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I. RELATÓRIO

Vistos.

PARTE, devidamente qualificada, ajuizou a presente ação de liquidação da pretensão individual correspondente à tutelada na sentença coletiva proferida contra BANCO DO BRASIL S.A(sucessor do Banco Nossa Caixa), em suma, aduzindo que nos autos da ação civil pública n. 0403263-60.1993.8.26.0053, que teve curso perante a 6ª Vara da Fazenda Pública da Comarca da Capital (SP), a liquidada foi condenada a pagar a todos os poupadores a diferença da aplicação da correção monetária nas contas de caderneta de poupança mantidas pela requerida, iniciadas e renovadas entre 01 a 15.01.89; que a liquidante, conforme documentação que acosta, mantinha junto à instituição requerida contas poupança em tais condições (conta 15.003.558-0, com saldo de R$ 1.905,14 em 1989); que devidamente aplicado o índice de 42,72% sobre o saldo referido (descontado o valor já creditado), acrescidos de: a) juros remuneratórios de 0,5% ao mês, capitalizados; b) juros de mora desde a citação para a ação coletiva, no percentual de 0,5% até a entrada em vigor do NCCC, e após 1% ao mês; e c) mais verbas honorária de 10% do valor da condenação; alcança-se o valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), o qual deve ser fixado como o devido.

Após as adequadas emendas do pedido inicial, foi determinado o processamento do pedido na forma de liquidação de sentença por artigos.

Devidamente citado na forma do art. 475-N, parágrafo único c.c. art. 97 do CDC (art. 103, § 3º, do CDC), o banco requerido ofertou resposta. Preliminarmente aduziu inépcia da inicial e ilegitimidade passiva. No mérito, após aventar prescrição dos juros (art. 205, § 3º, III, do CC e art. 178, § 10, III, do CC/16) e decadência do pedido à luz da legislação consumerista (art. 26 do CDC), sustentou teses de: a) não há título executivo em favor do autor em virtude da limitação da base territorial da sentença coletiva (art. 16 da Lei 7.347/85); b) que a prévia liquidação não pode ser feita nesta Comarca (embora não aponte o local onde deveria ser, então, feita); c) que a poupança do polo ativo aniversaria na 2ª quinzena do mês, sendo, por conseguinte, indevidos os valores cobrados; d) que é mister a citação do banco requerido para o procedimento de liquidação de sentença, nos termos do art. 475-E do CPC; e) que o índice a ser aplicado em fevereiro de 1989 é o de 10,14%, por decorrência lógica da aplicação do índice 42,72% em janeiro de 1989; f) que os juros moratórios são devidos apenas a partir da citação para a liquidação, e não desde a citação para a ação civil pública; g) que os juros remuneratórios devem ter incidência única no mês de fevereiro

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de 1989, sob pena de violação ao disposto no art. 468 do CPC (já que a sentença liquidada não é expressa quanto à incidência nos demais meses); h) que a atualização monetária se deve dar com base nos índices de correção da caderneta de poupança, e não os índices da tabela prática dos débitos judiciais do TJSP (que tem aplicação subsidiária, afastada por regras contratuais estabelecidas pelas partes); e i) que há excesso de execução, vez que a condenação coletiva não previu atualização do débito pela tabela prática do TJSP. Requereu a extinção do processo ou a improcedência do pedido de liquidação.

Houve réplica do liquidante, em síntese sustento o acerto de sua pretensão e valores reclamados.

II. FUNDAMENTAÇÃO

INÉPCIA DA INICIAL

A inicial do procedimento liquidatório não é inepta, vez que diversamente do alegado pelo liquidado, consta do processo (fls. 09) extrato indicativo do saldo em janeiro/1989, na conta-poupança mantida pelo polo ativo no banco sucedido pelo liquidado.

ILEGITIMIDADE PASSIVA

A questão da ilegitimidade passiva da instituição financeira restou expressamente apreciada e afastada pelo juízo da sentença coletiva, o que de per si já seria suficiente para desacolher a alegação do polo passivo, à luz do art. 475-G do CPC (regra da fidelidade da liquidação ao título executivo).

Mas mesmo que não tivesse sido apreciada, de todo modo a ilegitimidade arguida estaria afastada, por conta da regra do dedutível-deduzido, do art. 474 do CPC.

