voto que embasou aprovação das contas de luciana santos

35
VOTO – RECURSO IDENTIFICAÇÃO DO PROCESSO Número: 0902763-4 Órgão: Prefeitura Municipal de Olinda Modalidade: Recurso Tipo: Recurso Ordinário Exercício: 2002 Relator(a): Cons. em exercício Marcos Nóbrega Relator Orig. Cons. Teresa Duere Interessado(s): Luciana Barbosa de Oliveira Santos (Recorrente) Advogado(s): Cesar André Pereira da Silva (OAB: 19825PE) RELATÓRIO DO VOTO Trata-se de Recurso Ordinário interposto por Luciana Barbosa de Oliveira Santos, por conduto de advogado, contra a Decisão n.º 1108/08, proferida pela Primeira Câmara nos autos do processo de Prestação de Contas T.C. n.º 0301150-1, referente ao exercício de 2002. As contas da ex-prefeita de Olinda foram julgadas irregulares e, após o julgamento dos embargos de declaração oposto pela interessada, Processo TC nº 0806636-0, remanesceram as seguintes máculas: 1. Descumprimento do limite expresso no art. 212 da Constituição Federal (21%); 2. Descumprimento do art. 2º da lei nº 9.424/96, tendo em vista a não aplicação integral dos recursos do FUNDEF; 3. Descumprimento do artigo 72 da lei de Responsabilidade Fiscal; 1

Upload: giovanni-sandes

Post on 20-Jan-2017

728 views

Category:

News & Politics


2 download

TRANSCRIPT

Page 1: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

VOTO – RECURSO

IDENTIFICAÇÃO DO PROCESSO

Número: 0902763-4Órgão: Prefeitura Municipal de OlindaModalidade: RecursoTipo: Recurso Ordinário Exercício: 2002 Relator(a): Cons. em exercício Marcos NóbregaRelator Orig. Cons. Teresa DuereInteressado(s): Luciana Barbosa de Oliveira Santos

(Recorrente)Advogado(s): Cesar André Pereira da Silva (OAB: 19825PE)

RELATÓRIO DO VOTO

Trata-se de Recurso Ordinário interposto por Luciana Barbosa de Oliveira Santos, por conduto de advogado, contra a Decisão n.º 1108/08, proferida pela Primeira Câmara nos autos do processo de Prestação de Contas T.C. n.º 0301150-1, referente ao exercício de 2002.

As contas da ex-prefeita de Olinda foram julgadas irregulares e, após o julgamento dos embargos de declaração oposto pela interessada, Processo TC nº 0806636-0, remanesceram as seguintes máculas:

1. Descumprimento do limite expresso no art.

212 da Constituição Federal (21%);

2. Descumprimento do art. 2º da lei nº

9.424/96, tendo em vista a não aplicação

integral dos recursos do FUNDEF;

3. Descumprimento do artigo 72 da lei de

Responsabilidade Fiscal;

4. Descumprimento do limite expresso no art.

29-A da Constituição Federal, cujo repasse a

maior de duodécimos alcançou o valor de 0,6%;

5. Ausência de retenção na fonte de

contribuições previdenciárias devidas ao INSS;

1

Page 2: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

6. Existência de despesas sem licitação para

contratar empresa para bloqueio de ruas e

assentamento de tubos de concreto.

O Recurso Ordinário foi interposto em 20/05/2009 (fls. 01 a 27), sendo complementado inicialmente em 27/08/2009 (fls. 35 a 38), após o que os autos foram remetidos à equipe técnica a pedido do Ministério Público de Contas (fls. 30 a 32).

Na exordial de fls. 01 a 27, a requerente requer o provimento do Recurso para, reformando a decisão de primeira instância, julgar regulares com ressalvas as contas da recorrente, relativas ao exercício de 2002.

Elaborada Nota Técnica de Esclarecimento (fls. 39/43), abordando especificamente o capítulo do recurso relativo aos gastos com manutenção e desenvolvimento do ensino, foi emitido, em seguida, o Parecer MPCO n.º 515/2010 (fls. 46/61) acerca das questões até então levantadas. O referido parecer opina pelo provimento parcial do recurso para afastar as máculas referidas nos itens 2, 5 e 6 acima, mantendo o julgamento pela rejeição das contas, em função das irregularidades remanescentes.

Em 15/12/2010, a interessada requereu a esta Corte de Contas a juntada de documentação aos autos, bem como a concessão de prazo para manifestar-se a respeito da Nota Técnica de Esclarecimento (fls. 64). Foram acostadas, então, às fls. 68/80 e 82/84, as peças complementares ao presente Recurso Ordinário, protocoladas neste Tribunal de Contas em 10/01/2011 e em 09/02/2011, respectivamente, que impugnaram as irregularidades consideradas remanescentes pelo Parecer MPCO n.º 515/2010: descumprimento do limite expresso no art. 212 da Constituição Federal; descumprimento do artigo 72 da Lei de Responsabilidade Fiscal; e descumprimento do limite expresso no art. 29-A da Constituição Federal, com repasse a maior dos duodécimos na ordem de 0,6%.

Foi elaborado, então, o Parecer MPCO n.º 205/2012 (fls. 131/150), que manteve o opinativo pela irregularidade das contas, em função do descumprimento do limite expresso no art. 212 da Constituição Federal e do descumprimento do limite insculpido no art. 29-A da Constituição Federal. Quanto à irregularidade relativa ao descumprimento do art. 72 da Lei de Responsabilidade Fiscal, tendo em vista a apresentação de novo documento (fls. 85/130), o opinativo ministerial sugeriu que os autos fossem submetidos à equipe

2

Page 3: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

técnica para verificar as informações trazidas pela recorrente e manifestar-se sobre o ponto ora em evidência (fls. 143).

Em 07/03/2013, foi protocolada nesta Corte de Contas nova peça complementar ao presente Recurso Ordinário (fls. 157/159), contestando a irregularidade relativa ao descumprimento do limite mínimo de aplicação de recursos no ensino (art. 212 da Constituição Federal), acompanhada de farta documentação (fls. 160/436). Em seguida foi elaborado Relatório Complementar de Auditoria (fls. 438/445), por determinação do Relator (fls. 156), concluindo pela inconsistência da argumentação do recorrente e definindo em 20,70% o percentual da receita municipal aplicada em gastos com manutenção e desenvolvimento do ensino.

Após devidamente notificada do Relatório Complementar (fls. 448), a interessada apresentou defesa (fls. 450/457), protocolada nesta Corte de Contas em 27/06/2013, sem, entretanto, acostar nenhuma documentação.

Em 10/09/2013, foi protocolada pela recorrente nova peça complementar (fls. 462/464), acompanhada de documentação (fls. 465/481).

Ao fim, por determinação do Relator (fls. 482), foi emitida Nota Técnica de Esclarecimento (fls. 484/485), a fim de atender o item 4.b do Parecer MPCO n.º 205/2012 (fls. 150), a respeito do descumprimento do art. 72 da Lei de Responsabilidade Fiscal, irregularidade analisada no item 3.2 do referido opinativo ministerial.

Por meio do despacho às fls. 488, os autos foram novamente encaminhados ao Ministério Público de Contas para emissão de parecer complementar, tendo sido emitido o Parecer do MPCO nº 436/2014 (fls. 489/504), da lavra do Procurador Guido Monteiro.

A Prefeitura Municipal de Olinda também interpôs Recurso Ordinário, protocolado nesta Corte de Contas em 21/05/2009 (Processo T.C. n.º 0902782-8), contra a Decisão n.º 1108/08, requerendo sua anulação, sob a alegação de que o referido julgado teria imputado débito ao município, sem que o ente estatal fosse notificado para apresentar defesa, o Pleno deste Tribunal julgou pelo não provimento do referido recurso por meio do Acórdão T.C. nº 30/2016, publicado em 26/01/2016.

