universidade federal de mato grosso instituto de … · obrigada de coração pelas orações e...

123
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO SONIA APARECIDA DA SILVA DE LARA PIRES UM OLHAR FENOMENOLÓGICO NO EXERCÍCIO DO PODER DAS RELAÇÕES INTERPESSOAIS NAS INSTITUIÇÕES ESCOLARES: O GOSTO AMARGO DO MEL CUIABÁ-MT 2011

Upload: hoangtuyen

Post on 10-Dec-2018

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

1

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO SONIA APARECIDA DA SILVA DE LARA PIRES

UM OLHAR FENOMENOLÓGICO NO EXERCÍCIO DO PODER DAS RELAÇÕES INTERPESSOAIS NAS INSTITUIÇÕES

ESCOLARES: O GOSTO AMARGO DO MEL

CUIABÁ-MT 2011

Page 2: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

2

SONIA APARECIDA SILVA DE LARA PIRES

UM OLHAR FENOMENOLÓGICO NO EXERCÍCIO DO PODER DAS RELAÇÕES INTERPESSOAIS NAS INSTITUIÇÕES ESCOLARES: O GOSTO

AMARGO DO MEL

Dissertação de Mestrado em Movimentos Sociais, Política e Educação Popular, apresentada a Universidade Federal de Mato Grosso, como requisito final para obtenção do título de Mestre em Educação pela Universidade Federal de Mato Grosso, no Programa de Pós-Graduação em Educação.

Orientador: Prof. Dr. Luiz Augusto Passos

CUIABÁ-MT 2011

Page 3: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

3

P667o

Pires, Sonia Aparecida da Silva de Lara.

Um olhar fenomenológico no exercício do poder das relações

interpessoais nas instituições escolares: o gosto amargo do mel. / Sonia

Aparecida da Silva de Lara Pires. -- Cuiabá (MT): Instituto de

Educação/IE, 2011.

120 f.; 30 cm.

Dissertação (Mestrado em Educação).

Universidade Federal de Mato Grosso. Instituto

de Educação. Programa de Pós - Graduação em

Educação. Orientador: Prof. Dr. Luiz Augusto Passos.

Inclui bibliografia.

1. Gestão escolar. 2. Profissional docente. 3. Relações interpessoais -

Profissional docente – Gestor escolar. I. Título.

CDU: 37.014.63

Page 4: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

4

DISSERTAÇÃO APRESENTADA À COORDENAÇÃO DO PROGRAMA DE PÓS-

GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO DA UFMT

SONIA APARECIDA DA SILVA DE LARA PIRES

UM OLHAR FENOMENOLÓGICO NO EXERCÍCIO DO PODER DAS

RELAÇÕES INTERPESSOAIS NAS INSTITUIÇÕES ESCOLARES: O GOSTO AMARGO DO MEL

Banca Examinadora: ________________________________________________________________ Dr Eunice Aparecida de Jesus Prudente ( Avaliadora Externa USP) ________________________________________________________________ Dr Celso Luiz Prudente (Avaliador Interno UFMT) ________________________________________________________________ Dr Luiz Augusto Passos (Orientador UFMT) ________________________________________________________________ Dr Maria da Anunciação P. B. Neta (Suplente UFMT)

Aprovada em 19/12/2011

Page 5: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

5

Ao meu amado Jesus que durante toda minha vida esteve sempre presente, nos momentos difíceis, alegres e angustiantes e que nestes dois anos de Mestrado ficou ao meu lado me ajudando a escrever o que não considero como uma dissertação de mestrado, mas sim de uma superação e uma prova evidente do poder de Deus em minha vida.

Page 6: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

6

Agradecimentos

Por que Dele por Ele, para Ele são todas as coisas.......Deus; Ao meu amigo e irmão em Cristo Abrelino Carlos Tenedini que me mostrou

o caminho das pedras e acreditou mesmo sem ver;

Ao professor Dr. Vitale Joanoni Neto que sem me conhecer mais usado

por Deus leu meu primeiro esboço e o encaminhou aquele que seria um

divisor de águas em minha vida;

Ao Dr. Luiz A. Passos meu amigo, meu orientador e meu eterno referencial

de ser humano, que nos caminhos da vida acadêmica nunca deixou para

trás os sonhos, nunca deixou de dizer uma palavra amiga, um... Pois não...

Ao senhor Dr. Passos que jamais deixarei de chamar de Dr. Agradeço por

ter me adotado, por ter sido tão importante na minha vida durante esses

quase dois anos de convivência, pelos almoços em sua adorável casa,

pelo uso da sala, pelos puxões de orelha na reta final, por entender as

minhas angústias nos momentos finais da construção do texto para

defesa, pela sensibilidade, pela cumplicidade e acima de tudo pelo amor

fraterno que dedicou a mim. Dr. Passos sem dúvida... um legítimo

Personalista;

A Dr. Maria de Anunciação P.B. Neta, que de forma magistral, leu e

corrigiu a versão da qualificação, sugerindo modificações

importantíssimas, obrigada de coração;

Ao Dr. Celso Prudente, mais novo membro da UFMT, sociólogo,

antropólogo, cineasta... Enfim são tantos adjetivos mais que nenhum é

maior do que a graça e a leveza que usa para com todos os irmãos.

Obrigada Dr. Celso pela humanidade com que avaliou meu trabalho, com

um olhar de artista e de ser humano apaixonado pela arte do viver a vida;

Page 7: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

7

A Dra. Eunice Aparecida de Jesus Prudente, minha avaliadora externa,

que em sua agenda tão lotada reservou um espaço para ler meu trabalho

e contribuir de maneira grandiosa. Partindo de uma profissional com seu

currículum não poderia ser diferente, sua vasta experiência na área dos

direitos humanos, lhe outorga a prerrogativa de um ser humano com

compromisso com nosso povo. Obrigada Dra. Eunice pela sua disposição

e suas contribuições. Que o nosso Deus possa lhe fazer cada vez mais

forte na luta pelo povo que Ele tanto ama;

A Sonia Marisa Eugênio que não é só minha diretora financeira, é uma

amiga que soube chorar junto quando foi preciso e se alegrar quando

possível. Sonia minha gratidão, respeito e admiração pela mulher de fibra

que você é;

As amigas Leide e Vera pela atenção, estímulo e incentivo;

Aos amigos Artur, Sandra, Carvalho e Leninha que nunca deixaram de

acreditar que um dia eu pudesse chegar lá. Amigos... Cheguei!!!!!!;

A Luiza e Delma, funcionárias do PPGE, que me suportaram em amor.

Meninas muito obrigadas por tudo;

A família Tomaz da Silva, que mesmo sem me conhecer mais através

desta pessoa maravilhosa, bela e amiga chamada Josiane Tomaz me

acolheu em sua casa durante todo o primeiro ano do mestrado. Sem eles

minha estadia em Cuiabá no ano de 2010 seria muito difícil;

A família Araújo na pessoa desta mulher guerreira e serva de Deus, Zilma,

obrigada por vocês me acolherem em momento tão solitário da

construção do texto;

Page 8: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

8

Ao meu amigo Admilson que mesmo preocupado com sua defesa, não

deixou de se preocupar comigo. Amigo é coisa pra se guardar debaixo de

sete chaves, dentro do coração............;

A minha mãe Zilda que por muitas vezes não teve noticias da filha que

nem tempo para telefonar tinha. Essa vitória é nossa minha querida

mãezinha;

A minha irmã Solange que sempre disse ter orgulho de mim e acreditar no

meu potencial. Muito obrigada pela força;

Aos meus filhos João Olavo, Amandla e Monzano que agora podem dizer:

Minha mãe é mestre! Filhos se não os tivesse pediria a Deus para tê-los;

Aos meus pastores, Agnaldo e Enilda, que em 2009 começaram comigo

uma campanha de oração para que Deus me abençoasse e restaurasse os

meus sonhos. O sonho do mestrado foi restaurado e devolvido, foram 70

dias de muita intimidade com Deus. Obrigada de coração pelas orações e

clamores ao Deus dos exércitos;

Ao mais novo membro da família que ocupa um lugar de destaque em meu

coração. Meu amado marido Elias Ozéias de Lara Pires, que não tem nível

superior mais tem uma sabedoria que ultrapassa o conhecimento

acadêmico e que de forma espetacular e sobrenatural conquistou meu

coração.

As pessoas que o mestrado me proporcionou a conhecer: Dr. Edson e

Camila, Janaina, Raquel, Edson Evangelista, Dr. Tânia, seu Geraldo e

dona Tânia... Enfim pessoas que durante um tempo estiveram juntos

comigo, brincando, aconselhando, servindo e me ensinando a servir.

Page 9: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

9

A amiga e irmã em Cristo Eliana, que fez a primeira revisão do texto para

que o mesmo ficasse mais apresentável no contexto gramatical.

Ao Seminário Teológico Batista que me acolheu como hóspede em suas

dependências nos momentos finais da escrita do trabalho.

Faltam quatro dias para o natal!!! Vamos nos alegrar!!! Deus é conosco, amém?

Page 10: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

10

No princípio era a relação

Martin Buber

Page 11: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

11

RESUMO

A presente pesquisa de cunho qualitativo fenomenológico tem como objetivo examinar, e procurar compreender a conflitividade das relações interpessoais na dinâmica eu/outro(a) sob o foco das relações de trabalho em instituições educacionais. A pesquisa toma como referência central a obra síntese da maturidade de Emmanuel Mounier, O Personalismo; de inspiração filosófica husserliana, quando Husserl já fora enriquecido pela leitura de Merleau-Ponty XX. No Brasil, o educador Paulo Freire desenha sua matriz teórico-metodológica inspirado, em grandes linhas, na tradição dialético-fenomenológica destes três autores. Em fidelidade a esta esteira filosófica, trilharemos o mundo da vida dos educadores avaliando a dimensão política relacional, laboral, através de questionários e histórias de vidas com gestores e docentes, no contraforte da cultura da institucionalidade vigente nas escolas públicas estaduais do munícipio de Diamantino - Mato Grosso/Brasil. Cotejaremos os conflitos relendo-os e ressignificando-os à luz das anotações, de Mounier e Freire, que ganham teor político e ensejam possibilidades de ampliação de sentidos e eventuais caminhos de superação. Não existem relações neutras na forte cultura hierarquizada inculcada pelo Estado nas teorias de gestão e direção de controle, bem como através da formação acadêmica instituída que configura uma normalização de padrões de condutas desejáveis, distinguindo funções, hierarquizando pessoas, organizando relações de trabalho consolidando os interesses do capital. Neste contraforte, a despersonalização, a concepção instrumental dos seres humanos adquire uma racionalidade exterior e imposta, que fere, essencialmente, a pessoa. Conceito caríssimo a Mounier, que denuncia a implosão do escopo educacional pela violência de um Estado bonapartista, através do qual, o público, o sujeito de direitos, a dimensão de natureza política dos seres humanos são feridas de morte porque pessoa é o suporte mesmo da relação, que a plenifica, a política. Esta nossa denúncia, respaldados por Mounier e Paulo Freire.

Palavras-Chaves: Relações interpessoais. Política. Poder. Autonomia.

Emmanuel Mounier

Page 12: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

12

ABSTRACT

This phenomenological qualitative research aims to examine the conflicts and

seeking to understand the dynamics of interpersonal relationships between the

other and me, under the focus of labor relations in educational institutions. The

research takes as its central reference a summary of Emmanuel Mounier mature

work - Personalism; a reference work which has a Husserlian philosophical

inspiration, when Husserl had already been enriched by his readings about

Merleau-Ponty XX. In Brazil, the educator Paulo Freire draws his theoretical-

methodological matrix inspired, broadly speaking, in the tradition of those

dialectical-phenomenological three authors. In loyalty to this philosophical track,

we‘ll follow the world of educators life evaluating its the political and relational

dimension, their work, through questionnaires and life histories with managers

and teachers, in the foothills of the institutionalized culture present in state public

schools of the city of Diamantino- Mato Grosso / Brazil. We are going to collate

such conflicts and rereading them, providing new meanings to them in light of the

notes of Mounier and Freire, which gain political content and open possibilities of

expanding the senses and possible ways to overcome. There are no impersonal

relationships in the strong hierarchical culture inculcated by the State in the

theories of management control and direction, as well as through established

academic standards that sets desirable patterns of behavior, distinguishing

functions, ranking people, organizing labor relations consolidating the interests of

capital. In these foothills, this depersonalization, the instrumental conception of

human beings acquired an imposed and exterior rationality, wounding,

essentially, the person. Concept expensive to Mounier, who denounces the

implosion of the educational scope by the violence of a Bonaparte‘s state,

whereby, the public, the subject of rights, the political dimension of human beings

are bleeding to death because that person is the holder of relationship, which

makes it complete, politics. This is our complaint, supported by Mounier and

Paulo Freire.

Key Words: Interpersonal relations. Policy. Power. Autonomy.

Emmanuel Mounier.

Page 13: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

13

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1- Gráfico: Qual a sua formação?.................................................................

Figura 2-Gráfico: Quais as características básicas que você pensa ser

imprescindível para o exercício do cargo de gestor?..............................................

Figura 3-Gráfico de respostas à questão: Qual o nível de relacionamento que

tinha com o gestor?.................................................................................................

Figura 4-Gráfico de respostas à questão: Como você via o último gestor da

escola?....................................................................................................................

Figura 5-Gráfico de respostas à questão: O que foi feito para resolver o

problema quando o gestor era considerado inflexível?...........................................

Figura 6-Gráfico de respostas à questão: Como o gestor reagia ao ouvir suas

sugestões em relação a organização e administração da unidade escolar?

Figura 7-Gráfico de respostas à questão: A seu ver, qual o nível de

acompanhamento que o último gestor tinha das coisas que aconteciam na

escola?.....................................................................................................................

Figura 7 A- Gráfico de respostas à questão: O que impedia o acompanhamento

do gestor nas coisas que aconteciam na escola?

Figura 8- Gráfico de respostas à questão: Qual a sua opinião sobre o processo

eleitoral para escolha de gestores em Diamantino?

Figura 9- Gráfico de respostas à questão: Você incentivaria um colega a ser

gestor?

Figura 9 A-Gráfico de justificativas do Sim a questão número 9

Figura 9 B-Gráfico de justificativas do Não a questão 9

Figura 10-Gráfico de respostas: Você candidataria ao cargo de gestor?

Figura 10 A-Gráfico de justificativas

Page 14: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

14

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS UBES= União Brasileira de Estudantes Secundaristas. UNE= União Nacional dos Estudantes. SEDUC= Secretaria de Estado de Educação. MT= Mato Grosso. SINTEP/MT= Sindicato dos Trabalhadores do Ensino Público de Mato Grosso. PCCS= Plano de cargos, carreira e salários. PM-MT= Plano de Metas de Mato Grosso. FCD= Frente Cidadania e Desenvolvimento. PM-FCD= Plano de Metas da Frente Cidadania e Desenvolvimento. PEC= Proposta de Emenda Constitucional. CDCEs= Conselho Deliberativo da Comunidade Escolar. LDB= Lei de Diretrizes e Bases. ECFPH= Escola de Ciclo de Formação da Pessoa Humana. CFE= Conselho Federal de Educação.

Page 15: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

15

LISTA DE ANEXOS ANEXO A – História de vida do profissional João ANEXO B – História de vida do profissional Raimundo ANEXO C – História de vida do profissional Sérgio ANEXO D – História de vida da profissional Elena ANEXO E - História de vida da profissional Eliane

Page 16: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

16

LISTA DE APÊNDICES

APÊNDICE A – Questionário para os docentes

Page 17: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

17

Sumário

Introdução ........................................................................................................... 18

Capítulo I ........................................................................................................... 24

Da administração a gestão escolar ................................................................. 24

1.1. Da administração e gestão. ......................................................................... 26 1.2. Os profissionais da educação e a luta pela gestão democrática da educação escolar no Brasil ................................................................................................. 35

1.3. Os profissionais da educação e a luta pela gestão democrática em Mato Grosso. ............................................................................................................... 38

1.4. A estruturação de poder nas relações interpessoais ocorridas no ambiente escolar ................................................................................................................ 43 1.5. Foucault e a questão do poder .................................................................... 47

CAPÍTULO II ....................................................................................................... 53

A Metodologia e Interpretação dos resultados .................................................... 53

2.1- O Percurso Metodológico ............................................................................ 54 2.2- Os docentes e suas avaliações sobre as relações com os gestores nas instituições escolares .......................................................................................... 56 2.2. As narrativas dos gestores sobre o universo da gestão ............................... 69

Capítulo III ......................................................................................................... 77

Discussão dos Resultados .............................................................................. 77

Personalismo, Pedagogia da Dialogicidade e Relações Interpessoais. ...... 77

3.1. As relações interpessoais em um contexto fenomenológico ........................ 78 3.2. Pedagogia da Dialogicidade: As contribuições de Paulo Freire ................... 82

3.3. Personalismo: Pessoa e Existência ............................................................. 86 3.4. Uma avaliação das relações interpessoais entre gestores e docentes a partir do Personalismo de Mounier .............................................................................. 98

Considerações Finais ....................................................................................... 102

BIBLIOGRAFIA ................................................................................................. 105

ANEXO A .......................................................................................................... 111 Apêndice A ........................................................................................................ 122

Page 18: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

18

Introdução

Em minha caminhada de 24 anos de profissional da educação básica e

ensino superior, na qual onde ora estou como docente ou gestora, ora como

docente e gestora tenho defrontado várias vezes com questionamentos sobre

determinadas situações de conflitos no contexto escolar.

Neste espaço o foco não é uma discordância de ideias, divergências de

pensamentos e/ou posicionamentos opostos e sim, de acordo com o prefácio do

livro Pedagogia do Oprimido de Paulo Freie, escrito por Fiori (1983) uma

condução à dominação de consciências.

Depois de ouvir vários relatos de gestores descontentes com docentes

que ―não ajudam a escola... não concordam com nada... não vestem a camisa...‖

ou docentes que afirmam: ―não adianta opinar, pois o que sempre permanece é

a visão do gestor e não a nossa... agora que é gestor o discurso muda... Quando

o diretor era nomeado isso não acontecia...‖ resolvi estudar de forma mais

aprofundada sobre o que acontece no contexto escolar.

Tratava-se também de buscar o que desencadeia no meu entendimento

uma situação de correlação de forças, de lutas de poder, por vezes nem sempre

legitimado nas unidades escolares, configurando desta forma uma situação em

sua maioria de dificuldade de ouvir e se fazer ouvir, de se aceitar e aceitar o

outro com as divergências constantes e os consensos viáveis e, sobretudo,

compreender como seres humanos que convivem em um mesmo espaço

educativo.

Em suma, a leitura de um espaço considerado cenário- apesar de

conturbado, propício a participação de todos, à possibilidade de cada pessoa,

individualmente e a todos coletivamente, ao crescimento da pessoa humana em

todos os aspectos: dignidade, atuação, criticidade, capacidade de decisão e

ação, devendo ser respeitada a individualidade e a sociabilidade.

A preocupação também envolve a dimensão político- organizacional, pois

a mudança de designação de administração para gestão implica em uma

Page 19: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

19

mudança de paradigma nas características de diversos níveis e segmentos. De

acordo com Santos ( 2008) em seu livro A Gestão Educacional e Escolar para a

Modernidade, desde que os administradores escolares passaram a serem vistos

como gestores, a escola demandou uma mudança na formação destes gestores,

na resolução dos problemas administrativos ou técnicos nas formas de gerir,

pois, essa ―nova escola‖ necessita de ―gestores mais dinâmicos, criativos e

capazes de interpretar as exigências de cada momento e de instaurar condições

mais adequadas de trabalho.‖ (SANTOS,2008,p.2)

A primeira característica desta mudança está em a escola passar a ser

vista como um espaço de mobilização e articulação do talento humano e

sinergia coletiva. Em linhas gerais, é caracterizada pelo reconhecimento da

importância da participação consciente, efetiva e esclarecida das pessoas nas

decisões sobre os rumos da ação educativa. É o fortalecimento da desejada

democratização dos processos pedagógicos, técnicos, administrativos e

relacionais. Diferentemente da política administrativa institucional que

estabelecia uma relação verticalizada e possuía uma forte influência dos

modelos de administração técnica-burocrática.

A segunda característica é a inclusão agora legitimada dos movimentos

sociais organizados. A partir da sintetização da frase de Tilman Evers (1984) em

seu livro Identidade: a face oculta dos movimentos sociais ―nós somos os novos

movimentos sociais‖ os teóricos envolvidos com os grupos de movimentos

sociais organizados Conforme Lopes (2007) passam a reconhecer essa

definição e se apropriam dela para efetivarem a participação dos movimentos

sociais em espaços que até o momento lhe eram negados. A escola. Muitos

desses movimentos em alguns casos estão diretamente ligados ao segmento

dos profissionais da educação e desta forma em constante reflexão-ação no que

concerne a gestão da escola e a contribuição de outros setores mobilizadores e

defensores de uma educação autônoma, livre, feita por homens e mulheres

felizes que conseguem em meio a tantas diversidades e situações-limites

desenvolver um projeto pessoal e coletivo.

Page 20: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

20

Já a terceira característica está relacionada com a autonomia constituinte

nos princípios da gestão. Barroso (1996) nos aponta para a mudança de

entendimento do espaço escolar. ―as escolas passam a ser vistas como espaço

de construção social. Valoriza-se o papel dos sujeitos e o contexto social e

histórico da sua ação.‖ (BARROSO, 1996, apud SCHNECKNBERG, 2007,p.15)

A designação gestão/gestor redireciona, partilha, comunga e socializa a

posição de poder nas unidades educativas. O poder na gestão é visto como algo

pertencente a todos, algo que se torna público e não privado/pessoal como ora

se apresentava no contexto da administração escolar.

Por fim a quarta característica desta mudança paradigmática, que por

sinal é o motivo desta pesquisa é que tendo em vista as inúmeras ações, os

inúmeros enfrentamentos que os movimentos dos profissionais da educação e

movimentos simpatizantes tiveram para consolidar esta mudança que não

aconteceu de forma rápida e pacífica, mas sim através de muitas lutas e de um

tempo longínquo que muitas vezes causou desânimo, desesperança, medo,

coação, perseguição, desrespeito e desgentificação1, fez surgir nas relações

interpessoais um mecanismo obstaculizante e heterônimo que impede a

construção de um projeto educativo sonhado e gestado por todos. Não

queremos dizer que antes do paradigma da gestão não havia problemas em

relação ao conviver humano nas instituições. Contudo precisamos entender que

as relações que antes se estabeleciam eram verticalizadas e a preocupação

com as relações das pessoas se dava no campo da austeridade e

predominância do poder personificado e opressor.

Com o advento da gestão a utopia transforma-se em realidade e a

possibilidade das pessoas serem autônomas, das decisões sobre o destino da

escola e suas implicações serem resolvidas por seus pares e segmentos em

relações não mais verticalizadas mais sim horizontais, aqueceu o coração e

impulsionou a todos a acreditarem no sonho.

1 Freire menciona a “desgentificação” ocasionada nos adolescentes que queimaram o índio Pataxó,

Galdino, no Distrito Federal, como um processo invertido à educação.

