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1. Definição Choque é o estado fisiológico caracterizado por redução significativa da perfusão tecidual, resultando em oferta diminuída de oxigênio aos tecidos, decorrente do desbalanço entre a oferta e o consumo tecidual de oxigênio. Segundo a definição encontrada em livros-texto, “A condição na qual a produção metabólica de energia é limitada pelo suprimento ou pela utilização de oxigênio é chamada disóxia, e a expressão clínica desta condição é conhecida como choque.” (Paul L. Marino – Compêndio de UTI). Logo, podemos dizer que o choque é a expressão clínica da condição de disóxia tecidual. Esta pode ser decorrente da oferta insuficiente de oxigênio (como no choque cardiogênico ou hipovolêmico), ou da utilização tecidual inadequada do mesmo (como no choque séptico). Para evitar a anaerobiose, a oferta de oxigênio, e não somente ela, mas também o consumo, precisam ser adequados às necessidades teciduais. Se o consumo de O 2 não acompanha as demandas metabólicas, parte da glicose será desviada para as vias de metabolismo anaeróbico, com formação de lactato, gerando 2 ATP por cada molécula de glicose apenas. Entre os efeitos celulares do estado de choque hemodinâmico incluem-se: disfunção das bombas iônicas de membrana, edema intracelular, vazamento de íons para o extracelular e desregulação de pH intracelular. Alguns efeitos sistêmicos são alterações do pH sérico, disfunção endotelial, ativação da cascata inflamatória e da coagulação. 2. Conceitos de Fisiologia e Hemodinâmica Para compreender a fisiopatologia do choque primeiro é necessária a compreensão de alguns conceitos e variáveis hemodinâmicas. A perfusão tecidual é determinada basicamente por duas variáveis: o débito cardíaco (DC) e a resistência vascular sistêmica (RVS), da seguinte forma:

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1. Definição

Choque é o estado fisiológico caracterizado por redução significativa da perfusão tecidual, resultando em oferta diminuída de oxigênio aos tecidos, decorrente do desbalanço entre a oferta e o consumo tecidual de oxigênio.

Segundo a definição encontrada em livros-texto, “A condição na qual a produção metabólica de energia é limitada pelo suprimento ou pela utilização de oxigênio é chamada disóxia, e a expressão clínica desta condição é conhecida como choque.” (Paul L. Marino – Compêndio de UTI). Logo, podemos dizer que o choque é a expressão clínica da condição de disóxia tecidual. Esta pode ser decorrente da oferta insuficiente de oxigênio (como no choque cardiogênico ou hipovolêmico), ou da utilização tecidual inadequada do mesmo (como no choque séptico). Para evitar a anaerobiose, a oferta de oxigênio, e não somente ela, mas também o consumo, precisam ser adequados às necessidades teciduais. Se o consumo de O2

não acompanha as demandas metabólicas, parte da glicose será desviada para as vias de metabolismo anaeróbico, com formação de lactato, gerando 2 ATP por cada molécula de glicose apenas.

Entre os efeitos celulares do estado de choque hemodinâmico incluem-se: disfunção das bombas iônicas de membrana, edema intracelular, vazamento de íons para o extracelular e desregulação de pH intracelular. Alguns efeitos sistêmicos são alterações do pH sérico, disfunção endotelial, ativação da cascata inflamatória e da coagulação.

2. Conceitos de Fisiologia e Hemodinâmica

Para compreender a fisiopatologia do choque primeiro é necessária a compreensão de alguns conceitos e variáveis hemodinâmicas.

A perfusão tecidual é determinada basicamente por duas variáveis: o débito cardíaco (DC) e a resistência vascular sistêmica (RVS), da seguinte forma:

Perfusão Tecidual = DC x RVS

O choque pode ser causado por alteração em qualquer um dos componentes determinantes da perfusão ou de ambos ao mesmo tempo.

O débito cardíaco, por sua vez, pode ser definido como o produto da freqüência cardíaca (FC) pelo volume sistólico (VS):

DC = FC x VS

A freqüência cardíaca é bastante variável entre os indivíduos e num mesmo indivíduo a depender da situação clínica, de drogas utilizadas e de mediadores neurohumorais, e

usualmente não é sobre ela que é feita a maioria das intervenções clínicas que buscam melhorar o débito cardíaco, e sim sobre o volume sistólico e sobre a resistência vascular.

O débito cardíaco tem três determinantes principais: pré-carga, pós-carga e contratilidade. A resistência vascular sistêmica, por sua vez, tem os seguintes determinantes: comprimento do vaso, viscosidade sanguínea e diâmetro do vaso.

2a. Determinantes do débito cardíaco: volume sistólico

O débito sistólico do coração é o principal determinante do fluxo sanguíneo circulatório. Pelo princípio da continuidade, o volume ejetado pelo ventrículo esquerdo é igual ao volume que retorna ao lado direito do coração.

Pré-carga: é a força imposta a um músculo em repouso (antes do início da contração muscular), que estira o músculo a um novo comprimento. É a carga imposta ao músculo antes do início da contração muscular, exercendo uma força de estiramento sobre o mesmo. O aumento do comprimento do músculo em repouso irá aumentar a força de contração quando o músculo for estimulado a se contrair.

A pré-carga é uma expressão do volume diastólico final do VE, pois este volume é a força que estira o músculo cardíaco. No coração normal, o volume diastólico final (VDF) é o principal determinante da força de contração muscular.

