xiv encontro regional de história - a participaÇÃo da inglaterra e … · 2016. 12. 22. ·...

12
Graduada em História pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul – UFMS. Aluna especial do programa de Mestrado em História – UFGD. Docente do Colégio Innovare. E-mail: [email protected]. ** Graduada em Turismo pela Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul – UEMS. Aluna especial do programa de Mestrado em História - UFGD. E-mail: [email protected]. A PARTICIPAÇÃO DA INGLATERRA E DAS MULHERES NA GUERRA DO PARAGUAI APARECIDA DE FÁTIMA ASSIS DO NASCIMENTO* JESSIKA BORGES DE SOUZA** 1. INTRODUÇÃO Tradicionalmente a Guerra do Paraguai é retratada nos livros didáticos com dois eixos principais: causas e batalhas. Estas motivações se transformaram em mitos como e o caso do da participação inglesa na guerra por conta do medo frente ao desenvolvimento industrial paraguaio. Para Bethell, citando o historiador nicaragüense Fornos Peñalba (1979)em sua tese de doutorado, a Grã- Bretanha era o ‘quarto aliado indispensável’, de certa forma "o mais implacável de todos os inimigos do século XIX do Paraguai independente”. (BETHELL,1995). E incrível imaginar a economia do Paraguai afrontando a Inglaterra se partirmos como comparação a economia Paraguai hoje. Claro, ao fazer isso devemos situar as circunstâncias contextos histórico e seus meandros. A partir desta situação, surge uma pergunta: O Paraguai tinha realmente condições econômicas para enfrentar a Inglaterra? As "maquinações imperialistas da Inglaterra", concluiu Fornos Peñalba, em muito contribuíram para "eliminar uma das nações mais promissoras e progressistas da América Latina no século XIX". (BETHELL 1995). A primeira corrente denominada de “Tradicional”, considera que os fatores que promoveram a guerra se encontram em uma visão positivista, nacionalista no qual Solano Lopez é o único culpado pela guerra. Já a segunda corrent e conhecida como “Revisionista” aponta os interesses ingleses na Bacia Platina como causa maior para o estopim da guerra. Por última temos a corrente “Recente”, que atribui, como marco inicial da guerra os interesses dos jovens países platinos em garantir sua independência também garantir a continuidade (aberta antes mesmo da guerra) da navegação do Rio da Prata. A Historiografia mais recente sobre a Guerra do Paraguai, esta trazendo a tona a a presença feminina durante a guerra, descontruindo a percepção que os participantes envolvidos na guerra fosse somente homens. Nada sobre como as mulheres foi registrado de forma oficial.

Upload: others

Post on 28-Mar-2021

0 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: XIV Encontro Regional de História - A PARTICIPAÇÃO DA INGLATERRA E … · 2016. 12. 22. · contribuíram para "eliminar uma das nações mais promissoras e progressistas da América

Graduada em História pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul – UFMS. Aluna especial do programa de Mestrado em História – UFGD. Docente do Colégio Innovare. E-mail: [email protected]. ** Graduada em Turismo pela Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul – UEMS. Aluna especial do programa de

Mestrado em História - UFGD. E-mail: [email protected].

A PARTICIPAÇÃO DA INGLATERRA E DAS MULHERES NA GUERRA DO

PARAGUAI

APARECIDA DE FÁTIMA ASSIS DO NASCIMENTO*

JESSIKA BORGES DE SOUZA**

1. INTRODUÇÃO

Tradicionalmente a Guerra do Paraguai é retratada nos livros didáticos com dois eixos

principais: causas e batalhas. Estas motivações se transformaram em mitos como e o caso do da

participação inglesa na guerra por conta do medo frente ao desenvolvimento industrial paraguaio. Para

Bethell, citando o historiador nicaragüense Fornos Peñalba (1979)em sua tese de doutorado, “a Grã-

Bretanha era o ‘quarto aliado indispensável’, de certa forma "o mais implacável de todos os inimigos

do século XIX do Paraguai independente”. (BETHELL,1995).

E incrível imaginar a economia do Paraguai afrontando a Inglaterra se partirmos como

comparação a economia Paraguai hoje. Claro, ao fazer isso devemos situar as circunstâncias

contextos histórico e seus meandros. A partir desta situação, surge uma pergunta: O Paraguai

tinha realmente condições econômicas para enfrentar a Inglaterra?

As "maquinações imperialistas da Inglaterra", concluiu Fornos Peñalba, em muito

contribuíram para "eliminar uma das nações mais promissoras e progressistas da América

Latina no século XIX". (BETHELL 1995).