Page 21: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

21

Entretanto, cremos que envolvidos por demais nas caminhadas de lutas

deste movimento político-libertador, esquecemo-nos de preparar para aprender

a conviver com a nova realidade. Não nos preparamos para enfim... Para o

exercício do poder. O poder apresentado por Foucault (2008) que nas

instituições tem uma relação com a produção da verdade e as resistências que

suscita. Nada mudará a sociedade se os mecanismos de poder que funcionam

fora, abaixo e ao lado dos aparelhos de Estado a um nível muito mais elementar,

cotidiano, não forem modificados.

Precisamos agora desvincular a pessoa do eu totalitário e conviver com o

eu solidário, o eu no outro e o nós em todos. É algo inquietante e

fenomenologicamente desafiador, a história da educação tem na mudança

paradigmática de administração para gestão a oportunidade de viver uma

fenomenologia do ser humano, de entender o ser –para- si e o ser-no-mundo

(PONTY, 2006). É uma tarefa árdua, conflituosa e marcante, mas, sobretudo

necessária, pois servirá de instrumento de reflexão para aqueles que estão

envolvidos em instituições escolares, pois, as relações que se estabelecem

entre as pessoas não precisam e nem devem ser amorfas, desprovidas de

interesses e conflitos, mas acima de tudo devem se dar no campo do respeito,

da dignidade, da percepção e do percebido, da experiência e do experenciado,

da amizade e da fraternidade do ser ontologicamente relacional e principalmente

de uma relação que privilegie a vida e contraponha-se a qualquer ação de

violência que venha ferir os princípios dos direitos humanos. Contudo

percebemos que apesar de todo esse terreno fértil ainda há que se apropriar do

sonho, da utopia do respeito mútuo, do desejo da fraternidade consensual e da

convivência humana de diferentes pessoas com experiências diferentes.

Conforme Passos2 o que constitui a minha humanidade é o meu compromisso,

meu suor de tornar ético o que faço porque estou diante do desafio de escolher

um caminho não para mim individualmente.

2 Texto extraído da palestra proferida pelo Dr. Passos no Seminário de Jornalismo e Direito, promovido

pela Associação Mato-grossense de Magistrados (Amam), juntamente com o Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) e o Sindicato dos Jornalistas de Mato Grosso (Sindjor/MT), no período de 18 a 20/10/2005.

Page 22: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

22

O trabalho investigativo qualitativo de cunho fenomenológico apresenta-

se dividido em três capítulos distintos.

O primeiro capítulo apresenta um breve percurso pela história das teorias

administrativas e suas influências na administração e gestão escolar. Este

capítulo aborda três questões problematizadoras da pesquisa. Qual a diferença

existente entre os termos gestão e administração? O que levou os trabalhadores

da educação básica a lutar por uma gestão democrática nas escolas? E como

se estruturam as relações de poder no ambiente escolar? É um texto por

deveras político no sentido de elucidar a luta dos profissionais da educação

tanto a nível nacional como estadual pela gestão democrática da educação.

Nesse capítulo inicia-se a discussão da estruturação do poder nas relações

interpessoais e se reporta a Foucault para entender os domínios entre o ser-

poder e o poder-saber, apresentados nas instituições.

Compreende-se serem esses tópicos importantes e necessários para que

haja o entendimento sobre as fases pelas quais perpassam a discussão sobre

as relações interpessoais dos gestores e docentes no contexto escolar.

No segundo capítulo o método utilizado para o percurso metodológico é a

Fenomenologia que se baseou primeiramente nos estudos de Edmund Husserl.

Husserl após convívio com a Psicologia de Franz Bretano, apresenta a

sociedade da época uma fenomenologia com conceitos mais ampla preocupada

agora com o ser e os atos do ser, não mais através de investigações

simplesmente empíricas e modificações factuais estudadas pela Psicologia

(BELLO, 2004).

A fenomenologia husseriana pretende a partir desta mudança de visão

estudar a essência das coisas, como exemplo definir a essência da percepção,

da consciência e etc.

No segundo momento a interpretação metodológica continua neste fio

condutor da Fenomenologia, tendo relevantes, contribuições da Fenomenologia

merleaupontiana, através da obra Fenomenologia da Percepção (2006) em

contexto restrito do que Ponty explica como O ser-para-si e o ser-no-mundo se

faz presente através das avaliações dos docentes sobre as relações

Page 23: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

23

interpessoais com os gestores, as narrativas dos gestores sobre a práxis gestora

e todas as suas dimensões.

Este capítulo aborda a quarta problemática da pesquisa: Como a

comunidade escolar, gestores e docentes se reconhecem nas relações

interpessoais ocorridas no ambiente escolar?

O terceiro capítulo apresenta O personalismo de Emmanuel Mounier

como o principal marco de reflexão sobre a temática das relações interpessoais.

As contribuições de Freire com a pedagogia da Dialogicidade são de grande

importância nessa reflexão, pois nos alerta para os rumos que são traçados

quando há ausência do diálogo nas relações interpessoais.

Há um retorno também à discussão fenomenológica agora não como

método, mas como teoria, por entender que a fenomenologia nos apresenta

perspectivas de reflexão muito oportunas enquanto um estudo das essências, de

acordo com Ponty a fenomenologia é:

o estudo das essências e todos os problemas segundo ela

resumem-se em definir essências: a essência da percepção, a

essência da consciência, por exemplo. Mas a fenomenologia é

também uma fenomenologia que repõe as essências na

existência, e não pensa que se possa compreender o homem e o

mundo senão a partir de sua ―facticidade‖ (PONTY, 2006, p.1)

Freire e Mounier dialogam entre si neste capítulo com suas obras

clássicas, como: Pedagogia do Oprimido, da Esperança e da Autonomia

(FREIRE); o clássico Personalismo de Emmanuel Mounier e as leituras sobre a

obra de Mounier através de Peixoto e Severino com as obras Pessoa, Existência

e Educação e, Pessoa e Existência. Enfim, propõem-se concluir o capítulo com

uma avaliação das relações interpessoais através do Personalismo, tendo a

preocupação em identificar e possibilitar aos gestores e docentes das unidades

escolares um caminho para nos conhecer enquanto prósopon.

Ao final do trabalho como toda pesquisa fenomenológica não há como

finalizar ou concluir, pois para a fenomenologia as pesquisas não terminam em

Page 24: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

24

si e, portanto nos propomos a desobedecer às regras da gramática normativa e

não utilizar um ponto final no texto, tendo em vista de que não termina aqui,

sendo na verdade um texto sem fim... Parafraseando Freire um quefazer

constante.

Capítulo I

Da administração a gestão escolar

As transformações que vêm ocorrendo no mundo contemporâneo, em

consequência dos processos de globalização, que em se tratando de sistema

educacional conduzem à opressão do homem a uma educação da perversão,

afetando a sociedade e as relações que nela se estabelecem, exigem o exame

das condições objetivas destes impactos na educação brasileira, a fim de se

poderem perceber os desafios que elas nos apontam e os possíveis

encaminhamentos ou respostas para as políticas públicas, a administração da

educação, as políticas de formação de profissionais da educação e os

movimentos que subjazem os valores, comportamentos e atitudes construídos

historicamente.

As mudanças no mundo globalizado, em se tratando de sistema

educacional, conduzem à opressão do homem, como também a uma educação

da perversão, afetando a sociedade e as relações que nela se estabelecem.

As relações entre a administração da educação, as políticas de educação

e a formação de profissionais da área são de primeira grandeza.

A formação de profissionais para o exercício de uma prática competente

e reflexiva é uma exigência inquestionável, considerando- se a administração

como uma prática social de apoio à prática educativa, a política como uma

fixação de valores constituindo declarações operacionais e intencionais.

A historicização destas transformações aponta e destaca a importância da

capacidade de criação e ação humana coletiva na construção e reconstrução de

perspectivas intelectuais.

Page 25: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

25

Neste contexto que viabilizem a adoção de soluções políticas que

respondam efetivamente às necessidades sociais, objetivando a formação de

homens e mulheres íntegros, solidários, competentes, felizes, livres, humanos e

capazes de autogerir-se e compartilhar solidariamente da gestão dos destinos

da educação e da sociedade.

Desta forma, pretende-se tratar das relações interpessoais entre gestores e

docentes, expondo um pouco da história da organização institucional nas

unidades escolares e as influências das teorias administrativas, oriundas de um

contexto administrativo não educacional.

Apresenta-se também a importante organização do movimento sindical e social

dos profissionais da educação, no objetivo de romper com o modelo clássico de

administração capitalista e implantar um modelo democrático de gerir as

questões educacionais no seio da ação educativa. E por fim, observam-se as

manifestações de poder que se estruturaram nestas relações no ambiente

escolar após o advento da gestão democrática.

Já neste viés introdutório, contaremos com as contribuições de Freire e

Foucault servem de base para visualizar através de suas obras: Pedagogia da

Autonomia, Pedagogia do Oprimido e Microfísica do Poder, algumas

particularidades relativas à tentativa de uma prática autônoma que luta contra o

poder hegemônico de uma sociedade organizacional mecanicista, materialista,

individual, liberal e a questão do poder nas sociedades capitalistas.

Percorrer o caminho que norteia e configura a cidadania de seus atores,

conduz o individuo (o sujeito?) a analisar, refletir, questionar e compreender o

histórico em que se envolvem os profissionais da educação e principalmente a

maneira como reagem uns com os outros e como se reconhecem quando se

deparam em posições diferenciadas de poder.

É, no âmbito da gestão democrática, que se apresenta tensiva em uma

sociedade cuja democracia é de ―baixa intensidade‖ que se podem compreender

as grandes dificuldades e conflitos de estabelecer relações interpessoais,

circunscritas às relações de ordem profissional, no âmbito deste sistema.

Page 26: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

26

1.1. Da administração e gestão.

A Administração Escolar tem sido mais administração do que

escolar (no sentido em que se centrou mais na administração do

sistema do que no estudo da escola e mais nas teorias gerais da

administração), tal como a organização escolar se revelou mais

sinônimo de macro organização, isto é, de organização do

sistema escolar, do que de escola como organização (LIMA, 1996,

p.26)

Há uma diferença significativa entre o termo Administrador e Gestor?

Teríamos neste momento de reflexão semântica um caso de sinônimos, ou

palavras totalmente diferentes?

Para refletir sobre o conceito de gestão e entender a sua aplicabilidade,

necessariamente tornar-se necessário entender historicamente o conceito de

administração. Este conceito passa pelo entendimento das teorias de

administração geral.

A partir da análise do conceito de administração, percebe-se que a teoria

administrativa do século XX desenvolveu-se através de três escolas: a clássica,

a psicossocial e a contemporânea.

A escola clássica teve seu ápice na consolidação da Revolução Industrial

no início do século XX. Alguns historiadores, entre eles Hora (1994, p 36-38)

apresentam esta escola em três movimentos distintos, a saber: a administração

cientifica de Taylor, a administração geral de Fayol e a administração burocrática

de Weber. Esses movimentos mantêm seus princípios e valores, que se

difundem nas práticas e discursos, até os dias atuais.

A Administração cientifica evidencia claramente as intenções capitalistas

da administração quando têm em seu bojo a preocupação da maximização do

controle e a racionalização do trabalho (TAYLOR, 1911 apud HORA, 1994, p.36).

Em sua teoria administrativa Taylor procurou dar ênfase, racionalidade e

eficiência ao controle do trabalho. Taylor fez da eficiência o modus operandi da

indústria americana e a virtude central da cultura desse país. Ele teve

provavelmente mais influência que qualquer outro indivíduo sobre a vida pública

Page 27: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

27

e privada de homens e mulheres no século XX. As ideias de Taylor partiram da

fábrica, mas acabaram por penetrar obsessivamente em todos os aspectos do

século.

Como passo primordial propôs a criação de uma ―ciência da

administração‖. Observando o que ocorria na fábrica do início do século- aquele

ambiente chapliniano expresso no filme ―Tempos Modernos‖ -, e, ele teve o

discernimento decisivo: é possível aplicar o conhecimento ao trabalho. É

possível aperfeiçoar a produção descobrindo e prescrevendo a maneira certa de

fazer as coisas, para atingir o máximo em eficiência. Pode parecer banal, mas

revelou-se explosivamente inovador. Naquela época não havia nenhum

pensamento por detrás do ato de trabalhar. Trabalho era ação pura. Não havia

metodologia, só ―o quê‖, não ―como‖.

O Taylorismo é o germe de todas as propostas posteriores para formatar

racionalmente o ato de se produzir qualquer coisa. Gerar resultados por

intermédio de pessoas, gerir.

Desta forma criou-se um modelo diferente de organização, pois no seu

entender havia a necessidade da existência de um trabalhador que fosse

responsável pelo planejamento e controle de todas as atividades: (alguém que

pensasse) surge a figura do administrador, que sem dúvida alguma aparece

para garantir a hegemonia econômica ao capitalista e consequentemente maior

poder sobre a classe trabalhadora que não possuía conhecimento de

planejamento, controle e administração.

Taylor era ambivalente em relação ao papel das pessoas, e parte do fascínio

e da polêmica das suas ideias vem daí. Ele via a função do administrador como

claramente separada da função do trabalhador. O trabalhador faz, o

administrador pensa e planeja. O administrador descobre e especifica; o

trabalhador executa, e só. O executor, sendo passivo no processo, tinha de se

submeter ao sistema. O importante era o sistema e não o homem. Paro (1990,

p.65) tenta explicar esta análise afirmando:

Embora com matizes variadas, que servem para encobrir suas reais dimensões e visam a tender as necessidades de

Page 28: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

28

justificação ideológica do momento, a gerência enquanto controle do trabalho alheio, através da apropriação do saber e do cerceamento da vontade do trabalhador, encontra-se permanentemente presente na teoria e na prática da administração em nossa sociedade, perpassando as diferentes, ―escolas‖ e ―correntes‖ da administração neste século.

Historicamente, tanto o Taylorismo quanto a Administração Científica foram

muito criticados. Vários teóricos acusam Taylor de tentar imprimir às pessoas a

mesma precisão e regularidade das máquinas (visão mecanicista).

Para muitos Taylor analisou o homem apenas em sua individualidade,

desconsiderando o papel importante que as relações humanas desempenham

na melhoria dos processos produtivos (visão atomizada do homem). Sua Teoria

de Administração Científica para nós hoje nos parece absurda, acostumados ao

discurso ―participativo/não hierárquico/sem camadas‖ predominante na gestão

atual.

Apesar das críticas a ideia taylorista revelou outras dimensões que

acabaram por se complementar numa prática concreta. A sua principal

característica ocorre de um fato simples: ela funciona. Da concepção de

operação do Mc Donald‘s ao advogado que contabiliza cada centavo do tempo

que dedica a cada cliente, da universidade ao estádio de futebol, do hospital ao

partido político, das igrejas às organizações não governamentais, o taylorismo é

algo profundamente cristalizado e engessado na nossa maneira não só de gerir,

mas de viver.

Em suma podemos destacar que apesar das críticas ao Taylorismo e à

Administração Científica as ideias de Taylor não podem ser desconsideradas.

Taylor insistia que os administradores deviam analisar planejar e controlar ―a

melhor forma de operar‖, a ênfase na organização racional do trabalho, a

apelação aos planos de incentivos salariais e de premiações de produção para

os trabalhadores conforme tempo-padrão3

3 “A Gestão de A a Z” de Robert Heller, citado por Revista Exame de 24 de Setembro de 1997, editora

Abril, no artigo: Os princípios da gestão científica.

Page 29: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

29

Em um segundo movimento tem sua contribuição na teoria de Henry Fayol

(1994 apud HORA) o qual também teve como seu companheiro Taylor a

preocupação maior em criar uma Ciência da Administração.

Fayol ainda tendo como cenário a administração pensada a partir da

realidade interna da empresa (concebida esta até os anos 40 enquanto sistema

fechado e verticalizado onde a primazia era dada à hierarquia, à imposição de

regras e disciplinas rígidas), procura identificar os princípios básicos para a

divisão do trabalho:

...autoridade, disciplina, unidade de comando, unidade de direção, subordinação de interesses individuais aos interesses gerais, remuneração, centralização, hierarquia, ordem, equidade, estabilidade no quadro de pessoal, iniciativa, espírito de solidariedade e lealdade que constituem um dos modelos da estrutura capitalista. (HORA, 1994, p.37)

Percebe-se, assim, que Fayol define em seu estudo as funções essenciais

da administração: prever, organizar, comandar, coordenar e controlar.

No terceiro movimento surge a ideia de uma administração burocrática

originada de uma disfunção da racionalidade Weberiana: este movimento

intensifica o discurso da racionalidade tendo como foco a relação dicotômica

entre planejamento e execução, trabalho manual e intelectual.

Desta forma há a intensificação e dominação do capital sobre o trabalho.

Termos como eficiência surgem para elucidar a escravização dos serviços

realizados pela classe trabalhadora, a qual não se enquadrava nos níveis

intelectuais da época.

Sander (1982, p.11) explica que: ―... é eficiente aquele que produz o

máximo com o mínimo de desperdício de custo e de esforço, ou seja, aquele

que na sua atuação apresenta uma elevada relação produto/insumo.‖

Em síntese, para a Escola Clássica de Administração, o conceito de

organização remete para o estudo das atividades que são realizados para se

conseguir objetivos estabelecidos, ou seja, a existência de uma administração

eficiente. ―Nessa perspectiva a organização é caracterizada como um sistema

fechado, mecânico e racional, no qual a mediação administrativa se apoia

primordialmente no conceito de eficiência‖. (SANDER, op.cit.)

Page 30: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

30

Percebe-se que os estudos realizados durante esse período, detinham a

preocupação com o ―chão interno‖ da empresa, ou seja, os questionamentos e

abordagens restringiam-se a aspectos quantitativos, gerenciais, burocráticos e

normativos. Todavia, os conflitos começam a surgir de forma externa, com a

expansão do mercado, o acúmulo de mercadorias (excedente de produção) e

escassez da procura. Internamente, surgem os conflitos no bojo da própria

classe detentora do mercado (a burguesia) e, consequentemente, as lutas de

classes entre empregadores, empregados/as e sindicatos.

As décadas de 50 e 60 foram marcadas pelo processo de mudança na

economia, o surgimento do mercado internacional, ou seja, da

internacionalização, com o advento das empresas transnacionais e, ao mesmo

tempo, a inter-relação das organizações de todos os tipos, exigindo cada vez

mais uma atividade diferenciada e especifica de todas as estruturas

organizacionais existentes.

Não há mais espaço no mercado para uma visão estreita de

administração; há de se pensar em algo mais abrangente, olhar para o alto,

analisar comportamentos, há de se manter acesa a chama da solidariedade e

comprometimento, propiciando uma relação mais humana. Afinal, os conceitos

de eficiência e eficácia não se mantêm firmes sem um processo de

harmonização administrativa e coletiva.

Conforme Hora (1994), para contrapor esse período da ―eficiência‖ e

―controle‖ na economia implantada pela escola clássica, surge à escola

psicossocial tendo como contribuição a Teoria das Relações Humanas com

Belloto em 1999. Destacam-se nesta escola os teóricos Elton Mayo (1880-1949)

e Kurt Lewin (1890-1947).

Essa teoria das Relações Humanas acrescenta à Teoria Administrativa o

aspecto da integração social, a preocupação com o individuo no seu setor de

trabalho, o envolvimento e o compromisso dos empregados com a empresa, o

fator psicológico e social. Nela ao contrário da prática Taylorista não há a

pretensão de recompensar os trabalhadores com premiações materiais

Page 31: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

31

conforme a sua produtividade e sim inclui práticas de ―recompensas‖ com

aspectos altruístas.

A partir da observação da teoria administrativa da Escola Clássica percebe-

se que os estudos realizados durante este período, detinham a preocupação

com o ―chão interno‖ da empresa.

Talvez seja prudente afirmar que a Escola Psicossocial esteve embasada

numa teoria que se constituía pelo estudo da motivação das pessoas,

compreendendo que o seu comportamento é deduzido de normas. (idem).

Historicamente, acredita-se que independente da instituição os conflitos

existem e são em sua maioria necessários. Alguém disse um dia que é nos

momentos de crise que se cresce. A questão é como os conflitos são

administrados nas organizações?

Neste sentido, temos certo avanço com essa escola, pois a mesma vê o

conflito como uma possibilidade de negociação e alianças entre grupos. Este

avanço ainda é mínimo, pois continua insistindo na manutenção da ordem e do

status quo, no equilíbrio, na integração, enfim a se preocupar com uma política

administrativa em função dos objetivos e da economia eficiente e eficaz

intrínsecas na sociedade vigente.

Para a terceira escola defendida por Hora (1994) como Escola

Contemporânea, o objetivo central era desenvolver uma política administrativa

voltada para à resolução de problemas, o que, na verdade supõe um

compromisso político e social com as necessidades pertinentes à comunidade.

Nesta escola efetivamente pretende-se romper com os limites impostos

pela politica da administração eficiente e eficaz, comprometida e associada ao

conceito de produtividade, ―se refere a objetivos mais amplos de equidade e

desenvolvimento econômico social‖. (HORA, 1994, p. 42).

Sander denomina esta escola como a administração efetiva e assim a

concebe:

...a administração efetiva é uma derivação conceitual de um conjunto de teorias contemporâneas de administração e uma indução analítica de distintas experiências pratica na administração publica e na gestão da educação durante as décadas posteriores a Segunda Guerra Mundial. Suas principais

Page 32: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

32

contribuições vêm da administração para o desenvolvimento, da ecologia administrativa, da teoria da contingência, do desenvolvimento institucional e de outras perspectivas alternativas. (SANDER,1982, p.10)

Os teóricos da Escola Contemporânea têm como critério de desempenho a

efetividade, o mesmo é usado para solucionar os problemas encontrando a

resposta certa e almejada pelos membros da comunidade. Esta escola está

preocupada primordialmente com o desenvolvimento socioeconômico e a

melhoria das relações humanas em seus ambientes externos e internos.

As décadas de 70 e 80 denominadas por alguns como; ―Os Anos

Dourados‖ na música, arte, cultura, não foi diferente na política. No Brasil o

movimento estudantil representado pelas suas entidades legalmente

constituídas como, UBES, UNE e outros; o Tropicalismo, as reivindicações

trabalhistas através dos sindicatos e associações exigiam dos governos uma

transparência administrativa, maior participação popular e abertura de mercado,

estabilidade econômica e uma política menos segregacionista.

Estes movimentos sem duvida alguma foram um estopim no mundo

inteiro, interferindo nas relações econômicas e políticas a nível internacional,

começam a surgir questionamentos que promulgaram novas perspectivas

teóricas no âmbito da administração. Com base na Filosofia e Antropologia

surgem teorias administrativas criticas que revisitam o conceito de administração

questionando os critérios de eficiência, eficácia e efetividade.

Com este cunho filosófico e antropológico a administração passa a

preocupar-se com a qualidade de vida dos participantes e de suas concepções.

A preocupação com o fator humano é extremamente importante neste momento,

pois é com a valorização das pessoas que as teorias críticas de administração

perdem substancialmente seu teor técnico, burocrático, funcional e rígido e, que

apresentam características da Gestão da Qualidade Total que tem uma

obsessão pela avaliação e qualidade dos serviços.

Percebe-se a partir deste pequeno esboço sobre as escolas

administrativas e seus precursores que o contexto administrativo de nossas

Page 33: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

33

unidades escolares seguiu e ainda em sua maioria seguem a risca seus

ensinamentos.

