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1 URBANIZAÇÃO, DESENVOLVIMENTO SÓCIOECONÔMICO E CRIMINALIDADE VIOLENTA Fernanda Pamplona Ramão 1 Jandir Ferrera de Lima 2 Yonissa Marmitt Wadi 3 Resumo: Este artigo analisa a distribuição espacial da criminalidade violenta na cidade de Cascavel/PR no ano de 2005, comparativamente com alguns indicadores sócioeconômicos. Paralelamente a um intenso processo de urbanização, verificouse na cidade de Cascavel um aumento na renda per capita média e IDH, bem como nos Índices de Gini, Theil e de Intensidade da Pobreza. Apesar do crescimento econômico, houve ampliação da desigualdade social. Identificouse uma forte associação entre a condição sócioeconômica e a criminalidade violenta. Por fim, apresentamse estratégias de desenvolvimento territorial capazes de minimizar a problemática da criminalidade urbana. Palavraschave: desenvolvimento social, desenvolvimento territorial, economia urbana. Abstract: This article analyzes the space distribution of the violent crime rate in the city of Cascavel/PR in the year 2005, comparatively with some socioeconomic indicators. Parallelly to an intense urbanization process, it was verified in the city of Cascavel an increase in the medium per capita income and IDH, as well as in the Indexes of Gini, Theil and of Intensity of the Poverty. In spite of the economic growth, there was amplification of the social inequality. Was identified a strong relation between the socioeconomic condition and the violent crime rate. Finally, they come strategies of territorial development capable to minimize the problem of the urban crime rate. Keywords: social development, territorial development, urban economy. 1. INTRODUÇÃO Este artigo analisa a distribuição espacial da criminalidade urbana na cidade de Cascavel/PR, no ano de 2005, e sua relação com indicadores sócioeconômicos municipais. Avaliase o fenômeno da criminalidade urbana no intuito de fornecer elementos para o planejamento urbano e regional. 1 Cientista Social pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná UNIOESTE. Mestranda do Programa de Pós Graduação em Desenvolvimento Regional e Agronegócio da UNIOESTE / Campus de Toledo. Bolsista da CAPES. Membro do Grupo de Pesquisa Cultura, Relações de Gênero e Memória. Email: [email protected] 2 Ph.D. em Desenvolvimento Regional pela Université du Québec (UQAC). Professor Adjunto do Colegiado de Ciências Econômicas e do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional e Agronegócio UNIOESTE / Campus de Toledo. Pesquisador do GEPEC. Email: [email protected] 3 Doutora em História Social. Professora Adjunta do Colegiado do Curso de Ciências Sociais e do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional e Agronegócio UNIOESTE / Campus de Toledo. Pesquisadora do Grupo de Pesquisa Cultura, Relações de Gênero e Memória. Email: [email protected]

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URBANIZAÇÃO, DESENVOLVIMENTO SÓCIO­ECONÔMICO E

CRIMINALIDADE VIOLENTA

Fernanda Pamplona Ramão 1 Jandir Ferrera de Lima 2 Yonissa Marmitt Wadi 3

Resumo: Este artigo analisa a distribuição espacial da criminalidade violenta na cidade de Cascavel/PR no ano de 2005, comparativamente com alguns indicadores sócio­econômicos. Paralelamente a um intenso processo de urbanização, verificou­se na cidade de Cascavel um aumento na renda per capita média e IDH, bem como nos Índices de Gini, Theil e de Intensidade da Pobreza. Apesar do crescimento econômico, houve ampliação da desigualdade social. Identificou­se uma forte associação entre a condição sócio­econômica e a criminalidade violenta. Por fim, apresentam­se estratégias de desenvolvimento territorial capazes de minimizar a problemática da criminalidade urbana.

Palavras­chave: desenvolvimento social, desenvolvimento territorial, economia urbana.

Abstract: This article analyzes the space distribution of the violent crime rate in the city of Cascavel/PR in the year 2005, comparatively with some socioeconomic indicators. Parallelly to an intense urbanization process, it was verified in the city of Cascavel an increase in the medium per capita income and IDH, as well as in the Indexes of Gini, Theil and of Intensity of the Poverty. In spite of the economic growth, there was amplification of the social inequality. Was identified a strong relation between the socioeconomic condition and the violent crime rate. Finally, they come strategies of territorial development capable to minimize the problem of the urban crime rate.

Keywords: social development, territorial development, urban economy.

1. INTRODUÇÃO

Este artigo analisa a distribuição espacial da criminalidade urbana na cidade de

Cascavel/PR, no ano de 2005, e sua relação com indicadores sócio­econômicos municipais.

Avalia­se o fenômeno da criminalidade urbana no intuito de fornecer elementos para o

planejamento urbano e regional.

1 Cientista Social pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná ­ UNIOESTE. Mestranda do Programa de Pós­ Graduação em Desenvolvimento Regional e Agronegócio da UNIOESTE / Campus de Toledo. Bolsista da CAPES. Membro do Grupo de Pesquisa Cultura, Relações de Gênero e Memória. E­mail: [email protected] 2 Ph.D. em Desenvolvimento Regional pela Université du Québec (UQAC). Professor Adjunto do Colegiado de Ciências Econômicas e do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional e Agronegócio ­ UNIOESTE / Campus de Toledo. Pesquisador do GEPEC. E­mail: [email protected] 3 Doutora em História Social. Professora Adjunta do Colegiado do Curso de Ciências Sociais e do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional e Agronegócio ­ UNIOESTE / Campus de Toledo. Pesquisadora do Grupo de Pesquisa Cultura, Relações de Gênero e Memória. E­mail: [email protected]

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O processo de redefinição dos espaços e da organização da vida social caracterizados

pela intensa urbanização, especialmente das cidades de médio porte, desencadeou uma série

de mudanças de cunho espacial, econômico, cultural, político e social que alterou

significativamente as bases da sociedade. Da mesma forma, o rápido crescimento

demográfico, o êxodo rural e os deslocamentos humanos, o processo de industrialização, entre

outros fatores, intensificaram esse processo. Inseridas num contexto global de reconfiguração

das formas de organização da vida coletiva, essas transformações desencadearam novas

problemáticas a serem refletidas, dentre as quais destaca­se o fenômeno da criminalidade

urbana, considerada uma contra­face do processo de desenvolvimento.

O tema da violência e criminalidade vem motivando cada vez mais debates no cenário

nacional e regional, visto os crescentes índices de delitos que assolam o país e que agravam o

clima de insegurança pública. Ao problematizar o tema da distribuição espacial da

criminalidade violenta na cidade de Cascavel na contemporaneidade, fornecem­se dados

concretos para um debate consistente sobre a relação entre o processo de desenvolvimento

sócio­econômico e a ocorrência da criminalidade violenta. Busca­se contribuir com a

discussão sobre programas e projetos em políticas públicas de intervenção e prevenção.

