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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS DEPARTAMENTO DE DIREITO PRIVADO CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO BRUNO TERRA DO NASCIMENTO BARBOSA A VIDA PELO TRABALHO: DANO EXISTENCIAL NAS RELAÇÕES DE EMPREGO NATAL/RN 2014

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

DEPARTAMENTO DE DIREITO PRIVADO

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

BRUNO TERRA DO NASCIMENTO BARBOSA

A VIDA PELO TRABALHO: DANO EXISTENCIAL NAS RELAÇÕES DE EMPREGO

NATAL/RN

2014

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BRUNO TERRA DO NASCIMENTO BARBOSA

A VIDA PELO TRABALHO: DANO EXISTENCIAL NAS RELAÇÕES DE EMPREGO

Monografia apresentada como requisito

para obtenção do grau de bacharel em

Direito pela Universidade Federal do Rio

Grande do Norte

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Yara Maria

Pereira Gurgel

NATAL/RN

2014

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Divisão de Serviços Técnicos

Catalogação da Publicação na Fonte. UFRN / Biblioteca Setorial do NEPSA /

CCSA

Barbosa, Bruno Terra do Nascimento.

A vida pelo trabalho: dano existencial nas relações de emprego / Bruno Terra

do Nascimento Barbosa. – Natal, RN, 2014.

57 f.

Orientador: Profa. Dra. Yara Maria Pereira Gurgel.

Monografia (Graduação em Direito) – Universidade Federal do Rio Grande

do Norte. Centro de Ciências Sociais Aplicadas. Departamento de Direito

Privado.

1. Direito – Monografia. 2. Relações de trabalho - Monografia. 3. Relação

patrão – empregado – Monografia. I. Gurgel, Yara Maria Pereira. II.

Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.

RN/UF/BS CDU 349.23

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BRUNO TERRA DO NASCIMENTO BARBOSA

A VIDA PELO TRABALHO: DANO EXISTENCIAL NAS RELAÇÕES DE EMPREGO

Monografia apresentada como pré-requisito

para a conclusão do curso de graduação em

Direito pela Universidade Federal do Rio

Grande do Norte (UFRN).

Aprovado em _______/_______/________.

BANCA EXAMINADORA

___________________________________

Prof.º Dr.ª Yara Maria Pereira Gurgel - Orientadora

UFRN

___________________________________

Prof.º Me. Thiago Oliveira Moreira – Membro interno

UFRN

___________________________________

Profº Me. Anna Emanuella Nelson dos Santos Cavalcanti da Rocha – Membro interno

UFRN

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RESUMO

As relações de emprego são marcadas pela desigualdade entre patrão e empregados, da

qual podem ser desenvolvidos danos pessoais que afetam, especialmente, esses últimos.

Jornadas exaustivas, assédio moral e a não concessão de descanso são exemplos de condutas

perpetradas por empregadores que afetam a dignidade do trabalhador a ponto de interferir

negativamente em suas vidas fora do emprego, causando o chamado dano existencial. Neste

trabalho, trata-se dessa relativamente recente espécie de dano pessoal e da possibilidade do

pedido de indenização e seus pressupostos, bem como de uma análise de decisões judiciais

que reconheceram sua aplicação nas relações de emprego.

Palavras-chave: Dano existencial. Dignidade humana. Relação de emprego. Indenização.

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ABSTRACT

Employment relations are marked by inequality between employer and employees, of

which personal injury affecting especially the latter can be developed. Exhausting journeys,

mobbing and not granting rest are examples committed by employers affecting the dignity of

the worker to interfere negatively in their lives off the job, causing the so-called existential

damage. In this work, it is treated about this relatively new kind of personal injury and the

possibility of the application for compensation and its assumptions, as well as an analysis of

court decisions that recognized their application in relations job.

Keywords: Existential Damage. Human Dignity. Employment relationship. Indemnification.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO......................................................................................... 05

2 DA RELAÇÃO DE EMPREGO............................................................. 07

2.1 Características da relação de emprego................................................... 07

2.2 Risco de dano em face do poder empregatício....................................... 09

2.3 Proteção jurídica do trabalhador............................................................ 11

2.4 Princípio da proteção............................................................................... 13

2.5 Dignidade humana nas relações de emprego......................................... 16

2.6 Situações de dano nas relações empregatícias........................................ 20

3 DANO EXISTENCIAL NAS RELAÇÕES DE EMPREGO................ 24

3.1 O que é dano?............................................................................................ 24

3.2 Dos danos extrapatrimoniais................................................................... 26

3.3 Dano existencial........................................................................................ 32

3.4 Diferenças entre dano existencial e dano moral..................................... 38

3.5 Situações potencialmente geradoras de dano existencial nas relações

de emprego................................................................................................

40

3.5.1 Jornada de trabalho excessiva..................................................................... 40

3.5.2 Não concessão de férias.............................................................................. 41

3.5.3 Doença profissional (LER/DORT)............................................................. 43

3.5.4 Assédio moral e assédio sexual.................................................................. 43

3.5.5 Condições precárias de trabalho................................................................. 44

3.6 Problemática da reparação...................................................................... 46

3.6.1 Atual modelo de reparação......................................................................... 46

3.6.2 Análise de eficiência da reparação............................................................. 49

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................... 55

REFERÊNCIAS..................................................................................................... 58

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1 INTRODUÇÃO

A evolução das ciências jurídicas, carreada pela ideia de desenvolvimento dos povos,

tem gerado um processo de aumento na proteção aos direitos humanos ao longo dos tempos,

alcançando esferas antes desprezadas ou desprotegidas, dentre as quais podem ser citadas

como exemplos as questões ambientais, os direitos sociais e a tutela abrangente de garantia

dos direitos individuais.

Nesse contexto, papel importante é exercido pela responsabilidade civil, cuja evolução

se dá em favor da tutela dos direitos afetos ao ser humano, ultrapassando, pois, a antiga

barreira patrimonialista de percepção das relações sociais e avançando para a noção do direito

com base numa visão centrada no indivíduo enquanto sujeito de direitos.

Assim, entendimento mais recente acerca da responsabilidade civil orienta que o

escopo da tutela dos danos, sejam eles patrimoniais ou não, deve se voltar para as vítimas, na

busca de uma reparação ou compensação de alguma natureza que possa satisfazer ou mitigar

os efeitos causados.

Da mesma forma, passou-se a tutelar a responsabilidade civil nas relações de trabalho,

especialmente os danos de cunho moral, e, mais recentemente, reconheceu-se o dano estético

e o dano à saúde do trabalhador como espécies de danos abrangidos pelo ordenamento

jurídico pátrio e cujas reparações devem ser dadas aos indivíduos eventualmente lesados.

Nesse sentido, doutrina e jurisprudência brasileiras têm, ainda que timidamente,

buscado analisar um instituto distinto, chamado dano ao projeto de vida ou simplesmente

dano existencial, cuja incidência se dá, dentre outros casos, nas relações de emprego e com

efeitos talvez mais nocivos que os oriundos do próprio dano moral puro.

Como se verá, o ordenamento jurídico brasileiro insere a dignidade da pessoa humana

como fundamento da República, como consta no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal

de 1988, e, dentro do abrangente entendimento do que signifique tal ponto, encontra-se o

projeto de vida pessoal do indivíduo e sua vida de relação.

É óbvio, por um lado, que a vida na sociedade atual impõe algumas limitações ao

desfrute do convívio familiar, de praticar com mais frequência atividades prazerosas etc., por

razões diversas, mas ao passo que é imposta uma limitação mais severa devido a atos ilícitos

ou simplesmente injustos, encontra-se aí um caso de dano indenizável, o dano existencial,

cujos efeitos ultrapassam o momento da lesão e repercutem diretamente na vida e nos projetos

pessoais traçados pelo lesado. É sobre esse tipo de dano, suas causas, seus efeitos e

possibilidades de reparação que se debruçará neste trabalho.

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Posto isso, trabalhar-se-á, no primeiro capítulo, como base para o desenvolvimento do

tema principal, em uma abordagem sobre a relação empregatícia, tratando especificamente

quanto aos possíveis danos extrapatrimoniais que podem surgir em face de tal liame jurídico

entre empregadores e trabalhadores.

Já no segundo capítulo, adentra-se no tema dano existencial, trazendo seu conceito, o

contexto de surgimento da ideia na Itália, suas diferenças com relação ao dano moral, além de

causas que possuem potencial relativamente alto para a geração desse tipo de lesão aos

empregados e, ao fim, uma análise acerca da reparação desse dano, com base na ideia de

eficiência e sua influência no comportamento dos sujeitos integrantes dessa relação.

Ao final, chegar-se-á à conclusão se o instituto do dano existencial merece abordagem

isolada do dano moral, qual sua importância dentro das relações de emprego e quais as

possíveis soluções para a minimização dos eventos danosos nessa seara.

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2 DA RELAÇÃO DE EMPREGO

2.1 Características da relação de emprego

Inicialmente, parece interessante destacar as características que identificam a relação

empregatícia, a fim de que se tenha uma base segura para o desenvolvimento do tema em

torno desse citado liame. Para tanto, é necessário que se delimite a partir de que pontos a

relação de emprego se diferenciaria e por quais motivos, de uma relação de trabalho.

Não é necessário que se remonte às origens da vida humana, bem como às formas

iniciais de trabalho, para que se alcance o objetivo delimitado neste ponto. O labor autônomo

em razão da subsistência e a exploração do homem por outrem, como se baseou o trabalho por

longo período histórico, não se inserem como emprego e, portanto, não integram e não

possuem os requisitos que adiante serão delineados.

Assim, remete-se ao período de surgimento da atividade industrial, cujas alterações

advindas com a nova forma de produção deram início à relação empregatícia. Foi na

Revolução Industrial, portanto, que surgiu essa relação jurídica de trabalho da qual tratamos

neste ponto e cujos requisitos para sua caracterização serão elencados em seguida.

A Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) elenca, no caput do seu artigo 3º, os

elementos pelos quais se pode ser considerado empregado, que deve ser “toda pessoa física

que prestar serviço de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e

mediante salário”.

Além disso, o artigo 2º do mesmo código informa quem pode ser considerado

empregador, dispondo que seja “a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos

da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço”.

Das normas acima colacionadas, extrai-se que os elementos que caracterizam uma

relação de emprego são os seguintes: a) que o trabalho seja prestado por pessoa física; b) com

pessoalidade; c) de forma habitual ou não eventual; d) havendo subordinação do prestador do

serviço com relação ao tomador; e) e com onerosidade para esse último.

Conforme afirma Maurício Godinho Delgado1, esses são elementos fático-jurídicos, já

que pertencem ao mundo dos fatos, e o direito, portanto, trata apenas de reconhecê-los e

emprestar-lhes efeitos compatíveis com sua relevância sociojurídica. Desse modo, quando

conjugados esses elementos citados, está-se diante, então, de uma relação empregatícia.

1 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho 11. ed. São Paulo: LTr, 2012, p. 284.

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Iniciando pelo primeiro pressuposto elencado, importante marca da relação de

emprego é a prestação do trabalho por pessoa física. Para que haja relação de emprego, faz-se

necessário que o polo do qual faz parte o empregado seja ocupado por pessoa natural,

cabendo a ela a proteção que é dada pelas normas justrabalhistas. Em outra face, o

empregador pode ser pessoa física ou jurídica, sem prejuízo da caracterização do liame

empregatício.

Relacionado ao elemento fático-jurídico apontado acima, está o segundo pressuposto

da relação de emprego, a pessoalidade. Nesse ponto, destaca-se a obrigatoriedade de o

trabalho ser prestado por uma pessoa específica, a qual não pode ser substituída dentro do

mesmo vínculo, já que ele é intuitu personae no que toca ao prestador dos serviços. Por outro

lado, no que diz respeito ao empregador, impera a despersonalização do empregador, que

incide mais claramente nos casos de sucessão trabalhista.

O trabalho tem, ainda, que ser prestado de forma habitual ou não eventual, a fim de

que seja considerado como execução da parte que integra uma relação de emprego. O trabalho

esporádico não pode ser considerado para a determinação de vinculação empregatícia, embora

delimitá-lo seja tarefa árdua. A corrente que parece mais adequada é a perfilada por Alice

Monteiro de Barros2, que conceitua o trabalho eventual como aquele que não se insere na

rotina normal da empresa.

Além dos já descritos, outro pressuposto para caracterização da relação de emprego é a

onerosidade. Desse elemento, se extrai que para o trabalho prestado pelo empregado, há de

existir uma contraprestação financeira do empregador. Atesta-se o cumprimento desse

requisito com a existência de pactuação de pagamento de remuneração por serviços prestados,

com o sentido de ganho econômico em troca do trabalho exercido, quando das tratativas para

se firmar a relação jurídica entre as partes.

Ademais, a relação empregatícia caracteriza-se, também, pela subordinação. Esse

requisito diz respeito à obediência a uma hierarquia e atua objetivamente sobre o modo de

produção, derivando do próprio contrato de trabalho firmado entre as partes. É de bom tom

ressaltar que a subordinação a que se refere nas relações de trabalho é puramente objetiva, não

incidindo sobre a pessoa do trabalhador, mas sobre o exercício de sua função laboral.

Maurício Godinho Delgado3 classifica o pressuposto da subordinação em três

dimensões: clássica, objetiva e estrutural. A primeira se refere à aceitação do empregado

quanto ao poder de direção do empregador, tendo sido a responsável pela mudança na relação

2 BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho 6. ed. São Paulo, LTr, 2010. p. 222.

3 Op. cit. p. 297

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jurídica de trabalho predominante na história, substituindo a escravidão e a servidão. Já a

objetiva pressupõe um alinhamento do empregado aos objetivos da empresa à qual encontra-

se vinculado.

Assim, tendo um viés mais moderno, a dimensão estrutural toca ao empregado que

“acolhe estruturalmente a dinâmica de organização e funcionamento” do empregador, sem,

necessariamente, receber ordens diretas. Um bom exemplo é o do trabalho à distância,

controlado, comandado e supervisionado por meios telemáticos e informatizados.

Ligado à subordinação do empregado nessa relação jurídica está um poder que é

atribuído ao empregador, o chamado poder diretivo, pelo qual a esse último é permitido

estabelecer o direcionamento da força de trabalho. Por outro lado, o abuso na utilização desse

poder é um grande foco causador de danos extrapatrimoniais, tema que será analisado no

ponto seguinte.

2.2 Risco de dano em face do poder empregatício

Na relação existente entre empregador e seus empregados, ao primeiro são conferidos

poderes decorrentes desse liame, aos quais Maurício Godinho Delgado4 dá o título de poder

empregatício ou intraempresarial. Essa denominação dada pelo citado autor visa desvincular

as dimensões atribuídas ao termo da caracterização histórica de poder hierárquico, cuja

nomenclatura remonta a uma rigidez pouco democrática, típica do corporativismo.

Nas palavras de Maurício Godinho Delgado5, o poder empregatício “é o conjunto de

prerrogativas asseguradas pela ordem jurídica e tendencialmente concentradas na figura do

empregador, para exercício no contexto da relação de emprego”.

Para Arnaldo Süssekind6, o poder de comando é conferido ao empregador em razão

dos riscos da atividade econômica que correm sob sua responsabilidade, consubstanciando-se

através do poder diretivo e do poder disciplinar.

O conceito de poder empregatício é tido como a faculdade ou capacidade que assiste

ao empregador de ditar normas de caráter eminentemente técnico, fundado no próprio

contrato de trabalho, seja ele tácito ou expresso, haja vista conter direitos e deveres para

ambas as partes contratantes, com as responsabilidades sobre organização e disciplina

4 Op. cit. p. 658

5 Op. cit. p. 658

6 SÜSSEKIND, Arnaldo. Curso de Direito do Trabalho. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 255-256.

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concentrando-se na figura do patrão e podendo esse delegar parte desse poder a seus

prepostos.

Para fins de classificação, divide-se o poder de comando em três distintas dimensões,

quais sejam as de poder de direção ou organização, poder de controle e poder disciplinar. A

função organizacional ligada ao poder diretivo permite que o empregador exerça a

administração da força produtiva da empresa, expedindo ordens que se referem às atividades

desenvolvidas.

Já o poder de controle ou fiscalizatório tem o escopo de promover o acompanhamento

da prestação do trabalho e a vigilância ao longo do espaço empresarial7, projetando-se nos

controles de horário, frequência e, em caso limítrofe, nas revistas pessoais dos empregados.