O processo vertente foi redistribuído para minha relatoria em 20/05/2016.

3

Page 4: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

É o relatório.

VOTO

O recurso é tempestivo e interposto por parte legítima. Deve, portanto, ser admitido.

Vale destacar que, em homenagem ao princípio da unicidade recursal, o processo TC nº 0902782-8, acima mencionado, não poderia ter sido conhecido, vez que protocolado após a interposição do presente recurso. No caso em tela, é certo que a recorrente não pode invocar prejuízo, vez que deu causa mediata à nulidade ao interpor uma segunda peça recursal. Contudo, não se pode deixar de reconhecer a prevalência do recurso ora em julgamento. Trata-se de questão de ordem pública, e, portanto, pode ser invocada de ofício.

Após o julgamento dos embargos de declaração oposto pela interessada, Processo TC nº 0806636-0, remanesceram as seguintes máculas:

1. Descumprimento do limite expresso no art.

212 da Constituição Federal (21%);

2. Descumprimento do art. 2º da lei nº

9.424/96, tendo em vista a não aplicação

integral dos recursos do FUNDEF;

3. Descumprimento do artigo 72 da lei de

Responsabilidade Fiscal;

4. Descumprimento do limite expresso no art.

29-A da Constituição Federal, cujo repasse a

maior de duodécimos alcançou o valor de 0,6%;

5. Ausência de retenção na fonte de

contribuições previdenciárias devidas ao INSS;

6. Existência de despesas sem licitação para

contratar empresa para bloqueio de ruas e

assentamento de tubos de concreto.

Quanto aos itens 2 (Descumprimento do art. 2º da lei nº 9.424/96, tendo em vista a não aplicação integral dos recursos do FUNDEF), 5 (Ausência de retenção na fonte de contribuições previdenciárias devidas ao INSS) e 6

4

Page 5: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

(Existência de despesas sem licitação para contratar empresa para bloqueio de ruas e assentamento de tubos de concreto), acompanho o posicionamento do MPCO em seu Parecer MPCO n.º 515/2010 (fls. 46/61), que passo a transcrever:

“(...)

2. Descumprimento do art. 2º da lei nº 9.424/96, tendo em vista a não aplicação integral dos recursos

do FUNDEF

O Relatório de Auditoria do processo de prestação de contas apurou que o município não aplicou integralmente os recursos provenientes do FUNDEF. O acórdão vergastado não considerou as alegações prestadas pela defesa e a decisão dos embargos declaratórios interpostos confirmou que a referida irregularidade foi considerada como causa suficiente para a rejeição das contas.

Em sede de recurso, a suplicante aduz que o total dos valores efetivamente aplicados corresponde a mais de 98% do montante que deveria ter sido gasto. Além disso, afirma que, devido ao caráter vinculado da aplicação dos recursos do FUNDEF, caso não houvesse utilização integral dos valores em um exercício, a quantia não empregada seria utilizada no exercício seguinte, em respeito ao que preceitua o art. 8º, parágrafo único, da LRF.

O recurso ainda contesta os cálculos da Auditoria, ao alegar que no momento da averiguação da regularidade dos dispêndios, não se considerou o saldo financeiro inicial da conta do FUNDEF. Tal justificativa foi levantada durante o processo de prestação de contas, mas a Câmara julgadora não considerou o alegado ante a ausência de comprovação.

A recorrente também não comprova em sede recursal o alegado superávit da conta do FUNDEF, que teria sido desconsiderado pela Auditoria, apenas se limita a repetir as razões aduzidas no processo de prestação de contas. Desse modo, não deve ser acolhido tal argumento.

5

Page 6: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

As razões recursais ainda expressam contrariedade à classificação das despesas com conserto de fogões e aluguel de espaço para funcionamento de escola como indevidas. Segundo a recorrente, tais dispêndios não são censurados pela Lei 9.394/96, pois estariam relacionados a atividades meio para manutenção e desenvolvimento do ensino.

Com relação aos gastos com aluguel de imóvel para funcionamento de escola e aos reparos nos fogões, entende-se que são pertinentes à manutenção e desenvolvimento do ensino gastos dessa espécie. Realce-se que o Manual de Orientação do FUNDEF, elaborado pelo Ministério da Educação, aponta a adequação desse tipo de dispêndio às hipóteses previstas na Lei 9.394/96 (disponível no site http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/manual.pdf):

“CRITÉRIOS DE UTILIZAÇÃO DOS RECURSOS DO FUNDEF

(...)“O restante dos recursos (de até 40% do total) seja

direcionado para despesas diversas consideradas como “manutenção e desenvolvimento do ensino”, na forma prevista no art. 70 da Lei nº 9.394/96 (LDB). Esse conjunto de despesas compreende:

(...)c) ‘uso e manutenção de bens vinculados ao ensino’ –- aluguel de imóveis e de equipamentos;- manutenção de bens e equipamentos, seja na

realização de consertos ou reparos no seu funcionamento, seja na conservação das instalações físicas do sistema de

ensino fundamental;- Despesas com serviços de energia elétrica, água e

esgoto, serviços de comunicação, etc.”

Ainda assim, os gastos estariam abaixo dos recursos distribuídos. Entretanto, nos termos do Anexo II do Relatório de Auditoria (fls. 3508), os recursos distribuídos pelo FUNDEF somaram R$ 9.114.706,56, ao passo que os gastos, descontando-se os valores impugnados, chegaram a R$8.941.391,56, valor que excede 98% do que deveria ter

6

Page 7: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

sido aplicado. Parece de rigor excessivo o julgamento pela irregularidade das contas quando o dispêndio a menor foi inferior a 2% do total

Neste contexto, a o recurso deve ser acolhido quanto a este capítulo.

(...)

5. Ausência de retenção na fonte de contribuições previdenciárias devidas ao INSS;

O acórdão recorrido considerou como irregular a ausência de retenção na fonte das contribuições previdenciárias devidas ao INSS, referentes à prestação de serviços de construção civil e coleta e reciclagem de lixo e resíduos. Em conseqüência, determinou-se o encaminhamento dos autos ao órgão de previdência federal para que tomasse ciência dos fatos.

A interessada alega que, ainda no decorrer do processo de prestação de contas, notificou as empresas contratadas para que comprovassem a retenção dos valores devidos.

Além disso, afirma a recorrente que a hipótese prevista no art. 31 da lei 8.212/91 não se aplica ao presente caso, pois os serviços contratados não se caracterizariam como “cessão de mão de obra”, pois o contrato firmado não objetivava a locação de mão de obra, mas sim que determinada empresa se responsabilizasse pela entrega da obra ou serviço contratado. Demais disso, afirma-se que o serviço prestado em obras públicas não possuiria natureza de “serviço contínuo”, conforme exige o dispositivo legal.

A recorrente arremata a argumentação aduzindo que não existiu no presente caso a subordinação dos empregados disponibilizados pela empresa contratada ao poder de comando da Administração Municipal, situação que seria necessária para configurar o previsto no art. 31 da Lei

7

Page 8: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

8.212, de acordo com jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça apresentada.

