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1013 Anais 4º Simpósio de Geotecnologias no Pantanal, Bonito, MS, 20-24 de outubro 2012 Embrapa Informática Agropecuária/INPE, p. 1013-1023 Uso da terra e qualidade da água superficial na bacia do rio Miranda, MS Jeziel André Ferreira Sobrinho 1 Débora Fernandes Calheiros 1, 2 Peter Zeilhofer 1 1 Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT Av. Fernando Correa da Costa, 2.367 78060-900 - Cuiabá - MT, Brasil [email protected]; [email protected] 2 Embrapa Pantanal - CPAP R. 21 de setembro, 1880 - Caixa Postal 109 79320-900 - Corumbá - MS, Brasil [email protected] Resumo. Estudos relacionando qualidade de água superficial com o uso e ocupação da terra nas sub-bacias que formam o Pantanal são escassos. Este artigo descreve as relações espaciais de algumas variáveis de qualidade de água dos principais rios que compõem a bacia hidrográfica do rio Miranda – MS, amostradas no período de 2005-06, bem como as compara com o uso e ocupação do solo disponível (2008). Os mapas de uso e ocupação do solo foram relacionados espacialmente com as medianas das variáveis de qualidade de água amostradas em 22 pontos de coleta ao longo da bacia e suas respectivas áreas de drenagem. Apesar dos valores relativamente baixos de nitrogênio (NT) e fósforo total (PT) obtidos, pode-se relacionar com possíveis fontes antrópicas responsáveis pela elevação das concentrações em algumas sub-bacias como lançamento de esgotos urbanos e áreas de rizicultura irrigada (NT) e abatedouros e usinas de álcool (PT). As concentrações mais elevadas de material em suspensão total (MST), fino (MSFT) e grosso (MSGT) e correspondentemente menores de transparência foram observadas no trecho superior e médio do rio Aquidauana e no trecho médio do rio Miranda (exceto para o MSGT). Quando se compara os dados de uso da terra, observa-se que esses pontos correspondem a áreas que drenam regiões em que a cobertura de vegetação nativa já sofreu alteração significativa (> 60%). Os valores de turbidez se comportaram de forma similar, já as concentrações de oxigênio dissolvido foram menores nas áreas de planície de inundação, conforme esperado. Esses resultados podem contribuir para a gestão ambiental e conservação de recursos hídricos da bacia, visando o uso sustentável dos seus recursos naturais. Palavras-chave: qualidade de água, bacia do rio Miranda, geoprocessamento, uso da terra, Pantanal.

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Anais 4º Simpósio de Geotecnologias no Pantanal, Bonito, MS, 20-24 de outubro 2012Embrapa Informática Agropecuária/INPE, p. 1013-1023

Uso da terra e qualidade da água superficial na bacia do rio Miranda, MS

Jeziel André Ferreira Sobrinho1

Débora Fernandes Calheiros1, 2

Peter Zeilhofer1

1 Universidade Federal de Mato Grosso - UFMTAv. Fernando Correa da Costa, 2.367

78060-900 - Cuiabá - MT, [email protected]; [email protected]

2 Embrapa Pantanal - CPAPR. 21 de setembro, 1880 - Caixa Postal 109

79320-900 - Corumbá - MS, [email protected]

Resumo. Estudos relacionando qualidade de água superficial com o uso e ocupação da terra nas sub-bacias que formam o Pantanal são escassos. Este artigo descreve as relações espaciais de algumas variáveis de qualidade de água dos principais rios que compõem a bacia hidrográfica do rio Miranda – MS, amostradas no período de 2005-06, bem como as compara com o uso e ocupação do solo disponível (2008). Os mapas de uso e ocupação do solo foram relacionados espacialmente com as medianas das variáveis de qualidade de água amostradas em 22 pontos de coleta ao longo da bacia e suas respectivas áreas de drenagem. Apesar dos valores relativamente baixos de nitrogênio (NT) e fósforo total (PT) obtidos, pode-se relacionar com possíveis fontes antrópicas responsáveis pela elevação das concentrações em algumas sub-bacias como lançamento de esgotos urbanos e áreas de rizicultura irrigada (NT) e abatedouros e usinas de álcool (PT). As concentrações mais elevadas de material em suspensão total (MST), fino (MSFT) e grosso (MSGT) e correspondentemente menores de transparência foram observadas no trecho superior e médio do rio Aquidauana e no trecho médio do rio Miranda (exceto para o MSGT). Quando se compara os dados de uso da terra, observa-se que esses pontos correspondem a áreas que drenam regiões em que a cobertura de vegetação nativa já sofreu alteração significativa (> 60%). Os valores de turbidez se comportaram de forma similar, já as concentrações de oxigênio dissolvido foram menores nas áreas de planície de inundação, conforme esperado. Esses resultados podem contribuir para a gestão ambiental e conservação de recursos hídricos da bacia, visando o uso sustentável dos seus recursos naturais.

