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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS FACULDADE DE EDUCAO
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM EDUCAO SUJEITOS EM DILOGO NA PESQUISA COM FORMAO: OS CAMINHOS DA MEDIAO TERICA PELAS REFLEXES SOBRE A PRTICA PEDAGGICA
DE PROFESSORES DE LNGUA PORTUGUESA
Ana Maria Silva de Lucena
Manaus-AM 2018
UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS FACULDADE DE EDUCAO
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM EDUCAO
ANA MARIA SILVA DE LUCENA (Bolsista CAPES)
SUJEITOS EM DILOGO NA PESQUISA COM FORMAO: OS CAMINHOS DA MEDIAO TERICA PELAS REFLEXES SOBRE A PRTICA PEDAGGICA
DE PROFESSORES DE LNGUA PORTUGUESA
Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Educao da Universidade Federal do Amazonas, como requisito final para a obteno do ttulo de Doutora em Educao, sob orientao da Prof. Dr. Michelle de Freitas Bissoli.
Manaus-AM 2018
ANA MARIA SILVA DE LUCENA
SUJEITOS EM DILOGO NA PESQUISA COM FORMAO: OS CAMINHOS DA MEDIAO TERICA PELAS REFLEXES SOBRE A PRTICA PEDAGGICA
DE PROFESSORES DE LNGUA PORTUGUESA
Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Educao da Universidade Federal do Amazonas, como requisito final para a obteno do ttulo de Doutora em Educao, sob orientao da Prof. Dr. Michelle de Freitas Bissoli.
BANCA EXAMINADORA
Prof. Dr. Michelle de Freitas Bissoli - Presidente
Faculdade de Educao Universidade Federal do Amazonas (UFAM)
Prof. Dr. Dagoberto Buim Arena Membro
Faculdade de Filosofia e Cincia Universidade Estadual Paulista Jlio Mesquita
Filho (UNESP)
Prof. Dr. Lucola Ins Pessoa Cavalcante - Membro
Faculdade de Educao Universidade Federal do Amazonas (UFAM)
Prof. Dr. Carlos Humberto Alves Corra Membro
Faculdade de Educao Universidade Federal do Amazonas (UFAM)
Prof. Dr. Ilaine Ins Both
Faculdade de Educao Universidade Federal do Amazonas (UFAM)
Aos que resistem a pular fora da ponte e da vida. E aos que
acreditam na formao continuada como espao de dilogo com a
teoria, buscando novos modos de enxergar o real e ressignificar uma
atividade plena de sentido como a escrita.
AGRADECIMENTOS
Agora, momento de agradecer. A tradio latina me ensina que sua origem
vem de gratus e significa agradvel ou reconhecimento pelo bem que nos fizeram.
Ao contrrio da palavra obrigado, no h uma relao de obrigao, mas de gratido
para toda a vida. De modo geral, quero agradecer a todos que contriburam direta e
indiretamente nesta caminhada, inclusive queles que, porventura, tornaram-na
mais difcil, porque na adversidade tambm aprendi a lidar com os desafios para dar
passos frente.
De maneira especial, quero agradecer, in memoriam, aos meus pais, Znite
de Lucena e Ernande de Lucena, que se foram to cedo, mas deixaram seu
exemplo de luta, at o ltimo dia de suas vidas, para manter uma famlia unida,
ensinando com o prprio exemplo a ter interesse pelo mundo da escrita, mesmo que
fosse pela prosa romntica, a gosto de mame ou os textos em tom memorialista, a
gosto de papai. Meu amor, gratido e eterna saudade.
Aos meus irmos, Carlos, Jovana, Gilvane, Rosana e Raifran, a quem a vida
nos afastou da convivncia entre irmos, para que fssemos lutar pela
sobrevivncia. Mas que a prpria vida nos aproximou pelos meus sobrinhos
amados. Minha gratido pela torcida de vocs nas minhas conquistas e por terem
ajudado a me criar, como podiam, quando ficamos rfos.
Com todo o carinho, sou grata ao Carlos, meu esposo, pelo estmulo e por
suportar minhas quase interminveis exposies sobre o tema desta tese. Agradeo,
tambm, a Ftima Rodrigues, minha cunhada, pelo cuidado familiar quando no
podia me fazer presente. Igualmente, agradeo ao Mateus e a Gabriela, meus filhos,
que souberam esperar a concluso de uma pgina, de um captulo, de uma tese. A
Josie, minha sobrinha-filha, companheira de pesquisa, com quem dividi as vivncias
na construo de nossos projetos de tese. minha famlia, minha carinhosa gratido
e a merecida dedicatria deste trabalho.
Na Universidade Federal do Amazonas, minha gratido eterna professora
doutora Michelle de Freitas Bissoli, orientadora desta tese, que teve a pacincia e a
sensibilidade de discutir comigo, por inmeras vezes, qual era o propsito desta
pesquisa, dando orientaes valiosas que corrigiram diversas imprecises.
Agradeo pelo carinho, as palavras de incentivo, a generosidade e a coragem de me
receber, vinda de outro programa de pesquisa, para participar do Grupo de Estudos
e Pesquisa sobre a Escola de Vigotski (GEPEV).
Ao professor doutor Carlos Humberto Alves Corra, que me recebeu pela
primeira vez no PPGE, pelo apoio na minha caminhada inicial, sempre to gentil e
com palavras de confiana que me incentivaram a trazer o tom mais sensvel na
escrita da tese, sem medo de momentos subjetivos.
professora doutora Lucola Ins Pessoa Cavalcante, pelas leituras
preciosas no campo da formao e que me proporcionaram imprimir um acento mais
forte, de indignao e de denncia que trago nesta tese.
Aos professores participantes da pesquisa, diretora e aos funcionrios da
escola, pelo aceite em participar da pesquisa emprica e por me receberem sempre
com tanto carinho e alegria. Agradeo pela confiana depositada e espero retribuir
com outros projetos para ressignificar as atividades de escrita.
Ao Centro de Educao Tecnolgica do Amazonas (CETAM), instituio onde
trabalho, pelo apoio que recebi da gesto institucional, nas diversas etapas deste
estudo. Em especial, meus agradecimentos a duas pessoas no CETAM importantes
nesta trajetria: Carmem Lcia Ribeiro e Josiany Dantas, companheiras de labuta,
pelo incentivo e apoio em minha trajetria acadmica.
Agradeo, ainda, ao professor doutor Dagoberto Buim Arena que diminuiu a
distncia entre Marlia e Manaus, apontando, na banca de qualificao, aspectos
importantes para reviso do texto final e indicando referenciais valiosos citados
nesta tese.
Aos colegas do GEPEV, pelo convvio fraterno e solidrio da partilha do
conhecimento para compreendermos parte do real pela mediao do abstrato.
Vocs so parte importante do meu processo de humanizao. Em especial,
amiga Aline Janell, que sempre me incentivou, lendo meus textos e dando
sugestes e conselhos nessa caminhada. s minhas amigas do doutorado, Cleia
Printes, Snia Cludia Fonseca, Isabel Cristina Ferreira e Rita Luna, professoras
pesquisadoras com quem dividi as orientaes e leituras preliminares. s queridas
professoras doutoras Arlene Arajo e Ilaine Both, minhas fontes de inspirao como
pesquisadoras e autoras, pela beleza, cuidado e fora de seus textos.
CAPES pelo apoio financeiro na pesquisa.
RESUMO
A presente tese traz os resultados produzidos da pesquisa de doutorado intitulada SUJEITOS EM DILOGO NA PESQUISA COM FORMAO: os caminhos da mediao terica pelas reflexes sobre a prtica pedaggica de professores de lngua portuguesa, desenvolvida em uma unidade escolar pblica municipal, no municpio de Iranduba (AM), com a participao de quatro professores de lngua portuguesa. Tive por objetivo compreender como as reflexes sobre a prtica pedaggica dos professores, por meio da mediao terica, possibilitam-lhes perceber como ocorre o processo de desenvolvimento da escrita nos anos finais do Ensino Fundamental e as possibilidades de atuar intencionalmente sobre ele. A hiptese da qual parti para esta investigao que o repensar da prtica pedaggica, pela mediao do abstrato como instrumento de anlise do real, oferece ao professor de lngua portuguesa suporte terico para a compreenso do processo de desenvolvimento da escrita, favorece melhor conhecimento sobre a prtica pedaggica e contribui para refletir sobre a intencionalidade do trabalho docente. Como problema de pesquisa, indaguei: como as reflexes sobre a prtica pedaggica, por meio da mediao terica, podem contribuir para a compreenso do processo de desenvolvimento da escrita e, consequentemente, para uma ao intencional do professor sobre sua atividade? Para responder a esse questionamento, pautada no mtodo Materialista Histrico-Dialtico e com suporte na Teoria Histrico-Cultural (THC), conduzi uma formao continuada no primeiro e segundo semestres de 2017, com o grupo que se reuniu semanalmente para leitura, discusso e sesses de autorreflexo sobre os textos da coletnea de O texto na sala de aula: leitura e produo (GERALDI, 1984), com aproximaes tericas da THC feitas por mim. Os resultados evidenciam que as reflexes, mediadas pelo dilogo com a Teoria, trouxeram contribuio compreenso do sentido de lngua escrita dentro da sua funo social e como parte do processo de humanizao.
Palavras-chave: Escrita. Formao de Professores. Teoria Histrico-Cultural.