A respeito do assunto discutido, a Advocacia Geral da União emitiu o Parecer AC 055/06, com efeito vinculante para todos os entes da Administração Federal (art. 40, §1º, Lei Complementar nº 73/93), do qual se extrai o seguinte excerto:

“Portanto, atualmente, e desde 1º.02.1999 (Lei nº 9.711/98, art. 29), o quadro em relação à contratação de obras de engenharia civil pela Administração Pública, quanto à responsabilidade pelo pagamento das contribuições previdenciárias decorrentes do contrato, é o seguinte:

- a Administração Pública não responde, nem solidariamente, pelas obrigações para com a Seguridade Social devidas pelo construtor ou subempreiteira contratados para a realização de obras de construção, reforma ou acréscimo, qualquer que seja a forma de contratação, desde que não envolvam a cessão de mão-de-obra, ou seja, desde que a empresa construtora assuma a responsabilidade direta e total pela obra ou repasse o contrato integralmente (Lei nº 8.212/91, art. 30, VI e Decreto nº 3.048/99, art. 220, § 1º c/c Lei nº 8.666/93, art. 71);

- a Administração Pública contratante de serviços de construção civil executados mediante cessão de mão-de-obra deve reter onze por cento do valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação de serviços e recolher a importância retida até o dia dois do mês subseqüente ao da emissão da respectiva nota fiscal ou fatura, em nome da empresa contratada, cedente da mão-de-obra (Lei nº 8.212/91, art. 31).”

A recorrente mais uma vez pronuncia-se nos autos (fls. 35 a 38) para apresentar novo argumento. Argumenta a interessada que a Instrução Normativa MPS/SRP nº 03/2005,

8

Page 9: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

em seu art. 176, exclui a aplicação do instituto da retenção em casos de empreitada total, além de mencionar o disposto no art. 184 da instrução normativa.

A suplicante aduz, enfim, que, de acordo com o § 2º, art. 178 da Instrução Normativa MPS/SRP nº 03/2005, as hipóteses de contratação de obras de construção civil por órgãos da administração direta não tornam o ente público solidariamente responsável pelas obrigações previdenciárias decorrentes da atividade contratada e ainda sustenta que os serviços de engenharia contratados pela Administração Municipal, censurados no acórdão recorrido, enquadram-se na hipótese de exclusão de responsabilidade solidária prevista na referida instrução normativa.

Conforme se observa, o posicionamento defendido pela suplicante está em consonância com o já mencionado opinativo vinculante da Advocacia Geral da União (Parecer AC 055/06). Além disso, contemporaneamente, a matéria é regulada pelo previsto no art. 149, II c/c art. 157 da Instrução Normativa RFB n.º 971/2009, que dispõem no sentido de que, no caso de obra de construção civil por empreitada total onde o contratante é a Administração Pública, estando ausente o elemento da cessão de mão-de-obra, não se aplica o instituto da retenção nem o da solidariedade:

“Art. 149. Não se aplica o instituto da retenção:

(...)

II - à empreitada total, conforme definida na alínea "a" do inciso XXVII do caput e no § 1º, ambos do art. 322, aplicando-se, nesse caso, o instituto da solidariedade, conforme disposições previstas na Seção III do Capítulo IX deste Título, observado o disposto no art. 164 e no inciso IV do § 2º do art. 151;

“Art. 157. O órgão público da administração direta, a autarquia e a fundação de direito público, na contratação de obra de construção civil por empreitada total, não respondem solidariamente pelas contribuições sociais previdenciárias decorrentes da execução do contrato, ressalvado o disposto no inciso VIII do art. 152.”

9

Page 10: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

Restaria apenas verificar se os serviços de engenharia contratados pela Prefeitura de Olinda, considerados no acórdão guerreado, enquadram-se na modalidade de empreitada total tal qual defendido pela recorrente.

O Relatório de Auditoria, em seu Anexo XVI (fl. 3.524, processo nº 0301150-1), expõe o rol de despesas que teriam sido realizadas em descumprimento ao disposto no art. 31, da lei 8.212/91. No entanto, o cálculo desses valores foi efetuado com base em notas de empenho e notas fiscais de serviço, referentes aos trabalhos de construção civil e coleta de resíduos realizados. Vale mencionar ainda que os serviços de coleta e reciclagem de resíduos sólidos não se confundem com os serviços de limpeza, conservação e zeladoria de que trata o art. 31, §4.º, I, da Lei 8.212/91.

Para que fosse possível aferir a existência da irregularidade sob análise, à luz da interpretação legal anteriormente exposta, seria necessário avaliar sob que termos deram-se as contratações, se mediante cessão de mão de obra, ou se através de empreitada total. No entanto, não é possível alcançar tal conclusão apenas com base em notas de empenho e notas fiscais.

Sendo assim, entende-se que a irregularidade em questão deve ser afastada, posto que não restou demonstrado o dever legal de retenção na hipótese dos autos.

6. Existência de despesas sem licitação para contratar empresa para bloqueio de ruas e

assentamento de tubos de concreto

Constatou a Auditoria a realização de contratação direta de empresa para bloqueio de ruas com assentamento de tubos de concreto. O acórdão guerreado não acatou as razões da defesa que tentaram justificar a contratação sem processo licitatório.

10

Page 11: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

O recurso aduziu mais uma vez que, no presente caso, estavam presentes as condições legais que permitem à Administração Pública efetuar a contratação direta de empresa, já que havia sido realizado processo licitatório na modalidade Convite, que se encerrou sem vencedor ante a ausência de interessados, assim como também havia urgência na contratação, pois o serviço em questão deveria ser prestado durante o período carnavalesco que se aproximava.

A fim de demonstrar a ocorrência dos pressupostos fáticos que tornariam a conduta regular, a defesa faz menção às fls. 4.873 a 4.887 da prestação de contas. Demais disso, apresenta interpretação doutrinária do inciso V, art. 24, da Lei 8.666, que prevê a hipótese de contratação direta e relaciona tal análise à situação tratada neste ponto.

Dessa forma, a recorrente contesta as conclusões da equipe técnica, apresentadas durante o processo de prestação de contas, que imputou à Administração Municipal a culpa pelo resultado deserto do processo licitatório, uma vez que teria sido responsável pela escolha das empresas; além de ter concluído que a urgência na contratação decorreu de falha no planejamento, que não escusaria a contratação sem licitação.

No caso sob exame, parece um passo demasiado largo atribuir à Administração a culpa por ter a licitação anterior resultado deserta, conforme entendeu a equipe de auditoria (fls. 5097). Também não parece razoável o argumento de que o gestor deve promover a licitação com uma antecedência tal que lhe seja sempre possível repetir o certame se o primeiro resultar deserto. Aliás, a própria Lei de Licitações contempla a hipótese de não-repetição do certame se restar demonstrado prejuízo (art. 24, V).

Como a Administração realizou cotação de preços (fls. 4887) e, de todo modo, promoveu um certame que resultou deserto, não parece censurável, na espécie, a dispensa de licitação porque é razoável supor que a repetição do convite,

11

Page 12: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

na hipótese vertente, poderia acarretar prejuízo à Administração tendo em vista a proximidade do carnaval (art. 24, V, Lei 8.666/93).

O recurso, portanto, merece acolhimento quanto a este capítulo.

CONCLUSÃO

Ante o exposto, este Órgão Ministerial opina pelo conhecimento do presente recurso e, no mérito, pelo provimento parcial para afastar as máculas referidas nos itens 2, 5 e 6 acima, mantendo-se o julgamento pela irregularidade de contas”.

Passo às irregularidades remanescentes:

1. Descumprimento do art. 72 da LRF

A equipe de auditoria entendeu que não foi respeitado o limite para gastos com serviços de terceiros estabelecido pelo art. 72 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). O referido limite seria de 27,84%, enquanto que a Prefeitura Municipal de Olinda teria aplicado 36,39% da receita corrente líquida do exercício de 2002 com serviços de terceiros.

