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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ CENTRO DE TECNOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LOGÍSTICA E PESQUISA OPERACIONAL DAIANE GABRIELA PAULO NONATO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO, POLÍTICA INDUSTRIAL E INFRAESTRUTURA MACROLOGÍSTICA: UMA REFLEXÃO SOBRE O MODELO BRASILEIRO FORTALEZA 2015

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEAR

    CENTRO DE TECNOLOGIA

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM LOGSTICA E PESQUISA

    OPERACIONAL

    DAIANE GABRIELA PAULO NONATO

    DESENVOLVIMENTO ECONMICO, POLTICA INDUSTRIAL E

    INFRAESTRUTURA MACROLOGSTICA: UMA REFLEXO SOBRE O MODELO

    BRASILEIRO

    FORTALEZA

    2015

  • 1

    DAIANE GABRIELA PAULO NONATO

    DESENVOLVIMENTO ECONMICO, POLTICA INDUSTRIAL E

    INFRAESTRUTURA MACROLOGSTICA: UMA REFLEXO SOBRE O MODELO

    BRASILEIRO

    Dissertao de Mestrado apresentada ao

    Programa de Ps-Graduao em Logstica e

    Pesquisa Operacional, da Universidade Federal

    do Cear, como requisito parcial para a

    obteno do Ttulo de Mestre em Logstica e

    Pesquisa Operacional. rea de concentrao:

    Gesto Logstica.

    Orientador: Prof. Dr. Carlos Amrico Leite

    Moreira.

    FORTALEZA

    2015

  • 2

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao

    Universidade Federal do Cear

    Biblioteca de Ps Graduao em Engenharia

    N737d Nonato, Daiane Gabriela Paulo.

    Desenvolvimento econmico, poltica industrial e infraestrutura macrologstica:

    uma reflexo sobre o modelo brasileiro / Daiane Gabriela Paulo Nonato. 2015.

    76 f. : il. color., enc. ; 30 cm.

    Dissertao (mestrado) Universidade Federal do Cear, Centro de Tecnologia,

    Programa de Ps Graduao em Logstica e Pesquisa Operacional, Fortaleza,

    2015.

    rea de Concentrao: Gesto Logstica.

    Orientao: Prof. Dr. Carlos Amrico Leite Moreira.

    1. Logstica. 2. Investimentos. 3. Indstria Aspectos econmicos. I. Ttulo.

    CDD 658.78

  • 3

    DAIANE GABRIELA PAULO NONATO

    DESENVOLVIMENTO ECONMICO, POLTICA INDUSTRIAL E

    INFRAESTRUTURA MACROLOGSTICA: UMA REFLEXO SOBRE O MODELO

    BRASILEIRO

    Dissertao de Mestrado apresentada ao

    Programa de Ps-Graduao em Logstica e

    Pesquisa Operacional, da Universidade Federal

    do Cear, como requisito parcial para a

    obteno do Ttulo de Mestre em Logstica e

    Pesquisa Operacional. rea de concentrao:

    Gesto Logstica.

    Orientador: Prof. Dr. Carlos Amrico Leite

    Moreira.

    Data da aprovao: ______ /______ /______

    BANCA EXAMINADORA

    Prof. Dr. Carlos Amrico Leite Moreira (Orientador)

    Universidade Federal do Cear (UFC)

    Prof. Dr. Joo Welliandre Carneiro Alexandre

    Universidade Federal do Cear (UFC)

    Examinador Interno

    Profa. Dra. Liliane Cordeiro Barroso

    Banco do Nordeste do Brasil (BNB)

    Examinadora Externa

  • 4

    A Deus.

    minha me, Luciana.

  • 5

    AGRADECIMENTOS

    A Deus, pelo dom da vida, por minha sade de corpo e de mente.

    minha me, que foi o impulso to forte dessa caminhada, assim como meus irmos,

    sobrinhos e meu pai.

    Ao meu amado namorado, Marcos Kennedy, pelo incentivo nos momentos em que no

    me achei capaz.

    Ao meu orientador, Carlos Amrico Leite Moreira, por sua sensatez, sabedoria,

    tranquilidade e compreenso em suas orientaes, que foram essenciais para a construo de

    toda a estrutura ideolgica desta dissertao.

    Aos meus amigos da turma de mestrado, em especial Marcos Charles, Priscila, Carlos

    David, Romnia e Veriana pelas longas horas de estudo que gastamos juntos e pela pacincia

    que me dedicaram.

    Ao meu mdico Dr. Davi Queiroz, pelo carinho e cuidado no tratamento e por me

    ajudar a lidar com a ansiedade diante das dificuldades diria.

    Aos participantes da Banca examinadora, Joo Welliandre e Liliane Cordeiro, e tambm

    o Professor Joo Bsco, pelo tempo concedido nas suas valiosas colaboraes e sugestes em

    meu trabalho.

    A CAPES, pelo apoio financeiro com a manuteno da bolsa auxlio.

    E por todos os outros que direto e indiretamente contriburam no decorrer do meu

    mestrado com reflexes, crticas e sugestes que me foram to teis.

  • 6

    E ainda que [...] conhecesse todos os mistrios

    e toda a cincia e no tivesse caridade, eu nada

    seria.

    1 Cor 13,2.

  • 7

    RESUMO

    O desenvolvimento econmico do Brasil tem como um dos principais pilares as aes de

    Poltica Industrial que propulsionam investimentos em infraestrutura macrologstica e tornam o

    pas mais competitivo. A economia brasileira viveu um significativo crescimento no perodo do

    milagre econmico, nos fim dos anos 60 e com a implantao do II PND, em 1974. Porm,

    esta estratgia foi adotada a custo de um endividamento externo que inviabilizou sua

    continuao. Em 1980 a preocupao da economia brasileira com o ajustamento das contas

    nacionais e exteriores foi priorizado entrando em um perodo de fraco crescimento e de

    recesso nos investimentos em infraestrutura macrologstica, que se seguiu at o fim dos anos

    90, com as polticas de estabilizao. Entretanto, o estudo apresenta a retomada parcial dos

    investimentos pblicos a partir dos anos 2000 com a chegada do novo governo, atravs das

    aes de Poltica Industrial, como o Programa de Acelerao do Crescimento (PAC). Para tal, a

    metodologia de pesquisa utilizada qualitativa e descritiva. Neste sentido, a pesquisa conclui

    que estas inverses esto declinando e como forma de conter esta mudana o governo utiliza

    duas medidas: o sistema de concesses e a desvinculao dos investimentos em infraestrutura

    nacional do supervit primrio brasileiro. A economia chinesa como parmetro utilizado na

    pesquisa, surge para apresentar a estratgia de um pas que seguiu uma linha de polticas

    expansionistas com investimentos contnuos durante os ltimos cinqenta anos, resultando em

    um desenvolvimento econmico robusto.

    Palavras-chaves: Desenvolvimento econmico. Poltica Industrial. Investimentos.

    Infraestrutura.

  • 8

    ABSTRACT

    Brazil's economic development has as one of the main pillars of industrial policy actions that

    propel investment Macrologistic infrastructure and make the country more competitive. The

    Brazilian economy has seen significant growth in the period of "economic miracle" in the late

    '60s and the implementation of the Second National Development Plan in 1974. However, this

    strategy was adopted at the cost of an external debt which prevented its continuation. In 1980

    the concern of the Brazilian economy with the adjustment of domestic and overseas accounts

    was prioritized, entering a period of weak growth and recession in investments in Macrologistic

    infrastructure that followed until the end of the 90s, with the stabilization policies. However,

    the study presents the partial resumption of public investment from the 2000s with the arrival

    of the new government, through the actions of Industrial Policy, as the Growth Acceleration

    Program (PAC). To this end, the research methodology is qualitative and descriptive. In this

    sense, the research concludes that these investments are declining and in order to contain this

    change the government uses two measures: the system of concessions and the untying of

    investments in national infrastructure of Brazil's primary surplus. The Chinese economy as a

    parameter used in the research, appears to present the strategy of a country that has followed a

    line of expansionary policies with continuous investments during the last fifty years, resulting

    in a robust economic development.

    Keywords: Economic development . Industrial Policy. Investments. Infrastructure.

  • 9

    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 - O papel triplo da infraestrutura. ................................................................................. 33

    Figura 2 - Mapa da Ferrovia Transnordestina que atravessa os Estados do Cear, Piau e

    Pernambuco................................................................................................................................. 60

    ../../../../../../../Downloads/DISSERTAO%20VF4.doc#_Toc438473807../../../../../../../Downloads/DISSERTAO%20VF4.doc#_Toc438473808../../../../../../../Downloads/DISSERTAO%20VF4.doc#_Toc438473808

  • 10

    LISTA DE QUADROS

    Quadro 1 - Resumo comparativo entre a corrente de Smith e List. ........................................... 28

    Quadro 2 Taxa mdia do crescimento real do PIB (em %) ..................................................... 35

    Quadro 3 - Anlise percentual da dvida externa pelo devedor pblico e privado (US$ Milhes)

    ..................................................................................................................................................... 50

    Quadro 4 - Investimento direto estrangeiro no Brasil / 1991-00. ............................................... 53

    Quadro 5 - Contribuio da Formao Bruta de Capital Fixo no PIB (var.ref 2000) / 1991-00

    ..................................................................................................................................................... 53

    ../../../../../../../Downloads/DISSERTAO%20VF4.doc#_Toc438473829../../../../../../../Downloads/DISSERTAO%20VF4.doc#_Toc438473829

  • 11

    LISTA DE GRFICOS

    Grfico 1 - Taxa de crescimento do real do PIB e preos ao consumidor (%) ........................... 37

    Grfico 2 China: poupana domstica e investimento como % do PIB .................................. 41

    Grfico 3 - Dficit em transaes correntes do Brasil --- 1975-1985 (US$) .............................. 49

    Grfico 4 - Crescimento anual do PIB e do investimento ano 2000. .......................................... 57

    Grfico 5 Comparativo do valor pago R$ bilhes ................................................................ 58

    Grfico 6 Investimento Pblico em % PIB ............................................................................. 59

    Grfico 7 Percentual de investimentos por modo de transportes at 2015. ............................. 61

    ../../../../../../../Downloads/DISSERTAO%20VF4.doc#_Toc438473869../../../../../../../Downloads/DISSERTAO%20VF4.doc#_Toc438473870../../../../../../../Downloads/DISSERTAO%20VF4.doc#_Toc438473872../../../../../../../Downloads/DISSERTAO%20VF4.doc#_Toc438473873../../../../../../../Downloads/DISSERTAO%20VF4.doc#_Toc438473875

