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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA SOCIEDADE DEPARTAMENTO DE DIREITO DE MACAÉ CURSO DE DIREITO ÂNGELA MEDEIROS RAMOS ADMINISTRAÇÃO CONSENSUAL E TERMO DE COMPROMISSO DE CESSAÇÃO APLICADO AO PROCESSO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR ANTITRUSTE MACAÉ 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA SOCIEDADE

DEPARTAMENTO DE DIREITO DE MACAÉ

CURSO DE DIREITO

ÂNGELA MEDEIROS RAMOS

ADMINISTRAÇÃO CONSENSUAL E TERMO DE COMPROMISSO DE

CESSAÇÃO APLICADO AO PROCESSO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR

ANTITRUSTE

MACAÉ

2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA SOCIEDADE

DEPARTAMENTO DE DIREITO DE MACAÉ

CURSO DE DIREITO

ÂNGELA MEDEIROS RAMOS

ADMINISTRAÇÃO CONSENSUAL E TERMO DE COMPROMISSO DE

CESSAÇÃO APLICADO AO PROCESSO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR

ANTITRUSTE

Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado como pré-

requisito para a obtenção do título de Bacharel em Direito

pela Universidade Federal Fluminense.

Orientador: Professor Dr. Camilo Plaisant Carneiro

MACAÉ

2018

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ÂNGELA MEDEIROS RAMOS

ADMINISTRAÇÃO CONSENSUAL E TERMO DE COMPROMISSO DE

CESSAÇÃO APLICADO AO PROCESSO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR

ANTITRUSTE

Projeto de Monografia apresentado no curso de Graduação

em Direito do Instituto de Ciências da Sociedade de

Macaé da Universidade Federal Fluminense como

requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel no

Curso de Direito.

Aprovado em ____ de _____________ de _____

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________ Orientador: Professor Doutor Camilo Plaisant Carneiro - UFF

__________________________________________________ Professor Doutor Saulo Bichara Mendonça - UFF

__________________________________________________

Professor Mestre Eduardo Castelo Branco e Silva - UFF

MACAÉ

2018

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O pensamento é o ensaio da ação.

Sigmund Freud

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente devo agradecimento aos meus pais que estiveram ao meu lado nessa empreitada, dando todo o suporte que eu poderia desejar, sempre me apoiando e motivando, com exemplos e palavras. Obrigado Elizabet e Antônio pela educação que me deram, e por me ensinarem muito ainda hoje.

Não podemos fazer nada verdadeiramente sozinhos, e é por isso que agradeço aos meus amigos, que tornaram mais alegre o desgastante caminho de concluir um bacharelado. Necessária uma menção especial à minha irmã que me acompanhou de perto nessa jornada e deu todo o apoio para que eu conseguisse terminá-la.

Não só pela atenção durante a realização deste trabalho, mas pelo carinho dado por toda a graduação, agradeço de coração ao Thiago Régis. Não sei como seria o percurso sem você.

Devo agradecer ao meu orientador e a todos os meus professores, da graduação e fora dela, pois me moldaram, cada um à sua maneira, fazendo a pessoa que sou hoje. Obrigada.

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RESUMO

Tema recentemente discutido no ramo do Direito Administrativo, a

Administração Pública consensual foi a escolha principal para a construção do

presente trabalho de conclusão de curso. A partir da análise de diversas obras que

tratam a respeito do novo modelo de atuação e os seus efeitos para o alcance dos

interesses públicos, nasceu o interesse de desenvolver o presente trabalho. O

trabalho analisa a evolução do Direito Administrativo, abordando as suas

características e prerrogativas, procurando demonstrar os mecanismos próprios do

Poder Público. Posteriormente, a atenção se voltará para o estudo do atual

modelo de Administração Pública, baseada na busca pela consensualidade com o

administrado. Por fim, aborda o processo administrativo sancionatório antitruste e

a possibilidade de atuação conjunta com o infrator por meio da celebração do

termo de compromisso de cessação. Como metodologia, analisa a bibliografia e a

legislação brasileira quanto ao Direito Econômico.

Palavras-chave: Administração Pública; Atuação consensual; Termo de Compromisso de Cessação.

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ABSTRACT

A subject recently discussed in the branch of Administrative Law, the Public

Administration consensual was the main choice for the construction of the present

work of conclusion of course. Based on the analysis of several works that deal with

the new model of action and its effects for the achievement of public interests, the

interest of developing this work was born. The paper analyzes the evolution of

Administrative Law, addressing its characteristics and prerogatives, trying to

demonstrate the mechanisms of the Public Power. Subsequently, the focus will be on

the study of the current model of Public Administration, based on the search for

consensuality with the administered. Finally, it addresses the administrative antitrust

sanctioning process and the possibility of joint action with the violator through the

conclusion of the termination commitment term. As methodology, it analyzes the

bibliography and the Brazilian legislation regarding Economic Law.

Keywords: Public Administration; Consensual performance; Termination Commitment Term.

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Sumário

INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 9

CAPÍTULO I - PRERROGATIVAS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E

IMPERATIVIDADE DA ATUAÇÃO ADMINISTRATIVA ........................................... 11

1.1 Prerrogativas inerentes a atuação da Administração Pública ........................ 11

1.2 Poderes afetos ao regime jurídico administrativo .................................................. 14

1.3 O ato administrativo ........................................................................................ 20

1.3.1 Os atributos do ato administrativo ................................................................... 21

1.3.2 A atuação imperativa ..................................................................................... 23

1.4 A Administração Pública sancionatória ............................................................ 24

CAPÍTULO II - ADMINISTRAÇÃO CONSENSUAL E TERMO DE AJUSTAMENTO

DE CONDUTA .......................................................................................................... 28

2.1 Democracia participativa ................................................................................. 29

2.2 Administração Pública Monológica e Administração Pública Dialógica ........... 30

2.3 A eficiência no modelo de administração consensual ...................................... 32

2.4 Pressupostos para uma atuação consensual ................................................... 35

2.5 Instrumentos de atuação consensual .............................................................. 36

2.6 Releitura dos princípios da Supremacia do Interesse Público e da

Indisponibilidade do Interesse Público ................................................................. 38

2.6.1 A dicotomia interesse público versus interesse privado ............................ 40

2.6.2 A desconstrução do princípio da supremacia do interesse público ............ 41

2.7 O Termo de Ajustamento de Conduta no Direito brasileiro ............................. 43

2.7.1 Natureza Jurídica ....................................................................................... 43

2.7.2 Características ........................................................................................... 44

CAPÍTULO III - TERMO DE COMPROMISSO DE CESSAÇÃO .............................. 48

3.1 Processo administrativo sancionador antitruste e a sua eficácia .................... 48

3.1.1 O controle judicial no processo administrativo antitruste ........................... 51

3.2 Análise do Termo de Compromisso de Cessação .......................................... 53

3.2.1 Breve histórico acerca da evolução dos termos de compromisso de

cessação no Brasil .............................................................................................. 53

3.2.2 Elementos para a celebração do Termo de Compromisso de Cessação . 54

3.2.3 Efeitos decorrentes da celebração de Termo de Compromisso de

Cessação ........................................................................................................... 56

3.3 Caso relevante ............................................................................................... 58

CONCLUSÃO ............................................................................................................. 60

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................... 62

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INTRODUÇÃO

A consensualidade na Administração Pública se mostra como um importante

instrumento no combate às burocracias inúteis e prejudiciais à eficiência

administrativa. Apesar de sua relevância, essa ferramenta não se encontra inserida

em todos os setores do Poder Público, existindo certa resistência em sua introdução

nas áreas de atuação imperativa e unilateral.

O modelo de atuação conjunta quando implementado apresenta resultados

satisfatórios no atendimento dos interesses públicos, mas, pode-se perceber que a

carência de vontade política no desenvolvimento desse modo de exercício

administrativo contrasta com o atendimento aos fins do Estado.

No desenvolvimento do trabalho foi possível notar que a participação do

administrado na produção dos atos administrativos que repercutirão em sua esfera

jurídica, reduz a probabilidade de levar a discussão sobre o tema ao Poder

Judiciário, ou seja, a aceitação por parte do particular é maior.

O atendimento aos princípios e demais valores constitucionais amparam e

justificam a ação administrativa consensual. Com isso, o novo modelo representa a

busca pela efetivação dos direitos fundamentais e dos ideais democráticos que

tornam a atuação legítima.

Ao buscar desenvolver o tema, pôde-se perceber a carência de produção

teórica sobre o assunto, principalmente no tocante ao Termo de Compromisso de

Cessação (TCC) aplicado pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica -

CADE. A escassez de obras a respeito da matéria pode decorrer tanto de sua

recente introdução no ordenamento jurídico brasileiro, como também da reduzida

aplicação prática. Apesar disso, é interessante notar que a execução desse

instrumento pelo Cade é crescente o que corrobora com o aperfeiçoamento

acadêmico a respeito do assunto.

O presente trabalho de conclusão de curso não pretende esgotar o tema

Administração Pública consensual, nem mesmo tratar sobre todas as formas de

atuação conjunta. Assim, não serão tratados dispositivos peculiares existentes nas

inúmeras normas que regulamentam a participação privada na formação da vontade

administrativa.

A metodologia do presente trabalho se concentrou em análise bibliográfica,

não sendo encontradas muitas obras que tratassem diretamente do tema. Seria ideal

a realização de uma ampla pesquisa de campo que analisasse os efetivos

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resultados da celebração do TCC pelo Cade. Ocorre que esse tipo de pesquisa, para

ter respaldo, precisa ser conduzida numa larga escala, feito impraticável por um

estudante de graduação.

Foram consultadas pesquisas realizadas em outros trabalhos acadêmicos,

bem como diversas obras de autores renomados que deram subsídio teórico para o

desenvolvimento do trabalho.

Durante este trabalho também são abordados processos administrativos

antitrustes no âmbito do Cade no qual se analisa os votos dos Conselheiros do

Tribunal Administrativo do Cade, bem como as suas fases e resultados.

A jurisprudência pátria também foi bastante utilizada para observar o

entendimento dos Tribunais Superiores a respeito da atuação administrativa

conjunta com o administrado, bem como os possíveis efeitos dos ajustes nas demais

esferas do Direito.

Questiona-se neste trabalho o modo como o ordenamento brasileiro regula a

atuação consensual, bem como os procedimentos para a celebração do Termo de

Compromisso de Cessação no processo administrativo sancionador antitruste e os

seus possíveis resultados no âmbito econômico e administrativo.

O primeiro capítulo faz uma apresentação do Direito Administrativo, tratando

sobre suas prerrogativas e peculiaridades, traçando um breve histórico a respeito de

sua evolução. O segundo capítulo pondera o modelo inicial de atuação com as

exigências atuais de consensualidade, trazendo os fundamentos teóricos para uma

atuação conjunta e abordado críticas doutrinárias do atual modelo, questionando

também se esse deve ser introduzido. O terceiro capítulo analisa o Termo de

Compromisso de Cessação no âmbito do Cade, abordando os seus requisitos e

efeitos práticos.

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CAPÍTULO I

PRERROGATIVAS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E IMPERATIVIDADE DA

ATUAÇÃO ADMINISTRATIVA

Considerando a singularidade do tema abordado pelo presente trabalho, é

fundamental para adequada compreensão do leitor uma explicação, ainda que

bastante breve, de alguns temas que permeiam a atuação consensual no âmbito da

Administração Pública.

1.1 Prerrogativas inerentes a atuação da Administração Pública

Inicialmente e, antes de começar a discorrer sobre as prerrogativas

inerentes à Administração Pública, é necessário esclarecer ao leitor a evolução do

Direito Administrativo. Em sua obra intitulada Direito Administrativo, Maria Sylvia

Zanella Di Pietro apresenta os principais marcos para a disciplina, ligando a

evolução do Direito Administrativo a própria concepção de Estado. Nesse sentido,

no final do século XVIII e início do século XIX, durante o Estado Liberal

abstencionista, o Direito Administrativo surgiu como um ramo autônomo do direito,

tendo como marco o famoso caso Blanco, ocorrido em 1873 que inaugurou a

responsabilidade civil do Estado em termos publicísticos. (DI PIETRO, 2014, p.

01.)

Após a II Guerra Mundial surgiu o Estado Social de Direito, marcado pela

forte intervenção do Estado na economia. Tal ingerência se deu, dentre outras

formas, através de mecanismos de consensuais de atuação, bem como por meio

da criação de entidades administrativas dotadas de personalidade jurídica de

direito privado, acarretando em uma aproximação entre o direito público e o direito

privado. No entanto, na visão de Rafael Carvalho Rezende Oliveira, esse

totalitarismo estatal ocasionou na burocratização e ineficiência na atuação do

Poder Público (OLIVEIRA, 2017, p. 11).

Assim, na busca por resultados, nasceu o Estado Democrático de Direito ou

Estado Subsidiário, que transferiu ao setor privado as atividades econômicas, bem

como os serviços públicos por meio da delegação. Com isso, a Administração

Pública, que antes era burocrática, transformou-se em uma Administração Pública

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gerencial, sendo marcada pela descentralização de suas atividades e mecanismos

de controle estatal. Logo, pode-se concluir que não se trata de um abstencionismo

do Estado conforme os moldes do Estado Liberal (OLIVEIRA, 2017. p. 12).

Feito esse breve histórico acerca da evolução do Direito Administrativo,

percebe-se que sua origem está ligada ao surgimento do Estado Liberal de Direito,

sendo este caracterizado pela proteção dos direitos individuais frente ao Estado.

Ocorre que apesar da proteção aos valores individuais, o Direito Administrativo é

marcado por prerrogativas inerentes ao poder de império da Administração

Pública, que objetivam garantir o atendimento ao interesse público.

Para compatibilizar esses aludidos direitos individuais com as prerrogativas

que colocam o Poder Público em posição de superioridade frente ao administrado,

vinculou-se a atuação da Administração Pública ao princípio da legalidade. Dessa

forma, apesar da aparente contradição entre a necessidade de assegurar os

direitos individuais e ao mesmo tempo o interesse público, os limites e as

prerrogativas da Administração Pública são harmônicos. Sobre o tema destaca-se:

Daí a bipolaridade do Direito Administrativo: liberdade do indivíduo e autoridade da Administração; restrições e prerrogativas. Para assegurar-se a liberdade, sujeita-se a Administração Pública à observância da lei e do direito (incluindo princípios e valores previstos explícita ou implicitamente na Constituição); é a aplicação, ao direito público, do princípio da legalidade. Para assegurar-se a autoridade da Administração Pública, necessária à consecução de seus fins, são-lhe outorgados prerrogativas e privilégios que lhe permitem assegurar a supremacia do interesse público sobre o particular

(DI PIETRO, 2014, p. 62).