Palavras-chave: qualidade de água, bacia do rio Miranda, geoprocessamento, uso da terra, Pantanal.

Anais 4º Simpósio de Geotecnologias no Pantanal, Bonito, MS, 20-24 de outubro 2012Embrapa Informática Agropecuária/INPE, p.

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Abstract. Studies related to surface water quality and land use and cover in sub-basins that form the Pantanal Wetland are scarce. This article describes the spatial relationships of some water quality variables of major rivers of the Miranda River Basin (Mato Grosso do Sul State - Brazil, sampled in the years 2005-06 and compares them with available land use data (2008). The maps of land use were spatially related to the medians of water quality variables sampled at 22 sampling points along the basin and their respective drainage areas. Despite the relatively low values of total nitrogen (TN) and phosphorus (TP), they can be related to possible anthropogenic sources in some sub-basins such as effluents of urban sewage and irrigated agriculture (TN) and slaughterhouses and biofuel plants (TP). The highest concentrations of total (TSS), fine (TTSS) and coarse (TCSS) suspended solids and the corresponding lower transparency were observed in the upper and middle reaches of the Aquidauana River and in the middle reach of Miranda River (except for the TCSS values). When the data of land use are taking into account, it can be observed that those points correspond to areas that drain regions where the natural vegetation cover has been significant transformed (> 60%). The turbidity values behaved similarly, while the dissolved oxygen concentrations were lower in areas of the floodplain, as expected. The results of this work can contribute to environmental management and conservation of water resources in the basin, targenting the sustainable use of its natural resources.

Key-words: water quality, Miranda River Basin, geoprocessing, land use, Pantanal Wetland.

1. Introdução

O crescimento da demanda por recursos naturais em escala global pode ser considerado um dos fatores mais importantes para a intensificação do uso e ocupação da terra, sendo que a forma como tem sido realizado pode promover a degradação do meio ambiente (Foley et. al, 2005). No Brasil também se observa esta tendência, principalmente relacionado à abertura de novas áreas para a agropecuária e um aumento da poluição por esgotos não tratados, de origem domiciliar e industrial.

Firmino & Fonseca (2008) mostram como o aumento de áreas para a maior produção de culturas agrícolas como a soja e a cana-de-açúcar, podem impactar o meio ambiente de forma considerável, principalmente quanto ao desgaste do solo. Como observado pelos autores, alterações no uso do solo podem causar consequências no clima local e regional, na vegetação e nos recursos hídricos.

Nas últimas décadas, a expansão das atividades antrópicas relacionadas à agropecuária, à agroindústria, à extração mineral e ao lançamento de efluentes urbanos e industriais promoveu impactos expressivos em toda a Bacia do Alto Paraguai (BAP), com o aumento dos processos erosivos nos rios, aumentando por sua vez o transporte de material em suspensão e o aporte de carga orgânica, de fertilizantes e pesticidas (PCBAP, 1997; Calheiros & Oliveira, 2010). Esta expansão se deu a partir da década de 1970, principalmente na região do planalto, com conseqüências negativas na planície pantaneira adjacente, tanto ambientais quanto socioeconômicas, com o caso extremo do assoreamento do rio Taquari (MS). Araujo & Zeilhofer (2011) identificaram que as alterações nos padrões de qualidade de água nas bacias do rio Cuiabá e São Lourenço (MT) estavam relacionadas a mudanças no uso da terra, principalmente devido ao incremento de atividades agrícolas e da ocupação urbana. Na bacia do Alto Paraguai apenas o trabalho de Zeilhofer et al. (2010) correlacionou os efeitos do uso da terra sobre a qualidade de água. Na bacia hidrográfica do rio Miranda (MS), poucos são os trabalhos realizados sobre qualidade de água (Oliveira & Ferreira, 2003; SEMA-IMASUL, 2005; Embrapa, 2007; Freire et al., 2011) e sobre o levantamento da supressão da vegetação nativa (PCBAP, 1997; Pereira et al., 2004; Monitoramento, 2010), contudo sem correlacionar ambas informações.

