universidade federal do rio de janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii dióxido de...

115
Universidade Federal do Rio de Janeiro Universidade Federal do Rio de Janeiro Departamento de Ecologia Departamento de Ecologia Programa de Pós Programa de Pós- Graduação em Ecologia Graduação em Ecologia DIÓXIDO DE CARBONO E DIÓXIDO DE CARBONO E M LAGOS TROPICAIS: D M LAGOS TROPICAIS: D E E CONTROLES LOCAIS A P CONTROLES LOCAIS A P ADR ADRÕ ES GLOBAIS ES GLOBAIS Humberto Marotta Ribeiro Humberto Marotta Ribeiro Rio de Janeiro Rio de Janeiro – RJ RJ Março/2009 Março/2009 Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ecologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de Doutor em Ecologia. Orientadores: Prof. Dr. Alex Enrich Prast Prof. Dr. Carlos M. Duarte

Upload: others

Post on 08-Jul-2020

0 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

Universidade Federal do Rio de JaneiroUniversidade Federal do Rio de Janeiro Departamento de EcologiaDepartamento de Ecologia

Programa de PósPrograma de Pós--Graduação em EcologiaGraduação em Ecologia

DIÓXIDO DE CARBONO EDIÓXIDO DE CARBONO E M LAGOS TROPICAIS: DM LAGOS TROPICAIS: DE E

CONTROLES LOCAIS A PCONTROLES LOCAIS A PADRADRÕÕES GLOBAISES GLOBAIS

Humberto Marotta RibeiroHumberto Marotta Ribeiro

Rio de Janeiro Rio de Janeiro –– RJ RJ Março/2009Março/2009

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ecologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de Doutor em Ecologia.

Orientadores: Prof. Dr. Alex Enrich Prast Prof. Dr. Carlos M. Duarte

Page 2: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

Livros Grátis

http://www.livrosgratis.com.br

Milhares de livros grátis para download.

Page 3: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

ii

DióDióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais xido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globaisa padrões globais

Humberto MarottaHumberto Marotta Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ecologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de Doutor em Ecologia.

__________________________________________________________________________________ Prof. Dr. Alex Enrich PrastProf. Dr. Alex Enrich Prast

(Universidade Federal do Rio de Janeiro (Universidade Federal do Rio de Janeiro –– Dep. de Ecologia) Dep. de Ecologia)

__________________________________________________________________________________ Prof. Dr. Carlos M. DuarteProf. Dr. Carlos M. Duarte

(Instituto Mediterrâneo de Estudos(Instituto Mediterrâneo de Estudos Avançados Avançados –– Dep. de Pesquisa em Dep. de Pesquisa em Mudanças Globais)Mudanças Globais)

__________________________________________________________________________________ Prof. Dr. Alex KruscheProf. Dr. Alex Krusche

(Universidade de São Paulo (Universidade de São Paulo –– Centro de Energia Nuclear na Agricultura) Centro de Energia Nuclear na Agricultura)

__________________________________________________________________________________ Prof. Dr. Marcelo BernaProf. Dr. Marcelo Bernardesrdes

(Universidade Federal Fluminense (Universidade Federal Fluminense –– Dep. de Geoquímica) Dep. de Geoquímica)

__________________________________________________________________________________ Prof. Dr. Renato CrespoProf. Dr. Renato Crespo

(Universidade Federal Fluminense(Universidade Federal Fluminense–– Dep. de Biologia Marinha) Dep. de Biologia Marinha)

Rio de Janeiro Rio de Janeiro –– RJ RJ Março de 2009Março de 2009

Page 4: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

iii

Ficha Catalográfica

Marotta, H. Dióxido de Carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais. Tese de Doutorado – Departamento de Ecologia, UFRJ, 2009. 96p Palavras-chave: 1. Dióxido de Carbono; 2. Lagos; 3. Fluxos de CO2; 4. Autotrofia; 5. Heterotrofia.

Page 5: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

iv

Pensa-se erroneamente, com freqüência, que o pesquisador não tem o

direito de induzir além dos fatos observados. Entretanto, todo aquele que

tem a experiência no trabalho científico sabe, pertinentemente, que se

recusar a ultrapassar os fatos implica em raramente atingi-los“.

Thomas Henry Huxley (1825-1895), Cientista Evolucionista

Page 6: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

v

AGRADECIMENTOS

Talvez o melhor e ao mesmo tempo mais trabalhoso aspecto de uma tese em Ecologia seja reunir o número de pessoas fun-da-men-tais para participar de algo que seria indubitavelmente

impossível de ser concluído somente por mim. Nesta tese foram reunidos dados que foram coletados por pessoas enquanto eu estava na sexta série do ensino básico ou em lagos dos mais

distantes rincões e, portanto, nada mais natural que agradecer muitíssimo de coração! Ao prof. Alex Enrich-Prast (Dep. Ecologia - UFRJ) pela extrema paciência em compartilhar sua vasta experiência com um aluno com tantas deficiências. Sou sinceramente grato pelas lições e nossas acaloradas discussões científicas. Ao final, um amigo sempre presente e o cientista confidente nas horas mais necessárias, o valoroso equilíbrio entre o suporte, os ensinamentos e a critica!! Ao prof. Carlos Duarte (IMEDEA – CSIC/UIB) pelo duríssimo trabalho de tentar me ensinar um pouquinho de tanta experiência e me acolher de maneira tão verdadeira. Guardo com muito carinho e gratidão tantos ensinamentos, sempre muito densos, diretos e concentrados no tempo, mas com uma ternura particular. Quantas discussões e correções estimulantes!!............Desde luego ¡Muchísimas gracias al querido Profesor Duarte! Ao prof. Francisco de Assis Esteves (Dep. Ecologia - UFRJ) pelo inquestionável incentivo para meu aprimoramento e pela disponibilização dos dados de longa duração do projeto ECOLagoas. À profa. Ana Maria de Hollanda e Vasconcellos (Dep. Bioquímica - UFRJ), minha primeira orientadora de iniciação científica. A “simples e complexa” base de tudo, a desconfiança científica das mais aguçadas e criteriosas, associada à terna maneira de professora em essência. A todos os amigos de laboratório de Biogeoquímica da UFRJ, destacando aqueles que participaram mais diretamente desta tese: Luiz Bento, Luana Pinho, Leandro Pontual, Eliane Silva, Breno Alves, Ana Lúcia Santoro, Roberta Peixoto, Viviane Figueiredo, Maria Carolina Barroso, Juliana Menezes e Luciene Valladares pelas discussões sempre esclarecedoras e pela incessante ajuda nas coletas e análises. A todos los amigos del Instituto Mediterráneo de Estudios Avanzados (IMEDEA) por toda la acogida y cariño en Mallorca (España). La enseñanza desde el curro al ocio en la isla que es ¡una pasada! Imposible la tarea de apuntar toda la gente guai, pues ¡¡En Mallorca siempre bien!! A todos os amigos de laboratório de Limnologia da UFRJ, berçário de tantas idéias e interações profícuas e estimulantes, além do suporte indispensável para os experimentos de mesocosmos. Agradeço especialmente a ajuda e a discussão imprescindíveis dos meus amigos de sempre Adriano Caliman, Luciana Carneiro, Frederico Meirelles-Pereira André Amado e Rafael Gauriento. Aos profs. John Downing (Iowa State University), Yves Prairie (Université du Québec à Montreal), David Bastviken (Universitet Stockholms) e Andrew Dickson (University of Califórnia) pela especial atenção para ensinar com tanta delicadeza e eficiência dúvidas cruciais para a conclusão desta tese. Aos profs. Mauricio Petrucio (Universidade Federal de Santa Catarina) e Wanderley bastos (Fundação Universidade Federal de Rondônia) pela ajuda fundamental na coleta de dados presentes na tese.

Page 7: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

vi

A los funcionários de professor Duarte por toda la ayuda y cariño. Gracias al cariño y competéncia FUNDAMENTALES de mis amigos Paloma Albornoz, Juan Carlos Alonso, Rocio Santiago y Regino Martinez. Aos funcionários da secretária do Programa de Pós-Graduação em Ecologia (PPGE/UFRJ), Suely e Marcinha, pela gentileza e pela competência em resolver tudo junto ao PPGE. A todos os professores, que tanto contribuíram para minha formação pessoal e profissional, do Instituto de Biologia da UFRJ, do departamento de Bioquímica da UFRJ, do departamento de Geografia da UERJ e, obviamente, do Programa de Pós Graduação em Ecologia da UFRJ. Ao total e irrestrito suporte de minha família sem os quais esta tese seria impossível: minha mãe Maria, meus irmãos Carolina e Rodrigo, meu cachorro Dr. Taz Roberto, além, obviamente, da caríssima Roselaine pela presença e ajuda incessante em todas as etapas da tese. À tanta energia positiva de tantos seres vivos e paisagens, absolutamente transcendental à matéria e direto à alma.

Page 8: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

vii

RESUMO

Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais.

Lagos são potencialmente importantes condutores de carbono entre as fontes terrestres e a

atmosfera, apresentando águas superficiais tipicamente supersaturadas de dióxido de carbono

(CO2). Os lagos tropicais são amplamente distribuídos e caracterizados por relevantes

peculiaridades devido às mais altas temperaturas e diferenças no entorno terrestre, porém ainda

são fortemente subrepresentados na literatura sobre CO2 em águas naturais. Na presente tese, o

objetivo foi avaliar a relação entre a pressão parcial de CO2 (pCO2) das águas superficiais e

potenciais fatores direcionadores nos lagos tropicais (estratificação vertical, eutrofização,

carbono orgânico, acidificação, manipulações na cadeia trófica, pluviosidade e temperatura),

analisando as diferenças no fluxo de CO2 lago-atmosfera e suas potenciais causas entre baixas e

altas latitudes. O delineamento da tese incluiu coletas sazonais e inter-anuais, experimentos em

mesocosmos e compilações de dados globais. Um resultado consistente foi a persistência da

supersaturação de CO2 associada à alta variabilidade nas águas lacustres tropicais. Lagos

tropicais foram, em média, muito mais supersaturados em CO2 (1804 ± 35 µatm) que os lagos

temperados (1070 ± 6 µatm). A pCO2 também foi muito mais variável nos lagos tropicais que

nos temperados (coeficiente de variação de 185 e 80 %, respectivamente). Ao longo de um

período de 13 anos, a pCO2 apresentou intenso dinamismo em uma mesma estação de lago

tropical, alcançando uma imensa variabilidade de 1000 vezes. Além disso, as águas húmicas

apresentaram os mais altos valores de pCO2, possivelmente devido aos aportes de carbono

orgânico ou já mineralizado advindo de fontes alóctones. A elevada relação positiva entre

precipitação e pCO2 nos lagos estudados poderia ser atribuída aos aumentos no aporte de

carbono terrestre durante os períodos chuvosos. Sendo assim, as altas temperaturas anuais e a

influência terrestre incrementada pelas chuvas podem ser relevantes fatores direcionadores do

pCO2 de lagos nos Trópicos. Além disso, o controle descendente (direcionado pela predação)

também pode influenciar significativamente a pCO2 de lagos nas baixas latitudes, mesmo por

abundantes peixes onívoros caracterizados por interações menos concentradas que aqueles

especialistas típicos das regiões temperadas. Como conclusão, a presente tese disponibiliza fortes

indícios de que os lagos tropicais mantêm um elevado e variável desequilíbrio de CO2 em

relação à atmosfera, um significativo componente do ciclo do carbono ainda pouco estudado

mas importante para um melhor entendimento dos processos biogeoquímicos globais.

Page 9: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

viii

ABSTRACT

Carbon Dioxide in tropical lakes: From local controls to global patterns.

Lakes are potentially important conduits for carbon from terrestrial sources to the atmosphere,

showing surface waters typically supersaturated in carbon dioxide (CO2). Tropical lakes are

broadly distributed and show relevant specificities mainly by warmer temperatures and

differences in the terrestrial surroundings, but are still underrepresented in the literature about

CO2 in natural waters. Here, the objective was to assess the relationship between surface partial

pressure of CO2 (pCO2) and potential driving factors in tropical lake waters (vertical

stratification, eutrophication, organic carbon, acidification, food web manipulations, rainfall and

temperature), and to explore the differences in lake-atmosphere CO2 exchange and their potential

causes between low and high latitudes. The thesis design included seasonal and inter-annual

surveys, experiments in mesocosms, and global data compilations. A consistent result was the

persistence of CO2 supersaturation coupled to high variability in tropical lake waters. Tropical

lakes were, on average, far more supersaturated in CO2 (1804 ± 35 µatm) than temperate lakes

(1070 ± 6 µatm). pCO2 was also far more variable in tropical than in temperate lakes (coefficient

of variation = 185 and 80 %, respectively). Along a 13-year period, pCO2 showed intense

dynamics within any station in the same tropical lake, reaching a huge 1000-fold variability. In

addition, higher values of pCO2 were found in humic waters, possibly due to inputs of

mineralized and organic carbon from terrestrial sources. The strong positive relationship between

precipitation and lake pCO2 observed here might be attributed to increases in terrestrial carbon

inputs during rainy periods. Therefore, warmer annual temperatures and terrestrial acid inputs

into lakes, enhanced in rainfall events, might be relevant driving factors on lake pCO2 in the

Tropics. Furthermore, the top down control (predation driven) might also play a significant

influence on this variable at low latitudes, even by abundant omnivorous fishes showing less

concentrated interactions than specialist ones typical in temperate regions. In conclusion, this

thesis provides strong support that tropical lakes maintain large and variable CO2 disequilibria

with the atmosphere, a significant component of the carbon cycle that might be still little

studied but important to a better understanding on global biogeochemical processes.

Page 10: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

ix

SUMÁRIO

Introdução Geral

Objetivos Gerais

Estrutura da Tese

Capítulo 1: Revisão - Os fatores reguladores do metabolismo aquático e sua influência sobre o

fluxo de dióxido de carbono entre os lagos e a atmosfera

Capítulo 2: Mudanças nos padrões de estratificação térmica e de oxigênio associadas à

persistente evasão de CO2 à atmosfera em lagos das adjacências da Floresta Tropical Atlântica,

Brasil

Capítulo 3: Variabilidade de longo prazo no dióxido de carbono em dois lagos tropicais

submetidos a eventos seqüenciais de eutrofização e acidificação

Capítulo 4: Enriquecimento de pCO2 em eventos de precipitação em lagos costeiros tropicais

Capítulo 5: Teste experimental dos controles ascendente e descendente sobre os fluxos de CO2

em um lago húmico tropical

Capítulo 6: Grande Desequilíbrio de CO2 em Lagos Tropicais

..................................................... 07

............................................................................................................ 05

........................................................................................................... 01

.......................................................................................................... 06

.............................................................................................................................. 19

........................................... 31

............................................................................................. 67

............................................ 82

.. 53

Page 11: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

x

Conclusão Geral

Referências Bibliográficas

.............................................................................................. 94

............................................................................................................ 91

Page 12: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

1

INTRODUÇÃO GERAL

O dióxido de carbono ou gás carbônico (CO2) é um importante gás que contribui para o

Efeito Estufa no planeta (Royer et al., 2007). Pesquisas paleoclimáticas sugerem uma relativa

sincronia entre os aumentos naturais nas concentrações de CO2 atmosférico e as épocas de

aquecimento global na história geológica da Terra (Ahn & Brook, 2008; Came et al., 2007;

Kump, 2002). Um dos índices para avaliar o papel do CO2 na mudança climática é a força

radiativa, uma medida da influência de um fator na alteração do equilíbrio do fluxo de energia

entre o sistema Terra-atmosfera e o meio exterior (IPCC, 2007). Nesse sentido, o aumento de

concentração do CO2 atmosfèrico também é acompanhado de um importante incremento de

força radioativa para o aquecimento do planeta nos últimos séculos (Figura 1).

Figura 1: Concentrações atmosféricas de CO2 ao longo dos últimos 10.000 anos (painel grande)

e desde 1750 (painel inserido). As medições foram obtidas a partir de testemunhos de gelo

(símbolos com diferentes cores para os diferentes estudos) e amostras atmosféricas (linhas

vermelhas). As forças radiativas correspondentes são mostrados nos eixos do lado direito do

painel grande. Extraído de IPCC (2007).

Dió

xido

de

Car

bono

(ppm

)

Forç

a R

adio

ativ

a (W

m-2

)

250

300

350

0

1

Ano Ano

10000 5000 0

Tempo antes de 2005

Page 13: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

2

Os atuais níveis em torno de 380 ppm de CO2 na atmosfera são maiores do que a

variabilidade natural entre 180 a 280 ppm estimada para os últimos 400.000 anos (Kump, 2002).

Nesse sentido, estudos recentes têm atribuído especial relevância ao aumento antropogênico nas

concentrações de CO2 atmosférico desde a Revolução Industrial para explicar o atual

aquecimento global, que está sendo acompanhado também de aumento do nível dos mares e

redução das coberturas de gelo (IPCC, 2007; Figura 2).

Figura 2: Mudanças observadas na (a) temperatura média global da superfície terrestre; (b)

média global da elevação do nível do mar a partir de dados de marégrafo (azul) e satélite

(vermelho) e (c) cobertura de neve do Hemisfério Norte para março-abril. Todas as mudanças

são relativas às médias correspondentes para o período de 1961 a 1990. As curvas suavizadas

representam valores médios decenais, enquanto que os círculos indicam valores anuais. As áreas

sombreadas são os intervalos estimados com base em uma análise abrangente das incertezas

conhecidas (a e b) e nas séries temporais (c). Extraído de IPCC (2007).

(a) Média da Temperatura Global Ano (b) Média do Nível Global do Mar Ano (c) Cobertura de Neve do Hemisfério Norte Ano Ano

1850 1900 1950 2000

Dife

renç

a em

rela

ção

à m

édia

ent

re 1

961

e 19

90

(o C)

0,5

0,0

- 0,5

(106 k

m2 )

4

0

- 4

(mm

)

50

0

- 50

- 150

- 100

Tem

pera

tura

(o C) 14,5

14,0

13,5

(1

06 km

2 )

40

36

32

Page 14: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

3

Na escala global, os lagos são ecossistemas pequenos em área mas com ampla distribuição

geográfica (Downing et al., 2006) e potencialmente importantes na condução do carbono fixado

em compostos terrestres para seu retorno mineralizado à atmosfera (Cole et al., 1994; Cole et al.,

2007). A cota frequentemente baixa torna os lagos comuns ecossistemas de destino ao aporte

advindo de vastas áreas da bacia de drenagem (Lennon, 2004; Sobek et al., 2005). Nesse sentido,

é o balanço entre o aporte alóctone, a exportação a outros ecossistemas ou atmosfera, a produção

e a fixação autóctones de carbono que determina a pressão parcial de CO2 (pCO2) nas águas

superficiais (Cole et al., 2007), a principal condição reguladora do fluxo deste gás entre lagos e a

atmosfera (Cole & Caraco, 1998).

Sendo assim, os fatores que influenciam a produção primária (como incidência e

disponibilidade de radiação solar na água; Williamson et al., 1999), a degradação físico-química

e biológica (como a presença de substratos orgânicos, Amado et al., 2007) ou ambas (como a

concentração de nutrientes; Biddanda et al., 2001; e a estratificação das águas; Edmundson &

Mazumber, 2002) podem determinar os valores de pCO2 e consequentemente o fluxo de CO2

entre lagos e a atmosfera. A contribuição de ácidos terrestres ricos em carbono orgânico e

inorgânico (Cole et al., 2007) afeta as concentrações de CO2 dos lagos não somente por aumentar

o seu aporte ou a disponibilidade de recursos orgânicos a sua produção, mas também por alterar

o pH das águas. A acidificação dos ecossistemas aquáticos resulta em incremento de CO2

diretamente por equilíbrio iônico (Cole & Caraco, 1998), enquanto as águas mais básicas

apresentam, por outro lado, uma maior apreensão deste gás também pela calcificação biológica

(Riebesell et al., 2000).

A zona tropical pode apresentar regimes diferenciados de temperatura, incidência solar,

precipitação e produção terrestre na bacia de drenagem (Luyssaert et al., 2007), peculiaridades

que influenciam potencialmente tanto a produção físico-química (Amado et al., 2007) e

biológica (Raich et al., 2006) quanto a fixação autotrófica (Schindler, 1978) de CO2. As

condições tropicais podem sustentar expressivas emissões globais de CO2 por ecossistemas

Page 15: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

4

aquáticos à atmosfera (Richey et al., 2002). Apesar de sua relevância ao ciclo do carbono e

representatividade na superfície terrestre (Downing et al., 2006), os lagos situados em baixas

latitudes são fortemente subrepresentados na literatura científica sobre CO2 (Cole et al., 2007;

Sobek et al., 2005). Nesse sentido, um melhor entendimento sobre as mudanças climáticas

perpassa por reduzir a lacuna de dados relacionados aos lagos tropicais (Sobek et al., 2007).

Page 16: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

5

OBJETIVOS GERAIS

Avaliar a relação entre a pCO2 de águas superficiais e seus potenciais fatores

direcionadores nos lagos tropicais (estratificação vertical, eutrofização, concentrações de

carbono orgânico, acidificação, precipitação, manipulações na teia trófica, e temperatura);

Analisar as diferenças no fluxo de CO2 lago-atmosfera e suas potenciais causas entre

baixas e altas latitudes.

Page 17: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

6

ESTRUTURA DA TESE

A divisão em 6 capítulos pretendeu abarcar uma síntese do conhecimento científico

disponível e a discussão de novos dados sobre as relações entre importantes fatores

direcionadores da pCO2 das águas superficiais de lagos, os quais ainda são pouco estudados

principalmente nos Trópicos. Ao longo da tese foram utilizados diferentes níveis de abordagem

ecológica frente à complexidade do tema, incluindo coleta de dados a partir de amostragens no

campo, em bases de monitoramento de longo prazo, de experimentos com mesocosmos ou

mesmo na literatura científica. Um sumário da estrutura em capítulos desta tese foi organizada na

tabela 1.

Tabela 1: Temas de cada capítulo desta tese.

Capítulos Tema Geral

1 Revisão geral na literatura científica sobre CO2 de lagos e seus fatores reguladores.

2 Análise das emissões de CO2 em eventos de estratificação/desestratificação da água em lagos adjacentes a uma floresta tropical.

3 Avaliação das relações entre eutrofização, acidificação e pCO2 em um lago tropical de água clara e outro húmico, a partir de uma base de dados de longo prazo (13 anos) e um experimento de curto prazo em mesocosmos.

4 Relação entre pluviosidade e pCO2 em lagos costeiros tropicais.

5 Efeitos ascendentes (eutrofização) e descendentes (introdução de peixe onívoro) sobre os fluxos de CO2 na interface água-ar em uma abordagem de mesocosmos em um lago húmico tropical.

6 Análise da relação global entre temperatura e pCO2 das águas superficiais de lagos a partir da maior base de dados tropicais já construída sobre este tema na literatura.

Page 18: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

7

CAPÍTULO 1

Revisão:

Os Fatores Reguladores do Metabolismo Aquático e sua Influência sobre o Fluxo de

Dióxido de Carbono entre os Lagos e a Atmosfera

Publicado no periódico “Oecologia brasiliesis” (10 (2): 177-185, 2006 por Humberto

Marotta

Page 19: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

8

Considerações Iniciais

O ciclo global do carbono foi alterado significativamente pelas atividades humanas ao

longo dos últimos três séculos (Ver et al., 1999). A ação antrópica alterou em escala global tanto

as emissões de carbono inorgânico à atmosfera, especialmente sob a forma de dióxido de

carbono (CO2), quanto as taxas de produção e os estoques de carbono orgânico (Vitousek et al.,

1997). Os principais caminhos metabólicos nos quais o carbono orgânico é produzido e

degradado são respectivamente a produção primária e a respiração (Cole et al., 2000), cujo

balanço nos ecossistemas aquáticos é denominado de Metabolismo Aquático (Odum, 1956).

Dentre os ecossistemas naturais, os lagos são reconhecidos ambientes de acumulação de

materiais orgânicos e inorgânicos devido à freqüente posição terminal (menor cota) na bacia de

drenagem (Knoppers, 1994). Os lagos apresentam ampla distribuição geográfica (cerca de 304

milhões de ecossistemas situados em todas as zonas climáticas do planeta) e sua área global foi

estimada em torno de 4,2 x 106 km2, o que representa a expressiva parcela de quase 3 % da

superfície terrestre continental (Downing et al., 2006). Em virtude dessas características, os lagos

são potencialmente importantes no ciclo global do carbono (Cole et al., 1994).

