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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

ALEXANDRE MEIRELLES MARTINS

O ENSINO DA LEITURA DO RITMO MUSICAL EM ADOLESCENTES: DA

AÇÃO À OPERAÇÃO.

CURITIBA

2014

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ALEXANDRE MEIRELLES MARTINS

O ENSINO DA LEITURA DO RITMO MUSICAL EM ADOLESCENTES: DA

AÇÃO À OPERAÇÃO.

Dissertação apresentada como requisito parcial à

obtenção do título de Mestre em Educação, Curso

de Pós-Graduação em Educação, Linha de Pesquisa

Cognição, Aprendizagem e Desenvolvimento

Humano, Setor de Educação, Universidade Federal

do Paraná.

Orientadora: Profª. Drª. Tania Stoltz

Co-orientadora: Profª. Drª. Valéria Lϋders

CURITIBA

2014

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Então, um professor disse: “Fala-nos do Ensino”. E ele disse:

“Nenhum homem poderá revelar-vos nada senão o que já

está meio adormecido na aurora do vosso entendimento. O mestre

que caminha à sombra do templo, rodeado de discípulos, não dá de

sua sabedoria, mas sim de sua fé e de sua ternura.

Se ele for verdadeiramente sábio, não vos convidará a entrar

na mansão de seu saber, mas antes vos conduzirá ao limiar de

vossa própria mente.

O astrônomo poderá falar-vos de sua compreensão do

espaço, mas não vos poderá dar sua compreensão.

O músico poderá cantar para vós o ritmo que existe em todo

o universo, mas não vos poderá dar o ouvido que capta a melodia,

nem a voz que a repete.

E o versado da ciência dos números poderá falar-vos do

mundo dos pesos e das medidas, mas não vos poderá levar até lá,

Porque a visão de um homem não empresta suas asas a

outro homem.

E assim como cada um de vós se mantém só no

conhecimento de Deus, assim cada um de vós deve ter sua própria

compreensão de Deus e sua própria interpretação das coisas da

terra”.

Gibran Khalil Gibran

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente, gostaria de agradecer a pessoa que mais me incentivou a

continuar a vida acadêmica e que acreditou no meu potencial, minha querida

professora Drª. Valéria Lϋders.

Quero agradecer especialmente minha orientadora Drª.Tania Stoltz, pela

paciência, pelos esclarecimentos, pela dedicação, pelas correções, pelas aulas

dadas a cada conversa sobre Jean Piaget, enfim muito obrigado por tudo, com

certeza você é uma orientadora exemplar, e um ser humano tremendo.

Também, gostaria de agradecer especialmente aos professores. Danilo Ramos

por abrir meus olhos para o mundo da cognição musical. Ao professor

Guilherme Romanelli pelas preciosas contribuições, a professora Beatriz Ilari

por ter me aceito no projeto de musicalização infantil da UFPR que marcou

profundamente minha vida como professor, a professora Tamara Valente pelo

seu olhar crítico e pelo seu exemplo em sala de aula, aprendi muito com você.

A Patrícia Kebach pelas suas contribuições piagetianas. Ao professor Luís

Borcheidt pela entrevista. Ao professor Fernando Becker, pelo seu profundo

conhecimento da teoria de Jean Piaget. A professora Araci Asinelli da Luz, a

Helga Loos Sant´Ana, e todos os professores do departamento de Educação

da UFPR.

Gostaria também de agradecer aos professores do departamento de Artes que

sempre admirei: Rosane Cardoso e Norton Dudeque.

Além disso, aos colegas: Adriano Elias, Anderson Zabroki, Caroline Caregnato

e Débora Bérgamo, pelas preciosas contribuições.

Muito obrigado Francesco pelas valiosas contribuições estatísticas.

Agradeço também a minha família que me ajuda todos os dias a ter um objetivo

maior, Mãe Marcia, Graci, Pedro e Gabi, amo vocês.

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Ao atingirmos um objetivo, sempre queremos atingir outro, e assim

é o processo Vida. Nela, ou você atinge o alvo final, ou você começa

outro processo. A Vida é o conjunto de processos, experiências, para se

atingir alvos.

Você aprende até o último instante. Cada vez que você aprende,

você cria ilusão para aprender mais. Nunca se para de aprender. Com

isso você ganha amor à Vida.

Se isso é uma verdade para você, você não pode parar. A felicidade

está em cada alvo que você alcança e nos processos que você percorre

para alcançar o alvo. Para haver felicidade, é preciso ter objetivo. Se você

não tem objetivo, você se queixa e se degenera. Cai na futilidade.

(...) O mecanismo filosófico do progresso são os objetivos em

processos consecutivos. Quando você começar a se deprimir, arranje um

objetivo. De repente, você esbarrará como o grande Objetivo. Ingressará

em um mundo novo!

Dr. Celso Charuri

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RESUMO

O objetivo desse estudo foi comparar duas formas de ensino da leitura rítmica em adolescentes de escola pública entre dezesseis e dezoito anos, sem ensino prévio de teoria musical. A hipótese desta dissertação aponta para a maior efetividade do ensino inspirado pela teoria de Jean Piaget, iniciando pela ação, passando pela representação mental irreversível e culminando na operação. O ensino no primeiro grupo iniciou-se pela teoria musical, ou seja, usando uma metodologia de ensino tradicional. No segundo grupo, as aulas foram inspiradas no método ativo em educação musical de Jaques-Dalcroze e iniciaram pela ação, ou seja, pela prática vivenciada, que respeita a sequência do desenvolvimento cognitivo dos participantes. Devido à entrada em vigor da lei 11. 769 em 2012, o conteúdo da música voltou a ser obrigatório nas aulas de educação artística no Ensino Fundamental e Médio da escola brasileira. Por isso, é relevante observar qual a melhor forma de ensinar o conteúdo da música, e em específico da leitura rítmica musical para adolescentes, considerando ser este fundamental para o domínio formal da música. Além disso, observa-se carência de pesquisas com referencial teórico piagetiano que versam sobre como ocorre a aprendizagem da música em adolescentes. A cognição musical (HALLAM, 2011; LEVITIN, 2011; SLOBODA, 2008) aponta para o viés metodológico tradicional, no qual o ensino da música pressupõe o desenvolvimento de habilidades cognitivas multimodais que devem ser treinadas por meio da repetição. Este estudo quantitativo e qualitativo usou a metodologia quase experimental para a coleta de dados, sem uso de grupo de controle. Foram realizadas intervenções pedagógicas e comparados dois grupos de alunos adolescentes totalizando 64 sujeitos. Foi realizado um pré-teste antes do experimento de ensino e em seguida foram ministradas três aulas em cada grupo, seguidas de dois pós-testes, sendo que o primeiro aconteceu logo na semana subsequente. O segundo pós-teste ocorreu 19 semanas depois para o grupo A, e 23 semanas depois do experimento para o grupo B. Os resultados referem-se à execução de leitura rítmica e à composição escrita. Em relação à execução rítmica, as notas do pós-teste 1 foram muito próximas nos dois grupos, a diferença foi inexpressiva, sendo que a média da nota da execução rítmica foi de 5,19 para o grupo A, e de 6,0 para o grupo B. Já a média final do grupo A foi de 7,27 e de 8,02 para o grupo B. Em relação às notas relativas à composição, não houve variação no pós-teste 1 e no pós-teste 2, nos dois grupos. No pós-teste 2, as notas da leitura rítmica diminuíram nos dois grupos. Porém, é no grupo A que a queda foi mais significativa, ou seja, a nota da execução foi para 2,04, e a nota final, que engloba composição escrita e execução, foi para 4,10. No grupo B as notas relativas à leitura rítmica diminuíram para 4,47 e a nota final para 6,45. Portanto, há indicativos de que a hipótese desta pesquisa de que o ensino do ritmo musical para iniciantes é facilitado quando é respeitada a sequência do desenvolvimento cognitivo, proposta por Jean Piaget, foi confirmada. O respeito à sequência do desenvolvimento cognitivo favorece as tomadas de consciência que tem na abstração reflexionante e no processo autorregulador de equilibração a possibilidade de desenvolvimento da compreensão a partir do significado. Palavras-Chave: cognição musical; ensino de leitura rítmica; Jean Piaget.

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ABSTRACT The purpose of this study is to compare two forms of teaching rhythm reading in

adolescents between sixteen and eighteen years old, without previous

knowledge of music theory, to verify the hypothesis this dissertation indicates

that is more effective teaching using Jean Piaget´s Genetic theory, in which

teaching most necessarily starts with action, going through the mental

representation and culminating in operation. In this way, teaching in its first

approach starts with music theory that means, using traditional methodology.

And the second starts with the action, that is experienced practice, inspired in

Jaques-Dalcroze´s active method of music education which respects cognitive

stages of participants. In 2012, because of the entry into force of the law

11.769, the content of music returned to be compulsory in art education classes

in the Brazilian elementary school and in high school. Therefore, it is important

to observe what the better way to teach the content of music is, specifically

rhythm reading, because most of those students never get in contact with this

filed of knowledge. Thus, there is a need of research with Piaget´s approach to

show how the learning process occurs in adolescents that supposedly are in the

level of operations. Music cognition (HALLAM, 2011; LEVITIN, 2011;

SLOBODA, 2008) shows that the traditional methodological bias in which music

education foresees the development of multimodal cognitive skills that must be

trained through repetition. This study used a quasi-experimental methodology

for data collection, as a pedagogical intervention which was performed and

compared two groups of students totaling 64 subjects divided into two, aged

between sixteen and eighteen, without using the control group. A pre-test

before the teaching experiment was conducted, then three classes were taught

followed by two post-tests, the first of which happened right during the week

following the lessons and the second occurred after 19 weeks for group A, and

23 weeks in group B, in fact to assess the robustness of each learning group.

The results showed that the grades of the post-test 1 were very similar in both

groups, the difference was negligible, and the average value of the rhythmic run

was 5.19 for group A, and 6.0 for group B. Already, the average final group A

was 7.27 for the final average and 8.02 for group B. In the post-test 2, the group

grades decreased in both groups. However, in group A the drop was more

significant; the grade of execution was 2.04 and 4.10 to the end. In group B the

grades on the rhythmic reading decreased to 4.47, and 6.45. Therefore, the

hypothesis of this research proposed by Jean Piaget in which teaching of

musical rhythm for beginners is facilitated when its sequence of cognitive

development is respected was confirmed. The observance of the sequence of

development supports the process of making those in the reflexive abstraction

and equilibration processes of self-regulation aware while granting them the

possibility to develop and understand it through its meaning.

Keywords: music cognition; teaching rhythmic reading; Jean Piaget.

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RÉSUMÉ

L´objectif de cette étude a été la comparaison de deux différentes approches d´enseignent de lecture rythmique à des adolescentes ayant entre seize et dix-huit ans qui n´avaient pas de connaissances théoriques musicales au préalable. L´hipothèse de cette dissertation signale être plus éfficace l´enseignement basé sur la théorie de Jean Piaget, qui comence para l´action, passe par la représentation mentale et aboutit aux opérations. Dans le premier groupe, l´enseignement a commencé para la théorie musicale, c´est-à-dire en utilisant une méthode traditionnelle. Dans le deuxième groupe, les cours ont été inspirés para la méthode active d´éducation musicale de Jacques-Dalcroze et a débuté para l´action, c´est-à-dire para la pratique vécue qui respecte la séquence cognitive du développement cognitif des participants. Dû à l´entrée en vigueur de la loi 11. 769 em 2012, le contenu de la musique est devenu obligatoire dans les classes d´éducation artistique de l´enseignement fondamental et au collège de l´école brésilienne. À cause de cela, il est important d´observer quelle est la meilleure forme d´enseigner le contenu de la musique, et spécifiquement de la lecture rythmique, si on considere celui-ci comme contenu formel important de la musique. De plus, on observe le manque de recherches concernant comment les adolescents apprennent qui ont comme référence théorique Jean Piaget. La cognition musicale (HALLAM, 2011; LEVITIN, 2011; SLOBODA, 2008) montre que l´approche métodologique traditionnelle soutient que l´enseignement de la musique suppose le développement de compétences cognitives multimodales qui doivent être travaillées à travers de l´entraînement et de la répétition. Cette étude quantitative e qualitative a employée la méthodologie pseudo-expérimentale pour la collecte des données, sans l´utilisation de groupe de contrôle. Les interventions pédagogiques realisées ont comparées deux groupes d´élèves adolescents sommant 64 sujets. Un prétest a été réalisé avant l´expériment d´enseignement, ensuite trois cours ont été donnés à chaque groupe suivis de deux post tests, dont le premier s´est déroulé la semaine suivante aux cours, Le deuxième post test a été réalisé 19 semaines après le premier post test pour le groupe A, et 23 semaines après pour le groupe B. Les résultats se réfèrent à la lecture rythmique et à la compositon écrite. En ce qui concerne la lecture rythmique, les notes du post test ont été très proches dans les deux groupes, la différence étant insignifiante vue que les notes moyennes de la lecture rythmique ont été de 5,19 pour le groupe A et de 6,0 pour le groupe B. Et la moyenne finale du groupe A, a été de 7,27 et de 8,02 pour le groupe B. Les notes concernant la composition n´ont pas eu de variation significative entre les post test 1 et 2. Par contre, au post test 2, les notes de la lecture rythmique ont diminuées dans les deux groupes. Toutefois, c´est dans le groupe A que la diminution a été plus significative, la note de la lecture a baissé jusqu´à 2,04 et la note finale qui est l´additon des notes de la lecture et de la composition, a diminué à 4,10. Dans le groupe B les notes de la lecture ont diminuées à 4,10 et la note final, atteint 6,45. Ainsi, avec ses différences, il y a des indicatifs qui confirment l´hipotèse de cette recherche que l´enseignement du rythme musical est facilité quand on respecte la séquence du développement cognitif proposé par Jean Piaget. Le respect du développement favorise les prises de conscience qui ont en l´abstraction reflexive et dans le processus auto-régulateur de l´équilibration la possibilité du développement de la compréhension à partir de la signification.

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Mots-clés: cognition musical, l´enseignement du rythme, Jean Piaget.

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LISTA DE FIGURAS, QUADROS E TABELA

FIGURA 1 - SUBDIVISÃO BINÁRIA DE VALORES.......................................162

FIGURA 2 - GRUPO A ALUNOS QUE TOCAM UM INSTRUMENTO...........173

FIGURA 3 - GRUPO B TOCAM INSTRUMENTOS........................................173

QUADRO 3 - PORCENTAGEM DOS ALUNOS DO GRUPO A QUE SABEM

LER PARTITURAS..........................................................................................174

QUADRO 4 - PORCENTAGEM DOS ALUNOS DO GRUPO B QUE SABEM

LER PARTITURAS..........................................................................................174

FIGURA 5 - PÓS-TESTE 1 GRUPO A............................................................175

FIGURA 6 - PÓS-TESTE 1 GRUPO B............................................................176

QUADRO 7 – PÓS-TESTE 1 DOS ALUNOS DO GRUPO A QUE NÃO TOCAM

INSTRUMENTOS............................................................................................177

QUADRO 8 – PÓS-TESTE 1 DOS ALUNOS DO GRUPO B QUE NÃO TOCAM

INSTRUMENTOS............................................................................................178

FIGURA 9 – PÓS-TESTE 2 GRUPO A...........................................................181

FIGURA 10 – PÓS-TESTE 2 GRUPO B.........................................................182

FIGURA 11 – RESULTADOS PÓS-TESTE 2 DOS ALUNOS QUE NÃO

TOCAM INSTRUMENTOS DO GRUPO A.....................................................184

FIGURA 12 – RESULTADOS PÓS-TESTE 2 DOS ALUNOS QUE NÃO

TOCAM INSTRUMENTOS DO GRUPO B......................................................184

GRÁFICO 13 – NOTA DA COMPOSIÇÃO INDIVIDUAL NO GRUPO A........186

GRÁFICO 14 – NOTA DA COMPOSIÇÃO INDIVIDUAL NO GRUPO B........187

GRÁFICO 15 – EXECUÇÃO INDIVIDUAL NO GRUPO A..............................189

GRÁFICO 16 – EXECUÇÃO INDIVIDUAL NO GRUPO B.............................190

GRAFICO 17 – NOTA FINAL DO DESEMPENHO INDIVIDUAL DO GRUPO A

........................................................................................................................192

GRAFICO 18 – NOTA FINAL DO DESEMPENHO INDIVIDUAL DO GRUPO B

........................................................................................................................193

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GRÁFICO 19 – RESULTADO FINAL DO GRUPO A......................................195

GRÁFICO 20 – RESULTADO FINAL GERAL DO GRUPO B.......................196

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO DO AUTOR ....................................................................... 17

1. INTRODUÇÃO ............................................................................................ 19

2. DA PSICOLOGIA COGNITIVA À COGNIÇÃO MUSICAL: UM OLHAR

NECESSÁRIO PARA A EDUCAÇÃO MUSICAL ........................................... 22

2.1. O QUE É MÚSICA? .............................................................................. 23

2.2. DA PSICOLOGIA PARA A COGNIÇÃO MUSICAL ............................... 25

2.3. O FUNCIONALISMO AMERICANO ...................................................... 27

2.4. GESTALT E BEHAVIORISMO ............................................................. 29

2.5. O DESENVOLVIMENTO DA PSICOLOGIA DA MÚSICA ..................... 30

2.6. A COGNIÇÃO MUSICAL NA ATUALIDADE ......................................... 32

2.7. CONTRIBUIÇÕES DA COGNIÇÃO MUSICAL PARA A EDUCAÇÃO .. 37

2.8. CONSIDERAÇÕES FINAIS DO SEGUNDO CAPÍTULO ...................... 44

3. COGNIÇÃO MUSICAL E EDUCAÇÃO MUSICAL: BUSCANDO

ALTERNATIVAS PARA O ENSINO DO RITMO ............................................ 46

3.1. O QUE É RITMO? ................................................................................ 47

3.2. A COGNIÇÃO MUSICAL E A PERCEPÇÃO DO RITMO ..................... 49

3.2.1. AS PESQUISAS SOBRE A PERCEPÇÃO DO RITMO MUSICAL . 53

3.3. A EDUCAÇÃO MUSICAL E O ENSINO DA LEITURA DO RITMO ....... 54

3.4. A LEITURA RÍTMICA ........................................................................... 56

4. OS MÉTODOS ATIVOS EM EDUCAÇÃO MUSICAL ................................. 60

4.1. JACQUES-DALCROZE SUPERANDO A DUALIDADE CORPO-

ESPÍRITO POR MEIO DA MÚSICA ............................................................ 62

4.2. A ORGIGEM MOTRIZ DO SIGNIFICADO RÍTMICO ............................ 64

4.3. APLICAÇÕES DO MÉTODO DALCROZE ............................................ 69

4.4. EDGAR WILLEMS ................................................................................ 71

4.5. WILLEMS E O ENSINO DO RITMO ..................................................... 73

5. JEAN PIAGET E O ENSINO MUSICAL: POSSIBILIDADES DE DIÁLOGO

........................................................................................................................ 76

5.1. O CONSTRUTIVISMO PIAGETIANO ................................................... 76

5.2. FATORES QUE INFLUENCIAM O DESENVOLVIMENTO COGNITIVO

.................................................................................................................... 78

5.3. O PROCESSO DE EQUILIBRAÇÃO .................................................... 80

5.3.1. A ASSIMILAÇÃO E A ACOMODAÇÃO .......................................... 81

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5.4. DESENVOLVIMENTO E APRENDIZAGEM ......................................... 85

5.5. OS ESTÁDIOS COGNITIVOS .............................................................. 88

5.5.1. O SENSÓRIO-MOTOR .................................................................. 88

5.5.2. O PRÉ-OPERATÓRIO ................................................................... 92

5.5.1. DA AÇÃO À OPERAÇÃO .............................................................103

5.5.2. A GÊNESE DAS OPERAÇÕES “CONCRETAS” ...........................104

5.5.3. AS NOÇÕES DE CONSERVAÇÃO ..............................................105

5.6. AS OPERAÇÕES CONCRETAS .........................................................105

5.7. OPERAÇÕES FORMAIS .....................................................................107

5.7.1. ATRASOS NO PENSAMENTO FORMAL .....................................110

5.8. OUTROS DOMÍNIOS DE CONHECIMENTO E O DESENVOLVIMENTO

COGNITIVO ...............................................................................................113

5.9. A EDUCAÇÃO ARTÍSTICA E A PSICOLOGIA DA CRIANÇA .............115

5.9.1. A TOMADA DE CONSCIÊNCIA ....................................................116

5.9.2. O FAZER E O COMPREENDER ..................................................120

5.9.3. A AÇÃO, PONTO DE PARTIDA PARA O DESENVOLVIMENTO

MUSICAL ................................................................................................123

6. PESQUISAS EM MÚSICA COM REFERENCIAL PIAGETIANO ...............126

6.1. OS ESTADIOS COGNITIVOS E A MÚSICA ........................................126

6.2. A CONSERVAÇÃO APLICADA À MÚSICA .........................................131

6.3. A ADAPTAÇÃO MUSICAL ..................................................................133

6.4. IMITAÇÃO E REPRESENTAÇÃO MUSICAL.......................................136

6.5. A CONSTRUÇÃO DA NOTAÇÃO MUSICAL .......................................138

6.6. ASPECTOS FIGURATIVOS E OPERATIVOS NA MÚSICA ................143

6.7. O DESENVOLVIMENTO DAS NOÇÕES DE TEMPO E ESPAÇO E

AFINS .........................................................................................................146

6.8. JOGOS, MOVIMENTO E DESENVOLVIMENTO MUSICAL ................148

6.9. MUSICALIZANDO ADULTOS .............................................................151

7. METODOLOGIA ........................................................................................154

7.1. DO CONTEXTO DE ESTUDO .............................................................157

7.2. PARTICIPANTES DO ESTUDO ..........................................................158

7.3. DA COLETA DE DADOS. ....................................................................158

7.4. O PRÉ-TESTE .....................................................................................159

7.5. CONTEÚDO DAS AULAS ...................................................................159

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7.6. MÉTODO DE ENSINO ........................................................................160

7.6.1.1. Aula um ..................................................................................160

7.6.1.2. Aula dois .................................................................................163

7.6.3. CONTEÚDO DAS ATIVIDADES DE ENSINO NA TURMA B: DA

AÇÃO À OPERAÇÃO .............................................................................164

7.5.3.1. Aula um ..................................................................................164

7.6.3.2. Aula dois .................................................................................166

7.6.4. AULA TRÊS: GRUPO A E B .........................................................167

7.7. OS PÓS-TESTES: GRUPOS A E B ....................................................169

7.7.1. PRIMEIRO PÓS-TESTE ...............................................................170

7.7.2 SEGUNDO PÓS-TESTE ................................................................171

8. RESULTADOS E DISCUSSÃO .................................................................172

8.1 O PRÉ-TESTE ......................................................................................172

8.2. PÓS-TESTE 1 .....................................................................................175

8.3. DISCUSSÃO PÓS-TESTE 1 ...............................................................179

8.4. PÓS-TESTE 2 .....................................................................................180

8.5. RESULTADOS DOS ALUNOS DO GRUPO A E B QUE NÃO TOCAVAM

UM INSTRUMENTO ...................................................................................183

8.6. DESEMPENHO INDIVIDUAL PÓS-TESTE 1 E 2 NOS GRUPOS A E B

...................................................................................................................185

8.7. RESULTADO GERAL DO PÓS-TESTE 1 E DO PÓS-TESTE 2 ..........195

9. CONCLUSÕES E ENCAMINHAMENTOS FUTUROS ...............................198

REFERÊNCIAS .............................................................................................205

APÊNDICE ....................................................................................................218

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APRESENTAÇÃO DO AUTOR

Meu nome é Alexandre Meirelles Martins e nasci em Curitiba no dia 11

de abril de 1978. Estudei até a quarta série primária no Brasil. Em seguida, por

razões familiares acabei me mudando para a cidade de Genebra na Suíça,

onde estudei até os vinte e um anos. Frequentei o ensino Fundamental (Cycle

d´orientation de l´Aubépine), o Ensino Médio (Collège Calvin) e iniciei a

Universidade (Université de Genève). A determinada altura acabei retornando

ao Brasil, pois o ensino na Europa é integral e não tinha recursos para

sobreviver, além dos provenientes do trabalho noturno.

De retorno ao Brasil, me graduei em 2004, em Relações Internacionais

pelas Faculdades Integradas Curitiba. Trabalhei alguns anos num comércio

familiar e tive um sério problema de saúde. Devido a isto, decidi mudar de vida

e voltar a estudar. Foi então que me dediquei a uma de minhas paixões: a

música. Assim, ingressei no curso de Licenciatura em Música na Universidade

Federal do Paraná no ano de 2008 para tornar-me professor. Uma profissão

que já exercia em Genebra desde os 16 anos como professor de capoeira.

Infelizmente, a realidade brasileira pouco favorece a profissão de

professor. É uma das profissões mais desvalorizadas do mercado de trabalho

brasileiro. Por essa razão, e porque adoro estudar decidi tornar-me professor

universitário, já que sempre me perguntei qual era a melhor maneira de

ensinar. Assim, deparei-me com os teóricos da Educação e o que mais me

convenceu por sua abordagem complexa e profunda, foi Jean Piaget.

Assim, em 2010, num momento em que ainda não havia ingressado no

mestrado, tive a oportunidade de retornar à Genebra onde participei como

ouvinte do 19° Jean Piaget Advanced Course nos arquivos Piaget. Nesta

ocasião, também tive a oportunidade de participar do curso de verão no

Instituto Jacques-Dalcroze. Por incrível que pareça estive doze anos em

Genebra e não conheci os trabalhos nem de Piaget nem de Jacques-Dalcroze.

Aliás, estudei por quatro anos no mesmo colégio que este último!

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Após o término da licenciatura em 2012, na qual as disciplinas de

Educação como: Psicologia da Educação, Didática, Prática Pedagógicas, entre

outras, foram as mais apreciadas, além do programa de extensão chamado

“Musicalização da UFPR,” que me marcou profundamente, e onde realmente

aprendi na prática a ser professor, decidi continuar a vida acadêmica. Além

disso, naquele projeto de extensão tive um contato mais próximo com os

métodos ativos em educação musical.

Em 2012 ingressei no mestrado em Educação com o propósito de

pesquisar qual era a melhor e mais eficiente forma de ensinar um conteúdo de

música. E lhes apresento os resultados nas páginas seguintes...

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1. INTRODUÇÃO

Este estudo intenta realizar a comparação entre o método tradicional de

ensinar o ritmo musical para adolescentes do ensino médio e um método ativo

inspirado na sequência do desenvolvimento cognitivo observada por Piaget.

Sabe-se que todas as culturas que passaram pela face da Terra tinham

música. De acordo com John A. Sloboda (2007) não se tem notícia de

nenhuma cultura sem música. As civilizações não letradas faziam uso de

canções e poemas ritmicamente organizados para facilitar a memorização dos

mesmos. Parece de fato que a proximidade da fala com a modulação do seu

tempo aliada aos movimentos corporais deram origem ao ritmo musical. E é o

ritmo, de acordo com este autor, a mola propulsora da música. Nesse sentido,

a música foi e é onipresente na sociedade contemporânea e suas funções

variam de uma sociedade para a outra.

O ritmo, segundo Bohomil Med (1996), é a combinação e organização

de diversos sons em “ordem e proporção” (p. 11). Este é um dos fundamentos

necessários para a leitura musical. Outra característica do som necessária para

ler música é a altura, e diz respeito à velocidade das vibrações. Dessa forma,

quanto mais rápida a vibração do som do objeto emissor, como uma corda de

violino, por exemplo, mais agudo será o som. Os nomes das notas musicais

estão atrelados à altura, ou seja, ao número de vibrações exercido pelo corpo

vibracional. Existem outros parâmetros do som como a intensidade e o timbre.

Porém, são secundários para a leitura musical básica.

Maria Trench de Oliveira Fonterrada (2008), por sua vez, afirma que no

ocidente o ensino da música, e, notadamente, da leitura musical, se

desenvolveu tardiamente, somente no início do século XII, com o surgimento

da notação musical desenvolvida por Guido d’Arezzo que teve como objetivo

unificar as práticas musicais da Igreja, possibilitando a substituição da

transmissão de conhecimento oral por um sistema universal que revolucionou a

música da época, e é usado praticamente tal qual até hoje.

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Durante o Renascimento, se desenvolveram os conservatórios, que

eram originalmente orfanatos, onde as crianças aprendiam música para se

tornarem músicos à serviço da Igreja. Mais tarde, nos séculos XVII e XVIII, os

conservatórios começaram a profissionalizar os músicos, mais não somente

para atender a Igreja. Porém, foi somente no século seguinte que as escolas

de música desenvolveram-se. No contexto pós-revolução industrial surgiram os

métodos ativos na educação musical, isto é, uma forma de ensinar música

enfatizando a prática musical antes do ensino da teoria. Já que antes, nos

conservatórios, se começava música aprendendo teoria para somente depois

aprender um instrumento (FONTERRADA, 2008).

A questão sobre quais são as melhores práticas para o ensino musical,

voltou à tona com promulgação da Lei nº 11.769 de 18 de agosto de 2008 que

alterou a Lei n° 9.394, de 20 de dezembro de 1996, da Lei de Diretrizes e

Bases da Educação, para assinalar a obrigatoriedade do ensino da música na

educação básica. Nesse sentido, pode-se citar a Lei 11.769: “§ 6o A música

deverá ser conteúdo obrigatório, mas não exclusivo, do componente curricular

de que trata o § 2o deste artigo” (Brasil, 1996). Assim, a presente Lei traz a

obrigatoriedade do conteúdo de música, porém o art. 2o do art. 62 da Lei

no 9.394 foi vetado que diz que “o ensino da música será ministrado por

professores com formação específica na área” (Brasil, 1996). Desse modo, não

há necessidade de professores especialistas atuarem na área.

Mesmo sem professores especialistas, o conteúdo da música voltou à

sala de aula brasileira. Nesse sentido, deve-se lembrar de que a música foi

retirada do currículo escolar em 1971, após a promulgação da Lei n.5692/71, a

qual substituiu a disciplina de música pela atividade de educação artística que

abrange três linguagens artísticas: artes plásticas, música e teatro.

Dependendo da formação do professor a ênfase era dada numa das disciplinas

da educação artística, e frequentemente a música era deixada de lado. Com a

entrada em vigor em 2012 da Lei nº 11.769 o conteúdo da música passa a ser

obrigatório. Por isso, a presente pesquisa justifica-se, já que é relevante

observar qual a melhor forma de ensinar música a adolescentes, pois muitos

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desses, nunca tiveram contato com o ensino formal deste domínio do

conhecimento.

Qual a melhor forma de ensinar música para adolescentes do ensino

médio da escola pública? E, em específico, qual a melhor forma de ensinar a

leitura rítmica? Nesse sentido, o que é mais efetivo usar, a metodologia

tradicional usada pelos conservatórios, escolas de música e até mesmo pelas

universidades que até hoje iniciam o ensino rítmico pela teoria musical seguida

da prática, ou começar este ensino respeitando o modelo de desenvolvimento

cognitivo de Jean Piaget, no qual o conhecimento deve necessariamente iniciar

pela ação, passar pela representação mental e culminar na operação?

Visando responder a estas indagações a presente pesquisa tem como

principal objetivo comparar por meio de procedimento quase experimental de

ensino essas duas abordagens. Tem-se com hipótese norteadora que o ensino

do ritmo musical para iniciantes na música é significativamente facilitado

quando respeitada a sequência do desenvolvimento cognitivo, mesmo em se

tratando de alunos adolescentes.

Para isto, o trabalho começa apresentando uma revisão do estado da

arte que versa sobre a cognição musical e sobre a educação musical (cap. 2).

Em seguida realiza-se uma revisão de pesquisas em cognição musical sobre o

ritmo, além de uma revisão sobre educação musical, apresentando assim,

especificamente as tendências educativas atuais relativas ao ensino da leitura

rítmica (cap. 3).

Dando sequência ao trabalho, apresentam-se os métodos ativos de

educação musical que serviram como base (principalmente o método de

Jacques-Dalcroze) para atividades de leitura rítmica (cap. 4). Em seguida,

aborda-se o referencial teórico piagetiano que pautou o experimento de ensino,

assim como toda a pesquisa (cap. 5). Além deste, apresentam-se alguns dos

principais trabalhos que utilizaram a teoria psicogenética de Jean Piaget na

música (cap. 6). Depois disto, fala-se sobre a metodologia adotada na pesquisa

(cap. 7). E, após os resultados e discussão (cap. 8), o trabalho volta-se às

principais conclusões e encaminhamentos futuros (cap. 9).

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2. DA PSICOLOGIA COGNITIVA À COGNIÇÃO MUSICAL: UM OLHAR

NECESSÁRIO PARA A EDUCAÇÃO MUSICAL

Os filósofos gregos consideravam a música uma ciência e uma arte que

proporcionava algo sublime e transcendental. A música revelava uma realidade

divina, pois podia desencadear conhecimentos e sentimentos. Nesse sentido, o

objeto da música estava na “harmonia como característica divina do universo”.

Como Nicolau Abbagnano (2000) destaca, foram os pitagóricos que

introduziram a ideia de Música como ciência da harmonia e de ordem divina.

Através dela é que se chegaria ao conhecimento, pois a harmonia musical tem

a mesma função da harmonia do cosmos. Porém, Platão (Rep., VII, 531 a)

argumenta que a música não consiste necessariamente na busca de novos

sons colocando “os ouvidos à frente do espírito”. Dessa forma, se deve buscar

entender quais sons levariam ao belo e ao bom e por quais razões alguns sons

são harmônicos e outros não. Portanto, a compreensão dos fenômenos

musicais percebidos pelos sentidos estava atrelada ao desenvolvimento do

“espírito”, ou seja, da mente.

Certamente que as indagações dos filósofos gregos sobre a Música

faziam sentido no seu tempo e ainda fazem, porém naquele tempo se tratava

de outra Música que tinha outras funções e era uma das disciplinas mais

importantes junto com a aritmética, a geometria e a astronomia. Porém, os

tempos mudaram, as ciências avançaram substancialmente, avanços

tecnológicos ocorreram, novas disciplinas surgiram e a música transita hoje em

outros domínios do conhecimento como das neurociências, da psicologia, entre

outros. Contudo, questionamentos relativos à música e à mente perduram,

ultrapassando o conhecimento circunscrito à filosofia.

Todavia, uma das principais influências da mudança de rumo das

pesquisas musicais foi a consolidação da disciplina da psicologia e

notadamente da psicologia cognitiva. De fato, entender os efeitos da música

sobre o homem sem compreender como a mente humana funciona não faz

sentido. Por isso, a música se aproximou naturalmente da psicologia, e alguns

questionamentos sobre música e cérebro começaram a ser pesquisados

cientificamente sob o olhar deste novo paradigma.

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2.1. O QUE É MÚSICA?

O primeiro passo a ser dado nesta dissertação é definir o que é música.

Segundo Bohumil Med (1996) música é “a arte de combinar os sons simultânea

e sucessivamente, com ordem, equilíbrio e proporção do tempo” (MED, 1996,

p. 11). Além disto, este autor aponta as principais características do som que

são altura, duração, intensidade e timbre. Nesse sentido, a altura do som diz

respeito à velocidade da frequência das vibrações. Isto significa que quanto

maior a altura, maior o número de vibrações e consequentemente o som será

mais agudo. Para os não músicos, um erro frequente é o de confundir a altura

com a intensidade que caracteriza a amplitude das vibrações sonoras

“determinada pela força ou pelo volume do agente que as produz” (ibidem, p.

11). O timbre é o que diferencia o som de acordo com seu emissor, por

exemplo, o som da voz de uma pessoa é diferente do som da voz de outra, ou

com instrumentos musicais diferentes. Ou seja, é a “cor” do som que é

derivada “da intensidade dos sons harmônicos que acompanham os sons

principais” (ibidem, p. 12). Já a duração, se relaciona com a extensão e o

tempo do som emitido.

Maura Penna (2010) define a música como “uma forma de arte que tem

como material básico o som”. Além disto, ela argumenta que esta forma de

linguagem artística é uma construção histórico-cultural. Assim, ela deixa claro

que a música como linguagem não se caracteriza como linguagem universal,

pode ser que seja um fenômeno universal, porém difere em cada cultura em

que se desenvolve, como salienta a autora:

Se a música fosse uma linguagem universal, seria sempre significativa para qualquer pessoa – isto é, qualquer música seria significativa para qualquer pessoa –, independentemente da cultura, e, desse modo, a estranheza em relação à música do outro não existiria (PENNA, 2010, p. 24).

Já o compositor e educador canadense R. Murray Schafer (1986) define

a música como sendo “uma organização de sons (ritmo, melodias, etc.) com a

intenção de ser ouvida” (p. 35). Nesse sentido, ele argumenta que as antigas

definições de música hoje em dia não cabem mais devido a expansão, entre

outros, dos horizontes musicais com o desenvolvimento de novos instrumentos,

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procedimentos aleatórios, música eletrônica, música concreta e nova estética

musical. Como aponta o autor: “hoje todos os sons pertencem a um campo

contínuo de possibilidades, situado dentro do domínio abrangente da música”

(SCHAFER, 1986, p. 121).

Por fim, o pesquisador Ian Cross (2001) argumenta que a música tem

características universais construídas de forma natural pelas sociedades

humanas. Nesse sentido, ele aponta diferentes caminhos na definição da

música, como som e movimento, a heterogeneidade dos significados musicais,

a interação social que dá significados para cada cultura. Assim ele define

música como: “Música pode ser definida como atividades humanas

temporalmente padronizadas humanas em âmbito individual e social que

envolvem a produção e percepção de sons e que não tem referencial

consensual fixo assim como eficácia evidente (CROSS, 2001, p. 4) 1.

Portanto, podem-se sintetizar estas diferentes definições de música para

chegar a um denominador comum que auxiliará a melhor compreender as

pesquisas em cognição musical que tratam da música. Nesse sentido, música

é uma organização de sons para serem ouvidos e em uma linguagem

socialmente construída. Apesar de ser uma manifestação artística universal,

sua linguagem varia de cultura a cultura. Por isso, as pesquisas realizadas no

campo da cognição musical tratam usualmente da música ocidental, como

ocorre com o objeto de estudo desta pesquisa.

Dessa forma, se faz necessário aqui um retrospecto histórico para

explicar como a psicologia influenciou e deu origem à psicologia da música, ou

seja, em outros termos, à cognição musical.

1 Music can be defined as those temporally patterned human activities, individual and social,

that involve the production and perception of sound and have no evident and immediate efficacy or fixed consensual reference.

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2.2. DA PSICOLOGIA PARA A COGNIÇÃO MUSICAL

Robert Gjerdingen (2002) coloca a psicologia da música como uma

subárea da psicologia, pois trata de questionamentos de como a mente

humana se relaciona com a música. Portanto, o desenvolvimento da cognição

musical está de certa forma atrelada ao desenvolvimento histórico da

psicologia. Dessa forma, teóricos da música como Jean Phillipe Rameau

(1683-1764), Hugo Riemann (1848-1919) e Abramo Basevi (1818-1885), entre

outros, usaram noções da literatura de psicologia para fundamentar relações

musicais, notadamente, da psicologia da música como é o caso dos conceitos

de “sensação” e “percepção”, como o autor salienta:

Para conciliar as técnicas expressivas de seu tempo com as tradições mais rígidas do passado, ele propôs dois princípios emprestados da literatura psicológica: "sensação" e "percepção" (p.5). Leis da percepção são aplicáveis aos tons em si e fora de um contexto musical particular. (GJERDINGEN, 2002, p. 957)

2.

Beatriz Ilari (2010), por sua vez, argumenta que o estudo da mente

humana foi tradicionalmente uma tarefa da Filosofia. Pensadores como

Aristóxeno (4 AC), Pitágoras (510-70 AC) já relacionavam a matemática

existente nas escalas musicais com as sensações proporcionadas por estas.

Ela também salienta que a partir do Renascimento com Francis Bacon (1561-

1626) a ideia de relacionar música e mente voltou à tona, como destaca a

autora:

(...) deixou de lado a ideia tradicional da música enquanto uma ciência de relações matemáticas e centrou-se no estudo da música enquanto forma de sensação, de transmissão de ideias e de comunicação de emoções (ILARI, 2004, p.19).

Outros questionamentos relevantes foram levantados anos mais tarde

com o pensador John Locke (1632-1704). Por exemplo, de como as imagens

podem ser associadas à audição, como a percepção musical se dá, como o

desenvolvimento da atenção ocorre, assim como a performance3 e a memória

2 To reconcile the expressive techniques of his day with the stricter traditions of the past, he proposed two principles borrowed from the psychological literature: “sensation” and “perception” (p. 5). Laws of perception are applicable to tones per se and outside a particular musical contexto. 3 Performance: diz respeito à execução musical. Como não existe tradução apropriada em

português usa-se normalmente a palavra em inglês.

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musical acontece. Estes questionamentos ainda inquietam e estimulam os

pesquisadores atuais, porém no passado pouco se pesquisou neste sentido

devido aos escassos conhecimentos relativos ao funcionamento do cérebro,

anatomia do ouvido e sobre acústica (ILARI, 2004).

Gjerdingen (2002) diz que no século XVIII, com os avanços da física e

da mecânica, que proporcionaram um melhor entendimento sobre as vibrações

sonoras, os pesquisadores fixaram-se em questões relativas ao gosto, sentido

e sensibilidade musical (Empfindsamkeit). Isto foi o alicerce para experimentos

sobre sensações (Empfindungen). Assim, foi somente na metade do século XIX

que experimentos controlados buscaram associar a mente musical ao corpo e

às sensações por ele sentidas.

O mesmo autor aponta a influência do teórico conhecido como o pai do

“positivismo” Auguste Comte (1798-1857) sobre o rumo das ciências nas

universidades europeias e notadamente nas universidades da Alemanha que

por sua vez não reconheciam a psicologia como disciplina, e muito menos a

psicologia da música. Nesse sentido, o autor argumenta que as questões

relativas à mente deveriam ser tratadas “por baixo” pela filosofia e por “cima”

pela fisiologia.

Neste contexto surge Wilhelm Wundt (1832-1920) 4. Seu laboratório foi

determinante para o estabelecimento da psicologia como ciência estrutural que

observou as estruturas do consciente, como salienta o autor:

Wundt tinha adotado a ideia amplamente difundida de que os nervos carregam "energias nervosas específicas" para o cérebro (1874). Cada sinal representa uma sensação única, e um inventário de todas essas sensações comporiam os elementos da consciência. Assim como o faz a tabela periódica catalogando os elementos da matéria. (GJERDINGEN, 2002, p. 959)

5.

Nesse sentido, Wundt foi determinante no estudo de como as sensações

são relacionadas com o cérebro e como estas afetam a consciência. Wundt

4 Wilhelm Wundt (1832-1920) filho de pastor luterano era fisiologista e professor de Filosofia

em Leipzig onde, em 1879, fundou supostamente o primeiro laboratório de pesquisas em psicologia de acordo com (GJERDINGEN, 2002). 5 Wundt had adopted the widely prevalent idea that individual nerves carry “specific nervous

energies” to the brain (1874). Each signal represents a unique sensation, and an inventory of all such sensations would catalogue the elements of consciousness, Just as the periodic table today catalogues the elements of matter.

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também influenciou o filósofo Franz Brentano (1838-1917) que era professor de

filosofia na universidade de Viena. Gjerdingen (2002, p. 959) aponta as ideias

de Brentano, como a de que os atos e processos sentidos são provenientes do

consciente. Suas ideias influenciaram alguns de seus famosos estudantes

como Edmund Husserl (1859-1938), Sigmund Freud (1856-1939), Christian

Von Ehrenfels (1859-1932) e Carl Stumpf (1856-1936). O autor salienta que

após a publicação de Tonpsychologie (1883), Stumpf alcançou prestígio e

sucesso fundando o instituto de psicologia de Berlin e tornando-se rival de

Wundt. A obra de Stumpf causou enorme polêmica e foi rebatida por Carl

Lorenz aluno de Wundt. Mais tarde, ideias apresentadas na obra de Ernst Kurth

(1846-1946) intitulada Musikpsychologie (1931) também tentaram refutar as

ideias de Stumpf e marcaram, como Ilari (2010) aponta, distinções entre

objetos de estudo. De um lado, o estudo das vibrações e das sensações

causadas pela música e de outro o “estudo da música como forma de

cognição” (p. 20).

2.3. O FUNCIONALISMO AMERICANO

Gjerdingen (2002) menciona que a psicologia estrutural alemã foi levada

para os Estados Unidos da América por psicólogos que foram treinados na

Alemanha como W. Van Dyke Bingham (1880-1952), James Angell (1869-

1949), William James (1842-1910), entre outros que foram discípulos de Hugo

Munsterberg (1863-1916) que, por sua vez, foi seguidor de Wundt. Porém,

estes transformaram a psicologia estrutural de Wundt dando ênfase à

interpretação funcional da psicologia. Isto é, como o autor aponta, o

funcionalismo americano privilegia os processos mentais ao invés do conteúdo

mental, buscando de certa forma dar utilidade à psicologia.

Carl Seashore (1866-1949) foi um dos mais importantes cientistas do

funcionalismo americano. Foi professor da Universidade de Yowa e autor da

monografia “Psicologia do talento musical”6 (1919) que se destinou a

6 Psychology of Musical Talent.

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estudantes de psicologia aplicada como Gjerdingen (2002) salienta. Seashore

foi o pesquisador responsável por implantar testes psicológicos que

mensuravam o “talento” musical.

Os testes de Seashore foram projetados para mensurar “capacidades ou habilidades para a audição de tons musicais" específicas e assim constituem um legado de Wundt de de Wundt de "energias específicas nervosas". Por exemplo, a diferença na melodia foi medida utilizando sons puros que "soaram com rapidez sucessivamente... O ouvinte tinha que dizer se o segundo som era mais agudo ou mais grave do que o primeiro. Assim, o problema foi reduzido à sua forma mais simples". Sons puros foram produzidos por conjuntos de diapasões de precisão, utilizados por instituições de pesquisa de elite. (GJERDINGEN, 2002, p. 965)

7.

Como salienta Gjerdingen (2002), Seashore resumiu seu trabalho no

laboratório de psicologia que culminou na publicação de “Psicologia da

Música”8 (1938) considerado como um marco para as ciências musicais,

notadamente por questionamentos sobre a mente musical. Suas contribuições

para a nova psicologia da música são notáveis, levando a música para o

laboratório, submetendo-a a procedimentos científicos, interpretando resultados

empíricos e avaliando aspectos educacionais da “mente musical”.

Porém, Fonterrada (2008) questiona vários pontos relativos à aplicação

do teste de “talento” musical elaborado por Seashore, como por exemplo, a

própria definição do termo que possibilitasse verificar se tal teste poderia ou

não avaliar o que se pretendia. Além disto, a autora considera que o teste de

Seashore adota procedimentos científicos quantitativos altamente positivistas

para mensurar algo que é qualitativo e extremamente subjetivo.

Assim, para a autora mensurar o “talento” musical é tarefa impossível, já

que a musicalidade engloba outras facetas relevantes como diferentes

habilidades e capacidades cognitivas que são tanto objetivas como subjetivas.

Nesse sentido, Seashore se fixou somente nas capacidades objetivas e

7 The Seashore tests were designed to mesure specific “capacities or abilities for the hearing of

music tones”, and thus constitute a legacy of Wundt’s inventory of “specific nervous energies.” For instance, pitch discrimination was measured by two pure tones “sounded in quick succession(... ). The listener is to tell whether the second tone was higher or lower than the first. Thus, the problem is reduced to its simplest form”. Pure tones had been produced by large sets of precision tuning forks, the preserve of elite research institutions. 8 Psychology of Music.

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mensuráveis deixando de lado o lado sensível da música, como relata

Fonterrada:

Na verdade, o que Carl Seashore propõe é investigar a acuidade auditiva do sujeito, o que contribui para a identificação do que ele chama “talento” musical, mas que não é seu único requisito. Na verdade, “medir” talento é uma tarefa impossível; a musicalidade comporta muitas características, objetivas e subjetivas, e um leque enorme de habilidades e capacidades mentais e expressivas. Em seu teste, Seashore elege, apenas, as objetivas, que podem ser medidas. Essas características dão conta de aferir a acuidade da audição de parâmetros sonoros isolados, para o que concorrem também outras capacidades, como atenção e concentração, mas desconsideram a possibilidade de avaliar a sensibilidade do sujeito aos sons, ou sua maneira de “fazer música” (FONTERRADA, 2008, p. 97).

Contudo, Seashore trouxe contribuições significativas para as futuras

pesquisas no campo da psicologia da música. Cabe salientar aqui, que ele foi

um dos pioneiros a utilizar a psicologia experimental trazendo a ciência

positivista para perto da música. Gjerdingen (2002) aponta algumas

importantes contribuições de Seashore para o domínio científico da psicologia

da música, como, por exemplo, levantou possíveis paralelos entre música e a

linguagem, fundou as bases para avaliar o “talento” musical, nos deu a

psicologia da música, assim como estabeleceu métodos para o

desenvolvimento da estética musical, entre outros.

2.4. GESTALT E BEHAVIORISMO

De acordo com Ilari (2010) os trabalhos de Seashore trouxeram

significativos avanços para a área da psicologia da música, e notadamente,

serviram de base para o estabelecimento de uma nova tendência no estudo da

mente, ou seja, o estudo das partes e do todo contemplados pela psicologia da

Gestalt de Max Wertheimer (1934-1994), Wolfgang Kohler (1887-1967) e Kurt

Koffka (1886-1941). De acordo com Gjerdingen (2002), estes foram alunos de

Stumpf, reconhecidos pelo rigor científico estabelecido em seus experimentos.

Como o autor salienta com o advento da Segunda Guerra Mundial estes

autores foram para a América onde continuaram suas pesquisas. Cabe

salientar que o foco da primeira geração de teóricos da Gestalt não foi

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necessariamente a música, e com o trabalho de um discípulo de Wertheimer,

Rudolf Arnheim (1904-2007), o foco se deslocou para as artes visuais.

