sonar...o bicho não come. se é torto, desgosto, na alma, absorto. se é homem, humano, carne que...

33
1 SONAR É grande o segredo entre o céu e a árvore, gigante a falha entre a morte e a dor. Serrando a malha entre a vida e a tarde, nascida rumo ao norte esplendor. Temendo os ares marcados e frios, verbera a fronte das marcas risonhas. Sondando as faixas do seu arrepio, berrantes o voo paterna cegonha. É forte, é morte, quer vida. Os sons na tu'alma se apagam À parte a marreta arredia. E assim, morrendo na via, eterno à flor lumiar, o infinito martelo sonar.

Upload: others

Post on 08-Apr-2020

6 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

1

SONAR

É grande o segredo entre o céu e a árvore,

gigante a falha entre a morte e a dor.

Serrando a malha entre a vida e a tarde,

nascida rumo ao norte esplendor.

Temendo os ares marcados e frios,

verbera a fronte das marcas risonhas.

Sondando as faixas do seu arrepio,

berrantes o voo paterna cegonha.

É forte, é morte, quer vida.

Os sons na tu'alma se apagam

À parte a marreta arredia.

E assim, morrendo na via,

eterno à flor lumiar,

o infinito martelo sonar.

2

LUMIAR

Vivemos em um mundo sem luz,

humano, ordem e caos, fé e medo.

Dicotomia. Proporção e desproporção,

no louco abismo desenredo.

Tardia é a má-nifestação

do inquieto labor irreparado.

Anônima desconstelada prisão,

limitada ao pouco conquistado.

É forte a sorte da alegria.

Não falam na alma de um deus,

Perdido, à luz do dia?

É sorte, a flecha e a pontaria,

guiando a dor à - judiaria,

à inevitável conquista lumiar.

3

MATERNAL

Inefável e brusca a sequência da vida,

revogável relógio da eternidade.

Ilibada paixão, a tendência esquecida,

lembrando a um ser tua interna cidade.

Se é dócil o caráter ameno,

no adulto, saborosa lembrança.

Se é forte a mensagem serena,

no vigor, a eterna criança.

Sendo dó, faz o sol, esquecida.

Como a foz da feminina vida,

revolveu o glamouroso mar?

É feroz, o rapaz, seu menino,

saudosa morte do ser masculino,

à morte viva, repetivavida: maternal.

4

MUSICAL

Debalde a chama nos clama,

quando mudos sofremos o ardor.

Embalde a plana cama se inflama

no sono vivo, intenso torpor.

Aparte a hora do tempo perene,

cobrança intensa sem fé nem amor

Avoa a trilha da nota esmagada,

gritando, clamando, sorrindo e morrendo.

Cuidado imenso, fonte invisível:

É tensa e tenra a flama do riso,

guardado, esperado, correndo e nascendo

E surge no homem o deus represado,

traçando e trançando os dons delicados,

nascendo em festim o ser musical.

5

LUNAR

Volta seca, transição e ciclo,

implacável e opaca presença.

Embaladas as canções e mitos,

em cada alma que sente e pensa.

Afora a solidão celeste,

a imponente conexão à dor.

A lua cheia, ri, inconteste,

àquele de inoxidável valor.

É só, a vida inteira, o pecado,

unido e recalcado,

rico e singular?

Responde-lhe o céu estrelado:

mais belo que o louco enfado,

resiste obediente, o sol lunar.

6

INSULAR

É louco o fogo eterno da contramão,

traduzindo, morno gelo, a solidão.

É rosto o fogo fátuo embrulhado,

na face entremeada pelo enfado.

Cansaço breve, luta entregue ao luar,

lupino canto empurrando teu olhar.

É certa a ave transmontana e esguia,

à carta esbelta nunca entregue no dia.

Previsível aproximação,

forte elo, conexão,

coletiva e singular?

Desejo firme a ser vivido,

no carnaval multicolorido,

único, solidário e insular.

7

SOLAR

Sol pequeno, leve pena, brisa branca:

É forte o colar da realeza.

Sente plena, concorrente, a vida branda:

luminosa, inolvidável beleza.

A sela muda, de medo brilho, à febre azeda,

jardins suportam, espadas sangram tua ferida.

A busca leda, a ruga enferma, o verso insano,

verve louca intercotidiana transfletida.

Velho amigo, protetivo, protetor,

não é o mesmo algoz que o atacou?

É certa a sombra sob o lar.

