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FORMAÇÃO DE LEITORES: A RECEPÇÃO DE UMA OBRA INFANTOJUVENIL POR ESTUDANTES DO ENSINO FUNDAMENTAL II
Discente: Ana Estela Ferreira- UNESP Marília- [email protected]
Orientadora: Raquel Lazzari Leite Barbosa - UNESP Assis- [email protected]
Linha de Pesquisa: Teorias e práticas pedagógicas
Resumo
O objetivo dessa investigação é compreender como a literatura juvenil pode contribuir para a formação leitora de estudantes do Ensino Fundamental II de uma Escola Pública do interior estado de São Paulo. A questão de pesquisa a ser investigada está assim definida: Como a obra Nós três de Lygia Bojunga (1987), é recepcionada por estudantes do 7° ano do Ensino Fundamental, no contexto da formação de leitores. A metodologia dessa pesquisa é qualitativa do tipo pesquisa de campo, caracterizando-se por uma intervenção em sala de aula, na qual a professora responsável pela turma é a pesquisadora, e mediadora para a prática de leitura em questão. A pesquisa será desenvolvida no 2° semestre de 2016 com 26 estudantes do 7° ano, período vespertino. A construção dos dados será realizada mediante questionários, entrevistas, diário de campo, filmagens e gravações de áudio, que possam “ouvir” o que o leitor participante tem a dizer sobre sua experiência com a leitura. A intervenção nortear-se-á pelos seguintes passos: observação dos hábitos leitores, proposição e leitura da obra e discussão sobre as impressões de leitura de maneira dialógica. Os dados serão analisados na perspectiva de interação entre leitor e texto, de acordo com o conceito de horizonte de expectativa da estética da recepção, proposto por Jauss (1994), e espaços vazios, proposto por Iser (1996), tentando aproximá-los também dos estudos de Roger Chartier (1988).
Palavras-chave: Formação de leitores; estética da recepção; literatura infantojuvenil;
Introdução
A minha relação com a leitura literária iniciou-se na educação básica, especificamente
no ciclo II, quando primeiro encontrei os livros, e este encontro configurou-se como um
caminho novo, que ia muito além do aprender. Ler era, e é o ponto de vista por meio do qual
observo, e compreendo o mundo à minha volta, e meu mundo particular, e assim compreendo
que linguagem e realidade se prendem dinamicamente (FREIRE, 1989). Dessa forma, ao
concluir a graduação em Letras no período de 2006 a 2008, e iniciando como docente em
2009 comecei a perceber certo distanciamento entre a leitura literária e universo escolar
(ainda que da escola específica em que lecionava), concretizado pela falta de contato entre os
livros e os estudantes. Nesse limiar a consciência das minhas dificuldades como docente,
principalmente no contexto do trabalho com a leitura literária em sala de aula, conduziu-me
ao curso de Especialização em Literatura e Ensino, nas Faculdades FACCAT1 ao longo do
ano de 2013 e 2014, momento em que tive o primeiro contato enquanto profissional com a
literatura infantil e juvenil. Bem como pude conhecer algumas práticas de leitura e formação
de leitores, que talvez pudessem contribuir para o desenvolvimento de uma consciência
leitora, dentro de sala de aula.
Ler é muito mais do que decodificar palavras e frases, mais do que ler “corretamente”
sem errar palavras, ou ler em voz alta com certa entonação. Ler passa necessariamente pela
construção, pela atribuição de sentido do objeto lido, uma experiência. Ler é um processo de
interação entre leitor, texto e realidade.
Barthes (1988) ao escrever sobre “O que é ler? Como ler? Por que ler?” (p.43). Não
propõe uma definição do termo leitura, mas a apresenta, como sendo “precisamente aquela
energia, aquela ação que vai captar neste texto, neste livro [...] o lugar onde a estrutura se
descontrola” (p. 52) e nesse contexto o leitor é compreendido como um sujeito inteiro, de
experiências e historicidade, que é “atravessado por uma intervenção dialética [...] e produz
amonta linguagens, deixa-se infinitamente e incansavelmente atravessar por elas: ele é essa
travessia” (p.51).
