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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Adalberto Garcia Neto A RESPONSABILIDADE DA EMPRESA MULTINACIONAL PERANTE O DIREITO BRASILEIRO FRENTE VÍCIOS NOS PRODUTOS ADQUIRIDOS NO EXTERIOR. CURITIBA 2012

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

Adalberto Garcia Neto

A RESPONSABILIDADE DA EMPRESA MULTINACIONAL PERANTE

O DIREITO BRASILEIRO FRENTE VÍCIOS NOS PRODUTOS

ADQUIRIDOS NO EXTERIOR.

CURITIBA

2012

Adalberto Garcia Neto

A RESPONSABILIDADE DA EMPRESA MULTINACIONAL PERANTE

O DIREITO BRASILEIRO FRENTE VÍCIOS NOS PRODUTOS

ADQUIRIDOS NO EXTERIOR.

Projeto do trabalho de conclusão de Curso de

Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da

Universidade Tuiuti do Paraná, apresentado ao

Orientador Prof. Diogo do Nascimento Busse

CURITIBA

2012

TERMO DE APROVAÇÃO

Adalberto Garcia Neto

A RESPONSABILIDADE DA EMPRESA MULTINACIONAL PERANTE

O DIREITO BRASILEIRO FRENTE VÍCIOS NOS PRODUTOS

ADQUIRIDOS NO EXTERIOR.

Curitiba, _____ de Maio de 2012.

__________________________________

Prof. Dr. PhD. Eduardo de Oliveira Leite

Coordenador do Núcleo de Monografia

Universidade Tuiuti do Paraná

Orientador: _____________________________________

Professor Diogo do Nascimento Busse

Faculdade de Ciências Jurídicas

Professor: _____________________________________

Professor: _____________________________________

Esta monografia foi julgada e aprovada para obtenção do grau de Bacharel em Direito no Curso

de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.

HOMENAGEM

A Deus, por ter me permitido chegar até aqui, concluindo mais esta tarefa.

A meu Pai, Wilson Garcia (in memoriam), a eterna gratidão pela sábia

maneira com que soube me demonstrar que todas as atitudes praticadas em nossas

vidas tem um desdobramento que repercutirá no mundo jurídico. Pela forma de me

ensinar, criando e alimentando o interesse e a paixão pelo conhecimento do direito,

cativando minha atenção e despertando minha curiosidade. Por me direcionar,

mesmo que inconscientemente, e apesar de tardiamente, a seguir seus passos na

escolha desta bela profissão. A certeza de continuidade, os ensinamentos, os

valores, a conduta, a hombridade e a honra estão sendo passados a futuras

gerações, elevando sempre o amor pela família, e estando presente em todos os

momentos.

A minha mãe Eusa Garcia, por sua fé e positivismo inabaláveis, por suas

palavras de carinho, por seu ânimo inesgotável e a certeza que no final tudo dará

certo, sempre.

A Fernanda, esposa e companheira, por sempre acreditar, até mesmo

quando eu pensei em desistir.

A Mariana, minha filha, pelos momentos em que estive ausente, mas meus

pensamentos nunca deixaram de te acompanhar.

AGRADECIMENTOS

Ao meu professor orientador Diogo do Nascimento Busse, por me ajudar,

incentivar e ter aceitado o desafio do presente trabalho. Pela pessoa humilde e

acessível que é, sempre disposto a transmitir conhecimento, ensinando-me muito

sobre o Direito. Uma das poucas pedras preciosas que encontrei durante essa

caminhada.

Ao Professor Dr. Eduardo de Oliveira Leite, que pela paixão com que nos

ensinou, fez reafirmar o amor pela profissão escolhida.

RESUMO

O presente trabalho visa abordar uma questão vivenciada por grande parte dos brasileiros que, em suas viagens a trabalho ou a lazer ao exterior, acabam por realizar compras de produtos de marcas mundialmente conhecidas, as quais esse consumidor já as tem em grande conceito. Na sua grande maioria, os consumidores acabam por escolher determinada marca em detrimento de outra, por terem a certeza que os produtos adquiridos poderão ter o respaldo de uma representante no local de seu domicilio caso o produto venha a apresentar qualquer tipo de vício. O que na realidade não acontece, em face da insistência do representante brasileiro em negar e não reconhecer seu lugar na cadeia sucessória estabelecida pela legislação consumerista, tentando se eximir da responsabilidade em prestar a devida assistência ao consumidor lesado. Muito embora o Superior Tribunal de Justiça, órgão máxima para julgar casos pertinentes à legislação consumerista já tenha se posicionado quanto à questão, a falta de uma previsão expressa no nosso ordenamento, faz com que inúmeros consumidores continuem sendo lesado pelas praticas abusivas perpetradas pelos grandes conglomerados multinacionais.

Palavras-chave: direito do consumidor; garantia; produto importado; cadeia de fornecedores; representante multinacional.

ABSTRACT

The present work aims to address an issue experienced by many Brazilians who, in

his travels for business or leisure abroad, end up making purchases of products from

internationally renowned brands, which the consumer has to have a great concept.

For the most part, consumers end up choosing particular brand over another, for they

are certain that the products purchased may be supported by a representative at the

place of his domicile if the product will have any kind of addiction. What actually

happens, given the insistence of the Brazilian representative to deny and not

recognize his place in the chain of succession established by law consumerist, trying

to evade the responsibility to provide appropriate assistance to the injured consumer.

Although the Superior Court of Justice, maximum body to hear cases pertaining to

consumerist legislation has already positioned itself on the issue, the lack of an

express provision in our land makes many consumers continue to be injured by

unfair practices perpetrated by large conglomerates multinationals.

Key words: consumer rights; warranty; imported product, supply chain, representing

multinational.

SUMÁRIO

1- INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 9

2- A NECESSIDADE DE UMA INTERPRETAÇÃO PÓS-POSITIVISTA. ............................ 10

3- RESPONSABILIDADE NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR ......................... 13

3.1- CONCEITO DE CONSUMIDOR ................................................................................... 14

3.2- CONCEITO DE FORNECEDOR ................................................................................... 18

3.3- VULNERABILIDADE OU HIPOSSUFICIÊNCIA DO CONSUMIDOR? .......................... 19

3.3.1- A vulnerabilidade como princípio norteador das relações de consumo ...................... 21

3.3.2- Conceito .................................................................................................................... 22

3.3.3- Espécies de vulnerabilidade ...................................................................................... 23

3.3.3.1- Econômica .............................................................................................................. 24

3.3.3.2- Jurídica ................................................................................................................... 25

3.3.3.3- Técnica ................................................................................................................... 26

3.3.3.4- Fática ...................................................................................................................... 26

3.3.3.5- Política .................................................................................................................... 27

3.3.3.6- Informativa .............................................................................................................. 27

4- RESPONSABILIDADE DO FORNECEDOR A LUZ DO CÓDIGO DE DEFESA DO

CONSUMIDOR .................................................................................................................... 30

4.1- CONCEITO DE RESPONSABILIDADE CIVIL .............................................................. 31

4.2- ESPÉCIES .................................................................................................................... 32

4.3- RESPONSABILIDADE NAS RELAÇÕES DE CONSUMO ............................................ 32

4.4- DA RESPONSABILIDADE PELO FATO DO PRODUTO OU DO SERVIÇO ................. 34

4.5- DA RESPONSABILIDADE PELO VÍCIO DO PRODUTO OU DO SERVIÇO ................ 37

5- CADEIA DE FORNECEDOR E SOLIDARIEDADE ......................................................... 39

5.1- AS TENDÊNCIAS JURISPRUDENCIAIS DE EXTENSÃO DO CONCEITO DE

CONSUMIDOR E A SOLIDARIEDADE..................................................................................42

6- RESPONSABILIDADE DAS MULTINACIONAIS SEDIADAS EM TERRITÓRIO

NACIONAL – AFINAL, QUEM RESPONDE? ..................................................................... 43

6.1 - DA APLICAÇÃO DA LEI ESTRANGEIRA OU DA SUBMISSÃO AO CÓDIGO DE

DEFESA DO CONSUMIDOR .............................................................................................. 46

6.1.1- Da Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro ................................................ 46

6.1.2- O Código de Defesa do Consumidor como Norma Imperativa e de Ordem Pública ... 50

7- ENFRENTAMENTO PELOS TRIBUNAIS – CASOS CONCRETOS ............................... 52

8- LACUNA LEGISLATIVA E ADEQUAÇÃO AO CONTEXTO ATUAL...............................57

9- CONCLUSÃO ................................................................................................................. 58

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................................60

9

1 INTRODUÇÃO

Vivemos em um mundo globalizado, uma realidade da qual não se pode

escapar, fato este inevitável, e que é facilmente constatado pela integração entre os

países, seja por necessidade econômica, conveniência política ou fatores sociais.

O fenômeno da internet, o turismo e as relações privadas de ordem

internacional ultrapassaram as fronteiras nacionais para aumentar as relações

mercantis entre os países do mundo todo e tornando assim o direito do consumidor

um assunto de grande preocupação global, apesar de recente o tema.

Importante destacar que a questão influencia diretamente os cidadãos das

diversas nações, bem como todo o arcabouço jurídico que regula ou tenta regular as

diferentes questões que envolvem a sociedade, as informações, as finanças e o

comércio dos diferentes países.

Diante desta globalização, das relações comerciais e laborais estabelecidas

entre diversas empresas e diferentes nações, da facilidade através da internet de

atingir mercados até pouco tempo inalcançáveis, consubstanciada a valorização da

moeda nacional, é cada vez maior o número de brasileiros que viajam ao exterior a

negócios ou a lazer, e que acabam por adquirir produtos de marcas mundialmente

conhecidas e preferencialmente daquelas que contam com representação em

território brasileiro. A compra destes produtos na maioria das vezes se dá em face

da vantagem financeira encontrada pelo consumidor, somada à representatividade

global da marca.

Na sua grande maioria, as pessoas que adquirem produtos no exterior

acabam optando por determinada marca em detrimento de outra, justamente por

terem prévio conhecimento que a marca escolhida é mundialmente comercializada e

dispõe de representação no mercado brasileiro, e que, caso o produto adquirido

10

encontre-se eivado de algum vício, poderão contar com um representante local apto

a repará-lo, prestando a devida assistência e garantia.

O presente trabalho suscita uma pequena questão desse universo, que se

encontra pendente de regulamentação específica, deixando por muitas vezes

desamparado o consumidor perante a legislação vigente, que acaba por se sujeitar à

interpretação da legislação sob a ótica das empresas multinacionais e suas

representantes locais que não reconhecem a garantia do produto adquirido fora do

mercado brasileiro, negando sua responsabilidade quanto aos vícios, bem como

com o dever de repará-los.

2 A NECESSIDADE DE UMA INTERPRETAÇÃO PÓS-POSITIVISTA

Ao traçarmos os primeiros estudos sobre o tema proposto, constatamos que

a falta de uma legislação específica sobre o assunto, ou seja, sobre o dever das

representantes das empresas multinacionais sediadas em nosso território em honrar

a garantia dos produtos de sua marca provenientes do exterior, fez surgir à

necessidade de uma interpretação além-norma ou pós-positivista.

A tentativa de pacificar a problemática encontrada fez com que juízes e

tribunais inovassem, dando uma nova “leitura” à legislação existente, considerando

diversos aspectos, não só legais, mais também de ordem social, consubstanciado

ainda a princípios econômicos e de ordem pública, amparados na Constituição da

República, buscando um entendimento sobre para quem penderia o direito.

Não podemos esquecer que as diversas mudanças pelas quais nossa

sociedade vem passando têm influenciado em muito o nosso sistema jurídico como

um todo, ademais, o nosso sistema codificado “engessado” não poderia prever todas

essas mudanças e manter-se atualizado em satisfazer as necessidades dessa nova

11

sociedade. Diante deste novo panorama, aumentou a demanda por uma atuação

cada vez maior dos personagens que integram o nosso ordenamento, buscando

assim a pacificação dos problemas encontrados por essa nova sociedade, sendo

necessário muitas vezes atribuir uma nova perspectiva de interpretação das

consagradas teorias jurídicas até então consolidadas.

Neste sentido, encontramos as palavras do professor Ecio Oto Ramos

Duarte:

“o Estado legislativo de direito, em face de sua conjunção a uma concepção positivista de direito, não era capaz de formular a realização da aproximativa de um ideal moral que pudesse romper com a noção do direito como positivado e seguir à esteira do direito dimensionado, não mais numa filosofia da consciência, mais inserido numa filosofia da linguagem intersubjetiva construtiva da normatividade”

1.

Não pretendemos adentrar ao estudo profundo dos contornos destas teorias,

contudo, poderemos verificar que o processo de Globalização tem influenciado

nossa sociedade como um todo, assim como a atuação estatal que dela decorre.

Dessa forma, houve uma mutação da construção codificada do arcabouço

jurídico teórico, influenciando a jurisprudência dos tribunais pelas rápidas mudanças

ocorridas em nossa sociedade, cujo direito influenciado pela concepção positivista

sem prever tamanha evolução, acabava por muitas vezes não entregando a

contraprestação jurisdicional que dele se espera.

O Código de Defesa do Consumidor é um corpo de leis que decorre de

proteção Constitucional, conferida aos consumidores, conforme vemos a partir da

leitura do artigo 5º, XXXII.

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...]

