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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO A DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, pela Defensora Pública que esta subscreve, com endereço profissional para intimação pessoal, conforme determina o artigo 128, inciso I da Lei Complementar 80/94, na Av. Santos Dumont, 1535, Ferraz de Vasconcelos/SP, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fulcro no artigo 5º, incisos LXVIII e LXXVII, da Constituição da República e artigos 647 e seguintes do Código de Processo Penal, impetrar a presente ordem de HABEAS CORPUS com PEDIDO LIMINAR Av. Santos Dumont, 1535 - Ferraz de Vasconcelos/SP – CEP: 08531- 100 – Tel.: (11) 4678-3076. 1

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

A DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, pela

Defensora Pública que esta subscreve, com endereço profissional para intimação

pessoal, conforme determina o artigo 128, inciso I da Lei Complementar 80/94, na Av.

Santos Dumont, 1535, Ferraz de Vasconcelos/SP, vem, respeitosamente, à presença de

Vossa Excelência, com fulcro no artigo 5º, incisos LXVIII e LXXVII, da Constituição da

República e artigos 647 e seguintes do Código de Processo Penal, impetrar a presente

ordem de

HABEAS CORPUS com PEDIDO LIMINAR

em favor de JEAN ANDERSON TEIXEIRA SANTOS, RG n.º

38845050-SP, E WESLEY CARDOSO NOGUEIRA, RG n.º 55161886-SP, ambos

devidamente qualificados nos autos do processo de apuração de ato infracional n.º

0010549-93.2014.8.26.0191, indicando com autoridade coatora MM. Juiz de Direito

da 3ª Vara da Infância e Juventude do Foro Distrital de Ferraz de Vasconcelos –

Comarca de Poá, o que faz lastreado nos motivos de fato e de direito doravante

delineados.

Av. Santos Dumont, 1535 - Ferraz de Vasconcelos/SP – CEP: 08531-100 – Tel.: (11) 4678-3076.1

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DOS FATOS

Os Pacientes estão sendo processados pela suposta

prática de atos infracionais equivalentes aos delitos previstos nos artigos 157, § 2º,

inciso II; 311 e 180 (por cinco vezes, na forma do art. 70), todos do Código Penal, pelos

fatos descritos e nas circunstâncias supostamente descritas na representação.

Em 5 de novembro foi decretada a internação provisória

de ambos, ocasião em que foram encaminhados para a Cadeia Pública de Mogi das

Cruzes, onde permanecem aguardando vaga para transferência para unidade da

Fundação Casa até a presente data.

No dia seguinte, foi realizada a audiência de

apresentação. Na ocasião, Jean explicou que, na data da apreensão, cortou o cabelo e

foi até a casa de Jonas. Wesley estava lá. Nesse momento, a policial adentrou a

residência, sem qualquer autorização, e efetuou a apreensão. Não viu peças de moto

na residência. Explicou ainda que a policial achou as carcaças no matagal, elas são

antigas, já estavam lá, são de uma antiga apreensão, em que a Polícia Civil não levou

tudo. Todo mundo do Raspadão via aquelas carcaças ali. O veículo Montana não

estava na casa do Jonas, nem no matagal. Confessou o roubo da Montana (fls. 44).

O representado Wesley também negou a receptação e os

outros delitos imputados, confessando a participação no roubo (fls. 45).

Diante da gravidade dos crimes imputados, considerando

que o crime mais grave em tese foi praticado em Suzano, o Magistrado a quo

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determinou a remessa dos autos à Comarca de Suzano, submetendo o recebimento da

representação à ratificação do juiz natural (fls. 43).

Sendo assim, considerando principalmente o excesso de

prazo na permanência dos adolescentes na Cadeia Pública, sendo que a Fundação Casa

já avisou que não dispõe de vaga para a imediata transferência deles, resta

evidenciado o constrangimento ilegal sofrido, razão pela qual interpõe-se o presente

remédio constitucional.

Eis a síntese dos fatos.