De fato, passado em julgado a sentença (inclusive coletiva), reputar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e defesas que a parte poderia opor assim ao acolhimento como à rejeição do pedido.

Em suma, o banco liquidado – na esteira de jurisprudência uniforme dos Tribunais Superiores -, foi expressamente declarado responsável pelo pagamento dos valores relativos ao expurgo inflacionários do fracassado plano econômico governalmental do ano de 1989.

Nada mais pode se fazer quanto a isso.

PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PRINCIPAL

Conforme já ponderei na decisão que admitiu o processamento da liquidação, o STJ tem jurisprudência consolidada no sentido de que a execução da pretensão individual prescreve no mesmo prazo da ação

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coletiva de objeto correspondente (súmula 150 do STF), no caso, 05 (cinco) anos (STJ, Resp. 1.070.896-SC e Resp. 1.275.215-RS).

De acordo, ainda, com o STJ, esses 05 (cinco) anos (os mesmos indicados no art. 27 do CDC, se preferir o liquidado) devem ser contados do trânsito em julgado da sentença coletiva, ou, como no caso presente, da data em que definidos os critérios para liquidação/execução das pretensões individuais correspondentes.

No caso, a sentença coletiva transportada in utilibus (art. 103, § 3º, do CDC), conforme certidão acostada na inicial e referida no art. 98, § 1º, do CDC, tornou-se liquidável individualmente em 03.06.2011, tendo transitado em julgado, conforme se infere, mais ou menos nesta época.

Por conseguinte não há prescrição da pretensão liquidatória/executória na forma do art. 97 do CDC, vez que entre a data do suposto trânsito em julgado e o ajuizamento da presente liquidação/execução individual da pretensão coletiva de objeto correspondente (31.08.2012) não decorreram 05 anos.

Não se aplica ao caso, ademais, o prazo decadencial de 90 (dias) previsto no art. 26 do Código de Defesa do Consumidor.

A jurisprudência do STJ já firmou entendimento no sentido de que referido dispositivo destina-se a vícios aparentes ou de fácil constatação e a vícios ocultos, regulando a decadência, não tendo aplicação em caso de pretensões como a presente, em que se busca revisar ou questionar os lançamentos efetuados em conta-poupança (STJ, Edcl no Ag 1130640/PR, Rel. Massami Yueda, 3ª Turma, j. 09.06.2009).

PRESCRIÇÃO DOS JUROS

Anda que o juízo local seja simpático à tese (minoritária) do banco liquidado no âmbito das ações individuais que aqui tiveram curso, não há espaço para a aventada prescrição dos juros na liquidação presente (art. 205, § 3º, III, do CC e art. 178, § 10, III, do CC/16).

De fato, a prescrição para toda a pretensão (inclusive juros) restou interrompida com a citação do banco liquidado na ação coletiva, com retroação à data da distribuição da ação junto à 6ª Vara da Fazenda Pública da Capital (SP), conforme regra do art. 219 e §§ do CPC.

Assim, considerando a propositura da ação coletiva pelo IDEC em 26.03.1993; e considerando, ainda, o prazo de prescrição dos juros de 05 (cinco) anos conforme era regra vigente ao tempo (art. 178, § 10, III, do CC); bem se vê que não há espaço para se falar em prescrição dos juros da pretensão coletiva, que só ocorreria caso a ação coletiva tivesse sido ajuizada após 31.01.94.

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Tampouco há prescrição dos juros na presente liquidação da pretensão individual correspondente, cujo termo inicial – convém repetir – é o trânsito em julgado da sentença coletiva liquidada ou a data em que ela se tornou liquidável individualmente. Como isso se estima ocorrido em 03.06.2011, seja aplicando o extinto prazo do art. 178, § 10, III, do CC/16 (05 anos), seja o novo prazo do art. 205, § 3º, III, do CC/02 (03 anos), bem se vê que não houve o termo em vista do ajuizamento da presente liquidação em 31.08.2012.