Apesar de o som da campainha do russo Ivan Pavlov (1849-1936) ter

sido o gatilho do desenvolvimento do estímulo-resposta presente no

behaviorismo de Burrhus Skinner (1904-1990), a música teve pouco espaço no

paradigma behaviorista, como Gjerdingen (2002, p. 969) aponta. Talvez

porque, como Ilari (2010) salienta, a música envolva aspectos que não

condizem com as ideias do behaviorismo, como alguns aspectos cognitivos da

mente “temas como a introspecção, o pensamento e outros atributos da mente,

a criatividade, a beleza e a imagética” (ILARI, 2010, p. 21). Dessa forma,

poucos behavioristas se aventuraram em pesquisas sobre a mente musical.

Por sua vez, Gjerdingen (2002) diz que mesmo durante o apogeu do

behaviorismo, alguns pesquisadores como Edward Tolman (1886-1959)

demonstraram que os ratos de laboratórios faziam mais do que responder a

estímulos isolados quando aparentemente subtraiam informações do meio; que

parecia ser um processo análogo ao pensamento. George Miller (1920) mais

tarde mostrou como o cérebro processa de forma inata informações na

memória. Ulric Neisser (1966), por sua vez, argumenta que a psicologia

cognitiva surgiu para substituir o paradigma behaviorista, pois traz questões de

como a mente funciona de forma mais específica, pautando-se em

experimentos, estatísticas e interpretações.

2.5. O DESENVOLVIMENTO DA PSICOLOGIA DA MÚSICA

Ilari (2010) argumenta que Miller nomeou de revolução cognitiva as

mudanças que ocorreram na década de 50, com o nascimento das ciências

cognitivas, como, por exemplo, as neurociências, e a computação, e com a

fixação e valorização de áreas de conhecimento como a antropologia, a

psicologia e a linguística. Nesse sentido, o pensamento de Jean Piaget (1896-

1980) sobre como as crianças aprendem, as ideais de Noam Choamsky (1928)

sobre a linguagem e as descobertas sobre neurônios e inteligência artificial

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fizeram com que o conceito de mente fosse visto como um sistema complexo

“(o hardware) com adaptações específicas ao contexto (o software), que

precisava de esforços interdisciplinares para ser investigado” (p. 24), e

certamente modificaram os rumos da nova psicologia da música.

Gjerdingen (2002) também destaca que os livros Emoção e significado

na música9, de 1956, de Leonard Meyer e o A percepção da música10, de 1957

de Robert Francès, e As estruturas rítmicas11 (1956) de Paul Fraisse (1911-

1996) influenciaram os pesquisadores da década de 60, fazendo com que as

pesquisas nesse campo se focassem na percepção de padrões em melodias

como, por exemplo, o de Diana Deutsch (1938) que pesquisou sobre melodias

musicais e memória. Posteriormente, ela também contribui publicando o

importante livro Psicologia da Música12 (1982) e fundou o periódico Percepção

musical13. Gjerdingen (2002) também salienta que W. Jay Dowling (1941)

contribuiu com a psicologia da música com sua publicação Cognição musical14

(1986).

Ilari (2010) afirma que nas décadas de 80 e 90 aconteceu notável

avanço na área da psicologia da música, com a publicação de obras de

referência como, por exemplo, Uma teoria gerativa da música15 de Fred Lerdahl

e Ray Jackendoff (1983); A psicologia desenvolvimental da música16 de David

J. Hargreaves (1984), A mente musical17 de Sloboda (1983), entre outros. Ela

também salienta a importância dos periódicos sobre psicologia da música,

como Psicologia da Música18 (1972) pelos ingleses e os periódicos americanos

Psicomusicologia19 (1983-2001) e Percepção musical20 (1983).

9 Emotion and meaning in music.

10 La perception de la musique.

11 Les structures rythmiques.

12 Psychology of Music.

13 Music Perception.

14 Music Cognition.

15 A generative theory of tonal music.

16 The developmental psychology of music.

17 The musical mind.

18 Psychology of Music.

19 Psicologia e musicologia.

20 Music Perception.

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2.6. A COGNIÇÃO MUSICAL NA ATUALIDADE

Cognição vem do termo latim cognoscere que significa “pensar,” como

Marothy (2000) aponta. Nesse sentido, a cognição musical envolve o estudo de

como o cérebro humano estabelece conceitos, se relaciona com a música, e

especificamente com suas formulações verbais. Esse autor sugere que a

cognição musical envolve a integração de diversas áreas do conhecimento, já

que a música é uma experiência estética que envolve nossos sentidos e

proporciona um “sentir”. Assim, ele argumenta que sentir não é

necessariamente o oposto de pensar. Por esse motivo, o estudo da cognição

musical é um processo complexo que envolve diversas áreas do conhecimento

como a psicologia cognitiva, neurobiologia, musicologia, entre outros.

Day (2004) salienta que a cognição musical busca entender como a

experiência musical se dá tanto no sentido psicológico como no fisiológico já

que, por exemplo, duas pessoas que assistiram ao mesmo concerto terão

impressões tão diferentes a respeito deste que se pode duvidar se assistiram

ao mesmo evento. Ele também sustenta que a cognição observa a experiência

musical como algo percebido, ou seja, passa necessariamente pelo aparato

sensorial.

Porém, o autor destaca que a cognição musical não envolve somente os

processos mentais relativos à escuta musical, mas também abarca outros

aspectos como a memória musical, os estudos sobre preferências musicais,

entre outros, que contemplam áreas como a teoria musical, as neurociências e

a psicologia cognitiva, o que implica numa grande interdisciplinaridade. Assim,

a cognição musical lida com os processos mentais adjacentes das experiências

musicais como, por exemplo, a improvisação, composição, e performance e

traz questionamentos relevantes a respeito da mesma.

Day (2004) também argumenta sobre o recém-delineamento da

cognição musical como disciplina, que apesar de ter suas raízes teóricas na

psicologia do séc. XIX se formou nas últimas décadas com a fundação da

Sociedade para a cognição e percepção musical21 e com o lançamento do

21

Society for Music Perception and Cognition.

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periódico Percepção Musical22, ambos em 1983. O autor também destaca que

a primeira conferência internacional sobre cognição e percepção musical

aconteceu somente em 1990.

Daniel Levitin (2006) concorda com os autores acima e aponta para as

recentes pesquisas em percepção e cognição musical buscam responder a

questões tais como, o que faz com que uma pessoa escute uma peça musical

de uma forma e outra, que escutou a mesma obra, aparenta ter escutado algo

completamente diferente. Porque algumas pessoas dão tanta importância para

a música e outras não? Enfim, muitos questionamentos sobre a cognição

musical estão sendo feitos e o autor também destaca a interdisciplinaridade

desse domínio do conhecimento. Assim, a cognição musical dialoga com

outras áreas como a psicologia cognitiva, as neurociências, a computação, a

educação, entre outros. Citando Levitin:

Se todos nós ouvimos as coisas da mesma maneira, fica difícil compreender por que a Madonna de uma pessoa é o Mozart da outra. Contudo, se cada um de nós ouve as coisas de maneira diferente, como explicar o porquê de certas peças musicais serem populares para quase todas as pessoas? Por que é que algumas pessoas na nossa cultura são movidas pela música e outras não? Para algumas, um dia sem música é impensável; a música as acompanha quando acordam, tomam banho e comem, no carro a caminho do trabalho, e como uma espécie de fundo acústico enquanto trabalham. A música também cria um clima para os encontros românticos, e dá energia aos exercícios físicos. A música é usada em épocas de guerra para incentivar a solidariedade patriótica e para sincronizar a infantaria, nos momentos de tristeza como consolação, desde solenes até os de júbilo. O status único da música na vida do ser humano é marcado por sua onipresença e antiguidade (LEVITIN, 2006, p. 25).

Ilari (2010) salienta que as definições em torno da cognição musical

ainda estão num processo de construção, por isso existem diferenças

conceituais que “estão longe de serem consensuais,” já que diferentes áreas

do conhecimento contribuem para o desenvolvimento da mesma. Também, ela

destaca que a partir da década de 1980 o termo psicologia da música foi

substituído pelo termo cognição musical “sobretudo em estudos referentes ao

processamento de informações musicais pelo adulto com audição típica” (p.

27). Assim, ela argumenta sobre esta mudança de nomenclatura que o teórico

22

Music Perception.

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Gjerdingen aponta, devido à relação de diferentes “subáreas” da psicologia que

se aproximam da música, como é o caso da musicoterapia, a psicologia social,

a psicologia das emoções, a psicologia da educação, entre outros. Contudo,

Levitin (no prelo) define a psicologia da música de forma diversa. Para ele os

focos das pesquisas desta disciplina estão nas operações mentais, como, as

que ocorrem durante uma audição, práticas musicais, na composição e durante

a dança (provocada pela música).

Assim, a psicologia da música tem como base outras disciplinas da

psicologia, isto é, da psicologia cognitiva, psicologia aplicada, psicologia social,

psicologia do desenvolvimento humano, entre outras, assim como o

conhecimento das ciências cognitivas, “da música e das pesquisas musicais

realizadas pelas ciências da vida, ciências sociais e outras humanidades” (no

prelo). Dessa forma, a cognição musical, para este autor, é uma subárea da

psicologia da música e não significa de forma alguma ser sinônimo da mesma,

pois trata com abordagem experimental controlada como o sujeito percebe,

interpreta e se recorda da música.

Além disto, o autor destaca o crescimento atual da psicologia da música

com o aumento substancial das pesquisas que chegaram ao número de 700

publicações no ano de 2006. Levitin (no prelo) atribui este crescimento à

interdisciplinaridade crescente entre as disciplinas acadêmicas, ao movimento

de valorização da psicologia cognitiva nos anos 60, e ao desenvolvimento de

novas tecnologias que facilitam a manipulação do som. Dessa forma, o autor

aponta as principais linhas de pesquisa da psicologia da música, sendo a

cognição musical uma das linhas da psicologia da música. Citando o autor

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As linhas principais de pesquisa incluem : (1) percepção e cognição (por exemplo, os limites da percepção humana, as menores diferenças melódicas perceptíveis de altura, intensidade, etc; memória para os atributos musicais como melodia, ritmo, timbre, etc; atenção e organização perceptiva incluindo a junção/separação de vozes e instrumentos), (2) desenvolvimento (mudança de como os comportamentos musicais mudam ao longo da vida), (3) execução, planejamento do desenvolvimento motor, e aquisição de altos níveis de execução musical, (4) avaliação das habilidades musicais; (5) o papel da música no cotidiano, (6) desordens no processamento musical, (7) estudos apontando semelhanças e diferenças culturais, (8) o impacto da música em domínios não musicais, (9) educação (a melhor forma de ensinar música), e (10) bases psicológicas e evolucionárias da música. (LEVITIN, no prelo)

23.

Levitin (no prelo) também argumenta que os pesquisadores da área

estão se voltando para questões relativas às emoções provindas da audição

musical, assim como comparam a música com a linguagem, e também, devido

aos avanços tecnológicos em neuroimagens, se voltam para a observação de

como a música se processa no cérebro. Contudo, o autor salienta que a

errônea vinculação nos meios de comunicação de que a escuta passiva de

música clássica, especificamente a de Mozart, aumentaria a inteligência é

exagerada. Ele também destaca que pesquisas demonstram efeitos

extramusicais da audição, por exemplo, o de diminuir a dor e o estresse em

pacientes, devido ao fato de a música distrair e aumentar os níveis de

endorfina e dopamina aumentando assim a sensação de bem estar e o

sentimento de inclusão social.

Outro ponto que Levitin (no prelo) destaca é que as pesquisas

neurológicas relativas à percepção e à cognição musical são recentes e ainda

trazem muitos questionamentos. Ele também destaca que muitas questões

levantadas notadamente pelos teóricos da Gestalt de como melodias

transpostas para outras tonalidades são reconhecidas continuam ainda sem

solução. Assim como, da conservação do andamento, apesar de haver em

certas músicas diferentes dinâmicas, outro ponto é a questão de como o ser

humano consegue separar e escutar as diferentes vozes presentes na música, 23 Prominent lines of research include: (1) perception and cognition (e.g. perceptual thresholds – the

smallest perceptible differences in pitch, loudness, etc.; memory for musical attributes such as melody, rhythm, timbre, etc.; attention and perceptual organization including fusion/separation of voices and instruments); (2) development (how music behaviors change across the life-span), (3) performance, motor planning, and the attainment of expertise, (4) assessment and predictors of musical ability; (5) the role of music in everyday life, (6) disorders of music processing, (7) crosscultural similarities and differences, (8) the impacto of music training on nonmusical domains, (9) education (how best to teach music), and (10) the biological and evolutionary basis of music.

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e também de como se criam e se resolvem expectativas proporcionadas pela

música; estas questões dentre muitas outras ainda permanecem obscuras.

Apesar disso, Maróthy (2000) faz uma ressalva em relação à psicologia

experimental aplicada à música, pois o fato de procurar recriar em laboratório

situações da vida real de forma artificial pode reduzir algo que é complexo

como a música. Nesse sentido, ele argumenta sobre a diferença entre os

psicólogos que veem os seres humanos como “meros receptores” e alguns

pesquisadores que reduzem por sua vez a complexidade da música para poder

isolar variáveis e acabam negligenciando aspectos importantes da mesma.

Como destaca o autor:

Pior do que isso, os sujeitos estão sendo examinados em contextos experimentais, ao invés de situações realmente musicais, as relações entre os sons que estão sendo apresentadas aos sujeitos são semelhantes a exemplos de uma lição de solfejo. Qualidades por trás da “melodia” estão sendo negligênciadas, sons de piano, tons senoidais ou outros como, na melhor das hipóteses, sons sintéticos de baixa qualidade são suficientes. Perguntas como “você considera isso como um acorde de dó ou ré” são típicas. (MARÓTHY, 2000,

p.120) 24

.

Maróthy (2000) enfatiza que a música é resultado de ondas de vibrações

que se propagam no ar, por isso, antes de ser observada a música precisa ser

produzida. Nesse sentido, ele coloca que os sons precisam ser produzidos de

forma regular e sincronizada para serem percebidos, assim como são

sincronizados os impulsos dos neurônios nos seres humanos. Desse modo, a

percepção musical de um ouvinte é mais intensa se o sujeito estiver

sincronizado com a fonte produtora do som.

Ele também aponta para as sensações advindas da música que não se

restringem às sensações mentais, mas também são fruto da cadeia neural que

envolve o corpo “como um todo” durante as atividades musicais. Portanto,

perceber e fazer música desencadeia, conforme o autor sugere, uma

sincronização rítmica que atinge o corpo na sua totalidade. Fracionar o

24

Worse than that, subjects are examinated in experimental rather than really musical situations, sound relations being presented to them in examples similar to a lesson of solfeggio. Qualities beyong “pitch” being neglected, piano sounds or even sine tones or else, in the Best case, low dimension are synthetic sounds suffice. Questions like “Do you regard this tone as a C sharp or a D?” are typical.

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fenômeno musical é de certa forma para este autor sinônimo de retirar o viés

artístico da música. Nesse sentido, ele sugere que pesquisas em cognição

musical levem em conta a complexidade do que se mensura, por exemplo, com

neuroimagens “Gravações da atividade do cérebro (EEG), tensão muscular

(EMG), respiração, plestimogramas de dedos e resposta galvânica da pele

(GSR) durante a audição musical” (MAROTY, 2000, p. 122) 25.

No Brasil, as pesquisas em cognição musical seguem a tendência

mundial de crescimento, porém, em proporções bem menores. Existem

atualmente 10 grupos de pesquisa registrados no CNPQ, dos quais mais da

metade foram formados entre 2010 e 2011. Aliás, a Associação Brasileira de

Cognição & Artes Musicais foi formalizada em meados de 2006. Esta promove

o Simpósio de Cognição e Artes Musicais (SIMCAM), que está atualmente na

sua nona edição, e contribui também para a promoção e o fortalecimento da

área.

Contudo, Ilari (2010) ressalta que a disciplina da cognição musical ainda

carece de literatura especializada no Brasil. Poucas obras de referência como

as citadas nesse artigo foram traduzidas para o português. Esta, entre outras

dificuldades como o financiamento das pesquisas, a falta de equipamentos de

última geração, entre outros, assolam os pesquisadores brasileiros.

2.7. CONTRIBUIÇÕES DA COGNIÇÃO MUSICAL PARA A EDUCAÇÃO

Para David J. Hargreaves (1986) o termo cognição musical diz respeito à

percepção musical, a linguagem musical, o pensar e memorizar a música, a

atenção, as habilidades musicais e o aprendizado musical. Nesse sentido,

deve-se destacar que para este autor habilidades e aprendizado, apesar de

serem termos próximos, são diferentes. A ênfase da cognição musical está nas

operações mentais internalizadas, ou seja, nas representações mentais dos

25

(…) recordings of the activity of the brain (EEG), muscle tension (EMG), breathing, finger oscillogramme and galvanic skin response (GSR) while listening to music.

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sujeitos que planejam comportamentos sequenciados em suas mentes, o que

evidencia de certa forma a aproximação com a educação.

Ele aponta também que algumas pesquisas focaram-se em questões

sobre o desenvolvimento musical em crianças. Nesse sentido, Miller (1983) se

focou em pesquisar como ocorre o desenvolvimento da memória, do

pensamento lógico, da resolução de problemas, e de como as crianças

representam informações. Assim, o desenvolvimento é sinônimo de

aprendizado e é colocado por ele como a aquisição de habilidades “O

desenvolvimento é concebido, de acordo com este ponto de vista, na aquisição

de habilidades cognitivas específicas, e também no aumento da capacidade de

processá-las” 26 (HARGREAVES, 1986, p. 17).

John A. Sloboda (2008) concorda com Hargreaves no que tange à

aquisição de habilidades musicais, e argumenta também que é preciso

aproximar a música da psicologia cognitiva, pois “a maioria de nossas

respostas à música são aprendidas” (SLOBODA, 2008, p. 6). Nesse sentido, se

a música emociona, ela passa necessariamente por um “estádio cognitivo que

envolve a formação de uma representação interna, simbólica ou abstrata da

música” (ibidem, p. 3) e é socialmente apreendida. Dessa forma, a cultura tem

papel preponderante no desenvolvimento de habilidades musicais.

Assim, esse autor salienta que o processo de aprendizagem é

caracterizado pela forma como representamos a música em nossas mentes, e

se dá primeiramente por meio da enculturação27 durante a infância e

posteriormente pela aquisição e treinamento de habilidades específicas.

Citando Sloboda:

26

Development is conceived, from this point of view, in terms of the acquisition of particular cognitive skills, and of increases in the capacity and rate of processing. 27

A enculturação é fruto da exposição das crianças aos meios socioculturais e constitui uma

forma primária de aprendizado inconsciente de determinados aspectos da música.

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A primeira é a enculturação desenvolvimentista, isto é, aquele aprendizado que resulta de nossa exposição durante a infância aos produtos musicais comuns de nossa cultura, juntamente com a aquisição de habilidades simples, tais como a habilidade de reproduzir canções curtas. De maneira geral, o conhecimento adquirido nesta fase não resulta de uma aprendizagem ou de um esforço autoconscientes. Ao contrário, as crianças simplesmente adquirem conhecimentos através de suas experiências sociais no dia-a-dia. Em consequência disso, tal conhecimento tende a ser universal em uma determinada cultura, e constitui a base sobre a qual outras habilidades especializadas serão construídas. A segunda fase é a aquisição de habilidades específicas através do treinamento. Estas habilidades não são universais em uma determinada cultura; são aquelas que transformam os cidadãos comuns em “músicos” (SLOBODA, 2008, p. 10).

Além disto, ele destaca que na fase do aprendizado informal por meio da

enculturação não há esforço autoconsciente por parte das crianças, exceto se

estas estejam envolvidas em situações de aprendizado formal de música.

Mesmo assim, as crianças memorizam canções sem que haja

necessariamente a vontade de que memorizem. No que tange à segunda fase,

que diz respeito à aquisição e ao desenvolvimento de habilidades musicais

através do treino, fica claro que o esforço autoconsciente está presente, além

do uso de métodos adequados de ensino que motivem e sejam mais eficazes

para cada pessoa. Por isso, a compreensão dos processos psicológicos

envolvidos na aprendizagem é fundamental para que não se estabeleçam

receitas infalíveis de ensino e é preferível que o professor “faça uso de seus

próprios métodos, adequando-os às situações e aos alunos com quem

trabalha” (p. 261) para ter êxito.

Hargreaves (2003) destaca o poder que a música tem de influenciar as

pessoas, notadamente no campo da educação, como com o uso consciente de

determinadas canções para mudar estados emocionais de adolescentes do

ensino médio. Os comportamentos musicais são, para este autor, construções

socioculturais e envolvem diferentes níveis como as diferenças individuais que

abarcam o gênero, idade e personalidade, assim as interações interpessoais

que influenciam os gostos e preferências das crianças, também, o nível

institucional presente nos lares, nas escolas, na comunidade e nas

organizações musicais, e, por fim, o nível cultural presente principalmente na

mídia, e nas tradições culturais nacionais e regionais.

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Todavia, ele aponta a mudança de paradigma na educação que deve

levar em conta aspectos físicos e sociais para o desenvolvimento de

conhecimentos, e sugere que o referencial piagetiano deve ser substituído pelo

vygotskiano, pois se aprende música na interação entre pares, nos âmbitos

descritos acima, ou na relação professor/aluno, já para este autor, a teoria dos

estádios cognitivos de Piaget apesar de ser útil para saber o que as crianças

são capazes de aprender de acordo com sua faixa etária, não tem nada de

social.

Hargreaves (2003) sugere que a psicologia da música nunca esteve tão

próxima da educação musical, pois o desenvolvimento da educação musical

passa pelo desenvolvimento sociocultural que está interligado com a psicologia

social, como salienta o autor:

A incorporação da perspectiva social, cultural em música e psicologia é acompanhada pelo reconhecimento do amplo contexto social e cultural em educação musical, tal como a psicologia social, da música e da educação musical que tem bases sólidas. (HARGREAVES, 2003, p. 161)

28.

No entanto, cabe aqui relembrar que a posição de Jean Piaget difere

substancialmente da apontada por Hargreaves (2003). O desenvolvimento

mental para Piaget (2003) engloba diversos fatores como: a maturação, ou

seja, o crescimento orgânico do sujeito, a experiência adquirida na interação

com objetos, nas “interações e transmissões sociais” (Piaget, 2003, p. 138) e

por fim, o processo de equilibração29. Também, este autor destaca que as

interações sociais, afetividade e os processos cognitivos são indissociáveis.

Assim, a afetividade é o combustível da interação social que por sua vez pode

28

The incorporation of the social cultural perspective in music and music psychology is matched

by the acknowledgment of the broader social and cultural context in music education, such that

a developmental social psychology of music and music education has some firm conceptual

foundations.

29 Segundo Piaget o mecanismo de equilibração é constituído pelos processos de assimilação

e acomodação. Conceitos estes inspirados na Biologia. O sujeito assimila, ou seja, incorpora

determinado conhecimento que pode trazer contradições ao seu ponto de vista. Então, o

sujeito fica em desequilíbrio cognitivo momentâneo. Posteriormente, ao integrar este novo

conteúdo a sua estrutura pré-existente, o sujeito chega ao equilíbrio cognitivo. A figura da

espiral pode ilustrar o mecanismo da equilibração que é um processo contínuo durante toda a

vida.

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ter dois vieses: relação entre pares ou entre crianças e adultos com cunho

construtivo, e relações entre crianças e adultos como fonte de aprendizado,

citando Piaget:

Notemos primeiro que o termo “social” pode corresponder a duas realidades bem distintas, do ponto de vista afetivo, como já o acentuamos ao estudar o ponto de vista cognitivo: há, primeiro, as relações entre a criança e o adulto, fonte de transmissões educativas e linguísticas das contribuições culturais, do ponto de vista cognitivo, e fonte de sentimentos específicos e, em particular, dos sentimentos morais (...), do ponto de vista afetivo; e há, em seguida, as relações sociais entre as próprias crianças, e em parte entre crianças e adultos, mas como processo contínuo e construtivo de socialização e não mais simplesmente de transmissão em sentido único (PIAGET, 2003, p. 105).

Sloboda (2007), por sua vez, reitera que nossas relações com a música,

como escutar ou executar música, são comportamentos apreendidos

culturalmente, e que entender os mecanismos cognitivos envolvidos neste

desenvolvimento de habilidades passa necessariamente pela compreensão do

pensamento humano, isto é, pela cognição.

Susan Hallam (2001), por sua vez, destaca que aprender é um processo

natural no ser humano e que existem diversas formas para que o aprendizado

ocorra. Em alguns casos, mesmo com dificuldades aprende-se; para isto, é

necessário esforço e tempo. Também, é preciso apontar a complexidade do

processo de aprendizado e levar em conta aspectos como as características do

aprendiz, o meio no qual ocorre o aprendizado, o processo de aprendizado e

seus resultados, entre outros. Entretanto, esta autora menciona que as

pesquisas sobre aprendizado musical se dividem em duas categorias; os

estudos que abordam a enculturação, ou seja, estudos sobre o

desenvolvimento de processos que resultam em capacidades primitivas

musicais geradas a partir de experiências culturais, resultando em mudanças

cognitivas, e pesquisas sobre o desenvolvimento de habilidades musicais

(generative skills), ou seja, as experiências que ocorrem num meio educacional

específico, em que somente alguns indivíduos da sociedade participam e se

desenvolvem. Dessa forma, há presença deliberada de esforço e de

metodologias de ensino. Cabe salientar aqui a convergência das ideias desta

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autora com as de Sloboda (2007, 2008) que estão abarcadas no paradigma da

cognição musical.

Hallam (2011) também sustenta que o conceito de habilidade musical se

desenvolveu em paralelo com o desenvolvimento da psicologia na metade do

século XX. A psicologia buscou categorizar com testes psicológicos indivíduos

de acordo com seus níveis de inteligência que eram geneticamente

transmitidos e imutáveis. No meio musical, testes de habilidade ou de talento

musical buscavam auxiliar os professores de música para a seleção de

aprendizes, por exemplo, os testes de Revez (1953), Seashore (1960), Wing

(1961), Gordon (1963) e Bentley (1966).

Contudo, Hallam (2010) indica que as pesquisas atuais vêm

desconstruindo a utilidade dos testes de habilidades musicais do passado já

que evidências comprovam que o desenvolvimento musical está atrelado ao

número de horas de prática, e, sobretudo, de um estudo de qualidade e não a

herança genética do sujeito. Obviamente que não basta estudar de qualquer

forma para o desenvolvimento contínuo de habilidades musicais. Aliás, o

excesso de prática pode até levar os estudantes de música a desistir, como

algumas pesquisas destacam Wagner (1975, apud Hallam, 2011) e Zurcher

(1972, apud Hallam, 2011). Outros fatores como a motivação, a

autorrealização, a interação social, o apoio dos pais, entre outros, tem se

mostrado mais importantes para o desenvolvimento de habilidades musicais,

como destaca a autora:

Além disso, as habilidades podem ser desenvolvidas através de práticas lúdicas ou tocando em grupos, e não somente pela prática deliberada. Fatores sociais, como o apoio dos pais, a personalidade do professor e interações entre pares também mostraram-se mais relevantes do que a quantidade de prática para alcançar altos níveis de execução musical. (HALLAM, 2011, p. 310)

30.

Além disto, deve-se levar em conta que a habilidade musical é um

conjunto de habilidades cognitivas e está muito além do desenvolvimento de

30

In addition, skills can be developed through playful practice and playing in groups, not only

through deliberate practice. Social factors such as parental support, teacher’s personality and

peer interactions have also been shown to be more important than amount of practice time in

achieving a high level of musical performance.

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uma habilidade específica. Segundo a autora, para se desenvolver

musicalmente é necessário o desenvolvimento multimodal de diversas

habilidades cognitivas como, por exemplo, habilidades motoras, musicalidade,

habilidades para o aprendizado, e, sobretudo a criatividade. Também, é

necessário observar os pontos fortes e fracos de cada aprendiz, assim como

aspectos como motivação e autodisciplina, e sobretudo, destacar a leitura

musical que envolve o uso concomitante de diversas habilidades cognitivas.

Também, Levitin (2011) destaca que o estudo científico acerca do

desenvolvimento de habilidades que exigem alta qualificação, ou seja, alto

nível de especialização vem sendo investigado pelas ciências cognitivas e o

domínio da música segue esta tendência. Nesse sentido, este autor cita a

pesquisa de Anders Ericsson (1991, 1996, 2005) que trata a questão das

habilidades musicais como um problema de psicologia cognitiva “que diz

respeito à maneira como os seres humanos adquirem determinado grau de

especialização” (p. 222). Assim, argumenta-se que o esforço é um dos fatores

determinantes para se tornar especialista em qualquer coisa. O estudo aponta

também que são necessárias aproximadamente dez mil horas de prática para

chegar ao nível de alta qualificação em qualquer domínio. Isto equivale a

aproximadamente vinte horas semanais de estudo durante dez anos. Como

coloca Ericsson:

(...) De acordo com esta regra, nem mesmo os indivíduos "talentosos” podem alcançar desempenho a nível internacional sem aproximadamente 10 anos de preparação (...). Na verdade, as diferenças individuais no que se refere à quantidade de prática deliberada são determinados a partir do treino diário e mostraram estar relacionados com o nível de desempenho atingido por músicos profissionais e atletas (...). Uma análise dos padrões de prática e descanso dos executantes indicou que a quantidade máxima de treino suportada diariamente, durante anos, sem serem levados à exaustão e abandonos, foi em torno de quatro horas diárias. (ERICSSON and LEHMANN, 1996, p. 278-279)

31.

31

(...) According to this rule, not even the most “talented” individuals can attein international performance without aproximately 10 years of preparation (...). In fact, individual differences in the amount of deliberate practice, determined from diaries and retrospective estimates, were shown to be related to the level of performance atteined by expert musicians and athletes (...). An analysis of these performers’s daily patterns of practice and rest indicated that their maximum amount of fully concentrated training that they could soustain every day for years without leading to exhaustion and burning-out was around four hours a day.

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Ericsson (1991, 1996, 2005) também argumenta que nas pesquisas

relativas ao aprendizado e ao treino de habilidades, sendo elas em domínios

como a música ou esportes, usa-se o termo prática deliberada (deliberate

practice) para designar atividades individuais acompanhas por professores ou

por treinador para aprimorar aspectos específicos por meio da repetição e

refinamento das habilidades. Nesse sentido, para melhor proveito do

feedback32 por parte dos aprendizes é necessário concentração e esforço. Por

fim, Ericsson (2005) destaca que é necessário acúmulo de conhecimento para

alcançar altos níveis de performance e o desenvolvimento e aquisição de

representações mentais como mecanismos que possibilitem melhor controlar,

planejar e raciocinar sobre a melhor forma de manter e aprimorar as

habilidades cognitivas.

2.8. CONSIDERAÇÕES FINAIS DO SEGUNDO CAPÍTULO

A literatura aponta, por um lado, para a influência cultural na assimilação

do conhecimento musical que é apreendido de forma individual, de forma

inconsciente, durante as interações entre pares, e ou, com as produções

culturais de cada sociedade. Por outro lado, os indivíduos que deliberadamente

querem desenvolver as habilidades musicais se deparam com o ensino de

música formal ou informal. Este deve levar em conta que o ensino da música

abarca o desenvolvimento de habilidades cognitivas multimodais com

crescente complexidade, como por exemplo, a leitura musical que necessita da

coordenação de diversas habilidades (motoras, cognitivas, representacionais,

entre outras).

Dessa forma, compreender como se desenvolvem as habilidades

cognitivas em experts de nível internacional, que estão relacionadas ao tempo

gasto com a prática e com o aprimoramento das mesmas, pode ajudar a

identificar a melhor forma de ensino e treino efetivo de músicos iniciantes.

Aspectos como a motivação, a experiência prévia, a relação professor/aluno, a

32

Feedback diz respeito ao retorno dado ao aluno pelo professor ou treinador.

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afetividade, a concentração, e principalmente, o esforço deliberado são pré-

requisitos obrigatórios a serem levados em conta para um programa

educacional efetivo que busque a melhor forma de construção de

conhecimento e o desenvolvimento e treino de habilidades cognitivas

multimodais.

Conclui-se então que a educação musical deve levar em conta os

avanços da cognição musical buscando integrá-la, e repensando metodologias

de ensino que abarquem a cognição como um todo, lembrando que a música

como linguagem socialmente construída já está presente na mente de todos os

indivíduos de dada sociedade. Para que os sujeitos se motivem e se

desenvolvam musicalmente é necessário esforço deliberado para motivarem-se

a treinar habilidades cognitivas que estejam interligadas à energia da

afetividade proveniente da evocação de profundas emoções fruto da mente

musical.

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3. COGNIÇÃO MUSICAL E EDUCAÇÃO MUSICAL: BUSCANDO

ALTERNATIVAS PARA O ENSINO DO RITMO

De acordo com Carol L. Krumhansl (2000) a percepção musical tem sido

alvo de diversas pesquisas de psicologia, notadamente nas ramificações da

psicologia como psicofísica, psicologia da Gestalt, psicologia cognitiva,

psicologia das emoções e a neurociência. Isto se deve ao fato de que outras

disciplinas como a filosofia, a ciência da computação, a sociologia, a linguística,

entre outras, se debruçaram sobre o domínio da música. E, as disciplinas

tradicionais da música como a musicologia, a educação musical, a teoria da

música têm buscado compreender o elo entre os processos psicológicos e os

comportamentos musicais. Nesse sentido, a busca por compreender como

conhecimentos prévios podem afetar a percepção musical pode ilustrar como

as pesquisas têm se dado.

Também, a importância dada à cognição musical reflete de certa forma o

questionamento de como o conhecimento musical é adquirido. De acordo com

Krumhansl (2000), há três principais abordagens que se referem ao estudo de

como o aprendizado musical se dá. A primeira trata do desenvolvimento físico

e das aptidões musicais. Estudos têm demonstrado que bebês e crianças “tem

predisposições para o processamento musical” (p. 46) precoce. A segunda

trata dos efeitos do aprendizado musical sobre o ser humano, podendo se

tratar de aprendizado instrumental (incluindo a voz e o corpo que podem ser

considerados também como instrumentos) ou de aprendizado teórico. Por fim,

a terceira aborda como diferentes estilos musicais e a música de outras etnias

afetam os sujeitos observados. Cabe aqui salientar que a música erudita

ocidental tem servido como ponto de referência, e também é a mais

pesquisada.

O presente capítulo trata de como o ritmo musical é percebido,

processado e assimilado. Nesse sentido, ele aborda como as pesquisas em

cognição musical contribuem para melhor entender quais são as capacidades e

as limitações do ser humano em relação à percepção do ritmo. Em seguida, se

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falará sobre a educação musical e sobre o ensino da leitura rítmica. Por fim,

apresentam-se alternativas para o ensino da leitura rítmica que integram os

conhecimentos da cognição musical e da educação musical. Estes buscam

elucidar qual a melhor forma de ensinar a leitura do ritmo, aspecto fundamental

para a leitura musical.

3.1. O QUE É RITMO?

Segundo Bohumil Med (1996), em música o ritmo pode ser definido

como: “a distribuição ordenada de valores” e também trata da “relação entre as

durações das notas executadas sucessivamente” (p.128).

Por sua vez, o psicólogo Paul Fraisse (1981) sustenta que o estudo do

ritmo é árduo, pois não existe entre os estudiosos da área um consenso de

definição generalizável do ritmo, isto advém do fato de o ritmo se referir a uma

realidade complexa, na qual várias variáveis estão imbricadas. A opção de

alguns teóricos da música em restringir a definição do ritmo, como a

mencionada acima, é fruto de uma escolha estética pessoal, e se limita a

reconhecer somente uma parte do que realmente é o ritmo.

Fraisse (1974) destaca que a origem grega da palavra ritmo é rhythmos

e rheo (fluxo). A palavra rhythmos está ligada na filosofia grega à forma. E, a

forma pode ser modificada momentaneamente, moldada e improvisada. De

acordo com o autor, a definição literal do grego significa “forma particular de

fluir”. Foi nesse sentido que Platão usou este termo para os movimentos

corporais, e, no caso dos sons da música, estes podem ser descritos em forma

de números. Nesse sentido, rapidez e lentidão, apesar de serem opostos,

podem estar em harmonia, o que faz Platão chegar à definição de que o ritmo é

“a ordem dos movimentos” (p.4).

A ordem de movimentos do ritmo é, segundo Fraisse (1981), percebida

como uma sucessão de eventos que podem ser percebidos ou concebidos

mentalmente, tais como o ritmo do dia e da noite, o das estações e os

movimentos físicos lentos e rápidos (notadamente os movimentos dos planetas

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observáveis por meio da luz emanada por estes). Porém, em nenhum desses

casos é possível observar a ordem em si no sentido da sucessão de fases.

Nesse sentido, o ritmo é uma construção mental.

No entanto, o autor destaca que existe outra percepção de ritmo; a que

está ligada a atividades como a dança, a música e a poesia. Aqui se pode fazer

a conexão, feita por Platão, sobre a ordem e o movimento, porém neste caso

com o movimento humano. Nesse sentido, Fraisse (1981) deixa claro que a

percepção dos ritmos desta categoria provém necessariamente da atividade

humana.

Segundo Fraisse (1981), os psicólogos do século XIX como Mach (1865)

e Vierordt (1868) perceberam a relação entre movimento e ritmo, e iniciaram

experiências com movimentos rítmicos. Por outro lado, a teoria da Gestalt de

Von Ehrenfel´s coloca a percepção no cerne do problema. Nesse sentido, o

ritmo pode ser definido como “uma qualidade perceptiva específica ligada de

certa forma à sucessões” 33 (p.2), dessa forma, diz respeito à percepção de

sucessões.

Além disto, Fraisse (1981) destaca a questão da antecipação que

segundo ele é central quando se trata de ritmo, citando o autor: “podemos dizer

que se tem ritmo quando se pode prever, com base no que é percebido, ou

seja, podemos antecipar o que se segue” 34 (p. 2). Também, o autor aponta a

presença de padrões rítmicos reiterados sucessivamente, assim como o pulso

que se repete como o tic tac de um relógio. Dessa forma, segundo ele a

antecipação deve necessariamente estar ligada à organização temporal das

durações. Nesse sentido, o fator “tempo” é fundamental, pois nos casos

extremos onde o pulso é muito lento, o ritmo torna-se imperceptível, como

salienta o autor:

33

(…) a perceptual quality specifically linked to certain successions. 34

(…) we say that there is rhythm when we can predict on the basis of what is perceived, or in other words we can anticipate what will fallow.

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A possibilidade de percepção rítmica depende do andamento, porque a organização das sucessões em padrões perceptíveis é amplamente determinada pela lei da proximidade. Quando o andamento é lento demais, os ritmos, assim como, a melodia desaparecem. (FRAISSE, 1981, p. 3) 35.

Na próxima sessão abordam-se quais são as limitações e capacidades

do ser humano em relação à percepção do ritmo.

3.2. A COGNIÇÃO MUSICAL E A PERCEPÇÃO DO RITMO

Krumhansl (2000) argumenta que as pesquisas sobre a psicologia da

música relacionadas ao ritmo têm por principal objetivo mensurar e descrever

as capacidades humanas em relação à percepção do tempo musical. Nesse

sentido, a autora destaca que são medidas as durações das notas. São

apresentados nas pesquisas experimentais, padrões rítmicos com notas com

durações variáveis, curtas ou mais longas, e sem variações de altura. Dessa

forma, a medição do tempo de maior interesse, segundo a autora, é a medida

entre os ataques nos eventos rítmicos e não necessariamente a medição da

sua duração total. Assim, são usadas medidas em milissegundos (ms)

destacando que as pesquisas se focam nas durações na faixa entre 100 ms e 5

segundos “porque este é o intervalo no qual eventos temporais são percebidos

como ritmos organizados” (p.48). No entanto para facilitar a compreensão os

valores em milissegundos serão convertidos em bpm, ou seja, batidas (beats)

por minuto. Já para Fraisse (1974, 1978,1982), se o intervalo entre os sons for

menor do que 600 bpm, este será percebido como um único som, e se o

intervalo for maior do que 1,5 segundos, os ouvintes terão dificuldades em

considerá-lo como um ritmo. Assim, o limite para o estabelecimento de padrões

rítmicos mais longos é de 5 segundos. Nesse sentido, ele relaciona a

percepção do ritmo com o presente psicológico que é o “intervalo de tempo

durante o qual os eventos podem ser percebidos sem apelo à memória” (p.48).

35

The possibility of rhythmic perception depends on tempo, because the organization of succession into perceptible patterns is largely determined by law of proximity. When the tempo slows down too much, the rhythm and also the melody disappear.

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Dessa forma, pode-se dizer que a percepção do tempo e do ritmo é restrita a

uma faixa estreita de tempo o que afeta a organização do ritmo na música.

Citando Krumhansl:

Portanto, a organização perceptiva de padrões temporais só é possível em uma faixa limitada de tempos. Essa faixa corresponde à duração dos padrões rítmicos que se encontra tipicamente em música, e isso sugere que há uma limitação psicológica que afeta a padronização temporal em música. (KRUNHANSL, 2000, p.49).

Fraisse (1978, 1982) salienta a necessidade do estudo de um

componente básico da música: o pulso. Krumhansl (2000) classifica a pesquisa

empreendida por Fraisse como “o mais coerente e alentado programa de

pesquisa psicológica sobre o tempo” (p. 49). O pulso periódico básico está

vinculado tanto a atividades perceptivas quanto às atividades físicas. Nesse

sentido, o autor dá como exemplo o ato regular de sugar dos bebês, o ritmo

presente no andar, assim como nos batimentos cardíacos. Estes são

chamados de tempo espontâneo que é a velocidade natural dos ritmos

fisiológicos. E, estas batidas naturais encontram-se na faixa de 300 bpm

(batidas por minuto) para os valores mais baixos, e 42,8 bpm, para os valores

mais altos. O valor mais comum apontado por Fraisse é o de 100 bpm. Apesar

de haver diferenças entre os indivíduos estudados, a tendência é de

estabilidade, isto significa que há a tendência de o pulso ser constante.

Além do ritmo espontâneo, há o ritmo preferido. Estudos demonstraram

que cada indivíduo tem sua preferência em relação à velocidade do pulso. Num

experimento pediu-se para indivíduos ajustarem a velocidade de batidas

emitidas para que essas ficassem o mais natural possível. O resultado ficou,

como na experiência do ritmo espontâneo, em torno de 100 bpm. Portanto,

Fraisse (1982) conclui que a convergência dos resultados do ritmo espontâneo

e do ritmo preferido, em torno de 100 bpm, aponta na direção da existência de

um relógio biológico interno, como se fosse um metrônomo ou um marca-passo

que, por sua vez, sincroniza as diversas atividades humanas.

Também Fraisse (1982) destaca a habilidade de sincronização presente

nas pessoas que conseguem com certa facilidade sincronizar seus movimentos

ao escutar padrões rítmicos. Ele aponta existir forte conexão psicológica entre

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a percepção rítmica e a execução. Além disto, a habilidade de sincronização é

descrita por ele como algo natural que já está presente no começo da vida.

Nesse sentido, os adultos preferem manter a sincronia quando escutam algo,

“achando mais fácil bater no tempo do que fora dele” (p. 50).

É importante notar que essa habilidade de sincronizar com o estímulo apresentado contrasta com a maioria das reações, que ocorrem após a apresentação do estímulo. Isso sugere que os seres humanos são capazes de antecipar um estímulo rítmico e enviar os comandos motores de modo a coordenar os movimentos, de maneira precisa, com os estímulos. (ibidem, p. 50).

Fraisse (1982) também diz que, quando ouvintes escutam estímulos

sonoros iguais, geralmente têm tendência a fazer agrupamentos com dois sons

ou quatro sons, e mais raramente com três sons. Porém, não foram

encontradas evidências que caracterizam a formação de tais agrupamentos.

Por isso, são chamados de agrupamentos de ritmização subjetiva. Quanto mais

elementos rítmicos houver, maior a velocidade do tempo. Em que, o número de

elementos rítmicos depende diretamente do tempo. Além disto, o autor destaca

que é mais fácil a memorização de padrões rítmicos quando executados com

maior velocidade.

Quando são introduzidos novos elementos como pausas, figuras

rítmicas mais longas, execução mais forte ou com altura diferente, se

caracteriza a ritmização objetiva. Segundo Fraisse (1982), quando elementos

novos são introduzidos numa sequência de sons, os padrões de agrupamento

permanecem. Porém, as pausas maiores que 1800 ms são interpretadas pelos

ouvintes como o fim de um agrupamento, assim como o prolongamento de

determinado som. Nesse sentido, a percepção de sucessão é comprometida.

Para ele,

Duração e intensidade de um elemento, alternam entre si; um som que é prolongado é percebido como mais intenso, e um som mais intenso é percebido como mais longo. Os sons mais longos, e mais intensos são ouvidos como se fossem acentuados, e esses elementos tendem a definir o início dos grupos subjetivos. Da mesma forma, um som de altura mais aguda tende a definir o início de um grupo. (ibidem, p. 51).

Destarte, Fraisse (1982) afirma que é mais fácil para os participantes

produzir padrões rítmicos do que padrões arrítmicos, o que evidencia a “forte

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52

natureza rítmica do comportamento humano” (p. 51). Nesse sentido, os seres

humanos são capazes de medir o tempo e encontrar nele pequenas diferenças

com certa facilidade e exatidão.

Krumhansl (2000), por sua vez, destaca que a capacidade de percepção

está atrelada à produção de ritmos. Disso advém que os resultados, frutos de

experiências sobre percepção de ritmos, “têm paralelo em experimentos sobre

a produção. Isso sugere a existência de um forte componente motor

relacionado à representação psicológica do ritmo” (ibidem, p. 53). Além disso, a

autora aponta diversos fatores característicos do ritmo como: periodicidade,

agrupamentos de eventos perceptivos, grupos com durações variáveis e

silêncios dentre outros. Segundo Krumhansl:

Várias evidências substanciais sugerem que os ritmos se baseiam numa periodicidade, cuja escala varia aproximadamente de 300 a 900 ms. O agrupamento perceptivo de eventos é determinado por vários fatores, incluindo as pausas e as mudanças em duração, altura e intensidade. Grupos de grupos podem ser formados, mas a duração total do padrão parece estar limitada a cerca de 5s. (ibidem, p. 53).

A autora diz também que as pesquisas feitas até a época de Fraisse não

se preocupavam diretamente com o ritmo musical e usavam estímulos sonoros

bem artificiais. Porém, Fraisse (1982) justifica-se dizendo que mesmo com

estímulos artificiais, as regras abstraídas das experiências psicológicas são

aplicáveis à música. Nesse sentido, ele destaca que os padrões rítmicos

encontrados na música “tendem a ter durações que variam entre 2 e 5s” (p.

53). E que as durações encontradas na maior parte das canções classificam-se

em durações longas ou durações curtas.

No entanto, Krumhansl (2000) destaca que as pesquisas sobre o ritmo

musical com estímulos realmente musicais começaram na década de oitenta

decorrentes dos avanços tecnológicos com o uso de teclados e computadores

em experiências musicais. O exemplo da pesquisa de Schafer (1981) que

utilizou o teclado para analisar com exatidão de milissegundos a execução do

ritmo, é um exemplo de como é possível com o uso de tecnologias, verificar o

descompasso entre o que está escrito na partitura e o que é executado de fato.

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Apesar de as pesquisas realizadas sobre o ritmo não serem de fato

musicais, elas foram importantes para a compreensão dos mecanismos

inerentes ao mesmo. O importante foi, como Fraisse salientou, generalizar os

conhecimentos coletados a partir de experiências, não tão musicais, para a

música em si, que segue as mesmas regras. No próximo sub-capítulo aborda-

se especificamente as pesquisas sobre a percepção do ritmo musical.

3.2.1. AS PESQUISAS SOBRE A PERCEPÇÃO DO RITMO MUSICAL

Povel (1981) pesquisou como padrões rítmicos simples podem ser

reproduzidos por músicos e não músicos. O resultado do experimento mostrou

que, para padrões rítmicos simples, não houve diferenças significativas entre

os sujeitos. Porém, com padrões rítmicos complexos as diferenças entre os

participantes que já tinham passado por educação musical e os que não tinham

se confirmaram. Povel (1982, 1984) também desenvolveu um modelo de grade

temporal para explicar como os sujeitos percebem o ritmo.

Lerdahl e Jackendorff (1983, 2006) aproximam a música da linguística e

buscam aplicar regras a sequências musicais como a gramática fundamenta a

formação da língua. Assim, é feita a distinção entre o compasso musical e sua

métrica e o agrupamento. No compasso, há alternância regular de acentos

rítmicos com tempos fortes e fracos, que é denominada de métrica. Lembrando

que na grafia musical, o compasso é representado por uma barra vertical

chamada de barra de compasso no seu começo e fim. Dessa forma, há

hierarquia métrica em cada posição do compasso musical. Já o agrupamento,

para estes autores, se refere à organização musical em grupos, que não estão

necessariamente vinculados à estrutura do compasso, e que formam motivos

musicais, como destacam os autores:

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A estrutura de agrupamento é a segmentação da música em motivos, frases, e seções. (…). O segundo componente da organização rítmica é a métrica, que respeita uma contínua hierarquia temporal no enquadramento com as batidas alinhadas da música. (JACKENDOFF, R. & LERDAHL, F, 2006, p.38-39)

36.

Palmer e Krumhansl (1987a, 1987b) discutem a existência e a

percepção de acentos rítmicos propostos pelo modelo de métrica de Lerdahl e

Jackendorf. Nesse sentido, é discutida a questão dos tempos fortes e fracos

existentes em dado compasso musical. Assim, a título de exemplo, um

compasso quatro por quatro onde há quatro tempos. No primeiro tempo o

acento é o mais forte. Em seguida é o terceiro, depois é o segundo e por fim o

quarto. O experimento se deu da seguinte forma: foram apresentados trechos

musicais de compositores como Bach e Mozart que foram interrompidos em

diferentes momentos. Os ouvintes foram questionados se tais trechos eram

bons e se as frases musicais eram completas. O resultado do experimento se

alinhou com o modelo de hierarquia métrica.

Contudo, a revisão da literatura sobre o ritmo musical é extensa, mas

como o objetivo deste capítulo não se propõe a isto, volta-se agora para o tema

da leitura rítmica, tema de interesse nesta dissertação.

