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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE EDUCAÇÃO
CURSO DE GRADUAÇÃO EM PEDAGOGIA
ADRYELLE FERREIRA DE OLIVEIRA
POBREZA: COMO ESSE FENÔMENO INFLUENCIA NO PROCESSO
EDUCATIVO ESCOLAR
NATAL-RN
2016.2
ADRYELLE FERREIRA DE OLIVEIRA
POBREZA: COMO ESSE FENÔMENO INFLUENCIA NO PROCESSO
EDUCATIVO ESCOLAR
Artigo de conclusão de curso apresentada ao Curso de graduação em
Pedagogia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, com o
objetivo maior de expressar conhecimentos que possam contribuir
para área educativa assim como para a obtenção do titulo de
graduanda.
Orientador (a): Prof. (a) Dr. (a) Kilza Fernanda de Moreira Viveiros
NATAL-RN
2016.2
ADRYELLE FERREIRA DE OLIVEIRA
POBREZA: COMO ESSE FENÔMENO INFLUENCIA NO PROCESSO
EDUCATIVO ESCOLAR
Artigo de conclusão de curso apresentada ao Curso de graduação em
Pedagogia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, com o
objetivo maior de expressar conhecimentos que possam contribuir
para área educativa assim como para a obtenção do titulo de
graduanda.
Aprovada em de de 2016
BANCA EXAMINADORA
Prof. (a) Dr. (a) Kilza Fernanda de Moreira Viveiros – Orientadora
Departamento de Fundamentos e Políticas da Educação – UFRN
Primeiro/a Examinador/a
Prof. Dr. Moisés Dias Sobrinho
Segundo/a Examinador/a
Prof. Alexandre Remo Miranda de Araújo
NATAL-RN
2016.2
A todos que resistem e encontra-se em
situação de pobreza.
AGRADECIMENTOS
À Deus, que até hoje tem me fortalecido na sua graça e misericórdia e ao meu
grande Mestre Jesus Cristo que me inspirou com sua simplicidade e capacidade de amar
sem distinção, mostrando-me o caminho da igualdade perante os homens.
À minha família, em especial a minha mãe Elita Maria Ferreira que mais do que
ninguém me ensinou passos para libertação do meu ser feminista, a meu irmão
Josinaldo Lucas Ferreira o mais liberto e despreocupado que conheci minha tia Maria
Filomena Ferreira, Tio Messias Ferreira e Expedito Joaquim da Silva por acreditarem
em mim, e aos demais familiares, pelo amor e incentivo.
O meu “pet” Tina, a cachorra mais linda, alegre e carinhosa que me deixa
exageradamente feliz e que me acompanha nas madrugadas de estudo.
Ao meu amor, Daniel Carneiro Oliveira que em sua infinita paciência e
colaboração vem deixando meus últimos anos com cores quentes.
À Kátia Maria Serrano Carneiro Oliveira minha sogra que sabiamente me acolhe
com seus conselhos eficazes e a minha cunhada Elisa Beatriz Carneiro Oliveira que com
sua energia me deixa alto-astral e feliz. Ao meu sogro Antônio Francisco, sua esposa
Amanda Bezerra e a mais nova bebê que está por vir, agradeço pela amizade e
companheirismo. À Zuzu (Zuleide) que cuida de mim com muito amor.
Ao meu psicólogo Tiago Dantas Martins que diariamente me ouve
atenciosamente e se dispõe sempre a ajudar.
À criatura mais brilhante que já conheci minha orientadora e também mãe
professora Dra. Kilza Fernanda de Viveiros Moreira que me acolheu e muito me
ensinou e ensina nesse caminho que a vida nos reserva sempre bons momentos.
Aos meus amigos de curso e vida Alessandra Nascimento Silva, Louise
Sayonara Guedes, Sônia Cristina de Jesus Lopes, Richardson de Lima e Thayanne Érika
de Assis que sempre estiveram colaborando para minha formação pedagógica e humana.
Á todos e todas, professoras, bolsistas e supervisoras da Escola Municipal
Professora Emília Ramos que de alguma forma contribuíram para minha formação, em
especial as professoras Ana Lúcia de Lima e Helena Rufino que sabiamente me
auxiliaram ensinando-me a ser alfabetizadora e principalmente educadora. Agradeço,
também, a oportunidade de participar do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação
à Docência PIBID/pedagogia possibilitando a mim durante três anos e meio a
experiência enriquecedora de tornar-me atuante pedagogicamente em uma instituição
pública de ensino.
E finalmente agradeço a mulher selvagem que existe dentro de mim que me
inspira por natureza me fazendo sempre mais curiosa, resistente e forte.
Pão de Cada Dia
(Autor e data desconhecidos)
(Interprete: Gabriel O Pensador)
Mais um dia de trabalho querido diário
Eu ralo feito otário e ganho menos do que
eu valho mas necessito de salário que é
bem menos que o necessário
Hoje os rodoviários tão em greve por
melhores honorários e eu procuro um que
me leve
Eu tenho horário
Não posso chegar atrasado não posso ser
descontado
Se eu falar que foi greve meu chefe pode
ficar desconfiado
E se o desgraçado quiser me dar um pé na
bunda eu vou pro olho da rua e rapidinho
ele arruma outro pobre coitado
Desempregado desesperado é que mais tem
(olha o ônibus!!) Hein?
Já vem lotado gente pra cacete vidro
quebrado (Foi piquete) motorista com um
porrete do lado
Ele furou a greve porque também teme
ficar desempregado
Deixar seu filho desamparado
Quem sabe ser despejado do barraco
(E o aluguel lá no morro também já ta
puxado
Eu nem sei se eu tô sendo otário ou esperto
Eu tô aqui mas também tô torcendo pra
greve dar certo)
Eu fico calado porque eu também tô
preocupado
O meu salário até o fim do mês já ta
contado e o meu moleque tá todo gripado
Se eu tiver um imprevisto eu vou ter que
comprar remédio
Num sei como é que eu faço
Eu num sô médico
Se precisar eu vou ter que pedir um vale na
batalha
Como um esfomeado pede uma migalha
E o canalha lá pode até negar e aí vai ser
pior
Porque o meu único ganha-pão é esse meu
suor
Preciso do pão de cada dia e num sô filho
do padeiro
Então preciso do dinheiro
Eu tô no meu carro
Me olho no espelho...
Eu acho hilário
Eles acham que eu num trabalho só porque
eu sou um "empresário"
Meus funcionários devem achar que eu sou
um porco mercenário
Mas eu num sô nenhum milionário
Pra ser mais claro eu tô num mato sem
cachorro
Se eu corro o bicho pega
Se eu fico o bicho come
Pra quem vou pedir socorro?
Chapolim? Super-homem?
As despesas me consomem
Os lucros são poucos e ainda tenho que
pagar meus homens e zelar pelo meu nome
Que Sufoco! O governo num ajuda
Empréstimo de banco nem pensar!
Sem contar faculdade dos filhos pra pagar
Eles pensam que eu sou marajá!! (Num
dá?)
Não vai dar "Insensível você diz" mas é
impossível eu te aumentar "impossível te
fazer feliz"
Eu nunca quis ver meus empregados
cansados com fome
Mas o aumento tá negado
Agora some que eu tô ocupado no telefone
Eu não sou Raul Pelegrini
Essas coisas me deprimem e tal "Mas é que
eu tenho que manter a minha fama de
mau"
Durão afinal eu sou o patrão
Não posso ser sentimental
Porque eu não tenho dinheiro de sobra
Talvez tenha que demitir mão de obra com
urgência
Eu não consigo dormir
Não consigo superar a concorrência
Não sei se eu vou infartar ou se eu vou à
falência
Preciso do pão de cada dia e num sô filho
do padeiro
Então preciso do dinheiro
(Melhor do que dar um peixe a um homem
é ensiná-lo a pescar)
Então em ensina onde eu pesco grana
porque peixe só tem se comprar
Tem que pagar pra comer
Tem que pagar pra dormir
Tem que pagar pra beber pra esquecer e
até pra morrer tem que ter pois vão te pedir
(dinheiro) pro enterro (dinheiro) pro
caixão (dinheiro) pro velório (dinheiro) pro
sermão
Também é caro parir
Pagaram pr'eu entrar e eu rezo pra num
sair daqui
E eu tenho que me cuidar porque o
dinheiro mesmo pode interferir no nosso
destino
Fazer o sino tocar
Influenciar qualquer menino a nos matar
Você não sabe o que é capaz de fazer por
dinheiro alguém que não tem nada a perder
e vê a TV do mundo inteiro mostrar tudo o
que há pra se ganhar pra quem está no
fundo do poço
O único caminho é pro alto nem que seja
por cima do seu cadáver
Moço
Eu vejo isso o tempo inteiro
Eu sou coveiro (sério?)
