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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE SILVIA ROSA MARQUES PAULO A POÉTICA DO OLHAR: A IMAGEM DO TRABALHADOR RURAL NA PINTURA DE CANDIDO PORTINARI E NA FOTOGRAFIA DE SEBASTIÃO SALGADO NO PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM São Paulo 2008

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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

SILVIA ROSA MARQUES PAULO

A POÉTICA DO OLHAR: A IMAGEM DO TRABALHADOR

RURAL NA PINTURA DE CANDIDO PORTINARI E NA

FOTOGRAFIA DE SEBASTIÃO SALGADO NO PROCESSO

ENSINO-APRENDIZAGEM

São Paulo

2008

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SILVIA ROSA MARQUES PAULO

A POÉTICA DO OLHAR: A IMAGEM DO TRABALHADOR

RURAL NA PINTURA DE CANDIDO PORTINARI E NA

FOTOGRAFIA DE SEBASTIÃO SALGADO NO PROCESSO

ENSINO-APRENDIZAGEM.

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

Graduação em Artes, Educação e História da

Cultura da Universidade Presbiteriana Mackenzie,

como requisito parcial à obtenção do título de

Mestre em Artes, Educação e História da Cultura.

Orientador: Prof. Dr. Norberto Stori

São Paulo

2008

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Paulo, Silvia Rosa Marques

A poética do olhar: A imagem do trabalhador rural na pintura

de Candido Portinari e na fotografia de Sebastião Salgado no processo ensino-aprendizagem.

Silvia Rosa Marques Paulo-2008 234 f.: il. ; 30cm Dissertação (Mestrado em Educação, Arte e História da

Cultura) – Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2008. Orientação: Prof. Norberto Stori. Bibliografia: p. 209 – 217. 1. Arte-Educação. 2. Metodologia Triangular. 3. Leitura de

obras. 4. Propostas poéticas. 5. Fotografia e pintura. 6. Imagens do trabalhador rural. I. Título.

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SILVIA ROSA MARQUES PAULO

A POÉTICA DO OLHAR: A IMAGEM DO TRABALHADOR RURAL NA

PINTURA DE CANDIDO PORTINARI E NA FOTOGRAFIA DE SEBASTIÃO

SALGADO NO PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

Graduação em Artes, Educação e História da

Cultura da Universidade Presbiteriana Mackenzie,

como requisito parcial à obtenção do título de

Mestre em Artes, Educação e História da Cultura.

Aprovado em:

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________________

Prof. Dr. Norberto Stori - Orientador Universidade Presbiteriana Mackenzie

_____________________________________________________

Profª Drª Petra Sanchez Sanchez Universidade Presbiteriana Mackenzie

_____________________________________________________

Profª Drª Loris Graldi Rampazzo Universidade São Judas Tadeu

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Aos meus pais, José Marques e

Maria Kraus, trabalhadores rurais,

pela inspiração e estímulo para a

escolha do tema na presente

dissertação.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço muito aos meus filhos: Laura Maria e Artur José pela paciência,

compreensão, apoio e carinho que me dedicaram durante este período de estudos e

ao meu marido João Paulo pela atenção e críticas ao texto.

Aos meus pais, que graças ao esforço como trabalhadores rurais, me

proporcionaram o estudo e, mesmo com simplicidade souberam me mostrar o

caminho correto a percorrer.

A meu amigo de curso Professor Eduardo Mosaner, que me ajudou nas

correções dos textos do projeto, nos empréstimos de livros, sendo um grande

incentivador e por quem tenho grande admiração não só pelo seu trabalho, mas

também como ser humano, sempre de bom humor e pronto a colaborar com todos.

À Professora de Arte Michele Gesteira, pela colaboração e sugestões e às

Professoras Márcia Versutti, Zeinep Volfa e Patrícia Lourenço pelo apoio e incentivo.

Também agradeço imensamente a Professora Ana Lúcia pela ajuda na correção e

formatação da dissertação, e ao diretor Adilmício Vieira Gaia por ter concordado e

apoiado a aplicação do projeto na Escola Estadual Professora Zipora Rubinstein.

Aos colegas de curso do Mackenzie, em especial ao grupo dos “Alternativos”:

Silvia Cacace, José Romero, Ewerton Coelho, e Marina, do qual também faço parte.

À Professora Doutora Petra Sanchez e Sanchez, pela contribuição e

empréstimo de materiais, pelas sugestões dadas na qualificação e por todo o

carinho e atenção que sempre demonstrou com todos os seus alunos do Mackenzie.

À Professora Doutora Loris Graudi Rampazzo, pelas sugestões para o texto

da qualificação e pela simpatia e atenção ao trabalho de pesquisa.

Um agradecimento especial ao meu orientador Norberto Stori que acreditou e

incentivou na elaboração desta pesquisa, além de ter sido um excelente professor

durante o curso, se mostrando um grande conhecedor da História da Arte, tendo

também minha admiração pelo seu trabalho como artista plástico.

Ao Instituto Presbiteriano Mackenzie que financiou as despesas efetuadas

nesta pesquisa com verbas do Fundo Mackenzie de Pesquisa.

À secretária da Educação de São Paulo, pela ajuda através do programa

Bolsa Mestrado, pelo financiamento parcial dessa pesquisa.

Agradeço ainda a todos que de alguma forma me auxiliaram nesta jornada.

Obrigada!

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RESUMO

Esta dissertação teve por base uma pesquisa sobre metodologia de ensino

em Artes Visuais aplicada no Ensino Médio, na Escola Pública Estadual Professora

Zipora Rubinstein, situada na Zona Leste da cidade de São Paulo. O objetivo foi

aplicar a Metodologia Triangular, enunciada por Ana Mae Barbosa, visando o

desenvolvimento de habilidades para a apreciação, contextualização e elaboração

de propostas poéticas pelos alunos do Ensino Médio. A pesquisa justifica-se pela

utilização de imagens em sala de aula, havendo, portanto, uma preparação em

analisar e entender estas imagens antes do fazer artístico. As imagens analisadas

são de trabalhadores rurais e foram escolhidas por ser uma temática pouco

abordada na área e pouco conhecida pelos alunos. A proposta foi fazer com que os

mesmos conhecessem os artistas e suas obras, o contexto sócio-cultural e histórico

da época de criação, dialogando com as vivências e experiências expressas pelos

autores, criando assim, uma nova perspectiva crítica sobre a atual condição e

realidade na importância do fruir a Arte. A metodologia de pesquisa utilizada foi

qualitativa, tendo como base teórica a pesquisa-ação. Nela, os alunos produziram

respostas poéticas em artes plásticas a partir da leitura, análise e contextualização

da pintura de Candido Portinari e da fotografia de Sebastião Salgado,

reinterpretando-as e criando novas possibilidades de significações para elas. As

discussões que permearam o trabalho tiveram como referência as obras de sentido

social, ou seja, aquelas que tratam da análise dos trabalhadores em dois momentos

específicos e feitas por artistas com diferentes técnicas de abordar o assunto. Se de

um lado Portinari pinta os afrescos com a temática dos trabalhadores, por outro,

Salgado, usando a fotografia põe em evidência a dimensão dessa mesma categoria

de pessoas no momento em que interagem na questão social do Brasil.

Palavras-chave: Arte Visual, Abordagem Triangular, Trabalhador Rural, Pintura,

Fotografia e Pesquisa-Ação.

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ABSTRACT

This work was based in a research about a methodology of teaching in Visual

Arts applied in high school, in the Public State School Professora Zipporah

Rubinstein, located in the Eastern Region of São Paulo city. It aims to used the

methodology called “Triangular”, set out by Anna Mae Barbosa, intending to develop

the skills for the appreciation, contextualization and elaboration of poetic proposals of

high school students. The research was justified in using images in the classroom

and, consequently, there was a preparation to analyze and understand them before

making an artistic production. The images are of rural workers and were chosen

because it is an issue rarely studied in the field of Arts and little known by students.

The proposal was that they meet the artists and their works, the socio-cultural context

and history of the time, discussing their life and experiences expressed by the artists,

thus creating a new perspective on the current critical condition and really enjoy the

importance of the Arts. The methodology used was the qualitative research, which is

theoretically based on the Research-Action. In this, the students produced responses

in poetic art, by reading, analyzing and contextualizing painting of Candido Portinari

and pictures of Sebastião Salgado, reinterpreting and creating new readings of

works. The discussions held in this research are related to works that have social

meaning, those dealing with the analysis of workers at two specific moments by

artists who have different techniques to address the issue. In one part, Portinari

paints the frescoes with the theme of workers, on the other, Salgado, using photo

focuses on the dimension of those employees who interact with Brazil social.

Keywords: Visual Art, Triangular Approach, Rural Workers, Painting,

Photography and Research-Action.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 Foto Escola Rural “Água das Perobas”.................................................20

Figura 2 Pintura Os Semeadores Silvia Uny ......................................................22

Figura 3 Pintura O Leiteiro Silvia Uny ................................................................22

Figura 4 Pintura Trabalho ao Entardecer Silvia Uny ..........................................22

Figura 5 Pintura Carpindo a Lavoura Silvia Uny ................................................22

Figura 6 Pintura Os Garimpeiros Silvia Uny .......................................................23

Figura 7 Pintura O Velho Trabalhador Silvia Uny ..............................................23

Figura 8 Modelo gráfico da Metodologia Triangular ...........................................32

Figura 9 Pintura Retrato de Manuel Bandeira Portinari .....................................58

Figura 10 Pintura Retrato de Maria Portinari ........................................................58

Figura 11 Pintura Futebol Portinari .......................................................................59

Figura 12 Pintura Meninos Soltando Pipas Portinari ............................................59

Figura 13 Pintura Lavrador de Café Portinari .......................................................60

Figura 14 Pintura Mestiço Portinari ......................................................................60

Figura 15 Pintura Os Despejados Portinari ..........................................................60

Figura 16 Pintura Café Portinari ...........................................................................61

Figura 17 Pintura Construção da RodoviaIPortinari .............................................62

Figura 18 Pintura Escola de Canto Portinari ........................................................64

Figura 19 Pintura Fogo Portinari ..........................................................................64

Figura 20 Pintura Família Portinari .......................................................................65

Figura 21 Pintura Retirantes - 1944 Portinari .......................................................65

Figura 22 Pintura Retirantes - 1960 Portinari .......................................................66

Figura 23 Pintura Cena Gaúcha Portinari ............................................................67

Figura 24 Pintura Descobrimento Portinari ..........................................................67

Figura 25 Pintura Catequese Portinari .................................................................67

Figura 26 Pintura Santa Luzia e São Pedro Portinari ..........................................68

Figura 27 Pintura Flautista Portinari .....................................................................69

Figura 28 Pintura Jangadeiro Portinari .................................................................69

Figura 29 Pintura O Massacre dos Inocentes Portinari ........................................70

Figura 30 Pintura A Justiça de Salomão Portinari ................................................70

Figura 31 Pintura São Francisco se Despojando das Vestes Portinari ................73

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Figura 32 Pintura Jesus Carrega a Cruz às Costas Portinari ..............................73

Figura 33 Desenho Meninos de Brodósqui (A) Portinari ......................................74

Figura 34 Desenho Meninos de Brodósqui (B) Portinari ......................................74

Figura 35 Desenho Meninos de Brodósqui (C) Portinari ......................................74

Figura 36 Pintura Primeira Missa no Brasil Portinari ............................................76

Figura 37 Pintura Tiradentes Portinari .................................................................77

Figura 38 Pintura A Chegada de Dom João VI à Bahia Portinari ........................78

Figura 39 Pintura Guerra Portinari .......................................................................79

Figura 40 Pintura Paz Portinari ............................................................................80

Figura 41 Pintura Simão Cireneu Ajuda Jesus a Levar a Cruz Portinari .............81

Figura 42 Pintura Jesus Morre na Cruz Portinari .................................................81

Figura 43 Pintura Descobrimento do Brasil Portinari ...........................................82

Figura 44 Pintura Frevo Portinari .........................................................................82

Figura 45 Pintura Fundação de São Paulo Portinari ............................................83

Figura 46 Pintura Bandeirantes Portinari .............................................................83

Figura 47 Pintura Colheita de Café - 1958 Portinari ............................................83

Figura 48 Pintura Meninos Soltando Pipas Portinari ............................................83

Figura 49 Pintura Colheita de Café - 1933 Portinari ............................................86

Figura 50 Pintura Café - 1934 Portinari ................................................................86

Figura 51 Pintura Colonos Carregando Café Portinari .........................................86

Figura 52 Desenho Mãos Portinari .......................................................................89

Figura 53 Desenho Pés Portinari .........................................................................89

Figura 54 Desenho Trabalhador de Frente Portinari ............................................89

Figura 55 Desenho Homem com Saca Portinari ..................................................89

Figura 56 Desenho Homem Garimpando Portinari .............................................89

Figura 57 Desenho Colona Portinari ....................................................................90

Figura 58 Desenho Homem Sentado Portinari ....................................................90

Figura 59 Pintura Cana - 1937 Portinari ...............................................................90

Figura 60 Estudo de Pintura Cana Portinari .........................................................90

Figura 61 Pintura Colheita de Algodão Portinari ..................................................91

Figura 62 Pintura Faiscadores de Ouro Portinari .................................................91

Figura 63 Desenho Café Portinari ........................................................................91

Figura 64 Desenho Cana Portinari .......................................................................92

Figura 65 Desenho Algodão Portinari ..................................................................92

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Figura 66 Pintura Pau-Brasil Portinari ..................................................................93

Figura 67 Pintura Cana - 1938 Portinari ...............................................................93

Figura 68 Pintura Gado Portinari ..........................................................................93

Figura 69 Pintura Garimpo Portinari .....................................................................93

Figura 70 Pintura Fumo Portinari .........................................................................94