DO MÉRITO RECURSAL – DA ILEGALIDADE DA INTERNAÇÃO PROVISÓRIA

1. DO EXCESSO DE PRAZO NA CUSTÓDIA CAUTELAR DO PACIENTE EM CADEIA

PÚBLICA

Conforme se depreende das cópias acostadas, infere-se que os

adolescentes estão custodiados desde 04 de novembro, configurando, nesta data, o

OITAVO dia da permanências deles em repartição policial, em total afronta ao que

dispõe o art. 185 do Estatuto da Criança e do Adolescente:

Art. 185. A internação, decretada ou mantida pela autoridade

judiciária, não poderá ser cumprida em estabelecimento

prisional.

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§ 1º Inexistindo na comarca entidade com as características

definidas no art. 123, o adolescente deverá ser imediatamente

transferido para a localidade mais próxima.

§ 2º Sendo impossível a pronta transferência, o adolescente

aguardará sua remoção em repartição policial, desde que em

seção isolada dos adultos e com instalações apropriadas, não

podendo ultrapassar o prazo máximo de cinco dias, sob pena

de responsabilidade.

Desnecessária se mostra amplas exposições acerca dos graves

danos aos direitos individuais que o paciente sofre com a manutenção dessa situação,

tendo em vista que não só a Constituição Federal, como o Estatuto da Criança e do

Adolescente, e inúmeros documentos internacionais já ratificados pelo Brasil, expõem

um amplo rol de garantias aos jovens sob custódia estatal.

Ademais, não se pode olvidar também que o Estatuto da

Criança e do Adolescente faz menção expressa à ilegalidade da conduta de descumprir

prazo fixado em benefício do adolescente. Nesse sentido:

Art. 235. Descumprir, injustificadamente, prazo fixado nesta Lei

em benefício de adolescente privado de liberdade: Pena -

detenção de seis meses a dois anos.

Diante do tipo penal acima destacada, resta evidente que não

se trata de faculdade do Juízo a liberação do jovem quando não houver vaga para

que sua internação provisória seja cumprida em unidade da Fundação Casa. Desta

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feita, não há alternativa senão a imediata liberação do Paciente, sob pena de

consumação da citada figura típica.

Da mesma forma, também não se olvida da responsabilidade

do Estado para a garantia dos direitos do Paciente que, em razão de violação à

dispositivo legal expresso, encontra-se ilegalmente custodiado em repartição policial.

Nesse sentido, de rigor se mostra a necessidade da imediata liberação do paciente, sob

pena de responsabilidade civil objetiva do Estado.

Ainda que se tratasse de adulto custodiado, o poder punitivo

estatal não poderia se sobrepor aos direitos do cidadão, inclusive o direito

fundamental de ser tratado com dignidade. Todavia, em se tratando de adolescente, a

situação vai de encontro com toda a sistemática protetiva consolidada na Constituição

Federal com a adoção da doutrina da Proteção Integral e Prioridade Absoluta da

criança e do adolescente.

Por fim, no mesmo sentido de todas as alegações tecidas, cabe

ressaltar que no HC nº 2157541-77.2014.8.26.0000, interposto por esta Defensoria

Pública, o E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo entendeu que “Não sendo

providenciada a remoção no prazo legal (cinco dias), o adolescente deverá ser colocado

em liberdade, sob pena de responsabilidade. (...) Na impossibilidade de se atender

prontamente a determinação supra [transferência do adolescente para

estabelecimento que atenda ao disposto no artigo 123, do Estatuto da Criança e do

Adolescente], independentemente dos motivos, o paciente deverá ser colocado em

liberdade, sob pena de responsabilidade (art. 185, ECA) (grifo nosso).

Diante do exposto, estando os Pacientes aguardando vaga na

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Fundação Casa, custodiados há OITO DIAS em repartição policial, no momento, a

Cadeia Pública de Mogi das Cruzes, resta evidente o cerceamento ilegal de sua

liberdade, que poderá agravar-se ainda mais com a não concessão liminar da presente

ordem. Desta feita, requer-se a imediata colocação do adolescente em liberdade.

2. DA NULIDADE DA AUDIÊNCIA PELA AUSÊNCIA DE CITAÇÃO E NOTIFICAÇÃO

Ademais, no caso em tela, há de ser declarada nula a instrução,

por evidente violação ao direito de citação (pessoal) dos representados e de

notificação dos seus responsáveis legais.