Por fim, o poder disciplinar se constitui na capacidade do empregador de, quando

houver descumprimento de deveres trabalhistas por parte do trabalhador, impor sanções

disciplinares a esses últimos, que variam desde a admoestação, passando pela suspensão, até a

extinção do contrato por justa causa, a depender da gravidade do ato e da frequência com que

ocorre.

A obediência a esse poder de comando do chefe se fundamenta na subordinação

jurídica do empregado, que deve empregar sua força de trabalho ou conhecimento técnico à

disposição da empresa à qual encontra-se vinculado. Entretanto, há limitações para o seu

exercício, que deve respeitar os comandos constitucionais e das legislações regentes, bem

como do que fora pactuado no contrato de trabalho e em acordos e convenções coletivas, caso

as haja.

É sabido que na relação de emprego há dois polos cujos interesses, em regra, se

contrapõem, que são os ocupados pelo empregador e pelos empregados, respectivamente.

Enquanto o primeiro organiza, controla e dirige a prestação dos serviços, o último exerce suas

atividades com subordinação, em troca de remuneração. Tendo em vista a posição de

inferioridade do trabalhador na mencionada relação jurídica, marcada pelo desequilíbrio, é

necessário que sejam estabelecidos limites ao poder empregatício, de forma que sejam

respeitados os direitos inerentes ao sujeito cuja força de trabalho a ele está vinculado.

Desse modo, o exercício desse poder deve se dar com obediência aos critérios de

razoabilidade e respeito aos direitos fundamentais dos empregados, especialmente os inscritos

na Constituição Federal de 1988, que é considerada um marco no reconhecimento e na tutela

7 DELGADO, Maurício Godinho. Op. cit. p. 662.

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dos direitos da personalidade do ser humano no Brasil, bem como no Direito internacional,

especialmente no que toca às atribuições da OIT.

Assim, o empregador que extrapola os limites da razoabilidade ao exercer o poder que

lhe é conferido, atingindo, por consequência, a esfera personalíssima do trabalhador, ofende

comandos de status costitucional e pode causar danos de natureza eminentemente moral, os

quais tem o dever de reparar.

No tocante ao poder diretivo, pode ocorrer de o patrão, ou preposto que o represente,

organize a força produtiva de forma a causar danos aos empregados, a título de exemplo, com

a determinação de jornadas exaustivas e com tempo exíguo para intervalos, a despeito da

tutela normativa da integridade física e psíquica do obreiro.

Dentre os exemplos que podem ser citados de abuso do poder disciplinar, destaca-se o

tratamento vexatório de empregado por superior hierárquico em frente a seus colegas, como

nas cobranças exacerbadas de metas estipuladas pela empresa, situação na qual se configura

uma ofensa clara à dignidade humana e que deve, assim, ser refratada pelo direito.

2.3 Proteção jurídica do trabalhador

O Brasil formou-se como um país de economia basicamente agrícola, cuja mão de

obra que dava sustentação ao modelo implementado era eminentemente escrava e vinda do

continente africano. Apenas com a Lei Áurea, datada de 1888, esse regime jurídico aviltante

de exploração do ser humano foi abolido, como consequência da pressão européia,

maciçamente inglesa, decorrente do movimento de industrialização da sociedade e incentivo

ao trabalho livre e assalariado.

Somente a partir de 1888, portanto, é que se pode traçar uma evolução histórica do

direito do trabalho no Brasil, em que pese as Constituições anteriores ao referido ano já

mencionarem superficialmente sobre o direito ao labor no país e, por óbvio, já haver, em

muito pequena amostra, experiências de relações de emprego.

Até 1930, entretanto, o Estado brasileiro adotou uma política liberal não-

intervencionista, que resultava na ausência de interferência no mercado de trabalho8, bem

como eram incipientes os movimentos coletivos de organização de trabalhadores por

interesses comuns. Destaque-se que a competência para legislar em matéria laboral só passou

8 DELGADO, Maurício Godinho. Op. cit. p. 107.

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privativamente à União no ano de 1926, com a reforma constitucional que instituiu emenda à

Constituição de 1891.

Com a chegada de Getúlio Vargas à presidência da República, a atuação estatal no que

se refere à legislação trabalhista aumenta consideravelmente e fica marcado como um período

de algumas importantes conquistas nessa seara jurídica. Logo que iniciou seu mandato,

Vargas criou o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio e, nos anos que se seguiram,

estabeleceu a unicidade dos sindicatos, criou as Comissões Mistas de Conciliação e

Julgamento e passou a estruturar o sistema previdenciário.

A Constituição Federal de 1934 foi a primeira a tratar do direito trabalhista no Brasil,

trazendo disposições que garantiam a liberdade sindical, salário mínimo, férias anuais,

proteção ao trabalho feminino e infantil e isonomia salarial. A despeito de ter tido um período

de vigência muito abreviado, quando promulgou-se a Carta de 1937, sob a hégide do Estado

Novo, as disposições acima citadas podem ser, sim, consideradas um avanço no tratamento

juslaboral.

Em 1943, as legislações esparsas que regulamentavam o direito do trabalho foram

reunidas em um único diploma normativo, que foi chamado de Consolidação das Leis do

Trabalho (CLT), Decreto-lei n.º 5.452/1943. Além de unificar as leis então vigentes, a CLT

tratou de ampliar a abrangência da regulação das relações de emprego no país.

Como se sabe, a inspiração política de Getúlio que baseou sua política

intervencionista, especialmente no que se refere à legislação laboral, encontrava respaldo nos

regimes totalitários europeus contemporâneos ao seu governo, nitidamente o italiano. Desse

modo, destaca-se a Carta do Trabalho italiana, de cunho claramente fascista, como uma base

para elaboração da CLT, motivo pelo qual se caracterizaria como uma legislação notadamente

corporativa.

À exceção do sistema previdenciário, que foi distanciado do modelo justrabalhista na

década de 1960, entre 1945 e 1988 não foram notadas mudanças substantivas no que se refere

ao direito laboral. Apenas com a promulgação da Constituição Cidadã de 1988, reafirmou-se a

proteção jurídica dada ao trabalhador, com a instituição de um capítulo específico, intitulado

“Dos direitos sociais”, que abrange os artigos 6º a 11 da Carta de direitos.

A Carta Maior emprestou status constitucional a direitos que antes eram garantidos

pela legislação ordinária, como seguro desemprego, irredutibilidade salarial, gratificação

natalina, licença remunerada à gestante de cento e vinte dias, adicionais de insalubridade e

periculosidade, jornada semanal de quarenta e quatro horas, adicional de um terço no

pagamento do período de férias etc.

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Além disso, estabeleceu como fundamento da República Federativa do Brasil, dentre

outros, a dignidade humana, em seu artigo 1º, inciso III, e dispôs no artigo 170 que a ordem

econômica se funda na valorização social do trabalho humano.

Portanto, percebe-se que o sistema de proteção do trabalhador recebeu um importante

reforço com a promulgação da Constituição Federal em 1988, de forma que o equilíbrio

almejado entre o poder econômico, representado por empresas e empregadores em geral, e a

mão de obra, parece mais próximo, na medida em que se passa a tutelar as relações de

emprego tendo como núcleo essencial a dignidade da pessoa humana.

2.4 Princípio da proteção

Tal como exposto no tópico anterior, vê-se que há uma preocupação em se estabelecer

no ordenamento jurídico uma proteção ao polo ocupado pelos trabalhadores na relação

empregatícia. O que motiva tal proteção, distinta das demais relações pautadas

contratualmente, e o que a fundamenta?

Inicialmente, é importante destacar o desequilíbrio que caracteriza a relação de

emprego, na qual o empregador encontra-se em sobreposição jurídica diante do obreiro. A

partir da pactuação tácita ou expressa do contrato de emprego, o trabalhador submete a sua

força de trabalho ao poder de direção do patrão, a troco de uma remuneração pelos serviços

prestados.

Além da submissão jurídica acima apontada, na qual o empregado deve obediência a

um poder empregatício, há ainda o desequilíbrio econômico entre as partes pactuantes do

vínculo, pela qual aquele emprega sua força de trabalho à título oneroso, quadro no qual a

remuneração a ser percebida o objetivo principal da prestação dos serviços.

Diante da discrepância flagrante existente entre as posições ocupadas pelos integrantes

da relação de emprego, faz-se necessário que as normas que tratam do direito laboral

ofereçam um lastro de proteção maior ao polo vulnerável. Com base na máxima aristotélica

de tratar desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades, a legislação regente

das relações obreiras dispõe de um rol de direitos e garantias que visam, sobretudo, promover

a igualdade material no âmbito dessa relação jurídica.

Nesse sentido, os princípios que formam o núcleo essencial do direito do trabalho

norteiam o processo legislativo nessa seara jurídica e igualmente servem de premissas para a

interpretação e aplicação das normas já dispostas.

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O termo princípio deriva do latim principium, que significa início ou origem, como

também um preceito moral ou, ainda, um raciocínio que serve de base de uma ciência ou um

teoria. Esse último significado descrito acima reflete a utilização dos princípios pela ciência

jurídica, para a qual servem como uma base ideal para interpretação de uma regra ou,

também, para integração jurídica, quando da ausência de regra específica para determinado

caso.

No que toca à conceituação de princípios jurídicos, diversos doutrinadores expuseram

seus entendimentos, utilizando-se para tanto de variados critérios, como os da generalidade,

da fundamentalidade, da abstração ou da hierarquia. A definição sobre o conceito em pauta é

bem tratada por Robert Alexy, que faz uma análise com base no critério estrutural qualitativo

e, com ele, estabeleceu uma distinção entre regras e princípios, semelhante ao feito por

Dworkin.

Para Robert Alexy, regras e princípios estão dentro do que se entende por norma, a

qual seria gênero das espécies anteriormente citadas. A partir dessa bifurcação do que se

entenderia por norma, utilizam-se os critérios para distinção entre princípios e regras. Os

primeiros têm, notadamente, um alto grau de generalidade relativa, ao passo que as regras, por

outro lado, são dotadas de um pequeno grau de generalidade9.

Nesse sentido, Alexy conceitua os princípios jurídicos como mandados de

otimização10

que podem ser executados em diferentes graus de intensidade, a depender das

conjunturas fática e jurídica no momento de aplicação. Em sentido inverso, as regras são

aplicadas na medida do tudo ou nada11

, cabendo, pois, obediência na exata medida do

postulado normativo que a define ou o descumprimento in totum.

Posto isso, classifica-se a proteção utilizada no ramo justrabalhista como princípio, de

modo que sua aplicação pode se dar em variadas proporções, visando sempre a tutela da parte

mais vulnerável da relação empregatícia, o trabalhador, a fim de que seja atenuada a

discrepância econômica e jurídica existente com relação ao empregador.

Inclusive, o surgimento do Direito do Trabalho está intimamente ligado ao princípio

da proteção, que apareceu como forma de se controlar a exploração do ser humano enquanto

trabalhador. Desde seu surgimento, então, esse ramo jurídico é irradiado pelo princípio

tutelar, de forma a buscar um razoável equilíbrio entre as partes que integram o contrato

laboral.

9 ALEXY, Robert. Theorie der Grundrechte, 1985. In: BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional

– 25ª ed. São Paulo: Ed. Malheiros, 2010, p. 277. 10

ALEXY, Robert. apud BONAVIDES, Paulo. Op. cit. p. 278. 11 ALEXY, Robert. apud BONAVIDES, Paulo. Op. cit. p. 279

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15

Américo Plá Rodriguez12

entende que o princípio da proteção se estende em três

dimensões, quais sejam as dos princípios in dubio pro operario, da norma mais favorável e da

condição mais favorável. Quanto a esses, Maurício Godinho Delgado13

entende que a máxima

in dubio pro operario encontra-se atualmente abrangida pelo princípio da norma mais

favorável, em suas três esferas, inclusive com mais precisão e cientificidade que a adaptação

feita do princípio jurídico in dubio pro reo.

Abrangido pelo princípio tutelar, o princípio da norma mais favorável é dotado de uma

dimensão tríplice14

, que envolve as funções que exerce no ordenamento jurídico, que são

informadora, interpretativa e hierarquizante. Tal qual dispõe o caput do artigo 7º da

Constituição Federal de 1988, o rol de direitos ali elencados é o piso de garantias dada aos

trabalhadores, que podem, ainda, receber tratamento mais benéfico de acordo com a vontade

das partes da relação de emprego ou de alguma outra fonte normativa15

. Dessa forma, deve

prevalecer a norma que ofereça as melhores condições ao obreiro, tanto na fase de sua

elaboração pelo Poder Legislativo, quanto no conflito com outras normas e na interpretação

que é dada ao texto normativo.

Outro princípio abrangido pelo princípio protetivo é o da condição mais benéfica ao

trabalhador, pelo qual a esse é garantida a preservação da cláusula mais benéfica ao longo do

contrato16

. Diferente do princípio abordado no parágrafo anterior, neste, há conflito entre

cláusulas contratuais, e não entre normas. A CLT, em seu artigo 468, dispõe sobre tal

princípio, asseverando que “só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo

consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao

empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia”.

Nota-se, portanto, que o Direito do Trabalho é regido, essencialmente, pelo princípio

da proteção ao trabalhador, não só nos efeitos dos princípios da norma mais benéfica e da

condição mais benéfica, mas, sim, em todos os princípios que integram a doutrina

justrabalhista, repita-se, por ser o obreiro a parte mais vulnerável da relação empregatícia e,

por isso, merecer uma tutela jurídica mais ampla, a fim de promover um relativo equilíbrio

com relação ao empregador.

12

RODRIGUEZ, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho, 1993. In: DELGADO, Maurício Godinho.

Curso de Direito do Trabalho – 11ª ed. São Paulo: LTr, 2012. p. 193. 13

Op. cit. p. 207. 14

MASCARO, AMAURI. Iniciação ao Direito do Trabalho, 1991. In: DELGADO, Maurício Godinho. Op.

cit. p. 194. 15

BARROS, Alice Monteiro de. Op. cit. p. 130. 16

DELGADO, Maurício Godinho. Op. cit. p. 197.

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16

2.5 Dignidade humana nas relações de emprego

A dignidade da pessoa humana está expressa no artigo 1º, inciso III, da Constituição

Federal de 1988, como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil. Como

consignado no título anterior, a tutela da dignidade se insere como princípio sobre o qual se

funda todo o texto normativo constitucional, servindo, pois, como essência do Estado

Democrático de Direito e luz que se irradia sobre as demais normas do ordenamento jurídico

pátrio.

Além disso, o caput do artigo 170 da Carta Magna consagra como um dos

fundamentos da ordem econômica a valorização do trabalho humano, com o fim de assegurar

a todos uma existência digna, conforme os ditames da justiça social. Pode-se inferir, portanto,

que a dignidade humana é alvo de proteção especial da Lei Maior e se consagra como um

princípio balizador do direito brasileiro.

Ao abordar o tema, Yara Maria Pereira Gurgel17

discorre acerca da dignidade da

pessoa humana caracterizando-a nos termos a seguir delineados:

“A dignidade humana, como base ética da sociedade moderna, é valor absoluto e

qualidade inerente a todo ser humano; além de ser destituída de qualquer fator

moral, religioso ou econômico. Não há espaço para substituição, relativização ou

valoração do ser humano. Também não há que se pensar em dimensão quantitativa

ou qualitativa da dignidade. Todos os seres humanos possuem a mesma condição

humana e, portanto, igual valor absoluto – possuem idêntica dignidade e direito à

proteção jurídica.”

Em razão justamente do alcance de que é dotado esse princípio, torna-se difícil

estabelecer uma definição que exponha a abrangência da dignidade humana, com o fim de

delimitar seu grau de abstração para torná-la aplicável às questões práticas. Immanuel Kant

propõe uma diferenciação entre pessoas e objetos, pela qual, perfunctoriamente, as primeiras

seriam dotadas de dignidade, ao passo que os últimos, de preço18

.

Com essa proposição kantiana, propõe-se uma conceituação negativa do que seria a

dignidade humana, na qual seria desumano tudo aquilo que reduzisse um indivíduo à

17

GURGEL, Yara Maria Pereira. Direitos humanos, princípio da igualdade e não discriminação: sua

aplicação nas relações de trabalho. São Paulo: LTr, 2010. p. 31. 18

RABENHORST, Eduardo R. Dignidade humana e moralidade democrática, 1991. apud GURGEL, Yara

Maria Pereira. Op. cit. p. 31.

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17

condição de objeto19

. Assim, toda ação ou omissão que resulte de algum modo na coisificação

do ser humano constituiria uma ofensa à sua dignidade.