Figura 71 Pintura Algodão Portinari .....................................................................94

Figura 72 Pintura Erva-Mate Portinari ..................................................................94

Figura 73 Pintura Café - 1938 Portinari ................................................................94

Figura 74 Pintura Cacau Portinari ........................................................................95

Figura 75 Pintura Ferro Portinari ..........................................................................95

Figura 76 Pintura Borracha Portinari ....................................................................95

Figura 77 Pintura Carnaúba Portinari ...................................................................95

Figura 78 Pintura Colheita de Feijão Portinari .....................................................98

Figura 79 Pintura Colheita de Arroz Portinari .......................................................98

Figura 80 Pintura Colheita de Milho Portinari .......................................................98

Figura 81 Pintura Canavial Portinari ....................................................................98

Figura 82 Pintura Colheita de Café - 1960 Portinari ............................................99

Figura 83 Pintura Transporte de Café Portinari ...................................................99

Figura 84 Pintura O Arsenal - Frida Kahlo Distribui Armas ................................102

Figura 85 Pintura Jogos Infantis Portinari ..........................................................102

Figura 86 Xilogravura Operário ..........................................................................103

Figura 87 Pintura Mulheres Protestando ............................................................105

Figura 88 Xilogravura Xarqueada ......................................................................108

Figura 89 Xilogravura Camponeses ...................................................................109

Figura 90 Foto Garimpeiros de Serra Pelada Salgado ......................................114

Figura 91 Foto Bóias-Frias Salgado ...................................................................114

Figura 92 Foto Pés de Trabalhadores Salgado .................................................115

Figura 93 Foto Chá Ruanda Salgado .................................................................115

Figura 94 Foto Migração Rural para as Cidades Salgado .................................117

Figura 95 Foto Crianças as Margens da Rodovia Salgado ................................117

Figura 96 Foto Escola para Crianças do MST Salgado .....................................118

Figura 97 Foto A Luta pela Terra: Os ícones da Vitória Salgado .......................118

Figura 98 Foto Camponeses voltando do Trabalho. Salgado ............................120

Figura 99 Foto Kakuma, Quênia. Salgado .........................................................120

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Figura 100 Foto Zaire Salgado .............................................................................121

Figura 101 Foto Criança do Êxodo Salgado ........................................................121

Figura 102 Foto Fazenda de Salgado (antes do plantio)......................................122

Figura 103 Foto Fazenda de Salgado (depois do plantio)....................................122

Figura 104 Foto Grupo Dinka num campo de gado Salgado ...............................125

Figura 105 Foto Zebra da montanha Salgado .....................................................125

Figura 106 Foto Pingüins de Adélia Salgado .......................................................126

Figura 107 Foto Baleia franca-austral chamada Adelita Salgado ........................126

Figura 108 Foto Criança Dormindo na Rua Jacob Riis ........................................128

Figura 109 Foto Casa de Um Italiano Trapeiro Jacob Riis ..................................128

Figura 110 Foto Léo com Idade de Oito Anos Lewis Hine ...................................129

Figura 111 Foto Trabalhadores Orientando a Elevação do Cabo Lewis Hine ...129

Figura 112 Foto Família do Campo Walker Evans ...............................................130

Figura 113 Foto Cozinha do Agricultor Walker Evans .........................................130

Figura 114 Foto Cultura da Enxada Dorothea Lange ..........................................132

Figura 115 Foto Mãe Imigrante Dorothea Lange .................................................132

Figura 116 Foto Mulher em Ilhas Virgens Jack Delano .......................................133

Figura 117 Foto Colhedores de Algodão Jack Delano .........................................133

Figura 118 Foto Mãos que lavam Tina Modotti ....................................................134

Figura 119 Foto Mãos do Trabalhador Tina Modotti ............................................134

Figura 120 Foto A miséria Brasileira Pedro Martinelli ..........................................135

Figura 121 Foto Rio Içana Pedro Martinelli ..........................................................136

Figura 122 Foto São Paulo Cristiano Mascaro ....................................................138

Figura 123 Foto Bóias-Frias Rumo ao Ponto João Urban ...................................140

Figura 124 Foto Bóias-Frias João Urban .............................................................140

Figura 125 Foto Família com Onze Filhos Salgado .............................................145

Figura 126 Foto Crianças no Sul da Bahia Salgado ............................................145

Figura 127 Foto Criança Sofrendo de Desnutrição Salgado ................................146

Figura 128 Foto Transporte de Água a Longa Distância Salgado .......................146

Figura 129 Foto Parambu no Ceará Salgado ......................................................147

Figura 130 Foto Negros Correndo em Direção ao Mar Munkácsi ........................150

Figura 131 Foto Índia Cartier-Bresson (1948) ......................................................151

Figura 132 Foto Índia Cartier-Bresson (1950) ......................................................151

Figura 133 Foto Pollock de Chocolate Vik Muniz .................................................157

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Figura 134 Foto Medusa no prato de Macarronada Vik Muniz.............................157

Figura 135 Pintura Cana Portinari.........................................................................160

Figura 136 Fotografia Bóias-Frias Salgado ..........................................................160

Figura 137 Pintura Algodão ..................................................................................162

Figura 138 Fotografia Colhedores das Plantações de Algodão Salgado .............162

Figura 139 Pintura Café Portinari .........................................................................163

Figura 140 Fotografia Trabalhadores nas Plantações de Café Salgado .............163

Figura 141 Foto da Escola Estadual Professora Zipora Rubinstein .....................168

Figura 142 Foto da Imagem no Retroprojetor ......................................................172

Figura 143 Foto do Momento Descritivo da Obra ................................................172

Figura 144 Foto da Discussão do Formulário ......................................................172

Figura 145 Foto da Discussão do Formulário ......................................................172

Figura 146 Foto da Discussão do Grupo .............................................................173

Figura 147 Esboço do trabalho: Cortadores de Cana .........................................174

Figura 148 Esboço do trabalho: Caminho de Açúcar ..........................................174

Figura 149 Esboço do trabalho: Os Dois Mundos ................................................175

Figura 150 Esboço do trabalho: A Sombra do Algodão ......................................175

Figura 151 Esboço do trabalho: O Outro Lado da Embalagem ...........................175

Figura 152 Esboço do trabalho: Estudar ou Trabalhar?.......................................175

Figura 153 Foto da Discussão com o Grupo ........................................................176

Figura 154 Foto da Participação do Grupo ..........................................................176

Figura 155 Foto da Discussão com o Grupo ........................................................177

Figura 156 Quadro das Obras Selecionadas .......................................................179

Figura 157 Quadro de Desenvolvimento da Produção Artística ..........................190

Figura 158 Foto de Reinterpretação do Tema Cana - Cortadores de Cana ........190

Figura 159 Foto de Desenvolvimento da Produção Artística ...............................191

Figura 160 Foto de Reinterpretação: Cana - O Caminho de Açúcar ...................191

Figura 161 Foto de Desenvolvimento da Produção Artística ...............................192

Figura 162 Foto de Reinterpretação: Cana - A Escravidão Infantil .....................192

Figura 163 Foto de Desenvolvimento da Produção Artística ...............................193

Figura 164 Foto de Reinterpretação: Cana - O Trabalhador de Açúcar ..............193

Figura 165 Foto de Desenvolvimento da Produção Artística ...............................194

Figura 166 Foto de Reinterpretação: Cana - Vida Simples ..................................194

Figura 167 Foto de Desenvolvimento da Produção Artística ...............................195

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Figura 168 Foto de Reinterpretação do Tema Algodão - Os Dois Mundos .......195

Figura 169 Foto do Desenvolvimento da Produção Artística ...............................196

Figura 170 Foto de Reinterpretação: Algodão - A Sombra do Algodão .............196

Figura 171 Foto do Desenvolvimento da Produção Artística ...............................197

Figura 172 Foto da Reinterpretação: Algodão - Pegadas na Plantação ............197

Figura 173 Foto do Desenvolvimento da Produção Artística ...............................198

Figura 174 Foto da Reinterpretação: Algodão - Pés de Um Trabalhador ..........198

Figura 175 Foto do Desenvolvimento da Produção Artística ...............................199

Figura 176 Foto da Reinterpretação: Algodão - Imagens Através da Cortina ....199

Figura 177 Foto do Desenvolvimento da Produção Artística ...............................200

Figura 178 Foto do Desenvolvimento da Produção Artística ...............................200

Figura 179 Foto da Reinterpretação: Algodão - O Outro Lado ............................200

Figura 180 Foto do Desenvolvimento da Produção Artística ...............................201

Figura 181 Foto da Reinterpretação.do Tema Café – O Escuro .........................201

Figura 182 Foto do Desenvolvimento da Produção Artística ...............................202

Figura 183 Foto da Reinterpretação: Café - Estudar ou Trabalhar? ...................202

Figura 184 Foto do Desenvolvimento da Produção Artística ...............................203

Figura 185 Foto da Reinterpretação: Café - O Outro Lado da Embalagem .......203

Figura 186 Foto do Desenvolvimento da Produção Artística ...............................204

Figura 187 Foto da Reinterpretação: Café - Símbolo ..........................................204

Figura 188 Foto da Apresentação da Performance .............................................205

Figura 189 Foto da Apresentação da Performance .............................................205

Figura 190 Foto Orientação da Professora ..........................................................229

Figura 191 Foto da Reinterpretação:Café: Escravidão Infantil ............................229

Figura 192 Esboço do trabalho: Três Esferas ......................................................230

Figura 193 Foto da Reinterpretação: Algodão –Três Esferas .............................230

Figura 194 Foto Desenvolvimento da Produção Artística ....................................231

Figura 195 Foto da Reinterpretação: Café: O Consumo do Café ........................231

Figura 196 Foto da Reinterpretação: Café: Do Campo a Cidade ........................232

Figura 197 Foto da Reinterpretação: Café – O Mundo Gira ................................232

Figura 198 Foto do Desenvolvimento.da Produção Artística ...............................233

Figura 199 Foto da Reinterpretação: Café: Repetição ........................................233

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO .................................................................................................... 17

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 24

CAPÍTULO 1 Arte como Conhecimento e Linguagem .............................................. 30

1.1 Um Olhar sobre a Arte-Educação: Metodologia Triangular .......................... 30

1.2 A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e os Parâmetros

Curriculares Nacionais. ............................................................................................. 39

1.3 A Linguagem na Arte .................................................................................... 45

1.4 A Leitura de Imagens ................................................................................... 48

CAPÍTULO 2 A Arte de Candido Portinari como Expressão Ideológica .................... 55

2.1 Arte e Ideologia ............................................................................................ 55

2.2 A Temática Social de Candido Portinari: O Trabalhador .............................. 84

2.3 A Arte Social .............................................................................................. 100

CAPÍTULO 3 O Trabalho Fotográfico e Social de Sebastião Salgado .................... 113

3.1 O Poder da Imagem Fotográfica ................................................................ 113

3.2 A Fotografia Social e Ideológica ................................................................. 127

3.3 A Arte Mágica da Fotografia ....................................................................... 148

CAPÍTULO 4 Análise Comparativa das Obras de Candido Portinari e Sebastião

Salgado ................................................................................................................... 159

CAPÍTULO 5 Aplicação da Metodologia de Pesquisa no Ensino Médio ................. 166

5.1 O Método e os Procedimentos da Pesquisa .............................................. 166

5.2 Os Procedimentos Metodológicos .............................................................. 168

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5.3 Os Resultados da Pesquisa ....................................................................... 181

5.4 A Produção Artística................................................................................... 189

CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 206

FONTES .................................................................................................................. 209

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................... 213

APÊNDICES ........................................................................................................... 218

ANEXOS ................................................................................................................. 229

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APRESENTAÇÃO

A presente dissertação surgiu a partir de inquietações para entender as

relações culturais e sociais que permeiam as imagens dos trabalhadores rurais,

através da pintura do artista Candido Portinari (1903–1962) e da fotografia de

Sebastião Salgado (1944), cuja temática trabalhada por ambos, relacionadas a um

contexto social e em seus processos artísticos, estão ligadas à minha experiência de

vida e cultura.

Nasci e morei, até a minha adolescência, em um sítio de nome “Juca Batista”,

que foi de meu avô paterno, situado a 30 quilômetros de uma cidadezinha chamada

Bandeirantes, no Norte do Paraná. Assim como seus irmãos, meu pai trabalhava

desde criança ajudando meu avô na roça e, somente quando já eram adultos,

receberam um pedaço de terra como herança, onde meus pais criaram seus nove

filhos.

Por ser de família humilde os dois não tiveram instrução formal e nem

oportunidade de freqüentar a escola, já que tinham que trabalhar na lavoura desde

cedo para ajudar suas respectivas famílias.

Ainda criança, minha mãe conheceu algumas letras, durante o trabalho na

roça, através de uma latinha de banha usada para levar seu almoço. Neste período,

interessou-se por elas e perguntava ao pai o significado das letras e o significado

obtido pela junção das mesmas, aprendendo assim, praticamente sozinha, a soletrar

e fazer leituras básicas, embora não escrevesse.

Também criança, meu pai tinha que derrubar a mata para fazer plantação de

lavoura, período no qual foi instruído a fumar a fim de espantar a grande quantidade

de insetos existentes no local, através da fumaça que o cigarro de palha produzia.

Desde então não parou mais, o habito se tornou um vício que o acompanhou até o

final de sua vida. Ambos tiveram uma infância difícil, muitas vezes não tinham o que

comer, nem o que vestir e calçar. Trabalharam a vida toda na lavoura, pois não

tiveram outra opção e nem muita perspectiva de vida.

