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Vocação da Terra Alfredo Scheid Lopes Eng° Agr°, MSc PhD Professor Emérito do Dept° de Ciência do Solo Universidade Federal de Lavras, Lavras, MG Consultor Técnico da ANDA, São Paulo, SP e-mail: [email protected] Luiz Roberto Guimarães Guilherme Eng° Agr°, MSc, PhD Professor Adjunto do Dept° de Ciência do Solo, Universidade Federal de Lavras, Lavras, MG e-mail: [email protected] Carlos Alberto Pereira da Silva Administrador de Empresas Diretor Secretário da ANDA, São Paulo, SP e-mail: [email protected] Dezembro de 2003 AND AND AND AND ANDA Associação Nacional para Difusão de Adubos Associação Nacional para Difusão de Adubos Associação Nacional para Difusão de Adubos Associação Nacional para Difusão de Adubos Associação Nacional para Difusão de Adubos

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Vocação da TerraAlfredo Scheid LopesEng° Agr°, MSc PhD

Professor Emérito do Dept° de Ciência do SoloUniversidade Federal de Lavras, Lavras, MGConsultor Técnico da ANDA, São Paulo, SP

e-mail: [email protected]

Luiz Roberto Guimarães GuilhermeEng° Agr°, MSc, PhD

Professor Adjunto do Dept° de Ciência do Solo,Universidade Federal de Lavras, Lavras, MG

e-mail: [email protected]

Carlos Alberto Pereira da SilvaAdministrador de Empresas

Diretor Secretário da ANDA, São Paulo, SPe-mail: [email protected]

Dezembro de 2003

ANDANDANDANDANDAAAAAAssociação Nacional para Difusão de AdubosAssociação Nacional para Difusão de AdubosAssociação Nacional para Difusão de AdubosAssociação Nacional para Difusão de AdubosAssociação Nacional para Difusão de Adubos

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Revisão e atualização de matéria original publicada naRevista Panorama Rural, Ano III, n° 32, Outubro de 2001Impressão e acabamento: Editora Gráfica Nagy LtdaFotos: Alf Ribeiro

ANDA Associação Nacional para Difusão de AdubosPraça Dom José Gaspar, 30 - 9° andar - CentroSão Paulo, SP - Brasil - 01047-901Telefone: 55-11-3255.9277Fax: 55-11-3214.2831Site: www.anda.org.bre-mail: [email protected]

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m dos maiores desa-fios da humanidade éa previsão da demandana produção de ali-mentos para fazer faceao crescimento popu-

lacional da terra nas próximas décadas.A produção mundial de alimentosdeverá passar de 2 bilhões de tone-ladas em 1990, quando a populaçãomundial era de 5,2 bilhões, para 4bilhões de toneladas no ano de 2025,quando a população mundial deverá serde 8,3 bilhões de habitantes, segundoestudos e estimativas da OrganizaçãoMundial para a Alimentação, FAO.

Para que essas metas sejamalcançadas, a produtividade média degrãos, que era de 2,5 toneladas porhectare em 1990, deverá atingir 4,5toneladas por hectare em 2025 (Fig. 01).

A produção de

alimentos precisará

chegar a 4 bilhões de

toneladas em 2025,

quando o mundo

deverá ter 8,3 bilhões

de habitantes

O Brasil é um dos poucos países comgrandes e amplas possibilidades deser um participante importante nesseprocesso, pelas seguintes razões:

• PRODUTIVIDADE:O país possui tecnologias susten-

táveis de produção para, no curto prazo,conseguir grandes avanços na produ-tividade média de muitas culturas, princi-palmente aquelas que se constituemem alimentos básicos.

• EXPANSÃO:Dispõe da maior fronteira mundial

para expansão da agricultura, pois dototal de área potencialmente agricultávelem 1994, o Brasil utilizou apenas 9,2%,que representam 50,7 milhões de ha,contra 47,5% da China (95,7 milhõesde ha), 50,2% da França (19,5 milhões

U

Vocação da terraAs tecnologias sustentáveis, já disponíveisno país, podem aumentar a produtividadeagropecuária e fazer com que o Brasilocupe o espaço de potência mundial naprodução de alimentos - além se dar oexemplo na preservação ambiental.

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A fronteiraagricultável doBrasil equivale

quase à área total de32 países europeus

de ha) e 53% dos EUA (187,8 milhõesde ha), por exemplo. Além disso,apesar da disponibilidade de terraagricultável per capita estar decres-cendo a nível mundial - de 0,42 ha em1965 para 0,23 ha em 1995 -, o queocorreu no Brasil, no período de 1965-1995, foi um incremento de cerca de10% na área agricultável real percapita. Com isso, nesse período saltoude 0,37 para 0,40 ha (Fig. 02).

· DISPONIBILIDADE DE ÁGUA:Com cerca de 1/5 da água doce do

planeta, as possibilidades de aumentoda área sob irrigação, com incrementossubstanciais na produtividade dasculturas, são crescentes.

Como comparação adicional desta-que-se, por exemplo, que a área poten-cialmente agricultável do Brasil, de cer-ca de 550 milhões de hectares, é quaseigual à área total de 32 países daEuropa (Fig. 03). Só a área do Estadodo Mato Grosso, que atualmenteexplora apenas 25% do seu potencialagricultável, é equivalente a grande

O grande desafio mundial1990 2000 2025

POPULAÇÃO MUNDIAL (BILHÕES) 5,2 6,2 8,3

DEMANDA DE ALIMENTOS (BILHÕES t) 1,97 2,45 3,97

PRODUTIVIDADE (t/ha) 2,5 2,9 4,5

Fonte: Borlaug e Dowswell, 1993.

Estimativa de crescimento populacionale demanda por alimentos

Fig. 01

Fonte: Bot e outros, 2000)

0

0 ,51

1 ,52

2 ,53

3 ,5

Mundo América do Sul

AméricaCentral

e do NorteÁsia Brasil França China EUA

Hec

tare

s pe

r cap

ita

Terra Agricultável Real (1995) , Potencial (1994), sem descontar áreas marginais e Potencial “Equivalente” (1994), apósdescontadas as áreas marginais , em hectares per capita

Disponibilidade de terraTerras agricultáveis decrescem em todo o mundo mas têm

incremento no Brasil

Fig. 02

parte do cinturão do milho (Corn Belt)nos Estados Unidos, uma das áreasmais produtivas do mundo (Fig. 04).

Some-se o fato de que uma grandepercentagem da população ainda nãotem acesso ao mínimo das caloriasdiárias para não serem enquadradosna faixa de subnutrição ou desnutrição.Trata-se de um aspecto inadmissívelnuma terra já descrita por Pero Vaz deCaminha, como “a terra em tal maneiraé graciosa que, querendo-a aproveitardar-se-á nela tudo, por causa daságuas que tem”.

Tecnologias sustentáveisEste artigo procura mostrar como

o uso de tecnologias amplamente

Do tamanho do Meio-Oeste

Fonte: J. L. Coelho, John Deere, 2001.

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Columbus

Nashville

Duluth

Des Moines

Mato Grosso

Meio-Oeste (E. U. A.)

O estado do Mato Grosso equivale ao cinturãono milho (Corn Belt) nos Estados Unidos

Fig. 04

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disponíveis no país para aumentar aprodutividade da agropecuária bra-sileira, com ênfase no uso eficiente decalcário e fertilizantes, pode fazer comque o Brasil realmente possa exercer,

em sua plenitude, uma das suasmaiores vocações naturais, ocupandoo espaço que lhe é reservado de gran-de potência mundial de produção dealimentos, em futuro próximo.

Demonstraainda que o uso detecnologias sus-tentáveis que le-vem a um aumentona produção agro-pecuária se cons-titui em um forteinstrumento de pre-servação ambien-tal, diminuindo oumesmo até elimi-nando o desmata-mento desenfrea-do, muitas vezesde áreas não a-daptadas ao pro-cesso intensivo deexploração.

Finalmente,discute uma sériede ações que ne-cessitam ser im-

plementadas para a valorização daagricultura e que tenderiam a diminuirou eliminar os gargalos do agronegóciobrasileiro para tornar este paíssocialmente mais justo.

Alimentos: parte da população ainda não tem acesso ao consumo mínimo diário de calorias

Celeiro Mundial

GréciaUcrâniaBósniaCroáciaMacedôniaIslândiaIugosláviaNoruegaFinlândiaSuíçaBielo Rússia

Áustria Hungria Romênia Holanda Lituânia Itália Polônia Estônia

TchecoslováquiaFrançaIrlanda

BélgicaAlbânia

PortugalEspanha Bulgária

Reino UnidoAlemanha

LetôniaDinamarca

Suécia

Fonte: J. L. Coelho, John Deere, 2001.

A área agricultável do Brasil (550 milhões/ha)é aproximadamente igual à área total de 32 países da Europa

Fig. 03

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investimento em tecnologiaspara a melhoria da quali-dade dos solos pode sermelhor avaliado quando se

olha seus números. O uso eficiente defertilizantes e corretivos agrícolas éresponsável, dentre os diversos fatoresde produção, por cerca de 50% dosaumentos de produção e produtividadedas culturas.

Os dados da figura 05 traçam umparalelo entre a evolução do consumode fertilizantes - em termos deN+P2O5+K2O - e a evolução da produçãode 16 culturas (base seca) no Brasil, de1970/71 a 2002/03. O que fica evidenteé a relação estreita entre essas duasvariáveis.