A primeira corrente denominada de “Tradicional”, considera que os fatores que

promoveram a guerra se encontram em uma visão positivista, nacionalista no qual Solano

Lopez é o único culpado pela guerra. Já a segunda corrente conhecida como “Revisionista”

aponta os interesses ingleses na Bacia Platina como causa maior para o estopim da guerra. Por

última temos a corrente “Recente”, que atribui, como marco inicial da guerra os interesses dos

jovens países platinos em garantir sua independência também garantir a continuidade (aberta

antes mesmo da guerra) da navegação do Rio da Prata.

A Historiografia mais recente sobre a Guerra do Paraguai, esta trazendo a tona a a

presença feminina durante a guerra, descontruindo a percepção que os participantes

envolvidos na guerra fosse somente homens. Nada sobre como as mulheres foi registrado de

forma oficial.

Page 2: XIV Encontro Regional de História - A PARTICIPAÇÃO DA INGLATERRA E … · 2016. 12. 22. · contribuíram para "eliminar uma das nações mais promissoras e progressistas da América

2

Em que ambiente elas viveram? Que tipo de estratégias usou para sobreviver ao caos

da guerra e pós-guerra? Uma pergunta e obvia neste momento: Como se relata o estudo dessas

mulheres?

Elas não aparecem nos espaços públicos já que a historiografia tradicional não valoriza

os ambientes ocupados pelas mulheres, tamanha era e ainda é a exclusão feminina na história.

2. DESENVOLVIMENTO

Quando o assunto é a Grande Guerra do Paraguai, os motivos que a provocaram

perpassa por três correntes historiográficas. A corrente que atribui a participação britânica

com o real motivo para a eclosão da guerra, já perdeu terreno para a corrente a mais recente

que aponta os interesses das jovens nações na constituição do seu pais. Segundo Doratioto

(2002), a “guerra foi um desdobramento da política exterior das jovens nações sul-

americanas”. (DORATIOTO, 2002)

No entanto, por muito tempo acreditou-se que a expansão econômica paraguaia

prejudicaria os interesses ingleses na região, haveria ainda, a ameaça de que o Paraguai

eventualmente se transformasse em exportador de manufaturados ou que seu modelo de

desenvolvimento autônomo e independente pudesse servir de exemplo para outros países da

região.

Dentro da historiografia brasileira (cf. SQUINELO, 2002), a partir da década de

1970, difundiu-se o paradigma de que a Guerra do Paraguai foi resultado de uma

política imperialista, que teria na Inglaterra sua principal interface. Desse modo, o

interesse inglês seria o de aniquilar o modelo potencialmente industrializante e

independente do Paraguai comandado pela família Lopez, já que este poderia servir

de (mau) exemplo para os demais países da região. Esta vertente, que se consolidou

através das publicações de autores como Leon Pomer e José Chiavenato, colocou o

trono inglês como principal articulador do conflito, transformando Brasil e

Argentina, de certa forma, em coadjuvantes, no papel de seguidores das ordens do

império inglês.(CREMONESE-ADAMO, 2002, p.19).

Assim, partir da década 70, os professores de história passaram a adotar como verdade

inquestionável o livro Genocídio Americano, a Guerra do Paraguai, de Júlio José

Chiavenatto. Nele consta que o imperialismo inglês manipulou o Brasil, a Argentina e o

Uruguai, integrantes da Tríplice Aliança contra o ditador paraguaio Francisco Solano Lopez.

Segundo Chiavenatto em entrevista a Folha de S.Paulo em:

Page 3: XIV Encontro Regional de História - A PARTICIPAÇÃO DA INGLATERRA E … · 2016. 12. 22. · contribuíram para "eliminar uma das nações mais promissoras e progressistas da América

3

Folha -- Que era o Paraguai? Era um vilão?

Chiavenatto -Era praticamente o único Estado livre da influência inglesa no Cone

Sul. O Brasil, a Argentina muito mais, não tomavam nenhuma medida importante

sem a anuência da Inglaterra. Não poderiam ter ido à guerra se a Inglaterra não

tivesse feito os espetaculares empréstimos que a financiaram. O Paraguai era livre

desse esquema. Por ser um país "insular", não era tão fácil, inclusive

geograficamente, interferir no Paraguai quanto no Brasil. Em determinado momento,

o Paraguai criou um desequilíbrio de poder que, com outras razões --o Paraguai

também não é inocente-- gerou a guerra. (FOLHA DE S.PAULO, 2007).