INEXISTÊNCIA DE TÍTULO EXECUTIVO DIANTE DA LIMITAÇÃO TERRITORIAL DO ART. 16 DA LEI 7.347/85

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Resp 1.243.887-PR (Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 19.10.2011) – no mais importante precedente relativo a processo coletivo nos últimos 20 (vinte) anos -, estabeleceu que uma vez fixada a validade da sentença sobre território diverso daquele em que situado o órgão prolator, não compete ao juízo da liquidação/execução negar a existência de título na execução aforada fora daqueles limites, verbis: “1.1. A liquidação e a execução individual de sentença genérica proferida em ação civil coletiva pode ser ajuizada no foro do domicílio do beneficiário, porquanto os efeitos e a eficácia da sentença não estão circunscritos a lindes geográficos, mas aos limites objetivos e subjetivos do que foi decidido, levando-se em conta, para tanto, sempre a extensão do dano e a qualidade dos interesses metaindividuais postos em juízo (arts. 468, 472 e 474, CPC e 93 e 103, CDC). 1.2. A sentença genérica proferida na ação civil coletiva ajuizada pela Apadeco, que condenou o Banestado ao pagamento dos chamados expurgos inflacionários sobre cadernetas de poupança, dispôs que seus efeitos alcançariam todos os poupadores da instituição financeira do Estado do Paraná. Por isso descabe a alteração do seu alcance em sede de liquidação/execução individual, sob pena de vulneração da coisa julgada. Assim, não se aplica ao caso a limitação contida no art. 2º-A, caput, da Lei n. 9.494/97”.

E esse entendimento superior vem sido reverberado no âmbito do TJSP, inclusive, para os casos de liquidação imprópria decorrentes da mesma sentença ora liquidada (Agravo de Instrumento 0046921-03.2012.8.26.000, Rel. Paulo Pastore Filho, 17ª Câmara de Direito Privado, j. 30.06.2012).

No caso, o título executivo deixou patenteado que poderão liquidar/executar a sentença todo e qualquer poupador do Banco Nossa Caixa (sucedido pela liquidada), ainda que não associado do IDEC, que tenha poupança em janeiro de 1989, com aniversário na primeira quinzena.

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Diante, portanto, da ausência de restrição aos limites territoriais da sentença liquidada, não é lícito ao juízo se imiscuir na questão, forte no impedimento do art. 475-G do CPC.

Convém destacar, ademais, que o juízo prolator da sentença liquidada é sediado na Capital do Estado, com competência, portanto, para prolação de sentenças relativas a danos nacionais como o presente (art. 93, II, do CDC), o que afasta qualquer nulidade do título executivo liquidado.

Mesmo que não por isso, vale sempre apontar a existência de fundadas dúvidas sobre a constitucionalidade, oportunidade e eficácia do art. 16 da Lei 7.347/85 (e art. 2º-a da Lei 9.494/97), conforme razões constantes de trabalho acadêmico que publicamos, e que pedimos venia para transcrever:

“O art. 16 da Lei 7.347/85 e o art. 2º-A da Lei 9.494/97 são as maiores provas de que a

legislação processual coletiva brasileira avançou nos últimos 30 anos. Mas também

teve grandes retrocessos.

De fato, sendo o poder público o maior demandado em sede de processo coletivo (de

todas as naturezas), mais que depressa o Poder Executivo Federal, com o absoluto

beneplácito do Congresso Nacional, deu um jeito de limitar o alcance da tutela coletiva

(especialmente quando ele for o demandado).

O art. 16 da Lei 7.347/85, com a redação que lhe foi emprestada pela Lei 9.494/97

(que antes foi Medida Provisória 1570-4), estabelece que “a sentença civil fará coisa

julgada erga omnes, nos limites da competência do órgão prolator, exceto se o pedido

for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer

legitimado poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de prova

nova”.

A regra, por assim dizer, quebra por completo o espírito do processo coletivo, de

tutelar molecularmente o conflito e ampliar a abrangência da decisão para beneficiar

todos os interessados. Pois ao restringir o alcance da decisão “aos limites de

competência do órgão prolator”, a disposição faz com que os efeitos da coisa julgada

coletiva só valham dentro do território (Comarca ou da Subseção Judiciária) sobre qual

tem o órgão prolator (juízo ou Tribunal) competência, obrigando ao ajuizamento de um

sem número de ações civil públicas para a tutela de todos os prejudicados pela ofensa

aos direitos e interesses coletivos.

A doutrina é uniforme ao indicar a inconstitucionalidade, a ineficácia e a falta de lógica

do dispositivo.

