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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO
COORDENADORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Saúde
WILLIAM MACHADO DE OLIVEIRA
O Perfil Profissional de Egressos do Curso de Psicologia da
Universidade Metodista de São Paulo (2013-2015): avanços e
fragilidades na formação de psicólogos.
São Bernardo do Campo, 2018.
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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO
COORDENADORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Saúde
WILLIAM MACHADO DE OLIVEIRA
O Perfil Profissional de Egressos do Curso de Psicologia da
Universidade Metodista de São Paulo (2013-2015): avanços e
fragilidades na formação de psicólogos.
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Psicologia da Saúde da Universidade Metodista de São Paulo, em cumprimento às exigências para a obtenção de grau de Mestre.
Orientadora: Profa. Dra. Lucieneida Dováo
Praun
Co-orientador: Prof. Dr. Magno Oliveira
Macambira
São Bernardo do Campo, 2018.
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FICHA CATALOGRÁFICA
FICHA CATALOGRÁFICA
Ol4p
Oliveira, William Machado de
O perfil profissional de egressos do Curso de Psicologia da
Universidade Metodista de São Paulo (2013-2015): avanços e
fragilidades na formação de psicólogos / William Machado de
Oliveira. 2018.
103 f.
Dissertação (Mestrado em Psicologia da Saúde) –Escola de
Ciências Médicas e da Saúde da Universidade Metodista de São
Paulo, São Bernardo do Campo, 2018.
Orientação de: Lucieneida Dováo Praun.
Co-orientação de: Magno Oliveira Macambira.
1. Psicólogo - Competências 2. Egressos em psicologia
3. Psicologia 4. Psicologia – Formação profissional I. Título
CDD 157.9
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TERMO DE APROVAÇÃO
A dissertação de mestrado sob o título O PERFIL PROFISSIONAL DE EGRESSOS DO
CURSO DE PSICOLOGIA DA UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO
(2013-2015): AVANÇOS E FRAGILIDADES NA FORMAÇÃO DE PSICÓLOGOS
foi apresentada e aprovada em 24 de julho de 2018, perante banca examinadora composta
por Prof. Dr. Magno Oliveira Macambira (Presidente/UMESP), Profa. Dra. Maria do
Carmo Fernandes Martins (Titular/UMESP) e Profa. Dra. Ana Paula Grillo Rodrigues
(Titular/UESC).
__________________________________________
Prof/a. Dr/a. Prof. Dr. Magno Oliveira Macambira
Co Orientador/a e Presidente da Banca Examinadora
___________________________________________
Prof/a. Dr/a. Maria do Carmo Fernandes Martins
Coordenador/a do Programa de Pós-Graduação
Programa: PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA DA SAÚDE
Área de Concentração: PSICOLOGIA DA SAÚDE
Linha de Pesquisa: TRABALHO, ORGANIZAÇÕES E SAÚDE
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DEDICATÓRIA
Esta dissertação é dedicada de maneira especial para aquele que sempre sonhava
em ver seus filhos estudando e bem de vida, que de uma maneira simples e temperamental
mostrou que o peso da caneta era mais leve do que a da enxada. Aquele que não mediu
esforços para evitar faltar comida à mesa e dedicava seu tempo numa bela moda de viola,
regado pelo som da sanfona e de seu violão, meu pai, Adir Paulo de Oliveira (In
Memoriam).
Dedico também, aquele que pode ver o que me tornaria, mesmo antes que eu
pudesse enxergar, que acreditou no meu potencial e abriu as portas através de seu projeto
de vida para que eu pudesse transformar a minha. Se há um gesto concreto entre milhares,
de que o Centro Universitário Eniac cumpre sua missão, minha dissertação é prova disto,
minha eterna gratidão à Ruy Guérios (Mantenedor do Colégio e Centro Universitário
Eniac).
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AGRADECIMENTOS
A minha eterna namorada, esposa e razão das minhas alegrias e conquistas, Juliana
Machado de Oliveira, presente que ganhei de Deus para seguirmos esta minha jornada na
vida. Obrigado por me compreender, nos momentos em que abri mão de estarmos juntos
para dedicar-me aos estudos, a você minha vida, meu eterno amor.
Claro que nada do que eu fiz, seria possível sem que pessoas contribuíssem de
maneira amiga e qualitativa para que a minha caminhada fosse mais leve e humana, e
estes são os casos de: Robson Aparecido Gouveia, Marcelo Aparecido Gouveia, Nelson
Afonso da Silva Júnior, Neice Roberta Bezerra Jorge Gouveia, Glaucia Cristina de
Oliveira Macedo. Agradeço a vocês meus amigos, por me estenderem a mão nos
momentos em que mais precisei de apoio.
Dedico também, à todos os colaboradores da Universidade Metodista que direta
ou indiretamente contribuíram para que o meu mestrado acontecesse, sintam-se
homenageados através destes que dedicaram com competência seus esforços para me
ajudar: Rosângela de Souza Garcia (Bibliotecária), Nátali Susan Iamazaki (Auxiliar de
Biblioteca), Marlene do Nascimento Farias Santos (Auxiliar de Biblioteca), Isabel
Cristina da Costa Sousa (Auxiliar de Biblioteca), Dra. Maria do Carmo Fernandes Martins
(Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Saúde), Elisângela
Aparecida de Castro Souza (Assistente de Coordenação), Dra. Lucieneida Dováo Praun
(Professora e Orientadora) e Dr. Magno Oliveira Macambira ( Professor e Orientador). A todos
vocês, meu carinho e minha eterna gratidão.
À Deus, meu refúgio e minha fortaleza, muito obrigado por me sustentar na fé e
nos momentos difíceis, a ele a glória, o poder e o louvor, pois tudo que prometestes
cumpristes, e sei que este é só o começo de muitas vitórias que ainda estão por vir.
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EPÍGRAFE
O que não se sabe ao certo,
entretanto, é por quanto tempo o ódio social
alimentado pela exclusão e violência
cotidiana ficará contido. As periferias das
grandes cidades estão ao ponto da explosão.
Luci Praun
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RESUMO
O dia a dia do mercado de trabalho apresenta ao profissional Psicólogo, e
principalmente ao recém-formado, situações complexas que o levam a confrontar os
conhecimentos, as competências e habilidades desenvolvidas durante o curso de
graduação com as requeridas no exercício profissional. Além disso, a qualidade da
formação tem por objetivo, conforme legislação vigente, contribuir para o
desenvolvimento estrutural, social e econômico do país. Com base neste contexto o
objetivo deste estudo verificou por meio de pesquisa de campo de tipo exploratória, o
perfil profissional de egressos do curso de Psicologia da Universidade Metodista de São
Paulo. Diante da percepção dos egressos do período entre 2013 a 2015, verificou-se a
correlação entre formação profissional oferecida, ao longo da graduação com base no
Programa Pedagógico do Curso de Psicologia (PPC/2008) e a repercussão deste na
inserção do profissional no mercado de trabalho. A coleta dos dados foi realizada por
meio de convite via e-mail à 311 egressos e operacionalizado via plataforma virtual
(Google Forms), dos quais, obteve-se 31 respostas válidas. A escolha dos entrevistados,
considerando a amostra estabelecida, obedeceu ao critério de amostragem por
acessibilidade e os dados foram analisados a partir de estratégias de análise de natureza
quantitativa. O instrumento de pesquisa foi construído para este estudo e formado por
questões que visavam caracterizar os participantes, investigar sua percepção sobre sua
formação acadêmica e sua inserção profissional e levantar suas percepções quanto à
importância e ao domínio de competências profissionais. As respostas foram analisadas
por estatísticas descritivas e de tendência central. Os resultados sinalizaram um domínio
positivo de competências e habilidades profissionais de viés clinico, porém competências
e habilidades relativas aos processos psicológicos grupais e organizacionais apresentam
fragilidades e necessidade de serem potencializadas. Apesar de o curso oferecer ao
egresso a possibilidade de atuar em outras áreas da Psicologia, conclui-se que em sua
totalidade, os egressos participantes do estudo são predominantemente jovens de 20 a 30
anos, de gênero feminino, que andam na contramão da valorização monetária por gênero
ganhando mais que os homens na maioria das faixas de remuneração e atuam direta e
indiretamente na área clínica. Apesar de a pesquisa apresentar pontos que merecem
reflexão na estruturação da formação do curso, cerca de 87,1% dos egressos apontam que
o curso atendeu suas expectativas.
Palavras-chave: Competências do Psicólogo, Egressos em Psicologia, Psicologia,
Formação em Psicologia.
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ABSTRACT
The day by day on labor market presents to Professional Psychologist and also to
just-graduated, some complex situations that lead them to confront their knowledge,
competencies and abilities developed during the Graduation one related to professional
practice. Besides that, the quality of graduation aims to, according to current legislation,
to contribute to development structure, social and economic of the country. Based on this
context the objective of this study, by means of exploratory field research the professional
profile of graduates by Psychology course from Universidade Metodista do Estado de São
Paulo. Due to graduates’ perceptions of the period 2013 to 2015, check the correlation
between training offered, along the graduation, based to Programa Pedagógico do Curso
de Psicologia (PCC/2008) and its impact on the insertion of this group in the labor market.