1 Duarte, Écio Oto Ramos. Neoconstitucionalismo e positivismo jurídico: as faces da teoria do direito em tempos de

interpretação moral da constituição. São Paulo: Landy Editora, 2006, p.19.

12

XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor” 2.

Nossa Constituição Federal foi inteligente ao verificar que a pessoa por

detrás do sujeito de direito, em situações peculiares (vulnerabilidade e

hipossuficiência), necessita e merece proteção.

Como preceitua o ilustre doutrinador Silvio de Salvo Venoza:

“A Constituição Federal de 1988, pela primeira vez em nossa história jurídica, contemplou os direitos do consumidor. No inciso XXII do artigo 5º dispôs a carta: "O Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor". Nesse dispositivo Estado está como denominação genérica de administração, por todos os seus entes públicos. Não bastasse isso, a Constituição Federal tornou a defesa do consumidor um princípio geral da ordem econômica (artigo 170, V). Ainda, o artigo 48 das Disposições Transitórias determinou que o Congresso Nacional, dentro de cento e vinte dias da promulgação da Constituição, elaborasse código de defesa do consumidor. Assim sendo, foi promulgado o código que já atravessou os primeiros dez anos de vigência, com profícuos resultados na sociedade brasileira. O Código de Defesa do Consumidor (CDC) colocou nosso país dentro das mais modernas legislações protetivas das contratações de consumo, mormente das contratações em massa. (VENOSA, In. Site do MPF: 18 de setembro de 2002)”

3.

Conforme determinação constitucional foi elaborado e posteriormente

promulgado o Código de Defesa do Consumidor, que tratou ainda de classificar o

presente diploma como norma de ordem pública e interesse social, o que trás uma

importante relevância quanto à aplicabilidade do disposto quando encontrados

conflitos entre leis nos casos de situação jurídica multiconectada.

Assim, muito embora não haja uma determinação expressa prevista em

nossa legislação quanto ao tema proposto, vemos que, como Código de Defesa do

Consumidor trata-se de um ordenamento previsto constitucionalmente, de ordem

pública e interesse social, acaba por afastar qualquer possibilidade de aplicação de

outra normativa, fazendo com que juízes e tribunais possam aplicar as normas nele

2 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 1988

3 Venosa, Silvio de Salvo. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/6276/a-aplicacao-do-principio-da-vulnerabilidade-do-

consumidor-x-o-aspecto-da-invariabilidade-do-conteudo-dos-contratos-de-adesao#ixzz1y65HvPuI

13

contidas a caso concreto, atribuindo a responsabilidade objetiva e a cadeia de

fornecimento solidaria, resolvendo a problemática encontrada.

3 RESPONSABILIDADE NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Com o advento do Código de Defesa do Consumidor, viu-se que a intenção

do legislador foi criar uma legislação que respondesse e acompanhasse a formação

de uma sociedade caracterizada pela complexidade tecnológica e com produção em

massa, visando fundamentalmente à proteção dos interesses do consumidor, peça

essencial, porem, desamparado na normativa até então vigente, onde seus direitos

encontravam-se aquém de sua posição contratual.

Nas palavras da ilustre professora Claudia Lima Marques:

“Efetivamente, o novo do Código de Defesa do Consumidor é ter identificado um sujeito de direitos especiais, o consumidor, e ter construído um sistema de normas e princípios orgânicos para protegê-lo e efetivar seus direitos”

4.

Assim, surgiu a necessidade de se romper com o binômio das relações

contratuais e extracontratuais, buscando um regime de responsabilização mais

direto e objetivo.

O Código de Defesa do Consumidor passa a adotar a lógica dos bens

jurídicos tuteladas, abandonando a responsabilidade de acordo com a natureza do

vínculo. Passando a dividir a responsabilidade civil nas relações de consumo como,

responsabilidade por defeito e por vício, que serão demonstradas mais a frente.

Dessa forma, a legislação consumerista trouxe a responsabilidade como

risco da empresa.

A completa implementação da teoria do risco se processou com a

promulgação da Constituição da República de 1988, quando trouxe a

4 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 5ª. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006,

p.372.

14

responsabilidade objetiva do Estado em seu artigo 37, § 6º, que posteriormente

incorporou-se ao Código de Defesa do Consumidor como risco da empresa.

Importante destacar que, com o advento do Código Civil de 2002, a redação

disposta no artigo 927, e paragrafo único, trataram por instituir a cláusula geral da

responsabilidade objetiva.

“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”

5.

A teoria do risco aparece como justificativa para a responsabilidade civil

objetiva. Entende-se que, o desenvolvimento de uma atividade potencialmente

perigosa automaticamente incumbe o agente em responder por danos que cause a

terceiros. Depeende-se que a responsabilidade nasce da possibilidade de danos que

a atividade praticada ou desenvolvida possa vir a causar.

É claro que sua aplicabilidade restringe-se as relações de consumo, sendo

necessário detectarmos quando nos encontramos inseridos nessa categoria, assim,

passamos a demonstrar os conceitos de consumidor e fornecedor para termos

fielmente delimitados uma relação consumerista.

3.1 CONCEITO DE CONSUMIDOR

A codificação dos direitos do consumidor foi perfeita em seu artigo 2º, nos

trazendo a definição do que, para a legislação brasileira se entende por Consumidor:

“Art. 2º - Consumidor é toda a pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”

6.

5 BRASIL. Código civil. 64. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

6 BRASIL. Código de defesa do consumidor. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

15

Muito embora exista uma grande discussão sobre a aplicabilidade literal da

redação dada ao artigo acima mencionado, nos parece plausível que o legislador

quis delimitar o conceito de consumidor, sendo plenamente possível deduzir que

consumidor é toda a pessoa física ou jurídica que adquire o produto ou serviço como

sendo o destinatário final, ou seja, aquele que retira o bem do mercado para seu

próprio uso pessoal ou de terceiros, desde que não seja para fins de

comercialização.

Muito embora cabalmente demonstrado o conceito de consumidor pela

legislação, não podemos deixar de mencionar a discussão doutrinária no que

concerne à utilização do bem retirado do mercado para utilização em seu próprio

negócio, como por exemplo, a de um estabelecimento comercial que adquire

computadores para usar em seu trabalho, sem fins de comercialização, se estes

computadores apresentarem defeitos, a dúvida seria de como classificar este

estabelecimento, se ele poderia se enquadrar na figura de consumidor.

A partir da premissa acima suscitada, podemos citar as teorias mais

expressivas existentes a fim de classificar tal situação: a teoria finalista e a teoria

maximalista.

A primeira entende que o consumidor é aquele que adquire o bem ou o

serviço para uso próprio ou de sua família. Não podendo ser a figura do profissional,

uma vez que o Código de Defesa do Consumidor visa proteger o lado mais

vulnerável dessa relação que é o consumidor, ou seja, pessoa que não tem a

possibilidade de repassar o custo de eventual prejuízo para outro.

Lançamos mão dos ensinamentos balizadores da ilustre professora Cláudia

Lima Marques que demonstra tal corrente ao dizer:

“Destinatário final é aquele destinatário fático e econômico do bem ou serviço, seja ele pessoa jurídica ou física. Logo, segundo esta interpretação teleológica, não basta ser destinatário final fático do produto, retirá-lo da

16

cadeia de produção, levá-lo para o escritório ou residência: é necessário ser o destinatário final e econômico do bem, não adquiri-lo para revenda, não adquiri-lo para uso profissional, pois bem seria novamente um instrumento de produção cujo preço será incluído no preço final do profissional que o adquiriu. Neste caso, não haveria a exigida “destinação final” do produto ou do serviço”

7.

Esta corrente é defendida pela doutrina majoritária, sendo representa

inclusive pelos autores do anteprojeto do Código de Defesa do Consumidor. De

acordo com o jurista José Geraldo de Brito Filomeno:

“prevaleceu, entretanto, a inclusão das pessoas jurídicas como consumidores de produtos e serviços, embora com ressalva de que assim são entendidas aquelas como destinatárias finais dos produtos e serviços que adquirem, e não como insumos necessários ao desempenho de sua atividade lucrativa”

8.

Assim, o Código de Defesa do Consumidor reconhece a pessoa jurídica

como consumidor desde que sejam destinatários finais dos bens ou serviços

adquiridos.

Passamos agora para a teoria maximalista, que aceita que a normatização

consumerista também sirva para defesa daquele consumidor que também seja

profissional, pois elas seriam destinadas a reger toda uma sociedade de consumo,

incidentes todos os agentes de mercado, podendo assumir papéis de consumidor ou

fornecedor de acordo com a situação.

Novamente lançamos mão dos ensinamentos balizadores da professora

Claudia Lima Marques:

“O legislador Brasileiro parece ter, em princípio, preferido uma definição mais objetiva de consumidor. Cuja definição legal expõe a única característica restritiva seria a aquisição ou utilização do bem como destinatário final. Certamente, ser destinatário final é retirar o bem de mercado (caracterizando como ato objetivo), mas, e se o sujeito adquiri o bem para utilizá-lo em sua profissão, adquiri como profissional (elemento subjetivo), com fim de lucro, também deve ser considerado “destinatário final?”

9.

7 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 5ª. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006,

p.304. 8 FILOMENO, José Geraldo de Brito. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. Comentado pelos autores do Anteprojeto,

Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. 3ª edição.2001.Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001. p.29. 9 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 5ª. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006,

p.303.

17

Muito embora o artigo 2º do Código de Defesa do Consumidor não responda

a essa pergunta, a doutrina maximalista entende que para se caracterizar como

consumidor bastaria que o agente retirasse o produto do mercado, não levando em

consideração se o faz com intenção de lucro ou não.

A codificação consumerista trouxe também em seu texto, conceitos

suplementares vislumbrando situações futuras, estabelecendo assim a figura dos

consumidores por equiparação. Grosso modo, seria dizer que todos aqueles que

integram uma relação de consumo são considerados consumidores por

equiparação:

“Art. 2º, Parágrafo único – Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que hajam intervindo nas relações de consumo. Art. 17 – Para os efeitos desta seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento. Art. 29 – Para fins deste capítulo e do seguinte, equiparam-se a consumidores todas as vítimas do evento”

10.

Essas figuras criadas pela legislação consumerista podem, de forma objetiva

responsabilizar o fornecedor, afinal o Código procurou proteger os interesses

daquelas pessoas estranhas à relação de consumo, mas que de alguma forma

sofreram danos intrínsecos ou extrínsecos do produto ou serviço.

Tendo em vista que o legislador ao elaborar a codificação consumerista já

estivesse vivenciando o inicio de uma época de globalização, não se ateve as

futuras mudanças comportamentais que esse fenômeno viria a acarretar em nossa

sociedade, não podendo prever os impactos dessas mudanças no mundo jurídico.

Entretanto, o conceito e exploração de multinacionais em nosso mercado já estavam

a muito consolidado em nosso país. Vivemos a carência de uma previsão expressa

quanto às relações de consumos estabelecidas fora do mercado nacional, quando

10

BRASIL. Código de defesa do consumidor. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

18

poderia o legislador ter caracterizado a extensão da cadeia de fornecedores as

empresas que contam com sede em nosso território, responsabilizando-as

independentemente de onde a aquisição do produto tenha sido realizada.

Nesse sentido a legislação não especifica que a compra do bem tem que se

processar em território nacional para que o consumidor possa se valer das

prerrogativas lançadas da codificação consumerista na tentativa de ter seus direitos

resguardados.

Entretanto, antes de adentrarmos a questão acima suscitada, é essencial

definir na relação comercial a existência da figura do consumidor e do fornecedor,

para então podermos classificá-la como uma relação de consumo, e via de regra

aplicarmos a legislação consumerista.

3.2 CONCEITO DE FORNECEDOR

Passamos agora a delimitar o conceito de consumidor para termos

esclarecido quando podemos ter uma relação de consumo e assim aplicarmos a

legislação consumerista.

É certo que a existência de uma relação de consumo requer sejam seus

polos ativo e passivo ocupados, por consumidor e fornecedor. Assim, passamos a

demonstrar que a codificação trouxe em seu artigo 3º, a definição de fornecedor:

“Art. 3º - Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvam atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços”

11.

O legislador tentou prever diversas possibilidades de atividades quando

elaborou o caput do artigo 3º, evidenciando implicitamente que a atividade deverá

ocorrer de forma habitual, profissional e com fins lucrativos.

11

BRASIL. Código de defesa do consumidor. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

19

Passando então a conceituar em seus parágrafos o que se entende por

“produtos e serviços”:

“Art.3º - [...] § 1º - Produto é qualquer bem móvel ou imóvel, material ou imaterial” § 2º - Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancárias, financeiras, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista”

12.

Assim, podemos dizer que a nomenclatura de fornecedor perfeitamente se

aplica a todo comerciante ou estabelecimento comercial que abastece, fornece ou

resguarda habitualmente outro estabelecimento ou residência com produtos e

mercadorias necessárias ao seu consumo.

Tendo sido amplamente explicado os conceitos de consumidor e fornecedor,

passaremos a expor que, partindo do pressuposto dominante que o consumidor é o

elo fraco na relação de consumo, temos que identificar se sua fragilidade se dá pela

vulnerabilidade ou por hipossuficiência, previstos nos artigos 4º, I e 6º, VII,

respectivamente.