Como se depreende dos autos (Doc. Anexo), os Pacientes

foram ouvidos pelo Ministério Público, a representação foi ofertada e a internação

decretada, e no dia seguinte foi realizada a audiência de apresentação, sem qualquer

comunicação prévia aos representados e sem notificação aos responsáveis legais.

Desta feita, resta evidente a violação ao direito à citação prévia e pormenorizada da

acusação, garantida no art. 111, do ECA, razão pelo qual o procedimento deve ser

declarado nulo.

Nesse sentido, é cediço que a citação é ato processual que tem

dupla finalidade: dar conhecimento ao réu dos fatos que lhe são imputados e seu

chamamento ao processo, para se ver processado e apresentar sua defesa. Esta dupla

finalidade só poderá ser alcançada se o réu for citado com antecedência razoável, a

fim de que lhe seja garantido prazo mínimo para preparar sua defesa contra os fatos

que lhe são imputados.

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Evidentemente, a ausência de citação prévia e pormenorizada

da acusação, como ocorrido nos autos, viola diretamente os princípios do contraditório

e da ampla defesa, sem os quais não se concebe um devido processo legal, única

hipótese aceitável em um Estado que se pretende Democrático de Direito. Ou seja,

sem que se dê ao acusado oportunidade para contradizer as acusações a ele

imputadas através de um prazo razoável para a tomada das medidas que entender

cabíveis, exercendo, com plenitude, seu direito à autodefesa, estar-se-á ressuscitando

a ideia de um processo inquisitivo, em que não se respeitam quaisquer garantias

individuais.

Nada há que se cogitar quanto ao fato de o Estatuto da Criança

e do Adolescente e o Código de Processo Penal serem silentes quanto ao prazo

razoável para a citação com antecedência, posto que, a jurisprudência, em processos

criminais, tem se posicionado no sentido de ser válida a citação quando feita nas 48

horas precedentes ao interrogatório (RT 534/392). Logo, o dispositivo é perfeitamente

aplicável aos procedimentos regulados no Estatuto da Criança e do Adolescente.

Portanto, considerando que o interrogatório (e a audiência de

apresentação, no que tange aos procedimentos da infância) constitui um

desmembramento do princípio do devido processo legal, não há como se aceitar a

validade da citação realizada na sala de audiência, segundos antes do início do

interrogatório, em evidente violação ao princípio constitucional da ampla defesa (art.

5º, LV, Constituição Federal). A conjunção dos fatores: a) imediatidade entre citação e

interrogatório; b) impossibilidade de preparar sua defesa - sem nenhuma dúvida,

violou o direito constitucional à ampla defesa do adolescente.

Nesse sentido a jurisprudência:

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“PROCESSO PENAL - PRAZO RAZOÁVEL ENTRE A CITAÇÃO DO

RÉU E SEU INTERROGATÓRIO - AUSÊNCIA DE DISPOSITIVO A

RESPEITO - Embora não haja dispositivo expresso a respeito, a

jurisprudência, com base no artigo 3º do Código de Processo

Penal, legitima a analogia com o artigo 192 do Código de

Processo Civil, para admitir que, se a citação ocorrer nas 24

horas antecedentes ao interrogatório do acusado, não há

cerceamento de defesa. Entretanto, 24 horas é prazo exíguo

para oportunizar ao acusado orientar-se sobre o conteúdo da

acusação e aconselhar-se com seu advogado. O prazo mínimo

razoável para que sejam garantidos os princípios

constitucionais do devido processo legal e da ampla defesa é de

48 horas. Ademais, se, como no caso ""sub judice"", há

indicativos fáticos de não se ter efetivado a citação pessoal do

paciente, que compareceu espontaneamente à audiência

designada para seu interrogatório, tem-se que apenas nesse

momento processual ocorreu sua citação. Se assim é, não se

deve admitir válida a citação no mesmo dia marcado para o

interrogatório judicial, vez que o réu não teve possibilidade

real de orientar-se acerca do posicionamento defensivo a

adotar, ou sequer de informar-se sobre a importância desse

ato processual, - o que, ademais, constitui flagrante violação

ao princípio constitucional da ampla defesa, pois o

interrogatório, desde o advento da Lei 10.792/03 é

consagrado como meio de defesa.” (TJMG, HC nº

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1.0000.07.463939-4/000, Rel. Hyparco Immesi, Dj. 01.03.2008 –

sem grifo no original).

