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UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES MOURA A (IN) CONSTITUCIONALIDADE DO REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC): o conflito entre a Administração Pública Gerencial e Burocrática. VIÇOSA - MINAS GERAIS 2014

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA

LARISSA DEMARQUES MOURA

A (IN) CONSTITUCIONALIDADE DO REGIME DIFERENCIADO DE

CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC): o conflito entre a Administração Pública

Gerencial e Burocrática.

VIÇOSA - MINAS GERAIS

2014

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LARISSA DEMARQUES MOURA

A (IN) CONSTITUCIONALIDADE DO REGIME DIFERENCIADO DE

CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC): o conflito entre a Administração Pública

Gerencial e Burocrática.

Monografia, apresentada ao Curso de Direito da

Universidade Federal de Viçosa como requisito para

obtenção do título de bacharel em Direito.

Professor Orientador: Gabriel Gori Abranches.

VIÇOSA - MINAS GERAIS

2014

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RESUMO

A presente pesquisa remonta-se à análise da inconstitucionalidade do Regime Diferenciado de

Contratações Públicas (RDC), o qual foi inserto ao ordenamento pátrio em detrimento dos

preceitos fundamentais instituídos pela Lei 8.666/93. A priori, a Lei 12.462/2011possuía

natureza excepcional, admitindo-se sua aplicação somente para a contratação de bens e

serviços atinentes a realização dos eventos desportivos sediados pelo Brasil. O cunho efêmero

dessa legislação, contudo, se desfez frente à ampliação gradativa do seu âmbito de incidência,

perdendo sua aparente taxatividade, antes tida enquanto condição de existência, para ter suas

hipóteses ampliadas ao bel prazer do legislador. Não obstante, sua implementação não se

sucedeu de forma límpida, encontrando-se em manifesta afronta ao devido processo

legislativo e separação dos poderes. Ademais, as inovações incutidas pela mesma possibilitam

fraudes e direcionamento das licitações públicas de modo a fomentar toda e qualquer forma

de abuso do poder e suprimir o controle dos procedimentos versados pela Lei Geral de

Licitação e Contratos Públicos. Em verdade, a instituição do RDC representa a consolidação

de uma cultura gerencial na Administração Pública brasileira que, com fulcro no imperativo

da Eficiência, consagrado pelo caput do artigo 37 da Constituição Federal por força da EC

19/98, visa promover uma política de resultados em detrimento da estrita legalidade. Neste

sentir, figura o conflito entre Administração Pública Burocrática e Gerencial, sendo incutida

ao senso comum a falsa assertiva de que àquela é permeada pela ineficiência e morosidade do

aparato estatal. Por todo o exposto, mostrar-se-á de inobjetável clareza o vício substantivo que

macula todo o regime e que, por razões óbvias, merece ser extirpado do diploma nacional por

ofender a supremacia da ordem constitucional e subverter a função primordial da

Administração, qual seja, a defesa do interesse público primário.

Palavras-chave: Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC); Administração

Pública Burocrática; Administração Pública Gerencial; Princípio da Eficiência;

Inconstitucionalidade.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ADI Ação Direta de Inconstitucionalidade

ANAC Agência Nacional de Aviação Civil

APO Autoridade Pública Olímpica

Art. Artigo

C.O.I. Comité Olímpico Internacional

CF/88 Constituição Federal de 1988

DEM Partido dos Democratas

EC Emenda Constitucional

FHC Fernando Henrique Cardoso

FIFA Federação Internacional de Futebol

MARE Ministério da Administração e Reforma do Estado

MC Medida Cautelar

MP Medida Provisória

OS Organizações Sociais

OSCIP Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público

PAC Programa de Aceleração do Crescimento

PPP Parceria Público-Privada

PPS Partido Popular Socialista

PSDB Partido da Social Democracia Brasileira

PVL Projeto de Lei de Conversão

RDC Regime Diferenciado de Contratações Públicas

STF Supremo Tribunal Federal

TCU Tribunal de Contas da União

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO................................................................................................................................................... 06

1. REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC).................................................... 08

1.1 Conceito e contextualização..................................................................................................................... 08

1.2 Trajetória Legislativa................................................................................................................................ 09

1.3 Âmbito de aplicação................................................................................................................................. 17

1.4 Principais inovações à ritualística Lei Geral de Licitação (Lei nº: 8.666/93).......................................... 21

2. O CONFLITO ENTRE A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA BUROCRÁTICA E GERENCIAL................... 25

2.1 Administração Pública Burocrática.......................................................................................................... 25

2.2 Administração Pública Gerencial e Princípio da Eficiência..................................................................... 29

2.2.1 A Administração Pública Gerencial................................................................................................. 29

2.2.1.1 A Reforma Administrativa no Brasil.................................................................................... 32

2.2.2 O Princípio da Eficiência.................................................................................................................. 35

2.3 A desburocratização da Administração e o RDC..................................................................................... 38

3. ANÁLISE DA INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL DO RDC....................................................... 41

3.1 Afronta aos Princípios Basilares da Administração Pública.................................................................... 41

3.1.1 Violação à Legalidade..................................................................................................................... 42

3.1.2 Violação à Impessoalidade.............................................................................................................. 46

3.1.3 Violação à Moralidade..................................................................................................................... 50

3.1.4 Violação à Publicidade.................................................................................................................... 52

3.1.5 Violação à Eficiência....................................................................................................................... 56

3.2 Regime de exceção X Tentativa de supressão do certame licitatório....................................................... 59

CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................................................................. 61

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................................................................ 63

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6

INTRODUÇÃO

Como é cediço, historicamente o Estado concentrou diversas prerrogativas em sua

esfera de atuação necessárias à gestão dos interesses e bens da coletividade. No entanto, tais

prerrogativas não são irrestritas, mas comedidas pelo próprio interesse público, evitando-se

que os detentores do exercício do poder estatal ajam arbitrariamente e se afastem das

disposições legais regentes do Estado Democrático de Direito.

Nesta senda, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 instituiu uma

sistemática jurídico-principiológica com o desiderato de conduzir as atividades da

Administração Pública e coibir condutas abusivas atentatórias ao erário e aos interesses

individuais, assim considerados na sua faceta coletiva enquanto partícipes da sociedade1.

Sob essa ótica, o legislador constituinte fez expressa alusão a axiomas tais quais, a

legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, que se consubstanciam em

verdadeiros deveres de conduta do administrador e garantia do administrado, que poderá

estabelecer meios de controle social em vista desses parâmetros constitucionais. Não obstante,

tratou de resguardar procedimento rigorosamente determinado na conformidade legal,

intitulado por licitação pública, que assegure a contratação de obras, serviços, compras e

alienações no âmbito público.

É dentro dessa perspectiva, legalmente delineada, e contrapondo-se à exegese da Lei

Maior que será instituído o Regime Diferenciado de Contratações Públicas, Lei 12.462 de 04

de agosto de 2011, enquanto medida excepcional, tomada em decorrência da realização de

competições esportivas de repercussão mundial – Copa do Mundo, Copa das Confederações e

Olímpiadas – tendo o Brasil como país anfitrião.

Não há como negar que o quê a princípio fora criado com a intenção de ser um

“regime de exceção”, mostrou-se como uma tentativa de suprimir todo o preceito licitatório

promovendo a inobservância de postulados fundamentais instituídos pela Constituição.

Ademais, a própria origem do instituto e a expansão gradativa do seu âmbito de aplicação,

antes limitado, são rechaçadas tanto pela doutrina quanto pela jurisprudência.

Fruto da omissão político-administrativa e da inércia governamental, decorrida de

considerável lapso temporal desde a declaração do Brasil enquanto país sede para a tomada de

atitudes atinentes a preparação infraestrutural, a Administração valeu-se de uma nova

1 MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 28ª ed. rev. e atual. São Paulo:

Malheiros, 2011. p. 61-62.

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7

modalidade licitatória que supostamente proporciona celeridade e eficiência às contratações

públicas, em completo afastamento dos preceitos expostos pela legislação geral, Lei 8.666/93.

Mister salientar que esse regime também é oriundo de uma mudança do modelo

operacional da Administração Pública que sofre inúmeras influências de uma cultura

gerencial perpetuada pela Reforma Administrativa suscitada no governo de Fernando

Henrique Cardoso.

Por oportuno, questionar-se-á no presente estudo se a instituição do RDC, que

inicialmente fora criado a título de provisão a demanda imediata, consistirá em regra e no

afastamento progressivo do certame licitatório previsto pela Lei nº 8.666/93 e na consequente

abolição do controle funcional e metodológico semeado no modelo burocrático de

Administração.

Desta forma, mostra-se patente o estudo da (in) constitucionalidade desse regime

examinando-se os institutos trazidos pela Lei nº 12.462/11, propulsora do RDC, assim como

suas vantagens, seus equívocos, as perspectivas e as discussões econômico-jurídicas que a

rodeiam.

Propõe-se ainda o breve estudo dos modelos de Administração Pública no intuito de

determinar se a adoção de medidas inovadoras pautadas na “eficácia” dos resultados e

personificadas no RDC, caracterizam uma mudança da Administração, pura e simplesmente

burocrática para a gerencial e se tal fato representa um avanço histórico como vem sendo

divulgado.

Adverte-se que tais análises ocorrerão a partir de artigos de periódicos, doutrina,

decisões judiciais, bem como demais materiais de conhecimento científico difundidos pelos

meios virtuais de informação, que permitam investigar acerca dos pontos controversos do

RDC em relação Lei 8.666/93 e, por conseguinte, tecer críticas e levantar os pormenores da

adoção do regime em apreço.

Para a construção do conflito entre as aludidas vertentes da Administração Pública

adotar-se-á, no decorrer do presente estudo, o raciocínio indutivo que permita verificar a

mudança na forma de atuação estatal e avaliar as consequências oriundas.

Por derradeiro, através da junção dos métodos dedutivo e dialético, pretende-se aferir a

(in) constitucionalidade do RDC construindo, para tanto, um modelo teórico que abarque todo

o contexto social, político e econômico no qual sucedeu a instituição de seus preceitos.

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1. REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC)

1.1 Conceito e contextualização

O Regime Diferenciado de Contratações Públicas, comumente abreviado na sigla

RDC, trata-se de uma nova modalidade licitatória, como bem se depreende a partir da

interpretação literal da expressão. Nesse sentido prelecionam Ricardo Barreto de Andrade e

Vitor Lanza Veloso:

[...] registre-se que a Lei nº 12.462 parece ter instituído uma nova modalidade de

licitação, combinando alguns elementos das modalidades até então existentes na

disciplina administrativa com a introdução de relevantes inovações, para conformar

o que denomina Regime Diferenciado de Contratações Públicas. Nessa perspectiva,

no seu âmbito de incidência, o RDC constitui modalidade autônoma, abrangendo a

seleção e a contratação necessárias à obtenção do bem ou serviço demandado pela

Administração2.

Com efeito, a conceituação desse regime encontra-se intrinsicamente relacionada ao

contexto de sua implementação, o qual merece especial atenção no presente tópico.

Sua instituição desencadeou-se devido a proximidade e a consequente urgência para

proporcionar a infraestrutura necessária à realização dos eventos esportivos mundiais que

foram e serão sediados pelo nosso país, quais sejam, a Copa das Confederações da Federação

Internacional de Futebol - FIFA2013, a Copa do Mundo FIFA 2014 e os Jogos Olímpicos e

Paraolímpicos de 2016.

Salienta-se, sobretudo, que a escolha do Brasil para sediar os aludidos eventos

futebolísticos ocorreu em 30 de outubro de 20073. Da mesma maneira, em 02 de outubro de

20094, sobreveio a escolha do Rio de Janeiro para recepcionar as delegações estrangeiras nos

maiores episódios multiesportivos do mundo, as Olimpíadas e as Paraolimpíadas.

Num primeiro momento, torna-se forçoso reconhecer que tais designações, ocorridas

com mais de 05 anos de antecedência da realização dos eventos em questão, concederam

prazo hábil para munir as cidades-sede e todo seu entorno da infraestrutura imprescindível,

em atenção aos padrões de exigência da FIFA e do Comité Olímpico Internacional – C.O.I.,

por meio dos procedimentos de contratação pública usuais.

2 ANDRADE, Ricardo Baretto de; VELOSO, Vitor Lanza. Uma visão geral sobre o Regime Diferenciado de

Contratações Públicas: objeto, objetivos, definições, princípios e diretrizes. In: JUSTEN FILHO, Marçal;

PEREIRA, Cesar A. Guimarães (Coord.). O Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC):

Comentários à Lei nº 12.462 e ao Decreto nº 7.581. 2ª ed. rev. ampl. e atual. Belo Horizonte: Fórum, 2013,

p.31. 3 Data retirada do site oficial da Copa do Mundo da FIFA 2014. Disponível em:

<http://pt.fifa.com/worldcup/news/newsid=1158962/>. Acesso em março de 2013. 4 Data disponível no endereço:< http://www.abril.com.br/esportes/rio2016/>. Acesso em março de 2013.

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Ocorre, contudo, que o aparato governamental manteve-se inerte e como escusa

incutiu a ideia de que os procedimentos nas contratações públicas, instituídos pela legislação

geral, são lentos e burocratizados o suficiente para atender tempestivamente as demandas da

coletividade, sendo necessário propiciar a eficiência nas contratações públicas, que carecem

de medidas mais céleres, econômicas e competitivas.

Em verdade, essa morosidade administrativa representa verdadeira manobra política

para criação de uma legislação excepcional, apta à promoção do encurtamento de prazos,

simplificação de procedimentos e flexibilização de requisitos, afastando qualquer incidência

da ritualística Lei nº 8.666, de 1993, responsável pela instituição de normas gerais para

licitações e contratos. Assim, com fulcro na omissão intencional e na “suposta” atenuação dos

atrasos para a realização dos jogos, passou a integrar o ordenamento jurídico, por intermédio

da conversão da Medida Provisória nº 527 na Lei Federal 12.462/2011, o RDC.

A princípio o que fora criado com a intenção de ser um “regime de exceção”,

instrumentalizou-se no meio hábil para suprimir todo o certame licitatório e, por conseguinte,

burlar a observância de todos os preceitos principiológicos instituídos pela Constituição,

consoante será doravante alinhavado.

Com efeito, a criação desse regime traduz a incapacidade fática da Administração

Pública em promover estratégias de planejamento a longo prazo, tentando silenciar os anseios

sociais através de procedimentos rotineiros de exceção com eficácia limitada, que atuam em

completo descompasso à realidade jurídica, econômica e cultural da nossa nação.

1.2 Trajetória Legislativa

A conversão da Medida Provisória nº 527 na Lei nº 12.462, de 04 de agosto de 2011,

responsável pela instituição do Regime Diferenciado de Contratações Públicas, tratou-se de

um processo peculiar eivado de vícios formais de inconstitucionalidade.

A princípio, a aludida MP fora editada pela Presidente da República, no exercício dos

atributos que lhe conferem o art. 62 da Constituição5, no desígnio de alterar a Lei nº

5 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o

presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato

ao Congresso Nacional. § 1º É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria: I – relativa a: a)

nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos e direito eleitoral; b) direito penal, processual

penal e processual civil; c) organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de

seus membros; d) planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e

suplementares, ressalvado o previsto no art. 167, § 3º; II – que vise a detenção ou seqüestro de bens, de

poupança popular ou qualquer outro ativo financeiro; III – reservada a lei complementar; IV – já disciplinada

em projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional e pendente de sanção ou veto do Presidente da República.

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10.683/2003, cujo intuito original limitava-se, dentre outras medidas, à organização do Poder

Executivo e a reformulação do quadro institucional da gestão da aviação civil6.

Eis que durante a tramitação da medida na Câmara dos Deputados, é apresentado pelo

seu relator, o Deputado José Guimarães7, o Projeto de Lei de Conversão (PVL) através do

qual propôs emendas parlamentares substanciais que não guardavam qualquer pertinência

lógica com as proposições originais da Medida8.

Sendo esse projeto apreciado e aprovado pelo Senado Federal e, posteriormente,

sancionado, pela Presidente, entra em vigor em 05 de agosto de 2011 a Lei 12.462, instituindo

o RDC.

A despeito da inconstitucionalidade formal da norma supramencionada não ser o

objeto principal de estudo, neste presente tópico faz-se necessária sua breve análise a fim de

compreender, em sua totalidade, a desconformidade da mesma com regras de competência e

§ 2º Medida provisória que implique instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos nos arts. 153, I,

II, IV, V, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o

último dia daquele em que foi editada. § 3º As medidas provisórias, ressalvado o disposto nos §§ 11 e 12

perderão eficácia, desde a edição, se não forem convertidas em lei no prazo de sessenta dias, prorrogável, nos

termos do § 7º, uma vez por igual período, devendo o Congresso Nacional disciplinar, por decreto legislativo,

as relações jurídicas delas decorrentes. § 4º O prazo a que se refere o § 3º contar-se-á da publicação da medida

provisória, suspendendo-se durante os períodos de recesso do Congresso Nacional. § 5º A deliberação de cada

uma das Casas do Congresso Nacional sobre o mérito das medidas provisórias dependerá de juízo prévio sobre

o atendimento de seus pressupostos constitucionais. § 6º Se a medida provisória não for apreciada em até

quarenta e cinco dias contados de sua publicação, entrará em regime de urgência, subseqüentemente, em cada

uma das Casas do Congresso Nacional, ficando sobrestadas, até que se ultime a votação, todas as demais

deliberações legislativas da Casa em que estiver tramitando. § 7º Prorrogar-se-á uma única vez por igual

período a vigência de medida provisória que, no prazo de sessenta dias, contado de sua publicação, não tiver a

sua votação encerrada nas duas Casas do Congresso Nacional. § 8º As medidas provisórias terão sua votação

iniciada na Câmara dos Deputados. § 9º Caberá à comissão mista de Deputados e Senadores examinar as

medidas provisórias e sobre elas emitir parecer, antes de serem apreciadas, em sessão separada, pelo plenário

de cada uma das Casas do Congresso Nacional. § 10. É vedada a reedição, na mesma sessão legislativa, de

medida provisória que tenha sido rejeitada ou que tenha perdido sua eficácia por decurso de prazo. § 11. Não

editado o decreto legislativo a que se refere o § 3º até sessenta dias após a rejeição ou perda de eficácia de

medida provisória, as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados durante sua vigência

conservar-se-ão por ela regidas. §12: Aprovado projeto de lei de conversão alterando o texto original da

medida provisória, esta manter-se-á integralmente em vigor até que seja sancionado ou vetado o projeto. 6 Eis a redação do preâmbulo da Medida Provisória nº 527, de 18 de março de 2011: “Altera a Lei no 10.683, de

28 de maio de 2003, que dispõe sobre a organização da Presidência da República e dos Ministérios, cria a

Secretaria de Aviação Civil, altera a legislação da Agência Nacional de Aviação Civil - ANAC e da Empresa

Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária - INFRAERO, cria cargos de Ministro de Estado e cargos em

comissão, dispõe sobre a contratação de controladores de tráfego aéreo temporários, cria cargos de Controlador

de Tráfego Aéreo”. In: BRASIL, Medida Provisória nº 527, de 18 de março de 2011. Planalto, Brasília: DF,

2011. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/Mpv/527.htm>.Acesso em

março de 2013. 7 O deputado federal José Nobre Guimarães pertence ao Partido dos Trabalhadores do Estado do Ceará.

8 BRASIL, Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4645, ajuizada pelo Partido da Social Democracia

Brasileira (PSDB), dos Democratas (DEM) e do Partido Popular socialista (PPS), contra a Lei 12.462/2011,

que instituiu o chamado “Regime Diferenciado de Contratações Públicas” (RDC), aplicável às licitações e

contratos de obras de infraestrutura dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, da Copa do Mundo de 2014

e da Copa das Confederações da FIFA de 2013. Disponível na íntegra em:

<http://www.institutocertame.com.br/adin-4645-rdc-regime-diferenciado-contratacoes>. Acessado em abr. de

2013.

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com o procedimento constitucionalmente estabelecido para seu ingresso no mundo jurídico.

Ademais, o conhecimento desse vício de forma favorecerá a compreensão da contrariedade

substantiva entre o regime de exceção em apreço e normas basilares do nosso ordenamento.

Em um primeiro momento, essa inconstitucionalidade orgânica pode ser sentida na

ausência dos pressupostos constitucionais necessários à edição da medida provisória, quais

sejam a urgência e a relevância, preceituados no art. 62 da Lei Maior.

Neste liame, cumpre mencionar que a competência investida ao Chefe do Executivo

trata-se de uma exceção ao postulado legislativo inerente ao Congresso Nacional, devendo

assim ser exercida tão somente quando preenchidos os pressupostos formais aptos à

legitimação da Medida Provisória.

Para tanto, deverá configurar-se situação na qual o Executivo seja obrigado a produzir

norma jurídica, sob pena de “acarretar dano de difícil ou impossível reparação para o interesse

público9”. Nesse sentido, posicionou-se o Ministro Celso de Mello no julgamento da ADI-MC

293:

[...]O que justifica a edição das medidas provisórias é a existência de um estado de

necessidade, que impõe ao Poder Executivo a adoção imediata de providências

de caráter legislativo, inalcançáveis segundo as regras ordinárias de

legiferação, em face do próprio "periculum in mora" que certamente

decorreria do atraso na concretização da prestação legislativa.[...]10

[sem grifos no original].

A exegese jurisprudencial é corroborada pelo entendimento doutrinário de Celso

Antônio Bandeira de Mello que assevera:

Já que são excepcionais, ou seja, fórmulas atípicas, anômalas, de introduzir normas

primárias, só admissíveis para atender interesses relevantes, resulta imediatamente

claro que não é qualquer espécie de interesse que lhes pode servir de justificativa,

pois todo e qualquer interesse público é, ipso facto, relevante. Donde – e como nem

a lei nem a Constituição tem palavras inúteis – há de se entender que a menção do

art. 62 à “relevância” implicou atribuir uma especial qualificação à natureza do

interesse cuja ocorrência enseja a utilização de medidas provisórias. É Certo, pois,

que só ante casos graves, ante interesses invulgarmente importantes, justifica-se a

adoção de medidas provisórias. Isto, entretanto, não é suficiente para o cabimento

delas. Cumpre, ademais, que a cura de tal interesse deva ser feita sem retardamento

algum, à falta do quê a sociedade expor-se-ia a sérios riscos ou danos. Em suma: é

preciso que exista a “urgência” a que alude o art.62.