Maria Celina Bodin de Moraes desdobra o conteúdo da dignidade em quatro

postulados, em que cada um deles corresponde a um princípio jurídico. Em síntese, o sujeito

que reconhece outros sujeitos iguais a ele, merecedores da mesma proteção jurídica à sua

integridade física e psicofísica, dotados de vontade livre e partes de um grupo social.

Respectivamente, referem-se aos princípios da igualdade, da integridade física e psicofísica,

da liberdade e da solidariedade20

.

Importante também mencionar o entendimento de Judith Martins-Costa21

, para quem

integram e caracterizam a dignidade humana interesses constitucionalmente garantidos, tais

como a vida privada, a intimidade, as expectativas de vida e os projetos existenciais, além da

imagem, da autoestima e da honra.

Tal qual abordado alhures, o princípio da dignidade da pessoa humana faz parte da

essência do ordenamento jurídico do Estado Democrático de Direito, fazendo-se necessário

que toda norma se coadune com seus postulados. E é dessa maneira como devem ser

entendidas as normas de direito do trabalho, sempre harmonizadas com a proteção e o respeito

à dignidade do trabalhador.

A evolução das formas de trabalho ao longo da história mostra que nos primórdios não

havia qualquer respeito pela dignidade do trabalhador, cuja força de trabalho era empenhada

de maneira desumana. O regime escravista, que imperou durante séculos e deixou marcas

latentes na sociedade até os dias de hoje, reduzia o ser humano explorado à condição de

objeto, de mercadoria que poderia ser comprada ou trocada, no que talvez tenha sido a forma

mais abjeta com que os homens já se relacionaram.

Mesmo com a revolução industrial, surgida na Inglaterra no século XVIII, cuja

principal marca foi a mecanização dos sistemas de produção, não se entendia que o indivíduo

que empregava sua força de trabalho numa fábrica deveria ter uma esfera de dignidade que

limitasse a atuação e o poder diretivo de seu empregador. Jornadas exaustivas que chegavam a

até dezesseis horas, sem a possibilidade de fruir de qualquer período de descanso ou de

desfrutar de férias, caracterizavam a relação empregatícia de então, que resultavam, por

consequência lógica, em inúmeros acidentes de trabalho em homens, mulheres e crianças que

19

MORAES, Maria Celina Bodin de. O conceito de dignidade humana: substrato axiológico e conteúdo

normativo. In: SARLET, Ingo Wolfgang (org.). Constituição, direitos fundamentais e direito privado. Porto

Alegre: Livraria do Advogado, 2003. p. 120. 20

Idem 21

MARTINS-COSTA, Judith. Os danos à pessoa no direito brasileiro e a natureza de sua reparação. apud

MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo 3ª ed. São Paulo: LTr, 2012.

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18

se viam obrigados a enfrentar tão dura realidade nas cidades, após a migração em massa dos

campos.

Tudo isso, obviamente, gerou indignação em grupos de trabalhadores, que se

rebelavam contra os abusos que sofriam de seus empregadores, especialmente no que toca aos

baixos salários, às jornadas exaustivas e às más condições que lhes eram fornecidas para

exercerem suas respectivas funções na cadeia produtiva. Inspirados por doutrinas vinculadas à

esquerda política europeia, já a partir do século XIX, os obreiros passaram a se unir em

grupos que tinham interesses comuns e, com isso, ganharam força com o passar dos anos.

Já no início do século XX, os movimentos sociais exerciam pressão considerável sobre

os detentores do capital econômico e, com a Revolução Russa de 1917, fazia-se necessário o

estabelecimento de normas que limitassem o poder empregatício, a fim de conceder alguns

dos pleitos emanados pelos trabalhadores.

Nesse contexto, em 1919, após a I Guerra Mundial, foi criada a Organização

Internacional do Trabalho (OIT), a partir do Tratado de Versalhes. A clara preocupação

humanitária, a partir dos ideais de justiça social, foi considerada como primordial para que se

mantivesse a paz universal e permanente22

. Como bem destaca Maria Áurea Baroni Cecato23

,

o preâmbulo da Constituição da OIT já explicitava as motivações que resultaram na criação

do órgão, tal qual se observa no trecho abaixo transcrito:

(...) Considerando que existem condições de trabalho que implicam, para grande

número de indivíduos, miséria e privações, e que o descontentamento que daí

decorre põe em perigo a paz e a harmonia universais, e considerando que é urgente

melhorar essas condições no que se refere, por exemplo, à regulamentação das horas

de trabalho,à fixação de uma duração máxima do dia e da semana de trabalho, ao

recrutamento da mão-de-obra, à luta contra o desemprego, à garantia de um salário

que assegure condições de existência convenientes, (...)

Nesse sentido, revela-se nitidamente que a relação empregatícia, representada

formalmente pela figura do contrato de trabalho, abrange a tutela dos direitos relativos à

dignidade do trabalhador, que pode ser considerada a maior obrigação desse instrumento

contratual24

. Não se pode considerar que a relação de emprego se resuma às verbas oriundas

do pacto entre empregador e obreiros, especialmente após a promulgação da Constituição

22

Disponível em: <http://www.oitbrasil.org.br/content/hist%C3%B3ria>. Acesso em: 03 de outubro de 2014. 23 CECATO, Maria Áurea Baroni. A relativa relevância da Declaração de 1998 da OIT para a definição dos

direitos humanos do trabalhador. Disponível em:

<http://www.biblionline.ufpb.br/ojs2/index.php/primafacie/article/viewFile/6783/4218>. Acesso em 04/10/2014. 24

CASTELO, Jorge Pinheiro. Tutela antecipada no processo do trabalho. São Paulo: LTr, 1999. v. 2, p. 215. In:

CAIXETA, Sebastião Vieira. O assédio moral nas relações de trabalho. Boletim Científico – Escola Superior

do Ministério Público da União. Brasília: ESMPU, Ano II, nº 6, jan./mar., 2003. p. 92.

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19

Federal de 1988, que expressa a posição de destaque da dignidade humana no ordenamento

jurídico brasileiro.

Desse modo, o contrato de trabalho, mesmo o verbal, contém cláusulas implícitas de

proteção à esfera extrapatrimonial do empregado, que servem como uma limitação ao poder

empregatício.

Na 87ª Conferência Internacional do Trabalho, em 1999, no relatório do Diretor Geral

da OIT, foi apresentado ao mundo o conceito de trabalho decente, que, a partir dali, seria

estudado como base para o entendimento dos direitos humanos do trabalhador. Daaran Ghai25

entende que o conceito de trabalho decente se estrutura em quatro pilares, que são o emprego,

a proteção social, os direitos dos trabalhadores e o diálogo social. Ainda inserido no conceito

de trabalho decente, estão a liberdade sindical, a erradicação de qualquer trabalho forçado,

bem como de trabalho infantil e de quaisquer formas de discriminação nas relações

trabalhistas.

O que se entende por trabalho decente, de forma perfunctória, é a ocupação em

condições de promover ao trabalhador uma existência digna, com liberdade e segurança,

atingindo não apenas as questões salariais e de jornada, como também a esfera pessoal

daquele, sob o manto de proteção da dignidade humana.

Ainda sobre a dignidade humana, entende-se que seja ela o núcleo do ordenamento

jurídico, em torno do qual gravitam os direitos fundamentais, com base na ideia de unidade da

Constituição26

. No entendimento de Ingo Wolfgang Sarlet27

, os direitos e garantias

fundamentais encontram sua base na dignidade humana, ao passo que seriam concretizações

dessa.

No que se refere aos direitos fundamentais e a aplicação desses nas relações privadas,

Ingo Sarlet28

estabelece distinção entre duas situações. Caso haja relativa igualdade entre as

partes figurantes da relação, deve prevalecer o princípio da liberdade, somente se aplicando a

eficácia daqueles em caso de ofensa à dignidade humana. Por outro lado, caso seja a relação

pautada entre um indivíduo e detentores do capital econômico, resta clara a desigualdade e,

25

GHAI, Daaran. Travail décent : concept et indicateurs. Revue Internationale du Travail . Genebra : OIT, 2003,

vol. 142, n. 2, p. 121-157. In: CECATO, Maria Áurea Baroni. Op. Cit. p. 10. 26

MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional – 3. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2000. vol. IV, p.

180. 27

SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal

de 1988. Porto Alegre: Livraria dos Advogados, 2004, p. 79. 28

SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 6. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado,

2006, p. 392-400. In: LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Eficácia horizontal dos direitos fundamentais na

relação de emprego. Disponível em <http://www.esdc.com.br/RBDC/RBDC-17/RBDC-17-033-

Artigo_Carlos_Henrique_Bezerra_Leite_(Eficacia_Horizontal_dos_Direitos_Fundamentais_na_relacao_de_Em

prego).pdf>. Acesso em 04 de outubro de 2014.

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20

portanto, é necessária a aplicação dos direitos fundamentais, haja vista que assemelha-se à

relação travada com o poder público. É o que se chama de eficácia horizontal dos direitos

fundamentais.

2.6 Situações de dano nas relações de emprego

Como visto, as relações de emprego também são propícias para o surgimento de

danos, massivamente no que se refere aos empregados, que subordinam-se juridicamente ao

poder empregatício do patrão, de quem serão emanados direcionamentos do trabalho a ser

prestado, ordens e até eventuais repreensões. Relativamente ao poder empregatício, é nele que

se concentra, em maior quantidade, a origem de atos que levam ao surgimento de danos

extrapatrimoniais nessa seara, quando são extrapolados seus limites e acabam por atingir a

esfera da personalidade do trabalhador.

Destarte, os danos extrapatrimoniais nas relações de emprego são marcados pela

vinculação existente entre empregado e empregador, especialmente em razão das

características dessa relação jurídica entre as partes do contrato de trabalho. Os poderes de

direção e fiscalização conferidos ao empregador, como já tratado alhures, não são ilimitados,

mesmo que se fundamentem no direito de propriedade empresarial daquele, protegido no

artigo 170, inciso II, da Constituição Federal de 1988, já que no conflito entre esse princípio

orientador da ordem econômica brasileira e os princípios da proteção ao trabalhador e da

dignidade humana, esses últimos se sobrepõem na ponderação, em razão da posição nuclear

que ocupam no ordenamento jurídico.

Como já mencionado, a dignidade humana impõe-se como critério e parâmetro de

valoração a orientar a interpretação e a compreensão do sistema constitucional29

, se

estabelecendo nas relações empregatícias como uma espécie de barreira ao poder que é

conferido ao empregador em razão do vínculo que o une ao trabalhador em situação de

vulnerabilidade econômica, social e jurídica. Desse modo, a relação de emprego é pautada

não só pelo poder empregatício, mas também e essencialmente pela irradiação do princípio

constitucional da dignidade humana.

29

PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o direito constitucional internacional 7. ed. São Paulo: Saraiva,

2006. p. 27.

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21

Nesse sentido, se remete ao trabalho decente, tal qual proposto pela OIT, como forma

de se estabelecer um parâmetro base de dignidade nas relações laborais. Nas palavras de Yara

Maria Pereira Gurgel30

:

(...) Trabalho decente é a atividade exercida em conformidade com os preceitos de

igualdade, liberdade, equidade, respeito à saúde e segurança do trabalhador e com

remuneração justa, livre de qualquer margem de discriminação, de condição análoga

à de escravo, de trabalho infantil, fortalecida pelo diálogo social e essencial ao

combate à pobreza e à minimização das desigualdades sociais.

Alargando o que se considerou como o conceito de trabalho decente na Declaração

sobre os Princípios e Direitos Fundamentais do Trabalho, perfilho do posicionamento de José

Cláudio Monteiro de Brito Filho, o qual insere o direito ao trabalho, à livre escolha do

trabalho, além da proteção contra o desemprego e outros riscos sociais31

.

Com base no conceito apresentado, percebe-se que o ideal proposto sob o título de

trabalho decente objetiva o respeito à dignidade do trabalhador nas relações empregatícias e,

portanto, não se coaduna com ofensas a direitos que integram sua esfera da personalidade,

como a intimidade a honra. A ocorrência de danos morais stricto sensu nas relações laborais

atinge o campo extrapatrimonial do indivíduo que exerce atividade profissional, cujos efeitos

podem ser mais gravosos que se fossem passíveis de cálculo material.

Na esteira dos exemplos que podem ser citados de danos nesse ponto, inicio pela

discriminação. Independente do motivo que sirva de pretexto para a consecução de uma

prática discriminatória, essa tem uma força como ofensa relativamente forte e atinge a vítima

de forma repugnante. Além disso, é clara a ofensa ao princípio constitucional da igualdade,

que se desdobra na vertente negativa da não discriminação e tem aplicação nas relações de

emprego, como se nota no trecho a seguir delineado:

“(...) Nas relações laborais, em que uma das partes é hipossuficiente no que tange à

capacidade de negociação quanto às cláusulas contratuais, em decorrência da mais-

valia e da aderência às imposições do empregador, o Princípio da Igualdade e Não

Discriminação, juntamente com o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana,

assumem importante papel de proteção ao trabalhador perante sua fragilidade

econômica e social, especialmente quando se trata de grupos vulneráveis, como

forma, inclusive, de garantir a igualdade material.”32

30

Op. cit. p. 120. 31

BRITO FILHO, José Cláudio Monteiro de. Trabalho decente. São Paulo. LTr, 2004. p. 55-62. In: GURGEL,

Yara Maria Pereira. Op. cit. p. 120. 32

GURGEL, Yara Maria Pereira. Op. cit. p. 61.

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22

A discriminação nas relações de emprego ocorre principalmente na escolha dos

indivíduos que serão admitidos pela empresa. Dado o jus variandi do empregador, os critérios

estabelecidos para a seleção das pessoas que integrarão nos quadros de empregados podem ter

conteúdo discriminatório, seja por gênero, cor da pele, idade etc.

Esse tipo de prática discriminatória afeta a dignidade humana no princípio da

igualdade, especialmente em um viés que permite ao indivíduo proclamar um direito à

diferença, calcado no multiculturalismo e na diversidade humana. Portanto, a diferenciação

promovida em seleção para ocupação de determinada vaga de emprego em empresa, feita sem

fundamentação jurídica e baseada em conteúdo discriminatório pelas diferenças marcantes do

ser humano, ao invés de análise profissional, importa em dano.

Além da contratação, as práticas desse tipo de ofensa podem se delinear na

remuneração oferecida em contraprestação ao labor, quando são pagos valores distintos em

razão dos critérios carreados de conteúdo discriminatório. No Brasil, em que pese as políticas

de afirmação terem obtido notável crescimento nas últimas décadas, os números ainda não

refletem uma diminuição absoluta nesse ponto.

Em 2012, o IBGE divulgou a Síntese de Indicadores Sociais, na qual se listou que as

pessoas de cor preta ou parda possuem rendimento mensal médio equivalente a 60% da

recebida por pessoas de cor da pele branca, ao passo que mulheres recebem, em média, 73,3%

do percebido por homens.

Outros exemplos típicos de danos nas relações de emprego são os casos de assédio,

que pode ter natureza moral ou sexual. O assédio moral é a conduta abusiva de forma

reiterada e intencional, que vise ameaçar o emprego da vítima ou conturbar o ambiente de

trabalho, ferindo a dignidade e a integridade física ou psíquica daquela. Em regra, o assédio

moral implica em humilhações repetitivas, durante um longo período. Os requisitos para

caracterização desse tipo de dano são a repetição, a intenção deliberada de forçar a vítima a

desistir do emprego, a escolha de uma pessoa determinada e, em consequência, a degradação

do ambiente laboral.

Já o assédio sexual é a abordagem indesejada, de cunho sexual, realizada por

indivíduo que normalmente ocupa função de dirigente ou posição hierárquica superior no

estabelecimento empresarial. Os atos que resultam no assédio sexual podem ser explícitos ou

implícitos, havendo, inclusive, a possibilidade de chantagem por parte de superior

hierárquico, que oferece benefícios como aumento salarial ou promoção de função para

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23

conseguir favores sexuais. A Lei nº 10.224/2001 insere a prática no artigo 216-A do Código

Penal, cuja pena correspondente é de detenção de um a dois anos.

Adiante, serão tratados de forma mais específica os eventos danosos e seus efeitos e

repercussões nas relações de emprego.