Finda a guerra, sobe a serra, cai o mar,

cruza os campos, longos, corta o ar,

majestoso, intempestivo, solar.

8

ALMA

Ó alma, profunda praia, liberta

a palma o deserto profundo.

Gigante lodo, ser moribundo,

presente à vida do velho labor.

Sobeja talentos, enganos medonhos,

quantos os ganhos de erros acertos.

Esconde as chaves perdidas nos sonhos,

nascida gemelar aos loucos medos.

Sombra, sótão e porão,

será doce a grave ilusão,

no casamento com a silhueta?

Pressente, plana e calma.

Grita a fronte ao som da trombeta:

é cada alma um novo planeta!

9

MANGUEIRA

Linda mangueira, cereja primeira dos salões rurais,

és rica e viva, nos campos e montes onde o nada jaz.

Pequena nos céus, de eterno garbor, gigantes na flor,

Ouvimos sofridos, vividos os mimos, as perdas sem dor

Frutos perenes, perdidos na frente do velho arrebol

na noite calada, os ventos sem asas esperam o sol.

Raiz soberana, humilde e sem gana, sobejam frescor,

daqueles que sonham, perdidos e plenos, buscando o amor.

Razão sem igual, janela secreta d'ação pluvial

evoca os brios, calados e frescos, brando litoral,

e assim transcende, egresso e perene, o reino real.

No mundo pequeno das árvores belas,

em sua beleza enferma na cela,

natureza agreste: eis a majestade!

10

POLAR

Olvido em março reter a ferida,

conforme os anos ventam afora.

Envolve o cerco perene da vida,

no grave olho vermelho de outrora.

Na dúvida infame, crassa sabedoria,

retumba velada a velha ignorância.

O sono é claro ao longo do dia,

na noite arredia da lágrima santa.

É reto, sem eco, prontidão.

O uniforme - rito perdido,

vespertina luta secular.

Suave os medos dos sonhos,

risonhos, sempre esquecidos,

na inolvidável cadência polar.

11

ESTRELAR

Estrela estela da noite,

esteira do chão frutuoso.

Ergue a pureza da força,

perdida no mar furioso.

É certo o atrás lhe tropeça,

exceto o que veste e te trás.

Enxerto do auto e do halo,

tornado o fervor incapaz.

Te quero, te brilho e não faço,

um traço de bom coração,

tão simples raiar do parto.

Te movas sol entrevado,

à poeira corteja o enfado,

ao céu o golpe estrelar.

12

MEMORIAL

Luto para tê-lo seguro e inconteste,

na estante invisível do tempo da alma.

Brigo pra tê-lo firme e celeste,

em meio aos dias que o mundo embala.

Informo a fôrma que deve tomar,

para a guarda, que encarna, não falhe.

Vigio e amarro o que mando amar,

para que o verbo e a verve se espalhem.

Lembrança da glória invadida,

não és tão protegida,

na vasta divindade?

Sim, responde a ferida.

O sangue corrente da vida,

é o livro - nunca escrito - memorial.

13

SOLITÁRIO

Faço-me morto,

por sobre os lobos.

Faço-me ledo,

rente aos medos.

Brindo-me branco,

junto aos planos.

Sofro o disfarce:

Fraco.

Vejo-me santo.

Rindo-te franco,

valho.

Canto o epônimo.

Meigo, o divino.

Solitário.

14

SONETO PELA VIDA

Tortuosos caminhos o espreitam:

torturas à luz da lua.

Enforcam a senda do desprezo,

sob o suor, banhando a rua.

Sob a via engessada e bela,

enverga o reto sino das trevas.

Temor estreito em superstição,

atraem o gozo da torta bela.

É só pelo teu destino,

semblante da velha sina,

que ouriça a solidão.

E a nascente bloqueia a morte,

a sorte levanta o forte,

do irascível caminho da vida!

15

CORDIAL

É rico o santo desejo,

brindado à sede do vinho.

É roxo o vago cortejo,

brilhando o solo-sozinho.

Acorda sagrada muralha,

do louco pavor capataz.

Sobeja a lua castrada,

labor deixando o cais.

Se a marte, a bala ressoa,

será a madona cerrada,

a louca voz da pessoa?

Vos digo, amor, lugarinho:

Da flor ao passarinho,

passa vaga, a dor cordial!

16

PATERNAL

A voz do calor deixa o largo

serviço à foz da criança.

Louvor do telhado estrelado,

a vazão sob a música branda.

