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Igor Castellano da Silva [email protected] Professor de Relações Internacionais da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) Pesquisador do Instituto Sul-Americano de Política e Estratégia (ISAPE) Jogo dos Tronos e a Religiosidade: Mito e sistemas de crenças UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL Ação de Extensão - Game of Thrones e a Filosofia (EAD) Coordenador: Prof. Dr. José Miguel Quedi Martins

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Igor Castellano da [email protected]

Professor de Relações Internacionais da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)Pesquisador do Instituto Sul-Americano de Política e Estratégia (ISAPE)

Jogo dos Tronos e a Religiosidade:Mito e sistemas de crenças

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SULAção de Extensão - Game of Thrones e a Filosofia (EAD)

Coordenador: Prof. Dr. José Miguel Quedi Martins

• Religião, Religiosidade e Sistemas de Crenças– Sentido amplo: religare (manifestação do

sagrado)• A religiosidade não é religião no sentido estrito

(sistema religioso), mas o que do sagrado permanece nas crenças individuais e coletivas, no constante ato de religare.

– Sentido estrito: sistema de crenças (igrejas)

• Ser, Agir (Justiça, Ética e moral) e Devir

Introdução

1. Game of Thrones e o Conceito de Deus

2. Game of Thrones e a Justiça (Bem e Mal)

3. Game of Thrones e o Devir (missão)

Apresentação

1. Game of Thrones e o Conceito de Deus

• Sistemas religiosos e religiosidade em Game of Thrones

Sistemas religiosos

Religiosidade Religião (sistema)

Deuses antigos

Deus Afogado

Fé dos SeteR'hllorDeus de Muitas Faces

- Sincretismo- Fluidez

- Institucionalização- Hierarquização

Sincretismo: promessas ao Deuses Antigos e aos Sete

• Deus imanente

– Hierofania (ato de manifestação do sagrado) vinculada à natureza

• Deuses antigos e florestas

• R'hllor e fogo

• Deus Afogado e mar

• Grande Garanhão e o cavalo

O Conceito de Deus

• Deus transcendente e hipóstase (tornar algo uma substância)

– A Fé dos Sete

– Organização que espelha o sagrado (sete reinos)

O Conceito de Deus

2. Game of Thrones e a Justiça (Bem e Mal)

R'hllor (Deus vermelho, Deus do fogo)Grande Outro (Caminhantes Brancos, gelo)

vs

Game of Thrones: O dualismo aparente (Gelo e Fogo)

Deus Afogado (Deus do mar, gelo) Deus do Trovão (trovão, raio, fogo)

vs

Game of Thrones: O dualismo aparente (Gelo e Fogo)

Unidade de Westeros (Unida pelo fogo)

Inverno (Caminhantes brancos e guerras)

vs

Deuses antigos (paganismo)

Game of Thrones: O dualismo aparente (Gelo e Fogo)

• “Se os deuses existem e são justos, por que o mundo está tão cheio de injustiças?” (Jaime Lannister)

• Problema do Mal: “aparente contradição entre a existência de um Deus bom e justo e o mal que é claramente visível no mundo” (Schoone, 2012:167)

O Dilema do Mal

• Epicuro e Hume (céticos)

– A existência de Deus é logicamente incompatível com a existência do mal.

– Incompatibilidade entre Onisciência, Onipotência e Onibenevolência

• Três atributos das religiões abraâmicas

• Problema do mal – perigo verdadeiro a essas religiões

A Tese

"O poder [de Deus] é infinito: o que quer que ele deseja éexecutado. Mas nem homem nem qualquer outroanimal é feliz. Portanto ele não deseja sua felicidade.Sua sabedoria é infinita: ele nunca erra em escolher osmeios para qualquer fim: mas o curso da naturezatende a ser contrário a qualquer felicidade humana ouanimal: portanto não é estabelecido para tal propósito.Através de toda a história do conhecimento humano,não há inferências mais certas e infalíveis do que estas.Em que ponto, portanto, sua benevolência emisericórdia lembram a benevolência e misericórdiados homens?” (David Hume. Dialogues ConcerningNatural Religion. 1779)