O estudo da distribuição espacial dos delitos não trata do crime de modo geral, mas

das condições de incidência de determinados tipos de crimes. Parte­se do pressuposto de que

crimes não ocorrem aleatoriamente no tempo e no espaço. Beato (2004) apresenta as

hipóteses clássicas para a distribuição da incidência da criminalidade: na primeira, fatores de

origem sócio­econômica, tais como a privação de oportunidades, desigualdade social e

marginalização são estímulos determinantes para o comportamento criminoso. A segunda

hipótese aborda o fenômeno do crime como produto do baixo grau de integração moral, que

conduz os delinqüentes a agredir o consenso moral e normativo da sociedade. Embora se

credite o fenômeno a uma associação desses aspectos, por opção metodológica, nesse artigo

será considerada a primeira possibilidade.

A cidade de Cascavel ­ foco desta análise ­ é dotada de singularidades na construção

de seu espaço urbano, cujas origens remontam ao período de ocupação intensa da região

Oeste do Paraná. Segundo Sperança (1992) Cascavel é a única cidade regional que nunca teve

projeto de colonização. Sua ocupação intensa e seu desenvolvimento rápido e incessante

ocorreram, em larga medida, de forma desordenada. Ela foi decorrente de sua localização

geográfica privilegiada, num entroncamento, local de passagem e pouso de muitos viajantes, e

pela possibilidade de exploração de suas riquezas naturais, como a madeira. Desde sua

formação enquanto aglomerado urbano, Cascavel é caracterizada por seus altos índices de

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violência, especialmente de delitos de grande teor ofensivo. No início de sua ocupação

intensa, por volta da década de 1950 e 1960, a cidade era muito temida devido às lutas pela

posse das terras e por interesses econômicos (CORDEIRO, s.d.). Hoje Cascavel é lembrada

pela alta incidência de crimes violentos e contra o patrimônio.

O artigo está organizado em cinco partes, além desta introdução. Na segunda parte

apresenta­se o referencial teórico acerca do processo da urbanização e do desenvolvimento

sócio­econômico. Na terceira parte discute­se o tema da criminalidade violenta enquanto

fenômeno tipicamente urbano. No quarto item realiza­se um diagnóstico da distribuição

espacial da criminalidade urbana violenta na cidade de Cascavel, no ano de 2005,

comparativamente com indicadores sócio­econômicos de cada unidade administrativa

municipal. Na quinta parte apresenta­se alguns elementos que norteiam o atual debate sobre

criminalidade e política de segurança pública, para em seguida sugerir algumas ações de

desenvolvimento territorial capazes de contribuir para minimizar o problema da criminalidade

violenta no espaço urbano. Na sexta parte, tecem­se as conclusões.

2. URBANIZAÇÃO E DESENVOLVIMENTO SÓCIO­ECONÔMICO

A urbanização é elemento­chave para se compreender as modificações na

configuração espacial brasileira na contemporaneidade. Trata­se de um fenômeno no qual

contingentes populacionais se deslocam rumo às cidades, geralmente em busca de melhores

condições de vida. Em larga escala, esses deslocamentos humanos se justificam pelas

modificações nas relações produtivas no campo. O rápido crescimento demográfico, o

processo de industrialização, a modernização da agricultura e posteriormente o intenso êxodo

rural, entre outros fatores, engrossaram o processo de urbanização brasileiro que, embora

tenha se iniciado por volta da década de 1950, ganhou grande destaque a partir de meados da

década de 1970 no cenário nacional (MONTE­MÓR, 2004).

O contínuo processo de redefinição dos espaços e da organização da vida social,

atualmente caracterizado pela urbanização, especialmente das cidades brasileiras de médio

porte (STAMM, WADI e STADUTO, 2005), desencadeou mudanças substanciais não apenas

na distribuição espacial da população, mas nas suas formas produtivas e na vida social. Esse

processo de ocupação dos espaços urbanos ocorreu, e ainda ocorre, em grande escala, de

modo desordenado. Algumas cidades não possuem infra­estrutura e planejamento urbano

adequado para absorver o novo contingente populacional e garantir acesso suficiente aos

equipamentos e serviços urbanos de necessidade básica.

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Para Singer (2002) o fenômeno da urbanização em si pode ser compreendido como

uma conseqüência demográfica do rearranjo espacial das atividades econômicas. Desse modo,

alguns contingentes populacionais partem das áreas rurais ou de municípios menores, muitas

vezes devido à estagnação das economias locais, em busca de melhores condições de vida nas

cidades maiores, onde a economia é mais dinâmica e onde se localizam a maioria das

indústrias.

Na perspectiva de Henderson (2002) o processo de urbanização em países

subdesenvolvidos ­ como o Brasil ­ foi bastante intenso. O autor observa que o processo

vivenciado pelos Estados Unidos em 90 anos em termos de urbanização, que foi associado a

altos investimentos em educação e infra­estrutura, no Brasil ocorreu em 30 anos e sem

planejamento. Monte­Mór (2004) afirma que em 1970 o Brasil atingiu um grau de

urbanização de 56% e, em 1980, a população urbana no país somava 69,2% (SILVA, 1997).

Segundo o IBGE, no ano de 2002, esse percentual atingiu a casa dos 84,14%.

Pensar a urbanização, e as implicações decorrentes desse amplo processo de mudança

estrutural da sociedade brasileira, leva à reflexão acerca do processo de desenvolvimento. A

definição do conceito de desenvolvimento regional não é uma tarefa simples. A noção de

desenvolvimento não é neutra, mas carregada de ideologias, de visões de mundo e de projetos

de determinados sujeitos. Nesta análise, considera­se que “desenvolvimento nada mais é que

o crescimento ­ incrementos positivos no produto e na renda ­ transformado para satisfazer as

mais diversificadas necessidades do ser humano, tais como: saúde, educação, habitação,

transporte, alimentação, lazer, dentre outras” (OLIVEIRA, 2002, p. 40).

Considera­se necessário para o desenvolvimento que haja crescimento (aspecto

econômico) aliado ao viés social, o que implica na difusão dos benefícios econômicos para

toda a população, conduzindo à ampliação do bem­estar coletivo e das liberdades individuais.

Parte­se do princípio que o crescimento é requisito indispensável para o desenvolvimento,

mas não suficiente. Para Oliveira (2002) o processo de desenvolvimento se caracteriza por

mudanças qualitativas no modo de vida das pessoas, nas instituições e nas estruturas

produtivas. Nesse sentido, o termo desenvolvimento sócio­econômico é aqui empregado.

Sabe­se que o processo de desenvolvimento não é homogêneo ao longo do território e

que há a necessidade da intervenção governamental e de fortes investimentos sociais para sua

difusão. Ao governo compete o papel de regulador do processo de desenvolvimento. É

importante frisar que o crescimento é espontâneo e espacialmente concentrado, mas o

desenvolvimento deve ser planejado e permear todo o território.

