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UNIVERSIDADE FEDERAL DE JUIZ DE FORA FACULDADE DE COMUNICAÇÃO SOCIAL  Novas sociabilidades em Juiz de Fora: O impacto da internet na vida do jovem, do morador de rua e do trabalhador João Paulo Moreira Rabelo Juiz de Fora 8

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE JUIZ DE FORA

FACULDADE DE COMUNICAÇÃO SOCIAL

 

Novas sociabilidades em Juiz de Fora:

O impacto da internet na vida do jovem, do morador de rua e do trabalhador

João Paulo Moreira Rabelo

Juiz de Fora

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Novembro de 2008

João Paulo Moreira Rabelo

Novas sociabilidades em Juiz de Fora:

O impacto da internet na vida do jovem, do morador de rua e do trabalhador

Trabalho de Conclusão de CursoApresentado   como   requisito   para   obtenção   de grau   de   Bacharel   em   Comunicação   Social   na Faculdade de Comunicação Social da UFJF

Orientador: Prof. Dr. Bruno Fuser

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Juiz de Fora

Novembro de 2008

João Paulo Moreira Rabelo

Novas sociabilidades em Juiz de Fora:O impacto da internet na vida do jovem, do morador de rua e do trabalhador

Trabalho  de  Conclusão   de  Curso   apresentado   como   requisito   para   obtenção   de  grau   de Bacharel em Comunicação Social na Faculdade de Comunicação Social da UFJF.

Orientador: Prof. Dr. Bruno Fuser

Trabalho   de   Conclusão   de   Curso   aprovado   em   19/11/2008   pela   banca   composta   pelos seguintes membros:

_____________________________________________________________

Prof. Dr. Bruno Fuser (UFJF) ­ Orientador

_____________________________________________________________

Prof. Dr. José Luiz Ribeiro (UFJF) – Convidado

_____________________________________________________________

Prof. Ms. Diogo Tourino de Sousa (UFJF) – Convidado

Conceito obtido: _______________________________________________

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Juiz de ForaNovembro de 2008

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Aos meus pais, Geraldo e Janete.

Agradecimentos

Obrigado a todos os meus familiares que compreenderam a escolha que fiz por uma faculdade tão distante da terra natal.

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Obrigado aos amigos, aos companheiros de estágio (Acesso, Votorantim, TV Panorama...), aos professores da Faculdade de Comunicação e ao Grupo de teatro Divulgação. Todos vocês me ensinaram a (sobre)viver.

Obrigado ao professor Diogo, por ter gentilmente aceito fazer parte da banca deste trabalho e pelas   elogiáveis   performances   explicativas   em   sala;   obrigado   ao   meu   primeiro   chefe   e disciplinador, por ter me aceito monitor de sua disciplina e ator de suas obras dramáticas, venerável e amigo Zé Luiz; obrigado ao paciente e perspicaz professor Bruno que me fez entender que a internet pode, sim, mudar a vida de muita gente. 

Obrigado àqueles que colaboraram para a realização deste trabalho, em especial a Escola de Informática   e  Cidadania  do  CDInfo  do  bairro  São Pedro,  o   setor  de   internet  popular  da Biblioteca Municipal e o setor de internet popular do Centro Regional Santa Luzia.

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“... não são só aparelhos, são novas linguagens, novas formas de perceber, novassensibilidades, novas formas de entender o espaço, o tempo,

a proximidade, as distâncias”.

 Jesús Martín­Barbero

Resumo

Este trabalho tem como objetivo entender as modificações sociais decorrentes da utilização das   chamadas   novas   tecnologias   da   comunicação,   em   especial   a   rede   mundial   de computadores, na vida de três grupos de pessoas: o jovem, o morador de rua e o trabalhador – usuários de setores de internet popular de Juiz de Fora, também conhecidos como telecentros. Apresentamos estudos referentes à   introdução das tecnologias de suporte a inteligência na sociedade, o debate sobre a dependência cada vez maior da informática em nossas vidas e a identidade cultural na sociedade da informação. Um estudo de caso realizado por meio de visitas e entrevistas com os grupos e a posterior comparação de dados encerra o trabalho. Uma das principais conclusões é a constatação, entre todos os usuários pesquisados, de novas formas   de   sociabilização,   como   acesso   a   informação,   relacionamentos,   entretenimento   e trabalho, modificando hábitos existentes antes da explosão das novas mídias. 

Palavras­chave: Internet; Novas Tecnologias da Comunicação; Sociedade da Informação.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO                                                                                                                  8

        

2 AS MENSAGENS DA ERA DIGITAL 10

2.1 O MUNDO TODO NA REDE 15

2.2 A DEMODRATIZAÇÃO DA INFORMÁTICA 18

3 A IDENTIDADE CULTURAL NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO

3.1 QUAIS PAPÉIS? 28

3.1.1  A juventude 30

3.1.2  A mendicância 34

3.1.3 O trabalho 37

4 METODOLOGIA 39

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5  ESTUDO DE CASO 42

5.1 JOVENS NA ESCOLA DE INFORMÁTICA E CIDADANIA CIDADE ALTA 42

5.2 MORADORES DE RUA NAVEGAM NA REDE DA BIBLIOTECA MUNICIPAL   46

5.2.1 O Núcleo de Cidadão de Rua 48

5.3 EM BUSCA DE OPORTUNIDADES NO TELECENTRO DE SANTA LUZIA 52

6 CONCLUSÃO 59

7  REFERÊNCIAS               66

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1INTRODUÇÃO

Estudar o impacto dos meios de comunicação na sociedade não é tarefa fácil. A 

utilização e as formas de apropriação das diversas tecnologias se dão, ao mesmo tempo, por 

questões individuais,  coletivas,  sociais  e culturais.  Como em todas as áreas de estudo das 

ciências sociais aplicadas, aqui, também, não podemos cometer o erro da generalização de 

determinados comportamentos ou atitudes de grupos sociais. Por outro lado, devemos buscar 

traços que apontem para uma homogeneidade, mesmo relativa, da relação entre os atores e os 

meios. 

Escolhemos um meio de comunicação revolucionário como objeto de estudo: a 

internet. Ela representa para o século XXI não apenas o que os meios de comunicação de 

massa representaram para o século anterior. A mensagem dela é muito mais complexa por se 

tratar de ferramenta multimídia, onde todos podem se comportar como receptores, produtores, 

consumidores,   vendedores,   cidadãos   ou   trabalhadores   virtuais   –   para   ficar   em   alguns 

exemplos. 

O objetivo deste trabalho é analisar o impacto da rede mundial de computadores 

na vida de três grupos sociais  em Juiz de Fora.  A partir  de visitas semanais a setores de 

internet popular de bairros da cidade, encontramos o jovem, o morador de rua e o trabalhador 

como papéis sociais relevantes para esta análise. Antes de discutir as formas de uso por estes 

internautas,  apresentamos  alguns  dados   relativos  aos  perfis  em questão,  o  que  acaba  por 

facilitar nossa compreensão das necessidades demonstradas por eles ao longo do estudo de 

caso. Ao falarmos dos papéis de determinados grupos na sociedade, é relevante entendermos 

as   relações   entre   cultura,   identidade   e   sociedade   da   informação.   Para   isso,   buscamos   a 

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compreensão   do   tema   em  Stuart  Hall,  Nestor  García   Canclini,   Lúcia  Santaella   e   outros 

pesquisadores.

Antes disso, discutimos as modificações que já podem ser percebidas em nosso 

tempo com a introdução das tecnologias digitais. Para isso, conceitos de Marshall McLuhan 

ainda   são   indispensáveis   para   o   entendimento   geral   da   relação   meio   de   comunicação   e 

sociedade. Um autor que não poderia faltar em nossa lista é Manuel Castells, que, antes da 

virada do século, já havia se debruçado na tentativa de conceituar o novo tempo que estava 

por se consolidar: a sociedade em rede. Pierre Lévy é outro pesquisador difícil de descartar 

quando o assunto é cibercultura, por isso trazemos para este trabalho as idéias que ele discutiu 

em As Tecnologias da Inteligência e Cibercultura. 

Ao final, após a apresentação dos dados qualitativos colhidos durante o estudo de 

caso   com   os   usuários   de   telecentros,   buscamos   entender   de   que   forma   se   alterou   a 

sociabilidade desses indivíduos. 

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2 AS MENSAGENS DA ERA DIGITAL

                Se for verdade que os meios de comunicação são como braços,  pernas,  olhos, 

ouvidos e pensamentos do homem, existe uma tecnologia que resolveu juntar todo esse nosso 

aparato em uma única invenção: o computador. Sim, o bom e velho computador – e seus 

derivados  digitais  –  são,  hoje,  os  meios  pelos  quais  a  humanidade  resolve   todos  os  seus 

problemas. As indústrias, as universidades, as escolas, a comunicação, a máquina pública, a 

economia, a ciência, enfim, todas as áreas de trabalho, lazer e conhecimento estão envolvidos 

direta   ou   indiretamente   com   o   sistema   informacional.   E   tal   como   os   outros   meios,   a 

tecnologia   digital   –   com   sua   infinita   aplicabilidade,   que   vai   da   simulação   de   sistemas, 

compactação  de   informação,   redes  virtuais,   etc.  –   reconfigura  a   sociedade,  as   formas  de 

representação e as identidades. Já em 1964, McLuhan constatara o que, para ele, era a única 

parte do corpo que faltara se estender ­ o cérebro: 

Estamos nos aproximando rapidamente da fase final  das extensões  do homem: a simulação   tecnológica   da   consciência,   pela   qual   o   processo   criativo   do conhecimento se estenderá coletiva e corporativamente a toda a sociedade humana, tal como já se fez com nossos sentidos e nossos nervos através dos diversos meios e veículos.  Se a projeção da consciência  (...)  será  ou não uma ‘boa coisa’,  é  uma questão aberta às mais variadas soluções. (MCLUHAN, 1964, p. 17). 

A preocupação de McLuhan com o estudo dos meios, que explode na máxima “O 

meio é a mensagem”, é fácil de entender. A introdução da escrita, da imprensa, do telégrafo, 

do telefone, do cinema, do rádio, e de tantas outras técnicas cognitivas de suporte à nossa 

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inteligência transformou de tal forma as nossas vidas que é inconcebível desvincular nossas 

ações   e   manifestações   culturais   dessas   técnicas.   Cada   uma   das   invenções   citadas 

anteriormente  contribuiu  a   sua maneira,  e  cada  uma a seu  tempo,  para  uma determinada 

“cirurgia” no corpo social. O termo médico foi também proposto por McLuhan e ilustra bem 

a capacidade transformadora imposta pelas técnicas ao nosso corpo, às nossas mentes e à 

sociedade.  Os meios instauram uma nova dinâmica social,  à medida que estabelecem uma 

nova forma de lidar com a natureza:

Os novos meios e tecnologias pelos quais nos ampliamos e prolongamos constituem vastas  cirurgias  coletivas  levadas  a efeito  no corpo  social  com o mais completo desdém   pelos   anestésicos.   Se   as   intervenções   se   impõem,   a   inevitabilidade   de contaminar todo o sistema tem de ser levada em conta. Ao se operar a sociedade com uma nova tecnologia, a área que sofre a incisão não é mais afetada. A área da incisão e do impacto fica entorpecida. O sistema inteiro é que muda. (idem, p. 84)

Pierre   Lévy   (1996)   fez   uma   leitura   acerca   da   introdução   das   tecnologias   na 

sociedade sob um ponto de vista temporal. “Diferentes tecnologias intelectuais geram estilos 

de pensamento distintos” (LÉVY, 1996, p. 77).  Nas sociedades sem escrita, a forma de tempo 

é   circular,  do  eterno   retorno,   já   que,  não  dispondo  da  escrita,   a   transmissão  de   idéias   e 

pensamentos é feita oralmente. E para que a memória social persista nas gerações seguintes, a 

repetição das concepções estabelecidas através do mito era o recurso de que dispunham. Com 

o surgimento da escrita, florescem os Estados, as leis, o comércio e as grandes civilizações 

agrícolas. “Pela primeira vez os discursos podem ser separados das circunstâncias particulares 

em   que   foram   produzidos.   Por   isso,   tentar­se­á   construir   discursos   que   se   bastem   a   si 

mesmos” (idem, p.90). Para o autor, o tempo da escrita é linear, histórico, construído pelo 

acúmulo e aperfeiçoado com a invenção da imprensa. 

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Um terceiro tempo se instaura com a chegada da informática. Na era da “rede 

digital”, o tempo é pontual: informação é multimídia, conhecimento é feito por simulação e os 

suportes se tornam cada vez mais leves e inquebráveis. “Vivemos numa época em que um 

modelo raramente é definitivo. Ele é continuamente corrigido e aperfeiçoado, o conhecimento 

se encontra em metamorfose permanente” (idem, p.120). Pelo raciocínio do autor, passamos 

por três eras distintas, que podem ser ilustradas por três figuras: o círculo, representando a 

oralidade primária; a linha reta, quando a escrita permitiu o acúmulo de conhecimento e a 

História das civilizações pôde ter sua memória preservada; e o ponto, representando a era 

digital, na qual a informação é alterada a uma velocidade espantosa e o acesso a ela se dá 

através das redes telemáticas. 

Seguindo   as   premissas   de   Lévy,   tal   como   qualquer   outra   tecnologia   da 

inteligência, o computador se estabelece não como mera ferramenta de auxílio no trabalho, 

objeto de divertimento de jovens, equipamento infalível de cálculo, etc. Na era da rede digital, 

a   construção  do   conhecimento  por  meio  da   simulação  é   potencializada   ao   extremo.  Seu 

impacto vai muito além: a informática introduz um novo período no qual a imaginação pode 

ser auxiliada por uma máquina e uma enorme quantidade de informação pode ser armazenada 

em um artefato  midiático  de   tamanho   insignificante.  “Além de estender  a  capacidade  de 

memória   a   curto   prazo,   a   informática   funciona   como   suplemento   para   faculdade   de 

imaginar” (ibidem). 

Nas décadas de 80 e 90, os jovens brincavam com o fato de jogadores iniciantes 

de games movimentarem os braços para a esquerda e para a direita, para cima e para baixo, na 

tentativa de fazer curvas com o carro virtual na tela. Antes era mesmo em vão, já que, para 

acertar no comando, exigia­se apenas que o usuário utilizasse os movimentos dos dedos nos 

botões da manete. Todavia, o avanço dos sistemas de simulação possibilitou a concretização 

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de games para os quais a força e os impulsos físicos do jogador são indispensáveis.  No mais 

recente  videogame  da Nitendo, o  Wii,  os jogadores de boxe,  na tela,  são orientados pelos 

movimentos   dos   usuários,   que   precisam   impulsionar   braços   e   punhos   para   que   a   luta 

aconteça, uma doce ironia com o passado. 

Contrariamente  à  maioria  das  descrições   funcionais  sobre  papel  ou aos  modelos reduzidos analógicos,  o modelo  informático é  essencialmente  plástico,  dinâmico, dotado  de  uma  certa  autonomia  de   ação  e   reação.  Como Jean­Loius  Weissberg observou tão bem, o termo simulação conota hoje esta dimensão interativa,  tanto quanto a imitação ou a farsa. O conhecimento por simulação é sem dúvida um dos novos gêneros que a ecologia cognitiva informatizada transporta.  (LÉVY, 1999, p.121)

E nunca um meio incorporou tanto as características dos outros que o precederam 

como no caso do computador.  Nele,  produzimos textos,  por meio da confecção de blogs, 

leitura de jornais  on­line  e bibliotecas virtuais, mensagens instantâneas, e­mails, tradutores 

simultâneos, e tudo quanto o mais o teclado alcançar. O oral e o audiovisual também estão lá: 

sites   de   vídeos,  videochats,   filmes,   seriados,   programas   de   TV,   programas   de   rádio, 

programas   que   fazem   programas,   reunidos   em   uma   infinita   oferta   de   informação   e 

interatividade.   O   impacto   da   chegada  da   informática   em  nossas   vidas   é   comparado  por 

Castells à invenção do alfabeto, na Grécia, em 700 a.C.