3.3. A EDUCAÇÃO MUSICAL E O ENSINO DA LEITURA DO RITMO

Ensinar música é uma atividade complexa e ampla. Pode-se ensinar

esta arte de diversas formas: ensino de canções folclóricas, ensino

instrumental, percussão corporal, canto coral, aulas de musicalização para

crianças e mesmo adultos, teoria musical, etc. O domínio de conhecimento

musical e notadamente o da educação musical vêm se aproximando da

cognição musical. Nesse sentido, a literatura, internacional e nacional aponta

para o número crescente de pesquisas que buscam entender como a mente

musical relaciona-se com a música.

36

Grouping structure is the segmentation of the musical surface into motives, phrases, and

sections. (…) The second component of rhythmic organization is the metrical grid, an ongoing

hierarchical temporal framework of beats aligned with the musical surface.

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De acordo com Green (2002) a alfabetização musical é uma habilidade

rara na sociedade ocidental moderna. Por sua vez, Mills e MacPherson (2006)

afirmam que os métodos de ensino de leitura musical são falhos, e que muitas

crianças fracassam por causa da maneira como são ensinadas a ler música.

Helga Rut Gudmundsdottir (2010) salienta que os métodos de ensino de leitura

musical são na maior parte baseados em convenções. Quando os alunos não

alcançam fluidez na leitura musical, seus professores baseiam-se na própria

intuição e experiência para resolução desses problemas.

Segundo Wolf (1976), a leitura musical é um processo complexo que

envolve pelo menos duas habilidades distintas, a habilidade de ler e a

habilidade motora de executar aquilo que é lido. Gudmundsdottir (2007) diz que

do ponto de vista cognitivo, a leitura musical concilia simultaneamente

decodificação visual, resposta motora e sincronização dessas duas esferas.

Além disto, a decodificação dos símbolos musicais é uma tarefa múltipla

de acordo com Sloboda (1976, 1978, 1984) e é uma construção de processos

da percepção musical. Nesse sentido, Palmer e Krumhansl (1987) afirmam que

as informações relativas à altura, isto é, da melodia são processadas e

decodificadas separadamente das informações relativas à subdivisão do tempo

que, por sua vez, podem ser representadas pelas figuras rítmicas. Assim,

estudos como os de Waters e Underwood (1999) Schon e Besson (2002),

confirmaram que a melodia e o ritmo são processados e percebidos

separadamente. Estudos com músicos que tiveram problemas de saúde, e

notadamente problemas cerebrais provaram que o aspecto melódico é

independente do ritmo, citando a autora:

Outra evidência do processamento separado da melodia e do tempo é encontrada em estudos sobre músicos com lesões cerebrais. Em um estudo, os pesquisadores descrevem um músico profissional que, depois de sofrer danos cerebrais foi capaz de ler somente melodias e não o ritmo na notação musical (Fasanaro, Spitalere e Grozzi 1990). Assim, a leitura musical implica a descodificação de processos separados de leitura de melodia e de ritmo, no entanto estas duas esferas devem ser integradas na saída motora. (GUDMUNDSDOTTIR, 2010, p. 332)

37.

37

Further evidence of the separate processing of pitch and timing is found in studies on

musicians with brain injuries. In one study the researchers describe a professional musician

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56

Portanto, pode-se destacar a complexidade no processamento da

música pelo cérebro. Nesse sentido, os aspectos cognitivos envolvidos na

leitura musical exigem mais do que a leitura comum, pois a música apresenta

outros parâmetros, altura, duração, intensidade e timbre. Além disso, como

visto anteriormente, a leitura musical exige o processamento de duas

habilidades cognitivas: a decodificação visual, resposta motora e a

sincronização e integração das duas. No item subsequente aborda-se a leitura

rítmica, um dos pré-requisitos para a leitura musical.

3.4. A LEITURA RÍTMICA

Boyle (1970) e Elliott (1982) mostraram com seus respectivos estudos

que com a habilidade de leitura rítmica bem desenvolvida, o percentual de

sucesso na leitura musical é maior. Nesse sentido, Gudmundsdottir (2011)

destaca que a organização do tempo é primordial na música, e que a

informação musical está codificada junto com a métrica e com o ritmo. Dessa

forma, fica claro que o sucesso da leitura musical depende fortemente da

decodificação e da construção do tempo musical, assim como da leitura de

padrões rítmicos.

Palmer e Krumhansl (1990) e Sloboda (1983) apontam que a leitura

rítmica é tanto melhor quando está atrelada à habilidade de construir

mentalmente padrões rítmicos. Nesse sentido, experimentos confirmam que

músicos profissionais fazem uso de representações mentais quanto mais

executam ritmos.

Além disto, Gudmundsdottir (2010) afirma que deve-se levar em conta o

desenvolvimento cognitivo das crianças antes de planejar ensiná-las a leitura

rítmica. A autora argumenta que não há estudos feitos com rigor científico

sobre o efeito da aquisição da habilidade de leitura musical aplicada às

who after suffering brain damage was able to read only pitches but not the rhythm in musical

notation (Fasanaro, Spitalere, and Grozzi 1990). Thus, in music reading the decoding itself

entails the separate processes of reading pitch and timing while these two must be integrated in

the motor output.

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57

crianças. No entanto, Capodilupo (1992) destaca que, quando o mesmo

conteúdo de leitura musical é ensinado, com as mesmas aulas, a crianças de

faixas etárias distintas, as mais velhas respondem melhor e mais rápido.

Shehan (1987) argumenta que crianças do sexto ano (equivalente ao sexto ano

brasileiro) aprendem padrões rítmicos duas vezes mais rápido que crianças do

segundo ano, tendo exatamente o mesmo número de horas e a mesma forma

de ensino.

Assim, antes de escolher um método de ensino deve ser levada em

conta a idade dos alunos. Nesse sentido, Boyle (1970), Salzberg e Wang

(1989) apontam que métodos de ensino que usam a marcação do pulso com

os pés e a execução vocal ou com palmas é indicado para crianças mais

velhas e adolescentes. Por sua vez, este mesmo método mostra-se ineficaz

com crianças do terceiro e quarto ano de acordo com Palmer (1976), pois

crianças dessa idade tem dificuldades de efetuar diversas tarefas ao mesmo

tempo.

Por sua vez, Hewson (1966) pesquisou os efeitos da leitura musical

comparando duas metodologias de ensino. Seis turmas de escolas americanas

foram usadas no experimento que comparou a metodologia tradicional de

leitura musical com um método elaborado pelo próprio pesquisador. Seu

experimento apontou que o ensino é mais efetivo quando se inicia pela

experiência musical, ao invés de começar o ensino pela notação musical. Além

disso, o pesquisador concluiu em seu experimento que o aprendizado do ritmo

deve, para ser efetivo, conter necessariamente praticas rítmicas repetitivas.

Rodgers (1996) pesquisou a influência do ensino da notação musical

sobre as habilidades de leitura musical de estudantes de música. Além de

questionar se o uso de figuras rítmicas coloridas afetariam de alguma forma as

habilidades de leitura, de estudantes do primeiro e segundo ano do ensino

fundamental americano. Foram ministradas aulas de leitura rítmica durante 23

semanas para 134 alunos que foram separados em dois grupos: um

experimental com 64 alunos e o outro de controle com 70 alunos. Na verdade,

o grupo de controle teve exatamente o mesmo conteúdo, porém sem uso de

figuras rítmicas coloridas. O autor desse estudo concluiu que o grupo

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experimental teve um desempenho significativamente melhor do que o grupo

de controle no que tange a leitura rítmica. Também, 78% dos participantes

sinalizaram que o exercício de leitura rítmica com figuras coloridas era sua

tarefa preterida.

Bebeau (1982) efetuou experimento similar, porém comparando o ensino

do ritmo tradicional com uma metodologia de ensino mneumônica, na qual são

associadas palavras a ritmos. Dessa forma, este pesquisador inspirou-se em

metodologias de ensino ativas, isto é, que se utilizam de recursos lúdicos

baseados na vivência e na prática musical para ensinar música, como, por

exemplo, é o caso dos métodos dos educadores Zoltán Kodaly (1882-1967) e

Carl Orff (1885-1982). Dessa forma, Bebeau (1982) concluiu que com crianças

pequenas (até a terceira série) é mais efetivo o ensino baseado na estratégia

de associar palavras a ritmos do que o ensino tradicional de ritmos.

Nesse sentido, Bebeau (1982) destaca que um dos requisitos para ler

ritmos, de acordo com a metodologia tradicional, é de que o estudante tem que

conseguir manter a pulso. Já com a metodologia ativa, não há a necessidade

de conseguir conservar o tempo musical, e, mesmo com alunos jovens, há

possibilidade de aprendizagem de leitura rítmica, como destaca o autor:

A importância de pedir para os estudantes manterem o pulso enquanto aprendem a ler padrões rítmicos (Boyle, 1970) pode ser o único requisito do método tradicional que não é generalizável para outros métodos. Aos alunos que usam o tratamento mnemônico de leitura rítmica não é requisitado que mantenham a pulsação, contudo estes leem frases rítmicas com maior precisão do que os estudantes treinados com a metodologia tradicional. (BEBEAU, 1982, p. 118).

38

Dessa forma, este autor destaca que sua pesquisa permitiu identificar

que o fator determinante para uma leitura rítmica precisa não está

necessariamente atrelado ao pulso, e sim na dificuldade dos sujeitos em

decodificar a informação dos símbolos musicais e ao mesmo tempo terem que

se preocupar com a precisão do tempo. Nesse sentido, os resultados da

pesquisa de Bebeau (1982), apontam que o ensino da leitura musical pode ser

38

The importance of requiring students to maintain a separate overt pulse response while learning to read rhythmic patterns (Boyle, 1970) may be a unique requirement of the traditional method and not generalizable to other methods. Students in the speech cue treatment were not required to maintain a separate overt pulse response, yet they read rhythmic phrases with greater precision than traditional trained students.

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antecipado, e, de forma alguma deva estar necessariamente atrelado à

aquisição de conceitos matemáticos (como é o caso para entender as figuras

rítmicas com o método tradicional), assim como haver a necessidade de

conservação do pulso musical.

Contudo, nem todas as metodologias de ensino rítmico levam em conta

aspectos cognitivos dos alunos. Como se pôde observar, dependendo do nível

de desenvolvimento da criança e quanto maior a idade destas, maior a

facilidade em apreender ritmos. Cabe abordar, no capítulo subsequente, os

métodos ativos em educação musical que serviram de embasamento para a

elaboração das aulas do experimento de ensino de leitura rítmica desta

pesquisa.

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4. OS MÉTODOS ATIVOS EM EDUCAÇÃO MUSICAL

De acordo com Fonterrada (2008), na virada do século XIX para o

século XX ocorreram mudanças significativas na sociedade como um todo,

passando de uma sociedade pautada no trabalho de artesãos, para o trabalho

de massas de operários em fábricas. Assim, os ideais românticos foram

repensados e o individualismo deu lugar ao coletivismo. Estas mudanças

afetaram profundamente a sociedade que se viu diante de um novo paradigma.

A educação foi totalmente repensada, remodelada e surgiram neste momento

histórico, novas maneiras de se pensar o ser humano, agora pensando em

coletividade, em massas, enfim em um ensino para todos. Como destaca a

autora:

As grandes transformações artísticas e científicas produziram os pedagogos da música do século XX, e o estudo do pensamento de alguns deles mostrará claramente que elas estão presentes, algumas vezes como o próprio motivo da proposta e, em outras, participando dos conteúdos, metas e estratégias de ensino (FONTERRADA, 2008, p. 121).

Naquele momento a concepção de infância foi repensada lembrando

que de acordo com a autora: “num período histórico não muito distante, não

havia preocupação específica em cuidar do desenvolvimento e do bem-estar

da criança, ou mesmo do jovem e do adulto” (p. 121). No que tange a

aprendizagem musical, no século XIX, a principal preocupação era formar bons

intérpretes, a ênfase estava na técnica e na execução instrumental. Já no

contexto pós-revolução industrial (início do século XX), surgiram os métodos

ativos na educação musical. Estes representaram uma nova forma de ensinar

música enfatizando o “fazer” musical ativo aliado ao movimento corporal como

mola propulsora do desenvolvimento musical.

Mesmo com o desenvolvimento de novas estratégias de ensino de

música com os métodos ativos em educação musical, houve um confronto

direto com a metodologia tradicional do ensino de música. Nesse sentido,

pode-se citar como salienta Kebach et all (2013) o exemplo do conservatório de

Paris que foi, no início do século XX, a principal referência do ensino da música

ocidental. Nele, a forma de ensino era fragmentada com aulas de teoria com

matérias como o contraponto, harmonia, teoria musical e aulas de instrumento.

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Hoje em dia, no Brasil, este modelo de ensino de música ainda perdura, e é

seguido nos principais conservatórios e universidades.

Por sua vez, Fonterrada (2008) sugere que no Brasil os métodos ativos

chegaram nas décadas de 50 e 60. Porém, com a exclusão da disciplina de

Música em 1971 (lei n.5692/71), que foi substituída pela Educação Artística, as

abordagens ativas foram deixadas de lado, como salienta a autora:

Hoje, nem mesmo as escolas de música parecem dar-se conta da importância dessas propostas, permanecendo muitas delas no antigo esquema de iniciar crianças e jovens diretamente no instrumento, e colocando-os em classes de teoria da música para complementar a formação exigida pela aula de instrumento. (FONTERRADA, 2008, p. 120).

Obviamente, que após dois anos da entrada em vigor em 2012 da Lei nº

11.769 situação brasileira parece manter seus status quo como relatado por

Fonterrada (2008). No entanto, é necessário avaliar com mais profundidade o

panorama da educação musical brasileira com pesquisas e dados concretos,

para saber de fato se as escolas estão cumprindo, ou não, a nova legislação.

Mas, como este trabalho tem como objetivo a comparação entre a abordagem

tradicional de ensino de música com a proposta de ensino ativa, deixa-se de

lado a discussão da educação musical brasileira para abordar os métodos

ativos de primeira geração.

Na verdade, existem métodos ativos de primeira geração e de segunda

geração. Os primeiros datam do início do século XX e os subsequentes

surgiram a partir de 1950, e, estão atrelados à música eletrônica e

contemporânea como destaca Fonterrada (2008, p. 179-180). Serão abordados

nesta pesquisa os métodos ativos de primeira geração que tem como principais

expoentes educadores como: Émile Jaques-Dalcroze (1865-1950), Edgar

Willems (1880-1978), Zoltán Kodaly (1882-1967), Carl Orff (1885-1982) e

Shinichi Suzuki (1898-1998). Como o foco deste trabalho está no ensino da

leitura rítmica, se focará nos métodos ativos que trabalham de forma

diferenciada o ritmo, como é o caso do método Jacques-Dalcroze e o método

Willems. Cabe salientar aqui que como o autor desta pesquisa visitou e seguiu

um curso de formação no Instituto Jacques-Dalcroze de Genebra em 2010, a

ênfase será dada a esta abordagem.

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4.1. JACQUES-DALCROZE SUPERANDO A DUALIDADE CORPO-

ESPÍRITO POR MEIO DA MÚSICA

De acordo com Marie-Laure Bachmann (1984), ex-diretora do instituto

Jacques-Dalcroze de Genebra, o nascimento da rítmica, ou seja, da

metodologia de ensino de música elaborada por Émile Jacques-Dalcroze,

coincide com o retorno do ser humano ao centro das preocupações filosóficas,

psicológicas e pedagógicas. Por esta razão, certamente que o desenvolvimento

dessas disciplinas propiciou novas teorias que nos influenciam até hoje.

Segundo Bachmann (1984), Jacques-Dalcroze foi fortemente

influenciado pelas ideias de seu tempo. Nesse sentido, ele se propôs a ajudar o

homem a desenvolver-se para que este chegue à plenitude. Para isto, o ser

humano deve e precisa trabalhar todos seus sentidos, como destaca a autora:

Nenhuma das faculdades humanas deve ser deixada de lado; elas devem ao contrário poder ajudar-se mutualmente, e fazer com que suas atividades aconteçam concomitantemente tendo em vista o funcionamento equilibrado e harmonioso que é fonte de bem estar. (BACHMANN, 1984, p. 21)

39.

Assim, Jacques-Dalcroze procura ajudar o indivíduo, por meio de seu

método, a potencializar todos os meios de que possui para melhor agir e reagir.

Dessa forma, é preciso desenvolver o homem para que este possa enfrentar

qualquer situação da vida de forma autônoma. Como destaca Bachmann:

Bem estar e autonomia serão frequentemente lembrados por Jacques-Dacroze como consequência natural e evidente da prática assídua de seu método de rítmica. (ibidem, p. 21).

40

Desse modo, uma das preocupações da metodologia elaborada por

Jacques-Dalcroze é a adaptação do indivíduo ao meio em que vive. Bachmann

(1984, p. 22) destaca que como pedagogo da música, o autor mencionado

acima, se dedica a compreender como acontece a adaptação do sujeito. Para

isto, não basta o mero desenvolvimento dos sentidos humanos, é preciso ir

além, e otimizar ao máximo as potencialidades do indivíduo. Dessa forma, o

sujeito chegaria ao pleno desenvolvimento de suas capacidades e

39

Aucune des facultés humaines ne doit être laissée dans l´ombre; elles doivent au contraire pouvoir s´assister mutuellement, et faire concorder leur activité em vue de leur fonctionnement équilibré et harmonieux, qui est source de bien-être. 40

Bien-être et autonomie seront souvent évoqués par Jacques-Dalcroze comme les conséquences naturelles et évidentes de la pratique assidue de sa méthode de rythmique.

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consequentemente da sua autonomia. E, a música é para Jacques-Dalcroze

uma das melhores ferramentas para o desenvolvimento do ser humano, e

certamente é o modelo a ser seguido, pois de certa forma empresta dos ritmos

do corpo humano seu modelo de ritmo (p. 22).

Como mencionado anteriormente, Jacques-Dalcroze foi, de certa forma,

influenciado pelas ideias de seu tempo e a herança filosófica da dualidade do

ser é uma delas. De um lado tem-se o espírito que pode ser representado pela

inteligência, pela imaginação e pelos sentimentos. Do outro, a matéria

representada pelo corpo, pela ação, pelos sentidos e instintos. Como salienta

Bachmann (1984), espírito e matéria são adversários de longa data que

Jacques-Dalcroze tentará reunir para que o homem intelectual não seja

independente do homem físico (p. 22).

A fusão entre corpo e intelecto necessita, como Bachmann (1984)

aponta, de um catalisador, de uma liga que permita a aproximação desses

extremos. E, Jacques-Dalcroze utiliza-se da música como reconciliadora da

dicotomia espírito-corpo, pois é com ela que:

(...) dançamos e sonhamos, ela que seduz ou que agride nossos ouvidos como nosso pensar, que influência nossos sentimentos, que revela nossos instintos... Não há faculdade humana que seja envolvida pela música que as combina de mil maneiras, criada pelo homem e dirigida a ele, a música é dentre todas as produções humanas a que permanece a mais intimamente ligada à vida. (ibidem, p. 23)

41.

Desse modo, como Bachmann (1984) salienta, a música é a única arte

capaz de unir o espírito e corpo, pois como diz Jacques-Dalcroze (1965, p. 43),

a música “é composta de sonoridade e de movimento, ora o som é uma forma

de movimento” 42 e, o corpo, também é movimento. No que tange ao espírito,

este pode suscitar emoções e pensamentos que também são sinônimos de

movimento. Por isso que a música é a única arte capaz de “juntar estreitamente

41

(...) on danse et sur ele que l´on rêve, elle qui charme ou qui agresse nos oreilles comme notre pensée, qui influence nos sentiments, révèle nos instincts... Il n´est pas une seule de nos facultés humaines qu´elle met en jeu en les combinant de mille façons, créée par l´homme et s´adressant à lui, la musique est de toutes les productions humaines celle qui reste le plus intimmement mêlée à la vie. 42

(...) est composée de sonorité et de mouvement; or le son est une forme de mouvement.

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em uma só lei como em uma só força, todas as energias dispersas” (JAQUES-

DALCROZE, 1965, p. 114) 43.

Ora, para Jacques-Dalcroze (1965) é por meio do ritmo que ocorre a

ligação entre corpo e espírito, pois o ritmo é movimento, é interrupção e, como

Bachmann (1984) salienta, “o ritmo é a base de todas as manifestações vitais,

das mais evoluídas como das mais elementares” (p. 24) 44. Além disso, o ritmo

exprime as manifestações individuais, como destaca a autora:

Desse modo, a mesma ação realizada por duas pessoas diferentes terá uma duração, uma importância, um significado diferente de acordo com o ritmo pessoal. Do mesmo modo, a organização de um dia de trabalho, a expressão escrita de um pensamento, e em geral de toda atividade humana, de ordem prática, artística ou intelectual, carregarão a marca do ritmo individual da pessoa que o exerce. (BACHMANN, 1984, p. 24)

45.

Nesse sentido, é por meio do domínio do ritmo que o homem pode

chegar à plenitude com a união corpo-espírito, como argumenta Jacques-

Dalcroze (1965), todo “homem de ciência pode tornar-se um esportista no

momento em que desejar” (p. 163) 46. Dessa forma, o catalizador, ou seja, o

responsável pelo elo entre espírito e matéria é, segundo Jacques-Dalcroze, o

ritmo, que pode ser desenvolvido por sua metodologia denominada de rítmica.

4.2. A ORGIGEM MOTRIZ DO SIGNIFICADO RÍTMICO

Quando era professor de harmonia no conservatório de Genebra,

Jacques-Dalcroze (1965) percebeu a imensa dificuldade que seus alunos

tinham nos ditados harmônicos47. Na verdade, ele se deu conta que o ensino

43

(...) de rélier étroitement en une seule loi comme en une seule force, toutes les energies et les lois éparses. 44

le rythme est la base de toutes les manifestations vitales, les plus évoluées comme les plus élémentaires 45

Ainsi la même action exécutée par deux personnes diferentes aura une durée, une importance, une signification diferentes selon le rythme personnel qui la sous-tend. De même l´organization d´une journée de travail, l´expression écrite d´une pensée, et en general toute activité humaine d´ordre pratique, artistique ou intellectual, porteront la marque du rythme individual de celui qui s´y consacre. 46

(...) l´homme de science doit pouvoir devenir l´homme sportif au moment où il le désire. 47

Ditados harmônicos referem-se a uma forma de ditado musical, no qual, acordes são

tocados num instrumento harmônico (normalmente no piano).

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de música era equivocado, já que ao invés de construir uma base por meio de

aulas práticas, pedia-se aos alunos que escrevessem acordes, diretamente,

sem preparação prévia, ou treinamento. Desse modo, o autor destaca a

necessidade de fazer com que os alunos passem por experiências práticas,

antes mesmo de requisitar-lhes que escrevam o que estão ouvindo. Como

afirma Jacques-Dalcroze (1965):

(...) eu entendi que o erro do ensino usual é de fazer experiências com os alunos somente no momento em que se pede que anotem suas consequências, - ao invés de impor no começo dos estudos, no momento em que o corpo e o cérebro se desenvolvem em paralelo, comunicando sem cessar impressões e sensações. (JACQUES-

DALCROZE, 1965, p. 5) 48

.

Assim, Jacques-Dalcroze (1965) se pôs a treinar os ouvidos dos seus

jovens alunos, e percebeu que tão logo estavam treinados “aos

encadeamentos naturais dos sons e dos acordes, que sua mente não teria

nenhuma dificuldade em acostumar-se com os diversos processos de leitura e

escrita” (p. 5) 49. Em breve, o pedagogo musical chegaria à conclusão de que

“tudo que na música é de natureza motriz e dinâmica” (p. 5) 50, não se refere

necessariamente ao ouvido, mas ao corpo inteiro. O que deu origem a sua

abordagem de ensino de música, na qual os alunos eram treinados com

movimentos como caminhar, parar, e eram treinados para reagir com o corpo

inteiro na audição de ritmos musicais. Ele denominou seu método de rítmica

(em francês: rythmique).

Segundo Jacques-Dalcroze (1965, p. 37), para ser um músico completo

é necessário dominar aspectos do corpo e do espírito. Assim, o ouvido, a voz e

a consciência do som, dizem respeito ao espírito. Por outro lado, o corpo com

seus músculos e nervos, assim como a consciência do ritmo corporal, referem-

se, de acordo com o autor, ao corpo. De fato, é por meio do ouvido que se

percebe os sons e os ritmos, e é a voz que os reproduz. Além disso, a

consciência do som diz respeito a como se representa, na mente, a música

48

(...) j´ai compris que l´erreur de l´enseignement usuel est de ne faire d´expériences aux élèves qu´au moment même où on leur demande d´en noter les conséquences, - au lieu de les imposer tout au commencement des études, au momento où corps et cerveau se développent parallèlement, se communiquant incessamment impréssions et sensations. 49

(...)aux enchaînement naturels de sons et d´accords, son esprit n´a plus aucune peine à s´habituer aux divers procédés de lecture et d´écriture. 50

(...) tout ce qui, en musique, est de nature motrice et dynamique.

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percebida. Nesse sentido, é por meio de experiências repetidas de escutas e

da voz que se desenvolve a consciência do som.

Por sua vez, são através dos movimentos do corpo que se podem

perceber os ritmos. E, a consciência do ritmo se desenvolve “com o auxílio de

experiências reiteradas de contração e descontração muscular” (p. 37) 51.

Observa-se, portanto, que a consciência do som e do corpo necessita de

reiteração. Nesse sentido, a música demanda a coordenação simultânea do

ouvido, da voz e do corpo.

Ora, Jacques-Dalcroze (1965) diz que a própria musculatura percebe os

ritmos e com a reiteração de experiências rítmicas “se forma a memória

muscular e determina uma representação precisa e certa do ritmo” (p. 38) 52.

Assim, como o ouvido percebe os ritmos, e, com a reiteração de experiências

forma a memória sonora, é com a repetição que se aguça a percepção e

aspectos críticos relativos ao conteúdo musical escutado. Contudo, Jaques-

Dalcroze (1965) afirma que para iniciar os estudos de música deve-se iniciar

pela construção de representações motoras, como destaca o autor:

Se, enfim, admitindo a máxima de que a execução deve preceder a percepção e a crítica pessoal, nós comparamos as funções do ouvido com as da musculatura, e podemos afirmar que, a ordem de sucessão dos estudos musicais elementares deve ser a seguinte, em primeiro lugar cabe desenvolver o aparelho muscular... (JACQUES-DALCROZE, 1965, p. 38)

53.

Além disso, o autor destaca que o corpo da criança possui naturalmente

a noção de compasso musical. Através, dos batimentos cardíacos regulares,

mesmo que seja de forma inconsciente, se tem clareza do ritmo que pode ser

executado ou percebido. Também, com a respiração se têm ritmos regulares

que obedecem a músculos que podem ser controlados de acordo com nossa

vontade, mesmo que de forma limitada.

51

(...) à l´aide d´expériences répétées de contraction et de décontraction musculaire. 52

(...) se forme la mémoire musculaire et se determine une représentation nette et sûre du rythme. 53

Si enfin partant du príncipe que l´exécution doit preceder la perception et la critique personnelle, nous comparons les fonctions de l´oreille avec celles de l´appareil musculaire, nous arriverons à affirmer que, dans l´ordre des études musicales élémentaires, la première place échoit à l´appareil musculaire...

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O caminhar com certa regularidade é também um modelo de compasso

musical e de divisão do tempo. Porém, os músculos responsáveis pela

locomoção obedecem totalmente à vontade humana. Dessa forma, para

Jacques-Dalcroze (1965), o ponto de partida para a iniciação musical é

simplesmente o caminhar. Aos poucos o corpo inteiro será envolvido com

exercícios rítmicos, como aponta o autor:

Esta consciência do ritmo necessita da mobilização de todos os músculos conscientes, e é, portanto, o corpo inteiro que a educação deve movimentar para criar o sentimento rítmico. Diga-se de passagem, que condena-se o sistema de ensino musical que consiste em fazer estudar piano às crianças, antes de que seus organismos tenham uma consciência precisa e clara dos movimentos musculares cadenciados e ritmados. (ibidem, p. 39)

54.

Assim, Jacques-Dalcroze (1965) destaca a importância do movimento no

seu sistema de ensino. Alias, conforme suas próprias palavras “os músculos

são criados para o movimento, e o ritmo é movimento” (p. 39) 55. Dessa forma,

para o autor é simplesmente impossível representar ritmos sem que o corpo

esteja em movimento. Portanto, o movimento necessita de um espaço e de um

tempo para acontecer. E, são determinados pelo início e pelo fim do

movimento.

Ademais, Jacques-Dalcroze (1965) diz que o movimento é influenciado

pela força da gravidade, pela elasticidade e pela força muscular do sujeito.

Nesse sentido, a “forma do movimento é resultado da força muscular, de

extensão do espaço a percorrer, e da duração, combinados” (p. 39) 56.

Por isso, a importância de dominar preliminarmente os movimentos, no

sentido, das relações de “força, espaço e tempo” (p. 40) 57 para que se execute

um ritmo de forma adequada, segundo Jacques-Dalcroze (1965). Ele conclui

que:

54

Cette conscience du rythme demande le concours de tous les muscles conscientes, et c´est par conséquent le corps tout entier, que l´éducation doit mettre en mouvement pour créer le sentiment rythmique. Soit dit en passant, c´est la condamnation du système d´instruction musicale qui consiste à faire étudier le piano aux enfants, avant que leur organisme ait une conscience nette et claire des mouvements musculaires mesurés et rythmisés. 55

Les muscles sont crées pour le mouvement, et le rythme c´est du movement. 56

(...) la forme du mouvement resulte de la force musculaire, de l´étendue de la portion d´espace, et de la durée de la fraction de temps, combinées. 57

(...) force, d´espace et temps.

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1) O ritmo é movimento. 2) O movimento é de essência física. 3) Todo movimento exige um espaço e um tempo. 4) A experiência física desenvolve a consciência musical. 5) O aperfeiçoamento de aspectos físicos tem como consequência a precisão da percepção. 6) O aperfeiçoamento dos movimentos no tempo garante a consciência do ritmo musical. 7) O aperfeiçoamento dos movimentos no espaço assegura a consciência da plástica do ritmo. 8) O aperfeiçoamento dos movimentos no tempo e no espaço pode se realizar somente por meio de exercícios de ginástica rítmica. (JACQUES-DALCROZE, 1965, p. 40)

58.

Daí, a importância da ginástica rítmica para o desenvolvimento da

musicalidade, assim como para o aperfeiçoamento da consciência musical que

é desenvolvida por meio do movimento de um fazer musical ativo. Nesse

sentido, Bachmann (1984) suscita que a rítmica dalcroziana se opõe ao ensino

de música dita tradicional, isto é, de um ensino arcaico e medieval pautado na

“escolástica e no livresco” (p. 32) 59.

Desse modo, Bachmann (1984) relata que o aprendizado antes

intelectualizado ou somente técnico deu lugar a um ensino pautado no corpo,

por meio do movimento e da experiência que permitem uma melhor

compreensão dos conceitos musicais (p. 32). Mesmo assim, existe um

descompasso entre as abordagens pedagógicas ativas e as tradicionais, como

aponta a autora:

Hoje, tudo preconiza o vivido, sentido, e, desse modo, se observam numerosas pesquisas que seguidamente são bem sucedidas. Ora, se constata, no entanto, a persistência de um foço existente entre as atividades e a aprendizagem tradicionais estabelecidas e as aspirações da nova educação. (BACHMANN, 1984, p. 33)

60.

Nesse sentido, o método de Jacques-Dalcroze corrobora com a tese

defendida na presente dissertação, de que não faz sentido ensinar à leitura

rítmica partindo da teoria musical, e, sim iniciar o ensino por atividades práticas

58

1) Le rythme est du mouvement. 2) Le mouvement est d´essence physique. 3)Tout movement exige de l´espace et du temps. 4) L´expérience physique forme la conscience musicale. 5) Le perfectionnement des moyens physiques a pour conséquence la netteté de la perception. 6) Le perfectionnement des mouvements dans le temps assure la conscience du rythme musical. 7) Le perfectionnemnt des mouvements dans l´espace assure la conscience du rythme plastique. 8) Le perfectionnement des mouvements dans le temps et dans l´espace ne peut être acquis que par des exercices de gymnastique dite rythmique. 59

(...) scolastique et livresque. 60

Aujourd´hui, tout prône le vécu, le senti, et l´on assiste à de nombreuses recherches dans ce sens, souvent couronnées de succès. Or on constate pourtant la persistance d´un fosse entre les activités et apprentissages traditionnels en vigueur et les aspirations de l´éducation nouvelle.

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que envolvam a motricidade do corpo inteiro para um fazer musical

significativo. Aborda-se em seguida, a polivalência da rítmica dalcroziana que

não se limita à música, e, por vezes, se fusiona e contribui com outros

domínios do conhecimento.

4.3. APLICAÇÕES DO MÉTODO DALCROZE

De acordo com Bachmann (1984), a rítmica de Jacques-Dalcroze tem

como base a integração do espírito com o corpo, como apontado

anteriormente. Esta integração acontece por meio do ritmo, ou seja, de

atividades rítmicas que tem como objetivo desenvolver “meios de ação, de

reação e de adaptação do ser humano ao mundo que o circunda, de modo a

propiciar um aproveitamento máximo destas atividades” (p. 33) 61. Desse modo,

atividades rítmicas dizem respeito a qualquer indivíduo, independente da sua

idade, capacidade física, intelectual e de suas dificuldades. Portanto, não há

requisitos ou necessidade de alguma forma de talento para ser iniciada a

ginástica rítmica.

Aliás, no início, a aplicação da metodologia de Jacques-Dalcroze se deu

no âmbito do conservatório de Genebra. Porém, rapidamente se expandiu para

a escola maternal, para o ensino de cegos, pessoas com necessidades

especiais e, depois, para adultos, como aponta Bachmann (1984):

Ao mesmo tempo, e ainda que tenha feito da infância seu terreno de ação, ele não abandonou a ideia de um adulto aperfeiçoável, sentia ainda mais a necessidade de dar aos professores, mestres, músicos ou especialistas do movimento, os meios de dominar e integrar a seus respectivos domínios os princípios que ele acreditava. (BACHMANN, 1984, p. 34)

62.

61

(...) les moyens d´action, de réaction et d´adaptation de l´être humain au monde qui l´environne, en vue de tirer tout le parti possible. 62

En même temps, et bien qu´ayant fait de l´enfance son terrain d´élection, il n´abandonnait

pas l´idée d´un adulte perfectible, et ressentait toujours davantage la nécessité de donner aux

enseignants, instituteurs, musiciens ou specialists du movement, les moyens de maîtriser et

d´intégrer à leurs domaine respectifs les principes auxquels il croyait.

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Nesse sentido, o leque de atividades que poderiam se beneficiar da

rítmica dalcroziana é enorme. De fato, Jacques-Dalcroze acreditava, como

Bachmann (1984) aponta, que diversos domínios do conhecimento poderiam

tirar partido de sua abordagem. Como aponta a autora:

Homens do teatro, atores e diretores de cinema, diretores de ópera e de balé, dançarinos, coreógrafos; pintores; arquitetos e decoradores, músicos, maestros, compositores, cantores, instrumentistas; homens de letras, críticos e poetas; homens de ciência, médicos, psicólogos, pedagogos,... Em cada uma destas atividades, ele encontrou pessoas suficientemente convencidas do valor da experiência dalcroziana para julgá-la indispensável para o desenvolvimento de suas próprias atividades. (ibidem, p. 34)

63.

Ainda, Bachmann (1984) lembra que depois de Jacques-Dalcroze, seus

alunos diretos ou indiretos continuaram a ampliar à abrangência da rítmica.

Dessa forma, aumentou-se o leque de faixas etárias, assim como a aplicação

terapêutica de seu método. Hoje em dia, a rítmica dalcroziana encontra-se no

cerne de diferentes atividades humanas, sejam elas, relativas à aquisição de

conhecimentos, de práticas artísticas, de aprendizado de técnicas. “Ela se

propõe a favorecer a utilização e a tomada de consciência das capacidades

necessárias para a realização das mesmas” (p. 35) 64.

Além disso, Bachmann (1984) diz que a metodologia de Jacques-

Dalcroze não se refere propriamente a um método fechado, a ser seguido

cegamente. Na verdade, ela prefere usar termos como abordagem, experiência

ou enfoque. Pois, ela aponta caminhos a serem percorridos com certo grau de

flexibilidade, pois a rítmica dalcroziana se funda “na capacidade de fazer com

63

Hommes de théâtre, acteurs et metteurs em scène, directeurs d´opéra et de ballet, danseurs,

chorégraphes ; peintres, architectes et décorateurs, musiciens, chefs d´orquestres,

compositeurs, chanteurs, instrumentistes ; hommes de lettres, critiques et poètes ; hommes de

science, médecins, psychologues, pédagogues..., dans chacune de ces activités il s´est trouvé

des personnes suffisamment persuadées de la valeur de l´expérience dalcrozienne pour la

juger indispensable au développement de leur propre travail.

64 (...) elle se propose de favoriser l´utilisation et la prise de conscience des capacités

nécessaires à leur accomplissement.

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que o conjunto das faculdades humanas tornem-se uma ferramenta eficaz,

aqui, agora e em longo prazo” (p. 38) 65.

Por fim, a apresentação da abordagem de Jacques-Dalcroze realizada

aqui, não tem como objetivo esgotar, de forma alguma, o tema. Na verdade, foi

dada ênfase na parte rítmica devido à compatibilidade da temática da presente

pesquisa. De fato, não se abordaram temas como o solfejo e a improvisação

tão importantes no seu enfoque.

Além disso, é preciso salientar que a participação do autor num curso de

formação no Instituto Dalcroze, realizado no ano de 2010, em Genebra na

Suíça, como mencionado anteriormente, foi fundamental para a elaboração das

aulas do experimento realizado nesta pesquisa. Nesse sentido, as atividades

realizadas pelos participantes foram fortemente inspiradas em atividades da

abordagem de Jacques-Dalcroze.

4.4. EDGAR WILLEMS

Falando sobre o surgimento de uma nova educação musical, WILLEMS

(1968, p. 9) diz que a música vem evoluindo no decorrer da história, e que no

momento em que escreve estava acontecendo “uma metamorfose peculiar com

relação direta com a época” (p. 9) 66, em que vivia. Além desta influência de

aspecto histórico-cultural, outra variável influenciou, segundo ele, as mudanças

na educação musical: o desenvolvimento da psicologia que trouxe bases

racionais para justificar novos procedimentos metodológicos, como destaca o

autor:

Em seguida, que a educação musical, que tinha sido e ainda é parcialmente entregue ao empirismo, está graças ao desenvolvimento

65

(...) sa capacité à faire de l´ensemble des facultés humaines un outil efficace ici, maintenant

et à long terme.

66 (...) métamorphose très particulière en rapport direct avec l´époque.

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da psicologia contemporânea, encontrando bases racionais. (WILLEMS, 1968, p. 9).

67

Dessa forma, significativas mudanças vieram abalar a educação musical

no início do século XX. Além das relatadas acima, Willems (1968) salienta,

também, as mudanças sociais que levaram à democratização da música, o que

justifica a renovação da educação musical. Nesse sentido, suas ideias são bem

próximas das de Jacques-Dalcroze, seu antigo mestre, no que tange à busca

pelo equilíbrio entre corpo e espírito, e do ideal de busca pela perfeição, como

aponta o autor:

Aliás, é normal que se procure sempre, em qualquer atividade humana, a busca por um fazer sempre melhor. Porque a educação musical deveria ser à exceção a regra? Orientada continuamente em rumo à perfeição, rumo a um ideal, é seguir a lei do progresso. É também, manter o equilíbrio entre as forças materiais e espirituais que tendem à oposição entre si. (ibidem, p. 9-10)

68.

Nesse sentido, Willems (1968) sustenta que os novos métodos de

educação musical, isto é, os métodos ativos, trouxeram para a música novas

possibilidades pedagógicas que tornaram o ensino da música mais vivo,

agradável e musical. Dessa forma, o ensino musical é pautado em três esferas:

o desenvolvimento da escuta com ênfase para exercícios que desenvolvam o

ouvido musical, atividades corporais rítmicas para o desenvolvimento do ritmo

e atividades instrumentais que desenvolvam a musicalidade, e não somente o

aspecto mecânico do estudo instrumental.

Assim, de acordo, com Fonterrada (2008) o método Willems se

preocupa principalmente com o desenvolvimento da audição. Nesse sentido,

ela destaca a importância de ensinar a ouvir com exercícios específicos para

tal fim, e depois, se dedica a desenvolver a compreensão do que é escutado

(p. 142). Porém, a segunda esfera a ser desenvolvida no aprendizado musical

67

Ensuite, que l´éducation musicale, qui avait été et est encore partiellement livrée à

l´empirisme, est en passe, grâce au développement de la psychologie contemporaine, de

trouver des bases rationnelles.

68 Il est d´ailleurs normal qu´on cherche toujours, dans n´importe quelle activité humaine, à faire

de mieux en mieux. Pourquoi l´éducation musicale ferait-elle exception à la règle ? Tendre sans

cesse vers une perfection, vers un idéal, c´est suivre la loi du progress. C´est aussi maintenir

l´équilibre entre les forces matérielles et spirituelles qui tendent à s´opposer les unes aux

autres.

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é, para Willems (1968), nos moldes da abordagem dalcroziana, o aspecto

rítmico.

4.5. WILLEMS E O ENSINO DO RITMO

Willems (1950) defende que o ritmo é um dos elementos fundamentais

da música, junto com a melodia e a harmonia. Também, é “expressão direta de

um dos elementos constitutivos da natureza humana: a vida física” (p. 87) 69.

Nesse sentido, mesmo podendo observar o ritmo sob o ângulo mental ou

afetivo, é na vida física que se encontra a fonte do ritmo. Por isso, a

importância do movimento do corpo humano. Movimento, este, que pode ser

observado também na natureza.

No que tange a educação musical, Willems (1950) diz que a iniciação ao

ritmo deve ter como subsídio o movimento corporal, e de forma alguma a teoria

musical que traz um aspecto abstrato e cerebral a ser evitado, como aponta o

autor:

A educação musical dos pequenos, que estão ainda perto da origem natural da vida, nos permite estudar de perto a fonte real do ritmo musical. Esta busca como acabamos de ver, no movimento corporal e não na teoria, ou no cálculo sua fonte. A criança deve começar movimentando-se harmoniosamente de acordo com as leis naturais; aqui o instinto precede a consciência cerebral. Quando se trata das leis da vida física, deve-se desconfiar de qualquer intrusão cerebral prematura. (WILLEMS, 1950, p. 88)

70.

Ora, o ensino do ritmo musical deve desenvolver, segundo Willems

(1950), aspectos relativos ao sentido espaço e ao tempo. Dessa forma, por

meio do movimento corporal que a “sensação do transcorrer do tempo” (p. 88)

69

(...) est l´expression directe d´un des elements constitutifs de la nature humaine : la vie

physique.

70 L´éducation musicale des tout-petits, qui sont encore près des sources naturelles de la vie,

nous permet d´étudier de près la source réelle du rythme musical. Celle-ci est à chercher, comme nous venons de le voir, dans le mouvement corporel et non pas dans une théorie, ni dans un calcul. L´enfant doit commencer par bouger harmonieusement selon les lois naturelles ; ici l´instinct doit précéder la conscience cérébrale. Lorsqu´il s´agit des lois physiques de la vie, il faut se méfier d´une instrusion cérébrale prématurée.

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71 se desenvolve pela “experiência prática” (p. 88) 72. Assim, é “pelo movimento

corporal, que o sentido temporal junta-se ao sentido espacial, mais concreto,

mais tangível” (p. 88)73.

Também, de acordo com Willems (1950), a cultura rítmica é

fundamentada basicamente pelo instinto rítmico que pode ser desenvolvido

através de aulas de rítmica. Lembrando que “graças, (...), a Jacques-Dalcroze

se dá atualmente importância à educação rítmica” (p. 90) 74. Nesse sentido, as

aulas de rítmica devem ser dadas em paralelo às aulas de preparação musical

que enfatizam o aspecto da escuta, tão importante para este autor.

Assim, são as atividades rítmicas que acontecem inicialmente à prática

musical.

Willems (1950) argumenta que três aspectos do ritmo devem ser

praticados instintivamente, o pulso, o compasso e a subdivisão do tempo.

Somente mais tarde o aluno passará por uma tomada de consciência e terá

acesso às mais diversas fórmulas rítmicas e subsequentemente aprenderá a

ler e escrever os diversos ritmos existentes. Dessa forma, se faz para em

seguida se compreender o que se está fazendo, como destaca o autor:

Estes elementos devem ser sentidos e executados corporalmente. Deve-se, antes de tudo, treinar a criança a fazer, a executar sem pensar. O intelecto frequentemente se opõe a livre expressão da vida, (...), temos uma base prática para o futuro estudo da leitura e da escrita musical. O cálculo virá no momento, para a tomada de consciência, cerebral, daquilo que foi vivido, experimentado, realizado pelo instinto. (WILLEMS, 1950, p. 91)

75.

Portanto, as contribuições do método Willems são muito próximas da

abordagem de Jacques-Dalcroze e apontam a necessidade da ação antes de

71

(...) sensation de l´écoulement du temps. 72

(...) l´expérience pratique. 73

Par le mouvement corporel, le sens du temps rejoint celui de l´espace, plus concret, plus tangible. 74

Grâce, (...), à Jacques-Dalcroze, on donne actuellement de l´importance à l´éducation

rythmique. 75

Ces éléments doivent être ressentis et réalisés corporellement. Il faut, avant tout, entraîner

l´enfant à faire, à exécuter sans trop raisonner. L´intellect contrecarre souvent la libre

expression de la vie, (...), nous avons une base pratique pour l´étude future de la lecture et de

l´écriture musicale. Le calcul ne viendra qu´à ce moment, pour prendre conscience,

cérébralment, de ce qu´on a vécu, experimente, réalisé para l´instinct.

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75

uma futura tomada de consciência daquilo que é feito, como relata Willems

(1950):

Aliás, no começo, nossa intenção não consiste em fazer bem, mas de fazer. Deve-se agir primeiro e canalizar a ação em seguida; e tornar-se consciente mais tarde a fim de poder ler e escrever música. (WILLEMS, 1950, p. 97)

76.

As ideias desses dois autores de métodos ativos em educação musical

se aproximam das ideias do referencial teórico desta pesquisa. E, também,

serviram como fonte de inspiração para o estabelecimento de práticas

pedagógicas ativas no experimento de ensino. Nesse sentido, é preciso

destacar que existem abordagens ativas no Brasil, inspiradas, sem dúvida, nos

métodos ativos de primeira geração, como o método O Passo de Lucas

Ciavatta, ou as partituras gráficas do professor Luís Borcheidt que são

mencionadas no apêndice desta dissertação. No entanto, essas iniciativas

continuam tímidas no contexto educacional brasileiro.

O próximo capítulo aborda como é construída a inteligência da criança

ao adolescente, de acordo com a epistemologia de Jean Piaget que, a nosso

ver, justifica as práticas educativas dos teóricos dos métodos ativos, e o

experimento de ensino desse trabalho.

76

D´ailleurs, au début, notre intention n´est avant tout de bien faire, mais de faire. Il faut agir

d´abord et canaliser l´action ensuite; en devenir conscient plus tard afin de pouvoir lire et écrire

la musique.

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5. JEAN PIAGET E O ENSINO MUSICAL: POSSIBILIDADES DE

DIÁLOGO

A exposição das ideias piagetianas que segue tem por objetivo explicar

alguns conceitos importantes tomados como referencial teórico da presente

pesquisa. Estas explanações não pretendem esgotar, de modo algum, a teoria

psicogenética desenvolvida por Jean Piaget (1896-1980) que é ampla e

complexa, e que tem como principal objetivo explicar a gênese da inteligência

humana.

Assim, a explanação dos conceitos abordados a seguir tem como

principal meta explicar como, aos olhos do construtivismo piagetiano, o

conhecimento musical, e especificamente, o ensino da leitura rítmica poderia

ser entendido a partir de Piaget. Nesse sentido, é necessário compreender

como é construído o pensamento da criança para chegar ao pensamento do

adolescente, objeto deste estudo.

5.1. O CONSTRUTIVISMO PIAGETIANO

O pesquisador, biólogo e psicólogo suíço Jean Piaget foi um dos mais

importantes nomes da psicologia do século XX. Conhecido por seu rigor

científico, por sua vasta produção bibliográfica e por sua teoria construtivista

que, de acordo com Stoltz (2013) “entende o desenvolvimento psicológico

humano a partir de construções que se estabelecem de um nível inferior a um

nível superior e são desencadeadas pela interação do sujeito com o meio físico

e social” (p. 17).

Para Piaget (1958; 1964; 1974; 2003) o processo de desenvolvimento

cognitivo começa a partir do nascimento do sujeito que interage num dado

meio físico e social. Dessa forma, a inteligência é construída gradativamente e

paulatinamente por meio da interação que se dá pela ação do sujeito. Para

Piaget não há conhecimento inato. O sujeito desenvolve seu aparato cognitivo,

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isto é, sua forma de pensar, memorizar, raciocinar, entre outros atributos da

mente, através da interação com o meio físico e social.

Na verdade, Piaget (2003) destaca que é através do estudo da

psicologia da criança que se chega à compreensão de aspectos da psicologia

geral. Já que a psicologia da criança trata do desenvolvimento mental, ou seja,

aborda o crescimento mental que está relacionado com o desenvolvimento de

condutas e comportamentos do sujeito até o desenvolvimento de sua

consciência. Nesse sentido, Piaget (1972; 2003) destaca a diferença existente

entre a psicologia da criança e a psicologia genética. Para ele, a psicologia da

criança é um instrumento importante da psicologia genética. Dessa forma, o

termo genético nada tem a ver com o termo empregado pela biologia que se

refere à hereditariedade. A psicologia genética estuda o desenvolvimento

individual, isto é, o aspecto ontogenético77. Além de a mesma tratar da

psicologia geral como, por exemplo, o estudo da inteligência. Neste caso, se

procura explicar a gênese dos processos mentais, recorrendo de fato à

psicologia da criança que é um instrumento para explicar problemas da

psicologia geral, citando Piaget:

Chamamos psicologia genética o estudo do desenvolvimento das funções mentais, podendo esse desenvolvimento fornecer uma explicação, ou pelo menos um complemento de informação, quanto a seus mecanismos no estado acabado. Em outras palavras, a psicologia genética consiste em utilizar a psicologia da criança para encontrar a solução dos problemas psicológicos gerais (PIAGET, 1972, p. 280).

