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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE EDUCAÇÃO CURSO DE PEDAGOGIA JONAS ALVES BEZERRA DE MENDONÇA O FRACASSO ESCOLAR: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O PAPEL DA ESCOLA Natal/RN 2019

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE EDUCAÇÃO

CURSO DE PEDAGOGIA

JONAS ALVES BEZERRA DE MENDONÇA

O FRACASSO ESCOLAR: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O PAPEL

DA ESCOLA

Natal/RN

2019

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JONAS ALVES BEZERRA DE MENDONÇA

O FRACASSO ESCOLAR: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O PAPEL DA

ESCOLA

Trabalho de Conclusão de Curso na forma de

Monografia apresentado ao Curso de Pedagogia

do Centro de Educação da Universidade Federal

do Rio Grande do Norte, como requisito parcial

para obtenção do grau de Licenciado em

Pedagogia.

Orientador: Prof. Dr. Gilberto Ferreira Costa

Natal/RN

2019

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Mendonca, Jonas Alves Bezerra de.

O fracasso escolar: algumas considerações sobre o papel da escola / Jonas Alves

Bezerra de Mendonca. - Natal, 2020.

31 f.: il.

Monografia (Graduação) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de

Educação, Pedagogia.

Orientador: Prof. Dr. Gilberto Ferreira Costa.

1. Fracasso escolar - Monografia. 2. Educação brasileira - Monografia. 3. Escola -

Monografia. I. Costa, Gilberto Ferreira. II. Título.

RN/UF/BS - Centro de Educação CDU 37.015.3

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JONAS ALVES BEZERRA DE MENDONÇA

FRACASSO ESCOLAR: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O PAPEL DA

ESCOLA

Trabalho de Conclusão de Curso na forma de

Monografia apresentado ao Curso de Pedagogia

do Centro de Educação da Universidade Federal

do Rio Grande do Norte, como requisito parcial

para obtenção do grau de Licenciado em

Pedagogia.

Trabalho avaliado em: 10. 12. 2019

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________________

Prof. Dr. Gilberto Ferreira Costa

Orientador/Departamento de Práticas Educacionais e Currículo – DPEC

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE (UFRN)

______________________________________________________

Profa. Dra. Marisa Narciso Sampaio

Departamento de Práticas Educacionais e Currículo – DPEC

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE (UFRN)

_____________________________________________________

Profª Ms. Ariane Rochelle Mendonça

Departamento de Práticas Educacionais e Currículo – DPEC

Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

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Dedico esta produção ao meu pai Francisco e minha

mãe Enedina, que não estão mais presentes nesta

terra.

Aos meus irmãos Netto, Júlio César e Cecília

Rejane, pelo acompanhamento, conforto, auxílio,

afeto e esperança na minha pessoa.

A minha esposa Polyana e meu filho Pedro

Francisco, pela paciência, amor e carinho.

Aos meus sobrinhos Wallace, Karol, Nandinho,

Nathalia, Nara, Maria Clara e Maria Júlia.

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AGRADECIMENTOS

Ao orientador Gilberto Ferreira Costa pela empatia.

À amiga Rozangela Souza pela espontaneidade e companheirismo.

A Netto Silva e Jefferson Câmara, amigos da disciplina optativa para o curso da vida.

A Germano Ferreira, amigo de muitas jornadas e outras que virão.

Ao professor João Valença pela força e motivação.

Ao professor Flávio Boleiz pelas primeiras sementes dadas ao trabalho de conclusão de

curso.

A Renato Maia pela solidariedade anárquica.

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RESUMO

A presente monografia apresenta reflexões teóricas acerca do tema fracasso escolar.

Tem como objetivo principal compreender alguns aspectos que provocam o fracasso

escolar, entendendo-o enquanto fenômeno complexo, parte de um sistema político e

educacional amplo, complexo e diverso. A construção desses entendimentos se deu a

partir de pesquisa bibliográfica na qual foram levantados materiais que discutem a

temática com vistas à construção de um primeiro entendimento acerca do fenômeno.

Contribuíram com essa construção autores como Arroyo, (2000). Bernad Charlot

(2000), Phillipe Perrenoud (2001), entre outros. O trabalho nos permite constatar que o

fracasso escolar ainda se constitui, na atualidade, como um problema marcante na

educação brasileira. Entre outras inúmeras formas de enfrentamento do problema

apontamos que uma delas deve se dar a partir da construção de políticas de inclusão dos

sujeitos ao ambiente escolar, além da construção de concepções escolares e de formação

dos estudantes que valorizem suas culturas e suas realidades.

Palavras-chaves: Fracasso escolar. Educação brasileira. Escola.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.................................................................................................. 8

2 AFINAL O QUE É O FRACASSO ESCOLAR.............................................. 9

3 ALGUNS NÚMEROS QUE AJUDAM A ENTENDER ALGUNS

DESAFIOS DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA................................................. 21

4 A EVASÃO DOS ESTUDANTES NO CONTEXTO DO FRACASSO

ESCOLAR........................................................................................................... 24

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................. 26

REFERÊNCIAS................................................................................................. 27

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1 INTRODUÇÃO

O fracasso escolar, enquanto um dos problemas vinculado às grandes questões

da educação brasileira, aparece como um tema fértil, bastante debatido no meio

educacional, com vasta produção que discorre sobre o tema, mas ainda não totalmente

enfrentado. Visto sob diferentes enfoques e pontos de vista o fenômeno desperta

inquietação de inúmeros pesquisadores, professores, gestores e especialmente os cursos

de formação de professores quando no debate estão as grandes questões da educação

brasileira.

O interesse em discutir, nesse trabalho, o fracasso escolar decorre de

inquietações que me foram despertadas como aluno do curso de Pedagogia na UFRN.

As muitas discussões que assisti e das quais participei anunciavam uma escola completa

de desafios. Durante todo o curso convivi com professores compromissados com a

escola pública, preocupados com a realidade da educação brasileira, contudo cheios de

esperanças e de expectativas em torno da nossa atuação como profissionais da

educação. Assim, convivendo diariamente com discussões em torno da escola e ao

mesmo tempo sensibilizado com os problemas que pude perceber durante as atividades

de campo em que eu estive presente nas escolas, como os Estágios Supervisionados, por

exemplo, além de outras atividades realizadas no contexto das escolas, é que o tema

fracasso escolar foi se construindo como possibilidade de escrita.

Relevante é destacar que não se pretende neste artigo explorar com profundidade ou

adentrar de forma complexa no tema. Busca-se, compreender como a ideia de fracasso

escolar aparece em alguns autores destacando quais algumas causas que o provocam.

A construção deste artigo, a partir da escolha do tema de pesquisa, se deu

considerando as definições de uma pesquisa qualitativa que se construiu por meio de

uma pesquisa bibliográfica cujas condições me permitiram aproximar-me de um certo

referencial teórico e dissertar sobre o tema buscando dialogar com os autores lidos

(MINAYO, 1994).

