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UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ DEPARTAMENTO ACADÊMICO DE LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO ESPECIALIZAÇÃO EM ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA E LITERATURA THAÍS LOTTO NICOLA O CARÁTER ULTRARROMÂNTICO PRESENTE NO SAMBA-CANÇÃO: RECRIAÇÃO DA ESTÉTICA ULTRARROMÂNTICA MONOGRAFIA DE ESPECIALIZAÇÃO CURITIBA 2015

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UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ

DEPARTAMENTO ACADÊMICO DE LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO

ESPECIALIZAÇÃO EM ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA E LITERATURA

THAÍS LOTTO NICOLA

O CARÁTER ULTRARROMÂNTICO PRESENTE NO SAMBA-CANÇÃO:

RECRIAÇÃO DA ESTÉTICA ULTRARROMÂNTICA

MONOGRAFIA DE ESPECIALIZAÇÃO

CURITIBA

2015

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THAÍS LOTTO NICOLA

O CARÁTER ULTRARROMÂNTICO PRESENTE NO SAMBA-CANÇÃO:

RECRIAÇÃO DA ESTÉTICA ULTRARROMÂNTICA

Monografia apresentada como requisito

parcial para obtenção do título de Especialista

em Ensino de Língua Portuguesa e Literatura,

pelo Departamento Acadêmico de Linguagem

e Comunicação da Universidade Tecnológica

Federal do Paraná.

Orientadora: Profª. Mariana Sbaraini Cordeiro

CURITIBA

2015

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Ministério da Educação

Universidade Tecnológica Federal do Paraná Departamento Acadêmico de Linguagem e Comunicação - DALIC

Especialização em Ensino de Língua Portuguesa e Literatura - ELPL

TERMO DE APROVAÇÃO

ALUNO: Thaís Lotto Nicola Polo: Polo Jaú

TÍTULO DA MONOGRAFIA:

O caráter ultrarromântico presente no samba-canção: recriação da estética

ultrarromântica

Esta monografia foi apresentada às 10:30:00 AM h do dia 11/28/2015 como requisito

parcial para a obtenção do título de Especialista no curso de Especialização em Ensino de

Língua Portuguesa e Literatura da Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Campus

Curitiba. O candidato foi argüido pela Banca Examinadora composta pelos professores

abaixo assinados. Após deliberação, a Banca Examinadora considerou o trabalho:

1 Aprovado

2 x Aprovado condicionado às correções Pós-banca, postagem

da tarefa e liberação do Orientador.

3 Reprovado

Professora Mariana Sbaraini Cordeiro

UTFPR – PR

(orientador)

Professor Márcio Matiassi Cantarin

UTFPR – PR

Professora Maurini de Souza

UTFPR – PR

OBS: O DOCUMENTO ORIGINAL ENCONTRA-SE ARQUIVADO NA SECRETARIA DO

CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM LÍNGUA PORTUGUESA E LITERATURA.

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RESUMO

NICOLA, Thaís Lotto. O caráter ultrarromântico presente no samba canção: recriação da

estética ultrarromântica. Curitiba, 2015. 26 fls. Monografia. (Especialização em Ensino de

Língua Portuguesa e Literatura) – Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Campus

Curitiba, 2015.

O samba-canção é um gênero musical pertencente à música popular brasileira e possui em

sua temática um forte apelo ao romantismo em sua essência, identificando-se, portanto, com

o ultrarromantismo. Esse gênero musical teve seu apogeu na década de 50 com a ajuda de

intérpretes e compositores tais como: Herivelto Martins, Lupicínio Rodrigues, Noel Rosa,

Adelino Moreira, Dalva de Oliveira, Angela Maria, Maysa, Francisco Alves e Nelson

Gonçalves, entre tantos outros. Com origem em classes menos favorecidas do Rio de Janeiro,

o samba- canção utilizava em suas letras moldes linguísticos importados de realidades bem

distintas das suas, de modo a espelhar um desejo de ascensão social por parte de seus

compositores, bem como o ganho de seu espaço entre classes sociais de maior prestígio.

Por meio de um paralelo entre o samba-canção e o ultrarromantismo, ressaltam-se as

semelhanças existentes entre ambos, desde o modo de vida do homem-poeta até sua

expressão lírico-amorosa que encerra em si as desventuras do amor, os desejos de morte e

autopunição, a presença da mulher amada e a resignação diante do destino.

Palavras-chave: Samba-canção; Ultrarromantismo; Música popular brasileira

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 5

2 SAMBA – DAS ORIGENS À CONSOLIDAÇÃO ................................................... 7

2.1 O SAMBA-CANÇÃO ................................................................................................ 9

2.1.1 O kitsch na linguagem ........................................................................................... 10

2.1.2 Características da linguagem ................................................................................. 11

3 SAMBA-CANÇÃO E ULTRARROMANTISMO ................................................ 15

4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS .............................................................. 18

4.1 ANÁLISE DE COMPOSIÇÕES DO SAMBA-CANÇÃO ..................................... 18

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 24

REFERÊNCIAS ............................................................................................................ 25

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1 INTRODUÇÃO

O estudo que permeia o desenvolvimento deste trabalho tratará de abordar o samba-

canção, gênero da música popular brasileira surgido na década de 1930, em seus mais

diversos aspectos, chegando até a verificação de pontos de convergência entre ele e a

segunda geração Romântica do século XIX, o ultrarromantismo.

Veremos que tanto o ultrarromantismo, quanto o samba-canção, abordam o amor e

suas desventuras em sua temática. Desse modo, podemos aproximar, comparar e distinguir

estas diferentes manifestações artísticas buscando seu elo fundamental: a necessidade

humana de manifestar-se e de criar a ficção.

O objeto de estudo desse trabalho será a literatura em paralelo com o gênero musical

samba-canção. Apresentaremos quais são as formas de criar um cruzamento entre as

diferentes linguagens artísticas: música e literatura. Os objetivos do trabalho visam ampliar

o conhecimento do leitor de literatura em relação a outras artes; encontrar pontos de

aproximação entre composições do samba-canção com as características presentes em

poemas do ultrarromantismo; aproximar as diferentes linguagens por meio de temas

semelhantes das duas manifestações artísticas: o amor e suas desventuras.