Inconstitucional porque quebra a regra da proporcionalidade, e ao assim fazer viola o

princípio do devido processo constitucional na sua faceta material (art. 5º, LIV, da CF),

que impõe ao legislador o dever de elaborar normas de acordo com os interesses

sociais. Afinal, todo o poder emana do povo (art. 1º, parágrafo único, da CF), não

sendo lícito ao legislador estabelecer regras contrárias ao interesse público (primário).

Ineficaz, pois quando houve alteração do art. 16 da Lei 7.347/85 – aplicável

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especialmente à tutela dos direitos difusos – não se acautelou o legislador em

reformar, também, a regra do art. 103 e incisos do CDC. Como é da composição da

Lei de Ação Civil Pública e do Código de Defesa do Consumidor que temos o núcleo

do nominado microssistema processual coletivo – cujas regras, mais do que se

subsidiarem, se interpenetram formando um todo harmônico e único (vide item 7.9

supra) – a alteração não surtiu efeitos. Afinal, diante da redação do art. 103, I, do CDC,

no sentido de que a coisa julgada é erga omnes, sem menção a limitação territorial

alguma, de certo que em vista do princípio da máxima efetividade do processo coletivo

(vide item 7.6 supra), o sistema preferirá a aplicação desta regra em detrimento do art.

16 da LACP. Assim, não haverá limitação territorial alguma à coisa julgada coletiva.

Finalmente, a regra seria ilógica porque o legislador misturou, em absoluta falta de

técnica, os conceitos de coisa julgada e competência. Isto porque os efeitos emanados

da decisão e imutabilizados pela coisa julgada, não são contidos pela competência

(capacidade de aplicar o direito ao caso concreto) do órgão jurisdicional. A sentença

proferida por um Juiz de Direito da menor Comarca do país, tem efeitos em todo o

território nacional e, em determinados casos, até fora do país. Ninguém cogitaria que

um casal divorciado nesta Comarca, ou um devedor aí condenado a pagar

determinada quantia em dinheiro, deixasse de ser divorciado ou não mais tivesse a

dívida no exato instante que cruzasse fisicamente a fronteira da Comarca. Não faz o

mínimo sentido, assim, que uma decisão proferida em um processo coletivo esteja

adstrita aos limites do território do órgão prolator, quando no processo individual o

modelo é totalmente contrário.

A jurisprudência, especialmente do STJ, tem inúmeros precedentes enfrentando a

problemática do art. 16 da LACP. Dois, contudo, merecem especial destaque.

A Corte Especial do STJ tinha precedente consolidado no sentido da eficácia do art. 16

da Lei 7.347/85 (EREsp 293.407/ SP, Rel. Min. João Otávio Noronha, DJ 01/08/2006;

no mesmo sentido: STJ, Resp. 399.357/SP, j. 05.10.2009, 2ª Seção).

Este entendimento da Corte Especial pela eficácia do art. 16 da Lei 7.347/85, contudo,

sofreu forte baque recentemente. No julgamento do Resp. 1.24.887-PR, a mesma

Corte Especial do STJ reformulou seu entendimento e passou a admitir – com a mais

absoluta propriedade – que a limitação dos efeitos da coisa julgada no processo

coletivo não é feita à luz desta disposição, mas sim do pedido do autor acolhido pelo

Judiciário. Em outros termos, o que o STJ estabelece doravante é que os efeitos da

coisa julgada coletiva para fora dos limites da competência do órgão territorial têm a

ver com aquilo que ficou decidido na sentença, e não com o disposto no art. 16 da Lei

7.347/85. Assim, observada a regra de competência para o processamento de ações

cujos danos (ou prováveis danos) tenham âmbito local, regional ou nacional (art. 91 do

CDC), a coisa julgada coletiva poderá valer, inclusive, para fora dos limites de

competência territorial do órgão prolator, beneficiando indistintamente a todas as

vítimas (e sucessores) do evento.

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(…)

Com este entendimento – o mais importante precedente de processo coletivo dos

últimos 20 anos – o STJ corrige os rumos do processo coletivo brasileiro e resolve, de

quebra, dois problemas práticos que, até então, não tinham solução aparente.