Partindo desta indicativa de que a Inglaterra teria razões para promover a guerra, dois

historiadores paraguaios indicam a pouca expressividade dos ingleses como centro radiador

do conflito. A falta de fontes que comprovem a participação inglesa acaba por derrubar por

terra esta explicação da década de 60 sobre os motivos do conflito.

A opinião pessoal dos agentes britânicos que tiveram que negociar com o Paraguai

foi principalmente desfavorável, tanto sobre a natureza do regime político do país,

bem como o potencial comercial. Isso não impediu que os seguia instruções mais ou

menos consistente emitidos a partir de Londres a respeito da política para o

Paraguai, que consiste essencialmente evitar que o país utiliza-se Grã-Bretanha em

conflitos com os países visinhos. (HERKEN KRAUER;GIMENEZ DE HERKEN,

1983).

Dentro deste quadro, a Inglaterra não tinha o que temer. Suas relações com o Paraguai

sempre aconteceram dentro de formalidades diplomáticas voltadas para um comercio de

matérias primas como ocorria com os outros países da América Latina

Uma das intervenções mais importantes tomadas pelo governo britânico no

desenvolvimento da Guerra do Paraguai foi a publicação do texto do Tratado

Secreto da Tríplice Aliança, que teve lugar com a apresentação de documentos

oficiais do Ministério das Relações Exteriores do Parlamento britânico, em

1866. Esta decisão cria uma série de protestos por parte dos aliados e, acima de tudo,

em certa medida, marcar o tombamento da opinião pública européia e norte-

americanos em favor da causa de Paraguai. (HERKEN KRAUE;GIMENEZ DE

HERKEN, 1983).

A Inglaterra fora durante o século XIX o maior império do mundo o que implica

afirmar que essa condição fazia dos ingleses grandes parceiros da América Latina. Os países

latinos giravam na orbita britânica como fornecedores de matérias-primas e como países que

tinham débitos. Assim, a Inglaterra não mostrava interesse em produzir a guerra.

Não teria como o Paraguai se tornar uma potencia que viesse a ameaçar a Inglaterra.

O Paraguai estava iniciando seu processo industrial. Este contava com apenas uma20 km de

rede ferrovia, e algumas indústrias como casas de fundição como canhão e espada.

Page 4: XIV Encontro Regional de História - A PARTICIPAÇÃO DA INGLATERRA E … · 2016. 12. 22. · contribuíram para "eliminar uma das nações mais promissoras e progressistas da América

4

[...] Ferrovias e pequenas indústrias foram criadas com a contratação de

especialistas estrangeiros e a educação continuou a ser estimulada pelo

governo. “Tudo o que o Paraguai consome, ele mesmo produz”. Porém essa

autonomia é precária, apesar do desenvolvimento interno do país, a pobreza

ainda é muito grande (menor do que no período colonial). (AMIGOS DA

HISTÓRIA, 2013).

Não se pode, negar que o Paraguai dava seus primeiros passos para iniciar seu

processo de industrialização, porém, este processo não representou uma seria ameaça aos

interesses ingleses na Bacia Platina.

Na década de 60 surge a idéia que a Inglaterra é responsável pelo conflito no contexto

da Guerra Fria onde intelectuais latinos tentam ligar o imperialismo americano sobre os países

latinos fazendo paralelos com o imperialismo britânico no século XIX. Para o historiador

Menezes, “ao pesquisar a documentação diplomática britânica, não encontrou comprovação

para o envolvimento da Inglaterra como promovedora da guerra”. (MENEZES, 1998).

Confirmar que a guerra do Paraguai foi motivada pelos interesses do capitalismo

inglês em destruir o desenvolvimento paraguaio, que ameaçava os projetos britânicos na bacia

do Prata, hoje é errado.Na verdade o conflito deveu-se, basicamente, a disputas por

hegemonias geopolítica e controle das rotas de navegação na bacia do Prata.

No tocante a participação das mulheres na Guerra do Paraguai, acredito ser necessário

ter em mente que exclusão feminina na História, acontece por comportamentos de dominação

masculina. Simbolismos e representações em torno da condição histórica da mulher são

menosprezados nos meios didáticos como forma de perpetuar a exclusão feminina. Pouco se

trabalha a presença feminina nos fatos históricos, dando a impressão que as mulheres nunca

existiram. Essa negação histórica tradicional imposta às mulheres nos espaços públicos levou,

sumariamente, a marginalização social, sem direito de serem vistas como sujeito (as) histórico

(as).

