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[http://www.almadan.publ.pt][http://issuu.com/almadan]

revista digital em formato pdf

edições

o mesmo cuidado editorial

dois suportes...

...duas revistas diferentes

revista impressa

Iª Série(1982-1986)

IIª Série(1992-...)

(2005-...)

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EDITORIAL

II Série, n.º 20, tomo 2, Janeiro 2016

Propriedade e Edição |Centro de Arqueologia de Almada,Apartado 603 EC Pragal, 2801-601 Almada PortugalTel. / Fax | 212 766 975E-mail | [email protected] | www.almadan.publ.pt

Registo de imprensa | 108998ISSN | 2182-7265Periodicidade | SemestralDistribuição | http://issuu.com/almadanPatrocínio | Câmara M. de AlmadaParceria | ArqueoHoje - Conservaçãoe Restauro do PatrimónioMonumental, Ld.ªApoio | Neoépica, Ld.ª

Director | Jorge Raposo([email protected])Publicidade | Elisabete Gonçalves([email protected])Conselho Científico |Amílcar Guerra, António Nabais, Luís Raposo, Carlos Marques da Silvae Carlos Tavares da SilvaRedacção | Vanessa Dias,Ana Luísa Duarte, ElisabeteGonçalves e Francisco SilvaResumos | Jorge Raposo (português),Luisa Pinho (inglês) e Maria Isabeldos Santos (francês)

Modelo gráfico, tratamento de imageme paginação electrónica | Jorge RaposoRevisão | Vanessa Dias, Graziela Duarte,Fernanda Lourenço e Sónia Tchissole

Colaboram neste número |Marco António Andrade, Luísa Batalha,Márcio Beatriz, Nuno Bicho, JacintaBugalhão, Maria Teresa Caetano,Guilherme Cardoso, João Cascalheira,Fernando Augusto Coimbra, José M.

Lopes Cordeiro, Cláudia Costa, CatarinaCosteira, Ana Pinto da Cruz, VanessaDias, José d’Encarnação, Miguel Feio,César Figueiredo, Silvério Figueiredo,Rui Ribolhos Filipe, João José F. Gomes†, Célia Gonçalves, Susana GómezMartinez, António Gonzalez, MartaIsabel C. Leitão, Marco Liberato,Virgílio Lopes, Olalla López-Costas,Andrea Martins, Rui Mataloto, JoãoMarreiros, Lara Melo, Luís Campos

Capa | Luís Barros e Jorge Raposo

Composição gráfica sobre ilustração que reconstitui visualmente a informaçãoarqueológica disponível sobre aDomus de Santiago, em Braga.

Ilustração © César Figueiredo.

Depois de, no anterior Tomo, ter dedicado merecido espaço à ilustração científica, no caso aplicada ao registo e interpretação patrimonial de um dos mais antigosmoinhos de maré do estuário do Tejo, a Al-Madan Online volta ao tema.