A alma, acalma, vazia,

recheada de santa opulência.

É sagrada a cruzada vadia,

tresloucada e branda demência.

Se a arte te reza aparte,

será o folguedo, destarte,

a estátua da majestade?

Ressoa dor essencial:

Vibração, proteção que lhe farte

do salgado pendor paternal.

17

NOTURNO

É cego o valor do horizonte,

sambando na fronte dos olhos alheios.

Distantes da liga, fronteira distante,

contornam a ilha do medo.

Central, laboral e humano,

se esconde no meio da terra.

Insular, continental, soberano,

frutifica quando menos se espera.

Se é simples o tracejar celeste,

qual o valor desta peste,

que está a varrer nosso mundo?

O mestre nos veste tuas vestes:

A noite é o teste dos testes.

A solidão, o abismo noturno.

18

FRATERNAL

Labora a fronte grande sopa leal,

pensando o golpe no forte sem medo.

Sabor teimoso na planta fatal,

reflexo torpe da barca em degredo.

Segundo os olhos da estrada vazia,

são caros os partos dos novos arreios.

Tampouco ressoam a siderosofia,

unindo no mundo os polos solteiros.

Irmãos, polidos, unogestos.

Planejam o sopro eterno,

da vida em comunhão?

Árbitra a natureza da alma,

a vontade sombria da palma,

ao percurso, bom comum, fraternal.

19

BELO

Semente da cor, o capricho mostarda,

destoa e sacia a fome amarela.

Sacode o louvor construído na casa,

insurgente e galante vigente na tela.

O forte, ao norte, ressoa cinzento,

brilhando à luz do luar ao telhado.

Sobeja da alma a calma barrenta,

cruzada, pulsante, ao sul do estrabo.

Aquarela de amores,

vos sentem as cores,

do humano tear?

Do lar, ao negro do ódio,

do sangue, ao rubro do ópio,

ao ócio, o segredo mais belo.

20

ATRASADO

Não gosto do gosto regrado,

do ardor atrasado.

Não louvo o vento sem nós,

revolto o calor abrasado.

Incenso velado,

vazio entre sós.

Incerto e arredio,

premido e sem brio

Rejeito quem são como vós,

que tem sede e frio,

que gritam no rio.

Abunda em mim,

refresco sem fim,

longe do fel, atrasado.

21

FAMINTO

Se é fome, sem nome,

o bicho não come.

Se é torto, desgosto,

na alma, absorto.

Se é homem, humano,

carne que não mereço.

Se é forte, informe,

o que vale sem preço.

Me arde, me queima e costura.

O lodo da casa escura,

é o meio do labirinto?

E a sorte dançando nua,

é a fonte da cara dura,

é o seio do rosto faminto.

22

PUERIL

É amante das coisas belas,

mirantes das belas telas.

É rompendo a trança verde,

sucumbindo ao véu da rede.

Se me cobre a tenra idade,

de inocência e pura alegria,

o que me espera na mocidade,

que tanto me aguarda a seu dia?

É o filho, é o pai, o avô.

Gerações com graça e louvor,

manejando a luneta senil.

Quanto a mim, dourado e frio,

aguardando no leito do rio,

teu compasso, andamento pueril!

23

ALEGRE

Casa rasa que nos lava,

brisa leve que nos leve.

Sova a cova que sufoca,

a mais cara e linda verve

Se o anjo nos procura,

rente à dor que nos devassa,

somos corvos que depuram,

da carne, a pele e carcaça.

Sendo o gosto pelo louco,

o hálito da vida forte,

pertencerá a qual espécie?

É o leito do homem feito,

hígido, reto e perfeito,

indistinto rompante alegre.

24

INDESEJADO

Já se avizinha o andar vagaroso,

o confronto esperado na sombra.

De grande porte, animal poderoso,

aguarda a parte onde olhos se enfronham.

É natural farfalhar rente à relva,

daquele que caça ao início do mundo.

O homem que falha na queda à terra

completa o âmago do gosto profundo.

Sua espera, necessária e vazia,

trampolim que belo dia,

saltará ao grande lago?

Tão longe o oceano esperado,

daquele que sucumbe à fera,

por receio do coração indesejado.

25

INTELIGENTE

As grandes redes sacodem a chocalhos,

sendo o mel corrente da cana.

Aviva aqueles que vibram de gana,

lançando os ganchos dos troncos e galhos.

Nuclear a beleza da ordem vindoura,

herdando e doando os genes felizes.