Ainda nesse aspecto a aludida autora menciona em sua obra diversos

exemplos de prerrogativas ou privilégios da Administração Pública, dentre eles

encontram-se a autoexecutoriedade de seus atos, a autotutela, a possibilidade de

intervenção do Estado na propriedade privada, as cláusulas exorbitantes nos

contratos administrativos, o regime de execução de decisões transitadas em

julgado, os prazos processuais contados em dobro, a presunção de veracidade de

seus atos e outros (DI PIETRO, 2014, p. 62).

Assim, o regime jurídico administrativo, em sua busca pelo interesse

público, confere prerrogativas e sujeições ao Poder Público que se manifestam na

forma de princípios, poderes e regras. As prerrogativas públicas possuem como

características a exorbitância, bem como da instrumentalidade para o alcance dos

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fins do Estado. A exorbitância é a supremacia da Administração frente ao

particular, a instrumentalidade por sua vez é um meio para atingir o interesse

coletivo.

Nesse sentido, o autor Celso Antônio Bandeira de Mello entende que o

regime administrativo possui duas “pedras de toque”, o princípio da supremacia do

interesse público e o princípio da indisponibilidade do interesse público. A respeito

do interesse público esclarece que não se trata de uma oposição ao direito

privado, mas sim a soma de tais interesses para formar um interesse coletivo.

(MELLO, 2006, p. 60)

A supremacia do interesse público é entendida pelo autor como uma

posição privilegiada da Administração Pública nas relações com os particulares,

impondo restrições ou sujeições especiais, bem como garantindo benefícios ao

Poder Público. Essa superioridade que possibilita a criação de condições por atos

unilaterais emanados pela entidade administrativa é um instrumento para

assegurar o interesse público primário – interesse da coletividade como um todo.

(MELLO, 2006, p. 70-73)

Em relação à indisponibilidade do interesse público, entende-se que sendo

tais interesses próprios da coletividade não é cabível a sua disposição pelo

administrador que apenas o representa. Em razão disso, o sistema jurídico

desenvolveu diversos mecanismos para inibir as condutas da Administração

Pública que possam confrontar o interesse coletivo.

O princípio da legalidade é um instrumento que subordina a atividade

administrativa à lei, limitando a discricionariedade do administrador público em

suas escolhas e, com isso, preservando o interesse da coletividade. Assim, de

forma diversa ao aplicado no direito privado, a legalidade no direito administrativo

não é apenas a ausência de oposição à lei, mas uma condição a sua atuação. No

mais, o Pós-positivismo inaugurou um sistema jurídico baseado no respeito aos

princípios constitucionais e na efetivação dos direitos fundamentais, influenciando

no surgimento do princípio da juridicidade, pelo qual o administrador está

submisso à lei e ao Direito (OLIVEIRA, 2017, 37).

Não obstante, é possível destacar o princípio da publicidade, previsto de

forma explícita no texto constitucional, que cria o dever de ampla divulgação por

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parte da Administração Pública de seus atos, salvo os classificados como sigilosos

(DI PIETRO, 2014, p. 72.). O princípio da razoabilidade e da proporcionalidade

também é considerado um limite a atuação administrativa, nesse sentido, destaca-

se o entendimento de Diogo de Figueiredo Moreira Neto:

A razoabilidade, agindo como um limite à discrição na avaliação dos motivos, exige que sejam eles adequáveis,compatíveis e proporcionais, de modo a que o ato atenda a sua finalidade pública específica; agindo também como um limite à discrição na escolha do objeto, exige que ele se conforme fielmente à finalidade e contribua eficientemente para que ela seja atingida (1989, 37-40).

Além desses princípios que condicionam os atos da Administração Pública,

deve-se ressaltar o princípio da segurança jurídica, que em razão da sua

amplitude, inclui na sua concepção a confiança legítima e a boa-fé. Por esse

princípio as entidades administrativas pautam suas ações de acordo com a

lealdade, sem surpreender os administrados ou ferir os seus direitos subjetivos.

Nesses termos, entende-se que a segurança jurídica possui um caráter amplo,

que protege os particulares das arbitrariedades praticadas pela Administração

Pública. (OLIVEIRA, 2017, p.55)

Assim, conclui-se que a atuação do Estado é pautada por prerrogativas

indispensáveis para alcançar os fins a que se destina, legitimando a existência de

mecanismos que o colocam em uma posição de supremacia em relação aos

particulares. Todavia, o ordenamento jurídico limitou a discricionariedade nos atos

a serem praticados pelo administrador público ao estabelecer os princípios e

regras de necessária observância.

1.2 Poderes afetos ao regime jurídico administrativo

Os poderes próprios a atuação da Administração Pública são instrumentos

fundamentais para assegurar que não prevaleça o interesse individual em face do

interesse coletivo. Ou seja, trata-se de prerrogativas a serem utilizadas para

alcançar o fim previsto em lei. Nesse sentido, José dos Santos Carvalho Filho:

Pode-se, pois, conceituar os poderes administrativos como o conjunto de prerrogativas de direito público que a ordem jurídica confere aos agentes administrativos para o fim de permitir que o Estado alcance seus fins

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(CARVALHO FILHO, 2016, p 53).

Na visão de Maria Sylvia Zanella Di Pietro os poderes que baseiam a

atividade administrativa não são faculdades a serem exercidas de forma

discricionária pelo administrador público, uma vez que proporcionam benefícios

para toda a coletividade, sendo considerado um poder-dever irrenunciável. (2014,

p. 90)

Em relação às modalidades de poderes administrativos desenvolvidos pelos

autores, é necessário esclarecer que não há consenso no campo doutrinário.

Parte da doutrina pátria defende que a discricionariedade é considerada uma

espécie de poder, nesse sentido o autor José dos Santos Carvalho Filho. Para o

mencionado autor a possibilidade de valoração da conduta conforme a

conveniência e oportunidade diante da ausência de previsão legal expressa é uma

prerrogativa administrativa, que será legítima se estiver de acordo com os fins

legais (2016, p. 53).

De outro modo, Maria Sylvia Zanella Di Pietro elege como poderes

administrativos apenas o poder normativo, disciplinar, hierárquico e o de polícia.

Em relação ao poder discricionário defende:

Quanto aos chamados poder discricionário e vinculado, não existem como poderes autônomos; a discricionariedade e a vinculação são, quando muito, atributos de outros poderes ou competências da Administração. O chamado "poder vinculado'', na realidade, não encerra "prerrogativa" do Poder Público, mas, ao contrário, dá ideia de restrição, pois, quando se diz que determinada atribuição da Administração é vinculada, quer-se significa que está sujeita à lei em praticamente todos os aspectos. O legislador, nessa hipótese, preestabelece todos os requisitos do ato, de tal forma que, estando eles presentes, não cabe à autoridade administrativa senão editá-lo, sem apreciação de aspectos concernentes à oportunidade, conveniência, interesse público, equidade. Esses

aspectos foram previamente valorados pelo legislador (DI PIETRO, 2014, p 91).

O poder normativo é o comando emanado pela Administração Pública que

possui caráter geral e abstrato, distinguindo-se dos atos administrativos que

objetivam efeitos concretos. A sua manifestação ocorre por meio de resolução,

deliberação, instrução e regulamento.

Os regulamentos são tratados por José dos Santos Carvalho Filho como

um poder administrativo autônomo, chamado de Poder Regulamentar. Em sua

obra Manual de Direito Administrativo conceitua este poder como uma prerrogativa

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conferida à Administração Pública de editar atos gerais para complementar as leis

e permitir a sua efetiva aplicação. (CARVALHO FILHO, 2016, p.59)

Vale diferenciar, neste momento, regulamento executivo e regulamento

autônomo. O primeiro é um instrumento utilizado para complementar a lei, decorre

da impossibilidade do legislador prever todas as especificações indispensáveis na

norma. Nesses termos, o regulamento executivo é limitado à própria lei que

permite a sua existência, não podendo criar direitos ou obrigações. A Constituição

Federal prevê a sua existência de forma expressa:

Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: (...) IV - sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução (PLANALTO, 1988).

O regulamento autônomo não objetiva complementar a lei, mas sim inovar

no ordenamento jurídico pátrio, criando direitos e obrigações sem o devido

processo legislativo. Em regra, não é admitida essa espécie de regulamento no

Brasil, no entanto, há algumas ressalvas previstas no texto constitucional. Dentre

as exceções é importante citar o artigo 84, VI, a da CF/88.

Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: (...) VI – dispor, mediante decreto, sobre: a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos (PLANALTO, 1988).

A respeito do dispositivo acima transcrito é interessante destacar que

decorre de uma alteração legislativa que excepcionou o princípio da legalidade,

uma vez que autorizou o Chefe do Poder executivo a deliberar através de decreto

a respeito da organização e funcionamento da Administração Pública.

Além dessa ressalva, destacam-se as emendas constitucionais 8/95 e 9/95

que possibilitaram a criação da Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL)

e da Agência Nacional do Petróleo (ANP), dotadas de função normativa em seu

setor de atuação, conforme os limites legais. (DI PIETRO, 2014, p. 94)

Ainda sobre o tema, ressalta-se recente decisão do STF:

Ementa: EMENTAS: 1. INCONSTITUCIONALIDADE. Ação direta. Objeto. Admissibilidade. Impugnação de decreto autônomo, que institui benefícios fiscais. Caráter não meramente regulamentar. Introdução de novidade normativa. Preliminar repelida. Precedentes. Decreto que, não se limitando

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a regulamentar lei, institua benefício fiscal ou introduza outra novidade normativa, reputa-se autônomo e, como tal, é suscetível de controle concentrado de constitucionalidade. 2. INCONSTITUCIONALIDADE. Ação direta. Decreto nº 27.427 /00, do Estado do Rio de Janeiro. Tributo. Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS. Benefícios fiscais. Redução de alíquota e concessão de crédito presumido, por Estado-membro, mediante decreto. Inexistência de suporte em convênio celebrado no âmbito do CONFAZ, nos termos da LC 24 /75. Expressão da chamada “guerra fiscal”. Inadmissibilidade. Ofensa aos arts. 150 , § 6º , 152 e 155 , § 2º , inc. XII , letra “g”, da CF . Ação julgada procedente. Precedentes. Não pode o Estado-membro conceder isenção, incentivo ou benefício fiscal, relativos ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS, de modo unilateral, mediante decreto ou outro ato normativo, sem prévia celebração de convênio intergovernamental no âmbito do CONFAZ.

(ADI 3664, Relator(a): Min. CEZAR PELUSO, Tribunal Pleno, julgado em 01/06/2011, DJe-181 DIVULG 20-09-2011 PUBLIC 21-09-2011 EMENT VOL-02591-01 PP-00017 RTJ VOL-00219-01 PP-00187).

O poder disciplinar é a prerrogativa da Administração Pública de apurar

infrações e aplicar penalidades àqueles que com ela possuem vínculo específico.

Dessa forma, distingue-se do poder de polícia, dado que este, como será

abordado, possui um caráter geral e é aplicável a todos os particulares.

Ainda sobre o tema, o entendimento doutrinário firma-se no sentido de que

tal poder possui como característica a discricionariedade. No entanto, não se trata

de uma liberdade ampla do administrador público, devendo-se observar os limites

legais. Segundo Maria Silva Zanella Di Pietro a discricionariedade está ligada às

hipóteses normativas abertas, que possibilitam à Administração Pública tipificar a

conduta nos preceitos legais conforme as peculiaridades do caso concreto, não

sendo discricionária a apuração ou a aplicação da pena. (DI PIETRO, 2014, p. 96)

Além disso, o caráter axiológico da Constituição Federal exige que a

interpretação dos demais preceitos do ordenamento jurídico seja realizada

conforme os seus valores, assim, o processo administrativo deve assegurar a

ampla defesa e o contraditório. Ou seja, o devido processo legal também deverá

ser respeitado na seara administrativa, produzindo um resultado justo e legítimo. A

lei federal 9.784/99 dispôs de forma expressa em seu artigo 2° a respeito dos

princípios acima indicados.

Art. 2o A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência (PLANALTO, 1999).

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Em relação ao poder hierárquico a doutrina apresenta duas características

fundamentais, a subordinação e a coordenação. Tais atributos relacionam-se com

a possibilidade de rever os atos praticados por aqueles que ocupam posições

inferiores no escalonamento hierárquico, bem como de dirigir a atividade

administrativa.

Ademais, existem prerrogativas que são próprias a essa espécie de poder,

dentre elas pode-se mencionar a de criar atos normativos internos, a de dar

ordens, de controlar, aplicar sanções, bem como a de delegar atribuições (DI

PIETRO, 2014, p.97).

A hierarquia é inerente à organização da Administração Pública, não

estando presente quando se tratar de pessoas jurídicas diversas. Dessa forma, a

criação pelo Poder Público de uma nova entidade administrativa que integre a

Administração Pública Indireta não autorizará o exercício do controle hierárquico

sobre os atos dessa última, uma vez que se trata de uma nova pessoa jurídica.

Apesar disso, a doutrina entende ser cabível o exercício do controle

hierárquico impróprio entre pessoas jurídicas distintas mediante expressa

autorização legal. No mais, em caso de ausência de dispositivo nesse sentido, é

admitido o controle ou vinculação por parte do ente político que criou a entidade,

tendo o objetivo de analisar se os atos praticados por ela estão de acordo com os

motivos que legitimaram a sua criação.

Portanto, a autonomia presente nas entidades da Administração Indireta em

relação ao ente federado que a criou impede uma relação de subordinação, no

entanto não impossibilita a vinculação aos seus fins, nos termos previsto na lei

que a instituiu. (OLIVEIRA, 2017, p. 284)

Por fim, é de suma importância evidenciar o poder de polícia, uma vez que

possui um papel relevante para a atuação consensual no âmbito da Administração

Pública. Nesse contexto pode conceituá-lo como “a competência para disciplinar o

exercício da autonomia privada para a realização de direitos fundamentais e da

democracia, segundo os princípios da legalidade e da proporcionalidade”

(JUSTEN FILHO, 2014, p. 585).

Ainda sobre o tema, destaca-se o dispositivo presente no Código Tributário

Nacional:

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Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos. Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder (PLANALTO, 1966)

Dessa maneira, o poder de polícia condiciona e restringe os direitos dos

particulares com o objetivo de atender o interesse público, devendo ser exercido

nos limites legais previamente estipulados. No mais, de modo diverso do poder

disciplinar o poder de polícia atua com de acordo com uma supremacia geral, pois

independe de prévio vínculo com a Administração Pública.

O poder de polícia pode se manifestar tanto na forma de dever de

abstenção como em uma obrigação de atuação, em ambos os aspectos, para que

tenha efetividade, possuirá as três características apontadas pela doutrina. A

primeira é a discricionariedade, em regra, cabe ao administrador escolher o

momento de atuação ou a sanção a ser aplicada no caso concreto, a segunda

característica é a coercibilidade que está presente na maioria dos atos de polícia.