  • 12

    LISTA DE TABELAS

    Tabela 1 - Crescimento econmico comparado entre Brasil e China (% a.a.) ........................... 42

    Tabela 2 - Distribuio setorial do investimento (%) ................................................................. 45

  • 13

    SUMRIO

    1 INTRODUO ......................................................................................................................... 14

    1.1 Justificativa ............................................................................................................................. 15

    1.1 Problema da pesquisa ............................................................................................................ 16

    1.2 Objetivo Geral ........................................................................................................................ 17

    1.3 Objetivos especficos .............................................................................................................. 17

    1.4 Hipteses ................................................................................................................................. 17

    1.5 Metodologia de Pesquisa ....................................................................................................... 18

    1.6 Estrutura da dissertao ....................................................................................................... 19

    2 FUNDAMENTOS TERICOS DE POLTICA INDUSTRIAL .......................................... 21

    2.1. Reflexes sobre as ideias de List e Smith ............................................................................ 21

    2.2. A direo das linhas de poltica industrial .......................................................................... 29

    3 INVESTIMENTOS EM INFRAESTRUTURA MACROLOGSTICA COMO

    INSTRUMENTO DE POLTICA INDUSTRIAL .................................................................... 32

    3.1 Desenvolvimento via investimentos em infraestrutura macrologstica............................. 32

    3.2 O caso China ........................................................................................................................... 34

    3.2.1 Investimento em infraestrutura macrologstica como instrumento para o

    desenvolvimento industrial chins................................................................................................ 39

    4 O CASO BRASILEIRO ........................................................................................................... 42

    4.1 II PND: um salto na infraestrutura macrologstica brasileira .......................................... 44

    4.2 Anos 1980 e 1990: a crise da dvida, o plano de estabilizao econmica e a

    descontinuao dos investimentos por parte do Estado. .......................................................... 47

    4.2.1 A desacelerao dos investimentos nos anos 80 e 90 ......................................................... 49

    4.3 Anos 2000 e o novo impulso do Estado para os investimentos em infraestrutura

    macrologstica. .............................................................................................................................. 54

    4.3.1 A infraestrutura macrologstica brasileira ao alcance das Polticas Industriais .............. 56

    4.3.2 Novas iniciativas do governo brasileiro para incentivar a infraestrutura ......................... 62

    5 CONCLUSO ........................................................................................................................... 66

    REFERNCIAS ........................................................................................................................... 69

  • 14

    1 INTRODUO

    H mais de cem anos, o economista Friederich List apresentava sua teoria em um

    ambiente dominado pelas ideias liberais de Adam Smith. List defendia a interveno do Estado

    na economia, pois acreditava que a populao no era capaz de tomar decises de forma

    individual com o intuito de beneficiar toda a comunidade. Ao contrrio da teoria defendida por

    Smith, no consagrado e reconhecido livro A Riqueza das Naes.

    Os liberais acreditavam que os mercados, sem interveno direta do Estado, seriam

    capazes de ajustar seus desequilbrios atravs de variveis importantes como o preo, a oferta e

    a demanda. Porm, seus ideais apresentavam inconsistncias, pois estavam baseados apenas na

    economia da Inglaterra e, para List, a maioria dos pases tinham economias bem diversas que

    iam desde uma nao totalmente agrcola a uma com alto teor de tecnologia.

    Neste cenrio, o comrcio internacional entre naes de diferentes portes no trariam

    benefcios e nem desenvolvimento para as regies mais emergentes. O pas com maior poder

    econmico continuaria sua ascenso a custa dos mais pobres. Por isso, a estratgia de

    substituio de importaes com a imposio de tarifas para produtos estrangeiros foi

    importante e bastante defendida por List, devido a capacidade desta estratgia de estimular a

    produo e consumo interno de mercadorias, que antes eram importadas.

    Este estudo faz um aprofundamento sobre as principais ideias do economista Friedrich

    List em contradio com a teoria liberal. Pretende-se defender a utilizao de polticas

    industriais para o desenvolvimento econmico e industrial do pas tomando como base os

    investimentos em infraestrutura macrologstica, pois os investimentos em infraestrutura s so

    capazes de fortalecer a base produtiva das indstrias se as aes de poltica industrial estiverem

    atuando de forma eficiente na economia. Afinal, uma infraestrutura bem desenvolvida

    essencial para o amadurecimento das indstrias e atua como um pilar para manter a

    sustentabilidade e o bom funcionamento dos conglomerados brasileiros.

    Neste sentido, o trabalho apresenta a conjuntura econmica da China como um exemplo

    de nao que impulsionou gigantescas obras estruturais para manter as grandes indstrias que

    levaram o pas ao desenvolvimento econmico to esperado e a tornar-se um potencial

    exportador. Os chineses so os exemplos do funcionamento e interligao eficiente dos

    investimentos em infraestrutura macrologstica e poltica industrial.

    Cenrio este diferente da macroeconomia brasileira no mesmo perodo. O Brasil

    destacou-se nos anos de milagre econmico para em seguida apresentar uma conjuntura

  • 15

    desfavorvel aos investimentos nos anos que se seguiram. Um dos planos com maior teor

    significativo foi o II Plano Nacional Desenvolvimento (PND) que impulsionou as indstrias e

    deu nfase as obras de infraestrutura necessrias para o escoamento da produo,

    principalmente no que concerne ao setor logstico.

    No entanto, essas inverses, nos anos que seguiram, deixaram o pas a merc de uma

    grave dvida com o exterior que foi agravada com as oscilaes da economia americana. Neste

    sentido, o Brasil apresentou escassez de investimentos nos anos 80 e 90 do sculo XX, como

    ser apresentado atravs da anlise da formao bruta de capital fixo, retomando apenas nos

    anos 2000 com a chegada do governo Lula, que incentivou a recuperao do setor pblico na

    construo de obras estruturais e, mesmo assim, ainda no conseguiu equiparar-se com o

    perodo de milagre.

    Deste modo, o governo da presidenta Dilma Rousseff vem buscando uma nova

    retomada destes investimentos macrologsticos diante de uma crise fiscal e ausncia de

    recursos, atravs das concesses para a construo de novas obras e da estratgia de

    desvinculao dos mesmos investimentos, em especial do Programa de Acelerao do

    Crescimento (PAC), do supervit primrio.

    1.1 Justificativa

    A utilizao de polticas industriais nos pases desenvolvidos foi uma das estratgias

    essenciais para o aumento de competitividade e a conquista de uma economia forte. Este tipo

    de poltica tem sua base na estratgia protecionista de origem estatal, processo este que, para se

    tornar sustentvel, necessita de um grau de comprometimento elevado por parte da nao para

    expandir seu parque industrial e valorizar seu mercado interno.

    Alm dessas caractersticas, a poltica industrial necessita de cooperao e troca de

    informaes confiveis entre o governo, empresrios, trabalhadores e os prprios

    consumidores. Sua atuao se d por meio de aes estruturais e de carter setorial.

    As chamadas polticas industriais so polticas que no beneficiam a todos os setores da

    economia, mas estimulam os mais importantes segmentos atravs de investimentos acentuados,

    renncia fiscal, subsdios, entre outros, com o intuito de que os outros setores no beneficiados

    possam se desenvolver a partir destes.

  • 16

    O papel do governo diante deste cenrio construir os pilares de sustentao desta

    estratgia. No h como potencializar o parque industrial de um pas se no h a possibilidade

    do escoamento e distribuio dos produtos fabricados, energia necessria para bom

    funcionamento da produo e veculos adaptados para a circulao da grande quantidade de

    mercadorias com modais apropriados para o embarque e desembarque destes produtos. Neste

    sentido, os investimentos em infraestrutura macrologstica so essenciais para o

    desenvolvimento industrial do pas.

    Desta forma, a pesquisa se justifica para demonstrar a importncia das polticas

    industriais acopladas aos investimentos em infraestrutura macrologstica como condio para o

    desenvolvimento industrial da nao, apresentando o exemplo da China como promotor de um

    crescimento sobre uma base industrial slida e infraestrutura eficiente durante 40 anos

    consecutivos. Contrariamente ao cenrio brasileiro, que passou por perodos de grandes

    inverses, seguido de uma recesso significativa, impedindo o retorno de um novo milagre

    econmico. Assim, sero apresentadas as novas iniciativas do governo Lula e Dilma para

    promover estes investimentos que foram expressivos at o II PND e retomados de forma parcial

    nos anos 2000, como a desvinculao dos investimentos em infraestrutura do clculo do

    supervit primrio e estmulo a novas concesses.

    1.1 Problema da pesquisa

    A interveno do Estado na economia com o objetivo de promover o desenvolvimento

    econmico utiliza-se do protecionismo temporrio e seletivo como forma de amadurecer as

    indstrias locais. Estas aes na perspectiva de fortalecer as indstrias locais so medidas de

    poltica industrial, frequentemente utilizadas pelos pases desenvolvidos e subdesenvolvidos.

    As economias asiticas, em particular a China, so exemplos de pases que utilizaram de forma

    sistemtica estratgias de poltica industrial que incorporaram fortes investimentos em

    infraestrutura macrologstica. Em contrapartida, a consolidao da economia brasileira, a partir

    dos anos 90, de reformas neoliberais inviabilizou o desenvolvimento de aes de poltica

    industrial. Neste cenrio, ser que as iniciativas do governo visando incrementar os

    investimentos em macrologistica no Brasil vo ao sentido de fortalecer o padro exportador de

    base primria em detrimento do desenvolvimento industrial?

  • 17

    1.2 Objetivo Geral

    Refletir sobre o modelo econmico brasileiro, buscando evidncias da relao efetiva da

    infraestrutura macrologstica com as polticas industriais.

    1.3 Objetivos especficos

    Descrever as teorias de Friedrich List como contraponto aos argumentos de Adam Smith;

    Atualizar a teoria de Friedrich List atravs dos estudos de Ha-Joon Chang;

    Apresentar a efetividade da poltica industrial nos pases em que foi estabelecida com foco

    no desenvolvimento industrial;

    Demonstrar o caso chins como modelo de interveno governamental indutor do

    crescimento e do aumento de competitividade do pas;

    Discutir as perspectivas da poltica industrial no Brasil;

    Mostrar os investimentos em infraestrutura macrologstica como instrumento de polticas

    industriais e indutor do desenvolvimento econmico;

    1.4 Hipteses

    Partindo do pressuposto de que as hipteses so os possveis resultados que nos levaro

    a soluo do problema da pesquisa, tm-se as seguintes:

    1. Os investimentos em infraestrutura macrologstica como uma das aes de

    Poltica Industrial constituem-se em um pilar essencial para o desenvolvimento

    industrial e econmico.