Para conceber a leitura como processo, em que o leitor seria ele próprio o agente de
passagem, é necessário como já foi dito, que se construa sentido para o que se está lendo.
Chartier (1998) afirma que ler é “apropriar-se do inventar e produzir significados”, no
entanto, esse construir necessita ser compreendido como algo muito mais amplo, que não
permite uma visão fechada do ato de ler, e pensando no contexto de sala de aula, se é o leitor
que lê, como pode o sentido ser construído puramente pelo professor? Ou ainda pelo crítico
literário, o qual analisa o texto a partir de sua própria teorização e intelectualidade, e depois
será lido pelo professor, que o repetirá, de geração em geração? Ou como é possível que a
leitura já venha com um sentido determinado pelas explicações do livro didático ou materiais
fornecidos pelo governo para o ensino público, que já antes da leitura, tentam nortear o
sentido que a mesma terá? Para que ler se o sentido já está dado? São perguntas que
incomodam. Onde é que está o sentido de um texto? Chartier disserta que abordar a leitura, é,
1 Faculdade de Ciências Contábeis e de Administração de Empresas de Tupã (FACCAT)
portanto, considerar, conjuntamente, a irredutível liberdade dos leitores e os
condicionamentos que pretendem refreá-la (1990, p.123).
O foco deste trabalho é a leitura em sala de aula, e desta forma, de início o que se
compreende é que um ensino de leitura que seja de alguma forma impositivo sobre o leitor,
não o ajuda a verdadeiramente aprender que ler é tecer sentidos. Dessa forma é que Chartier
ao propor que “a leitura é sempre uma prática encarnada em gestos, espaços e hábitos” (apud
Xavier 2010), p.6), combate uma relação abstrata entre leitor e texto, na medida em que o
texto não é apenas seu conteúdo semântico, e o leitor não é alguém desvinculado de seu
contexto histórico e social, e muito menos o são, “as práticas através das quais ele se apropria
do texto” (CHARTIER, 1990 p.25) apresenta assim, a construção do sentido, não só do que
foi lido pelo leitor, mas o sentido mesmo do ato de ler, bem como o sentido da prática de
ensino de leitura, ambos concebidos como prática social e cultural.
No discurso dos professores e alunos, partícipes do processo de ensino aprendizado na
escola, também no discurso dos meios de comunicação, ou da sociedade em geral, sobressai-
se a ideia com força de afirmação de que os estudantes não demonstram ter interesse em ler o
que lhes é apresentado, criando por vezes aversão a tudo que se designa leitura,
principalmente a leitura literária, porém, em tempos de comunicação via Internet, e
principalmente com o surgimento de redes sociais e afins, nota-se que as crianças e jovens
escrevem e se comunicam o dia todo. Neste ponto, talvez se deva refletir sobre a concepção
do que é ler para o professor, e para os estudantes, mais especificamente, ler na escola. O
conceito de representação, formulado por Chartier, ajuda a refletir sobre esse processo “A
relação de representação — entendida como relação entre uma imagem presente e um objeto
ausente, uma valendo pelo outro porque lhe é homóloga” (p.184), ou seja, a ideia tanto do
professor quanto do aluno de que não há gosto pela leitura, e de que ninguém lê, traz a
impressão que a leitura está, portanto, em crise, o que causa uma sensação de fracasso, do
aluno ao ler, não porque este não lê, mas porque acha que não lê como tem de ser, e do
professor ao tentar ensinar a ler e achar que o aluno não leu, porque leva à leitura do aluno a
sua própria leitura. Todo esse contexto acaba por tornar alienado o processo de ensino de
leitura e escrita na escola
Professor e aluno, na pressuposição de que um ensina e outro aprende ou, no caso da leitura, de que a leitura de um vai corresponder à leitura do outro, quando percebem que isso não acontece, passam a procurar um culpado. Um deles não teria desenvolvido satisfatoriamente sua tarefa, individualizam-se as responsabilidades. (BARBOSA, 1998 p.16)
Chartier (1990) argumenta ainda que “As representações [...] são sempre determinadas
pelos interesses dos grupos que as forjam. Daí para o caso do necessário relacionamento dos
discursos proferidos com a posição de quem os utiliza” (p.17). Dessa forma, nas práticas de
leitura existentes na escola, encontra-se o ato de ler com caráter utilitário, ou seja, ler
executando tarefas, ler para aprender algum conteúdo, ler para responder exercícios, e
também o chamado ler por “prazer” associado sempre a leitura literária (apresentado dessa
forma até pelos meios de comunicação), há a institucionalização da leitura na escola, que
afasta mais do que aproxima, o leitor do texto lido.