O mau uso da terra associado ao desmatamento em áreas de proteção permanente

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(APPs), além do uso de fertilizantes na lavoura e a falta de tratamento de efluentes nas principais cidades, promovem consequentemente alterações nas características físicas e químicas da água, assoreamento do leito dos rios e efeitos diretos e indiretos na biota aquática que atingem a planície pantaneira. Além disso, na planície os impactos tenderam a se agravar com o aumento do desmatamento (Silva et al., 2011) para a conversão para pastagens plantadas e produção associada de carvão vegetal, além da expansão da monocultura de eucalipto na transição com o planalto e de rizicultura irrigada na planície, muitas vezes em áreas de APPs.

Desta forma, a determinação do aporte de sólidos suspensos, nutrientes e matéria orgânica, do grau de contaminação dos rios e córregos por pesticidas e metais pesados e a determinação de índices de qualidade ambiental e de bioindicadores são de extrema importância para o diagnóstico da conservação da qualidade e da quantidade de água da bacia do rio Miranda e, por conseguinte, contribuir para a conservação do Pantanal. Assim, estudos desta natureza são de grande importância para o aumento da compreensão dos processos chave que interferem na qualidade de água das bacias formadoras do Pantanal Mato-Grossense, visando subsidiar sua gestão integrada utilizando a bacia hidrográfica como unidade de planejamento e gestão.

2. Objetivo

Neste contexto, o objetivo deste trabalho foi realizar uma análise espacial da qualidade de água superficial na bacia hidrográfica do rio Miranda - MS e suas relações com o uso da terra e localização dos principais usuários de recursos hídricos.

3. Material e Métodos

A área de estudo deste trabalho é a Bacia Hidrográfica do rio Miranda (BHRM), um importante tributário do rio Paraguai, uma sub-bacia da Bacia do Alto Paraguai (BAP), contribuindo para formar o Pantanal Mato-Grossense. Está localizada no estado de Mato Grosso do Sul entre as coordenadas 19º 18’ 35’’e 22º 1’42’’ latitude Sul e 54º18’24’’ e 57º29’41’’ longitude Oeste. Sua área é de aproximadamente, 43.303 km2, dos quais 22.050 km2 pertencem à área de drenagem do rio Miranda e 21.253 km2 à do seu afluente principal, o rio Aquidauana, compondo cerca de 12% da Bacia do Alto Paraguai, abrangendo o território de 23 municípios, sendo que apenas 15 possuem núcleos urbanos inseridos na bacia. Dez municípios (Anastácio, Guia Lopes de Laguna, Nioaque, Rochedo, Terenos, Bodoquena, Dois Irmãos do Buriti, Bonito, Miranda e Jardim) possuem mais de 90% de sua área nesta bacia e 9 municípios possuem entre 10 a 50%; a maioria dos 23 municípios (65%) possui seu núcleo urbano na bacia (Pereira et al. 2004). O relevo apresenta aspectos diversificados com áreas de planícies que são periodicamente inundadas em altitudes abaixo de 200 metros, e áreas à montante com a presença de serras e planaltos, em torno de 800 metros (Figura 1).

A área da planície inundação da bacia é de cerca de 12.224 km2, sendo consideradas como sub-regiões do Pantanal: o Pantanal do Miranda e o Pantanal do Aquidauana, perfazendo cerca de 9% da área total (Hamilton et al., 1996).

Para a realização desta pesquisa foram coletadas amostras de qualidade de água mensalmente entre maio de 2005 e outubro de 2006, ao longo dos principais tributários dos rios Miranda e Aquidauana como parte das ações do Projeto FINEP/CT-HIDRO "Desenvolvimento de indicadores da qualidade das bacias hidrográficas do Tietê/Jacaré

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(SP) e do rio Miranda (MS) para manutenção da qualidade da água" (Chamada 01/2004). Para o monitoramento foram escolhidos 22 pontos (Figura 2) distribuídos ao longo da bacia no sentido montante-jusante. As principais variáveis de qualidade de água escolhidas para a análise espacial foram: oxigênio dissolvido (OD – mg/L), por meio de equipamento multianálise YSI devidamente calibrado; nitrogênio total (NT - µg/L) e fósforo total (PT –µg/L), por meio do método FIA (Wetzel & Likens, 1991; Valderrama, 1981; Zagatto et al., 1981; Machereth et al., 1981); turbidez (TD – UNT), material em suspensão total (MST - mg/L), material em suspensão fino total (MSFT > 62 µm – mg/L), material em suspensão grosso total (MSGT > 62 µm – mg/L) e transparência por disco de Secchi (m), segundo APHA (1998). Tais variáveis indicam a alteração da qualidade dos corpos d’água resultante da supressão da vegetação nativa, da entrada de nutrientes de forma difusa pela agropecuária ou pontual via lançamento de esgotos urbanos e agroindustriais.