Primeiramente, será retratada a história do samba, desde suas origens até sua

consolidação enquanto ritmo genuinamente brasileiro, que também originou diversas

vertentes, dentre elas: o samba-canção. Para propiciar ao leitor uma efetiva compreensão do

gênero musical em análise, será abordado o contexto socioeconômico de seu surgimento que

justificará todo o seu desenvolver, mediante panorama histórico. Assim, serão utilizados

como autores Jairo Severiano, para dar embasamento quanto às origens do samba-canção,

autores que exemplificarão o contexto do gênero citado: Beatriz Borges (1982), Ribeiro

(2006), Caldas (1985), Napolitano (2007) entre outros.

O leitor poderá conhecer também os representantes desse gênero musical em

análise. Representantes como: Herivelto Martins, Lupicínio Rodrigues, Dalva de Oliveira e

Maysa Monjardim. Os dois primeiros figurando a classe de compositores do gênero, e as

duas seguintes caracterizando a maneira de interpretação dos sambas-canção que,

juntamente com os compositores, acabam por participar da criação das canções e dar-lhes

ainda maior pungência romântica.

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Por se tratar de um gênero que tem por temática o amor e suas desventuras, o samba-

canção tem seus caminhos cruzados pelo kitsch que é algo por que se atrai, mas não

se consegue assumir como artístico (BORGES, 1982). O kitsch na linguagem será tratado

detalhadamente e exemplificado na linguagem do samba- canção.

A posteriori, este estudo apresentará uma explanação do que foi, como surgiu e se

desenvolveu a segunda geração Romântica do século XIX, ou seja, o Ultrarromantismo, com

vistas a fornecer ao leitor a formação das bases necessárias para a visualização e

compreensão das influências ultrarromânticas no samba- canção, no que tange a temática

e a linguagem. Usaremos críticos literários como Bosi (2000), Candido (1984), Coutinho

(1986) entre outros.

Como material de análise para este trabalho, serão citadas letras de alguns dos mais

importantes sambas-canção para aproximar a temática e linguagem destas duas

manifestações artísticas. Desse modo, será analisada a composição Cabelos brancos, de

Herivelto Martins; Vingança e Meu pecado, de Lupicínio Rodrigues; Neste mesmo lugar,

composta por Klécius Caldas e Armando Cavalcanti e Bom dia tristeza, de Vinicius De

Moraes e Adoniran Barbosa. A partir delas, desenvolver-se-á uma análise que trará à

luz vestígios ultrarromânticos presentes em suas entrelinhas.

Desse modo, a partir da utilização de uma metodologia de caráter teórico

bibliográfico no desenvolver deste trabalho, sua leitura fornecerá subsídios que conduzirão

o leitor por caminhos que o levarão ao alcance de seu objetivo central, ou seja, o

reconhecimento da existência de diversos pontos de convergência entre o samba-canção e o

ultrarromantismo.

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2 SAMBA – DAS ORIGENS À CONSOLIDAÇÃO

O samba é um gênero musical essencialmente urbano e carioca originário da mistura

de estilos musicais de procedência africana e brasileira. O termo da palavra samba é de

origem africana e tem seu significado ligado às danças típicas tribais do continente. Nei

Lopes, compositor, historiador e estudioso da cultura afro-brasileira elaborou a seguinte

definição do vocábulo samba:

O vocábulo samba é africaníssimo. [...] legitimamente banto, das bandas de

Angola e Congo. Samba entre os quiocos de Angola, é verbo que significa

cabriolar, brincar, divertir-se como cabrito. Entre os bacongos angolanos e

congueses o termo designa uma espécie de dança em que um dançarino bate

contra o peito do outro. (NEI LOPES apud SEVERIANO, 2008, p.69).

A essência desse estilo musical foi fixada em solo brasileiro na época do Brasil

Colonial, com a chegada da mão-de-obra escrava em nosso país. Nessa época o samba

era tocado com a ajuda de alguns instrumentos de percussão como: tambores, surdo, timbau

e acompanhados por violão e cavaquinho.

E sobre a origem do gênero importado da África e posteriormente da Bahia, o autor

Vasconcelos acrescenta:

[...] com a vinda dos escravos da África para o Brasil, vieram também suas

músicas e suas danças e, ao que tudo indica, foi na Bahia onde começaram a surgir

as primeiras sessões de samba, ou seja, danças de negros, sagradas e profanas.

Essas danças foram aos poucos tomando forma autônoma, distinguindo-se das

danças africanas originais. Mais tarde, baianas como Tia Ciata [...] e baianos como

Hilário Jovino transferiram-se para o Rio e continuaram aqui a promover, em suas

casas, na Rua da Alfândega e adjacências, sessões de samba e de candomblé.

A partir de 1870, pelo cruzamento ou influência recíproca e sucessiva do

lundu, polca [...], habanera, maxixe e choro, começaram a aparecer músicas que

tendiam ritmicamente para o samba [...] (VASCONCELOS, 1977, p. 25)

O primeiro samba que se tornou sucesso nacional, nasceu em agosto de 1916

em uma roda de batuqueiros, integrada por Ernesto dos Santos (Donga), Germano Lopes da

Silva, Hilário Jovino Ferreira, José Barbosa da Silva (o Sinhô), João da Mata e tia Ciata. Essa

composição foi chamada “O roceiro”, que Donga registrou com o título de “Pelo telefone”

(CALDAS, 1985).

A princípio a elaboração do samba era feita de maneira coletiva, os compositores

trabalhavam juntos na criação, não havia interesse comercial porque o samba não era visto

como meio de ganhar dinheiro, mas era produzido por prazer e diversão. Geralmente, as

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letras de sambas retratam a vida e o cotidiano de quem morava nas cidades, com destaque

para as populações de classe mais baixa.

Mais tarde, com a comercialização, as composições do samba passa a pertencer a

quem o registrasse primeiro. O novo ritmo firmou-se no mercado fonográfico e, a partir da

inauguração do rádio em 1922, chegou às casas da classe média (CALDAS, 1985).