A recorrente alega que somente os “serviços de natureza permanente”, considerados como aqueles “cuja necessidade administrativa não se esgota com a sua prestação”, entrariam no cálculo do limite a que se refere o art. 72 da LRF. Invoca, em seu socorro, o posicionamento adotado pelo Supremo Tribunal Federal no bojo da Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 2238-5. Trata-se, mais especificamente, de Medida Cautelar, que conferiu ao dispositivo normativo em comento interpretação conforme à constituição.

Não posso deixar de concordar com a recorrente. A Auditoria deveria ter discriminado os serviços de natureza permanente empenhados no exercício de 2002, o que não fez.

12

Page 13: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

Mesmo porque, a Medida Cautelar antedita foi exarada em 09/08/07, posterior à data do Relatório de Auditoria.

Devo dizer, em acréscimo, e, desde já pedindo vênia ao nobre membro do Parquet, que cabe a auditoria caracterizar a irregularidade. Não se trata, aqui, de inversão do ônus da prova. A gestora encaminhou toda a documentação pertinente. Com base nestes elementos, a equipe técnica apontou a irregularidade. Contudo, não basta para sua caracterização a soma de rubricas contábeis atinentes a despesas com serviços de terceiros (é o que se verifica no Anexo VI - quadro de fls. 3512: outros serviços de terceiros Pessoa Física; outros serviços de terceiros Pessoa Jurídica; serviços de consultoria; e outras rubricas de menor expressão). A superveniente interpretação conforme a constituição, em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade, impôs a necessidade de análise mais minudente acerca da natureza (permanente ou eventual) do gasto.

Em conclusão, não resta provada a ocorrência da irregularidade em tela. Logo, deve ser afastada.

2. Descumprimento do limite expresso no art. 29-A da Constituição Federal, cujo repasse a maior de duodécimos alcançou o valor de 0,6%;

Quanto a este ponto, a recorrente lançou mão, ainda, dos seguintes argumentos finais:

Quatro das outras cinco irregularidades que teriam motivado a rejeição das presentes contas em primeira instância já foram relevadas pelo Ministério Público de Contas, nos pronunciamentos de auditoria do parquet de contas. A irregularidade que teria remanescido, ao lado da aplicação de recursos na manutenção e desenvolvimento do ensino em percentual inferior ao constitucionalmente exigido, seria o repasse do duodécimo em 0,6% superior ao limite máximo estabelecido na Constituição. Tal irregularidade, além de não representar prejuízo efetivo ao erário, é perfeitamente sanável, mediante a compensação nos exercícios seguintes;

A decisão que aprovou as contas da Prefeitura de Olinda, exercício 2000, continha diversas outras irregularidades que, por não representarem, na ótica dessa Corte de Contas, prejuízo ao erário, não ensejavam a rejeição

13

Page 14: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

das contas, raciocínio que se estende à questão do duodécimo, tratada no presente recurso;

Este TCE, à semelhança do que ocorria com a aplicação de recursos no ensino aquém do constitucionalmente exigido, tinha o entendimento, naquele exercício, de que ela não ensejaria rejeição de contas.

O insigne Procurador, em seu Parecer nº 436/2001, assinala que o descumprimento do limite expresso no art. 29-A tem sido relevado por este Tribunal, quando considerado isoladamente ou ao lado de outras irregularidades de cunho meramente formal. Entretanto, em outros precedentes, a mesma irregularidade soma-se a outras de caráter mais grave para constituir fundamento de rejeição de contas.

É preciso o nobre Procurador quanto aos precedentes desta Corte de Contas. Contudo, não posso deixar de considerar que, na deliberação, em grau recursal, proferida no bojo da prestação de contas do chefe do executivo do município de Olinda relativa ao exercício financeiro de 2003, a irregularidade em tela juntamente com outras, inclusive não aplicação do percentual mínimo em educação, foi relevada. Entendo que deva ser adotado idêntico posicionamento. Ao final deste voto, voltarei ao tema, indicando, especificamente, o inteiro rol de precedentes que entendo aplicáveis ao processo vertente, em homenagem aos princípios da segurança jurídica e da coerência dos julgados.

3.Descumprimento do limite expresso no art. 212 da Constituição Federal

O art. 212 da Constituição Federal estabelece que os municípios apliquem percentual mínimo de 25% da receita de impostos e transferências na manutenção e desenvolvimento do ensino.

No acórdão recorrido, o percentual de 21% foi considerado como razão para rejeição das contas.

Segundo a recorrente, uma vez incluídos os restos a pagar de 2002 e as despesas da função administração (administração de pessoal, processamento da folha de pagamento e cadastro de recursos humanos relativos à Secretaria Municipal de Educação) da Secretaria Municipal

14

Page 15: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

da Fazenda e da Procuradoria Geral do Município, e excluída a receita da dívida ativa, chegar-se-ia a um percentual de 26,31%, superior aos 25% constitucionalmente exigidos.

Além disso, a recorrente assevera que, quando assumiu a sua gestão, o Município de Olinda se encontrava em uma grave situação fiscal, sem política de cobrança tributária, com dívida de longo prazo expressiva e dívida de curto prazo correspondendo a 60% da receita mensal do Município, conjuntura agravada com a crise econômica e social nos dez anos que antecederam ao exercício de 2002. Cita, ainda, os seguintes fatores agravantes: a alta densidade demográfica; quase ausência de indústrias; baixa receita municipal per capita; e precária infraestrutura urbana. Por outro lado, continua, com as medidas concretas adotadas pela gestão da recorrente, a receita diretamente arrecadada tem crescido, permitindo a regularização das finanças, os pagamentos dos fornecedores e servidores e a melhora na qualidade do serviço público.

A recorrente aduz que não era a ordenadora de despesas, função que delegou aos Secretários Municipais e, ainda que se considere abaixo do percentual constitucionalmente exigido o montante das despesas realizadas pela Administração Municipal com ações de manutenção e desenvolvimento do ensino no exercício de 2002, não poderia a mesma ter as suas contas rejeitadas, visto que não era a responsável pela execução do orçamento.

A recorrente alega, ainda, a impossibilidade de inclusão da receita da dívida ativa na base de cálculo do percentual estabelecido no art. 212, da Constituição Federal.

O relator de então solicitou elaboração de Nota Técnica de Esclarecimento. Foram elaborados novos cálculos. A recorrente, por meio da peça de fls. 68/80, os contestou.

Segundo a recorrente, os novos cálculos implicaram em piora de sua situação, haja vista ter reduzido o percentual de aplicação em educação para 19,86%. Fato que, por si só, deve ser repelido em face do princípio da proibição da reformatio in pejus.

É de se ressaltar que sua contestação não pára por aí. Entende a recorrente que a equipe de auditoria deveria acrescentar os restos a pagar processados ao montante efetivamente aplicado em ações de manutenção e desenvolvimento do ensino. Sistemática esta cuja pertinência já fora reconhecida pelo próprio Ministério Público de Contas.

15

Page 16: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

Melhor explicando, quer a recorrente que os novos cálculos partam do percentual originalmente apontado, que incluiu as despesas referentes à merenda escolar, aos convênios e ao salário educação (cujo expurgo não é possível por força da vedação da reformatio in pejus). Ao percentual original de 21% deve ser acrescidas as despesas referentes aos restos a pagar processados, conforme pediu o MPCO, e que totalizam, segundo a nota técnica de esclarecimento, R$ 1.190.989,62. Lembra, ainda, o opinativo do MPCO sobre a legitimidade das despesas com aluguel de imóvel para funcionamento de escola e reparos de fogões.

Em relação ao Relatório Complementar de Auditoria (fls.438/446), a recorrente ofertou contrarazões às fls. 450/457. Além de reafirmar o já alegado, acrescentou que, caso se considere aplicado o menor dos percentuais apontados, isto não constitui motivo para a rejeição das contas, seja pela proximidade em relação ao percentual mínimo exigido constitucionalmente, seja pela inexistência de qualquer dano ao erário.