RESUMEN
Esta tesis aporta los resultados obtenidos de la investigacin doctoral titulada "SUJETO EN DILOGO EN LA INVESTIGACIN-FORMACIN: las formas de mediacin terica por la reflexin sobre la prctica docente de los profesores de lengua portuguesa", desarrollado en una unidad de la escuela pblica en el municipio de Iranduba (AM), con la participacin de cuatro profesores de lengua portuguesa. En el caso de los profesores, por medio de la mediacin terica, les permite percibir cmo ocurre el proceso de desarrollo de la escritura en los aos finales de la Enseanza Fundamental y las posibilidades de actuar intencionalmente sobre l. La hiptesis que me fui para esta investigacin es que el replanteamiento de la prctica docente, a travs de la mediacin de lo abstracto y la herramienta de anlisis real, ofrece al profesor de lengua portuguesa la base terica para entender el desarrollo del proceso de escritura, promueve una mejor comprensin de la prctica pedaggica y contribuye a reflexionar sobre la intencionalidad del trabajo docente. Como problema de investigacin, pregunt: cmo las reflexiones sobre la prctica pedaggica, por medio de la mediacin terica, pueden contribuir a la comprensin del proceso de desarrollo de la escritura y, consecuentemente, a una accin intencional del profesor sobre su actividad? Para responder a ese cuestionamiento, pautada en el mtodo Materialista Histrico-Dialctico y con soporte en la Teora Histrico-Cultural (THC), condujo una formacin continuada en el primer y segundo semestres de 2017, con el grupo que se reuni semanalmente para lectura, discusin y sesiones de autorreflexin sobre los textos de la coleccin de "O texto na sala de aula: leitura e produo (GERALDI, 1984), con aproximaciones tericas de la THC hechas por m. Los resultados evidencian que las reflexiones, mediadas por el dilogo con la Teora, aportaron a la comprensin del sentido de la lengua escrita dentro de su funcin social y como parte del proceso de humanizacin.
Palabras clave: Escritura. Formacin de profesores. Teora Histrico-Cultural.
ABSTRACT
The present thesis presents the results of the doctoral research entitled "SUBJECTS IN DIALOGUE IN RESEARCH-TRAINING: the paths of theoretical mediation by reflections on the pedagogical practice of Portuguese-speaking teachers", developed in a municipal public school unit in the municipality of Iranduba (AM), with the participation of four Portuguese-speaking teachers. The purpose of this study was to understand how reflections on teachers' pedagogical practice through theoretical mediation enable them to understand how the process of writing development occurs in the final years of elementary school and the possibilities of acting intentionally on it. The hypothesis of this research is that the rethinking of pedagogical practice, through the mediation of the abstract as an instrument of analysis of the real, offers the Portuguese teacher a theoretical support for the understanding of the writing development process, favors a better knowledge about the pedagogical practice and contributes to reflect on the intentionality of the teaching work. As a research problem, I asked: how can reflections on pedagogical practice, through theoretical mediation, contribute to the understanding of the writing development process and, consequently, to an intentional action of the teacher on his / her activity? In order to respond to this questioning, based on the Materialist Historical-Dialectic method and supported by the Historical-Cultural Theory (THC), I conducted a continuous formation in the first and second semesters of 2017, with the group that met weekly for reading, discussion and sessions of self-reflection on the texts of the collection of O texto na sala de aula: leitura e produo (GERALDI, 1984), with theoretical approximations of THC made by me. The results show that the reflections, mediated by the dialogue with the Theory, have contributed to the understanding of the sense of written language within its social function and as part of the process of humanization.
Keywords: Writing. Training of Teachers. Historical-Cultural Theory.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Biblioteca da Escola ...............................................................................125
Figura 2 Professores em formao .......................................................................125
Figura 3 Acervo e ainda algumas caixas ..............................................................126
Figura 4 Datashow em uso ...................................................................................126
Figura 5 Cho da sala alagado ............................................................................141
Figura 6 Cho da sala alagado (b) .......................................................................141
Figura 7 Livro selecionado ...................................................................................145
Figura 8 Livro selecionado (b) ..............................................................................145
Figura 9 Troca de textos .......................................................................................150
Figura 10 Troca de textos (b) ...............................................................................150
Figura 11 Marcadores de leitura ...........................................................................151
Figura 12 Leitura individual...................................................................................153
Figura 13 Leitura individual (b)..............................................................................153
Figura 14 - Professora em leitura.............................................................................154
Figura 15 - Livro escolhido pela professora.............................................................154
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 Organizao das turmas em 2017..........................................................46
Quadro 2- Participantes da pesquisa ........................................................................53
Quadro 3 Roteiro de textos para estudo do grupo dialogal ...................................74
Quadro 4 - Periodizao etria segundo D.B. Elkonin ............................................101
Quadro 5 Distribuio da frequncia de uso dos trisslabos, tetrasslabos e pentasslabos com relao data de criao lexical para palavras proparoxtonas e no-proparoxtonas .................................................................................................180
LISTA DE GRFICOS
Grfico 1: Gnero dos responsveis.............................................................................223
Grfico 2: Estado civil dos responsveis.......................................................................223
Grfico 3: Profisso/Ocupao profissional dos responsveis....................................224
Grfico 4: Situao profissional dos responsveis.......................................................224
Grfico 5: Responsveis que recebem algum benefcio social...................................225
Grfico 6: Tipo de benefcio social recebido.................................................................225
Grfico 7: Renda mensal familiar informada.................................................................226
Grfico 8: Nmero de moradores por domiclio............................................................226
Grfico 9: Residncia......................................................................................................227
Grfico 10: Escolaridade dos responsveis..................................................................227
SUMRIO
INTRODUO: SENTIDOS E MOTIVOS DA PESQUISA ..................................... 16
1 OS CAMINHOS DA PESQUISA PELO MATERIALISMO HISTRICO-DIALTICO
................................................................................................................................ 24
1.1 O princpio dialgico................................................................................ ....... 26
1.2 O princpio de prtica pelo marxismo...................................................... ....... 28
1.3 O mtodo e as categorias metodolgicas assumidas na pesquisa........ ........ 30
1.3.1 O objeto de anlise da investigao ........................................................ 31
1.3.2 O princpio explicativo para o objeto de anlise ....................................... 33
1.3.3 A unidade de anlise que articula o objeto e o princpio explicativo ........ 37
1.3.4 O modo de proceder anlise que unifique objeto, princpio explicativo e
unidade de anlise ............................................................................................ 39
1.4 Percurso metodolgico............................................................................ ....... 40
1.4.1 A escola: o lcus de anlise .................................................................... 41
1.4.2 A proposta de pesquisa com formao .................................................... 50
1.4.3 Os participantes da pesquisa e seu universo de trabalho ........................ 52
1.4.4 A construo do perfil dos sujeitos em dilogo na pesquisa com formao
.......................................................................................................................... 54
1.4.5 A organizao e o desenvolvimento do grupo de estudos ....................... 70
1.4.6 Textos-base para estudo e discusso no grupo dialogal e textos
norteadores para mediaes com o grupo ....................................................... 74
1.4.6.1 Fundamentando o trabalho com O Texto na Sala de Aula............... ........ 79
2 O SENTIDO HUMANIZADOR DO TRABALHO DOCENTE E DE ESCRITA PARA
O PROFESSOR DE LNGUA PORTUGUESA ....................................................... 83
2.1 O esvaziamento do sentido humanizador da atividade docente do professor de
lngua portuguesa.......................................................................................... ....... 84
2.2 O sentido da formao continuada na atividade de estudo................... ........ 89
2.3 A atividade de estudo do professor......................................................... ....... 91
2.4 O trabalho com a linguagem na adolescncia........................................ ........ 95
2.4.1 A idade de transio e o papel da escola no desenvolvimento dos
interesses do adolescente ................................................................................ 95
2.4.2 A produo de textos na escola e sua relao com a formao do
pensamento conceitual na idade de transio ................................................ 106
2.4.3 A situao social de desenvolvimento na idade de transio ................ 111
3 O ESPAO DIALGICO NA PESQUISA COM FORMAO: NO RIO DE
REFLEXES SOBRE A PRTICA, POSSIBILIDADES DE PONTES DE
MEDIAO TERICA .......................................................................................... 117
3.1 No dilogo, as concepes e sentidos de linguagem e ensino da lngua pelos
professores participantes.............................................................................. ...... 117
3.1.1 O menino e a professora ....................................................................... 117
3.1.2 Nas reflexes, as pontes ....................................................................... 126
3.2 Vivncias de/com a lngua escrita dos professores em suas trajetrias de vida
e de profisso................................................................................................ ..... 134
I Parte - Vivncias com/de escrita na vida cotidiana e no cotidiano escolar . 135
3.2.1 A professora e o mdico ........................................................................ 135
3.2.2 A professora e a promotora ................................................................... 138
3.2.3 Os professores e os pombos ................................................................. 139
II Parte - Prtica de leitura de textos, prtica de produo de textos e prtica
de anlise lingustica .......................................................................................... 143
3.2.4 Prtica de leitura de textos .................................................................... 144
3.2.5 Intenes de prtica de produo de textos .......................................... 158
3.2.6 Prtica de anlise lingustica ................................................................. 172
3.3 Algo mais a dizer sobre a importncia da formao continuada e a dimenso
formadora da escrita no processo de humanizao da pesquisadora e dos
participantes da pesquisa.............................................................................. ..... 186
CONCLUSO ....................................................................................................... 193
REFERNCIAS ..................................................................................................... 198
APNDICE A - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para os Pais .. 211
APNDICE B Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para o (a)
Professor (a) ........................................................................................................ 215
APNDICE C Termo de Assentimento para Alunos ...................................... 219
APNDICE D Grficos da coleta de dados do questionrio socioeconmico
.............................................................................................................................. 223
APNDICE E Sntese dos textos-base para discusso no grupo dialogal .. 228
APNDICE F Roteiro de perguntas do encontro do grupo dialogal ............ 235
APNDICE G - Projeto de leitura e escrita em sala de aula ............................. 236
ANEXO A Autorizao da pesquisa pela Escola ........................................... 245
ANEXO B - Autorizao para realizao da pesquisa pela SEMEI .................. 246
ANEXO C- Parecer CEP ...................................................................................... 247
ANEXO D Questionrio socioeconmico ....................................................... 248
16
INTRODUO: SENTIDOS E MOTIVOS DA PESQUISA
Este estudo tem como foco as reflexes sobre a prtica pedaggica do
professor de lngua portuguesa no processo de desenvolvimento da escrita nos anos
finais do ensino fundamental e o sentido desta pesquisa, para mim, volta-se a
compreender, analisar e explicar qual o sentido que os professores atribuem sua
prtica e prpria relao que estabelecem com a escrita.