Primeiro, ratifica a possibilidade de reunião, para julgamento conjunto por um único

juízo, de ações coletivas conexas e litispendentes (item 10 infra), com a possibilidade

de a decisão proferida pelo juízo prevento valer, inclusive, na Comarca ou Subseção

Judiciária de onde proveio um ou mais processos reunidos. E segundo, permite que a

decisão proferida na ação civil pública para a tutela dos direitos difusos – que pela sua

própria natureza tem como titulares sujeitos indeterminados e indetermináveis, muitos

deles domiciliados em Comarcas e Subseções Judiciárias diversas – possam, todos,

ser beneficiados pela tutela coletiva“.(GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Direitos difusos e coletivos: teoria geral do processo coletivo. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 76/80)

Diante de todos esses termos, há sim título executivo em favor do liquidante, de modo que falece razão ao argumento do banco liquidado.

POSSIBILIDADE DE LIQUIDAÇÃO/EXECUÇÃO EM FORO DIVERSO DA CONDENAÇÃO

Os artigos 103, § 3º e 104, do CDC, possibilitam à vítima (ou sucessores) do evento narrado na ação coletiva para a tutela dos interesses e direitos individuais homogêneos, transportar in utilibus, para o plano individual, a sentença lá proferida.

No caso, a ação coletiva fixou os direitos dos poupadores do banco sucedido pelo liquidado, a receber correção monetária não aplicada aos saldos existentes à época. Podem, por conseguinte, os correntistas ou seus sucessores liquidar/executar a sentença coletiva para apurar o valor que individualmente será recebido (art. 97 do CDC).

Tratando-se de direitos individuais liquidados/executados, os beneficiários são as vítimas e sucessores. Não há, em princípio, valores vertidos ao fundo de reparação de bens e direito lesados (art. 13 da Lei 7.347/85), vez que nos direitos e interesses individuais homogêneos os seus titulares são identificáveis (ao menos nesta fase de liquidação/execução).

Por conseguinte, a ação poderá ser ajuizada no domicílio da vítima ou sucessores dela, na forma do art. 101, I, do CDC (vez que se trata de ação de responsabilidade civil), ou mesmo no juízo da ação coletiva (art. 98, § 2º, I, CDC).

Esse é o entendimento atual do STJ, que “considerando o princípio da instrumentalidade das formas e do amplo acesso à Justiça, desponta como um consectário natural dessa eficácia territorial a possibilidade de os

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agravados, consumidores titulares de direitos individuais homogêneos, beneficiários do título executivo havido na Ação Civil Pública, promoverem a liquidação e a execução individual desse título no foro da comarca de seu domicílio. Não há necessidade, pois, que as execuções individuais sejam propostas no Juízo ao qual distribuída a ação coletiva” (STJ, AgRg no Resp755.429-PR, Rel. Min. Sidnei Beneti, 3ª Turma, j. 17.12.2009).

Entendimento contrário, ademais, inviabilizaria a própria existência do juízo da 6ª Vara da Fazenda Pública da Capital, que ocupada com as milhares de liquidações/execuções das pretensões individuais correspondentes à tutela na sentença coletiva, não teria nem estrutura física e nem mental para o processamento das demais ações que, naturalmente, lhe competem.

A POUPANÇA DO POLO ATIVO ANIVERSARIA NA 2ª QUINZENA DO MÊS DE JANEIRO/89

A poupança do polo ativo, conforme extrato de fls. 09, aniversaria na primeira quinzena de janeiro de 1989.

Resta, portanto, afastada a tese do banco requerido.

NECESSIDADE DE PRÉVIA CITAÇÃO DO BANCO REQUERIDO PARA O PROCESSO DE LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA POR ARTIGOS

Há alguns julgados do TJSP dispensando a liquidação de sentença de casos como o presente, sob o fundamento de que a apuração do quantum devido depende, exclusivamente, de cálculos realizáveis pelo próprio credor, na forma do art. 475-B do CPC (Agravo de Instrumento 0207810-62.2011.8.26.0000, 17ª Câmara de Direito Privado, Rel. Paulo Pastore Filho, j. 25.04.2012) (Agravo de Instrumento 0014469-66.2011.8.26.0451, 37ª Câmara de Direito Privado, Rel. Sérgio Gomes, j. 23.04.2013).

Esse, contudo, não é o entendimento do juízo local.

Primeiro, porque o título executivo liquidado é expresso no sentido da necessidade de prévia liquidação, o que impede que essa outra instância deliberem em sentido contrário, na forma do art. 475-G do CPC.