A relação entre o aumento da pré-carga e o aumento da força de contração cardíaca é definida pela lei de Frank-Starling conforme ilustrado (imagem retirada do livro Compêndio de UTI – Paul L. Marino):

A FORÇA DA PRÉ-CARGA ATUA AUMENTANDO A FORÇA DA CONTRAÇÃO MUSCULAR.

Pode-se observar diferentes curvas dependendo da efetividade da contração muscular cardíaca.

Na clínica, O VDF não é facilmente determinado na prática. Por isso a Pressão Diastólica Final dos ventrículos (medida pelo cateter de Swan-Ganz) é mais usada como medida clínica da pré-carga, numa tentativa de estimar o VDF através da pressão por ele exercida. Porém, observando a curva abaixo:

Percebe-se que em situações de distensibilidade ventricular reduzida (ex: insuficiência cardíaca diastólica), para gerar uma mesma pressão é necessário um menor volume, tornando a relação pressão-volume mal definida na clínica. Dessa forma, a pressão diastólica final do VE (medida pelo cateter de Swan-Ganz) só se correlaciona bem com o volume diastólico final (ou seja, só é um bom preditor clínico da pré-carga) se a complacência ventricular for normal.

Pós-carga: é a carga imposta ao músculo após o início da contração muscular. É uma força que se opõe à contração muscular, ao contrário da pré-carga. É a carga que o músculo cardíaco precisa vencer para iniciar efetivamente a contração. À medida que aumenta a pós-carga, o músculo precisa desenvolver mais tensão para deslocar o volume de sangue contido no VE. Dessa forma, o débito cardíaco diminui com o aumento da pós-carga.

Contribuem para a pós-carga:

Pressão Pleural: pressões negativas em torno do coração dificultam o esvaziamento ventricular por se oporem ao deslocamento da parede ventricular para dentro durante a sístole. Este efeito é responsável pela queda transitória da pressão sanguínea durante a inspiração, quando o débito sistólico do VE tende a diminuir, enquanto aumenta o retorno venoso para o coração direito. Ao contrário, a pressão pleural positiva facilita a ejeção ventricular.

Impedância Arterial: é o principal determinante da pós-carga, e é maior nas grandes artérias. A impedância aórtica é a principal força que compõe a pós-carga do VE.

Volume Diastólico Final: a pré-carga é um componente da pós-carga, pois é uma carga volumétrica que precisa ser movida pelo VE durante a sístole.

A impedância arterial é composta por duas forças:

Complacência: força que se opõe à mudança de velocidade de fluxo em um vaso. É uma propriedade dos grandes vasos próximos ao coração, como a aorta, onde o fluxo não tem velocidade constante (aumenta na sístole e diminui na diástole).

Resistência: força que se opõe a um fluxo de velocidade constante. É propriedade de vasos de pequeno calibre, como as arteríolas, onde o fluxo é constante e não-pulsátil.

Deste modo:

IMPEDÂNCIA ≠ RVS ≠ PÓS-CARGA

Contratilidade: não há medida confiável da contratilidade na prática clínica. Pode ser estimada pelo ecocardiorama, e pode ser manipulada através da introdução de drogas inotrópicas.

A resistência vascular sistêmica é influenciada pelo comprimento do vaso e a viscosidade sanguínea (que aumentam a RVS) e pelo diâmetro do vaso (que diminui a RVS conforme aumenta).

2b. Parâmetros de Oxigenação

O oxigênio que entra na corrente sangüínea pelos pulmões é transportado aos órgãos vitais pelo DC. A taxa com que isso ocorre é chamada de oferta de O2 ou DO2, e descreve o volume de O2 que atinge os capilares sistêmicos a cada minuto (mL/min).

* o número 10 na equação acima é usado para converter o CaO2 de ml/dl para ml/l.

O conteúdo arterial de oxigênio (CaO2) pode ser definido pela fórmula:

CaO2 = 1.34 x Hb x SaO2

Logo:

A oferta de oxigênio aos tecidos é diretamente proporcional ao débito cardíaco, à concentração da hemoglobina plasmática, e à saturação da mesma pelo oxigênio.

O consumo de oxigênio pelos tecidos, ou VO2, descreve o volume de O2 em mL que deixa o sangue capilar para os tecidos. Como o O2 não é armazenado nos tecidos, todo o O2

que deixa os capilares é consumido. Logo, VO2 = consumo tecidual de O2 (em mL/min). É definido pelo produto do DC pela diferença de oxigênio contido no sangue arterial a venoso (que é o que foi extraído pelos tecidos na passagem pelos capilares). O conteúdo venoso de oxigênio pode ser estimado da mesma forma que o conteúdo arterial.

VO2 = DC x (CaO2 – CvO2) x 10

Decompondo a fórmula:

O VO2 é calculado usando-se a saturação de O2 colhida no sangue arterial e no sangue da artéria pulmonar ou da veia cava superior, logo, antes de passar pelos pulmões. Dessa

DO2 = DC x CaO2 x 10

DO2 = DC x 1.34 x Hb x SaO2 x 10

VO2 = DC x 13,4 x Hb x (SaO2 – SvO2)

forma, O VO2 calculado não espelha o VO2 corporal total, porque não inclui o consumo de O2

dos pulmões. Normalmente, o VO2 dos pulmões é apenas cerca de 5% do VO2 total, porém, em condições inflamatórias dos pulmões, o VO2 pulmonar pode chegar a 20% do total. Isso, entre outras coisas, torna o VO2 calculado um parâmetro insatisfatório para guiar a terapêutica em situações como o choque séptico e várias outras situações clínicas freqüentes em Terapia Intensiva.