Já o terceiro atributo é a autoexecutoriedade, sendo a prerrogativa conferida à

Administração Pública para implementar os seus atos sem necessidade de

interferência do Poder Judiciário. (OLIVEIRA, 2017, p. 272-273)

O exercício do poder de polícia ocorre em quatro fases, a primeira é a

ordem, ou seja, a norma que condiciona o exercício das atividades privadas. Após

se inicia a fase de consentimento por meio da qual a Administração Pública anui

ou não o pleito do administrado, podendo essa manifestação ser vinculada ou

discricionária. A terceira fase é a fiscalização, preventiva ou repressiva, através

dessa o ente público verifica o descumprimento da ordem ou do consentimento de

polícia. Por fim, a sanção, sendo a última fase do ciclo de polícia, na qual ocorrerá

a aplicação da medida coercitiva.

Em relação à sanção, o Estado Democrático de Direito impõe a observância

ao devido processo legal, aplicando-se os princípios da ampla defesa e do

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contraditório. O autor Marçal Justen Filho defende em seu livro Curso de Direito

Administrativo que a sanção deverá respeitar os princípios da legalidade,

legitimidade, culpabilidade, bem como o princípio da tipicidade, apesar deste

último ser objeto de controvérsia doutrinária (2014, p. 607-608).

Em sua obra Poder de Polícia Ordenação Regulação, Gustavo Binenbojm

defende que os órgãos e entidades administrativos são dotados de melhores

capacidades institucionais do que os corpos legislativos para o detalhamento das

infrações administrativas em cada setor sujeito à ordenação. Por isso, enquanto no

direito penal incide a regra da legalidade estrita, no direito administrativo

sancionador a legalidade pode apresentar-se como fundamento e balizamento

para a tipificação das condutas em regulamentos administrativos (2016, p. 107).

Feitas as elucidações a respeito dos poderes administrativos que

verticalizam as relações com a Administração Pública, torna-se possível, a partir

de agora, tratar acerca dos atos administrativos que exteriorizam a vontade do

Poder Público, evidenciando a sua supremacia.

1.3 O ato administrativo

Primeiramente é importante entender que não há consenso doutrinário a

respeito do conceito de ato administrativo. O entendimento desenvolvido por José

dos Santos Carvalho Filho define o ato administrativo como a exteriorização da

vontade de agentes da Administração Pública ou de seus delegatários, nessa

condição, que sob o regime de direito público, vise à produção de efeitos jurídicos,

com o fim de atender o interesse público (CARVALHO FILHO, 2016, p. 105).

Assim, é possível distingui-los dos atos da administração, uma vez que

esses últimos representam quaisquer atos emanados pelos órgãos que integram a

administração em qualquer dos Poderes. Ou seja, apesar de abranger qualquer

ato em sentido amplo, há uma restrição em relação ao agente, pois,

diferentemente dos atos administrativos, os atos da administração não são

exteriorizados por pessoas jurídicas de direito privado delegatárias do Poder

Público.

No mesmo sentido, é interessante mencionar o conceito apresentado por

Maria Sylva Di Pietro:

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pode-se definir o ato administrativo como a declaração do Estado ou de quem o represente, que produz efeitos jurídicos imediatos, com observância da lei, sob regime jurídico de direito público e sujeita a controle pelo Poder

Judiciário (2014, p. 205).

Ainda sobre o tema, de forma diversa do direito privado, a omissão da

Administração Pública não importará como um consentimento tácito. O silêncio

não é uma forma de exteriorização do ato administrativo, dessa forma, eventuais

efeitos materiais ocorrerão em razão de um fato administrativo.

Para sanar a irregularidade que decorre da ausência de manifestação o

interessado poderá recorrer à via judicial, pleiteando uma tutela mandamental que

ordenará à Administração Pública ou aos seus delegatários a produção de um ato

administrativo, cumprindo o seu poder-dever de agir, sob pena de sofrer as

medidas coercitivas decorrentes da desobediência (CARVALHO FILHO, 2016,

p.108).

1.3.1 Os atributos do ato administrativo

O ato administrativo é uma espécie de ato jurídico sujeito ao regime jurídico

de direito público, dessa maneira possui características específicas que o

distingue do ato regulamentado pelo direito privado. Tais atributos são essenciais

para o cumprimento dos fins que lhe são legalmente estabelecidos, sendo

indispensáveis para uma atuação efetiva em prol da coletividade.

Apesar de inexistir consenso doutrinário a maior parte dos autores elege a

presunção de legitimidade e veracidade, a autoexecutoriedade e a imperatividade

como atributos próprios dos atos administrativos.

A presunção de legitimidade e veracidade não são expressões sinônimas, é

possível traçar uma distinção entre tais prerrogativas. A primeira é a presunção de

que os atos administrativos surgiram de acordo com a lei, trata-se de uma

presunção relativa, ou seja, é possível prova em contrário. A segunda, presunção

de veracidade, é aquela por meio da qual se presumem verdadeiros os fatos

alegados pela Administração.

Algumas justificativas são apresentadas pela doutrina para atribuir tais

características aos atos administrativos, ressalta-se o rol contido na obra de Maria

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Sylvia Di Pietro:

1. o procedimento e as formalidades que precedem a sua edição, os quais constituem garantia de observância da lei; 2 .o fato de ser uma das formas d e expressão da soberania do Estado, de modo que a autoridade que pratica o ato o faz com o consentimento de todos ; 3 . a necessidade de assegurar celeridade n o cumprimento d o s atos administrativos, já que eles têm por fim atender ao interesse público, predominante sobre o particular; 4. o controle a que se sujeita o ato, quer pela própria Administração, quer pelos demais Poderes do Estado, sempre com a finalidade de garantir a legalidade; 5 . a sujeição d a Administração a o princípio da legalidade, o que faz presumir que todos os seus atos tenham sido praticados de conformidade com a lei, já que cabe ao poder público a

sua tutela (2014, p. .207)

Já a autoexecutoriedade é considerada o atributo mais relevante, uma vez

que se traduz na possibilidade de execução imediata do ato pela Administração

Pública, independendo de quaisquer providências a serem tomadas pelo Poder

Judiciário. Assim, garante a rapidez e a eficiência na prática de seus atos,

satisfazendo o interesse público.

Conforme analisado de forma breve anteriormente, a autoexecutoriedade

está presente no exercício do poder de polícia. A respeito desse atributo, destaca-

se o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

Um dos atributos do poder de polícia é a autoxecutoriedade. Isso significa que a Administração Pública pode, com os seus próprios meios, executar seus atos e decisões, sem precisar de prévia autorização judicial. A Administração, contudo, pode, em vez de executar o próprio ato, ingressar com ação judicial pedindo que o Poder Judiciário determine essa providência ao particular. Ex: diante de uma irregularidade grave, a Administração Pública poderia, em tese, interditar o estabelecimento. Se ela, em vez de executar esta ordem diretamente, ajuíza ação pedindo que o Poder Judiciário determine essa providência, tal ação não pode ser julgada extinta por falta de interesse de agir. A autoexecutoriedade não retira da Administração Pública a possibilidade de valer-se de decisão judicial que lhe assegure a providência fática que almeja, pois nem sempre as medidas tomadas pelo Poder Público no exercício do poder de polícia são suficientes. STJ. 2ª Turma. REsp 1651622/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 28/03/2017.

Para que o Poder Público execute seus atos pelos próprios meios é preciso

que a autoexecutoriedade esteja expressamente prevista no texto legal, ou seja, é

necessário que uma norma autorizante. Não obstante, também se admite a

execução imediata dos atos administrativos na hipótese de extrema urgência, em

que demora agrave ainda mais o prejuízo ao interesse público.

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Ainda sobre o tema, Maria Sylvia Di Pietro entende que apesar da dispensa

preliminar do controle jurisdicional, é possível a tutela judicial em momento

posterior, podendo incidir na responsabilidade objetiva do Estado por ato de seus

agentes (2014, p. 206). Ademais, a discussão a respeito das medidas executivas

utilizadas poderá ocorrer pela via judicial ou administrativa.

Ocorre que, essa particularidade não se encontra presente em todos os

atos administrativos, nos casos em que houver apenas a exigibilidade a

Administração Pública deverá recorrer ao Poder Judiciário para satisfazer o seu

direito, podendo fazer o uso apenas dos meios de coerção indireta, a exemplo a

aplicação de multa.

Há ainda a imperatividade, característica que em razão da sua relevância

para o assunto tratado nesse trabalho será analisada em tópico específico.

1.3.2 A atuação imperativa

A imperatividade ou coercibilidade é a prerrogativa presente nos atos

administrativos que possibilita a sua imposição aos particulares, independendo do

consentimento desses. Nesse contexto, os atos unilaterais da Administração

Pública atingirão a esfera jurídica alheia independentemente da anuência dos

administrados. Nesse sentido, o autor Celso Antônio Bandeira de Mello leciona:

Imperatividade - é a qualidade pela qual os atos administrativos se impõem a terceiros, independentemente de sua concordância. Decorre do que Renato Alessi chama de "poder extroverso", que permite ao Poder Público editar provimentos que vão além da esfera jurídica do sujeito emitente, ou seja, que interferem na esfera jurídica de outras pessoas, constituindo-as unilateralmente em obrigações (MELLO, 2006, p. 427).

Assim, a doutrina entende que a imperatividade é o poder que a

Administração possui de exigir o cumprimento do ato, não podendo o administrado

recusar-se a obedecer à ordem contida no ato administrativo quando este esteja

de acordo com a lei (CARVALHO FILHO, 2016, p. 126).

Tal atributo se justifica, assim como as demais prerrogativas, em razão do

interesse público, que deve sobrepor ao particular. A sua presença não está

restrita aos atos administrativos, podendo ser observada também nas cláusulas

exorbitantes existentes contratos administrativos.

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Dessa forma, as cláusulas exorbitantes marcam o desequilíbrio presente

nos contratos administrativos regidos pelo regime de direito público. Isto ocorre

porque o interesse público é mutável, exigindo a presença de instrumentos que

assegurem a sua satisfação. Com isso, as tais cláusulas próprias dos contratos

administrativos são impostas aos contratados, fazendo com que adéqüem a

execução do ajuste aos termos fixados.

Ademais, a imperatividade não é atributo inerente a todos os atos

administrativos, pois somente será encontrada naqueles que criarem uma

obrigação aos particulares, ou seja, que tenham um caráter coercitivo. As

manifestações da Administração Pública que dependam de prévia solicitação ou

consentimento do administrado não conterão essa característica.

Conforme demonstrado, a prerrogativa da imperatividade nas decisões

administrativas se encontra tanto nos atos administrativos como nos contratos

administrativos, possuindo um viés autoritário e unilateral.

Ocorre que o modelo moderno de atividade administrativa está pautado na

consensualidade, na busca de mecanismos de atuação conjunta com os

particulares, resultando em uma maior eficiência em seu objetivo primário.

Temos, portanto, um choque entre o sistema de ação autoritária e

unilateral, e um sistema de atuação conjunta com os particulares. Essa evolução

que ocorreu no Direito Administrativo aproximou o Poder Público e os

administrados, o que tornou as atividades daquele dotadas de maior legitimidade e

exequibilidade. O tema consensualidade na Administração Pública será melhor

desenvolvido no próximo capítulo.

1.4 A Administração Pública sancionatória

Para se entender melhor a proposta do presente trabalho de conclusão de

curso, que irá abordar a Administração Consensual e o Termo de Ajustamento de

Conduta, necessário se faz discorrer, brevemente, acerca da sanção aplicável no

âmbito da Administração Pública.

Anteriormente ao tratar a respeito do poder de polícia, comentou-se de

forma breve o tema Direito Administrativo sancionador. Nesse momento o assunto

será abordado com enfoque na atuação imperativa da Administração Pública,

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abordando também a regulação econômica.

A regulação é a forma de intervenção do Estado na economia por meio da

qual condiciona, coordena e disciplina a atividade privada, tendo o poder-dever de

fiscalizar e sancionar os particulares que não observarem os comandos. O

ordenamento jurídico pátrio utiliza esse modelo de ingerência estatal para evitar as

falhas de mercado, bem como para garantir e proteger os direitos fundamentais.

(OLIVEIRA, 2017, p. 535)

Conforme já apresentado a sanção é uma fase do ciclo do poder de polícia,

mas também é possível encontrá-la na regulação econômica. Nesse sentido, parte

da doutrina defende que a regulação é uma parcela do poder de polícia que além

de independer de comando normativo expresso, desenvolve-se de acordo com as

características do mercado regulado, sendo, dessa forma, considerada mais

flexível e eficiente. (BINENBOJM, 2016, p. 161)

Em regra, a regulação é exercida através das agências reguladoras que

são autarquias submetidas a um regime jurídico especial, dotadas de maior

autonomia. Não obstante, as agências reguladoras possuem poder normativo,

administrativos e judicantes no setor regulado, podendo executar e criar atos

normativos, bem como resolver os conflitos existentes naquele meio.

Acerca do poder normativo no âmbito das agências reguladoras é

interessante ressaltar que não há consenso doutrinário no tocante a sua

constitucionalidade. Isso ocorre porque diversos autores entendem que a

atribuição de editar normas abstratas e genéricas exorbita a competência da

Administração Pública, sendo uma função típica do Poder Legislativo, que

somente seria excepcionada pela Constituição Federal.

Assim, sob este prisma, Celso Antônio Bandeira de Mello defende que a

Constituição Federal limitou a atuação do administrador público em diversas

passagens, condicionando o exercício de suas atribuições à prévia autorização

legislativa, mencione-se como exemplo os artigos 5°, II e 84, IV da Carta Magna.

(MELLO, 2006, p. 353-354)

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)

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II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: (...) IV - sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução; (PLANALTO, 1988).

Nesse sentido, a doutrina majoritária defende que o poder de editar normas

gerais e abstratas atribuído às agências reguladoras deverá respeitar o princípio

da legalidade, não podendo ultrapassar os limites definidos na lei que delegou a

competência normativa. Desse modo, como forma de reduzir a discricionariedade,

tais autarquias deverão editar normas de caráter técnico para o setor regulado,

devendo observar os parâmetros estabelecidos previamente pelo legislador.

Além da possibilidade de criar normas que determinem condutas a serem

executadas pelos particulares, as agências reguladoras poderão estabelecer

sanções como forma de coerção para o adimplemento dos seus comandos.

Assim, independentemente de previsão legislativa, poderá a autarquia expedir

normas de comando e de controle por meio de regulamento administrativo dotado

de força normativa. Destaca-se o entendimento de Gustavo Binenbojm.

É possível, portanto, que normas que tipificam infrações administrativas e cominam sanções punitivas sejam veiculadas em regulamentos administrativos, desde que haja parâmetros mínimos de organização institucional e procedimental previstos na lei. Essas diretrizes se aplicam às inteiras às funções normativas atribuídas a agências reguladoras setoriais, cujo lastro de legitimidade está associado à sua especialização técnica nas matérias de sua competência. A preocupação garantista ínsita à reserva legal é assegurada não apenas pela exigência de tratamento suficiente da matéria pelo legislador, mas na maior capacidade institucional do ente regulador para delinear com precisão as condutas proscritas e oferecer, com isso, maior segurança jurídica aos agentes econômicos (2016, p. 165).