O objetivo desta revisão foi discutir os principais fatores reguladores do metabolismo

aquático de lagos e sua influência sobre o fluxo de CO2 entre lagos e a atmosfera. A revisão foi

estruturada em quatro partes. Na primeira, ressaltamos o papel do dióxido de carbono para o

aquecimento global. Na segunda, discutimos a relação entre o metabolismo aquático e o fluxo de

dióxido de carbono de lagos para a atmosfera. Na terceira, analisamos o papel da regulação

ascendente e descendente sobre o metabolismo dos lagos. Por fim, tecemos na quarta parte uma

breve discussão sobre as lacunas científicas acerca do tema.

O Dióxido de carbono e o Aquecimento Global

A molécula de CO2 apresenta a propriedade de absorver a radiação infravermelha (calor),

contribuindo para aumentar a temperatura da atmosfera terrestre em um processo denominado de

Page 20: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

9

Efeito Estufa. Pesquisas paleoclimáticas sugerem uma relativa sincronia entre os aumentos

naturais nas concentrações de CO2 atmosférico e as épocas de aquecimento global na história

geológica da Terra (Kump, 2002). Dados recentes do Relatório do Painel Intergovernamental de

Mudanças Climáticas (IPCC, 2001) evidenciaram um acentuado aquecimento de 0,6 oC da

superfície terrestre somente nas últimas três décadas. As conclusões do IPCC (2001) atribuem

especial relevância ao aumento de 30 % nas concentrações de CO2 atmosférico desde a

Revolução Industrial para explicar esse aquecimento global mais recente. Os atuais níveis de 380

ppm desse gás na atmosfera são maiores do que a variabilidade natural entre 180 a 280 ppm

estimada nos últimos 400.000 anos (Kump, 2002). Esse incremento antropogênico nas

concentrações de CO2 foi principalmente causado pela queima de combustíveis fósseis pela

sociedade urbano-industrial, que resultou na liberação à atmosfera de altas quantidades de

carbono antes estocadas no subsolo terrestre. Sendo assim, há cada vez mais indícios de que o

Efeito Estufa tem sido incontestavelmente acentuado pelas atividades humanas (Kerr, 2006).

As conseqüências do processo de aquecimento global intensificado pelas atividades

humanas ainda estão em debate na literatura. Os fenômenos decorrentes da ação antropogênica

mais comumente descritos são: o degelo das calotas polares (Rignot & Kanagaratnam, 2006), a

elevação do nível do mar (Miller & Douglas, 2004), os incêndios florestais (Westerling et al.,

2006), as extinções de espécies (Schwartz et al., 2006) e as catástrofes climáticas (Webster et al.,

2005). Em virtude desse cenário negativo, iniciou-se na década passada um debate mundial que

culminou com a assinatura do Tratado de Kyoto, o qual visa uma redução de, no mínimo, 5% das

emissões de gases causadores do Efeito Estufa relativas ao ano de 1990 até o período entre 2008

e 2012 (ONU, 1998). O Tratado de Kyoto é uma evidência de que a redução das emissões dos

gases do efeito estufa tornou-se uma importante meta, sem a qual se tornam inalcançáveis os

objetivos de mitigação do aquecimento global (Schneider, 2001).

Page 21: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

10

O Metabolismo Aquático e o Fluxo de Dióxido de Carbono entre os Lagos e a Atmosfera

Alguns processos podem apresentar um papel significativo para determinar a quantidade

de CO2 nos ecossistemas aquáticos. Dentre os quais é possível destacar o balanço de CO2 entre a

apreensão pela calcificação e a liberação pela dissolução (Gattuso et al., 1998), a produção de

CO2 pela degradação físico-química induzida pela luz solar (foto-oxidação; Granéli et al., 1996),

o próprio aporte alóctone de CO2 (Raymond et al., 1997), além de outros processos físicos e

químicos (Duarte & Prairie, 2005). Em lagos de pH muito básico e com alta disponibilidade de

carbonatos, o balanço entre a calcificação e a dissolução pode ser o processo mais importante

para determinar as concentrações de CO2 na coluna d’água (Hung & Hung, 2003). A foto-

oxidação pode representar, por sua vez, uma parcela significativa da produção de CO2 nos lagos

húmicos, onde existe alta disponibilidade de carbono orgânico dissolvido na água (Graneli et al.,

1996). No entanto, várias evidências sugerem que as concentrações de CO2 nos lagos são

significativamente reguladas pelo metabolismo aquático, ou seja, pelo balanço entre a respiração

e a fotossíntese (Cole et al., 2000). Os organismos vivos obtêm a energia para desempenhar suas

funções vitais a partir da decomposição da matéria orgânica (alimento), que pode ser produzida

(por seres autotróficos) ou consumida de outros organismos (por seres heterotróficos). Enquanto

a produção primária pela fotossíntese sintetiza a matéria orgânica a partir do consumo de CO2, a

respiração é o processo de degradação dos compostos orgânicos que resulta na liberação desse

gás. Sendo assim, além de sua importância em amenizar a temperatura global, o CO2 é um gás

diretamente envolvido na atividade biológica.

Os estoques de carbono fixado pela produção primária em biomassa são relevantes

reservas de carbono do planeta, as quais podem ser liberadas para atmosfera (principalmente

como CO2) a partir da decomposição biológica ou da queima natural e antropogênica (Houghton

& Woodwell, 1989). A biomassa terrestre global apresenta valores comparáveis à quantidade

total de carbono existente na atmosfera sob a forma de CO2 (Siegenthaler & Sarmiento, 1993).

Uma parcela relevante desse carbono orgânico terrestre é transportada, depositada ou

Page 22: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

11

mineralizada nos ecossistemas aquáticos (Cole & Caraco, 2001). Como conseqüência, a cadeia

trófica e a produção de CO2 nos ecossistemas aquáticos podem ser sustentadas não somente pela

matéria orgânica fixada pelos produtores primários autóctones, mas também pelo carbono

orgânico de origem alóctone (Pace et al., 2004). Dessa forma, os lagos podem apresentar um

metabolismo no qual as taxas de produção primária podem ser superiores, iguais ou mesmo

inferiores às taxas de respiração (Cole et al., 2000). O metabolismo aquático autotrófico se

caracteriza por taxas de produção primária superiores às taxas de respiração, tendendo a

apresentar, portanto, subsaturação de CO2 e assimilação líquida desse gás em relação à

atmosfera. Por outro lado, o metabolismo aquático heterotrófico se caracteriza por taxas de

respiração mais elevadas do que as taxas de produção primária, tendendo a apresentar

supersaturação de CO2 e liberação líquida desse gás à atmosfera.

Especialmente a partir dos últimos anos, a literatura científica passou a descrever com

maior ênfase a importância do aporte de carbono orgânico terrestre para sustentar o metabolismo

aquático heterotrófico (Duarte & Prairie, 2005). Na rede de drenagem da bacia amazônica, foi

estimado que o metabolismo aquático é predominantemente heterotrófico e que a expressiva

parcela de 80 % do CO2 liberado para atmosfera é originado da decomposição de carbono

orgânico terrestre (Richey et al., 2002). Lagos circundados por densas florestas são propícios a se

tornarem mais orgânicos devido à lixiviação (Engstrom et al., 2000) e a apresentarem um

metabolismo heterotrófico, caracterizando-se como importantes condutores de carbono entre as

fontes terrestres e a atmosfera (Cole et al., 1994). Em razão do significativo aporte orgânico

terrestre em escala global, a maioria dos lagos em todas as zonas climáticas do planeta apresenta

supersaturação de CO2 (Sobek et al., 2005). A evasão de carbono sob a forma de CO2 de lagos

para atmosfera foi estimada em torno de 70 g m-2 ano-1 (Cole et al., 1994). A partir da área mais

recentemente avaliada para os lagos (Downing et al., 2006), a emissão média anual de CO2 pode

ser extrapolada em escala global para 0,29 x 1015 g C ano-1, uma evasão equivalente aos cerca de

0,30 x 1015 g C ano-1 estimados para os rios do planeta (Cole & Caraco, 2001).

Page 23: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

12

Regulação Ascendente e Descendente sobre o Metabolismo Aquático dos Lagos

As condições ambientais, os recursos e a composição de espécies que alteram a produção

primária e a respiração também podem determinar o metabolismo aquático e sua influência sobre

o fluxo de CO2 entre os lagos e a atmosfera. A regulação do metabolismo aquático que é

resultante da disponibilidade de recursos aos organismos na teia trófica é denominada de

controle ascendente. Já a regulação do metabolismo aquático decorrente da influência dos níveis

tróficos superiores sobre os inferiores é denominada de controle descendente.

O controle ascendente é um importante determinante do metabolismo dos lagos (Hanson et

al., 2003). O aumento da disponibilidade de radiação solar na coluna d’água freqüentemente

favorece a produção primária (Williamson et al., 1999), enquanto o aporte de carbono orgânico

terrestre favorece a produção das bactérias heterotróficas (Lennon, 2004). Já o acréscimo de

nutrientes fosfatados e nitrogenados (eutrofização) incrementa tanto a produção primária

(Schindler, 1978) quanto a atividade microbiana heterotrófica (Azam, 1998).

Sendo assim, o controle ascendente promovido pela eutrofização tende a intensificar o

metabolismo autotrófico ou heterotrófico nos lagos?! Existe na literatura uma tendência geral na

qual o metabolismo heterotrófico predominaria em lagos com baixa disponibilidade de nutrientes

(oligotróficos; Del Giorgio, 1999), enquanto o metabolismo autotrófico predominaria em lagos

com alta disponibilidade de nutrientes (eutróficos; Schindler et al., 1997). Embora o processo de

eutrofização favoreça tanto produtores primários quanto microrganismos heterotróficos, o

metabolismo que tende a ser favorecido é o autotrófico (Biddanda et al., 2001). A principal causa

desta relação ainda não está clara, mas três hipóteses complementares estão em discussão na

literatura: 1) em condições oligotróficas, as bactérias heterotróficas incorporariam nutrientes da

água mais rapidamente do que os organismos autotróficos, possivelmente devido a sua alta razão

perímetro:volume (Sanders et al., 1992); 2) mesmo em condições oligotróficas, a comunidade

planctônica heterotrófica continuaria sendo particularmente subsidiada pelo aporte de matéria

Page 24: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

13

orgânica alóctone (Del Giorgio et al., 1999); e 3) em condições eutróficas, a predação seria mais

intensa sobre as bactérias do que sobre as algas (Fuhrman & Noble, 1995).

Além da eutrofização, o aporte de carbono orgânico dissolvido (COD) é um importante

processo de regulação ascendente sobre o metabolismo aquático dos lagos (Hanson et al., 2003).

O COD é utilizado principalmente por bactérias heterotróficas, que consomem a matéria

orgânica presente nos ecossistemas aquáticos e constituem recurso para protozoários ou para o

zooplâncton, organismos que são por sua vez um alimento potencial aos peixes. Esse caminho

alternativo da cadeia alimentar, baseado na matéria orgânica consumida pelas bactérias

heterotróficas e não no caminho tradicional baseado no carbono fixado pelas algas, é

denominado de Alça Microbiana (Azam et al., 1983). Portanto, a matéria orgânica terrestre

mineralizada nos lagos pode sustentar não somente as bactérias heterotróficas, mas também os

níveis superiores heterotróficos da cadeia trófica, como invertebrados e peixes (Pace et al.,

2004). Além de constituir recurso à respiração, o COD terrestre é caracterizado pela coloração

escura em virtude de sua composição rica em compostos refratários, como lignina e celulose

(Thurman, 1985). Essa característica intensifica a atenuação da radiação solar na coluna d’água,

o que geralmente desfavorece a produção primária aquática (Williamson et al., 1999). Sendo

assim, o controle ascendente causado pelo aporte de COD terrestre em geral favorece o

metabolismo aquático heterotrófico e a evasão de CO2 de lagos para atmosfera (Lennon, 2004).

Apesar da estreita relação positiva entre o COD terrestre e o metabolismo aquático

heterotrófico, verifica-se que o nível de explicação da regressão entre as concentrações de COD

e de CO2 em lagos na escala global é baixo, apesar de significativo (Sobek et al., 2005). Esse

aparente paradoxo é atribuído ao elevado ruído dessa regressão em virtude da origem do COD

nos lagos, a qual pode ser da lixiviação terrestre ou da produção primária aquática autóctone.

Embora também constitua um importante recurso às bactérias (Cole et al., 1988), o COD das

algas é produzido a partir da fixação de CO2 pela fotossíntese. Portanto, lagos com baixo aporte

de compostos orgânicos terrestres podem até apresentar uma relação negativa entre as

Page 25: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

14

concentrações de COD e de CO2 devido à elevada importância das algas (Carignan et al., 2000),

o que contribui para diminuir a relação positiva entre as concentrações de COD e o fluxo de CO2

de lagos para atmosfera na escala global (Sobek et al., 2005).

Além do controle ascendente, os fatores descendentes também regulam expressivamente a

estrutura e a função das comunidades aquáticas (Scheffer, 2004). Em um tipo específico de

controle descendente, o aumento na abundância de predadores carnívoros e conseqüente redução

na biomassa dos herbívoros pode causar um efeito positivo indireto sobre a produção primária, o

qual é denominado de Cascata Trófica (Borer et al., 2005) e pode ser freqüentemente relevante

nos lagos (Carpenter et al., 2001). No entanto, dificuldades logísticas tornam os estudos sobre o

controle descendente do metabolismo de lagos mais escassos quando comparados aos que

avaliam apenas o controle ascendente. Os trabalhos mais comuns sobre o controle descendente

incluem manipulações com introdução ou exclusão de espécies, as quais requerem grande

experiência e investimento.

Em um clássico experimento de lago inteiro, Schindler et al. (1997) constataram que as

mudanças na composição de espécies em lagos podem alterar o metabolismo aquático devido à

cascata trófica. Nesse experimento, foram comparados dois lagos dominados por peixes

piscívoros e outros dois por peixes planctívoros. Dentre os quatro lagos estudados por Schindler

et al. (1997), somente um dominado por peixes piscívoros e outro por peixes planctívoros foram

submetidos à eutrofização experimental. Ambos os lagos não eutrofizados apresentaram fluxos

de liberação de CO2 para atmosfera, enquanto os lagos eutrofizados apresentaram fluxo de

apreensão de CO2 atmosférico. No entanto, a eutrofização experimental favoreceu mais o

metabolismo autotrófico e a apreensão de CO2 atmosférico no lago dominado por peixes

planctívoros. Nesse lago, a exclusão dos peixes piscívoros resultou no aumento da pressão de

predação dos peixes planctívoros sobre o zooplâncton e no decréscimo da pressão de predação

do zooplâncton sobre o fitoplâncton, favorecendo por final os produtores primários e o

metabolismo autotrófico. A partir deste resultado, Schindler et al. (1997) concluíram que pode

Page 26: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

15

existir um efeito integrado entre os fatores ascendentes (eutrofização) e descendentes

(composição de espécies) sobre o metabolismo aquático dos lagos. Em outro experimento de

lago inteiro, Cole et al. (2000) também reforçaram essa tendência de que os controles

ascendentes e descendentes não devem ser analisados isoladamente. Nesse estudo, o

metabolismo heterotrófico persistiu em um lago não eutrófico, apesar da comunidade de peixes

ser dominada por planctívoros que reduziram a pressão de predação sobre as algas. Tal resultado

foi atribuído ao controle ascendente promovido pela alta disponibilidade de carbono orgânico

dissolvido que subsidiou a atividade aquática heterotrófica (Cole et al., 2000).

Na medida em que determinadas condições influenciam o estabelecimento das espécies

biológicas ao alterarem a quantidade e a qualidade de outros recursos, também podem apresentar

especial relevância ao metabolismo aquático. A temperatura, a pluviosidade e a profundidade são

exemplos de condições que influenciam inúmeros outros fatores de regulação tanto descendente

quanto ascendente sobre o metabolismo dos lagos. A pluviosidade favorece freqüentemente o

metabolismo aquático heterotrófico ao aumentar o aporte da lixiviação orgânica terrestre

(Biddanda & Cotner, 2002; Ram et al., 2003). No entanto, a intensificação das chuvas também

incrementa o aporte de nitrogênio e fósforo nos lagos (Schindler, 1978), o que poderia favorecer

por sua vez o metabolismo autotrófico especialmente em áreas agrícolas e urbanas. Contrário ao

esperado por razões fisiológicas, os efeitos da temperatura em escala global por si podem não

alterar significativamente a supersaturação de CO2 em lagos (Sobek et al., 2005). Apesar disso, o

aquecimento global associado a grande profundidade pode reduzir a produção primária lagunar,

resultado do aumento da faixa de anaerobiose e da produção de ácido sulfídrico na coluna d’água

(Verburg et al., 2003). Outro processo regulador do metabolismo dos lagos que influencia

diversas outras condições é o lançamento de esgotos sem tratamento. Esses efluentes domésticos

são ricos em compostos orgânicos, que sustentam o metabolismo heterotrófico (Lennon, 2004), e

em nutrientes nitrogenados e fosfatados, que favorecem o metabolismo autotrófico (Biddanda et

al., 2001). Elevadas quantidades de esgotos intensificam o metabolismo aquático heterotrófico e

Page 27: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

16

causam permanente supersaturação de CO2 na coluna d’água, pois aumentam excessivamente a

quantidade de carbono orgânico à heterotrofia e reduzem a disponibilidade de radiação solar à

autotrofia (Hellings et al., 2001). Por outro lado, reduzidas vazões de esgoto podem intensificar o

metabolismo aquático autotrófico, tal como foi detectado em um lago tropical (Carmouze et al.,

1991), em virtude das altas concentrações de nitrogênio e fósforo inorgânicos em relação à

disponibilidade compostos orgânicos. Portanto, torna-se evidente como a previsibilidade

pretendida com as pesquisas científicas, a qual relacione os efeitos das mudanças nas condições

ecológicas ao metabolismo aquático, pode ser permeada de alta complexidade e demandar mais

estudos devido às peculiaridades locais e aos numerosos mecanismos de causa e efeito

envolvidos, os quais além de interdependentes ainda se relacionam de forma direta e indireta.

Lacunas Científicas e Considerações Finais

O metabolismo aquático influencia o fluxo de CO2 para atmosfera nos lagos, os quais são

importantes ecossistemas na condução de carbono das fontes terrestres para a atmosfera (Cole et

al., 1994). Pesquisas recentes também confirmaram a relação positiva entre o aumento do CO2

antropogênico e o aquecimento global (IPCC, 2001). Desta maneira, estudos sobre os fatores

reguladores do metabolismo aquático em lagos permitem revelar aspectos importantes para o

próprio processo de aquecimento global. No entanto, existem na literatura relevantes lacunas

sobre os fatores que regulam o metabolismo aquático, embora sejam conhecidos isoladamente

vários níveis de regulação tanto da produção primária quanto da respiração (Cole et al., 2000).

A carência de estudos nos lagos tropicais é especialmente acentuada, apesar desses

ecossistemas apresentarem importante representatividade em escala global (Downing et al.,

2006) e expressivas peculiaridades como alta incidência solar e temperatura ao longo de todo o

ano. Em um recente levantamento global sobre as concentrações de CO2 em 4902 lagos (Sobek

et al., 2005), apenas 6 % eram tropicais ou subtropicais enquanto 60 % eram boreais. Outra

lacuna se refere à constatação de que a maioria dos lagos do mundo são pequenos e rasos

Page 28: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

17

(Downing et al., 2006), uma condição que aumenta freqüentemente a importância relativa das

margens densamente colonizadas por macrófitas aquáticas emersas (Wetzel, 1990). Essa

vegetação apresenta uma das mais altas taxas de produtividade primária do planeta (Wetzel,

2001), que pode resultar em substancial acúmulo de carbono no sedimento (Brevik & Homburg,

2004). No entanto, as macrófitas aquáticas flutuantes e emersas não reduzem as concentrações de

CO2 da coluna d’água como os outros produtores primários aquáticos, uma vez que incorporam

esse gás diretamente da atmosfera (Sculthorpe, 1967). Essa vegetação pode, por outro lado, até

aumentar as concentrações de CO2 devido à decomposição de sua biomassa morta no fundo dos

lagos (Kuehn & Suberkropp, 1998). Dessa forma, o acúmulo de carbono pelas macrófitas

aquáticas emersas não é considerado na avaliação isolada dos fluxos de CO2 entre os lagos e a

atmosfera. Apesar dessa potencial importância especialmente nos lagos rasos tropicais, a grande

maioria dos estudos simplesmente ignora a fixação de CO2 pelas macrófitas aquáticas emersas,

pois somente avaliam isoladamente o fluxo desse gás entre a coluna d’água e a atmosfera. Por

conseguinte, existe na literatura uma grande carência tanto de estudos sobre os fatores

reguladores do metabolismo em lagos tropicais quanto de trabalhos que considerem o importante

papel das macrófitas aquáticas emersas sobre o metabolismo aquático.

Os estudos ecológicos sobre o fluxo de CO2 entre os lagos e a atmosfera são relevantes não

apenas por discutirem os fatores reguladores do gás estufa mais abundante do planeta, enfocando

esses reconhecidos ecossistemas de ligação entre o ambiente terrestre e a atmosfera. Artigos

recentes têm debatido sobre o real papel da temperatura em intensificar o processo de

decomposição da matéria orgânica na escala global (para detalhes ver revisão de (Davidson &

Janssens, 2006). Portanto, estudos que avaliem os efeitos da temperatura para a decomposição

biológica e a conseqüente emissão de CO2 por lagos na escala global permitem inferir sobre o

papel do aquecimento do planeta em intensificar a liberação desse gás que contribui, por sua vez,

para aumentar a própria temperatura global. Em outras palavras, tal enfoque em lagos permite

avaliar se o aquecimento global pode ou não contribuir para intensificar o próprio aquecimento

Page 29: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

18

global (retro-alimentação positiva). Nessa linha, foi evidenciado recentemente que a elevação de

temperatura do planeta pode aumentar as emissões de metano de lagos para atmosfera, um outro

gás que intensifica o Efeito Estufa (Walter et al., 2006).

Portanto, apesar do grande avanço obtido na literatura científica acerca dos fatores

reguladores do metabolismo aquático e de seu papel na emissão à atmosfera do gás do Efeito

Estufa mais abundante (CO2), podemos sumarizar duas principais lacunas que podem insurgir

como ponto de discussão nos próximos anos. Enquanto na escala local intralagunar existe a

necessidade por abordagens integradas do metabolismo aquático entre as áreas central e

marginal, na escala global existe a demanda pela inclusão de mais estudos em lagos tropicais.

Page 30: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

19

CAPÍTULO 2

Mudanças nos Padrões de Estratificação Térmica e de Oxigênio Associadas à Persistente

Evasão de CO2 à Atmosfera em Lagos das Adjacências da Floresta Tropical Atlântica,

Brasil

Com o título “Changes in thermal and oxygen stratification pattern coupled to persistence of

CO2 outgassing in shallow lakes of the surroundings of Atlantic Tropical Forest, Brazil” dos

autores Humberto Marotta, Lurdemar T. Paiva & Mauricio M. Petrucio foi aceito para

publicação no periódico “Limnology”.

Page 31: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

20

Introdução

Lagos são ecossistemas aquáticos amplamente distribuídos na superfície terrestre

continental (Downing et al., 2006), constituindo reconhecidos ambientes de acumulação de

matéria orgânica e inorgânica na bacia de drenagem (Sobek et al., 2005). A matéria orgânica é

um essencial recurso à produção físico-química e biológica de dióxido de carbono (CO2) nestes

ecossistemas (Amado et al., 2007). Compostos orgânicos terrestres apresentam uma qualidade

mais refratária à decomposição biológica que aquela produzida nos ecossistemas aquáticos

(Hopkinson et al., 1998), mas podem sustentar a heterotrofia líquida e a supersaturação de CO2

na maior parte dos lagos do mundo (Cole et al., 2007; Sobek et al., 2005). Dessa forma, lagos

poderiam ser importantes ecossistemas no ciclo global do carbono, atuando como condutores de

carbono entre as fontes terrestres e a atmosfera (Cole et al., 1994).

