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 X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                            p.1         O que se ensina e se aprende sobre leitura, leitor e livro na Feira do Livro de Porto Alegre/RS  uma análise a partir do jornal Zero Hora     Resumo As representações que circulam em propagandas e em documentos oficiais (pareceres, orientações, programas, manuais) do Ministério da Educação destacam discursos que posicionam a leitura e a formação de leitores como prática central na constituição da cidadania. Esses ganham visibilidade em outras instâncias da mídia e tem, além de papel informativo, inegável caráter pedagógico, ao darem visibilidade e, assim, estabelecem certos estilos, comportamentos, verdades e modos de ser. Neste artigo, destacamos o que se ensina sobre leitores e leitura, no evento Feira do Livro de Porto Alegre/RS, valendonos de matérias e peças publicitárias veiculadas em 4 encartes do Caderno da Feira. Tal estudo integra pesquisa de doutorado em andamento e se ancora na perspectiva teórica dos Estudos Culturais. Autores como Colomer (2003), Chartier (1994; 1999), Hall (1997a), Fischer (2012), entre outros, são centrais nesta pesquisa. Registramse ensinamentos que convocam e estimulam o hábito de ler, e de certo modo distinguem  leitores e não leitores –, acentuando marcas identitárias que posicionam os leitores não  como consumidores de livros assíduos, mas como interessados, atentos, capazes de compartilhar suas leituras e até de participar como avaliadores de textos e até escritores quando convocados.  Palavraschave: Estudos Culturais; mídia; leitor; Feira do Livro de Porto Alegre/RS.   Gisele Massola UFRGS [email protected]   Maria Lúcia Castagna Wortmann UFRGS/ ULBRA/RS [email protected]   

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Page 1: X Anped Sulxanpedsul.faed.udesc.br/arq_pdf/1185-0.pdf · A Feira do Livro: um evento cultural que promove o livro e a leitura e propicia a formação de leitores A Feira do Livro

 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.1 

 

 

 

 

    O que se ensina e se aprende sobre leitura, leitor e livro na Feira do Livro de Porto Alegre/RS – uma análise a partir do jornal Zero Hora    

 

Resumo As  representações  que  circulam  em  propagandas  e  em documentos  oficiais  (pareceres,  orientações,  programas, manuais)  do  Ministério  da  Educação  destacam  discursos que  posicionam  a  leitura  e  a  formação  de  leitores  como prática central na constituição da cidadania. Esses ganham visibilidade  em  outras  instâncias  da mídia  e  tem,  além  de papel  informativo,  inegável  caráter pedagógico,  ao darem visibilidade  e,  assim,  estabelecem  certos  estilos, comportamentos, verdades e modos de  ser. Neste artigo, destacamos  o  que  se  ensina  sobre  leitores  e  leitura,  no evento  Feira  do  Livro  de  Porto Alegre/RS,  valendo‐nos  de matérias e peças publicitárias veiculadas em 4 encartes do Caderno da Feira. Tal estudo integra pesquisa de doutorado em  andamento  e  se  ancora  na  perspectiva  teórica  dos Estudos Culturais. Autores  como Colomer  (2003), Chartier (1994;  1999), Hall (1997a), Fischer (2012), entre outros, são centrais  nesta  pesquisa.  Registram‐se  ensinamentos  que convocam  e  estimulam  o  hábito  de  ler,  e  de  certo modo distinguem –  leitores e não  leitores –, acentuando marcas identitárias  que  posicionam  os  leitores  não  só  como consumidores  de  livros  assíduos, mas  como  interessados, atentos,  capazes  de  compartilhar  suas  leituras  e  até  de participar  como  avaliadores  de  textos  e  até  escritores quando convocados.  Palavras‐chave: Estudos Culturais; mídia; leitor; Feira do Livro de Porto Alegre/RS.  

 Gisele Massola 

UFRGS [email protected] 

  

Maria Lúcia Castagna Wortmann UFRGS/ ULBRA/RS 

[email protected]   

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O que se ensina e se aprende sobre leitura, leitor e livro na Feira do Livro de Porto Alegre/RS – uma análise a partir do jornal Zero Hora  Gisele Massola ‐ Maria Lúcia Castagna Wortmann 

 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.2 

 

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Iniciando a leitura... 

 

“Leitores de todos os cantões: grupo de quatro estudantes chineses explorou a Feira no dia da abertura”. Zero Hora, 27/10/2012, p. 01. 

“Quem  é  o  leitor?  Estudo  inédito  divulgado  revela  hábitos  de  leitura  dos gaúchos”. Zero Hora, 27/10/2012, p, 02. 

“Grande espaço para pequenos  leitores: área reservada às crianças está com infraestrutura renovada e ampliada”. Zero Hora, 30/10/2012, p. 34 

“Que tipo de leitor você é?”. Zero Hora, 03/11/2012, p. 01. 

“Livros para brincar: produtos da área infantil e juvenil vão além da literatura”. Zero Hora, 01/11/2012, p. 01. 

“Livros para leitores de todos os matizes: na tarde de hoje começa a Feira do Livro de Porto Alegre – 17 dias de descontos, debates, palestras e sessões de autógrafos  que  oferecem  atividades  para  todos  os  gostos”.  Zero  Hora, 31/10/2013, p, 01.  

“Indicados pela gurizada: histórias sobre deuses, heróis e guerreiros fazem a cabeça dos jovens leitores”. Zero Hora, 8/11/2013, p. 1.  

“Para  ser  leitor  não  basta  saber  ler:  entre  as  pessoas  que  têm  pleno entendimento do que leem, os gaúchos levam vantagem em relação ao país”. Zero Hora, 8/11/2013, p. 02. 

“À procura dos livros da Nobel de Literatura”. Zero Hora, 12/11/2013, p. 3. 