De acordo com Becker (1997; 2012), a posição evolucionista da teoria

piagetiana se contrapõem às visões empiristas e aprioristas. Na visão empirista

o conhecimento emana dos objetos presentes no meio externo que através de

reforço é internalizado, porém as estruturas de conhecimento são sobrepostas,

uma sobre as outras, sem haver necessariamente transformação do sujeito.

Dessa forma, o sujeito seria somente um receptor passivo de informações

advindas da realidade. Por sua vez, a visão apriorista destaca que o sujeito

nasce pronto para a aprendizagem. Dessa forma, as estruturas do sujeito são

pré-formadas, são inatas e herdadas geneticamente.

77

Origem do desenvolvimento do organismo desde o embrião.

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Para Piaget a inteligência não é inata, pois surge da interação entre o

sujeito com o meio físico e mental. Dessa forma, a inteligência é construída por

meio da interação. E, nesse sentido, de acordo com Stoltz (2013) “é preciso

entender que, ao mesmo tempo em que o sujeito constrói o objeto, constrói a si

mesmo” (p. 17). Assim, Piaget (1936) utiliza a capacidade de adaptação e de

organização do ser humano, noções estas retiradas da biologia, para explicar

como o ser humano constrói seu conhecimento.

Nesse sentido, Stoltz (2013) destaca que a adaptação é um processo

“dinâmico e contínuo, no qual a estrutura do organismo interage com o meio

externo para se reconstituir e criar uma nova significação para o sujeito” (p. 18).

Assim, por meio da adaptação, o sujeito passa por um processo interno de

construção, no qual integra e organiza o conhecimento assimilado, em forma

de um sistema.

5.2. FATORES QUE INFLUENCIAM O DESENVOLVIMENTO COGNITIVO

De acordo com Dole (1974), Piaget foi muito criticado por basear suas

pesquisas exclusivamente no estudo do desenvolvimento da inteligência do

sujeito, deixando de lado fatores como o meio social, a educação, a maturação,

etc. Buscando responder a seus “detratores”, Piaget (1958; 1964; 1965; 1972)

argumenta que a construção da inteligência depende de quatro fatores: a

maturação, a experiência física, a interação social e o mecanismo de

equilibração que integra os demais fatores.

O primeiro fator, ou seja, a maturação nervosa é condição sine qua non

para o desenvolvimento cognitivo. Ela pode ser determinante na gênese de

algumas condutas, porém não pode ser considerada como único fator de

desenvolvimento, citando o autor:

constata-se que a maturação abre possibilidades, que aparece portanto como uma condição necessária para a aparição de certas condutas, mas que não é sua condição suficiente, pois deve se reforçar pelo exercício e pelo funcionamento. Ademais, se o cérebro contém conexões hereditárias, ele contém um número sempre crescente de conexões, das quais a maioria é adquirida pelo exercício (DOLLE, 1974, p. 69).

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A maturação é indispensável e é responsável pelo desenvolvimento do

organismo. Ela é sem dúvida determinante no desenvolvimento da inteligência.

Basta observar que sem maturação orgânica não há condições de construção

qualquer. Por exemplo, dificilmente uma criança entenderá conceitos abstratos

da matemática.

O segundo fator de desenvolvimento cognitivo é a experiência adquirida

da ação sobre objetos. Para que haja desenvolvimento cognitivo há

necessidade da ação do sujeito sobre objetos. Existem duas modalidades de

experiência para Piaget, a experiência física e a experiência lógico-matemática.

A primeira se refere, por exemplo, a abstração de determinadas características

físicas de dado objeto. De acordo com Stoltz (2013), a experiência lógico-

matemática deriva da coordenação de ações sobre o objeto, da qual o sujeito

abstrai conhecimentos. Este processo denomina-se abstração reflexionante

(Piaget, 1977a; 1977b) e se refere ao conhecimento extraído pelo sujeito da

coordenação das suas ações, citando a autora:

Já a experiência lógico-matemática leva a um conhecimento a partir das coordenações de minhas ações e necessita de uma abstração reflexionante. A abstração reflexionante (...) é o resultado de um conhecimento advindo da coordenação das ações exercidas pelo sujeito sobre o objeto. Esse conhecimento não está no objeto, mas no sujeito que pensa. Por exemplo, o conhecimento de que há objetos mais quentes e objetos mais gelados do que outros não está no objeto, mas na mente do sujeito que pensa, e depende do estabelecimento de relações. A abstração reflexionante envolve o relexionamento e a reflexão. O reflexionamento constrói em um plano superior o que foi construído no plano da ação. Já a reflexão refere-se a um reflexionamento de segundo grau ou a uma tematização em um plano superior do que foi construído por meio da coordenação de ações (STOLTZ, 2013, p. 22).

De acordo com a autora, a experiência isolada não é suficiente para

explicar o desenvolvimento cognitivo, pois necessita da compreensão do

processo em si. Além disto, a compreensão da experiência adquirida na ação

depende dos outros fatores responsáveis pelo desenvolvimento da inteligência,

ou seja, da maturação biológica do sujeito, da interação e da transmissão

social e do processo de equilibração.

A interação e a transmissão social como fator de desenvolvimento

cognitivo se refere às interações vividas pelo sujeito em sociedade. Diversos

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conhecimentos são adquiridos dessa forma. Notadamente, como Dolle (1970)

destaca, a linguagem é um deles. Porém, ele lembra que a socialização e o

intercâmbio social começam com “condutas, (e), a socialização do pensamento

só é possível quando as estruturas de reversibilidade são adquiridas” (p. 70).

Isto significa que mesmo com a interação do sujeito no meio, sem a maturação

biológica, não há como o mesmo desenvolver-se. Também, ele destaca a

importância da escola como fator de transmissão social por meio da educação.

O quarto fator de desenvolvimento cognitivo é um elemento que integra

os fatores precedentes e se nomeia processo de equilibração. A seguir explica-

se como este processo acontece.

5.3. O PROCESSO DE EQUILIBRAÇÃO

Ele é um processo autorregulador do sujeito que está em situação de

desequilíbrio provindo de perturbações ou de um conflito cognitivo que busca

se adaptar ao meio no qual está inserido buscando um equilíbrio temporário.

Na verdade, de acordo com Stoltz (2013), a busca por um equilíbrio provisório

é a busca pela adaptação e o processo de equilibração “consiste no processo

de busca de um novo equilíbrio a partir de uma situação de desequilíbrio

cognitivo” (p. 24).

Para Piaget (1978), a inteligência é “adaptação às situações novas e é

então uma construção de estruturas” (p. 61). Estas são “um sistema de

transformações – indo do mais simples ao mais complexo” (p. 59). Nesse

sentido, de acordo com Stoltz (2013), o esquema é a unidade fundamental de

conhecimento. Na verdade, ele diz respeito à internalização da ação pela

generalização de seus atributos que podem ser repetidos. A construção de

esquemas de ação constituem as estruturas.

Stoltz (2013) destaca que a construção de estruturas novas de

conhecimento faz parte do desenvolvimento cognitivo representado por uma

adaptação do sujeito ao meio no qual está inserido. E o processo de

desenvolvimento das estruturas da inteligência está diretamente ligado à

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embriogênese, isto é, “ao desenvolvimento do corpo e de todas suas funções

que só se completa na adolescência” (p. 20).

Dessa forma, a adaptação e a organização são para Piaget (1936; 1964;

1983a) invariantes funcionais que levam ao desenvolvimento cognitivo e à

aprendizagem e estão estreitamente ligados ao processo de assimilação e

acomodação que são mecanismos complementares e indissociáveis.

5.3.1. A ASSIMILAÇÃO E A ACOMODAÇÃO

Piaget (1967) diz que nenhum conhecimento, nem que seja um

conhecimento perceptivo, é uma pura cópia da realidade, pois sempre contém

um processo de assimilação envolvido, “nós tomamos o termo assimilação no

sentido amplo de uma integração a estruturas prévias” 78 (p. 22). Nesse

sentido, a assimilação de conhecimento pode em alguns casos não modificar a

estrutura prévia, e em outros pode modificá-la ocorrendo adaptações e

acomodações à nova situação, como exemplifica Piaget:

Quando um homem ou um animal percebe um objeto, ele o identifica como pertencente a alguma categoria, conceitual ou prática, ou no plano propriamente perceptivo, ele o percebe pelo intermediário de esquemas funcionais ou espaciais (...): ele então o assimila a estruturas mais ou menos complexas e de diferentes níveis, mas anteriores a sua percepção do momento. (PIAGET, 1967, p. 22)

79.

Logo, para Piaget (1967) qualquer tipo de conhecimento contém sempre

e necessariamente “um fator fundamental de assimilação, que é o que dá

significado ao que é concebido e percebido” 80 (p. 23). O autor destaca que

para alguns antigos psicólogos e fisiologistas o termo assimilação significa

78

(…) nous prenons le terme assimilation au sens large d´une integration à des structures

préalables.

79 Quand un homme ou un animal perçoit un objet, il l´identifie comme appartenant à certaines

categories, conceptuelles ou pratiques, ou, sur le plan proprement perceptive, il le perçoit par

l´intermédiaire de schèmes fonctionnels ou spatiaux (...): il assimile donc à des structures plus

ou moins complexes et de niveaux divers mais antérieurs à as perception du moment.

80 (...) un facteur fondamental d´assimilation, qui seul confere une signification à ce qui est

perçu e conçu.

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82

“associação” 81, como demonstra o exemplo do cachorro do experimento de

Pavlov que escuta o som de uma campainha, em seguida recebe comida e

associa uma coisa à outra. Desse modo, ao escutar a campainha se põe a

salivar. Para Piaget (1967), a associação é somente um momento parcial do

processo de assimilação, já que o reflexo condicionado não é estável e

necessita periodicamente de reforço; caso a campainha soe e não se dê

comida para o cachorro, este após algumas repetições logo cessará de salivar.

Assim, esta associação só tem significado se estiver assimilada a um esquema

maior, num contexto mais amplo que “no início compreende a necessidade de

comida e a satisfação final, e a associação é o produto de um recorte arbitrário

no interior de um processo mais amplo” 82 (p. 23).

Dessa maneira, para Piaget (1967) o processo de assimilação é

duplamente importante, pois por um lado implica em significações necessárias

a qualquer conhecimento, e por outro lado a assimilação “expressa o fato

fundamental que todo conhecimento está ligado a uma ação e que conhecer

um objeto ou um evento, é utilizá-los assimilando-os aos esquemas de ação” 83

(p. 23).

No entanto, Piaget (1948) relata que a assimilação é uma forma de

adaptação que passa por transições, sendo assim, as adaptações ditas

hereditárias duplicam-se em adaptações não inatas. Isto significa que aos

poucos “os processos reflexos (...) são incorporados às atividades corticais” 84

(p. 48). Na verdade, Piaget as nomeia como associações adquiridas, hábitos

ou reflexos condicionados. Somente quando há intencionalidade que se pode

falar do começo da assimilação psicológica, antes disso, Piaget (1948) refere-

81

“associations”.

82 (…) comprenant le besoin de nourriture au départ et la satisfaction finale, et l´association

n´est que le produit d´un découpage arbitraire au sein de ce processus plus large.

83 (…) exprime ce fait fondamental que toute connaissance est liée à une action et que

connaître un objet ou un événement, c´est les utiliser en les assimilant à des schèmes

d´actions.

84 (...) les réflexes s´intègrent (…) aux activités corticales.

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83

se somente à assimilação por “secundários” 85 (p. 48), ou seja, que dizem

respeito às primeiras ações sobre coisas.

Por isso, é importante deixar claro que a assimilação biológica é uma

coisa e a psicológica outra, pois a adaptação inicial, ou seja, a hereditária

inclui, como sugere Piaget (1948), assimilação e acomodação como uma só

coisa, por isso são indiferenciadas. Como explica Piaget:

Do ponto de vista teórico, pode-se adotar o seguinte critério: em toda conduta, tal como a adaptação hereditariamente determinada, a assimilação e a acomodação são como uma coisa só e permanecem indiferenciadas, enquanto que com a adaptação adquirida elas começam a dissociar-se.

86 (PIAGET, 1948, p. 48).

Outrossim, para Piaget (1978) a assimilação é um conceito biológico. Na

verdade, há assimilação quando dado estímulo do meio é absorvido pelo

sujeito. Nesse sentido, há incorporação da informação nova numa estrutura

cognitiva pré-existente no sujeito. Citando Piaget:

Bem, a assimilação é justamente a prova de que a estrutura existe. É o fato de que um estímulo do meio exterior, um excitante qualquer, não pode agir e modificar uma conduta a não ser na proporção em que ela esteja integrada às estruturas anteriores. A assimilação é um conceito biológico antes de tudo. Absorvendo o alimento, o organismo assimila o meio: isto significa que o meio está subordinado à estrutura interna e não o inverso (PIAGET, 1978, p. 62).

Assim, a assimilação incorpora novos elementos à estrutura cognitiva e

permite, como Stoltz (2013) salienta, uma primeira compreensão da realidade,

mesmo que esta possa ser deformada de acordo com os esquemas existentes

no sujeito. Nesse sentido, não há avanços cognitivos contando somente com a

assimilação. Esta necessita ser “balanceada pela acomodação” (p. 19).

O processo de ajustamento de estímulos externos à estrutura interna

pré-existente do sujeito é denominado acomodação. Piaget (1978) destaca que

a “acomodação é determinada pelo objeto, enquanto que a assimilação é

determinada pelo indivíduo” (p. 62). Nesse sentido, uma não existe sem a

85

“secondaires”.

86 D´un point de vue théorique, on peut adopter le critère suivant : en toute conduite, dont

l´adaptation est héréditairement determinée, l´assimilation et l´accomodation ne font qu´un et

demeurent indifférenciées, tandis qu´avec l´adaptation acquise ells commencent à se dissocier.

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84

outra. Há necessidade de primeiramente incorporar algo para depois ajustar

este algo às construções preexistentes. Citando Piaget:

Você tem uma teoria, é um esquema de assimilação, você pode adaptá-la a situações bem diferentes; em mecânica, você terá os mesmos princípios de conservação do movimento em situações inteiramente diversas. O ajustamento do esquema de assimilação a todas estas situações é a acomodação (PIAGET, 1978, p. 63).

O caso de usar somente acomodações sem assimilar também não faz

sentido, pois se caracteriza em pura imitação. De acordo com Stoltz (2013) não

há avanços cognitivos neste caso, já que se o sujeito não incorporar

previamente algo novo a sua construção é como se partisse “do zero, e não de

algo construído” (p. 19) a cada acomodação. Como destaca Stoltz:

Outro exemplo para compreendermos esse processo pode ser visto no lento processo de aquisição da linguagem. A criança está rodeada de pessoas que falam com ela, mas só muito lentamente se aproxima dessa linguagem. Primeiro, ouvimos somente alguns ruídos, vocalizações representativas da linguagem da criança. Há aqui uma indiferenciação entre assimilação e acomodação. A criança pequena precisa perceber que o seu som é diferente daquele emitido no meio em que vive. Só assim poderá fazer novas adaptações. De um pa inicial significando “papai”, há muitos ajustes a serem feitos até chegar à palavra papai (STOLTZ, 2013, p. 20).

Piaget (1978) salienta que o equilíbrio provisório entre assimilação e

acomodação caracteriza a adaptação do sujeito ao meio. E, na adaptação

sempre há dois pólos: o “indivíduo-assimilação” e o “objeto-acomodação”.

Nesse sentido, este processo é de autorregulação já que há um movimento em

busca do equilíbrio que é caracterizado como um processo dinâmico, pois

quando o equilíbrio é alcançado “novos fatos exteriores vêm perturbá-lo” (p.

64).

Nesse sentido, os mecanismos de assimilação e de acomodação

ilustram como ocorre a construção de um esquema, que representa a essência

da ação, para estruturas mais complexas que ampliam a possibilidade de

adaptação cognitiva. Dessa forma, primeiro assimila-se determinado conteúdo

sem alterar a estrutura cognitiva que já existe no sujeito. Na sequência,

acontece a acomodação que é um ajuste do sujeito às exigências do objeto por

conhecer. Assimilação e acomodação levarão à adaptação que representa um

momento temporário de equilíbrio ou de uma nova compreensão, a qual está

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85

relacionada a uma integração do conhecimento novo ao sistema de

conhecimentos do sujeito. Assim, o conhecimento é construído pelo sujeito a

partir da ação e desenvolve-se na medida em que este assimila e acomoda

(PIAGET, 1987).

Portanto, o sujeito quando se depara com um conhecimento novo passa

pelo processo de assimilação e acomodação. Ao assimilar o sujeito integra

novos conhecimentos aos seus esquemas existentes sem alterar sua estrutura

cognitiva. Já quando o sujeito acomoda está ajustando-se ao conhecimento

novo. Dessa forma, os avanços do conhecimento são gradativos. E, a

adaptação é, de acordo com Stoltz (2013) “um estádio de equilíbrio” já que

“logo aparecerão novos objetos por conhecer” (p. 19). Além disto, se o sujeito

só acomoda estaria somente imitando e necessitaria recomeçar do zero a cada

novo conhecimento, já que para haver evolução é necessário primeiro integrar

o conhecimento novo através da assimilação, como relata a autora:

No caso do primado da assimilação, usamos o que já construímos e que está disponível por meio de esquemas e estruturas que nos permitem interpretar e entender a realidade em um primeiro momento. Toda compreensão envolve, portanto, algo que precisa ser assimilado com os recursos de que o sujeito dispõe, para que depois ele possa se ajustar à realidade (STOLTZ, 2013, p. 19).

Portanto, para o sujeito aprender é necessário haver assimilação

seguida da acomodação. Nesse sentido, a aprendizagem depende diretamente

do desenvolvimento das estruturas orgânicas e mentais do sujeito.

5.4. DESENVOLVIMENTO E APRENDIZAGEM

Segundo Piaget (1964), o desenvolvimento está relacionado com a

embriogênese, e é dessa forma um processo espontâneo que depende da

maturação orgânica e em específico da maturação do sistema nervoso. Ele

encerra-se somente na idade adulta. A aprendizagem, ao contrário do

desenvolvimento, é provocada por fatores externos como situações de

ensino/aprendizagem, situações de ensino externas, etc. Assim, a

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aprendizagem depende diretamente do grau de desenvolvimento orgânico do

sujeito, citando Piaget:

Na realidade, desenvolvimento é um processo essencial e cada elemento do aprendizado ocorre como uma função do desenvolvimento total, antes de ser um elemento que explica o desenvolvimento. (PIAGET, 1964, p. 10).

Stoltz (2013, p. 25) por sua vez, destaca que a aprendizagem segundo

Piaget divide-se em aprendizagem no sentido lato e no sentido stricto. Dessa

forma, a aprendizagem no sentido stricto diz respeito a “uma situação

específica, uma experiência, um treino, e leva a um conhecimento limitado,

restrito àquele conteúdo”. Nesse sentido, este tipo de aprendizado não dá

conta de transformações e restringe-se a aspectos figurativos do pensamento

como ocorre com a “imitação, percepção, memória, imagem mental” (p. 25).

Por outro lado, a aprendizagem no sentido lato refere-se aos aspectos

operativos do conhecimento, aspectos estes que se relacionam com o

desenvolvimento do próprio sujeito e das transformações em sua estrutura

cognitiva.

Piaget (1983) indica que existem duas formas de adquirir conhecimentos

de uma experiência: através da percepção e da aprendizagem, ou seja, “por

ligações sucessivas em função do tempo e das repetições objetivas” (p. 259).

Dessa forma, Piaget buscou junto com sua equipe do Centro de Epistemologia

Genética de Genebra responder ao questionamento sobre a possibilidade de

aprendizagem de estruturas lógicas, além de investigar se há uma lógica ou

pré-lógica relativas ao funcionamento destas mesmas estruturas.

Nesse sentido, Piaget conclui que para que sejam desenvolvidas as

estruturas lógicas são necessárias a aprendizagem e a experiência. Dessa

forma, estas estruturas não são formas a priori, isto é, não são pré-existentes

ou inatas, já que dependem de fatores externos (aprendizagem e experiência)

para que se formem. Como destaca Piaget:

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Do ponto de vista epistemológico, o conjunto dessas pesquisas parece-nos conduzir às seguintes conclusões. Parece excluído, em primeiro lugar, interpretar as estruturas lógicas como formas a priori, pois a aprendizagem e a experiência são necessárias para sua elaboração. (PIAGET, 1983, p. 262).

Além disto, as pesquisas sobre a aprendizagem de estruturas lógicas

demonstraram ser possível a construção de tais estruturas. Porém, com certas

ressalvas já que os experimentos mostraram que o progresso é limitado, pois

para haver aprendizado efetivo, é necessário um patamar anterior mínimo de

construção. Como ilustra Piaget (1983):

(...) obtemos dos indivíduos somente um certo progresso na construção de estruturas em jogo (e um progresso conforme à ordem dos estádios observados no desenvolvimento em situações não experimentais), mas não essa estrutura inteira, (...) para aprender uma estrutura lógica é necessário que a criança utilize a título de condições preliminares esboços não aprendidos dessa estrutura ou de outras estruturas que a implicam. A aprendizagem das estruturas lógicas repousa pois numa espécie de círculo ou de espiral, o que significa dizer que as estruturas não constituem o produto dessa aprendizagem somente, mas também de um processo interno de equilibração. (PIAGET, 1983, p. 261-262).

Assim, a aprendizagem é sempre um comportamento fruto do processo

de assimilação que ativa a lógica ou pré-lógica de estruturas existentes. Nesse

sentido, as atividades do sujeito “constituem, em última análise, a fonte mais

profunda das estruturas lógicas” e, na “medida em que o sujeito consegue agir

sobre” (p. 263) o objeto, o que é determinante para o desenvolvimento de

conhecimentos.

Piaget e Gréco (1974), apesar de constatarem a possibilidade de

sujeitos do nível pré-operatório poderem adquirir, por meio de treinamento, ou

seja, por aprendizagem, conhecimentos de tipo lógico-matemático do nível

operatório concreto, estes mostraram-se não ser “sempre tão sólidos, nem

principalmente tão móveis quanto as noções operatórias propriamente ditas,

normalmente adquiridas pelas crianças um ou dois anos mais tarde” (p. 226).

E, nestes experimentos os sujeitos nunca chegaram à formação completa de

uma estrutura operatória.

Contudo, não é exagero afirmar que a aprendizagem só é eficiente

quando produz uma estruturação, algo que está bem longe da simples

acumulação de informações advindas de observações empíricas. Nesse

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sentido, a atividade do sujeito é determinante na construção de conhecimentos

e de suas estruturas lógicas (PIAGET & GRÉCO, 1974).

Becker (1997) salienta que não existe aprendizagem que se inicia numa

tabula rasa, já que há sempre uma estrutura de conhecimentos desenvolvida.

Também, toda forma de aprendizagem está ligada a assimilação de

componentes novos que será acomodada posteriormente, citando Becker:

Existe uma lógica da equilibração, inerente aos mecanismos de aprendizagem, anterior, portanto, a qualquer aprendizagem s.str., mas, ao mesmo tempo, isomorfa à lógica que se constituirá mais tarde, no período operatório (BECKER, 1997, p. 25).

5.5. OS ESTÁDIOS COGNITIVOS

Stoltz (2008) destaca que o principal problema de Piaget é a

compreensão de como o desenvolvimento cognitivo ocorre. Ele busca entender

a gênese da formação das estruturas cognitivas, como se formam, se

organizam e como funcionam. Nesse sentido, a ação do sujeito sobre objetos é

o fator determinante do desenvolvimento. E a construção gradativa da

inteligência pode ser “entendida a partir de estádios de desenvolvimento” que

“culmina no desenvolvimento de uma necessidade e integra o precedente”.

Além disto, a autora salienta que a sequência do aparecimento dos estádios é

sempre a mesma, o que pode variar é o tempo de aparecimento, ou seja, a

idade dos sujeitos (p. 266).

5.5.1. O SENSÓRIO-MOTOR

Piaget nomeia de período sensório-motor aquele que precede à

linguagem. Neste, falta a função simbólica e, por conseguinte, não há

pensamento e nem “afetividade ligada a representações que permitam evocar

pessoas ou objetos na ausência destes”(p. 11). Na verdade, segundo Piaget

(2003, p. 12) é construído “um sistema complexo de esquemas de assimilação,

e de organizar o real de acordo com um conjunto de estruturas espacio-

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temporais e causais”. Nesse sentido, como há falta da função representacional,

a construção apóia-se nas percepções e movimentos, isto é, por meio de “uma

coordenação sensório-motora das ações, sem que intervenha a representação

ou o pensamento” (p. 12).

Na verdade, o ponto de partida do desenvolvimento são as atividades

espontâneas e totais do organismo e não somente reflexos concebidos como

simples respostas. Os reflexos que se desenvolvem por exercício (ex. sugar o

peito) têm uma função e formam os primeiros esquemas de assimilação. Nesse

sentido, cabe destacar que o organismo nunca é passivo e apresenta

“atividades espontâneas e globais, de forma rítmica” (p. 13).

O reflexo de sucção do recém-nascido é substituído pelo “exercício

reflexo”, isto é, há consolidação do reflexo pelo exercício funcional e é dessa

forma que o bebê começa aos poucos a encontrar e sugar o peito da mãe com

mais facilidade devido à ação de procurar o mesmo, formando assim

esquemas de assimilação que por sua vez são de natureza reprodutiva, ou

seja, funcional, posteriormente numa assimilação generalizadora

(generalizando o comportamento a diversos objetos) e por fim numa

assimilação recognitiva (que permite reconhecer, por exemplo, o bico do seio

da mãe de outros objetos).

Dessa forma, Piaget destaca que não se deve considerar um reflexo

como um automatismo puro e também coloca que apesar do exercício de

assimilação ter de certa forma origem hereditária, tem papel fundamental, pois

permite formar hábitos, citando o autor:

No exemplo da sucção, assiste-se, com efeito, e às vezes desde o segundo mês, ao fenômeno banal, mas não menos instrutivo, de uma sucção do polegar, não fortuita ou acidental, como a que se pode produzir desde o primeiro dia, senão sistemática, por coordenação dos movimentos do braço, da mão e da boca (...) sugerimos que se interprete essa aquisição como simples extensão da assimilação sensório-motora em jogo a partir do reflexo. Precisemos primeiro, que há aqui aquisição propriamente dita, visto que não existe reflexo nem instinto de sugar o polegar (ibidem, p. 15).

Assim, os primeiros hábitos formam-se, por exemplo, o hábito de sugar o

polegar. Destacando que estes dependem diretamente da atividade do sujeito

que se formou a partir de um reflexo e de um esquema de assimilação.

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Lembrando que o hábito não pode ser caracterizado como inteligência e, de

acordo com Piaget: “Um hábito elementar repousa num esquema sensório-

motor de conjunto em cujo seio ainda não existe, do ponto de vista do sujeito,

diferenciação entre meios e fins” (p. 16). Cabe aqui relembrar que um esquema

é uma ação internalizada e generalizada, passível de ser repetida.

Com o avanço das construções, comportamentos típicos da inteligência

sensório-motora, ou seja, de inteligência prática, passam a ser recorrentes,

como buscar um objeto desaparecido e distante independente do meio que for

empregado. “A coordenação dos meios e das finalidades é nova e se renova

em cada situação imprevista,” o que caracteriza a inteligência prática. Dessa

forma, o sujeito resolve situações com o emprego dos esquemas de

assimilação já desenvolvidos e conhecidos. E é no quinto estádio (entre 11 e

12 meses) especificamente que surge a busca de novos esquemas de

assimilação para solucionar problemas. Como exemplo, Piaget cita a conduta

do suporte. Isto é, um objeto fora do alcance do sujeito que está em cima de

um tapete perto do mesmo. Depois de tentativas infrutíferas a criança pode

pegar no tapete e relacionar o movimento deste com o do objeto, conseguindo

trazer o objeto puxando o tapete.

O fim do período sensório-motor é marcado pela transição para o

próximo estádio no qual o sujeito é capaz de encontrar meios novos para

solucionar problemas, “não mais por simples tacteios exteriores ou materiais,

senão por combinações interiorizadas, que redundam numa compreensão

súbita ou insight” (p. 18).

Os esquemas sensórios-motores “se revertem numa espécie de lógica

da ação” (p. 19). Nesse sentido, são construídas as bases estruturais das

futuras operações, isto é, esquemas de ação interiorizados. Esta lógica da

ação estabelece correspondências e relações entre os esquemas. Também, a

inteligência do estádio sensório-motor leva a organização do universo do

sujeito. Assim, por meio da inteligência prática o sujeito constrói o real que

comporta alguns esquemas de ação como o esquema do objeto permanente,

do tempo, do espaço e da causalidade.

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Neste ponto do desenvolvimento, o sujeito está totalmente centrado no

seu corpo e nas suas ações, caracterizando um egocentrismo total e

inconsciente. No decorrer dos dezoito primeiros meses de vida ocorre uma

descentração e a criança se dá conta que é apenas um objeto entre outros

num universo de múltiplos objetos permanentes “estruturado de maneira

espacio-temporal e sede de uma causalidade ao mesmo tempo espacializada e

objetivada nas coisas” (p. 19). Piaget (2003) destaca que a conservação do

objeto, ou seja, o objeto permanente tem como função a sua localização e está

interligada com a construção do espaço e tempo assim como com a

causalidade.

O próprio conceito de tempo e espaço, também é fruto de uma

construção progressiva. No início, não há “espaço único nem ordem temporal

que englobe os objetos e acontecimentos” (p. 21). E a causalidade também

está atrelada ao sistema dos objetos permanentes e de seus deslocamentos

que permite a construção do tempo e espaço não podendo dissociar-se da

estrutura causal, pois: “o próprio objeto é ser origem, sede ou resultado de

ações diversas, cujas ligações constituem a categoria causalidade” (p. 22).

Tal causalidade inicial pode chamar-se mágico-fenomenista: fenomenista porque qualquer coisa é capaz de produzir qualquer coisa (...) e “mágica” porque está centrada na ação do sujeito sem consideração dos contatos espaciais (...) Em compensação, à medida que o universo é estruturado pela inteligência sensório-motora segundo uma organização espácio-temporal e pela constituição de objetos permanentes, a causalidade se objetiva e espacializa, o que quer dizer que as causas reconhecidas pelo sujeito já não estão situadas na ação própria, senão em objetos quaisquer e as relações de causa e efeito entre dois objetos ou suas ações supõem um contato físico e espacial (ibidem, p. 23).

A construção do real como a construção dos esquemas sensório-

motores estão condicionadas a uma lei de desenvolvimento muito importante,

pois determina também a evolução intelectual do sujeito. São três formas

sucessivas de desenvolvimento sucessivo: ritmos, regulações e reversibilidade.

As estruturas iniciais de ritmo presentes nos movimentos “espontâneos e

globais do organismo”, assim como os reflexos dependem da estrutura de

ritmo: “não apenas em seus arranjos complexos (sucção, locomoção), senão

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porque o seu desenvolvimento conduz de um estado inicial X, a um estado final

Z, para recomeçar, em seguida, na mesma ordem” (p. 24).

Em seguida são as regulações que divergem do ritmo porque já

comportam esquemas múltiplos e são responsáveis pela formação dos

primeiros hábitos. E se aproxima da semi-reversibilidade, pois comporta um

sistema de feedback que proporciona um efeito retroativo.

Por fim, o princípio da reversibilidade que constitui a “origem das futuras

operações do pensamento”; porém já presente no nível sensório-motor desde

“a constituição do grupo prático dos deslocamentos”. Nesse sentido, Piaget

destaca:

O produto mais imediato das estruturas reversíveis é a constituição de noções de conservação ou de invariantes de “grupos”. Já no nível sensório-motor a organização reversível dos deslocamentos acarreta a elaboração de determinada invariante, sob as espécies do esquema do objeto permanente. Mas é evidente que, no nível presente, nem a reversibilidade em ação nem a conservação são ainda completas por falta de representação (ibidem, p. 25).

Portanto, no estadio sensório-motor que é um período pré-verbal há o

desenvolvimento do conhecimento prático. Na verdade, é formada a base do

conhecimento representacional. Nesse sentido, as construções deste período

como a noção de “objeto, espaço, tempo e causalidade são aqui elaboradas e

sua construção é indispensável para o pensamento representacional”

(STOLTZ, 2008, p. 266).

5.5.2. O PRÉ-OPERATÓRIO

No segundo estádio do desenvolvimento cognitivo, de acordo com Stoltz

(2008), surge a representação simbólica ou pré-operatória que ocorre a partir

da imitação diferida e se manifesta também na linguagem, imagem mental,

imitação, jogo simbólico e desenho a partir do desenvolvimento da função

semiótica que marca o desenvolvimento do pensamento verbal. As construções

do período sensório-motor serão reconstruídas neste nível. No entanto, as

ações interiorizadas ainda não podem ser consideradas como operações já

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que não há reversibilidade aliada à representação simbólica (p. 266). A seguir é

apresentado com mais detalhes as especificidades do estádio cognitivo pré-

operatório.

De acordo com Piaget (2003), entre um ano e meio e dois anos surge a

função simbólica que consiste em representar na mente do sujeito alguma

coisa (um significado qualquer: objeto, acontecimento, etc.) por meio de um

significante (linguagem, imagem mental). Antes disto, os esquemas sensório-

motores não permitem que se observe uma “conduta que implique a evocação

de um objeto ausente” (p. 51). Nesse sentido Piaget destaca:

Quando se constitui, cerca dos 9-12 meses, o esquema do objeto permanente; há, sem dúvida, procura de um objeto desaparecido: mas ele acaba de ser percebido, e corresponde, portanto, a uma ação já em curso, e um conjunto de indícios atuais permite encontrá-lo (PIAGET, 2003, p. 52).

Lembrando que Piaget (2003) salienta que a ação já atribui significados

práticos que são perceptivos. No entanto, não se pode falar em função

simbólica já que não há símbolo ou sinal. Há somente um indício perceptivo.

Desse modo, a função simbólica se inicia por volta dos dois anos e implica o

aparecimento de determinadas condutas que supõe a evocação ou lembrança

de objetos ou acontecimentos ausentes. Nesse sentido, o autor enumera cinco

condutas que ocorrem simultaneamente em ordem de complexidade: a

imitação diferida, o jogo simbólico, o desenho, a imagem mental e a evocação

verbal e que suscitam o uso da função simbólica.

A imitação diferida diz respeito à imitação de algo sem a presença física

do modelo imitado. Obviamente, no período sensório-motor há imitação, porém

em presença do modelo, mesmo que o sujeito continue imitando após o

desaparecimento do modelo. Isto não implica em representação mental. Nesse

sentido, o exemplo de uma criança que imita um comportamento de um colega

em casa, sem a presença do modelo, após algumas horas, por sua vez, pode

ser considerado imitação diferida e é o início da representação mental.

Por sua vez, o jogo simbólico, ou seja, o jogo de ficção que implica

encenação e também pode ser chamado de jogo de faz-de-conta constitui

claramente uma representação:

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A mesma garotinha inventou o primeiro jogo simbólico ao fingir dormir, sentada e sorrindo largamente, mas de olhos fechados, cabeça inclinada, polegar na boca e segurando um canto de pano, que simula o canto do travesseiro, consoante o ritual costumeiro que observa ao adormecer; pouco depois faz dormir o seu urso de pelúcia, enfia uma conchinha numa caixa dizendo “miau” (acaba de ver um gato no muro). Em todos esses casos, a representação é nítida e o significante diferençado é, de novo, um gesto imitativo, porém acompanhado de objetos que se vão tornando simbólicos (ibidem, p. 53).

Posteriormente, Piaget (2003) destaca o desenvolvimento do desenho

que inicialmente é “intermediário entre o jogo e imagem mental” e que surge

aproximadamente entre dois anos e dois anos e meio. Depois, vem a imagem

mental que é totalmente ausente no período anterior, já que se estivesse

presente durante a construção do objeto permanente, seria muito facilitada. Na

verdade, a imagem mental “surge como imitação interiorizada” (p. 53).

Por fim, com o início da linguagem é possível a evocação verbal de

acontecimentos passados. Como, por exemplo, a garotinha que brincava de

imitar o gatinho. Porém, se a mesma “diz “miau” sem ver o gato, há

representação verbal além de imitação e apóia exclusivamente no significante

diferençado constituído pelos sinais da língua em vias de aprendizagem” (p.

53).

A imitação tem grande importância na formação da função semiótica e

pode-se afirmar que esta está presente no estádio sensório-motor como

“prefiguração” da representação. Nesse sentido, Piaget (2003) afirma que a

imitação é uma prefiguração da representação, porém no período sensório-

motor é uma forma de “representação em atos materiais e ainda não em

pensamento” (p. 54).

Com a imagem mental, em seguida, a imitação já não é apenas diferida, senão interiorizada e a representação que ela possibilita, dissociada assim de todo ato exterior em proveito desses esboços ou bosquejos internos de ações que a suportarão, dali por diante está pronta para tornar-se pensamento. A aquisição da linguagem, tornada acessível nesses contextos de imitação, cobre finalmente o conjunto do processo, assegurando um contato com outrem muito mais vigoroso do que a simples imitação e permitindo, portanto, à representação nascente aumentar os seus poderes apoiada na comunicação (ibidem, p. 55).

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Piaget (2003) assinala que o jogo simbólico é, “sem dúvida, o apogeu do

jogo infantil” (p. 56). Ele também coloca que existem outras formas de jogo que

são importantes na vida das crianças. A adaptação ao mundo social dos

adultos é, segundo o autor, de certa forma forçada. Assim, a criança é obrigada

a adaptar-se ao mundo social adulto cheio de regras próprias, sendo que ela

está apenas começando a compreender o funcionamento das regras do mundo

físico. Também o autor afirma que a criança tem dificuldades de satisfazer

plenamente as necessidades afetivas e intelectuais do seu eu, nestas

adaptações que “para os adultos, são mais ou menos completas, mas que

permanecem para ela tanto mais inacabadas quanto mais jovem for” (p. 56).

Assim, o autor assinala a necessidade de uma atividade de adaptação

ao real que possa trazer equilíbrio afetivo e intelectual, com as palavras de

Piaget: “a assimilação do real ao eu, sem coações nem sanções” (p. 57). Esta

atividade é o jogo que transforma o real “por assimilação mais ou menos pura

às necessidades do eu, ao passo que a imitação é acomodação mais ou

menos pura aos modelos exteriores”. E, principalmente:

(...) a inteligência é equilíbrio entre assimilação e acomodação (ibidem, p. 57).

Piaget (2003) aponta também, que a linguagem tem papel de destaque

na adaptação social. A linguagem já tem forma pré-definida, é de natureza

coletiva, e é a criança que deve adaptar-se a ela. Daí, a necessidade da

criança dispor de um instrumento, tal como o jogo de expressividade que

proporciona assimilação lúdica, citando o autor:

É, portanto, indispensável à criança que possa dispor igualmente de um meio de expressão próprio, isto é, de um sistema de significantes construídos por ela e dóceis às suas vontades: tal é o sistema dos símbolos próprios do jogo simbólico, tomados de empréstimo à imitação a título de instrumentos, mas a uma imitação não procurada por si mesma e simplesmente utilizada como meio evocador a serviço da assimilação lúdica: tal é o jogo simbólico, que não é apenas assimilação do real ao eu, como o jogo em geral, mas assimilação assegurada (o que a reforça) por uma linguagem simbólica construída pelo eu e modificável à medida das necessidades. (ibidem, p. 57).

Nesse sentido, Piaget (2003) aponta quatro formas ou categorias de

jogo. A primeira delas é a única que está presente no sensório-motor e é

denominada de “jogo de exercício”. Esta forma inicial de jogo consiste na mera

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repetição, como fonte de prazer, com objetivo de adaptação. Lembrando que

nessa categoria não há simbolismo ou algum fator lúdico. Após, aparece o jogo

simbólico onde há representação, como mencionado anteriormente. E, em

terceiro lugar, surgem os jogos de regras que são transmitidos socialmente e

dessa forma destacam a crescente importância do social na vida das crianças

como, por exemplo, na bola de gude, no esconde-esconde, entre outros.

Após o jogo simbólico e somente a partir dele desenvolve-se o jogo de

construção que aos poucos substitui seu simbolismo lúdico por “verdadeiras

adaptações (construções mecânicas, etc.) ou soluções de problemas e

criações inteligentes” (p. 58). Além da inversão de papeis que pode acontecer

no jogo simbólico, o autor destaca a possibilidade de a criança reviver certas

situações da vida na prática, ao invés de simplesmente se satisfazer com a

lembrança, por meio da imagem mental. Neste caso, pode-se falar em algo

muito próximo da linguagem interior presente no adulto, porém com a diferença

da criança precisar reviver a situação na prática e não somente na mente.

Voltando ao jogo simbólico, deve-se considerar sua função de

assimilação da realidade ao eu e também, como Piaget (2003) assinala, seu

cunho afetivo. Dessa forma, a afetividade está relacionada com os interesses

cognitivos. Nesse sentido, os conflitos afetivos podem aparecer no jogo como

forma de solução dos mesmos, “mas também para a compensação de

necessidades não satisfeitas, para a inversão de papéis (obediência e

autoridade), para a liberação e extensão do eu” (p. 59). Aqui, deve-se destacar

a satisfação de desejos reprimidos, pensamento este muito próximo da

psicanálise de Freud, citando Piaget:

Ora, esse simbolismo centrado no eu não consiste em apenas formular e alimentar os diversos interesses conscientes do sujeito. O jogo simbólico apoia-se também, não raro, em conflitos inconscientes: interesses sexuais, defesa contra a angústia, fobias, agressividade ou identificação com agressores, recuos por medo do risco ou da competição etc. O simbolismo do jogo confunde-se, nesse caso, com o do sonho a tal ponto que os métodos específicos de psicanálise infantil utilizam frequentemente materiais do jogo (Melanie Klein, Anna Freud, etc.) (ibidem, p. 60).

Também, Piaget assinala o limite tênue entre o consciente e o

inconsciente presente no simbolismo do jogo que segundo ele se confunde

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com o simbolismo do sonho. Já que quando o sujeito dorme perde o uso

racional da linguagem, o senso de realidade e as ferramentas lógicas da

inteligência, “encontra-se, então, sem querer, na situação de assimilação

simbólica que a criança procura por si mesma”. E como destaca o autor, este

simbolismo “onírico” como Carl Gustav Jung (ex-discípulo de Freud) salientou,

consistia numa linguagem primitiva que era bem próxima do conceito de jogo

simbólico de Piaget.

Quanto ao desenho, Piaget (2003) destaca que este é uma forma de

função simbólica entre o jogo simbólico que proporciona prazer e determina o

fim próprio de suas ações, e a imagem mental. E ambos buscam representar a

realidade.

O autor começa criticando a posição adotada pelos associacionistas que

consideram a imagem como extensão da percepção e como “elemento do

pensamento” (p. 65). Para contradizer esta afirmação Piaget afirma que a

imagens mentais não derivam diretamente da percepção já que pesquisas

neurológicas (E.E.G.) demonstraram que a lembrança de um movimento

proporciona as mesmas ondas elétricas do movimento em si. Dessa forma, o

autor sustenta que a lembrança do movimento “supõe um esboço do

movimento” e de certa forma representação mental. Assim, se a imagem

estivesse ligada a percepção estaria presente desde o nascimento, o que não é

o caso, já que surge somente após o nível sensório-motor com o

desenvolvimento da representação mental.

Também, o autor diz que o aparecimento das imagens mentais ocorre

relativamente tarde e é de fato uma “imitação interiorizada” que busca

reproduzir uma “cópia ativa” da realidade percebida pelo aparato sensorial. No

entanto, Piaget destaca que o grande problema evocado pela imagem na

psicologia da criança consiste nas relações entre a imagem simbólica e “os

mecanismos pré-operatórios e operatórios do pensamento” (p. 66).

Primeiramente, as imagens mentais, segundo o autor, são

substancialmente diferentes conforme o estádio cognitivo do sujeito. Por

exemplo, as imagens pré-operatórias e as imagens dos níveis operatórios que

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são “vigorosamente influenciadas pelas operações”. Nesse sentido, Piaget

classifica as imagens como imagens reprodutivas e imagens antecipadoras. A

primeira diz respeito à lembrança de eventos passados, e a outra, sugere por

meio da imaginação movimentos ou resultados anteriores à percepção. Dessa

forma, pode-se imaginar mudanças em figuras geométricas na mente, antes

mesmo de modificá-las na prática.

As imagens mentais podem também estar pautadas em objetos

estáticos, em movimento (deslocamentos) e objetos em transformações

(mudanças de forma), ou seja, “estáticas, cinéticas e de transformação” (p. 67).

Lembrando que no nível sensório-motor as imagens mentais são

exclusivamente estáticas. As imagens cinéticas e de transformações só serão

reproduzidas exclusivamente a partir do nível das operações concretas

(aproximadamente entre sete e oito anos). E, é somente a partir deste estádio

que há possibilidade de compreensão e imaginação dos processos de

transformação e de antecipação decorrentes de imagens mentais. Como Piaget

coloca:

Vê-se, destarte, que não há exagero em falar-se no caráter estático das imagens pré-operatórias, não se tornando possíveis as imagens cinéticas e de transformação senão depois dos 7-8 anos, e isso graças a antecipações ou reantecipações, que se apoiam, sem dúvida, na compreensão operatória. (ibidem, p. 72).

Mas ainda, Piaget (2003) diferencia as imagens-cópias das imagens

mentais (cinéticas e de transformações). De modo que as primeiras são

“simples imitação material (gráfica ou por gestos) por oposição à imagem

mental, que é uma imitação interiorizada” (p. 68). Ele também destaca a

dificuldade experimental de investigação da imagem mental, já que esta é uma

construção subjetiva e interior. O uso de meios indiretos como desenhos, e

relatos verbais é fundamental e dizem respeito ao uso do método clínico que

permitiu verificações seguras.

Assim, o autor conclui que a imagem mental apesar de ser um sistema

de símbolos importante para compreender em que nível o sujeito se encontra,

não é suficiente para “engendrar as estruturas operatórias” (p. 74). De fato,

para Piaget as operações derivam de ações. Nesse sentido, ele destaca:

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Quando depois dos 7-8 anos, a imagem mental se torna antecipadora e, por conseguinte, em melhores condições para servir de apoio às operações, o progresso não resulta de uma modificação interna e autônoma das imagens, senão da intervenção de contribuições exteriores, devidas à formação das operações. Estas derivam, com efeito da própria ação, e não do simbolismo acompanhado de imagens, como também não, aliás, do sistema dos sinais verbais ou da linguagem (...). (ibidem, p. 74).

Também, Piaget (2003) relata a carência de estudos sobre a memória

da criança e aponta alguns resultados em relação ao rendimento (pesquisa

realizada por Claparède), como após a leitura de quinze palavras e se observa

quantas palavras o sujeito pode recordar-se. Verificou-se que com o aumento

da idade, um adulto se lembra de aproximadamente oito palavras.

Por sua vez, Piaget (2003) se pergunta como a memória se organiza e,

nesse sentido, ele diferencia a memória de reconhecimento e a memória de

evocação. Uma necessita da presença do objeto e a outra não. Sendo a

primeira anterior à segunda e ligada a “esquemas de ação e de hábitos” (p. 75).

Quanto à memória de evocação, ela desenvolve-se somente após o

desenvolvimento da imagem mental e da linguagem. E, traz o problema sobre

a “independência ou dependência em relação ao esquematismo geral das

ações e das operações” (p. 75). Nesse sentido, Piaget destaca:

Ora, a ação própria dá melhores resultados do que a percepção, e a aprendizagem na ordem ação → percepção é mais bem sucedida do que na ordem percepção → ação (com uma semana, pelo menos, de intervalo). Quanto à percepção da ação adulta, ela não acrescenta quase nada à percepção do simples resultado. A própria imagem-lembrança está, portanto, ligada a esquemas de ação e se encontram pelo menos dez etapas intermediárias entre a lembrança-motor com simples reconhecimento e a pura evocação de imagens interdependente da ação (ibidem, p. 75).

Outro ponto interessante se refere à memória. É que nem todo esquema

de conservação “(desde o esquema sensório-motor até os esquemas

operatórios: classificação, seriação, etc.)” (p. 76) é de fato memória. Assim, o

esquema “se conserva pelo funcionamento, mesmo independentemente de

qualquer “memória”: ou, se se prefere, a memória de um esquema é o próprio

esquema” (p. 76). Como destaca Piaget:

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Pode, portanto, supor-se que o que se chama comumente memória, depois de libertada dos resíduos da psicologia das faculdades, outra coisa não é senão o aspecto figurativo dos sistemas de esquemas em sua totalidade, a partir dos esquemas sensório motores elementares (ibidem, p. 76).

Portanto, Piaget observa em relação à memória, que alguns autores

como Freud e Bergson dizem que ela se conserva no inconsciente, onde as

lembranças permanecem esquecidas e podem ser evocadas. Outros dizem

que a memória é de fato uma reconstituição de acontecimentos passados. Já

para Piaget, a memória está ligada aos esquemas de ação e, de fato, estes se

confundem com a memória, já que o esquema é evocado pelo próprio

funcionamento do mesmo. Dessa forma, há relevância na conciliação dos

elementos motores e operatórios na memória.

Para Piaget (2003), a linguagem em crianças normais aparece, mais ou

menos, ao mesmo tempo em que as outras formas de representação. No

entanto, no surdo-mudo a linguagem por meio de gestos é apreendida bem

mais tarde do que a imitação diferida, o jogo simbólico e a imagem mental,

como destaca o autor:

No surdo-mudo, em compensação, a linguagem articulada só se adquire muito depois da imitação diferida, do jogo simbólico e da imagem mental, o que parece indicar-lhe o caráter genético derivado, visto que a sua transmissão social ou educativa supõe, sem dúvida, a constituição prévia dessas formas individuais de semiosis; essa constituição, ao contrário, como o demonstra o caso da surdi-mudez, independente da linguagem. Os surdos-mudos chegam, aliás, à sua maneira coletiva própria, à elaboração de uma linguagem por gestos, interessantíssima, pois é, ao mesmo tempo, social e procedente dos significantes de caráter imitativo, que intervêm de forma individual na imitação diferida, no jogo simbólico e na imagem relativamente próxima do jogo simbólico: com as suas propriedades de eficácia adaptiva e não lúdicas, a linguagem por gesto constituiria, se fosse geral, uma forma independente e original de função semiótica mas, nos indivíduos normais, torna-se inútil pela transmissão do sistema coletivo dos sinais ligados à linguagem articulada. (ibidem, p. 78).