Que é urgência? Que coisa deve ser havida como urgente? Mesmo que a palavra

contenha em si algum teor de fluidez, qualquer pessoa entenderá que só é urgente o

que tem que ser enfrentado imediatamente, o que não pode aguardar o decurso do

9 MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. Gilmar Ferreira Mendes, Inocêncio Mártires

Coelho, Paulo Gustavo Gonet Branco. – 6ª Ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2011. p.913. 10

BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade: ADI-MC

nº 293. Requerente: Procurador Geral da República; Requerido: Presidente da República. Relator: Ministro

Celso de Mello. Brasília: DF. Data de Julgamento: 06/06/1990. Tribunal Pleno. Data de Publicação: DJ 16-04-

1993. PP-06429. EMENT VOL-01699-01 PP-00009. Disponível em:

<http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/2907836/medida-cautelar-na-acao-direta-de-inconstitucionalidade-

adi-mc-293-df>. Acesso em jan. de 2014.

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tempo, caso contrário o benefício pretendido será inalcançável ou o dano que se quer

evitar consumar-se-á ou, no mínimo, existirão sérios riscos de que sobrevenham

efeitos desastrosos em caso de demora11

.

Observado o conteúdo originário da MP nº 527, acima sintetizado, urge os

questionamentos: Onde está a urgência e a relevância na reestruturação organizacional da

Administração Pública Federal? Não seria esse tema ordinário e trivial o suficiente para

suscitar a edição de uma MP?

Não obstante a organização infraestrutural do aparato governamental e gerenciamento

da aviação civil12

sejam matérias de suma importância, carecem da urgência autorizativa para

fins de edição da espécie normativa em comento. Afinal, tais ações são recorrentes no cenário

político nacional, sendo habitual a criação de órgãos, repartições e remanejamento do quadro

de servidores públicos. Isso sem mencionar o fato de que tais medidas podem ser prontamente

alcançadas a partir do planejamento da gestão e a partir da prestação legislativa ordinária, não

se caracterizando danos irremediáveis decorrentes do atraso da atividade legiferante pelo

Congresso Nacional.

Portanto, são nos pressupostos formais apregoados pelo art.62 da Lei da República,

que se esbarra a inconstitucionalidade formal da MP nº527.

A ausência desses preceitos importa ao Presidente, agente privativamente competente

pela edição do ato, manifesto abuso do poder de legislar, excedendo os limites da atividade de

criação das leis concedida ao Executivo no exercício de suas funções atípicas.

Sendo assim, a omissão dos imperativos de urgência e relevância material acabam por

retirar a legitimidade extraordinária constitucionalmente outorgada ao Chefe do Executivo,

fazendo com que este se aproprie da função institucional do Congresso Nacional, afetando

diretamente a harmonia existente ente os três poderes e ultrajando o Princípio Republicano da

Separação dos Poderes (art.2º da CF/88).

Não bastasse a violação do art. 62 da CF/88, o que por si só macula a

constitucionalidade da MP nº527 e, por conseguinte, da Lei 12.462/11, imperioso mencionar

11

MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Op. cit. p. 131-132. 12

Não só o aumento na demanda mas, principalmente, a qualidade do serviço pelo setor de aviação civil

tornaram-se temas cogentes no cenário nacional. A deficiência na infraestrutura, os constantes atrasos e

cancelamentos de voos, furtos e extravio de bagagens, baixa oferta de viagens regionais, estagnação de

pequenos e médios aeroportos e o abarrotamento daqueles situados em grandes centros urbanos, destacam-se

dentre às inúmeras reivindicações dos usuários desse setor. Ademais, é manifesto o déficit nas comunicações

internas entre a ANAC e os próprios consumidores e entre as empresas e seus passageiros, o que resulta no

aumento considerável do número de reclamações formais e ações judiciais. Atento às irregularidades e

insuficiência do setor, o legislador tratou de assegurar a aviação civil dentre as hipóteses, a princípio,

excepcionais de adoção do Regime Diferenciado de Contratações – RDC, mais precisamente no art. 1º, inciso

III da Lei 12.462/2011. Tal medida externaliza a preocupação com o tráfego aéreo e eficiência dos serviços

durante a realização dos eventos desportivos sediados pelo Brasil.

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o abuso do poder de emendar, característico no trâmite da medida provisória e na conversão

da Lei em questão.

Frise-se, nesse primeiro momento, a natureza dúplice da medida provisória: “É norma

jurídica com força cogente, e ao mesmo tempo, projeto de lei de iniciativa do Executivo, a ser

deliberado pelo Congresso Nacional 13

”.

Com força de lei e vigência imediata, as demais normas incompatíveis com a MP terão

sua eficácia suspensa até que tal ato normativo primário seja convertido ou não em lei.

Por outro lado, enquanto projeto de lei de iniciativa reservada, em que o Presidente é

investido de ampla margem de discricionariedade em relação aos requisitos de urgência e

relevância, sendo essa uma apreciação puramente política, haverá limites a tal arbítrio,

devendo a medida submeter-se ao escrutínio do Congresso Nacional, como bem se depreende

da lição exposta pelo Ministro Celso de Mello na ADI-MC 293, a seguir transcrita:

As medidas provisórias configuram, no direito constitucional positivo brasileiro,

uma categoria especial de atos normativos primários emanados do Poder Executivo,

que se revestem de força, eficácia e valor de lei . - Como a função legislativa

ordinariamente pertence ao Congresso Nacional, que a exerce por direito

próprio, com observância da estrita tipicidade constitucional que define a

natureza das atividades estatais, torna-se imperioso assinalar - e advertir - que

a utilização da medida provisória, por constituir exceção derrogatória do

postulado da divisão funcional do poder, subordina-se, em seu processo de

conversão legislativa, à vontade soberana do Congresso Nacional [...]

A plena submissão das medidas provisórias ao Congresso Nacional constitui

exigência que decorre do princípio da separação de poderes. O conteúdo

jurídico que elas veiculam somente adquirirá estabilidade normativa, a partir

do momento em que - observada a disciplina ritual do procedimento de

conversão em lei - houver pronunciamento favorável e aquiescente do único

órgão constitucionalmente investido do poder ordinário de legislar, que é o

Congresso Nacional . - Essa manifestação do Poder Legislativo é necessária, é

insubstituível e é insuprimível. Por isso mesmo, as medidas provisórias, com a sua

publicação no Diário Oficial, subtraem-se ao poder de disposição do Presidente da

República e ganham, em conseqüência, autonomia jurídica absoluta, desvinculando-

se, no plano formal, da autoridade que as instituiu14

. [sem grifos no original].

13

BRASIL, Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4645, ajuizada pelo Partido da Social Democracia

Brasileira (PSDB), dos Democratas (DEM) e do Partido Popular socialista (PPS), contra a Lei 12.462/2011,

que instituiu o chamado “Regime Diferenciado de Contratações Públicas” (RDC), aplicável às licitações e

contratos de obras de infraestrutura dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, da Copa do Mundo de 2014

e da Copa das Confederações da FIFA de 2013. Disponível na íntegra em:<

http://www.institutocertame.com.br/adin-4645-rdc-regime-diferenciado-contratacoes>. Acessado em abr. de

2013. 14

BRASIL, Supremo Tribunal Federal.Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade: ADI-

MC nº 293. Requerente: Procurador Geral da República; Requerido: Presidente da República. Relator:

Ministro Celso de Mello. Brasília: DF. Data de Julgamento: 06/06/1990. Tribunal Pleno. Data de Publicação:

DJ 16-04-1993; PP-06429; EMENT VOL-01699-01; PP-00009. Disponível em:

<http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/2907836/medida-cautelar-na-acao-direta-de-inconstitucionalidade-

adi-mc-293-df>. Acesso em jan. de 2014.

Page 15: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

14

Do exercício pelo Congresso Nacional da função legislativa, que lhe foi primariamente

constituída, urge a possibilidade de emendas parlamentares, com vista no §12º do art.62 da

CF/8815

.

No entanto, insta salientar que essa possibilidade não é irrestrita, devendo sempre

pautar-se pela pertinência entre as alterações suscitadas e os preceitos originais da MP, sob

pena de deturpar a competência privativa do Chefe do Executivo. Sob este prisma, encontra-

se entendimento firmado pelo excelso Supremo Tribunal Federal, veja-se:

TRIBUNAL DE JUSTIÇA - INSTAURAÇÃO DE PROCESSO LEGISLATIVO

VERSANDO A ORGANIZAÇÃO E A DIVISÃO JUDICIÁRIAS DO ESTADO -

INICIATIVA DO RESPECTIVO PROJETO DE LEI SUJEITA À CLÁUSULA

CONSTITUCIONAL DE RESERVA (CF, ART. 125, § 1º,"IN FINE")-

OFERECIMENTO E APROVAÇÃO, NO CURSO DO PROCESSO

LEGISLATIVO, DE EMENDAS PARLAMENTARES - AUMENTO DA

DESPESA ORIGINALMENTE PREVISTA E AUSÊNCIA DE PERTINÊNCIA -

DESCARACTERIZAÇÃO DA PROPOSIÇÃO LEGISLATIVA ORIGINAL, MOTIVADA PELA AMPLIAÇÃO DO NÚMERO DE COMARCAS, VARAS E

CARGOS CONSTANTES DO PROJETO INICIAL - CONFIGURAÇÃO, NA

ESPÉCIE, DOS REQUISITOS PERTINENTES À PLAUSIBILIDADE JURÍDICA

E AO "PERICULUM IN MORA" - MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA . - O

poder de emendar projetos de lei - que se reveste de natureza eminentemente

constitucional - qualifica-se como prerrogativa de ordem político-jurídica

inerente ao exercício da atividade legislativa. Essa prerrogativa institucional,

precisamente por não traduzir corolário do poder de iniciar o processo de

formação das leis (RTJ 36/382, 385 - RTJ 37/113 - RDA 102/261), pode ser

legitimamente exercida pelos membros do Legislativo, ainda que se cuide de

proposições constitucionalmente sujeitas à cláusula de reserva de iniciativa

(ADI 865/MA, Rel. Min. CELSO DE MELLO), desde que - respeitadas as

limitações estabelecidas na Constituição da República - as emendas

parlamentares (a) não importem em aumento da despesa prevista no projeto de lei,

(b) guardem afinidade lógica (relação de pertinência) com a proposição original

e (c) tratando-se de projetos orçamentários (CF, art. 165, I, II e III), observem as

restrições fixadas no art. 166, §§ 3º e 4º da Carta Política. Doutrina. Jurisprudência .

- Inobservância, no caso, pelos Deputados Estaduais, quando do oferecimento das

emendas parlamentares, de tais restrições. Precedentes do Supremo Tribunal

Federal. Suspensão cautelar da eficácia do diploma legislativo estadual impugnado

nesta sede de fiscalização normativa abstrata.16

[sem grifos no original]

O poder de emendar concedido aos parlamentares esbarra na impossibilidade de

veicular matérias diferentes das versadas na lei de iniciativa exclusiva do Presidente, de modo

a desfigurá-la, tornando acessória as previsões inicias da medida.

Trata-se, na verdade, de um imperativo lógico da Separação dos Poderes, o qual

resguarda a autonomia e independência do Executivo, Legislativo e do Judiciário, designando

15

Vide nota de rodapé nº.5. 16

BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade: ADI-MC

nº 1050. Requerente: Procurador Geral da República; Requerido: Governador do Estado de Santa Catarina e

Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina. Relator: Ministro Celso de Mello. Santa Catarina- SC,

Data de Julgamento: 20/09/1994. Tribunal Pleno. Data de Publicação: DJ 23-04-2004. PP-00006; EMENT

VOL-02148-02; PP-00235 RTJ VOL-00191-02 PP-00412. Disponível em:

<http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/747391/medida-cautelar-na-acao-direta-de-inconstitucionalidade-

adi-mc-1050-sc>. Acesso em jan. de 2014.

Page 16: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

15

a cada um funções típicas, inerentes e ínsitas à sua natureza, e atípicas, asseguradas pelo

constituinte originário. Esse paradigma permite maior interpenetração entre os poderes

culminando na harmonia desse mecanismo recíproco de controle, denominado de sistema de

freios e contrapesos17

.

É cediço que os motivos originários da MP nº527, destinados sucintamente a alteração

da estrutura administrativa do Poder Executivo Federal, não se coadunam com a temática de

licitações e contratações públicas, que culminou na instituição do RDC. Tanto é, que o

próprio Relator da proposição, o Deputado José Guimarães, em parecer apresentado no

plenário de sua Casa, em 15/06/2011, reconhece a impertinência temática das emendas

propostas:

[...] As peculiaridades que cercam a tramitação da MP 527 impõem que se fracione a

análise do mérito da matéria em dois compartimentos distintos, ainda que

mutuamente relacionados. No primeiro deles, a seguir inserido, examina-se o teor do

texto original e das emendas que lhe foram apresentadas pelos parlamentares. Em

sequencia, serão abordados aspectos correlatos ao tema abordado na MP, mas que

não constam do teor levado a conhecimento público quando da publicação do

instrumento de que se cuida no Diário Oficial da União.[...]

Como se afirmou anteriormente, a análise de mérito da MP deve prosseguir pela

abordagem de tema que não consta de seu teor original ou das emendas que lhe

foram oferecidas, mas que possui acentuada relação com os propósitos

fundamentais do instrumento. Tece-se referência ao regimento diferenciado de

licitações públicas, que o grupo hoje investido da responsabilidade de administrar o

país vem tentando ver aprovado desde a gestão anterior à atual, isto é, ainda sob a

administração do ex-Presidente Lula18

.”

O relato acima apenas ratifica que o exercício do direito subjetivo constitucional,

tocante aos parlamentares, excedeu os limites que lhes são próprios ao não resguardar a

pertinência temática da emenda à proposição normativa originária.

17

Nas palavras do doutrinador Alexandre de Moraes: “[...] O Direito Constitucional contemporâneo, apesar de

permanecer na tradicional linha da ideia de Tripartição dos Poderes, já entende que essa fórmula, se

interpretada com rigidez, tornou-se inadequada para um Estado que assumiu a missão de fornecer a todo o seu

povo o bem-estar, devendo, pois, separar as funções estatais, dentro de um mecanismo de controle recíprocos,

denominado ‘freios e contrapesos’ (checks and balances)”. In: MORAES, Alexandre de. Direito

Constitucional - 21 ed. – São Paulo: Atlas. 2007. p. 389. 18

DISTRITO FEDERAL. Câmara dos Deputados – DETAQ. Sessão: 153.1.54.O. Hora: 17:50. Fase: OD.

Orador: José Guimarães, PT-CE. Data: 15/06/2011. Parecer, pela Comissão Mista, à Medida Provisória 527

de 2011 (Altera a Lei 10.683 de 2003, que dispõe sobre a organização da Presidência da República e dos

Ministérios, cria a Secretaria de Aviação Civil, altera a legislação da Agência Nacional de Aviação Civil -

ANAC e da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária - INFRAERO, cria cargo de Ministro de

Estado e cargos em comissão, dispõe sobre a contratação de controladores de tráfego aéreo temporários, cria

cargos de Controlador de Tráfego Aéreo). Disponível em

<http://www.camara.gov.br/internet/sitaqweb/TextoHTML.asp?etapa=5&nuSessao=153.1.54.O%20%20%20

%20%20&nuQuarto=116&nuOrador=2&nuInsercao=27&dtHorarioQuarto=17:50&sgFaseSessao=OD%20%2

0%20%20%20%20%20%20&Data=15/06/2011&txApelido=JOS%C3%89%20GUIMAR%C3%83ES,%20PT-

CE&txFaseSessao=Ordem%20do%20Dia%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20

%20%20%20&txTipoSessao=Ordin%C3%A1ria%20-

%20CD%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20&dtHoraQuarto=17:50&txEta

pa=> . Acesso em mar. de 2013.

Page 17: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

16

Logo, o Projeto de Lei de Conversão padeceu por emenda parlamentar substancial sem

correlação, o que promoveu uma verdadeira desvirtualização do rol de dispositivos inseridos

no texto da referida Medida Provisória19

.

A não observância dessa limitação temática, que deveria ser elementar ao próprio ato

de emendar, criou obstáculos à atuação institucional dos demais parlamentares uma vez que

inibe o direito de discutir publicamente e, por conseguinte, de apresentar emendas às

proposições em votação.

Isso ocorre uma vez que os parlamentares somente tomarão conhecimento da matéria

que será votada no momento em que devem exercer o direito de voto, sem mencionar a

existência de constrições regimentais que impedem o oferecimento de emendas por

parlamentares em matérias novas incluídas em plenário pelo relator da proposição.

A subversão do trâmite da Medida Provisória, para incutir em seu bojo matérias sem

qualquer pertinência, afinidade ou conexão com aquela inicialmente proposta, representa

verdadeira “manobra” do Legislativo de usurpar a competência própria investida ao Executivo

por força da excepcionalidade que abarca os imperativos indelegáveis da apreciação da

urgência e relevância inerentes à adoção da medida. Com efeito, figura-se, nesse caso,

manifesta afronta ao Princípio da Separação dos Poderes (art. 2º da CF/8820

) e, sobretudo, à

Supremacia da Ordem Constitucional.

Igualmente, na medida em que se promove verdadeiro atropelo ao processo de

conversão, na tentativa de contornar os trâmites legislativos ordinários suplantando em

medidas provisórias “normas que não tenham sido objeto de exame pelas comissões temáticas

das Casas do Congresso Nacional21

”, amolda-se a violação ao Devido Processo Legal (art. 5º

LIV, art. 59 e 62 da CF/8822

).

19

Salienta-se que essa prática, contudo, vem se tornando rotineira no Parlamento brasileiro e representa

verdadeiro abuso do poder de emendar, através do qual se prima pela prevalência de interesses puramente

políticos em detrimento da estrita legalidade. 20

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art. 2º: São Poderes da União, independentes e

harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. 21

REZENDE, Renato Monteiro de. O Regime Diferenciado de Contratações Públicas: Comentários à Lei

12.462, de 2011. Núcleo de Estudos e Pesquisas do Senado. Texto para discussão 100. Agosto/2011.

Disponível em:

<https://docs.google.com/viewer?a=v&q=cache:Yr2FIw6jUxcJ:www.senado.gov.br/senado/conleg/textos_disc

ussao/TD100-RenatoRezende.pdf+Redime+diferenciado+de+contrata%C3%A7%C3%B5es+publicas&hl=pt-

BR&gl=br&pid=bl&srcid=ADGEESjC3RjC5uw6Ihzeyq1Ig2V1dD-

bB7YoyqbWvWImmau64bvJ62cON9u_MhcoZLGpnd1040u8OVVWr24uYU4SNq_bXkRLGxgJIweKAjKET

D5pv1NeP8k8Q9Kh4tZQWq_tsq7jt8zH&sig=AHIEtbQ7VF-lLmjU5U5FDsWkCM85QiX5Mw.> Acesso em

mar.de 2013. 22

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art. 5º, inciso LIV: ninguém será privado da

liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal. Art. 59. O processo legislativo compreende a

elaboração de: I - emendas à Constituição; II - leis complementares; III - leis ordinárias; IV - leis delegadas; V

- medidas provisórias; VI - decretos legislativos; VII - resoluções. Parágrafo único. Lei complementar disporá

Page 18: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

17

Imperioso esclarecer, por fim, que a sanção presidencial a projeto de lei que veicule

norma resultante de emenda parlamentar aprovada com transgressão da finalidade

originariamente proposta por meio de medida provisória, não tem o condão de sanar os vícios

de inconstitucionalidade formais acima suscitados.

Por óbvio, a simples anuência do Chefe do Executivo - ainda que deste seja a

prerrogativa institucional usurpada, como ocorreu no caso em deslinde - revela-se

juridicamente insuficiente para convalidar os descumprimentos de ordem constitucional23

.

Desta feita, manifesta ofensa aos preceitos constitucionais, acabam por desvestir de

validade não só a MP nº 527 mas, principalmente, a Lei 12.462/11, sendo a declaração de

inconstitucionalidade desta última, medida que se impõe em defesa da Supremacia do Estado

Democrático de Direito.

1.3 Âmbito de aplicação

Criado com a função precípua de erigir a infraestrutura necessária para a recepção dos

eventos desportivos sediados no nosso país, o RDC insurgiu na figura de modalidade

licitatória excepcional à Lei nº 8.666/93, apta a promover o encurtamento de prazos e

irromper com o trâmite burocrático permeado pela legislação geral de licitações e

contratações públicas. Pelo menos, essa foi a ideia semeada pelos nossos representantes

políticos no intuito de ver aprovado o aludido regime.

sobre a elaboração, redação, alteração e consolidação das leis. Caput do Art. 62: Em caso de relevância e

urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las

de imediato ao Congresso Nacional. 23

Eis a jurisprudência pátria acerca do tema: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE -

DEFENSORIA PÚBLICA - REMUNERAÇÃO - PISO REMUNERATORIO NÃO INFERIOR A SETE (7)

VEZES O MENOR VENCIMENTO DA TABELA DO PODER EXECUTIVO - VINCULAÇÃO

REMUNERATORIA CONSTITUCIONALMENTE VEDADA - NORMA LEGAL RESULTANTE DE

EMENDA PARLAMENTAR - ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL (CF, ART. 63, I)

E MATERIAL (CF, ART. 37, XIII)- PLAUSIBILIDADE JURÍDICA - PERICULUM IN MORA

CARACTERIZADO - MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA. PROCESSO LEGISLATIVO E ESTADO-

MEMBRO: A atuação dos membros da Assembleia Legislativa dos Estados acha-se submetida, no processo de

formação das leis, a limitação imposta pelo art. 63, I, da Constituição, que veda - ressalvadas as proposições de

natureza orçamentária - o oferecimento de emendas parlamentares de que resulte o aumento da despesa

prevista nos projetos sujeitos ao exclusivo poder de iniciativa do Governador do Estado. USURPAÇÃO DE

INICIATIVA E SANÇÃO EXECUTIVA: A sanção a projeto de lei que veicule norma resultante de

emenda parlamentar aprovada com transgressão a cláusula inscrita no art. 63, I, da Carta Federal não

tem o condão de sanar o vício de inconstitucionalidade formal, eis que a só vontade do Chefe do

Executivo - ainda que deste seja a prerrogativa institucional usurpada - revela-se juridicamente

insuficiente para convalidar o defeito radical oriundo do descumprimento da Constituição da Republica.