Mas a promoção do samba à condição de símbolo da identidade cultural brasileira

se deu em meio a duas perspectivas: a da valorização da "tradição" e a da sua

"modernização". Em determinados momentos, tais perspectivas oscilaram entre movimentos

de confluência e oposição. A ideia de “tradição” se refere à década de 1930, no qual o

samba tem como espaço segmentos sociais populares como origem. Conforme explicitado

por Napolitano, nesse momento verificava-se o movimento de subida ao morro como

maneira de entrar em contato direto com essa "tradição":

A partir de 1935, incrementou-se a prática das visitas organizadas aos morros

e às escolas de samba, por parte de personalidades nacionais e estrangeiras,

ciceroneadas pelos mediadores de plantão: artistas cultos, intelectuais boêmios e

sambistas das comunidades envolvidas. Esse movimento simbólico buscava

reafirmar a nacionalidade ancorada nas tradições populares, para reinventar as

bases da brasilidade e redirecionar os caminhos da arte brasileira, culta e popular

(NAPOLITANO, 2007, p.33)

Já a perspectiva de “modernização” se refere ao desejo de alguns indivíduos em

refinar o samba, ou seja, melhorar sua qualidade poética e abandonar das temáticas ligadas

à malandragem como a apologia à vadiagem. Ary Barroso parece ter traduzido plenamente

essas metas em Aquarela do Brasil. Essa composição conseguiu conciliar "tradição" e

"modernização". Portanto, o samba deveria "abrir a cortina do passado" nacional e realizar

a fusão com a tradição, sem negligenciar a modernidade (NAPOLITANO, 2007, p.44-5).

Na década seguinte, a polarização entre essas duas perspectivas se acentuou. O

debate entre os que valorizavam o refinamento da música popular e os adeptos da

preservação da "pureza" das nossas tradições culturais aparece nas páginas da Revista da

Música Brasileira, editada por Lúcio Rangel, que circulou durante os anos de 1954 e 1955.

Conforme nos mostra a pesquisadora Saraiva (2007), essa revista foi porta-voz de um amplo

debate sobre o jazz, que era visto por alguns como fonte de procedimentos que

descaracterizavam a música brasileira, mas por outros, como um símbolo de

"modernização".

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O samba é o ritmo que melhor expressa musicalmente as zonas urbanas. E é neste

contexto que surge o gênero samba-canção.

2.1 O SAMBA-CANÇÃO

O grande aumento no número de pessoas nos centros urbanos desencadeou um

consequente crescimento na quantidade de prédios, bem como a concentração de classes

menos favorecidas nos subúrbios, que devido também ao número de habitantes por moradia,

levou à transferência do centro familiar e social de casa para espaços externos, daí o

aparecimento dos bares de esquinas. É nesse cenário que se encontram os compositores do

gênero em análise.

Justamente nos bares de esquinas é que nasce o samba-canção, com caráter coletivo,

em sua grande maioria, de parcerias que proporcionavam um lapidar por meio de palpites e

correções pelos que mais dominavam a norma culta, até transcrições musicais em partituras

pelos que dominavam teoria musical, como meio de fixar e registrar fielmente as

composições (RIBEIRO, 2006).

Pery Ribeiro, filho da cantora Dalva de Oliveira e do compositor Herivelto Martins,

exemplifica esta parceria entre eruditos e músicos ordinários do samba- canção citado

anteriormente, por meio de um relato do maestro e compositor brasileiro Heitor Villa-Lobos

que se surpreende com o talento de Herivelto Martins.

Herivelto, como é possível, você não sabendo uma nota musical, tocando mal

esse violão, ser autor de uma maravilha como Ave Maria no morro? Enquanto

eu, formado, erudito, não consegui ainda fazer algo assim? (VILLA-LOBOS apud

RIBEIRO, 2006, p. 30).

Essa parceria chega à familiaridade e permeia todo o cenário de surgimento e

desenrolar do samba-canção, bem como a vida de seus autores tão associada ao seu meio

em uma relação intrínseca.

O samba-canção, enquanto gênero musical, passou por dificuldades desde seu

aparecimento até definir-se como tal. Surgiu por volta de 1928, por compositores

semieruditos, e era chamado de samba de meio de ano, já que não se encaixava nos

moldes nem do samba, nem da canção, mas uma espécie de misto de ambos. “Enquanto a

melodia canta como canção, o ritmo marca o samba, e acaba não sendo nada

propriamente dito.” (LYRA apud BORGES, 1982, p.15). Assim, Borges (1982, p.15),

define que “é através de seus principais temas que o samba-canção melhor se define”.

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A Enciclopédia da música brasileira (1977, p. 684), define o samba-canção como

“samba cuja ênfase musical recai sobre a melodia, geralmente romântica e sentimental,

contribuindo para amolecer o ritmo”.

Dentre seus principais compositores, podemos destacar: Cartola, Noel Rosa,

Lupicínio Rodrigues, Herivelto Martins, Ataulfo Alves, Adelino Moreira; os quais

protagonizaram uma tendência que além de musical era principalmente poética.

“Nos anos 40 e 50, em conjunção com a voga de música romântica estrangeira, o

samba-canção faz muito sucesso e consagra alguns de seus maiores cultores” (MATOS,

2013, p. 130).

Desse modo, esse gênero caracteriza-se pelo grau de rebuscamento de suas

metáforas, que revelam uma tentativa de aprimoramento linguístico, de modo a espelhar um

desejo de ascensão social por meio da arte. Com letras de poética lírico amorosas pungentes,

o samba-canção é um reflexo de padrões estéticos superiores tomados de empréstimo do

Romantismo. Sua poética caracteriza-se pela presença da sentimentalidade e do excesso,

tanto formal quanto temático (BORGES, 1982).

A tomada de padrões da arte culta na produção popular origina um gênero misto

que confunde o bom e o mau gosto. Daí esse gênero ser caracterizado como Kitsch. Nas

palavras de Borges (1982, p. 234), o Kitsch “acaba sendo tudo aquilo por que nos atraímos

e que não temos coragem de chamar de artístico.”