 

  As  expressões  acima  destacadas  compuseram,  recentemente,  os  títulos  de 

reportagens  publicadas  do  jornal  Zero  Hora,  de  grande  circulação  no  RS,  sendo  essas 

direcionadas à divulgação de um dos eventos culturais mais expressivos e representativos 

da cultura local – A Feira do Livro de Porto Alegre/RS. Elas foram retiradas de um conjunto 

de matérias relacionadas à leitura e a sujeitos leitores – notícias, reportagens, entrevistas, 

anúncios,  manchetes,  colunas,  informativos  –  produzidas,  publicadas  e  divulgadas 

durante os aproximadamente quinze dias de realização desse Evento. Essas reportagens 

e  as  imagens  nelas  incluídas  focalizam,  com  freqüência,  representações  de  jovens, 

adultos ou crianças, que participam sorridentes das programações do Evento, retratados 

frente a estantes ou pilhas de livros variados, ou lendo em bancos de praças; no caso das 

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O que se ensina e se aprende sobre leitura, leitor e livro na Feira do Livro de Porto Alegre/RS – uma análise a partir do jornal Zero Hora  Gisele Massola ‐ Maria Lúcia Castagna Wortmann 

 

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crianças,  essas  estão,  com  freqüência,  dispostas  em  rodas  de  leitura  folheando  livros 

coloridos  e  ilustrados.  Tais  excertos  foram  invocados  pelo  destaque  que  dão  a 

representações  positivas  do  ato  de  ler,  igualmente  freqüentes  em  outras  instâncias  e 

situações, estando entre essas, documentos oficiais (pareceres, orientações, normativas, 

decretos,  programas, manuais,...)  organizados  pelo Ministério  da  Educação  brasileiro. 

Aliás, é possível dizer que, cada vez mais  frequentemente, são colocados em evidência, 

em tais documentos, discursos que posicionam a  leitura e a  formação de  leitores como 

uma  prática  central  na  constituição  da  cidadania,  que  deve,  ao  mesmo  tempo, 

proporcionar prazer aos leitores e leitoras.   

   Assim, é possível dizer que, além de  representações de  leitor e de  leitura  terem 

ganhado as páginas dos jornais, estão em curso muitas iniciativas patrocinadas tanto pelo 

poder publico quanto por instâncias privadas, que se destinam a promover as atividades 

de  leitura  –  há  Manuais  que  reproduzem  práticas  desejáveis  e  até  mesmo  roteiros 

voltados  a  incentivar  o  ato  de  ler  e  são  oferecidos  treinamentos  a  bibliotecários, 

educadores,  voluntários  e mediadores,  com  formações  diversificadas,  objetivando  que 

esses se ocupem com a formação de leitores.  

Além disso, compondo este quadro, de certa forma promissor, o mercado editorial 

tem feito expressivos investimentos na composição visual dos livros de modo a torná‐los 

cada vez mais atraentes.   

Feitas  estas  considerações,  esclarecemos,  que  estaremos  nos  detendo  nas 

iniciativas voltadas à promoção da leitura e dos leitores realizadas no âmbito da Feira do 

Livro de Porto Alegre, divulgadas através dos Cadernos da Feira, suplemento publicado 

no jornal já referido, durante o período de realização da mesma.  

 

Referências teóricas e propósitos  

  Ancoradas na perspectiva teórica dos Estudos Culturais em Educação destacamos 

a  centralidade  que  a  cultura  tem  nos  processos  de  produção  das  visões  de  mundo 

partilhadas pelos sujeitos, tendo presente o quanto assumir tal compreensão modifica os 

modos  de  ver  as  relações  entre  as  coisas  e  os  artefatos  culturais,  como  indicaram 

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O que se ensina e se aprende sobre leitura, leitor e livro na Feira do Livro de Porto Alegre/RS – uma análise a partir do jornal Zero Hora  Gisele Massola ‐ Maria Lúcia Castagna Wortmann 

 

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Albuquerque  Jr  (2011), Barbero  (2010), Canclini  (2007), Costa  (2005), Grossberg  (2008), 

Hall (1997), Sarlo (2007), Yúdice (2006), entre outros autores que nos mostram como a 

cultura adentrou intensamente na vida cotidiana. Tal condição resulta, de certo modo, de 

um conjunto de transformações presenciadas em diferentes instâncias em esfera global – 

a aceleração e a compressão operadas nas relações espaço‐tempo, bem como nas formas 

de  comunicação  procedidas  através  de  aparelhos  digitais  móveis,  e  nos  espaços  de 

sociabilidade,  cada vez mais  confinados aos ambientes virtuais. Além disso, a partir do 

borramento  de  algumas  fronteiras  nacionais,  processou‐se  uma maior mobilidade  no 

fluxo e  circulação de pessoas e mercadorias,  concomitantemente a outras articulações 

entre  espaços  públicos  e  privados,  que  causaram  impactos  importantes  nos  sentidos 

conferidos às práticas culturais.  

A expressão “centralidade da cultura” é essencial à perspectiva que assumimos e 

ela  diz  respeito  ao  modo  como  a  cultura  tem  penetrado,  interpelado  e  mediado  as 

práticas cotidianas.   A partir dela, marca‐se a presença da cultura em distintas  instâncias 

do  nosso  dia‐a‐dia,  bem  como  o  papel  produtivo  que  essa  tem  na  construção  de 

significados, bem como de formas de ser e estar no mundo.  

Nas palavras de Hall  (1997a, p.  22),  cultura ganha  centralidade ao “penetrar em 

cada  recanto da vida  social  contemporânea,  fazendo proliferar ambientes  secundários, 

mediando tudo”. E a mídia – o rádio, os  jornal e revistas, a TV, os  filmes, os quadrinhos 

etc. – é um  importante espaço de mediação, circulação e divulgação de  informações na 

contemporaneidade, ocupando, igualmente, papel central não apenas de veiculação, mas 

de  construção  e  produção  de  significados,  imagens,  discursos,  narrativas  que  se 

constituem,  tal  como  sintetizou  Fischer  (2012),  nos  “modos  contemporâneos  de 

constituir sujeitos na cultura” (p. 113).  

Tomamos, então, as matérias publicadas na mídia impressa como textos culturais 

que constituem um peculiar modo de falar sobre e do  livro, na Feira do Livro, bem como 

das práticas de leitura que, através dela são destacadas.  