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Ferrera de Lima (2005) afirma que o elemento mais importante do desenvolvimento

regional é a integração entre as diversas sub­regiões, que no contexto municipal pode ser

caracterizada pelas diferentes unidades administrativas. Para o autor, a noção de integração

transcende o viés econômico e envolve aspectos sociais e culturais. As questões sociais

envolvem as disparidades na renda e qualidade de vida ao longo do espaço. Nesse contexto, a

integração deve ser norteada pela idéia que os diferentes grupos sociais podem progredir mais

e melhor de forma conjunta. Ainda para o autor, tal processo implica em educação, progresso

e bem­estar social.

Segundo Desbiens e Ferrera de Lima (2004) as políticas de difusão do

desenvolvimento devem estar voltadas à criação de oportunidades sociais, o que requer uma

constante necessidade de busca de equilíbrio: redistribuição dos rendimentos, garantia de

eqüidade e desenvolvimento humano. Os autores concluem que “uma teoria de

desenvolvimento regional exige uma filosofia empírica que extrapola as especialidades e visa

uma ação integrada que cobre todos os aspectos de um modo de vida” (2004, p. 7).

Com o advento da urbanização, tendência natural do processo de desenvolvimento

(HENDERSON, 2002), o rearranjo demográfico muitas vezes ocorre de forma mais acentuada

do que a realocação dos recursos básicos para garantir uma vida digna a amplas parcelas da

população, geralmente favorecendo alguns grupos ou regiões em detrimento de outras. Para

Oliveira (2002) essa desigualdade inerente ao processo de crescimento das regiões deve ser

combatida para gerar maiores e melhores benefícios para todos. Nesse sentido, pensar a

urbanização implica, direta ou indiretamente, refletir acerca do processo de desenvolvimento

social e econômico.

Além disso, novas problemáticas emergem ou se intensificam com o advento do

crescimento urbano desordenado, dentre as quais se destacam problemas na esfera do espaço

físico ou na chamada infra­estrutura urbana – como déficit habitacional e de saneamento

básico, acesso restrito à saúde e a postos de trabalho, etc. –, assim como nos espaços das

relações sociais – manifesta no aumento do individualismo, na desagregação das relações de

solidariedade e, de forma mais acentuada, nos elevados índices de violência e criminalidade.

3. A CRIMINALIDADE VIOLENTA COMO FENÔMENO URBANO

Considerando o cenário da intensa urbanização das cidades médias brasileiras e dos

desdobramentos desse processo, tem­se a questão da criminalidade urbana, aqui caracterizada

como qualquer ato que suscita a reação organizada da sociedade, caracterizado pela vontade,

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pelo dolo. De modo mais específico, há o fenômeno da criminalidade violenta, foco desta

análise. Segundo Cardia, Adorno e Poleto (2003, p. 64), do ponto de vista sociológico,

distinguem­se os crimes violentos dos não violentos: “os violentos compreendem ações que

ameaçam a vida ou a integridade física de quem quer que seja”. Nesta análise, foram

considerados crimes violentos os delitos de homicídio, lesão corporal, seqüestro/cárcere

privado, vias de fato, e achado de cadáver 4 . É importante frisar que nem todas essas tipologias

constituem­se crimes, conforme o Código Penal Brasileiro, mas, inicialmente, apenas

ocorrências policiais registradas pela Polícia Militar (PM).

A criminalidade violenta, especificamente a violência letal é considerada um

fenômeno urbano no Brasil e apresenta­se como “um dos pontos altos da precariedade que

caracteriza a transição de um país predominantemente rural (como até cinqüenta anos atrás)

para um país urbano” (CARDIA, ADORNO e POLETO, 2003, p. 43­44).

A análise do espaço urbano, para Gomes (2005), exige uma reflexão sobre

criminalidade. Na perspectiva do autor, o espaço urbano foi fragmentado em inúmeros

territórios com características próprias e excludentes da cidadania, favorecendo a instalação

da criminalidade e o enfraquecimento da sociedade. De modo complementar, para Beato et al (2004, p. 74) o problema da criminalidade em cidades de maior porte está relacionado às

falhas dos mecanismos de controle exercidos pelos moradores do espaço urbano. Beato (2004,

p. 07) observa que “o aumento da criminalidade é a contra­face do desenvolvimento, devido

ao aumento das oportunidades para o crime”.

De acordo com Gomes (2005) há consenso na literatura de que municípios mais

urbanizados apresentam maiores taxas de criminalidade violenta e que a violência urbana é

concentrada espacial e socialmente. Ele afirma que se por um lado as cidades médias

brasileiras aumentaram sua renda per capita em 3% (dados de 2001), por outro as suas periferias estão ficando cada vez mais populosas e mais pobres. Ademais, o autor destaca que

as cidades, de modo geral, estão se periferizando. Segundo Beato e Reis (2001) quanto

menores os indicadores de desenvolvimento e prosperidade mais elevadas são as ocorrências

de crimes violentos contra a pessoa tanto entre diferentes bairros como em municípios

distintos.

Beato e Reis (2001) acreditam que aspectos da vida urbana são importantes para a

compreensão do fenômeno, como a expansão urbana desigual, que segrega espaços e pessoas.

Sob este prisma, o espaço urbano constitui­se por territórios que geralmente não são

4 Considerou­se o achado de um cadáver crime por se pressupor a anterior ocorrência de um assassinato.

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integrados e que, inclusive, podem diferir da estruturação oficial. Essa segregação territorial

gera acessos diferenciados a serviços e equipamentos urbanos de necessidade básica e às

formas de lazer, mais presentes nas regiões centrais. A desigualdade de oportunidades e a

segregação espacial podem influenciar a incidência de crimes violentos. Kahn (2005) afirma

que hoje o nível de criminalidade de um determinado local possui uma relação mais forte com

as características sociais e demográficas do que com os recursos policiais e judiciais

existentes nesse local.

Nessa perspectiva, a sobreposição de carências – tais como baixa renda, moradia

precária, acesso restrito a equipamentos e serviços urbanos de necessidade básica, etc. – torna

certos grupos sociais ou moradores de alguns bairros potencialmente mais expostos ao

envolvimento em ocorrências violentas. Entretanto, Cardia, Adorno e Poleto (2003) ressalvam

que a relação não é direta, mas mediatizada pelas instituições. Assim, tem­se violações aos

direitos civis, econômicos e sociais que tendem a enfraquecer as relações dos grupos sociais

com as instituições de proteção social (públicas e privadas).

Para Rodrigues (2006), há uma correspondência espacial entre áreas que concentram

moradias precárias e as homogeneamente pobres em termos de renda e entre ambas e o

fenômeno da violência e criminalidade urbana. Para ela o local de moradia dos pobres serve

como denominador comum para associar pobreza e violência.

A literatura específica sobre o tema (BEATO et al, 2004; TEIXEIRA, 2004) demonstra que as taxas de criminalidade são distintas nos diferentes grupos e segmentos

sociais e “a estrutura urbana municipal seria um dos elementos da estrutura de oportunidades

que levam à ocorrência de crimes” (BEATO et al, 2004, p. 86). Assim, os resultados de uma

pesquisa municipal conseguiriam explicar as variações territoriais na distribuição de distintos

tipos de crime, pois as características do local estão diretamente relacionadas à ocorrência de

crimes.