2.1.1 O kitsch na linguagem

Os compositores do samba-canção se utilizam de uma linguagem literária e

rebuscada para conseguir status cultural para poder estar em meio às camadas mais

cultas. Com isso, abandonam a linguagem cotidiana e popular na busca de uma elevação

estilística para que a obra seja considerada original, pois acredita-se que para haver

poeticidade é preciso originalidade. Assim, no samba-canção a poeticidade pode virar

sinônimo de complicação.

Embora tente reproduzir uma cultura superior, não se pode dizer que este gênero

negue sua origem popular, posto que é por meio dela que ele atinge o grande mercado.

As composições desse gênero se valem de um modelo romântico, culto, antigo,

expresso em metáforas gastas, em tom demasiado solene, em ordem indireta que

ressaltam uma espécie de não valorização de suas origens (MATOS, 2013). Assim, pode-

se situar o samba-canção no terreno do Kitsch devido a sua dependência em relação a outra

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matriz formal, ou seja, por se prender a um modelo de arte culta não pertencente à realidade

de seus compositores.

Decorrente da arte culta, o kitsch se marca como a arte da classe média ou

baixa, que na perseguição do mito da grande arte, copia e imita procedimentos,

muitas vezes exagerados, atropelando-os sem muita organicidade, caracterizando-

se pelo excesso e pelo rebuscamento (BORGES, 1982, p. 112).

Outro fator que coloca o samba-canção enquanto kitsch é a ingenuidade encontrada

nessas produções, tida como fundamental à criação e à recepção, revelando a fé no poder e

sinceridade da arte expressa: o artista se coloca pessoalmente nas composições, na maioria

das vezes, as temáticas lhe são vivenciadas, e o receptor crê nisso, pois o compositor

enriquece as composições transformando sua vivência em arte (BORGES, 1982).

O conformismo presente nos sambas-canção também lhes confere o título de kitsch.

A ideia de pecado vinculada à religiosidade e o “castigo” são comuns e denotam forte

ligação com um fatalismo cristão. A vida, sempre detentora de um destino verte-se no

lamento ou na exaltação do que lhe foi dado, com total resignação. Todavia, a válvula de

escape acaba por ser o excesso e a sentimentalidade das letras (BORGES, 1982). Embora

ocupem terrenos culturalmente distintos, o sublime e a vulgaridade, a arte popular sempre

se nutriu da arte culta.

2.1.2 Características da linguagem

Os modernistas da primeira geração, primavam pela dissonância na linguagem

porque visavam uma quebra com o padrão vigente. O contrário do samba-canção, que busca

a consonância. Há um desejo de compor de acordo com um valor estético, mesmo que este

padrão seja antigo. Deste modo, usam as normas que conhecem: o padrão romântico

rebuscado.

As composições do samba-canção buscam o estilo do exagero romântico ou como é

caracterizado por Borges (1982, p. 56) “o derramamento que engloba o exagero e a grande

ênfase na expressão da linguagem”. A autora traz o conceito derramamento em oposição

à síntese. O segundo termo ligado a linguagem das letras da bossa nova.

O exagero na linguagem é o que peca em termos estéticos desde a queda dos

padrões românticos. Isto pesará mais para um público exigente e com concepções modernas.

Em termos musicais brasileiros, este público se concentra na bossa nova.

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A bossa nova está centrada num universo mais sofisticado. A música sai da classe

média e é orientada e consumida por ela. A criação das composições participa de um

processo no qual a criatividade combina beleza com clareza. Assim, a bossa nova vem

acentuar essa diferença entre a síntese moderna em contrapartida com o

derramamento do samba-canção (ALBIN, 2003).

O termo “derramamento” pode ser interpretado como uma linguagem vasta,

prolixa e excessiva, decorrente da tensão causada pelas desventuras amorosas.

O público da bossa nova, ouvinte intelectualizado ou bem informado, reconhece sua

própria dicção. Há uma aceitação desta música, mediante a uma identificação do ouvinte

com as ideias, contexto e valores presentes nas composições, fazendo com que haja o

reconhecimento por meio de semelhanças.

Diferentemente do samba-canção, que traz a diferença como forma de

reconhecimento, pois faz com que esse mesmo público se encante ou se deslumbre diante

de uma produção esteticamente extravagante, enfática e tida como de mau gosto, segundo

o público da bossa nova, pois que é contrário a sua concepção (BORGES, 1982).

O samba-canção aborda o modelo de um comportamento romântico que sofre pelo

seu amor mal sucedido e não mostra nenhum tipo de superação em relação a essa dor. Isso

tudo, não impede, no entanto, que o ouvinte da bossa nova provavelmente se emocione ao

ouvir um dramalhão de Lupicínio Rodrigues, pois este tipo de música fala do

sentimento de todos, ainda que censurados pelos ditames do bom gosto moderno.

Esse discurso romântico consegue aproximar dois públicos: o popular, que se

encanta com o rebuscamento, e o público mais sofisticado que se encanta a partir da

relação de estranhamento, pois este público está diante de algo não mais previsível como as

composições de sucesso popular. Quando se deparam com a cafonice sentimental, isto

causa-lhes estranhamento que até emociona, pois esse sentimentalismo todo é capaz de

mexer em partes não admitidas e impublicáveis porque revelam os sentimentos que muitas

vezes estão adormecidos. (WISNIK apud BORGES, 1982).

Há outro aspecto na linguagem do samba-canção: a redundância.

Essa redundância se dá pelo fato de o compositor, com medo de não ser

compreendido, repetir-se muitas vezes para assegurar que a sua mensagem seja

bem enfatizada e entendida. Com isso, abusa das imagens, dos conectivos e demais

elementos de ligação. Essas repetições podem causar confusões [...] duplo sentido

na letra, o que acaba por revelar significados ocultos. (BORGES, 1982, p. 62).

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A redundância se opõe à economia, sendo assim surge outro fator que se alia ao

derramamento: a extensão dos versos. O eu lírico num desejo de conter a dor e os conflitos

interiores acaba por passar esse desejo de controle para a linguagem que acaba por se

alongar nos versos e usar termos ou expressões prolixos.

Ao dirigir-se à escolha vocabular, a maioria das produções procura ao máximo

se desprender da linguagem comum para a busca de palavras literárias, pois é por meio

da escolha vocabular refinada que depende a originalidade da letra e a capacidade de causar

emoção. Assim, Borges (1982, p.52), afirma que “a única maneira de o autor do samba-

canção enfeitar e dar brilho a sua realidade é através da linguagem”.