Agora, apresenta-se uma reflexão da sua aplicação à reconstituição de contextos e estruturasarqueológicas, traduzindo visualmente o estado do conhecimento que deles dispomos, numa mediação criativa entre a Ciência e os diferentes públicos. Entre os vários exemplos de aplicação, destaca-se a espectacular modelação 3D da Lisboa romana (Olisipo) que muitos já terão tido a felicidade de ver, nomeadamente na exibição do documentáriosobre o fundeadouro recentemente descoberto no subsolo da frente ribeirinha desta cidade(filme realizado por Raul Losada, com uma contribuição muito importante deste projectográfico de César Figueiredo).Outros estudos desenvolvem matérias relacionadas com o mesmo período histórico, ao tratar as então muito populares corridas de cavalos através da sua representação nos mosaicostardo-romanos da Hispânia, ou as cerâmicas de verniz negro recolhidas nas mais recentesescavações arqueológicas do Teatro Romano de Lisboa, que atestam a integração da cidade nossistemas de circulação de pessoas e de bens que já a ligavam à Península Itálica e ao mundomediterrânico nos séculos II-I a.C. Mas, a propósito de um conjunto de placas de xistogravadas provenientes do povoado calcolítico do Castelo de Pavia (Mora), há também umareflexão sobre a presença, em contextos habitacionais, de materiais normalmente associados apráticas funerárias pré e proto-históricas. Outros autores abordam a produção de cerâmicavidrada em Alenquer, durante o século XVI, e integram essa actividade no plano mais geralda olaria coetânea na região do baixo Tejo. Por fim, a secção completa-se com a problemáticada História militar medieval e da guerra de cerco, a propósito da conquista da cidade islâmicade Silves por D. Sancho I, em 1189, com o apoio de cruzados que se dirigiam à Terra Santa.Num plano patrimonial mais geral, dá-se a conhecer a oficina artesanal de Manuel Capa edos seus filhos José e Carlos, em Tibães (Braga), especializada na reprodução das ferramentasusadas para trabalhar o couro, no domínio de artes ornamentais que remontam ao século XV.E não são esquecidos os vestígios da presença islâmica no nosso território, evidenciados porporta reconhecida na adaptação do antigo Convento de Nossa Senhora de Aracoeli apousada, em Alcácer do Sal, nem o primeiro templo cristão construído em Albufeira, no século XIII ou em data anterior, destruído pelo terramoto de 1755 e agora relocalizado porintervenção arqueológica que também recorreu a técnicas de Arqueologia da Arquitectura.Notícias diversificadas dão conta de trabalhos e projectos recentes de natureza muitodiversificada e, a terminar, reúne-se um amplo conjunto de comentários e balanços a eventos científicos e patrimoniais de âmbito nacional e internacional, consolidando a Al-Madan Online como veículo privilegiado para a rápida mediação e promoção do diálogointerdisciplinar e da Cultura científica. Como sempre, votos de boa leitura!...

Jorge Raposo

Paulo, Franklin Pereira, Telmo Pereira,Severino Rodrigues, João Maia Romão,Raquel Caçote Raposo, Sofia Soares,Maria João de Sousa e António CarlosValera

Os conteúdos editoriais da Al-Madannão seguem o Acordo Ortográfico de 1990.No entanto, a revista respeita a vontade dosautores, incluindo nas suas páginas tantoartigos que partilham a opção do editorcomo aqueles que aplicam o dito Acordo.

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ÍNDICE

II SÉRIE (20) Tomo 2 JANEIRO 2016online

EDITORIAL ...3

ESTUDOS

PATRIMÓNIO

Guerra de Cerco (Silves) |Lara Melo...64

Nos Bastidores de umOfício: as ferramentas para trabalhar o couro daoficina de Manuel Capa(Tibães, Braga) |Franklin Pereira...73

Ludi Circensese Aurigas Vencedores nos

Mosaicos Hispânicos |Maria Teresa Caetano...14

A ReconstituiçãoArqueológica: uma

tradução visual |César Figueiredo...6

Produção Oleira Renascentista na Bacia Hidrográfica do Baixo Tejo: a produção de cerâmicas

vidradas em Alenquer, durante o século XVI |Guilherme Cardoso, João José Fernandes Gomes †,

Severino Rodrigues e Luísa Batalha...54

A Cerâmica Campaniense do Teatro Romano de Lisboa |

Vanessa Dias...34

A Porta Muçulmana daAlcáçova de Alcácer do Sal |Marta Isabel Caetano Leitão...80

A Igreja de Santa Maria de Albufeira |

Luís Campos Paulo...86

Placas de Xisto Gravadas emContexto de Povoado: o casodo Castelo de Pavia (Mora) |Marco António Andrade,Catarina Costeira e RuiMataloto...43

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Lusitânia Romana, Origem de DoisPovos: tema de congresso internacional |José d’Encarnação...111

EVENTOSNOTICIÁRIO ARQUEOLÓGICO

ICArEHB - Centro Interdisciplinar de Arqueologiae Evolução do Comportamento Humano: umnovo polo de investigação arqueológica | CláudiaCosta, Célia Gonçalves, João Cascalheira, JoãoMarreiros, Telmo Pereira, Susana Carvalho,António Valera e Nuno Bicho...98

Pelourinho de Vila Verde dos Francos (Alenquer):formatos antigos, novos usos - um caso de reaproveitamento |Raquel Caçote Raposo...106