Sem mistério
No cemitério é onde eu cavo o meu pouco
dinheiro
Eu sou importante Deus ta de prova
A todo instante ele me manda gente e eu
sempre abrindo as covas
Até hoje eu não sei se ele me perdoou do
dia em que eu mexi naquele defunto cheio
de dente de ouro
Dei uma de dentista e deixei o rosto do
corpo todo torto
Mas é que eu ganho muito pouco
Aliás eu num tenho nem onde cair morto
Preciso do pão de cada dia e num sô filho
do padeiro
Então preciso do dinheiro
Eu sou PM
Não pense que é fácil
Tem que ser malandro pra viver se
arriscando rondando pra cima e pra baixo
Na corda bamba
Posso tombar na próxima curva e minha
mullher em casa estraga as unhas com
medo de ser viúva
E os meus nervos também não são de aço
Meu caráter muito menos por isso eu
sempre faço meus cambalachos
Com o tráfico eu já tô mancomunado
Quando eu não tô dormindo ou tô
trincando ou extorquindo os viciados
Eu fico rindo e o bolso do uniforme fica
inchado
Hí!Hí! Um cafezinho aqui!
Uma cervejinha ali (tô ligado)
Rá! Eu sei que eu não presto!
Meu colega diz (cê tá exagerando...) Ah
você que é muito honesto!
Detesto lição de moral cê devia fazer igual
e abusar da autoridade
Esse é o único poder que essa droga de
sociedade me dá o prazer de sentir o
gostinho
Não tô nem aí se você prefere bancar o
policial bonzinho
Perfeito
Mas vou continuar do meu jeito
Não sou super herói
E pimenta nos olhos dos outros não dói
E assim como o rato rói a roupa do rei de
Roma eu vou roendo grana
O poder me corrói
Tá me corrompendo e a soma vai crescendo
(Manda!)
Morrer é o que num posso mas quanto aos
negócios fica frio...
Enquanto houver crime no Rio eu num
volto pra casa de bolso vazio
Preciso do pão de cada dia e num sô filho
do padeiro
Então preciso do dinheiro
E eu sou o dinheiro
Todos me amam todos me querem todos
adoram sentir meu cheiro
Mas eu não sou democrático
Eu sou ingrato
Quem mais produz riqueza é quem tem
menos na mesa
Que chato
Pra quem me controla a carne sobra no
prato
Enquanto outros não me conhecem e
comem rato
É fato real
Rato sem sal
Saiu no jornal
Eu sou imundo
Que tal?
Eu sou o grande culpado nesse mundo tão
desigual
E gero o preconceito social: Quem me tem
vive bem quem num tem passa mal (sera?)
Loto
Jogo do bicho
Cês sonham comigo o tempo inteiro
O capitalismo é que nem Silvio Santos (Oi
Tudo por dinheiro!)
É que vocês pensam pequeno
Vocês são um bicho muito ingênuo
O que parece ser o antídoto pode ser o
próprio veneno
E o que parece essencial talvez seja
supérfulo
E o que cês sonham encontra lá longe tão
perto!
A felicidade é uma muleta e vocês são todos
mancos
Ela não cabe numa maleta
Não cabe no cofre
Não cabe em bancos
Qualquer que seja a profissão que você
exerça
Não deixe que a sua (fixação) por Tio
Patinhas lhe suba a cabeça
Vocês humanos estão cegos
Me supervalorizam demais
Cada vez mais
A cada segundo que passa
Deixam seu mundo em constante ameaça
me pondo acima de Deus e o diabo
Desse jeito eu acabo com a sua raça.
1
A POBREZA COMO FENÔMENO INFLUENCIADOR NO PROCESSO
EDUCATIVO ESCOLAR
Autora: Adryelle Ferreira de Oliveira
Orientadora: Kilza Fernanda Moreira de Viveiros
Universidade Federal do Rio Grande do
E-mail: [email protected]
Fundamentos da Educação
RESUMO
O presente artigo tem como finalidade investigativa compreender como a
pobreza pode influenciar no processo educativo escolar a partir de concepção de
docentes em formação do curso de Pedagogia. Esse estudo compreende uma tentativa
de desmistificar o entendimento que se tem sobre pobreza como uma fatalidade.
Resultado de um projeto de pesquisa acadêmico, cujo tema é, Educação, Pobreza e
Desigualdade Social. Esse projeto foi desenvolvido na Universidade Federal do Rio
Grande do Norte, tendo como orientadora a professora Doutora Kilza Fernanda Moreira
de Viveiros. Pensando na pobreza como fato social e almejando respostas para questões
problemas do trabalho, foi realizado um levantamento de dados com alunos do curso de
pedagogia da universidade já citada acima que ingressaram no curso em 2013.1 e que
brevemente estarão atuando como docentes. Para elucidar a pesquisa desenvolvemos
questionário com perguntas direcionadas acerca do objeto investigativo. O que é ser
pobre, o que significa pobreza, são as principais vias de se compreender como o fato
social vem provocando uma grande dimensão de desigualdades. Para tentar explicar
categoricamente o fenômeno da pobreza e suas consequências devastadoras, esse
trabalho compõe-se de um respaldo histórico e contextual dos principais acontecimentos
que de certa forma impulsionaram, as desigualdades. Seguindo a discursão,
encontraremos reflexões acerca da efetivação da escola pública democrática como um
dos recursos para a libertação do povo pobre oprimido, tornando possível o levantar das
suas vozes, entendendo a necessidade da autonomia dessa camada populacional. A
metodologia empregada baseia-se na pesquisa bibliográfica, entrevistas e questionários,
esta última relativa às informações coletadas nos autos das concepções de pobreza.
Portanto, a abordagem do estudo aqui transcrito é eminentemente qualitativa, tendo
como finalidade realizar uma análise social e política, em caráter descritivo e
explicativo, acerca das problemáticas expostas.
2
Palavras-chave: Educação. Pobreza. Desigualdade Social. Formação Docente.
ABSTRACT
The present article has as an investigative purpose to understand how poverty can
influence in the educational process school from the conception of teachers in formation
of the course of Pedagogy. This study comprises an attempt to demystify the
understanding of poverty as a fatality. Result of an academic research project, whose
theme is Education, Poverty and Social Inequality. This project was developed at the
Federal University of Rio Grande do Norte, with the guidance of Professor Kilza
Fernanda Moreira de Viveiros. Thinking about poverty as a social fact and aiming for
answers to problems of work, a survey of data was carried out with students of the
pedagogy course of the university already mentioned above who entered the course in
2013.1 and who will soon be teaching. To elucidate the research we developed a
questionnaire with questions directed about the investigative object. What is to be poor,
which means poverty, are the main ways of understanding how the social fact has
provoked a great dimension of inequalities. In order to try to explain categorically the
phenomenon of poverty and its devastating consequences, this work is made up of
historical and contextual support of the main events that have, to a certain extent,
boosted inequalities. Following the discourse, we will find reflections about the
effectiveness of the democratic public school as one of the resources for the liberation
of the oppressed poor, making it possible to raise their voices, understanding the need
for autonomy of this population. The methodology used is based on bibliographical
research, interviews and questionnaires, the latter concerning the information collected
in the records of the conceptions of poverty. Therefore, the approach of the study
transcribed here is eminently qualitative, with the purpose of carrying out a social and
political analysis, in a descriptive and explanatory character, about the problems
exposed.
Keywords: Education. Poverty. Social inequality. Teacher Training.
INTRODUÇÃO
Esse artigo discute A pobreza como um fenômeno social1. Um fato social como
a pobreza se reconhece pelo poder de opressão externa e interna que exerce sobre os
1 Durkhein, Émile. As Regras do Método Sociológico 2001. Afirma as características distintivas o fato
social: 1° uma exterioridade em relação às consciências individuais; 2° a ação coerciva que exerce ou é
3
indivíduos, fazendo daquele que tenta resistir à coerção um verdadeiro violador de
regras já “predestinadas” a sua condição social.