Muitas vezes nas escolhas de linguagem há combinações de rimas e palavras que

deixam outros significados aparecerem mesmo que não intencionalmente. Essa espécie de

“ato falho” é chamado pela autora de “fratura significativa” (BORGES, 1982, p. 68).

De maneira geral, o samba-canção procura uma consonância com os valores

burgueses românticos. Essa consonância nunca é absoluta e o romantismo acaba algumas

vezes tornando-se barroco, devido aos excessos de imagens, exageros e o sentimento que se

torna mais universal. Assim, procura-se esquecer a existência cotidiana e circunstancial

como: a pobreza, o dinheiro e a injustiça.

Sendo assim, para exemplificar, a injustiça desloca-se e passa a ser vista apenas

como injustiça amorosa: a grande metáfora do samba-canção. Dessa forma, o eu lírico

sempre viverá conflitos amorosos, melancolia e tristeza advinda desses conflitos,

semelhante ao ultrarromantismo no qual o poeta rejeitado passará sua vida em extremo

sofrimento, conformismo e autopiedade. Essas semelhanças com o Ultrarromantismo serão

mais exploradas a seguir.

Cabe ainda mostrar os principais valores que estão embutidos nas letras. A

idealização da mulher provoca uma série de consequências nesse universo de valores.

Justamente por ser idealizada, a ela cabe a culpa por toda e qualquer desilusão. Por isso,

homens e mulheres aparecem sempre em terrenos diferentes. A mulher, em boa parte das

letras, não consegue compreender e nem sentir o sofrimento amoroso, pois não possui a

lógica e a honra que são características únicas do homem nas letras do samba-canção.

Sendo assim, observa-se que o samba de um modo geral constitui-se num discurso

masculino e reforça a cumplicidade entre os homens.

Outros valores vinculados a essas músicas estão ligados ao esquema maniqueísta

baseado na ideologia cristã e burguesa. Assim as músicas tratarão desses esquemas como o

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“bem” e o “mal”, que nestas letras firmam seus conceitos sobre bases sólidas do tema da

traição.

Apesar de seus valores, o samba-canção trabalha com temas universais e ligados

às dores sentimentais. A dor é elemento principal nessas letras, cantá-la

pode ser uma forma catártica de ser livre dela, mas cantá-la constantemente pode

ser uma maneira de cultivá-la também. Sendo assim, o sofrimento pode ser

exorcizado através do lamento (BORGES, 1982, p.95).

De uma maneira ou de outra tais letras buscam um distanciamento entre a paixão,

que lhe serve de tema e o instrumento de que se utiliza: a linguagem. Há sempre uma

interdição da própria linguagem diante do sofrimento, assim a linguagem não dá

conta do mesmo, e é a partir daí que ultrapassa os limites do bom gosto, segundo o público

da bossa nova. O lamento e o sofrimento transferem-se para uma linguagem literária, de

exageros e de metáforas rebuscadas que não combinam com aspirações mais modernas.

Como já abordada, a elevação da linguagem busca uma originalidade na produção

artística, para assim, ser considerada poética. Esse preciosismo tratará de temas não tão

raros, mas comum a todos como: paixão, traição, saudade, despedidas, ou seja, tratará dos

sentimentos e desventuras amorosas e o modo como o eu lírico as enfrenta. Este será o ponto

de encontro com o ultrarromantismo.

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3 SAMBA-CANÇÃO E ULTRARROMANTISMO

O movimento literário do Romantismo tem como lugar de origem a Europa e surge

como sendo fruto de momentos de turbulência e agitação social. Sendo assim, essas

agitações refletem em uma literatura também de conflitos, porém tais conflitos estão ligados

ao mundo interior do próprio homem. Segundo interpretação do sociólogo Mannheim

apud Bosi (2000, p.10), “o romantismo expressa o sentimento dos descontentes”.

Bosi (2000, p.10) define o romantismo como sendo “um progressivo dissolver- se de

hierarquias (Pátria, Igreja, Tradição) em estados de alma individuais”. Moisés (2000, p.117)

mostra que “Os românticos vivem voltados para dentro de si, na sondagem de seu mundo

interior, onde vegetam sentimentos vagos”.

Em termos de Brasil, o Romantismo contribuiu para a firmação de uma literatura

nacional. A poesia romântica se manifestou no Brasil em 1836 com Suspiros Poéticos

e Saudades de Gonçalves de Magalhães. Os exageros do romantismo ideologicamente

levaram ao movimento que ficou conhecido como Ultrarromantismo. Trata-se assim de um

momento literário com as normas e ideais do romantismo, com a exaltação da

subjetividade, do individualismo, do idealismo amoroso e etc (BOSI, 2000).

Os ultrarromânticos de maior destaque no Brasil são Alvares de Azevedo, Junqueira

Freire e Fagundes Varela que buscam em poetas europeus como: Byron, Goethe e Musset,

inspiração para uma poesia de caráter intensamente subjetivo.

A segunda geração romântica é marcada por uma postura de exagero sentimental

que se torna inconfundível. Inspirados por escritores ingleses como Byron e Shelley,

os representantes dessa geração liam uma poesia que exaltava os sentimentos arrebatados

ao mesmo tempo em que apresentava o poeta isolado da sociedade, incompreendido por

defender valores morais e éticos contrários aos interesses econômicos da burguesia, como

afirma Candido: “Esses poetas levaram a melancolia ao desespero e o sentimentalismo

ao masoquismo, além de os temperar frequentemente pela ironia e o sarcasmo [...]” (2002,

p. 51).

Álvares de Azevedo foi o mais destacado autor ultrarromântico brasileiro. O autor

sempre explorou o tema dos desesperos passionais, porém sua obra é dividida entre: ironia,

amor e evasão da realidade nos sonhos ou na morte. Segundo Candido (2002, p. 54),

Álvares de Azevedo teve o “dom de passar de um pólo ao outro, modulando a dor e o

sarcasmo, o patético e o cômico, a grandiloquência e o prosaísmo, com uma versatilidade

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que era programada e ele manifesta pela adesão à teoria romântica dos contrastes, a

binomia, como a chamava.” Desse conflito, nasce sua identidade literária, que o torna

único entre os ultrarromânticos, e que será definida pelo modo contrastante de tratar os

temas da época.

