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1 VIOLÊNCIA JUDICIAL CONTRA OS MOVIMENTOS POPULARES NO PARANÁ João Marcelo Borelli Machado ? - UFPR [email protected] I – Introdução. O presente artigo tem por principal objetivo instigar dentro e fora do meio acadêmico uma discussão necessária, porém pouco enfrentada, sobre a existência da velada violência judicial contra os movimentos populares de luta pelo acesso a terra e moradia no Estado do Paraná. Partimos da organização da sociedade civil, que sob a forma dos movimentos sociais encontra o mais notável modo de exteriorização contemporâneo da luta coletiva pela ampliação dos espaços da vida democrática e de reclamação da cidadania. Nesse compasso, cumpre lembrar que o conceito de cidadania passa pelas dimensões dos direitos e deveres dos indivíduos (cidadania individual) e dos grupos (cidadania coletiva) na sociedade. “Na cidadania individual, o que se destaca é a dimensão civil da luta pelos direitos civis e políticos”, ao passo que “a cidadania coletiva privilegia a dimensão sociocultural, reivindica direitos sob a forma da concessão de bens e serviços, e não apenas a inscrição desses direitos em lei; reivindica espaços sociopolíticos sem que para isto tenha de se homogeneizar e perder sua identidade cultural.” 1 É exatamente nesta segunda perspectiva, da integração social 2 mediante a reivindicação dos espaços sociopolíticos e socioculturais, que se estruturaram os movimentos populares de luta pelo acesso a terra e moradia. ? O autor é mestrando em Direito Cooperativo e Cidadania pela Universidade Federal do Paraná – UFPR, advogado militante da Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares – RENAAP e assessor jurídico da Liderança do Partido dos Trabalhadores na Assembléia Legislativa do Estado do Paraná. 1 GOHN, Maria Glória (org.). “História dos Movimentos e Lutas – A Construção da Cidadania dos Brasileiros”, 2 a edição, São Paulo – SP: Ed. Loyola, 2001, p.195. 2 “Ocurre que se confunde – seguramente – el concepto de masa social con el de integración asociativa, y lo cierto es que el hombre sin asociaciones mediadoras se masifica, y masificado se desindividualiza.” in LAVIÉ, Humberto Quiroga. “Los Derechos Públicos Subjetivos y la Participación Social”, Buenos Aires – Argentina: Ed. Depalma, 1985, p.96. 1

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VIOLÊNCIA JUDICIAL CONTRA OS MOVIMENTOS POPULARES NO

PARANÁ

João Marcelo Borelli Machado? - UFPR

[email protected]

I – Introdução.

O presente artigo tem por principal objetivo instigar dentro e fora do meio

acadêmico uma discussão necessária, porém pouco enfrentada, sobre a existência da velada

violência judicial contra os movimentos populares de luta pelo acesso a terra e moradia no

Estado do Paraná.

Partimos da organização da sociedade civil, que sob a forma dos movimentos

sociais encontra o mais notável modo de exteriorização contemporâneo da luta coletiva

pela ampliação dos espaços da vida democrática e de reclamação da cidadania.

Nesse compasso, cumpre lembrar que o conceito de cidadania passa pelas

dimensões dos direitos e deveres dos indivíduos (cidadania individual) e dos grupos

(cidadania coletiva) na sociedade. “Na cidadania individual, o que se destaca é a

dimensão civil da luta pelos direitos civis e políticos”, ao passo que “a cidadania coletiva

privilegia a dimensão sociocultural, reivindica direitos sob a forma da concessão de bens

e serviços, e não apenas a inscrição desses direitos em lei; reivindica espaços

sociopolíticos sem que para isto tenha de se homogeneizar e perder sua identidade

cultural.”1

É exatamente nesta segunda perspectiva, da integração social2 mediante a

reivindicação dos espaços sociopolíticos e socioculturais, que se estruturaram os

movimentos populares de luta pelo acesso a terra e moradia.

? O autor é mestrando em Direito Cooperativo e Cidadania pela Universidade Federal do Paraná – UFPR, advogado militante da Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares – RENAAP e assessor jurídico da Liderança do Partido dos Trabalhadores na Assembléia Legislativa do Estado do Paraná. 1 GOHN, Maria Glória (org.). “História dos Movimentos e Lutas – A Construção da Cidadania dos Brasileiros”, 2a edição, São Paulo – SP: Ed. Loyola, 2001, p.195. 2 “Ocurre que se confunde – seguramente – el concepto de masa social con el de integración asociativa, y lo cierto es que el hombre sin asociaciones mediadoras se masifica, y masificado se desindividualiza.” in LAVIÉ, Humberto Quiroga. “Los Derechos Públicos Subjetivos y la Participación Social”, Buenos Aires – Argentina: Ed. Depalma, 1985, p.96.

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Essa peleja contínua e crescente pela aquisição e extensão dos direitos sociais,

políticos, econômicos e culturais está intimamente associada ao exercício pleno da

cidadania coletiva. No entanto, importante parcela do Poder Judiciário nacional e em

especial o paranaense, tem-se demonstrado excessivamente refratário às demandas

populares organizadas, externando em suas decisões judiciais posições político-ideológicas

conservadoras e violentas sob o prisma sociológico.

Os casos concretos selecionados têm por escopo auxiliar a melhor

compreensão do problema da violência judicial contra os movimentos sociais. Cumpre

ressaltar, que as decisões relatadas neste artigo não foram simplesmente pinçadas com o

objetivo de criticar gratuitamente alguns juízes e desembargadores paranaenses.

Definitivamente, o presente trabalho não se reduz ao propósito de personificação da

violência judicial.

O que se pretende invocar ao debate é a existência de decisões judiciais

exaradas por órgãos da justiça paranaense que em seu conteúdo comportam importantes

elementos de inconstitucionalidade, ilegalidade ou ilicitude, fatos estes que corroboram a

existência de uma violência judicial que se realiza mediante atos parciais e que denotam

uma preferência de classe, no que a instrumentalização dos meios representa uma das mais

eficazes formas de garantia da prevalência de uma determinada classe social sobre sua

opositora.

II – Por uma referência sociológica da violência.

A referência de violência utilizada no presente estudo não guarda identidade

com as definições encontradas nos manuais clássicos de criminologia. Trata-se sim de um

referencial sociológico híbrido, derivado das contribuições arendtianas e da teoria da luta

de classes marxista. A combinação destes dois marcos teóricos, aparentemente remotos,

atende o propósito maior de colmatar eventuais insuficiências de um ou de outro

pensamento na proposta de discussão dos aspectos jurídico-sociológicos da violência

judicial contra os movimentos populares.

A tese da luta de classes desenhada por Karl Marx e Friedrich Engels é

bastante conhecida no meio acadêmico e, por esse motivo, também é objeto de

prolongados debates. A existência de luta de classes é um elemento dado como certo e

conhecido neste trabalho e por essa razão não demanda um revigoramento de sua

definição. No que tange o tema da violência judicial contra os movimentos populares, sua

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importância passa pela compreensão que importante parcela da magistratura paranaense

perfila-se com os interesses da burguesia rural e opera a violência judicial como um

instrumento para o alcance de um fim, que será melhor detalhado quando da análise do

pensamento de Hannah Arendt e no desenvolvimento do trabalho.

Dos textos da autora alemã colhemos sua reflexão sobre o problema da

violência, que começa pela distinção terminológica entre os conceitos de “poder” (power),

“vigor” (strenght), “força” (force), “autoridade” e “violência”3. No pensamento arendtiano

“poder” consiste na habilidade humana para agir em concerto, “vigor” designa algo no

singular, uma “propriedade inerente a um objeto ou pessoa e pertence ao seu caráter,

podendo provar-se a si mesmo na relação com outras coisas ou pessoas, mas sendo

essencialmente diferente delas”4. “Força” é um termo reservado ao fenômeno da liberação

de energia por movimentos físicos e sociais, não se confundindo com “vigor”, enquanto

que “autoridade” designa algo inquestionável, que não necessita da persuasão ou de meios

externos de coerção para sua exteriorização.

A “violência” aproxima-se fenomenologicamente do “vigor” possuindo, no

entanto, um caráter instrumental. Meios, implementos, instrumentos, ferramentas são

alguns dos substantivos usados por Arendt. Além da revisão conceitual de violência, a

pensadora desmistificá-a ao analisá-la em três dimensões: desnaturalização,

despersonificação e desdemonização.