O interesse pela apreensão do enunciado de um texto dependerá do sentido que este adquira para cada leitor em particular. A partir de sua construção é que a leitura passará a ter um sentido na vida do sujeito e somente assim ele será leitor na ação da leitura (BARBOSA, 1998 p.12)
Formar leitores autônomos, leitores que não sintam que precisam de alguém para ler
para eles, romper com a sensação de inferioridade ao ler, supõe que eles façam sua própria
leitura do texto, enquanto que o comum em sala de aula, quando há espaço para leitura, esta é
a do professor, ou ainda menos, esta é a que se orienta que seja, a leitura indicada pelos livros
didáticos, apostilas e afins. Barbosa (2001) afirma que “Práticas de leitura fundam-se em
práticas anteriores, em transmissão cultural. A cultura institucionalizada predispõe a uma
recepção particular de discursos e dos valores neles vistos.” (p.55).
Sobre isto Zilbermam alerta que
(...) a sala de aula é um espaço privilegiado para o desenvolvimento do gosto pela leitura, assim como um campo importante para o intercâmbio da cultura literária, não podendo ser ignorada, muito menos desmentida sua utilidade. Por isso, o educador deve adotar uma postura criativa que estimule o desenvolvimento integral da criança. (2003, p.16)
O objetivo é a formação de leitores do ciclo II do ensino fundamental, de uma escola
pública, mais especificamente a leitura literária, uma vez que a hipótese de pesquisa é a de a
literatura juvenil pode contribuir para formar leitores neste nível de ensino. Desta forma,
justifica-se também a aproximação com a literatura juvenil, tentando compreender como esta
estabelece diálogo com o leitor criança e jovem.
A literatura infantil e juvenil, desde as suas primeiras manifestações de obras ainda no
século XVII até os textos que são produzidos atualmente, especificamente no Brasil, passou
por um longo percurso, e nem sempre se caracterizou por obras que possuíssem caráter
estético.
Edmir Perroti (1986), pesquisador, em seu livro O texto sedutor na literatura infantil,
disserta sobre o forte traço doutrinário e utilitário na literatura infantil e juvenil desde seu
nascimento e primeiros passos, e assinala que apenas na década de 70 há a renovação
necessária para romper com o discurso pedagogizante predominante nestas obras.
Nesse momento, surge na literatura brasileira para crianças e jovens um número grande de escritores, com uma consciência nova de seu papel social: reclamam a condição de artistas e desejam que suas obras sejam compreendidas enquanto objeto estético, abandonado, assim, o papel de moralistas “ou pedagogos”, que até então fora reservado a quem escrevesse para a faixa infanto-juvenil (p. 11).
De acordo com Perroti (1986), a obra O caneco de Prata de João Carlos Marinho
torna-se um verdadeiro divisor de águas, pois rompe completamente com o tom utilitário e
pedagogizante da literatura juvenil, ainda que tardiamente. A encenação da linguagem
presente neste texto cria no leitor uma distância crítica: ele sabe que o que lê é “ilusão”,
“criação”. Com isso o útil que está sempre presente na obra literária torna-se possibilidade e
não certeza, na medida em que sua referência é o universo.” (p. 84).
Tendo como horizonte o leitor infantil ou juvenil, neste contexto, vários escritores
intentam produzir textos de qualidade estética e portadores de um discurso que vai contra
certo condicionamento que a produção de obras de caráter utilitário possuía. Há a presença de
um discurso que, como discute Perroti (1986), “abre possibilidades ao leitor, deixando-lhe
claro que está diante de um objeto “criado” que não se quer verdade, nem dogma a ser
seguido” (p 133). Pode-se também inserir neste grupo algumas obras de Ana Maria Machado
como: Bisa Bia Bisa Bel (1990), bem como, Flicts (1989) de Ziraldo, e Os colegas (1972),
Corda Bamba (1979) de Lygia Bojunga.