A caracterização da área de estudo foi baseada em três planos de informação (PIs) pré-existentes. Todos os PIs, tanto os de formato raster quanto os de formato vetorial, foram projetados em sistema UTM, fuso 21 sul, utilizando o datum WGS84, sendo os mesmos: a) Modelo Numérico de Terreno, b) Mapa de uso e ocupação da terra e c) Localização das cidades e atividades industriais.

Para a delimitação da área de contribuição de cada ponto de coleta de qualidade de água foi necessária a utilização de um Modelo Numérico do Terreno (MNT), proveniente do projeto TOPODATA do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) com resolução espacial de 30 metros. Após imposição da rede de drenagem e preenchimento de depressões fechadas foi realizado processo de delimitação automatizada (“Watershed”) no ArcGIS a partir dos locais de coleta nas quais a direção do fluxo converge, indicando a área a montante de contribuição. Vale lembrar que devido ao curso natural das águas,

Figura 1. Hipsometria da bacia do rio Miranda – MS de acordo com um Modelo de Terreno SRTM-Topodata, com drenagem para a planície pantaneira à Oeste.

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Figura 2. Porcentagem (%) de alteração da cobertura vegetal nativa em 2008 na Bacia do rio Miranda-MS com localização das áreas urbanas, dos pontos de amostragem de qualidade de água e suas respectivas áreas de drenagem, bem como das principais atividades usuárias de recursos hídricos.

os pontos de coleta de qualidade de água que estão à jusante também recebem influencia dos pontos que estão à montante.

O mapa de uso e ocupação da terra referente a 2008 foi gerado com base nos dados do mapeamento das alterações da cobertura vegetal e uso da terra na Bacia do Alto Paraguai (Mapeamento 2010), cedidos pelo WWF-Brasil. Neste trabalho utilizaram-se imagens do período de março a julho de 2008 do satélite Landsat-5 TM que estão disponíveis no site do INPE, por meio da metodologia de interpretação visual em tela, na escala de 1:50.000. As classes de uso do mapeamento original foram sintetizadas em quatro categorias: Uso Antrópico (Agricultura, Pastagem, Alteração Manual/Manejo, Alteração Antrópica, Degradada por mineração e Reflorestamento); Vegetação Nativa (Vegetação fluvial, Formações florestais, Savana florestada, Cerrado, Campo, Chaco e Chaco úmido); Água e Áreas Urbanas.

Também foram georeferenciados a localização de empreendimentos classificados como grandes usuários de recursos hídricos (Embrapa, 2007), presentes na bacia: abatedouro, indústria de cimento, laticínios, pontos de mineração, áreas de agricultura irrigada e de produção de cana de açúcar e álcool. Os dados de identificação dos principais usuários de recursos hídricos na BHRM bem como as respectivas demandas de água foram levantados por Embrapa (2007).

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4. Resultados e Discussão

Os resultados de uso antrópico contrastados com as áreas com a presença de cobertura de vegetação nativa (Monitoramento 2010) em conjunto com a localização das áreas urbanas e dos principais usuários de recursos hídricos (Figura 2) mostram que a grande maioria da BHRM apresenta valores de uso antrópico maiores do que 55% até 75% o que caracteriza elevado índice de supressão da vegetação nativa. Os maiores usuários de água superficial e subterrânea na BHRM em 2006 foram a agricultura irrigada, com 93,7% (6.049.241 m³/mês) do volume total utilizado pelo conjunto de usuários e a Usina de Álcool com 4,5% (288.000 m³/mês), as outras categorias analisadas utilizam valores menores que 2%. As áreas urbanas que mais demandaram água foram Bodoquena com 45% (2.937.303 m³/mês) e Miranda com 42% (2.707.242 m³/mês), com base nas informações da empresa de abastecimento de água de Mato Grosso do Sul - SANESUL (comunicação pessoal).