E segundo, porque é da essência do modelo da liquidação da pretensão individual correspondente havida no processo coletivo (individuais homogêneos) o prévio processo de liquidação (imprópria), na forma do art. 97 e ss. do CDC, onde o liquidante, com base na certidão da extraída da sentença coletiva (art. 98, § 1º, do CDC) deve provar não só o quantum debeatur, mas também que se enquadra nos parâmetros estabelecidos na sentença coletiva.

No sentido do exposto há precedentes do TJSP sustentando a imprescindibilidade do processo de liquidação (imprópria) de sentença para os casos decorrentes da sentença coletiva obtida pelo IDEC contra o Banco

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do Brasil, oportunidade em que deverá o liquidante comprovar não só atender aos critérios estabelecidos na ação coletiva, mas também o quantum debeatur (Agravo de Instrumento 0012798-76.2012.8.26.0000, Rel. Fernandes Lobo, 22ª Câmara de Direito Privado, j. 27.09.2012).

Assim, a tese do liquidado fica prejudicada, vez que o juízo local determinou o regular processamento da liquidação por artigos (art. 475-E e F do CPC), oportunizando ao liquidado, então, o controle da adequação da situação do liquidante às balizas estabelecidas na sentença coletiva.

O ÍNDICE EM FEVEREIRO DE 1989 DEVE SER DE 10,14% POR DECORRÊNCIA LÓGICA DA APLICAÇÃO DO ÍNDICE DE 42,72% EM JANEIRO DE 1989

A tese da instituição financeira de que deverá haver uma suposta compensação entre os valores reclamados e reconhecidos na sentença coletiva relativos a janeiro/1989 (42,72%), com os valores pagos a maior pela aplicação do índice de 18,3540% de fevereiro/1989 (que na verdade deveria ser de 10,14%), extravasa por completo os limites do decidido no âmbito coletivo.

Com efeito, para que se operasse a suposta compensação era indispensável que tal questão fosse debatida na ação que teve curso na 6ª Vara da Fazenda Pública da Capital (SP), e que a sentença coletiva expressamente a destacasse, algo que, lendo e relendo a certidão acostada à inicial (art. 98, § 1º, do CDC), não encontrei.

Assim, se eventualmente houve pagamento a maior no mês de fevereiro (18,3540% em detrimento de 10,14%), não será por essa via da liquidação de sentença que o banco terá o reconhecimento da ocorrência.

Fica afastada, portanto, a inovadora arguição.

INCIDÊNCIA DE JUROS REMUNERATÓRIOS APENAS EM FEVEREIRO DE 1989

A sentença da ação coletiva previu claramente, através da decisão proferida em 08.06.2011, a aplicação de juros contratuais (remuneratórios) de 0,5%, tendo tal disposição transitada em julgado. Assim, mencionado encargo deve compor o cálculo do pedido de liquidação em todo o período de inadimplemento.

Afinal, os juros remuneratórios são devidos durante todo o período contratual, porquanto é sabido que eles integram a obrigação principal do contrato de depósito (poupança).

Por conseguinte, eles devem incidir mês a mês sobre a diferença entre os índices de atualização devidos e aplicados, contados a partir de quando deveriam ter incidido, até o momento de seu efetivo pagamento.

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Não é demais lembrar que o banco-depositário tem, desde 1989, em seu poder, para seu uso e benefício, e durante todo o tempo e até que se dê o pagamento correto, o valor que deveria ter pago ao depositante, de forma que a devolução pura e simples, sem a remuneração contratada, equivalerá a enriquecimento sem causa, em detrimento do patrimônio do poupador.

O TJSP, apreciando casos idênticos ao presente, tem assim se posicionado majoritariamente, o que confirma o acerto do ponto de vista ora defendido (Agravo de Instrumento 0280460-10.2011.8.26.0000, Rel. Paulo Pastore Filho, 17ª Câmara de Direito Privado, j. 24.10.2012) (Agravo de Instrumento 0216573-18.2012.8.26.0000, Rel. Afonso Bráz, 17ª Câmara de Direito Privado, j. 16.04.2013).

Portanto, não há espaço para a estapafúrdia tese de que os juros só incidiriam em fevereiro/1989 simplesmente porque a sentença não afirmou, expressamente, que deveriam incidir durante todo o período.