Outra faceta do projeto literário ultrarromântico será exemplificada por

Casimiro de Abreu. Em oposição à expressão pessimista do sentimento amoroso, típica, por

exemplo, de Álvares de Azevedo, que fala da solidão e da morte, Casimiro de Abreu

fala de sonhos de amor e suspiros de saudade. Suas figuras femininas não vêm associadas a

imagens de morte. (CANDIDO, 2002).

Junqueira Freire também fez parte de autores da segunda geração. Sua temática está

ligada “ao egocentrismo, patente num curto escrito autobiográfico que exprime a vocação

romântica da autoanálise desalentada, à qual não faltava certo prazer no sofrimento [...]”

(CANDIDO, 2002, p. 60).

Outro renomado autor foi Fagundes Varela que tem como principal característica

uma poesia confessional. Sua vida foi marcada por uma tragédia pessoal: seu primeiro filho

morreu com três anos de vida. A dor provocada por essa perda levou-o à vida boêmia e ao

alcoolismo. Em homenagem ao filho, compôs um de seus poemas mais conhecidos “Cântico

do calvário”.

O samba-canção faz uma releitura desses sentimentos ultrarromânticos, pois ambos

possuem as mesmas características e temáticas como: a solidão advinda do desprezo e

abandono do ser amado que acaba por exprimir um pessimismo doentio e descrença

generalizada. Temas que se repetem na literatura, desde as cantigas de amor, e em outros

estilos musicais, como por exemplo, o sertanejo universitário.

Tendo ainda como tema, o desejo de vingança, o tédio pela vida e até o chamado

Byronismo, relativo ao poeta inglês Lord Byron, uma atitude amplamente praticada pelos

românticos brasileiros da segunda geração, que é caracterizada por um estilo de vida

boêmia, voltada para o vício, para os prazeres da bebida, do fumo e do sexo, movidas pelo

egocentrismo, narcisismo, pessimismo e angústia (BOSI, 2000).

Os poetas da segunda geração romântica oscilavam o seu estado de espírito, o que

refletia em uma poesia de exagero, narcisismo e egocentrismo. Esses poetas eram dotados

de máscaras, pois ora vestiam a máscara de devassos, ora a máscara da loucura, embriaguez,

que por vezes cediam lugar às máscaras da ingenuidade e sensibilidade ao amar

(CANDIDO, 1984).

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Tanto os poetas ultrarromânticos quanto os compositores do samba-canção

possuíam uma vida boêmia e plena de conflitos amorosos. Almeida Garrett, um dos mais

importantes representantes do Romantismo português, tem em seus poemas o reflexo de

dores de angústia de seus relacionamentos amorosos, assim como os demais poetas

românticos, bem como no samba-canção.

Um exemplo disso é o compositor Herivelto Martins que diante do sofrimento da

separação da esposa, a cantora Dalva de Oliveira, compartilha com o público por meio de

suas músicas a crise e a angústia que estava vivendo. Tais letras são rebatidas pela ex-

mulher, Dalva, e a partir daí começa um verdadeiro duelo musical. Ambos expõem os

sentimentos de decepção e mágoa em suas letras (RIBEIRO, 2006).

Amor, medo, solidão e sentimentos contraditórios e exagero sentimental são vividos

tanto pelos poetas ultrarromânticos quanto pelos compositores. Sendo assim, podemos

dizer que há uma recriação da estética ultrarromântica.

Faremos no capítulo a seguir análises de algumas composições do samba- canção,

buscando mostrar a semelhança das temáticas do Ultrarromantismo presentes no samba-

canção.

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4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS

Neste capítulo será desenvolvida uma análise comparativa entre algumas

composições do samba-canção. Tal análise trará à luz vestígios ultrarromânticos presentes

em suas entrelinhas, destacando como ponto de convergência o amor e suas desventuras.

4.1 ANÁLISE DE COMPOSIÇÕES DO SAMBA-CANÇÃO

Diante das comparações entre o samba-canção e o Ultrarromantismo é preciso, por

meio de análises das letras, mostrar esse caráter ultrarromântico que está presente nas

músicas. A primeira letra a ser analisada será a composição de Herivelto Martins,

interpretada por Sílvio Caldas, chamada Cabelos brancos.

Não falem desta mulher perto de mim

Não falem pra não lembrar minha dor

Já fui moço, já gozei a mocidade

Se me lembro dela me dá saudade

Por ela vivo aos trancos e barrancos

Respeitem ao menos os meus cabelos

Brancos

Ninguém viveu a vida que eu vivi

Ninguém sofreu na vida o que eu sofri

As lágrimas sentidas

Os meus sorrisos francos

Refletem-se hoje em dia

Nos meus cabelos brancos

E agora em homenagem ao meu fim Não falem desta mulher perto de mim

Esta letra traz a tristeza do eu lírico pela impossibilidade da união, temática

recorrente nos poemas ultrarromânticos, na qual mostra um esforço desesperador e

comovente do eu lírico em controlar seu sofrimento: “Não falem desta mulher perto de

mim/ Não falem pra não lembrar minha dor”. A autopiedade também é explicitada na letra:

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“Respeitem ao menos os meus cabelos brancos[...] em homenagem ao meu fim/ Não

falem desta mulher perto de mim”. O uso do termo cabelos brancos se aplica como uma

metáfora de que todo o sofrimento e desfeita amorosa acabam por acelerar o processo de

envelhecimento.

Podemos aproximar a temática da composição Cabelos brancos, com o poema

ultrarromântico Por que mentias? de Álvares de Azevedo (1831-1852): “Por tua causa

desespero e morro.../ Leviana sem dó, por que mentias?/Sabe Deus se te amei! Sabem as

noites/ Essa dor que alentei, que tu nutrias!/ Sabe esse pobre coração que treme/ Que a

esperança perdeu por que mentias![...]. Tanto no poema quanto na canção há a atribuição

da dor da separação a mulher. O eu lírico em ambos os casos adoece pela dor da separação.

