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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Lilian Darab de Souza A COMPATIBILIDADE DAS QUALIFICADORAS NO HOMICÍDIO COM DOLO EVENTUAL CURITIBA 2010

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Lilian Darab de Souza

A COMPATIBILIDADE DAS QUALIFICADORAS NO HOMICÍDIO COM DOLO EVENTUAL

CURITIBA 2010

A COMPATIBILIDADE DAS QUALIFICADORAS NO HOMICÍDIO COM DOLO EVENTUAL

CURITIBA 2010

Lilian Darab de Souza

A COMPATIBILIDADE DAS QUALIFICADORAS NO HOMICÍDIO COM DOLO EVENTUAL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel. Professor Luiz Renato Skroch Andretta.

CURITIBA 2010

TERMO DE APROVAÇÃO

Lilian Darab de Souza

A COMPATIBILIDADE DAS QUALIFICADORAS NO HOMICÍDIO COM DOLO EVENTUAL

Esta Monografia foi julgada e aprovada para obtenção do grau de Bacharel em Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, de de 2010.

______________________________________________________

Faculdade de Ciências Jurídicas

Universidade Tuiuti do Paraná

Orientador: ______________________________________________________

Professor Luiz Renato Skroch Andretta

______________________________________________________

Professor 1º Membro da Banca

______________________________________________________

Professor 2º Membro da Banca

RESUMO

O presente trabalho de monografia possui como objetivo central a análise do

homicídio qualificado previsto no artigo 121, §2º, do Código Penal Brasileiro, quando

estiver presente o dolo eventual, ou seja, a compatibilidade entre as circunstâncias

qualificadoras no homicídio em que o elemento subjetivo é o dolo eventual.

Para tanto, buscamos diferenciar as diversas espécies de dolo, trazidas pela

doutrina, bem como a imprescindível diferença entre o culpa consciente e o dolo

eventual. Após, passamos a análise do homicídio na legislação penal brasileira,

inclusive as circunstâncias qualificadoras.

Por fim, procurou-se dar um maior enfoque a jurisprudência do Superior

Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal quando da busca de uma

conclusão sobre o tema sub judice, de momo que constatou-se que o entendimento

entre as duas Cortes é divergente em alguns pontos no tocante a compatibilidade

das qualificadoras do §2º, do artigo 121, do Código Penal Brasileiro, quando há o

dolo eventual.

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 6

2. TIPOS DE DOLO .................................................................................................. 8

2.1. DOLO ................................................................................................................ 8

2.2. DOLO DIRETO ................................................................................................... 13

2.3. DOLO EVENTUAL ............................................................................................. 14

2.4. CULPA CONSCIENTE ....................................................................................... 17

2.5. CULPA CONSCIENTE E DOLO EVENTUAL ..................................................... 18

3. ARTIGO 121, §2º, DO CÓDIGO PENAL – CIRCUNSTÂNCIAS QUALIFICADORAS. ................................................................................................. 20

3.1. MOTIVOS. .......................................................................................................... 20

3.1.1. Mediante paga ou promessa de recompensa. ................................................ 20

3.1.2. Motivo torpe. .................................................................................................... 22

3.1.3. Motivo fútil. ...................................................................................................... 24

3.2. MEIOS. ............................................................................................................... 25

3.2.1. Emprego de veneno. ....................................................................................... 25

3.2.2. Emprego de fogo ou explosivo. ....................................................................... 26

3.2.3. Emprego de asfixia. ......................................................................................... 26

3.2.4. Emprego de tortura.......................................................................................... 28

3.2.5. Meio insidioso e cruel. ..................................................................................... 29

3.2.6. Perigo comum. ................................................................................................ 29

3.3. MODOS. ............................................................................................................. 30

3.3.1. À traição. ......................................................................................................... 30

3.3.2. Emboscada. .................................................................................................... 31

3.3.3. Mediante dissimulação. ................................................................................... 31

3.3.4. Recurso que dificulta ou impossibilita a defesa da vítima. .............................. 32

3.4. FINS. .................................................................................................................. 34

3.4.1. Para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime. ........................................................................................................................ 34

4. O HOMICÍDIO NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA .................................................. 36

4.1. HOMICÍDIO SIMPLES........................................................................................ 36

4.2. HOMICÍDIO PRIVILEGIADO .............................................................................. 36

4.3. HOMICÍDIO QUALIFICADO ............................................................................... 37

4.4. POSSIBILIDADE DO HOMICÍDIO QUALIFICADO-PRIVILEGIADO. ................. 39

5. COMPATIBILIDADE DAS QUALIFICADORAS NO HOMICÍDIO COM DOLO EVENTUAL ............................................................................................................... 42

6. CONCLUSÃO ....................................................................................................... 53

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................... 54

6

1. INTRODUÇÃO

O aumento da população em todo mundo, gera consequentemente o

aumento também da criminalidade, e dentre os crimes mais brutais é inconteste o

fato de que se sobrepõe aos demais o crime de homicídio, pois trata-se do crime

que causa maior perplexidade a todos, por atingir o bem mais precioso do homem: a

vida; sendo considerado pela doutrina como o crime por excelência.

Ante a necessidade de prevenção e punição daqueles que retiram a vida de

outrem, o nosso ordenamento jurídico prevê a conduta de “matar alguém” como

típica, ou seja, impõe uma pena a quem realiza a conduta prevista no tipo.

Vale ressaltar, que há alguns crimes que ensejam uma maior

reprovabilidade do que outros, acarretando, assim, a necessidade de uma pena

mais severa, e isso é o que ocorre com o homicídio qualificado.

De tal modo, o Código Penal Brasileiro prevê no §2º do artigo 121, o

homicídio qualificado, no qual o agente terá uma pena maior do que a do homicídio

simples, ou seja, ao invés do parâmetro de pena ser de 06 a 20 anos, será de 12 a

30 anos, devido à presença de circunstâncias objetivas ou subjetivas previstas

nesse dispositivo, que agregam a prática do crime um maior grau de reprovabilidade

devido aos motivos, meios e modos de execução do crime.

Partindo dessa ideia e da premissa que o ordenamento jurídico brasileiro, via

de regra, utiliza para tipificação do crime a presença do elemento subjetivo dolo, -

fazendo de acordo com o tipo desvalor de resultado ou de ação. O dolo, como

elemento subjetivo, pode estar presente tanto no crime que faz desvalor de

resultado, quanto naquele que faz desvalor da ação, ou seja, em crimes que há

produção de um resultado naturalístico, tanto naqueles crimes de mera conduta.

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Há, portanto, necessidade da análise daqueles crimes de homicídio

cometidos com dolo eventual e a possibilidade de aplicação de cada uma das

qualificadoras do §2º, do artigo 121, do Código Penal Brasileiro.

Ao prever circunstâncias qualificadoras para o homicídio, o legislador não

especificou o tipo de dolo - surgindo assim, a questão sobre a compatibilidade das

qualificadoras previstas no § 2º, do artigo 121, do Código Penal, no homicídio em

que o elemento subjetivo é o dolo eventual.

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2. TIPOS DE DOLO

2.1. DOLO

O dolo pode ser definido de acordo com a teoria adotada, e essa pode ser a

teoria finalista ou a teoria tradicional/causal. Na primeira, o dolo é a vontade

consciente de praticar a conduta típica, enquanto, na segunda, o dolo além de ser

vontade consciente de praticar a conduta, possui um plus, a consciência de que se

realiza um ato ilícito.

Vale ressaltar nesse sentido o entendimento de Guilherme de Souza Nucci,

que além dessas duas teorias supra, acrescenta uma terceira:

“DEPENDE da teoria adotada: a) é a vontade consciente de praticar a conduta típica (visão finalista – é o denominado dolo natural); b) é a vontade consciente de praticar a conduta típica, acompanhada da consciência de que se realiza um ato ilícito (visão causalista – é o denominado dolo normativo); c) é a vontade consciente de praticar a conduta típica, compreende o desvalor que a conduta representa (é o denominado dolo axiológico, exposto por Miguel Reale Júnior, Antijuridicidade concreta, p.42).” (2008, p. 217)

Desse modo, depreende-se da leitura acima, que de acordo com a teoria

adotada, surge, também, o tipo de dolo, pois, para a teoria finalista o dolo é

denominado de dolo natural, já na teoria tradicional ou causal é chamado de dolo

normativo. O dolo natural é compreendido como a vontade de realizar qualquer

conduta, independentemente de ser ato ilícito ou não, já o dolo normativo é a

vontade de realizar a conduta com a consciência de que a mesma é um ato ilícito.

Tendo por base o conceito analítico de crime – que é adotado pela doutrina

moderna - como conduta humana, típica, antijurídica e culpável, devemos distinguir

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o dolo natural do normativo, para que assim, identifiquemos em qual destes

elementos estará presente o dolo.

Salientamos que o conceito analítico ou dogmático do delito, constitui em

síntese, a decomposição do crime em partes, de forma lógica, criando assim uma

unidade, fazendo com que a subsunção do fato a norma se torne racional e segura.

(PRADO, 2006, p. 236)

Pois bem, o doutrinador Fernando Capez faz a seguinte distinção entre dolo

natural e normativo, vejamos:

“a) Dolo natural: é o concebido como um elemento puramente psicológico, desprovido de qualquer juízo de valor. Trata-se de um simples querer, independente de o objeto da vontade ser lícito ou ilícito, certo ou errado. Esse dolo compõe-se apenas de consciência e vontade, sem a necessidade de que haja também a consciência de que o fato praticado é ilícito, injusto ou errado. Dessa forma, qualquer vontade é considerada dolo, tanto a de beber água, andar, estudar, quanto a de praticar um crime. Afasta-se a antiga concepção de dolus malus do direito romano. Sendo uma simples vontade, ou está presente ou não, dispensando qualquer análise valorativa ou opinativa. Foi concebido pela teoria finalista, integra a conduta e, por conseguinte, o fato típico. Não é elemento da culpabilidade, nem tem a consciência da ilicitude como seu componente.

b) Dolo normativo: é o dolo da teoria clássica, ou seja, da teoria naturalista ou causal. Em vez de constituir elemento da conduta, é considerado requisito da culpabilidade e possui três elementos: a consciência, a vontade e a consciência da ilicitude. Por essa razão, para que haja dolo, não basta que o agente queira realizar a conduta, sendo também necessário que tenha a consciência de que ela é ilícita, injusta e errada. Como se nota, acresceu-se um elemento normativo ao dolo, que depende do juízo de valor, ou seja, a consciência da ilicitude. Só há dolo quando, além da consciência e da vontade de praticar a conduta, o agente tenha consciência de que está cometendo algo censurável.” (2007, p. 202/203).

Assim, ao distinguir o dolo natural do normativo, observar-se-á que de

acordo com a teoria adotada pelo interprete será também distinto o elemento do

crime em que o dolo se encontrará. Veja que a teoria finalista abarca o dolo natural

como elemento subjetivo do tipo, e, desse modo, traz o dolo como elemento da

tipicidade.

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Ao contrário, para a teoria causal o elemento subjetivo dolo, necessita de um

plus, isto é, a consciência de que a conduta praticada é proibida; portanto, estará

presente dentro da culpabilidade, que além da vontade do agente, necessita da

presença de consciência de ilicitude da conduta.

Para aqueles que adotam a teoria tradicional o dolo normativo, ou a sua

falta, está inserido dentro da culpabilidade, e, assim, quando o agente não tiver a

consciência da ilicitude de sua conduta, será excluída a sua culpabilidade e

consequentemente a sua punibilidade.

Enquanto para aqueles que adotam a teoria finalista o dolo está inserido

dentro da tipicidade, ou seja, numa análise do crime de acordo com o conceito

analítico, não chegamos nem à culpabilidade, quando se comprovar que não há

dolo, salvo nos casos em que há previsão culposa.

O Código Penal Brasileiro adotou claramente em seu artigo 18 a teoria

finalista, quando assim definiu o crime:

“Art. 18 - Diz-se o crime: Crime doloso I - doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo; Crime culposo II - culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia. Parágrafo único - Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente” [grifo nosso]

Observa-se, portanto, que ao definir o crime doloso como sendo aquele em

que o agente quis o resultado (dolo direto) ou quando assumiu o risco de produzi-lo

(dolo eventual), o Código Penal Brasileiro adotou a teoria finalista da ação.

A teoria finalista da ação leva em consideração a vontade do agente,

analisando a finalidade de sua conduta, pois assim se definirá o dolo ou a culpa do

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agente. Significa dizer que será doloso o crime, quando a intenção do agente – ou

sua finalidade de sua conduta – coincidir com o resultado produzido (são os

denominados tipos congruentes). Por outro lado será culposo, quando a finalidade

do agente, isto é sua conduta, for outra contrária a produção do resultado, porém,

por imprudência, negligência ou imperícia acaba violando o bem jurídico penalmente

tutelado.

Frise-se, ainda, que há crimes, cuja consumação independem de um

resultado naturalístico, e nesses casos como a conduta típica já está prevista no tipo

penal, há violação ao bem jurídico penalmente tutelado, é o que ocorre, por

exemplo, nos crimes omissivos:

“Omissão de notificação de doença Art. 269 - Deixar o médico de denunciar à autoridade pública doença cuja notificação é compulsória:”

Nesse tipo penal, não há produção de um resultado naturalístico, porém o

médico que deixar de comunicar a existência de uma doença cuja notificação é

obrigatória, cometerá o crime em comento - são os denominados crimes omissivos

próprios, nos quais o não fazer está previsto no tipo e independem da produção de

um resultado.