3.3 VULNERABILIDADE OU HIPOSSUFICIÊNCIA DO CONSUMIDOR?

Muito embora neste ponto haja uma diferença de opinião entre eu e meu

ilustre professor orientador, entendo que, pelos estudos realizados e trazidos à

análise, bem como, pelas aulas de direito do consumidor frequentadas na faculdade,

que a partir da leitura do artigo 4º, I, do Código de Defesa do Consumidor, podemos

dizer que todo consumidor é vulnerável.

12

BRASIL. Código de defesa do consumidor. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

20

Trata-se de uma característica inerente a todo e qualquer consumidor, ou

seja, é uma condição atribuída ao consumidor trazida pela legislação, e dele não

podendo se desligar, nasce com a figura do consumidor.

“Art. 4º - A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:

I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo;”

13. (grifos nossos).

Do dispositivo acima transcrito, verifica-se que a legislação albergou todos

os consumidores como vulneráveis, não criando uma classe específica ou distinta.

Passando ao estudo da hipossuficiência, verificamos quando da leitura do

artigo 6º, VIII, que esta característica trata-se de uma marca pessoal de cada

consumidor, levados em consideração os fatos, a própria vida, as circunstâncias

fáticas que deverão ser consideradas, devendo ser verificadas pelo juiz ao analisar o

caso concreto.

“Art. 6º - São direitos básicos do consumidor: VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;“

14. (grifos nossos).

Vemos que é uma condição que deve ser valorada pelo juiz ao analisar o

caso concreto, e, em sendo identificada, ser aplicado à condição de hipossuficiente

como direito básico do consumidor.

Segundo preleciona o Douto professor De Plácido e Silva:

“Hipossuficiente é aquele que tem direito à assistência judiciária” 15.

13

BRASIL. Código de defesa do consumidor. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. 14

BRASIL. Código de defesa do consumidor. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. 15

SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. atualizadores: Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho. 26. ed. Rio de Janeiro:

Forense, 2006.

21

Assim, tratam-se de termos diferentes, sendo equivocada a utilização como

sinônimos, se os fossem, todo consumidor teria o direito a inversão do ônus da

prova.

Nota-se a vulnerabilidade como característica inerente a todo consumidor,

sendo aplicada independentemente da valoração do juiz ou do tribunal ao caso

concreto, dessa forma vemos sua aplicabilidade como tentativa de se buscar uma

igualdade de forças nas relações de consumo, de onde se parte da premissa de que

todo o consumidor é vulnerável, elo mais fraco da relação estabelecida, estando

sujeito às práticas abusivas dos fornecedores no mercado de consumo em geral.

3.3.1 A vulnerabilidade como princípio norteador das relações de consumo

Passamos agora a demonstrar o princípio maior que rege as relações de

consumo entendido como o princípio da vulnerabilidade do consumidor.

Ficou evidenciado que o legislador pretendia demonstrar a fragilidade do

consumidor na relação estabelecida frente ao fornecedor, assim, trouxe

explicitamente em seu artigo 4º, I, tal condição, pretendendo que esta fosse

reconhecida pelo mercado de consumo.

“Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:

I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo;”

16.

Dessa forma, o legislador reconheceu que todos os princípios, direitos e

garantias atribuídas ao consumidor decorrem da sua posição de vulnerabilidade

frente ao fornecedor.

16

BRASIL. Código de defesa do consumidor. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

22

Buscou-se, ao demonstrar a vulnerabilidade do consumidor, trazer o

fornecedor a um nível de igualdade, materializando outro consagrado princípio, o da

igualdade material. Pretendeu-se equilibrar a relação de consumo, quando o

consumidor lesado pleiteia seus direitos junto ao fornecedor, e, em não sendo

respondido, tem a necessidade de buscar a tutela de seus interesses, seja nas

esferas administrativas ou no judiciário.

Conforme os ensinamentos do professor Diogo do Nascimento Busse:

“Ao momento em que a legislação consumerista materializa no mundo fático essa conduta, acabou por aplicar o princípio da igualdade substancial, investigando a pessoa por detrás do sujeito de direito abstrato. Não mais bastando em nossa realidade à igualdade meramente formal no intuito de resguardar os direitos mais fundamentais, vez que negligencia as diferentes realidades dos sujeitos que dela necessitam”

17.

Dessa forma, atinge-se o que entendemos como o objetivo maior da Lei

nº8078/1990, senão outro o de equilibrar juridicamente a relação estabelecida entre

consumidor e fornecedor. Percebe-se, o grande esforço por parte do legislador de se

evitar uma relação desigual e injusta, impedindo qualquer prejuízo para o

consumidor. O Código de Defesa do Consumidor foi criado, exatamente, sob a

perspectiva do reconhecimento da vulnerabilidade do indivíduo tutelado, sendo

aquela o fundamento e a razão de ser de tal diploma jurídico, tentando-se, de todas

as formas, buscar valores e princípios imprescindíveis para que fosse efetivada uma

convivência mais harmônica nas relações de consumo.

3.3.2 Conceito

Nesse sentido, buscando o melhor entendimento possível do que se tem por

vulnerabilidade do consumidor frente às relações de consumo e o motivo pelo qual o

legislador constituinte acreditou ser o consumidor merecedor de um diploma legal

17

BUSSE, Diogo Nascimento. Direitos fundamentais na relação contratual: a pessoa por detrás do sujeito. In: “Revista Jurídica Ius gentium”. Faculdade Internacional de Curitiba, ano 3, n. 6 (jul/dez 2009). Curitiba: Facinter, 2009, p. 175-190.

23

específico para sua proteção, é de bom alvitre conceituar o que se tem por princípio

da vulnerabilidade.

O termo vulnerabilidade descende de vulnerável, diz-se do lado fraco de

uma questão ou do ponto por onde alguém pode ser ferido ou atacado. Aquele que

esta suscetível, por sua natureza, a sofrer ataques.

No Direito, vulnerabilidade é o princípio segundo o qual o sistema jurídico

reconhece a qualidade do agente mais fraco na relação, seja com relação a

trabalhadores, a gestantes, ao consumidor, etc... Daí se tem que especificamente o

princípio da vulnerabilidade do consumidor é a caracterização absoluta do

consumidor como sendo ente vulnerável, sendo essa uma premissa básica e

indispensável para a harmonização e equilíbrio nas relações de consumo.

Para jurisprudência majoritária, entende-se que essa caracterização de

vulnerabilidade como absoluta no sentido de que todo e qualquer consumidor é a

parte vulnerável na relação de consumo por diversos aspectos. Destarte, como o

legislador trouxe a previsão legal que deve ser reconhecida a vulnerabilidade do

consumidor, sem qualquer condicionante, onde houver uma relação de consumo, o

“elo mais fraco da corrente” vai ser sempre o consumidor.

Muito embora a doutrina majoritária entenda que o consumidor como

vulnerável, é importante destacar que em recentes decisões tem-se notadamente

visto que a jurisprudência busca avaliar a relação estabelecida ente as partes, não

aplicando indeliberadamente essa característica ao consumidor.

3.3.3 Espécies de vulnerabilidade

Conforme o significado da própria palavra, vulnerabilidade no direito do

consumidor pode ser compreendida em várias espécies.

24

A partir desta identificação, podemos demonstrar como e porque a

fragilidade do consumidor é exacerbada.

A vulnerabilidade pode ter caráter econômico, jurídico, técnico, político e

informativo, ou seja, o fornecedor tem todo esse “poderio de armas” para atacar o

consumidor. E o faz irrestritamente e da forma mais predadora que vemos hoje.

Considerando a vulnerabilidade como sendo a qualidade de quem é

vulnerável, daquele que está suscetível, por sua natureza, a sofrer ataques.

A seguir traçaremos uma breve explicação sobre as espécies de

vulnerabilidade que podem ser encontradas na relação consumidor-fornecedor.

3.3.3.1 Econômica

É o resultado da diferença de força entre os agentes econômicos e os

consumidores. Os fornecedores gozam de condições objetivas para impor sua

vontade pelos diversos mecanismos que se encontram a sua disposição. Destaca-se

a introdução dos contratos de adesão e os contratos submetidos às condições

gerais.

A vulnerabilidade econômica se processa quando verificada a mudança do

mercado concorrencial clássico do século XIX, não preocupado com qualquer tipo

de proteção ao consumidor.

Ao superarmos o mercado concorrencial, na segunda metade do século XX,

passamos a ter uma economia regulada, que veio a alterar consideravelmente o

quadro até então desenhado.

Passamos a fase dos grandes conglomerados, que alteraram todo conceito

de mercado por assim dizer. Desde a formação dos preços, as peças publicitárias

engenhosas, capazes de despertar os maiores desejos e influenciar o consumidor

25

criando necessidades irreais, trouxeram a tona uma nova problemática, a

necessidade de proteção do consumidor, elemento indispensável na atual economia.

O consumidor passa a ficar exposto a todo tipo de influencia externa,

enquanto os produtores passam a determinar o consumo, estimulando pelos mais

diversos meios novas necessidades ao consumidor, de certa forma até a prever o

que será consumido.

Assim, os conglomerados conseguiram colocar o consumidor um degrau

abaixo na relação de consumo, estando subordinado aos seus ditames.

Dessa nova realidade, surgiu a necessidade de uma maior intervenção

estatal no âmbito econômico das relações de consumo, buscando a balança

pendente, que se encontrava muito favorável ao fornecedor.

3.3.3.2 Jurídica

Trata-se da grande dificuldade que o consumidor encontra na luta em defesa

dos seus direitos, quer na esfera administrativa quer na esfera judicial.

Facilmente evidenciado quando tratamos dos contratos de adesão.

Já era sabido pelo legislador das dificuldades encontradas pelo consumidor

quanto a esse tipo de vulnerabilidade, que, em se preocupando com o tema, adotou

medidas que buscam equilibrar o assunto. Fato este demonstrado no art. 51 do

Código de Defesa do Consumidor, pelo rol taxativo de cláusulas abusivas que

bastam constar do instrumento para torna-las nulas de pleno direito.

O Código de Defesa do Consumidor ao elidir as cláusulas abusivas, busca

desestimular a estipulação de cláusulas contratuais que coloquem em desvantagem

o consumidor frente ao fornecedor.

26

3.3.3.3 Técnica

Decorre do fato do fornecedor deter todo o conhecimento a respeito do

produto ou serviço disponibilizado no mercado de consumo, mantendo o consumidor

a mercê de suas praticas, onde a única garantia do consumidor é a confiança e a

boa fé da outra parte.

Esta vulnerabilidade se opera graças à complexidade do mundo moderno,

que torna impossível ao consumidor conhecer todas as vantagens e desvantagens

de todos os produtos que adquire ou que tem intenção de adquirir. Ficando

desamparado e tendo que acreditar nas informações prestadas pelo fornecedor.

Informações estas que podem se mostrar conflitantes e já que dificilmente há

possibilidade de saber quando determinado produto ou serviço apresenta defeito ou

vício, ou ainda não restará para a finalidade pretendida, colocando em perigo sua

incolumidade física e patrimonial.

Enfim, vez que o fornecedor que opera no mercado dispõe de todo um

investimento em estruturas administrativas, legal, econômica e tecnologia para

amparar e explorar suas atividades, na contramão encontra-se o consumidor que

além de não possuir, na maioria dos casos sequer tem acesso as informações que

se mostram indispensáveis para aceitar ou não a compra do produto.

3.3.3.4 Fática

Nos dias de hoje, praticamente todos os lugares do planeta podem ser

atendidos pela grande maioria dos fornecedores. Tal vulnerabilidade se processa

quando, em determinado mercado somente existe um ou pouquíssimos

fornecedores, impossibilitando ao consumidor seu direito de escolha.

27

Decorre até da essencialidade do produto ou serviço no mercado, como no

caso de saúde, educação, disponibilidade de crédito, ficando o consumidor sujeito

às condições impostas pelo mercado.

3.3.3.5 Política

A vulnerabilidade política se manifesta pela falta da união dos consumidores.

Esta falta de união impossibilita a luta e reivindicação dos direitos dos consumidores,

que sozinhos, não conseguem impor suas necessidades frente aos grandes

conglomerados. Muito embora o Código de Defesa do Consumidor incentive a

possibilidade da criação de entidades civis de defesa de seus interesses, o que

vemos na prática é totalmente inoperante, os consumidores desconhecem a força

que poderiam ter se devidamente organizados.

Na contra mão dessa desorganização dos consumidores, encontram-se os

fornecedores, devidamente organizados em categorias, exercendo seu “lobby”

efetivo frente aos legisladores, persuadindo-os na medida de seus interesses.

3.3.3.6 Informativa

A vulnerabilidade informativa deriva diretamente do princípio da informação,

diretamente ligada ao produto ou serviço. É o fornecedor que detêm todas as

informações sobre o produto ou o serviço, as funções, qualidades, características e

as disponibiliza ao mercado consumidor para promover a comercialização do

produto ou do serviço frente aos diversos concorrentes do mesmo segmento

encontrados no mercado pelo consumidor final. Disponibiliza, em outras palavras, as

vantagens que o consumidor terá em adquirir determinado produto em detrimento de

outro. Assim, torna o consumidor à parte fraca da relação, já que este acredita, e

28

não tem motivos para questionar que as informações disponibilizadas pelo

fornecedor haveriam de vir contaminadas ou equivocadas, deliberadamente ou não.

