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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAPÁ PRÓ-REITORIA DE ENSINO DE GRADUAÇÃO CURSO DE LICENCIATURA PLENA FÍSICA LEANDRO RODRIGUES DE SOUZA “EXPERIMENTAÇÃO, MODELAGEM E SIMULAÇÃO HIDROLÓGICA APLICADAS AO USO DE ENERGIA HIDROCINÉTICA NA BACIA DO RIO MARACÁ” MACAPÁ - AP 2009

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAPÁ PRÓ-REITORIA DE ENSINO DE GRADUAÇÃO

CURSO DE LICENCIATURA PLENA FÍSICA

LEANDRO RODRIGUES DE SOUZA

“EXPERIMENTAÇÃO, MODELAGEM E SIMULAÇÃO HIDROLÓGICA APLICADAS AO USO DE ENERGIA HIDROCINÉTICA NA BACIA DO RIO

MARACÁ”

MACAPÁ - AP

2009

LEANDRO RODRIGUES DE SOUZA

“EXPERIMENTAÇÃO, MODELAGEM E SIMULAÇÃO HIDROLÓGICA

APLICADAS AO USO DE ENERGIA HIDROCINÉTICA NA BACIA DO

RIO MARACÁ”

MACAPÁ - AP 2009

Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado ao Curso de Licenciatura Plena em Física, da Universidade Federal do Amapá – UNIFAP, para obtenção do grau de Licenciado Pleno em Física. Orientador: Profº. PhD. Alan Cavalcanti da Cunha.

Co-orientador: Profº. Dr. Wilson Ricardo Matos Rabelo.

FOLHA DE APROVAÇÃO

LEANDRO RODRIGUES DE SOUZA

“EXPERIMENTAÇÃO, MODELAGEM E SIMULAÇÃO HIDROLÓGICA

APLICADAS AO USO DE ENERGIA HIDROCINÉTICA NA BACIA DO

RIO MARACÁ”

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito para a obtenção do título de

Licenciado no Curso de Licenciatura Plena em Física da Universidade Federal do Amapá –

UNIFAP.

Componentes da banca examinadora:

_____________________________ Professor PhD. Alan Cavalcanti da Cunha

NHMET/IEPA/PPGBIO/UNIFAP Presidente da Banca

_____________________________ Professor Msc. José Reinaldo Cardoso Nery

UNIFAP

_____________________________ Professor Dr. Rudi Henri van Els

UnB

Avaliado em 26 de janeiro de 2009.

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a todos meus

familiares que me fazem sempre acreditar em

meus objetivos; em especial à minha mãe

Laíde Rodrigues de Souza por me motivar e

pela educação, à minha avó Maria de Nazaré

Rodrigues por sempre me apoiar na vida e aos

amigos pelo apoio durante os momentos

difíceis e felizes da vida.

AGRADECIMENTOS

Escrever o agradecimento é a última tarefa na redação de um trabalho de conclusão de

curso. São tantas as pessoas, ao longo dos últimos anos, que de alguma forma contribuíram

para que essas páginas fossem escritas. Quero registrar aqui meus sinceros agradecimentos a

todos.

A Deus, pela vida, pela família e pelos amigos que sempre estiveram ao nosso lado, e

por termos tido a oportunidade de tornar realidade a conclusão deste curso que tanto

almejamos.

A minha família, em especial a minha Mãe pelo grande incentivo e apoio na minha

vida estudantil, principalmente nas vésperas das provas...

Ao meu orientador Prof. Dr. Alan Cavalcanti da Cunha, pela confiança, por sua

dedicação e paciência no desenvolvimento da pesquisa.

À equipe de pesquisadores e bolsistas do Núcleo de Hidrometeorologia e Energias

Renováveis (NHMET/IEPA), pelas sugestões valiosas, pelo auxílio nos trabalhos de campos

necessários para realização do trabalho da pesquisa e compreensão de conceitos fundamentais

a pesquisa.

Aos amigos Derivan Marques, José Raimundo e Luis Aramis que me ajudaram nos

trabalhos de campo para que fosse possível desenvolver o trabalho.

Aos amigos Eduardo e sua esposa Iracy pelo apoio deste trabalho.

Aos professores do Curso de Física da Universidade Federal do Amapá (UNIFAP),

pela contribuição à minha formação profissional.

Agradecer ao professor Antônio Cesar Pinho Brasil, (P&D) Hidrocinética, REMETAP

e AERBOM pelo apoio a pesquisa, ajuda financeira para realizar as viagens de campo e na

compra de equipamentos.

E, especialmente, aos alunos da Turma de Física 2005 que nesses 4 anos de graduação

fizemos valer o significado de amizade, respeito, união, incentivo e; aos alunos da Turma de

Física 2004 que tiveram alguns “imprevistos” e acabamos fazendo amizade também.

EPÍGRAFE

“Imagine que o mundo seja algo como uma

gigantesca partida de xadrez sendo disputada

pelos deuses, e que nós fazemos parte da

audiência. Não sabemos quais são as regras do

jogo; podemos apenas observar seu desenrolar.

Em princípio, se observarmos por tempo

suficiente, iremos descobrir algumas das regras.

As regras do jogo é o que chamamos de física

fundamental”

(Richard Feynman)

RESUMO

A presente pesquisa realizou um conjunto de estudos relacionados à quantificação e análise do potencial de geração de energia hidrocinética no Médio Rio Maracá, município de Mazagão - AP. O princípio básico de geração é o aproveitamento da energia cinética da corrente natural do escoamento turbulento, contudo sem a necessidade de construir represas e aproveitando a energia decorrente somente da energia cinética de movimento horizontal. O objetivo principal do estudo foi gerar informações fundamentais e subsídios hidrológicos para o aproveitamento de energia hidrocinética em regiões remotas do Estado do Amapá, cujo sistema gerador estivesse integrado a um sistema produtivo, como o da castanha do Brasil (Hevea brasiliensis) na Reserva Extrativista do Maracá. A metodologia básica utilizada aplicou duas linhas de abordagem. A primeira foi o estudo experimental in loco para quantificação da vazão média durante o período de um ano, dividida em quatro sub-etapas bimestrais, cujos principais produtos foram a parametrização hidráulica de uma seção previamente escolhida na Vila do Maracá, a elaboração de uma curva-chave ou análise de coeficientes de descarga, e finalmente uma análise do principal parâmetro de estudo, isto é, a velocidade média da corrente. Na segunda etapa foi elaborada uma série de análises numéricas hidrológicas na bacia hidrográfica com o uso de modelagem e simulação computacional hidrometeorológica (IPHS1). Neste caso, esta segunda análise foi a avaliação do comportamento hidrológico chuva-vazão no trecho de interesse fundamentada em dados reais de eventos de precipitação. Os dados reais foram obtidos em uma estação pluviométrica convencional da ANA a qual se encontra localizada na própria bacia hidrográfica e próxima da área de estudo. Desta forma, foi possível observar os principais riscos de enchentes sobre o sistema gerador hidrocinético (turbina) em caso de estudos preventivos de eventos extremos, como cheias repentinas. A análise principal foi a simulação chuva-vazão na bacia para uma área de interesse próxima da localização da instalação da turbina hidrocinética na comunidade do Maracá. Como conclusão, observou-se que a abordagem ora adotada foi de extrema importância para identificar e modelar as principais respostas oriundas de potenciais perturbações relacionadas às entradas do modelo IPHS1. Foi possível também melhor compreender os fenômenos hidrometeorológicos que influenciam o comportamento e funcionamento hidrológico que podem comprometer a operação da turbina hidrocinética em um caso real. Assim, foi possível obter uma melhor compreensão sobre as limitações e dificuldades da inserção dessa tecnologia em bacias cujos comportamentos hidráulicos normalmente são desconhecidos. Palavra chave: Hidrologia; Simulação e modelagem; Bacias hidrográficas; Energias renováveis; Bacia do Maracá

vi

ABSTRACT

This research conducted a series of studies related to the quantification and analysis of the potential of generating energy in the Middle Rio hydrokinetic Maracá, municipality of Mazagão - AP. The basic principle of generation is the kinetic energy of the chain of natural turbulent flow, but without the need to build dams and building is due only the kinetic energy of horizontal motion. The main objective of the study was generating key information and allowances for the use of hydrological hydrokinetic energy in remote areas of the state of Amapá whose generating system is an integrated production system, such as the brown of Brazil (Hevea brasiliensis) in the Extractive Reserve Maracá. The basic methodology used applied two lines of approach. The first was the in situ experimental study to quantify the average flow during the period of one year, divided into four sub-steps bimonthly, whose main products were the parameterization hydraulic previously chosen a section in the village of Maracá devising a curve Key or analysis of the coefficients of discharge, and finally an analysis of the main parameter of study, ie the average speed of the current. The second stage was drafted a series of numerical analysis hydrological basin in the use of computational modeling and simulation hydrometeorological (IPHS1). In this case, this second analysis was to evaluate performance rain-water flow in the stretch of interest based on data from actual events of precipitation. The actual data were obtained in a conventional ANA pluviometric station which is located in the basin and near the area. Thus, it was possible to observe the potential risks of flooding on the generator system hidrocinético (turbine) in case of preventive studies of extreme events, such as Flash floods. The analysis was the main rain-flow simulation in the basin for an area of interest near the location of the installation of the turbine of the hydrokinetic Maracá in the community. In conclusion, we observed that the approach adopted was now extremely important to identify and shape the main responses from potential disturbances related to the number of model IPHS1. It can also better understand the hydrometeorological phenomena that influence the behavior and running water that could compromise the operation of hydrokinetic turbine in a real event. It was possible to obtain a better understanding about the limitations and difficulties of the integration of this technology in water basins whose behaviors are usually unknown. Keyword: Hydrology; simulation and modeling; Catchment areas; Renewables; River Basin Maracá.

vii

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

FIGURAS

Figura 1: (a) Mostra a turbina da segunda geração. (b) turbina da segunda geração em

funcionamento. .........................................................................................................................17

Figura 2: Algoritmos de cálculo para transformação de chuva em Vazão. ..............................25

Figura 3: Método de Clark.......................................................................................................26

Figura 4 : Isócrona e histograma tempo – área.........................................................................27

Figura 5: Formas de histograma tempo-área para diferentes valores do parâmetro XN..........27

Figura 6: Ponto de controle ......................................................................................................29

Figura 7: Propagação de cheias no trecho do rio......................................................................29

Figura 8: Modelo IPH II. ..........................................................................................................32

Figura 9: Reservatório de interceptação ...................................................................................33

Figura 10: Infiltração e percolação na camada superior do solo ..............................................34