Como professora de lngua portuguesa dos anos finais do ensino fundamental
de escolas da rede pblica estadual e municipal de educao no Amazonas, desde
1992, pude perceber a tenso existente entre o conhecimento dos professores de
lngua portuguesa (entre os quais me incluo) sobre os processos de
desenvolvimento da escrita nos anos finais do ensino fundamental e a prtica
pedaggica realizada nas atividades de produo textual. Percebia que, mesmo
adotando prticas pedaggicas sustentadas nos conceitos tericos da lingustica
textual, esta, por si s, no era suficiente para responder s dificuldades que se
apresentavam (e se apresentam) ao ensino da escrita.
Ao ingressar no mestrado em Letras, na rea de concentrao em estudos da
linguagem, no ano de 2011, o interesse sobre a prtica pedaggica do professor de
lngua portuguesa ficou mais evidente, ocasio em que integrei o grupo de estudos
da oralidade e da escrita da fala amazonense, de onde partiram discusses no
campo da Sociolingustica Educacional que muito me estimularam a prosseguir nos
estudos sobre as relaes entre linguagem e atividade educativa no processo de
desenvolvimento da escrita.
Em 2013, ao participar das reunies do grupo de pesquisa Teoria Histrico-
Cultural, Infncia e Pedagogia, fui constituindo uma compreenso das contribuies
tericas da Escola de Vigotski e seus colaboradores como fundantes para a
conformao de uma concepo de linguagem a partir de um referencial Histrico-
Cultural.
Nesse percurso, observei no referencial terico Histrico-Cultural uma
possibilidade de contemplar uma nova forma de organizao da atividade
pedaggica que pudesse enxergar o aluno como sujeito de mltiplas linguagens,
capaz e ativo na apropriao da cultura (BISSOLI, 2005, p. 15), trazendo para
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discusso a importncia de se compreender o desenvolvimento da escrita a partir
das interaes presentes nas relaes pedaggicas, desvelando a funo da
atividade educativa na compreenso desse processo na esfera escolar.
Dessa forma, a partir dos pressupostos da Teoria Histrico-Cultural, minha
hiptese consistiu em que: a reflexo sobre a prtica pedaggica, pela mediao do
abstrato como instrumento de anlise do real, oferece ao professor de lngua
portuguesa suporte terico para a compreenso do processo de desenvolvimento da
escrita, favorece melhor conhecimento sobre a prtica pedaggica e contribui para
refletir sobre a intencionalidade do trabalho docente.
A partir da hiptese formulada, o problema enunciou-se da seguinte forma:
como as reflexes sobre a prtica pedaggica, por meio da mediao terica,
podem contribuir para a compreenso do processo de desenvolvimento da escrita e,
consequentemente, para uma ao intencional do professor sobre sua atividade?
No sentido de responder ao questionamento formulado, delimitei como
objetivo primrio: compreender como as reflexes sobre a prtica pedaggica dos
professores participantes da pesquisa, com base nas mediaes tericas,
possibilitam-lhes perceber como ocorre o processo de desenvolvimento da escrita
nos anos finais do Ensino Fundamental e as possibilidades de atuar
intencionalmente sobre ele.
Como objetivos especficos, elegi: a) Discutir, a partir de aproximaes com
os pressupostos da Teoria Histrico-Cultural, as concepes de lngua, linguagem e
escrita e suas especificidades nos anos finais do ensino fundamental; b) Examinar
as relaes entre as experincias de/com escrita, vividas pelos professores, sua
prtica pedaggica e as condies em que desenvolvem seu trabalho; c) Refletir
sobre a funo da formao continuada dos professores para a compreenso dos
processos de desenvolvimento da escrita nos anos finais do ensino fundamental.
Ao tomar por referncia Vygotski1 (2000), para quem toda a capacidade
grfica de expresses do prottipo mdio de homem culto do nosso tempo
expressa-se na escrita, possvel, ento, compreender por que, para o autor, uma
abordagem do ensino da escrita a partir de um ponto de vista histrico, ou seja,
1 A grafia do nome do autor aparece de distintas formas em suas obras, bem como em textos de autores
contemporneos que o estudam: Vigotskii, Vigotski, Vygotski. Neste estudo, fizemos a opo por utilizar a verso em portugus do seu nome (Vigotski), mais comumente adotada por pesquisadores do Brasil. No entanto, quando se tratar de citaes, ser mantido o nome como escrito nos originais.
18
com a inteno de compreend-la ao longo de todo o desenvolvimento histrico
cultural da criana a porta de passagem para a busca de uma das solues
acerca de toda psicologia da escrita (VYGOTSKI, 2000b, p. 184).
Assim, todo o desenvolvimento do processo metodolgico desta pesquisa
est voltado para que os professores se apropriem teoricamente dos conhecimentos
sobre a escrita, buscando compreender a gnese, a essncia do conceito de
linguagem que, nos pressupostos da Teoria Histrico-Cultural, deve ser
compreendido como constituinte do pensamento por meio dos signos, no seu
significado social, pois, segundo Vygotski (1993, p. 56-57), a funo inicial da
linguagem a de comunicao, de conexo social, de influncia naqueles que nos
rodeiam, tanto por parte dos adultos como da criana.
Isso nos mostra que, ao investigar o processo de desenvolvimento da escrita
sob um referencial histrico-cultural, observar-se- a atividade educativa como uma
formao constitutiva do ser humano em toda a sua totalidade, por meio da qual se
transmite s novas geraes o saber historicamente produzido, que pode contribuir
para a mxima humanizao dos indivduos.
Nesse sentido, tambm parti da compreenso de atividade pedaggica como
ato educativo intencional e diferenciado que focaliza os processos de ensino e de
aprendizagem de professores e alunos na esfera escolar. O desafio posto para esta
tese foi, ento, o acompanhamento de quatro2 professores de lngua portuguesa dos
anos finais do ensino fundamental, verificando, aps dois semestres letivos, as
contribuies do referencial Histrico-Cultural em sua compreenso acerca das
prticas pedaggicas necessrias para a mediao do processo de desenvolvimento
da escrita dos alunos dos anos finais do ensino fundamental. A categoria de
Atividade passou, ento, a orientar a proposta de trabalho com os professores, na
perspectiva da pesquisa com formao.
Conforme postula Kosik (2002),
No possvel compreender imediatamente a estrutura da coisa ou a coisa em si mediante a contemplao ou mera reflexo, mas sim
2 Durante a pesquisa, a professora Mariah teve deferimento de seu pedido de licena mdica, retornando
escola em maio de 2017. Tambm em maio de 2017, a professora Maiara solicitou licena-prmio e afastou-se da pesquisa a partir de 17 de maio de 2017. Assim, o grupo que, inicialmente, tinha quatro participantes, passou a ter trs com as participaes das professoras Mariah (meses de maio, junho, julho, agosto e setembro) e da professora Maiara (meses de maro, abril e maio).
19
mediante uma determinada atividade. No possvel penetrar na coisa em si [sem] responder pergunta que coisa a coisa em si? sem a anlise da atividade mediante a qual ela compreendida; ao mesmo tempo, esta anlise deve incluir tambm o problema da criao da atividade que estabelece o acesso coisa em si. Estas atividades so vrios aspectos ou modos da apropriao do mundo pelos homens. (KOSIK, 2002, p. 28, grifos no original).
Se, de acordo com Kosik (2002), o conhecimento se constri mediante a
atividade, compreender a atividade mediadora do professor de lngua portuguesa
sob a perspectiva histrico-cultural implica compreender como essa prtica se
constitui historicamente. E analisar a atividade por meio da qual o ensino da lngua
se constitui e a partir da qual se constri conhecimento sobre ele, em especfico,
conhecimento sobre a escrita, contribui para a compreenso do trabalho educativo
intencional com a linguagem como parte do processo de humanizao. Por outro
lado, mediante a atividade de pesquisa em que a pesquisadora e os professores
participantes se colocam como sujeitos produtores de significados e sentidos sobre
o objeto, em uma relao dialgica , que se acessa efetivamente e se torna
possvel compreender a coisa em si, ou o processo pedaggico no interior do qual
se desenvolve a escrita nos anos finais do Ensino Fundamental.
Importou para a anlise dos dados gerados a fundamentao nos
pressupostos estabelecidos por Vygotski (1993) sobre a relao entre aprendizagem
e desenvolvimento psicolgico e qual Davidov (1982)3 atribuiu grande importncia
ao aprofundar os estudos sobre o papel do ensino no desenvolvimento do aluno,
por meio da estruturao de sua atividade de estudo e com foco no conhecimento
terico e nas generalizaes tericas (LIBNEO; FREITAS, 2013, p. 329).
Como sua preocupao central deu-se em razo da formulao de uma teoria
de ensino-aprendizagem que relacionasse a influncia da educao e do ensino no
desenvolvimento do aluno, Davidov (1996,1997), em pesquisas realizadas com
Elkonin, formulou a teoria do ensino desenvolvimental com foco na atividade de
estudo, propondo, nos anos de 1960, a criao de novos programas de ensino a
partir dos postulados vigotskianos de que a base do desenvolvimento intelectual das
3 A grafia do nome do autor aparece de distintas formas em suas obras, bem como em textos de autores que o
estudam: Davydov, Davdov e Davidov. Assim como na grafia do nome de Vigotski, tambm fizemos a opo por empregar a grafia em portugus do seu nome (Davidov), mais comumente adotada por pesquisadores brasileiros. Mas, quando tratarmos de citao, ser mantida a grafia conforme os originais.
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crianas est no contedo dos conhecimentos assimilados. E, assim, criou-se o
conhecido sistema didtico Elkonin-Davidov4, cuja hiptese central a de que as
crianas pequenas podem desenvolver o pensamento terico por meio da
assimilao do conhecimento terico.