Nesse texto, início pelo item 1. Introdução onde esboçamos algumas ideias sobre a

construção do trabalho. Em seguida, damos continuidade com o ítem 2. Afinal, o que é

fracasso escolar onde buscamos caracterizar o fenômeno do fracasso escolar

identificando algumas de suas causas. Na sequência, apresentamos o ítem 3. Alguns

números que ajudam a entender alguns desafios da educação brasileira no qual

indicamos algumas taxas e percentuais relativas a educação brasileira no sentido de

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apontar que ainda temos muito a avançar em busca de superar os desafios postos. Em

seguida, no item 4. A Evasão dos estudantes no contexto do fracasso escolar fazemos

algumas considerações acerca da evasão escolar colocando-a como um recorte dentro da

grande temática. E, por fim, encerramos o trabalho com 5. Considerações finais

apresentando algumas possibilidades de enfrentamento do fracasso escolar.

2 AFINAL O QUE É O FRACASSO ESCOLAR

Abordar o fracasso escolar não é uma tarefa fácil e simples para um problema

comum e complexo no contexto da educação brasileira (PEDRALLI; RIZZATTI,

2013). Mesmo sendo um fenômeno perceptível nas mais diversas realidades e regiões

que compõem o Brasil, as leituras sobre o tema apontam diferentes perspectivas quanto

suas causas e efeitos na educação pública. Diante disso, identificar suas origens sem

fazer uma análise e reflexão profunda acerca desse fenômeno seria correr riscos como o

de aceitar determinismos vigentes e vagos no que concerne ao tratamento do assunto.

Visitando parte da literatura que trata dessa temática encontramos de forma

muito visível dois fatores que tentam responder às causas do fracasso escolar. Tais

fatores também buscam traçar conjunturas resultantes desse fenômeno. Portanto, o

fracasso escolar se explica por fatores extra-escolares e intra escolares (CORTELLA,

2011).

Como estratégia a escola e o poder público transfere para o aluno os problemas

escolares e nessa condição ele tende a ser visto como um sujeito imbuído de processos

plurais e singulares, cujas origens se explicam a partir de aspectos que são

desencadeados dentro e fora da instituição. São estes fatores - internos e externos – que

buscam explicar o problema do fracasso escolar e recaem sobre o aluno e que, de

alguma forma, prejudicam e chegam a comprometer o seu desempenho na escola, seja

na sua permanência no sistema de ensino, seja provocando a sua evasão, a reprovação,

entre outros.

Existem diversos estudos e pesquisas científicas que tentam colaborar,

interpretar e deslocar possíveis respostas mais categóricas, entretanto, elas não

conseguirão obter respostas contundentes do que poderia vir a ser o motivo de suas

causas, visto que para uma nação de dimensões continentais com características

regionais distintas e peculiares como é o caso do Brasil, procurar reduzir essa

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problemática a dados comuns seria insuficiente e ao mesmo tempo arriscado cair em

generalizações. É difícil termos a compreensão quantitativa e qualitativa de um

fenômeno dessa natureza que emerge em quase todos os espaços escolares e, não

somente, para além dos muros dele. Nesse nível de dimensão torna-se impossível

apenas diagnosticar cada caso de acordo com suas manifestações e características

somente locais sem relacionar com os processos e fenômenos globais.

Considerado entre uma das maiores problemáticas no sistema de educação

brasileiro o fracasso escolar ocupa significativo espaço na produção de conhecimento

no campo da educação. Não só isso, a discussão e as reflexões sobre esse fenômeno se

fazem presentes todos os dias no cotidiano das escolas, na rotina escolar dos

professores, nas famílias que enfrentam continuamente as situações de insucesso na

aprendizagem das suas crianças, dos jovens e dos adultos.

Historicamente presente na realidade educacional o fracasso escolar se estampa

em tempos atuais. Essa é uma questão que, mesmo no nosso século, considerado como

hodierno do ponto de vista das tecnologias, da mecanização e da robotização, tem uma

marca muito forte. Se considerarmos que na década de 90 tivemos a promulgação da

nossa Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 93/94), e estamos falando

de um recorte temporal de mais de duas décadas, já traz em seus princípios garantias

como a igualdade de condições e permanência para todos, além da garantia de

manutenção de um padrão de qualidade, nos perguntamos porque ainda temos tantas

situações de insucesso nas escolas. É na referida Lei que podemos encontrar o que prevê

o Art. 3º principalmente no que expressa os incisos I: “I - igualdade de condições para o

acesso e permanência na escola”, e mais ainda o inciso IX que diz: “IX - garantia de

padrão de qualidade;”.

Assim, pela lei todos os cidadãos brasileiros têm direito à educação e a uma

educação de qualidade. Contudo, mesmo com a garantia da lei permanecem ainda

inúmeras questões até então sem soluções a curto e médio prazo. Mesmo em pleno

século XXI, quando grande parte da sociedade vive sob a égide da tecnologia e dos

processos de robotização, da economia globalizada, por que ainda enfrentamos

situações como evasão, repetência, reprovação, distorção idade-série, contrastes sócio-

econômicos entre outros tantos problemas na educação brasileira?

Para além da LDB outros documentos oficiais que foram publicados a partir de

1996, como os Parâmetros Curriculares Nacionais/PCN, entre outras normatizações da

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Educação Básica, traduzem o sentimento e o desejo de mudanças na educação. As

Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica (DCN) publicadas pelo

Ministério da Educação são um exemplo disso. De acordo com as palavras do ministro

da educação em 2013, as DCN se tornaram próprias para “...um instrumento efetivo

para reinvenção da educação brasileira e a construção de uma Nação cada vez mais

justa, solidária e capaz de desenvolver todas as suas inúmeras potencialidades” (DCN,

2013).

Assim, a partir do entendimento que o fracasso escolar é um problema de

natureza complexa, com causas que se interrelacionam sob diferentes condicionantes,

trataremos de explicitar a seguir como o fracasso escolar tem sido compreendido por

alguns autores.

Para as autoras Paula e Tfouni (2009), o fracasso escolar é um construto antigo

entrelaçado na história da educação brasileira, marcada no seu seio por exclusões,

indiferenças e preconceitos, onde ter o acesso nem sempre garantiu a permanência e

dedicação do aluno na sala de aula. Ainda segundo as autoras:

As primeiras formulações sobre o fracasso, datam do final do século

XIX, foram de cunho racista e médico (...) fortemente influenciadas

pelo darwinismo social, baseavam-se em procedimentos

antropométricos que buscavam produzir provas empíricas sobre a

inferioridade de pobres e não-brancos, procurando justificar as

diferenças sociais entre estes e a classe dominante. (PAULA;

TFOUNI, 2009, p. 119).