Quando se pensa em pobreza na cidade do Natal, como educadores, logo nos
remetemos a memória do público pertencente às escolas públicas. Pessoalmente
constatei atuando como docente, crianças, jovens e adultos oprimidos pela pobreza.
Pobreza essa muitas vezes observada pelo ponto de vista do oprimido como uma
conjuntura sem perspectiva de êxito social.
A escolha inicial de entrevistar alunos concluintes do curso de pedagogia da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, fundamentalmente aconteceu pela
circunstância de tornarem-se educadores muito brevemente.
Isso implica dizer essencialmente que exerceram uma relevância social capaz de
formar cidadãos considerando as características socioculturais, possibilitando a
autonomia ao educando atuando como canal modificador de expectativas e atitudes,
assumindo a responsabilidade social e humana. Outro fator relevante para escolha
desses sujeitos se deu substancialmente pela responsabilidade coletiva que se deve
assumir ou que pelo menos se deve assumir enquanto educador.
Pensando nos possíveis dados foi direcionada uma pesquisa orientada por
questionário, onde solicitamos a esses alunos e alunas que respondessem sobre o que é
ser pobre, o que significa pobreza, em qual grupo social econômico estão inseridos,
entre outras. A partir daí novas indagações surgiram, o que nos levou a reconhecer a
pobreza e a formação de educadores e educadoras do curso de pedagogia da UFRN
como objeto de estudo, e nessa perspectiva a implicação dessa formação no processo
educativo de milhares de crianças, jovens e adultos que exercem seus direitos
relacionadas à educação frequentando uma escola pública gratuita.
Com isso, passamos a considerar e refletir sobre até onde a pobreza pode
influenciar no processo educativo escolar, tendo em vista que, um dos principais
objetivos da educação se torna a libertação do educando, sobretudo sobre os aspectos,
suscetível de exercer sobre essas mesmas consciências. Aplicação desta definição às práticas construídas
e às correntes sociais. Verificação dessa definição. Outra maneira de caracterizar o fato social: o estado de
independência em que se encontra em relação às suas manifestações individuais. Aplicação desta
definição às práticas construídas e às correntes sociais. (p.31).
4
cognitivo, físico, afetivo, de relação interpessoal e inserção social, ética e estética, tendo
em vista uma formação ampla.
DESENVOLVIMENTO – Surgimento do fenômeno da pobreza e desigualdade social
no Brasil
Um recorte histórico faz-se necessário para que se compreendam muitas
situações do próprio presente. O livro A Consciência Conservadora no Brasil de Paulo
Mercadante (1980), será a principal base para discussão desse primeiro capítulo sobre o
surgimento da pobreza e da desigualdade social no Brasil.
A história nos conta em seus relatos que muito antes dos Português “invadirem”
o Brasil o país já possuía habitantes hoje denominados vulgarmente de “índios”, aqui
não me aterei as questões da invasão portuguesa ao Brasil, mas as implicações políticas,
econômicas e sociais desse período onde Portugal possuía soberania sobre o Brasil.
FLEKNO, (A Relation of ten years traveis s.n. apud MERCADANTE 1980,
p.37) traz um relato de um jesuíta com relação ao seu ponto de vista sobre como no
Brasil se encarava os nativos, descreve ele como “asnos, dolentes e reumáticos (in
serviiudem nati) e só aproveitáveis para labor e servidão, pois a natureza não dotou o
país de outro animal de carga senão eles”.
Aqui seria suficiente analisarmos apenas essa discrição aos nativos e como isso
repercutiu naquela época e principalmente como se reproduz atualmente de maneira que
essas concepções podem indicar indícios de um início de desigualdades no Brasil, visto
que implica na propagação de uma doutrina de soberania humana.
É obvio que o conceito de pobreza empregado em seu sentido atual não pode ser
aplicado à situação dos nativos, tendo em vista que não viviam em um sistema
econômico semelhante ao nosso de acumulação, por exemplo.
No entanto, a condição em que diversos homens nativos foram obrigados a se
submeterem com a “ocupação” dos portugueses, nos fazem refletir um pouco sobre as
exigências muito semelhante as nossas, como por exemplo, a imposição de uma cultura
dominante que exclui aquele que não atende aos padrões exigidos.
Outro momento no Brasil capaz de demostrar agora a cristalização das
inconstâncias sociais, foi o período da iniciação do mercantilismo em paralelo ao fim do
5
feudalismo no século XVIII. A estruturação econômica do mercantilismo
principalmente na Europa existiu com o incentivo por parte da monarquia que por sua
vez, tentava garantir certos prestígios até financeiros a essa classe.
O mercantilismo ganhava espaço e incomodava os senhores feudais ao mesmo
tempo em que aumentava o poder da monarquia, tornando-se a monarquia a instituição
mais importante do Estado Português. Por sua vez o Estado Português adotou uma
“teoria” própria de que era necessária a utilização do monarca para a concentração e a
acumulação pela simples vontade divina, e isso seria para todos os poderes necessários
para o bem-estar coletivo. Segundo MERCADANTE, 1980,
O compromisso entre a nobreza e os mercadores iria definitivamente
empatar o destino histórico da burguesia portuguesa, pois a forma de
explorar o comércio ultramarino não permitia a liberação das forças
econômicas em que devia apoiar-se uma classe aspirante ao domínio
político do país. Durante os séculos de colonização, apesar dos
grandes lucros canalizados para as empresas particulares e para os
comerciantes, não pôde o grupo mercantil português promover a
revolução industrial e consequentemente libertar-se da natureza
mercantil de seu capitalismo (p. 26).
Apesar da teoria mercantilista se denominar a frente até mesmo da política e da
religião, os “mercantilistas” no Brasil adaptaram a teoria de acordo com suas intenções
econômicas. Um exemplo muito claro desse processo é a utilização da religião para
justificar a acumulação de bens e a escravização.
O trabalho manual por sua vez era visto com maus olhos, o trabalho braçal eram
atribuições apenas dos escravos. Apesar dos trabalhos livres e profissões lucrativas
ganharem espaço nesse momento histórico do Brasil, a nobreza sentia-se muito
incomodada a tantas mudanças e tentavam-se manter em suas aparências de
magnificência e em meio a tantas divergências tentou-se iniciar uma conciliação
econômica no Brasil.
O país dividido em sesmarias tentava explorar ao máximo suas terras. Toda a
economia nacional era norteada no sentido de fortalecer a grande exploração rural, que
asfixiava a pequena propriedade. MERCADANTE 1980 descreve (p.46) que na região
dos canaviais os proprietários de pequenos engenhos de açúcar ficam, desde a primeira
safra, tão empenhados em dívidas que, na segunda ou terceira, já se acham perdidos.
Essa situação não é diferente de hoje quando o capital mais vezes em sua concretude se
6
realiza apenas para os grandes proprietários de terras, ou melhor, dizendo os donos do
monopólio, ainda segundo MERCADANTE, 1980,
O povo não tinha a quem recorrer contra a autoridade onipotente;
desarmado, não dispunha nem de independência de ação e do
pensamento, nem do conhecimento prático de qualquer instituição
democrática. Carecia de consciência jurídica, decorrente de costumes
e tradições, para determinar o comportamento dos homens na vida
pública. (p.91)
O país sempre foi marcado por contradições, existia o liberalismo extremado que
se autodenominava revolucionário, mas que tinham medo da revolução, a elite que
exigia reformas, mas que não abria mão de regalias econômicas e ainda os queriam
abertura comercial, mas desejavam a permanência da escravidão. Significativas são as
palavras de Justiniano José da Rocha, “Ação, Reação e Transação”, apud:
MERCADANTE, A Consciência Conservadora no Brasil 1980,
Muitas vezes um partido está no poder, e, todavia, há nos elementos
sociais uma tendência tão contrária às suas ideias que o seu triunfo se
anula, e apenas lhe deixa servir aos interesses individuais e coletivos,
às paixões e às ilusões que os congregaram; até mesmo tão forte é às
vezes essa tendência que o partido, embora ocupe as posições do
domínio e da influência, tem de obedecer-lhe e de servi-la, ainda
contra os seus princípios, e de firmar as convicções que lhe são mais
repugnantes. (p.117)
Em meio a tantas contradições a tentativa de novamente haver uma centralização
nunca deixou de existir, ainda mais quando o liberalismo fracassará. Centralizar o país
significava além de muitas outras questões resistirem às tentativas abolicionistas e
controlar o país com base nos desejos de riquezas e interesses da nobreza, todos
baseados no lucro por intermédio do trabalho servil.