Apenas no período de 1977/78 a1980/81, e em anos mais recentes, apartir de 1997, o aumento do consumode fertilizantes não correspondeu, namesma intensidade, a um aumento naprodução dessas 16 culturas. Doisfatores podem explicar essecomportamento:a) O período de 1977/78 a 1980/81 foi o

de intensificação de abertura dossolos de cerrado no Brasil, os quais,normalmente, levam 4 a 5 anos paraserem corrigidos, antes de passa-rem a responder em níveis adequa-dos de produtividade. Foi também operíodo que precedeu o corte de sub-sídios à agricultura, havendo gran-des estoques acumulados nas pro-priedades rurais em face de possí-veis cortes desses subsídios, o queveio a ocorrer no início dos anos 80.

b) A partir de 1997, esse comportamen-to pode ser explicado pela consta-

Aposta nafertilidadeO impacto do uso de tecnologia defertilizantes e corretivos nas lavoura

tação de uma necessidade maior deadubos para a recuperação de áreasmarginais do cerrado, as quais têmbaixa fertilidade natural mas bompotencial produtivo. Também estásendo observado um incrementomaior no uso de fertilizantes mineraisna adubação da cana-de-açúcar emsubstituição ao vinhoto, cujadisponibilidade vem se reduzindocomo decorrência de novastecnologias na destilação do álcool.

Quanto estamos consumindoPara entender melhor o compor-

tamento do consumo de fertilizantes noBrasil, compare-se o consumo médiode nutrientes em alguns países em1990/91 (Fig. 06). Nesse ano safra, oconsumo no Brasil foi de 52 kg deN+P2O5+K2O por hectare. Esse con-sumo repetiu o de 1987/88 e, na ver-

dade, a série histórica anual anterior semanteve nesse patamar por muitosanos.

O ponto que deve ser enfatizado éque esse nível de consumo médio anualde nutrientes era considerado muitobaixo, diante da baixa fertilidade naturalda maioria dos solos brasileiros. Nos-sas estimativas de um consumo ade-quado, em 1990/91, em função daextração média de nutrientes pelasprincipais culturas, eram de cerca de120 kg de nutrientes por hectare.

Calcário: país ainda utilizadoses insuficientes

O

Fertilizante melhora a produçãoProdução agrovegetal (matéria seca - 16 culturas) e

consumo de nutrientes no Brasil - 70/71 a 02/03

Fig. 05

Índice

050

100150200250300350400450500

Índice 100: 72/7353,1 millhões t1,75 milhões t

02/03173,1 milhões t7,68 milhões t

Consumo de fertilizantes(N-P2O5-K2O)

Produção agrovegetal

AnoFonte: ANDA, FIBGE, 2003.

70/71 75/76 80/81 85/86 90/91 00/0195/96

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Dois outros aspectos relevantesapontam a figura 06. Um deles trata doaumento do consumo de nutrientes porhectare na China, que saltou de 224kg/ha, em 1987/88, para 295 kg/ha,em1990/91. Esse aumento, de 71 kg/ha,foi maior do que a média histórica deconsumo no Brasil, de 52 kg/ha. Tal fatotem profundas implicações com oaumento da produção e da produ-tividade na China, como será discutidomais adiante.

Por outro lado, o consumo na Ho-landa, que era de 741 kg/ha, em 1987/88, caiu para 602 kg/ha, em 1990/91, epara 545 kg/ha, em 1998. Em 1998, oBrasil aumentou o seu consumo médiopara 110 kg/ha, e em 2002, atingiu 138kg de nutrientes/ha (Fig. 07), o que, semdúvida, foi um dos fatores maisimportantes para os aumentos naprodução de grãos obtidos na safra2002/2003. Essa queda de consumode fertilizantes na Holanda se justifica.Com grande parte de solos arenosose lençol freático elevado, as altas taxasanuais de aplicação de fertilizantesminerais, aliadas a grande utilizaçãode estercos animais, levaram aHolanda a ter sérias restriçõesambientais e no estabelecimento delimites máximos desses produtosutilizados na agricultura.

Consumo comparativoO aumento no consumo e o uso

mais eficiente de fertilizantes minerais

que ocorreu no Brasil e semanteve nos últimos anos é,certamente, um componen-te importante no aumento daprodução e da produtividadeda maioria das culturas -principalmente aquelas con-sideradas de exportação. Osdados da figura 08 indicamque isto é uma tendênciatambém para outros países,e que o Brasil foi o único, emcomparação com a China, aÍndia e os países em de-senvolvimento que, no período conside-rado (1984-1994), apresentou aumentomédio da produção de grãos signi-ficativamente superior ao aumentomédio no consumo de fertilizantes.Esse fato é uma prova inquestionávelde aumento da eficiência do uso defertilizantes, nesse período, em nossopaís.

Há outro ponto a destacar quandose distingue o consumo de fertilizantespor grupos de culturas. As chamadasde exportação, como citros, soja, canae café, e que apresentam, em geral,mais altas produtividades, consomemmuito mais fertilizantes que aquelasque se constituem em produtos dacesta básica (mandioca, feijão, arroz emilho) onde se utilizam doses muitoaquém das recomendadas pela pes-quisa para alcançarem maiores produ-tividades (Fig. 09).

Relações de consumoDentre o três macronutrientes pri-

mários, nitrogênio, fósforo e potássio,a utilização de doses muito aquém dasadequadas é muito mais crítica para onitrogênio. Os dados da figura 10 mos-tram a evolução no Brasil da relação deconsumo de N/P2O5/K2O na década de50 e 60 e de 1970 até 2002. Em 1970,essa relação era de 0,67/1,0/0,8 e em1976 atingiu 0,37/1,0/0,52.

Esse aumento relativo no consumode P2O5

em relação ao N, em 1976, foiresultado da explosão da ocupação dossolos da região dos cerrados, atravésde incentivos governamentais. Comoesses solos são extremamente defi-cientes em fósforo, esse aumento eraplenamente justificável.

De 1976 até mais recentemente,essa relação voltou a se estreitaratingindo, em 2000, 0,79/1,00/1,14, paratodo o N/P2O5/K2O consumido naagricultura brasileira, inclusive nacultura de soja (Fig. 11). Se excluirmosa soja desses cálculos, pois essacultura praticamente não consomenitrogênio dos fertilizantes, a relaçãoficaria em 1,18/1,00/1,21. Se comparar-mos essa relação com a de países queapresentam agricultura tecnificada paraobtenção de altas produtividades, qualseja, de 2,82/1,00/1,10, pode-se concluirque a sub utilização de nitrogênio é umdos fatores mais limitantes para oaumento da produtividade de muitasculturas para as nossas condições.Essa relação de consumo para o anode 2002, no Brasil, foi de 0,64/1,00/1,09,considerando-se o consumo da culturada soja, ou 1,15/1,00/1,17, sem consi-derar a soja.

Luiz Roberto: “visão positiva”

Longe do ideal

52 97 114

278 295

602

0

100

200

300

400

500

600

BRASIL

VENEZUELAEUA

FRANÇACHINA

HOLANDA

kg/ha N-P2O5-K2O

Fonte: IFA, 1992.

52

224

741

(1987/88)

Consumo médio de nutrientes(1990-1991)

Fig. 06

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Consumo críticoO baixo consumo de nitrogênio pode

ser confirmado por um estudo deTsuioshi Yamada e Alfredo Scheid Lopes(1999). Assumindo-se uma eficiênciamédia de 60% para o nitrogênio, 30%para o fósforo e 70% para o potássio ea exportação (remoção das áreascultivadas pela produção) estimada paraas 16 principais culturas cultivadas,chegou-se ao seguinte déficit anualestimado de nutrientes, tomando-secomo base dados médios do período1993-1996:a) 888 mil toneladas de N, mesmo

considerando todo o N da soja e dofeijão como provenientes da fixaçãobiológica;

b) 414 mil toneladas de P2O5; ec) 413 mil toneladas de K2O.

Hoje, possivelmente, o déficit denitrogênio na agricultura brasileira jáultrapassa 1 milhão de toneladasanuais.

Esses dados não significam queestamos consumindo a quantidadeadequada de fósforo e de potássio, masque, dentre os três macronutrientes, osubconsumo é muito mais crítico emrelação ao nitrogênio. Esses dadosmostram que o déficit total de nutrientescorresponde a cerca de 30% doconsumo atual no país, representandoum déficit por área da ordem de 25 a 30kg de nutrientes por ha.

Revelam ainda que, na média, oprocesso produtivo da agricultura, nastaxas atuais de consumo de fertilizantesestá, em realidade, minando o recursosolo. Isso pode, no longo prazo, levar a

conseqüências altamente danosaspara a sustentabilidade da nossaagricultura.

Outro fator de baixa produtividademédia de um grande número deculturas no Brasil é a utilização dedoses insuficientes de calcário, apesardas respostas espetaculares emrelação aos aumentos de produção erelação benefício-custo, como mostraa figura 12. Isto é especialmente rele-vante pelas características de acidez degrande parte dos solos brasileiros.

Associa-se a isto, a restriçãocausada por toxidez de alumínio, a qual,segundo relatório da FAO, divulgado em2000, afeta cerca de 63% da área doBrasil. Esses problemas são resol-vidos com uso de doses adequadas decalcário.

Baixo uso de fertilizantesmina o recurso solo

Restrições na Holanda

kg/ha N-P2O5-K2O

110 110 114

272 277

545

0

100

200

300

400

500600

BRASIL

VENEZUELA EUA

FRANÇACHINA

HOLANDA

Fonte: IFA, 1999

Consumo médio de nutrientes, 1998Restrições na Holanda

110 110 114

272 277

545

Fonte: IFA, 1999, ANDA, 2003.