De acordo com Kahn (2005) a concentração espacial da violência é mais nítida em

cidades com elevado grau de desigualdade, onde pobres e ricos vivem segregados. Embora a

compreensão dessa distribuição seja uma tarefa nada simples, o autor defende que o nível

sócio­econômico isoladamente contribui com elevada parcela para explicar o fenômeno.

Não se busca nesta análise reduzir a compreensão da distribuição espacial da

criminalidade violenta na cidade de Cascavel à associação de alguns indicadores sócio­

econômicos. Contudo, é possível perceber que há influência desses fatores na incidência do

referido fenômeno, conforme pode ser verificado empiricamente no item subseqüente.

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4. ESPAÇO URBANO E CRIMINALIDADE: UMA ABORDAGEM TERRITORIAL

DA CIDADE DE CASCAVEL/PR

Propõe­se a seguir, a partir da visualização da distribuição territorial da criminalidade

urbana violenta na cidade de Cascavel/PR, comparativamente a alguns indicadores sócio­

econômicos das regiões administrativas (bairros), identificar elementos para compreender a

ocorrência deste.

O Estado do Paraná, segundo Moura e Magalhães (1996), foi a unidade federativa

brasileira que mais sofreu os impactos do processo de urbanização no cenário nacional. Em

apenas vinte anos, a partir da década de 1970, seu nível de urbanização passou de 36% para

73%. Em 2002, segundo o IBGE, o Estado atingiu os 83,13% de urbanização, constituindo­se

como o Estado mais urbanizado do Sul do Brasil. Inserida nesse contexto, a cidade de

Cascavel ­ foco desta análise ­, no ano de 2000 atingiu um grau de urbanização de 93,20%,

acima da média estadual (83,13%) e nacional (84,14%), conforme o Gráfico 1.

GRÁFICO 1

COMPOSIÇÃO DA POPULAÇÃO NA CIDADE DE CASCAVEL

Fonte: IBGE / 2004

Cascavel, considerada a cidade pólo­regional da região Oeste do Paraná (SPERANÇA,

1992) apresentou um notável processo de crescimento demográfico nas últimas décadas e,

conseqüentemente, vivenciou a emergência e/ou a intensificação de diversos problemas

decorrentes desse processo, tais como o fenômeno da violência e criminalidade urbana.

0

50.000

100.000

150.000

200.000

250.000

1960 1970 1980 1991 2000

Habitantes

População Urbana População Rural

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Os dados sócio­econômicos do município de Cascavel foram retirados dos Censos

Demográficos de 1991 e 2000, do Atlas do Desenvolvimento Humano e extraídos do relatório

organizado pela SEPLAN, intitulado “Perfil Municipal de Cascavel, 2004” 5 , que contém

dados demográficos, adensamento populacional, renda per capita, loteamentos irregulares, padrão construtivo, etc., por unidades administrativas da cidade. Essas informações, somadas

aos dados sobre a distribuição espacial das ocorrências policiais em cada unidade

administrativa de Cascavel, no ano de 2005, constituem a base de análise. As reflexões

teórico­metodológicas guiaram o trabalho junto às fontes. É importante salientar que as datas

de referência das fontes mencionadas não são exatamente as mesmas, o que não tira a

credibilidade do estudo, mas lhe confere um caráter exploratório e aproximativo.

Para a caracterização do perfil da cidade, a Tabela 1 apresenta a evolução de alguns

indicadores sócio­econômicos municipais:

TABELA 1

EVOLUÇÃO DE ALGUNS INDICADORES SÓCIO­ECONÔMICOS DE CASCAVEL

1991 2000 Renda per capita 266,52 347,00 IDH 0,730 0,810 Índice de Gini 0,571 0,593 Índice de Theil 0,581 0,614 Razão entre a renda dos 10% mais ricos e os 40% mais pobres 18,87 21,66 Razão entre os 20% mais ricos e os 40% mais pobres 12,69 14,44 Intensidade da pobreza 35,89 42,78 Fonte: IBGE ­ Censos Demográficos 1991 e 2000 e Atlas do Desenvolvimento Humano. Nota: O Índice de Gini, bem como o Índice de Theil são medidas de desigualdade relativa. Os valores podem variar entre 0 e 1 e quanto mais próximos de 1, maior é a desigualdade.

Com base nos dados apresentados na Tabela 1, nota­se um aumento na renda per capita média e no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) entre os anos de 1991 e 2000.

O IDH municipal é composto pelos seguintes elementos: expectativa de vida ao nascer (69,60

anos); taxa de alfabetização de adultos (0,930); taxa bruta de freqüência escolar (0,951); renda per capita (R$ 347,00). Cascavel ocupa a 15ª posição no Estado do Paraná, com um IDH considerado alto (0,810). Contudo, esses dois indicadores ­ IDH e renda per capita, por si só,

não demonstram diretamente uma melhoria das condições de vida de toda a população, uma

vez que retratam a média geral. Seria preciso considerar o aumento do custo de vida ocorrido

5 Disponível no site www.cascavel.pr.gov.br

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nos últimos anos para se verificar se o poder aquisitivo dos habitantes da cidade aumentou

proporcionalmente à elevação da renda, fato que não se constitui uma relação necessária e que

exigiria um estudo específico e aprofundado.

A partir da evolução do Índice de Gini e Índice de Theil, que são medidas de

desigualdade relativa, somadas à razão entre os 10% mais ricos e os 40% mais pobres, razão

entre os 20% mais ricos e os 40% mais pobres, além do indicador da Intensidade da Pobreza,

pode­se inferir que o crescimento econômico na cidade de Cascavel trouxe a concentração da

riqueza e, conseqüentemente, a ampliação da desigualdade econômica e social.

O Censo Demográfico de 2000 apresenta importantes indicativos que reforçam a

inferência sobre a ampliação da desigualdade econômica e social em Cascavel. Dentre as

196.683 pessoas com dez anos ou mais de idade, 75.741 não possuem rendimento. Se

consideradas apenas as pessoas nessa faixa etária (com dez anos ou mais de idade) que

possuem rendimento, o equivalente a 120.942 pessoas, tem­se que 61.271 pessoas ou quase

51% recebem nominalmente até 2 salários mínimos mensais. O salário mínimo utilizado foi

de R$ 151,00, de acordo com o IBGE, Censo Demográfico 2000. Atualmente o valor do

salário mínimo é de R$ 350,00.

Os Mapas 1, 2 e 3, a seguir, demonstram, respectivamente, o adensamento

populacional, a desigualdade na distribuição da renda e o padrão construtivo de cada unidade

administrativa municipal, e servirão de base para a análise subseqüente. Embora trate­se de

aspectos materiais e quantitativos, refletem atributos qualitativos. Aqui, considera­se a renda

como o mais importante indicativo da qualidade de vida da população, pois permite o acesso à

equipamentos e serviços urbanos de necessidade básica, saúde, educação, lazer, etc.