Para  isso,  estaremos  nos  valendo, mais  especificamente,  da  análise  de  algumas 

matérias de capa,  reportagens e peças publicitárias produzidas e veiculadas, no ano de 

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O que se ensina e se aprende sobre leitura, leitor e livro na Feira do Livro de Porto Alegre/RS – uma análise a partir do jornal Zero Hora  Gisele Massola ‐ Maria Lúcia Castagna Wortmann 

 

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2013, em 4 Encartes do Caderno da Feira, publicado pelo Jornal Zero Hora1,. Tal estudo é 

um  recorte  de  uma  pesquisa  mais  ampla,  em  desenvolvimento  em  um  curso  de 

doutorado em Educação. Ressaltamos que a opção de analisar  tal artefato decorreu de 

ser o jornal Zero Hora gerenciado por um grupo midiático de expressiva atuação na região 

sul  do  Brasil.  Além  disso,  esse  Grupo  tem  concedido  espaços  cada  vez  maiores  à 

divulgação da Feira do Livro, especialmente, a partir dos anos 1990, quando se tornou um 

dos principais patrocinadores e apoiadores da Feira. Aliás, a Feira é uma instância na qual 

se desenrolam inúmeras ações culturais patrocinadas tanto pela iniciativa privada, quanto 

por recursos públicos.  

 

A Feira do Livro: um evento cultural que promove o livro e a leitura e propicia a formação de leitores 

A  Feira  do  Livro  de  Porto  Alegre/RS  é  um  evento  regional  que  se  realiza 

anualmente,  desde  1955,  interruptamente,  e  que,  neste  ano  de  2014,  completa  sua 

sexagésima edição. Esta Feira é promovida pela Câmara Rio‐Grandense do Livro  (CRL), 

em parceria com o Ministério da Cultura (MinC) e a Prefeitura Municipal de Porto Alegre, 

sendo considerada um dos eventos culturais mais expressivos e representativos de Porto 

Alegre/RS em  termos de extensão, circulação de pessoas, número de expositores, bem 

como de programações endereçadas a públicos de diferentes faixas etárias2. 

                                                            1  Este  Jornal,  criado  na  década  de  1950,  inicialmente  de  propriedade  do  jornalista  Samuel Weiner,  cujo 

primeiro título foi Última Hora, destacando‐se por ser um  jornal de  linha editorial mais esquerdista que encerrou sua publicação (com essa nomenclatura) durante o período de implantação do golpe militar no Brasil, em  1964. Aliás, este periódico  foi adquirido pelo  também  jornalista e empresário Ary Carvalho, que alterou sua denominação, substituindo o termo Útima por Zero e captou novos sócios. Desse modo, o  jornal passou a circular com a denominação Zero Hora, sendo editado diariamente, desde 1964. Nos anos 1970, a família Sirotsky adquiriu o controle majoritário da Empresa, constituindo‐se, então, o Grupo da Rede Brasil Sul de Comunicação (RBS), que se tornou responsável pela edição do Jornal Zero Hora. Em 1982, o Jornal Zero Hora ultrapassou o Correio do Povo, seu maior concorrente, em número de tiragens diárias, vendas e  representatividade em  termos de  comunicação. Atualmente este grupo é apontado como um dos maiores complexos multimídia da região Sul do país, possuindo, no Rio Grande do Sul e em  Santa Catarina, oito  jornais,  vinte  e quatro  estações de  rádio AM  e  FM, dois portais na  internet, dezessete  emissoras  de  televisão  afiliadas  à  Rede  Globo,  duas  emissoras  locais  denominadas comunitárias  e  um  canal  veiculado  nacionalmente  voltado  para  o  segmento  rural.  De  acordo  com informações divulgadas pelo Grupo RBS, através do site  institucional, a  tiragem do  jornal  já atingiu o número de 190 mil exemplares por dia. 

2 A última edição do evento contou com 140 expositores, mais de 700 sessões de autógrafos, 156 eventos em  salas  (mesas  redondas,  palestras  seminários),  31  oficinas  e  encontros  relacionados  ao  livro  e  à 

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O que se ensina e se aprende sobre leitura, leitor e livro na Feira do Livro de Porto Alegre/RS – uma análise a partir do jornal Zero Hora  Gisele Massola ‐ Maria Lúcia Castagna Wortmann 

 

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A  Praça  da  Alfândega,  localizada  no  centro  histórico  de  Porto  Alegre,  um  dos 

pontos  de  maior  circulação  de  pedestres  da  cidade,  sedia  este  evento  desde  a  sua 

primeira  edição:  inicialmente  a  Feira  ocupava,  apenas,  o  espaço  restrito  da  Praça, 

estendendo‐se, posteriormente, a prédios vizinhos localizados no “Centro Histórico”, tais 

como: o Memorial do Rio Grande do  Sul, o Museu de Arte do Rio Grande do  Sul Ado 

Malagoli (MARGS), o Banco Santander Cultural, o Centro Cultural CEEE Érico Veríssimo, a 

Casa de Cultura Mário Quintana e a Biblioteca Pública do Estado, ocupando atualmente 

cerca de 224 mil metros quadrados.  

Cabe  referir  que  a  programação  deste  evento  está  subdividida  em  três  áreas 

centrais (Geral, Internacional e Infanto‐Juvenil), voltadas a atender e a valorizar aspectos 

simbólicos  associados  a  imagens,  artefatos  e  formas  de  identificação  da  cultura  local, 

mesmo que uma dimensão mais internacional também oriente essa programação.  Nessa 

última direção, processa‐se, a cada ano, homenagens a um país, tendo sido a Alemanha a 

homenageada na edição de 2013. Mas a dimensão de  internacionalização do evento não 

se esgota nessa homenagem e se estende à promoção de palestras, das quais participam 

autores  e  escritores  de  outros  países  representados  na  Feira,  além  de  serem  feitos 

lançamentos de seus  livros, debates sobre tradução e digitalização de acervos, mostras 

de filmes, seminários sobre literatura e a divulgação das traduções feitas a partir de obras 

de  autores  gaúchos  para  outros  idiomas.  Nas  últimas  edições,  visando  estender  a 

programação a  convidados externos,  foram  criados os “dias  temáticos”, nos quais  são 

privilegiadas atividades sobre o foco escolhido em cada ano. 