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24

3 DANO EXISTENCIAL NAS RELAÇÕES DE EMPREGO

3.1 O que é dano?

A palavra dano vem do latim dagnum, que é utilizada para significar um mal ou

prejuízo causado a alguma coisa ou pessoa, que leva a uma diminuição ou depreciação e afeta

seu estado. Por muito tempo, o termo foi visto com abrangência limitada às perdas

patrimoniais sofridas em decorrência de um ato antijurídico cometido por outrem.

Essa visão patrimonialista tradicional não satisfazia plenamente o alcance propugnado

pela expressão acima exposta, como se entende atualmente, pois resumia os danos a prejuízos

econômicos e, com isso, não abarcava os prejuízos que não fossem materialmente calculáveis.

Tomando-o em sua visão mais ampla, Sérgio Cavalieri Filho conceitua o dano como

“a subtração ou diminuição de um bem jurídico, qualquer que seja a sua natureza, quer se

trate de um bem patrimonial, quer se trate de um bem integrante da própria personalidade da

vítima, como a sua honra, a imagem a liberdade etc.”.33

Com a precisão habitual, Maria Helena Diniz34

assevera que dano é “a lesão,

equivalente à diminuição ou destruição, que, por causa de um certo evento, sofre uma pessoa

(física ou jurídica) ou mesmo uma dada coletividade, em detrimento de sua vontade, em

qualquer bem ou interesse jurídico, patrimonial ou moral”.

Em mesmo sentido seguem Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona35

, os quais

definem dano como lesão a um interesse juridicamente tutelado, seja ele patrimonial ou não,

causado por ação ou omissão do sujeito ofensor, incidindo não somente sobre o patrimônio

palpável, mas também nos direitos da personalidade.

Tendo em vista o disposto na Constituição Federal de 1988, não haveria espaço para a

ideia de dano apenas no que se refere ao patrimônio da vítima, já que assinala como

fundamento da república a dignidade da pessoa humana, a qual é vinculada de forma

indissociável dos direitos da personalidade, pelo que se infere que um mal causado

diretamente à pessoa deve ser tutelado, tal como o é um prejuízo econômico.

Assim, os danos não ocorrem somente na esfera patrimonial das pessoas, mas também

em direitos que sequer comportam quantificação econômica, tais como no dano moral puro,

33

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 89 34 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. v.7, 7. ed. São Paulo:

Saraiva, 2003. 35

GAGLIANO,Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. Responsabilidade

Civil. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

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25

no dano à imagem, no dano à saúde e no dano existencial, todos exemplos de lesões à esfera

extrapatrimonial, sobre as quais trata-se no presente capítulo.

A busca incessante do homem pelo equilíbrio social baseou-se sempre no princípio

basilar de respeito aos direitos alheios36

, representada pela máxima do neminem laedere, que

corresponde a um dever geral de conduta, sob o qual a ninguém se deve lesar e que Maria

Celina Bodin de Moraes37

considera como a base das relações sociais.

O sentimento instintivo de justiça do ser humano já seria suficiente para se buscar,

após um evento lesivo, uma punição para o ofensor e uma compensação ao lesado na

proporção de suas perdas. É nessa base que surge a responsabilidade civil, como uma espécie

de busca pela vingança privada38

, com o foco inicialmente muito voltado para a pessoa do

agente lesivo, sobre o qual uma punição ou pena deveria recair.

A Lei do Talião, que pregava uma resposta proporcional à ofensa perpetrada, é o

grande símbolo dessa vingança privada, um método rudimentar de resolução dos conflitos

sociais que surgiam, mas baseada num sentimento de justiça, pelo qual o ofensor não poderia

ficar impune frente ao dano causado a outrem. A atuação estatal se limitava, inicialmente, a

permitir ou proibir a vingança nos casos, passando, depois, à própria lei dispor sobre a quantia

a ser indenizada na composição.

Em Roma, surge a Lex Aquilia, com o propósito de punir o causador de danos. O

Estado passava a intervir nos conflitos sociais privados, fazendo o ofensor responder com seu

patrimônio e obrigando a vítima a aceitar a composição proporcional à lesão, estabelecendo a

culpa como o fundamento da responsabilidade39

, dando origem à responsabilidade

extracontratual.

Desde então, a culpa sempre ocupou lugar de destaque no tocante à responsabilidade

civil, notadamente em razão da sua posição como fundamento dessa última no Código de

Napoleão, que veio a influenciar diversas legislações civis no mundo, inclusive na elaboração

do Código Civil Brasileiro de 1916.

Por outro lado, a ideia de culpa como centro da responsabilidade civil não responde a

todos os casos de danos, especialmente quando o olhar sai do ofensor e se dirige para a

vítima, passando-se a observar a necessidade de reparação ao sujeito ofendido como objetivo

precedente em relação à punição do causador do prejuízo.

36

MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo. 3. ed. LTr, 2012. p.19. 37

MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à pessoa humana: uma leitura civil-constitucional dos danos

morais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 204. 38

GAGLIANO,Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Op. cit. p. 11. 39

DINIZ, Maria Helena. Op. cit.

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26

A responsabilidade civil e a proteção aos direitos da pessoa, de uma forma geral, se

expandem nos períodos que sucedem regimes políticos de exceção, tal qual uma resposta da

sociedade. Em âmbito internacional, o fim da Segunda Guerra Mundial foi o estopim para a

criação da Organização das Nações Unidas e a Declaração Universal dos Direitos Humanos,

em 1948, estabelecendo uma nova era, calcada na tutela do ser humano, assim como ocorreu

com a criação da OIT, a partir do Tratado de Versalhes.

No Brasil, o fim do regime ditatorial militar na década de 1980 resultou na

promulgação da Constituição Federal de 1988, a chamada “Constituição cidadã”, que, em seu

artigo 5º e incisos V e X, atribuiu importância fundamental aos direitos da personalidade e a

necessária reparação em caso de lesão. Em 2002, com o Código Civil, um capítulo foi

dedicado a eles e, assim, a responsabilidade civil expandiu-se para tutelar mais amplamente os

danos não patrimoniais.

Com isso, a responsabilidade civil passou a ocupar papel ainda mais relevante na

proteção jurídica dos indivíduos, pois houve um alargamento de incidência das pretensões

reparatórias no Judiciário, que antes timidamente eram aceitas quando referiam-se a lesões

que não afetassem o patrimônio econômico do ofendido, mesmo que indiretamente.

As mudanças na vida em sociedade desde então levaram a um número maior de

conflitos individuais e coletivos, expandindo, com isso, a quantidade de danos patrimoniais e

especialmente morais. A proteção conferida pela Carta Magna de 1988, hoje associada ao

Código Civil de 2002 e a um acesso maior ao Judiciário, proporcionou um aumento de

demandas judiciais por danos de natureza moral nas últimas décadas e assim também o foi na

seara trabalhista.

A função precípua da responsabilidade civil de buscar, ao máximo, a restauração do

status quo ante e tentar restabelecer o equilíbrio que havia antes do dano passaram a ser

reconhecidos e protegidos com maior abrangência após a Constituição de 1988, em especial

no que concerne às lesões extrapatrimoniais.

3.2 Dos danos extrapatrimoniais

De início, é importante abordar a questão terminológica vinculada ao presente tema, a

qual embora seja, em regra, desprezada em grande medida na utilização prática, constitui-se

como um elemento essencial para a compreensão do instituto e de sua classificação

doutrinária.

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27

O uso da expressão dano moral foi difundida no Brasil como abrangente de toda e

qualquer lesão que antingisse um indivíduo em qualquer esfera que não fosse a econômica ou

material. Assim, com essa conceituação negativa do instituto, vinculou-se a existência de

danos aos sentimentos de dor e sofrimento, o que, de certo, dificulta grandemente as

demandas reparatórias, em virtude de, praticamente, impossibilitar a vítima de produzir

provas que assegurem a ocorrência do prejuízo psicofísico, tema do qual se tratará mais

adiante.

Destarte, a evolução da responsabilidade civil rechaçou a ideia de ligação necessária

entre dano e sofrimento, passando desse critério eminentemente subjetivo para a aferição

objetiva de pressupostos outros, pelo que se considera inexata e restritiva a expressão danos

morais para se referir de forma geral aos danos que não sejam patrimoniais.

Além da denominação acima descrita, utilizam-se outras, tais como danos imateriais e

danos não patrimoniais, porém a terminologia que se mostra mais ampla e parece definir a

abrangência característica do instituto é danos extrapatrimoniais. Sérgio Severo assevera que

dano extrapatrimonial é gênero do qual dano moral é espécie40

, ou seja, quando ocorre um

dano moral, necessariamente há um dano extrapatrimonial, ao passo que a recíproca não é

obrigatoriamente verdadeira.

Acerca da terminologia danos extrapatrimoniais, Judith Martins-Costa compreende

como subespécie, dentre outros, os danos à pessoa, os danos à imagem, os danos à saúde, os

danos ao projeto de vida e à vida de relação. Portanto, o leque de projeções que se pode ter

com a denominação delineada acima é extensamente maior que a mera pretensão de vincular

a existência ou a configuração de um dano a um bem não patrimonial ao sentimento de dor ou

sofrimento psicológico.

Passada a análise sobre a terminologia a ser utilizada, remete-se à discussão no que

tange ao conceito de dano extrapatrimonial. A doutrina é pródiga na criação de definições

sobre danos extrapatrimoniais e segue distintas correntes para se chegar a esse fim, tendo por

conceituação básica a antiga noção de que seria uma lesão que causa desconforto psicológico,

angústia, humilhação, atinge à honra, à imagem e à moral, pela qual é devida indenização

compensatória discricionária, tendo em vista que não é possível aferir monetariamente o

quantum lesado.

Maria Helena Diniz, utilizando a expressão dano moral lato sensu, afirma que ele

“vem a ser a lesão de interesses não patrimoniais de pessoa física ou jurídica, provocada pelo

40

SEVERO, Sérgio. Os danos extrapatrimoniais. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 37.

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fato lesivo” que pode relacionar-se aos “direitos da personalidade, como a vida, a integridade

corporal, a liberdade, a honra, o decoro, a intimidade, os sentimentos afetivos ou a própria

imagem; ou aos atributos da pessoa, como o nome, a capacidade e o estado de família”.41

Por sua vez, Pontes de Miranda define o instituto como aquele que, só atingindo o

devedor como ser humano, não lhe atinge o patrimônio42

. Como é possível depreender da

definição transcrita, utiliza-se de critério negativo e necessariamente relaciona-a ao dano de

cunho patrimonial.

A utilização de critério negativo para definir o instituto, ou seja, determinar o que seria

dano extrapatrimonial a partir do que não seria uma lesão patrimonial, é bastante difundida na

doutrina e bem aceita, dada a subjetividade do tema e a consequente dificuldade de tratá-la de

forma objetiva e precisa.

No entanto, há vozes na doutrina que, ao criticarem o uso de uma definição negativa,

propõem que o dano extrapatrimonial deve valer-se de caracterização pelos seus próprios

fundamentos. Uma dessas vozes é a de Yussef Said Cahali43

, crítico do que chama de conceito

contraposto, e que caracteriza o dano extrapatrimonial como a privação ou diminuição

daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem, como a paz, a tranquilidade de

espírito, a integridade, a honra, dentre outros, classificando-o como ofensivo à parte social do

patrimônio moral e que atinge à esfera afetiva desse, para posteriormente apresentar a

seguinte definição:

“(...) tudo aquilo que molesta a alma humana, ferindo-lhe os valores fundamentais

inerentes à sua personalidade ou reconhecidos pela sociedade em que está integrado,

os quais não se pode enumerar exaustivamente, mas se evidenciam pela dor,

angústia, sofrimento, tristeza, pela ausência de um ente querido falecido, pelo

desprestígio, desconsideração social, descrédito à reputação, humilhação pública,

devassamento da privacidade, desequilíbrio da normalidade psíquica, traumatismos

emocionais, depressão ou desgaste psicológico, e pelas situações de

constrangimento moral”44

.

Já Humberto Theodoro Júnior, balisando seu conceito no entendimento de Carlos

Alberto Bittar, refere-se a danos morais como aqueles “ocorridos na esfera da subjetividade

ou no plano valorativo da pessoa na sociedade, derivando de práticas atentatórias à

personalidade humana e traduzindo-se em um sofrimento de pesar íntimo da pessoa ofendida,

41

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro, volume 7. 16 ed. São Paulo. Saraiva, 2002. p. 81-

83. 42

MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. 2. ed., Rio de Janeiro: Borsói, 1958, t. XXVI apud

Medeiros Neto, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo. 3ª Ed. LTr, 2012. p. 61 43

CAHALI, Yussef Said. Dano moral – 2ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 20.

apud MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Op. cit. p. 62. 44

CAHALI, Yussef Said. Idem.

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29

capaz de gerar alterações psíquicas ou prejuízo à parte social ou afetiva do patrimômio moral

do ofendido”45

Assim como já mencionado anteriormente, é tarefa de extrema dificuldade tentar

conceituar de forma exaustiva o instituto do dano moral, porém as definições supracitadas nos

elucidam quanto à essência de seu sentido. Ainda tratando do conteúdo definidor, Sérgio

Severo considera que há uma tendência relativamente recente que busca o desapego a

conceitos fechados e a pretensa preponderância desses para a realização da justiça no caso

concreto, relacionando, pois, a definição de danos extrapatrimoniais aos conceitos

indeterminados e às cláusulas gerais.

Dada a definição do que seriam danos extrapatrimoniais, necessário se faz estabelecer

diferenciação entre os institutos dos danos patrimoniais e extrapatrimoniais. À primeira vista,

parece óbvio que a grande distinção está no objeto atingido pelo dano, sendo aqueles

referentes aos bens materiais, enquanto que os últimos, aos bens imateriais.

No entanto, a esse respeito, nos parece correto o entendimento de Xisto Tiago46

,

quando considera que a diferença não está no dano em si considerado, mas nos efeitos por ele

causados. Nesse sentido, cita as palavras de Maria Helena Diniz47

, que por sua vez, corrobora

o entendimento acima retratado, afirmando que o critério de distinção entre os institutos deve

abranger o caráter de repercussão sobre a vítima.

Dessa forma, para fins de se estabelecer a distinção entre os danos pessoais, é

relativamente irrelevante a causa violadora, sendo, pois, preponderante, a repercussão que ela

venha a refletir na pessoa física ou jurídica lesada. Caso o prejuízo seja de ordem financeira e

possa ser mensurado um valor para reparação, está-se diante de um dano essencialmente

patrimonial. De outra maneira, como já descrito alhures, atingindo a esfera psíquica, a honra

ou a moral do sujeito passivo do dano, surge uma lesão de cunho imaterial, extrapatrimonial.

Por esse entendimento, consolida-se o disposto na súmula 37 do Supremo Tribunal

Federal, que assevera ser possível a cumulação de danos patrimoniais e extrapatrimoniais a

partir de uma mesma conduta lesiva, perpetrada contra o ofendido, de modo que uma lesão ao

patrimônio da vítima pode ter repercussões psicológicas, ou o inverso, e pela evolução da

teoria dos danos, é notório, pois, que toda lesão deve ser devidamente e integralmente

reparada.

45

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Dano moral. 4. ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2001. p. 2 apud

Medeiros Neto, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo. 3ª Ed. LTr, 2012. p. 61-62 46

Op. cit. p. 57 47

DINIZ, Maria Helena. Op. cit. p. 67.

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30

Posto isso, passa-se aos critérios caracterizadores dos danos extrapatrimoniais, os

quais devem ser preenchidos para que uma lesão a um bem jurídico seja considerada como

dano indenizável.

Na sociedade moderna, são comuns menções frequentes a supostos danos de natureza

extrapatrimonial nas relações sociais, especialmente no que se refere aos liames

consumeristas e empregatícios. Não obstante às características do convívio intersubjetivo,

devem ser separadas as contrariedades e dissabores comuns à vida social das efetivas lesões

pessoais.

Nessa esteira de pensamento, é válido reiterar, nem toda e qualquer situação incômoda

vivida no seio social deve ser elevada ao status de dano imaterial. É óbvio, entretanto, que o

indivíduo lesado não necessariamente precisa sentir dor, constrangimento ou qualquer tipo de

sofrimento para que se caracterize o dano, porém para efeitos de compensação, há de ser

violado algum direito da personalidade48

.

Desse modo, há um fenômeno no Judiciário pátrio que alguns convencionam chamar

de indústria do dano moral, pela qual é crescente o número de ações judiciais protagonizadas

por pessoas que buscam uma indenização monetária por qualquer melindre da vida social,

além daquelas que forçosamente vislumbram a suposta lesão em atos que podem ser

considerados comuns ou razoáveis. Esse suposto fenômeno é capaz de gerar uma grande

insegurança nas relações entre os indivíduos e entre esses e a Justiça.