    2. As polticas de estabilizao monetria dos anos 80 e 90 imobilizaram o Estado

    e inviabilizaram os investimentos em infraestrutura no Brasil. As iniciativas

    recentes em termos de investimento em infraestrutura no foram suficientes para

    viabilizar uma estratgia de longo prazo de desenvolvimento econmico.

  • 18

    1.5 Metodologia de Pesquisa

    Santos e Candeloro (2006) ensinam que a metodologia deve explicar, entre vrias

    conformidades, o tipo de pesquisa, o delineamento que ser utilizado e as variveis estudadas.

    No que concerne pesquisa cientfica, Andrade (1998) afirma que ela envolve procedimentos

    sistemticos, baseados no raciocnio lgico, que procuram encontrar solues para os

    problemas propostos, mediante o emprego de mtodos cientficos.

    Fonseca (2009, p. 21) destaca a importncia da pesquisa no mbito cientfico e

    importncia do conhecimento que nos traz quando afirma:

    A pesquisa uma atividade voltada para a soluo de problemas. Assim, ela parte de

    uma dvida, buscando uma resposta ou soluo, com o uso do mtodo cientfico [...]

    tambm uma forma de obteno de conhecimentos e descobertas acerca de um

    determinado assunto ou fato.

    Toda pesquisa tem sua caracterizao quanto ao tipo e demarcao. No que se refere ao

    tipo, sua classificao se restringe a ser de ordem quantitativa, qualitativa ou conter as duas

    abordagens. Quanto a sua demarcao, as principais so: descritiva, exploratria ou explicativa.

    Logo, neste contexto, esta dissertao tem caracterstica metodolgica qualitativa e descritiva.

    Isso se expressa por meio da definio destes dois conceitos na adequao da pesquisa

    elaborada. Para tanto, Fonseca (2009, p. 22) nos explica:

    A pesquisa descritiva [...] descreve uma realidade tal como esta se apresenta,

    conhecendo-a e interpretando-a por meio da observao, do registro e da anlise dos

    fatos ou fenmenos (variveis). Ela procura responder questes do tipo o que ocorre

    na vida social, poltica e econmica, sem, no entanto, interferir nessa realidade.

    Deste modo, ao se analisar bem a definio difundida por Fonseca, percebe-se que est

    alinhada forma de elaborao deste trabalho atravs da descrio das ideias defendidas por

    Friedric List estabelecendo relaes com os ideais de Adam Smith e incluindo um debate

    atualizado na teoria de Ha-Joon Chang e outros autores no menos importantes no que

    concerne ao protecionismo e desenvolvimento industrial, alm de caracterizar a dinmica dos

    investimentos em infraestrutura macrologstica realizados na China e no Brasil.

  • 19

    A elaborao desta pesquisa tambm traz em seus aspectos traos exclusivamente

    bibliogrficos que realizado durante os captulos, em especial no referencial terico, tratando

    do balano das economias chinesa e brasileira no que se refere ao Produto Interno Bruto (PIB),

    Formao Bruta de Capital Fixo (FBCF), taxa de investimentos, nvel de infraestrutura e

    inverses do setor pblico nas obras estruturais. Fonseca (2009, p. 21) nos explica que a

    pesquisa bibliogrfica no mera repetio do que j foi dito ou escrito sobre certo assunto,

    mas propicia o exame de um tema sob novo enfoque ou abordagem, chegando a concluses

    inovadoras.

    1.6 Estrutura da dissertao

    A dissertao est divida em quatro captulos, incluindo esta introduo que se refere ao

    primeiro captulo.

    O segundo captulo trata do Referencial Terico, no qual se encontra o embasamento

    das concepes investigadas. Ele contm a caracterizao das ideias do economista alemo

    Friedrich List, cuja teoria defende a interveno do Estado no somente como agente regulador,

    protetor da sociedade e mantenedor das obras estruturais como afirmava Adam Smith, mas

    como agente capaz de interferir na conjuntura para estimular o desenvolvimento econmico

    atravs de polticas protecionistas de cunho estatal. Este debate atualizado com Ha-Joon

    Chang, que apresenta a utilizao desta estratgia protecionista pelos pases desenvolvidos e o

    incentivo a utilizao deste modelo de desenvolvimento tambm nos pases perifricos para a

    criao de indstrias e seus pilares, estimulando o crescimento.

    O terceiro captulo apresenta atravs do cenrio chins a importncia do Estado como

    determinante no desenvolvimento atravs de Polticas Industriais que estimulam as indstrias e

    ao mesmo tempo cria as bases para o sustento desta poltica atravs de um forte investimento

    em infraestrutura macrologstica para escoar a matria-prima e os produtos manufaturados de

    forma gil e segura.

    O caso brasileiro tema do quarto captulo. A conjuntura econmica que favoreceu o

    perodo de milagre, a crise da dvida que afetou o pas nos anos 80 e a prioridade pelos planos

    de estabilizao monetria na dcada de 90 so apresentados para comprovar a recesso da

    economia que diminuiu drasticamente os grandes investimentos pblicos no Brasil. Alm disso,

    demonstrado a poltica industrial que retornou a partir de 2000 com a Poltica Industrial,

    Tecnolgica e de Comrcio Exterior (PITCE) e Plano de Desenvolvimento Produtivo (PDP)

  • 20

    atravs do novo governo e as estratgias para a continuao desses investimento em um quadro

    de poltica fiscal estremecida e ajustamento nas contas do Estado.

    Por fim, o captulo cinco apresenta as concluses retiradas a partir da discusso do

    trabalho e os resultados apurados, como a diviso das inverses pblicas com a iniciativa

    privada para suprir as necessidades de desenvolvimento da infraestrutura logstica do Brasil. E,

    o captulo seis encerra a pesquisa apresentando as principais referncias utilizadas.

  • 21

    2 FUNDAMENTOS TERICOS DE POLTICA INDUSTRIAL

    A poltica industrial como estratgia de desenvolvimento adotada nos pases

    globalizados tem obtido diferentes resultados. Essas diferenas se do a partir da conjuntura

    econmica estabelecida e do estgio de desenvolvimento econmico de cada regio.

    Em sua origem, a poltica industrial um dos instrumentos da Economia Poltica de

    cada pas. Para List (1986), um dos maiores defensores do protecionismo da indstria nascente,

    a Economia Poltica aquela qual cada nao, de forma individual, precisa obedecer com a

    inteno de progredir em suas condies econmicas.

    2.1 Reflexes sobre as ideias de List e Smith

    Grande crtico da teoria clssica liberal, List (1986) defendia a interveno do Estado na

    vida econmica da nao. Ao contrrio dos ideais de Adam Smith, em seu clssico A Riqueza

    das Naes, publicado em 1776, e seus seguidores como David Ricardo e Thomas Malthus, o

    economista alemo afirmava que o Estado no restringia a criatividade das pessoas, mas

    garantia as condies necessrias para que a criatividade e a liberdade de deciso sassem de

    seu estado potencial e se manifestassem na vida cotidiana, alm de promover o bem-estar

    coletivo e nacional.

    Esse autor, Adam Smith (1985a), tomando como base para seus estudos a Inglaterra do

    sculo XVIII, relata que o trabalho a nica fonte de riqueza de um pas e o progresso

    econmico motivado essencialmente pelos interesses pessoais dos indivduos. Smith (1985a,

    p. 152) afirmava que [...] as aes econmicas permitem alcanar o mximo de bem-estar para

    a humanidade sem qualquer recurso benevolncia ou caridade, mas deixando-se motivar

    apenas pelo amor-prprio (self-love) com que a Divindade dotou todos os homens.

    Alm disso, a presena do Estado garantiria apenas o direito educao, sade e

    segurana, sem interveno direta nos mercados. Os ideais Smithianos asseveravam que o

    Estado era um ser atuante, mas no poderia assumir a funo de tentar direcionar as decises

    dos indivduos sobre onde deveriam aplicar o seu capital.

    Segundo o sistema de liberdade natural, ao soberano cabem apenas trs deveres de

    grande relevncia, mas simples e de entendimento comum, como: proteger a sociedade

    contra a violncia e a invaso de pases estrangeiros, assegurar os indivduos contra a

  • 22

    injustia e opresso de outros membros da sociedade, implantando uma administrao

    judicial exata e, criar e manter obras pblicas que no seriam executadas pela sociedade,

    mesmo levando em conta sua importncia, se fossem deixadas na responsabilidade dos

    indivduos, como por exemplo, a educao e a infraestrutura (SMITH, 1985b, p.170)

    Desta forma, o economista clssico e pai do liberalismo econmico deixa claro sua

    defesa dos ideais liberais, laissez-faire (palavra de ordem do liberalismo econmico, que supe

    a mais absoluta liberdade de produo e comercializao das mercadorias) quando apresenta

    sua famosa expresso: No da benevolncia do aougueiro, do cervejeiro ou do padeiro que

    esperamos nosso jantar, mas da considerao que eles tm pelo seu prprio interesse (SMITH,

    1985a, p.74). Isto significa que o indivduo, buscando seus interesses pessoais, com uma

    condio mnima de justia, suas aes econmicas acabam levando o bem-estar para o pas,

    sem a necessidade da atuao concreta do Estado e sem a generosidade dos outros indivduos.

    como se uma mo invisvel guiasse os interesses individuais na direo mais favorvel aos

    interesses coletivos.

    Ele tambm defendia a inexistncia de privilgios nas atividades econmicas

    individuais, concedidas pelo Estado, como restries, concesses, subsdios, incentivos, entre

    outros.

    [...] uma vez eliminados inteiramente todos os sistemas, sejam eles preferenciais ou de

    restries, impe-se por si mesmo o sistema bvio e simples da liberdade natural.

    Deixa-se a cada qual, enquanto no violar as leis da justia, perfeita liberdade de ir em

    busca de seu prprio interesse, a seu prprio modo, e faa com que tanto seu trabalho

    como seu capital concorram com os de qualquer outra pessoa ou categoria de pessoas

    (SMITH, 1985b, p. 169).

    Vale destacar que no incio do sculo XIX muitos pases utilizaram de medidas

    protecionistas para fazer frente Inglaterra e somente em seguida aderiram ao liberalismo

    econmico de Smith, que estava baseado em: polticas industriais do laissez-faire internas;

    pequenas barreiras aos fluxos internacionais de bens, capital e trabalho; alm, da estabilidade

    macroeconmica nacional e externa, que era garantida pelo padro-ouro e o princpio do

    equilbrio oramentrio existente da poca. Esse sistema econmico liberal levou a um perodo

    de prosperidade considervel, sucumbindo em 1932, quando a Gr Bretanha, sua mais

    importante representante, reintroduziu tarifas alfandegrias (CHANG, 2004, p. 31).

