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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Daniele Dembiski Good COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA E A EFICÁCIA LIBERATÓRIA GERAL DO TERMO CONCILIATÓRIO CURITIBA 2011

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

Daniele Dembiski Good

COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA E A EFICÁCIA LIBERATÓRIA GERAL DO TERMO CONCILIATÓRIO

CURITIBA

2011

COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA E A EFICÁCIA

LIBERATÓRIA GERAL DO TERMO CONCILIATÓRIO

Curitiba

2011

Daniele Dembiski Good

COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA E A EFICÁCIA

LIBERATÓRIA GERAL DO TERMO CONCILIATÓRIO Monografia apresentada ao Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. Dr. Renato Luiz de Avelar Bandini.

CURITIBA

2011

TERMO DE APROVAÇÃO

Daniele Dembiski Good

COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA E A EFICÁCIA LIBERATÓRIA GERAL DO TERMO CONCILIATÓRIO

Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do título de Bacharel em Direito, pela seguinte Banca Examinadora do Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, 14 de março de 2011.

______________________________________

Prof. Dr. Eduardo de Oliveira Leite Coordenador do Núcleo de Monografia

Universidade Tuiuti do Paraná

______________________________________

Orientador: Prof. Dr. Renato Luiz de Avelar Bandini Universidade Tuiuti do Paraná

Prof. Dr. _____________________________ Universidade Tuiuti do Paraná

Prof. Dr. _____________________________ Universidade Tuiuti do Paraná

Agradecimentos

Primeiramente agradeço a Deus por conceder-me a vida, saúde e força para lutar por meus objetivos. A minha mãe Rosângela pelo exemplo de vida e alegria, características estas que a tornam uma pessoa única e querida por todos. Ao meu esposo Reginaldo, pelo amor, compreensão, apoio e até alguns puxões de orelha. Ao meu irmão Ricardo, companheiro e amigo, meu orgulho. A minha sobrinha e afilhada Lavínia, um presente de Deus em nossa família. Ao professor Renato pela atenção, tempo e principalmente paciência em todos os momentos e também por seu excelente trabalho como professor e orientador. Por fim, agradeço a todos aqueles que direta ou indiretamente colaboraram de alguma forma para a realização da presente monografia.

A justiça atrasada não é justiça; senão injustiça qualificada e manifesta.

Rui Barbosa

RESUMO

O presente trabalho tem por escopo oferecer um estudo a respeito da Lei nº 9.958, de 12 de janeiro de 2000, que alterou e acrescentou artigos à Consolidação das Leis do Trabalho (625-A a 625-H), introduzindo a figura das Comissões de Conciliação Prévia no ambiente das empresas ou dos sindicatos, com a finalidade de buscar a composição dos conflitos individuais de trabalho. A principal função atribuída a este instituto foi proporcionar ao trabalhador a resolução de litígios trabalhistas de forma célere, sem a intervenção do Judiciário, bem como desafogar a Justiça do Trabalho do excessivo número de processos. Arrazoa os principais aspectos deste mecanismo e, principalmente debate o artigo 625-E, parágrafo único, da CLT. Os efeitos da eficácia liberatória geral do termo conciliatório teriam o condão de garantir a imutabilidade da coisa julgada, assim como no Judiciário? Ademais, como fonte utiliza a pesquisa bibliográfica e jurisprudencial. Palavras-chave: Comissão de Conciliação Prévia; conflitos trabalhistas; métodos extrajudiciais; eficácia liberatória geral.

ROL DE ABREVIATURAS OU DE SIGLAS

Art.

CF

CCP

CLT

STF

TRCT

TRT

TST

OIT

OJ

Artigo

Constituição Federal

Comissão de Conciliação Prévia

Consolidação das Leis Trabalhistas

Superior Tribunal Federal

Termo de rescisão do contrato de trabalho

Tribunal Regional do Trabalho

Tribunal Superior do Trabalho

Organização Internacional do Trabalho

Orientação jurisprudencial

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 10 2. ANTECEDENTES HISTÓRICOS .......................................................................... 13 3. DIREITO INTERNACIONAL ................................................................................. 16

3.1 OIT ............................................................................................................................... 16

3.2 DIREITO COMPARADO ............................................................................................ 17

3.2.1 Argentina .................................................................................................................. 18

3.2.2 Austrália .................................................................................................................... 18

3.2.3 Espanha.................................................................................................................... 19

3.2.4 Estados Unidos ........................................................................................................ 19

3.2.5 Portugal .................................................................................................................... 20

3.2.6 Uruguai ..................................................................................................................... 20

4. FORMAS DE SOLUÇÃO DOS CONFLITOS TRABALHISTAS ........................... 21

4.1 AUTODEFESA ............................................................................................................ 21

4.2 AUTOCOMPOSIÇÃO ................................................................................................. 22

4.3 HETEROCOMPOSIÇÃO ........................................................................................... 23

4.3.1 Mediação .................................................................................................................. 24

4.3.2 Arbitragem e negociação coletiva prévia .............................................................. 25

4.3.3 Jurisdicional.............................................................................................................. 27

5. AS COMISSÕES DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA: LEI 9.958/2000 .......................... 28

5.1 FUNÇÃO E NATUREZA JURÍDICA ......................................................................... 28

5.2 OBJETIVOS ................................................................................................................ 30

5.3 PRINCÍPIOS NORTEADORES ................................................................................. 31

5.4 CONSTITUCIONALIDADE DAS COMISSÕES DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA ...... 32

5.4.1 Obrigatoriedade ou mera faculdade da passagem pela CCP ............................ 33

6. A EFICÁCIA LIBERATÓRIA GERAL DO TERMO DE QUITAÇÃO ..................... 38

6.1 OPINIÕES DIVERGENTES ....................................................................................... 42

6.2 A ASSISTÊNCIA NA RESCISÃO CONTRATUAL .................................................. 45

6.2.1 Súmula 41 do TST ................................................................................................... 47

6.3 COMPARAÇÃO ENTRE OS ARTIGOS 477, § 2º e 625-E da CLT ...................... 48

6.4 O TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL .............................................................. 50

6.5 EFICÁCIA LIBERATÓRIA / QUITAÇÃO GERAL .................................................... 51

7. CONCLUSÃO ....................................................................................................... 53

8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................... 57 9. ANEXOS ............................................................................................................... 59

10

1. INTRODUÇÃO

Os conflitos decorrentes das relações de trabalho no Brasil aumentam a

cada dia, dificultando a administração da Justiça e trazendo inúmeros prejuízos aos

trabalhadores, aos empresários e ao Estado.

Otavio Brito Lopes pondera que:

“Os custos sociais e econômicos que derivam dessa litigiosidade e da judiciarização exacerbada de sua solução, atinge em primeiro lugar o trabalhador, que além do ônus com as despesas do processo (locomoção para as audiências, honorários de advogado, etc.), se vê privado, por períodos cada vez mais longos, de tramitação processual, de direitos de natureza alimentar. O empregador, a seu turno, além do risco de acumular passivos trabalhistas comprometedores da saúde econômica da empresa, também tem que arcar com os custos do processo, tais como advogados, afastamento do trabalho de prepostos e testemunhas a fim de comparecer às audiências, custas, depósito prévio para recurso, etc., que se refletem no custo final do seu produto ou serviço. O Estado, por fim, arca com o custo econômico da manutenção de uma grande e pesada máquina judiciária; com uma função tão essencial como a jurisdição; e com o custo social de ter que, todos os anos, desviar dos programas sociais grandes somas da receita pública para dotar a máquina judiciária de recursos materiais e humanos essenciais à função jurisdicional”. [grifo nosso] (2000, p. 13-14).

Ademais, a morosidade para resolução de tais conflitos perante a Justiça do

Trabalho gera insatisfação aos sujeitos da relação (empregado/empregador) e

também demonstra que o apego exclusivo à via jurisdicional tem produzido

resultados danosos para todos.

Zoraide Amaral de Souza comenta:

“Em nossa época [...], paralelamente ao questionamento da eficiência do Judiciário, cresce a busca por meios alternativos de solução de conflitos, não apenas para escapar do custo e da morosidade da justiça estatal, mas também, e principalmente, para alcançar soluções mais justas e adequadas aos interesses dos litigantes, que nem sempre são aquelas que podem emanar de juiz técnico que manuseia, preponderantemente, a lei”. (2004, p. 19).

Neste contexto, Sérgio Pinto Martins explana que a maioria das reclamações

trabalhistas não é complexa, sendo que cerca de 60% delas resulta em acordo. Há

estatísticas que indicam que na primeira audiência há acordos, em média, 40% das

11

reclamações trabalhistas, porque os empregados preferem resolver a questão

naquele momento, mesmo abrindo mão de seus direitos, do que [sic] ter que esperar

muito tempo até a próxima audiência ou sentença. (2008, p. 5).

Em nome de diversos princípios, tais como celeridade, razoável duração do

processo, economia processual e buscando adaptar-se à nova realidade é que foi

criada a Lei nº 9.958, de 12 de janeiro de 2000, que alterou e acrescentou artigos à

Consolidação das Leis do Trabalho (625-A a 625-H), introduzindo a figura das

Comissões de Conciliação Prévia no âmbito das empresas ou dos sindicatos, com a

finalidade de buscar a composição dos conflitos individuais de trabalho.

As Comissões de Conciliação Prévia, também conhecidas por Câmaras de

Conciliação Prévia, têm por escopo resolver amigavelmente e extrajudicialmente os

conflitos individuais decorrentes da relação de emprego, de forma alternativa.

Contudo, nem todas as categorias profissionais implantaram tais Câmaras, fazendo

com que a tarefa de conciliar ainda fique à mercê do Poder Judiciário.

Tal modificação gerou diversas controvérsias na doutrina e na jurisprudência

trabalhista, de forma a suscitar inclusive a alegação de inconstitucionalidade de seus

dispositivos, haja vista contrariarem o princípio constitucional da inafastabilidade do

controle jurisdicional ou do direito de ação (artigo 5º, XXXV da Constituição Federal),

gerando dessa forma, um obstáculo no acesso ao Poder Judiciário.

Outro ponto controverso é a eficácia do termo conciliatório. Afinal, este termo

firmado entre as partes (empregado e empregador), perante as Comissões de

Conciliação Prévia, tem o poder de liberar o devedor das obrigações trabalhistas,

permitindo, porém, que sejam nele consignadas ressalvas quanto às parcelas

expressamente mencionadas no documento, conforme prevê o parágrafo único do

artigo 625-E da Consolidação das Leis de Trabalho?

12

Alguns, como se verificará adiante, defendem a constitucionalidade do

instituto, já que, além de desafogar a Justiça do Trabalho e descentralizar o sistema

de composição dos conflitos, representam um avanço nas relações trabalhistas.

Nos ensinamentos de Altamiro J. dos Santos,

“É a Comissão, sem dúvida, o produto de pesquisas, estudos e análises que objetivam encontrar um remédio jurídico e social extrajudicial para estabelecer equilíbrio e paz nas relações profissionais e sociais entre os sujeitos da relação de emprego: trabalhador e empregador, solucionando seus interesses de forma célere, prática, informal e prevenindo controvérsia ou conflito perante a Justiça do Trabalho, reservando-a para atuar em quaestio facti et quaestio juris de alta indagação ou complexidade jurídica”. [grifo do autor] (2001, p. 37)

A verdade é que, embora haja consenso quanto à importância da Comissão

de Conciliação Prévia como mecanismo de solução extrajudicial de conflitos, ainda

hoje, é objeto de controvérsias na Justiça do Trabalho e de questionamentos

doutrinário e jurisprudencial.

Se de um lado o trabalhador carece da assistência do Estado para a

garantia de decisões justas, de outro, argumenta-se que o Direito Processual precisa

transformar-se para solucionar de forma célere as demandas trabalhistas.

Diante deste panorama, faz-se necessário entender o que são as Comissões

de Conciliação Prévia e qual seu papel perante as relações trabalhistas no Brasil.

Posteriormente, será analisada sua eficácia e abordado o enquadramento na

conjuntura jurídica atual.

13

2. ANTECEDENTES HISTÓRICOS

O surgimento do instituto da conciliação remonta ao surgimento do próprio

ser humano. E ele é tão antigo, porque antigos são os conflitos entre os seres

humanos. E esses conflitos podem surgir em virtude das mais variadas situações.

Assim, a conciliação é tão antiga quanto o interesse dos homens em resolver,

pacificamente, os seus conflitos, envolvendo bens ou utilidades da vida (TEIXEIRA,

2003, p. 19).

Há registro dos antecedentes históricos do instituto da conciliação entre os

hebreus, nas leis da Grécia antiga, nas leis das XII Tábuas, em [sic] França, nos

Conselhos de Prud´hommes, restabelecidos por Napoleão I. (SANTOS, 2001, p.

158).