Fig. 07

2002: 138

kg/ha

Lavouras de exportação favorecidasConsumo de Fertilizantes no Brasil - 2002

Fig. 09

kg N+P2O5+K2O/ha

MANDIOCAFEIJÃO

ARROZMILHO

CITRUSSOJA

CANACAFÉ

Fonte: ANDA, 2003

1032

119 122 138

195

Alimentosbásicos

Culturas deexportação

83

0

50

100

150

200

250

195

28

7

2217

8

55

26

16

63

158

41

0

10

20

30

40

50

60

70

Cereais Raízes e tubérculos Fertilizantes

Fonte: World Resources 1998-1999 – www.wri.org

Brasil China Índia Países emdesenvolvimento

Incr

emen

to (%

)

Bom para a produtividadeIncremento no consumo de fertilizantes e na produtividade

de cereais, raízes e tubérculos no período de 1984-1994

Fig. 08

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Fundo do poçoCom incentivos fiscais e financia-

mentos oficiais, de longo prazo, a partirdo fim da década de 60 e início dos anos70, a capacidade de moagem de cal-cário no Brasil atingiu cerca de 50 mi-lhões de toneladas anuais. Isso signifi-cou um amplo aumento de oferta desseinsumo, considerado essencial pararacionalização da produção agrícola nopaís.

Estimativas que levam em conside-ração, entre outros fatores, a explosãodo crescimento da agricultura e pe-cuária na região dos cerrados, revelamuma necessidade de consumo da or-dem de 70 milhões de toneladasanuais.

Na verdade, o que ocorreu, em re-lação ao consumo, no período de 1984a 2002, foi que mesmo nos anos demelhor resultado de consumo aparente(1993 e 1994), utilizou-se apenas cercade 40% da capacidade instalada demoagem (Fig. 13).

O ano de 1990 foi o fundo do poçodo subconsumo de calcário pela agri-cultura brasileira, com não mais de 20%de consumo aparente em relação àcapacidade de moagem instalada.Atualmente, os níveis de consumoaparente estão entre 17 milhões e 19milhões de toneladas. Ainda é umconsumo muito aquém do que deveriaestar sendo utilizado para umaagricultura mais rentável e produtiva.

Relação inadequadaFig. 10

Relações de consumo de N-P2O5-K2Ona agricultura brasileira 1970-2002

0

0,2

0,4

0,6

0,8

1

1,2

1,4

1970 75 80 85 90 95 2000ANOS

Fonte: ANDA, 2003.

N / P2O5 / K2O50’ 0,33 / 1,00 / 0,5060’ 0,50 / 1,00 / 0,65

P2O5

K2O

N

Relações

Custo e benefícioBalanço econômico da calagem (Dose: 3t/ha)

Mococa, São Simão e Guaíra (SP)kg/ha

01000

2000

3000

4000

5000

6000

7000

8000

9000

Milho Soja Algodão

Em kg/ha:Custo do calcário

Aumento de produção:No 1o ano

No período

360422 150 473 120 245

(5 anos) (3 anos) (4 anos)Fonte: Raij & Quaggio, 1984.

2.6091.746

7.677

Fig. 12

Consumo tecnificadoRelação de consumo de nutrientes no Brasil (total e sem soja)

e dos países com agricultura tecnificada - 2002

Fig. 11

N P2O5 K2O N P2O5 K2O N P2O5 K2OCOM SOJA SEM SOJA PAÍSES COM AGRICULTURA

TECNIFICADAFonte: ANDA, 2003.

0

0 , 5

1

1 , 5

2

2 , 5

3

0,791,14 1,18

1,00

2,82

1,00 1,001,001,21

Relações

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1 0

Longe do adequadoO subconsumo de calcário se agrava

ainda mais quando se compara aevolução comparativa entre consumo decalcário e de fertilizantes no Brasil, de1973 a 2002, como mostra a figura 14.Uma relação entre o consumo decalcário e de fertilizantes consideradaaceitável pela pesquisa para aagricultura brasileira seria de 2,5 a 3,0para 1,0 – ou seja, para cada toneladade fertilizante aplicado, seriam neces-sárias 2,5 a 3,0 toneladas de calcário.

Essa relação considerada idealsomente foi observada em 1973,estreitando para quase 1 para 1, nosanos recentes, sendo que, em 2002,pela primeira vez, o consumo de calcáriofoi menor que o de fertilizantes (relação0,97:1,0). Mesmo que se considere aexpansão da área sob sistema deplantio direto, sistema que tende a

reduzir as necessidades de uso decalcário em relação ao cultivoconvencional, o balanço atual estálonge do ponto ideal para que sejamatingidas produtividades máximaseconômicas no processo produtivo.

Isso não significa que estamosutilizando muito fertilizante no nossosistema produtivo – os dados mostra-dos anteriormente demonstram queisso não é o caso. O fato, sim, é que énecessário aumentar tanto o uso defertilizantes como também de calcário.

Bons produtoresEssa sub utilização tanto de

fertilizantes, principalmente osnitrogenados, como de calcário e deoutras tecnologias disponíveis decomprovada eficiência, leva a umaquestão: Qual é seu reflexo naprodutividade, principalmente em

relação aos alimentos básicos?Os dados da figura 15 comparam

as produtividades médias de arroz,milho, trigo, feijão e soja no Brasil compaíses que apresentam altasprodutividades médias. Percebe-seque, apenas no caso da soja, onde ouso de alta tecnologia é quase umaregra nas áreas produtivas, aprodutividade média brasileira ésuperior a um grande produtor mundial,como os Estados Unidos.

Os dados comparativos deprodutividade de arroz no Brasil com aChina, onde toda a produção é sobirrigação por inundação, são até certoponto questionáveis. Isso porque noBrasil a média inclui também áreas desequeiro, cujas produtividades sãomuito baixas, em comparação com osistema sob irrigação, fazendo cair amédia geral do país.

O ponto importante é que muitosbons produtores dessas culturas noBrasil estão com as produtividadesmuito próximas ou até acima dasmédias desses outros países. São, porexemplo, lavouras brasileiras onde seatinge 10-12 t de milho/ha, 6 t de arrozde sequeiro/ha, 8-9 t de arroz irrigado/ha, 4 t de soja/ha, 6-7 t de milho safrinha/ha (após a soja), 3,5 t de feijão irrigado/ha e 350 arrobas de algodão/ha.

Estes números demonstram que hádisponibilidade de tecnologia para queessas altas produções sejam perfei-tamente alcançadas desde que se façauma diagnose correta das razõesdessas diferenças e que se adotemmedidas para que sejam, pelo menos,reduzidas.

Caminho a percorrerProdutividade média no Brasil

e em outros países - 2002

Fig. 15

t/ha

ARROZ MILHO TRIGO FEIJÃO SOJA

Fonte: FAO, 2003.

0123456789

BRASIL

3,3 3,0

1,50,7

2,6

6,3

8,0CHINAEUAFRANÇA

7,4

1,82,4

0

5

10

15

20

25

84 88 92 96 00 02

Milhões t

Ano

Solos pouco corrigidosConsumo de calcário no Brasil - 1984 a 2002*

Fig. 13

Fonte: ABRACAL, 2003

•Capacidade instalada: 50 milhões t/ano; Demanda estimada: 75 milhões/ano

O grave subconsumoRelação de consumo calcário/fertilizantes

no Brasil - 1973 a 2002

Fig. 14

0

0,5

1

1,5

2

2,5

3

3,5

73 80 85 88 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 .00 .01 .02

RELAÇÃO

CALCÁRIOFERTILIZANTES

ANOSFonte: ANDA, ABRACAL, 2003

Relação de consumo calcário/fertilizantes em 2002 = 0,97:1 !!!!

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1 1

Alfredo Lopes:“potencial único”

m outro importante aspectoque se faz necessáriodiscutir é o princípio desubstituição da terra. Trata-

se do conceito de que fertilizantesminerais e terra são substituíveis. Istoé, o aumento do uso eficiente defertilizantes permite uma redução naárea cultivada, e vice-versa.

Todas as práticas agrícolas, inclu-sive o uso de fertilizantes, apresentamimpactos ambientais. Mas a evidênciapreponderante é que fertilizantesminerais são necessários para o bem-estar da humanidade.

Existem riscos ambientais, mas elessão secundários em relação aosbenefícios, conforme o estudo O Usode Fertilizantes Minerais e o MeioAmbiente*, apoiado pelo Programa deMeio Ambiente das Nações Unidas,UNEP, pela Associação Internacional daIndústria de Fertilizantes, IFA e pelaAssociação Nacional para Difusão deAdubos, ANDA. Vale a pena compararos casos de substituição de terraocorridos, por exemplo, no Brasil (Fig.16), Estados Unidos (Fig. 17), Índia (Fig.18) e China (Fig. 19).

Em nome danaturezaUso de tecnologia favorece o princípiode substituiçao da terra

UEm 1940, quando relativamente

pouco fertilizante era usado, a produçãodas 17 culturas mais importantes naprodução de alimentos, forragem e fi-bras nos Estados Unidos atingiu 252milhões de toneladas, em 129 milhõesde hectares.

Compare-se esta esta-tística com o ano de 1990,quando os agricultoresamericanos colheram a-proximadamente 600 mi-lhões de toneladas em so-mente 119 milhões de hec-tares – 10 milhões de hec-tares a menos que 50 anosantes.

Se os Estados Unidostentassem produzir a co-lheita de 1990 com a tec-nologia que prevaleceu em1940, seria necessário ocultivo de 100 milhões de hectares a-dicionais de terra de qualidade seme-lhante. Isto poderia ter sido alcançado,teoricamente, arando-se 73% daspastagens extensivas da nação, ou con-vertendo 61% das florestas em área decultivo.

Destruição evitadaEm realidade, uma vez que muitas

dessas terras têm um potencialprodutivo muito menor do que o dasterras agora sob cultivo, realmente teriasido necessário converter umaporcentagem muito maior de pastagense áreas de pecuária extensiva ouflorestas e bosques em áreas de cultivo.Se isto fosse feito, imagine-se adestruição adicional pela erosão eólicae hídrica, o desmatamento e a extinçãode espécies de vida selvagem pordestruição de seus habitats, e ainda aenorme redução de oportunidade derecreação ao ar livre.