    No entanto, com argumentos slidos, List (1986) coloca em questo os fundamentos do

    liberalismo econmico de Smith, sem receio, cujos escritos se tornaram dogma sagrado da

  • 23

    Economia Poltica, atravs da demonstrao de quatro problemas gerais que comprometem a

    base da estrutura liberal e as mais importantes concluses alcanadas.

    O primeiro problema est no mtodo de anlise utilizado, pois este se sustenta na

    experincia da Inglaterra e generaliza sua teoria a partir da anlise da circunstncia dos ingleses

    para as outras naes do mundo, esquecendo-se da diversidade de cultura, poltica, economia e

    sociedade entre os outros pases.

    O autor alemo supunha que os pases de todo o mundo apresentavam estados de

    desenvolvimento econmico bastante diferente. H pases com grandes parques industriais a

    pleno vapor, como a Inglaterra, e h outros ainda pouco industrializados. Neste cenrio de

    contrastes, se houver livre comrcio internacional entre estas duas naes com estgios de

    desenvolvimentos to distintos, a nao ainda em desenvolvimento continuar em situao de

    atraso econmico, pois no ter foras para competir com os produtos manufaturados vindos,

    por exemplo, da Inglaterra.

    A soluo para este cenrio, segundo o economista alemo List (1986), seria que para o

    comrcio conseguir operar de forma justa e natural, as naes menos favorecidas de

    industrializao deveriam alcanar o estado de cultura do pas desenvolvido, no contexto da

    poca, alcanar o nvel de tecnologia da Inglaterra. Esta poltica se daria na imposio de

    tarifas entrada de produtos manufaturados que forem importados para consumo interno com o

    intuito de estimular a criao de novas indstrias e produo de mercadorias similares de

    origem nacional, mesmo com menor qualidade e preo maior que os estrangeiros.

    Chang (2004, p.26) faz uma anlise contempornea do cenrio de List e afirma:

    Impedir que as naes em desenvolvimento adotem essas polticas constitui uma grave

    limitao sua capacidade de gerar desenvolvimento econmico.

    Segundo Chang (2009), no sculo XIX, os atuais pases do norte do globo que so

    considerados ricos tambm utilizaram de proteo e subsdios, ao mesmo tempo em que

    discriminavam investimentos estrangeiros. Para evitar o crescimento de possveis concorrentes,

    estes pases no recomendavam s naes em desenvolvimento as estratgias que lhes foram

    to teis, assim, agem como maus samaritanos, agentes neoliberais dos pases ricos que

    estimulam os pases em desenvolvimento e ao invs de ajudar criam barreiras ao progresso

    econmico, e esto chutando a escada que subiram para atingir o topo a fim de impedir que

    outros subam em seguida e estremeam a conquista dos seus monoplios.

    As ideias de Chang (2009) consolidam-se em cima das bases de List (1986), como

    segue:

  • 24

    Qualquer nao que, valendo-se de taxas protecionistas e restries navegao, tiver

    levado sua capacidade industrial e sua navegao a um grau de desenvolvimento que

    impea as outras de concorrerem livremente com ela no pode fazer coisa mais sbia do

    que chutar a escada pela qual ascendeu grandeza, pregar os benefcios do livre

    comrcio e declarar, em tom penitente, que at recentemente vinha trilhando o caminho

    errado, mas acaba de descobrir a grande verdade (LIST, 1885, p. 295).

    O segundo problema (e no menos importante nas idias dos clssicos) foi a verdadeira

    diferena entre riqueza e fora produtiva de riqueza, confundida por Smith (1985a). List (1986)

    afirma que estes economistas ortodoxos impuseram o ter e o possuir riqueza como os mais

    essenciais objetivos das polticas econmicas nacionais, sem notar que, mais importante que o

    ter e possuir riquezas o poder de controle sobre os meios de criar e aumentar a riqueza de

    forma contnua. Os clssicos queriam derrubar o sonho dos pases desindustrializados de ter

    uma nao mais desenvolvida, propondo que deixassem seus desejos de maturidade e

    crescimento econmico, realizados por eles mesmos, para usufrurem da evoluo do pas com

    parques industriais em pleno funcionamento. Ou seja, tornarem-se pases atrasados

    economicamente em prol do poderio alcanado pela maior potncia industrial existente.

    Ainda assim, estimulavam a especializao de cada pas atravs da teoria das vantagens

    comparativas do comrcio internacional, desenvolvida por David Ricardo, discpulo de Smith

    que criou a teoria das vantagens absolutas para permanecerem no monoplio industrial,

    enquanto os outros pases passariam a ser apenas meros fornecedores de matria-prima, sem

    incentivos para o desenvolvimento de suas indstrias.

    O terceiro problema diz respeito ao embarao na compreenso da diviso do trabalho.

    List (1986) afirma que Smith (1985a) no percebeu que o motivo principal do crescimento da

    produtividade do trabalho no exclusivamente a sua especializao, mas essencialmente o

    conjunto de caractersticas cooperativas do trabalho especializado, pois a separao do trabalho

    sem a cooperao entre os operrios pouco serviria para estimular a produo. Principalmente,

    no que se trata ao mbito do livre comrcio internacional, devido grande possibilidade de no

    haver sincronia entre a fabricao de produtos, at mesmo entre os setores complementares. Por

    isso, a nao deve deixar em segundo plano qualquer unio internacional e investir esforos no

    fortalecimento interno do sistema econmico.

    No quarto problema, o economista alemo rebate umas das teses primordiais de Adam

    Smith e seus discpulos clssicos, a ausncia de interveno do Estado no ajustamento da

    economia do pas. List (1986) considera o fato de que os indivduos podem sim tomar as

  • 25

    melhores decises para si, pois so racionais. No entanto, as pessoas de forma individual no

    so capazes de levar em conta as necessidades das geraes futuras e outras situaes que s

    podero ser alcanadas com a unio de toda a comunidade. Alm de este ser um papel essencial

    do Estado, ele tambm tem o dever de promover o bem-estar para toda a sociedade de uma

    determinada regio. Suas funes so nicas e insubstituveis:

    [...] o Estado no orienta os indivduos sobre como empregar suas foras produtivas e

    seu capital...; o Estado deixa a critrio de cada indivduo como e onde investir seu

    capital, ou que profisso deve abraar. Diz apenas: vantajoso para nossa nao que

    ns mesmos produzamos esses ou aqueles artigos; mas, j que pela livre concorrncia

    com pases estrangeiros jamais poderemos obter essa vantagem, impusemos restries a

    tal concorrncia, pois em nosso ponto de vista necessrio proporcionar queles nossos

    concidados que investem seu capital nesses novos setores da indstria e queles que

    consagram suas foras corporais intelectuais a isso, as necessrias garantias de que no

    perdero seu capital e no falharo sua vocao na vida... (LIST, 1986, p. 117-8).

    O estudioso alemo do sculo XIX contesta o pensamento clssico e, principalmente,

    defende o protecionismo como meio para o desenvolvimento das naes menos

    industrializadas. A presena de barreiras alfandegrias para a entrada de importados no pas

    deveria possuir duas caractersticas importantes: provisoriedade e seletividade. A primeira se d

    porque o protecionismo s seria necessrio at a produo se encontrar forte o suficiente para

    competir na livre concorrncia; e a segunda, porque no conveniente que todos os setores da

    economia sejam protegidos dessa forma, mas somente os mais importantes que tenham

    elevados capitais fixos e de giro, muita mo-de-obra, conhecimento tcnico e que fabriquem

    produtos de primeira necessidade. Desta forma, protegendo apenas alguns setores essenciais, os

    outros se desenvolveriam ao redor destes.

    O padro da teoria de List vai contra todo o arcabouo das ideias dos economistas

    clssicos defensores do livre comrcio e da no interveno do Estado na economia local. Ele

    considerado a viso paterna defensora da indstria nascente, ou seja, em face dos pases

    desenvolvidos, os mais atrasados no conseguem desenvolver novas indstrias sem a

    interveno do Estado, principalmente por meio de tarifas protecionistas (CHANG, 2004, p.

    14).

    List no estava errado, ao contrrio, suas consideraes sobre o livre mercado vieram a

    se concretizar anos mais tarde, em pases com economias sustentveis como Coria, China,

  • 26

    Japo e Estados Unidos, que alcanaram seu desenvolvimento impondo tarifas elevadas e

    subsdios extensivos. A prpria Inglaterra, segundo Chang (2009), to conhecida por ser a casa

    do livre comrcio, foi uma das naes mais protecionistas do mundo at converter-se a

    liberdade comercial no sculo XIX.

    A histria do protecionismo nos pases ricos da atualidade amplamente ignorada, e a

    origem imperialista da integrao global dos pases desenvolvidos hoje mencionada

    muito raramente. A ltima cortina a se fechar desse episdio isto , o abandono do

    livre comrcio pela Inglaterra tambm apresentada de forma distorcida. Raras vezes

    menciona-se que o que realmente fez a Inglaterra abandonar o livre comrcio foi o uso

    bem-sucedido do protecionismo por seus concorrentes (CHANG, 2009, p. 24-25).

    Aos Estados Unidos, enquanto colnia inglesa no era permitida a utilizao de tarifas

    para proteger suas indstrias nascentes. No entanto, em 1791, Alexander Hamilton, secretrio

    do Tesouro americano, lideraria o movimento que levaria os EUA a desenvolver suas indstrias

    atravs de tarifas protecionistas e investimentos em infraestrutura financeira e de transportes,

    como uma das principais aes. Desta forma, as tarifas elevaram-se de 5% para 12,5%. Em

    1812, com a Guerra Anglo-Americana, o Congresso dobrou para 25% e com o surgimento de

    novas indstrias em 1820 aumentou para 40%, estabelecendo-se o programa de Hamilton e

    levando um desenvolvimento acelerado ao setor industrial. Alm disso, entre 1920-1930 esta

    tarifa alcanou o valor de 48% e a economia mais protecionista do mundo do sculo XIX

    tambm era a de maior crescimento. Liberando seu comrcio apenas aps a Segunda Guerra

    Mundial (CHANG, 2009, p. 55).

    Cem anos mais tarde, por volta de 1960, a corrente dos economistas do sculo XVIII,

    como Smith e seus seguidores, ganharia uma nova cara, a chamada economia neoliberal que era

    uma verso atualizada da inicial. Com poucas modificaes, entre elas, a democracia poltica e

    formas de monoplios, atravs de patentes ou emisso de notas bancrias pelo banco central.