Uma transformação tecnológica de dimensões  históricas  similares  está  ocorrendo 2.700 anos depois, ou seja, a integração de vários modos de comunicação em uma rede   interativa.   Ou,   em   outras   palavras,   a   formação   de   um   Supertexto   e   uma Metalinguagem que,  pela primeira  vez  na história,   integra no mesmo sistema as modalidades escrita, oral e audiovisual da comunicação humana. (...) A integração potencial  de   texto,   imagens  e   sons  no mesmo sistema –   interagindo  a  partir  de pontos múltiplos, no tempo escolhido (real  ou atrasado) em uma rede global, em condições de acesso aberto e de preço acessível – muda de forma fundamental o caráter da comunicação. (CASTELLS, 2000, p. 354) 

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E   o   que   implica   para   a   sociedade   saber   que   ela   vive   em   um   período   de 

convergência   tecnológica?  Quando  muda  o   sistema  de  comunicação,  mudam   também  os 

valores existentes. “Como a cultura é mediada e determinada pela comunicação, as próprias 

culturas,   isto   é,   nossos   sistemas   de   crenças   e   códigos   historicamente   produzidos   são 

transformados de maneira fundamental pelo novo sistema tecnológico” (idem, p.354).

Por falar em “novo” é bom que não deixemos de discorrer sobre o adjetivo que 

está sempre ao lado de “tecnologia” para designar os meios digitais que deram cara e corpo 

aos anos 2000. De  novo, mesmo, a tecnologia digital não tem nada. Nova, sim, pode ser a 

recente disseminação por que vêm passando os aparelhos digitais. Hoje, é pouco provável que 

não encontremos um computador,  um  audioplayer,  um telefone celular  ou qualquer outro 

suporte digital desta natureza dentro de uma casa de classe média1. Segundo Castells (2000), 

data   de   1975   a   invenção   do   microcomputador   e,   dois   anos   depois,   o   primeiro   produto 

comercial de sucesso fora lançado no mercado, o Apple II.  Até a chegada do computador 

caseiro, muitos estudos em microeletrônica já estavam sendo realizados. Foi em 1947 que se 

deu a invenção do transistor, aparelho que possibilitou o desenvolvimento dos chips. Portanto, 

é de se estranhar que chamemos de “novas” essas tecnologias. Além do mais, é difícil dar essa 

classificação a um conjunto de descobertas em um período no qual a velocidade de evolução 

de um produto para outro se dá em questão de meses. A nova tecnologia, hoje, pode não ser 

tão nova assim daqui a dois anos, quiçá daqui a dois meses. Essa velocidade mesma com que 

as tecnologias da informação suplantam umas as outras, sustentando cada vez mais os ideais 

1  Em   novembro   de   2006,   o   site   de   tecnologia   www.idgnow.uol.com.br   informou,   por   meio   da   pesquisa Indicadores VIVO do Mercado Brasileiro de Telefonia Móvel, que a maioria dos brasileiros que possui telefone celular tem renda mensal de até 480 reais (64% dos entrevistados), nível médio de escolaridade (49%) e idade entre 14 e 30 anos (CELULAR, on­line). Além disso, é cada vez mais comum as empresas lançarem promoções de recarga de crédito para os celulares pré­pagos. A Sercomtel Celular, por exemplo, oferece aos seus clientes créditos a partir de dois reais. A medida, segundo a própria empresa, beneficia principalmente os assinantes das classes D e E (SERCOMTEL, on­line). 

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dos marqueteiros que pregam a obsolescência programada dos produtos, é parte da revolução 

digital que faz com que novas formas de relações socioculturais sejam alteradas. 

Além   da   convergência   das   mídias,   que   outras   características   diferenciam   as 

tecnologias digitais dos outros meios?   Castells enumera questões importantes para a nossa 

abordagem. Um dos aspectos que ele discute é com relação à “penetrabilidade dos efeitos das 

novas tecnologias”: “Como a informação é parte integral de toda a atividade humana, todos os 

processos de nossa existência individual ou coletiva são diretamente moldados (embora, com 

certeza,  não determinados) pelo novo meio.” (idem, p.78). Isso quer dizer que as relações 

sociais são modificadas direta e indiretamente por causa desta tecnologia, independente da 

intensidade com que nos relacionemos com ela. Em outras palavras, por mais distante que um 

grupo esteja das tecnologias, ele será,  de alguma forma, influenciado pelas mudanças que 

decorrem   das   novas   relações   estabelecidas   pelo   meio   digital.   Outro   ponto   importante 

apontado pelo autor é com relação à lógica de redes: 

Essa configuração topológica, a rede, agora pode ser implementada materialmente em todos os tipos de processos e organizações  graças às recentes  tecnologias da informação. Sem elas, tal implementação seria bastante complicada. E essa lógica de redes, contudo, é necessária para estruturar o não­estruturado, porém preservando a flexibilidade,  pois  o   não­estruturado  é   a   força  motriz  da   inovação   da   atividade humana. (CASTELLS, 2000, p.78)

A   lógica   de   redes   está   intimamente   relacionada   com   a   Comunicação   Mediada   por 

Computador   (CMC),   da   qual   a   internet   é   mãe.   É   sobre   ela   que   vamos   aprofundar   nas 

próximas páginas. 

2.1 O MUNDO TODO NA REDE

                                     

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Quando   desenvolveu   o   conceito   de   aldeia   global,   McLuhan   não   teve   a 

oportunidade de presenciar a conexão instantânea, descentralizadora e penetrante da internet. 

Na sua época, os objetos de análise eram principalmente a TV e o rádio, que conglomeravam 

(e ainda o fazem) tribos inteiras ao seu redor, formando a massa de receptores sob uma só voz 

integralizadora. A aldeia que se edifica em nosso século ainda não se sabe se pode chamar de 

massa. Estamos falando não mais de um pequeno grupo central enviando informações para 

todos. O modelo atual vigente caminha e se consolida cada vez mais e mais por uma voz de 

todos para todos. O centro torna­se paulatinamente invisível no emaranhado da rede. Os nós 

se   entrelaçam   e   se   comunicam.   A   rede   mundial   de   computadores   foi   idealizada   pelos 

militares,   nos   EUA,   sendo   posteriormente   aperfeiçoada   por   universidades   e   centros   de 

pesquisa. Sobre o surgimento da internet, Castells nos relembra o contexto histórico no qual a 

tecnologia pôde se desenvolver: 

Nas origens da Internet, está o trabalho de uma das instituições de pesquisa mais inovadoras   do   mundo:   a   Agência   de   Projetos   de   Pesquisa   Avançada   do Departamento de Defesa dos Estados Unidos (DARPA). Quando, no final dos anos 50,   o   lançamento   do   primeiro   Sputnik   alarmou   o  establishment  militar   norte­americano   de   alta   tecnologia.   A   DARPA   assumiu   várias   iniciativas   ousadas, algumas   das   quais   mudaram   a   história   da   tecnologia   e   estabeleceram   a   era   da informação em grande escala. Uma dessas estratégias (...) era projetar um sistema de comunicação   invulnerável   a   ataque   nuclear.   Com   base   na   tecnologia   de comunicação por comutação de pacotes, o sistema tornou a rede independente de centros   de   comando   de   controle,   de   modo   que   as   unidades   de   mensagens encontrariam sua rota ao longo da rede, sendo remontadas com sentido coerente em qualquer ponto dela. (idem, p.375)

A rede tem essa característica de não dispor de um centro difusor e dependente 

para   que   as   mensagens   cheguem   ao   receptor.   Isso   torna   a   internet   uma   ferramenta 

completamente diferente daquelas que a sociedade estava acostumada até a década de 80 do 

século passado. Estamos falando de um meio de comunicação horizontal, que se conecta pelas 

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redes,   onde   produção   e   recepção   de   informação   se   confundem   e   a   alta   velocidade   de 

transmissão de dados permite a interconexão de computadores a qualquer distância de um 

ponto a outro do mundo, com o mínimo ruído possível.  “O único modo de controlar a rede é 

não fazer parte dela. E esse é um preço alto a ser pago por qualquer instituição, já que a rede 

leva todos os tipos de informação para o mundo inteiro” (idem, p.375). Segundo o autor, as 

principais   características   da   comunicação   mediada   por   computador   são:   penetrabilidade, 

descentralização multifacetada e flexibilidade.  A interatividade do meio é outro ponto que 

merece destaque. O conteúdo que será lançado na tela não é restrito a 14 ou 15 canais, como 

no caso da TV aberta, ou a seis freqüências de rádio, ou ainda a quatro opções de filmes, 

como no caso do cinema. O cardápio da internet é quase que infinito, sendo que o consumo 

do conteúdo é um pedido de cada um, ou seja, os caminhos a serem percorridos na rede estão 

subordinados   unicamente   à   vontade   do   freguês:   em   qualquer   hora,   e   praticamente   em 

qualquer lugar – levando­se em consideração a tecnologia já bastante difundida da rede sem 

fio.  Sobre esse aspecto, Sousa (2007), em seu artigo a respeito de um texto de Luiz Martino, 

exemplifica os dois tipos de meios, o meio ferramenta e o meio máquina: 

A televisão, por exemplo, é um meio máquina porque funciona “sozinha”, ou seja, a única   demanda   do   usuário   é   acionar   o   controle   remoto.   A   programação   é “despejada” para o telespectador. Já a Internet é um meio ferramenta. Para utilizar a rede é necessário uma pergunta, ou seja, é preciso dar comandos intencionais para se obter  as   respostas  que se deseja.  Não basta   ligar  o  computador  e  esperar  que  a Internet funcione sozinha! Como uma programação de televisão. Martino acredita que os meios máquinas, como rádio, TV e jornal, geram o atual [Ou seja, meios de comunicação de massa preocupados em atender a uma demanda por informações]. Já os meios ferramentas, como o telefone e Internet, geram a experiência social [os dos  meios  possibilitam uma experiência  de   troca  e  uma  postura  mais  ativa  dos usuários]. (SOUSA, 2007, p.7) 

Essa  diversidade  de  opções  e  conteúdos  a   serem requisitados  na  web  tende  a 

promover uma revolução na cultura de todas as sociedades: “o que caracteriza o novo sistema 

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baseado   na   integração   em   rede   digitalizada   de   múltiplos   modos   de   comunicação   é   sua 

capacidade de inclusão e abrangência de todas as expressões culturais” (CASTELLS, 2000, p.

396). Uma das conseqüências apontadas por Castells é o enfraquecimento do poder simbólico 

dos emissores tradicionais.  Isso quer dizer que hábitos sociais codificados pela história, como 

religião, moralidade e autoridade, tendem a se dissolver. 

  A   internet   é   uma   das   causas   da   revolução   por   que   vem   passando   a   nossa 

sociedade,   daí   a   importância   em discorrer   sobre  o   termo  Sociedade  da   Informação.  Seu 

crescimento vertiginoso nos últimos anos aumenta nossa dependência em relação à variedade 

de   benefícios   oferecidos   por   ela,   a   saber:   armazenamento   ilimitado   de   informações, 

comunicação instantânea, realização de provas e reuniões  on­line, criação de redes sociais, 

divulgação   de   páginas   pessoais,   acesso   rápido   a   notícias   atualizadas   minuto   a   minuto, 

recursos multimídia disponíveis o tempo todo, entre várias possibilidades advindas da rede:

No curto período de oito anos, a Internet  se disseminou por praticamente todo o mundo, propiciando conectividade a países até então fora de redes e substituindo outras   tecnologias   (Bitnet,   Fidonet   etc.)   mais   antigas.   Mesmo   ainda   sendo,   em muitos   países,   um   serviço   restrito   a   poucos,   a   velocidade   da   disseminação   da Internet,  em comparação com a de outros serviços,  mostra que ela se tornou um padrão de fato,  e que se está  diante de um fenômeno singular, a ser considerado como   fator   estratégico   fundamental   para   o   desenvolvimento   das   nações. (TAKAHASHI, 2000, p. 29)

De  acordo  com uma pesquisa  da  ONG norte­americana   Internet  World  Stats, 

publicada na reportagem “O Brasil cai na rede”, na revista Carta Capital, o número de novos 

conectados cresceu 900% no país entre 2000 e 2008. Ainda segundo a reportagem, o Brasil é 

o país em que os usuários passam mais tempo conectados por mês: “São mais de 22 horas 

mensais, ante 20 horas da França e 17,5 na Alemanha... Em 2007, pela primeira vez, foram 

vendidos mais computadores que tevês.” (O BRASIL..., 2008, p.28­29). 

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Interessante  notar  que  a  reportagem comparou a venda de computador  com o 

eletrodoméstico mais popular e cujo conteúdo é o mais consumido no país: a TV. Só que, 

apesar de as vendas do PC terem superado as de televisão, este continua sendo o aparelho 

mais presente nos lares dos brasileiros. E com relação à democratização das Tecnologias de 

Informação e Comunicação (TICs)?  

2.2 A DEMOCRATIZAÇÃO DA INFORMÁTICA

O turbilhão de informações ao qual podemos ter acesso com certa facilidade ­ seja 

em casa, seja no trabalho ou na faculdade rapidamente entramos em contato com informações 

de qualquer parte do mundo ­ ainda é algo a que muitos segmentos da população não têm 

acesso. A velocidade com que se desenvolvem novos programas, computadores mais potentes 

e tecnologias mais eficazes de manipulação da informação não é a mesma que se verifica na 

propagação do acesso a essas  tecnologias.  Isso quer dizer que há  uma brecha no que diz 

respeito à democratização do acesso às tecnologias de comunicação e informação (TICs). A 

expressão   inclusão  digital   surge  numa época  na  qual   informação  e   conhecimento  “são a 

alavanca   propulsora   da   Nova   Economia”   (MACADAR   e   REINHARD,   2002,   p.5). 

Assumpção (2001) a conceitua como sendo: 

... Os esforços de fazer que as populações das sociedades contemporâneas possam obter   os   conhecimentos   necessários   para   utilizar   linguagens   e   capacidades   dos recursos de TICs existentes e possam dispor de acesso regular aos equipamentos que possibilitam a existência dessas tecnologias. (ASSUMPÇÃO, 2002, p.7)

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Na mesma reportagem já citada de Carta Capital, é mencionado o caso da cidade 

Sud Mennucci (SP), na qual o analfabetismo reduziu­se pela metade após a implantação de 

um projeto que disponibiliza o acesso à  internet sem fio para todos os 7,7 mil habitantes. 

Segundo   a   revista,   a   prefeitura   implantou   a   rede   através   da   instalação   de   antenas   de 

retransmissão.  Para  que a  população  tenha acesso  à   internet  sem fio,  basta  que a  pessoa 

compre uma antena com um custo médio de 200 reais. Este seria o único gasto, não havendo 

restrição ao uso e nem pagamento de mensalidade. O resultado da empreitada chegou a ser 

reconhecido pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC):

Em 2001, 14% dos moradores da cidade eram analfabetos. Atualmente, são 7,25%. O município foi  incluído numa restrita  lista de 37 cidades do país onde o MEC avalia a razão do sucesso de práticas educacionais. Os índices podem ser atribuídos também ao fato de o acesso a rede ter mudado hábitos da população, como o de freqüentar   mais   a   biblioteca,   onde   há   computadores   disponíveis   a   todos.   (O BRASIL..., 2008, p. 33). 

Infelizmente,  não é   toda  cidade  que  dispõe  dos  mesmos   recursos  ou  situação 

política que Sud Menucci. O exemplo dela mostra um entre tantos outros benefícios que a 

inclusão digital e o acesso à rede mundial de computadores podem proporcionar. Atualmente, 

devido à  dependência que nossa sociedade vive dos processos tecnológico­informacionais, 

pode­se dizer que não existe muita diferença entre não saber ler e não saber lidar com as 

ferramentas   básicas   de   um   computador.   No   entanto,   para   Lévy   (1999),   sempre   haverá 

excluídos no processo de desenvolvimento de novos sistemas de comunicação. “Cada novo 

sistema de comunicação fabrica seus excluídos.  Não havia  iletrados antes da invenção da 

escrita. A impressão e a televisão introduziram a divisão entre aqueles que publicam ou estão 

na   mídia   e   os   outros”.   (LÉVY,   1999,   p.239).   Há   que   se   concordar   que   o   processo   de 

popularização e barateamento de uma nova tecnologia se faz com o tempo. A televisão, que 

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era   artigo   de   luxo  na   década   de   60,   hoje   integra   a  mobília   de   mais   de   90%  dos   lares 

brasileiros. O autor afirma que “... cada universal produz seus excluídos. O universal, mesmo 

se ele ‘totaliza’ em suas formas clássicas, jamais engloba o todo” (ibidem).  