Tampouco há sentido para a tese de que os embargos de declaração opostos pelo MP na ação coletiva, não poderiam extravasar os limites do pedido inicial do próprio IDEC, vez que eventual nulidade foi sanada pela coisa julgada material e não pode ser objeto de inovação em sede liquidatória (art. 475-G do CPC).

INCIDÊNCIA DE JUROS MORATÓRIOS DESDE A CITAÇÃO DA LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA

Com a mais absoluta propriedade o banco liquidado afirma que os juros de mora, na liquidação de sentença coletiva, deve ter por termo inicial a data da citação do incidente/ação.

E duas são as razões para justificar tal entendimento.

Primeiro, porque não se pode afirmar que a instituição financeira liquidada estivesse em mora, quando o polo ativo não havia sequer exercido a pretensão creditícia objeto da presente demanda (art. 396 do CC).

E segundo, pois sendo a condenação coletiva genérica (art. 95 do CDC), não se positiva obrigação líquida (exatamente o que se busca no presente incidente), o que afasta a mora enquanto não ocorrente a competente interpelação (art. 397 e parágrafo único, do CC), que no caso se deu com a citação para a presente medida.

Esse, aliás, o entendimento atual do STJ a respeito do tema, verbis: “Reconhecida a procedência do pedido em ação civil pública destinada a reparar lesão a direitos individuais homogêneos, os juros de mora somente são devidos a partir da citação do devedor ocorrida na fase de liquidação de sentença, e não a partir de sua citação inicial na ação coletiva. De acordo com o art. 95 do CDC, a sentença de procedência na ação coletiva que

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tenha por causa de pedir danos referentes a direitos individuais homogêneos será, em regra, genérica, dependendo de superveniente liquidação. Essa liquidação serve não apenas para apuração do valor do débito, mas também para aferir a titularidade do crédito, razão pela qual é denominada pela doutrina de “liquidação imprópria”. Assim, tratando-se de obrigação que ainda não é líquida, pois não definidos quem são os titulares do crédito, é necessária, para a caracterização da mora, a interpelação do devedor, o que se dá com a sua citação na fase de liquidação de sentença” (STJ, AgRg no REsp 1.348.512-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 18/12/2012).

O raciocínio supra desenvolvido, contudo, não pode ser utilizado no caso presente.

Isso porque a sentença coletiva liquidada é expressa no sentido de que os juros de mora de 0,5% ao mês até a entrada em vigor do CC/02, e depois de 1% ao mês, devem incidir desde a citação.

Assim, ainda que em dissonância com a jurisprudência superior, em vista da regra da fidelidade da execução ao título (art. 475-G do CPC), e em respeito à própria garantia constitucional da coisa julgada (art. 5º, XXXVI da CF), prevalece o comando constante da sentença coletiva transitada em julgado.

No exato sentido do exposto há vários precedentes do TJSP afirmando que os juros nos casos de liquidação da sentença coletiva obtida pelo IDEC contra o Banco do Brasil incidem desde a citação para a ação coletiva, nos termos do que ficou expressamente consignado no título executivo liquidado (Agravo de Instrumento 0216573-18.2012.8.26.0000, Rel. Afonso Bráz, 17ª Câmara de Direito Privado, j. 16.04.2013) (Agravo de Instrumento 0280460-10.2011.8.26.0000, Rel. Paulo Pastore Filho, 17ª Câmara de Direito Privado, j. 24.10.2012).

ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA PELOS ÍNDICES DA TABELA PRÁTICA DO TJSP

Alega a instituição financeira liquidada que o índice de correção monetária a ser aplicado é o da própria caderneta de poupança, vez que a aplicação dos índices da tabela prática do TJSP – além de subsidiários aos índices contratuais pactuados -, acarretaria desigualdade entre jurisdicionados de diversas unidades da federação, com prejuízo à regra constitucional da igualdade (art. 5º, caput, da CF).

Contudo, o uso dos índices da própria poupança trará nova discussão acerca dos índices de março, abril e maio de 1990, já solvida pela jurisprudência, razão pela qual, para que não se eternize o litígio, a adoção da Tabela Prática Bandeirante é de rigor.

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A inclusão dos índices dos demais planos econômicos, que não o objeto da ação civil pública, ademais, decorre da atualização do poder aquisitivo da moeda, sem representar acréscimo ao quantum devido pelo banco e sem importar desvirtuamente da regra da fidelidade da liquidação ao título (art. 475-G do CPC).