Pensando a educação brasileira, entendemos que no nosso país a história do

fracasso escolar não é recente. Por séculos, vivemos e continuamos vivenciando

contradições das mais diversas. Nesse sentido, o próprio Perrenoud (2001, p. 16) nos

ajuda a entender quando afirma que:

(...) Sempre houve fracassos, porém eram parcialmente ocultos pela

importância dos abandonos ou pela ausência total de escolarização.

Os fracassos também eram mascarados pela estrutura escolar, que

geralmente separava os alunos desde seu ingresso na escola (...)

(PERRENOUD, 2001, p. 16).

Nesse sentido, uma revisão acerca da história da educação brasileira nos permite

visualizar e entender que o fracasso escolar, principalmente se olharmos por uma lente

crítica, tem nos acompanhado por séculos.

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De fato, não se restringindo apenas à classificação que emoldura as suas causas a

fatores internos e externos, o fracasso escolar compreendido nos seus aspectos

históricos compreende múltiplos movimentos. Enumerá-los não seria razoável, pois são

problemas como aponta Angeluci et al (2004) de diversas ordens, são de natureza

psíquico, técnico, político e institucional, além de questões como rupturas e

continuidades teóricas metodológicas na área do saber produzido. (ANGELUCCI et al,

2004).

Ao longo da história brasileira o fracasso escolar é comumente direcionado e

atribuído ao próprio aluno por várias razões. Nessa concepção o fracasso se justifica

pelo próprio insucesso do aluno, seja por sua desistência, indisciplina, dificuldades de

aquisições dos conteúdos, faltas constantes, reprovações como acumulativos de suas

próprias falhas e erros. O fato é que esse pensamento impõe uma visão que se

fundamenta numa origem inatista do problema e intrínseca à natureza humana. Tal

pensar tem como finalidade ocultar as questões de classe social.

Desviando-se de uma visão biológica acerca das causas do fracasso escolar,

tendemos a ir noutra direção na qual esse fenômeno pode ser caracterizado por diversos

motivos. Para Heckert e Barros (2007) não basta restringir os problemas do fracasso e

desempenho escolar a fatores biológicos, cognitivos, familiar, cultural e intra-escolares

pela complexidade da sua dimensão, reduzindo-o a ordem do objeto pesquisado, “mas

das práticas que o constituem” (2007, p. 115).

Portanto, se faz necessário uma análise conjuntural e histórica para se entender o

problema. Sem dúvida, não é a finalidade desse trabalho, contudo para situar melhor o

problema do fracasso escolar entendemos ser necessário destacarmos aqui como alguns

autores têm tratado a questão do fracasso escolar a partir da escola.

Quando se trata do discurso escolar acerca das causas do fracasso, muitas vezes

as condições sociais de exclusão vivenciadas pelos estudantes são postas numa condição

secundária, e ao se tornarem invisíveis tais condições atenuam-se à muitas relações de

classes que se estabelecem nos espaços escolares. Tal condição impossibilita ou

minimiza o debate no qual a presença da crítica e das questões consideradas polêmicas

seriam necessárias. É que, nos parece, nunca foi conveniente favorecer no âmbito da

escola determinados debates que deixassem transparecer os problemas existentes na

escola e na sua organização enquanto uma instituição reprodutora de desigualdades.

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Ao invés de a escola provocar nos sujeitos uma reflexão maior sobre o que

acontece ao seu redor em interseção com os problemas e desafios do mundo, os quais,

também, lhe afetam de alguma maneira, muitas vezes, ignora essa realidade,

distanciando-se cada vez mais do espírito crítico e criativo que deve formar em seus

alunos na sala de aula.

Para Arroyo (2000)

(...) Quanto mais se degradam as condições sociais dos setores

populares, mais seletiva se torna a escola, mais difícil se torna à

infância e à adolescência acompanhar o elitismo de seus processos

excludentes. Ao menos ficam mais expostos os mecanismos, as

atitudes, os valores e os preconceitos que legitimam o fracasso

escolar. Fica mais destacado que nossa escola não foi estruturada

para permitir uma experiência educativa e cultural para a infância

pobre. Nem diante da degradação social da maioria da infância e da

adolescência a escola revê sua estrutura seletiva e excludente. ( p.

49).

Dessa forma, observa-se, por vezes, uma escola sem grandes compromissos com

as complexidades e tensões que a forjam, deslizando para o caminho da omissão que

mais tem causado danos e exclusões as classes populares. A forma como as disciplinas

escolares trabalham os conteúdos, associado à própria estrutura curricular não levam em

conta as fases e momentos que o aluno cognitivamente está.

Ainda segundo Perround (2001) “...o fracasso escolar é o fracasso da escola, que

as crianças não estão naturalmente destinadas a ser bons ou maus alunos, mas que assim

se tornam devido a um funcionamento particular do sistema escolar. (PERRENOUND,

2001. p. 18).

Essa situação de secundarizar as questões sociais do contexto da escola não seria

comum se não fosse naturalizada ao longo do tempo o contraste social e cultural que

existe no seio de toda sociedade. A escola da forma como foi instituída tem buscado

reproduzir a verticalidade econômica e cultural da sociedade, num jogo complicado em

que prevalecem os saberes e esclarecimentos de poucos no mesmo espaço de exclusão

sistemática de muitos na pirâmide social brasileira, mas também do conhecimento

escolar.

A partir desse entendimento, temos que a escola ao desconsiderar inúmeros

aspectos da vida dos estudantes, como as dificuldades, demandas, saberes e valores

prévios que eles trazem consigo acarretam imensuráveis prejuízos à sua formação,

contribuindo inclusive com a fragmentada e descontínua permanência. Implicações

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desse aspecto é a conhecida evasão escolar juntamente com a produção de outros

fracassos cada vez mais presentes na sala de aula.

Também encontramos no âmbito da escola uma trágica naturalização do fracasso

escolar como um fenômeno previsível e inevitável de acontecer dentro do processo de

escolarização, pressupondo que são casos dados e que a própria escola encara como

fatos incorrigíveis que estão fora do seu domínio e controle institucional. Até mesmo as

famílias adotam determinadas posturas que respaldam as atitudes da escola, anulando

assim possíveis ações que pudessem contribuir para minimizar os déficits escolares dos

seus filhos e filhas.

A cultura da exclusão escolar é um reflexo real da exclusão que constantemente

procede na sociedade como um todo. Os preconceitos, estigmas e estereótipos não

seriam tão maximizados nas relações sociais que se estabelecem se não fossem,

também, interiorizados de forma sutil e visível no processo de escolarização que as

instituições impõem. Até mesmo para os professores e coordenadores é desafiador lidar

com essa dinâmica cotidiana, como bem explana Arroyo (2000),

(...) a cultura da exclusão está materializada na organização e na

estrutura do sistema escolar. Ele está estruturado para excluir. (...)