Os estudos de genero são recentes dentro da pespectiva historiografica. A “Nova

História” favorece o estudo de grupos sociais excluidos. A grande problemática para quem

se envolve no estudo sobre mul heres são as fontes. Onde elas estão? Como acha-las? A

invisibilidade feminina na História Tradicional projetou novas abordagens de investigação

histórica.

Page 5: XIV Encontro Regional de História - A PARTICIPAÇÃO DA INGLATERRA E … · 2016. 12. 22. · contribuíram para "eliminar uma das nações mais promissoras e progressistas da América

5

No livro da Scott (1989, p. 28-29), ela também faz esse questionamento. “Porque e

desde quando as mulheres são invisiveis como sujeitos históricos, quando sabemos que elas

participaram dos grandes e pequenos eventos da história humana?”.

Uma pergunta e obvia neste momento: Como se relata o estudo das mulheres? Elas

não aparecem nos espaços públicos já que a historiografia tradicional não sabia achar os

ambientes ocupados pelas mulheres, tamanha era e ainda é a exclusão feminina na história.

Elas estão na “escuridão da História”.

Conforme a fala de Tedeschi,

O nascimento de novas abordagens e perspectivas na história com a fundação dos

Annales, em 1929, traz consigo uma nova agenda que conquistará um espaço

fundamental para a emergência da história das mulheres: a critica as narrativas

históricas tradicionais, da história factual particularmente política ou econômica, a

procura de colaboração com outras ciências, a substituição da história simplesmente

narrada, pela história- reflexiva problema.”(TEDESCHI 2012, p. 10).

No século XX, grandes mudanças sociais ocorridas nos anos 60 e 70, possibilitou

mudanças na historiografia com relação as mulheres, surgindo várias correntes para tentar se

explicar as causas da opressão feminina.

Para Guardia,

Este período inicial los estúdios centraron sua tencion em los origenes y causas de la

opression feminina y la respuesta de las mujeres. (...) A década de 80 marcou a luta

das mulheres contra a opressão, liderada por várias tendências feministas que vão do

político, defendida por Ellen DuBois¸ a uma releitura histórica cultural e da

consciência apoiado por Carol Smith Rosemberg, ou em relações igualitárias dentro

da história da mulher sustentada por Michelle Pierrot e ArlleteFargue. (GUARDIA,

2005, p. 16-18).

A nova Historiografia tem como ponto de partida que a construção social e histórica,

elas estão intrinsecamente ligadas às relações sociais e os significados de poder e aos

discursos de linguagens. O estudo do passado da historia feminina deve romper com

paradigmas tradicionais, romper com culturas e comportamentos abarcando as leis, o ensino,

o trabalho para que possamos realmente ver as resistências, lutas, consentimentos, poder,

exclusão na sua realidade histórica. O que temos em mente é que as poucas e ate inexistência

rede de informações força os pesquisadores da Nova História a valorizar fontes tidas como

menores.

Estudar o papel das mulheres deve-se partir do principio em forma de questionamento

e não tão somente de forma narrativa e continua de permanências e reforço da desigualdade

Page 6: XIV Encontro Regional de História - A PARTICIPAÇÃO DA INGLATERRA E … · 2016. 12. 22. · contribuíram para "eliminar uma das nações mais promissoras e progressistas da América

6

entre os sexos. O historiador deve levar em conta estas relações entre os sexos na constituição

social. É necessário entender os meios que causam as diferenças entre os sexos.

Para isso, Guardia (2005, p. 20) In.Villamil apud Guardia, 1992, p. 40) diz:

Plantear el estúdio de las relaciones entre os sexos como aspecto central, permitirá

reconstruir processos políticos, sociales y relaciones de poder, em el entendido que

lo privado no está em contraposicionconlo público y lo politico, sino vinculando

estas esferas como una totalidad. (apud GUARDIA, 2005 p. 20).

A relação de gênero formada por homens e mulheres é norteada pelas diferenças

biológicas, geralmente transformadas em desigualdades que tornam o ser mulher vulnerável à

exclusão histórica. Quando se trabalha com livros didáticos, temos noção de como o discurso

androcêntrico é o grande agitador da exclusão feminina. Ao analisarmos a Guerra do Paraguai

nos livros didáticos, nada ou pouco mencionam a presença das mulheres na guerra. Para

Dourado,

Ao estudar a condição feminina no passado e, em particular, a mulher na Guerra do

Paraguai, essa questão aparece como um desafio, ou mesmo um desejo de recuperar

a mulher na sua identidade social e de mostrar a sua presença nos campos de

batalha. Mesmo que não fizesse parte do processo de tomada de decisão, ela tinha

um papel relevante nos bastidores, pois o fato de não participar da história política e

administrativa não diminuiu a importância do papel que desempenhou.

