tarde demais. Adrian chutou uma pedra para fora de seu caminho e recomeçou a andar. Antes que pudesse dizer qualquer coisa para Tanya, precisava conversar com Diana. Não acreditava que o coração dela fosse se despedaçar, se eles não se casassem, mas se sentia moralmente obrigado a esclarecer as coisas com ela, antes. Só depois disso, poderia dizer a Tanya que a amava.

No entanto, ter descoberto que a amava não lhe dava tanto prazer quanto tinha esperado. A alegria que devia estar sentindo fora estragada pela culpa. Adrian se sentia culpado por ter sido tão cruel com ela, e tinha medo de que essa crueldade tivesse matado o amor de Tanya por ele.

Será que era demais, esperar que ela o amasse? Afinal, Tanya ainda tinha amor por ele, logo que chegou. Tentou analisar o comportamento dela, nas últimas semanas, mas não encontrou nada que lhe desse alguma esperança, por pequena que fosse. Ao contrário, as maneiras distantes da mulher tinham aumentado a barreira entre eles. Qual seria o melhor modo de destruir essa barreira? Se lhe dissesse, agora, que a amava, ela podia achar que estava se declarando por conveniência. Tanya era bastante esperta, e devia ter percebido que ele não amava Diana profundamente. Por causa disso podia pensar que Adrian preferia continuar com o casamento, só para não ter que enfrentar a publicidade que um divórcio sempre desperta.

Com amargura, Adrian percebeu que ia precisar de muito tempo e paciência, para provar seu amor. E, enquanto atravessava os campos, jurou que conquistaria Tanya de novo, não importando o quanto isso ia lhe custar.

De coração leve, ele voltou para casa mas, quando chegou ao seu quarto, sentou-se desanimado na cama. Se pelo menos pudesse ir, agora, até onde estava Tanya e lhe dizer o que estava sentindo. Mas o medo de ser repudiado não o deixou sair dali. Não, sua primeira decisão é que estava certa. Precisava agir com calma.

Adrian estava atrasado para o jantar, e quando entrou na sala de estar, já encontrou sua mãe e Tanya.

- Está atrasado - a sra. Chesterton disse. - E isso tem importância? - Que resposta extraordinária. Afinal, você é que gosta de ser pontual, nesta casa. - Então, preciso parar com isso. - Depois da eleição, vai ter que ser ainda mais pontual... Senão, não vai ter tempo de fazer nem

metade das coisas que pretende. - Pode ser que eu não vença - ele disse de repente. - É claro que você vai vencer. É uma pena que eu não consiga descobrir nenhum escândalo

sobre Poulton. Ajudaria muito a... - Tenho certeza que não existe nenhum escândalo na vida dele - Adrian interrompeu -, e mesmo

que houvesse, eu não lançaria mão de uma coisa dessas. - Não sei por que não. O agente dele não pensou duas vezes, antes de sujar o seu nome. - Esse negócio não teve nada a ver com Roger. Pelo que sei, ele nunca brigou sujo, e eu não

pretendo ser o primeiro. Tanya ouviu tudo surpresa e alegre. Seus olhos se encontraram com os de Adrian e ela sorriu

com ternura. Ele correspondeu ao sorriso com uma expressão tão triste, que ela não pode deixar de ficar confusa. Era como se Adrian soubesse por que ela estava, de repente, tão amigável e estivesse se sentindo infeliz com isso.

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Durante o jantar, Tanya quase não participou da conversa. Betty conversou animadamente, e ela e a mãe discutiram o custo das roupas das crianças e se Emma devia ou não ir para uma escola interna. Tanya tinha uma opinião muito bem formada a esse respeito e acabou fazendo um comentário:

- Quando uma criança é mandada para fora de casa, existe uma quebra na vida familiar. - O internato encoraja as crianças a se tornarem independentes - Dick afirmou com convicção. - Se uma criança é feliz e amada pelos pais, vai se tornar independente, naturalmente. - Mas nem sempre é assim. Veja Betty, por exemplo. Ela está sempre em volta das crianças,

sufocando-as com tanto amor e atenção. E é isso que a maioria dos pais faz. - Betty é assim, porque não tem quase nada para fazer... - Tanya se interrompeu, embaraçada,

mas Betty não ligou. - Você tem razão, Tanya, e Dick e eu temos pensado muito nisso, ultimamente. E agora é uma

hora tão boa quanto qualquer outra para falarmos nesse assunto. - Olhou em torno da mesa. - Nós decidimos montar uma casa.

- Pensei que tivesse tirado essa tolice da cabeça, há muito tempo - a sra. Chesterton zangou. - Por que acha que é tolice? - Porque vocês têm tanta privacidade aqui quanto teriam, se vivessem sozinhos. - A sra.

Chesterton olhou para Tanya com desgosto. - Aposto que isso é coisa sua. Já não prejudicou bastante Adrian, para interferir na vida de minha filha também?

Um silêncio desagradável tomou conta da mesa, mas Betty o quebrou logo em seguida. - É claro que Tanya tem alguma coisa a ver com isso. Não tanto pelo que disse, mas pelo fato

de estar aqui. Percebi que esta é a casa de Adrian e que, quando ele se casar com Diana, tem o direito de formar um lar sem a família toda em volta.

- Tenho certeza que Adrian não pensa assim - a sra. Chesterton respondeu. - Pensa ou não? - Betty perguntou ao irmão. - Na verdade, nunca pensei nisso - ele disse e, olhando para Tanya, percebeu que gostaria

muito mais de tê-la só para ele. - Mas acho que você tem razão. As pessoas precisam ter suas próprias casas.

Betty ficou contente. - Vou começar a procurar uma casa amanhã mesmo. - Sendo assim, eu também vou - a sra. Chesterton falou com frieza. - A casa que fica no final de Park Gates vai vagar em novembro - Adrian disse para a mãe. - É muito grande para mim. - Então, talvez pudéssemos aumentá-la para nós - Betty sugeriu e todos começaram a falar

sobre o que poderia ser feito. Tanya ficou contente quando o jantar acabou e foram para a sala de estar. Lá ela podia se

sentar em uma poltrona afastada, livrando-se da proximidade de Adrian. Observando-a caminhar graciosamente pelo tapete, Adrian achou que Tanya estava mais

desejável do que nunca e sentiu uma vontade enorme de expulsar, com beijos, a tristeza que marcava a linha de sua boca. Mas sabia que devia pagar pelo seu comportamento anterior. E como isso estava lhe custando caro! Tinha que fingir indiferença o tempo todo, sufocando o desejo que sentia por ela, sem nada manifestar. Talvez, quando tivesse se redimido de toda a sua culpa, pudesse confessar a Tanya o quanto precisava dela.

Com esforço, Adrian resistiu à vontade de sentar ao lado dela, e começou a conversar com Dick, sem imaginar que Tanya tinha interpretado seu gesto como de repulsa.

Adrian nem mesmo suporta sentar perto de mim!, Tanya pensou, cheia de tristeza. Decidiu, então, sair da sala.

- Aonde você vai? - Betty perguntou. - Para o meu quarto. Preciso costurar algumas roupas e... - Quer dar uma volta comigo? - Adrian a interrompeu. - Estou cansada demais. Quando chegou à porta, ele já estava lá e abriu-a para ela. - Tem certeza que não quer dar uma volta? - o rapaz perguntou, num tom de voz tão baixo, que

ninguém ouviu. - A noite está linda. A lua está brilhando e não há uma nuvem no céu. - Uma noite perfeita para os namorados - Tanya comentou, sem querer. - É - Adrian se aproximou mais dela. - Por favor, Tanya, vamos. - Não. Está confundindo suas mulheres. Devia estar fazendo esse convite para Diana, não para

mim. Ele recuou, com o rosto tenso. Tanya passou pela porta e subiu correndo as escadas. Em seu

quarto, ela passeou inquieta de um lado para o outro. A conversa com Adrian tinha aumentado sua

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tristeza. Que jogo ele estava fazendo, para sugerir que passeassem pelo jardim, à luz da lua? Será que desejava possuí-la à força? Nos últimos meses, pensou mal dele muitas vezes, mas nunca chegou a considerá-lo um cafajeste.

Sacudiu a cabeça, impaciente. Estava agindo de um modo muito antiquado. É claro que ele estava tentando tornar mais fácil uma situação muito difícil. Sem dúvida achou que uma atitude amigável, até mesmo afetuosa, ajudaria as coisas a correrem melhor, entre eles.

Adrian podia sugerir isso, porque não sentia nada por ela, mas ela o amava demais, para manter um relacionamento daqueles, quando desejava com tanto ardor algo mais profundo.

CAPÍTULO X

Na manhã do dia seguinte, Tanya foi, a pedido do secretário de Adrian, até a biblioteca de uma cidade ali perto, pesquisar algumas estatísticas. Diana, que precisava fazer algumas compras lá, levou-a de carro.

Quando passaram pela rua principal no carro vermelho de Diana, várias pessoas viraram-se para olhá-las, pois a curiosidade do povo pela história de Adrian e Tanya ainda não tinha morrido. Como sempre, Diana mostrava-se indiferente aos olhares que as seguiam. Era como se estivesse decidida a provar que não se importava com o falatório.

- E então? - Diana perguntou, com sua voz fria. - A que conclusão chegou, a meu respeito? Tanya não pôde deixar de sorrir. - Estou sendo tão evidente assim? - Podemos dizer que você não é bem uma diplomata. - Você gosta de fingimentos, então? - Geralmente, eles são necessários. Nem sempre é bom dizer sobre o que estamos pensando.

Às vezes, o único modo de sermos felizes é não encarar a realidade. Esta era a frase mais longa que Diana já tinha lhe dito, e Tanya sentiu não poder concordar com

ela. - Se a gente não encarar a realidade, vai viver sempre uma mentira. E eu achei que você não

tinha medo da verdade. - Eu não estava falando sobre mim - Diana disse, surpresa. - Desculpe. Você falou com tanta sentimento, que pensei que estivesse falando de si mesma. Continuaram por mais algum tempo em silêncio, até que Diana falou, de novo: - Acho que é compreensível sua curiosidade a meu respeito. Afinal, Adrian me pediu em

casamento... - É - Tanya respondeu com dignidade. - Gostaria de saber o que ele encontrou em você que não

achou em mim. - Eu estava aqui... e você não. - Você também é muito bonita - Tanya falou, com esforço. Diana fez um gesto de pouco caso. - A minha aparência não tem nada a ver. Acho que Adrian queria que seu segundo casamento

exigisse menos dele. - Nunca exigi nada dele - Tanya disse com frieza. - Acho que não me expliquei bem - Diana falou, rapidamente. - Ele queria um casamento que

exigisse menos dele emocionalmente. - Os olhos azuis estavam pensativos. - Você não pode negar que é muito sentimental, Tanya.

- Sinto as coisas intensamente - Tanya concordou -, mas você também sente. - Você gosta mesmo de analisar as pessoas, hein? Deve ser um hábito do seu povo. Tanya encarou essa frase de Diana como um sinal para terminar com aquele tipo de conversa e

ficou quieta. Só voltaram a conversar, quando a garota estacionou o carro em frente ao mercado da cidade.

- Quanto tempo vai ficar na biblioteca? - Diana perguntou. - Umas duas horas. - Então vamos nos encontrar no Café Procters, mais ou menos às onze horas. Tanya sacudiu a cabeça. - Posso suportar o clima da Inglaterra, mas o café que é servido nos restaurantes ingleses,

nunca! Diana riu.

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- Está bem, então, vamos nos encontrar aqui mesmo. Já era meio-dia, quando elas começaram a viagem de volta, correndo tanto, que os campos se

fundiam em um borrão verde. Era incrível como Diana dirigia bem. Olhando para seu rosto sério, mais uma vez Tanya suspeitou que a garota devia ter sentimentos mais profundos do que deixava transparecer.

- Não estou dirigindo muito depressa para você, estou? - Diana perguntou. - Não, não. Você é ótima motorista. Dirige como um homem. - Espero que isso seja um elogio. - É claro que é. Você faz bem tudo. Nunca permite que suas emoções a atrapalhem. - É divertido quando... - Ela parou de falar, quando o carro deu um pulo, andou mais alguns

metros e depois parou. Diana tentou dar a partida várias vezes, mas o motor se recusou a pegar. Depois de alguns instantes, saiu do carro e foi dar uma olhada no motor.

Tanya decidiu sair também e se juntou à outra. - Sabe o que é que há de errado? - Acho que não. - Diana se debruçou mais sobre o motor. Quando endireitou o corpo, estava

com uma mancha de óleo na ponta do nariz e os cabelos caídos sobre o rosto. - Não estou vendo nada solto, e os fios parecem em ordem.

- Talvez esteja sem gasolina. - O tanque estava cheio, quando saí de casa. - Entrou de novo no carro e virou a chave, na

ignição. - Você está certa. O ponteiro ainda está indicando que o tanque está cheio... o que é impossível. Nós já rodamos bastante. Parece que vamos ter que ficar aqui, se não arrumarmos mais gasolina. Vou andar até aquele posto lá atrás. Não é muito longe.

