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CENTRO DE EMPREGO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL DE VILA REAL SERVIÇO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL Designação da Ação: Técnico Comercial 06 VP8 – Procurar Emprego Refletir sobre condições de Trabalho Texto 1: É cada vez maior o número de portugueses sujeitos a trabalho escravo no seu próprio país CARLOS DIAS Trabalho clandestino deixou de se circunscrever ao Alentejo e já é prática nas explorações agrícolas do centro do país e até nas quintas do Douro, diz a CNA. Na última intervenção realizada no dia 30 de Janeiro em vários locais de Grândola e Alcácer do Sal, a Unidade Local do Litoral e Baixo Alentejo da Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) de Beja, este organismo foi confrontado com situações de trabalho não declarado em locais onde anteriormente já tinha sido detectada a mesma ilegalidade. Ao PÚBLICO, a ACT diz que “está aumentar o número” de trabalhadores portugueses a executar tarefas nas explorações agrícolas alentejanas em regime de clandestinidade. Em 2013 e 2014, adianta a Autoridade, e sobretudo nas vindimas, na apanha da azeitona e no abate de árvores, são portugueses a maioria dos trabalhadores a executar as tarefas em situação ilegal em herdades já anteriormente visitadas. Com esta iniciativa, e apesar de já não beneficiar do efeito surpresa, os inspectores do ACT detectaram ainda várias irregularidades, conseguindo identificar nesta situação quatro empregadores com um total de 19 trabalhadores, dos quais cinco de nacionalidade romena. Destes, apenas dois tinham número de beneficiário da segurança social. Dos 14 trabalhadores portugueses, dois estão declarados como trabalhadores por conta de outrem, quatro são falsos recibos verdes e oito são trabalhadores não declarados. Realizada uma consulta à base de dados da Segurança Social constatou-se que existem trabalhadores que se encontram na condição de clandestinos há mais de seis anos. As entidades empregadoras que actuam à margem da lei, vão ser sujeitos a “procedimentos coercivos", adianta a ACT no balanço desta operação que ontem divulgou. A ACT não esconde a sua preocupação pelo “aumento das situações que andam na fronteira do trabalho escravo” que inclui falta de pagamento de salários, retenção de documentos e frequentemente maus tratos. “Esta realidade é muito grave e com reflexos directos em termos fiscais e contributivos para a Segurança Social” frisa a ACT.

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VP 8 Emigração + Arroz do Céu

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Page 1: VP 8 Emigração + Arroz do Céu

CENTRO DE EMPREGO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL DE VILA REAL SERVIÇO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL

Designação da Ação: Técnico Comercial 06VP8 – Procurar Emprego

Refletir sobre condições de Trabalho

Texto 1: É cada vez maior o número de portugueses sujeitos a trabalho escravo no seu próprio paísCARLOS DIAS 

Trabalho clandestino deixou de se circunscrever ao Alentejo e já é prática nas explorações agrícolas do centro do país e até nas quintas do Douro, diz a CNA.Na última intervenção realizada no dia 30 de Janeiro em vários locais de Grândola e Alcácer do Sal, a Unidade Local do Litoral e Baixo Alentejo da Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) de Beja, este organismo foi confrontado com situações de trabalho não declarado em locais onde anteriormente já tinha sido detectada a mesma ilegalidade.Ao PÚBLICO, a ACT diz que “está aumentar o número” de trabalhadores portugueses a executar tarefas nas explorações agrícolas alentejanas em regime de clandestinidade. Em 2013 e 2014, adianta a Autoridade, e sobretudo nas vindimas, na apanha da azeitona e no abate de árvores, são portugueses a maioria dos trabalhadores a executar as tarefas em situação ilegal em herdades já anteriormente visitadas.Com esta iniciativa, e apesar de já não beneficiar do efeito surpresa, os inspectores do ACT detectaram ainda várias irregularidades, conseguindo identificar nesta situação quatro empregadores com um total de 19 trabalhadores, dos quais cinco de nacionalidade romena. Destes, apenas dois tinham número de beneficiário da segurança social.Dos 14 trabalhadores portugueses, dois estão declarados como trabalhadores por conta de outrem, quatro são falsos recibos verdes e oito são trabalhadores não declarados.Realizada uma consulta à base de dados da Segurança Social constatou-se que existem trabalhadores que se encontram na condição de clandestinos há mais de seis anos. As entidades empregadoras que actuam à margem da lei, vão ser sujeitos a “procedimentos coercivos", adianta a ACT no balanço desta operação que ontem divulgou.A ACT não esconde a sua preocupação pelo “aumento das situações que andam na fronteira do trabalho escravo” que inclui falta de pagamento de salários, retenção de documentos e frequentemente maus tratos. “Esta realidade é muito grave e com reflexos directos em termos fiscais e contributivos para a Segurança Social” frisa a ACT.http://www.publico.pt/local/noticia/e-cada-vez-maior-o-numero-de-portugueses-sujeitos-a-trabalho-escravo-no-seu-proprio-pais-1623469