O VO2 pode estar diminuído em duas situações: hipometabolismo ou disóxia. Como situações de hipometabolismo são incomuns no doente crítico, em Terapia Intensiva, VO2 baixo (<100ml/min/m2) pode ser usado como evidência de disóxia.

O VO2 pode ser medido diretamente através de equipamento especializado conectado à via aérea proximal, que mede a diferença de concentração entre o gás inspirado e expirado, sendo mais confiável. Este equipamento é de custo elevado e pouco disponível na prática, e exige treinamento para sua utilização. Ainda assim, não há comprovação de que seja útil perseguir metas de VO2 no tratamento do choque, principalmente no choque séptico.

A taxa de extração de oxigênio é a relação entre o O2 captado pelos tecidos e o O2

fornecido.

TEO2 = VO2 / DO2

Assim,

TEO2 = DC x 1,34 x Hb x (SaO2 – SvO2) x 10

DC x 1,34 x Hb x SaO2 x 10

Dessa forma, a taxa de extração (TEO2) pode ser expressa como:

A fisiologia corporal opera para manter o consumo de oxigênio (VO2) constante diante de variações na oferta (DO2). A TEO2 será aumentada caso caia a oferta de O2, até um limite. O VO2 irá se manter constante se as alterações na DO2 forem acompanhadas por alterações recíprocas na TEO2. Assim estabelece-se uma relação entre oferta e consumo, ou relação DO2/VO2 (imagem retirada do livro Compêndio de UTI – Paul L. Marino):

TEO2 = (SaO2 – SvO2) / SaO2

Inicialmente, quando há queda da oferta de O2 aos tecidos (DO2), a extração será aumentada até um nível máximo. A partir daí, o consumo (VO2) se torna dependente da oferta. Assim estabelece-se o conceito de DO2 crítica: é a menor DO2 capaz de sustentar o metabolismo aeróbico.

A DO2 crítica varia de pessoa a pessoa e não pode ser determinada com acurácia na clínica. Alguns recomendam manter DO2 : VO2 de 4:1 para evitar o limiar anaeróbico no paciente crítico.

Todas as variáveis descritas são componentes do choque e podem ser determinadas ou inferidas através do cateter de artéria pulmonar (Swan-Ganz).

Inicialmente na evolução do paciente em choque, há uma fase de “pré-choque” ou choque compensado, em que os mecanismos compensatórios hemodinâmicos conseguem suprir as necessidades metabólicas. Quando estes mecanismos são vencidos ou esgotados, instala-se a disóxia e ocorre disfunção orgânica (ex: queda de 20-25% do volume sanguíneo efetivo na hipovolemia, queda importante do débito cardíaco no choque cardiogênico, ativação da cascata inflamatória na sepse).

3. Classificação e Manifestações Clínicas do Choque

► Hipovolêmico (queda de 20-25% no volume sangüineo efetivo)

► Cardiogênico (queda do DC para < 2,5L/min/m2)

► Distributivo (vasoplegia, ativação da cascata inflamatória)

► Combinado

Componente hipovolêmico na sepse

Componente cardiogênico na sepse

Componente distributivo (SIRS) no IAM

Os diferentes estados de choque podem ser caracterizados com base em algumas características:

Para o choque cardiogênico, são possíveis várias etiologias:

Cardiomiopatias: IAM>40% do VE, IAM de VD, MCP dilatada, miocárdio atordoado, MCP da sepse.

Arritmias atriais e ventriculares: FA, flutter, TV, bradiarritmias, bloqueio cardíaco completo, FV.

Anormalidades mecânicas: defeitos valvulares, do septo ventricular, mixoma atrial, ruptura de VE.

Extracardíaco: TEP maciço, pneumotórax hipertensivo, pericardite constrictiva grave, tamponamento, HAP grave com Síndrome de Eisenmenger.

Para o choque de padrão distributivo:

SIRS / Sepse

Sd do choque tóxico

Anafilaxia

Reação a drogas / toxinas

Crise Addisoniana

Coma mixedematoso

Choque neurogênico

Síndrome pós- RCP

Para o hipovolêmico há muitas causas possíveis, como desidratação, perda sanguínea por trauma ou sangramento de outra etiologia, entre outras.

Parâmetros Clínicos:

São sinais cardinais comuns a todos os tipos de choque:

► Hipotensão: Não é obrigatória.

Ocorre na maioria dos pacientes. Pode ser absoluta (PAS<90mmHg) ou relativa (queda > 30mmHg na PAS)

► Oligúria (<0,5mL/kg/h)

► Pele fria / má perfusão periférica

No choque distributivo inicial e no choque terminal a pele pode se apresentar quente e hiperêmica.

► Alteração do Nível de Consciência

Agitação -> Confusão/delirium -> Obnubilação -> Coma

► Acidose metabólica

Aumento da produção de lactato, diminuição da excreção renal de ácidos

Diminuição do clearance do lactato no fígado, rins e músculos

► Base Excess

No choque, seja pelo aumento do lactato ou pela diminuição da excreção renal de ácidos, o BE fica negativo.

Sua normalização se associa a melhor evolução clínica.

Outras manifestações podem estar presentes a depender da etiologia do choque, e o maior detalhamento de cada uma delas não é o objetivo desta dissertação, uma vez que serão abordadas nas aulas específicas de cada condição.