Posteriormente, a recorrente atravessa nova peça (fls. 462/464), pela qual, sem abandonar sua convicção de que superou os 25% constitucionalmente, pede que seja considerado precedente deste Tribunal referente ao exame das contas do chefe do executivo do próprio município de Olinda. Mais especificamente, as contas do exercício de 2000, que foram aprovadas com percentual menor do que ora se discute. Lembra, ainda, que o exercício objeto do presente recurso é 2002, anterior, portanto, ao de 2005, quando o TCE mudou de posicionamento para considerar a irregularidade em causa como motivo de rejeição de contas.

Passo ao enfrentamento das alegações da recorrente quanto ao não cumprimento do percentual mínimo de gastos com manutenção e desenvolvimento da educação.

Responsabilidade exclusiva do ordenador de despesas

Ainda que o Prefeito não seja o ordenador de despesas na área da educação, figura como responsável pelo cumprimento dos programas e ações governamentais que devem, por disposição expressa da Constituição Federal, atingir o percentual mínimo de 25% da receita municipal resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências. A relevância da matéria em tela é de tal ordem que deve constar do Parecer Prévio das contas do Chefe do Poder Executivo. Assim já decidiu o Superior Tribunal de Justiça

16

Page 17: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

(ROMS 11060), que definiu a prestação de contas de governo como contas globais:

que demonstram o retrato da situação das finanças da unidade federativa (União, Estados, Distrito Federal e Municípios). Revelam o cumprir do orçamento, dos planos de governo, dos programas governamentais, demonstram os níveis de endividamento, o atender aos limites de gasto mínimo e máximo previstos no ordenamento jurídico para saúde, educação, gastos com pessoal. Consubstanciam-se, enfim, nos Balanços Gerais prescritos pela Lei nº 4.320/64. Por isso, é que se submetem ao parecer prévio do Tribunal de Contas e ao julgamento pelo Parlamento (art. 71, I c./c. 49, IX da CF/88).

Impossibilidade de inclusão da receita da dívida ativa na base de cálculo do percentual estabelecido no art. 212, da Constituição Federal

A recorrente alega a impossibilidade de inclusão da receita da dívida ativa na base de cálculo do percentual estabelecido no art. 212, da Constituição Federal, haja vista o art. 212 falar em receitas de impostos e transferências, ao passo que a dívida ativa inclui, além dos créditos relativos a outras espécies tributárias, créditos de natureza não tributária. Não obstante, o acórdão recorrido incluiu toda a receita da dívida ativa na base de cálculo dos 25%, quando apenas uma parte dela se referia a impostos. Ademais, a receita da dívida ativa relativa a impostos refere-se sempre a impostos de exercícios anteriores não pagos total ou parcialmente, de modo que não poderia a receita desses impostos ser contabilizada como receita do exercício de 2002.

Em sede de Nota Técnica de Esclarecimento, às fls. 39/43, a equipe de auditoria alegou, quanto a este quesito, que:1. O Comparativo da Receita Orçada com a Arrecadada

revela que a Prefeitura registra apenas o recebimento de dívida ativa proveniente da cobrança de tributos devidos, ou seja, a receita da dívida ativa é tributária;

2. Caso houvesse a inclusão indevida de valores decorrentes da cobrança de direitos diversos, esta falha decorreria exclusivamente da culpa da Prefeitura e, por conseguinte, do gestor. Assim, como a recorrente não apresentou qualquer prova que permitisse o levantamento dessa possível inclusão indevida, restou considerar inconsistente esse argumento;

17

Page 18: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

3. Quanto à questão da dívida ativa ser resultado de tributos devidos em exercícios anteriores diversos, o art. 35 da Lei nº 4.320/64 utilizado pela recorrente em sua argumentação determina que pertençam ao exercício financeiro as receitas nele arrecadadas. Portanto, mesmo que a receita da dívida ativa contemple tributos com fato gerador em diversos exercícios passados, para efeito do cálculo apenas importa que tenham sido efetivamente arrecadados nesse exercício.

Ao analisar os argumentos da recorrente, o MPCO fez as seguintes observações (fls. 46 a 51):

De acordo com os demonstrativos mensais de receita constantes às fls. 3.265 a 3.312, apresentados pela Administração Municipal, os valores dos itens “receita da dívida ativa” e “receita da dívida ativa tributária” coincidem durante todo o exercício.  Dessa foram, a Auditoria não descumpriu o correto procedimento de apuração quando considerou todo o valor da receita da dívida ativa na base de cálculo do limite constitucional.

A Nota Técnica de Esclarecimento (fls. 39 a 43), inclusive, realça que, de acordo com o comparativo da receita orçada com a receita arrecadada (fl. 116 do processo TC nº 0301150-1), toda a receita da dívida ativa registrada pela Prefeitura é proveniente da cobrança de tributos, desse modo, somente possui natureza tributária.

O art. 212 da Constituição determina que o percentual das aplicações em ensino deverá ser calculado sobre a receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências. A partir da leitura do texto normativo, percebe-se que a composição da base de cálculo não é restrita apenas ao montante dos impostos cujos fatos geradores tenham ocorrido no exercício, já que a referência à receita de impostos é feita sem ressalvas. Dessa forma, a impugnação da recorrente à inclusão da receita da dívida ativa de impostos é descabida, pois não encontra sustentação no mandamento constitucional.

Acompanho o entendimento do MPCO de que a impugnação da recorrente à inclusão da receita da dívida ativa de impostos na base de cálculo do percentual estabelecido no art. 212, da Constituição Federal, é descabida.

Inclusão das despesas realizadas na “função administração” pela Secretaria da Fazenda e

18

Page 19: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

pela Procuradoria no cálculo das despesas com manutenção e desenvolvimento do ensino

A recorrente alega também que o acórdão recorrido, acatando as ponderações da equipe de auditoria, deixou de incluir no valor das despesas com manutenção e desenvolvimento do ensino aquelas despendidas por outros órgãos da Administração Direta. Os dispêndios a que se refere a recorrente são gastos administrativos relativos a atos de pessoal, processamento e pagamento da folha de funcionários da Secretaria de Educação, que teriam sido efetuados pela Secretaria da Fazenda do Município e pela Procuradoria Geral do Município. A recorrente afirma que tais despesas são de “atividades – meio em favor da manutenção do ensino municipal”, no valor de R$ 3.141.126,46.

Segundo o Parecer do MPCO nº 515/2010, a partir do que expõe o demonstrativo de fl. 4.657 do processo de prestação de contas, o valor das despesas administrativas com a Secretaria de Educação foi calculado pela defesa considerando-se o dispêndio total da “função administração”, realizado pela Secretaria da Fazenda e pela Procuradoria, e dividindo-se tal valor proporcionalmente ao número de funcionários da Secretaria de Educação.

O art. 70 da lei de Diretrizes e Bases da Educação dispõe sobre as despesas consideradas como de manutenção e desenvolvimento do ensino, a saber: são aquelas realizadas com vistas à consecução dos objetivos básicos das instituições educacionais, compreendendo as que se destinam a realização de atividades-meio necessárias ao funcionamento dos sistemas de ensino.

Portanto, o rateio das despesas realizadas na “função administração pela Secretaria da Fazenda e pela Procuradoria não pode ser incluído no cálculo das despesas com manutenção e desenvolvimento do ensino, visto que despesa de apoio para fins de apuração dos gastos são aquelas diretamente relacionadas à atividade educacional, ou seja, devem ser despesas de atividade-meio inerentes ao custeio das diversas atividades relacionadas ao adequado funcionamento da educação básica.

