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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE DANIELLA DE LIZ ROSSONI CARDOSO NECCO A TERCEIRIZAÇÃO E O ESTREMECIMENTO DAS RELAÇÕES TRABALHISTAS NITERÓI 2016

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

DANIELLA DE LIZ ROSSONI CARDOSO NECCO

A TERCEIRIZAÇÃO E O ESTREMECIMENTO DAS RELAÇÕES TRABALHISTAS

NITERÓI

2016

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DANIELLA DE LIZ ROSSONI CARDOSO NECCO

A TERCEIRIZAÇÃO E O ESTREMECIMENTO DAS RELAÇÕES TRABALHISTAS

Trabalho de Conclusão de Curso

apresentado à Faculdade de Direito

da Universidade Federal Fluminense

como requisito parcial à obtenção do

grau de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Dr. Joaquim Leonel de Rezende Alvim

NITERÓI

2016

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Universidade Federal Fluminense

Superintendência de Documentação

Biblioteca da Faculdade de Direito

N364

Necco, Daniella de Liz Rossoni Cardoso

A terceirização e o estremecimento das relações trabalhistas / Daniella de Liz

Rossoni Cardoso Necco. – Niterói, 2016.

57 f.

TCC (Curso de Graduação em Direito ) – Universidade Federal Fluminense,

2016.

1. Direito do trabalho. 2. Terceirização. 3. Flexibilização. 4. Relações trabalhistas. 5. Emprego. I. Universidade Federal Fluminense. Faculdade de Direito, Instituição responsável II. Título.

CDD 342.6

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DANIELLA DE LIZ ROSSONI CARDOSO NECCO

A TERCEIRIZAÇÃO E O ESTREMECIMENTO DAS RELAÇÕES TRABALHISTAS

Trabalho de Conclusão de Curso

apresentado à Faculdade de Direito da

Universidade Federal Fluminense como

requisito parcial à obtenção do grau de

Bacharel em Direito.

Aprovado em 28 de março de 2016.

BANCA EXAMINADORA

____________________________________________________

Prof.Dr. Joaquim Leonel de Rezende Alvim - Orientador

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

____________________________________________________

Prof.ª Dr.ª Carla Appollinario de Castro

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

______________________________________________________

Prof.ªM.ª Clarisse Inês de Oliveira

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

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Dedico este trabalho ao amor da minha família...

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AGRADECIMENTOS

À Universidade Federal Fluminense pelo apoio institucional.

Ao meu primeiro orientador, Ricardo Melchior de Barros Rangel (in

memoriam), que me ofereceu sua atenção quando eu solicitei. Descanse em paz.

Ao professor doutor Joaquim Leonel de Rezende Alvim que ofereceu aulas

excelentes durante a minha graduação, além disso, aceitou prontamente me orientar

e realizou essa tarefa da maneira mais atenciosa possível.

À minha mãe, Maura, pelo amor incondicional que me ajudou durante toda a

graduação, sempre pude contar com sua palavra amiga e acolhedora.

Ao meu pai, Ernesto, pelo seu amor e dedicação. Ele sempre batalhou pelos

meus estudos, sem dúvida, seu apoio foi imprescindível ao meu sucesso.

À toda a minha família que acompanhou e torceu pelo meu crescimento.

Aos meus amigos da graduação, especialmente à Carol pelas risadas.

Às minhas amigas de escola que sempre deram uma palavra de incentivo

durante a minha graduação ou contribuíram de algum modo com algum

questionamento sobre a monografia. Obrigada Bilu, Luiza, Nathália, Priscilla,

Victoria.

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Há ainda um erro muito em voga, do qual

quero fugir como do diabo. Refiro-me à ideia

de progresso. Esse farol obscuro, invenção

do filosofismo atual, aprovado sem garantia

da Natureza ou da Divindade, essa lanterna

moderna projeta trevas sobre todos os

objetos do conhecimento; a liberdade se

esvai, o castigo desaparece. Quem quiser

ver com clareza na história deve, antes de

mais nada, destruir esse farol enganador.(...)

(BAUDELAIRE, 1988, pp. 35-6.)

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Resumo

O presente estudo discute o intenso processo de flexibilização nas relações de trabalho via terceirização. Na primeira parte são apresentadas as concepções filosóficas acerca do trabalho e, nesse sentido, a indicação do contexto histórico no qual teve origem a terceirização e o destacado avanço da globalização, do neoliberalismo e da reestruturação na cadeia produtiva. Adiante uma conceituação e apresentação da terceirização são fornecidas a partir de um enfoque jurídico seguido de uma breve análise legislativa sobre essa espécie de contratação. Ainda são expostos os argumentos emitidos pelos defensores e opositores desse fenômeno trabalhista. Também são enunciados os mais relevantes resultados que indicam um processo de precarização na vida da classe trabalhadora terceirizada.

Palavras-chave: terceirização; flexibilização; trabalho; precarização; emprego.

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RÉSUMÉ

Cette étude examine le processus intense de l'assouplissement des relations de travail via la sous-traitance. La première partie présente les conceptions philosophiques du travail et, en conséquence, ce qui indique le contexte historique dans lequel la sous-traitance est issue et la promotion exceptionnelle de la mondialisation, le néolibéralisme et la restructuration de la chaîne d'approvisionnement. Ensuite une conceptualisation et la présentation de la sous traitance sont fournies à partir d’ une approche juridique suivie d’ une brève analyse législative de ce type de contrat. En plus, les arguments émis par les partisans et les adversaires de ce phénomène du travail sont encore exposés. Aussi les résultats les plus pertinents indiquent processus de précarisation dans la vie de la classe ouvrière sous-traitance.

Mots-clés: la sous-traitance; la flexibilité; travail; précarité; l'emploi.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................... 10

1. O TRABALHO A PARTIR DE UMA PERSPECTIVA HISTÓRICA ............ 12

2. A GLOBALIZAÇÃO E A TERCEIRIZAÇÃO .............................................. 17

2.1 CONCEITUAÇÃO ................................................................................. 21

3. O DIREITO DO TRABALHO E A TERCEIRIZAÇÃO ................................. 23

3.1 A EDIÇÃO DA LEI 6.019/74 ................................................................. 24

3.2 TERCEIRIZAÇÃO LÍCITA E ILÍCITA DE ACORDO COM A

SÚMULA 331 DO TST ................................................................... 32

3.3 O PROJETO DE LEI Nº30/2015 .............................................. 35

4. A MERCANTILIZAÇÃO DO VALOR TRABALHO..................................... 40

4.1 TERCEIRIZAÇÃO NO CENTRO DA PRECARIZAÇÃO ....................... 41

4.2 TRABALHO DECENTE X TERCEIRIZAÇÃO ................................ 44

4.3 OS IMPACTOS DA TERCEIRIZAÇÃO

NA COLETIVIDADE ............................................................... 50

CONCLUSÃO ................................................................................................. 52

REFERÊNCIAS .............................................................................................. 54

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como tema o estudo da terceirização. A opção por

este assunto relaciona-se ao fato deste fenômeno inserir-se nas relações de

trabalho como uma prática cada vez mais usual na gestão econômica, na proporção

em que o empresariado reclama por medidas que possibilitem a flexibilização das

relações de trabalho gerando redução de custos e máxima expansão dos lucros.

Segundo Pochmann, estima-se que existam no mundo “376,8 milhões de

trabalhadores envolvidos diretamente com atividades laborais terceirizadas (15,5%

do total da mão-de-obra)”1. Dessa forma, eu, enquanto estudante de Direito,

busquei, ao realizar o presente estudo, compreender os reais sentidos da

terceirização. Ou seja, verificar se a mesma proporciona, de fato, aquilo que é

propagado por seus defensores. Além disso, analisar se os impactos sofridos pela

classe trabalhadora terceirizada revelam-se mais positivos ou negativos.

Isto posto, para melhor compreensão da terceirização que vem operando

verdadeira reformulação na relação trabalhista, a presente pesquisa, primeiramente,

apresentará uma breve reflexão filosófica acerca do trabalho e do contexto histórico

no qual surgiram as condições favoráveis a implementação dessa prática que foi

inserida através de um processo gradual e incisivo de promoção da globalização, do

neoliberalismo e da reestruturação na cadeia produtiva. Destaca-se a introdução do

modelo toyotista de produção no país, que se estendeu, sobretudo a partir da

década de 1970, com a inserção dos “círculos de controle de qualidade (CCQ)” 2nas

grandes empresas como reflexo de um movimento mais amplo que relaciona-se com

a multinacionalização.

1 POCHMANN, Marcio. O emprego no desenvolvimento da nação. São Paulo: Boitempo Editorial, 2008, p.20.

2 ANTUNES, Ricardo. Mundo do trabalho e sindicatos na era da reestruturação produtiva: impasses e desafios do sindicalismo brasileiro. Transinformação. Campinas. 1996, v 8, n 3, p.131.

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Posteriormente, a terceirização será abordada a partir de um viés jurídico

com ênfase nas construções legislativas e jurisprudenciais sobre o tema, ainda que

essa prática de contratação de terceiros não possua legislação específica a respeito.

Com efeito, a referida lacuna legislativa será examinada no que diz respeito aos

diversos embates referentes a extensão da aplicabilidade da terceirização. Em razão

disso, será especialmente apreciado o Projeto de Lei (PL) nº30/2015 que já foi

aprovado pela Câmara dos Deputados, praticamente na íntegra, e, atualmente,

tramita no Senado com a promessa de definir e regular o contrato de prestação de

serviço e as relações de trabalho dele decorrentes, ao indicar a terceirização como

um acontecimento inevitável, inexorável, imprescindível ao bom desenvolvimento

econômico brasileiro.

Em contraponto, o presente estudo também apresenta o discurso de parcela

da sociedade que critica a terceirização enquanto prática catalisadora desse cenário

de flexibilização das relações de trabalho. Ainda, nesse contexto, com base em

dados estatísticos, será retratado o quadro de precarização sofrido pela classe

trabalhadora terceirizada.

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1. O TRABALHO A PARTIR DE UMA PERSPECTIVA HISTÓRICA.

O termo trabalho pode ter nascido do vocábulo latino tripallium3, que

significa instrumento de tortura, e por muito tempo esteve associado à ideia de

atividade penosa e torturante. Com efeito, o trabalho desde muito tempo serviu

como instrumento de depreciação do indivíduo como, por exemplo, através do

julgamento aviltante daqueles que trabalhavam, visto que o labor era considerado

uma desonra, como bem destaca Aristóteles:

A perfeição do cidadão não qualifica o homem livre, mas só aquele que é isento das tarefas necessárias das quais se incumbem servos, artesãos e operários não especializados; estes últimos não serão cidadãos, se a constituição conceder os cargos públicos à virtude e ao mérito, pois não se pode praticar a virtude levando-se uma vida de operário ou de trabalhador braçal4.

Os gregos distinguiam claramente atividade braçal de quem cultiva a terra, a

atividade manual do artesão e a atividade do cidadão que discute e procura

soluções para os problemas da cidade.

Nas sociedades feudais, havia também grupos específicos que compunham

a força de trabalho – os servos, os camponeses livres e os aldeãos – e, em

contraponto, existiam aqueles que se beneficiavam do trabalho alheio – os membros

do clero e os senhores feudais.

Em linhas gerais, da Antiguidade até o fim da Idade Média, as concepções

do que denominamos trabalho apresentaram variações, mas poucas alterações.

3 Assim a língua grega diferencia entre ponein e ergazesthai, o latim entre laborare e facere ou fabricari, que têm a mesma raiz etimológica; o francês entre travailler e ouvrer, o alemão entre arbeiten e werken. Em todos estes casos só os equivalentes de <labor> tem conotação de dor e atribulação. O alemão Arbeit aplicava-se originariamente ao trabalho agrícola executado por servos, e não ao trabalho do artífice, que era chamado Werk. O francês travailler substituiu a outra palavra mais antiga, labourer, e vem de tripallium, que era uma espécie de tortura. Veja-se GRIMM, Wöterbuch, PP.1854., e FÈBRE, Lucien, Travail:évolution d’un mot et d’une idée, no Jounal de psychologie normale et pathologique. Vol.XLI, Nº. 1. 1948, apud ARENDT, Hannah. A Condição Humana; tradução de Roberto Raposo, posfácio de Celsio Lafer.- 10ªedição. Rio de Janeiro: Forense Universitária. 2007. P.90, grifo nosso. 4ARISTÓTELES apud VEYNE, Paul. Trabalho e Ócio.In: Áries, P.,Duby, G.História da vida Privada. São Paulo: Companhia da Letras, 1990. v.1: Do Império Romano ao ano mil. p. 124-5

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Sempre muito desvalorizado, o trabalho não era o elemento central, o núcleo que

orientava as relações sociais. Estas se definiam pela hereditariedade, pela religião,

pela honra, pela lealdade e pela posição em relação às questões públicas. Eram

esses os elementos que permitiam que alguns vivessem do trabalho dos outros.