Poupanças notáveis no uso de terratambém foram observadas na China(Fg. 19) e na Índia (Fig. 18) pelaaplicação de tecnologia moderna para

aumentar as produtivida-des na agricultura. Se osrendimentos de cereais de1961 tivessem preva-lecido em 1992, a Chinateria precisado aumentarsua área de cereais emquase três vezes e a Índiaem aproximadamenteduas vezes, para igualaras colheitas desses paí-ses em 1992. Obviamen-te, tal excesso de terraagrícola não estava dispo-nível.

O impacto social cau-sado pelos aumentos de

produção de trigo na Índia, passandode 11 milhões de toneladas, em 1965,para 55 milhões de toneladas, em 1991,foi muito grande. Permitiu que 65% de312 milhões de indianos obtivessem omínimo de 2350 quilocalorias diáriasna alimentação humana, segundorecomendações da FAO.

0

50

250

200

150

100

38-40 48-50 58-60 68-70 78-80 88-90

Milhões haÁrea total poupada pelo uso de tecnologia; 17 culturas,

1938- 40 a 1988-90.

Área usada

Área poupada

Anos

Fonte: Borlaug & Dowswell, 1996.

Produção:1938 - 40 : 252 Milhões t1988 - 90 : 596 Milhões t

Terras poupadas no EUA

Fig. 17Fig. 16

Fonte: Adaptado de Cardoso, 1998 e LSPA – IBGE, 2003.

Milhões ha t/ha

0

20

100

80

60

40

1970 75 80 85 90 95 96 97

Área usada

Área poupada

Anos

2

1

098

1,45

3,45

120 3

99 00 01 2002

140Produção

Produtividade(milhões t) (t/ha)1970 - 49,6 1,45 2002 - 184,5 3,45

Produção agro-vegetal (base seca) em 16 culturas e área poupada, 1970 a 2002

Terras poupadas no Brasil

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O caso do BrasilPara o caso do Brasil, no período de

1970 a 2002, mesmo estando as produ-tividades atuais ainda longe do pontode máximo econômico, o aumento daprodução das 16 principais culturas (ba-se seca) passando de 49,6 milhões detoneladas para 184,5 milhões de tone-ladas no período, foi muito mais peloaumento da produtividade, passando de1,45 toneladas por hectare em 1970 pa-ra 3,45 toneladas por hectare em 2002,do que pelo aumento da área cultivada(Fig. 16).

Também no caso do Brasil, para queobtivéssemos a produção total de 2002,porém com as produtividades de 1970,teríamos que estar cultivando mais doque o dobro da área cultivada em 2002.

Nossa defesa do princípio de substi-tuição da terra no Brasil vem de longadata. Essa filosofia foi o ponto básicodo artigo Preservação Ambiental e Pro-dução de Alimentos (Alfredo S. Lopes eLuiz Roberto G. Guilherme, ANDA, 1991),apresentado na ECO-92 bem como atrês ministros da Agricultura na últimadécada.

Para entender melhor esse princípio,vejamos outro exemplo. Em 1989, aANDA, que na época congregava tam-bém as empresas produtoras de cal-

Tecnologias poupam terra agricultáveis

cário, apresentou um programapara o governo federal onde jus-tificava o incentivo ao uso de cal-cário na agricultura brasileira. Ameta era atingir um aumento, nocurto prazo, de 23,4 milhões detoneladas na produção dosgrãos milho, trigo, feijão, arroz esoja.

Com base em uma série deexperimentos envolvendo a cala-gem nos solos brasileiros, a pre-missa básica foi a de que, com oincentivo ao uso de doses ade-quadas de calcário, obter-se-ia

um aumento médio de produtividadedessas culturas de 600 kg por hectare.Ou seja, a produtividade passaria de1,74 para 2,34 toneladas por hectare,aumentos considerados até conserva-dores pelos dados de pesquisa obtidosno país, como mostra a figura 12.

Em nome da biodiversidadeO custo desse programa seria de

1,28 bilhão de dólares. Os retornosestimados pelo aumento da produção(23 milhões de toneladas), aos preçosmínimos vigentes à época, seriam daordem de 4,18 bilhões de dólares - ouseja, uma relação benefício/custo de3,2/1,0. Se a tomada de decisão fossea de aumentar as mesmas 23 milhõesde toneladas de grãos pela simplesexpansão da área plantada, mas com aprodutividade vigente à época, de 1,74toneladas por hectare, seria necessáriodesmatar 15,9 milhões de novoshectares – equivalente a nada menosdo que perto de 90% da área total doUruguai, ou à quase totalidade dasterras potencialmente aráveis da Itália- a um custo de US$ 3,2 bilhões.

Dados da FAO estimam que cadatonelada de fertilizante equivale à pro-dução de 4 novos hectares sem o uso

de fertilizantes. Portanto, assumindo-seque os 9 milhões de toneladas de fertili-zantes consumidos à época teriam pou-pado 36 milhões de hectares, mais os15,9 milhões de hectares não ocupados,a soma de terra poupada atingiria 51,9milhões de hectares - área equivalentea um terço do Estado do Amazonas.

Por tudo isso, vale a pena frisar opapel que representa o uso de tecno-logias sustentáveis que levem ao au-mento da produtividade agropecuárianas áreas já incorporadas ao processoprodutivo. De fato, ele se constitui umpoderoso instrumento de preservaçãoambiental, pois diminui as pressões dedesmatamento das áreas florestadas,muitas vezes não adequadas ao pro-cesso intensivo da produção agrope-cuária, deixando mais espaço para a vi-da silvestre, a manutenção da biodi-versidade e a preservação da natureza.

Esse dados indicam, claramente,que, no curto prazo, as políticas públicasde apoio à agricultura deveriam, comabsoluta prioridade, incentivar o aumen-to da produtividade com sustentabili-dade nas áreas já incorporadas ao pro-cesso produtivo e não a simples expan-são da fronteira agrícola. O Brasil apre-senta cerca de 90 milhões de hectaresde pastagens degradadas que pode-riam, em face da existência de tecno-logia sustentáveis de produção disponí-veis, aumentar em muito a produção degrãos.

* Traduzido e adaptado por Alfredo S. Lopes e Luiz

Roberto G. Guilherme. Cópias desse trabalho po-

dem ser solicitadas à ANDA. Tel.: (0-XX-11) 3255-

9277 Site: www.anda.org.br. Os interessados em

conhecer detalhes sobre a Declaração de Apoio à

Proteção da Natureza com Agricultura e Silvicultura

de Alta Produtividade devem acessar o site

www.highyieldconservation.org

0

50

250

200

150

100

1961 65 70 75 80 85

Milhões haÁrea total poupada pelo uso de tecnologia;

todos os cereais, 1961- 92

90 92

Área usada

Área poupada

Anos

Fonte: Borlaug & Dowswell, 1996.

Produção:1961 : 87 Milhões t1992 : 200 Milhões t

Terras poupadas na Índia

Fig. 18

0

50

250

200

150

100

1961 65 70 75 80 85

Milhões ha Área total poupada pelo uso de tecnologia; todos os cereais, 1961- 92

90 92

Área usada

Área poupada

Anos

Fonte: Borlaug & Dowswell, 1996.

Produção:1961 : 147 Milhões t1992 : 400 Milhões t

Terras poupadas na China

Fig. 19

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oda a análise feita até aquinão terá sentido se nãoforem implementadas algu-mas ações vitais. Suas me-

tas devem ser, entre outras, a valori-zação da agricultura, o fortalecimento doagronegócio brasileiro, o aumento darenda na agricultura de subsistência efamiliar e a fixação do homem ao campo– todas plenamente possíveis dentro deum conceito amplo de preservaçãoambiental.

Para tanto, temos defendido comtodas as nossas forças, os aspectosmencionados a seguir, os quaisdiscutiremos detalhadamente. Sãoeles: a conscientização popular, a forçado agronegócio, a decisão política, asações emergenciais e a preservaçãoambiental.

Conscientização popularHá um desconhecimento, sobretudo

na população urbana, da importânciada agricultura e do trabalho do agricultorpara o desenvolvimento econômico esocial do país. Muito destaque tem sidodado nos noticiários das redes detelevisão para manchetes como, porexemplo, “invasão de sem-terra”, “calotena agricultura”, como se todo agricultorfosse caloteiro; “intoxicação comagrotóxico” e “leilão da vaca nelore queatingiu 700 mil reais”, como se issofosse a tônica dominante do setor.

Infelizmente, pouco espaço é dadoa notícias como “nova variedadepromete reduzir problemas desubnutrição”, “maior produtividade dasculturas melhora a competitividade daagricultura brasileira a nível mundial” etantos outros fatos positivos freqüentes

SoluçãodefinitivaFortalecimento da agriculturadepende da conscientização sociale de políticas duradouras

Tno campo. Pela primeira vez, uma im-portante rede brasileira de televisãoapresentou, em horário nobre, umasérie de reportagens no mês de maiode 2003, mostrando esse Brasil que obrasileiro da cidade não conhece: OBrasil Rural. Ainda hoje, muitas criançasque vão ao supermercado com os paiscomprar um pacote de leite ou um saqui-nho de feijão, pensam que aquilo é pro-duzido numa fábrica. Não fazem nenhu-ma relação com o trabalho diário dequem produz, faça chuva ou faça sol,esses e outros produtos agropecuáriospara que os mesmos estejam dispo-níveis na gôndola do supermercado.

Mesmo nas escolas primárias,existem educadores que, movidos pordistorções nas mensagens ecológicas,afirmam, sem base científica, que “tudoque é orgânico e natural é bom; tudoque é químico e sintético é tóxico”. Indu-zem, assim, o aluno à formação de uma

mentalidade de que todo o processoprodutivo tradicional no Brasil está forados padrões de sustentabilidade e depreservação ambiental.