Entre o caos e a terra, percorrem e escoam,

as hábeis fagulhas das almas matrizes.

A ordem encontra a vida,

rente ao abismo esquecido,

onde o inferno jaz demente.

Celebremos suprema elegia,

distante, a doença vazia,

encontra, brando, o verso inteligente.

26

CULPADO

Enorme o peso da pedra vazia,

nos ombros vermelhos que marcham na aurora.

Escorre o leite que outrora sorria,

no balde celeste da força que explora.

Deposta o arroz sorrindo pra lua,

o homem, sonhando que a tudo controla.

Teme como nunca o olho da rua,

guardando o sol e o feijão na gaiola.

Lunar, marítimo, terrestre,

onde está a garra campestre,

que vertera os tijolos no muro?

No fogo cerrado e escuro,

o sol, foco do mundo,

na fronte do ser, premido e culpado.

27

FERIDO

É forte o corte rasgado no norte,

fenda profunda do ledo horizonte.

Persegue a linha, na estrada da sorte,

alheio à vida secreta que rompe.

Persiste sangrando na beira do lago,

na estrada infinita, mantendo-se rei.

Não cede ao instinto lavrado ao estrago,

tampouco ao fogo, frutando a lei.

Pobre homem, ser sempre amado!

Fadado ao fracasso infindo,

sofrendo no ouro e na prata da escória.

Não sente a beleza do estrago,

que a chave do eterno reinado,

está na pureza, guerreiro ferido!

28

CARIDOSO

Meu dever é com o cego engodo,

o homem louco, sem brisa nem pão.

O desvalido honrado, o mendigo gordo,

esboço de alma, em corpo vão.

Minha missão é com o ledo engano,

esposa miserável da desventura,

filho depravado do erro profano,

irmã maculada da incultura.

Fragil, inapetente, necessitado, estéril.

O fraco servo infértil,

Não catapulta ao estado novo?

É firme o nome breve,

do anônimo herói iberbe,

na senda da vida, pontífice caridoso.

29

DIMENSIONAL

Secreta e profunda a porta do universo,

Invisível, curta, fulgáz e atroz.

A loucura rasa, abismo por certo,

é a tosca cegueira primando em nós.

Contínua, sem partes, indivisível,

contrária e inimiga, inumana natureza.

Línea, plana, inconfundível,

gritando aos olhos para que nunca veja.

É raro o pardo professor,

que por trás do homem ator,

enxerga a certeza por sob a vida.

Ensina-me, nobre perfeito!

Me dá o terreno direito,

de compreender o universo dimensional.

30

SAUDOSISTA

Supremo poder, rastro malvado,

é clara e visível a impotência.

Santo dever, ofício sagrado,

a saga da divina providência.

À parte, participa o homem,

sozinho, vazio, pequeno, limitado.

Escreve, registra, espirra e esconde,

cada imagem, dado, memória e fato.

Labor, intensa dor,

não ensina a este senhor,

que do passado surge o destino?

Exelso, labor menino,

perene, a perder de vista,

contraditório traço saudosista!

31

PROFANO

Rasa a beleza humana,

pobre a escuridão,

conduz a certeza santa,

no vale da perdição.

Fulgaz a felicidade,

retida e crível nas mentes pobres,

Imprime a necessidade,

na turba velha que mente e foge.

Real, crente e plana.

Não é a vida mundana,

conduzindo e destinando?

Pergunta a cela sagrada.

Na casa daquele que guarda,

o inevitável impulso profano.

32

SAGRADO

Bento o poder encrespado,

o rito empedrado soprando o dever.

Sacro o amor retesado,

o mito engessado ao alvorecer.

Santa a marca infugível,

que o céu intangível nos faz esquecer.

Divina a força invisível,

no seio dos homens a amadurecer.

O alívio na beira do abismo,

não mostra que o vício,

a nada derruba no veio do estrago?

Margeiam as asas das almas,

permeia na terra,

o ofício sagrado.

33

GEMELAR

Àqueles que somam aos reis,

pesa à terra os sôfregos ramos.

À sede do sangue, temeis,

brotos fortes que iniciam os anos.

Ao mar, navegar, na barriga,

que à cruz, ainda leve, a seta.

Encetar a nova voz, bígama,

de cromossomos que a luz liberta.

Ó dupla, díade, duo premente:

Não chega o destino,

ao mundo lhe jogar?

A mãe, o pai – semente,

A vida aos dois meninos,

interminável tema gemelar.