Ao desnaturalizar a violência como doença da sociedade, confronta as

justificações biológicas de Niezstche e Bergson5, qualificando como perigosos os

pensamentos organicistas em temas políticos. Com isto, recusa-se em associar a violência

ao processo histórico de luta pela sobrevivência no mundo animal porque isto significa

abrir mão do significado da política na determinação da pessoa.

A despersonificação da violência é outro elemento essencial para compreensão

do enfoque trabalhado no presente estudo. Isto porque, o que se discute não é a

potencialidade do sujeito violento que exara a decisão, mas sim o caráter instrumental

como essa violência se expressa num contexto de luta de classes, atuando como importante

meio de opressão da classe social hegemônica. Desta forma, demonstra-se também o

caráter não bestial e irracional da violência, que é desdemonizada e identificada como uma

3 ARENDT, Hannah. “Sobre a violência”, Rio de Janeiro - RJ: Ed. Relume-Dumará, 1994, p. 36. 4 Idem, p. 37. 5 OLIVEIRA, Waléria Fortes de; e GUIMARÃES, Marcelo Resende. “O conceito de violência em Hannah Arendt e sua repercussão na educação”, in http://www.educapaz.org.br/html/modules/wfsection/article.php?articleid=19

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medida eficaz para se alcançar um fim determinado e racional, o que corrobora também

seu aspecto instrumental e mediático.

Por fim, cumpre realçar a importância que a autora atribui ao poder e a política

como meios eficazes de oposição à violência. Em seu pensamento, o poder e a violência

são mutuamente exclusivos, sendo o primeiro a essência de todo governo e quando

legítimo não comporta a violência6. Com isto, ressalta que onde existe poder há

legitimação, porque derivado da comunidade política e anterior, e onde existe violência há

apenas justificação, por seu caráter instrumental e posterior.

III – Quatro relatos de decisões violentas contra os movimentos populares

rurais e urbanos no Paraná.

a) quando a celeridade é seleta e o juízo parcial:

Em 2004 foi ocupada a Fazenda Santa Filomena de 1800,7 hectares, situada na

comarca de Terra Rica – PR, por aproximadamente 350 trabalhadores rurais sem terra.

Prontamente, os dois proprietários ajuizaram uma Ação de Reintegração de Posse, autos

sob n.º 233/2004, instruída com a certidão explicativa de 5 anos atrás sob n.º 030/2000,

datada de 10 de agosto de 1999.

O juízo de Terra Rica sopesou célere e sinteticamente os bens jurídicos em

conflito e inaudita altera pars, sem requerer qualquer outra diligência complementar para

verificar o cumprimento da função social da propriedade, concedeu em 02 de agosto de

2004 a seguinte liminar reintegratória:

“2 – A documentação acostada a inicial é mais do que suficiente, não havendo

porque se fazer a audiência preliminar.

3 – Oficie-se ao INCRA solicitando informações sobre o imóvel. (…)

5 – Determino, pois, a expedição de mandado de reintegração de posse, e

desde já, defiro o reforço policial, se necessário, pois é inadmissível que as

pessoas façam o que bem querem ofendendo a propriedade privada.”7

6 Sua argumentação se processa no sentido de refutar afirmações como a de Wright Mills ("Toda política é uma luta pelo poder, a forma básica de poder é a violência"), de Max Weber (“O domínio do homem pelo homem baseados nos meios de violência legítima”) ou de Bertrand de Jouvenel (“"Para aquele que contempla o desenrolar das eras, a guerra apresenta-se como uma atividade que pertence à essência dos Estados") (SV, p. 31). in OLIVEIRA, Waléria Fortes de; e GUIMARÃES, Marcelo Resende. “O conceito de violência em Hannah Arendt e sua repercussão na educação”, in http://www.educapaz.org.br/html/modules/wfsection/article.php?articleid=197 Autos sob n.º 233/2004, comarca de Terra Rica – PR, Ação de Reintegração de Posse, fls. 83.

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A oposição dos camponeses ao cumprimento de ordem judicial deferida para

desocupação de fazenda notoriamente improdutiva ocasionou a lavratura de um Auto de

Resistência (fls.85). Posteriormente, mesmo em face da juntada de Ofício encaminhado

pelo INCRA (fls.88/91), informando que a propriedade foi declarada improdutiva e que

tramitava ação de desapropriação para fins de reforma agrária perante a Justiça Federal, o

magistrado manteve a ordem liminar de reintegração. Com o parecer do Ministério Público

estadual pela incompetência do juízo estadual (fls.260/262) os autos foram remetidos a 9a

Vara Federal de Curitiba em razão da provável conexão com autos de desapropriação sob

n.º 2001.70.11.001013-4.

Finalmente, em 24 de janeiro de 2005, a liminar foi revogada pelo juízo federal

por meio do despacho transcrito a seguir, in verbis:

“O imóvel objeto da presente ação, através de processo administrativo

destinado à propositura da desapropriação, foi classificado pelo INCRA como

improdutivo.

(…)

Destarte, diante dos acontecimentos, mencionados na Certidão de

Constatação de fls. 362-363, considerando, em especial, a situação instalada

e a supremacia do interesse social, REVOGO A LIMINAR anteriormente

concedida e, nos termos do artigo 265, IV, “a”, do CPC, SUSPENDO O

PROCESSO até o julgamento da ação declaratória de produtividade pela

superior instância.”

b) quando o rito e o quantum indenizatório variam em razão da classe social do

ofendido:

Duas ações ordinárias de indenização por danos materiais e morais

demonstram que para a justiça estadual paranaense nem todos são iguais perante a lei,

principalmente no momento de avaliação dos bens jurídicos lesionados e na fixação das

respectivas indenizações em função da classe social a que pertencem os ofendidos. Nos

dois casos figurou como agressor o Estado do Paraná.

Em 02 de agosto de 2004, seis meses8 após o recurso ter sido autuado no

Tribunal de Justiça do Paraná9, foi confirmada uma indenização por danos morais

8 O recurso foi autuado em 09/12/2003. Sua conclusão ocorreu em 18/03/2004 e em 08/06/2004 foi feito pedido de pauta. Julgado em 23/06/2004. 9 TJPR - 2a Câm. Cív. - Ap. Cív. n.º 0148368/3 – Ac. n.º 23982 - Rel. Des. Bonejos Demchuk – unan. - j.23/06/04 – pub. 23/08/04 - DJ 6691.

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equivalente a R$ 30.000,00 (trinta mil reais)10 para um fazendeiro e sua esposa que

tiveram suas terras ocupadas pelos trabalhadores rurais sem terra e cuja ordem de

reintegração de posse foi supostamente retardada de forma injustificada pelo Estado do

Paraná.

Idêntica sorte não teve um trabalhador rural sem terra, que durante a

desocupação de uma fazenda foi violentamente espancado e alvejado por um disparo de

arma de fogo em sua perna, fato este que ocasionou a posterior amputação do órgão. Sete

meses depois de autuado o recurso, este permanece estacionado em algum lugar do

gabinete do Desembargador relator11.

Adiante, transcrevemos parte da fundamentação da sentença12 monocrática que

aguarda julgamento do Tribunal de Justiça do Paraná:

“Sem dúvida, a conduta do réu ao realizar a desocupação foi, no mínimo,

imprudente, não existindo qualquer justificativa plausível para a lesão

causado no autor” (fls.265)

“O autor, … não estava, segundo os autos, praticando atos hostis aos

policiais militares, vale dizer, o Estado do Paraná não demonstrou ao menos

perfunctoriamente, que o autor tivesse causado algum fator apto a justificar

os ferimentos que sofreu.”(266/267)

E, mais adiante, após determinar a fixação da pensão mensal vitalícia em

liquidação de sentença, decide:

“O festejado prof. Clayton Reis, na obra Avaliação do Dano Moral, Ed.

Forense, 2a Ed., pág. 144, esclarece que No Estado do Paraná, O Tribunal de

Alçada vem fixando valores correspondente a 40 salários mínimos no caso de

correntista indevidamente registrado no Seproc, 100 salários mínimos, em

decorrência da morte em acidentes de trânsito e filho menor, dano estético em

120 salários, decorrente de deformação estética do lesionado, dano moral em

12 salários mínimos por causa de extravio de bagagem em viagem para o

exterior, dano extrapatrimonial em virtude de lesões corporais, em 25 salários

mínimos.