The data collection was carried out by means of invitation via email to 31 graduates and
made operational via Google Forms. Of which, 31 valid answers were obtained. The
choice of respondents, considering the sample established, followed to the discretion of
sampling accessibility and data were analyzed from strategies analysis quantitative. The
research instrument was built for this study and was made up of questions that aimed to
characterize the participants, to investigate their perception about their academic
formation and their professional insertion, besides raising their perceptions regarding the
importance and the domain of professional competences. Analyzes were performed of
Central tendency. The result signaled domain positive skills and professional biased
clinical, however skills and abilities related to group psychology process organizational
present weaknesses and need to be potentiated. Despite the course offer the egress the
possibility to deal in other psychology areas, concluded that in its entirety the graduates
are predominantly young 20 to 30 years gender female, walking in the against the
valuation monetary by genre gaining more than men most of the tracks remuneration and
work directly and indirectly in the clinic. Although the research presents some points in
which some deep reflection is needed in graduated composition course, about 87,1% of
the graduates point that the course has responded to the expectations.
Key-Words: Psychologist's skills, Graduates in Psychology, Psychology, Graduation in
Psychology.
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LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1 - CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA E CONTEMPORÂNEA DO
PROCESSO DE PROFISSIONALIZAÇÃO DA PSICOLOGIA NO BRASIL,
PROPOSTO POR PEREIRA & PEREIRA NETO, 2003. ............................................. 18
FIGURA 2- DIAGRAMA – SÍNTESE DA MINUTA DE DIRETRIZES
CURRICULARES PARA OS CURSOS DE PSICOLOGIA. ....................................... 53
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LISTA DE TABELAS
TABELA 1- COMPETÊNCIAS ESPECÍFICAS DO CURSO DE PSICOLOGIA ........ 51
TABELA 2 - EGRESSOS DO CURSO DE PSICOLOGIA DA UMESP, POR
SEMESTRE, POR SEXO (2013-2015) ........................................................................... 58
TABELA 3 - AMOSTRAGEM POR COTAS (GÊNERO / FAIXA ETÁRIA) ............. 59
TABELA 4 - DESCRIÇÃO DAS COMPETÊNCIAS E HABILIDADES POR ÊNFASE
.........................................................................................................................................61
TABELA 5 - DISTRIBUIÇÃO PERCENTUAL DO TOTAL DE ESTUDANTES
RESPONDENTES POR SEXO, SEGUNDO GRUPO ETÁRIO, A MÉDIA E O
DESVIO PADRÃO ......................................................................................................... 64
TABELA 6 - DISTRIBUIÇÃO PERCENTUAL DO TOTAL DE EGRESSOS, POR
SEXO, SEGUNDO A FAIXA DE RENDA MENSAL FAMILIAR .............................. 64
TABELA 7- IMPORTÂNCIA E DOMÍNIO DE INTERVENÇÃO EM ANÁLISE DO
CONTEXTO E ATUAÇÃO PROFISSIONAL .............................................................. 67
TABELA 8 - IMPORTÂNCIA E DOMÍNIO DE INTERVENÇÃO EM PROCESSOS
PSICOLÓGICOS GRUPAIS E ORGANIZACIONAIS ................................................. 72
TABELA 9 - IMPORTÂNCIA E DOMÍNIO DE CONHECIMENTO E
HABILIDADES DE INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA .................................................. 78
TABELA 10 – OPINIÃO SOBRE A RELAÇÃO ENTRE O CURSO DE
GRADUAÇÃO QUE REALIZOU EM PSICOLOGIA E SUA INSERÇÃO
PROFISSIONAL ............................................................................................................. 79
TABELA 11 – DISPOSIÇÃO DOS DADOS DAS HIPÓTESES ................................. 83
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SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 13
2. OBJETIVOS ................................................................................................................ 15
3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA .............................................................................. 15
3.1 Uma área de formação com procura crescente .................................................................. 17
3.2 Habilidades e Competências na formação do Psicólogo ................................................... 18
4. A PSICOLOGIA NO BRASIL: TRAJETÓRIAS ....................................................... 21
5. CONSTITUIÇÃO DA PSICOLOGIA NO BRASIL: DIFERENTES FASES ........... 21
5.1 O período pré-profissional (1833-1890) ............................................................................ 24
5.2 A fase da Profissionalização (1890 – 1906/1975) ............................................................. 25
5.3 O período “profissional” (a partir de 1975) e o curso de Psicologia da Metodista ............ 34
6. A PRÁTICA PROFISSIONAL DO PSICÓLOGO NO CONTEXTO DAS
MUDANÇAS NA SOCIEDADE BRASILEIRA ........................................................... 45
7. O FIM DO CURRÍCULO MÍNIMO E A DESCRIÇÃO DAS COMPETÊNCIAS E
HABILIDADES DO PSICÓLOGO ................................................................................ 46
8. DIRETRIZES CURRICULARES E COMPETÊNCIAS DO PSICÓLOGO .............. 55
9. MÉTODO .................................................................................................................... 66
9.1 Procedimento de coleta e análise dos dados ...................................................................... 68
9.2 Questionário aplicado ........................................................................................................ 69
10. RESULTADOS ......................................................................................................... 70
11. DISCUSSÃO ............................................................................................................. 80
12. CONCLUSÃO ........................................................................................................... 84
13. REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 86
14. APÊNDICE ............................................................................................................... 94
14.1 Apêndice A – Questionário da Pesquisa ......................................................................... 94
15. ANEXOS ................................................................................................................... 105
15.1 Anexo A – Aprovação do Comitê de Ética ..................................................................... 105
15.2 Anexo B - Modelo do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ........................ 106
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1. Introdução
O cotidiano apresenta aos egressos dos cursos de graduação situações complexas.
Finalizado o curso, quando inserido no mercado de trabalho, vê-se diante do confronto entre
habilidades e competências desenvolvidas durante a formação acadêmica e aquelas
requeridas no exercício profissional. Tal vivência permite-lhe avaliar a adequação da
proposta pedagógica do curso realizado e resgatar aspectos intervenientes desse processo
(Dyrce, 2008). Observar que avaliar constantemente os cursos de ensino superior também
tem sido uma forte preocupação do Ministério da Educação que, em 2004, instituiu o
Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – Sinaes (Lei nº 10.861, de 14 de
abril de 2004), passando a avaliar os cursos de graduação, o desempenho acadêmico dos
estudantes, bem como a qualidade da formação oferecida em âmbito nacional.
Os resultados destas avaliações, conforme a mesma legislação, impactam
diretamente nos cursos de graduação em Psicologia, pois servem de referencial básico para
os processos de regulação e supervisão da educação superior, bem como para autorização,
reconhecimento e renovação de reconhecimento destes cursos. Além disso, a qualidade da
formação tem por objetivo, conforme Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional –
LDB (Lei Nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996), contribuir para o desenvolvimento
estrutural, social e econômico do país.
Diante disto, o Sinaes, por meio do seu manual avaliativo, em sua nona dimensão,
faz referência à política de atendimento a estudantes e egressos. O sistema apresenta como
núcleo básico e comum a inserção profissional dos egressos e a participação destes na vida
da instituição, além de orientar para que seja observado se existem dados e indicadores para
avaliar esta dimensão, como pesquisas ou estudos sobre os egressos ou empregadores dos
mesmos.
Silva (2010) relata que há pesquisas nacionais sobre formação do profissional de
psicologia no nível de graduação, porém são escassas as informações sobre as estratégias
de qualificação e requalificação utilizadas pelo psicólogo brasileiro após inserção no
mercado de trabalho. Tal situação aponta para a importância de se resgatar e sistematizar as
diferentes dimensões que envolvem o processo de formação do psicólogo buscando
compreender, a partir do egresso dos cursos de Psicologia de uma instituição específica,
quais como as habilidades e competências desenvolvidas ao longo da graduação vêm
contribuindo no exercício da profissão.
Busca-se com a pesquisa ora proposta, frente ao exposto, esclarecer as seguintes
questões: a) como essas concepções e diretrizes se encontram presentes na formação
proposta pelo curso de Psicologia da UMESP; b) quais competências os egressos do curso
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de Psicologia da Metodista entre 2013 e 2015 avaliam ter um domínio satisfatório.
Buscando responder essas questões, a investigação proposta foi desenvolvida por
meio de pesquisa bibliográfica. Esta buscou resgatar o processo de constituição da área no
Brasil, identificando os princípios e diretrizes norteadores da formação do profissional de
Psicologia em diferentes contextos históricos. Uma segunda etapa da pesquisa de campo
será realizada com a aplicação de questionário, constituído por questões estruturadas, junto
a uma amostra de 17 egressos do curso de Psicologia da UMESP entre os anos de 2013 e
2015.
A escolha do curso de Psicologia da UMESP justifica-se por ter sido esta Instituição
de Ensino Superior (IES) a terceira a ofertar o curso no estado de São Paulo, já que até a
década de 1970 havia apenas dois cursos na área no estado de São Paulo: o da Universidade
de São Paulo (USP), estabelecido desde 1938, e o da Pontifícia Universidade Católica
(PUC), em funcionamento desde 1946, ambos de referência e modelo para a implantação
da graduação na Universidade Metodista de São Paulo (Prado, 2016).
Nesse marco, vale salientar que a construção de um curso com mais de 45 anos de
existência, como é o caso do da UMESP, percorre parte significativa da história no
desenvolvimento da psicologia no país. Seu corpo docente e discente, ao longo desta
trajetória, fez-se presente em movimentos, congressos, encontros, reuniões em conselhos,
dialogando e participando de discussões fundamentais sobre a constituição da área, sua
profissionalização, assim como sobre as diretrizes nacionais da educação desde sua criação
(Chippari, 2016). Ainda de acordo com a autora, a história do curso da Universidade
Metodista de São Paulo se entrelaça ao contexto social e regional em um momento em que
a psicologia já estava estabelecida e reconhecida enquanto profissão, através da Lei nº 4.119,
de 27 de agosto de 1962. Mas seu reconhecimento pouco mais de uma década depois, por
meio da Lei nº 74.259, de 08 de julho de 1974, o coloca como parte importante do processo
de formação de psicólogos no estado de São Paulo.