- Eu vou - Tanya se ofereceu. - É melhor você ficar com o carro. Depois que Tanya saiu, Diana fechou o capô e decidiu esperar do lado de fora do carro. Estava

muito quente e ela levantou o rosto para o sol, de olhos fechados. - Que lugar mais estranho, para alguém tirar uma soneca - uma voz disse, bem atrás dela. Era a voz que a perseguia em seus sonhos. A garota se endireitou rapidamente e olhou para

Roger. - Fiquei sem gasolina - disse com frieza, e esperou que ele começasse a rir. Mas em vez disso,

ele a encarou com simpatia. - O indicador de gasolina quebrou? Grata pelo fato de Roger não ter achado que ela esquecera de encher o tanque, que era o que a

maioria dos homens teria pensado, Diana concordou. - Vou até um posto perto daqui, buscar um pouco - Roger se ofereceu. - Tanya já foi. - Neste caso, vou lhe fazer companhia, até ela voltar. - Muito obrigada, mas não precisa se preocupar. Estou me sentindo muito bem, sozinha. - Sozinha e intocável. Furiosa, Diana virou-lhe as costas. Mal tinha acabado de fazer isso, quando Roger a agarrou e

fez com que se virasse de novo para ele. A garota ficou surpresa, ao ver que o rapaz não estava zangado, apenas confuso.

- Por que estamos sempre brigando, Diana? Antigamente, não éramos assim! - Quando nós éramos crianças você sempre foi educado. - Não podia continuar um garoto perfeito para sempre - Roger comentou com voz rouca, e

brutalmente puxou-a de encontro ao peito, colando sua boca à dela. Não havia ternura em seu beijo, só paixão, e ela lutou para se libertar. Mas ele a abraçou com

mais força, tornando impossível o menor movimento. - Não lute comigo - avisou com voz rouca. - Sou forte demais para você. - É desse modo que trata as mulheres... à força? - É o único jeito de tratar você. - Sua boca pressionou a dela, mais uma vez. - Se me beijar

também, eu a soltarei - falou baixinho. - Até fazer isso, vai continuar minha prisioneira. Sabendo que Roger era bem capaz de fazer o que estava dizendo Diana levantou a cabeça e

fechou os olhos, mostrando claramente, com aquele gesto, que era melhor ele acabar de uma vez com aquilo.

- Ah, não. Assim, não. Quero que saiba exatamente quem a está beijando. Diana abriu os olhos. - E acha que eu preciso estar de olhos abertos, para saber? - perguntou, com agressividade. - Pode ser que não - ele disse, prendendo mais uma vez sua boca com a dele. Porque tinha lhe prometido não resistir, Diana ficou imóvel e a força com que ele a segurava,

diminuiu. Uma de suas mãos deslizou gentilmente até a cintura da moça, enquanto a outra

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acariciava o início arredondado de seus seios. Diana tremia, consciente que não era de repulsa. Seu corpo estava completamente fora de controle e os músculos se moviam como se tivessem vontade própria, correspondendo às exigências do corpo dele. Seus beijos se tornaram mais profundos, à medida que seu desejo aumentava. Até aquele momento, Diana nunca soube o que era ser desejada com tanta violência e abandono, muito menos que pudesse se entregar a esse desejo com tanta selvageria. Ela enfiou as mãos por baixo da camisa dele, acariciando com as pontas dos dedos a pele macia e o emaranhado de cabelos no peito de Roger. O fato dela saber o quanto o excitava tornava seu desejo por ele ainda maior.

Foi o barulho de um carro se aproximando que fez com que voltassem à realidade, e Roger separou seus lábios dos de Diana, embora não fizesse nenhum gesto para soltá-la.

- Só quando conversamos é que irritamos um ao outro - ele sussurrou. - Não enxergue mais do que existe. - A voz de Diana estava fraca, mas ela se sentiu aliviada de,

pelo menos, poder falar normalmente, quando cada molécula de seu corpo ainda desejava, insanamente, continuar nos braços dele. - Você é um homem atraente e eu...

- Não me diga que isso é tudo. Você não é do tipo que se excita com qualquer um. - Fez uma pausa, depois continuou: - Está querendo que EU faça amor com você. EU.

- Você se tem em alta conta, não é? - Você também me tem. Como resposta, ela ergueu a mão e o esbofeteou no rosto. O som do tapa foi cortante, mas não

mais cortante do que o olhar que Roger lhe lançou quando deu um passo para trás, com a marca de seus dedos na face.

- Você não me disse que esbofetear o rosto de um homem era coisa de novela barata? - Talvez um homem à-toa só consiga entender um gesto barato - Diana respondeu com voz

gelada e, com o rosto sem expressão observou-o se afastar dali. Tremendo, a garota entrou no carro e encostou a cabeça na direção. Ficou assim até ouvir os

passos de Tanya, que se aproximava. Com um olhar para o rosto de Diana, Tanya percebeu que alguma coisa tinha acontecido à

moça na sua ausência. Mas não precisou perguntar nada, pois tinha se encontrado com Roger no caminho de volta e a boca do rapaz estava toda manchada de batom. Em silêncio Tanya observou Diana encher o tanque, dar a partida e sair na direção de Park Gates.

- Encontrei Roger - Tanya murmurou. - Eu também. Ele... ele se ofereceu para ir buscar um pouco de gasolina. Tanya esperou, e como a outra continuou quieta, disse abruptamente: - Sei que vai achar ruim que eu lhe faça esta pergunta, mas... você ama Adrian? Um bom tempo se passou, antes de Diana responder, friamente. - Claro que sim. Concordei em me casar com ele. - Acho que eu devia ter usado a palavra paixão. Sente paixão por ele? - Realmente, Tanya! - Diana não tentou esconder sua irritação. - Acho melhor pararmos com

essa conversa. Afinal, você ainda é a esposa dele. - Dentro de algumas semanas ele estará livre para se casar com você e... - Por favor, não diga mais nada. - Um coelho atravessou correndo a estrada e a garota apertou

o breque. Tanya tinha se esquecido de colocar o cinto de segurança, e por pouco não bateu a cabeça no

vidro. - Desculpe - Diana disse rapidamente. - Eu tinha que evitar matar o coitadinho. Continuaram a viagem em silêncio. Tanya examinou, disfarçadamente, o cabelo despenteado e

a boca trêmula da outra. - Vou me intrometer de novo - murmurou -, mas acho que Roger está apaixonado por você. - Tanya! - Diana gritou. - Quer fazer o favor de ficar quieta? Roger e eu não sentimos nada um

pelo outro. Ele e Adrian têm feito parte da minha vida desde que eu posso me lembrar, mas é com Adrian que vou me casar. Agora, se não quer que eu pare o carro e a faça ir andando até Park Gates, é melhor mudar de assunto.

- Vamos falar sobre o tempo, então - Tanya respondeu. - Acho que nisso não vamos poder discordar.

Nos dias que se seguiram, Diana evitou ficar a sós com Tanya, mas aos poucos sua amizade casual retornou. Como se quisesse mostrar que não estava ressentida, a garota inglesa falou muito sobre seu passado e ela mesma. Sua infância não tinha sido nada fácil, pois depois da morte da mãe foi mandada para um internato e só voltava para casa nas férias. Mesmo assim, ficava sempre com as governantas.

- Você recebeu muita atenção - Tanya comentou um dia -, mas pouco afeto.

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- Meu pai nunca foi um homem muito expansivo. Mas ele sente as coisas com intensidade. Tem muito orgulho de sua família e do que herdou. Até alguns anos atrás, ele costumava visitar todos os nossos parentes, não importa onde vivessem.

- Quem vai herdar o título dele? - Um primo que mora na Escócia. - Acho que ele não deve ter gostado muito do fato de você ser mulher. - Eu também não gostava. - Pegou uma pilha de panfletos, que estavam em cima da

escrivaninha. - Devo começar a angariar votos às cinco horas. É melhor eu ir andando. Tanya sabia que Diana ainda tinha muito tempo, e só estava usando aquilo como desculpa,

para acabar com a conversa. - Que bom que não tenho que fazer isso. Eu detestaria falar com gente estranha. - Falar com eles não é nada - a outra respondeu. - O duro é quando eles batem a porta na cara

da gente. Tanya ainda estava rindo, quando Diana saiu. Depois que ficou sozinha, começou a pensar na

conversa que tiveram. Será que a garota realmente teve vontade de ter nascido homem e por isso escondia sua natureza terna sob uma aparência fria? Ela ainda não conhecia Lord Biddell, mas já sabia que ele era um homem difícil de conviver, e que tinha piorado muito com sua doença.

Ainda estava pensando em Diana, quando a sra. Chesterton entrou. - Ah, você está aí, Tanya - a mulher disse, com tanta delicadeza, que Tanya começou a pensar

se ela também achava, como o filho, que não era má idéia levar o casamento para a frente. Pelo menos até a vida política de Adrian se estabilizar. - Acabei de falar com Lord Biddell - a sra. Chesterton continuou. - Estava se tratando em Harrogate, e só voltou para casa ontem à noite. Ele nos convidou para jantar, amanhã.

Tanya pensou um pouco. - Eu também estou incluída no convite? - Naturalmente. Você é a esposa de Adrian. - Acontece que Diana é a noiva dele. A sra. Chesterton riu, ligeiramente embaraçada. - No momento você é a esposa de Adrian e nós todos... nós todos esperamos que seja tratada

assim. - Acho que eu não gostaria de jantar com Lord Biddell. - Não seja tola, menina. Ele é um homem importante e pelo bem de Adrian você precisa... - Está bem - Tanya a interrompeu. - Eu vou. - Use um dos seus vestidos longos, minha querida. E num daqueles tons claros, de que tanto

gosta. Eles ficam muito bem em você. - A senhora quer que Lord Biddell veja que Adrian sempre teve bom gosto? - Tanya perguntou. - Bem, ele sempre teve, não é? - E com isso, a sra. Chesterton se retirou. Tanya esperava que Adrian comentasse alguma coisa com ela, sobre o jantar na casa de Lord

Biddell. Mas, naquela noite, ele saiu cedo de casa, para falar em um comício em uma das cidades vizinhas. E no dia seguinte também não disse nada. Tanya decidiu então que se ele não se sentia embaraçado de levar a esposa para jantar na casa do seu futuro sogro, ela é que não ia se sentir.

Naquela noite Tanya se vestiu com muito cuidado e, quando se olhou no espelho, ficou mais do que satisfeita com sua aparência. Uma das primeiras coisas que Adrian fez, logo depois de apresentá-la a todos como sua esposa, foi lhe dar dinheiro para aumentar seu guarda-roupa. Quando protestou contra o luxo e a quantidade de vestidos, a sra. Chesterton fez com que se calasse rapidamente, dizendo que a esposa de Adrian não podia continuar parecendo uma refugiada.

Bem, ninguém a tomaria por uma refugiada, agora. A saia rodada e esvoaçante, de seda cor de ametista, dava mais altura à sua figura esbelta, envolvendo sua cinturinha fina e caindo até o chão em pregas suaves. Uma blusa de organdi rosa, de decote baixo e mangas longas e cheias, completava sua toalete, numa mistura de inocência e sensualidade, que combinava com sua personalidade.

Não havia ninguém na sala de estar, quando Tanya desceu, e ela resolveu ir até o jardim. Já ia saindo, quando viu Adrian junto à escada e, antes que pudesse recuar, ele se virou e a viu.

- Que bom que desceu cedo! Eu queria mesmo falar com você. - Caminhou na direção dela, estreitando os olhos azuis ao ver o lindo quadro que ela formava. - Você fica bem com esse vestido. Ainda não a tinha visto com ele.

- Sua mãe o comprou para mim, a semana passada. - Você tem o tipo perfeito para usar essas saias esvoaçantes, de tecidos finos. Não deve nunca

usar roupas pesadas.

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- De qualquer modo, as roupas pesadas estão fora de moda - ela disse, recusando-se a tomar o comentário dele como um elogio.

- Uma mulher bonita pode fazer sua própria moda - Adrian respondeu e, com as mãos nos bolsos do smoking, continuou a admirá-la.

Resolutamente, Tanya se recusou a ficar emocionada com a expressão dos olhos dele. Mas embora continuasse olhando firmemente para o rosto do marido, estava tremendamente consciente dos ombros largos e dos quadris rijos dele; da inclinação altiva da cabeça suavizada pela curva sensível da boca; da linha rija do maxilar; das mãos finas e longas, que já tinham segurado e acariciado seu corpo. Mas era uma loucura pensar nele de um modo tão íntimo! Tanya gostaria de poder controlar sua imaginação com tanta facilidade quanto controlava as palavras que dizia.

- Eu queria lhe falar sobre o pai de Diana - Adrian interrompeu seus pensamentos. - Ele sabe sobre nós dois...