A produção autotrófica que fixa CO2 e a respiração que libera este gás são as maiores vias

metabólicas pelas quais a matéria orgânica é produzida e degradada no planeta (Cole et al.,

2000). A atividade biológica que determina o balanço de CO2 nas águas superficiais pode ser

fortemente influenciada pela estratificação da água nos lagos (Edmundson & Mazumder, 2002),

um dos mais importantes temas das ciências aquáticas desde o final do século XIX (Hoppe-

Seyler, 1895; Thienemann, 1925). Padrões de estratificação temporária da água durante uma

determinada estação do ano ou período do dia são frequentemente observados em lagos glaciais

(Edmundson & Mazumder, 2002), temperados (Melack & Jellison, 1998) e tropicais (Henry &

Barbosa, 1989). Estratificações persistentes são também comuns em lagos profundos (Laval et

al., 2005) e rasos (Townsend, 2006) ao redor do mundo, nos quais diferentes padrões de

estratificação são determinados por condições climatológicas e morfométricas (Timms, 1975). A

mistura de água é um controle físico-químico que pode ser regulado pela hidrologia,

profundidade, velocidade do vento, temperatura ou salinidade. A estratificação da água por

controles físicos também influencia os padrões de perfil vertical de gases biogênicos (Ford et al.,

2002).

Page 32: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

21

A estratificação de gases biogênicos envolvidos no balanço entre a fotossíntese e a

respiração, oxigênio (O2) e CO2, é frequentemente associada a mudanças nos fatores reguladores

das emissões de CO2 à atmosfera, como as concentrações deste gás, a temperatura ou o pH nas

águas superficiais. No entanto, a relação entre a estratificação da água e as emissões de CO2 em

lagos ainda demanda melhor conhecimento, especialmente nos Trópicos. No presente capítulo,

foram estudadas as variações diárias dos perfis de O2, CO2 e outras variáveis físico-químicas em

dois lagos rasos oligotróficos, situados nas adjacências da Floresta Tropical Atlântica (Brasil) em

três períodos (um durante a estação a seca e dois durante a estação chuvosa). Lagos desta região

apresentam uma estratificação sazonal na estação chuvosa bem descrita, conseqüência da menor

circulação das águas, mais alta temperatura do ar e maior aporte de águas frias, densas e ricas em

matéria terrestre, a qual é seguida por uma desestratificação no inverno seco quando o aporte

terrestre e a temperatura são menores e a velocidade do vento é mais alta (Tundisi, 1997). Nossa

hipótese foi que lagos com altas concentrações de carbono orgânico dissolvido (COD) por

aportes terrestres poderiam apresentar persistência das emissões de CO2 a atmosfera ao longo do

ano, apesar de mudanças no padrão de estratificação da água.

Área de Estudo

Os lagos Barra e Aguapé são situados próximos (distância de cerca de 6 km) em uma

altitude de 300 m nas adjacências do Parque Estadual do Rio Doce (Sudeste do Brasil; Figura 1),

uma grande área preservada de Floresta Tropical Atlântica (36.000 ha). Ambos os lagos são

oligotróficos (fósforo total em torno de 1 µmol L-1 e clorofila-a cerca de 15 µg L-1), rasos

(profundidade máxima de 10 m) e enriquecidos em carbono orgânico total (acima de 5 mg L-1)

por influência terrestre (Petrucio et al., 2006). O lago Aguapé apresenta margens dominadas por

plantação de eucalipto. Já o lago Barra é situado em uma antiga área de plantação de eucalipto

em processo de regeneração da Floresta Atlântica, apresentando baixa influência humana e alta

lixiviação de compostos advindos da floresta (Petrucio & Barbosa, 2004).

Page 33: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

22

Figura 1: Localização geográfica dos lagos estudados: Barra (19º51’32” S; 42º38'32” W) e

Aguapé (19º47’45” S; 42º36'53” W) no estado de Minas Gerais (Sudeste do Brasil).

O Parque Estadual do Rio Doce apresenta estações seca e chuvosas bem marcadas e as

condições meteorológicas nos meses estudados foram similares às médias históricas registradas

pelo Instituto Nacional de Meteorologia (INMET). As coletas foram realizadas em Março (verão

no fim da estação chuvosa) com uma temperatura média do ar de 25oC e precipitação acumulada

de 200 mm, Junho (inverno no meio da estação seca) com uma temperatura média do ar de 20oC

e precipitação acumulada de 20 mm, e Setembro (primavera no início da estação chuvosa) com

uma temperatura média do ar de 23oC e precipitação acumulada de 80 mm.

BRASIL

420 40’ W 420 30’ W

420 40’ W 420 30’ W

190 5

0’ S

190 50’ S

Lago Aguapé

Lago Barra

Page 34: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

23

Material e Métodos

Um ciclo de 24 horas (12:00, 18:00, 6:00 e 12:00 do dia seguinte) foi estudado em cada

período de coleta entre os dias: 9 e 10 de Março (fim da estação chuvosa), 12 e 13 de Junho

(estação seca) bem como 12 e 13 de Setembro (início da estação chuvosa). As amostragens

foram realizadas simultaneamente no centro de ambos lagos em 4 profundidades determinadas

por disco de Secchi (100, 10 e 1 % de incidência de luz além de um ponto na zona afótica).

As concentrações de O2 dissolvido pelo método de Winkler (Mackereth et al., 1978), a

alcalinidade total pela titulação de Gran (Mackereth et al., 1978) e o pH com um pHmetro

Marconi PA-200 (precisão de 0,01) foram analisados ainda no campo. No laboratório, amostras

de água filtradas (filtros Whatman GF/F com porosidade de 0,7 µm) foram analisadas para as

concentrações de COD pelo método da oxidação catalítica de alta temperatura em um Analisador

Shimadzu TOC-5000A (amostras pré-acidificadas a pH < 2,0). Já os filtros foram analisados

para determinar as concentrações de clorofila-a por extração com acetona 90% (Lorenzen,

1967).

As concentrações de CO2 foram calculadas pelo método pH-alcalinidade (Stumm &

Morgan, 1996) após correções para temperatura, altitude e força iônica como em Cole et al.

(1994). A saturação de CO2 foi calculada considerando o equilíbrio com a atmosfera (100%) de

380 µatm. Os fluxos deste gás na interface água-ar foram estimados considerando a velocidade

pistão (Cole & Caraco, 1998) e o fator de enriquecimento químico (Wanninkhof & Knox, 1996).

Os dados log-transformados apresentaram distribuição normal (Kolmogorov-Smirnov,

p<0,05), homogeneidade de variâncias (Bartlett, p>0,05) e pareamento (F test, p<0,05)

significativos. Sendo assim, os períodos de coleta foram comparados usando testes paramétricos

(Zar, 1996): one-way ANOVA para medidas repetidas (significativo p<0,05) e comparações

múltiplas de Tukey-Kramer (significativo p<0,05). Todos os testes estatísticos foram calculados

usando o programa Graphpad Prism 4.0.

Page 35: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

24

Resultados

Os perfis médios diários de temperatura (Figura 2), saturação de CO2 (Figura 3) e

saturação de O2 (Figura 4) apresentaram uma estratificação significativa tanto no fim quanto no

início da estação chuvosa em ambos os lagos (ANOVA and Tukey-Kramer, p<0,05) e uma

desestratificação significativa no inverno seco (ANOVA repetida, p>0,05). A estratificação

destas variáveis foi mais marcada no fim quando comparada ao início da estação chuvosa

(Figuras 2, 3 e 4).

25 30 350.0

2.5

5.0

7.5

10.0

Temperatura (oC)25 30 35

0.0

2.5

5.0

7.5

10.0

Temperatura (oC)25 30 35

0.0

2.5

5.0

7.5

10.0

Temperatura (oC)25 30 35

0.0

2.5

5.0

7.5

10.0

Temperatura (oC)25 30 35

0.0

2.5

5.0

7.5

10.0

aa

b

c

c

b

a

a

Temperatura (oC)

25 30 350.0

2.5

5.0

7.5

10.0

25 30 350.0

2.5

5.0

7.5

10.0

25 30 350.0

2.5

5.0

7.5

10.0

25 30 350.0

2.5

5.0

7.5

10.0

25 30 350.0

2.5

5.0

7.5

10.0

a

a

a

a

a

a

a

a

25 30 350.0

2.5

5.0

7.5

10.012:00 h

25 30 350.0

2.5

5.0

7.5

10.018:00 h

25 30 350.0

2.5

5.0

7.5

10.006:00 h

25 30 350.0

2.5

5.0

7.5

10.012:00 h

dia seguinte

25 30 350.0

2.5

5.0

7.5

10.0

aab

b

c

.Média Diária

a

ab

b

c

(2a) Fim da Estação Chuvosa

(2b) Estação Seca

(2c) Início da Estação Chuvosa

Figura 2: Variação diária dos perfis de temperatura nos lagos Aguapé (linhas com quadrados) e

Barra (linhas com cruzes) no fim da estação chuvosa (Março/2005), estação seca (Junho/2005) e

início da estação chuvosa (Setembro/2005). Ao menos de uma mesma letra representa diferença

não significativa entre profundidades de um mesmo perfil médio diário.

Page 36: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

25

1000 2000 3000 40000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

Saturação de CO 2 (%)

1000 2000 3000 40000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

Saturação de CO 2 (%)

1000 2000 3000 40000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

Saturação de CO 2 (%)

1000 2000 3000 40000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

Saturação de CO 2 (%)

1000 2000 3000 40000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

aa

b

c

c

b

aa

Saturação de CO 2 (%)

1000 2000 3000 40000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

1000 2000 3000 40000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

1000 2000 3000 40000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

1000 2000 3000 40000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

1000 2000 3000 40000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

aa

a

a

a

a

a

a

1000 2000 3000 40000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

12:00 h

1000 2000 3000 40000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

06:00 h

1000 2000 3000 40000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

06:00 h

1000 2000 3000 40000.0

2.5

5.0

7.5

10.012:00 h

dia seguinte

1000 2000 3000 40000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

aab

ab

c

.Média Diária

a

ab

b

c

(3a) Fim da Estação Chuvosa

(3b) Estação Seca

(3c) Início da Estação Chuvosa

Figura 3: Variação diária dos perfis de saturação de CO2 nos lagos Aguapé (linhas com

quadrados) e Barra (linhas com cruzes) no fim da estação chuvosa (Março/2005), estação seca

(Junho/2005) e início da estação chuvosa (Setembro/2005). Ao menos de uma mesma letra

representa diferença não significativa entre profundidades de um mesmo perfil médio diário.

Page 37: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

26

25 50 75 1000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

Saturação de O2 (%)

25 50 75 1000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

Saturação de O2 (%)

25 50 75 1000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

Saturação de O 2 (%)

25 50 75 1000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

Saturação de O 2 (%)

25 50 75 1000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

aa

b

cc

b

a

a

Saturação de O 2 (%)

25 50 75 1000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

25 50 75 1000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

25 50 75 1000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

25 50 75 1000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

25 50 75 1000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

aa

a

a

a

a

a

a

25 50 75 1000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

12:00 h

25 50 75 1000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

06:00 h

25 50 75 1000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

06:00 h

20 45 70 950.0

2.5

5.0

7.5

10.012:00 h

dia seguinte

25 50 75 1000.0

2.5

5.0

7.5

10.0

aa

b

c.Média Diária

a

a

b

c

(4a) Fim da Estação Chuvosa

(4b) Estação Seca

(4c) Início da Estação Chuvosa

Figura 4: Variação diária dos perfis de saturação de O2 nos lagos Aguapé (linhas com

quadrados) e Barra (linhas com cruzes) no fim da estação chuvosa (Março/2005), estação seca

(Junho/2005) e início da estação chuvosa (Setembro/2005). Ao menos de uma mesma letra

representa diferença não significativa entre profundidades de um mesmo perfil médio diário.

Considerando todas as profundidades amostradas, ambos os lagos estudados apresentaram

um aumento significativo de saturação de CO2, concentrações de COD e acidificação no início

da estação chuvosa (Figura 5, ANOVA repetida e Tukey-Kramer, p<0,05). Os fluxos de CO2 na

interface água-ar apresentaram os mais altos valores máximos no início da estação chuvosa em

ambos os lagos, mas significativas diferenças foram observadas somente no lago Aguapé (Figura

5, ANOVA repetida e Tukey-Kramer, p<0,05).

Page 38: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

27

0.0

2.0

4.0

6.0

8.0

10.0

aa

b

0.0

2.0

4.0

6.0

8.0

10.0

aa

a

0

900

1800

2700

3600

4500

a

a

b

0

900

1800

2700

3600

4500

aa

b

015

304560

7590

a aa

015

304560

7590

a

a a

0369

12151821

aa

b

0369

12151821

a ab

2022

242628

3032

a

bc

2022

242628

3032 a

bb

6.36.56.76.97.17.37.57.7

aa

b

6.36.56.76.97.17.37.57.7

a

a

b

0

10

20

30

40

aa

a

Inicio daEstaçãoChuvosa

Fim daEstaçãoChuvosa

EstaçãoSeca

(5a) Lago Aguapé

0

10

20

30

40a a a

Inicio daEstaçáoChuvosa

Fim daEstaçãoChuvosa

EstaçãoSeca

(5b) Lago Barra

Page 39: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

28

Figura 5: Fluxos de CO2 na interface água-ar em cada horário de coleta bem como saturações de

CO2 e de O2, concentrações de COD e clorofila-a, temperatura da água e pH em todas as

profundidades e horários coletados no fim da estação chuvosa (Março/2005), estação seca

(Junho/2005) e início da estação chuvosa (Setembro/2005) nos lagos (5.a) Aguapé e (5.b) Barra.

Os dois lagos estudados foram caracterizados por uma persistência das emissões de CO2 à

atmosfera, apesar da redução deste gás nas águas superficiais no meio dia em ambos os períodos

de coleta da estação chuvosa. Temperaturas mais baixas foram observadas no inverno seco em

ambos os lagos (Figura 5, ANOVA repetida e Tukey-Kramer, p<0,05). Considerando todas as

profundidades de coleta, a saturação de O2 e as concentrações de clorofila-a apresentaram

diferenças não-significativas entre períodos, apesar dos mais baixos valores mínimos de

saturação de O2 no fim e no início da estação chuvosa (Figura 5, ANOVA repetida, p>0,05).

Discussão

A bem descrita estratificação térmica no sistema de lagos do vale do rio Doce durante o

verão chuvoso (Tundisi, 1997), especialmente observada na coleta de Março de 2005, foi

associada a uma persistente estratificação diária de O2 e CO2 em ambos os lagos estudados. Este

resultado evidenciou que mesmo lagos rasos em áreas tropicais poderiam ser caracterizados por

estratificação de gases relacionados à decomposição orgânica. As altas temperaturas tropicais

poderiam favorecer a autotrofia líquida (redução de CO2) principalmente em águas superficiais

com disponibilidade de luz, e a heterotrofia líquida (aumento de CO2) principalmente nas zonas

mais profundas, onde a decomposição orgânica ou os aportes externos de CO2 e matéria orgânica

advindos do lençol freático são comumente mais altos (Boehrer et al., 2008).

A chuva é uma dinâmica natural que intensifica os aportes terrestres aos ecossistemas

aquáticos (Schindler, 1978). A matéria orgânica e inorgânica advinda da bacia de drenagem pode

sustentar a respiração e a supersaturação de CO2 (Cole et al., 2007; Sobek et al., 2005) ou ainda

contribuir à acidificação (Ram et al., 2003) nas águas dos lagos. Os aportes terrestres que

Page 40: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

29

sustentam a produção bacteriana (Petrucio et al., 2006) e reduzem a disponibilidade de luz ao

fitoplâncton (Barbosa & Tundisi, 1980; Henry & Barbosa, 1989) são tipicamente aumentados em

lagos na área estudada nos períodos chuvosos. Neste contexto, o ecossistema estudado com

maior aumento de COD e redução de pH (lago Aguapé) também apresentou o único incremento

nas emissões de CO2 à atmosfera.

No entanto, o início da estação chuvosa (Setembro de 2005), momento de estratificação

intermediária, foi caracterizada em ambos os lagos estudados por um significativo aumento na

saturação de CO2, COD e acidificação, contrastando com os resultados observados no fim da

estação chuvosa, que apresentou águas mais estratificadas. Esta diferença intra-sazonal poderia

ser relacionada às flutuações naturais nos aportes de ácidos orgânicos (Ram et al., 2003) e CO2

(Striegl & Michmerhuizen, 1998) advindos de fontes terrestres, pois a biomassa fitoplanctônica

(concentrações de clorofila-a) permaneceu similar entre todos os períodos amostrados.

Incrementos na taxa de lixiviação quando se inicia a estação chuvosa pode contribuir para

carrear carbono orgânico terrestre estocado nas águas subterrâneas ou no solo ao longo da

estação seca para os lagos (Schindler, 1978), reduzindo consequentemente estes estoques ao

longo da estação chuvosa.

Apesar de uma possível maior eficiência da produção primária para reduzir CO2 nas águas

superficiais durante eventos de estratificação (Boehrer et al., 2008), foi observada evasão de CO2

à atmosfera em todos os horários de coleta em ambos os lagos. Além dos aportes de carbono

terrestre (Sobek et al., 2005), a condição oligotrófica é outra característica que poderia ter

contribuído para este resultado, pois é bem descrito na literatura a tendência geral de dominação

por heterótrofos em ecossistemas aquáticos oligotróficos e por autótrofos nos eutróficos

(Biddanda et al., 2001; Duarte & Agusti, 1998). A persistência de evasão de CO2 em nosso

estudo confirmou que também lagos tropicais poderiam ser importantes fontes de carbono para a

atmosfera, como discutido para lagos globais em outros artigos baseados em levantamentos nos

quais as baixas latitudes foram fortemente subestimadas (Cole et al., 1994; Sobek et al., 2005).

Page 41: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

30

Sendo assim, nossos resultados confirmaram a hipótese, evidenciando evasão de CO2 à

atmosfera mesmo em águas pouco misturadas (estratificadas), onde a produção primaria é

reconhecidamente mais eficiente para reduzir as concentrações deste gás na superfície da coluna

d’água. Em conclusão, lagos rasos oligotróficos das adjacências da Floresta Tropical Atlântica

poderiam apresentar eventos de estratificação e desestratificação de temperatura, O2 ou CO2

associados a persistência de evasão de CO2, possivelmente subsidiada por aportes de carbono

alóctone.

Page 42: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

31

CAPÍTULO 3

Variabilidade de longo prazo no dióxido de carbono em dois lagos tropicais submetidos a

eventos seqüenciais de eutrofização e acidificação

Page 43: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

32

Introdução

Levantamentos nas águas superficiais dos lagos demonstram contundentemente que as

águas lacustres tendem a ser supersaturadas de CO2 (Cole et al., 1994; Sobek et al., 2005),

tornando tais ecossistemas importantes condutores de CO2 à atmosfera (Cole et al. 2007). A alta

concentração de CO2 na água dos lagos é devido aos aportes de carbono alóctone via lençol

freático e sob a forma tanto de CO2 quanto de carbono orgânico, sustentando o excesso de

respiração da biota aquática (Prairie et al., 2002; Sobek et al., 2005; Sobek et al., 2007). Dessa

forma, embora os lagos e tanques artificiais representem pouco mais de 3 % da superfície

continental terrestre (Downing et al., 2006), são ecossistemas que recebem uma substancial

parcela do carbono mobilizado no ambiente terrestre (Lennon, 2004; Sobek et al., 2005). Os

aportes de nutrientes também influenciam as concentrações de CO2 das águas lacustres,

aumentando a remoção deste gás pela autotrofia que se reflete em relações negativas entre as

concentrações de nutrientes e os valores de pCO2, como discutido para lagos canadenses (Prairie

et al., 2002), ou sustentando a produção de CO2 pela respiração aquática, como observado em

lagos finlandeses (Rantakari & Kortelainen, 2005). Na medida em que a química do carbono

inorgânico é altamente dependente do pH, mudanças nos aportes de bases (Raymond & Cole,

2003) e ácidos, tanto ácidos originados pela deposição atmosférica (Stoddard et al., 1999) quanto

ácidos orgânicos advindos da bacia de drenagem (Ram et al., 2003), também podem influenciar

a pCO2 das águas naturais.

Portanto, a pCO2 dos lagos pode ser extremamente dinâmico pela influência de múltiplos

processos afetando tanto a contribuição alóctone de carbono (por ex. a pluviosidade e as

mudanças no uso do solo), quanto a química do carbono nas águas lacustres (por ex. a

variabilidade do pH das águas advindas da bacia de drenagem ou do mar para os lagos) e a

apreensão de CO2 pela biota aquática (por ex. o aporte de nutrientes). Nesse sentido, o CO2 dos

lagos também pode ser altamente variável ao longo do tempo. No entanto, a maioria dos estudos

sobre a regulação de pCO2 nesses ecossistemas é derivado de levantamentos entre diferentes

Page 44: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

33

lagos ou de estudos sazonais, de maneira que avaliações de longo prazo das dinâmicas de pCO2

nas águas lacustres são escassos, embora os dados disponíveis confirmem que sua variação inter-

anual possa ser relevante (Kelly et al., 2001; Rantakari & Kortelainen, 2005).

No presente capítulo, foram avaliadas dinâmicas de longo prazo (ao longo de 13 anos) na

pCO2 durante eventos episódicos de eutrofização e acidificação em dois contrastantes, e

altamente dinâmicos, lagos rasos costeiros tropicais (um de água clara e outro húmico). O

objetivo foi analisar a resposta dos valores de pCO2 a mudanças inter-anuais em condições

limnológicas chave, como concentrações de nutrientes e pH. Na medida em que a eutrofização

influenciou somente o lago de água clara, a resposta do lago húmico ao enriquecimento de

nutrientes foi testada experimentalmente em mesocosmos, avaliando se os resultados obtidos

poderiam ser comparáveis ao observado no lago de água clara submetido a eutrofização.

Material e Métodos

Área de Estudo

Os lagos Imboassica (22o 25’ S e 42o 56’ O) e Cabiúnas (22o 00’ S e 42o 00’ O) são

situados na costa Norte do estado do Rio de Janeiro (Sudeste do Brasil, Figura 1). Está área

apresenta temperaturas médias mínima e máxima variando entre 20,7 oC em Julho e 26,2 oC em

Fevereiro (INMET, 1992). Apesar da alta variação inter-anual (Carmouze et al., 1991), as

pluviosidades mínima e máxima são tipicamente observadas em Agosto (38 mm) e Dezembro

(182 mm; INMET, 1992).

Ambos os lagos são alongados perpendicularmente à linha de costa, rasos e relativamente

próximos entre si (distancia de 30 km), apresentando uma similar área de bacia de drenagem (50

e 45 Km2 respectivamente). Os lagos são altamente dinâmicos, caracterizados por mudanças no

fluxo e na composição química do lençol freático (Farjalla et al., 2002) e por esporádicos aportes

de água do mar intensificados por aberturas na barra de areia que lhes separam do mar (Suzuki et

Page 45: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

34

al., 1998), condições que também afetam a extensão da colonização por macrófitas aquáticas em

ambos os lagos Imboassica (Dos Santos et al., 2006) e Cabiúnas (Dos Santos & Esteves, 2002).

Figura 1: Localização geográfica das estações de coleta (“Macrófitas” e “Aberta”) em cada lago

estudado.

O lago Imboassica, com uma área de 3,26 Km2, é localizado em uma Planície Fluvio-

Marinha Quaternária onde a floresta tropical foi desmatada (Cprm, 2000), apresentando águas

claras e pH levemente mais básico que o lago Cabiúnas. O uso da terra predominante na bacia

hidrográfica deste lago é o pasto extensivo, mas o aporte de nutrientes advindos de fontes

Rio de Janeiro

Macaé

Lago Imboassica

41o 45’ W

22o 15’ W

Macaé

5 0 5 10 km

Lago Cabiúnas

42o 00’ 08” W 22o 00’ 02” S

41o 56’ 08” W 22o 24’ 02” S

Lago Cabiúnas

Lago Imboassica

Macrofitas Aberta

500 m

Macrófitas Aberta

500 m

Brasil

Page 46: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

35

urbanas pode ser importante. As descargas de esgotos contribuíram para a eutrofização do lago

Imboassica principalmente depois de 1995 (Esteves, 1998). Atualmente, o aporte de esgotos é

estimado em torno de 2 x 106 L d-1 e alcança este lago por diferentes canais marginais (Marotta

et al., 2009).

O lago Cabiúnas é menor (0,34 Km2) e menos alterado pelas atividades humanas, pois é

localizado em uma unidade de conservação (Parque Nacional da Restinga de Jurubatiba). Este

lago é situado em uma Planície Arenosa Marinha do Quaternário onde a vegetação nativa

(denominada Restinga) é preservada (Cprm, 2000). A decomposição desta vegetação contribui

para substanciais aportes de COD para o lago Cabiúnas, que é como resultado húmico e ácido

(Farjalla et al., 2002). Apesar da localização em uma unidade de conservação, o lago Cabiúnas

também foi submetido à eutrofização, provavelmente devido à expansão urbana nos arredores do

parque nacional, mas este processo é relativamente mais recente (desde 2003) e modesto que

aquele do lago Imboassica.