Abordagem Geral:

► Avaliação diagnóstica concomitante à ressuscitação

► Anamnese + Exame Físico

Anamnese que for possível. Exame físico dirigido e eficiente, pois os achados do exame físico não são sensíveis nem específicos para determinar a causa do choque.

► Laboratório:

Hemograma, bioquímica (Na, K, Cl, HCO3), Uréia e creatinina, hepatograma, amilase, lipase, TAP/TTPA, fibrinogênio, d-dímero/PDF, enzimas cardíacas, gasometria arterial, lactato, screening toxicológico, culturas de focos suspeitos.

► Se após os passos iniciais, a causa do choque permanecer obscura, o cateter de artéria pulmonar pode fornecer pistas importantes para o diagnóstico.

► Monitorizar, no mínimo:

PAi

Monitorização cardíaca contínua

SpO2

PVC

ScvO2

Os esforços empregados na correção do choque objetivam restaurar o balanço de um ou mais dos 3 parâmetros principais:

Bomba cardíaca (débito cardíaco)

Sistema de transporte de O2 (circulação periférica)

Meio de transporte O2 (volume sangüíneo)

As principais manifestações clínicas do choque (hipotensão, má perfusão periférica, oligúria, alterações do estado mental e acidose) devem ser procuradas ativamente em todos os doentes graves.

A abordagem para o diagnóstico do choque e para a monitorização da resposta terapêutica deve integrar:

Achados do exame clínico (ex: estado mental, oligúria)

Variáveis hemodinâmicas (PAM, pressão de pulso)

Parâmetros metabólicos globais (lactato, base excess, SvO2).

O choque sempre deve ser abordado observando-se os parâmetros do “ABC” do ACLS, de modo a não deixar passar situações críticas que necessitam intervenção emergencial. Deve-se realizar teste de glicemia capilar se houver rebaixamento do nível de consciência.

De modo geral, independente da causa do choque, quase sempre a medida inicial (após monitorização) é reposição volêmica, exceto se há sinais claros de hipervolemia. Quando a hipovolemia não é a causa principal, freqüentemente ela é causa contribuinte.

Deve-se puncionar acesso venoso central para administração de drogas vasoativas, coleta de ScvO2 e medida de PVC. No choque, o limiar para indicação de acesso central e IOT deve ser baixo.

4. Parâmetros Predição de Resposta a Volume

► Estáticos:

PVC

PAOP

► Dinâmicos:

ECO

ΔP-P

Elevação dos mmii

4a. Uso da PVC

Comprovadamente por estudos clínicos que constituem bom nível de evidência, a pressão venosa central não é acurada como medida da pré-carga e sofre influência de vários fatores, como a presença de pressão expiratória final positiva ou PEEP. Deve ser interpretada

idealmente junto com a medida do débito cardíaco, e idealmente medida no final da expiração.

Medidas isoladas não são acuradas para acessar a pré-carga, mesmo nos extremos. A variação da PVC após prova de volume também não se mostrou eficaz como parâmetro de resposta volêmica nem se relacionou com variação no débito cardíaco. Variações menores que 4mmHg podem ser fisiológicas e não devem ser consideradas clinicamente significativas.

Quanto à influência da PEEP sobre a PVC, sabe-se que a PEEP se transmite em parte para dentro do lúmen dos vasos, elevando falsamente a PVC e mesmo a PCP. Assim, Deve-se subtrair a PEEP da PVC medida ao final da expiração.

Para predição de pré-carga, a única situação em que a PVC pode ser usada com maior confiabilidade é no paciente sem ventilação mecânica: se a PVC cai mais que 1mmHg com a inspiração (juntamente com queda > 2mmHg na PCP), pode ser usada como preditor de hipovolemia.

4c. Uso da Pressão Capilar Pulmonar PCP

Historicamente, a PCP tem sido considerada medida útil para acessar a pré-carga do VE e a presença/ausência de edema pulmonar. Porém, as medidas obtidas através do cateter de artéria pulmonar são derivadas de valores de pressão, logo:

1. Pode não haver linearidade entre a pressão e o volume das câmaras, conforme explicado em tópico anterior.

► Ex: Hipertrofia de VE, isquemia, PEEP.

2. A PCP pode superestimar a pressão diastólica final (PDF) do VE na estenose ou insuficiência mitral, e subestimar quando há disfunção diastólica ou hipervolemia.

3. Na insuficiência respiratória, a PCP pode exceder a PDFVE por constricção de pequenas veias em regiões do pulmão que estão hipóxicas.

Dessa forma, assim como a PVC, a PCP tem importantes limitações para a predição da resposta a reposição volêmica, e o cateter de artéria pulmonar vem sendo cada vez menos usado na prática clínica. No entanto, ainda é bem indicado e é de muito auxílio no diagnóstico e manejo de certas condições prevalentes no doente crítico, desde que seus dados sejam bem interpretados. A má interpretação dos dados pelos médicos é uma fonte importante de mau desfecho nos pacientes que utilizam cateter de artéria pulmonar.

Outras medidas úteis obtidas através do cateter de artéria pulmonar são:

► Medidas obtidas:

PVC, PAD, PVD, PAP, PCP (PAOP), DC por termodiluição

► Medidas derivadas:

VDF do VD, SvO2, VO2, DO2, TEO2.

4d. Uso do Ecocardiograma

O ecocardiograma está aos poucos substituindo o cateter de artéria pulmonar na UTI, pois dá estimativas aceitáveis da maioria dos parâmetros dados pelo Swan-Ganz.

