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UNIVERSIDADE SÃO JUDAS TADEU PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU MESTRADO EM ARQUITETURA E URBANISMO ELIZABETH FLORIDO DA SILVA DESVENDANDO O ESPÍRITO DO LUGAR: OLHARES SOBRE A MOOCA São Paulo 2017

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UNIVERSIDADE SÃO JUDAS TADEU

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU

MESTRADO EM ARQUITETURA E URBANISMO

ELIZABETH FLORIDO DA SILVA

DESVENDANDO O ESPÍRITO DO LUGAR:

OLHARES SOBRE A MOOCA

São Paulo

2017

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UNIVERSIDADE SÃO JUDAS TADEU

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU

MESTRADO EM ARQUITETURA E URBANISMO

ELIZABETH FLORIDO DA SILVA

DESVENDANDO O ESPÍRITO DO LUGAR:

OLHARES SOBRE A MOOCA

São Paulo

2017

Dissertação apresentada ao Programa de

Pós-Graduação Stricto Sensu em Arquitetura e Urbanismo como requisito para obtenção do título de Mestre.

Orientadora: Profa. Dra. Andréa de Oliveira

Tourinho

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UNIVERSIDADE SÃO JUDAS TADEU

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU

MESTRADO EM ARQUITETURA E URBANISMO

ELIZABETH FLORIDO DA SILVA

DESVENDANDO O ESPÍRITO DO LUGAR:

OLHARES SOBRE A MOOCA

Aprovado em: __________________ de 2017.

São Paulo

2017

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Arquitetura e Urbanismo como requisito para obtenção do título de Mestre.

Orientadora: Profa. Dra. Andréa de Oliveira Tourinho

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Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio

convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.

E-mail da autora: [email protected]

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca da

Universidade São Judas Tadeu

Bibliotecária: Cláudia Silva Salviano Moreira - CRB 8/9237

Silva, Elisabete Florido da

S586d Desvendando o espírito do lugar: olhares sobre a Mooca / Elisabete Florido

da Silva. - São Paulo, 2017.

188 f. : il. ; 30 cm.

Orientadora: Andréa de Oliveira Tourinho.

Dissertação (mestrado) – Universidade São Judas Tadeu, São Paulo, 2017.

1. Patrimônio cultural. 2. Mooca (São Paulo, SP). 3. Memória. I. Tourinho, Andréa de

Oliveira. II. Universidade São Judas Tadeu, Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu

em Arquitetura e Urbanismo. III. Título

CDD 22 – 363.0981

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Não sei quantas almas tenho

Não sei quantas almas tenho.

Cada momento mudei.

Continuamente me estranho.

Nunca me vi nem acabei.

De tanto ser, só tenho alma.

Quem tem alma não tem calma.

Quem vê é só o que vê,

Quem sente não é quem é,

Atento ao que sou e vejo,

Torno-me eles e não eu.

Cada meu sonho ou desejo

É do que nasce e não meu.

Sou minha própria paisagem;

Assisto à minha passagem,

Diverso, móbil e só,

Não sei sentir-me onde estou.

Por isso, alheio, vou lendo

Como páginas, meu ser.

O que segue não prevendo,

O que passou a esquecer.

Noto à margem do que li

O que julguei que senti.

Releio e digo: “Fui eu?”

Deus sabe, porque o escreveu.

Fernando Pessoa

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Agradecimentos

São tantas formas de agradecimento quantas são as pessoas que quero

muito agradecer pelo carinho, a paciência em entender meus maus momentos, a

torcida para ver tudo dar certo, o apoio moral, emocional, físico até, para que eu

não desistisse e pudesse estar agora aqui, como estou, celebrando a realização

desse trabalho que é um marco na minha vida. Que seja, espero, a abertura de

portas que estavam ali, fechadas, aguardando o momento certo de serem

abertas. E que ao se abrirem, eu possa, de verdade, contribuir para um mundo

melhor com tanto conhecimento adquirido. Que possa, mesmo, ousar um tanto a

mais na história da minha vida e percorrer novas estradas que me levem ao

encontro de mim mesma. E que no final dessa jornada, consiga fazer um balanço

e perceber que valeu a pena ter indo além do lugar comum.

Estão certos os orientais que em tudo vêm um motivo para agradecer. Até

mesmo quando se encontram diante das adversidades. Inspirada nessa filosofia

xintoísta, de amor à natureza como um todo, e isso inclui pessoas, seguem meus

humildes e mais profundos agradecimentos:

DEUS

O senhor brilha até quando não podemos imaginar que a luz vai estar lá.

PAI

A certeza de que serei amada para sempre, aqui e em qualquer lugar do mundo,

da imaginação, do transcendente, daquilo que está além de nossa compreensão

comum.

MÃE

Semente primeira que germinou uma vida, fonte inesgotável de sabedoria e de

um amor sem fim.

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MARCELO

Tem um pouco de você nisso tudo aqui, meu companheirão. Quis o tal do destino

que nossa união fosse breve, mas o que cultivamos será eterno em todas as

vidas.

LETÍCIA

Um dia, filha, você terá ideia do quanto me sacrifiquei para não deixar você de

lado. Hoje, o caminho é seu. Podemos, ou não, trilhá-lo juntas. Mas saiba: sempre

estarei aqui. E saiba que meu amor por você também.

GABRIEL

A materialização de um amor tão sublime e tão intenso que as palavras se

perdem em sonhos pueris de um universo lúdico, com aroma de tutti-frutti, de um

colorido intenso, o cantar de passarinhos, e uma explosão de alegria, diante de

você, meu neto querido e tão amado.

AMIGOS

Dizem que quem tem amigos não morre pagão, algo assim. E eu só tenho a

confirmar porque a lista não é pequena, graças a Deus!

Começo agradecendo ao Pedro Felice Perduca, alguém que sempre

admirei e amei como a pessoa que ele sempre foi, um “carcamano” convicto, um

mooquense daqueles que ou você ama, ou odeia. Sem meio termo. Ele me fez

amar mais ainda a Mooca, bairro que escolhi para viver e conviver, nascida que

sou no Brás, outro bairro querido.

Aí vêm os amigos de Mestrado, dos quais não vou lembrar todos os

nomes, mas tem a Elisângela, tão doce comigo, tão querida, sempre ali, disposta

a me levantar e me manter de pé. Ao Jacques, ao Adilson, o André, a Carol, meu

carinho por terem trilhado juntos uma parte dessa estrada chamada Mestrado. À

Fátima da Iniciação Científica, por ter me dado tanta força, ótimas dicas, gestos

mais que sinceros e amigos, só posso derramar uma chuva de carinho sem fim. À

profa. Paula, coordenadora do Mestrado, que com sua precisão soube me colocar

no eixo e dar o impulso que eu precisava para não sair do trilho. Quero registrar

aqui, os meus agradecimentos à Simone e ao Ibraim da Coordenadoria da Pós,

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por me ajudarem em vários momentos, à Giovana Ganéo, minha amiga querida,

que um dia bem lá atrás, fez de tudo para que eu pudesse continuar meus

estudos e que sempre me ajudou quando eu mais precisei. Ao Tatá do Distrito

Mooca, meu novo impulso para continuar a querer lutar pelo patrimônio

inestimável do bairro da Mooca. Ao Pedro Dias, que me enche de orgulho, pois

um dia foi meu estagiário e hoje é um parceiro, que muito me ajudou na

formatação desse trabalho. Uma força que eu precisava nessa altura de tudo. À

professora Danielle Guglielmi que, com sua gentileza e nobreza de caráter,

enriqueceu a banca do meu Mestrado.

E por fim, mas não menos importante, quero agradecer à Andréa que,

antes de se tornar minha orientadora nessa árdua tarefa de realizar o Mestrado,

tornou-se minha amiga, bem lá atrás, quando a conheci e a ela recorri diversas

vezes para impedir que a história da Mooca acabasse de maneira tão triste.

Obrigada, querida Andréa, por tudo e mais um pouco! Desculpa, também, por ter

te dado tanto trabalho! Nem eu podia imaginar como seria todo esse processo,

mas a gente percebe que “tudo vale a pena quando a alma não é pequena”.

Sábias palavras do poeta e escritor que aproveito aqui para me inspirar a te dizer

que sua ajuda foi mais do que indispensável, com suas dicas sopradas ao pé do

ouvido, descortinando um novo mundo que hoje, enfim, se abre diante de mim.

OBRIGADA!

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RESUMO

Este trabalho tem por objetivo a análise do conceito de “espírito do lugar” (Declaração de Québec, 2008) e a busca de instrumentos para a sua identificação na escala do bairro, a partir do estudo de caso da Mooca, na cidade de São Paulo, indagando-se sobre a pertinência de se utilizar tal conceito como instrumento de reconhecimento, adequado à política pública de memória. A presente pesquisa justifica-se pela falta de instrumentos apropriados de preservação para se trabalhar com o bairro e com as formas mais subjetivas de entender o patrimônio de um lugar. A pesquisa tem como premissa a relação entre memória, identidade e sentido de pertencimento que se manifesta como “espírito do lugar”, e busca apoio também em outro conceito, o de patrimônio ambiental urbano, em especial as representações sociais, como forma de revelar e desvendar o lugar e a identificação de um patrimônio nem sempre visível aos olhos, mas que instiga outros sentidos.

Palavras-Chave:

Patrimônio Cultural, Memória, Patrimônio Urbano, Mooca.

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ABSTRACT

This work aims to analyze the concept of "spirit of the place" (Declaration of Quebec, 2008) and the search for instruments for its identification in the neighborhood scale, based on the case study of Mooca, in the city of São Paulo, investigating the pertinence of using such a concept as an instrument of recognition, appropriate to the public policy of memory. The present research is justified by the lack of appropriate instruments of preservation to work with the neighborhood and the more subjective ways of understanding the heritage of a place. The research has as a premise the relation between memory, identity and sense of belonging that manifests as "spirit of the place", and seeks support also in another concept, that of urban environmental patrimony, especially the social representations, as a way of revealing and to discover the place and the identification of a patrimony not always visible to the eyes, but that instigates other senses.

Keywords:

Cultural Heritage, Memory, Urban Patrimony, Mooca.

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Lista de Figuras Figura 1. Demolição das Fábricas........................................................................55 Figura 2. Matarazzo por Dentro............................................................................56 Figura 3. Patrimônio na Borges de Figueiredo.....................................................56 Figura 4. A orla ferroviária além Tamanduateí......................................................57 Figura 5. A orla ferroviária além Tamanduateí (2)...............................................57 Figura 6. A orla ferroviária além Tamanduateí (3)...............................................57 Figura 7. Moinho Santo Antonio/Minetti-Gamba...................................................58 Figura 8. Mapa - Tombamento de galpões B. Figueiredo....................................62 Figura 9. Mapa Áreas da Operação Urbana Consorciada do Tamanduateí.........67 Figura 10. O Patrimônio ao longo do Rio Tamanduateí........................................68 Figura 11. Espaços produtivos ao longo do Rio Tamanduateí.............................69 Figura 12. Mapa dos setores e subsetores da OUCBT.......................................69 Figura 13. Mapa de bens culturais na OUCBT.....................................................72 Figura 14. Fábrica de Tecidos Labor em dois momentos.....................................74 Figura 15. Fábrica de Tecidos Labor – portão e casa admin................................75 Figura 16. Enquanto isso na Mooca.....................................................................77 Figura 17. Tombamento do sotaque da Mooca....................................................79 Figura 18. Pesquisa Datafolha Revela................................................................80 Figura 19. Por que eu amo a Mooca...................................................................81 Figura 20. “Fachada” do Luzes da Mooca............................................................83 Figura 21. Luzes da Mooca vista de trás..............................................................83 Figura 22. Visão da rua pelo condomínio Luzes da Mooca..................................84 Figura 23. Visão da rua pelo condomínio Luzes da Mooca (2)............................84 Figura 24. Hipódromo da Mooca..........................................................................87 Figura 25. Momentos do Colégio Brasilux............................................................88 Figura 26. Momentos do Colégio Brasilux (2)......................................................88 Figura 27. Momentos do Colégio Brasilux (3)......................................................89 Figura 28. Momentos do Colégio Brasilux (4)......................................................89 Figura 29. Armarinhos Fernando.........................................................................90 Figura 30. Armarinhos Fernando em chamas......................................................90 Figura 31. Fábricas da Mooca – Antarctica..........................................................92 Figura 32. Fábricas da Mooca – Cotonifício Crespi.............................................92 Figura 33. Fábricas da Mooca – Crespi Renovado..............................................93 Figura 34. Vilas, herança operária que ainda permanece....................................94 Figura 35. Vilas, herança operária que ainda permanece....................................94 Figura 36. Vila na Catarina Braida........................................................................95 Figura 37. Vila na Catarina Braida (2)..................................................................95 Figura 38. Conjunto Habitacional do IAPI.............................................................96 Figura 39. Antigo e novo na Rua da Mooca.........................................................96 Figura 40. Capa do livro Histórias da Mooca......................................................102 Figura 41. Histórias da Mooca e seus personagens...........................................102 Figura 42. Imagens do Histórias da Mooca.........................................................103 Figura 43. Imagens do Histórias da Mooca (2)...................................................104 Figura 44. Av. Paes de Barros em formação, s/d...............................................106 Figura 45. Av. Paes de Barros, 2017..................................................................106 Figura 46. Tradição gastronômica.......................................................................107 Figura 47. Tradição gastronômica (2).................................................................107 Figura 48. Tradição gastronômica.......................................................................108

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Figura 49. O cenário do Histórias da Mooca.......................................................108 Figura 50. O cenário do Histórias da Mooca (2).................................................108 Figura 51. O cenário do Histórias da Mooca (3).................................................109 Figura 52. O cenário do Histórias da Mooca (4).................................................109 Figura 53. O cenário do Histórias da Mooca (5).................................................109 Figura 54. O cenário do Histórias da Mooca (6).................................................109 Figura 55. Vestígios na fachada..........................................................................110 Figura 56. Casas da Mooca, detalhe..................................................................110 Figura 57. Casas da Mooca, janela.....................................................................111 Figura 58. Casas da Mooca, entrada..................................................................112 Figura 59. Fachadas da Mooca, galpões de fábrica...........................................112 Figura 60. Fachadas da Mooca, Estação Mooca / Gráfica Vanorden.................113 Figura 61. Passarela da Visconde de Parnaíba..................................................113 Figura 62. Paixão, memória viva.........................................................................117 Figura 63. Logomarca do Distrito Mooca............................................................132 Figura 64. Wynwood Walls.................................................................................133 Figura 65. Wynwood brasileira…………………………………..………………..…133 Figura 66. Wynwood brasileira...........................................................................134 Figura 67. José Américo Crippa Filho (Tatá)......................................................135 Figura 68. Mooca funcional................................................................................136 Figura 69. Mural de boas vindas........................................................................137 Figura 70. Mural de boas vindas (2)..................................................................137 Figura 71. Pesquisa “Facebook Mooca”............................................................139 Figura 72. Pesquisa “Facebook Juventus Mooca”.............................................140 Figura 73. Pesquisa “Juventus”.........................................................................141 Figura 74. Pesquisa “Mooca”.............................................................................141 Figura 75. Portal da Mooca................................................................................143 Figura 76. Portal da Mooca................................................................................144 Figura 77. Portal da Mooca nas redes sociais...................................................144 Figura 78. Facebook, conteúdo da página.........................................................145 Figura 79. Estação da Mooca de trem...............................................................148 Figura 80. Reportagem “A Hora da Mooca”.......................................................149 Figura 81. Página Juventino Mooca no Facebook.............................................152 Figura 82. Juventino Mooca no Facebook (post Antarctica)..............................154 Figura 83. “É a nova Mooca, meu!”....................................................................156 Figura 84. “É a nova Mooca, meu!” (Continuação).............................................157 Figura 85. “Juventus Origine Operare”...............................................................158 Figura 86. Onda retrô.........................................................................................159

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SUMÁRIO DO TRABALHO

INTRODUÇÃO...................................................................................................... 14

CAPÍTULO 1......................................................................................................... 23

A dimensão urbana na preservação do patrimônio

1.1 Da consideração dos velhos centros à proteção de conjuntos urbanos

(1913 a 1975)..................................................................................................24

1.2 Da dimensão material do patrimônio ao espírito do lugar (anos 2000)...........35

1.3 Do patrimônio ambiental urbano às referências culturais no Brasil.................44

CAPÍTULO 2..........................................................................................................52

A Mooca nas políticas públicas recentes de preservação e planejamento

2.1 Política pública de preservação: a identificação do patrimônio da Mooca.......55

2.2 Política pública de planejamento: a Operação Urbana Consorciada Bairros

Tamanduateí...................................................................................................63

CAPÍTULO 3..........................................................................................................77

A Mooca e o espírito do lugar: memória, identidade e pertencimento

3.1 Patrimônio ambiental urbano e o espírito do lugar..........................................77

3.2 Representações sociais: a Mooca no imaginário coletivo.............................100

3.2.1 As histórias da Mooca.................................................................................100

3.2.2 Olhares sobre a Mooca...............................................................................115

3.2.3 A Mooca nas redes sociais.........................................................................138

CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................163

ANEXO I – DECLARAÇÃO DE QUEBÉC..........................................................166

ANEXO II – PROJETO DE LEI 878/2016...........................................................170

ANEXO III – PRINTS DE REDES SOCIAIS........................................................172

REFERÊNCIAS...................................................................................................180

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INTRODUÇÃO

A cidade, enquanto lugar de manifestações tangíveis e intangíveis, de

acordo com o arqueólogo e historiador Ulpiano Bezerra de Meneses (2006, p. 36),

“apesar de tudo, pode ser vivida como um bem cultural”, considerando que ‘bem’,

na acepção simples da palavra, guarda relação com “coisa boa, aprazível,

benéfica, gratificante, confiável”, o que, contudo, é difícil de vislumbrar, de fato, na

cidade real. Ideia paradoxal, quando se pensa a cidade mais como “problema

urbano”, a partir da sociedade industrial do século XIX, do que nos seus valores

positivos.

Esta ideia de bem cultural, continua Meneses (2006, p. 36), só pode ser

compreendida quando se percebe a cidade nas três dimensões - “imbricadas e

que agem solidariamente” - em que se realiza: “a dimensão do artefato, a do

campo de forças e a das significações”. Ou seja, a cidade deve ser entendida

enquanto coisa fabricada, socialmente produzida e apropriada, em um campo de

interesses, tensões e conflitos sociais constantes. E são as práticas sociais que,

por um lado, dão forma e função ao espaço, e, por outro, também dão sentido e

inteligibilidade ao artefato, alimentando-se, elas próprias, de sentido:

O bem cultural tem matrizes no universo dos sentidos, da percepção e da cognição, dos valores, da memória e das identidades, das ideologias, expectativas, mentalidades, etc. (MENESES, 2006, p. 36)

O autor enfatiza, nesta direção, que “sem as práticas sociais, não há

significados sociais. Mas também não há significados sociais sem vetores

materiais” (MENESES, 2006, p. 37).

Em consonância com essa visão, mesmo em sua defesa da cidade como

obra de arte, Argan1 (2005) entende que são as pessoas que nela habitam as que

de fato constroem e rearranjam a cidade e seus sentidos, dentro das condições

sociais de seu momento. Para o historiador da arte italiano, o urbanismo é a

“ciência da administração dos valores urbanos, entre os quais os estéticos”

1 O original desta obra de Argan, História da Arte como história da cidade, data de 1984 e ainda é

evidente a atualidade do texto.

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(Argan, 2005, p. 227), expressando a sua concepção de que a forma urbana é

insuficiente para a percepção da cidade - esta que “é feita de homens e não

pedras” -, e que, portanto, a estética urbana não deve ser considerada sem as

práticas sociais. (Argan, 2005, p. 227)

Diante do exposto acima, fica evidente que a ideia de cidade como um bem

cultural a ser vivido - e não apenas como contêiner de bens culturais - abre uma

nova perspectiva de entendimento acerca dos valores que as práticas e as

relações sociais imprimem ao tecido urbano.

É exatamente nesta perspectiva que se insere o presente trabalho, que

entende o patrimônio cultural como valor positivo da cidade compreendida como

bem cultural.

O interesse crescente da sociedade, nas últimas décadas, por assuntos

relacionados ao patrimônio cultural ampliou o debate sobre o tema, incorporando

distintos enfoques, problemáticas e horizontes tanto acerca de aspectos

conceituais quanto os relativos à tutela de bens culturais. A preservação do

patrimônio tem sido tema constante de preocupação, pois a cidade enquanto

artefato socialmente produzido, e apropriado, em campo de forças sociais tão

variadas é lugar de energia constante, imanente e pulsante, em mutação

permanente, muitas vezes em processo antropofágico, em que “novos tecidos são

recriados para atender a outras demandas sucessivas de programas em

permanente renovação” (LEMOS, 1987, p. 47).

Assim como a cidade, o patrimônio cultural é aqui entendido também como

uma construção, um fato social (MENESES, 2006, ARANTES, 2006). Sendo

assim, defendemos que a temática da preservação do patrimônio cultural deve

ser estudada por meio das práticas sociais, uma vez que são as relações entre as

pessoas na sociedade que a institui e organiza (MENESES, 2006).

A proteção de bens culturais parece convergir para a ideia de um “diálogo”

necessário no espaço urbano, enquanto território habitado, no sentido de se

investigar o sentido do patrimônio cultural na vida das pessoas, e sua relevância,

tanto histórica quanto afetiva, para quem ali vive e os qualifica, cotidianamente,

como forma de devolver-lhes o sentido de viver, para resgatar a poética - muitas

vezes perdida -, de lugares destituídos, eles próprios, de sentidos de vida e de

uma correlação com o indivíduo e a coletividade.

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A questão da identidade e do sentido de pertencimento emerge, então,

como fundamental: como fortalecer os vínculos entre as pessoas e os lugares?

Como diz Lemos (2004), o “artefato cidade também se renova sobre si mesmo”, e

fica a dúvida se fragmentos de usos, saberes e de costumes, além de pedaços

que restaram de um conjunto significativo de determinado período e época,

poderiam se tornar depositários de nossa existência. O exemplo da “grande

residência burguesa” do início do século XX, transformada em “habitáculos

multifacetados”, para depois ser demolida e atender às novas regras de “conforto

ambiental”, dando lugar ao edifício de moradias, é espelho vivo das dinâmicas

transformadoras da cidade e de um certo processo de aculturação, na visão do

arquiteto Carlos Lemos (2004, p. 15)2.

A identidade está estreitamente relacionada à memória3, como bem afirma

(MENESES, 1992, p. 22):

A memória, como construção social, é formação de imagem necessária para os processos de constituição e reforço da identidade individual, coletiva e nacional. Não se confunde com a História, que é forma intelectual de conhecimento, operação cognitiva. A memória, ao invés, é operação ideológica, processo psico-social (sic) de representação de si próprio, que reorganiza simbolicamente o universo das pessoas, das coisas, imagens e relações, pelas legitimações que produz. A memória fornece quadros de orientação, de assimilação do novo, códigos para classificação e para o intercâmbio social. Nessa perspectiva, o estudo da memória ganharia muito se fosse conduzido no domínio das representações sociais, problemática na qual a Psicologia Social tem investido consideravelmente, nos últimos anos, procurando parâmetros e instrumentos metodológicos para análises de gênese, operações, produtos e funções. (MENESES, 1992, p. 22)

2 De acordo com o filósofo francês Gaston Bachelard (1984, p. 199-200), até “a mais modesta

habitação, vista intimamente, é bela”, carregando, assim, uma poética. Como perceber ou fortalecer a poética dos espaços? A começar pelo casa, “nosso canto do mundo”, “nosso primeiro universo” (BACHELARD, 1984, p. 199), palco de experiências múltiplas e sensoriais, um cosmos em toda a acepção do termo. E a cidade e seus monumentos, como flagrantes da morada do homem, macrocosmo e microcosmo interligados, deveriam, também, inspirar essa poética. A cidade entendida como lugar aonde - parafraseando o poeta português Antero de Quental - “habitam os desejos, os sonhos de luta ou o convite à acomodação, entre apelos de vida e apelos de morte”, que transcendem o limite do espaço habitado, e aonde a “marca inesperada da presença humana” (LEMOS, 2004, p. 17-18) irá imprimir sua personalidade. 3 Para a diferenciação entre os conceitos de memória individual, coletiva e nacional, ver

MENESES, 1992.

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Para este autor, o conceito de representações sociais, do campo da

Psicologia Social, pode contribuir para o estudo da memória, enquanto processo

de representação que confere identidade.

Alexandre (2004, p. 131), em seu trabalho Representação Social: uma

genealogia do conceito, define esse, a partir de Serge Moscovici, psicólogo social

quem primeiro começou a trabalhar com esse tema na década de 1960, como

sendo “um conjunto de conceitos, frases e explicações originadas na vida diária

durante o curso das comunicações interpessoais”.

Para Meneses (2006, p. 36), “[...] a cidade é também representação,

imagem. A imagem que os habitantes se fazem da cidade ou de fragmentos seus

é fundamental para a prática da cidade”. Esta noção é a base do presente

trabalho, que se trata de pesquisa no campo da preservação do patrimônio, com

fundamento na ideia da memória como construção da identidade cultural. Para

compreender esta noção é necessário trabalhar com duas dimensões distintas

que se complementam: o espaço e o tempo, na medida em que a memória nos

situa no tempo e a identidade nos situa no espaço (MENESES, 2009).

Relacionado a este último processo, está o sentimento e/ou relação de

pertencimento, pelo qual uma pessoa se apropria ou mantém relação direta,

permanente, com um lugar.

E a unidade territorial urbana mais próxima da vida individual e coletiva, ou

seja, onde o homem as exerce em sua cotidianidade, é o bairro. A relação direta,

permanente, requer o hábito (ligado ao habitante). O bairro pode, então, ser

considerado como o lugar onde se manifestam com maior força as relações de

pertencimento a partir do convívio e das relações de sociabilidade, que só

ocorrem, pois há constância. E é exatamente a relação de pertencimento entre

uma pessoa e um lugar que revela a identidade cultural do território em que se

insere. Esta relação de pertencimento ocorre por meio de “vinculações subjetivas

que se estabelecem com determinados bens”, como afirma Meneses (2010, p.

36), o que envolve valores afetivos relacionados à memória: “se se tratar de carga

simbólica e de vínculos subjetivos, como o sentimento de pertença ou de

identidade, o domínio é dos valores afetivos”.

A memória exerce, assim, um papel importante como fonte de ligação

social na construção da identidade cultural (TORINO, 2013).

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Com base nesta premissa, a maior dificuldade refere-se à questão de como

definir a identidade cultural de um determinado território. Ou seja, como identificar

as “vinculações subjetivas” ou os valores afetivos que conformam uma

determinada identidade cultural?

Este é um dos questionamentos essenciais que guiam esta pesquisa sobre

o bairro da Mooca na cidade de São Paulo, em que se pretende identificar e

analisar vários olhares sobre este território, buscando-se compreender a relação

entre memória, identidade e pertencimento. Busca, esta, que tem como

fundamento o conceito de “espírito do lugar” definido em carta patrimonial

recente4, a Declaração de Québec (2008):

O espírito do lugar é definido como os elementos tangíveis (edifícios, sítios, paisagens, rotas, objetos) e intangíveis (memórias, narrativas, documentos escritos, rituais, festivais, conhecimento tradicional, valores, texturas, cores, odores, etc.) isto é, os elementos físicos e espirituais que dão sentido, emoção e mistério ao lugar.

O espírito do lugar é definido como os elementos tangíveis (edifícios, sítios,

paisagens, rotas, objetos) e intangíveis (memórias, narrativas, documentos

escritos, rituais, festivais, conhecimento tradicional, valores, texturas, cores,

odores, etc.) isto é, os elementos físicos e espirituais que dão sentido, emoção e

mistério ao lugar.

Nesta pesquisa, a compreensão dos elementos intangíveis está

relacionada à busca pela identificação das representações sociais sobre o lugar,

com base nos conceitos de espírito do lugar e de patrimônio ambiental urbano

(Meneses, 1978), como veremos mais adiante. Estas representações cobram

importância pelo fato de o habitante do lugar transformar a natureza a sua volta e

atribuir-lhe sentido e valores próprios. Os autores estudados neste trabalho

mostram que é por meio dos valores atribuídos ao lugar, pelas práticas sociais

que se expressam no tecido urbano, que a cidade manifesta de fato o seu

significado.

Foi escolhido como estudo de caso o bairro da Mooca, por suas

características de bairro histórico, de consolidação antiga, que, mesmo com as

mudanças, nas últimas décadas, do seu perfil social - especialmente de um bairro

4 As cartas patrimoniais são documentos importantes que orientam a proteção do patrimônio

cultural, e são resultado, em geral, de reuniões internacionais, regionais ou locais.

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de origem operária para um bairro misto com moradias verticalizadas e oferta de

comércio e serviços - sustenta ainda uma memória social relacionada ao seu

passado industrial, desde a primeira fase do advento da industrialização em São

Paulo, entre o final do século XIX e a metade do XX.

O bairro mantém, até hoje, forte identidade com sua origem imigrante,

notadamente de italianos, e com isso uma imagem de bairro tradicional, ligado à

família, a um jeito próprio de seus moradores se expressarem com as mãos e

uma musicalidade na fala, que virou, inclusive, objeto de estudo de registro de

patrimônio imaterial do sotaque pelo órgão municipal de preservação da cidade

de São Paulo. A forte sensação de pertencimento que o mooquense mais antigo

tem com o bairro e que transmite, de algum modo, aos mais novos, fez com que

percebêssemos a pertinência do estudo do Spiritu loci ou espírito do lugar da

Mooca, termo que aparece revisitado na Declaração de Quebec de 2008. Para a

compreensão destas questões, é fundamental a pergunta pela possibilidade ou

não de se identificar o espírito do lugar de um bairro como a Mooca. Ou seja, é

pertinente considerar este conceito quando se trata da preservação do patrimônio

cultural numa cidade como São Paulo?

Para muitos segmentos, como o imobiliário, a Mooca é hoje reconhecida

por características, vinculadas, por exemplo, a questões mais funcionais - como

boa infraestrutura, facilidade de deslocamento para outros locais, proximidade

com o Centro -, do que pelo seu caráter histórico. Ainda assim, percebe-se a força

que esse lado histórico ainda exerce sobre as pessoas, dos mais velhos que

buscam em suas memórias e nas de familiares ou amigos registros de suas

histórias, que se mesclam com as do próprio bairro, aos mais novos que chegam

e se encantam com essas histórias, como veremos mais adiante neste trabalho.

Registros, histórias, memórias que são transmitidos oralmente e por escrito e que

vão constituindo as narrativas sobre o bairro. Representações sociais que esta

pesquisa pretende desvendar. O presente trabalho não tem como objetivo definir -

se é que isto é possível - o espírito do lugar da Mooca, mas, sim, desvendar os

distintos olhares sobre o bairro, buscando compreender a pertinência desse

conceito para a temática do patrimônio cultural.

Desta forma, o objetivo principal do trabalho é a análise do conceito de

espírito do lugar e a busca de instrumentos para a sua identificação na escala do

bairro, a partir do estudo de caso da Mooca.

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A presente pesquisa justifica-se pela falta de instrumentos pertinentes de

preservação para se trabalhar com o bairro e com as formas mais subjetivas de

entender o patrimônio de um lugar. Patrimônio que compreende tanto o material,

constituído por imóveis construídos ao longo do tempo e que remetem à

identidade do lugar, como é o caso do acervo industrial ferroviário do bairro da

Mooca, bem como pelos sentidos, afetos e valores que ligam as pessoas ao

lugar, o sentir o lugar, algo que as pessoas atribuem a um certo encanto que o

lugar emana e transmite. Esse conjunto é o que relaciona a memória, identidade e

o sentido de pertencimento. Por isso, é importante a busca de instrumentos que

melhor consigam identificar os valores subjetivos, percepções difíceis de

inventariar - quando se trata do tradicional inventário vinculado ao patrimônio

material -, mas identificáveis quando se conversa com as pessoas que vivem no

bairro ou quando se desvendam suas narrativas. Olhares sobre a Mooca.

Este trabalho está organizado em três capítulos, além desta Introdução e

das Considerações Finais.

O Capítulo 1, A dimensão urbana na preservação do patrimônio, aborda

conceitualmente o tratamento desta dimensão na temática da preservação do

patrimônio cultural. Ou seja, pretende entender como o urbano tem sido tratado

na referida temática, considerando que a cidade, enquanto artefato socialmente

produzido, apresenta aspectos muito particulares, com certeza muito diferentes

da abordagem do patrimônio como monumento, que vigorou entre o século XVIII

e a segunda metade do XX.

São três os itens que compõem este Capítulo 1. Os dois primeiros, “Da

consideração dos velhos centros à proteção de conjuntos urbanos (1913 a 1975)”

e “Da dimensão material do patrimônio ao espírito do lugar (anos 2000)” busca

contemplar a trajetória do tratamento da dimensão urbana no âmbito da

preservação. Já é bem conhecida a ampliação do conceito de patrimônio histórico

ao cultural, que abarca a ideia de patrimônio como monumento até a concepção

de proteção de amplos conjuntos urbanos. Contudo, têm sido menos abordados,

de forma específica, os distintos enfoques sobre a cidade em relação à proteção

do patrimônio. Desta forma, o capítulo inicia tratando dos trabalhos de Gustavo

Giovannoni, que, já na primeira década do século XX, foi o primeiro a trazer à

tona a dimensão urbana para a problemática do patrimônio, e percorre, em

seguida, o caminho das cartas patrimoniais que, a partir da década de 1960,

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passam a transmitir a importância da preservação de conjuntos urbanos. A

continuação, o item 2, aborda as questões que permearam a discussão entre o

protagonismo do patrimônio material até a releitura do Spiritu loci no campo da

preservação, passando pela defesa do patrimônio imaterial.

O terceiro item desse Capítulo 1, “Do patrimônio ambiental urbano às

referências culturais no Brasil”, trata do panorama brasileiro, com foco

principalmente em São Paulo, mostrando como a dimensão urbana tem sido

tratada do ponto de vista conceitual, bem como nas políticas públicas de

preservação, com base em dois conceitos importantes para a nossa temática, que

são os de “patrimônio ambiental urbano” e “referências culturais”.

Já o enfoque do Capítulo 2, A Mooca nas políticas públicas recentes de

preservação e planejamento, é o de mostrar como uma parte da cidade, a Mooca,

em sua dimensão urbana, tem sido tratada nas políticas públicas de memória e de

desenvolvimento urbano. No seu primeiro item, “Política pública de preservação: a

identificação do patrimônio da Mooca”, aborda-se como o órgão de preservação

do patrimônio da cidade de São Paulo tem identificado o patrimônio cultural na

Mooca, cujo destaque tem sido o enfoque material. Por outro lado, analisa-se, no

item seguinte, “Política pública de planejamento: a Operação Urbana Consorciada

Bairros Tamanduateí”, o tratamento da questão do patrimônio na Mooca no caso

concreto de uma política urbana voltada para os bairros que se desenvolveram ao

longo do Rio Tamanduateí.

O Capítulo 3, A Mooca e o espírito do lugar: memória, identidade e

pertencimento, busca uma abordagem própria para verificar a pertinência de se

utilizar o conceito de espírito do lugar em um bairro como a Mooca, por meio de

procedimentos metodológicos como a realização de entrevistas com pessoas e

entidades relacionadas a Mooca, bem como pesquisa e análise de redes sociais e

websites. O primeiro item desse Capítulo, “Patrimônio ambiental urbano e o

espírito do lugar” relaciona esses dois conceitos no que eles guardam de comum,

ou seja, a importância da percepção, do olhar, das imagens que as pessoas têm

em relação ao lugar onde vivem ou frequentam. No segundo item do Capítulo,

“Representações sociais: a Mooca no imaginário coletivo”, busca-se identificar, a

partir de histórias, de distintos olhares - por meio de entrevistas - e das redes

sociais e websites, as representações, imagens, que contribuem na conformação

de uma identidade ligada ao bairro. Pretende-se, com isto, entender e analisar as

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ideias, opiniões, de seus moradores e/ou frequentadores com relação ao bairro e

seu morador. Manifestações em sua maioria de ordem subjetiva, que, em várias

situações, ultrapassa a percepção individual e conforma um sentimento coletivo.

Busca-se, finalmente, verificar se as representações, imagens, que se formam

são constituidoras de um espírito do lugar. Um sentido estreitamente ligado à

memória, identidade e pertencimento.

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CAPÍTULO 1

A dimensão urbana na preservação do patrimônio

O enfoque de nossa pesquisa, relativo ao espírito do lugar, envolve

necessariamente a dimensão urbana do patrimônio, temática que tem sido objeto

crescente de interesse de trabalhos acadêmicos e por parte dos órgãos de

preservação, mas que ainda requer estudos mais aprofundados.

Se hoje parece óbvio se falar sobre a dimensão urbana do patrimônio, nem

sempre foi assim. É importante lembrar que prevaleceu durante muito tempo - até

pelo menos a segunda metade do século XX - a noção de patrimônio como

monumento.

Este capítulo recupera a trajetória do tratamento da cidade na preservação

do patrimônio, desde os trabalhos de Gustavo Giovannoni que, já na primeira

década do século XX, foi o primeiro a considerar a dimensão urbana do

patrimônio, até o conceito de “espírito do lugar” retomado no campo da

preservação. Esta trajetória é importante para entender os termos da

problemática enfrentada neste trabalho.