- Se prefere que eu não vá com vocês, não me importo de ficar. - É claro que deve vir conosco. Você é minha mulher. - Não na realidade. - Isso é outra coisa sobre a qual precisamos conversar. Já faz tempo que estou adiando essa

conversa, mas... Mas Tanya nunca ficaria sabendo o que ele ia dizer, pois a sra. Chesterton entrou na sala com

pose de rainha, usando um vestido de brocado vermelho, seguida por Betty e Dick. - Dez minutos depois, estavam na casa de Lord Biddell, construída em estilo Rainha Anne, cuja

aparência magnífica combinava com a mobília esplêndida. Olhando o hall decorado com lambris de madeira escura e a elegante sala de estar, Tanya começou a entender um pouco mais a personalidade de Diana. Como era verdadeira a frase que dizia que ninguém conhece uma pessoa até que a veja em sua própria casa, pensou, observando a garota, vestida elegantemente de preto, se adiantar para cumprimentá-los.

Mas se Diana combinava com aquele ambiente, o mesmo não acontecia com seu pai, um homem grande e atarracado, com feições duras e rudes, que pareciam feitas a machadadas. Seus olhos eram da mesma cor dos da filha, mas muito mais penetrantes, e quando ele a olhou, Tanya se sentiu como se ele estivesse enxergando seu próprio íntimo.

- Agora sei por que Adrian se casou com você - ele disse. - É uma potranca muito bonita. No silêncio embaraçado que se seguiu, e durante o qual ele era a única pessoa que estava à

vontade, Lord Biddell se ocupou com uma bandeja de aperitivos, murmurando zangado, quando não conseguiu achar o gelo.

- Juro que vou despedir Tompkins, se ele não melhorar. - Virou-se para a filha. - Peça gelo! Rapidamente, Diana saiu da sala. Tanya olhou surpresa para seu anfitrião. Será que ele sempre

falava com a filha assim? E a filha? Será que sempre obedecia com tanta docilidade? Ninguém parecia achar nada de estranho e ela começou a imaginar se não estava sendo muito sensível. Mas, com o correr da noite, decidiu que não estava, pois o homem continuou a tratar Diana como se fosse uma criança. Não só deu ordens a torto e a direito para a filha, como a interrompeu várias vezes, quando ela estava falando. Uma vez, quando ela fez um gesto, como se fosse interrompê-lo, ele ergueu a mão e ordenou-lhe que se calasse.

Inevitavelmente, a eleição acabou como assunto da conversa. - Não tem com que se preocupar, garoto - Lord Biddell disse com sinceridade. - O povo do

campo ainda tem bastante juízo para votar em você, e não naquele oportunista do Poulton. Tanya olhou rapidamente para Diana, mas a garota continuou a comer, como se o pai não

tivesse dito nada. Mas a rovniana era feita de outro material e, pousando o garfo, disse para seu anfitrião: - Por que chama o sr. Poulton de oportunista? - Porque ele é. Gostaria de botar a família Poulton inteira para fora deste país, a pontapés. Tanya não conseguiu se controlar. - O senhor se esqueceu que o pai de Roger lutou por este país e morreu na Irlanda? Ou isso não

tem mais nenhum valor? - É claro que tem. - Lord Biddell continuou cortando a carne, imperturbável. - Eu não disse que

eles são uma família de covardes, só que deviam ser expulsos do país. - Só por que eles não pensam como o senhor? Apenas nesse momento Lord Biddell deu a impressão de notar o tipo de comentários que ela

estava fazendo, e fixou-a com seu olhar duro. - Você não devia sair por aí defendendo o rival do seu marido, moça. Não é bonito, sabe?

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- No meu país, nós não consideramos bonito atacar um homem quando ele não está presente para se defender.

A sra. Chesterton soltou uma exclamação abafada, e Betty e Diana continuaram a olhar fixamente seus pratos. Só Adrian olhou diretamente para Tanya, segurando o pé do cálice com tanta força, que seus dedos estavam brancos. Mas, quando ele falou, sua voz era calma.

- Lord Biddell não estava querendo dizer exatamente o que você ouviu. Quando o conhecer melhor, vai entender o que estou dizendo.

- Adrian tem razão. - O velho Lord riu. - Sempre expresso minhas opiniões de um modo muito forte. É a única coisa em que consigo ser forte.

O momento embaraçoso passou e Tanya jurou nunca mais agir impetuosamente. Quando o jantar acabou, os homens permaneceram na mesa, com seus cálices de vinho do

Porto. A sra. Chesterton e Betty foram retocar a maquiagem, deixando Tanya e Diana sozinhas na sala de estar.

- Espero que não tenha ficado aborrecida com meu pai - Diana murmurou. - O que ele disse não me aborreceu tanto quanto o fato de você não ter defendido Roger. - E por que eu deveria defender Roger? Ainda insiste naquela idéia ridícula de que eu o amo? - Vamos deixar o amor fora disso. Só vamos nos lembrar que você é amiga dele. - Roger e eu não somos mais amigos - Diana declarou, sem rodeios. - É por isso que você permitiu que ele a beijasse, aquele dia em que o carro parou na estrada? - Não pude evitar. Roger me forçou. Ele está sempre fazendo coisas como essa. - Então Roger está sempre fazendo coisas como essa? E você ainda tem coragem de dizer que

ele não a ama? Por um instante Diana ficou sem palavras, mas depois sua inteligência a ajudou. - Você mesma disse que amor não tem nada a ver com paixão. E é isso que Roger sente por

mim. Paixão. - E amor - Tanya completou. - Não! Roger é um homem viril e se sente atração por uma garota ele... - Que bobagem está dizendo? Não pode achar que Roger sai por aí, beijando toda mulher

atraente que ele vê. Não importa o que diga, você não é tão tola a ponto de pensar que isso seja verdade! Ou é tão esnobe, que não é capaz de admitir o que sente por ele?

- Eu não sinto nada por ele. - Diana levantou-se de um salto da poltrona em que estava sentada e caminhou até o outro lado da sala. Fingiu arrumar umas almofadas, depois continuou: - Não sinto nada por Roger, e gostaria que você parasse de falar nisso. Senão, vou começar a pensar que está tentando criar um romance entre nós de propósito, para ficar com Adrian.

Tanya estremeceu visivelmente, mas se recusou a admitir que estava errada. - Eu nunca vou fazer nada para conquistar Adrian de novo, e sustento tudo o que eu disse sobre

Roger. Pode ser que você não o ame... não vou mais discutir a esse respeito, mas ele a ama. Tenho certeza disso.

Diana abriu a boca, mas antes que pudesse falar, a sra. Chesterton e Betty entraram, seguidas pelos homens. Lord Biddell estava de ótimo humor, e sugeriu um jogo de bridge.

- Você joga? - perguntou para Tanya. - Não. - Então Diana e eu jogaremos com Adrian e a sra Chesterton. Betty e Dick são só principiantes. - Prefiro não jogar esta noite - Diana disse. - Estou com dor de cabeça. - Vai lhe fazer bem jogar. - Mas eu não quero. Lord Biddell corou, e Betty desviou a atenção dos outros arrumando as cadeiras em torno da

mesa de bridge e se oferecendo para jogar no lugar de Diana. - Deixem-me jogar - pediu com vivacidade. - O meu bridge melhorou muito. Logo o jogo começou e Diana e Dick se sentaram com Tanya do outro lado da sala, tentando

ensiná-la a jogar buraco. Mas Tanya não conseguia se concentrar nas cartas. Tinha notado a tentativa de Diana resistir ao pai e, apesar da revolta ter sido fraca, gostaria de saber se tinha alguma razão oculta.

- Preste atenção no jogo, Tanya - Dick disse. - Já perdeu duas canastras. Sorrindo com ar culpado, Tanya se concentrou nas cartas, mas logo seus pensamentos se

desviaram de novo, desta vez para Adrian. Como ele combinava bem com essa mansão grandiosa! Ele tratava Lord Biddell com a mistura exata de respeito e bom humor, e sem dúvida seria um genro admirável. E Lord Biddell, com sua imensa riqueza e nome ilustre, seria um ótimo sogro. É, Adrian e Diana estavam destinados a se casar, e nem ela, nem Roger poderiam impedi-los.

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Sentindo-se completamente infeliz, Tanya decidiu se concentrar nas cartas que tinha na mão. Ficou maravilhada com a própria capacidade de fingir interesse no jogo, quando tudo que queria era fugir dali e se esconder.

CAPÍTULO XI

Não era sempre que Roger ficava irritado com sua família. Já fazia tanto tempo que estava acostumado a trabalhar com um monte de gente em torno dele, que tinha se habituado a não deixar que isso afetasse sua concentração. Mas, aquela noite, o falatório sem fim de seus irmãos o irritou tanto, que teve que se esforçar para não dar uns tapas em Brian, o mais barulhento de todos.

Felizmente, a sra. Poulton sempre percebia quando as coisas estavam ficando muito difíceis de agüentar para seu filho mais velho e, com algumas palavras firmes, tirou todos da sala. Depois, abaixou o volume do rádio, serviu outra xícara de chá e empurrou-a através da mesa.

- Beba enquanto está quente - disse. - Vai lhe fazer bem. Roger sorriu cansado e obedeceu. - Teve um dia duro, meu filho? - Já tive outros piores. Adrian está lutando com valor. O páreo vai ser duro. - Ainda acho que você vai vencer. - Palavras de mãe. - A campainha tocou e ele gemeu. - Não quero ver ninguém, esta noite.

Atenda e arrume uma desculpa qualquer, por favor. Docilmente, sua mãe concordou, mas quando voltou para a sala, não estava sozinha e Roger

deu um pulo, quando viu quem a acompanhava. - O que está fazendo aqui? - perguntou com grosseria. - Roger! - a sra. Poulton falou antes que Diana pudesse fazê-lo. - Que maneira de falar com uma

visita! - Virou-se para a garota. - Não ligue para ele. Está cansado. - Não fique arrumando desculpas para o meu mau humor, mãe - Roger falou, com azedume. -

Tenho certeza que Diana não espera que eu seja educado. A sra. Poulton saiu, fechando a porta atrás dela, e Roger indicou uma cadeira para Diana. - Minha mãe está certa - ele disse hesitante. - Fico com um humor horrível, quando estou

cansado. Desculpe. - Não foi nada. Na verdade, quem deve lhe pedir desculpas sou eu. Foi por isso que eu vim. - Pedir desculpas? Por quê? - Por eu ter esbofeteado você naquele dia. Por alguns instantes, Roger deu a impressão de estar embaraçado, depois sorriu. - Acho que eu mereci. - Sei que mereceu - ela disse com frieza. - Mas uma má ação não justifica outra. - Você não disse que veio até aqui para me pedir desculpas? - Roger perguntou com ironia. - Disse, mas você sempre me irrita, e eu acabo perdendo a paciência. - Pelo menos, isso mostra que você é humana. - Puxou uma cadeira e se sentou à cavaleiro, de

frente para ela. - Até você me bater, naquele dia, sempre a achei calma e fria como uma esfinge. - E é errado ser calma? - Só quando a pessoa começa a se tornar fria demais. Diana prendeu a respiração. - Você não tem papas na língua, não? - É o meu problema. Sempre falo antes de pensar. - É um hábito que devia perder. Isso pode afetar sua carreira política. - Você está coberta de razão - ele caçoou. - Talvez eu esteja precisando de uma esposa, para

me curar dos meus maus hábitos e me transformar num cavalheiro. Não quer se candidatar ao emprego?

- Mesmo que quisesse, não teria sucesso. É preciso ter muita capacidade e vontade de trabalhar numa tarefa tão árdua.

- Você também não tem papas na língua - comentou, balançando a cadeira para frente e para trás. - Esse golpe foi bem baixo.

- Acho que nenhum de nós está preocupado com o lugar que nossos golpes atingem. Nossas conversas sempre acabam em verdadeiras lutas livres.

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- A culpa é tanto minha quanto sua - Roger respondeu com generosidade. - Fique mais um pouco e tome uma xícara de chá. Só para provar que podemos conversar, sem brigar.

- Não posso. Papai está me esperando para jantar. Roger levantou as sobrancelhas, já zangado. - Já pensou em desobedecê-lo? Ou tem medo? - Medo do quê? - De ser independente. - Se eu quisesse ser independente, poderia ser. Mas acontece que prefiro fazer o que meu pai

quer. - Por quê? - Porque eu lhe devo isso. - Você lhe deve isso? Como assim? - Ele estava perplexo. - Eu lhe devo obediência e... - hesitou. - Obediência e amor. Sou tudo o que papai tem. Se ele

tivesse outros filhos... se ele tivesse um filho... - Meu Deus! Parece que você está precisando de um psicólogo. - O tom de Roger era o de quem

não estava acreditando no que ouvia. - Não me diga que tem complexo de culpa, por não ter nascido homem?

- É tão difícil assim, para você, entender? Não consegue imaginar como papai se sentiu, quando descobriu que minha mãe não poderia mais ter filhos, depois que eu nasci? Ele queria desesperadamente ter um filho... para herdar seu título.

- O título não vai desaparecer - Roger disse, ainda espantado. - Não posso entender esse seu sentimento. É tão fora da nossa época.

- É porque você foi educado de modo diferente do que eu fui. Para mim, é natural sentir isso. É lógico.