DC, PAD, PSAP, pressão de enchimento do VD e VE, FE, interdependência ventricular, função cardíaca D, disfunção diastólica, HVE, doença valvular, isquemia.

A principal função do Eco é fornecer dados para predizer a resposta a volume, além de parâmetros sobre a função cardíaca global. Para isso, tanto o eco transtorácico quanto o transesofágico podem ser usados com boa acurácia.

Indicações específicas para ECO-TE são:

Dissecção aórtica

Endocardite (principalmente se prótese valvar)

Cirurgia cardíaca complicada

Obesidade importante

Trombo intracavitário

Embolia de fonte cardíaca

Baixa qualidade do ECO-TT

Alguns dos parâmetros da relação coração-pulmão utilizados são:

1. Índice de distensibilidade da veia cava inferior: Dmax – Dmin / Dmin a. Avalia a variação no diâmetro da veia cava com a inspiração e expiraçãob. Valores > 12% (ou 18% em outro estudo) tiveram correlação forte com

resposta a volume (definida como aumento no índice cardíaco > 15% após prova de volume).

c. Nestes estudos, a PVC não foi capaz de predizer a resposta a volume.

2. Variações na velocidade do fluxo no trato de saída do VE:

ESTUDOS RECENTES TÊM ENFATIZADO PARÂMETROS DERIVADOS DA RELAÇÃO CORAÇÃO-PULMÃO PARA PREDIZER A RESPOSTA A

VOLUME NO CHOQUE.

a. Variação > 12% se associou com aumento > 15% no IC com VPP de 91% e VPN de 100%.

b. Os estudos que avaliaram citam este parâmetro como mais poderoso que todos os outros avaliados antes.

c. Pacientes devem estar em VM e bem sedados, sem arritmias ou doença valvar aórtica.

O valor estático dessas medidas não tem correlação com o status volêmico, apenas suas VARIAÇÕES com o ciclo respiratório.

Na maioria dos estudos, o ECO-TE trouxe informações relevantes para o manejo clínico em 60-90% dos casos, e teve impacto direto favorável no manejo agudo dos pacientes. Embora os estudos de que derivam as informações acima tenham sido conduzido primariamente em pacientes sépticos sob VM, seus dados são extrapolados para outros grupos de pacientes.

4e. Uso das Variações da PA (ΔP-P)

Variações respiratórias no volume sistólico e na pressão de pulso maiores que 10-13% têm alta sensibilidade e especificidade para afirmar que a reposição volêmica resultará em aumento significativo do débito cardíaco. Significa que o paciente ainda está na fase ascendente da curva de Frank-Starling, ou seja, ainda responde a volume com aumento do DC sem congestão pulmonar.

O ΔP-P é definido como a diferença entre a pressão de pulso máxima e mínima, calculada em um único ciclo respiratório, durante inspiração e expiração com pressão positiva, dividida pela média das pressões:

ΔP-P = Ppmax – Ppmin / [ (Ppmax – Ppmin) /2 ]

Se > 13%, prediz resposta a reposição volêmica com VPP de 94% e VPN de 96%.

Pouco confiável se arritmia grave, hipoxemia severa (PaO2/FiO2 < 100) ou PCP > 18mmHg.

Atualmente, é considerado o melhor preditor de resposta à reposição volêmica em pacientes sob VM.

4f. Elevação dos membros inferiores

Elevar os mmii a 45º: aumenta retorno venoso.

Se DC aumentar em 10 a 15%: prediz resposta à reposição volêmica.

Necessita de Swan-Ganz para monitorização do DC.

4g. Uso das Drogas Vasoativas

São usadas para manipular a distribuição relativa do fluxo sangüíneo e restaurar a perfusão tecidual. São divididas basicamente em dois mecanismos principais de ação:

► Inotrópicos: melhoram o DC e a oferta de O2 através de aumento da FC e da contratilidade.

► Vasopressores:

Melhoram a pressão de perfusão tecidual e preservam a distribuição regional do débito cardíaco através de um aumento na PAM acima dos limiares de autoregulação.

Também podem melhorar a pré-carga e aumentar o DC por diminuir a complacência do sistema venoso, aumentando o retorno venoso.

► Receptores em que atuam:

α1: musculatura lisa vascular: vasoconstricção

α2: vasodilatação por aumento da produção de NO

β1: músculo cardíaco: aumenta a FC e a contratilidade

β2: relaxamento da musculatura lisa bronquica e vascular (coronárias, artérias viscerais e da musculatura esquelética)

Dopamina: aumenta o DC por melhorar a contratilidade, e aumentar a FC em certas doses.

Vasopressina: induz vasoconstricção, principalmente nas arteríolas periféricas.

Tabela retirada do artigo original The Use of Vasopressors and Inotropes in the Emergency Medical Treatment of Shock - Emerg Med Clin N Am 26 (2008) 759–786

As drogas vasoativas só devem ser iniciadas após a restauração da volemia.

Pela ação em múltiplos receptores, as drogas podem causar efeitos mistos, alguns indesejáveis, como o aumento de consumo miocárdico de oxigênio.

Os efeitos hemodinâmicos das drogas podem ativar reflexos endógenos que se opõem ao efeito desejado. Um exemplo é a noradrenalina, que ao aumentar a PA através de vasoconstição, causa uma diminuição reflexa da freqüência cardíaca, desta forma reduzindo levemente o débito cardíaco.

4h. Uso da ScvO2

Seu valor fisiológico varia entre 65 a 75%.