    A Coria do Sul, durante o seu perodo de milagre econmico, entre os anos 1960 e

    1980, para alguns economistas da corrente de ideias clssicas, seguiu a estratgia de

    desenvolvimento econmico neoliberal; porm, eles estavam errados. A Coria do Sul ajudou

    determinadas indstrias novas, selecionadas pelo governo com o apoio do setor privado atravs

    de proteo tarifria, subsdios, entre outros, at o amadurecimento destas empresas para

    suportarem a concorrncia internacional; o governo possua os bancos e direcionava os

    investimentos ao que era vital; se alguns estabelecimentos privados fossem mal gerenciados, o

  • 27

    governo os tomava, reestruturava-os e tinha o poder de vend-los; alm disso, o Estado tinha

    total controle sobre os recursos em moedas estrangeiras e os utilizava para a importao de

    mquinas essenciais e insumos industriais (CHANG, 2009).

    O pas asitico adotou a caracterstica de temporariedade do protecionismo de List, pois

    segundo Chang (2009), no era para sempre a proteo tarifria e os subsdios que defendiam

    as indstrias da concorrncia internacional, mas apenas por tempo suficiente at a absoro de

    novas tecnologias e alcance de capacidade organizacional moderna.

    Outras economias do Leste asitico tambm obtiveram sucesso utilizando os ideais de

    desenvolvimento defendidas por List. Por exemplo, Taiwan investiu em uma estratgia bem

    parecida com a da Coria do Sul, com exceo de ter sido mais malevel com os investimentos

    estrangeiros e ter utilizado empresas pblicas de forma mais abrangente. Cingapura aderiu ao

    livre comrcio e abriu o pas para investidores estrangeiros; no entanto, discordava claramente

    de outros aspectos neoliberais. Contudo, mesmo aceitando os capitais externos, usou de

    subsdios significativos para trazer corporaes transnacionais de indstrias com bases

    estratgicas para a regio, principalmente no que se refere aos investimentos do governo em

    infraestrutura para determinadas indstrias.

    Os chineses alavancaram suas indstrias atravs de tarifas elevadas. Eles impuseram

    limites para a entrada de dinheiro estrangeiro e exigia que as empresas originrias do exterior

    comprassem certa quantidade de matria-prima dos fornecedores da regio. J a ndia acelerou

    seu crescimento econmico a partir da dcada de 80 do sculo XX, sem utilizar a poltica de

    abertura comercial e, mesmo aps 1990, com a liberalizao do comrcio, suas tarifas sobre as

    manufaturas estiveram acima de 30%. Alm disso, ainda nos anos 80 desse mesmo sculo, o

    protecionismo utilizado em certos setores era em excesso. Hoje, os indianos ainda impem

    restries entrada de investimentos estrangeiros diretos e, em algumas ocasies, fazem

    exigncias dos locais de consumo (CHANG, 2009).

    Pases como Finlndia, Noruega, Itlia e ustria os quais eram retrgrados no final da

    Segunda Guerra Mundial e viram a necessidade de desenvolvimento industrial rpido

    [...] tiveram tarifas relativamente altas at a dcada de 1960 e recorreram ativamente s

    empresas pblicas para impulsionar suas indstrias (CHANG, 2009, p. 57-58).

    perceptvel atravs das declaraes contemporneas de Chang que boa parte dos

    pases hoje considerados ricos utilizaram polticas protecionistas como tarifas, subsdio e

  • 28

    restries ao comrcio internacional, para estimular suas indstrias nacionais, mesmo tendo

    perodo e durao, destas polticas, diferentes.

    Segundo Chang (2004, p. 212), as reformas polticas neoliberais foram incapazes de

    realizar a promessa de crescimento econmico. Ao contrrio, as desigualdades de renda

    elevaram-se e no houve a acelerao de crescimento esperada. Se comparada com as polticas

    intervencionistas de 1960-1980, o crescimento diminuiu significativamente nas ltimas duas

    dcadas, principalmente nos pases em desenvolvimento. Para Weisbrot et al (2000), em 116

    pases, desenvolvidos e subdesenvolvidos, entre 1960 e 1980, o PIB per capita cresceu no

    compasso de 3,1% a.a e entre 1980 e 2000, a taxa diminuiu para 1,4% a.a.

    Desta forma, pode-se perceber que as polticas, e prprias instituies, promovidas pelas

    naes desenvolvidas nos pases atrasados economicamente no conseguiram gerar o to

    prometido sonho de crescimento. Logo, permitir que as regies subdesenvolvidas adotem

    polticas adequadas ao ambiente que se encontram resultar em um crescimento mais rpido,

    como aconteceu entre os anos 60 e 70.

    Quadro 1 - Resumo comparativo entre a corrente de Smith e List.

    SMITH LIST

    Generalizao da experincia Inglesa para as

    outras naes.

    Estgios de desenvolvimento econmico

    diferentes entre os pases.

    O ter e o possuir riqueza como objetivo

    essencial da Poltica Econmica Nacional.

    Poder de controle sobre os meios de criar e

    aumentar a riqueza de forma contnua.

    O crescimento da produtividade do trabalho

    devido a sua especializao.

    A especializao sem cooperao pouco

    estimula a produo.

    Ausncia da interveno do Estado no

    ajustamento da economia do pas.

    O protecionismo desenvolvido com a

    autoridade do Estado como meio para o

    desenvolvimento industrial.

    Fonte: Elaborada pela autora.

  • 29

    2.2 A direo das linhas de poltica industrial

    A Economia Poltica usa como instrumento de desenvolvimento nacional vrias aes

    que, em alguns casos, so similares a de outros locais. Dentre elas, tem-se a Poltica industrial,

    estratgia de alavancagem das indstrias nacionais a fim de colaborar para o crescimento e

    progresso da economia e sociedade de determinado pas.

    Polticas industriais existem quando h interveno do Estado na economia e utiliza-se

    de estratgias protecionistas de cunho seletivo e por tempo determinado. Tudo isso com o

    objetivo de desenvolver as indstrias locais, elevar a competitividade industrial e,

    consequentemente, incentivar os investimentos em infraestrutura macrologstica para sustentar

    a base produtiva da regio.

    De acordo com Krugman (1989 apud CORONEL; AZEVEDO; CAMPOS, 2014), uma

    poltica industrial pode ser entendida como um empenho governamental para incentivar setores

    avaliados como importantes para o crescimento econmico do pas. Assim, ao escolher

    defender e estimular apenas alguns setores especficos, os governos esto direcionando suas

    aes a fim de encontrar uma boa estratgia de desenvolvimento. Deste modo, o intuito da

    poltica industrial promover o desenvolvimento de setores econmicos que so considerados

    importantes para a gerao de divisas, expanso das tecnologias e aumento de empregos,

    colaborando, desta forma, para o aumento da competitividade industrial.

    Para Kupfer (2003), a perspectiva cuja poltica industrial deve ser pensada a de que o

    desenvolvimento crescimento com mudana estrutural e, por isso, cabe a esta poltica acelerar

    os processos de transformao produtiva que o prprio mercado, de forma lenta, pode operar e

    implantar os processos, mas que este mesmo mercado incapaz de articular. Os exemplos

    internacionais nos mostram que todos os pases praticam polticas industriais que podem se

    diferenciar em termos da natureza e habilidades dos instrumentos utilizados, mas definem

    horizontes, elegem prioridades e coordenam os processos decisrios.

    De acordo com Campanrio e Silva (2004 apud FLEURY, 2009), poltica industrial a

    criao, a implantao, coordenao e controle estratgico de instrumentos direcionados a

    aumentar a capacidade de produo e comrcio da indstria, com o intuito de garantir

    condies concorrenciais sustentveis nos mercados internos e estrangeiros. Os autores

    continuam suas ideias afirmando que estas polticas tm como objeto intervir nas atividades

    econmicas especficas de cada setor - por exemplo, automobilstica, siderurgia, txtil,

  • 30

    calados, telecomunicaes, eletrnico, qumico, entre outros, e em reas que afetam

    diretamente a competitividade, como incentivos fiscais e financeiros, qualidade de produtos e

    de processos, infraestrutura tecnolgica, suprimento energtico e de transportes, meio ambiente

    e gerao de emprego.

    As ideias defendidas pela Poltica Industrial nem sempre receberam esse nome. Suas

    aes foram implantadas h muitos anos em muitos pases, entre eles a prpria Inglaterra, que

    utilizou do protecionismo para defender suas manufaturas a partir do sculo XVI e s parou no

    sculo XIX quando sua liderana era bastante reconhecida (CHANG, 2009).

    A partir do conceito de poltica industrial pode-se perceber que as ideias defendidas por

    List (1986) sobrevivem at hoje. A interveno do Estado na economia para promover o bem-

    estar nacional e o uso do protecionismo temporrio e seletivo para o amadurecimento das

    indstrias locais so aes de poltica industrial utilizadas nos pases j desenvolvidos e nos

    pases em desenvolvimento.

    Os pases asiticos como Coria do Sul, China, ndia e Taiwan so casos reais e

    recentes de sucesso da poltica industrial. Segundo Bora et al (2000), as naes asiticas

    utilizaram polticas industriais com as seguintes aes: restrio s importaes; investimentos

    em setores estratgicos como capital humano, infraestrutura e logstica; crditos, subsdios e

    juros baixos para o setor industrial; criao de corporaes que controlariam empresas dos mais

    diversos ramos e responsabilidade macroeconmica.

    No incio do sculo XIX, segundo Chang (2002), o Japo comeou a estabelecer uma

    estratgia maior de desenvolvimento industrial e a proteo tarifria foi um elemento essencial.

    O progresso significativo deste pequeno pas asitico no ps-guerra com o lanamento de

    diversas inovaes nos prprios instrumentos de polticas de inovao, cincia e tecnologia

    demonstra que a capacidade de usar mais ferramentas de cunho poltico pode tornar a

    interveno estatal mais eficaz.

    Alguns estudiosos defendem direes opostas na composio e atuao das polticas

    industriais. Autores neoclssicos so totalmente contra essas estratgias de desenvolvimento,

    pois de acordo com seus argumentos, poucos so os setores beneficiados com os incentivos (e

    os so por presses polticas e institucionais) e, ao optar por medidas para proteger

    determinados conglomerados, o governo deixa de incentivar o progresso de reas importantes

    da economia, em detrimento do progresso econmico e social do pas. Alm disso, devido a

    dificuldade de se separar o que pblico do que privado, em pases como o Brasil, o uso

  • 31

    dessas polticas contribuem para o aumento da corrupo, vcios pblicos, socializao dos

    prejuzos e benefcios privados ( CORONEL; AZEVEDO; CAMPOS, 2014).