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1.1 Da consideração dos velhos centros à proteção de conjuntos urbanos

Relegado, durante muito tempo a um certo esquecimento, devido ao fato

de que boa parte de sua produção ocorreu na época do regime fascista italiano, o

engenheiro civil, com importante atuação na área da arquitetura e do restauro,

Gustavo Giovannoni (1873-1947)5 foi resgatado por alguns estudiosos como a

francesa Françoise Choay (2001), e, no Brasil, por Beatriz Kühl (2013). Além de

sua grande relevância no campo do restauro urbano, são importantes seus

estudos sobre a cidade, esta entendida como um organismo vivo e dinâmico,

passível, portanto, de mudanças e novos sentidos, porém, com respeito em

relação às pré-existências e ao tecido antigo. Sua contribuição para o urbanismo

é inegável, e se faz presente em inúmeros artigos e estudos que publicou, o que o

tornou referência também nessa área. Um dos principais responsáveis pela

redação da Carta de Atenas de 1931 - importante documento em defesa da

proteção e conservação do patrimônio histórico e artístico de distintas nações6 -,

Giovannoni também contribuiu para o reconhecimento do valor da chamada

“arquitetura menor” (que não é feita pelos profissionais da construção), entendida

como representativa dos atores sociais que vivem nas cidades e nelas imprimem

os seus valores e significados.

Em seu artigo “Vecchie Città ed Edilizia Nuova”, de 19137, encontram-se

importantes considerações sobre intervenções em áreas consolidadas e

proposições sobre como tratar o velho núcleo urbano da cidade. Sua visão ia

além de Roma, na Itália, foco maior de seus estudos e intervenções, pois, ao citar

importantes cidades europeias, a exemplo de Berlim, e mesmo norte-americanas,

permitia que suas contribuições teóricas tivessem um longo alcance. Giovannoni

5 Giovannoni formou-se em engenharia civil em 1895, tendo se especializado em história da arte.

Em 1899 começou a sua trajetória no ensino de arquitetura técnica na atual Faculdade de Engenharia da Universidade de Roma, além de ter atuado na produção de edifícios novos, bem como na restauração de existentes. 6 Este documento foi resultado de reunião científica organizada pelo Escritório Internacional de

Museus da Sociedade das Nações, ligado ao Comitê Internacional de Cooperação Intelectual, e aprovada pela Assembleia da Sociedade das Nações, e consiste em ponto de partida para a cooperação internacional no campo da preservação do patrimônio. 7 A análise do referido artigo tem como a base a sua versão traduzida para o português no livro

“Gustavo Giovannoni. Textos escolhidos”, organizado por Beatriz Kühl e publicado em 2013, que é uma compilação comentada de textos do estudioso italiano.

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combate o que chama de ausência de uma visão orgânica da cidade que traz

como resultado a criação de novos bairros no tecido urbano existente, sem

nenhuma preocupação com o que chama de aspecto da arte daquele lugar. É

uma perspectiva que amplia o olhar sobre a cidade, sendo pertinente para se

discutir a atualidade de nossas cidades, exauridas em sua morfologia urbana com

reflexo direto na qualidade de vida de seus habitantes.

Giovannoni reflete sobre a ampliação desmedida da cidade antiga, com a

chegada de novos bairros e suas próprias exigências, que provoca o

adensamento das áreas centrais, e a má gestão dos seus “negócios”, lojas,

habitações diferentes dos usos passados:

Esse desenvolvimento centrípeto fez aumentar enormemente o valor das áreas e das construções e, portanto, produziu acréscimos e elevações de velhos edifícios, um adensamento sempre maior, que tornou ainda piores as condições. Naquele momento, não se viu outro remédio além das operações cirúrgicas, e a picareta atuou, quase sempre de forma ineficaz, frequentemente sacrificando obras de arte e perturbando a harmonia e o caráter, mas sem chegar a resultados correspondentes ao objetivo. (GIOVANNONI, 1913/2013, p. 113)

Se levarmos em conta que Giovannoni escreveu sobre esses temas no

início do século passado, surpreende a atualidade de suas discussões acerca de

como conjugar passado e presente no desenvolvimento da cidade. Neste debate,

tomou por base a multidisciplinaridade entre diferentes campos, o que permitiu

aproximar, em suas discussões, o campo do planejamento urbano, área que

conhecia bem e para a qual contribuiu com sua participação na elaboração de

planos diretores de novos bairros em cidades italianas e de outras partes da

Europa, aos detalhes minuciosos da disciplina de restauro, como forma de

entender e encontrar a melhor maneira de lidar com “ambientes urbanos

seculares e continuamente construídos” (RUFINONI, 2013, p. 63). Seguidor dos

preceitos defendidos por Camillo Boito (1835-1914) quanto ao rigor científico com

que as intervenções deveriam ser feitas tendo por base o tratamento das

especificidades do ambiente urbano antigo, Giovannoni considerava que era

necessário pensar na composição urbana que inclui edificações significativas.

Essa discussão acerca de áreas que não se limitam ao entorno de um

monumento, por exemplo, já se faz presente nos escritos de especialistas e

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teóricos desde os meados do século XIX, como do próprio Camillo Boito e de

Alois Riegl (1858-1905), cuja contribuição sobre o reconhecimento do aspecto

cultural aos artefatos, somado à valoração socialmente atribuída a eles em

determinado tempo e espaço, tem sido reconhecida até hoje.

É certo que vários teóricos de renome, cada um no seu tempo, deram sua

contribuição em diversos estudos que permitiram uma ressignificação da noção

de patrimônio, como o já citado Riegl e Charles Buls (1837-1914), a quem

Giovannoni cita em seu texto de 1913. Dele, empresta o termo “organismo vivo”

para conceituar o patrimônio urbano: “a cidade, o povoado, o bairro, a praça, o

jardim, a via, são portanto considerados como obras de arte” (RUFINONI, 2013, p.

71-72).

Se esses e outros teóricos, a quem se juntam John Ruskin (1819-1900),

William Morris (1834-1896) e Camillo Sitte (1843-1903), em algum momento

repensam o conjunto urbano, é Giovannoni quem irá se debruçar sobre a

chamada ‘arquitetura menor’ e avançar nas discussões e no entendimento sobre

essa produção arquitetônica mais modesta. Passíveis de conservação e

salvaguarda, em muitos casos, como importantes elementos constitutivos do

patrimônio urbano, esses conjuntos passam a ser percebidos como componentes

daquele ‘pedaço’ de lugar. Mesmo face às transformações e mudanças de

configurações pelas quais a cidade passa de tempos em tempos, é o todo e a

ideia de conjunto que passa a ser pensado, e não apenas fragmentos isolados

que comprometem a historicidade local e o sentido a ele atribuído. Ao contrário, a

tendência dos projetos urbanísticos em voga até os dias de hoje dificulta a

permanência das pré-existências nos processos de intervenção que visam

"modernizar" - no sentido da introdução do novo - a cidade sem critérios que

avaliem as especificidades e características próprias do tecido urbano

remanescente de outros períodos.

O termo denominado por Giovannoni como patrimônio urbano, o primeiro a

dele fazer uso, segundo Choay (2001), remete ao tecido urbano antigo da cidade,

sua formação e a conjugação com o novo, e que leva à necessidade de

organização do território.

Esse ponto nevrálgico que o autor aborda em seus escritos revela uma

preocupação determinante que deveria nortear, em sua opinião, “a delimitação de

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critérios de intervenção na cidade histórica com vistas à preservação de suas

especificidades” (RUFINONI, 2013, p. 67). A relação entre passado e presente8,

ao invés de tratá-los como polos opostos, sem a necessária conexão entre um e

outro, deveria permitir o estabelecimento de uma espécie de diálogo a que

Giovannoni chama de “acordo respeitoso entre passado e futuro” (CABRAL;

ANDRADE, 2013, p. 54).

Desta forma, afirma o autor (2013, p. 94):

Essa divergência de critérios tem toda a aparência de um contraste irredutível entre duas concepções opostas, entre a Vida e a História. Parece que, de um lado, estão as exigências positivas do desenvolvimento moderno e do moderno modo de viver, do outro, o respeito pelas memórias históricas e artísticas, pelas condições de ambiente nas quais a velha cidade se desenvolveu. (GIOVANNONI, 2013, p. 94)

O caráter individual da localidade, segundo ele, é uma das perdas que os

novos traçados de ruas trouxeram para os “nossos dias”, além do que ele chama

de monotonia e o “tédio da geometria edilícia”, numa espécie de sistematização

que derruba o que considera “obstáculos” e não os enxerga como pontos de

referência que compõem aquela determinada paisagem.

O uso do termo ambiente por Giovannoni é recorrente em sua obra e se

refere, em alguns casos, à ideia de “contexto” de um monumento, do meio em

que está inserido. Kühl (2013, p. 94-95), no livro aqui referenciado, aponta

também que ambiente serve para qualificar, em outros momentos, “agrupamentos

menores”, conferindo-lhes “valor ambiental”. Choay (2001, p. 200-201) também se

refere ao termo empregado por Giovannoni: “esse termo designa as

consequências benéficas sobre a percepção da articulação dos elementos da

malha urbana”. E lembra do erro de tradução: “na tradução francesa das atas da

Conferência de Atenas, ele foi lamentavelmente traduzido por ambience (meio

físico no qual se encontram os seres vivos)”.

O caráter, a identidade, que as marcas do passado imprimem a um bairro

são, na visão de Giovannoni (2013, p. 175), um ideal a ser atingido, conforme se

8 Almeida (2009), ao tratar da origem das práticas de conservação, lembra que em tempos de

mudanças e transformações, os pensamentos se contrapõem quanto à visão que se tem do antigo e do novo, daquilo que se entende que seja um avanço para a sociedade no âmbito social, cultural e tecnológico, de um lado, e a visão mais romântica “de apego ao passado”.

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entende em seus escritos, ao que ele chama de “sistematização artística”. Uma

solução “modesta” em sua concepção, porém de grande alcance, ao permitir que

haja o “respeito pelo passado com critérios modernos”, de “enxerto de nova

beleza na beleza antiga”:

[...] Se juntamente com ela fosse possível, com o mesmo alto sentido de arte de que Bolonha nos deu o exemplo, restituir algumas das mais antigas construções, removendo acréscimos, como, por exemplo, reconduzir à altura de três pavimentos apenas e ao antigo elegante aspecto as casas do último trecho da rua; se, conjuntamente, e isso não apenas é possível, mas necessário, a limpeza e a ordem voltassem ao bairro, que hoje todos os serviços públicos da Prefeitura deixam indesculpavelmente abandonados, seria obtida uma verdadeira “sistematização artística”: obra não-triunfal, mas modesta, de respeito pelo passado com critérios modernos... (GIOVANNONI, 2013, p. 175)

Percebe-se, mais uma vez, a atualidade dos temas discorridos por

Giovannoni, e uma certa “poética dos espaços” que poderia ter saído do

pensamento de Bachelard (1984), quando o estudioso italiano dedica-se, em seus

escritos, à análise das zonas (rione) de Roma, e faz menção a uma delas, “um dia

tão bela e rica”, tornada “ínfima” em sua importância, com vários pontos que

refletem uma “triste miséria moral e material”. Esperançoso, ainda assim, quanto

ao destino das cidades, repudia o caminho fácil do esquadro e do compasso, e

propõe que se trate esses locais - os velhos centros urbanos -, como obras “de

estudo, de arte e de amor”. Em nome do que ele chama de “beleza de nossas

cidades gloriosas, variadas de aspecto assim como de recordações históricas,

que devem manter o seu caráter e a sua poesia, sem que a vulgaridade que tudo

iguala as atinja” (GIOVANNONI, 2013, p. 177).

O autor italiano foi, assim, um pioneiro na consideração da dimensão

urbana do patrimônio. Uma temática que ganhou corpo só no segundo pós-

guerra, quando cidades e capitais inteiras da Europa se viram diante de

escombros e da necessidade de uma reconstrução que permitisse resgatar a

identidade de seus habitantes. Antes disso, o pensamento dominante ao longo do

século XX foi o de não se permitir construções ao redor de monumentos ou

edificações reconhecidamente significativas segundo os critérios de

monumentalidade e excepcionalidade vigentes. Construções essas que

pudessem interferir, de algum modo, na visualização daquele bem protegido. A

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importância desse momento triste da história da humanidade, quando conjuntos

inteiros em várias cidades da Europa foram dizimados e transformados em meros

escombros, reside no fato de que trouxe uma mudança no olhar das pessoas em

geral, principalmente sobre a visão dos especialistas sobre a cidade. Por

consequência, sobre a maneira de pensar a cidade a partir daquela situação

extrema.

O entendimento de que conjuntos urbanos dialogam, efetivamente, com

todo um contexto que engloba a dimensão social e aspectos culturais específicos

levou tempo para ser entendido e considerado. Até então, a ideia predominante

que atravessou séculos e perdurou até parte do século XX foi a de se preservar o

que se entende por bens arquitetônicos isolados, ou determinados conjuntos,

vistos como monumentos de valor excepcional, com base em qualidades

materiais, “escolhidos para ser testemunho da história, isto é, como

representação à qual se atribuía valor histórico” (RODRIGUES, 2009, p. 1).

Um dos principais desafios do patrimônio é alcançar um cenário que

concilie conservação e desenvolvimento, tema que não é foco específico nesse

estudo, mas que não pode deixar de ser citado quando se trata de preservação

de conjuntos urbanos e áreas inteiras. Por essa razão, os escritos de

especialistas como Giovannoni são importantes de serem estudados e revistos,

assim como a consideração dos conteúdos abordados nas cartas patrimoniais.

Essas últimas são muito importantes pelo fato de representarem

documentos e orientações de caráter internacional, com o objetivo de propor o

melhor tratamento a ser dado à preservação do patrimônio, bem como por

estabelecer e divulgar as diretrizes que nortearam, até o momento presente, os

estudos, ações e políticas de proteção do patrimônio cultural.

Da primeira reunião realizada em 1931 que gerou a Carta de Atenas, com

a presença de autoridades e especialistas europeus, até a Convenção do

Patrimônio Mundial, em 1972, passando pela importante discussão de 1964 que

resultou na chamada Carta de Veneza e teve também participantes não europeus

(Tunísia, México e Peru), foram diversas reuniões de discussões que geraram

documentos sobre o patrimônio que se tornaram, inclusive, retratos de época.

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Para Kühl (2010, p. 289), as cartas patrimoniais “são fruto da discussão de

um determinado momento”, resultantes de encontros internacionais, regionais ou

locais, e oferecem “indicações de caráter geral”, não normativas, porém

conceituais e passíveis de serem reinterpretadas e atualizadas, bem como

adaptadas para a realidade de uma época e determinado lugar. Os responsáveis

por elaborar esses documentos são especialistas e organismos ligados ao

patrimônio cultural que vêm se reunindo em diversos momentos da sociedade

para encontrar um melhor entendimento sobre patrimônio em seus diversos

aspectos, bem como sobre ações de preservação que melhor se adequem aos

preceitos ali defendidos. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional

(IPHAN), órgão de preservação federal, reuniu as cartas patrimoniais mais

relevantes em uma publicação, que aponta mais de 40 cartas elaboradas até

hoje.

As primeiras cartas revelam a preocupação com a preservação do

patrimônio, face às preocupações da época, em termos de legislação, técnicas a

serem adotadas para o restauro de uma obra, por exemplo, bem como princípios

de conservação de bens históricos e artísticos. A primeira delas, a Carta de

Atenas, de 1931 - que já foi mencionada no início deste Capítulo -, ficou

conhecida como a carta dos restauradores, e o monumento isolado era o foco

daqueles especialistas que pensavam na vizinhança não como conjunto urbano,

mas como o entorno capaz de “valorizar” aquele bem a ser preservado. Visão que

muda em 1933, com a carta de mesmo nome elaborada durante o 4º Congresso

Internacional de Arquitetura Moderna (CIAM), que teve como tema central a

“cidade funcional com a ocupação racional do solo urbano”, voltada para o

atendimento das então denominadas funções básicas de ocupação humana:

habitação, lazer, trabalho e circulação.

O ponto de inflexão da consideração da dimensão urbana do patrimônio

veio com a Carta Internacional de Conservação e Restauro de Monumentos e

Sítios, conhecida como Carta de Veneza, de 1964, que aborda a questão do

restauro crítico, reconhecendo, no campo da conservação e do restauro, a

importância cultural da arquitetura menor e do conjunto urbano, posição já

defendida, muito antes, por Giovannoni. Com efeito, já no primeiro artigo da Carta

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de Veneza está o alerta de que à noção de monumento histórico inclui-se as

“obras modestas, que tenham adquirido, com o tempo, a significação cultural”.

A Carta de Veneza também coloca a questão dos valores humanos e da

“mensagem espiritual” que ecoa dos testemunhos do passado:

Portadoras de mensagem espiritual do passado, as obras monumentais de cada povo perduram no presente como o testemunho vivo de suas tradições seculares. A humanidade, cada vez mais consciente da unidade dos valores humanos, as considera um patrimônio comum e, perante as gerações futuras, se reconhece solidariamente responsável por preservá-las, impondo a si mesma o dever de transmiti-las na plenitude de sua autenticidade. (CARTA DE VENEZA, 1964, p. 1)

Esse alargamento de visão de bem culturais e do tempo cada vez mais

próximo em que se inserem foi o legado da Carta de Veneza que não pode ser

desmerecido, como lembra Kühl (2010), que alerta, também, para a importância

de se considerar o contexto em que cada carta foi redigida.

No caso da Carta de Veneza, Kühl destaca o período efervescente em que

a mesma surgiu, quando da “criação e consolidação de organizações

internacionais voltadas para a cultura", como o Conselho Internacional para

Monumentos e Sítios - ICOMOS9:

A organização do congresso, que deu origem à Carta de Veneza,e

ao próprio texto da Carta e, ainda, à criação do Icomos, fazem

parte de um esforço cumulativo de várias nações (e também de

seus serviços de preservação e de profissionais do campo) para

estabelecer um sistema de cooperação internacional que

auxiliasse na resolução das numerosíssimas questões envolvidas

na preservação de bens culturais, de modo a enfrentá-las com

rigor metodológico e coerência de critérios e de princípios. (KÜHL,

2010, p. 290)

A autora também lembra que, na Carta de Veneza, os monumentos são

considerados como “vivos”, sem a distinção que se fazia antes entre

9 O ICOMOS é uma organização não governamental ligada à Organização das Nações Unidas

para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), dedicada à proteção e conservação de monumentos e sítios, oficialmente reconhecida como conselho consultivo daquela entidade. Sua fundação ocorreu em 1965, em Varsóvia, na Polônia, um ano após a assinatura da Carta de Veneza (Fonte: ICOMOS).

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“monumentos vivos” e "monumentos mortos”. Até mesmo ruínas arqueológicas

compõem características de um determinado ambiente urbano, e são parte

integrante da cotidianidade de seus habitantes (KÜHL, 2010, p. 305).

Sua “filiação” direta com a Carta de Atenas de 1931 estabelece um diálogo

interessante ao mostrar, claramente, a ampliação de visão sobre o patrimônio e,

como lembra Kühl (2010, p. 307), a simples mudança de termo já é suficiente

para abarcar um novo entendimento:

Note-se que, em vez de “monumentos históricos e artísticos”, designação que predominava no século XIX (e comparece na Carta de Atenas, voltada a obras de grande interesse histórico-artístico), tem-se aqui um “monumento histórico”, que pode ser uma obra arquitetônica ou também um sítio, urbano ou rural, que não tenha necessariamente “valor” excepcional do ponto de vista formal e documental, mas que tenha adquirido uma significação de cunho cultural, que abarca um leque mais amplo de significados (lembrando a expressão “portadores de mensagem espiritual do passado” do preâmbulo). Ou seja, pela definição, o interesse pode voltar-se a bens por seus aspectos memoriais e simbólicos. Não são estabelecidos limites cronológicos e, por isso, a Carta refere-se ao patrimônio construído de qualquer época, inclusive a arquitetura recente.

Alguns anos após a Carta de Veneza, nas Normas de Quito (1967),

resultantes de reunião sobre conservação e utilização de monumentos e lugares

de interesse histórico e artístico nos países do continente americano, se

estabelece que “bens do patrimônio cultural representam um valor econômico e

são suscetíveis de constituir-se em instrumentos do progresso”, o que demonstra

claramente que o objetivo exposto é o de promover o desenvolvimento econômico

da região através de ações de valorização do patrimônio cultural. Este documento

traduz o momento em que a dimensão urbana do patrimônio é considerada como

elemento importante da economia local e passa a fazer parte das políticas de

turismo. De fato, o final dos anos 1960 e a década de 1970 marca o período em

que os centros históricos passam a ser considerados nas políticas de turismo e

planejamento territorial.

Outra carta importante é a Declaração de Amsterdã, de outubro de 1975,

ano em que se comemorou o “Ano Europeu do Patrimônio Arquitetônico”, que traz

em seu conteúdo a importância de se preservar e manter o patrimônio

arquitetônico da Europa por ser considerado “parte integrante do patrimônio

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cultural do mundo inteiro”. Este documento desenvolve importantes

considerações sobre o tema do patrimônio, ao afirmar que não são apenas as

“construções isoladas de valor excepcional e seu entorno, mas também os

conjuntos, bairros de cidades e aldeias, que apresentam um interesse histórico ou

cultural”. Esta carta defende enfaticamente que a preservação seja conjugada à

ação de planejamento, ao expor o caráter de “importância vital” na conservação

desses bens, e expor o seguinte em suas “considerações essenciais”:

c) Essas riquezas são um bem comum a todos os povos da Europa, que têm o dever comum de protegê-las dos perigos crescentes que as ameaçam: negligência e deterioração, demolição deliberada, novas construções em desarmonia e circulação excessiva.

d) A conservação do patrimônio arquitetônico deve ser considerada não apenas como um problema marginal, mas como objetivo maior do planejamento das áreas urbanas e do planejamento físico territorial. (DECLARAÇÃO DE AMSTERDÃ, 1975, p. 1-2)

Outro ponto importante a se destacar nessa carta é que, ao se proceder à

reabilitação de bairros antigos, recomenda-se cuidar para que não ocorram

“modificações importantes da composição social dos habitantes”. Levar em conta

essa premissa passa a delinear uma nova realidade a ser perseguida: a do

habitante, seu contexto e o tecido social que permeiam a relação espaço-temporal

de seu território, enquanto lugar de sua morada e de manifestações culturais

múltiplas da cotidianidade.

E para isso, o apelo que faz a referida Declaração inclui “instituições

espirituais e culturais”:

O congresso faz um apelo aos governos, parlamentos, instituições

espirituais e culturais, institutos profissionais, empresas

comerciais e industriais, associações privadas e a todos os

cidadãos, para que dêem total apoio aos objetivos desta

declaração e façam todo o possível para assegurar a sua

aplicação. (DECLARAÇÃO DE AMSTERDÃ, 1975, p. 2-3)

Nessa carta, está também a citação do ambiente que integra os bens e

“conjuntos arquitetônicos”:

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[...] O que hoje necessita de proteção são as cidades históricas,

os bairros urbanos antigos e aldeias tradicionais, aí incluídos os

parques e jardins históricos. A proteção desses conjuntos

arquitetônicos só pode ser concebida dentro de uma perspectiva

global, tendo em conta todos os edifícios com valor cultural, dos

mais importantes aos mais modestos, sem esquecer os da época

moderna, assim como o ambiente em que se integram.

(DECLARAÇÃO DE AMSTERDÃ, 1975, p. 3)

Na mesma Declaração (1975, p. 3), está registrado que:

[...] a preservação da continuidade histórica do ambiente é essencial para a manutenção ou a criação de um modo de vida que permita ao homem encontrar sua identidade e experimentar um sentimento de segurança face às mutações brutais da sociedade [...]

São esses avanços que se notam ao analisarmos as cartas e outros

documentos, que permitem um entendimento maior sobre a evolução do

pensamento no que tange às discussões sobre patrimônio. E quando a

Declaração de Amsterdã (1975, p. 3) fala de um “novo urbanismo”, da

recuperação da escala humana, considerando a diversidade plural da sociedade,

pode-se pensar nas possibilidades de se dar novos usos ao tecido urbano antigo,

em uma cidade mais justa, humanizada, sustentável. Isto contribui para a

economia de recursos e mantém viva a identidade local, através de uma medida

simples, porém imbuída de uma força incomum: a de deixar a cidade ser o que

ela é, sem fazer uso de cenários que tornam artificiais características antes

naturais do lugar, ou de simulacros daquilo que já foi.

Além das cartas patrimoniais, uma série de recomendações e outros

documentos foram sendo produzidos por outros organismos nesse e em outros

períodos subsequentes, que ampliaram o entendimento sobre bens culturais,

incorporando a visão do habitante local e os aspectos sociais, só para citar alguns

temas dessas discussões que vêm seguindo até os dias de hoje.

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1.2. Da dimensão material do patrimônio ao espírito do lugar

Embora tenha ficado evidente, na trajetória acima analisada, a ampliação

do conceito de patrimônio no século XX, verifica-se que a dimensão material é a

que predomina até a década de 1970.

Contudo, a partir dos anos 1960 as mudanças relacionadas aos valores

culturais, que ocorrem na sociedade em geral, terão impacto direto sobre os

conceitos de história, memória e identidade, refletindo-se diretamente no

tratamento da questão do patrimônio.

Somar os valores materiais de um bem cultural, ao conjunto no qual se

insere e o rodeia, e ampliar essa visão levando em conta o território urbano dentro

do conceito de patrimônio urbano, trouxe, por sua vez, a necessidade de se

considerar outros aspectos até então não pensados ou pouco defendidos:

[...] redes de sentido e valores imbricadas nas vivências sociais dos “patrimônios” (entendidos como referências espaciais de memória), que delineiam e (re)criam, a todo o momento, novas territorialidades. Tal ideário, incita que tratemos a questão do patrimônio de uma nova maneira. (NIGRO, 2013, p. 4)

Buscar entender e resgatar os valores atribuídos por aqueles que habitam

os espaços e usam os caminhos que os constituem, não é tarefa fácil. E nem

podem passar despercebidos, uma vez que essas características marcantes de

um lugar são capazes de estimular os sentidos e fazer enxergar esse ou aquele

lugar como “espaços amados” ou, ainda, “espaços louvados” (BACHELARD,

1984, p. 196). Memória individual e memória coletiva ou social adquirem novos

significados. A importância que moradores atribuem a certos lugares e artefatos

passa a ser um aspecto relevante das políticas de memória. Lugares e artefatos

que passam a ter um valor patrimonial, num alargamento tipológico e geográfico

que, como já citado anteriormente, Choay (2001) considera exacerbado, com o

perigo de que tudo seja considerado patrimônio.

Inoue (2015) lembra que a base conceitual que alimentou esse

alargamento já tinha começado com Riegl (1903), e que os “novos patrimônios” -

diversas categorias como o industrial, moderno, ferroviário, entre tantos outros -

foram se multiplicando a partir da década de 1960, “não só na França, mas

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inclusive internacionalmente” (INOUE, 2015, p. 4). Lembra também que, “com a

aproximação entre história e geografia”, a partir da “criação do conceito de

paisagem cultural”, ocorre a “aproximação dos aspectos materiais e imateriais do

patrimônio”:

O domínio patrimonial não são mais edifícios individuais, mas bens imateriais, conjuntos urbanos e até cidades inteiras, e atualmente, grandes porções do território sob o nome paisagens culturais. (INOUE, 2015, p. 4)

A aproximação entre os conceitos relacionados ao tangível e ao intangível

leva a uma noção de “territorialidade” e território, que - antes pensado como

"portador de limites materializados pelas fronteiras” (NIGRI, 2013, p. 5) -, passa,

cada vez mais, a ser considerado como dimensão em que se configuram as

relações simbólicas que expressam a identidade e os sentidos das coisas e dos

lugares:

Tais relações se concebem espacialmente, concreta ou abstratamente, e o território delineia-se como uma dimensão onde ocorre a sociabilidade e as práticas cotidianas.

[...] Robert David Sack (1987) concilia essas duas “visões” do território, vinculando-o a um exercício de poder. [...] Para ele, a “territorialidade” constitui uma forma de comportamento espacial socialmente construída, que tem implicações normativas. “A territorialidade está intimamente relacionada em como as pessoas usam a terra, como se organizam no espaço e como dão sentido ao lugar”. (SACK, 1986:2). Ela é uma estratégia humana para o estabelecimento de relações de afeto, influência e controle, que pressupõe três elementos territoriais: a definição de uma área, a delimitação de fronteiras (normativas e simbólicas), e o controle de acesso (poder). (NIGRI, 2013, p. 5)

Essa discussão sobre o território e a noção de territorialidade guarda

relação com a dimensão urbana do patrimônio, objeto de abordagem deste

capítulo.

Nesta direção, um dos primeiros conceitos desenvolvidos no campo do

patrimônio que envolveu essa discussão foi o de "paisagem cultural", tema

complicado, complexo, com muito conflito de interesses, mas que possibilita,

segundo apontam os especialistas, a extensão de um diálogo amplo entre

sociedade e poder público.

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Em 1972, a Convenção da UNESCO aprovou a documento para a

Proteção do Patrimônio Mundial Cultural e Natural, assinada em Estocolmo

(Suécia):

Considerando o patrimônio em seu duplo aspecto cultural e natural, a Convenção nos lembra as formas pelas quais o homem interage com a natureza e, ao mesmo tempo, a necessidade fundamental de preservar o equilíbrio entre ambos. (UNESCO)

Esse documento apresenta os critérios de definição de bens naturais e

culturais, dos quais destacamos dois itens que podem auxiliar sobre a decisão de

se manter determinadas áreas intactas, não apenas fragmentos isolados na

paisagem:

[...] ii. ser a manifestação de um intercâmbio considerável de valores humanos durante um determinado período ou em uma área cultural específica, no desenvolvimento da arquitetura, das artes monumentais, de planejamento urbano ou de paisagismo,

[...] iv. ser um exemplo excepcional de um tipo de edifício ou de conjunto arquitetônico ou tecnológico, ou de paisagem que ilustre uma ou várias etapas significativas da história da humanidade. (UNESCO)

A paisagem cultural é assim entendida:

Sua característica fundamental é a ocorrência, em uma fração territorial, do convívio singular entre a natureza, os espaços construídos e ocupados, os modos de produção e as atividades culturais e sociais, numa relação complementar entre si, capaz de estabelecer uma identidade que não possa ser conferida por qualquer um deles isoladamente. (ALMEIDA, 2007, p. 710)

O entendimento que se tem a partir dessa leitura leva a reconhecer a

importância de se considerar conjuntos e até mesmo lugares não edificados como

constitutivos do patrimônio cultural. Essa perspectiva mais abrangente, não

fragmentada, considera também registros e impressões imateriais sobre aspectos

que não são, muitas vezes, palpáveis ou perceptíveis, mas que exprimem melhor

a relação que existe entre o habitante e o seu bairro, por exemplo, como se verá

mais adiante nesta pesquisa.

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Essa definição aparece no referenciado trabalho do IPHAN, escrito por Rafael Winter Ribeiro, e

foi extraída da apresentação escrita pelo então presidente do órgão, Luiz Fernando de Almeida.

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Das possíveis leituras que se pode fazer sobre a paisagem, esta não deixa

de ser “uma espécie de documento de interpretação instável, aberta a múltiplas

interpretações” (MONDADA; SODERSTROM apud RIBEIRO, 1993, p. 74).

Interpretar a paisagem é algo, portanto, subjetivo, que, muitas vezes, guarda

relação com valores afetivos:

Nos recônditos da memória residem aspectos que a população de uma dada localidade reconhece como elementos próprios da sua história, da tipologia do espaço onde vive, das paisagens naturais ou construídas. A memória, do ponto de vista de Jaques Le Goff, estabelece um "vínculo" entre as gerações humanas e o "tempo histórico que as acompanha". Tal vínculo, além de constituir um "elo afetivo" que possibilita aos cidadãos perceberem-se como "sujeitos da história", plenos de direitos e deveres, os torna cônscios dos embates sociais que envolvem a própria paisagem, os lugares onde vivem, os espaços de produção e cultura. Sob essa ótica, Le Goff destaca que a "identidade cultural de um país, estado, cidade ou comunidade se faz com a memória individual e coletiva"; a partir do momento em que a sociedade se dispõe a "preservar e divulgar os seus bens culturais" dá-se início ao processo denominado pelo autor como a "construção do ethos cultural e de sua cidadania". (PELEGRINI, 2006, p. 116)

Fica evidente que espaço, tempo e natureza são as dimensões

constituidoras da vida: "a cultura é o agente, a área natural é o meio e a paisagem

cultural, o resultado” (SAUER apud Ribeiro, 1996, p. 19).

Pelegrini (2006) recorre a fundamentos da geografia cultural que relaciona

traços distintos das paisagens, distinguindo-as de outros espaços devido ao seu

geniu´s loci, ou seja, a “alma do lugar”. São esses aspectos que entendemos

devam ser considerados ao se tratar de um certo "espírito de ser mooquense", um

estado que reúne as condições de lugar, história, sentimento, referências visuais

e cognitivas, ou seja, camadas que se sobrepõem conferindo sentidos para o

habitante ou frequentador do bairro.

São “valores que dão sentido à vida”, como lembra Pelegrini (2006), que

destaca também a Declaração do México (1985), importante documento sobre

políticas culturais, cujos agentes ali reunidos entenderam que a cultura pode ser

considerada, na atualidade,

[...] como o conjunto dos traços distintivos espirituais, materiais, intelectuais e afetivos que caracterizam uma sociedade e um grupo social. Ela engloba, além das artes e das letras, os modos de vida, os direitos fundamentais do ser humano, os sistemas de

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valores, as tradições e as crenças. Concorda também que a cultura dá ao homem a capacidade de refletir sobre si mesmo. (DECLARAÇÃO DO MÉXICO, 1985, p. 1)

Identidade cultural, dimensão cultural do desenvolvimento, cultura e

democracia, patrimônio cultural estão entre os princípios que devem nortear as

políticas culturais, como está na referida Declaração.

Todo este debate não está isolado de outra discussão importante que

ganhou grande relevância nas últimas décadas, principalmente desde a década

de 1980, que é a do patrimônio imaterial, ainda que uma das cartas fundamentais

acerca do tema seja do início da década de 2000: a Convenção para a

Salvaguarda do Patrimônio Imaterial, resultante da Conferência Geral da

UNESCO, realizada em Paris no ano de 2003.

A importância de se salvaguardar tais valores intangíveis se dá pelo

aspecto principal que é a grande vulnerabilidade desse patrimônio que abarca as

“expressões de vida e tradições” de “comunidades, grupos e indivíduos”

(UNESCO). Como a manutenção dessa identidade está ligada à transmissão

entre gerações, a comunidade internacional entendeu que se faz necessário

promover e proteger a “herança cultural dos povos” através do que passou a ser

denominado “Patrimônio Cultural Imaterial”, pois além dos aspectos físicos e

materiais de “monumentos, sítios históricos e paisagens culturais”, entende-se

que:

Há muito mais, contido nas tradições, no folclore, nos saberes, nas línguas, nas festas e em diversos outros aspectos e manifestações, transmitidos oral ou gestualmente, recriados coletivamente e modificados ao longo do tempo. (UNESCO)

Desde então, uma série de incentivos e promoção de espécie de

‘concursos’ foram criados para que os espaços de produção desse saber

imaterial, por excelência, sejam reconhecidos como tal, e estimulados a continuar

produzindo e transmitindo esses conhecimentos. Assim, a memória e a identidade

se perpetuam por meio de uma dinâmica que envolve os organismos

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internacionais voltados ao tema, e à sociedade local, ongs, artesãos, artistas e

figuras de expressão relevante das comunidades.

Ao se realizar tais iniciativas (a Convenção, a salvaguarda, o

reconhecimento e incentivo junto aos representantes da sociedade), promoveu-se

a regulamentação do conceito de Patrimônio Cultural Imaterial e o entendimento

que há laços e elos de afetividade que atravessam o tempo e criam significados e

referenciais que constituem a riqueza imaterial de cada indivíduo, sua herança

cultural, no seu constante “criar, fazer e viver”. (UNESCO) Que reconhecem

esses bens como um legado para as futuras gerações.

O que traz de novo a Declaração de Quebec

De todas as cartas patrimoniais que trazem o conceito de patrimônio

urbano implícito em seu conteúdo, talvez a Declaração de Quebec (2008), sobre o

“Spiritu Loci”, seja a que mais se aproxima da ideia de se considerar os “valores

afetivos na preservação” (SILVA; TOURINHO, 2015), e parece revelar as

significações e o entendimento de como as permanências conseguem nutrir a

identidade de um lugar, a despeito das mudanças temporais, dos novos usos, e

da permanente transformação social. O texto da Declaração, no site oficial do

Icomos, informa sobre a reunião ocorrida na histórica cidade de Quebec, no

Canadá, por ocasião de seus 400 anos.

Dentre os principais pontos abordados nesse documento, logo em seu

início, colocam-se as ações que ocorreram desde 2003 até se chegar à sua

elaboração, e cuja preocupação central que norteou sua criação foi a de “proteger

e promover o espírito dos lugares, [...] sua essência de vida, social e espiritual”

(QUEBEC, 2008, p. 1).