Pois bem, feitas essas considerações acerca do dolo e das teorias que o

conceituam, vale lembrar aqui também, que há diversas espécies de dolo, quais

sejam: i) dolo natural/dolo normativo; ii) dolo direto ou determinado/dolo indireto ou

indeterminado; iii) dolo de dano/dolo de perigo; iv) dolo genérico/dolo específico; v)

dolo de primeiro grau/dolo de segundo grau. Veja que este rol doutrinário das

espécies de dolo apresentadas acima são meramente exemplificativos, pois a

12

doutrina traz inúmeras outras espécies, que não conveem serem definidas no

presente trabalho.

Desse modo, faz-se necessária uma breve conceituação dos tipos de dolo

apresentados, os quais não serão objeto de estudo a seguir. Primeiramente, dolo de

dano e o dolo de perigo: naquele o agente quer lesionar o bem jurídico protegido, há

vontade de produzir um resultado efetivo, quando na conduta do agente; já no

segundo, a vontade do agente se limita a expor o bem jurídico ao perigo, como

ocorre nos crimes previstos nos artigos 134 e seguintes do Código Penal Brasileiro.

Já o dolo genérico e o dolo específico, estão ligados a previsão do tipo

penal, que em cada caso prevê, ou não, um fim especial de agir, por exemplo, matar

alguém - esta conduta não prevê um especial fim de agir para que reste

caracterizada, pois é bastante que o agente mate alguém para que configure o tipo

do artigo 121 do Código Penal Brasileiro: veja que não há necessidade de que o

crime seja efetivado para busca de uma finalidade específica, configurando assim o

dolo genérico. Enquanto, no dolo específico, o especial fim de agir estará previsto no

tipo penal, como ocorre nos crimes eleitorais, v.g., corrupção eleitoral, disposto no

artigo 299 do Código Eleitoral, que prevê:

“Art. 299. Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita:” [grifo nosso]

É necessário, portanto, para consumação do crime que o agente além de

praticar a conduta prevista no tipo - nesse caso “Dar, oferecer, prometer, solicitar ou

receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem” -, ele

a realize com o dolo específico de “obter voto e para conseguir ou prometer

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abstenção”; assim, nos tipos penais que exigem essa finalidade específica, o dolo

específico previsto no tipo, a conduta será atípica, caso ele inexista.

Essas são as considerações necessárias, em um primeiro momento, a

respeito do dolo, visto que o dolo direto e dolo indireto/eventual serão tratados em

capítulos específicos, devido a sua importância no decorrer deste trabalho.

2.2. DOLO DIRETO

O dolo direto é a vontade de produzir o resultado, e o agente realiza os

meios necessários para tanto, produzindo o resultado desejado. Na concepção de

José Frederico Marques, dolo direto é:

“Diz-se dolo direto o dolo quando o resultado no mundo exterior corresponde perfeitamente à intenção e à vontade do agente. O objetivo por ele representado e a direção da vontade se coadunam com o resultado do fato praticado.” (1991, p.198).

Do mesmo modo é o entendimento de Guilherme de Souza Nucci acerca da

conceitualização do dolo direto, que segundo o autor “é a vontade do agente dirigida

especificamente a produção do resultado típico, abrangendo os meios utilizados

para tanto” (2008, p. 218).

De qualquer sorte, importante frisar que o dolo direto engloba duas

modalidades de dolo, o dolo direto de primeiro grau e dolo direto de segundo grau. O

primeiro consiste na vontade de produzir o resultado “x” típico, enquanto no de

segundo grau o agente quer realizar a conduta “x”, que era o resultado desejado,

mas além dela realiza “y” – que também é típico -, que já sabia que seria uma

conseqüência para alcançar “x”, é denominado também de dolo de conseqüências

14

necessárias. Por exemplo, o agente pretende matar “x” com uma bomba em seu

veículo, e para tanto, passa a vigiá-lo diariamente; para observar qual seria o

momento mais oportuno de colocar a bomba em seu veículo; assim, observa que

toda manhã “x” sai de sua casa para levar sua filha “y” à escola, escolhendo esse

momento para colocar a bomba no veículo e acioná-la, e, em determinado dia, o

agente realiza tal conduta, e mata “x” e “y”; veja que sua intenção era matar “x”, dolo

direto de primeiro grau em relação a este, porém, quando da busca de seu objetivo,

matou também “y”, dolo direto de segundo grau.

Outrossim, imprescindível destacar que o dolo direto de primeiro e de

segundo grau não se confundem com o dolo eventual, pois esta classificação de

dolo de primeiro e de segundo grau, está inserida no dolo direto, enquanto o dolo

eventual é o dolo indireto.

2.3. DOLO EVENTUAL

Há crimes nos quais o agente não quer exatamente a produção do

resultado, porém, quando na prática de uma conduta assume o risco de produzi-lo,

nesses casos podemos vislumbrar a ocorrência do dolo eventual.

O dolo eventual é também denominado por parte da doutrina de dolo indireto

ou indeterminado, - adotaremos aqui o nome dolo eventual –; neste tipo de dolo, o

agente não age especialmente para produzir um determinado resultado, porém, ao

imaginar que a sua ocorrência é possível ou provável, ele consente com a sua

ocorrência, ou seja, continua agindo assumindo o risco de produzir o resultado,

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concordando com a possível ocorrência do dano ao bem jurídico penalmente

tutelado.1 2

Torna-se mais clara a definição de dolo eventual quando exemplificada;

vejamos o que ocorre, por exemplo, nos crimes de trânsito: o sujeito ingere certa

quantidade de álcool, que altera sua capacidade de percepção e função motora, e

mesmo ciente de que não pode conduzir um veículo nessas condições, assume a

direção do automotor de forma desgovernada pelas ruas da cidade e em velocidade

excessiva, e visualiza, a uma razoável distância, vários pedestres atravessando a

rua pela faixa de pedestres, porém, nada faz para impedir o atropelamento desses

pedestres, consentindo com a possibilidade de atropelá-los, de forma que continua a

imprimir marcha ao seu automotor, de maneira que vem atingir um dos pedestres

que por ali passava e que não havia conseguido desviar do veículo, causando-lhe a

morte. Neste caso, o agente não estava agindo com a finalidade específica de matar

alguém, no entanto, ao agir daquela maneira, e visualizar a possibilidade da

ocorrência do resultado morte de um dos pedestres que por ali passava, o agente

não fez nada para impedir o resultado e sim, ao contrário, ele anui com a

1 “Assumir o risco significa prever o resultado como provável ou possível e aceitar ou consentir sua superveniência. O dolo eventual aproxima-se da culpa consciente e dela se distingue porque nesta o agente, embora prevendo o resultado como possível ou provável, não o aceita nem consente. Não basta, portanto, a dúvida, ou seja, a incerteza a respeito de certo evento, sem implicação de natureza volitiva. O dolo eventual põe-se na perspectiva da vontade, e não da representação, pois esta última pode conduzir também a culpa consciente. Nesse sentido, já decidiu o STF (RTJ 35/668; e no HC 75.666, rel. Pertence, DJ 06.02.98). A rigor, a expressão “assumir o risco é imprecisa, para distinguir eventual culpa consciente e deve ser interpretada em consonância com a teoria do consentimento. Deve-se a Frank a formulação de um princípio chamado de teoria positiva do consentimento, que ´útil, como critério prático, para identificar o dolo eventual. Segundo tal princípio, há dolo eventual quando o agente diz a si mesmo: “seja assim ou de outra maneira, suceda isto ou aquilo, em qualquer caso, agirei.” Revela-se, assim, a indiferença do agente em relação ao resultado.” (FRAGOSO, 2006, p. 212). 2 “É a vontade do agente dirigida a um resultado determinado, porém vislumbrando a possibilidade de ocorrência de um segundo resultado, não desejado, mas admitido, unido ao primeiro. Por isso, a lei utiliza o termo “assumir o risco de produzi-lo.” Nesse caso, de situação mais complexa, o agente não quer o segundo resultado diretamente, embora sinta que ele pode se materializar juntamente com aquilo que pretende, o que lhe é indiferente.” (NUCCI, 2008, p.219).

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possibilidade de sua ocorrência, e desse modo responderá pelo homicídio a título de

dolo.3

Luiz Regis Prado define o dolo eventual da seguinte maneira:

“significa que o autor considera seriamente como possível a realização do tipo penal e se conforma com ela. O agente não quer diretamente a realização do tipo, mas a aceita como possível ou provável – “assume o risco da produção do resultado” (art. 18, I, in fine, CP). O agente conhece a probabilidade de que sua ação realize o tipo e ainda assim age. Vale dizer: o agente consente ou se conforma, se resigna ou simplesmente assume a realização do tipo penal. Diferentemente do dolo direto, no dolo eventual “não concorre a certeza de realização do tipo, nem este último constitui o fim perseguido pelo autor”. A vontade também se faz presente, ainda que de forma atenuada.” (2006, p. 357)

Deve-se, ainda, salientar que o dolo eventual não deve ser confundido com

a mera esperança, ou seja, não basta que o agente queira o resultado e fique

esperando que o mesmo aconteça, como, por exemplo, o sujeito que joga o

desafeto em uma piscina no meio de uma tempestade, na esperança de um raio o

atinja e ele morra. Nesse caso não há dolo eventual.

3 “Haverá dolo eventual quando o agente não quiser diretamente a realização do tipo, mas aceitar como possível ou até provável, assumindo o risco da produção do resultado (art. 18, I, in fine, do CP). No dolo eventual o agente prevê o resultado como provável ou, ao menos, como possível, mas, apesar de prevê-lo, age aceitando o risco de produzi-lo. Com afirma Hungria, assumir o risco é alguma coisa mais que ter consciência de correr o risco: é assentir previamente no resultado, caso este venha efetivamente a ocorrer. Essa espécie de dolo tanto poder existir quando a intenção do agente dirige-se a um fim penalmente típico como quando dirige-se a um resultado extratípico. A consciência e a vontade, que representam a essência do dolo direto, como seus elementos constitutivos, também devem estar presentes no dolo eventual. Para que este se configure é insuficiente a mera ciência da probabilidade do resultado ou a atuação consciente da possibilidade concreta da produção desse resultado, como sustentam os defensores da teoria da probabilidade. É indispensável uma determinada relação de vontade entre o resultado e o agente e é exatamente esse elemento volitivo que distingue o dolo da culpa. Como lucidamente sustenta Alberto Silva Franco: “Tolerar o resultado, consentir em sua provocação, estar a ele conforme, assumir o risco de produzi-lo não passam de formas diversas de expressar um único momento, o de aprovar o resultado alcançado, enfim, o de querê-lo. Com todas as expressões – aceita, anui, assume, admite o risco ou resultado – pretende-se descrever um complexo processo psicológico em que se misturam elementos intelectivos e volitivos, conscientes e inconscientes, impossíveis de serem reduzidos a um conceito unitário de dolo. No entanto, como a distinção entre dolo eventual e culpa consciente paira sob uma penumbra, uma zona gris, é fundamental que se estabeleça com a maior clareza possível essa região fronteiriça, diante do tratamento jurídico diferenciado que se dá às duas categorias.” (BITENCOURT, 2009, p. 289/290).

17

2.4. CULPA CONSCIENTE

É tênue a linha que separa o dolo eventual da culpa consciente; desse

modo, deve-se passar a análise desta última, para posteriormente analisar as teorias

que visam diferenciar os dois institutos.

De acordo com Fernando Capez (2007, p. 208), são elementos do fato típico

culposo: i) conduta; ii) resultado involuntário; iii) nexo causal; iv) tipicidade; v)

previsibilidade objetiva; vi) ausência de previsão; vii) quebra do dever objetivo de

cuidado. Contudo, deve-se frisar, que na culpa consciente não há ausência de

previsão do resultado, vez que este elemento está presente somente na culpa

inconsciente.

Outrossim, para melhor distinguir a culpa consciente da inconsciente, é

necessário trazer o conceito de previsibilidade objetiva, que segundo o autor supra

consiste na:

“possibilidade de qualquer pessoa dotada de prudência mediana prever o resultado. É elemento da culpa. Conforme anota Mirabete, “a rigor, porém, quase todos os fatos naturais podem ser previstos pelo homem (inclusive de uma pessoa poder se atirar-se sob as rodas do automóvel que está dirigindo). É evidente, porém, que não é essa previsibilidade em abstrato de que se fala. Se não se interpreta o critério de previsibilidade informadora da culpa com certa flexibilidade, o resultado lesivo sempre seria atribuído ao causador. Não se pode confundir o dever de prever, fundado na diligência ordinária de um homem qualquer, com o poder de previsão. Diz-se, então, que estão fora do tipo penal dos delitos culposos os resultados que estão fora da previsibilidade objetiva de um homem razoável, não sendo culposo o ato quando o resultado só teria sido evitado por pessoa extremamente prudente. Assim só é típica a conduta culposa quando se puder estabelecer que o fato era possível de ser previsto pela perspicácia comum, normal dos homens”. (CAPEZ, 2007, p. 208 )

Assim, observa-se que a previsibilidade objetiva é comum a culpa

consciente e inconsciente, o que as diferenciam é a previsão do resultado pelo

agente, ou não. Pois, enquanto na culpa inconsciente não há previsão do resultado

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pelo agente, na culpa consciente, o agente prevê o resultado, mas, acredita que ele

não ocorrerá.