No mais, os Tribunais Superiores admitem o uso de meios de coerção

indiretos criados por regulamentos, a exemplo ressaltam-se as multas aplicadas

por agências reguladoras no âmbito do setor econômico ou de serviços públicos

regulado.

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. MULTA ADMINISTRATIVA APLICADA PELA ANAC. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. LEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO DE SANTA CATARINA. CONVÊNIO ADMINISTRATIVO ENTRE MUNICÍPIO DE CHAPECÓ E AERÓDROMO. 1. A análise que enseja a responsabilidade do Estado de Santa Catarina sobre a administração do aeródromo localizado em Chapecó/SC enseja observância das cláusulas contratuais, algo que ultrapassa a competência desta Corte Superior, conforme enunciado da Súmula 5/STJ. 2. Não há violação do princípio da legalidade na aplicação de multa prevista

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em resoluções criadas por agências reguladoras, haja vista que elas foram criadas no intuito de regular, em sentido amplo, os serviços públicos, havendo previsão na legislação ordinária delegando à agência reguladora competência para a edição de normas e regulamentos no seu âmbito de atuação. Precedentes. 3. O pleito de se ter a redução do valor da multa aplicada ao recorrente, por afronta à Resolução da ANAC e à garantia constitucional do art. 5º, XL, da CF/88 e arts. 4º. e 6º da LICC, bem como art. 106, III, alínea "c", c/c art. 112 do CTN, não merece trânsito, haja vista que a respectiva matéria não foi devidamente prequestionada no acórdão em debate. Agravo regimental improvido.

(AgRg no AREsp 825.776/SC, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/04/2016, DJe 13/04/2016).

Assim, é possível reconhecer a instrumentalidade das sanções aplicáveis em

caso de infração aos comandos provenientes de regulamentos, bem como a

supremacia e verticalidade presente nessa relação ao impor unilateralmente os

meios coercitivos. Além disso, observa-se uma aproximação entre o poder de polícia

e os instrumentos objeto de coerção indireta aplicáveis pelas agências reguladoras

aos particulares, ocasionando em uma relação autoritária e imperativa em ambos os

casos.

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CAPÍTULO II

ADMINISTRAÇÃO CONSENSUAL E TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA

A visão de Administração autoritária que atua de forma unilateral e

imperativa está sendo superada no ordenamento jurídico brasileiro. Com a

promulgação da Constituição Federal de 1988 e a instituição do Estado

Democrático de Direito passou-se a exigir maior participação popular na tomada

de decisões administrativas, tornando-as mais legítimas e compatíveis com os

anseios da sociedade.

Assim, exige-se cada vez mais a presença dos administrados junto à

Administração Pública no desempenho de suas atividades, o que propicia um

resultado mais eficiente no tocante ao interesse público a ser atendido.

Em sua obra “Novos institutos consensuais das ações administrativas”

Diogo de Figueiredo Moreira Neto (2003) apresenta os motivos que ocasionaram o

surgimento da consensualidade na Administração Pública. Dentre tais causas,

destaca-se o nascimento dos direitos fundamentais que reequilibrou a relação

entre o Estado e os seus cidadãos, exigindo o respeito aos valores universais em

suas ações para serem dotadas de legitimidade.

Ademais, com a transferência das atividades econômicas aos particulares,

o Estado passou a atuar de forma subsidiária, apenas nas hipóteses

indispensáveis para o atendimento do interesse público, privilegiando a iniciativa

privada e a decisões dos particulares. Outro importante fator que possibilitou a

alteração nas ações da Administração foi a concretização do princípio da

participação, por esse princípio a democracia legítima deve se concretizar de

forma imediata, sem intermediação dos representante eleitos ou órgãos do

governo, sendo as decisões tomadas em conjunto com os particulares diretamente

interessados.

Não obstante, o pós-positivismo como um marco do neoconstitucionalismo

também corroborou com a evolução no âmbito na Administração Pública, uma vez

que com a valorização dos princípios e a reaproximação do Direito e da moral

ocorreu a reestruturação da ordem jurídica estabelecida, o que ampliou e renovou

o seu alcance, atingindo os demais ramos do saber. (MOREIRA NETO, 2003, p.

136-138).

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Para igualmente justificar a instituição desse novo modelo de atuação

Alejandro Huergo Lora (1998, p.94-98) enumerou algumas razões. A primeira

causa é o aumento do número de atividades reguladas pelo Estado e de

interesses envolvidos, que ampliam a complexidade de suas decisões, tornando o

consenso entre as partes o método mais seguro de exercício. (ARAGÃO, 2005, p.

294)

Além disso, o autor indica que os atos de interferência unilateral do Estado

na sociedade e na economia não despertam o desejo de colaboração dos

administrados da mesma forma que aqueles deliberados em conjunto. E, por fim,

a terceira justificativa está relacionada à necessidade do Estado fomentar os

particulares em suas atividades econômicas, servindo como um instrumento de

intervenção na economia. . (ARAGÃO, 2005, p.294)

Temos, portanto, um novo sistema de ação no âmbito da Administração

Pública, que será mais bem desenvolvido e analisado no transcorrer deste

capítulo.

2.1 Democracia participativa

A Constituição Federal de 1988 estruturou a República Federativa do Brasil

como um Estado Democrático de Direito, assegurando a titularidade do poder ao

povo, devendo o exercício desse poder se dar por meio de seus representantes

eleitos.

Na visão de Paulo Bonavides, com a recente redemocratização, a estrutura

constitucional instituiu a necessidade de observância de quatro princípios, sendo

eles, respectivamente, o princípio da dignidade da pessoa humana, o princípio da

soberania popular, o princípio da soberania nacional e o princípio da unidade da

Constituição Federal.

Os princípios supramencionados auxiliaram na evolução modelo

democrático, sendo necessário abordar tais comandos constitucionais de forma

breve. O primeiro, o princípio da dignidade da pessoa humana é um vetor

axiológico que fundamenta os direitos humanos como direitos fundamentais,

sendo considerado o espírito da Constituição. O segundo, o princípio da soberania

popular está intimamente ligado à cidadania, ao passo que é a fonte do poder que

legitima a existência e limites do Estado soberano.

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O princípio da soberania nacional está relacionado com a independência do

Estado perante as demais organizações estatais existentes na esfera jurídica

internacional. Por fim, a unidade da constituição se apresenta como uma relação

de hierarquia entre as normas do ordenamento jurídico, bem como uma

ponderação de valores existentes no texto constitucional. (BONAVIDES, 2006, p.

10-11)

Em suma, a democracia participativa configura um novo modelo de Estado:

o Estado que preza pelo exercício da cidadania e pela deliberação popular como

elemento de consensualidade, legitimando a tomada de decisões por parte do

“soberano”. No tocante ao tema, destaca-se a posição de Cláudio Pereira Souza

Neto:

A democracia implica, além da atribuição do poder decisório às maiorias, a instauração de um contexto de diálogo, de respeito pela posição do outro e de garantia dos direitos fundamentais, sem exclusão (apud, BONAVIDES, 2006, p. 302-303).

Tal transformação está intimamente ligada à ascensão do Estado

Democrático de Direito, uma vez que a democracia representativa não era

suficiente para atender os anseios de uma sociedade complexa e amadurecida

que necessitava de realizar o controle social para ter os múltiplos interesses

públicos atendidos (SCHIRATO, 2009, p. 02).

Assim, a democracia substancial ao prezar por uma atuação conjunta,

propiciou o surgimento da Administração consensual. Diogo de Figueiredo Moreira

Neto conceitua o princípio do consenso como “o primado da concertação sobre a

imposição nas relações de poder entre a sociedade e o Estado” (2014, p.173). Isto

é, prevalece a consensualidade na tomada de decisões e na resolução de

conflitos existentes na esfera pública.

2.2. Administração Pública Monológica e Administração Pública Dialógica

O termo Administração Pública Monológica e Administração Pública

Dialógica decorrem de uma construção doutrinária, é utilizado para tratar a

respeito do fenômeno mundial que vem estabelecendo a cultura do diálogo nas

relações com o Estado.

A Administração Pública Dialógica se contrapõe à Administração Pública

Monológica, ao passo que no primeiro modelo de atuação há influência do cidadão

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na formação da decisão administrativa, sendo a aceitação espontânea. Na visão

de Diogo Figueiredo Moreira Neto:

Essas posturas indicam a busca incessante das soluções negociadas, nas quais a consensualidade aplaina as dificuldades, maximiza os benefícios e minimiza as inconveniências para todas as partes, pois a aceitação de ideias e de propostas livremente discutidas é o melhor reforço que pode existir para um cumprimento espontâneo e frutuoso das decisões tomadas. O Estado que substituir paulatinamente a imperatividade pela consensualidade na condução da sociedade será, indubitavelmente, o que garantirá a plena eficiência de sua governança pública e, como consequência, da governança privada de todos os seus setores (MOREIRA NETO, 2011, p. 142-143).

Assim, esse novo modelo de agir analisa o ato administrativo como um

instrumento no atendimento do interesse público, e não como um fim em si

mesmo. Ou seja, ainda que a Administração disponha da imperatividade e

unilateralidade poderá por outros meios alcançar os seus fins de forma mais

efetiva. Com isso, a doutrina defende que a modelo de manifestação de vontade

adotado pela Administração não deve sobrepor ao objetivo almejado por toda

coletividade, podendo nas hipóteses legais atuar em conjunto com o administrado.

A partir dessa nova perspectiva, o Poder Público passou a estimular a

participação dos administrados para que auxiliem na criação de práticas e

soluções que melhor atendam os objetivos da sociedade. Dessa forma, esse

modelo dialógico observa os mandamentos constitucionais ao respeitar o princípio

democrático, bem como a legitimidade na atuação da Administração Pública.

Odete Medauar (2003) aborda em sua obra a importância no

consensualidade no atual estágio de evolução do Estado:

A atividade de consenso-negociação entre Poder Público e particular, mesmo informal, passa a assumir papel importante no processo de identificação de interesses públicos e privados, tutelados pela Administração. Esta não mais detém exclusividade no estabelecimento do interesse público; a discricionariedade se reduz, atenua-se a prática de imposição unilateral e autoritária de decisões. A Administração volta-se para a coletividade, passando a conhecer melhor os problemas e aspirações da sociedade. A Administração passa a ter atividade de mediação para dirimir e compor conflitos de interesses entre várias partes ou entre estas e a Administração. Daí decorre um novo modo de agir, não mais centrado sobre o ato como instrumento exclusivo de definição e atendimento do interesse público, mas como atividade aberta à colaboração dos indivíduos. Passa a ter relevo o momento do consenso e da participação (2003, p. 78).

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Convém ressaltar que as concessões mútuas observadas nas relações

com o Estado não são encontradas na atuação monológica, essa última é

caracterizada pela unilateralidade e autoridade em suas decisões.

A Administração Pública Monológica está ligada à origem do direito

administrativo no Estado Liberal. Conforme anteriormente abordado, nesse

período a atuação imperativa do Estado deveria compatibilizar o interesse público

com a garantia das liberdades individuais. A presença da supremacia e

verticalidade nos atos do Estado era a marca dessa época.

No entanto, com o desenvolvimento da Administração Pública Dialógica, a

atuação consensual passou a ser privilegiada no ambiente administrativo, o que,

conforme será demonstrado propiciou o surgimento de resultados mais adequados

e eficientes.

2.3 A eficiência no modelo de administração consensual

A Emenda Constitucional n°19/1998, introduziu o princípio da eficiência no

rol do artigo 37, caput, concedendo-lhe o status de princípio constitucional

aplicável à Administração Pública. Trata-se de um princípio que visa concretizar

alguns dos objetivos traçados na Reforma do Estado.

Hely Lopes Meirelles (2003) entende a eficiência como um dos deveres da

Administração Pública, imposto a todos agentes públicos ao realizarem as suas

atribuições com presteza, perfeição e rendimento. O autor acrescenta que

Carvalho Simas defende que o princípio da eficiência é o dever de boa

administração (2003, p. 102).

Na visão de Maria Sylvia Di Pietro o princípio da eficiência apresenta dois

aspectos: pode ser considerado no tocante ao modo de organizar, disciplinar e

estruturar a Administração Pública, bem como em relação ao modo de atuação do

agente público (DI PIETRO, 2014, p. 84).

No primeiro aspecto a eficiência estará centrada no ideal de organização

administrativa, objetivando evitar burocracias inúteis e operacionalizar o sistema

de forma mais ampla, contando inclusive com a participação dos particulares que

integram o segundo e terceiro setor.

Em relação ao segundo aspecto ligado ao modo de exercício praticado pelo

agente público é preciso tecer alguns comentários preliminares. Conforme já

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mencionado no Capítulo I a Administração Pública está vinculada ao princípio

constitucional da legalidade, nestes termos o agente público não poderá atuar em

casos de omissão legislativa.

Assim, para alcançar a eficiência em sua atuação, o agente público deverá

observar os dispositivos legais, atuando de acordo com os limites da

discricionariedade disponíveis no caso concreto. Com isso, observado o

ordenamento jurídico, poderá o administrador público buscar o melhor resultado

para o interesse perseguido.

Convém destacar que o princípio da eficiência se encontra no mesmo

patamar dos demais princípios e regras constitucionais. Desse modo, não é

permitido ao agente público contrariar o direito com o fim de atuar de maneira

eficiente (DI PIETRO, 2014, p.85).

Assim, ao introduzir a eficiência no texto constitucional para concretizar a

Reforma do Estado, buscou-se alcançar uma atuação administrativa estratégica,

com decisões e resultados mais efetivos.

A partir disso, a atuação administrativa que se resumia na aplicação da lei

nos termos do princípio da legalidade evoluiu e transformou-se em uma atuação

com vistas ao atendimento da finalidade pública. Dessa maneira, o administrador

público pauta suas ações não somente na observância dos preceitos normativos,

mas também na análise dos resultados provenientes de seus atos.

À luz do princípio da eficiência, a conduta da Administração Pública deve

ser observada sob o aspecto da instrumentalidade, uma vez que a satisfação das

finalidades públicas deve prevalecer em relação ao meio utilizado para atender

esse fim. De forma semelhante, as características unilateralidade e imperatividade

do ato administrativo poderão ser relativizadas quando os acordos administrativos

se mostrarem mais eficientes. A respeito do tema, destaca-se a afirmação de

Azevedo Marques Neto:

A unilateralidade e a exorbitância tradicionais no exercício da autoridade pública (poder extroverso) têm que dar lugar à interlocução, à mediação e à ponderação entre interesses divergentes, sem descurar, por óbvio, da proteção da coletividade contra abusos dos agentes econômicos. De outro lado, a atividade regulatória estatal, neste novo contexto, tem que se pautar pelos interesses que lhe cumpre tutelar. (...) A finalidade da atividade regulatória estatal não é a aplicação de sanções e sim a obtenção das metas, pautas e finalidades que o Legislador elegeu como relevantes alcançar. Para atingimento destas finalidades primaciais pode

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lançar mão, dentre outros instrumentos, do poder de sancionar (2000, p. 83).