[...]. In: BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Medida cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade:

ADI-MC 1070 MS. Relator: Celso de Mello, Data de Julgamento: 23/11/1994, Tribunal Pleno. Data de

Publicação: DJ 15-09-1995 PP-29507 EMENT VOL-01800-01 PP-00187. Disponível em:

<http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/746928/medida-cautelar-na-acao-direta-de-inconstitucionalidade-

adi-mc-1070-ms>. Acesso em dez. de 2013.

Page 19: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

18

Assim sendo, na redação originária do art. 1º da Lei 12.462/1124

, fruto da conversão da

MP nº 527, constavam apenas 3 (três) hipóteses exclusivas que autorizavam a adoção do

regime, são elas: os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016; a Copa das Confederações da

Federação Internacional de Futebol Associação - FIFA 2013 e a Copa do Mundo FIFA 2014 e

as obras de infraestrutura e de contratação de serviços para os aeroportos das capitais dos

Estados da Federação distantes até 350 km (trezentos e cinquenta quilômetros) das cidades

sedes das referidas competições.

Ainda que a aplicação desse regime se restrinja, nesse primeiro momento, à realização

dos eventos em questão, deve-se reconhecer que o caput do aludido dispositivo, todavia, não

permite a delimitação do objeto com tanta precisão, por fazer constar em sua redação a

seguinte expressão: “[...] aplicável exclusivamente às licitações e contratos necessários à

realização:[...]”.

O termo licitações e contratos dá margem a ampla interpretação pela qual não há

limites das obras, serviços e aquisição de bens que poderão realizar-se por meio desse regime

diferenciado. Tal abrangência terminológica, portanto, inviabiliza a identificação de quais

seriam os projetos beneficiados pela aplicação do complexo normativo em comento, como

bem se assentaram as inquietações doutrinárias acerca do tema:

Com efeito, a expressão “licitações e contratos necessários à realização” (art.1º,

caput) dá margem a larga interpretação, pelo que o RDC poderia abranger desde

obras de estádios, passando por intervenções de mobilidade urbana e, até mesmo,

investimentos em saúde, educação profissionalizante e segurança pública. Os incisos

do art. 1º igualmente não contribuem para a definição do âmbito de aplicação do

RDC25

.

Não se pode olvidar, sobretudo, o questionamento no que concerne a existência de um

limite temporal aos contratos celebrados com fulcro nesse regime diferenciado.

Neste contexto, por ser manifesta a limitação de ordem temática a qual vincula a

adoção do RDC aos eventos supracitados, caso o objeto da contratação não tenha a remota

24

Lei 12.462/2011 - Art. 1º: É instituído o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), aplicável

exclusivamente às licitações e contratos necessários à realização: I - dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de

2016, constantes da Carteira de Projetos Olímpicos a ser definida pela Autoridade Pública Olímpica (APO); II

- da Copa das Confederações da Federação Internacional de Futebol Associação - Fifa 2013 e da Copa do

Mundo Fifa 2014, definidos pelo Grupo Executivo - Gecopa 2014 do Comitê Gestor instituído para definir,

aprovar e supervisionar as ações previstas no Plano Estratégico das Ações do Governo Brasileiro para a

realização da Copa do Mundo Fifa 2014 - CGCOPA 2014, restringindo-se, no caso de obras públicas, às

constantes da matriz de responsabilidades celebrada entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios; III -

de obras de infraestrutura e de contratação de serviços para os aeroportos das capitais dos Estados da

Federação distantes até 350 km (trezentos e cinquenta quilômetros) das cidades sedes dos mundiais referidos

nos incisos I e II. 25

ANDRADE, Ricardo Baretto de; VELOSO, Vitor Lanza. Uma visão geral sobre o Regime Diferenciado de

Contratações Públicas: objeto, objetivos, definições, princípios e diretrizes. In: JUSTEN FILHO, Marçal;

PEREIRA, Cesar A. Guimarães (Coord.). Op. cit., p. 32.

Page 20: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

19

possibilidade de findar-se a tempo da realização das competições, por óbvio, restará impedida

a aplicação deste regime.

Todavia, salienta-se a divergência no que diz respeito às obras e serviços que se

perpetuam no tempo, não sendo finalizadas para a celebração dos jogos. Acerca desta matéria,

posicionou-se o TCU, retificando escólio anteriormente prolatado por meio do acórdão 1538

de 2012, pacificando-a no seguinte sentido:

[...] a utilização do RDC em obras com término posterior à Copa do Mundo de

2014 – ou às Olimpíadas de 2016, conforme o caso – só é legítima nas situações

em que ao menos fração do empreendimento tenha efetivo proveito para a

realização desses megaeventos esportivos, cumulativamente com a necessidade de

se demonstrar a inviabilidade técnica e econômica do parcelamento das frações da

empreitada a serem concluídas a posteriori, em atendimento ao disposto nos arts. 1º,

incisos de I a III; 39 e 42 da Lei 12.462/2011, c/c o art. 23, § 1º, da Lei 8.666/9326

.

[sem grifos no original].

Evidente que a fundamentação legal, a qual vinculava a aplicação do RDC à realização

tempestiva das competições, era efêmera e, em verdade, representava apenas a ambição

política no sentido de implementar um regime excepcional capaz de sobrelevar todo o rigor

inerente ao procedimento licitatório incutido pelas normas gerais.

Em que pese a aparente taxatividade, progressivas alterações na letra da lei foram

aprovadas pelo Congresso Nacional, sendo o rol taxativo do art.1º da Lei 12.462/2011

acrescido ao bel prazer do legislador na medida em que se autorizou sua adoção para matérias

que não correspondem à finalidade originariamente proposta, veja-se:

Art. 1º É instituído o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC),

aplicável exclusivamente às licitações e contratos necessários à realização:

I - dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, constantes da Carteira de

Projetos Olímpicos a ser definida pela Autoridade Pública Olímpica (APO); e

II - da Copa das Confederações da Federação Internacional de Futebol

Associação - Fifa 2013 e da Copa do Mundo Fifa 2014, definidos pelo Grupo

Executivo - Gecopa 2014 do Comitê Gestor instituído para definir, aprovar e

supervisionar as ações previstas no Plano Estratégico das Ações do Governo

Brasileiro para a realização da Copa do Mundo Fifa 2014 - CGCOPA 2014,

restringindo-se, no caso de obras públicas, às constantes da matriz de

responsabilidades celebrada entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios;

III - de obras de infraestrutura e de contratação de serviços para os aeroportos

das capitais dos Estados da Federação distantes até 350 km (trezentos e

cinquenta quilômetros) das cidades sedes dos mundiais referidos nos incisos I e

II;

IV - das ações integrantes do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)

(Incluído pela Lei nº 12.688, de 2012);

V - das obras e serviços de engenharia no âmbito do Sistema Único de Saúde -

SUS. (Incluído pela Lei nº 12.745, de 2012);

26

BRASIL, Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 1538/2012. Plenário. Relator: Ministro Valmir Campelo.

Sessão de 20/06/2012. Disponível em:

<http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:c0KnICL4DQoJ:www.tcu.gov.br/Consultas/Juris/Do

cs/judoc/Acord/20120622/AC_1538_23_12_P.doc+&cd=1&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br>. Acesso em jan. de

2014.

Page 21: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

20

VI - das obras e serviços de engenharia para construção, ampliação e reforma

de estabelecimentos penais e unidades de atendimento socioeducativo. (Incluído

pela Medida Provisória nº 630, de 2013);[...]

§ 3º Além das hipóteses previstas no caput, o RDC também é aplicável às

licitações e contratos necessários à realização de obras e serviços de engenharia

no âmbito dos sistemas públicos de ensino. (Incluído pela Lei nº 12.722, de 2012).

[sem grifos no original]27

.

Fato é que o objeto de incidência delimitado tematicamente e, a princípio, apregoado

enquanto verdadeira condição de existência do RDC, fora gradativamente sofrendo

adulterações, tornando ilimitado o seu campo de abrangência e extirpando a transitoriedade

característica às suas normas.

A inclusão das ações integrantes do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)

no rol de incidência apenas corrobora essa assertiva ao passo que, traçado enquanto

verdadeiro modelo de estímulo ao crescimento econômico por intermédio de investimento em

setores basilares, promove a consecução de obras faraônicas de infraestrutura social, urbana,

logística e energética do país28

, não sendo fixados parâmetros mínimos para identificar quais

seriam os projetos inseridos nesse plano estratégico do Governo Federal. Deste modo,“basta

ao governo rotular a obra como parte deste programa para que ela esteja autorizada a adotar o

RDC”29

.

A partir desta, seguiram-se as demais modificações com vista a atender outras

demandas sociais, tornando optativa a aplicação do regime no âmbito do Sistema Único de

Saúde (SUS), obras de estabelecimentos penais e unidades de atendimento socioeducativo,

assim como no sistema público de ensino.

Notadamente, a inclusão de tais serviços públicos essenciais à sociedade poderá

acometer danos econômicos e sociais irremediáveis conquanto a adoção deste regime afasta a

27

BRASIL, Lei nº 12.462, de 04 de Agosto de 2011. Institui o Regime Diferenciado de Contratações Públicas -

RDC; altera a Lei no 10.683, de 28 de maio de 2003, que dispõe sobre a organização da Presidência da

República e dos Ministérios, a legislação da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) e a legislação da

Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero); cria a Secretaria de Aviação Civil, cargos de

Ministro de Estado, cargos em comissão e cargos de Controlador de Tráfego Aéreo; autoriza a contratação de

controladores de tráfego aéreo temporários; altera as Leis nos 11.182, de 27 de setembro de 2005, 5.862, de 12

de dezembro de 1972, 8.399, de 7 de janeiro de 1992, 11.526, de 4 de outubro de 2007, 11.458, de 19 de março

de 2007, e 12.350, de 20 de dezembro de 2010, e a Medida Provisória no 2.185-35, de 24 de agosto de 2001; e

revoga dispositivos da Lei no 9.649, de 27 de maio de 1998. É oriunda da conversão da Medida Provisória nº

527, de 2011. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/Lei/L12462.htm>,

Acessado em mar. de 2013. 28

A exposição dos motivos foi retirada do site do Portal Brasil no endereço <http://www.pac.gov.br/> acessado

em 15/03/2013. Nesse link também se encontram as funções institucionais, assim como dados fáticos do

Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) instituído pelo Governo Federal. 29

Estes são os dizeres do Advogado e professor universitário Rafael Valim, diretor executivo do Instituto

Brasileiro de Estudos Jurídicos da Infraestrutura (Ibeji), reproduzidos a título de entrevista veiculada na

Revista Eletrônica Brasil Econômico, na reportagem de Juliana Garçon. In: GARÇON, Juliana. “Atalho” para

obras da Copa já domina licitações públicas. Dispositivo já é usado em nove concorrências e também será

adotado em novos setores. Brasil Econômico. São Paulo. 11,12 e 13 da janeiro de 2013.

Page 22: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

21

aplicação da Lei 8.666/93 com todos os seus princípios, o que macula a transparência, a

isonomia, a objetividade no julgamento, o caráter competitivo, enfim, toda a lisura do certame

licitatório, extirpando a possibilidade de selecionar a proposta realmente mais vantajosa para a

Administração.

Ademais, a inconstitucionalidade que macula os preceitos regentes deste regime abre

margem à desobediência aos reclames de probidade administrativa e à prevalência de

vontades particulares e, até mesmo, do próprio Estado sobre o interesse público primário.

Com efeito, as inovações legislativas elidiram a taxatividade das hipóteses de

aplicação do RDC, dissipando a excepcionalidade que revestia o aludido complexo normativo

e o fim colimado para sua criação.

1.4 Principais inovações à ritualística Lei Geral de Licitação (Lei nº: 8.666/93)

A despeito de não ser objeto de estudo tecer os pormenores dos institutos abrangidos

pelo RDC, insta trazer a baila algumas das suas principais inovações no certame licitatório a

título de comparação com as normas gerais de contratação pública.

Adverte-se que, nesta oportunidade, não serão aprofundados os comentários atinentes

a constitucionalidade de seus preceitos, matéria esta que será apreciada no capítulo III da

presente pesquisa. Desta forma, este tópico destina-se tão somente a sobrelevar algumas das

principais inovações inauguradas por este regime de exceção contrapondo-as às premissas

instituídas pela legislação geral e introduzir brevemente a temática da inconstitucionalidade

que macula todo o diploma normativo em comento.

O aludido regime apregoa, enquanto regra geral, em seu art. 6º, §3º30

, a presunção de

sigilo do custo das obras, restringindo a publicidade do orçamento previamente estimado para

a contratação.

Resguardadas as devidas exceções, o sigilo vigorará durante todo o certame, não

constando no instrumento convocatório o que, de fato, inviabilizará o seu conhecimento

prévio pelos licitantes, muito embora o mesmo deva ser exclusivamente disponibilizado para

os órgãos de controle externo e interno. A divulgação do orçamento se dará somente após o

encerramento do trâmite legal.

30

Lei 12.462/11 - Art. 6º, § 3º:Se não constar do instrumento convocatório, a informação referida nocaputdeste

artigo possuirá caráter sigiloso e será disponibilizada estrita e permanentemente aos órgãos de controle externo

e interno.

Page 23: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

22

Neste ponto, o aludido regime destoa-se da previsão dos artigos 3º, § 3º; 40, § 2º,

II;44, § 1º, da Lei nº 8.666, de 199331

, os quais preceituam a ampla divulgação do orçamento

para todas as modalidades licitatórias, com vista a consagração do princípio da Publicidade,

regente de toda a atividade da Administração Pública.

Outrossim, institui a contratação integrada (art. 9º, caput32

), a partir da qual se

transfere ao particular a responsabilidade pela “elaboração e o desenvolvimento dos projetos

básico e executivo, a execução de obras e serviços de engenharia, a montagem, a realização

de testes, a pré-operação e todas as demais operações necessárias e suficientes para a entrega

final do objeto”33

, devendo constar no instrumento convocatório o anteprojeto de engenharia

que forneça aos participantes um delineamento do objeto da licitação (art. 9º, §2º, I34

).

A atribuição dos encargos acima mencionados encontra justificativa no imperativo da

eficiência de ordem técnica e econômica na medida em que os riscos relativos a execução do

contrato são compartilhados com o licitante para os casos de prestações dotadas de maior

complexidade.

Acerca da empreitada integral, urge o escólio de Marçal Justen Filho:

É adequada nas hipóteses de objetos dotados de elevada carga de complexidade, em

que a Administração não dispõe de condições de identificar, de modo preciso e

exato, as etapas, as tecnologias e os custos mais adequados. A empreitada integral

propicia, nesses casos, que a Administração atribua aos licitantes uma margem mais

ampla de autonomia para conceber soluções complexas e heterogêneas35

.

Importa destacar que a previsão deste regime de execução indireta pelo particular

contraria normas da Lei nº 8.666/93, mais precisamente os artigos 7º, § 2º, I e II e 40, § 2º, I e

31

Lei 8.666/93 – Art 3º, §3º: A licitação não será sigilosa, sendo públicos e acessíveis ao público os atos de seu

procedimento, salvo quanto ao conteúdo das propostas, até a respectiva abertura.

Art. 40, § 2º: Constituem anexos do edital, dele fazendo parte integrante: [...] II –orçamento estimado em

planilhas de quantitativos e preços unitários;

Art. 44, § 1º: § 1º: É vedada a utilização de qualquer elemento, critério ou fator sigiloso, secreto, subjetivo ou

reservado que possa ainda que indiretamente elidir o princípio da igualdade entre os licitantes. 32

Lei 12.462/2011 - Art. 9º: Nas licitações de obras e serviços de engenharia, no âmbito do RDC, poderá ser

utilizada a contratação integrada, desde que técnica e economicamente justificada e cujo objeto envolva, pelo

menos, uma das seguintes condições: 33

Lei 12.462/2011 - Art.9º,§ 1º: A contratação integrada compreende a elaboração e o desenvolvimento dos

projetos básico e executivo, a execução de obras e serviços de engenharia, a montagem, a realização de testes,

a pré-operação e todas as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto. 34

Lei 12.462/2011 – Art.. 9º, §2º, I: O instrumento convocatório deverá conter anteprojeto de engenharia que

contemple os documentos técnicos destinados a possibilitar a caracterização da obra ou serviço, incluindo: a) a

demonstração e a justificativa do programa de necessidades, a visão global dos investimentos e as definições

quanto ao nível de serviço desejado; b) as condições de solidez, segurança, durabilidade e prazo de entrega,

observado o disposto no caput e no § 1o do art. 6o desta Lei; c) a estética do projeto arquitetônico; e d) os

parâmetros de adequação ao interesse público, à economia na utilização, à facilidade na execução, aos

impactos ambientais e à acessibilidade. 35

JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 14 ed. São Paulo:

Dialética, 2010. p.131.

Page 24: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

23

II36

, segundo as quais a existência do projeto básico é elementar à consecução de grandes

obras e serviços, devendo o mesmo ser elaborado pela entidade licitante uma vez que esta

procederá o certame de acordo com as suas prementes necessidades. Ademais, tais

dispositivos asseveram a preexistência deste projeto que deverá encontrar-se disponível no

edital para exame dos interessados em participar do processo licitatório.

Os artigos 10 e 2337

do diploma em apreço, por seu turno, incorporam mecanismos de

remuneração do contratado que subordina a contraprestação do mesmo à resultado futuro e

incerto, assemelhando-se a sistematização dos contratos de risco38

.

O primeiro dispositivo prevê a remuneração variável para obras e serviços públicos,

decorrente do desempenho da contratada na consecução de metas e padrões de qualidade além

do esperado e, por conseguinte, da satisfatoriedade da licitante.

O segundo, em contrapartida, institui o contrato de eficiência, a partir do qual a

remuneração devida ao particular ocorrerá segundo a percentagem de economia gerada à

Administração graças à redução de despesas correntes durante a execução do contrato. Assim,

caso não se atinja a economia esperada pelo instrumento contratual, poderá haver o desconto

na remuneração, assim como aplicação de sanções de inexecução do objeto.

Tais hipóteses contrapõem-se aos preceitos regidos pela legislação geral que não

vincula a remuneração do particular à obtenção de metas acerca das quais paira a incerteza de

sua concretização.

Reputa-se, por fim, a dispensada publicação em diário oficial, preceituado pelo art. 15,

§2º39

, nas licitações cujo valor não ultrapasse R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais)

36

Lei 8.666/93 – Art. 7º, § 2º: As obras e os serviços somente poderão ser licitados quando: I - houver projeto

básico aprovado pela autoridade competente e disponível para exame dos interessados em participar do

processo licitatório; II - existir orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os

seus custos unitários. Art. 40, § 2º: Constituem anexos do edital, dele fazendo parte integrante: I - o projeto

básico e/ou executivo, com todas as suas partes, desenhos, especificações e outros complementos; II -

orçamento estimado em planilhas de quantitativos e preços unitários; 37

Lei 12.462/2011 - Art. 10. Na contratação das obras e serviços, inclusive de engenharia, poderá ser

estabelecida remuneração variável vinculada ao desempenho da contratada, com base em metas, padrões de

qualidade, critérios de sustentabilidade ambiental e prazo de entrega definidos no instrumento convocatório e

no contrato. Parágrafo único. A utilização da remuneração variável será motivada e respeitará o limite

orçamentário fixado pela administração pública para a contratação. Art. 23: No julgamento pelo maior retorno

econômico, utilizado exclusivamente para a celebração de contratos de eficiência, as propostas serão

consideradas de forma a selecionar a que proporcionará a maior economia para a administração pública

decorrente da execução do contrato. 38

Nas palavras de Rafael WallbachSchwind: “[...] Adota-se uma sistemática de contrato de risco, em que o

contratado assume o risco de ter ao menos parte da sua remuneração diretamente vinculada à obtenção de

certos resultados[...]”. Ainda segundo o autor esse modelo de contrato de risco deve ser mais utilizado pela

Administração Pública visto que: “[...] tem muito a contribuir para a maior eficiência na execução de obras e

serviços, sem colocar em risco as prerrogativas da Administração nem comprometer a busca pela satisfação

dos interesses público envolvidos.”. In: SCHWIND, Rafael Wallbach. Remuneração variável e contratos de

eficiência no Regime Diferenciado de Contratações Públicas. In: JUSTEN FILHO, Marçal; PEREIRA,

Cesar A. Guimarães (Coord.). Op. cit., p.175-176.

Page 25: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

24

para obras ou R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) para bens e serviços, inclusive de engenharia.

Tal previsão significa manifesta afronta ao Princípio da Publicidade materializado no âmbito

das licitações públicas e consagrado nos artigos 3º,caput e §3º e 21, incisos I, II e III da Lei

8.666/9340

.

Discriminados os preceitos fundamentais do RDC, há que se atentar à forma de

atuação do Estado, no que concerne ao seu posicionamento com a instituição desse regime e,

por conseguinte, de promover o gradual afastamento do procedimento licitatório tradicional

previsto pela Norma Geral de Licitação e Contratos.

Neste ínterim, estaria a Administração afastando os parâmetros burocráticos para

vestir medidas puramente gerenciais? No intuito de encontrar resposta a esse questionamento

remonta-se ao estudo aprofundado dos modelos de Administração Pública.