Tal   constatação  é   verossímil,  mas  omite   as   conseqüências   sociais,   culturais   e 

econômicas para aqueles que não podem usufruir das chamadas tecnologias da comunicação – 

em especial o computador de uso pessoal e a internet. O que farão os excluídos? Esperar a 

chegada da década da popularização dos meios? As  tecnologias  de suporte  à   inteligência 

fazem parte do cotidiano de pessoas e de diferentes instituições de todo o mundo, e por isso, 

devem ser objeto de políticas públicas para sua democratização. Diferente da TV ou do rádio, 

meios mais tradicionalmente ligados ao lazer e ao entretenimento, a comunicação mediada 

por computador e a tecnologia digital fazem parte de um novo sistema dos quais dependem os 

estudos, o trabalho e todo conglomerado urbano.

Uma das alternativas encontradas por prefeituras, ONGs e outras entidades para 

amenizar  a exclusão digital  no país é  a criação de espaços públicos  de acesso à   internet, 

conhecidos como  telecentros. Neles, populações de baixa renda que não têm condições de 

adquirir um computador e de pagar pelo acesso à internet podem usufruir gratuitamente de 

diferentes serviços e atividades relacionados à comunicação eletrônica. Apesar de a maioria 

desses   espaços   limitar   o   acesso   a   determinados   conteúdos,   como   sites   eróticos,   sites   de 

relacionamento,   bate­papos,   entre   outros,   o   usuário   tem   diante   de   si   um   mundo   de 

informações   à   sua   disposição.   O   Livro   Verde   da   Sociedade   da   Informação   no   Brasil 

classifica­o da seguinte forma:

O termo telecentro tem sido utilizado genericamente para denominar as instalações que prestam serviços de comunicações eletrônicas para camadas menos favorecidas, 

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especialmente nas periferias dos grandes centros urbanos ou mesmo em áreas mais distantes.  (...)  se forem analisados os perfis  dos diferentes  públicos que deles  se utilizam, não parece haver dúvida de que suas experiências têm agregado segmentos sociais que dificilmente teriam acesso à rede sem telecentros. (TAKAHASHI, 2000, p.34)

Bruno Fuser desenvolve trabalhos nos quais defende a utilização dos telecentros 

como equipamentos de comunicação comunitária. Para ele, deve haver nesses locais políticas 

claras de capacitação e formação permanentes dos envolvidos no processo: 

Entre as finalidades do telecentro comunitário estão o apoio à criação de emprego e empreendimento locais, fortalecimento da autoestima, apoio e desenvolvimento de ações   de   saúde,   educação,   organização   comunitária,   planificação   urbana, descentralização e ação política, fortalecimento de grupos marginalizados, acesso a novas fontes de informação e conhecimento, apoio a criação de diferentes formas de expressão artística e cultural.  (FUSER, 2007, p.11)

Obviamente, não é o que acontece na maioria dos telecentros, que, normalmente, 

se restringe a disponibilizar a máquina com acesso à internet para a comunidade, sem uma 

política definida de combate ao analfabetismo digital. Para Fuser (2008), a inclusão digital 

não deve ficar restrita à destreza técnica. (FUSER, 2008.p.3). 

Ainda assim, temos que reconhecer esses espaços como minimamente inclusivos, 

afinal,  propiciam o contato  primário  por  aqueles  que  não  têm recursos  para  adquirir  um 

computador. E o mérito por contribuir com a diminuição da exclusão digital não é só dos 

telecentros. O Núcleo de Informação e Coordenação (NIC. br), ligado ao Comitê Gestor da 

Internet  no  Brasil   (CGI.  br),   apontou que  a   inclusão  digital  no Brasil  é   conduzida  pelos 

setores de internet  popular  e pelas  lan houses.  O principal  ponto de acesso à   internet  no 

Brasil,  segundo a pesquisa divulgada no site IdgNow!, se dá em  lan houses,  com 49% de 

participação entre os entrevistados. “... O uso da Lan House como ponto de conexão subiu 19 

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pontos percentuais em relação ao ano anterior [2006], potencializado por um perfil novo de 

internauta   no   Brasil,   aponta   Mariana   Balboni,   gerente   do   Centro   de   Estudos   sobre 

Tecnologias da Informação e da Comunicação”. (PC POPULAR, on­line) 2. 

É,   portanto,   em   telecentros   e   em   espaços   pagos   de   acesso   à   internet   que   as 

populações de baixa renda poderão trocar informações com outras culturas, permitindo que a 

sua maneira de enxergar o mundo onde vive seja, de alguma forma, enriquecida. 

E   o   impacto  dessa   relação   irá   depender,   como  assinala   Brignol,   do   contexto 

cultural que o próprio usuário carrega consigo: “As preferências de acesso às possibilidades 

da   internet   são determinadas  pela  capacidade  de  produção de  sentido  de  cada   indivíduo, 

garantida   também   através   da   identificação   com   a   história,   valores,   hábitos   e 

tradições” (BRIGNOL, 2002, p. 2). 

Para esmiuçar os diferentes perfis de usuários dos telecentros mais à frente em 

nosso trabalho, é, portanto, indispensável o entendimento do conceito referente à identidade 

cultural dos grupos e da sociedade como um todo. 

2 As lan houses não foram objeto de análise do já referido artigo do pesquisador Bruno Fuser porque, para ele, tais estabelecimentos foram criados a partir da lógica do consumo. O pesquisador justifica que as ações da lan house reduzem a cultura “à condição de entretenimento e passatempo, avesso ao significado criador e crítico das obras culturais” (CHAUÍ, 2006, apud FUSER, 2008, p.9). A partir desse pressuposto, também focamos nosso trabalho em setores de internet popular financiados – diretos ou indiretamente – pelo Estado, por acreditar que é  seu dever implementar ações de integração de todas as classes sociais junto às tecnologias de comunicação e informação. Apesar disso, como mostraremos nos capítulos seguintes, buscamos conhecer a relação do usuário do telecentro com outras formas de acesso à informática, entre elas a lan house. 

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3 A IDENTIDADE CULTURAL DA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO

  Quando o assunto é  identidade cultural,  é  difícil  não falar em nacionalismo e 

globalização.   Isso  porque,  de  acordo  com as  premissas  de  Stuart  Hall,  no  contexto  pós­

moderno em que vivemos o tradicionalismo ao qual muitas sociedades estavam acostumadas 

foi substancialmente abalado por múltiplas influências,  provenientes de todas as partes do 

mundo.   “À  medida   em  que   as   culturas   nacionais   tornam­se  mais   expostas   a   influências 

externas é difícil conservar as identidades culturais intactas ou impedir que elas se tornem 

enfraquecidas através do bombardeamento e da infiltração cultural.” (HALL, 2006, p.74)

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Mas afinal,  o que é   identidade cultural?  Para Oliveira  (2006),   trata­se de “um 

sistema   de   representação   das   relações   entre   indivíduos   e   grupos,   que   envolve   o 

compartilhamento de patrimônios comuns como a língua, a religião, as artes, o trabalho, os 

esportes, as festas, entre outros” (OLIVEIRA, 2006, p.1). Para ela, os mapas culturais não 

coincidem com as fronteiras nacionais, ou seja, as delimitações geográficas não impediram 

que a cultura dos Estados Unidos fosse consumida tanto aqui no Brasil quanto em Tóquio, por 

exemplo. Para Canclini, a cultura de massa é um dos grandes responsáveis por acelerar esse 

processo: 

O   cinema   e   a   televisão,   para   alcançar   públicos   extensos   e   recuperar   os investimentos, promovem narrações espetaculares, inteligíveis por espectadores de todas   as   culturas.  As   referências  nacionais   e  os   estilos   locais   se   dissolvem   em filmes,  quadros  e  seriados de  televisão que cada  vez mais  se parecem com São Paulo, Tóquio, Nova York e México, Paris e Buenos Aires. (CANCLINI, 1999, p.134). 

O   autor   afirma   ainda   que   a   partir   da   segunda   metade   do   século   XX,   os 

referenciais   antigos   que   tínhamos   para   a   formação   de   nossas   identidades,   como   livros 

escolares,  museus,   rituais   cívicos,   sindicatos,   etnias,   símbolos  nacionais,   folclore,   artes   e 

literatura perderam muito espaço para os repertórios veiculados pelos meios eletrônicos de 

comunicação.  Para   ele,  na  modernidade   faz­se  um processo  de  coesão  social  no  qual  as 

identidades   regionais   e   nacionais   “se   reconstroem   em   processos   de   hibridização 

cultural” (idem, p.176). Por isso, hoje, a identidade é migrante, feita com elementos múltiplos 

de várias culturas. 

As próprias identidades nacionais,  que, na visão de Hall,  seriam, para nós, tão 

fortes   como   se   fizessem  parte   de  nossa  natureza   essencial,   passam por   um  processo  de 

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enfraquecimento   por   causa   dos   processos   de   globalização.   São   três   os   componentes 

constitutivos da cultura nacional: as memórias do passado; o desejo por viver em conjunto; e 

a perpetuação da herança. “Para dizer de forma simples: não importa quão diferentes seus 

membros  possam   ser   em  termos  de   classe,   gênero  ou   raça,   uma   cultura   nacional   busca 

unificá­los numa identidade cultural, para representá­los todos como pertencendo à mesma e 

grande família nacional.” (HALL, 2006, p.56). As identidades híbridas tomam o lugar das 

identidades nacionais. A desintegração ocorre devido à compressão do espaço­tempo:

Que impacto tem a última fase da globalização sobre as identidades nacionais? Uma de suas características principais é a ‘compressão do espaço­tempo’, a aceleração dos processos globais, de forma que se sente que o mundo é menor e as distâncias mais curtas,  que os eventos em um determinado lugar têm um impacto imediato sobre pessoas e lugares situados a uma grande distância. (ibidem). 

Podemos perceber que Hall e Canclini possuem pensamentos semelhantes quando 

o assunto é   identidade.  Ambos concordam que as  tradições  se perdem cada vez mais em 

função do que é  midiatizado.  “Quanto mais a vida social  se  torna mediada pelo mercado 

global de estilos, lugares e imagens pela mídia, mais as identidades se tornam desvinculadas 

de tempos, lugares, histórias e tradições. Parecem flutuar livremente”. (ibidem). 

O que descrevemos pode ser uma síntese da chamada crise de identidade, com a 

qual convive a atual Sociedade da Informação. Crise devido à rapidez com que se movem os 

referenciais de cada pessoa, hoje. É um estado de espírito que flui, por vezes, independente da 

vontade de quem está   lá.  O rompimento de laços com o passado e o enfraquecimento da 

família,  aliados, como já  citamos, aos processos de globalização, são causas e, ao mesmo 

tempo,   conseqüências.   Para   Santaella   (2003),   no   mundo   da   cibercultura,   ou   seja,   dos 

processos  de   representação  que  se   fazem nos  meios  digitais,  as   identidades   tendem a   se 

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multiplicar,  pois  estamos imersos em simbologias nas quais não conseguimos encaixar  as 

“outras pessoas” em sistemas determinados: 

O sujeito não está mais localizado em um tempo/espaço estáveis em um ponto de vista fixo a partir do qual calcula racionalmente suas opções. Ao contrário, ele está multiplicado   em   bancos   de   dados,   dispersado   entre   mensagens   eletrônicas, descontextualizado   e   reidentificado   em   comerciais   de   TV,   dissolvido   e rematerializado   continuamente   em   algum   ponto   na   incessante   transmissão   e recepção  eletrônica  de   símbolos.   Isso  nos   leva   a   concluir   que  o   surgimento  da cibercultura tornou o Outro (o grande outro da psicanálise, o lugar da linguagem, dos códigos, da cultura) mais complexo. (SANTAELLA, 2003, p.214)

Estamos falando do que está acontecendo de fora para dentro, ou seja, como os 

processos tecnológicos e sociais alteraram a maneira de percepção do sujeito e a maneira com 

a   qual   ele   estabelece   relação   com   os   bens   culturais.   E   a   internet   e   as   tecnologias   de 

comunicação e informação no geral são responsáveis por isso, à medida que oferecem uma 

quantidade de informação ilimitada e proporciona contato com diversas mídias e produtos 

culturais, em um só aparato tecnológico. Por outro lado, devemos estar atentos também aos 

processos   que   acontecem   no   sentido   inverso,   quer   dizer,   da   perspectiva   do   usuário.   As 

pessoas   têm   suas   identidades   multiplicadas   e   diluídas,   mas   não   podemos   afirmar 

taxativamente que elas são perdidas no espaço. “A crise identitária não traz exclusivamente 

desencanto ou perda, mas oportuniza o surgimento de uma identidade renovada, nutrida em 

vários   repertórios...”   (BRIGNOL,   2002,   p.4).   A   autora,   que   discute   a   reconstrução   das 

identidades a partir da utilização da internet, afirma que o surgimento de novas formas de 

interação pode, ao invés de lançar o indivíduo para um mundo desprovido de sentidos, fazer 

com que o usuário fortaleça seu repertório por meio da ferramenta multimídia: 

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...  As culturas locais podem ser potencializadas  pelo uso da Internet  ao invés de serem sucumbidas a ela, através da facilidade de produção e divulgação de conteúdo relacionado a  temas próprios  de uma região,  em sites  locais,  salas  de bate­papo voltadas para usuários específicos de uma cidade ou região e troca de e­mails entre pessoas com interesses comuns (idem, p.2). 

A reflexão proposta por Brignol pode soar estranha em se tratando de um meio 

tão   difuso   e   multifacetado   como   a   internet.   No   entanto,   o   fato   de   a   rede   mundial   de 

computadores ser uma ferramenta cujo motor de acesso é o usuário, ou seja, que depende de 

uma   postura   ativa   da   pessoa   que   está   navegando,   acaba   por   incentivar   a   procura   por 

elementos  que façam parte do cotidiano deste usuário,  fazendo­o reconhecer­se na página 

eletrônica. 

Ao contrário de estimular a homogeneização, uma das possibilidades da Internet é reforçar vínculos com o que é  próprio da cidade e do estado. A rede estabelece padrões compartilhados em escala global, mudando a relação com a cultura, sem que   as   identidades   locais   sejam   abandonadas,   mas   reconstruídas   a   partir   do confronto com outras possibilidades. Diferentemente de promover um enraizamento ou a ilusão de retorno a um passado perdido, a Internet  pode permitir que sejam conciliados valores provenientes da troca de informação global e os herdados como legado cultural da terra de origem. Parte­se do princípio de que a Internet faz com que seus usuários sejam obrigados a negociar com as novas culturas em que vivem... (ibidem).

Com este raciocínio, Brignol conclui que a comunicação mediada por computador 

faz  que  com que o  usuário  “redefina”  sua   identidade  cultural  a  partir  do contato  com o 

conteúdo on­line. Ela passa também pelo discurso que permeia entre o global e o local, sendo 

um tema recorrente na obra de Hall. Ao contrário de haver uma substituição do global pelo 

local, ocorre uma valorização do regionalismo dentro da esfera maior que é a globalização: 

“... parece improvável que a globalização vá simplesmente destruir as identidades nacionais. 

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É mais provável que ela vá produzir, simultaneamente, novas identificações ‘globais’ e novas 

identificações ‘locais’.” (HALL, 1999, p.78). 

Essa   explanação   sobre   a   questão   da   identidade   cultural   na   sociedade   da 

informação   permitiu   a   compreensão   das   relações   entre   as   TICs   e   as   transformações 

estabelecidas por elas na forma de percepção e apropriação cultural de quem as utiliza. O 

próximo passo para o nosso trabalho é a apresentação de três grupos sociais distintos, entre os 

quais estudaremos essas relações. 