Com o fim do período medieval e a emergência do mercantilismo e do

capitalismo, a concepção de trabalho foi alterada, se antes, o mesmo era visto como

uma atividade penosa e torturante passou aos poucos a ser considerado algo

positivo5.

Agora, vejamos como se revelaram as sucessivas transformações no âmbito

do trabalho já na modernidade. Para tanto, serão analisadas as consecutivas

revoluções industriais que forneceram as condições propícias ao atual estado de

coisas nas quais nos encontramos.

Para entendermos a realidade contemporânea na qual estamos inseridos, ou

seja, a terceira revolução industrial, também conhecida como revolução técnico

científica, devemos pontuar o que foram a primeira e a segunda revolução industrial.

A primeira revolução industrial foi aquela que se iniciou na segunda metade

do século XVIII e prosseguiu até o fim do século XIX. Ela se originou no Reino Unido

e depois se espalhou por outros países e regiões do globo. Seu principal símbolo foi

a máquina a vapor, que revolucionou o transporte marítimo e terrestre, permitindo a

produção industrial mecanizada, nesse contexto, as indústrias mais relevantes eram

as têxteis. A mão de obra dessa fase era formada por trabalhadores que não eram

especializados e, tampouco, qualificados.

Nessa época, revela-se, de forma avassaladora, ainda outro aspecto

negativo em relação ao trabalho, posto que foi corriqueira a prática da exploração da

força de trabalho utilizada como mecanismo de lucro, por exemplo, temos o século

XVIII, no qual eclodiram sucessivos movimentos operários insatisfeitos com uma

5 OFFE, Claus. Trabalho e Sociedade: Problemas estruturais e perspectivas para o futuro da ‘’Sociedade do Trabalho’’/ Claus Offe; tradução de Gustavo Bayer.- Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1989, p. 14: ‘’ A antiga hierarquia entre atividades "inferiores" e "superiores", entre meros afazeres úteis ou necessários e manifestações significativas de vida (que se reflete na maior parte das línguas europeias através da dualidade de conceitos como ponos/ergon, labor/opus, labour/work, Arbeit/Werk, trabalho/obra) foi nivelada e até mesmo invertida em consequência do triunfo da reforma teológica, das construções teóricas político-econômicas e da revolução burguesa (sobre a evolução conceitual cf. Conze, 1972 e Arendt, 1958)’’.

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série de abusos por parte de seus patrões. A título de exemplo, como destaque

histórico e referencial até hoje, temos o rebentamento do movimento operário norte

americano, em Chicago, no dia 1º de maio de 1886, que se revelou em uma greve

geral pela jornada diária de oito horas de trabalho.

Numa das passagens de Germinal, obra escrita em 1881, Émile Zola

descreve uma marcha dos mineiros do carvão de Montsou, norte da França.

Torturados pela fome, após dois meses de greve, milhares deles clamam por pão.

As mulheres tinham aparecido, cerca de mil, cabelos ao vento, desgrenhados pela correria, os farrapos deixando à mostra a pele nua, nudez de fêmeas exaustas de parir mortos de fome. Algumas traziam os filhos nos braços, e levantavam-nos, agitando-os como uma bandeira de luto e vingança. Outras, mais jovens, com peitos estufados de guerreiras, brandiam paus, enquanto as velhas, monstruosas, berravam tão alto que as veias dos seus pescoços descarnados pareciam rebentar.

Em seguida vieram os homens, dois mil furiosos, aprendizes, britadores, consertadores, verdadeira massa compacta (...). Os olhos faiscavam, viam-se apenas os buracos negros das bocas cantando a Marselhesa, cujas estrofes se perdiam num bramido confuso acompanhada pelo bater dos tamancos na terra dura. Acima das cabeças, entre a floresta de barras de ferro, passou um machado, bem ao alto. Esse único machado, que era como o estandarte do bando, desenhava no céu claro o perfil aguçado de um cutelo de guilhotina. (...)

Realmente, a cólera, a fome, os dois meses de sofrimentos e aquela correria desenfreada pelas minas tinham transformado em mandíbulas de animais ferozes as feições plácidas dos mineiros de Montsou. Naquele momento o sol desaparecia; os últimos raios, de um púrpuro sombrio, pareciam ensanguentar a planície. E a estrada também pareceu lavada em sangue; as mulheres e os homens continuavam marchando, cobertos de sangue, como carniceiros em plena matança. (...)

Era a visão vermelha que arrastaria a todos, fatalmente, numa dessas noites sangrentas desse fim de século. Sim, uma noite, o povo em torrentes, desenfreado, correria assim pelos caminhos, gotejando o sangue burguês, exibindo cabeças, semeando o ouro dos cofres arrombados. As mulheres gritariam, os homens abririam suas queixadas de lobos, prontos para morderem. Sim, seriam os mesmos farrapos, o mesmo matraquear de tamancos grosseiros, a mesma turba assustadora, suja, de hálito fétido, varrendo o mundo caduco com a sua irresistível avalanche de bárbaros.( ...) Não sobraria nada, as fortunas e os títulos das situações adquiridas desapareceriam, até o dia em que talvez desabrochasse uma nova sociedade. Sim, eram essas coisas que estavam passando pela

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estrada, como uma força da natureza, e vinha delas o vento terrível que lhes açoitava os rostos.

Um enorme clamor se elevou, dominando a Marselhesa:

— Pão! Pão! Pão!6

Já a segunda revolução industrial, que se estendeu do fim do século XIX até

o fim do XX, foi simbolizada pelo aperfeiçoamento contínuo dos sistemas produtivos,

dando origem a uma divisão do trabalho muito bem detalhada e encadeada.

Essa nova forma de organização tornou-se conhecida como fordismo, numa

referência a Henry Ford. Foi ele quem, a partir de 1914, implantou em sua fábrica de

automóveis um modelo que seria seguido por muitas outras indústrias, a ponto de

representar uma nova etapa da produção industrial. Numa linha de montagem, cada

operário faz apenas uma parte do trabalho, e isso agilizou e barateou imensamente

a produção, mas alienou o trabalhador do produto final do seu trabalho, na medida

em que numa linha de produção, o trabalhador apenas se concentra no esforço

repetitivo de sua tarefa, e, portanto, lhe falta a compreensão do produto como um

todo. A principal fonte de energia era o petróleo e as indústrias de vanguarda eram a

automobilística, a petroquímica, a mecânica e a siderúrgica. A força de trabalho

desse período era em geral especializada, com cursos técnicos de torneiro

mecânico, ferramenteiro, datilógrafo, arquivista, técnico de contabilidade, soldador,

pintor industrial, etc. Mas isso por si só não explica o fordismo. É apenas um de seus

aspectos.

Já no final do século XIX, Frederick Taylor, em seu livro Princípios de

administração científica, propunha a aplicação de princípios científicos na

organização do trabalho, buscando maior racionalização do processo produtivo. Por

conseguinte, com as mudanças introduzidas por Henry Ford em sua fábrica, as

expressões fordismo e taylorismo passaram a ser usadas para identificar um mesmo

processo: aumento de produtividade com o uso mais adequado possível de horas

trabalhadas, por meio do controle das atividades dos trabalhadores, divisão e

parcelamento das tarefas, mecanização de parte das atividades com introdução da

6 ZOLA, Émile. Germinal. Série Ouro. Martin Claret. p. 273-274

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linha de montagem e um sistema de recompensas e punições conforme o

comportamento dos operários no interior da fábrica.

Em razão dessas medidas, foi desenvolvido um sistema de planejamento

para aprimorar cotidianamente as formas de controle e execução das tarefas, o que

resultou na criação de um setor de especialistas na administração da empresa.

Por fim, a Terceira Revolução Industrial que se encontra em andamento e

deverá atingir o seu maior desenvolvimento no transcorrer do século XXI, iniciou-se

no fim dos anos 70, com a adoção das modernas tecnologias de informação pelas

empresas. Essa fase é marcada pela substituição do petróleo por outras fontes de

energia – hidrogênio, solar, de origem biotecnológica, etc. – e por novos setores de

vanguarda: a informática, a robótica, a biotecnologia, as telecomunicações, a

microeletrônica e outras.

É o que observa Giovanni Alves no tocante ao desenvolvimento da

tecnologia digital e da robótica na

constituição de um mundo do trabalho fluido [...] constituído pela utilização de novas técnicas de organização centradas no just-in-time/kanban, na produção de tempo real, exigindo fluxos de produção intermitentes e contínuos [...] de um mundo do trabalho difuso [...] constituído pelo desenvolvimento das formas de descentralização da produção de mercadorias, cuja expressão mais clara é a terceirização e a constituição de empresas-rede [...] e de um mundo de trabalho flexível [...] constituído pela introdução de novas tecnologias flexíveis de produção, adequadas a situações de mercados instáveis e de alta concorrência no mercado mundial.7

Como a recessão aumentou por causa da crise do petróleo, o empresariado

buscou novas alternativas a fim de elevar a produtividade do trabalho e expandir os

lucros. Começaram, então, a surgir novas formas de flexibilização do trabalho e do

mercado. Nesse sentido, importantes mudanças estão ocorrendo com essa nova

revolução industrial: tanto a mão-de-obra barata quanto a especializada em nível

médio (aquela da segunda revolução industrial) vão se tornando obsoletas ou

7 ALVES, Giovanni. O novo (e precário) mundo do trabalho. São Paulo: Boitempo, 2000, apud FILHO, Roberto Murillo de Souza. A flexibilização da legislação do trabalho no Brasil. Disponível em: <http://www.sintet.ufu.br/sindicalismo.htm#A FLEXIBILIZAÇÃO DA LEGISLAÇÃO DO TRABALHO> Acesso em: 15 de março de 2016.

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superadas; a mão-de-obra mais exigida atualmente é a qualificada e flexível, que se

renova ou se recicla constantemente, de preferência com elevada escolaridade. O

mais importante agora para o trabalhador não é a força muscular nem o trabalho

técnico repetitivo. As qualificações exigidas são a criatividade, a flexibilidade, a

capacidade de raciocínio e de saber se integrar no grupo, na equipe, na

comunidade.

Em seu livro Condição pós-moderna, David Harvey chamou essa fase de pós-fordismo, ou fase da acumulação flexível.

A acumulação flexível, como vou chamá-la, é marcada por um confronto direto com a rigidez do fordismo. (...) Caracteriza-se pelo surgimento de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras de fornecimento de serviços financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica e organizacional. A acumulação flexível envolve rápidas mudanças de padrões do desenvolvimento desigual, tanto entre setores como entre regiões geográficas, criando, por exemplo, um vasto movimento no emprego no chamado ‘’setor de serviços’’, bem como conjuntos industriais completamente novos em regiões até então subdesenvolvidas (...)

A acumulação flexível foi acompanhada na ponta do consumo, portanto, por uma atenção muito maior às modas fugazes e pela mobilidade de todos os artifícios de indução de necessidades e de transformação cultural que isso implica. A estética relativamente estável do modernismo fordista cedeu lugar a todo o fermento, instabilidade e qualidades fugidias de uma estética pós-moderna que celebra a diferença, a efemeridade, o espetáculo, a moda e a mercadificação de formas culturais. 8

2. A GLOBALIZAÇÃO E A TERCEIRIZAÇÃO.

É no interior desse debate de mudanças sociais e científicas que podemos

observar o surgimento das condições que tornaram possível a construção do plano

trabalhista que hoje se apresenta.

Nas últimas décadas do século XX, o termo globalização tornou-se sinônimo

e paradigma de modernidade. Nessa acepção, ele surgiu com o denominado

capitalismo global que pressionou as economias internas de cada país a se adaptar

às condições competitivas globais.

8 HARVEY, David. Condição pós-moderna. 3.ed. São Paulo:Loyola, 1993.p.140 e 148.

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A globalização relaciona-se ao processo pelo qual economias e sociedades

locais passam a participar e se tornar dependentes da economia e cultura

internacionais. Isso se opera por fluxos de tecnologia, informações, pessoas e

capital. As diversas inovações no campo da tecnologia permitiram uma flexibilização

das relações antes nunca percebida. Alguns são os estudos sobre essa tendência

considerando que :

A globalização tem um aspecto inegavelmente material, na medida em que é possível identificar, por exemplo, fluxos de comércio, capital e pessoas por todo o globo. Eles são facilitados por tipos diferentes de infra estrutura – física (como os transportes e sistemas bancários), normativa (como as regras de comércio) e simbólica ( a exemplo do inglês, usado como língua universal) – que criam as precondições para formas regularizadas e relativamente duradouras de interligação global. (...)

Mas o conceito de globalização denota muito mais que a ampliação de relações e atividades sociais atravessando regiões e fronteiras. É que ele sugere uma magnitude e uma intensidade crescente de fluxos globais de tal monta que Estados e sociedades ficam cada vez mais enredados em sistemas mundiais e redes de interação. Em consequência disso, ocorrências e fenômenos distantes podem passar a ter sérios impactos internos, enquanto os acontecimentos globais podem gerar repercussões globais de peso.(...)9

Outrossim, existem as circunstâncias políticas, como, por exemplo, a

adesão ao capitalismo, bem como a pressão contra as barreiras alfandegárias e o

nacionalismo econômico, liderada por países exportadores e órgãos internacionais

como o FMI e Banco Mundial.