39

Lei 12.462/2011 – Art. 15. § 2º: No caso de licitações cujo valor não ultrapasse R$ 150.000,00 (cento e

cinquenta mil reais) para obras ou R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) para bens e serviços, inclusive de

engenharia, é dispensada a publicação prevista no inciso I do § 1º deste artigo. 40

Lei 8.666/93 – Art. 3º, caput: A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da

isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento

nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da

legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da

vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.[...] § 3º: A

licitação não será sigilosa, sendo públicos e acessíveis ao público os atos de seu procedimento, salvo quanto ao

conteúdo das propostas, até a respectiva abertura.

Art. 21. Os avisos contendo os resumos dos editais das concorrências, das tomadas de preços, dos concursos e

dos leilões, embora realizados no local da repartição interessada, deverão ser publicados com antecedência, no

mínimo, por uma vez: I - no Diário Oficial da União, quando se tratar de licitação feita por órgão ou entidade

da Administração Pública Federal e, ainda, quando se tratar de obras financiadas parcial ou totalmente com

recursos federais ou garantidas por instituições federais; II - no Diário Oficial do Estado, ou do Distrito Federal

quando se tratar, respectivamente, de licitação feita por órgão ou entidade da Administração Pública Estadual

ou Municipal, ou do Distrito Federal; III - em jornal diário de grande circulação no Estado e também, se

houver, em jornal de circulação no Município ou na região onde será realizada a obra, prestado o serviço,

fornecido, alienado ou alugado o bem, podendo ainda a Administração, conforme o vulto da licitação, utilizar-

se de outros meios de divulgação para ampliar a área de competição.

Page 26: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

25

2. O CONFLITO ENTRE A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA BUROCRÁTICA E

GERENCIAL

Primeiramente, antes de ser trazer à tona as modalidades de Administração Pública, é

preciso definir com precisão o significado deste termo e suas atribuições.

Em linhas gerais, a Administração Pública nada mais é do que as atividades

desenvolvidas pelo aparato Estatal no intuito de planejar, dirigir e executar as decisões

políticas tomadas no âmbito de qualquer dos três poderes – Executivo, Legislativo e

Judiciário. Trata-se do desenvolvimento inexaurível, sistemático, técnico e legal das funções

precípuas assumidas pelo Estado na gestão da res pública.

O exercício dessas funções deverá ser neutro, despido de ambições particulares,

estritamente vinculado à normatividade, observando-se os ditames da responsabilidade

funcional, enfim, conforme preleciona Hely Lopes Meirelles, “preordenado à realização de

serviços, visando a satisfação das necessidades coletivas41” e colimando a supremacia e a

indisponibilidade do Interesse Público.

Alexandre de Moraes a resume da seguinte maneira:

A administração Pública pode ser definida objetivamente como atividade concreta e

imediata que o Estado desenvolve para a consecução dos interesses coletivos e

subjetivamente como o conjunto de órgãos e de pessoas jurídicas aos quais a lei

atribui o exercício da função administrativa do Estado42

.

Assim definida, cumpre-nos discorrer sobre o modelo burocrático da Administração.

2.1 Administração Pública Burocrática

A fim de tecer os pormenores dessa vertente burocrática faz-se necessário ponderar

brevemente a vertente antecedente, qual seja a patrimonialista. Esta, por sua vez, era adotada

pelas monarquias absolutistas que precederam o capitalismo e a democratização e

caracterizava-se pela confusão entre o patrimônio público e privado, consubstanciando-se em

verdadeira “extensão do poder soberano do monarca43

”.

41

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 27ªed. atual. São Paulo: Malheiros, 2002.

Pág.63. 42

MORAES, Alexandre de. Op. cit., p. 303. 43

HENRIQUE, Marco Antônio. Administração Pública Burocrática versus Gerencial: uma análise crítica.

XV Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e XI Encontro Latino Americano de Pós-Graduação –

Universidade do Vale do Paraíba. Disponível em:

<https://docs.google.com/viewer?a=v&q=cache:qVt1hImQ0XQJ:www.inicepg.univap.br/cd/INIC_2011/anais/

arquivos/0023_0043_01.pdf+administra%C3%A7%C3%A3o+publica+burocratica+a+gerencial&hl=pt&gl=br

Page 27: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

26

Marina Silva traduz o modelo do seguinte modo:

O Patrimonialismo é a apropriação privada dos bens públicos. E quando se fala em

bens públicos, não se trata apenas de bens materiais, mas do próprio exercício do

poder. Na visão patrimonialista, o governante é um senhor – como no tempo da

colônia – que tudo pode e o Estado é como se fosse sua propriedade particular.

Consequentemente, os cidadãos não têm direitos de fato. Recebem benesses aqui e

ali, em lugar de exigir os serviços e benefícios que são devidos à sociedade pelo

poder público. Troca-se cidadania por relações de favor pessoal. Aí morrem os

direitos, a justiça, a ética, o bem comum, os valores morais. E aí vicejam a

subserviência, o engodo, o banditismo político, a impunidade, o mau uso do dinheiro

público e a miséria social44

.

Frente à concentração de poderes nas mãos dos monarcas e os germes da nobreza, esse

período foi marcado pela corrupção, nepotismo e usurpação do poder, razão pela qual emergiu

a necessidade de pugnar por uma Administração verdadeiramente Pública que resguardasse os

interesses do corpo social e não dos seus próprios governantes.

Eis que surge a burocratização como consequência de uma ordem racional-legal, a

qual promove uma mudança quantitativa e qualitativa da Administração que carece da

estrutura adequada para garantir condições mínimas de gerenciamento, planejamento,

manutenção do aparato estatal e acompanhamento dos anseios sociais dentro de um contexto

socioeconômico tão complexo como mostrou ser o capitalismo.

Sob este prisma, Max Weber, principal expoente deste modelo, ao dedicar-se ao

estudo sistemático de suas organizações, não se preocupou em defini-lo, atribuindo-lhe um

conceito rígido mas limitou-se, tão somente, ao delineamento das características que lhe são

intrínsecas, as quais passam-se, sucintamente, a serem expostas45

:

Autoridade racional-legal: a autoridade do administrador, nesse caso, parte de um

pressuposto legal que legitima suas ações e decisões. Tal normatividade encontra-se livre de

tradições e subjetividades, trazendo meios coercitivos para assegurar sua aplicação. Insta

salientar que essa mesma norma que atribui poderes ao administrador mostra ser fonte de

&pid=bl&srcid=ADGEESjre3Qh6XccIcgujj8_UvXsqBwm__vpcJVEbVRLiBZaIuaxXMKCXwNYqJuaCfkg

Hu2VylNswZZMzTXak0ws5DshlElPstm3QLQKvre8b9PuLzBaswrzGRqdQ6ayx7OX6srBJ_oN&sig=AHIEtb

QFcgOm8Ea-j6QwWCLwC5WIspFOPQ>. Acesso em abr. de 2013. 44

SILVA, Marina. Reflexões sobre a Independência. Publicado na Gazeta do Rio Branco/AC e no site do

senado no link:

<http://www.senado.gov.br/senadores/senador/marinasi/detalha_artigo.asp?data=05/09/2000&codigo=1526>.

apud Apostila da Fapan – Faculdade de Paraíso do Norte. Disponível em:

<http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:tAwtaqYnOlcJ:www.fapanpr.edu.br/site/docente/arq

uivos/Administracao_Publica_Apostila01.pdf+&cd=1&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br> Acesso em jan. de 2014. 45

TORRES, Marcelo Douglas de Figueiredo. Estado, Democracia e Administração Pública no Brasil.

1ªed..Rio de Janeiro: FGV, 2004. Pág. 19-22. Disponível em: <http://books.google.com.br/books?hl=pt-

BR&lr=&id=jvDrA9D6vSAC&oi=fnd&pg=PA11&dq=Administra%C3%A7%C3%A3o+p%C3%BAblica+we

beriana&ots=bgqVHyheu2&sig=z4gMsV8DecyoJqXDW2nY_xS2klw#v=onepage&q=Administra%C3%A7%

C3%A3o%20p%C3%BAblica%20weberiana&f=false>.Acesso em jan. de 2014.

Page 28: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

27

restrição ao mesmo, haja vista que o agente somente está autorizado a atuar na medida dos

preceitos instituídos, ou melhor, segundo a própria lei (secundum legem).

Regras rígidas: as funções administrativas são meticulosamente discriminadas. Em

linhas gerais, os atos administrativos também são vinculados, não cabendo juízos de valores e

nem análises de conveniência e oportunidade pelo agente.

Hierarquia: o sistema de atribuições dos serviços público é hierarquicamente

organizado, coexistindo superiores e subordinados.

Impessoalidade: Aplicação de regras universalistas e abstratas que abarquem

administradores e administrados. Este preceito externa-se pela consagração do concurso

público enquanto meio de seleção a emprego ou cargo público, através do qual se promove o

acesso amplo, democrático e qualificado ao quadro de pessoal da Administração Pública,

fomentando a moralização do setor estatal em detrimento do nepotismo e política de

privilégios, antes imperantes. Essa universalização de acesso tende a promover a qualificação

do quadro técnico vez que a aprovação somente ocorre quando vencida todas as etapas que

permitem uma análise de conhecimentos específicos e dos títulos do profissional. Neste

diapasão, segundo Weber, o administrador burocrata cria uma espécie de compromisso com a

causa pública, identificando-se com os objetivos instituídos pelo órgão, departamento ou ente

para o qual exerce suas funções. Trata-se de uma assimilação impessoal, ou seja, não se

vincula a uma pessoa, um superior hierárquico, por exemplo, consubstanciando-se, tão

somente, em uma admiração pelos preceitos e serviços atinentes à organização.

Especialização: promove-se verdadeira divisão racional do trabalho “em que as

competências profissionais e jurisdicionais são claramente definidas por critérios técnicos”46

.

Institui-se uma cultura corporativa na qual se separa o planejamento da execução, cabendo a

Administração concretizar os objetivos delimitados pela política.

Continuidade e controle: os serviços públicos são contínuos, ininterruptos, o que

significa que não cessam ao bel prazer dos administradores visto que a prestação dos mesmos

recai sobre a coisa pública, bem pertencente ao corpo social, não se submetendo ao alvedrio

de particulares A existência do controle dos meios e procedimentos também é incisivo,

almejando-se o gerenciamento das atividades e a consecução das finalidades segundo a lei e o

interesse público.

46

Idem. Ibidem. p. 20. Disponível em: <http://books.google.com.br/books?hl=pt-

BR&lr=&id=jvDrA9D6vSAC&oi=fnd&pg=PA11&dq=Administra%C3%A7%C3%A3o+p%C3%BAblica+we

beriana&ots=bgqVHyheu2&sig=z4gMsV8DecyoJqXDW2nY_xS2klw#v=onepage&q=Administra%C3%A7%

C3%A3o%20p%C3%BAblica%20weberiana&f=false>.Acesso em jan. de 2014.

Page 29: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

28

In suma, essa forma de administração baseia-se no controle rígidos dos meios, na

criação de instituições e órgãos hierarquizados, na impessoalidade, no formalismo, na estrita

observância a procedimentos e regulamentos legalmente delineados, inaugurando o

profissionalismo do serviço público.

Com o advento da Constituição de 1988, instituem-se no ordenamento brasileiro os

preceitos burocráticos, consagrando os princípios regentes de toda a atividade administrativa.

A Carta Magna, sobretudo, esboça traços dessa burocratização, os quais se encontram

previstos em inúmeras de suas disposições, dentre elas a menção expressa aos princípios da

legalidade, legitimidade e economicidade trazidos pelo art. 7047

e aos preceitos de legalidade,

eficácia e eficiência presente no art.74, II48

; a previsão de concurso público enquanto a via

única e legitima para o ingresso no serviço público (art. 37, II49

); o dever de probidade pelo

servidor, assim como as sanções oriundas de sua inobservância, tais como a suspensão dos

direitos políticos, perda da função pública, a indisponibilidade de bens e o ressarcimento ao

erário, sem prejuízo da ação penal cabível (§4º do art.3750

) e da propositura de ação civil

pública pelo Ministério Público (Lei 8.429/92); submissão dos processos de obras, aquisição

de bens, serviços e alienações à realização de licitações públicas, nos termos da lei (art. 37,

XXI51

); e etc.

A despeito dos inúmeros atributos acarretados pela forma burocrática, há doutrina que

defende que esse modelo operacional ostenta uma estrutura inflexível e fechada sobre si

mesma, que se divorcia da defesa da res publica e, ate mesmo, da própria democratização,

veja-se:

47

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art. 70: A fiscalização contábil, financeira,

orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à

legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo

Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder. [sem grifos

no original]. 48

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art. 74, II: comprovar a legalidade e avaliar os

resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e

entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito

privado; [sem grifos no original]. 49

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – Art. 37, II: a investidura em cargo ou emprego

público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo

com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações

para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração; [sem grifos no original]. 50

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – Art. 37, § 4º: Os atos de improbidade administrativa

importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o

ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível. [sem

grifos no original]. 51

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – Art. 37, XXI: ressalvados os casos especificados na

legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública

que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de

pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as

exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

Page 30: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

29

Por um lado, a democracia requer e incentiva a participação individual, além de

desenvolver as condições históricas que exigem o crescimento da administração

pública. Por outro, o modelo burocrático tende a inibir, ou mesmo impedir, a

participação do cidadão anteriormente mobilizado nas decisões mais fundamentais

do Estado.52

.

As exigências da democracia se esbarram nas obstruções desnecessárias inerentes à

burocratização, sendo essa administração “supostamente” ineficiente, lenta e desmotivada,

incapaz de voltar-se para as demandas da sociedade. Sob esta perspectiva, alega-se que a

designação de um modelo focado tão somente no método, mostra ser eficaz no que diz

respeito ao controle de abusos, derivando, porém, na ineficiência de suas repartições e na

morosidade de seus pleitos.

No intuito de aproximar os serviços públicos à população, promovendo-se uma gestão

efetiva e assegurando-se a participação dos interessados por meio dos direito sociais

consagrados pela Carta Maior, é que surge o Princípio da Eficiência basilar à Administração

Gerencial, consoante será abordado a seguir.

2.2 Administração Pública Gerencial e Princípio da Eficiência

2.2.1 A Administração Pública Gerencial

O modelo burocrático, o qual primava pela formalidade, controle dos abusos e rigidez

dos meios sucumbiu frente aos anseios da própria democratização que carecia de uma

participação ativa de seus cidadãos, colimando pela primazia dos interesses dessa

coletividade53

.

Na medida em que o Estado assumia novas dimensões, oriundas das inovações

suscitadas na Carta Política, seus encargos não se restringiram ao controle rígido dos

processos devendo a gestão dos bens coletivos propagar-se no intuito de garantir o pleno

exercício dos direitos sociais consagrados pela CF/88.

52

TORRES, Marcelo Douglas de Figueiredo. Op. cit., p. 12. Disponível em:

<http://books.google.com.br/books?hl=pt-

BR&lr=&id=jvDrA9D6vSAC&oi=fnd&pg=PA11&dq=Administra%C3%A7%C3%A3o+p%C3%BAblica+we

beriana&ots=bgqVHyheu2&sig=z4gMsV8DecyoJqXDW2nY_xS2klw#v=onepage&q=Administra%C3%A7%

C3%A3o%20p%C3%BAblica%20weberiana&f=false>.Acesso em jan. de 2014. 53

Idem. Ibidem, p. 171e ss. Disponível em: <http://books.google.com.br/books?hl=pt-

BR&lr=&id=jvDrA9D6vSAC&oi=fnd&pg=PA11&dq=Administra%C3%A7%C3%A3o+p%C3%BAblica+we

beriana&ots=bgqVHyheu2&sig=z4gMsV8DecyoJqXDW2nY_xS2klw#v=onepage&q=Administra%C3%A7%

C3%A3o%20p%C3%BAblica%20weberiana&f=false>. Acesso em jan. de 2014.

Page 31: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

30

Nessa nova sistemática o Estado deixa de assumir funções puramente econômicas para

curar o interesse público primário54

, desvinculando-se da entidade em si, enquanto sujeito de

direito, e assumindo o papel de gestor social, atento às políticas públicas. Tudo isso somado à

selvageria capitalista, à tecnologia da informação e à necessidade de sobrevivência no

contexto internacional, exigiram uma nova postura do aparato estatal, através da qual

objetiva-se uma cultura gerencial nas organizações, que clama por eficiência e qualidade dos

serviços prestados.

A partir de tais inovações incutiu-se o paradigma do cidadão-cliente, compartilhando

algumas diretrizes da iniciativa privada, da qual se assemelha ao sobrelevar a satisfatoriedade

dos cidadãos com os resultados alcançados, como se clientes fossem.

Contudo, é imperioso que tais aproximações não sejam confundidas com uma tentativa

da Administração de imiscuir-se ao setor privado, sendo necessário abalizar as diferenças de

uma dinâmica gerencial para a privatização do aparato estatal em si.

Com efeito, “as condições institucionais terão que ser necessariamente diferentes das

existentes no setor privado, já que o Estado não opera através de trocas mas de transferências,

o mecanismo de controle não é o mercado mas o da política e da administração, e o objetivo

não é o lucro mas o interesse público55

”, como bem asseverou Luiz Carlos Bresser Pereira.

Em atenção à complexidade da realidade imposta, faz-se necessário adaptar as práticas

de gestão comumente empregadas pelos particulares às peculiaridades do setor público,

coordenando a coexistência de agentes públicos e seu rendimento funcional, de organizações

privadas, de instituições do terceiro setor, de cidadãos e politicas públicas.

54

Não há como mencionar o interesse público sem trazer à tona a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello que

promove a distinção entre interesse público primário e secundário: “Uma vez reconhecido que os interesses

públicos correspondem à dimensão pública dos interesses individuais, ou seja, que consistem no plexo dos

interesses dos indivíduos enquanto partícipes da Sociedade (entificada juridicamente no Estado), nisto

incluindo o depósito intertemporal destes mesmos interesses, põe-se a nu circunstâncias de que não existe

coincidência necessária entre interesse público e interesse do Estado e demais pessoas de Direito Público. É

que, além de subjetivar estes interesses, o Estado, tal como os demais particulares, é, também ele, uma pessoa

jurídica, que, pois, existe e convive no universo jurídico em concorrência com todos os demais sujeitos de

direito. Assim, independentemente do fato de ser, por definição, encarregado dos interesses públicos, o Estado

pode ter, tanto quanto as demais pessoas, interesses que lhes são particulares, individuais, e que, tal como os

interesses delas, concebidas em suas meras individualidades, se encarnam no Estado enquanto pessoa. Este

últimos não são interesses públicos, mas interesses individuais do Estado, similares, pois (sob o prisma

extrajurídico), aos interesses de qualquer outro sujeito.” “[...] os interesses secundários do Estado só podem ser

buscados quando coincidentes com os interesses primários, isto é, com os interesses público propriamente

ditos.” In: MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 65-66. 55

PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. A Reforma Gerencial do Estado de 1995. Revista de Administração Pública

– RAP. Rio de Janeiro (34). Julho, 2000. . 55-72. Disponível em:

<http://www.bresserpereira.org.br/papers/2000/81RefGerenc1995-INA.pdf>. Acesso em jan. de 2014.

Page 32: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

31

Salienta-se que dentro dessa perspectiva os clientes-cidadãos possuem mecanismos de

cobrança da eficácia da atividade administrativa, aferindo o desempenho dos agentes públicos

através de mecanismos de controle social.

Apesar desse novo modelo representar um afastamento das diretivas traçadas pela

burocratização, não configura uma completa ruptura com a vertente precedente. O que ocorre,

na verdade, é a flexibilização das principais conquistas da boa administração, tais quais a

avaliação sistemática, a recompensa pelo desempenho e a capacitação permanente,

adaptando-as aos anseios sociais e ao dinamismo característico da cultura gerencial.

Essa reestruturação da máquina administrativa, tenta avivar a capacidade de

implementar políticas públicas e pôr termo ao “anacronismo do modelo burocrático

tradicional”56

.

O modelo gerencial, portanto, promove o fortalecimento do núcleo estratégico do

estado por meio da descentralização das decisões, delegando maiores responsabilidades ao

gestor público, e da política que prima pela eficácia dos resultados.

Logo, será marcado pela alocação racional dos recursos, por uma política de

planejamento, pela resiliência sistemática e pela elasticidade, isso sem mencionar que essa

nova administração também propende exterminar uma obediência acrítica pelo servidor, que

cumpre suas funções segundo os procedimentos arcaicos, metodicamente alinhavados, sem

inová-los ou readaptá-los às necessidade vigentes a cada caso concreto. Neste diapasão,

objetiva-se usufruir não só do conhecimento técnico mas, principalmente, da capacidade

inovadora dos seus agentes, concedendo-os maior autonomia e liberdade de exercício, de

forma a potencializar a tomada de decisões imediatas e sobrelevar a motivação e a autoestima

do funcionalismo público.

Notadamente, a organização e funcionamento desse novel modelo caracteriza-se pela

busca na qualidade e eficácia dos serviços públicos, pela atividade administrativa voltada à

consecução de objetivos, à redução de custos e à predominância de uma política alicerçada

nos resultados57

, tudo isso com vistas a atender satisfatoriamente as demandas do cidadão-

56

Essa ideia é veiculada no Plano Diretor da Reforma do Estado. In: MARE (Ministério da Administração e

Reforma do Estado): Plano Diretor da Reforma do Aparelho Estatal. Brasília: Presidente da República,

Imprensa Oficial. Novembro de 1995. p. 17. Disponível em:

<http://www.bresserpereira.org.br/Documents/MARE/PlanoDiretor/planodiretor.pdf.> Acesso em jan.de 2014. 57

CUNHA, Marcos André da e RUIZ, Ivan Aparecido. O Princípio da eficiência na Administração Pública:

propostas para a otimização da cobrança judicial da dívida ativa. Disponível em:

<http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:Hv5WH9BE_FAJ:www.escoladegoverno.pr.gov.br/

arquivos/File/gestao_de_politicas_publicas_no_parana_coletanea_de_estudos/cap_8_administracao_e_previde

ncia/capitulo_8_3.pdf+&cd=1&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br>. Acesso em jan. de 2014.