Conforme destacado no trecho acima, a finalidade a ser alcançada pela

atividade estatal não se resume ao instrumento a ser utilizado, mas sim o

resultado pretendido com sua atuação. Nesse sentido, a dicotomia existente entre

ato imperativo e ato consensual deve ser analisada de acordo com o custo-

benefício existente em cada escolha.

Em casos de impasses decorrentes do conflito travado, a aplicação do

princípio da ponderação auxiliará na escolha do modelo de atuação a ser adotada:

imperativa ou consensual. O uso desse princípio deverá observar o meio a ser

utilizado, o tempo necessário para o cumprimento, o custo, bem como os demais

reflexos e resultados.

No âmbito do direito administrativo sancionador, a atuação do Poder

Público é caracterizada pela autoexecutoriedade, discricionariedade,

unilateralidade e imperatividade, dessa forma, em regra, não há espaço para a

consensualidade. Apesar disso, é possível observar que a sanção não possui um

fim em si mesmo, devendo ser entendida como um instrumento a ser utilizado pela

Administração Pública para atender as finalidades públicas.

Com isso, apesar dos atributos supramencionados a sanção poderá ser

objeto de acordo quanto ao modo de execução nas hipóteses em que houver

expressa previsão legal permitindo. Assim, a participação do administrado

diretamente interessado propiciará um resultado mais efetivo, em razão da maior

aceitação por parte do infrator. Ou seja, no caso de sanção no âmbito

administrativo a escolha do seu modo de execução poderá ocorrer tanto de forma

unilateral, como de forma bilateral quando a legislação autorizar.

Portanto, entende-se que o administrador deve buscar prevalecer os fins

sobre os meios, pautando suas ações no princípio da moralidade,

proporcionalidade e eficiência. No mais, parte da doutrina pátria ao debruçar sobre

a temática apresentada defende que é possível a relativização das formalidades

legais nas hipóteses em que se encontre em uma zona de certeza positiva, isto é,

não existam dúvidas acerca da ineficiência da aplicação da previsão normativa

naquele caso específico. Nesse sentido, ressalta-se o trecho contido na obra de

Alexandre Aragão:

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A adoção de meio diverso do formalmente previsto em lei só pode ser levada a cabo quando o juízo de que atende melhor aos objetivos legais se encontrar em uma zona de certeza positiva, ou seja, se estiver fora de dúvidas que o meio não previsto expressamente em lei atende melhor aos seus objetivos. Se houver juízos razoáveis (mesmo que não unânimes) de que o meio previsto na lei poderia ser igualmente eficiente do ponto de vista do atendimento aos interesses públicos alvejados, ela deverá ser prestigiada (ARAGÃO, 2005, p. 298).

Por fim, uma atuação conjunta na seara punitiva reflete também na redução

da judicialização das decisões administrativas, produzindo resultados mais céleres

e tempestivos para o fim almejado. Isso porque eventual discussão no Poder

Judiciário pode retardar a concretização da decisão, ocasionando a perda do

interesse público na execução da medida.

Passa-se a tratar, agora, dos requisitos a serem observados para o uso da

consensualidade no âmbito administrativo.

2.4 Pressupostos para uma atuação consensual

A contratualização administrativa ou atuação consensual substituiu a

relações unilaterais e impositivas por relações fundadas no diálogo. No entanto, a

doutrina brasileira diverge quanto a aplicação de acordos ligados ao direito privado

no âmbito de pessoas jurídicas de direito público, tais questionamentos decorrem

do modelo administrativo inicialmente adotado em nosso país. Conforme já

abordado, o Direito Administrativo brasileiro adotou o modelo desenvolvido no

Estado Liberal em que a imperatividade e unilateralidade caracterizavam a

atuação do Estado, essa forma de ação trouxe reflexos que podem ser

observados até os dias atuais.

A divergência a respeito da viabilidade da instituição de uma Administração

Pública dialógica também decorre do triste histórico brasileiro de corrupção e

improbidade no âmbito do serviço público. No entanto, esse quadro fático deve ser

combatido por meio do fortalecimento das instituições de controle e não através do

impasse na construção de uma Administração Pública mais eficiente. Dessa

forma, a implementação de instrumentos consensuais de atuação deve ser

elaborada com cautela, disponibilizando mecanismos de controle para eventuais

desvios de conduta.

Diogo de Figueiredo Moreira Neto em sua obra “Novos institutos

consensuais da ação administrativa” (2003, p. 174-178) classifica a atuação

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consensual de acordo com a sua intensidade, sendo o consenso como

coadjuvante e como determinante da ação administrativa. A primeira espécie de

ação conjunta é aquela em que a Administração ouve os particulares e negocia

com eles as melhores soluções, reservando a decisão final para si. Ou seja, na

atuação coadjuvante não há igualdade na deliberação entre as partes,

permanecendo o caráter decisório com o Poder Público. Nessa hipótese não é

essencial a presença de lei autorizando a participação do particular na

deliberação, dado que a manifestação desse não vinculará a conduta

administrativa.

No segundo modelo de consensualidade em que a atuação do particular é

determinante, a Administração deve ouvir os particulares, podendo negociar as

melhores soluções para atender os interesses dos envolvidos. No entanto, nesse

modo de exercício o Poder Público estará obrigado a respeitar a decisão que vier

a prevalecer na deliberação entre as partes. Assim, entende-se que essa forma de

ação somente poderá ser adotada por meio da atuação do legislador, uma vez

que a alteração nas competências da Administração deve decorrer de lei.

No mais, além da necessidade de preceito normativo autorizando a atuação

conjunta, é indispensável a manifestação de vontade do particular para fazer o uso

desse instrumento. Isto é, a atuação conjunta não pode ser impositiva, devendo

ser um meio através do qual os envolvidos manifestam livremente a sua vontade,

pois caso contrário a verticalidade e a imperatividade estarão presentes na

relação.

Há ainda que destacar a presença do interesse público na adoção da

consensualidade, uma vez que esse modo de ação objetiva tornar as decisões

administrativas mais eficazes e exequíveis. Porém, se o uso de instrumentos de

diálogo prejudicar a finalidade coletiva, deverá ser afastado. Ou seja, a atuação

imperativa e unilateral irá prevalecer na hipótese em que esta seja considerada a

mais adequada para o resultado perseguido.

2.5 Instrumentos de atuação consensual

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A transação administrativa representa uma técnica, método ou modelo de

atuação no qual as prerrogativas da unilateralidade e impositividade serão

substituídas pelo consenso. Assim, os destinatários dos poderes administrativos

atuarão de forma ativa na formação da vontade administrativa.

Jean-Pierre Gaudin ao tratar sobre a contratualização administrativa

apresentou três critérios formais para identificar o que chamou de contratos de

ação pública. O primeiro critério identificado seria a presença de um acordo

negociado, ou seja, os objetivos públicos seriam preenchidos e formados com a

atuação conjunta.

O segundo requisito apresentado pelo autor é o estabelecimento de um

cronograma de atuação que compatibiliza o orçamento existente e o planejamento

a ser desenvolvido. Por fim, como terceiro critério exige a presença de

contribuições recíprocas das partes envolvidas no acordo (Gaudin, 1999. p. 28).

A consensualidade no âmbito administrativo possui um papel relevante na

prevenção ou extinção do litígio presente nas relações jurídicas. Apesar de sua

importância, no direito brasileiro não existe um instrumento que regulamente de

forma genérica a técnica de atuação conjunta na Administração Pública, observa-

se a existência de diversos instrumentos esparsos que tratam a respeito.

Na há uma regra geral no direito brasileiro determinante da competência dos órgãos e entidades administrativas para a realização de acordos administrativos. Entretanto, é possível elencar, entre diversas autorizações legais, (i) o art. 10 do Decreto lei n. 3.365/41, segundo o qual “a desapropriação deverá efetivar-se mediante acordo ou intentar-se judicialmente ...”; (ii) o compromisso de ajustamento de conduta, previsto no § 6° do art. 5° da Lei federal n. 7.347/85 (Ação Civil Pública); (iii) os acordos no âmbito da execução dos contratos administrativos, nos termos da Lei federal n. 8.666/93, 8.987/95, 11.079/04 e 11.107/05;49 (iv) o compromisso de cessação de prática sob investigação, nos processos em trâmite na órbita do CADE (art. 53 da Lei federal n. 8.884/ 94), e (v) o contrato de gestão, previsto no § 8º do art. 37 da Constituição de 1988 (preceito inserido com a EC n. 19/98) (OLIVEIRA; SCHWANKA, 2008, p.318).

Diogo de Figueiredo Moreira Neto elege alguns exemplos de espécies de

atuação conjunta, dentre eles se podem mencionar o plebiscito, referendo, coleta

de opinião, debate público e a audiência pública (2003). Tais instrumentos de

diálogo serão classificados como coadjuvante ou determinante, a depender da sua

obrigatoriedade de aceitação por parte da Administração Pública, devendo haver

justificativa nos casos de recusa.

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A coleta de opinião é um instrumento em que a Administração se utiliza dos

meios de comunicação com o fim de recolher as preferências e razões de

determinado grupo social que será atingido pela decisão.

O debate público é caracterizado por uma atuação mais ativa dos

administrados na formação da vontade administrativa, pois além de coletar a

opinião destes possibilita a negociação.

Há ainda a audiência pública, um modelo de participação que está sendo

cada vez mais implementado pelo Poder Público, tal técnica possibilita a

negociação com os particulares, mas se distingue do debate público por possuir

maior formalidade processual, podendo inclusive ser determinante em seu

resultado.

Não obstante, ressalta-se o referendo e o plebiscito, ambos são institutos

de consulta pública constitucionais que se destinam a recolher a manifestação do

cidadão sobre decisões dos órgãos legislativos e administrativos. Tais modelos de

exercício da democracia direta são importantes para a legitimidade das decisões

que tratam sobre temas polêmicos e de relevante impacto social (MOREIRA

NETO, 2003, p. 148-149).

Por fim, observa-se que a evolução do Direito Administrativo caminha para

a relativização da unilateralidade e da imperatividade. Assim sendo, ao buscar

superar o antigo modelo e privilegiar o princípio democrático ocorreram

transformações na organização da Administração Pública. Tais mudanças podem

ser notadas na gestão compartilhada seja na Administração Direta seja na

Administração Indireta, a exemplo é interessante mencionar a composição por

particulares nos órgãos colegiados de gestão das autarquias.

Diogo de Figueiredo Moreira Neto ainda destaca a possibilidade de

designação atípica às entidades privadas, nesse modelo o legislador descentraliza

as atividades de acordo com o interesse público, não há transferência de funções,

mas apenas o reconhecimento estatal dos efeitos produzidos pelos atos

praticados por determinado grupo social, a exemplo a atuação de associação de

moradores. (2003, p. 149)

2.6 Releitura dos princípios da Supremacia do Interesse Público e da

Indisponibilidade do Interesse Público

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O interesse é entendido como um conjunto de valores que podem ser

éticos, morais, econômicos, dentre outros. É possível que exista mais de um

interesse sobre o mesmo objeto, dessa forma, a presença de um interesse não

anula os demais. Conforme brevemente relatado, o atendimento ao interesse

coletivo é o fim do Estado, ou seja, é a justificativa para a existência deste.

Rousseau apresentava o interesse público com a expressão “vontade geral”.

Só a vontade geral pode dirigir as forças do Estado de acordo com a finalidade de sua instituição, que é o bem comum, porque, se a oposição dos interesses particulares tornou necessário o estabelecimento das sociedades, foi o acordo desses mesmos interesses que o possibilitou. O que existe de comum nesses vários interesses forma o liame social e, se não houvesse um ponto em que todos os interesses concordassem, nenhuma sociedade poderia existir. Ora, somente com base nesse interesse comum é que a sociedade deve ser governada (ROUSSEAU, 1973, p. 49).

Ao legislador é atribuída a função qualificar como público ao interesse

geral, ao realizar essa escolha tal interesse público específico será

prioritariamente protegido e atendido em face dos demais, limitando a sua

disposição por parte da Administração Pública.

Diogo de Figueiredo Moreira Neto apresenta dois graus de interesse

público: o substantivo, que está ligado aos fins visados pela Administração

Pública, e o adjetivo, que se relaciona com os meios a serem utilizados para

atingi-lo. Nesses termos, na visão do autor, apenas o interesse público em sua

modalidade substantivo é indispensável. Destaca-se o trecho extraído de sua obra

“Curso de Direito Administrativo”:

A flexibilização deste conceito apresentará grande relevância no Direito contemporâneo, pois em diversas circunstâncias será necessário ponderar interesses públicos definidos em lei, cotejando-os com outros, igualmente protegidos, mas que lhes sejam concorrentes, visando a uma mais justa e melhor realização do Direito. São modernos exemplos de aplicação da flexibilização na satisfação de interesses que eram antes considerados como absolutamente indisponíveis, os variados tipos de acordos substitutivos, um instituto que vem sendo adotado na legislação brasileira para harmonizar a satisfação de interesses públicos com interesses individuais, coletivos ou difusos valorizados pelo Direito, dos quais são já costumeiros exemplos os termos de ajuste de conduta (TACs), os termos de compromisso e assemelhados (2014 p.161).

Feita essa breve distinção a respeito dos modelos de interesses públicos

existentes, é mister recordar os conceitos dos princípios da supremacia do

interesse público e da indisponibilidade do interesse público.

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O primeiro vetor axiológico, a supremacia do interesse público sobre o

interesse privado é o pilar do Direito Administrativo. Segundo a doutrina, apenas o

interesse público primário será privilegiado, isto é, aquele que satisfaz as

necessidades coletivas. De outro modo, o interesse próprio do Estado em suas

relações jurídicas, conhecido como interesse público secundário, poderá ser

suprimido quando em oposição ao interesse privado.

Já a indisponibilidade do interesse público impede que o administrador

deixe de atender o interesse coletivo quando não houver autorização legal.

Nesses termos, tal princípio impede a disposição do interesse pertencente a toda

sociedade por parte do administrador, dado que esse último apenas o representa.

Assim, a noção de supremacia e indisponibilidade do interesse público

compõe a formação do regime jurídico-administrativo, traçando as suas

características, deveres e obrigações.

No entanto, conforme será demonstrado, essa dicotomia público e privado,

juntamente com a idéia de superioridade e indisponibilidade vem sendo

relativizada pela doutrina.

2.6.1 A dicotomia interesse público versus interesse privado

Na visão de Daniel Sarmento, conforme a teoria moral, a prevalência dos

interesses da coletividade sobre os interesses particulares pode ser justificada

pelo organicismo e o utilitarismo (SARMENTO, 2005, p. 52). De forma diversa, há

ainda o individualismo que defende a supremacia incondicionada dos interesses

privados sobre o interesse coletivo.