Dito de outra forma, o simples fato de que atividades de cunho administrativo praticadas no âmbito de órgãos diversos tenha reflexo na atividade de educação não autoriza que sejam consideradas como despesas em educação.

Inclusão dos restos a pagar processados e os não processados do exercício de 2002, bem como inclusão

19

Page 20: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

dos restos a pagar não processados de exercícios anteriores liquidados e pagos no exercício de 2002

A recorrente contesta o cálculo realizado pela equipe de auditoria, sob a alegação de que deveriam ter sido incluídos os restos a pagar processados e os não processados, referentes às ações de manutenção e desenvolvimento do ensino do exercício, tendo em vista os termos do inciso II do art. 35 da Lei nº 4.320/64, quais sejam “pertencem ao exercício financeiro as despesas nele legalmente empenhadas”, numa evidente inclusão dos restos a pagar, que nada mais são do que despesas empenhadas ainda não pagas.

Alega ainda que a previsão contida no parágrafo único do art. 8º da LRF estabelece que os recursos legalmente vinculados à finalidade especifica serão utilizados exclusivamente para atender ao objeto de sua vinculação, ainda que em exercício diverso daquele em que ocorrer o ingresso.

Afirma, em acréscimo, que a Constituição Federal, no seu art. 212, ao vincular 25% “da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, às ações de manutenção e desenvolvimento do ensino”, estabeleceu a obrigatoriedade da reserva da receita correspondente, nos casos de recursos legalmente vinculados, ainda que para utilização em exercício posterior.

Assim, os restos a pagar com ações de manutenção e desenvolvimento do ensino, inclusive os não processados, estão com os recursos correspondentes assegurados, devendo ser contabilizados como despesa do exercício de 2002, uma vez que serão obrigatoriamente liquidados e pagos. Tal entendimento foi parcialmente acatado pelo Ministério Público de Contas, na análise do recurso contra a decisão que rejeitou as contas em 2003 (Processo T.C. nº 0700957-4), no sentido de incluir nos gastos com educação daquele ano os restos a pagar processados.

Na Nota Técnica de Esclarecimento, às fls. 39/43, a equipe de auditoria alegou, quanto a este quesito, que:

1. No que se refere às despesas, denomina-se realizada a despesa que encerrou o ciclo orçamentário, isto é, que foi liquidada e passou a ser uma obrigação do poder público, registrada, pois, nos sistemas patrimonial e financeiro;

2. Não assiste razão a recorrente agregar para efeito do limite o montante de restos a pagar. Apenas os restos a

20

Page 21: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

pagar processados poderiam ser contabilizados para o cálculo do atendimento do limite, visto que a obrigação fora reconhecida com a liquidação que averiguou a efetiva prestação do serviço ou a entrega do bem. Os restos a pagar não processados devem ser expurgados, pois não corresponderam a uma efetiva aplicação dos recursos, mas a uma possível aplicação no futuro;

3. Foi analisado o perfil de despesas da Secretaria de Educação e FUNDEF, composto por despesas das funções educação, cultura e encargos gerais e o Demonstrativo da Despesa Segundo a Classificação Funcional-Programática das funções supracitadas;

4. O montante de R$ 17.737.344,98 foi adotado como o valor empenhado pela Prefeitura de Olinda diretamente na área de ensino. O montante da função educação inclui o valor de R$ 141.263,50, empenhado na dotação da secretaria de obras para a construção, ampliação ou reforma de prédios escolares;

5. Do montante de R$ 17.737.344,98 deve ser expurgado o valor de restos a pagar não processados que chegou a R$ 548.206,25.

FUNÇÃODESPESA PAGA

(R$)RESTOS A

PAGAR (R$)DESPESA

EMPENHADA (R$)EDUCAÇÃO 15.264.900,11 1.632.762,36 16.897.662,47CULTURA 15.558,06 - 15.558,06ENCARGOS ESPECIAIS 717.700,94 106.423,51 824.124,45

TOTAL 15.998.159,11 1.739.185,87 17.737.344,98

SECRETARIARestos

Processados (R$)

Restos Não Processados

(R$)Restos a Pagar (R$)

EDUCAÇÃO 1.190.989,62 494.854,90 1.685.844,52OBRAS 53.351,35 53.341,35

TOTAL 1.190.989,62 548.206,25 1.739.185,87

Este posicionamento da equipe técnica coincide com diversos precedentes deste Tribunal. Sigo tal direcionamento.

Em relação aos restos a pagar não processados de exercícios anteriores liquidados e pagos no exercício de 2002, a equipe técnica concluiu, no Relatório Complementar de Auditoria (fl.443), pela pertinência de sua inclusão no cálculo das despesas com manutenção e desenvolvimento do ensino. Reconhecida a procedência, em tese, do argüido pela recorrente, foi realizada a análise, em concreto, da documentação comprobatória por ela anexada. Após o devido

21

Page 22: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

exame, alguns dos gastos referidos pela recorrente não foram acatados. Vale dizer, quanto a este ponto, foram expurgados dos cálculos produzidos pela recorrente as seguintes despesas:

O empenho nº 5.339/2001 não foi acostado aos autos, o que impediu a comprovação de sua liquidação e pagamento em 2002;

Os empenhos nºs 5.303/2001 e 5.304/2001 foram expurgados porque o objeto da despesa era fornecimento de fardamento escolar. Essa despesa não é considerada típica ou necessária à consecução dos objetivos das instituições educacionais que oferecem a educação básica, na forma preconizada no caput do art. 70 da Lei 9.394/96 - LDB. Tais despesas encontram-se mais próximas daquelas caracterizadas como assistência social, por conseguinte não integrantes do conjunto de ações de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino. O Art. 71, Inciso IV, da LDB exclui tais gastos porque integram ações de assistência social. Assim, seu custeio não deve ser realizado com recursos do ensino, ainda que os alunos beneficiários sejam da educação básica pública.

Assim, as despesas acima referidas, que somam R$ 330.427,40, devem ser expurgadas; acatando-se os demais gastos apontados pela recorrente, ou seja, o montante de R$ 694.465,13 relativos a restos a pagar não processados de 2001, liquidados e pagos no exercício de 2002.

Devo dizer que, aqui, esposo o entendimento que prevaleceu no julgamento das contas da Prefeitura de Olinda do exercício financeiro de 2003, quando no momento da discussão, o nobre Conselheiro Valdecir Pascoal defendeu a inclusão dos restos a pagar que não foram liquidados no ano anterior e foram pagos no exercício em análise:

(...)Sou da tese, neste caso concreto, e seguindo outros posicionamentos meus no passado, agora mesmo a Primeira Câmara julgou as contas da Prefeitura da Cidade do Recife, que aplicou apenas 23% em educação, de que devemos aceitar a defesa apenas no que diz respeito ao pagamento de restos a pagar que não foram liquidados no ano anterior e foram pagos. Então, são gastos com educação, não foram computados em 2002 porque estavam só empenhadas e em 2003 foram computados, normal, fazemos isso. Fui relator das contas de Governo do Estado em 2007 e fizemos dessa forma, exclui o apenas empenhado do referido exercício, mas computa o pago não considerado no ano anterior. Parece-me, com isso, chega próximo de 23% o gasto com educação, e não precisaríamos, no meu entender, à luz dos

22

Page 23: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

precedentes deste Tribunal e do juízo da proporcionalidade, mesmo com toda a tristeza de ver o não cumprimento de um percentual mínimo, e à luz do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, de dar provimento para aprovar, com ressalvas. Mesmo beirando os 23%.