Com uma visão mais voltada para o que aconteceu nas últimas décadas para que se

chegasse à eclosão de demandas reparatórias, percebe-se que o reconhecimento constitucional

do dever de reparação dos danos patrimoniais e, especialmente, extrapatrimoniais em 1988,

além da evolução da doutrina civilista nesse sentido, não houve necessariamente um aumento

na quantidade de lesões imateriais na sociedade, mas um reconhecimento maior, por parte dos

cidadãos, dos direitos que detêm. Aliado a esse ponto, importante parcela pode ser atribuída

às ondas de acesso à justiça, que promoveram o ingresso em maior escala dos brasileiros ao

Poder Judiciário e, portanto, passou-se a um número maior de demandas por parte da

população.

Mesmo o pensamento acima esposado parecendo bastante claro e coerente, não há

como negar a existência de demandas temerárias tratando sobre reparação indenizatória por

danos extrapatrimoniais. O subjetivismo da matéria abre margem a diversos entendimentos do

que poderia ou não ser considerado dano indenizável, sobrando, em alguns casos, para o Juiz

48

ANDRADE, André Gustavo Corrêa de. Dano moral e indenização punitiva. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p.

105. apud Medeiros Neto, Xisto Tiago de. Op. cit. p. 45.

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31

e seu entendimento particular. Em um mesmo Tribunal, sabe-se que determinados juízes são

mais abertos no que consideram dano moral, enquanto outros, mais rígidos na interpretação,

reconhecem menos pedidos que a ele chegam.

Nesta linha, aponta-se a dificuldade para diferenciar, nos casos concretos, os

dissabores da vida coletiva com os efetivos danos imateriais, em razão da inexistência de

critérios objetivos para caracterização destes últimos. Assim, é de singular importância a

atuação do magistrado, pois a ele é dado um poder discricionário nessas ações, o qual, claro,

deve ser pautado pelo bom senso e regido pelas chamadas regras de experiência, que são, em

suma, o saber da vida do julgador aplicado ao caso.

Em que pese a subjetividade do juiz nos casos concretos, a análise dos fatos e a

fixação da possível indenização a ser paga deve se basear no fato gerador, no grau de culpa do

ofensor, nas condições sociais e econômicas das partes e na repercussão social da lesão49

.

Antes disso, é necessário que estejam presentes alguns requisitos para que se caracterize a

lesão e, posteriormente, os meios com os quais ela deve ser reparada.

O primeiro desses requisitos é a ocorrência prévia de uma conduta lesiva exarada pelo

agente causador em face da pessoa lesada. Por conduta, nesse contexto, entende-se a ação ou

omissão que tenha potencial causador de prejuízo de qualquer monta à parte ofendida. Dessa

forma, depreende-se que não só uma atuação comissiva pode ser causadora de danos, mas

também uma omissão, considerada como uma atitude negativa quando se exige juridicamente

uma atuação para impedir a lesão ou atenuar a sua abrangência.

Igualmente, há que existir um dano em decorrência dessa conduta humana, o qual não

pode ser exclusivamente monetário, econômico ou material, mas que atinja o sujeito lesado na

sua esfera pessoal, desembocando em pelo menos uma das espécies de danos pessoais, seja

moral, à honra ou existencial, a título de exemplo.

O dano não necessariamente precisa ser resultado de um ato ilícito, bastando apenas

que seja considerado injusto. Esse ponto é bastante importante, especialmente do ponto de

vista da reparação integral, já que uma conduta, a despeito de não ser considerada ilícita, pode

ocasionar danos a outrem, afetando a dignidade alheia, motivo pelo qual deve ser

devidamente compensada, por tratar-se de dano injusto.

Quanto à exigibilidade do dano concretizado, há discussões na doutrina e

jurisprudência pátrias a seu respeito, questionando a necessidade efetiva do surgimento do

dano. Até no que se refere às questões probatórias em juízo, restaria bastante dificultada a

49

Melo, Nehemias Domingos de. Op. cit. p. 61.

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32

comprovação da existência da dor, do sofrimento, da humilhação, da quantificação da honra

atingida ou do efetivo prejuízo ao projeto de vida, em que pese a exigência doutrinária de que

haja dano certo.

Portanto, há situações em que a simples conduta do agente lesivo já permite a

presunção da existência, naquele caso, de dano extrapatrimonial, pela violação de direitos da

personalidade. É o que se chama de dano moral in re ipsa50

. O que se foca aqui é no potencial

causador de dano do ato emanado pelo agente, levando-se em consideração conceitos

subjetivos, como o bonus pater família, o homem médio, e sua suscetibilidade de sofrer

prejuízo de ordem psicológica em determinadas situações. Essa é a posição tanto da doutrina

como da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Além dos acima citados, outro importante critério de caracterização do dano

extrapatrimonial encontra-se no nexo de causalidade existente entre o fato lesivo, exercido

pelo agente gerador, e o dano causado na vítima. É, em síntese, o liame entre a conduta do

ofensor e a lesão sofrida pelo sujeito ofendido.

Por fim, é importante reiterar que os danos extrapatrimoniais de que se trata neste

tópico se referem, como descrito anteriormente, ao gênero, cujas espécies são, a título de

exemplo, o dano moral puro, o dano à honra, o dano à saúde e o dano existencial, numa

classificação que visa retirar de foco a generalização com que são tratados cada uma dessas

distintas lesões à pessoa para analisar com especificidade a respeito de uma, o dano

existencial.

3.3 O dano existencial

A espécie de dano à pessoa de que tratar-se-á neste tópico possui até os dias atuais

pouca repercussão no Brasil, seja nas demandas judiciais ou na própria doutrina. Ainda são

poucas as obras sobre o tema, assim como são relativamente escassas as decisões judiciais que

reconhecem o dano extrapatrimonial sob esse título.

O surgimento desse tipo de dano imaterial se deu na Itália, onde brotaram as ideias

iniciais em meados do século XX. Nesse país, classicamente, a responsabilidade civil por

danos extrapatrimoniais se dá apenas em casos expressamente tipificados na lei,

acrescentados pelas reparações oriundas de práticas consideradas criminosas.

50

CAVALIERI FILHO, Sérgio.Op. cit. p. 92

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33

Tal qual é possível depreender pela breve explanação acima delineada, o critério então

esposado na Itália para compensação de danos imateriais é bem restrito, deixando de abranger

situações em que ocorrem danos à pessoa, e, com isso, deixando-as consideravelmente

desprotegidas.

Partindo desse pressuposto, entre as décadas de 1950 e 1960 passou-se a reconhecer o

que ficou conhecido como dano à vida de relação (danno alla vita di relazione), que atingiria

o indivíduo indiretamente na sua capacidade laborativa51

, se concretizando na diminuição da

capacidade de obter rendimentos pelo trabalho.

Desse modo, percebe-se que a noção de dano à vida de relação surgiu intimamente

ligada à esfera de trabalho do ser humano, na medida em que se entendia que ofensas

psicológicas ou físicas responsáveis pelo impedimento do desfrute de atividades

extralaborativas, recreativas ou de lazer, seriam causadoras de dano em razão de, pela

ausência das práticas citadas, a disposição e o relacionamento social do trabalhador seriam

prejudicados e, em consequência disso, também seria atingida sua capacidade de ascensão na

profissão ou de obter contraprestação maior.

Assim, mostrava-se patente a necessidade da repercussão econômica da lesão para que

se configurasse o dano à vida de relação. Relacionando temporalmente à realidade brasileira

na época, percebe-se semelhança no tratamento dado aos danos extrapatrimoniais, para os

quais só eram concedidas reparações em casos de efeitos econômicos deles advindos.

A partir da década de 1970, houve um aumento no número de julgados que tratavam

desse tipo de demanda na Itália, com a singularidade de se exigir a proteção da pessoa contra

as ofensas que a impediam de exercer atividades que estivessem inseridas na sua rotina, sob o

argumento de tutela dos direitos invioláveis da pessoa humana.

Com o passar do tempo, muito em decorrência de o tema ter ganhado terreno na

academia local, viu-se uma evolução no que se entendia a seu respeito, principalmente no

tocante a não mais se exigir que o dano tivesse repercussão econômica na vida da vítima. Um

importante marco para tal evolução se deu com a sentença 184, de 1986, proferida pela Corte

Constitucional Italiana, que reconheceu o direito de uma pessoa a receber indenização por

dano à sua saúde, independente de prova de existência de dano econômico ou de conduta

tipificada criminalmente52

e denominou tal espécie de dano biológico, dentro do qual estava

inserido o dano à vida de relação.

51

ALMEIDA NETO, Amaro Alves de. Dano existencial: a tutela da dignidade da pessoa humana. Revista

dos Tribunais, São Paulo, v. 6, n. 24, mês out/dez, 2005, p. 68. 52

ALMEIDA NETO, Amaro Alves de. Op. Cit. p. 70.

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34

Sob a luz da decisão 184/86, no início da década de 1990, os juristas italianos Paolo

Cendon e Patrizia Ziviz foram responsáveis por diversos encontros acadêmicos e artigos

científicos que abordavam o que se passou a chamar de dano existencial53

. Como resultado

das discussões envolvendo essa espécie de dano, entenderam que qualquer lesão a direito

fundamental de um cidadão afronta a dignidade da pessoa humana, e, portanto, configura um

dano à existência desse indivíduo.

Seguindo a linha evolutiva do reconhecimento do instituto em análise, no ano 2000, a

Corte de Cassação proferiu a sentença de número 7.713, na qual reconheceu o direito à

indenização por dano existencial, em caso concreto ligado ao direito de família, mais

especificamente ao abandono afetivo e a sua repercussão na vida do filho desprovido de

carinho paterno, sobre quem se imputa o dever de tratamento digno ao menor. A partir dessa

decisão, dirimiu-se a região cinzenta de interpretação pelos órgãos judiciais italianos no que

toca à reparabilidade do dano existencial.

No Brasil, o tema começa a ser debatido com maior profundidade a partir de julgados

recentes que reconheceram o instituto e estabeleceram um quantum indenizatório para fins de

compensação da lesão sofrida pela vítima. Entretanto, há uma breve exceção de

reconhecimento pela doutrina do dano existencial, que é a menção ao dano à normalidade da

vida de relação, feita por Pontes de Miranda na obra “Tratado de direito privado”, datada de

1971 e, na década de 1990, Sérgio Severo também aborda o tema em obra acerca de danos

extrapatrimoniais, na qual cita a inexistência de repercussão jurisprudencial à época.

Em se tratando de decisões judiciais, apenas na segunda metade da primeira década

deste século XXI é que foram surgir escassos julgados no sentido de reconhecimento do dano

à vida de relação, com um aumento a partir do ano de 2010. Mais especificamente na seara

trabalhista, um marco importante para a elevação de demandas a esse respeito se deu com

duas decisões do TST publicadas no ano de 2013, que tiveram maior repercussão com a

divulgação midiática.

Numa dessas decisões, a Corte condenou o conglomerado estadunidense Walmart a

pagar a quantia de 8,5 mil reais a título de danos morais e existenciais a um empregado que

cumpriu horas extras acima do permitido por lei. Na outra, o TST rejeitou o esposado em

recurso de uma associação sul-mato-grossense contra decisão que a condenava a pagar 25 mil

reais a título de dano existencial a empregada por tê-la deixado sem férias durante nove anos.

Mas qual seria, afinal, a definição de dano existencial?

53

SOARES, Flaviana Rampazzo. Responsabilidade civil por dano existencial. Porto Alegre: Livraria do

Advogado, 2009. p. 43.

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35

Flaviana Rampazzo Soares54

, em seu livro que originou-se da dissertação de mestrado,

na qual abordou o instituto do dano existencial, empresta a seguinte definição:

“O dano existencial é a lesão ao complexo de relações que auxiliam no

desenvolvimento normal da personalidade do sujeito, abrangendo a ordem pessoal

ou a ordem social. É uma afetação negativa, total ou parcial, permanente ou

temporária, seja a uma atividade, seja a um conjunto de atividades que a vítima do

dano, normalmente, tinha como incorporado ao seu cotidiano e que, em razão do

efeito lesivo, precisou modificar em sua forma de realização, ou mesmo suprimir de

sua rotina”.

Destarte, o dano existencial se configura como uma alteração prejudicial nas relações

sociais da vítima, com incidência direta na rotina de afazeres que eram ou poderiam ser feitos,

com repercussão consistente nos seus planos de vida e, portanto, afetando em determinado

grau a sua existência.

Enquanto essa definição é centrada na lesão, Amaro Alves de Almeida Neto55

entende

o dano existencial como efeito de uma ofensa a qualquer um dos direitos fundamentais

tutelados constitucionalmente, que venha a causar uma alteração negativa no modo de ser da

vítima ou nas atividades normalmente por ele desempenhadas, sem a necessidade de

repercussão econômica.

A característica principal do dano existencial é o seu efeito sobre a vida do indivíduo

ofendido, de modo que frustra o projeto de vida traçado livremente por ele e que, por isso,

está intimamente ligado à dignidade humana, que é atingida gravemente, ao passo que a

vítima resta impedida de cumprir o plano que entendia ser o melhor para si.

Sabe-se, pois, que o dano existencial se divide em ofensas a dois grupos de interesse

do ser humano, quais sejam a vida de relação e o projeto de vida. A vida de relação é a

interatividade da pessoa com a coletividade, estabelecendo relacionamentos sociais com

outras pessoas e integra a esfera existencial humana, muito ligada à independência do ser.

Já o projeto de vida é, por um lado, o plano que se traça calcado na razoabilidade para

se atingir os objetivos a que se propõe o indivíduo, cujas principais áreas abrangidas são

divididas com vistas à saúde física, espiritual, intelectual, familiar, social, financeira e

profissional. Por outro lado, são as atividades que integram o cotidiano da pessoa que fazem

seu projeto de vida, muito baseada no standard de tarefas ou rotina, não apenas profissionais,

mas também as de lazer, esportivas e de descanso.

54

SOARES, Flaviana Rampazzo. Idem. p. 44. 55

ALMEIDA NETO, Amaro Alves de. Op. Cit. p. 68.

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36

O subjetivismo é a característica principal do projeto de vida, já que cada pessoa tem

traços peculiares de personalidade e experiência que definem as metas a serem alcançadas nas

áreas anteriormente citadas. Apesar disso, é possível ter como base o projeto de um homem

médio para que se caracterize o dano existencial, na busca pela aferição da proporção da

ofensa na vida da vítima.

Retorna-se, nesse ponto, ao abordado no tratamento da dignidade humana, em que

destacou-se duas das mais marcantes características dos seres humanos: a igualdade, já que

somos todos iguais na condição humana, e a diferença, em razão de cada indivíduo possuir

distinções em relação aos outros, de modo que não há duas pessoas com a mesma biografia56

.

Discute-se acerca do preenchimento do requisito do dano certo, exigido para

caracterização de dano juridicamente relevante. De um lado, a perda total ou parcial do

exercício de atividades rotineiras o preenche, porém, de outro, vislumbra-se um caráter de

potencialidade, já abordado no título anterior quanto aos danos extrapatrimoniais.

Não se pode deixar à parte esse quesito do potencial causador de danos de uma

conduta, tendo em vista que a vítima poderia ter planos de vida que nunca chegaram a

concretizar-se em razão do ato lesivo. É o que se chama de perda de uma chance, pela qual

não há certeza sobre o ato que seria executado, porém é certo que a vítima teve sua chance

desperdiçada por conduta de outrem. Assim, entende-se possível a cumulação de dano

extrapatrimonial por perda de uma chance e dano existencial decorrentes de uma mesma

conduta injusta.

Posto isso, cumpre destacar os principais efeitos decorrentes desse evento danoso, que

atinge o ser humano na esfera de sua existência. De início, as lesões que causam a perda da

mobilidade parecem ter efeito notadamente devastador sobre as atividades comumente

executadas pela pessoa ofendida, visto que a impede de exercer uma rotina que fosse

normalmente seguida ou que era planejada para o futuro.

Em que pese o maior espaço que se abriu para a locomoção de pessoas com parca

mobilidade, ainda se nota que a quantidade de transtornos sofridos por indivíduos em

ambientes públicos e privados é alta, além da perda, pelo menos parcial, da liberdade, em

razão de passar a depender de outras pessoas para a realização de atividades do cotidiano, nos

casos mais gravosos.