O conceito, objeto da Declaração em questão, é assim estabelecido:

O espírito do lugar é definido como os elementos tangíveis (edifícios, sítios, paisagens, rotas, objetos) e intangíveis (memórias, narrativas, documentos escritos, rituais, festivais, conhecimento tradicional, valores, texturas, cores, odores, etc) isto é, os elementos físicos e espirituais que dão sentido, emoção e mistério ao lugar. (DECLARAÇÃO DE QUEBEC, 2008, p. 2)

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Fica evidente a necessidade de se conjugar os aspectos tangíveis aos

intangíveis na construção da identidade local. Também é lembrada a atuação dos

agentes sociais, de gestores e de arquitetos, em uma dimensão multidisciplinar

que enriquece as questões relativas aos bens culturais e à preservação, em geral.

A figura do “usuário” é apontada de forma explícita, como parte fundamental do

processo de atribuição de sentido ao lugar.

Uma das preocupações do documento refere-se às descaracterizações de

bairros inteiros e à consequente perda de identidade, muitas vezes relacionada

aos deslocamentos constantes característicos de um mundo globalizado. Nesta

direção, o conceito de espírito do lugar seria mais adequado para tratar das

questões de memória e identidade, considerando que:

Visto como um conceito relacional, o espírito do lugar assume ao longo do tempo um caráter plural e dinâmico capaz de possuir múltiplos sentidos e peculiaridades de mudança, e de pertencer a grupos diversos. Esta abordagem mais dinâmica se adapta melhor ao mundo globalizado atual, caracterizado por movimentos transnacionais da população, relocação populacional, contatos interculturais crescentes, sociedades pluralísticas e múltiplas ligações ao lugar. (DECLARAÇÃO DE QUEBEC, 2008, p. 2)

O termo "relacional" tem o significado de “estabelecer relação” e sugere a

ideia de se estabelecer uma convivência pacífica entre dois termos de uma

equação. Se levarmos em conta as mudanças que vêm ocorrendo nas cidades -

e, no caso da Mooca, não é diferente -, é importante a indagação sobre que tipo

de convivência respeitosa pode haver do novo com o antigo, e do novo habitante

que chega sem ter vínculos familiares, históricos ou afetivos com o lugar.

A resposta parece chegar com a referida Carta no seguinte trecho:

As comunidades que habitam o lugar, especialmente quando se trata de sociedades tradicionais, deveriam estar intimamente associadas à proteção de sua memória, vitalidade, continuidade e espiritualidade. (DECLARAÇÃO DE QUEBEC, 2008, p. 2)

E se é mesmo que o espírito do lugar oferece “uma compreensão mais

abrangente do caráter vivo dos lugares”, o que estaria faltando, então, para que

tais recomendações se concretizassem e o reconhecimento claro da importância

de se manter o espírito do lugar aconteça de fato?

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Como resposta, a Declaração (2008, item 1, p. 3) enumera pontos que

deveriam ser seguidos pelos especialistas e órgãos de preservação quanto à

questão indiscutível, segundo a carta, de que o patrimônio cultural intangível

“confere um significado mais rico e mais completo ao patrimônio como um todo, e

deve ser considerado em toda e qualquer legislação” que trate do tema, assim

como nas ações de conservação e restauro.

E o tom de apelo se traduz em exigência para todos aqueles que se

envolvam com esses temas:

Considerando que o espírito do lugar é complexo e multiforme, exigimos que os governos e outros interessados convoquem a perícia de equipes de pesquisa multidisciplinar e especialistas com tradição para melhor compreender, preservar e transmitir este espírito do lugar. (DECLARAÇÃO DE QUEBEC, 2008, p. 3)

Ao falar em “ameaças de um mundo em transformação” nas dinâmicas que

regem hoje as cidades, a carta faz uma convocação a que se prepare os

habitantes e autoridades locais a fim de que se montem estratégias que amparem

e previnam o lugar de forma sustentável.

Um outro ponto subsequente, que merece ser considerado, inclusive em

relação ao bairro da Mooca, é que o compartilhamento do mesmo território por

grupos diferentes, com outras necessidades e cultura, não venham a acarretar a

perda da identidade original do local e a eminente disputa entre esses grupos. O

exemplo mais claro do que acontece hoje na Mooca é a grande confluência de

bolivianos, peruanos e chineses na região, num bairro italiano em sua essência.

Os chineses, em especial, já têm igreja e colégio próprio, em área contígua a

colégio tradicional da região, e já detêm parte significativa do comércio local na

Rua da Mooca e outros lugares, por exemplo.

Planejamento estratégico participativo, com entidades locais reconhecidas

e moradores participantes, e a sensibilização através de ações de

reconhecimento do patrimônio local, bem como do resgate da memória e da

história daquele lugar são desejáveis e necessários, para que não se incorra a

uma perda expressiva de bens culturais, tanto materiais quanto imateriais, e haja

competição e conflito crescentes entre os diferentes grupos.

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Nesses casos, é fundamental a gestão compartilhada entre os grupos mais

tradicionais, detentores do saber mais antigo que, junto aos mais jovens,

ajudariam a disseminar o espírito do lugar e preservar sua essência para as

gerações vindouras.

Além disto, uma das formas de proteção do espírito do lugar recomendada

na Declaração de Quebec, e que será analisada mais adiante na presente

pesquisa, é a sua transmissão por meio de “comunicação interativa”:

Meios de transmissão não‐formais (narrativas, rituais, atuações, experiência e práticas tradicionais etc.) e formais (programas educativos, bancos de dados digitais, websites, ferramentas pedagógicas, apresentações multimídia, etc.) deveriam ser fomentados, porque não apenas garantem a proteção do espírito do lugar mas, acima de tudo, protegem o desenvolvimento sustentável e social da comunidade. (DECLARAÇÃO DE QUEBEC, 2008, p. 4)

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1.3. Do patrimônio ambiental urbano ao imaterial no Brasil

As discussões internacionais sempre repercutiram, de alguma forma, no

campo da preservação do patrimônio no Brasil, com rebatimento - evidentemente

com suas peculiaridades - na atuação dos órgãos de preservação.

Tal como no panorama internacional, predominou no Brasil, desde a

institucionalização do campo da preservação na década de 1930, a visão de

patrimônio como monumento, com exceção do olhar de Mário de Andrade, cuja

visão acerca da importância dos aspectos intangíveis da cultura não foi a que

prevaleceu.

Desta forma, desde a criação do órgão federal de preservação em 1937 - o

Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN), atual Instituto do

Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) -, até a década de 1970,

prevaleceu o valor de excepcionalidade na preservação de bens culturais.

Este panorama começa a mudar nos anos 1970, com o programa federal

de política de proteção e desenvolvimento dos centros históricos, na linha do que

então se defendia na Carta de Veneza (1964) - importância dos conjuntos

urbanos e da chamada arquitetura menor - e nas Normas de Quito (1967) -

patrimônio como recurso econômico, incluindo seu valor para o turismo.

É então, nesse momento, que a dimensão urbana passa a entrar no debate

sobre preservação do patrimônio no Brasil, principalmente no âmbito dos órgãos

estaduais que começam a ser criados - como o Conselho de Defesa do

Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo

(CONDEPHAAT), criado em 1968 -, e, mais tarde, dos municipais - como o

Departamento de Patrimônio Histórico da cidade de São Paulo (DPH), ao qual irá

se juntar, em 1985, o Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico,

Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (CONPRESP).

Desta trajetória, interessa-nos focar, especificamente, no conceito de

“patrimônio ambiental urbano”, cuja discussão desenvolve-se em alguns meios

intelectuais e da administração pública em São Paulo.

O debate sobre esse conceito teve seu auge entre a década de 1970 e os

anos 1980. Foi no período inicial que o termo “patrimônio ambiental urbano”

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passou a ser utilizado com uma certa frequência. De acordo com Meneses

(1978), seu surgimento tinha como objetivo “superar as restrições e deformações

reducionistas implicadas em outros conceitos em voga (ou pelo uso inadequado

desses outros conceitos), como os de ´patrimônio artístico, histórico´, etc.”, ainda

utilizados então e que, pouco a pouco, vão dando lugar a um termo mais

abrangente, como o de ‘patrimônio cultural’. A partir de 1988, o conceito ampliado

de patrimônio, e com ele o de patrimônio ambiental urbano, foi abandonando o

campo da gestão urbana, focando-se exclusivamente no âmbito da preservação,

sobretudo com a aplicação do instrumento do tombamento pelo CONPRESP

(SILVA; TOURINHO, 2015). A data coincide com o início da atuação do referido

órgão, e é a mesma época da inclusão, na Constituição Federal, da defesa do

acesso à cultura e ao passado como um dever do Estado.

A noção de patrimônio ambiental urbano pretendia, então, superar a visão

do valor excepcional e englobar os bens culturais comuns, cotidianos do contexto

urbano, e o maior interesse de sua preservação seria o de proporcionar a leitura e

compreensão da cidade (Rodrigues, 2000). Como consequência, surgiria a prática

de proteção de manchas urbanas.

É Meneses quem fundamenta essa questão:

O Patrimônio Ambiental Urbano tem matrizes na dimensão física da cidade, pois é por meio de elementos empíricos do ambiente urbano que os significados são instituídos, criados, circulam, produzem efeitos, reciclam-se e se descartam. (MENESES, 2006, p. 36-37)

Contudo, diante de uma certa persistência, ainda hoje, dos critérios de

tombamento dos órgãos de preservação que ainda se valem de conceitos

tradicionais de valorização de bens materiais, em que a monumentalidade e a

excepcionalidade ainda predominam de maneira dissociada do conjunto urbano, a

aplicação do conceito de patrimônio ambiental urbano parece caminhar, diante do

modelo ainda vigente, para o campo das utopias. Percebe-se que se trata aqui de

adotar uma mudança referencial no modo de ver a cidade e de se tratar de um

tema, quando se aplica o termo ambiente. Em geral, assiste-se a uma realidade

em que a ação primeira tem sido a desconstrução da natureza para adaptá-la aos

novos paradigmas de ocupação que o chamado progresso e o novo impõem a

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cada instante. Alie-se a essa problemática, a falta de capacidade de conjugar a

ordenação urbana a boas práticas de preservação do tecido urbano, de suas

áreas envoltórias, com um foco mais direcionado aos seus habitantes, seu

cotidiano, que enfatize os aspectos socioculturais do ambiente urbano,

relacionando-o com a memória social, e a percepção das significações sociais

relacionadas à materialidade do espaço (SILVA; TOURINHO 2015).

Essas questões têm levado especialistas de outras áreas, além da

arquitetura11 - historiadores, antropólogos, urbanistas, geógrafos, entre outros -, a

reconhecerem o papel preponderante da cidade, não só como produto, mas como

produtora de processos culturais na vida de seus habitantes (LEMOS 200412;

MENESES, 2006, 2010; ARANTES, 2006).

No entanto, apesar dos avanços conceituais, verifica-se que predominou o

aspecto material no tratamento do patrimônio, conforme apontam Tourinho e

Rodrigues (2016, p. 81-82):

Com efeito, naqueles debates, Meneses já apontava o predomínio de um procedimento limitado e insuficiente quanto à identificação do patrimônio ambiental urbano, na prática das instâncias de intervenção - listagem de bens que apresentam características vinculadas a “ideias apriorísticas definidoras de bem cultural” - em detrimento de uma noção de patrimônio como fato social, que apenas pode ser definido “através de uma indagação de caráter sociológico, antropológico e histórico” (MENESES, 1979, p. 22).

Esta percepção traria um grande desafio para os especialistas: o de

entender o ambiente urbano como “conjugação dos agenciamentos físico-

territoriais e das relações e práticas sociais que ali se estabelecem”, sendo estas

as produtoras de “sobreposições de referências de memória e história que exigem

reconhecimento” (SILVA; TOURINHO, 2015, p. 9). Ainda assim, seria necessário

trabalhar, no âmbito da proteção do patrimônio, a percepção do conjunto urbano

não como “mera junção de elementos isolados, em que se selecionam e

protegem determinados bens em um perímetro pré-estabelecido”, mas sob o

11

Área de onde são oriundos a maioria dos profissionais de órgãos de preservação, como os da

cidade de São Paulo. 12

A título de registro, para situar a época exata dessas discussões, a edição original da publicação

de Carlos Lemos data de 1987.

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entendimento de sua amplitude, de como esse conjunto todo dialoga com suas

partes (SILVA; TOURINHO, 2015, p. 9).

Fica claro que a noção de patrimônio ambiental urbano não deve ser

entendida, pura e simplesmente, como cenário ou lugar apenas material,

edificado ou construído, e sim como uma dimensão que envolve “relações

processadas num lugar específico e não o próprio lugar” (YÁZIGI, 2012, p. 25-26).

É o espaço que, uma vez ocupado, ocasiona e favorece a convivência dos

diferentes tempos, através da permanência e da transformação de formas, usos,

funções e significados. E de suas permanências e transformações, surgem os

patrimônios históricos e culturais (GERALDES, 2006).

Seria, então, o modo como é ‘produzido’ esse patrimônio ambiental urbano

o que daria o seu real entendimento (MENESES, 1978), já que, como um sistema

de objetos socialmente apropriados, gera, com isso, as chamadas representações

sociais. Essas relações culturais, que dialogam entre si, revelam a própria vida

urbana, entende-se. São paisagens, espaços, construções, objetos móveis, enfim,

que estimulam a identidade local, que trazem a marca do indivíduo e de suas

relações sociais e espaço-temporais, como se fosse a sua própria casa. É um

fenômeno que acompanha o processo social, assumindo todas as modernidades

necessárias. Por isso, a chave de todo esse processo, e do entendimento mesmo

de patrimônio ambiental urbano parece estar na sociedade, o que implica uma

definição que “é sempre histórica e sociológica”, de “processo em ação contínua,

que não carece da inscrição definitiva de bens numa lista cumulativa” (MENESES,

1978).

O patrimônio ambiental urbano, portanto, acompanharia o processo social

(YÁZIGI, 2012, p. 25), nessa busca pela (re)qualificação das cidades, e do bem

estar e dos sentidos de pertencimento - cada vez mais fragilizados - dos que

nelas habitam. Compreender o que é esta “noção difusa de pertença”, vinculada à

identidade e à memória, parece ser uma tarefa essencial. Deixar de lado essa

questão é negar, de certo modo, que a cultura material, por fim, sofre a “constante

renovação dos sentidos a ela atribuídos pela sociedade” (RODRIGUES, 2009, p.

49).

Meneses (1978), como historiador e figura ligada aos órgãos de

preservação, colocou desde o começo a preocupação em relação ao fato de que

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o termo “patrimônio ambiental urbano” tomou sentidos diversos do conceito inicial

a ele atribuído, qual seja, a de um conjunto de bens físicos concebidos pela ação

humana que, ao produzir tais artefatos, transforma a natureza e dela se apropria

no cotidiano da vida urbana. Essa “apropriação social”, como Meneses destaca

em seus textos, é passível de uma investigação mais apurada e de um estudo

aprofundado que permita revelar a importância deste ou daquele objeto produzido

e selecionado, aos quais são atribuídos valores e significados que acabam por

vincular, eles próprios, uma imagem da cidade muitas vezes ignorada, ou pouco

distinguida, nas resoluções finais de tombamento sobre áreas preexistentes.

A questão da representação é, portanto, essencial no pensamento de

Meneses (1978):

Trata-se de paisagens, espaços, construções, objetos móveis também, cujo sentido se manifesta não por si, mas pela articulação que entre si estabelecem e que lhes dá suporte. [...] são percebidos como dotados de potencial que os torna aptos à elaboração de representações do meio ambiente urbano.

A produção e apropriação social de sentidos no meio urbano condicionam

a percepção que se tem de um bem cultural e o quanto isso emerge em partes ou

em escala maior, e influi na imagem que se tem de cidade. Tirar a participação

efetiva da sociedade no que diz respeito aos bens culturais e aos valores a eles

atribuídos levaria a um distanciamento desses valores. E se é a sociedade que

‘gera’ um bem cultural, é necessário saber do risco presente e começar a rever

conceitos a respeito do valor e da avaliação (reconhecimento de valor), “sem

excluir a perspectiva do especialista, obviamente, mas sempre privilegiando

aquela do usuário, do fruidor - em outras palavras, a perspectiva da velhinha do

cartum” (Meneses, 2010, p. 34). A velhinha em questão seria aquela que faz uso

do bem apropriado, uma igreja, por exemplo, e a ele atribui importância e

significados que traduzem o que ela entende e espera de tal lugar: que seja bom

para rezar, ato constante que a velhinha segue, religiosamente, em seu cotidiano.

Tal igreja, no caso, é a excepcional Catedral de Chartres, na França, que

dispensa comentários acerca de sua importância. Mas, neste caso, para a

velhinha do exemplo, a qualificação pelo sentido a que Meneses chama de

“fruição cognitiva” mostra que, mesmo ela não tendo conhecimento especializado

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sobre a arquitetura daquele local, é capaz de apreender a “antiguidade” do

templo, e o que se encerra por trás disso. Das experiências acumuladas ao longo

do tempo, ao enraizamento e referências que acumula para o espaço da sua

cidade, legitima seu ato contínuo (o de rezar). É o uso, enfim, a participação e o

valor que ali se agrega que legitima, enfim, a importância e a permanência

daquele bem, dito cultural. É o lugar de oração, e pronto. Não apenas o de

visitação pública que ocorre ali, uma atração em destaque no roteiro de viagem.

Entende-se que o atrativo de determinadas áreas em que se encontram

bens protegidos, mesmo legítimo do ponto de vista econômico e da fruição do

saber, não deveria, ainda assim, provocar o descarte daquilo que, muitas vezes, é

do interesse do habitante local, que habita o que se entende por “espaço banal”,

lugar da coexistência do diverso que não pode ser visto sem suas conexões

sistêmicas com a totalidade, com a formação socioespacial (SANTOS, 2006).

Essas questões adquirem relevância, no Brasil, principalmente na década

de 1980, no contexto da abertura política que culmina com o final da ditadura

militar, e das reivindicações referentes ao “direito à memória”. Nesse período,

como lembra Rodrigues (2009), São Paulo e outros municípios passam a

estruturar os órgãos de preservação, período em que até mesmo o termo utilizado

para qualificar o patrimônio, “histórico-arquitetônico”, muda para “cultural”, e

temas como os valores intangíveis adquirem importância:

Tão em voga entre a década de 1970 e os anos 1980, o conceito de Patrimônio Ambiental Urbano parece ter sido deixado de lado nos debates mais recentes sobre patrimônio cultural, tendo sido preterido, no contexto internacional e no Brasil, pela discussão, nas últimas décadas, de conceitos como o de patrimônio imaterial e o de paisagem cultural. (SILVA; TOURINHO, 2015)

Com efeito, a discussão sobre o patrimônio imaterial vai ganhando espaço

e verifica-se o seu rebatimento na Constituição brasileira de 1988:

Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:

I - as formas de expressão;

I - as formas de expressão;

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II - os modos de criar, fazer e viver;

II - os modos de criar, fazer e viver;

III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas;

IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais;

V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.

Importante lembrar da ação precursora de Mário de Andrade, que já

percebia, na década de 1930, a importância dos aspectos intangíveis da cultura,

quando formulou o primeiro projeto de criação do SPHAN (Fonseca, 2001, p.

111), versão que não predominou então:

[...] Mário de Andrade já assinalara, na proposta entregue ao ministro Gustavo Capanema em 1936, que o patrimônio cultural da nação compreendia muitos outros bens além de monumentos e obras de arte.

Como explica Rodrigues (2009), é a partir da década de 1980, que essa

visão começa a se consolidar:

[...] o universo de bens protegidos não se restringiria ao que é material, mas abrangeria as manifestações intangíveis, como as devoções e os fazeres.

Além disso, os bens protegidos pelo poder público não são mais considerados como um conjunto simbólico de representações da Nação, mas como parte integrante da memória da sociedade ou, em uma perspectiva pragmática, como matéria-prima para o desenvolvimento de atividades turísticas, ou como fator de valorização de empreendimentos imobiliários. (RODRIGUES, 2009, p. 2)

A partir do momento em que surge a consciência do direito à memória da

sociedade, entende-se que esta passa a compor parte importante de “referências

pretéritas que integram a construção do presente” (RODRIGUES, 2009, p. 2). A

multiplicidade de “culturas particulares” é a mistura que integra a sociedade,

responsável, ela, por atribuir valores e sentidos aos bens que, por si só, “não têm

um valor intrínseco” (FONSECA, 2001, p. 112).

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Ao se falar em “referências culturais”, toma-se “uma concepção

antropológica de cultura” (FONSECA, 2001, p. 113), que abarca a materialidade e

“sentidos e valores atribuídos pelos diferentes sujeitos a bens e práticas sociais”

(FONSECA, 2001, p. 113). Importante essa noção, tendo em vista que, quando se

pensa em “dimensão simbólica”, considera-se que não bastaria salvaguardar

apenas monumentos e determinadas áreas isoladas, num resultado que

fragmenta todo um sentido de lugar, portanto, compromete de forma irreversível o

espírito daquele lugar:

Logo, quando não se trata de solo virgem, inexplorado, mas de regiões que têm história, tradições, ou seja, quando se trata de um solo “cultivado”, que tem cultura inscrita nele, pensar em uma intervenção, mesmo que seja com o objetivo de preservar o patrimônio, implica uma reorientação do uso desse solo. Trata-se de levar em conta um ambiente, que não se constitui apenas de natureza − vegetação, relevo, rios e lagos, fauna e flora, etc. − e de um conjunto de construções, mas, sobretudo, de um processo cultural [...] (FONSECA, 2001, p. 113).

Cabe lembrar que o próprio decreto que cria o sistema de preservação do

patrimônio no Brasil e o SPHAN, em 1937, já aponta a importância da paisagem,

mas é apenas em 2009 que a chancela da paisagem cultural foi criada pelo

IPHAN, através da Portaria Iphan nº 127/2009, adotando os termos do debate

internacional e estabelecendo as “interações significativas entre o homem e o

meio natural como paisagens culturais”.

Contudo, apesar da ampliação desses conceitos - como paisagem cultural,

patrimônio imaterial, referências culturais, por exemplo -, nas últimas décadas, no

Brasil, as políticas públicas de preservação de cidades como São Paulo ainda não

conseguiram incorporar estas discussões e traduzi-las em metodologias de

trabalho. A prova disto está na proteção municipal de edifícios e conjuntos com

enfoque majoritariamente material por meio do tombamento. Isto fica evidente na

análise sobre a abordagem de um bairro consolidado como a Mooca nas políticas

públicas municipais, mais recentes, de planejamento urbano e de preservação do

patrimônio, que é objeto do capítulo seguinte deste trabalho. Quanto ao conceito

de espírito do lugar, sua abordagem ainda é incipiente no Brasil, e não tem sido

objeto de discussão e prática pelo órgão municipal de preservação de São Paulo.

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CAPÍTULO 2

A Mooca nas políticas públicas recentes de preservação e planejamento

Na realidade, a prática da preservação não legitima simplesmente sentidos socialmente atribuídos pela cultura comum e cotidiana a determinados aspectos da cultura, mas põe em prática os critérios, as concepções e os valores que são defendidos por técnicos e especialistas (arquitetos, urbanistas, historiadores, arqueólogos, antropólogos e geógrafos, entre outros). Consequentemente, as decisões das instituições de preservação podem estar em desacordo – e não raramente estão – com os valores vigentes locais. (ARANTES, 2006, p. 427)

Além da revisão do Plano Diretor da cidade de São Paulo - então em

vigência desde 2002 -, em 2014, e da lei de zoneamento, em 2015, outas

propostas para a cidade ensejaram uma série de discussões recentes sobre as

políticas urbanas municipais, incluindo o tema da preservação do patrimônio

cultural.

Este capítulo aborda como a Mooca tem sido tratada nas políticas públicas

de preservação e de planejamento neste contexto.

O enfoque do aspecto material nas políticas dos órgãos do patrimônio tem

se mostrado insuficiente, conforme se verifica na abordagem do bairro da Mooca,

que tem sido objeto de tantas mudanças urbanas. A consideração dos aspectos

intangíveis para a proteção do ambiente urbano e da identidade local, conceitos

abordados e revistos até aqui, seria importante para a identificação de bens

culturais a preservar. O imaterial, ligado também aos sentidos de pertencimento,

não tem sido considerado nas decisões relativas às resoluções de tombamento

de bens culturais do bairro. A participação de atores sociais e de moradores nas

decisões sobre esses aspectos culturais, afetivos, históricos, praticamente

inexiste, cabendo a alguns poucos moradores fazer essas reivindicações sobre

patrimônio junto ao poder público.

O que vem mantendo esse aspecto afetivo em relação ao bairro tem mais a

ver com um jeito próprio que o mooquense tem para entender o lugar em que vive

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do que por algum tratamento específico por parte de especialistas ou gestores

públicos, como pode ser observado ao longo desta pesquisa.

O reconhecimento dos órgãos públicos de preservação do patrimônio de

que as permanências que ainda resistem na paisagem constituem um patrimônio

ambiental urbano único em toda a cidade não tem sido suficiente para conter as

demolições e descaracterizações para que o mercado imobiliário possa implantar

seus projetos, sem diálogo algum com essas preexistências.

Cabe afirmar que grande parte das mudanças ocorridas na cidade de São

Paulo, nas últimas décadas, estão diretamente relacionadas à descentralização

industrial iniciada nos anos 1950 e mais fortemente a partir dos anos 1990, que

levou parques industriais inteiros para municípios próximos ou distantes do centro

da capital. Importante lembrar que nos bairros fabris mais próximos da antiga

ferrovia Santos-Jundiaí, como Brás, Mooca, Belenzinho, essa dispersão industrial

trouxe também uma nova dinâmica que foi se acentuando com o aumento da

verticalização a partir dos anos 2000. A Mooca, objeto de estudo dessa pesquisa,

é um exemplo nítido e atual dessas mudanças acentuadas, ocorridas nas duas

últimas décadas. Isto deveu-se, em grande parte, ao fato de abrigar uma série de

indústrias de médio e grande porte, algumas das quais estão no mercado até hoje

(Antarctica/Ambev, Alpargatas, União/Nova América/Camil etc.), e que passaram

a fazer parte de uma nova ordem econômica, ao deixarem muitos desses locais

vazios ou subutilizados. Alie-se a isso uma dinâmica de ocupação da cidade

regida por um mercado imobiliário que passou a adotar uma política mais

agressiva para alavancar seus projetos (mudança de perfil socioeconômico,

necessidade de grandes terrenos para a implantação de complexos imobiliários, a

partir dos anos 2000, e a abertura de ações dessas incorporadoras para o

mercado financeiro). A Mooca também é conhecida por ter uma ampla oferta de

serviços e de comércio, boa infraestrutura, e estar bem próxima ao centro da

cidade.

Se, de um lado, a mudança de endereço gerou novas centralidades nos

locais aonde se instalaram, por outro acabou provocando o esvaziamento dos

bairros fabris como a Mooca, que passaram a conviver com a ameaça constante

de demolições e descaracterizações do tecido urbano histórico e social ali

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constituído, ao longo deste período até os dias atuais. Áreas de grandes

proporções, muitas delas subutilizadas, geraram o interesse crescente do

mercado imobiliário, que precisava de terras que pudessem valorizar

rapidamente, em lugares estratégicos, como no Centro Expandido, dotado de

infraestrutura e boa rede de transportes.

Se o planejamento urbano busca hoje uma cidade mais voltada aos

cidadãos que nela vivem, abrindo novas perspectivas pouco imaginadas como a

participação nas decisões sobre o marco regulatório das políticas públicas

municipais, seja pela revisão do plano diretor estratégico do município, aprovada

em 2014 (PDE, Lei n. 16050/2014)13, ou pelas discussões mais recentes sobre o

Projeto de Lei que regula o instrumento Operação Urbana Bairros do

Tamanduateí (em tramitação na Câmara Municipal de São Paulo), é de se pensar

que se possa garantir também a fruição desses bens culturais que transmitem um

período da história da cidade, com a salvaguarda de um patrimônio cada vez mais

abandonado e desvalorizado. Tais iniciativas permitiriam conciliar o antigo e o

novo de maneira harmoniosa, a fim de que um bairro como a Mooca, considerado

histórico, tradicional e único, permanecesse na paisagem, não apenas no

imaginário coletivo das pessoas.

13

Essa lei aprova a Política de Desenvolvimento Urbano e o Plano Diretor Estratégico do

Município de São Paulo e revoga a Lei nº 13.430/2002. Foi aprovada no dia 30 de junho de 2014 e

sancionada em 31 de julho do mesmo ano.

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2.1 Política pública de preservação: a identificação do patrimônio da Mooca

Ao se analisar o que até hoje foi considerado como passível de tombamento no

bairro da Mooca, percebe-se, claramente, que o entendimento sobre o que é

patrimônio não saiu da escala do tangível, do imóvel construído, sem contar que,

mesmo aqueles que mereceriam um olhar especial e a preocupação em preservá-

los, acabaram sendo demolidos como é o caso de toda a área que abrigava o

Hipódromo da Mooca, nas ruas dos Trilhos, Bresser e Taquari, nada mais

restando de sua fachada e das arquibancadas. Também a Cia União dos

Refinadores, fabricante do Açúcar União e do Café Caboclo, teve o mesmo fim,

como será mostrado adiante, restando apenas a chaminé no meio do condomínio

que foi construído naquela área, comprometendo toda uma paisagem cultural do

local. Próximo dali, a Máquinas Piratininga e casas padrão de operários da fábrica

deram lugar a outro conjunto de prédios. O depósito dos Matarazzo também foi

totalmente demolido, bem ao lado do Moinho Santo Antonio (Minetti-Gamba) -

bem protegido por tombamento -, e que ainda assim corre o risco de ser

totalmente desfigurado, transformando inclusive a paisagem natural daquele local

que remete à configuração inicial da várzea do Tamanduateí, às margens da orla

ferroviária remanescente da São Paulo Railway, primeira companhia férrea de

São Paulo.

Figura 1 – Demolição das fábricas (nov. 2016). Grande vazio urbano na Borges de Figueiredo com a demolição da fábrica dos Matarazzo, desde 2015. Ao fundo, o complexo da Antarctica. Fonte: acervo da autora.

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Figura 2 – Matarazzo por dentro (nov. 2016). Condomínio desistiu da ocupação por conta do solo contaminado. Foto: acervo da autora.

Figura 3 – Patrimônio na Borges de Figueiredo (Nov. 2016). Ao lado do terreno da antiga fábrica dos Matarazzo, outro prédio em franca deterioração, encontra-se pichado e destelhado. Fonte: acervo da autora.

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Figuras 4,5 e 6 – A orla ferroviária além Tamanduateí (Nov. 2016). As fotos mostram o terreno por detrás das fábricas, pela visão do Viaduto São Carlos, e a composição ferroviária remanescente da São Paulo Railway. São imagens que permitem vislumbrar o

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desenho original dessa parte da cidade. Ao fundo, na 3ª. foto, os galpões da Bremensis. Fonte: acervo da autora.

Figura 7 – Moinho Santo Antonio/Minetti-Gamba (Nov. 2016). Patrimônio duplamente tombado, segue fechado com perigo dessa área ser totalmente descaracterizada. Fonte: acervo da autora.

Estudos acadêmicos aprofundados já se debruçaram sobre esse e outros

temas pertinentes à importância que um bairro com essa configuração

socioespacial teve para a história da cidade, uma história referencial para

entender o advento da imigração, das ferrovias, do trabalho nas fábricas e da

formação das mesmas, bem como de uma série de passagens significativas que

marcaram para sempre a vida de seus moradores e, em alguns casos, os rumos

da cidade e do país.

Um estudo realizado por técnicos do DPH, órgão de preservação do

município, afirma que:

Quando os bens se encontram historicamente inseridos no meio urbano, isto é, construído, não parece inadequado considerar que já tenham estabelecido relações suficientemente profundas com seu entorno de modo a torná-los inseparáveis. Nesse caso, um bem urbano existiria em si e ao mesmo tempo em relação ao ambiente que o envolve. Assim, num lugar urbano de reconhecida historicidade, se poderia dizer que a teia de relações constituída entre ambos ao longo do tempo sugere tal interatividade que qualquer intervenção que se venha a

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efetivar no bem ou em seu entorno introduziria, naturalmente, um elemento de instabilidade numa situação de conquistado equilíbrio. (DPH, 2008, p. 3)

Ainda que nesse trecho, o “Re-Estudo da área envoltória dos galpões

industriais em torno da Estação da Mooca” (constante do Processo Administrativo

nº 2008-0.141.892-1) esteja relacionando o bem cultural à sua área envoltória,

nota-se o reconhecimento de que qualquer intervenção que desconsidere as

relações previamente estabelecidas desestrutura não apenas o ambiente físico do

local, como os significados e significâncias que ali foram sendo construídos ao

longo do tempo, dos habitantes locais com o meio em que vivem e convivem.

Esse documento sucedeu o estudo que foi feito, em maio de 2007, para

orientar o processo que originou o tombamento de galpões industriais

remanescentes à Rua Borges de Figueiredo, ao longo da via férrea, chamado

pelos técnicos de “Estudo do entorno da estação da Mooca e área envoltória”

(constante do Processo Administrativo nº 2007-0.162.678-6). No primeiro estudo,

pode ser conferido o histórico do bairro e suas transformações, como estavam as

discussões do Plano Regional Estratégico da Mooca, naquela época, e a

operação urbana antes conhecida como Operação Urbana Diagonal Sul, com

propostas bem diferentes do que ficou elencado para a versão atual, a OUC

Bairros Tamanduateí. Foi realizado, no estudo, a análise de toda a área ao longo

da ferrovia, as fábricas que ali se estabeleceram, desde a pioneira Cervejaria

Bavária, ocupada posteriormente pela Cia Antarctica Paulista, bem como a

análise sobre a Borges de Figueiredo, dando por fim o seu parecer sobre o

patrimônio ferroviário-industrial do bairro da Mooca. O objetivo, neste capítulo,

não é o de se debruçar sobre uma análise aprofundada acerca de cada item ali

elencado, bem como os que se sucederam no referido reestudo, solicitado pelo

Conpresp. O que se percebe nesses dois documentos é a importância de uma

área abrangente no entorno da ferrovia, e a relevância de toda aquela

configuração para o patrimônio ambiental urbano ali constituído, bem como para o

desenho da cidade e até aspectos da paisagem natural. Interessa observar que

ambos os documentos atestam a necessidade de se preservar toda aquela área

significativa, única em sua configuração, “da configuração de uma situação

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urbana peculiar que detém ainda hoje um conjunto arquitetônico-ferroviário-

industrial representativo do início da industrialização de São Paulo” (DPH, 2008,

p. 34).

No estudo, não faltam referências e análises precisas que mostram e

confirmam a importância, enfim, de todo aquele sítio remanescente, bem como de

se considerar a fruição do morador, ele sim o detentor de saberes e fazeres que

marcam a paisagem e imprimem características únicas, que só a cotidianidade é

capaz de valorizar e perceber.

O trecho a seguir mostra a questão do tempo, das marcas deixadas que

fazem bem à memória e que, de um certo modo, permitem que o indivíduo se

situe:

[...] certas permanências se fazem necessárias porquanto suscitam indagações, dizem coisas e requerem respostas, estabelecendo uma espécie de diálogo primordial com o tempo. Dos transtornos de memória creditados a um constante refazer-se parece derivar a importância de um certo reconhecimento para fixação de valores capazes de colocar a situação presente em relação com a história da cidade, da sociedade, recompondo a ideia de uma dignidade do fazer. Para além então, da qualificação da memória social do espaço construído, talvez valesse considerar ainda, e de uma perspectiva social, a hipótese de não perder de vista a memória precisa do território geográfico, do sítio original sobre o qual a cidade de São Paulo está assentada. (DPH, 2008, p. 76)

Quando remete-se ao que o reestudo de tombamento expõe como

problemática gerada com o excesso de verticalização desordenada, fica claro que

o referido órgão propôs a manutenção daquela área a partir da ferrovia, por se

tratar “de uma ocupação urbana típica de um passado fabril” (DPH, 2008, p. 14),

pela horizontalidade do lugar que “chama realmente a atenção para a vida que se

desenvolve no nível da rua”. Como “cenário vigente” (p.15) e uma série de outros

qualificativos e destaques que merecem ser conhecidos desse estudo. Seja pelo

destaque na paisagem e por tudo já exposto, é que se recomendou o

“reconhecimento e regulamentação”, em caráter de urgência, “de um perímetro

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mínimo capaz de controlar o avanço das construções que possam comprometer a

visibilidade daquele conjunto” (DPH, 2008, p. 19):

[...] há uma unidade cultural de signo fabril nas relações estabelecidas entre os galpões tombados e as habitações remanescentes e seus moradores, assim como com o pequeno comércio local, [...] com os outros edifícios industriais instalados posteriormente nas redondezas. Trata-se de uma relação de conquistado equilíbrio estabelecida entre bens reconhecidos como valores culturais da sociedade e a manutenção de valores consonantes em suas proximidades.

A recomendação desses estudos, por fim, mesmo sendo o de estancar de

algum modo, o avanço de prédios de qualidade arquitetônica duvidosa, que

desconsideram “os valores do bairro, da rua, do lugar”, tornando-se “interferências

na paisagem local”, não é, necessariamente, o que prevaleceu na resolução final

de tombamento dos galpões da ferrovia e da Borges de Figueiredo, que

considerou, no final, um conjunto de sete galpões com face para a ferrovia e/ou

para a referida rua, com restrição de gabarito “caso a caso, desde que não

exceda o limite máximo de até 25 metros de altura”. O artigo 3º da referida

Resolução dispõe sobre a “área envoltória de proteção”, tratada também caso a

caso.