O sistema didtico Elkonin-Davidov, em oposio escola tradicional
sovitica da poca em que o ensino se baseava no conhecimento emprico (a partir
da aparncia do objeto, prprio da prtica cotidiana) prope uma perspectiva inversa
de anlise que parte do aspecto gentico e essencial dos objetos (mtodo geral), na
perspectiva de uma compreenso da articulao entre o todo e as partes, ao que
denominou de pensamento terico.
Com base no conceito de atividade, indicado por Leontiev5 (1978), Davydov
identificou o conhecimento terico como o contedo central e especfico da atividade
de estudo do aluno e que supe a necessidade de apropriao da experincia social
e histrica da humanidade representada pelos objetos do conhecimento.
Assim, a importncia do pensamento terico est relacionada ao
desenvolvimento de processos mentais para chegar a conceitos e, ento,
transform-los em ferramentas para generalizaes conceituais e aplicao em
problemas especficos.
A partir desse princpio, o papel do professor, especialmente, o de lngua
portuguesa, estruturar e organizar atividades de estudo que sejam favorecedoras
dessas abstraes e generalizaes dos conceitos e tornem os alunos capazes de
utiliz-los na anlise e soluo de problemas especficos que envolvam o objeto do
4 Para ampliao da leitura sobre o tema, sugerimos o artigo, em portugus, Didtica desenvolvimental da
atividade: o sistema Elkonin-Davidov (1958-2015), de Roberto Valds Puentes (2017). Segundo Puentes (2017), a concepo terica de ensino desenvolvida por Davidov, Elkonin, Repkin e seus colaboradores passou a ser chamada inicialmente de sistema Elkonin-Davidov e depois de Ensino Desenvolvimental ou Teoria da Atividade de Estudo. O sistema didtico foi aplicado pela primeira vez, de forma experimental, na escola n. 91 de Moscou, em 1959. As pesquisas foram interrompidas por quatro anos (1982-1986) devido a perseguies polticas aos pesquisadores e intrigas no meio acadmico. Mas, nos anos de 1986 a 1994, o governo russo reconheceu o trabalho dos pesquisadores e adotou em massa o sistema Elkonin-Davidov como um dos trs sistemas da Didtica Desenvolvimental da Atividade, junto com o sistema Galperin-Talzina e o sistema Zankoviano. Com o fim da Unio Sovitica, as pesquisas do grupo tiveram seu financiamento drasticamente reduzido ou cessado no caso das escolas localizadas nas ex-repblicas soviticas. Atualmente, com a asceno ao poder do presidente Vladiminr Putin, indo agora para mais um mandato em 2018, as reformas polticas e econmicas implementadas por Putin afetaram duramente o sistema nacional de educao e os sistemas didticos alternativos como o sistema Elkonin-Davidov. Segundo Puentes (2017), o sistema sobrevive com a ajuda de poucos pesquisadores e escolas, existindo praticamente na clandestinidade. 5 Segundo Leontiev (1978, 2014), a atividade so processos psicologicamente caracterizados por uma
macroestrutura de vnculos que se movem, como um todo, em direo a um objetivo que coincide, sempre, com o motivo que mobilizou o sujeito a executar tal atividade para satisfazer uma necessidade especial.
21
conhecimento terico, nesse caso, o conceito terico de escrita como instrumento
cultural complexo.
Considerando a proposta terica de generalizao conceitual e
desenvolvimento do pensamento terico, o conceito de escrita a ser apropriado
dever seguir o caminho da abstrao e generalizao, a partir da realizao de
atividades de estudo em que, primeiramente, seja desenvolvido o conceito de escrita
em sua funo social, como cultura escrita, para depois, com base nesse conceito,
proceder anlise do objeto em suas formas mais distintas e em contextos
especficos.
Nesse sentido, as atividades de estudo devero partir das necessidades e
motivos para apropriao das riquezas culturais da humanidade; segundo, a
formulao de tarefas de estudo do objeto como fenmeno universal abstrato;
depois, a anlise de suas diversas manifestaes em forma imediata, substantiva,
dos conceitos especficos do conhecimento terico. Isto significa compreender, por
exemplo, nos estudos sobre a escrita, que no se deve comear pelo estudo
estrutural, morfossinttico da palavra, mas pelo significado semntico que esta traz
para, depois, estabelecer sua relao com tipos estveis de enunciados da lngua,
que permitam, ao estudante, apropriar-se de estratgias de construo discursiva
que o capacitem a se tornar um usurio efetivo da escrita na sociedade em que vive.
Esse parece ser o desafio maior, como resume Mello (2010a): trazer a cultura
escrita para dentro da escola, por meio do trabalho com uma variedade de suportes
textuais nos quais se sustentam os diversos gneros discursivos para que, ento,
possa-se fazer da escola um espao da cultura escrita por excelncia.
Considerando a teoria do ensino desenvolvimental de Davidov para o trabalho
com a escrita a ser desenvolvido com e pelos professores de lngua portuguesa,
esta se demonstrou importante para a pesquisa, considerando as implicaes da
teoria da atividade e dos conceitos de atividade de estudo para aprofundamento das
investigaes dos problemas do ensino e da escrita, bem como para refletir sobre a
atividade de ensino dos professores por meio do desenvolvimento do pensamento
terico, que deve partir das abstraes, generalizaes e conceitos, em substituio
aos conceitos espontneos, de base emprica, que, pelo processo de superao,
elevam-se ao nvel do conceitual terico.
22
Assim, pensar a escrita a partir do pensamento terico implica substituir os
princpios que ainda regem o ensino da lngua como ensino mnemnico das
estruturas lingusticas, como hbito motor, mecnico da produo textual e romper
com a superficialidade na apresentao dos conceitos tericos, direcionando o
ensino da escrita, desde os primeiros anos escolares, para a formao do
pensamento terico.
Dessa forma, tanto os contedos quanto os procedimentos metodolgicos
estaro voltados, secundariamente, para que os alunos se apropriem teoricamente
dos conhecimentos sobre a escrita que parta do geral, buscando compreender a
gnese, a essncia do conceito.
Assim, entendemos que a reflexo do docente de lngua portuguesa, a partir
das mediaes tericas, pode contribuir para o desenvolvimento no processo da
escrita nos anos finais do Ensino Fundamental e favorecer uma prtica pedaggica
situada, intencional e sistematizada para a constituio do ser humano como sujeito
de linguagem que precisa apropriar-se desta como maneira de colocar-se no mundo,
fundando sua prpria historicidade.
Apresentarei, a seguir, a estrutura deste trabalho e explicitarei os caminhos
trilhados a partir das bases terica, metodolgica, axiolgica, filosfica, conceitual e
epistemolgica que guiaram nosso pensamento, nossas aes e embasaram esta
pesquisa.
O primeiro captulo explicita OS CAMINHOS DA PESQUISA PELO
MATERIALISMO HISTRICO-DIALTICO a partir do referencial Histrico-Cultural e
discute o mtodo e as categorias metodolgicas assumidas na pesquisa. Apresenta,
ainda, o percurso metodolgico e o campo da pesquisa que contemplam a escola
como lcus de anlise, os participantes e seu universo de trabalho. Tambm
organizamos um quadro estruturante com as leituras realizadas, mas sem a inteno
de didatizar o trabalho com O texto na sala de aula, apenas para evidenciar o
caminho que pretendamos percorrer com o grupo de professores, naquele dado
momento e dentro de determinadas condies do trabalho docente.
O segundo captulo apresenta O SENTIDO HUMANIZADOR DO TRABALHO
DOCENTE E O SIGNIFICADO DE ESCRITA PARA O PROFESSOR DE LNGUA
PORTUGUESA, enfocando a formao continuada do professor de lngua portuguesa
23
como possibilidade para uma reflexo sobre sua prtica e a transformao do seu
trabalho com a escrita em atividade humanizadora sua e de seus alunos.
No terceiro captulo, intitulado O ESPAO DIALGICO: no rio de reflexes
sobre a prtica, as pontes de mediao terica, apresento, a partir das fontes
geradoras de dados (dirios de campo, discusses do grupo dialogal, registros de
autorreflexo dos professores e o questionrio do primeiro encontro do grupo), as
anlises que partem das leituras realizadas pelo grupo de professores participantes em
articulao aos conceitos trabalhados durante o processo de formao continuada
proposto na pesquisa. Na anlise, apresento no s os achados da pesquisa, mas
tambm os equvocos cometidos na conduo da investigao e que seguem
apresentados como limites e possibilidades deste trabalho. Explicito as estratgias
construdas com os professores e utilizadas nas turmas, alm das anlises dos dados
gerados pela pesquisa sobre o processo de apropriao da escrita, enfocando os
sentidos do trabalho docente para os professores nos processos de produo de textos
com os alunos, as condies em que desenvolvem seu trabalho e sua formao.
Ao finalizar a apresentao do relatrio de pesquisa, teo as concluses
deste trabalho com o intuito de referendar a tese proposta para esta investigao e
apontar caminhos compreenso de uma prtica pedaggica situada e intencional
para a mediao do processo de desenvolvimento da escrita dos alunos dos anos
finais do ensino fundamental.
24
1 OS CAMINHOS DA PESQUISA PELO MATERIALISMO HISTRICO-DIALTICO
Se pesquisar a formao de professores implica compreender o que significa
formao e pesquisa, parte desta compreenso deve-se assuno de um ponto de
vista tanto conceitual quanto poltico sobre esses significados. Como destacam
Bissoli e Both (2016, p. 16), fundamentadas em Mszros (2005), Formar
professores , por isso, assumir uma postura filosfico-ideolgica, conceitual e
axiolgica que pode se perfilar lgica neoliberal ou, antes, constituir lcus de
contrainternalizao, resistncia e transgresso.
Assim, se a pesquisa procede de uma conscincia que se identifique com as
massas, essa ser a condio para a qual se voltar o seu resultado,
independentemente de qualquer finalidade previamente destinada, como pontua
Pinto (1969).