A evolução da linguagem se dá em etapas sucessivas, como Piaget

(2003) sugere. Começa na fase da lalação espontânea, ou seja, do balbucio

que está presente em todas as culturas entre 6 meses e 11 meses. A partir daí,

a criança começa, por imitação, a emitir os sons dos fonemas no final do

período sensório-motor, período este que pode ser descrito como “o das

palavras-frases”. Estas, expressão dos “desejos, emoções ou constatações

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(tornando-se o esquema verbal instrumento de assimilação e generalização a

partir dos esquemas sensório-motores)” (p. 78-79).

Depois, com aproximadamente dois anos, as crianças, começam a

utilizar frases com duas palavras. Em seguida, elas vão aumentando

paulatinamente o tamanho das frases, até formarem frases completas, porém

sem uso de estruturas gramaticais (frases sem conjugações, por exemplo) para

posteriormente ocorrer a aquisição gradativa dos recursos gramaticais. Nesse

sentido, Piaget (2003) destaca os trabalhos de R. Brown, J. Berko, e W. Miller

inspirados nos trabalhos do linguista N. Chomski. Esses trabalhos demonstram

que crianças entre 2 e 4 anos de idade, quando aprendem as regras sintáticas,

vão muito além da imitação “passiva”. O que demonstra, segundo o autor, que

há assimilação generalizadora. Também, R. Brown comprovou que quando

crianças reduzem frases típicas dos adultos a modelos infantis elas seguem

certas “exigências funcionais, como a conservação de um mínimo de

informação necessária e a tendência a aumentar esse mínimo” (p. 79).

Piaget (2003) assinala que há consenso, no meio científico, quanto ao

fato da linguagem aumentar “os poderes do pensamento em extensão e

rapidez” (p. 79). Porém, há controvérsias no que tange à natureza das

estruturas lógico-matemáticas estarem atreladas a fatores linguísticos. De

modo que o autor compara as condutas verbais com as sensório-motoras e

conclui que há avanços significativos com a linguagem no que tange a

velocidade dos acontecimentos, pois não estão atrelados necessariamente à

ação, e também, esta amplia o espaço-tempo, e por fim:

(...) enquanto a inteligência sensório-motora procede por ações sucessivas e graduais, o pensamento chega, mercê principalmente da linguagem, a representação simultâneas de conjunto (ibidem, p. 80).

No entanto, Piaget salienta que os avanços do pensamento

representativo sobre o sistema de esquemas sensório-motor, diz respeito ao

avanço da função semiótica como um todo e não somente à linguagem. Apesar

de esta exercer um papel preponderante já que ela já:

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(...) está toda elaborada socialmente e contém de antemão, para uso dos indivíduos que a aprendem antes de contribuir para o seu enriquecimento, um conjunto de instrumentos cognitivos (relações, classificações etc.) a serviço do pensamento (ibidem, p. 81).

Piaget (2003) destaca aqui que alguns autores, entre os quais Durkheim,

insistem em acreditar que a linguagem é a única responsável pelo aprendizado

da lógica. Ora, Piaget utiliza o argumento de observações feitas com surdos-

mudos e cegos para invalidar esta crença. Citando Piaget:

Mas havendo a perturbação sensorial, própria dos cegos de nascença, impedidos, desde o início, a adaptação dos esquemas sensório-motores e retardada a sua coordenação geral, as coordenações verbais não bastam a compensar esse atraso e torna-se necessária toda uma aprendizagem da ação para chegar à constituição de operações comparáveis às do normal ou mesmo do surdo-mudo (ibidem, p. 82).

Quanto à origem da lógica, Piaget (2003) assinala que esta é fruto dos

esquemas de ação do nível sensório-motor que continua desenvolvendo-se

com a função semiótica culminando com a linguagem que é uma ferramenta

importante para estruturar o pensamento e a lógica, até chegar às operações

lógico-matemáticas que é “o remate autêntico da lógica das coordenações de

ações, quando estas se acham em estado de interiorizar-se e agrupar-se em

estruturas de conjunto” (p. 83-84).

Assim, Piaget (2003) destaca a importância da função semiótica com

suas diferentes formas: imitação diferida, jogo simbólico, desenho, imagem

mental e linguagem. Ele destaca que apesar de expressarem-se de formas

diferentes, todas têm o mesmo fim que é o de permitir evocar um objeto ou

acontecimento passado sob a forma da representação mental, por isso,

apresentam “notável unidade”. A função semiótica, também, possibilita o

desenvolvimento e avanço do pensamento representativo que estava limitado

“às fronteiras restritas da ação sensório-motora e da percepção” e agora a

partir daqui, cabe estudar como a estruturação da inteligência se dá (p. 84).

Stoltz (2008) destaca que no nível pré-operatório, apesar da ação ser

interiorizada por meio da função simbólica, ela ainda não pode ser considerada

como uma operação já que não apresenta reversibilidade mental, isto é, o

sujeito não consegue por meio do raciocínio recriar situações mentalmente

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para chegar à compreensão de determinada situação que implicaria em lógica.

Nesse sentido, Stoltz (2013) salienta que ainda não há conservação, o exemplo

que segue de uma experiência piagetiana é esclarecedor:

Um exemplo clássico para verificar a ausência desse raciocínio na criança pequena é a experiência da conservação da massa. Tomando duas quantidades iguais de massa (atestadas pela criança), pega-se uma delas e a alonga em forma de salsicha comprida na frente da criança. A criança pré-operatória dirá que agora a quantidade de massa, ou “o tanto de comer”, mudou porque virou salsicha ou porque a salsicha é mais comprida. Inúmeras outras experiências poderiam ser aqui citadas e todas apontariam para o raciocínio da criança ser dominado pela percepção imediata. O que ela vê e percebe imediatamente é o que é tomado como conhecimento (STOLTZ, 2013, p. 32).

Nesse sentido, de acordo com Piaget (1976), o período pré-operatório é

um período pré-lógico já que a criança não consegue explicar como as

transformações, como a mencionada no exemplo acima, ocorrem. A criança

“tende a explicá-las em função de seus caracteres de configuração atual, mais

do que em função das transformações que levam de uma situação a outra” (p.

185).

5.5.1. DA AÇÃO À OPERAÇÃO

Piaget (2003) salienta que no início da vida da criança há construção

progressiva da inteligência prática por meio da ação sobre os objetos da

realidade, em seguida, com o início da função semiótica, inicia-se o estádio

pré-operatório, no qual há reconstrução de todos os esquemas do período

sensório-motor ao nível representacional, nas palavras de Piaget (2003): “O

primeiro obstáculo à operação consiste, pois, na necessidade de reconstruir

nesse plano novo, que é o da representação, o que já fora adquirido no da

ação” (p. 86). Além disso, um fator retarda o processo de passagem da ação à

operação: a transição do sujeito que está centrado no seu próprio corpo em

suas ações a um estado de descentração, no qual os objetos e o sujeito se

relacionam com infinitas possibilidades no universo material.

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5.5.2. A GÊNESE DAS OPERAÇÕES “CONCRETAS”

Piaget (2003) argumenta sobre a operação de reunião de duas classes,

com o exemplo dos pais que são a união da mãe com o pai. De fato, operações

são, como Piaget destaca:

ações, escolhidas entre as mais gerais (os atos de reunir, de ordenar etc. intervêm em todas as coordenações de ações particulares), interiorizáveis e reversíveis (à reunião corresponde a dissociação à adição, a subtração etc.). Nunca são isoladas, porém coordenáveis em sistemas de conjunto (uma classificação, a sequência dos números,etc.). Também não são próprias deste ou daquele indivíduo, senão comuns a todos os indivíduos do mesmo nível mental e intervêm não apenas nos raciocínios privados, senão também nas trocas cognitivas, visto que estas consistem ainda em reunir informações, colocá-las em relação ou em correspondência, introduzir reciprocidades etc., o que volta a constituir operações, isomorfas às de que se serve cada indivíduo para si mesmo (ibidem, p. 87).

Dessa forma, as operações são ações interiorizadas que são

“transformações reversíveis, podendo essa reversibilidade consistir em

inversões (A – A = 0) ou em reciprocidade (A corresponde a B e

reciprocamente)” (p. 88). Assim, deve-se levar em conta numa operação a

invariante, ou seja, como o autor denomina de noção ou de esquema de

conservação. Por exemplo, “o esquema do objeto permanente é a invariante do

grupo prático dos deslocamentos” (p. 88). Assim, a conservação é um indício

de estrutura operatória.

Piaget (2003) destaca também os papéis da linguagem e da

representação mental que permitem a comunicação e a evocação. Destarte, o

autor salienta o importante papel da comunicação por meio da linguagem

verbal, gestos, diferentes tipos de jogos, imitações recíprocas. Nesse sentido, é

preciso frisar que o universo do sujeito que era formado no período sensório-

motor somente por objetos (“pessoas-objetos”) passa a integrar outros sujeitos

“ao mesmo tempo exteriores e análogos ao eu”. Ora, é necessária ocorrer a

descentração para a construção das operações que se baseiam não somente

no plano físico, mas agora também “num universo interindividual ou social” (p.

88). Citando Piaget:

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Ao contrário da maioria das ações, as operações, com efeito, sempre comportam uma possibilidade de troca, de coordenação assim interindividual como individual, e esse aspecto cooperativo constitui condição sine qua non da objetividade da coerência interna (equilíbrio) e da universalidade das estruturas operatórias. Tais considerações mostram que as construções e a descentração cognitivas, necessárias à elaboração das operações, são inseparáveis de construções e da descentração afetivas e sociais (ibidem, p. 88-89).

Nesse caso, o autor coloca que o sentido de social deve ser ampliado,

pois o significado deste termo é limitado já que se refere somente às

“transmissões educativas, culturais e morais”. Ao passo que os processos

interindividuais de socialização, o aspecto cognitivo, afetivo e moral também

devem ser considerados.

5.5.3. AS NOÇÕES DE CONSERVAÇÃO

Apesar do início da função semiótica no período pré-operatório, é

característica deste a ausência da noção de conservação. Nesse sentido,

Piaget (2003) apresenta diversos experimentos que corroboram para

demonstrar que a conservação é adquirida somente no período das operações

concretas, como observa o autor:

Esses fatos podem servir de exemplo ao esquema geral da aquisição de toda noção de conservação, a partir das reações pré-operatórias de não conservação. Quer se trate das deformações de uma bolinha de argila a cujo propósito a criança descobrirá a conservação da substância lá pelos 7-8 anos, de peso, por volta dos 9-10 anos, e do volume, aos 11-12 anos (medido pela água deslocada no momento da imersão do objeto), quer se trate da conservação dos comprimentos (...), das superfícies ou dos volumes (por deslocamentos de elementos), da conservação dos conjuntos após mudança de disposições espaciais etc., encontram-se sempre, nos níveis pré-operatórios, reações centradas ao mesmo tempo em configurações perceptivas ou acompanhadas de imagens, seguidas, nos níveis operatórios, de reações fundadas sobre a identidade e a reversibilidade por inversão ou reciprocidade (ibidem, p. 91).

5.6. AS OPERAÇÕES CONCRETAS

Piaget chama de operações concretas, aquelas que se “baseiam

diretamente nos objetos e não ainda nas hipóteses enunciadas verbalmente,

como será o caso das operações proposicionais” (p. 91). Nesse sentido, as

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operações concretas são a transição entre ação e as estruturas lógicas. Estas,

por sua vez, devem coordenar “combinatória e uma estrutura de grupo, (...) as

duas formas possíveis de reversibilidade” (p. 91). As estruturas operatórias

concretas se coordenam em estruturas de grupo, por exemplo, como,

classificações, seriações, entre outros, como destaca o autor:

Tais estruturas, que denominaremos “agrupamentos”, é constituir encadeamentos progressivos, que comportam composições de operações diretas, (...). Podem acompanhar-se, a esse respeito, nos diferentes níveis pré-operatórios, os esboços sucessivos do que virão a ser os “agrupamentos” aditivos e multiplicativos de classes e relações, atingida a mobilidade de composição dedutiva coerente, porque volta a fechar-se sem cessar sobre si mesma, apesar da extensão indefinida do sistema (ibidem, p. 92).

Assim, Piaget (2003) destaca que os processos construtivos como a

seriação (ordenação de objetos em relação às grandezas), a classificação

(“agrupamento fundamental”, inicia-se com coleções de figuras, não figurais,

chegando à classificação operatória), a construção dos números inteiros (ligada

com as classes anteriores), o espaço, tempo e velocidade são estruturas de

agrupamentos e encadeiam-se progressivamente. Destaca-se também, entre

as estruturas de agrupamento, a noção de construção do tempo que por sua

vez, estrutura-se em três etapas:

1) uma seriação dos acontecimentos constitutiva da ordem de sucessão temporal; 2) um encaixe dos intervalos entre os acontecimentos pontuais, fonte da duração; 3) uma métrica temporal (já em ação no sistema das unidades musicais, muito antes de toda elaboração científica) isomorfa à métrica espacial (ibidem, p. 98).

Portanto, no nível das operações concretas a ação é internalizada e

reversível, porém está atrelada a objetos. O arremate das estruturas cognitivas

ocorre no período subsequente, no qual, de acordo com Piaget (2003), o

sujeito “consegue libertar-se do concreto e situar o real num conjunto de

transformações de possíveis” (p. 117).

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5.7. OPERAÇÕES FORMAIS

Piaget (1974) salienta que com o pensamento formal há inversão entre o

real e o possível. Nesse sentido, o possível não é simplesmente o

prolongamento do real ou “das ações executadas na realidade”. Na verdade, é

o real que se subordina ao possível no sentido de que os fatos passam a

serem “concebidos como o setor das realizações efetivas/no meio de um

universo de transformação possíveis” (p. 189) que só serão admitidos como

verdades após a verificação das hipóteses relacionadas aos mesmos.

Assim, o pensamento deixa de ser pautado na realidade concreta

percebida e passa a ser hipotético-dedutivo. Os dados apresentados em

proposições são considerados, como Piaget (1974) suscita, como “simples

dados, independentemente de seu caráter real”. Além disto, por meio da

dedução que liga as pontes das suposições é possível “delas deduzir suas

consequências necessárias, mesmo quando sua verdade experimental não

ultrapassa o possível” (p. 189). Dessa forma, o sujeito analisa a possibilidade

das hipóteses recorrendo a síntese entre o possível e necessário para chegar a

uma verdade plausível, como salienta o autor:

É esta inversão de sentido entre o real e o possível que, mais que qualquer outra propriedade subsequente, caracteriza o pensamento formal: em vez de apenas introduzir um início de necessidade do real, como ocorre nas inferências concretas, realiza desde o início a síntese entre o possível e necessário, deduzindo com rigor as conclusões de premissas, cuja verdade inicialmente é admitida apenas por hipótese, e, assim, vai do possível para o real (PIAGET, 1974, p. 189).

Também, Piaget (1974) destaca que no pensamento formal não há mais

necessidade de apresentar para o sujeito dados concretos de determinada

proposição. Dessa forma, é suficiente neste nível formular diretamente

proposições verbais que o sujeito dará conta de compreender a mesma, como

mostra o autor:

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(...) muitas vezes é suficiente traduzir em simples proposições uma operação concreta, sem apresentar ao sujeito objetos manipuláveis que servem de ponto de apoio para essa operação, para que se torne acessível ao nível formal (PIAGET, 1974, p. 189).

Porém, Piaget (1974) lembra que nem todo pensamento verbal é

necessariamente característico do nível formal, pois existe a possibilidade de

enunciados do nível das operações concretas produzirem raciocínios corretos.

Obviamente, que isto depende da complexidade do problema proposto “desde

que esses enunciados correspondam a representações suficientemente

concretas” (p. 189).

Na verdade, na visão piagetiana os enunciados verbais trazem a lógica

das proposições que neste nível supera o simples agrupamento de classes e

de relações do período precedente. Dessa forma, as operações formais

ampliam o leque de possibilidades de operações que partem de hipóteses, ao

invés de limitar-se a dados percebidos na realidade concreta. Nesse sentido, a

lógica das proposições traz a possibilidade ampliada de combinar todos os

possíveis no pensamento, como relata Piaget (1974):

(...) o pensamento formal parte de hipótese, isto é, do possível, em vez de limitar-se a uma estruturação direta dos dados percebidos. Portanto, o característico da lógica das proposições não é, apesar das aparências e da opinião corrente, ser uma lógica verbal: é antes de tudo, uma lógica de todas as combinações possíveis do pensamento, tanto no caso em que tais combinações aparecem com problemas experimentais, quanto no caso em que aparecem diante de problemas puramente verbais. Sem dúvida, tais combinações se superpõem, graças às hipóteses, à simples leitura dos dados, e supõem também um apoio verbal interior; mas não é esse apoio que constitui o motor efetivo da lógica das proposições. Esse motor é o poder de combinar graças ao qual ela insere o real no conjunto das hipóteses possíveis, compatíveis com os dados (PIAGET, 1974, p. 190).

Dessa forma, Piaget (2003) complementa que quando o pensamento se

desprende da realidade concreta é possível a construção de qualquer relação

ou classes “reunindo 1 a 1, ou 2 a 2, 3 a 3 etc. elementos qualquer” (p. 119)

Assim, há generalização das operações de classe e relação que se denomina

combinatória através da qual é possível combinar fatores físicos ou ideias e

chegar ao raciocínio do operatório formal.

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109

Piaget (1974) destaca que a combinatória abrange as demais

propriedades do pensamento formal e por isso tem maior grau de generalidade.

Nesse sentido, Piaget (2003) mostra que a combinação de proposições

possibilita a combinação de objetos e ideias de forma nova. Notadamente, em

enunciados com afirmações e negações, como é o caso das proposições de

“implicação (se... então), disjunção (ou..., ou..., ou os dois), (...), a implicação

recíproca etc.” (p. 121).

Nesse sentido, Piaget (1970b) argumenta que se torna efetiva a

capacidade do sujeito com pensamento formal de combinar proposições

quando o mesmo consegue raciocinar sobre hipóteses. Assim, a combinatória

torna-se de acordo com o autor a estrutura fundamental do ponto de vista da

lógica, pois possibilita a reversibilidade dupla marcada pela inversão, negação

e reciprocidade e simetria como destaca o autor:

(...) a lógica das proposições supõe ao contrário que para duas proposições p e q para suas negações, se considere não somente as quatro associações de base que elas abrangem (p e q; p e não-q; não-p et q; et não-p et não-q), mas também as 16 combinações que se obtem lingando 1 a 1, 2 a 2 e 3 a 3 estas associações de base (mais as 4 ou nenhuma). É assim que a implicação, da distinção não exclusiva ou a incompatibilidade são operações proposicionais fundamentais que se baseiam na união de 3 associações de base. (PIAGET, 1970, p. 151)

87.

Assim, Piaget (1970b) demonstra que a lógica do adolescente no nível

das operações formais é complexa, porém, coerente e aproxima-se da lógica

presente no pensamento de adultos instruídos e de certa forma até do

pensamento científico (p. 153).

Além disso, Piaget (1970) mostra que do ponto de vista social o sujeito

passa a ter mais meios para se engajar em discussões. Nesse sentido, pode-

se, por meio de hipóteses, adotar e compreender mais a fundo o ponto de vista

87

(...) la logique des propositions suppose au contraire que pour deux propositions p et q pour

leurs négations, l´on ne considere pas seulement les quatre associations de base qu´elles

comportent (p et q; p et non-q; non-p et q; et non-p et non-q), mais aussi les 16 combinaisons

que l´on obtient reliant 1 à 1, 2 à 2 et 3 à 3 ces associations de base (plus les 4 ou aucune).

C´est ainsi que l´implication, da distinction non exclusive ou l´incompatibilité sont des

opérations propositionnelles fondamentales qui reposent sur la liaison de 3 associations de

base.

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do outro. Dessa forma, o sujeito pode raciocinar sobre as consequências de

determinado ponto de vista mentalmente. Também, o sujeito que está no nível

cognitivo das operações formais pode interessar-se por problemas que se

encontram fora de sua alçada. Nesse sentido, destaca-se a capacidade do

adolescente em criar novas teorias e ideologias de forma a inserir-se na

sociedade adulta. Além de apresentar o desejo de reformar a sociedade, ou de

destruir a mesma, se for preciso, com o objetivo de reconstruir outra melhor,

nem que seja na imaginação.

5.7.1. ATRASOS NO PENSAMENTO FORMAL

As experiências descritas no livro de Barbel Inhelder e Jean Piaget Da

lógica da criança à lógica do adolescente (1970) foram pautadas em

observações feitas em estudantes de escolas de Genebra na Suíça. E, para

este fim, foram escolhidas as melhores turmas da rede pública. Nesse sentido,

Piaget (1970b) adverte que quando o experimento foi replicado em outros

lugares como em Nancy na França, ou Nova Iorque nos Estados Unidos, não

foi possível a generalização dos resultados para todos os sujeitos das

amostras. Nesse sentido, o autor afirma que as conclusões das observações

variam para algumas populações que apresentam atrasos.

Assim, o autor relata que a velocidade do desenvolvimento cognitivo que

pode ser observada pela passagem de um estádio cognitivo ao subsequente

pode variar dependendo do contexto social. Dessa forma, ele ilustra que em

Genebra o estádio pré-operatório inicia-se, em média, na idade entre um ano e

meio e dois e dois meses, e, vai até a idade de seis a sete anos. Em seguida, o

período operatório concreto começa aproximadamente entre sete e oito anos e

se estende até, em média, entre onze e doze anos. E, por fim, o nível das

operações formais começa entre onze e doze anos e termina entre quatorze e

quinze anos.

Piaget (1970b) destaca que a ordem de sucessão dos estádios

cognitivos é constante, o que pode variar são as idades médias de acordo com

o meio social no qual os sujeitos estão inseridos que varia de contexto a

contexto, como salienta o autor:

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Ora, se a ordem de sucessão desses estádios se mostrou constante, porque cada um é necessário para formação do seguinte, as idades médias variam consideravelmente de um meio social ou mesmo de um país ou de uma região para outra. É assim que na Martinica os psicólogos canadenses constataram atrasos sistemáticos; no Irã encontraram-se diferenças notáveis entre as crianças da cidade de Teerã e os analfabetos do campo; na Itália, N. Peluffo mostrou descompassos significativos entre os sujeitos das regiões do Sul e aqueles do Norte, com estes estudos interessantes sobre a maneira como os atrasos são progressivamente compensados nas crianças de famílias que imigraram do Sul para o Norte; pesquisas análogas estão em andamento nas crianças de reservas indígenas na América do Norte; etc. etc. (PIAGET, 1970b, p. 153)

88.

Portanto, Piaget (1970b) observa que a possibilidade de atrasos deve

ser considerada, e destaca que dependem de certa forma de incitações, ou

seja, de provocações intelectuais feitas pelos adultos, assim como de

atividades espontâneas das crianças que variam significativamente de um meio

social para outro.

Nesse sentido, as estruturas do pensamento formal, segundo o autor,

podem ter um atraso ainda maior (entre 15 e 20 anos), ou até, em

determinados meios sociais, nem formarem-se, pois dependem de um meio

social favorável que incite a cooperação o trabalho em grupo, como relata

Piaget:

Mas isto significaria que o término das construções cognitivas contenham um conjunto de trocas e de incentivos mútuas, a formação de operações supõe sempre a formação de operações supõe um meio favorável a “cooperações” ou seja, operações realizadas em conjunto (papel das discussões, controles mútuos, problemas levantados pelas trocas de informações ou por curiosidade ampliada graças à cultura do grupo social, etc). (PIAGET, 1970b, p. 153)

89.

88

Or, si l´ordre de succession de ces stades s´est révélé constant, parce que chacun est nécessaire à la

formation du suivant, les âges moyens varient par contre sensiblement d´um milieu social ou même d´un

pays ou d´une région à d´autres. C´est ainsi qu´à la Martinique les psychologues canadiens ont constate

des retards systématiques; en Iran on a trouvé de notables différences entre les enfants de la ville de

Téhéran et les analphabets de la campagne; em Italie, N. Peluffo a signalé des décalages très significatifs

entre les sujets des régions du Sud et ceux du Nord, avec des études fort interessantes sur les manières

dont les retards sont progressivement compenses chez les enfants des familles ayant émigré du Sud au

Nord; des recherches comparatives analogues sont en cours chez les enfants des réserves

d´Indiens en Amérique du Nord; etc. etc.

89 Mais cela signifierait que l´achèvement des constructions cognitives comporte un ensemble

d´échanges et d´incitations mutuelles, la formation des opérations supposant toujours un milieu

favorable à la “coopération” c´est-à-dire à des opérations effectuées em commun (rôle des

discussions, controles mutuels, des problèmes soulevés par les échanges d´information ou par

une curiosité élargie grâce à la culture du groupe social, etc.).

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Na verdade, Piaget (1970b) admite duas possibilidades quanto ao

desenvolvimento do estádio das operações formais. A primeira diz que todo

indivíduo normal pode chegar ao pensamento formal dependendo do meio

social no qual está inserido, e, dos estímulos cognitivos do mesmo. A segunda

destaca a atitude mental de determinados indivíduos normais que mesmo

inseridos num meio social favorável, podem não atingir o nível das operações

formais. Nesse sentido, as atitudes individuais levam vantagem sobre as

características gerais do desenvolvimento (comuns a todos os indivíduos)

fazendo com que haja diferenças significativas entre indivíduos da mesma

idade. O exemplo que segue ilustra como isto pode ocorrer no caso do

desenho:

(...) no caso do desenho: até o nível no qual a representação gráfica das perspectivas se torna possível, se observam progressos relativamente gerais, ao ponto de que o desenho de um boneco, para citar um caso particular, pode servir de teste de desenvolvimento mental. No entanto, se comparamos entre si os desenhos de sujeitos de 13-14 anos e a fortiori de 19-20 anos (o que se faz às vezes com recrutas que ingressam no éxercito), aqui, portanto, se tem um bom exemplo de conduta primeiramente subordinada à evolução dos estádios (...) e que se diferencia em seguida segundo os critérios de atitudes e não mais de desenvolvimento. (ibidem, p. 154)

90.

Nesse sentido, Piaget (1970b) argumenta que em outros domínios mais

cognitivos, como é o caso da representação do espaço acontece a mesma

coisa. Para representar o espaço o indivíduo tem que construir o mesmo em

todos os níveis cognitivos (do sensório-motor às operações concretas e

formais). Acontece que o desenvolvimento do conceito de espaço depende de

fatores figurativos, isto é, da percepção e da imagem mental, que se

diferenciam como mecanismos representativos. E, estes fatores, assim como

no caso do desenho relatado na citação acima, interferem e diversificam-se.

Assim, pode-se observar um desenvolvimento primário que acompanha os

90

(...) le cas du dessin: jusqu´au niveau où la représentation graphique des perspectives

devient possible, on assiste à des progrès relativement généraux, au point que le dessin d´un

“bonhome”, pour ne citer que ce cas particulier, peut servir de test de développement mental.

Par contre, si l´on compare entre eux les dessins des sujets de 13-14 ans et a fortiori de 19-20

ans (ce qu´on a fait parfois sur des conscrits entrant au service militaire) on est frappé des três

grandes différences qui séparent les individus: la qualité des dessins n´a plus alors de relations

avec le niveau d´intelligence. On a donc là un bom exemple d´une conduite d´abord

subordonnée à une évolution par stades (...) et qui se diversifie ensuite selon les critères

d´aptitudes et non plus de développement.

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estádios cognitivos. Depois de determinado patamar relativo à idade do sujeito,

surgem as diferenças individuais que dependem, neste caso, dos aspectos

figurativos e operatórios da imagem.

5.8. OUTROS DOMÍNIOS DE CONHECIMENTO E O DESENVOLVIMENTO

COGNITIVO

Na adolescência percebe-se que alguns indivíduos interessam-se mais

pelas matemáticas, outros pela física, outros pela literatura, etc.. Tais

indivíduos apresentam as mais diferentes capacidades e são, de fato, mais

talentosos em diferentes domínios do conhecimento (PIAGET, 1970, p. 154).

Desse modo, Piaget (1970) levanta a hipótese de que o pensamento formal

nem sempre pode estar presente no raciocínio de adolescentes entre quatorze

e quinze anos, como é o caso das estruturas operatórias concretas que em

média aparecem entre sete e dez anos. A razão disto estaria na diversificação

de capacidades do sujeito em razão de sua idade. E, segundo Piaget (1970),

esta interpretação implica admitir que somente os sujeitos talentosos do ponto

de vista físico-matemático poderiam construir o pensamento formal. Os demais

sujeitos com habilidades literárias, artísticas, etc. não seriam capazes de

chegar ao patamar do pensamento formal. Nesse sentido, ele argumenta que

isto não seria um problema de subdesenvolvimento e sim de diversificação de

capacidades, já que, com o avançar da idade amplia-se o leque de atividades.

Assim, as operações formais não seriam necessariamente consideradas como

um estádio cognitivo e sim “um conjunto de avanços especializados” 91 (p. 154).

No entanto, Piaget (1970) aponta outra hipótese, a qual integra os

conhecimentos dos estádios cognitivos com a diversificação de capacidades

individuais de cada sujeito. Nesse caso, todos os indivíduos normais poderiam

alcançar o patamar cognitivo das operações formais, seja entre onze e quinze

anos, seja entre quinze e vinte anos, em domínios de conhecimento diferentes

dependendo das capacidades individuais e de suas respectivas

91

(...) un ensemble de progrès déjà spécialisés.

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especializações profissionais. Portanto, o uso do pensamento formal não

dependeria do domínio de conhecimento, e seria diferente segundo caso a

caso.

Nesse sentido, o autor argumenta que para o estudo das estruturas

formais fez-se uso de provas que abordam o conhecimento lógico-matemático

e físico, já que faziam parte do conteúdo do meio escolar investigado. Porém,

Piaget (1970b) reconhece que não há evidências de que as provas utilizadas

tivessem características passíveis de generalizações e que pudessem ser

utilizadas em qualquer meio escolar.

Além disso, Piaget (1970b) coloca que mesmo em domínios do

conhecimento como a mecânica, a marcenaria, etc., onde os sujeitos não

apresentam necessariamente a melhor cultura geral, existe a possibilidade de

que, por meio de suas capacidades individuais, cheguem ao pensamento

formal nos domínios específicos em que atuam. Lembrando que o nível das

operações formais implica a possibilidade de elaborar hipóteses e agir sobre

elas, conjugando combinatória, negação, relações de reciprocidade,

reversibilidade, etc.

Contudo, Piaget (1970b) argumenta que existe a possibilidade de se

chegar ao pensamento formal em todos os domínios do conhecimento, e não

faz sentido julgar, por exemplo, um advogado sobre problemas de física dos

quais ele provavelmente esqueceu o mecanismo de funcionamento. Porém, no

que se refere ao seu domínio de conhecimento, ou seja, o do campo do direito,

ele certamente manipulará todos os fatores necessários e característicos do

pensamento formal, como ilustra o autor:

Fazer pensar um futuro advogado sobre a teoria da relatividade da física, ou fazer pensar um estudante de física sobre o direito das obrigações é outra coisa que esperar de uma criança generalizações quanto a questões de conservação do peso que esta descobriu na conservação da matéria: não é somente passar de um conteúdo do pensamento diferentes mas comparáveis, é sair do domínio de atividades vitais para abordar um domínio estranho aos interesses e aos projetos do sujeito. (PIAGET, 1970b, p. 155)

92.

92

Faire raisonner un futur avocat sur la théorie de la relativité en physique, ou faire raisonner

un étudiant en physique sur le Code des obligations est autre chose que d´attendre d´un enfant

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Nesse sentido, é diferente avaliar crianças sobre problemas de lógica e

adultos que, dependendo do domínio de interesse do sujeito, poderá ter

esquecido aspectos básicos de física ou de matemática, e por outro lado,

poderá apresentar pensamento formal em outras áreas do conhecimento,

dependendo do domínio de atividade que exerce.

5.9. A EDUCAÇÃO ARTÍSTICA E A PSICOLOGIA DA CRIANÇA

Piaget (1954) menciona que em relação ao domínio artístico como artes,

desenho ou música, o desenvolvimento parece ocorrer em sentido contrário ao

desenvolvimento mental das crianças. Quando se estuda o desenvolvimento

intelectual constata-se um progresso mais ou menos contínuo, ao passo que

nos domínios artísticos a tendência é contrária. Como destaca o autor:

(...) a jovem criança parece mais dotada que a criança mais velha, no campo do desenho, da expressão simbólica (representação plástica, papéis interpretados em cenas coletivas, organizados espontaneamente, etc.) e às vezes na música. (PIAGET, 1954, p. 22) 93

.

Além disto, Piaget (1954) argumenta ser mais difícil estabelecer estádios

de desenvolvimento no domínio de conhecimento artístico que em relação a

outras funções mentais, já que o meio social, o mundo adulto, o meio familiar, a

escola, entre outros, freiam o desenvolvimento de capacidades artísticas.

Também, as primeiras manifestações artísticas são próximas do jogo

simbólico que, por um lado, incorpora a realidade material, a qual a criança

deve se adaptar, e, por outro lado, permite a expressão individual do sujeito por

meio de representações de objetos, como, por exemplo, com o uso de imagens

mentais, que tem como principal objetivo a realização de desejos individuais,

qu´il généralisera aux questions de conservations du poids ce qu´il a découvert dans la

conservation de la matière: c´est non pas seulement passer d´un contenu de pensée à des

contenus différents mais comparables, c´est sortir d´un domaine et d´activités vitales pour

aborder um domaine étranger aux intérêts et aux projets du sujet.

93 (...) le jeune enfant parait mieux doué que l´enfant plus âgé, dans les domains du dessin, de

l´expression symbolique (représentation plastique, rôles joués dans des scènes collectives,

organisées spontanément, etc.) et parfois de la musique.

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assim como permite a diferenciação entre o eu e a realidade material e social

como aponta Piaget:

Que se trate do desenho de construção, de representação teatral, etc., a criança busca simultaneamente satisfazer suas necessidades e se adaptar aos objetos assim como aos outros sujeitos. Ela continua de certa forma, a expressar-se, mas também tenta inserir o que pensa e o que sente no mundo da realidade objetiva e comunicável que constitui o universo material e social. (PIAGET, 1954, p. 23)

94.

O principal freio ao desenvolvimento do jogo simbólico, expresso por

meio das artes, está segundo Piaget (1954) refletido nos sistemas de ensino

tradicionais que do ponto de vista intelectual impõe conhecimentos prontos, ao

invés de proporcionar pesquisa e reflexão. No domínio das artes, as pressões

do mundo adulto freiam o desenvolvimento da criatividade e da

espontaneidade estética.

Nesse sentido, a educação artística, assim como a educação como um

todo, não deveria aceitar a imposição de uma verdade ou de um ideal pronto,

bem como não deveria simplesmente transmitir conhecimentos e sim

possibilitar que estes fossem recriados pelos sujeitos que, somente assim,

poderiam conquistá-los: “la beauté, comme la vérité, ne vaut que recréee par le

sujet qui la conquiert” (p. 23).

5.9.1. A TOMADA DE CONSCIÊNCIA

Piaget (1977) diz que para alguns psicólogos a tomada de consciência é

“apenas uma espécie de esclarecimento que não modifica nem acrescenta

nada, a não ser a visibilidade ao que já existia antes que se projetasse a luz”

(p. 197). Nesse sentido, ele cita o argumento do psicólogo Sigmund Freud

(1856-1939) que compara a consciência a “um órgão dos sentidos internos”

que apesar de receber “uma matéria exterior” (p. 197) é incapaz de transformar

essas sensações percebidas. Reconhecendo as contribuições freudianas

94

Qu´il s´agisse de dessin de construction, de représentation théâtrale, etc., l´enfant cherche

simultanément à satisfaire ses besoins et à s´adapter aux objets ainsi qu´aux autres sujets. Il

continue, en un sens, de s´exprimer, mais aussi s´essaie à insérer ce qu´il pense et ce qu´il

sent dans ce monde de réalités objectives et communicables qui constitue l´univers matériel et

social.

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relativas ao inconsciente que é “um sistema dinâmico em permanente

atividade” (p. 197), Piaget (1977) busca “marcar e conservar as diferenças

entre o inconsciente e a consciência” destacando que “a passagem de um ao

outro exige reconstruções e não se reduz simplesmente a um processo de

iluminação” (p. 197). Assim, ele chega ao processo de tomada de consciência

que é a passagem, ou a transformação de um esquema de ação em um

conceito, ou seja, “essa tomada de consciência consistindo, portanto,

essencialmente numa conceituação” (p. 197).

Kesselring (2008), por sua vez, diz que nem sempre todas as ações dos

sujeitos são acompanhadas da observação consciente de todos os detalhes

que permeiam dado fazer, por isso, ele sugere que o termo consciência deveria

“ser substituído pela dinâmica da tomada de consciência” (p. 92) proposta por

Piaget, e que não constitui de forma alguma a “clarificação de conteúdos já

presentes, porém imersos no escuro” (p. 93).

Na verdade, para Piaget (1977) a tomada de consciência é a

transformação de um esquema de ação em conceito, ou seja, da internalização

desse para o âmbito do pensamento que resulta na conceituação. E, quando

acontece essa passagem ocorre uma reconstrução e ampliação do que foi

realizado no plano da ação para o plano representacional, ou seja, “numa

passagem da assimilação prática (assimilação do objeto a um esquema) a uma

assimilação por meio de conceitos” (p. 200). Dessa forma, ao tornarmos

consciente determinado esquema de ação, ele é reconstruído “num patamar

mais elevado de abstração, seja de representação, seja através da linguagem

ou da conceptualização” (KESSELRING, 2008, p. 93).

No pensar conceptual, só elementos originalmente interligados por associação são relacionados entre si sob um determinado aspecto, como, por exemplo, o aspecto causal (causa/efeito), instrumental (meio/fim) ou quantitativo (a mais/a menos). Portanto, no pensar conceptual, elementos representativos são operativamente enlaçados. De tais operações nos tornamos de novo conscientes, enquanto as vinculamos entre si através de operações de ordem superior. (KESSELRING, 2008, p. 93).

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Na verdade, Piaget (1978) diz que a ação, ou seja, o “saber fazer” 95 é

uma forma de conhecimento autônomo e que a conceituação acontece

posteriormente, por meio do processo de tomada de consciência (p. 231-232).

Dessa forma, todo o processo inicia-se com a ação que é em seguida

interiorizada por meio da representação mental que dá origem ao conceito, e,

que, segundo Caregnato (2012) são as “construções conceituais” que “tratarão

de fornecer as explicações para as ações do sujeito por meio da criação de

conexões entre compreensão e extensões do problema” (p. 92).

Nesse sentido, o conceito possibilita, no plano mental, o estabelecimento

de inúmeras relações e coordenações de ações internalizadas que seriam

limitadas no plano da ação prática, como salienta Caregnato (2012):

As coordenações realizadas a partir deste momento são coordenações ampliadas e melhoradas e, nesse sentido, são superiores àquelas realizadas antes do surgimento do conceito. As coordenações de ações, são limitadas porque, sendo materiais, elas procedem de um em um, enquanto que as coordenações do pensamento (de conceitos), ao contrário, conseguem reunir inúmeros dados simultaneamente, o que aumenta a extensão espaço-temporal envolvida, a velocidade do processo e a quantidade de deduções possíveis de serem criadas. (CAREGNATO, 2012, p. 92).

Além disso, Piaget (1977) diz que para atingir um determinado objetivo o

sujeito mobiliza-se conscientemente, e, por vezes, suas ações podem obter

sucesso imediato ou somente após várias tentativas. Nesse sentido, Kesselring

(2008) destaca que “enquanto não esbarramos com obstáculos, realizamos

ações rotineiras, sem estarmos conscientes de detalhes do nosso fazer” (p.

93), dessa forma, obstáculos e dificuldades despertam a consciência.

Retomando o processo de tomada de consciência proposto por Piaget

(1977), o sujeito parte de uma ação material que é em seguida interiorizada e

transformada num conceito. Na verdade, a tomada de consciência acontece

em função de um comportamento que é a busca da realização de um objetivo

consciente e acontece da “periferia para o centro” (p.198). Nas palavras de

Piaget (1977):

95

Savoir faire.

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(...) a tomada de consciência procede da periferia para o centro sendo esses termos definidos em função do percurso de um determinado comportamento. Este começa, com efeito, com a busca de um fim, donde os dois dados de observação iniciais que podemos denominar periféricos enquanto ligados ao desencadeamento e ao ponto de aplicação da ação: a consciência do objetivo a alcançar, em outros termos da intenção como direção global do ato, e o conhecimento de seu desfecho como fracasso ou êxito. (PIAGET, 1977, p.198).

Dessa forma, a tomada de consciência parte, segundo Piaget (1977),

da periferia, que pode ser representada pelos objetivos e resultados de

determinado ato, em direção “das regiões centrais da ação quando procura

alcançar o mecanismo interno desta”, que é na verdade a compreensão e

“reconhecimento dos meios empregados” (p. 198) durante a ação. Nesse

sentido, o conhecimento é construído na interação do sujeito com o objeto.

Por isso, em relação ao problema desta pesquisa que versa sobre qual a

melhor forma de ensinar a música e, em específico, qual a melhor forma de

ensinar a leitura rítmica para adolescentes, é importante respeitar a sequência

do processo de tomada de consciência proposta por Piaget (1977; 1978), e dar

prioridade ao fazer musical, com experiências práticas, permitindo a

compreensão daquilo que é feito com a tomada de consciência. Portanto, são

as construções conceituais que permitem a compreensão e a explicação do

fazer.

No pensar conceptual, só elementos originalmente interligados por associação são relacionados entre si sob um determinado aspecto, como, por exemplo, o aspecto causal (causa/efeito), instrumental (meio/fim) ou quantitativo (a mais/a menos). Portanto, no pensar conceptual, elementos representativos são operativamente enlaçados. De tais operações nos tornamos de novo conscientes, enquanto as vinculamos entre si através de operações de ordem superior. (KESSELRING, 2008, p. 93).

Nesse sentido, aborda-se agora como ocorre a passagem do êxito de

uma ação para a compreensão da mesma.

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5.9.2. O FAZER E O COMPREENDER

Primeiramente, é preciso frisar que o sentido do verbo fazer, presente no

título da obra Fazer e compreender 96 de Piaget (1978), diz respeito ao verbo

réussir que, em francês, significa fazer com êxito, ou seja, conseguir. Para ele,

o problema levantado nessa obra é mais complexo e profundo do que a

explicação do senso comum para a realização de uma ação com sucesso e de

sua posterior compreensão. Como diz Piaget, citando o argumento referente ao

senso comum:

(...) conseguir é entender em forma de ação uma dada situação ao nível suficiente para que os objetivos dados sejam alcançados, e compreender é conseguir dominar no pensamento as mesmas situações ao ponto de conseguir resolver os problemas por elas levantados referentes à ligação do como e do porquê utilizado na ação. (PIAGET, 1978, p. 237)

97.

Aliás, a explicação acima não explica porque há um avanço inicial do

fazer (com êxito) sobre a compreensão conceitual, que será posteriormente

invertida. Na verdade, Piaget (1978) afirma que a natureza do problema do

fazer e compreender é mais profunda e complexa, pois implica na

compreensão da “coordenação dos esquemas de ação”, e “nas coordenações

de conceitos” sejam eles “lógico-matemáticos ou causais” que o pensamento

chega, a partir de tomadas de consciência “elementares até chegar em

conceituações superiores” (p. 237). Nesse caso, há uma diferença entre a

coordenação de ações e de conceitos, já que a primeira refere-se à ação

prática, causal e material, e a segunda envolve a relação entre o significado

das ações, “mesmo se dentre estes elementos encontram-se representações

de movimentos” 98 (p. 238).

Outrossim, o fazer é anterior à conceituação, e é um fazer autônomo de

coordenação de esquemas de ação que, por sua vez, é limitado, no sentido em

96

Réussir et comprendre.

97 (...) réussir c´est comprendre en action une situation donnée à un dégré suffisant pour

atteindre les buts proposes, et comprendre c´est réussir à dominer en pensée les memes

situations jusqu`à pouvoir résoudre les problèmes qu´elles posent quant au pourquoi et au

comment des liaisons constatées et par ailleurs utilisées dans l´action.

98 (...) même si parmi ses éléments on trouve des représentations de mouvements.

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que depende da materialidade até a gradativa passagem para o nível de

representação. Nesse sentido, a coordenação de esquemas no patamar da

ação, procede necessariamente passo a passo “o que assegura uma

acomodação contínua do presente, evitando divagações, e ao mesmo tempo

em que uma conservação do passado já que este é também material” 99 (p.

238), mas que impede inferências ao futuro e ao domínio dos possíveis.

Por outro lado, a coordenação de ações interiorizadas, ou seja, as

coordenações do pensamento estão livres da materialidade que limita ação

prática, o que faz com que diversos dados sejam processados

simultaneamente “o que aumenta o poder em extensão de espaço-tempo, em

velocidade e em dedução sobre o possível” 100 (p. 238). Entretanto, Piaget

(1978) afirma que o pensamento está sujeito a deformações e erros quando

reconstitui “o passado, as leituras e interpretações do presente e as

especulações sobre o possível ou sobre o futuro” 101 (p. 238).

Por isso, Piaget (1978) relata que é preciso entender como uma

coordenação material e causal de uma ação pode formar um conhecimento, ou

um “saber fazer” 102 antes mesmo de atingir a representação e a compreensão.

Na verdade, a ação, ou seja, o fazer utiliza-se de uma estrutura análoga a

empregada pelas “estruturas operatórias, as coordenações dentre as mais

gerais da ação (ordem, encaixe, correspondências, etc.) são isomorfas as da

lógica” 103 (p. 239).

Isto posto, Piaget (1978) menciona que o poder cognitivo da ação é

peculiar, já que a causalidade presente na ação é “uma causalidade orgânica

99

(...) ce qui assure une accommodation continuelle au present, en évitant les divagations, en

même temps qu´une conservation facile du passé, puisqu´il est lui aussi matériel.

100 (...) ce qui découple leurs pouvoirs en extension spacio-temporelle, en vitesse et en

deduction sur le possible.

101 (...) du passé, les lectures ou l´interpretation du présent et les spéculations sur le possible ou

l´avenir.

102 Savoir faire.

103 (...) les structures opératoires, les coordinations les plus générales de l´action (ordre,

emboîtements, correspondances, etc.) étant isomorphes à certaines de celles de la logique.

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122

ou biológica e consequentemente cibernética” 104 (p. 239). Na verdade, o fazer

permite que se chegue à organização causal que tem papel fundamental na

organização posterior dos conhecimentos conceituais, por meio da

representação semiótica que pode coordenar e o operar no pensamento ações

interiorizadas. Como menciona Piaget:

(...) mas o núcleo funcional das coordenações é o essencial e que no plano da ação, permanece de natureza causal, encontra então seu equivalente, no plano do pensamento, que é a herança mais direta da ação: o sistema de coordenação operatória, que transforma os objetos do pensamento como a ação modifica os objetos materiais. (PIAGET, 1978, p. 241)

105.

Desse modo, Piaget (1978) afirma que a operação não é a

representação de uma ação, já que ela própria continua a ser uma ação

passível de mudanças e novidades, e não responde mais a causalidade física,

mas sim a implicações cognitivas. Por isso que Piaget explica que a operação

é uma ação interiorizada.

Assim sendo, o problema de fazer e compreender reside na passagem

da ação para a conceituação, pois um envolve a causalidade, e o outro, a

implicação. Piaget (1978) sugere que ocorrem avanços significativos quando a

causalidade dá lugar à implicação, pois ela permite conhecer as razões que

levam à compreensão do fazer. Como explica Piaget:

(...) o sistema de implicações significantes fornece um elemento que não se encontra nem nos objetivos nem nos meios empregados: a determinação das razões, fora das quais o sucesso da ação permanece sem significado. (ibidem, p. 241)

106.

Portanto, compreender significa, para Piaget (1978), extrair significado,

extrair a razão, de uma ação, ao passo que o conseguir fazer, apesar de ser

104

(...) une causalité organique ou biologique et par conséquent cybernetique.

105 (...) mais le noyau fonctionnel des coordinations elles-mêmes, qui constitue l´essentiel et qui,

au plan de l´action, demeure de nature causale, trouve alors son equivalent, au plan de la

pensée, dans ce qui est en fait l´héritage le plus direct de l´action : le système des

coordinations opératoires, qui transfome les objets de la pensée comme l´action modifie les

objets matériels.

106 (…) le système des implications signifiantes fournit un element qui n´est compris ni dans les

buts ni dans les moyens employés : c´est la determination des raisons, en dehors desquelles

les réussites ne demeurent que des faits sans signification.

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um pré-requisito para se chegar à compreensão, é um atributo limitado, visto

que a compreensão “chega a um saber que precede a ação e pode dispensar-

se dela” 107 (p. 242). Dessa maneira, o sujeito, ao buscar a razão, depara-se

com a infinidade de possibilidades que exige a superação do nível da ação,

como relata Piaget:

Em uma palavra, a compreensão ou a busca pela razão não pode superar os sucessos práticos e enriquecer o pensamento (...) o mundo das “razões” se amplia sobre os possíveis e assim ultrapassa o real. (ibidem, p. 242)

108.

Logo, trazendo a problemática do fazer e compreender para o campo do

ensino da música, fica claro a importância do fazer musical para criar conceitos

e extrair significados da ação permitindo gradativas tomadas de consciência

que permitirão compreender de fato o que se está fazendo. Por esta razão que

a prática no ensino musical é tão importante. Na sequência explica-se como a

ação é a base para a construção do conhecimento do domínio musical.

5.9.3. A AÇÃO, PONTO DE PARTIDA PARA O DESENVOLVIMENTO

MUSICAL

De acordo com Stoltz e Martins (2012) no caso do domínio de

conhecimento da música, se o sujeito nunca interagiu com este campo de

conhecimento, mesmo sendo adolescente ou adulto, ele necessita respeitar a

sequência estrutural de construção. Nesse sentido, todo aprendizado,

independente do domínio, deve partir da ação, ou seja, da inteligência prática.