Dessa forma, o montante de R$ 17.737.344,98 foi adotado como o valor empenhado pela Prefeitura de Olinda diretamente na área de ensino, estão incluídos neste valor os restos a pagar de 2002 (R$ 1.190.989,62), devendo ser excluídos os restos a pagar não processados do exercício de 2002, no valor de R$ 548.206,25, e incluídos os restos a pagar não processados de exercícios anteriores liquidados e pagos no exercício de 2002, R$694.465,13.

Assim, consoante os ajustes procedidos pela equipe técnica, os valores efetivamente aplicados na MDE seriam R$ 13.653.310,45 (Quadro de fls. 444). O que corresponderia ao percentual de 20,70%.

No entanto, no acórdão recorrido, foi considerado, como razão para rejeição das contas, o percentual de 21% referente às aplicações em ensino. A diferença, vale repetir, resulta dos novos cálculos da auditoria que excluíram os valores relativos à merenda escolar, convênios e salário educação.

Com a devida vênia, entendo que a reforma do Acórdão para consignar percentual inferior ao que dele consta constituiria reformatio in pejus. Aqui, sigo o conceito estrito de reforma, que abrange quaisquer valores, sejam absolutos sejam percentuais, que, por sua própria natureza, revelem distanciamento da ordem legal ainda maior do que o apontado no julgamento originário. Evidentemente, não haveria que se falar em reformatio in pejus se fosse o caso de recurso por parte do Ministério Público de Contas.

Sendo assim, meu entendimento é de que o percentual de gastos com educação consignado no Acórdão ora guerreado não deve ser alterado, pois o novo cálculo produzido pela equipe de auditoria resultou em percentual menor do que o originalmente apontado.

Poder-se-ia dizer que os novos cálculos da auditoria deveria se restringir ao arguido pela recorrente, de forma que se tomasse como ponto de partida o percentual inicialmente consignado de 21%, e, então, se procedesse aos ajustes solicitados e acatados pela equiipe de auditoria. O fundamento para tal entendimento seria a assunção de que todas as parcelas que compõem o percentual original são questões já decididas e insucestíveis de reforma que venha a prejudicar a parte que isoladamente recorreu. Em respeito

23

Page 24: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

a esta linha argumentativa, elaborei o quadro abaixo, no qual se verifica gastos efetivos em educação que montam a R$ 14.820.803,79, correspondentes a 22,46% das receitas de impostos e transferências.

DESPESA EMPENHADA NA FUNÇÃO 17.737.344,98(+) RESTOS A PAGAR DE 2001 PAGOS E LIQUIDADOS EM 2002 694.465,13(-) RESULTADO POSITIVO DO FUNDEF -3.062.800,07(-) RESTOS A PAGAR NÃO PROCESSADOS de 2002 -548.206,25VALOR EFETIVAMENTE APLICADO 14.820.803,79MÍNIMO A SER APLICADO 16.493.484,71% APLICADO 22,46%

Como se vê, ainda assim não teria sido atingido o percentual mínimo de 25%.

Para que não reste dúvida acerca do meu posicionamento, repito que tomo os novos cálculos em sua inteireza. Não dou a reformatio in pejus a abrangência de impedir que este Tribunal, tendo sido questionada a sistemática de cálculo, se abstenha de reconhecer erros além daqueles expressamente invocados pela recorrente.

No caso em tela, a equipe de auditoria, valendo-se do entendimento consagrado neste Tribunal, excluiu os valores relativos à merenda escolar, convênios e salário educação; corrigindo o cálculo original que tratou equivocadamente estas parcelas.

O óbice, próprio da reformatio in pejus, repousa, exclusivamente, na impossibilidade de se reformar qualquer valor, absoluto ou percentual, que, por sua própria natureza revele distanciamento da ordem legal ainda maior do que o apontado no julgamento originário.

Após o enfrentamento de todos os argumentos trazidos pela recorrente associados à sistemática de cálculo propriamente dita, subsiste a irregularidade do não cumprimento do mínimo constitucional. É hora, então, de sua valoração. Vale dizer, deve subsistir a deliberação ora guerreada que a considerou apta a macular as contas ao ponto de se recomendar ao Legislativo sua rejeição?

Devo repisar que a recorrente, neste particular, pede que seja considerado precedente deste Tribunal referente ao exame das contas do chefe do executivo do próprio município de Olinda. Mais especificamente, as contas de 2000, que foram aprovadas com percentual menor do que ora se discute, a saber: 20,70%. Lembra, ainda, que o exercício objeto do presente recurso é 2002, anterior,

24

Page 25: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

portanto, ao de 2005, quando o TCE mudou de posicionamento para considerar a irregularidade em causa como motivo de rejeição de contas.

Em suma, pede a recorrente que sejam observados os princípios da isonomia e da segurança jurídica.

Devo dizer que esta Corte de Contas, em inúmeros julgados, firmou o entendimento que a decisão relativa a determinado exercício deve levar em conta a valoração majoritariamente prevalente ao tempo em que foram julgados processos similares. Melhor explicando: se o processo originário diz respeito à prestação de contas do exercício financeiro de 2007, deve a decisão, em grau de recurso ordinário ou de pedido de rescisão a ser proferida em momento já muito protraído no tempo (2016), balizar-se pelo posicionamento adotado na maioria dos processos similares (leia-se: da mesma espécie, com as mesmas irregularidades e de exercício financeiro idêntico ou próximo). Dito de outra forma, não importa se na atualidade a irregularidade é repreendida com mais severidade. O julgador deve observar a valoração que prevalecia anteriormente. Em casos que tais, tem-se, por soberano, o princípio da isonomia.

Creio não ser preciso especificar os precedentes. Nos últimos meses, poucas foram as sessões em que não se aplicou o entendimento sobredito. Foram revertidos diversos julgados que ostentavam irregularidades de cunho previdenciário. Fui voto vencido em muitas ocasiões. Nelas tive a oportunidade de externar meu ponto de vista contrário a tese acima descrita. Não vou aqui repeti-lo. Não é o caso. Este é o momento de reconhecer a pertinência do pedido da recorrente, para que se dê guarida aos princípios da segurança jurídica e da coerência dos julgados.

Importa dizer, mesmo correndo o risco de malhar no óbvio, que a já consagrada tese não se restringe à matéria previdenciária. Sua aplicação perpassa toda a atividade julgadora deste Tribunal.

É o que se verifica, especificamente, no que toca ao não cumprimento do limite percentual mínimo de gasto com educação. É de se trazer à baila decisão que, pela importância do município, o Recife, assume posição paradigmática. Trata-se do Acórdão TC nº 1345/15, prolatado em 12 de agosto de 2015. Transcrevo excerto do voto condutor:

(...). Inicialmente quero ressaltar a importância do Ministério Público com sua participação no Tribunal de Contas e nas nossas reuniões. Realmente, os fatos levantados pelo Ministério

25

Page 26: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

Público são fatos relevantes, e este relator não desconhece esses fatos. Entendo que o discurso de campanha é muito diferente da prática, quando se fala no social, no desenvolvimento e na melhoria da educação, mas vemos que os índices, como demonstrou o Ministério Público, realmente não representam isso, pois, na verdade, deveria existir a aplicação dos 25% no mínimo em educação, até para que se melhorasse o nível educacional da capital do Estado de Pernambuco. No entanto, como está demonstrado no meu voto, neste Tribunal com relação ao exercício de 2006, 2007, 2008 há várias decisões nas quais se recomendou a aprovação de contas quando não havia alcançado esse limite. E também entendo que seria, no caso, uma penalização do administrador com relação a decisões anteriores já votadas por este Tribunal.