Nesse ponto, destaca-se a dialtica entre singularidade, particularidade e
universalidade, segundo a qual a pesquisa assume a tarefa de perceber, nas
situaes singulares que investiga, como a particularidade que envolve as histrias
dos sujeitos, ou suas condies materiais de existncia que se expressam
diferentemente de acordo com a classe social a que pertenam na sociedade
capitalista , permite ou no que esses mesmos sujeitos se aproximem (ou se
distanciem) do desenvolvimento mais avanado alcanado pela humanidade.
Conforme Oliveira (2005), a dialtica singular-particular-universal
[...] constitui-se na relao entre a singularidade (o indivduo) e a universalidade (o gnero humano), a qual se concretiza atravs das mltiplas mediaes determinadas pelas relaes sociais especficas do contexto (a particularidade) em que esse indivduo est inserido. (OLIVEIRA, 2005, p. 20).
Como define Oliveira (2005), essa a compreenso fundamental que se deve
ter, na condio de pesquisador ou profissional que pretende contribuir para a
emancipao humana, ao considerar que todo esse processo entre o singular (o
indivduo) e o universal (o gnero humano) se materializa por meio das relaes que
esse indivduo singular mantm com a particularidade. A questo a ser discutida,
ento, como essa singularidade humana construda na sua relao com a
universalidade, em que a funo da particularidade, enquanto mediao social por
25
meio da qual a universalidade se concretiza na singularidade, pode estar sendo
suprimida pelo bvio, como Mello (1993) alerta. Para a autora, a obviedade
estabelece uma relao direta e restrita entre indivduo-sociedade e indivduo-
genericidade, como processo adaptativo ao social, conforme denuncia Oliveira
(2005, p. 19-20), numa adaptao [que] no visa universalizao do homem, mas
universalizao do mercado.
A pesquisa se coloca, pois, como investimento na atividade de compreender
os mltiplos determinantes que medeiam as relaes entre os sujeitos singulares e o
humano genrico, como pontua Oliveira (2005) ou, mais especificamente, de
entender como as condies do contexto em que os professores de lngua
portuguesa produzem seu trabalho e sua formao alterados pela presena da
pesquisadora e pelas mediaes que produz permitem ou no a sua humanizao
e a de seus alunos.
Em outros termos, este trabalho assume os pressupostos vigotskianos de que
o desenvolvimento das funes psquicas superiores (VYGOTSKI, 2000a), que visa
a garantir a apropriao do patrimnio humano-genrico por todas as pessoas,
especialmente quelas que pertencem s camadas sociais que dele esto
expropriadas, deve caminhar de uma conscincia interpsquica que reside na prtica
social dos homens outra intrapsquica. Por meio das mediaes tericas do
trabalho de pesquisa, como atividade de mediao social do homem da cincia,
pretende-se interferir positivamente sobre o processo de tomada de conscincia dos
professores a respeito de seu trabalho com a escrita. preciso compreender que ao
pesquisador, cuja existncia tambm condicionada pelas determinaes da elite
que o dirige, cabe, por seu turno, a assuno consciente do seu papel como agente
de uma prxis transformadora, ao construir conhecimentos sobre e nas relaes que
estabelece com os sujeitos da realidade investigada, conforme pontua Snchez
Vzquez (2011).
Para o materialismo histrico-dialtico, a compreenso processual e totalitria
de dado fenmeno encontra respaldo, sobretudo, na dialtica, cujo fundamento da
anlise sustenta-se no estabelecimento de nexos entre singular e universal,
permitindo enxergar, em dado fenmeno, em que medida a singularidade condensa
a universalidade (MARTINS, 2015, p. 38).
26
Considerando neste estudo a adoo de uma concepo de pesquisa pela
epistemologia materialista histrico-dialtica e, ainda, dentro de uma perspectiva da
pesquisa com formao, que congrega a dimenso formativa como elemento
potencial e primordial da investigao, a opo terico-metodolgica pela Teoria
Histrico-Cultural e suas implicaes na perspectiva de realizao de uma pesquisa
com formao tornaram-se escolhas imbricadas.
Sob uma orientao dentro de um enfoque histrico-cultural, Delari Jr. (2015)
destaca que a questo do mtodo se coloca como uma questo central de busca da
verdade, como um dos meios necessrios para que a investigao cientfica atinja
um conhecimento crtico sobre a realidade humana e traga luz fundamentos para a
sua transformao coletiva em direo emancipao do gnero humano.
Para caminhar na direo dessa busca da criticidade, dois princpios devero
estar articulados: o princpio dialgico e o princpio da prtica.
1.1 O princpio dialgico
O princpio dialgico ou dialogismo pode ser compreendido nos estudos de
Volchinov (2017) sobre tema e significao na lngua em relao aos problemas da
compreenso. Segundo Volchinov (2017, p. 232), Toda a verdadeira compreenso
ativa e possui um embrio de resposta. Apenas a compreenso ativa capaz de
dominar o tema, pois o processo de formao s pode se apreendido com a ajuda
de outro processo em formao.
Desse modo, segundo Volchinov (2017), para compreender o discurso do
outro preciso que nos orientemos em relao a ele e, a cada palavra de enunciado
compreendida, acrescentemos nossas prprias camadas de palavras responsivas.
Nesse processo de compreenso ativa e responsiva, o autor reafirma o postulado de
que Toda a compreenso dialgica (VOLCHINOV, 2017, p. 232).
Nesse sentido, o dialogismo compreendido a partir do sentido de enunciado
como formas de discursos verbais vivos e integrais que compem a estrutura
socioideolgica. Assim, ao partirmos para uma anlise dialgica:
27
necessria uma anlise profunda e detalhada da palavra na qualidade de signo social, com o propsito de compreender a sua funo com um meio da conscincia.
Esse papel excepcional da palavra como um meio da conscincia determina o fato de que a palavra acompanha toda a criao ideolgica como seu ingrediente indispensvel. A palavra acompanha e comenta todo ato ideolgico. (VOLCHINOV, 2017, p. 100).
Mesmo assim, Volchinov (2017, p. 101) destaca que a palavra no capaz
de substituir por completo todos os signos ideolgicos, mas todos os signos
ideolgicos apoiam-se na palavra e so acompanhados por ela que est presente
em todo ato de compreenso e em todo ato de interpretao. Por isso, as prprias
formas e mecanismos da refrao ideolgica no signo e na conscincia devem ser
estudados no elemento material lingustico da palavra.
Considerando os parmetros de anlise dos registros de autorreflexo e as
produes orais dos sujeitos enunciadores, o princpio dialgico, conjugado com os
estudos da funo do signo no desenvolvimento das funes psquicas superiores,
definida por Vygotski (2007), busquei identificar as vozes que os sujeitos assumiram,
ou a quem atribumos a responsabilidade pelos enunciados nas atividades coletivas
mediadas pelas prticas de linguagem.
Analisei as instncias enunciativas s quais pertencem as vozes dos
sujeitos enunciadores: vozes do personagem (autor-personagem), vozes das
instncias sociais ou vozes do autor emprico, no perdendo de vista, nas anlises
realizadas, que voz ou vozes tinham assumido a responsabilidade pelos enunciados
e como ocorreu seu gerenciamento pelos sujeitos enunciadores que se apropriam
dessas vozes.
Assim, a palavra que buscamos nas anlises, como postula Bakhtin (1997, p.
393), precisa estar fundamentada, pois tem A obrigao de ser o representante de
algum. O cientista dispe de suas teorias, de sua experincia, de suas
experimentaes. Talvez, nesse ponto o cientista se aproxime mais do jornalista,
para quem Bakhtin (1997, p. 393) considera que Vive na esfera das questes que
podem ser resolvidas na contemporaneidade (ou, pelo menos, num tempo prximo).
Participa de um dilogo que pode ser concludo, de um dilogo que pode passar
ao, pode converter-se em fora emprica.
28
Se, como pontua Delari Jr. (2015), o relativismo e o dogmatismo negam o
dilogo, o princpio dialgico, por outro lado, estabelece o confronto para buscar a
maior objetividade que o critrio essencial para chegar crtica, como nos ensina
Saviani (1991), pois a criticidade demanda atentar para as contradies do real
como critrio de objetividade.
Porm, Delari Jr. (2015) alerta que o dilogo no suficiente para garantir a
existncia da objetividade, pois necessrio tambm o confronto com a realidade
material mediante uma interveno prtica que atue sobre, dentro e como
componente dessa prpria realidade. Assim, o princpio dialgico, cujo
entendimento busquei em Volchinov (2017), complementa-se ao princpio da
prtica, fundamentada nos postulados marxistas.
1.2 O princpio de prtica pelo marxismo
Embora o dilogo seja um princpio potencializador que permite a articulao de
pontos de vista parciais para a compreenso objetiva do conjunto da realidade, no
princpio da prxis, como prtica transformadora da realidade e possibilitadora da
emancipao do ser humano como ser humano genrico, que se constitui a fonte e o
destino do conhecimento crtico.
importante destacar que teoria e prtica no podem ser pensadas
separadamente, como momentos estanques em que uma s comea quando a outra
termina. Ou ainda pior, como se apregoa no senso comum, que na teoria uma coisa,
mas na prtica outra, como se teoria e prtica pudessem ser atividades
independentes e desconectadas. Como muito bem pontua Snchez Vzquez (2011, p.
242), O senso comum o sentido da prtica. [...]. A conscincia simples se v a si
mesma em oposio teoria, j que a intromisso dessa no processo prtico lhe
parece perturbadora.
A teoria , pois, um momento importante da prxis, pois o que vai qualific-la,
distinguindo-a de uma atividade cega, repetitiva. Do mesmo modo, a prxis, para existir,
precisa ser realizada por indivduos livres, conscientes, no podendo ser confundida
29
como simples prtica laboral, pois, como nos orienta Marx, a liberdade comea onde
cessa o trabalho condicionado pela necessidade e por fins externos.
Pensado a categoria da prxis a partir do ngulo do trabalhador, Marx auxilia na
compreenso de que, historicamente, as concepes sobre teoria e prtica
desenvolveram-se a partir do modo de produo do sistema capitalista que transformou
a fora de trabalho em mercadoria, igual a qualquer outro produto, comprado ou
vendido por um preo sujeito a avaliaes puramente quantitativas.