(DOURADO, 2010).

Falar sobre mulheres para muitos ainda parece algo novo. Pouco se lê sobre elas nos

livros didáticos de História, principalmente em conflitos. Na Guerra do Paraguai, as mulheres

quando representadas, foram a partir do olhar masculino que as colocava em segundo plano,

representadas como frágeis ou como esposas de oficias que se configurava no silencio

feminino. Qual era afinal, o papel que desempenharam na Guerra do Paraguai?

No Brasil, os estudos e pesquisas sobre a participação das mulheres na guerra segundo

Colling,

A participação feminina na guerra é mais estudada no Paraguai que no Brasil.

Existem dezenas de livros sobre a principal personagem da guerra, somente igualada

à Solano Lopes em importância – sua companheira Elisa Alicia Linch, a irlandesa,

tida como francesa. Madame Lynch, mulher e mãe de 5 filhos de Solano Lopes, que

sonhava em ser a Imperatriz do Prata. (COLLING, 2014).

Muito recentemente, a figura de Madame Linch foi resgatado do limbo histórico.

Exilada, esquecida pela História Tradicional hoje, ela é terma de pesquisa. Conforme Dourado

(2005, p.41):

Page 7: XIV Encontro Regional de História - A PARTICIPAÇÃO DA INGLATERRA E … · 2016. 12. 22. · contribuíram para "eliminar uma das nações mais promissoras e progressistas da América

7

Elisa Alicia Lynch, chamada simplesmente La Madama, pelos paraguaios da época,

ao contrário de La Señora, a esposa do presidente Carlos Antonio López e mãe de

Solano Lopes, foi a mulher mais famosa da história Paraguai e até hoje,

historiadores e novelistas do mundo inteiro procuram avalia-la, escrevendo sobre

ela, constantemente, em topo tipo de literatura.Sem dúvida, qualquer que seja o

julgamento dos estudiosos interessados em sua vida, seu caráter e sua atuação, não

se pode negar sua influência na história tanto social como política do Paraguai.

(DOURADO, P. 41).

E as outras mulheres de classes menos abastadas que conviveram durante a guerra, e

as que sobreviveram à guerra? O que falar então de Ana Néri, a heroína brasileira que prestou

serviços voluntários nos hospitais militares de Assunção, Corrientes e Humaitá, durante a

Guerra do Paraguai. Outras tantas mulheres seguiam o exército espontaneamente, seguindo

filhos ou maridos,exercendo varias atividades

Tanto as tropas paraguaias como as brasileiras eram acompanhadas por um

verdadeiro exército de mulheres. Esposas, prostitutas, companheiras, mães, que se

alimentavam das sobras de seus companheiros, cozinhavam, lavavam, cuidavam dos

feridos, abrigavam-se em barracas, distribuíam solidariedade humana, sendo por

vezes até maltratadas pelos maridos. Combatiam e morriam esquecidas. As

vivandeiras e andarilhas seguiam a tropa, vendendo víveres e bebidas. (PASCAL,

2006).

Com relação a Mato Grosso,em dezembro de 1864, o Paraguai invade a região. O líder

paraguaio aproveitou-se da fraca defesa brasileira da província para invadi-la e conquistá-la.

Fez isso sem grandes dificuldades e, após esta batalha, e deu continuidade à expansão do

Paraguai através de territórios disputados por Brasil e Argentina até atingir seu próximo

objetivo: Rio Grande do Sul.

No que tange a população feminina em termos de registros históricos no quadro maior

da guerra, neste episodio observa-se a forma que a mulher é registrada, como sexo frágil,

vitimada, desamparada frente a violência do combate.

A entrada do exército paraguaio em Mato Grosso desencadeou luta apenas em

Coimbra e em Dourados. Exceto em Corumbá, onde a população não teve barcos

para escapar, por todo o território invadido os povoadores brasileiros fugiram. A

fuga foi possível devido à própria escassez da população e ainda mais dramática era

a situação das mulheres, quando sob a dominação dos opositores. Além de sofrerem

violência sexual, havia possibilidade de degola. Tinham ainda que plantar, lavar,

cozinhar e transportar mercadorias para a tropa paraguaia. (DORATIOTO, 2002).