O livro III, Título XX, § 1º das Ordenações do Reino previa que “no começo

da demanda dirá o juiz a ambas as partes, que antes que façam despesas, e sigam

entre elas ódios e dissensões, se devem concordar, e não gastar suas fazendas por

seguirem suas vontades, porque o vencimento da causa sempre é duvidoso. E isto,

que dizemos, de reduzirem as partes a concórdia, não é de necessidade, mas

somente honestidade nos casos, em que o bem puderem fazer”. (MARTINS, 2008,

p. 1).

Altamiro J. dos Santos confirma que “a conciliação é uma fonte histórica no

Direito pátrio”. Estava presente no tempo das Ordenações do Reino, bem como na

Constituição do Império de 1824 e no Regulamento nº 737, de 1850 e considerada

formalidade indispensável ao processo. Ademais, complementa:

A Constituição Imperial de 1824, art. 161, estabelecia: “Sem se fazer constar que se tem intentado o meio de reconciliação, não se começará processo algum”. No mesmo sentido era o Regulamento nº 737, de 1850, art. 23, verbis: “Nenhuma causa comercial seria proposta em juízo contencioso, sem que previamente se tivesse tentado o meio de

14

conciliação, ou por ato judicial, ou por comparecimento voluntário das partes”. [grifos do autor] (2001, p. 161).

Wilson de Campos Batalha (citado por SANTOS, 2001, p. 161) comenta que:

“A Consolidação das Leis do Processo Civil, elaborada pelo Conselheiro Antônio

Joaquim Ribas, que teve força de lei, prescrevia no art. 185: ‘Em regra nenhum

processo pode começar sem que se faça constar que se tem intentado o meio de

conciliação perante o Juiz de Paz’”.

A Lei 9.958/2000 teve origem em proposta do Tribunal Superior do Trabalho,

o qual estava preocupado com o grande número de ações trabalhistas propostas na

Justiça do Trabalho todos os anos.

Sérgio Pinto Martins comenta que “o projeto original previa a obrigatoriedade

da instituição das comissões nas empresas com mais de 50 empregados. A

facultatividade das comissões foi estabelecida na Comissão do Trabalho da Câmara

dos Deputados”. E faz a seguinte anotação:

“A Presidência da República encampou o referido projeto, encaminhando à Câmara dos Deputados, por meio da mensagem nº 500, de 28 de julho de 1998. Ela resultou no projeto de Lei nº 4.694/98. Na Câmara dos Deputados a lei foi aprovada com 282 votos favoráveis, 90 contrários e uma abstenção, totalizando 373 votos. Posteriormente foi convertido na Lei nº 9.958, de 12-1-2000, que acrescentou os arts. 625-A a 625-H à CLT, estabelecendo regras sobre as Comissões de Conciliação Prévia”. (2008, p. 6).

No Brasil, a aludida lei puxou do Direito Processual para o Direito Individual

do Trabalho, o princípio da conciliabilidade, ao tornar obrigatória a tentativa de

solução extrajudicial dos conflitos da relação individual de emprego por seus

próprios sujeitos, sob o estímulo de organismos criados pela empresa, pelas

representações sindicais dos respectivos segmentos de produção e trabalho, ou

pela conjugação de ambos. [grifo do autor] (PINTO, 2007, p. 77).

15

O acréscimo de letras junto aos artigos tem por escopo inicial evitar a

renumeração de artigos, modificação de títulos e capítulos. É a forma de atender ao

disposto na alínea b do inciso III, do artigo 12 da Lei Complementar nº 95/981.

Estabeleceu a Portaria nº 329, de 14 de agosto de 20022, procedimentos

para a instalação e o funcionamento das Comissões de Conciliação Prévia e

Núcleos Intersindicais de Conciliação Trabalhista.

A Constituição Federal de 1988 em seu artigo 98, inciso II, prevê que:

A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão: [...] II - justiça de paz, remunerada, composta de cidadãos eleitos pelo voto direto, universal e secreto, com mandato de quatro anos e competência para, na forma da lei, celebrar casamentos, verificar, de ofício ou em face de impugnação apresentada, o processo de habilitação e exercer atribuições conciliatórias, sem caráter jurisdicional, além de outras previstas na legislação. [grifo nosso] [...]

Como se pode observar, a conciliação sempre esteve presente no Direito do

Trabalho como uma importante alternativa para resolução de conflitos trabalhistas.

Neste contexto, como diria Arion Sayão Romita (citado por SANTOS, 2001, p. 38) “o

órgão conciliador é um importante canal de exercício da cidadania, da dignidade

humana, dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (CF, art. 1º, II a IV), para

conviviologia e harmonia entre os agentes produtores do trabalho e do capital no

Estado Democrático de Direito”.

1 Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre a elaboração, a redação, alteração e a consolidação das leis, conforme determina o parágrafo único do art. 59 da Constituição Federal, e estabelece normas para a consolidação dos atos normativos que menciona. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp95.htm. Acesso em: 07 fev. 2011. 2 Disponível em: http://www.mte.gov.br/legislacao/portarias/2002/p_20020814_329.asp. Acesso em: 07 fev. 2011.

16

3. DIREITO INTERNACIONAL

3.1 OIT

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) manifestou-se a respeito da

prática da conciliação em suas Recomendações.

O artigo 8º da Convenção nº 158 da Organização Internacional do Trabalho3

não trata exatamente de Comissão de Conciliação, mas de que o trabalhador que

considerar injustificado o término de sua relação de trabalho terá o direito de recorrer

contra tal determinação perante um organismo neutro, como, por exemplo, um

tribunal, um tribunal do trabalho, uma junta de arbitragem ou um árbitro.

A Recomendação nº 92 da OIT, de 1951, indica a criação de organismos de

conciliação voluntária dos conflitos do trabalho, apropriado às condições nacionais,

com o objetivo de contribuir para a prevenção e solução dos conflitos de trabalho

entre empregadores e trabalhadores, com representantes das partes. (MARTINS,

2008, p. 8).

Já a Recomendação nº 94, propõe a criação de organismos de consulta e

colaboração entre os empregadores e trabalhadores, de âmbito empresarial, cuja

competência deveria excluir apenas as controvérsias trabalhistas inseridas no

campo da negociação coletiva. (ibid., p. 8).

Por fim, a Recomendação nº 130, de 1967, que trata de solução de conflitos

de forma autônoma dentro da empresa, incentivou a adoção de procedimentos que

possibilitem ao empregador e ao empregado a obtenção de acordo pela livre

3 BRASIL. Decreto nº 1855, de 10 de abril de 1996. Promulga a Convenção 158 sobre o término da relação de trabalho por iniciativa do empregador, de 22 de junho de 1982. Disponível em: http://www.mte.gov.br/rel_internacionais/conv_158.pdf. Acesso em: 05 jan. 2011.

17

manifestação de suas vontades, fazendo menção expressa à possibilidade de se

instituir mecanismos de conciliação na seara pública. (SAUMA, 2003, p. 37)4.

A OIT, contudo, não recomenda a adoção de instrumentos de conciliação

prévia de forma irrestrita. Apesar de considerar que a conciliação promovida

diretamente pelas partes pode ser vantajosa para o trabalhador, à medida que o

esclarecimento de dúvidas e a apuração dos fatos pertinentes à relação de emprego

podem ser facilitados pela aproximação com o ambiente do trabalho, onde os fatos

ocorreram e, na maioria dos casos, onde os documentos se encontram, a OIT dá

ênfase à criação de instrumentos extrajudiciais viabilizadores da conciliação

voluntária/facultativa, relegando para segundo plano a conciliação obrigatória. (ibid.,

p. 37-38).

3.2 DIREITO COMPARADO

Na legislação estrangeira será encontrada a divisão da arbitragem,

principalmente, sob o ângulo de ser facultativa ou voluntária (voluntary arbitration),

em que as próprias partes escolhem livremente como forma de solucionar seus

conflitos, e obrigatória (compulsory arbitration), imposta pela respectiva legislação

(MARTINS, 2010, p. 69).

José Roberto Freire Pimenta5 comenta:

“Embora o exame comparatístico possa não ser conclusivo (em virtude das peculiaridades da tradição cultural e jurídica de cada país), é bem verdade que os problemas que se buscou solucionar em nosso País com a Lei nº 9.958/2000 são comuns a todos os países que, nos dias atuais, são do

4 Comissões de Conciliação Prévia: Quando o Direito enfrenta a realidade: análises críticas em memória de Alaor Satuf Rezende. Coordenadores: RENAULT, Luiz Otávio Linhares; VIANA, Márcio Túlio. São Paulo: LTr, 2003. SAUMA, Ana Sofia Rezende. Artigo: A Conciliação dos Conflitos Individuais Trabalhistas no Direito Comparado. 5 ibid. Artigo: A Constitucionalidade da exigência de tentativa de conciliação extrajudicial para ajuizamento da ação trabalhista e da eficácia liberatória geral do respectivo termo de conciliação (arts. 625-D e 625-E, parágrafo único, da CLT).

18

ponto de vista político e jurídico Estados Democráticos de Direito e, economicamente, estão estruturados de acordo com o modo capitalista de produção (uniformemente reconhecendo em favor de seus trabalhadores uma gama variada de direitos de direitos fundamentais de natureza social e, todos os seus cidadãos, o direito fundamental de recorrer ao Poder Judiciário para a tutela efetiva de seus direitos)”. (2003, p. 130).

3.2.1 Argentina

A instituição da conciliação obrigatória no âmbito trabalhista neste país, pela

lei, foi fruto de uma experiência de acordo sindical, denominado “El Acuerdo Marco

para el Empleo, la Productividad y la Equidad Social”, firmado em 25 de julho de

1994, e que significou a experiência tripartite mais importante verificada naquele

país para concertar as pautas básicas dos instrumentos legais de ordem trabalhista

(SOUZA, 2004, p. 100).

Este acordo firmado pelos segmentos dos trabalhadores e dos

empregadores fez, além da Lei sobre Conciliación Laboral Obrigatória, outras de

importância significativa, como a de Riesgos Del Trabalho (Lei 24.857), Período de

Prueba y Contratos Promovidos (Lei 24.465), Pequena Empresa (Lei 24.467), etc.

3.2.2 Austrália

A arbitragem é obrigatória, assemelhando-se ao sistema jurisdicional, pois os

laudos valem como sentenças. Os tribunais de arbitragem são órgãos quase

judiciais. Os laudos arbitrais (awards) têm o mesmo valor das sentenças normativas.

Havendo impasse, a arbitragem passa a ser compulsória. Os laudos nacionais são

aplicados aos profissionais da categoria do país. Os laudos estaduais têm por base

mínima o que já foi determinado no âmbito nacional. (MARTINS, 2010, p. 69).

19

3.2.3 Espanha

Sérgio Pinto Martins descreve que neste país, existe o sistema de mediação,

arbitragem e conciliação que pode ser realizado nos órgãos indicados pelos

convênios coletivos.

A Ley de Procedimiento Laboral, de 1990, que foi reformulada pelo Real

Decreto legislativo nº 2/95, determina que o direito de ingresso em juízo fica

submetido à tentativa de conciliação, sendo carecedora da ação a parte que

ingressar com reclamação judicial sem provar que antes houve tentativa de

conciliação extrajudicial (2008, p. 9).

3.2.4 Estados Unidos

Zoraide Amaral de Souza explica que a conciliação neste país é usada em

algumas situações como sinônimo da mediação, porém, muitas vezes, é um

processo menos formal, com papel menos ativo do sujeito neutro. Comenta ainda,

que a diferença está no fato de que na conciliação o litígio já existe, já está posto,

enquanto a mediação previne as diferenças, as divergências existentes entre os

litigantes (2004, p. 84).

Resnik (1997, id., 2004, p.84-85) comenta que em estudos realizados pela

Professora Cooper Alexander em algumas conciliações, em class actions, sobre

valores mobiliários, chegou-se à conclusão de que nos Estados Unidos há um

mercado de conciliações.

20

O Civil Rights Act, de 19916, incentiva o uso de meios alternativos como

negociação de acordos, conciliação, facilitação, mediação, fact-finding, minitrials e

arbitragem.

3.2.5 Portugal

Zoraide Amaral de Souza apresenta duas situações que ocorrem no sistema

português (2004, p. 154):

A primeira, diz respeito à conciliação, cujas regras deverão estar presentes

em convenção coletiva de trabalho anterior, da categoria profissional, isto é, a

conciliação a ser realizada já terá pré-estabelecido o seu procedimento.

A segunda situação ocorrerá quando não houver previsão em convenção

coletiva do trabalho anterior. Neste caso, a conciliação poderá ser promovida de

acordo com as normas contidas nos artigos 509 e 1.407, do Decreto-Lei nº 375-A,

de 20 de setembro de 1999, isto é, de comum acordo das partes ou por somente

uma delas quando a outra não se manifestar sobre a proposta da celebração ou da

revisão da convenção coletiva.