Figura 11: Algoritmo de cálculo do modelo IPH II..................................................................35

Figura 12: localização da Bacia do Maracá..............................................................................36

Figura 13: Pluviômetro da ANA localizado na Vila do Maracá. .............................................37

Figura 14: Figura esquemática que exemplifica o processo de medição de vazão. .................38

Figura 15: : Molinete Universal Newton..................................................................................41

Figura 16: Batimetria no Rio Maracá ......................................................................................46

Figura 17: Resultados da terceira Experimentação ..................................................................47

Figura 18: (a) Mostra a turbina com funcionamento normal; b) a turbina foi coberta pela água

que causou o acidente. ..............................................................................................................47

Figura 19: Representação do hidrograma resultante (superior direita) e ambiente gráfico da

bacia simulado no IPHS1 (abaixo). ..........................................................................................52

Figura 20: Hidrograma da bacia do Maracá simulado para o mês de julho de 2008. Na parte

superior (vermelho) está indicada a precipitação e a curva (em verde) a resposta do aumento

de vazão sob influência da chuva. ............................................................................................53

Figura 21: Valores em verde indicam os dados de chuva e em amarelo os dados de

evaporação. ...............................................................................................................................53

viii

TABELAS

Tabela 1: Parâmetros do modelo Clark.....................................................................................30

Tabela 2: Coeficiente de correção da vazão medida com o método de flutuadores.................42

Tabela 3:Posições para medição de velocidade........................................................................42

Tabela4: Parametrização do IPH II...........................................................................................44

Tabela 5: Resultado de todas as coletas de campo....................................................................50

Tabela 6: Potência elétrica da Turbina......................................................................................51

Tabela 7: Resultado de todas as coletas de campo....................................................................56

GRÁFICOS

Gráfico 1: Resultados da Primeira Experimentação.................................................................47

Gráfico 2: Resultados da Segunda Experimentação.................................................................47

Gráfico 3: Diferença dos parâmetros coletados no trabalho de campo.....................................48

Gráfico 4: Resultados da terceira Experimentação...................................................................49

Gráfico 5: Batimetria do mês de agosto ...................................................................................50

Gráfico 6: Curva Chave com as 04 medições hidrométricas...................................................53

Gráfico 7: Curva Chave velocidade verso vazão......................................................................53

QUADROS

Quadro 1 - Potência elétrica da turbina hidrocinética verso diâmetro da hélice e velocidade da

corrente d’água..........................................................................................................................20

ix

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ANA – Agência Nacional de Água.

AERBOM - Acoplamento de Motobombas à Sistemas de Geração Eólica com uso de Inversor

de Freqüência.

CCC - Conta de Consumo de Combustíveis Fósseis.

ENM-UnB - Engenharia Mecânica da Universidade de Brasília.

IEPA – Instituto de Pesquisa Científica e Tecnológica do Estado do Amapá.

INMET – Instituto Nacional de Meteorologia.

IPHS – Instituto de Pesquisas Hidráulicas.

MME – Ministério de Minas de Energias.

NHMET – Núcleo de Hidrometeorologia e Energias Renováveis.

PCD’s – Plataforma Automática de Coleta de Dados.

REMETAP - Modernização da Rede Estadual de Meteorologia para previsão de Tempo,

Clima e Recursos Hídricos.

SI – Sistema Internacional.

THC - Turbinas Hidrocinéticas.

UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

UnB – Universidade de Brasilia.

VBEIC - Vazão de Base Especifica no Inicio da Chuva.

x

SUMÁRIO

RESUMO..................................................................................................................................vi ABSTRACT ............................................................................................................................vii LISTA DE ILUSTRAÇÕES.................................................................................................viii LISTA DE TABELAS, GRÁFICOS E QUADROS..............................................................ix LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS .............................................................................x 1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................................12

1.1 PROBLEMA E HIPÓTESES.......................................................................................14

2. OBJETIVOS .......................................................................................................................16 2.1. OBJETIVO GERAL ......................................................................................................16 2.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS.........................................................................................16

3. REFERENCIAL TEÓRICO ........................................................................................... ..17 3.1. A HIDROLOGIA E SEU PAPEL NO ESTUDO DE ENERGIA HIDROCINÉTICA ..17 3.2. PREVISÃO DE CHEIAS COM O SISTEMA HIDROLOGICO IPHS1.......................20

3.2.1 MECANISMOS PARA O CONTROLE DE ENCHENTES...............................21 3.2.2 PROPAGAÇÃO DE CHEIAS...........................................................................21 3.2.3. DESCRIÇÃO DO SISTEMA IPHS1 ................................................................22

3.2.3.1. ESTRUTURA DE MODELO IPHS1 .......................................................23 3.3. MODELO IPH II .............................................................................................................31

3.3.1 ALGORITMO DE PERDAS E EVAPORAÇÃO E INTERCEPTAÇÃO..........33 3.3.2 ALGORITMO DE SEPARAÇÃO DE ESCOAMENTO....................................33

4. MATERIAL E MÉTODOS...............................................................................................38 4.1. LOCALIZAÇÃO E ASPECTOS HIDROLOGICOS DA ÁREA DE ESTUDO ...........38 4.2 COLETA E REFINAMENTO DOS DADOS OBSERVADOS .....................................39 4.3. DESCRIÇÃO DO MÉTODO DE ANÁLISE DOS RESULTADOS.............................39

4.3.1 MÉTODO DE MEDIÇÃO DE VAZÃO COM FLUTUADORES.....................40 4.3.2 MÉTODO DE MEDIÇÃO DE VAZÃO COM MOLINETE..............................42

4.4 PARAMETRIZAÇÃO DO MODELO IPH II.................................................................44 4.5 CALIBRAÇÃO DO MODELO IPH II............................................................................45 5. RESULTADOS ALCANÇADOS......................................................................................46

5.1. AVALIAÇÃO HIDROMÉTRICA DA BACIA DO MARACÁ ...................................46 5.2. DESEMPENHO DAS PREVISÕES DO MODELO IPH II ..........................................53

6. CONCLUSÕES E SUGESTÕES ......................................................................................57 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................61

2. INTRODUÇÃO

Mais de dois bilhões de pessoas não têm nenhum acesso a fontes de energia, sendo que

a maioria delas está vivendo em áreas rurais, o que dificulta o desenvolvimento econômico e

social de suas populações (BASSAM, 2001). No Brasil, cerca de cinco milhões de domicílios

brasileiros - em torno de 12 milhões de habitantes - não têm acesso à energia elétrica.

Somente na Região Amazônica, estima-se que existam 18,45% domicílios que não são

atendidos pelo fornecimento de energia elétrica convencional. No intuito de eliminar essa

exclusão energética no país, o Governo Federal criou em 2004 o Programa “Luz para Todos”

que pretende universalizar o acesso à energia elétrica até o final de 2008, atendendo

aproximadamente quatro mil municípios e cerca de sete milhões de habitantes que hoje não

têm acesso à energia. Entretanto, problemas relacionados aos desequilíbrios sócio-espaciais,

como o alto custo da geração, transmissão e distribuição de energia hidrelétrica inviabilizam

iniciativas de atendimento às necessidades energéticas de pequena escala, deixando

desprovidas de abastecimento populações rurais e/ou extrativistas geograficamente isoladas

dos grandes centros urbanos (GREENTEC, 2003).

A base da rede de distribuição de energia elétrica no Brasil é formada pelos seguintes

sistemas: i) sistema que interliga as regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste; ii) sistema que

interliga as regiões Norte e Nordeste; e iii) sistemas isolados, formados por cerca de 300

localidades eletricamente isoladas umas das outras, principalmente na Região Norte,

correspondendo a 2% do mercado energético brasileiro. Para as grandes e médias cidades das

regiões Norte e Nordeste, não interligadas à rede do sistema integrado, o governo oferece um

subsídio para que as concessionárias atendam na modalidade de sistema isolado,

principalmente por meio das termelétricas. O subsídio é um mecanismo de compensação

financeira, denominado Conta de Consumo de Combustíveis Fósseis (CCC) que permite uma

tarifa ao consumidor final semelhante à tarifa de outros locais do país. Contudo, o subsídio só

12

atende fornecedores de energia (termelétricas) com capacidade mínima de 2MW. Assim,

somente cidades com mais de 4.000 habitantes usufruem desse mecanismo (ELS, 2005).

Ficam de fora, portanto, cidades menores, milhares de vilas e comunidades que não dispõem

de uma sistemática de atendimento. Na sua grande maioria o fornecimento é realizado pela

própria comunidade ou pelo poder municipal local. Normalmente os comunitários adquirem

um grupo gerador com recursos dos moradores, da prefeitura local ou de políticos com

objetivos eleitoreiros.

Uma alternativa encontrada pelas prefeituras para atendimento às comunidades

isoladas é o sistema de quotas mensais de óleo diesel, distribuídos entre os moradores.

Ultrapassando essa quota, os moradores assumem os custos adicionais, elevando o custo

médio para acima da tarifa média praticada pelas concessionárias. Porém quando há

dificuldade no transporte do óleo diesel até essas comunidades remotas uma possível solução

para o problema é o uso de fontes renováveis, tendo em vista a abundância local de recursos

como biomassa, energia solar, eólica e hidráulica, que oferecem energia em condições

adequadas às realidades locais.

As energias renováveis são provenientes de ciclos naturais de conversão da radiação

solar, que é a fonte primária de quase toda energia disponível na Terra. Por isso, são

praticamente inesgotáveis e não alteram o balanço térmico do planeta. As formas ou

manifestações mais conhecidas são: a energia solar, a energia eólica, a biomassa e a

hidroenergia.

Em algumas localidades da Amazônia é possível dar ênfase para a Hidroenergia -

Energia cinética das massas de água dos rios, que fluem de altitudes elevadas para os mares e

oceanos graças à força gravitacional. Este fluxo é alimentado em ciclo reverso graças à

evaporação da água, elevação e transporte do vapor em forma de nuvens, naturalmente

realizados pela radiação solar e pelos ventos. A fase se completa com a precipitação das

chuvas nos locais de maior altitude. Sua utilização é bastante antiga e uma das formas mais

primitivas são o monjolo e a roda d’água. A hidroenergia também pode ser vista como forma

de energia potencial; volume de água armazenada nas barragens rio acima. As grandes

hidrelétricas se valem das barragens para compensar as variações sazonais do fluxo dos rios

13

e, através do controle por comportas, permitir modulação da potência instantânea gerada nas

turbinas.

