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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE EDUCAÇÃO CURSO DE PEDAGOGIA CARLOS ALBERTO CHAGAS GOMES HISTÓRIAS EM QUADRINHOS EM SALA DE AULA: A CONSTRUÇÃO DE SABERES ATRAVÉS DE ADAPTAÇÕES LITERÁRIAS NATAL - RN 2016

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Page 1: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE ... · com que eu nunca deixe de sonhar. Aos grandes especialistas em quadrinhos Paulo Rodrigues Cosme, Douglas Coelho, Alexandre

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE EDUCAÇÃO

CURSO DE PEDAGOGIA

CARLOS ALBERTO CHAGAS GOMES

HISTÓRIAS EM QUADRINHOS EM SALA DE AULA: A CONSTRUÇÃO DE

SABERES ATRAVÉS DE ADAPTAÇÕES LITERÁRIAS

NATAL - RN

2016

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CARLOS ALBERTO CHAGAS GOMES

QUADRINHOS NA EDUCAÇÃO: A CONSTRUÇÃO DE SABERES E ATITUDES ATRAVÉS DE ADAPTAÇÕES LITERÁRIAS NA ESCOLA.

Trabalho de Conclusão de Curso

apresentado a Universidade Federal

como parte das exigências para a

conclusão do curso de Pedagogia.

Orientador: Prof. Dr. João Tadeu Weck

NATAL - RN

2016

Page 3: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE ... · com que eu nunca deixe de sonhar. Aos grandes especialistas em quadrinhos Paulo Rodrigues Cosme, Douglas Coelho, Alexandre

QUADRINHOS NA EDUCAÇÃO: A CONSTRUÇÃO DE SABERES E ATITUDES

ATRAVÉS DE ADAPTAÇÕES LITERÁRIAS NA ESCOLA.

CARLOS ALBERTO CHAGAS GOMES

Trabalho de Conclusão de Curso

apresentado a Universidade Federal

como parte das exigências para a

conclusão do curso de Pedagogia.

Natal, _______/________/_________

BANCA EXAMINADORA

_________________________________________________

Orientador: Prof. Dr. João Tadeu Weck

___________________________________________________

Prof. Dr. João Maria Valença de Andrade

_________________________________________________

Prof. Me. José Edmilson Felipe da Silva

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DEDICATÓRIA

A minha amada avó Aldair das

Chagas Lobato, a qual não pude

visitar tanto o quanto deveria em

seus últimos momentos no hospital,

por estar ocupado demais com os

assuntos da faculdade. Agora você é

uma só com o universo e teu sorriso

está vivo para sempre nas minhas

lembranças.

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AGRADECIMENTOS

A amada Pérola Soares Combes pelo apoio desde o começo desse processo

e pela paciência comigo no final dele, muito da responsabilidade de eu ter chegado

até aqui é sua.

Aos meus professores da Universidade Federal, em especial a Walter

Pinheiro, João Valença, João Tadeu e Moises Sobrinho, pelas maravilhosas

experiências em sala de aula e pelos ensinamentos para além do conteúdo

ministrado, vocês fizeram da minha formação profissional uma formação para a vida.

Aos meus pais, José Raimundo Gomes Neto e Cecilia Paula Chagas Lobato e

minhas irmãs Camila, Carla e Reese, pela criação, amor, carinho e apoio em todos

os momentos, por confiarem em mim e por sempre estarem lá quando eu precisei.

Ao meu excelentíssimo orientador João Tadeu Weck, por me ajudar na

escolha do tema, pelo coleguismo e parceria na orientação deste trabalho, pelas

conversas descontraídas e por fazer da produção desta pesquisa muito mais

prazerosa do que jamais poderia ser.

Em especial aos queridos amigos Paulo Rodrigues Cosme, Gustavo Laires e

Pedro Tolipan pela contribuição com esse trabalho e pelas conversas

engrandecedoras, que com certeza continuarão.

Aos jogadores da minha mesa de RPG, Pérola Soares, Antônio Junior, Jalves

Medeiros, Arthur Francisco, Gustavo Laires e os que por ela já passaram, que fazem

com que eu nunca deixe de sonhar.

Aos grandes especialistas em quadrinhos Paulo Rodrigues Cosme, Douglas

Coelho, Alexandre Callari, Bruno Zaggo e Daniel Lopes, pelos conhecimentos sobre

o tema e por me mostrarem que essa linguagem é muito mais do que ela aparenta

ser.

A toda a equipe do colégio Over, em especial aos professores de linguagens,

que assim como eu, acreditam que tão importante quanto o conteúdo são as

atitudes que os alunos despertam em sala de aula, em relação a leitura, ética e o

mundo que os cerca.

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RESUMO:

Esta pesquisa observou e descreveu uma experiência didática-pedagógica com a

linguagem de quadrinhos em uma instituição da rede privada de ensino no município

de Parnamirim-RN. Tal prática ocorreu na disciplina de Língua Portuguesa a partir

da utilização de adaptações literárias brasileiras em formato de quadrinhos. Assim,

essa pesquisa objetivou Perceber de que forma as HQ vêm sendo utilizadas na

escola. Compreender qual é a relação que os sujeitos escolares estabelecem com

as HQ neste contexto. Identificar as potencialidades que os sujeitos enxergam no

emprego de HQ como ferramenta de ensino-aprendizagem. Para atingir os objetivos,

a abordagem de pesquisa foi de cunho qualitativa e fez uso de elementos da

Pesquisa-Ação e Etnografia e, como instrumentos de coleta de dados foram

utilizadas a observação, entrevistas e aplicação de questionários. Durante a

investigação se constatou que a compreensão de um produto cultural tão complexo

como a História em Quadrinhos exige a identificação de seus elementos

característicos e da maneira como sua narrativa é articulada. Fornecer elementos

para o entendimento desta linguagem é fator essencial para a efetiva utilização em

sala de aula. Na parte final, foram elencados elementos a título de sugestão (e

reflexão) sobre o uso da linguagem de quadrinhos em sala de aula.

Palavras Chave: Histórias em Quadrinhos, Práticas Educativas, Tecnologias da

Informação e Comunicação (TIC).

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RÈSUMÉ:

Cette recherche a observé et décrit une expérience didactique-pédagogique avec le

langage des bandes dessinées dans un établissement d'écoles privées dans la ville

de Parnamirim-RN. Cette pratique a eu lieu dans la discipline de langue portugaise a

partir de l'utilisation des adaptations littéraires brésiliens en format de bande

dessinée. Ainsi, cette recherche visait à identifier les contributions de cette langue à

l'enseignement et l'apprentissage de la littérature brésilienne. Pour atteindre les

objectifs, l'approche de la recherche était de nature qualitative et fait usage

d'éléments de la recherche et de l'Ethnographie action et que les données des

instruments de collecte ont été utilisés observation, des entrevues et des

questionnaires. Au cours de l'enquête, il a été constaté que la compréhension d'un

produit culturel aussi complexe que le bandes dessinée nécessite l'identification de

ses caractéristiques et la façon dont le récit est articulé. Fournir des éléments pour la

compréhension de cette langue est un facteur essentiel pour une utilisation efficace

dans la salle de classe. Dans la dernière partie, ils ont été énumérés éléments par

voie de suggestion (et de réflexion) sur l'utilisation du langage comique dans la salle

de classe.

Mots clés : Bandes Dessinées, Pratiques Éducatives, Tecnologies de l’information e

de la Comunication (TIC)

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ENEM EXAME NACIONAL DO ENSINO MÉDIO

EUA ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA

HQ HISTÓRIAS EM QUADRINHOS

LDB LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL

PCNS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS

PNBE PLANO NACIONAL BIBLIOTECA NA ESCOLA

PPP PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO

TIC TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO

UFRN UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

WEB ABREVIATURA DE WORLD WIDE WEB, EM PORTUGUÊS “REDE”.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ............................................................................................................................... 10

2.1 O uso das TIC na Educação .................................................................................................. 13

2.2 A importância da leitura .......................................................................................................... 16

2.3 História das histórias em quadrinhos .................................................................................... 19

2.3 Elementos da Linguagem dos quadrinhos (Visual e sonora) ........................................... 26

2.4 Quadrinhos na educação ....................................................................................................... 29

2.5 Adaptações em Quadrinhos ................................................................................................... 31

3. QUADRINHOS NA EDUCAÇÃO: DIÁLOGOS EM SALA DE AULA ATRAVÉS DE

ADAPTAÇÕES LITERARIAS ........................................................................................................... 35

3.1 O trilhar metodológico ............................................................................................................. 35

3.2 Caracterização da Instituição ................................................................................................. 37

3.3 A proposta desenvolvida pela instituição ............................................................................. 40

4. ANALIDE DOS RESULTADOS ..................................................................................... 44

4.1 Análise dos dados ................................................................................................................... 44

4.1.1 Análise dos questionários com os alunos ..................................................................... 44

4.1.2 Análise dos questionários dos professores ...................................................................... 56

4.1.3 Análise das entrevistas com os docentes..................................................................... 62

4.2 Análise pedagógica do trabalho realizado ........................................................................... 65

CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................................. 68

REFERÊNCIAS: ................................................................................................................................. 74

ANEXOS .............................................................................................................................................. 77

Anexo 1 - QUESTIONARIO DE PESQUISA (ALUNO) ............................................................ 78

Anexo 2 - QUESTIONARIO DE PESQUISA (PROFESSOR) ................................................. 81

Anexo 3 - ENTREVISTA Professor 1 – João ............................................................................. 84

Anexo 4 - ENTREVISTA Professor 2 – Maria........................................................................... 86

Anexo 5 - ENTREVISTA Professor 3 – Francisca. ................................................................... 87

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1. INTRODUÇÃO

Os séculos XX e XXI estão marcados pelo acelerado desenvolvimento

tecnológico e, em especial das tecnologias ligadas à informação e comunicação.

Algumas tecnologias acabam por se tornar defasadas e inutilizáveis para exercer a

função ao qual elas foram originalmente designadas. Já outras, conseguem resistir

as provações do tempo, às vezes reformulando-se, às vezes sustentando a

necessidade de ser consumida, ou mesmo se encaixando em novos usos e

funcionalidades. Por esses motivos determinadas tecnologias conseguem manter-se

em pleno uso por longos períodos de tempo.

A escola é um tipo desses tipos de tecnologia, ela vêm se perpetuando por um

longo período de tempo, adaptando (se) as necessidades da vida contemporânea e

firmando sua importância na atual organização da sociedade. Como instituição, a

escola durante todo esse período vem suprindo as necessidades educacionais da

sociedade nos âmbitos formativos para a vida em comunidade, o que inclui garantir

os direitos do indivíduo a aprendizagem das habilidades básicas para o exercício de

sua cidadania. Porém, nesse atual contexto onde o aparato tecnológico tem

produzido cenários culturais em que as inovações científicas e tecnológicas surgem

de forma muito acelerada, é exigido que a escola reformule ou adapte suas práticas

para suprir as novas necessidades educacionais impostas por uma sociedade que

delegou as TIC (Tecnologias da Informação e Comunicação) o papel de mediadoras

em diversos processos sociais.

No Brasil, desde meados da década de 30 tiveram início políticas públicas

para inserção e uso de TIC na escola de diversas formas: cinema (criação do

Instituto Nacional de Cinema Educativo – INCE), rádio (criação da Rádio MEC e das

escolas radiofônicas – Rádio MEB), televisão (Projeto SACI) e mais recentemente

computadores (Proinfo, UCA, entre outros).

Para cada nova necessidade educacional que surge e que não é atendida

pela metodologia convencional, um novo uso pode vir a ser atribuído para as TIC na

busca por suprir tais necessidades. A partir do convívio cotidiano que alunos e

professores possuem e das “aprendizagens informais” que ocorrem, as TIC podem

ser utilizadas para fins pedagógicos, as possibilidades são infinitas e variam

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dependendo da ferramenta, da abordagem realizada em sala e das características

do público escolar.

A linguagem de Quadrinhos (HQ) há décadas está presente nas escolas (em

muitas instituições de forma tímida) como ferramenta para o aprendizado dos

alunos. Nos últimos anos, a oferta de materiais paradidáticos em forma de

quadrinhos tem aumentado consideravelmente nos catálogos das editoras e

licenciadoras. Esta linguagem (quadrinhos) já firmou seu lugar no enunciado de

questões de concursos e exames e nos livros didáticos distribuídos por todo país.

Mesmo assim o uso das HQ nas escolas ainda não foi convencionado, elas ainda

são vistas com certa suspeita por parte dos profissionais da educação e dos

familiares dos alunos. Entretanto, na tentativa de estimular o gosto pela leitura nos

alunos, a escola acaba recorrendo as HQ muitas vezes de forma descompromissada

e desnorteada, demonstrando que há uma grande lacuna a ser sanada para que

ocorra a utilização consciente desta linguagem.

Durante minha vivência profissional, percebi um aumento significativo na

presença das Histórias em Quadrinhos nas escolas privadas, seja através dos livros

didáticos, na forma de paradidático, ou até mesmo junto das perguntas, nas

avaliações. Descobri que na atualidade os quadrinhos conseguem se equiparar com

outros tipos de gêneros textuais em uso e presença na escola. Mas diferente de

outros gêneros, os quadrinhos possuem uma particularidade que os tornam mais

relevantes: eles fazem parte do cotidiano dos alunos fora da escola também. Eles

estão presentes na WEB, nos cinemas, nas livrarias, nos smartphones e tablets, nas

rodas de conversas e no imaginário dos alunos, conquistando uma popularidade

superior frente a outros tipos de mídia. Não obstante, suas contribuições para o

desenvolvimento das capacidades de leitura e da escrita dos alunos nos anos

iniciais podem ser extremamente significativas. Durante a fase de alfabetização, os

quadrinhos atendem a necessidade de um referencial visual, já que “a criança

precisa do auxílio da ilustração - que têm uma linguagem direta - facilitando o

entendimento das palavras” (SANDRONI e MACHADO apud AMARILHA, 2012). E

desperta o interesse da criança por possuir uma narrativa, pois “o mundo organizado

em narrativa corresponde a seus interesses e anseios, e por consequente é

significativo para elas (crianças)” (AMARILHA, 2012). Mas com as exigências da

sociedade na atualidade não basta apenas alfabetizar o indivíduo, precisa se

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também que ele desenvolva o gosto pela leitura e interpretação e uso de diversos

tipos de linguagens textuais. E nesse ponto os quadrinhos também podem auxiliar a

criança no desenvolvimento do hábito de leitura:

Hoje sabe-se que leitores de histórias em quadrinhos são também leitores de outros tipos de revistas, de jornais e de livros. Assim, a ampliação da familiaridade com a leitura de histórias em quadrinhos, propiciada por sua aplicação em sala de aula possibilita que muitos estudantes se abram para os benefícios da leitura, encontrando menor dificuldade para concentrar-se nas leituras com finalidade de estudo (VERGUEIRO, 2008).

Além deste aspecto, os quadrinhos também contribuem no desenvolvimento

do vocabulário do seu leitor, expandindo significativamente o repertório de palavras

das crianças:

As histórias em quadrinho são escritas em linguagem de fácil entendimento, com muitas expressões que fazem parte do cotidiano dos leitores; ao mesmo tempo, na medida em que tratam de assuntos variados, introduzem sempre palavras novas para os estudantes, cujo vocabulário vai se ampliando quase que de forma despercebida por eles (VERGUEIRO, 2008).

Nessa pesquisa pude acompanhar o decorrer do trabalho pedagógico

realizado em na escola privada (Over), na cidade de Parnamirim (RN), nas turmas

de 8ª e 9ª ano do Ensino Fundamental no ano letivo de 2016 com HQ. A escola

recorreu ao trabalho com quadrinhos na forma de paradidáticos almejando alcançar

resultados mais satisfatórios na aprendizagem dos alunos nos âmbitos da leitura,

escrita, interpretação textual, comunicação e desenvolvimento de ideias. A

instituição acredita que a metodologia convencional não estava despertando nos

alunos a motivação necessária para desenvolver essas capacidades que, são

fundamentais para um bom desempenho nos exames de seleção para o ensino

superior (foco principal da metodologia aplicada na escola). Esse trabalho não pode

ser entendido desconsiderando o contexto histórico e espacial em que a escola e os

alunos estão inseridos. Faz-se necessário um aprofundamento dessas questões

para que possamos entender as motivações da referida instituição para recorrer ao

trabalho com quadrinhos. Nosso objetivo nesta pesquisa foi Perceber de que forma

as HQ vêm sendo utilizadas na escola. Compreender qual é a relação que os

sujeitos escolares estabelecem com as HQ neste contexto. Identificar as

potencialidades que os sujeitos enxergam no emprego de HQ como ferramenta de

ensino-aprendizagem.

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2. TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO (TIC), A ESCOLA E O

PROCESSO DE LEITURA

2.1 O uso das TIC na Educação

O surgimento e desenvolvimento das sociedades tiveram como um dos seus

pilares processos que envolviam a comunicação. Inicialmente com a emissão de

sons, posteriormente, incorporando mais tarde as representações gráficas (pinturas

rupestres), chegando à escrita que teve sua popularização com a invenção da

prensa de tipos móveis, que provocou uma revolução, modificando contextos e, por

assim dizer, ampliando o mundo. Mas, é a partir do período compreendido entre os

séculos XIX e XX com o surgimento e desenvolvimento de vários meios técnicos de

comunicação (telefone, rádio, cinema, televisão), a mensagens foram se

multiplicando de forma crescente, chegando aos dias atuais a determinar escolhas e

principalmente inventar e reinventar cenários e paisagens culturais.

Tais meios, hoje conhecidos como TIC, encontram-se disseminados por toda

sociedade. Tais tecnologias, historicamente nunca foram tão utilizadas como no

momento atual. Com a intensa proliferação na última década, provocadas pelas

possibilidades que o mundo digital permite, tais meios passaram a ocupar espaço na

vida social e individual das pessoas e por elas são consideradas fundamentais

(notebooks, tablets e smartphones são exemplos disso). Difundem-se e são

fortemente consumidas, atendendo/criando uma lógica própria de produção e

consumo no mercado pela sociedade como um todo. “A miniaturização e a baixa dos

custos possibilitaram uma difusão de massa das TIC, que redundou em larga

penetração na vida cotidiana tanto no mundo do trabalho quanto na esfera do lazer”

(MERCIER et al. apud BELLONI, 2009, p. 20).

No quesito comunicação, tais tecnologias nos possibilitam estar em constante

interação com diferentes grupos, isto é, receber e passar informações/mensagens

por meio de aparelhos, como computadores, aparelhos de telefone celular entre

outros. Deste modo, as TIC atingem em escala global todas as esferas da nossa

sociedade, invadem as casas e a individualidade das pessoas (BELLONI, 2009),

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Sendo assim, somos usuários, consumidores e com a convergência dos

meios para o computador, até mesmo produtores de informações e conhecimentos.

Entretanto, manipular estes recursos requer domínio não somente técnico (ligado ao

manuseio e funcionamento dos equipamentos), mas certos conhecimentos que são

essenciais para vida social, para ingresso no mercado de trabalho formal e até

informal.

Para o mundo do trabalho, as TIC trouxeram significativas mudanças,

exigindo dos profissionais da educação competências e habilidades para atualizar-se

e autodidatismo, ou seja, capacidade de aprender por si. (BELLONI, 2009, p.29).

Deste modo, a utilização dos aparelhos tecnológicos poderá auxiliar o processo de

formação dos educandos, desde que proporcione o pensar do sujeito, não apenas

como consumidores, e que o professor os incorpore tais recursos de forma crítica e

criativa.

Neste cenário, a instituição “escola” foi atingida duplamente. De forma direta,

a partir das políticas e projetos para uso e inserção de diferentes TIC, como: TV

Escola, PROINFO, Vídeo Escola, Instituto Nacional de Cinema Educativo. E indireta,

gerada pelas influências e referências que alunos, professores, gestores e demais

funcionários trazem para dentro dos muros da escola.