O perímetro dos bairros de Cascavel foi redefinido no ano de 2004, conforme a lei nº

3825/2004. A composição atual das unidades administrativas municipais possui 31 bairros,

distribuídos em 80,87 Km 2 , conforme os mapas que seguem.

O Mapa 1 permite visualizar que o bairro mais adensado populacionalmente da cidade

de Cascavel é o Interlagos, com 5.849,72 habitantes por quilômetro quadrado, seguido dos

bairros Periolo (4.610 hab/km 2 ), Floresta (4.256,33 hab/km 2 ), Neva (4.077,22 hab/km 2 ) e

Guarujá (4.043,27 hab/km 2 ). Por outro lado, as unidades administrativas municipais menos

adensadas populacionalmente são: Esmeralda e Canadá, com respectivamente 545,38 hab/km 2

e 893,68 hab/km 2 , seguidos por Região do Lago (1.058,97 hab/km 2 ), Pioneiros Catarinenses

(1.093,38 hab/km 2 ), Country (1.138,42 hab/km 2 ), Recanto Tropical (1.298,66 hab/km 2 ),

Pacaembu (1.307,58 hab/km 2 ), Catorze de Novembro (1.526,27 hab/km 2 ) e Santos Dumont

(1.837,37 hab/km 2 ).

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MAPA 1

ADENSAMENTO POPULACIONAL

Fonte: adaptado de SEPLAN, 2004.

O Mapa 2 demonstra a distribuição espacial das famílias cadastradas na prefeitura que

recebem até meio salário mínimo per capita. É importante ressaltar que o valor base do

salário mínimo utilizado pela SEPLAN para a construção desse mapa foi de R$ 240,00.

Assim, meio salário mínimo corresponde a R$ 120,00.

Nota­se que a localidade mais pobre da cidade é o loteamento Gramado (área rosa do

mapa), que pertence ao bairro São Cristóvão, que possui 38,20% da população com renda per

capita de até R$ 50,00; outros 25,40%, que recebem de R$ 51,00 a 100,00; e 5,30%, que recebem de R$ 101,00 a 120,00.

Os bairros com maior número de famílias de baixa renda são: Esmeralda (com 19,40%

da população com renda per capita de até R$ 50,00; outros 26,60% que recebem entre R$

51,00 e 100,00; e 8,40% com rendimento entre R$ 101,00 a 120,00), seguido do Interlagos

(com 24,50% da população com renda per capita de até R$ 50,00; outros 18,20 % entre R$ 51,00 a 100,00; e 3,50% com rendimento entre R$ 101,00 a 120,00), Catorze de Novembro

(com 17,50% da população com renda per capita de até R$ 50,00; outros 16 % entre R$ 51,00

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a 100,00; e 7,60% com rendimento entre R$ 101,00 a 120,00) e Santo Onofre (com 16,80%

da população com renda per capita de até R$ 50,00; outros 26,90 % entre R$ 51,00 a 100,00; e 6,20% com rendimento entre R$ 101,00 a 120,00). Na seqüência tem­se os bairros Santa

Cruz (com 13,40% da população com renda per capita de até R$ 50,00; outros 20,50% entre R$ 51,00 a 100,00; e 5,50% com rendimento entre R$ 101,00 a 120,00), Cascavel Velho (com

16,40% da população com renda per capita de até R$ 50,00; outros 19,40 % entre R$ 51,00 a 100,00; e 3,90% com rendimento entre R$ 101,00 a 120,00), e Pacaembu (com 5,50% da

população com renda per capita de até R$ 50,00; outros 10,00% entre R$ 51,00 a 100,00; e 1,20% com rendimento entre R$ 101,00 a 120,00).

MAPA 2

FAMÍLIAS DE BAIXA RENDA

Fonte: adaptado de SEPLAN, 2004.

As unidades administrativas com menor número de famílias de baixa renda estão

ilustradas na cor azul clara e são constituídas pelo Centro (com 0,20% da população com

renda per capita de até R$ 50,00; outros 0,30 % entre R$ 51,00 a 100,00; e 0,10% com rendimento entre R$ 101,00 a 120,00), Country (com 0,30% da população com renda per

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capita de até R$ 50,00; outros 0,70 % entre R$ 51,00 a 100,00; e 0,20% com rendimento

entre R$ 101,00 a 120,00), Região do Lago (com 0,80% da população com renda per capita de até R$ 50,00; outros 1,80% entre R$ 51,00 a 100,00; e 0,40% com rendimento entre R$

101,00 a 120,00), Maria Luiza (com 1,20% da população com renda per capita de até R$ 50,00; outros 2,50 % entre R$ 51,00 a 100,00; e 0,90% com rendimento entre R$ 101,00 a

120,00), Parque São Paulo (com 2,40% da população com renda per capita de até R$ 50,00; outros 4,50% entre R$ 51,00 a 100,00; e 2,20% com rendimento entre R$ 101,00 a 120,00),

Coqueiral (com 3,90% da população com renda per capita de até R$ 50,00; outros 3,10% entre R$ 51,00 a 100,00; e 0,50% com rendimento entre R$ 101,00 a 120,00), Recanto

Tropical (com 0,20% da população com renda per capita de até R$ 50,00; outros 0,30 % entre R$ 51,00 a 100,00; e 0,50% com rendimento entre R$ 101,00 a 120,00) e Parque Verde (com

0,90% da população com renda per capita de até R$ 50,00; outros 2,20% entre R$ 51,00 a 100,00; e 0,50% com rendimento entre R$ 101,00 a 120,00).

Com base no Mapa 2, é possível perceber que o Interlagos é o bairro com maior área

de loteamentos irregulares (30% do total de acordo com a SEPLAN), bem como de lotes

públicos invadidos. Já o Loteamento Gramado, pertencente ao bairro São Cristóvão, destaca­

se por concentrar a maior área de pobreza da cidade (68,9% dos seus moradores).

O Mapa 3 ilustra o atual padrão construtivo da cidade de Cascavel, de acordo com a

condição da moradia. Segundo a SEPLAN, a classificação do padrão construtivo municipal

divide­se em seis categorias: Foco de pobreza 6 ; padrão intermediário 7 ; padrão baixo 8 ; padrão

médio 9 ; padrão médio alto 10 ; padrão alto 11 . Vale frisar que as áreas em branco não possuem

construções.