Texto 2 - Portugal tem cerca de 1400 escravos. Quase 30 milhões de pessoas vivem  como escravos em todo o mundo, perto de metade das quais na Índia, segundo a organização dos direitos humanos Walk Free Foundation. 

Alexandre Costa |

Portugal surge próximo do fim da lista dos países com mais casos de escravatura, está em 147º lugar entre 162. Ainda assim, tem 1368 escravos, segundo o "Índice da Escravatura Moderna" hoje divulgado pela Walk Free Foundation, organização de direitos humanos sediada na Austrália. No total, a organização calcula que quase 30 milhões de pessoas vivam em condições de escravatura em todo o mundo, uma parte muito significativa das quais em países de economias emergentes.A Índia surge destacada na lista dos dez países com mais pessoas a viverem como escravas, com cerca de 14 milhões de pessoas, seguida pela China com quase três milhões e pelo Paquistão com cerca de dois milhões. Seguem-se a Nigéria, Etiópia, Rússia, Tailândia, República Democrática do Congo, Myanmar e o Bangladesh.Estes dez países reúnem 76% das 29,8 milhões de pessoas que vivem como escravas em todo o mundo."Atualmente algumas pessoas continuam a nascer como escravas por hereditariedade, uma impressionante e dura realidade, em especial em algumas zonas de África Ocidental e do Sul da Ásia", refere a primeira edição do "Índice da Escravatura Moderna", que deverá passar a ser publicado anualmente.Moçambique surge como um caso preocupante

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A escravatura moderna inclui diversos tipos de trabalhos forçados como servidão por dívida, casamentos forçados e exploração de crianças, nomeadamente em países com conflitos armados.Entre os países lusófonos, Moçambique aparece com o maior número absoluto, com uma população escrava estimada de mais de 173 mil, destacado entre o grupo de países com um índice especialmente preocupante.A lista dos países com maior prevalência de escravatura, tendo em conta a totalidade da sua população, é encabeçada pela Mauritânia, seguida pelo Haiti, Paquistão, Índia e Nepal.Cabo Verde é o país lusófono que regista maior prevalência, surgindo nesta lista em 15º com cerca de 4 mil pessoas, seguido pela Guiné-Bissau em 20º com mais de 12 mil, por Moçambique 35º com mais de 173 mil pessoas, pelo Brasil em 94º com perto de 210 mil e por Angola em 116º com perto de 17 mil.

http://expresso.sapo.pt/portugal-tem-cerca-de-1400-escravos=f836289#ixzz3BonHel00

Texto 3 - Os Empregos Mais Bem Pagos em Portugal

Quais são os empregos mais bem pagos em Portugal? A crise afeta todos os sectores e empresas, mas continuam a existir, de facto, empregos bem pagos em Portugal, onde a remuneração ultrapassa de longe o salário mínimo, havendo mais procura de profissionais do que oferta.

Engenharias tecnológicas e de produçãoOs engenheiros das novas tecnologias e sistemas de informação começam logo no início de carreira a ganhar de 800 a 1.200€. Com mais experiência atingem dos 3 aos 5 mil euros por mês. São funções especializadas e cujas limitações salariais são mais flexíveis de muita procura.BancaOs diretores de topo chegam a auferir 7 ou 8 mil euros por mês de remuneração base, detendo ainda uma remuneração variável elevada, com bónus dependentes dos resultados.Distribuição e TelecomunicaçõesEmbora fiquem abaixo das remunerações da banca os valores rondam os cinco, seis mil euros mensais.FinançasNo sector das finanças existe grande variação de remunerações mediante os anos de experiência. Um auditor financeiro que tenha até 3 anos de trabalho aufere anualmente, à volta de 11 mil euros, sendo que, tendo mais de 3 anos, passa a receber mais do dobro: cerca de 22.400€.Marketing EstratégicoA perspetiva de crescimento à escala global das empresas portuguesas leva a uma maior preocupação em criar marcas também elas mundiais. Assim os profissionais especializados e já com experiência no mercado são bem remunerados pelos seus serviços.SaúdeOs médicos de especialidade, como cirurgiões ou mesmo os dentistas, estão no topo das profissões