Salientamos que, nos últimos 60 anos, a Feira passou por diversas transformações, 

as quais, nem sempre, são associadas a questões  internas deste evento, mas articuladas 

ao  contexto  mais  amplo  da  sociedade  que  vem  estabelecendo  novas  formas  de 

organização, bem  como de negociação dos processos de  comunicação,  entre os quais 

                                                                                                                                                                                          criação literária, 31 eventos artísticos e culturais, 20 sessões de cinema comentadas, presença de autores internacionais  e  uma  área  específica  dedicada  a  crianças  e  jovens  (Área  Infanto‐Juvenil)  com  416 atividades.  Cabe  ainda  indicar  que,  no  evento  de  2013,  realizado  em  dezessete  dias,  totalizou‐se  a comercialização de 411.056,   registrando‐se a circulação de aproximadamente 1 milhão e quatrocentas mil pessoas. Dados e números apresentados aqui foram fornecidos através de  informações divulgadas no site da Câmara Rio‐Grandense do Livro. Disponível em: http://www.feiradolivro‐poa.com.br/. Acesso em: dezembro de 2013. 

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O que se ensina e se aprende sobre leitura, leitor e livro na Feira do Livro de Porto Alegre/RS – uma análise a partir do jornal Zero Hora  Gisele Massola ‐ Maria Lúcia Castagna Wortmann 

 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.7 

 

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está o crescente domínio da tecnocultura, com suas redes de divulgação de informações, 

tais como a  internet, os sites, o correio eletrônico, facebook, twitter, entre outros, além 

dos canais multimídias, dos telefones celulares etc... Aliás, a partir da utilização das novas 

tecnologias  de  informação,  diferentes  estratégias  para  o  consumo  de  imagens, 

mercadorias,  bem  como  de  eventos  culturais  têm  sido  assumidas,  e  tal  adesão  está 

expressa nas atividades e propostas que  integram essa Feira do Livro, que, atualmente, 

possui uma estrutura complexa: essa inclui uma ampla gama de ações/proposições entre 

as quais  estão palestras, mesas‐redondas, oficinas, bate‐papos,  sessões de  autógrafos, 

destaques do dia, opiniões, perguntas para autores, diálogos com escritores, sendo que 

tudo isso torna este evento, um dos importantes marcadores culturais da cidade de Porto 

Alegre. Mas a Feira também ganhou relevo nas páginas do  jornal (bem como em alguns 

outros veículos midiáticos), nos quais se fortalece constantemente a ideia de ser esse um 

evento que merece ser visitado e desfrutado na sua multiplicidade pela população. Pode‐

se dizer,  inclusive, que no  jornal são  inventados alguns peculiares modos de  falar desta 

Feira e de valorizá‐la.  

 

Sobre leitura, leitor e livro 

Debruçando‐nos mais detidamente  sobre questões que dizem  respeito à  leitura, 

ao leitor e ao livro, destacamos ser cada vez mais recorrente a afirmação da centralidade 

assumida pelo texto escrito, decorrendo disso o interesse despertado pelos livros. Nessa 

direção, encontramos, nas teorizações de Chartier (1994), um importante argumento que 

relaciona  a  história  do  livro  à  história  da  leitura,  com  seus  lugares  privilegiados,  seus 

centros e periferias. E, por essa razão, os esforços empreendidos pelo autor (CHARTIER, 

1994)  para  discutir  os  significados  de  leitura  estão  focados  também  nos  processos  de 

produção e de transformação do texto escrito, com seus diferentes formatos, suportes e 

gêneros.  Para  ele,  ao  se  falar  em  leitura,  é  necessário  inscrever  está  prática  em  uma 

história de longa duração, afirmando, também, este autor, a importância “do leitor nesse 

ato de produção cultural” (p. 31). E não se trata de um leitor abstrato, aquele sujeito que 

domina  certas  capacidades  de  decifrar  um  texto  escrito, mas  de  leitores  vinculados  a 

práticas  específicas  e  a determinados  grupos  nos quais  esses  se  constituem  como  tal. 

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O que se ensina e se aprende sobre leitura, leitor e livro na Feira do Livro de Porto Alegre/RS – uma análise a partir do jornal Zero Hora  Gisele Massola ‐ Maria Lúcia Castagna Wortmann 

 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.8 

 

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Como  salientou  Chartier  (ibid),  “qualquer  leitor  pertence  a  uma  comunidade  de 

interpretação e se define em relação às capacidades de leitura; entre os analfabetos e os 

leitores  virtuosos  há  todo  um  leque  de  capacidades  que  deve  ser  reconstituído  para 

entender o ponto de partida de uma comunidade de leitura" (p.32).  

Assim,  parece‐nos  fundamental  considerar  o  contexto  sócio‐cultural  que  dá 

materialidade  à  figura  do  leitor,  bem  como  ressaltar  serem  as  práticas  de  leitura 

cotidianas  inumeráveis,  necessitando‐se,  para  analisá‐las,  buscar  saber  quais  são  as 

condições compartilhadas, a partir das quais os leitores se situam e dão sentido ao ato de 

ler. Tal atitude de pesquisa possibilita mostrar, ainda, que o mundo da leitura não é feito 

apenas de códigos, de estatísticas, ou de hierarquias entre bons e maus leitores, mas de 

diferentes experiências, individuais e compartilhadas frente ao texto. 

Salientamos  ter  sido  bastante  produtivo  aproximar  as  considerações  acima 

destacadas, do pensamento de Chartier (ibid), bem como de nelas apoiar as análises que 

desenvolvemos acerca de práticas e  significados de  leitura  realizadas na Feira do Livro, 

que  foram  explicitadas  nos  encartes  pesquisados.  Tais  práticas,  de modo  geral,  estão 

sustentadas  num  conjunto  de  discursos  que  posicionam  os  sujeitos  leitores,  fixando 

verdades, bem como definindo condutas desejáveis de  leitura, tal como  indicou Chartier 

(1999). Ou seja, essas determinam “o que se lê, de que forma se lê ou o que não deve ser 

lido” (p.13). 

  Seguindo na direção de problematizar discursos em  torno de práticas de  leitura, 

leitor e livro, Castro (2007) discute uma formação discursiva que posiciona o livro como o 

artefato  principal  das  práticas  de  leitura.  Em  suas  pesquisas,  o  autor  (ibid)  examinou 

representações (re)produzidas pela mídia impressa, a partir da seleção de três periódicos 

de grande circulação estadual e nacional – os jornais Gazeta do Povo e Folha de São Paulo, 

e a revista Veja3 –, entre os anos 1970 e 2000. Ao partir do pressuposto de que as práticas 

e  hábitos  de  leitura  são  adquiridos,  primeiramente  como  ensinamentos  escolares,  e, 

posteriormente,  no  cotidiano,  este  autor  (ibid)  indica  que  o  livro  se  instituiu  como  a 

forma de leitura “válida”, ou até mesmo como a única forma de ler.  