Amostragem

Amostras de água superficial foram coletadas pela manhã (cerca de 10:00 h) em intervalos

aproximadamente mensais ao longo de 13 anos para análises de pCO2, clorofila-a, nitrogênio

total (TN), nitrogênio dissolvido (ND), fósforo total (PT) e fósforo dissolvido (PD), bem como

para mensurações de pH, salinidade, temperatura e profundidade total (PROFTotal) em ambos os

lagos. O esforço amostral foi esparso entre 1996 e 1998, resultando em um total de amostras

mensais entre 90 e 120, dependendo de cada variável e estação de coleta ao longo dos 13 anos.

Neste intervalo de tempo de longo prazo (1992-2005), os ecossistemas estudados foram

submetidos a eventos de eutrofização e acidificação (Tabela 1).

A eutrofização pela expansão urbana na bacia de drenagem tem sido mais acentuada

principalmente desde 1995 no lago Imboassica e desde 2003 no lago Cabiúnas. No período de 13

anos estudado, as águas lacustre do lago Imboassica apresentaram os mais altos estoques de

Page 47: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

36

nitrogénio e fósforo durante o último intervalo de tempo, entre 2003 e 2005 (Marotta et al.,

2009). Outras importantes dinâmicas ambientais observadas também nos três anos a partir de

2003 foram a intensificação da pluviosidade, cerca de 40 % de aumento em comparação aos três

anos anteriores, e a redução da entrada de água marinha por aberturas da barra de areia em

relação aos três primeiros anos de 1992 a 1994 (4 vezes comparando com somente 1 vez entre

2003 e 2005). Estas dinâmicas foram associadas à intensa acidificação em ambos os lagos e uma

redução na concentração de nutrientes (não no estoque) das águas do lago Imboassica,

provavelmente devido ao efeito de diluição pelo substancial aumento de profundidade e não por

diminuição no lançamento de esgotos (Marotta et al., 2009).

Page 48: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

36

Tabela I: Características limnológicas das estações de coleta (valores estão em mediana e inter-quartiles de 25-75% para o período entre 2002 e 2005).

Lagos Estações de Coleta

Coloração (430 nm)

COD (mg L-1)

Razão COR : DOC (10-4)

Profund. (m)

Clorof-a (µg L-1)

Presença de Macrófitas Aquáticas Não-submersas nas

Margens

Aberta 0,015

(0,012-0,027) 15,1

(12,6-18,2) 9,54

(6,25-30,26) 1,5

(1,2-1,7) 23,2

(10,4-39,5) Ausente

Água Clara (Imboassica)

Macrófitas 0,037

(0,025-0,051) 15,2

(12,1-18,2) 23,68

(15,48-33,73) 1,1

(0,8-1,3) 8,0

(3,8-22,5)

Colonização principalmente por Typha domingensis.

Biomassa aérea estimada em torno de 1460 g PS m-2 em 2001 (Dos

Santos et al., 2006)

Aberta 0,039

(0,015-0,054) 11,8

(10,0-17,1) 26,14

(16,11-36,79) 3,3

(2,6-4,2) 3,0

(2,2-5,2) Ausente

Húmico (Cabiúnas)

Macrófitas 0,039

(0,020-0,057) 14,1

(10,3-19,8) 23,99

(19,66-37,11) 2,0

(1,3-2,6) 2,8

(1,9-4,3)

Colonização principalmente por Eleocharis interstincta.

Biomassa aérea estimada em torno de 300 g PS m-2 em 1998 (Dos

Santos & Esteves, 2002)

Page 49: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

37

Foram estudadas duas estações de coleta em cada um dos lagos (Figura 1). Uma estação é

situada junto à barra de areia que os separa do mar, denominada “Aberta”, e outra é adjacente ao

estande marginal de macrófitas aquáticas emersas (distante cerca de 300 m) na porção oposta ao

mar, denominada “Macrófitas”. Análises de sedimento indicam que o lago Imboassica apresenta

uma relevante heterogeneidade intra-ecossistêmica de produtores primários entre a estação

“Aberta” dominada por algas e “Macrófitas” dominada por macrófitas aquáticas emersas (Zink

et al., 2004), possivelmente devido a diferentes condições como turbulência e salinidade (Glenn

et al., 1995). Esta heterogeneidade também se reflete em mais baixos valores de razão

Coloração:COD e maiores concentrações de clorofila-a na estação “Aberta” (Tabela II),

indicando também uma mais alta influência algal (Reche & Pace, 2002) na porção do lago

Imboassica adjacente ao mar. Já o lago Cabiúnas apresenta águas humicas e heterogeneidade

intra-lagunar menos prONUnciada (Tabela II).

Delineamento do Experimento de Mesocosmos

Um experimento de mesocosmos foi realizado em Abril de 2005 para examinar a

resposta da pCO2 ao enriquecimento de nutrientes nas águas do lago húmico (Cabiúnas), o qual

não havia sido submetido à forte eutrofização. Foram usados 9 mesocosmos cilíndricos de 5600

L (2,0 m de diâmetro e 1,8 m de profundidade). Estes mesocosmos foram feitos de polietileno

transparente (0,6 mm de espessura), estendendo-se desde o sedimento de fundo até as águas

superficiais onde eram abertos em relação à atmosfera. As paredes dos mesocosmos foram

elevadas 30 cm acima do nível do lago para evitar trocas com as águas exteriores, sendo

cuidadosamente fixadas para minimizar distúrbios no fundo sedimentar, onde a base foi

afundada cerca de 30 cm. Macrófitas aquáticas não colonizaram os mesocosmos, cujas águas

confinadas eram ácidas (pH em torno de 6,1), ricas em COD (cerca de 27 mg L-1), entre

oligotróficas e mesotróficas (PT em torno de 0,4 µmol L-1, NT de 7 µmol L-1 e clorofila-a de 5,5

µg L-1), e não influenciadas por intrusões de água do mar (salinidade de 0,2). As manipulações

Page 50: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

38

experimentais e amostragens foram iniciadas uma semana após a fixação de todas as estruturas

para permitir a estabilização.

Após esta estabilização, cada conjunto de mesocosmos em tréplicas recebeu um dos

seguintes tratamentos experimentais: controle, adições moderadas de nutrientes (NUT-1), e

elevadas adições de nutrientes (NUT-2). Nitrogênio (N) e fósforo (P) foram adicionados para

alcançarem concentrações finais em torno de 15 µmol L-1 de P e 75 µmol L-1 de N no tratamento

NUT-1, bem como de 60 µmol L-1 de P e 300 µmol L-1 de N em NUT-2. O fósforo foi

adicionado como KH2PO4 e K2HPO4, para atenuar mudanças de pH, e o nitrogênio como

NH4NO3, para reduzir a influência negativa da amônia sobre os organismos, sendo ambos

misturados suavemente após cada adição. As concentrações finais de nutrientes nos tratamentos

experimentais foram escolhidas de maneira a reproduzir os padrões de eutrofização observados

em outros lagos da região, os quais não atingissem níveis tóxicos (Moss et al., 2004). O

experimento foi mantido por 9 dias após a primeira adição de nutrientes e as amostras foram

coletadas diariamente (em torno de 10:00 h) para análises dos níveis de nutrientes, pCO2, pH e

concentrações de clorofila-a. No último dia de experimento, também foi avaliada uma variação

diária de pCO2.

Métodos Analíticos

As amostras de água foram pré-filtradas (0,7 mm, Whatman GF/F) para as análises das

formas dissolvidas de nutrientes e congeladas. As concentrações de fósforo foram mensuradas

pelo método do azul de molibdênio com pré-digestão ácida, e as concentrações de nitrogênio

pela metodologia do nitrogênio total de Kjeldahl (Apha, 1992). As concentrações de clorofila-a

foram extraídas de amostras de 500 mL de água pré-filtrada com etanol no escuro por 24 h e

analisadas por espectrofotometria, usando comprimentos de onda de 433 nm para medidas da

excitação e 673 nm da emissão (Nusch & Palme, 1975). As concentrações de CO2 foram

determinadas pelo método do pH-alcalinidade (Stumm & Morgan, 1996) com as correções

Page 51: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

39

apropriadas para temperatura, altitude e força iônica (Cole et al., 1994). O pH foi medido com

uma precisão de 0,01, usando um pHmetro Analion PM 608, e a alcalinidade total pela titulação

de Gran (Apha, 1992). A Temperatura e a salinidade foram mensuradas com um

termosalinômetro YSI-30 calibrado. Os valores de pCO2 foi calculado a partir da lei de Henry,

considerando a divisão entre as concentrações de CO2 e a constante de Henry para este gás em

cada condição de temperatura e salinidade (Weiss, 1974).

Análises Estatísticas

Os dados amostrados na abordagem de longo prazo não apresentaram distribuição normal

(Kolmogorov-Smirnov, p>0,05) e homogeneidade de variância (Bartlett, p>0,05) significativas,

mesmo após as transformações. Portanto, a distribuição dos valores foi representada por

medianas e intervalos entre os quartis de 25 e 75 %, enquanto a comparação estatística por testes

não paramétricos (Zar, 1996), Kruskal-Wallis (significativo p<0,05) seguido pelo pós-teste de

Dunn (significativo p<0,05). No experimento de curto prazo, os grupos amostrais apresentaram

as premissas das análises paramétricas e a ANOVA Alinhada (significativo p<0,05) foi usada

para testar se a eutrofização experimental e o tempo foram fontes significativas de variação para

a pCO2. Todos os testes estatísticos foram calculados usando o programa PRISM 4.0, excepto a

ANOVA Alinhada processada no JMP 5.1.

Resultados

Ambos os lagos apresentaram intensas alterações ao longo dos 13 anos estudados, com

períodos de eutrofização e importantes variações de pH (Figuras 2, 3, 4 e 5). No âmbito desta

série temporal, foram identificadas três diferentes fases: uma mais pristina, caracterizada pelas

condições iniciais dos lagos nesses 13 anos (Maio/1992 a Outubro/1995); um período de

eutrofização no lago Imboassica (Fevereiro/1999 a Dezembro/2001) e de basificaçáo no lago

Page 52: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

40

Cabiúnas (Janeiro/2000 a Maio/2003) denominado fase I , e um período de intensa acidificação,

em torno de 2,5 unidades de pH (fase II, Novembro/2003 a Outubro/2005).

Figura 2: Todas as variáveis coletadas entre 1992 e 2005 na estação “Aberta”, dominada por

algas, do lago de águas claras Imboassica (cada triangulo negro representa uma amostra mensal).

A linha tracejada indica a mediana geral do período de 13 anos.

Page 53: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

41

Figura 3: Todas as variáveis coletadas entre 1992 e 2005 na estação “Macrófita”, densamente

colonizada por macrófitas aquáticas emersas nas margens, do lago de águas claras Imboassica

(cada triangulo negro representa uma amostra mensal). A linha tracejada indica a mediana geral

do período de 13 anos.

Page 54: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

42

Figura 4: Todas as variáveis coletadas entre 1992 e 2005 na estação “Aberta”, dominada por

algas, do lago húmico Cabiúnas (cada triangulo negro representa uma amostra mensal). A linha

tracejada indica a mediana geral do período de 13 anos.

Page 55: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

43

Figura 5: Todas as variáveis coletadas entre 1992 e 2005 na estação “Macrófita”, densamente

colonizada por macrófitas aquáticas emersas nas margens, do lago húmico Cabiúnas (cada

triangulo negro representa uma amostra mensal). A linha tracejada indica a mediana geral do

período de 13 anos.

Page 56: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

Tabela II: Variáveis estudadas entre as estações e períodos de coleta.

Lago de Água Clara Imboassica Lago Húmico Cabiúnas “Aberta” “Macrófitas” “Aberta” “Macrófitas”

Variáveis e Períodos (*) Mediana 25-75 %

Dif. Est. (**)

Mediana 25-75 % Dif. Est. (**)

Mediana 25-75 % Dif. Est. (**)

Mediana 25-75 % Dif. Est. (**)

P 513 255-873 a 2917 1608-3837 a 2100 1240-3524 a 3761 2888-6831 a I 145 85-346 b 2862 1547-5807 a 1425 296-2456 a 2816 1920-4694 a II 2312 1214-3392 c 5242 3745-6185 b 6688 4638-8324 b 8871 3247-12301 b

pCO2

(µatm) Total 462 162-1033 - 3249 1739-4465 - 3569 1995-7432 - 4113 2740-8670 -

P 3,3 2,1-10,9 a 8,7 5,0-13,3 a 2,5 1,5-4,6 a 3,0 1,9-5,7 a I 57,4 27,0-107,9 b 23,6 10,9-52,3 b 3,1 2,0-4,5 a 3,0 1,8-5,2 a II 11,2 7,4-17,8 a 4,6 2,6-10,1 a 2,8 1,8-5,3 a 2,8 2,0-4,1 a

Clor-a (µg L-1)

Total 20,5 6,4-42,0 - 9,9 4,7-24,0 - 2,9 2,0-4,9 - 3,0 2,0-5,0 - P 0,7 0,5-0,9 a 0,8 0,7-1,0 a 0,4 0,4-0,5 a 0,4 0,3-0,5 a I 2,0 1,6-2,4 b 1,6 1,2-2,1 b 0,5 0,3-0,6 a 0,4 0,3,0,6 a II 1,7 1,1-2,4 b 1,4 0,9-2,0 b 0,9 0,6-1,2 b 0,9 0,4-1,4 b

PT (µmol

L-1) Total 1,2 0,8-2,1 - 1,1 0,8-1,5 - 0,5 0,3-0,7 - 0,4 0,3-0,7 - P 0,3 0,3-0,4 a 0,4 0,3-0,5 a 0,2 0,2-0,3 a 0,2 0,2-0,4 a I 0,5 0,3-0,7 b 0,5 0,4-0,7 b 0,4 0,2-1,2 ab 0,2 0,1-0,4 ab II 0,8 0,6-1,2 c 0,9 0,5-1,2 b 0,7 0,4-1,3 b 0,5 0,2-0,8 b

PD (µmol

L-1) Total 0,5 0,3-0,8 - 0,5 0,3-0,8 - 0,3 0,2-0,4 - 0,2 0,2-0,4 - P 40,0 34,3-53,6 a 49,3 39,3-57,1 a 42,6 36,8-54,5 a 47,7 40,0-52,0 a I 126,8 57,4-181,4 b 122,4 76,5-164,7 b 45,1 38,4-59,2 a 50,4 44,8-60,8 a II 73,5 59,8-87,9 b 54,2 44,8-75,6 a 50,7 37,4-57,1 a 49,7 38,2-66,6 a

NT (µmol

L-1) Total 57,7 38,2-87,0 - 59,3 46,4-93,9 - 46,9 38,5-58,0 - 49,1 40,3-59,2 - P 35,4 28,6-43,2 a 36,6 32,1-44,8 a 34,5 25,3-43,2 a 35,8 25,2-45,5 ab I 72,2 35,1-106,6 b 77,9 61,8-97,5 b 27,4 19,8-38,3 a 32,4 27,7-44,3 b II 59,1 52,0-71,3 b 47,3 38,9-67,2 c 45,3 38,6-57,6 b 43,4 36,3-59,6 a

ND (µmol

L-1) Total 46,4 32,7-65,1 - 46,4 35,7-67,6 - 34,2 24,3-44,7 - 36,8 29,3-46,0 -

Page 57: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

2

P 7,92 7,75-8,20 a 7,15 6,88-7,44 a 6,78 6,42-7,01 a 6,65 6,43-6,89 a I 8,38 8,28-8,66 b 7,14 6,52-7,59 ab 7,09 6,96-7,32 b 6,99 6,86-7,18 b II 6,78 6,37-7,22 c 6,74 6,13-6,9 b 6,33 6,17-6,50 c 6,35 6,14-6,54 c pH

Total 7,98 7,51-8,38 - 7,10 6,69-7,48 - 6,89 6,46-7,19 - 6,76 6,46-7,05 - P 1,2 0,8-1,8 a 1,0 0,7-1,2 a 3,6 3,2-3,8 a 1,6 1,2-2,1 a I 0,8 0,7-1,1 b 0,5 0,4-0,6 b 2,7 2,4-2,9 b 0,9 0,7-1,4 b II 1,7 1,6-2,0 c 1,3 1,2-1,5 c 4,1 3,7-4,5 c 2,5 2,3-3,0 c

PROF Total

(m) Total 1,3 0,9-1,6 - 1,0 0,6-1,3 - 2,9 2,6-3,7 - 1,5 1,0-2,2 - (*) – O intervalo de 13 anos entre 1992 e 2005 (Total) foi dividido em P ou mais pristina (1992-1995), I (1999-2001 no lago de água clara e 2000-2002

no lago húmico), e II (2003-2005); (**) - Diferenças estatísticas entre os períodos de coleta P, I e II somente para uma mesma estação e variável

estudada. Uma letra distinta representa diferença significativa (p<0,05, teste de Dunn).

Page 58: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

46

O nitrogênio total aumentou três vezes entre os períodos mais pristina e de eutrofização

(fase I) no lago de água clara Imboassica, retornando a valores superiores aos da fase mais

pristina durante o período de acidificação (Figuras 2 e 3, Tabela 1). Por outro lado, não foram

observadas mudanças significativas nas concentrações de nutrientes entre as três fases de coleta

no lago húmico Cabiúnas (Figuras 4 e 5, Tabela 1). O fósforo total aumentou em ambos os lagos

entre os períodos mais pristina e de eutrofização (fase I), permanecendo também acima dos

níveis mais pristina durante o período de acidificação (fase II; Figuras. 2, 3, 4 e 5, Tabela 1). A

eutrofização no lago de água clara Imboassica durante a fase I resultou em elevado incremento

das concentrações de clorofila-a (aumento de 20 vezes na estação “Aberta” e de 3 vezes na

estação “Macrófitas”). Já no lago húmico Cabiúnas, as concentrações de clorofila-a

permaneceram baixas em todos os períodos de coleta (Figuras 2, 3, 4 e 5, Tabela 1). O pH

apresentou uma leve tendência de aumento entre os períodos mais pristina e de eutrofização,

seguida de um declínio acentuado em ambos os lagos e todas as estações durante a fase de

acidificação, uma redução acima de 2,5 unidades de pH entre 2003 e 2005 (Figuras. 2, 3, 4 e 5,

Tabela 1).

Ao longo dos 13 anos de estudo, os valores de pCO2 das águas superficiais do lago húmico

Cabiúnas se mantiveram cerca de 10 vezes, em mediana, acima do equilíbrio atmosférico, valor

2 vezes superior ao do lago de água clara Imboassica (Tabela 1). As estações com margens

densamente colonizadas por macrófitas emersas apresentaram, considerando também todo o

período de 13 anos, medianas de pCO2 mais altas do que as estações “Aberta” em ambos os

lagos, embora no lago húmico esta diferença não tenha sido significativa (Tabela 1). A pCO2

também apresentou intensa variabilidade ao longo do tempo nestes dois lagos (Figuras 2, 3, 4 e

5, Tabela 1). A supersaturação de CO2 foi persistente em todos os lagos e estações, excepto na

estação “Aberta” do lago de água clara Imboassica durante a fase de eutrofização (fase I),

quando o pCO2 decresceu substancialmente para valores bem abaixo do equilíbrio atmosférico

resultando em fluxo de apreensão líquida de CO2 (Figuras. 2, 3, 4 e 5, Tabela 1). O pCO2

Page 59: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

47

aumentou acentuadamente na fase de acidificação, um incremento de mais de 10 vezes entre

2003 e 2005 (Figuras 2, 3, 4 e 5, Tabela 1), quando ambos os lagos mantiveram grande emissão

de CO2 à atmosfera. No ano de 2004, este fluxo foi estimado em 34.640 e 69.638 mmol CO2 m-2

para os lagos de água clara e húmico, respectivamente, usando uma velocidade pistão

conservativa de 2,14 cm h-1 como Cole e tal. (1994).

As grandes mudanças de pH foram associadas a elevadas correlações significativas

negativas em ambos os lagos (r entre 0,7 e 0,8 em todas as estações de coleta, p<0,05, Tabela II).

Correlações significativas negativas foram também observadas entre pCO2 e as concentrações de

clorofila-a (p<0,05, correlação de Spearman, Tabela II), sugerindo que o incremento da biomasa

algal poderia ter causado redução de pCO2.

Tabela III: Correlação de Spearman entre pCO2 e as variáveis estudadas em cada estação de

coleta (significativo p < 0,05). Os nutrientes dissolvidos e totais estão em µmol L-1, a clorofila-a

em µg L-1 e a profundidade total em metros. O pH e a salinidade estão em suas respectivas

unidades próprias.

Lago de Água Clara Imboassica Lago Humico Cabiúnas Variáveis

“Aberta” “Macrofitas” “Aberta” “Macrofitas”

pH -0.85 -0.69 -0.77 -0.83

PT Ns Ns ns ns

NT Ns Ns ns ns

PD Ns 0.32 ns ns

ND 0.28 Ns 0.32 0.27

Clor-a -0.25 -0.33 Ns -0.25

PROF total 0.43 0.40 0.50 0.49

Salinidade -0.45 -0.27 -0.31 -0.32

O enriquecimento experimental de nutrientes nas águas do lago húmico causou um

aumento de 50% nas concentrações de clorofila-a e um incremento moderado de pH (Figura 6).

Os valores de pCO2 apresentaram uma tendência de declínio ao longo dos 9 dias de experimento,

a qual foi similar em todos os tratamentos (Figura 6). Dessa forma, o enriquecimento de

Page 60: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

48

nutrientes não resultou em significativa variabilidade de pCO2 (ANOVA, p > 0,05), embora

tenha causado significativos incrementos de pH e clorofila-a (ANOVA, p<0,05, Figure 6).

Apesar disso, as inclinações de declínio (± erro padrão) de pCO2 ao longo do experimento em

ambos os tratamentos enriquecidos de nutrientes (-662.0 ± 171.6, R2 = 0.71, p<0,01 e -620.1 ±

159.8, R2 = 0.71, p<0,01, respectivamente em NUT-1 e NUT-2) foram mais acentuadas do que

as observadas no controle (-378.8 ± 153.9, R2 = 0.50, p < 0,05). Já a variação diária de pCO2

conduzida no último dia de experimento foi similar entre tratamentos (Figura 7).

Figura 6: Variação de pCO2, clorofila-a e pH nos mesocosmos experimentais ao longo de 9

dias. A linha com quadrados negros representa o controle, e as linhas com triangulos e circulos

brancos os tratamentos com enriquecimento de nutrientes, respectivamente NUT-1 e NUT-2

(detalhes sobre os tratamentos na seção de métodos).

Page 61: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

49

Figura 7: Variação diária de pCO2 nos mesocosmos experimentais no último dia de

amostragem. A linha com quadrados negros representa o controle, e as linhas com triângulos e

circulos brancos os tratamentos com enriquecimento de nutrientes, respectivamente NUT-1 e

NUT-2 (detalhes sobre os tratamentos na seção de métodos).

Discussão

Em geral, os lagos aqui estudados atuaram como fontes de CO2 à atmosfera, pois 99 % das

medidas de pCO2 foram acima do equilíbrio atmosférico em torno de 380 µatm, sugerindo um

elevado aporte alóctone de carbono para ambos lagos. No entanto, os resultados apresentados

também evidenciaram que o papel desses ecossistemas como fontes de CO2 à atmosfera não é

estático, uma vez que a pCO2 nas águas de estudo foi intensamente dinâmica ao longo dos 13

anos, sendo caracterizada por uma imensa variação de 1000 vezes em uma determinada estação e

elevada diferença entre os lagos. Esta amplitude de variação foi desde a forte apreensão líquida

de CO2 durante a fase de eutrofização no lago de água clara até a intensa fonte de liberação

líquida deste gás observada durante a fase de acidificação, particularmente no lago húmico.

Sendo assim, foi evidenciada uma importante variabilidade de pCO2 entre lagos situados

próximos (30 km) e mesmo entre estações nos mesmos lagos, de forma que o lago mais ácido

húmico e as estações mais próximas das macrófitas emersas de ambos os lagos mantiveram os

valores de pCO2 mais altos ao longo de todo o estudo. As mais elevadas nas áreas mais próximas

das macrófitas aquáticas e mais distantes do mar confirma o papel das macrófitas aquáticas

emersas (Caraco et al., 2006) e dos aportes terrestres (Duarte & Prairie, 2005) para sustentar

Page 62: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

50

incrementos de CO2 nas águas naturais. A expressiva variabilidade intra-lagunar de pCO2 no

lago de água clara (cerca de 7 vezes entre estações), comparada com a ausência diferença

significativa no lago húmico, sugeriu que os aportes de carbono alóctone poderiam reduzir a

heterogeneidade intra-lagunar de pCO2 nos lagos tropicais.