Para o organicismo o Estado é uma entidade jurídica-política criada para

viabilizar os projetos de cada indivíduo, de forma ordenada e racional. Os

interesses do Estado não são desassociados e necessariamente opostos aos

interesses particulares, mas a condição de superioridade daqueles interesses é

importante para a manutenção da vida em sociedade (BINENBOJM, 2016, p. 85).

Para Daniel Sarmento outra teoria moral que justifica a supremacia do

interesse público é o utilitarismo, sendo este em essência uma análise sobre as

conseqüências de determinada escolha, ou seja, havendo interesses individuais

conflitantes a solução justa é aquela sacrifica determinado interesse de um

membro da comunidade para alcançar um benefício superior para toda sociedade.

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Dessa forma, o utilitarismo possibilita a supressão de determinado interesse em

prol da satisfação de um interesse mais amplo. (SARMENTO, 2005, p. 59-60)

Ocorre que, parte da doutrina considera o utilitarismo contrário ao sistema

de direitos fundamentais, dado que o status constitucional conferido a tais direitos,

bem como a hierarquia presente na dignidade da pessoa humana não permite a

sua disposição. Ou seja, os direitos fundamentais não objetivam preservar os

interesses do maior número possível de indivíduos, mas sim os valores morais de

cada indivíduo (BINENBOJM, 2016, p.88).

Assim sendo, a doutrina moderna coordenada por Gustavo Binenbojm

considera a supremacia do interesse público sobre os interesses particulares, na

perspectiva utilitarismo, incompatível com o sistema jurídico adotado pelo Brasil.

Apenas onde o constituinte for explícito ao estabelecer regras específicas de

prevalência poderá ser utilizado o princípio da supremacia (2016, p.88).

Para Daniel Sarmento os direitos fundamentais são considerados

verdadeiros interesse público a serem alcançados pelo Estado, destaca-se o

trecho extraído de sua obra:

Como se sabe, a idéia da dimensão objetiva prende-se à visão de que os direitos fundamentais cristalizam os valores mais essenciais de uma comunidade política, que devem se irradiar por todo o seu ordenamento, e atuar não só como limites, mas também como impulso e diretriz para a atuação dos Poderes Públicos. Sob esta ótica, tem-se que os direitos fundamentais protegem os bens jurídicos mais valiosos, e o dever do Estado não é só o de abster-se de ofende-los, mas também o de promove-los e salvaguarda-los das ameaças e ofensas provenientes de terceiros. E para um Estado que tem como tarefa mais fundamental, por imperativo constitucional, a proteção e promoção dos direitos fundamentais dos seus cidadãos, a garantia destes direitos torna-se também um autêntico interesse público (2005, p 136).

2.6.2 A desconstrução do princípio da supremacia do interesse público

Atualmente, parcela da doutrina sustenta a inexistência de supremacia

entre interesse público e interesse privado. Gustavo Binenbojn defende que o

interesse público somente poderá ser obtido a partir de um procedimento racional,

envolvendo os direitos individuais e coletivos constitucionalmente assegurados,

bem como a ponderação que permita a realização de todos os interesses na maior

extensão possível, conforme a proporcionalidade (ARAGÃO, et al, 2005, p. 167).

A ponderação é uma forma de balancear os interesses conflitantes na

situação em concreto como forma de alcançar uma solução satisfatória para as

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partes envolvidas. É possível observar a existência de três subprincípios ligados à

proporcionalidade, o primeiro é a adequação, que exige o uso de medidas aptas a

alcançar o resultado desejado. O segundo subprincípio é a necessidade, sendo a

restrição de direito uma excepcionalidade e, por fim, tem-se a proporcionalidade

em sentido estrito, que é a ponderação entre o ônus e o benefício.

Além da ponderação de interesses para solucionar eventuais conflitos, a

doutrina também argumenta que não há uma verdadeira supremacia do interesse

público, pois o texto constitucional em diversas passagens protege o interesse

individual, não havendo que falar em uma interpretação sistemática que privilegie

o interesse público. Não obstante, o status constitucional conferido à dignidade da

pessoa humana e demais valores fundamentais impedem com a sua supressão

quando em conflito com outros bens protegidos (OLIVEIRA, 2017, p. 46).

Há ainda que ressaltar a abstração e indeterminabilidade do termo

“interesse público”, o que eventualmente colidirá com o princípio da segurança

jurídica assegurado no Estado Constitucional Democrático de Direito. Isto é, o

“interesse público” é um conceito jurídico indeterminado que não pode ser argüido

para legitimar a prática de quaisquer atos, sob pena de ofensa ao modelo de

Estado assegurado (OLIVEIRA, 2017, p. 45).

Outro argumento suscitado pela doutrina pátria é a indissociabilidade do

interesse público e do interesse privado, uma vez que o atendimento de ambos é

a finalidade do Estado. Ou seja, não há que falar em apenas um objetivo a ser

alcançado pelo Poder Público, mas sim diversos fins a serem atingidos,

abrangendo tanto os interesses privados como o interesse coletivo (OLIVEIRA,

2017, p. 46).

Por fim, convém destacar o posicionamento de Rafael Carvalho Resende

de Oliveira contido em sua obra “Curso de Direito Administrativo”, segundo o autor

a atuação do poder público deve se pautar pela defesa e promoção dos direitos

fundamentais e pelo respeito à dignidade da pessoa humana. A promoção desses

direitos satisfaz os mandamentos constitucionais (2017, p.46).

Fato é que em nossa sociedade pluralista não existe apenas um interesse

público ou um único interesse privado, dessa maneira existem diversos pontos de

conexão. Assim, ao atender o interesse público também estará satisfazendo o

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privado, utilizando-se da ponderação e concordância prática em caso de conflito

entre esses. (2017, p. 47)

2.7 O Termo de Ajustamento de Conduta no Direito brasileiro

A reforma administrativa trouxe a necessidade de transformar o modelo de

gestão pública, buscando a implementação de novos mecanismos de atuação no

âmbito da Administração Pública. A atribuição de status constitucional ao princípio

da eficiência, juntamente com o novo modelo de organização administrativa que

aproximou a atividade do Estado com os particulares atuantes no segundo e

terceiro setor ocasionou na criação de instrumentos mais flexíveis e menos

burocráticos.

O termo de Ajustamento de Conduta (TAC) é um mecanismo criado para

propiciar um resultado mais eficaz, rápido e seguro. Constitui em uma ferramenta

que transforma a realidade por meio do consenso entre as partes envolvidas no

litígio, não objetiva sancionar, mas sim induzir comportamentos. Dessa forma,

conforme será esclarecido, o TAC foi introduzido no ordenamento jurídico para

possibilitar a instituição de uma Administração Pública de resultado.

Diogo de Figueiredo Moreira Neto (2003, p.157) considera os TACs como

ato jurídico complexo, presente na Administração Pública consensual, tendo como

objetivo substituir uma conduta imperativa e exigível por outra negociável,

resultando no melhor atendimento aos interesses públicos.

Os TACs são mecanismos para a atuação conjunta no âmbito

administrativo, ou seja, o Poder Público dispensa a aplicação instrumentos

sancionatórios para utilizar-se de meios consensuais. Em sua obra “Termo de

Ajustamento de Conduta em procedimentos sancionatórios regulatórios” os

autores André Saddy e Rodrigo Azevedo Greco (2015, p.171) defendem que os

TACs possuem três características: a primeira é a consensualidade, presente em

qualquer acordo, a segunda característica é a alternatividade, ou seja, alternativas

na lei para a substituição ou suspensão da sanção, e por fim, a finalidade pública

presente no uso desse instrumento.

.

2.7.1 Natureza Jurídica

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Quanto à natureza jurídica do TAC é preciso destacar que não se trata de

um tema pacificado na doutrina, diversos autores atribuem naturezas distintas a

esse mecanismo. Inicialmente, Caprara (2009) defende que as opiniões se

dividem em dois grupos. Aqueles que entendem que o TAC é um ato jurídico, e os

que defendem que é um modelo de transação.

Os que aduzem que o TAC é um ato jurídico têm como fundamento a

indisponibilidade dos direitos objetos do TAC, afirmando inflexibilidade ou rigidez

do conteúdo do direito, nesse ponto a doutrina é unânime (CAPRARA, 2009, p.

01).

Já os que entendem que o TAC é uma transação de cunho contratual,

defendem que devem ser aplicados os princípios de direito privado e público.

Quanto à transação no TAC deve-se destacar que os titulares dos direitos

materiais se distinguem daqueles legitimados para firmar o compromisso:

O compromisso, portanto, tem por objeto a reparação de interesses transindividuais, por natureza indisponível, tendo como legitimados órgãos que não se confundem com os titulares dos direitos defendidos, uma vez que difusos, coletivos ou individuais homogêneos, pertencentes à parcela da sociedade. A titularidade do direito, assim, não coincide com a legitimidade para firmar o ajuste, constituindo hipótese efetiva de composição extrajudicial de direitos transindividuais (CAPRARA, 2009, p. 1).

Outro posicionamento que merece destaque é o que entende os TACs

como compromissos de adequação de determinada conduta. Isto é, os TACs

seriam promessas do suposto infrator de, sob pena de sofrer determinada

punição, adequar seu comportamento à lei. (SADDY; GRECO, 2015, p.182)

Assim sendo, os TACs antecipam a resolução dos conflitos de forma mais

rápida e eficaz do que se ocorresse em juízo, uma vez que o grande volume de

demanda no Poder Judiciário o transforma em um mecanismo burocrático e tardio

na garantia dos interesses tutelados.

2.7.2 Características

Conforme anteriormente abordado, o uso de instrumentos consensuais

para a resolução de conflitos não configura uma disposição indevida do interesse

público, dado que o fim a ser alcançado permanecerá como o objetivo do ajuste

celebrado. Dessa forma, o uso do Termo de Ajustamento de Conduta para

substituir as sanções unilaterais e impositivas aplicadas pela Administração

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Pública não viola o princípio da indisponibilidade do interesse público, uma vez

que esse continuará a ser atendido por um mecanismo mais eficiente.

No entanto, para fazer uso do TAC é imprescindível que exista norma

expressamente autorizando, uma vez que se trata de uma ferramenta excepcional

no atendimento do interesse coletivo. Ademais, a Administração Pública está

vinculada ao princípio da legalidade administrativa, sendo impedida de praticar

atos além daqueles permitidos na norma.

O objeto do Termo de Ajustamento de Conduta é a prevenção ou a

reparação do dano, ou seja, uma ação contrária à norma jurídica poderá ocasionar

a aplicação de uma sanção passível de conversão em acordo entre as partes.

A ausência de uma norma geral que regulamente o procedimento para a

celebração desse ajuste faz com que a legitimidade ativa e passiva seja definida

pela lei que regulamenta cada procedimento de TAC. Como exemplo mencione-se

a lei 7.347/85, que disciplina a ação civil pública permite o uso desse instrumento

em seu artigo 5°, §6°:

Art. 5º - § 6° Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial (PLANALTO, 1985).

Nesse caso a legitimidade ativa é atribuída aos legitimados a propositura da

ação civil pública, sendo esses aqueles elencados no rol do artigo 5° do mesmo

diploma legislativo.

Quanto ao prazo máximo para a vigência dos Termos de Ajustamento de

Conduta é cabível ressaltar:

Como o TAC é considerado título executivo extrajudicial, exige-se, para sua certeza e liquidez, além do valor, o estabelecimento de condições de tempo (prazo), modo e lugar de cumprimento, incluindo a vigência. Todavia, conforme mencionado, diante da inexistência de legislação específica dispondo sobre a matéria, competirá às agências reguladoras, quando da regulamentação do TAC, a definição e o estabelecimento das condições que entenderem necessárias ao atendimento do interesse público, podendo, se preciso for, fixar em resolução eventual limitação legal ao prazo de vigência do TAC (discricionariedade consentânea ao interesse público que se deve proteger). (SADDY; GRECO. 2015, p.194)

Assim, a ausência de norma geral faz com que os Termos de Ajustamento

de Conduta tenham regulamentação distinta uns dos outros, tornando a tarefa de

traçar suas características mais árdua. Apesar disso, entende-se que a finalidade

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do TAC é a substituição de uma sanção administrativa ocasionada pela infração à

norma, isto é, busca-se um método alternativo.

Conforme apontado anteriormente a sanção em âmbito administrativo

deverá respeitar os valores constitucionais da ampla defesa e do contraditório,

valores esses que decorrem do princípio do devido processo legal. O TAC ao

substituir uma sanção também deverá ser executado conforme as regras do

ordenamento jurídico, privilegiando o diálogo e o esclarecimento pleno de ambas

as partes.

Ao utilizar o termo de ajustamento de conduta a Administração Pública não

poderá aplicar a sanção prevista administrativamente, pois, caso contrário, estaria

contrariando a segurança jurídica, boa-fé e a confiança legítima depositada pelo

particular nos atos do Poder Público. Assim sendo, a sanção estará sob condição

suspensiva, podendo ser aplicada em caso de descumprimento total ou parcial do

acordo celebrado com o administrado.

Apesar da impossibilidade de aplicação da sanção administrativa durante a

vigência do TAC, é plenamente cabível a aplicação da sanção penal decorrente do

mesmo ato praticado. Ou seja, em razão da independência entre a instância

administrativa e judiciária, é possível a aplicação da pena decorrente da prática de

um ato que configure tanto infração penal como infração administrativa, sendo que

nesse último caso tenha sido celebrado um ajuste com o Poder Público. Sobre o

tema é possível ressaltar o recente posicionamento do Superior Tribunal de

Justiça:

PROCESSUAL PENAL. CONSELHEIRO DE TRIBUNAL DE CONTAS ESTADUAL. CRIMES AMBIENTAIS. ARTS. 38, 40 E 48 DA LEI 9.605/98. DENÚNCIA. REQUISITOS. ART. 41 DO CPP. APTIDÃO. JUSTA CAUSA. ART. 395, III, DO CPP. LASTRO PROBATÓRIO MÍNIMO. PRESENÇA. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. ART. 397 DO CPP. INVIABILIDADE. RECEBIMENTO. (...) 7. A assinatura do termo de ajustamento de conduta com o órgão ambiental estadual não impede a instauração da ação penal, pois não elide a tipicidade formal das condutas imputadas ao acusado, repercutindo, na hipótese de condenação, na dosimetria da pena. 8. A jurisprudência desta Corte admite a aplicação do princípio da insignificância aos crimes ambientais, desde que, analisadas as circunstâncias específicas do caso concreto, se observe que o grau de reprovabilidade, a relevância da periculosidade social, bem como a ofensividade da conduta não prejudiquem a manutenção do equilíbrio ecológico, o que, na hipótese concreta, não é possível de ser aferido, de plano, no atual momento processual. 9. Denúncia recebida. (APn 888/DF, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, CORTE ESPECIAL, julgado em 02/05/2018, DJe 10/05/2018).