Considerando isto, temos na escola a melhor oportunidade que o sujeito pode vir a

ter de se apropriar desses saberes de maneira plena e otimizada. Pois, é

responsabilidade da escola munir o sujeito dos conhecimentos necessários para que

ele faça o uso correto das tecnologias atentando as suas necessidades sociais e o

seu direito constitucional de manifestar o pensamento, criar, se expressar e se

informar sob qualquer forma, processo ou veículo que queira como disposto no Art.

220 da constituição brasileira (BRASIL, 2012, p. 126). Diante dessa conjuntura, a

escola precisou se adaptar a essa nova dinâmica imposta pelo mundo globalizado e

por uma sociedade usuária e dependente das TIC.

Conforme acima descrito, a escola de uma forma ou de outra já incorporou as

TIC em seu interior, resta saber de que forma elas devem ser trabalhadas

considerando tudo o que já foi exposto sobre o papel que tais tecnologias exercem

na atualidade. De acordo com BELLONI (2009, pg.11) a integração das TIC à

educação formal só faz pleno sentido se realizada em sua dupla dimensão: como

ferramentas pedagógicas e como objeto de estudo. As ferramentas tecnológicas da

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informação e comunicação vêm demostrando ao longo dos anos um grande

potencial como ferramenta pedagógica. Ao realizar leituras sobre o estado da arte,

pode-se comprovar a existência de muitas pesquisas que investigaram e

comprovaram as diversas contribuições que o uso destas pode trazer para a

educação.

Para que se possa atingir bons resultados, compete ao professor

compreender (sociologicamente falando) a era das tecnologias, o que pressupõem

conhecê-las e sobressair o tecnicismo e deslumbramento, para que não sejamos

meros usuários, mas sim, conhecedores de cada tecnologia utilizada, e das

influências que estas têm sobre a vida cotidiana de cada sujeito.

Diante destes desafios acerca das habilidades requeridas para o uso das TIC,

especialmente em sala de aula, torna-se necessário possibilitar meios para a

aquisição dessas capacidades. Sendo assim, “é fundamental reconhecer a

importância das TIC e a urgência de criar conhecimentos e mecanismos que

possibilitem sua integração à educação” (BELLONI, 2009, p. 24).

É importante também que se desenvolva na escola o ato de se pesquisar e

estudar sobre o uso das TIC, com a finalidade de que o aluno seja capaz de

compreender como tais tecnologias vêm sendo utilizadas no seu entorno e quais são

as suas possibilidades. Desta forma, o aluno estará preparado para fazer um bom

manuseio das TIC na escola e no seu cotidiano.

Somente uma abordagem integradora que considere ao mesmo tempo

estas duas dimensões (instrumental e conceitual; ética e estética) poderá

dar conta da complexidade do problema e propiciar uma apropriação ativa e

criativa destas tecnologias pelo aluno e pelo professor (JACQUINOT apud

BELLONI, 2009, p. 12).

Mas afinal, porque trabalhar as TIC na escola é um processo que necessita

de constantes reflexões? Devemos assinalar que nenhum trabalho convencional

realizado na escola se justifica sem um planejamento, e no trabalho com as TIC não

poderia ser diferente. Se o professor não possuir o discernimento concreto de como

utilizar as ferramentas tecnológicas e as finalidades que ele almeja atingir, ou se o

aluno não possuir os saberes prévios que um trabalho mediado por tecnologias

exige as atividades realizadas com o auxílio das TIC não resultarão em

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conhecimentos significativos, além de despertar frustração por parte dos envolvidos

no processo e até mesmo pode até vir a atrapalhar a aprendizagem dos alunos.

Inovar nas metodologias de ensino não é tarefa fácil. A incorporação de outras

linguagens presentes dia-a-dia de docentes e discentes em sala de aula e buscar

romper com tradições enraizadas e receios acerca do que é novo, mas não tão novo

assim, é uma árdua tarefa.

Segundo Pretto (1996):

Um significativo passo nessa direção é considerar, no cotidiano da sua formação, as questões da comunicação, da informação e das imagens, com o objetivo de tornar os novos profissionais preparados para vivenciar os desafios do mundo que se está construindo. Naturalmente, se estamos pensando numa escola na qual a cultura audiovisiva seja uma presença, o professor, principal personagem desse processo, precisa estar preparado para trabalhar com essa cultura. Uma cultura que está intimamente relacionada com as mídias e, por isso, exige e determina uma nova linguagem (PRETTO, 1996, p. 118).

Em nosso estudo, buscou-se observar e analisar o uso de adaptações em

quadrinhos de duas grandes obras da literatura brasileira, “O Quinze”, de Rachel de

Queiroz, e “Dom Casmurro”, de Machado de Assis. Para que o leitor consiga

absorver toda a complexidade dessas duas obras literárias ele terá de ter uma

bagagem de conhecimentos significativos sobre a linguagem de quadrinhos como,

por exemplo: linguagem verbal e não verbal, disposição iconográfica,

enquadramento, onomatopeia, balões de fala, além de conhecimento de base

histórica, geográfica e linguísticas.

Para inserir diferentes linguagens em sala de aula na perspectiva de atender

as necessidades dos alunos e do mundo contemporâneo é necessário que o

professor transponha o patamar de mero usuário/espectador da tecnologia, mas que

ele a entenda em sua complexidade, e a sua importância no atual contexto histórico

em que a sociedade se encontra.

2.2 A importância da leitura

A prática da leitura é um dos processos onde, bem explorados, podemos

chegar a um excelente resultado no rendimento como um todo. Para Cagliari

(1999), no espaço escolar, a atividade mais importante que serve de apoio para as

demais desenvolvidas é a leitura pelo fato da ligação da mesma com tudo que é

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ensinado para o rendimento do cognitivo e, também, o caminho mais rápido para

obter conhecimento.

Segundo Solé (1998), o processo que envolve o desenvolvimento da leitura

envolve a linguagem em sua totalidade, como o falar, o ouvir, o sentir, o escutar e

o escrever, pois a criança vivencia em seu cotidiano todas essas linguagens que

elencarão seu aprendizado convencional da leitura.

O livro, não importa a qual gênero textual ele pertença, tem sempre a intenção de

nos tornar conscientes de algo. Enquanto textos de caráter informativo ou

científicos, por exemplo, se atêm a fatos particulares, os literários são mais

abrangentes em seu conteúdo e, dessa forma, possibilitam maior alcance de

interpretação.

É conhecido que a literatura tenha caráter polissêmico e, assim sendo,

proporciona ao leitor liberdade de representações do texto lido. Dessa forma, o

texto literário consegue proporcionar prazer ao que se lê, pois pode levar o leitor a

pensar e/ou repensar suas vivências da forma que lhe for mais conveniente, sem

sentir-se obrigado a ter uma opinião pré-determinada sobre o conteúdo lido. Em

termos de aprendizagem, ler não se limita, apenas, a construção conceitual. A

fruição/compreensão do texto recebe influência, não apenas, cognitiva, mas

também emotiva e volitiva inerente a cada indivíduo.

Ler proporciona experiências que não fazem parte da realidade do leitor e,

dessa forma, refle acerca dos mais variados temas sem precisar,

necessariamente, vivenciar tais situações. A interação que a literatura de um texto

literário proporciona (entre leitor e escritor) dá-se através da mediação da

linguagem escrita e/ou falada que permite trocas comunicativas entre os mais

variados grupos sociais.

Para trabalhar com textos, a escola precisa unir seu conteúdo à realidade

do aluno e sua cultura, pois se não o faz, corre o risco de o estudante não

absorver o assunto, estudo e não se reconhecer no mesmo. Mesmo em textos

cujo tema seja inédito para o aprendiz, há a necessidade de fazer uma referência

a conhecimentos que ele já possui. Para preparar alguém para se tornar um leitor

requer, não unicamente, o estímulo visual-motor, é necessário que haja uma

constante alusão às vivências do estudante.

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Conforme assinalado anteriormente, o fato de possuir caráter polissêmico,

faz com que a literatura não pode ser mediada de forma impositiva e com a única

intenção de informar. Também, seria inapropriado ater-se, tão somente, a um ou

alguns dos diversos sentidos e funções literárias.

Um esclarecimento acerca de tipos ou períodos literários poderá servir

somente para que os alunos se tornem conscientes e capazes de identificá-los.

Entretanto, a princípio, a preocupação maior é de fazer com que o aluno tenha

contato com as mais diversas obras, para que ele possa, então, formalizar os

conhecimentos acerca da diversidade existente na literatura.

De acordo com os estudos de Bordini e Aguiar (1993), o trabalho com

leituras deve, no Ensino Fundamental, enfatizar o trabalho com a multiplicidade

literária, ou seja, que o estudante tenha contato com uma grande quantidade e

variedade de textos literários, constituindo um acervo de leituras, sem preocupar-

se com classificações. Essa fase é essencial para que a criança tome gosto pela

leitura e faça dela um hábito. Somente, no Ensino Médio, considera-se coerente

que ocorra a sistematização teórica do conhecimento literário, mas que seja

introduzida em conjunto com a leitura de textos.

Além desta sistematização do trabalho com a literatura em sala de aula, faz-

se necessário que se tenha um conjunto de elementos que favoreçam o

desenvolvimento da atividade para a sua eficácia. Uma biblioteca bem estruturada,

equipada e preparada por bibliotecários é de suma importância para o

desenvolvimento da escola, pois atende as necessidades e estratégias de leitura,

professores leitores bem fundamentados metodológica e teoricamente, elaboração

de atividades que valorizem a literatura, além de uma relação democrática e

simétrica entre professor e aluno.

A responsabilidade maior de formar leitores é da escola, cabendo ao

professor a elaboração de estratégias para fazer com que o aluno sinta-se

motivado e torne o ato da leitura prazeroso.

Para que se assegure a continuidade do comprometimento positivo em

relação ao livro, é preciso que o hábito não seja apenas como um padrão

rotineiro de resposta, automaticamente provocado e realizado. A busca

frequente da literatura precisa surgir de uma atitude consciente, da

disposição de enfrentar o desafio que o texto oferece como nova

alternativa existencial. (BORDINI & AGUIAR, 1993, p. 18).

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19

Não é tarefa fácil formar leitores, exige uma série de estímulos, atividades

que devem ser trabalhadas incessantemente. É imprescindível que se acabe com a

ideia de que todo o desenvolvimento intelectual da criança deve ocorrer

exclusivamente em ambiente escolar.

O docente precisa ter conhecimento do nível de leitura dos alunos, tem que

considerar sua faixa etária, sua realidade socioeconômica, para então poder

escolher livros, textos adequados para os estudantes. Ser um leitor é também

importantíssimo para que o professor consiga desempenhar bem suas estratégias

de leitura com os alunos, pois se não o for, correrá o risco de desenvolver atividades

falhas, tendo em vista que as fará sem o devido entusiasmo e dedicação que lhes

são necessárias.

Especialmente nos dias de hoje, tendo “concorrência” com as facilidades e

o imediatismo das tecnologias digitais, formar leitores de literatura é uma tarefa

árdua. Por essa razão, faz-se necessário a junção do bom e velho livro com os

meios de comunicação mais avançados, usando estes como mecanismo de auxílio

para o estímulo à leitura da literatura.

2.3 História das histórias em quadrinhos

As histórias em quadrinhos ou Gibis (como são conhecidas aqui no Brasil as

revistas que as publicam), são uma forma de linguagem de grande complexidade

que pode ser definida como “Arte sequencial” (EISNER, 1985, p.11) ou como

“imagens pictóricas e outras justapostas em sequência deliberada destinadas a

transmitir informações e/ou produzir uma resposta no espectador” (MCCLOUD,

2005, p.9). Sua atual estrutura vem se desenvolvendo desde o século XIX com as

histórias percussoras dos quadrinhos: Histoires em Estampes (1846), de Rodolphe

Töpffer, na Suiça; Max und Moritz (1856), de Wilhelm Busch, na Alemanha; e As

Cobranças (1867) por Ângelo Agostini, no Brasil (ROSA, 2014, p. 40). Mas foi com a

criação do personagem “The Yellow kid”, de Richard Outcault publicado pela

primeira vez esporadicamente na revista Truth durante os anos de 1894 e 1895 e,

com estreia “oficial” no jornal New York World em 17 de fevereiro de 1895, que o

gênero definiu os seus parâmetros e se consolidou. “The Yellow Kid” foi um título de

grande sucesso, consumido por públicos de todas as faixas sociais. Foi o primeiro a

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vincular os recursos dos desenhos em quadros com a presença de balões de fala

para dar voz aos personagens. Seu nome (a criança amarela em tradução literal)

fazia referência à cor das páginas de jornal da época, que eram amareladas.

Mas antes do século XIX, conforme MCCLOUD (2005), podemos entender

que sua origem vem de muito antes do surgimento da imprensa americana.

Podemos perceber a presença dos quadrinhos a partir das pinturas rupestres da Gruta Pech-Merle e Lascaux (30000 a.C.), passando pelos papiros e murais egípcios (3000 a. C.), os vasos e porcelanas grego-romanas (500 a.C.), as tapeçarias de Bayeux (1070), as representações do martírio na Idade Média, indo até as manifestações mais explicitas de histórias em quadrinhos na época moderna na Suíça em 1824 (MOYA, 1977 apud BRAGA JR 2011. Pág. 23).

Através de uma profunda análise publicada em seu livro “Desvendando os

Quadrinhos” (M. Books, 2005) MCCLOUD percebeu que os antigos escritos egípcios

foram a primeira forma de expressão registrada a combinar escrita e desenho para

comunicar mensagens. De acordo com este autor, as inscrições egípcias antigas

assemelhavam-se com os quadrinhos na forma como as informações eram

dispostas, seguindo uma ordem determinada para a criação de uma narrativa.

Outra forma de registro antiga que remete à linguagem dos quadrinhos são as

pinturas rupestres, aonde se pode encontrar os mesmos elementos que hoje são

encontrados nos quadrinhos. Utilizando das ferramentas e das capacidades que

dispunham na época, os povos antigos utilizavam do desenho para se expressar

através de figuras e símbolos, representando aquilo que lhes cercavam e que lhes

despertava interesse.

No início do século XX as histórias em quadrinhos dominavam os jornais

americanos e passaram a ser conhecidas como comics (devido ao teor cômico) de

uma a duas páginas dessas publicações. Eram direcionadas as massas

trabalhadoras, e sua temática principal eram as crianças travessas.

Em 1903 é publicada a primeira tira em quadrinhos, mas esse formato só viria

a se consolidar com a série M. a Mutt (1907) de Budd Ficher (MOYA, 1997, p. 36),

que era publicada diariamente, originando o termo “tira diária” para essa subdivisão

dos quadrinhos. Ainda nos EUA, em 1913 as crianças endiabradas deram lugar aos

temas domésticos com Bringing up father (Pafuncio e Marocas) de George Mc

Manus, dando surgimento as Family strips (MOYA, 1997, p. 41) que consistiam em

histórias que tinham como personagens principais um núcleo familiar lidando com

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seus problemas cotidianos. Esses tipos de histórias foram uma importante válvula de

escape para o povo americano naquela época, já que no país predominava o clima

de tristeza e preocupação instaurado pela primeira Guerra Mundial.

Com a popularização e sucesso desses quadrinhos, vários novos títulos

foram surgindo, em geral sob a forma de suplemento comercializado com as edições

dominicais de diferentes jornais estadunidenses. O êxito foi tal que gerou a criação

de um nicho de mercado. Foram criados os Syndicates, sindicatos organizados com

a finalidade de distribuição dos quadrinhos para outros jornais em âmbito nacional e

internacional.

Com a crise de 1929 os quadrinhos mais uma vez atuam como uma

ferramenta de fuga dos problemas para a população, fazendo surgir diversos

gêneros com roteiro e arte muito superiores aos quadrinhos lançados até então. Em

um pequeno intervalo de tempo, apareceram quadrinhos de aventuras, de ficção

cientifica, fantasia e terror, dando início ao que ficou conhecida como era de ouro

dos quadrinhos. São frutos dessa época Popeye (1928) de Chic Young, Buck

Rogers (1930) por Phil Nowlan e Dick Calvins, a quadrinização de Tarzan (1928) por

Hal Foster, O Fantasma (1939) de Ray Moore, Flash Gordon (1937) de Alex

Raymond e muitos tantos outros personagens que iam desde o espaço sideral até o

coração da floresta africana (ROSA, 2014 p.43). Tal diversidade de gêneros gerou

um público abrangente que as consumia nas edições impressas dos jornais. Esta

mídia foi a responsável por difundir e popularizar a leitura dos quadrinhos entre o

grande público, acabava por limitar a quantidade de quadros que uma história

poderia conter em cada edição.

A grande revolução das comics viria a acontecer em 1938 com a criação do

personagem Superman por Joe Shuster e Jerry Siegel, o primeiro personagem do

gênero de super-heróis, que viria a se tornar um século depois o maior gênero de

histórias em quadrinhos nos EUA. A partir de Superman, surgem outros super-heróis

de igual importância: Batman (1939) por Bob Kane, Namor (1939) por Bill Everet,

Captain America (1941) por Jack Kirby e Joe Simon, Wonder Woman (1941) por

Willian Moulton e H.G.Peter, os primeiros de muitos outros personagens que

figurariam para sempre como ícones da cultura “pop” do século XX.

Com o advento do gênero de super-heróis e a sua grande popularidade, os

quadrinhos finalmente ganham subsídios para sustentar uma mídia própria

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inspirados nos pulps comics, como eram conhecidas as publicações feitas de um

material precário e de baixo custo (ROSA, 2014 p. 44) . O preço acessível e o

advento dos super-heróis popularizou esse tipo de mídia a partir de 1938, fazendo

com que novamente as HQ viessem a ser consumidas em massa pela população. A

popularidade dos quadrinhos cresceu de ano a ano, e em outras partes do mundo

surgem publicações em quadrinhos de igual popularidade as das publicações

americanas, sendo que essas conseguem ser líder de mercado até em terras

estrangeiras.

No Brasil as histórias em quadrinhos percorrem um caminho parecido com o

que aconteceu nos Estados Unidos. De acordo com o documentário “HQ” veiculado

em meados dos anos 90 pela TV Cultura (disponível em

https://www.youtube.com/watch?v=F4pxcbjZ40Q), “A campainha e o cujo” (1837) de

Manoel de Araújo (1806-1879) foi o primeiro quadrinho de que se tem notícia no

Brasil. Mas o pioneirismo no uso da nona arte em terras tupiniquins se deve a

Ângelo Agostini, com a criação de Nhô Quim (1879) e Zé Caipora (1883), ambos

figuram entre as primeiras narrativas quadrinizadas produzidas e publicadas por

aqui.

Em 1905 entra em cena o encarte infantil “O Tico-Tico”, que também foi

desenhada por Agostini e publicada semanalmente no Rio de Janeiro pela

Sociedade o Malho. O referido encarte possuía um cunho educativo e de

entretenimento e trazia além das histórias em quadrinhos, atividades, concursos e

informações que agradavam crianças e adultos. A publicação foi um grande sucesso

comercial e abriu caminho para outras publicações do gênero. São destaques dessa

época: a Gazetinha (1929) criada pelo jornal Paulista a Gazeta, que ficou famosa

com o personagem “Garra Cinzenta”, o Suplemento Infantil (1934) criado por Adolfo

Aizen, uma revista dedicada exclusivamente para as histórias em quadrinhos, O

Globo Juvenil (1937) criado por Roberto Marinho que logo depois cria também a

revista O Gibi (1939). O Gibi fez tanto sucesso que o nome dessa revista se tornou

anos mais tarde, sinônimo de histórias em quadrinhos no país, através do processo

de metonímia.

No Tico-Tico os quadrinhos eram cópias ou adaptações sem autorização de

histórias e personagens publicados em solo americano, com muito pouco conteúdo

original. Com o Suplemento Infantil o mercado passa a se regulamentar, e através

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dos Syndicates, as publicações americanas são importadas para o Brasil e são

publicadas nos principais periódicos de circulação nacional. Também passam por

esse processo, França, Itália, Argentina, Portugal e Espanha. Os principais países

consumidores e produtores de quadrinhos até os dias de hoje, com exceção do

Japão que vivenciou um processo diferente com a produção e o consumo de

histórias em quadrinhos.