Após os estudos serem apresentados e as discussões terem reconhecido

uma mancha urbana significativa na Rua Borges de Figueiredo e na Avenida

Presidente Wilson, do outro lado da linha de trem - que constitui um grande

acervo do patrimônio ambiental urbano da cidade, e que já vinha sendo alvo de

disputas acirradas por parte do mercado imobiliário -, é que o conselho municipal

de preservação, o Conpresp, decidiu pelo tombamento dos galpões

remanescentes desse período e de sua área envoltória (Resolução nº

14/CONPRESP/2007)14.

O objetivo seria o de preservar essas características históricas que são o

testemunho ainda vivo da primeira industrialização da cidade de São Paulo, junto

14

Para saber mais detalhes dessa Resolução de Tombamento, acessar o site do Conpresp (vide referências finais).

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à ferrovia remanescente do antigo ramal ferroviário da São Paulo Railway, com

antigas instalações industriais e armazéns de matérias primas e mercadorias de

grande relevância em todo esse processo de industrialização ocorrido em São

Paulo, expressivamente no final do século XIX e início do XX.

O mapa a seguir mostra a abrangência da área envoltória dos galpões

tombados pelo Conpresp:

Figura 8 – Mapa do tombamento de galpões na Rua Borges de Figueiredo. O traçado do mapa mostra o perímetro protegido e a abrangência da área envoltória dos galpões que foram escolhidos. Fonte: CONPRESP.

Mesmo com todas as recomendações que os dois estudos técnicos

apresentaram, nota-se, então, que o conselho municipal de preservação optou

pelo tombamento pontual de determinados galpões e por uma área envoltória

bem menos abrangente do que o recomendado nos estudos.

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2.2 Política pública de planejamento: a Operação Urbana Consorciada

Bairros Tamanduateí

Entende-se que, em princípio, os instrumentos de requalificação urbana

previstos no atual Plano Diretor da cidade de São Paulo, bem como a implantação

das operações urbanas, das quais a Operação Urbana Consorciada Bairros do

Tamanduateí (OUCBT) é o objeto principal desse estudo, já que abrange o

território da Mooca, devam ser considerados como avanços sobre as políticas que

visam o crescimento e o desenvolvimento urbano da cidade, com foco na

qualidade de vida. E ao incluírem em suas premissas de projeto de lei, em

andamento na Câmara Municipal de São Paulo (CMSP), itens que falam de

preservação e de requalificação de bairros históricos, poderia ser um passo

importante para a integração entre planejamento urbano e preservação. Contudo,

veremos adiante, que esta oportunidade vem se perdendo.

O presente capítulo, portanto, visa analisar como a Mooca tem sido

abordada na OUCBT, operação urbana em curso na cidade, que abarca parte dos

distritos do Cambuci, Mooca, Ipiranga e Vila Prudente. Compreender, portanto,

como é o tratamento específico da Mooca como bairro histórico, que demanda um

olhar diferenciado sobre suas permanências e o que resta de seu patrimônio. Tal

operação, que passa por bairros importantes da cidade, tem como objetivo

promover o desenvolvimento socioespacial e a requalificação urbana que se

pretende que aconteça na cidade hoje, especialmente em bairros antes fabris

como a Mooca, que cresceu às margens da ferrovia, e vêm sendo alvo constante

do mercado imobiliário, de demolições e descaracterizações do tecido urbano

histórico e social constituído. Desta forma, justifica-se a importância de se incluir

esses referenciais de estudos e proposições que foram, também, objeto de

discussões realizadas em audiências públicas que geraram o projeto de lei da

Operação Urbana Consorciada Bairros Tamanduateí, o PL do Executivo nº

723/2015, que hoje tramita na CMSP.

Novos modelos de gestão urbana vêm sendo pensados nas duas últimas

décadas, tendo por base a preocupação com o desenvolvimento sustentável de

toda a cidade.

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No âmbito da política urbana municipal, o Plano Diretor Estratégico (PDE,

Lei 16.050/14) e a Lei de Zoneamento (PL 272/2015)*RODAPÉ - O Projeto de Lei

(PL 272/2015) é uma revisão da Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo,

também chamada de Lei de Zoneamento. oferecem diretrizes e instrumentos para

se encarar esse desafio de forma pactuada com a sociedade. Entre os

instrumentos apontados para fazer essa nova dinâmica tornar-se realidade estão

as operações urbanas, cujo objetivo é realizar a reestruturação urbana de uma

porção do território previamente definida a partir do estabelecimento de parcerias

público-privadas.

A Operação Urbana Consorciada, de responsabilidade da SP-Urbanismo,

ligada à Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano, é um instrumento de

intervenção pública regulado pelo Plano Diretor (PDE, Lei 16.050/2014) com base

no Estatuto da Cidade (Lei 10.257/2001), lei federal que regulamenta o capítulo

'Política Urbana' da Constituição Federal, detalhando e desenvolvendo os artigos

182 e 183, sobre a função social da propriedade.

O instrumento da Operação Urbana, por sua vez, estabelece uma

regulamentação urbanística específica e incentivos ao adensamento populacional

e construtivo para um perímetro previamente definido. Para melhor entender esse

instrumento, destaca-se o artigo 32 do Estatuto da Cidade, com a seguinte

definição:

Considera-se operação urbana consorciada o conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Público municipal, com a participação dos proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados, com o objetivo de alcançar em uma área transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e a valorização ambiental.

Maricato (2002, p. 1) lembra que o instrumento da Operação Urbana

Consorciada já apareceu em vários momentos da política nacional, com nomes e

configurações bem diversas das apontadas hoje nos Planos Diretores de cidades

brasileiras. Em São Paulo, passou por diversas administrações paulistanas, das

mais diferentes ideologias, como as de Mário Covas, Jânio Quadros, Paulo Maluf,

Celso Pitta e Marta Suplicy.

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As Operações Urbanas, especificamente as que estão localizadas ao longo

do eixo ferroviário, incidem principalmente em áreas atualmente, com grande

potencial de desenvolvimento urbano, próximas a zonas dotadas de ampla

infraestrutura, por isso sua definição como territórios estratégicos pontuados no

mapa do PDE, e nos planos regionais dos bairros como áreas de interesse para o

adensamento da cidade.

As primeiras operações urbanas surgem, em São Paulo, no projeto de lei

do para seu Plano Diretor em 1985 e estavam voltadas para o maior

aproveitamento econômico da cidade, explorando uma prática que se tornou

recorrente: a da expansão urbana baseada exclusivamente na construção nova

sem pensar nenhuma forma de recuperar ou requalificar a estrutura já existente

da cidade (BALBIM, 2011, p. 90). É Maricato (2002) que expõe sobre o ''elemento

motivador'' dessas operações urbanas: o capital imobiliário que visa atender

demandas dos setores de alta renda, bem como da indústria da construção civil,

ávida por novas construções como forma de expandir seus negócios:

Em primeiro lugar, o elemento motivador dessas operações urbanas não é um plano urbanístico mais amplo elaborado pelo Poder Público e no qual se encaixe a necessidade de uma parceria para revitalização urbana dentro de prioridades por ele estabelecidas, ou ainda um estudo das demandas urbanísticas oriundas da sociedade civil, mas simplesmente uma resposta a demandas do setor imobiliário. (MARICATO, 2002, p. 10).

Com o passar do tempo, especialmente quando o Estatuto da Cidade foi

instituído em 2001, essa lógica perversa foi assumindo outros parâmetros que

não apenas o do interesse imobiliário, incorporando dispositivos para que o

instrumento de fato contribua com a qualificação urbana de áreas em

transformação.

A Operação Urbana Consorciada Bairros do Tamanduateí

Conhecida, atualmente, como Operação Urbana Consorciada Bairros

Tamanduateí (OUCBT), a proposta dessa Operação Urbana (PL 723/2015), cujo

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nome faz referência a um dos principais rios da cidade de São Paulo, o

Tamanduateí, abarca os bairros que se desenvolveram ao longo de seu curso, e

tem origem nos primeiros estudos da Operação Urbana Diagonal Sul, prevista

pelo Plano Diretor Estratégico de 2002 (Lei nº 13.430, de 13/09/2002) com

desenvolvimento realizado pela antiga Secretaria Municipal de Planejamento

(SEMPLA). A partir de 2012, rebatizada de Operação Urbana Mooca-Vila Carioca,

a operação passa por novos estudos urbanísticos realizados pelo consórcio

CMVC, contratado pela Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano (SMDU,

anteriormente SEMPLA), para trazer mais subsídios ao projeto. Rebatizado de

Operação Urbana Consorciada Bairros do Tamanduateí, o projeto atual trata de

um conjunto de ações e estratégias urbanísticas, sociais, ambientais e

econômicas formatadas sob as orientações do atual Plano Diretor do Município

(PDE, Lei 16.050/2014), junto à Macroárea de Estruturação Metropolitana (MEM),

um dos elementos estruturantes do ordenamento territorial de um território que

está sendo denominado de Arco Tamanduateí, especificamente no setor histórico

do desenvolvimento industrial da cidade, da orla ferroviária e fluvial, qualificado

como um ''território de estruturação de suas redes de infraestrutura (como

hídricas, ambientais, viárias e de mobilidade)15''.

A proposta da Macroárea de Estruturação Metropolitana mostra ser, antes

de uma ação prática, o reconhecimento, ainda que um tanto tardio, de que a

cidade de São Paulo se articula, dentro da região metropolitana em que está

inserida, nos meandros dos eixos não apenas viários e rodoviários, mas também

dos ferroviários, e das planícies fluviais dos Rios Tietê, Pinheiros e Tamanduateí,

estes últimos, esquecidos com o passar dos anos, degradados também, com

problemas sérios a serem enfrentados quanto à sua recuperação para que

possam vir a ser referência na paisagem, outra vez, e não sejam mais vistos pela

população como esgotos a céu aberto. Outro grande desafio a longo prazo é a

manutenção da ferrovia em nível, enfrentando o desafio de sua transposição.

15

Conforme Minuta do Projeto de Lei da OUCBT, p. 3 e 16.

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Figura 9 - Mapa das Macroáreas da Operação Urbana Consorciada Bairros do Tamanduateí. Fonte: GESTÃO URBANA.

No Projeto de Lei da OUCBT, há uma parte que trata das ''Estratégias de

desenvolvimento do PUE, Plano Urbanístico Específico desta Operação Urbana''

(p. 22-25), em que se pontuam os elementos fundamentais na conformação

desse território, o Rio Tamanduateí e a ferrovia.

A partir do rio, desdobram-se os temas dos alagamentos, da drenagem e da degradação ambiental das orlas fluviais. A ferrovia arrasta as questões do patrimônio fabril e ferroviário, da

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segmentação dos bairros e as indagações sobre o futuro dos espaços produtivos a ele associados.

Seria, segundo o mesmo documento, um projeto urbanístico composto por

um ''programa de intervenções públicas e por parâmetros urbanísticos que geram

a requalificação das orlas fluviais, o atendimento habitacional, a melhoria das

conexões interbairros e a qualificação do habitat urbano''. Dentre, ainda, as

diretrizes que compõem a Operação Urbana está o aumento dos índices de áreas

verdes, por meio de arborização urbana, implantação de novos parques, bem

como a melhoria do sistema de drenagem do solo, como estratégia ambiental

necessária para minimizar as ilhas de calor pelo excesso de construções e a falta

de verde, bem como para facilitar a absorção das chuvas e evitar enchentes e

alagamentos na região. Está no texto da Minuta e faz parte da lista de melhorias

urbanísticas e ambientais, um programa de preservação dos territórios produtivos

da região existentes ao longo da ferrovia e das indústrias, bem como a

valorização do patrimônio da cidade voltado ao trabalho e à história.

Figura 10 – O Patrimônio ao longo do Rio Tamanduateí. Os desenhos mostram o território, a partir da orla do Rio Tamanduateí e da ferrovia, e a identificação do patrimônio nas diversas áreas da OUCBT. Fonte: SP-URBANISMO.

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Figuras 11 – Espaços produtivos ao longo do Rio Tamanduateí. Mapa do território lindeiro ao Rio Tamanduateí mostra os espaços produtivos considerados na OUCBT. A Mooca foi dividida em três áreas, sendo o Polo Criativo aquele apontado na região de maior concentração do acervo industrial-ferroviário da região, na Borges de Figueiredo e Estação Mooca de trem. Fonte: SP-URBANISMO.

O território de abrangência da OUCBT engloba, juntamente com a Mooca,

mais quatro bairros: Cambuci, Ipiranga, Vila Carioca e Vila Prudente, dividido em

setores, como mostra o mapa a seguir.

Figura 12 - Mapa dos setores e subsetores da Operação Urbana Consorciada Bairros do Tamanduateí. Fonte: SP-URBANISMO.

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O objetivo dessas subdivisões seria o de tratar de forma específica as

particularidades existentes no perímetro da Operação Urbana quanto à

distribuição espacial da população, das atividades econômicas e sociais, da oferta

de infraestrutura e de serviços urbanos de sua área de abrangência. (SP-

URBANISMO, 2016, art. 4º., cap. 1, p. 28)

A divisão da extensa área de 1.668 ha (hectares16) da OUCBT parece

trazer a preocupação em tratar cada um desses trechos pelas características que

o tempo marcou na história desses bairros. Assim, a Mooca aparece como ''Polo

Criativo'', e a região do Sacomã, a partir da Avenida Henry Ford, como ''Polo

Logístico''. Ainda no artigo 4º do capítulo 1 do Projeto de Lei, há três parágrafos

que listam os eixos estruturantes dessas divisões:

Eixos de Qualificação: Tamanduateí, Moinho Velho e Alcântara Machado,

que formam o chamado Perímetro Incentivado.

Os Subsetores Independência, Juventus, Amadis, Ibitirama e Paes de

Barros constituem os Perímetros Consolidados.

Após a fase de elaboração da “Minuta Participativa da OUCBT”, o Projeto

de Lei incorpora alguns de seus comentários e parece trazer avanços quanto ao

tema patrimônio, preservação, requalificação, de forma ainda um tanto

abrangente e superficial, porém, pontual em sua redação, como o trecho

reproduzido da Seção IV do Capítulo I, em seu artigo 5º, que trata dos objetivos

gerais, das diretrizes específicas e das estratégias de transformação urbanística:

VII. Incentivar a preservação do patrimônio histórico, cultural e ambiental urbano. (SP-URBANISMO, 2016, p. 9)

Das estratégias elencadas na referida Minuta (SP-URBANISMO, 2016, p. 9

e 11) que possuem um viés urbanístico voltado à preservação histórica dos

bairros que fazem parte de operação, está:

Qualificar os caminhos históricos e avenidas junto aos rios - item 4 que

destaca a qualificação da vida urbana dos bairros;

16

Um hectare corresponde a uma área com 10 000 metros quadrados.

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Adquirir edifícios tombados, com restauro e reconversão, para uso voltado

à Economia Criativa, no Setor Mooca - item 6 para ''reorganizar as

dinâmicas metropolitanas e promover a economia'' nessa parte da cidade.

O item 9 que trata, em sua totalidade, da ''preservação do Patrimônio e da

valorização das iniciativas culturais'', expõe as seguintes estratégias para tratar as

presenças históricas significativas na cidade:

Destinar 4% dos recursos para preservação de bens tombados;

Adquirir imóveis tombados para restauro e reconversão de usos, em

especial para atividades ligadas à Economia Criativa;

Incentivar a preservação de bens culturais através da transferência de

potencial construtivo;

Controlar o gabarito e o tamanho dos terrenos dos novos

empreendimentos no Subsetor Hipódromo;

Recuperar o eixo perspectivo da av. D. Pedro I e as simetrias da Praça do

Monumento para visibilidade e destaque do Monumento à Independência.

(SP-URBANISMO, 2016, p. 14).

Na redação desse importante item para as questões de preservação do

Patrimônio na cidade, destaca-se:

''As ações da OUCBT buscam reservar e enfatizar essas presenças históricas, em ações pontuais de recuperação e projetos urbanos de recomposição paisagística''. (SP-URBANISMO, 2016, p. 14).

O mapa a seguir, de Bens Culturais Protegidos da área compreendida na

abrangência da OUC Bairros Tamanduateí, mostra 16 itens de bens protegidos

e/ou em processo de análise de tombamento, no caso da Mooca, além dos

demais bairros abrangidos:

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Figura 13 – Mapa de bens culturais na OUCBT. O mapa VI que consta na Minuta do Projeto de Lei 723/15, referente à OUC Bairros Tamanduateí, apresenta todos os bens protegidos e em processo de tombamento - lotes mais escuros -, das áreas de abrangência dessa operação urbana. Fonte: GESTÃO URBANA.

Os 16 itens de bens culturais da Mooca que aparecem no mapa foram

listados a seguir, junto com o status do processo de resolução, para melhor

compreensão da questão:

RELAÇÃO DE BENS PROTEGIDOS17

1. Grupo Escolar Oswaldo Cruz (CONDEPHAAT - SC.60/10)

2. Chaminé das antigas instalações da Companhia União de Refinadores

(CONPRESP - RT.05/10) 17

As siglas que aparecem nos documentos se referem a:

-RT – Resolução de Tombamento – quando o imóvel já está tombado;

-APT – Abertura de Processo de Tombamento – ainda não protegido, o bem aguarda definição dos órgãos

responsáveis.

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3. 3.1.Conjunto de galpões das Antigas Officinas da Sociedade Anônima

Casa Vanorden, 3.2 e 3.3 Grandes Moinhos Minetti Gamba; 3.4 Conjunto de

galpões R. Borges de Figueredo nº 964 a 1084; 3.5 Antigo conjunto de depósitos

para café, posteriormente pertencentes à CEAGESP; 3.6 Antigo Conjunto da

Sociedade Técnica Bremensis e Schmidt Trost; 3.7 Conjunto de armazéns da

antiga São Paulo Railway; (CONPRESP - RT.14/07, CONDEPHAAT -RT.SC.

31/13)

4. Conjunto de fábricas: Fósforos Fiat Lux, Duchen e Indústrias Reunidas

Francisco Matarazzo (CONPRESP - RT.19/11)

5. Antigo orfanato Casa da Divina Providência - Casa da Roda

(CONPRESP - APT.14/14)

6.Fábrica de Tecidos Labor (CONPRESP - APT.14/14 - CONDEPHAAT -

SC101/14)

7.Casas operárias da Rua Barão de Jaguara (CONPRESP - APT.14/90)

8. Antigos Armazéns Gerais Piratininga (CONPRESP - APT.16/11)

9.Residências - Rua dos Trilhos (CONPRESP - APT.14/14)

10.Antiga Creche Marina Crespi (CONPRESP - APT.03/10)

11.Estádio Conde Rodolfo Crespi (CONPRESP - APT.14/14)

12. Pizzaria São Pedro (CONPRESP - APT.14/14)

13. Antigo Cotonifício Crespi (CONPRESP - APT.14/14)

14. Companhia Antarctica Paulista - antiga Cervejaria Bavária

(CONPRESP- APT.09/07)18

41. Teatro Arthur de Azevedo (CONPRESP – RT. 29/92)

42. Grupo Escolar Pandiá Calógeras (CONPRESP – APT. 14/14)

18

A Cia Antarctica Paulista foi a única mudança ocorrida posteriormente à publicação do mapa,

com a publicação de sua resolução de tombamento (CONPRESP - RT.19/16), em 13 de setembro

de 2016 (cf. DOC, p. 44). Na versão oficial encontrada na página da Gestão Urbana da Prefeitura,

não havia sido feita a alteração até a conclusão final desse trabalho.

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Cabe ressaltar que a inclusão do referido mapa de bens protegidos no

perímetro da OUCBT no projeto de lei se deu por meio de reivindicação feita por

grupo de moradores ligados ao patrimônio, durante uma das audiências públicas

realizada no bairro da Mooca, anunciada posteriormente na audiência devolutiva

da OUCBT. Importante lembrar, também, que em toda a Minuta e nos mapas

referentes aos territórios de cultura e bens protegidos, no caso da Mooca,

aparece apontado apenas a Fábrica de Tecidos Labor, localizada na Rua da

Mooca e que não se encontra tombada até o presente momento, além do

conjunto de galpões das ‘Antigas Officinas da Sociedade Anônima Casa

Vanorden’, e imóveis conjugados à Estação Mooca, do lado da Avenida

Presidente Wilson - que o PL da OUCBT denomina de ‘Porto de Areia’, devido ao

uso do local por uma mineradora denominada AB Areias, no número 557, e que

está apontado para ser transformado num parque linear.

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Figuras 14 e 15 – Fábrica de Tecidos Labor em dois momentos. A fachada na Rua da Mooca e em foto mais antiga, o belo portão de entrada e a casa do administrador, ambos ainda preservados. (Fonte: ACERVO PORTAL DA MOOCA, s/d)

O principal problema que se verifica nesse projeto de lei é o que seria, de

fato, a definição do que é patrimônio na área em questão, o que ficou para uma

discussão posterior, ou seja, após a elaboração do projeto urbanístico básico, que

fundamenta a proposta para a área. Isto demonstra um contrassenso, uma vez

que já existe um projeto urbanístico tramitando na CMSP, que não dispõe,

claramente, sobre o que é considerado patrimônio na área. Ao não considerar os

bens culturais passíveis de preservação no projeto urbanístico, e apenas dispor

que cabe ao Departamento de Patrimônio Histórico (DPH) definir, posteriormente,

por meio de inventário, esses bens, provoca uma situação vaga, que não é

tratada no momento oportuno, concomitante à discussão da elaboração de lei

específica para a área.

Para conhecimento, segue o item que consta no capítulo 5 da referida

Minuta (SP-URBANISMO, 2016, p. 46), que trata da gestão da OUCBT, na Seção

II, referente à “atuação concertada dos órgãos e entidades municipais”:

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Art. 71. Caberá ao Departamento de Patrimônio Histórico, da Secretaria Municipal de Cultura, a elaboração de inventário de bens de interesse de preservação, bem como o acompanhamento e orientação dos estudos promovidos pela BTSA para intervenções urbanísticas em que seja necessário a valorização da paisagem cultural ou a restauração e readequação de edificações de interesse histórico, públicas ou privadas.

Conforme fica evidente, os bairros do Tamanduateí não foram

considerados como um todo, nos aspectos que conferem identidade a esses

lugares, mas, sim, em seus elementos tombados de forma separada. Com isto,

perde-se a oportunidade de considerar, em seu conjunto, a geografia original da

várzea do Tamanduateí que ainda é possível vislumbrar no eixo ferroviário da

Mooca, a partir da visão que se tem do Viaduto São Carlos.

São Paulo vive hoje duas lógicas extremas que o PDE e seus instrumentos

urbanísticos pretendem reverter: de um lado, a necessidade de reabilitar áreas

centrais dotadas de infraestrutura, com adensamento e implantação de

equipamentos públicos, e todos os problemas que podem e devem ocorrer com

medidas pouco aceitas pela sociedade, e de outro, fomentar, através dessas

políticas públicas urbanas, a geração de renda e o emprego em regiões mais

periféricas, outro enorme desafio.

No meio dessas discussões, encontra-se a questão da preservação do

patrimônio cultural dessas áreas, constituído de um acervo remanescente da

primeira industrialização paulistana, datada do final do século XIX e início do

século XX, que demanda um tratamento diferenciado, com base nas cartas

patrimoniais, mas também nos estudos já existentes realizados por técnicos do

DPH, por exemplo, que contribuem para que se entenda o valor desses sítios

históricos, a importância de suas permanências, num diálogo mais do que

possível entre o passado e o presente da cidade.

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CAPÍTULO 3

A Mooca e o espírito do lugar: memória, identidade e pertencimento

3.1 Patrimônio ambiental urbano e o espírito do lugar

A Mooca parece possuir, no imaginário coletivo, um certo encanto19 que

ainda ecoa, mesmo em uma paisagem já transformada com edifícios verticais,

restaurantes e estabelecimentos comerciais em profusão, mini empresas tipo call

center, entre outras mudanças.

Deparamo-nos, muitas vezes, com a ideia de que a Mooca “é um estado de

espírito”:

Figura 16 – Enquanto isso, na Mooca. Fonte: imagem de Facebook – página de Moisés Naif.

Tem gente que acha que é mooquense só porque usa a camisa grená do Juventus e porque come canolis

Sabe de nada inocente !!!

Não sei se ela começa na Av Paes de Barros ou termina na San Genaro.Não sei se conheço ela pelo começo da Rua da Mooca ou se as lembranças começam pelo Rua do Oratório com a Orfanato.

Mas sei que a esquina da minha casa foi a melhor curva de rio do Brasil

Bairro de briguentos que quebravam qualquer um folgado do Tatuapé, Vila Carioca, Industrial, Guarujá, Bragança ...até nos EUA !!!

[...]uma coisa eu sei...a Mooca é um estado de espírito !!!

Aqui eu vivo e respiro...

Aqui tenho a minha família...

[...]Não se fala em bairro, mas sim em uma família...com vários pais, irmãos,tios, primos,sobrinho e até alguns tios-avós [.....]..da geração de + - 65 até 85, todo mundo que nasceu ou despencou na Mooca se conhece por adoção, paixão ou ódio...por isso somos uma família.

(MOISÉS NAIF, morador, em sua página do Facebook. Disponível em: https://www.facebook.com/photo.php?fbid=1257729190915963&set=a.619810748041147.1073741834.100000366824618&type=3&theater)

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A respeito desta noção de encantamento, ver Yázigi (2013).

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Esta ideia do espírito da Mooca traduziu-se, inclusive, em projeto de lei (PL nº

878/2016), visando à proteção do patrimônio imaterial do bairro recentemente

apresentado na Assembleia Legislativa pelo deputado Chico Sardelli (PV),

também corregedor geral da mesma entidade:

Declara como Patrimônio Cultural Imaterial do Estado, os costumes, o esporte, as manifestações culturais e a gastronomia do bairro da Mooca, na Capital. (PL 878/16, 6 dez. 2016)

Conforme se verifica, o objeto do referido projeto de lei é bastante amplo e de

complexa identificação.

Mais adiante, a justificativa do projeto expõe:

Com o intuito de preservar o que restou da historia Mooquense, destacamos o cidadão José Américo Crippa Filho que, junto com outros moradores da região, iniciaram o projeto “Distrito Mooca” em parceria com a iniciativa privada e os órgãos públicos visando promover ações de proteção da Mooca, seus imóveis e sua historia.

A Mooca, com seus 7 Km² de área e sua população com mais de 63 mil habitantes, é um dos bairros que mais representa a cidade de São Paulo, cidade que acolheu milhares de imigrantes e que conserva a essência dos tempos antigos do sossego do início do século. (PL 878/16, 6 dez. 2016)

Ao afirmar que o bairro “conserva a essência dos tempos antigos do sossego do início do século”, fica muita clara a relação com as definições da carta patrimonial conhecida como Declaração de Quebec, sobre o espírito do lugar:

Como o espírito do lugar é um processo em permanente reconstrução, que corresponde à necessidade por mudança e continuação das comunidades, nós afirmamos que pode variar ao longo do tempo e de uma cultura para outra, em conformidade com suas práticas de memória, e que um lugar pode ter vários espíritos e pode ser compartilhado por grupos diferentes. (DECLARAÇÃO DE QUEBEC, 2008, p. 3)

Importante lembrar que, a respeito do chamado patrimônio imaterial da Mooca, houve a tentativa, em 2009, do então vereador Juscelino Gadelha e também conselheiro do Conpresp, em preservar o ‘mocanhês’, um jeito próprio de falar dos moradores mais antigos, que faziam uma mistura cantada do italiano com o português. O sotaque ainda pode ser conferido nos dias de hoje e algumas palavras desse vocabulário da Mooca já viraram gíria de paulistano, como ‘Ôrra, meu!’ e ‘belo’, ‘bela’, para se dirigir a alguém.

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Como mostra a reprodução da revista Veja na época:

Figura 17 – Tombamento do sotaque da Mooca (2009). Em reportagem de época, a repercussão sobre o tombamento do mocanhês, sotaque típico do bairro paulistano. Fonte: Revista VEJA.

Como fica evidente, a imagem da Mooca no imaginário coletivo esteve

sempre ligada a um bairro de origem industrial, operária e, predominantemente,

italiana. Esta imagem aparece também nos estudos e artigos acadêmicos sobre o

bairro, bem como nos relatos (depoimentos, entrevistas etc.) de antigos

moradores e/ou frequentadores do bairro.

O bairro não é mais fabril, nem italiano, e há várias décadas sustenta o

título utilitário-funcional de “média da cidade”, atribuído em reportagem do extinto

Jornal da Tarde, nos anos 1980, que analisava o melhor lugar para se viver na

cidade de São Paulo, “com infraestrutura boa, meios de transporte diversificados,

proximidade com o centro, e que ainda mantém ares e jeitos de uma cidade

interiorana”. Por isso o título de bairro mais tradicional de São Paulo. E “bairrista”,

como aponta pesquisa do Datafolha de 2007, publicada na Revista da Folha

daquele período, que aponta ser essa a razão para que a Mooca figurasse no

topo do ranking de bairro mais desejado para se morar e viver. Um lugar que “não

pode ser trocado por nenhum outro”. Um “oásis”, como repete uma reportagem do

mesmo jornal em 2010, que relembra esse título que o bairro recebe, quase como

se se tratasse de construir uma imagética da identidade do bairro da Mooca e de

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seus moradores e lugares. Você não as tem, mas delas se apropria por meio de

um manual de identidade de um imaginário coletivo.

Fig. 18 – Pesquisa Datafolha revela. Reprodução da pesquisa Datafolha de 2007 aponta a Mooca como o melhor bairro para morar. Fonte: Revista da Folha, 30/03/2007 (vide referências finais).

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Fig. 19 – Por que eu amo a Mooca. Nesse quadro da mesma pesquisa, os moradores elencam as razões para escolher o bairro. Prevalece a funcionalidade, além do sossego. Fonte: Reprodução da Revista da Folha, 30/03/2007 (vide referências finais).

Não é à toa que o mercado imobiliário se apropria de uma certa imagem do

bairro para vender os seus produtos, como no exemplo do empreendimento

denominado Luzes da Mooca.

A fábrica Açúcar União manteve sua sede administrativa, produção do café

Seleto e o armazenamento do produto em edifício localizado em quadra entre as

ruas Borges de Figueiredo e Rua João Antônio de Oliveira, até 2006. Desde 2012,

o antigo endereço da Companhia União dos Refinadores – Açúcar União deu

lugar a um condomínio de prédios conhecido como Luzes da Mooca, cuja

logomarca é a chaminé remanescente da fábrica demolida, protegido como bem

cultural da cidade pelo CONPRESP (Resolução nº 05/CONPRESP/2010). A

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chaminé está, hoje, cercada por quatro torres de apartamento neste

empreendimento da Cyrela, voltado à classe média em ascensão, cujo apelo de

publicidade dizia: ''inovador, diferenciado e com charme europeu'', ''ideal para

quem procura por luxo, conforto e tranquilidade'', este último um tanto difícil numa

região que cada vez mais se adensa, com seus inúmeros canteiros de obras,

trânsito constante e uma população flutuante considerável.

As torres receberam nomes italianos: Atrio Giorno, Portale Mattino, Villa

Solare, Villaggio Luna, Spazio Lume. Um simulacro da história de um bairro. O

filme publicitário criado para o Luzes da Mooca, assinado pela agência Eugênio

Marketing Imobiliário, tinha como mote a ideia de que ''alguma coisa está

acontecendo na Mooca” e que ''todos estão sendo atraídos para esse ponto da

cidade'', como explica o diretor de criação da Agência, Agostinho Moura

(CYRELA). A campanha remete à história do bairro, ainda que seja pura alegoria,

tal como se percebe no roteiro do filme: ao fundo, ouve-se trecho da ópera de

Giuseppe Verdi, La Traviata (1852), com atores vestidos como antigos imigrantes

italianos do final do século XIX. São homens, mulheres, crianças e anciãos

alegres e cantantes dublando a ópera e que, em determinado momento, juntam-

se em multidão para chegar a esse local especial na cidade. É quando o locutor

em off diz: ''Algo pulsa na Mooca e é sentido em toda a cidade''. O apelo forte de

lembrar que o bairro tem história remete à ideia de que o local do

empreendimento abriga hoje um fragmento dessa história: a chaminé tombada,

que passa a ser como uma espécie de ‘farol’ marítimo que com seu facho de luz

forte e intermitente, sinaliza o rumo certo, o bairro da Mooca. No discurso do setor

de Comunicação da Cyrela, a chaminé é lembrada o tempo todo como motivo de

orgulho para o empreendimento e afirma que ''a campanha foi feita para o bairro

da Mooca e é a cara de seus moradores'' (CYRELA).

Para finalizar essa análise de como o patrimônio cultural da cidade é

tratado, cabe reproduzir a afirmação do já citado diretor de criação da Eugênio,

Agostinho Moura: ''hoje as chaminés não emitem mais fumaça, elas emitem

tradição'' (CYRELA).

Recorre-se a Baudrillard (1993), para lembrar que, em sua obra Simulacros

e Simulação, o pensador francês afirma que a realidade já não é mais necessária,

até porque deixou de existir, e passamos a viver a representação da realidade,

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difundida na sociedade pós-moderna pelo aparato da mídia. Os símbolos são

mais importantes, bem como tudo a que eles remetem, como é o caso da

chaminé e de tantos outros exemplos que se poderiam dar. Nessas simulações

duvidosas do real, torna-se irônico e, um tanto contraditório, constatar que tais

representações agradam a muitas pessoas, colocadas na posição de

espectadores da própria realidade ali simulada.

Figura 20: “Fachada” do Luzes da Mooca. (2016) Fonte: acervo da autora.

Figura 21: Luzes da Mooca vista de trás. (2016) A chaminé vista de trás, pela rua João Antônio de Oliveira, parece enquadrada em uma tela vazada que abre a visualização para o bem cultural tombado. Ao fundo, a chaminé da Antarctica. Fonte: Acervo da autora.

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Figuras 22 e 23: Visão da rua pelo condomínio Luzes da Mooca. (2016) Essas imagens na Borges de Figueiredo revelam uma paisagem incomum em uma região que está sendo transformada. Ao fundo, a chaminé da antiga fábrica da Antarctica e o recorte fabril de galpão industrial à frente. Fonte: Acervo da autora.

Este exemplo nos faz questionar acerca das imagens que se criam sobre

certos bairros. Não cabe dúvida que são criação das empresas especializadas em

produtos publicitários, mas é importante nos perguntarmos sobre um determinado

imaginário no qual a publicidade se baseia. Os bairros de origem italiana, em São

Paulo, parecem ter ficado, particularmente, vinculados a uma imagem romântica

de “tradição italiana”.

Por outro lado, cabe nos perguntarmos, também, como essa imagem se

liga àquela de bairro de origem fabril e operária:

Até meados do século XIX, o bairro da Mooca era composto basicamente por pequenas propriedades agrícolas, chácaras, separado da cidade além do rio Tamanduateí. Com a chegada da

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ferrovia, em 1867, a região experimentou um surto de transformações, a partir da construção de fábricas, armazéns e equipamentos de apoio em todos os setores industriais, como a habitação operária, por exemplo. Aos poucos, conforme vai contando Mino Carta (2009), as Faíscas e os Monarcos, e toda espécie mais de força animal, foi sendo substituída pelo progresso. (SOUZA, 2011, p. 21)

E como essas imagens, por sua vez, sobrevivem às mudanças

socioeconômicas e urbanas das últimas décadas.

Ora marcada pelos elementos horizontais – armazéns e edifícios – ora por elementos verticais – chaminés, fornos, guindastes – a skyline da paisagem industrial do século XX também é tomada pela cidade contemporânea que cresce em seu lado. Este jogo de volumes configura marcos urbanos e elementos formadores da paisagem, identificadores, juntamente com as texturas, ritmos e aparência geral de uma parte da história da cidade de São Paulo. (SOUZA, 2011, p. 32-33)

Apesar de suas transformações, a Mooca continua sendo objeto de

interesse dos estudos - e inclusive tombamentos, como vimos no Capítulo 2 –

sobre sua origem industrial. Neste sentido, é pertinente citar os trabalhos de Kühl,

especialmente de 2008, quando trata da preservação do patrimônio arquitetônico

da industrialização, da importância desse legado para a conformação da cidade

de São Paulo, com expressiva presença em bairros como o de objeto desse

estudo, e cuja preocupação em sua conservação é considerada ainda recente.

Segundo Kühl, foi a partir dos anos 1960, efetivamente, que se iniciaram ações

nesse sentido na Inglaterra, berço da Revolução Industrial, cujos estudos

preliminares e levantamentos deram origem ao campo de estudos da arqueologia

industrial. É nesse trabalho também que ela cita importantes estudiosos ingleses

como, Kenneth Hudson e Angus Buchannan. Aponta ali também a importância da

ferrovia como marco de expansão geográfica da formação dessas indústrias e de

sua circunvizinhança formada por moradias apertadas umas às outras, para o

melhor aproveitamento dos lotes disponíveis, bem como o reconhecimento do

patrimônio industrial na história social e econômica da cidade, o que por si só já

justificaria um olhar mais atento e apurado para a configuração da cidade do

período industrial.