Em se tratando de Turbinas Hidrocinéticas (THC) é necessário avaliar/estimar locais

com potencial hidrocinético para utilização desta forma de energia e transformar em energia

elétrica para comunidades remotas na Amazônia.

Na presente pesquisa são abordados os principais aspectos físicos e técnicos

relacionados ao uso e instalação de picocentrais hidrocinéticas em comunidades remotas na

Amazônia, em especial no Amapá. No Estado do Amapá dois projetos de pesquisa e

desenvolvimento foram aprovados juntos à Eletronorte com intuito de desenvolver produtos

inovadores e sua inserção tecnológica em comunidades isoladas como é o caso da

comunidade do Caranã, Reserva Extrativista do Maracá – Mazagão. Estes projetos foram

coordenados pela UnB com apoio do IEPA/MME/MCT.

Desde o projeto P&D (Alternativas Energéticas para Comunidades Isoladas da

Amazônia: A energia hidrocinética no Maracá, sul do Amapá) aprovado em 2004 objetivou-se

apoiar a inserção social, técnica e econômica de uma turbina hidrocinética de 2ª geração.

Atualmente, o segundo projeto desenvolvido de produto, pretende difundir a tecnologia para

todas as regiões do Brasil, em especial a Amazônia, buscando-se o apoio de financiadores

como SUFRAMA, ADA, SUDAM, etc para a sua incubação e produção em escala.

Apesar de todos os avanços institucionais no desenvolvimento e inserção da

tecnologia há ainda imensas lacunas de conhecimento sobre as bacias hidrográficas nas quais

serão instalados esses equipamentos. Na mesma linha de raciocínio, torna-se importante e

vital para sua sustentabilidade técnica, econômica e social o conhecimento mínimo sobre a

hidrologia comportamental dos rios, avaliar suas características hidráulicas e as flutuações

fluviométricas, principalmente os possíveis eventos extremos que poderiam prejudicar ou

comprometer as instalações da turbina atualmente instalada naquela localidade.

Este trabalho versa sobre uma análise da hidrologia de um trecho do rio Maracá. Para

tanto foi elaborado duas abordagens: Uma experimental, representada pela hidrometria de

14

campo, e uma segunda, representada pela análise de simulação hidrológica em um trecho

representado na bacia.

2.1 Problema e hipóteses

Até que nível técnico é importante conhecer os detalhes das informações

hidrometeorológicas para melhorar a segurança e operação de turbinas hidrocinéticas

instaladas em rios típicos do Estado do Amapá e atender demandas de geração de energias em

comunidades remotas.

O conhecimento das características hidráulicas e hidrometeorológicas das bacias

deveria ser um dos critérios técnicos decisivos para a instalação e operação de turbinas

hidrocinéticas em qualquer bacia hidrográfica cujo potencial seja técnico, econômico e

socialmente viáveis.

A abordagem experimental apresenta algumas vantagens técnicas para indicar se é ou

não viável tecnicamente a instalação de equipamentos como as picocentrais hidrocinéticas. A

abordagem da análise numérica é da simulação computacional hidrológica também apresenta

outras vantagens técnicas na análise do potencial hidrocinético, considerando aspectos

históricos da bacia hidrográfica como precipitação, escoamento superficial, vegetação,

geomorfologia, etc, de tal forma que é possível se estimar respostas de interação chuva-vazão

e suas correlações com o funcionamento de turbinas hidrocinéticas.

3. OBJETIVOS

3.1 Geral

Estimar o potencial de energia hidrocinética em um trecho da Bacia Hidrográfica do

Rio Maracá com uso de técnicas experimentais hidrométricas e aplicação de um sistema de

simulação computacional hidrológica (IPHS1).

3.2 Específicos

- Elaborar cenários de relação chuva-vazão, com uso de dados obtidos em campo, e

modelar os principais respostas às perturbações de entrada do modelo IPHS1, sobre os

fenômenos hidrometeorológicos que possam influenciar a instalação e operação da turbina em

casos reais.

- Analisar, de forma simplificada, as principais conseqüências técnicas, econômicas e

ambientais resultantes da implementação de sistemas geradores de energia renovável de baixa

potência em comunidades remotas do Estado do Amapá.

- Elaborar estudos de simulação de chuva-vazão para uma seção bacia hidrográfica do rio

Maracá em questão e em outras localidades de interesse com o uso do software IPHS1 (clima,

dados de observações de estações hidrometeorológicas, réguas, etc).

- Estudar casos em que ocorrem eventos extremos de cheias cuja repercussão pode

reduntar danos aos equipamentos hidrocinéticos na comunidade do Caranã, localizada no

município de Mazagão-AP.

4. REFERÊNCIAL TEÓRICO

Nesta seção são apresentados alguns termos da hidrologia, os quais serão utilizados

na seqüência do trabalho. Por isso, considerara-se oportuna a inclusão de alguns conceitos

fundamentais à compreensão deste trabalho, uma vez que formam a base teórica sobre a qual

ele foi desenvolvido.

4.1 A Hidrologia e seu papel no estudo de energia hidrocinética.

O uso da energia cinética dos rios para gerar eletricidade é considerado uma

alternativa não convencional de aproveitamentos hidroelétricos. A sua tecnologia é um

avanço em relação ao aproveitamento hidrelétrico convencional no que diz respeito aos

impactos ambientais, pelo fato de dispensar o armazenamento da energia potencial em lagos

artificiais com o emprego de barragens e, conseqüentemente, não interfere no curso natural

dos rios.

Essa energia cinética pode ser transformada em energia mecânica por meio de uma

turbina hidráulica do tipo hidrocinética. Um dos primeiros equipamentos a fazer essa

transformação foi a roda d’água, que já era usada nas antigas civilizações. Entretanto, a roda

tem uma eficiência de transformação muito inferior às modernas turbinas hidrocinéticas

(BRASIL Jr et al, 2006).

A primeira experiência brasileira bem sucedida foi realizada por pesquisadores do

Departamento de Engenharia Mecânica da Universidade de Brasília (ENM-UnB), que

desenvolveram uma turbina axial a partir de estudos iniciados em 1990 (ELS et al., 2005).

17

Essa turbina hidrocinética experimental foi instalada em 1995 para dar apoio ao

funcionamento de um posto médico no município de Correntina-BA. Os pesquisadores do

Departamento de Engenharia Mecânica atualmente dispõem de tecnologia para projetar

turbinas que podem aproveitar corredeiras de água com velocidades até 2 m/s com o tamanho

da hélice variando de 0,80 a 2 metros de diâmetro.

A turbina pode ser fixada na margem dos rios por uma estrutura de sustentação que

permite retirar a turbina da água, facilitando assim a sua manutenção e limpeza, bem como

acompanhar a variação da cota do rio. As figura 1.a e 1.b mostram a máquina experimental

que foi projetada e instalada numa região de rios com alta velocidade no município de

Mazagão-AP. Essa máquina é da segunda geração de turbinas que foram desenvolvidas pelos

pesquisadores do ENM-UnB.

(a) (b)

Figura 1: (a) Mostra a turbina da segunda geração. (b) turbina da segunda geração em funcionamento.

A foto da Figura 1.b mostra a turbina em operação com a visão do rio turbulento do

fundo. A principal inovação da segunda geração de turbinas foi a incorporação de um tubo de

sucção cuja função é melhorar a eficiência de transformação da energia cinética da água do

rio em movimento mecânico.

A potência hidráulica da turbina disponível (1) depende da velocidade de corrente

d’água no rio e do tamanho do hélice, porém necessita-se da equação de Betz (2) para obter a

potência elétrica da turbina. O tamanho da hélice por sua vez depende da profundidade do rio.

O Quadro 1 mostra a potência elétrica em função da velocidade da água do rio e o diâmetro

do hélice.

18

(1)

Pelét. = 0,56.Pdisp. ηm.ηe (2)

Onde:

Pelét: Potência elétrica (W).

Pdisp: Potência disponível (W).

ρ: densidade da água (Kg/m³).

Vo: Velocidade da corrente do rio (m/s).

A: Área da secção da turbina (m²).

m: Massa de água (Kg).

ηm: Rendimento Mecânico.

ηe: Rendimento Elétrico.

Quadro 1 - Potência elétrica da turbina hidrocinética versus diâmetro da hélice e velocidade da água.

Fonte: Els, Campos e Salomon, 2004.

Com a consolidação da segunda geração de turbina como produto comercial e sua

conseqüente transferência para industrialização, o departamento de ENM-UnB iniciou um

novo projeto de pesquisa para desenvolver uma terceira geração de turbinas (Brasil Jr et al.,

2006).

2 30 0

1 1

2 2dispP mV AVρ= =

19

Todas as tecnologias de aproveitamento hidroenergético dependem das características

do rio que determina a opção tecnológica e a escolha do sítio para instalação do

empreendimento. No caso de turbinas hidráulicas convencionais, os valores da vazão do rio e

a queda determinam a melhor localização dos equipamentos hidráulicos. No caso de turbinas

hidrocinéticas, os fatores essenciais são a velocidade e profundidade do rio.

Entretanto, não são somente esses fatores físicos que determinam a escolha do sítio,

mas também a distância entre o sítio e os consumidores. Pois quando se trata de geração

descentralizada, é justamente a proximidade ao recurso natural que viabiliza a sua instalação,

como é o caso da comunidade do Caranã.

A escolha do sítio ideal pode ser uma operação bastante dispendiosa, pois requer

viagem de campo para fazer o levantamento das condições físicas do rio in loco. Uma forma

de facilitar esse trabalho de escolha do melhor sítio pode ser por meio de ferramentas

computacionais e assim otimizar o tempo de levantamento para a instalação desses tipos de

empreendimentos.

Segundo BRASIL Jr (2006), a geração 3 da turbina é um produto tecnológico de

mercado, disponibilizando a tecnologia para as comunidades isoladas que precisam de energia

na Amazônia. A primeira meta seria fazer a contabilidade de quanto se está ganhando em

termos ambientais e sociais com esse tipo de tecnologia. A segunda meta será a de instalar,

ainda as turbinas da geração 2, em unidades de conservação que necessitam de energia para o

dia-a-dia. Contudo, apesar da tecnologia já se encontrar na 3ª geração (BRASIL Jr, 2006), é

importante que se somem informações hidrológicas ao conhecimento de instalação e operação

da turbina.

A hidrologia é um campo vasto de conhecimento da área de engenharia. No presente

caso, focamos atenção nos estudos de previsão de cheias. O interesse maior é devido

justamente ter ocorrido, no início do ano de 2008, uma enchente “anormal” que ocasionou

danos estruturais à turbina instalada na comunidade do Caranã. Os danos causados pela

enchente, ou por falta de manutenção contínua dos equipamentos, redundaram na ruptura dos

cabos de sustentação horizontal da carcaça e quebra na estrutura do eixo de sustentação

20

vertical da turbina. Não se tem informações exatas sobre o ocorrido. Fato é que, sozinhos, ou

conjuntamente, ambos os fatores contribuíram para que o incidente acorresse.