3.1 QUAIS PAPÉIS?

Qual a relação existente entre o papel de um internauta na sociedade e o modo 

pelo qual a rede mundial de computadores influencia essa pessoa? Para tentar responder a esta 

pergunta, devemos conhecer o perfil deste internauta e escolher um aspecto da sua realidade 

social ou situação de vida. “... é necessário estabelecer a diferença entre identidade e o que 

tradicionalmente   os   sociólogos   têm   denominado   de   papel,   e   conjunto   de 

papéis” (CASTELLS, 2003, p.3). O autor introduz sua obra O Poder da Identidade com a 

distinção entre esse dois conceitos – papel e identidade. Este último tem uma definição mais 

abrangente e relaciona­se com o significado, a experiência e os atributos culturais  de um 

povo; já os papéis são as funções que o individuo desempenha na sociedade. 

Esses   papéis   (por   exemplo,   ser   trabalhadora,   mãe,   vizinha,   militante   socialista, jogadora  de  basquete,   freqüentadora  de  uma  determinada   igreja  e   fumadora,   ao mesmo   tempo)   são   definidos   por   normas   estruturadas   pelas   instituições   e organizações   da   sociedade.   A   importância   relativa   desses   papéis   no   acto   de 

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influenciar o comportamento das pessoas depende de negociações e acordos entre os indivíduos e essas instituições e organizações. (ibidem)

Neste   livro,   Castells   (2003)   analisa   as   transformações   desencadeadas   nos 

movimentos sociais e na política “como resultado da interação entre a globalização induzida 

pela   tecnologia,  o poder da  identidade,   (em termos sexuais,   religiosos,  nacionais,  étnicos, 

territoriais   e   sociobiológicos)   e   as   instituições   do   Estado”   (idem,   p.22).   Para   efeito   de 

comparação – longe da tentativa de aproximar o aprofundamento teórico deste trabalho de 

graduação com a obra do autor espanhol, mas de estabelecer aspectos comuns de abordagem 

– aqui, também vamos estudar um tipo de transformação, porém desencadeada em grupos 

bem menores. E as mudanças serão ocasionadas pela relação entre os usos da internet e o 

poder dos papéis ou funções do indivíduo na sociedade – e não especificamente da identidade, 

que   se   refere   a   significados   mais   globais.   No   entanto,   fica   a   pergunta:   então   por   que 

propusemos a  discussão sobre a   identidade?  Tais  significados  globais  serão discutidos  de 

maneira geral, nas conclusões do trabalho, mas não de forma aprofundada.

Vamos esboçar a seguir as características gerais desses três perfis. Escolhemos a 

juventude,   a  mendicância   e   o   trabalho   como  os  papéis   que   irão   influenciar   a   forma  de 

apropriação da internet  e das TICs.  A justificativa apresentada  para a escolha desses  três 

perfis se deve a um trabalho realizado por mim em parceria com o professor Bruno Fuser, da 

Faculdade   de   Comunicação   Social   da   UFJF.   Em   2007,   desenvolvemos   uma   pesquisa 

financiada pelo CNPq que objetivava compreender o trabalho dos telecentros existentes em 

Juiz de Fora3. Na época, fizemos um levantamento quantitativo e qualitativo dos telecentros 

existentes na cidade e foi feita uma comparação entre aqueles espaços mantidos pelo poder 

público   e   os   outros   desenvolvidos   por   ONGs   e   patrocinados   por   empresas.   Ciente   dos 

3  Parte das informações sobre a pesquisa está disponível em http://www.comunicacaoecidadania.ufjf.br/index_telecentros.htm 

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projetos de combate à exclusão digital em Juiz de Fora, a seleção dos grupos que comporiam 

meu Trabalho  de  Conclusão  de  Curso  deu­se  de  maneira  a   formar  um  leque  variado  de 

opções, justamente para entender o ajustamento que se dá entre o mundo multicultural da rede 

mundial de computadores e as especificidades e necessidades socioculturais de cada grupo. 

3.1.1 A juventude

Em 27 de julho de 2008, o Datafolha publicou uma pesquisa que mostra o perfil 

do jovem entre 16 e 25 anos no Brasil. Os números foram divulgados no jornal Folha de S.  

Paulo  no mesmo dia, e é um raio­X do pensamento dos brasileiros desta faixa etária com 

relação a temas como valores, sociedade, pátria, consumo, sexo e, inclusive, preferências de 

acesso à internet. O mapeamento foi feito por meio de 120 perguntas para 1.541 jovens em 

168 cidades do Brasil. Um dos resultados que mais chama a atenção realiza uma espécie de 

quebra de estereótipo daquele jovem rebelde, desnorteado e indisciplinado tão difundido na 

cultura nacional. “Para 40% dos jovens, o sonho maior é cuidar da vida, encontrar em lugar 

ao sol, ter um emprego decente” (A ECONOMIA..., 2008, p. 3). 

Na mesma página, um artigo assinado pelo psicanalista Contardo Calligaris faz 

uma leitura da maneira como a sociedade enxerga o jovem: “A adolescência como época 

separada e específica da vida foi inventada nos anos 1950 e 1960. É nessa época que o cinema 

e  a   literatura  criaram a   figura  do  adolescente   revoltado  ao  qual   foi  confiada  a   tarefa  de 

encenar rebeldias...” (CALLIGARIS, 2008, p. 3).   É esta a imagem que temos de jovens e 

adolescentes  em geral,   independente  da  sua   raça  ou  nacionalidade.    No entanto,  o  perfil 

traçado pela Folha não quer dizer que esta figura consolidada em nossas mentes esteja caindo 

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por terra. A pesquisa mostra que devemos enxergar o jovem não  somente  com qualidades 

com as quais estamos acostumados há tempos: a fase das incertezas, experimentações, crises 

sexuais e rebeldias comuns da idade. Além dessas características, ou apesar delas, é preciso 

reforçar –e a pesquisa mostra isso em números – que a juventude brasileira tem sonhos como 

a busca da sua independência financeira e a realização profissional.  

O ‘maior sonho’ dos jovens ouvidos pelo Datafolha é ‘trabalhar /formar­se’ numa profissão (18%). Ter uma casa, terminar os estudos e fazer família são as outras aspirações maiores. ‘Sucesso   profissional/   na   carreira’   ou   apenas   ter   um   bom   emprego   (fixo,   com carteira, numa boa empresa, com bom salário) ocupam o segundo lugar dos maiores sonhos dos brasileiros entre 16 e 25 anos, com 15 % das respostas. Para 7%, o sonho maior é fazer faculdade. Em suma,  pois,  para  40% dos   jovens  o   sonho maior  é   resolver   com ansiedade compreensível e convencional para a idade – e, provavelmente,  não só para essa idade: cuidar da vida, encontrar um lugar ao sol, ter um emprego decente e definir sua identidade por meio do trabalho de que gosta”. (A ECONOMIA..., 2008, p. 3).

Eles estão, portanto, em busca de realizações: a pessoal e a profissional. E como o 

próprio jornal enfatizou,  o sonho deles parece ser o mesmo que permeia várias idades. A 

realização profissional e a busca por estabilidade estão nos planos de muitos brasileiros, mas a 

diferença é que na juventude, o impulso e as circunstâncias que influenciam nessa busca são 

mais favoráveis. A idade, apesar de ser cheia de inseguranças, é também cheia de ousadia e 

vontade de aprender, sem ter preconceito com o novo. A disposição para se arriscar é muito 

maior na juventude, sem falar no potencial energético da idade. 

Com relação ao acesso aos meios de comunicação, a pesquisa mostra que “A TV 

ainda é a principal fonte de informação para o jovem brasileiro, mas ele se tornou multimídia” 

(INTERNET..., 2008, p.16).   Esta é uma opinião, apresentada dentro da reportagem, mas a 

análise faz sentido. Isso porque a pesquisa do Datafolha revela que a internet é a preferência 

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de 26% dos jovens na busca por informações; a TV aberta fica com 33%. Mas os números 

estão se invertendo de alguns anos para cá: 

A comparação com dados do Datafolha colhidos em São Paulo em 2000 mostra que, enquanto   na   época   45%   dos   jovens   disseram   ter   a   TV   como   o   veículos   de comunicação preferido para se informarem, hoje 33% afirmaram o mesmo. Já com a internet,   nota­se   um   processo   inverso.   O   número   dos   que   disseram   ter   a   rede mundial como principal veículo subiu de 11 % para 26 %. A média de tempo gasto na web diariamente é de 2,5 horas. (ibidem)

Além do mais, os dois veículos podem ser usados ao mesmo tempo. Enquanto o 

jovem   acessa  o   e­mail,   ou   conversa   com   amigos  no  MSN,   ele   dá   uma  bisbilhotada   no 

telejornal ou em alguma cena da novela preferida. É esse o jovem multimídia, que não se 

contenta em abrir apenas uma página na internet e de pesquisar apenas sobre um assunto. A 

geração   multimídia   permite   essa   prática.   Afinal   de   contas,   várias   ações   podem   ser 

desempenhadas   no   meio   digital   e   sem   prejuízo   de   atenção.     Com   relação   ao   conteúdo 

acessado na rede,  o campeão de audiência  foi,   sem surpresas,  o Orkut  – o maior  site de 

relacionamentos da internet. Na pergunta “O que você acessa na internet?”, 81 % dos jovens 

responderam   sites   de   relacionamento;   79%,   páginas   de  notícias;   76%,   e­mails;   e   61   %, 

download de música (ibidem). Essa constatação, como veremos posteriormente, se confirmará 

também em nosso estudo de caso. Na própria página do Orkut, os dados demográficos dizem 

o mesmo, e mais:  não só  a maioria de usuários é  de jovens (60,3%) como ela também é 

formada, em sua maior parte, por brasileiros (51,2%).  A maioria dos jovens acessa a internet 

fora de casa, principalmente em lan houses: 57%. Na reportagem, é destacado o fato de esses 

lugares funcionarem como um local de “pseudo­socialização”, já que, mesmo entre aqueles 

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que possuem internet em casa, é comum freqüentarem as lans. No testemunho de um deles, 

há a justificativa de ele faz isso para não ficar em casa sozinho. 

A população de  jovens  no Brasil,   segundo pesquisa do  Instituto  Brasileiro  de 

Geografia e Estatística (IBGE) publicada na Folha de S. Paulo  (PERFIL..., 2008, p.2), é de 

35.331.229 pessoas ou 19% da população. Quase 1/5 dos brasileiros têm entre 16 e 25 anos. 

Outros   pontos   que   podemos   destacar   na   pesquisa   Datafolha   com   relação   ao   perfil   da 

juventude são aqueles relativos  à  educação e à  organização social.  Por mais que seja  um 

recorte   restrito  de  uma  pesquisa,   acreditamos  que   seja   importante  para  o  nosso   trabalho 

analisar os dados de modo a aprofundar, mesmo que de forma limitada, a vivência cultural da 

juventude brasileira.  Um dado que contrasta  com aquele do qual falamos no início desde 

capítulo   sobre   os   jovens,   que   revelou   o   sonho   deles   de   conseguirem   se   realizar 

profissionalmente, é o que mostra que mais da metade (54%) dos jovens brasileiros já repetiu 

o ano e o índice é alto mesmo nas classes A e B. Nas classes D e E, os repetentes são 66% 

(REPETÊNCIA..., 2008). 

Com   relação   à   participação   dos   jovens   em   organizações,   a   religião   supera 

atividades   como   trabalho   voluntário,   grêmio   escolar   ou   sindicatos.   As   igrejas   são 

freqüentadas por 39% dos jovens entrevistados; trabalhos voluntários, 24%; e sindicatos, 5%. 

E é alto o número dos que disseram que não participam de nenhum tipo de organização: 45% 

dos jovens não freqüentam igrejas, grêmios, sindicatos, etc (JOVEM..., 2008). 

E em quem nossa juventude se espelha? Quem são os ídolos da população com 

idade entre 16 e 25 anos? Os números sugerem que a cultura de massa ainda se sobressai na 

mente  dos   jovens,   sendo que  as  pessoas  mais  bem­sucedidas  e   inteligentes  apontadas  na 

pesquisa são, respectivamente, a cantora Ivete Sangalo e o apresentador Silvio Santos. Parece 

que as promessas da fama e o glamour da vida televisiva ainda são considerados importantes 

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pelos jovens: 10% gostariam de ser cantor nacional; 8%, ator ou atriz profissional e jogador 

de futebol; 7% apresentador de TV; e 6% cantor estrangeiro. (INTERNET..., 2008) Estão aí, 

portanto,   as   conseqüências   de   se   ter   a   televisão   como   o   produto   informacional   mais 

consumido.  Talvez  se o  meio  de comunicação  mais   requisitado  fosse outro,  os  astros  do 

esporte e do pop nacional perdessem espaço para outros tipos de admirações ou expectativas 

profissionais. 

3.1.2 A mendicância4

Quando tinha 15 anos, Ubirajara Gomes da Silva se desentendeu com o avô e se 

mudou para as ruas de Recife. Por 12 anos, apesar de não pedir esmolas, viveu de bicos e dos 

trocados que as pessoas lhe ofereciam. Apesar da difícil situação de vida, devorava livros na 

biblioteca da cidade, até que descobriu a internet:

... começou a navegar em lan­houses e espaços públicos. ‘Às vezes eu deixava de comer   pra   entrar   na   internet.   Nesta   mesma   época,   em   2001,   surgiu   a   vontade de retomar   os   estudos,   interrompidos   no   sétimo   ano   do   Ensino   Fundamental. Ubirajara  matriculou­se   em  um curso   supletivo   e,   em 2006,   concluiu   o  Ensino Médio. Conversando com amigos virtuais, o rapaz teve a idéia de prestar concursos públicos (EX­MORADOR..., 2008, on­line).

O final dessa história muita gente já deve ter ouvido falar. Ubirajara conseguiu ser 

aprovado em um concurso público para o cargo de escriturário do Banco do Brasil. 

A conquista atraiu a mídia e tornou Ubirajara uma celebridade virtual. Sua página no  Orkut  –   sim,   ele   tem um perfil  no  site  desde  2006 –   recebeu  mais  de  500 

4 Na Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua, o “morar na rua” é designado pelo termo mendicância, por isso também o adotamos aqui.

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mensagens de felicitações. Em junho deste ano, Ubirajara recebeu um convite para morar com a família de Carlos Eduardo Monteiro, amigo que conheceu na internet. ‘Eles são muito bons pra mim. Pretendo ficar aqui até ter condições de pagar uma casa pra mim’ conta. (ibidem). 

Obviamente não é este o perfil dominante entre os milhares de moradores de rua 

espalhados pelo Brasil,  aliás, foi isso mesmo que motivou a atração midiática. A Pesquisa 

Nacional   sobre   a   População   em   Situação   de   Rua   realizada   pelo   Ministério   do 

Desenvolvimento Pessoal e Combate à Fome (MDS), em abril de 2008, identificou 31.922 

pessoas   em   situação   de   mendicância,   vivendo   em   calçadas,   praças,   rodovias,   parques, 

viadutos,   postos   de   gasolina,   praias,   barcos,   túneis,   entre   outros   locais.  O  número   pode 

parecer  alto,  mas  não  se   refere  a   todas  as  cidades  do  país   ­  os  pesquisadores  aplicaram 

questionários em 71 municípios brasileiros.  “Assim o total  de pessoas em situação de rua 

vivendo   no   Brasil   é   mais   elevado”   (PESQUISA...,   2008,   p.6).   Uma   das   principais 

constatações  do estudo é  que a  maioria  das  pessoas  nesta  condição são homens (82%) e 

alfabetizados (74%).  