Assim, cresci vendo meu pai trabalhar na roça, e minha mãe que além de

auxiliar nessa tarefa também lavava roupa no rio para ajudar no sustento da família,

carregando lata de água na cabeça, cuidando da casa e dos filhos. Ela deu a luz aos

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sete primeiros filhos em casa, com a ajuda de minha avó materna, sendo que

apenas os dois caçulas nasceram no hospital da cidade Eu nasci em uma

madrugada de Abril sob a luz de querosene, pesando aproximadamente um quilo, e

quando pequena recebi um apelido “Uny”, dado por minha irmã mais nova e que

ainda permanece, posteriormente adotei-o como pseudônimo para identificar meus

trabalhos de pintura. Dessa maneira, todos os irmãos foram crescendo sem muitos

cuidados e aprendendo cedo os afazeres domésticos para ajudar nos serviços de

casa.

Quando criança, nadava nos rios, brincava na terra com os pés no chão,

subindo em árvores, lembro-me que quando chovia andava pela enxurrada chutando

a água suja e, em seguida, eu e minhas irmãs plantávamos mudas de flores,

aproveitando a terra molhada. Às vezes passava carro na estrada, saíamos correndo

para abrir a porteira para ganhar uma moeda ou talvez um pão do padeiro. Muitos

dos nossos brinquedos eram inventados com pneus velhos, latinhas, sucatas e a

boneca era de sabugo de milho. Fiquei muito feliz quando ganhei uma boneca de

verdade, comprada na cidade de Aparecida do Norte, São Paulo, como pagamento

de uma promessa feita por minha mãe pela cura de uma doença chamada Crupe,

que quase me levou à morte.

No sítio onde morávamos não havia energia elétrica, usávamos a luz de

querosene ou lampião a gás, não tínhamos TV, nem geladeira, somente um rádio à

pilha. Em época de geadas, preparávamos o leite com açúcar na tigela e

colocávamos em cima do telhado, para que se transformasse em gelo durante a

noite. No dia seguinte, bem cedo, tomávamos o sorvete que achávamos muito

saboroso.

A casa era de madeira, com poucos quartos, em um deles todas as meninas

dormiam juntas, em colchões de palha desconfortáveis. Todas as manhãs meu pai

levantava cedo, antes do sol nascer, acendia o fogão de lenha e preparava um copo

de café com leite para cada filho e depois ia trabalhar na lavoura. E nós íamos para

a escola rural caminhando a uma longa distância, muitas vezes descalças, e quando

íamos de chinelo, tínhamos que tirá-lo para entrar na escola.

Na época de colheita de algodão, antes do nascer do sol, íamos todos para a

roça para ajudar na colheita, sentindo a terra fria nos pés e os espinhos, que eram

tirados em todo o caminho até a roça. Durante todo o dia, arrastávamos o fardo

amarrado pela cintura, que quando cheio, era trocado por outro vazio. Recordo-me

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que à tarde, na hora da pesagem, ficávamos curiosos para saber quantos quilos

cada um havia colhido e no final da semana já saberíamos quanto cada um

receberia Com esse dinheiro fazíamos muitos planos do que comprar, mas na

realidade era muito pouco e não se podia comprar quase nada.

Éramos uma família grande, crescemos sem muitos cuidados higiênicos ou

médicos, quando ficávamos doentes, minha mãe preparava chás medicinais que na

maioria das vezes ajudava a passar a dor. Não tínhamos muita vaidade, todas as

nossas roupas eram costuradas pela minha mãe, que nos ensinou e nos educou a

sua maneira, para sermos pessoas de bem.

Embora meus pais, com toda a dificuldade de vida, se preocupavam em

proteger seus filhos, mas não conseguiram evitar a maior dor que um ser humano

pode sentir que é perder um filho, eles passaram por esse sofrimento quando meu

irmão faleceu aos 18 anos de idade em conseqüência do trabalho na lavoura,

intoxicado indiretamente pelo veneno utilizado na plantação de algodão, pois era ele

quem ajudava meu pai na roça. Após o acidente restou o filho caçula, e as filhas que

não possuíam as mesmas habilidades de lidar com a terra.

Há três anos, em 2006, passamos por sofrimento parecido com o falecimento

de meu pai, grande homem, que viveu e trabalhou na roça a vida toda, conhecia a

terra, os fenômenos da natureza, e com suas mãos calejadas de trabalhar com a

enxada, plantou e fez muitas colheitas durante sua vida de trabalho na lavoura, uma

pessoa simples, falava pouco mais tinha grande sabedoria.

Meu avô paterno trabalhava apenas com uma das mãos, pois ainda jovem

perdeu o braço esquerdo durante o trabalho no engenho de cana-de-açúcar, porém,

isto não o impossibilitou de continuar o trabalho na roça, estava sempre com uma

foice ou um machadinho para cortar lenha e para roçar a trilha por onde passava.

Deste modo, toda a família, pais, avós e bisavós maternos e paternos, foi

formada por trabalhadores rurais. Existem muitas lembranças significativas da época

que morei no sítio, testemunhei, participando de atividades relacionadas a este tipo

de trabalho que foram significativas para mim. Os trabalhadores, inclusive minha

família, lavrar a terra para o plantio, esperando a chuva chegar para semear os

grãos, acompanhando o nascimento da plantação e, na época das colheitas,

arrancar e bater o feijão, dobrar o milho na roça, cortar o arroz, derriçar o café e

espalhar no terreirão para a secagem, colher o algodão entre outros.

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Estas cenas marcantes trazem recordações de uma época de grande

dificuldade para os trabalhadores da roça, onde não havia maquinários e o serviço

era feito manualmente. Durante muito tempo o transporte até a cidade ou outras

localidades era feito a cavalo ou de carroça atrelada ao burro, senão caminhando

durante horas até chegar ao local pretendido.

Portanto, participei da angústia e ansiedade deste grupo de pessoas,

aguardando o momento da colheita para então receber algum dinheiro que vinha

apenas na época da venda do produto, isto é, se a geada ou um período longo de

estiagem não destruíssem a plantação antes, dando fim à esperança de uma boa

colheita, levando embora o sonho e a esperança de um ano de safra melhor.

Foi a partir desse contexto histórico-cultural que surgiu o grande interesse por

essa temática voltada ao trabalho rural, ou seja, pela vida do homem e sua labuta na

lavoura, que tira seu sustento da terra, que sobrevive na dependência de grandes

transformações e da esperança de que um dia a vida irá melhorar, vivendo de

sonhos.

Essa vivência está na memória e uma das lembranças mais forte é a

interação com a natureza. Talvez esse processo espontâneo fizesse relacionar a

experiência particular ao artístico. Trata-se de uma escolha surgida pela junção da

história de vida e da arte em um momento de reflexão e experiências significativas,

construídas pelas relações vividas junto à família, ao meio social e cultural.

O período educacional mais marcante foi o do ensino primário, realizado em

uma escola rural de madeira (figura 1), situada no mesmo bairro em que morava no

Estado do Paraná, onde eram realizadas, ao ar livre, atividades artísticas que

despertavam grande emoção e interesse como: cantigas de roda, danças, teatros,

brincadeiras infantis e os desenhos que adorava fazer.

Figura 1 – Silvia Uny. Escola Rural Água das Perobas. 2007. Fotografia Bairro Juca Batista, Bandeirantes, Paraná. F

oto: Silvia

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Embora no sítio só tivesse o curso primário, havia a preocupação de que

todos fossem à escola. Assim, todos cresceram até que eu e minhas irmãs tivemos

que viajar aproximadamente 30 quilômetros por dia até a cidade de Abatiá para

fazer o ensino ginasial.

A principal habilidade sensível direcionada a expressão plástica era o

artesanato aprendido com irmãs mais velhas entre outras coisas as colchas de

retalhos que minha mãe fazia, pois na infância e adolescência nunca tive

oportunidade de ir ao museu ou ver qualquer tipo de obra de arte. Estas

experiências foram com certeza as mais notáveis formas de expressão de “arte” em

minha vida, além das atividades da escola no antigo ginásio, como dança de

quadrilha, artesanatos, teatros, fanfarras, já que a disciplina de Educação Artística

não fazia parte do currículo escolar da região, exceto o desenho geométrico.

Aos 19 anos deixei a casa de meus pais e vim para o município de Mogi das

Cruzes, São Paulo, com o objetivo de procurar um trabalho e também porque

gostaria de dar continuidade aos estudos, depois de muitas dificuldades comecei a

cursar a faculdade de Educação Artística, despertando em mim o grande interesse

pelas artes visuais, aprendendo assim, a técnica de desenho, pintura, xilogravura

entre outras.

Tornei-me professora de Arte, apesar de, no momento da escolha, não estar

consciente da influência das situações vividas na infância. A formação artística

constitui o meu repertório em relação à valorização educacional e ideológica no

campo da Arte, como também o contexto social no qual permanecem minhas raízes

culturais.

Todos esses fatos sempre foram muito inquietantes, fazendo-me refletir sobre

a vida e a cultura do homem do campo, da vida difícil e árdua do trabalhador rural

que não é valorizado e que, na maioria das vezes, o pouco que ganha perde devido

ao clima, ou em outras ocasiões, todo o dinheiro conseguido com a venda da

colheita do ano é repassado aos bancos, por causa dos financiamentos feitos para

realizar a plantação.

Toda essa problemática e vivência, com uma preocupação ideológica e

social, trouxe a reflexão sobre a cultura do trabalhador rural e sua história de vida,

fazendo com que fossem buscados temas da realidade vivenciada por mim,

possibilitando assim, a produção e estudo de imagens relativas ao assunto e que

evidenciam o homem trabalhando na roça. Comecei então, há alguns anos, o

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desenvolvimento de um trabalho voltado à temática rural, com um estilo de pintura

moderna como: Os Semeadores (figura 2), O Leiteiro (figura 3), Trabalho ao

Entardecer (figura 4), Carpindo a Lavoura (figura 5), Os Garimpeiros (figura 6) e O

Velho Trabalhador (figura 7). As obras representam imagens da vida cotidiana de

trabalhadores rurais e foram feitas aplicando-se pinceladas com gestos

espontâneos, buscando-se um colorido alegre e cujo objetivo é transmitir uma

mensagem ideológica de uma verdade social, assim como a valorização dos ideais

da cultura rural, com a esperança de transformar a consciência do ser humano

através das emoções provocadas por elas, como se observa abaixo:

Figura 2 - Silvia Uny. Os Semeadores. 2005. Pintura a óleo s/tela, 100x120 cm.

Figura 3 - Silvia Uny. O Leiteiro, 2004. Pintura a óleo s/tela, 100x80 cm.

Figura 4 - Silvia Uny. Trabalho ao Entardecer, 2005. Pintura a óleo s/tela, 100x80cm.

Figura 5 – Silvia Uny. Carpindo a Lavoura, 2004. Pintura a óleo s/tela, 100x120cm.

Foto: Silvia

Foto: Silvia

Foto: Silvia

Foto: Silvia

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Figura 6 – Silvia Uny. Os Garimpeiros, 2004. Pintura a óleo s/tela, 100x120cm.

Figura 7 – Silvia Uny. O Velho Trabalhador, 2003. Pintura a óleo s/tela, 80X100 cm.

As figuras mostram a realidade de um contexto social, do trabalho árduo que

retrata a força, a luta pela sobrevivência, a importância e a dificuldade do homem do

campo. Tendo como referencial as pessoas mais simples, lembranças da infância e

adolescência vividas na zona rural, das pessoas humildes e maltratadas pela

condição do trabalho braçal, expostas ao sol e ao peso de um trabalho necessário,

que nem todas as pessoas têm o interesse ou condições de realizar. Ainda que as

obras transmitam um colorido alegre, as figuras dos trabalhadores sem identidade

demonstram um grande cansaço e desânimo de uma rotina diária, sem esperança

de um futuro próspero.

Portanto, sinto a necessidade de pintar, retratando essa classe que muitas

vezes é esquecida, com pouca valorização e reconhecimento na sociedade e no

mercado de trabalho, pessoas a quem não é dado o devido valor, mas dos quais

todos dependemos para a alimentação. Gente que, na maioria das vezes, não sabe

ler nem escrever, mas que possui a habilidade de lidar com a terra, conhecendo a

melhor época do plantio, com pouca vaidade, que possuem o mesmo hábito, ou

seja, acorda muito cedo, trabalha o dia todo de “sol a sol” e vai dormir cedo para, no

dia seguinte, começar tudo de novo, pensando em melhorar a situação de vida.

Porém, este dia não chega, só trabalha mesmo para tirar o sustendo para viver, e

nada mais.

Foto: Silvia

Foto: Silvia

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INTRODUÇÃO

A experiência como professora de Arte na rede pública durante mais de

quinze anos foi um processo abrangente, ocorrido em várias escolas, em contato

com as mais diversificadas culturas e contextos sociais e trabalhando com vários

projetos artísticos de teatro, música e artes visuais, enfatizando propostas

interdisciplinares, que propiciaram maior participação dos alunos, direcionando a

reflexão da Arte inserida ou relacionada às suas vivências diárias.

Esta pesquisa surgiu a partir do interesse por diferentes linguagens artísticas,

principalmente, a pintura e a fotografia, pois, com os anos de experiência na área da

educação foi possível constatar sua importante função no ensino-aprendizagem,

através de análises de contextos culturais e histórico-sociais expostos na

representação artística. O trabalho propõe aos alunos de Ensino Médio uma

abordagem mais ampla sobre a imagem a respeito da cultura do trabalhador do

campo, oferecendo aos participantes a oportunidade de se tornar conhecedores,

leitores e apreciadores de obras de arte.

A temática dessa dissertação foi influenciada por algumas obras de dois

grandes artistas brasileiros: Candido Portinari1 (1903-1962) e Sebastião Salgado2

(1944) cujos temas, de certa forma, estão relacionados com as inquietações que

instigaram a presente pesquisa. Os autores revelam a complexidade da vida rural,

retratando os trabalhadores brasileiros, na pintura e fotografia, visualizando as

mesmas temáticas.