Falsos mitosA propósito, sobre o assunto

fertilizante mineral ou orgânico, vale apena mostrar os dados do experimentomais antigo do mundo, onde se faz acomparação entre essas fontes denutrientes (Fig. 20). Ele foi instalado naEstação Experimental de Rothamsted,na Inglaterra, em 1843. Durante 150anos, foram aplicados os tratamentosmostrados na figura.

De 1979 a 1983, foi colhido trigosarraceno, cujos valores médios de 5anos de produção aparecem nasrespectivas colunas. Ë óbvio que umaaplicação anual de 35 toneladas deesterco de curral - o que envolve umgrande volume de material e umtrabalho intenso para aplicação ao solo-, durante 150 anos, pode substituir aadubação com fertilizantes minerais.

É também óbvio que o simplesenriquecimento das 35 toneladas deesterco com 96 kg de N mineral por anolevou às maiores produções. Em outraspalavras, fertilizantes minerais eadubos orgânicos devem serconsiderados como complementares,não competitivos.

Para formar uma conscientizaçãopopular positiva sobre esse assunto,torna-se necessária uma ampla cam-panha de marketing, procurando atingirtodos os segmentos da sociedade, para

Ricos complementosAdubação mineral comparada à adubação orgânica

Fig. 20

Fonte: Rothamsted Experimental StationInício 1843 - Dados Médios 1979-1983

0

1

3

4

5

6

7

8

TESTEMUNHA PKNaMg N2PKNaMg ESTERCO35 t/ha ANO

ESTERCO + N235 t/ha +

96 kg N/ha/ano

t/ha

2

7,6

5,7 5,9

kg/ha:36 P; 90 K(todo ano)

15 Na; 36 Mg(cada 3 anos)

1,81,6

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desmistificar os falsos mitos. A criançaque será o cidadão de amanhã deve re-ceber, na sua formação inicial, umamensagem positiva do que representao esforço tecnológico de produção agro-pecuária e de como isso pode contribuirpara que esse país se transforme emuma grande nação socialmente maisjusta.

Uma boa alternativa para isso seriaa elaboração de histórias em quadri-nhos, criando personagens que trans-mitam informações básicas de comocuidar da terra, combater a erosão, adu-bar corretamente, reduzir os riscos parao homem e para o ambiente pelo usode produtos protetores de plantas, etc.Logicamente, isso envolve, além derecursos financeiros, uma ação contí-nua no aprimoramento das mensagense o comprometimento de todos os seg-mentos do agronegócio.

A força do agronegócioO agronegócio brasileiro, que

representa todos os segmentos de an-tes da porteira, dentro e depois da por-

teira, constitui-se uma grande força fi-nanceira. O problema é que carece deuma maior organização para podercontribuir cada vez mais com o desen-volvimento desse país. Segundo dadostrabalhados pela Associação Brasileirade Agribusiness, ABAG, o agronegóciobrasileiro atingiu, em 1996, 21% do PIB- R$ 161 bilhões, para um ProdutoInterno Bruto de R$ 779 bilhões (Fig.21). Nesse ano, esse segmento foiresponsável por 37% dos empregos,25% do valor da produção e 40% dasexportações, números que mostram asua importância para a economianacional.

Em 2002, a participação percentualdo agronegócio brasileiro (R$ 424,3bilhões) no Produto Interno Bruto (R$1.463 bilhões) aumentou ainda mais,atingindo 29%. Outro aspecto relevantea ser comentado é que o agronegóciobrasileiro tem mostrado um crescimen-to positivo na balança de pagamentos,no período de 1972 a 2002, compen-sando em muitos períodos as retraçõesde outros setores (Fig. 22).

Apesar dessa evolução, o segmentode dentro da porteira, ou seja, o setorprodutivo da agricultura mostrou, nasúltimas duas décadas, uma sensívelredução na sua renda total, revertendoparcialmente esse quadro apenas nosúltimos 2 anos, embora tenha obtidosensíveis aumentos na produção, comestabilização ou até diminuição da áreacultivada, o que reflete maior eficiênciaprodutiva (Fig. 23).

Porteiras do agronegócioComo se dividem os segmentos do agronegócio no Brasil - 1996

Fig. 21

ANTES DAPORTEIRA

(7,4 Bi; 4,6 %)DENTRO DA PORTEIRA

(68,1 Bi; 42,3 %)DEPOIS DA PORTEIRA

(85,5 Bi; 53,1 %)

Fonte: Pinazza e Alimandro, 1999

PRODUTO INTERNO BRUTO: R$779 BILHÕES AGRONEGÓCIO : R$161 BILHÕES (21%)

37 % dos empregos, 25 % do valor da produção e 40 % das exportações

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Esse aspecto é importante, poisressalta que as reivindicações dosegmento de dentro da porteira (29,6%do PIB do agronegócio em 2002), porpolíticas agrícolas de médio e longoprazos que possam levar às condiçõespara que o Brasil exerça em sua ple-nitude a sua natural e imbatível vocaçãoagrícola, teriam muito mais força polí-tica se incluíssem também o peso finan-ceiro dos segmentos de antes da portei-ra (6,2% do PIB do agronegócio), edepois da porteira (64,2% do PIB doagronegócio), dentro de um conceitomais amplo de segurança alimentar.

É preciso também que os segmen-tos de antes da porteira e depois daporteira se conscientizem de que se aagricultura for mal isso afetará tambémos seus negócios. De uma forma ou deoutra, ambos segmentos devem perce-ber que são parceiros em ações quemantenham as suas “galinhas-dos-ovos-de-ouro” produtivas e com ganhosque as permitam continuar no processoprodutivo.

Poucas empresas que atuam nosegmento de antes da porteira oudepois da porteira têm ações concretasque beneficiam o produtor dentro daporteira. Um exemplo positivo de açõesnesse sentido é o Programa de Apoioàs Exportações do Complexo Soja,apresentado ao governo federal emjulho de 2001 (ver a reportagem Jazidasdo Futuro, em Panorama Rural edição30, agosto/2001).

Esse programa, que reuniu na mesade negociações entidades de todos ossetores envolvidos nesse complexo, te-ve o mérito de levar em consideraçãoas vantagens para o complexo como umtodo, e não os benefícios individuais.Certamente, serve de exemplo do quedeve ser feito em outras cadeias produ-tivas, inclusive aquelas envolvendo aprodução de alimentos básicos.

A decisão políticaA falta de política agrícola de médio

e longo prazo, com o estabelecimentode regras claras que permitam aoagricultor planejar suas atividades, temsido uma constante nas duas últimasdécadas no Brasil. Por isso, não épossível entender o arquivamento, pelo

governo federal passado, das propos-tas do Fórum Nacional da Agricultura,elaboradas durante dois árduos anosde trabalho por representantes de váriossegmentos do setor e órgãos do go-verno.

Atualmente, o que se vê sãooperações “apaga incêndio”, deixandoo futuro em aberto – ou, o que é aindapior, às vezes fechado. Caberia umaampla discussão com a sociedade seela quer manter o triste status quo deter ainda 25 a 30 milhões de pessoaspassando fome nesse país gigante ede não se preparar para ocupar o lugarde destaque como um grande paísprodutor mundial de alimentos paraatender parte da demanda crescenteapontada na introdução desse trabalho.Com discussões amplas e ações efe-tivas envolvendo os dois primeiros as-pectos citados (conscientização populare a força do agronegócio), seria bemmais fácil conseguir o estabelecimentode uma sólida política agrícola.

Tomemos como exemplo, a políticaagrícola implementada pela China. Atéa década de 50, esse era o país quepraticava a agricultura mais natural eorgânica do mundo, usando muitopouco insumos modernos. Nessaépoca, a produtividade do arroz era deduas toneladas por hectare, praticamen-te a mesma obtida durante a dinastiaYuan, entre 1271 e 1368.

Mas os dirigentes chineses viramque não era possível mais continuarcom as produtividades que vinham

Balança positivaAgronegócio tem superávit na balança comercial do Brasil (1972-2001)

Fig. 22

-25

-20

-15

-10

-5

0

5

10

15

20

72 75 78 81 84 87 90 93 96 99

Bilhões US$

-25

-20

-15

-10

- 5

0

5

10

15

20

Fonte: SECEX, 2002 Anos

AgronegócioOutros setoresTotal

Eficiência produtivaIndicadores do desempenho da agricultura no Brasil 1980 - 2002

(1980 = índice 100)

Fig. 23

Fonte: FGV/IBRE/CEA, 2003

0

20

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140

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1980

1982

1984

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1990

1992

1994

1996

1998

170

Renda total

Produção

Área

2000

2002

Anos

Índice

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sendo obtidas, diante do aumento dademanda da crescente população, quehoje já atinge cerca de 1,2 bilhão de ha-bitantes. Assim, partiu-se para a “oci-dentalização” da produção. Para ilustraresse aspecto, a figura 24 apresenta aevolução do uso de fertilizantes mine-rais naquele país, os quais represen-tam, hoje, mais de 78% do consumointerno de nutrientes. Ainda assim, con-tinua o aproveitamento, de modo efi-ciente, da grande produção de adubosorgânicos naquele país.

Os resultados positivos dessapolítica agrícola podem ser vistos nasprodutividades comparativas de algu-mas culturas na China e no Brasil (Fig.25). Cabe ressaltar que esta maior pro-dutividade média de várias culturas naChina é resultado do uso de tecnologiase insumos, principalmente em peque-nas propriedades que atuam em sis-tema de agricultura familiar. Isto de-monstra que o acesso a tecnologiasmodernas que levam à ProdutividadeMáxima Econômica, PME, não é privi-légio de grandes propriedades ou em-presas agrícolas.