Nesse sentido, sob pressão da concorrência global e mudanças culturais, as

empresas buscam novos métodos de trabalho. Assim, surgem novas teorias

administrativistas propondo relações alternativas de trabalho. Dentre elas, a

terceirização que é a tendência de empresas especializadas para funções

específicas, como limpeza, informática, transporte ou alimentação. Tal busca por

flexibilização e mobilidade dos mercados de trabalho busca instaurar novas relações

de trabalho diversas da estabelecida pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT),

9 HELD, David e MCGREW, Anthony. Prós E Contras Da Globalização. Rio de janeiro: Ed.Zahar,

2001, pp.7-13.

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que é considerada antiquada e muito onerosa pelas empresas, tendo em vista que

foi criada em 1943 durante o governo de Getúlio Vargas.

Os defensores das mudanças ocorridas a partir dos anos 90 dizem que a

economia brasileira deverá melhorar com a flexibilização das barreiras impostas pela

rígida legislação trabalhista e, como resultado, teremos o consequente aumento da

concorrência estrangeira, uma pressão que faz com que as empresas do Brasil

estejam mais em sintonia com as do mundo. Nessa perspectiva, a Confederação

Nacional da Indústria (CNI), no documento Terceirização: o imperativo das

mudanças, realizado pela CNI, afirma:

A terceirização é um fenômeno irreversível, reflexo da divisão do trabalho moderno num contexto produtivo globalizado. A indústria precisa ter condições de competir não apenas no mercado interno, mas dentro de cadeias globais de valor10.

Comumente é apresentado o argumento de que a terceirização aumenta a

produtividade, pois empresas que se dedicam a sua atividade fim costumam ser

mais eficientes que um setor de empresa maior. Na abertura da primeira edição do

seminário Diálogo da Terceirização, ocorrido em 06 de novembro de 2015, Pedro

Alves de Oliveira, presidente da Federação das Indústrias do Estado de Goiás

(FIEG)11, afirmou ‘’terceiriza-se com o objetivo de se obter melhorias em

produtividade e especialização e, consequentemente, de ganhos de competitividade,

o que permite fornecimento de produtos e serviços com menores custos.’’

10 TERCEIRIZAR é a solução? Correio Braziliense, 26 de outubro de 2012. Disponível em <http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/euestudante/ensino_educacaoprofissional/2012/10/26/ensino_educacaoprofissional_interna,330203/terceirizar-e-a-solucao.shtml > Acesso em: 01 de março de 2016.

11 NATHALYA, Toaliari. Empresários e trabalhadores debatem terceirização em seminário realizado em Goiânia: Evento foi realizado na Casa da Indústria, sede da Federação das Indústrias do Estado de Goiás. Projeto de Lei que regulamenta o tema está em tramitação no Senado. Agência CNI de notícias, 9 de novembro de 2015. <http://www.portaldaindustria.com.br/cni/imprensa/2015/11/1,76528/empresarios-e-trabalhadores-debatem-terceirizacao-em-seminario-realizado-em-goiania.html> Acesso em: 01 de março de 2016.

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Com base nessa visão, revela-se um discurso que indica que as relações

tradicionais de trabalho, ou seja, aquelas que se manifestam por meio da

bilateralidade empregador-empregado, tornaram-se completamente ultrapassadas,

superadas. Na medida em que, segundo alguns, não é mais possível congregar

todas as funções e atividades na própria empresa contratante, pois isso se revelaria

em retrocesso econômico. E, nessa esteira, a relação triangular de trabalho é

apresentada como resposta a todos os problemas da cadeia produtiva.

Todavia, tal opção representa um custo para os trabalhadores, na medida

em que quando as grandes empresas reuniam numerosa mão de obra, era mais

oportuno fiscalizar o cumprimento de leis trabalhistas do que monitorar milhares de

pequenas empresas, pelo mesmo motivo, os sindicatos também perderam parte de

sua força. Nesse sentido Giovanni Alvez comenta:

A mescla de elementos predatórios, que ampliam a inseguridade típica da força de trabalho como mercadoria, e elementos de envolvimento, de caráter toyotista, é que sedimenta o peso ideológico da flexibilidade e da flexibilização da legislação trabalhista [...] alguns juristas buscam apresentar com positividade a flexibilização do Direito do Trabalho, ressaltando sua adaptabilidade às necessidades da empresa (e, por conseguinte, do próprio trabalhador assalariado) e seu caráter concertativo, pois supõe privilegiar o acordo entre as partes contratantes. O elemento paradoxal (e irônico) é que o apelo à livre negociação ocorre num período de crise estrutural do sindicalismo e de sua capacidade de mobilização de classe, além de ocorrer num cenário de desemprego massivo, o que demonstra o caráter ideológico visceral da lógica da

flexibilização12.

Com efeito, ao contrário do Fordismo / Taylorismo que defende uma

verticalização da empresa, que controlaria assim todo o ciclo de produção, o

Toyotismo é a favor da horizontalização, justamente para atender, com maior

eficiência, as atividades precípuas da empresa.

12 ALVES, Giovanni. ALVES, Giovanni. Flexibilização da Legislação Trabalhista -O Panorama Internacional apud FILHO, Roberto Murillo de Souza. A flexibilização da legislação do trabalho no Brasil. Disponível em: <http://www.sintet.ufu.br/sindicalismo.htm#A FLEXIBILIZAÇÃO DA LEGISLAÇÃO DO TRABALHO> Acesso em: 15 de março de 2016.

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2.1 CONCEITUAÇÃO

O fenômeno da terceirização não possui legislação específica a respeito.

Nessa medida, a conceituação do termo terceirização restringe-se ao debate

realizado em sede doutrinária, seja no âmbito jurídico com suporte da jurisprudência,

no sociológico ou ainda no empresarial.

Assim, vejamos algumas conceituações fornecidas pelas diferentes ciências

e distintos posicionamentos.

A seguir a definição de terceirização segundo o entendimento de Sergio

Pinto Martins:

A terceirização é um fenômeno que se apresenta com maior ou menor intensidade em quase todos os países. Num mundo que tende para a especialização em todas as áreas, gera a terceirização novos empregos e novas empresas, desverticalizando-as, para que possam exercer apenas a atividade em que se aprimoram, delegando a terceiros a execução dos serviços em que não se especializaram13.

O mesmo autor desenvolve o seu raciocínio ao explicar a origem do nome

terceirização:

Terceirização deriva do latim tertius, que seria o estranho a uma relação entre duas pessoas. Terceiro é o intermediário, o interveniente. No caso, a relação entre duas pessoas poderia ser entendida como a realizada entre o terceirizante e o seu cliente, sendo que o terceirizado ficaria fora dessa relação, daí, portanto, ser terceiro14.

Segundo Ciro Pereira da Silva, a terceirização pode ser definida como:

(...) a transferência de atividades para fornecedores especializados,

detentores de tecnologia própria e moderna, que tenham esta

atividade terceirizada como atividade-fim, liberando a tomadora para

concentrar seus esforços gerenciais em seu negócio principal,

preservando e evoluindo em qualidade e produtividade, reduzindo

custos e gerando competitividade15.

13 MARTINS, Sérgio Pinto. A terceirização e o direito do trabalho. São Paulo: Atlas, 2014, p.1. 14 MARTINS, Sérgio Pinto. A terceirização e o direito do trabalho. São Paulo: Atlas,2014, p.6. 15 SILVA, Ciro Pereira da. A terceirização responsável:modernidade e modismo. Ed: Ltr, 1997, p.30.

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A partir dessa perspectiva empresarial, os supracitados autores nos

propõem uma definição de terceirização voltada para um viés mercadológico que

busca, nessa modalidade de contratação, uma maneira de otimizar ao máximo a

gestão da empresa. Para mais, podemos vislumbrar uma indicação de que a mão de

obra contratada diretamente é considerada como obstáculo ao pleno crescimento da

indústria. Outrossim, é mencionado o termo ‘’atividade- fim’’ que será esclarecido ao

longo do presente trabalho em contraponto a expressão atividade meio.

Sob o enfoque jurídico, Mauricio Godinho Delgado preleciona:

Para o Direito do Trabalho terceirização é o fenômeno pelo qual se dissocia a relação econômica de trabalho da relação justrabalhista que lhe seria correspondente. Por tal fenômeno insere-se o trabalhador no processo produtivo do tomador de serviços sem que se estendam a este os laços justrabalhistas, que se preservam fixados com uma entidade interveniente. A terceirização provoca uma relação trilateral em face da contratação da força de trabalho no mercado capitalista: o obreiro, prestador de serviços, que realiza suas atividades materiais e intelectuais junto à empresa tomadora de serviços; a empresa terceirizante, que contrata este obreiro, firmando com ele os vínculos jurídicos permanentes; a empresa tomadora de serviços, que recebe a prestação de labor, mas não assume a posição clássica de empregadora desse trabalhador envolvido16.

Dessa forma, concluímos que a terceirização é a contratação de

prestação de serviços que se caracteriza notoriamente pela sua qualidade de

triangulação da relação de trabalho e consequente rompimento com o clássico

modelo empregatício que se funda em relação de caráter essencialmente bilateral

que se estabelece entre empregado e empregador. Neste sentido, para Vilson

Antonio Rodrigues Bilhalva ‘’terceirização é a transferência da execução de

determinadas atividades empresariais, até então realizadas por pessoal próprio,

para parceiros idôneos e especializados17’’.

Já Graça Druck aborda o tema sob um aspecto mais crítico que avalia a

flexibilização das relações trabalhistas:

(...) a terceirização é a principal política de gestão e organização do trabalho no interior da reestruturação produtiva. Trata-se da forma

16 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2014, p.436. 17 BILHALVA, Vilson Antônio Rodrigues. Terceirização, Revista Síntese Trabalhista, Porto Alegre, 96, jun/97, p.22)

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mais visível da flexibilização do trabalho, pois permite concretizar, no plano da atividade do trabalho, o que mais tem sido propagado pelas estratégias e discurso empresariais, contratos flexíveis: contrato por tempo determinado, por tempo parcial, por tarefa (por empreita), por prestação de serviço, sem cobertura legal e sob responsabilidade de terceiros, transferir custos trabalhistas e responsabilidades de gestão passa a ser um grande objetivo das empresas mais modernas e mais bem situadas nos vários setores de atividade, no que são seguidas pelas demais empresas18.

3. O DIREITO DO TRABALHO E A TERCEIRIZAÇÃO

O impacto promovido pela terceirização tornou a matéria de extrema

importância, motivo pelo qual o estudo dessa questão é cada vez mais atual, e para

entender melhor suas características é necessário entender sua fundamentação

jurídica.

Dito isso, os primeiros indícios do que hoje se denomina terceirização

surgem no período da Segunda Guerra Mundial, nos Estados Unidos. A relação de

emprego até então se caracterizava, quanto aos sujeitos, pelo binômio

empregado/empregador, de forma direta, entretanto, visando atender à grande

demanda armamentícia, as indústrias bélicas norte-americanas focaram suas

atividades para sua finalidade principal, delegando a terceiros as tarefas residuais,

aparecendo assim um novo participante nesta relação, que até então era bilateral19.

No Brasil, tal noção somente foi trazida na década de 1950, sendo a

indústria automobilística um forte exemplo, quando se contratou serviços de

terceiros para a produção de componentes dos automóveis com a reunião de peças

então fabricadas por aqueles para montagem final do veículo. Posteriormente, no

final da década de 1960, outro grande exemplo surge, as empresas de limpeza e

conservação. Assim foram surgindo sequencialmente diversas regulamentações

como os Decretos-leis nº 1.212 e 1.216, ambos de 1966, o Decreto nº 62.756/68 e o

Decreto-lei n° 1.034/69, por exemplo, cada um abordando situações específicas20.

18 DRUCK, Graça. 1999. In: BATISTA, Eraldo Lemes. Terceirização no Brasil e suas implicações para os trabalhadores. Campinas: Pontes Editores,2013, p.74 19 MARTINS, Sérgio Pinto. A terceirização e o direito do trabalho. São Paulo: Atlas,2014, p.2. 20 Ob.cit.,p.2.

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3.1 A EDIÇÃO DA LEI Nº 6.019/74.