Assim, o estado da alma do eu lírico da canção se assemelha ao do romântico. “O romântico

é temperamental, exaltado, melancólico. Procura idealizar a realidade, e não reproduzi-

la” (COUTINHO, 1986, p.7).

Toda a tensão e sofrimento vivido pelo eu lírico acaba influenciando na linguagem.

Sendo assim, os versos acabam se alongando devido à oscilação que se estabelece entre o

derramamento (explosão, choro e briga) e o esforço do eu lírico em controlar sua angústia.

Na composição de Herivelto Martins, Cabelos brancos, não houve tanta extensão nos

versos como na letra de Lupicínio Rodrigues, Vingança:

Eu gostei tanto, tanto quando me contaram que lhe encontraram bebendo e chorando na mesa de um bar, e que

quando os amigos do peito por mim perguntaram

um soluço cortou sua

voz, não lhe deixou falar

Mas eu gostei tanto, tanto, quando me contaram que tive mesmo de fazer esforço para ninguém notar. O

remorso talvez seja a causa do seu desespero

Ela deve estar bem consciente do que praticou, me fazer passar tanta vergonha com um companheiro e a

vergonha é herança maior que meu pai em deixou; mas

enquanto houver força em meu peito

eu não quero mais nada

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só vingança, vingança, vingança aos santos clamar. Ela há

de rolar como as pedras que rolam na estrada sem ter nunca

um cantinho de seu pra poder descansar.

O discurso configurado pela extensão dos versos aumenta a impressão de

derramamento. Há um forte aspecto confessional na letra, no qual o eu lírico deixa

transparecer o orgulho ferido. Os níveis masculinos sobrepondo-se aos femininos também

estão presentes. Nessas composições, o companheirismo é algo que só se tem entre homens

e se sobrepõe-se a qualquer experiência amorosa.

Na letra, o ouvinte fica sem saber qual foi o mal cometido e quem é esse

companheiro: “Ela deve estar bem consciente do que praticou/ me fazer passar tanta

vergonha com um companheiro”. A impressão que se tem é que esse companheiro

presenciou alguma cena de abandono ou desprezo amoroso, daí a humilhação. E devido tal

humilhação, o eu lírico deseja vingança e o mal para a mulher.

Há grande exagero e ódio, o eu lírico enxerga apenas a si próprio, só se preocupa

com sua dor e com o seu mundo, assemelhando-se às características típicas dos românticos

da segunda geração, “[...] a oclusão do sujeito em si próprio” (BOSI, 2000, p.120). Há uma

busca de evadir-se em si mesmo, dando mais valor ao indivíduo do que ao coletivo.

Outra característica presente nas canções é a fuga da realidade. Na letra Meu pecado,

de Lupicínio Rodrigues, o eu lírico busca alívio na fé que é o consolo. Assim, o poeta

se dirige a Deus para reclamar de seus dissabores.

Deixa-me sofrer que eu mereço Pois um pouco que padeço, não paga nem um terço do que fiz

Tão horrível meu pecado

Que sendo assim castigado

É que me sinto feliz

Deus concedeu-me o direito

De eu mesmo ferir meu peito

Não quis me ouvir ou julgar

Bem feliz é todo aquele que erra E aqui mesmo na terra

Pode seu crime pagar

Joguei uma jovem ao rigor dos caminhos

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A trilhar por um monte de espinhos

Vejam só a maldade que fiz

E quando a encontrei assim atirada,

doentia, tristonha e arruinada

Pus-me a rir desta pobre infeliz E hoje o remorso que trago comigo

Transformou-se em meu inimigo

E procura vingar-se em meu ser

Ando a vagar qual um louco morcego

Que procura fugir do sossego [...]

Observa-se nesta composição quase todos os valores e características do universo do

samba-canção: as metáforas rebuscadas combinadas com o registro coloquial, o

alongamento dos versos, a expiação da culpa, o kitsch, ou seja, a cafonice formal que rima

“sossego” com “morcego” e constrói versos como: “E quando a encontrei assim atirada/

doentia, tristonha e arruinada/ Pus-me a rir desta pobre infeliz”, no qual a redundância

aumenta o patético de uma construção se quer poética.

O homem é tido como onipotente, decide e perdoa, para logo em seguida se vitimar

diante da força arrebatadora da mulher, que normalmente, é quem castiga. A mulher ou

Deus, nunca o próprio homem. Assim, o eu lírico foge desta realidade de culpa, buscando

consolo em Deus. Podemos observar a fuga da realidade nas composições do samba-canção,

característica presente nos poetas ultrarromânticos. De acordo com Bosi (2000, p. 102), “o

eu romântico, objetivamente incapaz de resolver os conflitos com a sociedade, lança-se à

evasão”.

Os poetas românticos buscavam a fuga para as desilusões na morte, pois segundo

eles, a morte garante o término da dor e desilusões da vida: “Pensamento gentil de paz

eterna/ Amiga morte, vem./ Tu és o nada,/Tu és a ausência das moções da vida,/Do

prazer que nos custa a dor passada [...]”. Os versos de Junqueira Freire revelam as

razões românticas para o culto da morte. Ela é amiga e dá paz a quem vive em agonia. Tanto

os poetas quanto os compositores não podem negar a força dos desejos, mas os associam a

um sentimento de culpa e destruição.

Outra característica do ultrarromantismo é o conflito interior causado por uma

desilusão amorosa, característica presente no samba-canção. A principal temática das

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composições desse gênero musical é o desencontro amoroso. É importante destacar então, a

letra Neste mesmo lugar, composta por Armando Cavalcanti e Klécius Caldas, e interpretada

por Dalva de Oliveira:

Aqui, neste mesmo lugar, Neste mesmo lugar de nós dois, jamais poderia pensar

Que eu voltasse sozinho depois.

O mesmo garçom se aproxima,

Parece que nada mudou,

Porém qualquer coisa não rima

Com o tempo feliz que passou.

Por ironia cruel

Alguém começou a cantar

Um samba-canção de Noel,

Que viu nosso amor começar.

Só falta agora a porta se abrir

E ela ao lado de outro chegar

E por mim passar sem me olhar.