A literatura infantil e juvenil, conflituosa desde o seu nascimento, foi apresentada
pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) como gênero de leitura de distração, ou mais
facilitada para o leitor criança e jovem.
Assim a tarefa de formar leitores impõe à escola a responsabilidade de organizar-se em torno de um projeto de textos educativos com a intermediação da passagem de textos mais facilitados (infantil ou infanto-juvenil) para o leitor de textos de complexidade real tal como circulam socialmente na literatura e nos jornais, do leitor de adaptações ou de fragmentos para o leitor de textos originais e integrais. (BRASIL, 1998, p.70)
Segundo os PCN, a escola deve construir pontes entre tais textos de entretenimento e
leituras mais complexas.
Assim, a tarefa da escola, nestes ciclos, é, além de expandir os procedimentos básicos aprendidos nos ciclos anteriores, explorar, principalmente no que se refere ao texto literário, a funcionalidade dos elementos constitutivos da obra e sua relação com seu contexto de criação. (BRASIL, 1998, p.71)
A visão dos PCN continua ainda a apresentar os textos da literatura infantil e juvenil,
como textos mais facilitados, ou seja, resiste a noção implícita de caráter pedagógico, a ideia
de que o ser criança ou jovem não tem maturidade suficiente para ler textos complexos, e por
isso lê textos menos complexos. Este norteamento dos Parâmetros Curriculares Nacionais
pode colaborar para o distanciamento de tais textos em sala de aula, quando se supõe a falta
de disseminação ou distribuição dos mesmos no contexto escolar, o desconhecimento destas
obras pela maioria de professores de língua portuguesa, ou ainda, a ausência de disciplinas de
literatura infantil ou juvenil na grade curricular das universidades e faculdades de cursos de
letras e pedagogia.
Formar o gosto literário, por determinada obra ou gênero é tarefa que supõe o prazer
ao ato da leitura, como questiona Barthes (1988) “Que há de Desejo na leitura? O Desejo não
pode nomear-se, nem mesmo (ao contrário da Demanda) dizer-se.” (p.48) as pessoas sempre
vão se lembrar de qual livro mais gostaram de ler, da experiência da qual fizeram parte,
mesmo que não se lembrem do autor, e nem mesmo o nome da obra. Segundo Magnani
[...] o gosto (como sabor, ou prazer, ou moda, ou opinião, ou faculdade de julgamento) pela leitura, em particular a da literatura, não é um dado da ‘natureza humana’, imutável e acabado, e sua formação tem a ver com as necessidades, com o tempo e com o espaço em que se movimentam pessoas e grupos sociais. (1992, p. 101)
Sendo assim, o objetivo de formar leitores leva à reflexão sobre de que maneira é
construída a iniciação, o encontro do leitor criança e jovem com o mundo da leitura, “não
basta que os textos sejam bons ou bem escritos, é necessário que consigam produzir no leitor
um efeito de admiração ou de estranhamento” (CAMPOS, 2001 p. 137). Uma literatura que
fale da essência do ser humano enquanto criança e jovem, que não o faça de maneira
pedagógica, fechada, mas que “chame para fora” aquilo que se precisa simbolizar.
Convém então refletir sobre a inserção desta literatura infantil e juvenil no ambiente
escolar. Segundo Perroti (1986), o discurso estético, em obras de literatura infantil e juvenil,
aponta para participação do leitor e dessa feita deixa de ser autoritário, no entanto, ainda se
percebe a ausência de espaço para o caráter estético dos textos literários em classe, espaço
para partilha e discussão.
A relevância desse trabalho justifica-se por ter como objeto de estudo a literatura
infanto-juvenil, uma vez que este segmento, constituindo-se de obras de qualidade estética
tais quais as da chamada literatura adulta (se é que se pode fazer esta distinção), desempenha
papel importante na vida do leitor criança e jovem. Por outro lado, observando o Currículo
Oficial do Estado de São Paulo (2008), bem como os Parâmetros Nacionais (1998) e a
realidade de muitas das escolas públicas, observa-se que a Literatura Infantil, e
principalmente a literatura juvenil brasileira ainda não conquistou o seu lugar no espaço
escolar.