Por conta de todos esses acontecimentos então existentes, o deputado João

Alves apresentou o projeto de Lei nº 1.347, que após a aprovação do Congresso

Nacional se transformou na Lei nº 6.019 de 1974. Tal projeto teve como justificativa

a ideia de que:

O contingente de trabalhadores é representado, por exemplo, por estudantes que não dispõem de um tempo integral para um emprego regular; por donas-de-casa que, apenas em certas horas, ou em dias da semana, podem se dedicar a um trabalho para o qual tenham interesse e qualificação, sem prejuízo para seus encargos domésticos; para os jovens em idade do serviço militar, que encontram dificuldade de emprego justamente pela iminência de convocação; para os trabalhadores com mais de 35 anos, ou já aposentados mas ainda aptos e que não encontram emprego permanente, ou não o querem em regime regular e rotineiro. Serve, também, àqueles trabalhadores que ainda não se definiram por uma profissão definitiva e que, pela oportunidade de livre escolha entre várias atividades, podem se interessar por uma delas e, afinal, consolidar o emprego permanente. E, por ouro aspecto, não se deixam de atender àqueles que, apesar de já empregados desejam, com um trabalho suplementar, aumentar seus rendimentos( Diário do Congresso Nacional, de 30 de Junho de 1973. p. 3.766).21.

Assim surgiu no Brasil a Lei nº 6.019/74, regulamentando o trabalho

temporário, que ensejou a prática da terceirização, contrapondo a CLT. Esta lei

insere expressamente no ordenamento jurídico pátrio a relação trilateral de trabalho,

ainda que de maneira transitória, enquanto na Consolidação das Leis do Trabalho a

previsão sempre foi de uma relação bilateral.

Foram os artigos 2º e 4º da Lei nº 6.019/74 que trouxeram essa ideia de

trilateralidade:

Art. 2º - Trabalho temporário é aquele prestado por pessoa física a uma empresa, para atender à necessidade transitória de substituição de seu pessoal regular e permanente ou à acréscimo extraordinário de serviços. Art. 4º - Compreende-se como empresa de trabalho temporário a pessoa física ou jurídica urbana, cuja atividade consiste em colocar à

21 Ob.cit.,p.3.

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disposição de outras empresas, temporariamente, trabalhadores, devidamente qualificados, por elas remunerados e assistidos.

Nota-se que a lei deixa claro duas hipóteses de tal prestação ocorrer, ou

quando houver necessidade transitória de substituição de seu pessoal regular e

permanente, ou quando ocorrer acréscimo extraordinário de serviços. Vale ressaltar

que:

Ambas as hipóteses previstas na lei devem ser interpretadas de forma restritiva. A necessidade transitória de substituição deverá ser obrigatoriamente do pessoal regular e permanente. O acréscimo extraordinário de serviços, por sua vez, deve ser necessário. O acréscimo meramente suplementar decorrente de acordo de prorrogação não autoriza o trabalho temporário, mas apenas hipóteses estritas, tais como a necessidade imperiosa, resultantes de força maior, atendimento à realização ou conclusão de serviços inadiáveis ou cuja inexecução possa acarretar prejuízo manifesto, ou o chamado "pico de produção" comum em certas épocas específicas, nas quais é natural a necessidade de aumento de mão de obra (tal como o comércio no período de festividades natalinas)22

Seguindo essa mesma linha interpretativa, Delgado em possível

preocupação com as consequências da introdução de tal instituto no ordenamento

jurídico brasileiro, afirma que "essas duas restritas hipóteses de pactuação são

requisitos à licitude da existência do trabalho temporário e conclui ainda ressaltando

que "o desrespeito a tais requisitos compromete a relação jurídica trilateral

estabelecida, autorizando a formação do vínculo empregatício diretamente com o

tomador dos serviços (Súmula 331, I, TST) 23".

Tal interpretação se faz necessária uma vez que a relação de trabalho é, via

de regra, bilateral, sendo a relação trilateral exceção à normalidade e sua

generalização acarretaria enormes danos ao trabalhador no que cerne às garantias

trabalhistas.

A importância de existir real necessidade ao se firmar esse contrato de

prestação de serviço é tão grande que a própria lei, em seu artigo 9º, estabelece que

é necessário explicitar os motivos que justificam a contratação, no próprio contrato

firmado entre o tomador e o prestador de serviços:

22 MERÍSIO, Patrick Maia e MAIA, Silvana Liberto Alves. Direito do Trabalho. Rio de Janeiro, Elsevier, Campus Jurídico, 2015, p.275-276. 23 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2014, p.480.

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Art. 9º - O contrato entre a empresa de trabalho temporário e a empresa tomadora de serviço ou cliente deverá ser obrigatoriamente escrito e dele deverá constar expressamente o motivo justificador da demanda de trabalho temporário, assim como as modalidades de remuneração da prestação de serviço.

Ressalta-se que não somente o contrato empresarial, mas também o

contrato de trabalho firmado entre o empregado e a Empresa Temporária de

Trabalho (ETT) deve ser escrito, diferentemente da previsão celetista do caput do

artigo 442, aqui o contrato empregatício não pode ser tácito nem verbal, visto que:

A ausência desses requisitos formais do contrato temporário implica sua automática descaracterização, dando origem a um contrato empregatício clássico, por tempo indeterminado com respeito ao trabalhador envolvido24.

Logo, tais requisitos formais são pressupostos de existência do Contrato de

Trabalho Temporário e nota-se, novamente, grande esforço da lei para evitar uma

fraude na relação de emprego, sempre sob pena de caracterizar-se vínculo

empregatício definitivo entre a empresa cliente e o empregado.

Para garantir tal transitoriedade da prestação de serviço e, mais uma vez,

evitar que tal contrato seja utilizado de maneira a mascarar uma relação de emprego

normal com o intuito de se burlar as garantias trabalhistas, a Lei n° 6.019, prevê em

seu artigo 10º, que o empregado da Empresa Temporária de Trabalho não pode

exercer mais de três meses de serviços à empresa de um mesmo tomador, salvo se

o Ministério do Trabalho autorizar a prorrogação de tal prazo (O Ministério do

Trabalho Emprego publicou no Diário Oficial da União de terça-feira 03/06, a Portaria

789 que amplia o prazo de duração do contrato de trabalho temporário – nove

meses). O artigo 10º tem o seguinte conteúdo:

O contrato entre a empresa de trabalho temporário e a empresa tomadora ou cliente, com relação a um mesmo empregado, não poderá exceder de três meses, salvo autorização conferida pelo órgão local do Ministério do Trabalho e Previdência Social, segundo

24 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2014, p.481.

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instruções a serem baixadas pelo Departamento Nacional de Mão-de-Obra.

Entretanto, infelizmente, a aplicação na prática de tal dispositivo não

representa a vontade do legislador de garantir o caráter transitório da prestação, de

acordo com Delgado que faz a seguinte ressalva:

Ressalte-se, porém, que a coerência com a transitoriedade da Lei n° 6.019, lamentavelmente, não é muito significativa e rigorosa. é que esse prazo trimestral pode ser ampliado em conformidade com autorização conferida pelo órgão local do Ministério do Trabalho [...]25

Em relação aos aspectos subjetivos, no que cerne ao empregado temporário

a lei utiliza em seu artigo 4º a expressão "devidamente qualificados", e o Decreto nº

73.841/74, que regulamentou a Lei nº 6.019/74, utiliza o termo "pessoal

especializado", evidenciando-se assim a ideia de que não seria qualquer empregado

que estaria apto participar da relação trilateral legalmente estabelecida.

Nesse sentido, Delgado afirma que:

A partir desses diplomas especiais pode-se inferir a intenção da ordem jurídica de limitar a figura excetiva do trabalho temporário a funções e atividades caracterizadas por alguma qualificação ou especialização profissional, ainda que mínima e não formalizada26.

Entretanto, logo em sequência, o autor faz uma ressalva, demonstrando que

na prática a interpretação nem sempre é realizada dessa maneira:

Ressalte-se, porém, que a jurisprudência não se pacificou inteiramente a respeito desse tópico da ordem jurídica. Assim convive com a leitura acima também a interpretação de que as expressões normativas analisadas apenas pretendem esclarecer que o trabalhador temporário tem de atender às qualificações e especificações inerentes a função para a qual foi contratado, de modo a evitar a fraude no tocante às hipóteses de pactuação terceirizada.

25 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2014, p.481. 26 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2014, p.480.

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No mesmo sentido, alertando ainda, de maneira pontual, acerca da

impossibilidade da instituição da chamada cláusula de reserva, Merísio e Maia

apontam que a:

Obrigação da ETT que tem sido olvidada é a qualificação dos seus empregados, o que permite que funcionem como agências de emprego, não sendo incomum a efetivação de trabalhadores temporários na empresa tomadora pela qualidade dos serviços prestados. Deve ser considerada nula de pleno direito qualquer cláusula de reserva, proibindo a contratação do trabalhador pela empresa tomadora ou cliente ao fim do prazo em que se tenha colocado à sua disposição pela empresa de trabalho temporário. (Artigo 11, § único, Lei n° 6.019/74)27

Pontualmente, impende realçar os direitos dos empregados conferidos por

tal legislação especial, em seu artigo 12, sendo relevante notar, como bem

observado por Delgado, que a interpretação jurisprudencial e doutrinária tratou de

aproximar o então acanhado tratamento jurídico conferido aos seus integrantes do

padrão geral prevalecente no Direito do Trabalho:

Art. 12 - Ficam assegurados ao trabalhador temporário os seguintes direitos:

a) remuneração equivalente à percebida pelos empregados de mesma categoria da empresa tomadora ou cliente calculados à base horária, garantida, em qualquer hipótese, a percepção do salário mínimo regional;

b) jornada de oito horas, remuneradas as horas extraordinárias não excedentes de duas, com acréscimo de 20% (vinte por cento);

c) férias proporcionais, nos termos do artigo 25 da Lei nº 5.107, de 13 de setembro de 1966;

d) repouso semanal remunerado; e) adicional por trabalho noturno; f) indenização por dispensa sem justa causa ou término normal do

contrato, correspondente a 1/12 (um doze avos) do pagamento recebido;

g) seguro contra acidente do trabalho; h) proteção previdenciária nos termos do disposto na Lei Orgânica

da Previdência Social, com as alterações introduzidas pela Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973 (art. 5º, item III, letra "c" do Decreto nº 72.771, de 6 de setembro de 1973).

27 MERÍSIO, Patrick Maia e MAIA, Silvana Liberto Alves. Direito do Trabalho. Rio de Janeiro, Elsevier,

Campus Jurídico, 2015, p.276.

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É necessária especial atenção ao que se refere à alínea "a", que diz respeito

ao direito à remuneração equivalente a dos empregados da mesma categoria da

empresa tomadora, pois tal previsão, que homenageia o princípio da isonomia e o

princípio da primazia da realidade, visa evitar fraudes no momento da contratação,

como bem aduzem Merísio e Maia:

Esta norma realiza finalidade individual e coletiva, impedindo que a intermediação sirva como forma de baratear os custos do trabalhador, demonstrando-se a inserção, em termos jurídicos, do trabalhador temporário na empresa do tomador dos serviços, não se podendo falar em categoria profissional diferenciada de trabalhador temporário, o qual segue as condições singulares de vida e a categoria profissional dos empregados da empresa tomadora28.

Vale notar que a jurisprudência brasileira já é hegemônica quanto aos

direitos dos empregados temporários, convergindo para que essa categoria não

tenha seus direitos trabalhistas violados:

A jurisprudência e doutrina têm produzido crescente esforço hermenêutico a fim de melhor precisar a inserção da categoria temporária no universo do Direito do Trabalho, mitigando o caráter flagrantemente discriminatório que inspirou a criação da figura jurídica décadas atrás e que se manifesta no rol singelo de direitos lançado na Lei n° 6.019, de 197429.

Seguindo a linha interpretativa doutrinária e jurisprudencial nota-se que aos

empregados temporários foram conferidos por analogia todas as verbas contratuais

a que tem direito o empregado permanente, da mesma categoria, da empresa

cliente. Estendendo-se à tal classe de trabalhadores:

[...] parcelas como 13º salário proporcional (embora silente a Lei n° 6019/74); duração do trabalho de oito horas ao dia e 44 horas semanais, com adicional de, no mínimo, 50% para as horas extras (art. 7º, XIII e XVI, CF/88); jornada especial do art. 7º, XIV, da Constituição, se for o caso (turnos ininterruptos de revezamento); adicionais de insalubridade e periculosidade (embora silente a Lei n° 6.019/74), a par de outras parcelas de cunho ou reflexo salarial30.

28 Ob.cit.,p.277. 29 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2014, p.483. 30 Ob.cit., p.484.

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O autor ainda alerta para o fato de que "Outra leitura jurídica conduziria a um

salário real inferior ao do empregado da mesma categoria lotado na empresa cliente,

afrontando a regra do salário equitativo" e que, em razão disso, a jurisprudência tem

de se preocupar, e vem se preocupando, em harmonizar os princípios do Direito do

Trabalho ao tipo especial trazido pela Lei nº 6.019/74, garantindo aos trabalhadores,

regidos pelo regime desse diploma legal especial, as diretrizes do Direito Laboral,

encarando o contrato de trabalho temporário como mais uma forma legal de contrato

a termo.