Este capítulo terá como objetivo a descrição geral de sobre como funcionam os

mecanismos de propagação de cheias, os sistemas computacionais que são utilizados para sua

quantificação hidrológica, no caso o IPHS1, seus respectivos módulos, métodos e modelos

aplicados.

3.2. Previsão de cheias com sistema hidrológico IPHS1

A avaliação da diminuição da capacidade de amortecimento de cheias de rios pode ser

medida pela variação dos níveis d’água em períodos de cheia. A comparação desses níveis em

dois períodos distintos, no início da operação do rio e nas condições atuais, permite o estudo

da influência de cheias na propagação do rio.

3.2.1 Mecanismos para o Controle de Enchentes

Com o passar dos tempos e os avanços tecnológicos, o homem desenvolveu medidas

para a mitigação dos prejuízos causados pelas enchentes. Essas podem ser estruturais ou não-

estruturais. As medidas não-estruturais visam uma melhor convivência da população com as

enchentes. CHOW et al (1994) citam alguns exemplos de medidas não-estruturais como:

sistemas de alerta, cartas enchentes, seguros contra enchentes e também estratégias educativas

sobre os riscos causados pelas inundações. As medidas estruturais têm como objetivo reduzir

o risco de enchentes e podem ser extensivas ou intensivas. As medidas extensivas agem na

bacia e visam modificar a relação precipitação-vazão, enquanto as intensivas atuam

diretamente sobre o rio.

3.2.2 A propagação de cheias

Em um evento de cheia, ocorrido depois ou durante uma precipitação, forma-se uma

onda, ou um hidrograma de cheia, que se desloca no sentido do fluxo do curso d’água (de

montante para jusante); a esse deslocamento da onda de cheia dá-se o nome de propagação

21

superficial. Durante o fenômeno da propagação ocorre a diminuição da vazão máxima do

evento e o aumento do tempo de propagação (tempo de base).

Pode-se dizer então que a onda de cheia sofre um amortecimento da sua vazão

máxima, ou vazão de pico. Esta redução é função de características físicas do curso d’água

onde ocorre o escoamento. A capacidade de armazenamento é a característica que mais

influencia no amortecimento das vazões de pico; os cursos d’água largos, profundos e de

baixa declividade têm uma grande eficiência na redução das vazões máximas. Chama-se

tempo de retardamento, o tempo gasto pela onda para percorrer todo o trecho do curso d’água.

A capacidade de armazenamento e o atrito sofrido pela onda, com as paredes do curso d’água,

ou do canal, influenciam diretamente na velocidade de propagação (celeridade) que por sua

vez irá alterar o tempo de translação da onda (GERMANO e TUCCI 1998).

Pode-se imaginar um trecho de canal, com um observador fixo no início do trecho e

outro no final. Cada um deles verá um hidrograma de cheia diferente em sua seção. As

diferenças entre cada hidrograma observado estarão na vazão de pico e no tempo de

redistribuição da onda, ou seja, no tempo gasto entre dois valores iguais de vazão em um

mesmo hidrograma. Essas características específicas em cada seção determinam formas

diferentes de ondas. As características físicas dos cursos d’água que interferem diretamente

nas diferentes formas do hidrograma de entrada e saída em um trecho qualquer são:

• Geometria da seção transversal;

• Declividade do trecho;

• Comprimento do trecho;

• Tipo de controle;

• Vazão inicial.

3.2.3 Descrição do sistema IPHS1

O sistema IPHS1 foi desenvolvido por Tucci et al (1993) na versão DOS, no Instituto

de Pesquisas Hidráulicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS. Consiste

de um sistema computacional modulado, composto de vários modelos existentes na literatura.

Possibilita a obtenção de hidrogramas de projeto através da combinação desses modelos,

22

compondo assim um modelo próprio do usuário. VIEGAS et al (2004) apresentaram a versão

Windows com base na Metodologia de Modelagem Orientada a Objetos, aplicada a Sistemas

de Recursos Hídricos apresentada por VIEGAS (2004).

TUCCI (1998) aplicou o sistema IPHS1 para a elaboração do Plano Diretor de

Drenagem Urbana da cidade de Caxias do Sul (RS). O projeto definiu cenários de

planejamento quanto à ocupação urbana e ao risco de enchentes. O Sistema foi utilizado para

obter os escoamentos gerados em cada cenário, juntamente com um modelo hidrodinâmico

para simular a propagação na rede de drenagem pluvial.

MELLER et al (2002) estudaram a existência de pontos críticos no funcionamento da

rede de drenagem urbana de Porto Alegre, que utiliza como alternativa reservatórios de

detenção em alguns pontos da cidade. Foram gerados hidrogramas de projetos pelo sistema

IPHS1, que serviram como condições de contorno de montante e lateral para a representação

do escoamento na rede de drenagem de águas pluviais.

3.2.3.1 Estrutura do modelo IPHS1

O sistema IPHS1 permite a representação da bacia em estudo em dois módulos

básicos: Bacia e Rio. Essa característica permite a subdivisão da bacia em sub-bacias, trechos

de canais e inclui a operação de barragens. O hidrograma de projeto é determinado com o

auxílio da precipitação da região, das características físicas da bacia e de parâmetros de

modelos de transformação chuva-vazão.

As diferentes fases do processo de transformação de precipitação em vazão são

modeladas por algoritmos matemáticos. Na literatura há diferentes algoritmos compostos, os

quais identificam modelos tais como HEC-1, SSARR, IPH II, STANFORD IV e HYMO entre

outros VIEGAS (2004).

O IPHS1 não tem a pretensão de ser mais um modelo hidrológico, mas uma

ferramenta que permita ao usuário escolher, para cada fase do processo precipitação-vazão,

um algoritmo e compor seu próprio modelo.

23

A estrutura modular do sistema IPHS1 tem como objetivo (TUCCI, 1993):

a) melhor compreensão dos processos hidrológicos e dos algoritmos utilizados na simulação;

b) ensino de modelos matemáticos;

c) oferecer alternativas de escolha do melhor conjunto de algoritmos para uma bacia

específica.

O sistema de modulação pode ser obtido em versão WINDOWS para PC, ou em

versão FORTRAN. No primeiro caso, a entrada de dados é disponibilizada em forma

amigável mediante telas explicativas, programadas em DELPHI, permitindo uma fácil

integração com o usuário. Os algoritmos de cálculo e a saída foram programados em

FORTRAN devido a versatilidade para programação de complicados algoritmos de cálculo.

Aos usuários principiantes recomenda-se o uso de interface WINDOWS, e para

programadores existe a possibilidade de acesso às rotinas fontes, que permitirão adaptar o

sistema de modulação a requerimentos específicos.

Internamente o sistema está modulado segundo operações hidrológicas, oferecendo

as seguintes opções:

a) transformação chuva-vazão;

b) escoamento em rios;

c) propagação em reservatórios;

d) entrada, somas ou derivação de hidrogramas.

Para cada uma destas opções são fornecidas as características físicas da bacia e os

dados históricos. O modelo compõe os resultados de acordo com a numeração seqüencial

informada pelo usuário. Cada número identifica o hidrograma resultante no final da bacia ou

trecho.

O sistema é formado por três componentes:

- leitura de dados e manejo de arquivos;

- modelos;

24

- impressão e graficação.

A primeira componente (Versão WINDOWS) permite gerar os arquivos de

informações que contém os parâmetros, dados hidrológicos e/ou características físicas da

bacia de acordo com as necessidades do usuário. Para facilitar a entrada de dados a interface

dispõe de bases de valores dos distintos parâmetros da metodologia de simulação, para

distintas situações, podendo ser escolhido o parâmetro em função da informação contida na

própria base de dados ou fornecida pelo usuário (TUCCI, 1993).

A segunda componente está dividida em dois módulos: - módulo da Bacia;

- módulo do Rio.

Cada módulo é formado por sub-módulos que realizam operações hidrológicas

específicas. Por sua vez, cada sub-módulo apresenta como opções diferentes algoritmos de

cálculo.

Módulo da Bacia

No módulo da Bacia faz-se a divisão do Sistema (Bacia) em Sub-Bacias, de acordo

com suas características físicas e climáticas, disponibilidade de dados e locais de interesse.

Em seguida, a transformação da chuva em vazão para cada Sub-Bacia é feita escolhendo-se os

algoritmos de cálculo para a realização das seguintes operações hidrológicas. A figura 2

ilustra este módulo.

25

Figura 2: Algoritmos de cálculo para transformação de chuva em Vazão.

(Fonte: Viegas, 2004)

O módulo da Bacia tem a seguinte configuração (VIEGAS, 2004): Precipitação: Tem por finalidade calcular o hietograma de cada sub-bacia, podendo ser

feito de duas formas:

A) Com precipitação seqüência fornecida pelo usuário:

- Desagregada: definida pelo usuário;

- Acumulada: obtidas de curvas I-D-F e com reordenação do pico em 25, 50 ou 75%

da duração da precipitação.

As curvas I-D-F são determinadas pelas características da região, onde devem ser preenchidos alguns parâmetros como latitude, longitude, etc.

B) Com precipitação observada: é fornecido o posto de monitoramento e seu coeficiente de

Thiessen para o cálculo da precipitação média ponderada em cada intervalo de tempo.

Separação de escoamento: Separa a parcela de chuva efetiva para a determinação do

escoamento direto. Pode ser aplicado os seguintes algoritmos:

- algoritmo de Horton modificado – IPH II;

- equação de Holtan;

- método Exponencial (HEC-I);

- método de relações funcionais ou da curva número (SCS);

- índice φ.

26

Escoamento superficial: é a transformação da chuva efetiva no hidrograma de

escoamento direto. Pode ser feita pelos seguintes algoritmos:

- método Clark;

- hidrograma unitário fornecido;

- hidrograma unitário triangular do SCS;

- método de Nash modificado (HYMO).

Escoamento subterrâneo: Quando a chuva efetiva é calculada pelo algoritmo de

Horton Modificado, estimando-se desta forma a infiltração e a percolação, torna-se possível

calcular o escoamento de base produzido pela bacia por meio de um reservatório linear

simples. O modelo IPH II foi criado para trabalhar em conjunto com o método de escoamento

superficial e subterrâneo Clark representado a seguir.