Page 33: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

32

cliente. Tais atributos, sobretudo, corroboram a estreita relação existente entre a

Administração Pública Gerencial e o Princípio da Eficiência.

Sob este prisma, para fins ilustrativos e no intuito de facilitar o entendimento da

cultura gerencialista, cumpre discorrer, brevemente, a respeito da sua aplicação no

ordenamento pátrio e de sua interligação ao Princípio da Eficiência.

2.2.1.1 A Reforma Administrativa no Brasil

A primeira tentativa de implementar uma Administração Gerencial em detrimento da

burocratização inerente ao setor público brasileiro remonta-se ao Decreto-Lei nº 200 de

196758

. Em verdade, tal espécie normativa consubstanciou-se na tentativa de incutir maior

dinamismo operacional às atividades econômicas do Estado através da descentralização

funcional. Todavia, essa maior operacionalidade foi atribuída somente à Administração

Indireta, permanecendo a estrutura da Administração Direta enraizada à rigidez dos meios e

ineficiência dos resultados não conseguindo irromper, portanto, com a “obsolescência” do

núcleo burocrático e nem consolidar uma vertente gerencial.

Posteriormente a essa iniciativa, adveio a crise nos anos 80, a qual ameaçou o modelo

econômico vigente com a expressiva redução na taxa de crescimento econômico, aumento do

desemprego, elevados índices de inflação e o completo esgotamento da estratégia de

substituição de importação59

.

Nesse contexto, a redefinição do papel do estado na década seguinte tornou-se tema

cogente e, em resposta à crise econômica-social, surge a tentativa de reforma do aparato

estatal com vista a “resgatar a autonomia financeira e capacidade de implementar políticas

públicas60

”, por meio do ajuste fiscal.

Ademais, a reforma da máquina administrativa urgiu da necessidade da própria

democratização e cidadania que exigem a satisfatoriedade e o atendimento das demandas

58

BRASIL, Decreto-Lei Nº 200, de 25 de fevereiro de 1967. Dispõe sobre a organização da Administração

Federal, estabelece diretrizes para a Reforma Administrativa e dá outras providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del0200.htm>. Acesso em agosto de 2013. 59

MARE (Ministério da Administração e Reforma do Estado): Plano Diretor da Reforma do Aparelho

Estatal. Brasília: Presidente da República, Imprensa Oficial. Novembro de 1995. Pág. 10. Disponível em:

<http://www.bresserpereira.org.br/Documents/MARE/PlanoDiretor/planodiretor.pdf.> Acesso em jan. de

2014. 60

Idem. Ibidem, p.11. Disponível em:

<http://www.bresserpereira.org.br/Documents/MARE/PlanoDiretor/planodiretor.pdf.> Acesso em jan. de

2014.

Page 34: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

33

sociais. A partir de então, o Estado assumiu um papel decisivo não só no plano econômico

mas, principalmente, social.

No ano de 1995, sob a presidência de Fernando Henrique Cardoso (FHC), apresenta-se

à sociedade a proposta da Reforma, no intuito de consagrar novas instituições legais e

organizacionais. O elemento ordenador desse marco inaugural da Administração Gerencial foi

o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, elaborado pelo Ministério da

Administração e Reforma do Estado, comumente abreviado por MARE.

A proposta governamental veiculada nessa exposição visou, em primeiro plano,

instrumentalizar a reforma na Administração Pública Federal, mas os preceitos ali expostos

também poderiam incidir no âmbito municipal e estadual.

O Plano Diretor alvitrava, na verdade, a transferência para o setor privado das

atividades que podem ser geridas segundo o mercado e a promoção da publicização, que

consiste na cessão para o setor público não-estatal da “produção de serviços não competitivos

ou não exclusivos de Estado, estabelecendo-se um sistema de parceria entre Estado e

Sociedade para seu financiamento e controle.61

”. A partir de tais inciativas, figura-se a

parceria do setor público com Organizações Sociais (OS), com as Organizações da Sociedade

Civil de Interesse Público (OSCIP) e a celebração dos termos de Parceria Público-Privada

(PPP)62

.

Sob essa sistemática, conduziu-se à privatização de várias empresas estatais nacionais,

tais quais a Companhia Vale do Rio Doce (empresa do setor de mineração e siderurgia), a

Telebrás (empresa de telecomunicações) e o Banespa (banco pertencente ao governo do

estado de São Paulo)63

, que foram adquiridas em sua totalidade ou majoritariamente por

grupos estrangeiros.

Neste toante, reduziu-se significativamente a função do Estado enquanto prestador dos

serviços públicos, para enfatizar seu papel enquanto regulador, gestor, propriamente dito. É

61

Idem. Ibidem, p.13. Disponível em:

<http://www.bresserpereira.org.br/Documents/MARE/PlanoDiretor/planodiretor.pdf.> Acesso em jan. de

2014. 62

Acerca desses institutos jurídicos asseverou Celso Antônio Bandeira de Mello: “Tais figuras foram concebidas

ou para copiar mimeticamente instituições alienígenas, sem nenhuma relação com a índole do direito local, ou

para proporcionar ampla proteção aos inversores estrangeiros ou mesmo para exponenciar as “privatizações”,

designação que se deu para a retratação do Estado e liberação dos mercados à cobiça dos adventícios. É

prescindendo dizer que na implantação destas “novidades” o Direito Constitucional Pátrio foi atropelado sem

contemplações.” MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Op.cit., p.1085. 63

CARVALHO, Leandro. Governo Fernando Henrique Cardoso. Fernando Henrique Cardoso (FHC), durante

os dois mandatos como presidente da República, efetivou o Plano Real, privatizou várias estatais brasileiras e

implantou a política neoliberal. Disponível em:< http://www.brasilescola.com/historiab/governo-fernando-

henrique-cardoso.htm>. Acesso em: fev.de 2014.

Page 35: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

34

nesse quadro que se estrutura a migração da política rígida da administração burocrática para

o modelo gerencial em que prevalece a flexibilidade

É preciso, agora, dar um salto adiante, no sentido de uma administração pública que

chamaria de ‘gerencial’, baseada em conceitos atuais de administração e eficiência,

voltada para o controle dos resultados e descentralizada para poder chegar ao

cidadão, que, numa sociedade democrática, é quem dá legitimidade às instituições e

que, portanto, se torna ‘cliente privilegiado’ dos serviços prestados pelo Estado64

.

A reforma suscitada era ampla, abarcando vários setores nacionais e resumia-se

basicamente em promover a liberalização comercial em abandono à estratégia simplesmente

protecionista e instituir uma política de governança vez que a capacidade do estado em

promover políticas públicas encontra-se reduzida em razão da suposta ineficiência e rigidez

dos processos na seara administrativa.

A abertura do mercado nacional às empresas estrangeiras ocasionou duras críticas ao

governo FHC, sendo o nosso país alvo de um crescimento econômico ilusório para vivenciar,

ainda no seu segundo mandato, uma grande recessão econômica.

A experiência de uma cultura gerencial no nosso país inaugurou-se pelo extremismo, o

qual evidenciou que a transferência de serviços essenciais inerentes a Administração Pública à

iniciativa privada pode ocasionar danos irreversíveis à sociedade quando não regulamentados

com propriedade ou quando puramente subvertidos a interesses políticos e de concentração do

poder.

A despeito da existência de inúmeras críticas tecidas a esse governo, não cabe

tecermos os pormenores dessa análise, sob pena de fugir ao objeto central do presente estudo.

Contudo, merece a devida atenção o fato dessa cultura gerencial ter se enraizado no cenário

nacional, sendo possível evidenciar traços característicos na nossa própria Lei Maior. A título

de exemplificação, adverte-se alguns dos principais dispositivos constitucionais nesse sentido:

Art. 37, § 3º65

: que sucintamente viabiliza a participação do usuário na Administração

Pública direta e indireta, garantindo avaliações periódicas da qualidade dos serviços; o acesso

a informações sobre atos do governo e a representação contra o exercício negligente ou

abusivo do cargo, empresa ou função;

64

MARE (Ministério da Administração e Reforma do Estado): Op.cit., Disponível em:

<http://www.bresserpereira.org.br/Documents/MARE/PlanoDiretor/planodiretor.pdf.> Acesso emjan.de 2014. 65

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – Art. 37, § 3º: A lei disciplinará as formas de

participação do usuário na administração pública direta e indireta, regulando especialmente: I - as reclamações

relativas à prestação dos serviços públicos em geral, asseguradas a manutenção de serviços de atendimento ao

usuário e a avaliação periódica, externa e interna, da qualidade dos serviços; II - o acesso dos usuários a

registros administrativos e a informações sobre atos de governo, observado o disposto no art. 5º, X e XXXIII;

III - a disciplina da representação contra o exercício negligente ou abusivo de cargo, emprego ou função na

administração pública.

Page 36: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

35

Art. 37, § 8º66

: que institui a figura do contrato de gestão que eleva a autonomia dos

órgãos e entidades públicas em troca da fixação de metas de desempenho a cumprir;

Art. 41, §1º, inciso III67

: Imposição de avaliações periódicas de desempenho.

Obtempere-se que a consagração do Princípio da Eficiência, basilar da atividade

administrativa, fora introduzido à ordem constitucional brasileira por força da EC 19/98

promulgada ainda no primeiro mandato presidencial do FHC, mais exatamente em 04 de

junho de 1998.

Por tais razões, resta clarividente que a positivação desse axioma, juntamente com

todas as outras mudanças no âmbito administrativo, são reflexos das ambições políticas de ver

concretizado o novel modelo gerencial, razão pela qual se passa ao exame desse postulado

constitucional.

2.2.2 O Princípio da Eficiência

O Princípio da Eficiência ingressou expressamente na Constituição da República

Federativa do Brasil de 1988 por intermédio da EC 19/98, positivando-se ao lado dos demais

(Legalidade, Impessoalidade, Moralidade e Publicidade) enquanto premissa regente da

Administração Pública, estatuídos no caput do art. 3768

.

Ampla discussão doutrinária paira no sentido de ser a Eficiência um preceito implícito

à atuação do Administrador, balizado aos Princípios da Legalidade e Impessoalidade, vez que

a gestão dos interesses da coletividade é indissociável do dever do agente de agir com

presteza e rendimento funcional na busca pela otimização dos resultados ambicionados.

Afinal, qualquer raciocínio em sentido diverso, remonta a uma incongruência lógico-jurídica

inaceitável à sistemática da Administração Pública. Neste ínterim, urge a lição de Celso

Ribeiro Bastos:

O princípio da eficiência, certamente, é um daqueles que já, antes da Emenda

Constitucional nº 19/98, poderia ser extraído do sistema de princípios que regem a

66

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – Art. 37, § 8º A autonomia gerencial, orçamentária e

financeira dos órgãos e entidades da administração direta e indireta poderá ser ampliada mediante contrato, a

ser firmado entre seus administradores e o poder público, que tenha por objeto a fixação de metas de

desempenho para o órgão ou entidade, cabendo à lei dispor sobre: I - o prazo de duração do contrato; II - os

controles e critérios de avaliação de desempenho, direitos, obrigações e responsabilidade dos dirigentes; III - a

remuneração do pessoal. 67

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – Art. 41, § 1º: O servidor público estável só perderá o

cargo: [...] III - mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei complementar,

assegurada ampla defesa. 68

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – Art. 37, caput: A administração pública direta e

indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos

princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...]

Page 37: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

36

Administração Pública. Isso mostra-se um tanto óbvio, pois não seria razoável

pensar em atividades da Administração Pública desempenhadas com ineficiência e

sem o atingimento dos resultados dentro do seu objetivo maior, qual seja, a

realização do bem comum69

.

O reconhecimento da existência desse princípio anteriormente a sua previsão expressa

por força da aludida emenda, decorre da redação prevista pelo art.74, inc. II da CF/8870

que já

mencionava o controle interno dos poderes para atender a eficiência. Ademais, o Decreto-Lei

200/67, que dispõe sobre a organização da Administração Federal, estabelece diretrizes para a

Reforma Administrativa e dá outras providências, também possui regras que enaltecem a esse

preceito. A guisa de exemplificação, menciona-se as principais: fortalecimento do sistema de

mérito (art. 25, VII71

); dirigentes capacitados (art.25, V72

); supervisão ministerial das

entidades da administração indireta (art. 26, III73

) e demissão de servidor ineficiente ou

desidioso (art. 10074

).

Outrossim, a própria jurisprudência75

e doutrina76

pátria pacificaram a presença, ainda

que subentendida, desse princípio no nosso ordenamento, determinando-o, na maioria das

vezes, enquanto dever, ou melhor, verdadeiro encargo do agente investido em função ou

cargo público.

Sem adentrar no mérito dessa questão, ressalta-se que o fato do poder constituinte

reformador consagrá-la expressamente apenas positivou o entendimento esposado pela

doutrina e pelos tribunais, corroborando a importância desse princípio no nosso ordenamento

e a imperatividade que impõe sua estrita observância pelos agentes no exercício do múnus

público.

A jurisdicionalização desse preceito, indubitável à Administração Pública Direta e

Indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,

é exigência do próprio Estado Democrático e Social do Direito que deve primar pela

69

BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito administrativo. São Paulo: Celso Bastos, 2002. p.79. 70

Vide o teor da nota de rodapé nº 45. 71

Decreto-Lei Nº 200, de 25 de fevereiro de 1967. – Art. 25, VII – Fortalecer o sistema do mérito. 72

Decreto-Lei Nº 200, de 25 de fevereiro de 1967 – Art. 25, V: Avaliar o comportamento administrativo dos

órgãos supervisionados e diligenciar no sentido de que estejam confiados a dirigentes capacitados. 73

Decreto-Lei Nº 200, de 25 de fevereiro de 1967 – Art. 26, III: A eficiência administrativa. 74

Decreto-Lei Nº 200, de 25 de fevereiro de 1967 – Art.100: Instaurar-se-á processo administrativo para a

demissão ou dispensa de servidor efetivo ou estável, comprovadamente ineficiente no desempenho dos

encargos que lhe competem ou desidioso no cumprimento de seus deveres. 75

O doutrinador Alexandre de Moraes evidencia o reconhecimento do princípio da eficiência pelo próprio

Superior Tribunal de Justiça, transcrevendo para tanto parte da ementa do acordão prolatado em sede do

Recurso em Mandado de Segurança nº 5.590/95(STJ. 6ª T – RMS nº 5.590/95 – DF – Rel. Min. Luiz Vicente

Cernicchiaro, Diário da Justiça, Secção I, 10 jun. 1996, p. 20.395), veja-se: “a Administração Pública é regida

por vários princípios: legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade (Const. art 37). Outros também

evidenciam-se na Carta Política. Dentre eles, o princípio da eficiência. A atividade administrativa deve

orientar-se para alcançar resultado de interesse público”. MORAES, Alexandre de. Op.cit., p. 308. 76

MEIRELLES, Hely Lopes. Op.cit., p.102.

Page 38: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

37

concretização dos resultados socialmente relevantes. A propósito, prelecionou Hely Lopes

Meirelles: “Toda atividade do administrador público deve ser orientada para esse objetivo. Se

dele o administrador se afasta ou desvia, trai o mandato de que está investido, porque a

comunidade não institui a Administração senão como meio de atingir o bem estar social77”

.

Questão de suma importância remonta a definição de Eficiência dentro do

ordenamento nacional, a qual demonstra ser consequência da apropriação pelo constituinte

derivado de termo genuinamente nacional, empregado em sua acepção comum, qual seja: o

rendimento associado aos resultados obtidos e aos recursos empregados.

Desta maneira, a atuação eficiente exprime acepção tanto quantitativa quanto

qualitativa, ao passo que assume uma dimensão de racionalidade e otimização do uso dos

meios, ao mesmo tempo que estima pela satisfatoriedade social dos resultados obtidos por

intermédio da atividade administrativa. Sob este prisma, urge o posicionamento doutrinário:

Assim, a verificação da eficiência atinge os aspectos quantitativo e qualitativo do

serviço, para aquilatar o seu rendimento efetivo, do seu custo operacional e da sua

real utilidade para os administrados e para a Administração. Tal controle

desenvolve-se, portanto, na tríplice linha administrativa, econômica e técnica78

.

Observada essa pluridimensionalidade, é notório que a avaliação meramente

quantificada dos resultados não mostra ser suficiente para aferir a efetividade dessa premissa,

fazendo-se necessário um juízo atinente à qualidade desses efeitos, bem como o correto

aproveitamento dos meios empregados para tanto.

Sendo a concretização do bem comum, ou o interesse primário propriamente dito, o

desiderato máximo da atividade estatal, a eficiência se posta enquanto recurso de otimização

que garanta a proporcionalidade entre a conduta do agente estatal e o efeito social aspirado,

investindo-se enquanto instrumento de “adequação dos meios aos fins”79

.

A eficiência revela-se, portanto, pela aversão aos excessos, formalidades enraizadas e

negligência dos agentes, para se consagrar na idoneidade dos meios e excelência dos

resultados alcançados na razoabilidade do agir administrativo. Acerca do tema, asseveraram

os autores:

O Princípio da Eficiência, assim, apresenta-se como elemento normativo que impõe

ao agente público uma atuação voltada à utilização mais racional dos recursos

disponíveis, precedida de planejamento e organização, objetivando o alcance de

77

Idem. Ibidem, p. 85. 78

Idem. Ibidem, p.103. 79

RODRIGUES, Marilene Talarico M. Princípio da eficiência em matéria Tributária. In: MARTINS, Ives

Gandra da Silva (Coord.). 1ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais e Centro de Extensão Universitária, 2006.

Pág. 105.

Page 39: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

38

melhores resultados institucionais, sem se descurar da finalidade essencial da

Administração Pública, que é o atendimento ao interesse público.80

Convém ressaltar que a inserção desse princípio pelo constituinte derivado originou-se

da Reforma Administrativa de 1998 ter se fundamentado no modelo de Administração

Pública Gerencial, a qual anseia pelo rendimento funcional mas, sobretudo, pela garantia de

resultados satisfatórios segundo o paradigma do cidadão-cliente, como já exposto.

2.3 A desburocratização da Administração e o RDC

A instituição do Regime Diferenciado de Contratação Pública – RDC – significou uma

tentativa do Estado de se evadir dos meios rígidos semeados pela Lei nº 8.666/93 para burlar e

facilitar o direcionamento e as fraude nos certame de licitações e contratações públicas.

Como outrora mencionado, a escusa para a criação de um regime excepcional

sucedeu-se com base na promoção de medidas céleres destinadas a realização dos eventos

desportivos mundiais sediados pelo Brasil, de modo a evitar os riscos de atraso na consecução

da infraestrutura necessária.

Não bastasse, incutiu-se na mídia e nos meios sociais a ideia de que o processo

licitatório promovido segundo a Lei Geral de Licitação e Contratos Públicos representava um

entrave na medida em que engessava o certame com formalidades desnecessárias e era

ineficiente no que tange ao atendimento das demandas da sociedade. Essa falsa acepção fora

criada para fortalecer esse regime excepcional, sendo empregada verdadeira manobra política

para sua implementação, enxertando ao ordenamento proposições concatenadas e bem

articuladas, delineadas segundo a necessidade eminentemente “técnica” de renovar os

institutos jurídicos de acordo com a realidade fática. Esse clamor tecnicista tenta imprimir

uma pretensa neutralidade, diga-se de passagem, bem distante da Lei 12.462/201181

.

Adverte-se, ainda, os vícios formais de constitucionalidade maculados no processo de

concepção do RDC, que se valeu do atropelo à conversão da medida provisória e do direito

parlamentar de emenda para encurtar o devido processo legislativo e usurpar a competência

constitucionalmente designada, rompendo a harmonia entre os Poderes. Associado a tais

vícios encontra-se a constante ampliação das hipóteses, a princípio taxativas, de aplicação do

80

CUNHA, Marcos André da e RUIZ, Ivan Aparecido. O Princípio da eficiência na Administração Pública:

propostas para a otimização da cobrança judicial da dívida ativa. Disponível em:

<http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:Hv5WH9BE_FAJ:www.escoladegoverno.pr.gov.br/

arquivos/File/gestao_de_politicas_publicas_no_parana_coletanea_de_estudos/cap_8_administracao_e_previde

ncia/capitulo_8_3.pdf+&cd=1&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br>. Acesso em jan. de 2014. 81

MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 1076.

Page 40: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

39

RDC e o completo afastamento dos preceitos da Lei nº 8.666/93 quando adotado esse regime,

que, claramente, reafirmam a tentativa da Administração Gerencial de consagrar-se no cenário

nacional.

De fato essa aplaudida necessidade de reestruturar o procedimento licitatório significa

a redefinição da Administração Pública e do processo de desburocratização do aparato estatal.

Trata-se da tentativa da semear os germes de uma cultura gerencial exacerbada no intuito de

sobrelevar a eficiência em detrimento da legalidade, impessoalidade, moralidade, isonomia,

publicidade, transparência nas contratações e outros preceitos regentes das licitações.

Ocorre, na verdade, que o significado de Burocrático e os preceitos expostos por esse

modelo administrativo encontram-se corrompidos pela má utilização, o que não pode ser

entendido por ineficiência. O que deve ser sopesado, nesse caso, é a segurança jurídica

cingida pelo instituto que através da operacionalização dos meios alcança legitimamente os

resultados almejados. Como bem preleciona Celso Antônio Bandeira de Mello, a segurança

jurídica cuida “de evitar alterações surpreendentes que instabilizem a situação dos

administrados e de minorar os efeitos traumáticos que resultem de novas disposições jurídicas

que alcançariam situações em curso[...]”.82

É cediço que a formalização rigorosa do certame licitatório e a impessoalidade,

resguardadas pela Norma Geral, consentem com os moldes burocráticos weberianos, no

intuito de extirpar a discricionariedade individual e subjetividade, atendo-se aos reclames de

probidade administrativa. Tudo isso consente para o fim precípuo da atividade administrativa,

qual seja, atender o interesse público primário, o que somente será alcançado na estrita

observância dos preceitos legais instituídos.