Em seguida, deve passar pela inteligência representativa não reversível,

chegar à reversibilidade e, por fim, poder assim subordinar o real a infinitas

possibilidades, característica própria do estádio operatório formal.

107

(...) un savoir qui précède l´action et peut se passer d´elle.

108 En un mot, la compréhension ou recherche de la raison ne peut que dépasser les réussites

pratiques et enrichir la pensée (...) le monde des “raisons” s´élargit sur les possibles et déborde

ainsi le réel.

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Apesar de, em tese, o adolescente e o adulto já contarem com

estruturas cognitivas concretas ou formais, ao interagir pela primeira vez com o

campo da música, apresentam um tipo de atividade similar ao da criança.

Porém, a diferença entre a criança e o adolescente está em que este último

pode chegar a uma formalização, enquanto que a criança do sensório-motor

não tem recursos cognitivos para alcançá-la (MARTINS, A. M. & STOLTZ, T.,

2012).

Dessa forma, a ideia defendida aqui é a necessidade de reconstrução

estrutural a partir de um conhecimento de domínio. Podemos perceber

exemplos desta sequência quando observamos a evolução do

desenvolvimento e aprendizado de adolescentes que teoricamente deveriam

aprender mais facilmente a partir da prática musical, seguida da representação

mental por meio da teoria (notação musical) e culminando nas operações.

Independente do nível cognitivo do aluno fica claro que há necessidade

de primeiro tomar contato com o instrumento e iniciar-se em sua prática, que

pode ser representada pelo estádio sensório-motor, ou seja, partir da ação,

para posteriormente tomar contato com a linguagem abstrata da música, a qual

pode ser representada pelo nível pré-operatório. Nesse sentido, antes da

representação mental o sujeito precisa dominar a ação. O mesmo raciocínio se

refere à passagem para o nível das operações que são ações internalizadas

reversíveis concretas e, depois, formais.

Além disto, deve-se considerar que a forma de abordar a linguagem

abstrata da música difere se o aluno apresenta raciocínio pré-operatório,

operatório concreto ou operatório formal. Nesse sentido, Piaget (1970b)

destaca que as estruturas formais podem ser acessadas em outros domínios

do conhecimento, mas isto depende da capacidade e interesse do sujeito em

questão.

No caso específico do ensino da leitura rítmica, o ponto inicial para a

construção do conhecimento do domínio musical são as representações

sensório-motoras; desta forma começa-se pela ação, ou seja, pela produção de

ritmos, para somente depois compreender o que se faz. Nesse sentido, mesmo

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com adolescentes e adultos a sequência estrutural de construção deve ser

respeitada no ensino desse conteúdo.

Acredita-se muitas vezes que o adolescente e o adulto não necessitam

respeitar a sequência lógica representada pelos patamares cognitivos

piagetianos, e que coloca que o conhecimento parte da ação para chegar à

operação, pois se supõe estarem no estádio operatório formal. É preciso

considerar, no entanto, que na música, como conteúdo a ser apreendido, o

adolescente e o adulto podem estar muito distantes do raciocínio formal.

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126

6. PESQUISAS EM MÚSICA COM REFERENCIAL PIAGETIANO

Apesar de Piaget não ter estudado diretamente o domínio de

conhecimento da música, muitos pesquisadores usaram e vêm usando sua

teoria como referencial teórico. As pesquisas em educação musical com viés

cognitivo que usaram pressupostos piagetianos interessam particularmente.

Nesse sentido, a revisão bibliográfica que segue busca agrupar os trabalhos de

acordo com aspectos teóricos específicos utilizados a partir da teoria de Piaget.

Obviamente que cada pesquisa tem suas peculiaridades, e, às vezes, utiliza

vários pressupostos piagetianos.

Além disso, a presente revisão não contempla, de forma alguma, todos

os trabalhos com referencial piagetiano, que são numerosos, e que poderiam

ser em si o tema principal de um extenso trabalho acadêmico. Nesse sentido, é

feito um recorte com trabalhos que influenciaram, de alguma forma, a

elaboração da presente dissertação.

6.1. OS ESTÁDIOS COGNITIVOS E A MÚSICA

O paralelo entre o desenvolvimento cognitivo em estádios e o

desenvolvimento musical foi um dos aspectos da teoria piagetiana estudados

por pesquisadores como Swanick e Tillman (1986), Beyer (1988), Kebach

(2003a), Pecker e Kebach (2008), Justi (2009), entre outros.

No meio da educação musical, a Teoria da Espiral de Swanick e Tillman

(1986) talvez seja uma das mais conhecidas que se utiliza de pressupostos da

teoria piagetiana. O desenvolvimento musical para estes autores “ocorre em

forma de estádios de desenvolvimento, que segue uma ordem em particular,

podendo ser observados e acompanhados” (apud. MAFFIOLETTI, 2005, p. 48).

Porém, para observar as peculiaridades de cada patamar utiliza-se da

composição musical, sendo este o meio, segundo eles, mais direto para este

fim.

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A pesquisa de Swanick e Tillman (1986) teve como base a análise de

composições de alunos entre 3 e 15 anos de uma escola inglesa. Os sujeitos

da pesquisa foram divididos em três grupos: os sujeitos de 3 e 4 anos que

tinham 20 minutos de música, uma vez por semana; os sujeitos com idades de

5 a 7 anos que tinham 30 minutos de música duas vezes por semana e os

demais que tinham aulas de música uma vez por semana. Cabe aqui salientar

que as aulas foram ministradas por um dos pesquisadores (SWANICK e

TILLMAN, 1986, p. 313).

Os dados coletados somaram mais de 700 composições que foram

gravadas e analisadas. As composições foram entregues a três juízes, dentre

os quais, um sem formação musical e dois músicos com experiência na área.

Foi pedido para os juízes comparar as gravações das composições e para que

indicassem a idade da criança. Além disso, não foi dado aos juízes nenhum

critério “ou padrão de referência para a distribuição das composições por idade

de seus autores” (apud. MAFFIOLETTI, 2005, p. 50). Porém, os juízes com

experiência musical indicaram com precisão as idades dos sujeitos, a partir de

suas composições. Já o juiz sem formação musical não conseguiu realizar a

tarefa.

Apesar disso, Swanick (1991) decide replicar sua experiência em

crianças de outra cultura (em Chipre), além de aumentar o tamanho da amostra

e de mudar os juízes para educadores musicais. O resultado do experimento

permitiu a confirmação da “hipótese de que é possível identificar a idade das

crianças a partir da composição musical, com alto grau de confiabilidade” (p.

27).

No entanto, de acordo com Caregnato (no prelo), apesar de haver

semelhanças entre a Teoria da Espiral e a Epistemologia Genética como, por

exemplo, com o papel da ação que inicia o processo de desenvolvimento, as

divergências entre as duas teorias são importantes. A interpretação de

pressupostos teóricos piagetianos como o mecanismo de equilibração que

acontece na busca do equilíbrio entre assimilação e acomodação, o conceito

de egocentrismo, de intuição e de imitação diferem, por sua vez,

substancialmente (p. 12). Além disso, outros fatores de desenvolvimento

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128

cognitivo não foram levados em conta no modelo teórico de Swanick e Tillman

(1986) e por Swanwick (1988; 1994), como destaca Caregnato:

A Teoria Espiral Do Desenvolvimento Musical parece ter sido formulada a partir de uma releitura da Epistemologia Genética, ou a partir de uma interpretação mais livre dos conceitos formulados por Piaget. Dessa forma, a Teoria Espiral do Desenvolvimento Musical dificilmente pode ser considerada como uma teoria baseada na Epistemologia Genética. (CAREGNATO, no prelo, p. 12).

Kebach (2007) também critica a Teoria da Espiral, pois de certa forma

deforma “as ideias de Piaget sobre o funcionamento e estruturação cognitiva”

(p.45). Nesse sentido, a pesquisa de Swanick e Tillman (1986) deveria

descrever com mais afinco o processo composicional em si, que levou as

crianças por meio da ação sobre o objeto musical à compreensão do mesmo.

Ester Beyer (1988), em sua dissertação de mestrado, indica que Piaget

analisa o desenvolvimento cognitivo notadamente pelo estudo do

desenvolvimento da linguagem, entre outros fatores. Nesse sentido, esta

autora se posiciona e afirma que a música é uma linguagem que pode se

desenvolver como a língua falada e escrita, porém com atrasos, já que: “a

aquisição da linguagem verbal não é simultânea à linguagem da música” (p.

68), pois o contato com a língua verbal é bem maior em relação à linguagem

musical que depende da exposição da criança a estímulos musicais e da

possibilidade da mesma interagir, por meio da ação, sobre este objeto, como

defende Beyer:

Torna-se necessário que a criança exerça sua ação sobre o som, produzindo música, para que aprenda a codificar e decodificar mensagens musicais. O referido desenvolvimento não é tão requisitado como a língua falada e poderia estar neste fato uma das razões de se reproduzir a decalagem. (BEYER, 1988, p. 69).

Além disto, Beyer (1988) sustenta que a linguagem musical é tanto mais

complexa que a língua falada, pois apresenta quatro parâmetros em relação

aos sons: duração, altura, intensidade e timbre. Ao passo que a língua falada

comporta somente duração e altura, com preponderância do fator ritmo, ou

seja, de duração sobre a altura. Nesse sentido, o uso simultâneo de vários

fatores, como os mencionados acima, aumenta a complexidade cognitiva da

linguagem musical que “terá de ser mais desenvolvida” (p. 69). Também, a

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autora sugere que o desenvolvimento da linguagem é quesito necessário para

a adaptação e sobrevivência do indivíduo na sociedade. Ao contrário da

música, que é vista por “muitos como linguagem supérflua e não é oferecida às

crianças por ser considerada desnecessária” (p. 70).

Beyer (1988) salienta que o desenvolvimento musical depende da

exposição à música, ou seja, se os sujeitos foram expostos à educação formal

ou informal durante suas vidas. Dessa forma, como é impossível encontrar

sujeitos com a mesma experiência em relação à música, a autora, para

elaborar uma “linha evolutiva”, usa um sujeito hipotético que “teria recebido

estimulação sonora adequada desde o nascimento e cujo meio possibilite o

fazer musical” (p. 70), para classificá-lo em estádios cognitivos. Assim, a autora

usa a mesma divisão piagetiana dos estádios cognitivos, ou seja, do sensório-

motor ao operatório formal.

Dessa forma, o início do desenvolvimento cognitivo musical do sujeito se

dá no estádio sensório-motor que, além da formação dos órgãos perceptivos,

com destaque para a audição, refere-se à formação dos esquemas de ação

básicos para a subsequente construção do “fazer musical” (Beyer, 1988, p. 71).

Mais tarde, na fase pré-operatória, “ocorre a passagem das cognições motoras

(abstração simples) até a representação” (p. 71). Nesse sentido, com o

desenvolvimento da representação mental, a música é assimilada

gradativamente por imagens, imagens-símbolos e por fim será representada na

sua totalidade por meio da função simbólica. Desse modo, a autora defende

que:

(...) será necessária muita ação e reflexão por parte da criança até esta conseguir evocar uma canção simples de forma completa. Irá primeiramente imitar sons, depois passagens principais da canção, em seguida as extremidades até adquirir a representação da música por inteiro (ibidem, p. 71).

Nesse sentido, é neste período que se desenvolve o jogo simbólico que

dá significado “a cada um dos parâmetros musicais” (p. 71).

No período seguinte, ocorre a “passagem de um domínio figurativo para

um domínio operativo da música”. Desse modo, a possibilidade de

reversibilidade surge e possibilita ao sujeito “desmontar” e “remontar”

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determinada canção, além de favorecer a compreensão das “relações de

consequência e nas noções de verticalidade de uma melodia” (p. 72).

Dessa forma, devido ao contato com o domínio da música, o sujeito

gradativamente se familiarizará com a linguagem musical e com sua grafia. De

acordo com Beyer (1988), a aquisição da escrita musical é gradativa, e passa

por período de “tentativas de codificação própria” para a aquisição da grafia da

música, se houver necessidade. Além disso, junto com o desenvolvimento

musical ocorre o desenvolvimento das “estruturas cognitivas de seriação,

classificação, relação e conservação” (p. 72), que é requisito para a aquisição

do esquema de tonalidade que se completa no estádio subsequente.

Com as operações formais caracterizadas pelo pensamento hipotético-

dedutivo, as capacidades musicais são ampliadas. E, não há mais a

necessidade de o sujeito pautar-se no real para chegar a conclusões. Nesse

sentido, pode-se fazer “todo o percurso mentalmente até chegar às conclusões,

sem precisar da ação sobre o real”. Assim, surge a possibilidade de

compreensão melódica e harmônica e das “relações entre antecedentes e

consequentes em frases musicais” (BEYER, 1988, p. 72-73).

Assim, neste período se completa a aquisição do esquema de

tonalidade, que possibilita a aquisição paralela da improvisação melódica e

harmônica, de acordo com a autora, das “estruturas de operações

combinatórias, de proporções, de probabilidade e previsão segundo cada um

dos parâmetros musicais descritos”. Também, com a reversibilidade construída

nesse período chega-se ao entendimento da forma musical e seu subsequente

desenvolvimento de acordo com o período histórico, o que possibilita ao sujeito

que chega nesse patamar, criar “teorias sobre os movimentos estéticos”, e “até

chegar a novos patamares” (p. 73).

Por sua vez, Kebach (2003a) busca em sua dissertação de mestrado

compreender como a criança estrutura o conhecimento musical. Ela

desenvolveu provas a partir do método clínico piagetiano para observar como

os sujeitos conseguem dissociar os parâmetros do som (altura, duração,

intensidade e timbre) e integrá-los aos seus esquemas de ação em um grupo

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de 47 crianças de quatro a doze anos. Os resultados confirmaram a hipótese

da pesquisadora de que o desenvolvimento musical ocorre de forma análoga

às fases de desenvolvimento cognitivo apontadas por Piaget. Assim, as

crianças que apresentaram respostas pré-operatórias tinham em média, 5,3

anos; as crianças com comportamento pré-operatório tinham em média de 7,6

anos e as crianças com comportamento operatório concreto tinham em média a

idade de 8,4 anos, idades bem próximas às encontradas por Piaget.

Outro aspecto discutido na pesquisa de Kebach (2003a) refere-se ao

conceito piagetiano da conservação. Este será discutido a seguir.

6.2. A CONSERVAÇÃO APLICADA À MÚSICA

De acordo com Hargreaves e Zimmermam (1992), o estudo da

conservação musical que incorporou a teoria piagetiana à pesquisa em

educação musical desenvolveu-se de forma pioneira com as pesquisas de

Zimmermam (1964; 1971), como destacam os autores:

(...) que tem como um de seus pressupostos básicos a aplicação à música do conceito de conservação proposto por Piaget – de acordo com o qual as crianças pequenas adquirem, gradativamente, a compreensão de que duas propriedades de um objeto concreto podem covariar para produzir uma terceira propriedade invariante. (HARGREAVES e ZIMMERMAN, 1992, p. 234).

Essa pesquisa buscou investigar como a conservação dos parâmetros

sonoros, melodia e altura ocorrem em sujeitos com idades de cinco, sete e

doze anos. Nesse sentido, de acordo com Zimmerman (1971), a habilidade da

conservação musical desenvolve-se gradativamente com o crescimento dos

sujeitos. Além disso, a conservação do ritmo ocorre mais tarde que a

conservação da altura (apud CAREGNATO, 2012, p. 107). Serafine (1975), por

sua vez, aplicou os testes piagetianos de conservação de líquidos para fazer

um paralelo com a conservação da métrica musical com crianças de quatro a

nove anos e verificou que “a idade é um fator importante na conservação da

métrica” (ibidem, p. 109).

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Kebach (2003a) avaliou a capacidade de 22 crianças em conservar o

pulso, e constatou em experimentos que a média de idade para o nível pré-

operatório foi de 5,4 anos. Nesse sentido, de acordo com a autora: “com mais

ou menos esta idade, as crianças pré-operam na tarefa de conservar a

pulsação frente a uma modificação na célula rítmica e de compreender as

variações nas estruturas rítmicas” (KEBACH, 2003a, p. 157). Já as crianças do

nível posterior percebem as transformações rítmicas, porém algumas ainda não

conseguem conservar satisfatoriamente o pulso quando percebem tais

modificações. Por fim, no terceiro nível que corresponde ao estádio das

operações concretas, a idade média das crianças foi de 9,5 anos.

Na mesma pesquisa, Kebach (2003a) investigou a possibilidade de

conservação do parâmetro musical da duração. Nesse caso, a autora

investigou a conservação da duração de uma nota musical em vários contextos

de execução com os mesmos 22 sujeitos no experimento de conservação do

ritmo. Nesse experimento, foi pedido aos participantes que contassem as

pulsações de um compasso, sendo simultaneamente tocadas notas de mesma

duração em diferentes momentos.

A pesquisadora constatou que alguns sujeitos do pré-operatório sequer

conseguiam identificar a igualdade de duração das notas executadas

simultaneamente com a contagem. E novamente a média de idades (que com

a conservação do ritmo foi 5,4 anos) foi de 5,2 anos para sujeitos com

pensamento pré-operatório. Em seguida, alguns participantes demonstraram

respostas intuitivas e foram classificados no segundo nível com média de 8,2

anos. Os sujeitos com média de 10,4 anos “operaram sobre a problemática de

modo lógico, conservando a duração da nota e demonstraram, assim,

pertencer ao Nível III de desenvolvimento” (KEBACH, 2003a, p. 162).

Dessa forma, Kebach (2003a) conclui em sua pesquisa que as diferentes

provas de conservação permitiram relacionar o desenvolvimento musical com o

desenvolvimento geral da criança. Nesse sentido, as idades médias de cada

patamar de desenvolvimento musical condizem com as médias apontadas por

Piaget, “segundo o qual o estádio pré-operatório, que abrange também o

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intuitivo, vai até sete/oito anos, e o operatório começa, em média, a partir de

oito anos” (p. 180).

6.3. A ADAPTAÇÃO MUSICAL

Beyer (1988) menciona que na educação musical brasileira existem

professores que, desconhecendo o processo de equilibração de Piaget dão

preferência ao ensino pautado na reprodução automática de padrões e

consequentemente e inconscientemente ocorre a predominância da

assimilação sobre a acomodação. Desse modo, o sujeito assimila o conteúdo

musical, mas não sabe agir sobre o mesmo e não acomoda adequadamente.

Como aponta a autora:

Transformar o meio supõe a existência de ação do próprio sujeito. Pode verificar-se que lamentavelmente, esta ação do sujeito é quase inexistente na educação musical vigente, antes é fortemente enfatizado o “absorver musical”. Desta forma, ficam impedidos os alunos de adquirirem domínio sobre o discurso musical. O ideal é que se obtivesse o equilíbrio entre ambos processos (assimilação e acomodação), para atingir também o desenvolvimento normal das estruturas de organização interna (BEYER, 1988, p. 74).

Assim, os métodos de ensino que priorizam a reprodução, ou seja, a

imitação de modelos prontos, são criticados pela autora, como é o caso do

método Suzuki. Acompanhando Piaget, a autora diferencia três formas de

assimilação: a assimilação reprodutiva, recognitiva e generalizadora. Desse

modo, a primeira consiste na “simples imitação da frase musical assimilada”.

Em seguida, a assimilação recognitiva é um tanto mais complexa, pois

preconiza o reconhecimento e identificação de dada melodia. Assim, “pelo ouvir

sucessivas vezes a mesma música, gera-se o reconhecimento desta que será

fonte de prazer para o sujeito que a identifica”. Porém, como lembra a autora, o

sujeito, neste caso, ainda não opera. Por fim, a assimilação generalizadora

pode ser exemplificada com a duração, o sujeito que consegue generalizar

consegue mudar o tempo (andamento) de determinada canção (p. 75).

Contudo, Beyer (1988) adverte sobre a possibilidade de confusão entre

assimilação generalizadora e acomodação, já que em ambos os casos há

modificação interna da estrutura cognitiva do sujeito. Desse modo, com a

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assimilação há absorção de um padrão, sem haver necessariamente uma

“modificação essencial” do mesmo, o que ocorre com a acomodação que

“caracteriza-se pela ação desenvolvida a partir do assimilado” (p. 76). Como

aponta Beyer:

A acomodação visa experimentar para obter resultados, enquanto a assimilação generalizadora trabalha os mesmos conteúdos apenas para ampliar as aplicações do adquirido, ou seja, o mesmo comportamento visível de uma criança em relação a uma frase musical pode ser impulsionado por mecanismos de adaptação diferentes (ibidem, p. 76).

Portanto, o processo de adaptação é, de acordo com a autora, a

sucessão de adaptações que são de certa forma a reorganização da estrutura

interna, da mais específica para a mais ampla. Nesse sentido, “a organização

vai se abrindo em círculos concêntricos menores e maiores” (p. 76) formando

assim uma espiral de conhecimento. Consequentemente, diz Beyer, se há na

educação musical predomínio da assimilação em detrimento da acomodação, a

organização do sujeito, ao invés de ocorrer por meio de “um constante

equilíbrio dinâmico, torna-se parcial ou inteiramente estática” (p. 77).

Nesse sentido, há necessidade de sequência da organização interna

que deve seguir a seguinte ordem: “indiferenciação→ diferenciação (parcial)→

identificação→ nomeação de classes→ classificação interna (classificação ou

simples numeração dos elementos→ relação das classes com o todo” (p. 77).

Assim, se o sujeito somente reproduzir padrões sem efetivamente agir sobre o

objeto musical, dificilmente conseguirá construir um conhecimento musical que

ultrapasse a nomeação de classes, como ilustra Beyer:

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Para exemplificar, toma-se um ritmo ouvido por uma criança que não saiba diferenciar entre as diversas durações existentes. Após tentar reproduzir várias vezes este ritmo descobre que há sons “que a gente segura mais tempo e outros que segura menos”. É a primeira diferenciação ocorrida. Ao seguir desenvolvendo a ação e refletindo sobre este ritmo, a criança chegará à identificação do som mais curto e do mais longo, mesmo quando não execute o modelo rítmico do momento. A identificação dos elementos diferenciados ficou estabelecida. Caso houver neste ponto da exploração sonora da criança uma educação musical formal, esta começará a denominar os elementos pelos nomes das figuras de tempo (mínima, semínima, etc.). Se a referida criança prosseguir suas experiências sozinhas, poderá denominar as classes segundo nomes por ela conferidos. A próxima etapa deverá ser a da relação entre a mínima e a semínima, ou seja, quantas semínimas correspondem a uma mínima e quantas semínimas estão contidas numa mínima. Mais tarde, esta criança deverá subdividir os elementos deste ritmo e também configurar representantes de um grupo de sons. Em um patamar superior de abstração, a criança pode tomar como ponto de referência qualquer uma das figuras de tempo e elaborar o mesmo ritmo, variando o tempo de execução ou a forma de representação escrita (ibidem, p. 77-8).

Dessa forma, se houver a passagem abrupta para a fase de nomeação,

sem haver construção por parte do indivíduo dos patamares anteriores,

ocorrerá a “queima de etapas cognitivas” e assim, a carência de “embasamento

que sirva de suporte” comprometerá o equilíbrio evolutivo, assim, não sendo

possível o desenvolvimento da reversibilidade no domínio musical, o que

acarreta a impossibilidade de operar (BEYER, 1988, p. 78).

Kebach (2007), por sua vez, afirma que as mesmas regras do

conhecimento geral do construtivismo piagetiano se aplicam ao domínio de

conhecimento da música. Para ela, as “construções musicais obedecem às

mesmas leis de funcionamento de todo processo de adaptação do sujeito em

relação aos objetos descobertos” (p. 40), ou seja, estas construções gradativas

se dão, de acordo com a autora, por meio da interação do sujeito com o objeto

musical e não se desenvolvem exclusivamente por causa da herança genética,

como ilustra a citação:

(...) a hereditariedade na construção cognitiva, com base na epistemologia genética, não desempenha papel relevante como propõe o senso comum, especialmente no âmbito musical. Toda vez o músico executa ou cria uma peça musical com tal naturalidade que remete à possibilidade de algo inato. (KEBACH, 2007, p. 43).

Assim, Kebach (2007) argumenta que quando o sujeito se depara com

um conhecimento musical (objeto) novo, seus esquemas de assimilação se

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mobilizam visando apreender a novidade integrando a mesma aos seus

esquemas de ação já construídos. Nesse sentido, o sujeito constrói seu

conhecimento musical pela sua ação sobre o objeto a ser construído e não por

herança genética, nem por uma “recepção passiva de comandos exteriores ou

audições sem reflexão” (p. 47).

No que tange à aprendizagem musical, esta pesquisadora coloca o

papel do professor que deve tornar suas aulas significativas para os alunos, já

que é por meio de situações desafiadoras e, sobretudo pela ação progressiva

do próprio sujeito sobre o objeto musical que o “sujeito se constrói

musicalmente” (p. 47).

6.4. IMITAÇÃO E REPRESENTAÇÃO MUSICAL

Deckert (2008) estuda como ocorre, em crianças entre cinco e sete anos

do período pré-operatório, a passagem da imitação à representação mental por

meio da educação musical. Nesse sentido, são apresentadas as fases

sucessivas do processo imitativo e verifica-se se estas ocorrem no domínio

musical.

Desse modo, a primeira fase denominada por Piaget (1975) de

preparação reflexa, não foi observada pela pesquisadora já que se apresenta

no período sensório-motor, e desenvolve-se nos primeiros dias de vida por

meio de “reflexos puros” que são uma “espécie de reação circular”. Já a

segunda fase da imitação, denomina-se de “imitação esporádica” e ocorre

devido ao interesse que determinados sons suscitam, assim a criança “percebe

o som que o outro produziu e amplia-o em função da sua própria experiência”

(p. 99). A terceira fase da imitação trata da imitação sistemática, na qual o

sujeito consegue coordenar seus próprios movimentos com sua visão e com os

de outra pessoa, porém sem o uso da visão, a criança não consegue imitar

movimentos. Dessa forma, suas ações se referem à ação imediata, sem

possibilidade de evocação, previsão ou reconstituição mental, como sustenta a

autora:

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Pode-se observar no desenvolver das atividades de educação musical, analisando especificamente sob o aspecto rítmico, que a criança não consegue imitar movimentos com vistas à produção sonora feita pelo pesquisador se não forem vistos por ela. Pelo fato de não ser capaz de supor, por exemplo, que tipos de movimentos o outro está fazendo para produzir determinado som, ela precisa percebê-lo visualmente para só então executá-lo. (DECKERT, 2008, p. 99).

Além disso, o sujeito desse período não consegue imitar um movimento

particular de um conjunto de movimentos. Desse modo, se o professor

executar uma sequência de movimentos é mais fácil para o aluno imitar o todo,

e não a soma das partes. Obviamente que se pode dividir o movimento em

partes mais simples, porém estas devem ser visíveis e será “muito mais

complexo fazer a imitação em partes do que perceber o esquema como um

todo e imitá-lo” (p. 99).

Na quarta fase da imitação há avanços significativos em relação à

construção do espaço, objeto e causalidade. Desse modo, o sujeito nesse

período consegue através de “indícios” assimilar os gestos dos outros, mesmo

sem a percepção visual imediata. É também a fase em que se pode

compreender “a relação que existe entre o desenvolvimento da imitação e o ato

da inteligência como um todo” (p. 99), além de possibilitar a imitação de sons e

gestos, antes considerados de forma indiferente.

Em seguida, na quinta fase o sujeito alcança o patamar da imitação

sistemática, incorporando novos modelos de forma precisa. Nesse sentido,

pode-se “descobrir as novas propriedades dos objetos por meio de

experimentação ativa” que possibilita uma “acomodação por exploração

empírica, dirigida e sistemática” (p. 99). Isto significa que o sujeito é capaz, por

meio de sua ação sobre o objeto musical, de organizar e analisar estruturas

que se repetem, ou trechos rítmicos, assim como os agrupamentos sonoros

(p.99).

A última fase é a imitação diferida e representativa, na qual a imagem é

internalizada e pode ser evocada. Desse modo, com a construção da imagem

mental e o desenvolvimento da inteligência representativa, abrem-se novas

possibilidades e notadamente o poder de representar mentalmente o som.

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Assim, a criança do período pré-operatório pode escutar uma melodia qualquer

mentalmente e reproduzi-la (DECKERT, 2008).

Por fim, a pesquisadora concluiu que o experimento possibilitou observar

o percurso pelas diversas fases descritas por Piaget (1975) que levam da

imitação à representação mental. Ela pode constatar que durante o

experimento musical as crianças construíram por meio da imitação a

representação mental da música antes de poder representar graficamente a

mesma, como defende Deckter:

(...) a criança chega a uma compreensão do significado musical das células rítmicas, lançando mão de símbolos concretos e significantes diferenciados antes de chegar ao signo utilizado na música, a notação musical. (DECKERT, 2008, p. 101).

Observando que o sujeito representa o som mentalmente, antes mesmo

de poder representá-lo graficamente, abordam-se, a seguir, experimentos de

como é estruturada a apreensão da notação de ritmos simples.

6.5. A CONSTRUÇÃO DA NOTAÇÃO MUSICAL

Bamberger (1990) realizou experiências de produção espontânea de

notações musicais relativas ao ritmo musical, já que “os ritmos estão

profundamente entranhados em todo ser vivo”, seja pelos batimentos do

coração, seja pelo ritmo do caminhar, seja pela respiração, entre outros. Desse

modo, a divisão temporal está presente na vida de todos e a capacidade de

“captar o sentido da música popular está presente na quase totalidade da

comunidade” (p. 98). Porém, nem todos têm o conhecimento da notação

musical. Aliás, é pela falta de ensino formal da notação musical que foi possível

a realização dos experimentos, pois somente uma minoria tem acesso às

convenções de subdivisão rítmica.

Esta pesquisadora destacou a possibilidade de observar a construção

dos mecanismos cognitivos que dão coerência à compreensão musical em

crianças e adultos que estariam no mesmo patamar de desconhecimento no

domínio musical, apesar de os adultos já terem construído conhecimentos em

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outros domínios e as crianças estarem em diferentes fases deste processo.

Nesse estudo, foram estudados em três experimentos como são produzidas

notações espontâneas de ritmos simples produzidas por palmas. O primeiro

experimento foi realizado com 25 crianças de oito e nove anos. No segundo

experimento o grupo foi maior e abarcou faixas etárias maiores, foram 186

crianças entre quatro e doze anos. No último foram observados como 40

adultos, dentre os quais 20 sem formação musical e 20 com formação musical

analisavam as produções das crianças (BAMBERGER, 1990, p. 99).

Os resultados dos experimentos possibilitaram a construção de um

modelo de notações segundo a idade dos sujeitos que se inicia com garatujas

rítmicas produzidas pelas crianças entre 4-5 anos. Nesse sentido, os sujeitos

desse nível não conseguem distinguir “a ação de bater palmas e as batidas”,

como defende Bamberger:

As crianças menores parecem reproduzir no papel (ou mesmo “tocar”) os movimentos das mãos e dos braços que produzem as batidas. Pode-se dizer que elas não dissociam os efeitos separados e discretos (os sons das batidas) dos movimentos que as produzem ou que deles são causa. (BAMBERGER, 1990, p. 103-104).

Bamberger (1990) sugere que as crianças entre 6-7 anos já são capazes

de representar nas suas notações o número correto de eventos rítmicos

apresentados. Além disso, nesse nível inicia-se a diferenciação entre

representação figural e representação métrica. A primeira diz respeito à

centração no movimento de bater palmas e no agrupamento dessas por meio

da construção de figuras. Por sua vez, a segunda refere-se à “centração única

na diferenciação entre batidas e a ação de bater palmas e vem a ser um

começo de unidades discretas por contagem” (p. 107).

Na fase subsequente, as crianças aprofundam as notações figurais

apresentando progresso importante com distinção clara do agrupamento e até

ocorre a diferenciação da velocidade das batidas de palmas. Nesse sentido, as

representações rítmicas, deste nível, parecem contemplar a representação

rítmica de forma correta tanto para crianças quanto para adultos sem formação

musical.

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Na fase seguinte, Bamberger (1990) menciona que os sujeitos passam

de uma “centração na reprodução de uma ação efetuada e sentida, da

centração prestada aos agrupamentos em figuras” para uma “centração na

medida das durações relativas de todos os eventos” (p. 110). Isto significa que

surge a possibilidade de comparação de todos os eventos rítmicos, além da

possibilidade de classificação dos mesmos que, aliás, torna-se mais importante

que a representação figural.

No último patamar, as notações rítmicas são precisas e apresentam um

sistema de medida estável e coerente. Cabe aqui salientar que foram raras as

crianças que produziram notações deste tipo que se aproxima, de certa forma,

da notação tradicional musical. Como aponta a autora, as notações deste nível:

(...) mostram a duração de cada evento em relação a uma medida estável. Uma referência estável como essa funciona um esquema geral em relação ao qual todo evento pode ser medido de maneira correta e coerente. As (raras) crianças que produziram tais notações, de fato, inventaram os começos de um sistema formal simbólico, próximo da notação rítmica tradicional. (BAMBERGER, 1990, p. 111).

Também, de acordo com a autora, o sistema simbólico da notação

musical tem uma medida constante que pode ser representada pelo pulso

sendo que “o batimento de fundo estabelece a unidade métrica” (p. 112).

Desse modo, os sujeitos do último nível constroem uma “unidade-tempo

invariante, extraindo o batimento das durações variadas efetuadas na ação” (p.

113), que se aproximam dos agrupamentos descritos por Piaget e Inhelder

(1947, p. 46) que dizem que,

Todo mecanismo mental evolui do ritmo ao “agrupamento” por intermédio de regulações que coordenam, primeiro, os elementos dos ritmos iniciais e que resultam, em seguida, em sua reversibilidade crescente, em formas diversas de agrupamentos. (apud BAMBERGER, 1990, p. 113).

No que tange aos adultos, o experimento que Bamberger (1990)

efetuou, ocorreu da seguinte maneira: foram apresentadas as produções

gráficas das crianças e pedido que todas representassem o mesmo ritmo. Para

um grupo de quarenta adultos, metade desses sem formação musical e metade

com formação musical, apenas no nível de músicos amadores. Em seguida, foi

pedido que os mesmos escolhessem um tipo de notação e lessem o ritmo de

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acordo com as notações feitas pelas crianças. Ao final a autora observou que a

maior parte dos adultos com conhecimentos musicais escolheram as notações

com cunho métrico que equivalem ao nível de classificação. Já os que não

tinham nenhum tipo de conhecimento do domínio musical escolheram a

notação do nível figural. Também, a autora observou grande dificuldade de

compreensão do último nível por parte dos adultos sem formação musical.

Bamberger (1990) sustenta que os resultados dos experimentos

mostraram que o desenvolvimento da notação musical implica a construção

seja de aspectos figurativos ou (de construção) de aspectos métricos,

dependendo de como o sujeito apreende a realidade de acordo com seu

desenvolvimento cognitivo. Nesse sentido, a autora conclui que:

As diversas notações produzidas em períodos diferentes do desenvolvimento e em momentos diferente de certa aprendizagem mostram-nos o estado real da capacidade do sujeito de descrever, quer dizer, de exteriorizar certos aspectos dos fenômenos sem prestar atenção a outros (ou sem poder ainda tratá-los tendo em vista a descrição). Por vezes, assistimos ao conflito entre a experiência interior subjetiva e a exteriorização simbólica. (BAMBERGER, 1990, p. 123).

Assim, fica claro que o processo descritivo gera em si aprendizagem,

pois o sujeito aprende “a centrar, diferenciar e a classificar propriedades, a

comparar eventos separados” (p. 123), possibilitando a descentração do

mesmo. Além disso, a autora sustenta que há tendência nos sujeitos, após o

aprendizado métrico da notação musical tradicional, de julgar o aprendizado

figural como incorreto. No entanto, ela defende que o importante é chegar ao

aprendizado mesmo que a tomada de consciência apague o processo de

“apreensão natural e espontânea das estruturas e funções figurais” (p. 124).

Desse modo, o professor no ensino deve privilegiar a descrição de apreensão

rítmica tanto figurais como métricas e promover conflitos cognitivos entre as

duas que proporcionariam aprendizagem.

Beyer (1995b), por sua vez, pesquisou com referencial piagetiano como

se dá a grafia da altura musical em 20 alunos com idade entre 9-10 da rede

pública de Porto Alegre. Foram ministradas aulas de música durante dois

meses e, em seguida, foi realizada uma coleta de dados com o seguinte

procedimento: a professora tocava em diferentes alturas, sons graves e agudos

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numa viola, e os alunos tinham que escrevê-los. As aulas continuaram e foi

feita uma segunda coleta, igual à precedente, porém com a indicação do fator

tempo representado por uma flecha horizontal direcionada para a direita.

A pesquisadora apontou que os resultados permitiram estabelecer três

etapas evolutivas neste experimento educacional. Na primeira, os sujeitos

desconsideram a possibilidade de coordenação do eixo altura e tempo. Aliás, a

criança deste nível “escreve uma quantidade maior ou menor de pontos do que

sons tocados, (...), sem alguma classificação lógica pelo som” (p. 59). Desse

modo, não há relação entre a escrita e o que foi escrito. De acordo com a

autora, o pensamento neste nível é pré-operatório. Já no segundo nível, as

crianças consideram somente o fator altura. E, no terceiro nível, os sujeitos

levaram em consideração os dois eixos, tempo e altura.

Assim, Beyer (1995b) concluiu que os resultados obtidos no estudo

sobre “o desenvolvimento do conceito de altura em relação ao tempo” (p. 64)

permitiram observar que a maior parte dos alunos passou de um nível de

desenvolvimento cognitivo, relatado durante a primeira coleta de dados, para

um patamar superior durante a segunda coleta. Somente 10% dos alunos não

apresentaram progresso, e permaneceram com respostas inalteradas. Nesse

sentido, permitindo à autora de afirmar que as práticas pedagógicas foram

adequadas.

Além disso, chama a atenção da autora que durante o processo de

ensino/aprendizado, mesmo com o “feedback” da professora dando as

respostas corretas, os alunos “apresentaram ainda dificuldade em aprender o

que é afinal agudo e o que é grave” (p. 64). Nesse sentido, Beyer (1995b)

defende que memorizar não é sinônimo de aprender, pois não possibilita uma

“abstração do pensamento” (p. 64). Nesse sentido, é pela ação que o sujeito

constrói o conhecimento musical.

Cabe abordar, a seguir, os aspectos figurativos e operativos presentes

na aprendizagem musical.

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6.6. ASPECTOS FIGURATIVOS E OPERATIVOS NA MÚSICA

Beyer (1988) afirma que os recursos figurativos e operativos são

oriundos da ação do sujeito sobre o objeto. Dessa forma, por se referir ao

estado do objeto, o primeiro é mais “estático”, e o segundo trata das

transformações advindas sobre do mesmo. A autora afirma que no período pré-

operatório há predomínio do aspecto figurativo, pois a percepção é

predominante neste nível de desenvolvimento cognitivo (p. 77). Entretanto, a

autora sugere que apesar da percepção implicar o aspecto figural, o

desenvolvimento musical deve necessariamente incluir “ações e

transformações” (p. 79), ou seja, o aspecto operativo. Pois, se o ensino se

basear somente em aspectos figurativos ficaria limitado, como ilustra a autora:

(...) para efetivar a representação gráfica da música, o figurativo age na formação do símbolo musical e o operativo, na relação de correspondência entre os dois conjuntos (sons e grafia). Ou seja, até para que a alfabetização musical seja consumada, tarefa caracteristicamente operatória torna-se necessário o domínio figurativo. (BEYER, 1988, p. 79).

Desse modo, é necessária a integração dos aspectos figurativos aos

aspectos operativos e vice-versa, pois de acordo com a autora, no meio

artístico pode-se fazer uma analogia entre a percepção que está ligada a

aspectos figurativos, e a expressão, por sua vez vinculada aos aspectos

operatórios. No estádio pré-operatório, a “expressão está subordinada à

percepção”, porém, “a partir do momento que se forma o pensamento

operatório existe livre trânsito entre ambos” (p. 79), e isto deve ocorrer nos dois

sentidos.

No que diz respeito à música, Beyer (1988) tece uma crítica ao ensino

tradicional que privilegia a percepção que segue em via única rumo à

expressão. Nesse sentido, ela menciona que lamentavelmente alguns

exercícios como o ditado musical, ao invés de buscar o equilíbrio entre

percepção e expressão, tornam o exercício “um simples adestramento

mecânico dos alunos com o fim de obter-se resultados rápidos e satisfatórios

para os professores” (p. 79-80).

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Em relação ao estudo do ritmo, Beyer (1988) sugere que os aspectos

figurativos se referem aos conhecimentos gráficos específicos da escrita

musical, como, por exemplo, as figuras, os compassos, etc., ou seja, são as

regras envolvidas neste processo. Já os aspectos operativos, remetem a

operação do sujeito sobre estas regras, o que pode ser verificado pela

abstração da pulsação pelo sujeito. Como menciona a autora:

Se, por um lado, precisa-se aprender as regras específicas de escrita de tempo de uma música, para o domínio do código tradicional, por outro lado, é de importância fundamental o domínio da pulsação relativizada para assimilar o significado da própria música. (BEYER, 1988, p. 82).

No entanto, Beyer (1988) considera inadequado o uso de artifícios

figurais que são usados com frequência em muitos métodos de ensino da

educação musical. Na verdade, estes simplificam fórmulas rítmicas e as

associam a palavras como, por exemplo, associam “a semínima, a colcheia e a

semicolcheia às palavras “vou”, “corro” e “ligeirinho”. Nesse sentido, a autora

salienta que tais procedimentos “aprisionam” o aluno, pois utilizam a figura

semínima como “única unidade de tempo possível”. Para chegar ao “padrão

operativo”, no caso do ritmo, é preciso fazer o aluno chegar a um “raciocínio

para a compreensão” apoiando-se em sua “prática já vivenciada”. E, uma forma

de proporcionar a operação no domínio musical consiste em ensinar os

elementos básicos para que o aluno possa através de suas próprias

composições elaborar “os ritmos que souber fazer” (p. 82).

Weiland e Valente (2006) apresentam uma pesquisa na qual investigam

como aspectos figurativos da música podem desenvolver aspectos operativos.

Nesse sentido, a pesquisa foi realizada com crianças de sete a nove anos que

foram separadas em três grupos. O primeiro grupo tinha alunos iniciantes, o

segundo apresentava alunos que tiveram aulas de música durante dois

semestres, e o terceiro com alunos com experiência musical de três semestres.

Por meio do ensino da flauta doce, Weiland (2006; 2007) ministrou aulas

de música que buscou seguir o modelo C(L)A(S)P de Swanick (1979), no qual

o desenvolvimento do sujeito está pautado no “engajamento ativo e direto com

a música” (p. 50). Desse modo, é através principalmente de atividades de

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execução musical, composição e de apreciação que os alunos desenvolvem-se

musicalmente. E, as atividades como a literatura (por exemplo, o ensino da

história de uma determinada peça musical, de um dado período) e a técnica

são vistas como atividades periféricas (p. 50).

Assim, a pesquisadora procurou criar recursos figurativos, entre outros,

com o recurso do mapa musical, que consistem em cartelas com o conteúdo

escrito em partituras da música escutada. Isto possibilita a criação de um

recurso figurativo concreto que favorece o desenvolvimento dos aspectos

figurativos, como destacam as autoras:

O mapa musical diz respeito a uma atividade de apreciação musical, (...), Este recurso pôde prender a atenção dos alunos, instigando-os a ouvirem mais vezes a apreciação proposta pelo professor, mantendo

a sua atenção constante. (WEILAND E VALENTE, 2007, p. 54).

Como mencionado anteriormente, as atividades de ensino desenvolvidas

para a coleta de dados por Weiland (2007) abarcavam a apreciação, a

execução musical e a composição, cada qual desenvolvida com um grupo.

Uma das atividades que foi realizada com o grupo que tinha maior experiência

musical consistiu em apresentar uma cartela com dois trechos musicais. O

nome da atividade era: “qual a mais longa” (p. 56). No primeiro trecho havia

muitas notas escritas em dois compassos (com semicolcheias e colcheias), e

no segundo trecho havia quatro compassos com figuras rítmicas com valores

maiores (no caso, mínimas). Considerando o tamanho do primeiro trecho que

ia parecer maior, e levando em conta o aspecto figurativo, as crianças sem

compreensão operatória poderiam se enganar. Nesse sentido, de acordo com

a autora, para responder satisfatoriamente os alunos deveriam se apoiar em

aspectos operativos do pensamento, como indicam as autoras:

Para elaborar a resposta o aluno já deve possuir aspectos operativos do pensamento. Apoiando-se somente nos aspectos figurativos a resposta será baseada no tamanho físico da composição e não no número de tempos da mesma. Portanto, o aluno terá de comparar os tempos de duração das figuras rítmicas envolvidas na questão. Raciocinando assim, o aluno chegará à conclusão de que o primeiro exemplo, embora tenha mais notas musicais e fisicamente pareça mais longo, ocorrerá em um menor tempo. (WEILAND E VALENTE, 2007, p. 56).

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Portanto, de acordo com Weiland (2006), os alunos dos três grupos

investigados alcançaram a operatividade no domínio musical, por meio “de

recursos e estratégias apoiados em aspectos figurativos” que “facilitam a

aprendizagem” (p. 128).

No próximo item serão abordados trabalhos de educação musical com

referencial piagetiano que investigaram como atividades musicais podem

desenvolver aspectos cognitivos.

6.7. O DESENVOLVIMENTO DAS NOÇÕES DE TEMPO E ESPAÇO E AFINS

Maffioletti (1987) realizou dissertação de mestrado que buscou investigar

em que medida atividades rítmicas musicais influenciariam o desenvolvimento

das noções de tempo e espaço em crianças entre cinco e seis anos da rede de

escola pública estadual de Porto Alegre. No total, três escolas participaram do

experimento com uma turma pré-escolar cada. As atividades de ensino e a

aplicação das provas piagetianas não foram realizadas diretamente pela

pesquisadora. Houve a necessidade de capacitar as professoras participantes

do experimento com treinamento de 10 horas de atividades rítmicas, o mesmo

foi necessário para a aplicação das provas piagetianas (p. 70-71).

Assim, a intervenção confirmou a hipótese da pesquisadora, no que

tange ao desenvolvimento da noção de tempo. No entanto, não teve “o mesmo

efeito para a noção de espaço” (p. 138). Além disso, Maffioletti (1987) diz que

as situações vividas pelos alunos permitiram a construção do conhecimento

musical, porém tece uma autocrítica dizendo que o programa de treinamento

dos professores poderia ter evocado mais atenção, já que a construção musical

dos professores é tão importante quanto a das crianças, como defende a

autora:

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Cabe portanto, uma crítica ao programa de treinamento dos professores, pela despreocupação com a construção dos conhecimentos dos aplicadores, pois essa falha em alguns momentos contraria as ideias pedagógicas previstas para a abordagem junto às crianças. Enquanto para orientação das atividades foi respeitada a maneira como a criança constrói seus conhecimentos, pouca importância foi dada a esse mesmo aspecto na formação das professoras aplicadoras. (MAFFIOLETTI, 1987, p. 139).

Desse modo, Maffioletti (1987) argumenta sobre a necessidade de

preparar adequadamente terceiros quando estes participam diretamente do

experimento.

Por sua vez, Rabassi, Calsa e Pereira (2009) mostraram que os

resultados encontrados por Maffioletti (1987) podem ser, de certa forma,

replicados e que o ensino do ritmo musical, além de auxiliar no

desenvolvimento da noção de tempo nas crianças com idade pré-escolar, pode

também auxiliar atrasos relativos a esta aquisição.

Caregnato (2012) pesquisou como 16 alunos, sem ensino prévio de

música, do ensino fundamental da rede pública da cidade de Curitiba, da

primeira a quarta série, com idades entre cinco e nove anos, A desenvolverem

as noções de simultaneidade e de igualdade de durações por meio de práticas

musicais. O estudo utilizou-se do método clínico como metodologia de

investigação. Nesse sentido, os sujeitos participaram de um experimento

individual e de uma entrevista semiestruturada.

Caregnato (2012) supôs que o desenvolvimento da compreensão da

simultaneidade e da igualdade de durações em música acontecesse “em

função de um desenvolvimento do pensamento – e não apenas da percepção

infantil” (p. 206). Nesse sentido, a autora afirma que a compreensão destes

conceitos ocorre por meio de um processo de tomada de consciência. Como

sustenta a autora:

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(...) todo o desenvolvimento da simultaneidade e da igualdade de durações observado nas crianças que participaram deste trabalho espelha o processo de tomada de consciência. Foram observados processos de exteriorização – de formação do conhecimento do mundo, ou do real – e de processos de interiorização – ou de desenvolvimento cognitivo da criança. (CAREGNATO, 2012, p. 207).

A autora concluiu que as hipóteses do estudo foram confirmadas e que

se observou que, em relação ao desenvolvimento do conhecimento “temporal-

musical”, como os sujeitos não interagem com frequência com o mesmo,

ocorreu uma “defasagem horizontal” em relação às idades das etapas

apontadas por Piaget (CAREGNATO, 2012, p. 207).

6.8. JOGOS, MOVIMENTO E DESENVOLVIMENTO MUSICAL

Delalande (2003; 2008b) sugere que o jogo sensório-motor, ou seja, o

jogo de exercício ou de repetição tem uma função de adaptação. É por meio de

experiências sensório-motoras de jogo que a criança se adapta ao meio

externo. Nesse sentido, o autor afirma que produzir sons pode ser considerado

como um jogo. Aliás, no francês, o verbo jogar, ou seja, jouer, serve tanto para

jogar (jogos) quanto para tocar um instrumento. Dessa forma, a criança que

brinca com sons está exercitando suas capacidades sem necessariamente ter

um propósito específico, como aponta o autor:

Se Piaget fala de jogo a este respeito é porque a criança deleita-se exercitando no vazio, sem necessidade imediata, suas possibilidades motoras. (DELALANDE, 2003, p. 23)

109.