Vestígios da Presença Templáriano Castelo dos Mouros: umalaje epigrafada com a Cruz de

Cristo | António Gonzalez,Márcio Beatriz, João Maia

Romão e Maria João deSousa...108

Ânfora Romana Dressel 2-4 Recolhida aoLargo do Cabo Espichel |Guilherme Cardoso eSeverino Rodrigues...110

INCUNA 2015: XVII JornadasInternacionais de Património Industrial |José Manuel Lopes Cordeiro...114

Workshop Paleodiet meets Paleopathology: using skeletal biochemistry to link ancient health,food and mobility | Olalla López-Costas...117

I Congresso Internacional As Aves na História Natural, na Pré-História e na História: um balanço final |Silvério Figueiredo, Fernando Augusto Coimbra e Miguel Feio...119

XIX International Rock Art Conference |Andrea Martins...120

Simpósio de Materiais Líticos em Barcelona |Sofia Soares...122

XIII Congresso da Association Internationale pourl’Étude de la Mosaïque Antique | Virgílio Lopes...123

XI Congresso Internacional sobre a CerâmicaMedieval no Mediterrâneo | Susana Gómez Martineze Marco Liberato...124

Arqueologia em Lisboa: mesa-redonda e encontro |Jacinta Bugalhão...125

2ª Mesa-Redonda Peninsular Tráfego de Objectos |Ana Pinto da Cruz...127

II Fórum sobre Património Natural, Etnográficoe Arqueológico | Ana Pinto da Cruz...128

Colóquio PRAXIS IV | Ana Pinto da Cruz...128

Simpósio Fusis Φυσις: o ser humano e os mistérios daVida, da Morte e do Céu | Ana Pinto da Cruz...129

Colóquio Internacional Enclosing Worlds |António Carlos Valera...130

Lisboa 1415 Ceuta: história de duas cidades |Jacinta Bugalhão...132

Balas, Botões e Fivelas: intervençãoarqueológica no Campo de

batalha do Vimeiro |Rui Ribolhos Filipe...101

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primeiro painel da exposição, em que se procuroumostrar como os indígenas haviam reagido peran-te uma nova cultura e as novas ideologias políti-co-religiosas.O Doutor Manuel Salinas de Frías, catedrático deHistoria Antigua da Universidade de Salamanca,subordinou a sua intervenção ao tema do 2º pai-nel: “El contacto. El impacto de la presencia ro -mana en Lusitania”. Abordou-se, pois, o que fo -ram as guerras e a consequente organização ter-ritorial, mediante a promoção de algumas cidadesindígenas, prováveis fundações de César – Scal -labis, Metellinum e Norba Caesarina, por exemplo–, e a colonização propriamente dita, no final daRepública, correspondendo “ao estabelecimento,nesses territórios, de um número indeterminado,mas percentualmente importante, de população itá-lica, com a sua língua, costumes e formas de se or -ganizar”. “Myrtilis e Salacia”, acentuou, “tinhamuma história anterior ligada ao comércio colonialatlântico e gozavam do direito latino, provavel-mente desde a época de César”.Coube ao Doutor Patrick Le Roux, catedráticoemérito de História Antiga da Universidade de Pa -ris XIII, falar da “Lusitania provincia: las prime-ras épocas (de Augusto à morte de Calígula”. Co -meçou por salientar – como tem sido sua preo-cupação nos últimos trabalhos que vem publi-cando – aspectos metodológicos, frisando que asmudanças de perspectiva historiográfica ocorridasnos últimos 60 anos mostram que uma históriados aspectos político-administrativos ainda man-tém actualidade. Assim, é possível repensar a his-tória das províncias romanas, nomeadamente a daLusitânia, cuja promoção se fez dentro do novodispositivo posto em prática pelo imperador Au -gusto, sem a enquadrar em modelos ditos colo-niais, nacionais ou imperialistas. Uma análise docontexto político e militar de então permite-noscompreender melhor o que foi o estabelecimen-to de uma província inteiramente nova “nas suasdimensões, composição territorial e modos de gover-nação”. E como “uma província não nasce do dia pa -