56

SESSAREGO, Carlos Fernandez, “Proteción a la persona humana”, Ajuris. Revista da Associação dos Juízes

de Direito do Rio Grande do Sul, n. 56, 1.992, nov., p. 87-142. In: ALMEIDA NETO, Amaro Alves. Idem. p.

69.

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37

Em prosseguimento, há os danos que afetam as relações sociais da vítima, interferindo

negativamente no convívio com a entidade familiar da qual faz parte, no relacionamento com

amigos e colegas. Quanto a esse ponto, pode ser citado como exemplo o caso em que um

trabalhador tem sua vida social prejudicada em razão das condições que lhe são impostas em

seu emprego e que chegam a causar o fim de relacionamento amoroso ou o distanciamento da

família e de amigos, certamente tendo efeitos nefastos sobre si.

Em direção similar, há os danos que causam limitações ou impedimento ao desfrute de

atividades de lazer ou prazerosas para o ofendido, seja por questões físicas, como ter

adquirido doença ou lesão em atividade laborativa que impeça a prática de esportes, ou por

impedimento temporal, em que a pessoa, a despeito de ter determinada atividade como

rotineira ou, ao menos, planejava razoavelmente tê-la, é impedido por excesso ilícito de

jornada, inclusive nos finais de semana, exemplificativamente.

A despeito de haver reconhecimento como espécie autônoma de dano

extrapatrimonial, da ocorrência de dano à saúde, é possível e até provável, que

concomitantemente a ele, seja causado também dano existencial. O grau de ofensa,

obviamente, dependerá da intensidade do dano à saúde e de quais consequências ele gerará

para a vítima, mas, na maioria dos casos, a lesão à higidez de um trabalhador, por exemplo,

implicará em limitações ao exercício de determinadas atividades e é nesse ponto em que pode

se encontrar o dano existencial.

A doutrina francesa utiliza a expressão préjudice d´agrément para designar as lesões

que impedem o ser humano de praticar atividades que considera prazerosas, que podem ser

recreativas, esportivas ou sexuais. Configura-se, pois, na privação de sentimentos positivos

que o indivíduo poderia (continuar a) ter, caso não tivesse sofrido o dano.

O prejuízo recreativo refere-se ao impedimento de se fazer atividades prazerosas,

como determinada prática cultural, ou quando a ofensa atinge uma criança, impedindo-a de

desfrutar de sua jovialidade, consubstanciada nas brincadeiras infantis, havendo quem

destaque tal categoria como prejuízo juvenil.

Em sentido semelhante, o prejuízo esportivo denota a impossibilidade da prática de

atividade esportiva inserida na rotina da vítima do dano, espécie que caberá a cumulação com

danos patrimoniais no caso de ser a pessoa ofendida um desportista profissional.

Já o prejuízo sexual se refere à impossibilidade total ou parcial da vítima do dano, de

manter relações sexuais, ofendendo não só a atividade prazerosa que será cerceada do

indivíduo, mas a possibilidade de ter filhos, nas situações mais graves. Nesse caso, havendo

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38

relacionamento com a vítima, seu parceiro também é atingido pelo dano existencial, de forma

indireta ou em ricochete57

, pois sofre notadamente um prejuízo existencial.

Por fim, o efeito considerado mais gravoso é o da perda da expectativa de vida em

variação do tempo. Nesse tipo, a vítima sofre uma limitação na quantidade de tempo que

poderá viver e, portanto, ataca frontalmente o direito fundamental que serve de base para

todos os outros, que é o direito à vida, bem como o direito à dignidade humana.

Portanto, passada a evolução do reconhecimento do dano existencial e por sua

definição, cumpre destacar que, em razão da sua aparição relativamente recente no direito

brasileiro, ainda há confusão entre ele e o dano moral, sobre o que se tratará a seguir.

3.4 Diferenças entre dano existencial e dano moral

Antes de iniciar a diferenciação entre os institutos que dão título a este ponto, é

necessário esclarecer que o dano moral sobre o qual tratar-se-á se refere à espécie do gênero

danos extrapatrimoniais, e não como designação lata dos danos que não atingem o patrimônio,

tal qual comumente se observa no Brasil.

Ultrapassada a questão terminológica acima delineada, passa-se a abordar as

diferenciações entre os danos existencial e moral. Destaque-se que essas espécies de dano

extrapatrimonial possuem traços que as tornam peculiares, especialmente no que toca aos

efeitos sobre o indivíduo lesado.

O dano moral atinge o ser humano em sua esfera íntima, como um sentir58

,

caracterizando-se pelo sofrimento, pela angústia ou pela dor que pode acometer a vítima,

decorrente do ato lesivo protagonizado pelo ofensor. De outra banda, o dano existencial atinge

a esfera externa do ser humano, em suas relações sociais, nas atividades que desempenha

regularmente ou que planeja executar, e se consubstancia como uma limitação ao

desenvolvimento da vida do indivíduo afetado.

Percebe-se, daí, que o dano existencial ataca diretamente a liberdade do ser humano,

no momento em que o impede, inteira ou parcialmente, de manter relações sociais com outras

pessoas ou quando interfere de forma negativa nas atividades que são exercidas pela vítima. O

princípio da liberdade individual, como assevera Maria Celina Bodin de Moraes59

, se

57

SEVERO, Sérgio. Op. cit. p. 155-156. 58

SOARES, Flaviana Rampazzo. Op. cit. p. 46. 59

MORAES, Maria Celina Bodin de. Op. cit. p. 107.

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39

configura nas esferas da privacidade, da intimidade, do exercício da vida privada, com a livre

escolha individual do que e como se pretende fazer.

Ainda no que toca aos efeitos dos danos ora em diferenciação, depreende-se que o

dano moral puro é geralmente sentido mais rapidamente, tomando por base o estímulo

correspondente, que é a atividade lesiva. Na maioria dos casos, essa espécie de dano se faz

presente na pessoa instantaneamente, representada na humilhação sofrida, no abatimento em

face de um comportamento danoso do agente causador etc.

Já o dano existencial se concretiza com o tempo. Dada a subjetividade característica

dos danos extrapatrimoniais, uma mesma conduta em face de duas pessoas distintas pode

gerar reações diametralmente opostas, mas, no que se refere ao dano existencial, com o passar

do tempo, é possível aferir se houve prejuízo à vida de relação ou aos planos de vida do

indivíduo. Apenas com o transcorrer cronológico é que se pode detectar a existência dessa

espécie de dano.

A exigência dos efeitos no tempo se dá pelo requisito de alteração no standard

qualitativo e quantitativo60

de prazer relacionado à rotina do indivíduo, razão pela qual o dano

existencial, no tocante a seus efeitos, se configuraria como aborda Flaviana Rampazzo

Soares61

, na “renúncia involuntária às atividades cotidianas de qualquer gênero, em

comprometimento das próprias esferas de desenvolvimento pessoal”.

Feita a distinção entre os institutos, é importante ressalvar que é possível a ocorrência

de ambos de forma concomitante. Embora distintos, o dano existencial e o dano moral não

são, de forma alguma, opostos e, portanto, há situações em que uma só conduta lesiva pode

ser causadora de mais de uma espécie de dano à pessoa ofendida. A título de exemplo, pode

ser citado o caso em que, na duração da relação de emprego, o patrão dispense tratamento

desrespeitoso com uma empregada, causando-lhe abalos psicológicos instantâneos (dano

moral) que a atinjam de forma permanente, influenciando negativamente nas suas relações

sociais com o círculo de pessoas que a circunda (dano existencial).

Nos casos em que ficar constatada a ocorrência, derivadas da mesma conduta, de

ambas as espécies ora tratadas, quais sejam dano existencial e dano moral, é perfeitamente

possível que haja a cumulação, na esteira do que prescreve a súmula número 37 do Superior

Tribunal de Justiça.

60

SOARES, Flaviana Rampazzo. Idem. p. 46. 61

Idem, ibidem.

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40

3.5 Situações potencialmente geradoras de dano existencial nas relações de emprego

O dano existencial não ocorre exclusivamente sob o manto do vínculo de emprego,

mas nessa, encontra um componente com grande potencial lesivo, o poder empregatício, que,

aliado à subordinação do empregado, caracteriza uma relação jurídica notadamente desigual,

impondo ao elo mais fraco a exposição maior a eventos danosos, como este de que ora se

trata.

Assim, serão analisadas algumas situações ligadas ao vínculo empregatício que

possuem um potencial causador de dano existencial relativamente alto, seja no tocante ao

projeto de vida ou à vida de relação.

3.5.1 Jornadas de trabalho excessivas

A evolução do direito justrabalhista, delineada em síntese em capítulo anterior, revela

uma progressiva diminuição das horas voltadas para a jornada de trabalho. No início da

industrialização, com foco na Inglaterra, homens, mulheres e crianças cumpriam jornadas de

aproximadamente dezesseis horas diárias, tornando-se posteriormente em um dos motivos

pelos quais foram formadas as uniões dos obreiros na luta por melhores condições de

trabalho.

Hodiernamente, a Constituição Federal de 1988 traz em seu artigo 7º, inciso XIII,

disposição que consagra a jornada de trabalho não excedente a oito horas diárias e quarenta e

quatro semanais. Essa é a regra, havendo exceções como as dos serviços prestados em turnos

ininterruptos de revezamento e a jornada 12x36, na qual o empregado trabalha por doze horas

e descansa durante as trinta e seis seguintes.

Na CLT, o artigo 59 dispõe que a jornada pode ser acrescida, desde que não ultrapasse

o limite de duas horas extraordinárias de labor por dia, completando, assim, um patamar

máximo de dez horas diárias, sendo que as excedentes à jornada normal são pagas em valor

maior.

No mês de junho do ano de 2013, o Tribunal Superior do Trabalho publicou decisão

em que condenava o conglomerado estadunidense Walmart a pagar uma indenização sob o

título de danos existenciais a ex-empregados que cumpriam jornada acima dos limites

estabelecidos no ordenamento jurídico pátrio. No caso, um chefe de setor alegou que

trabalhava todos os dias, exceto dois domingos por mês, durante pouco mais de cinco anos,

em jornada de treze horas diárias.

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41

Nesse caso acima relatado, o empregado passou praticamente todos os dias durante os

cerca de cinco anos de vínculo com a empregadora, cumprindo jornada absurdamente

excessiva, deixando-o sem o descanso necessário e em condições que favoreciam ao

acometimento de acidentes de trabalho, além de comprometer totalmente a vida pessoal do

indivíduo. Com essa rotina intensa de labor, não era possível ao trabalhador ter qualquer outro

projeto de vida que não fosse o incessante trabalho na empresa, nem manter ou criar novos

relacionamentos sociais.

Portanto, não só pela questão patrimonial deve ser entendido o excesso de jornada,

mas principalmente pelos efeitos danosos que pode ter sobre a vida da vítima, que tem sua

vida de relação e seus projetos de vida comprometidos quase que integralmente em razão

desse dano injusto.

A título de exemplo, não poderia o trabalhador citado no caso acima fazer um curso

universitário ou especializar-se em área de seu interesse. Da mesma forma, dispunha de um

tempo limitadíssimo para a prática de alguma atividade realizadora, prazerosa ou de lazer, já

que em um mês inteiro, só gozava de duas folgas. Ainda mais importante, os relacionamentos

desse indivíduo poderiam ser afetados gravemente, visto que era impedida de conviver com

sua família, amigos ou quaisquer outras pessoas que não fossem seus colegas de trabalho.

Desse modo, fica claro que o excesso de jornada tem um potencial causador de dano

existencial relativamente alto, já que dificulta a execução de um projeto de vida feito

livremente pelo empregado, bem como impede em grande monta a relação desse com pessoas

de seu afeto, em decorrência do tempo despendido à disposição da empresa.

3.5.2 Não concessão de férias

O direito do trabalhador ao gozo de férias anuais está insculpido na Constituição

Federal no artigo 7º, inciso XVII. O objetivo da concessão de período de férias aos obreiros

tem ligação com os ideais de saúde e segurança laborativas, além de ser instrumento de

realização da cidadania do empregado62

, já que, nesse tempo, poderá desfrutar do convívio

familiar e exercer seu papel político e social.

Partindo daí, é possível notar que a supressão das férias dos empregados pode causar

prejuízos que integram o conceito de dano existencial, na medida em que não poderão

aqueles, exercer plenamente as atividades ligadas ao relacionamento social e, principalmente,

62

DELGADO, Maurício Godinho. Op. cit. p. 978.

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42

terá ofendido seu direito a atividades realizadoras, de lazer, normalmente presentes nos

períodos de férias dos trabalhadores.

Sobre essa questão, o TST63

publicou decisão em setembro de 2013 na qual condenava

uma associação do Mato Grosso a pagar indenização no valor de vinte e cinco mil reais a uma

economista que trabalhou durante nove anos sem o gozo de férias, sob o fundamento de que a

conduta lesiva da empregadora teria prejudicado as relações sociais e os projetos de vida da

ex-empregada.

Na esteira da decisão acima citada, é importante destacar que as férias, bem como os

outros períodos de descanso que fazem parte da relação empregatícia, têm, dentre outros

objetivos, o de fazer com que o homem não seja apenas um trabalhador e que viva apenas

para o trabalho, tal qual uma máquina, mas, sim, que seja um ser social, que convive com

outras pessoas e possui afazeres outros que o aproximam da noção de existência digna.

Assim, no caso de não concessão de férias, o trabalhador é ofendido no seu garantido

direito ao descanso, de status constitucional, como abordado anteriormente, e é em razão

disso, dessa violação ao direito de férias, que se funda a condenação da parte empregadora à

compensação do dano existencial causado. Nesse sentido, é valorosa a lição de Maurício

Godinho Delgado:

“(...) embora permitam as férias significativa intensificação do lazer do trabalhador e

sua família, elas não têm natureza de prêmio trabalhista. Desse modo, não se

vinculam à conduta obreira mais ou menos positiva em face do interesse do

empregador. Não são, portanto, parcela adquirida pelo empregado em função da

conduta contratual especialmente favorável ao empregador. Têm, pois, as férias,

efetivo caráter de direito trabalhista, inerente ao contrato de trabalho – direito a que

corresponde uma obrigação empresarial.”

Por outro lado, é possível também perceber um subjetivismo com relação ao tempo em

que houve labor sem a concessão das férias. No caso da decisão do TST, não há dúvidas, já

que nove anos seguidos de trabalho sem sequer um período de férias são, além de uma afronta

à dignidade do trabalhador, uma abrupta interferência em seu plano de vida e em suas

relações sociais.

Entretanto, será que a não concessão de férias no período de um ano teria o condão de

causar à vítima dano à sua esfera de existência, além da clara ofensa aos dispositivos legais

63

BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Recurso de Revista n.º 727-76.2011.5.24.0002. CASSEMS e

Margaret Flores Nunes Viana. Relator: Ministro Hugo Carlos Scheuermann. 06 de setembro de 2013. Disponível

em:

<https://aplicacao5.tst.jus.br/consultaProcessual/consultaTstNumUnica.do?consulta=Consultar&conscsjt=&num

eroTst=727&digitoTst=76&anoTst=2011&orgaoTst=5&tribunalTst=24&varaTst=0002>.

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43

que contemplam esse tipo de descanso trabalhista? Nessa hipótese, parece ganhar maior

importância a produção de provas, em que pese a dificuldade nesse ponto específico, para

configuração do dano existencial, além dos patrimoniais que faria jus o trabalhador.

Ademais, outro ponto importante a ser destacado é que o mundo empresarial impõe

forte pressão sobre boa parte dos empregados, que, em certas ocasiões, se veem praticamente

compelidos a não gozar de férias em razão do receio de perder aquela ocupação. Configura-se

dano existencial nesses casos também, já que o direito ao gozo de férias não é uma faculdade

do empregado, mas um dever de concessão imposto ao empresário.

3.5.3 Doença profissional – LER/DORT

A doença ocupacional ou profissional de que se tratará neste tópico é a LER/DORT,

cujas siglas significam, respectivamente, lesão por esforço repetitivo e distúrbios

osteomusculares relacionados ao trabalho. As causas geralmente são os movimentos

repetitivos e contínuos executados em atividade profissional que ocasionam a sobrecarga de

nervos, músculos e tendões.

Os efeitos da LER/DORT sobre a pessoa são o possível comprometimento das

capacidades de exercer as atividades que deram causa ao surgimento dessa doença

profissional, ou seja, as que eram feitas pelo trabalhador de forma repetitiva por um longo

período. Tornando-se mais gravosa, pode impedir que o indivíduo afetado consiga realizar

tarefas do cotidiano, como segurar objetos, utilizar computadores pessoais ou a praticar

alguma atividade desportiva que integrava sua rotina.