René Ariel Dotti caracteriza a culpa consciente da seguinte maneira, in

verbis:

“A culpa consciente é caracterizada pela previsão do agente quanto à probabilidade do resultado que ele espera, não venha ocorrer, confiando em sua habilidade ou destreza para enfrentar a situação de risco. É também chamada de culpa com previsão e que se aproxima do dolo eventual. Em muitas hipóteses é difícil fixar os limites entre uma e outra situação como ocorre com os crimes de trânsito.” (2001, p. 315)

2.5. CULPA CONSCIENTE E DOLO EVENTUAL

São várias as teorias que buscam diferenciar o dolo eventual da culpa

consciente, para este trabalho monográfico adotam-se as citadas por Luiz Regis

Prado, quais sejam: i) teoria da vontade; ii) teoria da representação ou da

possibilidade; iii) teoria do consentimento, da assunção ou da aprovação (volição);

iv) teoria da probabilidade ou da cognição; v) teoria da evitabilidade; vi) teoria do

risco; vii) teoria do perigo a descoberto; viii) teoria da indiferença ou do sentimento. 4

4 “a) Teoria da vontade: dolo é vontade, dirigida ao resultado (o autor deve ter consciência do fato, mas, sobretudo, vontade de causá-lo); b) Teoria da representação ou da possibilidade: dolo é previsão do resultado como certo, provável ou possível (representação subjetiva); c) Teoria do consentimento, da assunção ou da aprovação (volição): dolo exige que o agente consista em causar o resultado, ale, de o considerar como possível. Para a aplicação dessa teoria, Frank sugeriu a fórmula hipotética seguinte: diante da realização do tipo objetivo, o agente pensa: “seja assim ou de outro modo, ocorra esta ou outro resultado, em todo caso eu atuo”. Esta teoria não convence, pois na verdade o agente consente ou aceita tão-somente na possibilidade da produção do resultado, e não na sua real ocorrência. d) Teoria da probabilidade ou da cognição: para a existência do dolo, o autor deve entender “o fato como provável e não somente como possível” para a lesão do bem jurídico. Se o agente considerava provável o resultado (dolo eventual), se o considerava meramente possível (culpa consciente). e) Teoria da evitabilidade: há dolo eventual quando a vontade do agente estiver orientada no sentido de evitar o resultado.

19

Segundo Alberto Silva Franco:

“não basta para que haja dolo eventual que o agente considere sumamente provável que, mediante seu comportamento, se realize o tipo, nem que atue consciente da possibilidade concreta de produzir o resultado, e nem mesmo que tome a sério o perigo de produzir possível conseqüência acessória. Não é exatamente no nível atingido pelas possibilidades de concretização do resultado que se poderá detectar o dolo eventual e, sim, numa determinada relação de vontade entre esse resultado e o agente. Daí a posição mais correta dos defensores da teoria do consentimento que se preocupam em identificar uma manifestação de vontade do agente em relação ao resultado. Tolerar o resultado, consentir em sua provocação, estar a ele conforme, assumir o risco de produzi-lo não passam de formas diversas de expressar um único momento, o de aprovar o resultado alcançado, enfim, o de querê-lo.” (2007, p. 169)

É controverso o fato dentro da doutrina e jurisprudência, dos limites

utilizados para a caracterização do dolo eventual e da culpa consciente, tendo em

vista que os dois institutos são relativamente parecidos. Ocorre que para alguns, o

dolo eventual restará demonstrado em determinado caso, de acordo com a vontade

do agente, ou seja, o seu consentimento para a produção do resultado lesivo, assim,

para que reste caracterizado este elemento subjetivo, deve-se analisar o psique do

agente, qual era realmente sua vontade quando na prática da conduta. No entanto,

na prática, torna-se inviável realizar tal constatação, pois não há como entrar na

mente do agente para descobrir qual era realmente a sua vontade, se previu o

resultado e anuiu com a sua ocorrência ou não. Desse modo, quando na análise de

um caso concreto devemos nos ater às provas que demonstram qual era a vontade

f) Teoria do risco: a existência do dolo depende do conhecimento pelo agente do risco indevido (tipificado) na realização de um comportamento ilícito; g) Teoria do perigo a descoberto: fundamenta-se apenas no tipo objetivo. Perigo a descoberto vem a ser a situação na qual a ocorrência do resultado lesivo subordina-se à sorte ou ao acaso; h) Teoria da indiferença ou do sentimento: estabelece a distinção entre dolo eventual e culpa consciente por meio da disposição de ânimo ou da atitude subjetiva do agente ante a representação do resultado. Baseia-se na postura de indiferença diante da produção do resultado (dolo eventual), ou do “alto grau de indiferença por parte do agente para com o bem jurídico ou a sua lesão.” (PRADO, 2006, p. 357/358).

20

do agente, ou seja, ir além na análise das circunstâncias em que ocorreram os fatos,

pois somente assim será possível definir o que efetivamente ocorreu.

A fórmula de Hans Frank citada por Luiz Regis Prado disciplina que:

“Hans Frank criou a chamada fórmula de Frank (teoria positiva do consentimento e teoria hipotética do conhecimento, 1908) – há dolo eventual quando o agente diz para si mesmo: “seja como for, dê no que der, em qualquer hipótese não deixo de agir” ou “aconteça o que acontecer, continuo a agir” (revela a indiferença do agente em relação ao resultado). E existe culpa consciente quando: “se acontecer tal resultado, deixo de agir”. (ap. PRADO, 2006, p. 367)

3. ARTIGO 121, §2º, DO CÓDIGO PENAL – CIRCUNSTÂNCIAS

QUALIFICADORAS.

3.1. MOTIVOS.

3.1.1. Mediante paga ou promessa de recompensa.

O homicídio qualificado possui circunstâncias que o torna mais reprovável do

que o homicídio simples. Desse modo, podemos destacar que o homicídio será

passível de maior reprovabilidade de acordo os motivos, meios e modo de execução

do crime.

Por sua vez, as circunstâncias qualificadoras dos motivos estão estampadas

nos incisos I e II, do §2º, do artigo 121, do Código Penal, essas são: i) mediante

paga ou promessa de recompensa, ii) motivo torpe, e iii) motivo fútil.

A primeira qualificadora insculpida para o crime de homicídio, que será

analisada por ora, é a qualificadora do inciso primeiro “mediante paga ou promessa

21

de recompensa”, essa circunstância também é denominada de homicídio

mercenário.

Neste caso, o agente comete o crime de homicídio com o intuito de receber

de outrem uma determinada vantagem econômica, que por sua vez não necessita

ser especificamente dinheiro, podendo consistir em qualquer outra benesse de

cunho econômico. 5

Frise-se, no entanto, que há na doutrina divergência quanto à vantagem que

deve ser oferecida para configurar a qualificadora em análise. Para alguns, a

vantagem não necessita ser de cunho econômico, bastando apenas que o agente

tire algum proveito quando da realização do crime. Por exemplo, o homicídio

praticado em virtude de uma promessa de casamento, ou aquele que o sujeito

pratica visando obter um determinado cargo.

Pois bem, em que pese esse posicionamento de alguns doutrinadores, a

doutrina majoritária aceita que a qualificadora está vinculada a uma vantagem de

cunho econômico, não necessariamente dinheiro, mas algo relacionado a ele. Nesse

sentido segue o entendimento de Luiz Regis Prado6 e Julio Fabrine Mirabette7.

5 “Este é um crime típico de execução atribuída aos famosos “jagunços”; um crime mercenário. É uma das modalidades de torpeza na execução de homicídio, esta especificada. Na paga o agente recebe previamente a recompensa, na qual há somente a expectativa de paga. Respondem pelo crime qualificado o que praticou a conduta e o que pagou ou prometeu a recompensa.” (BITENCOURT, 2009, p. 314). 6 “Questiona-se se a recompensa visada limita-se à retribuição de ordem econômica ou se o legislador também albergou, no presente dispositivo, a contraprestação sem valor patrimonial. Sustenta-se, por um lado, que a qualificadora em análise engloba inclusive a recompensa destituída de valor econômico, isto é, considera-se que a expressão “promessa de recompensa” comporta motivos outros que, embora não econômicos, possam ser equiparados a estes (v.g. promessa de casamento, promessa de obtenção de cargo político etc.). Todavia, predomina o entendimento segundo o qual recompensa deve ter, para a configuração da qualificadora, caráter econômico. Embora não se negue que motivos não-econômicos possam perfeitamente configurar como móvel do delito, não foram estes incluídos no âmbito da qualificadora.” (PRADO, 2007, p. 69). 7 “É qualificado, em primeiro lugar, homicídio cometido “mediante paga ou promessa de recompensa, ou por motivo torpe” (inciso I). O chamado homicídio mercenário ocorre quando o agente ou recebe um pagamento para praticá-lo ou o comete apenas porque obteve a promessa de ser recompensado pelo ato. A recompensa, segundo alguns doutrinadores, deve ser uma vantagem econômica, podendo consistir não só em dinheiro, como também em perdão de dívida, promoção em emprego

22

Ademais, superada o ponto acima, deve-se salientar ainda, que a

qualificadora em questão pode ser configurada de dois modos, mediante paga ou

promessa de recompensa. Ou seja, aquele agente que efetivamente recebe a

vantagem econômica para matar alguém, veja que neste caso o recebimento da

vantagem econômica é anterior ao cometimento do crime, enquanto na promessa o

agente possui a mera expectativa de receber a vantagem econômica após a

realização do homicídio.

3.1.2. Motivo torpe.

O motivo torpe está inserido no inciso I, do § 2º, do artigo 121, do Código

Penal, do mesmo modo que a paga ou promessa de recompensa. A palavra torpe

vem do latim turpe e significa desonesto, impudico, infame, vil, abjeto, ignóbil,

repugnante, nojento, asqueroso, ascoso. Veja que não são poucos os significados

da palavra torpe, no entanto, devemos nos restringir aqueles motivos que causam a

sociedade uma maior repulsa. Segundo a Exposição de Motivos da Parte Especial

do Código Penal, o motivo torpe é definido da seguinte forma: “motivo torpe (isto é, o

motivo que suscita a aversão ou repugnância geral, v. g.: a cupidez, a luxuria, o

despeito da imoralidade contrariada, o prazer do mal etc.)”.

Devemos considerar que o motivo torpe não pode ser confundido com a

vingança ou com o ciúme, pois em que pese ambos serem repugnantes perante a

sociedade, não podem ser considerados como torpes.

etc. Afirma Costa e Silva, porém, que não constitui condição essencial da recompensa ter valor patrimonial, lembrando, para prova da asserção, a promessa do futuro casamento, com a própria pessoa investigadora ou terceiro. A redação do dispositivo, como análise do histórico da agravação, leva-nos a apoiar, porém, a primeira tese.” (MIRABETE, 2003, p. 69/70).

23

Primeiramente, quanto à vingança, essa pode ou não configurar um motivo

torpe, pois segundo o entendimento de Cezar Roberto Bitencourt, serão as

circunstâncias que determinarão se restará configurada a qualificadora ou não.

Enquanto, o ciúme não serve para caracterizar o motivo torpe, pois na lição do autor

supracitado, este sentimento é comum a toda a sociedade de modo que não pode

servir como qualificadora da torpeza no crime de homicídio. 8

De qualquer sorte, podemos identificar melhor como sendo motivo torpe o

homicídio praticado por cobiça, ou como é denominado por Julio Fabrine Mirabete9,

o homicídio por cupidez, que para melhor exemplificar, o autor cita aqueles

homicídios realizados para receber herança ou por rivalidade profissional.

Portanto, deve-se considerar o motivo torpe como aquele motivo vil, abjeto,

repugnante, etc., porém, ligado a uma vantagem econômica, uma vez que foi

inserido juntamente com o motivo da paga ou promessa de recompensa, ele deve

ser interpretado dentro desse contexto.

8 “b) Motivo torpe Torpe é o motivo repugnante, abjeto, ignóbil, vil, que repugna à consciência média. O motivo torpe não pode coexistir com o motivo fútil. Motivo torpe Torpe é o motivo que atinge mais profundamente o sentimento ético-social da coletividade; é o motivo repugnante, abjeto, vil, indigno, que repugna à consciência média. O motivo não Poe ser ao mesmo tempo torpe e fútil. A torpeza afasta a futilidade. O ciúme O ciúme, por si só, como um sentimento comum à maioria da coletividade, não se equipara ao motivo torpe. Na verdade, o ciúme patológico tem a intensidade exagerada de um sentimento natural do ser humano que, se não serve para justificar a ação criminosa, tampouco serve para qualificá-la. Vingança e motivo torpe Nem sempre a vingança é caracterizadora de motivo torpe, pois a torpeza do motivo está exatamente na causa de sua existência. Em sentido semelhante, sustenta Fernando de Almeida Pedroso que “a vingança, como sentimento de represália e desforra por alguma coisa sucedida, pode, segundo as circunstâncias que a determinaram, configurar ou não o motivo torpe, o que se verifica e dessume pela sua origem e natureza.” (BITENCOURT, 2009, p. 315). 9 “Refere-se o dispositivo também a qualquer motivo, ou seja, ao motivo abjeto, repugnante, ignóbil, desprezível, vil, profundamente imoral, que se acha mais abaixo na escala dos desvalores éticos e denota maior depravação espiritual do agente. Como melhores exemplos são citados os homicídios praticados por cupidez (para receber uma herança, por rivalidade profissional etc.) ou para satisfazer desejos sexuais.” (MIRABETE, 2003, p. 70).