Só falta agora a porta se abrir

E ela ao lado de outro chegar E por mim passar.

Nesta composição observamos outros aspectos ultrarromânticos presentes como: a

solidão e a sensação de deslocamento do poeta depois de uma separação amorosa. Por causa

do sofrimento o eu lírico, assim como o poeta ultrarromântico, acaba se voltando ao passado

como uma forma de fuga desta dor: “Porém qualquer coisa não rima / Com o tempo feliz

que passou”, o presente nunca é bom ou satisfatório, por isso o sujeito se remete a uma

sessão nostálgica. Na poesia da segunda geração, temos o poeta Casimiro de Abreu que

volta ao passado com saudades da infância, no poema Meus oito anos. Sendo assim, o elo

entre o poema e a canção se dá pela nostalgia, pela crença de que o passado era bem melhor

que o presente, porém a nostalgia do poema se refere à infância, já a nostalgia da

canção se refere ao amor vivido.

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Para finalizar as análises, veremos a letra Bom dia tristeza, composta por Adoniran

Barbosa e Vinicius de Moraes, e interpretada por Maysa:

Bom dia tristeza Que

tarde tristeza Você

veio hoje me ver Já

estava ficando

Até meio triste De estar tanto tempo

Longe de você

Se chegue tristeza

Se sente comigo

Aqui nesta mesa de bar

Beba do meu copo

Me dê o seu ombro

Que é para eu chorar

Chorar de tristeza

Tristeza de amar.

Além do conformismo, do eu lírico em já estar habituado a estar triste, encontram-

se também vestígios do chamado Byronismo, devido à atitude praticada pelo poeta que é

caracterizado por um estilo de vida boêmia, movida pelo pessimismo e angústia: “Se chegue

tristeza/ Se sente comigo/ Aqui nesta mesa de bar/ Beba do meu copo/ Me dê o seu ombro/

Que é para eu chorar”. Além desta atitude há também o fechamento do indivíduo em si

próprio, num devaneio melancólico. O sofrimento no samba-canção é quase que um status

do poeta- compositor.

Desse modo, podemos observar que tanto o samba-canção quanto o

ultrarromantismo se constituem como a expressão máxima de sentimentalismo. A

valorização das emoções pessoais constitui uma das motivações dos poetas e compositores,

pois o mundo interior é o que conta no momento da produção das suas obras.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo abordado neste trabalho visou mostrar o paralelo que o samba- canção faz

com o ultrarromantismo. Para poder explicitar tais semelhanças, foi necessário selecionar

cinco letras de músicas dos principais compositores desse gênero musical, tais como:

Herivelto Martins, Lupicínio Rodrigues, Klécius Caldas e Armando Cavalcanti, Vinicius De

Moraes e Adoniran Barbosa.

Por meio de análises, foi possível encontrar vestígios ultrarromânticos nas

composições do samba-canção, caracterizados por conflitos amorosos. A partir desses

conflitos, pode-se constatar que a dor do sofrimento amoroso refletiu em uma produção

artística em que o sujeito adquire uma postura pessimista e melancólica diante da vida e dos

relacionamentos que se assemelha a esta segunda geração romântica. Sendo assim, maior

parte dessas composições refletem a estética ultrarromântica.

Em relação à linguagem, foi observado que no samba-canção havia uma grande

preocupação com a forma, pois existia um forte desejo por parte dos letristas de elevar a

linguagem, para assim atingir as camadas mais cultas da sociedade. Abandona-se a fala

popular em função de um registro formal, fazendo uso de imagens literárias, o

rebuscamento de metáforas e o excesso de sentimentalismo que acabava beirando o mau

gosto, segundo o público da bossa nova, que foi denominado com a expressão: kitsch.

A partir do estudo realizado, conclui-se que o caráter ultrarromântico está presente

nas composições do samba-canção porque tais letras tratam de temas que abordam o

sentimento amoroso e o sofrimento por um amor frustrado, e por se utilizar de uma

linguagem rebuscada. Devido aos exageros ultrarromânticos, esse gênero musical acabou

sendo interpretado positivamente por mau gosto pela autora Borges (1982). É visto assim,

pois o samba-canção é intenso e consegue mexer nos sentimentos não admitidos e

inconfessáveis de cada indivíduo, despertando assim desejos reprimidos que acabam por

confortar as inseguranças e o sofrimento amoroso existente em cada ouvinte.

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REFERÊNCIAS

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JUNG, Carl G. O homem e seus símbolos. 2ª edição especial brasileira. Trad. De

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RIBEIRO, Pery; DUARTE, Ana. Minhas duas estrelas: uma vida com meus pais

Dalva de Oliveira e Herivelto Martins. 1. ed. São Paulo: Globo, 2006.

SEVERIANO, Jairo. Uma história da música popular brasileira: das origens à

modernidade. 1. Ed. São Paulo: 34, 2008.

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VASCONCELOS, Ary. Panorama da Música Popular Brasileira na Belle Époque.

Rio de Janeiro: Livraria Sant’Anna Ltda., 1977.

The ultra-romantic character presents in samba-canção: recreation of ultra-romantic

aesthetic

Abstract: Samba-canção is a musical genre that belongs to the Brazilian popular music

and it has in its subject matters a strong appeal to the romanticism in its pure essence,

therefore there is identification with ultra-romanticism. This musical genre had an apogee

in the fifties with the support of performers and composers such as: Herivelto Martins,

Lupicínio Rodrigues, Noel Rosa, Adelino Moreira, Dalva de Oliveira, Angela Maria,

Maysa, Francisco Alves e Nelson Gonçalves, among others. Originating in low classes

in Rio de Janeiro, samba-canção used in its lyrics, linguistic mold of different realities,

reflecting in a desire for social advancement by their composers, as well as the gain of its

place among the social classes of most prestigious. Through a parallel between samba-

canção and ultra-romanticism, it finds similarities between both, from the way of life of the

man-poet until its lyric-loving expression which contains within itself the love

misadventures, the death wishes and self-punishment, the presence of the beloved woman

and the resignation before the destination.

Keywords: Samba-canção; Ultra-romanticis; Brazilian popular music.