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2. Objetivos
A pesquisa proposta para o curso de Psicologia da Universidade Metodista de São
Paulo, tem como principal objetivo verificar, a partir da percepção dos egressos, a relação
entre formação profissional oferecida, ao longo da graduação, a estudantes egressos do
curso entre 2013 e 2015, e sua repercussão na inserção deste grupo no mercado de trabalho.
Como desdobramento deste objetivo geral, assumimos como objetivos específicos:
a) Identificar quais competências os egressos do curso de Psicologia da
Universidade Metodista entre 2013 e 2015 avaliam ter um domínio satisfatório.
b) Identificar a satisfação dos egressos frente às competências adquiridas no urso
de Psicologia;
c) Verificar se as ênfases descritas no plano pedagógico do curso contribuíram para
o desenvolvimento das competências e habilidades dos egressos durante o
período de formação;
d) Verificar se as ênfases de formação propostas pelo plano pedagógico se
concretizam nas atividades profissionais dos graduados;
e) Identificar como os egressos percebem a contribuição do curso para sua inserção
(ou não) no mercado de trabalho e atuação profissional.
3. Fundamentação Teórica
Desde o reconhecimento da Psicologia como profissão em 1962 (Lei 4119/1962), a
profissão do psicólogo vem experimentando um contínuo crescimento quando se considera
o número de profissionais inscritos inicialmente no Ministério de Educação e,
posteriormente, nos Conselhos Regionais e no Federal de Psicologia, instituído em 1974
(Bastos et al 2010).
De acordo com Bastos et al. (2010), este crescimento do número de registros
profissionais se dá em função do ritmo ainda acelerado do aumento do número de cursos de
graduação na área. Entretanto, apesar deste crescimento na oferta, Abbad e Mourão (2010)
nos alertam para a precariedade na formação e as nem sempre disponíveis oportunidades de
qualificação em psicologia no Brasil, visto que os cursos de graduação não atendem às
demandas de formação profissional em relação às competências instituídas pelas diretrizes
curriculares. Tal constatação pode ser observada, em parte, quando analisamos os resultados
da avaliação do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (ENADE).
Em 2016, de acordo com o Conselho Federal de Psicologia existiam 280.962 mil
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Psicólogos em todo o Brasil, dos quais o estado de São Paulo participava com 88.557 mil
registrados em conselhos regionais, correspondendo a uma parcela de 32% de profissionais
de todo o país.
Apesar da haver indícios do uso da Psicologia como estudos psicológicos em meados
de 1800, Pessoti (1988), Yamamoto et al (2010) relatam que ao longo desses 50 anos de
profissão regulamentada, muito se estudou e se debateu sobre a situação da Psicologia no
Brasil, bem como sobre as características da profissão, as responsabilidades e inserção do
profissional da área. Segundo Pacheco (2006), em 1975, a formação profissional em
psicologia começa a ser posta em questão, através da divulgação de trabalhos de iniciativa
tanto individual quanto institucional.
Mesmo com o grande destaque da Psicologia, na década de 1970, por sua formação
acadêmica voltada para a atividade clínica, o que auxiliou na consolidação de seus conselhos
representativos e no início da produção de artigos científicos na área, Abbad e Mourão
(2010) relatam que na década de 1990 o psicólogo começou a sentir e a perceber a variedade
de domínios e áreas de atuação que a profissão proporcionava. Essa percepção desenvolveu-
se, conforme os autores, apoiada pelas significativas mudanças econômicas, políticas e
sociais ocorridas na sociedade moderna, que contribuíram para o desenvolvimento de novas
técnicas de gestão, impulsionadas pela reestruturação produtiva e seus impactos nas relações
de trabalho traduzidas, entre outras formas, na crescente presença do trabalho temporário e
terceirizado, assim como do crescente desemprego estrutural e na baixa qualificação da
força de trabalho. Essas mudanças, tal como sustentam os autores, também incidiram na
busca destes trabalhadores por qualificação contínua e pelo aprendizado de novas
competências, a partir de então exigidas pelo mercado de trabalho. Assim também pensam
Bastos et al. (2010), que entendem que, em um mundo cambiante, os profissionais são
constantemente estimulados ou até obrigados a desenvolver novas competências em seu
trabalho.
De acordo com Abbad e Mourão (2010), este novo cenário acabou impactando
diretamente no desenvolvimento das práticas do profissional de Psicologia, visto que se
tornou também necessária sua capacitação para o aprimoramento de competências para o
exercício de intervir e propor melhorias como agente de transformação social, fazendo com
que o relacionamento ativo do aprendiz na construção do seu próprio perfil profissional e
seu contato frequente com outras pessoas acabe sendo a tônica da sua formação. Segundo
os autores,
Entre as mais importantes e salientes transformações estavam
aquelas que modificavam concepções do psicólogo sobre o
fenômeno psicológico, as fontes de conhecimentos que embasavam
a prática profissional, as formas de inserção do profissional no
mercado de trabalho, o tipo de clientela atendida e o foco de
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intervenção. (Abbad e Mourão, 2010, p. 381).
No mesmo sentido caminham tanto as Diretrizes Curriculares Nacionais, que
fundamentam o ensino superior no país como o Parecer do Conselho Nacional de Educação
(CNE) de nº 0072/2002, que determina que os cursos em psicologia contemplem de maneira
ampla a formação do psicólogo, respeitando as múltiplas concepções teóricas e
metodológicas, bem como suas práticas e áreas de atuação, apresentando três perfis para a
formação na área: o bacharelado em Psicologia, a licenciatura em Psicologia e a formação
do Psicólogo.
3.1 Uma área de formação com procura crescente
De acordo com dados do Sindicato das Mantenedoras de São Paulo, nas últimas
décadas o curso de Psicologia no Brasil apresentou um crescimento na sua procura na ordem
de 130%. Observou-se ainda um aumento de 35% no número de concluintes em todo país.
Os dados apurados pela entidade apontam ainda que 76% dos egressos dos últimos anos são
de rede privada de ensino. Até 2014, os cursos de psicologia foram responsáveis pela oferta
de 207.070 mil matrículas, que se desdobraram em 80.715 mil ingressantes nas faculdades
ou universidades. Tomando por referência o mesmo ano, 20.663 mil alunos conseguiram
concluir o curso.
Este crescimento também é percebido e examinado por Bastos et al. (2010), que
aponta para três grandes características que refletem e revelam permanências e mudanças,
ao longo dos últimos 20 anos, na profissão. Entre essas características percebe-se o aumento
da participação dos homens sem alteração do predomínio das mulheres, a melhor
distribuição da profissão no espaço nacional, e o interesse pela área por parte da população
de adultos jovens que, em 2009, tinha em média de 36,7 anos.
O Sindicato das Mantenedoras do Estado de São Paulo indica também que em 2014
a região do ABCD, onde localiza-se a UMESP, registrou 3.058 matriculas em cursos da
área, o que significou um aumento na procura de 42% ao longo da última década. Porém,
tal como os dados apresentados em âmbito nacional, dos 1.398 ingressaram nos cursos,
somente 178 conseguiram concluir, demonstrando uma queda no número de concluintes de
70% em comparação ao observado na última década.
De acordo com os dados fornecidos pela UMESP e correlacionando-os aos da
região, a universidade foi responsável por preparar para inserção no mercado de trabalho,
em 2014, 101 profissionais, correspondendo a 57% dos egressos graduados na área em 2014
na região do ABC.
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3.2 Habilidades e Competências na formação do Psicólogo
De acordo com o Projeto Pedagógico do Curso de Psicologia – PPC (2008) da
Universidade Metodista de São Paulo, os egressos do curso que são objeto desta pesquisa
foram formados através de duas ênfases: Psicologia da Saúde e Comunitária e Psicologia
Organizacional e do Trabalho. A escolha dessas ênfases foi determinada com base na
inserção regional, entendendo-se que a formação deve ser ampla e abrangente.
Ainda de acordo com o PPC (2008), as duas ênfases oferecidas pela instituição
possuem objetivos alinhados com as Diretrizes Curriculares Nacionais e se estruturam a
partir dos seguintes objetivos: a) capacitar o aluno para atuar nas organizações/instituições
considerando a necessidade de promover o desenvolvimento, a saúde e o bem-estar do
trabalhador, de maneira individual e/ou grupal, a partir da pluralidade da ciência
psicológica; b) capacitar o aluno para diagnosticar e intervir em uma perspectiva preventiva
e educativa; c) promover mudanças a partir da compreensão das relações entre indivíduo-
trabalho-organização e do reconhecimento da dinâmica da interação entre saúde-qualidade-
produtividade; d) identificar os desafios contemporâneos presentes no contexto do trabalho;
e) capacitar o aluno para atuar em instituições e na comunidade visando promover a saúde
integral, o desenvolvimento e o bem-estar tanto das pessoas envolvidas quanto dos
dispositivos institucional/comunitário, a partir da pluralidade da ciência psicológica; f)
capacitar o aluno para diagnosticar e traçar estratégias de intervenção nas instituições e
comunidades a partir das perspectivas da prevenção, da educação e do
tratamento/reabilitação; g) capacitar o aluno para analisar as variáveis psicossociais e os
componentes emocionais e cognitivos presentes em indivíduos, instituições e comunidades,
e, h) capacitar o aluno para que possa prover mudanças a partir da compreensão da interação
entre os elementos sociais, econômicos, culturais e políticos, além de elementos
psicológicos.