Apesar dos valores relativamente baixos de nitrogênio (NT) e fósforo total (PT) obtidos, as concentrações mais elevadas podem ser relacionadas com prováveis fontes antrópicas como lançamento de esgotos urbanos, laticínios e áreas de agricultura (em especial rizicultura) irrigada (NT), bem como abatedouros e áreas de cultivo de cana de açúcar que servem a uma usina de álcool (PT) (Figuras 2 e 3). As concentrações mais elevadas de material em suspensão total (MST), fino (MSFT) e grosso (MSGT), e correspondentemente menores de transparência, foram observadas no trecho superior e médio do rio Aquidauana e no trecho médio do rio Miranda (exceto para o MSGT) (Figura 4).

No rio Aquidauana o processo de produção de sedimentos em suspensão está mais expressivo. Quando se compara os dados de uso da terra, observa-se que esses pontos correspondem a áreas que drenam regiões em que a cobertura de vegetação nativa já sofreu alteração significativa (> 60%) (Figuras 3 e 4). Os valores de turbidez se comportaram de forma similar já as concentrações de oxigênio dissolvido foram menores nas áreas de planície de inundação, conforme esperado (Figura 3).

Apesar dos níveis de uso e ocupação da terra apresentarem índices elevados, em especial nas áreas de planalto circundante à planície dos rios Miranda e Aquidauana, as variáveis de qualidade de água OD, turbidez, NT (somas das formas nitrogenadas de nitrato, nitrito e nitrogênio amoniacal) e PT atenderam aos padrões permitidos pela legislação com base na Resolução CONAMA Nº 357 (Brasil, 2005) para as Classes 1 e 2. Os dados obtidos neste trabalho corroboraram a avaliação do Índice de Qualidade de Água (IQA), segundo a SEMA-IMASUL (2005) que apresentaram, em geral, classificação “Aceitável” nos trechos médio do rio Miranda e superior e médio do rio Aquidauana, com alguns trechos considerados “Ruim” próximos às áreas urbanas de Aquidauana e Anastácio. Contudo, maior detalhamento espacial e na frequência de amostragem, em especial coincidindo com eventos de chuva, são necessários para se poder determinar melhor a relação entre uso da terra e qualidade de água.

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Figura 3. Concentração (mediana) de NT, PT, OD e Turbidez (2005-06) e uso da terra (2008) nas áreas de drenagem de cada ponto de coleta na bacia do rio Miranda – MS.

Figura 4. Concentração (mediana) de MST, MSFT, MSGT e transparência (2005-06) e uso da terra (2008) nas áreas de drenagem de cada ponto de coleta na bacia do rio Miranda – MS.

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5. Conclusões

A realidade da maioria dos rios no país é de perda de qualidade e quantidade de água. A água destinada à irrigação, abastecimento público ou navegação, é considerada um recurso isolado para cada finalidade. A falta de coordenação entre esses diversos setores acaba por criar conflitos e diverge da premissa de análise integrada e com base em usos múltiplos, como rege a Lei de Recursos Hídricos (Lei 9.433/1997), comprometendo a manutenção dos processos ecológicos dos corpos d’água e levando à escassez e à degradação da qualidade. A necessidade de considerar que os serviços prestados pelos ecossistemas aquáticos necessitam de uma abordagem multisetorial e interdisciplinar é premente. Os resultados deste trabalho contribuem para a gestão ambiental e de recursos hídricos da bacia, uma vez que identificam as possíveis causas de alteração da qualidade de água, antes que processos de uso dos recursos naturais venham a comprometer esta qualidade de forma mais significativa.

6. Agradecimentos

Agradecemos à WWF-Brasil pela disponibilização dos arquivos de uso da terra de 2008. Agradecemos também à toda a equipe de apoio da Embrapa Pantanal, em especial aos colegas Maria Davina R. dos Santos, Egídia do A. Costa, Valdete J. S. Sanchez, Isac T. de Carvalho e Waldomiro Lima e aos bolsistas PELD/CNPq Elizângela V. da Silva, Marlene M. Mármora, Raphael R. Barreto. Nossas pesquisas na bacia do rio Miranda foram financiadas pelo Programa PELD/CNPq (Site 2, 520056/98-1), Projeto MCT/FINEP/CT-HIDRO GRH 1/2004, Projeto SINERGIA MCT/CNPq, Embrapa MP1 Projeto AVISAR.

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