3.2.6 Uruguai

De acordo com o Decreto-lei nº 14.188, de 5 de abril de 1974, não é possível

iniciar um processo judicial trabalhista se antes não houver a tentativa de conciliação

prévia perante o Ministerio de Trabajo y de Seguridad Social (NASCIMENTO, 2009,

p. 1.373). 6 A lei de direitos civis é um estatuto dos Estados Unidos que foi passado em resposta a uma série de decisões da Suprema Corte dos Estados Unidos que limita os direitos dos trabalhadores que processaram seus empregadores por discriminação. O ato representou o primeiro esforço desde a aprovação da lei de direitos civis de 1964 para modificar alguns dos procedimentos básicos e direitos substantivos fornecidos por lei federal em casos de discriminação de emprego. Disponível em: http://en.wikipedia.org/wiki/Civil_Rights_Act_of_1991. Acesso em: 05 mar. 2011.

21

4. FORMAS DE SOLUÇÃO DOS CONFLITOS TRABALHISTAS

O vocábulo “conflito”, de conflictus, significa combater, lutar, designa

posições antagônicas (NASCIMENTO, 2010, p. 481).

O Ministro Ildélio Martins, (1998, citado por Pinto, 2007, p. 751) considera a

palavra conflito como sendo “perturbações que afetam as relações empregatícias,

neste estágio avançado do Direito do Trabalho e das concepções que, a bem ou mal

[sic], avassalam a compreensão dos fatos e palpitam no ambiente social”.

Na lição de Amauri Mascaro Nascimento (1992, citado por SANTOS, 2001,

p. 169),

“Os conflitos são próprios dos seres com vida, impõe-se conviver com os mesmos e encontrar os melhores meios disponíveis para a sua solução adequada. Dessa maneira, dotar a sociedade de técnicas aprimoradas para resolver os conflitos é a tarefa fundamental que permite a harmonia e a paz social”.

Embora haja divergência doutrinária a respeito desta temática, será

aplicada, a princípio, a classificação adotada por Altamiro J. dos Santos, o qual

esclarece que “para a resolução dos conflitos individuais, projetam-se diversas

técnicas. Destacam-se as técnicas autodefensiva, autocompositiva e

heterocompositivas”. (2001, p. 169). Esta classificação também é adotada por Carlos

Henrique Bezerra Leite (2009, p.107).

4.1 AUTODEFESA

Nas palavras de José Augusto Rodrigues Pinto,

“A autodefesa é, sem dúvida, o mais antigo modo de pôr fim a um conflito de interesses. Há notícia de sua prática desde milhares de anos antes da Revolução Industrial, dentro de contextos sociais totalmente diferentes, embora com o mesmo conteúdo básico de paralisação como forma de protesto contra o mau trato dispensado ao trabalhador, quer sob o aspecto estritamente físico, quer sob o das condições de ambiente e de retribuição”. [grifos do autor]. (2007, p. 752).

22

Conforme registro de Amauri Mascaro Nascimento (1992, citado por PINTO,

2007, p. 753), “o vocábulo autodefesa indica o ato pelo qual alguém faz defesa

própria, por si mesmo. Supõe uma defesa pessoal. É a forma mais primitiva da

solução dos conflitos”. [grifos do autor].

Neste diapasão, Everaldo Gaspar Lopes de Andrade (1991, igualmente

citado por PINTO, 2007, p. 753) elucida que a autodefesa se configura “pela

imotivada resistência de uma das partes, especialmente do empregador, à tentativa

de negociação, levando os empregados à medida extrema de paralisar as suas

atividades, no sentido de provocar o empregador a resolver o conflito”.

Como exemplos de autodefesa no âmbito trabalhista, temos a greve e o

lockout7. Não se pode olvidar, no entanto, que tais meios por si só não solucionam o

conflito trabalhista, mas constituem importantes meios para se chegar à

autocomposição ou à heterocomposição.

4.2 AUTOCOMPOSIÇÃO

Otávio Brito Lopes apresenta a autocomposição como “a forma de solução

pacífica dos conflitos individuais ou coletivos de trabalho por iniciativa e ato de

vontade das próprias partes conflitantes”. (2000, p. 23).

Segundo Sérgio Pinto Martins, pode-se dividir a autocomposição em

unilateral e bilateral. A primeira é caracterizada pela renúncia de uma das partes à

sua pretensão. A segunda ocorre quando cada uma das partes faz concessões

recíprocas, ao que se denomina de transação. (2010, p. 49).

7 Vedado conforme artigo 17 da Lei 7.783/1989: Fica vedada a paralisação das atividades, por iniciativa do empregador, com o objetivo de frustrar negociação ou dificultar o atendimento de reivindicações dos respectivos empregados (lockout).

23

Márcio Túlio Viana aponta que, “em princípio, o Direito do Trabalho repele a

renúncia. Já a transação é admissível, dentro de certos limites” (2003, p. 69). É que,

na transação, como ensina Süssekind (1999, citado por VIANA, 2003, p. 69), ou não

se sabe a quem pertence o direito (res dúbia) ou se ignora qual será a decisão do

juiz (res litigiosa). Daí ser natural que surjam concessões recíprocas.

São exemplos de formas autocompositivas de solução dos conflitos

trabalhistas os acordos e as convenções coletivas, sendo que os acordos coletivos

são realizados entre o sindicato de empregados e uma ou mais empresas e a

convenção coletiva ocorre entre o sindicato de trabalhadores e de empregadores.

Ainda, nos dizeres de Sérgio Pinto Martins: “este é, realmente, o melhor

meio de solução dos conflitos, pois ninguém melhor do que as próprias partes para

solucionar suas pendências, porque conhecem os problemas existentes em suas

categorias”. (2010, p. 49).

Altamiro J. dos Santos explica que a técnica de autocomposição harmoniza-

se com o instituto da conciliação (2001, p. 170).

4.3 HETEROCOMPOSIÇÃO

Assim define Amauri Mascaro Nascimento, (1992, citado por PINTO, 2007,

p. 758):

“A heterocomposição é a solução dos conflitos trabalhistas por uma fonte suprapartes que decidirá com força obrigatória sobre os litigantes, estes se submetem à decisão ou são a ela submetidos”.

Ou seja, verifica-se a heterocomposição quando a solução dos conflitos

trabalhistas é determinada por um terceiro.

Na visão de Russomano, (1995, citado por PINTO, 2007, p. 758), a

heterocomposição se mostra uma “‘solução indireta’, tipificada ‘pela intervenção de

24

terceiro ou órgão alheio ao conflito, no sentido de obter a solução conveniente...’”.

[grifos do autor].

Na prática, José Augusto Rodrigues Pinto, esclarece que,

“A heterocomposição oferece diversas variações, quanto ao método para se desenvolver. Todas, porém, são caracterizadas pela presença de um estranho ao interesse em conflito com a tarefa de levá-lo a um termo a ser aceito pelos respectivos antagonistas, a saber: conciliação, mediação e arbitragem”. (2007, p. 759).

E complementa que “conciliação, mediação e arbitragem formam,

juntamente com os dissídios coletivos, o naipe de fórmulas heterônomas de solução

dos conflitos do trabalho”. (id., 2007, p. 846).

A doutrina diverge na classificação das formas técnicas heterocompositivas.

Será adotado no presente trabalho a disposição do Professor Altamiro J. dos

Santos, o qual elenca tais técnicas como sendo: mediação, arbitragem e negociação

coletiva prévia e jurisdicional. (2001, p. 170).

4.3.1 Mediação

Mediação vem do latim mediare, com o sentido de mediar, dividir ou meio de

intervir. (MARTINS, 2010, p. 50).

Conforme ensinamentos de Amauri Mascaro Nascimento (1992, citado por

SANTOS, 2001, p. 171):

“Mediação é uma técnica de composição dos conflitos caracterizada pela participação de um terceiro. Suprapartes, o mediador, cuja função será ouvir as partes e formular propostas. As partes não estarão obrigadas a aceitar as propostas. Só se comporão havendo o acordo de vontade entre ambas. A mediação é vista também como um componente de negociação”.

Américo Plá Rodriguez (citado por LOPES, 2000, p. 26-27), ao classificar os

meios de solução dos conflitos coletivos de trabalho, ratifica que “normalmente o

25

mediador é um perito na matéria, que após examinar a posição de cada um dos

litigantes, costuma formular uma recomendação para ser submetida às partes em

litígio”. [grifo do autor].

4.3.2 Arbitragem e negociação coletiva prévia

São técnicas de resolução de conflitos de instituição facultativa para os

dissídios coletivos do trabalho, tendo sido admitidos pelo artigo 114, § 1º e 2º da

Constituição Federal de 1988, que profere:

Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: [...] § 1º - Frustrada a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitros. § 2º Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente. [...]

Em síntese, Amauri Mascaro Nascimento (1992, citado por SANTOS, 2001,

p. 173) explica que a arbitragem:

“É uma forma de composição extrajudicial dos conflitos, por alguns doutrinadores considerada um equivalente jurisdicional. A questão será decidida não por um juiz, mas por uma pessoa ou órgão não investido de poderes jurisdicionais. Há sistema de arbitragem facultativa e privada, como o dos Estados Unidos da América, no qual os contratos coletivos prevêem a arbitragem e as partes escolhem, de comum acordo, o árbitro, que será um professor universitário, um advogado, um economista etc., inscritos como árbitros nos órgãos competentes. A remuneração do seu serviço é paga pelas partes. Há sistemas de arbitragem oficial e obrigatória, como na Austrália e Nova Zelândia, assemelhando-se ao sistema jurisdicional. No Brasil, a Constituição de 1988 prevê a arbitragem facultativa para os dissídios coletivos (art. 114, § 1º)”. [grifos do autor].

Ademais, registra-se que a arbitragem civil é disciplinada pela Lei 9.307, de

23 de setembro de 1996, a qual em seu artigo 1º estabelece:

26

As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis.

Orlando Teixeira da Costa (1997, citado por SANTOS, 2001, p. 173) frisa

alguns aspectos sobre a negociação prévia nos dissídios coletivos:

“A primeira Constituição que fala em negociação coletiva como termo inicial de um continuum que se desenvolve a partir do empreendimento autônomo das partes, passando facultativamente pela arbitragem até chegar à prestação jurisdicional especializada, é a de 1988. Somente quando aqueles que se opõem pela relação conflitual não conseguem compor-se é que pode ser feito o ajuizamento da ação, ou seja, do dissídio coletivo. Havendo êxito na negociação, o resultado será a celebração de um acordo ou convenção coletiva. Frustrada ela, os dissidentes poderão escolher a arbitragem ou reclamar a prestação jurisdicional”.

O autor salienta também:

“[...] a negociação coletiva é condição para o ajuizamento da ação, conforme interpretação judicial inaugurada pela Seção de Dissídio Coletivo no Tribunal Superior do Trabalho, por sua Jurisprudência Normativa nº 1, assim redigida: ‘Nenhuma ação de dissídio coletiva de natureza econômica será admitida sem antes se esgotarem as medidas relativas à formalização da convenção ou acordo coletivo, nos termos dos arts. 114, § 2º, da Constituição da República, e 616, § 4º, da CLT, sob pena de indeferimento da representação inicial ou de extinção do processo, ao final, sem o julgamento do mérito. O interessado que não conseguir efetivar a negociação coletiva direta com a parte contrária poderá solicitar a mediação do órgão local ou regional do Ministério do Trabalho, devendo deste obter uma ata do ocorrido. Após a manifestação do suscitado, as partes estabelecerão os pontos em relação aos quais houve acordo e as matérias litigiosas’”. (p. 174).

Nos dizeres de SANTOS, “há pontos de afinidade e harmonia entre o

instituto da Negociação Coletiva Prévia e o instituto da Comissão de Conciliação

Prévia. Os dois sistemas procuram conciliar, prevenir conflitos, demandas judiciais,

alcançar, desde logo, solução rápida, sem despesas, pacífica e que se harmonize

com os interesses dos interlocutores sociais da relação de emprego, inclusive com

objetivo de conviviologia social”. (2001, p.175).

27

4.3.3 Jurisdicional

A jurisdição é a forma de solucionar os conflitos por meio da intervenção do

Estado, gerando o processo judicial. O Estado diz o direito no caso concreto

submetido ao Judiciário, impondo às partes a solução do litígio.

Sobre essa técnica, segue o posicionamento do Professor Amauri Mascaro

Nascimento (1992, citado por SANTOS, 2001, p. 175):

“Significa, em termos históricos, a passagem da ação física (autodefesa) para a ação jurídica (processo judicial)”. E acrescenta: “No Brasil, a Jurisdição Trabalhista é exercida pela Justiça do Trabalho, ramo especial do Poder Judiciário com atribuições constitucionais para decidir os dissídios individuais e coletivos entre empregados e empregadores e, mediante lei, outras controvérsias oriundas de relação de trabalho (Constituição Federal, art. 114), através de órgãos integrados por juízes togados, que são especialistas em Direito...”.