Para Delalande (2003), a música se aproxima do jogo simbólico

piagetiano na medida em que alguns esquemas de movimento, assim como a

organização dos sons, estão presentes na realidade vivida. Por esta razão, a

música se confunde com o jogo simbólico, no qual o faz-de-conta predomina e

imita o meio que circunda o sujeito. E, a representação mental da música

evoca, por sua vez, um movimento, um gesto que pode estar associado com

sentimentos. Como indica Delalande:

109

Si Piaget parle de jeu à ce propos c´est parce que l´enfant se complaît à exercer “à vide”,

sans necessite immédiate, ses possibilites motrices.

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(...) se trata-se de uma música de notas, que é o decalque do que se poderia encontrar na captação de uma imagem, por exemplo, ou na representação física de um deslocamento qualquer. É um dos fatores, (...) que permitem de entender como a música evoca o movimento, uma situação vivida, ou ainda, e justamente por causa de tudo isto, os sentimentos. (DELALANDE, 2003, p. 24)

110.

Segundo o autor, a música não é somente um exercício sensório-motor,

já que o músico utiliza-se de sons e dá significado aos mesmos representando

a realidade ou o imaginário. Nesse sentido, a música tem seu valor simbólico

que pode evocar sentimentos, e que prolonga o jogo simbólico presente na

infância (DELALANDE, p. 2006, p. 2).

Além disso, Delalande (2006) sustenta que a produção de sons musicais

obedece a regras. E, evoca o jogo de regras piagetiano. No entanto, as regras

não são necessariamente para seguir o padrão social vigente, nem uma ordem

maior. As regras proporcionam, segundo o autor, prazer e podem chegar a ser

até engraçadas. Por exemplo, durante a execução de um cânone, se a

segunda voz começar atrasada, não respeitando a regra, o exercício não vai

dar certo. Porém, se as duas vozes começarem nos devidos momentos

respeitando a regra, num toque de mágica as vozes se encaixam produzindo

consonâncias, o que pode gerar satisfação (p. 2). Nesse sentido, o autor

lembra que cada cultura tem sua própria gramática musical e que o respeito às

regras estabelecidas pode ser fonte de prazer (DELALANDE, 2003, p. 25).

Portanto, fazer música é um processo complexo que envolve, segundo

Delalande (2006), ao mesmo tempo o jogo sensório-motor, o jogo simbólico e o

jogo de regras (p. 2), e, nesse sentido, estas informações são úteis para os

educadores, já que são as atividades prediletas das crianças. Além disso,

Delalande (2003) coloca que a pedagogia musical é uma forma de tentar

manter a presença do jogo na vida adulta, que poderia realizar-se por meio da

música (p. 31).

Bϋndchen (2005), por sua vez, investigou como o movimento corporal

pode favorecer a construção do conceito de ritmo e o conceito de performance,

110

(...) s´il s´agit d´une musique de notes, qui est le décalque de ce qu´on pourrait rencontrer

dans une prise de vue, par exemple, ou dans une quelconque représentation physique d´un

déplacement. C´est l´un des facteurs, (...), qui permettent de comprendre comment la musique

evoque un mouvement, une situation vécue, ou bien encore, et justement à cause de tout cela,

des sentiments.

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isto é, de execução musical, em 30 meninas entre onze e dezoito anos, através

da atividade de canto coral. Dessa forma, a pesquisa realizou-se com

intervenção pedagógica, seguida de coleta de dados que utilizou o método

dialético-didático que alia observações e entrevistas inspiradas no método

clínico piagetiano.

A autora destacou que a pesquisa pautou-se no construtivismo

piagetiano, por isso, foram privilegiadas as situações de cooperação e o

trabalho em grupo. Nesse sentido, esta pesquisa fundamentou-se “sobre a

trilogia cognição – música – corpo”, que foi integrada pelo construtivismo, e na

qual “aluno-cantor e professor-regente” constroem o conhecimento musical

pela “própria ação”, em que o corpo “foi o elo de ligação entre a música e a

cognição” (p. 221).

Outro aspecto interessante desta pesquisa foi a possibilidade de

construção do conceito do ritmo, por meio do movimento corporal que

confirmou a hipótese inicial da autora. Além disso, a tomada de consciência

desencadeada pelos movimentos corporais, e as reflexões, discussões e

intervenções permitiram a construção efetiva do conceito de ritmo, evitando

assim a simples reprodução de ideias prontas em nível prático, como defende

Bϋndchen:

O movimento corporal foi de fato um desencadeador de tomadas de consciência: à medida que criavam movimentos, agiam sobre si mesmas, integrando-os a uma estrutura rítmica; quando os representavam graficamente, podiam estabelecer relações; nas intervenções e entrevistas, estabeleciam outras relações; coordenando a performance e construindo no palco, novas relações apresentavam-se. Contudo, o envolvimento do corpo efetivou-se no desenvolvimento da construção do conceito de rimo a partir das reflexões, discussões e intervenções durante as atividades. Sem elas, o corpo estaria reproduzindo uma ideia pronta e desenvolvendo-se em nível prático. (BUNDCHEN, 2005, p. 222).

Por fim, Bϋndchen (2005) menciona a importância da composição ritmo-

corporal que possibilitou “processos do pensamento”, assim como a

cooperação advinda do trabalho em grupo que desencadeou a cumplicidade e

integração entre os participantes da pesquisa. Nesse sentido, o aspecto de

cooperação e aprendizado coletivo é abordado no relato que segue.

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6.9. MUSICALIZANDO ADULTOS

Kebach (2008; 2009), em sua tese de doutorado, investigou o

aprendizado coletivo de adultos por meio da musicalização, e analisou a

interação social neste processo de construção de conhecimento musical. A

pesquisadora utilizou-se do método dialético-didático aplicado a uma oficina de

musicalização de 60 horas, com nove professores como participantes, sem

conhecimento prévio de música, da rede municipal de Montenegro, no Rio

Grande do Sul. Dessa forma, a autora observou como os sujeitos resolvem e

elaboram tarefas musicais em grupo. E, desse modo, com viés construtivista e

interacionista procurou analisar como os participantes, ao controlar e gerenciar

suas condutas “em função das consequências de suas ações e dos conflitos”

constroem e estruturam o conhecimento musical (KEBACH, 2009, p. 79).

Ao utilizar adultos como participantes de sua pesquisa, Kebach (2008;

2009) procurou mostrar que os mecanismos cognitivos de construção de

conhecimento são os mesmos na espécie humana, independente da idade. Na

verdade, o que difere são as estruturas previamente construídas que

dependem “dos esquemas de ação conscientes e inconscientes de cada

indivíduo que se envolve em um processo de musicalização” (p. 78). Ponto de

vista que condiz com o adotado na presente pesquisa. Como aponta a autora:

(...) no adulto ocorre um processo semelhante: as condutas musicais respondem a mais de uma motivação, como o prazer da motricidade produtora de som, a ultrapassagem dessa origem material por um valor simbólico e o prazer de submeter a organização formal a um jogo de regra. A única diferença é que, nos adultos, o prazer da motricidade no ato de exploração sonora e os valores simbólicos gerados por seus pensamentos sincréticos são logo dominados pelas formas de submeter suas criações às regras estabelecidas coletivamente, já que possuem estruturas mentais formais em várias áreas de conhecimento e as aplicam na verificação lógica de suas ações. (KEBACH, 2009, p. 79).

Nesse sentido, a autora indica que os adultos agem da mesma forma

que as crianças em relação ao conhecimento musical, inicialmente com

condutas egocêntricas. Gradativamente o sujeito, interagindo, cooperando e

“na medida em que as fundações do pensamento se articulam” acontece a

descentração (KEBACH, 2009, p. 79). Para a autora, o sujeito constrói-se

musicalmente através de suas ações próprias, sendo a interação uma forma de

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reorganizar seu conhecimento levando em consideração as críticas que geram

conflitos “sociocognitivos”. Assim, quando está inserido num ambiente de

aprendizado coletivo, o sujeito “precisa agir coletivamente, sua invenção é

sucedida pela verificação coletiva” (p. 84), o que torna o trabalho em

cooperação desencadeador de descentração.

Além disso, Kebach (2009) indica que os adultos diferentemente das

crianças tendem “a objetivar suas condutas”, isto é, a ação ou o fazer musical

“vai sendo progressivamente substituído pelo “fazer e compreender” (KEBACH,

2009, p.85). E, esta compreensão possibilita diversas tomadas de consciência

que ampliam as estruturas cognitivas dos sujeitos.

Também, a autora coloca o mecanismo de autorregulação, ou seja, os

ajustes dos sujeitos para realizar determinada tarefa, como fundamentais para

a construção do conhecimento musical. Nesse sentido, o desenvolvimento

cognitivo do adulto inicia-se no estádio sensório-motor com a exploração e com

“formas iniciais de autorregulação”, segue-se a possibilidade de criar

“hipóteses” sobre a produção “de formas sonoras estruturadas” (p. 85), mesmo

que de forma pré-operatória, e culmina na coordenação progressiva de ações

que permitem a operação musical. Como ilustra Kebach:

Detalhando o processo do adulto, pode-se dizer que ao deparar-se com a possibilidade de organizar sons musicalmente, os possíveis já abertos em outras situações, referentes a outros objetos construídos e, inclusive, às construções parciais que já realizou sobre a música, garantem-lhe uma passagem por um estádio de exploração geral (sensório-motor), como formas iniciais de autorregulação. A partir daí, começa a criar hipóteses sobre possibilidades de produzir formas sonoras estruturadas (mesmo que de modo pré-operatório, num primeiro momento e, portanto, egocêntrico). Tão logo lhe sejam demandadas num ambiente coletivo regulações de suas ações em função das ações dos outros, a tendência é o aprimoramento da autorregulação, através da coordenação progressiva de ações, que foram mobilizadas por meio dos conflitos sóciocognitivos. Essas autorregulações permitem às operações musicais que sejam desenvolvidas progressivamente e que o sujeito, ao coordenar suas ações, especialmente em ambientes coletivos, vá construindo para si as relações existentes entre as propriedades da linguagem musical (KEBACH, 2009, p. 85).

Nesse sentido, a autora aponta a importância da interação e da

cooperação nas atividades musicais, como “apreciação, recriação e criação” (p.

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85), que possibilitaram, por meio do trabalho coletivo, o desenvolvimento

cognitivo de todos os sujeitos participantes de sua pesquisa.

Conclui-se, aqui, a revisão dos trabalhos piagetianos acerca da música

que foram relevantes para a produção desta pesquisa e segue-se no próximo

capítulo com os procedimentos metodológicos adotados.

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7. METODOLOGIA

De acordo com Koche (1997), a busca por explicações de como as

coisas são, suas origens, como surgem, transformam-se e desaparecem, vem

acompanhando a história da humanidade. Na realidade, o Homem busca

compreender a realidade que o circunda, a natureza das coisas para melhor

entender o meio no qual está inserido. Assim, a busca pelo entendimento da

natureza das coisas se dá por meio do conhecimento e este pode adotar

diferentes formas; mítico, ordinário, artístico, filosófico, religioso e científico.

A busca pela verdade levou a desenvolver diversas formas de

conhecimentos que buscaram explicar e atender as necessidades do homem.

Koche (1997) se atem a duas formas de conhecimento: o senso comum e o

conhecimento científico. O primeiro se caracteriza pela busca de soluções para

problemas imediatos que surgem de fenômenos do dia-a-dia, este

conhecimento é útil para a vida diária e para sobrevivência.

A ciência desenvolveu-se para responder a perguntas não respondidas

satisfatoriamente pelo senso comum. Assim, a preocupação de melhor

conhecer as coisas e fenômenos da natureza mostram ser significativas para o

homem compreender as coisas e o meio no qual habita. Além disto, a ciência

busca satisfazer às necessidades humanas como retratado, por exemplo, nos

avanços da medicina.

A busca pela verdade se modificou de acordo com o contexto histórico.

Para os gregos a verdade estava ligada ao intelecto, a retórica e passava

obrigatoriamente pela razão. A visão grega influenciou a ciência até o

Renascimento e era aliada ao dogmatismo religioso que a engessou. Quando o

pesquisador moderno Galileu arrisca sua vida recorrendo às ciências exatas

para comprovar empiricamente conhecimentos teóricos e derrubar, por

exemplo, a visão de que a Terra estava no centro do Universo, acontece a

revolução científica. Após Galileu e Newton, o dogmatismo predominou e a

verdade científica era vista como única e verdadeira. Com a teoria da

relatividade de Einstein tem-se a demonstração de que por mais numerosas

que sejam as provas acumuladas a favor de determinada teoria, esta está

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longe de ser absoluta, já que uma nova teoria mais moderna e abrangente

pode surgir e contradizer a anterior. Assim, o progresso científico deixa de ser

cumulativo e passa a ser revolucionário.

Dessa forma, a busca pela verdade tem acompanhado a história da

humanidade e gerou a ciência contemporânea como busca de superar o

conhecimento do senso comum que se mostrou insuficiente para responder às

dúvidas do Homem. O debate sobre a validade de uma verdade ainda perdura,

porém de forma diferente. Hoje em dia, os pesquisadores estão cientes de que

só se pode chegar a uma verdade relativa e ainda assim esta será passível de

discussões e críticas. Assim, a verdade será sempre “provisória” e passível de

mudanças.

Segundo Luna (1996) a pesquisa tem como principal objetivo gerar

conhecimento científico novo. Nesse sentido, ele afirma que a busca da

verdade deixou de ser o paradigma dominante já que a evolução do

pensamento epistemológico modificou o olhar sobre as ciências e houve

“substituição da busca da verdade pela tentativa de aumentar o poder

explicativo das teorias” (p. 14). Dessa forma, o pesquisador se torna um

intérprete do recorte parcial da realidade pesquisada de acordo com o

paradigma teórico adotado. Assim, o conhecimento gerado por pesquisas

deveria, como o autor salienta (p. 14), contribuir para preencher lacunas de

determinada área do conhecimento e, se possível, trazer contribuições para a

sociedade.

Para isto, o autor sustenta que são necessários alguns elementos

básicos que caracterizam uma pesquisa. O principal é o problema de pesquisa,

apesar de algumas modalidades de pesquisa identificarem o problema

posteriormente, a formulação do problema de pesquisa é fundamental. De fato,

é buscando responder às indagações e inquietações que a ciência avança.

Assim, é fundamental definir com clareza o problema de pesquisa. Em seguida,

se buscará responder ao mesmo levantando fontes e dados que serão

interpretados de acordo com um referencial teórico pertinente com a natureza

do objeto de estudo. Por fim, se produzirão respostas, e o pesquisador deve

indicar a confiabilidade e a possibilidade de generalização das mesmas.

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Por mais abrangente que possa ser, uma pesquisa toma sempre um “pedaço”, uma amostra de um fenômeno para estudo; até demonstração do contrário, os resultados a que a pesquisa chega – se teórica e metodologicamente corretos – têm sua validade restrita às condições sob as quais foi realizada. Cabe ao pesquisador indicar o grau de generalidade que se possa vir a atribuir a ele, ou seja, em que medida eles podem ser estendidos a situações não contempladas pela pesquisa (LUNA, 1996, p. 21).

Sampieri (2006), por sua vez, defende que a base de uma pesquisa está

na ideia a ser investigada. Por isso, é imprescindível ter acesso a fontes para

documentar um projeto. Esse autor considera importante juntar as abordagens

de pesquisa quantitativa e qualitativas. Por isso, para ele é importante se ter

clareza do objeto de estudo a ser pesquisado para melhor aproximá-lo da

realidade observável. Torna-se necessário explicitar o significado de pesquisa

quantitativa e pesquisa qualitativa. Isto é: a forma de pesquisa que usa dados

para provar uma hipótese sob forma numérica para medir e analisar

estatísticamente os padrões de comportamentos (contidos na hipótese) é a

pesquisa quantitativa. Já a pesquisa qualitativa utiliza-se de outras formas de

coleta de dados para melhor entender aspectos da realidade observada sem

necessariamente buscar confirmar uma determinada hipótese. O modelo

“multimodal” concilia as duas formas de pesquisa buscando ultrapassar as

limitações de cada uma das modalidades de pesquisa.

A presente pesquisa adotou a forma quase experimental “em sua

programação de procedimentos de coleta de dados” (CAMPBELL, 1979, p. 79),

pois foi realizada uma intervenção pedagógica em dois grupos. Cada grupo

com uma metodologia de ensino diferente da do outro, sem grupo de controle.

Num dos grupos o ensino pautou-se no referencial teórico piagetiano para a

elaboração das atividades educativas. No outro, a intervenção aconteceu de

acordo com a metodologia tradicional de ensino de música. O objetivo foi

comparar duas formas de ensino da leitura rítmica em adolescentes entre

dezesseis e dezoito anos, sem ensino prévio de teoria musical, para verificar a

hipótese desta dissertação que aponta ser mais efetivo o ensino pautado na

teoria intitulada Epistemologia Genética, de Jean Piaget, do que o ensino

tradicional. Desse modo, na primeira abordagem inicia-se pela ação, ou seja,

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pela prática vivenciada, que respeita as fases cognitivas dos participantes, e na

segunda inicia-se pela teoria musical, ou seja, usando uma metodologia de

ensino tradicional, por isso, se trata de um estudo comparativo.

A parte quantitativa do estudo expressa-se, sobretudo, pelas notas

dadas no pós-teste 1 e no pós-teste 2 para cada participante. A parte

qualitativa refere-se à análise dos dados a luz da teoria musical relativa ao

ritmo, e da teoria piagetiana.

7.1. DO CONTEXTO DE ESTUDO

Devido à carência de pesquisas piagetianas realizadas com

adolescentes em relação à construção do conhecimento musical, o

pesquisador optou por esse viés de pesquisa. Como se observou no capítulo

anterior, algumas pesquisas utilizaram-se de pressupostos da teoria

psicogenética. Nesse sentido, a presente dissertação propõe uma leitura

diferenciada da teoria de Jean Piaget, já que aborda um assunto que foi pouco

pesquisado, isto é, como o desenvolvimento musical ocorre em adolescentes

que estão supostamente no estádio das operações (concretas ou formais).

Além disso, o ensino do conteúdo da música voltou a ser obrigatório na

escola brasileira com a aprovação da Lei nº 11.769 em 2008, e como o

pesquisador licenciou-se em instituição universitária pública e a presente

pesquisa é financiada por entidades públicas, nada mais justo que pesquisar a

realidade da escola pública brasileira, no sentido de poder contribuir para

avanços qualitativos na mesma.

Como o foco da pesquisa é o ensino do conhecimento musical a

adolescentes, e também, como os licenciados em música estão aptos para

também ensinar no ensino médio, direcionou-se esta investigação para as

séries finais do ensino Médio. Para isto, o pesquisador entrou em contato com

diversas escolas da rede estadual de ensino e optou pela que aceitou seu

pedido de pesquisa. Cabe salientar aqui que nem todas as escolas estão

dispostas e abertas a serem observadas e servirem de laboratório de pesquisa.

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Assim, foi apresentado e explicado o projeto de pesquisa ao diretor da

escola que marcou uma entrevista do pesquisador com a pedagoga. A escolha

das turmas ficou a cargo da pedagoga da escola que disponibilizou duas

turmas do 3° ano, com rendimento escolar similar. Nesse sentido, a escola se

esforçou para ceder cinco aulas em cada turma sem que fosse possível obter

aulas extras.

7.2. PARTICIPANTES DO ESTUDO

Os participantes do estudo são 64 alunos adolescentes estudantes de

duas turmas de 3ª ano do ensino médio de uma escola pública estadual do

município de Curitiba, Paraná, Brasil. A faixa etária desses adolescentes

concentra-se entre 16 e 18 anos.

7.3. DA COLETA DE DADOS.

No início do mês de abril de 2013 numa escola estadual da cidade de

Curitiba no estado do Paraná aconteceu este experimento de ensino de

música. Foram ministradas aulas de música a duas turmas do terceiro ano do

ensino médio. Cada uma com uma metodologia de ensino diferente. A escola

disponibilizou cinco encontros de uma hora aula, isto é de quarenta e cinco

minutos cada, uma vez por semana. Na primeira aula foi feito um pré-teste,

após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (anexo 1),

em seguida se iniciou o ensino do conteúdo. Nas duas aulas subsequentes foi

ministrado somente conteúdo, e, nas duas últimas aulas foram realizados os

pós-testes e respondidos os questionários fechados. As aulas foram

ministradas pelo mesmo professor, no caso, o próprio pesquisador.

O experimento foi realizado na própria sala onde os alunos têm aulas.

Cada grupo permaneceu no seu ambiente habitual de estudo onde há quadro

verde para escrever com giz, boa iluminação, mas não há isolamento acústico

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específico. As aulas não foram filmadas, e o único registro autorizado foi a

gravação em áudio da leitura rítmica individual durante as avaliações.

É preciso justificar as razões do não uso do método clínico piagetiano.

Na verdade, devido à escassez de encontros disponibilizados pela escola ficou

inviável a realização de tal procedimento. A coleta de dados restringiu-se a um

pré-teste, três aulas e dois pós-testes envolvendo o conteúdo de leitura rítmica.

O estudo desde o seu início até o seu término teve a duração de seis meses.

7.4. O PRÉ-TESTE

O pré-teste foi denominado pelo pesquisador de questionário pré-teste

(anexo 2) e teve como objetivos coletar informações gerais sobre os

participantes, tais como, nome, idade e a série de ensino, e, sobretudo, saber

quais alunos tiveram contato com o ensino formal de música. Nesse sentido,

foram elaboradas perguntas gerais como, por exemplo, se tocam algum

instrumento musical, ou se cantavam. Outras perguntas mais específicas

seguiram, sobre se já tiveram aulas de teoria musical, se sabem o que significa

o termo rítmica e se sabem ler partituras. Caso algum aluno ou um grupo de

alunos tivessem tido aulas de teoria musical, e especificamente de leitura

rítmica, eles poderiam participar da pesquisa, porém seriam isolados.

7.5. CONTEÚDO DAS AULAS

O conteúdo ministrado foi a leitura rítmica em compasso binário simples.

Nesse sentido, foram abordadas as grafias de algumas figuras rítmicas como

semínimas e suas respectivas pausas, colcheias e suas respectivas pausas

(sem contratempo) e a semicolcheia (sem o ensino de sua pausa). Apesar do

conteúdo do ritmo binário ser bem mais extenso e abarcar outras formas de

subdivisão do tempo, limitou-se a abordar somente as figuras mencionadas

acima devido ao pouco tempo disponível para o ensino e para a coleta de

dados com as avaliações.

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7.6. MÉTODO DE ENSINO

Foram ministradas aulas de leitura rítmica para as turmas A e B com

exatamente o mesmo conteúdo, porém com metodologias de ensino diferentes.

Na turma B, as aulas foram dadas inspiradas em Piaget, iniciando pela ação,

isto é, pela prática musical vivenciada. Em seguida, passou-se para a

representação mental, articulando ação à explicação teórica das figuras e seus

respectivos valores e, por fim, chegar às operações com o estabelecimento de

relações lógicas em uma composição. Já na turma A, o ensino começou com a

explicação teórica para fundamentar a subsequente prática da leitura rítmica.

Assim, no grupo B o ensino iniciou-se pela ação, pela prática musical, e no

grupo A o ensino começou pela explicação da teoria musical relativa ao ritmo.

Foram dadas três aulas e dois encontros suplementares foram dedicados para

realizar os pós-testes e para responder aos questionários fechados.

7.6.1.1. Aula um

Antes de entrar especificamente no tema da aula que era sobre o ritmo

musical, realizou-se breve introdução sobre a importância da música na

sociedade ocidental. Falou-se sobre a presença da música nos meios de

comunicação como televisão, rádio, etc. Assim como da presença nos filmes,

citou-se filmes franceses, nos quais há pouca música e muito silêncio.

Também, abordaram-se filmes mudos que apesar de não haver fala há música.

Depois, continuou-se falando da presença da música no transporte coletivo da

cidade de Curitiba que apesar de poder distrair alguns é imposta a todos os

passageiros. E que, aliás, não agrada de fato a todos já que normalmente trata-

se de música erudita.

Após a introdução sobre a importância da música começou-se a falar

sobre os quatro elementos básicos da música, (MED, 1996, p. 11): ritmo,

melodia, andamento e timbre. Procurou-se explicar cada um de forma sucinta e

esclarecedora. Por exemplo, falou-se que na música não se deve confundir

altura com dinâmica. No primeiro caso, um som é alto quando ele é agudo e

baixo quando ele é grave. Já no segundo caso, quando se trata de dinâmica

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trata-se do volume, ou seja, da potência da onda sonora. Explicou-se o que é

timbre, ou seja, a cor de cada som, dando-se como exemplo da peculiaridade

da voz de cada pessoa ou de cada instrumento.

Logo adiante, abordou-se que a Igreja foi a grande responsável pelo

sistema de notação da música ocidental, desenvolvido por Guido d´Arezzo para

padronizar suas práticas musicais nos coros durante a liturgia. Assim, explicou-

se como se chegou à pauta musical com 5 linhas e falou-se sobre o nome das

notas musicais.

Em seguida, informou-se que para ler música é necessário tanto saber o

nome das notas musicais e sua grafia na pauta musical quanto conhecer a

duração de cada nota, ou seja, saber quais figuras representam determinados

valores. Nesse sentido, foi abordado o sistema de leitura denominado de

tablatura que serve para escrever melodias e harmonias para guitarras e

violões de forma simplificada, porém que não contempla o ritmo. Com somente

uma informação, a da altura, é necessário conhecer previamente dada melodia.

Caso contrário. não há como executar com exatidão uma melodia. Assim,

reiterou-se a necessidade de conhecer os valores rítmicos para cada nota

tocada ou cantada.

Em seguida, foram apresentadas as figuras rítmicas no quadro com a

representação gráfica das mesmas, assim como o nome de cada uma.

Explicou-se também a proporção de acordo com a figura abaixo:

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FIGURA 1 - SUBDIVISÃO BINÁRIA DE VALORES

Fonte: (MARIANI, 2002, p. 36).

Por exemplo, a semínima, equivale a duas colcheias, que equivalem a

quatro semicolcheias, como mostra a figura.

Também, abordou-se o que é um compasso, como este se organiza, o

que é uma barra de compasso e como se explica a fórmula de compasso. Deu-

se como exemplo o compasso 4/4 que é um dos mais usados na música

ocidental, no qual há quatro tempos ou pulsos que podem ser preenchidos com

figuras variáveis, inclusive silêncios. Terminou-se a aula com a explicação da

grafia da figura semínima e da grafia de sua respectiva pausa.

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7.6.1.2. Aula dois

A segunda aula foi iniciada retomando a subdivisão binária dos valores e

suas respectivas pausas. Assim, reiterou-se o conteúdo da aula anterior

relembrando também o que é a fórmula de compasso e também explicando o

que é o pulso. Em seguida, escreveram-se alguns compassos no quadro para

exemplificar o conteúdo dado. Também, explicou-se alguns símbolos

recorrentes da grafia musical como o ritornello e a barra dupla que marca o fim

da música.

Após esta recapitulação, começou-se a leitura rítmica. A primeira figura

apresentada foi a semínima que num compasso 4/4 pode ser representada

pelo pulso. Depois, apresentou-se a figura da colcheia representada por duas

colcheias, e, em seguida, introduziu-se a figura da semicolcheia, representada

por quatro semicolcheias. Escreveram-se algumas frases rítmicas com as

figuras acima no quadro e leu-se em conjunto.

Frase 1:

Frase 2 e 3:

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7.6.3. CONTEÚDO DAS ATIVIDADES DE ENSINO NA TURMA B: DA AÇÃO

À OPERAÇÃO

7.5.3.1. Aula um

Nos primeiros minutos de aula foi possível observar uma turma bem

indisciplinada e agitada. A professora que cedeu sua aula não permaneceu na

sala de aula. Primeiramente, foi explicado o termo de consentimento e pediu-se

para os alunos preencherem o termo de consentimento. A leitura do termo de

consentimento foi feita pelos próprios alunos que demonstraram ter

dificuldades com algumas palavras como “cognição”. Além disso, alguns alunos

não quiseram participar das atividades.

Buscando seguir o modelo de desenvolvimento cognitivo de Jean Piaget,

esta aula se concentrou no movimento do corpo e na percepção, próprios do

estádio sensório-motor. Dessa forma, falou-se muito pouco. Foi feita uma breve

introdução falando da importância da música em nossa sociedade, e da

onipresença desta nas sociedades humanas.

A primeira atividade foi o ensino de um elemento básico da música: o

pulso. Usou-se um metrônomo para os alunos sentirem na prática o que é o

pulso. Foi pedido aos alunos que acompanhassem as batidas do metrônomo

batendo com os pés. Dessa forma, a turma inteira ficou em pé (exceto os que

pediram para não participar) e acompanhou o pulso do metrônomo batendo os

pés alternadamente. Esta atividade aparentemente simples apresentou certa

dificuldade para a turma. A tendência de acelerar o pulso predominou, por isso

foi pedido aos alunos que ignorassem o metrônomo111 e que acompanhassem

o professor. O resultado foi bem melhor.

A atividade seguinte também foi para trabalhar o pulso. O professor

bateu o pulso (lento) com os pés e os alunos bateram com as mãos. Em

111

O metrônomo é um relógio que mede o andamento musical. O metrônomo

mecânico consiste num pêndulo oscilante cujas oscilações, reguladas pela distância de um

peso na haste do pêndulo, podem ser mais lentas ou mais rápidas, sendo que a cada oscilação

corresponde um tempo do compasso. Há também metrônomos eletrônicos, em que cada

tempo do compasso é indicado pelo piscar de um led e por um som eletrônico (fonte:

wikipidea).

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165

seguida, pediu-se para os alunos ficarem em pé em fileiras, de forma que cada

um pudesse passar para o colega ao lado, mantendo o pulso, um objeto.

Depois, ao invés de passar um objeto, pediu-se para que batessem palmas

cada um na sua vez. A atividade transcorreu relativamente bem e os alunos

desta sala conseguiram manter, apesar da tendência a acelerar o pulso ter

aparecido, o pulso.

Em seguida, já com o pulso apresentado e vivenciado foi realizado um

exercício que pode ser representado pela figura da colcheia. Dessa forma, o

professor batia o pulso com os pés, e pediu para que os alunos dobrassem o

pulso, isto é, para cada pulso eles batiam duas vezes, batendo com as mãos

sobre as carteiras. O professor mostrou uma vez como deveriam bater na

mesa e foi o suficiente para que a turma conseguisse reproduzir tal exercício.

Depois disto, o professor pediu para que os alunos pegassem canetas e

cadernos. As espirais dos cadernos serviriam como reco-recos e as canetas

como baquetas. Simulando assim um instrumento musical. Então foi

apresentada à turma a semicolcheia que equivale ao dobro da figura

vivenciada anteriormente (eram duas colcheias). Mais uma vez a turma não

teve dificuldade para realizar o exercício.

Assim, depois de ter apresentado o pulso que pode ser representado

com a semínima, e praticado o mesmo com dois exercícios, foi realizado um

exercício com duas colcheias, e logo em seguida fez-se o exercício com quatro

semicolcheias. Nesse sentido, foram abordadas subdivisões binárias que foram

vivenciadas e apresentadas por meio da ação, sem nenhuma explicação verbal

ou expositiva.

A última atividade foi uma prática em conjunto. A turma foi dividida em

três grupos. Cada qual executava um dos exercícios realizados. Um batia o

pulso com os pés, outro batia duas colcheias com palmas e o outro fazia quatro

semicolcheias com as espirais dos cadernos. Na verdade, cada grupo

começava a execução, de seu respectivo ritmo, de acordo com o sinal do

professor. A prática deu certo, e em sequência cada grupo mudou a figura que

batiam. Dessa forma, os que estavam batendo duas colcheias, passaram a

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bater quatro semínimas, e os que estavam executando quatro semicolcheias,

passaram a bater o pulso, ou seja, a semínima.

A mudança de papéis gerou desconforto para o grupo que ficou com o

pulso. Assim, tiveram dificuldades a manter o pulso e, consequentemente, a

prática foi prejudicada. Em seguida, o sinal bateu.

7.6.3.2. Aula dois

Na segunda aula a turma mudou para uma sala maior. No começo da

aula os representantes da turma pediram licença e falaram para a turma

colaborar por causa da aula passada que tinha sido um pouco tumultuada. E,

de fato, a turma colaborou durante a aula.

O planejamento da aula pedia para o professor levar a turma para o

pátio para revisar as atividades da aula precedente, só que com percussão

corporal. Porém, devido ao pátio ser um espaço aberto ficou difícil de escutar

as palmas e o pulso batido com os pés. Então, voltou-se para a sala de aula

para retomar as práticas rítmicas da aula passada.

Chegando à sala de aula, iniciaram-se as mesmas atividades, porém

com percussão corporal. Só o pulso que se manteve com a batida de pés,

alternando pé esquerdo com pé direito. O pulso foi executado primeiramente

pela turma inteira. Em seguida, a turma bateu colcheias em suas coxas. Logo

depois, foram executadas semicolcheias com palmas.

Como na aula anterior, a turma foi dividida em três grupos que

executaram com percussão corporal as figuras estudadas. O resultado foi

satisfatório, e alternaram-se assim as figuras em cada grupo.

No final da aula, o professor escreveu no quadro os símbolos referentes

a cada figura, realizada antes nas ações, explicando o nome de cada uma.

Dessa forma, esta aula passou da ênfase no nível sensório-motor, marcado

pela ação, para o estádio pré-operatório marcado pela representação mental.

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Nos últimos minutos da aula o professor escreveu alguns compassos no

quadro e leu junto com a turma.

7.6.4. AULA TRÊS: GRUPO A E B

A terceira aula foi semelhante para os dois grupos. Primeiramente, o

professor escreveu no quadro as três figuras estudadas e suas respectivas

pausas (exceto a pausa de semicolcheia que não foi estudada). De modo a

retomar o conteúdo ministrado anteriormente. Em seguida, o professor

escreveu três frases musicais com quatro compassos em compasso binário

simples com fórmula de compasso quatro por quatro.

Assim, o primeiro exercício da aula foi a leitura musical das frases

escritas no quadro. A primeira frase conteve semínimas, colcheias e pausas de

semínimas. O nível de dificuldade da primeira pode ser considerado como fácil.

Frase 1:

A segunda e terceira frase misturou as três figuras estudadas,

semínimas, colcheias, semicolcheias, pausas de semínima e de semicolcheias.

As frases foram lidas primeiramente pelo professor que batia o pulso e em

seguida o mesmo leu uma a uma com os alunos. Repetiu-se o processo

diversas vezes até a turma conseguir ler com autonomia.

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Frase 2:

Frase 3:

O segundo exercício apresentado na terceira aula foi a leitura rítmica a

duas vozes. O professor escreveu duas frases de três compassos com as

figuras rítmicas estudadas previamente. O professor leu junto com os alunos as

duas frases. Em seguida, a turma foi dividida em dois grupos. Cada grupo teve

que ler uma das frases. Num primeiro momento, cada grupo leu a frase que lhe

foi atribuída sozinho. Em seguida, os dois grupos leram ao mesmo tempo as

duas frases rítmicas. Logo depois, cada grupo leu a frase executada

anteriormente pelo outro grupo, também simultaneamente.

O terceiro e último exercício da aula foi um ditado rítmico. O professor

leu três frases com fórmula de compasso dois por quatro, com três compassos.

O nível de dificuldade foi aumentando gradativamente como ilustram as figuras

abaixo.

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Frase 1 do ditado:

Frase 2 do ditado:

Frase 3 do ditado:

A correção do ditado foi feita pelos alunos que foram ao quadro e

escreviam as figuras. Após eles terem escrito corretamente as três frases, a

turma inteira leu-as novamente.

7.7. OS PÓS-TESTES: GRUPOS A E B

Os participantes foram submetidos a dois pós-testes intervalados para

melhor avaliar o aprendizado dos alunos. O primeiro aconteceu exatamente na

sequência das aulas e o segundo foi realizado aproximadamente cinco meses

depois para avaliar de fato a solidez do aprendizado de cada grupo. Este

intervalo até a realização do segundo pós-teste justifica-se por razões inerentes

à escola que não tinha folga para ceder aulas. O segundo pós-teste não

aconteceu na mesma semana nos dois grupos. No grupo A o segundo pós-

teste aconteceu 19 semanas depois do primeiro. E, no grupo B foi realizado

após 23 semanas.

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7.7.1. PRIMEIRO PÓS-TESTE

O primeiro pós-teste conteve três exercícios de dificuldades distintas. O

primeiro exercício (ver em anexo 3) tratou de associar os símbolos gráficos das

figuras estudadas a suas respectivas pausas. A dificuldade deste exercício foi a

introdução da figura rítmica mínima e de sua pausa, assim como a pausa da

semicolcheia, figuras estas que não foram estudadas nas aulas.

O segundo exercício foi o mais fácil da avaliação. Consistia

simplesmente em assinalar o nome das figuras rítmicas estudadas. Cabe aqui

salientar, que os dois primeiros exercícios foram individuais.

A terceira questão da avaliação pediu para que os alunos escrevessem

uma composição individual de cinco compassos com fórmula de compasso

quatro por quatro. Em seguida, eles teriam que ler o que escreveram. Para o

exercício de leitura rítmica, as turmas foram divididas em grupos de

aproximadamente cinco alunos. Os alunos que passaram por ensino prévio de

música foram colocados nos mesmos grupos.

Ao terminar a avaliação, os alunos responderam a um questionário

fechado (anexo 5) que teve como objetivo saber primeiramente como os alunos

avaliavam o seu próprio aprendizado. Os participantes poderiam escolher entre

insuficiente, inadequado, adequado e bom.

A segunda pergunta do questionário buscou coletar informações sobre

como os alunos avaliaram a metodologia de ensino. Novamente, eles poderiam

escolher entre as mesmas respostas apontadas acima, além de poder explicar

o porquê de sua escolha.

Por fim, a última pergunta foi aberta e pediu-se para os participantes

escreverem sobre o que eles menos gostaram na aula de música.

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7.7.2 SEGUNDO PÓS-TESTE

No segundo pós-teste o conteúdo da primeira e da segunda questão foi

exatamente o mesmo. A novidade apareceu nos demais exercícios. O terceiro

exercício foi o de composição rítmica. Foi solicitado aos alunos que

escrevessem cinco compassos em compasso dois por quatro. Desta vez, a

leitura ficou para o último exercício.

O quarto exercício buscou avaliar a leitura rítmica. Foram apresentadas

três frases musicais de quatro compassos com fórmula de compasso dois por

quatro. As figuras apresentadas foram as estudas nas aulas. Porém, desta vez

a prova inteira foi individual. Para a leitura rítmica, o professor acompanhou e

gravou o desempenho de cada aluno. Nesse sentido, o pulso foi marcado com

estralo de dedos pelo professor.

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8. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foi analisada a trajetória individual de cada sujeito do pré-teste aos pós-

testes e do conjunto de sujeitos de cada grupo, evidenciando semelhanças e

diferenças na comparação entre os métodos de ensino. Nesta comparação foi

dada especial ênfase à composição expressão da relação teoria e prática,

assim como, para a execução representada pela leitura rítmica.

8.1 O PRÉ-TESTE

Os participantes são adolescentes brasileiros curitibanos com faixa

etária entre 16 e 17 anos de ambos os sexos. Denominou-se turma A com 31

alunos e turma B com 33 alunos. A escolha das turmas foi feita pela pedagoga

da escola que buscou selecionar alunos com rendimento acadêmico similar, na

verdade o boletim anual das tuas turmas foi fornecido ao pesquisador. É

interessante salientar que com turmas semelhantes, no que tange ao

desempenho escolar, verificaram-se poucas diferenças no pré-teste em relação

aos conhecimentos relativos ao domínio da música. Cabe aqui ressaltar que

tratando-se de pesquisa acadêmica, os alunos tiveram total liberdade para

participar ou não do experimento. E, já no pré-teste, 6% dos alunos do grupo B

decidiram não participar, ao passo que todos os alunos presentes do grupo A

participaram.

Quando questionados se tocam ou se já tocaram instrumentos musicais

no grupo A, 52% disseram que tocavam instrumentos e 48% não. Como ilustra

o gráfico abaixo.

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FIGURA 2 - GRUPO A ALUNOS QUE TOCAM UM INSTRUMENTO

Fonte: o autor.

Já no grupo B, 36% dos alunos responderam sim, e 57% responderam

que não. Como se pode observar, as respostas em relação às aulas de teoria

musical mostraram-se semelhantes com 30% de respostas afirmativas em

ambos os grupos.

FIGURA 3 - GRUPO B TOCAM INSTRUMENTOS

Fonte: o autor.

52%

48%

3A- Tocam Instrumento

sim não

36%

58%

6%

3B - Tocam Algum Instrumento

sim não não respondeu

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Quando questionados se sabem ler partituras e se conhecem o

significado de leitura rítmica os resultados foram relativamente próximos para

os dois grupos. No grupo A, 12,90% responderam sim, e 87,10% não. E, no

grupo B 15,15% dos alunos responderam sim, e 78,79% não.

QUADRO 3 - PORCENTAGEM DOS ALUNOS DO GRUPO A QUE SABEM

LER PARTITURAS

sabem ler partituras grupo A %

sim 4 12,90%

não 27 87,10%

não respondeu 0 0,00%

Total 31

Fonte: o autor

QUADRO 4 - PORCENTAGEM DOS ALUNOS DO GRUPO B QUE SABEM

LER PARTITURAS

sabem ler partituras grupo B %

sim 5 15,15%

não 26 78,79%

não respondeu 2 6,06%

Total 33

Fonte: o autor.

Em relação à pergunta sobre se conhecem o significado de leitura

rítmica, novamente os resultados foram semelhantes com aproximadamente

6% de respostas positivas para os dois grupos. A diferença nas respostas

negativas, isto é 84,85% para o grupo B e 93,% para o grupo A aparece, pois

9,09% dos alunos entrevistados no grupo B não responderam a pergunta.

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Dessa forma, o pré-teste possibilitou mostrar que houve pouca diferença

de conhecimento do domínio musical entre os sujeitos observados em ambos

os grupos. A única diferença mais acentuada, que chega a quase 20%, diz

respeito à prática de instrumento musical. Neste quesito o grupo A mostrou-se

em leve vantagem com aproximadamente 57% de seus integrantes tocando

algum instrumento, como mencionado anteriormente. Já no grupo B o número

de alunos já iniciados na música foi menor, com 36,36% dos alunos.

8.2. PÓS-TESTE 1

Os resultados do pós-teste 1 procurou abranger todo o conteúdo

ministrado durante o experimento de ensino. A prova foi feita com três

questões, duas teóricas e uma de composição e leitura rítmica. Devido ao

grande número de participantes cada turma foi dividida em grupos menores

para a leitura rítmica. Todas as outras questões foram individuais. Também,

separaram-se os alunos com conhecimentos prévios de leitura de partituras

dos demais.

FIGURA 5 - PÓS-TESTE 1 GRUPO A

Fonte: o autor

6%

12%

47%

35%

3A - Pós-teste 1

de 2,0 a 3,9 de 4,0 a 5,9 de 6,0 a 7,9 8,0 ou mais

Não houve notas menores que 2,0.

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Na turma A, 35,29% dos alunos tiveram notas maiores que 8,0, e

47,06% tiveram notas entre 6,0 e 5,9. Somando 82,35% com resultados entre

6,0 e acima de 8,0. Entre 4,0 e 5,6 houve 11,76% dos participantes. E, 5,88%

tiveram notas entre 2,0 e 3,9. Somando 17,64 % dos alunos com notas entre

2,0 e 5,6.

FIGURA 6 - PÓS-TESTE 1 GRUPO B

Fonte: o autor

Na turma B, 60% dos alunos tiveram notas acima de 8,0. Já 20% da

turma teve nota entre 6,0 e 7,9. Somando 80% dos alunos com notas a partir

de 6,0 e acima de 8,0. E, 20% dos alunos deste grupo ficaram com notas entre

4,0 e 5,9. Nenhum aluno ficou com nota abaixo de 4,0.

Na turma A, 35,29% dos alunos tiveram notas maiores que 8,0, e

47,06% tiveram notas entre 6,0 e 5,9. Somando 82,35% com resultados entre

6,0 e acima de 8,0. Entre 4,0 e 5,6 houve 11,76% dos participantes. E, 5,88%

tiveram notas entre 2,0 e 3,9. Somando 17,64 % dos alunos com notas entre

2,0 e 5,6.

Aparentemente, os resultados das avaliações pós-teste 1 parecem

próximos já que tanto no grupo A quanto no grupo B aproximadamente 80%

dos alunos tiveram notas entre 6,0 e notas acima de 8,0. Porém, a

20%

20% 60%

3B - Pós-teste 1

de 4,0 a 5,9 de 6,0 a 7,9 8,0 ou mais

Não houve notas menores que 4,0.

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porcentagem de notas entre 2,0 e 5,6 é mais expressiva no grupo A chegando

a quase 18%. E, ao contrário, no grupo B não houve nota abaixo de 4,0. Na

verdade, há diferenças nas avaliações com notas mais baixas. Viu-se que

quase 20% dos alunos tiveram notas entre 4,0 e 5,9. Já o grupo A teve quase

18% com notas bem mais baixas entre 2,0 e 5,9. E, quase 6% destes tiveram

notas entre 2,0 e 3,9.

Além disso, vale aqui relembrar que dentre os participantes do grupo B,

36,36% tocam ou já tocaram algum instrumento musical. Já no grupo A, a

maioria dos alunos, isto é 57,58%, disseram que tocavam instrumentos. Nesse

sentido, a média das notas dos alunos com conhecimentos prévios de música

foi superior no grupo A (média de notas: 8,31 com 7 alunos) do que no grupo B

(média de notas: 7,5 com 4 alunos). Na verdade, há diferenças nas avaliações

com notas mais baixas. Viu-se que quase 20% dos alunos tiveram notas entre

4,0 e 5,9. Já o grupo A, teve quase 18% com notas bem mais baixas entre 2,0

e 5,9. E, quase 6% destes tiveram notas entre 2,0 e 3,9.

No entanto, quando são excluídos os alunos com conhecimento prévio

de música os resultados mudam consideravelmente. Por exemplo, no grupo B

as notas acima da média somam 72,73% sendo 18,18% delas acima de 9,0. E,

27,27% das notas ficaram entre 4,0 e 6,9. Já no grupo A, 66,67% dos alunos

tiveram notas acima da média, e não houve notas maiores do que 9,0. Os

alunos que ficaram com notas entre 4,0 e 6,9 somam 33,33%.

QUADRO 7 – PÓS-TESTE 1 DOS ALUNOS DO GRUPO A QUE NÃO TOCAM

INSTRUMENTOS.

Pré-teste do grupo A, alunos que não tocam instrumento %

menor que 4,0 0 0,00%

de 4,0 a 6,9 2 33,33%

de 7,0 a 8,9 4 66,67%

9,0 ou mais 0 0,00%

Total 6

Fonte: o autor

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QUADRO 8 – PÒS-TESTE 1 DOS ALUNOS DO GRUPO B QUE NÃO TOCAM

INSTRUMENTOS.

Pré-teste do grupo B alunos que não tocam um instrumento %

menor que 4,0 0 0,00%

de 4,0 a 6,9 3 27,27%

de 7,0 a 8,9 6 54,55%

9,0 ou mais 2 18,18%

Total 11

Fonte: o autor

Porém, a principal diferença entre o desempenho de ambos os grupos

foi a grande abstenção dos alunos do grupo A que chegou a 45,16% dos

alunos, sendo que todos iniciaram a experiência. Já o grupo B, começou com

6% de alunos que decidiram não participar da pesquisa e na avaliação final

24,24% dos alunos não quiseram participar da avaliação. A diferença chega a

mais de 20% entre a participação de cada grupo. Quando, são excluídos os

alunos que tocam música a diferença na abstenção fica mais evidente.

Somente 6 alunos do grupo C fizeram a avaliação, ao passo que 11 alunos do

grupo B.

Além disto, em relação ao pós-teste observou-se que a metodologia de

ensino foi avaliada positivamente em ambos os grupos e os resultados foram

muito próximos. Por exemplo, no grupo A, os resultados sobre o método foram

avaliados como “bom” por 29,03% e “adequado” 35,48% dos alunos, somando

quase 64,51% de avaliações positivas. Neste sentido, a diferença entre as

avaliações positivas é de somente aproximadamente 5%. Também, nenhum

aluno respondeu que o método era “inadequado” e somente dois alunos, o que

equivale a 6,45% da amostra, respondeu que o método é “insuficiente”. Porém,

novamente 29,03% dos alunos se abstiveram de avaliar o método de ensino.

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No grupo B o método de ensino foi avaliado como “bom” por 36,36% e

“adequado” 33,33% dos alunos, somando quase 70% de avaliações positivas.

Nenhum aluno respondeu que o método era “inadequado” e somente um aluno,

o que equivale a 3,03% da amostra, respondeu que este é “insuficiente”. No

entanto, 27,27% dos alunos não responderam como avaliam o método de

ensino.

Quando perguntados sobre como os alunos avaliam o seu aprendizado

no grupo B as respostas foram: 15,14% de respostas “bom”, 39,39% de

respostas “adequado”, somando 54,55% de respostas positivas. Já as

respostas negativas somam menos de 12,12% com 3,03% de “inadequado” e

9,09% de “insuficiente”. Porém, 33,33% dos alunos deste grupo não

responderam a pergunta. Já no grupo A, as respostas positivas somaram

51,61% com 12,9% “bom”, e 38,71% de respostas “adequado”. Porém, as

respostas “insuficiente” somaram 19,35% e a abstinência chegou a 29,03%.

8.3. DISCUSSÃO PÓS-TESTE 1

Os resultados demonstraram que houve aprendizado efetivo nos dois

grupos com diferentes metodologias de ensino. O método que partiu da ação

isto é, o grupo B, teve resultados estatisticamente melhores para a avaliação

72,73%. Porém, os resultados são bem próximos do método tradicional com

66,67%. A diferença entre as notas dos dois grupos fica somente em 6%. E, a

diferença entre as notas abaixo da média também somam 6%. Dessa forma, no

grupo A houve 6% a mais de alunos abaixo da média.

Além disto, os resultados do questionário sobre o método de ensino foi

positiva em ambos os grupos. Com resultados bem próximos 51,61% para o

grupo A 55,55% para o grupo B. O que demonstra que em ambos os grupos

foram ministradas aulas diferentes, porém que possibilitaram um aprendizado

efetivo nesta etapa da pesquisa.