Um assunto que chegou a suscitar polêmica surgiu após a edição das Leis

nº 7.839/89 e nº 8.036/90, que passaram a garantir aos empregados temporários o

direito ao FGTS, pois em razão de tal benefício, parte da doutrina e da

jurisprudência entendeu que havia incompatibilidade desta garantia com a

indenização por dispensa sem justa causa, entendimento este superado pela TST

na Súmula 125:

Observe-se que após a extensão do FGTS à categoria temporária surgiu o entendimento judicial e doutrinário de que a Lei do Fundo de Garantia teria revogado, por incompatibilidade, a indenização por dispensa sem justa causa do trabalhador temporário (art. 12 "f", Lei n° 6.019). Tal entendimento, contudo, choca-se com matriz interpretativa dominante na jurisprudência, quando enfrentando situação jurídica semelhante (incompatibilidade ou não do FGTS com indenização especial rescisória do art. 479, CLT): é o que se percebe pela Súmula 125, que firmou como plenamente compatíveis as verbas da velha indenização por dispensa antecipada e o recém-surgido Fundo de Garantia31.

Por fim, há que se destacar os artigos 14 e 16 da Lei de Trabalho

Temporário, que estabelece a responsabilidade solidária do tomador de serviços,

quando da falência da ETT, quanto ao recolhimento das contribuições

previdenciárias, remuneração e indenização por dispensa sem justa causa ou

arbitrária, correspondentes ao tempo em que o empregado prestou aquele serviço.

Tal responsabilidade, inclusive, confere à empresa cliente o dever de fiscalização:

A relação triangular não afasta a obrigação fiscalizadora da empresa tomadora dos serviços em relação aos direitos trabalhistas e

31 Ob.cit., p.483.

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previdenciários dos empregados, permitindo a lei que aquela exija desta comprovante de regularidade de sua situação perante o INSS (artigo 14, Lei n° 6.019/74) e ainda trazendo a previsão segundo a qual a falência da ETT implica na responsabilidade solidária pelo recolhimento das contribuições previdenciárias, remuneração e indenização pela dispensa arbitrária ou sem justa causa, no tocante ao período em que o trabalhador esteve sob suas ordens (artigo 16, Lei n° 6.019/74)32.

Visto isso, não é possível olvidar que em 20 de Junho de 1983 ocorreu outro

marco regulatório da terceirização, com a edição da Lei n° 7.102, que tratou da

segurança dos estabelecimentos financeiros, permitindo a exploração de serviços de

vigilância e de transporte de valores no setor financeiro.

Delgado explicita as inovações trazidas pela Lei n° 6.019/74:

A Lei n° 6.019/74 criou relação justrabalhista trilateral, que se repete mutatis mutandi, nas demais situações de terceirização: a) empresa de trabalho temporário (ETT) ou empresa terceirizante; b) trabalhador temporário; c) empresa tomadora dos serviços (ETS) ou empresa cliente33.

Desta feita, a partir da Lei n° 6.019/74 e da Lei n° 7.102/83 surge no Brasil a

relação de trabalho triangular, ainda que de maneira restrita, com as participações

do empregado, do empregador e do tomador de serviços; e não mais bilateral, onde

somente existiam como partícipes o empregado e o empregador.

Paralelamente a isso, consolida-se no cenário internacional, ratificando a

utilização da terceirização de trabalho como tendência cada vez mais comum, o

Toyotismo, uma vez que este:

[...] propõe a subcontratação de empresas, a fim de delegar a estas tarefas instrumentais ao produto final da empresa polo. Passa-se a defender, então, a ideia de empresa enxuta, disposta a concentrar em si apenas as atividades essenciais a seu objetivo principal, repassando para as empresas menores, suas subcontratadas, o cumprimento das demais atividades necessárias à obtenção do produto final almejado34.

32 MERÍSIO, Patrick Maia e MAIA, Silvana Liberto Alves. Direito do Trabalho. Rio de Janeiro, Elsevier,

Campus Jurídico, 2015, p.277. 33 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2014, p.478. 34 DELGADO, Mauricio Godinho. Capitalismo, trabalho e emprego: entre o paradigma da destruição e os caminhos da desconstrução. São Paulo: Ltr, 2005, p.48.

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.

Entretanto, a realidade é que as regras de responsabilidade previstas na Lei

n° 6.019/74 não estavam produzindo efeitos tão concretos no plano jurídico e social,

havendo-se a necessidade de incorporar novas regras quanto à responsabilização.

Tendo isso em vista, o Tribunal Superior do Trabalho, por meio da Súmula 331, no

ano de 1993, preocupado com as possíveis consequências equivocadas de tal

instituto, estabeleceu os limites da terceirização, que serão abordados mais adiante

em tópico mais apropriado.

3.2 TERCEIRIZAÇÃO LÍCITA E ILÍCITA DE ACORDO COM A SÚMULA 331

DO TST.

Voltando a atenção quanto à classificação da terceirização, no Brasil é a

Súmula 331, do TST que estabelece as formas lícitas e ilícitas de tal instituto,

valendo ressaltar que tal súmula substituiu a de nº 256, também do TST, e tem o

seguinte texto:

I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).

II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).

III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.

IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.

V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida

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responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.

VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.

Analisando o conteúdo do entendimento sumulado, conclui-se que são

quatro as formas de terceirização lícita no ordenamento pátrio. A primeira está

prevista no inciso I, que são as hipóteses que encontram tutela na Lei n° 6.019/74; a

segunda, a terceira e a quarta, estão previstas no inciso III, tratando-se: i) das

atividades de vigilância, previstas na Lei n° 7.102/83; ii) das atividades de

conservação e limpeza e, por fim; iii) dos serviços especializados ligados, sempre, à

atividade-meio do tomador.

Outra previsão que se pode destacar da referida súmula diz respeito às

sanções em caso de terceirização ilícita e às hipóteses de responsabilização do

tomador nos casos de inadimplemento da empresa prestadora de serviços.

A ideia de responsabilização do tomador já estava prevista na Lei n°

6.019/74, entretanto tal responsabilização, solidária, era muito restrita, como bem

analisa Delgado:

Não obstante solidária a responsabilidade criada pela Lei n°. 6.019/74, sua hipótese de incidência era sumamente restrita: incidiria apenas havendo falência da empresa fornecedora de força de trabalho (rectius: insolvência). Além disso, a responsabilidade solidária não abrangeria todas as verbas do contrato envolvido, mas somente aquelas poucas especificadas pela Lei n°. 6.019. As limitações da responsabilidade aventada pelo diploma de 1974 sempre foram debatidas e questionadas pelos operadores jurídicos, em busca de fórmula responsabilizatória mais consentânea com a realidade socioeconômica e normativa trabalhista35.

Em razão de tal busca por uma adequação à realidade, é que a Súmula 331

muda a maneira de se encarar a responsabilidade da empresa tomadora dos

serviços, que a partir de agora passaria a ser subsidiária, e englobaria não apenas

as verbas previstas na Lei n° 6.019, mas toda e qualquer verba decorrente da

terceirização, nos termos do inciso IV e V da Súmula 331.

35 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2014, p.485.

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O entendimento jurisprudencial sumulado claramente percebe a existência de responsabilidade do tomador de serviços por todas as obrigações laborais decorrentes da terceirização (ultrapassando a restrição de parcelas contida no texto da Lei n°. 6.019/74) [...] Não há dúvida de que a interpretação contida na Súmula 331, IV, abrange todas as hipóteses de terceirização veiculadas na ordem sociojurídica brasileira. Nesse quadro, parece claro que a compreensão sumulada abrange também o trabalho temporário. Superam-se, nesse sentido, as limitações tradicionalmente criticadas quanto ao texto do art. 16 da Lei n°. 6.019/7436.

Outro ponto interessante sobre tal responsabilização é exposto por Merísio e

Maia , quando concluem que pouco importa a questão da licitude da terceirização, a

responsabilidade do tomador de serviços sempre existe, ainda que tais autores

critiquem o fato de tal responsabilização sempre ser subsidiária.

Não é cediço afirmar que, independente da terceirização ser lícita ou ilícita, há responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, mas infelizmente em ambas as hipóteses a consequência para o tomador dos serviços no direito brasileiro é a responsabilização subsidiária, agindo de forma diversa de ordens jurídicas diversas [...]37

Tal crítica consiste no fato de que, nos casos de terceirização ilícita, o

tomador de serviços utiliza a terceirização apenas para mascarar a real relação de

emprego existente entre ele (tomador) e o empregado, o que ensejaria, de forma

mais justa, que a responsabilidade fosse solidária, uma vez que a relação aqui é

pessoal, havendo subordinação direta, sendo a culpa do tomador igual a do

prestador, senão maior.

Vale ressaltar que, no Brasil, nos casos de terceirização ilícita, como nota-se

da leitura da Súmula 331, pode se caracterizar a formação de vínculo empregatício

clássico entre o empregado e o tomador de serviços. Essa ilicitude está presente

nos casos de violação do caráter transitório de contrato de trabalho temporário, de

terceirização da atividade fim da empresa cliente, ou nos casos onde há

subordinação direta do empregado para com o tomador, caracterizando a

pessoalidade.

36 Ob.cit.,p.485. 37 MERÍSIO, Patrick Maia e MAIA, Silvana Liberto Alves. Direito do Trabalho. Rio de Janeiro, Elsevier, Campus Jurídico, 2015, p.281.

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De acordo com Neto e De Britto, atividade fim é "aquela ligada diretamente

ao núcleo, ao objeto do empreendimento, à finalidade principal da empresa"38. Logo,

conclui-se que o enunciado 331 do TST, ao proibir a terceirização de tal atividade

revelou preocupação de que a terceirização não fosse uma forma de maquiar a

relação de emprego.

Da mesma forma, os entes da Administração Pública serão

responsabilizados subsidiariamente caso seja verificada conduta culposa no

cumprimento das obrigações da Lei nº8.666, de 21.06.1993, especialmente na

fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de

serviços como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre do mero

inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente

contratada.

Ressalta-se que a responsabilidade subsidiária do tomador de serviços

abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da

prestação laboral, ou seja, a empresa tomadora não será responsabilizada pelas

verbas relativas aos períodos em que não houve prestação de serviços a ela.

3.3 O PROJETO DE LEI Nº30/2015.

No momento presente, tramita, no Senado, o Projeto de Lei (PLC)

nº30/201539 que dispõe sobre o contrato de prestação de serviço a terceiros e as

relações de trabalho dele decorrentes, o mesmo denominava-se PLC 4.330/2004 e

foi aprovado, praticamente na íntegra, pela Câmara dos Deputados. O citado projeto

foi proposto pelo então Deputado Sandro Mabel, PMDB/GO.

A justificação do projeto aponta a terceirização como um acontecimento

inevitável, inexorável, imprescindível ao bom desenvolvimento da nova empresa

38 NETO, Indalécio Gomes e BRITO, Rider Nogueira de. A terceirização no Brasil. Curitiba, Íthala, 2012, p.18. 39 O Projeto de Lei (PLC) nº30/2015 tem Paulo Paim como relator atual. O último local do citado projeto foi a Secretaria Legislativa do Senado Federal em 16/03/2016. E consta como último estado: aguardando leitura de requerimento em 16/03/2016. Disponível em: http://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/120928. Acesso em: 13 de abril de 2016.

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resultante das profundas reformulações na organização do trabalho. Nessa

perspectiva, a justificação do projeto aponta:

‘’(...) a terceirização é uma das técnicas de administração do trabalho que tem maior crescimento, tendo em vista a necessidade que a empresa moderna tem de concentrar-se em seu negócio principal e na melhoria da qualidade do produto ou da prestação de serviço.

Dessa forma, segundo seus idealizadores, a referida iniciativa parlamentar

se propõe a regularizar a terceirização com o objetivo de proteger os trabalhadores

sujeitos a terceirização, pois os mesmos não possuem uma lei específica que regule

o assunto.

Todavia, essa pretensa aspiração se revela duvidosa na medida em que o

PLC nº30/2015 pretende generalizar a aplicabilidade da terceirização a qualquer

gênero da atividade econômica, em contraposição aos limites impostos pela

interpretação contida na Súmula 331 do TST, que presentemente a admite apenas

na atividade-meio. Como exposto no artigo 4º do PLC nº30/2015, in verbis:

Art.4º É lícito o contrato de terceirização relacionado a parcela de qualquer atividade da contratante que obedeça aos requisitos previstos nesta lei, não se configurando vínculo de emprego entre a contratante e os empregados da contratada, exceto se verificados os requisitos previstos nos arts. 2º e 3º da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto- Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943.(...) (grifo nosso).

Assim, verifica-se que a proposição tenciona tornar lícito o contrato de

terceirização às atividades-meio e também às atividades-fim, por esta última,

compreende-se as práticas executadas relacionadas ao núcleo do conteúdo central

da empresa, as ações que revelam sua identidade empresarial.