GargalosUma boa política agrícola

certamente seria aquela que procuras-

se, dentre outros objetivos, estabelecerações que pudessem se contrapor oudiminuir os efeitos negativos de algunsdos gargalos do agronegócio brasileiro.Segundo Luiz Antônio Pinazza e RégisAlimandro (1999), os principais proble-mas são os seguintes:• Carga tributária em alimentos indus-

trializados: 32,7% no Brasil contra5,5% na França; 6% na Espanha ena Holanda; 7% na Alemanha; e 8%em Portugal.

• Custo equivalente de transporte atéo porto, por tonelada: US$ 32 no

Brasil contra US$ 15 nosEstados Unidos e US$17 na Argentina.

• Taxas portuárias, portonelada: US$ 9 a US$12 no Brasil, contra US$3 em Roterdã, na Holan-da.

• Taxa básica de juros:20% no Brasil, em julhode 2001, contra 5,5% dataxa média internacio-nale 1,25% nos EstadosUnidos.

• Barreiras tarifárias: pes-quisas envolvendo os 25maiores importadoresde óleo de soja do mun-do, que representam40% do consumo mun-dial, mostram que o cres-cimento do consumoanual do produto foi de

2,76%. Em uma simulação realizadanesses países, o crescimentodoconsumo de óleo, sem as barreiras,seria de 8,38%.

• Protecionismo dos países desenvol-vidos: subsídios dos 29 paísesmembros da OCDE de US$ 366bilhões, mais de US$ 1 bilhão pordia – ou seja, 42% do valor da produ-ção – sendo que a União Européiaatingiu 142 bilhões; os EstadosUnidos, US$ 87 bilhões; e o JapãoUS$ 56 bilhões.Outro aspecto que merece reflexão

Falta de políticas agrícolas afetam culturas, como a do café

Ocidentalização da China

TOTAL FONTE DO NUTRIENTEANO N-P2O5-K2O (% DO TOTAL)

MILHÕES t MINERAL ORGÂNICO

1949 4,3 1,4 98,6

1965 9,1 19,3 80,7

1975 16,0 33,6 66,4

1983 28,6 58,0 42,0

1998 34,4 78,3(e) 21,7(e)

Fonte: IFA, 2000

Quantidades de fertilizantes minerais e orgânicos aplicados na China

Fig. 24

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é o que ocorreu com a evolução do cré-dito rural no Brasil, em relação ao PIBagrícola, de 1970 até 2001 (Fig. 26). Cer-tamente, não são situações desejáveisnem o excesso de crédito, com dinheirofácil, subsidiado e muitas vezes malutilizado – como ocorreu até o início dadécada de 80 –, nem o atual baixo per-centual de crédito em relação ao PIBagrícola (para fazer face a uma econo-mia mundial globalizada aonde ossubsídios à agricultura chegam a 42%da produção nos países da OCDE).Essa “involução” do crédito agrícolaoficial, passando, a valores atualizadospara dezembro/99, de R$ 54 bilhões em1979, para R$ 11,8 bilhões, em 1999,levou a uma mudança sensível no perfildas fontes de crédito para a agriculturaem 1999/2000 e anos sub-seqüentes,com o agricultor entrando com mais de50% de recursos próprios (Fig. 27).

As ações emergenciaisEnquanto não é estabelecida uma

política agrícola clara que permitaagilizar o processo para que a vocaçãoagropecuária brasileira seja exercidaem sua plenitude, algumas açõesemergenciais podem ajudar, e muito,no curto prazo. Citamos como exemplo:

Transporte: num modelo de trans-porte baseado, em sua grande maioria,nas rodovias, porque não dar prioridadea uma constante operação tapa-buracosbem feita nas rodovias federais e esta-duais antes que o problema se agrave

de tal forma que apenas uma “recapea-mento” geral resolva? Talvez, se aque-les com capacidade de decisão usas-sem mais o transporte rodoviário ao in-vés do aéreo, esta situação já teria sidoresolvida.

Isenção de IPI: por que um taxistapode ter isenção de IPI na compra deseu instrumento de trabalho e o mesmonão pode ser estendido para tratores emáquinas agrícolas?

ICMS: por que o retorno de 75% doICMS pago pelos produtores de algodãodo Mato Grosso não pode ser adotadoem outras culturas e por outros estadosprodutores?

Armazenagem: por que não imple-mentar, no curto prazo, um programa

“INVOLUÇÃO” DO CRÉDITO RURAL OFICIAL 1979-1999 (Deflacionado)

em bilhões de R$

0

10

20

30

40

50

60

79 81 83 85 87 89 91 93 95 97 99

54,0

11,8

FONTES DE CRÉDITO PARA AAGRICULTURA

1999/2000 US$ 23,3 BILHÕES

- Industrias de insumos- Companhias de “trading”- Industrias de processamento- Outras

Crédito oficial

Recursos própriosdo agricultor

58 %14 %

28 %

Fonte: ABAG, BACEN, 2001

Queda de recursosFig. 27

O recuo do crédito agrícolaA drástica redução do crédito concedido

e o PIB na agricultura brasileira (US$ bilhões)

Fig. 26

0102030405060708090

70 75 80 85 90 95

CRÉDITO

PIB

ANOSFonte: Pinazza e Alimandro, 1999 e SECEX, 2002.

00

Produtividade disparaComparação da produtividade média de algumas culturas na China e no Brasil – 2002 (415 milhões t vs 95 milhões t)

Fig. 25

FAO, 2003.

0

1

2

3

4

5

6

7

CHINA BRASIL

t/ha

6,3

3,3 3,0

3,8

1,81,5

5,1

2,6

ARROZ MILHO TRIGO SOJA

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que permita a instalação de silos naspropriedades rurais, à semelhança doque ocorre nos Estados Unidos, ondea capacidade de armazenagem nasfazendas é suficiente para uma safra?

Extensão rural: por que não darmais ênfase aos programas estaduaisde extensão rural, principalmente paraatender os pequenos produtores ou deagricultura de subsistência e familiar,levando-lhes tecnologias sustentáveissimples que irão reverter em aumentossensíveis da produtividade e da rendadesse segmento?

Crédito: por que não desburocratizaro processo de liberação de crédito ruraldisponível, principalmente para o pe-queno produtor, incluindo nesse proces-so a implementação efetiva do segurorural para cobrir os riscos do impon-derável?

Esses são apenas alguns exem-plos de indagações que nos são feitaspor agricultores das mais diversasregiões do país. Talvez, essas e outrasquestões deveriam merecer umaatenção especial por parte daquelesque tenham poder de decisão e queestejam realmente interessados em

construir o futuro da nação. Logica-mente, para se estabelecerem as prio-ridades na execução dasações emergenciais, todosos segmentos envolvidosdeveriam ser consultados.

Preservação ambientalA implementação de

ações efetivas envolvendoos quatro primeiros as-pectos discutidos anterior-mente transcenderão emseus efeitos finais, o au-mento da produtividade e darenda do setor rural paraque o agricultor possa con-tinuar na sua missão de produziralimentos, fibras ou outros produtos daagropecuária. Seus efeitos serão tam-bém marcantes num contexto maisamplo que envolve questões comosustentabilidade e preservação am-biental.

Incentivos que permitam a adoçãode tecnologias sustentáveis que levemao aumento da produtividade daagropecuária brasileira resultarão nadiminuição das pressões de desmata-

mento em áreas menos vocacionadaspara produção intensiva, como é o caso

de muitas áreas da regiãoamazônica.

Esse enfoque deverá serbem recebido pela socieda-de, cada vez mais preocu-pada com problemas am-bientais, pelas ONGS eoutros órgãos nacionais einternacionais ligados aomeio ambiente. Trata-se deum processo do qual o Bra-sil, certamente, obterávantagens.

Um exemplo é o que vemocorrendo com a fantástica

evolução do plantio direto no Brasil enos cerrados, conforme mostra a figura28. Este fato está fazendo com que oBrasil seja, hoje, respeitado no mundointeiro como líder de um processo pro-dutivo na região tropical muito maissustentável que o praticado pela agri-cultura convencional de aração e grada-gem. O sistema é cerca de oito vezesmais eficiente no seqüestro de carbono(CO

2), contribuindo assim, para a redu-

ção do efeito estufa.Vale ressaltar que florestas nativas

são ainda mais efetivas no seqüestrode carbono e que, se a agricultura brasi-leira puder ser mais eficiente, produtivae sustentável nas áreas já exploradas,então estaremos contribuindo aindamais para a redução do efeito estufa edo aquecimento global. Vale a penarepetir: o uso de tecnologias susten-táveis, nas áreas já exploradas, que le-vem a um aumento na produtividade daagropecuária brasileira se constitui emum poderoso instrumento de preser-vação ambiental, reduzindo ou elimi-nando as pressões de desmatamentoem áreas menos vocacionadas paraprodução intensiva.

Carlos Alberto:“Plantio direto: exem-plo para o mundo”

Produção preservacionistaExpansão do plantio direto – Brasil e Região dos Cerrados

Fig. 28

AnosFonte: FEBRAPDP, 2003.

75/76 85/86 95/96 00/0180/81 90/91 03/04 (e)

Milhões ha

Cerrados

Brasil

02468

1012141618202224

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Desafio degigantePolíticas agrícolas estimulam aprodução, a renda do setor e tornamo país socialmente mais justo

Um dos exemplos mais mar-cantes do desenvolvimentoda agricultura no Brasil emdécadas recentes, com to-

dos os seus benefícios econômicos esociais, é o que aconteceu na regiãodos cerrados no Brasil Central. Até adécada de 60, essa região era conside-rada marginal para a produção agrícolaem decorrência de vários fatores.