Não podemos deixar de salientar que não se poderia imaginar o mercado

consumidor sem o efeito da publicidade como ferramenta dos fornecedores de

produtos e serviço a fim de atingir o consumidor, além de ter como objetivo a venda

de um produto ou serviço, a publicidade direcionada induz o consumidor à compra

de determinado produto, sendo necessário armá-lo de certos instrumentos para que

ele possa melhor se defender.

Não seria exagero considerar o artigo 37º e seus parágrafos como o

principal dispositivo que rege a publicidade, pois foi através dele que o Código de

Defesa do Consumidor condenou, expressamente e de forma ampla, a publicidade

enganosa e abusiva, capazes de corromper a vontade do consumidor, levando-o a

adquirir produtos e serviços que, se fosse devidamente informado, não o faria.

Portanto, nosso Código com este dispositivo, exige a veracidade da informação

veiculada, para que o consumidor possa fazer sua escolha de forma livre e

consciente, dada as diferentes características dos produtos disponibilizados no

mercado.

“Art. - 37. É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.

§ 1° - É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços.

§ 2° - É abusiva, dentre outras a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança.

§ 3° - Para os efeitos deste código, a publicidade é enganosa por omissão quando deixar de informar sobre dado essencial do produto ou serviço”

18.

18

BRASIL. Código de defesa do consumidor. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

29

No anseio de maiores resultados junto ao mercado, todas as empresas, em

especial os grandes conglomerados e as multinacionais estabelecidas no mercado

nacional, se fizeram valer de hábil publicidade para ganhar a fidelidade do

consumidor. A título de exemplo, as grandes marcas em eletrônicos estão

estabelecidas no mercado brasileiro desde 1924, caso da Philips, outra gigante

mundial a Panasonic, desde 1967, enquanto a Sony desde 1972. Fica claro que ao

longo do tempo se posicionaram para o mercado consumidor como empresas

sérias, cujos produtos são de extrema qualidade e que estão no mercado há muito

tempo. O que outrora eram artigos de grande luxo e valor elevado, cuja

confiabilidade na marca e no produto era tanta, que fazia com que o consumidor

enaltece-se o conceito e se fidelizasse com determinada empresa, passando estas

informações entre as gerações, tem se mostrado na atualidade que, estas mesmas

empresas estão mais preocupadas na produtividade em escala e nos vultuosos

lucros, deixando em segundo plano a confiabilidade dos produtos bem como o peso

da marca que carregam, delegando-as a um segundo plano, haja visto a forma com

que na grande maioria estas empresas vem tratando o seu consumidor final.

Aqui peço desculpa e licença ao meu professor orientador, bem como aos

professores convidados, e abro um comentário próprio a fim de ilustrar a questão.

Até meados de 2009, qualquer pessoa que entrasse em minha residência poderia

constatar que eu era um consumidor fiel a Philips, possuía em minha casa desde

pilhas recarregáveis, telefone sem fio, televisores, até filtro de água, enfim, senão a

totalidade, a grande maioria dos meus produtos eletroeletrônicos assim como os

eletrodomésticos era da Philips, tenho certeza que este conceito sobre a empresa

não surgiu espontaneamente comigo, foi de certa forma sendo solidificado por meu

avô, que lembro ainda dizendo, “televisor bom é o televisor da Philips”

30

Ocorre que, como sempre acreditei nas informações veiculadas pela

empresa, fui mais uma vítima dessa forma de prática perpetrada pelos fornecedores

na finalidade única de atingir o seu objetivo final, ou seja a venda. Depois desta

experiência, nunca mais comprei um produto sequer da empresa e tento de todas as

formas dissuadir qualquer pessoa que pretenda realizar uma compra e acabe por

escolher pelos produtos dessa empresa 19.

Fica claro que estas empresas sediadas há muito em nosso país auferiram

largos lucros no mercado interno mediante a publicidade praticada, fazendo com que

o consumidor viesse a escolher seus produtos levando sempre em consideração o

peso da marca, independente onde o consumidor estivesse realizando suas

compras, seja no mercado interno ou no mercado externo.

Sobre este aspecto, é importante dizer que, se um consumidor em viagem

resolve por adquirir determinado produto, o que geralmente ocorre especialmente

frente à vantagem econômica encontrada, é certo que há de optar por uma marca

por ele conhecida, até pelo sentimento de que, em o produto apresentando

determinado defeito ou vício, poderá ele contar com um representante em seu local

de residência apto a resolver o problema.

4 RESPONSABILIDADE DO FORNECEDOR A LUZ DO CÓDIGO DE DEFESA

DO CONSUMIDOR

Não poderíamos adentrar neste tema sem antes tecer alguns breves

comentários acerca da responsabilidade civil e suas espécies que influenciam as

relações de consumo.

19

Na tentativa de melhor exemplificar essa espécie de vulnerabilidade, segue em apêndice, caso concreto enfrentado pelo autor, (Doc. I).

31

Importante ressaltar que não podemos confundir a responsabilidade com

indenização.

4.1 CONCEITO DE RESPONSABILIDADE CIVIL

A responsabilidade civil encontra-se quando da quebra do equilíbrio

contratual provocado por um dano, ou seja, esta intimamente ligada ao fato de

respondermos pelos atos que praticamos. Temos então um dever, obrigação ou

sanção decorrente de algum ato ou fato.

Neste contexto, lançamos mão dos ensinamentos do ilustre professor De

Plácido e Silva:

“Designa a obrigação de reparar o dano ou de ressarcir o dano, quando injustamente causado a outrem. Resulta da ofensa ou violação de direito, que redunda em dano ou prejuízo a outrem. Pode ter por causa a própria ação ou ato ilícito, como, também, o fato ilícito de outrem, por quem, em virtude de regra legal, se responde ou se é responsável”

20.

Conforme preleciona Gustavo Tepedino:

“A ideia de responsabilidade civil relacionava-se, tradicionalmente, com o princípio elementar de que o dano injusto, ou seja, o dano causado pelo descumprimento de dever jurídico, deve ser reparado”

21.

Ainda, sobre a Responsabilidade Civil, corrobora Diniz:

“A responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesmo praticado, por pessoa por quem ela responda, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal”

22.

Partindo deste conceito, tem-se como fenômeno centralizador da

responsabilidade o agente causador do dano, isto porque a culpa é o fundamento da

responsabilidade civil subjetiva.

O professor Silvio Salvo Venosa afirma que:

“A responsabilidade civil leva em conta, primordialmente, o dano, o prejuízo, o desequilíbrio patrimonial, embora em sede de dano exclusivamente moral, o que se tem em mira é a dor psíquica ou o desconforto comportamental da

20

SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. atualizadores: Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p.1222. 21

TEPEDINO, Gustavo, Temas de Direito Civil, 3ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p.192 22

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: responsabilidade civil. 18ª ed. São Paulo: Saraiva, v. 7, 2004, p. 40.

32

vítima. No entanto, é básico que, se houver prejuízo a ser ressarcido, não temos porque falar em responsabilidade civil: simplesmente não há porque responder. A responsabilidade civil pressupõe um equilíbrio entre dois patrimônios que deve ser restabelecido”

23.

Podemos dizer que, a aplicação da responsabilidade civil nas relações de

consumo se processa quando surge para o fornecedor de produtos ou serviços, a

obrigação de responder por defeitos ou vícios relacionados aos bens por ele

comercializados.

4.2 ESPÉCIES

A Responsabilidade Civil pode ter diversas subespécies, dependendo da

perspectiva que ela é analisada. Entendem-se as seguintes subespécies: a

responsabilidade contratual e extracontratual, a reponsabilidade subjetiva e objetiva

e a responsabilidade nas relações de consumo, para o presente estudo, vamos nos

ater a responsabilidade nas relações de consumo.

4.3 RESPONSABILIDADE NAS RELAÇÕES DE CONSUMO

O arcabouço jurídico da legislação consumerista nos trás a definição dos

direitos dos consumidores. Tomando como pressuposto de sua existência a ordem

constitucional, fica claro que suas normas encontram embasamento em princípios

de ordem pública e de interesse social, cujo objetivo primordial é garantir o respeito,

a dignidade, a saúde, a segurança, a proteção dos interesses econômicos, a

transparência e equidade nas relações de consumo, bem como a melhoria da

qualidade de vida dos consumidores em geral.

Antes do advento do Código de Defesa do Consumidor, havia grande

dificuldade de se imputar a responsabilidade diretamente ao fornecedor frente ao

23

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil. Vol.4. 3ª ed. São Paulo: Atlas S.A., 2003, p.28.

33

consumidor lesado, face o consagrado princípio de que os efeitos do contrato só

repercutiriam entre as partes. Com a explosão do mercado consumidor, viu-se a

necessidade de um contrato que alcançasse os eventuais responsáveis, e não tão

somente a contra parte vendedora.

Diante dessa problemática, seria necessário repensar as normas existentes,

buscando uma solução que imputasse ao fabricante ou produtor uma

responsabilidade objetiva, levando a uma divisão dos riscos comerciais

anteriormente suportados pelo fornecedor vendedor.

Deste enfrentamento, surge o Código de Defesa do Consumidor, como uma

das codificações mais modernas do mundo sobre o gênero 24, em especial por trazer

ditames que buscam equilibrar as relações entre fornecedores e consumidores.

Essa tentativa se materializa na medida em que a legislação outorga aos

consumidores meios de idôneos para a satisfação de seus anseios, sancionando as

praticas abusiva e impondo a responsabilidade civil objetiva aos fornecedores, que,

ao lado da penal e administrativa alarga o poder e alcance da ação civil pública,

permitindo ainda a ação coletiva, reconhecendo direitos básicos do consumidor

através da fixação de obrigações a todos os integrantes da cadeia de fornecimento.

Com isso, os consumidores passaram a exigir e defender uma melhor

qualidade dos produtos e serviços a eles disponibilizados no mercado, alterando

substancialmente as relações econômicas estabelecidas com os fornecedores.

24

Teixeira, Sálvio de Figueiredo, voto proferido no recurso especial nº63.981 - SP (1995/0018349-8), disponível em:

<http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/justica/detalhe.asp?numreg=199500183498>

“[...] No mérito, no entanto, tenho para mim que, por estarmos vivendo em uma nova realidade, imposta pela economia

globalizada, temos também presente um novo quadro jurídico, sendo imprescindível que haja uma interpretação afinada com

essa realidade. Não basta, assim, a proteção calcada em limites internos e em diplomas legais tradicionais, quando se sabe

que o Código brasileiro de proteção ao consumidor é um dos mais avançados textos legais existentes, diversamente do que

se dá, em regra, com o nosso direito privado positivo tradicional, de que são exemplos o Código Comercial, de 1.850, e o

Código Civil, de 1.916, que em muitos pontos já não mais se harmonizam com a realidade dos nossos dias [...]”.

34

Os consumidores lesados passam a poder utilizar os remédios processuais

trazidos pela legislação. Dessa forma, o código abrange toda cadeia de

fornecedores, imputando-lhes independentemente de culpa o dever de reparar e

indenizar os danos suportados pelo consumidor.

4.4 DA RESPONSABILIDADE PELO FATO DO PRODUTO E DO SERVIÇO

Ao falarmos de responsabilidade pelo fato do produto, dizemos que se trata

de um dano que extrapola a esfera do produto em si. Poderíamos dizer que seria um

vício somado a um problema extra, que causa um dano maior que o simples mau

funcionamento, ultrapassando consideravelmente o valor do produto, causando

danos à saúde ou à segurança do consumidor.

Conforme se verifica da leitura dos artigos 12º a 17º do Código de Defesa do

Consumidor, quis o legislador imputar a responsabilidade objetiva, pois tratou de

estender a todos os agentes da cadeia de fornecedores exceto o comerciante, cuja

responsabilidade é subsidiária.

Art. 12 - O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

§ 1° - O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:

I - sua apresentação;

II - o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam;

III - a época em que foi colocado em circulação.

§ 2º O produto não é considerado defeituoso pelo fato de outro de melhor qualidade ter sido colocado no mercado.

§ 3° - O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando provar:

I - que não colocou o produto no mercado;

35

II - que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste;

III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Portanto, a responsabilidade do fabricante, construtor, produtor e do

importador pelo fato do produto é objetiva, independente de averiguada culpa, ou

seja, se ocorrer qualquer lesão ao patrimônio do consumidor, inclusive psíquica ou

física, serão aqueles responsabilizados nos termos da lei.

Entretanto, a título de esclarecimento, faz mister mencionar que a

responsabilidade do comerciante é subsidiária, sendo auferida quando verificados e

preenchidos os requisitos do artigo 13º da Lei nº8.078/1990.

“Art. 13 - O comerciante é igualmente responsável, nos termos do artigo anterior, quando:

I - o fabricante, o construtor, o produtor ou o importador não puderem ser identificados;

II - o produto for fornecido sem identificação clara do seu fabricante, produtor, construtor ou importador;

III - não conservar adequadamente os produtos perecíveis. Parágrafo único. Aquele que efetivar o pagamento ao prejudicado poderá exercer o direito de regresso contra os demais responsáveis, segundo sua participação na causação do evento danoso”

25.

Partindo das premissas outorgadas pela legislação consumerista,

poderíamos dizer que, se um consumidor realizasse a aquisição de um produto no

mercado estrangeiro de uma empresa multinacional, que conta com uma

representante dentro do território nacional, e esse produto, no decorrer de seu

funcionamento, viesse a causar um dano ao consumidor, quem deveria ser

acionado? Não encontramos na legislação vigente motivo que impeça a

responsabilização da empresa situada no mercado brasileiro, por ser

correspondente direta da empresa com a qual o consumidor realizou o contrato.