Esta alta variabilidade dos lagos em 13 anos incluiu importantes alterações nos fatores

direcionadores de pCO2. A vertiginosa queda de pH, acima de 2,5 unidades em três anos, foi

acompanhada de um grande incremento de pCO2. O baixo pH nas águas naturais pode ser

causado pelo aporte de CO2 (Jones & Mulholland, 1998) ou de carbono orgânico (Ram et al.,

2003) e, por outro lado, causar aumentos nas concentrações deste gás diretamente por equilíbrio

iônico (Cole & Caraco, 1998). As correlações significativas da profundidade e salinidade com os

valores de pCO2, respectivamente positiva e negativa, em todas as estações de coleta podem ser

atribuídas a condições altamente dinâmicas. Os aumentos de profundidade em ambos os lagos

frequentemente indicam intensificação dos aportes ricos de carbono orgânico advindo do lençol

freático (Farjalla et al., 2002) ou da mortandade de macrófitas emersas (Dos Santos et al., 2006),

enquanto a entrada de água do mar é relacionada a aumentos de salinidade com decréscimo dos

substratos orgânicos e da acidez (Suzuki et al., 1998). Nesse sentido, a acidificação das águas

lacustres observada neste capítulo é resultado da contribuição do aumento no aporte do lençol

freático, uma vez que este compartimento constitui uma significativa fonte de ácidos orgânicos

para os lagos da região, caracterizada por valores baixos de pH e altos de pCO2 (quase 70.000

µatm; Suzuki, 1998).

Além disso, o lago de água clara recebeu significativos aportes de nutrientes durante a fase

I (1999 – 2003), o que não foi observado no lago húmico. A eutrofização e o conseqüente

aumento dos organismos autotróficos causou um abrupto declínio de pCO2 no lago de água

clara, substituindo uma elevada fonte de CO2 em um seqüestrador liquido deste gás. Este

resultado confirmou a clássica tendência na qual a eutrofização poderia ser relacionada ao

crescimento de biomassa algal (Fee, 1979) e contribuir para tornar os lagos seqüestradores

Page 63: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

51

líquidos de carbono atmosférico (Schindler et al., 1997). A principal causa desta relação é ainda

discutível, mas pode ser explicada pela mais alta predação sobre as bactérias (Fuhrman & Noble,

1995) e mais eficiente apreensão de nutrientes pelas algas (Sanders et al., 1992) nas

concentrações ambientais de nutrientes, ou ainda pelo carbono orgânico alóctone sustentando a

heterotrofia mesmo em sistemas oligotróficos onde a escassez de nutrientes limita a produção

primaria (Del Giorgio et al., 1999).

No entanto, a eutrofização na condição de baixo pH não foi associada à bem descrita

tendência de redução de CO2 nas águas lacustres (Biddanda et al., 2001) em ambas as

abordagens de ecossistema inteiro e de mesocosmos. A forte eutrofização experimental não foi

suficiente para reduzir a pCO2 significativamente ao longo dos 9 dias de experimento, apesar do

aumento na biomassa autotrófica. Variações diárias significativas dos valores de pCO2

evidenciaram que o metabolismo foi suficiente para compensar o CO2 removido durante o dia.

Foi observado, porém, uma tendência de declínio de CO2 ao longo do experimento com uma

taxa mais rápida nos tratamentos enriquecidos de nutrientes. O declínio de pCO2 ao longo dos 9

dias foi em torno de 20 %, muito inferior que a redução calculada de 90 % esperada pelas trocas

com a atmosfera durante o período experimental. Este contraste demonstra evidentemente a forte

atividade heterotrófica para sustentar a persistência de elevado CO2 em todos os mesocosmos

experimentais, possivelmente pelo papel do carbono orgânico alóctone sustentando as teias

tróficas aquáticas (Pace et al., 2004) e o enriquecimento de CO2 pela heterotrofia liquida nos

lagos (Biddanda & Cotner, 2002).

Como conclusão, os resultados demonstraram uma acentuada dinâmica inter-anual para o

CO2 nos lagos tropicais estudados, alcançando uma variabilidade de uma ordem de magnitude

possivelmente em resposta ao aporte de CO2 e carbono orgânico do lençol freático bem como a

alterações na contribuição alóctone de nutrientes e na química da água. Enquanto a eutrofização

resultou em diminuição de CO2 no lago de água clara, a adição experimental de nutrientes nas

águas do lago húmico foi associada à persistência de elevado CO2 sustentado pela atividade

Page 64: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

52

heterotrófica. Estes resultados sugeriram diferentes respostas à eutrofização nos lagos tropicais.

Águas básicas claras enriquecidas de nutrientes poderiam apresentar redução de pCO2 pelos

produtores primários, como é bem descrito na literatura. No entanto, as águas ácidas húmicas

poderiam apresentar persistência ou mesmo aumento de pCO2 com a eutrofização, possivelmente

sustentada pelo carbono orgânico e inorgânico alóctone. Os dados deste capítulo demonstram

que o papel dos lagos como fonte de CO2 é susceptível à considerável variabilidade ao longo do

tempo, consequência do balanço entre os aportes alóctone de carbono orgânico, CO2 e nutrientes

advindos da bacia de drenagem.

Page 65: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

53

CAPÍTULO 4

Substanciais Enriquecimentos de pCO2 em eventos de precipitação em lagos costeiros

tropicais

Page 66: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

54

Introdução

Mesmo ocupando uma pequena parcela da superfície terrestre (2 - 4 %), as águas interiores

podem influenciar os balanços regionais e globais de carbono, uma vez que seus fluxos líquidos

de carbono tendem a ser muito maiores por unidade de área que àqueles normalmente

observados nas circunvizinhanças terrestres (Cole et al., 2007). O desproporcional papel dos

lagos no balanço regional de carbono é advindo da sua condição de recipiente para uma

substancial parcela do carbono produzido dentro da bacia de drenagem (Lennon, 2004; Sobek et

al., 2005). Este aporte alcança os lagos pelo escoamento superficial e pelo lençol freático,

dinâmicas que são intensificadas durante eventos de precipitação (Schindler, 1978).

Apesar da composição mais refratária à decomposição biológica (Hopkinson et al., 1998),

o carbono orgânico terrestre apresenta um importante papel nos lagos, pois podem ser

mineralizados e sustentar parcialmente as teias tróficas aquáticas (Pace et al., 2004), o

metabolismo (Cole et al., 2000) e a própria persistência da supersaturação de CO2 nas àguas

lacustres (Sobek et al., 2005). Os aportes alóctones de CO2 também podem contribuir para

manter a alta pressão parcial de dióxido de carbono (pCO2) nos ecossistemas aquáticos acima do

equilíbrio com a atmosfera (Raymond & Cole, 2003). Os enriquecimentos de CO2 nas águas

lacustres podem ser altamente associados ao padrão de precipitação (Rantakari & Kortelainen,

2005), possivelmente devido aos aumentos no aporte do lençol freático contendo altas

concentrações de carbono orgânico e inorgânico terrestre (revisão em Cole et al., 2007).

Os lagos costeiros tropicais no Brasil são ecossistemas tipicamente pequenos, rasos e

amplamente distribuídos em bacias de drenagem onde a vegetação de Restinga é uma importante

fonte de carbono orgânico, que é frequentemente pigmentado (Amado et al., 2007). Análises

recentes têm evidenciado consistentemente que os lagos brasileiros são em maioria

supersaturados de CO2 (capítulo 6), possivelmente pela influência terrestre. O lençol freático

desempenha um importante papel no balanço hídrico e no aporte de materiais aos lagos costeiros

brasileiros, o que pode ser intensificado pela alta precipitação especialmente na condição de

Page 67: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

55

baixa retenção de água pela textura arenosa dos solos (Farjalla et al., 2002). Nesse contexto, a

pCO2 dos lagos costeiros brasileiros pode variar intensamente e sincronicamente ao longo do

tempo (capítulo 3), sugerindo um controle meteorológico desta variável. No entanto, ainda

carecem estudos sobre o papel da chuva sobre a variabilidade de CO2 nestes ecossistemas.

No presente capítulo, foi avaliada a variação de pCO2, pH e carbono orgânico dissolvido

(COD) em lagos costeiros brasileiros para testar a hipótese de uma relação positiva entre a

precipitação e o transporte associado de carbono terrestre e pCO2 nestes lagos.

Materiais e Métodos

Os 12 lagos estudados (Figura 1) são situados no Parque Nacional da Restinga de

Jurubatiba, uma das mais importantes áreas de conservação para ecossistemas costeiros do

Brasil. Estes lagos são relativamente próximos com uma distância máxima de aproximadamente

40 km (entre 22º 00’ e 22º 23’ S / 41º 15’ e 41º 45’ O; Figura 1).

Page 68: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

56

Macaé

220 15’

Macaé

Estado do Rio de Janeiro

5 0 5 10 0 5 Km 410 45’

Figura 1: Localização geográfica dos lagos estudados (1) – Carapebus, (2) Garças, (3) Piri-piri

1, (4) Peri-peri 2, (5) Maria Menina, (6) Robalo, (7) Visgueiro, (8) Catingosa, (9) Pires, (10)

Preta, (11) Barrinha e (12) Casa Velha.

1

2

10 9 8 7 6 5 4

12

3

11

220 03’ 19,3’’ S

410 40’ 46,8’’ O

Page 69: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

57

A região estudada apresenta altas temperaturas, com médias mensais variando entre 20,7

oC em Julho e 26,2 oC em Fevereiro (INMET, 1992). As médias mínimas e máximas são

tipicamente observadas em Agosto (38 mm) e Dezembro (182 mm; INMET, 1992),

respectivamente, mas existe uma elevada variação inter-anual (Carmouze et al., 1991). Lagos

desta região apresentam importantes aportes de ácidos orgânicos terrestres advindos das águas

do lençol freático hipersaturadas de CO2 (18.154 %, Suzuki et al., 1998). Os lagos estudados

(Figura 1 e Tabela 1) são ricos em COD (acima de 6,5 mg C L-1), de oligo a mesotróficos

(fósforo total abaixo de 1,3 µmol L-1), de água salobra (amplitude de salinidade de 2 a 33) e

rasos (profundidade maxima abaixo de 6,0 m).

Tabela 1: Características gerais dos lagos estudados.

Lagos P Total * (mmol L-1) Salinidade *

Área (km2)

Carapebus 0,6 – 1,3 1,7 - 7,3 4,33

Garças 0,4 - 0,5 32,2 - 33,2 0,42

Casa Velha 0,2 - 0,5 5,0 - 7,0 0,54

Barrinha 0,8 - 1,3 5,0 - 6,5 0,24

Preta 0,2 - 0,7 3,3 - 4,5 2,19

Maria Menina 0,5 - 0,7 15,8 - 18,1 0,24

Pires 0,4 - 1,0 7,0 - 2,5 0,92

Visgueiro 0,3 – 1,0 21,8 - 22,1 1,18

Robalo 0,4 - 0,6 20,0 - 25,8 0,85

Catingosa 0,5 - 0,7 20,5 - 20,6 0,09

Peri-peri 1 0,7 - 0,9 12,9 - 25,7 0,14

Peri-peri 2 0,8 - 1,0 10,6 - 14,0 0,83

(*) – Amplitude considerando os eventos de coleta em cada lago.

As amostragens de campo foram realizadas em ciclos de 24 horas caracterizados por

diferentes pluviosidades acumuladas de 7 dias entre 2003 e 2006. No lago Carapebus, o esforço

amostral foi maior, sendo que o pCO2, pH, salinidade e temperatura foram analisados 9 vezes em

dois ciclos diários consecutivos (18:00, 6:00, 10:00, 14:00, 18:00 h do dia seguinte) e somente

Page 70: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

58

uma vez para as concentrações de COD em cada amostragem de campo (N = 6 eventos de coleta

entre 2003 e 2004). Duas estações oligo-mesotróficas durante o estudo (cerca de 0,8 µmol L-1 de

fósforo total e 5,0 mg L-1 de clorofila -a), foram analisadas neste lago, uma estação

(CAR_Macrófitas) colonizada por macrofitas aquáticas submersas, principalmente Potamogetum

stenostachys com uma biomassa de 1430 ± 200 g m-2; média SE (N = 21 quadrats entre janeiro e

julho de 2004), e uma estação não colonizadas por macrófitas (CAR_Aberta). Além do lago

Carapebus, mais 11 lagos costeiros de oligo a mesotróficos e com diferentes níveis de influência

de água marinha foram amostrados (Tabela 1). Nestes lagos, pCO2, pH, salinidade e temperatura

foram analisados simultaneamente 4 vezes em um ciclo diário (18:00, 6:00, 12:00, 18:00 h do

dia seguinte) e somente uma vez por ciclo diário para as concentrações de COD em cada um dos

eventos de coleta, ambos em 2006.

Amostras de água superficial foram imediatamente analisadas para pH e alcalinidade.

Temperatura e salinidade foram mensuradas in situ com um termosalinômetro YSI-30 calibrado.

No laboratório, amostras de água pré-filtradas (0,7 mm, Whatman GF/F) e pré-acidificadas a pH

menor que 2,0 foram analisadas para as concentrações de COD pelo método da oxidação

catalítica em um analisador Shimadzu TOC-5000. As concentrações de CO2 foram determinadas

pelo método do pH-alcalinidade (titulação de Gran) após as correções para temperatura, altitude

e força iónica como Cole et al. (1994). Os valores de pCO2 foram calculados a partir da lei de

Henry, considerando a divisão entre as concentrações de CO2 e a constante de Henry para este

gás em cada condição de temperatura e salinidade (Weiss, 1974).

Os dados de pluviosidade foram obtidos no Centro de Tecnologia Aeroespacial (CTA, São

José dos Campos). A pluviosidade foi agregada em valores acumulados nos 7 dias que

precediam cada evento de coleta, pois o balanço entre autótrofos e heterótrofos é altamente

dinâmico e intervalos semanais podem aumentar a acurácia dos estudos sobre o metabolismo

lacustre (Staehr & Sand-Jensen, 2007), representando a escala temporal para o efeito da chuva

sobre o transporte de materiais da bacia de drenagem para os lagos.

Page 71: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

59

Os dados log-transformados apresentaram distribuição normal (Kolmogorov-Smirnov,

p<0,05), homogeneidade de variâncias (Bartlett, p>0,05) e pareamento (teste F, p<0,05)

significativos. Dessa forma, os eventos de coleta foram comparados por testes paramétricos

pareados com uma significância de p<0,05 (Zar, 1996) . Foi usado o teste-t pareado para

comparar dois conjuntos de dados ou a ANOVA one-way repetida seguida pelo teste de Tukey-

Kramer para as comparações entre mais conjuntos de dados. Toda a estatística foi calculada

usando o programa Graphpad Prism 4.0. Além disso, médias diárias integradas foram calculadas

em cada evento de coleta por lago (N = 2 no lago Carapebus e N = 1 nos outros lagos).

Resultados

As mudanças nos valores médios de pCO2 e pH nos lagos entre os eventos de coleta com

diferentes precipitações acumuladas de 7 dias (coeficientes de variação = 75 e 72 %

respectivamente) foram expressivos, mas não muito maiores do que a variação nestas

propriedades dentro dos ciclos diários (coeficientes de variação = 68 e 42 % respectivamente).

No entanto, a amplitude diária de pCO2 e pH foi muito mais elevada, em média cerca de 4 e 2

vezes respectivamente, nos eventos de coleta após os períodos chuvosos em todos os 12 lagos

estudados, excepto na estação colonizada por macrofitas aquáticas submersas no lago Carapebus.

O aumento significativo de 6 vezes (p<0,0001, teste-t pareado) dos valores máximos de pCO2

nos ciclos diários subsequentes a precipitações acumuladas de 7 dias mais elevadas foi

consistentemente maior do que os apresentados pelos valores mínimos, que foram, em média, de

apenas 85 % (p<0,05, teste-t pareado).

A pluviosidade acumulada de 7 dias aumentou expressivamente ao longo dos eventos de

coleta no lago Carapebus (Figura 2). Este aumento da precipitação foi acompanhado por um

grande enriquecimento de pCO2 (em torno de 11 vezes na estação colonizada por macrófitas

submersas e de 4 vezes na outra estação), duas vezes mais elevado que o das concentrações de

Page 72: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

60

COD, além de uma redução de 1,0 unidade de pH em ambas as estações deste lago (Tukey-

Kramer, p<0,05; Figura 2 e Tabela 2).

Figura 2: Variáveis estudadas nas diferentes datas de coleta nas estações de águas abertas

(triângulos) e colonizadas por macrófitas submersas (cruzes) no lago Carapebus: (a) Precipitação

acumulada na semana que precedeu cada coleta (quadrados negros) e concentrações de COD, (b)

pH e (c) pCO2. As barras indicam os erros padrões e ao menos uma letra igual diferenças não

significativas (Tukey-Kramer, p<0.05) para pH e pCO2 entre estações e eventos de coleta.

Page 73: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

61

Dessa forma, a pluviosidade acumulada de 7 dias apresentou uma forte relação positiva

com o pCO2 ou o COD e negativa com o pH em ambas as estações do lago Carapebus (p < 0,05;

Figura 3).

Figura 3: Relação entre os valores médios de pCO2, COD e pH com a precipitação acumulada

na semana que precedeu cada evento de coleta na estação colonizada por macrofitas submersas

(3.a, 3.b e 3.c) e de águas abertas (3.d, 3.e e 3.f) do lago Carapebus. Linhas sólidas representam a

regressão linear ajustada (R2 em cada gráfico).

Page 74: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

62

Tabela 2: Valores integrados diários de pCO2, COD e pH nos períodos de coleta com menores e

maiores valores de precipitação acumulada de 7 dias em cada lago estudado, além da variação

(razão) entre ambos os períodos.

Lagos Precipitação

de 7 dias (mm) *

pCO2 (µatm)**

COD (mg L-1)**

pH ** Salinidade **

1,2 871 17,7 8,4 33,2

38,7 4419 23,0 7,8 32,2 Garças

Razão 5,07 1,30 0,93 0,97 1,2 552 18,8 8,5 25,7

38,7 8389 34,8 7,4 12,9 Peri-peri 1 Razão 15,20 1,30 0,87 0,50

1,2 1927 38,0 7,8 10,6

38,7 6644 43,8 7,7 14,0 Peri-peri 2 Razão 3,45 1,15 0,99 1,32

1,2 1889 35,9 8,0 18,1

38,7 6387 42,7 7,7 15,8 Maria Menina

Razão 3,38 1,19 0,96 0,87 1,2 1611 43,0 8,3 25,8

38,7 13736 38,3 7,6 20,0 Robalo Razão 8,53 0,89 0,92 0,77

1,2 2115 39,0 7,6 3,3

38,7 5950 42,0 7,3 4,5 Preta Razão 2,81 1,08 0,96 1,36

1,2 1564 35,5 8,0 7,0

38,7 5505 34,5 7,5 3,5 Pires Razão 3,52 0,97 0,94 0,50

1,2 3446 nc 7,8 20,6

38,7 20037 40,1 7,1 20,5 Catingosa Razão 5,81 - 0,91 0,99

1,2 2643 37,6 8,0 21,8

38,7 16672 37,8 7,2 22,1 Visgueiro Razão 6,31 1,01 0,90 1,01

1,2 361 41,2 8,7 5,0 Casa Velha 38,7 1153 40,9 8,3 7,0

Page 75: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

63

Razão 3,19 0,99 0,95 1,40 1,2 1167 42,9 8,2 4,9

38,7 2684 43,1 7,8 6,5 Barrinha Razão 2,30 1,00 0,95 1,32 0-6,7 386 9,1 8,0 5,0-7,0

34,6-67,6 4203 17,9 6,8 1,7-2,8 CAR_ Macrófitas

Razão 10,90 1,98 0,85 0,37 0-6,7 1609 8,1 7,4 5,0-7,3

34,6-67,6 5905 16,6 16,6 2,0-2,8 CAR_ Aberta

Razão 3,67 2,05 0,89 0,39

(*) – Cada período de amostragem caracterizado por maior ou menor precipitação acumulada de

7 dias incluiu 3 eventos de coleta no lago Carapebus e um nos outros lagos.

(**) – Os valores de pCO2, pH e salinidade incluíram medias diárias integradas enquanto as

concentrações de COD somente um valor em cada evento de coleta por lago (ver métodos para

detalhes).

nc – não coletado.

Um generalizado aumento de pCO2 e redução de pH com a intensificação das chuvas foi

também evidente nos outros lagos estudados (Tabela 2; ou teste-t pareado, p<0,05 Figura 3),

sendo acompanhado de um incremento de 300 a 1500 % na amplitude dos valores de pCO2 nas

condições mais chuvosas. No entanto, as concentrações de COD não diferiram consistentemente

entre ambos os períodos mais seco e chuvoso nestes lagos (Tabela 2 ou teste-t pareado, p>0,05;

Figura 3). Além disso, as taxas de aumento de pCO2 nos 11 lagos coletados simultaneamente

apresentaram uma relação significativa com as taxas de redução de pH e de aumento de

salinidade, mas não com as mudanças de COD (regressão linear, significativo p<0,05; Figura 4).

Page 76: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

64

Figura 4: Relação entre a taxa de variação do pCO2 médio com (4.a) pH, (4.b) salinidade, e (4.c)

concentrações de COD nas águas superficiais de 11 lagos simultaneamente avaliados (ver

métodos) em dois ciclos de 24 horas com diferentes precipitações acumuladas de 7 dias (1,2 e

38,7 mm). As linhas representam a equação de regressão linear ajustada para (4.a) taxa de

variação de pCO2 = 12,3 ± 2,14* taxa de variação de pH -1,14 ± 1,27, R2 = 0,79, F = 33,20, p <

0,0005, (4.b) taxa de variação de pCO2 = -7,4 ± 2,92* taxa de variação de pH 12,78 ± 3,06, R2 =

0,41, F = 6,33, p < 0,05, e (4.c) não significativa p > 0,05.

Discussão

A maioria dos lagos estudados foi caracterizada por águas supersaturadas de CO2 e

atuaram, portanto, como fontes deste gás à atmosfera em todos os eventos de coleta,

possivelmente pela contribuição de altos aportes alóctones de carbono para estes lagos. Somente

dois lagos apresentaram médias diárias abaixo do equilíbrio atmosférico. Os mais baixos valores

de pCO2 foram observados na estação colonizada por macrófitas submersas no lago Carapebus,

confirmando o papel dessa vegetação para a absorção de CO2 nas águas naturais (Krause-Jensen

& Sand-Jensen, 1998).

O incremento na pluviosidade diluiu a elevada heterogeneidade de pCO2 no lago

Carapebus, uma vez que a diferença de quase 11 vezes nessa variável entre a estação de água

aberta e àquela colonizada por macrofitas submersas foi reduzida para um valor não significativo

no período de chuvas mais intensas. O enriquecimento de pCO2 com o incremento das chuvas

acumuladas de 7 dias foram de uma ordem de magnitude. O substancial aumento nos valores

médios e máximos de pCO2 foram muito maiores do que nos mínimos, resultando em variações

Page 77: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

65

diárias expressivamente mais altas nos eventos de coleta que precederam maiores chuvas

acumuladas de 7 dias. Este resultado confirmou não somente a associação entre a intensificação

da precipitação e os enriquecimentos de CO2 nos lagos (Rantakari & Kortelainen, 2005), mas

também o intenso metabolismo das águas interiores tropicais (Richey et al., 2002) atuando para

reduzir os valores máximos de pCO2 mesmo no curto prazo de tempo ao longo de um ciclo

diário.

O grande aumento de pCO2 com a intensificação das chuvas, que confirmou os resultados

previamente observados em grandes lagos boreais na escala anual (Rantakari & Kortelainen,

2005), não foi acompanhado por incrementos significativos nas concentrações de COD.