No entanto o país continuava necessitando de reformas econômicas, estruturais,
sociais e políticas para o seu bom funcionamento, contudo nenhum dos grupos ali
presentes fossem eles, conservadores, a favor ou contra a reforma, nenhum em seu
estado de comando conseguiu pôr fim a escravidão. Ainda sobre a escravidão
MERCADANTE, 1980 descreve que,
A escravidão delatava as limitações do liberalismo, e não puderam
nunca os radicais incorporar à pregação de seu programa o item
favorável ao abolicionismo. Tornavam-se irresolutos diante da
instituição, e o próprio Visconde de Cairu, paladino das ideias
avançadas do liberalismo econômico, incluía em seu Manual de Política
Ortodoxa a confissão de que “contra o mal da escravaria no Brasil não
cabia no engenho humano achar remédio” e que para provimento de
7
remédio a tamanho mal só nos podia valer a Divina Providência. O
grupo abominava e temia as revoluções, silenciava diante do elemento
servil. A escravatura no Brasil desnaturava mesmo a generosidade dos
socialistas. No manifesto de janeiro de 1849 dois dos itens defendidos
pela revista iriam figurar: o trabalho como garantia de vida para o
cidadão e o comércio a retalho só para brasileiro. Uma ideia tentadiça,
reflexo do movimento francês de 1848, juntada ao ponto de vista
retrógrado da nacionalização do comércio (p.133)
Não é difícil encontrarmos tentativas de respostas, ou melhor, de justificativas
para fundamentar a escravidão como necessária. Presenciamos até mesmo citações
como foi descrita anteriormente onde se põe a responsabilidade em divindades como
única força capaz de deter “tamanha barbaridade”.
A pobreza, por exemplo, é necessária para o funcionamento de muitas
corporações. É imprescindível para o capitalismo e para quem o aceita que ela insista e
persista. Até mesmo algumas das principais instituições religiosas pregam a
“importância” e erroneamente o conformismo em se está em situação de
vulnerabilidade, afirmando com intensões mercantis e não com proposito
evangelísticos, se valendo dos “Livros Sagrados” que a pobreza pode lhes garantir vida
eterna nos céus.
Todas essas fundamentações, sem dificuldades fazem parte de uma coerção
simbólica2 que amedronta cada vez mais o pobre, que ao invés de ajudá-los a
indignarem-se com sua situação de vulnerabilidade os encorajam a aceitar
conformando-os a conjuntura de miséria.
Atualmente vivenciamos em um sistema opressor que escraviza por intermédio
da cultura, do capital, ou da ausência de capital, do saber escolar ou ausência desses, do
saber político e legal, entre muitos outros fatores que serão discutidos adiante.
Intensificação da Pobreza no Século XVIII e XIX
2 BOURDIEU, Pierre (1989). O Poder Simbólico para o autor é o poder subordinado, é uma forma
transformada, quer dizer, irreconhecível, transfigurada e legitimada, das outras formas de poder: só se poder passar para além da alternativa dos modelos energéticos que descrevem as relações sociais como relações de força e dos modelos cibernéticos que fazem delas relações de comunicação, na condição de se descreverem as leis de transformação que regem a transmutação das diferentes espécies de capital em capital simbólico e, em especial, o trabalho de dissimulação e de transfiguração (numa criação das relações de força fazendo ignorar-reconhecer a violência que elas encerram objetivamente e transformando-as assim em poder simbólico, capaz de produzir efeitos reais sem dispêndio aparente de energia. (p.15).
8
Os séculos XVIII e XIX foram marcados por pensamentos ocidentais repletos de
críticas ao sistema feudal da época, principalmente o econômico, político e religioso.
Essas críticas se iniciaram principalmente por intermédio de pensamento Iluminista, que
por sua vez apoiava-se na ciência como razão dos fatos e acontecimentos sociais.
Sobre influência dos pensamentos iluminismo que tinha como finalidade libertar
os homens do medo, tornando-os senhores, no Ocidente Europeu pode constatar a
presença de duas revoluções que muito influenciaram no processo de intensificação da
pobreza, foram elas, a Revolução Francesa e a Revolução Industrial, segundo
MARTINS, (1994, p. 05) “A dupla revolução que este século testemunha - a Industrial
e a Francesa - constituía os dois lados de um mesmo processo, qual seja, a instalação
definitiva da sociedade capitalista”, sendo a segunda a que mais resultou nas grandes
desigualdades sociais.
A Revolução Industrial trouxe um conjunto de transformações comportamentais,
na cultura com implicações para própria sociedade. O homem que antes era considerado
um ser “aprisionado” pelos mitos e magias segundo as teorias iluministas, foi “liberto”
com a revolução, mas tornou-se vítima de novo engano: o progresso da dominação
técnica.
As transformações da Revolução Industrial não estão somente associadas aos
aspectos positivos. As principais mudanças que esse fato histórico ocasionou foram às
desigualdades sociais. Ocorreu nesse período uma grande parcela de pessoas
desempregadas, a substituição do trabalho do homem pela máquina, a precarização do
trabalho humano, entre outros.
Esse progresso transformou-se em poderoso instrumento utilizado pela indústria
cultural para conter o desenvolvimento da consciência das massas. A indústria cultural,
nas palavras de ADORNO (1996 Theodor Adorno sobre a sociologia empírica, “Wesen
und Wirklichkeit des Mensches”, Sociologia II, 1962, apud: COSTA 1989, p.197)
"impede a formação de indivíduos autônomos, independentes, capazes de julgar e de
decidir conscientemente".
A Revolução Industrial que ocorreu no século XVIII foi a instalação definitiva
do capitalismo, segundo MARTINS (1994), o capitalismo,
9
[...] representou o triunfo da indústria capitalista, capitaneada pelo
empresário capitalista que foi pouco a pouco concentrando as
máquinas, as terras e as ferramentas sob o seu controle, convertendo
grandes massas humanas em simples trabalhadores despossuídos. (p. 5
e 6).
Como resultado dessa Revolução e implicações capitalistas ainda se vivencia o
controle que se tem sobre as massas populares em relação as grandes produções, os
instrumentos de trabalho e o saber científico que continuam nas mãos dos empresários
capitalistas como também a precarização da mão de obra como atribuição do pobre.
Talvez a denominação e as diferentes formas de exploração tenham se
modificado, com o avanço da tecnologia existe também um refinamento no tipo de
exploração. Hoje a dominação não se restringe apenas ao campo da força do trabalho, a
dominação está nas imposições de culturas, que por sua vez colabora para a maior
exclusão do pobre na área que deveria ser de convívio social de todos independente de
classe social. Ainda segundo, MARTINS 1994, a Revolução teve grandes
consequências para a sociedade,
Estas transformações, que possuíam um sabor de cataclisma, faziam-
se mais visíveis nas cidades industriais, local para onde convergiam
todas estas modificações e explodiam suas consequências. Estas
cidades passavam por um vertiginoso crescimento demográfico, sem
possuir, no entanto, uma estrutura de moradias, de serviços sanitários,
de saúde, capaz de acolher a população que se deslocava do campo.
Manchester, que constitui um ponto de referência indicativo desses
tempos, por volta do início do século XIX era habitada por setenta mil
habitantes; cinquenta anos depois, possuía trezentas mil pessoas. As
consequências da rápida industrialização e urbanização levadas a cabo
pelo sistema capitalista foram tão visíveis quanto trágicas: aumento
assustador da prostituição, do suicídio, do alcoolismo, do infanticídio,
da criminalidade, da violência, de surtos de epidemia de tifo e cólera
que dizimaram parte da população etc.
O mais lamentável é perceber a grande associação desagradável à pessoas em
vulnerabilidade, onde são por vezes são observadas como improdutivas
economicamente. No entanto nos esquecemos de que muitas das iniciativas como a
Revolução Industrial e a concretização do capitalismo que são fatores consideráveis
para intensificação da pobreza foram materializadas e idealizadas pelas classes
dominantes e não por uma ideia coletiva e/ou democrática que se buscava um
desenvolvimento social igualitário, mas sim a produção e acumulação de capital por
meio da exploração.