Percebe-se ofendida a integridade física do trabalhador que adquire tal doença a partir

das atividades profissionais que exerce e, desse modo, é atingida a esfera dos direitos da

personalidade do ser humano. Assim, o dano existencial se configura na alteração negativa da

rotina do indivíduo, que pode tornar-se incapaz para a atividade profissional que sempre

exerceu ou, ainda, ficar impossibilitado de exercer tarefas básicas do dia-a-dia, passando a

necessitar de ajuda de terceiros para realizá-las.

3.5.4 Assédio moral (mobbing) e assédio sexual

Assédio moral é definido como a conduta que cause constrangimento ou outro tipo de

sentimento negativo, executada de forma repetitiva, geralmente com o intuito de fazer com

que a vítima se sinta desconfortável e abra mão de determinada função mais vantajosa ou até

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do próprio emprego. Comumente, o assédio é praticado subjetivamente de acordo com a

antiga ideia de hierarquia, do chefe ou gerente com os empregados, sendo possível que ocorra

também entre empregados ou, mais raramente, de empregados com a pessoa que ocupa

função de chefia.

Dessa forma, o assédio moral pode causar um desequilíbrio de proporções maiores e

que resultem na influência negativa sobre a vida da pessoa ofendida reiteradamente no

exercício de sua função. Ao atingir a esfera íntima da vítima, causando-lhe, pois, dano moral,

é possível que haja repercussão na esfera externa, consubstanciada no seu relacionamento

com outras pessoas ou na própria rotina de atividades praticadas.

Assim estariam configurados os danos à vida de relação, caso a vítima, em decorrência

de algum transtorno psicológico oriundo do assédio moral, tivesse afetada relevantemente a

sua capacidade de interagir com as pessoas, bem como os danos ao projeto de vida, na

hipótese de a ofendida ter sido compelida a desistir de seu emprego e pedir demissão para

afastar-se das condutas lesivas que lhe eram impostas.

Da mesma maneira, como já abordado alhures, o assédio sexual, considerado crime

tipificado no artigo 216-A do Código Penal, é a abordagem indesejada, de cunho sexual,

realizada por indivíduo normalmente ocupante de função de dirigente ou posição hierárquica

superior no estabelecimento empresarial.

Geralmente com efeitos psicológicos mais danosos, o assédio sexual tem um potencial

relativamente alto para causar dano existencial à vítima, já que a conduta considerada

criminosa a expõe a uma situação vexatória e humilhante, sendo possível que reflita na sua

esfera externa da mesma forma como mencionada acima para o caso de assédio moral, com

dificuldades para relacionar-se socialmente ou com prejuízo ao projeto de vida profissional.

3.5.5 Condições precárias de trabalho

A Constituição Federal de 1988 estabelece que é direito de todos a manutenção de um

meio ambiente ecologicamente equilibrado, no artigo 225, deixando claro no artigo 200 que o

meio ambiente de trabalho integra o conceito acima descrito. Nessa esteira, há várias Normas

Regulamentadoras do Ministério do Trabalho e Emprego que têm o objetivo de fazer cumprir

o disposto na Carta Magna.

Tal como já abordado, a OIT definiu o que se entende por trabalho decente, passando

a fazer campanhas em todo o mundo com parcerias locais para o estabelecimento de

condições dignas aos trabalhadores. Retomando o conceito exposto de Yara Maria Pereira

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45

Gurgel64

, trabalho decente seria o “exercido em conformidade com os preceitos de igualdade,

liberdade, equidade, respeito à saúde e segurança do trabalhador e com remuneração justa,

livre de qualquer margem de discriminação, de condição análoga à de escravo, de trabalho

infantil, fortalecida pelo dialogo social e essencial ao combate à pobreza e à minimização das

desigualdades sociais”.

Posto isso, revela-se a importância essencial dada à proteção à saúde e segurança do

trabalhador, que tem forte ligação com a manutenção de um bom e seguro ambiente de

trabalho. O trabalho em condições precárias causa prejuízo não só ao labor em si considerado,

mas principalmente à esfera íntima do trabalhador, podendo vir a provocar dano moral pela

sua submissão.

No entanto, o dano existencial fica mais claramente configurado nas situações mais

extremas, quais sejam nas condições análogas às de escravo e na exploração do trabalho

infantil. Em ambas as citadas, os sujeitos vítimas da conduta lesiva são subjugados e levados

a condições inferiores ao patamar mínimo de proteção do ser humano no trabalho.

Nessas situações, geralmente a exploração se dá sem o mínimo respeito à tutela dos

direitos trabalhistas, com jornada exaustiva, remuneração ínfima, descansos raros e em

condições que atingem negativamente a essência do ser humano. Desse modo, a esfera

existencial do indivíduo é atacada, dada a forma como é subjugado, principalmente em

decorrência de necessidade econômica.

Além disso, repercute na esfera externa da vítima. No caso do trabalho análogo ao de

escravo, a exploração impede que o indivíduo tenha uma vida fora do ambiente de trabalho,

prejudicando-o quanto ao plano de vida e à vida de relação, se considerarmos o exemplo

típico de fazendeiros que enganam pessoas desempregadas e as prendem às fazendas com

ameaças e dívidas que a fazem se vincular ao patrão. Esse tipo de exploração da mão de obra

fere o homem em sua essência, bem como toda a sociedade, em reflexo.

No Brasil, ainda existe a grave situação dos estrangeiros explorados principalmente no

na indústria têxtil, com maior concentração no estado de São Paulo. Várias empresas já foram

autuadas pela imposição de trabalho escravos a bolivianos, peruanos, paraguaios e haitianos,

que são confinados em alojamentos improvisados, cujo ambiente é notadamente indigno, para

trabalharem em jornadas exaustivas, por remuneração ínfima e com a exploração por dívida.

Nesses casos, a situação econômica ruim nos países de origem faz com que os

imigrantes venham ao Brasil em busca de uma melhoria financeira para si e parte da família.

64

GURGEL, Yara Maria Pereira. Op cit. p. 31.

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46

Aproveitando-se perversamente dessa situação, várias fábricas de costura, mas não só elas,

substituem os empregados formais pelos estrangeiros, devido o baixo custo e a alta

produtividade, frutos da vil exploração, cujos reflexos surgem no mercado pelo conhecido

dumping social, prática na qual a produção se dá com desrespeito às normas trabalhistas para

maximizar o poder de concorrência e, consequentemente, os lucros daí advindos.

De outra banda, a exploração do trabalho infantil revela uma vil face exploradora,

enquanto submete uma pessoa com pouca idade e, portanto, dotada de condições físicas

inferiores, e que deveria voltar-se unicamente ao ensino e ao desenvolvimento enquanto ser

humano, ao trabalho geralmente pesado.

Fica clara a incidência do dano existencial, pois compromete o plano de vida da

criança de forma gravíssima, já que ocupa o tempo em que ela deveria estar estudando com a

prestação de serviços ilicitamente. Além disso, retira da criança toda a rotina que deveria ser

seguida por ela, com atividades realizadoras, de lazer e recreação, incidindo negativamente

em todo o desenvolvimento daquele ser humano.

3.6 Problemática da reparação do dano

Há parte da doutrina que estabelece diferenças terminológicas entre os termos que

expressam a resposta do ofensor à vítima em razão do dano causado, que são os seguintes:

reparar, compensar e indenizar. A primeira expressão designaria o efetivo retorno ao status

quo ante, como o conserto do prejuízo causado, enquanto a compensação seria uma espécie

de oferta de outra coisa no lugar do dano sobre a vítima projetado e, por fim, a indenização

representaria a mitigação dos efeitos do dano, para que torne a pessoa ofendida indene.

Apesar das distinções acima apontadas, neste capítulo os três termos serão utilizados

como sinônimos, enquanto será analisado o atual modelo de reparação dos danos

extrapatrimoniais e, aí incluída, do dano existencial, suas particularidades e sua efetividade,

especificamente no âmbito da relação de emprego.

3.6.1 Atual modelo de reparação dos danos extrapatrimoniais

Inicialmente, a admissibilidade de provimento de compensação financeira por um

prejuízo essencialmente não-econômico foi o principal ponto de debates, com destaque ao

posicionamento de Savigny, para quem o patrimônio ideal dos seres humanos não seria

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47

suscetível de reparação, pois não estaria disposto no mercado, não podendo, portanto, ser

objeto de obrigação jurídica.65

Para os filiados à corrente que não aceitava a reparação por danos imateriais, não

poderia haver uma quantificação econômica de um dano primordialmente psicológico ou

moral, motivo pelo qual não existiria um critério de equivalência para a satisfação do lesado,

além de considerarem como imoral a “troca” de um dano por uma quantia em dinheiro

arbitrariamente definida.

Em que pese o posicionamento supramencionado, cuja filiação é minoritária, não há

razão para sustentar-se tal corrente de pensamento, fundamentalmente ao se levar em conta o

sofrimento, a humilhação, o abalo psicológico e os prejuízos além do patrimônio causados à

vítima de lesão extrapatrimonial, a qual não deve restar impune em virtude da inexistência de

formas reparatórias diversas da monetária.

Por conseguinte, a satisfação ou compensação da vítima, tendo em vista a mormente

impossibilidade de retorno ao status quo ante, é feita por meio de verba indenizatória, com o

fim de dirimir o mal que lhe foi causado e impor, a um só tempo, uma sanção ao agressor,

visando, com isso, o reestabelecimento da paz nas relações sociais.

A reparação integral dos danos extrapatrimoniais constitui-se em princípio basilar da

responsabilidade civil, insculpido na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, incisos

V e X, direcionando-a no sentido da busca pela mais ampla e completa compensação possível

pelos danos sofridos pela vítima, com o objetivo, primeiro, de diminuir ou amparar o

sofrimento gerado e, também, para inibir a reiteração da prática danosa pelo ofensor ou por

terceiros.

Enquanto o dano patrimonial é indenizado em equivalência monetária ao prejuízo

sofrido, a lesão extrapatrimonial, por não ser passível de mensuração econômica, é dotada de

cunho mais aberto, cuja valoração passa pela compensação do sujeito lesado, pela sanção que

deve ser imposta ao agente causador e pela prevenção ou inibição que deve ser dada com

vistas para a sociedade.

A despeito de correntes que asseveram não ser a reparação monetária moralmente

adequada para compensar uma lesão psicofísica sofrida por uma pessoa, ela é considerada,

pela doutrina e pela jurisprudência majoritárias, como a forma mais apropriada para tal fim,

dentre as possibilidades que se apresentam.

65

Medeiros Neto, Xisto Tiago de. Op. cit. p. 73.

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48

Olhando com atenção, a impossibilidade de se retornar ao status quo ante, quando não

havia acontecido o dano – situação ideal – remete a algum modo ressarcitório, pois, a título de

exemplo, não pode uma empresa retornar seu empregado à situação anterior que ele integrava

antes de ter sofrido o prejuízo extrapatrimonial.

Nesse caso, o dinheiro não é visto como “um fim em si mesmo, mas como meio de

obtenção de sensações positivas”66

pela utilidade no âmbito social, bem como para sancionar

economicamente o causador do dano, do que se tratará mais adiante.

Apesar dos pontos positivos que lhe são atribuídos, a praxis atual gera, por diversos

fatores, o suposto fenômeno da indústria do dano moral, pela qual se multiplicam as ações

indenizatórias por questões das mais variadas, principalmente dissabores comuns à vida social

moderna, visando unicamente a obtenção da quantia financeira a ser provida em juízo.

Nessa esteira de pensamento, vale o questionamento: será mesmo a indenização

monetária a melhor solução para a reparação de danos extrapatrimoniais? Existiria, pois, uma

solução ideal? Há de se ressaltar aqui a subjetividade do conceito de reparação, tendo em

vista que cada caso traz consigo suas peculiaridades, assim como os sujeitos lesados, os quais

podem se satisfazer até com uma mera retratação formal ou, por outro lado, exigirem

obrigações de maior exigência. Portanto, a solução ideal varia topicamente e nem sempre

pode ser alcançada.

Em mesmo sentido, a reparação do dano existencial se dá por meio de indenização

arbitrada pelo julgador, como forma de gerar uma sensação agradável ao ofendido com o

recebimento de quantia monetária, cujo fito é de compensar o prejuízo extrapatrimonial

sofrido.

Para tanto, é necessário que sejam preenchidos alguns requisitos específicos dessa

espécie de dano para que, assim, seja estipulada uma quantia a título de indenização. Júlio

César Bebber67

elenca os pontos que devem ser observados, quais sejam a injustiça do dano, a

situação presente da vítima com relação ao passado e ao provável futuro, a razoabilidade do

prejeto de vida e, por fim, o alcance do dano.

É necessário que o dano seja injustamente causado à vítima para que seja considerado

para fins reparatórios. Outro requisito a ser analisado é a situação presente da pessoa

66

SILVA, Wilson Melo da. O dano moral e sua reparação. 3.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999 apud Medeiros

Neto, Xisto Tiago de. Op. cit. p. 93. 67

BEBBER, Júlio Cesar. Danos extrapatrimoniais (estéticos, biológico e existencial): breves considerações.

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49

ofendida, com relação ao momento anterior ao dano, bem como o que se desenha para o

futuro com os efeitos da lesão sofrida. Só com essa análise é que se pode afirmar que ocorreu

um dano existencial que afetou de modo negativo a vida do trabalhador em suas perspectivas,

em comparação com sua rotina ou seus planos anteriores ao período da conduta lesiva do

empregador.

Além desses, um importante critério para que o instituto não se torne uma folha em

branco é a percepção da razoabilidade do projeto de vida da vítima, tendo em vista que é

preciso que se faça uma análise, pelo menos superficial, sobre a possibilidade/probabilidade

de concretização do plano alegado e supostamente ruído. Um projeto que se mostre

totalmente irrazoável ou amplamente improvável de ser realizado não pode, obviamente, ser

danificado ou obstado, de modo que sua reparabilidade também não é possível ou sequer

desejável, em nome da segurança jurídica.

Ainda, é essencial que se busque o alcance do dano, consubstanciado na proporção dos

efeitos desse sobre a vida da vítima de forma ampla, nas atividades que ela ficou

impossibilitada de fazer, nas relações sociais que ela foi impedida de manter, ou seja, em toda

a abrangência de decorrências negativas proporcionadas pela conduta lesiva perpetrada pelo

empregador ao empregado.

3.6.2 Análise da eficiência da reparação

A questão da quantificação do valor arbitrado para fins de reparação monetária dos

danos extrapatrimoniais é um dos principais temas de debate e divergência na doutrina e na

jurisprudência brasileiras. O fato de não haver critérios objetivos legais para a mensuração da

quantia que deve ser estipulada para a sanção do agente causador implica na importância

fundamental do papel do magistrado para a consecução de tal fim.

Embora não haja oficialmente modo estabelecido para valoração do quantum da

indenização, doutrina e jurisprudência estabeleceram critérios que devem, em tese, ser usados

para isso. São eles a análise da gravidade e da repercussão do dano no seio social, a

intensidade dos efeitos danosos na vítima, o grau de culpa ou do dolo, caso haja, e, por fim, a

situação econômica do agente causador.

Mesmo com a utilização do critério acima descrito, bem como de outros tantos criados

pela jurisprudência, não se nota uma uniformidade nos valores estipulados em condenações

por danos extrapatrimoniais. Da mesma forma, nos casos em que se requereu indenização a

título de dano existencial, os valores arbitrados são díspares entre si, o que, além de levar a

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50

uma situação de insegurança jurídica, pode influenciar comportamentos de empregadores e

empregados, de forma a perder-se de vista o sentido inicial da reparação dos danos imateriais.

O fenômeno intitulado indústria do dano moral recebeu tal nomenclatura em razão do

aumento no número de demandas judiciais que pleiteavam reparação por danos

extrapatrimoniais no Brasil, notadamente a partir do início deste século. Os pleitos se referem

a diversos fatos supostamente lesivos em searas cíveis, consumeristas e laborais.

A crítica que é feita a partir desse fenômeno é em cima de uma suposta banalização

dos danos extrapatrimoniais, com a ampliação das possibilidades de lesões reparáveis por

indenização, o que beneficiaria pessoas com valores monetários em troca de situações comuns

do cotidiano.

Da mesma forma ocorre à respeito das relações empregatícias, haja vista que na

Justiça do Trabalho também há críticas ao aumento na quantidade de demandas de

empregados pleiteando reparação por danos extrapatrimoniais sofridos em decorrência do

vínculo de emprego.