Portanto, é possível inferir que o aumento de pCO2 com as maiores precipitações não foi

regulado pelo aporte de COD advindo da bacia de drenagem, um fator regulador muito comum

da heterotrofia líquida nas águas costeiras (Ram et al., 2003) e, consequentemente, do pCO2 dos

lagos (Sobek et al., 2005). A expressiva redução de pH associado à relação significativa entre as

taxas de variação de pH e salinidade com o aumento da precipitação e do pCO2 nos 11 lagos

estudados simultaneamente indica um alto dinamismo desses ecossistemas após o incremento

das chuvas, possivelmente determinado pelos aportes do lençol freático, a principal fonte de

água doce nesses lagos (Farjalla et al., 2002). Os aportes de carbono inorgânico advindo do

lençol freático poderia ter sido suficiente para elevar substancialmente o pCO2 e reduzir o pH,

pois o lençol freático nas bacias de drenagem dos lagos da região estudada é ácido e pode

apresentar 70,000 µatm de pCO2, 180 vezes mais alto do que o equilíbrio com a atmosfera

(Suzuki et al., 1998). Nesse contexto, os aportes do lençol freático têm sido evidenciados como

relevantes reguladores das condições dos lagos costeiros tropicais (Herrerasilveira, 1996).

Como conclusão, os resultados apresentados aqui demonstram o importante papel das

chuvas, e consequentemente dos aportes do lençol freático, para causar grandes enriquecimentos

de pCO2 e declínios de pH, aumentando a variabilidade de pCO2 nos lagos costeiros brasileiros.

Mesmo que o lençol freático possa contribuir relativamente com poucas quantidades de CO2

Page 78: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

66

diretamente à atmosfera (Cole et al., 2007), o aporte de altas concentrações de CO2 do lençol

freático para os lagos poderia sustentar intensos fluxos. As emissões de CO2 dos lagos costeiros

brasileiros à atmosfera estudados foram aumentados expressivamente, em média, de 31,2 mmol

m-2 d-1 no período mais seco para 187,1 mmol m-2 d-1 após as chuvas mais intensas. Portanto,

reforçam-se os indícios de que a precipitação e a subseqüente entrada de CO2 do lençol freático

para os lagos poderiam constituir uma importante via de condução de CO2 desde a respiração

dos solos para a atmosfera.

Page 79: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

67

CAPÍTULO 5

Teste experimental dos controles ascendente e descendente sobre os fluxos de CO2 em um

lago húmico tropical

Page 80: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

68

Introdução

A supersaturação de CO2 na água dos lagos determina o fluxo deste gás à atmosfera (Cole

et al., 1994; Cole et al., 2007). No entanto, a pressão parcial de CO2 (pCO2) nas águas lacustres

pode variar amplamente entre lagos diferentes (Sobek et al., 2005) ou ao longo do tempo em um

mesmo lago (Rantakari & Kortelainen, 2005), sugerindo que esta variável é submetida a uma

regulação altamente dinâmica. Em geral, o pCO2 das águas lacustres integra processos ocorrendo

tanto na bacia de drenagem quanto nos próprios lagos. Os principais processos biológicos

envolvidos são a remoção de CO2 pela fotossíntese e a produção deste gás pela respiração, de

forma que a produção liquida ecossistêmica representa o balanço entre estes processos e

determina o papel biológico no fluxo de CO2 nas águas lacustres (Cole et al., 2000). A produção

primária e a respiração da comunidade nos lagos são frequentemente reguladas pela

disponibilidade de recursos, tipicamente nutrientes, apesar dos predadores também influenciarem

ambos ao apresentarem possíveis efeitos relevantes sobre a biomassa algal e a estrutura da teia

trófica (Schindler et al., 1997). Além disso, os aportes enriquecidos de compostos húmicos

podem ser um importante recurso sustentando parcialmente as teias tróficas (Pace et al., 2004) e

a produção de CO2 pela respiração aquáticas nos lagos (Cole et al., 2007). Dessa forma, tanto os

efeitos ascendentes quanto descendentes podem atuar em conjunto, uma vez que podem

influenciar outros processos (cf. McCollum et al., 1998) os quais afetam o metabolismo

ecossistêmico e, portanto, o pCO2 das águas lacustres.

Estudos experimentais testando simultaneamente os controles de nutrientes e predação

sobre o CO2 dos lagos têm mostrado serem uma interessante via para testar a importância das

forças ascendentes e descendentes (como Schindler et. al. 1997 e Cole et al. 2000) . No entanto,

ainda existe uma relevante escassez de estudos em lagos tropicais, apesar da magnitude e

variabilidade de pCO2 tipicamente superiores aos dos lagos temperados, que os torna

significativos no fluxo global de CO2 nas águas lacustres (capítulo 6). Além disso, as cadeias

tróficas dos lagos tropicais apresentam peculiaridades que também necessitam ser melhor

Page 81: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

69

avaliadas. Evidências recentes indicam que os peixes de hábitos alimentares especialistas, como

piscívoros e planctívoros, podem exercer um controle ascendente sobre os fluxos de CO2 água-ar

(Schindler et al. 1997, Cole et al. 2000). Por outro lado, a intensidade do controle ascendente dos

peixes onívoros ainda é menos estudada, embora sejam organismos amplamente distribuídos e

possam influenciar significativamente (Drenner et al., 1996) a estrutura da teia trófica nos lagos

tropicais (Okun et al., 2008).

No presente capítulo, a intensidade dos controles ascendente pelos nutrientes e

descendente por peixes onívoros, bem como a interação entre estes fatores, sobre o pCO2 foi

avaliada por meio de mesocosmos experimentais em um lago húmico tropical. Mesocosmos

constituem uma solução intermediária entre os custos e as dificuldades de replicação dos

experimentos de lago inteiro e as limitações de escala dos microcosmos na pesquisa ecológica

(Naeem, 2001). Foram testadas duas hipóteses: (a) os aportes de nutrientes não influenciam a

pressão parcial de CO2 no lago estudado e (b) a introdução de peixes onívoros não altera estes

fluxos.

Material e Métodos

Área de Estudo

O experimento foi realizado no lago tropical Cabiúnas (22o 17’ 51.7” S e 41o 41’ 20.3” O)

na estação mais seca de 2005. Este lago húmico costeiro é situado na Planície Marinha do

Quaternário (Cprm, 2000), Norte do estado do Rio de Janeiro (Sudeste do Brasil, Figura 1). As

condições meteorológicas durante os 75 dias desde uma semana antes do início do experimento

até o último dia de amostragem incluiram uma baixa precipitação acumulada (330 mm) e uma

alta temperatura média do ar (22 oC). O lago Cabiúnas apresenta uma área de 0,35 km2 e uma

profundidade média de 2,4 m (Panosso et al., 1998), encontrando-se em uma área de

conservação onde a vegetação de Restinga é preservada (Parque Nacional da Restinga de

Jurubatiba. Esta vegetação é típica sobre os solos arenosos na costa do Brasil. O aporte de

Page 82: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

70

matéria orgânica advinda dessa vegetação contribui para as condições húmicas do lago Cabiúnas

(Farjalla et al., 2002), o qual apresentou altas concentrações de COD (17 mg L-1)

predominantemente advindo de fontes terrestres (80 %), águas altamente pigmentadas (0.06 abs

em 430 nm) e baixa salinidade (em torno de 0,2) durante o período de estudo. O lago Cabiúnas é

tipicamente supersaturado de CO2, com uma pressão parcial deste gás (± SE) de 7255 ± 743

µatm entre 2003 e 2005, e de 14113 ± 1228 µatm ao longo do período de experimento.

Figura 1: Localização geográfica do lago Cabiúnas e do local dos mesocosmos.

Delineamento Experimental

O experimento foi realizado em 16 mesocosmos cilíndricos de 5600 L (2,0 m de diâmetro

e 1,8 m de profundidade acima do sedimento de fundo). Estes mesocosmos abertos com a

atmosfera foram feitos de polietileno transparente (0,6 mm de espessura), incluindo toda a

coluna d‘água desde o sedimento de fundo até 30 cm acima do nível da água com uso de

plásticos flutuantes. A fixação dos mesocosmos foi realizada cuidadosamente para minimizar o

distúrbio no sedimento, de maneira que o experimento foi iniciado somente 1 semana após a

Rio de Janeiro

Macaé

41o 45’ W

22o 15’ W

Macaé

5 0 5 10 Km

Lago Cabiúnas

42o 00’ 08” W 22o 00’ 02” S

Mesocosmos

500 m

Brasil

Page 83: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

71

montagem de toda estrutura para fins de estabilização. A base do mesocosmo foi afundada no

sedimento de fundo cerca de 30 cm para mantê-lo estável e separado do lago. Os mesocosmos

não foram colonizados por macrófitas aquáticas e uma rede de nylon de 1 cm foi colocada na

base daqueles onde os peixes foram introduzidos para evitar escapadas.

O experimento incluiu um desenho fatorial 2 X 2 com adição de peixes e enriquecimento

de nutrientes como fatores de tratamento, resultando em 4 tratamentos experimentais: +Peixe,

+Nutrientes, +peixe +nutrientes, e controle. A espécie de peixe onívoro Hyphessobrycon

bifasciatus, a qual se alimenta de uma ampla variedade de zooplâncton, larvas de caramujo e

algas (perifiton), é muito comum nos lagos da região estudada e foi usada nos tratamentos

correspondentes em densidades observadas no lago Cabiúnas (13 indivíduos por m-2). Os peixes

foram excluídos dos mesocosmos controle e + nutrientes. Nitrogênio (N) e fósforo (P) foram

adicionados semanalmente nos tratamentos +nutrientes e +nutrientes+peixe, mantendo-se as

concentrações totais finais entre 35 e 40 µmol L-1 para P, entre 200 e 250 µmol L-1 para N, além

de uma baixa razão N:P em torno de 6. Estas concentrações foram selecionadas no sentido de

reproduzir aquelas de lagos eutrofizados nesta região, enquanto não representassem níveis

tóxicos (Moss et al., 2004), sendo comparadas às concentrações do controle, características deste

lago (0,7 µmol P L-1 e 53 µmol N L-1). O fósforo foi adicionado como KH2PO4 e K2HPO4 para

atenuar alterações de pH e N como NH4NO3 para reduzir a possível influência negativa da

amônia sobre os organismos, de forma que ambos os nutrientes foram suavemente misturados

após cada adição.

A duração do experimento foi de 7 semanas entre Maio e Julho de 2005 e as coletas foram

semanais. A primeira amostragem de água foi realizada antes da primeira adição de nutrientes e

peixe (semana zero), 8 dias após o tempo de estabilização desde a montagem das estruturas. No

campo, foram mensurados temperatura, pH e alcalinidade nas águas superficiais (0,10 m) em

diferentes horas do dia (18:00, 6:00, 10:00, 14:00 e 6:00 h do dia seguinte). Além disso, foi

determinada a transparência e coletada água superficial em torno de 10:00 h para as análises de

Page 84: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

72

clorofila-a pelágica e perifítica, COD e coloração da água no laboratório. Os efeitos dos

tratamentos sobre a produção líquida diurna dos mesocosmos (metabolismo aquático diurno)

foram avaliados a partir da variação das concentrações de oxigênio (O2) em perfis verticais (5,

10, 40, 70, 100, 130 e 160 cm) integrados, os quais foram amostrados em torno de 7:00, 12:00

and 16:30 h nas duas últimas semanas de experimento (semanas 5 e 6).

Métodos Analíticos e Estimativa de pCO2

As concentrações de COD foram mensuradas pelo método da oxidação catalítica de alta

temperatura, usando um analisador TOC-5000 Shimadzu. A coloração foi determinada pela

absorção em 430 nm e a transparência da água por disco de Secchi. As amostras de água para

nutrientes foram congeladas antes de serem analisadas por métodos padrão (Apha, 1992). A

clorofila-a pelágica foi determinada pelo método da fluorescência (Beutler et al., 2002), usando

um fluorímetro Aquafluor (modelo 8000-001).

As concentrações de CO2 foram calculadas a partir de pH e alcalinidade mensurados no

campo, seguindo Stumm & Morgan (1996) após correção para temperatura, altitude e força

iônica como Cole et al. (1994). A alcalinidade total foi determinada por titulação de acido

sulfúrico 0,01 N de acordo com a função de Gran (Gran, 1952). O pH foi analisado em um

pHmetro calibrado Analion (modelo PM 608) com precisão de 0,01. As concentrações de O2,

temperatura e salinidade foram mensurados usando um oxitermosalinômetro (modelo YSI-30).

O pCO2 foi calculado a partir da lei de Henry, considerando a divisão entre as concentrações de

CO2 e a constante de Henry para este gás em cada condição de temperatura e salinidade (Weiss,

1974).

Análises Estatísticas

Dados log-transformados foram submetidos à ANOVA “one-way” com posterior

comparação dos valores de “p” obtidos pelo teste-t e corrigidos pelo teste FDR (lambda

Page 85: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

73

específico igual a zero, significativo p < 0,05) para comparar cada tratamento experimental ao

longo do tempo. O teste FDR é mais robusto que as tradicionais correções de Bonferroni, sendo

recomendada para estudos envolvendo um relativo grande número de comparações múltiplas

(Garcia, 2004). Já a produção líquida diurna entre tratamentos foi analisada por ANOVA “one-

way” com pós-teste de Tukey-Kramer (significativo p<0,05) devido ao menor número de

comparações múltiplas envolvidas. Os efeitos gerais da adição de nutrientes ou peixe e da

interação entre ambos sobre os valores de pCO2 foram avaliados comparando as estimativas de

componentes da variância, obtidas por um modelo de mínimos quadrados com efeitos

estocásticos ajustado pela Probabilidade Máxima Restrita (PMR). Esta análise é altamente

recomendada para experimentos de medidas repetidas várias vezes e mudanças na variância. O

teste FDR foi calculado no programa Q-value (descrito em Garcia, 2004), o modelo ajustado

pela PMR no JMP 5.1, e outras análises estatísticas e gráficos no programa Graphpad PRISM

4.0.

Resultados

A adição de nutrientes causou um contínuo aumento nas concentrações de clorofila-a

pelágica somente na presença de peixe, alcançando um incremento de 10 vezes ao longo do

experimento (p<0,01, FDR; Figura 2a). O tratamento que recebeu somente peixe não apresentou

diferenças significativas (p>0,05, FDR) na clorofila-a em comparação ao controle (Figura 2a).

O enriquecimento de nutrientes resultou em maior crescimento das algas perifíticas nas paredes

dos mesocosmos também na presença de peixe (cerca de 30 % em relação ao controle), de forma

que a clorofila-a total aumentou fortemente em ambos tratamentos onde os nutrientes foram

adicionados (Figura 2b). A produção líquida diurna de O2 nos mesocosmos durante as últimas

semanas foi significativamente diferente (p < 0,01, Tukey-Kramer) somente na presença tanto de

nutrientes quanto do peixe, tratamento no qual esta taxa foi em torno de 4 vezes mais autotrófica,

em média, que nos outros (Figura 3). A coloração declinou significativamente ao longo do

Page 86: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

74

experimento, não apresentando diferenças significativas entre tratamentos (p>0,05, ANOVA

Alinhada com medidas repetidas, dados não apresentados), possivelmente pela fotodegradação e

respiração biológica dos compostos pigmentados.

Figura 2: Variação temporal da média ± erro padrão das concentrações de clorofila-a: (2a)

pelágica e (2b) total (pelágica + perifítica) nos mesocosmos experimentais. Linhas sólidas com

quadrados negros e triângulos representam o controle e o tratamento com adição isolada de

peixe, respectivamente, enquanto as linhas tracejadas com cruzes e círculos negros representam

os tratamentos que receberam somente nutrientes e peixe + nutrientes, respectivamente.

Page 87: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

75

Figura 3: Produção líquida de O2 em cada mesocosmo por tratamento nas últimas semanas de

experimento: (3a) semana 5 e (3b) semana 6. Valores positivos indicam autotrofia líquida e

valores negativos heterotrofia líquida. Letras iguais representam diferenças não significativas

entre tratamentos (Tukey-Kramer, p>0,05).

Page 88: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

76

Todos os tratamentos e réplicas experimentais apresentaram persistência de supersaturação

de CO2 (Figura 4). Os nutrientes resultaram em alterações significativas de pCO2 ao longo do

experimento tanto nos mesocosmos onde sua adição foi isolada quanto naqueles onde foi

combinada com a introdução de peixe (p<0,05; FDR, Figura 4). O enriquecimento de nutrientes

causou uma redução de pCO2 até a terceira semana de experimento, a partir da qual esta variável

aumentou para valores superiores aos do controle (p<0,05; FDR, Figura 4). No tratamento onde

os nutrientes foram adicionados na presença de peixe, o decréscimo de pCO2 foi mais persistente

(até a quarta semana de experimento), e seu subsequente incremento mais modesto, levando o

pCO2 à valores significativamente menores do que nos mesocosmos que receberam nutrientes

isoladamente (p<0,05; FDR, Figura 4). Por outro lado, a introdução isolada de peixe não causou

diferenças significativas em relação aos mesocosmos controle (p>0,05; FDR, Figura 4).

Figura 4: Variação temporal da média ± erro padrão de pCO2 nos mesocosmos experimentais.

Linhas sólidas com quadrados negros e triângulos representam o controle e o tratamento com

adição isolada de peixe, respectivamente, enquanto as linhas tracejadas com cruzes e círculos

negros representam os tratamentos que receberam somente nutrientes e peixe + nutrientes,

respectivamente.

Page 89: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

77

Tanto a adição de nutrientes quanto a interação entre nutrientes e peixes apresentaram uma

alta participação relativa para explicar as mudanças no pCO2 em relação ao controle, mas não a

introdução de peixe isoladamente (modelo dos mínimos quadrados ajustado por PMR; Tabela 1).

Tabela 1: Participação relativa dos efeitos estudados sobre a variância do pCO2 (modelo dos

mínimos quadrados ajustado por PMR).

Efeitos Razão da Variância

Componente da Variância Erro Padrão Participação

Relativa (%)

Peixe 0,29 786.602 2.157.996 8,8

Nutrientes 1,22 3.281.672 3.281.672 36,8

Interação entre Peixe e Nutrientes

0,81 2.171.913 1.379.698 24,4

Resíduo - 2.672.477 - 30,0

Discussão

As águas lacustres estudadas permaneceram como fontes de CO2 à atmosfera ao longo de

todo o experimento e tratamentos. Este resultado pode ter sido causado por uma intensa

heterotrofia líquida, pois a redução esperada para a pCO2 por equilíbrio com a atmosfera teria

sido de 95 % em somente duas semanas se o ecossistema estivesse balanceado. A pCO2

decresceu no controle (25 % em 6 semanas), mas muito menos do que o esperado se o

metabolismo da comunidade estivesse balanceado. A supersaturação de CO2 foi observada

mesmo em mesocosmos enriquecidos de nutrientes, contrastando com a tendência geral descrita

na literatura de predomínio da produção líquida de CO2 em águas oligotróficas e apreensão

líquida deste gás nas aguas eutróficas muito produtivas (Duarte & Agusti, 1998), apesar da

eutrofização favorecer tanto a produção primaria (Schindler, 1978) quanto a respiração (Azam,

1998). Nesse sentido, o grande estoque de carbono orgânico dissolvido neste lago húmico

poderia ter sido suficiente para manter a alta respiração após a adição de nutrientes, sustentando

Page 90: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

78

uma elevada pCO2 mesmo na presença de intenso crescimento algal para aumentar a autotrofia

(Biddanda et al., 2001).

O declínio inicial de pCO2 após a adição de nutrientes observado no presente capítulo

corroborou os resultados de outros estudos realizados em lagos (Biddanda et al., 2001; Fee,

1979) e reservatórios (Chrzanowski & Grover, 2001) temperados e em um lago subtropical

(Carmouze et al., 1991). No entanto, esta redução de pCO2 foi seguida por um considerável

incremento nos mesocosmos onde somente os nutrientes foram adicionados, alcançando valores

de pCO2 superiores aos do controle ou dos tratamentos recebendo peixes, sugerindo a alta

respiração do excesso de matéria orgânica estimulada pelo enriquecimento de nutrientes. A

mudança de tendência da pCO2 após 3 semanas no tratamento com adição isolada de nutrientes

poderia ter sido consequência do tempo de resposta dos organismos heterotróficos, como

bactérias, zooplâncton e caramujos (Mccollum et al., 1998), para acompanhar o aumento da

produção algal. O zooplâncton (Schindler et al., 1997) e os pequenos macro-invertebrados

(Mccollum et al., 1998) podem aumentar o CO2 não somente pela respiração, mas também por

reduzir a produção primária pela sua pressão de herbivoria. A redução das concentrações de

clorofila-a planctônica nas últimas semanas de experimento nos mesocosmos que receberam

somente adições de nutrientes sugeriu um aumento da pressão de predação com o aumento do

fitoplâncton (Polis, 1999). Confirmando esta explicação, um aumento significativo na biomassa

de zooplâncton foi observado após a eutrofização experimental nos mesmos mesocosmos

estudados aqui (Carneiro, 2008).

Nossos resultados experimentais confirmam as conclusões de Biddanda et al. (2001) e

Lennon (2004) sobre papel da eutrofização em reduzir o CO2 dos lagos, mas este padrão poderia

não ser o caso do longo prazo, quando a decomposição da matéria orgânica poderia retornar CO2

às águas lacustres. A capacidade da eutrofização para reduzir pCO2 nos lagos pode também ser

dependente do estoque de COD, o qual foi predominantemente terrestre (80 %) e muito mais alto

no lago húmico estudado (17 mg L-1) do que nos lagos temperados estudados por Biddanda et al.

Page 91: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

79

(2001), cujos valores de COD variavam entre 1,3 e 9,5 mg L-1. Apesar de uma composição mais

refratária (Hopkinson et al., 1998), a matéria orgânica terrestre sustenta a atividade heterotrófica

(Pace et al., 2004), e contribui para a típica alta supersaturação de CO2 das águas húmicas (Cole

et al., 2000; Jonsson et al., 2003) ou predominante evasão deste gàs nos lagos globais (Cole et

al., 1994; Sobek et al., 2005). Nesse sentido, condições como ação de predadores sobre os

produtores primários (controle descendente) ou grande estoque de carbono orgânico alóctone

para respiração (controle ascendente) poderiam exercer uma contribuição crucial para

persistência (Cole et al., 2000), ou mesmo aumento (Rantakari & Kortelainen, 2005), da

supersaturação de CO2 após uma eutrofização do lago estudado.

A introdução isolada de peixe não apresentou um efeito significativo sobre a pCO2 (Figura

2), sugerindo que o organismo onívoro utilizado, uma espécie chave nos lagos costeiros da

região, não influenciou significativamente os processos autotróficos e heterotróficos de maneira

diferenciada no ecossistema, possivelmente exercendo pressões comparáveis em ambos

componentes. O papel dos peixes zooplanctívoros e piscívoros em decrescer e aumentar,

respectivamente, a evasão de CO2 tem sido demonstrado na literatura (Schindler et al. 1997, Cole

et al. 2000), mas o papel de peixes onívoros que se alimentam tanto de algas quanto de

zooplâncton ainda não havia sido avaliado. A pressão da espécie onívora sobre ambos os

componentes autotrófico e heterotrófico resultou em um efeito neutro na pCO2.

No entanto, a presença do peixe apresentou uma forte interação com a adição de nutrientes,

incrementando o efeito do enriquecimento de nutrientes em causar a redução de CO2. O efeito

significativo dos nutrientes para reduzir a pCO2 em comparação aos tratamentos onde somente

nutrientes foram adicionados, possivelmente devido aos elevados aumentos na biomassa algal

(clorofila-a pelágica) fixando CO2 na presença do peixe, pode ser explicado pelo eficiente

controle do peixe sobre as populações de herbívoros zooplânctonicos, que foi observado em

outro estudo nos nossos mesocosmos experimentais (Carneiro, 2008). O efeito sinérgico das

adições de peixe e nutrientes foi relacionado a um aumento de 4 vezes nas emissões integradas

Page 92: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

80

de CO2, comparado ao efeito não significativo da adição isolada de nutrientes, indicando que os

controles ascendentes e descendentes podem atuar em sinergismo para regular as emissões de

CO2. Nossos resultados sugerem que mesmo peixes onívoros típicos podem exercer um controle

sobre a pCO2 em condições eutróficas, confirmando que os peixes onívoros podem aumentar

este controle (Pace et al., 1999). Estes peixes poderiam não ser suficientes para evitar as cascatas

tróficas nos lagos tropicais (Okun et al., 2008), ou seja, a supressão do controle alternado do

zooplâncton favorecendo o nível dos produtores primários em sinergismo com o enriquecimento

de nutrientes como descrito em Drenner et al. (1996).