Isto posto, ao banalizar a terceirização, resta claro que a primordial intenção

do PLC nº30/2015 não é viabilizar a otimização na organização da empresa com

consequente concentração de seus esforços na atividade-fim, e sim beneficiar o

empresariado que vai se valer desse instrumento de contratação a fim de reduzir

ainda mais os seus custos com mão de obra. Como resultado, teremos grandes

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empresas funcionando sem empregados formais, ou seja, aqueles contratados

diretamente.

Nessa esteira, percebemos um futuro pouco favorável aos trabalhadores,

pois se atualmente a terceirização apenas da atividade-meio já causa tantos

prejuízos, a subcontratação operada na atividade-fim será sinônimo de uma

completa degradação das relações trabalhistas gerando um total retrocesso a todas

as reivindicações já conquistadas.

Por isso, em relação ao trabalho terceirizado, diferentes camadas da

sociedade vêm apresentando um debate acalorado sobre o tema. Com efeito,

podemos constatar um grupo que opõe severas críticas a aprovação da corrente

redação do PLC nº30/2015, em contraposição a outro que enxerga na vigente

proposição uma fonte de soluções.

O deputado Arthur Oliveira Maia (SD-BA) indica que a regulamentação será

favorável para o trabalhador terceirizado, visto que não há lei específica sobre o

assunto. Segundo o parlamentar, ‘’foi uma grande vitória da visão moderna de que

as relações de capital e trabalho tem de ser feitas com o fortalecimento do ambiente

econômico e segurança jurídica’’40. Assim, verifica-se uma perspectiva liberal do

trabalho focada no lucro em detrimento dos trabalhadores.

Para João Carlos Gonçalves, secretário-geral da Força Sindical, ‘’o debate

sobre terceirizar ou não se encontra superado’’41. O que é preciso, segundo sua

avaliação, é avançar na proteção aos direitos dos terceirizados. Portanto, a partir de

sua fala, percebemos que seu discurso vai de encontro com grupos que apontam a

terceirização como algo inevitável.

Laercio José de Oliveira, deputado federal (SD-SE) e vice-presidente da

Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), é drástico

ao abordar a legalidade da extensão da terceirização. O deputado disse que ‘’o

40 REGRAS para o trabalho terceirizado dividem opiniões na Cãmara em 2015. Agência Câmara. Artigo publicado em 05 de janeiro de 2016. 41 Projeto da terceirização incorpora conquistas. 19 de maio de 2015. Agência Senado. Disponível em:< http://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2015/05/19/projeto-da-terceirizacao-incorpora-conquistas-diz-secretario-geral-da-forca-sindical >Acesso em: 28 de fevereiro de 2016.

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projeto nº30/2015 garante segurança jurídica aos trabalhadores. Para ele, o único

defeito da proposta é não abranger a terceirização do setor público.’’42

De acordo com o atual presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Ives

Gandra Martins Filho, é importante a aprovação de um marco regulatório da

terceirização. Ele argumenta ‘’ Se conseguirmos uma lei melhor trabalhada, que dê

explicações melhores a alguns marcos mais definidos, poderemos dar mais

segurança não só às empresas, mas aos trabalhadores (...)’’.43 Dessa forma,

percebe-se que o atual presidente do TST considera a terceirização uma relação de

trabalho legitima que deve ser regulamentada em favor dos empresários e obreiros.

Já Maurício Godinho Delgado pondera ao opinar que

a terceirização, ao reverso do que o projeto faz, tem de ser restrita. O projeto teria de restringir a terceirização, pois ela já se tornou uma epidemia; epidemia restringe-se e se controla; ou seja, coloca-se o fenômeno dentro de margens de segurança, ao invés de se instigar a sua generalização. O PL não regulamenta, restringindo, a terceirização; ele na verdade, desregulamenta, liberaliza, generaliza o fenômeno da terceirização.44

Em sentido mais radical, Jorge Luiz Souto Maior é contra a regulamentação,

pois o mesmo se posiciona contra a terceirização em qualquer circunstância:

Em suma, o efeito necessário, já concretizado, é o da rejeição plena da Súmula 331 do TST, que(..) representa o fim da terceirização. (...) Ora, a rejeição jurídica à terceirização, tal qual conhecida atualmente, parte do pressuposto de que a terceirização fere direitos fundamentais dos trabalhadores, tais como a vida, a saúde, o lazer a a própria dignidade e é mais que evidente que algo ruim em pequena escala não se transforma em algo positivo em grande escala. 45

42 JORNAL do Senado. Ano XXI. Nº 4.303. Brasília, quarta-feira, 20 de maio de 2015, p.7. 43 PRESIDENTE do TST defende regulamentação da terceirização. O novo presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Ives Gandra Martins Filho, defendeu, no dia 23 de fevereiro de 2016, a aprovação de um marco regulatório da terceirização. Ele discutiu o tema em visita ao presidente do Senado, Renan Calheiros, acompanhado do corregedor-geral da Justiça do Trabalho, Renato de Lacerda Paiva. Disponível em: <http://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2016/02/23/presidente-do-tst-defende-regulamentacao-da-terceirizacao>. Acesso em: 06 de março de 2016. 44 MAURÍCIO Godinho afirma que a regulamentação da terceirização vai esvaziar o papel da Justiça do Trabalho. Notícia publicada em: 26 de setembro de 2013. Disponível em: <http://www.anamatra.org.br/index.php/noticias/mauricio-godinho-afirma-que-regulamentacao-da-terceirizacao-vai-esvaziar-o-papel-da-justica-do-trabalho. > Acesso em: 05 de janeiro de 2016. 45 SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Juridicamente, a terceirização já era: acabou! São Paulo. Artigo publicado em 01 de outubro de 2015. Disponível em:

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Por sua vez, temos a magistrada trabalhista Áurea Sampaio que revelou sua

opinião em entrevista realizada pelo Conjur. Vejamos:

ConJur - O presidente da Anamatra disse, em entrevista, que todos os juízes são contra a terceirização. A senhora concorda?

Áurea Sampaio - A maioria é contra a terceirização. A terceirização, na verdade, é uma precarização das relações do trabalho. O terceirizado não tem nenhum vínculo com a empresa para a qual ele presta serviço. Nós temos casos de processos em que o empregado sequer sabe para quem está prestando serviço. Ele foi contratado por uma empresa, que foi contratada por outra e ele está prestando serviço para uma terceira. E na hora de reclamar os seus direitos ele não sabe nem contra quem demandar. E o direito do trabalho sempre teve por princípio a ligação do empregado com o seu empregador. E é preciso que o empregado esteja inserido em um contexto, em uma categoria profissional, saber quem são os empregadores. O terceirizado não tem esse vínculo. Há pessoas que sentam ao lado, às vezes, fazendo o mesmo trabalho, e ganham infinitamente mais, têm direitos superiores ao dele. Não consigo enxergar a vantagem

para o empregado em ser terceirizado. 46

Em síntese, constata-se que a terceirização é um assunto ainda muito

controverso e, por isso, as diferentes opiniões sobre uma possível regulamentação

devem ser ponderadas e bem analisadas em prol da sociedade.

No entanto, nesse debate, devemos partir da premissa de que a questão dos

limites constitucionais da terceirização compreende, muito além da liberdade de

iniciativa do empreendedor, também o dever estatal de proteção constitucional aos

direitos fundamentais dos trabalhadores, como veículo de afirmação do Estado

Democrático de Direito. Nesse sentido, Amauri Mascaro Nascimento é preciso:

O direito do trabalho tende à realização de um valor: a justiça social. Não é o único meio de sua consecução, mas é uma das forma spelas quais um conjunto de medidas que envolvem técnicas econômicas de melhor distribuição de riquezas, técnicas políticas de organização

<http://www.amatra15.org.br/NovoSite//artigos/detalhes.asp?PublicacaoID=32945> Acesso em: 06 de março de 2016. 46 ITO, Marina. Revista Consultor Jurídico, em 11 de março de 2012 <http://sindjufe-mt.jusbrasil.com.br/noticias/3051963/veja-aqui-as-polemicas-sobre-teletrabalho-e-terceirizacao-entre-outros> Acesso em: 06 de março de 2016.

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da convivência dos homens e do Estado e técnicas jurídicas destinadas a garantir a liberdade do ser humano, dimensionando-a num sentido social, visa a atingir a justiça social47.

4. A MERCANTILIZAÇÃO DO VALOR TRABALHO.

Importa salientar que o modelo terceirizante é tema bastante controvertido

desde o período da França revolucionária48, pois a participação de um terceiro

intermediário não apresenta sentido razoável na tradicional lógica dicotômica

composta pelo obreiro que aliena o resultado de seu trabalho em prol do

empregador que dele se apropria ou se beneficia diretamente, em troca do

pagamento do salário. Se levarmos em conta que o salário corresponde aos

serviços prestados pelo trabalhador, concluiremos, por óbvio, que a terceirização

leva a efeito uma realidade na qual o empregado está sujeito a uma depreciação da

sua remuneração, na medida em que a ingerência da empresa prestadora de

serviço representa um receptáculo entre o tomador de serviços e a contraprestação

pecuniária. Em outras palavras, o trabalho prestado pelo empregado torna-se moeda

de troca entre o tomador de serviços e a empresa prestadora de serviços.

Adentrando numa concepção histórica da questão, Rodrigo de Lacerda

Carelli aponta que :

A degeneração da terceirização, o fenômeno da intermediação de mão de obra, também tem suas raízes já antigas. Em 1848, na França, durante a revolta que culminou na revolução popular desse mesmo ano, uma das principais manifestações da população era justamente contra entre os intermediários entre o empresário e os trabalhadores, tendo sido verificado o caráter odioso do lucro pela mera venda do trabalho alheio. Houve a verificação de algo muito simples e lógico: se uma pessoa se interpõe entre o tomador de serviços e o trabalhador, parte dos salários desses últimos fica com o intermediário, que não realiza nenhuma atividade produtiva, somente tem seus ganhos pelo trabalho de outra pessoa. A realização de intermediação de maão de obra com fins lucrativos tomou o

47 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito do trabalho : história e teoria geral do direito do

trabalho : relações individuais e coletivas do trabalho / Amauri Mascaro Nascimento. – 26. ed. – São Paulo : Saraiva, 2011, p.60.

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pejorativo nome de ‘’marchandage’’, e se tornou, inclusive, atividade criminosa tipificada na França.

Não é por outro motivo que o primeiro princípio fundamental da

Constituição da organização do Trabalho, conforme a Declaração de Filadélfia de 1944, afirma que o trabalho não é uma mercadoria. Isso porque não há condições de resguardar a dignidade da pessoa humana pela mercantilização do ser humano, pois, afinal, é isso que se trata quando se fala em fornecimento de mão de obra. A mercantilização coloca o ser humano a mercê das regras de mercado, podendo, se a mercadoria ‘’abundar’’, diminuir o valor do trabalho, que pode chegar a níveis tão baixos que impedirão a mera sobrevivência dos trabalhadores.49

Nesta mesma linha de raciocínio, José Roberto Freire Pimenta afirma que:

Por isso mesmo e que vários ordenamentos jurídicos, nacionais e internacionais, ainda hoje, consideram ilegal a pura e simples intermediação de mão de obra (de modo pejorativo denominada marchandage), na medida em que a participação de um terceiro intermediário nessa relação de trabalho subordinado não teria nenhuma justificativa plausível, não passando de reles venda, por um intermediário, do trabalho alheio, que se apropriaria de parte do valor da remuneração que, uma vez paga pelo tomador, deveria naturalmente destinar-se por inteiro a quem prestou aquele trabalho.50

4.1 TERCEIRIZAÇÃO NO CENTRO DA PRECARIZAÇÃO.

Para subsidiar os debates sobre a precarização do trabalho, apresentamos

abordagem de Zygmunt Bauman sobre o medo e a incerteza que tomam conta dos

trabalhadores, destituídos dentre outras coisas, da dignidade e experiência no

mundo globalizado.

A desregulamentação universal – a inquestionável e irrestrita prioridade outorgada à irracionalidade e à cegueira moral da

49 CARELLI, Rodrigo de Lacerda. A Terceirização no Século XXI’’, in Ver.TST, Brasília, vol.79,

nº4/dez 2013. 50 PIMENTA, José Roberto Freire. A responsabilidade da Administração Pública nas terceirizações, a decisão do Supremo Tribunal Federal na ADC nº 16-DF e a nova redação dos itens IV e V da Súmula nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho’’, in Rev.Eletrônica. nº10, vol.I, p.17.