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E a Mooca reflete ainda algo desse período, e o que se percebe sobre esse

espírito que parece prevalecer no bairro, a despeito de não ter o bairro

‘envelhecido’ de maneira a favorecer seu recorte histórico, são fragmentos que se

juntam para compor um mosaico multifacetado de cenas históricas e cenários que

ainda persistem na paisagem, além dos que são lembrados por não estarem mais

lá, como é o caso do Hipódromo da Mooca e sua fachada monumental, bem

como as arquibancadas, demolidas completamente entre o final dos anos 1950

para o início dos 60. O mesmo acontece com o antigo Colégio Comercial Brasilux,

no número 2.214 da Rua da Mooca, do qual nada restou, e que formou boa parte

da juventude dos anos 1950-60 em cursos de Datilografia e Contabilidade. Muitos

lembram desse local, contam histórias, mas sabem que sua lembrança ficou

apenas na memória.

A memória recente do famoso professor Pasquale (Cipro Neto), em artigo

para a Folha de São Paulo de 2014, revela a Mooca da infância primeira, das

passagens marcantes, e de um cenário que ficou para sempre na memória:

Nasci em Guaratinguetá (SP), um ano depois do quarto centenário de São Paulo. Com um ano de idade, eu já era mooquense. Sim, antes de sermos

paulistanos, paulistas, brasileiros, os da Mooca somos mooquenses. E para sempre, ainda que se saia do bairro.

[...] Muitas vezes foi preciso encarar a madrugada na fila da Companhia União, na rua Borges de Figueiredo, para comprar o quilo de açúcar a que

tínhamos direito. Era tempo de racionamento!

[...]A minha Mooca tinha (e ainda tem) casas e vilas. Os prédios eram poucos, praticamente restritos à nossa "Champs-Élysées" -a Paes de Barros, na

qual havia também muitos casarões.

(NETO, 2014)

Mas a análise que faz do bairro hoje, mostra mudanças que culminaram

com a perda do que Pasquale chama de “ar um tanto provinciano”, e denuncia:

[...]há coisa de dez anos, chegou a hora de sofrer um estupro urbano, patrocinado (com a devida omissão do poder público) pela infrene e infame sanha

do mercado imobiliário, que "descobriu" a Mooca.

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Galpões centenários, em que funcionaram estabelecimentos comerciais ou industriais (o da União, por exemplo) não tiveram um fim digno, como o que teve o

que hoje abriga o maravilhoso Sesc Pompeia.

[...] Destruição da memória é sinônimo de boniteza?

(NETO, 2014)

Figura 24 - Hipódromo da Mooca. Fachada monumental do antigo Hipódromo da cidade, entrada pela Rua dos Trilhos, não resistiu às mudanças e foi demolida no final dos anos 1950. Fonte: acervo pessoal da autora.

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Figuras 25, 26, 27 e 28: Momentos do Colégio Brasilux. O início nos anos 1920, o auge nos anos 1950-60, até a demolição do imóvel nos anos 1990, quando se tornou o Colégio Meta. Em foto de 2014, a área é ocupada pela rede de lojas Marabraz até os dias de hoje. Fontes: Portal da Mooca, foto da autora.

Mais recentemente, em 2015, depois de dois incêndios seguidos nos

galpões ocupados pelo Armarinhos Fernando na rua Clark e na Taquari, uma

grande reforma foi realizada pela loja que mudou as fachadas da esquina das

ruas Taquari com a Bresser. Os galpões não estavam protegidos, mas chegaram

a pertencer à família Crespi e compunham anexos da antiga fábrica têxtil, com

exceção do galpão da rua Clark, praticamente destruído após o incêndio, e que

ainda permanece de pé com o que restou. Totalmente modificada, a referida

esquina hoje abriga uma vitrine na rua Bresser que expõe as mercadorias e,

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pouco a pouco, essas transformações vão dando o testemunho vivo de que as

características fabris do bairro vão se apagando.

Figura 29 – Armarinhos Fernando. (2017) A fachada modificada do Armarinhos Fernando, na Rua Taquari, após dois incêndios seguidos. Nota-se o recorte do antigo depósito de algodão. Fonte: acervo da autora.

Figura 30 – Armarinhos Fernando em chamas. O incêndio ocorreu por duas vezes em

2013 nos galpões da loja e um dos depósitos, nas ruas Taquari e Clark, em frente ao

prédio do Cotonifício Crespi. Fonte: UOL Notícias

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Se o alargamento, na linha do tempo, sobre o que se entende por

patrimônio histórico, como lembra Choay (2001), trouxe uma espécie de inchaço

em relação ao patrimônio e a tudo que se deve ou não preservar, por outro, deu a

possibilidade de se considerar o legado da industrialização como importante

acervo histórico, de qualidade arquitetônica única, e de assim ter-se um retrato de

uma época, de caráter quase vernacular, mas que encerra uma riqueza de

relações sociais, jeitos, costumes e modos vivendi como poucos conseguem

reproduzir. Sentidos que ficaram ligados a uma forma de ser do ser mooquense,

como herança de um período em que ganhar o pão de cada dia com o suor do

seu trabalho e a importância dada à família eram as molas mestras da vida no

bairro. Tudo girava em torno disso. Mais do que citar lugares, as pessoas falam

de seu sentimento pela Mooca, o “melhor bairro para se morar, viver e morrer”.

Ainda assim, lugares são relacionados como os que representam esse estado de

ser.

Quando Meneses (1978) destaca a importância dos componentes físicos

do ambiente urbano, “para suporte das evocações”, está se referindo a algo maior

do que o simples “culto ao passado”, cujo maior perigo está em provocar uma

espécie de amnésia social em que não mais prevalece a consciência histórica do

indivíduo sobre o seu passado, alimentada pela lembrança de situações que

mudam com o passar do tempo, mas apenas da “obsolescência programada”.

Essa prática recorrente na cidade20 prejudica o envelhecer natural “das coisas

urbanas (como do resto), o que corresponde a uma verdadeira reificação da

cidade”. (Meneses, 1978, s/n).

O convívio dentro e fora das fábricas ia além dos limites dos seus muros e

portões. Do apito das chaminés das fábricas ao barulho característico do trem

passando, bem como da abertura dos portões para a saída dos operários, são

todos elementos que passam a compor o imaginário coletivo das pessoas e de

famílias inteiras. Mesmo as que não trabalhavam nelas passam a tê-las como

referência diária em suas vidas. É como se todos, operários e moradores, se

20

A obsolescência programada aparece muito em definições da área de defesa do consumidor como uma espécie de fórmula encontrada pelos fabricantes de produtos de consumo durarem menos. Fazendo uma relação com esse sentido para a questão dos imóveis industriais em desuso, seria a ação intencional dos proprietários em permitirem a invasão de suas propriedades e a deterioração eminente ao não cuidarem, nem darem uma destinação às áreas para não terem que preservar o imóvel, e sim acabar demolindo e aproveitar apenas o terreno.

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integrassem àquele campo simbólico, a fábrica, repleto de significados e sentidos

de valor, mas principalmente, de lugar.

Figura 31 – Fábricas da Mooca - Antarctica. Vista geral da Mooca pela avenida Presidente Wilson, a partir do Centro, revela a presença da fábrica (neste caso, a Cia. Antarctica Paulista, já desativada) e à sua volta, a cidade que cresceu (Fonte: Portal da Mooca).

Figura 32 – Fábricas da Mooca – Cotonifício Crespi. (1999) Nesta foto, a antiga fábrica Crespi se impõe na paisagem e seu prédio de tijolos à vista, datado de 1897, convive com o dia a dia dos moradores e frequentadores da região. Fonte: Acervo da Autora.

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Figura 33 – Fábricas da Mooca – Crespi renovado. (2005) Foto mostra o prédio da antiga fábrica Crespi transformada no Supermercado Extra, do Grupo Pão de Açúcar, que alugou o imóvel tombado e ia descaracterizá-lo, mas cedeu a movimento de alguns moradores e profissionais que exigiram que o mesmo fosse restaurado, mantidas a sua volumetria e fachada, apenas adaptando o prédio ao novo uso. Fonte: acervo da autora.

O lugar de trabalho é também um ambiente sagrado, no qual se ganha o

pão de cada dia. É ali que surge o convívio entre seus pares, os colegas de ofício,

e as relações interpessoais passam a acontecer. A figura do operário era, talvez,

a que mais conferisse ao ambiente industrial essa dinâmica social, pois era na

saída das fábricas, após o término do expediente, que o fenômeno da

sociabilidade21 se manifestava mais fortemente. Fosse no bar ou se dirigindo para

as agremiações sociais, aonde podiam jogar damas ou xadrez, descansar um

pouco lendo algum periódico, ou simplesmente jogando conversa fora, o ambiente

social da fábrica se dava ali de forma mais descontraída e alegre. O futebol

também fazia parte desse convívio social já que cada fábrica tinha seu time

classista, assim chamados os clubes de classe operária, nascidos dentro dos

portões das fábricas. A Mooca é chamada de “celeiro” de craques da várzea

paulistana, e também desses clubes das fábricas como, por exemplo, o

RefiUnião, do Açúcar União, e o Juventus, o mais famoso de todos que virou um

time de futebol e tem o nome do conde Rodolfo Crespi, industrial do Cotonifício

Crespi, nomeando seu estádio de futebol.

21

Socialização ou sociabilização são palavras sinônimas e têm a ver com o controle social que é feito por meio de instituições, da família, da escola. Poderia ser aqui, o controle que as fábricas exerciam no cotidiano das pessoas, mesmo após o horário de trabalho.

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Para entender, portanto, as questões das representações sociais dentro da

ótica do patrimônio ambiental urbano é necessário “examinar o modo como ele é

produzido”, dentro de uma determinada sociedade, como afirma Meneses (1978).

Trabalho e moradia que produziram um bairro com forte sentido de

identidade.

Figuras 34 e 35 – Vilas, herança operária que ainda permanece. (2016) Entrada de vila de casas na Rua Catarina Braida. Esse tipo de configuração residencial ainda é comum no bairro. Fonte: acervo da autora.

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Figuras 36 e 37 - Vila na Catarina Braida. (2016) A mesma vila, vista por dentro. Em uma das casas, funcionou a redação do jornal ítalo-brasileiro “La Fanfulla”, até meados dos anos 2.000. Fotos: acervo da autora.

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Figura 38 - Conjunto Habitacional do IAPI. (2016) Chão de paralelepípedos e prédios baixos construídos entre 1946 e 1950 são referência na paisagem do bairro. Fonte: acervo da autora.

Figura 39 – Antigo e novo na Rua da Mooca. (2016) Mesmo com as descaracterizações que o bairro sofre em geral, há exemplos de como fachadas antigas são aproveitadas e destacadas em reformas como essa, na Rua da Mooca. Uma espécie de resposta às fachadas ativas tão em voga nos dias de hoje, cujo desenho se repete em vários pontos da cidade e imprime uma monotonia de traços iguais, sem identidade. Fonte: acervo da autora.

Todos estes elementos fazem parte do patrimônio ambiental urbano da

Mooca. Como dá para se observar nos capítulos anteriores, mesmo com a

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importância dada aos estudos sobre a dimensão urbana do patrimônio ter

provocado um certo impacto sobre as políticas de preservação, que se traduziu

principalmente na proteção de conjuntos urbanos e mesmo de centros históricos,

nota-se que a partir do segundo pós-guerra, têm predominado os aspectos

materiais, os quais não têm dado conta da requalificação do patrimônio.

No caso de São Paulo, ao rever o conceito de patrimônio ambiental urbano

e as diversas interpretações que a ele foram sendo dadas por técnicos e

especialistas ao longo do tempo, principalmente quando do início da atuação da

esfera municipal no âmbito da preservação do patrimônio na cidade de São

Paulo, conclui-se sobre a relevância de se trabalhar com tal noção.

Contudo, ficou claro, também, que o conceito foi aplicado como proteção

de manchas urbanas, o que não deixa de ser importante, face à proteção apenas

de edifícios de valor excepcional, uma medida que acabou não dando conta da

preservação de bairros como a Mooca.

Por isto, defendemos, neste trabalho, a importância de se recuperar a

dimensão que Meneses (1978), por sua vez, defendeu, desde a década de 1970,

de que o conceito de patrimônio ambiental urbano deveria considerar as

representações sociais. Nesta direção, sua premissa básica seria a de unir o

tangível e o intangível de forma a se considerar as práticas sociais que geram as

representações e os valores de lugares, com seus objetos, costumes, jeitos,

cheiros e cores. Até mesmo lendas. Ao abarcar e considerar a importância da

história local, bem como as particularidades do lugar, geradas pelas

representações sociais, passa a se estabelecer um diálogo entre especialista e o

fruidor, este como cidadão ou morador que faz uso das coisas e lugares e a eles

atribui sentidos e valor, como exposto anteriormente neste trabalho.

Importante destacar que são “valores territoriais”, como lembra Yázigi

(2013, p. 671), para quem a defesa do “espaço banal” pela sociedade é a melhor

forma de evitar que os valores do mercado imobiliário predominem.

Contudo, a velocidade das transformações provoca grandes alterações no

convívio social (visitas, um batizado, a morte de alguém, a celebração de um

aniversário, ou simplesmente ‘jogar conversa fora’). Tudo isso, dentro do universo

do intangível, daquilo que não se vê, mas se expressa e sente, e que impacta na

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paisagem, objetos, e lugares físicos, levando ao sentimento de distanciamento e a

um certo desencantamento (YÁZIGI, 2013).

A questão da identidade, sabe-se, é peça fundamental para que o indivíduo

entenda o seu lugar no mundo perante a coletividade da qual faz parte, com quem

convive e interage. Essa ideia encontra um paralelo na análise de Foucault (2008,

p.6) sobre o discurso das mudanças e transformações, na obra “Arqueologia do

Saber” (original de 1969), quando faz a análise da estrutura de uma narrativa

histórica, cujas descrições “(...) se ordenam necessariamente pela atualidade do

saber, se multiplicam com suas transformações e não deixam, por sua vez, de

romper com elas próprias”:

Em suma, a história do pensamento, dos conhecimentos, da filosofia, da literatura, parece multiplicar as rupturas e buscar todas as perturbações da continuidade, enquanto a história propriamente dita, a história pura e simplesmente, parece apagar, em benefício das estruturas fixas, a irrupção dos acontecimentos.

A passagem do tempo, entende-se, é inexorável, seja nos costumes e

hábitos, seja na forma como o indivíduo interage em seu meio. Os lugares físicos

também sofrem a influência direta dessas mudanças e dos novos costumes e

usos.

A noção de espírito do lugar pode, portanto, contribuir para a compreensão

do patrimônio ambiental urbano do bairro.

Descobrir, portanto, ou como parece mais adequado, redescobrir o

chamado “espírito do lugar”, não parece ser tarefa fácil, principalmente, se os

instrumentos utilizados forem, por exemplo, mapas analisados, friamente, através

do aplicativo Google Earth, no lugar de se fazer caminhadas que permitam

adentrar vielas e lugarejos que poucos conseguem enxergar no dia a dia, mas

cuja importância reside no fato de que são tais facetas encobertas ou mesmo

escondidas que revelam um patrimônio ambiental urbano inestimável, passível de

estudo e análise mas, principalmente, capaz de mudar o rumo de decisões sobre

as permanências que podem ser vistas, não mais como incômoda materialidade,

e sim como recantos inspiradores, cujo poder de encantamento sobre quem delas

toma conhecimento e se depara pode ser o antídoto para uma cidade visualmente

empobrecida e repetitiva.

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Uma tarefa que parece árdua, num primeiro momento, mas que logo se vê

facilitada quando se recorre a relatos como o do livro Histórias da Mooca, de Mino

Carta, analisado a seguir, que remete à ideia de um diário escrito, talvez, não

para os mooquenses, mas para quem quer e gostaria de conhecer um pouco

sobre eles e seu bairro.

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3.2. Representações sociais: a Mooca no imaginário coletivo

3.2.1 As histórias da Mooca

A construção do espírito de um lugar é longa, e depende não apenas da

memória individual, mas de saberes, tradições, histórias, imagens que passam

por várias gerações. Questão complexa, que envolve uma relação muito particular

entre passado e presente, pois a memória reverbera e se produz também pelo

presente. O espírito do lugar parece evocar sentidos profundos de preexistências

que são sentidas como presente. Meneses (1992, p. 19) explica o caráter

dinâmico da memória e o quanto do presente - enquanto tempo em que se vive -,

retroalimenta fatos e acontecimentos:

Dentre as principais categorias de suporte – a linguagem, o corpo,

as cerimônias, os objetos materiais - apenas a primeira mereceu

atenção suficiente, em especial no que concerne à palavra narrativa

e à passagem do registro oral para o escrito (até os

desdobramentos eletrônicos atuais). Esta última questão revela,

com clareza, a impossibilidade de analisar tais fenômenos do

ângulo apenas instrumental: eles correspondem a mudanças

substantivas e generalizadas da memória: com a escrita surge a

objetividade derivada da separação entre conhecido e conhecedor,

dado e interpretação, lógica e retórica, conhecimento e sabedoria,

ser e tempo; reduz-se a fluidez oral/aural pela fixação de um

espaço visual; elimina-se, no tempo e no espaço, a concomitância

entre fonte e receptor; abrem-se as portas da abstração; da

verbalização, agora exclusiva do contexto, deriva o controle da

significação (precisão) [...]

Ainda que fique claro que a linguagem é apenas um dos instrumentos para

entender a memória, esta é a dimensão analisada neste capítulo - a partir do

discurso narrativo -, devido à complexidade de uma análise mais ampla de outros

aspectos, que exigiria maior tempo e, inclusive, um trabalho em conjunto com

outras disciplinas, como a Antropologia e a Psicologia, entre outras.

Desta forma, para análise das narrativas sobre a Mooca, é fundamental,

inicialmente, ressaltar a importância das histórias que se produzem do bairro.

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Para compor essas histórias, ou seja, uma narrativa sobre o passado

histórico da Mooca e o quanto dele ainda sobrevive nos dias de hoje, verifica-se a

recorrência de registros referentes à cotidianidade do cidadão trabalhador,

morador do bairro, operário de fábrica ou não, descendente de imigrantes

italianos, em grande parte. Nestes registros do “tempo mooquense”, busca-se

entender as características dos imigrantes - sempre com o risco de se incorrer em

uma visão estereotipada -, para melhor interpretar sentimentos que parecem

impregnar paredes, muros, fachadas, caminhos e construções, ou como diriam

muitos desses moradores, “está no ar”.

Muitas foram as histórias escritas sobre a Mooca, e analisaremos, neste

trabalho, uma obra que teve grande destaque neste sentido, as Histórias da

Mooca (com a benção de San Gennaro), de Mino Carta.

O jornalista e escritor genovês radicado no Brasil, Mino Carta, mergulha no

ambiente do bairro e seus personagens, como mostra em seus escritos. Sob sua

ótica, as relações sociais ocorrem em um cotidiano diferente do vivido hoje, bem

mais simples, um tanto singelo, como se percebe no trecho a seguir:

“[...] no Alto da Mooca, a Pioneira, grande loja da avenida Paes de Barros, contratou Walter no início dos anos cinquenta para que lhe anunciasse as novidades e os preços baixos, através de um serviço de alto-falantes também destinado a irradiar programas musicais, e a Ave-Maria às cinco em ponto da tarde. Às cinco saíam as operárias do Cotonifício Crespi, e o dono da Pioneira recomendava: “Capricha na Ave-Maria, Walter, que as normalistas estão saindo.” (CARTA, 1982, p. 60)22

22

Walter Silva foi famoso jornalista e locutor de rádio, tendo sido apelidado de Pica-Pau devido ao programa que apresentava na Rádio Bandeirantes, no final dos anos 1950, intitulado “Pick-Up do Pica-Pau”, que lançou artistas como Elis Regina.

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Figura 40 – Capa do livro Histórias da Mooca (1ª. edição). Escrito por Mino Carta, com fotos de Helio Campos de Mello, foi lançado em 1982 e reeditado em 2009. Fonte: reprodução do livro.

Figura 41 – Histórias da Mooca e seus personagens. Na foto, aparece Walter Silva, famoso radialista, um dos personagens da baixa Mooca que é retratado no livro de Mino Carta. Fonte: reprodução do livro.

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Mino Carta narra histórias da Mooca, um bairro que conheceu de perto, e

sua vivência com moradores que ele eternizou nas páginas de seu livro de 1982.

São relatos de vida de pessoas comuns, sendo grande parte delas oriundi, ou

seja, vindos da mesma pátria primeira, a Itália. No prefácio da segunda edição, de

2009, o jornalista lamenta as mudanças que soam para ele como “algo que cai

mal”, como um ataque de uma certa “fúria selvagem”. Para ele, “São Paulo destrói

sua memória com imensa alegria”.

Quem traduz esse sentimento de Mino Carta é outro jornalista, Gilberto

Amendola do Grupo Estado, em resenha crítica sobre essa última edição de

Histórias da Mooca:

Mino não faz sociologia. Busca melancolicamente lembranças de um bairro que não existe mais. Muita coisa mudou. O sotaque cantado e a fala exagerada se mantêm, a melhor casa de massas é dirigida por irmãos paraibanos, o Toninho do churro, depois de meio século de atividades, fechou as portas sem revelar sua receita a ninguém e a festa de San Gennaro segue em frente. Mas a ocupação do espaço, na palavra dos arquitetos, mudou. O Crespi, que poderia ser uma espécie de museu do trabalho, foi selvagemente modificado para abrigar um hipermercado.

Mas há uma informalidade meio brusca e meio carinhosa que subsiste nas gentes, um tom direto nas falas e gestos que faz da Mooca algo tão indefinível quanto o encontro vocálico de seu nome que gera polêmica se tem acento ou não. Isso sobrevive a qualquer fúria pretensamente modernizante. (AMENDOLA, 2009)

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Figuras 42 e 43 – Imagens de Histórias da Mooca. Fotos em preto e branco e trechos destacados em manuscrito - lembrando os de um diário -, dão o tom e o ‘colorido’ da obra que traça um paralelo entre a Mooca antiga e a Mooca que cresceu e se modificou. Fonte: reprodução do livro.

Em outra passagem do livro de Mino Carta, um panorama de época é

traçado sobre o transporte de mercadorias da chamada “primitiva indústria

paulistana”:

Então larga parte do transporte de mercadorias, no varejo dos ambulantes e no atacado das grandes firmas, ainda se fazia por tração animal,... [...] Estabelecida à rua da Mooca, no mesmo local em que hoje se ergue um conjunto de edifícios da Guarantã, a Rodovalho fechou as portas na década de trinta, vencida, antes que a Faísca, pelo progresso motorizado. Os cavalos foram leiloados e alguns arrematados, segundo lembrança inapagada, pelo conde Matarazzo, enquanto os cocheiros aposentavam suas cartolas e uniformes oitocentescos. (CARTA, 1982, p. 10)

Tempos de ‘Moocas’ que se sobrepõem, e que continuam em

transformação no início da década de 1980, período retratado no referido livro.

Era uma época conturbada, de grave crise econômica que culminou com a

manifestação das Diretas Já, em 1984, para eleger o presidente do país. O ano

de 1989 viu crescer o fantasma da hiperinflação, quando o índice alcançou 80%

ao mês e o Plano Collor, que teve como medida mais traumática o confisco, por

18 meses, dos saldos de contas-corrente e cadernetas de poupança. Traçar um

paralelo da economia brasileira nesse período, conhecido como a ‘década

perdida’, serve como entendimento sobre os fatores que levaram ao encolhimento

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da indústria em São Paulo. A menção sobre esse período econômico da cidade

de São Paulo serve para esclarecer sobre os fechamentos de indústrias e

transferência de boa parte delas para fora do Estado, ou para o interior de São

Paulo.

A Mooca das “normalistas” e dos operários das fábricas só ficaram na

lembrança. Assim como as saudosas raias do antigo prado que abrigou o primeiro

Hipódromo de São Paulo. Ali, mais do que “um clube de corridas de cavalos, era

um centro de entretenimento aberto a todas as camadas sociais, e atrativo

turístico da cidade” (SILVA, 2006, p. 16), em uma época em que passar as tardes

de domingo em um bosque daqueles era ter um weekend23 mais bucólico dentro

da cidade.

Nas narrativas de Mino Carta, percebe-se que o elemento principal dos

lugares que ele destaca são as pessoas. Gente “que forma um diferencial [...]

nesse lado da cidade e que também pode ser considerado um patrimônio da

Mooca” (SILVA, 2006, p. 44).

Os lugares também são destaque: a barbearia, a quitanda, o armazém de

secos e molhados, ruas, vilas, fachadas de passagem, de fundo, casas, janelas,

portas. Todos compondo a história da Mooca e de seu morador. Grande parte do

que o jornalista relata em seus registros encontra-se na chamada Mooca baixa,

próxima ao Parque D. Pedro II, estigmatizada assim por ter ficado separada pela

porteira da linha de trem, hoje substituída por um viaduto na Rua da Mooca

(Viaduto Prof. Alberto Mesquita Camargo), que passa perto da Rua Borges de

Figueiredo, e do estabelecimento Di Cunto, cenários e lugares que são lembrados

também, assim como a Festa de San Gennaro. Para o lado que adentra o bairro,

ele lembra da Rua Oratório, do Crespi, nas ruas Taquari e Javari, e de uma Paes

de Barros que não existe mais, onde era possível caçar pequenas aves e

vislumbrar apenas casas, algumas delas, verdadeiras mansões para os padrões

da região.

23

O termo em inglês significa ‘fim de semana’ e era muito utilizado até os anos 1960, conforme

relatos dos próprios moradores.

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Figura 44 – Av. Paes de Barros em formação, s/d. A elegante avenida, em chão de paralelepípedo, ainda em formação, com pose de Ângelo Torrezani, filho do imigrante italiano que foi marceneiro do Crespi, Luigi Torrezani. Fonte: acervo de família de Egýdio Torrezani.

Figura 45 – Av. Paes de Barros, 2017. A avenida, hoje, com prédios e serviços. Fonte: acervo da autora.

A narrativa de Mino Carta (1982, p. 30) adentra casas, como a de Fortunata,

espécie de símbolo de todas as mammas e nonas da Mooca:

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O pimentão aconchega-se muito à vontade entre cebola, alho,

salsão e carne moída, e com eles estabelece uma perfumada

sociedade, finalmente capacitada a conferir sabor à comunhão com

o tomate, graças também à excitante cumplicidade do orégão e da

pimenta calabresa, outrossim conhecida pela alcunha dialetal de

peppone. Em setembro de 1981, Fortunata, tida e havida como

cozinheira inexcedível no vasto território que se alastra do Parque

da Mooca ao Cambuci, cobriu de molho à bolonhesa uma tonelada

e meia de macarrão na Festa de San Gennaro. Mas com isso,

entenda-se, não se esgota a comilança, que se prolonga por três

fins de semana e cujo eixo é o dia do santo, padroeiro de Nápoles,

dia 19 de setembro.

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Figuras 46, 47 e 48 – Tradição gastronômica. Mamma Fortunata revela o segredo do molho no livro de Mino Carta e voluntários com as famosas “mammas da San Gennaro” preparam o molho e recheios das massas da festa de San Gennaro. Fonte: reprodução do livro, e foto de Sérgio Ceribelli, set. 2016).

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Figuras 49, 50, 51, 52, 53 e 54 – O cenário do Histórias da Mooca. Reproduções do livro mostram gentes e lugares da Mooca até os anos 1982. Fonte: reprodução do livro.

Alguns desses aspectos ainda existem hoje no bairro, seja um detalhe de

fachada, um portão ou janela, e até o medalhão do cavalo Marcial do Conde

Crespi, na entrada da antiga fábrica, na Rua Javari:

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Figura 55 – Vestígios na fachada. (2001) Medalhão do cavalo Marcial, pertencente ao conde Rodolfo Crespi, detalhe que se encontra na entrada da antiga fábrica, acesso pela Rua Javari. Fonte: acervo da autora

Assim como os vestígios, remanescentes, marcas na paisagem

contribuíram para Mino Carta evocar suas histórias, consolidando imagens de

uma Mooca perdida, o bairro ainda guarda muitos aspectos que também podem

ensejar outras narrativas.

Figura 56 – Casas da Mooca, detalhe. (1999) Azulejo em casa na Rua dos Trilhos Fonte: acervo da autora

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Figura 57 – Casas da Mooca, janela. (2016) Tijolinho à vista e janelões de madeira resistem no visual de algumas casas e construções da região. O traço da pichação denuncia novos códigos urbanos. Fonte: acervo da autora.

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Figura 58 – Casas da Mooca, entrada. Portão e o detalhe da fachada com entrada saindo direto para a rua são muito comuns na região. Fonte: livro Casas Paulistanas.

Figura 59 – Fachadas da Mooca, galpões de fábrica. (2016) A arquitetura típica convive com a atualidade do bairro, na Rua Borges de Figueiredo, em área de preservação do patrimônio. Fonte: acervo da autora.

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Figura 60 – Fachadas da Mooca, Estação de trem da Mooca / Gráfica Vanorden. (2016) Outro bem cultural tombado em esquina da Borges de Figueiredo, Rua Monsenhor Felipo, faz parte do dia a dia das pessoas que moram e circulam naquela área para ir e vir de trem. Fonte: acervo da autora

Figura 61 – Passarela da Visconde de Parnaíba. (2016) A passarela da antiga São Paulo Railway, ao lado do Museu da Imigração, é um remanescente histórico da engenharia inglesa que não recebeu, ainda, a proteção dos órgãos de preservação. Sob responsabilidade da CPTM, atualmente encontra-se fechada. Fonte: acervo da autora.

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Através do exercício do olhar, distraído ou apurado, busca-se encontrar o

espírito da Mooca, ou mesmo as razões de seus moradores estabelecerem

sentimentos de pertencimento em relação ao bairro. Tentar entender os

sentimentos que os moradores ou frequentadores cultivam pelo bairro, torna-se

pertinente e necessário quando o assunto é patrimônio e suas relações com a

memória, com as representações sociais, que nutrem o sentimento pelas coisas e

o pertencer a um determinado lugar, neste caso, a Mooca.

São como pistas que levam a outras pistas, esse caminho de entender o

que separa o real do imaginário coletivo que as pessoas criaram sobre seu bairro

e sua história, seus lugares e acontecimentos. Tudo isso junto, talvez se pudesse

dizer, seria o começo do entendimento sobre o que é o patrimônio de um bairro

como a Mooca. Dessa “construção de sentidos” (VASCONCELOS, 2014, p. 2)

que conferem a esse ou aquele objeto, bem como a um acontecimento, a um jeito

de ser, algo do intangível, determinado valor, significado, importância, e neste

caso, também, a certos afetos que se tem por esse lugar.

Interessante refletir sobre alguns pontos que Vasconcelos (2014) expõe,

com base em autores que pesquisou, e que podem levar a um entendimento

sobre os olhares sobre a Mooca, que será abordado logo em seguida:

A Memória Coletiva de Maurice Halbwaschs traz a reflexão sobre a

(im)possibilidade de uma memória estritamente individual.

Halbwaschs acredita que: “estamos então tão bem afinados com

aqueles que nos cercam que vibramos em uníssono, e não

sabemos mais onde está o ponto de partida das vibrações, em nós

ou nos outros” (HALBWASCHS, 1990, p.47)

[...] memória como teia extensa [...] que se incorpora à vivência do

sujeito, constituindo-se também em pilar de sua identidade.

(VASCONCELOS, 2014, p. 2)

E se tudo não passa de uma questão de “ressonância” dos objetos e da

imaterialidade que evoca o espírito do lugar, cujo alimento principal são os

“sentimentos” e a “emoção”, remete-se ao elemento humano para que expresse

suas histórias e auxilie na busca para encontrar o que seria, de algum modo, esse

‘espírito mooquense’ e suas peculiaridades.

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3.2.2 Olhares sobre a Mooca

Devido às características singulares que o bairro da Mooca possui e ainda

prevalecem no imaginário das pessoas mais antigas, algo que de uma certa forma

influencia até quem vem de fora, é que surgiu a questão que passou a nortear

esta pesquisa: que instrumentos poderiam, de algum modo, identificar os

significados atribuídos ao bairro da Mooca, e saber como perduram até os dias de

hoje valores que a todo tempo são lembrados e citados pelas pessoas e

reforçados na mídia.

A partir dessa indagação, optou-se por realizar algumas entrevistas com

agentes e/ou atores sociais que exercem papel de relevância e influência no meio

em que atuam. Apesar da escolha ser restrita a seis pessoas, o alcance das

ações que realizam ou fomentam atinge grupos expressivos das pessoas que

vivem e trabalham no bairro, exatamente pelo fato de serem formadores de

opinião, atuando como empresários, professores, gestor público (subprefeito da

Mooca) ou liderança local. Este foi o critério de escolha dos entrevistados.

Contaram, ainda, os seguintes aspectos que os caracterizam de forma

distinta: ser morador antigo, ter ascendência imigrante, atuar na área de

educação da região, empresário local, jovem empresário da região em início de

carreira, profissional atuante no meio de defesa do patrimônio, ter acesso ao

universo jovem, especialmente como professor.

Paralelamente às entrevistas, a pesquisa realizada nas redes sociais,

especialmente em páginas do Facebook que registram temas ligados ao bairro da

Mooca, ampliou, além dos seis entrevistados, o universo de referências. Foi

possível identificar conteúdos temáticos variados, registrados por pessoas do

bairro e de outros lugares, muitas expressando suas primeiras impressões sobre

a Mooca e compartilhando a experiência de viverem num local diferenciado.

Sabe-se que a imagem da Mooca no imaginário coletivo esteve sempre

ligada a um bairro de origem industrial, operária e, predominantemente, italiana.

Esta caracterização aparece nos estudos acadêmicos sobre o bairro, bem como

em reportagens e nos relatos (depoimentos, entrevistas etc.) de antigos

moradores e/ou frequentadores do bairro.

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Avaliar, portanto, a percepção que se tem da Mooca de ontem e da Mooca

hoje pareceu, no decorrer das pesquisas, ser um caminho a percorrer para melhor

entender algo não palpável, mas que exerce grande influência no bairro como um

todo, e que desde a segunda metade dos anos 1980 vem chamando a atenção

crescente da mídia e das pessoas que não moram ali, a tal ponto de parecer uma

experiência quase sensorial.

Porém como exemplifica Arantes (2006), é pela experiência de habitar a

cidade, em porções do território, que se dão os “sentidos de lugar”, por isso a

ideia de “construção social”, considerando

[...] que não se vive em abstrato, mas em determinado tempo-espaço. E é nesse marco territorial, cultural e histórico – a cidade artefato – que os sentidos de localização e de pertencimento, assim como a consciência de si, são constantemente refeitas e acumuladas ao longo do tempo. (ARANTES, 2006, p. 430)

Utilizando-se o espaço da fábrica como símbolo de uma representação

social que marcou tempo e presença no bairro e na vida das pessoas, percebe-se

que, trabalhar nessa ou naquela fábrica - a despeito das más condições de

trabalho de algumas delas afetarem individualmente o trabalhador - no sentido

coletivo imprimia um certo status aos operários quando estes se reuniam para

alguma atividade desportiva entre fábricas, ou mesmo quando perguntados aonde

trabalhavam, diziam com orgulho pertencer a essa ou aquela indústria. Essa

identidade com o local de trabalho é um sentimento que perdura até mesmo

quando o funcionário se aposenta.

Um caso concreto desse sentimento de pertença que gera o binômio

operário-fábrica está no relato do ex-antarcticano Bonifácio Calixto Paixão, 69

anos, que dedicou 32 anos de sua vida à famosa fábrica de bebidas, Companhia

Antarctica Paulista. Participante exemplar das atividades sociais estimuladas pela

agremiação da referida fábrica, a ARCA, sigla para Associação Recreativa e

Cultural da Antarctica, Paixão não chega a se referir de forma saudosista dos

tempos vividos na Antarctica, tamanha força que a imagem do lugar continua a

exercer em seu imaginário.

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Promovemos encontros semestrais com os ex-funcionários, inclusive com os que trabalham na AMBEV24. É uma festa só, tem ex-funcionário que mora na Alemanha e faz até teleconferência pra se sentir presente no encontro. Parece que o tempo não passou e que continuamos ali, sendo os mesmos colegas de trabalho de tantos setores da Antarctica. Tempo que jamais vai se apagar. (Bonifácio Calixto Paixão em depoimento oral)

Figura 62 - Paixão, memória viva. (2012) Bonifácio Calixto Paixão trabalhou durante mais de 30 anos na Cia. Antarctica Paulista e se orgulha de ter um acervo de fotos, objetos, publicações e jornais da antiga companhia em que trabalhou. Fonte: acervo da autora.

Paixão trabalhou durante mais de 30 anos na Cia. Antarctica Paulista e,

para ele, tudo permanece muito vivo nas lembranças. Em sua casa, mantém um

acervo documental, fotográfico e de objetos da fábrica, colecionados por ele ao

longo dos anos, somados aos que foram doados pelos ex-colegas de trabalho.

Além de cultivar essas lembranças, o que ele gosta mesmo é de manter relações

com todos que conheceu na fábrica durante os anos em que trabalhou lá, tanto

que boa parte desse grupo continua a se reunir duas vezes ao ano. A menção ao

ex-funcionário da Antarctica deve-se ao fato de ser um exemplo vivo dessa

vivência dentro de uma fábrica, do tipo de relação que os operários de diversos

setores cultivavam entre si, incluídos aí os superiores hierárquicos, e a questão

do orgulho, como já citado, em terem pertencido ao quadro funcional de uma

24

Ambev é sigla para American Beverage Company, surgida da união da Companhia Antarctica Paulista e da Companhia de Bebidas das Américas. Primeira multinacional brasileira, a Ambev torna-se a terceira maior indústria cervejeira e quinta maior produtora de bebidas do mundo. Fonte: Junta Comercial do Estado de São Paulo.