As dificuldades encontradas em se encontrar material sobre a história das mulheres

nos remetem a analisar campos ate então menosprezados pela História do herói, do macho que

Page 8: XIV Encontro Regional de História - A PARTICIPAÇÃO DA INGLATERRA E … · 2016. 12. 22. · contribuíram para "eliminar uma das nações mais promissoras e progressistas da América

8

reforçam a fala androcêntrica. Ambientes como, o domestico, o privado, o cotidiano, espaços

familiares, o casamento, os filhos foram e ainda permanecem como redutos que ao mesmo

tempo revelam-se de confinamento, mas, de resistência feminina.

Nesse sentido, os principais relatos sobre a presença feminina na guerra são obtidos

por meio de literatura e de relatos de viajantes como afirma Maria Aparecida Macedo Pascal,

Aa literatura destacou a presença das mulheres no conflito. Em “Escenas de la

Guerra Del Paraguay y los Caminhos de laMuerte” de Manuel Galvez, romance

histórico que se passa no plano argentino e paraguaio, o autor comentou o hábito dos

brasilieiros de levarem suas mulheres e companheiras para a guerra, dizendo que

argentinos e uruguaios riam-se de seus aliados que se entorpeciam com seu exército

feminino e uma multidão de carretas para transportá-lo. Porém reconhecia que os

brasileiros tinham quem os cuidassem na enfermidade e compartilhasse com eles as

dificuldades atrozes da marcha. (PASCAL, 2006).

No Brasil, Machado de Assis, escreveu sobre o papel da mulher na guerra no sentido

submisso da condição feminina. Como espartanas as mulheres brasileiras entregavam seus

filhos a guerra como parte de uma construção e fortalecimento da identidade nacional daquele

período. Publicado no ano de 1878, “Dona Valéria, mãe de Jorge, que é apaixonado por

Estela. Contrária ao romance entre os dois manda o filho para a Guerra do Paraguai para

acabar com o relacionamento...” (ARAÚJO, 1997 aput ASSIS, 1878).

Na imprensa paraguaia durante o conflito as mulheres eram valorizadas denotando um

caráter nacionalista e patriótica por parte de toda população do país ajudou a construir a ideia

de que os paraguaios estavam engajados no conflito. As mulheres de modo especial tendiam

sobre os mesmos atos heróicos e de bravura como forma de assustar os inimigos. Seja fazendo

doações de jóias ou participando ativamente dos regimentos militares, é fato a participação

feminina na guerra. No entanto, quando o conflito acaba a condição feminina no Paraguai e as

lutas por igualdade se restringem somente ao campo das ideias, para Ortolan,

Enquanto no período do desenrolar da Guerra do Paraguai, as capacidades das

mulheres receberam destaque na imprensa, com o intuito de motivá-las a colaborar

com o Estado; no período do pós-guerra, as campanhas que defendiam a

participação política, a libertação da mulher de sua prisão doméstica e a garantia de

acesso a melhores níveis de educação para as mulheres, visando sua lenta e gradual

emancipação, ficariam restritas aos discursos. (ORTOLAN, 2007).

Com o final do conflito e a derrota do Paraguai, as mulheres sucumbiram a uma das

mais antigas formas de tortura, humilhação, sujeição que pode existir. Não falo somente deste

Page 9: XIV Encontro Regional de História - A PARTICIPAÇÃO DA INGLATERRA E … · 2016. 12. 22. · contribuíram para "eliminar uma das nações mais promissoras e progressistas da América

9

conflito claro, mas a questão em si perpassa pelo domínio do corpo, controle físico das

representações de poder do patriarcalismo.

Com o fim da guerra, as exultantes notícias dos jornais não fariam efeito em favor

das mulheres. Quase todas as que caíram nas mãos de brasileiros foram violentadas.

Muitas foram presas fáceis para os 30 mil soldados que tomaram a capital do

Paraguai. Os soldados brasileiros celebraram a queda de Assunção violando as

mulheres, saqueando casas e edifícios públicos. “A soldadesca desenfreada abriu as

válvulas a sua feroz lascívia e essas infelizes que haviam visto morrer seus maridos,

filhos e noivos sofreram os ultrajes da luxúria na noite mais negra de sua vida”,

afirmou na época o general Garmendia, do Paraguai. (ORTOLAN, 2004).