Entre eles, cite-se a baixa fertilidadenatural de seus solos; a ocorrência deveranicos (períodos variáveis de faltad‘água na época das chuvas); a toxidez

de alumínio e deficiência de cálcio nosubsolo, limitando o desenvolvimentoradicular; a baixa capacidade dearmazenamento de água e a ausênciade infra-estrutura, como transportes,energia elétrica e outros.

Através de uma ação integrada doscentros de pesquisa, universidades,serviço de extensão, empresas priva-das, etc., foram geradas diversas novastecnologias. Com incentivos governa-mentais à época, elas permitiram quea região fosse palco, segundo NormanBorlaug, Prêmio Nobel da Paz de 1970,

da maior revoluçãoverde de toda a his-tória da humanida-de.

Já em 1990,exp lo ravam-se ,nessa região, 10milhões de hecta-res de área comculturas anuaissob condição desequeiro. A produ-ção era de 20 mi-lhões de toneladas

de grãos – produtividade média de 2 to-neladas por hectare – além de 300 milhectares irrigados e 35 milhões dehectares de pastagem melhorada, tota-lizando 22,6 milhões de toneladas dealimentos (Fig. 29).

Celeiros férteisLevantamentos não oficiais recentes

estimam que a região dos cerrados res-ponde, atualmente, por 43% do gadobovino, 23% da produção de café, 34%do arroz, 59% da soja e 29% do milho. Afigura 30 apresenta dados mostrandoque se a tecnologia disponível no anode 1995, e praticada por bons produto-res dos cerrados, fosse aplicada naárea de 45,3 milhões de hectares jáaberta, a produção poderia atingir 98milhões de toneladas de alimentos –ou seja, 4,3 vezes a produção de 1990(Fig. 29).

O potencial total da região, con-siderando-se a tecnologia disponível eas produtividades alcançadas por bonsprodutores em 1995 e assumindo-seas premissas da figura 31, é de 354milhões de toneladas de alimentos efibras. Nenhum país do mundo apre-senta essa possibilidade de crescimen-to na produção agropecuária no médioprazo.

Se isso se constitui um potencialfantástico nessa região, antes conside-rada marginal para a produção agrope-cuária, o que não poderia acontecer nasoutras regiões produtoras do Brasil,com solos mais férteis e menos limi-tações climáticas, se houvesse real-mente uma política de incentivo ao au-mento da produção, mediante o aumen-to da produtividade com sustenta-bilidade?

A fartura dos Cerrados

ATIVIDADE ÁREA PRODUTIVIDADE PRODUÇÃO(MILHÕES ha) (t/ha/ano) (MILHÕES t)

CULTURAS ANUAIS

SEQUEIRO 10,0 2,0 20,0

IRRIGADO 0,3 3,0 0,9

GADO DE CORTE 35,5 0,05 1,7

TOTAL 45,8 22,6

Fonte: Macedo, 1995

Produção de grãos e carne na região dos Cerrados - 1990

Fig. 29

Força disponível

ATIVIDADE ÁREA PRODUTIVIDADE PRODUÇÃO(MILHÕES ha) (t/ha/ano) (MILHÕES t)

CULTURAS ANUAIS

SEQUEIRO 20 3,2 64

IRRIGADO 5 6,0 30

GADO DE CORTE 20 0,2 4

TOTAL 45 98

Fonte: Macedo, 1995

Potencial de produção da região dos cerrados na área já aberta,utilizando tecnologias disponíveis

Fig. 30O salto possível

Assumindo:a) 1/3 da área ( 71 milhões ha) para preservação ambiental; b) disponibilidade de água para irrigar 10 milhões ha; c) aumento de produtividade compatível com tecnologias atuais.

ATIVIDADE ÁREA PRODUTIVIDADE PRODUÇÃO(MILHÕES ha) (t/ha/ano) (MILHÕES t)

CULTURAS ANUAIS

SEQUEIRO 60,0 3,3 192IRRIGADO 10,0 6,0 60

GADO DE CORTE 60,0 0,2 12CULTURASPERENES 6,0 15,0 90TOTAL 136,0 354

Potencial de produção da região dos Cerrados

Fig. 31

Fonte, Macedo, 1995

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Cabe também indagar quais seriamos retornos econômicos e sociais sefosse dada prioridade, pelas políticaspúblicas, à aplicação dos princípios demanejo sustentável – pelo uso de tecno-logias simples já geradas e que leva-riam a aumentos sensíveis de produtivi-dade – pelos produtores que praticama agricultura de subsistência e familiar,principalmente nas regiões mais po-bres do país? Vale a pena lembrar oexemplo da China, onde, mesmo numsistema produtivo amplamente domina-do pela agricultura familiar em peque-nas propriedades, as produtividadesmédias para várias culturas são bemsuperiores às obtidas no Brasil (Fig. 25).

Outro exemplo recente de resultadosamplamente positivos de implementa-ção de políticas públicas que levaram àinclusão social de milhares de agricul-tores de subsistência é o que vemocorrendo em áreas-piloto em paísesdo Sub-Saara na África conformetrabalho publicado na Revista Science,volume 299, número 5610, de 21 de feve-reiro de 2003, em artigo de autoria deGordon Conway (Presidente da Funda-ção Rockfeller) e Gary Toenniessen(Diretor de Segurança Alimentar damesma Fundação (Fig. 32).

Nesse trabalho, menciona-se ocaso da Sra. Namurunda, do distrito deSiaya, no Quênia, que representa asituação de milhares de agricultores desobrevivência naquela região. Até

recentemente, a falta de quase tudo –terra, dinheiro, trabalho e nutrientes nosolo – fazia com que ela não pudessedar alimentação adequada à família.Seus dois filhos sofriam de desnutriçãoe doenças persistentes. Ela precisavaobter uma produção total de 1 toneladapor hectare para várias culturas apenaspara sobreviver e 2 toneladas para geraruma renda modesta. Freqüentemente,a sua produção era menor que 1tonelada (Fig. 32A). Hoje, ela produzmais que 2 toneladas por hectare (Fig.32B), plantando ainda verduras elegumes como culturas mais rentáveis,e obtendo lucro suficiente para custeara escola de dois filhos e do irmão. Asestratégias para se aumentar a pro-

dutividade do solo levaram em conta:ciclagem de nutrientes, interaçãolavoura-pecuária, fixação biológica denitrogênio, fosfatos de rocha, melhoriados pousios e uso eficiente de peque-nas doses de fertilizantes formuladospara fornecer os nutrientes que eramdeficientes. A repercussão internacionaldesse projeto, que contou inclusive coma colaboração do Professor AlfredoScheid Lopes na sua elaboração, deuao Dr. Pedro Sanches, um dos mentoresdo mesmo, o Prêmio Internacional deAlimentação de 2002.

UM ESTUDO DE CASO NO SUB-SAARA

Prod

utiv

idad

e at

ual (

t/ha)

1

2

3

1 2 3 4

Ervas daninhas Insetos e

doençasSeca

Linha de sobrevivência

> 2 t/haFertilidade

do solo

B - Com segurança alimentar

Culturas adequadas

Estação de crescimento (meses)

Prod

utiv

idad

e po

tenc

ial (

t/ha)

Fonte: Conway & Toenniessen, 2003

Prod

utiv

idad

e po

tenc

ial (

t/ha)

Estação de crescimento (meses)1 2 3 4

1

2

3

Linha de sobrevivência

Ervas daninhas

Insetos edoenças

Seca< 1 t/ha

A - Sem segurança alimentar

Prod

utiv

idad

e at

ual (

t/ha)

Fig. 32

Práticas agronômicas simples contribuem para ganhos de produtividade e de rentabilidade e para a redução da exclusão social

Índice de Desenvolvimento Humano (IDH - ONU), em 23 municípioscom agricultura desenvolvida (início da década de 70 e anos 90)

Fonte: Regis Bonelli, IPEA, 2002

Início 70’s

ALTO

MÉDIO

BAIXO 14

9

3

16

4

Anos 90

Saúde, Educação, Habitação

Qualidade de vidaFig. 33

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O exemplo de SorrisoA força do campo para o

desenvolvimento econômico e social dopaís é inquestionável, mas essainformação precisa chegar a toda àsociedade. Dados recentes doeconomista Regis Bonelli, do Institutode Pesquisa Econômica Aplicada, IPEA,publicados na revista VEJA (13 de junhode 2001), mostram a evolução do Índicede Desenvolvimento Humano, IDH, em23 municípios ou regiões brasileirascom agricultura avançada. Este índice,que inclui condições de saúde,habitação e educação, comparou oinício dos anos 70 com os anos 90, efalam por si só (Fig. 33).

Regis Bonelli mostra o crescimentomédio anual do PIB de 1975 a 1996 emalguns desses municípios ou regiõescom agricultura desenvolvida, em com-paração com a média brasileira, de3,2%. Em Barreiras, BA, 12,3%; Rondo-nópolis, MT, 6,5%; Balsas, MA, 6,4%;Juazeiro, BA, 6,4%; Petrolina, PE, 5,6%;Paracatu, MG, 4,7%; Chapecó, SC,4,5%; Dourados, MS, 4,2% e Barretos,SP, 4,0%.

Cálculo feito por um agrônomo deSorriso, MT, serve também para ilustraresse tópico. Sorriso foi fundada há ape-nas 17 anos e hoje apresenta 55 milhabitantes. A área plantada do município– principalmente com soja, milho, algo-

dão, arroz – é de 550 mil hectares e opotencial total é de 800 mil hectares.

Considerando-se uma produtivida-de média de 50 sacas por hectare, omunicípio produz 27,5 milhões desacas de grãos. Na base de 500 sacaspor carreta, são necessárias 55 mil car-retas para escoamento da produção.Como cada carreta contém 22 pneus,tem-se um total de 1.210.000 pneus.Com a distância de 4600 km de ida evolta até o porto de Paranaguá e umconsumo de 1 litro de diesel para cada2,5 km, seriam necessários 101,2milhões de litros de combustível.