Estamos sugerindo que essa cultura se materializou ao longo de

décadas na própria organização da escola e do processo de ensino. No

próprio sistema. Aí erradica sua força e sua persistência, desafiando a

competência dos mestres e das administrações mais progressistas.

(ARROYO, 2000 p. 47).

A escola segue os programas oficiais e currículos de ensino que devem

reconhecer e reverberar em suas práticas a participação de toda comunidade no que diz

respeito às escolhas e decisões tomadas para uma melhor gestão democrática. Por outro

lado sabemos que nem sempre os atores e sujeitos que compõem o espaço escolar, como

os pais e alunos, sentem ou são incentivados a cumprirem seu dever enquanto cidadãos

participativos, demonstrando, por vezes, que os documentos oficiais estão distantes das

garantias estabelecidas.

Mesmo assim, é importante destacar que nas últimas décadas pode-se constatar

um relativo esforço na busca de uma qualidade de ensino da rede pública, e muitas

experiências demonstram a capacidade da escola pública de construir com os sujeitos,

propostas pedagógicas de qualidade. Isso pode ser constatado no número crescente de

estudantes dessas escolas ingressando no nível superior de ensino.

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Para Dubet (2003) a escola demonstra que determinadas competências

educativas e recursos culturais já estejam consolidados nos pais dos alunos, de modo

que possam com isso de maneira eficiente auxiliar seus filhos com os conhecimentos

trabalhados nas suas atividades. Dessa forma, de acordo com Paula e Tfouni (2009) os

alunos devem estar organizados competitivamente com suas habilidades aprendidas no

ambiente familiar para se adaptarem facilmente às aprendizagens instituídas na escola.

Contudo, sabemos que essa não é a realidade da maioria das famílias que entregam seus

filhos à responsabilidade da escola, sem muitas vezes entender qual o seu verdadeiro

papel.

Assim, entregando a educação de seus filhos à escola, os pais nem sempre têm

clareza da proposta pedagógica, das finalidades e propósitos da formação escolar. O

sistema de ensino escolar mesmo não sendo claro para com aqueles que estão dentro da

sua esfera deixam visíveis algumas regras e imposições classistas que cada sujeito deve

ocupar dentro do regime capitalista de produção que vivem (DUBET, 2003). Mesmo

que o seu projeto político pedagógico contemple uma educação mais humana, solidária

e justa perante todos, formando cidadãos sensíveis, criativos e críticos ao enfrentamento

das dificuldades sociais existentes, os indivíduos vão se deparar e desagregar-se

progressivamente desse ideal para mergulhar no jogo de rivalidade dos desempenhos

(DUBET, 2003) que embrionariamente desde a educação infantil, passando pelo ensino

fundamental, médio e superior o lançará na disputa aparentemente ingênua, no primeiro

momento, para uma batalha feroz e desigual pela melhor nota, colocação, nível de

ensino e mercado de trabalho.

Em uma sociedade pautada nos melhores índices e desempenhos dos seus

sujeitos dentro do quadro educacional nas relações cotidianas, onde é estabelecido que

cada um é responsável por seu sucesso e fracasso na vida, sem levar em conta as

distâncias sócio-econômicas fundadas, fica evidente que os que se sobressaem no topo

da pirâmide social são exceções das classes populares diante da maioria elitista, nas

quais são justificadas pelo discurso meritocrático ambíguo das classes favorecidas que

reitera que todos são iguais, e, que, portanto, têm as mesmas chances e oportunidades, e

que basta querer quando nem sempre é sinônimo de oportunidade e poder.

O círculo vicioso aumenta mais ainda quando os próprios colegas embarcam na

“onda” da cobrança, recaindo sobre este aluno deboches e insultos, minando

sobremaneira o seu otimismo, já que nem o professor, colegas e familiares o

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compreendem ou auxiliam-no a reverter este cenário perturbador. Esse estado de

marcação cerrada, inferioridade e entraves cognitivos desse aluno “problema” será

desdobrado não somente na área escolar como nas próprias relações sociais, onde será

certamente revisto e cobrado por sua inadimplência pelos saberes não desenvolvido.

Formas e atitudes cristalizadas de racismos de modo nem sempre sutil e visível

perpassam na sociedade e atravessam as relações dentro dos espaços escolares,

atingindo o íntimo e desestruturando alguns dos sentimentos de muitos sujeitos que não

se veem pelo biótipo eurocêntrico estimulado na mídia e na moda. Esse preconceito

pode ser mais fortemente sentido para além dos muros da escola, onde muitos desses

alunos ao saírem de suas comunidades marcadas pelo alto índice de violência e

assassinatos encaram os desafios contínuos dos caminhos que os levam até chegar à

escola. Isso pode ser ilustrado desde pelo olhar diferenciado das pessoas que moram no

centro urbano em relação a sua origem, linguagem e a estética considerada periférica e

de cunho marginal quanto na abordagem coercitiva da polícia que os enquadra como

potenciais suspeitos vindos de uma “zona tensa” da cidade.

O processo de escolarização concebe e reproduz de várias formas a divisão

social e econômica da sociedade como ressalta Paula e Tfouni (2009), que pautado no

paradigma do desempenho dos melhores que se sobressaem nas aprendizagens

transmitidas, acaba com isso resultando na classificação e definição dos alunos mais

aptos e capazes de internalizar e processar com desenvoltura os conteúdos escolares,

externando-os, assim, os resultados favoráveis aos critérios estabelecidos pelo sistema

de ensino ancorado na meritocracia, onde segundo Dubet (2003)

[...] as igualdades sociais comandam diretamente a entrada nas

carreiras escolares e os próprios processos escolares produzem essas

desigualdades que, por sua vez, reproduzem as desigualdades

sociais. O sistema está fechado. Abrindo-se, a escola não é mais

“inocente”, nem é mais “neutra”; está na sua “natureza” reproduzir

as desigualdades sociais produzindo as desigualdades escolares. (p.

34).

De acordo com Paula e Tfouni (2009)

O fracasso escolar tem relação com [...] essa contradição fundamental

que organiza nossa sociedade em diferentes e até antagônicas classes

sociais - na medida em que a educação (grau de escolaridade) é

utilizada como critério de classificação social, pois é justamente ela

que garante e autêntica a divisão social do trabalho da forma como

encontramos em nossa sociedade contemporânea. (p. 122),

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A escola, nessa perspectiva direciona um ensino que reconhece os melhores

estudantes considerados “únicos e normais” no desempenho escolar, reproduzindo,

assim, cada vez mais um olhar estigmatizado do aluno “problema” na sala de aula, nos

corredores da escola e refletindo na própria vida privada dele, pelo fato de não ter

internalizado os processos de ensino e aprendizagens como pretendido. Por obter

desempenhos indesejáveis e inconcebíveis aos conteúdos ministrados pelo professor

estes alunos terão que arcar com as críticas e cobranças do docente, que nem sempre

será alguém empático e flexível a sua carga pessoal e dificuldade cotidiana.