24

3.1.3. Motivo fútil.

O motivo fútil é aquele que é insignificante, vão. A qualificadora do motivo

fútil está inserida no artigo 121, §2º, inciso II, do Código Penal, e causa estranheza

perante alguns doutrinadores, dentre eles destacamos o renomado jurista Cezar

Roberto Bitencourt, pois, segundo seu entendimento é um absurdo lógico a

presença desta qualificadora em nosso ordenamento jurídico, haja vista que o

homicídio sem motivos configura o tipo penal do caput do artigo 121 do Código

Penal, enquanto a presença de um motivo quando da prática do crime de homicídio

configura a forma qualificada do §2º. 10

Observa-se desse modo, que devemos distinguir o motivo fútil da ausência

de motivos, pois a ausência de um motivo não qualifica o homicídio.

De acordo com a Exposição de Motivos da Parte Especial do Código Penal,

o motivo em questão é “fútil (isto e, que, pela sua mínima importância, não e causa

suficiente para o crime).”.

10 “c) Motivo fútil Fútil é o motivo insignificante, banal. Motivo fútil não se confunde com motivo injusto, uma vez que o motivo justo pode, em tese, excluir a ilicitude, afastar a culpabilidade ou privilegiar a ação delituosa. Vingança não é motivo fútil, embora, eventualmente, possa caracterizar motivo torpe. Ausência de motivo Motivo fútil não se confunde com ausência de motivo. Esta é uma grande aberração jurídico-penal. A presença de um motivo, fútil ou banal, qualifica o homicídio. No entanto, a completa ausência de motivo, que deve tornar mais censurável a conduta, pela gratuidade e maior reprovabilidade, não o qualifica. Absurdo lógico: homicídio motivado é qualificado; homicídio sem motivo é simples. Mas o princípio da reserva legal não deixa outra alternativa. Por isso, defendemos, de lege ferenda, o acréscimo de uma nova qualificadora ao homicídio:”ausência de motivo”. Vingança e motivo fútil Vingança não é motivo fútil, embora, eventualmente, possa caracterizar motivo torpe. O ciúme, por exemplo, não se compatibiliza com motivo fútil. Motivo fútil, sendo a Exposição de Motivos, é aquele que “pela sua mínima importância, não é causa suficiente para o crime.” Na verdade, essa declaração da Exposição de Motivos não é das mais felizes, porque se for “causa suficiente para o crime” jusficá-lo-á, logo será excludente de criminalidade. (...) Insuficiência e ausência de motivo A insuficiência de motivo não pode, porém, ser confundida com ausência de motivos. Aliás, motivo fútil não se confunde com ausência de motivo. Está é uma grande aberração jurídico-penal. A presença de um motivo, fútil ou banal, qualifica o homicídio. No entanto, a completa ausência de motivo, que deve tornar mais censurável a conduta, não o qualifica.” (BITENCOURT, 2009, p. 315).

25

Veja-se, portanto, que o motivo fútil se distingue do motivo injusto e do justo,

da vingança e do ciúme e da ausência de motivos. Num primeiro momento em

relação ao motivo injusto, não pode ser confundido com o motivo fútil, por não

apresentar a desproporcionalidade referida na Exposição de Motivos do Código

Penal. De um outro modo, o motivo justo por vezes poderá ser causa excludente da

antijuridicidade, não podendo se falar em crime. Esse é o entendimento de Cezar

Roberto Bitencourt:

“Motivo fútil e motivo justo Motivo fútil não se confunde com motivo injusto, pois este não apresenta aquela desproporcionalidade referida na Exposição de motivos. E um motivo aparentemente insignificante pode, em determinadas circunstâncias, assumir certa relevância. Por outro lado, sendo justo o motivo não se poderá falar em crime.” (2009, p. 316)

3.2. MEIOS.

3.2.1. Emprego de veneno.

O veneno é “qualquer substância – mineral, animal ou vegetal -, que

inoculada, ingerida ou introduzida no organismo, provoque lesão ou perigo de lesão

à saúde de outrem”. (PRADO, 2007, p. 71)

Acrescenta ainda o autor, que o conceito de veneno deve ser definido de

modo objetivo, isto é, não pode levar em consideração as características da vítima,

por exemplo, pessoa diabética, criança, etc. Desse mesmo entendimento

compartilha o professor Júlio Fabrini Mirabette (2003, p.71).

Diverge nesse ponto o autor Magalhães Noronha citado por Rogério

Sanches Cunha em sua obra Direito Penal Parte Especial (2009, p. 24), que entende

26

por veneno qualquer substância passível de causar lesão ou perigo de lesão à

saúde, v.g., o açúcar para os diabéticos.

Entende-se, porém, que não há como configurar a qualificadora do emprego

de veneno, quando a substância de maneira objetiva, não é apta como tal, ou seja, o

açúcar para a grande maioria das pessoas é uma substância inofensiva, ao contrário

do cianureto que é de origem vegetal e pode matar alguém com a ingestão de uma

pequena quantidade.

Outrossim, deve-se destacar que para a configuração da qualificadora em

comento é necessária que a substância a ser ministrada à vítima, ocorra sem o seu

conhecimento, pois uma vez que a vítima sabe que está ingerindo a substância

maléfica não há como caracterizar tal qualificadora. Cita a doutrina, que quando a

vítima é forçada a ingerir o veneno poderia, de acordo com o caso, configurar até a

qualificadora do meio cruel, porém, não a do meio emprego de veneno.

3.2.2. Emprego de fogo ou explosivo.

O inciso III, do §2º, do artigo 121, do Código Penal, traz como circunstâncias

qualificadoras o emprego de fogo ou explosivo, haja vista que a prática do homicídio

quando presente algum desses meios denotam um maior grau de reprovabilidade.

Delmanto exemplifica que “Fogo. Como exemplo, cite-se o deitar

combustível e atear fogo ao corpo da vítima. Explosivo. O meio usado é a dinamite

ou substâncias de efeitos análogos.” (2007, p. 353).

3.2.3. Emprego de asfixia.

27

A asfixia segundo Rogério Sanches Cunha é:

“o impedimento, por qualquer meio (mecânico – enforcamento, afogamento, estrangulamento, esmagadura ou sufocação – ou tóxico – produzido por gases deletérios) da passagem do ar pelas vias respiratórias ou pulmões da pessoa, acarretando a falta de oxigênio no sangue, podendo, dependendo do tempo e suspensão da respiração, causar a sua morte.” (2009, p. 25)

Veja que a asfixia empregada por muitos agentes quando na prática de um

homicídio pode ocorrer por vários meios, que por sua vez distinguem-se os meios

mecânicos dos tóxicos. Os meios mecânicos da asfixia são aqueles provocados por

uma ação externa do agente contra a vítima, para tanto, pode utilizar as próprias

mãos, como por exemplo, no estrangulamento. No entanto, observa-se que para

asfixiar sua vítima o sujeito pode valer-se também de outros meio para auxiliá-lo, tal

como o uso de uma corda, um lençol, etc..

Faz-se necessária a distinção entre os tipos de asfixia, e, para tanto, adotar-

se-á o entendimento de Antonio José Eça (2003, p.161), que traz os seguintes

aspectos de cada um deles. Primeiro para caracterizar a sufocação, relata que ela

pode ser direta ou indireta, naquela um obstáculo se opõe ao ingresso de ar pelos

orifícios respiratórios, ou então pelas vias respiratórias, enquanto na indireta há uma

compressão grave do tórax, que impede os movimentos respiratórios.

Por sua vez, o enforcamento se diferencia dos demais, pois consiste na

compressão do pescoço da vítima por um laço, trazendo-a a morte através do peso

do seu próprio corpo.

No estrangulamento há a constrição do pescoço, porém, não é determinada

pelo peso da vítima e sim por outros meios, como exemplo as mãos do agente.

28

De outro modo, temos a esganadura que é compressão do pescoço pelo

antebraço ou mãos do agente. Por fim, o afogamento que consiste na inspiração de

água ou outro líquido que cause a morte.

Assim, nota-se a clara distinção entre o meio mecânico de sufocação e o

tóxico, pois em que pese em ambos o agente ter o auxílio de meios externos, no

primeiro a asfixia não decorre de uma ação do próprio organismo da vítima, tal como

ocorre pelo meio tóxico, e sim, por uma produção mecânica através de algum objeto

ou das mãos do próprio agente, para a obstrução das vias respiratórias de modo a

suprimir o oxigênio da vítima, causando-lhe a morte.

3.2.4. Emprego de tortura.

Como o próprio nome diz, a tortura nada mais é do que suplício ou tormento

violento infligido a alguém de modo desnecessário quando o agente pratica o crime

de homicídio. Esta qualificadora foi inserida no tipo penal qualificado do artigo 121,

porque o agente que ao matar alguém, utiliza-se de meio violentos, aumentando o

sofrimento de sua vítima, aplicando-lhe um meio de execução mais sofrido que o

normal, denota um maior grau de reprovabilidade, e assim, deve ter sua pena

majorada.

Nota-se, porém, que essa circunstância qualificadora não se confunde com o

crime de tortura, pois é um meio utilizado pelo agente para obter o crime final, qual

seja, o homicídio. Há, contudo, na análise do caso concreto de se verificar qual o

elemento subjetivo do agente quando na prática da conduta, haja vista que se ele

utiliza a tortura como um meio para a prática do homicídio, este restará configurado,

enquanto, se o agente tiver o dolo de torturar, mas acabar matando a vítima por

29

culpa, responderá pela pena do artigo 1º, §3º, da Lei Federal nº 9.544/1997.

(CUNHA, 2009, p. 25)

3.2.5. Meio insidioso e cruel.

O meio insidioso é aquele em o agente pratica por meio de estratagema,

perfídia, conforme o entendimento de Damásio de Jesus (2010, p. 100). No

raciocínio do mesmo autor, o meio cruel por sua vez é aquele que causa sofrimento

à vítima.

Nota-se que vários são os meios que podem ser caracterizados como cruéis

na prática do homicídio, exemplo clássico deste, é de Damiens citado por Michael

Foucault em sua obra Vigiar e Punir. Nesta obra é demonstrado os meios utilizados

na época de 1757 para aplicação de pena aos condenados, oportuno transcrever um

breve trecho da citada obra:

“levado e acompanhado numa carroça, nu, de camisola, carregando uma tocha de cera acesa de duas libras; [em seguida], na dita carroça, na praça de Grève, e sobre um patíbulo que aí será erguido, atenazado nos mamilos, braços, cochas e barrigas das pernas, sua mão direita segurando a faca com que cometeu o dito parricídio, queimada com fogo de enxofre, e às partes em que será atenazado se aplicarão chumbo derretido, óleo fervente, piche em fogo, cera e enxofre derretidos conjuntamente, e a seguir seu corpo será puxado e desmembrado por quatro cavalos e seus membros e corpo consumidos ao fogo, reduzidos a cinzas, e suas cinzas lançadas ao vento.”(FOUCAULT, 1987, p. XX)

3.2.6. Perigo comum.

Por fim, na análise das circunstâncias qualificadoras pelos meios de

execução, nos resta a qualificadora do perigo comum, que deve por sua vez seguir a

mesma linha da parte exemplificativa, isto é do fogo e explosivos. De acordo com

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Fernando Capez “meio de que possa resultar perigo comum é aquele que pode

expor a perigo um número indeterminado de pessoas, fazendo periclitar a

incolumidade social” (2007, p. 54).

3.3. MODOS.

Num primeiro momento o artigo 121, §2º, inciso IV, do Código Penal, traz

três exemplos de circunstâncias qualificadoras pelos modos de execução do crime,

quais sejam à traição, à emboscada, e a dissimulação, sendo que ao final do

dispositivo nos traz uma circunstância qualificadora genérica, que deve ser

analisada por meio de interpretação analógica com as demais circunstâncias

contidas no dispositivo.

3.3.1. À traição.

A traição consiste literalmente na perfídia, deslealdade, aleivosia, nesta o

agente engana a vítima, colhendo-a por trás. Imaginemos, por exemplo, a situação

de uma vítima que é atacada pelas costas de maneira inesperada pelo agente,

nesse caso há necessidade da quebra de fidelidade e lealdade entre a vítima e o

agente, para que reste configurada a qualificadora em questão, esse é o

entendimento adotado por Fernando Capez, em seu Curso de Direito Penal: parte

especial. (2007, p. 56)

Deve-se destacar, que há diferença entre o ataque efetuado nas costas da

vítima, e aquele praticado pelas costas.