Para um melhor entendimento e aprimoramento da construção dos conhecimentos,
habilidades e competências do curso de psicologia, as diretrizes curriculares determinam
eixos que estruturam ao longo do processo de formação a explicitação de seus pressupostos
e fundamentos, procedimentos, interfaces e práticas, quais sejam: fundamentos
epistemológicos e históricos; fundamentos teórico-metodológicos; procedimentos para
investigação científica e prática profissional; Fenômenos e processos psicológicos;
Interfaces com campos afins do conhecimento e Práticas profissionais para atuação em
diferentes contextos (CNE, 0062/2004).
De acordo com Abbad e Mourão (2010) as competências dos psicólogos, após
análise das Diretrizes Curriculares, podem ser agrupadas em cinco categorias de conteúdo:
1. análise do contexto e do campo de atuação; 2. intervenção; 3. investigação científica; 4.
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avaliação e 5. atuação inter e multiprofissional.
Para garantir a formação e capacitação do conhecimento no campo da psicologia e
constituir a identidade do curso, o Conselho Nacional de Educação determina a criação de
um núcleo comum baseado no conjunto de competências básicas que aferem desempenhos
e atuações iniciais do formando de psicologia, permitindo assim o domínio de
conhecimentos psicológicos e a capacidade de utilizá-los em diferentes contextos que
exijam investigação, análise, avaliação, prevenção e intervenção dos processos psicológicos
(CNE, 0062/2004).
Segundo o PPC (2008), as competências propostas pelo curso de Psicologia
oferecido pela UMESP possuem características parecidas com aquelas propostas pelas
Diretrizes Curriculares Nacionais e estão dispostas da seguinte maneira: a) elaborar projetos
e desenvolver estratégias para possíveis intervenções nas situações e relação do
trabalho/institucional comunitárias, considerando o contexto regional; b) elaborar e redigir
relatórios de natureza científica ou técnica; c) analisar, descrever e interpretar
comportamentos dos indivíduos e grupos a fim de facilitar o acesso aos estados subjetivos
dos mesmos escuta e observação psicológicas; d) analisar e interpretar a rede discursiva e
os laços sociais presentes no contexto institucional/comunitário; e) realizar entrevistas em
diferentes contextos e finalidades; f) conduzir e mediar diferentes tipos de reuniões; g)
identificar as necessidades individuais e grupais de natureza psicológica no contexto do
trabalho e institucional/comunitário; h) utilizar diferentes métodos e técnicas de intervenção
com indivíduos e grupos; i) atuar em equipes inter e multidisciplinares; j) coordenar e
manejar processos grupais, considerando as diferenças individuais e culturais de seus
membros; k) coordenar, elaborar e acompanhar projetos de intervenção envolvendo
indivíduos e/ou grupos no contexto do trabalho; l) atuar de forma compatível com as normas
éticas que pautam o exercício profissional do psicólogo.
Ainda de acordo com o PPC do curso de Psicologia da UMESP (2008), espera-se
que tais competências possam formar egressos que sejam envolvidos na promoção da saúde
e prevenção de doenças de natureza psicológica em indivíduos, grupos e/ou organizações.
De acordo com Abbad e Mourão (2010), estas competências reportam-se a
desempenhos e atuação do graduado em Psicologia garantindo um domínio básico ao
profissional e a capacidade de utilizá-los em diferentes contextos. Assim também indicam
Zabala e Arnau (2010), que afirmam que o conceito de competência surge de posições
basicamente funcionais, ou seja, com relação ao papel que devem cumprir para que as ações
humanas sejam o mais eficiente possível.
Neste mesmo sentido e visando garantir o nível dos conteúdos programáticos, a
qualidade do ensino, as habilidades e competências aprendidas durante esse processo de
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formação, o Instituto Nacional de Educação e Pesquisa (INEP), em cumprimento à Lei nº
10.861, de 14 de Abril de 2004, busca aferir, a cada três anos, de acordo com calendário a
avaliação do Ensino Superior, a qualidade do ensino oferecido pelas instituições por meio
do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (ENADE).
Abbad e Mourão (2010) nos alertam para os resultados obtidos nas últimas
avaliações do exame do ensino superior, que apontam baixa qualidade do ensino,
ressaltando que as competências relacionadas às investigações científicas demandam uma
maior requalificação, além de possuir defasagem de competências em organizações e em
processos grupais.
Assim também alertam Zabala e Arnau (2010), indicando que a formação inicial e
permanente da maioria das profissões centrou-se e se reduziu à aprendizagem de alguns
conhecimentos, ignorando as habilidades para o desenvolvimento da profissão, fomentando
o caráter dissociado entre a teoria e a prática, onde os alunos memorizam os assuntos,
desenvolvendo conhecimento adquiridos em uma prova e não para poder aplicá-los. Neste
sentido, a continuidade da formação se faz necessária e auxilia no desenvolvimento e
aprimoramento de práticas e competências que até então não foram desenvolvidas no
período de graduação.
Segundo Heloani et al (2010), atualmente a Psicologia tem sido uma das profissões
que conciliam a atividade autônoma e assalariada. No entanto, a maioria dos profissionais
da área é assalariada. Tal situação é gerada em função da diversidade de setores nos quais o
Psicólogo atua, a maioria inserida no serviço público, acompanhada, em seguida, pela
inserção no setor privado e, em menor proporção, no terceiro setor.
Concomitantemente, Bastos e Guedes (2010) ressaltam a importância da psicologia
se tornar objeto de estudo e pesquisa científica constante, oferecendo assim dados que
promovam reflexões não só para avaliar o cumprimento dos compromissos sociais, mas,
sobretudo, para apontar problemas, desafios e limites que possam impulsionar os seus
processos de mudança. Os autores destacam que a ausência dessa investigação sistemática
afeta os insumos para avaliar e rever a formação que está sendo oferecida aos profissionais,
exigência fundamental de toda atuação responsável.
A trajetória para a psicologia conquistar o status que possuí, consolidou-se através
do tempo por fases significantes e estruturantes que deram a psicologia base para a
construção de sua identidade. Estes aspectos foram distribuídos em fases importantes,
como: O período pré-profissional (1833-1890), A fase da profissionalização (1890 –
1906/1975), O período “profissional” (a partir de 1975) e em especial nesta última fase a
importante participação da Universidade Metodista de São Paulo no processo de
estruturação da Psicologia em São Paulo. A demonstração histórica da Psicologia no Brasil
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e seu desbravamento é tema de pesquisa de diversos autores, dentre eles Bastos e Guedes
(2010); Costa (2010); Lisboa e Barbosa (2009); Massimi (1990); Pereira e Pereira e Neto
(2003); Pessoti (1988) e Yamamoto (2010) que contribuem no processo de resgate histórico
e suas trajetórias iluminando e orientando os desafios da solidificação da profissão
percorrida até o presente momento e que serão retratados através das trajetórias no decorrer
do próximos capítulos da dissertação.
4. A Psicologia no Brasil: trajetórias
O traço distintivo desta primeira parte da pesquisa é mostrar o percurso histórico da
formação e institucionalização da psicologia no Brasil e como este processo se entrelaça
com a formação do profissional da área, em base a pesquisa bibliográfica.
Busca-se nesse momento, a apresentação das diferentes fases que marcam a
constituição da área no Brasil, para posteriormente localizar o debate sobre habilidades e
competências do profissional de psicologia no contexto das exigências da atual legislação,
assim como nas diretrizes que embasam a matriz curricular do curso de Psicologia da
UMESP.
5. Constituição da psicologia no Brasil: diferentes fases
A formação do Psicólogo no Brasil é tratada há mais de 100 anos como um tema
importante por diversos autores (Bastos & Guedes, 2010; Costa, 2010; Yamamoto, 2010;
Lisboa & Barbosa, 2009; Pereira & Pereira e Neto, 2003; Massimi, 1990; Pessoti, 1988).
Em comum, os autores ressaltam a trajetória da profissão partindo da premissa de que para
se entender o contexto presente e traçar o futuro há que se refletir criticamente e
construtivamente sobre o processo histórico de ensino, assumindo compromisso com a
qualidade da formação tanto básica como específica dos psicólogos brasileiros.
Dentre os principais relatos sobre a estruturação da psicologia no Brasil, Pessoti
(1988) destaca-se por ser um dos pioneiros neste assunto. Sua abordagem sobre o tema
retrata o contexto histórico da psicologia através de uma divisão em quatro períodos
marcados pela ausência ou presença de instituições ligadas a Psicologia. Segundo o autor,
foi a partir da independência política do Brasil, em 1822, que o país começa a se aproveitar
dos múltiplos modos culturais e científicos, passando a vivenciar a criação de instituições
de ensino para a promoção do desenvolvimento local. Nasce, nesse contexto, em 1833, as
Faculdades de Medicina da Bahia e do Rio de Janeiro, ambas voltadas a atender as
necessidades básicas e intelectuais da elite daquele período.
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Com o advento das Faculdades de Medicina e o início das escolas de magistério,
surge a construção de um saber psicológico. Esta fase, por sua vez, pode ser circunscrita,
conforme o autor, em dois períodos: o “Pré-institucional”, que se estende até 1833, marcado
pela influência do empirismo e relativismo religioso nos saberes psicológicos, e o
“Institucional”, em curso entre 1833 e 1934, marcado pelos critérios epistemológicos e
científicos (Pessoti, 1988 p.20-21). Em seguida, mais dois períodos são citados pelo autor,
o “Universitário”, que foi de 1934 a 1962, marcado pelo início do ensino superior da
Psicologia na “Universidade de São Paulo - USP” e na Pontífice Universidade Católica –
PUC e, por último, o período que ficou conhecido como “Profissional”, momento que tem
como marco a regulação da profissão, em 27 de agosto de 1962.
Autores como Pereira e Pereira Neto (2003) relatam que esta periodização proposta
por Pessotti (1988), estabeleceu marcos para a trajetória de desenvolvimento da Psicologia
no país que foi de fundamental importância para a compreensão e organização da profissão.