Até agora vimos fatos importantes que marcaram a história da

administração, seu conceito, seus principais ícones, porem tentamos descobrir

nesta mesma historia onde começa a Gestão e o porquê deste novo elemento

conceitual.

O termo ou tema gestão escolar têm sido cada vez mais objeto de olhares

teóricos. É preciso entender antes de tudo que como que faz o objeto é o olhar,

delimitando-se de onde se fala e, sobretudo que viés se define o(s) conceito e

sentidos construídos estarão evidentemente apresentando visões que

respaldam a preocupação em diferenciar gestão de administração em seus

aspectos teórico-práticos.

No estudo sobre Gestão, algumas literaturas são conflitantes no sentido da

explicação de uma definição conceitual, pois os próprios teóricos e estudiosos

da Administração Escolar entendem que não há a necessidade ou ate mesmo a

importância em conceituar ou definir o que venha ser o termo gestão, haja vista

que o mesmo está intrínseco na discussão teórico-conceitual no campo da

administração educacional.

Para elucidar esta discussão Machado e Ferreira, apud Barroso 1995

concluem que a distinção entre gestão e direção/administração estaria dada pela

predominância do sentido político da segunda, ―selecionando valores e

orientações‖, e pela predominância técnica da primeira, ―exigindo, sobretudo

capacidade de organização e de implementação‖.

Percebe-se um contexto sócio histórico que se caracteriza por um

processo evolutivo de mudanças e transformações cada vez mais velozes.

Nossa sociedade é marcada por rótulos que ao entender converge para a

mesma ideia. Souza (2005) resume esta convergência em três termos: Scaff

(1990) denomina a sociedade contemporânea de sociedade Informática. Lévy

(1996-1999) criou a chamada ―cybercultura‖ e Lyotard (1998) após estudos

afirmar perceber a realidade atual como, ―pós-modernidade‖.

Page 34: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

34

Entende-se que independente do rótulo é incontestável a afirmação de

que os tempos são outros e, portanto, são momentos de surgimento de novos

conceitos e práticas. Toda prática administrativa escolar exercida durante anos

foi sem dúvida, produto da sociedade industrial. Contudo esta já está em

desuso. Já há algumas décadas estamos vivendo a transição para a sociedade

da informação, uma realidade pós-moderna, composta por atividades

administrativas horizontais, numa rede de relações, segundo (CASTELLS, apud

SOUZA, 2005). É a sociedade dita pós-industrial segundo Touraine (1970).

Nesta nova fase da história não há mais espaço para o diretor-administrador,

este cede lugar ao diretor-gestor.

Quando o discurso evolutivo é utilizado para explicar esses novos

conceitos e práticas, saímos de um mundo onde as grandes verdades eram

absolutistas e entramos em uma sociedade onde nada acontece mais a médio e

longo prazo.

Nóvoa (1999) afirma que o tempo da pós-modernidade é o atual, o aqui e

o agora. Sendo assim não há mais prática administrativa inquestionável,

baseada em verdade absoluta, numa linha verticalizada, há sim inúmeras

incertezas contextuais, o que perfaz o surgimento de um profissional pós-

moderno, aberto, reflexivo, crítico (e aí surge o diretor-gestor) que pensa, age e

executa coletivamente em um dinâmico processo em curto prazo.

Este tempo novo é o tempo da troca do saber e fazer individual para o

saber e fazer juntos. Não é mais possível administrar com verdades eternizadas.

É preciso gestar uma escola onde as decisões e a s atitudes passem a ser

tomadas de forma horizontal.

Na gestão os princípios Fayolistas de divisão de trabalho, de necessidade

da autoridade e da responsabilidade (ordens dadas/ordens/executadas),

unidades de comando e presença da centralização são postos em cheque. A

prática gestora sofre uma mudança radical ao jogar por terra este princípios da

sociedade industrial. As implicações para o exercício da gestão são claras em se

apresentarem como:

Page 35: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

35

-O trabalho dos gestores e docentes deve ser feitos em atividades

coletivas para que não se perca a noção do todo;

-Tanto gestores quanto docentes devem compartilhar a autoridade e a

responsabilidade, pois desta forma aumenta o compromisso coletivo

desmistificando a supremacia do poder individual.

A descentralização do poder faz com que o comando não parta do cume

da pirâmide mais sim do conjunto dos seres que se relacionam de maneira

criativa e organizativa, de papéis e funções que se configuram conforme as

necessidades.

Finalmente na descentralização de poder há a dessacralização da

hierarquia e do comando (hierarquia do grego hierós ‗sagrado‘ e ‗comando e

autoridade‘ do grego arkhê), compreendendo a ordem antes tão dura, fria e

rígida nos modelos industriais sendo complementada pela desordem, não sendo

entendido como uma total ausência da ordem, mas como outra possibilidade de

ordenamento nunca antes aceito pela burocracia tecnocrática da administração.

1.2. Os profissionais da educação e a luta pela gestão democrática da educação escolar no Brasil

Tudo o que a gente puder fazer no sentido de convocar os que vivem em

torno da escola, e dentro da escola, no sentido de participarem, de

tomarem um pouco do destino da escola na mão, também. Tudo o que a

gente puder fazer nesse sentido é pouco ainda, considerando o trabalho

imenso que se põe diante de nós que é o de assumir esse país

democraticamente. Paulo Freire

O subtítulo acima não tem a pretensão de aprofundar-se na história da

Gestão Democrática da educação em nível nacional. Até porque não é o foco

deste trabalho discutir de maneira pontual o sistema de organizacional de

ensino. Sendo assim o texto tem o objetivo somente de situar o assunto no

universo do cotidiano escolar.

Page 36: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

36

De acordo com (BORDIGNON, 2005, p.3) ―a partir dos anos 20, através

de Anísio Teixeira, Fernando de Azevedo, Lourenço Filho, entre outros

educadores inspiraram o movimento dos Pioneiros da Educação Nova.‖ Esse

manifesto possibilitou que alguns educadores progressistas viessem a

participar da comissão constituinte de 34.

Esse acontecimento originou a semente que deu início a gestão

democrática na Constituição de 34, onde pela primeira vez a educação é

organizada concebendo-se como um projeto de cidadania, através de sistemas

de ensino, administrados por representantes de docentes.

Muito tempo se passou exatamente cinquenta e quatro anos depois essa

semente veio a brotar e frutificar de fato.

em um movimento organizado por educadores, no fórum de

Defesa da Educação Pública, que garantiu, na Constituição de

1988, a afirmação do princípio da ‗gestão democrática‘ do ensino

público, na forma da lei (art.206,incisoVI). (BORDIGNON, 2005,

p.4)

Tendo em vista que a gestão democrática possui princípio precípuo da

participação da sociedade, a constituição estendeu aos municípios o direito de

organizar, também seus sistemas de ensino, com autonomia (grifo nosso) e em

regime de colaboração entre si, com os estados e com a União (art.211).

Para os educadores brasileiros isso representou um avanço significativo,

pois, se podemos assim dizer a legislação brasileira a partir da Constituição de

88 passa a promulgar através de dispositivos constitucionais que a educação

escolar no Brasil é (BORDIGNON, 2005,p.4) emancipatória, com fundamento no

exercício da cidadania.

Situar a educação emancipatória como marco teórico da gestão

democrática da educação é a confirmação da presença de um dos anseios dos

profissionais da educação em relação ao efetivo exercício da cidadania. Muitos

profissionais da educação anônimos participaram dessa luta iniciada na década

Page 37: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

37

de 20, com a certeza de que a educação precisava ter presente o ser sujeito no

coletivo e a ação social que se realiza entre esses sujeitos, essa práxis nos

remete aos conceitos freireanos de autonomia e alienação.

Educadores como Anísio Teixeira, Paulo Freire e outros proclamavam em

suas obras e em suas vidas acadêmicas que o grande desafio da educação

emancipadora é o exercício efetivo da cidadania, ação essa que pressupõe

autonomia não somente aos sujeitos, mas as instituições e combate de forma

radical a alienação.

Para esses educadores, educação emancipadora e gestão democrática

são indissociáveis. É através dela que todos os sujeitos envolvidos direta e

indiretamente, podem participar, organizar, propor, se envolverem no coletivo e

propiciarem assim uma relação dialógica. De acordo com Bordignon:

O princípio da ―gestão democrática do ensino público‖ ganhou

status de norma constitucional (art206, inciso VI) graças a uma

paciente e persistente luta dos educadores para tornar efetivo o

fundamento, também constitucional, da educação como exercício

da cidadania o que, por sua vez, fundamenta nosso projeto de

sociedade democrática. Ou seja: a gestão democrática das

instituições educacionais é colocada como fundamento, condição

essencial, da qualidade social da educação, da formação da

cidadania como (e pelo) exercício de poder social. (2005, p.31).

Esse grande desafio que teve e ainda tem nos profissionais da educação,

um grande percurso a seguir no sentido de estabelecer definitivamente a quebra

do paradigma que se fundamenta até hoje nos colégios jesuíticos que tinham

uma prática de exclusão e seleção, onde só havia espaço para os ‗obedientes‘.

Ainda bem que contra essa tendência secular existem homens e

mulheres firmes no propósito de juntos rebelarem-se e juntas conquistarem a

participação de todos nas decisões e avaliações das políticas educacionais, de

romperem com as práticas autoritárias, hierárquicas e clientelistas, de

resguardarem a representação legítima de todos os segmentos e de

Page 38: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

38

democratizar a administração do sistema de ensino. Só assim alcançaremos os

princípios fins da democracia escolar: autonomia, desalienação e maioridade

política.

1.3. Os profissionais da educação e a luta pela gestão democrática em Mato Grosso.

É preciso e até urgente que a escola vá se tornando em espaço

escolar acolhedor e multiplicador de certos gostos democráticos

como o de ouvir os outros, não por puro favor, mas por dever, o de

respeitá-los, o da tolerância, o do acatamento às decisões tomadas

pela maioria a que não falte, contudo o direito de quem diverge de

exprimir sua contrariedade. Paulo Freire 1995

À medida que se aproxima o terceiro milênio, acelera-se o processo de

globalização da sociedade e integração das economias. O mundo moderno da

sociedade da informação, cada vez mais competitiva, tem nas condições de

cidadania e na qualidade de vida as principais diferenças entre as nações. A

educação, prioridade estratégica no contexto do Plano de Metas, reveste-se do

mesmo caráter histórico, dinâmico e situacional que caracteriza a vida. A

formação do homem e o desenvolvimento da sociedade são, portanto, tarefa

fundamental da educação (Plano de Metas da Frente Cidadania e

Desenvolvimento, 1995, p.3)

Os dados aqui apresentados pertencem ao período de 1995 à 2003, em

que o Estado de MT, fora governado pelo Ex-Senador da República, Dante

Martins de Oliveira.

O governo antecessor a Dante é marcado por muitas lutas entre

movimentos civis organizados e os interesses governistas. O governo era

presidido por Jaime Campos, político conhecido nos cenários federal e estadual

e membro da família que comandou o Estado de MT por mais de duas décadas.

Page 39: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

39

Em seu governo, Jaime destituiu a Lei da Gestão Democrática e passou

a nomear os diretores das escolas públicas conforme interesses e acordos

políticos implantou uma política de arrocho salarial, chegando a fazer com que

os salários dos profissionais da educação chegassem a uma perda de até 70%

do seu valor de compra.

Com a possibilidade de uma candidatura popular formada por um grupo

de partidos políticos, denominada ―Frente Cidadania e Desenvolvimento‖,

surgem à esperança que o processo de democratização da escola pública fosse

retomado e consolidado.

No início do mandato de Dante de Oliveira os órgãos públicos, e dentre

eles a educação, sofreram um grande golpe que foi a demissão de mais de

5.000 (cinco mil) funcionários não estáveis, com a justificativa de se adaptar e

enquadrar na Lei de Responsabilidade Fiscal, também conhecida como Lei Rita

Camata.

Em sua redação a Lei é clara em exigir a punição dos governantes que

gastarem acima de 60% dos recursos com a folha de pagamento de pessoal.

Como se isso não bastasse, o governo que antes era conhecido como

democrático popular; devido a sua participação em um dos maiores movimentos

popular comandado pela elite intelectual brasileira intitulada ―Direta, Já!‖, se

apresentava, efetivamente, como mais um governo que não seria diferente dos

demais, a não ser pelo discurso menos ofensivo a categoria.

Em contrapartida toda essa decepção influenciou a união da força sindical

representada até hoje pelo SINTEP, ao qual pertencia como militante naquele

período. Graças à participação efetiva dos trabalhadores da educação através

do sindicato, as discussões sobre a Gestão Democrática foram retomadas.

Foram momentos difíceis, como são todos aqueles em que a luta contra

opressão faz ressurgir no oprimido o desejo de libertação. Freire em seus

inúmeros inscritos reconhece que ao fazer parte destes momentos difíceis, o

povo, o trabalhador, o oprimido se reconhecem como sujeito de conhecimento.

Atrevemo-nos a dizer aqui que a participação nos fóruns de debates

acirrados com o governo, nas passeatas, nos movimentos grevistas, nos gritos

Page 40: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

40

dos excluídos, os trabalhadores em sua maioria esmagadora fizeram aquilo que

Fiori (1995) através da pedagogia da libertação intitulou de Aprender a dizer a

sua palavra.

Freire também utiliza em sua obra Pedagogia do Oprimido (1983) a

necessidade do trabalhador em aprender a dizer a sua palavra, para que com

ela, ele se constitua em uma pessoa construtora, livre das amarras do sistema

opressor, que supõe um compromisso dinâmico que não pode parar na

interpretação da história, mas que impulsiona à ação transformadora desta

mesma história. (FIORI, 1995).

Após vários enfrentamentos dos movimentos organizados com o governo

ao longo de um período de tentativas de sabotagem e concomitante a isso por

vários momentos de deliberações coletivas e organizadas, chega-se a uma

proposta única de Gestão Democrática que tinha a pretensão de ser o desejo de

toda a população mato-grossense, pois ―O ensino ainda é considerado em

nosso país como privilégio social (FERNANDES, 1989)

Em face das lutas ocorridas neste cenário de embate ideológico, a

democratização do ensino implantada em MT, através do Decreto Lei nº 740 de

29/12/1995, que instituiu a Gestão Democrática Escolar no âmbito do poder

executivo do Estado. Está longe de ser a gestão sonhada, idealizada e

reivindicada pela categoria, contudo já possui alguns substanciais avanços. Na

utopia, espera-se que a

...educação prepare os indivíduos para o exercício da cidadania plena, ajudando-os a exercer seus direitos associados as responsabilidade e deveres de todo o cidadão consciente e crítico, portanto, socializando na realização da ação comum, e ao mesmo tempo oferecendo a todos a oportunidade de realizar seu potencial. ( D‘AMBRÓSIO, 1999, p.22 )

As propostas dos elaboradores do Plano de Metas-MT (PM-MT)

1995/2006, basearam-se na reformulação dos conteúdos educacionais, na

reestruturação das ideias pedagógicas e na valorização dos profissionais da

educação.

É importante que os currículos escolares superem a arrogância e

a prepotência do conhecimento pronto, terminado, sobre a

Page 41: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

41

inteligência e a criatividade, característica de nossa espécie como

um todo e em permanente aprimoramento e agudez. (SEDUC-

MT, apud, UBIRATAN D´AMBRÓSIO, 1999, p.45)

Com essa abordagem o PM-MT 1995/2006 tenta apresentar à sociedade

a educação enquanto que um dos principais pilares que sustentam o conjunto

das políticas delineadas pelo governo e que exige de nós novas formas de

comportamento não conhecidas, senão em teoria: criatividade, ousadia,

desprendimento, rebeldia e paixão de acordo com Maldonado4 (1994).

Para a educação o Plano de Metas da Frente Cidadania (PM—FCD) tinha

como compromisso traçar um perfil de como estava à educação de Mato Grosso

e propor possíveis soluções. Após esta avaliação, constatou-se que não havia

surpresas para os profissionais da Educação e sindicalistas, que há longas

datas denunciavam as condições que se apresentavam péssimas na educação

mato-grossense.

Entretanto, até por questões óbvias ao governo coube todos os méritos

em apresentar de forma sensacionalista e demagógica para a sociedade os

entraves que obstaculizavam a mudança de um modelo de educação

discriminadora e excludente para um modelo de educação igualitária,

transformadora, inclusiva, participativa e dinâmica, quando efetivamente esta

condição de crise derivava da própria violência do Estado.

Aparentemente o governo desnuda para sociedade civil e organizada

todas as mazelas existentes e assume publicamente a vontade e o compromisso

em romper com as aparências e resgatar de uma vez por todas o valor da

palavra, o compromisso do discurso, o comprometimento com as massas,

conforme Freire (1996), a ação não pode esgotar-se no ativismo, nem na

reflexão desvinculada da atividade humana, que se apresenta, como síntese, na

práxis.

4 Carlos Alberto Reys Maldonado, na época secretário de Estado de Mato Grosso em uma entrevista cedida

à Tv Centro América.

Page 42: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

42

Reorganizar o Sistema de Educação do estado de Mato Grosso, colocando como foco referencial de suas ações a unidade escolar [...] Promover política de profissionalização docente que estabeleça uma relação madura de responsabilidade e direitos. [...] Instituir um programa de avaliação institucional, interna e externa, que subsidie as necessidades de intervenção e eventuais redirecionamentos de Gestão, o acompanhamento permanente da execução da política educacional e instrumentalize a prestação de contas sistemática à sociedade. (PM-MT, 1995, p.17)

Sob olhares e opiniões divergentes em relação a este governo ―tão

democrático, participativo e envolvido com as reivindicações dos movimentos

sócio educacionais‖, a sociedade educacional resolve dar crédito, afinal este

governo surgiu em um momento de convivência com seus pares, concordando

ou não, com sua forma de apresentar à sociedade a estrutura governamental do

Estado e seus pilares, admite-se que as propostas são boas, pois refletiam as

demandas da população e dos trabalhadores da educação, e o quadro

apresentando era verdadeiro.

A educação encontrava-se sucateada devido a total ausência do poder

público, com seus discursos vazios, práticas arcaicas e medíocres e medidas

simplistas e apolíticas, e os desvio de recursos que sempre foram e continuam

sendo realizados em nome da Educação.

Toda essa situação que por anos vinha se arrastando – e continua! -

contribuiu para ―desprofissionalização‖ dos profissionais da educação, para o

descontentamento dos docentes com as propostas pedagógicas que divergiam

de suas necessidades e especificidades e com o desrespeito com nossas

crianças, jovens e adultos, proporcionando um ambiente de competição e

dominação.

Deixar para trás o autoritarismo, as regras sem sentido, a burocracia, a

forma engessada de organização curricular e os modos de avaliação excludente

era o principal objetivo dos movimentos sociais e educacionais naquele

momento, e os desejos e demandas dos profissionais dos trabalhadores se

manteriam, por justiça, e muitas vezes, apesar do governo.

Page 43: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

43

1.4. A estruturação de poder nas relações interpessoais ocorridas no ambiente escolar

“Os membros de equipes eficientes reconhecem as dificuldades e apoiam uns aos outros‖. Todos compartilham qualquer reconhecimento que a equipe recebe de fontes externas. Todos têm um senso de auto-realização ―(WEISS, 1994, p.34)

Segundo Débora Dias Gomes (1994), a riqueza de uma boa gestão está

na promoção de trabalhos em equipe baseados na confiança, respeito mútuo,

cooperação, co-criação e comunicação. Atualmente, é ampla a compreensão de

que o trabalho de um indivíduo será humanizador, quando integrado nas

atividades cooperativas de um grupo. Resultado de certo equilíbrio entre

autoafirmação e a o sentido de corpo, que promove a integração de todos com

todos.

Este conceito promove o esforço da máxima interação de membros e

ações convergindo para busca de soluções plausíveis. É a integração e a co-

criação na cultura da participação, proporcionando um clima de confiança e

respeito mútuo, nos trabalhos colaborativos e solidários.

Entende-se, portanto, que a força do trabalho, em uma gestão

participativa está no trabalho de todos os membros que interagem no processo,

logo deve tecer consensos na empatia e afetividade. Para tanto é necessário

que haja, no caso da instituição escolar, a busca conjunta da unidade na

diversidade no interior da escola, mediante organização técnico-pedagógica, na

qual os gestores, coordenação pedagógica e principalmente trabalhadores da

educação, operem juntos nas mais variadas áreas ou funções do projeto

educativo.

Ao se fazer uma análise na estrutura escolar atual. Dalmás (1994)

constata a existência de três tipos de gestores: o tradicional, o burocrático, o

participativo entre outros. Segundo Dalmás, o gestor tradicional entende a

escola como se fosse um feudo e os profissionais como se fossem os vassalos.

Algo muito parecido com o que é denunciado no livro Pedagogia do Oprimido

(1983) de Paulo Freire quando aponta a opressão existente entre a classe

Page 44: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

44

burguesa dominante (opressores) e a classe dos trabalhadores/dominados

(oprimidos) que se enfrentam em todos os espaços da sociedade, e de modo

particular, nas redes públicas de educação.

Um gestor tradicional e/ou burocrático que possui este tipo de concepção

acaba por coibir na escola toda e qualquer iniciativa de parceria, união, trabalho

em grupo, afetividade e respeito mútuo. Este tipo de atitude favorece o

surgimento nas escolas de... Pessoas, então dependentes e determinadas por

pensamentos, normas de conduta, ideais, projetos que não são seus,

normalmente ―impostos‖ pelos meios de comunicação ou pelo senso comum

vigente. (ZATTI, 2007.)

Uma gestão que se configura com base na dependência de muitos em

uma única figura, no caso do gestor, torna o espaço escolar uma verdadeira

batalha para aquisição do poder e/ou manutenção do poder o ―empoderamento‖.

Foucault alerta:

... E na medida em que o poder não está localizado exclusivamente no aparelho de Estado [...] nada mudará a sociedade se os mecanismos de poder que funcionam fora, abaixo e a o lado dos aparelhos de Estado a um nível muito mais elementar, cotidiano, não forem modificados. (FOUCAULT, 2008, p.298)

Este modelo de gestão torna a escola sem alma e sem motivação.

O gestor participativo, terminologia que surge com a Lei 9394/96 de 20 de

dezembro, tem sido um dos grandes desafios dos tempos pós-lei, pois o

entendimento de gestor participativo ou gestão participativa na atual legislação

compreende, conforme Demo (1993)

...a construção da cidadania que inclui autonomia, participação, construção compartilhada, pensamento crítico em oposição à ideia de subalternidade, mas envolve, também, a de responsabilidade, prestação de contas [..].com o bem comum que é o espaço público. (DEMO, 1993, p.25)

No entendimento de Demo a escola que possui um gestor democrático e

participativo é aquela em que há uma formação política clara e definida,

Page 45: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

45

ultrapassando as práticas excludentes, pois percebem a existência e a

necessidade da dimensão humana na construção das relações interpessoais.

É como se neste tipo de organização o ―pensar certo‖, conceito que Paulo

Freire utiliza muito, principalmente em Pedagogia da Autonomia, fosse

exercitado em sua completude. Conforme Freire (1996): pensar certo é o pensar

dialógico e demanda respeito aos princípios éticos. Pensar certo é fazer certo, é

uma exigência enquanto organização e estruturação de poder nas unidades

escolares em que precisamos entender a existência e necessidade dos conflitos,

pois, nenhum de nós pensa igual.