Na pesquisa foram analisadas as imagens do trabalhador rural, retratadas

pelo artista Candido Portinari, nascido no interior de São Paulo em Brodósqui. O

recorte analisado foi em sua fase conhecida como “Ciclos Econômicos”, pintura em

1 Candido Torquato Portinari. O artista pintou quase cinco mil obras, de pequenos esboços a gigantescos murais. Foi o pintor brasileiro a alcançar maior projeção internacional. Nasceu em 29 de dezembro de 1903, numa fazenda de café, no interior de São Paulo, filho dos imigrantes italianos Giovan Battista Portinari e Domenica Torquato, que tiveram doze filhos, sendo ele o segundo. Candido Portinari faleceu no Rio de Janeiro em 06 de fevereiro de 1962. 2 Salgado, Sebastião. Nasceu em Aimorés, Minas Gerais, em 08 de fevereiro de 1944, reside em Paris, onde permanece a maior parte de sua vida. Formado em economia pela Universidade de São Paulo, trabalhou na Organização Internacional do Café em 1973, e trocou a Economia pela fotografia. O artista dedicou-se a fazer crônicas sobre a vida das pessoas excluídas. Este trabalho está documentado na publicação de dez livros e realização de várias exposições, tendo recebido vários prêmios e homenagens na Europa e no continente americano. Fundou em 1994 a sua própria agência de notícias, "a Imagens da Amazônia", que representa o fotógrafo e seu trabalho.

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afresco nos murais para o Ministério da Educação e Cultura no Rio de Janeiro, hoje

Palácio Gustavo Capanema3, entre os anos de 1936 a 1944, tendo como objeto de

análise três de suas obras: Cana de Açúcar (1938), Algodão (1938) e Café (1938).

Também, serão examinadas as fotografias de Sebastião Salgado, autor nascido em

Aimorés, Minas Gerais, cujas obras são: Cortadores de Cana (1987) Plantações de

Algodão (1980) e Café (2002).

Deste modo, foram estudadas as representações artísticas pelo ponto de

vista histórico-social, estimulando a formação estética e cultural do educando e

desenvolvendo conceitos sobre a pintura e a fotografia, estabelecendo significações

e interpretações nas relações de construção de conceitos como a crítica e estética,

histórica e artística. Esses pontos são essenciais, uma vez que estabelecem práticas

de aprendizados do currículo de Ensino Fundamental e Médio no Brasil.

Os educandos, ao utilizarem a comparação entre estas técnicas

diferenciadas, passaram a observar de maneira mais apropriada, identificando as

mudanças e permanências das ações do trabalho rural e as relações do presente e

do passado, contribuindo assim, para esclarecer uma abordagem crítica, social e

cultural a partir de sua realidade.

A proposta possibilitou aos educandos condições para que percebessem as

relações entre a obra, o artista e seus contemporâneos, suas influências e o

contexto no qual foram criadas e seu próprio cotidiano. A maneira que cada

indivíduo vê e interpreta uma imagem varia de acordo com a pessoa, cultura, época

e experiência de vida O intuito foi observar a opção estética e o modo como cada

artista se utiliza de técnicas, criando um novo discurso, por vezes social, político e

histórico a partir da observação de fatos reais.

Desta forma, foi traçado um paralelo entre as duas linguagens artísticas,

possibilitando que a fruição, a análise estética, a contextualização e a elaboração de

uma proposta poética através das imagens, tornem-se possíveis na sala de aula,

estabelecendo assim, uma leitura e apreciação das obras na pintura e fotografia.

Por meio das duas linguagens podemos observar igualdades na mesma

temática. Foram transmitidas informações que puderam colaborar para elaboração

de conceitos e reflexões, estimulando, deste modo, um encontro com o objeto

3 Palácio Gustavo Capanema - O atual Edifício Gustavo Capanema ou Palácio Capanema (também conhecido pelo seu uso original, o Ministério da Educação e Saúde, ou ainda como MEC) é um edifício público localizado no centro da cidade do Rio de Janeiro, na rua da Imprensa, número 16.

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artístico e possibilitando ao aluno uma experiência estética, sendo que a mesma

será vivida por cada um à sua maneira, conforme sua vivência, ou seja, suas

condições sociais e econômicas.

Este percurso educativo trabalhou o olhar cuidadoso, apreciativo, crítico e

criador, pois as pessoas não estão, em sua maioria, habituadas a ver, costumam

olhar sem ver, principalmente quando se trata de imagens artísticas. O intuito foi

trabalhar a leitura da imagem, conhecendo-a, produzindo e valorizando a arte como

conhecimento, podendo-se fazer uma observação dos acontecimentos sócio-

econômicos, políticos e culturais.

A leitura e o recorte utilizados na pesquisa criaram uma nova realidade e uma

nova lógica frente ao contexto social e histórico. Além disso, a necessidade de

refletir sobre as obras de Portinari e Salgado transmitiram novas perspectivas do

processo de criação, criando novas características do meio em que a imagem do

trabalhador foi analisada. Tratou-se de referenciar e investigar as linguagens através

das obras, verificando como a opção estética leva a uma reflexão sobre as

definições da ação do trabalho humano. Portanto, o objetivo da imagem é o homem

em ação e o exercício do trabalhador em uma visão externa. Para tanto, a

apreciação estética é o próprio ato de perceber, ler, analisar, interpretar, criticar e

refletir sobre o contexto visual.

Portinari e Salgado sempre desenvolveram seus trabalhos demonstrando

uma preocupação com o povo simples, o trabalhador rural e as pessoas sofridas que

lutam pela necessidade de sobrevivência. Mesmo vivendo em épocas diferentes,

existem nas obras desses artistas, sejam na tela ou no papel fotográfico, flagrantes

coincidências geradas pela imposição das desigualdades sociais.

As produções trabalhadas revelam os problemas da sociedade, por isso a

importância de contextualizá-las como fortes instrumentos na educação, capazes de

estimular o desenvolvimento das inteligências, respeitando os limites e as

expectativas de cada um. Isoladamente, as linguagens têm suas características

próprias, com riqueza de opções a serem trabalhadas sob um olhar diferenciado,

sendo usadas para o enriquecimento crítico e sensitivo do educando.

O aluno pode transformar-se em seu encontro com a obra de arte, quando há

possibilidade de estabelecer e compartilhar relações pessoais de significado na

experiência estética com a arte e a cultura, desenvolvendo um olhar ativo, uma

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percepção imaginativa, podendo assumir uma atitude de participação individual e

grupal mais densa nas transformações culturais do mundo em que vive.

Todavia, o problema foi como trabalhar um processo de alfabetização visual,

de contextualização e produção de obras de acordo com a Metodologia Triangular,

em sala de aula, com adolescentes de Ensino Médio de uma Escola Pública

Estadual?

O objetivo foi aplicar a referida metodologia elaborada pela Professora Ana

Mae Barbosa4 que é apreciar, contextualizar e produzir, visando à ampliação de

conhecimentos dos alunos de Ensino Médio, que seguirão a proposta acima e

integraram a História da Arte, o fazer artístico e a leitura da obra, visto como uma

das maneiras mais completas de trabalhar os conteúdos, visando o desenvolvimento

de habilidades e competências.

O caminho metodológico deste trabalho se insere na pesquisa qualitativa, da

Pesquisa-Ação, desenvolvida no campo de Arte-Educação, no ambiente de sala de

aula, na disciplina de Arte do Ensino Médio do 2º ano da Escola Pública Estadual

“Professora Zipora Rubinstein”, situada em Guaianazes, na Zona Leste na cidade de

São Paulo.

Como mencionado, as atividades foram desenvolvidas com a seleção de três

imagens de trabalhadores rurais na pintura de Portinari e três fotografias de

Sebastião Salgado tendo as mesmas temáticas. Para cada obra selecionada foi

completado um ciclo de atividades, que é repetido para todas as imagens, sempre

apresentando diferentes momentos correspondentes aos três passos da Proposta

de Metodologia Triangular de Ana Mae Barbosa: o “fruir” (ou apreciar e ler a

imagem), o “contextualizar” (conhecer obra e o artista) e o “fazer” (ou produzir uma

obra poética).

No primeiro capítulo foi examinado o ensino da Arte como parte do currículo

no processo de ensino-aprendizagem, discutindo e analisando a proposta Triangular

elaborada pela educadora Ana Mae. Além disso, será dada uma ênfase maior na

leitura de imagens.

4 Ana Mae Tavares Barbosa nasceu no Rio de Janeiro, mas foi criada em Pernambuco, graduou-se em Direito, carreira que abandonou logo após a formatura. Atualmente, é professora titular aposentada e pesquisadora da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). É a principal referência no Brasil para o ensino da Arte nas escolas, tendo sido a primeira brasileira com doutorado em Arte-Educação, defendido em 1977, na Universidade de Boston USA.

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O sistema aplicado foi o Image Watching, elaborado pelo Professor Robert

William Ott5, que estabelece cinco categorias para a leitura de imagens:

descrevendo, analisando, interpretando, fundamentando e revelando. Trata-se de

uma abordagem que fornece conceitos voltados à produção artística, valorizando o

modo crítico e criativo de aprender arte na educação, proporcionando meios para

obter respostas assimilativas e interpretativas.

Outra análise igualmente abordada foi sobre a Arte-Educação, e a Lei número

9.394/96, de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, designando a área por Arte e

não mais Educação Artística, incluindo-a no currículo com conteúdos próprios. Além

disso, os Parâmetros Curriculares Nacionais, publicados pelo Ministério da

Educação também foram mencionados.

O segundo capítulo trata-se da significação ideológica do artista Candido

Portinari, cuja temática básica foi à questão social, que foi demonstrada nos seus

diversos painéis com temas históricos, religiosos, culturais e sociais espalhados pelo

Brasil e exterior. Na mesma parte, há uma ênfase maior aos trabalhos em afresco

que retratam os ciclos econômicos, desenvolvidos para o Ministério da Educação e

Cultura no Rio de Janeiro e que serão analisadas na pesquisa por manifestarem o

referido tema.

O terceiro capítulo abordou a fotografia de Sebastião Salgado, considerado

um dos maiores fotógrafos do mundo, cujas obras mostram pessoas desprezadas

pela sociedade, trabalhadores que lutam pela sobrevivência e por um pedaço de

terra. O autor sempre se preocupou com o povo, o trabalhador, a miséria humana e,

por essa razão, suas fotos expõem a realidade da vida.

A utilização do trabalho de Salgado nesta pesquisa foi em decorrência da sua

própria origem, pois era filho de agricultores e as luzes e os focos projetaram parte

da realidade dele, a existência de imagem do homem trabalhador e de suas

condições de vida.Também foi destacado o trabalho de fotógrafos americanos e

brasileiros que se preocuparam com a questão social e demonstram isso através de

suas imagens fotográficas.

Outro assunto mencionado é o papel social do fotógrafo, a criação do Instituto

Terra, na cidade de Aimorés em Minas Gerais, uma Organização Não-

5 Professor Robert William Ott (1935-1998). Arte-educador norte-americano. Desenvolveu o método de leitura de imagem, o sistema de crítica artística Image Watching. Em 1988 veio ao Brasil ministrar cursos no MAC-USPcom o método de análise de imagem.

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Governamental (ONG) com o projeto de recuperação do meio-ambiente, tendo como

objetivo desenvolver um processo educacional e de pesquisa voltado para a

recuperação de áreas degradadas. Foi enfatizado o trabalho minucioso do fotógrafo

e a importante função da fotografia enquanto elemento de arte e fotojornalismo.

No quarto capítulo foram analisadas de maneira comparativa as duas

linguagens artísticas, sendo três imagens na pintura de Portinari e três na fotografia

de Salgado, sendo as mesmas utilizadas na aplicação da Proposta Triangular.

Finalmente no quinto capítulo, foram abordados os fundamentos teóricos e a

metodologia utilizada, sendo ela uma pesquisa qualitativa, tendo como base a

Pesquisa-Ação e a referência teórica dos autores Michel Thiollent6 e Antonio

Chizzoti7. Seu objetivo foi a descoberta de novos conhecimentos coletivos na

resolução de um problema com envolvimento do pesquisador e participantes do

trabalho prático e intelectual. Foram apresentados também os resultados da

pesquisa, a metodologia utilizada e seus procedimentos, bem como os objetivos

satisfatórios e consistentes alcançados.

No apêndice foi demonstrado o desenvolvimento da pesquisa feita com

alunos do Ensino Médio através de formulários por eles respondidos, durante a

aplicação da Metodologia Triangular de Ana Mae e os cinco momentos da leitura de

imagem de Robert Ott.

Encontra-se em apêndice os formulários respondidos pelos alunos

participantes da pesquisa, e no anexo o trabalho do 2º ano do Ensino Médio

realizado pela professora Michele Gesteira8 que desenvolveu o mesmo projeto com

alunos de outras salas de aula.

6 Michel Thiollent (1947-), sociólogo, Doutor em Sociologia e Economia. É autor de livros sobre metodologia da Pesquisa-Ação, por isso, considerado um "metodólogo". Suas áreas de estudos abrangem desenvolvimento local, extensão universitária, sistemas agroindustriais, inovação tecnológica e organizacional. 7 Antonio Chizzotti, filósofo e Doutor em Educação. Atualmente é Professor associado da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Filosofia da Educação, atuando principalmente nos seguintes temas: Epistemologia da Educação, Políticas Públicas de Educação e Currículo, e pesquisas em Ciências Humanas. 8 Michele Gesteira - (1984-) professora de Arte da Escola Estadual Zipora Rubstein.

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CAPÍTULO 1

Arte como Conhecimento e Linguagem

O papel na Arte educação está relacionado aos aspectos artísticos e estéticos do conhecimento. Expressar o modo de ver o mundo nas linguagens artísticas, dando forma e colorido ao que, até então, se encontrava no domínio da imaginação, da percepção, é uma das funções da Arte na escola.