mais bem pagas. Quando se alcança um dado estatuto deixam até de obedecer a valores de mercado.Advogados e JuízesA par dos médicos estão os advogados que atingindo determinado estatuto alcançam valores elevados, sendo uma profissão onde a remuneração varia imenso também consoante a experiência. Os juízes por sua vez chegam a receber entre 4 a 7 mil euros mensais.Pilotos e Controladores AéreosOs pilotos de aviação civil auferem cerca de 8 mil euros e os controladores de tráfego aéreo 5 mil. São profissões exigentes a nível pessoal, mental e físico.Investigação CientíficaA procura de portugueses licenciados em áreas científicas e as constantes necessidades de investigação e pesquisa levam a remunerações altas neste sector.Funções técnicas especializadasAs funções técnicas especializadas (carpinteiros, canalizadores, eletricistas) são igualmente muito procuradas, e o nível de escolaridade e formação dos portugueses é cada vez maior, diminuindo a oferta nestas áreas sempre de enorme saída.Esta lista dos empregos mais bem pagos em Portugal foi elaborada com base em estudos salariais de empresas consultoras como a Hay Group e a Page Personnel.

http://www.economias.pt/os-empregos-mais-bem-pagos-em-portugal/

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Texto 4 - 10 Estágios que Pagam melhor do que o teu trabalho Sara Sousa Carreiras 

Prepara-te, pois saber o que estes estágios pagam será o suficiente para cuspires o teu café. A Glassdoor.com, uma plataforma onde as pessoas podem compartilhar anonimamente as vantagens e desvantagens do seu local de trabalho, acaba de lançar a lista dos estágios mais bem pagos de 2014. A maior parte deles fazem parte de áreas como tecnologia – como já era de esperar. Verifica quais as empresas que integram o top 10 e o que os seus estagiários têm a dizer sobre a experiência:

10. Apple: Base média de salário mensal: €4.156O que os Estagiários dizem: “Além de fornecer alojamento gratuito (que era, no pior dos casos, a 15 minutos de carro do trabalho) ou uma bolsa de habitação de 726€, algumas equipas oferecem gratuitamente almoços/jantares para os empregados, e também temos benefícios, como o seguro de saúde, a adesão a centros de fitness, descontos em produtos, etc.”9 . Google: Base média de salário mensal: €4.334O que os Estagiários dizem: “Eles pagaram o alojamento durante todo o estágio. Eu aprendi muito com os engenheiros e realizei imenso trabalho em rede.”8 . Exxon Mobil: Base média de salário mensal: €4.336O que os Estagiários dizem: “Desenvolvimento profissional numa empresa Fortune 5.”7 . Ebay Inc.: Base média de salário mensal: €4.448O que os Estagiários dizem: “O melhor lugar para começar a tua carreira. Boa visibilidade para os gerentes de nível superior.”6 . Microsoft: Base média de salário mensal: €4.457O que os Estagiários dizem: “O programa de estágio é muito bem organizado. Asseguram a habitação, aluguer de carros, bem como eventos apenas para estagiários.”5 . Facebook: Base média de salário mensal: €4.511O que os Estagiários dizem: “Os benefícios e salários são, obviamente, grandes, e já que é uma empresa bem conhecida, traduz-se num bom lugar para começar, se quiseres ser reconhecido noutras empresas de tecnologia e startups.”4. LinkedIn: Base média de salário mensal: €4.523O que os Estagiários dizem: “Excelentes benefícios. Pessoas simpáticas. Ambiente favorável ao trabalho.”3. Twitter: Base média de salário mensal: €4.931O que os Estagiários dizem: “Podes ter uma palavra a dizer em praticamente todas as decisões da empresa, serás generosamente compensado, e vais aprender uma tonelada de coisas.”2. VMware: Base média de salário mensal: €5.058O que os Estagiários dizem: “Compensação é a palavra-chave desta empresa, que oferece bons bónus e outras regalias.”1. Palantir: Base média de salário mensal: €5.094O que os Estagiários dizem: “O trabalho é motivado por uma missão real. Muito poucas pessoas estão lá apenas pelo dinheiro.”

http://www.empregopelomundo.com/carreiras/10-estagios-que-pagam-melhor-que-o-teu-trabalho/

Exercício:

1. Análise comparativa e contrastiva dos 4 textos.2. Noções-chave a retirar de cada um deles.3. Argumentação sobre o tema “Todos podem ser vítimas de trabalho escravo.4. Reflexão sobre os requisitos para chegar ao topo de uma carreira.