É sob essa perspectiva que o termo burocrático deve ser interpretado, sendo

propiciador do funcionalismo no setor público através da hierarquia, da impessoalidade e da

especialização. Uma suposta obsolescência e rigidez técnica apenas são suscitadas pelos

gerencialistas no intuito de infundir verdadeira intromissão de interesses privados na esfera

pública.

Com efeito, o intuito da Legislação Geral (Lei 8.666/93) é justamente evitar qualquer

forma de controle político sobre a máquina administrativa, bem como delinear a separação

dos papéis designados ao setor público e aos particulares, o que não se configura na

administração gerencial e que resta por comprometer toda a lisura do certame.

82

MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 115.

Page 41: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

40

O encurtamento de prazos, simplificação de procedimentos e flexibilização de

requisitos demonstram que esse regime excepcional preocupou-se tão somente com os

resultados, sem preponderar se os meios utilizados para tanto são razoáveis e observam a

estrita legalidade inerente a própria atividade administrativa.

Por consequência lógica, não há que se falar em Eficiência na ausência do devido

controle e planejamento dos métodos, fato este que irá denegrir todo e qualquer tipo de

resultado. Esse vocábulo, portanto, não deve ser entendido puramente por apreensões

quantitativas e satisfatórias, mas sim observar a qualidade e a realidade jacente. De que nos

adianta estruturas faraônicas de estádios se a situação no transporte público, educação, saúde e

segurança estão em pleno caos? Como pode haver eficiência pela aplicação do RDC se às

vésperas dos eventos não houve sequer uma efetiva melhora no caos da aviação civil, nas

rodovias e no trânsito caótico dos grandes centros urbanos?

Esse redesenho programático da Administração, ao dar primazia extrema a uma

eficiência apenas aparente e momentânea, afasta a razoabilidade coerente e sobrejulga os

demais preceitos constitucionais consagrados na nossa Lei da República, conforme será

abordado a seguir.

Page 42: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

41

3. ANÁLISE DA INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL DO RDC

3.1 Afronta aos Princípios Basilares da Administração Pública

Com o advento da Constituição de 1988, foram positivados os princípios regentes da

Administração, o que exprimiu o fenômeno da “Constitucionalização da Administração

Pública83

”, como bem observou Cármem Lúcia Antunes Rocha. Desta feita, por força da EC

19/98, já objeto de estudo, o caput do artigo 37 recebeu a seguinte redação:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União,

dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de

legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao

seguinte:84

[...]

A partir da redação do enunciado e da totalidade do dispositivo em comento (incisos,

alíneas e parágrafos), a Administração se consolidou no ordenamento jurídico, sendo suas

funções meticulosamente delineadas pelo legislador constituinte.

A inserção desse postulado axiológico possibilitou a releitura das atividades precípuas

da Administração, bem como o modus operandi das mesmas. Ademais, sedimentou-se

verdadeira garantia ao cidadão que, em meio ao parâmetro instituído, poderá exercer o

controle sobre os deveres indeclináveis do agente público, condicionando-os à observância

dos preceitos constitucionalizados que significam expressão máxima da vontade do titular dos

interesses administrados – o povo85

.

A Administração pós-1988 deve, assim, ser encarada sob a ótica constitucional e

desvinculada da politicagem que se imiscuía ao exercício de suas funções.

Ante o exposto, remete-se ao exame da constitucionalidade material do RDC,

enfatizando-se os contrapontos com os cânones constitucionais positivados no caput do art.

37 da CF/88. Frise-se que esse regime de exceção macula não só os princípios expressos no

dispositivo em apreço, opondo-se a diversos outros preceitos instituídos na Carta Política,

implícitos ao ordenamento pátrio e até mesmo àqueles incutidos pelas normas

infraconstitucionais, mais precisamente a Lei Geral de Licitação e Contratos.

83

Nas palavras da Ministra do Supremo Tribunal Federal a “administração pública constitucionalizou-se”.

ROCHA, Carmen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais da administração pública. Belo Horizonte: Del

Rey, 1994, p.15. 84

BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em mar. de 2013. 85

MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p.84.

Page 43: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

42

No entanto, por uma questão puramente didática, apenas os postulados constantes do

enunciado do art. 37 da Constituição, serão objetos da análise dessa incompatibilidade

substantiva.

3.1.1 Violação à Legalidade

O Principio da Legalidade é desiderato máximo do Estado Democrático de Direito, na

medida em que representa a submissão do Estado à lei e tem por fundamento a soberania

popular86

, resguardando a sociedade de toda e qualquer tirania ou autoritarismo pelos seus

governantes.

Traduz o postulado de que a Administração Pública somente estará legitimada a agir

dentro dos limites legais, ou melhor, o exercício da atividade administrativa deverá ocorrer na

conformidade da lei. Nesse sentido, assevera Celso Antônio Bandeira de Mello que “[...] a

administração é atividade subalterna à lei; que se subjuga inteiramente a ela; que está

completamente atrelada à lei; que sua função é tão somente a de fazer cumprir lei preexistente

[...]87

”.

Enquanto ao particular é permitido fazer tudo o que a lei não proíbe, para a

Administração pende a restrição no sentido de que somente estará autorizada a agir secundum

legem, consoante previsão legal. Administrar é, portanto, “aplicar a lei de ofício88

”.

Este primado da lei recai estreitamente sob a figura do administrador público que

deverá ser probo e sujeito aos mandamentos legais, ao interesse público primário, do qual não

se pode afastar sob pena de ser responsabilizado na esfera criminal, cível e administrativa

(processo disciplinar)89

. Deste modo, é de inobjetável clareza que não há para esse agente

total liberdade ou subjetividade no exercício de suas funções, sendo predominante a

objetividade e os fins colimados pela lei, até mesmo quando concedida certa

discricionariedade90

.

86

MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p.100. 87

Idem. Ibidem, p.103. 88

FAGUNDES, Miguel Seabra. O Controle dos Atos Administrativos pelo Poder Judiciário. 3ª ed. Rio de

Janeiro: Forense, 1975. Pág. 17 apud MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo.

28ª ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2011. p.968. 89

MEIRELLES, Hely Lopes. Op. Cit., p.86. 90

Nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello: “Discricionariedade é a margem de “liberdade” que

remanesça ao administrador para eleger, segundo critérios consistentes de razoabilidade, um , dentre pelo

menos dois comportamentos, cabíveis perante cada caso concreto, a fim de cumprir o dever de adotar a solução

mais adequada à satisfação da finalidade legal, quando, por força da fluidez das expressões da lei ou da

liberdade conferida no mandamento, dela não se possa extrair objetivamente uma solução unívoca para a

situação vertente; [...] percebe-se que se trata necessária e inexoravelmente de um poder demarcado, limitado,

Page 44: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

43

Por razões um tanto óbvias, a obediência a este preceito remonta à observância de

todos os demais princípios administrativos, por se tratar de pressuposto fundamental ao

Estado Democrático de Direito, como já abalizado.

O preceito em comento encontra-se radicado ao ordenamento constitucional nos

artigos 5º, II91

e 37, caput92

, dentre outros, de observância obrigatória dos administradores e

administrados, governantes e cidadãos brasileiros, consagrando-se enquanto direito e garantia

fundamental dada sua essencialidade.

Isso posto, passa-se à apreciação da constitucionalidade material do RDC sob o prisma

da estrita legalidade, notadamente, em consonância às previsões do artigo 37, por dirigir-se à

atividade administrativa consignando preceitos básicos de regência.

Neste sentir, cumpre mencionar a previsão do inciso XXI do art. 37, in verbis:

XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e

alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade

de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de

pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente

permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do

cumprimento das obrigações.

Nota-se que a licitação é erigida como procedimento de observância obrigatória nas

hipóteses das contratações a serem realizada pelo setor público.

Do dispositivo alhures citado extrai-se não só a obrigatoriedade desse certame, bem

como o fato de sua realização figurar-se enquanto verdadeiro corolário da moralidade e

isonomia inerentes às atividades administrativas e responsáveis por limitar o juízo

discricionário de seu agente. Como outrora mencionado, essa discricionariedade não se

confunde com a liberdade de conduta do servidor público, restringindo-se ao fim colimado

pela lei e atuando nos limites legalmente delineados.

Neste diapasão, há que se suscitar a manifesta inconstitucionalidade que macula a Lei

12.462/2011, especificamente nos seus artigos 1º, inciso I e II e 6593

, por contrariar a estrita

legalidade inerente aos dispositivos constitucionais supramencionados.

contido em fronteiras requeridas até por imposição racional, posto que, à falta delas, perderia o cunho de poder

jurídico. [...] São os próprios pressupostos legais justificadores do ato, a finalidade normativa – ainda que

expressos mediante conceitos algo imprecisos – e a causa do ato que determinam os limites da discrição.”

MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Op. Cit., p.980-981. 91

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art. 5º, II: ninguém será obrigado a fazer ou deixar

de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; 92

Vide a transcrição do dispositivo na redação do subtópico anterior. - Afronta aos Princípios Basilares da

Administração Pública – do presente estudo. 93

Lei 12.462/2011 - Art. 1º [...] I - dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, constantes da Carteira de

Projetos Olímpicos a ser definida pela Autoridade Pública Olímpica (APO); e II - da Copa das

Confederações da Federação Internacional de Futebol Associação - Fifa 2013 e da Copa do Mundo Fifa 2014,

definidos pelo Grupo Executivo - Gecopa 2014 do Comitê Gestor instituído para definir, aprovar e

Page 45: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

44

In suma, esse primeiro dispositivo delega à Autoridade Pública Olímpica a seleção das

obras e serviços que deverão ser submetidos ao regime excepcional. O outro, por sua vez,

permite que, enquanto não definida a Carteira de Projetos Olímpicos, sejam abraçadas às

decisões que a Administração Pública entender pertinente para o cumprimento das obrigações

assumidas perante o Comitê Olímpico e Paraolímpico Internacional. Ocorre que os

parâmetros definidos pelos aludidos artigos são vagos e imprecisos, subvertendo o uso

indiscriminado desse Regime - o RDC.

Subjuga-se, nesses casos, ao crivo da Administração definir se determinada obra ou

compra destina-se a atender as necessidades dos incisos do art.1º, o que de fato extravasa a

discricionariedade, subvertendo aquilo que realmente seja definido enquanto pressuposto de

oportunidade e conveniência. Não obstante, a redação prevista no art. 65 desse mesmo

diploma normativo, elastece ainda mais essa discricionariedade concedida ao Executivo.

A ausência de critérios objetivos na delimitação da contratação necessária aos eventos

desportivos previstos outorga desproporcional poder de decisão ao Poder Executivo.

Ademais, a mera referência a necessidades vinculadas à realização dos mesmos não oferece

qualquer limitação ao exercício da competência administrativa, o que ocasiona a utilização

arbitrária do RDC que, a princípio, posicionava-se como uma legislação puramente

excepcional.

Torna-se notório que a Lei 12.462/2011, ao estabelecer a previsão correlata aos

dispositivos em apreço, afronta o art. 37, caput e inciso XXI da CF/88 inobservando os

valores constitucionalmente protegidos e, principalmente, admitindo que o regime licitatório

seja definido por ato do Executivo e não por prévia determinação legal.

A partir dessa deturpação de competência, a inconstitucionalidade se faz sentir

também sobre o pleito do art. 22, XXVII94

, que designa à União poder privativo para legislar

sobre normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades. Afinal, como bem

asseverou Celso Antônio:

supervisionar as ações previstas no Plano Estratégico das Ações do Governo Brasileiro para a realização

da Copa do Mundo Fifa 2014 - CGCOPA 2014, restringindo-se, no caso de obras públicas, às constantes

da matriz de responsabilidades celebrada entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios; [...] Art. 65. Até que a Autoridade Pública Olímpica defina a Carteira de Projetos Olímpicos, aplica-se,

excepcionalmente, o disposto nesta Lei às contratações decorrentes do inciso I do art. 1o desta Lei, desde

que sejam imprescindíveis para o cumprimento das obrigações assumidas perante o Comitê Olímpico

Internacional e o Comitê Paraolímpico Internacional, e sua necessidade seja fundamentada pelo contratante

da obra ou serviço. [sem grifos no original]. 94

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art. 22, XXVII: normas gerais de licitação e

contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da

União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas

públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III.

Page 46: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

45

[...] Pretende-se através da norma geral, abstrata e por isso mesmo impessoal, a lei,

editada, pois, pelo Poder Legislativo – que é o colégio representativo de todas as

tendências (inclusive minoritárias) do corpo social - garantir que a atuação do

Executivo nada mais seja senão a concretização desta vontade geral95

.

Desta feita, nos termos da Carta Política, cabe ao Legislativo e não ao Executivo, por

ato discricionário, determinar o regime jurídico do certame licitatório.

Isto posto, na medida em que o Legislativo legitima a delegação de suas funções

típicas ao Executivo, a violação ao Princípio da Legalidade torna-se inconteste, representando

grande ameaça ao Estado de Direito. Não bastasse, a possibilidade do uso arbitrário desse

regime excepcional contaria toda a soberania popular, pondo em risco a tardia democracia

conquistada pela nação brasileira.

Nesse ínterim, aduziram os Procuradores da República Athayde Ribeiro Costa,

Carolina de Gusmão Furtado, Ana Carolina Oliveira Tannus Diniz e Paulo Roberto Galvão

Carvalho, em nota técnica produzida em ocasião do projeto de lei de conversão da MP nº

521/2010, a qual tentou incutir ao bojo da medida em tramitação no Congresso Nacional

proposições do Regime Diferenciado de Contratação Pública mas que, devido o decurso do

prazo constitucional, perdeu seu efeito, veja-se:

Houve afronta ao artigo 22, inciso XXVII e 37, inciso XXI, ambos da Constituição.

[...]

A nosso ver, a aplicação do regime RDC às “licitações e contratos” “necessários

à realização da Copa das Confederações Internacional de Futebol Associação –

FIFA 2013 e da Copa do Mundo FIFA 2014, definidos pelo Grupo Executivo –

GEOCOPA 2014” é uma cláusula intoleravelmente aberta, e que, à rigor,

indica que esta sendo conferido ao Poder Executivo o poder de definir ou

escolher, com base em critério de elevado subjetivismo, o regime jurídico da

licitação pública. Este poder de regência normativa é exclusivamente do

legislador, e não pode se transferido ou delegado ao Poder Executivo, da forma

que está no projeto.

Não há nenhuma baliza legal sobre a qualificação nos casos concretos do que seja

uma licitação ou contratação “necessária” aos eventos previstos na norma,

outorgando-se desproporcional poder de decisão ao “Grupo Executivo – GEOCOPA

2014”. Sendo indiscutível a relevância dos eventos citados na norma, a mera

referência a necessidade vinculadas aos mesmos não oferece nenhuma limitação

ao exercício da competência administrativa, possibilitando o seu uso com

arbitrariedade. (NOTA AO PROJETO DE LEI DE CONVERSÃO DA MP

521/2010)96

. (Grifos originais).

95

MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p.100. 96

COSTA, Athayde Ribeiro. DINIZ, Ana Carolina Oliveira Tannus. FURTADO, Carolina de Gusmão.

CARVALHO, Paulo Roberto Galvão. Nota técnica encaminhada por Procuradores da República

Membros do Grupo de Trabalho Copa do Mundo FIFA 2014 da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão

ao Procurador-Geral da República, Sr. Roberto Gurgel, em ocasião do Projeto de Lei de Conversão da

MP 521/2010 apud BRASIL, Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4645, ajuizada pelo Partido da

Social Democracia Brasileira (PSDB), dos Democratas (DEM) e do Partido Popular socialista (PPS), contra a

Lei 12.462/2011, que instituiu o chamado “Regime Diferenciado de Contratações Públicas” (RDC), aplicável

às licitações e contratos de obras de infraestrutura dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, da Copa do

Mundo de 2014 e da Copa das Confederações da FIFA de 2013. Disponível na íntegra em:

Page 47: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

46

Destarte, uma vez violado o Princípio da Legalidade, por afronta direta ao art. 37

caput e inciso XXI e art. 22, inciso XXVII, ambos da Constituição, a declaração de

inconstitucionalidade da lei é medida patente que se impõe na defesa da ordem constitucional.

3.1.2 Violação à Impessoalidade

Presente no caput do art. 37 o Princípio da Impessoalide consiste basicamente na

separação entre o agente público e as funções por ele exercidas. Deste modo, durante o

desempenho de suas atividades deverá pautar-se segundo os preceitos da instituição, deixando

de lado favoritismos, anseios e relações de foro pessoal. Seus atos, portanto, deverão ser

imputados diretamente à Adminsitração e nunca a pessoa do agente.

Sob este prisma, Alexandre de Moraes preleciona que “[...] o administrador é um

executor do ato, que serve de veículo de manifestação da vontade estatal, e, portanto, as

realizações administrativo-governamentais não são do agente político, mas sim da entidade

pública em nome da qual atuou97

”.

Por vezes, esse preceito recai sobre o campo de incidência do Princípio da Igualdade

ou confunde-se com o Princípio da Finalidade, de modo que deve ser encarado sob três

perspectivas, são elas:

Impõe a igualdade de tratamento, através da qual a Administração deverá pautar-se

por condutas isonômicas, sem discriminações, animosidades ou políticas de benefícios,

agindo da mesma maneira independente de quem seja o administrado ou de qual seja sua

pretensão. É nessa medida que se traduz o Princípio da Iguadade consagrado pelo art.5º, caput

da CF/8898

e referenciado no art. 37, inciso II e XXI99

;

Impõe observância ao Princípio da Finalidade de forma que o adminsitrador

somente deverá agir almejando o fim legal. Assim, esse fim legal será aquele ditado, expressa

ou implicitamente, pela norma, sendo inafastável o objetivo maior de toda a Administração,

qual seja, o interesse público100

. O ato administrativo deverá ser harmônico aos interesses da

coletividade esquivando-se de todo e qualquer interesse próprio ou a favor de terceiros. Nas

<http://www.institutocertame.com.br/adin-4645-rdc-regime-diferenciado-contratacoes>. Acesso em abr. de

2013. 97

MORAES, Alexandre de. Op. cit., p. 305. 98

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art. 5º, caput: Todos são iguais perante a lei, sem

distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a

inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos

seguintes:[...]. 99

Vide nota de rodapé de números 47 e 49, nas quais se encontram as transcrições dos aludidos incisos do art. 37. 100

MEIRELLES, Hely Lopes. Op.cit., p. .90.

Page 48: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

47

palavras de Hely Lopes, o que esse preceito “veda é a prática de ato administrativo sem

interesse público ou conveniência para a Administração, visando unicamente a satisfazer

interesses privados, por favoritismo ou perseguição dos agentes governamentais, sob a forma

de desvio de finalidade.101

Impõe neutralidade do agente que fica impedido de fazer autopromoção, como bem

se depreende da vedação expressa constante no §1º do art. 37 da CF/88102

.

Analisando o RDC sob essa perspectiva axiológica, primeiramente, cumpre sobressair

a inovação trazida por este regime denominada de contratação integrada, delineada mais

especificamente pelos arts. 2º, II103

; 8º, V, §5º104

; 9º105

e 36, § 1º106

.

Como já mencionado no presente estudo, a contratação integrada trata-se de um

instituto único através do qual serão realizados o projeto básico, executivo e a execução da

101

Idem. Ibidem, p. 90. 102

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art.37, §1º: A publicidade dos atos, programas,

obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação

social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de

autoridades ou servidores públicos. 103

Lei 12.462/2011 – Art. 2º, I: empreitada integral: quando se contrata um empreendimento em sua

integralidade, compreendendo a totalidade das etapas de obras, serviços e instalações necessárias, sob inteira

responsabilidade da contratada até a sua entrega ao contratante em condições de entrada em operação,

atendidos os requisitos técnicos e legais para sua utilização em condições de segurança estrutural e

operacional e com as características adequadas às finalidades para a qual foi contratada. 104

Lei 12.462/2011 – Art.8º, V: contratação integrada; §5º: Nas licitações para a contratação de obras e

serviços, com exceção daquelas onde for adotado o regime previsto no inciso V do caput deste artigo, deverá

haver projeto básico aprovado pela autoridade competente, disponível para exame dos interessados em

participar do processo licitatório. 105

Lei 12.462/2011 – Art.9º: Nas licitações de obras e serviços de engenharia, no âmbito do RDC, poderá ser

utilizada a contratação integrada, desde que técnica e economicamente justificada e cujo objeto envolva, pelo

menos, uma das seguintes condições: I - inovação tecnológica ou técnica; II - possibilidade de execução com

diferentes metodologias; ou III - possibilidade de execução com tecnologias de domínio restrito no mercado.

§ 1o A contratação integrada compreende a elaboração e o desenvolvimento dos projetos básico e executivo,

a execução de obras e serviços de engenharia, a montagem, a realização de testes, a pré-operação e todas as

demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto. § 2o No caso de contratação

integrada: I - o instrumento convocatório deverá conter anteprojeto de engenharia que contemple os

documentos técnicos destinados a possibilitar a caracterização da obra ou serviço, incluindo: a) a

demonstração e a justificativa do programa de necessidades, a visão global dos investimentos e as definições

quanto ao nível de serviço desejado; b) as condições de solidez, segurança, durabilidade e prazo de entrega,

observado o disposto no caput e no § 1o do art. 6o desta Lei; c) a estética do projeto arquitetônico; e d) os

parâmetros de adequação ao interesse público, à economia na utilização, à facilidade na execução, aos

impactos ambientais e à acessibilidade; II - o valor estimado da contratação será calculado com base nos

valores praticados pelo mercado, nos valores pagos pela administração pública em serviços e obras similares

ou na avaliação do custo global da obra, aferida mediante orçamento sintético ou metodologia expedita ou

paramétrica. § 3º Caso seja permitida no anteprojeto de engenharia a apresentação de projetos com

metodologias diferenciadas de execução, o instrumento convocatório estabelecerá critérios objetivos para

avaliação e julgamento das propostas. § 4º Nas hipóteses em que for adotada a contratação integrada, é

vedada a celebração de termos aditivos aos contratos firmados, exceto nos seguintes casos: I - para

recomposição do equilíbrio econômico-financeiro decorrente de caso fortuito ou força maior; e II - por

necessidade de alteração do projeto ou das especificações para melhor adequação técnica aos objetivos da

contratação, a pedido da administração pública, desde que não decorrentes de erros ou omissões por parte do

contratado, observados os limites previstos no § 1º do art. 65 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. 106

Lei 12.462/2011 – Art.36, § 1º: Não se aplica o disposto nos incisos I, II e III do caput deste artigo no caso

das contratações integradas.