(Analice Dutra Pillar. 2007, p. 71).

1.1 Um Olhar sobre a Arte-Educação: Metodologia Triangular

A arte é conhecimento construído pelas pessoas através dos tempos,

identificando-se com os meios que permitem a comunicação entre indivíduos,

possibilitando a compreensão de mundo, da sociedade e da cultura.

O ensino desta disciplina vem passando por transformações devido às

grandes mudanças ocorridas no processo de educação em geral, principalmente na

própria área. No presente capítulo sobre Arte-Educação é necessário que a Arte seja

percebida como sendo uma área de conhecimento, como uma forma de identificação

e expressão de valores e experiências adquiridos em sua trajetória histórica. É

importante que ela seja tratada como uma disciplina, em outras palavras, um ramo

de conhecimento artístico, semelhante ao científico, que tem suas linguagens e

conteúdos próprios constituída pelo conjunto de conhecimentos sobre esse assunto.

A partir dos anos 80, seu ensino passou a ser repensado pelos profissionais

da educação, professores e especialistas, que começaram a refletir e trabalhar não

só a produção como também a leitura da imagem e a contextualização histórica,

estabelecendo assim, relações que permitem a interdisciplinaridade no processo de

ensino e aprendizagem.

Nesta perspectiva, a inclusão dos fundamentos do trabalho da pesquisadora

Ana Mae Barbosa, doutora em Arte-Educação, garantiu novas práticas que

representam uma importante contribuição na análise da proposta dos anos 70 nos

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Estados Unidos, no qual professores e artistas começam a pesquisar e trabalhar no

DBAE, Discipline-Based Art Education, ou seja, Arte-Educação baseada em

disciplinas, determinando as reflexões sobre o trabalho do filósofo e pedagogo

americano Jonh Dewey9, das Escuelas al Aire Libre mexicanas nos anos de 1913 e

1920 a 1933, identificado pela Professora Ana Mae como o único movimento

modernista do ensino que, deliberadamente, integrou a idéia de arte como livre

expressão e como cultura.

O DBAE, patrocinado pelo Getty Center Foundation, que fornece auxílio para

instituições e indivíduos do mundo inteiro, financiando projetos que promovem as

artes visuais, passou então a preparar e capacitar professores de Arte nos Estados

Unidos e Canadá, em projetos que, além da produção, incluíam a História, Estética e

a Crítica de Arte.

Estas bases teóricas garantiram que no Brasil, no final dos anos 80, surgisse

uma proposta de ensino em Arte, esta metodologia foi difundida e, inicialmente posta

em prática no Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo,

(MAC/USP) pela Arte-educadora citada anteriormente, então diretora do museu

entre os anos de 1986 e 1993. Deste modo, somente nos anos 90 uma nova

metodologia foi aplicada no meio acadêmico do país, apresentando assim uma linha

de pesquisa mais consistente, discutida em encontros da área, tornando-se uma

opção importante na busca por um ensino diferenciado em Artes, difundido em

várias regiões através da Fundação Iochpe10, por professores e por outras

instituições de ensino.

Esta metodologia foi denominada “Proposta Triangular”, que permite o

envolvimento de três vertentes: Apreciação Artística, Contextualização Histórica e o

Fazer Artístico, de acordo com essa abordagem, o conhecimento e o

desenvolvimento na área de artes visuais só é obtido quando os três elementos são

simultaneamente colocados em prática. Assim, desenvolve-se um novo contexto ao

ensino das Artes nas escolas brasileiras. Na seqüência, o quadro ilustrativo ajuda a

visualizar o processo:

3. John Dewey (1859-1952), Filósofo e Educador, um dos fundadores da Escola Progressista norte-americana, conhecida também como Escola Nova. 4. Iochpe-Maxion S/A, instituiu em 1989 a Fundação Iochpe, a qual desenvolve programas nas áreas de Educação, Cultura e Bem Estar Social realizando parcerias com entidades públicas e privadas. Mantém a educação de crianças e adolescentes como prioridade e apóia ações de investimento social e atividades culturais, beneficiando mais de cento e vinte mil pessoas em vários Estados. É uma organização civil sem fins lucrativos, qualificada como OSCIP, que se dedica a apoiar profissionais e empresas em suas ações de investimento social.

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Figura 8 - Modelo Gráfico da Metodologia Triangular.

Esta proposta do ensino de Arte é uma nova leitura do DBAE, que reúne

várias disciplinas como Arte Visual, Estética, Crítica e História da Arte as quais foram

re-elaboradas pela autora Ana Mae Barbosa, em três substratos: a análise ou leitura

da obra, a contextualização através da História da Arte e a produção da obra. A

metodologia Triangular na visão da autora é:

A proposta Triangular é construtivista, interacionista, diagonal, multiculturalista e pós-moderna por tudo isso e por articular arte como expressão e como cultura na sala de aula, sendo essa articulação o denominador comum de todas as propostas pós-modernas do ensino da arte que circulam internacionalmente na contemporaneidade (BARBOSA, 1998, p. 41).

Com foco neste conceito e tendo uma abordagem direcionada às questões

que envolvem a Arte estruturada em conhecimento e saberes, o ensino da disciplina

deve conciliar a História, a Crítica Artística e as relações da obra a partir de

características sociais e culturais da época. Esta pode ser considerada a

metodologia mais completa utilizada em sala de aula, com base na concepção de

Apreciar/Fruir (leitura da obra)

ABORDAGEM TRIANGULAR

(Ana Mae Barbosa)

Conhecer/Contextualizar (o autor e seu tempo)

Fazer/Produzir (elaborar respostas poéticas)

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que a Arte auxilia na fundamentação de uma proposta de ensino e aprendizagens

artísticas.

A referida proposta é inserida como parte integrante e significativa, pois inclui

fatores eficazes e essenciais, associando e inter-relacionando elementos

fundamentais no processo de ensino. Como destaca Ana Mae:

Esta metodologia do ensino da Arte corresponde às quatro mais importantes coisas que as pessoas fazem com arte: elas as produzem, as vêem, procuram entender seu lugar na cultura através do tempo, fazem julgamento acerca de sua qualidade (1991, p.3).

Desta forma, ela proporciona uma contribuição ampla ao desenvolvimento e

às experiências humanas.

Assim sendo, percebe-se que as propostas idealizadas pela Professora Ana

Mae não se restringem à produção artística, mas contribuem para a valorização do

empenho do professor em sala de aula, que, por sua vez, deve compreendê-la e

evidenciar sua dimensão histórica, apreciação e crítica.

Do mesmo modo, coloca-se em evidência a leitura de imagens, que tem como

objetivo tornar possível o perfeito entendimento, para os alunos, do que é arte e

quais as formas de expressá-la tanto no aspecto de identidade como de cultura. Por

esta razão, a compreensão de uma obra exige muito mais do que ver e ouvir; requer

conhecer os parâmetros que transcendem o gosto pessoal, que também é histórica

e socialmente construída. O ato de ler a imagem e escrever a palavra inicia-se na

leitura de mundo. Neste sentido, levando-se em consideração as idéias do educador

e pedagogo Paulo Freire11 verifica-se que:

Ler é entrar nos textos, com vias a compreendê-lo, desde sua relação dialética com seus contextos e o nosso contexto O contexto do escritor e o contexto do leitor. Ao ler eu preciso estar informando-me do contexto social, político, ideológico, histórico do autor. Eu tenho de situar o autor num determinado tempo (FREIRE, 1995, pp. 4-5).

Através da observação detalhada das obras de arte, é que se permite divagar,

na acepção de imaginar, e visualizar uma nova forma de entender o mundo, fato

11 Paulo Freire (1921-1997) Educador brasileiro. Destacou-se por seu trabalho na área da educação popular, voltada tanto para a escolarização como para a formação da consciência. É considerado um dos pensadores mais notáveis na história da pedagogia mundial, tendo influenciado o movimento chamado Pedagogia Crítica.

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este que inclui questões estéticas e de consciência crítica. Isto remete ao

entendimento do conceito de alfabetização estruturado por Paulo Freire, que atua de

maneira a conectar o ato de ler e escrever com a tomada de consciência de nossa

historicidade e com a possibilidade de questionar e de transformar a realidade em

que vivemos.

A leitura de produções artísticas envolve o questionamento, a busca, a

descoberta e o despertar da capacidade crítica dos alunos e, é exatamente o que a

proposta mencionada sugere, ou seja, desenvolver as habilidades de ver, julgar e

interpretar as obras, compreendendo os elementos e as relações estabelecidas

entre o contexto histórico em que foram criadas e o momento em que se encontra

seu observador, já que diferentes gerações as observam, analisam e compreendem,

conforme seus preceitos e convicções.

Outra importante questão, que merece ser destacada nas interpretações

deste novo procedimento, demonstra que estas não apresentam um sentido de certo

ou errado, pois as variáveis intervenientes, surgidas do sujeito/obra/contexto, lhe

confere uma conotação muito mais ampla. A interpretação deve ser realizada com

foco na obra e não no artista que a produziu, isto inviabiliza qualquer tentativa de

adivinhar a idéia do autor, mas permite a ação de criar sua própria maneira de

entender o teor artístico de seu trabalho. Este ato determina que ao ler determinada

imagem, o educando tenha que “saboreá-la”, fornecendo seus inúmeros significados

e garantindo que ele próprio crie, de maneira prazerosa, a enorme gama de

interpretações possíveis de uma mesma obra. De modo mais resumido, aprender a

ler uma imagem é saber explorá-la, interpretá-la e buscar conhecimento significativo,

pois trata-se de uma tarefa flexível e diversificada que depende da sensibilidade do

olhar de cada um.

Ao se trabalhar a Arte com o educando, é necessário que se conceda a

liberdade de criação, sendo um fator importante para produção de conhecimento

trazendo várias interpretações e reflexões, ampliando assim sua capacidade crítica

positiva e construtivista. Deve-se ainda considerar que o objetivo ao ensinar Arte,

não é a intenção de formar artistas, mas sim, indivíduos com maior sensibilidade

desenvolvida a partir da familiarização com os objetos de arte, havendo assim um

expressivo aprimoramento da capacidade de diálogo, principalmente sobre as

diferentes opiniões e as produções culturais e artísticas.

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Uma distorção percebida e apontada pela educadora Analice Dutra Pillar12

(1996) sobre releituras, é que, a maioria dos professores ainda se dedica, de forma

muito pragmática, sobre a Proposta Triangular, acarretando um enrijecimento dos

conceitos, que é totalmente inadequado quando se lida com atividades totalmente

soltas e desprovidas de regras, o que está direcionando este apoio à produção de

cópias, sem o devido cuidado de promover, o despertar da interpretação,

transformação do aluno, que difere muito de modelos estáticos existente nas demais

ciências, já que a cópia se destina apenas a garantir um aprimoramento das

técnicas, não agindo como fator predominantemente criativo e interpretativo.

Ambas são atividades de ensino, mas uma é da ordem de reprodução e a

outra da criação. O fazer é uma das atividades que estimula a aprendizagem da

História da Arte e a leitura de imagens, pois é assim que o estudante pode descobrir

as possibilidades e limitações das linguagens expressivas, de seus diferentes

materiais e instrumentos.

Dessa forma, sendo a contextualização, uma das propostas defendidas por

Ana Mae Barbosa:

Nossa aproximação da história da arte não é linear, mas pretende contextualizar a obra de arte no tempo e explorar suas circunstâncias. Em lugar de estarmos preocupados em mostrar a chamada ‘evolução’ das formas artísticas através do tempo, pretendemos mostrar que a arte não está isolada de nosso cotidiano, de nossa história pessoal. Apesar de ser um produto da fantasia e imaginação, a arte não está separada da economia, política e dos padrões sociais que operam na sociedade. Idéias, emoções, linguagens diferem de tempos em tempos e de lugar para lugar e não existe visão desinfluenciada e isolada. Construímos a história a partir de cada obra de arte examinada pelas crianças, estabelecendo conexões e relações entre outras obras de arte e outras manifestações culturais. (BARBOSA, 1998, p. 19).

Como é possível observar, a autora dimensiona a História da Arte não como

um contexto racional e cientifico, mas que trata de perceber a produção artística

como intimamente ligada ao viver social, respeitando suas formas, maneiras e

temporalidade. Como resultado, ao contextualizar o objeto de estudo, opera-se no

domínio da História da Arte, que permite situar o artista e a obra no seu tempo e

12 Analice Dutra Pillar, professora e pesquisadora da faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), na área de Artes Visuais do curso de Pedagogia e no programa de Pós-Graduação em Educação. Mestre e Doutora em Artes pela Escola de Comunicações e Arte da Universidade de São Paulo (ECA/USP).

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espaço, relacionando as questões históricas e sociais, na arte, educação e cultura, e

que estiveram presentes no momento de sua realização. Quando o aluno

contextualiza a imagem no seu tempo, ele busca conhecer todos os elementos que

a cerca e que fez parte do período de sua criação.

A Professora e Doutora em Arte-Educação, Rosa Iavelberg13, (2004) entende

que a aplicação da Proposta Triangular deve ser realizada após o educando

apresentar suas condições, ou seja, ao manifestar seus pontos de vista e mostrar

que as criações artísticas elaboradas na sala de aula favorecem a construção de

uma imagem positiva de si mesmo, assim como conhecedor e produtor de arte. A

Proposta Triangular, que não se apresenta como um procedimento dominante ou

hierárquico, é resultante da combinação dos mais variados conteúdos e apontam

para o conceito de pertinência na escolha de determinada ação, enfatizando sempre

a coerência entre os objetivos e os métodos.