Os primeiros estudos acadêmicos sobre os quadrinhos surgem nessa época.

Os europeus se interessam pela popularidade dos quadrinhos e passam a levantar

pesquisas nas áreas de comunicação, artes e educação envolvendo esse tipo de

linguagem. Itália e França são os polos pioneiros no estudo dos fumetti (como são

conhecidas as HQ na Itália) ou bande dessinées (como são conhecidas as HQ na

França):

Enquanto, na França, os estudiosos cuidavam mais do aspecto artístico e estético das bandes dessinées, os italianos viam o aspecto educacional dos fumetti. Ao mesmo tempo, o Instituto de Pedagogia da Universidade de Roma, no Centro de Sociologia de Comunicações de Massa, dirigido pelo Prof. Romano Calisi, chegava a surpreendentes conclusões no estudo dos quadrinhos. (...) cai definitivamente por terra à antiga assertiva gratuita de que os quadrinhos deixavam as crianças preguiçosas mentalmente para, numa reviravolta total, chegar à conclusão exatamente contrária: os quadrinhos despertam uma resposta imediata, fulminante na mentalidade infantil (MOYA (Org.), 1977. Pág. 22).

Apesar desses importantes estudos, os quadrinhos ainda são vistos como

uma leitura pobre e de preguiçosos pela população em geral, principalmente quando

comparada a outros tipos de publicações literárias. Tal preconceito perdurou por

muito tempo e que ainda nos dias atuais, não foi totalmente superado.

O cenário piora em 1954 com a publicação do livro “Seduction of the

Innocent” (Sedução do Inocente) escrito pelo psiquiatra Frederic Wertman, que

alertava os pais e responsáveis sobre os possíveis perigos que a leitura dos

quadrinhos poderia trazer para as crianças. Apesar de o livro não ter sido publicados

internacionalmente, nos EUA os efeitos sobre a indústria de quadrinhos foram tão

catastróficos que ecoaram em várias partes do mundo, gerando consequências para

editoras em diferentes continentes. Em resposta ao livro, editores e publicadoras se

reúnem criando o Comics Code Authority, um selo que deveria vir estampado nas

revistas que cumprissem os requisitos desse código de conduta. O código não era

obrigatório e nem previsto em nenhuma lei, porém, as distribuidoras começaram a

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deixar de distribuir revistas que não estampassem o código em suas capas. Entre as

restrições do código constavam a proibição de: insinuação sexual, imagens

violentas, terror, menção a corrupção, uso de determinados termos, deturpação da

imagem das “instituições centrais da sociedade” (família e igreja), perversidade e

crimes hediondos. Como resultado a qualidade dos roteiros caiu consideravelmente,

as histórias foram infantilizadas, os quadrinhos adultos deixaram de circular, fazendo

com que países europeus deixassem por um tempo de importar quadrinho

americano, focando seu mercado para a produção interna.

Nessa época no Brasil eram vendidos quadrinhos com as mais variadas

temáticas, já que o público leitor tinha uma faixa etária bem variada. Com os reflexos

do que vinha acontecendo nos EUA, em 1961 um grupo de editores das principais

revistas em circulação no Brasil decide criar um código de conduta brasileiro com 18

regras do que poderia ser ou não publicado em quadrinhos por aqui. De acordo com

Waldomiro Vergueiro (2008) foi nesse período que no Brasil, o estigma de literatura

marginal se consolidou de vez e o meio passou a ser alvo de críticas das camadas

ditas pensantes da época. O mercado de quadrinhos nacional fica agitado, com a

proibição imposta sobre os títulos importados, autores nacionais emergem para

satisfazer as necessidades do público que havia ficado órfão das obras de terror e

erotismo americanas.

Foi diante da crise nos Estados Unidos que o meio teve de se reinventar. No

contexto dos movimentos de contra cultura, surge a vertente underground dos

quadrinhos, encabeçada pelo artista Robert Crumb, vendendo seus quadrinhos de

forma clandestina dentro de um carrinho de bebê. Eram publicações caseiras e

politicamente incorretas, mais esteticamente superiores a tudo o que vinha sendo

publicado. A vertente underground atraiu um público diferente para os quadrinhos,

dando novo folego ao mercado. Na Europa ao contrário do que ocorria nos EUA os

quadrinhos continuavam a se desenvolver. Na revista francesa Pilote surge Asterix

(1959) da dupla René Goscinny e Albert Uderzo, série que perdura até os dias de

hoje. De volta aos EUA as duas maiores empresas de quadrinhos americanas,

Marvel e DC comics, que dominavam o mercado de quadrinhos americanos com

suas histórias de super-heróis, mantinham o mercado ativo com suas constantes

reinvenções. Superman e Batmam que fizeram muito sucesso no final dos anos 60

(ROSA, 2014 p 21), voltam, e junto de outros heróis formam a liga da justiça,

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sucesso de vendas. A Marvel através das mentes criativas de Stan Lee e Jacky

Kirby cria “Os Vingadores” em 1963 (ROSA, 2014, p.16), grupo de super-heróis

diferentes para disputar o mercado com DC comics. É graças ao embate dessas

empresas que os leitores americanos finalmente voltam a ter acesso a conteúdo de

melhor qualidade. É neste contexto que surgem super-heróis humanizados, que

flertam com temas atuais e despertam o interesse dos leitores pela história, ciências

e filosofia.

Em 1978 Will Eisner, que colhia os louros do sua série de sucesso The Spirit,

cria o termo Graphic Novel para designar o seu novo trabalho “Um contrato com

Deus”, acreditando que o termo comics não era o suficiente para representar a

grandeza de sua nova obra. De fato, seu novo trabalho não poderia ser comparado

a nada que havia sido publicado em solo americano antes dele, e a partir dele,

outros artistas utilizam o termo Graphic Novel para nomear trabalhos mais

caprichados e com acabamento gráfico diferenciado, dando o pontapé inicial para o

que viria a acontecer com os quadrinhos no próximo milênio.

Além do advento das Graphic Novel entram em cena no mercado de quadrinhos

mundial os mangás, quadrinhos japoneses que se desenvolveram alheios às

variações do mercado ocidental.

Em um cenário de globalização na virada do século, o mercado de quadrinhos

também se globaliza, as fronteiras oceânicas se encurtam e quadrinhos americanos

e europeus transitam de um lado a outro do oceano, nunca antes na história foi

possível encontrar tamanha diversidade nas prateleiras das bancas de jornal.

O último marco na história dos quadrinhos até os dias de hoje foi a obra de

Art Spielrgman, Mauz, o primeiro quadrinho a ganhar o prêmio Pulitzer, um dos mais

importantes prêmios do jornalismo e literatura dos EUA, acabando de vez com o

estigma negativo em relação aos quadrinhos. A partir dele os quadrinhos ganham

espaço nas prateleiras das livrarias, só que não no formato que eles eram

comercializados nas bancas. Os quadrinhos alcançam o patamar de livro, muitos

sendo publicados em capa dura com papel especial e a preços altos.

Surgem no Brasil grandes nomes dos quadrinhos nacionais: no ano de 1959

(ROSA, 2014, p.24) o jornalista Mauricio de Souza larga a vida de repórter

investigativo e desenha sua primeira tira em quadrinhos para o jornal Folha de São

Paulo, dando início ao mais bem sucedido estúdio de produção de quadrinhos

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nacionais, a Mauricio de Souza Produções, responsável pela criação de

personagens icónicos como Mônica, Cebolinha, Cascão, Magali e os demais

personagens da turma da Mônica. Em 1960 Ziraldo cria sua primeira série de

sucesso, Pererê, que fez dele o primeiro autor de quadrinhos brasileiros a lançar

uma série em quadrinhos de grande sucesso nacional (ROSA, 2014, p.46.).

Respirando a vertente underground dos quadrinhos americanos, surge o quadrinista

Henfil com sua personagem Graúna, em plena repressão imposta pela ditadura

militar que taxou determinados tipos de quadrinhos como “subversivos”. Importante

também foi a publicação Circo editorial, que debutou importantes quadrinistas

nacionais que fizeram grande sucesso como Laerte, Gláuco e Angeli, também

conhecidos como Los três amigos, que até hoje figuram nos livros didáticos por todo

país.

Hoje o mercado se diferenciou bastante, surgem os autores independentes na

margem do cenário principal de quadrinhos, publicando suas obras de forma

diferenciada e com isso encontrando espaço nas prateleiras da livrarias e na WEB

para alcançar o mais diferenciado público.

2.3 Elementos da Linguagem dos quadrinhos (Visual e sonora)

A definição de quadrinhos é um tema de grande discussão. Enquanto texto,

podem ser definidos como hipergênero (RAMOS, 2009, p 347) englobando uma

série de outros gêneros que são ligados pelas mesmas características e elementos

comunicativos, como por exemplo, a tira, a charge e o cartum. Enquanto arte, os

quadrinhos por muito tempo foram considerados como meio inferior de

representação, voltado para as massas e como produto de mercado, para só

posteriormente serem reconhecidos como uma forma de arte legitima de extrema

relevância para a cultura contemporânea, assumindo o posto de 9ª das mais

importantes formas de arte da humanidade1. Ao mesmo tempo em que os

quadrinhos compartilham elementos de linguagem de outras formas de arte, como o

cinema, arquitetura, pintura e fotografia. Os quadrinhos se destacam pelos seus

próprios elementos de linguagem que lhes são únicos.

1 Esta classificação foi adotada e popularizada por Francis Lacassin em seu livro Pour un neuvième art, la bande dessinée. Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Numera%C3%A7%C3%A3o_das_artes

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Nota-se que as histórias em quadrinhos constituem um sistema narrativo composto por dois códigos que atuam em constante interação: o visual e o verbal. Cada um desses ocupa, dentro dos quadrinhos, um papel especial, reforçando um ao outro e garantindo que a mensagem seja entendida em plenitude (VERGUEIRO, 2008, p. 31).

Dentro dos códigos visuais na composição das histórias em quadrinhos, a

iconografia refere-se a toda a linguagem não verbal presente em uma página e é

responsável pela transmissão universal de informações explícitas e implícitas para o

leitor. “A linguagem icônica estão ligadas questões de enquadramento, planos,

ângulos de visão, formato dos quadrinhos, montagem de tiras, páginas, gesticulação

e criação de personagens” (VERGUEIRO, 2008 p. 34). As imagens são um

elemento muito forte para esta linguagem, pois histórias completas podem ser

narradas apenas com a utilização de imagens. Estas, inicialmente eram em forma de

desenhos cartunescos, mas hoje com a evolução das técnicas artísticas as

possibilidades de representação são infinitas.

Já no tocante às cores, estas vão além da já conhecida psicologia das cores,

a presença e ausência se configuram em elementos de definição e reconhecimento

dos tipos de quadrinhos. Podemos citar como exemplo disso, os mangás que são

conhecidos por serem publicados em preto e branco, recorrendo às hachuras para

dar forma e textura ao desenho.

Tão importante quanto às imagens, é a forma como elas são dispostas nos

quadrinhos, o tamanho e a quantidade de informações de uma imagem influenciarão

na forma como o leitor irá assimilar as informações contidas nos quadrinhos. Uma

imagem maior permite que o leitor perceba detalhes e informações que não seriam

recebidos se a mesma imagem fosse disposta em menor tamanho.

Todos esses elementos dependerão da forma como serão dispostos para

transmitir a informação desejada para o receptor, por exemplo, uma figura

posicionada em um ponto central da página de um quadrinho é mais bem percebida

do que uma figura posicionada propositalmente nas extremidades da página. O

enquadramento é o elemento de demarcação da temporalidade das histórias em

quadrinhos. Dentro de um enquadramento vão constar as informações da história

referentes a um momento da narrativa, em outro quadro, normalmente o posterior,

será retratado o que acontece após o que foi descrito no quadro anterior. “Assim,

dentro de um mesmo quadrinho podem estar expressos vários momentos, que,

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vistos em conjunto dão a ideia de uma ação específica” (VERGUEIRO, 2008, p. 35)

A disposição das informações em quadros diferentes causa a impressão de

passagem de tempo e de narração contínua. A passagem de tempo de um quadro

para outro não é fixa. Para perceber quanto tempo passa de um quadro para o outro

o leitor irá ser auxiliado pelos recursos verbais descritos em forma de narração (duas

horas depois, no dia seguinte, depois, etc.) ou de recursos iconográficos (a

luminosidade, a troca de cenário, o movimento dos personagens, etc.). Existem

diversos tipos de enquadramento, eles podem vir a acrescentar algum tipo de

sentido junto da linguagem iconográfica, como por exemplo, enquadramentos com

borda diferenciada que são utilizados para descrever pensamentos ou fatos que

ocorrem no passado.

Mas, a linguagem dos quadrinhos não é composta somente por códigos

visuais. A linguagem verbal se apresentará de diversas formas: narração, expressão

dos personagens em formas de balão de fala e onomatopeia. A expressão verbal

nos quadrinhos possui um caráter sonoro dentro da linguagem, representando a voz

dos personagens e os barulhos que ocorrem na narrativa. A narração ou legenda é

um recurso amplamente utilizado nos quadrinhos como meio de descrever a história

que está sendo narrada na imagem ou os acontecimentos que ocorreram antes dela.

A narração “Representa a voz onisciente do narrador da história, sendo utilizada

para situar o leitor no tempo e no espaço, indicando mudança de localização dos

fatos, avanço ou retorno no fluxo temporal, expressões de sentimento ou

percepções de personagens” (VERGUEIRO, 2008, p. 62). Ela pode vir em 1ª ou 3ª

pessoa, acrescentando ainda mais sentido às informações que estão sendo

representadas nas imagens.

Os balões de fala são o elemento de caráter sonoro nos quadrinhos utilizados

para representar a fala e o pensamento dos personagens na história. Os diálogos

nos quadrinhos são vinculados principalmente dentro dos balões de fala, sendo à

disposição desses balões dentro do quadrinho que definem a ordem em que o

diálogo acontece. Eles possuem formas e tamanhos diferentes e sua principal

característica é o seu contorno. O contorno do balão de fala define se o personagem

está falando ou pensando, a tonalidade que ele está utilizando, até o estado

emocional do personagem. A fala dos personagens será indicada pelo apêndice

(RAMOS apud VERGUEIRO, 2008, p. 221) do balão de fala, sendo que este pode

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conter mais de um apêndice, quando a fala de vários personagens é simultânea. Os

balões de fala são um recurso exclusivo dos quadrinhos, eles surgiram com o The

Yellow Kid, e a partir deste foi convencionado.

Outro recurso da modalidade sonora dos quadrinhos é a onomatopeia. Ela é

utilizada para descrever qualquer tipo de som que não seja o da fala de algum

personagem. Cada tipo de som possui uma onomatopeia especifica, alguns

exemplos são “Chomp” para o barulho de mastigar, “Rasg” para o de rasgar,

“Smack” para o de beijo, etc. As onomatopeias são convencionadas por idioma e

região, “Elas variam de país a país, na medida em que diferentes culturas

representam os sons de acordo com o idioma usado para comunicação”

(VERGUEIRO, 2008 p.62). No Brasil se optou por importar um grande número de

onomatopeias americanas incorporadas em nossas traduções e produções locais.

Diante da complexidade desses recursos e da infinidade de possibilidades

que por eles podem ser utilizados, não é de se esperar que o leitor não iniciado

possua todas as sinapses necessárias para interpretar todos os usos desses

elementos. Considerando isso VERGUEIRO (2008) defende que antes de se utilizar

os quadrinhos como ferramenta pedagógica na escola, é necessário que seja feito

um trabalho de alfabetização dos recursos dos quadrinhos, para que alunos e

professores tenham a capacidade de utilizar as histórias em quadrinhos de forma

plena em sala de aula.

2.4 Quadrinhos na educação

Desde antes de ser conhecida como histórias em quadrinhos, a arte

sequencial vem sendo utilizada de alguma forma como instrumento de propagação

de informações e conhecimentos. Temos como exemplo no período medieval, onde

a capacidade de ler era privilégio de uma minoria, os quadros da via-sacra dispostos

em sequência nas paredes das igrejas cristãs, que eram uma forma eficiente de

contar a trajetória de Jesus Cristo (do julgamento até o calvário). Desde então, as

histórias em quadrinhos veem sendo utilizadas para outros tipos de finalidades além

daquela de entretenimento pela qual elas se difundiram:

A percepção de que as histórias em quadrinhos podem ser utilizadas de forma eficiente para a transmissão de conhecimentos específicos, ou seja, tendo uma função utilitária e não somente de entretenimento, já e comum ao meio profissional a muito tempo. True comics, Real life comics e Real facts comics foram as primeiras revistas de histórias em quadrinhos com

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caráter puramente educacional, publicadas nos Estados Unidos durante a década de 1940 (RAMOS 2009, p.85).

Nos EUA surgiram publicações como a Educational Comics, voltadas para a

veiculação de materiais instrucionais focados em história e na religião cristã. Já, em

outras partes do mundo surgem iniciativas de igual pioneirismo. Por exemplo, na

Itália, onde os fumetti já eram objetos de estudos, materiais utilizando a linguagem

dos quadrinhos com temática religiosa, voltados para crianças. Outra iniciativa

importante foi a publicação da Classics Illustrated que teve tradução para diversos

países inclusive o Brasil, trazendo adaptações de histórias clássicas da literatura

moderna, criando uma nova modalidade de uso da linguagem que persiste até os

dias atuais.

Ainda merece destaque a iniciativa de utilização da linguagem de quadrinhos

para a instrução profissional como aconteceu durante a 2ª Guerra Mundial quando o

governo estadunidense solicitou os serviços de Will Eisner para a produção de

folhetos instrucionais para soldados em formação e em campo de batalha. Eram

folhetos que continham instruções técnicas e códigos de conduta para os soldados.

Eles foram produzidos por um longo período de tempo, pois, de acordo com o

próprio Eisner, os folhetos obtiveram resultados favoráveis.

No Brasil as HQ com finalidades educativas surgem junto das principais

publicações de quadrinhos no início do século XX. De acordo com VERGUEIRO

(2009, p. 88) a primeira revista a publicar conteúdo educativo no país foi O tico-tico

em 1905, com conteúdo de carga moral e que instruíam as crianças sobre a boa

conduta da época.

Percebendo a grande possibilidade dos quadrinhos como ferramenta

pedagógica, diversas entidades da esfera pública como igrejas, empresas, órgãos

públicos entre outras passam a empregar os quadrinhos como ferramenta educativa,

muitas vezes distribuindo essas publicações gratuitamente entre a população.

Eram materiais em formato de quadrinhos infantis, encartes ou cartilhas e possuíam

caráter formativo, instrucional, informativo para cuidados com a saúde e com o meio

ambiente, entre outros. “De uma maneira geral, trata-se de uma produção

diferenciada, realizada, em seu conjunto, de forma totalmente descentralizada,

descontrolada e desorganizada” (RAMOS, 2009, p.90).

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Mesmo diante de tantas possibilidades de uso de quadrinhos como

ferramenta pedagógica, a escola demora muito a utilizar esta linguagem em suas

práticas. A porta de entrada para as HQ na escola são os livros didáticos. De acordo

com VERGUEIRO (2009, p.10) eles tornam-se presentes nos livros desde meados

dos anos de 1980. Um uso que se expandiu e se perpetua até a presente data. Em

2006, os quadrinhos entram de forma integral na escola, a partir do PNBE, Plano

Nacional Biblioteca na Escola, foram selecionados 10 títulos em quadrinhos do total

de 225 livros selecionados (VERGUEIRO, 2009, p. 12). Os quadrinhos e suas

variantes são recomendados como objeto de estudos pelos PCNs da Língua

Portuguesa para o ensino fundamental e médio, estabelecendo de vez a presença

das histórias em quadrinhos no ensino regular.