Por vezes, a forma como as disciplinas escolares trabalham os conteúdos,

associado à própria estrutura curricular não levam em conta as fases e momentos que o

aluno cognitivamente está. Simplesmente, a escola apresenta os conteúdos e lança os

obstáculos a serem superados, sem relevar as dificuldades e necessidades daquele aluno.

O aluno, por vezes, ao não compreender o que está posto sente-se um peixe fora d'água.

Ainda, na opinião de Arroyo (2000):

Os conteúdos de cada disciplina, a sequência, as precedências, as

avaliações e os domínios tidos como básicos, pouco tem a ver com o

direito à formação básica do cidadão comum. Eles se justificam na

lógica interna de cada disciplina. (ARROYO, 2000. p. 50).

Com isso, na maioria dos casos o que se percebe ainda são escolas que, como no

passado, continuam fortalecendo a manutenção das desigualdades sociais por meio de

formações técnicas para uma mão de obra barata e abundante e outra de caráter

intelectual e de liderança sobre a primeira.

É como se a escola ao fortalecer as desigualdades sociais e culturais as concebe

como necessárias assumindo o ponto de vista do poder político e econômico. Essa

concepção de uma escola classista estabelece uma justificativa da pobreza e miséria

como algo natural que não deve ser encarado e discutido, mantendo-se assim como

coluna para sustentar os mais variados problemas resultantes da sociedade capitalista na

qual convivemos.

Muitas vezes, a própria escola desconhece ou faz vista grossa para determinados

fenômenos que dizem respeito à situação de dificuldades do aluno, imperando um

discurso dúbio que mais encobre os reais problemas do que de fato deseja solucionar. Se

a realidade por fora dos muros da escola já demonstra ser difícil e conflituosa demais

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para os professores e coordenadores, dentro dela vemos a sua fiel reprodução, onde os

professores selecionam ao seu gosto aqueles alunos que mais se sobressaem nas

exigências do currículo (PERRENOUD, 2001).

Com isso, Perrenoud problematiza que

(...) Se um professor nunca se perguntou com quais critérios trata os

pedidos dos alunos, ignorando alguns, levando os outros mais ou

menos a sério, ele não domina a parcela de desigualdade que, nas

interações didáticas, está relacionada ao simples fato de que ele só

houve de forma regular e real, uma parte de seus alunos e não se

dirige a todos do mesmo modo e com a mesma frequência.

(PERRENOUD, 2001. p. 26).

É conveniente responsabilizar uma criança das classes desfavorecidas por seu

não desenvolvimento intelectual escolar. Minar suas condições físicas e biológicas

pressupõe discriminar um problema dado como difícil e inconcebível do ponto de vista

didático para o ensino. Dessa maneira, teremos as mais diversas razões e explicações da

escola para justificar seus métodos de ensino como algo intransponível para alguns

alunos, que trazem em suas bagagens de aprendizado lacunas que se apresentam como

verdadeiros desafios às metodologias modernas e inovadoras.

Na medida em que o aluno não consegue acompanhar o passo a passo do

professor forjando no quadro os conteúdos que devem ser interiorizados no seu espírito,

o estado de ânimo e bom humor para com as lições e aprendizagens podem ser

comprometidos por não acompanhar e processar as devidas mensagens escolares que

chegam sem parar. Logicamente, algo parece estar errado nesse jogo sério de interesses

e trocas intelectuais, onde somente o aluno será penalizado por suas limitações

cognitivas, enquanto, por vezes, os conteúdos e processos de ensino saiam isentos do

fracasso escolar.

É importante considerar que grande parte do sucesso dos alunos no sistema de

ensino tem a ver com uma escola que respeite as diferenças, as singularidades e que seja

inclusiva. Nesse pensamento, é importante trazer o que Paulo Freire (1991) sobre o

processo de ensinar e aprender. Segundo ele, para garantir que a escola deve ser um

local privilegiado para construção de conhecimentos e, portanto um lugar que deve

possibilitar aos sujeitos a libertação, visto que é por meio do diálogo, mas também das

contradições, em que são dadas as possibilidade de compreensão de mudança da

realidade. Nesse sentido, a escola deve ser o lugar de transformar histórias e de

proporcionar mudanças na vida dos sujeitos. “ [...] Uma escola portanto que “...pratique

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uma pedagogia da pergunta, em que se ensine e se aprenda com seriedade, mas em que

a seriedade jamais vire sisudez. Uma escola em que, ao se ensinarem necessariamente

os conteúdos, se ensine também a pensar certo”. (FREIRE, 1991, p. 24).

Com esse ideário, defendemos que a escola do fracasso escolar, a escola que

reprova e que provoca a evasão e o desinteresse deve abrir espaço para uma escola

necessária aos filhos das classes trabalhadoras. O ensino e a aprendizagem não podem

ocorrer friamente, dentro dos muros e das prisões escolares, pelo contrário, “ensinar e

aprender não podem dar-se fora da procura, fora da boniteza e da alegria” (FREIRE,

1996, p.142). E essa procura deve se dar nessa relação entre professores e alunos,

sujeitos aprendentes que dão sentido e significado às suas práticas.

Não se podem subestimar as capacidades cognitivas das crianças que estão em

idade escolar. Muitas delas têm suas especificidades e percursos que não condizem com

determinados planejamentos escolares que não estejam de acordo com suas realidades.

Considero importante que o espaço educativo dedique na sua agenda do projeto

político pedagógico um compromisso com suas potencialidades, ainda, por vezes,

submersas, mas que se forem dadas as reais condições e possibilidades de organizar de

acordo com a necessidade de cada um será possível traçar metas e emergir novos

caminhos. Nessa direção, Perrenoud (2001) enfatiza em poucas palavras que é preciso

não somente acreditar na criança, mas fazer um ajustamento desse otimismo onde,

(...) Poucas crianças são limitadas definitivamente por um falta de

desenvolvimento intelectual. A maioria delas é capaz de aprender

coisas complexas, desde que ajustemos constantemente a mensagem

e as exigências, os objetivos próximos e as situações didáticas aos

seus recursos do momento. (PERRENOUD, 2001. p. 18).

A escola tal como conhecemos hoje ainda mantém resquícios de um passado

processado para atender à demandas das classes privilegiadas que a desenvolveram em

busca de seus interesses e objetivos econômicos e culturais, e que veem na instituição

de ensino a reprodutividade fiel das divisões sociais por categorias distintas que

atendam o interesse do sistema capitalista.