Então, pode-se reafirmar que o contato do aluno com a obra de arte favorece

a apreciação de inúmeras interpretações e significações como o contexto histórico

social e os fatores econômicos e culturais. Verifica-se que diante de uma produção

artística, as habilidades de percepção, intuição, raciocínio e imaginação, criam a

sensibilidade entre o educando e a obra. Segundo o filósofo Pareyson14:

A interpretação da obra constrói relações de simpatia, congenialidade, sintonia, dos infinitos aspectos presentes nos pontos de vista do indivíduo, o que se pode conceituar que o interpretar significa conseguir sintonizar à realidade de uma forma através da feliz adequação entre um de seus aspectos e a perspectiva pessoal de quem a olha. (PAREYSON, 1989, p. 29).

Portanto, a obra de arte tem como aspecto fundamental a garantia de

conseguir conectar as sensações, emoções e reflexões, permitindo que seu

conteúdo seja reinventado internamente. É importante destacar que cada educando

pode ter uma interpretação própria, nunca sendo indiferente, uma vez que causa um

impacto que parte do indivíduo e, ao mesmo tempo, é impregnado de novas

sensibilidades. Sendo assim, não se deve procurar uma intenção do artista e sim

7. Rosa Iavelberg é doutora em Arte-Educação pela Escola de Comunicação e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP) e coordenou e elaborou os Parâmetros Curriculares Nacionais de Arte no Ensino Fundamental. 8. Luigi Pareyson (1918-1991) um dos maiores filósofos italianos do século XX. Concluiu sua licenciatura em 1939 na Universidade de Turim, onde também lecionou. Ao longo da sua vida destacou-se ainda por sua atividade política, tendo participado na resistência antifascista italiana.

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desenvolver uma interpretação individual, através da produção de significados,

elaborando suas próprias conclusões.

Antes de apreciar determinada obra de arte, é importante que se consiga

situá-la no tempo, conhecer as expressões poéticas existentes, pois esta se

consagra em refletir o significado em determinado lapso de tempo, onde o ambiente

influenciou o artista e fez com que determinados valores tenham sido estabelecidos,

pela forma como a sociedade se estruturava considerando ainda outros aspectos,

como o contexto histórico e social, a cultura e a política. De acordo com a Professora

Doutora Miriam Celeste Martins15:

A obra de arte permite várias leituras, estando vinculada ao nível de informação que o espectador possui, sempre lembrando que uma obra não envelhece, pois em cada período sempre surge uma significação, que lhe rejuvenesce e permite que renasça, permitindo que ocorram infinitas leituras, uma vez que se reconhece que o ser humano tem uma capacidade igualmente infinita de perceber, sentir, pensar, imaginar e emocionar-se (MARTINS, 1998, p. 61).

A Professora Miriam Celeste defende a posição de que ao se apreciar

determinada obra de arte realiza-se, automaticamente, a ressignificação atualizando

e produzindo interpretações dinâmicas que estão ligadas à sensibilidade de cada

indivíduo. A afirmação deste, por sua vez, pode produzir uma significação própria

frente às produções artísticas. Percebe-se que as obras produzidas no passado

podem não ter o mesmo significado que é percebido no momento de sua leitura,

pois, os contextos culturais se modificam de acordo com as experiências vivenciadas

pelos indivíduos, as pessoas que estavam presentes na ocasião em que a obra foi

produzida e, de outra forma, aqueles que a apreciam no presente, atribuindo-lhe

novos sentidos.

As obras de arte somente são perecíveis no que se refere à matéria, porém

são perpetuadas na lembrança, na significação e na representação de um fato

ocorrido. Por este motivo, sua restauração e reprodução passam a ter o objetivo de

conservar o patrimônio histórico-cultural da humanidade. Todavia, não se pode

esquecer o que é confirmado, uma vez que sua simbologia e interpretação estão

15 Mirian Celeste Martins é doutora pela Faculdade de Educação da USP e professora da pós-graduação do Instituto de Artes da Universidade do Estado de São Paulo (UNESP). Coordenadora da “DVDteca” do Instituto Arte na escola da Fundação Iochpe. Atualmente é docente do curso de pós-graduação "Educação, Arte e História da Cultura" na Universidade Presbiteriana Mackenzie, sócia-diretora do Rizoma Cultural; assessora de instituições educacionais e culturais e co-responsável pela Proposta Curricular de Arte da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo.

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diretamente relacionadas ao contexto do observador. Este, ao tomar contato com a

obra, estabelece conexões externas, induzidas pelo seu entendimento internalizado

e que possui suas próprias aspirações.

Ana Mae defende a articulação entre as disciplinas que fazem parte do

processo de ensino, afirmando:

Quando falo de conhecer arte falo de um conhecimento que nas artes visuais se organiza inter-relecionando o fazer artístico, a apreciação da arte e a história da arte. Nenhuma das três áreas sozinhas corresponde à epistemologia da arte (BARBOSA, 1991, p. 31).

Compreende-se que o conhecimento da arte passa, invariavelmente, pela

experiência do fazer artístico, pela leitura, não obrigatoriamente nesta ordem,

alcançando a contextualização. A educação e o espaço escolar podem se tornar

mais eficiente para desenvolver no indivíduo a percepção para a leitura e o

entendimento das imagens que o rodeiam.

O educador em Arte exerce um papel importante, como mediador entre o

público e a arte, identificando-se com a proposta na educação e sugerindo uma

metodologia que abrange todas as etapas do aprendizado. O ensino da Arte visa,

principalmente, à formação reflexiva, que perpassa as diversas formas de

expressão.

Em resumo, a reflexão sobre a Metodologia Triangular do ensino de Arte

inclui a maneira de apreciar o ato do “fazer artístico” dos alunos, visando que estes

se conscientizem sobre o uso dos diversos materiais e procedimentos artísticos,

percebendo outras maneiras de reinterpretar, utilizando diversas linguagens

artísticas, como as instalações, as intervenções, as performances e outras, que

possibilitam a compreensão de como a organização destes elementos no espaço

traz análises acerca de sua visão no seu mundo. A produção de uma obra pode ser

uma criação ou uma releitura, é um fazer a partir dela, é reler e reinterpretar, criando

novos significados, a partir de novos olhares, novas linguagens artísticas na

contemporaneidade.

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1.2 A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e os Parâmetros

Curriculares Nacionais.

O ensino da Arte passou a ser reconhecido como atividade educativa

obrigatória através da Lei de Diretrizes e Bases16, da Educação Nacional - LDB

5691/71, recebendo o nome de Educação Artística, porém não possuindo ainda o

status de disciplina.

Sua implantação no currículo escolar apresentou resultados contraditórios, já

que não havia dentre o corpo docente indivíduos habilitados para as várias

modalidades, isto é, polivalentes, e, por esta razão, não tinham os conhecimentos

das várias formas de linguagens, tornando-se incoerente aos princípios

estabelecidos pela própria diretriz.

Após a promulgação da Constituição de 1988, desencadearam-se discussões

acerca da nova composição da LDB da Educação Nacional que somente foi

sancionada em 20 de dezembro de 1996.

Com a edição da Lei n° 9394/96, a nomenclatura do componente curricular

Educação Artística foi alterada para Arte, passando a ser obrigatória na Educação

Básica, com reflexos importantes tanto no Ensino Médio como na Educação de

Jovens e Adultos, como destacado no parágrafo 2º do artigo 26 da LDB: “O ensino

da arte constituirá componente curricular obrigatório, nos diversos níveis da

educação básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos” (p.

12).

A nova Lei de Diretrizes e Bases (LDB/96) prevê dois níveis de ensino: o

Básico, e o Superior. Sendo a Educação Básica formada pela Educação Infantil,

Ensino Fundamental e Médio, que tem por finalidade, segundo o Artigo 22º,

“desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação indispensável para o exercício

da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos

posteriores” (p. 9). O ensino Superior está direcionado a formação profissional

específica.

16 Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Será grafado como LDB.

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O Ensino Médio passa a ser a etapa final da educação básica, com duração

mínima de três anos. Uma de suas diretrizes curriculares, conforme o artigo 36

(LDB/96),

I - destacará a educação tecnológica básica, a compreensão do significado da ciência, das letras e das artes; o processo histórico de transformação da sociedade e da cultura; a língua portuguesa como instrumento de comunicação, acesso ao conhecimento e exercício da cidadania (p. 15).

Nessa perspectiva, são incorporados os quatro pilares do conhecimento

definidos no relatório de Jacques Delors17 e apontado pela UNESCO18 em 1996,

como eixos estruturais da educação na sociedade contemporânea como diretrizes

gerais e orientadoras da proposta curricular: aprender a conhecer, aprender a fazer,

aprender a viver e aprender a ser. Todos eles ganharam expressão nas práticas

educativas.

Para complementar a legislação após a promulgação da LDB/96, o MEC

redige e publica os Parâmetros Curriculares Nacionais19 em 1998, definindo assim

as principais linhas de referência para a prática educacional, tendo como finalidade a

orientação e elaboração das propostas curriculares, os projetos pedagógicos das

instituições de ensino, bem como as atividades dos docentes, nas diversas áreas e

níveis de ensino, apoio ao planejamento e ao desenvolvimento do currículo escolar.

O PCN é um documento sem caráter de lei, ou seja, de adoção não obrigatória por

parte dos sistemas de ensino.

Os temas transversais, que incluem Meio Ambiente, Saúde, Pluralidade

Cultural, Orientação Sexual, Ética, Trabalho e Consumo, são trabalhados nos

conteúdos de todas as linguagens da Arte e demais áreas de conhecimento, de

modo separado ou interdisciplinar.

No trecho do PCN que trata da Arte, encontram-se as quatro propostas para

as linguagens artísticas no Ensino Médio, a saber: Artes Visuais, Música, Teatro e

Dança. No documento, são estabelecidas diretrizes básicas para a ação

17 Jacques Delors - (1925) Político europeu de nacionalidade francesa, tendo sido Presidente da Comissão Européia entre 1985 e 1995. De origem humilde, foi funcionário do Banco de França em 1945, após a Segunda Guerra Mundial, e estudou Economia na Sorbonne. Foi autor e organizador do relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI, intitulado: Educação, um Tesouro a descobrir (1996), em que se exploram os Quatro Pilares da Educação. 18 UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Ciência, Educação e Cultura. 19 PCN - Parâmetros Curriculares Nacionais: referência produzida a partir da nova LDB/96.

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pedagógica, que recomenda articular o conteúdo de ensino da Arte em “três eixos

norteadores: produzir, apreciar e contextualizar” (MEC, p. 49). Esses elementos

mantêm seu espaço próprio, mas devem estar relacionados na prática, e seus

conteúdos podem ser trabalhados em qualquer ordem, conforme a proposta

curricular. Os mesmos evidenciam uma política pedagógica pautada pela interação

do contexto histórico-social do aluno, objetivando a aprendizagem e considerando o

ensino da Arte como promotor da abertura da relação do mundo interior do aluno

com seu próprio contexto social.

A criação dos PCNs por si só provam que o sistema educacional brasileiro

tem preocupações na promoção de uma educação democrática, garantindo que este

atinja todas as camadas sociais. Nesta proposta, não se indica um ensino estático

de conteúdos generalizados, mas sim currículos escolares dinâmicos pautados em

observar os problemas sociais e, de maneira autônoma, elaborar sua própria

proposta pedagógica.

Para tanto três áreas foram organizadas para compor o currículo da escola: 1.

Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, 2. Ciências da Natureza, Matemática e

suas Tecnologias e 3. Ciências Humanas e suas Tecnologias, todas interligadas

entre si, colaborando no desenvolvimento dos projetos educacionais de maneira

significativa.

Com estes instrumentos ocorre uma valorização da Arte na formação de

crianças e jovens, pois seus fundamentos destacam justamente os aspectos dos

desenvolvimentos essenciais inerentes à criação e percepção estética dos alunos.

Deve-se mencionar também, que isso alterou profundamente o modo de se tratar os

conteúdos, visando adequá-los à realidade, que se norteia pelo aprimoramento

cultural do cidadão contemporâneo.

De acordo com os Parâmetros Curriculares de Arte:

As formas artísticas apresentam uma síntese subjetiva de significações construídas por meio de imagens poéticas (visuais, sonoras, corporais, ou de conjuntos de palavras, como no texto literário ou teatral). Não se trata de um discurso linear sobre objetos, fatos, questões, idéias e sentimentos. Antes, a forma artística é uma combinação de imagens que são objetos, fatos, questões, idéias e sentimentos, ordenados pela objetividade da matéria articulada à lógica do imaginário. O artista seleciona, escolhe, reordena, recria, reedita os signos, transformando e criando novas realidades. Ele pode fazer uma árvore azul, o céu verde, aludir com sons à idéia de uma catedral. A arte não representa ou apenas reflete a realidade,

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mas é também a realidade percebida, imaginada, idealizada, abstraída (BRASIL, 1998, p. 32).

Para trabalhar com Arte, o professor se utiliza de suas vivências para realizar

a transposição de aprendizagem que envolve o fazer, apreciar e refletir sobre o fazer

artístico, promovendo ao aluno a oportunidade de fruir a arte, garantindo a liberdade

de sentir-se livre para expressar suas opiniões através da arte que produziu,

partindo de outro ponto de vista. Deve-se ainda ressaltar que a comunicação

pessoal se amplia, principalmente por ter se direcionado a intensificar as relações

dos indivíduos, tanto com ele mesmo, como com o seu semelhante.

De maneira concomitante, percebe-se que o estudante sente-se estimulado a

aprofundar seu conhecimento, buscando os aspectos ligados à percepção,

observação, imaginação e sensibilidade e que, de acordo com o PCN do Ensino

Fundamental:

O papel da escola é estabelecer os vínculos entre os conhecimentos escolares sobre arte e os modos de produção e aplicação desses conhecimentos na sociedade. Por isso um ensino e aprendizagem de arte que se processe criadoramente poderá contribuir para que conhecer seja também maravilhar-se, divertir-se, brincar com o desconhecido, arriscar hipóteses ousadas, trabalhar muito, esforçar-se e alegrar-se com descobertas. Porque o aluno desfruta na sua própria vida as aprendizagens que realiza (BRASIL, 1998, p. 31).