Para isso será investigado com mais aprofundamento teórico e metodológico, a
seguinte questão: Como a obra Nós três de Lygia Bojunga (1987), é recepcionada por
estudantes do 7° ano do Ensino Fundamental de uma escola pública do interior do
Estado de São Paulo, no contexto da formação de leitores? É importante salientar que a
escolha dessa obra se deve ao fato de que possui valor estético e literário ao tratar de temas
inerentes a alma humana, como a morte, a solidão, e construção dos relacionamentos,
cumprindo assim o caráter humanizador da literatura.
O diálogo entre leitor e texto norteará esta pesquisa, uma vez que se buscará criar um
espaço para esta relação dentro de sala de aula. O aporte teórico serão os conceitos de
representação, apropriação, e práticas de leitura propostos por Roger Chartier (1990), no
sentido de compreender o ato da leitura como prática cultural e em toda a sua historicidade, e
dessa forma ter embasamento para compreender o ensino de leitura literária em sala de aula
de maneira mais ampla. Objetivam-se também, as contribuições os conceitos que a Estética da
Recepção de Jauss (1994) e Teoria do Efeito de Iser (1996) podem trazer para esta relação, na
medida em que estas procuram criar mais espaço para leitor no processo de construção de
sentido para o texto.
Objetivo geral
O objetivo deste projeto de pesquisa é compreender como a Literatura Juvenil pode
contribuir para a formação de leitores do Ensino Fundamental II, mais especificamente
estudantes do 7° ano do Ensino Fundamental de uma Escola Pública do interior do estado de
São Paulo.
Objetivos específicos
Os objetivos específicos desta pesquisa estão assim definidos:
Fazer uma revisão da literatura acerca das metodologias e práticas de ensino que
trabalhem com formação de leitores por meio da literatura infantil e juvenil, no ensino
fundamental que acabará por delinear também como está sendo situada a literatura
juvenil no âmbito escolar;
Fazer uma revisão bibliográfica que ajude a compreender a leitura como prática social,
e como ela se delineia no contexto de sala de aula;
Realizar uma pesquisa de campo, do tipo intervenção em sala de aula com as obras
Nós três de Lygia Bojunga (1987), com estudantes do 7° ano do Ensino Fundamental,
para observar como os estudantes recepcionam esta obra literária juvenil, a fim de
observar o processo de despertar o gosto pela leitura literária;
Registrar as experiências vivenciadas através de questionários, diários de campos, e
entrevistas, de modo que seja possível delinear alguns aspectos e características das
obras escolhidas, que emergem diante desse encontro entre leitor e obra. Os dados
serão analisados a partir dos conceitos da Teoria da estética da recepção de Jauss
(1994) e a Teoria do efeito de Iser (1996).
Procedimentos metodológicos
Para a concretização desta pesquisa, que visa uma investigação didática em sala de
aula com estudantes dos 7° ano do Ensino Fundamental, do qual sou professora, inicialmente,
utilizar-se-á como embasamento teórico os estudos de Bogdan & Bkelin (1994), os quais
ajudam a bem como os estudos de Marli André (1986), as quais procuram, segundo André
(1995)
“tratar dos problemas da pesquisa em educação, e tem a preocupação com o ensino no contexto escolar. As pesquisas que venho
desenvolvendo nos últimos anos têm como foco de interesse questões da prática escolar cotidiana, visando encontrar alternativas para o redimensionamento do saber e do fazer docentes.” (p.6)
A metodologia de abordagem qualitativa, que ganhou espaço no cenário de pesquisa
brasileiro nas décadas de 80 e 90, contribui para os estudos em educação, uma vez que
posiciona o fazer pesquisa inserindo no dia a dia escolar na medida em que “Na investigação
qualitativa, a fonte direta de dados é o ambiente natural, constituindo o investigador o
instrumento principal.” (Bogdan & Biklen, 1994 p.47), ou ainda por ter, de acordo com Ludke
(1986) o objetivo de aproximar o trabalho de pesquisa da vida diária do educador, em
qualquer âmbito em que ele atue, tornando-o um instrumento de enriquecimento de seu
trabalho. (p.2)
Inicialmente, esta pesquisa pretende aproximar-se dos conceitos teóricos de Roger
Chartier, historiador do livro e da leitura, na medida em que este possibilita uma compreensão
mais ampla das relações constituídas em torno da leitura, concebendo-a como uma prática
cultural, como explica Chartier “A leitura não é somente uma operação abstrata de intelecção:
é pôr em jogo o corpo, é inscrição num espaço, relação consigo mesmo ou com o outro. ”
(1991 p. 181).