Método CLARK de escoamento superficial e subterrâneo

O método Clark (1945) é uma combinação do histograma tempo-área (HTA) com

reservatório linear simples (RLS), como indicado pela figura 3. HTA é a razão entre a

translação da chuva e o deslocamento sobre a superfície da bacia. RLS são os efeitos de

armazenamento das partículas de água no percurso até o ponto de saída da bacia.

Figura 3: Método de Clark

Fonte: Mine, Tucci 1998.

Para obter HTA deve-se estimar o tempo de concentração Tc da sub-bacia e a posição

das isócronas, que são pontos com igual tempo e translado com igual tempo de controle

(figura 4). Para cada isócrona “ti” deve-se calcular a área “Ai” traceja “An":

27

Figura 4 : Isócrona e histograma tempo – área.

A área acumulada de contribuição é relacionada ao tempo de percurso pelas seguintes equações (3), (4) e (5):

Onde: Ac: é a área acumulada expressa relativamente à área total;

T: é o tempo em unidades do tempo de Tc;

n: é um coeficiente que varia com a forma da bacia.

Figura 5: Formas de histograma tempo-área para diferentes valores do parâmetro XN.

Fonte: Germano, 1998.

A partir das diretivas HEC (Figura 5), os histogramas de tempo-área têm as seguintes formas:

(3)

(4)

(5)

28

Cada lâmina de chuva efetiva é distribuída no tempo pelo HTA e filtrada pelo

reservatório linear simples (RLS). E a vazão de saída é dada pela equação (6):

Onde: Qt: é a vazão de saída no instante t;

VE(t+1): é a vazão de entrada ao RLS;

K: é a constante de armazenamento do RLS.

Os parâmetros são fornecidos pelo usuário ou podem ser calculados pelo modelo,

utilizando as equações (6) e (7) de Dooge (1973):

Onde: A: é a área da bacia em Km²,

S é a declividade média da bacia em (m/10Km).

As seguintes expressões obtidas para bacias urbanas brasileiras, por

GERMANO,1998, foram desenvolvidas para uso com o modelo IPH II usando as equações

(9) e (10).

Onde:

L: é o comprimento do Principal em Km.

S: é a declividade do rio principal em %.

IMP: área impermeável.

(6)

(7)

(8)

(9)

(10)

29

Parâmetros do método Clark A Tabela 1 mostra os parâmetros utilizados no modelo Clark.

Tabela 1: Parâmetros do modelo Clark

PARÂMETROS FUNÇÃO

Ks (h) Retardo do reservatório linear simples (entre 0 e 15)

XN Forma do histograma tempo-área (entre 0 e 2)

Fonte: Viegas 2004. Módulo Rio

É composto dos algoritmos que fazem a propagação das ondas de cheia nos rios,

canais e reservatórios. As figuras 6 e 7 mostram os ambientes deste Módulo.

Figura 6: Ponto de controle

Fonte: Viegas 2004

Figura 7: Propagação de cheias no trecho do rio.

Fonte: Viegas 2004

O módulo do Rio é dividido em três partes:

- escoamento em rios;

- escoamento em reservatório;

30

- derivações de vazões.

Para o escoamento em rios propriamente existem as seguintes opções:

- Modelo Muskingum: Desenvolvido por McCarthy (1940) o algoritmo está baseado na

equação da continuidade concentrada e numa função que relaciona o armazenamento com as

vazões de entrada e saída do trecho de propagação.

- Modelo Muskingum- Cunger linear ou não linear: Cunge (1969) relacionou a difusão

numérica produzida pelo Método de Muskingum com o coeficiente de difusão hidráulica da

equação de difusão linearizada. Os parâmetros K e X podem ser estimados pelas

características físicas do trecho e pela discretização.

- Modelo Muskingum- Cunger não linear com planície de inundação: Está baseado na

metodologia apresentada por Miller e Cunge (1975) utilizando o método Muskingum-Cunge

para o caso de extravasamento da calha principal em caso de uma cheia.

Para escoamento em reservatório é utilizado o método de Pus oferecendo como

opções: fornecimento das características das estruturas de saída da água (vertedores ou

orifícios) ou diretamente a vazão e saída, operação de comportas, operação de um by-pass que

permita a simulação de reservatório do tipo off-line.

Para a derivação de vazões o sistema oferece um algoritmo para simular a separação

de fluxo ou divergência produzida por um canal de derivação sem estrutura de controle, neste

caso a derivação pode ser diretamente em função das características dos canais, ou mediante

uma percentagem fixa.

A terceira e última parte do sistema é a saída que tem por finalidade apresentar os

dados utilizados e os resultados numéricos e gráficos, quando solicitados. Esta é realizada

dentro da interface do WINDOWS, podendo ser os gráficos exportados à planilhas eletrônicas

(ex. Excel) ou processadores de texto (ex.Word). Dentro da saída do modelo na interface

Windows se inclui a saída original do KERNELL FORTRAN (núcleo de cálculo) que embora

com menor detalhamento gráfico, possui maiores informações sobre a simulação (valores de

31

parâmetros, singularidades de simulação, etc.) que permitiriam realizar uma análise mais

detalhada de singularidade da simulação.

3.3 Modelo IPH II

Dentre os modelos da série foi escolhido o IPH II (Figura 8) que é um modelo do tipo

concentrado, aplicado para projetos de engenharia em bacias rurais e urbanas e é o que mais

se ajusta às características da região de estudo (Bacia do Maracá). Além disso, necessita de

poucos parâmetros e se baseia em metodologias conhecidas.

O modelo tem como base um algoritmo de separação do escoamento desenvolvido por

Berthelot (1970), que utiliza equações de continuidade, combinada com a equação de Horton

e uma função empírica para a percolação. Berthelot et al (1972), Sanchez (1972) e Munoz e

Tucci (1974) apud Tucci (1998), obtiveram bons resultados ao aplicarem o algoritmo em um

modelo chuva-vazão nas bacias dos rios Capivari (SC), Cauca (Colômbia) e Chasqueiro (RS)

respectivamente.

O modelo é composto pelos seguintes algoritmos (GERMANO et al, 1998):

• perdas por evaporação e interceptação;

• separação dos escoamentos;

• propagação do escoamento superficial;

• propagação subterrânea;

• otimização dos parâmetros (opcional).

Os parâmetros que compõem o modelo são:

Io → capacidade de infiltração máxima do solo (mm);

Ib → capacidade de infiltração mínima do solo (mm);

H → parâmetro de decaimento da infiltração no solo (adimensional);

Rmáx → capacidade máxima do reservatório de interceptação (adimensional).

32

Uma análise da sensibilidade dos parâmetros feita por TUCCI (1979) apud TUCCI

(1998), constatou que Io, Ib, e H são os mais sensíveis no controle de volumes do hidrograma.

Os dois primeiros variam com o valor de H, e o aumento dos três parâmetros produzem

redução do volume de escoamento superficial.

Figura 8: Modelo IPH II.

Fonte: Viegas, 2004.

O modelo IPH II destaca-se entre os modelos concentrados de chuva-vazão, sendo

amplamente utilizado na Região Sul do Brasil. PAIVA, GASTALDINI (2002) aplicou o IPH2

para a previsão, em tempo real, de vazão e volumes afluentes ao Reservatório da Usina de

Ernestina (RS). O modelo foi adaptado para ser utilizado com a atualização dos parâmetros,

levando em consideração os dados observados no início de cada intervalo de tempo, para a

previsão de parâmetros nos intervalos seguintes. A autora afirma que esta possibilidade de

atualização torna-se viável no IPH II, por este possuir poucos parâmetros e representar bem os

processos hidrológicos.

MARTINS (2004) utilizou o modelo IPH2 para a quantificação da produção de

sedimentos na Bacia Hidrográfica do Vacacaí-Mirim em Santa Maria (RS). Para isso, calibrou

o modelo para eventos de cheia ocorridos na Bacia, obtendo dessa forma os melhores

parâmetros. Em seguida utilizou o modelo para gerar hidrogramas de cheia utilizando

hietogramas de projeto para períodos de retorno de 1 à 100 anos. O volume escoado e a vazão

de pico desses hidrogramas foram utilizados para a determinação da perda de solos por

evento, utilizando a Equação Universal de Perda de Solos Modificada (MUSLE). Apesar de

sua ampla utilização para obtenção de hidrogramas de cheia, o modelo IPH2 apresenta como

principal dificuldade, a estimativa de seus parâmetros.

GERMANO et al (1998) utilizaram dados de eventos de cheia referentes a 28 bacias

urbanas brasileiras de seis diferentes cidades, ajustando o modelo IPH2 para cada um deles.

33

Baseado nas respostas obtidas, o estudo propôs a utilização de valores médios para os

parâmetros do modelo, sendo calculadas através de equações empíricas, funções das

características fisiográficas das bacias. Meller et al (2002) aplicou o modelo IPH2 em sub-

bacias localizadas na Bacia Hidrográfica do Vacacaí-Mirim. Os parâmetros resultantes da

calibração dos eventos de cheia foram comparados aos propostos por Germano et al (1998). A

correlação se mostrou razoável para a bacia do rio Maracá.

3.3.1 Algoritmo de Perdas Evaporação e Interceptação

O sistema IPHS1 é orientado a eventos, por isso o algoritmo de tratamento da

evaporação não se inclui dentro do modelo IPH II, pois é desprezível para eventos de curta

duração.

Figura 9: Reservatório de interceptação

Fonte: MINE,1998.

A precipitação é inicialmente retida pelo reservatório de interceptação (cobertura

vegetal e depressões) até que sua capacidade Rmax seja satisfeita (Figura 9). A precipitação

restante é utilizada no algoritmo de infiltração para o cálculo dos volumes superficial e

percolado.

Uma parte da precipitação resultante, devido às áreas impermeáveis, é escoada apenas

superficialmente, sem passar pelo algoritmo de infiltração. O parâmetro utilizado para definir

a porcentagem de área impermeável na bacia é representado por IMP.

3.3.2 Algoritmo de Separação de Escoamento

O estudo da hidrologia compreende a coleta de dados básicos como, por exemplo, a

quantificação de água precipitada ou evaporada e a vazão dos rios; a análise desses dados para

o estabelecimento de suas relações mútuas e o entendimento da influência de cada possível

34

fator e, finalmente, a aplicação dos conhecimentos alcançados para a solução de inúmeros

problemas práticos. Deixa, portanto, de ser uma ciência puramente acadêmica para se

constituir em uma ferramenta imprescindível ao engenheiro, em todos os projetos

relacionados com a utilização dos recursos hídricos (NELSON, 2000).