Todos pensamos muito e em muitas coisas ao mesmo tempo, uma

caraterística fundamentalmente humana e por isso discutimos muito, e no

confrontamos muito para defender nosso posicionamento, contudo é neste

espaço de disputas, lutas, alegrias, contentamentos e descontentamentos é que

crescemos e fazemos com que os outros cresçam.

Não há necessidade de lutar pelo poder/domínio de uma situação ou cargo.

Será que se deve dominar as pessoas para conseguir fazer valer nossas ideias?

Se seguirmos alguns princípios cristãos, encontraremos em Gn 1.28...‖Dominem

sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu e sobre todos os animais que se

movem pela terra.‖ Não vejo neste versículo as palavras pessoa, homem/mulher

ou qualquer outra que justifique a atitude de domínio da pessoa humana sobre a

outra.

Não foi dada a ordenança de dominar outros homens/mulheres e

tampouco o poder de controlar seus pensamentos. Na leitura bíblica

perceberemos que a todo o momento da vida do cristão convertido ao

cristianismo havia um servidor não um opressor. Em Marcos 10-45 Jesus disse:

Pois também o Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir, e

para dar a sua vida em resgate de muitos. Em suma Jesus de alguma forma

exemplifica e estabelece com eficiência a condição radical da fraternidade onde

impere o respeito e a dignidade humana.

Entende-se que não estamos mais nos tempos da Idade Antiga e

precisamos então compreender e analisar as estruturas de relações de poder

Page 46: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

46

nas unidades escolares. O poder possui uma trajetória histórica na vida dos

seres humanos e sempre apontou que o direito de comandar consiste em que

cada sujeito transfira sua força e poder àquele cidadão, mas, considerando que

ninguém pode transferir seu poder de forma natural, trata-se de abrir mão de seu

direito de resistência.

Defina-se, então, que o poder e suas divergências são resultados de

conflitos subjacentes entre interesses humanos e, que essas divergências são

inevitáveis pela natureza hierárquica do sistema social. O poder é visível nas

estruturas de ideologia, autoridade e organização, sendo que para resolver esta

questão da luta pelo poder, imposta pelo próprio poder não adianta ficar

discutindo quem oprime e quem é oprimido, nem em quem o exerce e quem

pode exercê-lo, mas em transformar os conflitos em oportunidades de

crescimento. A escola apresenta-se nesse contexto, como cúmplice na criação e

na perpetuação do poder.

Nesta concepção, o poder não é uma relação que é escolhida ou evitada,

mas uma relação necessária pelas situações sob as quais os sujeitos convivem.

Assim percebemos o quanto o poder torna-se questão fascinante para o sujeito,

no sentido de usá-lo, desfrutá-lo ou admirá-lo e frequentemente contra o outro,

pois nesse caso poder não é mediação é o fim em si mesmo.

Cabe analisar que nem todas as relações de poder são consensuais, pois o

consentimento exige que se tenha um comportamento aprovador quando há

situações de obediência relutante, coerção e hábito que não incluem tal atitude.

A aceitação, nesse sentido, é um ideal nas relações entre os sujeitos na

escola, pois envolve uma situação na qual não existe um conflito subjacente de

interesses e os sujeitos se reúnem no curso de uma ação ou aceitam um estado

de coisas.

Contudo, Foucault (2007) desenvolve a ideia de que as relações de poder

não se passam nem no âmbito do direito, nem da violência, nem se apresentam

de forma contratual ou repressiva unicamente, ou seja, o poder não é algo que

nega que impõe limites ou que castiga. O poder estaria vinculado ao exercício

de gerir a vida dos homens, orientá-los em suas ações para que seja possível

Page 47: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

47

desenvolvê-los ao máximo, aproveitando suas potencialidades em um sistema

de construção coletiva de suas capacidades.

Desta maneira, entende-se que é na organização e estruturação das

unidades, como espaço garantido do exercício do poder, que se buscam as

especificações destas relações, pois nestes locais privilegiados é que os

interesses dos diferentes grupos sociais são interpretados.

Surgem assim, do embate experimentado pelos sujeitos que compõem a

gestão das escolas, diferentes modos do exercício do poder junto aos seus

pares, decorrente, de sua trajetória histórica, da cultura organizacional, da

realidade social e das constantes influências do mundo social e política.

1.5. Foucault e a questão do poder

Não é tarefa fácil abordar, de modo simples, claro, preciso e rigoroso, o

pensamento de um autor de textos tão densos e complexos como Michel

Foucault, nos quais ideias, categorias e métodos se elaboram, apresentam,

transformam, aprofundam e enriquecem ao longo do tempo e da obra.

O objetivo pretendido aqui é tentar entender de maneira mais

transparente possível o exercício do poder nas relações interpessoais a respeito

do contexto educacional tendo a educação como produtora de Sujeito na

história, isto é, pensar a educação a partir da dimensão: ser e poder e os

indivíduos que por ela são afetados.

Para tal, utilizarei a obra Foucault e a Educação do autor Neto (2003). O

autor é considerado por muitos teóricos da atualidade, o pesquisador brasileiro

no campo da educação que mais e melhor tem trabalhado, com o pensamento

do filósofo francês. Neto (2003), explica de maneira acessível e didática a

filosofia de Foucault, o que ele escreveu sobre o sujeito, os saberes, os poderes,

as instituições e as contribuições que esse filósofo nos oferece para a partir dele

discutir questões educacionais.

Page 48: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

48

Algumas obras de Foucault também serão utilizadas como Vigiar e Punir

e Microfisica do Poder, no sentido de não só usar Foucault através de, mas de

visitar Foucault enquanto fonte original.

A obra de Neto (2003) nos alerta logo em sua introdução que não

devemos utilizar de termos como método foucaultiano ou teoria foucaultiana,

pois os entendimentos tradicionais que temos de teoria e de método não se

assemelham a obra de Foucault.

De acordo com Neto (2003), Foucault nunca quis ser um modelo, nem

fundador de uma escola, mas quis, sim , que suas contribuições fossem

tomadas como ferramentas, ―como um instrumento, uma tática, com coquetel

molotov, fogos de artifício a serem carbonizados depois do uso‖5

Neto (2003) afirma que só podemos nomear o pensamento de Foucault

como método foucaultiano e teoria foucaltiana se utilizar uma definição diferente

do que o pensamento moderno nos apresenta. Sendo assim o autor sugere

em vez de falarmos em uma teoria foucaultiana, é mais adequado

falarmos em teorizações foucaultianas [...] sendo assim se

quisermos adotar uma perspectiva foucaultiana, não devemos nos

preocupar em chegar a conceitos estáveis e seguros em nossas

pesquisas, já que acreditar que eles tenham tais propriedades é

acreditar que a própria linguagem possa ser estável e segura-

uma suposição que não faz o mínimo de sentido nessa

perspectiva [...] (NETO,2003,pp.21-22)

O pensamento de Foucault é tão as avessas com o pensamento moderno

que há quem o classifique com as seguintes palavras: ―Foucault desconcerta‖ e

ou ―Foucault é um enigma‖ (TAYLOR & BALL apud NETO,2003,p.25)

Neto nomeia as fases ou etapas de obras de Foucault, como ―domínios

foucaultiano‖, sendo um desses domínios o ―ser-poder‖ este será o fio condutor

5 -Declaração de Foucault, de 1975, citada por Simons, 1995, p.93, citada por neto, 2003, p.19

Page 49: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

49

que refletiremos a questão do exercício do poder.Em Vigiar e Punir, obra

considerada por Foucault o seu primeiro livro:

Foucault coloca toda ênfase na busca do entendimento acerca

dos processos pelos quais os indivíduos se tornam sujeitos como

resultado de um intricado processo de objetivação que se dá no

interior de redes de poderes, que os capturam, divide e classifica.

(NETO, 2003, p.65)

É possível perceber a educação nesse contexto, pois, hoje como é a

política educacional, praticada pelo Estado no que tange ao cotidiano escolar,

nota-se claramente uma falsa democracia e uma falsa autonomia, pois, a todo

instante tanto gestor como docente, ou seja, os profissionais da educação se

vêm engendrados em um emaranhado de regras, normas, decretos, portarias,

medidas, campanhas e outros mecanismos que nos fazem reféns do sistema,

perfazendo assim um vulgo ditado popular: ‗se não podes com eles junte-se a

eles‘.

Esse comentário incita a muitos profissionais da educação a se

individualizarem e buscarem por meios mais rápidos e caminhos mais curtos

defenderem seu posicionamento ou o posicionamento que lhe é vantajoso.

Foucault conduz o sujeito a partir dessa busca a ―ontologia histórica de

nós mesmos nas relações de poder que nos constituem como sujeitos atuando

sobre os demais‖ (MOREY apud NETO, 2003, p.66)

Os comentários apresentados sobre Foucault servem para elucidar o

compromisso nesse texto em somente discutir as contribuições do autor para a

educação, especificamente na questão do exercício do poder. Isto porque Neto

(NETO) nos adverte a não querer ser mais um a ‗usar‘ Foucault para qualquer

problema de investigação já posto, antes mesmo de assumir uma perspectiva

foucaultiana para constituir aquilo que se pensa ser um problema de

investigação.

Para o autor existem alguns equívocos que precisam ser resolvidos

mediante a uma conduta intelectual adequada.

Page 50: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

50

O primeiro equívoco é não compreender que as teorizações

foucaultiana não são ―pau para toda obra‖.No pensamento de

Foucault não há lugar para metanarrativas e para expressões do

tipo ― a natureza humana‖ e ― a história da Humanidade‖, nem

para certas palavras como ―todos‖ e ―sempre‖. Nas raras vezes

que tais palavras aparecem, elas se referem a períodos históricos

e espaços geográficos bem delimitados. ( NETO,2003,p.22)

Para esse momento da pesquisa em relação a Foucault, tem-se a

preocupação em perguntar e examinar como funciona o exercício do poder nas

relações interpessoais entre gestores e docentes na ótica foucaultiana.

Não desconsideramos os demais sujeitos envolvidos no processo

educativo, como, alunos, demais profissionais da educação, pais, comunidade

externa e Estado. Contudo a curiosidade, a preocupação e desejo encontram-

se no seio das relações desses dois sujeitos: gestor e docente. Como esse

exercício do poder funciona e acontece?

Foucault é um autor importante nesse questionamento por possuir várias

obras em que apresenta como tema a questão do poder nas sociedades

capitalistas, a sua natureza e seu exercício em instituições.

O segundo equívoco que Neto (2003) alerta está relacionado a uma

concepção errônea de alguns pesquisadores em entender que os problemas a

serem pesquisados existem e estão desvinculados com o mundo a mercê de

uma teoria para resolvê-los. Confesso ter permanecido nessa categoria de

pesquisadores por alguns anos de minha vida, por sorte compreendi que o fato

de possuir uma visão de mundo sobre o assunto, experiências e experimentos,

de certa forma já possuo uma teorização sobre o fenômeno que proponho a

pesquisar.

Realmente não há como separar teoria e prática e no segundo equívoco o

autor adverte que esse entendimento dicotômico não se restringe somente ao

pensamento de Foucault, na verdade temos em alguns momentos de nossas

pesquisas, afirma Neto, uma conduta intelectual inadequada, em usar um autor

Page 51: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

51

por que ele está na moda e aí tentar de todas as formas ―enformar e engessar‖

as discussões através de... Ou rejeitarmos porque achamos que está em desuso

―fora de moda‖.

Seja lá como for ao caso desta pesquisa tanto Foucault, como Freire,

Mounier e Ponty são usados pela justificativa de que são autores que cada um

em seu tempo, seu espaço e sua vida contribuíram e contribuem sobremaneira

nas percepções que envolvem o ser, o ser-poder, o eu, o ser-no-mundo o ser

consigo.

Cada qual de uma maneira nos faz perceber o quão é importante estudar

a incompletude do ser e suas relações.

No caso de Foucault em seu livro Vigiar e Punir, o autor passa conforme

Neto (2003, p.66) a se interessar especificamente pelo ―poder enquanto

elemento capaz de explicar como se produzem os saberes e como nos

constituímos na articulação entre ambos‖. Foucault irá nessa fase de sua obra

tratar de poder e do ser-poder através do método genealógico que se baseia em

valorizar a história, em sua materialidade.

Mas, mesmo estudando minuciosamente o funcionamento do

poder, a rigor esse não é o objeto de Foucault; o poder entra em

pauta como um operador capaz de explicar como nos subjetivou

imerso em suas redes. (NETO, 2003, p.74)

Para isso o autor define que há sempre algo por trás das coisas e esse

algo nem sempre é aquilo que imaginamos ou o que é mostrado a nós. Isso

acontece frequentemente nas escolas quando alguém tenta ―discutir a relação‖,

muitos se esquivam dizendo que não há nada para discutir ou ao discutirem são

evasivos e superficiais. Às vezes o medo, a cumplicidade acaba por impedirem

que haja nas escolas uma reflexão sobre nossos discursos e práticas de

convivência. O método genealógico estuda esses aspectos do poder tendo

como pressuposição um único a priori, a história.

Page 52: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

52

A genealogia pode funcionar como uma insurreição dos saberes.

Não tanto contra os conteúdos, os métodos e os conceitos de

uma ciência, mas de uma insurreição, sobretudo e acima de tudo

contra os efeitos centralizadores de poder que são vinculados à

instituição e ao funcionamento de um discurso científico

organizado no interior de uma sociedade como a nossa. E se essa

instituicionalização do discurso científico toma corpo numa

universidade ou, de um modo geral, num aparelho pedagógico,

[...]? no fundo pouco importa. É exatamente contra os efeitos de

poder próprios de um discurso considerado científico que a

genealogia deve travar o combate. (FOUCAULT, 1999, p.14)

No viés do processo histórico Foucault, estuda as transformações e

práticas institucionais com relatos sobre poder, punição e disciplina. De uma

maneira pormenorizada e a nível institucional, ele coloca em um mesmo nível, a

prisão, a escola, o hospital, o quartel e o asilo, identificando essas instituições

como instituições de sequestro, pois no centro dessas instituições -passam-se

suplícios, castigos e violências corporais, para o que Foucault denomina de

disciplinamento de corpos dóceis.

Em nossa pesquisa com docentes conseguimos perceber algo parecido

com essa comparação que Foucault apresenta. Muitos docentes não

responderam perguntas que possuíam certo sentido de denúncia, de revelação

do que de fato acontece no chão da escola, quando estamos falando de

relações interpessoais.

Page 53: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

53

CAPÍTULO II

A Metodologia e Interpretação dos resultados

Em alguns momentos deste trabalho, mais precisamente desde a

introdução tenho tentado justificar a escolha da temática. Lembrei-me de um fato

interessante ocorrido em setembro na II Semana Acadêmica promovida pela

UFMT este ano, quando na oportunidade apresentei um pôster intitulado ―As

Relações Interpessoais: O gosto amargo do mel‖. Na verdade, fiz um recorte

sobre o que estava pesquisando para a dissertação.

No momento em que tive a presença de minha avaliadora, uma

professora do curso de Geografia, ela me fez várias perguntas, elogiou o

trabalho, mas percebi em seu olhar uma pergunta que não queria calar. Antes de

ir embora ela perguntou:

- Mas com tantas coisas para pesquisar na educação, por que você

escolheu as relações interpessoais?

Respondi imediatamente:

- Porque creio que sejam as relações interpessoais o maior problema que

nós educadores estamos vivenciando há algum tempo.

Senti um pouco de decepção em seu rosto ao ouvir minha resposta e me

perguntou se eu acreditava ser as relações interpessoais mais importantes do

que a violência nas escolas, a má remuneração, a desvalorização dos

profissionais da educação e etc...

Percebi ser este o momento ideal para justificar e problematizar mais

ainda meu objeto de estudo. Quando me proponho a pesquisar as relações

interpessoais com um cunho qualitativo fenomenológico, tenho em mente o que

Fini, nos explica em relação a pesquisa qualitativa

Nesta maneira de pesquisar, não se admite dicotomizar o mundo

interior X mundo exterior. O fenômeno é aquilo que surge para a

consciência e se manifesta para esta consciência. Isto significa

Page 54: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

54

que só existiria um fenômeno se existir um sujeito. Nesta

perspectiva, não existe interrogar, por exemplo, o ensino ou a

aprendizagem, mas sim o sujeito que está ensinando e o sujeito

que está aprendendo. Na pesquisa fenomenológica educacional

sempre haverá um sujeito, numa situação, vivenciando o

fenômeno, educacional. (FINI apud BICUDO, 1994, p.25)

Embora seja inseparável o sujeito de suas circunstâncias, nos ensina

Ortega Y Gasset, todo ato educativo é uma relação social estabelecida entre

pessoas, e o que esta relação expressa, ainda que tacitamente, repercute nos

processos de ensino-aprendizagem, e na interatividade possibilitada ou

aniquilada. Pessoas- insiste Mounier- não são neutras e de suas posições e

relações é tecida a cultura, o éter que envolve autoritarismo, afinidade, rejeição

ou estigma.

Fini ajudou-me responder a pergunta de minha avaliadora.

Quando estamos convivendo em uma unidade escolar, sei que há vários

problemas de ordem administrativa, burocrática e pedagógica. Contudo entendo

que se as relações que se configuram nesse espaço forem de respeito para

comigo e para com o outro, de valorização do eu e do outro, de humanização

dos espaços por nós utilizados, não será difícil resolver qualquer outro problema

ou conflito que possa surgir. É uma constatação empírica. Se experimentarmos

a sinergia em nossas relações interpessoais no ambiente escolar, estaremos em

conjunto resistindo a qualquer acontecimento que venha nos impossibilitar de

consolidarmos uma educação dialógica, humanizadora e adversa a qualquer tipo

de violência, seja ela velada ou revelada.

2.1- O Percurso Metodológico

Quando finalmente consegui definir o objeto a ser pesquisado, percebi

que não seria uma tarefa fácil, afinal os docentes e os gestores teriam que

responder um questionário que estaria avaliando não o seu trabalho pedagógico,

Page 55: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

55

mas sua maneira de conviver com o outro nesse espaço pedagógico,

identificando em alguns momentos posições ou situações de empoderamento e

desgentificação nas relações interpessoais ocorridas entre os sujeitos

pesquisados.

No momento da aplicação dos questionários com os docentes, muitos

perguntaram se podiam deixar algumas questões em branco, pois poderiam se

comprometer (um detalhe, não havia necessidade de se identificar para

responder), logo notei que se insistisse eles não iriam responder nenhuma

pergunta.

Deixe-os a vontade, resolvi apostar no bom senso e não perder a

oportunidade de ter entre os quase 200 professores da rede pública estadual de

Diamantino, pelo menos 30% de questionários respondidos.

Quando sai a campo, procurei visitar todas as 05 escolas públicas da

zona urbana do município e as 03 escolas da zona rural, contudo 01 escola não

foi possível, tendo em vista inúmeros contratempos ocorridos nesse percurso. O

fato de não ter conseguido investigar 100% das escolas da zona urbana não

invalida a pesquisa. O resultado foi satisfatório, pois, no universo populacional

de + ou – 200 docentes obteve um retorno de 64 questionários respondidos, ou

seja, 34% dos docentes representam a amostra elegida da pesquisa no

segmento dos docentes.

Em relação aos gestores os 07 que foram procurados, 05 aceitaram

responder em forma de memorial descritivo a seguinte pergunta: Como foi para

você a mudança de docente para gestor? (anexos A, B, C, D e E) O objetivo

dessa única pergunta foi desenvolver através do instrumento de pesquisa-

história de vida a oportunidade dos entrevistados em relatar de maneira livre e

autônoma seu percurso profissional, emocional e particular no espaço

educacional. Não percebi nenhuma objeção nos gestores para elaborarem seu

memorial, a não ser a velha desculpa de falta de tempo, pois sempre estão

sobre carregados de tarefas, na verdade encontrei muito mais resistência nos

docentes, tendo em vista que o instrumento de coleta de dados foi o

questionário com perguntas estruturadas e semiestruturadas (apêndice A).

Page 56: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

56

A escolha da pesquisa de cunho qualitativo fenomenológico se deu por

entender que o objetivo dessa pesquisa é o de descrever um fenômeno: as

relações interpessoais entre os sujeitos gestores e docentes. Não pretendo

buscar nessas relações a explicação de causa e efeito, na verdade espero é

chegar à essência do exercício do poder nas relações interpessoais entre

gestores e docentes, se isso é possível. De acordo com Fini (idem p.24) a

pesquisa de cunho qualitativo fenomenológico pretende chegar à essência do

fenômeno.

Como toda pesquisa fenomenológica, várias questões me perseguiram

por todo o percurso investigativo e gerou durante todo tempo da pesquisa uma

incomodação que ao mesmo tempo em que provocava um clima de tensão, me

impulsionava a buscar a essência do fenômeno. O momento mais difícil para

mim na pesquisa foi viver o que a Fenomenologia chama de époche, ou seja, a

redução, suspensão ou retirada de toda e qualquer crença, teorias

ou explicação sobre o fenômeno. Abandonar, ou deixar de lado,

por enquanto, os pressupostos ou pré-conceitos estabelecidos a

priori a fim de permitir o encontro do pesquisador com o

fenômeno. (idem, p.27)

Manter este distanciamento para alguém que viveu 10 anos como gestora

e ao mesmo tempo como docentes não foi fácil, por diversas vezes me vi

utilizando inferências pré-concebidas sobre o fenômeno e tive que com muita

dificuldade ―esvaziar-me‖ para receber e interpretar as informações que adquiria

com a pesquisa.

2.2- Os docentes e suas avaliações sobre as relações com os gestores nas instituições escolares

Como disse anteriormente na pesquisa com os docentes foi utilizado o

instrumento de coleta de dados- o questionário. Propõem-se a uma análise

Page 57: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

57

compreensiva e interpretativa desses questionários por meio de blocos de

gráficos com as perguntas e respostas quantificadas, sendo assim nesse

momento apresenta o resultado quantitativo das questões de 1 a 5.

Figura nº 1= Gráfico nº 01- Qual a sua formação?

Fonte: Questionário desenvolvido pela pesquisadora nos anos de 2010 e 2011

Figura nº 2= Gráfico nº 02- Quais as características básicas que você pensa ser

imprescindíveis para o exercício do cargo de gestor?

Fonte: Questionário desenvolvido pela pesquisadora nos anos de 2010 e 2011

Con

heci

men

toD

inam

ism

oLi

dera

nça

Em

patia

For

maç

ão …

Exp

eriê

ncia

Vis

ãoC

apac

idad

eP

aciê

ncia

Fle

xibi

lidad

eS

ociá

vel

Hum

ildad

eC

olab

orad

orC

riativ

oM

edia

dor

Just

iça

Tra

nspa

rênc

iaH

ones

tidad

eD

emoc

rátic

oC

arát

erP

rofis

sion

alO

usad

iaB

om r

elac

iona

men

toC

ompe

tênc

iaG

osta

r do

que

faz

Res

pons

abili

dade

Dis

poni

bilid

ade

Org

aniz

ação

Ser

ieda

deC

omun

icaç

ãoA

cess

ibili

dade

Ouv

inte

Com

prom

isso

Sab

er v

iver

em

…E

duca

do

46

17

1

1411

1 1 1

18

14 3 3 4 3

5 4

8

1

6

1

1112

1

64 4

1

74 4 5 5

3

Page 58: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

58

Figura nº 3= Gráfico nº 03- Qual o nível de relacionamento que tinha com o gestor?