25

BRASIL. Código de defesa do consumidor. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

36

Muito pelo contrário, embora a legislação consumerista encontre-se carente

de uma ordem expressa sobre o dever de responder, encontramos no direito

societário a responsabilidade solidária das empresas do mesmo grupo econômico.

O grupo econômico ou ainda grupo societário nada mais é do que a

comunhão de empresas ou ainda uma forma de integração, seguindo todas uma

única direção econômica, indiferente de ser administrada por diretorias distintas.

Nossa Legislação possui, em seus mais diversos campos, dispositivos que

tratam da responsabilidade solidária ou subsidiária dos grupos econômicos.

Conforme podemos verificar da leitura do artigo 264 do Código Civil, será solidária

quando em uma mesma obrigação houver mais de um responsável pelo seu

cumprimento.

“Art. 264 – Há solidariedade, quando na mesma obrigação concorre mais de um credor, ou mais de um devedor, cada um com direito, ou obrigado, à dívida toda”

26.

Dessa forma, nos deparamos com uma situação na qual a responsabilidade

é solidária, podendo o credor exigir o cumprimento da responsabilidade de ambos os

devedores ou de apenas um deles, podendo àquele que cumprir a obrigação o

direito de regresso contra o devedor solidário.

Assim, muito embora não exista previsão legal quanto à responsabilidade

sobre o tema proposto, poderíamos por analogia, buscar respaldo junto ao direito

societário. Entretanto, veremos que a legislação consumerista consegue buscar a

referida responsabilização através da cadeia de fornecimento.

Enfrentaremos melhor a questão da cadeia de fornecimento em tópico

específico, que será abordado adiante.

26

BRASIL. Código civil. 64. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

37

4.5 DA RESPONSABILIDADE PELO VÍCIO DO PRODUTO OU SERVIÇO

Vicio é o defeito ou mau funcionamento do produto ou do serviço, não

podendo se confundir com uma característica do produto ou do serviço. Trata-se de

algo que lhe diminua o valor, que resulte em um funcionamento indesejado ou

defeituoso, enfim, quando o produto adquirido não resta à finalidade que lhe foi

proposta, não extrapolando o valor auferido ao bem ou ao serviço.

Trata-se de uma responsabilidade diversa da exposta no tópico anterior, pois

cuida especificamente do produto em si, e não dos danos por este causado, estando

previsto nos artigos 18º e 19º da Lei 9.078/1990, in verbis:

Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

§ 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;

II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;

III - o abatimento proporcional do preço.

§ 2° Poderão as partes convencionar a redução ou ampliação do prazo previsto no parágrafo anterior, não podendo ser inferior a sete nem superior a cento e oitenta dias. Nos contratos de adesão, a cláusula de prazo deverá ser convencionada em separado, por meio de manifestação expressa do consumidor.

§ 3° O consumidor poderá fazer uso imediato das alternativas do § 1° deste artigo sempre que, em razão da extensão do vício, a substituição das partes viciadas puder comprometer a qualidade ou características do produto, diminuir-lhe o valor ou se tratar de produto essencial.

§ 4° Tendo o consumidor optado pela alternativa do inciso I do § 1° deste artigo, e não sendo possível a substituição do bem, poderá haver substituição por outro de espécie, marca ou modelo diversos, mediante complementação ou restituição de eventual diferença de preço, sem prejuízo do disposto nos incisos II e III do § 1° deste artigo.

§ 5° No caso de fornecimento de produtos in natura, será responsável perante o consumidor o fornecedor imediato, exceto quando identificado claramente seu produtor.

38

§ 6° São impróprios ao uso e consumo:

I - os produtos cujos prazos de validade estejam vencidos;

II - os produtos deteriorados, alterados, adulterados, avariados, falsificados, corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde, perigosos ou, ainda, aqueles em desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação;

III - os produtos que, por qualquer motivo, se revelem inadequados ao fim a que se destinam.

Art. 19. Os fornecedores respondem solidariamente pelos vícios de quantidade do produto sempre que, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, seu conteúdo líquido for inferior às indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou de mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

I - o abatimento proporcional do preço;

II - complementação do peso ou medida;

III - a substituição do produto por outro da mesma espécie, marca ou modelo, sem os aludidos vícios;

IV - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos.

§ 1° Aplica-se a este artigo o disposto no § 4° do artigo anterior.

§ 2° O fornecedor imediato será responsável quando fizer a pesagem ou a medição e o instrumento utilizado não estiver aferido segundo os padrões oficiais”

27.

Nas situações observadas, a responsabilidade caberá aos fornecedores e

aos integrantes da cadeia de fornecimento, sendo imputado a todos o dever de

responder pelos danos que venham a ser causados e suportados pelo consumidor.

Fica claramente demonstrado que nosso código adota a responsabilidade

objetiva ao tratar de vícios dos produtos e serviços. A responsabilidade por

responder pelo vício dos produtos e serviços, somente não é atribuída aos

fornecedores, sejam solidários ou subsidiários, quando aplicadas ao caso concreto

uma das hipóteses de excludente de responsabilidade previstas nos artigos 12, §3°,

quando o legislador se refere ao produto, e no artigo 14, §3°, quando cita o serviço.

27

BRASIL. Código de defesa do consumidor. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

39

Neste caso, o código nos trás expressamente três hipóteses de exclusão da

responsabilidade, quais são:

a. Não introdução do produto no mercado consumo;

b. Inexistência de defeito no produto;

c. Culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Como já mencionado, temos uma das melhores legislações do mundo em

termos de proteção ao consumidor, servindo de inspiração a outros sistemas

jurídicos na confecção de seus códigos.

Cuidou ainda nosso legislador em antever possíveis escusas nocivas ao

consumidor, para tanto, arrolou ainda em seus dispositivos a impossibilidade do

fornecedor em alegar que desconhecia dos vícios existentes na tentativa de se

eximir do ônus de responder por estes, conforme podemos verificar da leitura do

artigo 23º, in verbis:

“Art. 23 - A ignorância do fornecedor sobre os vícios de qualidade por inadequação dos produtos e serviços não o exime de responsabilidade”

28.

Vencida essa etapa em demonstrar as excludentes de responsabilidade do

fornecedor, é interessante mencionar que, uma vez levantados os casos de

responsabilidade dos fornecedores quanto aos vícios nos produtos, porque persiste

a tentativa das empresas multinacionais em tentarem se eximir de responder pelos

vícios dos produtos de sua marca quando estes comercializados fora do território

nacional?

5 CADEIA DE FORNECEDOR E SOLIDARIEDADE

O Código de Defesa do Consumidor trata das formas de produção e

fornecimento em cadeia, incluindo todos os fornecedores como responsáveis

28

BRASIL. Código de defesa do consumidor. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

40

solidários, com exceção das responsabilidades imputadas individualmente nos

artigos 12º e 13º do Código de Defesa do Consumidor 29.

Em uma primeira análise e a grosso modo, poderíamos dizer que vem a ser

o meio que os fornecedores e fabricantes se organizam na produção, distribuição e

comercialização dos produtos e serviços, transferindo a cada novo elo da “corrente”

a responsabilidade solidaria.

Nas palavras da ilustre professora Claudia Lima Marques:

“A cadeia de fornecimento é um fenômeno econômico de organização do modo de produção e distribuição, do modo de fornecimento de serviços complexos, envolvendo um grande número de atores que unem esforços e atividades para uma finalidade comum, qual seja a de poder oferecer no mercado produtos e serviços para os consumidores”

30.

A grande maioria dos consumidores em suas aquisições diárias não

vislumbra a cadeia de fornecedores diretos ou indiretos que em muitos casos integra

o produto final por ele adquirido. Na maioria das operações realizadas, o consumidor

não tem sequer consciência de que existe mais de um fornecedor envolvido, e que

ele consumidor, mantém com todos uma relação contratual, podendo exigir

informações e garantia.

Mais uma vez lançamos mão dos abalizadores ensinamentos da professora

Claudia Lima Marques:

“A nova teoria contratual, porém, permite esta visão de conjunto do esforço econômico de “fornecimento” e valoriza, responsabilizando solidariamente, a participação destes vários atores dedicados a organizar e realizar o fornecimento de produtos e serviços“

31.

Assim, a sistemática de proteção do consumidor na legislação consumerista,

especialmente em seu artigo 3º, abrange todos os que participam da cadeia de

29

MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 5ª. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p.402. 30

MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 5ª. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006,

p.402. 31

MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 5ª. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006,

p.403

41

fornecimento, considerando-os como fornecedores independente da relação direita

ou indireta, contratual ou extracontratual firmada com o consumidor.

A professora Claudia Lima Marques cita ainda reflexos deste fenômeno de

pluralidade passiva na relação de consumo: o fenômeno da pós-personificação (ou

catividade) e a conexidade dos contratos:

“Na sociedade de massa a “personalização” do fornecedor quase que desapareceu, para ser então substituída, na sociedade da informação ou pós-moderna, por uma “repersonalização” desmaterializada do fornecedor, através de símbolos, de fazeres, de condutas sociais, de práticas comerciais ou da própria organização da cadeia”

32.

Essa ideia de “repersonalização” do fornecedor trouxe a tona uma nova

visão de identificação, trazendo assim novos conceitos, como os símbolos ou logo

marcas, que passaram a identificar e consequentemente cativar os consumidores.

Aparentemente, deixamos de saber quem responde. Como por exemplo, ao realizar

uma compra de um produto, levo em consideração a marca, estando aquele viciado,

vou buscar minha reparação junto ao “detentor” da marca, independentemente se a

compra se processou fora do mercado brasileiro. Quem estaria mais bem preparado

para buscar a solução do problema, o consumidor ou a representante sedia em

nosso território.

Conclui-se que:

“o resultado mais destacável desta visualização da cadeia do consumidor, do aparecimento plural dos sujeitos fornecedores, é a solidariedade entre os participantes da cadeia, mencionada nos artigos 18º e 20º do Código de Defesa do Consumidor, e indicada na expressão genérica “fornecedor de serviços” do artigo 14º, caput do mesmo diploma”

33.

Destarte, a organização de uma cadeia de fornecedores é uma pratica

conhecida, entretanto, para o plano jurídico é recente, não existindo uma previsão

32

MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 5ª. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p.403. 33

MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 5ª. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p.403.

42

legal expressa, e que embora não exista, não impede sua aplicabilidade, sendo

transferida aos juízes e tribunais se adequarem aos casos a eles propostos.

5.1 AS TENDÊNCIAS JURISPRUDENCIAIS DE EXTENSÃO DO CONCEITO DE

CONSUMIDOR E A SOLIDARIEDADE

Diante dos estudos realizados, fica comprovado que a jurisprudência

brasileira tem inovado, passando a reconhecer a solidariedade dos integrantes da

cadeia de fornecimento construída e imputada por força da lei que decorre do

Código de Defesa do Consumidor, como por exemplo, em matéria de publicidade

onde o código imputa a responsabilidade para toda a cadeia, sendo o risco

profissional de quem veicula e de quem dela se aproveita;

Evidente que as normas contidas na legislação consumerista já

responsabilizavam os integrantes da cadeia de fornecimento, vez que qualquer um

deles poderia despertar a confiança do consumidor na relação estabelecida, o que

não seria justo em não o responsabilizar por eventuais problemas.

Entretanto, notamos que embora contemos com uma das melhores

legislações do mundo em se tratando da defesa dos interesses dos consumidores 34,

nossa legislação não consegue acompanhar as grandes e rápidas mudanças

comportamentais do mercado e seus atores, deixando na maioria das vezes

desamparado o consumidor lesado pela carência de normas expressas, o que vem

sendo sanado pelo posicionamento dos juízes e tribunais, demonstrando

brilhantismo em suas decisões.

34

Teixeira, Sálvio de Figueiredo, voto proferido no recurso especial nº63.981 - SP (1995/0018349-8), disponível em: <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/justica/detalhe.asp?numreg=199500183498>. Acessado em 07/05/2012. “[...] No mérito, no entanto, tenho para mim que, por estarmos vivendo em uma nova realidade, imposta pela economia globalizada, temos também presente um novo quadro jurídico, sendo imprescindível que haja uma interpretação afinada com essa realidade. Não basta, assim, a proteção calcada em limites internos e em diplomas legais tradicionais, quando se sabe que o Código brasileiro de proteção ao consumidor é um dos mais avançados textos legais existentes, diversamente do que se dá, em regra, com o nosso direito privado positivo tradicional, de que são exemplos o Código Comercial, de 1.850, e o Código Civil, de 1.916, que em muitos pontos já não mais se harmonizam com a realidade dos nossos dias [...]”.

43

Dessa forma, temos uma economia globalizada, não existindo mais

fronteiras rígidas, o que estimula e favorece a livre concorrência, fato este não

alcançado pelas leis de proteção ao consumidor, especialmente levando em

consideração as relações internacionais, composta de atores dos negócios

mercantis as grandes multinacionais que contam com sucursais em vários países.

Dentro desta linha de raciocínio, não há como desvincular a imagem, marca

ou empresa sediada em nosso território, da marca ou empresa mundialmente

conhecida, vez que, uma se beneficia da outra, devem, assim, arcar igualmente com

as consequências de eventuais vícios dos produtos fabricados e comercializados,

não sendo plausível que seja o consumidor, a parte mais frágil nessa relação, a

suportar as consequências negativas do objeto defeituoso.