ScvO2 e SvO2 são próximas e ambas podem ser usadas, porém a ScvO2 é a mais estudada no choque e validada à beira do leito. A discordância entre elas é em média 5%. Embora tenham boa correlação entre si, podem divergir, principalmente na sepse.

De forma geral:

► Se ScvO2 < 70%

A oferta de O2 está comprometida (aumento da TEO2)

O objetivo é normalizar a oferta!

DO2 = DC x 1,34 x Hb x SaO2 x 10

► Se ScvO2 = 50%

TEO2 chegando ao máximo

Disóxia iminente

A ScvO2 se correlaciona com a evolução em todos os tipos de choque. A abordagem do Early Goal Directed Therapy demonstrou benefício do aumento da ScvO2 apenas no choque precoce. Estudos não demonstraram benefício no choque tardio, quando a extração de O2 dos tecidos pode estar prejudicada, levando a uma ScVO2 elevada que não se traduz em sinal de bom prognóstico, e sim no oposto.

4i. Uso do Lactato

É um bom indicador de gravidade e mortalidade em UTI. O acúmulo de lactato pode ser um achado tardio em pacientes com comprometimento da oxigenação tecidual (já há disóxia), porém quando se eleva mostra correlação direta com a mortalidade em pacientes com choque circulatório.

No choque séptico, os níveis de lactato são melhores preditores de desfecho fatal que as variáveis de transporte de O2 medidas pelo Swan-Ganz, e a hiperlactatemia precede a acidose.

A especificidade do lactato é ruim no choque, pois qualquer condição clínica que exceda a capacidade do metabolismo aeróbico pode aumentar o lactato, independente da presença de choque (ex: estado de mal convulsivo, exercício extenuante).

Na sepse, o acúmulo de lactato não se deve apenas ao aumento da produção pelo metabolismo anaeróbico. A endotoxina bloqueia a enzima piruvato desidrogenase (que mobiliza o piruvato para dentro da mitocôndria), causando bloqueio da via que metaboliza o lactato.

O lactato venoso central tem boa correlação com o lactato arterial e também pode ser usado para monitorização.

A queda > 10% da lactatemia nas primeiras 24h de tratamento do choque é preditor de boa evolução.

5. Abordagem Geral Baseada nos Parâmetros Hemodinâmicos:

Para choque cardiogênico e hipovolêmico (que são mais dependente da DO2):

DO2 = (VS x FC) x 1,34 x Hb x SaO2 x 10

Pode-se intervir em qualquer dos componentes:

SaO2: FiO2 e PEEP

Hb: transfusão

FC: marcapasso, inotrópicos

VS: cristalóides, vasodilatadores, inotrópicos

Parâmetros de resposta clínica:

► Macrohemodinâmicos

Queda da FC

Aumento da PAM

Melhora do nível de consciência

Melhora da diurese

► Microhemodinâmicos

Melhora do BE, ScvO2, lactato

Idealmente, seguir terapia guiada por objetivos.

► Mesmo com todos os avanços no diagnóstico e manejo do choque, a mortalidade ainda é alta:

35 a 60% dos choques sépticos morrem dentro de 30 dias

60 a 90% dos choques cardiogênicos morrem dentro de 30 dias

No hipovolêmico a mortalidade é altamente variável, e está diretamente ligada ao atraso da terapia efetiva.

6. Abordagem do Choque Hipovolêmico

6a. Etiologias mais freqüentes:

► Hemorrágico

Trauma

HDA/HDB

Pancreatites

Hematomas

Fraturas

Aneurismas

► Depleção Hídrica

Para o ambiente

Para o 3º espaço

6b. Sinais e Sintomas

1. Devidos à depleção volêmica em si:

► Primariamente relacionados à má perfusão:

Mais precoces: lassidão, fadigabilidade, sede, cãimbras, hipotensão postural.

► Se perda hídrica mais severa:

Dor abdominal e/ou torácica (isquemia mesentérica, coronária e cerebral)

Letargia/confusão

2. Devido ao tipo de fluido perdido

Sangue

Água livre

Água + Na

3. Devido às alterações hidroeletrolíticas associadas

6c. Hemoglobina e Hematócrito

O uso da hemoglobina e do hematócrito para determinar a extensão da perda sangüínea na abordagem de urgência é inadequado. Por ser perdido sangue total e não apenas plasma, as concentrações finais não vão se alterar agudamente.

O Hematócrito não se altera significativamente no período inicial após a perda de sangue. Nas primeiras horas após hemorragia aguda, a queda do hematócrito é resultado da reposição volêmica, que diluirá o pool de hemácias, e não da intensidade da perda sangüínea.

Cada tipo de fluido de reposição altera de forma diferente o hematócrito:

Fluidos acelulares: redução

Concentrado de hemácias: aumento

Sangue total: sem alteração

É importante destacar que a reposição volêmica com concentrado de hemácias causará aumento do hematócrito e portanto aumento da viscosidade sanguínea, que a princípio pode contribuir para a piora do débito cardíaco. Se o objetivo do tratamento é corrigir a síndrome de baixo débito, o fluido de escolha deve ser o acelular (cristalóide), que ao reduzir a viscosidade sanguínea facilita a ejeção pelo VE. O concentrado de hemácias só será usado se for necessário melhorar a oferta de oxigênio através do aumento da concentração de Hb após a correção do débito cardíaco.