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dessas fábricas que até os dias atuais figuram entre as maiores do país e do

mundo.

A qualificação desse patrimônio material e, principalmente, imaterial, é de

caráter existencial, do viver aquele momento diário em sua vida. Os tempos de

cada uma dessas vivências não se apresentam de maneira ordenada ou

cronológica, pois funcionam através de associações livres entre essas

lembranças e os fatos do passado.

Tentando entender o espírito de ser mooquense

Não vou dizer o que a Mooca é para mim e sim o que ela era para o meu pai: ele se dizia brasileiro de coração e alma [...] que o Brasil era o melhor país do mundo [...] São Paulo, a locomotiva do Brasil [...] São Paulo a maior cidade do Brasil [...] a Mooca o melhor bairro, pois era um dos mais próximos do Centro [...] e a RUA DOS TRILHOS a melhor rua do bairro, por ser residencial, cortar o bairro de ponta a ponta, e ser uma rua conhecida. Eu respondi: então nós moramos no melhor lugar do mundo. Ele continuou: sim, aqui na nossa casa – RUA DOS TRILHOS 2.132 ! (Gilda Schmidt, 74 anos, em depoimento colhido em 26/05/2016)

Na busca dessas narrativas e vivências que expressem os significados do

bairro, que cheguem o mais próximo possível do que seria o espírito da Mooca, e

de como avaliar essa percepção que se tem hoje da Mooca e o que confere a ela

essa “marca” de ser um bairro diferente, querido e desejado por muitos, recorreu-

se à opinião de alguns atores sociais do bairro, tanto em entrevistas e conversas

informais, entremeadas por algumas perguntas idênticas, bem como a uma

análise preliminar de algumas páginas nas redes sociais, especialmente o

Facebook, que tratam do tema Mooca.

A principal pergunta lançada foi: “saberia dizer o que é esse espírito de ser

mooquense?” Ao se abrir as páginas do Facebook voltadas ao bairro e seus

moradores/frequentadores, o que se nota, de imediato, é um pensamento

ufanista, de quem se orgulha muito de viver na Mooca, ou mesmo de ter uma

forte ligação com o bairro. Mesmo nos posts que não são especificamente de

relatos sobre o bairro, e que não enfatizam o caráter histórico, apenas o

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contemporâneo ou fatos corriqueiros, ainda assim, é possível conferir esse

sentimento.

Precedendo as entrevistas estruturadas, realizamos alguns contatos com

um público da Terceira Idade, que frequenta a Universidade Aberta à Maturidade

da Universidade São Judas Tadeu. Mesmo nessas conversas menos formais,

muitos dos que estão na faixa etária acima dos 70 anos mostraram uma lucidez

muito grande sobre as referências mais importantes do seu passado. As

lembranças de infância e juventude, a casa dos pais, os primeiros amores, até

chegar ao cenário principal disso tudo: o bairro em que nasceram, para onde os

pais imigrantes vieram, ou que, simplesmente, escolheram para viver suas

histórias de vida.

Todos surpreenderam pela vitalidade e disposição aparentes. Mas é Gilda

Schmidt, de 74 anos, que se destaca por reunir alguns requisitos básicos de uma

“típica mooquense”, ou como muitos dizem, é uma “mooquense inveterada”: a

origem europeia (o pai era húngaro), o gosto pela história, especialmente do

bairro, e o amor incondicional pela Mooca, mesmo quando não se vive mais na

região, e que é o seu caso, pois Gilda, hoje, é moradora do Tatuapé. Sua

memória perfeita e o gosto por relatar fatos de sua vida e do cotidiano da Mooca

de sua meninice e adolescência, permitem que se faça um passeio imaginário

sem sair do lugar.

Faz parte das tarefas que os professores passam para a turma da

Maturidade, escrever suas histórias, relatar fatos da vida, de situações que

atravessou, da família, do trabalho, da vida como um todo. Até mesmo, aspectos

da história e da política da época (Revolução de 1924 e de 32, as grandes

guerras, e a morte de Getúlio Vargas, por exemplo), no país e no mundo, são

relatados com propriedade. Recomendável seria, aproveitando um grupo desse

gênero na região, fazer um trabalho mais aprofundado ligado à identidade e

sensação de pertencimento em relação aos lugares de vida.

O saldo final desse encontro com os alunos da Terceira Idade foi

enriquecedor e, como já exposto aqui, é um bom termômetro para medir as

questões relativas à memória, e que merece ser melhor utilizado.

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Foi, contudo, na preparação do roteiro e na realização das entrevistas com

as seis pessoas escolhidas para falarem do “espírito mooquense” que foi possível

aprofundar e identificar, ainda que preliminarmente, algumas das referências que

constroem esse “espírito”.

Como já citado anteriormente, o fato de ser um universo reduzido de

amostragem parece não prejudicar a análise, pois todos exercem papéis que

influenciam um grupo bem maior de pessoas e têm condições de refletir e

colaborar com a discussão do eixo condutor da entrevista: a ideia do espírito

mooquense por meio de suas impressões pessoais e percepção profissional à

frente das funções que exercem.

Como explica Gil (2008):

As pesquisas exploratórias têm como principal finalidade desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e ideias, tendo em vista a formulação de problemas mais precisos ou hipóteses pesquisáveis para estudos posteriores. De todos os tipos de pesquisa, estas são as que apresentam menor rigidez no planejamento. Habitualmente envolvem levantamento bibliográfico e documental, entrevistas não padronizadas e estudos de caso. Procedimentos de amostragem e técnicas quantitativas de coleta de dados não são costumeiramente aplicados nestas pesquisas. (GIL, 2008, p. 27)

No que tange às entrevistas, tomando por base o mesmo autor, é certo que

as mesmas ajudam e “possibilitam ter um contato com a realidade vivida pelos

atores sociais”, por isso a decisão tomada, durante o avanço deste trabalho, em

realizar algumas entrevistas de caráter informal. Mesmo com o tempo escasso

para avançar nesse método, ainda assim a contribuição dessa parte ao trabalho

foi relevante e esclareceu, ou mesmo confirmou, aquilo que se entende e aqui

denomina por “espírito mooquense” e esse estado de ser do morador /

frequentador do bairro.

Segundo Gil:

[...] à medida que as leituras e entrevistas vão sendo realizadas, o problema vai se aprimorando, tornando-se mais claro e mais específico, o que irá contribuir, isso sim, para a construção de hipóteses mais pertinentes e elaboração de instrumentos mais adequados para a coleta de dados. (GIL, 2008, p. 37)

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No caso específico de dois dos entrevistados - Ângelo Agarelli, que

administra o Portal da Mooca, e de José Américo Crippa Filho, que criou a

associação Distrito Mooca -, esse universo parece se ampliar ainda mais, dado o

alcance de público que atingem. A diretora de escola, Ângela Limberg, por força

do ofício, conversa e interage com seus alunos, pais e outros professores, além

de realizar um trabalho permanente extraclasse com os alunos sobre o bairro

aonde vivem ou estudam. Francisco Antonio Parisi é empresário local em contato

com outros empresários que mantêm negócios na região. Além disso, participa de

diversos eventos e é membro do Rotary Mooca, além de dirigir a distrital mais

antiga da centenária Associação Comercial de São Paulo (à época em que foi

entrevistado), o que amplia significativamente seu universo de atuação e o

alcance de suas realizações. Entrevistar o subprefeito da Mooca, que atuou na

gestão passada, encerrada em dezembro de 2016, foi uma escolha pensada

também, pelo alcance e repercussão de seu pensamento e ação, ainda mais pelo

fato de ser uma figura pública atuando como um braço da Prefeitura na região.

O acervo digital da Mooca – Ângelo Agarelli

O primeiro dos entrevistados, Ângelo Agarelli, tem 69 anos, nasceu na

Mooca e sempre morou na região. Nasceu na rua dos Trilhos, depois morou na

rua Domingos de Oliveira, na avenida Paes de Barros e, atualmente, vive na rua

Etiópia, todos logradouros do bairro da Mooca. A paixão pelo bairro e pelo time do

coração, o Juventus, só são superadas pelo amor à família. A origem italiana e a

formação da família no bairro são motivo de orgulho para ele. Ângelo é o fundador

do Portal da Mooca, site iniciado em 1999 e que se tornou referência sobre o

histórico do bairro e a memória de seus moradores, especialmente das famílias

mais antigas.

Hoje, mantém também uma página no Facebook que chega a ter, em

média, 7 mil visualizações diárias25.

25

A parte da entrevista de Agarelli, em que ele dá mais detalhes sobre o funcionamento da página no Facebook, encontra-se referenciada no próximo item deste Capítulo, sobre a Mooca nas redes sociais.

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Agarelli destaca os costumes e a tradição, bem como esse hábito entre as

pessoas de se falarem, de se conhecerem, como o grande diferencial da Mooca

em relação aos outros bairros:

Com a vinda dos prédios no lugar das indústrias, vai se perdendo um pouco essas características, mas quando os jovens tomam conhecimento sobre a Mooca, leem a respeito e ficam sabendo como é o jeito de ser mooquense, eles vêm conferir de perto e começam a cultuar essas características.

Uma das questões centrais, sobre a Mooca operária, teve como resposta

do antigo morador e administrador do site, o seguinte:

Não diria (que a visão seja ainda de bairro operário). Ainda existem prédios de muitas indústrias que fazem lembrar bem. Eu noto que há uma tendência de se considerar o passado melhor que o presente, o modo de vida daquela época, havia mais amor e respeito. Qualidade de vida e tranquilidade também. A Mooca preserva muito disso ainda. E o mooquense vive, de um certo modo, o passado. Quem vem para cá de fora nota essa diferença, vê o pessoal com a camisa do Juventus...que bairro tem isso? Ver as pessoas vestirem a camisa do próprio bairro...”! Até adesivo “Amo a Mooca...” Esse é um ponto marcante que não se vê em outro lugar da cidade. Não temos mais aquele hábito de puxar a cadeira para fora do portão, mas a vizinhança se conhece.

Quanto às transformações, Agarelli considera que quem sente mais é

quem já está aqui e mora há bastante tempo, já que percebe o aumento no

trânsito, no barulho, a questão da segurança e o tipo de pessoas que passam a

frequentar o bairro. Ainda assim, os novos moradores enxergam a Mooca como

um lugar melhor para se viver em relação a outros bairros da cidade.

A juventude é percebida como mais bairrista e tradicionalista, “se interessam

muito pela história, e por ela se apaixonam facilmente”:

Vira e mexe aparecem alunos fazendo seu TCC sobre o tema “Juventus” e sobre a Mooca também. Quando eles vêm para cá e conhecem o estádio, essa garotada de menos de 18 anos se torna habituèe do clube. A torcida até aumentou. A mesma coisa quando aprendem mais sobre o que é a Mooca. Logo se apaixonam...

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Sobre o espírito de ser mooquense, fica evidente o binômio tradição e

família. Nas palavras de Agarelli, “é você amar o lugar em que você está e não ter

vontade de ir pra outro lugar”.

Mooca, refúgio de ‘heróis’ – Alexandre Franco Martins

Outro entrevistado foi Alexandre Franco Martins, de 39 anos, arquiteto de

formação com especialidade na área de restauro e patrimônio, que colaborou com

alguns casos importantes de preservação do patrimônio da Mooca, como o

tombamento do Cotonifício Crespi, hoje ocupado pelo Supermercado Extra, da

antiga Creche Ninho Jardim Condessa Marina Crespi, e vem colaborando, desde

então, com pautas relacionadas ao patrimônio da Mooca, cuja mais recente é a

tentativa de trazer de volta um monumento comemorativo de um feito histórico do

piloto Eduardo Pacheco Chaves (Edu Chaves), realizado há 102 anos, no extinto

Hipódromo da Mooca, área ocupada atualmente pela Subprefeitura da Mooca e

outros próprios públicos.

Sobre o que teria mudado hoje em relação ao cenário do começo dos anos

2000, o arquiteto responde:

O reconhecimento da importância dos testemunhos dos acontecimentos históricos da Mooca e da cidade de São Paulo, a preocupação em sua permanência e a vontade de sua preservação atuais são as mesmas daquelas expressas na década de 2000 quando nos articulamos para evitar a demolição de um edifício que materializa um período histórico e que foi cenário dos principais acontecimentos do bairro e da vida da maioria de seus moradores.

Martins aponta algumas mudanças nesse meio tempo, além da experiência

adquirida:

[...] a maior capacidade em organizar um movimento como este, auxiliado pelas novas tecnologias e mídias sociais, e principalmente pelo aumento do conhecimento e identificação das pessoas por estas edificações históricas, ainda que elas não sejam protegidas ou tombadas pelos órgãos de preservação.

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Ao avaliar a visão da Mooca hoje e sua história, bem como a maneira como

as pessoas enxergam o patrimônio histórico do bairro, Martins enfatiza que não

se trata, simplesmente, de saudosismo, e sim de uma identidade pura que

preserva valores como a família, suas histórias, lugares e o sotaque

inconfundível:

Os agentes responsáveis pela formação e desenvolvimento da Mooca foram os mesmos de diversos outros bairros de São Paulo, como a Lapa ou a Barra Funda: o imigrante europeu e as indústrias. Mas, ao contrário destes distritos, a identidade da Mooca está fortemente associada a estes dois processos históricos. Quando é mencionada a imigração do início do século, principalmente a italiana e a industrialização, a Mooca é a primeira referência. E hoje, nas primeiras décadas do século XXI, a visão que se tem da Mooca é a de um bairro tradicional, muito festivo, constituído por famílias de descendentes italianos que se reúnem aos domingos para [a] macarronada, com antigas fábricas e pizzarias.

Sobre as mudanças e transformações ocorridas ao longo de todos esses

anos, desde o fechamento das primeiras indústrias do bairro, dos anos 1990 para

cá, Martins expressa opinião semelhante à de Ângelo, ao dizer que a identidade

continua forte e serve como referência para os moradores “históricos” (destaque

dele) e para os novos, que logo incorporam para si todo o passado da região. As

mudanças, inevitáveis, puderam ser sentidas em toda a cidade, não apenas na

Mooca, com a fuga das indústrias para o interior e outros estados e o processo

vertiginoso de verticalização.

À pergunta estimulada de como um jovem profissional como ele, à época

com apenas 23 anos, atuou diretamente sobre essas questões do patrimônio,

Alexandre responde que os jovens se interessam por temas ligados à memória e

história do bairro:

Morar em um bairro com um passado, vamos dizer assim, heroico, constituído por gente que enfrentou adversidades, atravessou o oceano, muitas vezes sem nada, trabalhou, foi explorado, constituiu família, educou os filhos e venceu, garante uma genealogia que motiva. É como se você fosse descendente de um rei ou um personagem histórico relevante. Acredito que é assim a visão dos jovens sobre a Mooca.

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Martins não mora mais na Mooca, mas já morou até os 24 anos na Vila

Bertioga, na rua Avaí, e ao ser perguntado sobre que locais físicos representariam

esse espírito de lugar da Mooca, não hesita em dizer: “eu elegeria a rua Taquari e

o Cotonifício Crespi.

Já sobre o espírito de ser mooquense, ele considera a consciência histórica

da ação humana, da vontade sobre os acontecimentos. Não entende que haja

apenas uma visão saudosista sobre o bairro, e sim “uma visão histórica, cujo

passado ainda continua presente nas histórias familiares, nos lugares, no sotaque

típico”.

Sobre a visão do jovem em relação a temas como preservação e

patrimônio, Alexandre, que também é professor, entende que os jovens são

grandes defensores e querem fazer parte.

[...] os jovens da classe média e média alta que habitam nosso bairro e muitos outros, com a informação ofertada pela internet e mesmo a educação formal recebida nas escolas, estão sensíveis a estes temas, sendo, acredito eu, uns dos principais defensores.

É uma fase em que estão em busca de sua identidade e de se firmar no

mundo. Por isso, em sua opinião, o fato de morarem em um bairro histórico como

a Mooca imprime um certo ar de heroísmo, a começar pela saga dos imigrantes

que enfrentaram tantas dificuldades e adversidades para garantir o pão de cada

dia e condições melhores de vida. “E é como se eles pudessem fazer parte

desses heróis de ontem”, segundo Martins. Para ele, esse é o “espírito da Mooca”

que move as pessoas.

A Mooca e sua nova vocação – Francisco Antonio Parisi

O outro entrevistado foi Francisco Antonio Parisi, 57 anos, nascido na

Mooca, bairro onde morou por 30 anos, mas do qual nunca saiu, como diz, por ali

exercer atividades empresariais (é dono de agência franqueada dos Correios na

Mooca, desde 1992) e institucionais. Rotariano ativo, exerce atualmente a

superintendência da Distrital Mooca da Associação Comercial de São Paulo,

organismo centenário que fomenta o empreendedorismo, mas que tem em seu

histórico o amparo e apoio a ideias voltadas ao civismo e à cultura, bem como aos

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principais acontecimentos da história da cidade e do país, temas que, segundo

ele, fazem parte da história da Associação Comercial, que “sempre apoiou essas

manifestações culturais e cívicas”.

Estudou na também centenária Oswaldo Cruz, e nas escolas Armando

Araújo e Firmino de Proença. Também estudou na Faculdade Anhembi-Morumbi.

Passou boa parte da infância e juventude no Juventus, lugar que para ele, bem

como o Largo São Rafael, traduzem esse espírito de ser mooquense, por serem

os lugares que marcaram uma época de sua vida, da infância à adolescência. O

pai, de nome Raphael Parisi, foi um dos diretores da Fundação Ferraz de

Camargo, o Grêmio sócio-recreativo da Companhia União dos Refinadores,

fabricante do açúcar União e do café Caboclo. Era uma época em que as

indústrias aproximavam a família do trabalhador através de uma série de

atividades lúdico-recreativas, como lembra bem Parisi, e que se tornavam uma

espécie de “quintal” estendido da própria casa. Parisi lembra bem desse período,

não se considera um saudosista, mas em sua opinião, teve uma infância feliz e

especial.

Sob a ótica de um empresário da região, Parisi diz que a visão, hoje, de

quem vem de fora, é que a Mooca é um bairro certinho, onde tudo funciona:

[...] sabemos das carências, uma delas é o Patrimônio Histórico e saber o que o bairro quer, daqui para a frente. O que nos conforta é ver pessoas engajadas que não permitem que tudo isso aqui acabe. A elas, dou todo o meu apoio. As mudanças do pequeno comércio, a área gastronômica que está ficando forte [...], o Tatuapé é o exemplo do que vai acontecer aqui.

O cenário é muito favorável. A Mooca é vista como um lugar organizado e as pessoas que investem aqui já vêm com uma percepção muito boa do local. O pequeno empresário percebeu que precisa se atualizar também, participar mais, e isso já vem acontecendo.

A Mooca está se consolidando como área de Serviços. Logo mais, teremos mais 320 salas comerciais [...] (referindo-se ao empreendimento que está sendo finalizado na antiga área da fábrica Ar Frio, nas ruas Lituânia e Valentim Magalhães). É uma mudança significativa de cenário.

Parisi entende que a percepção de um bairro fabril, de origem operária,

mudou um pouco, mas há um saudosismo que se mantém é e cultivado na

família, que vem dos avós, pais, e os filhos de hoje, na faixa dos 50 a 70 anos.

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[...] cultivamos essa herança. O próprio Juventus é assim. Tenho um filho menor, de 16 anos, e ele tira sarro disso tudo, mas agora ele está começando a assimilar a Mooca e quer vir pra cá o tempo todo. Tem muito a ser feito nesse sentido, mas se ficarmos unidos, iremos alcançar o objetivo.

Ele acredita que a essência da Mooca se mantém, mesmo com as

mudanças aparentes. Em sua visão, tem mudado arquitetonicamente, com a

chegada dos prédios, mas a Mooca conserva ainda alguns exemplares e tem

pessoas que não deixam isso acabar. Há esse orgulho de ser mooquense, de

dizer que aqui é como um país, algo que para ele vai ficar e perdurar.

O espírito mooquense, para Parisi, reside na espontaneidade das pessoas,

que fazem as coisas de coração e colocam sua alma em tudo o que fazem. E

exemplifica com os eventos de aniversário dos 460 anos, em que houve uma

“união de forças e de talentos” para realizar uma festa que contou com uma

exposição fotográfica sobre a origem operária da Mooca (“Mooca Origine

Operaria”), um evento de cunho histórico e cultural no dia do aniversário do bairro,

em 17 de agosto, e uma série de outras atrações.

Essa união entre empresários, comunidade e vocês que fomentam a cultura local e a preservação histórica do bairro foi super importante e deu frutos. E é um processo contínuo que queremos passar na troca de gestão, agora em 2017. Não tem isso nos outros bairros. A Mooca é diferente, mesmo. Ouço os outros superintendentes dizerem “na minha região não tem isso...” [...]

Os elevados índices da Mooca – Evando Reis

Evando Reis, 59 anos, foi entrevistado em agosto de 2016, período em

que ainda era o Subprefeito da Mooca, divisão regional da Prefeitura de São

Paulo que engloba também dois distritos mais centrais, como o Brás e o Pari, e o

Tatuapé, Belenzinho e Água Rasa, mais à leste da cidade. Engenheiro de carreira

da antiga Light, Evando ficou quase três anos à frente da Subprefeitura da Mooca.

Nascido em São Miguel Paulista, na zona leste, lugar aonde reside, Evando Reis

confessa que “vestiu a camisa” e até o hábito mooquense de trajar a camiseta do

Juventus no final de semana absorveu para si. Considera-se um “mooquense

nato”, e vê como a “cara” da Mooca o Juventus, a Paes de Barros, o Di Cunto, a

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Subprefeitura da Mooca, o Museu da Imigração e o Moinho Santo Antônio. Para

ele, ser mooquense é ser o que todos gostariam de ser: “ter gosto e paixão pelas

suas raízes”.

Sobre os outros distritos que englobam a Subprefeitura, o ex-subprefeito

afirma que são todos distritos estruturados, mas com características próprias. “A

Mooca, por ser mais antiga e histórica, tem esse apelo mais forte da tradição, e o

seu IDH é mais elevado, porque o mooquense toma conta do seu bairro”.

Apesar de não ter nascido aqui, Reis já conhecia a Mooca desde os anos

1980, pois tinha amigos que moravam na região e ali se encontravam,

especialmente na Paes de Barros (avenida principal da região) para fazerem seus

programas domingueiros e saídas noturnas para se divertirem, comer, paquerar.

Lembra também que sua formatura da turma de Engenharia em 1981 foi realizada

no Clube Atlético Juventus:

Mal sabia eu que estava sendo ‘preparado’ (grifo do entrevistado) para me tornar subprefeito anos mais tarde, aqui na Mooca, lugar que me recebeu de braços abertos. Sinto uma afinidade muito grande com a região. Como mooquense honorário, adotado, poderia dizer: tô em casa.

Em sua opinião, as transformações não vão acabar com o espírito da

Mooca porque sua história é muito forte e presente:

Não passou e nunca vai passar essa lembrança da origem fabril e operária da Mooca. Só faz história quem tem história. E a Mooca é esse exemplo vivo de um passado grandioso que faz dela hoje um dos melhores bairros para se viver. Na minha opinião, deve continuar essa forte tendência de cultivar a memória do bairro. Afinal, tem muita história para se contar. E tudo isso deve ser preservado.

Reis considera que esse espírito que o bairro da Mooca apresenta, e que é

tão percebido pelas pessoas e por elas absorvido, deveria existir nos demais

distritos e cita Itaquera, local que frequenta até hoje e que foi seu primeiro

endereço de infância, como um lugar que perdeu esse espírito, que tinha usos e

costumes arraigados, de aspecto quase rural, mas que com o crescimento,

acabou se perdendo:

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Isso de amar e gostar da região em que se vive, perdeu-se com o tempo em Itaquera e perdura até hoje na Mooca. Imagine um lugar que possuía cerca de 50 mil habitantes que hoje ultrapassa o um milhão de pessoas. Os prédios trouxeram um certo isolamento e distanciamento das ruas. Como consequência, as pessoas deixaram de viver de fato. O diferencial da Mooca é manter acesa essa chama, esse cuidado e amor sem igual. Não pode se perder.

O sentimento de pertencimento do mooquense – Ângela Limberg

Como educadora na região desde 2003, Ângela Limberg está na faixa dos

45 aos 50 anos e dirige a centenária escola estadual Oswaldo Cruz que, na época

de grupo escolar, alfabetizou milhares de moradores, incluindo o entrevistado,

Francisco Parisi. Por isso, sua presença forte nas lembranças de tantos desses

moradores. Moradora da Mooca desde 1998, Ângela já morou na Rua da Mooca

por dois anos, ao lado da saída do Colégio São Judas, depois morou na Avenida

Paes de Barros até dezembro de 2015 e, no momento, mora na Rua Marques de

Valença. Trabalhou no Oswaldo Cruz em 2003 e 2004, depois retornou em 2007,

e está lá até hoje, onde pretende se aposentar.

Ângela entende que as mudanças estão acontecendo no bairro e que

outras influências vão tomando conta, pouco a pouco:

Hoje temos outros imigrantes que vêm para São Paulo e passam a morar aqui. São chineses, árabes, bolivianos, africanos. A Mooca é muito divulgada como bairro ótimo para se viver, que acaba provocando essa onda de gente que não para de chegar, de dentro e de fora.

Em relação aos alunos de origem estrangeira, o impacto de professores e

funcionários na escola acontece logo de cara, já que é preciso traduzir o que eles

dizem e pensam, através da palavra escrita e falada.

Sobre essa “cultura mooquense” e o espírito do bairro, Ângela logo emenda:

Vou falar por mim. Quando vim pra Mooca em 1998, fui morar na Paes de Barros, no edifício Orquídea. Com todo respeito, era um reduto de carcamanos, como se diz dos italianos em geral. Eles todos têm um forte sentido de pertencimento ao acharem que o prédio é deles, bem assim o bairro inteiro. E isso engloba a história, a memória, os costumes.

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Essa ideia de propriedade, como diz, é muito forte entre os mooquenses

que brigam pelo bairro, por sua melhoria, o que ajuda a manter lugares históricos

ainda de pé:

É uma espécie de patriotismo misturado com orgulho de ser daquele lugar, com essa ideia de propriedade. É o Juventus, a escola, o teatro [...] é tudo deles! É certo afirmar que quando é amado, é cuidado. E isso não se vê nos outros bairros. Esse sentimento tão forte.

Para a diretora do Oswaldo Cruz, a simples permanência da chaminé da

União, na rua João Antonio de Oliveira, demonstra que as pessoas “brigaram”

pela história do lugar. Ao ser perguntada sobre como o jovem encara todo esse

patrimônio e a história local, ela diz que os alunos se sentem orgulhosos disso

tudo, e de estudarem numa escola centenária:

Em outras escolas públicas você vê muita depredação, vidros quebrados, paredes pichadas. Aqui não se vê nada disso. Às vezes deixamos a Sala de Vídeo aberta com os equipamentos, e nada acontece. Os alunos daqui, quando terminam o Ensino Médio, voltam pra cá pra nos visitar, ver como está a escola, matar a saudade. Os estudantes bem mais antigos vêm direto aqui pra rever a escola.

Limberg lembra que a escola vem fomentando a Educação Patrimonial,

com aulas de sensibilização, a partir do acesso ao acervo antigo de fotos e

documentos do Oswaldo Cruz, bem como visitas de campo para conhecerem

lugares históricos e até mesmo conversar com pessoas da região:

Trabalhamos em conteúdo de aula sobre a história da Mooca, por isso convidamos pessoas atuantes como você, para contar mais sobre o bairro e seu patrimônio histórico, bem como recomendamos leituras de jornais da região. Mas o que eles mais gostam é de fazer as visitas aos locais. Já fomos conhecer a Paróquia São Rafael, o Museu do Imigrante, o Estádio do Juventus, o Di Cunto. Lá, fomos muito bem recebidos, a molecada adorou. Quando eles voltam, fazem desenhos do que viram e escrevem seus relatos. O Plácido (diretor do Juventus) até montou quadrinho desses desenhos!

Essa relação que a escola mantém com a região legitima, na opinião da

diretora, o que a Mooca “tem de melhor”: “as relações humanas”. Ela lembra que

um dos antigos alunos, Bartolomeo Lococciolo, que foi presidente do Conseg do

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8º D.P. e é dono do Pastifício Carasi, faz questão de mandar, todo ano, o bolo de

aniversário da Escola.

Para Limberg, o espírito de ser mooquense é isso, esse vínculo forte, o

amor ao bairro e às suas origens e aos lugares significativos na vida de todos,

como é o caso do antigo Grupo Escolar Oswaldo Cruz, e de querer tomar como

propriedade tudo que tem no bairro.

Um ponto que ela relaciona com a Mooca, que dá esse sentido de lugar

seria o Clube Juventus, por movimentar famílias, adultos, crianças, moradores e

gente que vem de fora para conhecer o estádio e o time do Juventus. Um mais

antigo seria o Museu da Imigração, pois como diz: “foi onde tudo começou”.

A Mooca “descolada” - José Américo Crippa Filho

O empresário José Américo Crippa Filho, mais conhecido como Tatá,

tem 45 anos e foi entrevistado porque hoje protagoniza um movimento que tem a

intenção de ver a Mooca revitalizada através de uma série de ações culturais,

com ênfase para a arte e a gastronomia, esta última, campo de atuação de Tatá

bem como de outros participantes do que eles chamam de ‘Distrito Mooca’.

O cenário em que eles ‘atuam’, especialmente, é o mesmo que

protagonizou momentos destacados na história da região e de toda a cidade, qual

seja: o início da industrialização em São Paulo, no final do século XIX e início do

XX, e na metade dos anos 1980, o surgimento da badalada casa noturna Moinho

Santo Antonio, instalada na antiga fábrica de farinha e óleo Minetti-Gamba,

considerada a primeira investida desse gênero para revitalizar galpões históricos

sem uso ou subutilizados da cidade. O local é a já mencionada rua Borges de

Figueiredo, à margem da linha férrea. Com os Di Cunto, tradicional família italiana

que se tornou um ícone do bairro e de São Paulo com sua confeitaria, a mais

antiga em funcionamento desde 1935, Tatá encontrou apoio para disseminar as

ideias de sua associação ‘Distrito Mooca’, por isso é considerado como o

padrinho do Distrito Mooca.

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Figura 63: Logomarca do Distrito Mooca. (2016) Com criação do artista plástico Mozart Fernandes da Vértices Cenografia - Arte e Design para o Distrito Mooca, a logomarca reproduz o recorte histórico do bairro que abriga o novo movimento. Fonte: reprodução.

Durante a conversa que foi compilada em forma de entrevista, e analisando

as reportagens em que Tatá aparece para falar da associação que criou há dois

anos, a ‘Distrito Mooca’, nota-se que a “ocupação” dos galpões e da área da

Borges de Figueiredo ao longo da linha férrea, a que ele se refere quase o tempo

todo, está ligada, no entender dele, à intenção de trazer mais vida e movimento

ao local, mas com pessoas que consumam arte, a boa gastronomia, e a história

do lugar. Para ele e seus amigos, o cenário natural da Mooca que permanece

com características que são a sua identidade, precisa ser mantido como

inspiração, qualidade de vida, e também como um atrativo que traga as pessoas

para a região.

[...] o Distrito Mooca é um projeto que eu comecei há dois anos

atrás, [...] de revitalização de toda a parte histórica da Mooca, de

toda a parte industrial, que hoje está meio que abandonada, muitas

portas fechadas, e esse meu projeto é [sic] trazer a revitalização,

[...] arte em peso, gastronomia, algumas lojas, barbearias, estúdios

de tatuagem, lojas de antiguidade, de vinil, propostas bem conceito

do mundo moderno. Trazer muito grafite, muita vida, muita cor, pra

todas aquelas paredes abandonadas, das fábricas, dos

galpões...Trazer, também, um pouco do verde pra essa região que

foi sempre industrial, não tem verde,... é um projeto bem bacana

[...], trazendo as pessoas de fora pra conhecer (a área) que

abrange o Museu da Imigração, o passeio da Maria Fumaça, todo

esse paralelo da linha do trem.

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A inspiração, diz ele, veio de Wynwood, bairro da cidade de Miami (EUA),

que sofreu uma transformação urbana que manteve, de um lado, a história local

com seus vários galpões de tecelagem abandonados, e trouxe vida local, de

outro, devido a novos usos, intervenções de arte urbana etc. Para ele, a mesma

ação pode ser implantada na Mooca.

Figura 64 – Wynwood Walls. (2015) Distrito em Miami foi fonte de inspiração para Tatá criar o Distrito Mooca: mix de infraestrutura urbana com jeitinho de cidade pequena acolhedora. Fonte: Acontece.

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Figuras 65 e 66 – Wynwood brasileira. (2016) A presença marcante de brasileiros em Miami também se reflete na arte de rua. Na foto 62, mural dos brasileiros Os Gêmeos. Na seguinte (foto 63), mural do artista brasileiro Kobra na principal rua daquela região. Fonte: Enjoy Miami.

Quando perguntado sobre os locais de referência no bairro, logo cita o

Clube Juventus, a própria rua que leva o nome do clube, local aonde morou a vida

toda:

...a avenida Paes de Barros, o campo do Juventus, o parque aonde

fica o Distrital da Mooca, que foi o Hipódromo de São Paulo, a

gente tem toda a parte histórica da Mooca, a parte mais importante,

principal, de todo o acontecimento da época (da industrialização)

que fica paralelo à linha do trem..., são pra mim os lugares

referência da Mooca.

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Figura 67 - José Américo Crippa Filho (Tatá). (2016) Da cultura low rider direto para projetos gastronômicos descolados e intervenções artísticas, Tatá idealizou o Distrito Mooca e hoje busca aliar esses novos conceitos à preservação do patrimônio histórico e cultural do bairro. Foto: Celso Rodrigues.

Tatá não chegou a responder sobre a visão que as pessoas têm da Mooca,

mas para ele é muito claro que cabe ao morador e às pessoas preocupadas em

cuidar do bairro manter os locais que ainda sobrevivem ao tempo e à ação

humana. A história também deve ser contada e recontada, em sua opinião, pelos

mais antigos que conhecem bem as diversas passagens e momentos importantes

que o bairro protagonizou.

Para ele, o que as pessoas procuram no bairro é essa chamada “ilha de

tranquilidade” que os folhetos publicitários vêm propagando nos últimos 10 anos,

uma espécie de refúgio na cidade grande:

A Mooca tem um diferencial em relação aos outros, ...é um bairro

de raízes, onde as pessoas nasceram e vieram pra ficar, mesmo

sendo um bairro de imigrantes. É um bairro bacana, que a gente

defende. É parecido com um bairro do interior, as pessoas

conversam nas ruas, se cumprimentam. [...] todo mundo se

conhece, é um bairro tranquilo, muito seguro, [...] próximo do centro

da cidade. É o primeiro bairro da zona leste, o Portal da Zona Leste

[...].

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Figura 68 – Mooca funcional. Folheto publicitário distribuído em faróis da região mostra uma Mooca “funcional”, com destaque para a localização privilegiada, proximidade com o centro, infraestrutura completa. O texto fala de ruas “calmas e tranquilas”, com “moradores que se orgulham de viver no local e não o trocam por nenhum outro”. Fonte: reprodução.

O jovem não tem conhecimento logo que chega, como comenta Tatá, mas

quando conhece mais de perto, quer cuidar também. Para ele, viver na Mooca é

cultivar um estado de espírito de quem nunca quer deixar esse lugar. Ele mesmo

faz questão de dizer:

[...] eu não saio daqui, gosto muito do bairro da Mooca.

Ao falar de revitalização e de manter os galpões industriais, bem como a

região do mesmo jeito, com a mesma paisagem histórica que ali se instalou desde

o final do século XIX, tem-se a impressão de que Tatá não está falando a mesma

coisa quando se refere ao tipo de intervenção que anda acontecendo nesses

locais que ele e amigos estão fazendo. A ideia, para ele, é que ocupar a região de

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algum modo que mantenha os locais o mais original possível, faz parte do

conceito desse público Hipster, de formadores de opinião (artistas, chefs,

produtores culturais...), e também é uma forma de “demarcar o território” para que

este não venha a ser ocupado por mais conjuntos de prédios e edifícios, em sua

opinião. Também é a forma encontrada por ele para revitalizar as áreas que se

encontram degradadas.

Essa parte da revitalização, de trazer as pessoas que são formadoras de opinião, que têm algo bacana, um conceito pra agregar aqui no projeto, dentro de um bairro que tem história e cultura, na minha visão [...] tem que ocupar de forma bacana [...] esses espaços ociosos estão prontos para virarem novos edifícios, novos condomínios com as construtoras que vêm chegando, comprando os imóveis, comprando terrenos [...] aí que a gente vai acabar não conseguindo fazer nada. [...] sou pequeno, [...] vou indo vagarosamente, com as pessoas que eu conheço, o meu círculo de influência, tentando ocupar pequenos espaços pra começar a abrir aquelas portas, a dar vida, pra não ser ocupado por mendigo, [...] construtoras, tudo isso.