Para este estudo utilizou-se o modelo descrito de uma simplificação do algoritmo

apresentado por Tucci (1993). A infiltração é obtida pela equação de Horton (Figura 10) e a

percolação pela equação (11) e (12) proposta seguir:

Os parâmetros mais sensíveis de acordo com Tucci (1993) apud (1998) são Io, Ib e H

no controle de volumes dos hidrogramas. Tucci (1993) fez uma análise de sensibilidade

desses parâmetros através de equações analíticas e experimentos numéricos. Os resultados

foram os seguintes:

• Os parâmetros Io e Ib variam de acordo com o valor de H;

• O aumento de Io, Ib e H produzem redução do volume de escoamento superficial;

• A influencia de Io diminui à medida que diminui o valor de H, aumentando a

influencia de Ib, pode ser observado diretamente da equação de infiltração. Quando H

é muito pequeno, a influência de Io é maior para umidade baixa.

Figura 10: Infiltração e percolação na camada superior do solo

Fonte: GERMANO et al 1998.

Parte da água que se precipita sobre o solo é absorvida por ação de capilaridade que se

soma à ação da gravidade. Se o solo, no início da chuva, apresenta certa umidade, tem uma

capacidade de infiltração menor do que estivesse seco.

0( ) ( )

( ) (1 )

t

b b

t

b

I t I I I H

T t I H

= + −

= −

(11)

(12)

35

Figura 11: Algoritmo de cálculo do modelo IPH II.

Fonte: MINE, TUCCI; 1999.

A seguir o algoritmo de separação de escoamento e seus respectivos parâmetros: Na Figura 11 é possível observar o fluxograma do modelo que representa o processo

de cálculo em um intervalo de tempo. O algoritmo de separação de escoamento foi divido em

duas etapas: propagação e escoamento, onde observa-se na parte superior o modelo de

escoamento e no canto inferior esquerdo o primeiro processo do algoritmo de propagação.

36

4 MATERIAL E MÉTODOS

Neste capítulo são apresentadas as principais características hidrológicas e

hidrometricas da área de estudo, bem como as etapas de implementação do sistema de

modelagem IPHS1 e a experimentação/graficação das vazões em um trecho previamente

escolhido na bacia do Maracá, a coleta de dados de entrada do modelo IPHS1.

4.1 Localização e aspectos hidrológicos da área de estudo

A Bacia Hidrográfica do Maracá (Figura 12) esta localizada no Município de Mazagão

– AP e encontra-se cerca de 2 horas de Macapá, na Rodovia BR-156 (em sentido ao

município de Laranjal do Jari). Há várias comunidades que moram na região, e suas principais

fontes de renda são o extrativismo (castanha) e a fabricação de móveis (baixo Maracá).

Figura 12: localização da Bacia do Maracá

37

A Bacia do Maracá e suas características como clima e hidrográfia são bastante

semelhantes às de bacias Amazônicas. Sobre sua topografia há uma região de altitude que

torna a região propícia ao uso de energia hidrocinética. O rio Maracá é perene e deságua no

braço esquerdo do rio Amazonas. De acordo com a Figura 12, o trecho do canal do rio Maracá

estudado foi aquele indicado pela seta, mais precisamente na parte sul ou médio Maracá.

4.2 Coleta e Refinamento dos Dados Observados

Foram realizadas quatros batimetrias hidrométricas no rio Maracá com intuito de obter

a vazão e elaborar uma curva-chave representativa de ponto específico da bacia. Além disso,

foram considerados dados pluviométricos da estação meteorológica da ANA (Figura 13)

localizada na região. Os valores de precipitação foram utilizados como dados de entrada no

sistema hidrológico IPHS1. O objetivo foi simular o comportamento hidrológico da Bacia,

fundamentando em informações reais e representativas da bacia.

Figura 13: Pluviômetro da ANA localizado na Vila do Maracá.

Na Figura 13 observa-se o pluviômetro da Agência Nacional de Águas – ANA

localizado na vila do Maracá próximo do ponto ou seção de medida de vazão no médio do rio

Maracá.

4.3 Descrição do Método de Análise dos Resultados

Para obter alguns parâmetros de entrada na simulação na bacia foi necessário usar

algumas técnicas para obter os dados hidrometeorológicos. Um dos parâmetros que permite

38

determinar a potência hidráulica disponível em um local é a velocidade média da corrente

d’água conforme a equação de Betz (2). Outro parâmetro importante é a vazão que relaciona o

volume de água e o tempo, medida no SI em m³/s. Podemos calcular a vazão de vários modos,

porém utilizamos apenas dois métodos experimentais: com flutuadores e com molinete.

4.3.1 Método com Flutuadores

O método de flutuadores pode ser utilizado para o cálculo de vazão em cursos d’água

de maior porte. É preciso encontrar um trecho de rio retilíneo, e com comprimento de 5 a 10

metros, sem corredeiras e obstáculos como galhos ou pedras, pois do contrário a medição

poderá ser prejudicada. Para utilização de método são necessários dois pedaços de corda,

quatro estacas, vara de bambu graduada a cada 10 cm ou régua minimétrica, trena, prancheta

com papel, caneta e calculadora, MME (2007).

Para obtenção de vazão deve-se então com as estacas, marcar uma distância “d” entre

5 e 10 metros, nos dois lados do rio, fixando-as no chão. Medir com trena a largura do rio

(distância entre as margens), e com o bambu a profundidade em diversos pontos da região

mediana ao trecho. Realizar o cálculo da média aritmética dos valores de profundidade

obtidos, de forma a obter a profundidade média (figura 14).

Determinam-se então as áreas das secções transversais do rio no início e no final da

secção (A1 e An), multiplicando o valor da profundidade média calculada através da relação

anterior, pela largura do rio. Deverá ser considerada como área para o cálculo a média entre as

duas secções obtidas.

Figura 14: Figura esquemática que exemplifica o processo de medição de vazão.

Fonte: MME, 2007.

39

De posse da área média passa-se à determinação da velocidade da água, no trecho do

rio. Para isso, torna-se necessário díspar de um cronômetro e um objeto que flutue. Esse

objeto pode ser uma garrafa descartável com 3/4 de seu volume com água. Para realizar a

medida é preciso lançar o flutuador a uns 3 metros de distância antes da corda inicial para dar

tempo a outra pessoa se posicionar perto da corda inicial. Deve-se iniciar a marcação do

tempo assim que o flutuador ultrapassar a corda inicial. Acompanhar o percurso, mantendo a

marcação do tempo, até que o flutuador chegar à segunda corda, quando então o cronômetro

deverá ser travado, obtendo assim o tempo gasto para fazer o percurso.

Deverão ser realizadas no mínimo 10 medições, anotando os tempos encontrados.

Calcular então o tempo médio através de outra média aritmética. A velocidade média “v” será

dada pela relação da equação (13) entre a distãncia “d” considerada o tempo médio “tm”.

(13)

Onde:

Vm: velocidade média no trecho (m/s)

d: distância percorrida (m)

tm: tempo médio (s)

A água perto da superficie e próximo às margens fluem mais lentamente. Por esse

motivo recomenda-se multiplicar a velocidade por um fator usado para correção da

velocidade (Tabela 2). Reconhecendo a área do rio e a velocidade da água, e levando em

consideração a observação anterior, é possível calcular a vazão “Q” do rio no trecho

selecionado utilizando a equação (14):

Q = Vm.A.F (14)

Onde:

Q: vazão (m³/s)

Vm: Velocidade média no trecho (m/s)

A: Área da secção do rio (m²)

F: Fator de correção (admensional)

40

Tabela 2: Coeficiente de correção da vazão medida com o método de flutuadores.

NATUREZA DAS MARGENS FATOR DE

CORREÇÃO

Margens e fundo liso 0,85

Margens e fundo em alvenaria 0,83

Margens e fundo escovado no solo 0,8

Margens com vegetação e fundo liso 0,75

Margens com vegetação e fundo rugoso 0,7

Fonte: MME, 2007

Observação: Neste trabalho adotou-se o fator “F” iqual a 0,7.

4.3.2 Método de Medição de Vazão com Molinete

O trabalho realizado pelo iniciou-se com a implantação de seções de réguas verticais,

que permitem a verificação das variações do nível do rio; em seguida definiram-se seções de

medição, onde foram realizadas as medições de descarga a 0,2p; 0,4p; 0,6p; 0,8p da

profundidade do Rio. Após ter sido medida a largura do rio e marcadas as verticais, posiciona-

se o molinete na primeira delas. Em função da profundidade da vertical deternina-se, com

base na Tabela 3, o número de medidas a ralizar e a profundidae de cada uma delas, anotando-

se os valores obtidos. No caso a vazão de cursos d’água naturais a determinação não é

simples, pois o valor da vazão que se pretende utilizar pode variar bastante conforme a época

do ano e o regime de chuva na região.

Tabela 3: Posições para medição de velocidade.

Pontos Posição em relação a S*

Cálculo da vel. Média na vertical (m/s)

Prof. (m)

1 0,6p v= V0,6 0,15 - 0,6

2 0,2 e 0,8p** v= (V0,2 + V0,8)/2 0,6 - 1,2

3 0,2; 0,6; e 0,8p v= (V0,2 + 2.V0,6 + V0,8)/4 1,2 - 2,0

4 0,2; 0,4; 0,6; 0,8p v= (V0,2 + 2.V0,4 + 2.V0,6 + V0,8)/6 2,0 - 4,0 *S: Superfície; p**:Profundidade

Fonte: DNAEE (1997) apud SANTOS et al (2001). Cabe ainda observar que a velocidade superficial é medida a 10 cm de profundidade

para que o hélice do molinete fique submerso, enquanto que a velocidade do fundo é medida

entre 15 e 25 cm acima do fundo, em função da distância do lastro ao eixo do molinete.

41

O estudo visou a quantificação das vazões de um trechos do rio Maracá localizado a

jusante do local onde está instalada a turbina hidrocinética na comunidade do Caranã, para a

determinação das curvas de descarga (curva chave). Esta curva de descarga é obtida através

de medições diretas da velocidade em diversas seções dos rios e a determinação das áreas.

Baseado no livro de Hidrométria Aplicada e usando o método de verticais para caracterização

do perfil e vazão do Rio Maracá, realizamos diversas análises.

Figura 15: : Molinete Universal Newton

Etapas do Cálculo: 1º) Velocidade (m/s): É calculada pela equação (15):

(15) Onde: “a” e “b” são constates da equação do molinete

a = 1,0211

b = 0,0062

n = número de rotações do hélice do molinete.