10 Autos sob n.º 425/2000, que tramitaram perante a 2a Vara de Fazenda Pública de Curitiba, PR. 11 TJPR – 5a Câm. Cív. – Ap. Cív. n.º 0158772/0, autuado em 24/05/2004 e concluso, último andamento em 02/08/2004. 12 4ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba, autos sob n.º 35554, sentença de fls.261/272.

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Assim é que, louvando-me dos preceitos supramencionados, e considerando a

idade do autor na época do sinistro, à míngua de outros elementos, entendo

ser razoável fixar-se o dano moral em R$ 6.400,00 (seis mil e quatrocentos

reais), em favor do autor.” (fls.270/271)

Em suma, a indenização por danos morais devido à postergação da

desocupação de uma fazenda gerou a reparação equivalente a 116 salários mínimos13,

enquanto que a indenização por danos morais decorrente da perda de um órgão que

dificultará a locomoção e impedirá um camponês de trabalhar na lavoura por toda a vida

mereceu uma reparação equivalente a 21 salários mínimos em valores vigentes14.

c) quando o juízo está acima da lei e da justiça:

Relatórios da Comissão Pastoral da Terra – CPT, apontam que a política

agressiva do governo do Paraná15 em relação aos movimentos populares transformou esse

Estado num dos principais focos de violência no campo a partir de 1998. De 1995 a 2000

foram registrados 16 (dezesseis) assassinatos de trabalhadores rurais, 31 (trinta e uma)

tentativas de homicídio, 07 (sete) casos de tortura, 322 (trezentos e vinte e dois)

trabalhadores feridos e 470 (quatrocentos e setenta) presos, em 130 (cento e trinta) ações

de despejo. No período de 2001 a 2003 foram registrados 04 (quatro) assassinatos, 21

(vinte e um) casos de ameaças de morte, 07 (sete) trabalhadores feridos e 49 (quarenta e

nove) presos.16

Aliada a ação opressora do executivo perfilou-se parcela do poder judiciário

paranaense. Em 1999 na comarca de Loanda, região noroeste do Paraná, o juízo local

deferiu liminares de reintegração de posse no atacado e autorizou a realização de diversas

interceptações telefônicas ilícitas de líderes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem

Terra..17 Pelas transgressões perpetradas a magistrada local não sofreu qualquer sanção

penal ou administrativa.

13 A Lei n.º 10.888, de 24 de junho de 2004 fixava o salário mínimo em R$ 260,00. 14 A Medida Provisória 248/05, ainda não convertida em lei, fixou o novo salário mínimo em R$ 300,00. 15 Entre os dias 1o e 2 de maio de 2001 foi instalado o Tribunal Internacional dos Crimes do Latifúndio e da Política Governamental de Violação dos Direitos Humanos no Paraná visando apurar diversas violações aos direitos fundamentais da pessoa praticadas durante o governo de Jaime Lerner (PFL). 16 Dados extraídos com base nos relatórios da CPT, in Comissão Pastoral da Terra. “Conflitos no Campo no Brasil”, Goiânia: Edições Loyola, 2003, 2003 e 2004. 17 “O caso foi encaminhado à Comissão Interamericana da OEA, vez que na via jurisdicional nacional, além da demora injustificada das investigações e responsabilizações, a Juíza foi totalmente absolvida de sua conduta criminosa: ‘Muito embora se observe condutas funcionalmente censuráveis, não vejo como atribuir pelo que foi apurado a prática de crime em exame à magistrada …’ (Autos de Investigação Criminal n.º82.516-5, de Curitiba, fls.384)” in Relatório de violações de direitos humanos contra trabalhadores rurais

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d) quando os direitos fundamentais da pessoa não têm valia:

Em 27 de abril de 2004, nos autos sob n.º 192/04 e n.º 196/04, o juízo da 2a

Vara de Fazenda Pública da Capital outorgou competência a Guarda Municipal para o

cumprimento de liminar de reintegração de posse, atendendo solicitação desprovida de

base legal proveniente da Prefeitura Municipal de Curitiba.

Transcrevemos abaixo os principais trechos da ordem de despejo18:

“É profundamente lamentável a conduta do Estado do Paraná em não

contribuir para com o cumprimento de decisão judicial, esta emanada no

intuito de proteção do patrimônio público, inclusive com reflexos junto ao

meio ambiente.

Veja-se que à fl.80dos autos o senhor comandante da Polícia Militar e o

Secretário de Segurança, na pessoa do Chefe do gabinete, foram intimados

para o cumprimento, mas nada foi feito, salvo por parte do comandante, que

teria encaminhado um plano de ação …

Mas só isto não resolve. É preciso que as coisas andem de acordo como que

determina a Constituição Federal. É preciso que se saiba que existem três

Poderes da União independentes e harmônicos entre si. É preciso que se saiba

que existe um Estado Democrático de Direito. É preciso que se saiba que,

mesmo com eventuais mazelas sociais, ao Poder Público cabe a realização de

metas de política urbana, mas que ficam prejudicadas por condutas como esta

invasão. É preciso que se saiba que a credibilidade de um governo se dá

quando ocorre o cumprimento das leis.

Assim, como o próprio Município ofertou a Guarda Municipal para fazer o

trabalho que caberia à Polícia Militar, não nos resta outra saída que não seja

de determinar o cumprimento desta maneira.

Ainda mais que agora a Guarda Municipal pode fazer uso de arma de fogo,

conforme Lei Federal n.º 10.826/03, como forma de proteger, entre outras

coisas, os bens públicos, de acordo com o art. 144, § 8o, CF. Isto enseja em

sem terra, encaminhado em 13 de outubro de 2004 ao Relator Especial sobre Independência dos Juízes e Advogados da Organização das Nações Unidas – ONU. 18 Os despachos possuem idêntico teor e encontram-se às fls.91/92 dos autos sob n.º 192/04 e fls.103/104, dos autos sob n.º 196/04.

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um raciocínio de capacidade de segurança e de ação específica para a que se

propõe, pois, caso contrário, aquela lei não permitiria o uso de arma de fogo

por estes servidores.

Ou seja, é possível fazer o uso desta instituição para proteger aquele

patrimônio, ainda mais que, conforme informações da procuradoria do

Município, os guardas municipais já receberam treinamento específico.

Diante do exposto, defiro o uso da Guarda Municipal para a desocupação da

área.”

IV – As classe sociais na formação dos quadros dos movimentos populares

e dos órgãos judiciários paranaenses.

As razões históricas, sociais e econômicas da formação e evolução dos

movimentos populares brasileiros é ignorada por importante parcela dos magistrados

paranaenses. O desconhecimento desses fatores metajurídicos está ligado intimamente à

origem social e a formação jurídica que essas pessoas receberam antes de chegar à

judicatura. Esse fato constitui uma das causas da violência judicial praticada.

Da época do Brasil colônia à estruturação da República, a insensibilidade e o

posterior desconhecimento dos dramas sociais transformou o Poder Judiciário em

importante instrumento opressor da classe trabalhadora pela elite econômica nacional.

Mais de quinze anos depois do advento da “Constituição cidadã”, nas palavras

do ex-Deputado constituinte Ulisses Guimarães19, grande parte dos direitos sociais

permaneceram negados a milhões de brasileiros. No entanto, a brutal realidade nacional e o

retorno à democracia política possibilitaram a reativação das lutas sociais colocadas em

estado de latência durante os “anos de chumbo” inaugurados com o golpe de 1o de abril de

1964.

Como bem esclarece Maria Glória Gohn: “os anos 80 de nosso século

inauguram novos tempos para a questão da cidadania. Acuados pela conjuntura política

do país, vários militantes de lutas sociais no Brasil nos anos 60 e 70, aliados a novos

parceiros, sem tradição associativista anterior, iniciaram várias frentes de articulações,

fundaram organizações, lideraram movimentos, apoiaram-se em estruturas tradicionais

que estavam se renovando em parte, como a Igreja Católica, e foram à luta. Novas 19 Discurso do Presidente da Câmara dos Deputados, proferido em 05 de outubro de 1988.