Ao pensar sobre os PCNs em sua construção, observa-se que os

conhecimentos ou as formas de aprendizagem passa pela busca de vivências e

experiências vividas no dia-a-dia, de maneira que, se a aprendizagem do educando

for organizada na escola em conjunto com outras áreas de conhecimento, em

contato com a produção artística, pode exercitar suas capacidades cognitivas,

sensitivas e imaginativas ampliando o entendimento de situações problemas que

estão presentes no cotidiano e na sociedade em geral.

Conforme demonstrado no documento: “a arte ensina que nossa experiência

gera um movimento de transformação permanente que é preciso reordenar

referências a cada momento, ser flexível” (PCN, 1998, p.20). Sobre esse ponto de

vista, para Ana Mae Barbosa (2001) deve-se ter uma preocupação com as

deficiências educacionais ainda presentes nos dias atuais, muito embora se deva

reconhecer que os educadores se apresentem conscientes da importância do

ensino, agregando-se às propostas presentes nos PCNs, que exige que o sistema

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educacional seja igual para todos, sendo um dos pontos principais que reflete sobre

a sobrevivência do educando, já que a grande maioria ao terminar ainda os

primeiros anos do Nível Básico de Ensino, tem que entrar no mercado de trabalho e

conseqüentemente abandonar os bancos escolares.

Deste modo, fica evidente que na proposta curricular do Ensino Fundamental

e Médio, é importante integrar não apenas o desenvolvimento das habilidades e

competências formais, mas também deve-se encontrar na Arte a dimensão da

criação, da apreciação e da comunicação.

Sobre esta questão, o sociólogo Francês Louis Porcher20, se pronuncia da

seguinte forma:

O problema de uma democratização da cultura coloca-se com extrema precisão neste terreno; a escola deve assegurar a igualdade das oportunidades, ou seja, fornecer a cada criança os meios de acesso à arte existente. Não é mais necessário demonstrar, hoje em dia, que as crianças dos ambientes sócio-culturais desfavorecidos se acham prejudicados no acesso à cultura estética porque as condições para esse acesso não lhes serão oferecidas dentro das respectivas famílias (PORCHER, 1982, p.16).

Em relação ao acesso à cultura estética como forma de representação e

entendimento sobre o espaço vivido e percebido nas suas realizações, como forma

de planejar e apreciar as expressões e modos, o sociólogo relata que durante algum

tempo as justificativas para se sentirem injustiçados era a falta do contato com a arte

no ambiente familiar. No presente, este acesso deve ocorrer na escola, pois a

cultura estética é fundamental na construção da identidade do educando.

A introdução da Arte no Ensino Fundamental e Médio é de grande

importância, requer dos educadores um conhecimento histórico e que seja

transmitido de forma a possibilitar seu pleno entendimento, garantindo a fluidez da

capacidade de criar através de estilo estético e a capacidade de decodificá-lo. Desta

maneira, o aluno deve entender que a Arte é uma atividade criadora histórica, social

e cultural, que se integra facilmente ao lazer, ao conhecimento e ao

desenvolvimento criativo. Segundo o PCN que trata do Ensino Fundamental:

20 Louis Porcher (1940-):sociólogo e escritor Foi o "professor"durante dez anos nos Estados Unidos e chefe da língua francesa no Ministério da Educação Nacional de 1981 a 1984. Terminou a sua carreira como professor universitário em uma unidade de formação e ensino do francês de investigação e investigação na Universidade da Sorbonne Nouvell – Paris.

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A arte na escola tem uma função importante a cumprir. Ela situa o fazer artístico dos alunos como fato humanizador, cultural e histórico, no qual as características de arte podem ser percebidas nos pontos de interação entre o fazer artístico dos alunos e o fazer dos artistas de todos os tempos, que sempre inauguram formas de tornar presente o inexistente. Não se trata de copiar a realidade ou a obra de arte, mas sim de gerar e construir sentidos (BRASIL, 1998, p.35).

Para que se consiga estabelecer a conexão entre o objeto artístico e o sujeito,

é necessário, que os elementos, os símbolos e os códigos sejam perfeitamente

entendidos, e que consigam compor uma obra. Percebe-se ainda, que os artistas e

os educadores contribuem de forma decisiva na relação entre o sujeito e o objeto

artístico, desde que estejam cientes e envolvidos de maneira direta com o ensino-

aprendizagem.

Os PCNs apontam para uma política pedagógica pautada pela interação do

contexto histórico-social, objetivando a aprendizagem e considerando o ensino da

Arte como promotor da abertura para a relação do mundo interior do aluno, com seu

próprio contexto social. A criação dos PCNs comprovam que o sistema educacional

brasileiro tem preocupações na promoção de uma educação democrática,

garantindo que este atinja todas as camadas sociais.

No Ensino Médio, a disciplina de Arte tem por objetivo colaborar para que se

estimule a percepção, expressão, criação e reflexão sendo sempre pautada pelo

diálogo entre o aluno e a realidade. Assim, aprender esta disciplina deve ser

encarado como direito de todo aluno, que é um ser pensante, e dando possibilidade

que estes criem outras verdades. O sistema de ensino, por sua vez, torna-se uma

instituição social, com a função de transmitir, articulando os conhecimentos, através

de projetos em salas de aulas, que se estendem para além dos muros escolares e

que devem apontar soluções para questões da comunidade local. Desta forma, a

escola pode ser responsável pela conservação de culturas adequando seus

currículos ao contexto social.

As instituições de ensino aproximam os seres humanos, fundamentados no

contexto cultural e artístico da humanidade, o que permite que se conheçam os

aspectos mais significativos da cultura, fruto das diversas manifestações,

aprofundando estudos que contribuam para a ampliação dos saberes artísticos.

As escolas ampliaram a forma de ensinar e estão atuando num universo

muito mais amplo, sendo necessário que o educar insira estes novos elementos em

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suas atividades e planejamentos, contando com a ampliação das concepções de

mundo. Esta situação impõe mudanças profundas tanto na postura do profissional

docente como pelas instituições de ensino. Portanto, o professor é constantemente

desafiado a sair do seu estado de inércia para um total redirecionamento de suas

práticas e atitudes diante dessa nova realidade que se lhe apresenta.

Redimensionamento este, que poderá partir de um estudo mais aprofundado e

histórico da estética, a fim de contribuir para ampliar a visão de Arte na escola.

1.3 A Linguagem na Arte

A expressão artística, em sua extensa gama de atuação, faz uso de possíveis

linguagens que o produzir não é só uma ação limitada ao contato com o objetivo,

sua intenção é, sobretudo, partir de uma maneira explícita em sua forma de

manifestar-se. As linguagens, ao estabelecerem certa relação significativa entre

símbolos e representações, criam um novo modo de expressão. Na área de Arte,

embora pouco exploradas, elas extrapolam as diferentes formas de comunicação

tradicionalmente vinculadas à fala ou ao idioma. Os indivíduos fazem uso das

linguagens para exercer a comunicação, utilizam sistemas de representação com o

intuito de elaborar e objetivar seus pensamentos e sentimentos, projetando e

compreendendo os acontecimentos do mundo.

Conforme ponto de vista defendido pela artista plástica e Professora Fayga

Ostrower21 (1987, p. 19.), “as linguagens têm por característica a busca de

conteúdos significativos e, portanto, nossa penetração na realidade é sempre

mediada por linguagens, como sistemas de representações”. Ao comentar sobre o

tema comunicação, a autora enfatiza os tipos de linguagens possíveis e suas formas

de representação, como sendo, a dança, o teatro, a música e outras expressões que

produzem sentimentos.

A Professora Miriam Celeste Martins (1998) deixa claro que quando se fala

em linguagem vêm à mente a fala e a escrita, pois se está condicionado a pensar

21 Fayga Ostrower (1920-2001) Foi uma renomada artista plástica, nascida na Polônia. Atuou como gravadora, pintora, desenhista, ilustradora, teórica de arte e professora. Chegou ao Rio de Janeiro na década de 1930, naturalizando-se brasileira em 1934. Realizou diversas exposições individuais e coletivas no Brasil e no exterior. Seus trabalhos podem ser encontrados nos principais museus brasileiros, da Europa e das Américas.

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que a comunicação acontece somente através das formas verbais, orais e escritas,

sendo as únicas maneiras utilizadas para alcançar o saber, compreender, interpretar

e produzir conhecimento no mundo. Mas este pensamento exclui outras expressões

de sentido que, mesmo sem serem verbais, também comunicam e produzem

conhecimento.

Na arte, os diversos modos de exprimir idéias e sentimentos, como, por

exemplo, as representações nas linguagens plásticas, visuais, cênicas, musicais,

entre outras, abrem caminho para expressar diferentes percepções, intuições,

sentimentos, pensamentos e, por conseguinte, o conhecimento. Quanto mais as

linguagens se enriquecem e se ampliam, maiores são as possibilidades de

interpretar, simular e imaginar. Além disso, as leituras devem envolver os vários

aspectos da comunicação humana que, como mencionado, não se limitam aos

verbos. Por outro lado, é imprescindível que elas sejam entendidas como um

processo que estabelece a interlocução entre o indivíduo e outro elemento,

resultando na absorção de uma mensagem.

Conseqüentemente, a arte é comunicação e sua linguagem se resume ao

discurso de natureza visual, cujo único propósito está contido na imagem, no simples

recado que o artista quis transmitir. A arte fala por si, mesmo que seus admiradores

não consigam captar a mensagem do artista. Quanto a isso, nas palavras de

Picasso, citadas por Herchel B. Chipp (1913-1992):

Todos querem compreender a pintura. Porque não tentam compreender o canto dos pássaros? Por que se ama uma noite, uma flor, tudo que rodeia o homem, sem tentar compreendê-los? Mas no caso da pintura as pessoas querem compreender. Se ao menos compreendessem que o artista trabalha por necessidade, que ele próprio é um infinito elemento do mundo [...]. Como querem que um espectador viva o meu quadro como eu vivi? Um quadro me vem de longe [...] Como penetrar nos meus sonhos, nos meus instintos, nos meus desejos, nos meus pensamentos, que levaram tanto tempo para amadurecer e vir a luz? (CHIPP, apud BUORO, 1988, p. 276).

Acredita-se que quando um observador se depara com uma obra de arte, não

é capaz de compreender todas as idéias e simbologias existentes, até porque, nem

o próprio artista consegue explicar completamente suas aspirações.

Podemos refletir que o artista deve ter liberdade de criação, e que as pessoas

devem respeitá-la sem querer compreender pontualmente, uma vez que, a arte é

acima de tudo, a exteriorização da vivência, significações, sentimentos e

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sensibilidade do artista. As obras podem informar o contexto onde foram produzidas,

contendo informações históricas e sociais, dialogando com outros tempos e lugares,

ou seja, para entender o contexto ao seu redor precisamos da arte.

Portanto, os objetos artísticos e estéticos são carregados de informações e

que, por meio da leitura, é possível desenvolver a sensibilidade, ampliando a

compreensão do educando. Pode-se trabalhar a percepção e a imaginação criadora

por meio de elementos formais e estéticos, construindo conhecimento das

percepções sobre o mundo e dos diálogos com outras linguagens.

As linguagens se apresentam, no dia-a-dia, de forma a incluir as informações

acerca das artes produzidas em vídeos, revistas, outdoors, jornais, livros, cinema,

galerias e museus, valorizando autores locais, nacionais ou universalmente

consagrados. Isto leva os observadores a refletir sobre a arte e seus códigos. Os

diversos tipos de leitura de imagens podem apresentar diferentes aspectos na sua

dimensão cultural.

A Professora Analice Pillar destaca, ainda, que:

Ao lermos uma obra de arte, estamos nos valendo do nosso conhecimento artístico ou não para dar um significado à obra. A idéia de leitura dominante, geralmente implica uma ação decifradora entre um sujeito percebedor e pensante sobre um objeto geralmente fixo. Alerta ainda que o perigo das leituras ficam aprisionadas em técnicas de interpretação, ou em significados fechados que não levam em conta o prazer e o diálogo com a obra. É ‘apropriar-se de um objeto de conhecimento em nível de representação e como interpretação que permite interpretações sobre a realidade’. (PILLAR, 1996, p.45).

Nesse sentido, a interpretação difere de uma pessoa para outra, dependendo

de sua realidade, reflexões e se a obra tem algum significado ou não para o

indivíduo. Do mesmo modo, a leitura é um dialogo entre formas, cores, texturas e

espaços, ou seja, é a explicitação de sua sensibilidade. A proposta Triangular no

Ensino da Arte mostra a importância da leitura de imagens, denominada apreciação,

produzida através da observação, em que se busca explicitar relações de um texto

com o contexto de seu apreciador, através do diálogo do leitor com a obra.

É necessário “alfabetizar” os indivíduos para a prática dessa ação. Por meio

dela, o aluno é preparado para a decodificação da gramática visual, dialogando e

relacionando cultura, conhecimento e experiência estética, ou seja, a partir de dados

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referenciais podem ser lançados diferentes olhares, fazendo diversas leituras de

mundo.

Também é imprescindível destacar que aprender arte requer tempo, tanto

quanto qualquer outro tipo de aprendizado, esperando por uma leitura de uma

imagem sob o olhar de um conhecedor de arte, o qual exige que este seja inserido

neste universo. Porém, é muito mais que isto, pois se trata do domínio dos

“vocábulos”, no sentido de símbolos que transmitem significados, e da gramática, a

organização de todos os seus elementos, que lhe garantirá a produção de uma

leitura efetiva.