                                                            3  Enquanto  o  primeiro  é  o  principal  jornal  e  de  maior  circulação  no  estado  do  Paraná,  os  demais, 

respectivamente, jornal e revista, fazem parte do conjunto de periódicos mais lidos no Brasil. 

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O que se ensina e se aprende sobre leitura, leitor e livro na Feira do Livro de Porto Alegre/RS – uma análise a partir do jornal Zero Hora  Gisele Massola ‐ Maria Lúcia Castagna Wortmann 

 

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  Nas palavras do autor (CASTRO, 2007) 

Na verdade, o discurso sobre a centralidade do livro como fonte única da leitura  começa  na  família  –  até  pais  não‐leitores  cobram  que  os  filhos leiam  livros!  Fora  dela,  o  discurso  ganha  força  na  escola  e  é  também reiterado  constantemente  em  outros  ambientes  sociais  e, principalmente, nos jornais, nas revistas e na televisão (p. 48).  

  E  os  discursos  que  nos  posicionam  como  leitores,  igualmente  conferem 

centralidade ao livro, havendo uma variedade de produções que direta ou indiretamente 

abordam  a  temática  da  leitura,  do  livro  e  do  leitor,  tais  como  reportagens,  crônicas, 

quadros, notas, propagandas, entrevistas, charges, tiras de quadrinhos, tornando alguns 

discursos  dominantes/hegemônicos.  Para  Chartier  (1994),  a  centralidade  do  livro  pode 

também  ser  verificada  no  uso  recorrente  de  representações  desse  em  moedas,  em 

monumentos, na pintura e na escultura, situação em que esse é veiculado como símbolo 

de saber e autoridade.  

 

Quem  é o  leitor? Constituindo modos de  ser  leitor nas páginas do  Encarte Caderno da Feira do Livro 

Direcionando  o  olhar  para  as  considerações  apontadas,  e  refletindo  sobre  as 

análises que temos realizado ao problematizar o evento cultural Feira do Livro de Porto 

Alegre,  cujo  central  é  a  comercialização  de  livros,  percebe‐se  em  ação,  nessa  Feira, 

mecanismos/estratégias  que  dão  destaque  a  políticas  de  promoção  da  leitura  para  a 

formação de leitores, sendo essas estruturadas a partir de um discurso que reafirma ser a 

leitura a “mola propulsora” da civilidade e da cidadania. 

Passamos  a  apresentar  algumas matérias  e  uma  peça  publicitária  retiradas  dos 

suplementos  do  Caderno  da  Feira  do  Livro,  em  diferentes  datas,  indicando  a  ênfase 

atribuída  ao  discurso  que  explicita  atributos  e  práticas  desejáveis  para  a  produção  de 

sujeitos leitores. 

Destacamos que os Encartes que abordaram a 59ª Feira do Livro de Porto Alegre 

tiveram como mote norteador o  lema “Ler é poder”. Poder no sentido de potencializar 

ao  sujeito  leitor  ações  que  possibilitem  torná‐lo  capaz  de  “saber,  questionar,  pensar, 

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O que se ensina e se aprende sobre leitura, leitor e livro na Feira do Livro de Porto Alegre/RS – uma análise a partir do jornal Zero Hora  Gisele Massola ‐ Maria Lúcia Castagna Wortmann 

 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.10 

 

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conscientizar, encantar,  influenciar,  realizar,  imaginar, argumentar e descobrir4”,  sendo 

esses atributos configurados como desejáveis para a formação em potencial de um leitor. 

Ressaltamos  que  essa  mesma  expressão  compôs  peças  publicitárias  sobre  a  Feira, 

amplamente veiculadas em instâncias da mídia, nas quais imagens focalizavam livros que 

inspiraram grandes personalidades, tais como Sigmund Freud, John Lennon e Steve Jobs, 

cujos nomes, em formato de palavras cruzadas, se entrecruzam com os títulos dos livros 

por eles lidos. Aliás, esta propaganda publicitária tem o formato de um convite que, não 

apenas sugere ao público leitor conhecer as atividades desenvolvidas na programação da 

Feira, mas que o convoca a visitar outros espaços desse evento. Assim, ela conclama o 

público leitor a participar das atividades programadas e a “consumir” livros, enfatizando 

os  propósitos  arrolados  para  a  promoção  do  evento  –  a  ideia  de  democratização  ao 

acesso do livro e às ações de formação de leitores.  

Já nos Encartes, há variadas matérias, reportagens, manchetes, crônicas, quadros, 

notas,  entrevistas,  charges,  tiras  de  quadrinhos,  fotografias  que  apresentam  a 

programação da Feira. E a partir delas, evidenciam‐se algumas das direções que orientam 

as políticas de leitura destacadas nesta Feira. Pode‐se dizer que estas abrangem formação 

e  informação,  direcionam‐se  a  indicar  aprendizagens  de  leitura  marcadas  como  mais 

“eficazes”,  porque  são  trabalhadas  didaticamente,  e  que  vinculam,  ainda,  leitura  ao 

prazer de  ler, sempre perseguindo a  intenção de cativar os consumidores de  livros. Nos 

Encartes  veiculam‐se  discursos  que  promovem  a  leitura,  enquanto  prática  desejável,  e 

apregoa‐se  a  renovação  das  ações  de  valorização  dessa  prática,  bem  como  de 

estimulação  ao  reconhecimento  dos  diferentes  interesses  dos  leitores,  para  que  se 

proponham  eficazes  estratégias  que  os  levem  a  ler.  Aliás,  muitas  são  as  ações  e 

estratégias que apelam ao gosto, à sedução, à sensibilidade dos sujeitos, estando essas 

indicadas, nas  já referidas peças publicitárias e nos documentos oficiais de promoção da 

leitura,  que  incluem  campanhas  diversas,  Portarias  e  Leis  criadas  com  o  objetivo  de 

contemplar as demandas para a formação de uma população leitora.  