31

De acordo com Rogério Greco “Pelas costas configura-se a traição, quando

o agente ataca a vítima por trás, sem que ela pudesse percebê-lo. Golpe nas costas

identifica a região do corpo onde o golpe foi produzido.” (2008, p. 171)

Veja que o fato da vítima receber o golpe fatal nas costas não é bastante

para a caracterização da traição, v.g., quando há uma briga e a vítima é atacada

com uma facada nas costas, neste caso não se configura a qualificadora em

questão, pois não há deslealdade do agente.

Ademais, Damásio acrescenta que a traição pode ser física ou moral, sendo

a primeira caracterizada quando o agente mata a vítima pelas costas, enquanto a

segunda seria no exemplo do sujeito atrair a vítima pra um local onde existe um

poço.

3.3.2. Emboscada.

A emboscada também é a denominada tocaia, ou seja, o agente aguarda a

vítima escondido, para atacá-la quando estiver desprevenida.

Mirabete define a qualificadora como “a espera, por pare do agente, da

passagem ou chegada da vítima descuidada, para feri-la de improviso (RT 333/500)”

(2003, p. 73).

Isso significa que a qualificadora será aplicada, quando o agente ficar na

espreita aguardando a vítima para atacá-la a vítima de inopino.

3.3.3. Mediante dissimulação.

32

Dissimular é o mesmo que disfarçar, nestes casos o agente finge ser amigo

da vítima, ou mesmo que sente um carinho por ela, para aproximar-se dela com a

intenção de matá-la. (NUCCI, 2010, p. 614).

Nestes casos, observa-se que o agente se vale de um vínculo anterior com a

vítima de amizade ou de confiança, para mascarar sua verdadeira intenção que é

matá-la.

Não obstante, deve-se destacar que Fernando Capez traz ainda, a distinção

entre a dissimulação material e a moral. A primeira, consiste na utilização de

aparatos ou disfarces para praticar o crime, por exemplo, o autor supra cita o caso

do agente que disfarçado de encanador entra na casa da vítima para matá-la.

Enquanto, a dissimulação moral é aquela na qual o agente ludibria a vítima, fingindo

ser sua amiga, para obter-lhe a confiança, e assim, poder executar o crime.

3.3.4. Recurso que dificulta ou impossibilita a defesa da vítima.

Trata-se de uma qualificadora que deve ser interpretada de acordo com as

demais hipóteses trazidas pelo inciso IV, do §2º, do artigo 121, do Código Penal,

caracterizada, portanto, com a surpresa.

Segundo a doutrina e jurisprudência, para a configuração da circunstância

qualificadora em análise, é imprescindível que o ataque ocorra de maneira

inesperada pelo agente, dificultando ou impossibilitando a defesa da vítima, ou seja,

o modo de execução deve se assemelhar aos exemplos trazidos pela primeira parte

do dispositivo, tendo em vista ser uma fórmula genérica do dispositivo.

33

Nesse viés, de acordo com a concepção de Damásio de Jesus, o fato de o

agente possuir superioridade em arma ou em forças não configura por si só a

qualificadora, in verbis:

“A superioridade em armas ou em forças não qualifica o homicídio. Pode consistir simples eventualidade a circunstância de o sujeito ativo do fato se encontrar armado, enquanto a vítima não, ou que o sujeito ativo seja fisicamente superior àquela.” (2010, p. 102)

Assim, não será o fato do agente estar fortemente armado, ou ser mais forte

do que a vítima, que qualificará o homicídio. Não obstante, essas circunstâncias

possam pegar a vítima de surpresa, e a vítima inferiormente desprotegida em

relação ao agente, é necessário que o agente utilize-se desse aparato como um

modo insidioso na execução do delito, senão estaríamos inserindo dentro dessa

qualificadora praticamente todos os crimes de homicídio, pois para a consumação

do delito a vítima sempre estará vencida e terá sua defesa dificultada para que o

agente tenha êxito na execução.

Ensina Nélson Hungria que deve ser restringida a aplicação dessa

circunstância para aqueles casos em que o agente ataca traiçoeiramente, em suas

palavras:

“se fosse rejeitado esse critério restritivo, estariam abrangidos entre as agravantes obrigatórias gerais ou como qualificadoras do homicídio todos os modos possíveis e inimagináveis de ser o sujeito passivo reduzido à inferioridade ou impotência de defesa, como sejam, v.g., a agilidade do agente a maior habilidade deste no manejo das armas, certos truques usualmente empregados para vencer a resistência oposta etc. Seria mesmo rara a hipótese em que se não tivesse de reconhecer a agravação da pena, pois o próprio fato do êxito do ofensor resulta, na grande maioria dos casos, de haver este empregado algum recurso para neutralizar a possibilidade ou eficiência da reação do ofendido.” (1979, p. 171)

34

Portanto, a presente circunstância qualificadora deve ser analisada

restritivamente e de acordo com as demais circunstâncias previstas no inciso IV,

caso contrário estará aplicando-se de forma indiscriminada a qualificadora em

análise.

3.4. FINS.

3.4.1. Para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro

crime.

Por fim, tratar-se-á da qualificadora subjetiva disposta no inciso V, do §2º, do

artigo 121, do Código Penal, que traz uma maior reprovabilidade aquele crime

cometido com o intuito de assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou

vantagem de outro crime.

Num primeiro momento, observa-se que a qualificadora em questão ocorrerá

através da conexão entre os crimes, ou seja, pelo nexo entre um e outro,

diferenciando em conexão teleológica, conseqüencial ou ocasional.

A conexão teleológica existe quando o crime de homicídio é praticado

anteriormente a execução do outro crime, o agente age motivado pela vontade de

praticar outro crime além do homicídio, isto é, mata para assegurar a execução

daquele outro crime. Fernando Capez traz como exemplo o agente que mata o

marido para poder estuprar sua mulher, nesse caso o agente matou com o especial

fim de assegurar a execução do outro crime, porém, a circunstância qualificadora

persistirá independentemente do segundo crime se concretizar ou não, pois os

35

motivos determinantes do crime fora para assegurar a execução de outro crime, o

que de per si torna a conduta passível de maior reprovabilidade.

De outro modo, a conexão conseqüencial é aquela em que o agente pratica

o homicídio com a finalidade de assegurar a ocultação, a impunidade ou a vantagem

de outro crime. Nestes casos, o crime de homicídio é posterior ao cometimento de

outro crime, ao contrário do que ocorre com a conexão teleológica, pois o agente

impelido da vontade de não ser descoberto mata um terceiro que por algum motivo

possuía conhecimento do crime ou da autoria delitiva.

Veja ainda, que a conexão conseqüencial deve ser dividida de acordo com o

tipo de finalidade que enseja o homicídio, pois quando o agente mata para

assegurar a ocultação crime, ele age com o propósito de evitar que terceiros tenham

conhecimento da prática do delito, assim, v.g. mata a testemunha do crime. Por

outro lado, quando o sujeito ativo mata para assegurar a impunidade de outro crime,

uma vez que neste caso a materialidade do crime é sabida por alguém, porém, a

autoria é desconhecida, por isso se difere do primeiro caso, em que a testemunha

sabe que foi o sujeito “A” que praticou o crime, e esse a mata para não ser delatado

as autoridades, enquanto quando o sujeito mata para assegurar a impunidade de

outro crime, a vítima, só possui conhecimento dos fatos e não da autoria.

Há ainda, a conexão conseqüencial praticada para assegurar a vantagem de

outro crime, imaginemos o caso em que “A” e “B” resolvem roubar um banco, e após

a prática do crime, que foi bem sucedido, “A” resolve matar “B” para poder fruir

sozinho do dinheiro advindo do roubo do banco. Observa-se que o motivo que

ensejou o homicídio foi para assegurar vantagem de outro crime, presente, portanto,

a qualificadora do inciso V.

36

Ademais, há também a conexão ocasional, porém esta não influi na medida

de aplicação da pena, porque consiste na prática ocasional de dois delitos, fazendo

com que o sujeito responda por eles em concurso material.

4. O HOMICÍDIO NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA 4.1. HOMICÍDIO SIMPLES

O homicídio simples está previsto no caput do artigo 121 do Código Penal, e

prescinde de uma análise mais profunda, pois o dispositivo prevê a conduta de

“matar alguém” e a ela agrega uma pena de 6 (seis) a 20 (vinte) anos de reclusão.

Nota-se que o homicídio simples restará configurado, quando não houver

nenhuma circunstância que o qualifique e torne o seu grau de reprovabilidade maior

do que a figura simples do caput.

A distinção entre as figuras do homicídio simples, privilegiado e qualificado,

é necessária, pois, dependendo do tipo de crime praticado pelo agente haverá

diversas conseqüências quando da aplicação da pena. Veja que enquanto o

homicídio simples prevê uma pena de 6 (seis) a 20 (vinte) anos, o homicídio

qualificado parte de um parâmetro de pena de 12 (doze) a 30 (trinta) anos, e o

privilegiado, por sua vez, prevê uma causa de especial diminuição de pena que pode

variar de um sexto a um terço.

4.2. HOMICÍDIO PRIVILEGIADO

O homicídio privilegiado não é um novo tipo penal, e sim é uma causa de

especial diminuição de pena prevista para o crime de homicídio do artigo 121 do

Código Penal.

37

O §1º prevê três hipóteses nas quais o agente que praticar o homicídio terá

sua pena diminuída, transcreve-se:

“Caso de diminuição de pena § 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço.”

Observa-se, que a primeira delas é o motivo de relevante valor social,

segundo Pierangeli “esses motivos estão ligados aos interesses coletivos ou aos fins

da vida em sociedade, razão pela qual o agente tem diminuído seu grau de

censurabilidade (culpabilidade)” (2007, p.30).

Como exemplo de valor moral, a doutrina usa a eutanásia, pois nesses

casos impelido de valor nobre, o agente pratica o crime para evitar o sofrimento da

vítima.

Já na violenta emoção, o agente age após a injusta provocação da vítima,

há necessidade desse liame entra a conduta da vítima que desencadeia a do agente

que o mata, por exemplo, no pai que mata o estuprador de sua filha.

4.3. HOMICÍDIO QUALIFICADO

Na forma qualificada do homicídio, encontra-se a presença de diversas

circunstâncias que denotam uma maior reprovabilidade da conduta do agente,

podendo ser distinguidas, quanto aos motivos, meios, modos e fins de execução,

conforme já fora demonstrado acima.

Pois bem, a análise desse tipo penal é de suma importância, tendo em vista

que além da pena ser maior do que a prevista no caput do artigo 121 do Código

38

Penal, tal crime é considerado hediondo, nos termos do artigo 1º, inciso I, da Lei

Federal nº 8.072/1990. Isso significa que o agente ao cometer o crime de homicídio

qualificado sofrerá todas as conseqüências previstas na Lei de Crimes Hediondos,

podendo destacar-se dentre essas, o aumento do tempo de cumprimento de pena

para efeitos de progressão de regime. Cite-se ainda, que o início de cumprimento de

pena será sempre em regime inicial fechado.

Ademais, não podemos deixar de fora a grande celeuma que há no tocante

a questão da possibilidade da concessão de liberdade provisória para aqueles que

praticam o crime de homicídio qualificado. Tal discussão se dá, uma vez que o artigo

2º, inciso II, da Lei Federal nº 8.072/1990, veda a possibilidade da concessão de

fiança, aos crimes hediondos e aos equiparados aos hediondos.

Assim, alguns juristas defendem que o dispositivo citado encontra-se

plenamente em vigor, e por proibir a concessão de liberdade provisória através de

fiança, não há outra conclusão contrária de que também é proibida a concessão de

liberdade provisória sem a fiança. Enfatizam ainda, tornando mais concreto seu

argumento, com o artigo 5º, inciso LXIII, da Constituição Federal, “a lei considerará

crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática de tortura, o tráfico

ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes

hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo

evitá-los, se omitiram;”.

Contrário sensu, Alberto Silva Franco (2007, p.353) entende que a Lei

11.464/2007 que alterou a Lei nº 8.072/1990, excluiu a vedação da concessão de

liberdade provisória para os crimes hediondos e equiparados, haja vista que deixou

apenas a vedação a concessão de fiança.

39

4.4. POSSIBILIDADE DO HOMICÍDIO QUALIFICADO-PRIVILEGIADO.

Será qualificado-privilegiado o homicídio, quando houver concomitantemente

uma circunstância qualificadora e o privilégio previsto no §1º do artigo 121 do Código

Penal.

Destarte, deve-se consignar que o homicídio qualificado-privilegiado não se

insere no rol de crimes hediondos, pois em que pese ter a presença de uma

circunstância qualificadora o privilégio do artigo 121, que é de caráter subjetivo

impera sobre as qualificadoras afastando a hediondez do delito.

Antes das alterações da Lei Federal nº 8.072/1990 advindas da Lei Federal

nº 8.903/1994, o homicídio não estava inserido no rol de crimes hediondos, e não

havia, portanto, a necessidade de discussão dessa questão.

Hoje em dia, é pacífico o entendimento de que o homicídio privilegiado-

qualificado não é considerado crime hediondo.

Outrossim, conforme fora explicitado acima, o homicídio privilegiado é

aquele em que o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor

social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta

provocação da vítima, veja que é uma forma privilegiada do crime de homicídio de

caráter subjetivo, assim, surge a seguinte questão, em quais hipóteses do §2º do

artigo 121, do Código Penal, o agente que praticou o crime na forma do §1º do

mesmo artigo, poderá ter sua pena agravada?