O Dilema do Mal

• Politeísmo– Não há um Deus onipotente – dividem espaço com outros– e.g. Velhos Deuses

• Maniqueísmo (Zoroastrismo)– Deuses disputam com o lado oposto – não há

comprometimento com uma bondade objetiva (absoluta)– e.g. Deus afogado x Deus do Trovão; R’hllor x Grande

Outro

• Deus não onibenevolente – Epicuro: rejeitava a ideia de um deus preocupado com os

assuntos humanos e seu bem-estar (rejeitava a ideia de amor divino ou bondade)

• Ateísmo– Problema evidencial: o problema do mal fornece

evidências da não existência de Deus

Soluções diretas

vs

vs

• Relatividade do Bem e do Mal

– nem todos acreditam que as mesmas coisas sejam boas ou más em termos morais (julgamentos subjetivos).

– moralidade é relativa, logo o mal objetivo não existe.

Antítese 1

• Demócrito – a bondade não é uma questão de ação; depende do desejo interior do homem. O homem bom não é o que pratica o bem, mas o que deseja praticá-lo sempre.

• Abelardo – justiça e injustiça de um ato não estão no ato em si, porém na intenção de quem o pratica.

• Kant – se o agente pratica o ato com boas intenções, respeitando as leis morais, o ato é bom.

-------------• Aristóteles – o bem é a atitude racional para com as sensações e os

desejos (equílíbrio).• Santo Tomás de Aquino – o mais elevado bem é a concretização de si

mesmo conforme Deus ordenou.• Thomas Hobbes – aquilo que agrada ao homem é bom e o que lhe causa

dor ou desconforto é ruim.• Espinosa – o esforço de se preservar (sobrevivência) é um bem; o que

entrava esse esforço é um mal.-------------

• Protágoras – "O homem é a medida de todas as coisas" Cada um tem o direito de determinar, por si, o que é o bem e o que é o mal.

• Heráclito – nós vemos os opostos (bem e mal) Deus vê harmonia.

Relativismo moral na Filosofia

• Bem e Mal em todas as religiões

– Atrocidades em nome do deus do fogo

– Defesa dos fracos em meio ao gelo (Bran)

Game of Thrones: Antiarquétipo e complexidade moral

Magia: ação dos homens e mediação com o transcendental

• Santo Agostinho (Trindade e Fé dos Sete?)

• Argumentos – Deus não é responsável pela existência do mal

• Mal não existe por si só – ausência de bondade

• Virtude moral do homem – livre-arbítrio (Homem pode optar e Deus deve respeitar a opção)

• Problema – Livre-arbítrio como justificativa do mal: é um bem

tão valioso que de alguma forma compensa todas as atrocidades mundanas?

Antítese 2

– “Livres” de religiões

Livre-Arbítrio em Game of Thrones

• Necessidade do mal no mundo• Leibniz e a Necessidade do mal

– O mundo em que vivemos é o melhor possível– O mal é uma parte necessária do mundo– “O bem e o mal andam de mãos dadas, e nós apenas

vivemos no mundo com a melhor combinação de ambos” (Schoone, 2012:175).

• Aristóteles e a Catarse (descarga emocional e empatia)– Reconhecer o “mal” como parte de si (catarse) para poder

controlá-lo, permitindo ao homem o governo de suas próprias paixões e, assim, tornando-o dono de si mesmo vs

– Proposta pedagógica repressiva em que a educação do homem se dá recalcando seus impulsos inferiores

Antítese 3 – Possível síntese

• O mal (conflito e guerra) como lógica constante da vida política– Dialética em Hegel e Marx - contradições que incentivam o

movimento histórico– “uma ordem pacifista de observância mais rigorosa

sempre só poderá regular os meios, os objetos e a direção da luta [do conflito] no sentido da eliminação de alguns (determinados) deles” (Weber, 2000:24).