2.5 Adaptações em Quadrinhos

As possibilidades de se trabalhar com a linguagem de quadrinhos na escola

são infinitas “os limites do emprego de HQ em sala de aula são os limites da

criatividade do professor” (CALAZANS, 2004, p.17). Elas podem ser utilizadas como

ferramenta para promover a conexão de saberes de todas as áreas do

conhecimento. Apesar disto, poucas foram às possibilidades que de fato foram

exploradas dentro de sala de aula na nossa realidade escolar. A única exceção à

regra é o seu uso como material de leitura sugerida ou paradidático, nas disciplinas

de Português. Enquanto a instrumentação de quadrinhos pelos professores em

outras disciplinas não foi difundida, salvo algumas exceções, na área de linguagens

ocorre justamente o contrário. Muitos professores de Língua Portuguesa, mesmo

aqueles que não foram como define VERGUEIRO (2008), alfabetizados na

linguagem dos quadrinhos, sentem-se à vontade para adotá-los em suas práticas,

principalmente as adaptações de histórias literárias para a linguagem dos

quadrinhos.

O surgimento dos quadrinhos de adaptações literárias não tem relação

nenhuma com o ambiente escolar, muito pelo contrário, quando surgiram

suspeitava-se que os quadrinhos na verdade afastavam as crianças da escola.

Como já mencionado anteriormente, as primeiras adaptações de obras literárias em

quadrinhos surgem nos Estados Unidos nas páginas da revista Classics Illustrated.

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32

Inicialmente chamada de Classic Comics, a revista surgiu em 1941 e durou até 1947, tornando-se cultuada na área e abrindo espaço para a quadrinizações de romances como Moby Dick, de Herman Melville, Os miseráveis, de Victor Hugo, Anna Karerina, de Leon Tolstoi, entre outros

(MOYA (Org.), 2008, p. 128).

Essa revista é uma das primeiras a fazer com que as possibilidades

educativas dos quadrinhos fossem reconhecidas. Com o sucesso da revista não

demora muito para que a ideia seja copiada por outras editoras consolidando então

um novo segmento na indústria, as adaptações literárias em quadrinhos, vertente da

nona arte que se desenvolveu e se perpetua até os dias de hoje.

As adaptações literárias em quadrinhos não demoraram a chegar ao Brasil.

Em 1949 a Editora Brasil América Ltda. (EBAL) passou a publicar adaptações para o

português das histórias da Classic Illustrated e versões inéditas de clássicos da

literatura brasileira e lusitana nas revistas Edição Maravilhosa (1949-1961) e Álbum

Gigante (1949-1955) (ZENI apud VERGUEIRO, 2008, p. 128). O sucesso dessas

revistas, no entanto não foi o motivo para a consolidação e expansão desse gênero

no mercado nacional. Isso só veio a acontecer 50 anos mais tarde com um

fenômeno que revolucionou toda a indústria de quadrinhos nacionais.

A partir de 2006, último ano do primeiro mandato do presidente Lula da Silva, houve outro movimento no sentido de introduzir os quadrinhos na área de ensino, eles foram incluídos na lista do Plano Nacional Biblioteca na Escola (PNBE) (VERGUEIRO, 2009, p. 12).

O PNBE desenvolvido desde 1997, tem o objetivo de promover o acesso à

cultura e o incentivo à leitura nos alunos e professores por meio da distribuição de

acervos de obras de literatura, de pesquisa e de referência2. Desde 2006 o

programa vem contemplando histórias em quadrinhos em seu catálogo. Isso é

verificado no edital publicado em 09 de fevereiro de 2006, aonde consta a compra

de livros de imagem e livros de histórias em quadrinhos, dentre os quais se incluem

obras clássicas da literatura universal, artisticamente adaptadas para o público

jovem (VERGUEIRO, 2009, p.17). Em 2006 foram selecionados dez (10) adaptados

para quadrinhos, e desde então, o programa nunca deixou de incluir histórias em

quadrinhos nas suas listas de pedidos. A cada ano, cerca de 50% dos títulos em

quadrinhos encomendados pelo programa são de adaptações literárias de autores

2 Como descrito no site do governo: http://portal.mec.gov.br/programa-nacional-biblioteca-da-escola

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nacionais e internacionais. E qual é a importância desse programa para o mercado

de quadrinhos no Brasil? A resposta está nos números. A quantidade de cópias que

o governo compra de cada título vária em torno de sete (7) a quinze (15) mil

unidades (quantidade extremamente atraente para as editoras), que desde então

passaram a investir forte no segmento para tentar ter um livro de seu catálogo

solicitado pelo programa governamental.

Na busca por ter um título seu selecionado pelo programa do governo, desde

2006 as editoras vêm publicando diferentes títulos de HQ por ano, sendo destas

cerca de 40 edições de adaptações literárias em quadrinhos. Com isso o mercado

brasileiro de quadrinhos passou a receber uma variedade nunca antes vista de

títulos inéditos de histórias em quadrinhos. Além das adaptações literárias, outras

vertentes da indústria em quadrinhos também ganharam maior atenção pelas

editoras. Além da variedade, as editoras investem no acabamento gráfico dos

quadrinhos para o mercado, fazendo com que algumas publicações de HQ ganhem

status de “livro”, passando inclusive a ser vendidas em livrarias e lojas

especializadas em livros. Toda essa atenção que as histórias em quadrinhos, em

especial as adaptações literárias em quadrinhos, passam a receber desde o

lançamento do edital do programa PNBE, na verdade é fruto de um equívoco do

governo, que classificam os quadrinhos como uma forma de literatura.

Dizer que quadrinhos são literatura evidencia duas posturas: A primeira é que se busca um rótulo social e academicamente prestigiado – o literário – para justificar a presença dos quadrinhos na escola e, possivelmente, na lista do PNBE. A outra indica um desconhecimento da área de quadrinhos, que soma poucos estudos acadêmicos, embora como número já suficiente para afirmar que quadrinhos são quadrinhos e literatura é literatura

(VERGUEIRO, 2009, p.36).

Resulta disso tudo uma nova concepção acerca dos quadrinhos e de sua

presença na escola. Esse fenômeno acarretado pela entrada oficial das HQ na

escola pública compara-se a outro fenômeno semelhante que ocorreu com outro tipo

de publicação, a literatura infantil, que desde que começam a figurar nas listas de

aquisição do governo, em 1997, passam a ser alvo de inúmeros estudos

acadêmicos. Essa pesquisa é a prova de que os quadrinhos estão seguindo pelo

mesmo caminho.

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3. QUADRINHOS NA EDUCAÇÃO: DIÁLOGOS EM SALA DE AULA ATRAVÉS DE

ADAPTAÇÕES LITERARIAS

3.1 O trilhar metodológico

Esta pesquisa fez uso da abordagem de investigação de cunho qualitativa,

pelo fato desta abordagem enfatizar características e especificidades próprias do

grupo pesquisado, ou seja, buscamos estudar o tema Histórias em Quadrinhos

como ferramenta pedagógica a partir do ponto de vista e perspectiva dos sujeitos

envolvidos com o objeto da pesquisa.

A abordagem qualitativa conforme afirmado acima, tem como base de análise

os aspectos da vida social, configurados nos seguintes princípios: ontológicos – que

aborda o mundo com um conjunto de ideias; epistemológicos - ao especificar um

conjunto de ideias, teorizam sobre o mundo social; e metodológicos – ao examinar

de que maneira específica observam e interpretam a realidade social (REES e

BRITO, 2011). Em relação aos sujeitos, DUARTE (2002) afirma:

Numa metodologia de base qualitativa o número de sujeitos que virão a compor o quadro das entrevistas dificilmente pode ser determinado a priori – tudo depende da qualidade das informações obtidas em cada depoimento, assim como da profundidade e do grau de recorrência e divergência destas informações. Enquanto estiverem aparecendo “dados” originais ou pistas que possam indicar novas perspectivas à investigação em curso as entrevistas precisam continuar sendo feitas (Duarte, 2002:143).

Os sujeitos principais dessa pesquisa são os 4 professores de língua

portuguesa da escola que trabalham ativamente com histórias em quadrinhos e os

100 alunos em média que cursam o 8ª e 9ª anos da escola privada Over, no período

letivo de 2015.

Buscamos investigar se os professores possuíam o embasamento necessário

para realizar a mediação necessária com Histórias em Quadrinhos em sua prática

didática – pedagógica? Qual a relação e quais conhecimentos possuem sobre a

linguagem dos quadrinhos? O que acharam da experiência e quais resultados que

atingiram com a turma? E, por fim, a opinião sobre as possibilidades possíveis de

uso de Histórias em Quadrinhos em sala de aula. Tais informações nos permitiram

traçar um panorama sobre o uso e das possibilidades pedagógicas da linguagem de

quadrinhos em cenários educacionais.

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Já em relação aos alunos (os outros sujeitos da pesquisa), buscamos

identificar qual é a relação destes com a linguagem de quadrinhos? O que pensam

sobre o uso pedagógico de quadrinhos na escola? Como vivenciaram a experiência?

Quais conhecimentos eles identificaram que foram desenvolvidos nesta prática

didático-pedagógica? E, por último, se são favoráveis a continuidade de práticas

envolvendo o uso de Histórias em Quadrinhos.

Para responder tantas questões, optamos por utilizar elementos da pesquisa

etnográfica e da Pesquisa-ação. A utilização da Etnografia significou a possibilidade

de desmascarar práticas pedagógicas dominantes centradas no modelo de

comunicação unilateral, nas quais os conteúdos pedagógicos e as ferramentas

didáticas encontram-se distante do universo vivencial dos alunos e, que a utilização

de uma linguagem familiar auxilia para o efetivo aprendizado.

O uso de estratégias da Pesquisa-ação foi no sentido de incentivar entre

pesquisador e os sujeitos envolvidos uma espécie de “auto reflexão coletiva” no

sentido de averiguar o potencial pedagógico de Histórias em Quadrinhos, sobre as

práticas educacionais e, para buscar o entendimento sobre a prática realizada.

Segundo THIOLLENT (2002)

Com a orientação metodológica da pesquisa-ação, os pesquisadores em educação estariam em condição de produzir informações e conhecimentos de uso mais efetivo, inclusive ao nível pedagógico, o que promoveria condições para ações e transformações de situações dentro da própria escola (Thiollent, 2002, p. 75).

Para que pudéssemos atingir as condições acima assinaladas, foi necessário

um verdadeiro mergulho na práxis dos sujeitos envolvidos na pesquisa visando

identificar as perspectivas envolvidas no processo ensino-aprendizagem, questões

que normalmente ficam ocultas, outras que estão latentes que sustentam as práticas

cotidianas de professores e alunos e o uso de materiais em uma linguagem diferente

das tradicionais.

Como técnicas para coleta de dados foi feito uso da observação, entrevistas e

aplicação de questionários. A observação consistiu em não somente ver ou ouvir,

mas para obter dados e informações sobre ações realizadas pelos professores e

alunos, que em muitas vezes não tem consciência que realizam, mas que norteiam o

comportamento pedagógico. A observação foi participante, não estruturada e

naturalizada pelo fato do pesquisador pertencer ao quadro de funcionários da

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instituição aonde a pesquisa foi realizada. As entrevistas foram planejadas de forma

estrutura, seguindo um roteiro prévio a fim de se adquirir informações chaves dos

entrevistados. Elas foram realizadas no local de trabalho dos entrevistados e

contaram com total colaboração dos mesmos, não foi estipulado um tempo limite

para a sua realização e foi possível atingir todos os tópicos do roteiro com os

entrevistados.

Os questionários aplicados (anexos 1 e 2) foram elaborados a partir dos

conhecimentos prévios que o pesquisador possuía dos sujeitos da pesquisa e foi

estruturado com questões abertas para que os pesquisados pudessem responder

com sua linguagem própria e emitir opiniões. No caso dos alunos foi disponibilizado

de forma virtual com a ferramenta Google docs. Isso ocorreu devido à

impossibilidade de aplicar em momento de aula formal (ocuparia demasiado tempo

do professor da disciplina) ou nos intervalos (pela dificuldade de reuni-los). O convite

dos alunos para participar da entrevista foi realizado da seguinte forma, em dado

momento do calendário da disciplina de língua portuguesa, havia um momento em

que os professores participantes desta pesquisa deveriam dedicar a análise das

leituras obrigatórias que os alunos deveriam ler durante aquele período. Porém,

como nas turmas do 8ª, 9ª ano do fundamental e 1ª série do ensino médio uma das

obras era em formato de quadrinhos, os professores convidaram um especialista no

assunto para explicar para os alunos os principais elementos de uma história em

quadrinhos e principalmente de uma adaptação literária em quadrinhos. Foi nesse

momento que ocorreu a inserção do pesquisador na sala de aula. Após assistirem

uma aula sobre quadrinhos, foram convidados a participarem da pesquisa

preenchendo os questionários que seriam disponibilizados para eles a partir da data

da aula e maneira digital pela ferramenta do Google Drive3, os alunos receberam a

orientação de como acessar o questionário em casa, visto que não havia tempo

hábil para a aplicação do questionário com os alunos em sala de aula por questões

de desencontro de disponibilidade, sendo que essa possibilidade foi pensada

entendendo que os mesmos possuem diversos meios para ter acesso ao

questionário por meio digital.

3 O arquivo ainda encontra-se disponível em:

https://drive.google.com/open?id=0B1xtr4x0_VT1bFplZzY3R0lDRDA)

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Para auxiliar na compreensão do fenômeno pesquisado e na análise e

entendimento dos dados realizamos pesquisas de ordem documental e bibliográfica.

A primeira, para identificar em documentos oficiais (Parâmetros Curriculares

Nacionais, O PPP da instituição e planos de ensino dos professores), o papel às

TIC. A pesquisa bibliográfica abrangeu a literatura em torno do uso de TIC em sala

de aula, de mediação pedagógica e sobre a linguagem de quadrinhos. Tais escolhas

foram norteadas, conforme afirmado acima, na perspectiva do entendimento das

ações empreendidas pelos sujeitos e para legitimar nossas análises.

3.2 Caracterização da Instituição

Esta pesquisa foi realizada na instituição de ensino privada Over, localizada

na Avenida Abel Cabral - Nova Parnamirim – RN, sem número. A instituição (antigo

colégio Overdose), foi fundado em 1998 como cursinho voltado para a preparação

de alunos para prestar o vestibular da UFRN e das principais instituições privadas de

ensino superior do estado. Em 2009 a instituição se expandiu com a fundação de

outra unidade de ensino, sendo a primeira a funcionar também como escola,

oferecendo turmas do 8° ano do Ensino Fundamental até a 3ª Série do Ensino

Médio. Em 2013 é fundada mais uma escola da rede, a primeira a oferecer turmas

na modalidade da educação infantil e ensino fundamental I, além daquelas

modalidades que já eram oferecidas nas demais unidades da rede. Em 2015 essa

mesma unidade deixa de oferecer turmas na modalidade cursinho, e é aberta mais

uma unidade de ensino da rede. Fundada no ano de 2013 (terceira unidade de uma

rede de cinco (5) unidades de ensino distribuídas pela região metropolitana de

Natal). Oferece turmas de Educação Infantil até o Ensino Médio, funcionando nos

períodos da manhã e da tarde. A rede de ensino

A unidade pesquisada possui vinte e cinco (25) salas de aulas, 08 banheiros,

04 bebedouros, 04 espaços de convivência, biblioteca, sala de xadrez, quadra de

esportes, parque infantil, sala de vídeo, lanchonete, sala para atendimento

psicológico, coordenação, sala dos professores, copa, secretaria, recepção, portaria,

depósito e estacionamento. Todas as salas de aula são equipadas com carteiras, ar-

condicionado e quadro branco. As salas de aula do ensino infantil e fundamental I

possuem também mesa para estudo em grupo, armários e mural de exposição, já as

salas do ensino fundamental II e Médio são equipadas com computadores e

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retroprojetores. As áreas de convivência possuem mesas e bancos fixos para o uso

dos alunos, a biblioteca tem transito livre para os alunos do contra turno. Dentro de

suas dependências são oferecidos pela escola: serviço de monitoria de estudos para

os alunos do ensino fundamental II e ensino médio, esportes, dança, cursos de

robótica, astronomia e preparatórios para as olimpíadas de matemática, português,

física e história.

A equipe gestora é composta por um Diretor Geral, seis (06) coordenadores

locais (Educação Infantil, Primeiro Segmento do Ensino Fundamental, Segundo

Segmento do Ensino Fundamental, Ensino Médio e Esportes) e um auxiliar de

coordenação. Um dado que preocupante apurado durante o levantamento da

documentação da escola é a constatação de que a mesma não possui PPP. Além

de ser obrigatório o Projeto Político Pedagógico é um documento de extrema

relevância para escola no qual estão contidos os princípios que norteiam as ações

da escola de acordo com LIBÂNEO (2005, p.345) o PPP "é um documento que

propõe uma direção política e pedagógica para o trabalho escolar, formula metas,

prevê as ações, institui procedimentos e instrumentos de ação.". Sua ausência,

portanto dá margem ao entendimento que determinadas ações da escola como, por

exemplo, propor a aplicação de TIC para os professores como ferramenta

pedagógica em sua prática, não necessariamente está em consonância com a

ideologia da instituição. Se o for, é necessário que os sujeitos responsáveis

formalizem essa linha de ação da instituição no documento do PPP. O artigo 12 da

LDB diz: "Os estabelecimentos de ensino respeitando as normas comuns e as do

seu sistema de ensino, terão a incumbência de elaborar e executar sua proposta

pedagógica". Ou seja, é papel da instituição produzir esse documento e ter

coerência de deixar explícito nele, o tipo de ação que já ocorre na escola.

O único documento de base da escola é o seu regimento criado em 1998,

época que a instituição ainda era cursinho, ou seja, ele não contempla as

necessidades da instituição enquanto escola. A escola possui conselho de classe

ativo, ele é composto por membros do corpo docente, gestor e por pais e

responsáveis, sua principal ação ocorre no final do ano, na seleção por critério

próprio dos alunos com média insuficiente para aprovação que podem mesmo assim

avançar para a próxima série.

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As observações realizadas na instituição revelaram que na verdade a escola

em sua ânsia por atingir os melhores resultados no ENEM e vestibulares nacionais e

regionais, acaba por focar sua metodologia na transmissão do conteúdo curricular

em um fluxo acelerado e que claramente sobrecarrega o aluno. A prática é

tradicionalista, a didática é unilateral e conteudista em que a educação realmente se

configura como define FREIRE (87), como bancária.

O educador é o sujeito, conduz os educandos à memorização mecânica do conteúdo narrado. Mais ainda, a narração os transforma em “vasilhas”, em recipientes a serem “enchidos” pelo educador. Quanto mais vá “enchendo” os recipientes com seus “depósitos”, tanto melhor educador será. Quanto mais se deixem docilmente “encher”, tanto melhores educandos serão. Desta maneira, a educação se torna um ato de depositar, em que os educandos são os depositários e o educador o depositante (FREIRE, 87 p. 33).

Apesar de ser prática predominante na escola, por vezes a educação

bancária dá lugar a uma intervenção educativa diferenciada em sala de aula. Alguns

professores, por diversas razões, buscam formas alternativas de fazer com que o

aluno atinja o conhecimento. Uma das alternativas utilizadas pela instituição e objeto

desta pesquisa foi a mediação de saberes através do uso de histórias em

quadrinhos. Nessa perspectiva, ações pedagógicas diferenciadas como essa, que

proponham a reflexão e a aprendizagem do aluno por outro meio que não seja a

intervenção direta do professor, se constituem em elemento de motivação e que

desperta uma atitude pró ativa por parte dos alunos, além de serem importantes

para a sua formação social, tendo em vista que em sua vida cotidiana e profissional

o indivíduo interagirá com conhecimentos veiculados em diferentes linguagens e

meios.

Por isso, consideramos que as atividades que mobilizem diferentes

capacidades cognitivas devem ser incentivadas e expandidas na escola.

Entendemos que apesar de não estarem contidas diretamente no planejamento

atual da escola, essas ações possibilitam e muito para que os resultados almejados

pela escola sejam alcançados.