Fonte: Questionário desenvolvido pela pesquisadora nos anos de 2010 e 2011

Gráfico nº 04- Como você via o último gestor da escola?

Fonte: Questionário desenvolvido pela pesquisadora nos anos de 2010 e 2011

Gráfico 5- O que foi feito para resolver o problema, quando o gestor era

considerado inflexível?

53%47%

Flexível Inflexível

Page 59: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

59

Fonte: Questionário desenvolvido pela pesquisadora nos anos de 2010 e 2011

Após inúmeras tentativas de interpretar de forma compreensiva os dados

obtidos com a pesquisa, percebi que por ser uma pesquisa qualitativa

fenomenológica com base nas percepções merleaupontiana, jamais poderia

analisar as respostas dos docentes sem considerar o que Merleau-Ponty nos

apresenta em seu livro Fenomenologia da Percepção (2006), o autor defende

que o sentido das experiências fenomenológicas não é ordenado pelas

capacidades cognitivo-conceituais dos sujeitos, mas pelas habilidades

perceptivo-motoras do corpo próprio.

Percebi ser importante ―comparar as respostas‖ dos docentes, colocando-

me no lugar deles, na verdade oportunizar a mim enquanto pesquisadora um

momento de juntos com meus colegas sermos, conforme Ponty (2006): sujeitos

em perfeita correlação com o mundo. O mundo de que fala a fenomenologia é,

sobretudo o mundo humano. Um mundo em que nos é percebido.

Não nos importa que o local deste mundo seja a escola. Ela é um mundo.

Um mundo que ao ser gestado possuía através de seus gestores (no caso do

Brasil- os Jesuítas) o propósito de propagar a fé cristã através da colonização e

civilização dos indígenas. Não meu objetivo aqui enveredar pela história da

40%

57%

3%

Tentava conversar Não fazia nada Convocava uma reunião com o CDCE

Page 60: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

60

educação em nosso país, quero somente chamar atenção para a constatação de

que a escola enquanto ―mundo‖ vem ao longo do tempo de sua criação sendo

palco de uma estrutura que se mantém em sua historicidade em sistemas de

governo que instauraram no ambiente escolar a máxima da concorrência

desleal, da dominação, do comando, da subserviência através ―do poder

hierárquico que impõe suas ideias e até camuflam a descentralização, a

autonomia e a participação.‖ (MAMEDES, 2005, p.43)

A escola deve ser a meu ver um mundo de utopia. O termo utopia na

Obra Conscientização: teoria e prática-uma introdução ao pensamento de Paulo

Freire, é compreendido no sentido de que ―o utópico não é o irrealizável; a

utopia não é o idealismo, é a dialetização dos atos de denunciar, o ato de

denunciar, o ato de denunciar a estrutura desumanizante e de anunciar a

estrutura humanizante.‖ (FREIRE, 1979, p.27).

Porque apesar da história da formação e criação da escola, é possível

através da iniciativa de pessoas que lutam num contexto de racismo,

discriminação cultural, atentado contra os direitos da pessoa humana e de jogo

do poder, vir a transformar esta história, pois conforme a utopia freiriana a cerca

da compreensão da realidade não ―é‖, mas ―está sendo‖ e que, portanto, pode

vir a ser mudada. (STRECK, 2008, p.418)

Como é possível perceber, a totalidade dos entrevistados é formada em

Licenciatura Plena em Pedagogia, assim evoquei as aulas de didática no curso

de Pedagogia que iniciei no final da década de 80 e conclui no final da década

de 90, naquela época ouvia dos professores que nós estávamos sendo

formados para sermos cientistas da educação, pois, a Pedagogia é a ciência

reflexiva sobre as demais ciências. Cabe a Pedagogia, diziam formar

profissionais reflexivos na práxis da ação educativa.

Um dado importante é que as escolas em que os docentes foram

entrevistados são de educação básica, ou seja, não se restringem aos anos

iniciais, contexto em que os docentes são todos formados em Pedagogia. Nessa

situação deveria haver mais docentes em áreas específicas.

Page 61: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

61

Não é possível saber se o que houve foi à rejeição desses profissionais

em responder o questionário ou a disposição mais acessível dos pedagogos em

responder e devolver os questionários. Nesse momento de análise

compreensiva e interpretativa parece-me conveniente perceber tanto o que está

explícito quanto o implícito nos discursos dos docentes e gestores. Foucault

(1992) nos revela:

Em vez de acreditar na metafísica, o genealogista deve escutar a

história, em seu próprio funcionamento, em sua própria

materialidade. Assim procedendo, ele aprende que ―atrás das

coisas há ‗algo inteiramente diferente‘: não seu segredo essencial

sem data, mas o segredo que elas são sem essência, ou que sua

essência foi construída peça por peça a partir de figuras que lhe

eram estranhas‖ (FOUCAULT, 1992, p.18)

A partir do viés da cientificidade reflexiva do curso de pedagogia, em vigor

naquele momento como referência teórica, citado pelos professores no curso

superior das décadas de 80 e 90 começo a pensar em que essa formação

reflexiva poderia influenciar nas relações que se estabelecem nas unidades

escolares? Cabe realmente a Pedagogia e somente ao pedagogo essa postura

reflexiva? Essa postura reflexiva interfere nas relações do exercício do poder

estabelecido nas unidades escolares?

São dimensões interessantes e merecedoras de uma ‗boa roda de

conversa‘, tendo em vista que as totalidades dos questionários devolvidos de

minha pesquisa são de docentes habilitados em pedagogia. Torna-se por isso

evidente que todas as demais questões respondidas poderão fornecer as

considerações finais da pesquisa o que Foucault (sd, p.17) explica com o

método genealógico: a genealogia seria a tática que, a partir das discursividades

locais assim descritas, colocam os saberes em jogo, liberados da sujeição, que

surgem delas.

Neto (2003) acrescenta: a genealogia referindo-se ao conceito

foucaultiano nos oferece uma perspectiva processual da teia discursiva. Talvez

Page 62: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

62

através das dimensões que forem surgindo através ‗das discursividades locais‘

melhor se possa entender as heteronomias6 que favorecem uma relação de

―estranheza‖7

Quando perguntado aos docentes sobre as características

imprescindíveis ao gestor, os termos flexibilidade e liderança foram os mais

citados pelos entrevistados, em um universo extremamente diversificado de

características. É interessante o aparecimento do termo flexibilidade, entendo-o

partindo do local que se apresenta como uma característica de alguém que está

aberto às discussões, que a se ver em um cargo ou posição de destaque, tem

um comportamento de socialização das ideias e decisões.

Aparentemente quem é flexível não é individualista e sempre procura

desenvolver seus atos e ações de maneira participativa. Talvez seja por isso que

logo em seguida a característica elegida pelos docentes tenha sido a liderança,

ou seja, alguém capaz de se colocar a frente, resolver e defender os interesses,

anseios, projetos e decisões de um determinado grupo.

Tenho visto muito em instituições não educativas a insistência até um

tanto apelativa no que concerne ao espírito de liderança necessário nas

organizações. A escola, como mostra o resultado deste questionário não tem

sido diferente, esta característica não é somente um desejo ou uma necessidade

dos órgãos normativos, mas a comunidade interna entende ser a liderança uma

das características indispensáveis ao gestor do século XXI.

O gestor que se preocupa em ouvir a opinião dos colegas antes de decidir

algo e, mesmo que já possua sua opinião formada sobre o assunto, não a

apresente como algo pronto e acabado, que esteja livre para debates,

enfrentamentos e questionamentos. É o que a comunidade educacional espera

e que deve ser uma prática constante daquele que não lidera sozinho mais com

todos.

6 Em Pedagogia do Oprimido (1983) Freire explica que heteronomia é a condição de um indivíduo ou

grupo social que se encontra em situação de opressão, de alienação, situação em que se é “ser para

outro”. 7 -O termo estranheza Sartreano é usado para explicitar quando Sartre afirma em sua obra “O Ser e o nada”

que o outro é o meu inferno. “o inferno são os outros”

Page 63: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

63

Essas características elencadas pelos docentes me deixaram ansiosa

para saber o nível de relacionamento estabelecido nas escolas com aquele que

os colegas traçaram o perfil do que seria ideal.

Em primeiro momento percebe-se que a maioria dos entrevistados,

apesar de considerarem imprescindível características que a meu ver

preconizam um relacionamento menos formal, quando se deparam com a

necessidade de nomear o tipo de relacionamento com os gestores, se divide

categoricamente entre algo profissional (talvez técnico, burocrático e funcional) e

uma predominante tentativa em superficializar o relacionamento.

O gestor flexível é a tônica dos docentes e ao serem perguntados

especificamente sobre essa característica no ato de gestar encontramos um

nível muito alto de inflexibilidade na opinião dos mesmos. O gestor que para eles

precisa estar aberto às discussões, opiniões e apto a fazer concessões,

aparentemente possui dificuldades em atender a essa característica,

contribuindo desta forma para certo distanciamento da participação ativa dos

docentes enquanto vozes que se fazem presentes no processo de construção

de nossa humanidade.

Mais uma vez retorno a máquina administrativa que inculca na cabeça da

maioria daqueles que assumem a gestão da escola que ele é quem determina,

que por mais democrática que seja a gestão, se algo der ―errado‖ a

responsabilidade será do gestor.

Quando nos deparamos com esse discurso sistêmico e organizacional

normativo, efetivamente nos reportamos ao questionamento sobre quais são as

reais intenções contidas na política de gestão? Porque em muitos momentos os

gestores não podem atender aquilo que realmente seria o ideal para a escola?

Muitos entrevistados tinham até medo de responder as perguntas. Que

sistema é esse, que aprisiona as pessoas a ponto de deixa-las reféns de suas

angústias? De inviabilizar não só o diálogo, mas o resultado deste diálogo?

Page 64: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

64

Gráfico nº 6- Como o gestor reagia ao ouvir suas sugestões em relação à

organização e administração da unidade escolar?

Fonte: Questionário desenvolvido pela pesquisadora nos anos de 2010 e 2011

Gráfico nº 7- A seu ver, qual o nível de acompanhamento que o último gestor

tinha das coisas que aconteciam na escola?

Fonte: Questionário desenvolvido pela pesquisadora nos anos de 2010 e 2011

Gráfico nº 7 A- O que impedia o acompanhamento do gestor nas coisas

que aconteciam na escola?

Page 65: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

65

Fonte: Questionário desenvolvido pela pesquisadora nos anos de 2010 e 2011

Na rotina da escola muitas vezes há vozes que ora se calam, ora fazem

outros calar e pela maioria das vezes são obrigadas a se calarem

conjuntamente. Arrisquei-me no trocadilho de palavras para registrar minha

compreensão à angústia dos dois segmentos: docentes e gestores.

Para que os profissionais possam ser ouvidos e se fazerem ouvir, para

que possam ter condições de acompanhar o que de fato acontece em todo o

espaço escolar, necessariamente precisaríamos ser atendidos em várias

reivindicações, principalmente no que se refere à autonomia gestora.

O conceito de autonomia enquanto direito pessoal na construção de uma

sociedade democrática que a todos respeita e dignifica. (STRECK, 2008, p.56).

Uma autonomia que não se apresentasse enquanto expressão de governo

legitimada por instrumentos legais, mas a autonomia que de acordo com Freire

(1996) propõe a discussão sistêmica deste conceito, uma vez que para ele

autonomia está no cerne da tão questionada modernidade.

Freire não propõe essa discussão somente no campo do debate sobre

concepções da modernidade, mas, sobretudo pelo paradoxo do mundo escolar

de autonomia/dependência.

É necessário entender que somos seres humanos dependentes.

Dependentes de nossa cultura e de nosso ser. A escola é um ―mundo‖ feito por

homens e mulheres, que necessariamente são dependentes. Para Freire esse é

o X da questão, precisamos nos conscientizar que:

Page 66: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

66

ser autônomo é ter capacidade de assumir essa dependência

radical derivada de nossa finitude, estando livres para deixar cair

às barreiras que não permitem que os outros sejam outros e não

um espelho de nós mesmos (FREIRE apud STRECK,2008,p.56)

Streck, (2008) completa dizendo que ―É a autoridade do eu, o do tu, que

me faz assumir a radicalidade de meu eu.‖ Assim, entendo e analiso o

comportamento tanto dos docentes como dos gestores. São vozes que se calam

e outras que nem deixam falar, pois convivem num ―mundo‖ onde o solo que

pisam é irrigado com o determinismo neoliberal, que contribui para o desrespeito

da pessoa em sua dignidade humana e profissional.

Gráfico nº 8 – Qual a sua opinião sobre o processo eleitoral para escolha de

gestores em Diamantino?

Fonte: Questionário desenvolvido pela pesquisadora nos anos de 2010 e 2011

Gráfico nº 9- Você incentivaria um colega a ser gestor?

Fonte: Questionário desenvolvido pela pesquisadora nos anos de 2010 e 2011

Page 67: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

67

Gráfico 9 A- Justificativa do sim

Fonte: Questionário desenvolvido pela pesquisadora nos anos de 2010 e 2011

Gráfico 9 B- Justificativa do não

Fonte: Questionário desenvolvido pela pesquisadora nos anos de 2010 e 2011

Gráfico 10- Você candidataria ao cargo de gestor?

Page 68: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

68

Fonte: Questionário desenvolvido pela pesquisadora nos anos de 2010 e 2011

Gráfico 10 A- Justificativas

Fonte: Questionário desenvolvido pela pesquisadora nos anos de 2010 e 2011

No início desta pesquisa, logo no 1º capítulo houve uma tentativa

modesta em demonstrar as implicações político-ideológicas que a luta pela

Gestão Democrática teve no seio do movimento dos profissionais da educação e

a própria estrutura de poder que se configurou durante a luta e após ela.

Apesar de muitos profissionais atuantes no processo na época considerar

que a proposta finalizadora ainda estava aquém dos interesses pelos quais os

profissionais saíram as ruas para manifestar, há de se considerar que avanços

ocorreram, fato este visível na maioria dos entrevistados que reconhecem em

uma das categorias que envolvem a democracia nas escolas, a eleição de

diretores um processo justo e democrático.

Page 69: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

69

Os docentes (neste caso em específico) confiam no processo eleitoral e

concordam que todos devem ter a oportunidade de se candidatar, principalmente

aqueles que são considerados pela comunidade interna como profissionais

competentes e preenchem os requisitos para o cargo e, sobretudo, para

adquirirem experiência na área da gestão.

Um fato interessante demonstrado na pesquisa com os docentes, no

momento em que alguns declaram que não incentivariam o colega a assumir o

cargo.

As justificativas deixam uma lacuna para interpretação. O número

considerado de abstenções em responder parece ter uma relação quando estes

mesmos docentes respondem que nada fizeram quando o gestor era

considerado inflexível. A impressão que se tem é que para justificar esse não os

docentes teriam que elencar motivos que necessariamente estariam

relacionados com o nível de relacionamento que tinha com o gestor.

2.2. As narrativas dos gestores sobre o universo da gestão

Para compreender como os gestores se percebem no universo da gestão,

como percebem sua função/funções, como se comportam em relação a este

universo com dimensões técnicas-pedagógicas e burocráticas, optei por utilizar

do instrumento de história de vida ou como também é conhecido por alguns de

memorial descritivo, no intuito de obter o máximo de informações relacionadas a

seguinte questão: o que significou para sua vida profissional a mudança de

professor para diretor?

Das 05 escolas existentes na zona urbana e 03 da zona rural, tive a

devolução de 05 textos. Onde há diretores que estão em seu primeiro mandato,

diretores que já possuem uma vasta experiência em cargos administrativos, com

sucessivos mandatos tanto eletivos quanto nomeados por governo estadual ou

municipal e diretores que exerceram muito pouco a atividade de docente.

Page 70: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

70

Estarei interpretando os textos dos gestores através de algumas

dimensões ou categorias encontradas no decorrer da leitura, apresentarei esta

interpretação com alguns parágrafos retirados dos textos e copilados neste

espaço para que aja uma coerência textual e uma identificação de onde falo e

porque suponho tal conjectura.

A 1ª dimensão analisada foi gestores e a gestão democrática e, quanto a

isso nos reportamos a alguns relatos,como:

Logo que assumi, tive que desenvolver algumas capacidades

gerenciais, no sentido de fazer gestão de pessoas, reunir com a

diretoria da associação de moradores e construir um projeto de

gestão articulado com os anseios dos moradores[...] Avalio como

um dos períodos mais importantes da minha vida, pois, foi um

período de crescimento como cidadão, como ser humano e

principalmente como Profissional da Educação Básica. Nesse

sentido recomendo a experiência de gestão escolar a todos os

colegas profissionais da educação básica como uma forma de

fortalecimento dos processos de democratização do ensino no

Brasil. (Anexo A);

O desafio da mudança de função de professor para diretor não é o

pior, ou a que mais causa impacto. Para quem partcipa

ativamente de todos os momentos dentro de uma escola como

professor com responsabilidade e cooperando com a equipe da

Gestão facilmente supera o impacto da mudança. O que

realmente causa impressão e para isto o profissional deve estar

atento é que ele deixa de ser aquele que aponta erros, e, ―atira

pedras‖ e passa a ser aquele que as recebe, ou seja, passa a ser

―vidraça‖ e aí que fica dificil se manter no equilíbrio. É preciso ter

frieza em muitos momentos, saber analisar com cautela os atos e

fatos. (Anexo B);

Page 71: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

71

Passei por momentos muito difícieis, inclusive na campanha,

muita desonestidade por parte das pessoas, sendo que a única

coisa que sempre quis e quero é uma gestão séria,comprometida

e o melhoramento em todos os aspectos da escola que sempre

me acolheu. (Anexo C);

Foi mais uma nova experiência de muitos desafios e lutas pela

frente. Me vi cercada por diferentes grupos...[...]Em poucas

palavras a promotora disse: ―pelo visto a diretora tem muita

afinidade com os pais‖[...]Aprendi que conquistar a confiança dos

pais e o trbalho em equipe se consegue ir longe.[...]Aprendi muito

nesta minha trajetória e que o segredo de uma gestão bem

sucedida é o trabalho em equipe.[...] A mudança de professora

para diretora significou para eu exercer uma liderança com muita

garra, perseverança e, apesar dos problemas,saber esperar com

paciência, otimismo e determinação. Também aprendi que a

responsabilidade de um ―gestor‖ é grande. O professor preocupa-

se em cuidar de sua turma, o gestor precisa olhar de todos os

ângulos, pois está direcionando de modo global,vê e administra a

unidade escolar como um todo.(Anexo D)

Ser diretora é estar no topo de uma pequena mas significativa

pirâmide, onde a base é sua responsabilidade. As experiências

que vivenciei com certeza engrandeceram minha vida profissional.

(Anexo E).

É quase unanimidade nos relatos de que o dia-a-dia da gestão não é

tarefa fácil,devido a responsabilidade que o cargo trás consigo, a expectativa

que a comunidade escolar possui em relação ao gestor e a cobrança que exite

tanto da comunidade interna quanto externa. A importância do trabalho em

equipe é citado de maneira tímida nos relatos, fato que confirma quando

Ferreira(2000) cita:

A gestão democrática da educação é, hoje, um valor já

consagrado no Brasil e no mundo, embora ainda não totalmente

Page 72: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

72

compreendido e incorporado à prática social global e a prática

educacional brasileira e mundial. É indubitável sua importância

como um recurso de participação humana e de formação para a

cidadania.É indubitável sua necessidade para a construção de

uma sociedade mais justa, humana e igualitária. É indubitável sua

importância como fonte de humanização. Todavia, ainda muito se

tem por fazer.(FERREIRA,2000,p.167)

Realmente pelo que posso perceber com estes relatos carregados de

siginificação, que há uma vontade de fazer, mas, por problemas adversos a

nossa vontade não conseguimos, é, preciso que a sociedade e aí falo não só da

comunidade interna,como externa, as políticas públicas e a gestão da

educaçãoos compartilhem com os mesmos ideias. Sei que é complicado

equacionar vontade política com anseios políticos, principalmente quando

partimos do pressuposto de que a gestão se faz inserida em um sistema

capitalista desigual que favorece uma anarquia econômica, política, social que a

cada dia acirra mais o individualismo em âmbito pessoal e institucional.

As autores mais citados nesta pesquisa fenomenológica que tem como

sustentação princípios que convergem na direção de uma nova perspectiva

relacional, tanto no nível coletivo,institucional e individual, se espelha em:

Mounier,Ponty e Freire, que em relação a essa categoria analisada defenderam

a si e os outros contra toda tentativa de sacrificar os seres humanos em sua

condição de sujeitos e de fazê-los sucumbir as ideologias subjacentes ao

mercado.

A 2ª categoria a qual nos preocupamos em identificar é a questão das

relações interpessoais entre os gestores e docentes tendo em vista as vozes

dos gestores.

Mesmo sem receber recursos regulares, conseguimos em dois

anos, adquirir uniformes para todas as crianças e adultos,

construímos um muro em regime de mutirão para garantir a

Page 73: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

73

segurança, iluminamos o acesso até a escola, construímos a tão

sonhada quadra de esportes e posterior a iluminação.(Anexo A)

Como diretor por mais de 5 anos administrava uma escola com

pouquíssimos recursos. A cooperação dos professores e a

cantina sustentava financeiramente a escola.[...] Buscar

mudanças não só para mim como profissional, mas para o grupo

com que trabalho e com os alunos que sempre foram a razão do

meu trabalho.[...]Nunca tive dificuldades de relacionamento com

alunos e colegas.(Anexo B)

Em todo trabalho que nos propomos a fazer têm que haver

dedicação, obstáculos sempre encontramos em todas as

funções, mas temos que saber contornar, levantar a cabeça e

seguir em frente, na certeza de que está fazendo a sua parte.

Nunca me abalei ou deixei de fazer o que propus,

reconhecimento nem sempre temos, mas o que vale é a certeza

do dever cumprido. Em todos os lugares que passei

independente da função sempre cumpri com seriedade a minha

função.[...] Diante de tudo nunca desanimei e nem me intimidei

perante as ofensas e dificuldades colocadas, os desafios foram e

estão sendo a cada dia um diferente, mas considero estar

vencendo e lutando por cada um deles.(Anexo C)

No mês de agosto de 2008,iniciou a reforma geral da escola. Só

que eu não sabia que por trás dessa reforma, o pior estava por

vir. No início de 2009 foi preciso alugar um salão de uma igreja

para iniciar o ano letivo. Ali começou a verdadeira batalha, não

sei ao certo se foi uma ―mãe‖ de aluno ou se foi um ―colega‖ de

trabalho que fez uma denuncia ao ministério público, dizendo

que o local não oferecia qualidade no ensino. A promotora levou

isso a sério, além da denúncia, a mesma reuniu fofocas tiradas

Page 74: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

74

do ―caldo de piranha‖8 e montou muitos questionários para mim

responder e para Seduc, e para melhorar mais a situação

acabou em sessão pública, onde me deixou muito angustiada,

pois, temia pelo fechamento da escola. (Anexo D)

Pensei que com a reforma concluída, tudo seria mais fácil, porém,

mais lutas pela frente, constantes denúncias desta vez na

ouvidoria e merenda escolar, todas inventadas, querendo ―puxar o

tapete‖ da direção e CDCE. Como toda denuncia planejada não

tinha sucesso, a vitória ficou ao meu lado junto com minha equipe.