No entanto, mesmo sem considerar os critérios de Pessoti (1988) inadequados, os autores
trazem uma nova proposta refinada e contemporânea para a já conhecida periodização,
visando incrementar as reflexões sobre a história da profissão de Psicólogo(a) no país,
apoiadas pelas referências teóricas das “Sociologia das Profissões”, por se tratar de uma
especialidade da sociologia geral que explora o processo de profissionalização que
especifica uma série de características ou atributos considerados inerentes e comuns a todas
as profissões (Cardoso, 2005).
Pereira e Pereira Neto (2003) consideram que a periodização proposta por Pessotti
(1988) deixa uma lacuna, já que não apresenta, segundo os autores, um referencial teórico
expressivo voltado diretamente à profissão de Psicólogo. Para os autores, há, na trajetória
proposta por Pessotti (1988) uma carência de discussões científicas acerca da profissão.
Desta maneira, os períodos são apresentados e estruturados cronologicamente, salientando
datas que marcam a criação de instituições ligadas ou não a Psicologia, a partir de uma
trajetória embasada em textos coloniais que discorrem explicitamente sobre política,
teologia, medicina, pedagogia e moral. Diante desse quadro, visando ampliar a perspectiva
proposta por Pessoti (1988), e amparados por referencias teóricas da Sociologia das
Profissões, Pereira e Pereira Neto (2003) apresentam uma proposta contemporânea, visando
incrementar as reflexões sobre a história dessa profissão, incluído escritos de autores como:
Marina Massimi, Lourenço Filho, Antônio Gomes Penna que trazem textos com
fundamento científico e atual, propondo assim, uma classificação da divisão do
desenvolvimento e estruturação da Psicologia em três períodos, a saber: pré-profissional
(1833-1890), profissionalização (1890/1906-1975) e profissional (pós 1975).
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Figura 1. Contextualização histórica e contemporânea do processo de profissionalização da Psicologia no Brasil, proposto por Pereira & Pereira Neto (2003).
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5.1 O período pré-profissional (1833-1890)
Pereira e Pereira Neto (2003) articulam de maneira sutil os dois primeiros períodos
propostos por Pessoti (1988) -“Pré-Institucional”, até 1833, e “Institucional”, que se inicia
em 1833 e se estende até 1934em um só período “pré-profissional”, visando descrever o
momento histórico que antecede a profissionalização da Psicologia no país. Para Pessoti
(1988), sobre o período denominado de “pré-Institucional” versam os escritos feitos pelos
missionários da nova terra descoberta até a criação das Faculdades de Medicina no país.
Estes escritos, segundo o autor, eram individuais, sem compromisso com a construção ou
difusão de um saber psicológico, em sua total idade influenciados pela ideologia dos
modelos dominantes europeus, solidificados em um moralismo cristão com cunhos
civilizatórios, transcritos de uma pedagogia racionalista com um naturalismo de matriz
empirista, coroado pelo organicismo e pela ênfase na influência do ambiente. Já o período
Institucional teve como marco a construção das Faculdades de Medicina da Bahia e do
Rio de Janeiro em 1833 e foi até 1890, que passa a partir deste momento a utilizar o uso
dos termos próprios de estudo no campo emocional contribuindo assim na construção do
conhecimento de um Saber Psicológico.
Após a criação das Faculdades de Medicina da Bahia e do Rio de Janeiro em 1833,
Pessotti (1988) relata que este novo período Institucional acabou produzindo médicos
com vínculos enraizados nas questões étnicas, afetivas ou culturais com a população,
visto que estes profissionais passaram a utilizar seu conhecimento empírico para a
construção científica específica do saber que ficou conhecido a partir de 1890 como
Psicologia, através da Reforma de Benjamin Constant que tinha segundo Freitas (2015)
o intuito de substituir o currículo acadêmico pelo currículo enciclopédico, ou seja, um
currículo prático, característico das ideias positivistas. Esta aproximação da Medicina
para a Psicologia trouxe contribuições intelectuais, estudos sistemáticos, proporcionando
assim uma escrita culta e acadêmica, colaborando para a construção de manuais, tratados
com propósitos práticos e principalmente uma grande diversidade de estudos para os
campos psicológicos.
Para Pereira e Pereira Neto (2003), estes eram sinais de novos tempos para a
Psicologia, pois nas faculdades os médicos apresentavam um grande interesse na
construção de conteúdos psicológicos, visto que na Faculdade de Medicina da Bahia o
enfoque dos conteúdos produzidos era voltado para os aspectos sociais, forense e de
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higiene mental, enquanto que na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro a produção
dos saberes psicológicos cresciam ligados à neurologia e neuropsiquiatria.
Neste ponto, Pereira e Pereira Neto (2003) utilizam-se dos escritos de Pessoti
(1988) para apresentar sua argumentação englobando os dois períodos propostos,
reforçando o que passam a denominar de período “Pré-profissional”, compreendido entre
os anos que sucedem 1833 até 1890, justamente por ser constituído por um momento em
que não havia uma psicologia propriamente dita, dotada de sistematização teórica e
terminologia própria, carente de um campo de conhecimento específico, sem sequer
possuir uma prática reconhecida no país. O campo da psicologia estava no início de suas
reais propostas. O que havia então eram apenas pessoas interessadas nas questões
psicológicas, não havendo no século XIX, todavia a profissão de Psicólogo(a) no Brasil.
São essas as considerações que levam o autor a delimitar esse período como “Pré-
Profissional”.
Esse pensamento também é compartilhado por Waeny e Azevedo (2009), pois,
segundo os autores, com a Reforma de Benjamin Constant, de 1890, a tendência
humanista na educação foi deixada de lado, apoiada pelo decreto de Lei nº 981 de 1890
(Brasil, 1980), sendo substituída por uma tendência cientificista, passando a ganhar uma
identidade e ser conhecida como tal. A reforma de Benjamin Constant era composta de
21 decretos com foco em métodos e conteúdos de cunho liberal e elitista, versavam sobre
a educação e estabelecimentos mantidos pelo governo federal na capital federal,
ressalvando o ensino superior que tinha instituições de ensino em outras cidades e capitais
do país (Delaneze, 2007).
5.2 A fase da Profissionalização (1890 – 1906/1975)
Pessoti (1988), Massimi (1993) e Pereira e Pereira Neto (2003) concordam que os
três momentos mais importantes que marcam o início estruturação profissional da
Psicologia se dá justamente no período criado pela Reforma de Benjamin Constant, em
1890, em conjunto com a inauguração do Laboratório Experimental na Educação –
Pedagogium, em 1906, e a regulamentação da profissão em 1962.
Entretanto, Pereira e Pereira Neto (2003) complementam que para se tornar um
tipo de atividade além de específica, especializada, era necessário que a Psicologia
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detivesse um conhecimento delimitado, complexo e institucionalizado. A área de
conhecimento necessitava organizar seus interesses em associações que padronizassem a
conduta dos pares, realizando uma autorregulação que deveria se efetivar por meio da
fiscalização, apoiada em dispositivos formais, entre os quais se destacam os códigos de
ética. Dessa forma, os autores propõem como referência para demarcar o fim do período
de profissionalização a criação do código de ética de 1975, que regulamenta a praticada
profissão.
Com o início dos anos de 1890 a Psicologia começa a se aproximar da educação
impulsionada pela reforma de Benjamin Constant, que inclui a Psicologia nas matrizes
curriculares, fazendo-se importante para o desenvolvimento da profissão e contribuindo
assim, para o início da institucionalização da Psicologia no Brasil (Pereira & Pereira Neto,
2003). Assim também entendem Waeny e Azevedo (2009), no qual reforçam que neste
momento nasce a primeira formalização do ensino da Psicologia, onde na disciplina de
Filosofia, que antes contemplava e discutia temas psicológicos, passa a se chamar
“Psicologia e Lógica”, e a disciplina de Pedagogia acabou sendo reorganizada como
“Pedagogia e Psicologia”.
Logo em seguida, mais precisamente em 1892, em São
Paulo, a Psicologia assume forma de disciplina específica,
apoiada pelo surgimento das escolas normais que tinham
como objetivo formar um corpo docente competente e
adequado às necessidades do sistema educacional brasileiro,
encontrando fundamentação na Psicologia experimental que
acabava de surgir (Massami, 1993). Essa transformação no
ensino, assim como a constituição das escolas normais, foi
amparada em São Paulo pelo decreto nº27, de 12 de março
de 1890, que, especifica que “sem professores bem
preparados, praticamente instruídos nos modernos processos
pedagógicos e com cabedal científico adequado às
necessidades da vida atual, o ensino não pode ser
regenerador e eficaz”. Até então, a “Psychologia” era
conhecida, desde 1833, pelas Faculdades de Medicina, como
um objeto de estudo das áreas de conhecimento como:
Filosofia, Direito, Medicina, Pedagogia e Teologia Moral,
sendo ensinada pela Faculdade de Direito de São Paulo como
uma “Ciência do Homem” fundamentada na fisiologia ou
“Física da Natureza Humana” tornando-se uma disciplina
curricular obrigatória no país em 1928 (Lisboa & Barbosa,
2009).Pode-se dizer que as articulações entre Psicologia e
Educação foi essencial para a autonomização da psicologia
no Brasil, de tal maneira que se pode dizer que a Educação
foi o terreno fértil no qual a Psicologia se desenvolveu. Essa
relação permaneceu forte nos anos subsequentes, podendo-
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se dizer que foi no campo da Educação que a Psicologia mais
efetivamente encontrou as bases para seu desenvolvimento
e, ao mesmo tempo, que foi na Psicologia que mais o campo
da Educação fundamentou suas teorias e práticas (Antunes,
2002, p.193).