28

5. AS COMISSÕES DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA: LEI 9.958/2000

A criação das Comissões de Conciliação Prévia, assim como dos juizados

especiais de pequenas causas trabalhistas, é uma reivindicação antiga da doutrina,

de forma a tentar desafogar a Justiça do Trabalho do excessivo número de

processos.

Como dizia Rui Barbosa “Justiça tardia não é justiça” (citado por PASSOS,

2002, p. 19). Neste diapasão, procurando adequar-se aos novos anseios da

sociedade, foi criada a Lei 9.958, sancionada em 12 de janeiro de 2000, em vigor

desde 14 de abril de 2000, que alterou e acrescentou à Consolidação das Leis do

Trabalho os artigos 625, letras A a H, 876 e 877-A, que dispõe sobre as Comissões

de Conciliação Prévia e a execução de título extrajudicial perante a Justiça do

Trabalho.

Este modelo foi uma inovação no ordenamento jurídico brasileiro,

objetivando principalmente atender com agilidade a resolução de conflitos laborais,

visto que as verbas trabalhistas são dotadas de caráter alimentar e a morosidade

processual, muitas vezes, acabam por gerar prejuízos à parte hipossuficiente

(trabalhador).

Nos termos de Nicanor Sena Passos,

“Podemos conceituá-las como um organismo jurídico, de natureza autocompositiva, em que as partes respectivas, através de atos não jurisdicionais, buscam, mediante comum acordo, solucionar conflitos individuais trabalhistas, existentes ou na iminência de existir”. (2002, p. 37).

5.1 FUNÇÃO E NATUREZA JURÍDICA

A função das Comissões de Conciliação Prévia é “tentar conciliar os conflitos

individuais de trabalho.” (art. 625-A da CLT).

29

Zoraide Amaral de Souza explica que “a função desempenhada pelas

Comissões de Conciliação Prévia é, apenas, de tentar promover o entendimento

entre empregado e empregador, não possuindo, assim, poderes para julgar, arbitrar

ou decidir a respeito de qualquer demanda”. (2004, p. 201).

Como lembra Wagner D. Giglio8 (1982, citado por ROMITA, 2004, p. 9), “a

proposta conciliatória deve, idealmente, ser a mais próxima possível da solução

jurisdicional e, em qualquer caso, deve evitar-se que no ânimo das partes paire uma

sensação de injustiça”.

Otávio Brito Lopes explica que:

“Não se trata, da dicção legal, de uma atuação meramente passiva e inerte (a Lei diz “tentar conciliar”, e não aguardar a conciliação), mas ativa, com a formulação de propostas e contrapropostas, o aconselhamento dos demandantes quantos aos reais benefícios do acordo, orientação a respeito das possíveis dificuldades decorrentes de uma eventual demanda (no que diz respeito ao seu tempo de duração, ao ônus probatório e o eventual posicionamento da jurisprudência, contrária ou a favor de uma tese ou de outra), e ainda podendo prestar verdadeira consultoria a respeito dos direitos e obrigações legais de cada um.” [grifos do autor]. (2000, p. 45).

Segundo MARTINS, “a natureza jurídica das comissões é de mediação. [...]

Além disso, tem natureza de órgão privado, de solução de conflitos extrajudiciais, e

não público.” (2008, p. 16).

Como prevê a Lei 9.958/200, cabe ainda às Comissões de Conciliação

Prévia:

- Receber, datar e assinar a cópia da demanda formulada por escrito pelo

interessado, ou reduzi-la a termo, se oral, também datando e assinando (§ 1º do art.

625-D da CLT);

8 SOUZA, Zoraide Amaral de. Arbitragem – Conciliação – Mediação nos Conflitos Trabalhistas. São Paulo: LTr, 2004. Prefácio: Arion Sayão Romita.

30

- Fornecer ao empregado e ao empregador, caso não prospere a tentativa

de conciliação, declaração da tentativa conciliatória frustrada com a descrição de

seu objeto, firmada pelos seus membros (§ 2º do art. 625-D da CLT);

- Em caso de conciliação, lavrar o respectivo termo, que será assinado pelos

seus membros e colher as assinaturas dos envolvidos (empregado e

empregador/preposto devidamente habilitado), fornecendo pelo menos uma cópia

para cada parte (art. 625-E da CLT);

- Em caso de conciliação apenas parcial, lavrar o termo relativo aos pontos

acordados e expedir a declaração de tentativa conciliatória frustrada, com a

descrição de seu objeto, quanto ao mais;

- Tomar todas as medidas cabíveis e necessárias para a realização da

realização da sessão de tentativa de conciliação no prazo improrrogável de dez dias,

a contar da provocação do interessado (art. 625-F da CLT);

- Caso não seja possível realizar a sessão conciliatória no prazo de dez dias,

deve providenciar declaração de tentativa frustrada de conciliação e fornecê-la ao

interessado no último dia do prazo, impreterivelmente (parágrafo único do art. 625-F

da CLT).

5.2 OBJETIVOS

Para o Ministério do Trabalho e Emprego, o objetivo primordial foi o de

viabilizar e sustentar o sistema de solução extrajudicial de conflitos trabalhistas. A lei

veio oferecer ao trabalhador e ao empregador a possibilidade de resolver, de forma

alternativa, controvérsias trabalhistas, sem demora e baixo custo.

Ademais, busca-se por meio deste instituto o desenvolvimento da cultura

negocial nas relações de trabalho, na medida em que possibilita a conciliação dos

31

conflitos individuais do trabalho sem necessidade de intervenção do Poder

Judiciário, que doravante se reserva para os casos mais complexos ou para os que

não tenham sido solucionados no âmbito daquelas Comissões9.

5.3 PRINCÍPIOS NORTEADORES

Segundo dispõe o Ministério do Trabalho e Emprego10, as CCP´s regem-se

pelos seguintes princípios.

Princípio da composição paritária, ou seja, mesmo número membros

representantes dos empregadores e dos trabalhadores;

Princípio da constituição facultativa, pelo qual as Comissões, só serão

criadas por iniciativa e se for do interesse dos trabalhadores e dos empregadores;

Princípio da negociação coletiva e da auto-regulamentação, que decorre

da exigência de negociações prévias onde se discutam e se formalizem, em

consonância com a lei, as regras gerais das Comissões;

Princípio da informalidade e da celeridade, pelo qual o procedimento de

conciliação é marcado pela simplicidade, sem os atos formais do processo judicial e

com finalização rápida; e

Princípio da boa-fé e da lealdade, necessário em qualquer tentativa de

solução justa e ética de um conflito de interesses.

Em relação a este último, LOPES reforça que “o conciliador, ou mediador,

não pode jamais faltar com o dever de boa-fé, pois, mais que o interesse patronal ou

trabalhista, está representando o interesse público na pacificação dos conflitos

9 BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Comissão de Conciliação Prévia: Manual de Orientação. 3ª ed. Disponível em: http://www.mte.gov.br/geral/publicacoes.asp. Acesso em: 10 set.2010. 10 (ibid.)

32

individuais de trabalho. E não poderia ser de outro modo, pois o dever de boa-fé há

em qualquer ato jurídico.” (2000, p. 46).

Nos dizeres do Altamiro J. dos Santos:

“O conciliador e demais membros integrantes da Comissão de Conciliação

Prévia Trabalhista devem adotar técnicas e princípios que possam servir de

bússola para apontar o rumo mais adequado em cada quadro fático ou caso

concreto para favorecer maior sucesso nas metas desejadas às partes

figurantes e destinatárias do resultado que se quer alcançar.” [grifo nosso]

(2001, p. 179).

5.4 CONSTITUCIONALIDADE DAS COMISSÕES DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA

Desde o surgimento da Lei 9.958/2000, muito se tem discutido sobre o

disposto no artigo 625-D, CLT, o qual prescreve que:

Qualquer demanda de natureza trabalhista será submetida à Comissão de Conciliação Prévia se, na localidade da prestação de serviços, houver sido instituída a Comissão no âmbito da empresa ou do sindicato da categoria. [...] § 2o Não prosperando a conciliação, será fornecida ao empregado e ao empregador declaração da tentativa conciliatória frustrada com a descrição de seu objeto, firmada pelos membros da Comissão, que deverá ser juntada à eventual reclamação trabalhista. [...]

O fato de que o litígio trabalhista tenha que se submeter, ab initio, à

Comissão Conciliatória Prévia, e só depois, em caso de insucesso, poderia a parte

provocar a atuação da Justiça do Trabalho criou uma nova modalidade de condição

da ação trabalhista, bem como apresentou uma suposta violação ao artigo 5º, inciso

XXXV da Constituição Federal que profere:

Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito; [...]

33

Jose Roberto Freire Pimenta11 tece alguns comentários a respeito da

interpretação doutrinária:

“Independentemente de seu juízo sobre a conveniência da efetiva instituição das Comissões de Conciliação Prévia disciplinadas pelos novos artigos 625-A a 625-H da CLT, os autores que a analisaram dividiram-se, a grosso modo, em dois grupos diametralmente opostos acerca da constitucionalidade ou da inconstitucionalidade da exigência de prévio exaurimento da tentativa de conciliação antes do ajuizamento das reclamações trabalhistas correspondentes. De um lado, ficaram aqueles que consideram tal exigência flagrantemente inconstitucional, por afrontar a garantia constitucional da inafastabilidade do controle jurisdicional ou o princípio constitucional da isonomia. De outro, os que entendem que a lei nada mais fez que instituir uma nova condição da ação (ou um pressuposto processual específico) para o ajuizamento das ações trabalhistas, sem qualquer afronta aos princípios e as regras constitucionais de natureza processual em vigor”. [grifos do autos] (2003, p. 136).

Para Ives Gandra Martins (2001, citado por ARRUDA, DIONÍSIO, 2002, p.

23), a argumentação de que as Comissões de Conciliação Prévia constituem

obstáculo de acesso ao Judiciário não é verdadeira:

“A pretensa inconstitucionalidade, vislumbrada por alguns, na obrigatoriedade da passagem prévia da demanda perante a Comissão de conciliação, não tem qualquer procedência. As comissões de conciliação prévia não constituem óbice ao acesso ao Judiciário, assegurado pelo art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, na medida em que são apenas instância prévia conciliatória, em que a Comissão deve dar resposta à demanda em 10 dias (CLT, art. 625-F), o que, de forma alguma, representa óbice ao judiciário”.

5.4.1 Obrigatoriedade ou mera faculdade da passagem pela CCP

Houve intenso desacordo no âmbito doutrinário e jurisprudencial a respeito

da obrigatoriedade ou faculdade da passagem da demanda trabalhista perante as

CCP´s.

11 ibid. Artigo: A Constitucionalidade da exigência de tentativa de conciliação extrajudicial para ajuizamento da ação trabalhista e da eficácia liberatória geral do respectivo termo de conciliação (arts. 625-D e 625-E, parágrafo único, da CLT).

34

Inúmeras decisões judiciais, especialmente do Tribunal Superior do

Trabalho, consideraram a obrigatoriedade da tentativa conciliatória como

pressuposto processual e até mesmo condição da ação, gerando inclusive a

extinção do processo sem julgamento do mérito. Isto posto, importante relembrar a

definição de pressupostos processuais e de condição da ação:

Nas palavras de Humberto Theodoro Júnior (2006, citado por WAMBIER,

2007, p. 220), pressupostos processuais “são as exigências legais sem cujo

atendimento o processo, como relação jurídica, não se estabelece ou não se

desenvolve validamente não atingindo a sentença que deveria apreciar o mérito da

causa”.

WAMBIER explica que são três as condições que permitem a regular

admissibilidade da ação: interesse processual, legitimidade das partes e

possibilidade jurídica do pedido. Lembra ainda que tais condições devem estar

presentes, todas, concomitantemente, para que se abra caminho para a prestação

da tutela jurisdicional requerida. E que, ausente qualquer delas, fica bloqueado o

caminho para a integral prestação da tutela, pois o juiz deve decretar a carência da

ação sem o julgamento do mérito. (2007, p. 137)

Neste diapasão, cita-se como exemplo a seguinte decisão:

RECURSO DE REVISTA – DEMANDA NÃO SUBMETIDA À COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA – O art. 625-D da CLT trata da necessidade de se submeterem à Comissão de Conciliação Prévia as demandas trabalhistas em que houver sido instituída tal Comissão, no âmbito da empresa ou do sindicato da categoria. Não cumprindo o Autor tal determinação legal, falta à ação um pressuposto processual de validade, devendo ser extinto o processo, sem o julgamento do mérito. Recurso de Revista conhecido e provido. (TST – RR 99520/2006-653-09-00 – Relª. Minª. Maria de Assis Calsing – DJE 20.03.2009)12 [grifo nosso]

12 Brasil, Tribunal Superior do Trabalho. Recurso de Revista – Demanda não submetida à Comissão de Conciliação Prévia. RR 99520/2006-653-09-00.0. Recorrente: Irmol Indústrias Reunidas de Móveis Ltda; Recorrida: Aparecida de Fátima da Silva Balarotti. Relatora: Maria de Assis Calsing. 11 mar. 2009. Disponível em: http://aplicacao5.tst.jus.br/consultaunificada2/. Acesso em: 01 fev. 2011

35

Insta salientar, no entanto, que diante das controvérsias acerca da

obrigatoriedade ou mera faculdade de submissão às Comissões de Conciliação

Prévia, em 29 de maio de 2009, o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Superior

do Trabalho unificaram seus posicionamentos, consequentemente a jurisprudência

dos Tribunais Regionais do Trabalho, decidindo que:

“... a submissão de conflitos à Comissão de Conciliação Prévia não constitui pressuposto processual nem condição para agir – não cabendo, portanto, a extinção do processo sem julgamento do mérito em caso de ausência de tentativa de conciliação”.13

Assim, a partir da unificação do STF e TST, a submissão das demandas

trabalhistas às Comissões de Conciliação Prévia tornou-se mera faculdade da parte,

bem como uma simples forma de resolução extrajudicial de conflitos individuais

trabalhistas.