Em relação aos fertilizantes,considerando-se uma aplicação médiade 0,4 toneladas por hectare, o con-sumo total seria da ordem de 220 mil

toneladas. Numa média de 27 toneladaspor carreta, seriam necessárias 8.148carretas. Considerando-se a neces-sidade de 3 “chapas” (ajudantes paradescarga) por carreta, isso represen-taria 24.444 homens/dia e etc., etc., etc.

O leitor já percebeu que estas contaspodem se estender infinitamente,mostrando a importância dos diversoselos das cadeias produtivas do agro-negócio. Mas uma pergunta merece serfeita nesse ponto: quantas cidades co-mo Sorriso, surgiram no Centro-Oestenos últimos 30 anos, sendo o vetor bási-co desse desenvolvimento a evoluçãoda produção agrícola?

A evolução, entre 1990 e 2003, naprodução de algodão e a de soja emMato Grosso (Fig.34 e 35) é mais um

Terra da sojaEvolução da produção de soja no Mato Grosso – 1990 a 2003 (e)

Fig. 35

0

2

4

6

8

10

12

14

90 92 94 96 98 00 02 03 (e)

Mihões t

Fonte: CONAB, 2003.Anos

2,6

13,1

Plumas voltam a crescerEvolução da produção de algodão no Mato Grosso - 1990 a 2003 (e)

Fig. 34

Fonte: CONAB, 2003

0

20 0

40 0

60 0

80 0

1 0 0 0

1 2 0 0

1 4 0 0

1 6 0 0

9 0 9 1 9 2 9 3 9 4 9 5 96 9 7 9 8 9 9 .0 0 .0 1 .02 .0 3

X 1.000 t

58

1.525

Anos (e)

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atestado da pujança do setor rural bra-sileiro. Pujança essa que demonstraque o segmento de dentro da porteira,ou seja, o setor produtivo da agriculturabrasileira, pode ser extremamente efi-ciente e competitivo, como demonstramos dados recentes sobre a cultura dasoja no Brasil, a qual, em 2002, pelaprimeira vez na sua história, alcançouprodutividade média maior que aquelaregistrada nos Estados Unidos (Fig. 15),com o Brasil se tornando o maiorexportador mundial dessa “commodity”.

Essa evolução da agriculturabrasileira, principalmente na cultura dasoja, está preocupando, e muito, ospaíses competidores, como relatado aseguir. No início de 2002, conformematéria do correspondente PauloSotero, do jornal o Estado de São Paulo,(http://www.estado.estadao.com.br/editorias/2002/02/24/eco041.html), oEconomista André Pessoa, daAgroconsult, convidado a falar no Fórumsobre as Perspectivas da AgriculturaMundial, promovido pelo Departamentode Agricultura dos Estados Unidos,apresentou dados comparativos sobrea produção de soja no Estado de MatoGrosso e nos Estados Unidos cujasíntese é mostrada na figura 36. Cha-mou a atenção o fato da produtividadeda soja no Mato Grosso ser 20% maiorque a média americana (50 sacos/hacontra 45 sacos/ha), com custos deprodução de cerca da metade daquelesobservados nos EUA (US$ 6,23 por

saco no Mato Grosso, contra US$ 11,72por saco nos Estado Unidos). Ao finalde sua apresentação, o Sr. Lee, Vice-Presidente-Senior da Divisão de Grãose Produtos Tropicais da firma ManFinancial comentou: “Eu comparariasua palestra a uma reunião do comandodo Al-Qaeda, que está preparando aruína da agricultura mundial com a su-perprodução”. Pessoa manteve-se frio.Muito cumprimentado depois da confe-rência, ele explicou ao Jornal Estado deSão Paulo a razão provável do alarmade Lee. “Vai ficar caro para o governodos Estados Unidos competir conosco,se eles mantiverem a política de subsí-dios à produção”, disse o economista.“Eles vão ter de gastar muito mais doque os US$ 180 bilhões que estão na

Farm Bill, e isso vai aumentar a resis-tência política que já começou contraos elevados subsídios, que só benefi-ciam os produtores que menos precisamda ajuda do governo e derrubam os pre-ços internacionais.” Haveria uma saídamelhor? “Meu conselho aos produtoresamericanos é que eles vendam suasterras aqui, enquanto elas ainda estive-rem sobrevalorizadas pelo efeito dossubsídios que recebem, para comprarterra no Mato Grosso, onde um hectarecusta de 10 a 15 vezes menos que noMeio-Oeste americano e a produtividadeé 20% superior. Nós os receberíamosde braços abertos e os ensinaremoscomo ser competitivos em agriculturasem subsídios”, disse. “A única coisaque pediríamos em troca seria para nosensinarem como fazer tão bem o lobbyno Congresso”. Coincidência ou não, 3meses depois, duas ONG’scanadenses e uma americana estavamno Brasil oferecendo US$ 165,00 porhectare para que agricultoresbrasileiros não plantassem sojanaquele ano.

A foto da figura 37, mostrando o inícioda colheita em Sapezal, Mato Grosso,onde 36 colhedeiras de soja eramseguidas de 18 plantadeiras de milho,em sistema plantio direto, circulou pelainternet como pano de fundo da propa-ganda do Agrishow- Rondonópolis, em2002. Com produtividades médias de3,0-3,5 toneladas de soja/ha, seguindo-se 6-7 toneladas de milho safrinha/ha,em sistema plantio direto, praticamente

Fonte: Fundação MT, 2002

Modelo de tecnologia agrícolaDetalhe da colheita de soja no Mato Grosso, seguido do plantio

da safrinha de milho em Sistema de plantio direto

Fig. 37

Fig. 36

A soja lá e cá Estimativas de Produtividade média e custo de produção

nos Estados Unidos e no Mato Grosso

EUA (Heartland)2000/01

Produtividade (sc/ha) 45,0 50,4 Custo variável (US$/sc) 3,71 4,49Custo fixo (US$/sc) 8,01 1,74Custo total (US$/sc) 11,72 6,23

Produtividade (sc/ha) 45,0 50,4 Custo variável (US$/sc) 3,71 4,49Custo fixo (US$/sc) 8,01 1,74Custo total (US$/sc) 11,72 6,23

Custos variáveis (US$/ha) 187,10 224,30Custos fixos (US$/ha) 404,20 87,10Custo Total (US$/ha) 591,40 311,40

Custos variáveis (US$/ha) 187,10 224,30Custos fixos (US$/ha) 404,20 87,10Custo Total (US$/ha) 591,40 311,40

Brasil (MT)2001/02

Fonte: AGROCONSULT, 2002

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sem erosão, não seria exagero dizerque nessa região se pratica uma dasagriculturas mais avançadas ecompetitivas do mundo.

Uma pergunta poderia ser feitanesse ponto: Quais seriam asimplicações econômicas e sociais paraa região centro-oeste do Brasil se, a parda eficiência e competitividade já de-monstrada pelo segmento de dentro daporteira do agronegócio brasileiro,fossem acrescidas ações concretas deredução do chamado custo Brasil,notadamente em relação ao custos detransporte até o porto? Se além dahidrovia do Rio Madeira, já em operaçãoligando Porto Velho (RO) ao RioAmazonas, com 1.056 km de extensão,for viabilizada a hidrovia do Tapajós (emestudo) e o asfaltamento da rodovia BR-163 de Cuiabá até Santarém, compro-misso assumido do Governo Federal edo Governo do Mato Grosso, isso repre-sentaria uma redução aproximada de 3a 4 US$ por saco para o transporte degrãos para o mercado consumidor daEuropa e outros, tornando o Brasil prati-

Fig. 38

Fonte: http://www.estado.estadao.com.br/editorias/2002/03/31/ger014.html

Rotas alternativas para a exportaçãoAlgumas alternativas que possibilitariam a redução em US$ 3,00 a

US$ 4,00 por saca de soja exportada para a Europa

camente imbatível como potência mun-dial na produção de alimentos (Fig. 38).

Investimentos com retornogarantido

Esses são apenas alguns exem-plos de como o desenvolvimento agro-pecuário acelera a urbanização. O

crescimento econômico resultante, porsua vez, corresponde a melhorias con-cretas nas condições de vida dapopulação e no Índice de Desenvol-vimento Humano, IDH, no seu entorno– ou seja, de acesso aos serviços fun-damentais a que todo cidadão tem di-reito.

Segundos dados do BNDES, paracada R$ 1 milhão investidos na agrope-cuária seriam gerados 202 empregos,mais do que qualquer outro segmento,como mostra a figura 39. Portanto, nãocabem dúvidas de que vale a penainvestir em programas e políticasagrícolas.

Tais investimentos estimularão oaumento da produção e da produtividadeda agropecuária e a sustentabilidadedo processo produtivo. Contribuirão pa-ra o aumento da renda do segmento, apreservação ambiental e, acima de tudo,para tornar o país socialmente maisjusto.

Não permitamos que o Brasil percao bonde da história!

Exército de mão-de-obra

202

163149

136120 116 115 114 113 111 111 110 103 99 92 91 85 78 74

0

50

100

150

200

250

Agropecuária

Madeira

Comércio

Alim. e bebidas

Outras in

dústrias

Prod. quím

icos

Ind. extr. mineral

Prod. min. não met.

Serv. de tra

nsporte

Metalurgia básica

Construção

Celul. e papel

Textile confecção

Máquinas e equip.

Borracha e plástic

o

Telecomunicações

Montadoras

Eletrodomésticos

Refino petro

. e coque

Fonte: BNDES (Folha de São Paulo 26/09/99)

Empregos gerados por setores (por R$ milhão)

Fig. 39