2ª) Área da secção (m²): É obtida pela relação (16). A= (Pn + P(n-1)).L (16)

2 Onde: Pn e P(n-1) são as profundidades das verticais

L= distâncias entre as verticais; no caso utilizou-se L= 3 m.

3ª) Vazão ‘Q’ (m³/s): É a relação das equação (15) e (16).

Q= V.A (17)

42

Onde: V= velocidade (m/s)

A= Área da secção do Rio (m²)

Sobre os métodos apresentados nas seções (4.3.1) e (4.3.2), é mais satisfatório usar a

técnica com o molinete por ser mais precisa a medição. Com o método de flutuação é

aconselhável usar somente quando não houver materiais necessários para realizar a coleta de

descarga líquida como barco ou até mesmo por ser um local de difícil acesso.

4.4 Parametrização do Modelo IPH II

Obtidos os valores de precipitação dos postos de chuva e características das

peculiaridades das sub-bacias, os parâmetros (Tabela 4) do modelo IPH II foram estimados de

tal forma que a vazão nos pontos de controle e trechos de água se equiparasse com os valores

observados.

Tabela 4: Parametrização do IPH II

PARÂMETROS BACIA DO MARACÁ

Io (mm/h) 13

Ib (mm/h) 0.23

H 0.86

Rmax (mm) 12 % da Área

Impermeável 0.01

VBEIC* (m³/s/km²) 0.005

*Vazão de Base Especifica no Inicio da Chuva (m³/s/km²) Tais parâmetros usados foram estimados da literatura. Porém, para tornar os dados

próximo do resultados observados e das características do local de estudo foi necessário fazer

uma calibração.

43

4.5 Calibração do Modelo IPH II

Os valores usados para Io variaram entre 12 mm/h a 15 mm/h, sendo que o ideal

estimado foi o de 13 mm/h para todas as sub-bacias. Para Ib foram utilizados valores entre

0,20 mm/h a 0,27 mm/h e modificados constantemente até a resposta almejada ou medida

hidrometricamente.

Posto que o parâmetro de decaimento da infiltração no solo (H) é muito sensível, foi

determinado um valor constante baseado nos valores encontrados na literatura. Como este

parâmetro é adimensional o valor adotado foi 0,86. Assim, foram trabalhados apenas os

valores de infiltração (Io) e de percolação (Ib). Os Rmax foram estimados entre 10 < Rmáx <

13. A porcentagem da Área Impermeável variou (0,01-0,001)%, pois se trata de uma área

praticamente rural, tais valores são de fundamental importância, pois variam de zero a um.

Por exemplo uma área de 100 % é considerada impermeável, ou seja, uma porcentagem de

urbanização elevadíssima, que não é o caso da região de estudo, pois a região do Maracá é

predominante área de floresta. Por fim a Vazão de Base Especifica no Inicio da Chuva

(VBEIC) que é a vazão estimada para o inicio da chuva, é inversamente proporcional a área

da sub-bacia em km². Os valores de VBEIC foram estimados na ordem de 0.002 a 0.0057

m³/s/km² para bacia do Maracá.

5 RESULTADOS ALCANÇADOS

Nesta seção são analisados e discutidos os resultados obtidos durante a pesquisa de

acordo com a metodologia aplicada, tanto experimental que serviu para dados de entrada do

modelo IPHS1 quanto da simulação e modelagem.

5.1. Avaliação Hidrométrica da Bacia do Maracá

O estudo visou a quantificação das vazões de um trecho do Rio, para a determinação

das curvas de descarga (curva-chave). Esta curva de descarga foi obtida através várias de

medições diretas da velocidade do rio e pela determinação e integração das áreas. Baseado em

Santos et al 2001, foi usado o método de medição de velocidade com o molinete. Através de

verticais foi possível caracterizar o perfil esquemático do rio Maracá na seção escolhida. Em

síntese obtiveram-se os seguintes resultados:

1ª Medição de Vazão

No dia 02 de Julho de 2007 houve a primeira atividade de campo no Rio Maracá no

qual realizamos a medição da velocidade, vazão e profundidade do rio e outros parâmetros

como largura, nível da lâmina d’água, etc (Ver Gráfico 1).

Gráfico 1: Resultados da Primeira Experimentação (02/07/2007).

1ª Coleta 02/07/2007

0

0,5

1

1,5

2

2,5

3

3,5

4

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15

Largura do Rio (45m)

Pro

fundid

ade (m

)

45

Área Total: 111,66 m² Velocidade média: 1,53 m/s

Vazão total: 170,7 m³/s Largura do Rio: 45 m

Profundidade média do Rio: 2,48 m.

No mês de julho foi realizada primeira da campanha hidrométrica. Trata-se de um

período em que se observam valores médios comparados com os resultados obtidos

posteriormente. Tal afirmação se confirmou quando relacionado com a climatologia da região.

2ª Medição de Vazão

No dia 13/10/2007 realizou-se a 2ª campanha de medição de vazão no rio Maracá no

qual obtivemos os seguintes resultados (Ver Gráfico 2). Sabendo-se que o mês de outubro é

um dos meses críticos de estiagem na região, era de se esperar a redução dos parâmetros

observados:

Gráfico 2: Resultados da Segunda Experimentação.

Área Total: 92,42 m²

Velocidade média: 1,14 m/s Vazão total: 104,92 m³/s

Largura do Rio: 39 m Profundidade média do Rio: 2,36 m

Ao realizar a tabulação dos dados da segunda campanha elaborou-se um diagnóstico

dos dados (Gráfico 3) fazendo a diferença das medições e, encontramos os seguintes

resultados dos meses de julho (azul) e outubro (vermelho):

2ª Coleta 13/10/2007

0

0,5

1

1,5

2

2,5

3

3,5

4

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15

Largura do Rio (39m)

Pro

fundid

ade (m

)

46

Gráfico 3: Mostra a diferença dos parâmetros coletos no trabalho de campo.

Área Total: 19,24 m² Velocidade média: 0,39 m/s

Vazão total: 65,78 m³/s Largura do Rio: 6 m

Profundidade média do Rio: 0,12 m

3ª Medição de vazão

No dia 28/02/2007 realizou-se a 3ª batimetria no Rio Maracá (figura 15) e pode-se

alcançar a meta da pesquisa Souza et al (2008) que seria a curva chave (ver posteriormente).

Além disso, observou-se um aumento dos parâmetros analisados: vazão, profundidade,

largura e velocidade do rio (Gráfico 4).

Figura 16: Batimetria no Rio Maracá

Diferença de nível

0

0,5

1

1,5

2

2,5

3

3,5

4

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15

Largura do Rio (m)

Pro

fundid

ade (m

)

45m

39m

47

Vazão do Rio Maracá 28/02/08

0

1

2

3

4

5

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17

Largura do Rio (50 m)

Pro

fun

did

ad

e (

m)

Figura 17: Resultados da terceira Experimentação

Área Total: 131,5 m²

Velocidade média: 1,66 m/s Vazão total: 218,25 m³/s

Largura do Rio: 50 m Profundidade média do Rio: 2,63 m

Em virtude do aumento considerável da velocidade/vazão do rio no período de

fevereiro e março em que houve um evento de cheia brusca e conseqüentemente o acidente na

turbina devido à falta atenção dos moradores da região do Caranã na operação de turbina. A

Figura 17 mostra a turbina antes e depois do acidente. Na Figura 17.b é possível visualizar a

estrutura danificada após ruptura de cabo de sustentação horizontal.

(a) (b)

Figura 18: (a) Mostra a turbina com funcionamento normal; b) a turbina foi coberta pela água que

causou o acidente. Fonte: Osias, 2008

48

4ª Medição de vazão

Por fim, realizou-se a quarta e ultima batimetria no rio Maracá no mês de agosto no

qual é um momento de transição para período critico de seca na região de estudo.

Gráfico 5: Batimetria do mês de agosto.

Área Total: 101,22 m² Velocidade média: 1,42 m/s

Vazão total: 142,72 m³/s Largura do Rio: 42 m

Profundidade média do Rio: 2,41 m.

Abaixo na Tabela 5 foram colocadas todas as campanhas hidrométricas realizadas no

decorrer da pesquisas para auxilio na modelagem do modelo IPHS1.

Tabela 5: Resultado de todas as coletas de campo.

PARÂMETROS CALCULADOS

1ª coleta (Julho)

2ª Coleta (Outubro)

3ª coleta (Fevereiro)

4ª Coleta (Agosto)

Área (m²) 111,66 92,42 131,5 101,22

Largura do rio (m) 45,00 39,00 50,00 42,00

Profundidade (m) 2,48 2,36 2,63 2,41

Vazão (m³/s) 170,70 104,92 218,25 142,72

Velocidade média (m/s)

1,53 1,14 1,66 1,42

Podemos observar as variações dos parâmetros medidos em que se visualiza a

diferença extrema do mês de outubro, considerado período de critico de seca, com os do mês

de fevereiro que é um período de cheia.

Devido à sua condição de máquina de fluxo livre, pelo princípio de Betz, o máximo

teórico de potência que se deve extrair desse tipo de máquina é 0,56. Além disso, foram

49

considerados os rendimento mecânico de turbina e elétrico do gerador iguais a 0,7 e 0,9

respectivamente.

Na Tabela 6 observa-se a potência da turbina na decorre do ano, utilizou-se a equação

(1) para calcular a potência hidráulica. Em seguida, calculou-se a potência elétrica através da

equação (2).

Tabela 6: Potência elétrica da Turbina.

Mês (2007/2008)

Velocidade (m/s)

Potência Elétrica (W)

Julho 1,53 885,63 Outubro 1,14 366,35

Fevereiro 1,66 1131,11 Agosto 1,42 708,02

Observa-se a grande influência da velocidade do escoamento nos resultados obtidos.

Isso se deve ao fato de a velocidade ser elevada ao cubo na equação da potência hidráulica

(1).

Outro resultado importante foi criar a curva-chave de um trecho específico do rio

Maracá, na qual podem-se calcular a vazão em função de profundidade e a velocidade em

função da vazão que interessa para geração de energia hidrocinética.

Curva-Chave (Ch)

A curva-chave é a relação entre os níveis d´água e velocidade com as respectivas

vazões de um posto fluviométrico ou entre velocidade e vazão. Para o traçado da curva-chave

em um determinado posto fluviométrico, é necessário que se disponha de uma série de

medições de vazão no local, ou seja, a leitura da régua e a correspondente vazão (dados de h,

v e Q). A curva chave usa modelo de seção com controle local, ou seja, predominância da

declividade do fundo sobre as demais forças do escoamento, como por exemplo, a pressão.

Com isso, temos uma relação entre profundidade e vazão ou velocidade e vazão.