Encontramos algumas dessas estratégias na série “Para o seu  filho  ler”, que, ao 

lado da apresentação diária dos destaques da programação endereçada às  crianças na 

                                                            4Disponível em: http://www.feiradolivro‐poa.com.br/ Acesso em: fevereiro de 2014. 

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O que se ensina e se aprende sobre leitura, leitor e livro na Feira do Livro de Porto Alegre/RS – uma análise a partir do jornal Zero Hora  Gisele Massola ‐ Maria Lúcia Castagna Wortmann 

 

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Feira,  destacava  certas  obras  qualificando‐as  como  “boa  leitura”,  divulgando,  assim, 

livros  que  deveriam  ser  lidos  pelas  crianças.  Na  matéria  selecionada  da  edição  de 

03/11/2013, o destaque  foi para o escritor Ziraldo, que participou na 59ª edição da Feira, 

em duas atividades: a primeira uma sessão de autógrafos da obra A Menina das Estrelas, 

na  Esquina  das  Histórias;  e  a  segunda,  no  projeto  O  Autor  no  Palco,  organizado  pela 

Câmara  Rio‐Grandense  do  Livro  (CRL)  em  parceria  com  as  Secretarias  Estadual  e 

Municipal de Educação. Neste Projeto, escolas previamente  inscritas deviam  listar, por 

ordem  de  preferência,  autores  que  gostariam  de  encontrar  na  Feira,  sendo  essa  uma 

interessante  estratégia  de  promoção  de  leitura,  pois  as  crianças  deveriam  propor 

questionamentos  a  serem  feitos  ao  autor  da  obra  lida,  no  momento  do  encontro 

presencial. Na fotografia divulgada no Encarte, Ziraldo aparece posicionado no centro da 

imagem,  rodeado  de  crianças  que  vestem  camisetas,  que  reproduzem  a  figura  do 

personagem de uma de suas obras mais conhecidas – o menino maluquinho. Mais ao final 

da matéria, há uma advertência sobre a participação nas atividades – essa só é possível 

caso tenha ocorrido o agendamento antecipado dos grupos de escolares. A pergunta que 

finaliza  a matéria não deixa de  alertar  as  crianças  sobre o envolvimento de  sua escola 

neste projeto, pois ela questiona: “Será que a sua [escola] fez [o agendamento]?”.  

 

 Figura 1. Excerto do Encarte “Para o seu filho ler”. Fonte: Zero Hora, 3/11/ 2013, p. 2 

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X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.12 

 

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Os  apelos  contidos  no  texto  sugerem,  pelo  menos,  dois  entendimentos 

recorrentes:  primeiro,  os  sujeitos  devem  ser  cada  vez  mais  cedo  capturados  para 

desenvolver hábitos de  leitura, servindo  isso como uma garantia para que venham a ser 

incluídos no grupo de  sujeitos  leitores,  letrados,  cultos,  conscientes, esclarecidos e até 

mesmo capazes de mudar a sociedade; e segundo, a promoção de ações que colocam o 

livro  em  evidência,  ao mesmo  tempo  em  que  aproximam  o  leitor  da  chamada  “boa 

leitura”,  tornam  o  livro,  cada  vez mais,  um  bem  de  consumo  cultural  a  ser  produzido, 

divulgado, distribuído e vendido, principalmente ao público escolar. O  reconhecimento, 

por  parte  da  crítica,  da  importância  de  determinadas  obras,  faz  com  que  essas  sejam 

constantemente reeditadas e comercializadas. Além disso, a escola (e seus professores) é 

sobrecarregada  de  funções  pedagógicas,  estando,  entre  essas,  a  “missão”  de  formar 

novos  leitores e também de perpetuar autores de obras reconhecidas e consagradas da 

literatura.  Para  seduzir  um  público  cada  vez  mais  jovem,  escritores  e  editoras  têm 

investido  em  estratégias  diferenciadas  que  se  voltam  a  tornar  os  livros  produtos 

vendáveis. E, para tanto, são promovidos bate‐papos, palestras, mediações, sempre que 

possível com autores “renomados”, para dar sustentação às práticas de aproximação de 

leitores e escritores. 

Ainda pensando sobre os ensinamentos contidos no Encarte sobre os modos de 

tornar‐ se leitor, destacamos outra matéria divulgada em 08/11/2013. E essa é, tal como a 

anteriormente  comentada,  também  ilustrada por uma  fotografia que  apresenta, nesse 

caso, ao centro, uma figura feminina que segura um  livro aberto, em posição de  leitura, 

sendo essa seguida do seguinte título que está em destaque “Para ser  leitor, não basta 

saber  ler”.  Nessa  matéria  é  dado  destaque  a  resultados  de  uma  pesquisa  recente 

(configurada  como  inédita),  que  revela  índices/números  acerca  do  analfabetismo 

funcional, bem como de levantamentos que apontam hábitos de leitura do povo gaúcho. 

Tal pesquisa foi realizada pelo Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (IBOPE), 

a pedido da Câmara Rio‐Grandense do Livro (CRL), com o objetivo de entender o quanto 

o  leitor  compreende  daquilo  que  leu.  Como  a  matéria  informa,  o  público  alvo  da 

amostragem foram sujeitos  leitores maiores de 15 anos, que receberam em um primeiro 

momento uma revista fictícia e responderam a um questionário, contendo em torno de 

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X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.13 

 

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vinte  perguntas.  Constaram  da  primeira  parte  questões mais  simples,  que  indagavam 

sobre o  título e o conteúdo da capa, e da segunda, mais complexa, a  interpretação de 

textos, com exigência de elaboração de respostas escritas sobre o que fora lido.  

 

Figura 2. Excerto do Encarte “Para ser leitor, não basta saber ler”. Fonte: Zero Hora, 8/11/2013, p.2 

 

  É  importante observar que os  resultados numéricos dessa pesquisa  revelam  três 

aspectos  relativos  aos  índices  de  analfabetismo,  no  Rio  Grande  do  Sul,  através  do 

cruzamento dos dados  levantados: o primeiro é “positivo” e diz respeito ao fato de “os 

gaúchos levarem vantagem entre as pessoas que têm pleno entendimento do que leem! 