Organizado pelo Museo Nacional de ArteRo mano, com o patrocínio da Dirección del

Festival de Teatro Clásico, realizou-se, em Mérida,a 18 e 19 de Setembro de 2015, um encontro in -ter nacional em que se abordou o tema: a Lusitâniaromana, na origem de dois povos.Fora esse, aliás, o tema da exposição, patrocinadapela Consejería de Educación y Cultura del Go -bierno de Extremadura, a que se deu o mesmo no -me e que, inaugurada nesse museu a 23 de Março,se daria por encerrada a 30 de Setembro, para vira ser apresentada em Lisboa, no Museu Nacionalde Arqueologia (onde está desde 25 de Janeiro de2016).Presidiu ao congresso o director do Museo Nacio -nal de Arte Romano, Prof. Dr. José María ÁlvarezMartínez, comissário da mostra, juntamente como Doutor Carlos Fabião e o Dr. António Car valho,director do Museu Nacional de Arqueo logia.Foram convidados a participar os autores dostex tos do bem organizado catálogo da exposição.A ideia seria a apresentação do que haviam escri-to, uma vez que a linguagem oral permite, em reu-nião de especialistas e para um público interessa-

do (diga-se desde já que o auditório do museu es -teve sempre muito bem preenchido!), acentuar as -pectos inovadores e mais interessantes. E assimaconteceu, porque todos os oradores compreende -ram o desafio e as imagens com que foram acom -panhando o seu discurso complementaram efi-cazmente o panorama já mui sugestivamente tra-çado no catálogo.Os trabalhos iniciaram-se a meio da tarde do dia18, numa sessão que contou com a presença deMi riam García Cabezas, Secretária General deCul tura de la Junta de Extremadura, arqueólogaela também, que se congratulou com a iniciativa,saudou os participantes e teceu as naturais con-siderações acerca da importância dos estudos ar -queológicos como fomentadores de uma cidada-nia alimentada pelas raízes do passado. José MaríaÁlvarez Martínez, a abrir a sessão, não deixara,aliás, de sublinhar o objectivo primordial da ex -posição e do encontro: reflectir sobre um passa-do comum.Foi o Doutor Amílcar Guerra, professor associa-do da Faculdade de Letras da Universidade de Lis -boa, quem apresentou “La mirada del outro”, o

Lusitânia Romana, Origem de Dois Povos

tema de congresso internacional

José d’Encarnação

Por opção do autor, o texto não segue as regras do Acordo Ortográfico de 1990.

EVENTOS

FIG. 2 − Mesa da sessão de abertura.

FIG. 1

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O tema escolhido pelo Doutor Virgílio HipólitoCorreia, director do Museu Monográfico de Co -nímbriga – “Vivir y morir en sociedad en Lusi -tania romana” – proporcionou uma abordagem jámais filosófica, digamos assim, existencial, porqueprocurou dar respostas a cinco questões: “Quemsou? O que sou? Onde vivo? Como estou? E no fim?”.Interrogações cujas propostas de solução se estri-baram, por exemplo, na análise de como a arqui-tectura doméstica (foi aduzido o testemunho dosdados colhidos em Conimbriga) pode reflectir taispreocupações. Sublinhou-se a contribuição dosmonumentos epigráficos daquela cidade na ten-tativa de se identificar a esperança média de vidaou o papel da mulher na sociedade. E se este últi-mo aspecto é, na verdade, digno de nota e essasepígrafes deixam transparecer o papel relevante damulher, já uma tentativa estatística oferece debi-lidades, atendendo ao diminuto número de epí-grafes e, sobretudo, tendo em conta que podemser muito diversas as intenções que se têm quan-do se erige um monumento funerário ou os sen-timentos nele subjacentes.O Doutor Jonathan Edmondson, ainda que vin-do de paragens bem longínquas – é catedrático deHistória Antiga na Universidade de York (On tário,Canadá) –, quis estar presente, pois muito temestudado a Hispânia Romana, designadamente aLusitânia e, de modo especial, do ponto de vistada sua economia. Por isso, o seu contributo inti-tulou-se “Los recursos económicos de la Lusitaniaromana y los modos de producción”. Questõesque abordou: a visão da produção económica naAntiguidade, conforme pode ler-se nas obras dePolíbio, Estrabão e Plínio-o-Antigo, informa-ções a cotejar com os testemunhos arqueológicosdetectados tanto em sítios rurais como urbanos;os recursos marinhos: sal, peixe e preparados depeixe (garum, liquamen, etc.); os recursos minei-ros: os metalla (de que Aljustrel continua a ser pa -radigma), as pedreiras de mármore, a exploraçãode minérios de ouro e de prata, mas também decobre e estanho, ocupando a Lusitânia, neste pon -