Assim, temos consagrado um novo quadro jurídico, sendo necessária que

haja uma interpretação afinada com essa nova realidade. Não basta, assim, a

proteção calcada em limites internos e em diplomas legais tradicionais, quando se

sabe que o Código brasileiro de proteção ao consumidor é um dos mais avançados

textos legais existentes, diversamente do que se dá, em regra, com o nosso direito

privado positivo tradicional, que em muitos pontos já não mais se harmonizam com a

realidade dos nossos dias.

6 RESPONSABILIDADE DAS MULTINACIONAIS SEDIADAS EM TERRITÓRIO

NACIONAL – AFINAL, QUEM RESPONDE?

Ao traçarmos o objetivo do presente trabalho, buscamos identificar por que

as empresas multinacionais sediadas em território nacional se negam em honrar a

garantia e reparar os produtos viciados da sua marca adquiridos fora do mercado

brasileiro. Se não em todos, na grande maioria dos poucos julgados existentes ou

44

em manifestações divulgadas pelas empresas, encontramos a mesma linha de

defesa ou justificativa, qual seja, que a empresa sediada no Brasil não fabricou o

produto, não o disponibilizou no mercado consumidor, que apesar de vinculada à

mesma Matriz, é empresa distinta daquela, que elabora mercadorias próprias,

prestando cada qual sua garantia de forma independente, que cumpre estritamente

a legislação pátria inclusive o Código de Defesa do Consumidor, que a legislação

consumerista não pode ser aplicada, haja visto que o negócio de compra e venda

fora realizado no exterior, não estando sujeito a legislação brasileira.

No intuito de demonstrarmos as informações acima citadas, segue uma

carta resposta da Empresa HP-Hewlett-Packard do Brasil, quanto a seu

posicionamento sobre a garantia de produtos importados.

HP e a questão da garantia dos produtos importados – a posição da empresa. “Esclarecimento da empresa HP - Hewlett-Packard a respeito de uma reclamação publicada em forma de reportagem a respeito dos problemas de quem compra produtos da marca no exterior e precisa de assistência técnica no Brasil, país onde tem representação comercial. Democraticamente, cedemos o espaço às considerações da HP. Em seguida, Josué Rios, colunista do JT e advogado especialista de defesa do consumidor, expõe o seu entendimento, e que é o do Grupo Estado, a respeito das responsabilidades da companhia sobre a assistência a produtos da marca adquiridos no exterior: Em relação ao post publicado no último dia 24 de novembro, no blog Advogado de Defesa, sobre o caso do consumidor Bruno Santana, a Hewlett-Packard do Brasil esclarece que cumpre estritamente a legislação brasileira, inclusive o Código de Defesa do Consumidor (CDC), que em seu artigo 12, § 3°,inciso I, exclui de responsabilidade o fabricante, construtor, produtor ou importador pelo fato do produto e do serviço, quando provar que não colocou o produto no mercado. (grifos nossos). O CDC, portanto, não prevê hipótese de garantia de produtos para quem adquiriu equipamentos em outro país, mesmo que o fabricante possua subsidiária no Brasil. O CDC se aplica apenas aos negócios concretizados no país e a subsidiária não fica obrigada a oferecer assistência técnica ou a reconhecer o direito de garantia. (grifos nossos) A HP Brasil pode ajudar o cliente, informando o número do telefone do call center do país onde o produto foi adquirido. A empresa ressalta ainda que, se o produto foi comprado no exterior, o modelo foi lançado no Brasil e o cliente apresentar a nota fiscal de compra e comprovar que os impostos foram pagos, quando aplicável, a garantia será honrada e o tempo de reparo será o mesmo para os produtos em garantia adquiridos localmente”. Assessoria de imprensa, HP Brasil

45

OPINIÃO DE JOSUÉ RIOS, COLUNISTA DO JORNAL DA TARDE E ESPECIALISTA EM DEFESA DO CONSUMIDOR: “Ninguém está mais autorizado do que o Superior Tribunal de Justiça (STJ), que é a mais alta Corte judiciária para julgar conflitos de consumo no País para interpretar o Código do Consumidor. E aplicando esta legislação, em um caso bastante conhecido e comentado pela doutrina especializada (recurso especial nº 63981-SP), o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já condenou uma multinacional (a Panasonic do Brasil) a prestar garantia a produto comprado no exgerior e que apresentou vício em seu funcionamento, a saber: uma máquina fotográfica compra nos Estados Unidos. Nesse julgado, o STJ deixou claro que, por pertencer a um grupo empresarial, “com sede em outro lugar”, a Panasonic do Brasil “tem a responsabilidade de cumprir com a obrigação de assistência assumida pelo fabricante”. Ainda segundo o STJ, “o Código de Defesa do Consumidor implantou uma configuração jurídica nova às relações de consumo existentes no Brasil,” deixando claro – a alta Corte de Justiça – que assim como a força da marca e de sua propaganda induz o consumo dos seus produtos sem limite de fronteiras, em contrapartida, a responsabilidade do fornecedor não pode se lrestringir ao local da venda. “Se a empresa nacional aproveita-se de todas as vantagens decorrentes do conceito mundial, evidentemente que ela tem que oferecer algo em contrapartida aos consumidores da marca,” concluiram os ministros da Quarta Turma do STJ. O veredicto em questão, aplica-se perfeitamente ao caso da HP. E portanto a empresa deve rever a sua taxativa afirmação de que “cumpre estriamente a legislação brasileira.” O conceito do que seja cumprir a legislação de um País, em muitos casos costuma envolver uma “tecnologia” um poucos mais complexa do que a aplicada a computadores e máquinas do gênero. Daí, nossa afirmação de que a HP do Brasil tem de prestar assistência ao produto adquirido por qualquer consumidor no exterior, como foi o caso de Bruno Santana, de São Paulo, que reclamou da empresa à coluna Advogado de Defesa do JT”

35.

Diante das informações divulgadas pela HP, teríamos que adentrar

brevemente a análise do direito internacional a fim de confirmar se o posicionamento

adotado pela empresa, bem como por demais fornecedores realmente se aplica a

realidade jurídica brasileira.

35

Esclarecimento da Empresa HP – Hewlett-Packard ao consumidor e opinião de Josué Rios, Colunista do Jornal da Tarde e especialista em defesa do consumidor. Disponível em:< http://blogs.estadao.com.br/advogado-de-defesa/hp-e-a-questao-dos-produtos-importados-a-posicao-da-empresa/>. Acessado em: 05/05/2012.

46

6.1 DA APLICAÇÃO DA LEI ESTRANGEIRA OU DA SUBMISSÃO AO CÓDIGO DE

DEFESA DO CONSUMIDOR

6.1.1 Da Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro

Com o advento do decreto lei nº4657/1972, foi inserida no ordenamento

pátrio a Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro, dando nova leitura a sua

antiga versão, impondo sua aplicabilidade em todo arcabolso jurídico nacional.

Dentre as funções da Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro,

podemos ressaltar as seguintes observações elencadas pela ilustre professora

Maria Helena Diniz:

"É o diploma da aplicação, no tempo e no espaço, de todas as normas brasileiras, sejam elas de direito público ou privado. (...) Não rege relações de vida, mas sim as normas, uma vez que indica como interpretá-las ou aplicá-las, determinando-lhes a vigência e eficácia, suas dimensões espacio-temporais, assinalando suas projeções nas situações conflitivas de ordenamentos jurídicos nacionais e alienígenas, evidenciando os respectivos elementos de conexão"

36.

Dessa forma, vemos a Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro

como uma legislação distinta ao Código Civil, autônoma e dele não fazendo parte.

Trata-se de uma legislação que visa facilitar a sua aplicação, tem caráter universal, e

pode ser aplicada a todos os ramos do direito. Na verdade, constrói um repositório

de normas preliminar à totalidade do ordenamento jurídico pátrio.

Em outras palavras, seria dizer que é um conjunto de normas sobre normas,

cuja finalidade é disciplinar as normas jurídicas, delimitando sua aplicabilidade e

disposição no tempo e no espaço.

Assim, em havendo conflito entre normas, devem-se ser observados os

contornos trazidos pela Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro quanto à

aplicabilidade da norma cabível. Sendo necessário demonstrar subsunção do caso

concreto à norma estampada na Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro.

36

DINIZ, Maria Helena. Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro Interpretada. 9ª ed. São Paulo, Saraiva, 2002, p 3-4.

disponível em http://www.webartigos.com/artigos/lei-de-introducao-ao-codigo-civil/4063/. Acessado em:03/04/2012.

47

A ilustre professora Maria Helena Diniz, discorre sobre o tema levantando as

seguintes questões:

“Como a venda internacional vincula-se a dois ou mais países, surgirá a questão tormentosa de saber quem terá competência para apreciar os litígios de decorrentes. Seria a lei nacional ou a do domicílio dos contraentes? Teria, ou não, aplicabilidade a lei do local da execução da obrigação contratual? Deverá ser aplicada a Lei da situação dos bens objeto do contrato ou do lugar em que a obrigação foi contraída, ou, ainda, a lei que as partes contraentes escolheram manifestando expressamente sua vontade, ou a norma deduzida da vontade presumida dos contratantes?”

37.

Notoriamente no Brasil, a Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro

fixou critérios para determinar a competência jurisdicional em matéria internacional,

selecionamos alguns pontos que julgamos importantes quanto à aplicação de leis

estrangeiras, que estabelece o que segue:

a. Será competente a autoridade judiciária brasileira, se o réu estiver

domiciliado no Brasil ou aqui tiver de ser cumprida a obrigação, conforme

o artigo 12º, caput;

b. Será competente a autoridade judiciária brasileira se ação for relativa à

imóvel situado em território nacional, artigo 12º, § 1º;

c. Deverá o órgão judicante aplicar a lei do lugar da celebração da

obrigação no que atina à sua substância e efeitos (ius loci contratus),

artigo 9º. Assim para qualificar e reger a obrigação aplicar-se-á a lei do

país em que ela se constituir. A obrigação resultante do contrato reputar-

se-á a constituída no local em que residir o proponente, artigo 9º, § 2º;

logo não se deverá se cogitar do momento e do lugar do contrato. Na

venda internacional, se houver dúvidas ou conflitos de interesses, aplicar-

se-á a lei do lugar onde foi feita a proposta. Mas válida será a eleição de

foro (forum contractus), ou melhor da autoridade judiciária competente

decorrente de cláusula contratual, em respeito à autonomia de vontade,

37

DINIZ, Maria Helena, Tratado Teórico e Prático dos Contratos, Tomo 1, São Paulo, Saraiva, 1993, p.506.

48

desde que não viole o artigo 12, § 1º, da Lei de Introdução as Normas do

Direito Brasileiro, pois em matéria de contrato transnacional isto viria a

eliminar incerteza dos contraentes no que atina ao local em que as

eventuais controvérsias serão dirimidas, facilitando as negociações

comerciais internacionais 38.

Dessa forma, a norma contida no artigo 9º da Lei de Introdução as Normas

do Direito Brasileiro não afasta a autonomia da vontade, que abrange os naturalia,

accidentalia e os essentialia negotti, já que o Código Civil de 1916 em seu artigo 42º

(atualmente corresponde ao artigo 78º do Código Civil de 2002) admite a eleição do

domicílio, como a lei que regerá o contrato, excluindo outras leis aplicáveis à

avença, respeitando as limitações de ordem pública.

Entretanto, se a obrigação for executada no território nacional, pelo princípio

da lex loci solutionis, disposto no artigo 9º, § 1º, da Lei de Introdução as Normas do

Direito Brasileiro, a questão será regulada pela lei brasileira naquilo que ela entender

essencial à validade do negócio; não se aplicará, portanto, a lex loci contractus, ou

seja, mesmo que a execução do contrato esteja prevista pelas partes, não se

aplicará o imposto pela autonomia da vontade. Todavia, será aplicada no que atina à

execução propriamente dita, pois algumas peculiaridades inerentes à substância e

efeitos da obrigação poderão ser reguladas pela lex loci contratus 39.

Considerando o acima exposto, podemos dizer que muito embora a Lei de

Introdução as Normas do Direito Brasileiro venha tentar fixar a matéria, quando em

um momento ela derroga a competência à lei do país em que se constituiu a

38

DINIZ, Maria Helena, citando, Steiner Vagts, Transnational legal problems, USA, 1976, p.809; W. Bulgarelli, Contratos, cit., p. 215; Amílcar de Castro, Direito Internacional Privado, Rio de Janeiro, Forense, 1968, p.139-41; Oscar Tenório, Direito Internacional Privado, cit., v. 2, p. 178-85. 39

DINIZ, Maria Helena, 1993, citando Loussouarne e Bredin, Droit du Commerce international, Paris, Sirey, 1969; Annie Toubiana, “Le domaine de la loi du contrat em droit international privé, in Contrats internationaux et dirigisme étatique”, Dalloz, 1972; Georgette N. Nazo, A lei aplicavél, cit., Ver. De Direito Civil Imobiliário, Agrário e Empresarial, p.153.

49

obrigação, a faz de forma diversa se a obrigação vier a ser executada em território

nacional, abrindo assim o campo de interpretação jurisprudencial.

Consequentemente, por falta de uma determinação expressa, que nossos

tribunais, considerando o disposto no artigo 4º da Lei de Introdução as Normas de

Direito Brasileiro, podem decidir o caso pautados na analogia, costumes e princípios

gerais de direito.