Como pesquisadora da rea da formao de professores cujo campo conjuga a
dimenso da formao e do trabalho docente, acredito no necessrio esforo cognitivo,
nesse processo de articulao entre teoria e prtica, mediado pelo dilogo, para
resgatar nos participantes da pesquisa as inquietaes que j mobilizavam os gregos
antigos, isto , envolver tambm a atividade moral, a participao nos dilogos e
decises com demais membros da sociedade, a fim de pensarmos uma formao
docente em que professores, livres e crticos, nos limites e possibilidades da estrutura
social vigente, possam refletir sobre sua realidade e, assim, ter condies de
transform-la.
Apesar dos nossos esforos em pesquisa, sabemos que existem muitas
limitaes e desafios que se colocam prtica pedaggica do professor para o
desenvolvimento de uma prtica transformadora e emancipatria na escola.
necessrio esforo cognitivo, leituras e compromisso tico para entender que teoria e
prtica, embora sejam diferentes e contraditrias, so os dois lados opostos de uma
mesma moeda.
Pasqualini (2015), em pesquisa sobre a prtica pedaggica do professor da
educao infantil, pontua, dentre as dificuldades de realizar pesquisa dentro do
materialismo histrico-dialtico, a compreenso dicotmica do docente sobre a
totalidade concreta, que vislumbra a busca pelo conhecimento crtico como atividade
prpria do pesquisador, cabendo-lhe, apenas, na funo de docente, realizar a prtica a
partir das orientaes que o campo terico indicar, como se este fosse superior quela.
A articulao dos dois princpios para a busca da criticidade, o dialogismo e a
prtica, permite estabelecer uma relao de contradio e de interdependncia entre os
elementos constitutivos da realidade que precisa ser mudada, interpretada, refletida e
pensada criticamente.
30
Como a grande preocupao de Vigotski esteve sempre voltada questo do
mtodo, como questo primria que permite realizar a busca da verdade, acredito que
essa seja tambm uma preocupao vital no desenvolvimento de todo percurso de
pesquisa que se coloque dentro de uma concepo materialista histrico-dialtica e de
uma orientao histrico-cultural.
Nesse sentido, nossa pesquisa sobre as reflexes dos professores de lngua
portuguesa acerca do processo de apropriao da escrita na esfera escolar, nos anos
finais do ensino fundamental, seguiu os caminhos da cognio traados por Vigotski e
didaticamente explicitados por Delari Jr. (2015), o qual passo a expor, partindo sempre
de uma compreenso do mtodo como campo terico-filosfico e como prtica da
investigao cientfica, e de metodologia como as problematizaes acerca do mtodo
que reflete criticamente sobre as prprias condies de possibilidades para que o
conhecimento terico se d (DELARI JR, 2015, p. 55).
1.3 O mtodo e as categorias metodolgicas assumidas na pesquisa
Considerando os conceitos de mtodo e de metodologia tomados na Teoria
Histrico-Cultural, cabe apresentar as categorias metodolgicas gerais postuladas por
Vigotski e que esto a problematizar o processo de investigao por meio das seguintes
questes: (i) qual o objeto de anlise; (ii) qual o princpio explicativo para o objeto de
anlise; (iii) qual a unidade de anlise que articula concretamente o objeto ao seu
princpio explicativo; e (iv) qual o modo de proceder anlise que perpassa o objeto a
ser analisado, o seu princpio explicativo e a unidade de anlise articulatria entre
objeto-princpio explicativo.
Anuncio neste subitem que, para a anlise dos dados gerados, as categorias de
Humanizao, Atividade e Desenvolvimento, articuladas s unidades de anlise do
significado e das vivncias e partindo do princpio explicativo da mediao pedaggica e
da necessidade de apropriao-objetivao da escrita, devem permear todo o processo
da pesquisa, desde as discusses no grupo dialogal, a anlise de narrativas de
autorreflexo, a observao participante das turmas e os registros do dirio de campo,
como possibilidade de compreenso das mltiplas relaes e contradies da realidade
pesquisada.
31
Apresentadas as categorias metodolgicas, passarei a explicitar o delineamento
da pesquisa, a partir da articulao que estabeleo entre o estudo desenvolvido, o
objeto de anlise, o princpio explicativo do objeto, a unidade de anlise e o modo de
proceder anlise.
1.3.1 O objeto de anlise da investigao
Ao considerarmos, dentro da psicologia histrico-cultural, como seus grandes
objetos de anlise a conscincia, a personalidade e o prprio homem, uma vez que
estes, como pontua Delari Jr. (2015), no so dentro da tradio marxista da psicologia
histrico-cultural entes com vida prpria, seres em si, mas seres sociais, podem-se
encontrar tambm as denominadas funes psquicas superiores (FPS) como
importantes objetos de anlise e que, por definio, so desenvolvidas de maneira
consciente, no meio social, de forma mediada e voluntria.
Para Vygotski (2012), as funes psicolgicas do ser humano esto regidas,
dentro de um sistema amplo e complexo, por aspiraes, atraes e interesses
sedimentados na personalidade. Essas so foras motrizes que variam de acordo com
a idade e seu desenvolvimento determina as mudanas que ocorrem na prpria
conduta.
Para o autor bielorrusso, preciso ver esse processo de desenvolvimento em
toda a sua complexidade real e tomar em conta todas as novas formaes reais que
surgem quando a criana passa de uma idade outra (VYGOTSKI, 2012, p. 12,
traduo nossa).
Como uma das formas superiores de conduta, a escrita constitui-se como
elemento da conscincia humana que contm todas as contradies desse conjunto. A
escrita, como instrumento cultural, no s possibilita o registro, a comunicao, a
expresso das formas mais elaboradas da cultura humana, mas, sobretudo, como
elucida Vygotski (2000b), do ponto de vista psicolgico,
[...] o domnio da escrita no deve ser entendido como uma forma de conduta puramente externa, mecnica, dada desde fora, mas como um determinado momento no desenvolvimento do comportamento que surge de modo inevitvel em um determinado ponto e est
32
vinculado geneticamente com tudo que o preparou e o tornou possvel. O desenvolvimento da linguagem escrita pertence primeira e mais evidente linha do desenvolvimento cultural, uma vez que est relacionado com o domnio do sistema externo de meios elaborados e estruturados no processo do desenvolvimento cultural da humanidade. (VYGOTSKI, 2000b, p. 185).
A importncia da funo psquica superior da linguagem, destacada por
Vygotski (2000b), reside justamente no fato de pertencer a essa primeira linha do
desenvolvimento cultural que permite a conexo social entre humanos e a
capacidade de influenciar no seu desenvolvimento por meio da apropriao das
objetivaes humano-genricas6.
Sobre a categoria objetivao-apropriao na relao entre o pensamento e a
linguagem, Grillo (2017, pp. 18-19), em ensaio introdutrio obra Marxismo e
Filosofia da Linguagem (MFL) de Volchinov (2017), ao citar Humboldt7 (2013),
destaca que a essncia da linguagem ser mediao entre os homens e deles com
o mundo [...] e a lngua elo entre os homens, pois este s compreende a si mesmo
depois de certificar-se da compreenso de suas palavras pelos demais.
Nesse sentido, Vygotski (2012, p. 73) tambm argumenta que Para captar a
prpria dinmica espiritual, para compreender as prprias percepes externas, o
indivduo deve objetivar cada uma delas em palavras e relacionar com outras
palavras (VYGOTSKI, 2012, p. 73).
6 Conforme Heller (1977), as objetivaes humano-genricas so o resultado da atividade humana, usado como
sistema de referncia contextual e concretizado historicamente pelos homens ao longo das geraes, no percurso de toda a histria da humanidade. Dividem-se em objetivaes em-si (ontologicamente primrias: linguagem, usos e costumes) e para-si (ontologicamente secundrias: Cincia, Arte, Moral, Poltica e Filosofia). Ainda segundo Heller (1977), como as objetivaes humano-genricas se efetivam por meio da socialidade e dentro da estrutura social em que o indivduo vive, tambm s podem ser concretizadas em sua plenitude quando esse indivduo consegue superar as determinaes histrico-sociais e se apropriar das possibilidades j apresentadas pelo gnero humano.
7 Importante linguista alemo, Wilhelm von Humboldt (1767-1835) considerado o fundador da
lingustica geral embora no Brasil esse ttulo seja atribudo a Saussure - e foi quem deu as bases para os estudos histricos da linguagem dentre tantos outros na rea da filosofia, teoria literria, filologia clssica, lnguas basca, indgena das Amricas e chins. Na obra MFL, Volchinov (2017) destaca a influncia determinante desse terico para a lingustica russa, dado que seu pensamento mais amplo, complexo e contraditrio, e por isso que Humboldt se tornou mentor de orientaes bastante dspares (VOLCHINOV, 2017, p. 149).
33
Grillo (2017, p. 26), ao sintetizar os princpios da concepo de Potebni8
(2010) sobre a relao entre pensamento e linguagem, argumenta que A palavra
contm a representao do elemento unificador do objeto bem como a imagem
partilhada; ambos compem o elemento estvel da representao ao mesmo tempo
que encerram a possibilidade do novo, do inesperado.
E como no se pode perder de vista que o projeto da psicologia histrico-
cultural desenvolver a cincia do novo homem, pois, reiterando a mxima da
Teoria Histrico-Cultural, o compromisso maior de seus pesquisadores est em
explicar a realidade no s como ela , mas como ela pode ser, todo objeto de
anlise da THC deve voltar-se a um projeto de transformao da sociedade,
contribuindo para que seja justa e igualitria e, como tambm nos orienta Pinto
(1969), que adote uma posio em favor das massas mais sacrificadas da
sociedade.
Nesse aspecto, delimitei como objeto primrio de anlise nesta tese a
formao continuada dos professores de lngua portuguesa e, como objeto
secundrio, a compreenso da lngua escrita nos anos finais do ensino fundamental.