Dessa forma, a regra do artigo 625-D, da CLT, agora não representa mais

condição insuperável à apresentação de ações da Justiça do Trabalho pelo princípio

maior do acesso à Justiça.

Tal decisão gerou enorme discussão e divergência entre os ministros do

STF, mas foi o entendimento prevalecente que o artigo 625-D da CLT deverá ser

interpretado conforme a Constituição Federal, sob pena de representar um óbice ao

direito de acesso à Justiça.

Ademais, cabe frisar que a decisão do STF acerca da submissão às CCP´s

das demandas trabalhistas como faculdade e não como obrigação, possui caráter

liminar e possui validade até o julgamento da matéria, objeto de duas Ações Diretas

de Inconstitucionalidade (ADIs 2139 e 2160).

13 BRASIL, Tribunal Superior do Trabalho. TST: tentativa de conciliação prévia não é condição para ação. Notícias. 29/05/2009. Disponível em: http://ext02.tst.jus.br/pls/no01/NO_NOTICIAS.Exibe_Noticia?p_cod_noticia=9294&p_cod_area_noticia=ASCS&p_txt_pesquisa=concilia%E7%E3o%20pr%E9via. Acesso em: 08 fev. 2011.

36

Cabe salientar ainda, que este assunto ainda não foi sumulado, apesar dos

Tribunais do Trabalho já terem se posicionado no sentido da não obrigatoriedade da

submissão das demandas trabalhistas às Comissões, como é o caso do Tribunal

Regional do Trabalho da 9ª Região:

TRT-PR-27-04-2010 COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA. ART. 625-E DA CLT. A interpretação e o alcance do art. 625-D, devem ser realizados, necessariamente, à luz do que estabelece o Texto Constitucional e os artigos 8º e 444, também da Consolidação, voltados ao interesse público e às disposições de proteção ao trabalho. Por estes fundamentos é que não pode sobressair do referido dispositivo legal outra interpretação, senão a de que se trata de uma faculdade assegurada ao empregado, com o fim de obter um título executivo extrajudicial, conforme previsto pelo art. 625-E, parágrafo único, do mesmo diploma trabalhista. Assim sendo, não há como atribuir àquele dispositivo legal uma nova condição de ação, nem tampouco pressuposto processual. A lei ordinária não pode afrontar o disposto no texto constitucional inserido no artigo 5º, inciso XXXV, mormente criando nova condição de ação, de forma a exigir que o empregado ingresse inicialmente perante a comissão de conciliação prévia, como requisito essencial para o exercício da ação. Não tendo o artigo 625-D da CLT imposto qualquer cominação à não observância do procedimento em comento, tem-se que encerra mera faculdade conferida às partes. Incabível, nesse passo, a extinção do feito sem julgamento do mérito por ausência de submissão do conflito oriundo da relação de trabalho a uma Comissão de Conciliação Prévia, bem assim inaplicável o disposto no art. 267, § 3º, IV e VI, do CPC. (TRT-PR-01025-2008-091-09-00-9-ACO-11835-2010 – 2ª. TURMA - Relator: ROSEMARIE DIEDRICHS PIMPÃO - Publicado no DJPR em 27-04-2010)14 [grifo nosso] TRT-PR-07-12-2010 PASSAGEM PELA COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA. FACULDADE DO TRABALHADOR. O objetivo precípuo do legislador ao instituir as Comissões de Conciliação Prévia foi o de privilegiar a adoção de soluções autônomas dos conflitos trabalhistas. Porém, se a demanda não foi submetida à tentativa conciliatória extrajudicial, mas essa ocorreu em Juízo e não obteve sucesso, não se vislumbra qualquer resultado prático na pretensão da reclamada em exigir nova tentativa de conciliação perante a comissão instituída para este fim. Ademais, a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade n.º 2.139 e 2.160, deferiu parcialmente a cautelar para dar interpretação conforme à Constituição Federal relativamente ao art. 625-D da CLT, no sentido de considerar a submissão da demanda à Comissão de Conciliação Prévia mera faculdade conferida ao trabalhador, ante a garantia de acesso à Justiça consagrada no art. 5.º, XXXV, da Constituição Federal. Recurso das reclamadas a que se nega provimento, no particular. (TRT-PR-06914-2008-003-09-00-0-ACO-39744-2010, 3ª.

14 Brasil, Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região. Comissão de Conciliação Prévia – Art. 625-E da CLT. RO 01025-2008-091-09-00-9. Recorrente: Indústrias Reunidas Cristo Rei Ltda; Recorrido: Ildefonso Cordeiro de Paula. Relator: Rosemarie Diedrichs Pimpão. 23 mar. 2010. Disponível em: http://www.trt9.jus.br/internet_base/publicacaoman.do?evento=Editar&chPlc=3746796&procR=AAB9IGABoAACR20AAT&ctl=13787. Acesso em: 01 fev. 2011.

37

TURMA, Relator: CÁSSIO COLOMBO FILHO, Publicado no DEJT em 07-12-2010)15 [grifo nosso] TRT-PR-04-06-2010 EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA. SUBMISSÃO PREVISTA EM NORMA COLETIVA. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO. A obrigatoriedade de passagem pela Comissão de Conciliação Prévia afronta o art. 5.º, XXXV, da CF e vai de encontro ao posicionamento esposado pelo próprio Supremo Tribunal Federal (ADIs 2.139 e 2.160). Ainda que esteja prevista em norma coletiva, a necessidade de submissão da demanda a Comissão de Conciliação Prévia não merece prevalecer, sob pena de violação ao princípio da inafastabilidade da jurisdição. Ausência de contrariedade ao art. 7.º, XXVI, da CF ou ao art. 611 da CLT. Precedentes do C. TST e da 4ª Turma deste E. Regional. Embargos declaratórios conhecidos e parcialmente providos, apenas para prestar esclarecimentos. (TRT-PR-00313-2009-023-09-00-9-ACO-16811-2010, 4ª. TURMA, Relator: LUIZ CELSO NAPP, Publicado no DJPR em 04-06-2010)16 [grifo nosso]

Neste sentido, a 3ª turma do referido Tribunal, assentou tal entendimento na

Orientação Jurisprudencial nº 28, inciso I:

COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA. ART. 625-D DA CLT. I - mesmo quando nos autos forem comprovados a existência e regular funcionamento de Comissão de conciliação Prévia, a ausência de submissão prévia da controvérsia não acarreta a extinção do processo, sem julgamento do mérito, devendo haver razoável interpretação dos princípios da inafastabilidade da jurisdição (art.5º. inciso XXXV,.da CF/1988), no contexto da economia e celeridade processual e da instrumentalidade das formas, de modo que as propostas conciliatórias feitas em Juízo suprem a finalidade da norma do art.625-D, da CLT; [...]

15 Brasil, Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região. Passagem pela Comissão de Conciliação Prévia. Faculdade do Trabalhador. RO 06914-2008-003-09-00-0. Recorrentes: Karoline Andressa Machado Tomasoni, Melbra Comércio de Artigos do Vestuário Ltda e Distribuidora Paranaense de Roupas Ltda; Recorrido(s): Os mesmos. Relator: Cássio Colombo Filho. 24 nov. 2010. Disponível em: http://www.trt9.jus.br/internet_base/publicacaoman.do?evento=Editar&chPlc=4091059&procR=AAB9IGABoAACS8VAAR&ctl=21959. Acesso em: 01 fev. 2011. 16 Brasil, Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região. Embargos de Declaração - Comissão de Conciliação Prévia - Submissão prevista na norma coletiva - Princípio da Inafastabilidade da Jurisdição. RO 00313-2009-023-09-00-9. Recorrentes: Felomena Moreira da Silva e Usina de Açúcar Santa Terezinha Ltda; Recorrido(s): Os mesmos. Relator: Luiz Celso Napp. 14 abr. 2010. Disponível em: http://www.trt9.jus.br/internet_base/publicacaoman.do?evento=Editar&chPlc=3815256&procR=AAB9IGABoAACTGCAAN&ctl=1874. Acesso em: 01 fev. 2011

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6. A EFICÁCIA LIBERATÓRIA GERAL DO TERMO DE QUITAÇÃO

Com efeito, dispõe o artigo 625-E da CLT que:

Aceita a conciliação, será lavrado termo assinado pelo empregado, pelo empregador ou seu proposto e pelos membros da Comissão, fornecendo-se cópia às partes. Parágrafo único. O termo de conciliação é título executivo extrajudicial e terá eficácia liberatória geral, exceto quanto às parcelas expressamente ressalvadas.

Segundo Paulo Henrique Tavares da Silva, “a ideia prevalecente é a de que

a celebração de conciliação perante a Comissão de Conciliação Prévia implica numa

total exoneração do empregador quanto aos créditos decorrentes da relação de

trabalho”. (Revista da ESMAT 13 – Ano 2 – N. 2 – Novembro de 2009, p. 87). Neste

diapasão, o referido ainda acrescenta o entendimento do Ministério do Trabalho e

Emprego a respeito do tema:

“Havendo acordo entre as partes, o termo de conciliação terá eficácia liberatória geral, exceto quanto às parcelas expressamente ressalvadas. Por eficácia liberatória geral entende-se a plena quitação dos direitos nascidos da relação de emprego. Logo, o acerto realizado perante a Comissão de Conciliação Prévia, sem ressalvas pelo trabalhador, possui eficácia quitatória sobre todo e qualquer direito trabalhista relativo ao contrato de trabalho em discussão. Dessa maneira, o empregado, depois de dar como solucionada a controvérsia em torno de um direito ou de vários direitos laborais decorrentes do contrato, não poderá reclamar eventuais diferenças que julgue seu credor com fundamento naquele ou naqueles direitos anteriormente transacionados”. (BRASIL, 2003, p. 18-19).

O Tribunal Superior do trabalho, a contrario sensu, tem entendido que:

RECURSO DE REVISTA. TERMO DE CONCILIAÇÃO. COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA. EFICÁCIA LIBERATÓRIA. ACORDO - ALCANCE. A eficácia liberatória geral atribuída ao termo de conciliação firmado perante a comissão de conciliação prévia, nos exatos termos do parágrafo único do art. 625-E da CLT, abrange apenas os itens objeto do ajuste, não compreendendo, obviamente, outros que sequer lhe foram submetidos. Recurso de revista conhecido e provido. Precedentes da 3ª Turma. (RR - 38700-74.2008.5.01.0046, Data de Julgamento: 22/09/2010, Relator Ministro: Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 01/10/2010)17. [grifo nosso]

17 Brasil, Tribunal Superior do Trabalho. Recurso de Revista – Termo de Conciliação – Comissão de Conciliação Prévia – Eficácia Liberatória – Acordo Alcance. RR-38700-74.2008.5.01.0046.

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AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA. TERMO DE QUITAÇÃO. LIMITES DA EFICÁCIA LIBERATÓRIA. Diante dos princípios da inafastabilidade da jurisdição e da indisponibilidade dos direitos trabalhistas, o acordo celebrado perante a comissão de conciliação prévia não tem o alcance pretendido pela reclamada, já que não se pode reputar válida renúncia que tenha como objeto direitos indisponíveis. A quitação não é de parcelas ou de títulos, mas dos valores recebidos, considerando a discriminação verificada no termo de conciliação, nada impedindo que sejam postuladas, perante o Poder Judiciário, diferenças ou complementações dessas mesmas parcelas ou outros títulos, ainda não pagos. A CCP não imuniza a empresa no tocante à observância do princípio da irrenunciabilidade nem a sua atuação é embaraço, por via reflexa, ao direito de obter tutela jurídica efetiva. Agravo de instrumento não provido. (AIRR - 138740-72.2007.5.01.0281 Data de Julgamento: 01/09/2010, Relator Ministro: Augusto César Leite de Carvalho, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 24/09/2010)18. [grifo nosso]

Como se pode observar, essa denominada “eficácia liberatória geral” gera

discordância entre os aplicadores do Direito. A dificuldade reside no fato de que a lei

nada dispõe sobre a necessidade de ser especificado, expressamente, o que se

está quitando com o acordo realizado perante a Comissão.