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3.3 A proposta desenvolvida pela instituição

Ao seguir sua filosofia de ensino própria, com foco na formação de alunos

para a prestação de exames, o colégio Over deparou-se com um grande problema

ao receber os resultados dos primeiros ENEM em que a escola participou desde a

sua fundação. Percebeu-se um grande déficit de rendimento dos alunos nesses

exames principalmente na área de linguagens, que não correspondia ao mesmo

padrão de desempenho das áreas de exatas e ciências naturais, por exemplo. Esse

problema perdurou até o ano de 2014, até que a coordenação pedagógica da rede

em conjunto com os docentes específicos de linguagens decidiu tomar uma série de

medidas para tentar combater esse problema que a abordagem tradicional não

estava conseguindo dar conta. Muitos desses problemas já haviam sendo

identificados pelos professores em meio ao se trabalho com os alunos, outros, só

foram percebidos com a análise dos resultados no ENEM, dentre eles foram

destacados principalmente: dificuldade de interpretação de textos simples e

complexos e de compreensão de enunciados de questões, inabilidade para

organizar suas ideias em forma de texto, incapacidade de utilizar/reconhecer

recursos linguísticos, vocabulário limitado e até casos de analfabetismo funcional.

Após este diagnóstico, coordenação e pedagógica e professores passaram a

propor em reuniões, sugestões para o combate das principais dificuldades dos

alunos da escola em relação à área de linguagens. Entre as medidas adotadas,

podemos destacar: Implementação de oficinas de produção de textos, estimulo a

leitura e escrita nas avaliações e a adoção de materiais paradidáticos nas disciplinas

de Língua Portuguesa e Interpretação. É nesse contexto que a escola abre espaço

para o trabalho com HQ em sala de aula.

Tal linguagem já estava presente na escola de outra forma: no corpo das questões

das avaliações dos alunos em diversas disciplinas. A escola seguiu em sua

metodologia uma tendência nacional que é a de inserir a linguagem de quadrinhos,

em especial, o gênero tira, em questões de provas. Essa tendência se mostra

presente em livros didáticos, principalmente os de Língua Portuguesa, e em exames

nacionais como, por exemplo, o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM).

A partir da intervenção acima descrita, a linguagem de quadrinhos passou a

ser fazer presente oficialmente nessa escola, sob a forma de materiais paradidáticos

de leitura obrigatória. Esse trabalho teve início no ano de 2015, com a adoção da

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adaptação literária “O Quinze”, publicado pela editora Ática em 2012, baseado no

romance de mesmo nome e de autoria de Rachel de Queiroz, para as turmas de 9ª

ano de toda a rede. A adaptação de “O Quinze” foi o único quadrinho proposto pela

escola no ano de 2015. Para o 9º ano também foi sugerido outro paradidático: “O

Auto da Barca do Inferno” escrito por Gil Vicente, que se junto do “O Quinze”

somaram uma série de outras obras que compuseram os paradidáticos adotados

pela escola no ano de 2016.

A obra de Rachel de Queiroz (“O Quinze”), adaptada para a linguagem de

quadrinhos faz parte da Coleção Clássicos Brasileiros em HQ da editora Ática Este

selo da referida editora teve início em 2008 e que desde lá já publicou diversas

obras clássicas da literatura brasileira em forma de quadrinhos como por exemplo: O

Guarani, de José de Alencar, A escrava Isaura de Bernardo Guimarães, Memórias

Póstumas de Brás Cubas e O Alienista, de Machado de Assis, entre outros. O

diferencial desta coleção é o compromisso da editora em selecionar apenas artistas

brasileiros de prestígio no mercado nacional e internacional de quadrinhos para

produzir as adaptações, com resultados sempre acima da média. O artista

responsável pela adaptação do primeiro romance de Rachel de Queiroz foi o

pernambucano Shiko (https://pt.wikipedia.org/wiki/Shiko), que foi responsável pela

arte e do roteiro desta quadrinização. O original do romance foi escrito em 1930 e

retrata a seca de 1915, contando a história de vários personagens que viveram uma

das maiores secas que o sertão brasileiro já sofreu. A adaptação ficou bastante fiel

ao livro e os elementos iconográficos utilizados pelo artista são fascinantes por

utilizar muito bem o recurso das imagens em consonância com o texto. Esse foi um

dos motivos que levaram a escolha desse material. Também foi considerado o fato

de a obra tratar de algo muito próximo da realidade vivenciada dos alunos: a seca no

nordeste brasileiro.

Conforme Vygotsky (2005) cada pensamento tende a relacionar alguma coisa

com outra, a estabelecer uma relação entre as coisas. “Cada pensamento se move,

amadurece e se desenvolve, desempenha uma função, soluciona um problema”

(VYGOTSKI, 2005, p. 157).

Ainda segundo o pensador russo, a significação é a implicação que o signo

produz naquilo que está no contexto. Para melhor esclarecer: algo que tem algum

significado para a população que vive numa determinada região, pode não significar

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nada para outras pessoas de origens e locais diferenciados, com culturas diferentes.

Os signos estão diretamente relacionados às interações e aos aspectos histórico-

culturais de determinada região ou localidade. Os objetivos da escola com a

realização de atividades envolvendo esta adaptação nas turmas de 9ª eram

principalmente dois: Introduzir aos alunos de maneira mais atraente a leitura de uma

obra literária, considerando suas necessidades e sua faixa etária e as dificuldades

que os alunos apresentavam em relação à leitura e escrita.

O outro foi de utilizar uma linguagem (no caso, de quadrinhos) que servisse

como porta de entrada para outras formas de leitura, fazendo com que os alunos

reconhecessem a importância da leitura para a sua aprendizagem e que

enxergassem na mesma uma forma de prazer.

Quando a escola realiza de forma correta sua atividade fim, possibilita que o

estudante se aproprie de novas palavras, de novos signos visuais e os internalize,

possibilita a estes, novas formas para compreender, explicar e buscar alternativas

para situações vividas na realidade cotidiana. Se os participantes desse processo

conseguem usar o conceito aprendido/incorporado em um novo contexto, significa

que eles avançaram no processo de significação conceitual, o que os potencializa

para novas aprendizagens. Nesse sentido temos um processo ensino-aprendizagem

capaz de potencializar o desenvolvimento humano. Desenvolvimento esse, que nas

palavras de Vygotsky “não é a simples continuação direta de outro, mas ocorre uma

mudança do próprio tipo de desenvolvimento do biológico para o histórico-social”

(VYGOTSKY 2001, p. 149).

Entre acertos e erros, o trabalho com a adaptação se mostrou um enorme

sucesso. Após os primeiros meses de trabalho resultados satisfatórios foram

colhidos pela escola, seu desempenho na área de linguagens em exames e

simulados nacionais superou significativamente os resultados passados. Diante

desta conjuntura, a escola optou por não somente dar continuidade, mais sim

expandir todas as ações tomadas no ano anterior focadas nas disciplinas de

linguagens.

Em 2016, as oficinas de produção de texto continuaram, o número de

materiais paradidáticos por turma dobrou e foi inaugurada a biblioteca setorial em na

unidade de Nova Parnamirim (a única que ainda não possuía tal espaço). Como

resultado de tais ações, se verificou o aumento da presença de materiais em

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linguagem de quadrinhos na escola. Agora eles figuram também na forma de leitura

disponível em todas as bibliotecas existentes nas unidades da rede e são

selecionados três (3) paradidáticos em HQ para trabalho com turmas do ensino

fundamental e médio. A adaptação “O Quinze” passou a ser trabalhada pelas turmas

de 8º e continua com as turmas de 9º ano, juntamente com a adaptação da obra de

Machado de Assis, “Dom Casmurro” (Ática, 2012).

A escola espera obter os mesmos resultados do ano anterior, melhorando seu

desempenho na área de linguagens com porcentagem igual ou superior.

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4. ANALIDE DOS RESULTADOS

4.1 Análise dos dados

Os dados coletados a seguir foram colhidos a partir da data de 12 de

setembro de 2016 até o dia 3 de novembro do presente ano. Os alvos desta

pesquisa foram os alunos do 8º e 9º ano do ensino fundamental do colégio Over e

os três (3) docentes da área de linguagens que aqui serão identificados como Maria,

João e Francisco. Além da aplicação da ferramenta do questionário foram utilizadas

como meio de coleta de dados: a observação e, no caso dos docentes, a entrevista.

Com os dados coletados por esta pesquisa, pretendemos verificar como vêm sendo

realizado o uso de quadrinhos como ferramenta de mediação pedagógica. A partir

da análise dos dados coletados será possível entender qual é a relação desses

sujeitos com a mídia HQ, de que forma eles vêm sendo de fato utilizados na escola,

o que os sujeitos pensam sobre o uso pedagógico de quadrinhos na escola, como

foi essa experiência, que tipos de conhecimento já foram trabalhados pelo uso da

HQ. E, por último, se são favoráveis à continuidade de práticas envolvendo o uso de

Histórias em Quadrinhos na escola.

A somatória total de participantes desta pesquisa foram quarenta e oito (48)

indivíduos, dentre estes três (3) docentes e quarenta e cinco (45) alunos. Os dados

dos questionários aplicados com os alunos foram convertidos em porcentagens para

a sua análise. Optamos por demonstrar esses dados em forma de gráficos para

melhor visualização dos resultados.

4.1.1 Análise dos questionários com os alunos

Os dados que serão apresentados e analisados a seguir foram coletados no

período compreendido entre os dias 12 de setembro e 03 de novembro do presente

ano. Os alvos desta pesquisa foram os cento e onze (111) alunos do 8º e 9º ano do

ensino fundamental do colégio Over e os três (3) docentes da área de linguagens

que aqui serão identificados como Maria, João e Francisco. Além da aplicação da

ferramenta do questionário foram utilizadas como meio de coleta de dados: a

observação e, no caso dos docentes, a entrevista.

Pretende se com isso desvelar qual é a relação desses sujeitos pesquisados

com a mídia HQ; de que forma eles vêm sendo de fato utilizados na escola; o que

tais sujeitos pensam sobre o uso pedagógico de quadrinhos na escola; como foi

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essa experiência e que tipos de conhecimento já foram trabalhados pelo uso da HQ.

E, por último, se são favoráveis à continuidade de práticas envolvendo o uso de

Histórias em Quadrinhos na escola.

A somatória total de participantes desta pesquisa foram quarenta e oito (48)

indivíduos, dentre estes três (3) docentes e quarenta e cinco (45) alunos. Os dados

dos questionários aplicados com os alunos foram convertidos em porcentagens para

a sua análise. Optamos por demonstrar esses dados em forma de gráficos para

melhor visualização dos resultados.

No gráfico 01 está exposta a caracterização da faixa etária dos alunos

participantes. Através dele será possível traçar um perfil especifico dos alunos com o

qual estamos trabalhando, principalmente em relação as suas necessidades

cognitivas e também, aos interesses sociais relacionados ao contexto de sua idade

(amigos, hobbies, etc.)

Gráfico 1 - Faixa etária dos alunos entrevistados.

Podemos ver que 91,5% dos alunos, a grande maioria, encontra-se na faixa

etária de 11 a 15 anos, portanto, de acordo com o nível de ensino em que

atualmente se encontram. Em relação aos 7% dos alunos que possuem acima de 15

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anos de idade, constatamos em nossas observações que, em sua maioria, são

alunos repetentes ou que cursam o fundamental na modalidade dependência4.

O próximo dado é referente ao contato dos alunos com a linguagem das

histórias em quadrinhos. Aqui nos interessou saber principalmente se os alunos

possuem familiaridade com esse tipo de linguagem. A pesquisa comprovou nossa

hipótese e constatou um importante dado: 100% dos alunos participantes já tiveram

contato com histórias em quadrinhos dentro e fora da escola.

Gráfico 2 – Porcentagem de alunos que já tiveram contato com histórias em quadrinhos.

As HQ na atualidade estão mais populares do que nunca. Os dados

comprovam que para uma criança em idade escolar é quase impossível não ter

contato com esse tipo de mídia, seja por interesse pessoal, midiático ou mesmo

escolar. Esse dado é de grande importância, pois, sabendo-se que o aluno já teve

contato com essa mídia, quando ele se deparar com propostas que envolvam

quadrinhos na escola, ele se sentirá mais a vontade para trabalhá-la do que com

outra modalidade ao qual ele não conheça a linguagem.

Apesar disto, não nos interessa saber somente se o aluno já teve contato com

HQ em sua vivência, nos interessa saber qual é a relação que o aluno possui com

4 Na escola Over os alunos que não conseguem ser aprovados em uma ou duas disciplinas no alo letivo

podem ficar de dependência dessas disciplinas no ano seguinte, cursando simultaneamente a série posterior

em um turno e a anterior no outro turno só nas disciplinas que o aluno está de dependência.

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elas. O próximo gráfico responde esse questionamento, os alunos poderiam optar

por quatro opções, em uma escala crescente, respondendo qual é o seu nível de

interesse em relação às histórias em quadrinhos.

Gráfico 3 – Relação dos alunos com histórias em quadrinhos

Para a surpresa do pesquisador, os dados comprovaram que mais de 90%

dos alunos participantes possuem uma relação positiva com histórias em

quadrinhos. 84% dos alunos gostam de histórias em quadrinhos, enquanto 7% é

realmente fã, um dado muito importante, que nos permite afirmar realmente que

histórias em quadrinhos são ferramentas de ensino de interesse dos alunos, e que

por estes possuem teor valorativo positivo. 7% dos alunos são indiferentes a

linguagem das histórias em quadrinhos, demonstrando neutralidade em relação à

sua leitura. Apenas 2% dos alunos não gostam de histórias em quadrinhos, resta

saber destes que relação foi estabelecida com histórias em quadrinhos na escola

tendo havendo uma indisposição inicial com a temática.

O próximo ponto é referente à frequência com que os alunos leem

quadrinhos. Essa informação nos permitirá perceber a familiaridade dos alunos os

com a sua leitura, principalmente, a identificação de seus elementos constituintes:

ordem de leitura, personagens, balões de fala, enquadramento, etc.

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Gráfico 4 – Frequência de leitura de histórias em quadrinhos dos alunos

A partir deste gráfico é possível levantar algumas constatações em

comparação com o gráfico anterior. Primeiro, nem todos os alunos que gostam de

quadrinhos são leitores assíduos de histórias em quadrinhos, e segundo, não

precisa ser necessariamente fã do meio para ler quadrinhos constantemente. Esse

gráfico nos permite perceber também que mais da metade dos alunos participantes

têm contato com quadrinhos em seu cotidiano, mostrando que os alunos estão

dispostos a ler quadrinhos mesmo sem haver qualquer tipo de obrigatoriedade, ou

seja, sem a leitura estar vinculada a alguma atividade da escola, por exemplo. Dos

participantes, 9% são leitores assíduos de quadrinhos, uma porcentagem pequena

do número de alunos, abrindo margem para a interpretação de que, mesmo

gostando do gênero, os alunos talvez não dominem por completo a linguagem dos

quadrinhos.

A seguir perguntamos para os participantes, qual era a principal forma de

acesso deles as HQ. Nesse quesito eles poderiam responder mais de uma

alternativa. Sabemos que os participantes têm acesso aos quadrinhos na escola de

várias formas, a dúvida é se a escola é o único ponto de acesso dos alunos aos

quadrinhos, ou se em seu cotidiano eles vivenciam os quadrinhos de outra forma e

que formas são essas.

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Gráfico 5 – Principal forma de acesso dos alunos a histórias em quadrinhos

Esse gráfico têm algumas particularidades importantes. De acordo com ele, a

principal forma de acesso da maioria dos alunos aos quadrinhos é pela internet,

sendo que as redes sociais figuram em segundo lugar. Algo que nos chamou a

atenção enquanto quantificávamos os dados desse gráfico era que, alguns

participantes marcavam o quesito “rede social” e não necessariamente assinalaram

o quesito “internet”, fato esse que ocorreu mais de uma vez. Nossa explicação para

tal incoerência é de que, ao assinalar o quesito “rede social” o aluno não percebia

que, para atualizar sua rede social é necessário estar conectado à internet. Ou seja,

a porcentagem do quesito “internet” poderia ser ainda maior. As bancas de revistas

são a terceira principal forma de acesso dos alunos aos quadrinhos, essas que no

passado foram o principal meio de se obter quadrinhos no Brasil e que vêm

perdendo espaço para as livrarias, que figuram em quarto lugar. Nestas últimas

(livrarias), veem ocorrendo a cada dia mais o aumento do espaço de exposição

disponível para publicações em quadrinhos em suas dependências. Biblioteca, livro

didático e paradidático figuram respectivamente em quinto, sexto e sétimo lugares,

ambos são formas de acesso relacionadas à escola. Isso significa que cerca de 25%

dos participantes têm na escola sua principal fonte de acesso a leitura de

quadrinhos. Blogs, cinema e sebos são os meios menos importantes de se ter

acesso a quadrinhos para os alunos participantes.

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Além de estar presentes nos livros didáticos, paradidáticos e na biblioteca,

outra maneira que os quadrinhos são utilizados na escola é através de avaliações.

Os professores costumam em suas avaliações eventualmente fazer uso de

quadrinhos principalmente nos enunciados das questões. Perguntamos para os

participantes se eles já haviam se deparado com quadrinhos em suas avaliações.

Gráfico 6 – Porcentagem de alunos que já vivenciou avaliações que possuíam quadrinhos

Aqui na verdade temos a porcentagem de quem reconheceu que já realizou

avaliações com quadrinhos. Considerando que todos os alunos participantes

realizaram as mesmas avaliações, fato confirmado através de nossa observação.

Para os alunos que afirmaram ter vivenciado quadrinhos nas avaliações, foi

perguntado o que eles acharam desse uso, considerando sua já estabelecida

relação com os quadrinhos, confirmadas nos gráficos anteriores.

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Gráfico 7 – Opinião dos alunos sobre o uso de histórias em quadrinhos em avaliações

Mais alguns dados reveladores. Dessa vez percebemos que uma

porcentagem muito baixa de alunos afirmou que a ferramenta foi negativa para a sua

aprendizagem, precisamente 5%. Outros 2% foram neutros ao uso de quadrinhos

nas avaliações. Restando então 83% de alunos que de alguma forma foram

beneficiados pelo uso dos quadrinhos nas avaliações, precisamente 42% que

afirmam ter conseguido entender melhor o que estava sendo proposto, graças ao

uso dos quadrinhos. Outros 32% afirmam que tiveram sua atenção aumentada

simplesmente por haver quadrinhos na avaliação, e 19% que pelo menos puderam

relaxar um pouco mais durante a avaliação ou até diminuir sua tensão em uma

atividade avaliativa. Aqui o trabalho com quadrinhos na escola já começa a

demonstrar seus resultados, atendendo os interesses da escola na garantia do

preparo do aluno para a prestação de exames.

Convencionalmente, livros e exames da área de linguagens já são conhecidos

por fazer grande uso de quadrinhos, principalmente os do gênero tiras. Mas através

de nosso estudo constatamos que muitas outras possibilidades podem ser

trabalhadas em outras áreas de conhecimento. Perguntamos aos participantes se o

uso de quadrinhos em outras áreas já faz parte do seu contexto.

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Gráfico 8 – Conhecimentos que já foram trabalhados através de quadrinhos na escola

Sem muita surpresa, 80% dos participantes identificaram o uso de quadrinhos

relacionados ao conhecimento linguístico. A grande revelação foi que quase 70%

dos participantes afirma que os quadrinhos podem auxiliar na aprendizagem de

conhecimentos de mundo e quase 50% afirmam que pode auxiliar na aprendizagem

relacionada a conhecimento histórico. Digno de destaque é também o

reconhecimento por parte de 30% dos alunos de que quadrinhos já foram

trabalhados na obtenção de conhecimentos de caráter artístico e também de caráter

pessoal. Em grande parte essa percepção aprimorada é resultado do trabalho com

as adaptações literárias “O Quinze” e “Dom Casmurro", que permitiram que os

alunos fossem conectados a outros tipos de conhecimentos para além dos

relacionados a linguagens, principalmente os de mundo com a temática da seca, e

histórico com a questão do período retratado nas duas obras.

Sabendo de como é a realidade do cotidiano de sala de aula, perguntamos

para os alunos se de fato, eles haviam realizado por completo a leitura das

adaptações em quadrinhos.