Na pesquisa bibliográfica, também serão consultadas várias literaturas referentes ao
assunto em estudo, artigos publicados em periódicos que envolvam o tema em questão,
literatura e ensino, bem como teses e dissertações que possibilitarão que este trabalho tome
forma para ser fundamentado. Algumas leituras iniciais já assinalam certa ausência de
trabalhos que tratem do tema do ensino de leitura literária juvenil, em sala de aula no ciclo II
do ensino fundamental.
No segundo momento, realizar-se-á pesquisa de campo com os estudantes
supracitados, caracterizando-se por uma intervenção em sala de aula, na qual a professora
responsável pela turma é a pesquisadora, e mediadora para a prática de leitura em questão. A
pesquisa será desenvolvida no 2° semestre de 2016. A turma que participará deste projeto
como objeto de pesquisa, é uma sala com 26 alunos, estudantes do período vespertino, que
apresentam boa frequência as aulas, mas que, no entanto, não apresentam nenhuma
singularidade que os distancie de outras turmas, desta escola, ou de outras. A escolha dessa
turma e/ou nível de ensino e obras literárias deve-se ao fato de que o enfoque dessa
investigação é a literatura juvenil, pela escolha de uma obra que apresenta qualidade estética,
com um caráter de encenação, tendo em vista que estas são mais significativas para o público
desta faixa etária, bem como e a partir disso, aprofundar em que sentido o contato com tais
textos contribui para a prática de formação de leitores no Ensino Fundamental.
A intervenção nortear-se-á pelos seguintes passos: Observação dos hábitos leitores dos
alunos desta sala em seu dia a dia; verificar o histórico de leitura dos mesmos, nos registros da
biblioteca em parceria com a professora responsável pela sala de leitura, tentando coletar
dados sobre o que eles leem, a frequência, e algumas escolhas; observar em sala de aula, no
ato das leituras em livros didáticos, ou quaisquer outros materiais, como é a dinâmica
cotidiana ( leitura silenciosa, leitura em voz alta, individual ou coletiva) os desequilíbrios que
surgem nestes momentos; propor um questionário para coletar dados sobre o perfil leitor
destes alunos( se possui livros em casa, alguns relatos sobre suas histórias com a leitura) os
quais tem a intenção de aliar-se aos dados de observação já realizados; propor uma roda de
conversa após a realização do questionário, ou entrevistas com alguns sujeitos de pesquisa,
caso a leitura do questionário conduza para isso; convidar os alunos a lerem o livro Nós Três
de Lygia Bojunga ( 1987), os alunos serão orientados a lerem em casa, pois considera-se que
a formação do leitor , principalmente literário, também pressupõe o gosto e a liberdade, e
obrigá-los a ler em classe, seria “ fazer a hora da leitura da professora”; será estipulado em
comum acordo um prazo para que os alunos participantes realizem a leitura, sendo que
durante esses dias, será acolhida como observação todos os apontamentos ou questionamentos
que os alunos começarem a expor acerca da leitura; a roda de partilha acontecerá de forma
dialógica, em que a professora- pesquisadora tem a intenção de atuar como mediadora na
movimentação dessas experiências leitoras, providenciando para que todos possam falar,
mesmo os alunos que escolheram não ler o livro. Os alunos escolherão um ou mais trechos do
livro que quiserem partilhar (está parte da pesquisa pretende ser gravada, mas não se descarta
o uso do diário de campo); após esse passo, os alunos terão acesso a outro questionário, o qual
abordará perguntas específicas sobre o livro, para recolher dados mais precisos sobre as
teorias que ancoram a análise dos dados.