    Estes argumentos, utilizados por defensores da economia neoclssica, so chamados de

    polticas horizontais, pois no apoiam o fato de s determinados setores receberem incentivos.

    O contrrio das polticas industriais verticais, nas quais so escolhidas atividades econmicas

    especficas para serem beneficiadas. Para os neoclssicos, o mais importante o governo

    oferecer uma economia com infraestrutura e fundamentos macroeconmicos fortes e estveis,

    tais como, segundo Ferreira e Hamdan (2003): poltica fiscal austera; controle de inflao;

    incentivo poupana; estabilidade econmica e poltica; defesa do direito propriedade;

    sistema judicirio eficiente; reduo dos custos de logstica; educao e qualificao de mo de

    obra; programas visando medir a qualidade e a competitividade do setor industrial; regulao

    das concesses de servios pblicos e investimento em capital humano. Assim, somente deste

    modo poder promover a competitividade das indstrias nacionais.

    As primeiras aes que tinham como objetivo defender a indstria nacional brasileira

    ocorreram no governo de Getlio Vargas, presidente do Brasil na dcada de 30, com a poltica

    de substituio de importaes. Em seguida, Juscelino Kubitschek, presidente brasileiro entre

    os anos de 1956 e 1961, promoveu o desenvolvimento do setor industrial, principalmente as

    indstrias de bens de consumo durveis. A terceira tentativa de poltica industrial no Brasil foi

    com Ernesto Geisel, que assumiu o governo do pas entre os anos de 1974 e 1979, com o II

    Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND). Nos anos seguintes estas polticas no foram

    priorizadas at 2002, quando Luiz Incio Lula da Silva chegou ao governo. Este, a fim de

    fomentar a industrial local, lanou, em 2004, a Poltica Industrial, Tecnolgica e de Comrcio

    Exterior (PITCE); em 2008, a Poltica de Desenvolvimento Produtivo (PDP) e, em 2011, o

    Plano Brasil Maior (CORONEL; AZEVEDO; CAMPOS, 2014). Vale ressaltar que as polticas

    de desenvolvimento da indstria local brasileira e as suas bases atravs dos investimentos em

    infraestrutura macrologstica sero discutidas nos prximos captulos de forma mais especfica.

  • 32

    3 INVESTIMENTOS EM INFRAESTRUTURA MACROLOGSTICA COMO

    INSTRUMENTO DE POLTICA INDUSTRIAL

    A importncia do Estado como interventor na economia essencial para o

    desenvolvimento do pas. Friederich List apresentava argumentos a favor da influncia do

    governo para o progresso de determinadas naes que esto vivas e foram comprovadas com

    exemplos reais de pases que cresceram e se desenvolveram por conta do estmulo do Estado

    em determinadas indstrias relevantes para a regio.

    possvel observar que no processo de desenvolvimento econmico dos pases

    emergentes e at mesmo dos desenvolvidos o Estado esteve presente na determinao das

    prprias estratgias de desenvolvimento, dentre elas a criao de poltica industrial vertical:

    estimulando o investimento em infraestrutura macrologstica para dar o sustento no progresso

    das indstrias que precisam escoar seus produtos de forma gil e com segurana.

    3.1 Desenvolvimento via investimentos em infraestrutura macrologstica

    Segundo Bruno e Silva (2009), o conceito de infraestrutura se refere ao sistema de

    servios coletivos de uma regio ou pas, tais como os sistemas de transporte, telecomunicaes

    e de saneamento bsico. O desenvolvimento econmico de um pas no pode ser explorado sem

    a anlise de sua infraestrutura logstica, visto que ela funciona como uma das bases principais

    para o alicerce da nao, pois proporciona o desenvolvimento de outras atividades e sistemas.

    Ainda para Bruno e Silva (2009), os sistemas de transporte, tais como o rodovirio,

    hidrovirio, areo e porturio, so exemplos de componentes fundamentais da infraestrutura

    econmica porque permitem a articulao entre as regies produtoras e consumidoras dos bens

    e servios disponveis em um pas. Logo, se no h uma infraestrutura de transporte

    suficientemente desenvolvida, a economia ter sua taxa de crescimento limitada, pois um

    sistema deficiente de transporte torna-se um gargalo na estrutura da economia. Assim, tm-se

    as rodovias, usinas hidreltricas, portos, aeroportos, rodovirias, sistemas de telecomunicaes,

    ferrovias, rede de distribuio de gua e tratamento de esgoto, sistemas de transmisso de

    energia, entre outros, atuando como elementos essenciais para o funcionamento adequado das

    ofertas e demandas.

    H uma srie de projetos em infraestrutura pelo Brasil, como o Programa de Acelerao

    do Crescimento, Olmpiadas 2016, Transnordestina, entre outros que sero vistos no captulo

  • 33

    quatro, que esto em andamento e podero transformar a economia atravs da competitividade,

    melhor distribuio de renda e aumento na capacidade de crescimento com menor inflao.

    Para Pinto et al (2010), no Brasil, a organizao dos setores de infraestrutura possuem

    trs papeis que colaboram para o desenvolvimento do pas. So eles: o macroeconmico, o

    microeconmico e o espacial, como apresenta a Figura 1.

    Fonte: Pinto et al (p. 7, 2010)

    No que se refere dimenso macroeconmica, possvel afirmar que existe uma

    relao de complementariedade entre o investimento em infraestrutura e o investimento total,

    dados os requisitos necessrios de instalao e servios de infraestrutura para um bom

    funcionamento das atividades econmicas. Ento, a partir dessa relao pode-se instituir um

    valor mximo para o crescimento em longo prazo da taxa de investimento em infraestrutura.

    Deve-se destacar que a economia pode tambm crescer condicionada a outros limites sem que o

    valor mximo estabelecido pelo estoque de capital em infraestrutura chegue a ser totalmente

    alcanado. No entanto, quanto menor for o tamanho do investimento neste setor, maiores sero

    as chances de que ele se transforme em um dos principais fatores limitantes do crescimento

    econmico. Neste sentido, tem-se que o primeiro papel dos investimentos em infraestrutura

    extinguir qualquer eventual valor mximo para o crescimento econmico (PINTO et al, 2010).

    Pelo enfoque microeconmico, a disponibilidade e a qualidade da infraestrutura

    brasileira resultam em externalidades positivas para os outros setores da economia. Ao

    contrrio, uma infraestrutura problemtica gera custos de produo mais elevados, pressiona o

    Infraestrutura

    Macroeconmico

    Espacial Microeconmico

    Figura 1 - O papel triplo da infraestrutura.

    Macroeconmico

  • 34

    aumento da inflao e o custo de vida, alm de reduzir a competitividade da economia

    medida que os produtos importados e exportados vo ficando mais caros.

    J no que concerne ao papel espacial e territorial, a difuso da infraestrutura uma

    condio para o desenvolvimento regional e local. As indstrias de infraestrutura levam a uma

    transformao territorial que requer decises estratgicas e polticas para que continue a se

    expandir. No entanto, deve-se salientar que, estando construda em determinado local, no

    haver possibilidade de mudana. E, por isso, necessrio considerar os seus efeitos para o

    meio ambiente e toda a sociedade local.

    3.2 O caso China

    O crescimento do Brasil muito pequeno se comparada com o crescimento de pases

    com poder econmico parecido com o brasileiro. A China um grande exemplo de nao que

    investiu em infraestrutura para dar base ao desenvolvimento industrial atravs de polticas

    industriais que tiveram como objetivo alavancar a economia chinesa e torn-la a grande

    potncia de hoje.

    Segundo Marques (2009), ... a economia do drago asitico avanou a taxas acima de

    dois dgitos durante boa parte dos ltimos 30 anos. Nenhum outro pas apresentou vigor

    semelhante nesse perodo.

    No constitui nenhuma novidade o fabuloso desempenho econmico da China desde as

    reformas iniciadas por Deng Xiaoping em 1978. Neste perodo, o PIB apresentou um

    crescimento real mdio anual de 10% que se compara com uma taxa de 3,7% para o

    perodo 1960-1977 , ao mesmo tempo em que a inflao, na mdia, foi de 6% ao ano

    (NONNENBERG, 2010).

    O quadro 2 apresenta o alto crescimento da China a partir de 1955 at 2007. A anlise

    consolida o crescimento significativo do PIB do pas instigado pelo crescimento induzido

    atravs do investimento nas indstrias e setores secundrios, alm da abertura da economia ao

    mercado internacional que fez com que a concorrncia melhorasse os processos produtivos do

    pas e seus produtos para fazer paridade com os produtos estrangeiros. Esse potencial de

    crescimento, se comparado aos pases asiticos, no primeiro perodo 1955-77 est abaixo das

    economias de Taiwan, Hong-Kong, Cingapura e Japo, com 9,4%, 8% e 7,7%,

  • 35

    respectivamente. No segundo perodo, 1978-07, o drago chins deixa para trs o Japo com

    2,4% apenas e na comparao da soma total dos anos 1955-07, a China perde apenas para

    Cingapura com 0,1% de percentual de diferena (NONNENBERG, 2010).

    Quadro 2 Taxa mdia do crescimento real do PIB (em %)

    Pas 1955-1977 1978-2007 1951-2007

    China 4,8 9,7 7,3

    Fonte: Nonnenberg, 2010.

    A Repblica Popular da China um dos maiores pases do mundo em rea territorial.

    Segundo Mendona (2009), a China manteve a maior renda per capita do mundo at o sculo

    XV, mas foi superada pela Europa. Contudo, quatro sculos depois se mostrava uma nao

    economicamente pobre, atrasada e bastante instvel do ponto de vista poltico, de acordo com

    Lyrio (2010).

    No entanto, mesmo dona de uma industrializao tardia, a Revoluo Comunista de

    1949 trouxe, com a chegada de Mao Ts-Tung ao poder, um processo de industrializao

    bastante forte. Sob o comando deste governante (1949-1976), a China deixou para trs mais de

    um sculo de atraso econmico, por meio do fortalecimento das indstrias como um dos fatores

    essenciais.

    Segundo Ouriques e Andrade (2010), ainda no ciclo de Mao, o controle da economia foi

    centralizado com empresas estatizadas e a criao de planos quinquenais, que eram as diretrizes

    estratgicas do pas. Reformas importantes foram realizadas, dentre elas a alocao do

    excedente agrcola para o fortalecimento da indstria, principalmente a siderrgica.

    As aes destes planos comearam com a organizao da economia iniciando pelo

    campo, com uma reforma agrria radical para eliminar os grandes proprietrios e organizar os

    camponeses em comunas (OURIQUES; ANDRADE, 2010). Mao acreditava que as bases para

    uma industrializao eficiente deveriam partir do campo.