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Gráfico 9 – Porcentagem de alunos que leram o quadrinho paradidático

E com isso recolhemos mais um dado positivo: 91% dos alunos que

participaram da pesquisa haviam lido por completo o quadrinho sugerido, uma

constatação muito importante. Tanto a adaptação de “O Quinze”, quanto à

adaptação de “Dom Casmurro” não são literaturas simples. Sua linguagem é

complexa, e para que ocorra o entendimento pleno das obras, o leitor precisa

acessar uma série de conhecimentos prévios que talvez os alunos sintam dificuldade

de lidar. Esse gráfico comprova que um dos objetivos da escola foi atingindo,

fazendo com que os alunos tivessem contato com a literatura brasileira, sendo o seu

formato em quadrinhos importante para o alcance desse objetivo.

Esse resultado gera margem para se pensar se talvez esse trabalho pudesse

gerar o mesmo resultado caso fosse realizado com uma literatura convencional.

Para esclarecer se o resultado seria o mesmo, perguntamos para os alunos que

diferença eles apontavam entre a atividade desenvolvida com HQ daquelas que

eram realizadas com a obra literária. Aproveitando que os mesmos trabalharam

também no mesmo período com um livro convencional.

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Gráfico 10 – Opinião dos alunos sobre a leitura de um paradidático em quadrinhos em comparação a

leitura de um livro comum

O resultado que consta no gráfico acima deixa claro o porquê do êxito do

trabalho com as adaptações. 14% dos alunos apenas considera que não há

diferença no trabalho de um livro convencional ao invés de um quadrinho. 55% dos

alunos, quase metade da turma, afirma que quadrinhos são mais atraentes que

livros, e 27% acreditam que ler livros em quadrinhos é mais fácil do que ler livros em

formato convencional, dois pontos que corroboram a importância dos quadrinhos

para o resultado positivo na leitura dos clássicos sugeridos pela escola. Interessante

saber que 2% afirmaram que a leitura pode ser até mais significativa que a leitura de

um livro, a mesma porcentagem que acredita que em relação a um livro, a leitura de

um quadrinho pode ser boba.

Outro objetivo da escola era fazer com que os quadrinhos fossem uma ponte

para que os alunos tivessem acesso a outros tipos de leituras. Essa na verdade é a

principal preocupação de pais e educadores em relação ao trabalho com quadrinhos

na escola, sendo essa também uma das preocupações deste estudo. Por isso,

questionamos os alunos que relação eles desenvolveram com a leitura após o

trabalho com quadrinhos na escola.

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Gráfico 11 – Reação dos alunos após a leitura do paradidático em quadrinhos

Aqui temos mais um resultado positivo, 64% dos alunos participantes da

pesquisa se sentiu de alguma forma, motivado para continuar lendo. Seja dando

continuidade na leitura de quadrinhos (37%), seja lendo mais sobre a temática que o

quadrinho trata (11%) ou mesmo expandindo horizontes para outros formatos de

leitura (16%), os quadrinhos nessa prática conseguiram de fato, estimular o ato da

leitura nestes alunos, atingindo mais um dos objetivos almejados pela escola e

revelando a potencialidade do trabalho realizado. O resultado só não foi tão positivo,

pois 25% dos alunos não se sentiram motivados o suficiente para ler algo por conta

própria, sendo que 9% se sentiram aliviados por não precisar mais ler nada.

Preocupante mesmo foi que 2% dos alunos sentiram aversão ao gênero HQ depois

da realização deste trabalho, algo que deveria ser avaliado com mais atenção pelo

professor para se descobrir o que pode ter acontecido.

Ao fim da pesquisa, perguntamos para os alunos como a escola deveria

conduzir o trabalho com quadrinhos posteriormente, com base em tudo que foi

trabalhado com eles.

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Gráfico 12 – Opinião dos alunos sobre o trabalho com histórias em quadrinhos na escola

Fica claro aqui que os alunos avaliaram o trabalho como positivo, sendo que

38% deles acham que o trabalho com quadrinhos na maneira como aconteceu com

eles deve continuar. Já a maioria (44%) acredita na verdade que o trabalho deve

aumentar sua frequência, talvez no sentindo de serem ofertados mais títulos em

quadrinhos ou mesmo, no tempo que os alunos dispõem ao longo do ano para

trabalharem em cima das obras. 2% dos alunos acreditam até que os quadrinhos

deveriam ser vistos em todos os anos. Apesar de serem minoria, 11% dos alunos

acreditam que a escola deve focar menos no trabalho com quadrinhos, sendo que

outros 2% consideram que a escola deve mesmo é deixar de trabalhar com

quadrinhos. Talvez estes alunos não consigam enxergar o resultado positivo com

quadrinhos que eles mesmos fizeram parte.

4.1.2 Análise dos questionários dos professores

Para a análise dos dados coletados com os docentes, optamos por não expor

todos os dados em gráficos, devido ao número pequeno de participantes.

Analisaremos os dados dos questionários dos docentes em consonância com os

questionários dos alunos, subsidiando nossas afirmações com base nos dados que

constatamos com os alunos. Ao todo foram 3 docentes participantes da pesquisa,

todos ministram aulas tanto no ensino fundamental quanto no ensino médio. Dois

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docentes afirmam ter entre 1 a 5 anos de docência, enquanto o outro afirma ter entre

6 a 10 anos de carreira. Com base nesse perfil, podemos constatar que são

docentes iniciantes na profissão, que estão tendo a oportunidade de experimentar o

que aprenderam em sua formação, ainda não adquiriram os comodismos que alguns

profissionais adquirem ao longo da profissão e por isso, não se sentem intimidado

em trabalhar práticas inovadoras. Essa leitura é bastante coerente em relação ao

trabalho desenvolvido por eles com quadrinhos, que no senso comum pode ser

considerado inovador.

Quando perguntado qual era a relação dos docentes com a mídia quadrinhos,

eles poderiam responder em uma escala crescente se eram: indiferentes,

reconhecedores do meio, leitores ou entusiastas. Todos os três entrevistados

afirmaram ser na verdade, leitores de quadrinhos. Um ponto muito positivo da

pesquisa, mostrando que, por serem leitores, os professores são conhecedores,

mesmo que superficiais, da linguagem dos quadrinhos e de seus elementos, no

caso: do processo de produção, circulação, público-alvo, finalidades, autores, etc.

Sem esses conhecimentos, o trabalho com quadrinhos em sala de aula não teria

subsídios para ser um trabalho mais profundo, perdendo riqueza. Como já era

esperado, todos eles afirmaram na pesquisa que já haviam utilizado quadrinhos em

sala de aula. Os docentes selecionados para esta pesquisa na verdade, são os

docentes de Língua Portuguesa da escola Over que são responsáveis pela

mediação com as adaptações literárias com as turmas de 8ª e 9ª anos, apesar de

que, foi constatado através da observação, que o uso de quadrinhos em sala de aula

não se limita apenas aos docentes de língua portuguesa. Professores de história,

geografia, artes, ciências, filosofia e até matemática já fizeram uso de quadrinhos na

escola, principalmente na elaboração de suas avaliações.

Uma seção do questionário foi destinada a forma como os quadrinhos, caso o

professor houvesse feito uso do mesmo em sua prática, são utilizados em sala de

aula. O participante poderia marcar mais de um ponto nesta etapa do questionário.

Os três docentes, conforme mencionado anteriormente, afirmaram ter feito uso de

HQ como leitura obrigatória em sala de aula. Um dos docentes afirmou ter utilizado

os quadrinhos também como leitura opcional, ou seja, utilizou quadrinhos em outra

prática além da utilização das adaptações literárias, que seriam obrigatórias. Dois

dos docentes afirmam utilizar quadrinhos também no enunciado de suas avaliações,

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uma prática comum na escola como mencionado anteriormente e que é tendência

em exames nacionais e materiais didáticos. Além destes usos, dois docentes

afirmaram ter utilizado os quadrinhos para exemplificar o conteúdo trabalhado.

Através da observação, visualizamos duas formas distintas de fazer esse tipo de uso

em sala de aula. A primeira é se baseando nos próprios exemplos que o material

didático traz consigo. Tanto quadrinhos quanto outros tipos de linguagens são

utilizados como exemplo no material didático dos alunos, e alguns professores

aproveitam essa ferramenta na utilização do livro didático para trabalhar o conteúdo

com os alunos. A segunda maneira de utilizar os quadrinhos como exemplo do

conteúdo foi no próprio trabalho com as adaptações em HQ, que foram amplamente

analisadas pelos professores principalmente nas aulas de literatura. Ficando claro

que, possivelmente dois dos docentes, não se limitaram apenas a leitura das

adaptações, mais também as trabalharam de forma mais profunda. Por fim, dois

docentes afirmaram ter utilizados quadrinhos também como forma de produção

textual, ou seja, dois professores já produziram histórias em quadrinhos em sala de

aula com os alunos. Apesar de ser uma forma de trabalho muito interessante, que

desenvolve diversas capacidades dos alunos muito importantes para sua formação

como estudante, trabalhar com a produção de quadrinhos vai exigir muito mais

conhecimento do professor sobre a área já que: é um trabalho complexo,

normalmente não é desenvolvido por uma só pessoa, exige diversas capacidades

que os alunos possam não vir a ter, entre outros motivos. Mas se os docentes

levaram em conta todos esses aspectos, a produção de quadrinhos em sala de aula

foi bem desenvolvida pelos mesmos.

A seguir, foi perguntado para os professores que aspectos eles consideram

na utilização de quadrinhos em sala de aula. Nessa pergunta o entrevistado poderia

também responder mais de um quesito. Todos os participantes responderam que

utilizam HQ em sala de aula porque elas são atraentes para os alunos e contemplam

de forma satisfatória os seus objetivos pedagógicos. Esses aspectos puderam ser

confirmados com a análise dos dados coletados na pesquisa com os alunos, em que

fica claro que os alunos têm interesse nos quadrinhos, já que mais de 90% dos

alunos participantes da pesquisa gostam de história em quadrinhos e que os

objetivos de trabalho dos professores podem ser contemplados com quadrinhos, já

que mais de 60% dos alunos se sentiram compelidos a ler mais por causa dos

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quadrinhos, por exemplo. Dois dos professores afirmaram que utilizam quadrinhos

por considerar que eles podem agregar mais conteúdo ao que se propõem em sala

de aula. A pesquisa com os alunos também pode confirmar que sim, quadrinhos

agregam diversos conteúdos nas práticas de língua portuguesa já que os alunos

afirmam que também desenvolveram conhecimentos referentes à área de

atualidades, história e artes. Isso pode ser potencializado ainda mais se o trabalho

for realizado em um contexto interdisciplinar, onde os professores de diferentes

matérias poderiam explorar a mesma publicação pelo viés de sua disciplina, por

exemplo. Um dos professores afirmou que prefere trabalhar com quadrinhos por sua

leitura ser mais rápida e mais fácil também. Essas são características verdadeiras da

leitura de quadrinhos, já que por possuírem um referencial visual, a transmissão da

informação contida nas páginas é muito mais rápida e facilmente recebida pelo

cérebro. Porém, essa característica é muitas vezes, vista com preconceito por parte

dos responsáveis e educadores. Um paradigma que ainda não foi quebrado.

Perguntamos para os professores que tipos de capacidades, na opinião deles,

poderiam vir a ser desenvolvidas/aprimoradas pelos alunos através do trabalho

realizado com quadrinhos na escola. Em nosso estudo para esta pesquisa,

descobrimos que qualquer tipo de conhecimento pode ser trabalhado através dos

quadrinhos, as possibilidades são verdadeiramente infinitas. Porém, o que realmente

nos interessa saber neste estudo é se, professores comuns são conscientes das

possibilidades pedagógicas dos quadrinhos, se em suas intervenções eles objetivam

atingir tais capacidades que podem vir a ser adquiridas através da leitura de

histórias em quadrinhos.

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60

0

0,5

1

1,5

2

2,5

3

3,5

Capacidades que os professores acreditam que podem ser adquiridas/aprimoradas através das HQ

Gráfico 13 – Capacidades que os professores acreditam que podem ser adquiridas/aprimoradas

através das HQ

Podemos perceber através deste gráfico que todos os professores

participantes da pesquisa acreditam que as principais capacidades referentes ao

ensino de linguagens: leitura, escrita, interpretação, vocabulário, contextualização,

estimulo a leitura e uso da língua nas mais diversas formas, podem vir a ser

trabalhadas através dos quadrinhos. Essa informação comprova o quão conscientes

os professores estavam dos objetivos que eles desejavam atingir com os alunos

através do uso de quadrinhos na escola, já que estas foram as principais

capacidades vistas como deficiência da prática de ensino regular e que deveriam ser

alcançadas pela intervenção com quadrinhos. Não somente isto, sendo os

participantes professores formados em letras, ministrantes da disciplina de língua

portuguesa, interpretação, literatura e redação, não há referência maior para a

comprovação de que as HQ na escola podem desenvolver estes aspectos referentes

a linguagens.

Em relação às capacidades atitudinais, foi consenso entre os participantes

que os quadrinhos podem desenvolver os aspectos: ético, crítico, social e criativo

dos alunos. Foi percebido através da observação que, os participantes buscam

trabalhar esses aspectos não pela utilização da linguagem de quadrinhos em si, mas

sim pelo tipo de quadrinhos que são abordados em sala de aula e nas avaliações.

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Explicando melhor, ao selecionar um texto motivador para uma redação, por

exemplo, os professores dão preferência ao trabalho com quadrinhos que despertam

a crítica e a reflexão nos alunos, como por exemplo, autores como: Quino, Schulz,

Bill Waterson, Laerte, Henfil, Angeli, e muitos outros quadrinistas que trazem em sua

obra conteúdo de caráter reflexivo, fazendo com que esse tipo de mensagem seja

comunicada ao aluno. Interessante notar que algumas capacidades referentes ao

raciocínio lógico, na opinião dos participantes, podem vir a ser alcançadas também

pelo uso de quadrinhos, sendo que todos acreditam que os quadrinhos podem

aprimorar/desenvolver a capacidade de raciocínio lógico. Ademais foi reconhecido

por dois professores que as capacidades de reconhecer padrões e símbolos, que

também são relacionadas à linguagem, também podem ser desenvolvidas. Somente

um professor arriscou dizer que os alunos podem desenvolver a capacidade de

memorização e reconhecimento geográfico através dos quadrinhos, capacidades

estas que são fundamentais para a compreensão de histórias em quadrinhos mais

complexas.

Chegando ao fim da pesquisa, questionamos os participantes como eles

perceberam a aceitação dos alunos ao trabalho que foi realizado em sala de aula

com HQ em uma escala de: ruim, satisfatório, bom e excelente. Dois dos

professores consideram que a receptividade dos alunos foi boa, ou seja, os alunos

aceitaram o trabalho e desenvolveram de maneira satisfatória, fato que pudemos

comprovar através dos dados coletados com os alunos. Um dos professores

respondeu que o trabalho foi satisfatório, uma escala abaixo de bom, talvez por ele

perceber que os alunos aceitam trabalhar com quadrinhos apesar de não atingirem

as expectativas almejadas pelo professor, talvez. E como resultado deste trabalho,

temos a opinião dos professores em relação a forma como eles planejam trabalhar

com os quadrinhos na escola no futuro em uma escala de: encerrar, diminuir,

continuar, aprimorar e expandir o trabalho. Dois dos professores pretendem

aprimorar tudo o que foi desenvolvido ao longo do ano, não fica claro se eles se

referem a aumentar a quantidade de quadrinhos paradidáticos lidos pela turma ou a

presença de quadrinhos nas suas avaliações ou até mesmo a profundidade que eles

são trabalhados em sala, só se sabe que o trabalho será aprimorado de alguma

forma. Já o outro professor pretende expandir esse trabalho. Ou seja, trabalhar os

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quadrinhos na escola em outras formas além das que foram realizadas nesse

trabalho.

4.1.3 Análise das entrevistas com os docentes

Uma das ferramentas que utilizamos nessa pesquisa foi a da entrevista. As

entrevistas que realizamos foram direcionadas aos professores de Língua

Portuguesa, responsáveis pela intervenção com quadrinhos na escola. Através da

entrevista, pudemos colher o depoimento deles em relação ao trabalho que foi

realizado, considerando principalmente: as motivações para o trabalho, o

desenvolvimento do mesmo, o modo de avaliação e o que ele pode destacar sobre o

trabalho. Participaram da entrevista os mesmos três docentes que preencheram o

questionário, para preservar sua identidade adotaremos os nomes fictícios: João,

Maria e Francisca para nomeá-los. A entrevista foi realizada no ambiente de trabalho

dos entrevistados, teve duração média de 10 minutos, sem controle de tempo.

O primeiro ponto abordado na entrevista foi em relação os motivos que os

levaram a escolher trabalhar com quadrinhos. O primeiro entrevistado afirmou:

“Sabíamos que dentre os livros da seleção deveriam constar quadrinhos por causa

de tudo o que eles ajudam na leitura com os alunos nê? Em relação ao referencial

visual que eles oferecem.” (João). Referindo se a seleção que os professores fazem

no início do ano letivo para decidir que livros serão adotados pela escola naquele

ano. A segunda entrevistada destacou “...as adaptações que eu tenho percebido

como O Quinze e Dom Casmurro eles têm sido fieis a própria narrativa. E eu

percebo que torna se uma linguagem mais dinâmica pra eles (alunos), um

envolvimento maior mesmo com o objetivo que eles tenham acesso a uma literatura

engajada, uma literatura que tenha um compromisso maior.” (Maria) Ou seja, os

professores estão escolhendo trabalhar com as adaptações de HQ por perceberem

que as mesmas tem uma boa qualidade, sendo fieis a obra original, podendo vir a

ser a porta de entrada dos alunos para leituras mais complexas. A terceira

entrevistada ao ser questionada sobre o porquê de se trabalhar quadrinhos

respondeu: “Em relação ao Quinze e a Dom Casmurro eu não contribui (para a

escolha) porque eu não conhecia as obras antes de utilizá-las.. No entanto, a

receptividade dos alunos foi realmente muito positiva, pois eles acharam

interessante a mistura das imagens (com o texto).” (Francisca). Foi constatado em

observação que a professora Maria foi a principal responsável por inserir o trabalho

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com quadrinhos na escola, sugerindo a possibilidade de trabalho com os mesmos,

mostrando resultados positivos, expandindo o trabalho junto com os seus colegas. E

foi possível perceber a aceitação por parte dos seus colegas, para que eles

obtivessem acesso a resultados positivos com a instrumentação de HQ em sala de

aula.

A segunda etapa das entrevistas foi relacionada a esclarecer como foi o

desenvolvimento do trabalho em sala de aula com HQ. Os entrevistados destacaram

dois pontos principais em relação a isto, a receptividade dos alunos ao trabalho e

sua relação com a linguagem das histórias em quadrinho. O professor João

destacou como foi sua didática, mencionado como as leituras foram feitas em sala e

que à medida que o trabalho foi sendo desenvolvido foi percebido um maior

envolvimento dos alunos. Ele percebeu que em alguns momentos os alunos

sentiram dificuldade com alguns elementos próprios dos quadrinhos, dificuldade

também indicada pela professora Maria em sua entrevista, de acordo com ela: “eu

percebi que alguns alunos sentiram essa dificuldade, tivemos de retomar essa

estrutura, o balão, o narrador que está presente no material que foi adotado.”

(Maria). Para ambos os casos, os professores afirmaram dispor dos recursos

necessários para tirar as dúvidas dos alunos em relação aos elementos das histórias

em quadrinhos. Voltando ao professor João, ele afirmou que o trabalho foi muito

bem recebido pelos alunos, pois era algo que dialogava com os interesses dos

mesmos. A professora Maria, que já havia trabalhado com quadrinhos

anteriormente, não se limitou somente a leitura da obra, ela transpôs a história de O

Quinze do quadrinho para outras linguagens, como a fotografia e o poema, em

trabalhos que contaram com ampla participação dos alunos. E por fim a professora

Francisca destacou em seu relato que também não quis se limitar a leitura da

história em si, mas a leitura do quadrinho como um todo (os elementos gráficos, a

escolha das cores, a expressão dos personagens), ou seja, os aspectos artísticos da

obra. Através destes relatos podemos afirmar que os professores possuíam os

subsídios necessários para conduzir o trabalho com os quadrinhos como eles

merecem ser feitos, explorando suas infinitas possibilidades. E também foi possível

perceber que todos os professores tinham propriedade sobre os quadrinhos que

estavam utilizando, mostrando se aptos a esclarecer as dúvidas dos alunos que

surgiram no decorrer do trabalho.