Grifo nosso(Anexo D)

Tive que aprender a lidar com questões burocráticas até então

desconhecidas, além do equilíbrio emocional e a ponderação em

situações diversas.( Anexo E)

Num primerio momento de interpretação das histórias de vida, narradas

pelos gestores,percebi claramente indícios de uma relação calcada no trabalho

em equipe com a procupação com o aspecto físico da escola, com o patrimônio

público e com o desenvolvimento das questões pedagógicas através de

projetos. Conheço esta realidade de perto, pois em muitos momentos fiz parte

de multirões para construir salas de aula,aquisição de materiais pedagógicos e

outros que no momento faziam-se necessários à escola.

Não considero estas iniciativas erradas, contudo gostaria imensamente

que elas acontecem em um clima diferente do que presencie por diversas vezes

e que reaparece em alguns discursos dos gestores.

Infelizmente muitas vezes no ambiente escolar nos vemos obrigados a

fazer aquilo que é de responsabilidade aos órgão públicos, e o que é pior que

acabamos por reconher essa atitude como uma demonstração de equipe coesa,

de grupo de trabalho unido e de bom relacionamento entre gestores e docentes.

8 Nome dado a uma coluna social de um jornal da cidade

Page 75: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

75

O fragmento do anexo C demonstra que o gestor está satisfeito pois os

docentes ajudam na cantina e ficam a espera das mudanças que ele enquanto

gestor irá trazer para a escola. Até o anexo C, percebe-se que não há de forma

clara nenhum indício de que haja na escola, na visão do gestor algum problema

ou conflito de relacionamento,afinal, se os docentes auxiliam na cantina,se

reunem-se em prol da construção de quadra,providenciam iluminação, então

está tudo ótimo, não há problemas.

A partir do anexo D e E temos um testemunho de gestores que

evidenciam claramente os conflitos nas relações interpessoais, a ponto de estes

conflitos atingirem a comunidade como um todo e trazer o um outro poder

institucionalizado para a escola. Confesso que considero uma expressão forte

quando leio: ―querendo puxar o tapete da direção e do CDCE, mas a vitória ficou

ao meu lado, junto com a minha equipe‖.

É um discurso claro de adversidade,agressividade,luta de poder e divisão

de grupos em um ambiente que pretende pelo menos em um contexto

contemporâneo oferecer um mundo mais justo e mais humano, onde

equidade,solidariedade e felicidade exista não para uns mais para todos.

Estes discursos que demonstram uma luta por poder na escola,

aparentemente nos leva a pensar que apesar de controvérsias, Vallin(2004,p.1)

estaria certo quando afirma: ― em diversas coisas que fazemos na vida,nosso

prazer,nosso gosto,o que nos leva a fazer ou procurar alguma coisa é o poder. A

sensação de poder nos fascina.‖

Mais será que em relação a escola é viável lutar por poder desta

maneira? Será que vale a pena sacrificar momentos que poderiam ser de

entendimento e de construção de ideias? Entendo que o enfrentamento é

necessário, que não há como exigir das pessoas que sejam consensuais o

tempo inteiro, mas os conflitos nas relações interpessoais mediante uma certa

disputa de poder não pode chegar a ação do desrespeito, independente se este

é relacionado a uma pessoa,um grupo, ou mesmo a natureza.

Partindo de um princípio que

Page 76: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

76

o homem é um ser natural,mas é um ser natural humano. E,

exatamente, o homem singulariza-se por uma dupla capacidade

de romper com a natureza. Só ele conhece esse universo que o

absorve e só ele o pode transformar, ele, o menos armado e o

mesnos poderoso dos grandes animais. E, o que é infinitamente

mais, é capaz de amar (MOUNIER, 2004,p.32)

Essa capacidade de criar, de transformar e de amar, faz parte da história

humana e por mais que exstam estruturas que favoreçam a uma cultura, por ora

desumana, não podemos deixar que elas se insiram em nossos espaços

escolares a ponto de nos fazer coisas e ainad o que é pior auxiliar nosso

processo de coisificação do ser humano.

Somente boa vontade, capacidade de amar e qualquer outra atitude de

bom senso e discernimento não é suficiente para que possamos ter nas escolas

relações fraternas que possibilitem a ausência de práticas negativas.

A luta não é e nem deve ser contra o colega, o gestor ou o docente. A

luta não é contra o ser humano, é contra um sistema capitalista, contra a

exploração do trabalho humano, contra uma cultura de opressão, de relações de

força, prestígio e poder. A luta é cultural, não humana e pessoal.

Devemos olhar para a pesoa e a comunidade,local ou global,fica mais

fácil encontrar nosso papel. Há mais de dois mil anos Jesus já dizia em Mateus

20,26-27

Voces sabem: os governadores das nações tem poder sobre

elas, e os grandes tem autoridade sobre elas. Entre voces não

deverá ser assim:quem de vocês quiser ser grande,deve tornar-

se o servidor de vocês; e quem de vocês quiser ser o primeiro

deve tornar-se o servo de vocês.

No universo da gestão, particularmente no seio das relações

interpessoais, o gestor e os docentes devem se colocar a serviço do coletivo. Os

governantes que legislam sobre as questões legais também devem entender

que estão em seus cargos para servir a coletividade. Ao optarem por este

Page 77: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

77

princípio de servidão, o mesmo fará diferença entre gerar conflitos,mal-estar e

comportamentos maldosos, em ter amor pelo que faz e proporcionar um

ambiente de respeito e bem-estar, pois o contrário disso não há prazer, não há

vida plausível, há morte...

Capítulo III

Discussão dos Resultados

Personalismo, Pedagogia da Dialogicidade e Relações Interpessoais.

Do pensar clássico de gregos e romanos ao pensamento da atualidade, o

assunto teoria sempre teve no centro de seu objetivo maior acerca do sentido e

natureza do conhecimento e a eventual compreensão, interpretação ou

explicação sobre tudo e todos.

Se nos valermos da filosofia clássica e enciclopédica, encontraremos a

teoria9 no ―[..] seu significado original grego:[...]com contemplação, ato

contemplativo ou mesmo beatitude‖ segundo Pereira (1995). Ela, contudo, entra

no pensamento clássico moderno, como compreensão, visão de mundo,

conceito elaborado da ação reflexiva sobre o mundo.

Grandes filósofos antigos como Aristóteles compreendiam a teoria na

perspectiva estética, como deleite, repouso, harmonia e fruição. Desta forma a

promulgavam em suas obras como é o caso da obra Ética a Nicômano.

9 “Segundo José Pedro Machado, no seu Dicionário Etimológico da Língua

Portuguesa (Livros Horizonte, Lisboa),teoria vem do grego 'theoría' e do latim

homónimo. No primeiro caso: «"Acto de ver, observar, de examinar; acto de ver

um espectáculo, de assistir a uma festa". Daí a própria festa, festa solene, pompa,

procissão, espectáculo, teoria; deputação (das cidades da Grécia às festas solenes

de Olímpia, de Delpos e de Corinto ou aos templos de Zeus Nemeu, de Apolo

Délio); função de teoro [teoro, do grego 'theorós', espectador, que viaja para ver

o mundo; espectador dos jogos públicos, deputado enviado pelos estados gregos;

magistrado]; contemplação do espírito, meditação, espírito; especulação teórica;

teoria (em oposição à prática)». Já na raiz latina, 'theoría' significa, apenas, «a

especulação, a investigação especulativa». Foi nesta acepção que, segundo o

dicionário Morais, teoria entrou no séc. XVI pela primeira vez na língua

portuguesa”. Consultado 27?10/2011: http://migre.me/60vPh.

Page 78: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

78

Contudo, na ciência moderna ou porque não dizer na filosofia da

contemporaneidade a discussão sobre a importância da teoria-teorização não se

resume apenas enquanto ato contemplativo, contrário à prática ou reduzida a

círculos intelectuais... (PEREIRA, 1995) A teoria é na atualidade a busca pela

natureza, sentido, explicação ou interpretação do eu, do ser, do ser-no-mundo

sem aquela característica de frieza e dicotomização da prática.

Neste capítulo demonstra-se o calor que há na discussão e análise

teóricas do fenômeno Relações interpessoais, buscando através de Mounier e

Freire um debate de ideias profundas, semelhantes, humanizantes e

humanizadoras.

Contemplam-se pensamentos que escapam a todas as sistematizações,

porque se assentam na pessoa, a qual por ser livre imprescindível e humana

não se admite um esgotamento reducionista e/ou positivista. De acordo com

(PEREIRA, 1995) ―... da teoria não se podem excluir o desejo, a paixão e todas

as ações do homem, um ser que busca eternamente o sentido de sua

existência. E por isso mesmo teoriza.‖

Este homem apaixonado, pessoa absoluta, única, transcendental,

transcendente e comunitário é analisado pelo Personalismo no cenário do

coração da ação educativa- o ambiente escolar.

3.1. As relações interpessoais em um contexto fenomenológico

Propor-se a discutir as relações interpessoais em um contexto

fenomenológico é ter a oportunidade de utilizar da multiplicidade de olhares que

a Fenomenologia pode proporcionar e da abertura de locais de aplicação desses

olhares. Ainda mais apontar para a solidificação do espaço da reflexão

fenomenológica, bem como o resgate do pensamento de Husserl de forma direta

e através de seus diversos interlocutores como, Rezende, Martins, Meleau-

Ponty, Teles, Bello, e outros.

Page 79: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

79

O homem é um ser transcendental, sendo assim as relações que se

estabelecem em nosso cotidiano com os outros e comigo mesmo, fazem parte

de uma transcendentalidade fenomenológica.

Para que possamos entender o termo transcendental no contexto

fenomenológico, primeiramente é necessário compreender porque essa

expressão transcendental e a partir de que local ela se configura. Bello nos

explica da seguinte forma:

Para entender o termo transcendental, partimos da consideração

do ato da percepção: este não deriva do objeto externo, mas

depende das potencialidades do sujeito humano. A percepção

serve para conhecer a realidade externa, ou seja, é relacionada

intencionalmente ao objeto enquanto percebido. Uma folha

percebida é ligada intencionalmente à percepção. Essa estrutura

percepção/percebido é inerente à estrutura transcendental do ser

humano, pois todas as vivências estão ligadas/relacionadas à

estrutura do ser humano. A percepção que se define por estrutura

transcendental tem o sentido de que o ser humano já possui estas

estruturas e, portanto, elas transcendem o objeto físico. Diferente

é o significado do termo transcendente: aquilo que está além.

(2004, p.49)

Neste contexto o conceito de transcendental está ligado à subjetividade,

algo que sabemos ser próprio do ser humano, não é algo que está fora ou que

não nos pertence e não nos importa. Em contraste, as relações interpessoais

configuram-se em algo que está além desta nossa transcendentalidade, elas

estão além do sujeito, além de nossa subjetividade, mas isso não quer dizer que

ela não nos importa, a questão é: o comportamento que temos as formas com

as quais nos relacionamos conosco e com os outros estão intimamente ligadas

ao nosso passado, presente e futuro.

Assim considera-se pertinente aqui lembrar um fato corriqueiro muito

usado no contexto escolar. A autoavaliação. Por diversas solicitei de alguém que

Page 80: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

80

se autoavaliasse ou estive eu em uma situação na qual me era solicitado avaliar

meu trabalho.

O interessante desta prática é que quando nos colocamos para refletir

sobre nossa pessoa, nossos atos, conceitos e atitudes em um primeiro momento

temos uma enorme dificuldade e na maioria dos casos optamos por nos avaliar

de forma negativa Isto porque, talvez se espere que o outro diga que não é bem

assim e nos massageie o ego com elogios. Colocando em destaque nossos

pontos positivos. Outras vezes, não nos poupamos de modéstia e nos avaliamos

de forma tão positiva, que não há chances de comentários, observações ou

contribuições para o nosso crescimento pessoal.

Esse fato se manifesta de maneira interessante na escola. Um dia estava

participando de uma daquelas ‗maravilhosas‘ reuniões pedagógicas onde de

tudo acontece, quando um gestor no término de sua fala disse: - Ok pessoal,

algum comentário sobre o que ficou decidido? Coitada da docente que resolveu

responder a pergunta. Ela foi sincera e disse que não havia concordado com

praticamente nada tendo em vista que o gestor já havia determinado e não

consultado os docentes....Naquele momento um silêncio pairou sobre a sala e

todos ficaram olhando para ela, uns com ar de reprovação, pois, queriam que

‗aquilo‘ terminasse logo e outros balançavam a cabeça concordando, mas,

ninguém falava nada (para ser mais clara havia uns burburinhos). Percebi

naquele momento que deveria observar com atenção tudo o que estava

acontecendo, estava claro que aquele fato seria oportuno em minha pesquisa. O

gestor teve um comportamento aparentemente democrático e pediu para que a

docente então se pronunciasse, fizesse suas observações, pois estávamos ali

para discutir... Os comentários foram feitos e junto com eles algumas

observações sobre a insatisfação de alguns com a postura do gestor (a partir do

encorajamento de um, adesão de outros). Após o término das conversas a

reunião terminou com o gestor não mudando uma vírgula do que já havia

determinado e ainda deixando claro que se não estivessem satisfeitos podiam

pedir seu distratos (a escola naquela época tinha 70% de interinos).

Page 81: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

81

Percebi de um lado frustrações, raiva, revolta e imobilidade de outro um

ser humano incapaz de permitir ser questionado ou ter sua postura avaliada.

Imaginei como será que ele se autoavalia?

A fenomenologia husseriana não se dedicou ao estudo das relações

interpessoais, mas ao entender a transcendentalidade do ser humano como tudo

aquilo que é vivido/experienciado. Comecei então a me perguntar o que é

transcendente e o que é transcendental nas relações interpessoais?

De forma empírica, na verdade o termo relações interpessoais se for

explicado de forma fenomenológica ele deve ser entendido como algo

transcendente, pois, as relações interpessoais são na verdade atos e

comportamentos que estão fora de uma sistematização, de uma lógica, de um

padrão, de uma normalidade.

Vejamos a história contada acima. Ela pode ser para uns, algo absurdo e

talvez até a quem diga que não é bem assim... Mas a questão é que isso

aconteceu e acontece de fato em várias escolas, como também temos situações

totalmente diferentes nas quais há um respeito, uma comunhão mesmo que

cheia de divergências durante a formalização de um consenso.

Entendo agora porque falar sobre ―o conceito husseriano de estrutura

transcendental é o ponto fundamentalmente novo da fenomenologia‖ (BELLO,

2004, p.50). Quando discutimos a estrutura transcendental no dizer de Husserl

temos que nos preocupar com o que o EU vive e experiência, pois, para o

filósofo todo o percurso de viver, experenciar e perceber repercute em termos

fenomenológicos na intencionalidade dos fatos.

Na dimensão das relações interpessoais, reforçamos nosso entendimento

no seu ser transcendente coberto de intencionalidade, seja ela boa para mim,

para o outro, para nós, ou para o espaço que ocupamos.

Parece que para entender fenomenologicamente isso precisamos buscar

em Ponty (2006) algo que venha nos esclarecer de forma mais direta. Por isso a

leitura de alguns pontos importantes da obra A Fenomenologia da Percepção

que já era preconizada por Husserl e tem em Ponty um detalhamento

fenomenológico.

Page 82: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

82

3.2. Pedagogia da Dialogicidade: As contribuições de Paulo

Freire

Um sonho quando se sonha junto é apenas um sonho, mas um sonho

sonhado por todos Cria uma realidade: O DIÁLOGO.

Com todo respeito a Paulo Réglus Freire, nosso eterno educador e

personalista, pois com ousadia atrevi a recriar uma frase usada por ele.

Contudo creio fortemente que Freire se estivesse vivo não me condenaria, pois

em seu livro Medo e Ousadia escrito conjuntamente com o educador norte-

americano Ira Shor o mesmo clama a seus leitores que tenham a ousadia de re

(criá-lo) e não copiá-lo.

Freire teve um modo de ver e fazer educação totalmente diferente do que

a sociedade está acostumada não é a toa que seus livros foram traduzidos para

os mais diversos idiomas afirmando desta forma que sua leitura e seus

ensinamentos não são aplicáveis somente no chamado ― Terceiro mundo‖ de

acordo com Gadotti:

As teorias de Paulo Freire cruzaram as fronteiras das disciplinas,

das ciências, para além da América Latina. Ao mesmo tempo em

que as suas reflexões foram aprofundando o tema que ele

perseguiu por toda a vida- a educação como prática da

liberdade- suas abordagens transbordaram-se para outros

campos do conhecimento, criando raízes nos mais variados

solos- desde mocambos do Recife às comunidades burakunins

do Japão- fortalecendo teorias e práticas educacionais, bem

como auxiliando reflexões não só de educadores, mas também

de médicos, terapeutas, cientistas sociais, filósofos, antropólogos

e outros profissionais. Seu pensamento é considerado um

modelo de transdiciplinaridade. (GADOTTI, 2001, p.1)

Page 83: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

83

Freire contribuiu não somente com a educação de jovens e adultos, mas

também para todos e todas aquelas que lutam por uma educação libertadora,

para uma práxis dialógica do respeito e da valorização da pessoa. Freire sempre

lutou contra a coisificação seja ela cometida onde quer que seja. O ser liberto,

responsável, comprometido e engajado era para Freire a principal característica

de um ser inconcluso, inacabado.

Ele procurava empoderar às pessoas mais necessitadas para que elas

mesmas pudessem tomar suas próprias decisões, autonomamente. Seu método

pedagógico aumentava a participação ativa e consciente. (GADOTTI, 2001, p.2)

Para entendermos Freire, precisamos antes de tudo não tentar enquadrá-lo

e tampouco aprisioná-lo em uma teoria/filosofia/metodologia específica. Penso

que o melhor seria dizer que o Brasil teve a sorte de ―parir de suas entranhas‖

um homem chamado Paulo Freire. Dentre os diversos feitos de Freire, este

subtítulo de capítulo irá se reportar à Pedagogia da Dialogicidade. Tentar em

poucas e resumidas linhas entender, de acordo com a concepção freiriana:

1º O que é diálogo?

2º O que é relação dialógica?

3º Diálogo, dialógica e Dialogicidade são as mesmas coisas?

4º Em que a Pedagogia da Dialogicidade contribuiu nas discussões sobre as

relações interpessoais?

5º Qual a relação entre Freire e Mounier?

Ao procurarmos no dicionário Aurélio, encontramos a seguinte definição

para a palavra diálogo:

―Fala entre duas pessoas ou mais pessoas, conversação, colóquio. Troca ou

discussão de ideias, de opiniões, de conceitos, com vistas à solução de

problemas, ao entendimento ou à harmonia. Comunicação.‖(FERREIRA,2004).

Esta definição apresenta duas premissas básicas:

1ª só existe diálogo, quando há divergências de ideias, opiniões, caso contrário

o que há é um consenso;

2ª o diálogo só existe quando há problemas, se não há problemas para serem

resolvidos então não há necessidade de diálogo.

Page 84: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

84

O livro Pedagogia do Oprimido (1983) de Paulo Freire começa a nos inserir

ao que o autor entende enquanto diálogo:

A existência, porque humana, não pode ser muda, silenciosa, nem

tampouco pode nutrir-se de falsas palavras, mas de palavras

verdadeiras com que os homens transformam o mundo. Existir

humanamente, é pronunciar o mundo, é modificá-lo. O mundo

pronunciado, por sua vez, se volta problematizado aos sujeitos

pronunciantes, a exigir deles novo pronunciar. Não é no silêncio

que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação e

reflexão (FREIRE, 1983, p.90)

Ou seja, com esta afirmação Freire já nos esclarece o que não é diálogo.

Diálogo não é um amontoado de ideias que um sujeito deposita no outro.

Diálogo não é uma simples roda de conversa onde trocamos ideias a serem

consumidas pelos sujeitos. Diálogo não é sinônimo de polêmica, não é uma

imposição da sua verdade. Não é doação. Não é um instrumento de conquista

do outro para se fazer detentor do saber. Diálogo é: ―encontro amoroso dos

homens que, mediatizados pelo mundo, o ‗pronunciam‘, isto é, o transformam, e,

transformando-o, o humanizam para humanização de todos‖ (FREIRE, 1980,

p.43).

Como é impactante ler este conceito de diálogo que Freire nos revela.

Observar em todas as suas obras e em toda sua vida pela América Latina,

Europa, África e tantos outros locais que tiveram a oportunidade de sentir e viver

esta relação dialógica, relação que não se esgota na práxis momentânea ou

temporária, relação que se estende na permanência da vivência e da

experiência dos seres humanos. Uma relação de fazeres e (des) fazeres, de

encontros e (des) encontros, de muitos conflitos de ideias e opiniões, de

embates e enfrentamentos que por vezes nos causam mais que uma dor moral

ou física, uma dor na alma.

Quantos de nós em nossa caminhada sozinhos ou no coletivo não tivemos

a amarga experiência de sentir o gosto de ‗perder o poder‘, de ser ridicularizado,

Page 85: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

85

de ter que em plena relação dialógica sentir que não havia mais espaço para o

nós e que o eu prevalecia a todo custo. Quantas vezes pelo caminho perdemos

a palavra, a voz e até mesmo o sonho?

Apesar de tudo isso Freire nos mostra que a palavra, o diálogo e a relação

que ora se estabelece através do diálogo nos proporciona algo muito mais

importante: a humanização dos homens.

Acredito e creio que era essa a certeza que movia a vida de nosso

educador humanista/personalista. Entender que os homens se fazem na relação

dialógica, na Pedagogia da Dialogicidade, em que o que deve prevalecer não é

o poder heterônimo, não é o status quo, o mandonismo, autoritarismo, mas o

cerne da existência humana. O amor entre os homens. O amor que resulta em

respeito a ouvir, a aceitar, a dividir, a tolerar, a suportar, a se alegrar com os

que se alegram e a chorar com os que choram.

Freire em toda a sua trajetória literária sofreu grandes influências e

inspiração de pensadores franceses, sobretudo Bernanos, Maritain e Mounier.

A influência de Mounier para o autor brasileiro foi muito direta em dois

contextos distintos: no Movimento de Cultura Popular (MCP) do Recife, fundado

por Germano Coelho, e nos grupos dos católicos de esquerda, sobretudo a Ação

Católica e a Ação Popular. (ANDREOLA, 2007, p.1)

Citamos a influência mais específica de Mounier no pensamento de

Freire, no objetivo de demonstrar as dimensões pedagógicas do Personalismo

de Mounier na pedagogia da Dialogicidade.

Mounier concebia a educação como um espaço de promoção da pessoa

na totalidade do seu ser, enfatizando prioritariamente a comunicação, a

autonomia e a liberdade, vista pelo autor como condição essencial do existir

humano.

Segundo Mounier, o fim da educação não consiste em fazer, mas em

despertar pessoas... Educação é aprendizagem da liberdade, sempre num

contexto de comunidade, não individualismo (MOUNIER, 2004)

Mounier era contra as posições alienantes e deformadoras do

racionalismo e da supervalorização do intelectualismo na modernidade.