Assim, ao invés de ser uma instituição que explicite as diferenças e distâncias

instaladas no seio da sociedade a escola reproduz a desigualdade social como condição

da manutenção do modelo de dominação das classes vigente. Não é de se estranhar que

a todo tempo o aluno é submetido a provar diante da sua turma, professor, coordenador,

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família, diretor e assim sucessivamente, que está em sintonia com as imposições e

regras que buscam alcançar a excelência.

O aluno oriundo das classes trabalhadoras que traz no seu percurso de vida todas

as possíveis privações provenientes das relações desiguais de classes, ao se deparar

dentro da sala de aula com um ensino pautado em valores e conteúdos pré-estabelecidos

que mais parece um corpo estranho do que algo comum ao seu repertório cultural vai se

desencontrar nos caminhos desse conhecimento, portanto, estará fadado a fracassar, e o

que era para ser uma troca de saberes se torna um conflito entre opostos. Nessa direção,

BOURDIEU (1992) destaca o papel reprodutor e excludente da escola à medida que o

conteúdo escolar não dialoga com o universo cultural do aluno, priorizando a cultura

dominante.

É importante também destacar a contribuição de Althusser (1992) quando se

debruça sobre a escola e seu papel social. Para esse pensador a escola enquanto

instituição formadora se materializa como um aparelho ideológico de estado, e nesse

sentido, seu papel é o de reforçar a desigualdade e as contradições sociais. Dessa forma,

os conteúdos e o conhecimento construído na escola estão afastados da realidade dos

sujeitos e se colocam a disposição de uma classe social em detrimento dos saberes de

outra.

Na opinião de Perrenoud “(...) Quando a cultura escolar é elitista, muito

distanciada da língua e dos saberes das classes populares, aumentam os desvios (...)”

(PERRENOUD, 2001. p. 20). Nesse sentido a escola que deveria ser a instituição

provedora e de integração entre os saberes populares e intelectuais deixa somente

predominar a segunda intenção formal, por considerar a única autêntica e capaz de dar a

luz na escuridão. Aderindo somente os valores burgueses a escola perde o que há de

mais oportuno para aproximar a comunidade nos seus objetivos didáticos: trabalhar com

a pluralidade dos professores e alunos em constante construção com o conhecimento

para combater e erradicar os desvios.

O currículo como está posto em muitas escolas no Brasil ao longo dos anos tem,

por vezes, se distanciado da perspectiva de inclusão dos povos que compõe a sociedade

brasileira, unificando de maneira assimétrica e sobrepondo determinada cultura

tradicional em relação à outra, sem que com isso consiga criar elos de respeito e

dignidade para com os saberes das minorias étnico e raciais. Sacristan

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Na mesma obra, Perrenoud enfatiza que “(...) O currículo real, transposição

didática e tradução pragmática do currículo formal, depende ainda mais da

arbitrariedade dos estabelecimentos de ensino e dos professores. (...)” (PERRENOUD,

2001. p. 20) e que dessa forma, as tensões são projetadas pela cumplicidade dos agentes

educativos que formalizam os absurdos, naturalizando suas práticas diante das mais

complexas relações humanas. O autoritarismo é contemplado e respaldado pelo

currículo. Instala-se normas que segmentam os indivíduos, grupos, trabalhos, atividades

e toda rede de relação conjunta que compreende a escola.

O currículo escolar como se tem materializado nos estabelecimentos de ensino

desconsideram em grande parte demandas resultantes das múltiplas formas e relações

que preenchem cotidianamente as escolas. Relações e formas provenientes das

diferentes comunidades e sujeitos. Não é de se estranhar que ainda tenhamos

professores e alunos perdidos pelos percursos traçados pelas escolas sem conhecimento

prévio dos mesmos. Tornam-se irrelevante suas perspectivas e conceitos diante da

norma curricular que põem em detrimento determinado saberes populares para edificar

e consagrar, principalmente, os das classes dominantes vigentes. Currículo, aqui

compreendido e construído a partir da cultura real, originado de vários processos e que

não se limita a “um objeto delimitado e estático que se pode planejar e depois

implantar” (SACRISTÁN, 1995).

Diante de uma educação, por vezes, precariamente conduzida para atender as

necessidades e carências específicas de uma dada realidade escolar, é que vamos

encontrar algumas disparidades e contrastes que podem estar lado a lado com outras

experiências escolares que passam longe das dificuldades e carências, conseguindo

manter melhor os padrões educacionais exigidos. Por um lado um país que se diz de

“todos” em um dos seus principais slogans, por outro uma nação dividida, onde sua

grande maioria está privada dos serviços e acessos mais básicos a sua existência. Na

escola não seria diferente, em se tratando de comunidades desassistidas nas grandes

periferias que povoam as metrópoles e comunidades da zona rural onde a situação é

bem mais agravante.

Há regiões onde sequer não existem escolas, transportes que levem seus alunos,

faltam materiais didáticos, merenda, bibliotecas, sala de informática, espaço para a

prática do esporte e lazer, faltam professores e entre tantas outras necessidades. Muitas

dessas escolas convivem com realidades bem diferentes de outras que recebem

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melhores investimentos e incentivos. Isso pode ser percebido por algumas regiões,

estados, municípios e até bairros, onde determinados recursos se consolidam enquanto

outros não se efetivam, deteriorando e sucateando a infraestrutura e prejudicando a vida

de muitos alunos e professores. Isso reflete, de certa modo, no desempenho do aluno em

sala de aula; na prática cotidiana do professor e na própria comunidade escolar.

3 ALGUNS NÚMEROS QUE AJUDAM A ENTENDER ALGUNS DESAFIOS DA

EDUCAÇÃO BRASILEIRA

O fracasso escolar em todas as suas dimensões não é algo fácil de ser compreendido

e difícil é seu enfrentamento. Alguns dados que apresentamos a seguir sinalizam muito

do esforço que precisa ser despreendido pelos governos e pela sociedade de um modo

geral para que esse problema histórico seja superado.

Se pensarmos a nível de Brasil temos ainda um grande déficit a ser corrigido.

Um recorte feito entre os jovens com idade entre 18 a 29 anos, segundo o IBGE/Penad

(2016) mostra que a escolaridade média dessa população urbana é de apenas 11,6 anos.

Para esse mesmo dado a população rural apresenta como índice dois anos a menos.

Ainda segundo o IBGE (2016) a taxa de escolaridade entre os mais ricos e os

mais pobres temos 3,8 anos a mais de escolaridade entre os primeiros. Essa é a distância

entre os 25% mais ricos e os 25% mais pobres da sociedade brasileira.

Considerando as matrículas na educação básica o IBGE aponta que em 2016

98,2% das crianças e dos jovens de 6 a 14 anos estavam na escola em 2015, mas na

zona rural esse número chegava a 69,9%. Se considerarmos os desafios postos para a

educação das comunidades rurais esse índice não é apenas considerado baixo, mas ele

esconde muitas das dificuldades vivenciadas pelos professores e alunos que fazem parte

desses contextos.