10
Existe uma noção prévia de que o pobre só se encontra na situação de
instabilidade por incapacidade de se sobressair da situação, e essas noções são
continuamente impostas a população.
O que é importante deixar esclarecido aqui é que, tanto no Feudalismo como na
modernidade no ápice a Revolução Industrial houve grandes explorações das classes
menos desfavorecidas, desigualdades sociais, entre outros. No entanto foi apenas a
partir da Revolução Industrial que surgiram os conceitos de divisão do trabalho,
proletariado, fim da produção independente, etc. e essas mudanças foram mais violentas
para a sociedade e consequentemente mais convenientes para o então sistema
explorador que continua em atividade até hoje, o capitalismo.
Neoliberalismo e seus efeitos sociais
O neoliberalismo é um sistema econômico que surgiu no final da Segunda
Guerra Mundial propondo mudanças no sistema capitalista daquela época, suas
principais intensões eram um estado não interventor da economia.
Foi necessário preparar as bases de outro tipo de capitalismo, duro e livre de
regras para o futuro. Em 1944 Friedrich Hayek um economista austríaco deu sua
contribuição para a implementação de um sistema neoliberal ao escrever o livro
Caminhos da Servidão, onde deixava claro que “o capitalista perverso ou o espírito
malévolo desta ou daquela nação e a estupidez dos países ou um sistema social que
ainda não foi derrubado por completo reluta em uma crise civilizatória e que produz
efeitos diferentes dos esperados por ‘grandes homens” (p.37).
Nenhum espírito sensato teria duvidado de que as regras primitivas
nas quais foram expressos os princípios da política econômica do
século XIX eram apenas o começo, de que ainda tínhamos muito a
aprender e de que havia ainda imensas possibilidades de progresso no
caminho que vínhamos seguindo. Mas esse progresso só seria
alcançado à medida que conquistássemos um crescente domínio
intelectual das forças que teríamos de empregar. Muitas eram as
tarefas evidentes, como o aperfeiçoamento do sistema monetário e a
prevenção ou o controle do monopólio, e eram ainda mais numerosas
as tarefas menores, mas nem por isso menos importantes, em outros
campos em que o governo sem dúvida possuía enormes poderes para o
bem e para o mal; tudo levava a esperar que, com uma melhor
compreensão dos problemas, algum dia teríamos condições de
empregar com êxito esses poderes. (p.43).
11
É mais que necessário ressaltar que HAYER ao escrever e divulgar suas ideias
liberais estava vivenciando um contexto histórico diferente do nosso atual, ele
vivenciava um fim de uma grande guerra e mais do que isso, uma tentativa de
reconstrução social e um verdadeiro caos econômico. Seria inconveniente analisar uma
obra e criticá-la sem analisar o momento social em que foi escrita, mas o que quero
apresentar e trazer como reflexão é simplesmente a aceitação e aplicação que sua obra
possui nos dias de hoje, tendo como base as grandes desigualdades sociais que essa
doutrina vem causando.
HAYER defende o controle do capital apenas a aqueles que o já possui, a ideia
da liberdade do próprio indivíduo que é pregada por ele se anula ao propor controle do
monopólio. O controle do monopólio nos dias atuais não se restringe apenas ao âmbito
financeiro e ao mesmo tempo está diretamente ligada ao econômico e financeiro.
O que quero dizer, é que existe um monopólio simbólico até mesmo das
instituições que deveriam ser públicas ou aparentam ser mais acessíveis e/ou populares.
A escola é um exemplo desse tipo de poder simbólico3 monopolizado, ao propor que
uma escola “publica” se trabalhe com base em um currículo pautado nas deliberações
das classes dominantes, negligenciamos a clientela principal que são os estudantes em
sua maioria pobres da instituição pública. Ainda sobre esse domínio em O Poder
Simbólico de Pierre Bourdieu (1989)
As ideologias, em oposição ao mito, produto coletivo e coletivamente
apropriado, servem de interesses particulares que tendem a apresentar
como interesses universais ao conjunto do grupo. A cultura dominante
contribui para a integração real da classe dominante (assegurando uma
comunicação imediata entre todos os seus membros e distinguindo-os
das outras classes); para a integração fictícia da sociedade no seu
conjunto, portanto, à desmobilização (falsa consciência) das classes
dominantes; para legitimação da ordem estabelecida por meio do
estabelecimento das destinções (hierárquicas) e para a legitimação
dessas destinções. Este efeito ideológico, produ-lo a cultura dominante
dissimulando a função de divisão na função de comunicação: a cultura
que une (intermediário de comunicação) é também a cultura que
separa (instrumento de distinção) e que legitima as distinções
compelindo todas as culturas (designadas como subculturas) a
definirem-se pela sua distância em relação a cultura dominante. (p.10
e 11)
Começamos a perceber, portanto, que não é apenas a questão econômica que
exclui talvez ela seja o fator mais visível e central, no entanto a exclusão começa na
3 BOURDIEU, Pierre – 1989, op. cit., p.15.
12
maternidade onde se nasce, na ausência do nome do pai no registro de nascimento, na
sua cor da pele, no bairro onde se mora, na escola que frequenta, nos grupos de amigos,
nas músicas que se ouvem e, assim, esses “fatores” vistos muitas vezes como escolhas
pessoas, vão lhe privando de uma cultura denomina de cultura dominante.
Controle do monopólio; cultura; educação; território, entre outros, fazem parte
de uma ideia neoliberal e mais do que isso, da sua visível aplicação no Brasil. É
significativo deixar manifesto que não apenas o sistema neoliberal é propulsor da
pobreza no Brasil, até porque este trabalho apresenta em seu tópico inicial do capítulo
primeiro uma retomada das influências da “colonização” e do domínio português sobre
o Brasil e como isso influenciou na pobreza e na desigualdade social.
No entanto faz-se necessário o questionar e principalmente perceber a que ponto
essa iniciativa econômica vem prejudicando cada vez mais a população pobre e como
isso pode trazer consequências no âmbito educacional, tendo em vista o poderio das
classes dominantes até mesmo no que por direito temos e que nos querem e nos negam
diariamente com intenções claras de manutenção da burguesia e controle do capital da
Nação.
Docentes em formação na área da Pedagogia e a idealização conceitual da pobreza
Como foi visto, as reformas ocorridas no âmbito histórico foram fundamentais
para dar ensejo à transformação dos valores de pobreza ocorridas em nossa sociedade,
fomentando novas decisões da esfera econômica, política e cultural.
Se de um lado a Constituição Federal de 1988 estabelece como direito
fundamentais Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do
direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, (art. 5º), além de
estipular que o direito de ninguém será submetido [...] a tratamento desumano ou
degradante, por outro ainda há uma forte hierarquia ordenando as relações sociais,
sustentada por uma cultura de desigualdades de muitos séculos, que subordina aos
pobres a uma educação diferenciada na infância, a condições desfavoráveis no mercado
de trabalho e à realização de tarefas subalternas.
13
E como se não bastasse, persiste o discurso de que tais fatores seriam inerentes à
condição pessoa do pobre como já discutido anteriormente, em razão das diferenças
sociais, como já visto no capítulo anterior.
Quando pensamos em educação também como direito de todos nos
preocupamos também com os mediadores desse processo. O ser professor não se faz
agente sozinho, param nos tornarmos agentes educadores necessitamos de educandos,
porque a educação é mutua, é construção coletiva.
Para responder à questão central do trabalho aqui expresso, até onde a pobreza
pode influências no processo educativo escolar? Foi necessário como nos perguntarmos
incialmente se nossos educadores reconhecem o fenômeno da pobreza.
Dessa forma, busca-se aqui, através dos questionários feitos aos docentes em
formação da UFRN, analisar os seus entendimentos sobre pobreza, com intuito de
perceber como as relações de desigualdade estiveram presentes em suas caminhadas, e
de que forma tais relações interferiram e/ou interferem em suas posições profissionais e
pessoais.
Já sobre as entrevistas, e seus resultas, nas principais e mais reproduzidas
respostas dos entrevistados foi constatado que cerca de 88,88% dos docentes definiram
pobreza como uma “ausência econômica que impedem os pobres de obterem bens
matérias e ascensão social”.
Outro termo muito utilizado nas entrevistas para definir pobreza é a expressão
“condição social”. O termo “condição social” foi analisado e está presente em 100% das
falas dos 88,88% dos entrevistados.