Sustento que, a partir dessa categoria metodolgica, as anlises dos objetos podem
contribuir para as transformaes sociais, em que alunos compreendam o
significado social de escrita e seus professores recuperem o sentido da atividade
mediadora do trabalho pedaggico, o senso crtico diante da realidade e,
consequentemente, a humanizao.
1.3.2 O princpio explicativo para o objeto de anlise
Para a THC, no basta eleger o objeto e analis-lo. preciso, alm disso,
estabelecer os nexos causais entre o objeto e aquilo que explica sua origem
histrica. Se, para o materialismo histrico-dialtico, as relaes sociais
estabelecidas historicamente marcam a ontognese humana, suas contradies,
8 Fillogo russo-ucraniano, Aleksandr Potebni (1835-1891) considerado um dos expoentes russos
do subjetivismo individualista de tendncia humboldtiana. Embora convirjam em muitos pontos, Potebni tece vrias crticas a Humboldt e assume, em sua concepo da relao entre pensamento e linguagem, que As leis de criao da linguagem so psicolgicas, portanto, a origem da linguagem est nas leis do psiquismo individual (GRILLO, 2017, p. 25).
34
avanos, retrocessos e superaes, possvel, ento, compreender por que, para a
psicologia histrico-cultural, no h outro princpio explicativo para a conscincia, as
funes psquicas superiores e a personalidade que no seja necessariamente pelas
relaes sociais humanas.
Como pontua Delari Jr. (2015), o surgimento de diferentes momentos do
desenvolvimento ontogentico, como as fases de transio, explica os diferentes
modos de relao social que se apresentam na existncia humana, em cada idade
psicolgica. As relaes sociais so fonte, fora motriz e princpio explicativo de
anlise das funes psquicas humanas.
Em um trecho lapidar, Vygotski (2012, p. 21, traduo nossa) declara que,
De fato, somente o homem no processo de seu desenvolvimento histrico consegue criar novas foras motrizes da conduta, to s ao longo do processo histrico-social do ser humano tem surgido, tem se formado e tem se desenvolvido suas novas necessidades ao tempo em que as prprias necessidades naturais tm experimentado uma profunda mudana no desenvolvimento histrico do homem. (VYGOTSKI 2012, p. 21, traduo nossa).
Assim, segundo Vygotski (2012, p. 21), preciso levar em considerao a
mudana da natureza humana no processo de desenvolvimento histrico, o carter
histrico das novas formaes psquicas, que se pode denominar de interesses, e
compreender que as necessidades humanas se refratam mltiplas vezes no prisma
das complexas relaes.
preciso, ainda, compreender as relaes sociais no apenas como fatores
externos, do meio ambiente em interao com o indivduo ou, tampouco, simples
contexto, pano de fundo, cenrio. As relaes sociais como princpio explicativo so,
segundo Vygotski (2012), situaes sociais marcantes e de profundo impacto que
ocorrem no ser humano. Considerando a adolescncia, especialmente, a fase de
transio, existem mudanas qualitativas significativas no pensamento do
adolescente, com o aparecimento de uma forma completamente nova de relao
entre o abstrato e o concreto, uma nova forma de fuso ou de sntese, cujo ncleo
fundamental a formao de conceitos, que aglutina todas as mudanas que se
produzem no pensamento do adolescente.
Dessa forma, considerando como objeto de anlise a compreenso, pelo
professor de lngua portuguesa, do processo de apropriao da escrita nos anos
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finais do ensino fundamental, por meio das mediaes realizadas no grupo dialogal,
preciso pensar tambm sobre as mltiplas determinaes que esto a influir no
adolescente durante a idade de transio9, o que implica compreender, por exemplo,
que preciso criar a necessidade da escrita a partir da formao de interesses (que
so necessidades culturais superiores) pela escrita que movero o jovem a
estabelecer, com esse instrumento cultural complexo, uma ligao com as demais
atividades que sucessivamente aparecero em sua vida.
Como as relaes pessoais, nessa fase, so o ponto de partida, h de se
considerar que o adolescente se completa, enriquece-se e se orienta pelo social,
conforme nos orienta Vygotski (2012) que, ao citar Zalkind (s.d.), alerta, ainda, que
preciso partir dos grandes interesses do adolescente e, aos poucos, ir orientando e
transformando seus interesses e atividades por meio da insero de atividades
correntes, do cotidiano, que tambm so importantes nessa relao entre o pessoal
e o social, o intrapsquico e o interpsquico.
preciso, pois, como sustenta Vygotski (2012, p. 24), compreender que
todos os mecanismos da conduta do adolescente comeam a funcionar em um
mundo interno e externo completamente distinto, em que interesses internos e
influxos incitadores externos so responsveis pelas mudanas profundas que
experimentam os adolescentes neste perodo.
Pensando mais especificamente sobre as atividades de escrita, alm da
mediao pedaggica do professor e/ou de um par mais avanado, preciso
considerar os interesses egodominantes dos adolescentes, os interesses centrais e
que podem mov-los para os atos de escrita. Assim, o professor, como aquele que
organiza os elementos externos mediadores do processo de apropriao-objetivao
do conhecimento historicamente acumulado, precisa pensar em propostas de
atividades de leitura e produo de textos que saiam das temticas habituais, sejam
mais desafiadoras e projetem o pensamento do adolescente para as grandes
9 Ao citar os estudos de Blonski (1930), Vygotski (2012, p. 255, nossa traduo) destaca etapas e estgios do
perodo de vida infantil que so separados entre si por crises mais [etapas] ou menos [estgios] violentas. Essas etapas so perodos da vida infantil marcados por mudanas no desenvolvimento que, s vezes, apresentam-se sob a forma de crises agudas. Na idade de transio, por volta dos treze anos, diversos autores descrevem uma crise que denota uma fase negativa da idade de maturao sexual, marcada pela queda no rendimento escolar que se d pela mudana do pensamento visual-direto a uma forma superior de atividade intelectual voltada deduo e compreenso. Os perodos de crise se intercalam com perodos estveis e confirmam a tese de que o desenvolvimento da criana um processo dialtico, em que a passagem de um estgio a outro no se d pela via evolutiva, mas pela via revolucionria.
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questes que lhe despertam o interesse e lhe encaminhem rumo s objetivaes
genricas para-si (HELLER, 1977).
Nesse sentido, verifica-se a importncia da escola na modificao de
interesses, permutando-os, educando-os e formando novos interesses culturalmente
desenvolvidos nos adolescentes, a partir da apropriao das objetivaes genricas
que podem ampliar a viso de mundo dos estudantes. Significa, pois, que a escola
pode influenciar positivamente essas tendncias que o adolescente traz,
canalizando essa potncia para outros interesses que so foras motrizes do
desenvolvimento das funes psquicas superiores e para a formao de sua
conscincia e personalidade.
Quanto aos interesses culturais, destaca-se a importncia da escola em
apresentar aos alunos, nesse perodo, os patrimnios culturais desenvolvidos pela
humanidade. Mas preciso questionar, dentro do modo de produo capitalista que
tudo massifica, transformando em produto para ser produzido e consumido em larga
escala, a dificuldade de se desenvolverem interesses culturais fora do que a
indstria cultural tem oferecido aos jovens, impedindo-os, como alerta Adorno
(2002), de se tornarem autnomos, independentes, com capacidade de julgar e
decidir conscientemente.
Ao citar Gramsci (1966), Both (2016, p.148) destaca tambm que a
apropriao desse patrimnio cultural no ocorre espontaneamente, mas necessita
que seja ensinada ao aluno pelo professor, ou seja,
Em outros termos, requer que os conhecimentos que integram o patrimnio cultural da humanidade sejam transmitidos, pelos indivduos que possuem experincia mais rica, para os indivduos menos desenvolvidos (GRAMSCI, 1966), com o propsito de promover a elevao das capacidades na perspectiva humanizadora. (BOTH, 2016, p.148).
Para que esse processo de apropriao ocorra, o adulto tambm dever ter
se apropriado do patrimnio cultural da humanidade. Essa questo coloca em foco o
problema da formao cultural do professor que, como destaca Vygotski (2012),
como adulto mais desenvolvido, deve apresentar ao adolescente os patrimnios
culturais que contribuiro para reorientar seus interesses nessa fase. Mas o
problema incide no fato de que a formao precarizada do professor e suas
condies limitadoras de vida e de trabalho o impedem de ajudar a desenvolver
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interesses culturais, pois ele mesmo tambm no se apropriou do patrimnio cultural
da humanidade. Afinal, a mxima de que ningum pode dar o que no tem aplica-se
tambm a essa situao.
Dessa forma, pensar sobre o princpio explicativo do objeto, na psicologia
histrico-cultural, no significa apenas saber se os estudantes tm ou no interesse
pelo estudo, pela escrita, pois em uma viso fatalista a partir da qual os interesses
seriam definidos apenas a partir de disposies internas aos indivduos, se no o
tm, jamais estudaro de fato. Significa, entretanto, saber como ser esse interesse
do jovem, de onde procede, como pode ser modificado e ampliado. Assim,
acreditamos que a atividade mediadora do professor, ao partir dessa compreenso
das necessidades culturais que precisam ser cultivadas na idade de transio, cria
uma situao verdadeira em que o adolescente encontra o sentido real da escrita
como um instrumento que ele poder utilizar em suas relaes com as pessoas que
fazem parte de seu universo existencial (BASSAN, 2012, p. 12).
Do mesmo modo, nesta pesquisa, as reflexes realizadas no grupo dialogal e
os registros de autorreflexo que objetivam o processo de transmutao das
relaes interpsquicas do processo formativo em ponderaes dos prprios
sujeitos, mediadas pelo pensamento terico acerca do desenvolvimento da escrita ,
possibilitaram o reencontro (ou mesmo o encontro) do professor com o sentido
humanizador da atividade docente, qualificando a sua prtica pedaggica.