Corroborando o exposto, apresenta-se o entendimento do Tribunal Regional

do Trabalho da 9ª Região, ainda não uníssono:

TRT-PR-22-06-2010 COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA - ACORDO - AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO - VALIDADE. O acordo firmado perante a Comissão de Conciliação Prévia possui eficácia liberatória. Inteligência do parágrafo único do art. 625-E da CLT. A anulação de ato negocial só é possível quando presente vício de consentimento, nos termos da Lei civil. Recurso do reclamante a que se nega provimento. (TRT-PR-02818-2008-069-09-00-4-ACO-19380-2010 – 1ª. TURMA - Relator: BENEDITO XAVIER DA SILVA - Publicado no DJPR em 22-06-2010)19 [grifo nosso]

Recorrente: Luis da Silva Madureira; Recorrido: Auto Viação Tijuca S.A.. Relator: Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira. 22 set. 2010. Disponível em: http://aplicacao5.tst.jus.br/consultaunificada2/. Acesso em: 01 fev. 2011. 18 Brasil, Tribunal Superior do Trabalho. Agravo de Instrumento em Recurso de Revista - Comissão de Conciliação Prévia - Termo de quitação - Limites da Eficácia Liberatória. AIRR-138740-72.2007.5.01.0281. Agravante: ETE – Engenharia de Telecomunicações e Eletricidade S.A.; Agravado: Jerferson da Silva Santos. Relator: Augusto César Leite de Carvalho. 01 set. 2010. Disponível em: http://aplicacao5.tst.jus.br/consultaunificada2/.Acesso em: 01 fev. 2011. 19 Brasil, Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região. Comissão de Conciliação Prévia – Acordo – Ausência de Vício de Consentimento – Validade. RO 02818-2008-069-09-00-4. Recorrente: Nelson Centenaro; Recorrida: Globoaves Agropecuária Ltda. Relator: Benedito Xavier da Silva. 08 jun. 2010. Disponível em: http://www.trt9.jus.br/internet_base/publicacaoman.do?evento=Editar&chPlc=3839030&procR=AAB9IGABoAACUITAAF&ctl=4679. Acesso em: 01 fev. 2011.

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TRT-PR-23-11-2010 EMENTA: COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA. CLÁUSULA DE QUITAÇÃO TOTAL DO CONTRATO DE TRABALHO. INTERPRETAÇÃO DO ARTIGO 625-E DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO (CLT) EM FACE DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL (CF). ORIENTAÇÃO INTERNA CORPORIS Nº 28. Na composição do litígio trabalhista perante a Comissão de Conciliação Prévia, mediante pagamento de parte das verbas pleiteadas e expressa quitação total de eventuais créditos oriundos da relação de emprego, a par da inexistência de qualquer ressalva pela parte queixosa, ainda assim não incide a eficácia liberatória geral prevista no texto consolidado, em prestígio à cláusula de amplo acesso à ordem jurídica justa (CF, art. 5º, XXXV), como assentado na Orientação, interna corporis nº 28. Recurso conhecido e parcialmente provido. (TRT-PR-04780-2007-670-09-00-2-ACO-37441-2010 – 3ª. TURMA - Relator: ALTINO PEDROZO DOS SANTOS - Publicado no DEJT em 23-11-2010)20 [grifo nosso] TRT-PR-21-01-2011 ACORDO FIRMADO NA COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA. EFICÁCIA LIBERATÓRIA. O negócio jurídico entabulado entre as partes e formalizado perante à Comissão de Conciliação Prévia com a devida assistência não pode, sem justo motivo, ser maculado porque representaria invasão no domínio da autonomia privada e da ênfase que se atribui à conciliação e às formas alternativas de solução de conflitos. Mais do que isso, a presente ação trabalhista promovida pelo autor representa inversão de expectativas, e se acolhida, vulneraria a boa fé atribuída pelo empregador ao aderir àquele negócio jurídico e nele investir não apenas o capital, mas também sua crença nas instituições jurídicas e na motivação declarada pela parte contrária na firmeza do negócio. Se o autor tinha restrições ao negócio jurídico firmado, deveria tê-lo apresentado à época e não outorgado ampla quitação aos créditos trabalhistas a que fazia jus. Assim, considerando o art. 625-E, da CLT, expressamente atribui eficácia liberatória aos negócios jurídicos realizados em Comissões de Conciliação Prévia, ou seja, quitação geral das obrigações, assumindo a natureza legal de transação que soluciona e previne litígios, rejeitam-se as pretensões formuladas pelo autor em face da ré, considerando quitados todos os direitos trabalhistas que eventualmente pudesse pretender, em razão do negócio jurídico de fl. 21/22 - volume de documentos. (TRT-PR-12285-2009-011-09-00-2-ACO-01253-2011 – 4ª. TURMA - Relator: LUIZ CELSO NAPP - Publicado no DEJT em 21-01-2011)21 [grifo nosso]

20 Brasil, Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região. Comissão de Conciliação Prévia - Cláusula de quitação total do Contrato de Trabalho – Interpretação do artigo 625-E da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) em face da Constituição Federal (CF) – Orientação Interna Corporis nº 28. RO 04780-2007-670-09-00-2. Recorrente: Deorlei dos Santos; Recorrido: Curitiba Locações Ltda. Relator: Altino Pedrozo dos Santos. 10 nov. 2010. Disponível em: http://www.trt9.jus.br/internet_base/publicacaoman.do?evento=Editar&chPlc=4052326&procR=AAB9IGABoAACTH%2BAAB&ctl=1477. Acesso em: 01 fev. 2011. 21 Brasil, Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região. Acordo firmado na Comissão de Conciliação Prévia – Eficácia Liberatória. RO 12285-2009-011-09-00-2. Recorrente: Osni Fabrício; Recorridos: Pampapar S.A. Serviços de Telecomunicações e Eletricidade e Brasil Telecom S.A.. Relator: Luiz Celso Napp. 08 dez. 2010. Disponível em: http://www.trt9.jus.br/internet_base/publicacaoman.do?evento=Editar&chPlc=4133944&procR=AAB9IGABoAACVRyAAC&ctl=21183. Acesso em: 01 fev. 2011.

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Afinal, os efeitos da eficácia liberatória geral do termo conciliatório teriam o

condão de garantir a imutabilidade da coisa julgada, assim como no Judiciário? É

possível emprestar ao termo de conciliação extrajudicial uma dimensão tão ampla, a

ponto de inviabilizar posterior demanda judicial acerca de direitos oriundos do pacto

e não contemplados expressamente na avença anterior? A citada quitação estará

restrita ao que foi conciliado ou se estende aos demais pontos de conflito

eventualmente existente entre empregador e trabalhador?

Nas palavras de Hélio Mário de Arruda e Sônia das Dores Dionísio:

“O parágrafo único do art. 652-E da CLT fez um ‘imbróglio”, misturando várias matérias numa mesma disposição legal. Destacaremos, em primeiro lugar, que a lei atribui ‘a esse termo de conciliação’ eficácia liberatória geral, exceto quanto às parcelas expressamente ressalvadas. Conduto, ele (o termo) só valerá como quitação apenas em relação àquilo que foi postulado pelo empregado ou pelo empregador, conforme o art. 940 do Código Civil e § 2º do art. 477 da CLT, e não geral, como pretende o legislador”. [grifos do autor]. Consequentemente, ainda que não haja a ressalva, qualquer direito que não tenha sido abrangido pela conciliação subsistirá, porque, de acordo com o § 2º do art. 2ª da Lei de Introdução ao Código Civil, a nova lei não revoga nem modifica as regras existentes”. (2002, p. 29).

Para melhor compreensão do tema, serão apresentadas algumas opiniões

acerca da eficácia liberatória geral do termo de quitação, bem como a corrente

doutrinária dominante. Não se pode olvidar, entretanto, que tal divergência deve ser

sempre verificada à luz dos princípios informadores do Direito do Trabalho.

Nesse contexto, enfatiza Raimundo Simão de Melo (2001, citado por Hélio

Mário de Arruda e Sônia das Dores Dionísio, 2002, p. 30):

“É preciso, para prestigiar a solução extrajudicial dos conflitos trabalhistas, ser razoável quanto à interpretação dos instrumentos legais que lhes dão sustentação, nem protegendo o empregado com dogmas, nem, por outro lado, afrontando e sacrificando princípios protetores da pessoa humana do trabalhador, este, que em regra, continuará sendo a parte mais fraca da relação de trabalho”.

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6.1 OPINIÕES DIVERGENTES

Segundo João Luiz Vieira Teixeira, “a corrente doutrinária dominante

entende que a quitação se lança para além da matéria abordada pela transação, que

nem corresponde a uma demanda trabalhista”. E complementa: “na hipótese

expressamente prevista de dispensa do trabalhador, tudo aquilo que não for trazido

à negociação, de acordo com o art. 625-E da CLT, em seu parágrafo único, estará

quitado, excetuadas as ressalvas especificadas pelo trabalhador”. (2003, p. 90).

Ainda, conforme o referido autor:

“Cabe aqui uma brevíssima diferenciação entre renúncia e transação: enquanto aquela é unilateral e recaí sobre direito certo, esta é bilateral e incide sobre direitos incertos (prováveis – res dúbia). A semelhança existente entre os institutos é que ambos são causas extintivas de obrigações”. (2003, p. 90).

A respeito do assunto, é importante fazer referência à opinião de Manoel

Antonio Teixeira Filho (citado por João Luís Vieira Teixeira, 2003, p. 90),

manifestada em um parecer jurídico acerca das Comissões de Conciliação Prévia22:

“[...] devo dizer que embora eu sempre haja sustentado que a quitação passada pelo empregado perante o sindicato de sua categoria ou a DRT – na oportunidade do pagamento dos valores que o empregador lhe entendia devidos em decorrência da dissolução do contrato – estava limitada aos valores especificados no termo ou recibo, isso não significa que deva manter o mesmo entendimento, quanto à quitação dada em decorrência de conciliação realizada no âmbito da CCP. Justifico-me”. [grifos do original]

Será demonstrada qual é a explicação dada, pelo referido autor, sobre essa

diferenciação entre uma quitação efetuada perante um sindicato, e outra, efetuada

perante uma Comissão de Conciliação Prévia:

“Ocorre que, no caso do art. 477, da CLT, o sindicato profissional ou a autoridade do Ministério do Trabalho atua, exclusivamente, como agente fiscalizador da regularidade do pagamento efetuado ao empregado e da correspondente quitação que este outorga, não agindo, portanto, como órgão de conciliação. [...] As CCP´s, ao contrário, por expressa disposição legal, são organismos extrajudiciais de conciliação (melhor: transação), vale dizer, incumbidos de instar as partes a uma solução negociada do conflito

22 Parecer jurídico feito pelo professor e advogado Dr. Manoel Antonio Teixeira Filho, no mês de março do ano 2000, para o Banco Bradesco S/A, respondendo a questionamentos a ele efetuados acerca das, então, recém-criadas Comissões de Conciliação Prévia, instituídas pela Lei nº 9.958/2000.

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de interesses. Sob essa inomitível perspectiva teleológica desses organismos instituídos pela Lei nº 9.958/2000, não vejo motivo por que o empregado não possa dar quitação não apenas dos pedidos formulados, mas de todos os direitos relativos ao contrato de trabalho, desde que isso reflita a sua real manifestação de vontade [...]”. (2003, p. 91). [grifos do original]

Para aprofundar sua linha de pensamento, Manoel Antonio Teixeira Filho

nos traz a seguinte opinião, acerca da percepção do legislador trabalhista, ao

instituir a criação das Comissões de Conciliação Prévia:

“Demais, se o escopo fundamental que levou o legislador a instituir as CCP´s foi, inegavelmente, o de eliminar os conflitos de interesses, esse objetivo estaria frustrado se a quitação que o empregado desse, em decorrência da transação aqui realizada, devesse ficar restrita aos pedidos formulados, pois isso permitiria ao demandante formular em juízo pretensões não manifestadas perante a CCP. Ainda: a conciliação (a que se referirá a quitação) será celebrada perante um órgão integrado por representantes dos próprios empregados, os quais a Lei (CLT, art. 625-B, § 1º) atribui garantia de emprego até um ano após o término do mandato. Sendo assim, não pode cogitar, levianamente, de a quitação vir a ser sempre dada sob pressão do empregador ou conter, inevitavelmente, vício de consentimento [...]”. (2003, p. 91). [grifos do original]

Para o mencionado autor, não há que se falar em vícios do consentimento

quando da realização de acordo diante da CCP, porquanto tal conciliação é

facultativa. Assim, caso o empregado sinta-se pressionado ou coagido, basta que o

mesmo se negue a realizar tal conciliação, desse ato não podendo advir nenhum

efeito negativo para com o empregado.