Isso implica dizer, portanto, que na opinião desses entrevistados, a falta de
oportunidade não pode descaracterizar a ausência de interesse do indivíduo pobre, mais
precisamente como descreve um (a) discente ao ser questionado (a) sobre o que é
pobreza, indicou que se tratava de “uma condição gerada pela falta de oportunidade ou
interesse do indivíduo. Pois, quando se tem vontade ‘tudo’ se consegue. Ou seja,
quando o indivíduo quer, procura algo para fazer e ter seu próprio sustento.”
O que chama a atenção nesse ponto da entrevista, é que desses 88,88% de
discentes que assim caracterizaram pobreza, se enquadram e se intitularam como
14
pertencentes do um grupo econômico denominada “classe média” e “baixa classe
alta”4.
O mais interessante é perceber que dentro desse grupo apenas 18,75% tiveram
seus estudos em instituições públicas. Considerável são as palavras de ACKERLY, B.
A. (2000, p. 05, apud: LEÃO, REGO, 2014, p.38) “Já é difícil reconhecer a opressão
que não experimentamos e às vezes é difícil entender e articular até a opressão
experimentada [..]”.
Certamente não necessário vivenciar o problema, até porque não é incomum
observar de pessoas pobres a apresentação de uma postura conformista de sua situação.
No entanto levar em consideração que uma pessoa pobre que cotidianamente lhes é
negado o direito político, social, educacional, entre outros, posicionar-se dessa forma é
compreensível, pois muito possivelmente está mais suscetível a manobras midiáticas,
políticas e econômicas.
Com tudo, não devemos consentir com educadores declarando que a pobreza é
um fator orgânico da sociedade, e que depende individualmente de cada pobre o seu
progresso social. Faz-se necessário pensar seu processo formativo e o quanto isso é
necessário ser revisto, levando em consideração que a maior parte dos discentes da área
de pedagogia está voltada para uma esfera de trabalho de um público em
vulnerabilidade.
Certamente muitas dessas ideias desses educadores em formação não se
distanciam das idealizações reforçadas pela grande mídia e pelas teorias como o
neoliberalismo, capitalismo, etc. Idealizações essas que necessitam de aceitação cada
vez mais, para que se mascare a austeridade dos que enriquecem por meio da pobreza da
maioria.
A imagem dos pobres como ausentes de valores também é reforçada na escrita
dos entrevistados. Muitos discentes com base nos dados coletados associam a pobreza à
violência, a crimes como consumo e venda de drogas, furtos e roubos, mal-educados,
sujos, entre outros.
4 Dados do governo federal. Critério para a definição das classes sociais no Brasil. Secretaria de Assuntos
Estratégicos (SAE).
15
Sem dúvidas essas pessoas cheiram a negligencias, exalam desigualdades
sociais, talvez seja mais fácil culpar a vítima que aparenta visivelmente cheiros
considerados ruins do que entender o motivo do seu odor. Porque o que leva o indivíduo
a esse odor cheira consideravelmente pior e em maior escala, sendo que esse odor é
ocultado pelo próprio sistema que oprime. Segundo Leão e Rego, 2014,
A humilhação é dupla: por um lado, o indivíduo é silenciado, por
outro, vê imposta uma descrição que não corresponde à visão que
possui de si mesmo e que representa um desrespeito à sua. Isso pode
ser constatado cotidianamente no Brasil pela maneira na qual os
pobres são descritos pelos membros da classe média e pela própria
mídia (por exemplo, quando o indivíduo pobre é chamado de
“marginal”, de “preguiçoso”, de “vagabundo” ou é acusado de ser
culpado pela sua situação, sem poder em momento nenhum oferecer
sua visão da pobreza). Ao receber esse rótulo de membros perigosos,
inúteis e associais da comunidade, os pobres são de fato excluídos
expressamente dela; porém, espera-se deles, ao mesmo tempo, que se
comportem como membros comprometidos com ela. Os pobres no
Brasil vivem continuamente em uma tensão: por um lado, são
excluídos e humilhados por parte de um sistema econômico e legal
que os prejudica; por outro, recebem o apelo a se considerarem parte
do mesmo sistema e, assim, respeitarem suas regras e normas sociais e
legais. (p. 39).
É notório que a “ordem” social é injusta como também é a fonte geradora,
permanente, desta “tentativa de melhoria social” que se nutre da pobreza e da miséria.
Um sofrimento social evitável que insiste em responsabilizar o pobre e o põe como o
possível reparador de danos sócio desigual, vivenciados muito antes do conceito de
pobreza existir.
Conceituando a definição de pobreza
Até onde sabemos a pobreza é um fenômeno que atinge milhares de pessoas, e
se tratando do Brasil temos uma superabundante amostra desse cenário. Nas escolas
públicas de todo o país podemos constatar essa realidade, onde crianças, jovens e
adultos são vítimas da pobreza. Mas sabemos previamente o que é pobreza, quem são
esses pobres e porque continuam nessa circunstância de vulnerabilidade?
É substancial assimilarmos que a pobreza existe e persiste historicamente por
intermédio das divisões socioterritoriais, de trabalho, de etnia, de gênero, entre outros e
ainda é um dos fenômenos históricos mais brutais que até hoje em pleno século XXI
com todo o progresso da humanidade continua a insistir.
16
Esse padrão de concentração, apropriação e expropriação de renda é um modelo
que continua racista, sexista, empurrando ao desemprego e aos empregos mais precários
os coletivos sociais, étnico-raciais, de gênero, das periferias e dos campos. Esse padrão
racial e sexista de trabalho continua produzindo milhões na pobreza.
Pobreza por sua vez é uma situação na qual as necessidades não são atendidas de
forma adequada. É considerado na Declaração Universal dos Direitos Humanos em seu
Artigo 25°, inciso I:
Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à
sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação, ao
vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos serviços
sociais necessários, e tem direito à segurança no desemprego, na doença, na
invalidez (...) (s.n.). BRASIL. Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988.
Pensando nisso com enfoque primordialmente na educação e sabendo que de
acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais a Educação nos Referências
conceituais, 2013,
Os fundamentos que orientam a Nação brasileira estão definidos
constitucionalmente no artigo 1º da Constituição Federal, que trata dos
princípios fundamentais da cidadania e da dignidade da pessoa humana, do
pluralismo político, dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa.
Nessas bases, assentam-se os objetivos nacionais e, por consequência, o
projeto educacional brasileiro: construir uma sociedade livre, justa e
solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a
marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o
bem de todos sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação. (Diretrizes Curriculares Nacionais da
Educação Básica, 2013, p.16).
As Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica que tem como objetivo
reduzir desigualdades e erradicar a pobreza está incontestavelmente certificado que a
pobreza é uma adversidade social real e, portanto, indutora direta no processo de
educação escolar, assim faz-se necessário a seguinte indagação: como a pobreza pode
influenciar o processo educativo escolar?
Discutimos anteriormente que com base nos dados levantados na pesquisa feita
com uma pequena amostra de pedagogos em formação, percebemos em sua maioria das
respostas um discurso muito estigmatizado do que é ser pobre e do que é pobreza, e por
sua vez, trataram a causa como uma fatalidade, isso porque nossos educadores
aparentemente não apresentam um discernimento dessa circunstância.
17
É necessário, portanto, não ignorar, secundarizar a visão da pobreza como
escassez material, privação das condições mais básicas para viver de forma justa e
digna, como ser humano, os corpos não importa a pedagogia e à docência não devem
resistir a dar a centralidade devida às bases materiais do viver, do pensar, do ser sujeito
intelectual e moral. Segundo Paulo Freire (1996),
(...) nas condições da verdadeira aprendizagem os educandos vão se
transformando em reais sujeitos da construção e da reconstrução do saber
ensinado, ao lado do educador, igualmente sujeito do processo. Só assim
podemos falar realmente de saber ensinado, em sua razão de ser e, portanto,
apreendido pelos educandos. Percebe-se, assim, a importância do papel do
educador, o mérito da paz com que viva a certeza de que faz parte de sua
tarefa docente não apenas ensinar os conteúdos, mas também ensinar a
pensar certo. (p. 14).
O docente segundo percebemos, não deve se reduzir ao currículo imposto pelos
detentores do poder, se se respeita a natureza, a origem ou a subjetividade do ser
humano, o ensino dos conteúdos não pode dar-se alheio à formação do educando.