A partir deste momento, a Psicologia passa a disseminar os seus
conhecimentos para a população com a inserção da Psicologia como disciplina,
viabilizada pela reforma de Benjamin Constant, em 1890, assim como com o
surgimento da Psicologia Experimental.
Estes mesmos pensamentos se encontram nos escritos de Antunes
(1991), os quais relatam que a criação do Laboratório Experimental, só foi
possível através do decreto nº 980, de 1890 (Brasil, 1890), proposto pelo
advogado e diplomata Rui Barbosa. O laboratório ficou conhecido como um
centro de produção de conhecimentos e estímulos para as realizações
educacionais. Manteve-se em funcionamento até 1897 como um museu
pedagógico. Ainda segundo o autor, logo em seguida, e com intuito de ser um
“Centro de Cultura Superior aberto ao público”, por intermédio de Medeiros
de Albuquerque, nascem 1906 o Laboratório de Psicologia Pedagógica,
“Pedagogium”, projetado pelo psicólogo e advogado Alfred Binet idealizador
do teste de quociente de inteligência ou QI em Paris, coordenado pelo médico
e psicólogo Manoel Bonfim, acompanhando assim as tendências europeias da
psicologia. O Laboratório, conforme Niskier (2011), foi extinto em 1919 pelo
decreto municipal nº 1360, do Rio de Janeiro, por não atingir de acordo com
Antunes (1991) as finalidades previstas na reforma de Benjamin Constant,
entre as quais transformar o ensino em formador de alunos para os cursos
superiores e não apenas reparador.
Pessoti (1988) complementa retratando a importância que o
Laboratório teve na disseminação do conhecimento científico, pois com a
realização de pesquisas passou a contribuir com artigos que foram publicados
na revista Educação e Pediatria, bem como no auxílio de trabalhos que
culminaram na construção do livro de Manuel Bonfim intitulado “Noções de
Psicologia”, editado em 1917 e em 1922, e no estudo do médico e Psiquiatra
Plínio Olinto, “Fadiga Intelectual de Escolares”, de 1934.
É parte desse processo, tal como já apontado anteriormente, conforme
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destaca Massimi (1990), o quanto a pedagogia começa a encontrar fundamento
científico na psicologia experimental, que acabara de surgir. Este será o
caminho, conforme o autor, pelo qual a disciplina de psicologia conquista, em
1893, sua obrigatoriedade na Escola Normal de São Paulo estendendo-se, em
1928, para todo país.
Segundo Pereira e Pereira Neto (2003), em paralelo, a medicina
deixava cada vez mais claro seu interesse na institucionalização da psicologia,
fato este que se consolida em 1923, após a criação de um laboratório
experimental dentro da Colônia de Psicopatas do Engenho de Dentro, no Rio
de Janeiro, que ficou conhecido como Hospital Nacional de Psicopatas.
Centofanti (1982) relata que o laboratório experimental estava naquele
momento sob a direção do médico polonês Waclaw Radeki que o transforma,
em 1931, no Instituto de Psicologia. Esta situação é oficializada em 1932, pelo
Ministério da Educação e Saúde Pública, que reconhece o Instituto como
centro coordenador de estudos de psicologia geral e aplicada, com objetivos
que abarcavam desde a realização de pesquisas científicas, aplicações práticas,
à formação de psicologistas profissionais, mediante cursos teóricos e práticos,
e com estágio obrigatório em seus laboratórios, através do decreto nº 21.173
(Brasil, 1932).
Conforme Penna (1992), este laboratório contribuía no auxílio das
atividades médicas, atendimentos sociais, estruturação de um núcleo de
pesquisa e um centro de formação de psicólogos, onde eram realizadas práticas
que em seguida se tornaram práticas do psicólogo, como a testagem e a
psicoterapia.
Logo após, na Escola Normal de São Paulo, sem a necessidade de
decreto governamental, nasce o segundo laboratório de Psicologia
Experimental, administrado pelo médico, pedagogista e livre docente da
Universidade Moderna em São Paulo Ugo Pizzoli, que passa a realizar
pesquisas experimentais sobre o raciocínio infantil, grafismo, memória,
cinética, tipos intelectuais e associação de ideias. Mas é sob a direção de
Lourenço Filho, com auxílio de Noemi Silveira, que os estudos do
desenvolvimento mental, inquéritos sobre jogos, influência de leituras e de
cinema, aprendizagem e maturidade para aprendizagem da leitura e da escrita
se tornam referências descritivas para o estudo do teste ABC, em 1927
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(Pessotti, 1988).
De acordo com Guimarães (1928), neste período a psicologia passa a
contar com médicos que resolvem dedicar-se a profissão de psicólogo, a
exemplo de Nilton Campos, que se dedica à área após participar de curso
ministrado por Radeki na Universidade do Rio de Janeiro, em 1925,
posteriormente, junto com Radeki, Campos publicaria suas “Pesquisas
Experimentais da Influência do Material Mnemônico Esquecido Sobre a
Associação Livre”, nos Trabalhos de Psychologia em 1928, que eram na
verdade, separatas dos “Anaes da Colônia de Psychopatas” (Centofanti, 1982).
Neste ínterim a Psicologia começava a se expandir no país, através das
fundamentações científicas que Radeki havia estruturado para facilitar o
aprendizado, o que acabou colaborando para mostrar que seu trabalho parecia
estar na direção certa, pois seus fundamentos acabaram atraindo a equipe
médica das Forças Armadas que indicou um grupo de militares para fazer o
curso de Psicologia no Laboratório, dos quais designou três médicos a ficarem
para aprender a desenvolver pesquisas psicológicas para o recrutamento de
aviadores, dentre eles o capitão Ubirajara da Rocha e os tenentes Arauld Bretas
e Alberto Moore (Centofanti, 1982).
Esta aproximação com a área médica do Exército foi extremamente
relevante para a profissionalização da Psicologia no país, pois fez com que a
concepção teórica da Psicologia de Radekiana amadurecesse e concluísse entre
1928 e 1929, durante o curso de Psicologia ministrado na Escola de Aplicação
do Serviço de Saúde do Exército, a publicação de 17 fascículos divididos em
cinco capítulos intitulados “Resumo do Curso de Psychologia”. Estes escritos
incluíam de maneira criteriosa e clara os cinco elementos centrais e
fundamentais do sistema de aprendizagem, estabelecendo sua primeira
estruturação no ensino que ficaram conhecidas como: “A psicologia da vida
intelectual, A Psicologia da Vida Afetiva, A Psicologia da Vida Ativa,
Problemas da Psicologia individual e Coletiva e Psicotécnica conhecida como
a prática dos conhecimentos aplicados” (Centofanti, 1982. p. 15).
Este curso deixou um legado importante para o desenvolvimento
posterior da Psicologia daquele período, com destaque para Ubirajara da
Rocha que produziu dois trabalhos que tratavam do estudo da atenção nos
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aviadores que fora publicado em 1929, além das produções dos tenentes
Arauld Bretas e Alberto Moore, cumprindo assim a finalidade do laboratório
(Centofanti, 1982).
Centofanti (1982) também relembra que o plano de ensino proposto por
Radeki foi o primeiro de domínio público sobre a formação em Psicologia no
Brasil, o qual acabou não sendo concretizado visto o fechamento do Instituto
em menos de um ano de atividade, em 24 de outubro de 1932, pelo decreto de
Lei nº 21.999 (Brasil, 1932), com motivos não muito claros na justificativa da
lei. Porém, o autor traz a perspectiva de três possíveis interpretações que
poderia justificar o fechamento do Instituto, dentre elas, uma forte pressão de
setores influentes da Psiquiatra sobre alguns ministros para impedir a
profissionalização da Psicologia no Brasil; a influência de grupos católicos
ligados à Psicologia pressionando o alto escalão do governo Vargas solicitando
a queda de Radeki, bem como o fechamento do Instituto; e a de que o
orçamento do instituto daria apenas para mantê-lo durante sete meses em que
ficou aberto, visto que ele havia sido criado para se auto sustentar. Ainda de
acordo com o autor, o Instituto voltou às suas atividades em 1937,
incorporadas à Universidade do Brasil, valendo-se de alguns dispositivos da
Lei nº 452, de maio de 1937 (Brasil, 1937).
Penna (1992) relembra de maneira importante que Radeki não era
Psicólogo e sim um estudioso da Psicologia, o que teria contribuído para
ressaltar de maneira sutil que o trabalho do Psicólogo(a) não era o de ensinar
médicos a tratar dos doentes, visto que suas bases de conhecimento eram
advindas da produção científica estruturadas dos seus conhecimentos no
campo da Psicologia, evitando assim, que o Psicólogo não se tornasse uma
figura ameaçadora aos olhos dos médicos, e sim, um profissional que atua de
forma complementar e articulada ao que conhecemos hoje de processo
Psicoterapêutico. Para Pereira e Pereira Neto (2003) esta experiência foi à
parte significativa do processo de profissionalização da psicologia, visto que a
partir daí ficou estabelecido qual era o campo de atuação das práticas da área,
e que, diga-se de passagem, são utilizadas até hoje.
É também na década de 1930 que a psicologia consegue sua inserção
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no ensino superior passando a configurar como uma disciplina obrigatória
conhecida como “Psicologia Geral” nos cursos de Filosofia, Ciências,
Pedagogia e em matrizes curriculares dos cursos de licenciatura. Foi mais
precisamente em 1934 com a criação da Universidade de São Paulo, que
naquele momento transformou a antiga escola normal “Instituto de Educação
Caetano de Campos” em “Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP”
com o intuito de incorporar o Laboratório Educacional à “Cátedra de
Psicologia Educacional”, o que mostra que a Psicologia começou a ganhar
relevância na formação de outros profissionais (Lisboa & Barbosa, 2003).