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48

obra ou serviço, tudo isso no mesmo procedimento licitátorio e sob o encargo do licitante

vencedor. Justifica-se por meio do imperativo de eficiência de ordem técnica e econômica ao

passo que se transfere ao particular os riscos relativos à consecução do objeto contratual.

Outrossim, essa sistemática imprime a presença do anteprojeto de engenharia no

instrumento convocatório, que forneça aos participantes um breve delineamento do objeto da

licitação (art. 9º, §2º, I107

). Ocorre que essa indefinição do objeto, ou seja, a contratação da

obra/serviço sem que antes o objeto esteja nitidamente individualizado no edital, com todas as

suas minudências expostas, ocasiona manifesta afronta ao Princípio da Isonomia dos

concorrentes assegurado pelo inciso XXI do art. 37 da nossa Carta Política.

A ausência dessa descrição analítica, função assentida ao Projeto Básico por força do

art. 6º, IX da Lei 8.666/93108

, resta por comprometer a lisura do certame e o propósito cingido

à sua realização: a seleção da melhor proposta para a Administração. Por óbvio, é a descrição

pormenorizada do serviço a ser executado que permite aos participantes do certame o

conhecimento do objeto licitado e, por conseguinte, a oferta de proposta pertinente.

Igualmente, será a partir da definição prévia e precisa desse objeto que a própria

Administração poderá delimitar requisitos essenciais à contratação, por exemplo a habilitação

técnica109

, e permitir um parâmetro objetivo para a comparação das propostas. Será neste

último quesito, portanto, que a neutralidade do administrador restará maculada dada a

ausência de critérios desvinculados de subjetividade (sejam eles quantitativos mas,

principalmente, qualitativos), de antemão delineados, para a escolha do proponente que

107

Vide nota de rodapé de nº 101, na qual consta a transcrição do dispositivo em apreço. 108

Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993 – Art. 9º, IX - Projeto Básico - conjunto de elementos necessários e

suficientes, com nível de precisão adequado, para caracterizar a obra ou serviço, ou complexo de obras ou

serviços objeto da licitação, elaborado com base nas indicações dos estudos técnicos preliminares, que

assegurem a viabilidade técnica e o adequado tratamento do impacto ambiental do empreendimento, e que

possibilite a avaliação do custo da obra e a definição dos métodos e do prazo de execução, devendo conter os

seguintes elementos: a) desenvolvimento da solução escolhida de forma a fornecer visão global da obra e

identificar todos os seus elementos constitutivos com clareza; b) soluções técnicas globais e localizadas,

suficientemente detalhadas, de forma a minimizar a necessidade de reformulação ou de variantes durante as

fases de elaboração do projeto executivo e de realização das obras e montagem; c) identificação dos tipos de

serviços a executar e de materiais e equipamentos a incorporar à obra, bem como suas especificações que

assegurem os melhores resultados para o empreendimento, sem frustrar o caráter competitivo para a sua

execução; d) informações que possibilitem o estudo e a dedução de métodos construtivos, instalações

provisórias e condições organizacionais para a obra, sem frustrar o caráter competitivo para a sua execução;

e) subsídios para montagem do plano de licitação e gestão da obra, compreendendo a sua programação, a

estratégia de suprimentos, as normas de fiscalização e outros dados necessários em cada caso; f) orçamento

detalhado do custo global da obra, fundamentado em quantitativos de serviços e fornecimentos propriamente

avaliados. 109

A habilitação, também conhecida por qualificação, consiste na fase do procedimento licitatório através da

qual a Administração verificará a aptidão do licitante para a futura contratação. A qualificação técnica, por

sua vez, trata-se da verificação da aptidão profissional e operacional do proponente. A documentação

pertinente a essa habilitação encontra-se exposta no art. 30 da Lei 8.666/93.

Page 50: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

49

apresentar a opção mais pertinente e vantajosa em atenção ao interesse não só do ente político

enquanto sujeito de direito mas sim, do corpo social.

O próprio Tribunal de Conta da União, sobretudo, já proferiu entendimento atinente

aos prejuízos da subjetividade no julgamento das propostas e da notória ruptura dos fins

colimados pela licitação, quando da elaboração de um projeto básico falho, evasivo e não

correspondente à real necessidade do setor público:

12. Quanto à necessidade, ou não, de elaboração de orçamento detalhado quando da

contratação de obra em regime de empreitada global, a conclusão foi no sentido de

que a lei exige a elaboração de tal orçamento detalhado para todo e qualquer

tipo de modalidade de contratação, inclusive a empreitada integral, ou turn

key, e de que as razões e ordem material que fundamentam essa exigência legal

também valem para todo e qualquer tipo de contratação, quer seja pela

necessidade de a administração conhecer a estimativa de custos da obra antes

de licitá-la, de compatibilizar as execuções financeira e física do

empreendimento, de avaliar os novos custos em caso de eventual modificação

necessária no projeto, ou, ainda, de garantir que o preço pago seja uma justa

remuneração pelo bem obtido. [...]

21. Conforme informações apresentadas pela CTS, os dois principais contratos da

presente obra foram celebrados sob o regime de execução denominado “empreitada

integral”, por meio do qual as empresas licitantes oferecem um preço

“fechado” pela execução integral do objeto licitado, entregando-o em condições

de plena utilização ou operação.

22. Uma primeira irregularidade grave, já detectada nos autos em instruções

anteriores refere-se à baixa qualidade do projeto básico conforme constava da

licitação, não apenas em seu detalhamento, mas também em suas soluções. [...]

78. No que diz respeito à licitação, conclui-se que o projeto básico não se

encontrava em condições de ser licitado, vez que não espelhava uma solução

viável e suficientemente detalhada. O volume de modificações que se fizeram

necessárias posteriormente demonstram objetivamente essa conclusão.[...]

82. A má qualidade do projeto básico fez surgir a necessidade de diversas e

profundas modificações no desenho original durante a execução da obra, que

deu ensejo à celebração de diversos aditivos, o que também, e a princípio, não é

permitido pela legislação brasileira em obras sob regime de empreitada

integral, salvo para situações imprevisíveis.[...]

118. Com efeito, a precariedade do projeto básico e a inexistência de orçamento

com nível de detalhamento suficiente comprometem a licitação da qual adveio o

contrato, vez que incompatíveis com as condições estabelecidas em lei. As

modificações que se fizeram necessárias durante a execução da obra não só

comprovam essa assertiva, como, por si só, já configuram razão suficiente para

a nulidade do contrato, vez que seu objeto inicial restou desfigurado e que sua

conclusão já exige que as condições inicialmente contratadas sejam alteradas

acima dos limites legais. Além disso, e conforme apontado pela Unidade

Técnica, a simples existência de cláusula de medição e pagamento contrária aos

ditames legais e à moralidade, economicidade e razoabilidade já seria também

suficiente para que se declarasse o contrato nulo, pela flagrante ilegalidade de

cláusula essencial110

. [sem grifos no original]

110

BRASIL, Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 2873/2008. Plenário. Processo TC-007.162/2006-0

(Apenso: 005.425/2005-5). Interessado: Congresso Nacional. Responsáveis: Carlos Von Beckerath Gordilho

(002.366.915-20); Denival Damasceno Chaves (004.477.735-34); Fernando Durao Schleder (440.709.507-

53); Flávio Mota Monteiro (635.036.208-00); Frederico Pires da Silva (663.602.507-72); Ivan Carlos Alves

Barbosa (033.422.635-04); Janary Teixeira de Castro (163.535.875-20); Joao Luiz da Silva Dias

(011.089.806-00); José Hamilton da Silva Bastos (056.283.855-49); Luiz Fernando Tavares Vilar

(020.645.705-78); Luiz Otávio Ziza Mota Valadares (110.627.386-91); Nestor Duarte Guimaraes Neto

(110.289.805-82); e Pedro Antonio Dantas Costa Cruz (113.611.405-00).

Page 51: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

50

Nãs bastasse, a isonomia entre os licitantes participantes também é corrompida ao

passo que a elaboração do projeto-básico, executivo e a consecução do serviços, ficarão à

cargo do vencedor. Logo, este último poderá criar um pleito demasiadamente detalhado, ou

melhor, epecífico que restrinja plenamente sua execução por outrem, dificultando o acesso de

eventuais participantes e traçando condições autobenéficas.

Ante o exposto, os dipositivos da lei 12.462/2011, ora impugnados, violam

diretamente o Princípio expresso da Impessoalidade ao desatender os postulados de isonomia

entre os licitantes e a neutralidade do próprio administrador afastando-se da finalidade maior

do certame, qual seja, o interesse público.

3.1.3 Violação à Moralidade

A moralidade, por óbvio, sempre consistiu em um valor ínsito ao ordenamento,

consubstanciado enquanto postulado geral do Direito e que existe por força própria. Salienta-

se que a despeito da sua existência implícita no sistema, o que de maneira alguma retira sua

relevância, sua positivação apenas ganhou forma com a Constituição de 1988.

Tal axioma representa verdadeiro pressuposto de validade de todo o agir

administrativo, de modo que se firma a obediência a uma moral jurídica, interpretada como o

“conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da Administração111

”, e não

puramente social. Nesse sentido, Celso Antônio Bandeira de Mello adverte que haverá

trangressão desse axioma na hipótese de afronta aos valores sociais juridicamente

consagrados112

.

No exercicio desse munus público não deverá o agente ater-se tão somente ao

cumprimento da estrita legalidade, mas acatar preceitos éticos que unam a moral

administrativa à supremacia dos interesses da coletividade.

Nesse diapasão, a moralidade administrativa deverá ser sentida nos deveres de

honestidade, lealdade, boa-fé e probidade, relacionando-se intimamente à noção de bom

administrador impedido de agir de maneira imoral ou amoral.

A imoralidade administrativa importa em ato de improbidade, à luz do art. 37 §4º da

CF/88, que ocasiona prejuízo ao patrimônio público pelo enriquecimento ilícito do agente,

Disponível:.<http://www.camara.gov.br/internet/comissao/index/mista/orca/tcu/PDFs/Acordao28732008-

TCU-Plen%C3%A1rio.pdf>. Acesso em jan.de 2014. 111

HAURIOU, Maurice. Précis Élémentaires de Droit Administratif. Paris, 1926. p. 197 apud MEIRELLES,

Hely Lopes. Op. cit., p.87. 112

MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Op. Cit.,.p.120.

Page 52: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

51

ofensa aos príncipios regentes da Administração Pública ou lesão ao erário. A prática dessa

conduta é sancionada através da suspensão dos direitos políticos, perda da função pública,

indisponibilidade dos bens e ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei,

sem prejuízo da ação penal cabível113

. Não obstante, o Ministério Público poderá propor

também ação civil pública no intuito de anular ato lesivo à moralidade administrativa, com

respaldo na Lei 8.429/92.

Colacionado a este preceito encontra-se a previsão de crime de responsabilidade do

Presidente da República que atenta contra a probidade administrativa (art. 85, inciso V114

).

Neste tocante, no capítulo de direitos políticos o § 9º do art. 14115

determina que lei

complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim

de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato e a

normalidade e legitimidade das eleições.

A exigência dessa moralidade é consentânia à toda bagagem principiológica inserida

no caput do art. 37 do diploma constitucional, sendo representação máxima do Estado

Democrático de Direito destinado à assegurar direitos e garantiais fundamentais e sociais que

permitam a coexistência de uma sociedade fraterna, com respaldo mormente na sua ordem

interna.

Contrapondo-se a toda essa moralidade administrativa, urge o RDC, enquanto regime

excepcional à lei 8666/93, com vista a alcançar maior celeridade dos certames licitatórios e

“eficiência” nas contratações em detrimento dos postulados e valores constitucionalmente

consagrados.

Como mencionado no subitem acima, o regime de contratação integrada, inovação

trazida à tona pela legislação em comento (Lei nº 12.462/11), subverte o princípio da licitação

(inciso XXI do art. 37) ao passo que enfatiza a subjetivação do critério da escolha das

propostas, mediante a ausência prévia de individualização do objeto, função destinada ao

Projeto Básico que ficará a cargo do licitante vencedor e não mais da própria Administração.

Sucede que essa inversão lógica, no intuito de transferir os riscos da consecução do

contrato ao particular, torna o certame licitatório mero instrumento formal, eivando toda a

113

Redação do §4º do art. 37 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 114

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art. 85, V: a probidade na administração. 115

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art. 14, §9º: Lei complementar estabelecerá outros

casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a

moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e

legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo

ou emprego na administração direta ou indireta. [sem grifos no original].

Page 53: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

52

moralidade do ato uma vez que a Administração se esquiva de cumprir atividades pró-ativas

essenciais à escolha da proposta mais vantajosa.

Além do mais, como pode haver fiscalização e controle da execução dos meios, como

assim se diz a função destinada a Administração no RDC, se não preexiste um parâmetro de

avaliação? Afinal, o anteprojeto de engenharia não é o meio apto para detalhar o objeto,

fornecendo apenas um breve delineamento do mesmo. Isso sem mencionar que a licitação

será instaurada a partir de uma necessidade premente da Administração, e por consequência

lógica, da própria sociedade, sendo aquela a responsável por promover uma descrição

analítica do objeto, aferindo o fim almejado graças a critérios objetivos de avaliação das

propostas. Qualquer subterfúgio a essa sistemática, sobretudo no que tange à subjetividade

por parte da Administração, macula a moralidade erigida pela Carta Constitucional.

O mesmo raciocínio se atribui à inovação introduzida ao bojo do art. 10116

da

legislação ora reprovada, que imprime a remuneração variável para obras e serviços públicos

decorrente do desempenho da contratada na consecução de metas e padrões de qualidade além

do esperado e, por conseguinte, da satisfatoriedade da entidade licitante.

Fato é, que essa previsão em nada se coaduna com os postulados constitucionais,

positivados no caput e inciso XXI do art. 37 da CF/88, ao remeter ao gestor público a opção

do montante a ser pago aos contratados, viabilizando a interpessoalidade entre as esferas

público-privada no fomento de relações “promíscuas” entre esses agentes117

.

3.1.4 Violação à Publicidade

Primeiramente, cumpre mencionar que esse preceito deve ser interpretado sob duas

vertentes, quais sejam, enquanto garantia do acesso à informação e como requisito de eficácia

dos atos administrativos.

No que concerne à perspectiva do direito à informação, adverte-se que se trata da

garantia constitucional que viabiliza o exercício da cidadania ao propiciar o pleno

116

Lei 12.462/2011 – Art.10: Na contratação das obras e serviços, inclusive de engenharia, poderá ser

estabelecida remuneração variável vinculada ao desempenho da contratada, com base em metas, padrões de

qualidade, critérios de sustentabilidade ambiental e prazo de entrega definidos no instrumento convocatório e

no contrato. 117

BRASIL, Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4645, ajuizada pelo Partido da Social

Democracia Brasileira (PSDB), dos Democratas (DEM) e do Partido Popular socialista (PPS), contra a Lei

12.462/2011, que instituiu o chamado “Regime Diferenciado de Contratações Públicas” (RDC), aplicável às

licitações e contratos de obras de infraestrutura dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, da Copa do

Mundo de 2014 e da Copa das Confederações da FIFA de 2013. Disponível na íntegra em:<

http://www.institutocertame.com.br/adin-4645-rdc-regime-diferenciado-contratacoes>. Acesso em abr. de

2013.

Page 54: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

53

conhecimento das medidas e atos tomados pela Administração e ao assentar meios para a

participação e controle social por intermédio do mandado de segurança (art. 5º, LXIX118

);

direito de petição (art. 5º XXXIV, “a”119

); ação popular (art.5º, LXXIII120

), habeas data (art.

5º, LXXII121

), suspensão dos direitos políticos por improbidade administrativa (art. 37, §

4º122

) e fornecimento de certidão (art. 5º, XXXIV, “b”123

).

Noutro plano, esse princípio firma-se na garantia de que os atos oficiais só tenham

efeitos externos após a sua publicação. Contudo, não se deve confundir eficácia com condição

de existência ou validade do ato, “por isso mesmo, os atos irregulares não se convalidam com

a publicação, nem os regulares a dispensam para sua exequibilidade, quando a lei ou o

regulamento a exige124

”, como bem se posicionou Hely Lopes.

Sendo a Administração responsável pela res publica, outro não podia ser o

entendimento a não ser a ampla divulgação dos atos oficiais. Logo, o sigilo somente será

admitido em hipóteses excepcionais para os casos nos quais o interesse público o justifique.

Uma das exceções ao postulado da publicidade se encontra no art 5º, XXXIII125

da

CF/88, que tratou de assegurar a todos o direito a receber dos órgãos públicos informações de

seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja

imprescindível à segurança da sociedade e do Estado. Fora essa hipótese, segundo a previsão

do inciso X do dispositivo supramencionado, também se faz necessário resguardar a

118

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art.5º, LXIX: conceder-se-á mandado de

segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por "habeas-corpus" ou "habeas-data", quando

o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no

exercício de atribuições do Poder Público; 119

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art.5º, XXXIV, “a”: o direito de petição aos

Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder. 120

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art.5º, LXXIII: qualquer cidadão é parte legítima

para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado

participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor,

salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência. 121

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art.5º, LXXII: conceder-se-á "habeas-data": a)

para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou

bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público; b) para a retificação de dados, quando

não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo. 122

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – Art. 37, § 4º: Os atos de improbidade

administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade

dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal

cabível. 123

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art.5º,XXXIV, “b”: a obtenção de certidões em

repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal. 124

MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. .92. 125

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art.5º, XXXIII: todos têm direito a receber dos

órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas

no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança

da sociedade e do Estado.

Page 55: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

54

intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas126

. Isso sem mencionar que o

sigilo também será a regra durante as investigações policiais.

Sob à ótica da publicidade, é manifesta a contrariedade da Lei 12.462/2011, mais

especificamente do §2º do art. 15. Esse dispositivo, por sua vez, dispensa a publicação de

extrato do edital no Diário Oficial da União, do Estado, do Distrito Federal ou do Município

para as licitações cujo valor não ultrapasse R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais) para

obras ou R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) para bens e serviços, inclusive de engenharia.

Essa “aberração” jurídica não encontra respaldo em qualquer norma do nosso

ordenamento denotando, ao contrário, manifesta afronta à previsão do caput do art. 37 da

Carta Política. Isso ocorre uma vez que a própria Constituição consagra a plena transparência

dos atos tomados pela Administração o que, via de consequência, remonta à ampla divulgação

dos mesmos à sociedade. Afinal, como bem colacionou Celso Antônio Bandeira de Mello:

Não pode haver em um Estado Democrático de Direito, no qual o poder reside no

povo (art. 1º, parágrafo único da Constituição), ocultamento aos administrados dos

assuntos que a todos interessam, e muito menos em relação aos sujeitos

individualmente afetados por alguma medida127

.

Sendo o povo o titular dos interesses administrados, o acesso às informações deverá

ser amplo, ressalvados as devidas exceções, e deverá ocorrer pelo meio oficial de divulgação

da respectiva entidade pública: o Diário Oficial. Essa previsão é no sentido de resguardar a

seguridade da informação que não pode ser veiculada por meios efêmeros e instáveis, como

demonstra ser o virtual.

A simples publicação em sítio eletrônico oficial centralizador de divulgação de

licitações ou mantido pelo ente encarregado do procedimento licitatório na rede mundial de

computadores apesar de mostrar ser uma maneira célere e simplória, não demonstra a mesma

estabilidade da publicação impressa.

Ademais, ainda que a informatização seja uma nova realidade incutida no cenário

nacional, o acesso à internet ainda é restrito seja por condições econômico-sociais ou até

mesmo físicas, que inviabilizem o sinal de rede.

Devendo a divulgação da informação ocorrer na maior medida possível, torna-se

clarividente que apenas o Diário Oficial demonstra ser o meio apto a vencer a amplitude

territorial e as contradições regionais do Brasil.

126

Tais exceções também se encontram dispostas na Lei 12.527/11, responsável por regular o acesso à

informação previsto no inciso XXXIII do art. 5º. 127

MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p.105.

Page 56: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

55

Salienta-se que a segurança dos meios impressos é assegurada graças à perpetuidade

da informação no tempo, sendo o Diário oficial verdadeiro “repositório oficial e permanente

do registro dos atos estatais, desde 13 de maio de 1808, quando foi criado por D. João, com o

nome de ‘Impressão Régia’.128

”.

O Diário Oficial ao cumprir sua função maior - a divulgação da informação -,

possibilita o amplo conhecimento do cidadão, garantindo-o instrumento eficaz de controle

social.

Corroborando a subversão desse preceito, urge também a regra do § 3º do art. 6º da Lei

ora impugnada, o qual possui a seguinte redação:

Art. 6o:

Observado o disposto no § 3o, o orçamento previamente estimado para a

contratação será tornado público apenas e imediatamente após o encerramento

da licitação, sem prejuízo da divulgação do detalhamento dos quantitativos e das

demais informações necessárias para a elaboração das propostas.

[...]