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No tocante aos ônus e vantagens na celebração dos TACs a obra de André

Saddy e Rodrigo Azevedo Greco (2015, p. 187) defende que a Administração

Pública trocará uma obrigação incerta, que seria a sanção aplicada em razão da

infração, por uma obrigação certa de fazer ou não fazer. Isto é, a sanção

administrativa não é, em regra, dotada de autoexecutoriedade, dependendo da

tutela jurisdicional para o cumprimento coercitivo, ocorre que o Poder Judiciário

muitas das vezes profere decisões intempestivas, prejudicando o interesse

público.

O TAC proporciona uma redução de gastos ao Poder Público na medida

em que dispensará os gastos decorrentes da demanda judicial para o

cumprimento da sanção imposta. Ademais, o acordo poderá conter cláusulas de

renúncia ao direito de discussão das multas eventualmente aplicadas em razão do

descumprimento do ajuste.

Apesar dos benefícios acima exemplificados, o TAC somente deverá ser

celebrado quando for a alternativa que melhor atenda o interesse público. Assim

sendo, na hipótese de garantia da dívida ou até mesmo de certeza no

cumprimento da sanção administrativa, a Administração Pública terá um ônus

maior para justificar a necessidade e utilidade de um acordo.

Feitos esses esclarecimentos a respeito da atuação consensual na

Administração Pública, passa-se a tratar agora do Termo de Compromisso de

Cessação desenvolvido no âmbito do Conselho Administrativo de Defesa da

Economia (CADE).

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CAPÍTULO III

TERMO DE COMPROMISSO DE CESSAÇÃO

Antes de abordar o tema central desse capítulo é necessário pontuar de

forma breve o modelo de atuação adotado pelo Conselho Administrativo de

Defesa da Economia, destacando o seu relevante papel no desenvolvimento

econômico do país.

3.1 Processo administrativo sancionador antitruste e a sua eficácia

Conforme apontado, o poder de polícia é um dos poderes conferidos à

Administração Pública, através dele a atuação administrativa atua com

unilateralidade e imperatividade na restrição da liberdade e direitos individuais. No

âmbito econômico o poder de polícia atua na fiscalização, prevenção e repressão

do abuso de poder econômico.

A Constituição Federal de 1988 legitima essa espécie de atuação ao prever

em seu artigo 173, §4° necessidade de lei para a repressão às práticas

prejudiciais no âmbito econômico. Tal norma objetiva garantir a livre concorrência

e proteger os princípios da ordem econômica listados no artigo 170 da Carta

Maior.

Assim, para efetivar as previsões constitucionais no que tange a defesa do

livre mercado foi criado o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC).

O SBDC é formado pelo Conselho Administrativo de Defesa da Concorrência

(CADE) e pela Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da

Fazenda. O objetivo principal do SBDC é a promoção de uma economia

competitiva, prevenindo ou repreendendo ações que possam prejudicar a disputa

saudável e transparente no mercado.

Em caso de violação aos valores constitucionais da ordem econômica,

deverá ser instaurado o processo administrativo antitruste, que terá o fim de

proteger o livre mercado. O processo Administrativo é o vínculo jurídico existente

entre os administrados e os diversos órgãos que compõem a Administração

Pública. A característica verificada nesse vínculo é a imparcialidade do órgão

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julgador, uma vez que o Estado participa diretamente da relação processual.

Dessa maneira, o processo sancionador antitruste se apresenta como um

procedimento para apuração de infrações à ordem econômica, dotado de diversas

fases internas que privilegiam os princípios constitucionais. . (Leonardo Vizeu

Figueiredo, 2014, p.304)

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE é uma autarquia

em regime especial que possui a função de proteger e garantir a livre

concorrência, tendo competência para prevenir, fiscalizar e julgar os atos

praticados pelos agentes econômicos que violem a higidez do mercado.

A competência para a instauração do processo administrativo antitruste é

atribuída ao Cade, devendo o julgamento ser realizado pelo Tribunal

Administrativo de Defesa Econômica do Cade. A manifestação conclusiva desse

tribunal não poderá ser objeto de recurso em sede administrativa, mas é possível

a sua análise pelo Poder Judiciário.

A decisão do Tribunal Administrativo de Defesa Econômica poderá resultar

na aplicação de multas em valor proporcional ao dano causado, observando os

limites legais. Além disso, é possível a inscrição do infrator no Cadastro Nacional

de Defesa do Consumidor, restrição no parcelamento de tributos, licenciamento

compulsório das patentes de sua titularidade, cisão da sociedade infratora ou

transferência do controle societário, dentre outros.

Apesar da diversidade de sanções, a multa é o principal instrumento

utilizado pelo Cade. No entanto, a aplicação desse mecanismo de sanção

pecuniária não revela resultados satisfatórios no âmbito administrativo. Isto

porque, conforme já apontado, a multa administrativa não é dotada de

autoexecutoriedade, mas apenas da exigibilidade. Com isso o Cade não pode

utilizar de ferramentas de coerção diretas para ver o seu direito satisfeito.

Não obstante, as decisões proferidas pelo Tribunal do CADE são, na

maioria das vezes, levadas para discussão no Poder Judiciário, que é moroso na

resolução dos litígios e pode até mesmo suspender a sanção aplicada. Ou seja,

mesmo sendo um instrumento válido para punir o infrator, a multa não proporciona

o resultado esperado das decisões administrativas.

As condutas que caracterizam infrações à ordem econômica são diversas,

no ordenamento jurídico pátrio para que determinada ação seja considerada

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ofensiva aos valores da ordem econômica basta que os seus efeitos tenham

potencial danoso. Logo, em razão da limitação do legislador em elencar um rol de

condutas que infringem o livre mercado, optou-se por uma tipificação aberta, com

dispositivos legais meramente exemplificativos.

Portanto, a configuração de abuso do poder econômico dependerá dos

efeitos decorrentes daquela conduta. Assim sendo, é possível que determinada

ação prevista no texto normativo como prejudicial à ordem econômica, mas que

produza efeitos positivos no mercado não seja passível de sanção. Isto ocorre

porque o Brasil adotou a regra da razão, por tal teoria a verificação de

determinada infração será efetuada de acordo com os seus efeitos danosos.

Sobre o tema destaca-se o entendimento de Leonardo Vizeu Figueiredo:

Outrossim, na análise de eventual infração anticompetitiva, mister se faz que as autoridades de defesa da concorrência não se atenham apenas à verificação da conduta per se, fazendo-se mister a verificação do dano ou eventual efeito danoso dessa conduta para o processo competitivo do respectivo nicho econômico mercadológico, estabelecendo-se, ainda, nexo de causalidade entre a conduta e a ameaça ou a lesão à ordem econômica para a devida manifestação da materialidade do fato sub judice. Fácil perceber que a verificação da infração é efetuada com base na regra da razão, não bastando comprovar que houve, tão somente, uma conduta desleal per se. Para tanto, é necessário averiguar se houve dano, efetivo ou potencial, ao mercado, bem como se tal prejuízo foi oriundo da infração sob investigação (FIGUEIREDO, 2014 p. 269)

Em relação à responsabilidade por infração contra a ordem econômica, é

interessante ressaltar que ela transcenderá a pessoa jurídica que praticou o ato,

podendo alcançar as pessoas físicas que tinham poderes de gestão ao tempo da

prática da conduta, bem como as demais pessoas jurídicas que integram o grupo

econômico. Os artigos 31 e 32 da Lei 12.529/2011 apontam:

Art. 32. As diversas formas de infração da ordem econômica implicam a responsabilidade da empresa e a responsabilidade individual de seus dirigentes ou administradores, solidariamente. Art. 33. Serão solidariamente responsáveis as empresas ou entidades integrantes de grupo econômico, de fato ou de direito, quando pelo menos uma delas praticar infração à ordem econômica (PLANALTO, 2011).

Há ainda a hipótese de desconsideração da personalidade jurídica nos

casos de infração à ordem econômica. No entanto, convém ressaltar que somente

será utilizado esse instrumento em hipóteses excepcionais, pois se deve preservar

a autonomia patrimonial da pessoa jurídica, evitando atingir os bens dos seus

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sócios. O artigo 34 do mesmo diploma legislativo estabelece um rol de situações

em que será possível a desconsideração da personalidade jurídica:

Art. 34. A personalidade jurídica do responsável por infração da ordem econômica poderá ser desconsiderada quando houver da parte deste abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. Parágrafo único. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.

A desconsideração da personalidade jurídica não objetiva considerar

inexistente a personalidade da sociedade constituída de acordo com os preceitos

legais, mas tem o intuito de alcançar as pessoas e bens que estão sobre ela,

respeitando os limites e preservando a personalidade nas demais relações

jurídicas que integre (FIGUEIREDO, 2014, p. 271).

No tocante as espécies de desconsideração a doutrina aponta duas

teorias: a teoria menor e a teoria maior. A teoria menor exige apenas a existência

de prejuízo ao lesado para que a autonomia patrimonial da pessoa jurídica seja

afastada. Por outro lado, a teoria maior requer a comprovação de desvio de

finalidade ou confusão patrimonial.

Com a leitura do artigo 34 da lei 12.529/2011 é possível notar que o

legislador elegeu a teoria menor para ser aplicada no processo administrativo

antitruste, uma vez que os requisitos para a desconsideração da personalidade

jurídica são objetivos, podendo decorrer do mero estado de insolvência.

3.1.1 O controle judicial no processo administrativo antitruste

Inicialmente convém tratar a respeito das decisões proferidas no Cade no

âmbito do processo administrativo. Conforme já apontado, o Cade é uma

autarquia em regime especial que tem o dever de zelar pela livre concorrência no

mercado, realizando funções de fiscalização e julgamento das questões antitruste.

Leonardo Vizeu Figueiredo entende que:

As decisões do CADE não comportam revisão no âmbito do Poder Executivo, podendo ser revistas apenas pelo Poder Judiciário, com base no princípio do and justice for all ou na inafastabilidade da justiça (art. 5º, XXXV, CRFB) (2014, p.256).

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Dessa maneira, em razão do princípio da inafastabilidade do controle

jurisdicional será possível ingressar com demanda no Poder Judiciário para

discussão da decisão proferida no âmbito do CADE.

Ademais, o ordenamento jurídico do Brasil adota o sistema de jurisdição

uno, ou inglês, nesse modelo as questões relacionadas à Administração Pública,

bem como as demais questões cíveis comuns serão levadas para julgamento no

mesmo Tribunal, não havendo que falar em uma justiça própria para assuntos

ligados ao Poder Público.

Rafael Carvalho Rezende Oliveira aponta que o sistema de jurisdição una

(unidade de jurisdição), de origem inglesa e norte-americana, confere ao Poder

Judiciário a prerrogativa de decidir de maneira definitiva sobre a juridicidade de

todos os atos praticados por particulares ou pela Administração Pública (2017, p.

05).

Ocorre que os processos administrativos do CADE são dotados de alta

complexidade técnica, abordando assuntos distintos daqueles de conhecimento

dos magistrados. Além da peculiaridade da matéria, as decisões repercutem em

todo setor econômico, produzindo efeitos que não podem ser previstos pelo Poder

Judiciário em razão da sua limitação técnica e operacional.

Em razão disso, há divergência quanto a possibilidade de judicialização das

decisões administrativas antitruste, há julgados que entendem pela possibilidade

de análise pelo Poder Judiciário apenas dos aspectos formais da decisão do

Cade, outra corrente defende a ampla análise judicial, pautando-se no princípio

constitucional da inafastabilidade do controle jurisdicional.

No informativo 605 o Superior Tribunal de Justiça ressaltou a importância

da preservação do princípio da separação dos poderes no momento da análise do

ato administrativo pelo Poder Judiciário. Em seu julgado, a corte superior

entendeu que o Poder Judiciário não possui a expertise necessária para

compreender as conseqüências econômicas e políticas de uma decisão que

invada o mérito administrativo, devendo restringir a sua análise ao âmbito da

legalidade do ato com a norma. (AgInt no AgInt na SLS 2.240-SP, Rel. Min. Laurita

Vaz, por unanimidade, julgado em 7/6/2017, DJe 20/6/2017).

No mesmo sentido, Diogo de Figueiredo Moreira Neto, em sua obra Curso

de Direito Administrativo, apresenta o Princípio da Insidicabilidade do Mérito

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Administrativo, aplicando-o nos casos em que o mérito contido no ato

administrativo não pode sofrer controle pelo Poder Judiciário (2014).

3.2 Análise do Termo de Compromisso de Cessação

A higidez da ordem econômica constitui um direito difuso pertencente a

toda coletividade, em razão disso a adoção de meios eficazes no combate ao

abuso de poder econômico refletirá em benefícios para todo o meio social.

Com o fim de produzir melhores resultados, o Cade na condução de

procedimentos administrativos, de procedimento preparatório de inquérito

administrativo para apuração de infrações à ordem econômica, bem como em

processo administrativo para imposição de sanções administrativas por infrações à

ordem econômica, poderá celebrar um termo de compromisso de cessação (TCC),

conforme o juízo de conveniência e oportunidade no atendimento dos fins legais.

(FIGUEIREDO, 2014, p. 322)

A expressão “juízo de conveniência e oportunidade” contida no artigo 85 da

Lei 12.529/2011 indica que a celebração do TCC por parte da autoridade

administrativa é dotada de discricionariedade, isto é, não há que falar em direito

subjetivo do administrado na celebração do instrumento consensual.

Em sua obra “A utilização do termo de compromisso de cessação de prática

no combate aos cartéis” a autora Patrícia Regina Pinheiro Sampaio entende os

termos de compromisso de cessação como acordos celebrados entre o CADE e

uma ou mais pessoas investigadas por violação aos valores da ordem econômica,

no qual o investigado tem a obrigação de cessar a conduta prejudicial à economia

e o Cade suspende o processo administrativo sancionatório antitruste,

extinguindo-o e arquivando-o após cumprimento do pactuado (2008, p. 01).

Assim sendo, é possível considerar o TCC um instrumento alternativo de

solução de controvérsia, por meio do qual o agente que comete infrações e

prejudica o livre mercado se compromete a algumas obrigações perante a

autoridade, encerrando o seu processo punitivo. Conforme será demonstrado esse

mecanismo é essencial para a produção do resultado desejado, de forma

tempestiva e menos onerosa.

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3.2.1 Breve histórico acerca da evolução dos termos de compromisso de

cessação no Brasil

A Lei 8.884/94 estipulou, em sua forma inicial, a possibilidade de

celebração de Termo de Compromisso de Cessação de Prática, nesse modelo o

agente se comprometia a cessar a prática abusiva em troca da extinção do

processo administrativo antitruste, no entanto a confissão de culpa não era um dos

requisitos, dado que a confissão refletiria na esfera penal.