Ademais, há a previsão contida no artigo 40, item 2, inciso II, da

Convenção sobre os Direitos da Criança adotada pela Assembleia-Geral das Nações

Unidas (Decreto Legislativo nº 11/90 e Decreto Presidencial nº 99710, de 21/11/90).

Referido dispositivo garante ao menor de dezoito anos "ser informado sem demora e

diretamente ou, quando for o caso, por intermédio de seus pais ou de seus

representantes legais, das acusações que pesem contra ele".

Ainda que se pudesse cogitar que o fato de o adolescente

estar acompanhado de sua defesa técnica no momento da audiência implicaria na

sanatória do vício de citação, o que não pode ser admitido, tendo em vista que não

se confundem os direitos à defesa técnica e a autodefesa, os representantes legais

do apelante sequer foram informados da apreensão e da realização da audiência de

apresentação do adolescente, e, da mesma forma, também não foram cientificados,

previamente, da acusação formulada.

Em situação semelhante o C. STJ já reconheceu a nulidade do

procedimento:

“HABEAS CORPUS. ATO INFRACIONAL EQUIPARADO A ROUBO

CIRCUNSTANCIADO (ARTIGO 157, § 2º, INCISO II, DO CÓDIGO

PENAL). AUSÊNCIA DE CITAÇÃO PARA AUDIÊNCIA DE

APRESENTAÇÃO. NULIDADE CARACTERIZADA. CONCESSÃO DA

ORDEM. 1. Os artigos 111, inciso I, e 184, § 1º, do Estatuto da

Criança e do Adolescente, em reforço ao conteúdo do artigo

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227, § 3º, inciso IV, da Constituição Federal, esclarecem a

obrigatoriedade de prévia cientificação do menor e de seus

pais ou responsável acerca do teor da representação

ministerial, com o objetivo de terem prévio conhecimento da

acusação formulada, garantindo-se, assim, a observância dos

postulados da ampla defesa e do contraditório. Doutrina. 2.

Na hipótese vertente, da leitura da decisão que recebeu a

representação, observa-se que o Juízo de origem não

determinou a citação do adolescente e de seus pais ou

responsável legal, tampouco notificou estes últimos sobre a

audiência de apresentação. 3. A simples apresentação do

menor para a audiência, à qual compareceu sua responsável

legal, não é o bastante para se entender como cumprida a

exigência de prévia ciência da acusação, tanto por ele quanto

por seus pais, motivo pela qual resta patente a configuração

da nulidade pela falta de citação.”. (STJ, HABEAS CORPUS Nº

147.069 – MG, Quinta Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, j.

16.09.2010 – sem grifo no original).

Assim, por todo o exposto, fica notória a nulidade do

procedimento e do ato processual (interrogatório) praticado em audiência de

apresentação, devendo esta ser declarada nula para todos os efeitos, bem como os

atos processuais subsequentes, devendo a instrução ser refeita e os Pacientes

imediatamente colocados em liberdade.

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Ressalta-se que, por se tratar de nulidade absoluta, é

irrelevante o momento processual em que arguidas (podendo até mesmo ser

reconhecidas de ofício), além de ser presumido o prejuízo engendrado aos Pacientes.

De modo retórico, cabe recordar que a Doutrina da Proteção

Integral revogou qualquer possibilidade de se reduzir garantias individuais, de

caráter material ou processual, no que diz respeito às crianças e adolescentes. Isso já

seria decorrência direta do artigo 5º, caput, da Constituição Federal, que traz o

princípio da igualdade, bem como seus incisos LIV (princípio do devido processo legal)

e LV (garantia do contraditório e ampla defesa aos acusados em geral, por todos os

meios e recursos a eles inerentes).

Como se não bastasse o Poder Constituinte ter trazido essas

garantias, para que nenhum Magistrado possa ter dúvidas, o próprio Estatuto da

Criança e do Adolescente trouxe previsões semelhantes. Em seu artigo 110 consta

expressamente que nenhum adolescente será privado de sua liberdade sem o devido

processo legal. Soma-se a isso o disposto no artigo 111, que garante ao adolescente a

igualdade na relação processual.