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competição de mercado -, a desatada liberdade concedida ao capital e às finanças à custa de todas as outras liberdades, o despedaçamento das redes de segurança socialmente tecidas e societaramente sustentadas, e o repúdio a todas as razões que não econômicas, deram um novo impulso ao implacável processo de polarização, outrora detido (apenas temporariamente, como agora se percebe) pelas estruturais legais do estado do bem-estar, dos direitos de negociações dos sindicatos, da legislação do trabalho e – numa escala global (embora, neste caso, de modo muito menos convicente) – pelos primeiros efeitos dos órgãos internacionais encarregados da redistribuição do capital. A desigualdade – intercontinental, entre os estados e, mais fundamentalmente, dentro da mesma sociedade (sem levar em conta o nível do PNB exaltado ou lastimado pelo país) – atinge uma vez mais proporções que o mundo de há muito pouco tempo, confiante na sua habilidade de auto-regular-se e autocorrigir-se, parecia ter deixado para trás uma vez por todas. Segundo cálculos cautelosos e, se faz diferença, conservadores, a rica Europa conta entre seus cidadãos três milhoes de desabrigados, vinte milhões de expulsos do mercado de trabalho, trinta milhões que vivem abaixo da linha de pobreza. O desvio do projeto da comunidade como defensora do direito universal da vida decente e dignificada para o da promoção do mercado como garantia suficiente da universal oportunidade de autoenriquecimento aprofunda mais o sofrimento dos novos pobres, a seu mal acrescentando o insulto, interpretando a pobreza com humilhação e negação da liberdade do consumidor, agora identificada com a humanidade.

Os efeitos psicológicos, porém, vão muito além das crescentes fileiras dos despojados e dos redundantes. Apenas os poucos poderosos para chantagear os outros poderosos na obrigação de um dourado aperto de mão podem estar certos de que sua casa, não obstante possa agora parecer imponente e próspera, não é assombrada pelo espectro da ruína de amanhã. Nenhum emprego é garantido, nenhuma posição é inteiramente segura, nenhuma perícia é de utilidade duradoura, a experiencia e a prática se convertem em responsabilidade logo que se tornam haveres, carreiras sedutoras muito frequentemente se revelam em vias suicidas. Em sua versão presente, os direitos humanos não trazem consigo a aquisição do direito a um emprego, por mais que bem desempenhado, ou – de um modo mais geral- o direito ao cuidado e à consideração por causa de méritos passados. Meio de vida, posição pessoal, reconhecimento da utilidade e merecimento da auto-estima podem todos desvanecer-se simultaniamente da noite

para o dia e sem se perceber51.

Nessa esteira, atualmente, observa-se uma sujeição dos trabalhadores ao

sistema de produção capitalista que vem se tornando cada vez mais racionalizado,

51 BAUMAN, Zygmunt. O mal estar da pós modernidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar

Ed.1998.

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em que se produz uma confiança desmedida na razão do homem e em sua criação

e na impessoalidade, como elemento essencial das relações pessoais. Por

conseguinte, temos como resultado, indivíduos mais vulneráveis e, por isso, mais

dispostos a se submeter às precárias condições impostas pelo mercado de

produção. Como exemplo de técnica de racionalização apresenta-se o downsizing,

ou seja, uma prática empresarial capaz de encolher o tamanho da equipe de

trabalho, seja por meio da terceirização, seja simplesmente demitindo funcionários,

principalmente os mais antigos e com salários maiores. Por conseguinte, todas

essas mudanças provocam conflitos com sindicatos e com outras organizações de

defesa dos direitos dos trabalhadores.

Conforme Eugène Enriquez em comentários precisos sobre o tema:

Além disso, constatamos - exatamente por causa da automação e das novas tecnologias - que cada vez temos menos necessidade da maioria das pessoas. O que é bastante curioso aqui, nesse fenômeno que vai ser traduzido por perda de emprego, é a tese de que isso leva a economia capitalista a se comportar melhor. Mas não é verdade. Ou seja, depois dessa redução de empregos, do uso de tecnologias como reengenharia e outras do gênero, das técnicas de qualidade total, nas quais não acredito de maneira nenhuma - o crescimento global em todos os países, na realidade, diminuiu. Sobre a qualidade total, vejo-a como uma inutilidade, pois qualidade total nunca existiu em lugar nenhum. Podemos melhorar a qualidade de um produto, mas qualidade total não existe. Quando falamos em qualidade, o que estamos querendo dizer? A qualidade da organização geral, a qualidade dos métodos que estamos realizando, a qualidade do produto, a qualidade de vida das pessoas que trabalham, que vivem na empresa, a qualidade de melhor atendimento ao cliente. É tudo isso ao mesmo tempo. Certas qualidades são contraditórias, porque se o chefe de empresa quer aumentar o ritmo, a rapidez dos movimentos, ele não vai se preocupar com a qualidade de vida dos seus colaboradores. Definitivamente, a noção de qualidade total é a noção de um mundo que não existe. Não pode existir um mundo totalmente racional, onde cada qual funciona bem, no tempo previsto, com os gestos necessários, sem sentimento, nem paixão. Seríamos perfeitos autômatos. Na França, há 10 anos se falava muito em qualidade total, hoje ninguém mais fala, foi uma moda como qualquer outra. O problema é que, por hipótese, não existe uma empresa que faça produtos de qualidade ruim. Não existe uma empresa que vai tentar sempre manipular o cliente. O problema da qualidade é um problema normal de toda organização. A noção de qualidade total é como se, efetivamente, tudo pudesse ser perfeito. Sinto muito, mas Deus fez o

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mundo imperfeito e não vejo como os homens poderiam fazer melhor que Ele. (...) O que isso provoca em nossa civilização? Diria que provoca o desenvolvimento da perversão social, ligada ao desenvolvimento da psicologização do problema. O que entendo por perversão social se aplica às empresas dominadas por lógicas e estratégias financeiras e industriais e que têm, cada vez mais, tendência a considerar os homens como objetos eminentemente substituíveis, atendo-se apenas aos problemas financeiros52.

4.2 TRABALHO DECENTE X TERCEIRIZAÇÃO.

Hodiernamente, observamos uma prevalência da perspectiva neoliberal

sobre o trabalho e, por conseguinte, um anseio intenso de otimização do rendimento

da empresa. Todavia, essa lógica não confere a devida atenção ao trabalho

enquanto um espaço de desenvolvimento social na qualidade de campo de

interação entre os trabalhadores ou, mesmo, esfera de realização de possíveis

aspirações individuais. Ao contrário, a terceirização, e sua configuração triangular de

relação de trabalho, desvincula o trabalhador do local onde suas atividades laborais

são exercidas, pois como já comentado, a figura do tomador de serviços não se

confunde com a empregadora (empresa prestadora de serviços).

No século XX, o Brasil viu a mão de obra passar da agricultura para a

indústria. Dos anos 1980 em diante, grande parte dessa mesma mão de obra

passou para o setor de serviços, que hoje emprega 71% dos brasileiros, seguido por

19% na indústria e 10% na agricultura. Apesar da automatização da indústria ter

cortado vagas, grande parte da migração para os serviços se deu por causa de

processos de terceirização. Se, no passado, uma empresa tinha copeiros e

faxineiros no seu quadro de funcionários, hoje esses serviços são terceirizados para

empresas especializadas. Portanto, percebe-se uma clara categorização dos

trabalhadores, evidenciada na fala de Druck:

A classe trabalhadora muda a sua ‘’forma de ser’’ (ANTUNES, 1995), constituída por segmentos e fragmentos de trabalhadores, que

52 ENRIQUEZ, Eugène. Perda de trabalho, perda de identidade. In: Nabuco, Maria Regina, Carvalho Neto, Antonio. Relações de trabalho contemporâneas. Belo Horizonte: IRT, 1999. pp. 69-83. GRIFO NOSSO

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possuem estatutos diferentes: i) os de primeira categoria, formados pelos ainda contratados pelas empresas, que são cada vez mais minoritários, são aqueles que ainda tem um contrato de trabalho, carteira assinada, benefícios e cobertura social, mesmo que numa condição de diminuição de todos esses direitos, ii) os de ‘’segunda categoria’’ – os subcontratados/terceirizados-, em geral precarizados, sem benefícios, sem direitos sociais, com salários mais baixos, menos qualificados, contratados por tempo determinado ou por empreita, iii) os ‘’conta própria’’, trabalhadores individuais, autônomos, que vivem na ‘’solidão do mercado’’.53

Nesse sentido, segundo relatório da Central Única dos Trabalhadores54,

verifica-se destacada ocorrência de denúncias de discriminação em setores onde há

trabalhadores terceirizados, principalmente nos serviços que exigem menor

escolaridade como, por exemplo, os de limpeza e vigilância, com refeitórios,

vestiários e uniformes que os diferenciam, incentiva-se a percepção discriminatória

de que são trabalhadores de “segunda classe”.

Outrossim, as pesquisas são fartas na medida em que apresentam dados

estatísticos que apontam um diferencial salarial em desfavor dos trabalhadores

terceirizados em relação aos trabalhadores contratados de forma direta. Nessa

perspectiva, segundo análise do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos

Socioeconômicos – DIEESE55, observamos que a remuneração média dos setores

tipicamente terceirizados é 24,7% menor em comparação aos setores tipicamente

contratantes. Outrossim, percebe-se que a jornada semanal contratada consome

mais horas dos funcionários terceirizados em relação aos demais. Dito isso, não é

inesperado o fato dos acidentes de trabalho serem bem mais frequentes nas

empresas terceirizadas: 80% dos acidentes de trabalho no Brasil são com

funcionários terceirizados.Igualmente, constata-se que os terceirizados permanecem

menos anos no emprego, ocasionando uma alta taxa de rotatividade e, por isso, é

duas vezes maior se comparada com os setores tipicamente contratantes.

53 DRUCK, Graça. Globalização, Reestruturação produtiva e Movimento Sindical. Caderno CRH, Salvador, n.24/25, p.33,jan/dez.1996 54 Terceirização e desenvolvimento: uma conta que não fecha: / dossiê acerca do impacto da terceirização sobre os trabalhadores e propostas para garantir a igualdade de direitos / Secretaria. Nacional de Relações de Trabalho e Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos. - São Paulo: Central Única dos Trabalhadores, 2014. p.28 55 Lílian Arruda Marque do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos – DIEESE, em abril de 2015, realizou apresentação referente à terceirização durante a primeira audiência no Senado na discussão do Projeto de Lei 4330/2004.

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Tabela 1 - Condições de trabalho e terceirização, 2013.

A par disso, existem os numerosos casos envolvendo terceirização e

acidentes fatais como, por exemplo, no setor da construção.

Tabela 2 - Terceirização e acidentes fatais no setor da construção por segmentos selecionados – Brasil 2013

Fonte: Artigo – Terceirização e os limites da relação de emprego de Vítor Araújo Filgueiras – Auditor Fiscal do Trabalho .

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Outro índice alarmante apresentado pelo Dieese aponta o número

preocupante de casos envolvendo o resgate de terceirizados submetidos a condição

análoga de escravo no Brasil56.

Tabela 3- Trabalhadores terceirizados em condição análoga à trabalho escravo no Brasil – informações dos dez maiores resgates em cada ano de 2010 a 2013.

Fonte: Artigo – Terceirização e os limites da relação de emprego de Vítor Araújo Filgueiras – Auditor Fiscal do Trabalho

Ainda segundo entrevista bastante elucidativa concedida pelo juiz do

Trabalho no Tribunal Regional do Trabalho da IV Região (TRT 4), Rodrigo Trindade

de Souza, aponta-se que a terceirização além de precarizar as condições laborais

da grande maioria dos terceirizados, também prejudica especialmente os

trabalhadores mais vulneráveis, indivíduos compreendidos entre aqueles que se

encontram em condições econômicas mais fragilizadas: mulheres, jovens, negros e

imigrantes57. Nesse sentido, o magistrado Rodrigo Trindade de Souza aponta:

56 Também sobre a questão dos terceirizados e o trabalho escravo, o site Repórter Brasil veiculou notícia sobre o caso do Bob’s que fez uso do trabalho escravo durante o Rock in Rio, segundo fiscalização realizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego que conclui que a rede de fast food é responsável pela situação a que 93 pessoas foram submetidas durante o festival. Disponível em: < http://reporterbrasil.org.br/2013/12/bobs-usou-trabalho-escravo-durante-o-rock-in-rio-aponta-fiscalizacao/>. Acesso em: 06 de março de 2016.

57 Como exemplo de ofensa aos direitos desses grupos mais frágeis, no caso, imigrantes, o site Repórter Brasil veiculou notícia sobre costureiros bolivianos que viviam sob condições degradantes em alojamentos, cumpriam jornadas exaustivas e estavam submetidos à servidão por dívida em oficina terceirizada na periferia de São Paulo. Disponível em: <http://reporterbrasil.org.br/2014/11/fiscalizacao-flagra-exploracao-de-trabalho-escravo-na-confeccao-de-roupas-da-renner/ > Acesso em: 13 de março de 2016.