§ 3oSe não constar do instrumento convocatório, a informação referida nocaput

deste artigo possuirá caráter sigiloso e será disponibilizada estrita e

permanentemente aos órgãos de controle externo e interno129

.

[sem grifos no original].

Notadamente, há inversão da lógica constitucional em que o sigilo torna-se regra e não

exceção. Segundo o dispositivo em apreço haverá uma presunção desse sigilo haja vista que,

não constando no instrumento convocatório o orçamento previamente estimado, presumar-se-

á o caráter sigiloso dessa informação.

Com respaldo no escólio de Hely Lopes, “em princípio, todo ato administrativo deve

ser publicado, porque pública é a Administração que o realiza130

”, o que de fato destaca a

excepcionalidade do sigilo à informação.

128

BRASIL, Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4645, ajuizada pelo Partido da Social

Democracia Brasileira (PSDB), dos Democratas (DEM) e do Partido Popular socialista (PPS), contra a Lei

12.462/2011, que instituiu o chamado “Regime Diferenciado de Contratações Públicas” (RDC), aplicável às

licitações e contratos de obras de infraestrutura dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, da Copa do

Mundo de 2014 e da Copa das Confederações da FIFA de 2013. Disponível na íntegra em:<

http://www.institutocertame.com.br/adin-4645-rdc-regime-diferenciado-contratacoes>. Acesso em abr. de

2013. 129

BRASIL, Lei nº 12.462, de 04 de Agosto de 2011. Institui o Regime Diferenciado de Contratações Públicas

- RDC; altera a Lei no 10.683, de 28 de maio de 2003, que dispõe sobre a organização da Presidência da

República e dos Ministérios, a legislação da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e a legislação da

Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero); cria a Secretaria de Aviação Civil, cargos de

Ministro de Estado, cargos em comissão e cargos de Controlador de Tráfego Aéreo; autoriza a contratação de

controladores de tráfego aéreo temporários; altera as Leis nos 11.182, de 27 de setembro de 2005, 5.862, de

12 de dezembro de 1972, 8.399, de 7 de janeiro de 1992, 11.526, de 4 de outubro de 2007, 11.458, de 19 de

março de 2007, e 12.350, de 20 de dezembro de 2010, e a Medida Provisória no 2.185-35, de 24 de agosto de

2001; e revoga dispositivos da Lei no 9.649, de 27 de maio de 1998. É oriunda da conversão da Medida

Provisória nº 527, de 2011. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-

2014/2011/Lei/L12462.htm>. Acessado em mar. de 2013. 130

MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 94.

Page 57: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

56

Com efeito, a transparência e a publicidade das informações são as condutas

colimadas pela Constituição, justificando-se a ausência das mesmas somente nas hipóteses em

que o interesse público seja sobressalente, por exemplo, a segurança da sociedade e do Estado

ou para resguardar um interesse privado substancialmente maior, sob pena de ferir a

intimidade, a vida privada, a honra e a imagem do particular.

Ante o exposto, não se pode olvidar da inconstitucionalidade que macula o §2º do art.

15 e o § 3º do art. 6º, restando por eivar todo o Regime Diferenciado de Contratação Pública.

3.1.5 Violação à Eficiência

O Princípio da Eficiência já foi objeto de exame no presente estudo, notadamente no

subitem 2.2.2, razão pela qual não convém adentrar na sua conceituação ou até mesmo no

contexto de implementação desse postulado no ordenamento pátrio para não tornar repetitivo

e maçante o desenvolvimento deste trabalho.

Entretanto, aproveita-se a ocasião para promover uma releitura do RDC sob a

sistemática da eficácia de resultados pela Administração Pública.

Brevemente, salienta-se a pluridimensionalidade desse preceito: quantitativa, atinente

à busca pela racionalidade e otimização dos meios, e qualitativa, correlata a noção de

satisfatoriedade social com os resultados obtidos.

Ademais, importa colacionar sua introdução ao caput do art. 37 da CF/88, com o

modelo de Administração vigente à época da promulgação da EC 19/98. De fato, a tentativa

de adotar uma cultura gerencial no âmbito da Administração Pública brasileira, voltada para a

noção de cidadão-cliente, foi o fator gerador da inserção do Princípio da Eficiência dentre

aqueles afetos ao direcionamento da atividade do aparato estatal na gestão dos interesses da

coletividade.

Segundo essa dúplice acepção e atentos ao contexto da Administração Gerencialista é

que será guiada essa análise da incompatibilidade substantiva da legislação em comento.

Nesse primeiro momento, destaca-se que a criação desse regime de exceção, que se

originou a partir de uma manobra política, ocorreu com fulcro na busca da eficiência das

licitações e contratações públicas, com vista a romper a morosidade e burocratização

características aos certames, condicionando-os à consecução de resultados.

Na medida em que a Lei 12.462/2011 vincula a adoção do regime à realização de

eventos específicos cria-se meios, tais quais, a contratação integrada; a remuneração variável

de acordo com o desempenho; a dispensa da publicação de extrato do edital em diário oficial

Page 58: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

57

a depender do valor e do objeto licitado, bem como a presunção do sigilo no que tange ao

orçamento previamente estimado para a contratação, dentre inúmeros outros, que enfatizam a

discricionariedade do agente público sem se preocupar em ministrar critérios objetivos ao

procedimento.

A ausência de limitação da competência concedida, por sua vez, acaba por deturpar a

finalidade fundamental da licitação – selecionar a proposta mais vantajosa às conveniências

públicas – dando azo ao predomínio de interesses particulares ou, até mesmo, do interesse

público secundário em detrimento do primário.

Outrossim, a própria criação do RDC é resultado da ausência de planejamento, traço

característico à Administração brasileira que teve tempo suficiente para realizar as

contratações necessárias para desenvolver a infraestrutura dos eventos desportivos pelos

instrumentos usuais de contratação. Contudo, o aparato estatal preferiu se mante inerte e, nas

vésperas, emburrar a criação de um regime excepcional.

Essa consagrada falha de planejamento representa um risco de dilapidação do

patrimônio público, ao não identificar previamente quais são as obras necessárias à realização

dos eventos, como ocorre nos incisos I e II do art.1º, bem como na previsão do art. 65 do

diploma em comento.

A escolha a critério do administrador acaba por alimentar um uso indiscriminado do

RDC e a permitir a irrealidade de orçamentos previamente determinados. A título de

exemplificação, há que se mencionar trechos de julgado do TCU que revelam que o

orçamento inicial dos gastos em ocasião dos jogos Pan Americanos de 2007 foi,

absurdamente, ultrapassado (cerca de 10 vezes o valor inicialmente previsto) em razão da

ausência de determinação antecipada das obras necessárias à realização dos jogos, veja-se:

Em decorrência da especialmente da falta de planejamento e da definição tardia da

matriz de responsabilidades, houve evolução da estimativa da despesa ao longo do

tempo, bem como a participação cada vez mais substancial da União. Ao final, as

Unidades Técnicas do Tribunal estimaram o custo dos jogos em cerca de 3,3 bilhões

de reais aos cofres públicos. A participação da União aumentou cerca de 50% sendo

que, do valor global gasto por esse ente, mais de 70% foram aplicados no primeiro

semestre de 2007, em razão de convênios, licitações e contratações de última hora,

resultantes da falta de planejamento131

.

131

Manifestação do TCU no processo TC 014.075/2009 (Acórdão nº 2101/2008 – Plenário de 24/09/2009)

apud BRASIL, Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4655, ajuizada pelo Procurador-Geral da

República, Roberto Gurgel, perante o Supremo Tribunal Federal (STF) contra a Lei 12.462/11, que cria o

RDC (Regime Diferenciado de Contratações Públicas), aplicável a licitações e contratos de obras da Copa de

2014 e das Olimpíadas 2016. Importante mencionar que a ADI fora distribuída por prevenção para o ministro

Luiz Fux, que recebeu a primeira ação ajuizada no Supremo contra o RDC, de autoria do PSDB, DEM e PPS

(ADI nº 4645). Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?s

eqobjetoincidente=4138546>. Acesso em abr. de 2013.

Page 59: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

58

Com respaldo na manifestação acima do TCU, órgão de controle externo da

Administração Pública, não há como ignorar o questionamento a seguir: como poderá existir

eficácia nos resultados sem uma política de planejamento pelo aparato estatal?

Com efeito, não adianta a Administração perseguir apenas a consecução de resultados

sem promover a adequação dos meios, repeitada a devida proporcionalidade. Torna-se, assim,

de inobjetável clareza que a verdadeira intenção da máquina administrativa, corrompida pela

ganância política, resume-se à implementação de uma Eficiência ilusória que mascare, através

de infraestruturas farônicas, toda a ausência do aparato estatal na concretização de políticas

públicas.

Cumpre menionar que as inovações trazidas pelo RDC, ao visarem apenas a celeridade

e resultado das contratações, acabam por elevar a “Eficiência” a todos ao demais valores

consitucionalmente previstos, como passa-se a expor.

Igualmente, na medida em que esses institutos jurídicos inovadores revelam o uso

indiscriminado desse regime excepcional, outorgando um desproporcional poder de decisão

ao aparato administrativo e permitindo até mesmo a delegação de funções típicas do

Legislativo ao Executivo, há evidente tentativa de sobrepor a eficiência à estrita Legalidade,

colocando em risco a própria manutenção do Estado Democrático de Direito.

Ao ocasionar a ruptura da isonomia dos licitantes e abrir azo ao subjetivismo dentro do

certame licitatório, afastando-se da neutralidade exigida do administrador no exercício de suas

funções, há justaposição da Impessoalidade e da Moralidade à Eficiência.

A mitigação da divulgação de informações imprecindíveis da licitação no meio oficial

– Diário Oficial -, respeitadas as hipóteses excepcionais, e a regra da presunção de sigilo,

invetem a lógica constitucional, impondo obstáculos à participação e a mecanismos de

controle pelos cidadãos. Neste plano, o axioma da Publicidade é subjugado à Eficiência.

Manifesta subsunção de todas as premissas constitucionais à Eficiência, remonta a

verdadeira incongruência lógico-jurídica, sendo notório que não pode haver a eficácia de

resultados, sendo esta apenas aparente e fruto de oratória política, em afronta aos demais

princípios basilares da atividade administrativa.

É sob essa análise crítica que a “eficiência” apregoada por esse regime excepcipal

deve ser entendida, não restando dúvidas quanto a violação aos preceitos expostos no caput e

incisos do art. 37 da CF/88.

Page 60: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

59

3.2 Regime de exceção X Tentativa de supressão do certame licitatório

A implementação do Regime Diferenciado de Contratações Públicas, confirma a

“manobra” política do aparato estatal para introduzir ao ordenamento pátrio diploma

normativo diverso da Lei 8.666/93 – Lei Geral de Licitação e Contratos Públicos.

O regime, a priori, excepcional era limitado materialmente e marcado pela

efemeridade de seus dispositivos. Ocorre que, gradativamente, perdeu sua transitoriedade

graças a ampliação do seu âmbito de incidência, fato este que ratifica a tentativa de

consolidação e afastamento dos preceitos instituídos pelo Legislação Geral.

O RDC sedimenta-se enquanto verdadeiro mecanismo de corrupção sistêmica, o qual

perpassa pela alcunha de consolidação da Administração Gerencial e flexibilização dos

procedimentos, para extipar valores que deveriam guiar o aparato estatal nas licitações e

contratações públicas132

.

Frise-se que os defensores desse modelo gerencial pervertem os institutos burocráticos

afirmando a incapacidade dos mesmos em atender os anseios sociais. Em verdade, não pode

haver Administração Pública que não prime pela heraquia funcional, controle metodológico,

organização procedimental, seleção técnica do seu quadro de servidores, divisão racional dos

trabalhos, impessoalidade, moralidade e que permita a incidência de meios de controle pelos

próprios cidadãos, conforme direciona a vertente burocrática. Somente a partir de tais

postulados será alcançada a Eficiência e a sintonia entre Estado de Direito e Soberaia Popular.

O que não pode acontecer é a total flexibilização desses institutos permitindo uma

dinâmica gerencial que promova a confusão entre o setor público e privado, entregando a este

último funções precípuas da Administração na defesa dos interesses da coletividade, como se

configurou na Reforma Administrativa suscitada no mandato de Fernando Henrique Cardoso

e como vem acontecendo por intermédio do RDC.

Sem sombra de dúvidas, a Eficiência adotada pela Administração Pública Gerencial

não pode ser alcançada a qualquer custo, sobrejulgando todos os demais princípios estimados

pela Constituição, consoante estudado acima.

Por todo o exposto, adverte-se que a suposta acusação de obsolescência da Lei Geral,

Lei. 8.666/93, pelos legisladores fora apenas um oportunismos político imbuído pela tentativa

de investir em mecanismos menos rigorosos de defesa contra fraudes nas licitações.

132

SERRANO, Pedro Estevam. Contratos realmente "diferenciados". O Regime Diferenciado de

Contratação usado pelo governo Dilma nas licitações da Copa do Mundo é um mecanismo nefasto de

corrupção sistêmica. In: Carta Capital. Publicado em 03 de junho de 2012. Disponível

em:<http://www.cartacapital.com.br/politica/contratos-realmente-diferenciados/>. Acesso em: abr. de 2013.

Page 61: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

60

Deste modo, torna-se manifesta a intenção do Estado, com fulcro no imperativo da

eficiência, de valer-se de um regime simplificado de contratações, o qual se respalda no

encurtamento de prazos, simplificação de procedimentos e flexibilização de requisitos, para

burlar o certame constitucional de licitação e promover o favorecimento e a pessoalidade nas

contratações. Essa desburocratização administrativa, na verdade, não exprime apenas um

pensamento gerencial mas descumpre todos os Preceitos Constitucionais.

Page 62: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

61

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao final do presente estudo conclui-se:

1) A priori, o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC) fora criado

enquanto regime de exceção à Lei 8.666/93, para promover uma modalidade de certame

licitatório mais célere e supostamente mais eficiente frente à necessidade de proporcionar a

infraestrutura nacional necessária à recepção dos eventos desportivos sediados no Brasil;

2) Sua trajetória legislativa foi marcada por vícios formais de

inconstitucionalidade uma vez que a Lei 12.462/2011 é fruto da conversão da medida

provisória nº 527, a qual padeceu dos pressupostos constitucionais para sua edição. Não

obstante, a incompatibilidade orgânica também é sentida no manifesto abuso do poder de

emenda concedido aos parlamentares, que excederam os limites que lhes são próprios ao não

resguardar a pertinência temática à proposição normativa originária no trâmite de conversão

da medida provisória em Lei no Congresso Nacional;

3) A despeito da limitação de ordem temática, atinentes a realização das

competições esportivas supracitadas no presente estudo, a excepcionalidade do regime nunca

fora bem delineada, o que inviabilizava a identificação dos projetos contemplados, bem como

a perpetuidade do diploma normativo em apreço no ordenamento pátrio. Ademais, a aparente

taxatividade do rol de aplicação sofreu progressivas alterações a bel prazer do legislador que

desvestiu o regime da transitoriedade que lhe era ínsita. Notadamente, o RDC introduziu

diversas inovações jurídicas que se contrapõem às premissas instituídas pela ritualística Lei

8.666/93;

4) A Administração Pública Burocrática tem por expoente máximo a introdução

do funcionalismo público, sendo caracterizada pela hierarquia, impessoalidade, discriminação

meticulosa das atividades, principalmente no que tange ao detalhamento dos procedimentos a

serem observados e ao controle rígido dos meios. Neste ínterim, há vertente que defenda a

suposta ideia de que esse modelo é calcado pela ineficiência, sendo incapaz de prover as

demandas sociais.

5) Administração Pública Gerencial, por sua vez, surge com o desiderato máximo

de trazer a eficiência para o âmbito das contratações públicas, direcionando todo o aparato

estatal a promoção de uma política alicerçada nos resultados. Dessa forma, afasta-se da

rigidez setorial, promove-se a extrema flexibilização das principais conquistas da boa

administração e introduz o paradigma do cidadão-cliente, compartilhando diretrizes da

Page 63: UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA LARISSA DEMARQUES …

62

iniciativa privada e transferindo a esta o encargo antes pertencente exclusivamente à seara

administrativa pública. Neste sentir, ampla doutrina acerca do tema difunde a ideia de um

“anacronismo do modelo burocrático tradicional133

”, para justificar a necessidade de

implantar uma cultura gerencial intimamente relacionada à sobreposição do Princípio da

Eficiência. No Brasil, essa Administração Pública Gerencial inaugurou-se através da proposta

de redefinição do papel do estado, o que ocorrerá sob a presidência de Fernando Henrique

Cardoso (FHC), sendo marcada pelo extremismo e evidenciando que a transferência de

serviços essenciais inerentes ao setor público à iniciativa privada pode ocasionar danos

irreversíveis à sociedade. Obtempere-se que a consagração do Princípio da Eficiência

enquanto regente da atividade da máquina estatal, positivando-o expressamente no caput do

art. 37 da CF/88, aconteceu nesse mesmo período por força da EC 19/98. Esse axioma da

Eficiência assume uma pluridimensionalidade a qual deve ser interpretada sob duas óticas:

otimização do uso dos meios e satisfatoriedade social dos resultados obtidos.

6) Em verdade, a “aclamada” necessidade de se reestruturar o certame licitatório

representou o processo de desburocratização estatal, exemplificada pela própria introdução do

RDC em completo afastamento dos preceitos instituídos pela Lei nº 8.666/93, semeando os

germes de uma cultura gerencial exacerbada no cenário nacional.

7) As inovações incutidas pelo RDC representam a sobreposição da “Eficiência” a

todos os demais postulados constitucionalmente consagrados, representando verdadeira

ameaça à supremacia da ordem constitucional e ao Estado Democrático de Direito. Na medida

em que patente inconstitucionalidade substantiva se materializa, afasta-se o ideal da política

dos resultados haja vista que, por remeter-se à verdadeira incongruência lógico-jurídica, não

pode haver eficiência na ausência da estrita legalidade, impessoalidade, moralidade e

publicidade. Desta forma, a “eficiência” divulgada é apenas aparente e ilusória.

8) Cediço, portanto, que o RDC, enquanto regime de “exceção”, aos poucos

perdeu esse caráter para assumir a manobra política de consolidar-se no ordenamento e

gradativamente suprimir os ditames licitatórios apregoados pela legislação geral e pela Lei da

República.

133

MARE (Ministério da Administração e Reforma do Estado): Plano Diretor da Reforma do Aparelho

Estatal. Brasília: Presidente da República, Imprensa Oficial. Novembro de 1995. p. 17. Disponível em:

<http://www.bresserpereira.org.br/Documents/MARE/PlanoDiretor/planodiretor.pdf.> Acesso em jan.de

2014.

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Social Democracia Brasileira (PSDB), dos Democratas (DEM) e do Partido Popular socialista

(PPS), contra a Lei 12.462/2011, que instituiu o chamado “Regime Diferenciado de

Contratações Públicas” (RDC), aplicável às licitações e contratos de obras de infraestrutura

dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, da Copa do Mundo de 2014 e da Copa das

Confederações da FIFA de 2013. Disponível na íntegra em:<

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Geral da República, Roberto Gurgel, perante o Supremo Tribunal Federal (STF) contra a Lei

12.462/11, que cria o RDC (Regime Diferenciado de Contratações Públicas), aplicável a

licitações e contratos de obras da Copa de 2014 e das Olimpíadas 2016. Importante mencionar

que a ADI fora distribuída por prevenção para o ministro Luiz Fux, que recebeu a primeira

ação ajuizada no Supremo contra o RDC, de autoria do PSDB, DEM e PPS (ADI nº 4645).

Disponível

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Contratações Públicas - RDC; altera a Lei no 10.683, de 28 de maio de 2003, que dispõe

sobre a organização da Presidência da República e dos Ministérios, a legislação da Agência

Nacional de Aviação Civil (Anac) e a legislação da Empresa Brasileira de Infraestrutura

Aeroportuária (Infraero); cria a Secretaria de Aviação Civil, cargos de Ministro de Estado,

cargos em comissão e cargos de Controlador de Tráfego Aéreo; autoriza a contratação de

controladores de tráfego aéreo temporários; altera as Leis nos 11.182, de 27 de setembro de

2005, 5.862, de 12 de dezembro de 1972, 8.399, de 7 de janeiro de 1992, 11.526, de 4 de

outubro de 2007, 11.458, de 19 de março de 2007, e 12.350, de 20 de dezembro de 2010, e a

Medida Provisória no 2.185-35, de 24 de agosto de 2001; e revoga dispositivos da Lei no

9.649, de 27 de maio de 1998. É oriunda da conversão da Medida Provisória nº 527, de 2011.

Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/Lei/L12462.htm>,

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Inconstitucionalidade: ADI-MC nº 293. Requerente: Procurador Geral da República;

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Julgamento: 06/06/1990. Tribunal Pleno. Data de Publicação: DJ 16-04-1993; PP-06429;

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Inconstitucionalidade: ADI-MC 1070 MS. Relator: Celso de Mello, Data de Julgamento:

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Carlos Von BeckerathGordilho (002.366.915-20); Denival Damasceno Chaves (004.477.735-

34); Fernando DuraoSchleder (440.709.507-53); Flávio Mota Monteiro (635.036.208-00);

Frederico Pires da Silva (663.602.507-72); Ivan Carlos Alves Barbosa (033.422.635-04);

Janary Teixeira de Castro (163.535.875-20); Joao Luiz da Silva Dias (011.089.806-00); José

Hamilton da Silva Bastos (056.283.855-49); Luiz Fernando Tavares Vilar (020.645.705-78);

Luiz Otávio Ziza Mota Valadares (110.627.386-91); Nestor Duarte Guimaraes Neto

(110.289.805-82); e Pedro Antonio Dantas Costa Cruz (113.611.405-00).

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=JOS%C3%89%20GUIMAR%C3%83ES,%20PT-

CE&txFaseSessao=Ordem%20do%20Dia%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20

%20%20%20%20%20%20%20&txTipoSessao=Ordin%C3%A1ria%20-

%20CD%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20&dtHoraQua

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