Educar é substantivamente formar. Enquanto educador deve-se reconhecer
precisamente esse fenômeno, pois nos é dado o encargo de observar, comparar, avaliar,
escolher, decidir, intervir, romper e de optar. Devemos por compromisso à profissão nos
fazermos seres éticos, não podemos aceitar a transgressão como um direito, mas como
uma possibilidade. Possibilidade contra que devemos lutar e não diante da qual cruzar
os braços sendo coniventes de uma ordem perversa, irresponsabilizando-as por sua
malvadez, ao atribuir imponderáveis os danos por elas causados aos seres humanos.
A fome e o desemprego no mundo são imoralidades e não fatalidade como o
reacionarismo apregoa com ares de quem sofre por nada poder fazer, a minimização dos
seres humanos, no caso as maiorias compostas de minorias que não perceberam ainda
que junta seria a maioria.
Ser pobre vai muito além de do fato de ter não refeições nutricionais diárias, são
indivíduos invisíveis que não possuem voz alguma, ainda mais se tratando de políticas
públicas que lhes concernem. O pobre é, em suma, considerado mero objeto de políticas
públicas, não sujeito político e isso representa uma forma de perda de autonomia.
Autonomia por sua vez pressupõe um sujeito capaz de se afirmar perante o
outro como ator apto a fundamentar verbalmente suas ações, intenções, desejos e
necessidades. Essas pessoas muitas vezes não possuem consciência do fato de que são
18
vítimas de alguma injustiça, tal humilhação representa uma erosão da autonomia
individual.
Pobreza é a situação na qual as necessidades não são atendidas de forma
adequada, ela é socialmente evitável, as suas causas não são naturais, mas sim
resultados do agir do homem, que está inserido de forma consciente no mundo onde a
globalização oculta ou nela busca penumbrar a reedição intensificada ao máximo,
mesmo que modificada, da medonha malvadez com que o capitalismo aparece na
História.
As condições de vida e de trabalho desse homem pobre isolam-no fisicamente
do grupo durante longos períodos de tempo; adquire, em virtude da brutalidade das
modificações a que se sujeita uma espécie de desenraizamento crônico: nunca mais se
poderá sentir em casa em lugar nenhum, ficará mutilado psicologicamente. O discurso
ideológico procura disfarçar que ela vem intensificando a riqueza de uns poucos e
verticalizando a pobreza e a miséria de milhões. O sistema capitalista alcança no
neoliberalismo o máximo de eficácia de sua malvadez intrínseca.
Quanto a pobreza como fenômeno influenciador no processo educativo escolar,
não é difícil perceber como isso ocorre, é um diagrama, o docente com suas análises
muitas vezes superficiais sobre pobreza, é “agente educador” de uma criança, jovem ou
adulto pobre, que por sua vez, sente-se causador da própria pobreza e por isso
identifica-se como ser inferior sem condições nenhuma de evadir-se de tal condição,
assim, temos dois autômatos que não pensam nem agem por si mesmo, cujas ações
estão subordinadas aos desejos alheios do neoliberalismo, ações estas que não são
previamente refletidas, temos por tanto consentimento entre ambas as partes, um
sistema opressor e um oprimido que se atem de suas responsabilidades de educador, de
libertador, formando assim uma sociedade estrategicamente voltada a servidão da
“aristocracia”.
A inflexibilidade da escola pública gratuita
Não só as escolas públicas como também a própria universidade é um espaço
que se prega democracia, igualdade, etc. isso porque são instituições do povo,
construídas pelo povo e por intermédio de muita luta, mas que resiste até hoje a adaptar-
se a sua clientela.
19
Em todo esse trabalho de pesquisa também desenvolvi levantamentos
investigativos acerca da opinião de gestores e coordenadores pedagógicos em relação a
pobreza e principalmente sobres os alunos pobres. As opiniões não diferiram das dos
discentes já citados no tópico acima, os gestores e coordenadores pedagógicos de
escolas públicas me afirmaram que a pobreza muitas vezes persiste por falta de interesse
do indivíduo pobre, cupão principalmente a mãe das crianças por serem “sujas e mal-
educadas”. O que me chama atenção ainda nessa fala generalizada é a ideia patriarcal de
que apenas a mulher é responsável pelo cuidado dos filhos, e mais interessante é
perceber que entre os seis entrevistados que me relataram esse “problema” em seus
pontos de vista, cinco eram mulheres “educadoras”.
Como uma instituição pública que atente o público que é pobre pode deduzir
tantas ideias negativas em relação aos seus clientes? Se a pobreza fosse fácil e desejada
de ser combatida, certamente não seria um trabalho descomplicado. Agora se
imaginarmos pessoas pobres lutando contra um sistema que não deseja sua ascensão
esse trabalho de “vitória social” torna-se impossível.
A escola ainda é condizente com as explorações que são feitas por meio dos
sistemas econômicos, culturais e até mesmo político. Ainda existe uma grande
necessidade da escola se posicionar como um espaço revolucionário que é. Ainda não se
compreendeu a função social da escola. Diariamente crianças, jovens e adultos
abandonam a escola por razões indispensáveis de sobrevivência, deixam de frequentar o
ambiente escolar para garantir seu próprio sustento, trabalhando incessantemente nas
ruas ou em trabalhos subalternos, expondo-se a situações de vulnerabilidade. Porque a
escola pública insiste em permanecer entre seus muros frios? De acordo com FREIRE,
1996
Se tivesse claro para nós que foi aprendendo que percebemos ser
possível ensinar, teríamos entendido com facilidade a importância das
experiências informais nas ruas, nas praças, no trabalho, nas salas de
aula das escolas nos pátios dos recreios, em que variados gestos de
alunos, de pessoal administrativo, de pessoal docente se cruzam
cheios de significação (p. 25)
Sabemos que em meio a tantas discursões, não serei hipócrita de negar as
grandes dificuldades que um professor ou gestor transitam, mas a partir do momento
que compreendemos que a luta não é individual e sim coletiva, lutaremos juntos por
uma só causa.
20
Estreitar laços entre escola e sociedade é sim função da escola tendo em vista
que ela possui o conhecimento e o poder de condicionar essa luta, de acordo com
ROCHA E LEÃO, 2014, se realmente nos considerássemos sujeitos moralmente
responsáveis perante os outros, não poderíamos aceitar a situação de absoluta falta de
recursos, de privação, de humilhação e de sofrimento na qual se encontram tantos
indivíduos, p. 44. Até quando vamos permitir que o desenvolvimento econômico,
alimentado pelo desenvolvimento técnico-cientifica nos oprima afirmando que esses
dois últimos sejam garantias de desenvolvimento social?
A instituição pública continua a serviço do capital, mas se refletirmos um pouco
perceberemos a incoerência desse fato. O capitalismo que oprime professores com
salários miseráveis, falta de reconhecimento da classe, entre outros é o mesmo que que
sacrifica o pobre diariamente em favor da sua própria sobrevivência, é preciso entender
mais uma vez que a luta é coletiva, até porque as opressões partem de um mesmo
opressor.
Não é diferente nas escolas que o capitalismo/liberalismo exerce um poder de
concorrencial e estatizante, nas escolas existe a seleção “natural” dos que se adaptam
melhor ao ambiente e a oferta dos conteúdos unificados e padronizados seguindo
orientação da economia.
O que mais chama a atenção nesses processos de junção entre
capitalismo/liberalismo e escola é a aceitação de uma doutrina que segundo ela mesma
precisa existir e que “necessita” explorar para que se mantenha a sociedade como uma
realidade definitiva que se aperfeiçoa para o bem comum, no entanto sabemos para
quem está direcionado esse bem comum. A sociedade contemporânea segundo
LIBÂNIO, OLIVEIRA e TOSCHI, 2003,
[...] designa uma gama de fatores econômicos, sociais, políticos e
culturais que expressam o espirito da época e etapa de
desenvolvimento do capitalismo em que o mundo se encontra
atualmente. Esse termo sugere a ideia de movimentação intensa, ou
seja, de que as pessoas estão em meio a um acelerado processo de
integração e reestruturação capitalista. Exatamente por isso, há quem
diga que a globalização é um conceito ou uma construção ideológica.