O importante efeito da interação entre nutrientes e o peixe sobre o CO2 também foi

confirmado pela sua alta participação relativa (quase 25 %) para explicar a variância da pCO2 no

modelo de ajuste utilizado neste capítulo. Além disso, uma outra alternativa para avaliar os

efeitos líquidos dos tratamentos foi calcular em cada um deles o fluxo de CO2 integrado ao longo

de todo o experimento, estimado como Cole & Caraco (1998) e usando uma velocidade de vento

conservativa de 0,5 m s-1 (Cole et al., 1994). A liberação de CO2 calculada ao longo das 6

semanas de experimento nos mesocosmos controle foi de 118,8 ± 1 mol CO2, valor similar

(Tukey-Kramer, p > 0,05) ao dos mesocosmos onde somente o peixe onívoro (117,0 ± 5.4 mol

CO2) ou nutrientes foram adicionados (113,3 ± 5.8 mol CO2). Já a adição de nutrientes na

presença deste peixe causou uma redução significativa de 40 % na liberação integrada de CO2

(Tukey-Kramer, p > 0.001), alcançando uma evasão líquida de 75,9 ± 5,7 mol CO2 à atmosfera

ao longo do experimento. Estas estimativas evidenciaram que os efeitos da adição de nutrientes e

introdução do peixe estudado foram claramente não aditivas, como o desvio do fluxo de CO2 no

tratamento +nutriente+peixe relativo ao controle foi quase 6 vezes maior do que a soma dos

desvios dos fluxos de CO2 integrados entre os dois tratamentos com adição isolada de nutrientes

e peixe em relação ao controle. Nesse sentido, somente a interação entre o enriquecimento de

nutrientes e a presença do peixe onívoro causou uma significativa diferença nos fluxos de CO2

em comparação aos observados nos mesocosmos controle. Portanto, o papel de remoção ou

Page 93: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

81

introdução de uma simples espécie no funcionamento do ecossistema, um tema que ainda

necessita ser melhor estudado na literatura (Simberloff, 2003), poderia também ser influenciado

ou mesmo mais variável pelas condições ecológicas e recursos altamente dinâmicos.

Como conclusão, o presente capítulo não confirmou completamente nenhuma das duas

hipóteses formuladas. A adição de nutrientes não resultou em um claro declínio da pressão

parcial de CO2, uma vez que a inicial redução foi compensada por um subsequente aumento.

Além disso, a introdução do peixe onívoro reduziu fortemente a pCO2 na condição enriquecida

de nutrientes, incrementando o papel das adições de nutrientes em influenciar a apreensão de

CO2 pela comunidade. Estes resultados evidenciaram que os controles ascendente e descendente

poderiam não atuar isoladamente para influenciar a pCO2 e a evasão de CO2 nos lagos tropicais,

mas sim interagir e amplificar os efeitos de cada controle isolado.

Page 94: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

82

CAPÍTULO 6

Grande Desequilíbrio de CO2 em Lagos Tropicais

Com o título “Large CO2 disequilibria in tropical lakes” dos autores Humberto Marotta,

Carlos M. Duarte, Sebastian Sobek & Alex Enrich-Prast foi aceito para publicação no

periódico “Global Biogeochemical Cycles.

Page 95: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

83

Introdução

Lagos são potencialmente importantes na condução de carbono entre as fontes terrestres e

a atmosfera, uma vez que suas águas superficiais são comumente supersaturadas de CO2 (Cole et

al., 1994; Cole et al., 2007). O crescente reconhecimento do papel dos lagos para o ciclo global

do carbono tem fomentado uma série de levantamentos de pCO2 nas águas destes ecossistemas

ao redor do mundo (Cole et al., 1994; Sobek et al., 2005),. Embora a maior análise publicada na

literatura inclua quase 5.000 lagos (Sobek et al., 2005), os ecossistemas tropicais continuam

extremamente subrepresentados nestes levantamentos (≤ 3 % do número total de lagos),

refletindo a carência de observações de pCO2 nos lagos situados em baixas latitudes. No entanto,

os ecossistemas aquáticos tropicais podem apresentar persistência de supersaturação de CO2

mesmo ao longo do dia ou ano (Marotta et al., in press) e sustentar intenso metabolismo (Richey

et al., 2002) devido as suas altas temperaturas (Brown et al., 2004) e elevada produção terrestre

na bacia de drenagem (Luyssaert et al., 2007). Os aportes orgânicos advindos do meio terrestre

apresentam um importante papel para subsidiar a heterotrofia aquática e, consequentemente, a

supersaturação de CO2, justificando a relação positiva comumente descrita entre carbono

orgânico dissolvido (COD) e pCO2 nos lagos (Cole et al., 2007; Sobek et al., 2005). Apesar das

altas temperaturas frequentemente influenciarem o balanço de CO2 nos ecossistemas naturais,

aumentando os fluxos de CO2 com a atmosfera (Cornelissen et al., 2007; Knorr et al., 2005;

Rastetter et al., 2005; Shaver et al., 2006; Wang et al., 1999), levantamentos globais de pCO2 na

literatura indicaram ausência de relação significativa entre esta variável e latitude ou temperatura

da água nos lagos (Cole et al., 1994; Sobek et al., 2005). No entanto, estes resultados poderiam

refletir as limitações de bases de dados nas quais os lagos tropicais estão fortemente

subrepresentados.

No presente capítulo, foi testada a relação entre pCO2, latitude e temperatura da água

superficial dos lagos. Nesse sentido, a base de dados de pCO2 dos lagos tropicais foi

substancialmente expandida (N = 367 lagos), combinando nossas amostragens de campo com

Page 96: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

84

estimativas obtidas a partir da literatura. Estes dados foram reunidos com o maior levantamento

até então disponível (Sobek et al., 2005), resultando em uma base de dados de pCO2 que incluiu

5190 lagos de todos os continentes e com grande amplitude de pCO2 (3 a 71.394 µatm), latitude

(0o a 79o) e temperatura da água (0,7 a 33,5 ºC).

Material e Métodos

Os dados de pCO2, temperatura e COD nas águas superficiais dos lagos tropicais foram

obtidos a partir de coletas de campo (n=86) e compilação na literatura representada por teses e

artigos publicados (n=133) bem como no maior levantamento global disponível (n=148 em

Sobek et al. 2005), totalizando 367 lagos tropicais. Este conjunto de dados incluiu uma grande

variedade de lagos, tanto rasos e profundos quanto de água doce e salinos, os quais foram

reunidos com os dados de lagos não tropicais: 4791 de Sobek et al (2005) e Alin & Johnson

(2007), bem como 32 de nossas próprias coletas de campo. A grande maioria (95 %) de todos

dados de pCO2 no presente capítulo, incluindo todos os lagos brasileiros amostrados in situ,

foram obtidos pelo mesmo método, cálculos físico-químicos baseados no pH e alcalinidade.

Portanto, não seria esperado que a diferença entre métodos contribuísse muito para a variância

dos dados . Além disso, Sobek et al. (2005) já haviam concluído que diferenças de método

apresentam pequena influência na variância de pCO2 no conjunto de dados globais que foi

incorporado nesta tese.

Em cada campanha de campo, águas superficiais dos lagos foram cuidadosamente

amostradas evitando-se bolhas de ar para análises imediatas de pH e alcalinidade. O pCO2 foi

calculado como Weiss (1974). Temperatura e salinidade foram mensurados in situ com um

termosalinômetro YSI-30 calibrado. No laboratório, concentrações de COD foram quantificadas

em amostras de água pré-filtradas (0,7 mm, Whatman GF/F) e pré-acidificadas a pH menor que

2,0, usando o método de oxidação catalítica de alta temperatura em um analisador Shimadzu

TOC-5000.

Page 97: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

85

As concentrações de CO2 da nossa base de dados incluiu medidas diretas usando

analisadores de infra-vermelho calibrados, mas preponderantemente indiretas (95 % do total),

calculadas pelo método pH-alcalinidade (titulação de Gran) após correções relacionadas a

temperatura, altitude e força iônica como Cole et al. (1994). Portanto, não seria esperado que

esta diferença de método contribuísse significativamente para a variância dos dados, o que

também foi confirmado por Sobek et al. (2005).

Os fluxos de CO2 água-ar (FCO2) foram estimados de acordo com Cole & Caraco (1998):

FCO2 = α K ([CO2]água - [CO2]sat.); onde α é o fator de enriquecimento químico calculado como

Wanninkhof & Knox (1996); K é a velocidade pistão (cm h-1) calculada como Cole & Caraco

(1998) e assumindo uma velocidade do vento conservativa igual a 0,5 m s-1 (Cole et al., 1994) ou

a média global de 3,0 m s-1 atualmente estimada na literatura (Archer & Jacobson, 2005);

[CO2]água é a concentração de CO2 (µmol L-1) na água e [CO2]sat. é a concentração de CO2 (µmol

L-1) da água no equilíbrio com a atmosfera (370 µatm).

Apesar dos nossos esforços para reduzir a escassez de dados tropicais, a presente base

ainda foi dominada por lagos de mais altas latitudes que poderiam tendenciar a relação entre os

valores de pCO2 e temperatura ou latitude, como a equação de regressão é influenciada pela

média de ambas as coordenadas. No sentido de evitar esta tendenciosidade, os dados foram

divididos em classes de temperatura e latitude para balancear os pesos da média de pCO2 entre

diferentes temperaturas da água ou latitudes, independentemente do número de observações em

cada faixa dessas variáveis. A escolha do intervalo das classes (2 oC para temperatura da água e

4o para latitude) objetivou alcançar um número mínimo de observações que possibilitassem

análises mais robustas. A variação na amplitude dos valores de pCO2 com o aumento de

temperatura dos lagos foi testada pela comparação das inclinações obtidas pela regressão de

quartiles para 97% e 3% no programa R. A regressão de quartiles é uma extensão das clássicas

estimativas dos mínimos quadrados de modelos médios condicionais para a estimativa de

Page 98: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

86

conjunto de modelos para diversas funções quartiles condicionais, considerando a mediana como

parâmetro central (Koenker, 2005).

Resultados e Discussão

A maioria dos lagos tropicais (87 %) foram supersaturados de CO2, uma percentagem

atuando como fonte de liberação deste gás para a atmosfera similar a aquela observada em outras

latitudes (92 %). No entanto, a média geométrica de pCO2 dos lagos tropicais (1804 ± 35 µatm)

foi significativamente mais alta (Teste-t, p<0,05) do que a apresentada pelos lagos polares (494 ±

8 µatm) e temperados (1070 ± 6 µatm). Nesse sentido, foi detectada uma relação significativa

negativa entre pCO2 e latitude (Figura 1), indicando um decréscimo médio de 2,83 ± 0,54 % de

pCO2 por grau de latitude desde os trópicos aos pólos. Uma análise mais detalhada dos

resultados revelou que os mais altos valores de pCO2 foram observados em lagos situados entre

as latitudes 16 e 20 º, cuja média de pCO2 excedeu em mais de 20 vezes a dos lagos polares

(Figura 1). Embora o aumento de pCO2 em lagos com maiores concentrações de COD seja bem

descrito na literatura (Sobek et al., 2005), a redução de pCO2 observada com o aumento de

latitude foi independente desta variável. Não foi detectada relação significativa entre COD e

latitude considerando tanto dados de lagos individuais quanto médias de pCO2 agrupadas por

classes de latitude (p > 0,05; regressão linear).

Page 99: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

87

Figura 1: Relação entre as médias (± erro padrão) de pCO2 dos lagos e a latitude (agrupadas em

classes de 4º de latitude). Sólidos e barras representam a média e o intervalo do erro padrão

respectivamente. A equação da regressão ajustada foi pCO2 (µatm) = 5518,3 e0,028±0.005Latitude

(graus); R2 = 0,62; F = 27,52; p< 0,0001.

Por outro lado, foi detectado um incremento significativo da média de pCO2 nos lagos

agrupados em classes de temperatura da água mais elevada (Figura 2), um aumento médio (±

erro padrão) estimado em 6,65 ± 0,83 % de pCO2 por grau Celsius (Figura 2). Além disso, a

relação significativa entre temperatura e pCO2 (regressão linear, p < 0,05) foi observada mesmo

quando os dados foram divididos em classes de 1, 3, 4 ou 5 oC e ainda quando os dados brutos

foram analisados. Análises de regressão múltipla indicaram que estas relações não foram

redundantes, sendo as diferenças tanto de latitude quanto de temperatura estatisticamente

significativas (Tukey-Kramer, p < 0,001).

Page 100: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

88

Figura 2: Relação entre as médias (± erro padrão) de pCO2 dos lagos e a temperatura da água no

momento da coleta (agrupadas em classes de 2 ºC de temperatura). Sólidos e barras representam

a média e o intervalo do erro padrão respectivamente. A equação da regressão ajustada foi pCO2

(µatm) = 682,6 e0.066±0.008Temperatura (ºC); R2 = 0,82; F = 4,44; p< 0,0001.

Uma análise mais detalhada da distribuição de pCO2 ao longo do gradiente de temperatura

da água também revelou que a amplitude de pCO2 aumentou significativamente em condições

mais quentes (regressão de quartiles, p<0,01; Figura 3), também sugerindo que a relação entre

pCO2 e temperatura nos lagos é complexa. Esta relação poderia ser provavelmente determinada

pelo efeito da temperatura sobre o metabolismo lacustre, o qual pode reconhecidamente

favorecer tanto a heterotrofia líquida, resultando em alto pCO2, quanto a autotrofia líquida,

causando baixo pCO2, em função das características dos lagos. A mais alta amplitude de pCO2

nos lagos com o aumento de temperatura foi consistente com a maior amplitude de valores de

CO2 em condições mais quentes que havia sido previamente descrita em escala global para

florestas (Luyssaert et al., 2007) e solos (Raich & Schlesinger, 1992).

Page 101: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

89

10 15 20 25 30

Temperatura da Água (oC)

32

1024

32

768

pCO

2 (µ

atm

)

0 5

Figura 3: Relação entre pCO2 e temperatura da água no momento da coleta na qual cada ponto

representa lagos individuais. As linhas indicam a regressão ajustada para o maior quartil de 97%

(log pCO2 = 0,034 ± 0.004*Temperatura + 3.28 ± 0.03; p < 0,0001) e o menor de 3 % (log pCO2

= -0,016 ± 0.004*Temperatura + 3.28 ± 0.03; p < 0,0005) da distribuição de pCO2 com o

aumento de temperatura.

A supersaturação de CO2 mais alta e variável nos lagos situados nos Trópicos do que em

outras latitudes confirmou os resultados prévios de lagos africanos incluídos no pioneiro artigo

de Cole e tal. (1994). Já a relação não significativa entre os valores de pCO2 e temperatura (p >

0,05) foi observada quando os dados de Sobek et al. (2005) foram re-analisados usando o mesmo

método de agregação dos lagos por classes de temperatura utilizado aqui, confirmando que as

conclusões prévias de ausência de relação entre pCO2 e temperatura ou latitude nas análises de

Sobek et al. (2005) foram derivadas da escassez de dados tropicais nos levantamentos globais

disponíveis (Cole et al., 1994; Sobek et al., 2005) e não de diferentes abordagens de análise.

Mesmo considerando que os padrões observados não permitem inferir sobre mecanismos

atuantes de causa e efeito torna-se possível sugerir a participação de diversos processos,

incluindo aumento do metabolismo tanto autotrófico (Alin & Johnson, 2007) quanto

Page 102: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

90

heterotrófico (Davidson & Janssens, 2006) com o incremento da temperatura, tal como esperado

pela teoria metabólica (Brown et al., 2004).

A conclusão de que ecossistemas aquáticos continentais podem sustentar grandes emissões

de CO2 à atmosfera é consistente com estudos prévios que evidenciaram uma liberação média de

830 g C m-2 y-1 na planície de inundação amazônica, incluindo rios e alagadiços (Richey et al.,

2002). Assumindo similares e conservativos coeficientes de difusão de gás, estimou-se a partir

do presente estudo que lagos tropicais podem emitir em torno de 600 e 80 % mais CO2 em

mediana por unidade de área (176 g C m-2 y-1) que os lagos polares (28 g C m-2 y-1) e temperados

(99 g C m-2 y-1) respectivamente. Nesse contexto, as estimativas de liberação global de CO2 de

lagos a atmosfera atualmente usadas na literatura necessitam ser revisadas para incluir os

maiores fluxos daqueles ecossistemas situados nos Trópicos.

Considerando a mediana global de pCO2 observada aqui, a área total dos lagos e sua

distribuição latitudinal, obtidas pelo método de Pareto descrito em Downing et al. (2006), além

de um importante parâmetro subestimado (velocidade pistão de 0,5 m d-1 como Cole et al.,

1994), foi possível re-estimar a taxa de evasão anual de carbono à atmosfera pelos lagos globais

de 0,15 Gt C (Cole et al., 1994) para 0,44 Gt C. Mesmo esta estimativa conservativa é mais alta

do que a dos rios, reservatórios e estuários do planeta ou ainda equivalente à exportação total de

carbono orgânico dos rios para os oceanos (Cole et al., 2007). Usando a média global da

velocidade do vento de 3,0 m s-1 (Archer & Jacobson, 2005), esta estimativa poderia ser elevada

para 0,83 Gt C ano-1, uma contribuição significativa na escala global quando comparada à evasão

de CO2 por todas as outras águas continentais juntas (Cole et al., 2007). Em conclusão, qualquer

avaliação do papel dos lagos no ciclo global do carbono deve, necessariamente, incluir os lagos

tropicais como premissa para se alcançar uma melhor confiabilidade nos processos globais

examinados.

Page 103: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

91

CONCLUSÃO GERAL

Os dados tropicais da presente tese, ainda escassos na literatura internacional, confirmaram

a forte e generalizada condição de supersaturação de CO2 nos lagos, a qual os caracteriza como

ecossistemas potencialmente importantes na condução do carbono fixado em vastas áreas

terrestres da bacia de drenagem para sua evasão à atmosfera (revisão no capítulo 1).

Os resultados da presente tese evidenciaram que mesmo eventos de estratificação da água,

caracterizados pela redução das concentrações deste gás na superfície, podem apresentar

persistência da evasão de CO2 à atmosfera em lagos das adjacências da floresta tropical,

possivelmente sustentada pela influência dos aportes terrestres (capítulo 2). Nesse sentido, a

relação negativa entre eutrofização e pCO2 que é bem descrita na literatura global não foi

observada nas águas ácidas do capítulo 3 ou dos mesocosmos do capítulo 5, pois a condição de

baixo pH é tipicamente relacionada ao maior aporte de ácidos terrestres orgânicos e inorgânicos.

Esta característica poderia favorecer a produção líquida de CO2 pela heterotrofia e processos

físicos químicos, apesar do reconhecido aumento da produção primaria nos períodos de

eutrofização. Já as águas mais básicas nos dados de longo prazo (13 anos) do capítulo 3

apresentaram importantes reduções de pCO2 na condição eutrófica, confirmando a tendência

geral da literatura e contrastando com os resultados obtidos na estação de águas mais ácidas

deste mesmo lago. Nesse contexto, a chuva pode ser uma dinâmica chave para intensificar o

carreamento de compostos orgânicos e inorgânicos terrestres para os lagos, sustentando

substanciais incrementos na evasão de CO2 à atmosfera (capítulo 4).

No entanto, as respostas da pCO2 superficial de lagos à eutrofização não dependem

somente dos recursos (controle ascendente), mas também das características tróficas de efeito

descendente. No experimento de mesocosmos do capítulo 5 foi observado um evidente

sinergismo entre os controles ascendente (enriquecimento de nutrientes) e descendente

(introdução de uma espécie de peixe onívoro) para determinar a evasão de CO2 à atmosfera.

Apesar do peixe onívoro não ter alterado significativamente o pCO2 superficial na condição

Page 104: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

92

oligotrófica, complementando o modelo conceitual sobre a influência dos hábitos dos peixes ao

CO2 das águas lacustres, sua presença nos mesocosmos eutrofizados foi associada a uma emissão

de CO2 substancialmente menor quando comparada com aqueles submetidos apenas ao

enriquecimento de nutrientes.

Um outro resultado marcante da tese foi a maior amplitude dos valores de pCO2 e dos

fluxos de CO2 à atmosfera observada nos lagos tropicais em escala global (capítulo 6). Esta

maior variabilidade de pCO2 em lagos de baixas latitudes poderia ser atribuída ao papel das mais

altas temperaturas em favorecer tanto a autotrofia quanto a heterotrofia aquáticas, conseqüência

da complexa relação entre temperatura e o CO2 nesses ecossistemas. No entanto, a relação média

entre águas mais quentes e este gás foi positiva, possivelmente refletindo o reconhecido caráter

da maioria dos lagos do planeta como fontes de emissão de CO2 à atmosfera, o qual poderia ser

físico-químico e biologicamente favorecido nas temperaturas mais altas. A elevada variação de

pCO2 superficial nos lagos tropicais também foi confirmada na escala local de um mesmo lago,

exemplificadas por aumentos superiores a uma ordem de grandeza entre diferentes anos (capítulo

4) ou mesmo entre poucas semanas (capítulo 5), possivelmente refletindo o papel dos aportes

terrestres.

Portanto, os resultados aqui apresentados evidenciaram a alta complexidade envolvida na

regulação do CO2 nos lagos tropicais, inferida pela alta variabilidade deste gás nas águas

superficiais. A relevância dos ecossistemas lacustres, como destino e condução para o aporte

orgânico e inorgânico advindo de vastas áreas terrestres da bacia hidrográfica, os tornam

potencialmente importantes no ciclo global do carbono. O aporte de ácidos terrestres que são

incrementados pelas chuvas além das altas temperaturas anuais constituem relevantes fatores

direcionadores do pCO2 de lagos nas baixas latitudes. Mesmo os peixes onívoros abundantes nos

trópicos também podem influenciar significativamente o pCO2 dos lagos, apesar das interações

potencialmente menos concentradas que as exercidas pelos peixes especialistas típicos das

regiões temperadas. Nesse contexto, a lacuna de dados, a relevância e a complexidade de fatores

Page 105: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

93

influenciando o funcionamento destes ecossistemas tornam cruciais a realização de mais estudos

de caráter local, os quais serão imprescindíveis para subsidiar a composição de trabalhos de

enfoque global ou mesmo de previsões mais realistas dos eventuais efeitos das alterações

humanas. Como conclusão, a presente tese disponibiliza fortes indícios de que lagos tropicais

mantêm um elevado e variável desequilíbrio de CO2 em relação à atmosfera, um significativo

componente do ciclo do carbono que poderia apresentar peculiaridades pouco estudadas mas

importantes para um melhor entendimento dos processos biogeoquímicos globais.

Page 106: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

94

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Ahn, J., and E. J. Brook. 2008. Atmospheric CO2 and climate on millennial time scales during the last glacial period. Science 322: 83-85.

Alin, S. R., and T. C. Johnson. 2007. Carbon cycling in large lakes of the world: A synthesis of production, burial, and lake-atmosphere exchange estimates. Global Biogeochemical Cycles 21.

Amado, A. M., J. B. Cotner, A. L. Suhett, F. D. Esteves, R. L. Bozelli, and V. F. Farjalla. 2007. Contrasting interactions mediate dissolved organic matter decomposition in tropical aquatic ecosystems. Aquatic Microbial Ecology 49: 25-34.

Apha. 1992. Standard methods for the examination of water and wastewater. , 18 ed. American Public Health Association.

Archer, C. L., and M. Z. Jacobson. 2005. Evaluation of global wind power. Journal of Geophysical Research-Atmospheres 110.

Azam, F. 1998. Microbial control of oceanic carbon flux: The plot thickens. Science 280: 694-696.

Azam, F., T. Fenchel, J. G. Field, J. S. Gray, L. A. Meyerreil, and F. Thingstad. 1983. The Ecological Role of Water-Column Microbes in the Sea. Marine Ecology-Progress Series 10: 257-263.

Barbosa, F. A. R., and J. G. Tundisi. 1980. Primary Production of Phytoplankton and Environmental Characteristics of a Shallow Quaternary Lake at Eastern Brasil. Archiv Fur Hydrobiologie 90: 139-161.

Beutler, M. and others 2002. A fluorometric method for the differentiation of algal populations in vivo and in situ. Photosynthesis Research 72: 39-53.

Biddanda, B., M. Ogdahl, and J. Cotner. 2001. Dominance of bacterial metabolism in oligotrophic relative to eutrophic waters. Limnology and Oceanography 46: 730-739.

Biddanda, B. A., and J. B. Cotner. 2002. Love handles in aquatic ecosystems: The role of dissolved organic carbon drawdown, resuspended sediments, and terrigenous inputs in the carbon balance of Lake Michigan. Ecosystems 5: 431-445.

Boehrer, B., R. Fukuyama, and K. Chikita. 2008. Stratification of very deep, thermally stratified lakes. Geophysical Research Letters 35.