ra a noite”, os testemunhos epigráficos (de Igaedis,Aritium Vetus, Arronches e Viseu, entre outros)dão-nos a possibilidade de, sem esquecer os dadosarqueológicos e os seus contextos, nos aperceber -mos melhor dos “ritmos da construção provincial”.Para Le Roux, “a Lusitânia constituiu-se comouma normal província à beira-mar, foi organizadasem qualquer distinção ou indício de inferioridadee pode ser colocada no mesmo plano que a Aqui tânia,por exemplo”. E Mérida, se não assumiu logo fun-ções de capitalidade, deteve, porém, ao longo dotempo, importante papel como garantia da “tran-quilidade do imperador e das populações”.O Doutor Vasco Gil Mantas, professor auxiliaraposentado da Universidade de Coimbra, abor-dou, de seguida, um tema que é da sua predilec-ção – a rede viária e a rede urbana na Lusitânia –,dando conta como Roma, para melhor conseguiros seus objectivos administrativos e económicos,estabeleceu cidades, é certo, mas procurou de ime -diato consolidar as comunicações entre elas.Estava, pois, aberto o caminho para o Doutor JoséCarlos Saquete Chamizo, do Departamento de His -toria Antigua da Universidade Hispalense, que deuà sua comunicação o título de “La fundación deAu gusta Emerita y su impacto entre los Lusitanos”,na sequência do que Patrick Le Roux assinalara.Interessou-se, de modo especial, por reflectir so -bre qual o estatuto jurídico outorgado às “genteslusitanas que habitaban previamente en el territo-rio que fue asignado a Emerita”, opinando que,mui provavelmente, “la mayoría fueron integradoscomo incolae, aunque algunos miembros de la eli-te podrían haber recibido la ciudadanía romana”.Emerita terá, naturalmente, exercido forte poderde atracção para os membros do escol provincial,onde o culto a Augusto e a outros imperadores di -vinizados serviu de trampolim para quem alme-jasse cargos maiores.No dia 19, o Doutor Thomas Schattner, membrodo Instituto Arqueológico Alemão, de Madrid,abordou o tema “La ciudad entre la tradición indí-gena y el modernismo romano. Reflexiones parauna nueva experiencia para los Lusitanos”. Ou se -ja, voltámos a olhar para a cidade, mas na sua es -trutura, interrogando-nos sobre quais terão sidoas linhas de força do povoamento romano: a ci -dade romana introduziu um novo modelo de con -vivência cívica, que é preciso não olvidar; no seuplaneamento (ortogonal ou de acordo com as con -dições do terreno) não foi menosprezada a neces-sidade de deixar evidentes marcas de poder, de har-monizar “arquitectura y paisaje, tamaño y jerarquia”e de se terem em conta as questões relacionadascom a circulação e o tráfico.