Não bastasse isso, a legislação consumerista foi editada nos termos do

artigo 5º, inciso XXXII e do artigo 170, V, ambos da Constituição Federal, bem como

a defesa dos consumidores está elevada ao princípio geral da atividade econômica,

assim, não podendo estar num plano inferior ao de Convenções e ou Tratados

Internacionais.

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor;

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho

humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

V - defesa do consumidor;” 40

Assim, não mereceria amparo à colocação de que Convenção é Lei especial

e, portanto, nos critérios de solução de contradições prevaleceria sobre o Código de

Defesa do Consumidor.

Ocorre que, o Código de Defesa do Consumidor também é norma especial,

pois regula universalmente toda e qualquer relação de consumo. A presente regra

foi editada com a finalidade de defender e proteger os consumidores nas relações

de consumo.

40

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

50

Dessa forma, nos parece plenamente possível afirmar que, havendo conflito

entre normas e aplicação de leis alienígenas e o Código de Defesa do Consumidor,

prevalecerá sempre o Código de Defesa do Consumidor, por ser hierarquicamente

superior, vez que, editado nos termos do art. 5º, inciso XXXII da Constituição

Federal, e especial, pois o Código de Defesa do Consumidor regula todas as

relações de consumo.

6.1.2 O Código de Defesa do Consumidor como Norma Imperativa e de Ordem

Pública

Uma das bases existenciais do Direito consumerista é o reconhecimento da

vulnerabilidade do consumidor na relação comercial estabelecida com o fornecedor.

Todo arcabolso jurídico nacional tem por base o atendimento das necessidades dos

consumidores, pautado no princípio da dignidade humana, respeito à saúde, a

segurança, a proteção e qualidade de vida do dos consumidores.

No intuito de cumprir essas diretrizes, nossa legislação estabelece uma série

de deveres aos fornecedores em relação aos produtos e serviços comercializados,

visando à coibição de praticas maléfica como abuso de mercado, publicidade

enganosa e abusiva, bem como, a solução de controvérsia e a reparação de

prejuízos e danos causados aos consumidores.

No tocante ao consumo além das fronteiras nacionais, essa visão protetiva é

transportada para o campo internacional, sendo o consumidor reconhecido como

parte mais fraca da relação. As regulamentações referentes ao assunto criam um

elemento de conexão sendo sempre favoráveis ao consumidor, como sua residência

ou a aplicação de Lei nacional mais protetiva, por se tratar de norma imperativa.

51

Essa intervenção, que afasta a Lei designada, ocasiona em um segundo

plano um efeito positivo, que é a aplicação da regra mais adequada à situação

enfrentada.

Há outras situações que enseja a aplicabilidade de outra legislação, o

método das “lois de Police” apresenta incontestáveis vantagens para assegurar o

respeito a esses imperativos que existem em razão de sua fraqueza.

No âmbito da defesa do consumidor, o interesse estatal é de tal ordem que

há impedimento do uso de leis estrangeiras, exceto quando forem mais benéficas ao

consumidor.

A utilização das normas imperativas como uma tendência atual em matéria

de consumo, ao lado de sua regulamentação nos processos de integração regional é

apontada pela professora Claudia Lima Marques.

“A tendência é a elaboração de regras nacionais, muitas consideradas de ordem pública internacional lois de Police ou leis de aplicação imediata, assim como a aproximação e a harmonização das regras nacionais, que asseguram a proteção do consumidor, nos organismos internacionais dedicados a integração econômica, como a União Européia e o Mercosul” 41

.

A União Européia é o maior exemplo de regulamentação regional do

consumo estabelecendo o caráter de norma imperativa, tal como ocorre com

provisões da diretiva 97/7/EC sobre proteção de consumidores em relação a

contratos a distancia e diretiva 99/44/EC sobre vendas de produtos de consumo e

garantias associadas 42.

Isso significa que a norma material, protetiva, do foro pode ser afastada, se a

mesma matéria tiver outra lei aplicável em virtude de regras de conflito do próprio

41

MARQUES, Claudia Lima. A Insuficiente proteção do consumidor nas normas de Direito Internacional Privado – da necessidade de uma Convenção Interamericana (CIDIP) sobre a Lei aplicável a alguns contratos e relações de consumo. Revista dos Tribunais. ano 90. vol. 788. 2001. p. 19 42

European Commission – Health and Consumers Protection. Safeguarding Consumers' Interests. Ensuring Safe Shopping. Review of the Consumer Acquis. Disponível em: <http://ec.europa.eu/consumers/cons_int/safe_shop/acquis/index_en.htm> Acessado em: 05/06/2012.

52

foro ou se estas indicarem uma norma estrangeira que, por sua vez, também é

protetiva.

Neste sentindo, encontramos os ensinamentos do professor Silvio de Salvo

Venosa:

“O Código de Defesa do Consumidor não é lei exclusiva de proteção, pois o artigo 7º desse diploma estatui que os direitos previstos nesse Código não excluem outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário e de outras normas. Portanto, o Código de Defesa do Consumidor admite que outras normas completem o microssistema, desde que em proteção ao consumidor. Desse modo, se, por um lado, admitem-se outras normas protetoras, é discutível que possam conviver com o microssistema normas que restrinjam os direitos do consumidor”

43.

Dessa feita, a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor como lei

de aplicação imediata ou ainda como lei de ordem pública, afasta a aplicação de

qualquer lei estrangeira, exceto quanto esta for mais benéfica ao consumidor. Trata-

se de Lei cogente, ou seja, absoluta, não podendo ser afastada sequer pela vontade

das partes. Deliberando que a relação será regida pelas leis brasileiras, aplicando no

que concerne o Código de Defesa do Consumidor.

7 ENFRENTAMENTO PELOS TRIBUNAIS – CASOS CONCRETOS

Nos casos concretos submetidos à apreciação dos tribunais brasileiros,

estes têm demonstrado claramente uma nova visão, trataremos em específico o

ponto que incluem no conceito de fornecedor a figura daquele que apõe sua marca

no produto ou serviço fornecido de forma massificada mercado nacional.

Neste sentido, observamos o caso paradigmático que foi decidido pelo Superior

Tribunal de Justiça, que consolidou esse entendimento através do Resp. nº63.981-

SP, que segue:

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RECURSO ESPECIAL Nº 63.981 - SP (1995/0018349-8)

43

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2004, pág. 159

53

RELATOR

RELATOR

P/ ACORDÃO

RECTE

ADVOGADO

RECDO

ADVOGADOS

: MIN. ALDIR PASSARINHO JÚNIOR

: MIN. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA

: PLÍNIO GUSTAVO PRADO GARCIA

: PLÍNIO GUSTAVO PRADO GARCIA (EM CAUSA

PRÓPRIA)

: PANASONIC DO BRASIL LTDA

: CARMEM LAIZE COELHO MONTEIRO E OUTROS

EMENTA DIREITO DO CONSUMIDOR. FILMADORA ADQUIRIDA NO EXTERIOR. DEFEITO DA MERCADORIA. RESPONSABILIDADE DA EMPRESA NACIONAL DA MESMA MARCA (“PANASONIC”). ECONOMIA GLOBALIZADA. PROPAGANDA. PROTEÇÃO AO CONSUMIDOR. PECULIARIDADES DA ESPÉCIE. SITUAÇÕES A PONDERAR NOS CASOS CONCRETOS. NULIDADE DO ACÓRDÃO ESTADUAL REJEITADA, PORQUE SUFICIENTEMENTE FUNDAMENTADO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO NO MÉRITO, POR MAIORIA. I - Se a economia globalizada não mais tem fronteiras rígidas e estimula e favorece a livre concorrência, imprescindível que as leis de proteção ao consumidor ganhem maior expressão em sua exegese, na busca do equilíbrio que deve reger as relações jurídicas, dimensionando-se, inclusive, o fator risco, inerente à competitividade do comércio e dos negócios mercantis, sobretudo quando em escala internacional, em que presentes empresas poderosas, multinacionais, com filiais em vários países, sem falar nas vendas hoje efetuadas pelo processo tecnológico da informática e no forte mercado consumidor que representa o nosso País. II - O mercado consumidor, não há como negar, vê-se hoje "bombardeado" diuturnamente por intensa e hábil propaganda, a induzir a aquisição de produtos, notadamente os sofisticados de procedência estrangeira, levando em linha de conta diversos fatores, dentre os quais, e com relevo, a respeitabilidade da marca. III - Se empresas nacionais se beneficiam de marcas mundialmente conhecidas, incumbe-lhes responder também pelas deficiências dos produtos que anunciam e comercializam, não sendo razoável destinar-se ao consumidor as consequências negativas dos negócios envolvendo objetos defeituosos. IV - Impõe-se, no entanto, nos casos concretos, ponderar as situações existentes. V - Rejeita-se a nulidade arguida quando sem lastro na lei ou nos autos.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, prosseguindo no julgamento, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por maioria, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, vencidos os Ministros Relator e Barros Monteiro. Votaram com o Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira os Ministros César Asfor Rocha e Ruy Rosado de Aguiar.

54

Brasília, 11 de abril de 2000 (data do julgamento).

Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR. Presidente Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA. Relator p/ Acórdão

O voto proferido pelo Senhor Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira,

demonstra que nosso judiciário encontra momentos de brilhantismo, especialmente

ao pontuar que nossa codificação vive uma nova realidade imposta por uma

economia globalizada, que traz consigo um novo quadro jurídico, sendo necessária

uma interpretação fiel a essa nova realidade, não mais bastando à proteção calcada

somente em diplomas legais tradicionais.

Com o advento da informação e da globalização econômica, barreiras

comerciais rígidas deixaram em tese de existir, estimulando e favorecendo a livre

concorrência, possibilitando um maior intercambio entre pessoas e bens.

Demonstrou ainda em seu voto que é necessário que as leis de defesa do

consumidor ganhem mais expressão acompanhando esse novo quadro, buscando o

equilíbrio que deve ditar as relações jurídicas, sobretudo quando em escala

internacional, onde estão presentes empresas poderosas, multinacionais, com filiais

e representantes em vários países.

Dessa forma, se uma empresa se beneficia desse novo panorama, não há

justificativa para que não corresponda à altura com as consequências de eventuais

deficiências dos produtos que anunciam e comercializam, não sendo justo que o

consumidor, a parte mais fraca nessa relação, tenha que suportar as consequências

negativas da um produto defeituoso.

Dessa feita, o Superior Tribunal de Justiça, reconheceu que empresas

multinacionais, que contam com representação em território nacional, devem

55

independentemente de onde foi realizada a negociação, responder pelos vícios dos

produtos e serviços de suas marcas globalizadas.

O entendimento proferido pelo Superior Tribunal de Justiça veio a pacificar a

questão sendo seguido por outras cortes de instancias inferiores.

VÍCIO NO PRODUTO. NOTEBOOK. DEFEITOS DIVERSOS. MERCADORIA ADQUIRIDA NO MERCADO NACIONAL, INOBSTANTE TENHA SIDO IMPORTADA POR COMERCIANTE QUE DESATIVOU O NEGÓCIO APÓS A VENDA DO EQUIPAMENTO. LEGITIMIDADE PASSIVA DA EMPRESA QUE IMPORTA E COMERCIALIZA PRODUTOS DA MESMA MARCA (HP HEWLETT - PACKARD DO BRASIL) NO BRASIL. RESTITUIÇÃO DO VALOR PAGO. DANO MORAL CONFIGURADO. PECULIARIDADE. REDUÇÃO DO QUANTUM. “Assiste razão ao autor ao referir ser a ré HP BRASIL legítima e responsável solidariamente no presente caso. A questão é polêmica, mas ostenta a melhor justiça. Nos dias de hoje, diante de uma economia globalizada na qual empresas comercializam seus produtos por todo o mundo através de suas sucursais, imperioso receba o direito do consumidor interpretação condizente com a realidade em que está inserido. Assim, se a empresa nacional beneficia-se da marca do produto defeituoso, deve também honrar com a sua garantia legal. Alega a ré HP BRASIL ser pessoa jurídica independente e autônoma da fabricante americana HP COMPANY, o que se mostra, se não inverídico, ao menos insuficiente para afastar o fato de que compõem o mesmo grupo econômico. Observa-se no contrato social da ré (e suas alterações) juntado aos autos às fls.34/91 que é a HP BRASIL LTDA. formada por outras duas “HPs” internacionais, quais sejam, HP GLOBAL INVESTIMENTS B.V., com sede nos países baixos, e HP INTER-AMERICANAS, com sede na Califórnia nos Estados Unidos da América. Ora, resta claro que a HP – Hewllet Packard – é grupo econômico de dinâmica mundial e globalizada, pouco importando o fato de constituir diversas outras empresas, filiais, sucursais, com capital independente ou não, para que efetue de maneira descentralizada a comercialização de seus produtos. Nesse passo, a legitimidade da HP BRASIL há de ser reconhecida por ser compreendida dentro de um mesmo grupo econômico, ainda que assim não seja formalmente entendida. Dessa forma, aplicável ao caso a norma estatuída no artigo 28 parágrafo 2º do Código de Defesa do Consumidor

44, a qual menciona que são

solidariamente responsáveis as sociedades integrantes do grupo societário e as controladas” Recurso parcialmente provido. (Recurso Cível Nº 71002342863, Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Leila Vani Pandolfo Machado, Julgado em 25/08/2010);

O presente julgado reconhece a HP BRASIL como empresa pertencente do

mesmo grupo econômico, que efetua de maneira descentralizada a comercialização

44

Art.28, [...] §2º. As sociedades integrantes dos grupos societários e as sociedade controladas, são subsidiariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código.