Borer, E. T. and others 2005. What determines the strength of a trophic cascade? Ecology 86: 528-537.

Brown, J. H., J. F. Gillooly, A. P. Allen, V. M. Savage, and G. B. West. 2004. Toward a metabolic theory of ecology. Ecology 85: 1771-1789.

Came, R. E., J. M. Eiler, J. Veizer, K. Azmy, U. Brand, and C. R. Weidman. 2007. Coupling of surface temperatures and atmospheric CO2 concentrations during the Palaeozoic era. Nature 449: 198-U193.

Caraco, N., J. Cole, S. Findlay, and C. Wigand. 2006. Vascular plants as engineers of oxygen in aquatic systems. Bioscience 56: 219-225.

Carignan, R., D. Planas, and C. Vis. 2000. Planktonic production and respiration in oligotrophic Shield lakes. Limnology and Oceanography 45: 189-199.

Carmouze, J. P., B. Knoppers, and P. Vasconcelos. 1991. Metabolism of a Subtropical Brazilian Lagoon. Biogeochemistry 14: 129-148.

Carneiro, L. S. 2008. Efeito de peixes onívoros sobre a estrutura e estabilidade de cadeias tróficas aquáticas. Tese de Doutorado. Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Carpenter, S. R. and others 2001. Trophic cascades, nutrients, and lake productivity: whole-lake experiments. Ecological Monographs 71: 163-186.

Chrzanowski, T. H., and J. P. Grover. 2001. Effects of mineral nutrients on the growth of bacterio- and phytoplankton in two southern reservoirs. Limnology and Oceanography 46: 1319-1330.

Page 107: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

95

Cole, J. J., and N. F. Caraco. 1998. Atmospheric exchange of carbon dioxide in a low-wind oligotrophic lake measured by the addition of SF6. Limnology and Oceanography 43: 647-656.

---. 2001. Carbon in catchments: connecting terrestrial carbon losses with aquatic metabolism. Marine and Freshwater Research 52: 101-110.

Cole, J. J., N. F. Caraco, G. W. Kling, and T. K. Kratz. 1994. Carbon-Dioxide Supersaturation in the Surface Waters of Lakes. Science 265: 1568-1570.

Cole, J. J., S. Findlay, and M. L. Pace. 1988. Bacterial Production in Fresh and Saltwater Ecosystems - a Cross-System Overview. Marine Ecology-Progress Series 43: 1-10.

Cole, J. J., M. L. Pace, S. R. Carpenter, and J. F. Kitchell. 2000. Persistence of net heterotrophy in lakes during nutrient addition and food web manipulations. Limnology and Oceanography 45: 1718-1730.

Cole, J. J. and others 2007. Plumbing the global carbon cycle: Integrating inland waters into the terrestrial carbon budget. Ecosystems 10: 171-184.

Cornelissen, J. H. C. and others 2007. Global negative vegetation feedback to climate warming responses of leaf litter decomposition rates in cold biomes. Ecology Letters 10: 619-627.

Cprm. 2000. Unidades morfoesculturais e geomorfológicas de Macaé. CPRM. Davidson, E. A., and I. A. Janssens. 2006. Temperature sensitivity of soil carbon decomposition

and feedbacks to climate change. Nature 440: 165-173. Del Giorgio, P. A., J. J. Cole, N. F. Caraco, and R. H. Peters. 1999. Linking planktonic biomass

and metabolism to net gas fluxes in northern temperate lakes. Ecology 80: 1422-1431. Dos Santos, A. M., A. M. Amado, M. Minello, V. F. Farjalla, and F. A. Esteves. 2006. Effects of

the sand bar breaching on Typha domingensis (PERS.) in a tropical coastal lagoon. Hydrobiologia 556: 61-68.

Dos Santos, A. M., and F. D. Esteves. 2002. Primary production and mortality of Eleocharis interstincta in response to water level fluctuations. Aquatic Botany 74: 189-199.

Downing, J. A. and others 2006. The global abundance and size distribution of lakes, ponds, and impoundments. Limnology and Oceanography 51: 2388-2397.

Drenner, R. W., J. D. Smith, and S. T. Threlkeld. 1996. Lake trophic state and the limnological effects of omnivorous fish. Hydrobiologia 319: 213-223.

Duarte, C. M., and S. Agusti. 1998. The CO2 balance of unproductive aquatic ecosystems. Science 281: 234-236.

Duarte, C. M., and Y. T. Prairie. 2005. Prevalence of heterotrophy and atmospheric CO2 emissions from aquatic ecosystems. Ecosystems 8: 862-870.

Edmundson, J. A., and A. Mazumder. 2002. Regional and hierarchical perspectives of thermal regimes in subarctic, Alaskan lakes. Freshwater Biology 47: 1-17.

Engstrom, D. R., S. C. Fritz, J. E. Almendinger, and S. Juggins. 2000. Chemical and biological trends during lake evolution in recently deglaciated terrain. Nature 408: 161-166.

Esteves, F. A. 1998. Lagoas Costeiras: Origem, funcionamento e possibilidades de manejo, p. 63-87. In F. A. Esteves [ed.], Ecologia de Lagoas Costeiras. NUPEM.

Farjalla, V. F., B. M. Faria, and F. A. Esteves. 2002. The relationship between DOC and planktonic bacteria in tropical coastal lagoons. Archiv Fur Hydrobiologie 156: 97-119.

Fee, E. J. 1979. Relation between Lake Morphometry and Primary Productivity and Its Use in Interpreting Whole-Lake Eutrophication Experiments. Limnology and Oceanography 24: 401-416.

Ford, P. W., P. I. Boon, and K. Lee. 2002. Methane and oxygen dynamics in a shallow floodplain lake: the significance of periodic stratification. Hydrobiologia 485: 97-110.

Fuhrman, J. A., and R. T. Noble. 1995. Viruses and protists cause similar bacterial mortality in coastal seawater. Limnology and Oceanography 40: 1236-1242.

Garcia, L. V. 2004. Escaping the Bonferroni iron claw in ecological studies. Oikos 105: 657-663.

Page 108: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

96

Gattuso, J. P., M. Frankignoulle, and R. Wollast. 1998. Carbon and carbonate metabolism in coastal aquatic ecosystems. Annual Review of Ecology and Systematics 29: 405-434.

Glenn, E., T. L. Thompson, R. Frye, J. Riley, and D. Baumgartner. 1995. Effects of Salinity on Growth and Evapotranspiration of Typha-Domingensis Pers. Aquatic Botany 52: 75-91.

Graneli, W., M. Lindell, and L. Tranvik. 1996. Photo-oxidative production of dissolved inorganic carbon in lakes of different humic content. Limnology and Oceanography 41: 698-706.

Hanson, P. C., D. L. Bade, S. R. Carpenter, and T. K. Kratz. 2003. Lake metabolism: Relationships with dissolved organic carbon and phosphorus. Limnology and Oceanography 48: 1112-1119.

Hellings, L., F. Dehairs, S. Van Damme, and W. Baeyens. 2001. Dissolved inorganic carbon in a highly polluted estuary (the Scheldt). Limnology and Oceanography 46: 1406-1414.

Henry, R., and F. A. R. Barbosa. 1989. Thermal Structure, Heat-Content and Stability of 2 Lakes in the National-Park of Rio Doce Valley (Minas-Gerais, Brazil). Hydrobiologia 171: 189-199.

Herrerasilveira, J. A. 1996. Salinity and nutrients in a tropical coastal lagoon with groundwater discharges to the Gulf of Mexico. Hydrobiologia 321: 165-176.

Hopkinson, C. S. and others 1998. Terrestrial inputs of organic matter to coastal ecosystems: An intercomparison of chemical characteristics and bioavailability. Biogeochemistry 43: 211-234.

Hoppe-Seyler, F. 1895. Über die Verteilung absorbierter Gase im Wasser des Bodensees und ihre Beziehungen zu den in ihm lebenden Tieren und Pflanzen. Schr. Ver. Gesch. Bodensee 24 S: 29-48.

Houghton, R. A., and G. M. Woodwell. 1989. Global Climatic-Change. Scientific American 260: 36-44.

Hung, J. J., and P. Y. Hung. 2003. Carbon and nutrient dynamics in a hypertrophic lagoon in southwestern Taiwan. Journal of Marine Systems 42: 97-114.

INMET. 1992. Relatório Anual do Instituto Nacional de Meteorologia - 1991. INMET. IPCC. 2001. Climate change 2001: The scientific basis. Canbridge University Press. ---. 2007. Climate change 2007: The physical science basis, p. 18. Jones, J. B., and P. J. Mulholland. 1998. Carbon dioxide variation in a hardwood forest stream:

An integrative measure of whole catchment soil respiration. Ecosystems 1: 183-196. Jonsson, A., J. Karlsson, and M. Jansson. 2003. Sources of carbon dioxide supersaturation in

clearwater and humic lakes in northern Sweden. Ecosystems 6: 224-235. Kelly, C. A. and others 2001. Natural variability of carbon dioxide and net epilimnetic

production in the surface waters of boreal lakes of different sizes. Limnology and Oceanography 46: 1054-1064.

Kerr, R. A. 2006. Global change - No doubt about it, the world is warming. Science 312: 825-825.

Knoppers, B. 1994. Aquatic primary production in coastal lagoons, p. 243-286. In B. Kjerfve [ed.], Coastal lagoon processes. Elsevier.

Knorr, W., I. C. Prentice, J. I. House, and E. A. Holland. 2005. Long-term sensitivity of soil carbon turnover to warming. Nature 433: 298-301.

Koenker, R. 2005. Quantile regression, 1 ed. Cambridge University Press. Krause-Jensen, D., and K. Sand-Jensen. 1998. Light attenuation and photosynthesis of aquatic

plant communities. Limnology and Oceanography 43: 396-407. Kump, L. R. 2002. Reducing uncertainty about carbon dioxide as a climate driver. Nature 419:

188-190. Laval, B. E., J. Imberger, and A. N. Findikakis. 2005. Dynamics of a large tropical lake: Lake

Maracaibo. Aquatic Sciences 67: 337-349. Lennon, J. T. 2004. Experimental evidence that terrestrial carbon subsidies increase CO2 flux

from lake ecosystems. Oecologia 138: 584-591.

Page 109: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

97

Lorenzen, C. J. 1967. Determination of Chlorophyll and Pheo-Pigments - Spectrophotometric Equations. Limnology and Oceanography 12: 343-&.

Luyssaert, S. and others 2007. CO2 balance of boreal, temperate, and tropical forests derived from a global database. Global Change Biology 13: 2509-2537.

Mackereth, F. J. H., J. Heron, and J. F. Talling. 1978. Water Analysis: some revised methods for limnologists. Freshwater Biological Association Scientific Publication n. 36. Cumbria and Dorser.

Marotta, H., L. Bento, F. A. Esteves, and A. Enrich-Prast. 2009. Whole Ecosystem Evidence of Eutrophication Enhancement by Wetland Dredging in a Shallow Tropical Lake. Estuaries and Coasts 32: 654-660.

Marotta, H., L. T. Paiva, and M. M. Petrucio. in press. Changes in thermal and oxygen stratification pattern coupled to persistence of CO2 outgassing in shallow lakes of the surroundings of Atlantic Tropical Forest, Brazil. Limnology.

Mccollum, E. W., L. B. Crowder, and S. A. Mccollum. 1998. Complex interactions of fish, snails, and littoral zone periphyton. Ecology 79: 1980-1994.

Melack, J. M., and R. Jellison. 1998. Limnological conditions in Mono Lake: contrasting monomixis and meromixis in the 1990s. Hydrobiologia 384: 21-39.

Miller, L., and B. C. Douglas. 2004. Mass and volume contributions to twentieth-century global sea level rise. Nature 428: 406-409.

Moss, B. and others 2004. Continental-scale patterns of nutrient and fish effects on shallow lakes: synthesis of a pan-European mesocosm experiment. Freshwater Biology 49: 1633-1649.

Naeem, S. 2001. Experimental validity and ecological scale as criteria for evaluating research programs, p. 223-244. In R. H. Gardner, W. M. Kemp, K. V. S. and J. E. Petersen [eds.], Scaling relations in experimental ecology. Columbia University Press.

Nusch, E. A., and G. Palme. 1975. Biologische Methoden für die Praxis der Gewässeruntersuchung. Bestimmung des Chlorophyll-a und Phaeopigmentgehaltes in Oberflächenwasser. GWF-Wasser/Abwasser 116: 562-565.

Odum, H. T. 1956. Primary Production in Flowing Waters. Limnology and Oceanography 1: 102-117.

Okun, N., J. Brasil, J. L. Attayde, and I. A. S. Costa. 2008. Omnivory does not prevent trophic cascades in pelagic food webs. Freshwater Biology 53: 129-138.

ONU. 1998. Protocolo de Kyoto de la convención marco de las Naciones Unidas sobre el cambio climático. ONU.

Pace, M. L., J. J. Cole, S. R. Carpenter, and J. F. Kitchell. 1999. Trophic cascades revealed in diverse ecosystems. Trends in Ecology & Evolution 14: 483-488.

Pace, M. L. and others 2004. Whole-lake carbon-13 additions reveal terrestrial support of aquatic food webs. Nature 427: 240-243.

Panosso, R., J. L. Attayde, and D. Muehe. 1998. Morphometry of the Imboassica, Cabiúnas and Carapebus Lagoons: Implications for its functioning and management, p. 91-108. In F. A. Esteves [ed.], Ecology of coastal lagoons. NUPEM/UFRJ.

Petrucio, M. M., and F. A. R. Barbosa. 2004. Diel variations of phytoplankton and bacterioplankton production rates in four tropical lakes in the middle Rio Doce basin (southeastern Brazil). Hydrobiologia 513: 71-76.

Petrucio, M. M., F. A. R. Barbosa, and A. L. S. Furtado. 2006. Bacterioplankton and phytoplankton production in seven lakes in the Middle Rio Doce basin, south-east Brazil. Limnologica 36: 192-203.

Polis, G. A. 1999. Why are parts of the world green? Multiple factors control productivity and the distribution of biomass. Oikos 86: 3-15.

Prairie, Y. T., D. F. Bird, and J. J. Cole. 2002. The summer metabolic balance in the epilimnion of southeastern Quebec lakes. Limnology and Oceanography 47: 316-321.

Page 110: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

98

Raich, J. W., A. E. Russell, K. Kitayama, W. J. Parton, and P. M. Vitousek. 2006. Temperature influences carbon accumulation in moist tropical forests. Ecology 87: 76-87.

Raich, J. W., and W. H. Schlesinger. 1992. The Global Carbon-Dioxide Flux in Soil Respiration and Its Relationship to Vegetation and Climate. Tellus Series B-Chemical and Physical Meteorology 44: 81-99.

Ram, A. S. P., S. Nair, and D. Chandramohan. 2003. Seasonal shift in net ecosystem production in a tropical estuary. Limnology and Oceanography 48: 1601-1607.

Rantakari, M., and P. Kortelainen. 2005. Interannual variation and climatic regulation of the CO2 emission from large boreal lakes. Global Change Biology 11: 1368-1380.

Rastetter, E. B., S. S. Perakis, G. R. Shaver, and G. I. Agren. 2005. Terrestrial C sequestration at elevated-CO2 and temperature: The role of dissolved organic N loss. Ecological Applications 15: 71-86.

Raymond, P. A., N. F. Caraco, and J. J. Cole. 1997. Carbon dioxide concentration and atmospheric flux in the Hudson River. Estuaries 20: 381-390.

Raymond, P. A., and J. J. Cole. 2003. Increase in the export of alkalinity from North America's largest river. Science 301: 88-91.

Reche, I., and M. L. Pace. 2002. Linking dynamics of dissolved organic carbon in a forested lake with environmental factors. Biogeochemistry 61: 21-36.

Richey, J. E., J. M. Melack, A. K. Aufdenkampe, V. M. Ballester, and L. L. Hess. 2002. Outgassing from Amazonian rivers and wetlands as a large tropical source of atmospheric CO2. Nature 416: 617-620.

Riebesell, U., I. Zondervan, B. Rost, P. D. Tortell, R. E. Zeebe, and F. M. M. Morel. 2000. Reduced calcification of marine plankton in response to increased atmospheric CO2. Nature 407: 364-367.

Rignot, E., and P. Kanagaratnam. 2006. Changes in the velocity structure of the Greenland ice sheet. Science 311: 986-990.

Royer, D. L., R. A. Berner, and J. Park. 2007. Climate sensitivity constrained by CO2 concentrations over the past 420 million years. Nature 446: 530-532.

Sanders, R. W., D. A. Caron, and U. G. Berninger. 1992. Relationships between Bacteria and Heterotrophic Nanoplankton in Marine and Fresh Waters - an Inter-Ecosystem Comparison. Marine Ecology-Progress Series 86: 1-14.

Scheffer. 2004. Ecology of Shallow Lakes. Kluwer Academic Publishers. Schindler, D. E., S. R. Carpenter, J. J. Cole, J. F. Kitchell, and M. L. Pace. 1997. Influence of

food web structure on carbon exchange between lakes and the atmosphere. Science 277: 248-251.

Schindler, D. W. 1978. Factors Regulating Phytoplankton Production and Standing Crop in Worlds Freshwaters. Limnology and Oceanography 23: 478-486.

Schneider, S. H. 2001. Earth systems engineering and management. Nature 409: 417-+. Schwartz, M. W., L. R. Iverson, A. M. Prasad, S. N. Matthews, and R. J. O'connor. 2006.

Predicting extinctions as a result of climate change. Ecology 87: 1611-1615. Shaver, G. R. and others 2006. Carbon turnover in Alaskan tundra soils: effects of organic matter

quality, temperature, moisture and fertilizer. Journal of Ecology 94: 740-753. Siegenthaler, U., and J. L. Sarmiento. 1993. Atmospheric Carbon-Dioxide and the Ocean. Nature

365: 119-125. Simberloff, D. 2003. Communities and ecosystems impacts of single-species extinctions. In P.

Kareiva and S. A. Levin [eds.], The importance of species: Perspectives on expendability and triage. Princeton University Press.

Sobek, S., L. J. Tranvik, and J. J. Cole. 2005. Temperature independence of carbon dioxide supersaturation in global lakes. Global Biogeochemical Cycles 19 1-10.

Sobek, S., L. J. Tranvik, Y. T. Prairie, P. Kortelainen, and J. J. Cole. 2007. Patterns and regulation of dissolved organic carbon: An analysis of 7,500 widely distributed lakes. Limnology and Oceanography 52: 1208-1219.

Page 111: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

99

Staehr, P. A., and K. Sand-Jensen. 2007. Temporal dynamics and regulation of lake metabolism. Limnology and Oceanography 52: 108-120.

Stoddard, J. L. and others 1999. Regional trends in aquatic recovery from acidification in North America and Europe. Nature 401: 575-578.

Striegl, R. G., and C. M. Michmerhuizen. 1998. Hydrologic influence on methane and carbon dioxide dynamics at two north-central Minnesota lakes. Limnology and Oceanography 43: 1519-1529.

Stumm, W., and J. J. Morgan. 1996. Aquatic chemistry:chemical equilibria and rates in natural waters, 3 ed. Wiley-Interscience.

Suzuki, M. S., A. R. C. Ovalle, and E. A. Pereira. 1998. Effects of sand bar openings on some limnological variables in a hypertrophic tropical coastal lagoon of Brazil. Hydrobiologia 368: 111-122.

Thienemann, A. 1925. Die binnengewässer mitteleuropas. , p. 255. In A. Thienemann [ed.], Die binnengewässer.

Thurman, E. M. 1985. Organic Geochemistry of natural waters. Nijhoff/Junk. Timms, B. V. 1975. Morphometric Control of Variation in Annual Heat Budgets. Limnology and

Oceanography 20: 110-112. Townsend, S. A. 2006. Hydraulic phases, persistent stratification, and phytoplankton in a

tropical floodplain lake (Mary River, northern Australia). Hydrobiologia 556: 163-179. Tundisi, J. G. 1997. A note on the effect of rainfall in the process of stratification and stability in

the Rio Doce lakes, p. 79-82. In J. G. Tundisi and Y. Saijo [eds.], Limnological Studies on the Rio Doce Valley Lakes, Brazil. Brazilian Academy of Sciences.

Ver, L. M. B., F. T. Mackenzie, and A. Lerman. 1999. Biogeochemical responses of the carbon cycle to natural and human perturbations: Past, present, and future. American Journal of Science 299: 762-801.

Verburg, P., R. E. Hecky, and H. Kling. 2003. Ecological consequences of a century of warming in Lake Tanganyika. Science 301: 505-507.

Vitousek, P. M., H. A. Mooney, J. Lubchenco, and J. M. Melillo. 1997. Human domination of Earth's ecosystems. Science 277: 494-499.

Walter, K. M., S. A. Zimov, J. P. Chanton, D. Verbyla, and F. S. Chapin. 2006. Methane bubbling from Siberian thaw lakes as a positive feedback to climate warming. Nature 443: 71-75.

Wang, Y., R. Amundson, and S. Trumbore. 1999. The impact of land use change on C turnover in soils. Global Biogeochemical Cycles 13: 47-57.

Wanninkhof, R., and M. Knox. 1996. Chemical enhancement of CO2 exchange in natural waters. Limnology and Oceanography 41: 689-697.

Webster, P. J., G. J. Holland, J. A. Curry, and H. R. Chang. 2005. Changes in tropical cyclone number, duration, and intensity in a warming environment. Science 309: 1844-1846.

Weiss, R. F. 1974. Carbon dioxide in water and seawater: the solubility of a non-ideal gas. Marine Chemistry 2: 203-215.

Westerling, A. L., H. G. Hidalgo, D. R. Cayan, and T. W. Swetnam. 2006. Warming and earlier spring increase western US forest wildfire activity. Science 313: 940-943.

Wetzel, R. G. 1990. Land-water interfaces: Metabolic and limnological regulators. Vereinigung für Theoretische und Angewandte Limnologie 24: 6-24.

---. 2001. Limnology: lake and river ecosystems, 3 ed. Academic Press. Williamson, C. E., D. P. Morris, M. L. Pace, and A. G. Olson. 1999. Dissolved organic carbon

and nutrients as regulators of lake ecosystems: Resurrection of a more integrated paradigm. Limnology and Oceanography 44: 795-803.

Zar, J. H. 1996. Biostatistical analysis, 3 ed. Prentice Hall. Zink, K. G., A. L. S. Furtado, P. Casper, and L. Schwark. 2004. Organic matter composition in

the sediment of three Brazilian coastal lagoons - District of Macae, Rio de Janeiro (Brazil). Anais Da Academia Brasileira De Ciencias 76: 29-47.

Page 112: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta
Page 113: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

1

Page 114: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

Livros Grátis( http://www.livrosgratis.com.br )

Milhares de Livros para Download: Baixar livros de AdministraçãoBaixar livros de AgronomiaBaixar livros de ArquiteturaBaixar livros de ArtesBaixar livros de AstronomiaBaixar livros de Biologia GeralBaixar livros de Ciência da ComputaçãoBaixar livros de Ciência da InformaçãoBaixar livros de Ciência PolíticaBaixar livros de Ciências da SaúdeBaixar livros de ComunicaçãoBaixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNEBaixar livros de Defesa civilBaixar livros de DireitoBaixar livros de Direitos humanosBaixar livros de EconomiaBaixar livros de Economia DomésticaBaixar livros de EducaçãoBaixar livros de Educação - TrânsitoBaixar livros de Educação FísicaBaixar livros de Engenharia AeroespacialBaixar livros de FarmáciaBaixar livros de FilosofiaBaixar livros de FísicaBaixar livros de GeociênciasBaixar livros de GeografiaBaixar livros de HistóriaBaixar livros de Línguas

Page 115: Universidade Federal do Rio de Janeiro …livros01.livrosgratis.com.br/cp093619.pdfii Dióxido de carbono em lagos tropicais: De controles locais a padrões globais Humberto Marotta

Baixar livros de LiteraturaBaixar livros de Literatura de CordelBaixar livros de Literatura InfantilBaixar livros de MatemáticaBaixar livros de MedicinaBaixar livros de Medicina VeterináriaBaixar livros de Meio AmbienteBaixar livros de MeteorologiaBaixar Monografias e TCCBaixar livros MultidisciplinarBaixar livros de MúsicaBaixar livros de PsicologiaBaixar livros de QuímicaBaixar livros de Saúde ColetivaBaixar livros de Serviço SocialBaixar livros de SociologiaBaixar livros de TeologiaBaixar livros de TrabalhoBaixar livros de Turismo