Pois bem, existem duas posições na doutrina a primeira delas traz a

seguinte fundamentação de que seriam incompatíveis todas as circunstâncias

qualificadoras com o homicídio privilegiado, pois leva em conta a disposição

topográfica da norma penal, e uma vez que o homicídio privilegiado encontra-se

previsto no §1º e as circunstâncias qualificadoras no §2º, ambos do artigo 121, do

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Código Penal, elas seriam incompatíveis entre si, compartilham desse entendimento

E. Magalhães Noronha (ap. CAPEZ, 2007, p. 40) e Flávio Augusto Monteiro de

Barros, no livro Crimes Contra Pessoa que traz o entendimento de James

Tubenchlack:

“Como se sabe, na ordem dos quesitos formulados pelo juiz e votados pelo júri, os privilégios se situam antes das qualificadoras (art. 484, III). Por assim ser, quando reconhecido um privilégio, o entendimento jurisprudencial dominante é no sentido de ficar prejudicada a votação do quesito versante sobre a qualificadora. E outra não poderia ser a solução, tomando-se em conta a própria sistematização do art. 121 do CP, que enuncia as causas de diminuição de pena no §1º e as de aumento no §2º, de sorte que as primeiras dizem respeito, exclusivamente, ao tipo básico ou fundamental do homicídio. Exesege em contrário, convenhamos, viria a acarretar gravames irremediáveis ao acusado.” (ap .BARROS, 1997, p. 24)

Um segundo posicionamento entende que por tratar-se de circunstância de

caráter subjetivo, ou seja, dos motivos que ensejaram o agente a praticar o delito, a

princípio, por simples lógica será incompatível com as circunstâncias qualificadoras

de caráter subjetivo.

Há divergências sobre a incompatibilidade com as circunstâncias de caráter

objetivo com o homicídio privilegiado. Essa segunda corrente doutrinária, traz que

não são incompatíveis as qualificadoras de caráter objetivo do inciso III e IV, pois

aquelas dizem respeito, aos meios e modos de execução do crime, não ensejando

nenhuma incoerência em incidir ambos em um mesmo delito que há presença do

§1º. Suponhamos, que o agente impelido por violenta emoção, após presenciar a

morte de sua filha, utilizando-se de meio que dificulte ou impossibilita a defesa do

agente o mata, neste caso seria possível a presença da qualificadora com o

privilégio. Neste sentido já se posicionou o Superior Tribunal de Justiça, nos

seguintes julgados, in verbis:

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“PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO-PRIVILEGIADO. COMPATIBILIDADE ENTRE QUALIFICADORA INSERTA NO ART. 121, § 2º, INCISO IV COM A FORMA PRIVILEGIADA. POSSIBILIDADE. I - Não há incompatibilidade, em tese, na coexistência de qualificadora objetiva (v.g. § 2º, inciso IV) com a forma privilegiada do homicídio, ainda que seja a referente à violenta emoção. (Precedentes desta Corte e do Pretório Excelso). II - Assim, a resposta afirmativa ao quesito atinente a forma privilegiada do crime de homicídio não implica a prejudicialidade do quesito que indagaria aos jurados acerca da qualificadora inserta no art. 121, § 2º, inciso IV do CP (recurso que dificultou a defesa da vítima). Recurso especial provido.” (REsp 922932 / SP, RECURSO ESPECIAL 2007/0028150-1, Relator(a) Ministro FELIX FISCHER (1109), Órgão Julgador T5 - QUINTA TURMA, Data do Julgamento 13/12/2007, Data da Publicação/Fonte, DJe 03/03/2008) Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sSeq=747227&sReg=200700281501&sData=20080303&formato=HTML “PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. TRIBUNAL DO JÚRI. LEGAÇÃO DE NULIDADES. QUESITOS. OPORTUNIDADE. PRECLUSÃO. CPP, ART. 479; 571, VIII E 572, I. HOMICÍDIO PRIVILEGIADO QUALIFICADO. COMPATIBILIDADE. - Em tema de nulidade no processo penal, as vigas mestras do sistema assentam-se nas seguintes assertivas: (a) ao argüir-se nulidades, dever-se-á indicar, de modo objetivo os prejuízos correspondentes, com influência na apuração da verdade substancial e reflexo na decisão da causa (CPP, art. 566); (b) em princípio, as nulidades consideram-se sanados se não forem argüidas no tempo oportuno, por inércia da parte. - Os pedidos e as reclamações relativas aos quesitos formulados aos membros do Tribunal do Júri devem ser feitos logo após a sua leitura e explicação pelo Juiz Presidente, restando sanadas as eventuais nulidades ou omissões se não argüidas nessa oportunidade. - Inteligências dos arts. 479; 571, VIII, e 572, I, todos do Código de Processo Penal. - Não incompatibilidade na coexistência de circunstâncias que qualificam o homicídio e as que o tornam privilegiado. - O reconhecimento pelo Tribunal do Júri de que o paciente agiu sob o domínio de violenta emoção com surpresa para a vítima não é contraditório, tendo em vista que as circunstâncias privilegiadoras, de natureza subjetiva, e qualificadoras, de natureza objetiva, podem concorrer no mesmo fato-homicídio. - Recurso especial parcialmente conhecido e desprovido.” (REsp 326118 / MS, RECURSO ESPECIAL 2001/0057386-1, Relator(a) Ministro VICENTE LEAL (1103), Órgão Julgador T6 - SEXTA TURMA, Data do Julgamento 14/05/2002, Data da Publicação/Fonte DJ 17/06/2002 p. 311) Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=homicidio+privilegiado-qualificado+&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=4 “PENAL. JURI. HOMICIDIO PRIVILEGIADO-QUALIFICADO. POSSIBILIDADE. 1. NÃO HA INCOMPATIBILIDADE NA COEXISTENCIA DE CIRCUNSTANCIAS QUE QUALIFICAM O HOMICIDIO E AS QUE O TORNAM PRIVILEGIADO. 2. PODE O JURI RECONHECER CONCOMITANTEMENTE QUE O REU AGIU SOB O DOMINIO DE VIOLENTA EMOÇÃO, LOGO EM SEGUIDA A INJUSTA PROVOCAÇÃO DA VITIMA, E QUE EMPREGOU UM MEIO QUE DIFICULTOU OU IMPOSSIBILITOU SUA DEFESA.

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3. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO MAS IMPROVIDO.” (REsp 68037 / SC, RECURSO ESPECIAL 1995/0029695-0, Relator(a) Ministro EDSON VIDIGAL (1074), Órgão Julgador T5 - QUINTA TURMA, Data do Julgamento 04/06/1996, Data da Publicação/Fonte DJ 02/09/1996 p. 31095, LEXSTJ vol. 95 p. 337,RT vol. 736 p. 605) Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/processo/jsp/ita/abreDocumento.jsp?num_registro=199500296950&dt_publicacao=02-09-1996&cod_tipo_documento=

5. COMPATIBILIDADE DAS QUALIFICADORAS NO HOMICÍDIO COM DOLO

EVENTUAL

A grande celeuma que se põe é sobre a compatibilidade das qualificadoras no

homicídio qualificado com a presença do dolo eventual. A doutrina pouco fala sobre

o assunto, então para melhor compreensão do tema em questão torna-se

imprescindível a análise de julgados acerca do tema.

O primeiro ponto a ser observado é a natureza das qualificadoras, ou seja,

dividi-las em qualificadoras de caráter objetivo e as de caráter subjetivo, todas estão

previstas no §2º, do artigo 121, do Código Penal, em que pese já terem sido

dispostas nos capítulos anteriores, achamos pertinente sua transcrição novamente:

“Homicídio qualificado § 2° Se o homicídio é cometido: I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe; II - por motivo futil; III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum; IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossivel a defesa do ofendido; V - para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime: Pena - reclusão, de doze a trinta anos.”

As qualificadoras de caráter objetivo são aquelas relativas aos meios e aos

modos de execução do crime, quais sejam as previstas nos incisos III e IV, enquanto

as restantes são de caráter subjetivo, pois dizem respeito aos motivos determinantes

do crime.

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Primeiramente, passaremos a análise das qualificadoras de caráter subjetivo,

que na concepção de Guilherme de Souza Nucci não há incompatibilidade entre

essas com o homicídio com dolo eventual, pois:

“o elemento subjetivo do delito de homicídio é o dolo, em qualquer de suas espécies: direto ou eventual. Portanto, é viável que o agente assuma o risco de produzir o resultado morte (dolo eventual), motivado pela torpeza, futilidade ou ânsia de assegurar a impunidade ou vantagem de outro crime” (2010, p. 601)

Compartilhamos do entendimento do ilustre doutrinador, pois como vimos

anteriormente no dolo eventual o agente ao praticar determinada conduta assume o

risco de produzir o resultado morte, isto é, prevê a ocorrência do resultado e anui

com a sua produção, assim, nada impede que as qualificadoras de caráter subjetivo

seja o motivo que determinou o agente a agir daquele modo.

Imagine, por exemplo, que “A” matador de aluguel, foi contratado para matar

“B”, incidindo desse modo a qualificadora do inciso I, pois bem, planejado o crime

“A” dirige-se a um estádio de futebol, local em que “B” se encontrava para assistir

um jogo, e se posiciona em uma cabine no estádio para que pudesse visualizar “B”

no meio da multidão e atirar no mesmo. Ciente de que poderia errar quando na

execução do crime, e acertar outrem ao atirar, “A” anui com a ocorrência do

resultado, vindo a disparar dois tiros, que atingiu “C” que estava ao lado de “B” no

momento do jogo. Neste caso, observa-se que “A” praticou o crime mediante paga, e

mesmo não possuindo dolo direto em relação a “C”, anuiu para com o resultado

morte quanto atirou, neste caso estaria presente a circunstância qualificadora.

O Superior Tribunal de Justiça já decidiu em caso análogo pela

compatibilidade da qualificadora do inciso I, in fine, no homicídio com dolo eventual,

no julgamento do Habeas Corpus nº 58.423/DF, vejamos:

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“Homicídio qualificado e dolo eventual (compatibilidade). Qualificadora do inciso IV (inexistência). Intimação/excesso de linguagem (questões improcedentes). 1. São compatíveis, em princípio, o dolo eventual e as qualificadoras do homicídio. É penalmente aceitável que, por motivo torpe, fútil, etc., assuma-se o risco de produzir o resultado. 2. A valoração dos motivos é feita objetivamente; de igual sorte, os meios e os modos. Portanto estão motivos, meios e modos cobertos também pelo dolo eventual. 3. Inexistência, na hipótese, de antinomia entre o dolo eventual e as qualificadoras do motivo torpe e de recurso que dificultou a defesa das vítimas. 4. No caso, entretanto, ausente está, segundo os elementos dos autos, a qualificadora do inciso IV. 5. Intimação pessoal e excesso de linguagem – questões suscitadas, mas sem procedência. 6. Habeas corpus deferido em parte, a fim de que se exclua do processo a qualificadora do inciso IV do § 2º do art. 121 do Cód. Penal. [...] Vasculhei a doutrina, pouco encontrei, bem pouco, especificamente, talvez até porque não a tenha bem vasculhado, mas encontrei, verbi gratia, nas "Lições" de Heleno Fragoso (parte especial, 1877, pág. 69), estes tópicos: "As circunstâncias que qualificam o homicídio estão, evidentemente, cobertas pelo dolo. A qualificação através dos motivos não apresenta dificuldades, pois são hipóteses de maior reprovabilidade, através de componentes subjetivos do comportamento. O mesmo se diga da qualificação ligada ao fim de agir (art. 121, § 2º, V). Não se exige que o agente tenha consciência de que o motivo que o levou a atuar é fútil ou torpe. A valoração dos motivos não depende do réu, fazendo-se objetivamente, segundo os padrões éticos dominantes no meio e no lugar onde o fato ocorreu. Os meios e modos de execução que qualificam o delito, referem-se à exacerbação do ilícito, integrando a figura típica. Assim sendo, são elementos que devem estar cobertos pelo dolo (bastando o dolo eventual), sendo, pois, excluídos pelo erro." Vejam: (I) "a valoração dos motivos não depende do réu, fazendo-se objetivamente"; (II) quanto aos meios (inciso III) e modos (inciso IV), "são elementos que devem estar cobertos pelo dolo (bastando o dolo eventual)". E mais: se dolo é, ao mesmo tempo, representação e vontade – vontade dirigida ao resultado, também a vontade de quem assume o risco de produzir o resultado, lá dolo direto, cá dolo eventual, conforme, entre outros, Hungria (vol. I, tomo II, págs. 114 e segs.) –, então confiramos esta conclusão de acórdão estadual (constante do parecer nos autos do REsp-365, de 1989, citado): "Ora, se dolo é vontade e representação não se vê porque aquele que, apesar da previsão do resultado, persiste em seu comportamento não possa fazê-lo por motivo fútil. A futilidade do motivo, vale dizer o móvel que impele o comportamento do agente ativo, tanto pode ocorrer no dolo direto, como no eventual. No denominado dolo eventual o agente tem consciência da ilicitude de seu comportamento e vontade de praticar o ato. O resultado não é representado como certo, mas como possível. Mas o agente prefere que ele ocorra, a desistir do seu ato..." Escreveu Dotti ("Enciclopédia Saraiva do Direito", São Paulo, 1977, vol. 53, pág. 320): "Cumpre, porém, não confundir o motivo com o dolo. Aquele pode ser classificado como social ou anti-social (que perante a ética se designarão como moral ou imoral, nobre e ignóbil) e no campo legal é tratado como