A grande questão na narrativa histórica tradicional é o pouco espaço legado às

mulheres, privilegiando somente política e a economia (não que acredito que estas narrativas

não sejam importantes, são também), onde elas pouco apareciam e continuam aparecendo

minoritariamente. O historiador deve se emaranhar em novas fontes e tem novos olhares sobre

sua pesquisa. Segundo Dourado,

Às mulheres restam as entrelinhas, um espaço casual nas narrativas das grandes

batalhas. Mas nem tudo se perdeu. Por meio da análise de relatórios de refugiados e

de documentos oficiais, ordens do dia, cartas, memórias, reminiscências e diários

(inclusive em língua francesa, inglesa e espanhola), é possível conhecer, por

exemplo, as dificuldades vividas pelas brasileiras que foram aprisionadas pelo

inimigo na região fronteiriça do Mato Grosso. (DOURADO, 2014).

Emaranhar-se no estudo das Mulheres sugere um caminho tortuoso, árduo nos quais

pesquisadores irão se deparar com relatos, circunstâncias, que fizeram ou ainda faz parte do

seu cotidiano. Enxergar estas correlações culturais irá ser mais uma fonte de pesquisa sobre as

mulheres e sua exclusão. As mulheres nunca foram mudas, elas nunca foram ouvidas. Elas

estão presentes em todos os momentos, situações e ações humanas.

3. CONCLUSÃO

A guerra do Paraguai ocorrida no Segundo Reinado possui diferentes correntes

historiográficas que ao longo do tempo vem explicando as razões do conflito. Alguns

especialistas afirmam que o conflito era parte da política expansionista de Solano López. Há o

consenso na Historiografia Tradicional que o único culpado da guerra fora Solano López, que

levou o Paraguai a ruína econômica.

Page 10: XIV Encontro Regional de História - A PARTICIPAÇÃO DA INGLATERRA E … · 2016. 12. 22. · contribuíram para "eliminar uma das nações mais promissoras e progressistas da América

10

Nos anos 1960, uma corrente historiográfica, apresentou a versão de que o conflito

bélico teria sido motivado pelos interesses da Inglaterra que buscava a qualquer custo impedir

o crescimento da economia paraguaia. Nesta corrente, os países da Tríplice Aliança não

passaram de meras marionetes nas mãos dos britânicos. O que percebi nas pesquisas é que, a

teoria que aponta ser a Inglaterra culpada pelo conflito não procede em função das fontes que

assinalam que os ingleses não teriam nada a ganhar com o conflito já que a América Platina

era um grande parceiro comercial incluindo desta maneira o Paraguai.

As causas do conflito não foram em razão de influência externa ou por uma pura e

simples ambição de um único homem. Mas sim, uma série de fatores que envolveram os

países participantes no sentido de garantir suas independências e de concretizar a formação

dos Estados nacionais na região.

O intuito neste artigo é dar inicio aos estudos teóricos sobre as mulheres na Guerra do

Paraguai. Procurar fontes bibliográficas sobre o tema para construir uma analise das

representações construídas sobre as mulheres paraguaias no conflito.

Em especial sobre as mulheres na guerra as fontes que pretendo utilizar se baseiam na

Literatura, trabalhos acadêmicos recentes, relatos de oficiais, pesquisas em museus. Este

projeto tem com principal objetivo encontrar a presença de mulheres paraguaias no conflito

para colocar em voga sua existência na História deste grande episodio da América do Sul. As

informações sobre o conflito que narram a presença das mulheres paraguaias.

Como exemplo, temos Antônia Alves Feitosa no Brasil, que no Piauí conseguiu ser

incluída no Exército Nacional como segundo sargento para ir para o campo de batalha na

Guerra do Paraguai ou, Ana Justina Ferreira Neri que serviu, o Exercito brasileiro como

voluntária na Guerra do Paraguai como auxiliar do corpo de saúde do Exército brasileiro. Da

resistência liderada por Ludovina Alves Portocarrero, em Forte Coimbra no momento do

ataque paraguaio. Figura presente nos acampamentos seguindo seu marido Solano Madame

Elisa Lynch.

BIBLIOGRAFIA

Page 11: XIV Encontro Regional de História - A PARTICIPAÇÃO DA INGLATERRA E … · 2016. 12. 22. · contribuíram para "eliminar uma das nações mais promissoras e progressistas da América

11

AMIGOS DA HISTÓRIA. Disponível em:

http://amigodahistoria.blogspot.com.br/2013/11/aguerra-do-paraguai-breve-historico-e.html.

Acessado em 02 de maio de 2016.