Para   efeito   de   comparação,   apresentamos   outra   pesquisa,   com   dados   locais, 

elaborada   em   parceria   com   a   Associação   Municipal   de   Apoio   Comunitário   (Amac),   a 

Prefeitura   de   Juiz   de   Fora   e   a   Incubadora   Tecnológica   de   Cooperativas   Populares 

(INTECOOP/SEDETEC/UFJF). O diagnóstico foi feito em novembro de 2007 e identificou o 

universo de 745 pessoas em situação de rua, dentre os quais 409 são catadores de material 

reciclável.   Uma   equipe   formada   por   psicólogos,   sociólogos   e   assistentes   sociais   aplicou 

questionários junto aos moradores de rua entre os meses de abril a outubro de 2006, com o 

objetivo de conhecer a trajetória e as formas de sobrevivência dessa população. Os autores 

tiveram a preocupação de não encarar esse grupo como um nicho homogêneo: 

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Os moradores  de rua apresentam uma história  de sucessivas  perdas:  da casa,  da família,   do   emprego,   de   referências,   e   da   própria   identidade   e   autoestima.   É importante   ressaltar  que a população de  rua   tem práticas,   e  valores  relativos  ao ‘habitar a rua’ diferenciados, porque se apropriam, usam e se experienciam de várias maneiras os espaços onde passam a viver.   A heterogeneidade da população com vivência de rua pode então ser apreendida como resultado de visões e percepções de mundo particulares a cada tipo de relação e experiência estabelecida com o espaço público  ocupado,  onde são  introduzidas  novas formas  de  viver  e  sobreviver  nas cidades,   revelando   um   universo   de   valores   referentes   ao   ‘mundo   da rua’ (DIAGNÓSTICO..., 2007, p. 12).

O nível de escolaridade das pessoas entrevistadas em Juiz de Fora é menor do que 

o registrado nas outras cidades pesquisadas pelo MDS: 72,3% possuem ensino fundamental 

incompleto na cidade da Zona da Mata, contra 48,3% dos mais de 31 mil moradores de rua 

espalhados pelo Brasil. Segundo o levantamento municipal, “é recorrente os casos em que o 

pouco acesso à escola decorre da necessidade de sobrevivência, reduzindo as possibilidades 

de ingresso e/ou permanência no mercado de trabalho” (idem, p.21). Mesmo assim, podemos 

encontrar   números   parecidos   de   moradores   de   rua   que   chegaram   à   faculdade   (superior 

completo ou incompleto) – 0,9% em Juiz de Fora e 1,4% no Brasil. 

Interessante destacar que a grande maioria dos que estão nas ruas de Juiz de Fora 

não   são   da   cidade.   “Juiz   de   Fora,   por   ser   pólo   geopolítico,   atrai   pessoas   das   regiões 

circunvizinhas  em busca de  trabalho  e  melhores  condições  de vida.  Muitos  deles,  menos 

qualificados, e desprovidos de oportunidades, instalam­se em situação precárias” (ibidem). A 

população de rua natural  de Juiz de Fora corresponde a 39,3%, o restante  veio de outros 

estados, como Rio e São Paulo. Com relação aos números do MDS, observamos uma ligeira 

discrepância  superior  à  média   local,   já  que 45,8% dos entrevistados  “sempre viveram no 

município em que moram atualmente” (PESQUISA..., 2008, p.8). 

Em relação à  experiência  profissional,  no caso  local,  41,8% dos entrevistados 

trabalham há mais de seis anos como catadores de papel; os números nacionais são menores 

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com relação a esta atividade (27,5%), mas mostram que a imagem de mendigo à qual sempre 

vinculamos o morador de rua pode estar equivocada.

Apenas   15,7%   das   pessoas   pedem   dinheiro   como   principal   meio   para   a sobrevivência.   Esses   dados   são   importantes   para   desmistificar   o   fato   de   que   a população em situação de rua é composta por “mendigos” e “pedintes”. Aqueles que pedem dinheiro para sobreviver constituem minoria. (idem, p.10)

“Desmistificar” é um termo que nos interessa profundamente aqui, já que, quanto 

mais nos aproximarmos da realidade dessas pessoas, menos tortuoso será  o caminho para 

compreender suas atitudes, e, assim, tentar responder aos questionamentos desse trabalho. 

Uma das perguntas que talvez mais inquietam as pessoas que se deparam dia a dia 

com os moradores de rua é o motivo pelo qual elas se encontram nessa situação. Os dois 

estudos   têm   respostas   semelhantes   com   números   diferentes.   No   Brasil,   35,5   %   dos 

entrevistados afirmam que saíram de casa por problemas com drogas ou álcool (ibidem); em 

Juiz de Fora, a dependência química foi citada por apenas 1,2%. O principal motivo para 

viver nas ruas da cidade mineira é o desemprego – 54,8%, que, nacionalmente, foi apontado 

por 29,8% dos entrevistados. O emprego seria também a motivação de 61,9% dos moradores 

de rua de Juiz de Fora para abandonar a mendicância. 

A empregabilidade, como se vê, pode definir o destino de muita gente. Por isso, a 

escolhemos como o terceiro e último parâmetro de análise da apropriação da rede mundial de 

computadores. 

3.1.3 O trabalho

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Gostando ou não, é no trabalho que a maioria das pessoas passa a maior parte do 

seu dia, sendo o seu repertório sociocultural envolvido total ou parcialmente pela ocupação 

que escolheu. Além disso, é da renda obtida por meio da atividade remunerada que as famílias 

constroem suas  vidas,  definem planos,   adquirem bens  e   estabelecem padrões  de  saúde e 

educação, podendo ocupar diferentes classes sociais.   A profissão de alguém diz  tanto de 

quem ela é que a pergunta “O que fulano faz da vida?” é sempre parte de uma conversa entre 

pessoas que acabam de se conhecer, método infalível de se firmar vínculos comuns. 

No   Brasil,   a   Pesquisa   Nacional   de   Amostras   por   Domicílios   (PNAD   2007) 

registrou queda de 8,2% na taxa de desemprego, em dois anos – de 2005 a 2007. O estudo 

aponta ainda que o tempo de estudo do brasileiro aumentou, mas a renda diminuiu: 

De acordo com os números da pesquisa do IBGE, de 2006 para 2007 caiu a parcela dos trabalhadores ocupados que estudaram até sete anos e aumentou o percentual de pessoas que estudaram de oito a dez anos (+5,4%) e 11 anos ou mais (+ 5,9%). Junto à escolaridade, a renda também cresceu em relação aos anos anteriores, com o maior ganho médio desde 1999. No entanto, o rendimento médio mensal do trabalhador em 2007 ainda é menor do que era em 1997: diminuiu de R$ 1.011 para R$ 960 no período. (TRABALHADOR..., 2008, on­line)

A reportagem publicada no site G1 sobre a pesquisa PNAD 2007 traz a declaração 

de um especialista  do IBGE, Cimar Azevedo,  que admite  que a distribuição de renda no 

Brasil ainda é injusta. “A gente percebe que os empregados ganham, em média, R$ 916; o 

trabalhador doméstico (tem renda) R$ 331, mesmo com o salário mínimo de R$ 380 do ano 

passado; e o empregador chega a R$ 2.857" (idem). Por outro lado, o presidente do IBGE, 

Eduardo   Pereira   Nunes,   afirmou   ao   G1   que   praticamente   todos   os   indicadores   sociais 

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melhoraram, porém só não avançam mais por causa da distribuição de renda. “Houve uma 

redução expressiva da concentração de renda no Brasil, mas ela ainda é grande. O país ainda 

terá que mudar a distribuição de renda.”. (ibidem). 

Uma carreira almejada por cada vez mais brasileiros que procuram estabilidade 

financeira e salários melhores é a do funcionalismo público. A maioria das vagas é destinada 

a pessoas que não têm experiência prévia e existem oportunidades para todos os níveis de 

escolaridade, do fundamental ao superior. O site G1 revelou que a procura pelos concursos 

públicos no Brasil dobrou em cinco anos.  “Pesquisas feitas por cursos preparatórios revelam 

que, há cinco anos, os interessados nas vagas do setor público eram 5 milhões. Atualmente, 

são 10 milhões de pessoas se preparando para os exames” (JOVENS..., 2008, on­line).

4 METODOLOGIA 

Já definidos os papéis a serem explorados para avaliarmos as diferentes formas de 

apropriação, apresentamos aqui de que forma a pesquisa foi conduzida para o estudo de caso. 

Foi  feito um trabalho de observação, com a aplicação do método etnográfico e estudo das 

apropriações de três grupos de usuários, em três setores de internet popular: a) o da Biblioteca 

Municipal  Murilo  Mendes,  onde  os  moradores  de   rua  utilizam  as  TICs;   b)   a  Escola  de 

Informática e Cidadania do CDInfo, com foco de estudo no caso dos jovens; c) e o Centro 

Regional   do   bairro   Santa   Luzia,   local   que   tem   como   característica   forte   presença   de 

trabalhadores diversos e desempregados a procura de alguma oportunidade. 

Segundo   Brandão   (2008),   “Dois   pilares   modelam   e   sustentam   o   método 

etnográfico: a interação prolongada entre o pesquisador e o sujeito da pesquisa e a interação 

cotidiana do pesquisador no universo do sujeito” (BRANDÃO, on­line). Mesmo entendendo 

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que o acesso à internet é uma atividade solitária entre a máquina e o sujeito e sabendo que a 

presença   de   um   observador   se   torna,   por   isso,   invasiva,   tentamos   buscar   o   máximo   de 

proximidade   com o  universo  dos  usuários,   de  modo   a   entender   suas   preferências   e   seu 

comportamento ali e fora do local. A aproximação se deu, sobretudo, por meio da técnica da 

entrevista e da pesquisa qualitativa. Optamos pela realização de dois tipos de entrevistas: a 

entrevista  centrada  (focused   interview)  e  a  entrevista  de questões  abertas.  Na primeira,  o 

investigador  “...  após  estabelecer  hipóteses  sobre  um  tema preciso,  deixa  que a  conversa 

desenrole  bastante   livremente,  de  maneira  que  o  entrevistado   libere   toda  sua  experiência 

pessoal” (MORIN, 1973, p.119). Acreditamos que esta é uma forma de proporcionar mais 

informalidade à  conversa,  sem perder o objetivo do pesquisador que é  o de identificar no 

entrevistado   suas   emoções,   seus   gostos,   sua   vivência   e   a   impressão   da   experiência   que 

pretendemos analisar. A outra técnica visa estabelecer um roteiro determinado para que o 

pesquisador tenha um foco e seja mais objetivo: “as perguntas são redigidas de antemão e 

devem ser formuladas segundo uma ordem precisa; a liberdade do entrevistador é bastante 

restrita,   mas   a   do   entrevistado   continua   grande   no   quadro   das   indagações 

apresentadas” (ibidem). 

Portanto, por meio da convivência diária, entrevista centrada (conversa com tema 

previamente definido e estudado) e entrevista com questões abertas, acreditamos ter atingido 

nosso objetivo de entender com alguma profundidade cada grupo e, posteriormente, submetê­

los   a   comparação.   Inicialmente,   foi   solicitada   aos   respectivos   coordenadores   de   cada 

telecentro uma autorização informal  para que o autor deste  trabalho pudesse freqüentar  o 

espaço semanalmente. Foram entrevistados: Auzenda Maria Vilela, coordenadora do setor de 

internet  popular  da Biblioteca  Municipal;  Soraya Nogueira  Martins  e  Silvânia  Ribeiro  da 

Silva,   educadoras   e   responsáveis  pela  parte  pedagógica  do  Núcleo  de  Cidadãos  de  Rua; 

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Luzimar Nascimento,  supervisora de promoção social  e responsável pelo setor de internet 

popular da Regional Santa Luzia; e Dulce Fani, coordenadora da EIC Cidade Alta.   Após o 

pedido   ser   aceito,   procuramos   conhecer   o   espaço   com   os   próprios   coordenadores   dos 

telecentros,   perguntando­lhes   sobre   as   características   gerais   do   espaço,   as   regras   de 

funcionamento, a qualidade dos equipamentos disponíveis, a abrangência de atendimento, as 

preferências de acesso e a que finalidade tais espaços serviam à população. Depois, partimos 

para a observação dos usuários, da seguinte forma: às segundas e quartas pela manhã, visitas 

ao setor de internet popular da regional Santa Luzia; às terças pela manhã e quartas­feiras à 

noite, na EIC Cidade Alta; e, finalmente, às sextas­feiras pela manhã na Biblioteca Municipal 

ou no Núcleo  de Cidadãos de Rua –  local  onde os  moradores  de rua são acolhidos  pela 

prefeitura. Com relação a este último, enfrentamos sérias dificuldades para o estudo de caso. 

Durante   a   execução   do   projeto,   dentro   do   prazo   pré­determinado   para   a   realização   das 

entrevistas,   os   moradores   de   rua   deixaram  de   freqüentar   o   setor   de   internet   popular   da 

biblioteca, limitando nosso contato com eles, junto aos computadores, a apenas dois dias. No 

entanto, optamos por manter o grupo de estudo e terminar a coleta de informações no próprio 

Núcleo onde eles são acolhidos,  com entrevistas individuais baseadas no contato que eles 

tiveram   com   os   telecentros   em   outras   ocasiões,   não   necessariamente   naquelas   em   que 

estivemos ao lado deles. 

O universo de entrevistados não foi definido numericamente. Todas as entrevistas 

foram feitas com o consentimento de cada um deles, sendo todos informados previamente que 

as perguntas seriam objeto de estudo de um Trabalho de Conclusão de Curso. A coleta de 

informações foi feita com base no que os usuários disseram e nas observações semanais. Cada 

uma das questões, a seguir, foi desdobrada em outras que iam surgindo de acordo com o perfil 

de cada usuário:  Como se deu, quando e onde foi o seu primeiro contato com a internet? 

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Como chegou a este telecentro? Por que veio? Além do telecentro, tem contato com a internet 

em outro lugar? Se sim, qual prefere? É fácil aprender a utilizar a internet? Por quê? Você 

considera a internet uma perda de tempo? Por quê? Você confia no que encontra na internet? 

Quais  sites você  visita?  Como você  descobre  os sites  que visita?  O que mais   te  atrai  na 

internet e o que ela representa para você? O que é mais difícil para você ao usar a internet? 

Como ela influencia no seu dia­a­dia? A internet é melhor que a televisão? Por quê? Se não 

tivesse internet, o que estaria fazendo no lugar do acesso? Como a internet muda a sua vida? 

Quanto você gasta com lan house? O que você faria com esse dinheiro se não gastasse com 

lan house? 

Analisaremos a seguir cada caso separadamente,  conhecendo, primeiramente,  o 

lugar onde os grupos freqüentam e, logo depois, os próprios grupos. Ao final, vamos cruzar 

os dados obtidos. 

5 ESTUDO DE CASO

Aqui  apresentamos  os  principais  pontos  observados  durante  as  visitas  aos   três 

locais propostos. Em cada telecentro, estabelecemos um perfil como alvo de análise, o que 

não quer dizer que os usuários não possam assumir papéis semelhantes em todos eles. Por 

exemplo, encontramos o jovem em todos os telecentros: o jovem morador de rua, o jovem 

usuário da EIC Cidade Alta e o jovem a procura de crescimento profissional, em Santa Luzia. 

O objetivo deste capítulo é descrever as experiências dos usuários com a internet, seja no 

telecentro – onde a maioria foi entrevistada – seja em outro local citado por eles, como em 

casa ou em lan houses. 

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5.1 JOVENS NA ESCOLA DE INFORMÁTICA E CIDADANIA CIDADE ALTA

A Eicca (Escola de Informática e Cidadania Cidade Alta) existe há três anos. A 

escola, vinculada ao CDInfo, oferece curso de informática básica (Windows, Word, Excel, 

PowerPoint e internet) a 16 turmas com 10 alunos cada, por um período de quatro meses. 

“Entregamos certificados a 32 turmas por ano, mas muitos alunos deixam o curso antes de 

concluir. Temos um índice aproximado de 30 % de evasão”, diz Dulce. A Eicca funciona em 

parceria com a Paróquia São Pedro, sede da escola, com a Infraero (Empresa Brasileira de 

Infra­Estrutura Aeroportuária) e com a Universidade Federal de Juiz de Fora. Além de ser 

sede da escola, a Paróquia São Pedro disponibiliza acesso à internet por meio de conexão 

banda   larga   (Velox)   e   também  oferece   suporte   pedagógico.  A   Infraero   contribui   com  a 

compra de apostilas ­ uma para cada aluno, sendo que ele não precisa pagar por elas ­ e 

uniformes. O CDInfo é o responsável pelo suporte técnico em caso de problemas com os PCs. 