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bandeiras foram construídas. Direitos sociais tradicionais se misturaram com os direitos

sociais modernos, em busca de mudanças sociais no país. O momento político nacional

favoreceu a eclosão das lutas sociais, pois a insatisfação era generalizada. A dimensão da

cidadania foi resgatada com ímpeto e vigor, tornando-se a principal bandeira

reivindicatória dos anos 70 e 80. Fortalecida pela conjuntura internacional, que também

destacava a questão dos direitos humanos como básicos, a cidadania tornou-se o móvel e

o articulador das lutas sociais ocorridas. O saldo configurado foi a inscrição, em leis, de

diversos direitos sociais demandados pelos movimentos sociais daquelas décadas. (…) Em

síntese, podemos dizer que as ações coletivas nos anos 70 e 80, no Brasil foram

impulsionadas pelos anseios de redemocratização do país, pela crença no poder quase que

mágico da participação popular, pelo desejo de democratização dos órgãos, das coisas e

das causas públicas, pela vontade de se construir algo a partir de ações que envolviam os

interesses imediatos dos indivíduos e grupos. Os movimentos sociais, populares ou não,

expressaram a construção de um novo paradigma de ação social, fundado no desejo de se

ter uma sociedade diferente, sem discriminações, exclusões ou segmentações.”20

O dito popular “a união faz a força” traduz a forma concreta encontrada pelos

mais fracos para nivelar a correlação de forças decorrentes da luta de classes.

No entanto, o Poder Judiciário é formado majoritariamente por indivíduos

provenientes da classe social dominante21, o ensino jurídico brasileiro é elitista e

instrumental, a ideologia neoliberal permeia os meios de comunicação e orienta a opinião

pública na direção de um comportamento conservador. Com tudo isto, a jurisprudência dos

Tribunais pátrios acaba enveredando-se pelo tranqüilo caminho da manutenção do injusto

status quo.

Todos esses fatores são fundamentais para que os direitos sociais reclamados

pelos movimentos populares acabem tornando-se impraticáveis, seja pelo exegético

respeito de parcela dos direitos constitucionais, seja pela prevalência da denominada

20 GOHN, Maria Glória (org.). “História dos Movimentos e Lutas – A Construção da Cidadania dos Brasileiros”, 2a edição, São Paulo – SP: Ed. Loyola, 2001, fls.202/203. 21 “Deve-se notar que a elaboração das camadas intelectuais na realidade concreta não ocorre num terreno democrático abstrato, mas de acordo com processos históricos tradicionais muito concretos. Formaram-se camadas que, tradicionalmente, ‘produzem’ intelectuais; trata-se das memas camadas que, muito frequentemente, especializaram-se na ‘poupança’, isto é, a pequena e média burguesia fundiária e alguns estratos da pequena e média burguesia das cidades.” in GRAMSCI, Antonio. “Os Intelectuais e a Organização da Cultura”, Rio de Janeiro – RJ: Ed. Civilização Brasileira, 1968, p.10.

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“reserva do possível” sobre o chamado “mínimo existencial”22, quando as condições

materiais mínimas de existência de todos os brasileiros ficam subordinadas aos

compromissos do Estado com os prestamistas internacionais.

Delimitados por essa visão restrita da realidade social, muitos magistrados

paranaenses passam a interpretar o sistema jurídico sob uma perspectiva em que o direito

absoluto de propriedade (art. 5o, XXII, CF/88) reina soberano, enquanto que o direito ao

cumprimento da função social da propriedade (art. 5o, XXIII, CF/88) permanece sob a

penumbra, esquecido pelos operadores do direito e quase transformado em figura

alegórica, como pateticamente o fez esse mesmo Poder Judiciário com a antiga redação do

§ 3o, do artigo 192 da Carta Magna, no que se tornou co-responsável pelo agravamento da

crise da dívida pública brasileira durante a década de 90 do século XX.

Os capítulos referentes à política urbana (arts. 182 e 183 da CF/88) e a política

agrícola e fundiária e da reforma agrária (arts. 184 a 191 da CF/88), tem recebido reduzida

atenção dos Tribunais brasileiros, principalmente quando da reclamação da elaboração ou

cumprimento de políticas públicas específicas. Esse fato, por si só, ocasiona um excesso de

cumprimento de princípios constitucionais como o direito absoluto de propriedade e traz

como contrapartida um déficit de eficácia do direito à vida e à dignidade da pessoa

humana.

Despachos açodados, como o descrito no primeiro caso do item II, ou

proferidos sem fulcro constitucional, como o transcrito no quarto relato daquele item,

comprovam que bens jurídicos disponíveis como o direito à propriedade e indisponíveis

como o direito à vida ou a dignidade da pessoa humana, não são devidamente sopesados

por alguns órgãos da justiça paranaense.

Destarte, se os princípios e preceitos constitucionais fundamentais, os direitos

sociais e de direitos humanos não são acatados ou são indefinidamente postergados pelos

elaboradores e executores das políticas públicas, a inércia ou a resistência do Poder

Judiciário em reconhece-los e dar-lhes a efetividade negada, somente vem agravar a

situação social real e colocar o próprio direito em estado de crise. Como o direito à vida e a

dignidade da pessoa humana são direitos indisponíveis e alimentam o ímpeto

revolucionário das lutas populares por moradia e acesso a terra, as pressões sociais pela

22 BARCELLOS, Ana Paula de. "A Eficácia Jurídica dos Princípios Constitucionais", Rio de Janeiro – RJ: Ed. Renovar, 2002.

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satisfação desses direitos são amplificadas e o gradual crescimento do déficit de

cumprimento amplia a crise do direito23.

V - Motivações jurídico-ideológicas das decisões judiciais.

Toda decisão judicial é reflexo do peculiar modo como o magistrado

compreende o mundo.

É o juiz quem aplica a lei ao caso concreto e “em verdade, lei e direito estão a

serviço da ordem capitalista, que necessita, para garantir a segurança das expectativas, o

cálculo econômico e o jogo do mercado, mediante o reconhecimento, a definição e a

regulação da propriedade privada, da livre disposição contratual, dos direitos adquiridos

e do princípio pacta sunt servanda (Faria, p. cit., p.32). As medidas legislativas ‘sempre

chegam ou para reprimir os conflitos sociais ou, dependendo da correlação política de

forças, para moldá-los’ (Pressburger, 1989, p.3). Nestas condições é plantada a falsa idéia

de ordem, segurança, desenvolvimento e progresso. Na verdade, o Direito é usado como

instrumento de conservação.”24

É exatamente essa motivação jurídico-ideológica que impulsiona um

magistrado a deferir uma liminar de reintegração de posse sem que a exordial esteja

devidamente instruída com toda documentação correlata e, posteriormente, sustente a

decisão mesmo após comprovado por documento hábil que o princípio da função social da

propriedade foi desrespeitado. Neste momento, perece também o princípio de presunção de

validade e eficácia dos atos administrativos diante de um suposto direito absoluto à

propriedade privada, simplesmente porque no entender do juízo “é inadmissível que as 23 “No Brasil, gradativamente desarticulam-se as coordenadas ideológicas do modelo político-administrativo centrado em máximas do individualismo possessivo que permeou o movimento codificador do início do século XIX (Faria, 1988, p.55). O colapso do individualismo jurídico, o esvaziamento da concepção burguesa de Direito (edificada em torno da noção de Direito subjetivo), a superação da força analítica dos esquemas teóricos da dogmática jurídica, em suma, a crise do saber normativo que não tem conseguido ser metodologicamente homogêneo, oportunizou o surgimento de movimentos desafiando a rigidez lógico-formal do sistema legal e judicial. São organizações populares, sindicais, religiosas e comunitárias que, mediante politização de questões aparentemente técnicas, procuram criar fatos consumados para reivindicar novos direitos e abrir caminhos para práticas contraditórias, que comprometem a integridade e a plenitude da ordem vigente. Há uma crescente reivindicação de direitos (o de morar, por exemplo) que emergem das mobilizações e das organizações comunitárias e populares. Por isso, verdadeiramente, a crise do Direito envolve indagações pertinentes à Filosofia do Direito, quais sejam: as que dizem respeito às relações entre o Direito e o poder; ao questionamento da ordem legal injusta; à reforma ou transformação da sociedade orientada pelo critério do justo (Kato, 1989, p.173)” in PORTANOVA, Rui. “Motivações Ideológicas da Sentença”, 3a edição, Porto Alegre - RS: Ed. Livraria do Advogado, 1997, p.51/52. 24 PORTANOVA, Rui. “Motivações Ideológicas da Sentença”, 3a edição, Porto Alegre - RS: Ed. Livraria do Advogado, 1997, p.67.