6d. Conceitos Hemodinâmicos

A pressão arterial varia de próximo ao normal (na hipovolemia leve) até a hipotensão postural, e à medida que aumenta a gravidade da hipovolemia, torna-se baixa independente da posição corporal.

► Alterações da PA:

Próximo ao normal: hipovolemia leve

Hipotensão ortostática: hipovolemia moderada

Hipotensão persistente: hipovolemia grave

Hipotensão postural levando a tontura pode ser a principal queixa e é fortemente sugestiva de hipovolemia na ausência de neuropatia autonômica ou uso de anti-hipertensivos.

Sobre o uso da PVC para monitorização da volemia e pré-carga, alguns conceitos são importantes: é a PDF do VE (e não a pressão atrial D / PVC) que se correlaciona com a pré-carga e o débito cardíaco. A PVC é um parâmetro útil para acessar a pré-carga somente se ela puder ter relação direta com a PDFVE, como explicado em item anterior. São situações em que a PVC não reflete a PDFVE (e por conseguinte, a pré-carga):

1. ICC pura de VE:

A PCP pode ser alta mas a PVC permanecer normal se a função do VD é preservada. Neste caso, tratar a PVC baixa com reposição volêmica pode levar a EAP.

2. ICC pura de VD:

A PVC tende a exceder a PDFVE (PVC alta mesmo se depleção hídrica).

6e. Classificação

Classe I Classe II Classe III Classe IV

Perda volêmica (%)

< 15 15 - 30 30 - 40 > 40

Perda volêmica (ml)

< 750 750 - 1500 1500 - 2000 > 2000

FC < 100 > 100 > 120 > 140

PA Normal Normal Baixa Baixa

Enchimento capilar

Normal Diminuído Diminuído Diminuído

FR < 20 20 - 30 30 - 40 > 35

Débito Urinário > 30 ml/h 20 - 30 5 - 20 Desprezivel

Nível de Consciência

Pouco ansioso

Ansioso Ansioso - Confuso

Confuso – Letárgico

Reposição Volêmica

Cristalóide Cristalóide Cristalóide + Sangue

Cristalóide + Sangue

6f. Abordagem Geral

Reposição volêmica agressiva até a normalização da PA e da perfusão periférica.

Sinais clínicos macro-hemodinâmicos como PA, débito urinário, nível de consciência e perfusão periférica são adequados para guiar a reposição volêmica.

Passar Pai em todos que não responderem prontamente à infusão de volume:

No paciente hipovolêmico os sons de Korotkoff são abafados e o pulso atenuado: aferição manual da PA pode ser subestimada.

Variações amplas da PAS e da pressão de pulso com o ciclo respiratório estão relacionados à hipovolemia persistente e baixo enchimento ventricular.

O desenvolvimento de edema periférico se deve comumente à hipoalbuminemia dilucional aguda e não deve ser usado como marcador de ressuscitação volêmica adequada ou de sobrecarga hídrica.

O fluido de escolha para reposição volêmica é o Ringer Lactato

► Taxa de infusão:

Bolus de 500ml a cada 30 min

Infusão de 20ml/kg em 1 a 2h

► Acesso venoso ideal: periférico calibroso

Veias antecubitais

Idealmente 2 acessos periféricos

A maior prioridade no paciente com sangramento é manter o débito cardíaco. Para isso, o fluido inicial de escolha é o cristalóide. Como explicitado acima, o concentrado de hemácias não é o fluido de escolha para corrigir o DC, pois pode diminuir o DC.

Após estabilização do DC, as variáveis de transporte de O2 (hemoglobina, saturação de hemoglobina) devem ser analisadas e corrigidas se necessário. É nesta fase que o concentrado de hemácias deve ser usado.

Estratégia para reposição volêmica:

1. Estimar o volume sangüíneo normal: 60ml/kg em mulheres e 65ml/kg em homens.

2. Estimar a porcentagem de perda sangüínea

o Classificar o paciente nos estágios I a IV

3. Calcular o déficit de volume

4. Determinar a reposição de volume para cada tipo de fluido usado:

o Se cristalóide: apenas 20% fica no intravascularo Se colóide: 50 a 75% fica no intravascular

Os objetivos do tratamento do choque hipovolêmico são principalmente:

o Índice cardíaco = 3 L/min/m2 o DO2 > 500 mL/min/m2

o VO2 > 100 mL/min/m2 o Lactato < 2 mmol ou BE > -2mmol/L

7. Anafilaxia

É uma reação alérgica grave de início abrupto e potencialmente fatal. Mediada por IgE, após exposição a antígeno em pacientes previamente sensibilizados.

A reação anafilactóide é clinicamente indistinguível da anafilaxia, porém não tem participação da IgE.

A anafilaxia fatal mais comumente resulta de asfixia por edema de vias aéreas ou falência respiratória por broncoespasmo, e menos comumente de colapso circulatório. Nos casos fatais, o intervalo médio entre o surgimento dos sintomas e o óbito em geral é menor que 30 minutos.

7a. Sinais e Sintomas

Sintomas cutâneo-mucosos: 90%

Flush, prurido, urticária, angioedema, hiperemia ocular

Sintomas respiratórios: 70%

Congestão e descarga nasal, mudança na qualidade da voz, sensação de garganta fechada ou sufocamento, tosse, espirro, dispnéia, estridor, broncoespasmo

Sintomas gastrointestinais: 40%

Náusea, vômitos, cólicas, diarréia

Sintomas cardiovasculares: 35%

Tontura, taquicardia, hipotensão, choque

7b. Critérios Diagnósticos

Cada critério reflete uma apresentação clínica diferente da anafilaxia. O diagnóstico é provável quando qualquer um dos 3 critérios é preenchido.