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de seus produtos. Assim, a corte optou em aplicar a legislação consumerista, em

especial o artigo 28, §2º, atribuindo responsabilidade subsidiária, impondo o dever

de honrar a garantia do produto comercializado fora do mercado nacional.

REPARAÇÃO DE DANOS. CONSUMIDOR. VÍCIO DO PRODUTO. ILEGITIMIDADE PASSIVA AFASTADA. RESTITUIÇÃO DO VALOR DO BEM. Ilegitimidade passiva afastada, pois mesmo que o produto da mesma marca não tenha sido por ela importado, é parte integrante de negocio globalizado, com extensão mundial. Ademais, se a empresa nacional se beneficia da marca do produto com defeito, deve também honrar com sua garantia legal. Incontroverso pelos documentos anexados o vício no produto, sem que a demandada tenha demonstrado fato impeditivo, modificativo ou extintivo do autor, ou seja, de que não havia o defeito ou de que este se originou por culpa exclusiva do consumidor. Não tendo sido sanado o vício na motocicleta no prazo máximo de trinta dias, nos termos do artigo 18, § 1º, do CDC, é direito do consumidor postular a restituição imediata da quantia paga. Desse modo, correta a sentença que determinou a devolução do valor investido na compra do produto. PRELIMINAR AFASTADA. RECURSO DESPROVIDO. UNÂNIME. (Recurso Cível Nº 71002331437, Terceira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Jerson Moacir Gubert, Julgado em 25/02/2010);

No presente julgado, a decisão foi embasada no fato de que embora o

produto da mesma marca não tenha sido importado pela empresa reclamada, esta é

parte integrante do negócio globalizado. Assim, se beneficia da marca do produto

com defeito, deve também com sua garantia legal, aplicando as normas dispostas

no Código de Defesa do Consumidor ao presente caso.

CONSUMIDOR. VÍCIO DO PRODUTO. NOTEBOOK IMPORTADO. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE DAS EMPRESAS NACIONAIS AFASTADA. SUBSTITUIÇÃO DO BEM VICIADO. DANO MORAL EXISTENTE. Têm legitimidade passiva as empresas que ostentam a marca do produto adquirido no estrangeiro porquanto elas integram uma rede de negócio globalizado, com extensão mundial, auferindo largos lucros na medida em que têm clientes em decorrência da confiança por estes depositada na marca. Se a empresa nacional beneficia-se da marca do produto viciado, deve, por outro lado, cumprir a garanta contratual, sobretudo porque já havia substituído determinadas peças viciadas do computador importado. Os vícios alegados pelo autor são incontroversos ante a documentação acostada, a ausência de contestação específica e a substituição não impugnada de algumas peças viciadas realizada a título de garantia prestada no Brasil. Esse contexto determina a substituição do bem, nos termos do art. 18 do CDC. O dano moral resta caracterizado pela desconsideração ao consumidor, que, além de ficar privado por cerca de quatro meses do notebook período em que esteve recolhido para fins de conserto, se vê frustrado em relação à marca em que tanto confiava. RECURSO PROVIDO. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. (Recurso Cível Nº 71001339670, Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Maria José Schmitt Sant Anna, Julgado em 04/07/2007).

57

No mesmo sentido, o julgado acima colacionado demonstra o entendimento

de que, se a empresa integra uma rede de negócios globalizados, com extensão

mundial, auferindo largos lucros na medida em que tem clientes em decorrência da

confiança por estes depositada na marca. Se a empresa sediada no mercado

nacional se beneficia da marca globalizada, deve, por arcar com a garantia

contratual.

8 LACUNA LEGISLATIVA E ADEQUAÇÃO AO CONTEXTO ATUAL

Embora o Superior Tribunal de Justiça tenha entendido em responsabilizar o

fornecedor, assim obrigando a filial brasileira em prestar a devida assistência, já que

esta desfruta de elevado conceito, inclusive aproveitando a publicidade que é feita

em função da marca mundial, ou seja, aproveitando todas as vantagens decorrentes

desse conceito, seria no mínimo justo que ela oferecesse algo em contrapartida aos

seus consumidores, decorrendo assim o dever de reparar o dano sofrido por quem

confia e compra uma mercadoria viciada, acreditando na marca.

Entretanto, não existe tal previsão expressa no direito brasileiro. Estamos

então, frente a uma lacuna presente em nossa legislação face aos rumos adotados

por nossa sociedade, que urge por uma reforma como a realizada na Lei de Defesa

do Consumidor Argentina, Ley 24.240, reformada em 1998 pela Ley 24.999, artigo

40º, que trás expressamente a responsabilidade solidária nos seguintes termos:

“porductor, el fabricante, el importador, el distribuidor, el provedor, el vendedor y quien haya puesto su marca em la cosa o servicio”

45 (grifo

nosso).

45

ARGENTINA, Ley 24.240, 1993. disponível em: <http://www.infoleg.gov.ar/infolegInternet/anexos/0-4999/638/texact.htm>. acessado em 06/06/2012.

58

Fica claramente demonstrada a necessidade de uma reforma em nossa

legislação, buscando solidificar o entendimento pacificado por nossa corte superior,

trazendo maior segurança aos consumidores.

O primeiro passo nesse sentido foi dado no 5º Congresso Brasileiro de

Direito do Consumidor, quando aprovado a seguinte tese:

“11. As normas do CDC, como expressamente consignado em seu art. 1º, são de ordem pública e interesse social; entre a ordem pública local e a ordem pública estrangeira o juiz deve preferir a ordem pública de seu país; as disposições do CDC, por serem normas de ordem pública, não podem deixar de ser aplicadas às relações de consumo que envolvem consumidores residentes no território nacional, ressalvada a aplicação cumulativa da legislação estrangeira mais favorável”

46.

Assim, o Congresso Brasileiro de Direito do Consumidor demonstrou

novamente que aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, reconhecendo-o

como normas de ordem pública e interesse social, se sobrepondo as demais normas

nacionais ou alienígenas, devendo ser aplicada em todas as relações de consumo

que envolva consumidores residentes em território nacional.

9 CONCLUSÃO

Podemos concluir que, a discussão travada no polêmico Resp. 63.981-SP,

no qual a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu, por maioria dos votos,

que os produtos adquiridos no estrangeiro têm a garantia válida no território

nacional, desde que haja uma representante da marca no país, seja ela coligada,

filial ou subsidiária. Assim, podemos dizer que, embora a relação de consumo seja

entabulada e concretizada no mercado exterior, mas cuja execução efetiva se dê em

território nacional será tutelada pelo Código de Defesa do Consumidor. Dessa forma,

caso haja um defeito ou vício no produto dentro do prazo de garantia, o conserto ou

troca deve se processar por conta da empresa que explora a marca em território

46

Revista do Consumidor. ed. 35, 2000. p.265

59

nacional, mesmo que esta seja reconhecida como pessoa jurídica diversa

fornecedor internacional.

Destarte, fica demonstrado que o Código de Defesa do Consumidor, afasta

a aplicabilidade de outras normas, por se tratar de uma lei de aplicação imediata e

de ordem pública, devendo o juiz a preferir, não podendo deixar de ser aplicadas as

normas do Código de Defesa do Consumidor as relações de consumo que envolva

consumidores residentes no território nacional.

60

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARAÚJO, Nadia de. Direito Internacional Privado – Teoria e Pratica Brasileira. 2. ed. São Paulo: Renovar, 2010 BRASIL. Código Civil Lei nº3.071 de 1º de Janeiro de 1916. Atualização, Notas Remissivas e Índices pelo Desembargador Manoel Augusto Vieira Neto. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 1969. BRASIL. Código civil. 64. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. BRASIL. Código de defesa do consumidor. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. T4 – Quarta turma. Recurso Especial REsp 63981-SP (1995/0018349-8). Recorrente: Plínio Gustavo Prado Garcia. Apelada: Panasonic do Brasil Ltda. Relator: Min. Aldir Passarinho Junior. São Paulo, 11 de abril de 2000. Lex. CDC-90 Código de defesa do consumidor, DJ 20/11/2000 p. 296, JBCC vol. 186 p. 307, LEXSTJ vol. 139 p. 59, RSTJ vol. 137 p. 389. BUSSE, Diogo Nascimento. Direitos fundamentais na relação contratual: a pessoa por detrás do sujeito. In: “Revista Jurídica Ius gentium”. Faculdade Internacional de Curitiba, ano 3, n. 6 (jul/dez 2009). Curitiba: Facinter, 2009, p. 175-190. CARBONELL, Miguel. Neoconstitucionalismo. 2. ed. Madrid: Editorial Trotta S/A, 2005. DINIZ, Maria Helena. Tratado Teórico e Prático dos Contratos, Obra em 5 v. Tomo 1 e 5, São Paulo: Saraiva, 1993. DUARTE, Écio Oto Ramos. Neoconstitucionalismo e Positivismo Jurídico: As faces da teoria do direito em tempos de interpretação moral da constituição. São Paulo:Landy Editora, 2006. FILOMENO, José Geraldo de Brito. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. Comentado pelos autores do Anteprojeto, Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. 3ª edição.2001.Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001. MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 5. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006. SAMPAIO, Nadja. Defesa do Consumidor: Para a Justiça, produto importado tem garantia. Disponível em: http://oglobo.globo.com/economia/seubolso/mat/2010/01/16/para-justica-produto-importado-tem-garantia-915543198.asp. Publicado em: 16 jan. 2010. Acesso em: 10 jun. 2011. SILVA, De Placido e. Vocabulário Jurídico. atualizadores: Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. TEPEDINO, Gustavo. Temas de Direito Civil. 3. ed. São Paulo: Renovar, 2004.

61

VADE MECUM. Obra Coletiva da Editora Saraiva com a Colaboração de Luiz Roberto Curia, Lívia Céspedes e Juliana Nicoletti. 13. ed. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012. VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil. Vol.4. 3ª ed. São Paulo: Atlas S.A., 2003.

62

ANEXOS

A seguir, apresento a título de complementação, materiais publicados que

demonstram práticas abusivas, bem como, um exemplo de vulnerabilidade

informativa perpetradas pela Philips do Brasil, enfrentados pelo autor do presente

trabalho.

Anexo I – material publicitário de autoria da Philips, restando dúvidas se se trata de

uma propaganda elaborada pela empresa mundial ou pela representante nacional.

Traz um exemplo de vulnerabilidade informativa, estando o consumidor sujeito as

informações prestadas pelo fornecedor.

Anexo II – Traz um teste comparativo entre as principais marcar fabricantes de

televisores, com a finalidade de demonstrar ao consumidor a superioridade da

Philips frente a concorrência. Possibilitando a empresa a utilizar o “claim” de melhor

imagem em se tratando de tv’s de LCD, a fim de mobilizar o consumidor na hora de

escolher por uma marca na hora da compra.

“clain” trata-se das afirmações que se fazem a cerca do funcionamento, bem como

das características de um produto. Exemplos: o produto dura mais, não agride o

meio ambiente.

63

ANEXO I

O material colacionado, de autoria do fabricante e fornecedor, demonstra

informações controversas a respeito das características do produto por ele fabricado

e comercializado por seus revendedores e representantes.

O material publicitário em questão tem como objetivo divulgar as qualidades do

produto, levando argumentos de convencimento a fim de induzir o consumidor na

compra/aquisição do bem.

Nota-se em especial a questão relativa à quantidade de imagens que podem ser

reproduzidas na tela por segundo.

A título de informação, os primeiros televisores de LCD vinham ao mercado com

uma frequência de atualização de imagens de 60 Hz, ou seja, eram capazes de

reproduzir 60 imagens por segundo na tela. A Philips, ao disponibilizar um televisor

com 120 Hz estava dando um salto evolucionário, seu produto era capaz de

proporcionar ao espectador uma frequência de atualização de imagens de 120

quadros por segundo, o dobro da concorrência, o resultado seria uma imagem muito

mais nítida e definida, em especial nas cenas de ação e movimento.

O material publicitário se contradiz em diversos pontos:

1- Traz que o produto em questão tem uma tela de LCD de 120 Hz;

2- Em um quadro no lado direito, informa que o LCD é de 100 Hz;

3- Nas especificações, na secção de resolução de imagens suportadas, informa

que a frequência de atualização em resolução Full HD é de no máximo 60 Hz.

Podemos afirmar que trata-se de uma propaganda enganosa, a medida que traz

informações contraditórias, levando o consumidor a acreditar que o produto em

questão conta com determinadas características que produziram um determinado

funcionamento, o que na prática não é verdade.

64

Anexo II

Teste comparativo de Tv’s de LCD, encomendado pela Philips do Brasil ao Ibope em

Setembro de 2008.

O presente material era uma pesquisa quantitativa, realizada através de teste

comparativo de qualidade de imagens direto, sem identificação da marca, o qual

tinha por escopo demonstrar a superioridade da marca Philips sobre suas principais

concorrentes, deixando claro ao consumidor as vantagens em se adquirir um

televisor da empresa.

Tinha por objetivo a possibilidade da Philips em utilizar o “claim” de melhor TV de

LCD do mercado.