EVENTOS

to de vista, papel preponderante. Tempo aindapara se assinalar a existência, documentada, de for-mas de produção diversificadas, desde um regimede auto-suficiência, mormente a nível familiar, atéaos latifúndios e aos domínios imperiais.Coube ao Doutor Carlos Fabião, professor asso-ciado na Faculdade de Letras de Lisboa, traçar umapanorâmica do que poderia ter sido a Lusitânia nocontexto da globalização romana, aplicando-se ovocábulo – hoje de moda… – para significar os in -tercâmbios havidos entre as diversas partes do Im -pério e mesmo “con más remotas regiones totalmenteajenas al Imperio, como la China, de donde llegabanlas sedas, el subcontinente indio, con sus exquisitasespecias, o el Báltico, fuente del apreciado ámbar”.Os dados cerâmicos são, neste contexto, sobeja-mente comprovativos dessas relações, de modoque, a terminar, Carlos Fabião pôde afirmar que“después de la conquista de Britania, Lusitania se vol-vió un lugar de paso importante para las comuni-caciones entre el Mediterráneo e y el Atlántico, queno era ya il fin del mundo sino un mar igualmenteromano”.Coube ao Doutor Francisco Germán RodríguezMartín, membro do Grupo de Investigación“Lu sitania”, debruçar-se sobre o tema das “villaecomo testimonio emblemático del mundo ruralromano”, no que foi acompanhado pelo Dr. An -tónio Carvalho, que se referiu, mais especifica-mente, ao caso da villa de Quinta das Longas (El -vas), cuja escavação dirigiu. Os autores optarampor um discurso novo em relação ao que fora pu -blicado no catálogo. Assim, começaram por actua -lizar os conhecimentos acerca da “realidad del ám -bito rural lusitano”. Distinguiram os modelos deocupação rural identificáveis nos três conventus e,dentro de cada conventus, procuraram analisar, deforma pormenorizada, as duas grandes realidadesterritoriais: a costa e o interior, no conventus Pa -censis e Scallabitanus, e a bacia do Guadiana e ointerior, no Emeritensis. Análise que comple-mentaram com a alusão às actividades produtivas(azeite, vinho, salga de peixe, etc.) e à existência

112 II SÉRIE (20) Tomo 2 JANEIRO 2016online

FIG. 3 − Panorama da assistência.

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ponto de vista do uso da cor nos fundos dos três regis-tos do mosaico, quase um unicum no Ocidente”, oque demonstra, em seu entender, “a origem orien-tal do mosaicista que realizou esta obra-prima”.Demorou-se ainda na análise do mosaico com ce -na épica da Casa da Domus da Medusa, de Alterdo Chão, opinando que não são convincentes asinterpretações já adiantadas – o encontro finalentre Eneias e o rei dos Rútulos ou a entrevista en -tre Alexandre e o rei persa Poros, nas margens doHydaspe –, pelo que mais aturada investigação sehá-de fazer nesse sentido.Os três comissários da exposição tiveram, na ses-são de encerramento do Congresso, palavras deagradecimento e de congratulação pelos objecti-vos alcançados.Pelas 20 horas, fez-se a comemoração do XXIXDía do Museo Nacional de Arte Romano, poisque, obra de Rafael Moneo, foi aberto ao públi-co a 19 de Setembro de 1986. Após a intervençãoprotocolar do director, procedeu-se à entrega dosprémios “Genio protector de la colonia AugustaEmerita”, instituídos pela Asociación de Amigosdel Museo. Receberam o galardão o Dr. AntónioCarvalho, em nome do Museu Nacional de Ar -queologia, prémio justificado “por su buen hacery relación con el centro emeritense durante muchasdécadas”, e o Professor Patrick le Roux, “por sus rele-vantes estudios sobre la colonia Augusta Emerita yla formación de la provincia de Lusitania”. O elo-gio ao trabalho desenvolvido pelo Museu Na cionalde Arqueologia foi feito pelo Doutor José MaríaÁlvarez Martínez e coube ao presidente da Aso -ciación de Amigos, Rafael Mesa, realçar o perfildo Professor Le Roux. Ambos agradeceram comemoção.Ainda na mesma sessão se procedeu, pela Dra.Trinidad Nogales, à apresentação das Actas delXVIII Congreso Internacional de Arqueología Clá -sica, realizado em Mérida (Maio de 2013). E asautoridades presentes no acto tiveram palavras deapreço pela iniciativa.