VOTO DO RELATOR

Tenho por escorreitas as análises de admissibilidade e quanto à preliminar arguída, contidas no Parecer do Ministério Público de Contas, acima transcrito, motivo pelo qual adoto os argumentos e fundamentos nele esposados, entendendo que deve o recurso ser conhecido e negada a preliminar arguída pelo interessado.

Quanto ao mérito, sempre me posicionei no sentido de que este Tribunal deve observar o cumprimento da aplicação do mínimo constitucionalmente exigido, tanto na manutenção e desenvolvim

ento do ensino, quanto na saúde.

No entanto, estamos aqui tratando da prestação de contas do exercício de 2006, quando o Tribunal adotava um posicionamento mais pedagógico ao apreciar essa questão, e várias prestações de contas foram aprovadas, com ressalvas, por este Tribunal, mesmo diante de casos de aplicação na manutenção e desenvolvimento do ensino em percentual abaixo do limite exigido, como por exemplo, na Prestação de Contas da Prefeitura Municipal de Olinda, exercícios de 2003, onde restou aplicado 22,58% (Processo TCE-PE nº 0700957-4, recurso julgado pelo Pleno em 27.05.2009); na Prestação de Contas da Prefeitura Municipal de Olinda, exercícios de 2000, tendo sido aplicado 20,41% (Processo TCE-PE nº 1103530-4, recurso julgado pelo Pleno em 17.07.2013); nas deliberações proferidas nos processos TCE-PE nº 0750075-0 (Prestação de Contas da Prefeitura Municipal de Cedro, exercício de 2006, tendo sido aplicado 21,46%); TCE-PE nº 0730049-9 (Prestação de Contas da Prefeitura Municipal de Xexéu, exercício de 2006, com aplicação de 22,00%); TCE-PE nº 0580065-1 (Prestação de Contas da Prefeitura Municipal de Granito, exercício de 2004, quando foi aplicado 22,67%).

26

Page 27: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

Assim, merece guarida a pretensão recursal, devendo ser modificado o Parecer Prévio emitido pela Segunda Câmara desta Casa, na apreciação do Processo TCE-PE nº 0701692-0, para recomendar a aprovação, com ressalvas, das contas do Sr. João Paulo Lima e Silva, relativas ao exercício financeiro de 2006.

A deliberação acima deixa claro que no exercício financeiro de 2006 o tratamento dispensado por este Tribunal ainda era de ordem pedagógica. O que dizer, então, do exercício de 2002? Os precedentes nela arrolados são muito esclarecedores. Já me parecem suficientes para revelar que nos exercícios anteriores a 2006 também preponderava o viés pedagógico. Mas podem ser acrescidas, ainda, as Prestações de Contas do Recife de 2001 – 23,26% (TC nº 0201132-3), de 2002 – 24,76% (TC nº 0301516-6), de 2003 – 22,61% (TC nº 0402452-7); Jaboatão dos Guararapes de 2001 – 23,53% (TC nº 0203289-2); Prefeitura do Paulista de 2002 – 23,63% (TC nº 0301061-2).

Não posso deixar de chamar a atenção para o fato de que, dentre os precedentes listados na deliberação acima destacada, há prestações de contas da própria Prefeitura de Olinda. Não apenas o exercício financeiro de 2000, invocado expressamente pela recorrente, e em que se apontou o percentual de 20,41%, mas também o de 2003, em que se apurou o percentual de 22,58%. Não me parece possível que este Tribunal possa, acerca da mesma matéria, manter deliberação diversa. Em outras palavras, não se pode recomendar a rejeição das contas de 2002 quando foi recomendada a aprovação com ressalvas das contas de 2000 e 2003, contendo a mesma irregularidade.

É de se assinalar que nestes precedentes do município de Olinda há a presença de outras irregularidades que não foram afastadas mas sim relevadas, ou seja, consideradas insuficientes para macular as contas. Passo a transcrevê-las.

Exercício financeiro de 2003: Da não aplicação do percentual mínimo exigido pelo artigo 60 do ADCT, no ensino fundamental.

Restituição de R$ 70.506,47 à conta do FUNDEF, referentes à despesas indevidamente realizadas com tais recursos;

Do repasse de Duodécimo acima do limite previsto no artigo 29–A da CF/88, devendo ser efetuada a compensação de R$ 240.823,44.

Exercício financeiro de 2000:

27

Page 28: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

CONSIDERANDO que a Administração fracionou despesas de forma irregular, deixando de realizar o devido processo licitatório, adquirindo produtos por meio de dispensas inadequadas, contrariando o Princípio da Licitação Pública, estampado no artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal;

Realização de contrato com empresa que apresentava suas atividades suspensas por irregularidade fiscal, ferindo o artigo 29, II, da Lei nº 8.666/93;

O Município não apresentou em suas contas registros contábeis e gerenciais necessários para o acompanhamento da aplicação das verbas do FUNDEF, contrariando o artigo 5º da Lei nº 9.424/96, combinado com os artigos 72 e 73 da Lei Federal nº 9.424/96;

Apesar de não caracterizar dano ao erário, restou demonstrada a manifesta falta de controle interno no sistema de contabilidade da Prefeitura, mais precisamente em relação às movimentações contábeis dos valores previdenciários;

Inexistência de Livro de Registro de Bens Móveis e Imóveis, descumprindo determinação contida no artigo 74, “caput”, da nossa Constituição Federal, e no artigo 94 da Lei nº 4.320/64, e o Inventário Físico-Financeiro dos Bens Municipais apresenta-se incompleto, infringindo o artigo 94 da Lei nº 4.320/64;

Despesas com publicidade sem a comprovação do conteúdo, ferindo o artigo 5º da Resolução TC nº 05/91;

Ausência de controle na aquisição de combustível, em descumprimento à Decisão TC nº 329/92;

Realização de processos licitatórios com projetos básicos falhos e por vezes ausentes, ferindo o artigo 6º, XI, e artigo 7º, § 2º, I, da Lei nº 8.666/93;

Ausência de Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) ou Estudo Preliminar de Impacto Ambiental (EPIA), bem como licença da CPRH para os serviços de limpeza urbana, contrariando o artigo 12, VII, da Lei de Licitações e Contratos.

Isto posto,

CONSIDERANDO em parte os Pareceres do Ministério Público de Contas, MPCO nº 515/2010, 205/2012 e 436/2014;

CONSIDERANDO a tempestividade do recurso e a legitimidade da parte para recorrer, nos termos dos artigos 77 e 78 da Lei Orgânica do Tribunal de Contas (Lei Estadual nº 12.600/2004);

CONSIDERANDO as razões contidas na peça recursal;

28

Page 29: Voto que embasou aprovação das contas de Luciana Santos

CONSIDERANDO a sistemática adotada por este Tribunal na aplicação de precedentes;

CONSIDERANDO que, na época do exercício financeiro aqui envolvido, esta Casa adotava um posicionamento mais pedagógico ao analisar o percentual de aplicação na manutenção e desenvolvimento do ensino;

CONSIDERANDO, particularmente, os Pareceres Prévios das contas do chefe do executivo do município de Olinda relativos aos exercícios financeiros de 2000 e 2003;

CONSIDERANDO os princípios da segurança jurídica e da coerência dos julgados;

Voto, preliminarmente, pelo conhecimento do presente Recurso Ordinário e, no mérito, dou-lhe provimento para, reformando a Decisão n.º 1108/08, julgar REGULARES, COM RESSALVAS, as contas da gestora, Sra. Luciana Barbosa de Oliveira Santos, relativas ao exercício de 2002. Ademais, que seja igualmente reformado o Parecer Prévio do exercício retromencionado, de forma que dele passe a constar recomendação ao Legislativo Municipal pela APROVAÇÃO, COM RESSALVAS, das contas da Prefeita já acima nominada.

29