A maior diferença encontrada no experimento foi à abstenção dos alunos

na avaliação. Houve no grupo do ensino tradicional praticamente o dobro de

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180

abstenção durante a avaliação. Todos os alunos deste grupo participaram do

pós-teste, mas nem todos participaram do pós-teste.

Na verdade, o pós-teste 1 serviu para mostrar que com as duas

abordagens metodológicas a maioria dos alunos conseguiu obter a média 7,0.

E, como esse primeiro teste ocorreu uma semana após o ensino da leitura

rítmica, o conteúdo ainda estava presente na memória dos alunos.

8.4. PÓS-TESTE 2

O pós-teste 2 aconteceu 19 semanas depois do primeiro pós-teste para

o grupo A, e depois de 23 semanas para o grupo B. A principal razão de avaliar

os grupos depois de tanto tempo foi de mensurar realmente o quê ficou

armazenado na memória dos sujeitos a respeito da leitura rítmica. Além disso,

no primeiro pós-teste a execução, ou seja, a leitura rítmica foi avaliada em

grupos, já no pós-teste 2 ela foi individual proporcionando resultados mais

precisos sobre a efetividade das duas abordagens de ensino. Assim, o pós-

teste 2 foi individual em todos os quesitos testados que foram a teoria, a

composição e a execução.

Além disso, a correção da execução, ou seja, da leitura rítmica foi

realizada com o auxílio de dois alunos do programa de Pós-graduação em

Música da Universidade Federal do Paraná que serviram de árbitros para

avaliar e dar notas as gravações do pós-teste 2. Cabe salientar aqui, que só foi

pedido aos juízes que dessem uma nota para determinado áudio, sem prestar

maiores esclarecimentos sobre a natureza da pesquisa. Ademais, eles

somente tiveram acesso às frases escritas que foram lidas pelos alunos

avaliados, assim como o acesso as faixas de áudio, ou seja, as gravações

identificadas apenas com números, e sem distinção de grupos. Por isso, as

notas da leitura rítmica são a média das notas dos dois árbitros juntamente

com a nota atribuída pelo pesquisador.

Por isso, as notas da leitura rítmica são a média das notas dos dois

árbitros juntamente com a nota atribuída pelo pesquisador. O pós-teste 2

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181

aconteceu 19 semanas depois do primeiro pós-teste para o grupo A, e depois

de 23 semanas para o grupo B. A principal razão de avaliar os grupos depois

de tanto tempo foi de mensurar realmente o quê ficou armazenado na memória

dos sujeitos a respeito da leitura rítmica. Além disso, no primeiro pós-teste a

execução, ou seja, a leitura rítmica foi avaliada em grupos, já no pós-teste 2 ela

foi individual proporcionando resultados mais precisos sobre a efetividade das

duas abordagens de ensino. Assim, o pós-teste 2 foi individual em todos os

quesitos testados que foram a teoria, a composição e a execução.

FIGURA 9 – PÓS-TESTE 2 GRUPO A

Fonte: o autor

A maior parte da turma A, isto é, 64%, teve o desempenho menor que a

nota 4,0. E, 27% dos alunos tiveram notas entre 4,0 e 6,9. Ao passo que,

somente 4% tiveram notas entre 7,0 e 8,9. Já os alunos que obtiveram notas

acima de 9,0 totalizaram 5%. Se juntarmos as notas acima da média chega-se

ao total de 9%, já as notas abaixo da média somaram o total de 91%.

Na turma B, os resultados foram bem diferentes. Os resultados abaixo

da média englobam 41% de notas entre 4,0 e 6,9, e 17% de notas menores

que 4,0, somando o total de 58%. Já as notas acima da média somam o total

64%

27%

4%

5%

3A - Pós-Teste 2

menor que 4,0 de 4,0 a 6,9 de 7,0 a 8,9 9,0 ou mais

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182

de 42% dos alunos, sendo que 25% tiveram notas acima entre 7,0 e 8,9 e, 17%

obtiveram notas maiores que 9,0.

FIGURA 10 – PÓS-TESTE 2 GRUPO B

Fonte: o autor.

Portanto, as diferenças são significativas entre os resultados das

avaliações feitas por meio do pós-teste 2, entre os grupos A (do ensino

tradicional) e o grupo B (do ensino que respeita a sequencia cognitiva proposta

por Jean Piaget). Nesse sentido, comparar somente as notas abaixo da média

tem-se 91% dos alunos do grupo A, contra 58% do grupo B, diferença de 33%

de rendimento entre os grupos. No que tange as notas acima da média

somente 9% dos alunos do grupo A tiveram notas acima da média, ao passo

que no grupo B, foram 42%. Mais uma vez, a diferença de rendimento foi

expressiva.

Nesse sentido, constata-se que o respeito da sequência cognitiva

proposta por Jean Piaget produz conhecimentos mais duradouros, pois os

sujeitos que iniciaram o ensino rítmico a partir da ação, seguida da

representação gráfica dos valores das figuras rítmicas, para culminar na

operação, e neste caso, operação concreta que diz respeito à leitura rítmica

musical, obtiveram resultados mais significativos.

17%

41%

25%

17%

3B - Pós-Teste 2

menor que 4,0 de 4,0 a 6,9 de 7,0 a 8,9 9,0 ou mais

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183

Os resultados do grupo A deixaram claro que iniciar o processo

educativo exigindo dos alunos certo nível de abstração, para que

compreendessem primeiramente a abstrata teoria musical para somente depois

agir e colocar em prática o que foi supostamente assimilado, não é uma boa

estratégia, pois não respeita o processo de tomada de consciência que

possibilita a criação de conceitos que dariam suporte para a compreensão da

teoria musical. Desse modo, observa-se que com os resultados do pós-teste 2,

do grupo A, que representa o ensino tradicional, não houve respeito aos

processos de construção cognitiva, de modo que em um primeiro momento

(pós-teste 1) os alunos conseguiram ler ritmos apoiados mais em uma

memorização do que propriamente em uma compreensão, visto que meses

depois pouco sobrou dessa construção frágil que não respeitou os processos

de construção do conhecimento.

8.5. RESULTADOS DOS ALUNOS DO GRUPO A E B QUE NÃO TOCAVAM

UM INSTRUMENTO

Os dados isolados do rendimento avaliado durante o pós-teste 2 dos

alunos do grupo A que não tocavam algum tipo de instrumento ou cantavam

mostraram que nenhum aluno ficou com nota acima da média. Neste caso,

78% ficaram com notas abaixo de 4,0 e 22% entre as notas de 4,0 e 6,9. Como

ilustra o figura 11:

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184

FIGURA 11 – RESULTADOS PÓS-TESTE 2 DOS ALUNOS QUE NÃO

TOCAM INSTRUMENTOS DO GRUPO A

Fonte: o autor.

Já, no grupo B os resultados aumentaram consideravelmente, sendo

que 20% dos alunos tiveram notas acima da média entre 7,0 e 8,9. Ao passo

que 60% tiveram notas entre 4,0 e 6,9. E, 20% ficaram abaixo de 4,0,

totalizando o percentual de 80% abaixo da média, como indica o figura 12:

FIGURA 12 – RESULTADOS PÓS-TESTE 2 DOS ALUNOS QUE NÃO

TOCAM INSTRUMENTOS DO GRUPO B

Fonte: o autor.

78%

22%

3A- Pós-Teste 2- Alunos que não tocam instrumentos

menor que 4,0 de 4,0 a 6,9

Não houve notas maiores que 6,9.

20%

60%

20%

3B - Pós-Teste 2- Alunos que não tocam instrumentos

menor que 4,0 de 4,0 a 6,9 de 7,0 a 8,9

Não houve notas maiores que 8,9.

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185

Assim sendo, viu-se que os alunos do grupo A, que foram submetidos ao

ensino de acordo com a metodologia tradicional, sequer atingiram a média no

pós-teste 2, ao contrário dos 20% dos alunos do grupo B que tiveram notas

entre 7,0 e 8,9. Além disso, somente 22% dos sujeitos do grupo A, contra 60%

do grupo B, ficaram com notas entre 4,0 e 6,9. Contudo, 78% dos alunos do

grupo A ficaram com notas abaixo de 4,0, contra 20% do grupo B o que

demonstra uma considerável diferença de rendimento entre os dois grupos.

Neste caso, quando se excluem os alunos sem conhecimento prévio do

domínio musical, os resultados tornam-se mais expressivos, ou seja, 80 % dos

alunos do grupo B com resultados entre 4,0 e 8,9, e 78% dos resultados do

grupo A com notas abaixo de 4,0. O que demonstra, mais uma vez, o poder da

assimilação prática que é fundamental para o processo de tomada de

consciência, para a formação de conceitos e possibilita a construção e a

compreensão de um conhecimento.

Além disso, observou-se que os sujeitos do grupo A, ou seja, do grupo

do ensino tradicional, efetivamente apagaram da mente o conteúdo ministrado,

pois muitos tiveram notas abaixo de 4,0, e, como se verá mais a frente, que a

média das notas da leitura rítmica foi de 2,04, sendo que um ponto é dado para

os alunos que mantiveram e que conservaram o pulso, ou seja, a maioria

desses alunos tirou aproximadamente 1,0 ponto de um exercício que valia 6,0.

Para entender melhor as diferenças entre os resultados dos grupos A e

B, se fará na sequência a comparação e análise individual das notas obtidas

nos pós-testes 1 e 2 das três melhores notas, e das três piores notas dos

sujeitos de cada grupo.

8.6. DESEMPENHO INDIVIDUAL PÓS-TESTE 1 E 2 NOS GRUPOS A E B

O resultado do desempenho individual dos alunos do grupo A e do grupo

B, procurou comparar as notas do pré-teste 1 com o pré-teste 2. Na verdade,

as notas foram separadas de acordo com os exercícios apresentados na

avaliação, ou seja, um exercício sobre a teoria abordada que somou pontos

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186

junto com o exercício de composição da escrita rítmica totalizando três pontos

e, o principal exercício dos dois pós-testes foi o exercício de execução que diz

respeito propriamente à leitura rítmica valeu seis pontos, nesse sentido a,

somatória das notas chegou a nove pontos, sendo que um ponto adicional foi

dado para os alunos que conseguiam manter a pulsação durante a leitura

rítmica totalizando dez pontos, em ambos os testes.

Nesse sentido, os gráficos 13 e 14 apresentam os resultados referentes

à composição rítmica e à teoria rítmica, exercício solicitado nos dois pós-testes.

GRÁFICO 13 – NOTA DA COMPOSIÇÃO INDIVIDUAL NO GRUPO A

Fonte: o autor.

Se observarmos as três melhores e as três piores notas do grupo A

referentes ao pré-teste 1, ficamos respectivamente com os alunos “E”, “H” e “K”

para os alunos com melhores notas e “A”, “F” e “G” para os sujeitos que

obtiveram as piores notas. Pode-se observar que os alunos que tiveram as

melhores notas no pós-teste 1 foram os alunos, “E” com 2,8, “H” com 2,7 e o

“K” com 3 pontos, ou seja, esse último acertou obteve todos os pontos. Já no

0

0,5

1

1,5

2

2,5

3

3,5

A B D F G H I J K L M N O P Q

Pós-teste 1

Pós-Teste 2

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187

pós-teste 2, as notas dos melhores alunos do grupo A diminuíram de 2,8 para

2,2 para o aluno “E”, de 2,7 para 1,25 no caso do aluno “H” e de 3,0 pontos

para 2,5 referente ao aluno “K”. A média dos pontos perdidos dos três alunos

foi de 0,82 pontos de uma avaliação para a outra.

No que diz respeito aos sujeitos do grupo A que tiveram os piores

resultados neste quesito observa-se que suas respectivas notas foram de 1,0

para o aluno “A”, 1,6 para o aluno “F” e de 1,8 para o sujeito “G”. Nota-se que

ao contrario, daqueles que obtiveram as melhores notas no pós-teste 1, esses

alunos tiveram um aumento em suas notas, com exceção do aluno “A” que

diminui sua nota de 1,0 para 0,85. Os demais, “F” e “G” passaram

respectivamente de 1,6 para 2,7 e de 1,8 para 2,5. Desse modo, há um

aumento médio de 0,82 pontos levando em conta as notas dos três alunos.

GRÁFICO 14 – NOTA DA COMPOSIÇÃO INDIVIDUAL NO GRUPO B

Fonte: o autor.

Adotou-se o mesmo critério na observação dos dados do grupo B

relativos às três melhores e piores notas para as questões de teoria e de

composição rítmica. Neste caso, os alunos com as melhores no pós-teste 1

0

0,5

1

1,5

2

2,5

3

3,5

A´ B´ C´ D´ E´ F´ G´ H´ I´ J´ K´

Pós-teste 1

Pós-teste 2

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188

foram o aluno “B´”, o “D´” e o “J´” com a nota 3,0 para o primeiro, 3,0 para o

segundo e 2,8 para o terceiro. Todos esses sujeitos diminuíram de nota no pós-

teste 2, ou seja, de 3,0 para 2,65 para o sujeito “B´”, de 3,0 para 1,8 para o

aluno “D´” e de 2,8 para 1,6, no caso do aluno “J´”. Desse modo, a diminuição

média das notas foi de 0,92 pontos do pós-teste 1 para o pós-teste 2.

Já, os alunos que obtiveram as piores notas foram os alunos “E´” com

1,0, assim como, o sujeito “G´” com a mesma nota, e por fim o aluno “K´”, com

1,4. No pós-teste 2, todos estes alunos aumentaram suas respectivas notas

passando de 1,0 para 1,45, de 1,0 para 1,65 e de 1,4 para 1,9. Isto quer dizer

que houve aumento médio de 0,53 pontos para os alunos com as três piores

notas no quesito teoria e composição rítmica.

Em suma, em relação às questões de teoria e de composição rítmica a

tendência observada tanto no grupo A quanto no B é de diminuição do

rendimento dos alunos que obtiveram as melhores notas neste quesito, sendo

de 0,82 pontos para o grupo A e de 0,92 pontos para o grupo B. Já, para os

alunos que tiveram as piores notas a tendência foi ao contrário inversa, com

um acréscimo de 0,82 pontos na média das notas dos sujeitos do grupo A,

assim como, para os do grupo B, com aumento de 0,53 pontos. O que sugere

que houve um pequeno progresso na compreensão teórica das figuras

rítmicas, porém este deve ser visto com ressalvas, pois havia no pós-teste 2,

frases rítmicas para serem executada que podem ter servido como exemplo de

composição.

Este resultado semelhante nos grupos A e B pode ser explicado pela

falta de investimento na escrita musical nos dois métodos, o que leva a pensar

na necessidade de, após o primeiro momento de ação prática, o trabalho com a

teoria musical dever ser acompanhado do exercício da escrita musical

No entanto, no caso dessa pesquisa a variação de notas mais

importante e significativa a ser observada é a da execução, ou seja, da leitura

rítmica, por razões que dizem respeito à mensuração da efetividade das

metodologias de ensino, de leitura rítmica, adotadas para o ensino em cada

grupo. No caso, é preciso enfatizar que o exercício de leitura rítmica foi

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189

realizado no pré-teste 1 em grupo, já no pré-teste 2 ele foi individual. Por esta

razão, observou-se importantes diferenças nos resultados coletados como os

gráficos 15 e 16 ilustram, trazendo respectivamente os dados coletados para o

grupo A e para o grupo B.

GRÁFICO 15 – EXECUÇÃO INDIVIDUAL NO GRUPO A

Fonte: o autor.

No grupo A, as notas do pré-teste 1 foram significativamente

superiores as apresentadas no pré-teste 2. Ao adotar o critério das três

melhores e das piores notas observa-se esta tendência. Os sujeitos com os

melhores resultados foram os alunos “D”, “K” e “M”, que tiveram a nota 6,6,

pois estavam no mesmo grupo. No entanto, no pós-teste 2 os alunos “C” e “K”

sequer conseguiram ler as frases e tiraram 0. Somente o aluno “D” obteve a

nota 1,0. Dessa forma, a diminuição média foi de 6,2 pontos para os indíviduos

com as melhores notas do grupo A.

No que tange as três piores notas obtidas por alunos do grupo A, a

tendência observada nas notas dos melhores alunos permaneceu. Dessa

forma, os piores alunos deste grupo foram o aluno “A” com apenas 1,0 ponto, o

0

1

2

3

4

5

6

7

A B D F G H I J K L M N O P Q

Pós-teste 1

Pós-Teste 2

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190

aluno “I” com 4,6 pontos, e o aluno “N” com 4,4 pontos, no pós-teste 1. Já, no

pós-teste 2, tanto o aluno “A” quanto o aluno “N” tiraram zero, o que significa

que não conseguiram ler as frases propostas. Somente o aluno “I” conseguiu

ler e melhorar seu desempenho passando de 4,6 para 6,2 pontos, porém pode-

se excluir este resultado já que este aluno tem conhecimentos prévios de

música. Neste caso, a diminuição foi de 3,1 pontos entre as notas do pós-teste

1 e o pós-teste 2, no grupo do ensino tradicional, ou seja, o grupo A.

No grupo B, os melhores resultados foram dos alunos “A´”, “C´” e “I´” que

obtiveram respectivamente as notas, 6,8, 7,0 e 6,8, no pós-teste 1. Durante o

segundo pós-teste as notas diminuíram de 6,8 para 5,8 para o aluno “A´”, de

7,0 para 3,0 para o aluno “C´”, e de 6,8 para 6,4 no caso do aluno “I´”. No caso,

houve diminuição de 1,8 pontos nas notas entre o pós-teste 1 e o pós-teste 2.

Ao passo que, as piores notas do pós-teste 1 do grupo B, foram as dos

alunos “F´”, “G´” e “H´” que obtiveram respectivamente 5,5 pontos, 4,8 pontos e

5,8 pontos. No segundo pós-teste as notas diminuíram de 5,5 para 3,0 pontos,

no caso do aluno “F´” e de 4,8 para 2,3 pontos na nota do aluno “G´”, já no

caso do aluno “H” a nota aumentou de 5,8 para 6,8. Desse modo, houve

diminuição média de 1,3 pontos nas notas dos sujeitos do grupo B.

GRÁFICO 16 –– EXECUÇÃO INDIVIDUAL NO GRUPO B

Fonte: o autor.

0

1

2

3

4

5

6

7

8

A´ B´ C´ D´ E´ F´ G´ H´ I´ J´ K´

Pós-teste 1

Pós-teste 2

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191

Portanto, observou-se diminuição das notas obtidas durante a leitura

rítmica em ambos os grupos. No entanto, no grupo A a diminuição das notas foi

mais expressiva, sendo de 6,2 pontos para os alunos que haviam tido

resultados melhores e de 3,1 pontos para aqueles com notas inferiores. Ao

contrário, as notas obtidas no grupo B, apesar de assinalar uma tendência para

uma leve diminuição entre os pós-teste 1 e o pós-teste 2, expressaram uma

pequena queda de somente 1,8 pontos para os melhores alunos, e de 1,3 para

os sujeitos que tiveram notas inferiores.

A diminuição do rendimento após um periodo prolongado de tempo é

esperada a partir de uma abordagem teórica piagetiana. Piaget distingue

claramente entre desenvolvimento e aprendizagem (PIAGET & GRÉCO, 1959).

Desenvolvimento é muito mais amplo que a aprendizagem, que se refere a um

treino em relação a um conteúdo específico. Nesse sentido, entende-se a

diminuição das notas nos dois grupos investigados. Porém, a diminuição foi

muito maior no grupo do ensino tradicional, o que leva a pensar que o ensino

que segue o desenvolvimento cognitivo é mais efetivo.

Além, do desmembramento dos resultados individuais do pós-testes 1 e

do pós-teste 2 referentes à leitura e a composição (que abrange de certa

forma a teoria) rítmicas, traz-se agora os resultados totais que referem-se a

nota final obtida pelos sujeitos participantes dessa pesquisa. Os gráficos 17 e

18 ilustram os resultados das notas finais dos dois grupos que comenta-se a

seguir.

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192

GRAFICO 17 – NOTA FINAL DO DESEMPENHO INDIVIDUAL DO GRUPO A

Fonte: o autor.

Utilizou-se o mesmo critério de observação, separando assim, as três

melhores e piores notas de cada grupo.

No grupo A, as melhores notas foram dos alunos “D”, “K” e “M” que

obtiveram respectivamente as notas, no pós-teste 1, de 8,8 pontos, de 9,6

pontos, e de 8,6 pontos. Depois que realizaram o pós-teste 2, essa notas

caíram para 3,6 para o aluno “D”, para 2,5 no caso do aluno “K”, e para 1,6

referente ao aluno “M”, o que totaliza uma queda média de 6,4 pontos para

estes três sujeitos.

No caso, dos sujeitos com as piores notas do grupo A, observou-se os

alunos, “A”, “G” e “N” que obtiveram sucessivamente as notas 2,0, 6,7 e 4,4

durante o primeiro pós-teste. A segunda nota diminuiu para 0,87 para o aluno

“A”, para 4,9 no caso do aluno “G”, e para 2,0 pontos referindo-se à nota do

aluno “N”. Dessa forma, a média de diminuição foi de 1,83 pontos para as

notas desses três indivíduos.

0

1

2

3

4

5

6

7

8

9

10

A B C D E F G H I J K L M N O

Pós-teste 1

Pós-Teste 2

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193

GRAFICO 18 – NOTA FINAL DO DESEMPENHO INDIVIDUAL DO GRUPO B

Fonte: o autor.

No caso do grupo B, as melhores notas foram as dos sujeitos “C´”, “D´” e

“I´” que respectivamente apresentaram as notas 9,6, 9,0 e 9,4 durante o pós-

teste 1. No entanto, quando esses sujeitos realizaram o pós-teste 2, o resultado

diminuiu para 4,85 para o sujeito “C´”, para 5,4 do aluno “D´” e para 9,2 no caso

do sujeito “I´”. A redução média do pós-teste 1 para o pós-teste 2 foi de 2,85

pontos para esses alunos.

Os alunos do grupo B que obtiveram as piores foram o “A´”, o “E`” e o

“G´” com as seguintes notas: 6,8, 6,8 e 5,8. No caso do aluno “A´” houve um

aumento de sua nota de 6,8 para 7,8. Já o aluno “E´”, diminuiu sua nota para

3,4 e o sujeito “G`” para 3,9. Sendo assim, a média de diminuição desses três

sujeitos do grupo B, foi de 1,43.

Assim sendo, a média das notas do pós-teste 1 individuais dos melhores

e dos piores indivíduos desta pesquisa, diminuíram consideravelmente quando

comparadas ao pós-teste 1. Contudo, foram os sujeitos do grupo A que tiveram

uma queda de produção mais expressiva, sendo que houve uma redução

0

1

2

3

4

5

6

7

8

9

10

A´ B´ C´ D´ E´ F´ G´ H´ I´ J´ K´

Pós-teste 1

Pós-Teste 2

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194

média de 6,4 pontos para o resultado dos três melhores indivíduos e, de 1,83

para os três piores. No caso, dos indivíduos do grupo B houve diminuição das

notas, porém foi menos significativa sendo de em média de 2,85 pontos para

os melhores e de 1,43 para os piores.

É preciso lembrar que o pós-teste foi realizado em pequenos grupos, o

que levou a um desempenho do grupo e não individual. No segundo pós-teste,

realizado individualmente, foi possível observar mais claramente o

desempenho individual, visto que muitas vezes a maioria dos membros do

grupo teve um desempenho muito inferior ao que apresentou no primeiro pós-

teste. Esta situação leva a pensar, como Piaget, na necessidade de avaliações

cognitivas individuais após um desempenho coletivo para aferir

adequadamente o nível de desenvolvimento.

Logo, os resultados obtidos nos pós-testes demonstram que houve

significativa diminuição das notas dos alunos do grupo A, pautado no ensino

tradicional, no qual se inicia o processo educativo pela teoria musical. Apesar

de também ter havido uma redução do desempenho dos alunos do grupo B,

essa foi bem menos expressiva, pois os alunos mantiveram o conteúdo

lecionado na memória. Desse modo, o ensino que se iniciou pela prática

rítmica pautada na vivência corporal justificada pelo respeito às etapas

cognitivas propostas por Jean Piaget mostrou-se mais efetivo e com resultados

mais duradouros.

Por outro lado, observa-se que alguns participantes, um no grupo A e

quatro no grupo B, apresentam, em relação ao primeiro pós-teste, aumento de

rendimento no segundo pós-teste. A explicação piagetiana recorre

necessariamente ao processo autorregulador de equilibração, o qual se

expressa na busca de um novo equilíbrio a partir de uma situação de

desequilíbrio cognitivo. Nesta busca, o processo de equilibração coordena a

maturação orgânica, a experiência física, e a interação e transmissão social. A

equilibração se expressa em seu tempo, não sendo voluntária. O processo de

equilibração é o problema central do desenvolvimento (PIAGET, 1975).

Também, pode-se pensar aqui na continuidade da interação do participante do

estudo com a prática musical.

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195

8.7. RESULTADO GERAL DO PÓS-TESTE 1 E DO PÓS-TESTE 2

Após a comparação feita em termos individuais entre os resultados do

pós-teste 1 e do pós-teste 2, sendo que foram observados os melhores e os

piores resultados em cada grupo, passa-se agora aos resultados da média das

notas de todos os sujeitos dos grupos A e B participantes dessa pesquisa. No

caso, os resultados foram desmembrados em execução, composição e nota

final.

No grupo A, a execução rítmica teve como média de notas durante o

pós-teste 1 o valor de 5,19 pontos que diminuiu para 2,04 no pós-teste 2. No

que tange a composição rítmica, a nota praticamente permaneceu a mesma

mantendo-se entre 2,08 e 2,06. No entanto, a nota final geral, desse grupo,

passou de 7,27 para 4,10.

GRÁFICO 19 – RESULTADO FINAL DO GRUPO A

Fonte: o autor.

No grupo B, os resultados foram semelhantes em relação à composição

rítmica com valores bem próximos, isto é, 2,06 e 1,97 entre os dois pós-testes.

Já, os valores referentes à execução da leitura rítmica foram substancialmente

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Execução Composição Nota final

Pós-teste 1

Pós-Teste 2

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melhores, diminuíram de 6,0 para 4,47 pontos. O desempenho final do grupo B,

também foi melhor, passou da média de 8,02 para a de 6,45 pontos.

GRÁFICO 20 – RESULTADO FINAL GERAL DO GRUPO B

Fonte: o autor.

Contudo, a comparação entre os resultados dos grupos A e B são

elucidativas. Os resultados falam por si, de um lado no pós-teste 1, tem-se para

a leitura rítmica 5,19 de um lado, e 6,0 pontos para o outro. E, no mesmo

quesito de execução no pós-teste 2, a nota cai para 2,04 no grupo A, e para

4,47 no grupo B, o que é mais do que o dobro.

A única semelhança presente nesta pesquisa, está nos dados relativos à

composição com dados praticamente iguais nos dois lados, tanto no pós-teste

1, quanto no pós-teste 2, isto é aproximadamente 2,0 pontos nos dois grupos, o

que é impressionante.

Em relação à média das notas finais, elas ficaram em 7,27 no grupo A

no pós-teste 1, e em 8,02 no grupo B, e diminuíram para 4,10 no grupo A, e

para 6,45 pontos no B, confirmando assim, a hipótese dessa pesquisa de que o

ensino do ritmo musical para iniciantes é facilitado quando é respeitada a

sequência do desenvolvimento cognitivo proposta por Jean Piaget, na qual o

conhecimento deve necessariamente iniciar pela ação, passar pela

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1

2

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9

Execução Composição Nota final

Pós-teste 1

Pós-Teste 2

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representação mental para enfim culminar na operação. Por outro lado, o

presente estudo apresenta indicativos da hipótese piagetiana de que o

desenvolvimento cognitivo precede a aprendizagem, uma vez que respeitando

a sequência deste desenvolvimento há a possibilidade de maior aprendizagem

efetiva.

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9. CONCLUSÕES E ENCAMINHAMENTOS FUTUROS

Buscando identificar quais são as melhores práticas educativas no

domínio da música, o autor dessa pesquisa realizou um experimento com o

objetivo de responder qual é a melhor forma de ensinar a leitura rítmica para

adolescentes do ensino Médio da escola pública brasileira. Desse modo,

comparou o ensino tradicional, que ainda é utilizado em muitos conservatórios

e universidades no Brasil e no mundo, no qual a iniciação do processo

educativo se dá a partir da abstrata teoria musical, com uma metodologia ativa

que começa o ensino respeitando o modelo de desenvolvimento cognitivo de

Jean Piaget, no qual o conhecimento deve necessariamente iniciar pela ação,

passar pela representação mental e culminar na operação. Nesse caso, o

ensino foi inspirado em atividades presentes na abordagem do educador

Jacques-Dalcroze, e partiu da ação, ou seja, do fazer musical vivenciado

corporalmente para, em seguida, se construir a compreensão da abstrata

notação do ritmo musical.

Da literatura examinada nesta pesquisa observou-se que na área da

cognição musical as tendências apontam para o ensino de habilidades

musicais treináveis por meio da repetição, como por exemplo, os trabalhos de

Hargreaves (1986), Sloboda (2008), Hallam (2011) e Levitin (2011), entre

outros. Na verdade, no domínio da música, as abordagens do Behaviorismo e

da Gestalt parecem ainda predominar com grande produção de pesquisas

quantitativas que tratam a música como uma ciência exata.

Por outro lado, pesquisas em educação musical como os trabalhos de

Hewson (1966), Bebeau (1982) e Rodgers (1996) que compararam

metodologias ativas de ensino de leitura rítmica com o método tradicional

mostraram ser mais efetivo começar o ensino pela prática. Porém, esses

trabalhos não explicaram com profundidade o porquê das diferenças

observadas.

Por esta razão, a explicação de como a inteligência é construída no ser

humano, presente no referencial teórico piagetiano, trouxe subsídios

importantes para auxiliar na compreensão e no estabelecimento de atividades

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educativas que permitiram chegar à resposta do problema dessa pesquisa.

Para Piaget (1958; 1964; 1965; 1972), a construção da inteligência depende de

quatro fatores, ou seja, da maturação, da experiência física, da interação e

transmissão social e do mecanismo de equilibração que integra os demais

fatores.

A maturação nervosa é responsável pelo desenvolvimento do organismo

e é determinante para o desenvolvimento da inteligência, assim como é a

experiência adquirida da ação sobre objetos. Para que ocorra o

desenvolvimento cognitivo há a necessidade da ação do sujeito sobre objetos.

No entanto, a experiência isolada não é capaz de explicar sozinha o

desenvolvimento cognitivo, pois necessita da compreensão do processo em si,

e esse depende dos outros fatores responsáveis pelo desenvolvimento da

inteligência, ou seja, da maturação biológica, da interação e da transmissão

social, além do processo de equilibração que integra os demais.

Por sua vez, o processo de equilibração é um processo autorregulador

do sujeito que está sempre em busca do equilíbrio cognitivo, já que está

exposto a situações do meio que podem levar a perturbações. Desse modo, a

busca por um equilíbrio temporário, faz com que o sujeito adapte-se a

situações novas. E a adaptação e a organização são invariantes funcionais que

levam ao desenvolvimento cognitivo e à aprendizagem, e estão ligadas ao

processo de assimilação e acomodação (que integram o processo de

equilibração), mecanismos do processo de desenvolvimento cognitivo que se

inicia no nascimento, com a interação entre o sujeito e o meio físico e social.

Assim, a inteligência é construída por meio da interação que se dá pela

ação do sujeito que desenvolve seu aparato cognitivo e seu conhecimento da

realidade, ou seja, sua forma de pensar, memorizar, raciocinar, etc. Desse

modo, para haver aprendizado, que é um comportamento fruto do

desenvolvimento, do processo de assimilação, é necessário que o sujeito ative

a lógica ou a pré-lógica de estruturas existentes. Nesse sentido, quando o

sujeito age sobre o objeto desenvolve conhecimentos e constrói estruturas

lógicas. Do mesmo modo, quando há transformação desses esquemas de ação

que se tornam conceitos, ocorre a interiorização da ação para o pensamento e

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acontecem tomadas de consciência, isto é, quando acontece a passagem

paulatina do que foi realizado no plano da ação para o plano representacional,

ou seja, conceitual. Assim, a passagem da assimilação prática para a

assimilação de conceitos permite a sucessão de tomadas de consciência, que

são, de certa forma, a reconstrução e a ampliação do que foi realizado no plano

da ação para o plano representacional.

Nesse sentido, Piaget (1978) sugere que a ação é uma forma de

conhecimento autônomo com alto poder cognitivo devido à causalidade

presente nela. Na verdade, o fazer permite chegar à organização causal que

tem papel fundamental na posterior organização dos conhecimentos

conceituais. Assim, quando ocorre a conceituação, por meio do processo de

tomada de consciência, os esquemas de ação são interiorizados desvelando

construções conceituais que trarão explicações para a compreensão do fazer.

Em outras palavras, o conceito permite a reconstrução no plano mental de

inúmeras relações e coordenações de ações interiorizadas que seriam

limitadas no plano da ação prática.

Por conseguinte, a partir do fazer, ou seja, de uma coordenação material

e causal, são formados conhecimentos que podem ser chamados de “saber

fazer” e que precedem a compreensão e a representação da ação. Na verdade,

quando ocorre a passagem do fazer para o compreender, a ação que está

ligada à causalidade dá lugar à conceituação ligada à implicação, ocorrendo

assim a compreensão, ou seja, a causalidade dá lugar à implicação, e é

possível conhecer as razões que implicam na compreensão do fazer. Portanto,

a compreensão do fazer implica na extração dos significados da ação.

Por isso, quanto ao funcionamento cognitivo, ressalta-se a importância

do fazer musical antecedendo a criação de conceitos e a extração de novas

significações da ação permitindo gradativas tomadas de consciência, que

possibilitarão de fato compreender o que se está fazendo. Nesse sentido, a

comparação dos dados, fruto do experimento de ensino entre os dois grupos

participantes (A e B) foi categórica, e confirma a hipótese sustentada pelo autor

de que é mais efetivo iniciar o ensino da leitura rítmica para adolescentes, com

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201

o movimento e a percepção do corpo, respeitando a sequência cognitiva

proposta por Piaget.

Observou-se que com ambas as metodologias de ensino os sujeitos

apresentaram, em um primeiro momento, indicativos de que aprenderam o

conteúdo da leitura rítmica, como comprovam os resultados do pós-teste 1, que

foram elucidativos com resultados muito próximos entre os dois grupos.

Lembrando que no grupo A, ou seja, o grupo no qual o ensino partiu da teoria

musical, a média das notas da execução (ou seja, da leitura rítmica) foi de 5,19

pontos e a nota geral do grupo foi de 7,27 pontos; e, no grupo B, ou seja, o

grupo que começou o ensino rítmico pela ação, a média da nota da execução

rítmica foi de 6,0 pontos e a nota geral do grupo foi de 8,02.

Em um segundo momento, no pós-teste 2, que foi realizado 19 semanas

mais tarde para o grupo A e 23 semanas depois do pós-teste 1 para o grupo B,

as notas diminuíram. A razão pela qual os pós-testes não puderam ser

realizados exatamente no mesmo momento foi a indisponibilidade de datas na

escola na turma B. Apesar do pós-teste 2 ter acontecido quase um mês antes

no grupo A, a diminuição das notas foi mais significativa nesse grupo, que teve

um rendimento bem inferior. Desse modo, a nota geral de leitura rítmica passou

de 5,19 para 2,04 e a nota geral de 7,27 para 4,10. Já no grupo B, a diminuição

da nota foi menos significativa, de 6,0 para 4,47, no caso da execução da

leitura rítmica, e de 8,02 para 6,45 da nota média do grupo B em geral.

Portanto, a nota geral da leitura rítmica do grupo B ficou maior que o

dobro da nota do grupo A, o que traz indicativos favoráveis à hipótese de que o

ensino do ritmo musical para adolescentes é amplamente facilitado quando é

respeitada a sequência do desenvolvimento cognitivo proposta por Jean

Piaget, na qual o conhecimento deve necessariamente iniciar pela ação, passar

pela representação mental irreversível, para enfim culminar na operação.

Assim sendo, os dados demonstram que no caso do domínio musical,

mesmo que o sujeito tenha interagido informalmente com o conteúdo da

música, podendo até ter chegado a tocar algum instrumento musical, porém

sem ter passado pelo ensino formal, independente da idade do sujeito,

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necessitará respeitar a sequência estrutural de construção. Neste caso, é

possível inferir a partir da teoria do desenvolvimento de Piaget, que todo ensino

de um domínio novo deveria partir da ação, ou seja, da inteligência prática,

para somente depois, passando pela inteligência representativa não reversível,

chegar a propor exercícios que contribuam para o desenvolvimento da

reversibilidade operatória expressa no conteúdo estudado.

Nesse sentido, apesar dos sujeitos desta pesquisa supostamente

encontrarem-se no estádio das operações, sejam elas concretas ou formais,

quando interagiram pela primeira vez com o ensino formal da música,

apresentaram um tipo de atividade similar ao da criança. Desse modo, foi mais

efetivo e duradouro o ensino que se iniciou pela prática musical no grupo B, e

este demonstrou que antes de entrar na linguagem abstrata da música é

preciso que o sujeito domine a ação para criar conceitos significativos, e estes,

por sua vez, por meio do processo de tomada de consciência, proporcionam a

compreensão do fazer musical e levam a um novo conhecimento significativo e

duradouro.

A tomada de consciência envolvendo a abstração reflexionante explica-

se a partir do processo autorregulador de equilibração, o qual se expressa na

busca de um novo equilíbrio a partir de uma situação de desequilíbrio cognitivo.

A partir do estudo sugere-se que métodos ativos, que partem da ação, facilitam

o processo de desenvolvimento cognitivo que tem no processo de equilibração

o seu motor principal.

A ação sustenta-se na assimilação, e só há assimilação cognitiva se há

intencionalidade (Piaget, 1948). Nesse sentido, entende-se porque iniciar pelo

resgate da ação construtiva promove a vinculação do sujeito com o objeto de

estudo tornando-o significativo a ponto de querer se aventurar em uma

compreensão para além da ação prática, em direção ao entendimento de

infinitas possibilidades do objeto com o qual se interage, as suas razões. A

repetição depois da teoria, própria do método tradicional, erra ao não

considerar, primeiro, a assimilação prática como necessariamente anterior à

teorização, levando mais a uma ação repetitiva não significativa, pois pouco

respeitou o primado da assimilação. A assimilação prática ocorre por meio dos

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esquemas à disposição do sujeito. Em um primeiro momento, se tratando de

leitura rítmica, é preciso resgatar, portanto, o ritmo no próprio corpo, expresso

pela coordenação entre movimentos e percepção.

A partir do desenvolvimento de estudos empíricos envolvendo outras

situações de ensino pode-se atender à proposição de Piaget de que cabe aos

pedagogos e aos educadores a elaboração de experimentos, no sentido de

evidenciar qual o ensino mais efetivo (Piaget, 1932). Considerando o quadro de

crise da educação brasileira é preciso repensar as práticas educativas

contando com estudos aprofundados para além de uma ilusão de um

aprendizado pautado basicamente na memorização de conteúdos. Quando o

ensino parte de conceitos e de teorias desvinculados de uma prática

significativa, não se avança na contribuição para o desenvolvimento da

reflexividade e da criticidade do sujeito. O problema é que estamos muito

distantes de uma formação de professores e de um ensino que saiba como

iniciar por uma prática significativa, em seus respectivos domínios do

conhecimento. A partir do estudo pode-se inferir que a prática significativa no

domínio da música necessita iniciar-se pelo próprio corpo, pela própria pessoa

do estudante e não partir de uma teorização vazia, mesmo que esta, diga

respeito ao campo do conhecimento que o sujeito quer conhecer. Sugere-se

que o processo de ensino é facilitado se respeitada a sequência do

desenvolvimento cognitivo e dificultado se esta ordem for invertida. Pode-se

falar aqui da necessidade da uma reconstrução estrutural a partir do

conhecimento de domínio específico.

Além disso, seria interessante replicar essa pesquisa com adultos sem

conhecimento prévio de música, buscando verificar se as hipóteses

confirmadas nessa pesquisa continuam válidas e passíveis de generalizações

para outras situações de ensino. Nesse sentido, seria também interessante

expandir os domínios de conhecimento, como, por exemplo, para o domínio do

ensino de línguas estrangeiras, nesse caso, verificando o que é mais eficaz,

começar o ensino pela gramática ou pela prática da língua?

Estudos futuros deverão aprofundar o problema epistemológico por

detrás de diferentes abordagens de ensino, além de empiricamente, e

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contando com pós-testes com considerável variação de tempo, verificar a

solidez de conteúdos trabalhados.

Com este trabalho permanece a inquietude, própria do sentimento de

que há muito por fazer para o desenvolvimento de uma educação de qualidade.

Espera-se, entretanto, ter contribuído minimamente para o debate em torno da

educação musical.

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218

APÊNDICE

ENTREVISTA COM LUÍS BORCHEIDT.........................................................218

MÉTODO: O´ PASSO.....................................................................................220

TERMO DE CONSENTIMENTO.....................................................................222

PRÉ-TESTE....................................................................................................224 PÓS-TESTE 1.................................................................................................225 PÓS-TESTE 2.................................................................................................226 QUESTIONÁRIO 1..........................................................................................228

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ENTREVISTA COM LUÍS BORCHEIDT

Em entrevista realizada no dia vinte e seis de fevereiro de 2014, o

professor de percussão e rítmica da PUC me recebeu para conversarmos

sobre o ensino do ritmo. Na verdade, Luís Borcheidt é bacharel e licenciado em

música , além de ter mestrado em música em cognição e filosofia da música

concluído em 2008 na UFPR. Ele trabalha como músico profissional e é

professor efetivo do IFPR desde 2009 e da PUC desde 2013.

Perguntei como ele ensina o ritmo para alunos iniciantes. Ele me

respondeu que como teve contato com vários métodos ativos, em particular

com o método Orff/Wuytack desenvolveu uma forma ativa de trabalhar com o

ensino do ritmo. Na verdade, ele ensina a ler e escrever música a partir da

prática e somente depois de trabalhar com os sons do corpo que irá propor aos

alunos de refletir sobre a prática.

Nesse sentido, ele desenvolveu um tipo de notação não convencional de

notação musical que chamou de partitura gráfica, pois relata que muitos alunos

têm grandes dificuldades de compreender os símbolos abstratos da notação

tradicional. Por isso, prefere iniciar com uma notação alternativa e dar uma

base que permite facilitar a compreensão pela prática da leitura rítmica em

conjunto. Na verdade, ele busca ensinar a teoria da música de forma

sinestésica.

Esta metodologia, trabalha com o compasso quaternário, pois segundo

ele é mais fácil entender a quadratura com o recurso concreto que utiliza (uma

folha de papel dobrada cinco vezaes). Além disso, o repertório em geral ouvido

pelos estudantes do curso de licenciatura em música é em geral em compasso

quaternário.

Depois, perguntei como ele ensinava o pulso. E, ele falou que é o mais

complicado já que é preciso sentir o pulso de dentro para fora. Desse modo,

propõe exercícios para que os alunos trabalhem o pulso de forma coletiva com

percussão corporal. Ele não gosta de usar o metrônomo para ensinar o pulso,

já que é uma forma de imposição, ou seja, seguir uma pulsação artificial ao

invés de achar uma coletiva com os alunos na sala de aula.

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220

No final da entrevista conversamos sobre a sala de aula. Então, ele falou

que muitos professores conhecem os métodos ativos, porém na hora de

ensinar, perpetuam as velhas práticas de transmissão do conhecimentos por

meio de conceitos abstratos que segundo ele serão em um curto espaço de

tempo apagados da memória.

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221

O MÉTODO O PASSO DE LUCAS CIAVATTA

Buscando alternativas para o ensino de música, o professor Lucas

Ciavatta criou uma metodologia de ensino que se utiliza do corpo como

instrumento musical para superar as dificuldades de aprendizado. Nesse

sentido, é de certa forma uma releitura do método ativo de Jacques-Dalcroze

que trabalha o ensino do ritmo com o caminhar, entre outros procedimentos.

Dessa forma, baseando-se na pulsação o método de educação musical

de Lucas Ciavatta busca por meio do movimento corporal ensinar o ritmo

musical. Na verdade, o método denominado de O Passo consiste em um

caminhar sem sair do lugar, gerando um movimento baseado no compasso

quaternário, no qual cada passo é um tempo de um compasso. Desse modo, é

criado um mapeamento do ritmo com o movimento corporal que permite

colocar em prática conceitos abstratos como o tempo musical e a pulsação,

como sustenta Ciavatta:

O passo parte de um andar específico que desloca o eixo do corpo e trabalha necessariamente o equilíbrio. Traz assim a noção de regularidade e possibilita o aprendizado da pulsação. A percepção dessa pulsação diretamente associada ao movimento corporal permite que algo essencialmente abstrato como o tempo possa ser mapeado, pois passa, a partir do estabelecimento de uma relação direta entre a movimentação corporal e o fazer musical, a ser concreto, palpável. (CIAVATTA, 2003, p. 36-37).

Nesse sentido, as dificuldades encontradas pelo autor enquanto atuava

como professor, como a falta de recursos matérias, como por exemplo, a falta

de instrumentos musicais levou Ciavatta (2003) a elaborar atividades que

usassem o corpo como instrumento, ou seja, sua metodologia faz uso da

percussão corporal, além da possibilidade de explorar recursos como a

construção de instrumentos a partir de sucatas, como sugere o autor:

Não ter instrumentos não servia de justificativa para a falta de estudo: a batida grave e abafada de um surdo podiam ser facilmente reproduzidas numa parede; a diferença entre o grave e o agudo de um agogô se fazia ou com palmas graves e agudas ou com duas garrafas, uma cheia outra pela metade, ou simplesmente com a voz; o reco-reco podia ser uma espiral de caderno; e mesmo a virada do tamborim podia ser estudada apenas com as mãos. (CIAVATTA, 2003, p. 32-33).

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222

Contudo, a metodologia elaborada pelo professor e pesquisador Lucas

Ciavatta (2003) é propriamente uma releitura brasileira dos métodos ativos de

primeira geração do início do séc. XIX, pois sua metodologia também faz uso

de ritmos brasileiros.

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TERMO DE CONSENTIMENTO

O presente termo de consentimento se refere à pesquisa “Cognição musical e

o ensino do ritmo: da ação à operação” em desenvolvimento no Departamento

de Artes, Setor de Ciências Humanas, de Letras e Artes da Universidade

Federal do Paraná, a ser realizada no Colégio L., como parte integrante da

disciplina de Cognição Musical do curso de Pós-Graduação em Educação de

Alexandre Meirelles Martins (pesquisador este que vos apresenta o seguinte

termo), sob a supervisão da Professora Doutora Tania Stoltz.

O presente estudo pretende analisar se o pressuposto defendido pelo

psicólogo suíço Jean Piaget de que o aprendizado deve seguir

necessariamente a sequência ação → representação mental → operação, se

aplica ao domínio de conhecimento da música. Dessa forma, serão ministradas

três aulas de aproximadamente 20 minutos cada, seguida de um quarto e,

último encontro, para realizar uma avaliação individual. As aulas serão

dedicadas ao ensino do conteúdo do ritmo musical, e avaliação será para

mensurar a efetividade das aulas ministradas anteriormente.

Nesse sentido, sua participação é muito importante, pois contribuirá para

melhor compreensão dos processos psicológicos envolvidos na aprendizagem

musical, assim como o aprendizado como um todo.

Cabe aqui destacar que a presente pesquisa não apresenta nenhum risco à

sua integridade física e moral. Além disso, todo participante poderá, em

qualquer momento, efetuar perguntas sobre o experimento se assim desejar.

Caso algo no procedimento desencadeie algum tipo de constrangimento, o

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224

participante tem total liberdade de se abster e até de encerrar a sua

participação sem haver nenhum tipo de represálias de qualquer ordem.

Por fim, o pesquisador assegura total confidencialidade quanto aos dados

produzidos, nesse estudo. Além do mais, as identidades serão absolutamente

preservadas, e será assegurado sigilo absoluto.

Uma cópia deste documento lhe será entregue assim que você assiná-lo.

Li a proposta acima e entendi os procedimentos e disponho a participar deste

estudo.

Nome:__________________________________________________________

Assinatura:______________________________________________________

Data:__/__/__.

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QUESTIONÁRIO PRÉ-TESTE

1) Qual é o seu nome?

Resposta:_______________________________________________________

2) Quantos anos você tem?

Resposta:_______________________________________________________

3) Em que série está?

Resposta:_______________________________________________________

4) Você toca algum instrumento musical, se sim qual?

□Não

□Sim, Qual______________________________________________________

5) Já teve aulas de teoria musical?

□Não

□Sim

6) Sabe o que significa “rítmica” em termos musicais, se sim pode definir com

suas palavras?

□Não

□Sim___________________________________________________________

7) Sabe ler partituras?

□Não

□Sim

Obrigado pela colaboração !!!

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PÓS-TESTE 1

Nome:________________________________________ data:_____________

Turma:_______________ Grupo:________________

1) Associe os valores das figuras a suas respectivas pausas:

□ □

□ □

□ □

□ □

2) Assinale quais são os nomes das figuras rítmicas estudadas:

□ breve □ semínima □ fusa □ superfusa

□ colcheia □ semicolcheia

3) Composição e leitura ritmica. Escreva 5 compassos na folha em anexo. Em

seguida será feita a leitura em grupos.

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227

PÓS-TESTE 2

Nome:________________________________________ data:_____________

Turma:_______________

1) Associe os valores das figuras a suas respectivas pausas (1,0):

□ □

□ □

□ □

□ □

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2) Assinale quais são os nomes das figuras rítmicas estudadas (1,0):

□ mínima □ semínima □ fusa □ superfusa

□ colcheia □ semicolcheia

3) Escreva 5 compassos com as figuras rítmicas estudadas na folha em anexo

(1,0):

4) leitura rítmica, leia os seguintes compassos (6,0)

1)

2)

3)

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QUESTIONÁRIO EXPERIMENTAL 1

Nome:________________________________________ data:_____________

Turma:_______________

1) Como você considera o seu aprendizado em relação ao conteúdo ensinado?

□ insuficiente □inadequado □ adequado □ bom

2) Como você avalia o método de ensino?

□insuficiente □inadequado □adequado □bom

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

3) O que você menos gostou na aula?

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________