Já a UFJF disponibiliza os bolsistas, todos alunos de graduação da universidade, promove a 

coordenação pedagógica e emite os certificados de conclusão de curso.  

A escola  conta  com oito  monitores,   três  voluntários  e  cinco  bolsistas,  que  se 

revezam nas aulas de três horas por semana. Os alunos contribuem com uma mensalidade de 

cinco   reais   para   auxiliar   a   paróquia.   Mas   quem   não   pode,   não   contribui.   É   opcional. 

“Perguntamos quem pode contribuir. No início do curso, recebíamos alunos com idade de 12 

a   20   anos.   Hoje   temos   estudantes   de   todas   as   idades”,   informa   a   coordenadora. 

Aproximadamente 300 alunos já passaram pelo curso. Dulce afirma que os alunos só podem 

usar a internet no horário das aulas, pois as salas ficam trancadas na ausência dos monitores. 

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Não é permitido acessar sites pornográficos, mas os computadores não são bloqueados. “Por 

isso   é   freqüente   chamarmos   a   atenção   de   muitos   alunos   que   descumprem   a   regra”.   A 

impressora só pode ser utilizada para imprimir trabalhos da escola. Para receber certificados 

exige­se o mínimo de 80% de freqüência.   A escola possui 10 computadores e alguns têm 

entrada para CD, mas nenhum grava CD ou DVD. Os PCs não possuem entrada para USB. E 

todos têm entrada para disquete.

Felipe Roth Couri, de 14 anos, mora no bairro São Pedro e está na oitava série. 

Por recomendação de um amigo, resolveu procurar a escola de informática do seu bairro, 

segundo  ele  porque  queria   fazer  um curso  avançado  de   informática,  mas,  para   isso,   era 

preciso ter certificado do básico. Aos 10 anos, o pai comprou um computador para a casa da 

família  e  o   jovem acabou  aprendendo  a  utilizar  a  máquina  sozinho.  Ele  afirma  que   tem 

internet em casa e que sabe mexer em quase tudo no PC. “Mas aqui na EIC aprendo coisas 

mais detalhadas de Word, Excel, PowerPoint, etc.”, informa Felipe. Ele diz que, quando teve 

o primeiro contato com o computador, não sentiu dificuldade. Nas observações feitas nos dias 

de visita, acessou sua página do Orkut, pesquisou sobre futebol no site Globo.com, procurou 

um vídeo de uma antiga partida de futebol em outro site e, mesmo não existindo saída de 

áudio  no  computador  da  escola,  assistiu  a  um vídeo de  campanha  publicitária  do  qual  o 

jogador de futebol  Ronaldinho Gaúcho participou.  Para  ele,   internet  não é  uma perda de 

tempo, já  que “Eu posso me manter atualizado para o dia­a­dia.  Encontro coisas que não 

conseguiria  achar  em outro lugar  senão aqui,  como por exemplo,   lançamentos  de jogos e 

resultados de partidas de futebol de times da Europa. É difícil eu entrar na internet para fazer 

pesquisas escolares”. Entre os sites que estão na lista dos preferidos, estão o Orkut, jogos em 

geral  e  músicas.  “Acho que  o  Orkut  é  muito  bom para  conhecer  gente  nova e  poder   se 

comunicar até com pessoas de outros países”. Ainda sobre o Orkut, Felipe faz um comentário 

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interessante sobre o porquê do sucesso desse site entre os jovens: “Podemos falar coisas para 

as outras pessoas no Orkut que não falaríamos caso estivéssemos cara­a­cara. Isso ajuda 70% 

nas paqueras com as garotas”, afirma. Para ele, a internet é um meio de diversão. Em casa, 

confessa que fica conectado à rede todos os dias depois que chega da escola, de 0h às 2h30 da 

madrugada. “Caso eu não estivesse na internet em casa estaria usando o tempo para dormir ou 

jogar videogame”, diz. Além disso, afirma que poderia fazer coisas mais úteis como ajudar a 

mãe  nos  afazeres  domésticos  ou  praticar  esporte  com os  amigos.  “Depois  que  a   internet 

chegou lá em casa, parei de jogar bola e de ajudar minha mãe e casa”, diz. 

Seu colega de turma na EIC, o jovem Pedro Lúcio Silvestre da Silva, de 15 anos, 

está   na   sétima   série  do   ensino   fundamental.   Pedro  procurou  o   curso  de   informática  por 

indicação da mãe e também porque considera importante aprender sobre a informática. Assim 

como Felipe, Pedro também tem computador em casa há quatro anos, só que com conexão à 

internet discada. “Aprendi a mexer com informática sozinho e com a ajuda dos amigos que 

sabiam mexer com internet. Estraguei o PC várias vezes tentando aprender”, diz. Ele afirma 

que não acessa a internet somente em casa ou nos computadores da EIC, durante as aulas. 

Pedro possui três contas em lan houses do bairro e gasta pelo menos quatro reais por semana 

freqüentando esses espaços. “Gosto de ir à lan para encontrar os amigos e brincar com jogos 

em rede”. Pela internet discada, a família tem uma despesa de mais de quarenta reais. “Se não 

gastasse com internet acho que usaria o dinheiro para comprar um telefone celular”. E com 

relação ao tempo livre longe das conexões, acha que, caso não estivesse usando a internet, 

estaria jogando vôlei com os amigos. Mas, para ele, a internet não é uma perda de tempo, já 

que é nela onde pode “conhecer pessoas do outro lado do mundo”. O Orkut, as salas de bate­

papo do UOL, MSN e vídeos musicais no Youtube estão entre as suas preferências de acesso 

na rede. Pedro também gosta de se divertir com o site Desciclopédia, que satiriza uma outra 

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página famosa de pesquisas, a Wikipédia. Com relação ao Orkut, aqui também encontramos 

outra declaração interessante: “Tenho cinco perfis no Orkut, sendo todos eles verdadeiros [ou 

seja, com a identificação real do usuário] e um falso”. O jovem afirma que está perdendo o 

gosto pelo Orkut porque “dá muita confusão”. Os colegas brincam de “invadir” o perfil do 

outro e usarem a identidade do amigo, de forma virtual.  Pedro também faz isso e até nos 

explicou como aprendeu o processo de roubo de perfil: “Acesso o Google e digito: ‘ como 

hackear o orkut’. Daí têm várias dicas de conseguir a senha e se passar pelo perfil do amigo. 

É por isso que tenho vários perfis, pois quando um amigo invade uma página eu tenho que 

apagá­la rapidamente para não fazerem sacanagem com o perfil verdadeiro”. 

Para   a   estudante   Vilmara   Aparecida,   de   13   anos,   a   busca   pela   escola   de 

informática foi para “me ajudar a conseguir um emprego”, revela. O primeiro contato com 

computador se deu na própria EIC e, logo depois, passou a freqüentar as lan houses. Ela não 

possui e­mail e afirma que só utiliza a internet para acessar os sites de revistas juvenis, como 

a “Toda Teen” e o Orkut. A jovem considera o uso da internet uma perda de tempo quando 

está no Orkut, mas acha útil para fazer os trabalhos escolares. “Orkut é para quem não tem o 

que fazer. Eu uso não porque eu gosto, mas porque muita gente me envia recados na minha 

página e, por isso, acabo acessando”. Vilmara não considera a internet como uma ferramenta 

que melhora a comunicação entre as pessoas e diz preferir acessar a rede nas lans do que na 

escola de informática. “Acho que o tempo que eu gasto na internet eu poderia estar com os 

amigos ou assistindo a algum filme. Mas eu mexo com internet mais por não ter o que fazer e 

porque todos os amigos falam muito nela”. 

Já  para a  usuária  Diana dos Santos,  de 19 anos,  cujo primeiro contato com a 

internet se deu em lan house, a internet tem uma única serventia: a busca de informação para 

fazer trabalhos escolares. Ela não tem computador em casa e, por indicação dos vizinhos, 

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buscou   uma   escola   de   informática   para   aprender   a   utilizar   melhor   os   programas   de 

computador. O perfil dela diverge da maioria dos jovens estudados. Ela usa a internet mais 

para fins pedagógicos do que para entretenimento em geral. “Eu trabalho numa fábrica aqui 

em Juiz de Fora e lá vejo que para tudo hoje é preciso de computador. Acho importante, pois 

é  aprendendo que vou conseguir  um emprego melhor”,  acredita.    A jovem demonstra   ter 

pouca habilidade com a interface básica do computador e se confunde várias vezes quando 

tenta acessar sites de sua preferência como o de uma rádio local e da revista preferida. “Eu 

prefiro a internet que a TV. Pois a TV a gente fica só olhando e na internet você mexe e 

explora  mais”.  Caso  ela  não  estivesse  navegando  na   rede,   acredita   que   estaria   em casa, 

assistindo TV, ou sem fazer nada. 

6.1 MORADORES DE RUA NAVEGAM NA REDE DA BIBLIOTECA MUNICIPAL 

No setor de internet popular da biblioteca municipal existem sete computadores, 

sendo seis para uso livre da população e um para serviços internos.  Todos os equipamentos 

estão  conectados  à   internet,   por  meio  da   rede  banda   larga  Velox  e  possuem o   software 

gratuito Linux. Qualquer pessoa pode utilizar os computadores do local, “desde que haja um 

entendimento   mínimo   de   informática”,   informa   Auzenda   Villela.   A   recomendação   da 

administração da biblioteca é a de que as funcionárias não dediquem atenção específica aos 

usuários. Eles já devem ter uma bagagem de entendimento. Se o usuário tiver menos que 16 

anos, os pais ou os responsáveis legais devem preencher um termo de autorização para acesso 

à internet. Cada um tem direto a uma hora de acesso por dia. Mesmo que ninguém esteja 

utilizando os computadores, o usuário não pode acessar o computador mais do que uma hora 

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diária.   Para   garantir   o   acesso,   ele   mesmo   faz   a   marcação   em   uma   tabela   de   horários, 

disponível na mesa das funcionárias. 

Todos os computadores  são bloqueados para sites de bate­papo,  programas de 

mensagem instantânea (MSN, ICQ, Yahoo Messenger) e sites de relacionamento,  além de 

páginas eróticas.  O site de vídeos Youtube é   liberado,  porém nenhum computador possui 

saída para áudio, o que acaba por inviabilizar o aproveitamento do seu conteúdo audiovisual. 

Mesmo com a restrição de acesso a sites com conteúdo erótico, já houve casos de usuários 

que  conseguiram modificar   a   configuração  dos  computadores  para   acessarem páginas  de 

pedofilia. Nesses casos, a coordenação do setor proíbe a entrada do usuário que transgrediu as 

normas. A funcionária diz que vários usuários vão ao local para entrarem em contato com a 

prefeitura e fazerem reclamações do seu bairro. Ela destaca o caso de uma mãe que procurou 

ajuda do telecentro para divulgar o problema de saúde do filho acidentado. Foram reservados 

horários específicos para que o setor pudesse receber participantes de três programas distintos 

desenvolvidos  pela  Prefeitura  Municipal:  1)  Programa  Casa  Aberta,  que  oferece  apoio  a 

crianças abandonadas pelos pais e que sofreram abusos sexuais, de até 10 anos; 2) Programa 

de Erradicação do Trabalho Infantil (PET), que atende a menores abandonados pelos pais; 3) 

e os Cidadãos de Rua. 

6.1.2 O Núcleo de Cidadão de Rua

O   Núcleo   de   Cidadão   de   Rua   surgiu   em   1998   com   o   objetivo   de   acolher 

moradores  de rua de Juiz  de Fora,  oferecendo a essas pessoas serviços como dormitório, 

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atendimento psicológico, atividades educativas, curso de alfabetização, atendimento médico, 

tratamento dentário,  auxílio  para emissão de documentos,   refeições  gratuitas,  entre  outros 

serviços.   Atualmente,   o   núcleo   recebe   cerca   de   200   moradores   de   rua,   diariamente. 

Atividades recreativas e educativas também integram a rotina dos moradores de rua. Eles têm 

aulas   de   artes,   oficinas   de   artesanato,   aulas   de   alfabetização,   cursos   supletivos,   e 

programações   culturais   como   bingos,   sessão   de   vídeos,   palestras   e   visitas   a   espetáculos 

teatrais. Os dias que mais preocupam as responsáveis pelo Núcleo são sábados e domingos, 

quando as  portas  do  local  se  abrem apenas  no horário  da noite,  para  dormir.  No fim de 

semana  os  moradores  de   rua  permanecem mais  nas   ruas  do  que  no  abrigo  e  acabam se 

expondo mais aos riscos. “Fim de semana é uma agressão para eles. Têm mais contato com 

drogas e  com a bebida alcoólica”,   informa Silvânia.  É  por   isso que todos  se reúnem,  na 

segunda­feira, para que possam conversar sobre o que fizeram no fim de semana e trocarem 

dicas proveitosas. Há ainda reuniões semanais dos alcoólicos anônimos. 

  A  idéia  de   levar  os  moradores  de   rua  ao   telecentro  da  biblioteca  municipal, 

quinzenalmente, surgiu após visita feita pelos cidadãos à biblioteca. Vamos ver o que disse 

uma das pedagogas responsáveis, Silvânia Ribeiro da Silva:

Há um ano, os professores levaram os moradores de rua para conhecer a biblioteca. A escolha deste telecentro foi aleatória. Não foi por um objetivo específico.  Mas acreditávamos que o contato com a internet  serviria para aumentar a auto­estima dessas pessoas, ampliando seu campo de ação e levar para eles algo novo. 

Este não é  o único lugar de acolhimento aos moradores  de rua da cidade.  De 

acordo com as pedagogas entrevistadas, existe outro núcleo em Juiz de Fora conhecido como 

A Casa da Cidadania, que recebe pessoas mais velhas e em situação de maior vulnerabilidade, 

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muitas vezes portadoras de alguma doença grave. Já no Núcleo, o perfil dominante é o da 

idade adulta, caracterizado por pessoas que desejam, um dia, sair da condição de morador de 

rua. De acordo com a ficha cadastral dos freqüentadores do Núcleo, a maioria dos moradores 

de rua é alfabetizada, mas abandonou os estudos. 

Os moradores de rua freqüentavam a biblioteca desde agosto do ano passado e, 

repentinamente,  durante  a  nossa  pesquisa  de  campo,  perderam vontade  de  ir  ao  local  de 

maneira disciplinada, ou seja, dentro do horário reservado para eles no setor e sempre em 

grupos.   “Tudo   o   que   é   novo   assusta   muito   eles.   Acho   que   não   soubemos   prepará­los 

corretamente para lidar com a internet. Além disso, havia ainda o problema do deslocamento 

até lá. Todos reclamam da distância”.

No primeiro dia de visita ao telecentro da biblioteca, sete pessoas do Núcleo de 

Cidadãos de Rua estiveram no local. É interessante notar que nem todos quiseram sentar em 

frente   ao   computador.   Todos   eles   oferecem   muita   resistência   para   utilizar   o   PC.   As 

coordenadoras do Núcleo não os obrigam a freqüentarem o local. É feito um convite a todos, 

mas poucos vão. A única mulher do grupo que estava no setor não sabia nada de informática, 

mas   teve  curiosidade  em mexer  na  máquina.  Como  não   sabia   se  virar  na   rede,  pediu  à 

monitora que mostrasse a ela alguma coisa sobre “romance”. Minutos seguintes – após já ter 

acessado uma história de amor – ela parece ter perdido a paciência e desistiu de acessar o 

computador.  

Um senhor analfabeto pediu às assistentes que procurassem algo de sua cidade, 

Bicas   ­   MG.   Era   o   seu   primeiro   contato   com   a   máquina.   Apesar   de   estar   próximo   do 

computador, relutava em aproximar suas mãos do teclado e do mouse. A monitora sugeriu 

que ele entrasse em um site de jogos infantis. Como eles têm pouca intimidade com o PC é 

comum que isso aconteça. É enorme a dependência que os esses usuários têm dos monitores 

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dos telecentros. Todos parecem estar lá mais por obrigação do que por necessidade. Como 

havíamos dito no início, as coordenadas do programa fazem um convite a todos os cidadãos 

de rua para visitarem o setor de internet popular. Dos poucos que aceitam, ainda há aqueles 

que relutam em chegar perto da máquina, mesmo já dentro da biblioteca. Apenas quatro se 

animaram a entrar na internet. 