ARAÚJO, Felipe. Info Escola aput ASSIS, Machado. 1878. Iaiá Garcia. São Paulo: Globo, 1997.

Disponível em: http://www.infoescola.com/livros/iaia-garcia/. Acessado em: 15/10/2016.

BETHELL, Leslie. Cronologia da Guerra. In: MARQUES, Maria Eduarda Castro Magalhães.

(Org.). A Guerra do Paraguai: 130 anos depois. Rio de Janeiro, Relume-Dumará, 1995.

COLLING, A. M.; José Carlos da Silva Cardozo; Jonathan Fachini da Silva; Denize

Teresinha Leal Freitas. As chinas gaúchas: a invisibilidade do feminino na Guerra do

Paraguai. In: XII Encontro Estadual de História, 2014, São Leopoldo. História, Verdade e

Ética. São Leopoldo: UNISINOS, 2014.

CREMONESE-ADAMO, Camila. Fronteira, mitos e heróis: a criação e apropriação da figura

do Tenente Antônio João Ribeiro no antigo sul de Mato Grosso. Input:SQUINELO, Ana

Paula. A Guerra do Paraguai, essa desconhecida... Ensino, memória e história de um conflito

secular. Campo Grande: UCDB, 2002. Dourados, MS: UFGD, 2010. 177p.

DORATIOTO, Francisco. Maldita guerra: nova história da Guerra do Paraguai. São Paulo:

Companhia das Letras, 2002, 617 p. ISBN: 85-359-0224-4.

DOURADO, M. T. G. Mulheres comuns, senhoras respeitáveis: a presença feminina na

Guerra do Paraguai. Campo Grande, MS: Ed. UFMS, 2005. 135 p.

__________________. A história esquecida da Guerra do Paraguai: Fome, doenças e

penalidades. 2010. 221 f. Tese (Doutorado) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências

Humanas, Departamento de História, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.

FOLHA DE SÃO PAULO. Disponível em: www1.folha.uol.com.br/.../336867-e-impossivel-

ser-neutro-diz-julio-jose-c... Acessado em 28 de out de 2007.

GUARDIA, Sara Beatriz. (Edición y compilación). Escritura de la historia de lasmujeresen

América Latina. El retorno de lasdiosas.(Compilación y Edición). Coedición: CEMHAL,

Universidad de San Martín de Porres, Universidad Fernando Pessoa (Portugal), Foro de

EstudiosCulturales de Viena (Austria). Lima: Editorial Minerva, 2005.

_________ Escritura de la historia de lasmujeresen América Latina. El retorno de

lasdiosas.(Compilación y Edición). Coedición: CEMHAL, Universidad de San Martín de

Porres, Universidad Fernando Pessoa (Portugal), Foro de EstudiosCulturales de Viena

(Austria). Lima: Editorial Minerva, 2005. In. PERROT, Michelle. Lesfemmes ou lessilences

de l’ Histoire. Paris: Flamarion, 1999.

Page 12: XIV Encontro Regional de História - A PARTICIPAÇÃO DA INGLATERRA E … · 2016. 12. 22. · contribuíram para "eliminar uma das nações mais promissoras e progressistas da América

12

HERKEN KRAUER, Juan Carlos; GIMENEZ DE HERKEN, Maria Isabel. GranBretaña y

laGuerra de la Triple Alianza. Asunción: Arte Nuevo, 1983.

MENEZES, Alfredo da Mota. Guerra do Paraguai: como construímos o conflito. Cuiabá, MT:

Editora da Universidade Federal de Mato Grosso, 1998.

ORTOLAN, Fernando L. As mulheres espartanas da Guerra do Paraguai. Aventuras na

História, Brasil, p. 66 - 66, 16 dez. 2004.

ORTOLAN, Fernando Lóris. Acabou a Guerra...de volta ao lar. Representações das mulheres

na imprensa paraguaia durante e após a Guerra do Paraguai 1864 - 1904. Revista Ágora,

Vitória, n. 5, 2007, p. 1-19

PASCAL, Maria Aparecida Macedo. As mulheres e a Guerra do Paraguai. 2006. Disponível

em: http://www.mackenzie.com.br/fileadmin/Graduacao/EST/Publicacoes_-

_artigos/pascal_11.0.pdf. Acessado em 02 de maio de 2016.

SCOTT, J. W..Gender and the Politics of History. New York: Columbia University Press,

1988. PP. 28-50.

TEDESCHI, LosandroAntonio. As mulheres e a história: uma introdução teórico

metodológica. Dourados, MS: ed. UFGD, 2012.