Page 86: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

86

Reconciliar a inteligência e o amor era o desejo supremo de Mounier

(ANDREOLA, 2007, p.2 )

Trazer para os espaços acadêmicos e científicos a reflexão sobre o amor,

identificando esse sentimento como uma direção na luta por um projeto

socialista de uma nova civilização é, o mesmo que falar de algo que não só

desejamos mais sonhamos.

Uso essas palavras, pois entendo que Freire foi um dos educadores

brasileiros que mais falou de sonho.

O sonho do operário que muitas vezes não pode entrar naquele edifício que

ajudou a construir;

O sonho do camponês que no meio de tanta terra, não tem a sua própria terra;

O sonho do sindicalista que vê nos movimentos sociais organizados uma

oportunidade de fazer valer a voz do trabalhador;

O sonho do educador que percebe que para construir o futuro é preciso sonhá-

lo.

A Pedagogia da Dialogicidade é uma pedagogia, parafraseando Gadotti,

2001. Uma pedagogia dialógico-dialética, que não é mecânica. Uma dialética

continua que não exclui a subjetividade, que é idealista e idealizadora da

realidade.

Desta forma não há como não identificar as relações existentes entre

Mounier e Freire, ambos apresentaram a sociedade um projeto-político-

pedagógico que converge em uma iniciativa emancipatória de construção de

uma nova civilização, de uma quebra de paradigmas onde para sermos felizes e

fazer felizes os outros, basta que sejamos mais humanos e solidários.

3.3. Personalismo: Pessoa e Existência

Optei por teorizar o tema relações interpessoais no contexto escolar entre

gestores/docentes, tendo como aporte teórico o Manifesto de Emmanuel

Page 87: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

87

Mounier ― O Personalismo‖ que representa a obra mais madura do autor, que

morreu poucas semanas depois do seu término.

Emmanuel Mounier nasceu em Grenoble, em 1º de abril de 1905. Filho de

família simples, após cursar, de forma breve a faculdade de Ciências, dedicou-

se à filosofia, em 1924, tendo como mestre Jacques Chevalier em Grenoble.

Terminando seus estudos em Chevalier, parte para Paris, onde começa o

magistério, em 1928 e ganha bolsa de doutorando de três anos. Nessa época

conhece Maritain, Jean Guilton e o padre Pouget. Em outubro de 1932 Mounier

inaugura a revista ―Esprit”, pela qual renunciou à vida acadêmica. ―Esprit” foi o

meio pelo qual o pensamento personalista teve sua divulgação e efervescência.

Em 22 de março de 1950, faleceu por um colapso cardíaco (SEVERINO, 1974,

p.1).

O personalismo apresentado por Mounier surge em período de crise

política e espiritual, isto é, em meio aos genocídios que assombraram o séc. XX

nasce o que consideramos uma filosofia a serviço do prósopon10. Mounier não

pretendeu em sua curta passagem por este mundo formar um sistema filosófico,

mas trazer à ascensão o prósopon em sua integridade. Diante disso Mounier

afirma:

a História da pessoa será paralela à história do personalismo não

se desenvolverá somente no plano da consciência, mas em toda a

sua grandeza, no plano do esforço humano para humanizar a

humanidade.(MOUNIER,2004,p.17)

Essa preocupação em humanizar a humanidade é um dos fins da filosofia

personalista

[...] que tem o cuidado de permanecer sendo uma aventura

aberta. Está voltado mais para o futuro que para o passado. Quer

desembaraçar os valores de todos os mal-entendidos que os

retém prisioneiros. A rigidez do sistema, o personalismo opõe a

10

O termo grego será utilizado em todo o decorrer da pesquisa quando este referenciar-se a pessoa

enquanto afrontamento, tendo em vista que Mounier a utiliza para demonstrar que por ser um ser que

afronta, “mas que por vez num mundo hostil: a atitude de oposição e proteção pertence, pois, a sua

própria condição.” (MOUNIER, 2004, p.67)

Page 88: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

88

dupla exigência do rigor e da flexibilidade da permanência e da

atenção a tudo que nasce [...] (MOIX, 1968, p.181)

Ou seja, mais que uma convicção, postura ou atitude, o personalismo é

uma filosofia. Mas não é um sistema. Assim percebe-se uma das características

marcantes da filosofia proposta por Mounier, a sua forma assistemática; porém o

próprio Mounier diz que o personalismo:

Não foge a sistematização. Porquanto o pensamento necessita de

ordem: conceitos, lógica, esquemas unificantes, não servem

apenas para fixar e comunicar um pensamento que sem eles se

diluiria em intuições opacas e solitárias; servem também para

perscrutar essas intuições em toda a sua profundidade; são

simultaneamente instrumentos de descoberta e de exposição.

Porque define estruturas, o personalismo é uma filosofia, e não

apenas uma atitude. (MOUNIER, 2004, p.14).

Desta forma Mounier define estruturas e introduz nessas estruturas o

princípio de imprevisibilidade que impede que se busque qualquer tipo de

sistematização. Isto permite ao personalismo uma abordagem da existência das

pessoas como existências livres e criadoras.

O pensamento mounierista é uma filosofia do engajamento, a qual

Mounier atribui grande importância pelo fato de que o engajar-se ―é uma

exigência essencial da vida pessoal‖ (MOIX, 1968, p.176). Pode-se dizer que,

por meio da ação, a pessoa humana transforma a natureza e a si mesmo, pois

permite a manifestação de si em sua totalidade, de maneira criativa e livre.

A vinculação do seu pensamento com a ação é extremamente importante

para o desenvolvimento da pessoa e, simultaneamente, da doutrina

personalista, tendo em vista que esta é a finalidade da sua filosofia, isto é,

promover de forma integral todas as dimensões que compõem o universo

pessoal. Apesar de seu primeiro impulso ter sido à ação civilizadora, Mounier

sentiu necessidade da Reflexão filosófica para fundamentar e fecundar a ação.

Assim o pensador parte da pessoa e elabora a sua doutrina, o personalismo:

Page 89: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

89

―Se quisermos ter uma noção da humanidade, precisamos captar no seu vivo

exercício e na sua atividade global‖ (MOUNIER, 2004,p.31)

A exigência da ação, do engajar-se é ― que modifique a realidade exterior,

que nos forme, que nos aproxime dos homens, que enriqueça de valores nosso

universo‖ (MOUNIER,2004,p.103). Aqui, encontra-se levemente a importância do

engajamento para a existência humana, pois favorece a formação daquele que

executa a ação e a recebe, as suas potencialidades, as suas virtudes, enfim a

sua unidade pessoal:

Ora, nunca relações entre pessoas se podem estabelecer em um

plano puramente técnico. Desde que o homem é presente todos

são por ele contaminados. Agem até pela qualidade de sua

presença. Os próprios meios materiais tornam-se meios humanos,

vivem nos homens, por eles modificados e modificando-os a eles,

ao mesmo tempo em que integram essa interação num processo

total (MOUNIER, 2004, p.105)

Encontra-se, aqui, uma perspectiva relacional à qual Mounier atribui

grande significado, pois está implicado no engajamento. É no contato com o

outro, que cada pessoa faz a experiência de si. A partir do outro, tem-se a

possibilidade de um desvelar-se do próprio ser; porém isso se torna factível,

desde que a acessibilidade, a disponibilidade estejam presentes. Este tema será

melhor discutido quando avaliarmos as relações interpessoais entre gestores e

docentes a partir do Personalismo.

Dialogo ainda com outros dois trabalhos de Filósofos brasileiros que

tomam Mounier como referência, Antônio Joaquim Severino com sua obra

profunda e documentada, Pessoa e Existência (1983), tese doutoral

apresentada na PUC/SP e Adão José Peixoto cuja tese intitulada: Pessoa,

Existência e Educação (2009) que por se tratar não somente por isso, mas por

consequência de um tempo mais atual, apresenta-nos a filosofia/teoria

mounierista, personalista com a obra Pessoa, Existência e Educação, buscando

Page 90: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

90

a incidência desta mesma teoria e projeto político como contribuições para a

educação contemporânea.

Tanto Severino (1983), quanto Peixoto (2009) possuem muitos

momentos de coincidências no que tange às concepções evocadas acerca de

Emmanuel Mounier, com óbvias particularidades em cada um. Defendem o

personalismo como filosofia que teve e continua a ter um importante papel a

desempenhar na luta pelo desenvolvimento em que se envolvem as nações na

forma como elas se constituem no panorama contemporâneo, pois a filosofia de

acordo com esses autores auxilia no esclarecimento dos rumos do

desenvolvimento humano na sociedade, mediante um projeto político

educacional voltado às relações de diálogo e corresponsabilidade no projeto de

humanização, que passaria pela construção de ser pessoa, numa sociedade

conflitiva, individualista e concorrencial, que se abre para a guerra, exclusão, e

injustiças.

Os dois autores são uníssonos e fiéis em suas obras na afirmação de que

o Personalismo possui uma ruptura com os modelos clássicos da lógica

filosófica, afinal o objeto de investigação do seu pensamento é de natureza

diferente. (PEIXOTO, 2009). O objeto de estudo do Personalismo conforme

descreve a obra O Personalismo escrita por Mounier e traduzida para o

português por Alves (2004) tem por centralidade a pessoa, que se realiza nas

coordenadas do fato, no pensamento que se compromete na existência que

radica e a personaliza, separando-a no ‗afrontamento‘ com todos os outros seres

humanos num projeto aberto a ser buscado através das escolhas, da autonomia

e da liberdade, que a define no seu projeto de ação e existência.

O conceito etimológico de ―afrontar‖ apresentado por Mounier é para nós

estudiosos da Fenomenologia e para essa pesquisa em particular que aborda as

relações interpessoais uma contribuição ímpar. Ao utilizar a palavra ‖ afrontar‖

entendemos que o autor nos chama atenção para a constituição de pessoa

através do ―confronto‖ com o outro. Nas relações que se estabelecem entre

gestores e docentes no contexto escolar este ―afrontamento‖ acontece

constantemente.

Page 91: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

91

Quando Mounier nos chama a atenção para esse olhar humano já no

século XX, percebemos que não é de hoje que a sociedade e consequente as

relações interpessoais que nela se configuram apresentava-se como uma

sociedade marcada pelos niilismos – ausência do sentido e de significação na

existência, inclusive durante o período europeu entre guerras - e ceticismos e

descrença num projeto transformador dos tempos e culturas naquele tempo em

lutas, durante a guerra e após aquele período, durante a guerra fria. Mounier em

toda a sua trajetória de vida, um tanto curta, pois morreu jovem, com 45 anos

em 22 de março de 1950 com parada cardíaca, de acordo com Peixoto (2009),

lutou por um diálogo aberto, hoje falaríamos intercultural que possibilitasse uma

sociedade aberta, democrática e esperançosa que soldasse coletivamente os

seres humanos para a Vida.

Uma morte muito prematura! Mounier estava apenas iniciando os

seus projetos. Apesar do breve período que teve para se dedicar

à organização das linhas mestras do movimento personalista,

deixou-nos um raro testemunho de crença na pessoa e na

possibilidade da construção de uma sociedade justa e fraterna.

(PEIXOTO, 2009, p.23)

Apesar de nos deixar muito cedo sem dúvida alguma, deixou-nos um

legado atual para que possamos compreender a atitude do filósofo e até mesmo

da própria filosofia no sentido do engajamento político na história da

humanidade.

Para muitos Mounier não passou de:

... um pensador cristão que tenta renovar a igreja em declínio,

mas prefiro aqui coloca-lo como o cristão, o filósofo, o educador,

o homem de ação e contemplação, o polemista e,

principalmente, um homem voltado para a ação política.

(NASCIMENTO, 2007, p.117).

Em sua obra célebre O Personalismo destacou em um primeiro momento

as circunstancias em que foi escrita, num período de pós-guerra e apenas três

Page 92: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

92

meses antes de vir a falecer de forma repentina. ―Em seu pensamento não há

doutrinas, pois se existissem estariam repletas de sistematizações.‖ (MOUNIER,

1978 apud PEIXOTO, 2009).

Para alguns pensadores da atualidade; falta ao personalismo um

embasamento teórico-metodológico, um rigor filosófico e doutrinário. Muitos não

o consideraram filosofia tendo em vistas essas argumentações. Para contradizer

esses argumentos ―Mounier afirma que o seu pensamento não é apenas uma

atitude ou um sistema fechado de ideias; é uma filosofia. ―O Personalismo é uma

filosofia, não é um sistema.‖ Não tinha por isso, o compromisso de produzir uma

integração de todas as dimensões que incluíssem uma forma de intervenção

claramente definida, com metodologias comprovadas, posto que ele tinha mais

de um anúncio profético libertador, do que uma doutrina acabada e definida.

(MOUNIER,1964,p.16 apud PEIXOTO,2009,p.26). Desta forma podemos

perceber a tese que permeou toda a vida de Mounier que foi discutir as

estruturas existentes na época, dominadas pelo

capitalismo/racionalismo/positivismo, baseado em uma herança iluminista

modernizante que, de um lado, supervalorizava os conceitos e a razão e, de

outro, anula a preocupação com a existência pessoal, tornando a pessoa uma

ilha ou uma peça de máquina de um sistema de produção. (PEIXOTO,2009).

Mounier reafirma que:

O pensamento necessita de ordem: conceitos, lógica, esquemas

unificantes não servem apenas para fixar e comunicar um

pensamento que sem eles se diluiria em intuições opacas e

solitárias; servem também para perscrutar essas intuições, em

toda a sua profundidade; são simultaneamente instrumentos de

descoberta e de exposição. Porque define estruturas, o

Personalismo é uma filosofia, e não apenas uma atitude

(MOUNIER, 2004, p.16)

É uma postura de engajamento político, que traz à centralidade dos

debates a pessoa como centro da discussão, em certo sentido, contrariando

tanto os marxistas que sustavam a afirmação de que as crises ocorridas na

Page 93: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

93

humanidade, são decorrentes da crise econômica e que ela, como determinação

da cultura, teria que ser resolvida no âmbito da economia, à qual o sujeito era

apenas ―força de trabalho‖ ou ―proprietário dos meios de produção‖, em ambos

os casos, sem rosto, sem identidade, desumanizado. Fruto isolado e coisificado

―da crise de enfraquecimento do modo de produção capitalista.‖ (PEIXOTO,

2009).

Conforme Chaigne:

para os marxistas em época de crise é simples ―operem a

economia e o doente se recuperará.‖ Como também os

espiritualistas que defendem, ―a crise é uma crise de valores‖, é

uma crise não da economia, mas do homem. ―mudem os

homens e as sociedades se curam.‖ (CHAIGNE, 1969, p.59 apud

PEIXOTO, 2009, p.24)

Mounier acredita não ser nem marxismo nem espiritualismo que trará a

resposta para a resolução das crises, no seu entender estas são visões estreitas

e possuem um entendimento periférico do que realmente está, no seu entender,

enunciado e explícito. Para que essas visões possam servir como ferramentas

na resolução da crise na humanidade, elas precisam estar juntas, pois, há

necessidade de ocorrerem mudanças na sociedade tanto na esfera das

estruturas-econômicas como, na quebra de paradigma dos valores sociais

agregados, através da superestrutura jurídica, políticas e simbólicas. Mounier

descreve:

...nós não estávamos satisfeitos om nenhum deles. Parecia-nos

que espiritualistas e marxistas participavam do mesmo erro. Erro

que consistia em separar o corpo e a alma, o pensamento e a

ação, o homo faber e o homo sapiens. Nós afirmávamos, por

outro lado, por outro lado: a crise era ao mesmo tempo

econômica e espiritual, crise de estruturas, crise do homem. Não

retomávamos somente a palavra de Péguy: A revolução será

moral ou não será revolução. Afirmávamos: A revolução moral

será econômica, ou não será revolução. A revolução econômica

Page 94: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

94

será moral ou não será nada. (MOUNIER 1990, p.199 apud

PEIXOTO, 2009, p.24)

Através do lançamento da revista Sprit em 1932, na França, Mounier tem

a oportunidade de apresentar ao mundo uma filosofia inovadora, filosofia do eu

em relação ao outro, ―... ou seja, do espírito na forma pessoal que lhe é

conatural e necessária. Contudo a pessoa não está centrada em si mesma, mas

ligada, através da consciência, a um mundo de pessoas que são os outros e a

comunidade.‖ (NASCIMENTO, 2007, p.117)

É interessante abordar que Mounier não foi mais um filosofo do século XX

que se preocupou em dialogar criticamente com todos os outros filósofos e suas

concepções. Mounier em sua trajetória filosófica abordou pensamentos

polêmicos como o Marxismo, Cristianismo, Capitalismo e Existencialismo. Como

representante de uma filosofia que defende a pessoa como ser único e absoluto,

o filósofo da ―persona‖ não esconde a forte influência que teve pelas ideias

marxistas, existencialistas e cristãs.

Ele estabeleceu um diálogo franco e crítico com essas correntes de

pensamento sem, no entanto, deixar de reconhecer as suas contribuições para a

compreensão da realidade e para a origem do próprio personalismo. (PEIXOTO,

2009, p.51)

Com base nessas influências Mounier desenvolve em sua postura

personalista um repúdio ao capitalismo, que para o filósofo é o principal culpado

pelo processo de ―desgentificação‖ da pessoa e da exploração e opressão do

homem pelo homem. Peixoto afirma que

...que o capitalismo transformou a propriedade num instrumento

de privação e negação do outro. A propriedade que deveria ter

uma função social assumiu um caráter eminentemente privado. A

posse se transformou em‗posse-conquista‘ e ‗posse-conforto‘,

em exclusão do trabalhador. (PEIXOTO, 2009, p.52)

Tem–se na afirmação do autor uma visão que acontece em algumas

unidades escolares quando se tem a apropriação da escola enquanto bem

Page 95: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

95

privado e consequentemente a possibilidade de posse de tudo o que nela há

inclusive os direitos individuais, as recusas e toda tentativa de enfrentamento.

Para Mounier o marxismo foi como para muitos segmentos também a

oportunidade de enfrentamento ao capitalismo que reduzia a pessoa a um objeto

a ser possuído. Apesar de ser totalmente contrário ―a concepção eminentemente

economicista e coletivista do marxismo‖ Peixoto, 2009. Mounier soube encontrar

nas ideias de Marx características admiráveis, como, a questão do engajamento,

de presença e de profunda necessidade de uma transformação da sociedade.

Para Mounier isso caracterizou verdadeiramente o surgimento da práxis.

Poderíamos dizer, penso eu que se fosse não o marxismo mais

um pensamento que em nome de uma coletividade elimina a

pessoa, Mounier teria trilhado os caminhos marxistas. O fato

exclusivo de o marxismo, em sua reação polêmica, não ter

sabido distinguir entre materialismo e realismo, e se opor a um

espiritualismo desencarnado e a um realismo espiritual integral,

do qual a filosofia clássica anterior ao seu desvio idealista

oferecia-lhe as linhas mestras, demonstra até que ponto era

estreita a imagem que se fazia da realidade do homem.

(MOUNIER, 1992, p.617 apud PEIXOTO, 2009, p.55)

Realmente apesar de todo o reconhecimento, generosidade e respeito,

não há como um personalista, defensor assumido da pessoa e sua

transcendência humana, comungar com os mesmos pensamentos.

Sendo Mounier, um filósofo cristão defensor da existência humana, o

Personalismo pode ser entendido como uma vertente de pensamento

pertencente ao Existencialismo que tem seu ícone em Sartre. Contudo já nas

primeiras leituras sobre o Existencialismo sartreano, percebe-se que os

princípios e verdades defendidas são de um Existencialismo ateísta que fornece

ao homem uma liberdade sem limites, onde o outro não é considerado como

pessoa, não há uma possibilidade de comunhão, mas sim de uma completa

adversidade.

Page 96: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

96

O outro na concepção sartreano, é um obstáculo, uma ameaça à

minha liberdade: [...] o outro é aquele que me vê, que me

objetifica com seu olhar, que me rouba o mundo, me arrebata a

liberdade. (MOIX, 1968, p.2006 )

Partindo desta constatação identificamos claramente que o Personalismo

jamais pode ser comparado ao existencialismo sartreano. O que o Personalismo

defende enquanto vertente da filosofia Existencialista é uma ― perspectiva cristã,

que deseja recuperar a prática do existencialismo autêntico não como

concepção do ser condenado a solidão, mas como concepção do ser solitário.‖

(COUSS,1969,p.86,PEIXOTO,2009,p.56).

Em muitos momentos de minha caminhada como gestora percebi como é

forte este sentimento de isolamento que muitas vezes acomete os gestores e

demais docentes. Infelizmente presenciei também cenas em que o

existencialismo sartreano teve seu auge de maneira explícita.

Moix retrata de forma clara o que separa o existencialismo do

personalismo é a confusão frequente Que faz do primeiro entre o

trágico e o desespero; o fracasso total da comunicação e a

impossibilidade de fundar a comunidade: a interioridade mal

compreendida que assinalam uma volta ao individualismo; a

negação da natureza humana; a negação da história; a idéia de

uma liberdade sem limites e por vezes, sem finalidade;

dissolução da verdade na subjetividade; desconfiança excessiva

da razão; o niilismo filosófico; e, sobretudo a recusa sistemática

da objetividade, que termina nas recusas das mediações, da

ciência, da técnica, da organização e marca ao idealismo.

(MOIX, 1968, p.222 )

Para Mounier nada está perdido e a realidade não pode ser vista com

este olhar tão frio e cético, pois para o personalismo a humanidade deve ser

vista com um olhar esperançoso, confiante, vencedor, humanizante e

humanizador. Ao homem cabe no entender do personalismo mounierista

Page 97: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

97

transcender todos os obstáculos crendo que o ser humano é uma criação de

Deus e que tem o dever de ser feliz e fazer os outros felizes, ou seja: [...] Mesmo

encontrando a cada passo o mistério, mesmo marchando muitas vezes na noite,

o cristão crê que todo existente é um sinal da superabundância do amor de

Deus. Moix (1968 apud PEIXOTO, 2009, p.56)

O conceito de transcendência e a possibilidade do homem transcender os

obstáculos que a convivência humana nos propicia, é confirmada quando

observamos a influência direta e constante do cristianismo na vida e obra do

personalismo mounierista. Mounier defendia um cristianismo diferente do que

era apresentado pela igreja católica ocidental, para ele os cristãos haviam

chegado a uma posição de conformismo e a igreja havia sido invadida pelas

concepções materialistas e econômicas, deixando de pregar o evangelho

autêntico. Em carta escrita a sua irmã Mounier desabafa: ― um dia ou outro

temos que aceitar ou querer a conversão que precisamos operar em nós.