No  Brasil  esses  correspondem  a  25%,  e,  no  Estado,  a  30%.”  O  segundo  dado  é 

“preocupante”: “1/3 dos entrevistados com formação em curso superior não alcançou o 

índice  de  alfabetismo  de  Nível  3,  que  correspondia  ao  estipulado  como  “completo 

entendimento de textos longos”. E o terceiro é mais “esperançoso”, pois aponta que “o 

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O que se ensina e se aprende sobre leitura, leitor e livro na Feira do Livro de Porto Alegre/RS – uma análise a partir do jornal Zero Hora  Gisele Massola ‐ Maria Lúcia Castagna Wortmann 

 

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analfabetismo  funcional  diminui  quanto  menor  a  faixa  etária  considerada, 

correspondendo a 1% entre 15 e 24 anos”.  

Observando os  resultados explicitados,  ao menos uma das expressões  chama  a 

atenção – “os gaúchos  levam vantagem entre as pessoas que  têm pleno entendimento 

do  que  leem!”  Relativamente  a  isso,  ganham  destaque  conceitos  tais  como 

conscientização  e  problematização  aplicados  à  leitura  e  à  escrita,  configuradas  como 

ferramentas  essenciais  à  formação  de  cidadãos  capazes  de  exercerem  seus  direitos  e 

deveres de  forma plena. E  isso  implicaria  a  capacidade de  acessar  textos diversos, em 

situações variadas, bem como de com eles interagir e deles tirar o proveito necessário em 

diferentes  situações  da  vida.  A  leitura  –  do  texto  e  do  contexto  –  foi  marcada  em 

diretrizes para a formação de leitores, que estão alicerçadas em representações de leitura 

como  prática  redentora:  “para  ser  leitor  não  basta  apenas  saber  ler”,  é  necessário 

assumir  habilidades  que  possibilitem  interpretar,  relacionar,  argumentar,  descobrir, 

questionar, para tornar‐se um sujeito leitor pleno, crítico, cidadão e competente. Assim, a 

prática  da  leitura  possibilitaria  uma  ampliação  dos  limites  da  ação  política,  um  efetivo 

diálogo  e  o  “esclarecimento”.  Tal  como  está  explicitado  em  discursos  que  orientam 

documentos oficiais, concebe‐se a leitura, desse modo, como um “ato emancipatório”! E, 

na pesquisa, em relação a essa possibilidade, os leitores gaúchos estariam em condições 

privilegiadas por estarem acima da média nacional.  

Examinamos,  a  seguir,  mais  uma  peça  publicitária  veiculada  no  Encarte  em 

09/11/2013,  destacando  as  características  de  um  “sujeito  leitor”  nela  apontadas.  Nela 

apela‐se  para  que  o  leitor  se  torne,  também,  doador  de  suas  obras  –  solidário, 

desapegado – enfim, que compartilhe seus  livros para colaborar na formação de outros 

leitores. Esta peça publicitária, que esteve espalhada nos espaços internos da Feira, mas, 

também,  nos  jornais  e  em  outros  materiais  de  divulgação,  em  todo  o  Estado,  traz 

fotografias de escritores regionais conhecidos: Marta Medeiros, Fabrício Carpinejar e Luís 

Augusto  Fischer  (o  patrono  da  59º  edição  da  Feira),  semelhantes  às  utilizadas  em 

processos de  identificação –  frente e perfil. No  lado direito das  fotos, há uma  legenda 

com  a  seguinte  conclamação:  “Liberte  seus  autores da  estante. Doe  Livros. Postos de 

coleta na Feira do livro de Porto Alegre. Safepark, Panvel e Zaffari”.  

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O que se ensina e se aprende sobre leitura, leitor e livro na Feira do Livro de Porto Alegre/RS – uma análise a partir do jornal Zero Hora  Gisele Massola ‐ Maria Lúcia Castagna Wortmann 

 

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Esta  foi  uma  campanha  liderada  pelo  Banco  de  Livros  –  uma  iniciativa  da 

Federação  das  Indústrias  do  Rio  Grande  do  Sul  (FIERGS)  –  dentre  às  direcionadas  a 

estimular o hábito de ler, valendo‐se da doação/troca de livros entre leitores para colocar 

em circulação obras já lidas. Eis o chamamento: “basta levar um livro de casa, que você já 

leu, e  trocar por qualquer outro que esteja disponível nas prateleiras do estande. Não 

precisa pagar nem se cadastrar” (Zero Hora, 09 de novembro de 2013, p. 3). A ressalva é 

que a  troca só será válida entre  livros de obras  literárias, não sendo considerado outro 

suporte (revistas, jornais, gibis, histórias em quadrinhos, livros didáticos,...) como artefato 

de  leitura.  Cabe  referir  que  esta  campanha,  em  forma  de  convite,  também  convoca  a 

população não só a participar do Evento, Feira do Livro, mas a visitar o estande do grupo 

que edita o Encarte, localizado nas dependências da Feira.  

 

 

Figura 3. Excerto do Encarte campanha publicitária para doação de livros. Fonte: Zero Hora, 09/11/2013, p. 3 

 

Pode‐se  considerar  que  tais  apelos  fomentam  o  amor  ao  livro  através  do  seu 

compartilhamento, permitindo  experimentar  a  literatura, mas  também  atentando para 

uma dimensão socializadora, na qual o sujeito se integraria a uma comunidade de leitores 

com referências e cumplicidades mútuas – todos seriam apreciadores da leitura literária. 

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Pensando sobre concepções acerca da formação do leitor literário, que se inicia na escola 

e que  se  amplia para outras  instâncias, Colomer  (2007)  salienta que  a  leitura de obras 

especificamente literárias contempla aos menos três funções sociais: introduzir o leitor na 

cultura escrita e na leitura; desenvolver capacidade interpretativa que permita tanto uma 

socialização mais  rica  e  lúdica  dos  indivíduos,  quanto  a  experimentação  de  um  prazer 

literário  que  se  constrói  ao  longo  do  processo;  e  estimular  a  formação  de  cidadãos 

preparados para enfrentar a diversidade social e cultural do contexto atual.  

Ao  aproximar  esses  entendimentos  sobre  os  propósitos  de  estimular  a  leitura 

literária,  da  proposta  de  divulgação  expressa  na  campanha  publicitária  que  referimos, 

entendemos estar nessa explicitada a  intenção de “pôr obras  renomadas nas mãos de 

toda  a população”. E mais, de  tornar  cada  leitor  responsável pela  formação de outros 

leitores. 