- Não é lógico - ele corrigiu. - É um jeito emocional de sentir. - Pelo menos você admite que sou capaz de sentir emoções. Os olhos de Roger pousaram em sua boca e ela soube, na mesma hora, que ele estava se

lembrando do modo como tinha reagido aos beijos dele. Diana o examinou rapidamente, vendo o quanto estava exausto e como seu rosto estava pálido e marcado por linhas de cansaço. Será que seu cabelo sempre tinha sido tão rebelde? Que vontade de correr os dedos por entre eles...

De repente, Diana parou de pensar, arrependida de ter seguido o impulso de vir até ali. Tanya é que era a culpada. Tanya é que estava tentando fazer com que ela se apaixonasse por outra pessoa, e deixasse Adrian. No entanto, Diana nunca tinha amado Adrian. Ele nunca foi capaz de excitá-la como Roger fazia. Seu coração começou a bater com força, e Diana sentiu medo que Roger visse a artéria que pulsava em seu pescoço.

- Preciso ir - sussurrou. Em silêncio, ele a acompanhou até seu carro. - Nunca teve vontade de lutar por alguma coisa em que acreditasse? - ele perguntou, quando

ela se sentou atrás da direção. - Até hoje, não. Mas agora resolvi lutar por uma coisa. - Posso saber pelo quê? - Minha liberdade - Diana respondeu vagarosamente. - O direito de fazer exatamente o que

quero. Havia tanta tristeza em seus olhos, que Roger sentiu uma vontade enorme de tirá-la do carro e

abraçá-la. Estava fazendo tanto esforço para se controlar, que quando falou sua voz saiu rouca e áspera.

- Se quer mesmo sua liberdade, deve lutar por ela. - Sem ligar para quem eu possa ferir? - Não se pode fazer uma omelete sem quebrar os ovos. - Detesto omeletes - disse com raiva e, pisando com força no acelerador, saiu dali. Com uma sensação de inutilidade, o que raramente acontecia com ele, Roger foi para seu

quarto, o único lugar onde podia ficar, sem ser perturbado. Ver Diana estava se tornando um tormento cada vez maior e ele lamentava o dia em que a beijara pela primeira vez. Até agora, ainda não tinha descoberto por que fizera aquilo. Só sabia que, quando Diana caminhou na direção dele, lá nos bosques, esbelta e indiferente, sentira-se tão excitado quanto um adolescente. Ela ficaria surpresa, se descobrisse que, desde que era menino, ele já estava perdido de amor por ela.

- Mas agora, não - Roger murmurou. - Tenho coisas melhores para fazer do que desperdiçar a minha vida querendo uma mulher que tem medo até de admitir que simpatiza comigo.

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Endireitando os ombros num gesto de briga que seu cabo eleitoral adoraria ter visto, Roger foi para seu escritório. Tinha muitas coisas para fazer, e talvez no trabalho encontrasse um pouco de paz.

Na manhã seguinte, Tanya estava a caminho da cidade, quando viu Roger saindo do correio. Eles não se encontravam desde a noite em que tinha ido à casa dele, dizer-lhe que sua identidade fora descoberta. Estava imaginando se devia evitá-lo, quando ele a viu e caminhou para ela. De perto, Roger parecia bem cansado: seu rosto estava cheio de rugas de preocupação e as mãos mexiam inquietas com um monte de folhetos.

- Faz tempo que não a vejo - disse. - Tenho estado muito ocupada. - Garantindo a vitória de Adrian? - Ela corou e ele colocou a mão em seu braço. - Desculpe,

Tanya. Falei sem pensar. Vamos tomar um café? - Acha que não tem importância nós sermos vistos juntos? - E se tivesse? Você me é mais importante como amiga do que a carreira política. Tanya o acompanhou até um bar ali perto, onde já tinham estado uma vez. Depois que o líquido

claro que os ingleses chamavam de café foi colocado na frente deles, começou a examinar o rosto dele.

- Você não está com uma boa aparência. Roger. É por causa de Diana? - O que ela tem a ver com isso? - Você está apaixonado por ela. Eu... - Pelo amor de Deus! - ele explodiu. - Quer parar com esse martírio? - Você e Diana é que estão se martirizando. - Não me diga que falou nessa tolice para ela. - Roger estava furioso. - Droga, Tanya. Precisa

parar de interferir na vida dos outros. - Está bem. - Tanya o olhou de frente, sem piscar. - Continue fingindo. Você e Diana. A vida é

tão curta e sem significado, que não tem importância se passarem por ela representando. - Não. - A voz dele soou angustiada. - Você sabe que eu não acredito nisso. Mas... - Ele sacudiu

a cabeça. De que adiantava continuar lutando contra seus sentimentos? É claro que amava Diana. E a amaria por toda sua vida. - Você tem razão. Mas de que me adianta isso? Eu e Diana nunca poderemos ser felizes juntos.

Os lindos olhos de Tanya se encheram de lágrimas. - Precisa tentar. Diana o ama também. Nunca admitiu isso para mim, mas eu sei. - Está enganada, ela é uma digna filha de Lord Biddell. Mesmo que gostasse de mim... - Ela o ama. - Mas ama mais ainda o pai dela. - Talvez o ame tanto quanto a você - Tanya concedeu -, mas não mais. É por isso que você

precisa mostrar a ela o caminho. - Mostrar a ela o caminho? - Dizer-lhe como se sente. - Mesmo assim, ela nunca faria uma coisa que pudesse aborrecer o pai. - Já lhe pediu para se casar com você? - Está louca? - Então, como quer que Diana deixe o pai? Está esperando que ela o peça em casamento? - Está querendo que eu faça papel de tolo? E sabe tão bem quanto eu que a menos que Diana

resolvesse enfrentar Lord Biddell, nunca teríamos uma chance de sermos felizes. - Precisa lhe dar uma razão para enfrentar o pai. - Não tenho intenção de fazer o primeiro movimento. Tanya levantou as mãos para o céu - Você é teimoso como uma mula! Você precisa fazer o primeiro movimento... ela precisa fazer

o primeiro movimento... Nunca ouvi falar tanto em movimento, com todo mundo parado. - Inclinou-se para ele. - Se encorajar um pouco Diana... o suficiente para ela saber que está em seus pensamentos, tenho certeza que ela vai achar coragem para enfrentar o pai.

- Não posso falar com Diana. Ela riria na minha cara. - Pobre garotinho! - Tanya caçoou, mostrando-se cruel pela primeira vez, desde que o conhecia.

- Não tinha percebido o quanto você é covarde. O rosto de Roger ficou tão vermelho quanto seu cabelo. - Vamos deixar esse assunto de lado - disse, tenso. Tanya concordou. - Não vou mais tomar o café. Está muito fraco. - Eu também não. - Deixou algumas moedas sobre a mesa saiu com ela do café.

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- Continuamos amigos? - Tanya perguntou, com voz abafada. Sem hesitar, ele segurou seus ombros. - Sempre, Tanya, sempre.

CAPÍTULO XII

- Diana, onde está você? A voz de Lord Biddell ressoou tão alto no hall, que as cabeças de veados, que decoravam as

paredes, pareceram estremecer. A moça, que estava na porta da frente, virou-se para o pai. - Que é, papai? - Venha até a biblioteca. Preciso falar com você. - Já estou de saída. Isso não pode esperar? - Não, não pode - o pai gritou. - Venha cá. Encolhendo os ombros, ela obedeceu. Lord Biddell estava sentado atrás de uma escrivaninha de

carvalho, maciça, com um charuto na boca. Parecia que nada no mundo conseguiria varrer a expressão de satisfação de seu rosto de feições rudes.

- Ouvi dizer que você está andando com aquele tal de Poulton - entrou firme no assunto. - É verdade?

- Não, não é. - Alguém viu você saindo da casa dele. - Eu fui vê-lo - ela respondeu. - Mas isso não quer dizer que eu esteja andando com ele. - Bom, seja lá o que for, não quero saber disso. Ouviu? - É impossível deixar de ouvi-lo, com o senhor gritando desse modo. O pai estranhou. - O que há com você, mocinha? Mudou muito, de uns tempos para cá. - Talvez eu esteja crescendo. - Crescendo? Que tolice é essa? Você já é uma moça feita. - Estou surpresa do senhor ter percebido. - Não se faça de espertinha comigo. Se eu... - ele se interrompeu quando a governanta entrou,

carregando um enorme buquê de rosas de cabo longo e um ramalhete de violetas. - Que diabo é isso?

- São para a srta. Diana, senhor. Olhando surpresa para seu pai, Diana pegou as flores e tirou um cartão do envelope preso ao

buquê. "Não seja como as violetas, que crescem melhor na sombra, mas como as rosas, que se abrem

ao calor do sol." Embaixo da mensagem, estava a assinatura de Roger. As faces de Diana mostravam-se

coradas, quando ela se dirigiu para a porta. - Quem mandou essas flores? - o pai gritou, atrás dela. - Roger Poulton. - E o que ele quer, mandando flores para você? - Por que ele não deveria mandar? É um dos meus amigos. - Você não se dá com ele há anos! - Lord Biddell resmungou. - É aquela garota estrangeira que

está fazendo você pensar assim. A esposa de Adrian. Eu sempre soube que nada de bom podia sair daquele casamento.

- E por que não devo ser amiga de Roger? - Diana explodiu. - Eu o conheço desde criança e ele é muito inteligente.

- Sei que ele é inteligente. Já ouvi um ou dois de seus discursos. O rapazinho sabe como convencer as pessoas de que seu ponto de vista está certo... mesmo que esteja errado. Mas inteligência não é tudo, minha cara, e precisa parar de vê-lo.

- Eu não o tenho visto. - Como não? Você foi à casa dele! - Bem, eu... - Diana não conseguiria nunca dizer a verdade ao pai, e se viu forçada a mentir. -

Eu costumava ir lá quando era criança e... e queria vê-lo de novo. - Para quê? Você não é mais uma criança. É uma mulher e deve se comportar como tal.

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- Gostaria que o senhor me tratasse como uma mulher. Infelizmente, sempre me trata como se eu fosse uma criança. Vive me dizendo o que devo fazer, o que devo vestir, quem devo ver. - Sua voz estava abafada pelas lágrimas. - Até mesmo com quem devo me casar.

- As coisas mudaram mesmo... Acho que Adrian acabou se apaixonando de novo pela mulher dele.

- Sorte dele se se apaixonou. Ele seria um idiota, se a mandasse embora. - Agora tenho certeza de que você está louca. - Por quê? Porque não pretendo me casar com Adrian? - Por causa do Poulton? - o pai rugiu. - Não me diga que aquele aventureiro significa alguma

coisa para você! - Ele significa tudo! - Diana estava tão zangada, que mal percebeu o que estava dizendo. - E

não o chame de aventureiro. Eu o amo, entendeu? Eu o amo. Um longo silêncio caiu entre eles. Era difícil dizer quem estava mais surpreso: Diana ou o pai.

Mas Lord Biddell se recuperou primeiro e, quando falou, sua voz era quase delicada. - Sabe o que está dizendo, Diana? - Eu... eu não sabia. Não sabia, até o momento em que o disse - murmurou. - Até agora, eu... eu

nem sabia que isso era verdade. - É claro que não é verdade! - Lord Biddell inclinou-se na cadeira, tentando parecer um tio

bondoso. - Está exausta, mocinha. Esse negócio todo do Adrian é que a deixou assim. E naturalmente você é orgulhosa e não quer admitir que está magoada.

- Não estou magoada por causa de Adrian. Agora eu não me casaria com ele, mesmo que ele estivesse livre. Eu não o amo. Nunca amei.

- Pode ser que sim, pode ser que não. Mas este não é o momento para resolver isso. Tudo que quero agora é fazer com que você volte ao normal. Talvez deva fazer um cruzeiro... Ir até a América ou as Bahamas. Vai se sentir muito melhor, depois que mudar de ambiente.

- Já estou me sentindo muito melhor. Pela primeira vez na vida, sei o que quero, sem ninguém precisar me dizer.

- Só quero o melhor para você - seu pai prosseguiu. - Você é como um filho para mim... - Esse é o mal, papai. Eu não sou um filho e nunca poderei ser. Esse é que sempre foi o

problema. Tentei ser o filho que o senhor nunca teve e, por causa disso, falhei como mulher. Nós dois estivemos nos enganando e precisamos parar com isso. Não posso carregar o seu nome para sempre e, mesmo que eu lhe dê um neto, ele não poderá carregá-lo, também.

O rosto de Lord Biddell tornou-se sombrio. - E você espera que eu me sinta alegre com um neto de sobrenome Poulton? Passou-se um momento, antes de Diana responder. - Nunca pensei nisso até agora, mas... por que não? - Esse sujeito a ama? - Lord Biddell perguntou de repente. - E por que ele deveria? Nunca o encorajei. - Homens como Roger Poulton não precisam de encorajamento. - Ele viu o brilho nos olhos dela

e continuou rapidamente: - Pelo menos, ele tem mais juízo que você. Sabe qual é o lugar dele, mesmo que você não saiba.

- Nós todos temos um lugar no mundo - Diana disse furiosa -, e o senhor não é mais importante que qualquer outra pessoa.