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Pedagogicamente nos interessou saber quais foram os critérios de avaliação

utilizados pelos professores na condução desse trabalho. O professor João buscou

avaliar dos alunos não só o que eles aprenderam em relação a história contida no

quadrinho, mas também a maneira que ela foi exposta na adaptação comparando

essa forma de linguagem com a linguagem de um livro convencional. Já a

professora Maria quis avaliar o que os alunos apreenderam da obra, mas não no

formato de uma prova convencional, e sim de trabalhos expositivos, produções e

apresentações, focando não a história da adaptação em si, mas nas sensações a

aprendizagens que esta transmitiu para o aluno. Somente a professora Francisca se

limitou ao tradicionalismo e cobrou o conteúdo transmitido pelos quadrinhos na

forma de uma prova escrita. Aqui fica claro que os professores perceberam que o

que pode ser aprendido com o quadrinho é muito mais do que a história que ele está

contando, mas a própria forma que o quadrinho conta a história é digna de atenção

e pelos alunos deve ser percebida.

Por fim serão analisados alguns pontos mencionados pelos professores que

são dignos de nossa atenção. O professor João mencionou o quanto se sentiu à

vontade para trabalhar com o quadrinho selecionado em sala de aula e destacou o

impacto desse tipo de trabalho para a atual geração, que vive conectada à internet e

que tem pouca capacidade de abstrair. “...eles são muito dispersos. Não todos, mais

a maioria, e se houver elementos que favoreçam pra eles imaginarem, melhor. Mais

Aeles vão desenvolver a leitura e a curiosidade também.” (João). Ao final da

entrevista ele ainda afirma que as adaptações literárias em quadrinhos são muito

importantes de serem trabalhadas, mas que não podem ser consideradas isoladas

das obras originais. A professorar Maria menciona que considerou o trabalho um

sucesso, e que foi possível criar a ponte com os alunos para as leituras canônicas

da sociedade, função essa que em sua opinião, é dever do professor. A professora

Francisca menciona o mesmo aspecto, o de que não se podem considerar as

adaptações em quadrinhos isoladas das obras originais, mas que os quadrinhos

também devem ser respeitados na escola, principalmente por causa do momento

histórico em que estamos vivendo em que os quadrinhos estão em evidência, seja

no cinema, seja na WEB, eles fazem parte do cotidiano dos alunos.

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65

4.2 Análise pedagógica do trabalho realizado

Com o suporte de teorias pedagógicas buscamos analisar como ocorreu o

processo de aprendizagem durante a realização do trabalho analisado nesta

pesquisa, atentando para suas principais particularidades que, graças à coleta de

dados, puderam ser evidenciadas. Através da análise dos dados podemos perceber

que aparentemente o processo de aprendizagem se concretizou. Mas não ficam

claro quais foram os elementos que permitiram que tau aprendizagem fosse

alcançada por parte dos sujeitos envolvidos no processo, alunos e também

professores, e nem o grau de sucesso da mesma. Uma leitura destes elementos

através do diálogo com importantes pensadores da educação pode auxiliar para que

fique claro como se deu esse processo.

Podemos analisar este processo sobre a ótica da teoria Sócio Interacionista,

onde teríamos um processo de aprendizagem que se deu graças a interação do

sujeito, aluno, com o conhecimento potencial, as capacidades almejadas pelo

trabalho, através da instrumentalização de uma ferramenta, o quadrinho. Para

Vygotsky (2002) a criança no estágio de construção do seu aprendizado desenvolve

o seu intelecto a partir da interação social com materiais fornecidos pela cultura do

universo daqueles que a cercam. Essa interação como já sabemos, ocorreu através

da proposta idealizada pela escola, os alunos puderam ter acesso a um objeto

histórico cultural carregado de conhecimento potencial que pode vir a ser acessado

pelos alunos. Na teoria Sócio Interacionista, Vygotsky defende o conceito de Zona

de desenvolvimento proximal que, de acordo com ele:

É a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes (VYGOTSKY, 1991, p.97)

Neste caso, o nível de desenvolvimento real dos alunos se refletia como a

capacidade de fazer a leitura de um texto em quadrinhos, um conhecimento que já

pertencia a eles, como foi comprovado pelo questionário, onde 100% dos alunos

afirmou que já haviam lido quadrinhos. E o conhecimento potencial neste caso era

essencialmente: o conteúdo do quadrinho, sua história, e as capacidades para a

compreensão efetiva deste, como por exemplo: vocabulário, contexto histórico

social, linguagem, etc. Conhecimentos estes que de acordo com os dados dos

questionários foram alcançados por boa parte dos sujeitos. Ou seja, percebemos

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que os alunos alcançaram um novo conhecimento que para eles era proximal, ou

seja, um conhecimento capaz de ser alcançados por estes graças as suas atuais

estruturas cognitivas, graças a interação social com o objeto de conhecimento

acarretada pela prática, que por razão desse processo pode ser definida como

educativa.

Ainda sobre este processo, pode-se percebê-lo como dialógico pela ótica de

Paulo Freire. Já que os professores na intenção de fazer com que o conhecimento

fosse alcançado pelos alunos, pensaram em uma estratégia com foco na realidade

do aluno, no contexto histórico e sociocultural deles, através de uma linguagem que

faz parte do seu cotidiano e que dialoga diretamente com eles. Podemos traçar um

paralelo entre a prática estudada nesta pesquisa com a prática de alfabetização que

Paulo Freire desenvolveu para o Plano Nacional de Educação, salvo as diferenças

entre o público-alvo de ambas. As duas práticas possuem como base norteadora

uma prática pensada no aluno, com base no diálogo com este.

E que é o diálogo? É uma relação horizontal de A com B. Nasce de uma matriz crítica e gera criticidade (Jaspers). Nutre-se do amor, da humildade, da esperança, da fé, da confiança. Por isso, só o diálogo comunica. E quando os dois pólos do diálogo se ligam assim, com amor, com esperança, com fé um no outro, se fazem críticos na busca de algo. Instala-se, então, uma relação de simpatia entre ambos. Só aí há comunicação (FREIRE, 1967).

Em seu livro, “Educação como prática da liberdade” (Paz e Terra, 1967),

Freire nos mostra que a educação como ação libertadora e democrática, de poder

ser entendida pelo aluno para que por este possa vir a ser alvo de reflexão, ou seja,

a educação só pode vir a ser ferramenta da libertação quando se comunica com o

aluno. Entendemos que o processo estudado foi dialógico por percebemos que, o

conhecimento que foi construído não foi induzido pelo professor de maneira

expositiva e impositiva, mas sim, construído junto com o aluno, pensado para eles,

partindo dos conhecimentos prévios que possuem sobre o tema e sobre a

linguagem, explorando suas possibilidades e respeitando os seus limites cognitivos.

Ademais sobre a proposta é interessante pensar que ela não almeja somente a

conquista do conhecimento concreto que é vinculado na leitura da história em

quadrinhos, já que ela almeja também que o aluno desperte novos tipos de atitudes

com relação a leitura, e sobre isso podemos recorrer ao pensamento do filósofo e

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pedagogo americano John Dewey em seu livro Experiência e Educação, onde ele

afirma

Talvez a maior de todas as falácias pedagógicas seja a noção de que uma pessoa aprende apenas aquela coisa específica que está sendo estudada no momento. O aprendizado colateral, ou seja, a formação de atitudes duradouras, de preferências e aversões, pode ser, e muitas vezes é, muito mais importante do que a lição de ortografia, geografia ou história apreendida. Porque, fundamentalmente, no futuro são essas atitudes que contam (DEWEY, 1976).

Ao incorporarmos a TIC em sua dupla dimensão, conforme proposta de

BELLONI (2009), propiciamos a todos envolvidos no processo ensino-aprendizagem

a possibilidade de refletir sobre a importância e o papel das mensagens recebidas

por diferentes meios de comunicação e informação e, portanto contribuindo para a

formação do cidadão.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Percebemos que quando o trabalho didático-pedagógico é fruto de um

processo bem planejado, de uma reflexão conjunta, quando leva em consideração

características dos sujeitos envolvidos, ele tende a apresentar bons resultados (foi o

que de fato pudemos observar nesta pesquisa)

Levando-se em conta as expectativas da instituição pesquisada as práticas

realizadas com a Linguagem de quadrinhos foram bem sucedidas, atingindo os

objetivos esperados e em alguns aspectos, superando-os. Mas afinal de contas,

essa pesquisa revela enfim a grande pergunta que sempre é levantada quando se

pensa na inserção e uso de Histórias em Quadrinhos na escola: Quadrinhos são

educativos? Não há sombra de dúvida que sim. O uso de tal linguagem pode ensinar

aos seus leitores os mais diversos saberes, sejam eles informativos, científicos,

filosóficos, de entretenimento, enfim, há uma infinidade de possibilidades de se

ensinar algo a alguém através de Histórias em Quadrinhos.

Mas creio que na verdade, para aqueles que se interessam em saber se a

leitura de quadrinhos é boa para as crianças, a pergunta que necessariamente deve

ser feita é “Quadrinhos podem contribuir de forma positiva para a educação?” Diante

desta pergunta, a resposta não é imediata, visto que no outro caso o conhecimento

em questão não tinha juízo de valor.

Se quadrinhos podem contribuir de forma positiva para a educação de

crianças? Sim, eles podem. Não significa que sempre irão, mesmo dentro da escola.

Os quadrinhos, assim como outros tipos de TIC, possuem um enorme potencial

educativo de possível aplicabilidade para a educação, e nessa pesquisa, fica

evidente que os resultados podem ser muito positivos. Mas fica claro também a

importância do professor na função de mediador do trabalho pedagógico. Para

exercer tal mediação é fundamental que haja apropriação dos saberes referentes a

esta linguagem.

O professor que domina a linguagem dos quadrinhos desenvolverá atividades

que geram conhecimentos significativos tanto do ponto de vista do conteúdo

formal, quanto da leitura de mundo.

Assim, uma postura crítica e reflexiva ligada a linguagem de quadrinhos na utilização

de recurso didático é válida nas diversas abordagens no ambiente escolar,

proporcionando um método agradável, dinâmico e com maior possibilidade de

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diálogos acerca de diferentes temas. Tais estratégias poderão transformar os

pensamentos inadequados a respeito da utilização de Histórias em Quadrinhos em

possibilidades de sensibilização e desenvolvimento de conteúdos de ensino.

Ao final desta pesquisa, diante de tudo o que já foi apresentado nas páginas

anteriores, será apresentada uma proposta de intervenção direcionada para a

instituição analisada. Ao longo da investigação, se pode perceber que o trabalho

pedagógico realizado pelos professores pesquisados foi eficiente, produzindo bons

resultados. A tarefa de pensar alternativas para sua melhoria mostrou-se tarefa

difícil, porém não impossível. Com base no material nos foi possível perceber pontos

da prática realizada que podem ser melhorados, sejam eles em relação aos

elementos da intervenção, dos sujeitos envolvidos nela ou mesmo no cenário em

que ela ocorreu.

Foram elencados cinco (5) pontos importantes que podem vir a ser

melhorados e que com certeza, podem contribuir de forma bastante significativa

para as futuras intervenções, sendo eles: preparo dos docentes, conscientização

sobe a ferramenta, forma de avaliação, expansão do trabalho realizado e introdução

de ferramentas de maior proximidade dos alunos.

O primeiro ponto relaciona-se com a formação dos professores para

desenvolverem práticas pedagógicas com a linguagem dos quadrinhos. Foi

percebido que os docentes da pesquisa demonstraram grande desenvoltura em

mediar o trabalho com o uso de quadrinhos em sala de aula, já que o conhecimento

que os mesmos possuíam na oportunidade era o suficiente para se explorar de

forma adequada as adaptações literárias. Porém, podemos considerar que esses

conhecimentos encontram-se no nível básico, ou seja, eles são capazes de

reconhecer e identificar os elementos de uma história em quadrinhos, mas não são

capazes de explicar o porquê da escolha de determinados elementos para a obra e

que sentidos eles causam. Para agregar maior profundidade ao trabalho realizado e

para sanar qualquer dúvida que possam surgir por parte dos alunos durante o seu

desenvolvimento, os docentes precisam passar por um processo que VERGUEIRO

(2008, p. 31) chama de alfabetização em quadrinhos, “A alfabetização na linguagem

específica dos quadrinhos é indispensável para que os alunos identifiquem as

múltiplas mensagens neles presentes e, também, para que o professor obtenha

melhores resultados em sua utilização”. Um indivíduo alfabetizado na linguagem dos

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quadrinhos é capaz de, além de identificar os elementos de um quadrinho, analisá-

los profundamente em âmbitos de pré e pós produção, identificar o que é roteiro,

argumento, arte conceitual, arte final, a escolha de determinados elementos, fazer a

leitura das imagens, das composições pictóricas e o sentido que essas causam,

entre outros conhecimentos. Esse processo é de fácil resolução, sendo necessário

disponibilizar para os docentes, literatura adequada sobre o tema, que atualmente é

bastante acessível. Ao alfabetizarem-se, estes passam a dispor da bagagem

intelectual necessária para realizar uma intervenção com quadrinhos muito mais

profunda.

Outro ponto destacado foca a relação que alguns indivíduos mantém com as

histórias em quadrinhos. Ao longo deste estudo, foi descrita a trajetória que as

histórias em quadrinhos fizeram para chegar até a mão dos alunos na escola. E

nesse percurso histórico foi construído pela sociedade em geral um estigma nas HQ

de leitura de entretenimento barato, que não podem contribuir em nada na educação

dos jovens. Esse estigma ainda existe, principalmente na visão de alguns

responsáveis pelos alunos. Essa visão pode muito bem ser transmitida para os

alunos e impactar de forma negativa a prática. Acreditamos que essa visão deve ser

combatida na escola, e essa ação deve ser de responsabilidade dos professores e

dos gestores das instituições. Os professores deverão antes e durante sua prática,

demonstrar de que forma a leitura de um quadrinho pode ser tão relevante quando a

leitura de um livro comum. São exemplos disso, os títulos que foram selecionados

durante a coleta de dados desta pesquisa. Já a coordenação, poderá fazer a sua

parte de forma mais direta com os responsáveis pelos alunos, ao evidenciar a

importância do trabalho com paradidáticos na escola, sobretudo com quadrinhos. A

apresentação das razões para se utilizar quadrinhos, os objetivos do trabalho e

também os bons resultados obtidos em experiências anteriores.

Um ponto que na verdade nos trouxe preocupação e que destona de toda a

proposta inovadora de trabalho aqui analisada, é a forma de como o trabalho em

especial com quadrinhos foi avaliado. A forma de avaliação de dois dos três

professores analisados é centrada em uma atividade escrita nos moldes tradicionais

para composição de uma nota ao fim do processo. No nosso atual contexto histórico

social, dispomos de outras opções de avaliação mais eficientes, condizentes com

propostas de trabalho contínuo e menos taxativas. Muitos são os fatores que

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fundamentalmente são responsáveis pela permanência do sistema de avaliação

tradicional: resistência da escola, comodismo, falta de tempo, pressão de pais e

responsáveis, estímulos externos, enfim, pensar em propostas de avaliação

diferenciadas demonstra ser tarefa difícil dentro deste contexto. Mas nos preocupa

saber que os alunos estão sujeitos a um sistema de avaliação que é deficiente em

averiguar o aprendizado do aluno, que não dá conta de identificar outras

capacidades, capacidades estas que justamente foram trabalhadas pela proposta. A

proposta ideal seria de modo processual, centrada nos três eixos do planejamento

estudantil: conceitual, procedimental e atitudinal.

Seria também interessante expandir algo que foi percebido em nossas

observações. Em uma das práticas, a professora trabalhou a adaptação literária em

consonância com o texto original, não necessariamente introduzindo a leitura da

obra original, mas contextualizando a prática para que os alunos entendessem que

aquele material é a adaptação de um texto que por ser em um formato diferente, traz

um entendimento da história de forma diferente. Hora, se o objetivo da escola é

fazer com que os alunos se aproximem das literaturas canônicas e também,

Quando tratada sob o ponto de vista de um paradidático é bastante importante recuperar a leitura sobre a obra original, pois nosso foco de interesse está na obra original. A adaptação aqui é um apoio, uma ferramenta, uma outra leitura. E não podemos nos esquecer disso: a adaptação traz apenas uma leitura da obra original e não a solução, a interpretação definitiva dela (ZENI apud VERGUEIRO, 2008, p.131).

Então, como proposta seria muito interessante em algum momento da

formação dos alunos, talvez no Ensino Médio, trazer a leitura da obra original que foi

trabalhada na forma de quadrinhos. A atividade seria muito interessante, já que a

leitura prévia realizada com quadrinhos sobre a obra dará muito mais subsídios para

que os alunos explorem de forma com maior consistência a obra original. Essa

proposta se aproveitaria também do vínculo afetivo que os alunos por ventura

possam ter feito com a adaptação e permitindo uma leitura mais interessada de um

livro convencional.

E por fim, como última proposta fica um ponto que em nossa opinião ainda

não foi enveredado pela escola: se apropriar das outras tecnologias que fazem parte

do contexto dos alunos. A proposta de se trabalhar com quadrinhos é a de

justamente, dialogar com o aluno na forma de uma linguagem que ele também

utilize, mas os quadrinhos notadamente não são a única linguagem que faz parte do

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cotidiano dos alunos. As tecnologias digitais são amplamente utilizadas pelos

alunos, e por eles são apropriadas. Existem muitas possibilidades de difundí-las nas

práticas escolares. Dentro dessa proposta existem diversas formas de introduzi-las.

Na coleta de dados, um docente ao menos afirmou que fez em sala produção de

histórias em quadrinhos. Pois bem, já mencionamos que a produção de histórias em

quadrinhos envolvem competências que os alunos possam não vir a possuir. Mas

existem na WEB muitos sites com aplicativos de produção de quadrinhos como o

Pixton, stripgenerator, o makebekiefs comics, entre outros. São ferramentas muito

dinâmicas e fáceis de utilizar, não exigindo dos usuários a habilidade de desenhar.

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VYGOTSKY, Lev S. A Construção do Pensamento e da Linguagem. 1 ed. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

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_________________. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. 4ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991.

_______________. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

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ANEXOS

Anexo 1 - QUESTIONARIO DE PESQUISA (ALUNO)

Obrigado por dedicar parte do seu tempo para responder este questionário. Não há necessidade de identificação, suas respostas ficarão totalmente anônimas e se tiver qualquer

dúvida sobre o questionário, fale comigo [email protected] Sua participação é muito importante!

1. IDENTIFICAÇÃO

1.1 Faixa etária? 8 a 10 anos ( ) 11 a 15 anos ( ) Acima de 15 anos ( )

1.3. Qual é o seu nível? Ensino Fundamental ( ) Ensino Médio ( )

2. CONTATO COM O OBJETO DE ESTUDO.

2.1. Você já leu quadrinhos? Sim ( ) Não ( )

2.2. Qual é a sua opinião sobre histórias em quadrinhos? Não gosta ( ) Indiferente ( )

Gosta ( ) Fã ( )

2.2.1 Com que frequência você lê quadrinhos? Raramente ( ) De vez em quando ( )

Constantemente ( )

2.2.2. Através de que maneiras você normalmente tem acesso a quadrinhos?

Livros didáticos ( ) Livros paradidáticos ( ) Redes sociais ( ) Blogs ( ) Bancas ( )

Livrarias ( ) Jornais ( ) Amigos ( ) Sebos ( ) Bibliotecas ( ) Cinema ( )

Internet ( ) Outros meios ( )

3. SOBRE O USO DE QUADRINHOS NO ENUNCIADO DAS QUESTÕES.

3.1. Você já teve de responder questões que continham quadrinhos no enunciado?

Sim ( ) Não ( )

3.2. Com que frequência? Raramente ( ) Constantemente ( )

3.1.1. Se sim, você acha que para responder a questão, os quadrinhos :

Atrapalharam ( ) Dificultaram ( ) Não contribuíram em nada ( ) Tornaram a questão mais

atraente ( )

Auxiliaram para que eu entendesse o que estava sendo proposto ( ) Me divertiram ( )

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3.1.2. Que tipos de conhecimentos essas questões envolviam?