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jurídico e anti-jurídico, legítimo e ilegítimo, escusável e não-escusável, conforme a doutrina de Ferri." Há, portanto, precedentes nossos tanto em relação aos motivos (incisos I e II) quanto em referência aos modos (inciso IV). De igual maneira, há boa – se não excelente – doutrina. Isto é, há conceitos de ordem jurisprudencial e de caráter doutrinal segundo os quais não são antinômicos dolo eventual e qualificadoras do homicídio. Torno, pois, ao parecer de Fischer, no precedente de 1995: "... inexiste qualquer incompatibilidade entre dolo eventual e motivo fútil (circunstância subjetiva), como se pode sustentar o raciocínio de que, a priori, o dolo eventual é incompatível com a qualificadora da surpresa (que tem caráter objetivo)?" Confiram, ainda, Toledo no REsp-365, de 1989: "Alguém, por motivo fútil, pode assumir o risco de produzir o resultado. Por essas razões, afasto a alegada incompatibilidade entre o motivo fútil e o dolo eventual." Diante dos conceitos a cujo propósito fui refletindo à medida que aqui os resumia, estou assumindo posição a favor da compatibilidade entre dolo eventual e qualificadoras, contudo, no caso sob nosso exame, não creio penalmente existente, valendo-me da denúncia e do acórdão, a qualificadora do inciso IV, ei-la segundo as respectivas descrições:” (HC 58423 / DF, HABEAS CORPUS 2006/0093270-6, Relator(a) Ministro NILSON NAVES (361), Órgão Julgador T6 - SEXTA TURMA, Data do Julgamento 24/04/2007, Data da Publicação/Fonte DJ 25/06/2007 p. 304) [grifo nosso] Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sSeq=681636&sReg=200600932706&sData=20070625&formato=HTML

No caso sub judice, vislumbra-se que o Superior Tribunal de Justiça

entendeu que são compatíveis as qualificadoras dos incisos I, II e IV com o dolo

eventual.

Pois bem, acerca da qualificadora do motivo fútil a jurisprudência do

Superior Tribunal de Justiça é farta no sentido de que é perfeitamente compatível a

presença dessa com o dolo eventual:

“AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. FALTA DE PARTICULARIZAÇÃO DO DISPOSITIVO VIOLADO. SÚMULA Nº 284/STF. MOTIVO FÚTIL E DOLO EVENTUAL. INCOMPATIBILIDADE. INOCORRÊNCIA. RECURSO IMPROVIDO. 1. A falta de indicação do artigo de lei federal, tido como violado ou interpretado divergentemente, inibe o conhecimento do recurso especial. 2. "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia." (Súmula do STF, Enunciado nº 284). 3. Não há incompatibilidade entre a qualificadora do motivo fútil e o dolo eventual. Precedentes do STJ. 4. Agravo regimental improvido.” (AgRg no Ag 815349 / BA, AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 2006/0171191-0, Relator(a) Ministro HAMILTON CARVALHIDO (1112), Órgão Julgador T6 - SEXTA TURMA, Data do Julgamento 14/08/2007, Data da Publicação/Fonte, DJ 19/11/2007 p. 305)

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[grifo nosso] Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sSeq=711820&sReg=200601711910&sData=20071119&formato=HTML “CRIMINAL. HC. HOMICÍDIO QUALIFICADO. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO CONTRA SENTENÇA DE PRONÚNCIA. ACÓRDÃO QUE DETERMINA A REINSERÇÃO DA QUALIFICADORA DO MOTIVO FÚTIL. INCOMPATIBILIDADE COM DOLO EVENTUAL. INOCORRÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE DE EXCLUSÃO DE QUALIFICADORA QUE NÃO SE MOSTRE MANIFESTADAMENTE DESCABIDA. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. ORDEM DENEGADA. I. Hipótese em que o Tribunal a quo deu provimento ao recurso em sentido estrito interposto pelo Parquet para reinserir a qualificadora do motivo fútil, por entender inexistir incompatibilidade entre o dolo eventual e tal qualificadora de índole subjetiva. II. O dolo do agente, direto ou indireto, não se confunde com o motivo que ensejou a conduta, sendo certo que o réu, ao assumir o risco de atingir o resultado fatal, pode ter praticado o crime levado por frivolidade, não se afigurando, em princípio, a apontada incompatibilidade. III. As qualificadoras só podem ser excluídas quando, de forma incontroversa, mostrarem-se absolutamente improcedentes, sem qualquer apoio nos autos – o que não se vislumbra in casu, sob pena de invadir a competência constitucional do Conselho de Sentença. IV. Ordem denegada." (HC nº 62.345⁄DF, Relator Ministro Gilson Dipp, in DJ 18⁄12⁄2006) [grifo nosso] Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sSeq=659749&sReg=200601490606&sData=20061218&formato=HTML “PENAL. HOMICÍDIO. DOLO EVENTUAL E MOTIVO FÚTIL. COMPATIBILIDADE. Não há, no crime de homicídio, incompatibilidade entre dolo eventual e motivo fútil. É possível, por motivo fútil, alguém assumir o risco de produzir o resultado. Afastado, assim, ó óbice de tal incompatibilidade, cabe ao Tribunal 'a quo' examinar, em consequência, a existência da qualificadora referente ao motivo fútil. Recurso especial conhecido e parcialmente provido." (REsp nº 365⁄PR, Relator Ministro Edson Vidigal, in DJ 10⁄10⁄89) [grifo nosso] Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/processo/jsp/ita/abreDocumento.jsp?num_registro=198900089072&dt_publicacao=10-10-1989&cod_tipo_documento=

Ademais, colaciona-se julgado sobre a compatibilidade da qualificadora do

perigo comum com o dolo eventual:

“PROCESSUAL PENAL. SENTENÇA DE PRONÚNCIA. ART. 408 DO CPP. CRIME DE HOMICÍDIO DA COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI POPULAR. DOLO EVENTUAL. ART. 18, I DO CPB. EXCLUSÃO DA QUALIFICADORA DE PERIGO COMUM (ART. 121, § 2o., III DO CPB) PELO JUIZ PRONUNCIANTE. IMPOSSIBILIDADE, SALVO SE MANIFESTA OU INDISCUTÍVEL A SUA INADMISSIBILIDADE. LIÇÕES DA DOUTRINA JURÍDICA E DA JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS DO PAÍS. 1.Não se permite ao Juiz, na sentença de pronúncia (art. 408 do CPP), excluir qualificadora de crime doloso contra a vida (dolo eventual), constante

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da Denúncia, eis que tal iniciativa reduz a amplitude do juízo cognitivo do Tribunal do Júri Popular, albergado na Constituição Federal; tal exclusão somente se admite quando a qualificadora for de manifesta e indiscutível impropriedade ou descabimento. Lições da doutrina jurídica e da Jurisprudência dos Tribunais do País. 2.Caracteriza-se o dolo do agente, na sua modalidade eventual, quando este pratica ato do qual pode evidentemente resultar o efeito lesivo (neste caso, morte), ainda que não estivesse nos seus desígnios produzir aquele resultado, mas tendo assumindo claramente, com a realização da conduta, o risco de provocá-lo (art. 18, I do CPB). 3.O agente de homicídio com dolo eventual produz, inequivocamente, perigo comum (art. 121, § 2o., III do CPB), quando, imprimindo velocidade excessiva a veículo automotor (165 km⁄h), trafega em via pública urbana movimentada (Ponte JK) e provoca desastre que ocasiona a morte do condutor de automóvel que se deslocava em velocidade normal, à sua frente, abalroando-o pela sua parte traseira. 4.Recurso do Ministério Público a que se dá provimento.” (REsp 912060 / DF, RECURSO ESPECIAL 2006/0268673-2, Relator(a) Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA (1128), Relator(a) p/ Acórdão Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO (1133), Órgão Julgador T5 - QUINTA TURMA, Data do Julgamento 14/11/2007, Data da Publicação/Fonte DJe 10/03/2008) Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sSeq=737865&sReg=200602686732&sData=20080310&formato=HTML

Vem à baila ainda, a questão sobre a qualificadora do inciso IV, in fine, pois

no dolo eventual, não há a premeditação do agente para a prática do delito, o que

seria necessário para a configuração da qualificadora da surpresa que deve ser

interpretada analogicamente as demais hipóteses do inciso. A questão é controversa

entre a jurisprudência, pois o Supremo Tribunal Federal já decidiu pela

incompatibilidade dessa qualificadora com o dolo eventual, enquanto o Superior

Tribunal de Justiça entende ser compatível, senão vejamos:

“Habeas Corpus. 2. Homicídios qualificados. 3. Alegação de excesso de linguagem. Inexistência do vício. 4. Inocorrência de falta de correlação entre a denúncia e a pronúncia. 5. Dolo eventual não se compatibiliza com a qualificadora do art. 121, § 2o , IV (traição, emboscada, dissimulação). 6. Primariedade e bons antecedentes como excludente de prisão preventiva, matéria não conhecida, sob pena de supressão de instância. 7. Precedentes. 8. Ordem parcialmente concedida, para exclusão da qualificadora argüida” (HC 86163 / SP - SÃO PAULO, HABEAS CORPUS, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Julgamento: 22/11/2005, Órgão Julgador: Segunda Turma, Publicação, DJ 03-02-2006 PP-00089,EMENT VOL-02219-5 PP-00848) [grifo nosso] Disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginador/paginador.jsp?docTP=AC&docID=363833

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Em sentido contrário encontra-se o julgamento do Habeas Corpus 58.423/DF, verbis:

“Homicídio qualificado e dolo eventual (compatibilidade). Qualificadora do inciso IV (inexistência). Intimação⁄excesso de linguagem (questões improcedentes). 1.São compatíveis, em princípio, o dolo eventual e as qualificadoras do homicídio. É penalmente aceitável que, por motivo torpe, fútil, etc., assuma-se o risco de produzir o resultado. 2.A valoração dos motivos é feita objetivamente; de igual sorte, os meios e os modos. Portanto estão motivos, meios e modos cobertos também pelo dolo eventual. 3.Inexistência, na hipótese, de antinomia entre o dolo eventual e as qualificadoras do motivo torpe e de recurso que dificultou a defesa das vítimas. 4.No caso, entretanto, ausente está, segundo os elementos dos autos, a qualificadora do inciso IV. 5.Intimação pessoal e excesso de linguagem – questões suscitadas, mas sem procedência. 6.Habeas corpus deferido em parte, a fim de que se exclua do processo a qualificadora do inciso IV do § 2º do art. 121 do Cód. Penal. (...) Os registros de nossa jurisprudência encontrados por mim são deste teor: (I) "não há, no crime de homicídio, incompatibilidade entre dolo eventual e motivo fútil. É possível, por motivo fútil, alguém assumir o risco de produzir o resultado. Afastado, assim, o óbice de tal incompatibilidade, cabe ao Tribunal a quo examinar, em conseqüência, a existência da qualificadora referente ao motivo fútil" (REsp-365, Ministro Edson Vidigal, DJ de 10.10.89); (II) "o dolo eventual pode coexistir com a forma pela qual o crime é executado. Assim, nada impede que o agente, embora prevendo o resultado morte, o aceite e pratique o ato usando de meio que surpreenda a vítima, dificultando ou impossibilitando a defesa, tal o quadro que entremostra nos autos" (REsp-57.586, Ministro Costa Lima, DJ de 25.9.95); (III) "detectada a dificuldade, em face do material cognitivo, na realização da distinção concreta entre dolo eventual e preterdolo, a acusação tem que ser considerada admissível" (REsp-192.049, Ministro Felix Fischer, DJ de 1º.3.99); (IV) "o fato de o agente assumir o risco de produzir o resultado, aspecto caracterizador do dolo eventual, não exclui a possibilidade de o crime ser praticado mediante o emprego de recursos que dificultem ou impossibilitem a defesa da vítima. Precedentes" (HC-36.714, Ministro Gilson Dipp, DJ de 1º.7.05). Há, entre nós, então, precedentes, uns mais antigos, outros modernos, no sentido da compatibilidade entre dolo eventual e qualificadoras do homicídio, por exemplo, segundo os indicados precedentes, em casos de qualificação pelos motivos – fútil – e pelos modos – surpresa. No precedente da relatoria do saudoso Costa Lima, lá se tomou, também, o parecer do então Procurador e hoje Ministro Felix Fischer, e desse longo parecer estou recolhendo estes tópicos: "Se o modelo de conduta proibida admite, pela sua estrutura, o dolo eventual, então qualquer pretensa incompatibilidade só poderá ser reconhecida no plano concreto, pela própria forma de execução do tipo e nunca por conflito interno, apriorístico. Este suposto conflito interno, data venia, não existe. Ora, se o colendo STJ declinou que inexiste qualquer incompatibilidade entre dolo eventual e motivo fútil (circunstância subjetiva), como se pode sustentar o raciocínio de que, a priori, o dolo eventual é incompatível com a qualificadora da surpresa (que tem caráter objetivo)?