Mounier ( apud MOIX,1968,p.335) É um desabafo de um filósofo mas antes de

tudo um cristão apaixonado pelos princípios cristão que reconhecem no homem,

na pessoa um ser único e absoluto, um ser especial e por isso tão amado por

Deus, um ser que na sua absolutez precisa reencontrar a sua totalidade

humana. É a presença de um humanismo integral. Mounier afirma que:

O homem que não está mais entre as mãos de Deus é aquele que não

tem mais sua vida nas mãos, e cujo ser se fragmenta em uma multiplicidade de

forças divergentes. Mounier (apud GUISSARD, 1969, p.48)

As influências dos princípios cristãos são tão fortes no Personalismo

mounierista que o filósofo chega a declarar: ―o meu evangelho, além disso, é o

evangelho dos pobres.‖ Mounier (apud GUISSARD, 1969, p.49)

Mounier em todo seu tempo insistiu e influenciou a igreja católica da época

para que houvesse uma renovação e certo retorno a igreja cristã primitiva que

era voltada para o compromisso e o comprometimento com a pessoa humana.

Page 98: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

98

3.4. Uma avaliação das relações interpessoais entre gestores e

docentes a partir do Personalismo de Mounier

Ao propormos estudar as relações interpessoais a luz do personalismo de

Mounier, precisamos declarar que essa pesquisa não terá o objetivo de se

aprofundar na historicidade do termo, contudo tentarei de maneira modesta

pontuar alguns momentos que, no meu entendimento, fundamentam a

compreensão, a importância e a atualidade do pensamento político de Mounier

para a sociedade mundial em todos os seus aspectos reais e contraditórios.

Quando penso desta forma estou me baseando não só na leitura da

única obra de Mounier que tive acesso: O Personalismo, trad. por Alves (2004),

mas, sobretudo nas palavras de Severino11 que assim escreve: ―As ideias de

Mounier ajudariam a traçar perspectivas para crises políticas de qualquer

sociedade onde o ser humano é manipulado, explorado, oprimido, como é bem o

caso da sociedade brasileira‖.

Mounier nasceu em Grenoble na França, no dia 1º de abril de 1905. Fez

mestrado em Filosofia, com a dissertação ―O conflito do Antropocentrismo e do

Teocentrismo na filosofia de Descartes‖. Enquanto esteve em Paris, teve um

vasto círculo de amigos, dentre eles Jean Paul Sartre, Gabriel Marcel e Raïssa

Maritain. Este circulo de amigos era o que havia de melhor na vida intelectual de

Paris. Com a convivência com estes pensadores Mounier, resolve publicar em

1932 a revista “Sprit‖, ferramenta através da qual o filósofo rompe com a

desordem estabelecida pelo caos que as tragédias do século XX deixaram na

Europa e no mundo.

O programa do movimento liderado por Mounier e da revista criada por

ele era sintetizado no slogan ―Refazer o renascimento‖, ou seja, promover uma

―revolução personalista e comunitária‖. Com Mounier nasce o que podemos

chamar de uma filosofia da pessoa.

11

Entrevista de Joaquim Severino, cedida a IHU on-line, ano V edição número 155. ISSN 1981-8769 no

ano de 2005. pp 18-20, intitulada. “Herdamos uma filosofia da práxis”

Page 99: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

99

A Europa dos tempos de Mounier vivia um contexto de crise política e

espiritual, tragédias, guerras que verdadeiramente assombraram e nos

assombram até hoje. Devido ao contexto da época instaurou-se um pessimismo

coletivo nos intelectuais, a ponto de apresentarem julgamentos pessimistas

quanto ao futuro.

Na França um poeta francês chamado Paul Valéry, escreve:

Há a ilusão perdida de uma cultura europeia e a demonstração

de impotência do conhecimento para salvar o que quer que seja.

Há a ciência atingida em suas ambições morais, e como que

desonrada pela crueldade de suas aplicações. (VALÉRY apud

LORENZ, 2008, p. 12)

A crise da racionalidade e o desespero que se instaura desde o simples

trabalhador até a grande elite intelectual europeia, na verdade é consenso em

toda humanidade que se vê fragilizada perante a tanta tragédia. (LORENZ,

2008) Será que o racionalismo teria morrido nos campos de batalha? O

distanciamento no qual homens e mulheres passam a ter em relação a

esperança, fé e amor, será o prenúncio da morte?

Este desespero que percebemos, pela ausência de um local seguro, algo

concreto, palpável e firme para se sustentar, submete o ser humano ao

―niilismo‖12.

É no convívio com as sombras do passado, com o medo do futuro e com

a angústia do presente que o personalismo de Mounier irá se contrapor.

Mounier não nos vai dar o esclarecimento ou o resumo de uma

doutrina que dele não era passível, mas, muito antes, vai tentar,

a partir de seus temas e dados fundamentais, apresentar-nos em

plena elaboração e em plena vida uma filosofia que escapa a

12

Segundo Gérard Durozoi, em seu Dicionário da Filosofia (1996) o conceito de niilismo em Nietzsche, o

designa em primeiro lugar a ausência de fins determináveis “faltam fins”- que permitiriam a priori dar

um sentido à vida humana: “o futuro não tem objetivo”, ainda mais porque “Deus está morto.”

Page 100: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

100

todas as sistematizações, exatamente porque assente na

pessoa, que é livre e sempre imprevisível. É assim que o que

aqui encontramos é, sobretudo o acento doutrinário, sem corpo

de doutrina, a sistematização sem sistema, o encontro com

temas que merecem e justificam existências, essa dimensão de

testemunho e de mensagem, para que o seu pensamento mais

normalmente é compelido e que, tanto sua vida como sua obra,

sempre quiseram assumir. (COSTA apud ALVEZ, 2004, p.10)

Partindo desta constatação, o personalismo de Mounier é por excelência

o personalismo existencial, de um homem que teve como uma das suas

principais missões neste mundo, o engajamento nas questões políticas, sociais,

ideológicas e espirituais. Mounier desafiou os intelectuais da época a se

tornarem pessoas engajadas. Para o pensador ― engajar-se é uma exigência

essencial da vida pessoal‖ (MOIX,1968,p.176).

O que se propõe com esse engajamento é uma nova civilização. Esta

civilização para o pensador é o que já nos referimos anteriormente uma filosofia

a serviço da pessoa. Pessoa que se envolva e se comprometa pessoalmente

com a realidade imposta, tomando posse de seus direitos fundamentais, como,

viver, amar e ser amado, respeitar e ser respeitado, lutar por uma vida digna

sem em momento algum se esquecer de sua humanidade e de sua condição

existencial de ser humano.

A exigência deste engajamento e desta luta, perpassa necessariamente

pelo que (MOUNIER, 2004, p.103)) nos demostra: ― que nos modifique a

realidade exterior, que nos forme, que nos aproxime dos homens, que enriqueça

de valores nosso universo‖.

Mounier será ainda mais claro em se tratando de relações entre as

pessoas.

Ora nunca relações entre pessoas podem estabelecer-se

em um plano técnico. Desde que o homem é presente

todos são por ele contaminados. Agem até pela qualidade

da sua presença. Os próprios meios materiais tornam-se

humanos, vivem nos homens, por eles modificados e

Page 101: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

101

modificando-os a eles, ao mesmo tempo se integram essa

interação num processo total (MOUNIER, 2004, p.105)

Entendemos que aqui se encontra uma perspectiva relacional à qual

Mounier abordará em toda sua práxis filosófica, pois ai está o cerne do

engajamento. É nas relações que acontecem o encontro do eu com o outro, que

a pessoa faz a experiência de si. É a partir do contato pessoal com o outro que

há a possibilidade de um desvelar-se do próprio ser, conforme Lorenz (2008),

porém isso se torna factível, desde que a acessibilidade, a disponibilidade

estejam presentes.

O personalismo mounierista contribui de maneira didático-pedagógica,

humanizadora e transformadora com a temática das relações interpessoais,

pois, estamos diante de uma filosofia que tem em seu seio não sistematizações

de ideias e suposições de alguém distante com a práxis, não é um olhar vertical,

não é um discurso denso e complexo é, na verdade um testemunho de vida de

alguém que amou o ser humano independente das circunstâncias, que não

deixou que as armadilhas do sistema capitalista individualista maculassem esse

amor. Que durante toda sua curta existência lutou pela permanência da

condição humana em sua integralidade e dignidade.

Creio que por pior situação que a política educacional brasileira esteja

passando nada se justifica na violência revelada ou velada, no desrespeito, na

tentativa de coisificação do ser humano.

Talvez se Mounier ainda estivesse vivo ele diria o que o apóstolo Paulo

disse na carta de I Coríntios 13.13 ―Assim, permanecem agora estes três: a fé, a

esperança e o amor. O maior deles, porém é o amor‖

Page 102: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

102

Considerações Finais

Enfim é chegado o momento de olhar para trás, para os papéis

espalhados pala sala do meu orientador, em uma das dependências da

Universidade Federal de Mato Grosso e dialogar novamente com alguns

autores, mas necessariamente dialogar comigo mesma, se isso é possível.

Percebo ao ver o trabalho em sua fase ―final‖ que o universo do pesquisador é

algo que a fenomenologia merleaupontiana diria: um pensamento encarnado no

corpo.

Corpo que Ponty, Foucault, Mounier, Freire e tantos outros citam em

enfoques diferenciados de maneira direta ou indireta no caso de Freire, mas que

em si é o corpo.

Em entrevista a IHU Online, Rocha (2011,11) diz que Ponty ―trás o corpo

como um ponto fundamental de apreensão do mundo, ponto que muitas vezes

descuidamos na filosofia, ou mesmo na educação‖. Esse corpo sente dor,

angústia, alegria, é oprimido, oprime, é meu, é do outro e se manifesta na

interação e constituição do outro.

Evocar a corporeidade sem tê-la usado como uma dimensão do trabalho

nesse momento pode aparentar sem sentido, mas justifico a permanência e

utilização, no sentido de chamar atenção para a constituição do espaço onde

esses corpos se situam e se constituem com os significados de suas ações.

Conforme Ponty (2006) o corpo dotado de intencionalidade encarnada.

Para Mounier (2004) será existência incorporada, Foucault(1997) em Vigiar e

Page 103: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

103

Punir, corpos dóceis e em Freire (1996) corpo existencial que interage com o

outro.

Refletindo sobre estes conceitos e lembrando que tenho como pano de

fundo a compreensão fenomenológica, percebo que estamos diante talvez de

um dos maiores desafios do século XXI, em meio a tantos progressos

tecnológicos, a ascensão da robótica, o cinema 6 D, os avanços da medicina e

tantos outros feitos, precisamos relembrar fatos do passado e perceber como

acontecimentos como o maquinismo, o fascismo, a civilização burguesa

individualista, a insegurança da racionalidade contribuíram para a

despersonalização do ser humano.

Mounier não resolve sair em defesa de uma filosofia do prósopon á toa,

isto só acontece porque os valores que dignificam a pessoa humana estavam

desaparecendo e a sociedade caminhava a passos largos para uma crise da

existência.

Será que há alguma coincidência com o que vivemos na atualidade?

Em nome de um sistema capitalista liberal desigual e fomentador de

exclusão, terminamos por não nos reconhecer enquanto seres incompletos e

inacabados.

Buber(1979) irá dizer que na relação do EU e o TU, essa incompletude

irá gerar reciprocidade que, em consequência gerará amor, a responsabilidade,

unidade, diálogo, ou seja, não é só EU e nem só o Tu, mas sim EU e TU, que

por sua vez respeito e amor.

O amor é uma força cósmica. Aquele que habita e contempla no

amor, os homens se desligam do seu emaranhado confuso

próprio das coisas; bons e maus, sábios e tolos, belos e feios,

uns após outros, tornam-se para ele atuais, tornam-se TU, isto é,

seres desprendidos, livres, únicos, ele os encontra cada um

face-a-face. [...] O amor é responsabilidade de um EU para com

um TU: nisto consiste a igualdade daqueles que amam

igualdade que vai do que não pode consistir em um sentimento

qualquer igualdade que vai do menor, ao maior do mais feliz e

Page 104: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

104

seguro, daquele cuja vida está encerrada na vida de um ser

amado, até aquele crucificado durante sua vida na cruz do

mundo por ter podido e ousado algo inacreditável: amar os

homens. (BUBER, 1979, p.17)

Não estou me referindo aqui ao amor enquanto sentimento, por entender

que este todos nós já o temos em nosso íntimo, mas o amor que surge nas

relações dialógicas, estabelecidas entre as pessoas, o amor que emerge de um

momento de diálogo frente a uma situação que aparentemente era impossível

de se resolver, o amor necessário a relação dos homens e das mulheres.

Quando nos relacionamos com nosso próprio com amor não há lugar para

violência, não há lugar para nenhum sentimento que nos torne menos humano.

É no diálogo que esse amor tem que surgir, para que em diálogo mediante a

palavra possamo-nos ―confrontar‖ e nos ―suportar‖ em amor.

Gostaria que nas relações interpessoais, estabelecidas no convívio da

escola fossem envolvidas deste amor e que ele fosse a opção para a

humanização das relações.

Page 105: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

105

BIBLIOGRAFIA

ALMEIDA, João Ferreira de. Bíblia de Estudo da Mulher. Belo Horizonte: atos, 2002. BARROSO, J. A Administração da Educação: os caminhos da descentralização.

Lisboa: Colibri, 1995 a.

BELLO, Ângela Alves. Fenomenologia e Ciências Humanas: psicologia, história

e religião/org. e trad. Miguel Mahfoud e Marina Massini. Bauru, SP: EDUSC,

2004.

________________. A fenomenologia do ser humano: traços de uma filosofia no

feminino/trad. de Antônio Angonese. Bauru, SP: EDUSC, 2000.

BORDIGNON, Genuíno. Gestão Democrática da Educação. Boletim nº 19-

outubro. 2005

BICUDO, Maria Aparecida Viggiani & ESPÓSITO, Vitória Helena Cunha.

Pesquisa Qualitativa em Educação: um enfoque fenomenológico. Piracicaba:

Editora UNIMEP, 1994.

BUBER,Martins. Eu e Tu; trad do alemão,introdução e notas de Newton Aqulies

Von Zuben. São Paulo, Cortez & Moraes, 2. Edição. Ver. 1979.

CHALITA, Gabriel. Pedagogia do Amor: a contribuição de histórias universais a

formação de valores das novas gerações- São Paulo: editora Gente, 2003.

Page 106: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

106

D‘AMBRÓSIO, Ubiratan. Educação para uma sociedade em transição.

Campinas: Papirus, 1999.

DALMÁS, Ângelo. Planejamento Participativo na Escola. Petrópolis,RJ: Vozes

1999.

DEMO, Pedro. Desafios Modernos da Educação. Petrópolis. Vozes. 1993

DEPRAZ, Natalie. Compreender Husserl/trad. de Fábio dos Santos. 3 ed.

Petrópolis, RJ: Vozes 2011

FIORI, Ernani Maria. Aprender a dizer a sua palavra. (prefácio).In: FREIRE,

Paulo. Pedagogia do Oprimido. 12ª Ed. Rio de Janeiro; Paz e Terra, 1983.

FOUCAULT, Michel. Microfísica do Poder. Org. e tradução de Roberto Machado.

Rio de Janeiro: Edições Graal. 2008

________________. Genealogia e Poder. 1992 In:_______________ Microfísica

do Poder. Rio de janeiro: Edições Graal. 2008

FREIRE, Paulo Réglus. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro. 3ª edição.

Editora Paz e Terra. 1975

_____________________Extensão ou Comunicação? 5 ed. Rio de Janeiro: Paz

e Terra, 1980.

_____________________Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à

prática educativa. São Paulo: Paz e Terra. 1996

_____________________Pedagogia da Esperança: um reencontro com a

pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro. Paz e Terra. 1992

___________________SHOR,Ira. Medo e Ousadia: o cotidiano do professor.

Trad, Adriana Lopez. 2ª edição. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

Page 107: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

107

____________________Professora Sim, Tia Não. Editora Paz e Terra, 1995.

GADOTTI, Moacir. Cátedra Paulo Freire. Universidade Nacional da Costa Rica.

Auditório Del. CIDE. San José. 2001.

GÉRARD, Durozoi. Dicionário de Filosofia. 2ª edição, trad. Marina Appenzeller.-

Campinas, SP: Papirus, 1996.

GUISSARD, Lucien. O cristão Mounier. In: Domech, Jean-Marie et al. (orgs.)

Presença de Mounier. Trad. de Maria Lucia Moreira. SP: Duas Cidades, 1969.

HORA, Dinair Leal da. Gestão Democrática na Escola: artes e ofícios da

participação coletiva. Campinas. São Paulo. Papirus. 1994.

LIMA, L Afonso, A . Reformas da Educação Pública: democratização,

modernização, neoliberalismo. Porto: Afrontamento, 1996;

MAMEDES, Cleusa Bernadete Larraganhas. Democracia na Escola pública e

participação de professores. Cáceres-MT: Editora Unemat, 2005.

MATO GROSSO, Secretaria de Estado de Educação. Plano de Metas da Frente

Cidadania e Desenvolvimento. 1995.

MATTHEWS, Eric. Compreender Meleau-Ponty/trad. De Marcus Penchel.

Petrópolis, RJ: Vozes, 2010.

MARTINS, Joel. Um Enfoque Fenomenológico do Currículo: Educação como

Poíesis. Org. do texto Vitória Helena Cunha Espósito. São Paulo: Cortez, 1992.

MERLEAU-PONTY, Maurice. A Fenomenologia da Percepção; (Carlos Alberto

R. de Moura) 3ª ed.- São Paulo: Martins Fontes 2006.

Page 108: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

108

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Gestão Democrática da educação. Boletim nº 19.

Outubro. 2005. In: BORDIGNON, Genuíno.

MOIX, Candide. O pensamento de Emmanuel Mounier. Trad. de frei Marcelo L.

Simões. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1968.

MOUNIER, Emmanuel. O Personalismo. Emmanuel Mounier; (tradução Vinícius

Eduardo Alves). São Paulo: Centauro, 2004.

NASCIMENTO, Claudemiro Godoy do. A Práxis Filosófica no Pensamento de

Emmanuel Mounier em Tempos de Globalização. Goiânia. Fragmentos de

Cultura. V.17, nº 1/ 2,PP.117-136.2007

NETO, Alfredo Veiga. Foucault e a Educação. Belo Horizonte: Autêntica,2003

NÓVOA, Ântonio. Entrevista ao Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 9 de setembro

de 1999

PARO Vítor Henrique. Administração Escolar: uma introdução crítica. Cortez.

Autores Associados. 1990

PEIXOTO, Adão José. Pessoa, Existência e Educação. Goiânia: Edição da

UCG, Ed. Alínea, 2009.

PEREIRA, Otaviano. O que é Teoria. Coleção Primeiros Passos. Editora

brasiliense. 10ª edição. São Paulo. 1995

REVISTA de Educação Pública- v. 16 nº 31- (maio-agosto. 2007)- Cuiabá:

EdUFMT, 2007.192 p. In: Lopes, José Rogério. Movimentos sociais, negociação

da realidade e modos de modernização na sociedade brasileira. 2007.

REVISTA Gestão em Rede- nº76- (abril. 2007)- Consed-Mec. Brasília. REVISTA

Pesquisa Qualitativa/publicação da sociedade de Estudos e pesquisa

Page 109: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

109

Qualitativos. Ano 3, nº 1 (2008)- São Paulo: SE&PQ,2005.In: SPÒSITO, Vitória

Helena Cunha. Autonomia e heteronomia na escola: o coletivo e o individual na

educação.

REVISTA IHU Online- nº 378 ano XI. 31.10.211. ISSN 1981-8769.Universidade

do Vale do Rio dos Sinos. São Leopoldo RS.

REZENDE, Antônio Muniz. Concepção fenomenológica da educação. Polêmicas

do Nosso Tempo. São Paulo: Cortez: Autores Associados, 1990.

SANDER, Benno. Administração da Educação no Brasil: é hora da relevância,

Educação Brasileira, Brasília. Conselho de Reitores das Universidades

Brasileiras (CRUB), ano IV, nº 9, 2º semestre, 1982.

SANTOS, Clóvis Roberto. A Gestão Educacional e Escolar para a Modernidade

Mudança. Thompson Pioneira. 1ª edição. São Paulo. 2008.

SARTRE, Jean Paul. O Ser e o Nada. 7. Ed. Petrópolis: Vozes, 1999.

SEVERINO, Antônio Joaquim. Pessoa e Existência. Iniciação ao Personalismo

de Emmanuel Mounier. São Paulo: Autores Associados: Cortez 1983.

SOUZA, Sérgio Augusto Freire de. A Escola Fayolistas e a Escola pós-moderna

contextos para administradores e gestores da educação. 2005

STRECK, Danilo R.; REDIN, Euclides; ZITKOSKI, Jaime José (orgs) Dicionário

Paulo Freire. Belo Horizonte: Autêntica, 2008.

TELES, Maria Luiza Silveira. Educação sem fronteiras: Cuidando do ser/

Petrópolis, RJ: Vozes, 2003.

TOURAINE, A. A sociedade pós-industrial. Lisboa: Moraes Editora, 1970.

Page 110: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

110

ZATTI, Vicente. Autonomia e educação em Immanuel Kant e Paulo Freire. Porto

Alegre: EDIPUCRS. 2007.

VALLIN, Celso. Poder e democracia na escola. São Paulo, PUC-SP,2004.

Page 111: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

111

ANEXO A

Page 112: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

112

Page 113: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

113

ANEXO B

Page 114: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

114

Page 115: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

115

ANEXO C

Page 116: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

116

Page 117: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

117

Page 118: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

118

ANEXO D

Page 119: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

119

Page 120: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

120

Page 121: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

121

ANEXO E

Page 122: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

122

Apêndice A

Prezados colegas, tendo em vista a pesquisa em curso sobre

as relações interpessoais no contexto escolar no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu da Universidade Federal de Mato Grosso, solicito se possível, responderem a este questionário. Não há necessidade de identificação

1) Qual a sua formação?___________________________________

2) Quais as características que você pensa ser imprescindíveis para o

exercício do cargo de gestor?( no mínimo

três)___________________,_____________________e_________

_____________________

3) Qual o nível de relacionamento que tinha com o gestor?

( ) profissional ( ) amigável ( )superficial ( ) difícil

4) Como você via o último gestor da escola?

( ) Flexível ( ) Inflexível

5) Se a resposta for inflexível, o que você fez para resolver os

problemas e os conflitos que

ocorreram?_____________________________________________

______________________________________________________

6) Como o gestor reagia ao ouvir suas sugestões em relação a

organização e administração da unidade escolar?

( ) Ouvia atentamente ( ) Ouvia sem dar muita importância ( ) Nem sempre ouvia minhas sugestões ( ) Nunca ouvia minhas sugestões

7) Ao seu ver qual o nível de acompanhamento que o último gestor

tinha das coisas que aconteciam na unidade escolar?

( ) alto ( ) médio ( )baixo ( ) nunca sabia o que de fato estava acontecendo na escola

Page 123: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE … · Obrigada de coração pelas orações e clamores ao Deus dos exércitos; ... que fez a primeira revisão do texto para

123

7 A) se a resposta não for alto, o que lhe impedia de realizar este acompanhamento___________________________________________________________________________________________________________

8) Qual a sua opinião sobre o processo eleitoral para escolha de

gestores em Diamantino- MT?

( ) polêmico ( ) justo e democrático ( )político ( ) outros

9) Você incentivaria um colega a ser gestor?

( ) sim ( ) não

Justifique:____________________________________________________

10) Você se candidataria ao cargo?

( ) sim ( )Não

Justifique_____________________________________________________ Obrigada por responder este questionário ______________________ Profª Mtda Sonia Apª da S. de L. Pires