Figuras 69 e 70 – Mural de boas vindas. (2017) Grafite em muro dá as boas-vindas para quem vem da Mooca baixa pelo Viaduto Alberto Mesquita de Camargo, esquina com a Rua Borges de Figueiredo: “Bem-vindo à Mooca, Bello!”. No prédio laranja funcionou o Frigorífico Anglo e hoje é ocupado pela Central Logística, área de armazenagem de mercadorias. Realização: Distrito Mooca, artista grafiteiro: Sipros.Fonte: divulgação

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3.2.3 A Mooca nas redes sociais

Considerando que as tecnologias modernas (bases de dados numéricos, sites da internet) permitem constituir rápida e eficazmente inventários multimídia que integrem os elementos materiais e imateriais do patrimônio, recomendamos fortemente sua utilização, para melhor conservar, difundir e promover os lugares patrimoniais e seus espíritos. Essas tecnologias facilitam a diversidade e a renovação constante da documentação sobre o espírito do lugar. (DECLARAÇÃO DE QUEBEC, 2008, item 7)

A Declaração de Quebec (2008), sobre o “Spiritu Loci”, é a que mais se

aproxima da ideia de se conjugar “valores afetivos na preservação” (SILVA;

TOURINHO, 2015), e parece revelar as significações e o entendimento de como

as permanências conseguem nutrir a identidade de um lugar, a despeito das

mudanças temporais, dos novos usos, e da permanente transformação social.

São esses novos usos que surgem na região, e até uma nova linguagem

de um bairro que tem sotaque próprio, o mocanhês, eternizado nas páginas de

Guido Carlos Piva (1999) com o personagem Pimpinello Rizoni, e que poderia ter

como fundo de cena o contraste da imagem do mural grafitado na entrada da

Borges de Figueiredo pelo Distrito Mooca, endereço principal de fábricas famosas

que aconteceram ao longo da linha férrea, para se declamar um de seus poemas:

COZA NUOVA E COZA VÉCCHIA Fô buscando argo nuovo, qui entrê no qui sei lá...

só incontrê os sonhi vécchios, quando a los nuovos fui busca.

Fô aí qui capitê:

tutti las coza nuova, é vécchia pra qui usô.

O vécchio qui ezisti im me, é nuovo pra qui sonhô.

O nuovo, qui busco alora, é sonho vécchio qui arguém dexô.

Alora capitê...

non só busco o qui penso nuovo, las coza vécchia vô resgatá,

nas vécchia faço uma iscôlhia, e cum las nuovas io vô giuntá.

[...]

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Nessa mistura du vécchio e nuovo, é qui nói tê qui si agiustá,

é nessi imbrólhio todo, qui vá surgi lá novitá.

(PIVA, 1999, p. 22-23)

O espírito do lugar da Mooca pode contribuir para a conjugação entre o

velho e o novo, como está no poema de Guido Carlos Piva, a relação entre o

passado e o presente que se quer ver num bairro como é a Mooca.

Essa relação, e os confrontos que se estabelecem entre distintas posições

com relação ao novo e ao antigo, ficam claros na análise da imagem da Mooca

nas redes sociais, que podem constituir instrumentos relevantes para avaliação

do espírito do lugar, bem como defende a Declaração de Quebec.

Nesta direção, foi feita, inicialmente, busca, na internet, de dois verbetes,

que se mostraram os mais concorridos: ‘Facebook Mooca’ e ‘Juventus’.

No dia 27-09-2016, pesquisa no Google com a palavra chave de busca

“facebook mooca” gerou, aproximadamente, 7.460.000 resultados.

Figura 71 – Pesquisa "Facebook Mooca". Print da página de pesquisa com a palavra-chave Facebook Mooca mostra o resultado: mais de 7 milhões de citações. Fonte: Google.

Rápida busca, no mesmo período, para o termo “facebook Juventus

Mooca”, contabilizou, aproximadamente, 54.700.000 resultados (conforme link

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<https://www.google.com.br/webhp?sourceid=chrome-

instant&ion=1&espv=2&ie=UTF-8#q=facebook+juventus+mooca>), valores que

vão sendo mudados, constantemente, no decorrer dos dias em que se realizou a

busca, pois, deve-se considerar, ainda, que existem muitas repetições e apenas a

citação da palavra-chave em questão.

Figura 72 – Pesquisa “Facebook Juventus Mooca”. Nesse print da página de pesquisa, a palavra-chave anterior é acrescida do verbete Juventus e os resultados disparam: quase 50 milhões de citações. Fonte: Google.

No dia 7 de novembro de 2016, a pesquisa com a palavra Juventus gerou

124 milhões de resultados (conforme link

<https://www.google.com.br/webhp?sourceid=chrome-

instant&ion=1&espv=2&ie=UTF-8#q=juventus>) a pesquisa sobre a Mooca gerou

7.430.000 resultados, como mostra a reprodução das páginas de pesquisa a

seguir (link: <https://www.google.com.br/webhp?sourceid=chrome-

instant&ion=1&espv=2&ie=UTF-8#q=mooca>):

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Figura 73: Pesquisa “Juventus”. O print da página de pesquisa com a palavra-chave

“Juventus” chega a mais de 100 milhões de resultados. Fonte: Google.

Figura 74 – Pesquisa “Mooca”. Página de pesquisa do Google mostra os resultados para a palavra-chave mooca: mais de 7 milhões de resultados. Fonte: Google.

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De qualquer modo, os números que aparecem nas pesquisas são um

demonstrativo claro do grande interesse que a Mooca e o Clube Juventus

exercem sobre as pessoas.

Encabeça a pesquisa para o verbete ‘mooca’, o Portal da Mooca, do

entrevistado Ângelo Agarelli, cuja apresentação do ‘Quem Somos’ do site é

também um convite e um quase ‘apelo’ ao resgate da história do bairro e de suas

gentes:

O site PORTAL DA MOOCA é escrito por gente que nasceu e cresceu no Bairro e que presenciou todas as suas mudanças ao longo de sua história.

Este site faz parte de um projeto de grande alcance visando a preservação da história deste que é considerado senão o mais, um dos mais tradicionais bairros da cidade de São Paulo.

Nas páginas do Site será contada a história e as histórias da Mooca, de suas famílias tradicionais, de seus personagens ilustres, de seus clubes, seus esportistas, suas empresas, seus lugares interessantes, suas tradições, enfim tudo o que já aconteceu e está acontecendo na Mooca.

Periodicamente, novas matérias estarão sendo acrescentadas. Mas a elaboração das mesmas não ficará restrita aos autores do Site. O “PORTAL” não é uma propriedade particular, mas um patrimônio histórico pertencente a todos os mooquenses. Você, que como nós, é morador ou admirador da Mooca e tem algo interessante para nos contar também pode participar enviando informações, histórias e fotos.

Não deixe que as nossas histórias se percam com o tempo, como certamente já aconteceu com muitas delas.

Colabore! Sua participação será muito importante! (Portal da Mooca)

O site conta hoje com outra importante ferramenta, a página no Facebook,

que imprime um dinamismo maior às postagens que são feitas diariamente, tanto

em termos de alcance e visibilidade, como pelo retorno instantâneo. As postagens

seguem a mesma receita diária: um post de utilidade pública e serviços, um sobre

o Juventus, uma publicação de foto antiga com legendas explicativas e outra, de

caráter mais contemporâneo, que mostra a Mooca hoje para quem está de fora,

às vezes vivendo até em outros países, e quer matar a saudade e saber como

anda o bairro aonde viveu.

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Sobre os depoimentos, Angarelli destacou em sua entrevista que são colhidos a

partir do conhecimento que ele próprio possui das famílias e das pessoas da

Mooca.

Muita gente nos procura também e quer dar sua contribuição. As pessoas mandam informações e dão sugestões para publicação. Procuramos ressaltar a trajetória daquela família, se é alguém que tem alguma relevância para o bairro e sua história. Essa história vai sendo contada pelos próprios moradores mais antigos, daquilo que se lembram ou que tenham ouvido falar.

Um fator importante que ele destaca sobre o andamento do site e sua

permanência no ar para consulta é o fato de que seu objetivo é a ampliação e a

preservação das várias histórias dessas famílias e do bairro, tornando-se, assim,

um grande arquivo virtual.

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Figuras 75 e 76 – Portal da Mooca. Página de entrada do site. No cabeçalho, encontram-se notícias atuais sobre o Clube Atlético Juventus, grande paixão de Ângelo e da grande maioria dos mooquenses. Fonte: Portal da Mooca.

Figura 77 – Portal da Mooca nas redes sociais. Página de entrada no Facebook. Fonte: https://www.facebook.com/portal.damooca/?fref=ts.

Um dia de conteúdo - analisado no dia 06/10/2016 - mostra o tipo de

postagem que é feita, de acordo com o que o administrador do Portal, Ângelo

Agarelli, relatou: um post de divulgação/utilidade pública (programação do Teatro

local, eventos no Museu da Imigração...), imagem/texto/vídeo sobre a Mooca -

Bar do Giba, muito conhecido, próximo ao Estádio do Juventus na Javari, em

reportagem da TV Gazeta com os comentários enaltecendo o estilo mooquense,

que aqui é a “República da Mooca”, com sotaque e jeito próprio etc. Neste caso, o

conteúdo que fala sobre o Juventus está representado nesse post do Bar do Giba,

muito frequentado por moradores e torcedores antigos que vão ao Estádio e já

ficam por lá, ou marcam sua presença, especialmente aos sábados:

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Portal da Mooca

O bairro da Mooca ainda preserva muitas tradições dos imigrantes italianos, portugueses e espanhóis. Uma delas é ir ao jogo do Juventus e depois passar no bar do Giba. O estabelecimento tem cinquenta e dois anos, é frequentado por ex-jogadores, e por inúmeras famílias do bairro. Por tudo isso, o local e a família do Seu Giba são "Cara de São Paulo".

http://www.tvgazeta.com.br/vide…/bar-giba-tem-52-anos-mooca/

...Ver mais

Bar do Giba tem 52 anos de tradição na Mooca

Por tudo isso, o local e a família do Seu Giba são "Cara de São Paulo".

TVGAZETA.COM.BR

Principais comentários

67Você, Angelo E. Agarelli, Adelton Matheus e outras 64 pessoas

2 compartilhamentos

Henrique F. de Andrade Esse estilo Mooquense é conhecido em todo o Brasil. O sotaque,a educação, a prestação de serviço. Italianos,espanhóis, portugueses,gente de todo o Brasil, fazem da Mooca essa 'República' tão especial!

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Henrique F. de Andrade E...dale ô,dale ô!!!

Curtir · Responder · 2 h

Figura 78 – Facebook, conteúdo da página. Reprodução de postagem da página do Portal da Mooca no Facebook destaca um dos redutos mais frequentados dos juventinos, o Bar do Giba, localizado na mesma Rua Javari, aonde se encontra o Estádio e a Esfiharia Juventus. Fonte: https://www.facebook.com/portal.damooca/?fref=ts

Sobre o alcance do site, Agarelli acredita que atinja cerca de 60 países,

possivelmente moradores que foram morar em outros lugares do mundo, como é

o caso de uma senhora que hoje mora na Itália, uma das primeiras a dar esse

feedback do site e, muito emocionada, ficou encantada de encontrar informações,

fotos e história do bairro aonde morou. Na ferramenta Facebook, o alcance médio

chega a 7 mil visualizações diárias, número que salta para 30 mil visualizações,

dependendo do que se posta, segundo informou o entrevistado.

Outras páginas foram analisadas no Facebook, sendo que em grande parte

delas o que prevalece são posts publicitários, ofertas e procura de serviços de

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toda espécie, alguma propaganda política (as pesquisas foram realizadas, grande

parte, no período pré-eleitoral), e eventualmente reclamações sobre buracos e

segurança. Muito pouco foi encontrado sobre o aspecto histórico e de patrimônio

na Mooca. As fotos das páginas de entrada e os nomes escolhidos, porém,

enaltecem esse orgulho mooquense que se nota no morador: Mooca mooquense,

Mooca Uma Paixão, Mooca Eh Mooca, Mooca, Belo!, Principado Independente da

Mooca, Mooca é Mooca, Mooca Mia, entre outras (conforme pesquisa realizada

no dia 07/11/2016, no link

<https://www.facebook.com/search/top/?init=quick&q=mooca&tas=0.57790145100

55034>).

Neste ponto, cabe fazer uso das teorias de Comunicação, especialmente aquelas

que tratam das mudanças nos meios de difusão de informações, de troca de

conhecimentos, da maneira como todo esse aglomerado de ideias fragmentárias

e impressões chegam ao seu destinatário. Maingueneau (2004, p. 71-72) fala de

como o “midium”, que é o meio de transmissão do discurso, mudou com o

advento das novas tecnologias pois, mais que um “instrumento para transportar

uma mensagem estável”, passa a imprimir “um certo aspecto a seus conteúdos e

comanda os usos que dele podemos fazer”.

Com efeito, quando se abre uma das diversas páginas relacionadas ao

bairro da Mooca e ao Clube Juventus, ali o discurso se faz valer de interjeições

que expressam esse estado de espírito de quem vive na Mooca, dentre os quais

se destacam: “é Mooca, meu!”, “Mooca é Mooca”, “Aqui é Mooca!”, “o resto é

bairro!”.

Talvez fosse pertinente um estudo mais aprofundado sobre como funciona

a convergência midiática e a mistura de gêneros de discurso, bem como a

estética da fala, com suas múltiplas linguagens que atingem públicos os mais

variados e inesperados possíveis, mas que esse trabalho não comporta para o

momento. Ainda assim, é interessante registrar que se trata de um processo

ainda em construção, o da análise de discursos em páginas de redes sociais, e de

mensurar e avaliar como esses conteúdos estão sendo produzidos. Melhor

dizendo, qual o universo do seu alcance.

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Lembrando Cogo (2016), é necessário entender de que forma a memória vem

sendo construída nessa “ressignificação dos acervos”, ao fazer uso de uma

“ferramenta de múltiplas vozes”, nessa nova dinâmica da sociedade midiática.

As pessoas que participam das mídias sociais vivem uma dinâmica de

comunicação e apropriação de conteúdos que merece um estudo mais apurado,

já que nesse universo expandido a participação é estimulada, há um certo

engajamento até, conforme o tema proposto nos posts publicados, porém tal

engajamento nem sempre se torna efetivo, nem chega a sair do campo virtual

para se materializar em alguma ação concreta, como alerta Bonas (2016).

Utilizando o exemplo do estudo de caso que é objeto de análise dessa pesquisa,

seria o de buscar formas de proteger o patrimônio cultural existente e também

fomentar atividades voltadas a manter viva a memória das passagens históricas

do bairro. Essas ações não têm se concretizado na vida real, necessariamente,

exceção ao Distrito Mooca que busca na prática (a ação de ocupar imóveis na rua

Borges de Figueiredo) sua legitimidade de chamar a atenção para um nascente

polo cultural e criativo na região, despertando o interesse constante da grande

mídia com matérias positivas que citam uma nova Mooca, e que agora quer ser

reconhecido dentro da própria região. Ainda assim, Tatá e seu grupo mantêm

uma página no Facebook e uma conta no Instagram, ambas do Distrito Mooca, o

que demonstra que as redes sociais têm sua força, bem como as mídias em

geral, o que inclui citar jornais, vídeos, blogs, rádios, movimentos coletivos etc.

Essa nova forma de lidar com a realidade e com a memória, por certo, veio para

ficar e segundo Cogo (2016), assumem sua “relevância política, econômica,

sociocultural e comunicacional”.

No caso das páginas relacionadas ao Distrito Mooca, as atualizações não

chegam a ser constantes, mas sempre que se posta algo surgem os comentários

de seus seguidores. Cabe citar o uso do WhatsApp como veículo para

disseminar tais pensamentos e conceitos, bem como para divulgar os links das

reportagens que saem nas mídias tradicionais (papel) e na internet. De qualquer

forma, a atuação desse grupo se traduz em ações práticas, algumas delas citadas

aqui, quais sejam: alugar galpões de indústrias desativadas e reocupá-los com

usos criativos, da chamada Economia Criativa como, Gastronomia, manifestações

artísticas e bares temáticos. Solicitar melhorias locais como, tapa-buracos,

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limpeza urbana / anti-pichação, melhora na coleta de lixo e entulho, bem como

iluminação, estão entre os itens mais requisitados que eles também reivindicam e

conseguem junto ao poder público local. Tatá, em sua entrevista, lembrou das

ações que promoveu antes do término do ano, para melhorar o entorno da

Estação Mooca de trem, do lado da Rua Borges de Figueiredo: iluminação local,

limpeza, remoção de antigo ponto de táxi desativado e de vendedores

ambulantes.

Figura 79 – Estação Mooca de trem. (2016) Entrada para a estação de trem da CPTM, na esquina das ruas Borges de Figueiredo e Monsenhor João Felipo. O prédio de esquina, número 1, foi ocupado pela antiga Gráfica Vanorden (Antigas Officinas Casa Vanorden), edificação histórica de 1909 tombada pelo Conpresp em 2007, encomendada pelo conde Francisco Matarazzo. Hoje é utilizado, parcialmente, como estacionamento de veículos. O Distrito Mooca solicitou remoção do antigo ponto de táxi que aparece na foto, e de camelôs, bem como a iluminação do local para “valorizar” o patrimônio. Fonte; acervo da autora.

Com isso, atraem o interesse de mídia escrita e virtual, com reportagens

que ressaltam que há algo de novo no ar da antiga Mooca, bairro tradicional

paulistano de origem fabril com expressiva concentração de descendentes de

italianos.

Uma dessas reportagens aparece na Revista Vip de dezembro de 2016 e

aponta lugares interessantes para se ir e comer, ou se divertir, todos no bairro da

Mooca. O título “A Hora da Mooca”, sugere uma revitalização que prevê um novo

colorido nas “ruas acinzentadas por causa das antigas fábricas”, como destaca a

reportagem. E vai mais longe ao afirmar que a Mooca é o “novo centro das

atenções da cidade”, e que está “despontando na cena cultural da cidade”. As

baladas promovidas na área ocupada pela Associação Brasileira de Preservação

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Ferroviária (ABPF) só fazem sucesso, segundo seus organizadores, porque tudo

ali “exala história” e “cheira a coisa antiga”. É esse fascínio, pode-se dizer, que

atrai as pessoas para passarem alguns momentos dentro de um cenário natural,

neste caso, entre vagões de trens e de composições que remontam a dois

séculos atrás e início do XX.

Figura 80: Reportagem “A hora da Mooca”. Reprodução de página da Revista VIP de dezembro/2016 com a matéria “A Hora da Mooca” mostra quem está ‘protagonizando” as novidades no bairro. Entre os destaques, o empresário Tatá e seu “Distrito Mooca”. Fonte: Reprodução da Revista VIP.

Outra reportagem mais recente ainda, de 2017, publicada em caderno

virtual do jornal Meio & Mensagem, veículo dirigido da área de Publicidade e

Propaganda que aborda diversos aspectos do Mercado e tendências, coloca em

seu título: “Bairro paulistano da Mooca é exemplo de tendência para 2017”. O

destaque é o projeto Distrito Mooca, citado na reportagem como promotor de

revitalização no bairro paulistano e apontado como exemplo de tendência de

mercado, chamada por eles de “Fronteiras urbanas”:.

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Refere-se a uma diáspora criativa, em que criativos e inovadores deixam de migrar para grandes centros urbanos e buscam fixar-se em locais afastados e mesmo em seus locais de origem, transformando-os. “Isso ocorre devido ao alto custo dos grandes centros e também por esses espaços não serem mais compatíveis com as demandas dos criativos”, afirma Daniela (Dantas, diretora da consultoria WGSN Latam). A criação passa a acontecer num entorno e com referências completamente diferentes. (FERNANDES, 2017)

O próprio Tatá, em vídeo da reportagem, diz que pensou na Vila Madalena

como o lugar para montar sua hamburgeria temática, mas os custos altos e o

amor pelo bairro onde nasceu falaram mais alto.

Apenas a título de complementação do pensamento aqui exposto, é

interessante lembrar que a mesma reportagem afirma, com base em

especialistas, que “a tendência é não ter mais tendências num sentido imperativo,

e muito menos seguir tendências”, o que significa dizer para o que interessa

nessa pesquisa, que o Distrito Mooca e aqueles que o protagonizam, talvez não

sejam uma onda passageira e sim uma mudança comportamental. Os itens que a

distinguem, segundo a especialista Daniela Dantas, e que complementam as

fronteiras urbanas, são o uso das tecnologias como forma de aproximar culturas,

no que ela chama de “Encontro de Culturas. Neste, ela explica, as pessoas

“viajam” para milhares de lugares sem sair de casa:

“É como se as pessoas transportassem o mindset26 de viajante para o seu cotidiano”, explica Daniela. As pessoas passam a buscar novidades e experiências autênticas perto de onde vivem, como frequentar uma festa ou restaurante de outra cultura. (FERNANDES, 2017)

Seria quase como redescobrir sua própria cidade, seu bairro, sua

vizinhança. Desvendar o espírito do lugar talvez esteja, também, relacionado a

esse tipo de percepção que poderia ser chamada de ‘caminho da volta’, um tipo

de sentimento que vem acometendo as pessoas em buscar bem perto tudo aquilo

que estava ali e ninguém mais enxergava, ou sabia. E isso se aplica a lugares e

26

Mindset é um termo utilizado nos meios organizacionais para designar mudança de paradigmas,

de mentalidade, portanto, de atitudes, comportamento, uma nova visão sobre as coisas. (conforme

o site www.rh.com.br. Acesso em 06 jan. 2017)

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sentimentos. Também à identidade e ao sentimento de pertença. E o que parece

que esses jovens liderados por Tatá estão fazendo é redescobrir a Mooca dos

mooquenses para os mooquenses, mas também para aqueles que apreciam uma

boa história, lugares inspiradores, recantos únicos que remetem a outros tempos,

e uma boa gastronomia, de preferência aquela que revisita os livros de receita

dos avós e bisavós. Parece surgir, assim, um mix de aconchego, regado a cultura

e bom gosto, desaceleração do tempo para se apreciar melhor todo esse cenário,

e um quê de nostalgia com o pé no moderno.

Por outro lado, há o perigo de se cair no lugar comum e de se perder a

identidade local ao se ocupar, tão somente, locais históricos com restaurantes e

bares descolados, atraindo um público diferente demais, ou tribos moderninhas

que acabam imprimindo sua própria marca sobre esses lugares. E Tatá parece

perceber isso ao dizer que essas ocupações, como chama a vinda dos colegas

artistas e empresários da Gastronomia para a Mooca, como apenas uma das

várias ações que almeja para o bairro que para ele deveria ser transformado num

grande centro nervoso de cultura em geral, com áreas históricas conservadas e

galpões restaurados, tendo a composição ferroviária servindo de transporte

temático até a antiga sede da Prefeitura, no Parque D. Pedro II, chegando até a

Estação da Luz.

Retomando a questão das pesquisas realizadas na internet, nota-se como

as pessoas da Mooca se enchem de orgulho para falar do bairro e isso aparece

nas capas das inúmeras páginas que foram criadas no Facebook, mesmo que o

assunto ali abordado não seja, especificamente, para falar de cultura, da história

do bairro ou de patrimônio histórico. Ainda assim, colocam o “orgulho de ser

mooquense”, que este é “o melhor bairro para se viver”, que “tem o time do

coração” que é o Juventus.

Entre os destaques estudados, está a página Juventino Mooca, já que o

termo Juventus quando associado ao nome do bairro, gera mais conteúdo e é

mais recorrente. Foram 17.685 pessoas curtindo a página até o dia 27/09/2016. É

atualizada, engajada, com alcance considerável. Normalmente, a média são 300

curtidas em cada post, para mais, além dos compartilhamentos:

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Figura 81 – Juventino Mooca no Facebook (2016). Print da página mostra pintura mural que se encontra no estacionamento do Supermercado Extra, na entrada da Rua Javari, originalmente ocupado pelo Cotonifício Crespi. Ali, alguns dos ícones se destacam, como o prédio do Cotonifício Crespi, quase demolido, e hoje reconhecido como símbolo do bairro fabril. Fonte: Facebook

Essa página reflete um pouco do “movimento” que existe entre jovens de

20 e poucos anos, até uns 35 anos, no máximo, que seguem uma linha

tradicionalista em relação ao futebol do Juventus, ‘atitude’ que reflete também nos

conteúdos que apresentam o histórico do bairro e o patrimônio material que ainda

existe. Talvez por isso, a página se mostre bem mais “engajada”, já que discute

não apenas o destino do estádio histórico, tombado pelo patrimônio, mas aborda

diversos outros assuntos, como a recente publicação sobre o tombamento da

Antarctica, na Folha de São Paulo, na coluna de Mônica Bergamo (13-09-2016).

Uma boa parte sugere um museu no local, como mostra a postagem a seguir:

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Mônica Bergamo: Cervejaria Antarctica, na Mooca, é tombada e poderá virar

parque

O Conpresp (órgão munipal do patrimônio histórico de São Paulo) aprovou o tombamento da Cervejaria Antarctica, na

Mooca. A área, hoje degradada, deverá…

M.FOLHA.UOL.COM.BR

HTTP://M.FOLHA.UOL.COM.BR/COLUNAS/MONICABERGAMO/2016/09/1813101-CERVEJARIA-ANTARCTICA-NA-MOOCA-E-TOMBADA-E-PODERA-VIRAR-PARQUE.SHTML?CMPID=COMPFB

Ordem cronológica

322Fênix CH e outras 321 pessoas

62 compartilhamentos

Comentários

Michele Luglio Podiam fazer algo nos moldes do Distillery District de Toronto, com bares e casas de show

Curtir · Responder · 17 de setembro às 12:53

Juventino Mooca ou um parque lindo

Curtir · Responder · 1 · 19 de setembro às 11:09

Tai Goncalves Prefiro que parem de construir prédios

Curtir · Responder · 4 · 17 de setembro às 13:14

Juventino Mooca que que tem a v?

Curtir · Responder · 19 de setembro às 16:38

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Renato Caggiano Concilio Museu da Cerveja!!!

Curtir · Responder · 17 de setembro às 13:25

Karina Costa João Tadeu de Lucca, falamos disso essa semana!

Curtir · Responder · 17 de setembro às 13:30

Dy Cerqueira Museu Histórico da Mooca (Fundação, dados, objetos, fotos, histórias, principais obras de crescimento,

artistas, esportistas, clubes, comidas típicas, imigrantes, perfil dos moradores, áreas de interação estilo o museu do

futebol, representação dos bondinhos da rua dos trilhos, colégios, etc..rs) Sou a favor de um mega museu da Mooca

Curtir · Responder · 3 · 17 de setembro às 13:48

Juventino Mooca o museu do imigrante é bem legal e quase ninguém vai

Curtir · Responder · 19 de setembro às 11:08

Ver mais respostas

Marco Poma Teles Cunha Filho

Curtir · Responder · 17 de setembro às 14:05

Renato Corona Parque!! Parque!! Muito parque!!

Curtir · Responder · 2 · 17 de setembro às 14:07

Kauê Gregório Cesar Gregório Marcelo Angelotti

Curtir · Responder · 1 · 17 de setembro às 14:08

Kika Del Piero Bruno, vamos vender para eles nossa ideia do museu da cerveja!!!

Curtir · Responder · 2 · 17 de setembro às 15:31

Figura 82 - Página Juventino Mooca no Facebook (post Antarctica, 2016). Essa é uma

das mais movimentadas páginas da região com postagens mais engajadas como essa

sobre o tombamento da fábrica desativada da Cia. Antarctica Paulista Fonte: Facebook.

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Matérias que falam da Mooca também são destaque nessas páginas

virtuais, como a que saiu no mês de aniversário, em agosto deste ano, no

caderno Paladar do Estadão, sobre donos de restaurantes e de endereços de

Gastronomia na região que “representam uma nova Mooca, mais jovem e

descolada”, conforme o texto do jornal destaca. O post da referida reportagem

teve quase 200 curtidas só naquele dia, e as opiniões, divergentes, são uníssonas

em ser contra o que chamam de “Mooca moderna”. Nesse, os ânimos se exaltam

por conta da idéia de denominar o morador / habituée da Mooca como hipster,

termo que designa um grupo de pessoas com estilo próprio e que habitualmente

inventa moda, determinando novas tendências alternativas, fora dos gostos

massificados. Grande parte não aceita essa condição, nem reconhece essa

mudança de perfil que a reportagem aponta. A outra polêmica que aparece na

reportagem é chamar quem vem de fora de ‘moqueiro’, outro termo não aceito

pelos seguidores da página, como está registrado nos posts a seguir:

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Juventino Mooca

19 de agosto ·

SE ALGUÉM ME CHAMAR DE MOOQUEIRO MAS VAI TOMAR UMA PIABA NAS FUÇA QUE

VAI SANGRAR 47 DIAS

NOSSO BAIRRO VIROU HIPSTER

http://paladar.estadao.com.br/…/restaurante-e-bares,e-a-nov…

É a nova Mooca, meu! - Paladar - Estadão

O bairro completou 460 anos, mas está mais jovem do que há dez anos graças a novos e ótimos endereços para quem

gosta de comer e beber

PALADAR.ESTADAO.COM.BR

HTTP://PALADAR.ESTADAO.COM.BR/NOTICIAS/RESTAURANTE-E-BARES,E-A-NOVA-MOOCA-MEU-

,10000070248

Ordem cronológica

166Renato Corona e outras 165 pessoas

21 compartilhamentos

Figura 83 – “É a nova Mooca, meu!” (2016). Nessa outra postagem da página Juventino Mooca no Facebook, de 13/09/2016, os internautas comentam reportagem sobre a “nova Mooca” e criticam o grupo liderado por Tatá do Distrito Mooca, e repudiam qualquer nome que se dê à Mooca e seus novos moradores, de “Hipster” a “moqueiros”. Fonte: Facebook.

As opiniões, em geral, são bem contrárias a essas tendências de

comportamento que vêm ocorrendo na Mooca (a postagem completa está nos

anexos finais desse trabalho), e o post reproduzido a seguir, encerra os

comentários daquele dia, com a opinião de Sergio Agarelli, sobrinho de Ângelo

Agarelli do Portal da Mooca, valorizando quem vem de fora e destacando que a

Mooca deva ser um bairro hospitaleiro. Ele mesmo lembra da torcida juventina,

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formada por jovens que vêm de fora, e que misturam o sentimento de torcer pelo

time e o amor ao bairro:

Curtir · Responder · 20 de agosto às 20:40

Sergio Agarelli Então quem nasce na Mooca é mooquense e quem vem de fora é Moquero ? Nada disso, Conheço muita

gente visitante que ama a Mooca muito mais que alguns" mooquenses natos". 90% da jovem torcida do Juventus, em

especial do Setor 2, vem de fora da Mooca. Voce sai com eles pra outras cidades e os caras ficam cantando "Mooca é o

bairro que vou morrer..." Os caras daqui nem ligam pro Juventus quanto mais para o Bairro. Não vou falar do avanço

comercial (que é bom) e a verticalização (que é pessima) mas temos que ser justos. Mooca siginfica Fazer Casa que

significa Hospitalidade.

Curtir · Responder · 3 · 24 de agosto às 16:52

Figura 84 – “É a nova Mooca, meu!” (Continuação, 2016). Post de Sérgio Agarelli se contrapõe às críticas dos outros internautas. Fonte: Facebook

Como a página é bem movimentada, e o assunto principal é o Juventus, o

post a seguir mostra, claramente, a vontade do jovem torcedor em manter tudo do

jeito que está, sem mudanças no bairro e no futebol que é jogado no estádio da

Rua Javari:

Juventino Mooca compartilhou a foto de Manto Juventino.

12 de setembro às 11:37 ·

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Manto Juventino atualizou a foto da capa dele.Curtiu

12 de setembro às 09:15 ·

Juventus 2 x 0 Marília

28/04/2012

Campeonato Paulista Série A3 - Segunda fase

foto: Ale Vianna

Ordem cronológica

352Você e outras 351 pessoas

Comentários

Diego Tambellini Ruiz Rua Javari tradição! Verdadeiro futebol!

Pra q arena! To fora modinha!

Figura 85 – “Juventus Origine Operare” (2016). Print da página Juventino Mooca mostra o quanto o jovem torcedor, muitos deles moradores do bairro, é tradicionalista e conservador, a começar pelo termo em italiano que utilizam nas bandeiras da torcida Forza Juve pra lembrar a origem do bairro e do time oriundo de fábrica: “Mooca Origine Operare”,. Fonte: Facebook

É o sentimento tradicionalista que aparece, uma vez mais, conforme o

trecho destacado a seguir:

Rua Javari tradição! Verdadeiro futebol!

Pra q arena! To fora modinha! (Juventino Mooca, post de 12/09/2016)

Os jovens parecem cultuar o passado com um certo entusiasmo, de uma

forma diferente dos mais velhos, como dá para notar nas páginas das redes

sociais e no o exemplo aqui reproduzido, tirado de uma delas, a Juventino Mooca.

Isso ficou bem claro também nas conversas que geraram as entrevistas

compiladas para essa pesquisa, com destaque para a opinião de Alexandre

Franco Martins, que diz que o jovem se identifica com esse “ato heróico” do

passado, dos imigrantes terem atravessado o Atlântico, saídos em grande parte

do continente europeu (primeira onda imigratória), para tentarem a sorte na

América, por vislumbraram aqui a terra da ‘cuccagna’, da fartura. A terra

prometida.

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Até mesmo as faixas e bandeiras que os torcedores usam durante as

partidas no estádio mostram essa identificação com o que entendem por tradição:

“Juventus Origine Operare”. O termo em italiano faz alusão ao fato de o clube ser

de origem classista, termo que designa os times nascidos dentro das fábricas,

como é o caso do Juventus, nascido no Cotonifício Rodolfo Crespi. O termo

também faz alusão direta à origem operária do próprio bairro.

Figura 86 : Onda retrô (2012). Reprodução de olho de reportagem que explica o que é sentir saudade em cada momento da vida. Fonte: Revista Época.

Esse comportamento do jovem mooquense, ou mesmo do torcedor

juventino, morador ou não da Mooca, parece seguir forte tendência de um revival

e de uma cultura retrô muito em voga nos dias atuais. Reportagem da revista

Época (2012), intitulada “Saudades de um tempo que não vivi”, já mostrava essa

identificação dos jovens por músicas, roupas, carros e objetos de épocas que não

viveram:

[...] pertencem à geração shuffle. Assim como nos tocadores digitais de música, em que a função shuffle mistura aleatoriamente uma coleção de canções, eles podem ouvir e ver o que quiserem na internet numa ordem aleatória. Épocas, estilos e origens são embaralhados. Eles cresceram no espaço cultural da internet, onde aquilo que é antigo tem o mesmo espaço e valor que o novo – onde o mais velho e o mais recente convivem lado a lado, ao alcance instantâneo de um toque de tela ou de teclado. Nos últimos anos, a internet se tornou o centro de um fenômeno que domina a cena cultural: a prática de reciclar e celebrar o passado. Não se trata,

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porém, da velha nostalgia que faz seu avô se emocionar ouvindo discos de Silvio Caldas ou vendo, pela 20ª vez, as cenas românticas de Doutor Jivago, sucesso dos anos 1960. O apego ao que se viu, ouviu ou viveu no passado é algo que nós todos sentimos e que se confunde com a saudade da própria juventude e de si mesmo. O que está em curso com a onda retrô é diferente. (SHIRAI, 2012)

Diferente porque, na verdade, o cult agora é curtir o passado. É a

retromania, uma espécie de fuga do momento presente que os jovens buscam

para se firmar, ou mesmo para cultuar heróis do passado porque os de hoje

parecem não mais existir. Tal fenômeno de comportamento encontra força na

indústria cultural, com a reedição de filmes, livros, séries, discos, numa onda de

revival sem precedentes.

Na mesma reportagem, o autor do livro Retromania, Simon Reynolds,

destrincha a cultura retrô e afirma:

Outras eras tiveram suas próprias obsessões com o antigo, da veneração da Renascença pelo classicismo romano e grego à invocação do medieval no movimento gótico [...] Mas nunca houve uma sociedade na história humana tão obcecada pelos artefatos culturais de seu próprio passado imediato. É como se as transformações no comportamento e a facilidade e a rapidez da produção e do acesso aos bens culturais dos últimos 60 anos tivessem sido tão intensos que agora a humanidade se volta para trás, revolvendo a memória na tentativa de digerir e entender o que se passou. (SHIRAI, 2012)

Descobrir esse movimento que atende pelo nome “Distrito Mooca”, um

nome simples direto, e acompanhar o protagonismo de Tatá, seu idealizador, foi

como desvendar uma espécie de revolução silenciosa. De gente jovem fazendo

algo que se podia esperar que viesse dos mais velhos, em termos de atitude. É o

surgimento, parece, de uma força paralela inesperada, mas talvez a mais forte, de

"proteção" à Mooca. O espírito do lugar é perceptível na fala de todos que

mantêm páginas relacionadas ao bairro. Encontra-se ‘presente’ nas páginas do

Facebook e do Instagram, no nome da comunidade, nas imagens que eles usam

de capa e de perfil, em alguns dos posts que colocam. Na fala também, carregada

de frases e termos ufanistas que demonstram o orgulho que o mooquense sente

por seu bairro, seja o antigo ou o novo que adotou o bairro como seu também.