Se forem agregadas as categorias ‘padrão baixo’, ‘padrão intermediário’, ‘focos de

pobreza’, referente às cores amarelo, vermelho e rosa, verifica­se claramente que as moradias

mais precárias localizam­se no limite do perímetro urbano municipal, ou seja, nas áreas mais

periféricas. Assim, de modo genérico, os bairros com as condições de moradia mais precárias

6 Compostos por um cômodo e feitos com sobras de materiais, podendo ainda ter mais de um cômodo e banheiro interno, mas sem acabamento. 7 Limiar entre foco de pobreza e baixa renda. Caracteriza­se por construções com acabamento precário e instalações hidráulicas e elétricas geralmente incompletas e expostas. 8 Utiliza apenas materiais indispensáveis e sem revestimento. Construídas em etapas, sem projetos e sem cômodos definidos. 9 Edificações térreas, assobradas ou geminadas. Mínima preocupação com projeto. Composta de sala, dois ou três dormitórios, banheiro, cozinha e dependências de empregada. Uso de materiais convencionais e acabamento de boa qualidade. 10 Construções geralmente isoladas, sendo térreas ou com mais pavimentos. Projeto arquitetônico planejado. 11 Edificações com terrenos de grandes dimensões totalmente isolados, obedecendo a um projeto arquitetônico. Contêm ainda áreas livres com projeto paisagístico, piscina e quadras esportivas.

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são: Interlagos, Floresta, Cataratas, Esmeralda, Catorze de Novembro, Brazmadeira, Santa

Cruz, Morumbi, Brasília e Periolo.

MAPA 3

PADRÃO CONSTRUTIVO

Fonte: adaptado de SEPLAN, 2004.

Com base nessas informações, em seguida será abordada a distribuição espacial do

crime violento no perímetro urbano da cidade de Cascavel, buscando perceber as possíveis

associações entre a configuração do espaço urbano municipal e a ocorrência dos delitos. A

organização do espaço urbano municipal será mensurada a partir das características dos 31

bairros existentes. É importante frisar que os aspectos sócio­econômicos aqui abordados não

abrangem a qualidade de vida da população cascavelense como um todo, mas constituem

importantes indicativos.

As ocorrências policiais registradas pelo 6º Batalhão da Polícia Militar de Cascavel,

referentes aos crimes violentos contra a pessoa foram computadas em seus valores absolutos,

cuja distribuição espacial encontra­se ilustrada no Mapa 4.

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MAPA 4

CRIMES VIOLENTOS CONTRA A PESSOA

Fonte: construído com base nos registros de ocorrências policiais do 6º BPM, 2005.

Constata­se que o cenário mais recorrente para a ocorrência de crimes violentos contra

a pessoa (CV) é, disparadamente, o bairro Interlagos, com 239 ocorrências policiais

registradas no ano de 2005, o correspondente a 12,6% do total. Em seguida, destaca­se o

Centro, com 175 ocorrências policiais ou o equivalente a 9,2%. Logo depois aparecem os

bairros São Cristóvão (125 ocorrências policiais de CV ou 6,6% do total), Floresta (122 CV

ou 6,4%), Santa Cruz (106 CV ou 5,6%) e Brasília (103 CV ou 5,4% do total).

Se os quatro mapas apresentados forem comparados (referentes ao adensamento

populacional, renda per capita, padrão construtivo e distribuição espacial da criminalidade violenta em cada unidade administrativa), podem ser identificadas importantes sobreposições:

o Interlagos é o bairro com o maior número de ocorrências de criminalidade violenta na

cidade de Cascavel, é também o que possui o maior adensamento populacional (5.849,72

hab/km 2 ), baixa renda (com 24,50% da população com renda per capita de até R$ 50,00; outros 18,20 % entre R$ 51,00 a 100,00; e 3,50% com rendimento entre R$ 101,00 a 120,00),

com vários focos de pobreza, maior número de loteamentos irregulares da cidade, ou seja, não

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aprovados pela Prefeitura e/ou não registrados em cartório de registro de imóveis (30% do

total), além vários lotes invadidos (Mapa 2) e de precárias condições de moradia (Mapa 3).

Por outro lado, o bairro considerado o mais nobre cidade, o Country, apresentou o

menor índice (9 CV ou 0,4%), seguido do Recanto Tropical (10 CV ou 0,5%) e Região do

Lago (13 CV ou 0,6%), também bairros bem conceituados, sendo este último devido à sua

localização privilegiada, tanto pela proximidade ao Lago Municipal quanto pela localização

da Vila Militar de Cascavel e do 6º Batalhão da Polícia Militar de Cascavel. Esses três bairros

possuem baixo adensamento populacional (respectivamente 1.138,42; 1.298,66 e 1.058,97

hab/km 2 ), estão situados em áreas com menos de 10% das famílias com baixa renda (Mapa 2)

e são bairros constituídos por habitações consideradas de padrão médio alto (Mapa 3).

De modo genérico e excetuando­se o centro ­ lócus privilegiado da circulação de pessoas de todos os bairros e da ocorrência de todos os tipos de crimes ­ verifica­se a

existência de uma escala nos crimes violentos, com maior intensidade nas regiões mais

periféricas que definem o limite do perímetro urbano. O quadrante territorial situado entre as

regiões Norte e Leste apresenta­se como o mais violento. Neste recorte, apenas os bairros

Interlagos, Floresta, São Cristóvão e Brasília somam 589 ocorrências, o correspondente a 31%

do total das ocorrências policiais de crimes violentos contra a pessoa, sendo que esses bairros

ocupam 13% (10,82 km 2 ) do território urbano municipal. O bairro Interlagos, responsável

pelo maior número de registros de criminalidade violenta representa 2,23% do território

urbano cascavelense e foi o cenário de 12,6% das ocorrências.

Verificou­se que a “sobreposição de carências” (CARDIA, ADORNO e POLETO,

2003) foi significativa. Foi identificada uma forte associação entre a condição sócio­

econômica (tipo de moradia, distribuição da renda e com o adensamento populacional) com o

fenômeno da criminalidade urbana violenta na cidade de Cascavel.

5. CRIMINALIDADE E POLÍTICAS DE SEGURANÇA PÚBLICA: REFLEXÕES

PARA UM DEBATE

No ano de 2000 foi lançado o Plano Nacional de Segurança Pública do Governo

Federal. Esse documento baseava­se em uma política abrangente de apoio à iniciativas

estaduais e municipais nas várias áreas relativas à segurança. Contudo, para Sento­Sé (2005),

pouco foi feito de concreto a partir de então. Para este autor, a iniciativa com maior potencial

foi o Plano de Integração e Acompanhamento dos Programas Sociais de Prevenção à

Violência ­ PIAPS, vinculado ao Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da

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República. Porém, o PIAPS não possuía recursos próprios. A intenção do referido Plano era a

de articular diferentes esferas do Executivo Federal, de modo que programas vinculados a

diferentes pastas (Saúde, Educação, Justiça, Meio Ambiente, etc.), estivessem conectados

entre si. Ainda para Sento­Sé (2005) tais ações seriam escolhidas a partir de demandas

desenvolvidas pelos governos municipais, por intermédio da atuação articulada entre poder

público local e sociedade civil. Em 2001, o PIAPS foi aplicado em algumas cidades

metropolitanas. Entretanto, com a mudança de governo federal, em 2003, o PIAPS foi

desativado antes mesmo que pudesse ser avaliado.