– "todas as sociedades produzem constantemente em si antagonismos que não nascem casualmente nem podem ser arbitrariamente eliminados" (Dahrendorf, 1976:239).

• Fundamentos para aperfeiçoamento das sociedades– desenvolvimento tecnológico– construção de Unidades políticas/Estados – instiga a mudança social (barganha/transações entre

atores, revoluções, reformas, etc)

O Papel do Conflito

• Religiosidade não ocidental– O bem e mal não se separam – não são campos distintos.

– Bem e mal como relativo ao homem – elementos principados

– Livre-arbítrio é o que permite a ação das forças naturais (ação e reação - única garantia da justiça – teleologia coletiva/Unidade)

– Regulação do Cosmos - desordem, querelas, desventuras –atuaria no reverso do equilibro com fins da própria manutenção deste.

– Agente distribuidor da justiça kármica e aplicador das penas (atributo da ação e reação, obedientes ao karma) • Legba e o Estranho

– O ideal do autoconhecimento (ser antes do devir)

Religião – Outras percepções monoteístas

A Necessidade do Mal

Ação e reação: necessidade do “mal” (Justiça)

• O Problema da Onisciência

– Problema na proposição de Epicuro: Deus não precisa não ser bom para não interferir

• Afastado das necessidades temporais dos seres humanos

• Eventualmente, a sua opção pela não interferência é a prova de sua bondade.

• Não ciência dos resultados - Garantia da justiça está fora do seu conhecimento – melhor a atuação interação entre homens (papel do homem como criador)

– Papel do Homem

Uma questão restante

3. Game of Thrones e o Devir (missão)

• Milenarismo

– lócus da religião e das crenças onde se enfatiza percepções sobre a redenção (salvação) e a violência

• Messianismo

– papel da liderança na história e no milênio

– Herói: Hegel e Campbell

Milenarismo, messianismo e mito do Herói

• “O mesmo acontece com todos os grandes indivíduos históricos –seus objetivos pessoais contêm a vontade essencial do Espírito doMundo. Eles devem ser chamados de "heróis", na medida em quenão tiraram seu objetivo e sua vocação do rumo calmo e regulardas coisas, sancionado pela ordem existente, mas de uma fontesecreta cujo conteúdo ainda está oculto e ainda não veio à luz.”(Hegel, 2004:79)

• “Além disso, não precisamos correr sozinhos o risco da aventura,pois os heróis de todos os tempos a enfrentaram antes de nós. Olabirinto é conhecido em toda a sua extensão. Temos apenas deseguir a trilha do herói, e lá, onde temíamos encontrar algoabominável, encontraremos um deus. E lá, onde esperávamosmatar alguém, mataremos a nós mesmos. Onde imaginávamosviajar para longe, iremos ter ao centro da nossa própria existência.E lá, onde pensávamos estar sós, estaremos na companhia domundo todo” (Campbell, 2014:131)

O mito do Herói

• “Entre o homem de moralidade relativa ou sociale o homem de moral absoluta ou individual estáo herói histórico, em quem o exclusivamenteindividual se funde com o universalmentesocial– com o Espírito do Mundo em direção àIdéia absoluta, a partir de uma faserelativamente histórica para a próxima.” (Hegel,2004:36)

• “O herói é quem deu a própria vida por algomaior que ele mesmo” (Campbell, 2014:131)

O mito do Herói

• “Bem, há dois tipos de proeza. Uma é a proezafísica, em que o herói pratica um ato decoragem, durante a batalha, ou salva umavida. O outro tipo é a proeza espiritual, naqual o herói aprende a lidar com o nívelsuperior da vida espiritual humana e retornacom uma mensagem” (Campbell, 2014:131)

O mito do Herói

• Mito do exílio e Messianismo – Exilados que levam a religião e o milênio

– Ândalos e a Fé dos Sete

– Azor Ahai e a Fé de R'hllor

– Garanhão que monta o mundo e Grande Garanhão

Milenarismo, messianismo e mito do Herói

Deuses e Reis: Quem governa?