Neste mesmo momento a psicologia começa a se desvincular das
aplicações médicas, iniciando seu desenvolvimento autônomo, passo este
importante para sua valorização (Pessotti, 1988). Além disso, a área passa a
ganhar força fora do estado de São Paulo, começando a se desenvolver também
em Universidades como a do Brasil, no Rio de Janeiro, a Católica e a Federal
de Minas Gerais, e a Federal do Rio Grande do Sul (Lisboa & Barbosa, 2003).
Logo no final da década de 30, mais precisamente no ano de 1939, a
psicologia no Rio de Janeiro passa a se fortalecer ganhando duas cátedras
importantes, fato este que só foi possível após a retomada e incorporação do
Laboratório do Engenho de Psicopatas pela Universidade do Brasil no Rio de
Janeiro, em 1937, e que ficaram conhecidas como Cátedra da Psicologia Geral
tanto no departamento de Filosofia, Psicologia Educacional, como no
departamento de Pedagogia e Psicologia Aplicada da Escola Nacional de
Educação Física e Desportos (Penna, 1992).
Para Pereira e Pereira Neto (2003), a década de 1930 contribuiu sem
dúvidas para a solidificação acadêmica da psicologia, repercutindo na década
de 40 através da institucionalização da formação do Psicólogo Brasileiro,
conforme Decreto-Lei nº 9.092 de 26 de Março de 1946 (Brasil, 1946), que
determinava que para obter o diploma de licenciado, os alunos do quarto ano
receberiam formação didática, teórica e prática, no ginásio de aplicação, e
seriam obrigados a fazer um curso de psicologia aplicada à educação, deixando
claro ainda que os que não estivessem dentro destas exigências receberiam
apenas o diploma de bacharel. Desta maneira, o psicólogo habilitado deveria
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frequentar os três primeiros anos de filosofia, biologia, fisiologia, antropologia
ou estatística e, em seguida, especializar-se em psicologia, para poder enfim
iniciar o exercício das atividades de psicólogo.
Assim sendo, a psicologia já era uma ciência presente na vida das
pessoas e o movimento para o estabelecimento e regulamentação da profissão
começou a aparecer através da proposta de anteprojeto de Lei nº 3.825, de
1958. Tal fato culminou no pedido do Conselho Nacional de Educação de
sugestões relativas para regulamentação da psicologia às entidades da área
acerca da profissão de Psicologistas, mas infelizmente a proposta não veio ser
aprovada pelo MEC, pois estava em jogo naquele momento uma disputa
coorporativa pela exclusividade da atividade clínica, disputa esta que separava
médicos e psicólogos (Esch & Vilela, 2001).
Apesar da tentativa frustrada de regulamentação da profissão, a
psicologia continuava a desenvolver força na esfera acadêmica, passando neste
mesmo período a ganhar seu primeiro curso autônomo, tanto no Rio de Janeiro
pela Universidade Católica em 1953, quanto, posteriormente, em São Paulo,
pela Universidade de São Paulo, em 1958. Este último regulamentado pela Lei
nº 3.862, de 28 de maio de 1957, que determinava a criação do curso de
Psicologia na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP (Penna, 1992).
Para Lisboa e Barbosa (2009), a presença marcante da Psicologia nas
outras profissões e agora sua independência acadêmica culminaram para que
na década de 1960 fosse estabelecida a regulamentação da prática e do ensino
da Psicologia no Brasil, fato este que foi amplamente amparado pela tão
conhecida Lei nº 4.119, de 27 de agosto de 1962, e pelo Parecer nº 403/62 que
fixava o currículo mínimo e a duração dos cursos de Psicologia passando a
abranger três níveis de seguimentos determinando um período para a formação
e o segmento, que são conhecidas até hoje como: bacharel (Pesquisador,
4anos), licenciatura (Professor, 4 anos) e formação do Psicólogo (5 anos).
Pessoti (1988) afirma que esta crescente inserção da Psicologia no ensino
superior a partir de 1934 até 1962 ficou conhecida como período universitário.
Dentre as principais motivações que levaram a regulamentação da
profissão, está a instalação do processo de industrialização, que acabou
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provocando uma sistematização na economia e na organização social do país,
exigindo assim, uma reorganização do contexto urbano, de maneira que,
passasse a proporcionar práticas de produção que fortalecessem a economia e
promovessem um autocontrole das ações sociais, assim sendo as práticas
científicas da psicologia proporcionava a avaliação das pessoas de acordo com
suas peculiaridades e contribuía para a mediação das relações entre elas (Luzio
& Ribeiro, 2006).
Outro ponto que chama a atenção é que este processo regulatório tornou
oportuna a abertura da era do programa de Stricto Sensu para a Psicologia,
proporcionando assim o início da sua primeira turma de mestrado em 1966 e
de doutorado em 1974 legitimando academicamente a profissão a lutar pelo
domínio de segmentos importantes do mercado de trabalho (Biaggio &
Grinder 1992).
Agora com a regulamentação da profissão e a institucionalização de um
currículo mínimo, a Psicologia acaba vivendo seu melhor momento entre os
anos 1960 a 1979 conforme afirma Bernardes (2004), pois se vê diante de um
enorme crescimento proporcionado pela grande abertura de cursos de
Psicologia nas redes de ensino privados, fruto da reforma universitária
proposta pela Lei nº 5.540 (1968), de 28 de novembro de 1968, com o objetivo
de conter a “Crise Universitária” que ficou conhecida no início da década de
60 por não proporcionar vagas para alunos que saiam do ensino médio e que
foi proposta pelos militares que haviam se instalado no governo e visava fixar
normas de organização e funcionamento do ensino superior e sua articulação
com a escola média.
Segundo Pereira e Pereira Neto (2003), este crescimento exponencial
levantou à questão da importância da demarcação do campo de atuação e a
necessidade de se obter o cadastro dos profissionais que já existiam ou que
trabalhassem com as vertentes psicológicas, o que veio acontecer com o
Decreto nº 53.464, de 21 de janeiro de 1964, que regulamenta a Lei nº 4.119,
de 27 de agosto de 1962, definindo assim a função do recém-profissional, a
saber:
Art. 4º - São funções do psicólogo: 1) Utilizar métodos e
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técnicas psicológicas com o objetivo de: a) diagnóstico
psicológico; b) orientação e seleção profissional; c)
orientação psicopedagógica; d) solução de problemas de
ajustamento. 2) Dirigir serviços de Psicologia em órgãos e
estabelecimentos públicos, autárquicos, paraestatais, de
economia mista e particulares. 3) Ensinar as cadeiras ou
disciplinas de Psicologia nos vários níveis de ensino,
observadas as demais exigências da legislação em vigor. 4)
Supervisionar profissionais e alunos em trabalhos teóricos
e práticos de Psicologia. 5) Assessorar, tecnicamente,
órgãos e estabelecimentos públicos, autárquicos,
paraestatais, de economia mista e particulares. 6) Realizar
perícias e emitir pareceres sobre a matéria de Psicologia
(Brasil, 1964).
A lei impactou diretamente a vida das pessoas que vinham atuando no
campo da psicologia, fato este, comprovado por Prado (2016), ao relatar que
ao lecionar Psicologia Geral na então antiga Faculdade de Ciências Humanas
e hoje Universidade Metodista de São Paulo, em São Bernardo, além de ser
licenciado em Filosofia, fazia pouco tempo que tinha feito bacharelado em
Psicologia e, mesmo antes da regulamentação, já trabalhava como Psicólogo
na área de Relações Industriais, em Seleção de Pessoas. Vale, no entanto,
destacar que a nova legislação garantiu a ele a continuidade de exercer sua
profissão como professor, mas não lhe garantiu o registro como Psicólogo
visto que para recebê-lo o profissional deveria ter no mínimo cinco anos de
exercício nesta função.
5.3 O período “profissional” (a partir de 1975) e o curso de Psicologia da
Metodista
Como Decreto nº 53.464, de 21 de janeiro de 1964 a representatividade
e atuação do trabalho do psicólogo em outros campos foram regulamentadas.
A psicologia passou a estar presente na clínica, na escola, no trabalho, na área
acadêmica e jurídica, o que acabou gerando conflitos e disputas com outras
atividades profissionais.
Pereira e Pereira Neto (2003) orientam que mesmo com a
regulamentação da profissão e com o cadastro dos profissionais era preciso
organizar-se como profissionais. Os autores relembram que este movimento
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começou a se estabelecer no I Encontro Nacional de Psicologia, realizado em
1971, no qual estavam representantes de todas as Associações de Psicologia
para discutirem a importância da criação dos Conselhos de Psicologia. Os
resultados deste encontro culminaram na Lei federal nº 5.766, de dezembro de
1971 que determinou a criação dos Conselhos Federais e Regionais com o
objetivo de orientar, disciplinar e fiscalizar os princípios da ética e o exercício
da profissão. Ainda segundo os autores, com essa diretriz regulamentada,
nasce em 1975 o código de ética que permeia as práticas profissionais do
psicólogo até hoje, vindo ser fixada, em 1977, pelo segundo conselho eleito,
tendo como premissa orientar e fiscalizar a profissão.
Além disso, com a criação do Conselho profissional, iniciou-se a
intervenção social da profissão, que colaborou no norteamento da maneira
como os profissionais formados iam ocupando o mercado de trabalho, a
clínica, de maneira que, ao mesmo tempo em que o Código de Ética
normatizava a conduta, oferecia garantia e valorização das práticas
profissionais, estabelecia um padrão de conduta profissional a ser observado
(Furtado, 2012).