de unidades rurais secundárias. A arquitectura degrandes villae como São Cucufate, Quinta dasLongas, Torre Águila, Freiria e outras, permitiu de -duzir como se fizera para o mundo rural a trans-posição dos modelos arquitectónicos urbanos.Tive ensejo, por meu turno, de traçar, em pince-ladas largas, o que ultimamente se tem reflectidoacerca do significado das manifestações religiosas,consubstanciadas, de modo particular, nas epí-grafes dedicadas às divindades indígenas, às divin-dades ditas “clássicas” do panteão romano, aoimperador imbuído de espírito divino (designa-damente quando proclamado divus, após a mor-te) e às divindades ditas “orientais”. Creio deversublinhar três aspectos:‒ Em primeiro lugar, a confirmação dada pelosdois ex-votos de Alcains de que existiu uma liga-ção íntima, mesmo do ponto de vista da nomen-clatura, entre as pessoas integradas na gentilitas ea divindade que designavam para sua protectora(neste caso, Polturus da gentilitas Polturiciorum aprestar culto a Asidia Polturicea);‒ Depois, o facto de uma dedicatória como a deViseu vir “assinada” por uma só pessoa tal não de -nuncia, obrigatoriamente, um acto isolado, não--oficial; neste caso, a meu ver, Albinus Chaereaefilius nada mais foi do que o porta-voz, o promotordo que fora um desiderato comum;‒ Finalmente, a exemplo do que acontece comorganizações associativas nossas contemporâneas,o objectivo oficial – ainda que de índole religiosa‒ mascara a necessidade de se criarem laços capa-zes de ter, em bloco, intervenção político-econó-mica; não é, pois, inocentemente que os cultosromanos que exigiam iniciação tenham membrospredominantemente recrutados no escol doslibertos da cidade…O tema a deitar luz sobre “La lenta transforma-ción” ocorrida na transição para a Idade Média foitratado, no começo da tarde de sábado, pelaDoutora María Cruz Villalón, catedrática de Arteda Universidade da Extremadura (Cáceres). Des -de o século III que se apercebia a tendência parauma mudança dos padrões estéticos, com o pro-gressivo desaparecimento da imagem e o encararda realidade de um prisma mais eivado de religio -sidade, na medida em que já se fazia sentir maiorconvivência com o Cristianismo, tendência quedesembocará, já no século VI, com “uma criaçãounicamente dedicada à religião cristã”. Para melhorse compreender esse processo de transformação,a Doutora María Cruz Villalón referiu, comoexemplos, Mérida e Mértola, assim como os mo -saicos e a iconografia patentes nas villae tardo--romanas da Lusitânia, até à época visigoda,

quando se assiste à “adição de basílicas”, como foio caso de Torre de Palma ou de Casa Herrera.Da equipa do Museo Nacional de Arte Romano,o Dr. José Luis de la Barrera Antón deu conta, emseguida, do que foi a monumentalização dos cen-tros urbanos, entendendo-se por “monumentali-zação” a introdução de imóveis com alguma im -ponência arquitectónica e vasto significado polí-tico, nas urbes privilegiadas da província, comespecial menção à de Augusta Emerita, desde osprimórdios da criação da Lusitânia até finais doséculo I d.C. Particular atenção dedicou ao deno-minado “foro provincial” e ao grande templo queora se considera ter sido erigido, seguindo padrõesmetropolitanos, pelo governador provincial L.Fulcinius Trio. Nem sempre, porém, a adopção demodelos foi imediata, porque se registou a natu-ral dificuldade em “asimilar un vocabulario queresultaba novedoso”.Coube à Dra. Trinidad Nogales Basarrate, agorade novo regressada à equipa do Museo Nacionalde Arte Romano, sintetizar os resultados da lon-ga investigação que tem levado a cabo no âmbi-to da escultura. Tem a escultura da Lusitânia umalinguagem própria? Como é que, afinal, se pro-cessou a adopção dos novos modelos que o colo-nizador recém-chegado necessariamente houve demostrar? Retratos, grupos escultóricos imperiais,relevos comemorativos contribuíram, pois, paraa mudança cultural que essas imagens eloquen-temente transmitiam.Por fim, os mosaicos. Deles falou a Doutora Jani -ne Lancha, professora emérita da Universidade“Lumière” de Lyon, mostrando os exemplaresmais significativos de um conjunto que pode clas -sificar-se como deveras notável: entre outros, omosaico do Oceano de Faro, os mosaicos de te -mática marinha da villa de Milreu, o mosaico dasMusas de Torre de Palma… Mereceu-lhe parti-cular atenção o extraordinário mosaico cosmo-lógico de Mérida, cuja originalidade iconográfi-ca e pictórica salientou, de modo especial “do

FIG. 4 − Os três comissários na sessão de encerramento.

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