• Papel libertador da religião antiga (religiosidade sincrética contra incesto, fratricídio, escravidão)

• Daenerys e mito do herói

• Ajuda aos injustiçados (messianismo)

• Ética na magia (?)

• Reformadores de religiões

Mito do Herói

• Já que o mal é sempre presente: Haveria algum limite moral para a maldade justificável?

• Pelo que é justo lutar? O que seria um bem justo?

– Milenarismo e Unidade

• O que deve ser a justiça para além da moral?

– Ação e reação proporcional?

Algumas questões

• Diversidade e complexidade da estrutura de crenças em Game of Thrones

• Conceito de Deus, Ideia de Bem e Mal e Justiça, Perspectiva do Devir

• É possível antever algum desfecho?

Considerações

• A Máscara de Deus (Entrevista com Joseph Campbell): https://www.youtube.com/watch?v=qBhU7AWTI_U

• Game Of Thrones Season 2: Religions Of Westeros: http://www.youtube.com/watch?v=DIe0Q3PgcOw

• Game of Thrones Blu-Ray Special Feature - The Old Gods and the New: http://www.youtube.com/watch?v=qQDpIB6S4ac

• OHF Book Club: Religion in Game of Thrones: http://www.youtube.com/watch?v=DiMkX_HOWuk

• HISTORY OF WESTEROS - Children of the Forrest, Religion, Age of Heroes, Free Folk & Valyria: http://www.youtube.com/watch?v=NXvEeneGhJA

Vídeos

Referências bibliográficas

ARENDT, Hannah (1999). Eichmman em Jerusalém: Um relato sobre a banalidade do mal. Tradução: José Rubens Siqueira. São Paulo: Companhia das Letras.ARISTÓTELES (2005). Arte Poética. Tradução Pietro Nasseti. São Paulo: Martin Clare.BERGSON, Henri (2005). Cursos sobre a filosofia Grega. Tradução Bento Prado Neto. São Paulo: Martins Fontes.BERMAN, Marshall (1992). Tudo que é sólido desmancha no ar. São Paulo: Rocco.CAMPBELL, Joseph (2014). O poder do mito. São Paulo: Palas Athena.CASTELLANO DA SILVA, Igor (2008). “A Influência da Religiosidade nas Políticas de Defesa de EUA e Brasil”. Trabalho de conclusão de curso de graduação em Relações Internacionais. Faculdade de Ciências Econômicas. Porto Alegre: UFRGS. HEGEL, G.W.F. (2001). A Razão na História – Uma Introdução geral à Filosofia da História. Trad. Beatriz Sidou. São Paulo. Ed. Centauro.LEIBNIZ, Gottfried Wilhelm (2009). Theodicy: Essays on the Goodness of God, the Freedom of Man and theOrigino f Evil. New York: Cosimo Books.NICOLA, Ubaldo (2002). Antologia Ilustrada de Filosofia - Das Origens à Idade Moderna. São Paulo: Ed. Globo.PASQUINO, Gianfranco (1998). "Conflito". In: BOBBIO, Norberto et al.. Dicionário de Política. Brasília, Editora da UnB.SCHOONE, Jaron Daniël (2012). “Por Que o Mundo Está Tão Cheio de Injustiça?”: Os Deuses e o Problema do Mal; in JACOBY, Henry (org); A Guerra dos Tronos e a Filosofia; Rio de Janeiro: Editora Best Seller,. pp 167-178.SPINOZA, Baruch de (2005). Ética Demonstrada à Maneia dos Geômetras. Tradução Jean Melville. São Paulo: Martin Claret.WEBER, Max (2000). Economia e sociedade: fundamentos da sociologia compreensiva. Vol. 1. Brasília: UnB.

Igor Castellano da [email protected]

Professor de Relações Internacionais da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)Pesquisador do Instituto Sul-Americano de Política e Estratégia (ISAPE)

Jogo dos Tronos e a Religiosidade:Mito e sistemas de crenças

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Coordenador: Prof. Dr. José Miguel Quedi Martins