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pessoas façam o que bem querem ofendendo a propriedade privada.”25 Desta forma, a

violência opera na repressão da classe trabalhadora e os direitos sociais e econômicos

reclamados não são observados por um órgão parcial do judiciário paranaense.

Parece existir uma hierarquia para alguns magistrados entre o direito à

propriedade (art. 5o, XXII, CF/88) e o direito ao cumprimento da função social da

propriedade (art. 5o, XXIII, CF/88), de tal forma que um suposto desrespeito ao primeiro

corolário induz a desconsideração total da existência do segundo. Essa opção ideológica

acarreta o esvaziamento das normas constitucionais referentes à política urbana (arts. 182 e

183 da CF/88) e a política agrícola e fundiária e da reforma agrária (arts. 184 a 191 da

CF/88). É a contenção via repressão da cidadania coletiva para conservação de injustiças

sociais e de estados de fato que acalantam inconstitucionalidades de fato.

Desta maneira, os objetivos fundamentais de construir “uma sociedade livre,

justa e solidária” (art. 3o, I, CF/88), capaz de “garantir o desenvolvimento nacional” (art.

3o, II, CF/88) e “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades

sociais e regionais” (art. 3o, III, CF/88), promovendo “o bem de todos, sem preconceitos

de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (art. 3o, IV,

CF/88), são compelidos a permanecer aguardando ad infinitum seu momento de efetivação.

Idêntica situação ocorre quando o magistrado extrapola sua competência

constitucional e passa a legislar em proveito de uma parte no processo, visando garantir o

direito absoluto à propriedade e a suposta manutenção da ordem constitucional vigente26.

Cumpre frisar que “o povo concedeu ao Poder Legislativo, e não aos juízes, a

tarefa de formular as regras jurídicas que hão de governar a nação (Guimarães, 1958,

p.330). Assim, tendo o Legislativo se pronunciado e declarado um interesse superior a

outro, o juiz deve subordinar o seu juízo pessoal ou subjetivo a estes interesses. O juízo do

bem e do mal das disposições com que a nação pretende ditar critérios para a vida em

25 Autos sob n.º 233/2004, comarca de Terra Rica – PR, Ação de Reintegração de Posse, fls. 83. 26 “A crítica à neutralidade do juiz deu-se a partir do momento em que se começou a investigar a concepção do Judiciário como instância política. Foram os cientistas políticos que primeiro viram nos tribunais um subsistema do sistema político global. Um e outro partilhavam a característica de processarem uma série de inputs externos constituídos por estímulos, pressões, exigências sociais e políticas e, através de um mecanismo de conversão, produzirem outputs (as decisões) portadoras de impacto social e político nos restantes subsistemas. Desta constatação advinham duas conseqüências: 1a, as motivações sentenciais variavam conforme a classe, a formação, a idade e a ideologia do juiz e por conseqüência; 2a, restava desmentida a idéia de justiça como função neutra e eqüidistante dos interesses das partes (Santos, B., 1989, p.51).” in PORTANOVA, Rui. “Motivações Ideológicas da Sentença”, 3a edição, Porto Alegre - RS: Ed. Livraria do Advogado, 1997, p.72/73.

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comum não pertence ao juiz. O clima de legalidade ditado constitucionalmente no Estado

de Direito repele a institucionalização de sentenças contra legem.

O juiz pode dilatar, completar, melhorar e fazer interpretação larga e hábil da

lei. Também lhe compete ter atuação ativa e participante no processo, mas não pode

esquecer dos limites ditados pelo sistema.

Não é permitido ao julgador desobedecer, anular, subverter, alterar, corrigir,

substituir, negar a lei e assim decidir o contrário do que a norma estabelece e alterar os

‘desígnios positivados pelo Estado através da via adequada’ (Maximiliano, 1979, p.79;

Dinamarco, 1987, p.280)”27

Portanto, ao atribuir competência para que a Guarda Municipal exerça as

funções da Polícia Militar do Estado, o juiz acaba caindo em total contradição quando

desrespeita uma norma fundamental em nome de outra norma de mesma hierarquia. Neste

momento, a pretensão ideológica do juiz de alargar o campo de proteção de uma norma

que entende absoluta (o direito à propriedade) e a devoção messiânica a uma determinada

compreensão de Estado Democrático de Direito, resvalam em indiscutível

inconstitucionalidade.

Mas pior que a violência das decisões parciais, açodadas ou manifestamente

inconstitucionais, como as que foram anteriormente descritas, são as decisões ilícitas

deferidas no transcorrer do processo, como as referidas no terceiro relato. Sua violência é

aviltante porque transcende as motivações jurídico-ideológicas do magistrado e campeia

pelo prado da ilicitude penal, convertendo em criminoso aquele que deveria operar como

guardião da constituição e das leis nacionais. Essa é a violência judicial em sua forma

plena, porque a preferência de classe é explícita e a instrumentalização dos meios é voraz.

Ao deferir conscientemente autorização judicial para realização de

interceptações telefônicas sem amparo legal, o magistrado incorre na infração penal

descrita no artigo 10 da Lei n.º 9.296/96, gerando enorme prejuízo social em razão da

quebra de sua imparcialidade e no descrédito total do Poder Judiciário, afetando toda a

instituição.

Por fim, deparamo-nos com a violência judicial velada e travestida de

eqüidade. Escondendo-se por trás do suposto tratamento desigual aos desiguais, ocorre a

inversão da valoração de bens jurídicos notoriamente desproporcionais. É a violência

27 PORTANOVA, Rui. “Motivações Ideológicas da Sentença”, 3a edição, Porto Alegre - RS: Ed. Livraria do Advogado, 1997, p.38.

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instrumentalizada que confere diferentes trâmites a ritos idênticos e avilta a auto-estima de

um trabalhador por ele pertencer a essa classe social.

O segundo relato exemplifica de forma contundente como a classe social dos

lesionados determina celeridades distintas na tramitação de feitos de mesma natureza e

valorações distintas dos bens jurídicos no momento de fixar as indenizações28. Inexistem

recursos lógicos ou éticos que permitam compreender porque uma desocupação de terras

postergada indevidamente merece uma indenização em danos morais equivalente a 116

salários mínimos vigentes à época da decisão29 e porque a perda de um órgão essencial a

locomoção de uma pessoa e que a impedirá de trabalhar no campo pelo resto de sua vida,

merece uma indenização quase seis vezes menor30. Ainda mais quando o próprio

magistrado na sentença enaltece que esse valor equivale ao dobro da importância devida

por extravio de bagagem e a um quarto do quantum indenizatório fixado por abalo de

crédito.

O desembargador gaúcho Rui Portanova buscou esclarecer as motivações

ideológicas das sentenças a partir da compreensão da visão tradicional do direito e das

decisões judiciais, desvendando as ideologias que as impregnam e lançando-se, finalmente,

a construção alternativa de uma base teórica e processual para o magistrado, que deve

decidir segundo escopos dos processos sociais, políticos e jurídicos. Esses são

instrumentos de grande valia para contenção da violência judicial instrumentalizada por

meio das decisões aqui transcritas.

Engajado no movimento crítico e alternativo do Direito e do Poder Judiciário,

Portanova defende que: “um Direito do ponto de vista alternativo não nega a existência do

conflito social, a luta de classes e as desigualdades econômicas … e opta pela via pacífica

da transformação sociopolítica. … Por outro lado, não se trata de ignorar e desprezar o

sistema legislativo vigente … Trata-se de fazer uso alternativo do Direito posto, buscando

semiologicamente outras definições para as mesmas palavras das leis já existentes … em

proveito não da classe e grupos dominantes, mas dos espoliados e oprimidos.”31

28 “A divergência entre julgados do mesmo tribunal e entre tribunais diversos contraria a finalidade do processo e da própria jurisdição (Tubelis, 1988, p.336), além de debilitar a autoridade do Poder judiciário e causar profunda decepção às partes. (Buzaid, 1985, p.192)” in PORTANOVA, Rui. “Motivações Ideológicas da Sentença”, 3a edição, Porto Alegre - RS: Ed. Livraria do Advogado, 1997, p.42/43. 29 Autos sob n.º 425/2000, que tramitaram perante a 2a Vara de Fazenda Pública de Curitiba, PR. 30 Autos sob n.º 35554, que tramitaram perante a 4ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba, sentença de fls.261/272. 31 in PORTANOVA, Rui. “Motivações Ideológicas da Sentença”, 3a edição, Porto Alegre - RS: Ed. Livraria do Advogado, 1997, p.82.