Sem dar ao pai uma chance de responder, abriu a porta e saiu correndo. Deixando o buquê em cima de uma das mesinhas do hall, com a mente num verdadeiro turbilhão, abriu a porta da casa e começou a caminhar pelo bosque. Só quando viu os portões de Park Gates, é que percebeu que tinha ido à procura de Tanya.

Tanya era a única pessoa com quem podia falar livremente. Tanya era a única pessoa que percebeu quais eram seus verdadeiros sentimentos, antes dela mesma saber disso. Sem fôlego, Diana parou em frente a porta da casa, no momento em que Tanya e Adrian saíam.

- Oi - Adrian disse. - Vou fazer um comício em Little Compton. Quer vir junto? - Não posso. - Olhou para Tanya. - Vai com ele? - Vou. Estava querendo conversar comigo? - Não podemos demorar - Adrian interrompeu. - Já estamos atrasados. - Telefono para você, assim que eu voltar - Tanya disse. - Não sei se vou estar em casa. É melhor eu telefonar para você. Diana atravessou o gramado, na direção do atalho que geralmente usava, quando vinha de sua

casa. Tanya observou-a até ela sumir no bosque, depois virou-se para Adrian. - Tenho certeza que alguma coisa está muito errada. Acho que devo ficar e conversar com

Diana.

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- Agora não dá mais. Diana já deve estar longe. Foram até o local do comício em silêncio, e Tanya só conseguiu se esquecer de Diana e prestar

atenção no marido, quando se sentou atrás dele, no palanque. Adrian estava muito pálido, e ela percebeu que ele também tinha notado a hostilidade da audiência. Aquele ia ser um comício muito duro.

Foi pior do que Tanya esperava. Adrian só conseguiu falar por alguns minutos, antes de ser interrompido aos gritos. Ele fez o possível para controlar a assistência e, quando a gritaria aumentou, olhou na direção de Tanya. Ela sabia que Adrian estava esperando pelo seu sinal, para irem embora, mas estava decidida a não deixar o marido fugir das críticas. Se ele acreditava mesmo no que estava dizendo, encontraria forças para convencer o povo da sua sinceridade. Fez um gesto muito rápido e leve com a cabeça, o rapaz endireitou os ombros e virou-se para enfrentar a audiência.

O falatório continuava, mas Adrian levantou a voz e logo algumas pessoas começaram a prestar atenção no que dizia. Aos poucos, a atmosfera mudou e ele pôde expor suas idéias e ser ouvido.

Os aplausos que recebeu, quando terminou, compensaram aquela meia hora inicial. Quando estavam saindo, Adrian segurou o braço de Tanya.

- Obrigado por ter me feito ficar. Eu teria ido embora, se você não estivesse comigo. Era a primeira vez que Adrian reconhecia que sua presença o estava ajudando, e Tanya ficou

zangada com ela mesma, por causa da ternura que sentiu por ele. - Estou contente por poder servi-lo. - Acho que não devia usar essa palavra. Tanya não respondeu e Adrian largou seu braço. No caminho de volta, ele estava mais distante

do que nunca, respondendo às suas perguntas com gentileza, mas de modo frio. Depois de algum tempo, Tanya ficou em silêncio. Estava contente por só faltarem dois dias para a eleição. Depois disso, estaria livre para ir embora, livre para arrancar Adrian de sua vida, para sempre.

Quando entraram em casa, faltava mais de uma hora para o jantar e Tanya parou no hall. - Acho que vou ver Diana - disse. - Se tivesse dito antes, eu poderia ter deixado você lá. Espere um pouco, que vou levá-la. - Não é preciso. Estou querendo dar uma caminhada. Seus olhos se encontraram através do hall. Os dele estavam sérios, e seus lábios estavam

apertados numa linha tão fina, que Tanya pensou que ele fosse perder o controle. Então, com um encolher de ombros, Adrian se virou e entrou na biblioteca.

Recusando-se a pensar nele, foi para a casa de Diana. - A srta. Diana não está em casa - a moça que atendeu a porta disse. - Lord Biddell também

está esperando por ela. - É você, Diana? Tanya deu um pulo, quando a voz de Lord Biddell ecoou no hall e o homem apareceu, apoiado

em uma bengala. - Ah, é a esposa de Adrian. Entre, entre. Pensei que fosse Diana. Não sei onde esta menina pode

estar. Já passou bastante da hora do jantar. Ela nunca chegou tão atrasada. - O senhor sabe aonde ela foi? - Não. Minha filha saiu daqui gritando como uma lavadeira, mas não disse para onde ia. Está

ficando muito independente. - Pelo menos ela está mostrando que tem vontade própria. - Acho que devo isso a você, não? - Nunca disse a sua filha como devia se comportar. - Mas tem lhe dado exemplos. Não sei o que está acontecendo! Está todo mundo louco! Bem, já

que está aqui, não quer jantar comigo? - Sinto muito, mas não posso. Estão me esperando em Park Gates. - Então é melhor você ir - Lord Biddell disse, acompanhando-a até a porta -, senão todos vamos

jantar tarde. Tanya não pôde deixar de sorrir e ficou surpresa, quando ele retribuiu seu sorriso. - Gostaria que Diana tivesse um pouco do seu desembaraço e independência. - Agora há pouco o senhor disse que ela estava muito independente e que o senhor não gostava

disso. - Detesto que me lembrem o que eu falei. Esse é o problema com as mulheres sempre se

lembram do que a gente disse. Tanya não pôde deixar de rir. Em pequenas doses, Lord Biddell até que era divertido! Mas ela

entendia por que Diana tinha tanto receio dele e também por que, finalmente, acabou se rebelando contra o pai.

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A família já estava sentada à mesa, quando chegou a Park Gates. Rapidamente, sentou-se ao lado de Adrian, e ficou grata quando ele lhe perguntou se tinha visto Diana. Depois do jantar, quando se encaminhavam para a sala de estar, para tomar café, ele ficou para trás, mostrando claramente que queria falar com Tanya a sós.

- Conseguiu encontrar Diana? - Ela não estava em casa e o pai não sabia onde poderia estar. - Acha que eles brigaram? - Tenho certeza. Gostaria de não ter ido ao comício. Diana estava precisando falar comigo. - É bobagem você se sentir culpada. E acho que está preocupada à toa. Diana não é do tipo

capaz de fazer tolices. Provavelmente está aborrecida por ter se descontrolado e foi se acalmar conversando com alguma amiga. Tenho certeza que logo vai voltar para casa.

Havia lógica no que Adrian estava dizendo e Tanya concordou com ele. - Acho que tem razão. - É a primeira vez que admite que eu possa ter razão, em alguma coisa. Não havia humor na voz de Adrian, só uma amargura que ela não conseguiu entender. Que

direito ele tinha de ser amargo, quando ela é que estava sofrendo, ela é que fora enganada? - Vou para meu quarto, Adrian. Não quero café. Adrian a acompanhou até o início da escada. - Não vou deixar que continue fugindo de mim, Tanya. Temos que conversar a respeito de

muitas coisas, mas vamos deixar isso para depois da eleição. Tanya concordou e subiu as escadas. Não tinha intenção de discutir nada com Adrian, nem

antes, nem depois da eleição. Mas se dissesse isso, agora, estaria precipitando uma discussão, e ela já estava no fim de sua paciência. Quando não precisassem mais dela ali, faria as malas e iria embora.

CAPÍTULO XIII

O sol penetrando no quarto através das cortinas despertou Tanya, na manhã seguinte. Antes de se vestir, telefonou para Lord Biddell. Mas Diana ainda não voltara, e ninguém sabia dela.

- O senhor já falou com a policia? - Não - ele gritou. - Diana saiu de casa de mau humor, e vai voltar quando tiver se acalmado.

Conheço minha filha. Tanya teve que se controlar para não lhe dizer que, segundo ele mesmo, Diana nunca tinha

feito isso antes. - Ela pode ter sofrido um acidente, ou ter se sentido mal. Talvez, se o senhor chamar a polícia... - Se uma dessas coisas tivesse acontecido, eu já estaria sabendo. E seria uma tolice chamar a

polícia. Tanya desligou o telefone, muito preocupada com Diana. Já estava quase na escada, quando se

lembrou de Roger. Será que Diana tinha ido procurá-lo? Não era o tipo de coisa que a garota faria normalmente, mas ela estava fora de si. Correndo, Tanya desceu a escada, mas parou no último degrau, quando Adrian saiu da sala onde costumavam tomar café da manhã. Só um leve erguer de sobrancelhas mostrou sua surpresa, quando a viu de penhoar. Era a primeira vez que ela saía do quarto sem estar completamente vestida.

- Chegou a tempo de tomar café comigo - ele disse.- Não desci para tomar café. Preciso telefonar para Roger, para saber se Diana está lá. Ela pode

ter ido procurá-lo, afinal os dois se amam. Só depois que falou, é que Tanya se lembrou que Adrian não tinha a mínima idéia do que Diana

e Roger sentiam um pelo outro. Ele podia muito bem pensar que a esposa tinha incentivado um romance entre os dois, de propósito, para tirar Diana do caminho.

- Está me dizendo que Diana e Poulton estão apaixonados um pelo outro? - Sei que Roger ama Diana, e tenho certeza de que ela também o ama. - Ela disse isso? - Não, mas acho que está tentando esconder seus sentimentos. Por isso é que estou querendo

ligar para Roger. - Se Diana está escondendo seus sentimentos, acho que você devia respeitar sua vontade. E se

ela estivesse com Poulton e quisesse que você ficasse sabendo, teria lhe telefonado. - Então, o que devo fazer?

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- Por enquanto, nada. Vamos tomar café. Ele a segurou pelo braço, e Tanya sentiu o calor de sua mão através do penhoar de seda. Isso

despertou nela uma tremenda vontade e de se jogar nos braços dele. Em vez disso, afastou-se, com brusquidão e entrou na saleta. Adrian a seguiu, em silêncio. Tanya observou-o encher uma xícara de café, cortar e passar manteiga em um pãozinho, e estendê-los para ela.

- Coma - disse com gentileza. - Vai fazer você se sentir melhor. Há quanto tempo sabe que eles estão apaixonados?

- Há pouco tempo. Diana ainda está lutando contra, mas Roger já admitiu o que sente. Adrian olhou-a com atenção. - Pobre Tanya! Você não tem tido sorte no amor, não? Roger... - Mas eu nunca amei Roger - ela o interrompeu, decidida a não deixar que ele sentisse pena

dela. - Ele era... e ainda é meu amigo. - Nos olhos dele, ela viu a dúvida. - Não estou interessada em me casar com ninguém, por enquanto. E, quando o fizer, vai ser com um homem que não me lembre o meu relacionamento com você.

O sangue que subiu ao rosto de Adrian mostrou a Tanya que o tinha convencido de que não amava nem Roger nem ele.

- Falando de novo em Diana - ele disse, com voz sem expressão -, acho que ela deve ter ido para algum lugar, para pensar em paz.

Tanya se sentiu mais calma com essas palavras, mas depois que Adrian saiu, seus medos voltaram. Diana era uma garota sensata, mas qualquer mulher pode fazer uma besteira, quando ama e acha que não é correspondida. Num impulso, saiu correndo para a casa de Roger. A porta foi aberta por ele mesmo, que ficou bastante surpreso quando a viu. Desde que Adrian a tinha apresentado como sua esposa, Tanya nunca mais o procurou.

- Mas que surpresa agradável! É uma visita social? - É. Posso entrar? - Tanya perguntou em voz baixa. - Claro que sim. - Gostaria de falar com você a sós - disse, quando viu que ele a levava para a sala de visitas. - Pois não. - Abriu a porta do seu escritório. - O que foi que aconteceu? - É sobre Diana. Ela está aqui? O espanto de Roger não podia ser mais sincero, e a preocupação de Tanya pela segurança de

Diana aumentou. - Por que ela deveria estar aqui? Se essa é outra de suas idéias para nos aproximar... - Eu não tenho nada com isso, mas Diana sumiu. Ela brigou com o pai ontem e desapareceu.

Ninguém a viu. - E por que achou que ela podia ter vindo para cá? - Porque você foi a causa da briga dela com Lord Biddell. - Escute aqui, Tanya, se está inventando essa história... - É verdade. Foi o pai dela que me disse. Roger começou a andar de um lado para outro, impaciente. - Tem certeza que ninguém sabe onde ela está? - Tenho. E quando pedi a Lord Biddell para chamar a polícia, ele disse que não estava

preocupado. - É egoísta demais, para se preocupar com alguém que não seja ele mesmo. - Afirmou que Diana tinha fugido num acesso de mau humor e que voltaria logo que se

acalmasse. Ele pode estar certo. - E pode estar errado. Vou até lá. Se Diana ainda não tiver chegado e ele não quiser chamar a

polícia, eu chamarei. - Quer que eu vá junto? - Não. É melhor você não se envolver. Sem saber se tinha feito o melhor, Tanya deixou que Roger a levasse até Park Gates. Dali, ele

foi para a casa de Diana. Foi um homem extremamente calmo que parou em frente à escrivaninha de Lord Biddell. - Veio tentar conseguir o meu voto? - o velho perguntou, sarcástico. - Estou aqui por causa de Diana. Estou preocupado com ela. - Está mesmo? E que direito tem de se preocupar com a minha filha? - Com o direito de um homem que se importa com a segurança de uma pessoa amiga. Sei que

Diana não veio para casa ontem à noite e... - Foi aquela estrangeira que lhe contou isso? Roger não perdeu o controle. - Acho que o senhor deve chamar a polícia. Se não chamar, eu chamo.