Note-se, inclusive, que na esteira da condicionante havida no título liquidado, o presente entendimento não autoriza poupadores com saldo em caderneta de poupança nos períodos relativos aos demais planos econômicos frustrados (Bresser, Collor I e Collor II) a promover liquidação com base na sentença aqui tratada, que se limita a condenar o banco embargante ao pagamento de expurgos inflacionários relativos às perdas de 1989.

Também no âmbito do TJSP já se encontram posicionamentos no sentido da aplicação da tabela prática para correção dos créditos decorrentes da sentença coletiva promovida pelo IDEC, firma na tese de que não há violação alguma às premissas estabelecidas no título liquidado, ou mesmo ao princípio da igualdade constitucional (Agravo de Instrumento 0204306-14.2012.8.26.0000, Rel. Afonso Bráz, 17ª Câmara de Direito Privado, j. 16.04.2013) (Embargos de Declaração 0207810-62.2011.8.26.00000, Rel. Paulo Pastore, 17ª Câmara de Direito Privado, j. 04.07.2012) (Agravo de Instrumento 0578586.48.2010.8.26.0000, Rel. Antonio Ribeiro, 15ª Câmara de Direito Privado, j. 26.04.2011).

ABSOLUTA GENERALIDADE DA CONTESTAÇÃO AO PRESENTE PROCEDIMENTO LIQUIDATÓRIO E PREVALÊNCIA DOS CÁLCULOS APRESENTADOS PELO POLO ATIVO

A contestação ao presente procedimento liquidatório é absolutamente genérica, fugindo da regra da impugnação especificada prevista no art. 302 do CPC.

Por conseguinte, presumem-se como incontroversos os cálculos de liquidação apresentados pelo polo ativo (art. 334, III, do CPC), que, ademais, simplesmente espelham o comando da sentença coletiva ora liquidada.

É um engano pensar, ademais, que o procedimento de liquidação (imprópria) da pretensão individual correspondente à tutelada na sentença coletiva não possa ser julgado antecipadamente, sem a realização de perícia ou prova em audiência.

Primeiro, porque conforme regra do art. 475-F do CPC, aplica-se ao procedimento da liquidação por artigos, ainda que adaptada às nuances do

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processo coletivo, o procedimento comum, onde há previsão expressa do julgamento antecipado do mérito (art. 330, I, do CPC).

E segundo, porque já tendo o polo ativo, documentalmente, comprovado se enquadrar nos parâmetros estabelecidos na sentença coletiva, bem como demonstrado, analiticamente, a correção de sua conta, não há sentido para que se postergar a prolação da decisão neste feito, ainda mais diante da regra da tempestividade prevista no art. 5º, LXXVIII, da CF.

Fica dispensada, por isso, qualquer providência instrutória outra (especialmente perícia contábil) para determinar o quantum devido, que só depende de cálculo aritmético não impugnado adequadamente pelo banco liquidado.

III. DECISÃO

Poso isso, JULGO PROCEDENTE a presente liquidação da pretensão individual correspondente (por artigos), fixando o valor indenizatório devido em R$ 20.000,00 (vinte mil reais) para janeiro/2012, em valores que serão objeto de atualização conforme sentença liquidada ao tempo do pagamento; e assim o faço com resolução do mérito da liquidação, nos termos do art. 269, I, do Código de Processo Civil.

Tratando-se de liquidação autônoma (art. 475-E e F c.c. art. 475-J, parágrafo único, ambos do CPC, e art. 97 do CDC) – em que pese a natureza interlocutória da decisão (art. 475-H do CPC) -, não resta dúvida de que há sucumbência do banco liquidado, que pagará as despesas processuais (custas antecipadas) e honorários da parte adversa, ora fixados (inclusive nos termos da sentença liquidanda) em 10% do valor devido (atualizado). Tais valores, ao tempo do cumprimento de sentença, serão acrescidos ao valor principal reconhecido para execução conjunta.

Aguarde-se o decurso de prazo para eventual agravo e/ou a comunicação da concessão de efeito suspensivo por 30 (trinta) dias.

Após, intime-se por minuta o doravante exequente a apresentar cálculo atualizado do crédito nos termos do aqui decidido e, via advogado constituído, intime-se o devedor para pagamento em 15 dias, sob pena de multa de 10% (art. 475-J do CPC).

Int.