1.3.3 A unidade de anlise que articula o objeto e o princpio explicativo
Como orienta Delari Jr. (2015), no enfoque histrico-cultural, pautado na
prpria epistemologia do materialismo histrico-dialtico, a relao entre o objeto e
seu princpio explicativo no se d de forma direta, mas pela mediao de unidades
de anlise que se constitui como realidade material e dinmica que preserva as
caractersticas essenciais da totalidade. E no sendo possvel, pois, ao investigador
pesquisar a totalidade da conscincia humana e a totalidade das relaes sociais
em seu desenvolvimento, cabe ao pesquisador eleger as unidades de anlise que
iro permitir investigar essa realidade complexa em suas caractersticas mais
concentradas.
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Nesse direcionamento, esta pesquisa considerou como unidades de anlise
que articulam o objeto e seu princpio explicativo duas unidades: a primeira a do
significado social da escrita; a segunda a vivncia do significado social da escrita.
Compreendo essas duas unidades de anlise como cruciais para essa
categoria metodolgica, uma vez que no s articulam o objeto e o princpio
explicativo, mas tambm esto intrinsecamente relacionadas, j que o significado
social da escrita decorre das vivncias, como uma forma particular de experincia
pela qual passamos, uma experincia vivida muito intensamente (DELARI JR.,
2015, p. 62). Do mesmo modo, s podemos partilhar das vivncias de outrem
mediante a apropriao do significado da palavra, materializada nos signos cujos
sentidos e significado do-se na relao com o social.
Assim como ocorre na compreenso da escrita na idade de transio, em que
possvel verificar como as vivncias, aglutinadas pelo signo lingustico, podem
possibilitar no s o desenvolvimento da conscincia (a ampliao da viso de
mundo dos adolescentes), mas tambm podem promover o desenvolvimento da
personalidade, do mesmo modo, considerou-se o significado da escrita por parte do
professor de lngua portuguesa, bem como as vivncias do significado social da
escrita.
Dessa forma, busquei, no material coletado/produzido por intermdio das
observaes participantes, do grupo dialogal e dos registros autorreflexivos e do
questionrio do primeiro encontro do grupo, categorizar os sentidos atribudos pelos
professores participantes da pesquisa ao processo de desenvolvimento da escrita
nos anos finais do ensino fundamental, destacando a forma pela qual compreendem
seu trabalho.
Os sentidos da palavra tanto nos discursos orais quanto escritos dos
participantes so tomados como fonte para a apreenso da realidade estudada,
permitindo buscar compreender as relaes entre a realidade em que o trabalho dos
professores se desenvolve, sua formao inicial e continuada (e aquela induzida
pela pesquisa) e as possibilidades de ressignificao da atividade docente no
processo de apropriao da escrita como instrumento cultural complexo. Assim, os
sentidos produzidos pelos professores, ao refletirem sobre a apropriao da escrita
no contexto escolar, suas possibilidades e desafios, constituram o corpus da
pesquisa sobre o qual me debrucei na anlise.
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Cabe, ainda, o alerta feito por Delari Jr. (2015) para o cuidado de no se
confundir unidade de anlise (significado e vivncia), objeto (a compreenso do
ensino de linguagem pelo professor de lngua portuguesa) e princpio explicativo
(relaes interpsquicas, no contexto da formao continuada, em que esto
presentes as reflexes do grupo dialogal, observaes participantes e os registros
autorreflexivos), uma vez que so dimenses muito amplas da pesquisa e com alto
grau de importncia. Compreender um objeto de estudo por meio de uma unidade
de anlise implica encontrar nesse objeto as contradies e os processos de
desenvolvimento que se encontram no objeto como tal (DELARI JR, 2015, p. 77).
Assim, as vivncias partilhadas no contexto da formao continuada com os
professores participantes da pesquisa foram a unidade mediadora para
compreenso dos sentidos de linguagem escrita que os professores desenvolveram.
Para Vygotski (2012), as vivncias continuam se aprofundando com o
desenvolvimento de conceitos e, nesse aspecto, o importante papel da formao
continuada na escola para a sistematizao desses sentidos partilhados socialmente
permite que o indivduo adentre em sua realidade interna, no mundo das suas
prprias vivncias, percorrendo o caminho do interpsquico ao intrapsquico.
1.3.4 O modo de proceder anlise que unifique objeto, princpio explicativo e
unidade de anlise
Considerando a tradio das pesquisas dentro da Teoria Histrico-Cultural, o
mtodo gentico ou gentico-causal consiste num modo de pesquisa que, para
Vigotski, implica buscar saber as causas dos processos investigados dentro de sua
dinmica que inclui aspectos formais, estruturais, funcionais e sistmicos.
Nesta pesquisa, o estudo nos domnios genticos da ontognese da funo
psquica da escrita na idade de transio, alm da anlise microgentica do
desenvolvimento social das funes psquicas superiores dentro do espao da sala
de aula, durante um perodo de nove meses, mediante processos de observao
participante, registros de autorreflexo e grupos dialogais com os professores,
atenderam parte das necessidades deste trabalho de pesquisa e das necessidades
sociais do grupo com o qual trabalhei.
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No tive, desde o incio, a expectativa ilusria de que, no curto espao de
tempo (de maro a novembro 2017), o grupo alcanaria a superao da
pseudoconcreticidade e a apropriao dos conceitos tericos com a ascenso ao
abstrato-universal, pois, como nos alerta Pasqualini (2015, p. 139), o tempo do
processo de pesquisa e o tempo do processo de formao, em geral no coincidem,
impondo desafios ou mesmo dilemas ao pesquisador na conduo do processo.
Nesta pesquisa, conjuguei, ainda, alguns elementos da pesquisa-formao
que, para Perrelli, Rebolo, Teixeira e Nogueira (2013) trata-se de uma pesquisa que
no se limita a recolher e analisar os dados, mas promove a formao dos
participantes. Nesse sentido, busquei legitimar a pesquisa a partir das tcnicas de
observao participante, grupo dialogal, registros de autorreflexo e questionrio
aplicado no primeiro encontro do grupo. Essas tcnicas foram conjugadas e
adaptadas pesquisa, quando, ento, intentei construir um caminho coerente com a
prpria teoria que assumi aqui, o que s se tornou possvel a partir das mediaes
com os princpios e conceitos da Teoria Histrico-Cultural. Estes foram o ponto de
partida e de chegada da anlise dos dados construdos.
1.4 Percurso metodolgico
A partir do referencial Histrico-Cultural para compreender os sentidos que os
professores atribuem prtica do docente de lngua portuguesa e pautada na
aproximao com o materialismo histrico-dialtico para compreenso crtica da
realidade social, esta pesquisa, com especial fundamento na Atividade de Estudo,
foi orientada na organizao de um grupo de quatro professores de lngua
portuguesa dos anos finais do ensino fundamental, na escola investigada, com o
objetivo de compreender como a reflexo sobre a prtica pedaggica desses
professores, a partir das mediaes tericas, incide no processo de compreenso
sobre o desenvolvimento da escrita. A inteno foi apresentar textos-base da
coletnea de O texto na sala de aula (GERALDI, 1984) que tratam da relao
terico-prtica sobre o ensino da lngua portuguesa sem, contudo, trabalhar
diretamente a teoria.
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A mediao terica com fundamento na THC foi realizada por meio de textos
norteadores cuja leitura foi de responsabilidade minha, considerando que, medida
que o grupo de professores ganhava estofo nas leituras dos textos-base que so
mais ancorados na prtica, tambm sentiria a necessidade de aumentar seu
arcabouo terico, quando, ento, eu fazia a mediao terica pela THC com os
textos norteadores.
Minha inteno no foi a de limitar o acesso dos textos da THC ao grupo de
professores, pois cheguei a sugerir a incorporao das leituras norteadoras ao
nosso cronograma de estudos. Mas a realidade objetiva se imps sobre os sujeitos
reais. E como a realidade deve ser o critrio de verdade, os sujeitos no dispuseram
(porque tambm no dispunham) mais do que 1h30min por semana para ler, discutir
e refletir sobre os textos-base que selecionamos para abordar a prtica pedaggica
no trabalho com a escrita.
Assim, no planejamento dos encontros do grupo dialogal, realizei snteses
que articulavam as leituras dos textos-base com os textos norteadores, tentando
antever uma prtica que no tinha acontecido. Mas, medida que os encontros
ocorriam, tambm revisava os textos norteadores, os conceitos, num processo de
retomada constante, pois o grupo reconhecia que este era o meu lugar
epistemolgico, o de produzir o conhecimento cientfico pela mediao terica das
reflexes que faziam sobre sua prtica pedaggica.
Para a gerao dos dados da anlise, utilizei quatro fontes de informao,
quais sejam: a) o roteiro de discusso no grupo dialogal, realizado a partir das
leituras e discusses com os professores e redigido pela pesquisadora; b) narrativas
de autorreflexo, realizadas pelos professores, a partir das leituras dos textos
propostos; c) dirio de campo da pesquisadora, redigido a partir das observaes da
prtica em sala de aula, das discusses e das narrativas de autorreflexo e d) o
roteiro de perguntas do primeiro encontro do grupo dialogal (APNDICE F).
1.4.1 A escola: o lcus de anlise
A pesquisa foi realizada em uma Escola Pblica Municipal da zona urbana de
Iranduba-AM, municpio da regio metropolitana de Manaus.
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O primeiro contato com a Escola pesquisada aconteceu em 2015 e os
trmites para autorizao da pesquisa (anexos A e B) ocorreram em 2016, bem
como a autorizao do Comit de tica por meio do processo CEP no 1.821.103
(anexo C). Em 2017 comearam os encontros semanais no grupo dialogal que se
estenderam durante o primeiro semestre letivo (maro a julho). A proposta para o
segundo semestre foi fazer encontros quinzenais (de agosto a novembro), uma vez
que tinha observado, no segundo semestre, que as escolas da rede municipal
possuem um conjunto de atividades programadas pela Secretaria de Educao, em
articulao com uma empresa privada de comunicao e o Exrcito Brasileiro, que
demandam reunies para traar estratgias ou tticas, como distingue Charlot10
(2014), de participao da escola e que incidem sobre o tempo d