Os dados de 2015, de acordo com dados divulgados pelo MEC indicam que 85,

7% das escolas públicas contam com infraestrutura básica e 44, 8% contam com

biblioteca ou sala de leitura. Essa infraestrutura quando garantida pode ser um elemento

facilitador dos processos de ensino e aprendizagem. É importante ressaltar que o fato de

existir 85,7% das escolas com infraestrutura básica, não significa dizer que esse

percentual está associado a espaços físicos em perfeitas condições de uso, como

banheiros adequados, salas de aula ventiladas e ou climatizadas, rampas de acesso a

alunos e alunas portadoras de necessidades especiais, entre outros aspectos.

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Quando olhamos para os dados relativos ao sucesso dos estudantes concluintes

do Ensino Fundamental, consta nos relatórios do IBGE/Pnad (2015) que, no Brasil, de

cada 100 estudantes que ingressam na escola 86 concluem os anos iniciais do Ensino

Fundamental aos 12 anos, e apenas 76 concluem o ensino fundamental anos finais aos

16 anos.

O insucesso quanto ao percurso das crianças e jovens até concluir o Ensino

Fundamental não é muito animador. O percentual de conclusão desse nível de ensino

entre jovens de 16 anos no Nordeste chega a 66,2%. Esse número é inferior à média

nacional que é de 75,9%. Números como esses mostram que as desigualdades regionais

também estão presentes.

Um dado preocupante é no que se refere ao que o MEC considera como nivel de

leitura suficiente. Os dados do MEC/Inep/DAEB indicam que apenas 29,8% dos alunos

da rede pública de 3o ano do Ensino Fundamental apresentam nível suficiente de

Leitura na zona rural, sendo que esse mesmo dado é de 47,7% da zona urbana.

De acordo com o SAEB e censo escolar, em 2015, o Índice de Desenvolvimento

da Educação Básica (Ideb) para o anos iniciais do Ensino Fundamental na região

nordeste ficou em 4,6. Esse número mostra que a região se encontra abaixo da média

nacional que era, na época, de 5,3 das escolas públicas. Enquanto na rede privada da

mesma região o índice cresceu 6,3 e ficou próximo de sua média nacional que era de

6,8.

Indicadores Educacionais do DEED revelam que a taxa de aprovação do Ensino

Fundamental total no ano de 2016 foi de 89,8%, contra 8,3% de reprovação, seguido

por 1,9% de abandono. No 3º ano do Ensino Fundamental onde se encerra o ciclo de

alfabetização a taxa de aprovação foi de 88,4%, diante de 10,7% de reprovação, na qual

apenas 0,9% abandonaram esse período.

Na Região Nordeste a taxa de distorção idade-série (Defasagem de mais de 2

anos entre a idade adequada e o ano que o aluno está cursando) em 2016 no ensino

fundamental esteve em 25,2%, acima da taxa nacional que era de 18,6% no mesmo ano.

No 1º ano do Ensino Fundamental a taxa de distorção idade-série no Brasil era de 3,4%,

enquanto nos anos seguintes esse percentual continuou aumentando, chegando a 20,5%

no 5º ano do Ensino Fundamental.

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O Censo Escolar apontou que no RN o IDEB (2015) apresentou uma nota 4,8

abaixo de Estados vizinhos como o Ceará que foi de 5,9, que se manteve acima da

média nacional que foi de 5,5.

Segundo dados do MEC/Inep/DAEB Em 2016, no RN apenas 30,6% dos alunos

estavam suficientemente alfabetizados em leitura, escrita e matemática, abaixo da média

nacional que era de 45,5%. Esse mesmo dado quando observados no estado do Ceará a

média era de 51,7%, acima da média nacional.

Em se tratando da formação de professores, o estado do RN possui um

percentual de 0,3% de seus professores com ensino fundamental, 15,9% possuem

ensino médio e 8,3% tem o magistério. Já com relação a formação de ensino superior os

professores do RN totalizam 75,5%. Um pouco abaixo da média nacional que é de

77,5%, mas acima da média da região Nordeste que foi de 64,7%. Quando olhamos a

formação desses professores encontramos que 71,8% possuem licenciatura, 3,8% não

têm licenciatura e 32,6% são pós-graduados. Fonte: MEC/Inep/DEED – Microdados do

Censo Escolar

No Rio Grande do Norte, de cada 100 alunos que ingressam na escola, 79 deles

concluem o Ensino Fundamental de 1 aos 12 anos, e 69 dos 2 aos 16 anos, sendo que

apenas 47 concluem o Ensino Médio aos 19 anos.

Sem dúvida que esses dados não podem ser analisados isoladamente sem uma

compreensão mais completa dos contextos e dos condicionantes que atravessam as

análises. Contudo, trazê-los para esse trabalho nos ajuda a entender que o fracasso

escolar não é algo simples e que refletir sobre esse fenômeno significa estar disposto a

aprofundar-se em muitas questões. São temáticas que não se explicam de forma

superficial ou de forma localizada nem fragmentada, pois dele (o fracasso escolar) são

possíveis inúmeros recortes.

Se enumerássemos aqui os problemas decorrentes desses números, teríamos uma

lista gigantesca, na qual encontraríamos problemas dos mais diversos e todos

certamente comprometeriam o sucesso do aluno na escola, comprometeriam portanto

seu processo de ensino e aprendizagem.

Sem dúvida, entre eles, estaria como implicações do descaso da classe política à

educação brasileira, o fenômeno da evasão escolar.

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4 A EVASÃO DOS ESTUDANTES NO CONTEXTO DO FRACASSO ESCOLAR

A evasão escolar sempre foi compreendida como um grande desafio, e tem se

caracterizado pelo abandono de parcela dos alunos que ingressam em determinada

modalidade de ensino e em pouco tempo se evadem. Sobre esse problema ainda não

resolvido existem muitas interrogações acerca dos motivos reais que levam os alunos a

abandonar a escola.

Muitas são as razões relacionadas às consequências que levam o aluno a ser

prejudicado de alguma forma durante o seu percurso escolar. Nessa perspectiva de

entender a evasão escolar como um dos aspectos do fracasso escolar, as autoras Paula e

Tfouni (2009) dizem:

O fracasso escolar é entendido como uma categoria genérica, ou seja,

uma forma de interpretação que comporta vários fatores, tais como

repetência e evasão escolar, dificuldade de aprendizagem ou mesmo

um desempenho insatisfatório em uma única disciplina escolar.

(PAULA e TFOUNI, 2009, p. 119).