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Em se tratando, bem se vê, de elementos tão diversos - o dolo de caráter nitidamente psíquico e a surpresa pertinente ao meio de execução -, impõe-se concluir que não há a mínima incompatibilidade entre ambos." Vasculhei a doutrina, pouco encontrei, bem pouco, especificamente, talvez até porque não a tenha bem vasculhado, mas encontrei, verbi gratia, nas "Lições" de Heleno Fragoso (parte especial, 1877, pág. 69), estes tópicos: "As circunstâncias que qualificam o homicídio estão, evidentemente, cobertas pelo dolo. A qualificação através dos motivos não apresenta dificuldades, pois são hipóteses de maior reprovabilidade, através de componentes subjetivos do comportamento. O mesmo se diga da qualificação ligada ao fim de agir (art. 121, § 2º, V). Não se exige que o agente tenha consciência de que o motivo que o levou a atuar é fútil ou torpe. A valoração dos motivos não depende do réu, fazendo-se objetivamente, segundo os padrões éticos dominantes no meio e no lugar onde o fato ocorreu. Os meios e modos de execução que qualificam o delito, referem-se à exacerbação do ilícito, integrando a figura típica. Assim sendo, são elementos que devem estar cobertos pelo dolo (bastando o dolo eventual), sendo, pois, excluídos pelo erro." Vejam: (I) "a valoração dos motivos não depende do réu, fazendo-se objetivamente"; (II) quanto aos meios (inciso III) e modos (inciso IV), "são elementos que devem estar cobertos pelo dolo (bastando o dolo eventual)". E mais: se dolo é, ao mesmo tempo, representação e vontade – vontade dirigida ao resultado, também a vontade de quem assume o risco de produzir o resultado, lá dolo direto, cá dolo eventual, conforme, entre outros, Hungria (vol. I, tomo II, págs. 114 e segs.) –, então confiramos esta conclusão de acórdão estadual (constante do parecer nos autos do REsp-365, de 1989, citado): "Ora, se dolo é vontade e representação não se vê porque aquele que, apesar da previsão do resultado, persiste em seu comportamento não possa fazê-lo por motivo fútil. A futilidade do motivo, vale dizer o móvel que impele o comportamento do agente ativo, tanto pode ocorrer no dolo direto, como no eventual. No denominado dolo eventual o agente tem consciência da ilicitude de seu comportamento e vontade de praticar o ato. O resultado não é representado como certo, mas como possível. Mas o agente prefere que ele ocorra, a desistir do seu ato..." Escreveu Dotti ("Enciclopédia Saraiva do Direito", São Paulo, 1977, vol. 53, pág. 320): "Cumpre, porém, não confundir o motivo com o dolo. Aquele pode ser classificado como social ou anti-social (que perante a ética se designarão como moral ou imoral, nobre e ignóbil) e no campo legal é tratado como jurídico e anti-jurídico, legítimo e ilegítimo, escusável e não-escusável, conforme a doutrina de Ferri." Há, portanto, precedentes nossos tanto em relação aos motivos (incisos I e II) quanto em referência aos modos (inciso IV). De igual maneira, há boa – se não excelente – doutrina. Isto é, há conceitos de ordem jurisprudencial e de caráter doutrinal segundo os quais não são antinômicos dolo eventual e qualificadoras do homicídio. Torno, pois, ao parecer de Fischer, no precedente de 1995: "... inexiste qualquer incompatibilidade entre dolo eventual e motivo fútil (circunstância subjetiva), como se pode sustentar o raciocínio de que, a priori, o dolo eventual é incompatível com a qualificadora da surpresa (que tem caráter objetivo)?" Confiram, ainda, Toledo no REsp-365, de 1989: "Alguém, por motivo fútil, pode assumir o risco de produzir o resultado. Por essas razões, afasto a alegada incompatibilidade entre o motivo fútil e o dolo eventual." Diante dos conceitos a cujo propósito fui refletindo à medida que aqui os resumia, estou assumindo posição a favor da compatibilidade entre dolo eventual e qualificadoras, contudo, no caso sob nosso exame, não creio

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penalmente existente, valendo-me da denúncia e do acórdão, a qualificadora do inciso IV, ei-la segundo as respectivas descrições:” (HC 58423 / DF, HABEAS CORPUS 2006/0093270-6, Relator(a) Ministro NILSON NAVES (361), Órgão Julgador T6 - SEXTA TURMA, Data do Julgamento 24/04/2007, Data da Publicação/Fonte DJ 25/06/2007 p. 304) [grifo nosso] Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sSeq=681636&sReg=200600932706&sData=20070625&formato=HTML

E ainda: “PROCESSUAL E PENAL. HOMICÍDIO. DOLO EVENTUAL E SURPRESA. COEXISTÊNCIA. I - O dolo eventual pode coexistir com a forma pela qual o crime e executado. Assim, nada impede que o agente, embora prevendo o resultado morte, o aceite e pratique o ato usando de meio que surpreenda a vítima, dificultando ou impossibilitando a defesa, tal o quadro que entremostra nos autos. II - RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO.” (RESP 57.586⁄PR, Min. JESUS COSTA LIMA, DJ de 25⁄09⁄1995) “CRIMINAL. HC. HOMICÍDIOS QUALIFICADOS. PRONÚNCIA. EXCESSO DE LINGUAGEM. INVASÃO DA COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. VÍCIOS NÃO VISLUMBRADOS. FALTA DE CORRELAÇÃO ENTRE A DENÚNCIA E A PRONÚNCIA. INOCORRÊNCIA. DELITOS DE TRÂNSITO. ESTADO DE EMBRIAGUEZ. CULPA CONSCIENTE. IMPROPRIEDADE. QUALIFICADORA. ÓBICE À DEFESA DA VÍTIMA. INCOMPATIBILIDADE COM O DOLO EVENTUAL. IMPROCEDÊNCIA DA ALEGAÇÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. ORDEM DENEGADA. Não se verifica qualquer ilegalidade na pronúncia exarada contra o paciente, a qual foi restrita à exposição do juízo de admissibilidade da acusação, assim como determina o Código de Processo Penal. Convicto, o Magistrado, a respeito da materialidade do delito doloso contra a vida e das evidências da autoria, rechaçou a tese defensiva relacionada à culpa consciente e acolheu a imputação concernente ao dolo eventual. A pronúncia não ultrapassou a barreira do juízo de admissibilidade da acusação, não se mostrando apta a influenciar ou invadir a competência do Conselho de Sentença. Somente quando evidente a inexistência de crime ou de que haja indícios de autoria – em decorrência de circunstâncias demonstradas de plano e estreme de dúvidas – tão-somente assim, o Julgador pode deixar de pronunciar o acusado. Não se admite a apontada inexistência de correlação entre a denúncia e a decisão que submeteu o paciente ao Tribunal Popular, pois, além de restar evidenciada a correspondência entre a situação fática constante das referidas peças, não se vislumbrou, sequer, a alteração da classificação jurídica dos fatos imputados ao paciente. O exame, na via eleita, da caracterização de dolo eventual ou de culpa, ocasionaria o revolvimento do conjunto fático-probatório. Precedentes. O fato de o agente assumir o risco de produzir o resultado, aspecto caracterizador do dolo eventual, não exclui a possibilidade de o crime ser praticado mediante o emprego de recursos que dificultem ou impossibilitem a defesa da vítima. Precedentes. As qualificadoras só podem ser excluídas quando, de forma incontroversa, mostrarem-se absolutamente improcedentes, sem qualquer apoio nos autos – o que não se vislumbra no caso. Ordem denegada.” (HC 36714 / SP, HABEAS CORPUS 2004/0097475-3, Relator(a) Ministro GILSON DIPP (1111), Órgão Julgador T5 - QUINTA TURMA, Data do Julgamento 16/06/2005, Data da Publicação/Fonte DJ 01/07/2005 p. 572) [grifo nosso] Disponível em:

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https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sSeq=558624&sReg=200400974753&sData=20050701&formato=HTML "PROCESSUAL E PENAL. HOMICÍDIO. DOLO EVENTUAL E SURPRESA. COEXISTÊNCIA. I. O dolo eventual pode coexistir com a forma pela qual o crime é executado. Assim, nada impede que o agente, embora prevendo o resultado morte, o aceite e pratique o ato usando de meio que surpreenda a vítima, dificultando ou impossibilitando a defesa, tal o quadro que entremostra nos autos. II Recurso especial conhecido e provido." (REsp nº 57.586⁄PR, Relator Ministro Jesus Costa Lima, in DJ 25⁄9⁄95) [grifo nosso] Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/processo/jsp/ita/abreDocumento.jsp?num_registro=199400371020&dt_publicacao=25-09-1995&cod_tipo_documento= "CRIMINAL. HC. HOMICÍDIOS QUALIFICADOS. PRONÚNCIA. EXCESSO DE LINGUAGEM. INVASÃO DA COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. VÍCIOS NÃO VISLUMBRADOS. FALTA DE CORRELAÇÃO ENTRE A DENÚNCIA E A PRONÚNCIA. INOCORRÊNCIA. DELITOS DE TRÂNSITO. ESTADO DE EMBRIAGUEZ. CULPA CONSCIENTE. IMPROPRIEDADE. QUALIFICADORA. ÓBICE À DEFESA DA VÍTIMA. INCOMPATIBILIDADE COM O DOLO EVENTUAL. IMPROCEDÊNCIA DA ALEGAÇÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. ORDEM DENEGADA. Não se verifica qualquer ilegalidade na pronúncia exarada contra o paciente, a qual foi restrita à exposição do juízo de admissibilidade da acusação, assim como determina o Código de Processo Penal. Convicto, o Magistrado, a respeito da materialidade do delito doloso contra a vida e das evidências da autoria, rechaçou a tese defensiva relacionada à culpa consciente e acolheu a imputação concernente ao dolo eventual. A pronúncia não ultrapassou a barreira do juízo de admissibilidade da acusação, não se mostrando apta a influenciar ou invadir a competência do Conselho de Sentença. Somente quando evidente a inexistência de crime ou de que haja indícios de autoria – em decorrência de circunstâncias demonstradas de plano e estreme de dúvidas – tão-somente assim, o Julgador pode deixar de pronunciar o acusado. Não se admite a apontada inexistência de correlação entre a denúncia e a decisão que submeteu o paciente ao Tribunal Popular, pois, além de restar evidenciada a correspondência entre a situação fática constante das referidas peças, não se vislumbrou, sequer, a alteração da classificação jurídica dos fatos imputados ao paciente. O exame, na via eleita, da caracterização de dolo eventual ou de culpa, ocasionaria o revolvimento do conjunto fático-probatório. Precedentes. O fato de o agente assumir o risco de produzir o resultado, aspecto caracterizador do dolo eventual, não exclui a possibilidade de o crime ser praticado mediante o emprego de recursos que dificultem ou impossibilitem a defesa da vítima. Precedentes. As qualificadoras só podem ser excluídas quando, de forma incontroversa, mostrarem-se absolutamente improcedentes, sem qualquer apoio nos autos – o que não se vislumbra no caso. Ordem denegada." (HC nº 36.714⁄SP, Relator Ministro Gilson Dipp, in DJ 1º⁄7⁄2005) [grifo nosso] Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sSeq=558624&sReg=200400974753&sData=20050701&formato=HTML

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Na doutrina, Fernando Capez, compartilha do entendimento do Supremo

Tribunal Federal, entende ser incompatível o homicídio com dolo eventual e a

qualificadora da surpresa, “pois é necessário que o agente tenha a vontade de

surpreender a vítima.” (2007, p. 58).

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6. CONCLUSÃO

Podemos concluir que a compatibilidade das qualificadoras no homicídio

com dolo eventual, dependerá de uma análise das circunstâncias concretas de cada

caso.

Conforme fora demonstrado no decorrer do presente trabalho, não é pacífico

dentro da doutrina e jurisprudência sobre a compatibilidade ou não, das

qualificadoras no homicídio com dolo eventual. Para alguns não há compatibilidade

entre as circunstâncias qualificadoras de caráter subjetivo com o dolo eventual, pois

uma vez que no dolo eventual, o agente apenas anui com a ocorrência do resultado,

ele não poderia agir motivado pelas circunstâncias de caráter subjetivo dos incisos I,

II, e V, do §2º, do artigo 121, do Código Penal.

No entanto, observou-se nos julgados supracitados que não é unânime o

entendimento acerca dessa incompatibilidade, pois segundo o entendimento do

Superior Tribunal de Justiça, a priori são compatíveis as circunstâncias

qualificadoras do inciso IV, que é de caráter objetivo, enquanto para o Supremo

Tribunal Federal essa qualificadora é incompatível com o dolo eventual.

Pois bem, compartilhamos do entendimento do Superior Tribunal de Justiça,

haja vista que o agente mesmo agindo com dolo eventual quando na prática do

homicídio, não esta afastada a possibilidade de que o mesmo aja de modo que

dificulte ou impossibilite a defesa da vítima.

Ademais, no tocante as demais circunstâncias qualificadoras, verifica-se que

do mesmo modo que a circunstância do inciso IV, não há incompatibilidade,

devendo desse modo ser analisado de acordo com as circunstâncias de cada caso

concreto.

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7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro, volume 2: parte especial (arts. 121 a 361), 2ª ed. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2007.

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