Ainda no início da década de 1970 a psicologia no Brasil passa a
apresentar um forte crescimento no número de formados, apoiado pela
crescente e proliferada oferta do ensino privado (Pereira & Pereira Neto,
2003). Rocha Jr. (1996) alerta que o crescimento da rede privada de ensino
superior não se concentrava apenas na capital, mas se expandiu inclusive para
o interior do estado, por meio de cursos que em sua maioria, continuam em
funcionamento até hoje.
Neste período e aproveitando a grande tradição da já conhecida
Faculdade de Teologia da Igreja Metodista em São Bernardo do Campo,
consolidada desde 1938,e o advento da demanda vinda da população, nasce
em 01 de julho de 1971,através do Instituto Metodista de Ensino Superior, na
então Faculdade de Ciências Humanas e Letras, o curso de Psicologia da atual
Universidade Metodista do Estado de São Paulo. A autorização de
funcionamento do curso foi emitida por meio do Decreto nº 68.793, de 22 de
junho de 1971 (Brasil, 1971), sendo o curso reconhecido posteriormente pela
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Lei nº 74.259, de 08 de julho de 1974 (Brasil, 1974).
O curso de Psicologia da Universidade Metodista surge exatamente no
período assinalado por Pereira e Pereira Neto (2016) como profissional (após
1975). Sua trajetória histórica servirá para elucidar as implicações que o
processo de formação proporcionou durante o período em que a psicologia
vive a regulação da profissão, a criação de um currículo mínimo e a criação do
conselho profissional, condições essas que, segundo os autores, demonstram a
organização da profissão, sofrendo apenas as alterações socioeconômicas e
disputas interprofissionais.
Implantado sob o auxílio do professor convidado e reconhecido pela
sua atuação na indústria, Péricles de Oliveira Prado Filho1, o curso nasce com
a premissa de contribuir com a formação de profissionais “Humanistas” e
cidadãos críticos (Prado Filho, 2016). Ainda de acordo com o autor, o Instituto
Metodista do Ensino Superior, por meio da antiga Faculdade de Ciências
Humanas e Letras, teve uma contribuição histórica no desenvolvimento e na
expansão da psicologia no estado de São Paulo, pois até então, existiam apenas
três cursos de Psicologia em São Paulo, entre eles o da Universidade de São
Paulo – USP e os dois da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo –
PUC, um deles em funcionamento na Faculdade São Bento e outro no Sedes
Sapientiae, que já havia formado alunos Psicólogos e serviram de modelo para
a implantação do curso implantado por Prado Filho junto ao Instituto
Metodista de Ensino Superior.
Chaves (1992) alerta que o forte crescimento da oferta de cursos de
Psicologia naquele período produzia de maneira negativa, escolas com baixa
qualidade de ensino ou controle, ofertando assim uma formação insatisfatória
durante o primeiro período da década de 1970. Tal fato, também se apresenta
nos escritos de Prado Filho (2016) no qual relata que a principal crítica sofrida
nos primeiros anos do curso de psicologia oferecido pela Metodista, feita pelos
1 Psicólogo, Mestre em Psicologia Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e licenciado em Filosofia. Professor titular de psicologia social na Universidade Metodista de
São Paulo. Foi o primeiro coordenador do curso de psicologia e ocupou cargo de diretor, logo
após a consolidação do curso, sua atuação profissional compreende os anos de 1974 a 1997
(Prado, 2016).
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professores e alunos, se relaciona a falta de uma formação mais objetiva e
diretiva no desempenho prático e profissional do psicólogo, visto que sua
matriz curricular contemplava entre as disciplinas aquelas mais teóricas,
deixando a prática apenas no último período letivo. Ainda de acordo com o
autor, a crítica teve impacto positivo, pois impulsionou a Diretoria Geral para
uma proposta de melhoria do curso, o que acabou acontecendo após Péricles
de Oliveira Prado Filho assumir a coordenação do Departamento de
Psicologia, em 1974, momento em que redirecionou e ampliou, com ajuda dos
docentes, o currículo do curso, oferecendo aos alunos daquele período a
possibilidade de aplicar seus conhecimentos através de monitorias, auxílio ao
professor em sala de aula, sem o prejuízo de se construir uma sólida formação
humanista, valorizando atividades cada vez mais práticas, deixando assim o
currículo do curso amplamente estruturado também na formação profissional
do Psicólogo.
Em paralelo a essa situação, a elevada oferta proporcionada pelas
instituições de ensino daquele período também se apoiava na crescente procura
da classe média e alta, por serviços psicológicos, visto que a psicanálise e a
psicologia passavam a fazer parte do cotidiano da sociedade através das
revistas, jornais e programas de TV (Pereira & Pereira Neto, 2003).Assim
sendo, para os autores, a Psicologia passa a partir de 1975 pelo dilema de
qualquer começo de profissão ao se estabelecer no mercado: a crescente
procura pelo curso e a da necessidade de garantir seu poder, prestígio,
reconhecimento e autoridade em sua área de atuação, situação também relatada
por Bock (2010, p. 249- 250).
É nos anos 70 que muitos cursos vão surgir. São Paulo passa
a ter um grande número de cursos que colocam no mercado
um número enorme de profissionais. Sou o nº 2.771 no
Conselho Regional de Psicologia de São Paulo (CRP– 06),
inscrita em 1977. Como esse Conselho tinha, à época, mais
de 60% dos psicólogos inscritos no País, significa que não
éramos mais de 5 mil (aproveito para salientar que estamos
em meados dos anos 70, imagine em 1962, quando a Lei foi
promulgada!).
Segundo Prado (2016), o curso de Psicologia da Faculdade de Ciências
Humanas da Metodista foi responsável pela graduação da primeira turma da
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região do ABC Paulista. Tratava-se de um grupo heterogêneo, que possuía
alunos recém-chegados do colegial, senhores e senhoras idosas, alunos de
outras regiões de São Paulo, além de uma grande quantidade de alunos de
Santos, visto que nesta cidade não havia nenhum curso superior naquele
período. Eram também, conforme o autor, atraídos pelo nome da instituição,
“Metodista”, em virtude do respeito conquistado pelo já tradicional curso de
Teologia.
Já na década de 1980 tanto Bastos (2002) quanto Rocha Jr. (1996),
relatam que era um momento de certa calmaria e passividade, com ajustes
individuais de currículos sem muito tangenciamento regional ou nacional,
além de profissionais preocupados na produção de dados e informações sobre
o que acontecia na profissão e no processo de formação, o momento era,
segundo os autores, de fazer um diagnóstico acerca da profissão. Essas ações
foram acompanhadas de encontros e semanas de psicologia, que convidavam
os alunos e psicólogos a refletirem também sobre a construção da sua
identidade e seu campo de atuação, o que contribuiu e muito para a expansão
e entrada do psicólogo na saúde mental e comunitária, apoiados pela
necessidade de estágio dos alunos e dos anseios de movimentos sanitaristas
que caminhavam a passos largos (Bock, 2010).
Pensar nos caminhos que o psicólogo havia tomado levou o Conselho
Federal de Psicologia– CFP a fazer um diagnóstico de como se encontrava a
psicologia no país. Esses esforços culminaram na produção do livro intitulado
“Quem é o Psicólogo Brasileiro?” com objetivo de proporcionar um primeiro
diagnóstico da profissão e da formação (Bernardes, 2004).
O diagnóstico ressalta que entre 1985 a 1987 a profissão era composta
por 85% de mulheres, os psicólogos eram mal remunerados e que em parte
exerciam sua profissão em período parcial, trabalhando em paralelo a outras
atividades para complementar sua renda mensal. Os dados também revelaram
que os profissionais eram em sua maioria jovens, com73 a 90% deles na faixa
dos 20 a 30 anos. Estavam também concentrados nos centros urbanos, locais
estes onde se encontram os cursos de formação e uma maior proximidade com
o mercado de trabalho (Pereira& Pereira Neto, 2003). Ainda de acordo com os
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autores, a perda de autoridade e valorização profissional era evidente, visto
que os profissionais necessitavam de renda complementar e não conseguiam
manter-se apenas com o exercício das atividades da clínica.
Apesar do momento que a psicologia passava, voltada à reconstrução
de sua identidade, a década de 1980 presenciou um salto exponencial no
número de profissionais registrados no Conselho Federal de Psicologia,
passando de 5 mil membros na década de 1970 para 30 mil profissionais no
início da década de 1980. O crescimento, sem dúvida, foi favorecido pela forte
expansão dos cursos de psicologia em todo território nacional, principalmente
no sudeste e, posteriormente, de forma mais lenta, por todo o país (Bock,
2010). Após a pesquisa de 1987, realizada pelo CFP, o número de psicólogos
no país já ultrapassava a marca de 58 mil profissionais inscritos no final da
década de 80 (Rosas & Xavier, 1988).
Desta maneira, a década de 1990, diferente da década anterior, foi
marcada pela intensa necessidade de se discutir uma maneira de administrar e
coordenar a psicologia no Brasil, além de repensar o modelo de formação. Por
parte da classe de psicólogos notava-se, conforme Rocha Jr. (1996), o desejo
de uma redefinição do papel e funções do psicólogo no mercado profissional,
tanto nas instituições públicas quanto nas privadas. Esse desejo mobilizou no
início da década de 1990 a organização do “I Encontro de Coordenadores de
Curso de Formação de Psicólogos”, garantindo um importante documento
sobre a formação profissional do psicólogo brasileiro que ficou conhecido
como “Carta de Serra Negra”. Este documento apresentava sete princípios
norteadores de formação e dez sugestões de operacionalização destes
princípios elaboradas após encontro promovido pelo Conselho Fede