CRITÉRIO I:

Apresentação clínica aguda (minutos a horas), com acometimento de pele e/ou mucosas (urticária generalizada, prurido, angioedema em língua, lábios, úvula) MAIS PELO MENOS UM DOS ABAIXO:

Sintomas respiratórios (dispnéia, broncoespasmo, estridor, hipoxemia, queda do PFE)

Queda da PA ou sintomas relacionados a disfunção de órgão-alvo (hipotonia, síncope, incontinência)

Sintomas cutâneos estão presentes em mais de 90% dos casos, logo este é o critério mais freqüentemente preenchido.

CRITÉRIO II:

Dois ou mais dos abaixo, que venham a ocorrer minutos a horas após a exposição a um provável alérgeno:

Acometimento de pele e/ou mucosas

Queda da PA ou sintomas relacionados à disfunção de órgão-alvo

Sintomas gastrointestinais persistentes (cólicas, vômitos)

Cerca de 10 a 20% dos casos cursam sem lesões cutâneo-mucosas, que segundo este critério não são necessárias para o diagnóstico.

CRITÉRIO III:

Queda da PA minutos a horas após exposição a um alérgeno conhecido para o paciente:

Para adultos: PAS < 90mmHg ou redução > 30% pa PAS basal.

Este critério objetiva detectar anafilaxia que cursa apenas com instabilidade hemodinâmica e se aplica apenas a pacientes com exposição conhecida a alérgenos.

7c. Manejo Clínico

Passos cruciais:

o Remover o Ag o Chamar por ajudao Injeção intramuscular de adrenalinao Oxigênio suplementar / assegurar via aéreao Ressuscitação volêmica

Estabilização inicial:

o IOT sempre pelo médico mais experienteo Exame cutâneo completoo Dois acessos periféricos calibrosos para infusão de volume.o Monitorização cardíaca e oximétrica contínua.

Adrenalina IM na coxa

o Fazer EV se sintomas graves

Posicionar paciente em decúbito dorsal com mmii elevados:

o Melhorar retorno venoso e maximizar perfusão dos órgãos vitais (pacientes com desconforto respiratório ou vômitos podem não tolerar o decúbito).

O2 suplementar (caso não necessite IOT)

o FiO2 100% se possível: 6 a 8 l/min em máscara

Pacientes que não respondem prontamente à adrenalina devem ser considerados volemicamente depletados, pois mantém a PA baixa apesar de vasoconstricção máxima. Podem ser necessários grandes volumes de reposição

Como hidratar:

o Se normotenso: SF 0,9% 125ml/h para manter acesso.

o Se hipotenso: 1 – 2l de SF 0,9% (5 – 10ml/kg nos 30 minutos iniciais).

Para o tratamento medicamentoso, a adrenalina é a droga de escolha. É a única que previne/reverte o broncoespasmo e o colapso circulatório. Tem ação em receptores α1, β1 e β2. Deve ser administrada via intramuscular:

o Absorção mais rápida que via SC

TODOS OS PACIENTES PRECISAM DE REPOSIÇÃO VOLÊMICA.

DEVIDO AO AUMENTO DA PERMEABILIDADE VASCULAR, ATÉ 35% DO VOLUME INTRAVASCULAR PODE VAZAR PARA O 3º ESPAÇO EM

ALGUNS MINUTOS.

o Dose IM: 0,3 a 0,5mg por dose (1mg/ml)

Administrar EV se não houver resposta à dose IM:

o Hipoperfusão muscular pelo choque (?)

o Dose EV: 2 – 10 mcg/min

Nos pacientes em uso de β-bloqueador a adrenalina pode ter dificuldade em agir devido ao bloqueio dos receptores. Neste caso:

o Conduta: GLUCAGON. Tem efeito inotrópico e cronotrópico não mediado por receptores β.

Inibidores da Enzima de Conversão da Angiotensina (IECA) e Bloqueadores do Receptor de Angiotensina (em menor intensidade) interferem com os mecanismos compensatórios endógenos, resultando em sintomas mais severos ou prolongados.

Tratamentos Adjuvantes:

Anti-histamínicos:

o Nunca são de escolha. São 2ª linha.

o Aliviam prurido e urticária, mas não aliviam broncoespasmo, obstrução de vias aéreas, sintomas gastrointestinais ou choque.

o Doses: Difenidramina 25 a 50mg EV (máx: 400mg/dia)

o Bloqueador H2 não tem evidência de benefício ou de risco.

Broncodilatadores:

o Não reduzem o edema de mucosa (reduzido pelo efeito α1 da adrenalina).

Corticóides:

o Útil para prevenir fase bifásica da anafilaxia (até 20% dos casos)

o Se usado: Metilprednisolona 1 – 2mg/kg/dia.

o Suspender em 4 dias: todas as reações bifásicas foram relatadas em até 72h.

NÃO HÁ CONTRAINDICAÇÕES ABSOLUTAS AO USO DA ADRENALINA.

7d. Alta Hospitalar

Não há consenso sobre por quanto tempo se deve observar o paciente no Pronto Socorro.

o Se não respondeu à adrenalina: internar.

o Se respondeu: observar no mínimo 2h, de preferência 8h.

Caso o paciente não possa ficar em observação por pelo menos 8h, só deve ser liberado após receber injetor de adrenalina para uso caso necessário.