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- Você o quê? - Lord Biddell rugiu. - Como se atreve a interferir nos problemas da minha família? Posso expulsá-lo daqui!

- Eu já esperava que o senhor dissesse isso - Roger respondeu com desprezo. - Está tão preocupado com sua posição social, que pouco se importa com a segurança de sua filha!

O rosto de Lord Biddell estava tão vermelho, que Roger pensou que ele fosse ter um ataque. - Se não sair daqui em dois segundos - gritou -, eu mesmo vou jogá-lo na rua. - Papai! Os dois homens se viraram e olharam surpresos para Diana, que estava parada na porta. - Onde, diabos, você esteve? - o pai gritou. Sem responder, a moça olhou para Roger. - Por que você e papai estavam discutindo? Roger ainda estava olhando para ela, como se não acreditasse em seus olhos. - Onde você esteve? Está bem? - Claro que estou bem. Mas gostaria de saber o que está acontecendo aqui. Para Roger, a voz dela soou inacreditavelmente calma, como se Diana tivesse saído há poucos

minutos para dar uma volta, em vez de ter desaparecido por quase vinte e quatro horas. Ele perdeu a calma.

- Nada aconteceu. Nada, a não ser que Tanya está doente de preocupação por sua causa, e eu vim até aqui, tentar convencer seu pai a chamar a polícia.

Diana empalideceu. - A polícia? Mas eu... Não pensei que alguém fosse se preocupar comigo! - Estava realmente

espantada. - Porque você não tem sentimentos. É bem igual a seu pai! Da próxima vez que sair de casa,

tenha a decência de avisar Tanya. Não sei o que sente por aquela garota, mas ela gosta muito de você. - Com violência, ele empurrou-a para fora de seu caminho, e saiu batendo a porta.

Diana não se moveu de onde estava, até que o barulho do carro de Roger se perdeu na distância.

- Estou esperando por uma explicação, Diana. - Saí, para pensar um pouco. Queria ficar em paz. - E eu fiquei aqui, agüentando esse aventureiro. Nunca ninguém falou assim comigo! - Parou,

espantado com a expressão da filha. – Por que está tão feliz?- Pena que eu não ouvi Roger brigando com o senhor. - Onde esteve? - Na casa da prima Margaret. Não o avisei, porque não queria que fosse atrás de mim, nem que

ficasse telefonando para lá. Queria decidir algumas coisas, bem sossegada. - Encarou-o de frente. - Vou sair de casa. Quero viver minha própria vida.

- Nem pense nisso! Este é o seu lar e é aqui que vai ficar. Aposto que essas idéias são daquela estrangeira. Ou são de Poulton?

- De nenhum dos dois. É uma decisão minha. - E aonde pretende ir morar? - Na casa de Margaret. Pelo menos até eu decidir o que fazer da minha vida. - Pois vai ter que decidir bem depressa. No momento em que sair por aquela porta, não lhe dou

mais um tostão. - Achei que não ia dar mesmo. - As mãos de Diana tremiam, e ela as escondeu nos bolsos do

vestido. - Mas isso não vai fazer com que eu mude de idéia. Vou trabalhar. - Só se for limpando chão. - É um trabalho tão honesto quanto qualquer outro. - Eu sabia - Lord Biddell gritou. - Roger Poulton é que está fazendo você pensar assim. - Isso não tem nada a ver com Roger. - O rosto de Diana estava tenso, mas seus modos eram

decididos. - Peja primeira vez na vida, tomei uma decisão sozinha. Não espero que acredite no que vou dizer, mas quero que saiba que eu ainda amo você, papai, e que não pretendo magoá-lo, a menos que não possa evitar. Mas preciso viver a minha própria vida.

- Já vi que não vou fazer com que mude de idéia - ele disse, depois de um longo silêncio. - Pois bem, tente conseguir um emprego. Tente se manter sozinha. Vai voltar correndo para cá, logo, logo.

- Nunca! - Vai sim. Não sabe o que é viver com pouco dinheiro. - Pois vou aprender. Pode ser duro, mas vou aprender. Diana olhou para o pai, desejando que ele entendesse o que estava tentando fazer. Mas ele

retribuiu seu olhar com frieza, antes de se sentar com dificuldade, por causa da artrite. Foi nesse

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momento que Diana teve vontade de correr para o pai, e lhe dizer que nunca o deixaria. Mas dominou-se: se fizesse isso, estaria perdida. Com um suspiro, saiu e fechou a porta.

No seu quarto, colocou algumas roupas numa valise e, antes de sair, olhou para as flores de Roger, que estavam em cima da penteadeira. Ia mostrar a ele que não era nenhuma violeta. Mas, e depois? Para Roger, ela sempre ia representar um modo de vida que ele desprezava. Mesmo que conseguisse viver por si mesma, para Roger ela sempre seria uma menininha rica, brincando de ser independente. Ele, com toda a certeza, teria uma carreira política cheia de sucesso, com uma esposa sensata, capaz de ajudá-lo. Uma mulher que viesse o mesmo tipo de família, que entendesse seu modo de pensar e concordasse com ele.

Mas ela não estava fazendo isso por causa de Roger. Estava fazendo por si mesma. Não podia se esquecer disso, nunca.

Em Park Gates, Tanya esperava ansiosa pelo telefonema de Roger, mas foi Diana quem chamou.

- Desculpe, Tanya. Não pensei que você fosse ficar preocupada. - Viu Roger? - Vi. Ele estava com meu pai, quando cheguei. Mas já foi embora. Vou sair de casa - continuou. -

Vou ficar com uma prima, até arranjar emprego. Tanya estava sem palavras. Não era isso que queria para Roger e Diana. O que havia com eles,

que não conseguiam ver que só seriam felizes juntos? Tanya continuou olhando para o fone muito tempo depois que se despediu de Diana, desejando que ele fosse o pescoço de Roger, para que pudesse torcê-lo. Por que ele não confessou que amava Diana e a pediu em casamento? Trêmula, entrou na biblioteca, mas virou-se para sair, quando viu Adrian lá.

- Não sabia que você já tinha voltado - disse ela. - Precisa ir? - ele perguntou, segurando-a pelo braço. - Vou lavar meu cabelo. - Ele está lindo assim. - Quer falar comigo sobre alguma coisa em particular? - Você não consegue nem fingir que gosta de mim, não é? Tanya quase riu. Gostar dele! Que palavra fraca para descrever a onda de amor que a invadia,

sempre que o encontrava! - Se quer falar comigo sobre a eleição - disse ela com frieza -, tudo bem. Mas se for para falar

sobre o passado, vou embora. - Não estou interessado no passado. Só no futuro. - Meu futuro vai começar no dia em que eu sair daqui. Sem responder, Adrian estendeu a mão para uma caixa de prata, cheia de cigarros. - Não está fumando demais? - Tanya perguntou. - Vou parar, depois que a eleição terminar. - O que vai fazer, se Roger vencer? - Vou continuar a cuidar das minhas terras. E nunca mais vou mexer com política. - Por que concordou em se candidatar? - Acharia que sou um fraco, se lhe dissesse que deixei as pessoas em torno de mim me

influenciarem? - As pessoas em volta sempre nos influenciam. Mas uma pessoa amadurecida toma suas

próprias decisões. Como Diana. - Mudou de assunto de propósito. - Ela vai sair de casa e arranjar um emprego.

- E ela decidiu isso sozinha, sem a sua ajuda? - Decidiu. A gente pode influenciar, mas não tomar a decisão. Diana é que resolveu sair de casa

e ir trabalhar. - Mas ela não sabe fazer nada! - Diana é forte e tem duas mãos. Não é nenhuma vergonha usá-la para ganhar a vida. É o que

eu também vou fazer. - Você não vai precisar... - ele se interrompeu, quando vi a expressão dos olhos dela. - Desculpe, Adrian, mas preciso mesmo lavar a cabeça. Até logo. Com a imaginação, Adrian seguiu Tanya até seu quarto e observou-a tirar a roupa. Será que ela

ainda dobrava tudo com cuidado, só deixando as meias jogadas no chão? Seus lábios abriram-se num sorriso e seus olhos se encheram de ternura, quando imaginou Tanya soltando o cabelo dourado, que caía numa nuvem até a cintura. Parecia impossível que tivesse acreditado que seu amor por ela acabara! Agora, Adrian sabia que estava tentando se defender, quando se forçou a tirá-la da cabeça, quando se forçou a esquecer a mulher que amava e que tinha se divorciado dele. Só porque achava que isso era verdade, é que tentou reconstruir sua vida com outra pessoa.

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Agora, sabia que isso tinha sido tolice. Não importa com quem ele vivesse, a imagem de Tanya sempre o perseguiria.

Não posso deixá-la ir embora, pensou. Nada do que tenho terá o menor valor, a menos que possa compartilhar tudo com ela.

CAPÍTULO XIV

No dia da eleição, Tanya acompanhou Adrian até o local onde estava sendo feita a votação. Todos os correligionários dele estavam confiantes em sua vitória, e ela teve que se lembrar que o mesmo acontecia com os partidários de Roger. Para eles, não havia dúvida de que Roger ia ganhar.

Se pelo menos os dois pudessem vencer! Tanya ficaria profundamente sentida, se Adrian perdesse, e sabia que não era porque achasse que ele estava mentindo, quando lhe disse que preferia cuidar de suas terras, em vez de fazer política. Era porque não queria que nenhum outro homem o vencesse. Isso mostrava o quanto ainda o amava!

Às sete horas eles voltaram para casa para um jantar leve. Depois Tanya perguntou a Adrian se queria que ela fosse de novo com ele para o local da eleição.

- Afinal, dentro de uma hora a votação estará terminada, e o fato de eu estar ou não com você não vai fazer diferença.

- Mas eu gostaria que fosse comigo. Se me acompanhou até agora, é justo que me acompanhe no momento final.

Em silêncio, Tanya foi até o quarto se arrumar. Precisava esconder seus sentimentos por pouco tempo mais. Logo a farsa estaria acabada, e não teriam mais necessidade de fingir diante dos outros que eram um casal perfeito.

Às nove horas a votação acabou, e Adrian e Tanya foram para o Salão da Prefeitura esperar o resultado. Adrian parecia ter se livrado completamente de sua inquietude, e se sentou numa cadeira, com os braços cruzados, o rosto calmo e relaxado. Estranhamente, não parecia cansado, e sua boca expressava firmeza, como se estivesse bem preparado para enfrentar o resultado da eleição.

Percebendo que Tanya o observava, Adrian arrastou a cadeira para mais perto dela. Por um momento, sua cabeça bloqueou a visão do resto da sala, e Tanya teve a impressão de que estavam completamente sozinhos. Trêmula, esperou que ele falasse, mas suas palavras não poderiam ter sido mais banais.

- Parece cansada, Tanya. Quer que eu arranje um uísque para você? - Não, obrigada. - Sentiu que se afundava no azul daqueles olhos, e tentou se controlar. - O

resultado ainda demora? - Algumas horas. Acho que... - Ele se levantou de um salto, quando viu a garota alta, de cabelos

escuros, que se aproximava. - É Diana - murmurou, e foi cumprimentá-la. - Oi, Adrian. Não podia deixar de vir lhe desejar boa sorte - falou com um leve sorriso. - Estou muito contente que tenha vindo, Diana. Você trabalhou como ninguém, na minha

campanha. Eles continuaram se olhando, um pouco embaraçados, e Tanya se aproximou. - Que bom ver você, Diana - disse Tanya com sinceridade. - Já era para eu estar aqui, mas perdi o trem e tive que esperar por outro. - Então, saiu mesmo da casa de seu pai? - Adrian perguntou. - Já era tempo, não acha? - Diana respondeu. - Se precisar de alguma coisa... Se quiser que eu fale com Lord Biddell... Rapidamente, Tanya saiu dali. Era justo que Adrian e Diana pudessem conversar a sós. Suas

tentativas para aproximá-la de Roger tinham dado em nada, e precisava se preparar para o caso de Diana resolver voltar para Adrian. Não era difícil adivinhar como seria a vida deles: um relacionamento sem altos nem baixos, mas provavelmente era o que preferiam.

Em alguns meses já terão se esquecido de que eu existo, Tanya pensou, desanimada. Sozinha com Adrian, Diana não sabia o que dizer. Não tinha certeza se ele sabia de sua briga

com o pai e tinha vergonha de discutir seus sentimentos por Roger. - Quero que me deixe ajudá-la, se precisar de dinheiro ou conselhos. - Adrian disse com firmeza.

- Se bem que não sirvo para dar conselhos. Não fiz da minha vida um sucesso. - Não seja tolo. Não tem culpa pelo que aconteceu entre você e Tanya. - Mas sou culpado pelo que aconteceu nos últimos meses. - Na época, você fez o que achou que fosse certo.