Partindo-se desta série de valores (h e Q ou v e Q) a determinação da curva-chave

pode ser feita de duas formas: gráfica ou analiticamente. A experiência tem mostrado que o

50

nível d´água (h) e a vazão (Q) e velocidade (v) e vazão (Q) ajustam-se bem à curva do tipo

potencial, que é dada por:

Q= a. (h- ho)b (17)

V= c. (Q- Qo)d Onde:

Q é vazão em m³/s;

h é o nível d´água em m (leitura na régua);

a, b, c. d, ho e Qo são constantes para o posto, a serem determinados;

ho corresponde ao valor de h para vazão Q=0.

Qo corresponde ao valor de v para velocidade V=0 As equações acima podem ser linearizadas aplicando-se o logaritmo em ambos os lados: log Q = log a +b log(h- h0) (19)

log V = log c +d log(Q- Qo) (20) Fazendo Y = log Q, A = log a e X = log(h-h0), tem-se uma equação da reta: Y = A + bX (21)

A maneira mais prática de se obter os parâmetros a, b e h0 é o método gráfico, que

necessita de papel di-log. Entretanto, em face à dificuldade de encontrar este papel no

mercado, introduziu-se também, neste curso, o método analítico para a definição das curvas-

chaves (gráfico 6 ). Os coeficientes “a” ,“b”,”c” e “d” foram obtidos de uma regressão não-

linear, apartir do Excel.

Fazendo também W = log V, C = log c e Z = log(Q- Qo), tem-se uma equação da reta:

W = C + dZ (22)

(18)

51

Gráfico 6: Curva Chave com as 4 medições hidrométricas (batimetrias, parâmetros hidráulicos, etc).

Gráfico 7: Curva-Chave velocidade verso vazão.

A curva chave da velocidade em função da vazão foi muito importante, pois é a partir

da velocidade que se pode avaliar a viabilidade de instalação de turbinas hidrocinética em

comunidades isoladas.

Jul

Fev

V = 0,107.Q**0,513

R² = 0,962

0,8

0,9

1,0

1,1

1,2

1,3

1,4

1,5

1,6

1,7

1,8

90 110 130 150 170 190 210 230

Ve

locid

ad

e (

m/s)

Vazão (m³/s)

Seção de Estudo no Maracá - Mazagão - Amapá

Curva Chave - V x Q

52

5.2. Desempenho das Previsões do Modelo IPH II

O sistema IPHS1 foi utilizado para o cálculo da contribuição das séries de vazões de

cada uma das sub-bacias e para a simulação dos níveis de evaporação do rio Maracá em

determinado período do ano, mediante obtenção e dados hidrometeorológicos da bacia.

Ao realizar a simulação da bacia do Maracá (Figura 18), foi possível observar as

respostas hidrológicas características resultantes da fisiográfia da bacia. O principal resultado

foi seu hidrograma resultante o qual é a denominação dada ao gráfico que relaciona a vazão

em uma determinada secção de um curso de água em função do tempo.

Figura 19: Representação do hidrograma resultante (superior direita) e ambiente gráfico da bacia

simulado no IPHS1 (abaixo).

Na Figura 18 é apresentado o hidrograma observado para o mês de fevereiro de 2008

simulado no modelo IPH II, bem como a precipitação média ocorrida na bacia. Este evento foi

simulado para o período de 29 dias em intervalos horários. Sobre a figura acima, observa-se o

gráfico que em azul mostra a vazão de entrada e de vermelho a vazão de saída.

Ainda na Figura 18 temos que o modelo não simulou bem o início do aumento de

vazão do hidrograma. Entretanto, previu uma vazão máxima, uma vez que a máxima obtida

com o modelo neste evento foi de 203,555 m³/s, valor bem próximo do calculado que foi de

218,25 m³/s (Ver figura 6) na área de estudo.

53

Chuva Efetiva x Histograma Resultante

Na Figura 19, é apresentado mais uma das saídas gráficas do IPHS1 que é a chuva

efetiva x hidrograma resultante, a qual mostra o comportamento da vazão no decorrer da

precipitação observada pela estação e ANA (2007 e 2008).

Figura 20: Hidrograma da bacia do Maracá simulado para o mês de julho de 2008. Na parte superior

(vermelho) está indicada a precipitação e a curva (em verde) a resposta do aumento de vazão sob influência da chuva.

Observa-se na figura acima que o modelo simulou muito bem este evento de cheia e

no final do tempo ocorreu um amortecimento da onda de cheia. Como mencionado acima, o

modelo não respondeu imediatamente desde o início da precipitação devido a vários fatores

principalmente pela evaporação de parte da chuva na região de estudo (Figura 20). Na tabela

5 estão os valores de precipitação e evaporação do modelo.

Figura 21: Valores em verde indicam os dados de chuva e em amarelo os dados de evaporação.

54

Tabela 7: Na coluna “A” observam-se os intervalos de chuva num total de 12 registros. Na coluna “B” observam-se os dados de evaporação. E na coluna “C” estão os valores de precipitação.

Uma observação importante é que o total precipitado é a soma de da coluna “B” com a

“C”, pois mesmo antes da chuva atingir o solo, parte é evaporado. Portanto, com o resultado

da modelagem é necessário que se criem mecanismos para não ocorrer danos aos

equipamentos de geração como ocorreu no período de cheias de 2008 cujo acidente foi

causado no Caranã, e danificou a turbina hidrocinética instalada. Os moradores da região em

que a turbina foi afetada devem receber capacitação e treinamento para melhorar sua

capacidade de realizar manutenção periódica dos equipamentos (tanto na turbina quanto na

estrutura) para que o investimento dure ainda por muitos anos. Mas também é necessário que

toda a comunidade fique atenta aos eventos hidrometeorológicos extremos. Não basta usar

tecnologia sem o conhecimento do ambiente físico na qual o equipamento está instalado.

Estes resultados demonstram que uma onda de cheias com estas proporções poderia causar os

mesmos danos que ocorreram na situação real. Esta é a principal contribuição deste trabalho,

além disso, é possível neste momento, e apartir de dados climatológicos, estimar cheias

apartir do modelo.

6 CONCLUSÕES E SUGESTÕES

O objetivo do trabalho foi estimar o potencial hidrocinético do projeto de geração

descentralizada de energia elétrica a partir do aproveitamento de fontes renováveis de energia

em comunidades remotas da Amazônia, com base na avaliação dos aspectos tecnológicos,

socioeconômicos, ambientais e institucionais destes tipos de projetos, especificamente a

geração e energia a partir de fontes renováveis hidrocinética.

Além disso, a pesquisa não se limitou à análise experimental realizada na Bacia do

Maracá. Outro ponto central foi elaborar cenários de relação chuva-vazão, com uso de dados

obtidos em campo, e modelar as principais respostas às perturbações de entrada do modelo

IPHS1 de uma unidade de geração descentralizada de energia elétrica numa comunidade de

castanheiros no Estado do Amapá.

Em se tratando de alternativas energéticas para comunidades remotas, o estudo

hidrológico realizado para a turbina hidrocinética do Caranã vai ajudar futuros

empreendimentos, principalmente, a produção de castanha, visto que, com o funcionamento

da turbina, é possível gerar energia elétrica com segurança suficiente para o funcionamento de

equipamentos com um secador de castanha do Brasil (Hevea brasiliensis). Esta segurança que

poderá agregar valor operacional ao produto no período de inverno de entressafra, pois não

vai permitir a deterioração do produto, uma vez que a castanha vai estar com baixa umidade e

passível de armazenamento.

Além disso, sobre os resultados alcançados no trabalho podem-se fazer a seguinte

síntese:

• O conhecimento das características hidráulicas e hidrometeorológicas das

• bacias deveria ser um dos critérios técnicos decisivos para a instalação e

operação de turbinas hidrocinéticas em qualquer bacia hidrográfica cujo potencial seja

técnico, econômico e socialmente viáveis.

• A abordagem experimental apresenta algumas vantagens técnicas para indicar

se é ou não viável tecnicamente a instalação de equipamentos como as picocentrais

hidrocinéticas. A abordagem da análise numérica é da simulação computacional hidrológica

também apresentam outras vantagens técnicas na análise do potencial hidrocinético,

considerando aspectos históricos da bacia hidrográfica como precipitação, escoamento

superficial, vegetação, geomorfologia, etc, de tal forma que é possível se estimar respostas de

interação chuva-vazão e suas correlações com o funcionamento de turbinas hidrocinéticas.

• Quando fizemos a escolha do software para simular/modelar a bacia do

Maracá, optou-se pelo IPHS1 por ser livre no mercado e por atender as necessidades da

pesquisa.

• Sobre as batimetrias, o objetivo era quantificação mensal. Por isso acabou não

acontecendo devido a falta de recursos financeiros e só foram realizadas apenas 4 medições,

as quais foram suficientes para elaborar a curva-chave, ou seja, o cumprimento de uma das

metas alcançadas na pesquisa.

A relevância do tema dessa pesquisa é confirmada pela política nacional ao promulgar

a lei da universalização ao acesso e serviço de energia elétrica em 2002 com metas claras para

atender as populações rurais. O Programa Luz para Todos do Governo Federal implementado

para atender as exigências dessa lei, tem como meta atender dois milhões de domicílios rurais

até 2008, sabendo que deste montante pelo menos 300.000 domicílios na Amazônia deverão

ser atendidos com alguma forma de geração descentralizada de energia elétrica conforme

afirma ELS, 2008.

Os resultados do esforço de universalização estão obrigando os Estados a rever as suas

ações e mostrar a necessidade de mudança de paradigma para que as metas estabelecidas

sejam alcançadas. A eletrificação rural, mesmo nos moldes convencionais de extensão da rede

elétrica, precisa ser integrada num esforço de desenvolvimento local, e por isso não pode mais

ser considerada atribuição unicamente das instituições convencionais de geração e

distribuição de energia elétrica. Por tanto, este trabalho pode servir para novas pesquisas na

região, visto que é pesquisa inédita realizada no Estado do Amapá.

Mas a modalidade de geração de energia hidrocinética em regiões remotas, cujas

bacias hidrográficas são desconhecidas ou pouco estudadas, precisar levar em consideração as

características hidráulicas e hidrológicas locais, sob pena de pôr em risco os investimentos de

esforço econômico, material e humano quando submetido a algum tipo de evento

hidroclimatológico adverso, como enchentes bruscas ou estiagens prolongadas. Assim, o

presente trabalho buscou justamente tratar de alguns detalhes técnicos deste tema e que devem

ser considerados nos projetos futuros de geração de energia hidrocinética na região.

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