De acordo Pelissari (2012, p. 33 apud SILVA FILHO; ARAÚJO, 2017) “o

conceito de evasão traz um caráter subjetivista, responsabilizando o aluno pela sua saída

da escola, considerando apenas os fatores externos, caindo na armadilha do

reprodutivismo das relações sociais na escola”. Somam-se a isso os estereótipos e

estigmas étnico-raciais e sexuais injetados de forma pejorativa e discriminatória por sua

origem social e cultural, classificando-os como “favelados” (negros, pobres,...), “bicho

do mato”, ”ignorantes”, “Paraíba” (índios, caboclos, nordestinos,...) ou “viado” e

“baitola” por sua identidade de gênero, não representando os padrões da cultura vigente,

heteronormativa e dominante de fisionomia e descendência europeia.

De acordo com Brandão (1983), a evasão dos alunos não pode ter como culpa as

características individuais dos alunos muito menos deve ter como responsabilidade suas

famílias. Muitas vezes, o que acontece é que a evasão é a forma pela qual as famílias

respondem à escola em função da ação por vezes impositiva e descontextualizada que

ela exerce sobre seus filhos. Dessa forma entende-se que a evasão é consequência do

modo como a escola trabalha com a família, de como a escola trabalha o conhecimento

escolar.

Nessa direção, Vasconcelos (1995) aponta em suas discussões sobre Projeto

Político Pedagógico e o dia a dia da sala de aula, que a ausência de atenção da escola ao

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aluno quando da escolha do método de ensino é um aspecto responsável pela evasão

escolar.

Ainda sobre a temática, Arroyo (1997) afirma que ...”é preciso professores

dinâmicos, responsáveis, criativos, que sejam capazes de inovar e transformar sua sala

de aula em um lugar atrativo e estimulador (ARROYO, 1997, p. 23).

Contudo, como todos os problemas relacionados à educação brasileira, discutir

os problemas que ocasionam a evasão escolar sem considerar o contexto

socioeconômico e cultural em que estão inseridos estes alunos é como procurar uma

agulha no palheiro. A realidade contrastante em que se encontram os sujeitos das classes

trabalhadoras com suas trajetórias de vida marcada e incutida por privações de várias

ordens se estendem, por vezes, às gerações familiares seguintes.

As consequências são as mais diversas, uma delas deixada pelos resquícios de

uma realidade econômica injusta é que o aluno, por vezes, passa a questionar-se

consciente ou inconscientemente sobre ser válido continuar e persistir nos estudos ante

situações que cotidianamente lhe confronta diariamente. Situações marcadas na maioria

das vezes por processos de segregação. Na opinião de Charlot (2000, p. 18), se faz

necessário que o problema da evasão escolar seja vista sob diferentes perspectivas como

por exemplo:

sobre o aprendizado... sobre a eficácia dos docentes, sobre o serviço

público, sobre a igualdade das chances, sobre os recursos que o país

deve investir em seu sistema educativo, sobre a crise, sobre os modos

de vida e o trabalho na sociedade de amanhã, sobre as formas de

cidadania”. (Charlot, 2000, p. 18).

Nesse sentido, reforçamos a ideia o fracasso escolar não pode ter como culpa os alunos

que não conseguem aprender, mas inúmeros condicionantes, sejam políticos,

econômicos, culturais e sociais, que se apresentam como indicadores do problema. Isso

explica porque ainda temos um número tão elevado de evasão nas escolas.

Assim, percebe-se que o tema evasão escolar precisa ser incansavelmente

discutido e necessário se faz que suas causas sejam identificadas e possíveis soluções

que surgem devem ser encaradas por diferentes frentes, desde as políticas públicas que

precisam valorizar a escola e o professor, assim como a atenção necessária da escola ao

seu projeto político pedagógico sem esquecermos, principalmente, da luta pela

igualdade de direitos e por uma melhor distribuição e renda.

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Portanto, o fracasso escolar ocupa diversos problemas e contextos na vida

cotidiana escolar, mas ao falar dele é quase impossível não imaginá-lo sem pensar na

questão da evasão, que talvez, seja o que mais vem preocupando nos últimos anos pais,

professores, gestores e os próprios alunos, sendo, por vezes, confundido como o

fracasso escolar em si, quando a evasão é mais uma questão, entre outras, que afligem a

escolarização.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O problema do fracasso escolar conforme posto acima exige bastante atenção

por parte de todos que fazem a educação escolar brasileira. O enfrentamento do fracasso

escolar exige cada vez mais atenção dos governos no que se refere, principalmente, às

políticas públicas para a educação. Em especial, essa política deve estar vinculada a

uma formação de professores que valorize esse profissional sob diferentes aspectos:

valorização social, salarial e de condições de trabalho.

Nessa direção se faz necessário a construção de um currículo no qual as

aprendizagens se construam a partir do encontro entre diferentes saberes, aqueles que o

aluno traz em seu percurso e aqueles que o professor propõe como conhecimento

científico necessário à aprendizagem.

Nessa perspectiva de currículo é importante pensar a escola enquanto instituição

comprometida com seu papel social assumindo no processo de ensino e aprendizagem

uma postura criativa que se materializa por meio de seu currículo. E nesse processo é

fundamental que o aluno construa uma compreensão da realidade na qual está inserida,

buscando interpretá-la e ao mesmo tempo em que esteja contribuindo para sua

transformação.

Nessa escola em que o acesso e a permanência devem ser garantidas o professor

é o agente capaz de propor mudanças, de pensar e refletir junto com seus alunos sobre

suas aprendizagens, sobre o que é relevante. Nesse sentido, não podemos desconsiderar

o pensamento freiriano que entende a docência como uma experiência que permite

dupla aprendizagem. A de quem ensina e a de quem aprende. Portanto, há que se

ensinar com alegria com amorosidade.

É fundamental esse cuidado com o currículo, com a prática dos professores, com

a realidade dos sujeitos que constituem a escola, desde a educação. Mas é da mesma

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forma tão importante o investimento na formação dos professores, no incentivo à

formação continuada, na melhoria das condições do trabalho docente.

Com esse trabalho, buscamos compreender o fracasso escolar e, por tudo que

trouxemos aqui, é possível concluir que não é possível discutir o fracasso escolar

considerando apenas os indivíduos como parte maior da produção e perpetuação dos

problemas escolares. É preciso entender o fracasso escolar em todas as suas dimensões e

considerar a necessidade das garantias sociais, uma vez que os aspectos inerentes ao

fracasso escolar tem também como cenário as oportunidades sociais e as condições de

vida dos sujeitos e as dimensões que as envolvem. Enquanto as desigualdades

socioeconômicas permanecerem instaladas na esfera da sociedade a escola estará diante

de desafios, cada vez, mais complexos no que concerne às desvantagens e diferenças

entre seu público. A ausência de equidade no meio social que se encontram os sujeitos,

consequentemente, surtirá efeitos contrastantes na vida escolar também.

Assim, considero que esse trabalho muito contribuiu na minha formação

enquanto futuro profissional, uma vez que permitiu me aproximar de uma temática que

certamente fará parte de meu cotidiano enquanto pedagogo.

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