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Na América Latina esse movimento alternativo começou pela defesa Direitos

Humanos. Valendo-se de garantias da magistratura como a independência funcional,

diversos juízes brasileiros têm alterado antigos paradigmas secularmente consolidados nos

tribunais pátrios, seja por meio de uma nova interpretação e aplicação sistêmica das

normas constitucionais modernas, seja pela atribuição de prevalência as normas

fundamentais cujo conteúdo notoriamente contempla direitos humanos internacionalmente

reconhecidos, quando em aparente estado de conflito com outras disposições de mesmo

status.

O contradiscurso alternativo fulcra-se em novos paradigmas científicos, como:

o exame da eficácia do Direito positivo e da efetividade do poder político; o alargamento

da análise jurídica e relativização das categorias; o rompimento com o saber jurídico

tradicional e abertura; a estimulação da revisão dos pressupostos metodológicos, como a

neutralidade; uma visão do sistema jurídico como produto e condição da existência e da

reprodução de uma formação social determinada; e, a maior negociabilidade e flexibilidade

das decisões.

VI – O contraponto dos direitos fundamentais da humanidade.

As decisões judiciais paranaenses analisadas neste ensaio são a expressão da

instrumentalização da violência de classe pela via institucional, cometida contra os

movimentos populares e que somente pode ser efeicazmente combatida mediante a

oposição das normas relativas aos direitos fundamentais da humanidade, sejam àquelas

contempladas pelo texto constitucional pátrio, sejam àquelas consagradas nos tratados

internacionais de direitos humanos subscritos pela República Federativa do Brasil.

Destaque-se primeiramente, o fato que o Brasil orienta-se pelo princípio da

prevalência dos direitos humanos32 em suas relações internacionais e que a Emenda

Constitucional n.º 45, de 08 de dezembro de 2004, inseriu o § 3o no artigo 5o da Carta

Magna, disciplinando que “os tratados e convenções internacionais sobre direitos

humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por

três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas

constitucionais”.

32 “Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: (…) II - prevalência dos direitos humanos;”

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Esses argumentos são trazidos à baila porque são importantes fundamentos

jurídicos para mudança de postura da parcela dos magistrados paranaenses que

permanecem arraigados a tradição autoritária que prevalecia antes da redemocratização

brasileira.

A defesa intransigente promovida por alguns juízes do direito absoluto à

propriedade (art. 5o, XXII, CF/88) desligada da observância do cumprimento de sua função

social (art. 5o, XXIII, CF/88), mascara uma situação fática de ausência de neutralidade33 e

transborda na quebra de imparcialidade do julgador, comprometendo os princípios

fundadores do Estado Democrático de Direito (art. 1o, caput, CF/88), cujo respeito e defesa

são freqüentemente invocados por esses mesmos magistrados.

No entanto, outros princípios e preceitos fundamentais, como: o princípio da

dignidade da pessoa humana (art. 1o, III, CF/88); o direito à liberdade (art. 5o, caput,

CF/88); o direito à moradia (arts. 6o, caput, e 182, caput, CF/88); o direito de acesso a terra

(art. 184, caput, CF/88); o princípio de cumprimento da função social da propriedade (arts.

5o, XXIII e 170, III, CF/88); o direito à vida (art. 5o, caput, CF/88); e, finalmente, o direito

as decisões judiciais fundamentadas (art. 93, IX, CF/88); caem por terra quando apenas

parcela do ordenamento jurídico é observada e acatada.

Retomando-se a análise seqüencial dos quatro casos relatados no item II deste

breve ensaio, extrai-se o seguinte:

a) quando a celeridade é seleta e o juízo parcial:

Neste caso a violência judicial é instrumentalizada contra o movimento

popular, por meio da interpretação parcial da ordem constitucional na concessão de uma

liminar reintegratória e, posteriormente, em sua conservação, mesmo diante de um novo

elemento documental que passa a integrar o processo34, qual seja: a prestação de

informações pelo INCRA comunicando que a propriedade sub judice é improdutiva e

encontra-se em processo de desapropriação para fins de reforma agrária.35

33 “a idéia de justiça é ideológica, pois traduz os interesses dos grupos detentores do poder e é utilizada para manutenção dessa relação de poder. Existe uma idéia de justiça que está a serviço da contestação, dos oprimidos, dos dominados. Uma justiça a serviço da conservação (Aguiar, 1984, p.59)” in PORTANOVA, Rui. “Motivações Ideológicas da Sentença”, 3a edição, Porto Alegre - RS: Ed. Livraria do Advogado, 1997, p.64. 34 “Art. 462. Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento da lide, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a sentença.” in Código de Processo Civil. 35 “Art. 184. Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do

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Cumpre lembrar, que o expediente encaminhado pelo Instituto Nacional de

Colonização e Reforma Agrária – INCRA presume-se válido segundo as normas de

interpretação de Direito Administrativo brasileiro, no que deveria prevalecer36 o direito

público subjetivo de promover a reforma agrária sob a pretensão individual de

absolutização do direito à propriedade. Isto posto, por contingência do artigo 931 do

Código de Processo Civil, que prevê a aplicação subsidiária do rito ordinário aos

procedimentos de reintegração de posse37, a liminar poderia ter sido revogada pelo mesmo

juiz estadual38, com fulcro no § 4o do artigo 273.

Porém, preferiu o magistrado por suas motivações jurídico-ideológicas manter

uma decisão parcial e que instrumentaliza a violência judicial, negando vigência mesmo

em face da documentação acostada aos autos, ao princípio da função social da propriedade

(arts. 5o, XXIII e 170, III, CF/88), ao direito de acesso a terra (art. 184, caput, CF/88); a

garantia de acesso à Justiça (art. 5o, XXXV, CF/88) e o direito à decisão fundamentada

(art. 93, IX, CF/88); o direito social ao trabalho (art. 6o, caput, CF/88); e a garantia de

igualdade de todos perante a lei (art. 5o, caput, CF/88).

b) quando o rito e o quantum indenizatório variam em razão da classe social do

ofendido:

Neste caso a instrumentalização da violência judicial em virtude da classe

social do ofendido que pleiteia indenização aflora em dois momentos. Nota-se claramente

que o ritmo do trâmite processual e a valoração dos bens jurídicos lesionados de um

capitalista agrário39 e de um trabalhador rural são diversos. Não ocorre a valoração dos

segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei.” in Constituição da República Federativa do Brasil. 36 “hay un principio básico de racionalidad que prescribe que cuando un individuo tiene dos o más intereses que no pueden satistacerse simultáneamente, debe dar preferencia a sus intereses más importantes, cualquiera que sea el criterio para jerarquizar tales intereses. Lo mismo se debería hacer con los intereses en conflicto de varios individuos cuando se adopta el punto de vista del observador ideal: deben prevalecer aquellos intereses de mayor jerarquía. (…) Esta suma de intereses también la debería hacer el observador ideal com los intereses de distintos individuos con los que se identifica, de modo que, siendo los intereses de igual jerarquía, prevalecen los de mayor número de individuos, no por originarse en una mayoría – lo que es, en sí mismo, irrelevante, pues implica el cómputo de distintos individuos – sino simplesmente por constituir más intereses.” in NINO, Carlos Santiago. “Ética y Derechos Humanos – Un ensayo de fundamentación”, 2a edição, Buenos Aires – Argentina: Ed. Astrea de Alfredo y Ricardo Depalma, 1989, p.255/256. 37 “Art. 931. Aplica-se, quanto ao mais, o procedimento ordinário.” in Código de Processo Civil. 38 “Art. 273. (…): § 4o A tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo, em decisão fundamentada.” in Código de Processo Civil. 39 “Quanto ao arcabouço institucional do capitalismo, a sua peça-mestra é o confinamento da atividade estatal à proteção da ordem, do contrato e da propriedade privada, como garantias do exercício da liberdade empresarial. O conjunto das liberdades civis e políticas passa, assim, a exercer um papel secundário nesse quadro institucional: elas podem ser preteridas diante da liberdade de empresa, como se

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bens jurídicos lesionados, mas sim uma estipulação de valores indenizatórios segundo a

classe social dos ofendidos.