Desses quatro,  apenas um demonstrou ter mais  intimidade com o computador: 

Wilson Gonçalves dos Santos, 43 anos. Ele é alfabetizado e já  navegou sozinho, em duas 

páginas da internet: o site do Atlético Mineiro e da sua cidade natal, Bom Jesus do Galho. O 

primeiro contato de Wilson com a internet se deu no telecentro da biblioteca.  “Quem me 

ensinou a mexer foi a Auzenda [a coordenadora do setor de internet popular da biblioteca]”. 

Mas confessa que procura outros locais para acessar a rede, como o telecentro da Câmara 

Municipal. Wilson não acha que é perda de tempo estar na internet, pois “muita coisa que 

você não conhece se acha na internet. Fico informado”. Com relação ao conteúdo que busca 

na rede, confessa que gosta de saber as notícias da sua cidade. E que “queria muito descobrir 

o e­mail da sua ex­mulher para poder procurá­la”. Wilson citou ainda o Youtube, que ficou 

conhecendo por meio de jornais, mas até agora não conseguiu acessar por causa da restrição 

imposta pelas regras do local. Caso ele não estivesse se distraindo na internet, acha que estaria 

lendo uma revista ou jornal, ou andando na rua.

 É interessante notar que aqueles que não sabem nada de informática recebem um 

tratamento  quase que  infantil  por  parte  das  monitoras  e coordenadoras  do projeto.  Como 

nenhum deles sugere temas,  as monitoras  entram em sites de jogos para eles.  O nível de 

dificuldade desses jogos é o mínimo possível. E é muito mais fácil existir identificação com 

uma atividade lúdica.

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Após o fim do horário  reservado no telecentro para os moradores  de rua,  um 

homem chegou para acessar a rede. Júlio César também fazia parte do Núcleo de Cidadãos de 

Rua, mas não queria se misturar aos colegas no momento dedicado a eles no local. Ele fez 

questão   de   só   sentar   em   frente   à   máquina   depois   da   saída   dos   colegas.   Júlio   César 

demonstrava já ter conhecimento com a rede. Ele levou até uma lista de assuntos que iria 

pesquisar naquele dia: datas comemorativas, meditação, alimentação e autoconhecimento. Ele 

disse que também iria fazer uma conta de e­mail naquele dia. Júlio César diz que gosta de se 

distrair com os computadores e, caso não estivesse o setor de internet popular, estaria catando 

papel na rua.  

Marcelo  Sales,  de  20 anos,  se  envolveu com drogas  muito  cedo e o  vício   foi 

sustentado com a venda de objetos  da própria   família.  Os pais  perderam a paciência e o 

expulsaram de casa, obrigando o jovem a buscar abrigo no Núcleo de Cidadão de Rua da 

prefeitura. Sua motivação em procurar a rua como alternativa de sobrevivência é a mesma da 

maioria dos brasileiros entrevistados pelo MDS – 35,5% deles saíram do lar por causa da 

dependência química.

 No dia que conversamos com Marcelo, uma sexta­feira de manhã, ele participava 

de uma oficina de artesanato ministrada pela educadora Soraya Nogueira Martins. Para ele, a 

melhor  coisa  que   inventaram foi  o  computador,   tecnologia  com a  qual   teve  contato  pela 

primeira vez há exatos três meses, na biblioteca municipal. Antes disso, segundo ele, nunca 

tinha se conectado. Mas não é só no setor de internet popular que Marcelo navega na rede. 

Nos fins de semana, quando não há atividades culturais ou oficinas no Núcleo de Cidadão de 

Rua e o local só abre para oferecer os dormitórios, o jovem gasta uns trocados que recebe – 

que ele não revela como consegue – com a internet rápida das lan houses. E lá se diverte com 

clipes de música no Youtube, com o Orkut, entra em salas de bate­papo, MSN e nas páginas 

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on­line da Revista Playboy. “As melhores coisas que descobri foi o site da revista Playboy e 

do Orkut. Minha vida com a internet é a melhor coisa. Quando não mexo na internet a vida 

fica parada. Estou viciado no Orkut e fico curioso para saber se têm recados. Gosto de saber 

de notícias de futebol e celebridades”. 

Uma das  respostas  que mais  chamou a atenção foi  a  que ele  confessou o que 

estaria fazendo caso não estivesse na internet. “Quando tô na net não penso em besteira, não 

fico na rua. Quando tô no Orkut não corro o risco de ter um policial na minha cola, me dando 

geral na rua. Não penso na droga”. 

6.2 EM BUSCA DE OPORTUNIDADES NO TELECENTRO DE SANTA LUZIA

Cerca de 300 a 400 atendimentos, por mês, são feitos no setor de internet popular 

da Regional Santa Luzia, sendo que a maioria dos freqüentadores é formada por estudantes e 

desempregados.  Inaugurada há  cinco anos, a regional  Santa Luzia foi o primeiro local do 

bairro a oferecer um espaço de acesso gratuito à internet, criado especialmente para atender à 

comunidade   carente   da   região,   de   forma   a   contribuir   com   o   trabalho   e   os   estudos   dos 

moradores.  “Antigamente  o movimento  aqui  era  bem maior.  Atendíamos  a  cerca  de  800 

pessoas  por  mês.  Fomos  perdendo  espaço  para   as  lan  houses,   onde  o  usuário   tem uma 

liberdade muito  maior  de acesso.  O foco do nosso setor  de  internet  é  mais  voltado para 

estudos e trabalho do que para lazer”, informa a supervisora Luzimar Nascimento.

Para poder ter acesso aos computadores, é preciso realizar um cadastro prévio e 

sempre apresentar um documento de identidade ao funcionário responsável.  “Dessa forma 

conseguimos manter o controle e conhecemos quem são as pessoas que procuram pelo setor”. 

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Todos   os   três   computadores   disponíveis   têm   acesso   à   internet   via   rádio,   sendo   que   na 

prefeitura existe uma rede de controle de todo o conteúdo que é utilizado. A supervisora não 

sabe informar por que sites de Orkut ou bate­papo são bloqueados pela prefeitura, mas “o 

MSN é liberado, pois é uma ferramenta de comunicação”, diz. Um problema muito recorrente 

no setor, citado pela supervisora, é com relação às dificuldades impostas pelas restrições de 

acesso a determinados conteúdos,  o que, por vezes,  acaba impedindo de serem realizados 

alguns estudos: “Já tivemos casos em que só de a pessoa digitar a palavra ‘sexo’ no Google 

travou   o   sistema.   Isso   atrapalha   muito   para   a   pesquisa   dos   usuários”.   A   impressora   do 

telecentro só  pode ser usada para  impressão de documentos  considerados  pela supervisão 

“importantes”, como: currículos, comprovante de inscrição para concursos, etc. O usuário tem 

direito de usar, no máximo, meia hora de internet, tempo que pode ser estendido caso não 

tenha outra pessoa esperando pelo acesso. 

Procuramos estabelecer dias e horários fixos para visita a todos os telecentros, 

para que pudéssemos encontrar um grupo de usuários com o perfil semelhante em cada local. 

Na   regional  Santa   Luzia,   onde   realizamos  nossa   pesquisa   principalmente   no   período   da 

manhã,  notamos  uma  forte  presença  de  pessoas  desempregadas  em busca  de  ocupação e 

daquelas que, mesmo já empregadas, estavam à procura de informações para conseguir um 

trabalho melhor e ter um salário mais alto. 

Em   um   desses   dias,   as   três   pessoas   que   estavam   no   telecentro   eram 

desempregadas. Entre eles estava um homem de 54 anos de idade, que afirmou freqüentar o 

local todos os dias. Sem trabalho, dedica as horas livres para o engajamento em movimentos 

sociais,  sendo militante  político filiado ao PSOL e,  segundo ele,  ex­candidato a deputado 

estadual pelo PSTU. Possui três endereços de e­mail para se comunicar com integrantes dos 

partidos políticos. Diariamente, ele acessa a página do Tribunal Superior Eleitoral para ficar 

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atualizado quanto aos processos que correm contra os candidatos e as informações sobre as 

eleições municipais de 2008. Verificamos que no caso dele a internet é o lugar onde pode pôr 

em prática suas ideologias, e encontrar pessoas que partilham do seu pensamento político. Ele 

diz que a internet ocupa seu tempo livre e, caso não tivesse acesso à rede, estaria em casa 

lendo algum livro ou buscando outras formas de entrar em contato com os integrantes do seu 

partido. 

Uma jovem de 18 anos,   também desempregada,  estava no local  para procurar 

informações sobre concursos. Após concluir o segundo grau, se dedica ao curso de inglês e à 

informática – ambos os cursos oferecidos pela prefeitura. Ela afirma que quer fazer alguma 

prova de concurso, mas não sabe qual. “Qualquer uma que exija só segundo grau completo”, 

afirma.   Não   gosta   de   acessar   sites   de   relacionamento   nem   programas   de   mensagem 

instantânea. Ao mesmo tempo em que pesquisava concursos públicos, fazia pesquisa sobre 

horóscopo no Google.  Para ela  a internet  nunca é  uma perda de tempo,  porque consegue 

economizar jornais, já que “todas as informações sobre ofertas de emprego posso conseguir 

na internet”. 

Um estudante universitário de geografia, de 30 anos, também desempregado, logo 

acessou o MSN e abriu o e­mail quando se conectou. Ele freqüenta o local pelo menos duas 

vezes   por   semana,   e   gosta   de   conversar   com   os   amigos   pelo   programa   de   mensagens 

instantâneas. Além de pesquisar temas da sua faculdade, procura também por jogos de RPG. 

No caso dele, que freqüenta o local praticamente todas as manhãs, a internet é entretenimento 

puro. O tempo que está sendo dedicado à rede poderia ser usado para os estudos. “Poderia 

estar lendo algum livro agora ou adiantando algum trabalho da faculdade, mas gosto de me 

divertir aqui”. 

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Outra usuária do setor, de 28 anos, diz que é estudante do segundo grau. Não vai 

ao local com muita freqüência. Ela faz curso de digitação, desenho de moda e quadrinhos, 

além de se dedicar à música. Na internet, faz pesquisas para encontrar emprego e procura por 

cifras musicais. Como o setor não fornece impressão de documentos, copia as letras à mão em 

um pedaço de papel improvisado. Mesmo tendo um endereço de e­mail, ela afirma que não 

gosta de verificar sua caixa de mensagens no telecentro porque tem medo que sua senha fique 

armazenada no computador. Todos os usuários têm um tempo máximo de 30 minutos para 

acessar os computadores. “Para mim a internet não é uma perda de tempo, principalmente 

porque todas as informações sobre concursos públicos posso encontrar aqui e quando preciso 

imprimir o comprovante de inscrição, a coordenadora permite”. 

Em outro dia de visita, um pintor desempregado tentava atualizar seu endereço 

junto a Caixa Econômica Federal para receber seu extrato do Fundo de Garantia. Ele chegou a 

descrever a importância que a internet tem em sua vida: sem ela, teria que enfrentar fila no 

banco para resolver  as pendências.  Ele afirma que não usa e­mail  porque não sabe como 

utilizá­lo.  Tudo o que  aprendeu com informática   foi  por  conta  própria,  mas diz  que  tem 

vontade de fazer um curso. Além de pesquisar informações sobre seu trabalho, como variação 

de cores de tinta, etc, ele gosta de saber sobre futebol e música. 

O agente penitenciário Amilton Afonso da Silveira Mendes, de 26 anos, freqüenta 

o setor de internet popular de quatro a cinco vezes por semana. "É bem em frente à minha 

casa. Venho aqui porque é mais econômico". Ele afirma que também usa a internet em lan 

houses, mas muito pouco. Gasta, em média, apenas cinco reais por mês nesse tipo de serviço. 

O dinheiro, caso não fosse utilizado em  lan houses,  iria para as economias que faz para o 

apartamento que planeja comprar.   "Só  quando não tem outro jeito que pago por internet. 

Aqui  [no telecentro]  eu consigo achar  o que quero",  afirma.  Amilton não se  lembra nem 

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quando e nem onde ocorreu seu primeiro acesso à   internet e diz com segurança que a rede 

mundial   de   computadores   não   é   uma   perda   de   tempo,   e   justifica:   “Faço   um   curso   de 

capacitação à distância, por meio da internet, aqui na regional. O curso é pago pelo poder 

público pra gente obter especialização em nossa área”, diz.   O agente afirma que confia no 

que encontra na rede, mas somente nas informações que ele procura. “Só utilizo para o que 

realmente   preciso:   informações   sobre   concursos,   e­mail   e   curso   on­line.   Nada   de 

entretenimento”. Caso não estivesse acessando a internet, estaria usando o tempo livre para se 

dedicar aos estudos para a prova de concurso, para a qual já se inscreveu. Ele acredita que 

sem a internet, sua vida seria mais difícil,  já que todas as informações sobre concursos às 

quais têm acesso foram obtidas pela internet. 

Adalberto  Tenório  da Silva,  de 38 anos,   trabalha  como vendedor  autônomo e 

depende da internet para executar seu trabalho. A internet popular da Regional Santa Luzia 

foi  descoberta  por  ele  há   três  anos,  mas o  primeiro  contato  que   teve  com a   informática 

ocorreu no banco onde trabalhava,  em 1996. "Não fiz curso. Aprendi a mexer com meus 

colegas.  Acho  que   sei  muita   coisa,  mas  preciso   fazer   um curso  de  Excel".  Ele   diz  que 

freqüenta  o  setor  duas  vezes  por   semana e  que   também tem cadastro  em outro  setor  de 

internet  popular  no  centro  da  cidade.   "Nas  lan  houses  vou  muito   raramente.  Só   quando 

preciso de algo com muita urgência", explica. Para ele, internet não é sinônimo de perda de 

tempo, muito pelo contrário,  é  nela que consegue informações  para mandar seu currículo 

profissional   e   se   candidatar   a   uma  vaga  no  mercado.  No  dia   em que  nos   encontramos, 

Adalberto foi ao telecentro com apenas uma finalidade: imprimir um processo do Tribunal de 

Justiça.   "Se  não   tivesse   a   internet,   tudo   seria  mais   demorado  para   eu   ter   acesso   a   esse 

documento, pois a  sede do Tribunal fica em Brasília". Os únicos sites que acessa são, além 

do que já citamos, o do jornal Tribuna de Minas e o próprio e­mail. Ele diz que confia nas 

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informações que estão na internet e que o site da Tribuna foi uma "recomendação de amigos" 

e que há quatro anos que não compra jornal na banca por causa disso. Sempre que precisa de 

alguma informação do jornal, que é de circulação local, vai ao setor de internet popular. "Vou 

direto à página de classificados do Tribuna de Minas. Anoto o e­mail e envio meu currículo. 

Foi dessa forma que conseguir me colocar em vários postos de trabalho", diz.  

Uma das  dificuldades  que   ele   sente   no   setor   são  os  problemas  de  acesso  do 

servidor da prefeitura.  "Às vezes  ele   trava  e  não consigo entrar  na página que gostaria". 

Adalberto acredita que a internet influencia 100% no seu dia­a­dia e opina: "Quem não tem 

acesso a ela pode ser considerado analfabeto. Se eu passar uma semana sem acessar a rede, é 

como se  eu   ficasse   sem  ler".  Com relação  ao   tempo  que  se  dedica  ao  acesso,  caso  não 

estivesse em frente ao computador, Tenório afirma que estaria trabalhando e que as pessoas 

devem usá­la com “objetividade”: “Eu tenho um amigo que fica direto, mas eu não consigo 

ficar mais que 20 ou 30 minutos. Eu adoro quando o currículo pode ser enviado por e­mail, 

pois é mais fácil. Já enviei mais de 50 currículos pela internet”.  