Posto isso, parece interessante que se utilize de uma ferramenta característica da

economia, a eficiência, para analisar a quantificação das indenizações por danos pessoais no

Brasil e suas consequências. Em que pese ter-se em mente que uma decisão eficiente não é

necessariamente a melhor68

, essa análise demonstra se os valores estipulados têm potencial

para cumprir todas as funções que a ela são atribuídas.

Por ser característica da economia, a eficiência é, em breve síntese, a busca da

utilização da menor quantidade de recursos possíveis para se atingir o melhor resultado

desejado, por meio da análise do custo-benefício em cada escolha ou atitude a ser tomada,

baseada no ponto de vista de Kaldor-Hicks.

Partindo da premissa de que o direito, tal qual a economia, é utilizado no modelo em

que as pessoas reagem a estímulos para produzirem seus comportamentos, pode-se atribuir à

legislação e às decisões judiciais o papel de estimulantes sociais, através das quais os sujeitos

tomarão decisões sobre que atitudes tomar. Desse modo, analisar-se-á a estipulação de valores

pelo Tribunal Superior do Trabalho para condenações em dano existencial, a fim de responder

ao questionamento se tais decisões possuem potencial para diminuir a prática de tal conduta

lesiva e tornar a relação empregatícia em algo condizente com as ideias de trabalho decente.

68

DEL MASSO, Fabiano. Direito econômico esquematizado. Editora Método. São Paulo, 2011. p. 240.

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51

A primeira decisão judicial a ser analisada é a prolatada pelo Tribunal Superior do

Trabalho69

, na qual uma rede de supermercados foi condenada ao pagamento de R$ 8,5 mil

em indenização pela imposição de jornada exaustiva ao empregado postulante, com cerca de

treze horas e trinta minutos diariamente em seis dias na semana, além do labor em dois

domingos por mês, durante todo o período de vínculo.

A questão que se apresenta é se o valor arbitrado para condenação da empresa que deu

causa ao surgimento do dano existencial na vida do empregado é suficiente para produzir os

efeitos reparatório, punitivo e pedagógico. Será que essa quantia efetivamente compensa todo

o prejuízo à vida de relação e aos projetos de vida da vítima? Aparentemente, não.

É necessário ponderar o tempo pelo qual o empregado foi submetido ao excesso de

jornada, considerando que eram ultrapassados os limites normativos estabelecidos para

trabalho em horas extraordinárias. No caso analisado, foram durante três anos que ocorreram

as jornadas excessivas, que faziam com que o indivíduo lesado vivesse para trabalhar, já que

em mais da metade das horas de um dia ele estava à disposição de seu empregador.

Já a segunda decisão, é a que o TST70

condenou uma associação do Mato Grosso a

pagar indenização no valor de vinte e cinco mil reais a uma economista que trabalhou durante

nove anos sem o gozo de férias, sob o fundamento de que a conduta lesiva da empregadora

teria causado dano existencial à vítima.

Em que pese ter sido o valor atribuído maior que o da decisão anteriormente

mencionada, ainda parece não atingir plenamente os objetivos atinentes à tutela indenizatória

dos danos extrapatrimoniais.

O prejuízo causado à trabalhadora pela não concessão de férias durante nove anos,

especificamente em sua vida de relação e nos projetos de vida que ela eventualmente tinha e

foi compelida a modificar ou abandonar, não é devidamente compensado pela quantia

descrita, assim como não há efetiva punibilidade do agente ofensor e, da mesma forma, o fim

69

BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. AIRR n. 2125-29.2010.5.04.0203. WMS Supermercados do Brasil

Ltda. e Cristiano Câmara de Oliveira. Relator: Desembargador José Roberto Freire Pimenta. 02 de outubro de

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ublicacao=DEJT&query=NEAR((%20dano,%20existencial),%20100)>. Acesso em 05 de outubro de 2014.

70

BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Recurso de Revista n.º 727-76.2011.5.24.0002. CASSEMS e

Margaret Flores Nunes Viana. Relator: Ministro Hugo Carlos Scheuermann. 06 de setembro de 2013. Disponível

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outubro de 2014.

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52

pedagógico da condenação se esvai em razão da ínfima repercussão sobre o patrimônio do

empregador.

As condutas que deram causa ao surgimento do dano existencial nos casos citados

certamente gerou lucro à empresa, que explorou a mão de obra dos empregados de forma a

gerar uma diminuição em sua esfera de dignidade. Ainda, é possível que a empregadora tenha

ciência da porção de lucro que se aufere da jornada exaustiva imposta à obreira, bem como do

quanto, em média, é produzido por cada trabalhador.

Depreende-se que os valores recebidos em função da exploração danosa da

empregada são, pois, fruto de uma lesão injusta e, portanto, devem ser calculados e

posteriormente acrescentados ao quantum indenizatório, de modo a cumprir as funções

punitiva e pedagógica, além de influenciar a empresa condenada e todas as outras a

empreenderem esforços para que sejam minimizadas as possibilidades de novos danos, já que

teria um custo elevado.

Assim, além dos valores para compensação financeira do dano, o ideal é que se busque

os valores aproximados que foram auferidos pela produção do empregado em situação de

dano. Dessa maneira, os empregadores passariam a temer as condenações que lhes seriam

impostas pelo órgão judicante e, caso não tornem o ambiente de trabalho em local em que se

preza pela proteção à dignidade humana, os valores das indenizações a serem pagas poderia

ter um forte impacto nas finanças empresariais.

Acerca da função sancionatória da indenização pelos danos pessoais, há uma corrente

no direito brasileiro, da qual faz parte Antônio Jeová Santos71

, que defende uma espécie de

sanção exemplar, a exemplo do que ocorre, por exemplo, nos Estados Unidos, onde além da

quantia fixada a título de reparação do dano, há outra, cumulada, chamada de punitive ou

exemplary damages, cujo objetivo é punir o ofensor para que ele não repita o ato e, a um só

tempo, dissuadir a sociedade da idéia de agir de forma semelhante.

Em pesquisa jurisprudencial, Puschel et al72

analisou, dentre outros pontos, os valores

das indenizações por danos extrapatrimoniais, na qual consta que 57% das decisões de

Tribunais Regionais do Trabalho analisadas não ultrapassam vinte e cinco mil reais, relativos

a diversas causas de pedir. Desse dado, pode-se inferir que, em grande monta, as decisões

sobre danos extrapatrimoniais no Brasil geralmente possuem atribuições de valores

71

Medeiros Neto, Xisto Tiago de. Op. cit. p. 101. 72

PÜSCHEL, F. P., Correa, A. R., Salama, B. M., Rodriguez, J. R., & Hirata, A. (2011). A quantificação do

dano moral no Brasil: justiça, segurança e eficiência. Série Pensando o Direito, 37, 1-75.

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53

relativamente baixos, ainda mais quando se nota, na mesma pesquisa, que apenas 10% das

condenações alcançam valores acima de cinquenta mil reais.

Um motivo bastante utilizado para fundamentar a aplicação ou a diminuição em sede

de recurso das quantias estipuladas pelo juízo de primeiro grau para indenização das vítimas é

a da vedação ao enriquecimento sem causa, insculpida no artigo 884 do Código Civil. Em

face dessa norma, não pode a vítima receber indenização superior à abrangência do dano

sofrido, tal como se utiliza esse argumento.

Por outro lado, as quantias baixas nas condenações de danos extrapatrimoniais e,

especialmente de dano existencial nas relações de emprego, tendem, tal qual se entende na

teoria dos jogos utilizada na economia, a influenciar no comportamento dos players dessa

relação jurídica empregatícia. Por valores considerados baixos, já que se fala aqui de

empresas, essas pessoas jurídicas não experimentam da função punitiva de maneira eficaz,

vindo a prejudicar sobremaneira a consecução da função pedagógica, o que, na prática,

significa a manutenção de uma relação de emprego potencialmente lesiva ao elo mais fraco.

Portanto, a ideia de que haveria uma indústria do dano moral, na qual as pessoas

ajuízam demandas reparatórias com o intuito de locupletar-se indevidamente, não condiz com

o resultado da pesquisa descrita acima. Pelo contrário, a justificativa para a existência de

tantos processos envolvendo discussões sobre danos extrapatrimoniais e, desde 2012, também

de dano existencial, parece estar mais ligada à baixa punibilidade dos agentes causadores.

Ao receberem condenações em valores baixos, sem que se atente para o quanto se

conseguiu de lucro em cima da causa provocadora do dano, as empresas podem, inclusive,

adicionar tais quantias em planilhas de custos, a fim de analisar se é mais viável

economicamente prevenir ou impedir a ocorrência do dano ou simplesmente aguardar uma

condenação dentro dos valores médios estabelecidos em decisões judiciais. Desse dano,

podem advir consequências nocivas duradouras ou permanentes, com efeitos que podem

afetar a dignidade humana e a esfera existencial do indivíduo, refletindo em sua vida de forma

prejudicial ao que foi designado por ele mesmo como ideal.

Nesse sentido, o juiz, ao valorar o caso concreto, deve sopesar a punição a ser dada ao

ofensor, de um lado, e a compensação oferecida à vítima, de outro, baseado em critérios de

razoabilidade. Impõe-se, pois, que o magistrado, na fixação do quantum reparatório, não

atribua valor excessivamente baixo, já que, agindo assim, além de possivelmente reforçar o

dano já causado ao ofendido, pode estimular a prática da conduta lesiva por parte do agente

causador, bem como de terceiros.

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54

Assim como ocorre no direito estadunidense, em que vigora o exemplary damages, no

qual o agente lesivo, para fins punitivos e pedagógicos, recebe um aumento na indenização a

ser paga, poderia tal prática ser implantada no Brasil, respeitadas as diferenças existentes

entre os países e seus respectivos sistemas jurisdicionais, de forma que houvesse uma espécie

de punição significativa para sujeitos que sejam reiteradamente causadores de danos

existenciais relacionados ao liame empregatício.

O que está em foco aqui é mais que a indenização a ser recebida pela pessoa que tenha

sofrido o dano existencial, mas a sua segurança, incolumidade física e psíquica e, enfim, sua

vida, consubstanciada nos projetos que elaborou livremente, nas relações sociais que mantém

e nas atividades realizadoras que desempenha.

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55

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho estruturou-se, inicialmente, com uma exposição acerca da relação

de emprego, com um breve resumo sobre seu desenvolvimento histórico ao tratar das

características que a marcam, especialmente no que se refere ao poder diretivo do empregador

e sua adequação à coexistência com o princípio da proteção. Como se tem ciência, o ambiente

de trabalho, desde quando se passou a tratar de relação de emprego, a partir da Revolução

Industrial, é propício para a ocorrência de danos pessoais.

Foi posta em destaque a dificuldade de se definir limites para a abrangência desses

importantes pontos do liame empregatício, mas que a medida a ser usada como parâmetro é a

dignidade humana, insculpida como fundamento da República na Constituição Federal de

1988. Ao citar situações de ofensa à dignidade humana perpetradas no contexto da relação

empregatícia, nota-se mais uma afronta ao texto constitucional, o qual prevê em seu artigo

170 a valorização do trabalho humano como fundamento da ordem econômica.

Utilizando-se da ideia kantiana de que as pessoas se diferem dos objetos por

possuírem dignidade, seu reflexo nas relações de emprego é a busca histórica da não

coisificação do homem em seu trabalho, ou seja, da não exploração indigna da força de

trabalho humana.

Nesse sentido, em formulação da Organização Internacional do Trabalho no final do

século XX, surgiu a ideia da promoção do trabalho decente, que seria o labor em condições de

liberdade, segurança e com capacidade para prover ao trabalhador uma existência digna.

Assim, estaria ele inserido dentro do que se entende por trabalho decente, com respeito à

dignidade do trabalhador, na esfera de sua existência.

Daí implicaria a responsabilidade vinculada ao empregador de fornecer condições

dignas aos seus empregados, não somente com relação ao ambiente de labor, mas também à

vida que eles levam fora da empresa. A interferência das obrigações profissionais na vida

pessoal de um indivíduo não pode tomar proporções que venham a causar danos e eventuais

efeitos negativos que podem ter caráter permanente e afetar de modo negativo o desenrolar

próprio do indivíduo.

Como descrito alhures, a dimensão existencial do ser humano é dividida

metodologicamente em projeto de vida e vida de relação. As situações de dano existencial

afetam prejudicialmente essas projeções do indivíduo, importando na frustração de um plano

de vida, consubstanciado nas atividades que se tem prazer em praticar, chamadas de

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realizadoras, ou impedindo a realização pessoal construída com base nos critérios de

razoabilidade.

Além disso, podem interferir negativamente nas relações sociais, impondo a quebra de

determinada relação sem a voluntariedade da parte, que, por sua vez, acaba impedida de

mantê-la por motivos que lhe são impostos.

Diferencia-se do dano moral stricto sensu na medida em que esse último atinge o ser

humano em seu âmbito interior, causando-lhe dor, angústia ou humilhação, ao passo que o

dano existencial ataca a esfera exterior do indivíduo, gerando prejuízo à sua vida externa, nas

relações prejudicadas, nos projetos forçadamente abortados ou nas atividades realizadoras que

deixam de fazer parte da rotina da vítima. Mas não só por isso.

Outra diferenciação que é feita entre as duas espécies de danos extrapatrimoniais

acima citadas é com relação ao tempo que é necessário para que a vítima sinta os efeitos do

dano a ela causado. No dano moral puro, em regra, a ofensa é sentida quase que

imediatamente após a consecução da conduta lesiva, enquanto que o dano à existência só pode

ser percebido com o passar do tempo, já que se caracteriza pela alteração no standard de

atividades praticadas ou de relações sociais mantidas, bem como no projeto de vida elaborado

pela pessoa atingida.

Posterior à caracterização e conceituação do instituto, foram elencadas situações de

relação empregatícia carreadas de potencial considerado alto para causar dano existencial aos

empregados, como a imposição de jornada excessiva, sem a concessão dos descansos

legalmente previstos ao trabalhador, quais sejam intrajornada, interjornada e o descanso

semanal remunerado.

Igualmente, a não concessão de férias e a ocorrência de doença profissional como a

LER/DORT, que causa limitações à execução de determinadas atividades profissionais e

pessoais, a depender de sua intensidade, além dos assédios moral e sexual e o trabalho em

condições degradantes, a exemplo de trabalhadores em condição análoga à de escravo e da

exploração do trabalho infantil.

No tópico final, foi abordada a questão da reparação, em que foi feita uma análise do

atual modelo reparatório dos danos extrapatrimoniais, com forte apego à indenização, até hoje

considerada a melhor forma de se compensar a vítima de forma mais satisfatória possível. No

tocante especificamente ao dano existencial, é imprescindível a aferição da razoabilidade do

projeto de vida para que seja conferida indenização correspondente, bem como o alcance do

dano, para que se saiba haver tido ou não interferência negativa na vida de relação.

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Por fim, passou-se a analisar a eficiência das decisões sobre dano existencial, tomando

por base dois acórdãos do Tribunal Superior do Trabalho, que abordavam a imposição de

jornada excessiva e a não concessão de férias, respectivamente. Quanto ao primeiro tema, a

condenação se deu no valor de oito mil e quinhentos reais, pelo cumprimento de jornada

superior a treze horas diárias durante três anos de vínculo de emprego, caso em que se chegou

à conclusão de que não havia, nesse decisum, o preenchimento da função punitiva e/ou

pedagógica, servindo como uma espécie de estímulo indireto à atividade ilícita protagonizada

pela empresa.

Já na segunda decisão analisada, o TST condenou a empresa ao pagamento de

indenização no valor de trinta mil reais pela não concessão de férias à empregada durante

nove anos, na qual se chegou à conclusão de que, mesmo em quantia superior à vista no caso

anterior, não compensa todos os prejuízos externos da vida da trabalhadora, que teve sua vida

de relação comprometida de forma grave.

Posto isso, conclui-se o presente trabalho sobre a análise dessa espécie de dano pessoal

relativamente recente no Brasil, com a consciência de que o tema deve ser mais explorado

pela doutrina, já que há um aumento no número de demandas judiciais pleiteando indenização

pela ocorrência de dano existencial, especialmente na seara trabalhista. Ao fazê-lo, é

necessário que se volte o olhar para o ser humano, sob a ótica de sua dignidade,

ultrapassando, com isso, questões meramente patrimoniais e econômicas, e chegando à tutela

do homem naquilo que há em si como essência, a sua própria existência.

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