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A terceirização ataca os trabalhadores em condições econômicas mais fragilizadas. Por isso, é muito comum a terceirização com mulheres, que ainda são um grupo social fragilizado, no sentido de que têm salários inferiores. Nós ainda não cumprimos o nosso projeto de igualdade de salários independente de gênero. A terceirização ataca também outros grupos fragilizados. Acaba tendo muita incidência com trabalhadores mais jovens, com negros e imigrantes. É muito comum se identificar prática de trabalho escravo ou de condição análoga à escravidão em empresas terceirizadas.58

A sociedade, estando ciente dessas informações, deve questionar até que

ponto a terceirização, enquanto trabalho formal, é capaz de integrar realmente um

indivíduo na sociedade, pois, como vimos, a terceirização, na verdade, vem servindo

como instrumento de precarização das relações de trabalho. Como apontado acima,

os dados estatísticos revelam os efeitos nefastos sofridos pela classe trabalhadora e

como, por vezes, as consequências são irremediáveis, visto que também ocorrem

inúmeros casos de morte. Isto posto, é preciso pensar em soluções urgentes que

busquem a promoção do trabalho decente59 em razão da terceirização estar se

tornando cada vez mais usual na prática empresarial.

Ainda foi noticiado sobre a mineradora Anglo American , uma das maiores do mundo, que foi flagrada com 173 haitianos e nordestinos, empregados de uma empresa terceirizada da companhia, em regime análogo ao escravo. Os estrangeiros eram maioria e estavam em situação ilegal no país. Disponível em: <http://www.cut.org.br/noticias/mineradora-e-autuada-por-trabalho-analogo-a-escravidao-2177/> Acesso em : 13 de março de 2016. 58 Entrevista Rodrigo Trindade de Souza. A quem interessa a terceirização. Disponível em: <http://www.extraclasse.org.br/edicoes/2015/06/a-quem-interessa-a-terceirizacao/ >. Acessado em: 13 de março de 2016.

59 Organização Internacional do Trabalho OIT Notícias: Brasil, 2007 – 2014 / Organização Internacional do Trabalho. - Brasília: OIT, 2015, p.4. Formalizado pela OIT em 1999, o conceito de Trabalho Decente sintetiza a missão histórica da Organização de promover oportunidades para que homens e mulheres obtenham um trabalho produtivo e de qualidade, em condições de liberdade, equidade, segurança e dignidade humanas, sendo considerado condição fundamental para a superação da pobreza, a redução das desigualdades sociais, a garantia da governabilidade democrática e o desenvolvimento sustentável. O Trabalho Decente é o ponto de convergência dos quatro objetivos estratégicos da OIT: a promoção do emprego produtivo e de qualidade, a extensão da proteção social, o fortalecimento do diálogo social e o respeito aos direitos no trabalho (em especial aqueles definidos como fundamentais pela Declaração Relativa aos Direitos e Princípios Fundamentais no Trabalho e seu seguimento adotada em 1998, quais sejam, a liberdade sindical e reconhecimento efetivo do direito de negociação coletiva, a eliminação de todas as formas de trabalho forçado, a abolição efetiva do trabalho infantil e a eliminação de todas as formas de discriminação em matéria de emprego e ocupação).

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Pode-se dizer que a entrada do século XXI assiste no Brasil ao confronto de

duas concepções de sociedade. Uma delas é a tradicional que se apoia numa

interpretação distorcida do liberalismo rotulada de neoliberalismo. A pregoa o

respeito a liberdade, como direito formal, mas atenta apenas ao mundo dos

negócios, ao mercado, sem qualquer preocupação com a justiça social, com a

situação daqueles que aprenderam – com a história de suas famílias e com a sua

própria história- que o direito de ser livre é apenas uma fantasia hipócrita quando

concedido a uma pessoa que não tem possibilidade de ser livre. Essa é uma

concepção egoísta e materialista da sociedade, que começa a ser superada no

Brasil.

Outra concepção, que vai ganhando novos adeptos e já se faz ouvida hoje, começando a pesar nas decisões políticas, é de caráter humanista. Para os adeptos desta concepção de sociedade, a primeira prioridade é a pessoa humana, com sua dignidade e seus direitos fundamentais. O que permitiu o surgimento dessa concepção foi o aparecimento do povo como protagonista da história, como bem assinalou o sociólogo Florestan Fernandes. (...) A conclusão final é que nas primeiras décadas do século XXI o Brasil deverá livrar-se dos resquícios de sua pesada herança colonial, definindo-se aqui uma nova sociedade, democrática e justa.60

Dito isso, não se pode conceber as relações de trabalho a partir de um viés

estritamente econômico, olvidando-se de sua função social61. O contrato de

terceirização deve ser entendido não apenas como resultado das pretensões

individuais dos contratantes, mas como instrumento regulador das relações de

trabalho que se revelam em mecanismo de convívio social e de preservação de

interesses da coletividade. Com efeito, os eventos que ocorrem relativamente a um

60 DALLARI, Dalmo. Sociedade, Estado e direito: caminhada brasileira rumo ao século XXI. Em: Carlos Guilherme Mota, org. Viagem incompleta: a experiência brasileira (1500-2000) – a grande transição. São Paulo, Ed. Senac, 2000, p.486-7. 61TRABALHO DECENTE NAS AMÉRICAS: UMA AGENDA HEMISFÉRICA, apresentado XVI Reunião Regional Americana Brasília, maio de 2006. ‘’Os governos e os atores sociais na região devem levar em conta essa estrutura complexa do emprego, e não, como é usual, assumir que os mercados de trabalho funcionam de forma homogênea e com um forte componente assalariado. Diante dessa realidade, e levando em consideração o panorama descrito na seção anterior, a região deve enfrentar cinco desafios para gerar trabalho decente e com- bater a pobreza: 1) que o crescimento econômico seja promotor do emprego para todos; 2) que os direitos do trabalho sejam cumpridos e efetivamente aplicados; 3) que a democracia seja fortalecida; 4) que sejam adotados novos mecanismos de proteção adequados à realidade atual; 5) que, por essa via, a exclusão social seja combatida.’’ Disponível em: <http://www.oit.org.br/sites/default/files/topic/decent_work/doc/agenda_hemisferica_537.pdf> Acesso em : 27 de fevereiro de 2016.

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contrato de trabalho terão, forçosamente, repercussão em outros casos que digam

respeito ao mesmo tipo de contrato e, mais, na sociedade enquanto um todo como

será abordado no próximo tópico.

4.3 OS IMPACTOS DA TERCEIRIZAÇÃO NA COLETIVIDADE.

Druck & Franco, observando os efeitos da terceirização, descrevem:

(...) a terceirização é uma das principais formas ou dimensões da flexibilização do trabalho, pois ela consegue reunir e sintetizar o grau de liberdade que o capital dispõe para gerir e, desta forma, dominar a força de trabalho. Liberdade que é verificável através da flexibilização dos contratos e, principalmente da transferência de responsabilidade de gestão e de custos trabalhistas para um terceiro62.

Desse modo, percebe-se que a terceirização está promovendo verdadeira

reestruturação das condições de trabalho, operando efeitos não apenas individuais,

pois, como veremos a seguir, a terceirização acarreta prejuízos não só aos

trabalhadores terceirizados, que sem dúvida são o alvo principal, mas também a

toda coletividade, enquanto nação.

Nesse contexto, segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica

Aplicada (IPEA), Marcio Pochmann, ao apresentar o estudo A Dinâmica das

Contratações no Trabalho Terceirizado, apontou que os elevados níveis de

rotatividade ocasionados pela terceirização são prejudiciais a Previdência Social.

Vejamos:

(...) entre os trabalhadores terceirizados demitidos, somente

um terço consegue reempregar-se novamente num período de 12 meses, ou seja, dois terços deles levam mais de um ano para conseguir um posto de trabalho novamente. Isso dificulta a contribuição para a Previdência Social, pois eles dificilmente terão

62 DRUCK, G & FRANCO, T. A terceirização no Brasil: velho e novo fenômeno. Laboreal, 4,

(2), 2008, pp. 83-94.

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condições de se aposentar em 35 anos de trabalho, por não terem 35 anos de contribuição63.

Ora, na medida em que pretendem expandir a terceirização para as

atividades-fim, conclui-se que a tendência é a piora na implementação da

contribuição para a Previdência Social64.

Ademais, ressalta-se que a terceirização também poderá afetar o Índice de

Desenvolvimento Humano (IDH) brasileiro, na medida em que a avaliação desse

índice leva em conta os parâmetros: educação, saúde e renda65. E, nesse sentido,

os dois últimos são mais afetados pela precarização resultante da terceirização.

A renda é essencial para acessarmos necessidades básicas como água,

comida e abrigo, por isso, quando constatou-se que a renda dos terceirizados é

menor, podemos vislumbrar uma piora significativa nesse parâmetro.

Já a saúde é outro ponto relevante. A promoção do desenvolvimento

humano solicita um aumento das oportunidades que os indivíduos devem ter a fim

de evitar a morte precoce e também garantir um ambiente saudável, inclusive o de

trabalho, tanto mentalmente quanto fisicamente. No entanto, a expansão do trabalho

terceirizado pode causar uma vulnerabilidade nesse aspecto, visto que, como já

apontado, o número de acidentes do trabalho é acentuadamente maior com

trabalhadores terceirizados. E também o elevado nível de rotatividade entre os

terceirizados pode ser fonte constante de insegurança e angústia em decorrência da

maior probabilidade em ser demitido.

63 Clipping de notícias - Correição Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região/PE . Agência Brasil. 04 de outubro de 2011. 64 Com base nessa visão, o ministro da Previdência Social, Carlos Eduardo Gabas, posiciona-se contra o projeto de lei que regulamenta a terceirização. Disponível em: <http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2015-04/ministro-da-previdencia-diz-ser-contra-projeto-que-regulamenta-terceirizacao. > Acesso em: 10 de março de 2016. 65 O atlas. Desenvolvimento Humano. Disponível em: <http://www.atlasbrasil.org.br/2013/pt/o_atlas/desenvolvimento_humano/ >Acesso em: 02 de fevereiro de 2016.

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CONCLUSÃO

Ao longo do presente estudo, pode-se verificar que já foram atribuídos

diversos sentidos ao trabalho e, nessa perspectiva, os distintos modos de produção

foram essenciais para a formulação dos diferentes contextos trabalhistas que se

revelaram ao longo da história.

Essa pesquisa apontou que atualmente a sociedade vivencia uma

conjuntura na qual se destaca um dinamismo do capitalismo flexível, caracterizado,

principalmente, pela construção de modernas redes de informação e notável fluidez

nas relações humanas. E, nesse sentido, manifesta-se uma flexibilização das

relações de trabalho a fim de atender as demandas do empresariado que busca

manter um nível de competitividade econômica em escala global.

Nesse panorama, surge a terceirização como pretensa técnica capaz de

solucionar os problemas econômicos que afetam o país, nesse sentido, ela é

apresentada como sinônimo de progresso, reflexo da modernidade, capaz de gerar

empregos e otimizar lucros. No entanto, na prática, a promessa não é cumprida.

Com efeito, essa espécie de contratação está afetando a vida de milhares de

trabalhadores terceirizados que vem observando uma acelerada degradação das

suas condições de trabalho. Nesse sentido, os dados estatísticos apontados

puderam indicar a terceirização como instrumento de retrocesso das conquistas

trabalhistas já alcançadas. Como exposto durante essa pesquisa, quando os

terceirizados são comparados com os contratados diretamente, percebe-se que

aqueles ganham menos, possuem contratos de trabalho menos duradouros, além de

serem expostos a um maior risco de sofrerem acidentes de trabalho, dentre outros

prejuízos. Portanto, conclui-se que a sociedade deve questionar esse método de

contratação, voltar sua atenção a esse fenômeno, pois não se pode admitir a

redução dos níveis de proteção da classe trabalhadora como hoje se apresenta.

Outrossim, foi apontado o PLC nº30/2015 que tramita atualmente no Senado

e pretende estender a aplicabilidade da terceirização, tornando-a lícita também na

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atividade-fim. Ora, essa proposta parlamentar revela a verdadeira face da

terceirização: o desmantelamento da classe trabalhadora. Visto que, se atualmente

a situação já é alarmante apenas com a terceirização na atividade-meio, a

banalização da terceirização em qualquer atividade econômica, promoverá a total

supressão dos direitos trabalhistas já alcançados.

Por outro lado, constata-se que o projeto de lei lançou luz sobre a

terceirização, pois desde sua proposta, a mesma vem sendo mais discutida na

imprensa, meios acadêmicos, sindicatos tanto patronais como dos empregados,

entidades representantes da magistratura, movimentos sociais, etc. Logo, percebe-

se uma maior visão crítica sobre o atual status dos trabalhadores terceirizados.

Por fim, concluímos que o contemporâneo nível das relações de trabalho é

capaz de revelar o grau de qualidade da vida de uma população. Portanto, quando

uma técnica de gestão empresarial, como é o caso da terceirização, é analisada,

deve-se levar em consideração aspectos mais humanísticos, pois em última análise,

estamos falando de pessoas. É imperioso lembrar que a Constituição de 1988,

também conhecida como Constituição cidadã, comprometeu-se com princípios que

foram consagrados através de intensas lutas sociais, como o valor social do

trabalho, a dignidade da pessoa humana e a erradicação da pobreza com a redução

das desigualdades sociais.

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REFERÊNCIAS

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