[...] nesse conceito esconde-se a ideologia neoliberal, segundo a qual,
para garantir seu desenvolvimento, a um país basta liberalizar a
economia e suprimir formas superadas e degradadas de intervenção
social, de modo que a economia por si mesma se defina e seja criado,
assim, um sistema mundial auto-regulado (p. 51).
21
Todo esse sistema leva o capitalismo a estabelecer, para a escola, finalidades
mais compatíveis com os interesses do mercado, modificando os objetivos e prioridades
da escola, que produzem modificações nos interesses, nas necessidades e nos valores
escolares. Forçam a escola a mudar suas práticas por causa do avanço tecnológico, dos
meios de comunicação, da introdução da informática e por fim induzem alterações de
atitude do professor e no trabalho docente. No entanto a realidade foge do esperado, não
se há investimento por parte do capital nas escolas e sim o sucateamento das mesmas.
Passos para a flexibilização de uma escola democrática que educa
É mais fácil e mais cômodo manter a escola nos padrões já discutidos
anteriormente do que revolucionar ou formar cidadãos críticos. É preciso, porém que
tenhamos na resistência que nos preserva vivos, na compreensão do futuro e presente da
situação de degradação desses seres como problema social e na vocação para o ser mais
como expressão da natureza humana em processo de estar sendo, fundamentos para a
nossa rebeldia e não para a nossa resignação em face das ofensas que nos destroem o
ser.
Não é na resignação, mas na rebeldia em face das injustiças que nos afirmamos.
É a partir de este saber fundamental: mudar é difícil, mas é possível, que vamos
programar nossa ação político-pedagógica, não importa com qual projeto nos
comprometemos, pois se escolhemos ou fomos escolhidos para sermos educadores
devemos, portanto nos assumir enquanto sujeitos moralmente responsáveis perante os
outros, não podemos aceitar por tanto a situação de absoluta falta de recursos, de
privações, de humilhações e de sofrimento na qual se encontram tantos indivíduos.
O problema da pobreza também é nossa responsabilidade, ainda temos voz e
resistência para irmos de encontro às essas doutrinas que nos querem fazer professores
condizentes e insanos. Podemos por intermédio das nossas ações pedagógicas diárias
fazer o outro refletir sobre direitos adulterados.
De outro lado, é tarefa árdua para as escolas e seus (as) gestores (as) não se
deixarem contaminar por essas representações sociais dos (as) pobres. Difícil não ver
crianças, adolescentes e jovens pobres como seres destituídos de valores, preguiçosos,
sem dedicação ao estudo, indisciplinados e até violentos.
22
As representações sociais pesam sobre as representações pedagógicas. Sempre
que predomina uma visão moralista dos graves problemas sociais, tende-se a apelar para
programas socioeducativos, para as escolas e seus profissionais.
Assim, uma pergunta obrigatória se coloca: por que as escolas não reagem, e
continuam aceitando essa sublime missão de salvar os (as) pobres? Podemos respondê-
la da seguinte maneira: as formas de pensar a pobreza como questão moral não são
apenas da sociedade, da mídia e dos programas socioeducativos, mas são também das
escolas e da cultura pedagógicas demasiadamente moralizantes.
A ênfase nessa interpretação moralista da pobreza traz consequências para a
escolarização dos pobres. Isso ocorre porque os esforços escolares não priorizam
garantir seu direito ao conhecimento, mas sua moralização. Logo, os estudantes não
receberão aprendizados sobre as ciências e tecnologias que possam vir a libertá-los, mas
apenas lhes será dado o domínio de habilidades mais elementares de ciências e a
alfabetização na idade determinada como "certa" pelo sistema educacional.
Enquanto a pobreza for pensada como uma questão moral, os currículos para os
pobres continuarão sendo pensados para moralizá-los, não para garantir o direito deles
ao conhecimento, às ciências e às tecnologias. Serão currículos pobres de
conhecimentos e repletos de bons conselhos morais de esforço, trabalho, dedicação e
disciplina.
Entender a pobreza para repensar os currículos e as práticas educacionais é
permitir cultivar nossa sensibilidade para ouvir e incorporar em nosso exercício
profissional as questões que ecoam das vivências da pobreza.
É preciso que formemos indivíduos capazes de pensar e aprender
permanentemente e que também desenvolva conhecimento, capacidades e qualidades
para o exercício autônomo consciente e crítico da cidadania.
Imagina-se por tanto que pobres tenham as mesmas chances que as nossas, que
lhes falta é trabalho para sair da situação de instabilidade, quando na verdade a palavra
trabalho é aplica em suas vidas em todos os sentidos. O trabalho do pobre mantem a
economia viva, trabalham quase que de graça, fazem o trabalho “sujo” e pesado que os
23
outros se recusem a fazer e recebem em troca a aceitação de sua situação, muitas vezes
carregada de culpa por não conseguirem uma melhor condição de vida.
A pobreza influência negativamente e diariamente milhares de crianças, jovens e
adultos em escolas públicas do Brasil, mas, mais do que isso, as concepções tidas por
docentes absolutamente influenciam em proporções bem maiores.
Foi constatado nesse trabalho por tanto, como é vital refletirmos sobre nossa
formação docente, partindo do princípio que, enquanto mediadores se exercerça uma
função de educar, condição necessária à cidadania. Aqui também foi diagnosticado que
a democratização do acesso, garantia e permanência, faz-se mais do que fundamental,
tendo em vista que a pobreza mais do que nunca exclui e oprime a essa parcela da
população.
Um grande obstáculo a ser enfrentado por nós docentes além da busca contínua
por formação é o incentivo a participação política e efetiva dos pobres. A ausência de
autor respeito é a consequência de uma humilhação que toma a forma de estigmatizar a
pobreza e de culpar os pobres por sua situação, como já falado anteriormente.
Com tudo que já foi exposto e desenvolvido no decorrer desse trabalho, como se
não fosse suficiente as grandes desigualdades sociais, atualmente o Brasil vem perdendo
cada vez mais sua autonomia educacional em especial na educação pública. Uma grande
recessão com relação às perdas educacionais vem mobilizando considerável parcela da
sociedade para essas tomadas de decisões antidemocráticas tidas por unanimidade pelos
representantes públicos.
O período em que estamos vivenciando é de total alerta por suas intenções de
uma autonomia e liberdade econômica dos pais, onde se extrai de políticas públicas para
se manter a estrutura capitalista.
Por fim, é necessário reafirmar que uma sociedade com sujeitos iguais e livres só
existe se houver vínculos de pertinência que os liguem a todos os aspectos da vida
social, como a língua, a memória, as tradições culturais, a educação, saúde, política,
economia, etc. Que mantenhamos nossa perseverança de educadores viva.
Algumas Considerações
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De acordo com a nossa condição de graduanda no curso de Pedagogia e
participante de uma iniciação cientifica cujos estudos objetivam o estudo da pobreza no
campo educacional é que escolhemos para este trabalho de conclusão de curso estudar
“Educação, pobreza e desigualdades sociais”, objetivando compreender as implicações
da compressão do vocábulo pobreza pelos alunos do último período do curso de
pedagogia.
Tal objetivo remeteu a uma pesquisa de campo norteada por um questionário
semiestruturado aplicado no final do ano de 2015, sendo seus resultados analisados a
luz da compreensão de Bourdieu, Sônia Rocha, Walquiria Leão Rego, Alessandro
Pinzani, Paulo Freire, Emília Viotti, entre outros, e diante do que se estudou
consideramos que: existe uma necessidade de assimilação do conceito de pobreza não
só por parte dos docentes em formação, como também de toda a comunidade escolar,
abrangendo pais, gestores, coordenadores, alunos e funcionários.
Percebeu-se também que a formação docente é fundamental no processo de
entendimento desse fenômeno, assim concluímos também a relevância dos nossos
formadores acadêmicos de se aterem e se inquietarem na perspectiva de sensibilizar-se
com a temática, tendo em vista o poder a libertação da educação.
Finaliza-se assim, que o estudo da pobreza no campo educacional exige um
maior aprofundamento continuo da pesquisa cientifica, tendo em vista as
transformações sociais diárias que nos ocorre. Por fim, reafirma-se a seriedade que
devemos ter enquanto educadores permitindo-nos sensibilizar-se em entender quem são
esses sujeitos pobres e o porquê de estarem em situação de vulnerabilidade e as
implicações legais que lhes concernem estando eles em estado de negligência social.
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