De acordo com Ludke (1986) analisar os dados qualitativos significa “trabalhar” todo
o material obtido durante a pesquisa, ou seja, os relatos de observação, as transcrições de
entrevista, as análises de documentos e as demais informações disponíveis (p.45). Dessa
forma, a partir de todos os dados recolhidos, a análise tentará “ouvir” o que o leitor
participante tem a dizer sobre sua experiência, procurando relacionar à isso, alguns
procedimentos metodológicos da teoria da Estética da Recepção de Jauss (1994) e a Teoria do
Efeito de Iser (1996) que criam um espaço para o a voz do leitor durante o ato da leitura,
mediante a interação entre leitor e texto, entendendo por recepção a acolhida de uma obra no
momento de seu aparecimento e no decorrer da história, segundo disserta Ando
A literatura, sob o viés da estética da recepção, além de proporcionar prazer estético, porta a função de transformar o leitor. Nessa perspectiva, a leitura se constitui a partir de uma relação dialógica entre texto e leitor, mediante a atualização da obra, que é atualizada como resultado da leitura (2006, p.41).
Bem como a Teoria do Efeito de Wolfang Iser (1996), que em “O ato da leitura”,
discute sobre a estrutura do texto literário que desencadeia o efeito e a reação do leitor ao ter
contato com a obra. O efeito advém dos espaços vazios deixados pelo texto, os quais têm de
ser preenchidos pelo leitor, por meio de suas experiências. Ao deixar um horizonte aberto, a
estrutura do texto, orienta as projeções de que o leitor fará a cada passo lido. Como explica
Ando
“O horizonte de expectativas [...] determina a distância estética, que, por seu turno, possibilita medir o caráter artístico de uma obra. Isso significa que é a partir do modo como esta produz seu efeito em seu público, que se tem uma maior ou menor distância estética, vale dizer, há um maior ou menor afastamento entre o horizonte de expectativas do público e o horizonte de expectativas suscitado pela nova obra, cuja acolhida decorre da negação de experiências conhecidas ou da conscientização de novas experiências.” (2006, p.41)
Cumpre, porém, assinalar que se pretende também aproximar os dados de alguns
conceitos de Chartier (2011) quando o mesmo propõe uma visão mais ampla práticas de
leitura ao apresentar o aspecto do suporte do livro como algo que também contribui para a
recepção e apropriação da obra lida “a estética da recepção [...] ao centrar sua atenção apenas
na relação autor/leitor e nas obras com estatuto literário [...] ignora os efeitos produzidos pelos
dispositivos de produção de livros na recepção dos textos” (p.99).
De início a pesquisa intenta compreender de que maneira “o efeito” resultante da
experiência literária pode contribuir como estratégia para a formação do leitor criança e
jovem, mas desde já, aponta-se para a ideia de que o processo de aproximação com o livro em
sala de aula, também contribua para um despertar leitor nestes estudantes.
Baseados em algumas dessas concepções, compreende-se que formar leitores no
ambiente escolar deve primeiramente partir do princípio de que é necessário haver um espaço
para que este fale, sinta, construa, dessa feita, uma metodologia que proporcione um lugar
ativo para o leitor e uma obra que interaja com o mesmo.
Atividades e cronograma de execução
Atividades Acadêmicas Ano 2016 2017
Semestre 1º 2º 1º 2º
Revisão bibliográfica. Participação em grupos de pesquisa e estudos.
Cumprimento dos créditos das disciplinas. Aperfeiçoamento no projeto de pesquisa
Levantamento de estudos, pesquisas, documentos escritos, mídias, bibliografias e etc.
Construção dos dados a partir da realização das intervenções.
Análise dos dados à luz da teoria estudada
Participação em eventos acadêmicos e científicos com o propósito de apresentar os resultados parciais da pesquisa, a fim de obter contribuições.
Reflexões finais; principais evidências; perspectivas para a área científica e para a relevância social a qual se propõe.
Elaboração da dissertação
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