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Tudo isso parece imprimir uma marca, um cenário simbólico carregado de

significados, pronto para ser desvendado e vivenciado. Porque o que se percebeu

vindo desse grupo que protagoniza uma mudança de usos nos velhos galpões da

Mooca, é que o principal instrumento deles é a ação que chega antes mesmo de

se conceituar o que quer que seja o sentido que o bairro exprime de suas

permanências. Para eles, o rótulo não importa, qual seja, dizer que o bairro é

tradicionalista, de origem operária, ou algo assim. O que importa é mostrar que

essa história continua viva e que é cult vir para a Mooca, frequentar os lugares do

momento, e conhecer lugares marcados pelo tempo das ferrovias, das indústrias,

dos imigrantes e de revoluções.

Essas marcas do passado estão expressas nos tijolos aparentes e nas

chaminés remanescentes que despontam na paisagem, na conformação de

habitações e prédios monumentais industriais. É esse ‘conjunto’ todo que exprime

esse sentimento e o sentido de lugar. De quem ‘tem’ o endereço dos sonhos para

frequentar, viver, morar: a Mooca.

O presente trabalho apresenta uma espécie de ‘ensaio’ de possibilidades a

serem melhor exploradas e aprofundadas, já que as redes sociais apresentaram a

Mooca para o mundo lá fora, trazendo gente de toda parte, de bairros vizinhos e

de outros lugares e países.

É certo, entretanto, que ao repetir à exaustão esse sentimento do

mooquense, acaba-se criando um simulacro da vida mooquense, sem ir além

disso. Sem transformar esse sentimento em ações de defesa do patrimônio da

Mooca. Ou que permitam que passagens relevantes da história de São Paulo e

do Brasil sejam conjugadas com os lugares que serviram de cenário para elas. O

ano de 2017, por exemplo, é o ano do centenário da primeira greve geral dos

operários no Brasil, ocorrida no pátio da fábrica do Crespi. Até o momento,

nenhuma menção ao fato que, de algum modo, será lembrado durante eventos

comemorativos do bairro por um grupo que promove a história e a cultura local,

que encontram apoio da Associação Comercial da região.

Ainda assim, as páginas mencionadas e outras tantas existentes no

universo virtual promovem o bairro e instigam quem as acessa a conhecerem a

região, bem como ajudam a transformá-la numa espécie de recanto do desejo,

seja para frequentar, visitar, e até morar. Com certeza, também para conhecer um

pouco de sua história que, como se percebe, é a história da cidade de São Paulo,

muitas delas de âmbito nacional, como a já citada greve operária, o advento das

fábricas, chegada e permanência de imigrantes, feitos históricos que marcaram

época, a exemplo do sobrevôo que o piloto Edu Chaves (1887-1975) realizou,

saindo da Mooca, na pista do antigo prado (Hipódromo), em julho de 1914, sem

escala até o Rio de Janeiro.

Percebe-se que a internet exerce um papel importante, tanto para

disseminar e propagar histórias de vida, passadas em cenários que não se

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repetem mais, mas também como um registro importante de fatos históricos,

depoimentos de quem viu e viveu boa parte desses acontecimentos, e das

transformações do bairro, e que guarda com carinho essas passagens, como

mostra trecho de depoimento a seguir, reproduzido de página da internet que tem

por objetivo registrar a memória da cidade:

Rua Padre Raposo, Mooca, onde passei parte de minha infância entre 1953 e 1960, estudei no grupo escolar Pandia Calogeras no mesmo local havia o ginásio estadual M.M.D.C. na Av. Paes de Barros, passávamos todos pela Rua Visconde de Inhomirim esquina com Madre de Deus onde havia um cinema chamado Cine Aliança, ia todos aos domingos para as matinês, pois não perdia um seriado chamado homem foguete, na Rua do Oratório.

Havia também o Cine Patriarca, um pouco mais além um enorme cinema na Rua da Mooca, chamado Cine Imperial, [...] o Cine Icaraí, um pouco mais abaixo, o Cine Moderno, e bem no começinho da Rua da Mooca o Cine Roma, [...], bem em frente ao Cine Moderno havia a escola técnica de comércio Brasilux.

[...]. Na Rua Bresser havia um belo campo de futebol com arquibancadas e tudo, lá era o antigo prado paulistano, tudo isto ainda está vivo na minha memória,... depois, tudo mudou e eu também.

(Depoimento de Sidney Morihiro Kanashiro para o site São Paulo, minha cidade, em 25/03/2010)

Em trabalho acadêmico de 2007, Rizzi relata que o bairro ficou à margem

de alterações profundas que acabaram por desconfigurar traçados inteiros como

o Parque Dom Pedro II, área que mantém uma proximidade fronteiriça com a

Mooca, e a avenida radial Alcântara Machado que, em sua extensão acabou com

trechos inteiros de ruas e partes de quadras, deixando “marcas e cicatrizes

urbanas visíveis até agora”. Mudanças essas que não chegaram a atingir o bairro

por dentro, pelo menos até o momento em que essa análise foi feita. Ainda assim,

é possível afirmar que o ambiente físico da Mooca mantém a sua permanência,

de um bairro que é muito querido por seus moradores, visitantes e

frequentadores, que talvez não tenha mais boa parte de seu patrimônio material,

mas o afetivo suplanta essa questão, e agora o mooquense parece ter despertado

para essa urgência em manter lugares que inspiram o espírito mooquense. Os

defensores do bairro que surgem, a exemplo de Tatá e seu Distrito Mooca,

assumem esse papel de manter o charme e a beleza natural de uma atmosfera

que ainda se mantém quase bucólica em várias partes do bairro.

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Considerações finais

A insuficiência do tratamento do patrimônio em relação ao bairro histórico

da Mooca, com remanescentes significativos do período industrial e determinadas

características urbanas que imprimem uma atmosfera única ao lugar, dando um

sentido que os mooquenses se “orgulham” de ter e sentir, é que nos levou a

realizar essa pesquisa e direcioná-la pelo sentido de “espírito do lugar”, com base

em documentos patrimoniais como a Declaração de Quebec (2008), sobre o

“Spiritu Loci”. Assim também com o conceito de patrimônio ambiental urbano

(Meneses, 1978).

Entendemos que, ao nortear nossa pesquisa pela ideia de tentar identificar

os significados atribuídos ao bairro da Mooca por seus moradores, e saber como

perduram até os dias de hoje valores que a todo tempo são lembrados e citados

pelas pessoas e reforçados na mídia, conseguimos chegar à clara conclusão de

que um caminho foi aberto para se entender a cidade e seus diversos sentidos.

Sentidos esses que só mesmo quem nela vive pode lhe atribuir e fazer valer. Nas

duas últimas décadas, temos assistido a uma degradação crescente do espaço

urbano que os gestores de cada momento não têm conseguido estancar. É claro

que uma grande cidade dificulta a sua manutenção no que se refere a lixo e

conservação, mas pode-se dizer que, depois de concluir essa pesquisa sobre um

bairro com as características que a Mooca possui junto aos seus moradores e

frequentadores, de um forte sentido de pertencimento, permite dizer que ao se

identificar com um lugar, pode-se dele melhor cuidar, a ponto de refletir

positivamente nos índices que uma gestão pública municipal enfrenta dia a dia e

busca alcançar: um lugar mais limpo e cuidado, sem depredação, sem violência,

mais humano e poético. E isso tudo, a partir dos sentidos e valores atribuídos por

seus habitantes, que poderiam e deveriam ser mais ouvidos pela sociedade em

geral, pois só assim teríamos, de fato, uma cidade humanizada, que valoriza as

pessoas e respeita sua história, seu jeito próprio de ser, sua ‘cara’, portanto, sua

identidade, sem imposições e sobreposições.

São esses valores que as práticas e as relações sociais imprimem ao

tecido urbano que também nortearam o presente trabalho, desde o início, com

uma visão não distorcida ou fantasiosa, porém partindo de um entendimento do

patrimônio cultural como um valor positivo que agrega valor àquela parte da

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cidade, e reflete em seus habitantes sentidos que valorizam ainda mais seus bens

culturais. Ganha a cidade, ganham seus habitantes.

O presente trabalho, ao tratar de temática do campo da preservação do

patrimônio cultural, conjugando aspectos tangíveis e intangíveis, resultou numa

análise que teve os valores afetivos como fio condutor que levou a perceber a

identidade cultural do lugar, as vinculações subjetivas ali geradas e, por

conseguinte, os sentidos. Sentidos de lugar. Nessa teia de conexões, a memória

foi a mola propulsora que trouxe o entendimento desse vasto campo e a

compreensão da relação que mantém com a identidade e o pertencimento.

É pertinente ressaltar, como foi feito nesse trabalho, que o aspecto do

intangível nunca foi considerado no bairro, que vem sofrendo mudança acelerada

desde o fechamento de diversas indústrias, no início dos anos 1990, e com o

processo de verticalização que vem trazendo novas dinâmicas sobre o tecido

antigo do bairro. A escolha da Mooca vem da percepção do forte sentimento de

pertencimento que o mooquense tem pelo seu bairro, e pelo fato de não haver,

até o presente momento, uso de instrumentos adequados, como já citado aqui, ou

meios que permitam a compreensão desses vários olhares que moradores e

frequentadores assíduos lançam sobre o lugar, sem deixar de lado o aspecto

histórico, de um bairro de predominância imigrante, de italianos expressivamente,

que têm na família e na origem fabril, seu forte traço que é a marca de seu perfil.

Para a compreensão de todas essas questões, foi fundamental a pergunta

central, se seria possível se identificar o espírito do lugar de um bairro como a

Mooca. E ainda mais, se seria pertinente considerar este conceito ao se tratar da

preservação do patrimônio cultural numa cidade como São Paulo. A resposta vem

com a conclusão de que o conceito de espírito do lugar é um instrumento

pertinente para as ações de preservação do patrimônio, principalmente quando se

trata a unidade do bairro, por ser esse o lugar da cotidianidade, aonde o indivíduo

se manifesta no coletivo. Porém, é pertinente dizer que sua aplicação exige

aprofundamento conceitual e de desenvolvimento de práticas metodológicas,

considerando que se trata de conceituação recente, portanto, que carece de

fundamentação teórica mais aprofundada. E que, por sua natureza, também

requer trabalho multi e interdisciplinar, com a contribuição de campos disciplinares

como a Arquitetura, a História, a Antropologia, a Geografia, e a Psicologia, por

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exemplo. É possível conferir essa questão pela bibliografia estudada, que

contemplou autores e especialistas consagrados, de diversas áreas de atuação

no campo do patrimônio, como Ulpiano Meneses, Carlos Lemos, Marly Rodrigues,

Gustavo Giovannoni, Françoise Choay, além da revisão sobre os conceitos

contidos nas cartas patrimoniais, lançando um olhar apurado para as políticas

públicas de preservação do patrimônio, e de planejamento, por meio do projeto de

lei que regulamenta a Operação Urbana Bairros Tamanduateí, que atravessa

parte significativa do território da Mooca.

Com esse trabalho, por fim, pretendeu-se lançar luz sobre o tema e

contribuir, de algum modo, para avançar nas discussões sobre a conjugação do

patrimônio material e imaterial, tendo o aspecto humano como premissa principal.

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ANEXOS

ANEXO I – DECLARAÇÃO DE QUEBÉC

DECLARAÇÃO DE QUÉBEC Sobre a preservação do "Spiritu loci" Assumido em Québec, Canadá, em 4 de outubro de 2008 INTRODUÇÃO Reunião na histórica cidade de Québec (Canadá) de 29 de setembro a 4 de outubro, 2008, a convite do ICOMOS, Canadá, na ocasião da 16ª Assembléia Geral do ICOMOS e dos festejos do aniversário de 400 anos da fundação de Québec. Os participantes assumem a seguinte Declaração de princípios e recomendações para a preservação do spiritu loci através da proteção do patrimônio tangível e intangível, considerado uma forma inovadora e eficiente de assegurar o desenvolvimento ustentável e social no mundo inteiro. Esta Declaração é parte de uma série de medidas e ações tomadas pelo ICOMOS no decurso dos últimos cinco anos para proteger e promover o espírito dos lugares, isto é, sua essência de vida, social e espiritual. Em 2003, o ICOMOS enfocou o simpósio científico de sua 14ª Assembléia Geral sobre o tema da preservação dos valores sociais intangíveis de monumentos e sítios. Na Declaração Kimberly, que logo se seguiu, o ICOMOS se comprometeu a considerar os valores intangíveis (memória, crenças, conhecimento tradicional, ligação ao lugar) e também as comunidades locais, guardiãs destes valores, no manejo e preservação de monumentos e sítios em conformidade com a Convenção do Patrimônio Mundial de 1972. Em 2005, a Declaração Xi'an do ICOMOS chamou atenção para a conservação de contextos definidos enquanto aspectos físicos, visuais e naturais, assim como práticas sociais e espirituais, costumes, conhecimento tradicional e outras formas e expressões intangíveis na proteção e promoção dos monumentos e sítios que compõem o patrimônio mundial. Ainda, chama atenção para a abordagem multidisciplinar e as diversificadas fontes de informação para melhor compreender, administrar e conservar o contexto. A Declaração de Foz do Iguaçu, elaborada em 2008 pelo ICOMOS Américas especifica que os componentes tangíveis e intangíveis do patrimônio são essenciais para a preservação da identidade das comunidades que criaram e transmitiram espaços de relevância cultural e histórica. As novas Cartas do ICOMOS para Roteiros Culturais e sobre interpretação e apresentação formuladas após amplas consultas e apresentadas para ratificação na atual 16ª Assembléia Geral do ICOMOS, também reconhecem a importância das dimensões intangíveis do patrimônio e o valor espiritual dos lugares. Devido à

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natureza indivisível do patrimônio tangível e intangível e aos significados, valores e contexto que o patrimônio intangível assegura aos objetos e lugares, atualmente o ICOMOS está considerando a adoção de uma nova Carta especificamente dedicada ao patrimônio intangível de monumentos e de sítios. A este respeito, estamos fomentando discussões e debates para o desenvolvimento de um novo vocabulário conceitual devido às mudanças ontológicas do espírito do lugar. A 16ª Assembléia Geral e mais especificamente o Fórum da Juventude, o Foro dos Aborígines e o Simpósio Científico nos deram a oportunidade de explorar com maior profundidade as relações entre o patrimônio tangível e intangível e os mecanismos culturais e sociais internos do espírito do lugar. O espírito do lugar é definido como os elementos tangíveis (edifícios, sítios, paisagens, rotas, objetos) e intangíveis (memórias, narrativas, documentos escritos, rituais, festivais, conhecimento tradicional, valores, texturas, cores, odores, etc.) isto é, os elementos físicos e espirituais que dão sentido, emoção e mistério ao lugar.

Em vez de separar o espírito do lugar, o intangível do tangível e considerá‐los

como antagônicos entre si, investigamos as muitas maneiras dos dois interagirem e se construírem mutuamente. O espírito do lugar é construído por vários atores sociais, seus arquitetos e gestores, bem como seus usuários que contribuem ativamente e em conjunto

para dar‐lhe um sentido.

Visto como um conceito relacional, o espírito do lugar assume ao longo do tempo um caráter plural e dinâmico capaz de possuir múltiplos sentidos e peculiaridades de mudança, e de pertencer a grupos diversos. Esta abordagem mais dinâmica se adapta melhor ao mundo globalizado atual, caracterizado por movimentos transnacionais da população, relocação populacional, contatos interculturais crescentes, sociedades pluralísticas e múltiplas ligações ao lugar. O espírito do lugar oferece uma compreensão mais abrangente do caráter vivo e, ao mesmo tempo, permanente de monumentos, sítios e paisagens culturais. Supre uma visão rica, mais dinâmica e abrangente do patrimônio cultural. O espírito do lugar existe, de uma forma ou de outra em praticamente todas as culturas do mundo e é construído por seres humanos em resposta às suas necessidades sociais. As comunidades que habitam o lugar, especialmente quando se trata de sociedades tradicionais, deveriam estar intimamente associadas à proteção de sua memória, vitalidade, continuidade e espiritualidade. Os participantes da 16ª Assembléia Geral do ICOMOS, assim sendo, lavram a seguinte Declaração de princípios e recomendações para organizações intergovernamentais e não governamentais, autoridades nacionais ou locais e todas as instituições e especialistas habilitadas a contribuir, por intermédio da legislação, de políticas, e de processos de planejamento e gestão, para melhor proteger e promover o espírito do lugar.

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REPENSANDO O ESPIRITO DO LUGAR 1. Reconhecendo que o espírito do lugar é composto por elementos tangíveis (sítios, edifícios, paisagens, rotas, objetos) bem como de intangíveis (memórias, narrativas, documentos escritos, festivais, comemorações, rituais, conhecimento tradicional, valores, texturas, cores, odores, etc.) e que todos dão uma contribuição importante para formar o lugar e lhe conferir um espírito, declaramos que o patrimônio cultural intangível confere um significado mais rico e mais completo ao patrimônio como um todo, e deve ser considerado em toda e qualquer legislação referente ao patrimônio cultural e em todos os projetos de conservação e restauro para monumentos sítios, paisagens, rotas e acervos de objetos. 2. Considerando que o espírito do lugar é complexo e multiforme, exigimos que os governos e outros interessados convoquem a perícia de equipes de pesquisa multidisciplinar e especialistas com tradição para melhor compreender, preservar e transmitir este espírito do lugar. 3. Como o espírito do lugar é um processo em permanente reconstrução, que corresponde à necessidade por mudança e continuação das comunidades, nós afirmamos que pode variar ao longo do tempo e de uma cultura para outra, em conformidade com suas práticas de memória, e que um lugar pode ter vários espíritos e pode ser compartilhado por grupos diferentes. IDENTIFICANDO AS AMEAÇAS AO ESPÍRITO DO LUGAR 4. Considerando que mudança climática, turismo em massa, conflitos armados e desenvolvimento urbano induzem transformações e ruptura das sociedades, precisamos melhorar nosso entendimento sobre estas ameaças para poder estabelecer medidas preventivas e soluções sustentáveis. Recomendamos que entidades governamentais e não governamentais e organizações do patrimônio local e nacional desenvolvam planejamento estratégico a longo prazo para prevenir a degradação do espírito do lugar e seu entorno. Os habitantes e autoridades locais deveriam também ser conscientizados sobre a proteção do espírito do lugar, para que assim estejam melhor preparados a lidar com as ameaças de um mundo em transformação. 5. À medida que aumenta o compartilhamento dos lugares empossados com diferentes espíritos por vários grupos, aumenta o risco de competição e conflito. Reconhecemos que estes sítios requerem gestão, planejamento e estratégias específicas, ajustadas ao contexto pluralístico das sociedades multiculturais modernas. Como as ameaças ao espírito do lugar são especialmente poderosas

entre grupos minoritários, sejam nativos ou recém‐chegados, recomendamos que

estes grupos sejam os primeiros e mais importantes a se beneficiar de políticas e práticas específicas. PROTEGENDO O ESPIRITO DO LUGAR 6. Como hoje em dia na maioria dos países do mundo o espírito do lugar, sobretudo seus componentes intangíveis, atualmente não se beneficiam de

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programas de educação formal ou de proteção legal, recomendamos a implementação de reuniões e consultorias com peritos de diferentes origens e recursos, pessoas das comunidades locais, e o desenvolvimento de programas de treinamento e políticas jurídicas para uma melhor proteção e promoção do espírito do lugar. 7. Considerando que modernas tecnologias digitais (bancos de dados, websites) podem ser usadas eficaz e efetivamente a um custo muito baixo para desenvolver inventários multimídia que integrem elementos tangíveis e intangíveis do patrimônio, nós incisivamente recomendamos seu amplo uso para melhor preservar, disseminar e promover os sítios do patrimônio e seu espírito. Estas tecnologias facilitam a diversidade e renovação constante da documentação sobre o espírito do lugar. TRANSMITINDO O ESPIRITO DO LUGAR 8. Reconhecendo que o espírito do lugar é essencialmente transmitido por pessoas e que a transmissão é parte importante de sua conservação, declaramos que é por meio de comunicação interativa e participação das comunidades envolvidas que o espírito do lugar é preservado e realçado da melhor forma possível. A comunicação é, de fato, a melhor ferramenta para manter vivo o espírito do lugar. 9. Dado que geralmente as comunidades locais estão mais bem posicionadas para compreender o espírito do lugar, sobretudo no caso de grupos culturais tradicionais, nós afirmamos que são também aquelas melhor equipadas para sua salvaguarda e que estas devem estar intimamente associadas em todos os

esforços para preservar e transmitir o espírito do lugar. Meios de transmissão não‐formais (narrativas, rituais, atuações, experiência e práticas tradicionais etc.) e formais (programas educativos, bancos de dados digitais, websites, ferramentas pedagógicas, apresentações multimídia, etc.) deveriam ser fomentados, porque não apenas garantem a proteção do espírito do lugar mas, acima de tudo, protegem o desenvolvimento sustentável e social da comunidade. 10. Reconhecendo que a transmissão intergeracões e transcultural desempenha um papel importante na disseminação sustentada e na preservação do espírito do lugar, recomendamos a associação e o envolvimento das gerações mais novas, bem como de grupos culturais diferentes associados ao lugar, na tomada de decisões políticas e gestão do espírito do lugar.

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ANEXO II – PROJETO DE LEI 878/2016

Texto original da propositura do Projeto de Lei 878/16, que trata da proteção do

Patrimônio Imaterial da Mooca:

PROJETO DE LEI Nº 878, DE 2016

Declara como Patrimônio Cultural Imaterial do Estado, os costumes, o esporte, as

manifestações culturais e a gastronomia do bairro da Mooca, no município de São

Paulo.

A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SÃO PAULO DECRETA:

Artigo 1º – Fica declarado como Patrimônio Cultural Imaterial do Estado de

São Paulo, os costumes, o esporte, as manifestações culturais e a gastronomia

do bairro da Mooca, no município de São Paulo.

Artigo 2º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICATIVA

A primeira citação do bairro da Mooca ou distrito da Mooca data de

1556, quando a governança de Santo André da Borda do Campo, comunicava

que todos estavam "obrigados a participar da construção da ponte do rio

Tameteai (Tamanduateí)". Essa ponte se fazia necessária para a ligação entre

zona leste e a freguesia eclesiástica da Sé. A região leste era habitada pelos

índios da tribo Guaiana (tupi-guarani), que deixaram algumas marcas

tradicionais no bairro, inclusive seu próprio nome. Segundo historiadores, o

vocábulo é oriundo do Tupi Guarani e possui duas versões, MOO-KA (ares

amenos, secos, sadios) e MOO-OCA (fazer casa), expressão usada pelos

índios da Tribo Guarani para denominar os primeiros habitantes brancos, que

erguiam suas casas de barro. Outros historiadores dão como certo que o

mesmo é de origem asiática MOKA, que significa variedades de café, que

vinha antigamente da cidade de MOCA (YEMEM), porto do mar vermelho.

A partir de 1890 a região começou a atrair imigrantes, principalmente

italianos que vinham em busca de emprego nas fábricas, indústrias têxteis e de

calçados que começavam a surgir.

Sucessivas ampliações das centenas de fábricas instaladas desde o

final dos anos de 1800 até meados dos anos de 1900, foram acompanhadas

por construção de moradias para seus funcionários que, junto com suas

famílias, adotaram a Mooca como seu lar, permanecendo até os dias de hoje.

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A Mooca é hoje o maior centro industrial do município de São Paulo

sendo representada por um cenário comercial intenso.

Com o intuito de preservar o que restou da historia Mooquense,

destacamos o cidadão José Américo Crippa Filho que, junto com outros

moradores da região, iniciaram o projeto “Distrito Mooca” em parceria com a

iniciativa privada e os órgãos públicos visando promover ações de proteção da

Mooca, seus imóveis e sua historia.

A Mooca, com seus 7 Km² de área e sua população com mais de 63 mil

habitantes, é um dos bairros que mais representa a cidade de São Paulo,

cidade que acolheu milhares de imigrantes e que conserva a essência dos

tempos antigos do sossego do início do século.

Na área esportiva, não podemos deixar de citar o Clube Atlético Juventus,

inicialmente com o nome de “Cotonifício Rodolfo Crespi F.C.” que foi fundado

em 1924 em uma modesta salinha, fruto da fusão do Extra São Paulo F.C. e do

Cavalheiro Crespi F.C. tradicionais clubes da várzea do bairro da Mooca

formado por empregados da fábrica de tecidos da família Crespi. A sede do

clube além do futebol também tem importante destaque em outras

modalidades.

Reconhecendo a importância do presente Projeto de Lei para assegurar

os costumes, o esporte, as manifestações culturais e a gastronomia do bairro

da Mooca a condição de Patrimônio Cultural Imaterial do Estado de São Paulo,

entende-se que, a presente propositura poderá ajudar a obstaculizar o

crescimento desordenado e a mudança do bairro centenário.

Assim, conto com os nobres pares para aprovação do presente projeto

de lei que se traduz no reconhecimento da história de São Paulo, sua

preservação e garantia para gerações futuras.

Sala das Sessões, em 1/12/2016.

a) Chico Sardelli - PV

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ANEXO III – PRINTS DE REDES SOCIAIS

Portal da Mooca

PROGRAMAÇÃO DO TEATRO ARTHUR AZEVEDO

Boa noite, amantes do choro! Como havíamos prometido antes, aqui está o link para fazer a sua RESERVA ANTECIPADA para os shows gratuitos promovidos pelo Clube do Choro de São Paulo em outubro. Só tem showzaço! http://bit.ly/RESERVAS-OUTUBRO Na sexta-feira, 07 de outubro, os grandes Alessandro Penezzi e Nailor Proveta fazem um duo imperdível, abrindo o evento em atíssimo nível....

Ver mais

Portal da Mooca

5 h ·

PROGRAMAÇÃO DO MUSEU DA IMIGRAÇÃO

Para o Dia do Nordestino, o Museu da Imigração preparou uma programação especial gratuita para os dias 7, 8 e 9 de outubro! Veja:http://bit.ly/2dREb66

#mooca #museudaimigrcao #imigraxao #museu #diadonordestino#nordestino #eventos

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Museu da Imigração comemora Dia do Nordestino - Museu da Imigração

Para comemorar o Dia do Nordestino, o Museu da Imigração preparou uma programação especial gratuita para os dias 7, 8 e 9 de outubro que inclui teatro…

MUSEUDAIMIGRACAO.ORG.BR

Principais comentários

6Angelo E. Agarelli e outras 5 pessoas

1 compartilhamento

Eduardo Paradisi Parabéns pelo dia do Nordestino , tenho o maior apreço , tenho grandes amigos abraços a todos os meus amigos nordestinos.

Portal da Mooca

O bairro da Mooca ainda preserva muitas tradições dos imigrantes italianos, portugueses e espanhóis. Uma delas é ir ao jogo do Juventus e depois passar no bar do Giba. O estabelecimento tem cinquenta e dois anos, é frequentado por ex-jogadores, e por inúmeras famílias do bairro. Por tudo isso, o local e a família do Seu Giba são "Cara de São Paulo".

http://www.tvgazeta.com.br/vide…/bar-giba-tem-52-anos-mooca/

...Ver mais

Bar do Giba tem 52 anos de tradição na Mooca

Por tudo isso, o local e a família do Seu Giba são "Cara de São Paulo".

TVGAZETA.COM.BR

Principais comentários

67Você, Angelo E. Agarelli, Adelton Matheus e outras 64 pessoas

2 compartilhamentos

Henrique F. de Andrade Esse estilo Mooquense é conhecido em todo o Brasil. O sotaque,a educação, a prestação de serviço. Italianos,espanhóis, portugueses,gente de todo o Brasil, fazem da Mooca essa 'República' tão especial!

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Curtir · Responder · 2 · 2 h

Henrique F. de Andrade E...dale ô,dale ô!!!

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https://www.facebook.com/portal.damooca/?fref=ts

Juventino Mooca

17 de setembro às 12:39 ·

Nois qué parque?

QUÉ

Mônica Bergamo: Cervejaria Antarctica, na Mooca, é tombada e poderá virar

parque

O Conpresp (órgão munipal do patrimônio histórico de São Paulo) aprovou o tombamento da Cervejaria Antarctica, na

Mooca. A área, hoje degradada, deverá…

M.FOLHA.UOL.COM.BR

HTTP://M.FOLHA.UOL.COM.BR/COLUNAS/MONICABERGAMO/2016/09/1813101-CERVEJARIA-ANTARCTICA-NA-MOOCA-E-TOMBADA-E-PODERA-VIRAR-PARQUE.SHTML?CMPID=COMPFB

Ordem cronológica

322Fênix CH e outras 321 pessoas

62 compartilhamentos

Comentários

Michele Luglio Podiam fazer algo nos moldes do Distillery District de Toronto, com bares e casas de show

Curtir · Responder · 17 de setembro às 12:53

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Juventino Mooca ou um parque lindo

Curtir · Responder · 1 · 19 de setembro às 11:09

Tai Goncalves Prefiro que parem de construir prédios

Curtir · Responder · 4 · 17 de setembro às 13:14

Juventino Mooca que que tem a v?

Curtir · Responder · 19 de setembro às 16:38

Renato Caggiano Concilio Museu da Cerveja!!!

Curtir · Responder · 17 de setembro às 13:25

Karina Costa João Tadeu de Lucca, falamos disso essa semana!

Curtir · Responder · 17 de setembro às 13:30

Dy Cerqueira Museu Histórico da Mooca (Fundação, dados, objetos, fotos, histórias, principais obras de crescimento,

artistas, esportistas, clubes, comidas típicas, imigrantes, perfil dos moradores, áreas de interação estilo o museu do

futebol, representação dos bondinhos da rua dos trilhos, colégios, etc..rs) Sou a favor de um mega museu da Mooca

Curtir · Responder · 3 · 17 de setembro às 13:48

Juventino Mooca o museu do imigrante é bem legal e quase ninguém vai

Curtir · Responder · 19 de setembro às 11:08

Ver mais respostas

Marco Poma Teles Cunha Filho

Curtir · Responder · 17 de setembro às 14:05

Renato Corona Parque!! Parque!! Muito parque!!

Curtir · Responder · 2 · 17 de setembro às 14:07

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Kauê Gregório Cesar Gregório Marcelo Angelotti

Curtir · Responder · 1 · 17 de setembro às 14:08

Kika Del Piero Bruno, vamos vender para eles nossa ideia do museu da cerveja!!!

Curtir · Responder · 2 · 17 de setembro às 15:31

Vanessa Daniella Alexandre Serrano

Curtir · Responder · 2 · 17 de setembro às 15:34

Daniela Peres Ademir Peres

Curtir · Responder · 17 de setembro às 16:45

Caio Tadeu Amanda Regina Fernandes

Curtir · Responder · 18 de setembro às 17:35

Elizabeth Florido Olá, tudo bem? Vamos nos manifestar também pela páginaMooca - patrimônio e transformações, em

prol da memória e da verdadeira qualidade de vida do bairro. Sem os excessos que hoje assolam a nossa paz tão

propagada em folhetos publicitários, e que hoje, condiz muito pouco com a realidade. Sem destruir as coisas belas que

tanto suor e lágrimas erigiram com o esforço de tantas nações, dentro de uma única nação! Aguardo seus comentários

também na nossa página! Obrigada!

Curtir · Responder · Agora mesmo

Juventino Mooca

19 de agosto ·

SE ALGUÉM ME CHAMAR DE MOOQUEIRO MAS VAI TOMAR UMA PIABA NAS FUÇA QUE

VAI SANGRAR 47 DIAS

NOSSO BAIRRO VIROU HIPSTER

http://paladar.estadao.com.br/…/restaurante-e-bares,e-a-nov…

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É a nova Mooca, meu! - Paladar - Estadão

O bairro completou 460 anos, mas está mais jovem do que há dez anos graças a novos e ótimos endereços para quem

gosta de comer e beber

PALADAR.ESTADAO.COM.BR

HTTP://PALADAR.ESTADAO.COM.BR/NOTICIAS/RESTAURANTE-E-BARES,E-A-NOVA-MOOCA-MEU-

,10000070248

Ordem cronológica

166Renato Corona e outras 165 pessoas

21 compartilhamentos

Comentários

Caio Pimentel Nem li a matéria, dei um Ctrl+F, procurei a palavra gentrificação e não a encontrei e conclui que

não vale a pena

Curtir · Responder · 3 · 19 de agosto às 11:32

Pedro Mezgravis Gentrificação até na Javari. Virou uma "arena retrô".

Mas não desistiremos...!

Curtir · Responder · 2 · 19 de agosto às 11:32

Jaison Patrocinio Josiane Lima

Curtir · Responder · 19 de agosto às 11:44

Rafael Tápias Juliana Constancio olha isso amor !!

Curtir · Responder · 19 de agosto às 11:51

Rafael Tápias Sandra Nunes da Costa Fernanda Tapias

Curtir · Responder · 1 · 19 de agosto às 11:51

Rafael Tápias Fernando Bordini Constancio

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Curtir · Responder · 1 · 19 de agosto às 11:51

Alex Mariano Pereira a matéria tem data do futuro. 13 de dezembro de 2016

Curtir · Responder · 2 · 19 de agosto às 11:54

Leonardo Ojeda Não a Mooca moderna!

Curtir · Responder · 3 · 19 de agosto às 12:12

Reinaldo Pereira Neto Não à Mooca moderna!

Curtir · Responder · 19 de agosto às 12:20 · Editado

Raul Macedo Valforte Gourmetizaram a mooca!

Curtir · Responder · 19 de agosto às 12:22

Thaina Dlugosz

Curtir · Responder · 1 · 19 de agosto às 12:24

Thaina Dlugosz Eu TO é amando Danillo

Curtir · Responder · 19 de agosto às 12:25

Marcela Paiva Barbara Paiva Fabio Paiva "m o o q u e i r o s". Me abstenho a tecer mais comentários.

Curtir · Responder · 1 · 19 de agosto às 13:29

Barbara Paiva Mooqueiro é um caralho, eu sou mooquense! Mas gostei dessa parte:

"Nos últimos meses, os mooqueiros se uniram em um projeto de revitalização do bairro. Escolheram a área que faz divisa

com o Centro e o Cambuci, repleta de antigos galpões industriais e ...Ver mais

Curtir · Responder · 3 · 19 de agosto às 13:36

Rodrigo Borges Sou Móqueiro por adoção, pois casei com uma nativa do bairro, moro aqui a mais de 12 anos e

posso dizer que não imagino outro lugar melhor pra se viver em São Paulo

Curtir · Responder · 19 de agosto às 16:11

Vinicius Bernardi Num tem essa de moqueiro, não!

Curtir · Responder · 20 de agosto às 07:04

Vinicius Bernardi Mooquero é o cazzo!

Curtir · Responder · 20 de agosto às 07:43

Gabriela Capo miga Amanda que porra é essa?

Curtir · Responder · 20 de agosto às 08:47

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Flavio Cuter Vai, defende mais o politicamente correto

Curtir · Responder · 20 de agosto às 09:56

Bruno Canone Garcia Moquense porra

Curtir · Responder · 20 de agosto às 15:57

Meire Antiqueira Luiz Camargo Livia Naujocks Antiqueira

Curtir · Responder · 1 · 20 de agosto às 19:25

Israel Adriano parabénsss .

Curtir · Responder · 20 de agosto às 20:40

Sergio Agarelli Então quem nasce na Mooca é mooquense e quem vem de fora é Moquero ? Nada disso, Conheço muita

gente visitante que ama a Mooca muito mais que alguns" mooquenses natos". 90% da jovem torcida do Juventus, em

especial do Setor 2, vem de fora da Mooca. Voce sai com eles pra outras cidades e os caras ficam cantando "Mooca é o

bairro que vou morrer..." Os caras daqui nem ligam pro Juventus quanto mais para o Bairro. Não vou falar do avanço

comercial (que é bom) e a verticalização (que é pessima) mas temos que ser justos. Mooca siginfica Fazer Casa que

significa Hospitalidade.

Curtir · Responder · 3 · 24 de agosto às 16:52

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REFERÊNCIAS

ACONTECE GUIA. Wynwood, o bairro que transforma Miami. Acontece Magazine, 17/11/2015.

Disponível em: <http://acontece.com/t/905-wynwood-o-bairro-que-transforma-miami/>. Acesso em:

16-02-2017.

ALARDÍN, Gabriela Lee. Patrimonio urbano. Disponível em:

<https://www.youtube.com/watch?v=oXfv2zrsFk4>. Acesso em: 26 mai. 2015.

ALEXANDRE, Marcos. Representação Social: uma genealogia do conceito. Revista Comum, Rio

de Janeiro, v.10, nº 23, p. 122-138, jul-dez 2004. Disponível em: <http://www.sinpro-

rio.org.br/imagens/espaco-do-professor/sala-de-aula/marcos-alexandre/Artigo7.pdf>. Acesso em:

16 nov. 2016.

ALMEIDA, Eneida de. Metrópole e memória: a origem das práticas de conservação. Revista

arq.urb, n. 2, 2º semestre de 2009. Disponível em:

<http://www.usjt.br/arq.urb/numero_02/artigo_eneida.pdf>. Acesso em 19 jan. 2016.

AMENDOLA, Gilberto. Livro de Mino Carta será lançado hoje. 24/09/2009. Disponível em:

<http://www.boitempoeditorial.com.br/publicacoes_imprensa.php?isbn=978-85-7559-142-

0&veiculo=%20Jornal%20da%20Tarde>. Acesso em: 15 out. 2016.

ANDRADE, Paula Rodrigues de. O patrimônio da cidade: arquitetura e ambiente urbano nos

inventários de São Paulo da década de 1970. 2012. Dissertação (Mestrado em História e

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