Linguístico (Leitura, escrita,

interpretação, etc.)

De mundo (Atualidades, comportamento,

cultura, etc.)

Lógico (Figuras, formas, espaço,

medidas, etc.)

Científico (Dados, fatos científicos, fórmulas,

etc.)

Histórico (Fatos históricos, modos de

vida, períodos antigos, etc.)

Artístico (Analise do desenho, da vertente

artística, da forma como foi produzido, etc.)

Geográficos (Paisagens, lugares,

regiões, etc.)

Pessoal (Sua opinião pessoal sobre determinado

tema)

3.2. Na sua opinião questões que possuem quadrinhos devem:

Deixar de ser abordadas na escola ( )

Diminuir sua frequência na escola ( )

Manter sua presença na escola ( )

Aumentar sua presença na escola ( )

Expandir para outras formas de trabalho na

escola ( )

Por quê?

__________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________

4. SOBRE O USO DE QUADRINHOS COMO LEITURA OBRIGATÓRIA NA

ESCOLA.

4.1. Você já teve de ler quadrinhos como parte dos livros indicados como leitura obrigatória na

escola?

Sim ( ) Não ( )

4.1.1. Se sim, você acha que a leitura de um quadrinho em relação à leitura de um livro:

É mais difícil ( )

É boba ( )

Não é diferente ( )

É mais fácil ( )

É mais atraente ( )

É mais significativa ( )

4.1.2. Após a leitura do quadrinho sugerido pela escola, você sentiu:

Aversão ao gênero ( )

Alívio por ter acabado ( )

Nada de diferente ( )

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Vontade de Ler mais sobre a historia ( )

Vontade de ler outro quadrinho ( )

Vontade de ler outras coisas ( )

4.2. Em relação a escola sugerir quadrinhos como leitura obrigatória, você acha que isso deve:

Parar ( )

Ser menos frequente ( )

Continuar ( )

Ser mais frequente ( )

Ser regra para todos os

anos ( )

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Anexo 2 - QUESTIONARIO DE PESQUISA (PROFESSOR)

Obrigado por dedicar parte do seu tempo para responder este questionário.

A finalidade dessa pesquisa é verificar a visão de professores sobre o uso da linguagem de

quadrinhos como recurso didático-pedagógico em sala de aula.

Não há necessidade de identificação, suas respostas ficarão totalmente anônimas e se tiver qualquer

dúvida sobre o questionário, fale comigo [email protected]

Sua participação é muito importante!

1. IDENTIFICAÇÃO

1.1. Quais disciplinas você ministra atualmente?

___________________________________________________

1.2 Ministra(ou) aulas na(o) : Educação Infantil ( ) Ensino Fundamental ( ) Ensino Médio ( )

Ensino Superior ( )

1.3 Tempo de carreira: 1 a 5 anos ( ) 6 a 10 anos ( ) Mais de 10 anos ( )

2. CONTATO COM O OBJETO DE ESTUDO.

2.2. Qual é a sua familiaridade com a linguagem de quadrinhos?

Indiferente ( ) Reconhece o meio ( ) Leitor ( ) Entusiasta ( )

2.3. Você já utilizou quadrinhos em sala de aula?

Sim ( ) Não ( )

3.1. CASO NÃO TENHA UTILIZADO

3.1.1. Pretende utilizar? Sim ( ) Não ( )

Por quê?

:__________________________________________________________________________________

___

__________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________

_______________________________________

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3.2. CASO JÁ TENHA UTILIZADO

3.2.1. De que forma os quadrinhos já foram utilizados em sua prática educativa?

Como leitura obrigatória ( ) Como leitura opcional ( ) No enunciado das

questões ( )

Como exemplo do conteúdo ( ) Como produção textual ( )

3.2.2. Quais aspectos você considera ao utilizar os quadrinhos ao invés de outros tipos de textos

em sua prática educativa?

Sua leitura é mais rápida ( ) Acrescentam elementos ao conteúdo ( ) São fáceis de

trabalhar ( )

São atraentes para os alunos ( ) Contemplam de forma satisfatória os meus objetivos

pedagógicos ( )

3.2.3. Que capacidades você acredita que possam vir a ser desenvolvidas/aprimoradas pelos

alunos através da leitura de quadrinhos na escola?

Leitura Raciocínio lógico Conduta ética e

cidadã Criatividade

Escrita Reconhecer

padrões Contextualização Senso Crítico

Vocabul

ário

Reconhecimento

de símbolos

Posicionamento

geográfico

Utilização da

língua nas mais

diversas formas

Interpre

tação Memorização Socialização Estimulo a leitura

Justificativa:________________________________________________________________________

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__________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________

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3.2.4. Ao se depararem com uma Atividade/Exemplificação/Explicação/Questão que envolva

quadrinhos, a reação dos alunos tem se mostrado:

Ruim ( ) Satisfatória ( ) Boa ( ) Excelente ( )

3.2.5. A partir disso em relação ao trabalho com quadrinhos na escola, você pretende:

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Encerrar o trabalho ( ) Diminuir a frequência ( ) Dar continuidade ( ) Aprimorar ( )

Expandir ( )

4. QUANTO A RELAÇÃO DO OBJETO DE ESTUDO COM A EDUCAÇÃO NO

ATUAL CONTEXTO NACIONAL.

4.1. Qual é a sua opinião sobre o aumento das opções de Quadrinhos como materiais

paradidáticos para as escolas?

Deve parar ( ) Deve continuar ( ) Deve aumentar ( ) Não sou capaz de opinar ( )

4.2. Qual é a sua opinião sobre a aquisição/solicitação desse tipo de material pelas escolas:

Deve parar ( ) Deve continuar ( ) Deve aumentar ( ) Não sou capaz de opinar ( )

4.3. Qual é a sua opinião sobre a presença expressiva de questões em concursos e exames

envolvendo quadrinhos:

Deve parar ( ) Deve continuar ( ) Deve aumentar ( ) Não sou capaz de opinar ( )

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Anexo 3 - ENTREVISTA Professor 1 – João

Como foi a seleção do material? Porque Quadrinhos?

Bom, nós nos reunimos no começo desse ano para planejar o material que iriamos abordar esse ano.

Sabíamos que dentre os livros da seleção deveriam constar quadrinhos por causa de tudo o que eles

ajudam na leitura com os alunos nê? Em relação ao referencial visual que eles oferecem. Com o

sucesso do trabalho que a professora “Maria” havia desenvolvido no ano anterior, decidimos

continuar com o quadrinho “O Quinze”, daí decidimos pegar também “Dom Casmurro” pela

importância da obra e “Clube do Terror” para os meninos mais novos além das outras literaturas.

Como foi o desenvolvimento do seu trabalho com os quadrinhos?

A gente trabalhava com rodas de leitura, cada um lia um pouquinho, e quando eles sentiam a

necessidade eles mostravam as imagens pro restante dos colegas, quando eles viam que o quadrinho

tinha alguma coisa a destaca. E ai as vezes eles perguntavam como é que funcionava aquelas caixas

de quadrinhos (enquadramento). Não é que eles não entendiam, é que eles ficavam em dúvida se

aquilo causava algum efeito, eles percebiam que as vezes as imagens vinham esfumaçadas, e eu

perguntava pra eles “porque as imagens vem esfumaçadas? Qual é o propósito do auto com isso? Ah

é pra dar um ar de mistério, suspense, ou porque ela estava triste ou porque ela estava feliz?” Tem

momentos no quadrinho do Dom Casmurro que mostra os flashback dos personagens, e quando

tinha um flashback a coloração do quadrinho mudava completamente. E eu perguntava pra eles:

“Porque ficou cinzento? Porque a coloração mudou?” e eles me respondiam é porque é um

flashback, é uma lembrança. Dessa forma é como se eles estivessem vivenciando um filme, que é a

forma mais próxima de se chegar a algo que eles gostam, que é series e filmes, e eles vem o

desenrolar da história quase se mexendo. Então isso pra eles é muito bom, porque os meninos tem

uma capacidade muito ruim de imaginação pra esses contos. No caso da história de Dom Casmurro,

eles tem dificuldade pra imaginar o que acontece. Então o quadrinho ajuda eles a ver o que

aconteceu, como era o personagem, como ele andava, como ele se comportava, como era na época,

isso ajuda a eles a visualizar. Então o quadrinho é impressionante por isso, porque dá vivência a

história. Porque eles visualizam a cena, a grande dificuldade que eu tenho em ler narrativas comuns

é que esses meninos tem muita dificuldade de prender a atenção, e contando a história eles se

perdem no meio pensando outras coisas porque não conseguem imaginar a cena, naquele lapso eu

perco um momento importante da história, e isso já acontece mais com os miseráveis em que a

gente lê o texto mesmo do livro (...).

Como professor de português, você acha que é importante nessa fase ter um referencial visual

(para a leitura)?

Muito, pra idade deles é. Porque se não eles não conseguem imaginar, porque eles são muito

dispersos. Não todos, mais a maioria, e se houver elementos que favoreçam pra eles imaginarem,

melhor. Mais eles vão desenvolver, a leitura e a curiosidade também. Porque o quadrinho é muito

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legal pra eles enquanto um momento de abstração da obra mas eles não podem deixar de ler a obra

original, porque ela traz a crítica mais real que o autor quis passar, o quadrinho passa a história mais

ele não é tão fiel quanto o autor original. E quando eles leem a obra original, eles conseguem abstrair

além do vocabulário que é importantíssimo eles conseguem vivenciar isso de uma forma mais

próxima da realidade.

Você se sentiu à vontade para utilizar quadrinhos em sala de aula?

Assim, quando a gente escolheu os quadrinhos eu tive que levar pra casa porque eu nunca tinha lido

Dom Casmurro em quadrinhos, então eu fui ler ele inteiramente em casa, fui ver os quadros, os

elementos, porque tinha aquela coloração, porque tinha aquela imagem porque eu sabia que isso

poderia despertar a curiosidade deles em sala de aula. E eu já tinha lido Dom Casmurro antes, já

tinha tido contato com a obra, então aquilo ali foi só um retrato do que eu já tinha visto. Então eu

sabia que eles iriam ter curiosidade.

Então conhecer a obra foi importante pra você identificar os recursos do autor (da adaptação

utilizou), o porque ele utilizou tal coisa.

Isso, isso. Mas inclusive pra mim enquanto professor foi importante ler o quadrinho de Dom

Casmurro porque eu consegui visualizar outro lado da história que eu não tinha conseguido ter visto.

Fiquei muito surpreso por eu ter gostado, porque eu tinha um preconceito com quadrinhos das

literaturas originais, eu achava que eles não iam conseguir representar da mesma forma, mas não

eles além de representarem muito bem eles conseguem transmitir uma veracidade muito grande da

obra, não é igual, mas é muito próximo.

Como é que foi a sua avaliação? Que critérios você utilizou para avaliar o trabalho?

Pra esse final de semestre como a gente tá lendo dois livros, o Dom Casmurro e no segundo Os

miseráveis, a gente tá fazendo um trabalho com os dois textos. Então eu quero que eles analisem o

texto de Os Miseráveis enquanto literatura original e analisem o Dom Casmurro enquanto

quadrinhos. Eu vou pedir que eles façam essa analise em forma de texto, que eles escrevam um

texto pra mim falando o que eles encontram de diferente nas duas obras. Eu quero ver se eles tem

essa percepção da leitura, e se eles vão conseguir transmitir isso através do texto. Eu quero ver no

que eles escrevem no que eles se prendem mais e como eles conseguem desenvolver isso.

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Anexo 4 - ENTREVISTA Professor 2 – Maria

Quais foram os critérios para a seleção das adaptações em quadrinhos “O Quinze” e “Dom

Casmurro”? Porque quadrinhos?

Bom, o gênero HQ é um gênero que eu percebo que é bem acessível a turma de agora, aos alunos de

agora. É uma leitura mais dinâmica. Primeiro que as HQ que a gente tem percebido, as adaptações

que eu tenho percebido como O Quinze e Dom Casmurro eles têm sido fieis ai a própria narrativa. E

eu percebo que torna se uma linguagem mais dinâmica pra eles, um envolvimento maior mesmo

com o objetivo que eles tenham acesso a uma literatura engajada, uma literatura que tenha um

compromisso maior.

Você sentiu alguma dificuldade no trabalho com quadrinhos?

Olha, eu sempre fui uma leitora de quadrinhos, fui alfabetizada também (pelos quadrinhos) e a

minha filha também quando ela começou a se alfabetizar eu fiz logo a assinatura (de gibis) e gosto

também desse gênero. Assim, as dificuldades das questões conceituais eu não tive não. Agora eu

percebi que alguns alunos, a própria leitura da estrutura dos quadrinhos, alguns, não foram todos,

não sabiam se liam pra baixo, se liam pro lado, e isso me chamou a atenção. A princípio eu achava

que isso era algo já dado, e que na nossa época era algo tão simples nê? Mas eu percebi que alguns

alunos sentiram essa dificuldade, tivemos de retomar essa estrutura, o balão, o narrador que está

presente no material que foi adotado. Mas dessa questão da estrutura de maneira geral, não.

Como é que foi a sua avaliação? Que critérios você utilizou para avaliar o trabalho?

O principal objetivo na verdade foi que eles tivessem contato com a literatura que a gente diz que

são literaturas canonizadas hoje nê? Rachel de Queiroz que eu trabalhei com a turma de 8º ano e

Machado de Assis com a turma do 9º ano. A princípio o contato com a narrativa, trazer esse

clássico pra sala de aula mesmo e a HQ acho que foi uma mão na luva. Mas não ficar só na

questão da leitura em si, a gente procurou desenvolver um projeto com eles que além da

reflexão sobre as temáticas que são abordadas nas duas narrativas, transpor para outros

gêneros. O Quinze por exemplo, a partir da narrativa por exemplo eles fizeram poemas, e

poemas que nós já tínhamos trabalhado em sala de aula, a estrutura do soneto, algo mais do

clássico mesmo. E o que eu falei pra eles:” Pessoal, agora nós vamos ser desafiados em

trazer essa narrativa para o poema e uma pessoa que lê o poema vai dizer - pô isso aqui está

O Quinze” por exemplo. Além disso, que é uma outra linguagem, trabalhar com a fotografia,

e (fazer) com que eles fizessem uma comparação entre 1915 a 2016 que estamos, como está

essa seca hoje? Será que as pessoas vivem mesmo dessa maneira? Será que algo mudou?

Então na verdade eu quis fazer com que eles sentissem o impacto, e a narrativa em si já é

impactante. E eu percebi uma resposta muito positiva dos alunos, eles (disseram) “Ah

professora, eu nunca imaginei” a momentos da narrativa que eles disseram “Professora, isso

aqui existiu mesmo? Esse personagem existiu mesmo?” Então esses levantamentos que eles

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fizeram foi assim, impressionante. Muito gratificante o trabalho. E eu tenho a certeza que O

Quinze ficará pra sempre na cabecinha desses meninos.

Para finalizar, você consegui atingir os objetivos desse trabalho?

Ah sim, com certeza. O principal objetivo é essa ideia mesmo do contato com a leitura e

romper um pouco, não desmerecendo/desvalorizando qualquer leitura que eles façam hoje

de qualquer gênero. Mas eu acho que nós professores temos esse compromisso, de trazer

para essa meninada ai narrativas que fazem parte da nossa história, escritores que tiveram,

e tem ai e são imortais. Esse compromisso com a humanidade nê? Então acho assim, eu

acredito que houve essa sensibilização mesmo, que eles se encantem.

Anexo 5 - ENTREVISTA Professor 3 – Francisca.

Quais foram os critérios para a seleção das adaptações em quadrinhos “O Quinze” e “Dom

Casmurro”? Porque quadrinhos?

Em relação ao Quinze e a Dom Casmurro eu não contribui (para a escolha) porque eu não conhecia

as obras antes de utiliza-las. No entanto a receptividade dos alunos foi realmente muito positiva, pois

eles acharam interessante a mistura das imagens (com o texto). Quem trouxe a proposta foi a

professora Maria, e no momento que ela disse que seriam em quadrinhos eu achei “super”

interessante para se trabalhar com os alunos porque eu sabia que eles iriam ter interação com a

obra, que eles conseguiriam visualizar mais facilmente o que de fato acontece na obra.

Como foi o desenvolvimento do seu trabalho com os quadrinhos?

Primeiro, fazer relação da imagem com o contexto da história, principalmente “O Quinze” que

mostra um cenário muito árido e que eles não teriam essa visibilidade apenas com a linguagem do

autor da obra original. Então toda a imagem envolve um tom vermelho, um tom de terra, que

realmente mostra a secura do nordeste, no caso o Ceará na época, então ela favoreceu. Então eu

tive o cuidado de mostra para os alunos o contexto em que a história se passava junto com imagem

pra que eles pudessem compreender a ideia do texto. E com relação a Dom Casmurro, a imagem é

um tanto quanto caricata, não é uma imagem “bonitinha”, mas também não é uma imagem feia, é

como se fosse a personalidade aflorando pela imagem no texto. E os meninos puderam fazer o

seguinte, a leitura também de como a expressão facial, de como a imagem do personagem se

inteirava com o contexto, então isso foi também muito interessante. Então foi bem assim, a leitura

foi feita pra todos, eles fizeram leitura coletiva, e com relação a Dom Casmurro especificamente, eu

fiz uma votação na sala para quem seria Dom Casmurro, Bentinho e Capitu e que eles dessem vida

para os personagens com a voz deles e quando os outros colegas escutassem, já associariam aquela

voz especifica para o personagem.

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“Que capacidades podem ser desenvolvidas/aprimoradas com o uso dos quadrinhos?” Justificativa

Porque a junção da imagem com o texto, primeiro que chama a atenção do aluno, ele é bem visto, e

as características dos quadrinhos favorecem a criticidade do aluno. Uma expressão facial, um termo

mais adequado, o próprio quadrinho chama a atenção do aluno para determinadas situações do

cotidiano e a sociedade de modo geral.

Como é que foi a sua avaliação? Que critérios você utilizou para avaliar o trabalho?

Bem, foi uma prova do paradidático, uma prova escrita que falava basicamente do contexto, mas a

associação da imagem com o contexto favoreceu para que eles conseguissem compreender a história

de modo geral e eles utilizaram isso também como resposta. Principalmente em “O Quinze” em que

a imagem ficou muito, muito bem elaborada e eles conseguiram fazer essa relação. Foi uma prova

escrita com 5 questões que envolviam o enredo e particularidades das personagens em si.

Você havia mencionado em outra oportunidade que não conseguia enxergar o quadrinho de forma

isolada, que ele serviria como porta de entrada para a obra original. Me fale um pouco mais sobre

isso.

Por que é o seguinte. A gente vê hoje que muitos alunos têm dificuldade de leitura, ou falta de

incentivo, os pais não buscam então eles as vezes não tem por onde começar. Muitas vezes eles

chegam pra mim: “professora eu queria ler mais, como eu vou ler mais?” Sempre minha indicação

começa por um quadrinho porque ele realmente estimula todo o aspecto social, crítico, escrito,

visual do aluno e que eles possam a partir daí ir para leituras mais sérias, de leituras em textos na

integra sem necessariamente ter imagens, a gente começa pela imagem depois passa pela escrita e

por ai em diante vai seguindo um raciocínio. Mas eles tem muita dificuldade, eles não sabem por

onde. Uma coisa boa que aconteceu com a vertente desses filmes da Marvel e da DC comics é que

eles tem a curiosidade de fazer a leitura desses textos e depois partir para outros