    O governo de Mao incentivou a indstria pesada chinesa por meio de grandes

    investimentos e utilizou das estratgias de substituio de importaes para desenvolver e

    proteger as manufaturas nacionais. Sob a liderana Mao Ts-Tung, a China tinha toda sua

    produo industrial controlada pelo Estado, assim como os preos e a distribuio dos recursos.

  • 36

    Alm disso, a entrada de capital estrangeiro e a formao de empresas privadas eram proibidas.

    A inteno do governo era tornar a Repblica chinesa uma economia autossuficiente.

    No somente o governo de Mao Ts-Tung estimulou o crescimento chins, mas tambm

    criou os pilares para o sucesso das reformas econmicas posteriores realizadas pelo novo

    governo, Deng Xiaoping (1978-1992).

    As iniciativas de Mao-TseTung [...] prepararam o terreno para um novo tempo, o de Deng

    Xiaoping, O lder assumiu o comando da Repblica Popular em 1979 e adotou a chamada

    proposta das quatro modernizaes. O programa estava focado nos setores agrcola,

    industrial, cientfico e tecnolgico e serviria para preparar a poltica de portas abertas,

    com a entrada da China no mundo capitalista (MARQUES, 2009, p. 50).

    No perodo de Xiaoping, as reformas econmicas e polticas adotadas foram

    direcionadas para a abertura do comrcio externo, que fez com que o pas atrasse grandes

    investidores estrangeiros. De acordo com Morrison (2015), a liberalizao do comrcio foi um

    dos requisitos principais para o sucesso econmico chins. A ausncia de barreiras comerciais

    levou um incentivo maior para a concorrncia e trouxe investimentos diretos do exterior.

    Em sntese, a estratgia de desenvolvimento da China, a partir de 1978, se baseou na

    reforma do modo de utilizao da terra, na promoo e expanso das exportaes,

    proteo do mercado interno, estmulo ao investimento estrangeiro, formao de joint

    ventures (grandes empresas estatais), e na indstria pesada sob o controle do

    planejamento central, na transio de um planejamento misto de preo, controlados pelo

    mercado (SULEIMAN, 2008, p.14).

    Adotando esta estratgia e com uma indstria em fase de crescimento em uma agenda

    de prioridades do governo, a partir do grfico 1 at 1994 o comportamento da economia

    chinesa foi marcada por ciclos, com oscilaes no PIB e na inflao. O crescimento do PIB

    caiu cerca de 12% em 1978 para 5% em 1981, para atingir 15% em 1984, retrocedendo para

    cerca de 4% entre 1989 e 1990. E a partir de 1991 as taxas aproximam-se cada vez mais da

    mdia de 10%.

  • 37

    Fonte: Nonnenberg, 2010.

    Para consolidar as melhorias, principalmente no mbito de infraestrutura e comrcio

    internacional, de acordo com Marques (2009), no governo de Xiaoping foram criadas as Zonas

    Econmicas Especiais (ZEEs) em 14 cidades do litoral do Oceano ndico para o setor

    industrial. A escolha da localizao facilitava o escoamento das mercadorias e a proposta atraia

    empresas para a regio. Assim, foram realizados investimentos em infraestrutura de portos,

    rodovias e aeroportos para sustentar esta estratgia, que deu certo. Os investimentos

    estrangeiros passaram de US$ 80 mil em 1979 para US$ 12, 1 bilhes em 1984, ano este em

    que a China registrou seu maior PIB.

    Marques (2009, p. 52) ainda continua:

    Com esse fluxo de recursos financeiros, o Estado sustentou a industrializao sem fazer

    dvida e imps condies s multinacionais que ingressassem no pas. Exigia que o

    capital estrangeiro se associasse a alguma empresa nacional, estatal ou coletiva para

    absorvem novas tecnologias. Outro requisito era a garantia de que toda a produo fosse

    voltada para o mercado externo, o que levou o Estado a praticar abertura e protecionismo.

    Jabbour (2006, p.219) explica sobre as estratgias das ZEES:

    Grfico 1 - Taxa de crescimento do real do PIB e preos ao consumidor (%)

  • 38

    As Zonas de Processamento de Exportaes (ZPEs) coreanas e japonesas foram a

    inspirao para a instalao em territrio chins das Zonas Econmicas Especiais

    (ZEEs) como plataforma de exportao, processamento de tecnologia externa e

    tambm verdadeiros laboratrios econmicos e sociais, nos quais as tcnicas e

    habilitaes capitalistas pudessem ser observadas e assimiladas. [...] as ZEEs deveriam

    ser o entrelaamento do territrio chins ao chamado mundo chins do sudeste asitico,

    mundo chins este com acmulos de bilhes de dlares e dotado de tcnicas de

    gerenciamento de produo de ponta no mundo.

    Logo, diante desta poltica, o Estado chins com sua atuao direta nos ltimos anos

    tornou o pas uma gigantesca economia e um dos maiores produtores mundiais. Elaborou uma

    significativa poltica industrial com grande atrao de investimentos, modernizou sua

    infraestrutura e manteve baixo o custo de produo, resultando em um substancial

    desenvolvimento industrial. Enquanto o Brasil, no mesmo perodo, deixava as polticas de

    investimento em segundo plano para focar nos planos de estabilizao que tinham natureza

    recessiva e destruam a capacidade de investimento do Estado.

    De acordo com Medeiros (2010), a China possui um sistema de planejamento prximo

    ao existente em diversas economias capitalistas; porm, com duas particularidades: de um lado,

    maior o peso das empresas e bancos estatais como operadores diretos do planejamento do

    Governo sobre atividades estratgicas; de outro, h uma autonomia muito grande dos governos

    subnacionais (que tambm possuem empresas pblicas) sobre as decises de investimentos.

    A expanso recente da China vem sendo impulsionada pelos investimentos em

    infraestrutura, em particular em autoestradas, e construo residencial, associados ao seu

    processo de urbanizao. Pois, de acordo com Jabbour (2006), o aumento em seu nvel de

    acumulao produtiva exigiu do pas investimentos em infraestrutura de energia e transporte

    para evitar estrangulamentos na cadeia de produo e consequentemente solucionava a

    necessidade de unificao de um territrio econmico com 9 milhes de km e um mercado de

    aproximadamente 700 milhes de habitantes. O resultado destas aes aumentava o mercado de

    consumo interno e reduzia as desigualdades regionais no pas.

  • 39

    3.2.1 Investimento em infraestrutura macrologstica como instrumento para o

    desenvolvimento industrial chins.

    Uma das interpretaes do modelo recente de crescimento na China, de acordo com Lo

    e Guicai (2006), de que a principal mquina foi o investimento interno; em particular, os

    investimentos nos setores intensivos em capital. Este crescimento, liderado pelos

    investimentos, teria sido iniciado nos anos 90 e seria, em parte, uma consequncia das

    prioridades estabelecidas pelo prprio governo com a concentrao espacial dos investimentos

    nas reas urbanas e zonas especiais e pela marginalizao da agricultura e do interior. Tal

    estratgia teria gerado grande concentrao de renda e desacelerao no crescimento do

    consumo das famlias, induzindo um crescimento desproporcional da indstria pesada com

    grande impacto na relao capital-produto.

    A substituio de importaes em bens intermedirios e elevao da capacidade

    produtiva na indstria pesada afirmou-se como uma base essencial do crescimento

    recente chins como defendem os autores que enfatizam o investimento como mquina

    de crescimento da China (MEDEIROS, 2010, p. 9).

    O Estado Chins, nos dois primeiros ciclos realizados entre o Oitavo (1991-1995) e

    Nono (1996-2001) Planos Quinquenais, consolidou inicialmente as bases da industrializao do

    pas para estimular setores dinmicos e gerar condies estruturais e microeconmicas para o

    desenvolvimento competitivo dessas indstrias. No primeiro ciclo, as aes possuram forte

    participao do Estado, que passou a ser decisivo na alocao dos recursos, sendo responsvel

    pelo provimento de infraestrutura, fornecimento de energia e matrias-primas (MANSIERO;

    COELHO, 2014).

    Com um pas de imensa capacidade territorial, a infraestrutura chinesa era um obstculo

    significativo para o desenvolvimento. Neste sentido, investir neste setor era crucial e estava nos

    planos do governo, para criar condies favorveis ao sustento das indstrias e escoamento da

    produo. Logo, foram construdas estradas para melhorar a eficincia nos transportes de

    mercadorias, portos foram modernizados e novos aeroportos surgiram.

    A China tambm est tentando construir um sistema de rodovias interestaduais mais

    extensas do que a Amrica em apenas 15 anos, enquanto praticamente todas as grandes

    cidades esto construindo ou acabando de concluir um novo grande aeroporto. Na

  • 40

    ltima contagem, a China tinha mais de quinze mil projetos rodovirios em obras, que

    adicionaro 162 mil km de estrada para o pas, o suficiente para circular o planeta no

    Equador cinco vezes. Este feito muito maior do que aquele que os Estados Unidos

    empreenderam durantes os anos 50 e 60 na construo de um sistema de rodovia

    interestadual, e possui potencial para absorver os excedentes de capital e trabalho pelos

    prximos anos. Ele tambm acarreta altos riscos, uma vez que se os investimentos no

    retornarem para eles o valor no devido tempo, ento a crise fiscal do estado vai

    acontecer rapidamente (HARVEY, 2007, p. 132).

    No perodo Xiaoping, sobre um regime autoritrio do Estado, o governo decidiu que

    durante cinco anos, um quarto do oramento do pas seria destinado, exclusivamente, ao setor

    de transportes, o que gerou vrios benefcios para um melhor funcionamento das atividades

    logsticas. Neste sentido, salienta Marques (2009), a pavimentao das estradas passou de 890

    mil km para 1,8 milho km entre o final dos anos 70 e comeo do sculo XXI. Hoje, os

    aeroportos da China somam mais de 80 com capacidade para avies de porte grande e um

    pouco mais da metade da carga transportada vai por gua, atravs dos oito mil atracadouros dos

    portos fluviais.

    A construo de infraestrutura suficiente para sustentar a indstria pesada chinesa foi

    elaborada com um planejamento equilibrado desde os anos 90, atravs de importaes de

    equipamentos e implantaes recentes de indstrias mecnicas de ponta e join-ventures com

    multinacionais do setor, como Siemens, Alston, GE, entre outras. Assim, na medida em que

    nasciam polos regionais industriais, a necessidade de articulao entre transportes e

    suprimentos energticos era essencial (MAMIGONIAN, 2006 apud JABBOUR, 2006).

    A forte economia que a China alcanou ao longo desses anos indica a importncia

    fundamental da sua indstria. Seus indicadores econmicos, que tomam como base o PIB,

    constatam o privilgio ocupado pela indstria na participao do crescimento do pas, segundo

    Mansiero e Coelho (2014).