1.4 A Leitura de Imagens

O ensino de Arte tende a proporcionar leituras de imagens em sala de aula,

refletir e dialogar sobre sua importância nos dias atuais, o que se pode aprender

através dela e como analisá-la de maneira significativa e de que qual forma ela está

sendo inserida cada vez mais no mundo contemporâneo. O termo leitura, nesta

questão, deve ser entendido como sendo a interpretação da obra como um texto,

apresentando início, meio e fim e seguindo uma ordenação livre de acordo com seu

tipo. Pode-se afirmar que a valorização da imagem divulgada na televisão, na

publicidade e em outros meios que a usam para comunicação, impressiona as

pessoas atualmente, mesmo em um mundo predominantemente imagético. Muitas

são as possibilidades de caminhos para entrar numa imagem, desvendar seus

códigos e dialogar com ela.

Segundo Analice Dutra Pillar, o conceito de leitura seria:

Ler uma imagem é saboreá-la em seus diversos significados, criando distintas interpretações, prazerosamente. Há uma decomposição visual da imagem no momento da leitura e ao mesmo tempo uma interpretação pessoal do observador. Comparar imagens destacando semelhanças e diferenças é um estudo muito enriquecedor acerca da gramática visual, dos significados que as obras possibilitam, de sua sintaxe e do vocabulário próprio de cada linguagem. Uma imagem permite diversas leituras, feitas de acordo com as relações que seus elementos sugerem. (PILLAR, 1999, p.12).

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Observar e fazer leituras são duas maneiras distintas de entender as

imagens, porque cabe ao leitor interpretar de acordo com seus sentimentos e suas

experiências. É o que a Professora Pillar considera, o leitor é aquele que sabe

apreciar e obter prazeres significativos por meio de diferentes olhares sobre a

imagem. Seu diálogo com uma obra se realiza, efetivamente, pela observação das

formas, cores, texturas, volumes; garantindo que sejam obtidas informações e

inferências sobre o objeto e suas características.

Sendo assim, o professor deve ter algumas estratégias que propiciem e

favoreçam a realização do diálogo entre os alunos e o objeto de estudo; explorando

seus significados, aspectos técnicos, formais e contextuais; analisando e

estimulando a interpretação que cada um atribui na observação.

Porém, deve-se antes aquecer o olhar, ou, em outras palavras, preparar os

participantes fazendo um levantamento prévio sobre o objeto cultural. Durante a

leitura, é necessário estimular os alunos a participar por meio de perguntas, para

que seja compreendido o que eles pensam sobre a arte. Algumas sugestões seriam:

O que os alunos vêem em uma imagem? O que analisam? Como interpretam? Por

que eles lêem de formas diferenciadas?

É importante ainda, destacar que a leitura depende muito da forma em que o

leitor observa a partir de uma leitura externa, o impacto sugerido nos permite sentir

as reações de estímulo interno, considerando os resultados das reflexões que o

sujeito está pronto a produzir. Tudo que é observável deve estar sempre

fundamentado no conhecimento significativo da imagem concebida pelo observador,

levando em consideração seus saberes e fazeres. Desta maneira as variáveis

dependem do sujeito dentro de determinado espaço e o período no qual se

encontra. Estas afirmações preceituam que as pessoas agem de forma diferente,

sofrendo a influência dos diferentes momentos e, assim, são capazes de criar

diferentes modos de entendimento e interpretação da obra.

Considerando que essas significações se constroem a partir da origem social,

da vivência familiar e contexto histórico do indivíduo, a partir da experiência se

estabelece uma relação dialética entre o contexto de produção do objeto lido e o

contexto presente, em que envolve não somente o inteligível, mas também o

sensível.

Existem diferentes métodos de realizar a leitura das imagens. Porém, a

abordagem utilizada nesta pesquisa tem por base os trabalhos do pesquisador

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norte-americano Robert William Ott, que criou uma metodologia para o olhar em

relação às obras de arte que abrange cinco estágios: descrever, analisar, interpretar,

fundamentar e revelar. A proposta do autor inclui a relação entre a escola e os

espaços expositivos de Arte.

O sistema de leitura e interpretação de obras Image Watching, elaborado pelo

Professor Ott, é uma das formas de utilização e aplicação do DBAE pela Getty

Foundation e pela Metodologia Triangular, adaptada no Brasil na década de 80, pela

Professora Ana Mae. Este processo direcionado ao estudo das Artes visa a crítica, a

apreciação estética, a história da arte e a produção dos alunos nas aulas. Desta

forma, são expostas a seguir as cinco categorias que compõem o sistema de leitura:

1 - Descrevendo

É um momento de observação para aproveitar tudo o que uma imagem pode

oferecer. Os olhos precisam percorrer o objeto de estudo com atenção. Quando a

imagem é mostrada, é preciso esperar alguns instantes para que os alunos a

observem cuidadosamente. Em seguida, pedir para que eles descrevam o que estão

vendo. A partir desse exercício, poderão posteriormente identificar e interpretar os

detalhes visuais. Os mesmos escreverão tudo o que é perceptível na obra de arte

que está sendo estudada. O professor ajudará fazendo perguntas, que auxiliarão

quando forem expor o que perceberam, as deduções feitas por eles próprios.

2 - Analisando

Nesta parte é necessário perceber os detalhes e a postura do professor é

muito importante. Possui por objetivo estimular o aluno a prestar atenção na

linguagem visual, se harmonizando com seus elementos, texturas, dimensões,

materiais, suportes e técnicas. Possibilitando assim, um exercício verbal de análise,

reflexão e construção de idéias sobre conteúdos e temas relativos à obra.

3 - Interpretando

A partir das idéias colocadas pelos alunos, o professor poderá aproveitá-las

para as diversas atividades pedagógicas possíveis. Com a ajuda dos alunos, deve-

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se listar e eleger aquelas que correspondem aos objetivos de ensino. Este é o

momento de maior participação e fornece elementos para análise sensorial,

emocional e pessoal de cada um. Todos devem ter espaço para expressar as

próprias interpretações, bem como sentimentos e emoções. Outra sugestão é

mostrar outras manifestações visuais que tratem do mesmo tema e estimular os

estudantes a fazer comparações (cores, formas, linhas, texturas, organização

espacial, entre outras).

4 - Fundamentando

Nesta fase, a interpretação da obra terá como base informações adicionais

fundamentadas no conhecimento da História da Arte, ou seja, a contextualização,

podendo ser utilizados livros, textos, slides, vídeos, filmes e DVDs. É importante que

eles pesquisem informações sobre a vida e a obra do autor, no contexto histórico,

sócio-cultural e artístico da época, que eles percebam as influências de outras

tendências ou artistas contemporâneos. Neste estágio, os participantes receberão

informações sobre a obra, o autor, o título e seu contexto. A partir de então, é

importante verificar se houve mudança na interpretação e em quais aspectos elas

ocorreram. Conseqüentemente, poderá ser proposta a elaboração de uma síntese

escrita, em grupo, em forma de redação ou dissertação, reunindo todos os

elementos analisados e discutidos nos momentos anteriores.

5 - Revelando

É o momento de produzir uma resposta poética a partir do entendimento da

obra de arte estudada e vivenciada. Com tantas novidades e aprendizados, os

alunos certamente estarão estimulados. É a ocasião de revelarem, através do fazer

artístico, o resultado do processo de construção de conhecimento no qual

participaram, expondo o progresso conseguido. Nesta etapa, uma nova obra é

criada pelo aluno e é preciso encorajar a atividade grupal e experimentar as

representações nas três dimensões, investigar materiais plásticos, formas, cores,

texturas e linhas e exercitar as habilidades para recorte, colagem e modelagem.

Na produção realizada pelos estudantes, é importante que eles entendam que

o fazer artístico, como a releitura, não é uma cópia e sim uma reinterpretação,

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podendo haver uma relação entre as duas obras, a apresentada ao aluno e a

produzida por ele.

Cabe lembrar que ao se propor a realização da leitura e releituras, todos os

materiais e recursos devem estar prontos, de maneira a vincular às abordagens

históricas, sociais, estéticas, formais, ou ainda a partir de aspectos sensoriais,

emocionais ou cognitivos. Muitas metodologias de leitura de imagem podem ser

ampliadas e aprofundadas, partindo de novos subsídios teóricos que auxiliem o

educador de Arte nesse trabalho.

É preciso considerar que, para se fazer a leitura, um dos aspectos a serem

cultivados pelos professores diz respeito ao tempo de contemplação dedicado a uma

obra de arte, que deve ir se ampliando, tanto para o aluno quanto para o professor.

Quanto à leitura, a Professora Anamelia Bueno Buoro22 afirma:

A questão da relação visual com a imagem é a primeira a ser abordada na caminhada até sua leitura propriamente dita. Ela revela diversas facetas, quando se trata de ensino aprendizagem da arte. Uma delas é a relação do tempo de ver e do olhar do sujeito-aluno diante da mesma imagem. Outra é a do tempo de ver do sujeito-educador. (BUORO, 2001, p. 43).

Antes da leitura da obra tem se, no primeiro momento, uma relação visual

com a imagem. Uma única obra expressa diversificados sentidos para o

entendimento do olhar, tanto para os estudantes como para o educador. Este tem

um olhar diferenciado daqueles, pois considera suas experiências de vida e

conhecimentos sobre o mundo atual interagindo as formas de ver, entendendo a

imagem como forma de explicitar emoções sensíveis aos educandos.

Por outro lado, durante a leitura, o aluno descreve, analisa, interpreta e

contextualiza uma obra. Ele constrói, gradualmente, uma teoria de arte, que usa

para explicitar a sua compreensão, são idéias que ele adquire no decorrer de suas

experiências cotidianas, em seus encontros com trabalhos de arte.

Porém, deve-se ter cautela na metodologia da utilização de algumas imagens,

para não cairmos no “fazer outra vez, fazer de novo, refazer”, ou simplesmente nos

apropriarmos das imagens, como um exercício de cópia descontextualizada,

desconectada e desprovida de qualquer apropriação do conhecimento.

22 Anamelia Bueno Buoro é mestre e doutoranda em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP. Atua como coordenadora de Artes do IBECC-SP e como professora de 1º e 2º grau. Trabalha na formação de professores dando cursos de História da Arte e Metodologia de Ensino de Arte em diferentes escolas de São Paulo.

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Assim, é fundamental valorizar a leitura de imagens e enfatizar as

características de sua forma narrativa, associando-as a objetos reais e aos signos.

Esta é a metodologia a ser aplicada nesse contexto, visando estimular, aprofundar e

conhecer as imagens das mídias e obras de arte usadas nas salas de aula.

No entanto, sabe-se da impossibilidade de utilização de trabalhos artísticos no

ambiente escolar. Por este motivo, recomenda-se a visita aos museus, galerias,

ateliês de artistas e de artesãos e outros locais que possam ser agendados pelas

escolas. Um dos modos de a arte estar mais próxima da educação é por meio das

reproduções, mas algumas imagens utilizadas são, muitas vezes, cópias de péssima

qualidade, com grande perda da resolução de cores, formas e proporções.

Geralmente, elas não mostram nem o vestígio do que a obra realmente é. Por essa

razão, é importante o cuidado com as reproduções usadas, pois grande parte dos

materiais apresentados aos educando está muito distante da obra original.

Quando as reproduções são usadas como recurso, alguns passos

processuais podem ser feitos pelos educadores. Por exemplo: destacar o título, o

nome do autor, o local onde se encontra a obra, a data da criação e as medidas

originais. Além disso, a utilização de aparelhos de reprodução também é

interessante, como retroprojetor, data show, uma vez que possibilitam a

demonstração pela aproximação e pelo distanciamento, com a real medida que a

obra possui.

Cabe aos educadores a responsabilidade de trazer a discussão e reflexão

sobre o olhar do estudante para a leitura de imagens. É imprescindível lembrar que

se trata de um ato de interpretá-las, traduzi-las e estabelecer relações visuais com o

contexto em que foram produzidas, atentando sempre para o fato de que o exercício

de ler imagens é tão importante quanto produzir e não pode, de maneira alguma, ser

interpretado como um “fazer nada”.

A Professora Marisa Vorraber Costa23 (2003), alerta sobre o papel que os

educadores têm desempenhado na escola, se é o de transmitir a cultura dominante

que classifica e discrimina, ou o de levar nossos alunos a perceberem seu papel. Na

prática, deve refletir, entre outras coisas, o cotidiano, abordando conteúdos que

23 Marisa Vorraber Costa é licenciada em Filosofia, doutora em Ciências Humanas e professora titular em Ensino e Currículo. Atua presentemente nos Programas de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e da Universidade Luterana do Brasil, onde ministra as disciplinas Sociologia da Educação, Educação e Pós-Modernidade, Escola e Cultura Contemporânea, Introdução aos Estudos Culturais, entre outras.

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levem em conta a diversidade ética sobre o mesmo tema, possibilitando ao

educando problematizar sua própria posição dentro da sociedade.

Pode-se e deve-se permitir que o educando, ao olhar as imagens, possa

traçar percursos pessoais e coletivos, percebendo a narratividade existente nelas, as

relações que podem ser estabelecidas com outras figuras, outras sonoridades,

outras gestualidades, para que, a partir delas e nelas, se percebam como sujeitos.

Ao refletirmos sobre uma proposta, considerando que a arte não envelhece,

pois os objetos artísticos podem ser vistos, sentidos, apreendidos em qualquer

tempo, pois a arte transpõe barreiras, transcende o tempo, espera-se que ela

proporcione ao educando o encontro dele consigo mesmo, deixando um canal

aberto para os sentidos, sensações e sentimentos. Neste contexto é importante que

o educador esteja comprometido com a arte, para abastecer os olhares por diversos

percursos, e que, ao mesmo tempo, seja capaz de se auto-avaliar dentro desse

processo de ensino-aprendizagem.