De qualquer forma, quatro elementos desenvolvidos no PIAPS merecem ser

salientados: a consideração do tema segurança como questão associada a diversos setores da

gestão pública; ênfase na orquestração entre estes diferentes setores em iniciativas articuladas;

importância à implementação de projetos provenientes do diálogo entre o poder local e os

cidadãos; e a perspectiva preventiva da problemática da segurança pública. Esses aspectos

apontam para uma nova tendência: o enfoque preventivo e sob o prisma municipal de uma

política de segurança pública inteligente. Inicia­se, assim, um processo no qual as ações

tradicionalmente reativas estão cedendo espaço para um postura pró­ativa do poder público.

Isto significa que o foco está saindo do combate ao bandido para a qualidade de vida do

cidadão. Para Sento­Sé (2005) há indícios de que essa tendência seja irreversível e, talvez, a

mais próspera estratégia de reverter a conjuntura atual de violência e criminalidade urbana

que assola o país.

Nessa linha de pensamento, o elemento principal para uma estratégia

multidimensional, consistente e eficiente de combate e prevenção da criminalidade é a

criação, na esfera municipal, de um organismo central, que articule departamentos e

secretarias relevantes (Educação, Saúde, Planejamento Urbano, Cultura, Ação Social, etc.).

Trata­se de uma pluralidade de ações e projetos, mas sob a unidade de um organismo central.

Kahn (2005) apresenta, em linhas gerais, os ingredientes para políticas bem­sucedidas

de prevenção ao crime, identificados na literatura sobre a temática:

“uma aposta consistente de prevenção do crime é aquela baseada em projetos que têm as seguintes características: um diagnóstico preciso que determine os desafios, fatores de risco e recursos da comunidade; um plano de ação que estabeleça prioridades, identifique programas que possam ser modelos úteis e defina objetivos de curto e longo prazos; um processo de implementação rigoroso que inclua o treinamento e coordenação dos parceiros envolvidos; avaliações que forneçam retornos tanto sobre os processos quanto sobre os resultados obtidos; uma coalizão de atores­chave com lideranças fortes e staff de apoio administrativo; uma estratégia de comunicações que possa mobilizar profissionais e cidadãos e seja sensível à idade, gênero e diferenças culturais” (KAHN, 2005, p. 51).

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De modo mais pontual, Soares (2005, p. 34), defende que o processo deve transitar

pelos seguintes estágios:

1. Realização de um diagnóstico das dinâmicas criminais e dos fatores de risco;

2. Elaboração de um plano de ação ­ capaz de formular uma agenda, identificar prioridades e recursos e estipular metas;

3. Implementação ­ coordenar e garantir o cumprimento de metas e cronograma; 4. Avaliação ­ não só dos resultados, mas do processo;

5. Monitoramento ­ para correção dos possíveis erros.

Para o autor, o organismo central deve ter liderança, competência de envolvimento dos

diferentes setores, além de buscar agregar o maior número possível de cidadãos (estimulando

a diversidade dos participantes) e entidades (igreja, universidades), formais ou não,

conduzindo o processo com base no tripé diagnóstico­planejamento­avaliação. Em suma, o

poder municipal deve adotar uma nova abordagem da questão da segurança pública, que seja

coerente com a pluridimensionalidade do problema que se impõe (SOARES, 2005, p. 44).

5.1 CRIMINALIDADE URBANA VIOLENTA: AÇÕES ESTRATÉGICAS DE

DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL

A partir da reflexão teórico­metodológica e da distribuição espacial dos delitos

violentos na cidade de Cascavel, apresenta­se algumas estratégias de desenvolvimento

territorial capazes de minimizar a problemática da criminalidade urbana violenta na cidade em

análise.

A análise realizada constatou que a cidade de Cascavel cresceu economicamente nos

últimos anos, tendo elevado o IDH e renda per capita, mas, ao que tudo indica, em pontos concentrados do território. Os benefícios desse crescimento econômico não se propagaram a

todos os habitantes, ao contrário, aumentou a concentração de renda e a segregação espacial

da parcela mais privilegiada da população. Tanto que está ocorrendo um acréscimo no

número de condomínios fechados de classes médias e altas, que já somam 9 no perímetro

urbano, simultaneamente a ações de ‘transferência’ de populações carentes situadas em

regiões circunvizinhas ao centro da cidade para regiões periféricas, como o bairro Interlagos.

Assim, Cascavel apresenta­se apenas como um pólo de crescimento, pois não houve

mudanças positivas na sua estrutura social abrangendo toda a população urbana. Demonstrou­

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se ainda, que a distribuição espacial da criminalidade violenta na cidade de Cascavel possui

forte associação com fracos indicadores sócio­econômicos, especificamente com adensamento

populacional, distribuição da renda per capita e padrão construtivo das habitações. Diante desse quadro e, em consonância com a nova tendência no trato da segurança

pública, mais voltada à prevenção da criminalidade por intermédio de ações da gestão

municipal, faz­se necessário desenvolver uma política de segurança pública de gestão

inteligente, pautada em um diagnóstico consistente sobre as especificidades de cada unidade

administrativa. A gestão municipal deve assumir sua responsabilidade, visto tratar­se de uma

problemática considerada, em grande escala, uma contra­face do processo de

desenvolvimento e da falta de planejamento urbano adequado capaz de proporcionar

condições de vida digna a amplas parcelas da população.

Nesse processo, sugere­se a ação articulada entre as diferentes secretarias municipais

(Saúde, Educação, Assistência Social, Cultura, etc.) e um organismo central de gestão, que

poderia ser o Conselho de Segurança Municipal ­ CONSEG, para uma política de segurança

pública pautada, sobretudo, na prevenção da criminalidade urbana, superando o modelo

puramente repressivo como forma de resolução do problema. Desse modo, a nova agenda

política municipal deve incorporar a segurança pública como uma de suas responsabilidades,

criando políticas sociais específicas e de largo alcance entre as populações mais vulneráveis,

visando interromper as dinâmicas causadoras da violência.

Fundamentalmente, caberia ao organismo central, de caráter independente e com

recursos próprios, formar uma equipe interdisciplinar de profissionais com capacidade para

realização de pesquisas sociais, de cunho quantitativo e qualitativo, sobre as diferentes

unidades municipais. Essas pesquisas identificariam as dinâmicas locais e gerais

desencadeadoras da criminalidade urbana violenta. Elas atuariam de forma articulada com as

diversas secretarias municipais, a comunidade e a mídia, mantendo uma interlocução entre

poder público local e sociedade civil.