    Este resultado chins no foi alcanado facilmente, mas dependeu de um planejamento

    industrial bem especfico, orientado e conduzido pelo Estado com o objetivo de desenvolver o

    pas, gerando mais emprego e renda para a populao.

    [...] a existncia de um planejamento industrial especfico, formulado, orientado e

    liderado pelo Estado no mbito de uma estratgia nacional de desenvolvimento do pas

    [...] encontra seu respaldo histrico-institucional a partir das reformas de 1978

    momento em que a indstria chinesa iniciou sua reorganizao e estratgia de

  • 41

    desenvolvimento, tendo seu momento mais evidente e contundente em 1989, quando o

    Estado chins assumiu institucionalmente a importncia da indstria no crescimento do

    pas e deliberadamente optou pela realizao de polticas especficas, com seu Conselho

    de Estado emitindo as diretrizes para uma poltica industrial em seus Oitavo e Nono

    Planos Quinquenais. (MANSIERO; COELHO, 2014).

    Assim, a partir deste cenrio, percebe-se a importncia do Estado chins no

    desenvolvimento do pas atravs do estmulo a indstria, que acelera a competitividade, gera

    mais empregos e renda para populao e o fortalecimento dos pilares de sua estrutura

    produtiva, como os intensos investimentos em infraestrutura macrologstica, como afirma

    Investimentos (2015) entre 2003 e 2013, a China investiu 8,5% e a infraestrutura representou

    20% do PIB chins. A China prova viva das ideias defendidas por List (1987) sobre o papel

    do Estado na sociedade.

    O grfico 2 apresenta a participao da poupana e do investimento sobre o PIB, sendo

    possvel perceber trs perodos, no qual o primeiro vai de 1978 a 1992, com ambos os valores

    oscilando entre valores pouco superiores a 35% do PIB. No segundo, de 1993 a 2000, os

    valores se elevam pouco acima de 40% para diminuir nos anos seguintes, mas mantendo o

    equilbrio e a partir de 2001, ambas as taxas aumentam aceleradamente, porm se distanciando

    cada vez mais, com a poupana atingindo impressionantes 54% em 2007, ao passo que os

    investimentos estacionam em torno de 43%, ainda assim uma cifra muito elevada.

    Fonte: Nonnenberg, 2010.

    Grfico 2 China: poupana domstica e investimento como % do PIB

  • 42

    4 O CASO BRASILEIRO

    Ao se examinar o cenrio da economia brasileira nos ltimos 40 anos, percebe-se que o

    Brasil tambm recebeu intensas parcelas de investimento em infraestrutura macrologstica para

    manter os pilares da sua estrutura de produo. No entanto, esses investimentos no foram

    suficientes para acelerar e tornar significativo o crescimento brasileiro nos anos subseqentes e

    incentivar a sua produtividade, como aconteceu na China, onde o Estado intensificou, sem

    paradas, os investimentos durantes as ltimas dcadas.

    A tabela 1 mostra a diferena em porcentagem de crescimento dos dois pases no

    mesmo perodo. Isto se evidencia porque os alicerces econmicos chineses e brasileiros eram

    bem diversos. De acordo com Carneiro (2002), a alta dinamicidade no perodo da moderna

    industrializao, entre as dcadas de 1930 e 1980, possibilitou ao Brasil alcanar taxas mdias

    de 6% a.a.

    Tabela 1 - Crescimento econmico comparado entre Brasil e China (% a.a.)

    Pas/Ano 1929/1980 1980/2000

    Brasil 6,0 2,3

    China 3,0 9,7

    Fonte: Adaptado de Carneiro (2002, p.30)

    No perodo entre os anos 1960-70, a economia brasileira no possua nenhum escudo

    significativo contra ataques especulativos, ao contrrio da China. Segundo Marques (2009, p.

    20), Na China, essa questo parece equacionada pelas reservas acima de U$ 2,1 trilhes,

    resultado do aumento gradativo das exportaes. A ausncia de proteo, baixas reservas,

    contras oscilaes do mercado foi um dos gargalos que impediu o crescimento do Brasil nos

    anos que seguiram e a presena de reservas internacionais fortaleceu a economia chinesa.

    Marques (2009, p.20), continua:

    A ausncia de uma linha ideolgica [...] exps sorte os incrementos feitos aqui nos

    anos de expanso, uma vez que cada governante conduziu sua prpria poltica sem

    aparentemente se preocupar em dar sequncia s idias que estavam funcionando na

    prtica. Do outro lado do globo, a manuteno do Partido Comunista Chins no poder a

  • 43

    algumas dcadas assegurou a continuidade dos planos de estruturao econmica,

    iniciados com o processo de abertura ao capitalismo, em 1979.

    A queda visvel da taxa de crescimento brasileiro aps a dcada de 80, sculo XX,

    ocorreu em dois perodos distintos: anos 1980, influenciado pela crise da dvida externa, e anos

    1990, devido ao reposicionamento internacional da economia. Na dcada de 80, a preocupao

    com o pagamento da dvida externa e o rompimento do financiamento com os investidores

    estrangeiros levou ao forte declnio do crescimento econmico do Brasil. J nos anos 90, a

    desacelerao da taxa foi consequncia da combinao do novo cenrio internacional com

    caractersticas prpria da economia brasileira (CARNEIRO, 2002, p. 30).

    Em contraste com o freio das taxas no Brasil, no mesmo perodo, a China estabelecia

    estratgias de iseno fiscal para atrair capital estrangeiro ao pas. Alm de oferecer, tambm,

    infraestrutura suficiente para manter tais investimentos. De acordo com Marques (2009, p.31),

    O Estado ofereceu infraestrutura e iseno fiscal (de impostos) para atrair capital estrangeiro,

    mas imps regras a sua atuao, atrelando-o s empresas nacionais.

    O Brasil, entre os anos 1980-90, no conseguiu estabelecer uma estratgia de

    desenvolvimento como na China, atravs de planejamento, projetos especficos e polticas de

    desenvolvimento de longo prazo. No governo do presidente Juscelino Kubitschek adotou-se a

    estratgia de cinqenta anos em cinco com o Plano de Metas. Este consistia no investimento

    em reas prioritrias para o desenvolvimento econmico, principalmente, infra-estrutura

    (rodovias, hidreltricas, aeroportos) e indstria, assim como o Plano Nacional de

    Desenvolvimento (PND). No entanto, nenhum deles tornou-se to significativo para o

    crescimento da economia brasileira como o II Plano Nacional de Desenvolvimento, objeto de

    estudo primordial desta pesquisa.

    Segundo Mansiero e Coelho (2014), o Plano de Metas e os Planos Nacionais de

    Desenvolvimento (PND) foram os que mais se aproximaram destas polticas de xito chinesas.

    Aps os anos 90, o que se viu foram polticas isoladas, sem articulao com os agentes

    produtivos e fraca capacidade de liderana do Estado. O cenrio mudaria, porm, a partir dos

    anos 2000, com a chegada do governo Lula.

  • 44

    4.1 II PND: um salto na infraestrutura macrologstica brasileira

    O II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND), de 1975 at 1979, no governo do

    General Ernesto Geisel, foi um substancial programa de investimentos cujos objetivos eram

    transformar a estrutura produtiva e superar os desequilbrios externos, direcionando o Brasil

    para uma posio de potncia intermediria no cenrio internacional. A escolha do II PND

    como parmetro se justifica pelas substanciais inverses realizadas nesse perodo, tanto em

    infraestrutura como na base produtiva, em especial nos setores de bens intermedirios e bens de

    capital. Constitui-se a ltima iniciativa de realizao planejada de blocos de investimentos

    visando a transformao estrutural da base produtiva.

    Para Carneiro (2002, p. 55), o plano tambm propunha a transformao das matrizes

    energtica e de transporte para que a implantao da indstria de bens intermedirios criasse

    uma demanda capaz de viabilizar os novos segmentos da indstria de bens de capital.

    O ajustamento estrutural do perodo 1974-1979 constituiu um ponto de ruptura, ao

    direcionar a industrializao para as indstrias capital-intensivas e tecnolgico-

    intensivas, integrando o parque industrial e dando-lhe capacidade de competitividade

    internacional (CASTRO E SOUZA, 1985, p.58).

    A inteno do Brasil a partir da criao deste Plano era preservar o crescimento do pas

    e ampliar a diversificao da estrutura produtiva. Para Fonseca e Moreira (2012), o plano

    consolidaria o pas como um modelo de capitalismo industrial, com crescimento de 10% a.a. no

    PIB, 12% na indstria e 7% na agricultura e como estratgia diante da crise do balano de

    pagamentos, a proposta era aumentar em 2,5 vezes no quantum das exportaes entre 1974 e

    1979 atravs da exportao de matrias-primas e investimentos no transporte ferrovirio e no

    sistema de telecomunicaes, alm de programas de eletrificao rural, irrigao, construo de

    armazens e centrais de abastecimento. A importao diminuiria com a estratgia de substituio

    de importaes de bens de capital e insumos bsicos, elevada produo de petrleo no pas e

    ampliao na gerao de energia hidreltrica.

    Em consonncia com os setores que receberiam os capitais, de acordo com Fonseca e

    Moreira (2012), coube estabelecer os setores primordiais para o II PND. So eles:

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    I. Insumos bsicos: metais no ferrosos, explorao de minrios, petroqu-

    mica, fertilizantes e defensivos agrcolas, papel e celulose;

    II. Infraestrutura e energia: ampliao da prospeco e produo de petrleo,

    energia nuclear, ampliao da capacidade hidreltrica (Itaipu) e substituio

    dos derivados de petrleo por energia eltrica e pelo lcool (Prolcool),

    expanso das ferrovias e a utilizao de carvo;

    III. Bens de capital: mediante garantias de demanda, incentivos fiscais e

    creditcios, reservas de mercado (lei de informtica) e poltica de preos.

    A Tabela 2 apresenta a distribuio setorial dos investimentos realizados e sua

    evoluo. A partir de sua anlise, nota-se que h uma boa distncia das metas estabelecidas

    pelo Programa e o executado. No setor de energia a projeo era de 19,4% e alcanou 10,1%.

    Carneiro (2002, p. 68) explica que mesmo no alcanando o desejado os investimentos

    ampliaram-se tanto no segmento produtor de petrleo quanto no de hidroeletricidade, embora

    em uma velocidade insuficiente para reduzir a dependncia de importaes, no caso do

    petrleo. Neste mesmo perodo o Brasil enfrentava dficits em sua balana comercial pela

    crise do petr