Após, com a Lei 10.149/2000 que instituiu o acordo de leniência no Brasil o

uso de Termo de Compromisso de Cessação passou a ser vedado em caso de

prática de cartel. Somente com a Lei 11.482/2007 que alterou a Lei 8.884/94

retornou a possibilidade de TCC em casos de cartéis.

No atual modelo é preciso mencionar três modificações introduzidas para a

celebração do Termo de Compromisso de Cessação. A primeira medida foi

implementada pela Lei 11.482/2007, traduz-se na necessidade de recolhimento de

valor ao Fundo de Direitos Difusos e Coletivos nos casos de cartel. A Resolução

N° 46 do CADE inseriu ainda a obrigatoriedade de confissão da culpa pelo infrator

nos casos em que já houver firmado Acordo de Leniência, bem como a

possibilidade de adesão ao programa de prevenção de infrações à ordem

econômica.

3.2.2 Elementos para a celebração do Termo de Compromisso de Cessação

Inicialmente convém esclarecer que o procedimento para a celebração do

Termo de Compromisso de Cessação possui a sua regulamentação prevista na

lei, em Resoluções do CADE, bem como no Regimento Interno do CADE -

RICADE. Dessa forma, quando a regra não estiver contida no texto legal, poderá

sofrer alterações de acordo com a conveniência e oportunidade do CADE, a

depender das circunstancias do caso concreto. (CADE, 2016, p. 06).

Destaca-se o artigo 85, §14 da Lei 12.529/2011 que “o Cade definirá, em

resolução, normas complementares sobre o termo de compromisso de cessação”

(PLANALTO, 2011).

O artigo 85, §1° da Lei 12.529/2011 prevê alguns elementos que deverão

estar presentes no momento da celebração do TCC. Segundo o dispositivo é

preciso que conste a especificação das obrigações do representado,

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comprometendo-se a não pratica a conduta investigada, seus efeitos lesivos e

outras obrigações que a autoridade administrativa julgar cabíveis.

Outro ponto considerado fundamental na celebração do acordo é a fixação

do valor da multa a ser aplicada em caso de descumprimento, total ou parcial, dos

termos previamente fixados. Há ainda que constar no TCC o valor da contribuição

pecuniária ao Fundo de Defesa de Direitos Difuso quando cabível.

Os elementos acima destacados não poderão ser relativizados pelo CADE

na celebração do acordo, não existindo discricionariedade na verificação da

presença desses por parte da autoridade administrativa. Ademais, segundo o texto

legal o termo de compromisso de cessação somente poderá ser apresentado uma

única vez.

No tocante à suspensão do processo administrativo sancionador antitruste

a Lei 12.529/2011 determina que a mera apresentação de proposta de TCC não

paralisa o curso do processo administrativo, sendo necessária a aceitação por

parte do Cade.

No mais, a norma indica que somente ocorrerá a suspensão em relação ao

representado que firmou o compromisso, seguindo o processo para os demais

representados. Assim, o ordenamento jurídico objetiva privilegiar aqueles que

cooperam com o Poder Público e passam informações relevantes para a cessação

da prática lesiva à ordem econômica.

É interessante mencionar que a suspensão do processo administrativo

cessará a partir do descumprimento, parcial ou total, dos termos contidos no termo

de compromisso de cessação. Além disso, o descumprimento também implica na

imposição de sanções contidas no TCC, bem como na adoção de medidas

judiciais cabíveis para a execução.

O artigo 3° da Lei 9.876/99 estabelece que com a celebração do termo de

compromisso de cessação a pretensão punitiva no âmbito da Administração

Pública ficará com a prescrição suspensa, dessa forma, o prazo extintivo voltará a

correr com o descumprimento do pactuado por parte do representado que firmou o

compromisso (PLANALTO, 1999).

Quanto á exigência judicial do TCC deve-se esclarecer que esse possui

status de título executivo extrajudicial, assim eventual inadimplemento das

obrigações nele contidas implicarão no início do processo de execução judicial. A

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vantagem apresentada por essa previsão legislativa é a celeridade na prestação

jurisdicional e o juízo de certeza e liquidez da obrigação, uma vez que não haverá

a fase de conhecimento para análise do mérito pelo juízo.

Por fim, a lei possibilita a alteração dos termos previstos no termo de

compromisso de cessação pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica

quando houver a comprovação que existe onerosidade excessiva para o infrator,

bem como não acarrete prejuízo para terceiros ou para a coletividade.

Na visão de Leonardo Vizeu Figueiredo apesar do TCC ser um instrumento

consensual, a fixação e alteração das cláusulas é uma decisão unilateral tomada

pelo Cade:

Isso porque a celebração do compromisso de cessação implica em encerramento imediato da prática de atividades ou atos, objetos de apuração, bem como em correção das irregularidades, nos termos a serem impostos e aceitos pelo infrator. Assim, há conjugação de vontades, em caráter bilateral, tão somente, no momento de formalização do ajustamento de conduta, sendo a estipulação de suas cláusulas unilateralmente feita pelo ente regulador, a qual o infrator apenas acata (2014, p.351).

Portanto, é possível afirmar que não existe uma verdadeira paridade na

celebração de Termo de Compromisso de Cessação no tocante a fixação das

cláusulas compromissórias, podendo observar a presença de certa verticalidade

na relação. Assim, apesar de ser um mecanismo consensual não é considerado

paritário.

3.2.3 Efeitos decorrentes da celebração de Termo de Compromisso de

Cessação

Conforme já apontado o modelo de atuação consensual proporciona

diversos benefícios no âmbito da Administração Pública. A possibilidade de

alcançar resultados favoráveis aos interesses públicos é crescente quando o

particular diretamente afetado pela ação administrativa participa da construção do

ato.

Do mesmo modo ocorre no setor econômico, a interferência do agente

infrator na sanção administrativa propicia o cumprimento efetivo dos termos

impostos, bem como uma maior aceitação por parte do representado.

Além disso, as decisões produzidas no processo administrativo antitruste

são tomadas com extrema cautela, em razão dos possíveis que reflexos que

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podem ocasionar no mercado. Dessa forma, na maioria das vezes, a decisão é

intempestiva, ocasionando morosidade na cessação da conduta prejudicial ao

mercado concorrencial.

A solução consensual do conflito se apresenta como um método eficaz na

proteção ao mercado, pois o cumprimento do TCC ocorrerá de maneira mais

célere do que o processo administrativo destinado a sancionar o infrator. No mais,

o requisito de cessar a prática ilegal para a celebração do termo de compromisso

de cessação produz efeitos imediatos no setor econômico anteriormente lesado.

A adoção de meio mais célere proporcionará a economia de recursos no

âmbito do Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE, uma vez que

não destinará os recursos humanos e financeiros para o curso regular do processo

administrativo moroso. Assim, os efeitos provocados pela consensualidade

alcançam não apenas o mercado regulado, mas também a própria Administração

Pública.

O Conselheiro Luís Fernando Schuartz ao atuar como relator no Processo

Administrativo n° 08012.011142/2006-79, demonstrou matematicamente que em

determinadas hipóteses a solução por meio de TCC atenderá melhor ao interesse

público. Como argumentou apresentou: (I) o tempo até a decisão administrativa do

CADE, caso não ocorresse o arquivamento antes por perda do objeto; (II) a

probabilidade de busca pela tutela jurisdicional no Poder Judiciário pela parte

condenada, conseguindo medida para suspender e retardar o cumprimento da

decisão; ( III ) o valor a ser entregue pela infratora ao Fundo de Defesa dos

Direitos Difusos. (SAMPAIO, 2008, p. 251)

O Conselheiro Ricardo Villas Bôas Cueva em seu voto no processo

supramencionado destacou que a celebração do compromisso de cessação

importará substancial redução de custos sociais, incluindo-se não somente o custo

que a Administração incorreria até uma decisão final de mérito e na eventual

disputa judicial acerca da legalidade do processo administrativo, mas também o

custo privado de continuação do litígio. Apresentou como benefício o imediato

desalinhamento de interesses entre a compromissária e os demais integrantes do

polo passivo do processo administrativo, bem como o efeito dissuasório que tende

a reforçar a eficácia da proteção da concorrência e a desobstrução das

autoridades, que poderão dedicar seus esforços a outras investigações.

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Assim sendo, o termo de compromisso de cessação proporciona diversos

resultados práticos para o Poder Público, bem como no setor econômico sobre o

qual incidirá os seus efeitos. A adoção de um modelo dialógico de Administração

Pública garante uma maior participação do representado no processo

administrativo e privilegia o princípio da eficiência constitucionalmente

assegurado.

O princípio da eficiência em sua modalidade boa administração pode ser

notado com a redução da prática de burocracias inúteis, que oneram os cofres

públicos e atrasam o resultado pretendido. No mais, a consensualidade é uma

ferramenta que dinamiza e racionaliza o modelo de atuação administrativa,

ocasionando o restabelecimento mais célere e tempestivo do equilíbrio no

mercado econômico.

Essa ascensão da consensualidade verificada em toda Administração

Pública representa a busca por práticas de governança que garantam a boa

administração. Com isso, deve-se entender o desenvolvimento do TCC como um

processo de evolução do próprio Direito Público, no qual se privilegia o fim a ser

alcançado.

Não obstante, o termo de compromisso de cessação é uma ferramenta

dotada de caráter instrumental no alcance dos fins do Estado. O TCC é um

mecanismo legalmente admitido capaz sofrer modificações em sua constituição na

medida em que as peculiaridades do caso concreto exigirem, podendo ser

considerado um meio flexível no atendimento do interesse público.

3.3 Caso relevante

Para analisar a importância do Termo de Compromisso de Cessação

celebrado no âmbito do Conselho Administrativo de Defesa Econômica foi

escolhido um caso recente que envolveu a Empresa UTC Engenharia.

No ano de 2017 o Cade conduzia uma investigação que apurava a prática

de cartel em licitações da Petrobrás no mercado de serviços de engenharia,

construção e montagem industrial “onshore” (PA 08700.002086/2015-14), bem

como a prática de conluio em procedimentos licitatórios de obras e montagem

eletronuclear da Usina Angra 3 (PA 08700.007351/2015-51).

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Em janeiro do mesmo ano o Cade firmou Termos de Compromisso de

Cessação para ambos os processos administrativos, os TCCs foram submetidos a

homologação pelo Tribunal do Cade.

A peculiaridade centrada no caso é o elevado valor fixado para o Termo de

Compromisso de Cessação assinado pela UTC no âmbito do processo de cartel

em licitações da Petrobrás, equivalente ao montante de R$ 129.232.142,71 (cento

e vinte e novemilhões, duzentos e trinta e dois mil, cento e quarenta e dois reais e

setenta e um centavos), sendo considerada a maior contribuição pecuniária

individual negociada com uma empresa em TCC.

Com a celebração do TCC a UTC auxiliou as investigações, apresentando

documentos e informações. Dessa maneira, a cooperação da empresa possibilita

a apuração de outras irregularidades desconhecidas pelo Cade e até mesmo a

comprovação daquelas já sob investigação, reduzindo e otimizando o gasto

público.

Além disso, ao firmar um acordo no âmbito administrativo o agente

econômico foi obrigado a cessar a prática prejudicial aos outros agentes

econômicos, bem como á Administração Pública, uma vez que a fraude ao

sistema licitatório impede a escolha da melhor proposta e ofende diversos

princípios administrativos.

O TCC celebrado com a UTC Engenharia determinava que o pagamento da

primeira parcela de contribuição deveria ocorrer em dezembro de 2017. Ocorre

que a empresa descumpriu o ajuste, fazendo com que fosse instaurado um

procedimento para analisar o atraso no cumprimento do pactuado.

Com a mora da UTC Engenharia, o Cade aplicou a multa prevista no Termo

de Compromisso de Cessação para os casos de descumprimento, bem como

retomou o curso dos processos administrativos que se encontravam suspensos.

O caso apresentado revela a aplicação do Termo de Compromisso de

Cessação e as suas possíveis implicações na regulação do mercado. Apesar da

violação do acordo, a mera celebração do TCC ocasionou na cessação da prática

criminosa realizada pela empresa, assegurando o valor constitucional da livre

concorrência.

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CONCLUSÃO

O recente modelo consensual de atuação administrativa, especialmente no

tocante à celebração de Termo de Compromisso de Cessação de conduta é tema

com pouca produção doutrinária do Brasil. Ainda assim, é de extrema relevância que

seja debatido, compreendido e aperfeiçoado esse método manifestação

administrativa.

A passagem de uma Administração Pública monológica para uma

Administração Pública dialógica decorreu, dentre outros motivos, da transferência

aos particulares das atividades econômicas, que se tornaram cada vez mais

complexas e numerosas, bem como da garantia aos direitos fundamentais e da

reforma administrativa.

A soma desses fatores propiciou o nascimento da consensualidade nas

relações jurídicas com o Poder Público, afastando-se dos ideais imperativos e

unilaterais que comandavam o sistema. A alteração do modelo de atuação

reaproximou o particular do Estado, ocasionando na relativização de algumas

prerrogativas inerentes à Administração Pública.

Conforme apontado, essa flexibilização nas normas de Direito Público gerou

discussão doutrinária no tocante a sua validade. Parte minoritária defendeu a

impossibilidade de atuação conjunta, uma vez que implicaria no afastamento da

imperatividade e unilateralidade, ferindo o interesse público.

Apesar da divergência prevaleceu o entendimento que o fim do Estado não

seria prejudicado com a participação popular, pelo contrário, a manifestação do

administrado concretiza os valores constitucionais democráticos, tornando a decisão

administrativa mais legítima.

Além disso, como demonstrado, o atual modelo de colaboração entre as

partes produz resultados mais céleres e aceitos pelos envolvidos, reduzindo a

judicialização da questão.

No tocante ao tema debatido no presente trabalho, o Termo de Compromisso

de Cessação, deve-se entendê-lo como uma manifestação da consensualidade no

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meio econômico, auxiliando no combate às infrações à economia que prejudicam o

modelo concorrencial.

Nos termos apresentados, o TCC celebrado pelo Cade prestigia o princípio

constitucional da eficiência administrativa ao passo que produz resultados mais

céleres, reduz os custos da Administração Pública na condução do processo

administrativo e aplica multas pecuniárias que são destinadas ao Fundo de Defesa

dos Direitos Difusos. Ademais, a participação do agente econômico infrator no

acordo substitutivo reduz a possibilidade de futuras transgressões por parte desses.

A alteração no modelo de formação da vontade administrativa trouxe

significativos resultados sob o setor de atuação, mostrando-se como um método

eficiente que merece ser inserido nos demais setores de forma mais ampla pelo

Poder Público.

Apesar da necessidade de implementação desse novo sistema consensual, é

imperioso que os meios de prevenção e fiscalização de desvios de condutas dos

agentes públicos sejam aperfeiçoados para melhor identificar ações contrárias ao

ordenamento jurídico que prejudiquem os interesses da sociedade.

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