O  jovem que entrevistamos  em seguida,  Clayton  da  Silva Souza,  de  21 anos, 

descobriu o  telecentro  de Santa Luzia por  indicação de uma amiga.  Seu   primeiro  acesso 

ocorreu  quando estava  no  quartel,  dois  anos  atrás,   e  aprendeu  a usar  a   internet  com os 

amigos. "Só sei mexer na internet, mais nada, pois nunca cheguei a fazer curso". Ele marca 

presença todos os dias da semana no telecentro e oito vezes,  no mesmo período,  em  lan 

houses, onde chega a gastar cerca de 32 reais, mensalmente, em horas acessadas. "Se eu não 

usasse a internet, com esse dinheiro acho que compraria uma roupa", afirma. Clayton achou 

fácil usar a internet,  mas no começo teve dificuldade na digitação: "Ainda não sei digitar 

direito, mas hoje estou melhor do que antes, quer dizer, mais ou menos". Ele considera que a 

internet  é  uma perda de tempo se a pessoa usar para determinados conteúdos, como sites 

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pornográficos.  O  jovem confia  nas   informações  dos  sites  da  Globo.com,  mas afirma não 

confiar nos amigos virtuais do Orkut, site do  qual nem chegou a fazer parte, apesar da idade. 

"Via os meus amigos  entrarem [no Orkut],  mas não quis participar,  pois  acho que quem 

procura Orkut é porque está na solidão". Mas gosta de acessar o programa MSN e o e­mail. 

“Uso a senha do MSN de um amigo, pois perdi a minha conta. Gosto de conversar com uma 

pessoa aqui”.  Para entrar no Youtube, site que diz ser o ideal para encontrar todas as músicas 

que gosta, ele precisa ir às lans, já que no telecentro não existe saída de áudio.

Ele afirma que sente muita dificuldade nos termos em inglês que encontra na rede. 

Apesar de acessar todos os dias, em  lan houses  e no setor de internet popular, para ele, a 

internet não influencia tanto no seu dia­a­dia, a não ser pelas informações que encontra. Se 

não estivesse na internet, acredita que estaria dormindo ou procurando outro emprego. Faço 

uma observação com ele que emprego também pode ser procurado na internet, mas ele não 

retruca. “O que mais me atrai na rede é poder conversar com as pessoas que mais gosto, pelo 

MSN ou através de bate­papos”. 

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6 CONCLUSÃO

Se tivéssemos que escolher uma palavra para caracterizar cada forma de uso da 

internet pelos três grupos, teríamos: entretenimento, novidade e utilidade para a juventude, o 

morador de rua e o trabalhador, respectivamente. Não é nosso propósito engessar, nem criar 

estereótipos sobre a (s) maneira (s) como cada perfil de usuário se apropria das TICs. No 

entanto,   tais  vocábulos podem servir,  de maneira  geral,  para entendermos as variantes  de 

utilização dessas tecnologias, o que não quer dizer que vamos fugir de especificidades que 

destoam da tentativa rotulá­los. 

Todos os grupos estudados vivem na rede mundial de computadores o que Sousa 

(2007) chama de experiência social5. 

O espaço de fluxos cria localidades e permite a prática social sem a necessidade da materialidade.   Transações   econômicas,   compras   de   supermercado,   consulta   a jornais,   namoro   e   até   sexo   acontecem   num   espaço   sem   espaço,   ou   mais precisamente,  sem o espaço material  como nós conhecemos.  A Internet  abala as fronteiras geográficas, antes tão bem definidas. (SOUSA, 2007, p.13) 

5 A pesquisadora se baseou nas obras de CASTELLS, já citado por nós neste trabalho, e em MARTINO (2000). 

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Uma experiência social que é, ao mesmo tempo, perto e distante do real. Perto 

porque,   apesar   da   imaterialidade,   a   interação   não   deixa   de   estar   lá,   mesmo   que   seja   a 

interação de dados, bits, mas ocorre, pois essas informações são decodificadas e levadas ao 

destinatário num infinito jogo de emissão­recepção. E distante porque as redes se conectam 

quase   que   ilimitadamente   de   um   ponto   a   outro   do   planeta.   Estar   conectado   na   internet 

implica,   necessariamente,   conectar­se   com   pessoas,   instituições,   organizações   políticas, 

científicas, imprensa, religião. Praticamente tudo o que está materialmente presente em nosso 

cotidiano também o está virtualmente disponível na rede mundial de computadores. 

Os   jovens,   em   sua   maioria,   querem   experiências   sociais   na   internet   para 

divertimento e descontração, mas também como forma de ir em busca de melhores condições 

de vida e garantirem vaga no mercado de trabalho – como apontado na pesquisa Datafolha. 

Todos eles estão matriculados em cursos de informática porque se preocupam com o futuro e 

sabem   que   a   capacitação   técnica   é   indispensável   na   sociedade   da   informação,   onde 

praticamente todos os setores de trabalho dependem do conhecimento de programas básicos 

de computador. 

A predominância pela busca de sites de relacionamento, como o Orkut, indica um 

traço de sua vida afetado diretamente pela   internet:  os relacionamentos.  No Orkut,   temos 

vários perfis  estacionados no território virtual,  onde se pode obter informação, a qualquer 

momento,   sobre   suas   preferências   e   gostos,   possibilitando   ainda   o   envio   de   mensagens, 

declarações de amizade e paqueras. Sobre essa pessoa, você pode saber também se existem 

amigos em comum entre você e ela, os quais você talvez não conhecesse caso ela não tivesse 

sua virtualidade exposta na rede. Nesse local, a vida pessoal, profissional e sentimental do 

usuário pode ser exposta; uma presença atemporal, na qual, mesmo se você for o único que 

está  on­line  em determinado  momento,  a   interação  não se  anula,  pelo  contrário,  pode se 

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fortalecer.   É   possível   dizer   que   esses   jovens   estejam   envolvidos   por   um   novo   tipo   de 

sociabilidade, que se dá cada pela mais através da representação. 

...O papel mais importante da Internet na reestruturação das relações sociais é a sua contribuição para o novo modelo de sociabilidade, baseado no individualismo. As pessoas organizam­se cada vez mais não só em redes sociais como em redes sociais organizadas por computador. Por conseguinte, não é que a Internet crie um modelo de individualismo em rede, mas o modelo da Internet providencia o suporte material apropriado para a difusão do  individualismo em rede como forma dominante de sociabilidade. (CASTELLS, 2003, p.161) 

Outra ferramenta bastante apontada pelos usuários, principalmente entre os jovens 

da   Cidade   Alta   e   os   usuários   da   regional   Santa   Luzia,   é   o   programa   de   mensagens 

instantâneas.   No   Brasil   o   mais   popular   é   o   MSN.   Muitos   usuários   que   observamos 

apresentaram justificativa semelhante para a procura por este tipo de serviço, além de permitir 

a aproximação entre as pessoas. Um estudo promovido pela Associeted Press e AOL, nos 

Estados Unidos, e divulgado no site Terra aqui no Brasil,  mostra que “entre os usos mais 

comuns que os  jovens fazem dos programas de comunicação instantânea está  o de evitar 

situações potencialmente embaraçosas ou desagradáveis” (JOVENS USAM..., 2008, on­line). 

O MSN, o bate­papo e as mensagens virtuais são ambientes que propiciam uma interação que, 

para a maioria dos jovens que conversamos, evitam constrangimentos. 

De acordo com o estudo, mais de quatro em cada dez, ou 43% dos adolescentes que usam mensagens instantâneas, dizem que o fazem para falar coisas que não diriam pessoalmente. Vinte por cento usa os instant messengers para convidar alguém para sair ou aceitar convites, e 13% para terminar um relacionamento. ‘Se elas surtarem ou coisa parecida, você não vê’, diz Cassy Hobert, 17, estudante do segundo grau em Frenchburg, no Estado do Kentucky. ‘E se eu surtar, elas também não vêem. ’ (ibidem) 

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A utilização de personalidades falsas, como no caso do jovem Pedro, da Escola de 

Informática e Cidadania, seja no Orkut, no MSN, ou no bate­papo, ou o simples fato dos 

usuários criarem personagens no processo de interlocução com desconhecidos na rede são 

aspectos que chamam a atenção para um assunto do qual  falamos no  terceiro  capítulo:  a 

identidade dos sujeitos  inseridos na ordem da sociedade da informação.  A psicóloga Ana 

Cristina Garcia Dias, ao retomar conceitos de Turkler (1995) e Suller (2000), cita o exemplo 

das salas de bate­papo on­line, que, ao possibilitarem o anonimato e o uso da imaginação, “... 

poderiam estar revolucionando o falar­de­si, as relações interpessoais e a própria identidade 

dos indivíduos” (DIAS, 2006, p.7).

A   falta   de   pistas   de   orientação   (...)   daria   oportunidade   de   construção   e experimentação de diferentes personagens, dentro de um contexto considerado como seguro e lúdico. A proteção oferecida pelo anonimato permitiria a experimentação de papéis e a realização virtual de fantasias que não seriam admissíveis ou possíveis para a maioria das pessoas na vida real de forma desinibida (ibidem). 

Ora,  podemos  concluir   a  partir  daí   que  a   tecnologia  digital   reforça  os  níveis 

fragmentários da vida moderna, em que, na visão de Santaella, é difícil estabelecer o sujeito 

em um “tempo/espaço estáveis em um ponto de vista fixo” (SANTAELLA, 2003, p.214), 

com a constatação da busca por identidades múltiplas na rede. Isso pode ser verificado mais 

fortemente, justamente pelo maior contato com as ferramentas de comunicação instantânea e 

sites de relacionamentos, entre os jovens com os quais tivemos contato – não só os jovens 

usuários da escola de informática Cidade Alta, incluímos aí alguns jovens moradores de rua, 

como o Marcelo, e também os jovens desempregados que freqüentam o telecentro de Santa 

Luzia. A exposição sem constrangimentos na internet através de chats e outras ferramentas, 

de acordo com Dias e outros autores citados por ela, chegaria ao ponto de “permitir  uma 

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melhor expressão do verdadeiro self [eu; ego] que as relações face a face” (DIAS, 2006, p.2). 

A nossa hipótese é a de que as identidades também sejam renovadas por causa das tecnologias 

digitais. 

Com relação ao uso da informática pelos moradores de rua, que também o fazem 

por entretenimento, acreditamos que o contato com um ambiente novo, para a maioria deles, 

se torna, no primeiro momento, motivo de espanto. O interesse aumenta na medida em que se 

dá a identificação – como no caso dos adultos que pediram para buscar informações sobre a 

sua terra natal, ou encontraram atividades lúdicas que remetem ao ambiente real do cotidiano 

deles.  Essa situação remete  a  outra  capacidade  da  internet  em reforçar   identidades   locais 

conforme   abordamos   anteriormente.   Para   Brignol   (2002),   “Ao   contrário   de   estimular   a 

homogeneização, uma das possibilidades da Internet é reforçar vínculos com o que é próprio 

da cidade e do estado” (BRIGNOL, 2002, p.3). 

A rede estabelece padrões compartilhados em escala global, mudando a relação com a cultura,  sem que as identidades locais sejam abandonadas,  mas reconstruídas a partir  do confronto  com outras  possibilidades.   (...)  A  internet  pode permitir  que sejam conciliados valores provenientes da troca de informação global e os herdados como legado cultural da terra de origem. (ibidem).

Na vida de um dos entrevistados, o envolvimento com a rede social do Orkut ou 

com outros  conteúdos atrativos  referentes  ao sexo,  fez com que ele nos declarasse que a 

distração com esses sites diminuiu as chances dele à exposição de riscos na rua. Para outro 

morador de rua, a internet serviria como ferramenta para voltar a encontrar a família, caso ele 

tivesse   o   e­mail   para   procurar   a   ex­mulher.   Não   podemos   esquecer   que   as   desavenças 

familiares são um dos principais motivos para que as pessoas desse grupo procurassem a rua 

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como abrigo. A internet, portanto, poderia ser trabalhada para tentar estabelecer uma forma 

de contato com os seus parentes.

 Obviamente, as dificuldades de acesso à internet para os moradores de rua são 

muito maiores do que entre os jovens ou entre os adultos do Santa Luzia. Por isso, como e por 

que pensar em políticas de inclusão digital  para esse grupo de pessoas, que está   longe da 

inclusão social? Pessoas que vivem em situação extrema de pobreza passam diariamente por 

provas de sobrevivência nas ruas e são semi­analfabetas “terão cabeça” para pensar em se 

entregar a uma experiência social  on­line?6 Não podemos cair na armadilha de achar que a 

existência   dessas   limitações   seja   uma   desculpa   para   deixá­los   longe   do   mundo   virtual. 

Também não  podemos  afirmar  que  a   implementação  de  políticas  públicas  de  combate  à 

exclusão   digital   entre   esses   grupos   irá   transformar   sobremaneira   as   suas   vidas   mas, 

inevitavelmente, as fará enxergar o mundo de outra forma. Fuser (2008) justifica que “Ações 

de inclusão digital, no nosso entender, podem ser vistas como práticas de uma determinada 

política cultural”. (FUSER, 2008, p. 8). E completa:

A criação  de   telecentros   em pontos  de   cultura   e   em outras   iniciativas  públicas estabelecem claramente  essa relação.  Conceber  os   telecentros  como parte  desses equipamentos culturais pode ser uma alternativa importante (...) [já que] os espaços culturais  constituem oportunidade  de  não   reproduzimos  as   ações  disciplinadoras quase sempre presentes na educação técnica. (ibidem)

O uso da internet, portanto, serviria aos moradores de rua como uma atividade 

cultural alternativa àquelas já desenvolvidas dentro do Núcleo de Cidadão de Rua. Mas “o 

acesso, simplesmente, não garante a inclusão na perspectiva cidadã” (idem, p.5). Para que isso 

6   Esta indagação, e a maneira como foi colocada, é quase que uma transcrição literal da pergunta feita por um dos consultores durante a sessão de apresentação oral do projeto “As Novas Tecnologias da Comunicação e Informação no Panorama da Inclusão Digital”, no XIV Seminário de Iniciação Científica da UFJF, em outubro deste ano (Informação Verbal).  Nele, também abordávamos a questão do acesso à internet pelos moradores de rua. 

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ocorra, ou seja, para que as populações de rua possam tirar proveito próprio da rede, é preciso 

que   elas   sejam   capacitadas   para   tal   ambiente   e   passem   a   atuar   neles   como   agentes   e 

produtores de conteúdos. 

No bairro Santa Luzia, a questão de se pensar no acesso para, de alguma maneira, 

tirar   proveito   dele   na   busca   por   melhores   oportunidades   de   emprego   foi   o   fator 

preponderante,  principalmente   a  procura  por   concursos  públicos,  citado  pela  maioria  dos 

entrevistados. No local, há uma maior liberdade de uso da internet e, diferente da maioria dos 

jovens que conversamos, os usuários não possuem computador em casa. Nesse telecentro, as 

pessoas já vão com alguma atividade ou tarefa programada para navegarem na internet. A 

procura  por   serviços  é  muito  grande,   como   impressão  de  documentos,   comprovantes   de 

inscrição em concursos e vestibulares, consulta a processos judiciais, realização de cursos à 

distância etc. A maioria dos desempregados e trabalhadores que vai ao local reconheceu a 

importância da internet para o acesso às mais variadas informações, inclusive o caso de um 

trabalhador que disse  ter parado de comprar  jornal  por causa do conteúdo do veículo ser 

disponibilizado no site. No caso dele, o que mais o interessava era o caderno de classificados 

para encontrar alguma oferta de emprego, o que acabou se concretizando várias vezes. 

Ócio, lazer, diversão, serviços, aprendizado, trabalho, informação, comunicação, 

cidadania   e   inclusão   social.   Aqui   certamente   cabem   mais   conceitos   para   qualificar   a 

motivação dos diferentes usuários que navegam na rede mundial de computadores, mas vai 

depender sempre do perfil a ser analisado, da situação observada, do local, e ainda se existem 

pessoas   dispostas   para   a   capacitação   de   grupos   marginalizados   durante   o   acesso   às 

tecnologias digitais. 

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7 REFERÊNCIAS

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CALLIGARIS, Contardo. A adolescência acabou? Folha de S. Paulo, São Paulo, 27 jul. 2008. Caderno Jovem Século 21, p.3.

CANCLINI, Nestor García. Consumidores e Cidadãos: conflitos multiculturais da globalização. Rio de Janeiro. Ed. UFRJ, 1999. 

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