  Mas  outra  interessante  estratégia  de  formação  de  leitores  está  proposta  no 

Encarte  de  13/11/2013.  Ela  diz  respeito  à  escrita  colaborativa  –  a  organização  de  uma 

História Coletiva –, da qual participaram dezenas de  leitores‐autores, a partir de desafio 

lançado pelo  escritor,  e  também  colunista do  jornal  Zero Hora,  Fabrício Carpinejar.  Ele 

convocou os leitores a darem continuidade à trama por ele inicializada e intitulada Diabo 

Verde, em um período de cinco dias. Carpinejar  iniciou uma história que se passava em 

uma  casa  impregnada  por  um  terrível  odor,  em  quatro  parágrafos.  A  história  e  cinco 

trechos  enviados  por  leitores  deram  continuidade  à  trama  cujo  desfecho  estava  em 

aberto. Ao final de cada dia, um trecho de até 1,4 mil caracteres, foi  divulgado através do 

site institucional do Grupo RBS (www.zerohora.com/feiradolivro2013), na aba dedicada à 

cobertura da Feira.  

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Figura 4. Excerto do Encarte “Experiência Coletiva”. Fonte: Zero Hora, 13/11/2013, p. 3 

 

A partir da proposta explicitada, e reproduzida no excerto acima, pode‐se pensar 

que o leitor capturado por tal desafio, não somente necessitaria estar imbuído do desejo 

de desenvolver o domínio de práticas de  leitura  –  ter domínio da  língua  escrita,  saber 

reconhecer  estruturas  textuais,  buscar  ampliar  o  conhecimento,  desenvolver  o 

hábito/gosto  pela  leitura  para  querer  ler,  por  exemplo  –,  mas,  também,  sentir‐se 

estimulado  a  desenvolver  atividades  de  escrita  individuais  e  coletivas,  que  lhe 

permitissem  experimentar  a  escrita de  contos, poemas,  fábulas, ou  como  no  exemplo 

destacado, de uma narrativa. A proposta envolveu levar os leitores a assumirem o papel 

de  escritores.  Esses  foram  estimulados  a  integrarem‐se  na  construção  da  trama,  na 

indicação e  composição dos personagens, bem  como  incitados a  se embrenharem nos 

enredos, buscando resoluções para as situações narradas. Certamente tal experiência de 

escrita visa aumentar a conexão entre leitura e escrita, ao possibilitar que o leitor inclua a 

sua  produção  textual  no  texto  de  um  autor  já  reconhecido.  Ou  seja,  tal  experiência 

permite  o  trânsito  na  dimensão  criativa  do  ato  de  escrever,  permitindo  ao  sujeito 

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anteriormente posicionado apenas como leitor a descoberta da força expressiva de seus 

próprios textos.  

Cabe  registrar,  ainda,  relativamente  a  essa  proposta  de  escrita  coletiva,  os 

comentários de dois participantes que tiveram suas narrativas selecionadas: o  jornalista 

Paulo Roberto e a uma dona de casa Denise Flores, cujos comentários acerca do desafio 

de  participar  dessa  experiência,  transcrevemos  a  seguir.  Disse  o  jornalista:  “(...)  logo 

pensei em colocar mais personagens para ampliar as possibilidades de desfecho. E, como 

o  cheiro  era  tão  diferente,  achei  que  ele  só  poderia  ser  sobrenatural”  (Zero  Hora, 

13/11/2013,  p.  2).  Já  a  dona  de  casa  expôs:  “aquela  altura,  duas  coisas  tinham  que  ser 

resolvidas: de onde estava vindo o cheiro e o que estaria causando. Como o teor estava 

beirando  o  fantasioso,  escolhi  o  porão  da  casa  que  remete  a  histórias  sobrenaturais” 

(Zero  Hora,  13/11/2013,  p.  2).  Além  disso,  ambos  encerram  a  matéria  externando  sua 

satisfação de terem participado de um desafio que lhes oportunizou dividir um espaço de 

escrita com um escritor local de quem se tornaram apreciadores e fãs. 

 

Algumas palavras finais 

Ao finalizar este texto voltamos a destacar que, apesar deste evento cultural – a 

Feira do Livro de Porto Alegre – ter como finalidade principal a comercialização e a venda 

de  livros,  nela  tem  sido  colocadas  em  ação,  em  cada  uma  das  edições,  um  conjunto 

variado de estratégias voltadas não, apenas, à convocação da população (e dos leitores) 

de diferentes  faixas etárias para circular por esse Evento, mas,  também, direcionadas à 

estimulá‐la a envolver‐se com uma ampla gama de atividades que incluem, por exemplo, 

mostras e exibições fotográficas, oficinas de criação  literária, palestras, entrevistas com 

autores, apresentações de grupos musicais diversos, sessões de autógrafos, mediações 

de leitura, debates, mesas redondas, exposições de pintura e escultura, entre outras. 

Pensando mais detidamente acerca do que se tem dito sobre os sujeitos  leitores 

através das páginas do suplemento Encarte da Feira, argumentamos, ao longo do texto, 

que  neles  são  destacadas  muitas  representações  sobre  leitura,  leitor  e  livro. 

Notadamente nas últimas edições deste Encarte, importantes estratégias de convocação 

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à  leitura  têm  sido  destacadas,  estando  entre  essas  o  oferecimento  de  leituras 

comentadas,  o  encontro  com  escritores  e  a  possibilidade  de  criação  de  textos 

desafiadoramente  coletivos.  Portanto,  para  além  da  possibilidade  de  formarem‐se 

consumidores de livros, o Encarte e as atividades que esse tem vinculado à Feira do livro 

tem ampliado as formas de estimulação dos hábitos de leitura. Assim, mesmo que a Feira 

cada vez mais amplie o oferecimento à população de uma variada gama de produtos da 

cultura que incluem outras modalidades de vivenciá‐la, o livro e a leitura não deixaram de 

ser as grandes estrelas deste acontecimento  já  tão  ligado à vida do povo gaúcho.   E as 

estratégias  que  tão  brevemente  focalizamos  neste  texto  possuem  uma  parte 

considerável de responsabilidade nisso.  

 

 

Referências  

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X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.20 

 

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