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Texto 5 – Literatura: José Rodrigues Miguéis - Arroz do Céu 

A. Exploração do títuloB. Construção de uma história com as imagens abaixo, retiradas do conto original.

C. Leitura expressiva do texto:

Ao longo dos passeios de Nova York, por sobre as estações e galerias do subway, abrem-se grandes respiradouros gradeados por onde cai de tudo: o sol e a chuva, o luar e a neve, luvas, lunetas e botões, papelada.chewing gum, tacões de sapatos de mulheres que ficam entalados, e até dinheiro. Às vezes, lá no fundo, no lixo acumulado ou em poças de água estagnada, brilham moedas de níquel e mesmo de prata. Os garotos ajoelham de nariz colado às grades, tentando lobrigar tesouros na obscuridade donde sopra um hálito húmido e oleoso e o cheiro dos freios queimados. Fazem prodígios de habilidade e obstinação para pescar as moedas perdidas. Alguns têm êxito nisso, mas depois engalfinham-se em disputas tremendas sobre a posse e a partilha do tesouro: nunca se sabe quem foi que viu primeiro.Outros, quando a colheita promete, chegam a arriscar nisso algum capital: juntam as posses, e entram dois, é quanto basta, no subway; uma vez lá dentro. trepam sub-repticiamente aos respiradouros, o que é uma difícil operação de acrobacia, para colher aquele dinheiro-de-ninguém, enquanto um ou mais camaradas vigilantes os vão guiando cá de fora. Também os há que entram sem pagar, por entre as pernas da freguesia e agachando-se por baixo dos torniquetes.

O limpa-vias trabalhava há muitos anos no subway, sempre de olhos no chão. Uma toupeira, um rato dos canos. Picava papéis na ponta de um pau com um prego, e metia-os no saco. Varria milhões de pontas de cigarros, na maioria quase intactos, de fumadores impacientes, raspava das plataformas o chewing gum odioso, limpava as latrinas, espalhava desinfectantes, ajudava a pôr graxa nas calhas, polvilhava as vias de um pó branco e misterioso, e todas as vezes que o camarada da lanterna soltava um apito estrídulo – lá vem o comboio! – ele encolhia-se contra a parede negra, onde escorriam águas de infiltração, na estreita passagem de serviço. Até já tinha ajudado a recolher pedaços de cadáveres, de gente que se atirava para debaixo dos trens, e a transportar os corpos exangues de velhos que de repente se lembravam de morrer de ataque cardíaco, nas horas de maior ajuntamento, uns e outros perturbando o horário e provocando a curiosidade casual e momentânea dos passageiros apressados. Sempre de olhos no chão, bisonho e calado, como quem nada espera do Alto, e não esperava. A vida dele vinha toda do chão imundo e viscoso. Nem sequer olhava a lívida claridade que resvala dos respiradouros para o negrume interior, onde tremeluzem