O fato de se tratar de decisões proferidas por juízos monocráticos diversos não

isenta o Tribunal paranaense do dever de corrigir a desproporcionalidade valorativa entre

as indenizações concedidas em função dos bens jurídicos lesionados. Inexiste argumento

legítimo em direito capaz de justificar que a perda de um órgão humano mereça um

ressarcimento quase seis vezes menor que a demora do Estado em cumprir uma ordem

judicial.

Com esta atitude judicial violenta, os economicamente desiguais são tratados

de forma socialmente desigual e as desigualdades de dignidade são ampliadas ao invés de

serem minoradas. O direito à vida e à integridade física (art. 5o, caput, CF/88); o direito à

liberdade (art. 5o, caput, CF/88); a garantia de acesso à Justiça (art. 5o, XXXV, CF/88) e

direito à decisão fundamentada (art. 93, IX, CF/88); a tratamento isonômico perante a lei

(art. 5o, caput, CF/88); o direito à indenização por dano moral (art. 5o, X, CF/88); e,

princípio da dignidade da pessoa humana (art. 5o, caput, CF/88), são protegidos pelos

órgãos do poder judiciário paranaense segundo a classe social do ofendido.

c) quando o juízo está acima da lei e da justiça:

A pior forma de violência judicial é o crime praticado no exercício da função

jurisdicional. Ocorre, quando o aplicador da lei ao caso concreto esquece-se da relevância

social do serviço público por ele prestado e passa a realizar atos que em sua substância

caracterizam infrações penais, tal como a interpectação não autorizada de comunicações

telefônicas tipificada pelo artigo 10 da Lei n.º 9.296/96, conforme o sucintamente relatado

no item II.

Diversamente das duas situações anteriores não existe qualquer argumento

jurídico-ideológico capaz de justificar a decisão. O que há é uma conduta parcial40 do

tem visto amiúde na Ásia, na África e na América Latina.” in COMPARATO, Fábio Konder. “A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos”, 3a edição, São Paulo – SP: Ed. Saraiva, 2003, fls.538. 40 “Desinteressado no conflito, subordinado à lei e protegido de influências políticas e outras pressões, o juiz imparcial faz o Judiciário independente, democrático e baluarte das liberdades individuais. O Judiciário só existe porque é imparcial e sujeito à lei (‘sobre a justiça da lei há outro foro, os plenários dos legislativos em primeiro lugar’). A justiça consiste num método, e esse método é o das decisões imparciais. O juiz não se deve comprometer. Sua imparcialidade é seu apanágio. Parcialidade é perversão. ‘O ordenamento é, pois, suposto da justiça. E nele, imparcialmente, não comprometidamente, trabalhará o juiz’ (Müeller, 1989, p.121). É importante a imparcialidade judicial, dada a natureza secundária e substitutiva de sua atividade, ou seja, a jurisdição só ocorre nas hipóteses em que os litigantes não realizaram a atividade primária afastadora da ilicitude. Age, por isto, o Judiciário, na substituição das partes para lograr a pacificação social (Arruda Alvim, 1975, p.39).” in PORTANOVA, Rui. “Motivações Ideológicas da Sentença”, 3a edição, Porto Alegre - RS: Ed. Livraria do Advogado, 1997, p.42.

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órgão judiciário tipificada pela legislação penal. Sob o prisma sociológico, exterioriza-se a

violência judicial em sua forma plena, porque totalmente instrumentalizada a favor de uma

determinada classe social.

Os lesionados, membros de movimento popular cujo sigilo das comunicações

telefônicas foi ilegalmente quebrado, são aviltados em seu direito à intimidade e à vida

privada (art. 5o, X, CF/88); à inviolabilidade das comunicações telefônicas (art. 5o, XII,

CF/88); a garantia do devido processo legal (art. 5o, LV, CF/88); ao princípio da legalidade

(arts. 5o, XII e 37, caput, CF/88); o respeito ao Estado Democrático de Direito (art. 1o,

caput, CF/88); a garantia de acesso à Justiça (art. 5o, XXXV, CF/88) e o direito à decisão

fundamentada (art. 93, IX, CF/88); e, finalmente, o direito à indenização por dano moral

(art. 5o, X, CF/88).

d) quando os direitos fundamentais da pessoa não têm valia:

O último caso diz respeito à violência judicial praticada contra o movimento

popular de luta pelo direito à moradia41. Na ânsia de efetuar a defesa jurídico-ideológica do

direito absoluto à propriedade e de uma visão particular de Estado Democrático de Direito,

o órgão da justiça paranaense desrespeita toda ordem constitucional, utilizando como

justificativa seu próprio acatamento.

A ordem judicial inconstitucional que outorga competência para Guarda

Municipal de Curitiba realizar a reintegração de posse em favor da Prefeitura42 encontra

guarida em motivações jurídico-ideológicas que desprezam todo um conjunto de normas

de idêntica hierarquia, como: o direito social à moradia (art. 6o, caput, CF/88); a garantia

ao devido processo legal (art. 5o, LV, CF/88); o princípio da legalidade (arts. 5o, II e 37,

41 “Dentre os movimentos populares urbanos, a luta pela moradia continuou a ter a centralidade como a luta popular mais organizada. … Uma terceira parte inovou suas práticas seguindo o modelo do movimento popular rural: realizando ocupações, não mais de áreas vazias, cada vez mais escassas e distantes dos grandes centros urbanos, mas ocupando prédios públicos e privados, ociosos ou abandonados, nas áreas centrais das grandes cidades. Inicialmente, eles criaram fatos políticos novos e, ao mesmo tempo, novos cortiços nas áreas centrais. Mas a pressão contínua com que, progressivamente, fossem elaboradas políticas públicas para regularizar essas ocupações, a exemplo do plano de recuperação da região central de São Paulo, e os planos urbanísticos e de regularização da posse para os imóveis ocupados. in GOHN, Maria Glória (org.). “Movimentos Sociais no Início do Século XXI – antigos e novos atores sociais”, Petrópolis - RJ: Ed. Vozes, 2003, p.25/26. 42 “Sólo un derecho público subjetivo de índole superior o que importe una valoración superior, puede prevalecer sobre otro derecho público subjetivo, cuando el órgano jurisdiccional entienda que existe dicha prelavencia. Si el contraste se da entre un derecho público subjetivo y una pretensión individual, ya hemos señalado que se debe preferir a los intereses de la sociedad, que revisten caráter absoluto frente a las pretensiones de los particulares, con la salvedad de los casos en que sólo esté en juego el área de reserva de los derechos humanos, donde el interés social no puede prevalecer.” in LAVIÉ, Humberto Quiroga. “Los Derechos Públicos Subjetivos y la Participación Social”, Buenos Aires – Argentina: Ed. Depalma, 1985, p.57.

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caput, CF/88); o direito à decisão fundamentada (art. 93, IX, CF/88); e o respeito ao

Estado Democrático de Direito (art. 1o, caput, CF/88).

e) Aplicação dos tratados internacionais de direitos fundamentais da

humanidade.

No início deste tópico destacamos que algumas normas protetoras dos direitos

fundamentais da humanidade foram consagradas pelo texto constitucional brasileiro,

enquanto que as demais estão sendo progressivamente incorporadas ao ordenamento

jurídico pátrio. Destacamos também, que nas relações internacionais a República

Federativa do Brasil defende a prevalência dos direitos humanos (art. 4o, II, CF/88).

No entanto, o que realmente compete frisar neste momento é a promulgação da

Emenda Constitucional n.º 45, de 08 de dezembro de 2004, que adicionou o § 3o ao artigo

5o da Constituição Federal de 1988, reconhecendo a aplicação dos tratados internacionais

de direitos fundamentais da humanidade em condições de equivalência às emendas

constitucionais.

Este fato abre um novo leque protetor de direitos e garantias fundamentais no

Brasil, entre os quais destacam-se a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 e

a Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969, mais conhecida como Pacto de São

José da Costa Rica.

A aplicação conjugada do artigo XXV da Declaração Universal dos Direitos

Humanos de 194843 e dos §§ 1o e 2o do artigo 21 do Pacto de São José da Costa Rica44,

que ratificam a efetividade das normas nacionais de direitos fundamentais da humanidade,

representa mais uma importante trincheira de resistência à violência judicial.