Por todo exposto, a irregularidade ocorrida, além do evidente

prejuízo à defesa do paciente, violou a regra constitucional do devido processo legal,

e as garantidas expressas no art. 111, incisos I, II e VI, do Estatuto da Criança e do

Adolescente.

Ademais, cabe recordar que por tratar-se de medida gravosa, a

custódia cautelar é subsidiária, só se justificando nos casos de comprovada

excepcionalidade. Nesse sentido há disposição expressa nas Regras Mínimas das

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Nações Unidas para a Administração da Justiça da Infância e Juventude (Regras de

Beijing):

“13. Prisão preventiva.

13.1 Só se aplicará a prisão preventiva como último

recurso e pelo menor prazo possível.

13.2 Sempre que possível, a prisão preventiva será

substituída por medidas alternativas, como a estrita

supervisão, custódia intensiva ou colocação junto a uma

família ou em lar ou instituição educacional.”

Por todo o exposto, a presente ordem deve ser

liminarmente provida, para decretar a imediata liberação dos Pacientes pelo excesso

de prazo de permanência em repartição policial, e a fim de que os atos processuais

efetivados na Comarca de Ferraz de Vasconcelos, a partir da audiência de

apresentação, sejam declaradas nulos por evidente infração legal.

DA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA

Considerando todo o conteúdo exposto, estão presentes

os requisitos que autorizam a concessão, em caráter liminar, da ordem de habeas

corpus, com o fim de relaxar a internação provisória da paciente. Senão vejamos.

A matéria é exclusivamente de direito. A fumaça do bom

direito reside, além dos documentos já acostados (Cópia integral dos autos), em todas

as alegações expendidas. Trata-se de simples subsunção do fato à lei, que impõe que

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toda interação provisória seja devidamente fundamentada. Exceções não podem ser

admitidas no que tange ao respeito aos direitos e garantias de crianças e adolescentes

submetidos a processo socioeducativo, sob pena de violação, não só do devido

processo legal, como ao próprio Estado Democrático de Direito.

Negada a antecipação da tutela recursal, não se

possibilitaria um verdadeiro acesso à Justiça por parte dos jovens, posto que,

considerando-se o tempo necessário para o julgamento do mérito da presenta ação,

não há dúvidas que, confrontado ao exíguo tempo do procedimento de apuração de

ato infracional, esta, sem qualquer dúvida, será julgada prejudicada se não provida

liminarmente.

O acesso à justiça, referido na Constituição em seu artigo

5º, XXXV, não implica tão-somente um acesso vazio aos meios judiciais de impugnação,

sem qualquer possibilidade de resultado prático, afinal, de nada adianta ter garantido

formalmente o direito se, materialmente, não será acessado.

Por sua vez, o perigo na demora também é evidente, pois,

como dito, os pacientes estão ilegalmente privados não só do direito fundamental à

liberdade, como também de seus direitos constitucionais à educação, convivência

familiar e comunitária, dentre outros.

Diante do exposto, requer-se a reconsideração liminar da

decisão que confirmou a internação provisória dos paciente, em respeito, também, à

proteção integral que eles fazem jus.

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DOS PEDIDOS

Ante todo o exposto, requerer-se:

a) o conhecimento e provimento do pedido para antecipar

o efeito da ordem pretendida, a fim de que seja relaxada a internação provisória

diante da ilegalidade da permanência dos pacientes na Cadeia Pública de Mogi das

Cruzes por prazo SUPERIOR ao legal;

b) a intimação do I. representante do Ministério Público para

intervir no feito;

c) ao final, declarar nulos os atos ocorridos na audiência de

apresentação, assim como todos os atos subsequentes, por violação ao direito de

citação dos pacientes e da garantia legal e constitucional de notificação aos pais e/ou

responsáveis;

d) com fundamento no art. 128, I da LC nº 80/94, seja esta

Defensora Pública intimada pessoalmente de todos os atos e decisões praticados no

feito, mesmo que tal se dê mediante carta, com aviso de recebimento, a ser enviada

em seu nome na sede da Defensoria Pública em Ferraz de Vasconcelos.

Termos em que,

Pede deferimento.

Ferraz de Vasconcelos, 11 novembro de 2014.

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RAFAELA SOARES MOURÃO SOUSA

1a Defensoria Pública de Ferraz de Vasconcelos

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