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- E tornei duas mulheres infelizes. Você e Tanya. - Eu não. Não vamos fingir a nosso respeito. - Seu pai sempre me jogou em cima de você como o marido ideal e isso impediu que você

soubesse o que realmente sentia. - Eu era muito imatura. Levei muito tempo para crescer. - E agora que cresceu, o que vai fazer? - Não sei. Meu lema é dar um passo de cada vez. - Olhou em torno, mas não viu Tanya. - E você,

Adrian? Vai deixar Tanya ir embora? Adrian semicerrou as pálpebras, mas decidiu não esconder a verdade. - Até hoje, eu estava decidido a lutar por Tanya mas, nas últimas horas, tenho pensado se ela

não será mais feliz livre de mim. - É claro que não. Tenho certeza que ela o ama. - Olhou para o relógio. - Preciso ir. Despeça-se

de Tanya por mim, sim? Diana saiu apressada e só percebeu que estava chovendo, quando já estava na rua. Tropeçou

duas vezes com seus sapatos de saltos altos na calçada molhada, e uma vez chegou a cair na lama. Logo, seus cabelos estavam emplastados na cabeça, e fios de água desciam pelo seu rosto, misturando-se às lágrimas que corriam de seus olhos.

Tinha ido à prefeitura na esperança de ver Roger também, mas a informaram de que ele ficaria na sede de seu próprio eleitorado, até sair o resultado. Mas, o que teria ganho, vendo-o de novo? Uma declaração de amor? Se ele quisesse fazer uma, teria tido muito tempo, no dia que ela passou em casa fazendo as malas para ir embora. Tinha até mesmo esquecido seu orgulho e dito para a governanta que, se Roger telefonasse, era para lhe dar seu novo endereço. Mas ele não a procurou, e mesmo que tentasse acreditar que era porque o rapaz estava muito ocupado com a eleição, não conseguia. Se Roger realmente a amasse, nada o impediria de lhe telefonar.

Diana parou para tirar o cabelo molhado do rosto e, aborrecida, percebeu que estava no caminho errado. Já ia voltando, quando viu que estava em frente da sede do eleitorado de Roger. As janelas estavam cheias de cartazes com o rosto do rapaz e a lembrança dele a atingiu com tanta intensidade, que ela parou, ofegante. Num impulso, abriu a porta e entrou na sala cheia de gente e fumaça de cigarros. Todos se voltaram para ela que, com o rosto completamente sem expressão, procurou pelo homem que amava. Não o vendo em lugar nenhum, voltou-se para a porta, pronta para fugir dali.

- Diana! Que está fazendo aqui? Roger estava abrindo caminho no meio da multidão, em sua direção. Na luz fluorescente, a pele

dele estava de um branco esverdeado e seu cabelo mais vermelho do que nunca. Seu rosto estava coberto de linhas de tensão, os olhos vermelhos e com olheiras enormes, de cansaço. Vendo-o assim, uma onda de amor por ele a invadiu e seu coração contraiu-se, cheio de ternura.

- O que você quer aqui? - ele repetiu, com aspereza. - Ver... ver você, antes que o resultado seja anunciado - gaguejou, e pela primeira vez não

estava no controle da situação. Roger continuou olhando fixamente para Diana, desejando que ela não tivesse escolhido aquela

noite para ir até lá. Estava muito tenso e cansado, vê-la era um tormento que o fazia se lembrar de tudo que queria esquecer: da maciez de sua pele; do seu hálito quente e perfumado, do toque de seus lábios. Como tinha sido tolo, mandando-lhe aquelas rosas e esperando uma resposta da parte dela!

Lembrando-se da calma com que Diana entrou na biblioteca, naquele dia em que foi falar com Lord Biddell, Roger sentiu-se revoltado. Provavelmente Diana tinha ido até Londres para ficar com um de seus amigos da alta sociedade, e devia ter se divertido muito com sua preocupação. Decidido a não mostrar de novo seus sentimentos, falou com frieza:

- É muita bondade sua vir me desejar boa sorte, Diana. Ou veio me dar os pêsames, no caso de eu perder?

- Quer que lhe dê os pêsames? - Eu não quero nada de você. - Olhou por cima do ombro, quando alguém atrás dele o chamou. Diana aproveitou esse momento, abriu a porta e fugiu. Infelizmente, saiu para um corredor

sombrio e ficou parada lá, odiando aquela sua fraqueza que a fizera vir em busca de Roger. No fundo, esperava que, se ela fizesse o primeiro movimento, ele faria o segundo. Agora, já sabia que estava enganada. Roger não se importava com ela. Decidida, começou a procurar um jeito de sair dali, sem passar pela sala principal de novo. Abriu a porta que ficava à sua esquerda e deu numa cantina. A garota atrás do balcão olhou-a, surpresa.

- O chá acabou - disse. - Eu só estou tentando achar o caminho para a rua.

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- Eu lhe mostro - Roger disse atrás dela. Puxou-a para o corredor, abriu outra porta e empurrou-a, sem cerimônia, para dentro de um escritório vazio. Olhando-a com mais atenção, Roger sentiu os músculos de sua garganta se contraírem. Os olhos dela estavam inchados e sua maquiagem toda borrada. Seu cabelo estava colado na cabeça e na testa, e seu ar impecável se fora. Só sua boca continuava linda como sempre. Na verdade, mais linda ainda, pois estava pálida e trêmula, macia e vulnerável.

Consciente do olhar dele, Diana apertou o casaco em torno do corpo, estremecendo quando a gola molhada tocou em seu pescoço.

- Você está ensopada - Roger disse. - Não vou derreter. - Não mesmo? - Viu a insegurança aparecer no rosto dela, e tentou lutar contra sua vontade de

consolá-la. - Seu pai não vai aprovar sua vinda até aqui. - Não era o que ele queria dizer, e Roger imaginou se ainda não acabaria arruinando sua vida, por causa de suas palavras impensadas. - Desculpe, Diana. Você veio e estou contente por isso.

- Não vai me mostrar a saída? - ela perguntou. - Quer que eu lhe mostre? - O que você faria, se eu lhe respondesse que não? - Isto! - E Roger abraçou-a. Sentindo o corpo trêmulo da garota de encontro ao seu, o rapaz

perdeu completamente o controle. Até aquela noite, só tinha mostrado a Diana sua raiva e seu desejo, mas agora, mostrou a necessidade que tinha dela. Mostrou abertamente que, sem ela, nenhuma vitória valia a pena, nenhuma derrota era mais desastrosa que a perda de seu amor. - Não vai ser fácil para nós. Concorrer a uma eleição vai ser brincadeira de criança, comparado com a luta que vou ter que enfrentar, para você vir a ser minha para sempre, Diana!

- Eu já sou sua - Diana disse. - Saí de casa, Roger, e posso vir para você, quando me quiser. - Eu só a quero de um modo: aberto e honesto. E isso significa que você deve voltar para a casa

de seu pai, antes de vir para mim. - Não tem medo que eu mude de idéia? A resposta de Roger foi colar seus lábios aos dela, percorrendo seu corpo com mãos

acariciantes, pressionando-a contra suas coxas. Diana ficou mole de desejo e ele teve que empurrá-la contra a parede, mantendo-a lá com seu peso.

- Como eu o quero - ela exclamou. - E você, Roger, você me ama como eu te amo? - Esta é a resposta para a sua pergunta - ele disse. - E é por isso que, com você ao meu lado,

não tenho medo de ninguém.

CAPÍTULO XV

Quando Tanya olhou para Adrian de novo, Diana já havia ido embora e ele estava sozinho. Sabendo que ele estava distraído, observou-o à vontade. Ele estava bem mais magro, e ela gostaria de saber se era por causa de sua presença ou por causa da eleição. No entanto, apesar de estar tão zangado e irritado, Adrian sempre tentou ser delicado com ela. Delicado demais. Se seu relacionamento fosse normal, ele teria descarregado nela um pouco de sua tensão.

Adrian se virou para falar com alguém e Tanya percebeu que ele estava fazendo um tremendo esforço para permanecer calmo. A maioria das pessoas o achava um homem enigmático, mas ela sempre o entendeu com facilidade. Mesmo aos dezoito anos, percebeu que sua reserva era, na verdade, timidez, e sua indiferença um modo de defesa.

De repente, Tanya percebeu que não devia mais continuar ali e foi para a rua. Estava chovendo forte, e ela andou a esmo, até se ver na frente da sede do eleitorado de Roger. Várias pessoas estavam saindo de lá, e ela já ia embora, quando Diana a chamou:

- Tanya! O que está fazendo aqui? - Eu queria ver Roger. - Ele acabou de sair. Foi para a prefeitura. - Ele... está me dizendo que ele venceu? - Venceu. Sinto muito. Foi uma vitória por apenas oito votos. - Oh, coitado do Adrian! - Não quer ir até a prefeitura? Estou indo para lá.

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- Não, não posso. - Apressada, Tanya saiu dali. Adrian tinha perdido por sua culpa. Até ela chegar, todos confiavam na vitória dele. Ele devia estar cheio de ódio por ela. Bem, Adrian não teria que vê-la de novo. Ia manter sua palavra e sair de casa imediatamente.

Ignorando a chuva, pegou um táxi e em vinte minutos estava em Park Gates. A casa parecia vazia. Deviam estar todos na prefeitura com Adrian. Tanya sorriu com amargura. A família de um lado, ela do outro. Sozinha, sempre sozinha.

Já era bem mais de meia-noite, quando Adrian voltou para casa. Cansado, entrou na biblioteca e serviu-se de um uísque. Depois, foi para a sala de estar, atrás de Tanya.

- Alguém viu Tanya? - perguntou, quando não a viu ali. - Na certa foi para a cama - sua mãe respondeu. - Deve estar se sentindo tão culpada, que... - Não vou admitir que culpem Tanya por isso - falou Adrian asperamente. - A minha derrota não

teve nada a ver com ela. Pode ser que eu tenha perdido alguns votos no início, mas depois que Tanya começou a fazer campanha comigo, ganhei muito mais votos do que perdi. O povo gostava dela. Eles podiam conversar com ela, de igual para igual.

- Até parece que está apaixonado por ela - sua mãe disse. - Fico contente da senhora ter, finalmente, percebido. A sra. Chesterton virou-se para a filha, espantada. - Você sabia disso? - Sabia. E acho ótimo. Tanya é um encanto de pessoa. Incapaz de continuar ouvindo a discussão sobre a esposa, Adrian subiu e parou em frente à

porta do quarto de Tanya. Ia bater, quando se lembrou das horas e decidiu deixá-la descansar. No dia seguinte, às sete e meia, já estava à espera de Tanya no hall. Às oito e meia, resolveu ir

tomar café. Estava na segunda xícara, quando a empregada entrou. - Desculpe-me, senhor, mas sabe onde a sra. Tanya está? - Ela não está em seu quarto? - Não, e não dormiu lá. Sua cama não foi desarrumada, e metade das suas roupas desapareceu. - O quê?! - Sem esperar mais nada, ele subiu as escadas de dois em dois degraus. Como a

criada tinha dito, metade das roupas de Tanya não estava nos armários e a cama estava arrumada. Rapidamente, ele procurou por um bilhete, mas não achou nada. Roger!, pensou de repente. Ela deve ter ido procurar Roger!

Sem pensar duas vezes, Adrian pegou o carro e saiu, dirigindo como um robô. Só voltou à vida quando parou em frente a casa do rival. Bateu com violência à porta, e quando Roger atendeu, disse:

- Vim buscar Tanya. - Aqui? - Eu sei que ela está com você. Não dormiu em casa ontem e suas roupas desapareceram. - Tanya não está aqui, mas eu gostaria que estivesse. - Meu Deus, você tem coragem! - Porque assim, saberíamos onde ela está. Nós não temos nenhum envolvimento emocional,

fique sabendo. - Eu... eu sei. Desculpe, mas tenho que encontrá-la. Ela deve ter ido embora com Diana. - Diana não foi para casa, ontem. Ficou aqui. - Um pouco embaraçado, Roger continuou: - Nós

ficamos noivos. Minha mãe insistiu para que ela passasse a noite conosco. Adrian estava sem fala. Deixou-se cair numa cadeira e enterrou o rosto nas mãos. - Agora, não sei mesmo por onde começar a procurá-la. - Tanya deve estar o mais longe possível daqui - Roger disse, sem rodeios. - Ela me disse que

iria embora, assim que a eleição terminasse. E quando ficou sabendo que você tinha perdido, decidiu ir imediatamente.

- Como Tanya deve me odiar - Adrian disse com amargura. - Não. Tanya o ama, Adrian - Roger retrucou. E vendo a expressão de surpresa de Adrian: - Não

me diga que não sabia! Pelo amor de Deus, homem! Tanya nunca deixou de amá-lo. Por que acha que ela concordou com tudo que você lhe propôs? Se tivesse um pingo de orgulho, Tanya já teria saído daqui há muito tempo. Só ficou porque o ama, e se foi embora agora, é porque perdeu a esperança de conquistá-lo de novo.