Mas o Estado Democrático de Direito também pressupõe que continuem

ingressando na carreira da magistratura juízes de diferentes matizes ideológicas. Portanto,

mesmo essas novas normas de direitos fundamentais da humanidade, que hodiernamente

estão em situação de equivalência com as emendas constitucionais, também continuarão a

43 “Artigo XXV - 1. Todo homem tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar, a si e a sua família, saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle.” (Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovado pela Assembléia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948). 44 “Art. 21 – Direito à propriedade privada. § 1o Toda pessoa tem direito ao uso e gozo dos seus bens. A lei pode subordinar esse uso e gozo ao interesse social. § 2o Nenhuma pessoa pode ser privada de seus bens, salvo mediante o pagamento de indenização justa, por motivo de utilidade pública ou de interesse social e nos casos e na forma estabelecidos pela lei.” (Convenção Americana de Direitos Humanos, de 22 de novembro de 1969, Conferência de São José da Costa Rica) o Brasil aderiu em 25 de setembro de 1992, promulgada pelo Decreto n.º 678, de 06 de novembro de 1992.

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ser desprezadas pelos magistrados que ancoram suas decisões em motivações jurídico-

ideológicas diversas. Neste momento, os operadores populares do direito deverão alçar as

instâncias superiores essa discussão, ampliando os espaços de debate para adequada

integração e harmonização das normas nacionais e internacionais de direitos fundamentais.

VII - Considerações finais.

A instrumentalização da violência judicial contra os movimentos populares

vem ocorrendo com considerável freqüência no Estado do Paraná. Os casos citados no item

II deste artigo são amostras desta incômoda realidade, expandindo-se ou contraindo-se

conforme o fervor da luta de classes.

A principal causa da violência judicial ora estudada é a injustiça social. “Na

raiz dessa injustiça está um sistema sócioeconômico intrinsecamente perverso, porque

baseado na desigualdade, que produz cada vez mais riqueza, poder e arbítrio para uns

poucos, e pobreza, submissão e miséria crescentes para a grande maioria. Para manter

essa injustiça, cometem-se inúmeras violências, e a maior delas consiste em retirar do

povo a possibilidade de participar da vida política, econômica e social do País; consiste

em dificultar e, às vezes, em impedir a livre organização dos cidadãos para a defesa de

seus direitos mais legítimos, deixando a brutalidade freqüentemente impune.”45

A primeira forma encontrada para reprimir os movimentos populares foi sua

criminalização por meio dos tipos penais da formação de bando ou quadrilha, dano e

esbulho possessório. No entanto, a resposta dos operadores jurídicos populares foi imediata

e tecnicamente precisa, ocasionando inclusive a mudança da jurisprudência sobre o tema

no Superior Tribunal de Justiça e no Supremo Tribunal Federal.

Mas o problema da violência judicial possui raízes ainda mais profundas e de

difícil solução. Destarte, impressiona o contingente de magistrados paranaenses que

ignoram os fundamentos sociológicos, políticos e jurídicos dos direitos sociais reclamados

pelos movimentos populares e que, nas motivações ideológicas de suas decisões, externam

o total desconhecimento que “os movimentos sociais progressistas atuam segundo uma

agenda emancipatória, realizam diagnósticos sobre a realidade social e constroem

45 in BICUDO, Hélio. “Direitos Humanos e sua Proteção”, São Paulo – SP: Ed. FTD, 1997, p.94.

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propostas. Atuando em redes, articulam ações coletivas que agem como resistência à

exclusão e lutam pela inclusão social.”46

Como se limitam a conhecer parte da realidade social brasileira, esses juízes

carecem de imparcialidade suficiente para sopesar adequadamente os bens jurídicos em

estado de conflito. Diante dessa situação, elegem a proteção dos interesses da burguesia

agrária em detrimento dos anseios dos trabalhadores rurais, mesmo sabendo que os direitos

fundamentais e sociais desses últimos também merecem especial tratamento do texto

constitucional e dos tratados internacionais de defesa dos direitos humanos, incorporados

em posição de equivalência às emendas constitucionais por força do § 3o, artigo 5o, da

Carta Magna.

Quando isso ocorre, as motivações jurídico-ideológicas das sentenças traduzem

não só o reconhecimento da existência da luta de classes no seio da sociedade como

também refletem a preferência de classe dos julgadores. Assim se dá a instrumentalização

da violência judicial contra os movimentos populares.

Tal situação reclama à pronta e eficaz resposta dos operadores populares do

direito, que devem combater a violência judicial instrumentalizada por meio de manifestos

públicos, valendo-se dos dispositivos legais de correição parcial47, encaminhar

reclamações ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ)48 e, em casos extremos, promover

denúncias aos organismos internacionais de proteção dos Direitos Humanos.

46 in GOHN, Maria Glória (org.). “Movimentos Sociais no Início do Século XXI – antigos e novos atores sociais”, Petrópolis - RJ: Ed. Vozes, 2003, p.14/15. 47 “Art. 14. A Corregedoria-Geral da Justiça, que tem como incumbência a inspeção permanente dos Magistrados, das serventias do foro judicial e dos serviços do foro extrajudicial, terá sua competência e atribuições estabelecidas no Regimento Interno. Art. 16. O Corregedor-Geral da Justiça, além de realizar inspeções e correições permanentes nos serviços judiciários, terá sua competência e atribuições estabelecidas no Regimento Interno. Parágrafo único. O Corregedor Adjunto terá sua competência e atribuições estabelecidas no Regimento Interno.” (Lei n.º 14277, de 30 de dezembro de 2003 - Código de Organização e Divisão Judiciária do Estado do Paraná - CODJ-PR). “Art. 16. Compete à Corregedoria da Justiça a inspeção permanente sobre todos os juízes e auxiliares da justiça, para instruí-los, emendar-lhes os erros e, em relação a estes, punir lhes as faltas e abusos, devendo manter, para isso, cadastro funcional próprio. Art. 20. Ao Corregedor de Justiça compete: (…) VI – receber e processar as reclamações contra juízes, funcionando como relator em seu julgamento pelo Conselho da Magistratura; (…) XI – verificar, determinando as providências que julgar convenientes, para a imediata cessação das irregularidades que encontrar: (…) d) se consta a prática de erros ou abusos que devam ser emendados, evitados ou punidos, no interesse e na defesa do prestígio da justiça; (…) f) os autos cíveis e criminais, apontando erros, irregularidades e omissões havidas em processos findos ou pendentes;” (RESOLUÇÃO NORMATIVA nº 04/86, de 08 de maio de 1986, publicada no Diário da Justiça do dia 23 de junho de 1986, Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná). 48 O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), previsto no artigo 103-B da Constituição Federal de 1988, foi incorporado ao ordenamento jurídico pátrio por meio da Emenda Constitucional n.º 45, de 08/12/2004.

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O motor da história49 escancara todo o antagonismo que repousa no interior do

sistema capitalista. As decisões judiciais violentas freqüentemente externadas pelo órgão

judiciário, nada mais são do que o mais claro sintoma de debilidade de todo o arcabouço

ideológico do capitalismo, incapaz de sustentar-se no tempo em razão da ação destruidora

de seu gérmen interno, a contradição.

Isto significa dizer, que um modo de produção pautado pela produção social

das mercadorias e a apropriação privada dos excedentes está inevitavelmente condenado à

superação histórica por um novo modelo, que necessariamente deverá contemplar a

substituição do paradigma da concorrência pela solidariedade, da resistência à exclusão

pela promoção da inclusão, da concentração da riqueza pela distribuição de direitos

fundamentais da humanidade.

Nas palavras do mestre Fábio Konder Comparato: “para conjurarmos o risco

de consolidação da barbárie, precisamos construir urgentemente um mundo novo, uma

civilização que assegure a todos os seres humanos, sem embargo das múltiplas diferenças

biológicas e culturais que os distinguem ente si, o direito elementar à busca da

felicidade.”50

VIII - Referências bibliográficas.

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49 “A luta de classes é o motor da história” in MARX, Karl e ENGELS, Friedrich. “O Manifesto Comunista”, 1848. 50 in COMPARATO, Fábio Konder. “A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos”, 3a edição, São Paulo – SP: Ed. Saraiva, 2003, p.540.

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