Com relação à eficácia liberatória geral do termo de quitação firmado

perante uma Comissão de Conciliação Prévia, conforme estatuído pela lei em

exame, eis o que nos diz o mesmo autor:

“É de extrema importância prática, no entanto, chamar a atenção ao fato de que a inferência que estamos a dar à expressão ‘eficácia liberatória geral’ (CLT, art. 625-E, parágrafo único) está intimamente jungida aos termos mediante os quais a quitação for outorgada. Clarifico. Se a quitação disser respeito, apenas, aos pedidos formulados diante da CCP, a eficácia liberatória será geral quanto a esses pedidos, exceto se o autor fizer expressa ressalva acerca de alguns deles”. (2003, p.92). [grifos do original]

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Não havendo ressalvas nesse termo de quitação, Manoel Antonio Teixeira

Filho esclarece:

“Se, contudo, a quitação abranger, de maneira expressa, todos os direitos pertinentes ao contrato de trabalho, importa afirmar, até mesmo os que o empregado não fez valer na oportunidade de seu comparecimento à CCP, a eficácia liberatória decorrente da quitação será efetivamente geral, por forma a fazer com que o empregado não possa pleitear, mesmo em juízo, outros direitos derivantes da relação jurídica material havida com o empregador”. (2003, p. 92).

Dessa forma, conclui o autor que tal quitação é efetivamente geral, mas

dentro dos limites do que foi estabelecido em tal termo, ou seja, as parcelas

ressalvadas e individualizadas poderão ser novamente pleiteadas, seja perante a

CCP, seja perante a Justiça do Trabalho.

Neste sentido, Otávio Brito Lopes entende que:

“Conciliadas as partes, o termo respectivo tem efeito de quitação, isto é, efeito liberatório geral em relação às parcelas submetidas à mediação da Comissão, não atingindo outras reivindicações que não tenham sido objeto da demanda e, consequentemente, não foram acordadas. E não poderia ser de outra forma, pois a transação, o pagamento e a quitação sempre hão de ter um objeto claro, específico e expresso no respectivo instrumento”. (2000, p. 116).

Em posição antagônica, Indalécio Gomes Neto (citado por TEIXEIRA, 2003,

p. 92-93), “o que se preconiza é o máximo de transparência na organização e

funcionamento dessas Comissões, a fim de que, no futuro, não se inquine de nulos

os seus atos, por vícios intrínsecos ou extrínsecos”. Para o referido autor, todos os

direitos disponíveis quitados por meio de conciliação perante uma Comissão de

Conciliação Prévia, nos termos da lei, têm eficácia liberatória geral, ou seja, não

podem mais ser postulados em juízo, o que implicaria a rejeição, pelo Poder

Judiciário, de tais pedidos.

Para o Ministério do Trabalho e Emprego (entendimento já mencionado), “o

acerto realizado perante a Comissão de Conciliação Prévia, sem ressalvas pelo

trabalhador, possui eficácia quitatória sobre todo e qualquer direito trabalhista

relativo ao contrato de trabalho em discussão”.

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6.2 A ASSISTÊNCIA NA RESCISÃO CONTRATUAL

A assistência ao trabalhador no ato da homologação foi criada pela Lei nº

4.066, de 28 de junho de 1962. Seu artigo 1º dispunha que “o pedido de demissão

ou recibo de quitação do contrato de trabalho firmado por empregado com mais de

um ano de serviço, só será válido quando feito com a assistência do respectivo

sindicato ou pela autoridade do Ministério do Trabalho e da Previdência Social ou da

Justiça do Trabalho”.

Posteriormente, a Lei nº 5.472, de 09 de julho de 1968, acrescentou um

parágrafo ao artigo 1º da Lei 4.066: “no termo de rescisão, ou recibo de quitação,

qualquer que seja a causa ou forma de dissolução do contrato, deve ser

especificada a natureza de cada parcela paga ao empregado e discriminado o seu

valor, sendo válida a quitação apenas, relativamente às mesmas parcelas”.

Na visão de Sérgio Pinto Martins “um dos objetivos visados pela Lei nº 5.472

foi o de eliminar a prática dos empregadores de pagar valores globais, sem

quaisquer especificações do que estava sendo saldado ao empregado, que dava

‘quitação geral’, fazendo com que tais recibos passassem a ser ineficazes”. (2008, p.

69). Com o advento da referida lei, houve a necessidade da discriminação da

natureza da parcela que estava sendo paga e da distinção entre parcela (que seria o

aviso prévio, férias, 13º salário etc.) e valor (que seria a importância pecuniária paga

ao empregado).

Mais tarde, a Lei nº 5.562, de 12 de dezembro de 1968, transferiu as

disposições da Lei nº 4.066, com as modificações da Lei nº 5.472, para a CLT, em

seu art. 477, que posteriormente foi alterado pela Lei nº 5.584, de 26 de junho de

1970.

Dispõe o artigo 477, §§ 1º, 2º e 3ª, da CLT que:

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É assegurado a todo empregado, não existindo prazo estipulado para a terminação do respectivo contrato, e quando não haja ele dado motivo para cessação das relações de trabalho, o direto de haver do empregador uma indenização, paga na base da maior remuneração que tenha percebido na mesma empresa. § 1º - O pedido de demissão ou recibo de quitação de rescisão, do contrato de trabalho, firmado por empregado com mais de 1 (um) ano de serviço, só será válido quando feito com a assistência do respectivo Sindicato ou perante a autoridade do Ministério do Trabalho e Previdência Social. § 2º - O instrumento de rescisão ou recibo de quitação, qualquer que seja a causa ou forma de dissolução do contrato, deve ter especificada a natureza de cada parcela paga ao empregado e discriminado o seu valor, sendo válida a quitação, apenas, relativamente às mesmas parcelas. § 3º - Quando não existir na localidade nenhum dos órgãos previstos neste artigo, a assistência será prestada pelo Represente do Ministério Público ou, onde houver, pelo Defensor Público e, na falta ou impedimento deste, pelo Juiz de Paz. [...]

De acordo com o § 1º do dispositivo supracitado, o pedido de demissão do

empregado ou recibo de quitação da rescisão do contrato de trabalho, tendo o

obreiro mais de um ano de casa, só será válido quando feito com a assistência do

respectivo sindicato ou perante a autoridade do Ministério do Trabalho. A contrario

sensu, se o empregado tiver menos de um ano de casa, mesmo pedindo demissão,

o acerto de contas da rescisão do contrato de trabalho pode ser feito na própria

empresa, não necessitando de assistência.

Sérgio Pinto Martins explica que tal parágrafo trouxe uma inovação, pois,

anteriormente, tendo ou não o empregado mais de um ano de casa, o pagamento

das verbas rescisórias era feito na própria empresa, sem necessidade de

assistência. E complementa: “A mudança deu-se em razão das fraudes que eram

praticadas, pois o empregado assinava o termo de quitação sem assistência de

qualquer pessoa e dava quitação sobre o que era pago, não tendo direito de

reclamar eventuais diferenças”. (2008, p. 70).

O § 2º (supracitado), por sua vez, dita que no instrumento de rescisão ou

recibo de quitação, deve ser especificada a natureza de cada parcela paga ao

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empregado e discriminado seu valor, sendo válida a quitação apenas relativamente

às mesmas parcelas.

Por fim, cabe destacar que conforme § 3º do aludido dispositivo legal, na

falta do sindicato ou de representante do Ministério do Trabalho, a homologação

pode ser feita pelo Ministério Público ou, onde houver, pelo Defensor Público e, na

falta ou impedimento destes, pelo Juiz de Paz.

6.2.1 Súmula 41 do TST

As correntes existentes a respeito da interpretação a ser dada ao § 2º do art.

477 da CLT eram duas. A primeira dizia que a quitação abrangia o valor pago

conforme o seguinte aresto (citado por Sérgio Pinto Martins, 2008, p. 71):

“O recibo vale apenas pelas importâncias recebidas, considerando-se como pagamento parcial se os direitos do reclamante excederem àquele valor quitado” (Ac. TRT da 1ª R., 1ª T., Rel. Juiz Rubem Moreira Leite, conforme Cavalheiros Bonfim e Silvério dos Santos (Dicionário de decisões trabalhistas. 12. ed. Rio de Janeiro: Trabalhistas, 1975, p. 425, nº 2.929)).

A segunda corrente interpretava o § 2º do art. 477 da CLT no sentido de que

a quitação se referia a parcelas, pois tal mandamento legal menciona “válida a

quitação relativamente às mesmas parcelas”. Recebendo o empregado o que lhe foi

pago a título de parcela, não poderia reclamar eventual diferença da parcela

recebida. Na jurisprudência (citado por Sérgio Pinto Martins, 2008, p. 71),

verificamos o acolhimento da referida orientação no seguinte acórdão:

“O Tribunal Regional sustentou a tese de que os empregados tinham direito a incluir, no cálculo da remuneração, para fins indenizatórios, a parcela relativa a horas extraordinárias habituais e que a quitação por eles dada quanto à indenização não tem efeito liberatório, por não haver o pagamento levado em consideração o serviço suplementar. Revista provida, para julgar improcedente a reclamação. A quitação dada pelo autor envolve, expressamente, a parcela relativa à indenização por despedida. Na forma do § 2º do art. 477 da CLT, o recibo vale quanto às parcelas nele contidas

48

(segundo sua natureza jurídica) e não mais, restritamente, quanto aos valores consignados e relativos a cada parcela” (Ac. da 1ª T. do TST, Proc. RR 248/72, Rel. Min. Mozart Victor Russomano, conforme Calheiros Bonfim e Silvério dos Santos (1973, p. 343)).

Sérgio Pinto Martins (2008, p. 71) conclui que a tese predominante no TST

foi justamente a primeira, tendo sido editada a Súmula 41, em 14 de junho de 1973,

cuja redação era a seguinte: “a quitação, nas hipóteses dos §§ 1º e 2º do art. 477 da

Consolidação das Leis do Trabalho, concerne exclusivamente aos valores

discriminados no documento respectivo”. Assim, o que valia era a importância paga

ao empregado e não a parcela, podendo o empregado reclamar as diferenças que

entendesse devidas, pois o título em si não estava quitado.

6.3 COMPARAÇÃO ENTRE OS ARTIGOS 477, § 2º e 625-E da CLT

A Súmula 330 do TST surgiu da necessidade de se interpretar mais

corretamente o § 2º do artigo 477 da CLT, de acordo com a Resolução nº 22/93 do

TST, de 17 de dezembro de 1993.

Sérgio Pinto Martins elucida que o artigo 625-E, da CLT tem certa inspiração

na Súmula 330 do TST23 quanto à eficácia liberatória e ressalvas (2010, p. 58),

porém, destacamos que a celebração do termo de conciliação extrajudicial e a

homologação sindical do termo rescisório são institutos diferentes.

23 SUM-330 QUITAÇÃO. VALIDADE (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003 A quitação passada pelo empregado, com assistência de entidade sindical de sua categoria, ao empregador, com observância dos requisitos exigidos nos parágrafos do art. 477 da CLT, tem eficácia liberatória em relação às parcelas expressa-mente consignadas no recibo, salvo se oposta ressalva expressa e especificada ao valor dado à parcela ou parcelas impugnadas. I - A quitação não abrange parcelas não consignadas no recibo de quitação e, conseqüentemente, seus reflexos em outras parcelas, ainda que estas constem desse recibo. II - Quanto a direitos que deveriam ter sido satisfeitos durante a vigência do contrato de trabalho, a quitação é válida em relação ao período expressamente consignado no recibo de quitação.

49

Para entender o que vem a ser a eficácia liberatória geral, é necessário fazer

uma comparação entre o art. 625-E e a previsão contida no § 2º do art. 477, ambos

da CLT.

Prescreve o artigo 477, § 2º da CLT que:

É assegurado a todo empregado, não existindo prazo estipulado para a terminação do respectivo contrato, e quando não haja ele dado motivo para cessação das relações de trabalho, o direto de haver do empregador uma indenização, paga na base da maior remuneração que tenha percebido na mesma empresa. [...] § 2º - O instrumento de rescisão ou recibo de quitação, qualquer que seja a causa ou forma de dissolução do contrato, deve ter especificada a natureza de cada parcela paga ao empregado e discriminado o seu valor, sendo válida a quitação, apenas, relativamente às mesmas parcelas. [...]

Da leitura dos aludidos dispositivos legais, pode-se concluir a disparidade

dos institutos. Enquanto no artigo 477 da CLT, o efeito liberatório está vinculado às

parcelas discriminadas no TRCT, já que é obrigatória a especificação da natureza de

cada uma delas juntamente com a discriminação do valor, “sendo válida a quitação,

apenas, relativamente às mesmas parcelas” (parte final); o artigo 625-E, parágrafo

único, prescreve que o termo terá eficácia liberatória geral, “exceto quanto às

parcelas expressamente ressalvadas”.