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lâmpadas eléctricas, entre as pilastras inumeráveis daquela floresta subterrânea metalizada: nunca lhos tinham mandado limpar. Eram provavelmente o domínio exclusivo de operários especializados, membros de outro sindicato, que ele não conhecia. Nem talvez soubesse que existiam os respiradouros. Era estrangeiro, imigrante, como tanta gente. não brincara nem vadiara na voragem empolgante das ruas da grande cidade, e vivia perfeitamente resignado à sua obscuridade. Devia aquele emprego a um camarada que era membro dum clube onde mandavam homens de peso, mas ele de política não entendia nada, nem fazia perguntas. Como tinha nascido na Lituânia, ou talvez na Estónia, só falava em monossílabos; e, debaixo da pátina oleosa e negra que o ar do subway nela imprimira com o tempo. a sua face era incolor e a raça indistinta. Antes disso tinha trabalhado em escavações, um «toupeira». Este emprego era muito melhor, embora também fosse subterrâneo. E não tinha que falar o inglês, que mal entendia.Ora, à esquina de certa rua, no Uptown, há uma igreja, a de São João Baptista e do Santíssimo Sacramento, a todo o comprimento de cuja fachada barroca e cinzenta os respiradouros do subway formam uma longa plataforma de aço arrendado. Os casamentos são frequentes, ali, por ser chique a paróquia e imponente a igreja. O arroz chove às cabazadas em cima dos noivos, à saída da cerimónia, num grande estrago de alegria. Metade dele some-se logo pelas grelhas dos respiradouros, outra parte fica espalhada nas placas de cimento do passeio. Depois dos casamentos, o sacristão ou porteiro da igreja, de cigarro ao canto da boca, varre o arroz para dentro das grades, por comodidade. Provavelmente é irlandês, o arroz não lhe interessa, nem se ocupa de pombos: pombos é lá com os italianos, que, apesar de se dizerem católicos, são uma espécie de pagãos. O que se derramou no pavimento da rua, lá fica: é com os varredores municipais.Volta e meia há casório, sobretudo no bom tempo, ou aos domingos. E um desperdício de arroz, não sei donde vem o costume: talvez seja um prenúncio votivo de abundância, ou um símbolo do «crescei e multiplicai-vos» (como arroz). A gente pára a olhar, e tem vontade de perguntar: «A como está hoje o arroz de primeira cá na freguesia?»Aquela chuva de grãos atravessa as grades, resvala no plano inclinado do respiradouro, e, se mão adere à sujidade pegajosa ou ao chewing gum (o bairro é pouco dado a mastigar o chicle), ressalta para dentro do subterrâneo, numa estreita passagem de serviço vedada aos passageiros.A primeira vez que viu aquele arroz derramado no chão, e sentiu os bagos a estalar-lhe debaixo das botifarras, o limpa-vias não fez caso; varreu-os com o resto do lixo para dentro do saco cilíndrico, com um aro na boca. Mas como ia agora por ali com mais frequência, notou que a coisa se repetia. O arroz limpo e polido brilhava como as pérolas de mil colares desfeitos no escuro da galeria. O homem matutou: donde é que viria tanto arroz? Intrigado, ergueu os olhos pela primeira vez para o Alto, e avistou a vaga luz de masmorra que escorria da parede. Mas o respiradouro, se bem me compreendem, obliquava como uma chaminé, e a grade, ela própria, ficava-lhe invisível do interior. Era dali, com certeza, que caía o arroz, como as moedas, a poeira, a água da chuva e o resto. O limpa-vias encolheu os ombros, sem entender. Desconhecia os ritos e as elegâncias. No casamento dele não tinha havido arroz de qualidade nenhuma, nem cru, nem doce, nem de galinha.Até que um dia, depois de olhar em roda, não andasse alguém a espiá-lo, abaixou-se, ajuntou os bagos com a mão, num montículo, e encheu com eles um bolso do macaco. Chegado a casa, a mulher cruzou as mãos de assombro: alvo, carolino, de primeira! Dias depois, sempre sozinho, varreu o arroz para dentro de um cartucho que apanhara abandonado num cesto de lixo da estação, e levou-o para casa. Pobres, aquela fartura de arroz enchia-lhes a barriga, a ele, à patroa e aos seis ou sete filhos. Ela habituou-se, e às vezes dizia-lhe: «Vê lá se hoje há arroz, acabou-se-nos o que tínhamos em casa.» Confiada naquele remedeio de vida!O limpa-vias nunca perguntou donde é que chovia tanto grão, sobretudo no bom tempo, pelo Verão, e aos domingos, que até parecia uma colheita regular. Embrulhava-o num jornal ou metia-o num cartucho, e assim o levava à família. Ignorando que lá em cima era a Igreja de São João Baptista e do Santíssimo Sacramento, e como tal de bom-tom, não sabia a que atribuir o fenómeno. Pelo lado da raiz, no  subway, os palácios, os casebres e os templos não se distinguem.

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E foi assim que aquela chuva benéfica, de arroz polido, carolino, de primeira, acabou por lhe dar a noção concreta de uma Providência. O arroz vinha do Céu, como a chuva, a neve, o sol e o raio. Deus, no Alto, pensava no limpa-vias, tão pobre e calado, e mandava-lhe aquele maná para encher a barriga aos filhos. Sem ele ter pedido nada. Guardou segredo – é mau contar os prodígios com que a graça divina nos favorece. Resignou-se a ser o objeto da vontade misericordiosa do Senhor. E começou a rezar-lhe fervorosamente, à noite, o que nunca fizera: ao lado da mulher. Arroz do Céu...O Céu do limpa-vias é a rua que os outros pisam.

in Gente da Terceira Classe, Lisboa, Editorial Estúdios Cor, 1971, pp. 67-71 (1ª ed. 1962)

D. Comparação do texto original com a história construída.E. Esquema com as categorias da narrativa neste conto.F. Aprofundamento da leitura:

G. Expressão oral: Explicar a ligação do conto ao tema em estudo e refletir sobre o papel da imigração / emigração na sociedade portuguesa.