- Não pode ser verdade. Várias vezes eu tentei dizer-lhe que a amava, mas ela sempre me evitou.

- Pode ser que estivesse com medo de você querer ficar com ela por conveniência. Adrian gemeu, lembrando-se de todas as vezes em que tinha usado essa mesma expressão,

falando com Tanya. Não era de estranhar que ela duvidasse de seus sentimentos.

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- Eu amo minha mulher, e quero começar de novo. Se eu tiver que sair da Inglaterra para ficar com ela, eu saio. - Fez uma pausa, depois continuou: - Ela não pode desaparecer. Não tinha dinheiro, e deve ter ido procurar uma dessas associações de refugiados, para pedir ajuda.

Adrian entrou em contato com todas as associações de refugiados que havia no país, mas nenhuma pôde ajudá-lo. Nem mesmo a melhor agência de detetives de Londres conseguiu localizar Tanya. Ele sorria cada vez com menos freqüência, e trabalhava cada vez mais. Ficou muito abatido e suas têmporas embranqueceram. Tanya era como uma febre em seu sangue.

Alguns meses mais tarde, Adrian recebeu um chamado de seu advogado, dr. Truscott, que lhe contou que Tanya telefonara para saber se estava havendo alguma dificuldade com o divórcio, e se precisava assinar algum papel.

- Então o senhor tem o endereço dela - Adrian gritou, cheio de alegria. - Onde ela está? - Não posso lhe dizer. Ela me escreveu em confiança. - O senhor é meu advogado, não dela. E está falando da minha mulher, entendeu? Da minha

mulher! - Fez uma pausa e continuou, mais calmo: - O senhor sabe que há muito estou tentando achar minha esposa. Quero começar meu casamento de novo, e se me impedir de vê-la, estará agindo contra a lei. A lei espera que o senhor faça tudo para reunir um casal.

- Não é bem assim, sr. Chesterton, mas eu entendo o senhor. Espero não me arrepender nunca de ter lhe contado que a sra. Chesterton está nas ilhas Scilly.

- Que diabo ela está fazendo lá? - Não sei. - Bem, obrigado pela ajuda. Não vou me esquecer nunca. Horas depois, Adrian estava de saída para as ilhas Scilly.

CAPÍTULO XVI

O avião cortava os ares e Adrian, impaciente, desejava que tivesse alugado um jato. Nessa velocidade, ainda levariam uma hora para aterrissar. Só Diana, que o tinha levado ao aeroporto, sabia para onde ele ia.

- Hoje é um dia de sorte mesmo! - ela dissera. - Você vai buscar Tanya, e meu pai concordou em receber Roger.

- Bem que eu lhe disse que ele poderia não dançar no dia do seu casamento, mas dançaria no do batizado do neto. Ou neta.

- Isso vai acontecer dentro de oito meses - confessou. - Você é o primeiro a ficar sabendo. Estou tão feliz.

Já era tarde, quando o avião pousou na capital da maior das ilhas Scilly, Santa Maria. Era uma cidade pequena, onde quase não havia automóveis. A paz era total, e com amargura Adrian imaginou se era por isso que Tanya tinha vindo para ali achar a paz que não tivera junto dele. Quando chegou ao centro da cidade, entrou num bar para matar a sede. Uma mulher de pele queimada de sol o serviu.

- Veio passar as férias aqui? - ela perguntou. - Não. - Adrian hesitou, mas acabou dizendo a verdade: - Vim atrás da minha mulher. Nós

discutimos e ela fugiu de casa. - Quando isso aconteceu? - perguntou a balconista com simpatia. - No último outono. Mas não tenho o endereço dela. Deve ter arrumado um emprego, pois

estava sem dinheiro. - O senhor deve ir falar com a sra. Tregar. Ela é a maior faladeira desta ilha, e sempre sabe de

tudo. Se quiser, posso levá-lo até lá. Adrian pagou o refrigerante e os dois saíram. Dois quarteirões depois, chegaram à loja da sra.

Tregar. - Este moço está procurando pela esposa dele - a mulher explicou para a sra. Tregar. - Ela é

estrangeira e deve estar trabalhando aqui mesmo, nessa ilha. - Ela tem olhos esverdeados e um cabelo loiro e muito longo, que usa preso na nuca - Adrian

informou. - Claro que me lembro dela. Uma moça muito bonita. Está trabalhando numa fazenda do outro

lado da ilha, Mayfield. Rezando para a mulher estar certa, Adrian partiu para Mayfield. Quando atravessou um

pequeno bosque e avistou a fazenda, pensou que estivesse numa terra de contos de fadas. Havia

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flores por todos os lados, um verdadeiro arco-íris sobre a terra. Era evidente que os donos de Mayfield cultivavam flores, e podia entender por que Tanya estava trabalhando ali.

Tanya. Dentro de alguns minutos ele a veria, e o que ia dizer? Correu a mão pelo colarinho da camisa, e percebeu que sua pele estava úmida. O aroma das flores começou a lhe fazer mal, e ele desejou que tivesse se alimentado melhor, antes de vir. De que adiantava atravessar correndo meia Inglaterra à procura da esposa, para cair desmaiado aos pés dela, quando a encontrasse?

Foi então que Adrian levantou a cabeça e parou. Caminhando na direção dele vinha uma garota, carregando um enorme buquê de tulipas, tão douradas quanto seus cabelos. Seus olhos estavam fixos nas flores que aconchegava ao peito, como se fossem uma criança. A garganta de Adrian se contraiu, e naquele momento ele daria tudo que possuía, para ver Tanya carregando uma criança nos braços... um filho dele.

Adrian a chamou com suavidade, e ela levantou os olhos, mas não parou até chegar bem perto dele.

- Eu devia saber que não podia confiar no seu advogado. - Ele só me disse onde você estava depois que o ameacei de morte. - A voz dele soou calma. - Por que veio até aqui? Era fácil responder a esta pergunta, mas neste instante Adrian não conseguiu lhe dizer que a

amava. O que faria, se Tanya risse? Como poderia encarar uma vida sem ela? - Preciso pôr estas flores em um vaso. Vamos até aquela estufa. Poderemos conversar lá. - Conversar? - Sobre o futuro. Foi para isso que veio, não foi? Em silêncio, ele a seguiu até a estufa e observou-a acomodar as flores. Tanya apontou para

uma cadeira de vime. - Sente-se. - Depois continuou, quando viu a testa porejada de suor do marido: - Prefere que a

gente vá lá para fora? - Prefiro... não... diabos, eu não sei. - Está se comportando de um modo estranho, Adrian. Está me olhando como se eu fosse um

fantasma. - Faz tanto tempo que estou procurando por você, que não consigo acreditar que a encontrei.

Fico achando que você vai desaparecer. - Sou tão real quanto as flores. - Mas as flores são apanhadas e mandadas para outro lugar, e se você desaparecer de novo,

eu... - Foi então que Adrian perdeu o controle. - Como pode achar ruim eu olhar para você? Há meses que venho olhando para toda mulher que encontro na rua, na esperança de vê-la! Não sabe o inferno em que tenho vivido, desde que me abandonou. Tentei achá-la por todos os meios possíveis, e esta manhã, quando Truscott me disse onde você estava, vim diretamente para cá.

- Estava com tanta pressa assim de me ver? - ela perguntou, baixinho. - Pensou que eu não estivesse? - Examinou o rosto dela imaginando se Roger estava certo,

quando lhe disse que Tanya o amava. Ela não tinha mostrado nenhuma alegria ao vê-lo. Mas também, como poderia, quando ele a tinha recebido tão mal, na noite de sua chegada a Park Gates?

- Não precisava vir até aqui. Tudo podia ser arrumado através do dr. Truscott. - Eu vim até aqui para lhe pedir para começarmos tudo de novo. - Não, obrigada. Não me interessa. Não houve nenhuma hesitação na resposta de Tanya. Ela nem mesmo fingiu pensar um pouco.

Adrian estava tão chocado, que não sabia o que dizer. Onde estava o amor que já tinham sentido, um pelo outro? Aquela emoção maravilhosa e cheia de vida, que transformou duas pessoas de nacionalidades e posições diferentes em uma só? Mas eles estavam separados agora, e esta separação aumentava cada vez mais.

- Se não quer voltar para mim, não tenho mais nada a dizer. - Sinto que tenha vindo até aqui, por nada, Adrian. Virou as costas para ele e começou a acomodar algumas flores numa caixa de madeira. Adrian

piscou, procurando afastar as lágrimas, e caminhou para a porta. Tentou abri-la, mas não conseguiu, pois estava empenada. Puxou-a com violência, e quando ela cedeu, seu dedo esbarrou em um pedaço de metal, cortando-se.

- Droga! - Um fio de sangue escorria do dedo machucado, e com a outra mão, Adrian tirou o lenço do bolso.

- Você se machucou! - Tanya exclamou, e tentou pegar o lenço da mão dele. - Não me toque - ele disse com aspereza - Desculpe. Não sabia que me odiava tanto - disse, pálida.

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- Odiar você? - Adrian riu. - Se pelo menos eu pudesse! Não sabe que eu a amo, Tanya? Que é porque a desejo tanto, que não posso suportar que me toque?

- Você me ama?! Você me deseja?! - Que ironia da vida, não? Primeiro, eu a rejeitei, e agora você faz o mesmo comigo. - Eu não sabia... nunca pensei... Por que não me disse nada, quando eu estava na sua casa? - Para você pensar que eu estava me declarando por causa da eleição? - Lembrou-se das muitas

vezes em que tinha tentado dizer-lhe. - Estava esperando que tudo acabasse... mas então, você desapareceu.

- Pensei... quando o vi agora... que me quisesse de volta porque Diana se casou com Roger. - E que diferença isso faz? - É mais fácil, para você, continuar comigo, do que procurar outra mulher. - Meu Deus! Que tipo de cafajeste acha que eu sou? Sei que tenho me comportado como um,

mas... - Não fale assim. - Tanya apoiou as mãos no peito dele. - Uma mulher não gosta que falem mal

do homem que ela ama. Os olhos dele brilhavam, como se estivessem cheios de eletricidade. - Disse... o homem que você ama? - O homem que eu sempre amei. Mesmo quando eu falava que o odiava, estava mentindo.

Nunca vou amar mais ninguém, Adrian, mesmo que não fiquemos juntos. - Eu nunca vou deixá-la - ele gemeu, e sem perder mais tempo com palavras, procurou a boca

de Tanya com paixão, mostrando-lhe o quanto tinha sentido sua falta. No entanto, quando ela começou a corresponder ao beijo, ele a afastou.

- Se começarmos agora, não vou poder parar - disse abruptamente. - E não sei o que seu patrão diria, se viesse até aqui e nos encontrasse esmagando suas lindas tulipas.

- A única pessoa que pode vir até aqui, a esta hora do dia, é o velho George, que faz os pacotes de flores. E poderíamos pagar pelas flores estragadas - ela murmurou.

- Tenho uma idéia melhor. Se sairmos agora, podemos contratar um helicóptero... E depois que eu fizer alguns telefonemas, estaremos prontos para ir.

- Ir para onde? - Para qualquer lugar que você queira. Para continuar a lua-de-mel que não vai terminar nunca. Tanya olhou-o demonstrando enorme ternura. - Se você tivesse me dado alguma demonstração sobre como se sentia, não teríamos perdido

tantos meses. - Não sei não. Não pode imaginar o número de vezes que tive vontade de entrar no seu quarto e

fazer amor com você, de um modo violento! - Puxou-a mais para perto, pressionando seu corpo ao dela. - Às vezes ficava tão atormentado, que não conseguia dormir. Costumava andar de um lado para o outro, xingando-me por ter tão pouco controle.

- Ao contrário, controle demais... - falou Tanya, meio séria, meio provocante. - No momento, meu controle está acabando bem depressa - disse Adrian com seriedade. - Não

fique me olhando assim. Não sabe o mal que me faz! - Tive uma ótima idéia. A necessidade mútua aumentava seu desejo. Suas bocas se juntaram, e sua paixão se difundiu,

intensificando-se até se tornar uma chama viva dentro deles. Com uma selvageria que a surpreendeu e emocionou, Adrian abriu o vestido de Tanya, fazendo

os botões saltarem. A pele sedosa de seu corpo se descobriu para ele, e ela se rendeu sensualmente ao seu toque, colocando os braços em torno do seu pescoço e puxando-o para o fundo da estufa. Suas mãos deslizaram pelo corpo do marido, até que a timidez a impediu de continuar. Murmurando baixinho, Adrian pegou sua mão e encostou-a em sua pele máscula e quente.

- Segure-me - pediu. - Quero que me sinta... Tanya. Caminhando pelo lado de fora da estufa, o velho George viu Tanya e um homem alto, de cabelo

escuro, desaparecerem atrás de uns caixotes que protegiam a parte de baixo da estufa. - É mesmo uma boa coisa que a estufa não seja toda de vidro - ele comentou rindo e esfregando a barba. - Se fosse, eu estaria vendo uma ou duas coisas que não são para os meus olhos!

FIM

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