Como foi constatado que a criminalidade urbana violenta possui uma forte associação

com as carências sociais, estima­se que a atenuação dessas carências deva implicar em uma

redução dos níveis de criminalidade. Com base nesse diagnóstico, sugere­se, de modo mais

específico, que seja estabelecido um plano de ação, que inicialmente tenha como alvo

prioritário o bairro Interlagos, cenário significativo para ocorrência de crimes violentos contra

a pessoa na cidade de Cascavel, e onde o quadro de “sobreposição de carências” é mais

acentuado. Tal medida poderia ser encarada como um plano­piloto de uma política de

segurança pública de gestão inteligente e pluridimensional, coerente com a complexidade do

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fenômeno a ser combatido. Esta ação deveria ser implementada, avaliada e monitorada,

servindo de base para uma posterior ação estratégica sobre outras unidades administrativas

municipais.

Para uma política mais incisiva de segurança pública, seria necessária a realização de

um estudo mais aprofundado e específico sobre a dinâmica da criminalidade no bairro

Interlagos, que levasse em conta aspectos mais qualitativos. Contudo, a partir dos elementos

já identificados nessa análise, é possível tecer algumas sugestões capazes de contribuir para

minimizar a problemática em questão. De modo pontual, sugerem­se dois blocos de ações:

ações de caráter emergencial e as de caráter preventivo.

QUADRO 1

AÇÕES ESTRATÉGICAS DE COMBATE E PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE

URBANA VIOLENTA

ORGANISMO AÇÕES EMERGENCIAIS AÇÕES PREVENTIVAS 1 SECRETARIA DE

SEGURANÇA ­ Intensificação do patrulhamento policial nos 3 turnos.

2 SECRETARIA DE OBRAS

­ Melhoria e manutenção da rede de iluminação pública.

­ Ampliação da rede urbana (asfalto, esgoto, água e transportes) visando tornar o território mais fluido e, assim, talvez, torná­lo atrativo à instalação de empresas.

3 SECRETARIA DE AÇÃO SOCIAL

­ Distribuição de cestas básicas e encaminhamento das famílias carentes à programas institucionais de assistência social, mas exigindo uma contrapartida do beneficiário.

4 SECRETARIA DE CULTURA

PROMOVER AÇÕES DE INTEGRAÇÃO COMUNITÁRIA: ­ Realização de atividades culturais, tais como festas populares típicas, a criação de grupos de teatros ou dança voltados à comunidade e até a realização periódica de palestras e/ou vídeos educativos com acesso livre ao salão comunitário de cada bairro.

5 SECRETARIA DE ESPORTE E LAZER

PROMOVER AÇÕES DE INTEGRAÇÃO COMUNITÁRIA: ­ Abertura de centros de lazer (quadras esportivas), que poderia aproveitar a estrutura da escola local.

6 SECRETARIA DE EDUCAÇÃO

­ Desenvolvimento de cursos de formação profissionalizante no salão comunitário do bairro, visando qualificar a mão­de­obra e também ocupar o tempo dos moradores desempregados.

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7 SECRETARIA DA INDÚSTRIA E COMÉRCIO

­ Incentivar a instalação de empresas ou indústrias no Interlagos, mediante incentivos fiscais, desde que comprometidas a absorver mão­de­obra local.

8 SECRETARIA DA SAÚDE

­ Ampliar o quadro médico do posto de Saúde do Interlagos, bairro mais adensado do município e com alto índice de população de baixa renda, dependente do atendimento público de saúde.

9 SECRETARIA DE PLANEJAMENTO

­ Desenvolver novos projetos habitacionais e/ou de melhorias nas condições de habitação dos moradores, buscando promover uma vida mais digna.

O primeiro bloco de estratégias, denominadas ações emergenciais, visa produzir um

efeito imediato na redução dos altos índices de criminalidade violenta, que assolam

principalmente o bairro Interlagos. Associada à melhoria da rede de iluminação pública, a

intensificação do patrulhamento policial nos três turnos no bairro em questão, poderia reduzir

o clima de insegurança pública vigente e garantir maior tranqüilidade à população local.

Paralelamente, seria importante promover uma ação de amparo social aos moradores mais

carentes do bairro, tais como a distribuição de cestas básicas e encaminhamento dessas

famílias a programas institucionalizados de assistência social, mas exigindo uma contrapartida

do beneficiário, como por exemplo a realização de algumas horas semanais de trabalho

voluntário em prol da comunidade, pelo menos aos moradores que estiverem desempregados,

ou ainda, exigir que o beneficiário esteja estudando ou fazendo algum curso

profissionalizante. Tais medidas justificam­se pelo fato de a comunidade não poder mais

esperar por uma melhoria na sua qualidade de vida.

As medidas de caráter preventivo estão voltadas à melhoria das condições de vida da

população e produzirão efeitos à médio prazo. Essas estratégias de desenvolvimento territorial

podem contribuir para a redução das desigualdades sociais e econômicas e, indiretamente,

para a redução dos elevados índices de criminalidade violenta. Ademais, além de contribuir

para o aumento da segurança pública municipal, essas ações podem gerar um efeito

multiplicador positivo sobre as outras esferas da vida econômica e social.

Vale ressaltar que as estratégias apresentadas são complementares e podem ser

eficientes para a redução dos índices de criminalidade se forem implementadas de forma

integrada.

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6. CONCLUSÃO

O objetivo desse artigo consistiu em analisar a distribuição espacial da criminalidade

urbana violenta na cidade de Cascavel/PR, em 2005, e sua relação com indicadores sócio­

econômicos de cada unidade administrativa municipal. Percebeu­se que a criminalidade

violenta é, em larga medida, função de carências sociais.

Compreender os aspectos particulares de cada bairro pode contribuir para o

desenvolvimento de ações mais incisivas de combate e prevenção da violência e

criminalidade. Estratégias puramente repressivas devem ser superadas por políticas

preventivas interligadas a uma diversidade de políticas sociais. Políticas demasiadamente

generalizantes de combate à criminalidade são consideradas ineficientes. Nessa perspectiva, o

plano municipal é a esfera privilegiada para a formulação de políticas de segurança pública,

pois está mais próximo da população e pode desenvolver estratégias mais eficazes de

resolução de problemas associados às características locais, como a criminalidade violenta.

A chave de todo o processo seria uma política pautada na prevenção da criminalidade

violenta, sempre articulada a políticas sociais mais abrangentes e voltadas à comunidades

mais carentes, como o caso do bairro Interlagos. Especificamente neste bairro, cenário típico

para a ocorrência de crimes violentos contra a pessoa na cidade de Cascavel, foram

constatados problemas sérios relacionados a uma alta proporção de loteamentos irregulares,

lotes públicos invadidos, bem como condições precárias de moradia, alto percentual de

famílias com baixa renda, além de constituir­se no bairro mais adensado populacionalmente

do município. Por isso, nesse bairro, a ação em termos de segurança pública, num primeiro

momento, deve ser prioritária.

Por fim, pode­se dizer que as condições de vida urbana em áreas de maior

concentração humana requerem programas ou planejamento urbano que venha a oferecer uma

maior qualidade de vida à população. A superação de problemas, dentre os quais o da

criminalidade violenta, é peça essencial de um processo de desenvolvimento consistente, que

deve permear todo o território.

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