Paulo Henrique Tavares da Silva entende que o caminho é inverso: lá o

efeito liberatório é exceção; aqui é a regra! (Revista da ESMAT 13 – Ano 2 – N. 2 –

Novembro de 2009, p. 89). E conclui seu raciocínio ao enfatizar que: “a Lei

9.958/2000, que introduziu em nosso ordenamento jurídico o regramento das CCP´s,

trouxe instituto com características até então inexistentes no sistema de proteção do

trabalho”.

50

6.4 O TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL

Primeiramente, deve ser lembrado o conceito de título executivo, que nos

termos de João Luis Vieira Teixeira,

“Título executivo é o documento que, ao mesmo tempo em que qualifica a pessoa do credor, legitima-o a promover a execução. Nesse título, há a representação de um ato jurídico em que figuram credor e devedor, além da eficácia que a lei lhe confere de atribuir ao credor o direito de promover a execução contra o devedor. Logo, nesse título, estão compreendidos o objeto, os limites e a extensão que se irá promover”. (2003, p. 101).

Como é cediço, a teor do que prescreve o artigo 876 da CLT, com o advento

da Lei 9.958/2000 e, mais especificamente, por meio do parágrafo único, do artigo

625-E da CLT, houve uma importante mudança na competência da Justiça do

Trabalho, pois esta passou a ser competente para a execução de títulos executivos

extrajudiciais.

Desse modo, o artigo 876 da CLT foi alterado e passou a vigorar com a

seguinte redação:

As decisões passadas em julgado ou das quais não tenha havido recurso com efeito suspensivo; os acordos, quando não cumpridos; os termos de ajuste de conduta firmados perante o Ministério Público do Trabalho e os termos de conciliação firmados perante as Comissões de Conciliação Prévia serão executada pela forma estabelecida neste Capítulo. [...]

Entretanto, como bem frisa Manoel Antonio Teixeira Filho (2001, citado por

TEIXEIRA, 2003, p. 101), acerca dessa nova competência da Justiça do Trabalho,

“isso não significa que o processo do trabalho passou a admitir a execução por

quantia certa fundada em qualquer título extrajudicial; os títulos que autorizam a

execução são, apenas, aqueles expressamente mencionados na Lei”. [grifos do

original]. E os títulos mencionados pela lei são: o termo de conciliação, obtido no

âmbito das Comissões de Conciliação Prévia e o termo de ajustamento de conduta,

celebrado com o Ministério Público do Trabalho.

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Para Altamiro J. dos Santos,

“É inquestionável a competência da Justiça do Trabalho para conhecer e decidir as matérias objeto dos títulos executivos extrajudiciais originários do órgão conciliador prévio e o termo de ajuste de conduta firmado perante o Ministério Público do Trabalho”. (2001, p. 273).

6.5 EFICÁCIA LIBERATÓRIA / QUITAÇÃO GERAL

Sérgio Pinto Martins comenta que “o projeto original, que deu origem à Lei

9.958, previa que o acordo seria homologado pelo juiz do trabalho, visando evitar

fraudes, mas não foi aprovado pelo Congresso Nacional”. (2008, p. 78).

Nota-se que na Súmula 330, o TST usa a expressão eficácia liberatória,

enquanto a Lei nº 9.958/2000 emprega o termo eficácia liberatória geral no parágrafo

único do artigo 625-E da CLT. Para um melhor entendimento, importante se faz

entender o sentido da expressão eficácia liberatória.

Para Altamiro J. dos Santos, “eficácia é a força ou efeito que o ato ou fato

jurídico produz, para ser cumprido em todo o seu conteúdo”. (2001, p. 257).

Pedro Nunes (1976, citado por SANTOS, 2001, p. 259) conceitua a palavra

liberatória como: “Liberar. Desonerar, desobrigar: liberar os bens; liberar o devedor.

Solver, resgatar, remir: liberar a obrigação. Quitar (a dívida)”. E acrescenta o

relevante sentido técnico e científico do que se deve entender por liberatório: “Que

tem o feito de solver, quitar, liberar ou remir uma dívida ou obrigação: pagamento

liberatório”. [grifos do autor].

Sérgio Pinto Martins entende que a eficácia liberatória geral só pode dizer

respeito ao que estiver constando do termo de conciliação e não em relação ao

contrato de trabalho, salvo se assim for descrito no termo. (2008, p. 78)

Prevê o artigo 320 do Código Civil que:

52

A quitação, que sempre poderá ser dada por instrumento particular, designará o valor e a espécie da dívida quitada, o nome do devedor, ou quem por este pagou, o tempo e o lugar do pagamento, com a assinatura do credor, ou do seu representante.

Logo, não pode haver eficácia liberatória daquilo que não foi pago. Sobre o

tema, Sérgio Pinto Martins complementa que a quitação compreende apenas as

parcelas e valores pagos e não os títulos. Se não houve o pagamento integral, o

empregado poderá reclamar eventuais diferenças ou até mesmo verbas que não

foram pagas e que, portanto, não foram quitadas. (2008, p. 79).

O Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região, em sua Orientação

Jurisprudencial nº 28 (3ª turma) ratifica este entendimento:

COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA. ART. 625-D DA CLT. [...] II – a transação obtida em CCP acarreta quitação e eficácia liberatória apenas das parcelas que compuserem o pedido formulado na respectiva reclamação, bem como outras parcelas expressamente ressalvadas no termo de conciliação. Não é admitida a quitação da totalidade da relação de trabalho, sem especificação das parcelas quitadas.

53

7. CONCLUSÃO

O instituto conciliação existe desde os primórdios da humanidade e sua

importância no Processo do Trabalho é inequívoca.

O Ordenamento Jurídico busca atualmente, nessas experiências, uma forma

de solução para a crise do poder estatal, que tem se mostrado incapaz de cumprir

com uma de suas funções essenciais, que é a de distribuir justiça e promover a

pacificação social, através da jurisdição.

A morosidade da justiça para resolução dos conflitos trabalhistas tem gerado

enorme insatisfação dos sujeitos da relação (empregado/empregador) e também

demonstra que o apego exclusivo à via jurisdicional tem produzido resultados

danosos para todos.

Devido o crescimento exacerbado de ações, a Justiça do Trabalho deixou de

atuar com agilidade e eficiência desejáveis em decorrência do aumento expressivo

de ações, com isso os juízes estão trabalhando muito além de sua capacidade

laborativa e aglomerando processos.

Assim, na constante busca de aprimoramento no Direito do Trabalho,

marcado atualmente pela lentidão que sofre todo o Poder Judiciário, vem através da

Lei 9.958/2000 criar o instituto da Comissão de Conciliação Prévia, visando

minimizar os efeitos negativos, enfrentando, contudo, certa resistência à adoção dos

meios alternativos para composição de conflitos trabalhistas.

A conciliação deve sim ser utilizada como meio alternativo, não em

substituição à atividade jurisdicional, mas como complemento de sua atuação. Uma

forma de aliviar a justiça formal, sem que, todavia, se cogite de suprimi-la.

Neste contexto, através da criação da Lei 9.958/2000 é possível visualizar a

intenção do legislador ao criar tal norma: fazer com que empregados e

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empregadores tenham uma prestação jurisdicional célere, visando suavizar os

efeitos negativos gerados pela morosidade do Judiciário.

O principal objetivo das Comissões de Conciliação Prévia é desafogar a

Justiça do Trabalho, ficando esta reservada para resolução de conflitos de maior

complexidade. Afinal, não é plausível que as demandas trabalhistas fiquem sujeitas

apenas ao julgamento de órgãos jurisdicionais, onde se estima que em 60% dos

casos sejam concretizados acordos, sendo 40% já na primeira audiência.

Para que as Comissões de Conciliação Prévia atinjam a eficácia pretendida

pelo legislador, há de se propor várias mudanças, principalmente na concepção do

brasileiro, o qual tem desconfiança e aversão a procedimentos extrajudiciais de

solução de conflitos.

O atual posicionamento, ainda que liminar, do STJ e TST de que a

submissão das demandas trabalhistas às Comissões de Conciliação Prévia é

facultativa e não mais obrigatória, traz certa fragilidade ao instituto, eis que, diante

da mera faculdade das partes passarem pelas CCP´s antes do ingresso com a

reclamatória trabalhista, poucos serão os interessados.

A autocomposição através das Comissões de Conciliação Prévia

Trabalhistas de maneira alguma pode ser caracterizada como uma violação

constitucional. Cabe ressaltar, que a lei não objetiva excluir ou dificultar o acesso à

Justiça, nem exclui o direito de ação e nem tenta afastar o Poder Judiciário, busca

tão somente tentar conciliar as partes, que frise-se: não são obrigadas a realizar o

acordo.

O cerne do problema em relação à Comissão de Conciliação Prévia reside

na questão dos efeitos da eficácia liberatória geral do termo conciliatório. É

inaceitável que o acordo celebrado perante a CCP tenha eficácia liberatória geral,

55

como ocorre no acordo firmado perante o Poder Judiciário. Com efeito, os membros

integrantes da CCP, representantes dos empregados e dos empregadores, não

gozam da imparcialidade conferida aos magistrados reforçando a imparcialidade.

Conferindo aos efeitos da eficácia liberatória geral do termo conciliatório a

garantia da imutabilidade da coisa julgada, assim como no Judiciário, atribuir-se-ia

maiores poderes à Comissão de Conciliação Prévia, em detrimento do Poder

Judiciário.

Neste diapasão, os efeitos da quitação, no Direito do Trabalho, devem ser

visualizados de forma restritiva. A quitação dos valores constantes no termo

conciliatório vale apenas pelas importâncias ali consignadas, não gerando efeito

liberatório em sua totalidade, ou seja, do contrato de trabalho como um todo.

Assim, à luz dos princípios informadores do Direito do trabalho – o tutelar e o

da indisponibilidade dos direitos trabalhistas, entende-se que a quitação concedida

pelo empregado perante a Comissão de Conciliação Prévia, mesmo que por

cláusula expressa conferindo eficácia liberatória geral ao ato, abrange tão somente a

matéria e as questões que foram objeto da demanda submetida ao órgão

conciliador, não impedindo que o empregado pleiteie judicialmente outros direitos

que entenda devidos. Logo, não pode haver eficácia liberatória daquilo que não foi

pago.

Para que surtam os regulares efeitos jurídicos, o termo de conciliação

poderia ser homologado pela autoridade do Ministério do Trabalho e Emprego ou

por um Juiz do Trabalho, visto que a transação capaz de autorizar a extinção do

processo pressupõe acordo homologado em juízo conforme o artigo 831, parágrafo

56

único, da CLT (entendimento já pacificado pelo TST na súmula 100, V24 e OJ 132 da

SBDI-225).

Por fim, torna-se cristalino que existem várias melhorias a serem feitas no

instituto da Conciliação Prévia para que este alcance a sua finalidade de maneira

satisfatória, sendo uma ferramenta a favor dos interessados (empregado,

empregador e Estado), motivo pelo qual foi realizado o presente trabalho.

24 SUM-100 AÇÃO RESCISÓRIA. DECADÊNCIA (incorporadas as Orientações Jurisprudenciais nºs 13, 16, 79, 102, 104, 122 e 145 da SBDI-2) - Res. 137/2005, DJ 22, 23 e 24.08.2005 [...] V - O acordo homologado judicialmente tem força de decisão irrecorrível, na forma do art. 831 da CLT. Assim sendo, o termo conciliatório transita em julga-do na data da sua homologação judicial. (ex-OJ nº 104 da SBDI-2 - DJ 29.04.2003) [...] 25 OJ 132 DA SDI-2 DO TST – AÇÃO RESCISÓRIA. ACORDO HOMOLOGADO. ALCANCE. OFENSA À COISA JULGADA. DJ 04.05.2004. Acordo celebrado – homologado judicialmente – em que o empregado dá plena e ampla quitação, sem qualquer ressalva, alcança não só o objeto da inicial, como também todas as demais parcelas referentes ao extinto contrato de trabalho, violando a coisa julgada, a propositura de nova reclamação trabalhista.

57

8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Prévia: Análise interpretativa. Lei nº 9.958, de 12 de janeiro de 2000. (CLT, arts. 625-

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58

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geral do direito do trabalho: relações individuais e coletivas do trabalho. 24. ed. São

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NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. 35. ed. São

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9. ANEXOS

- Manual de Orientação sobre a Comissão de Conciliação Prévia elaborada pelo

Ministério do Trabalho e Emprego;

- Notícia do Tribunal Superior do Trabalho de 29 de maio de 2009;

- Notícia do Tribunal Superior do Trabalho de 08 de abril de 2010;

- Processo TST-AIRR-138740-72.2007.5.01.0281;

- Processo TRT-PR-12285-2009-011-09-00-2 (RO);

- OJ nº 32 – 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região;

- Contrato HDI Seguros / Sindicato dos Securitários do Paraná;

- Demonstrativo do ano de 2010 referente atuação das CCP´s instituídas pela HDI

Seguros e HSBC Seguros.