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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA
MESTRADO EM PSICOLOGIA SOCIAL
Compromisso Convencional: Fator de proteção para as
condutas Agressivas, Anti-sociais e de Uso de Álcool?
Célia Maria Cruz Marques Chaves
João Pessoa, Março de 2006
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA
MESTRADO EM PSICOLOGIA SOCIAL
Compromisso Convencional: Fator de proteção para as
condutas Agressivas, Anti-sociais e de Uso de Álcool?
Célia Maria Cruz Marques Chaves, Mestranda
Prof. Dr. Valdiney Veloso Gouveia, Orientador
Dissertação submetida ao Curso de Mestrado
em Psicologia Social da Universidade Federal
da Paraíba, como requisito parcial para a
obtenção do grau de Mestre em Psicologia
Social.
João Pessoa, Março de 2006
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA
MESTRADO EM PSICOLOGIA SOCIAL
Compromisso Convencional: Fator de proteção para as
condutas Agressivas, Anti-sociais e de Uso de Álcool?
Célia Maria Cruz Marques Chaves
Dissertação avaliada em 28 de Março de 2006
_______________________________________________
Prof. Dr. Valdiney Veloso Gouveia (UFPB, Orientador)
_______________________________________________
Prof. Dr. Joseli Bastos da Costa (UFPB, Membro)
_______________________________________________ Prof. Dr. Genário Alves Barbosa (UFPB, Membro)
João Pessoa, Março de 2006
“Nunca me deixe esquecer que tudo o que tenho, tudo o que sou e o que vier a ser
vem de Ti Senhor”.
(Ana Paula Valadão)
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Ao meu amado marido e amigo: Paulo Chaves
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AGRADECIMENTOS
Agradecer! Este é sem dúvida um momento especial num trabalho como este. Muitas
pessoas estiveram envolvidas, e por isso, também são responsáveis por mais esta etapa concluída
na minha carreira acadêmica. Na verdade, não vejo esse momento como um “fim” mas como um
começo de uma série de trabalhos e conquistas acadêmicas que estão por vir. Assim, inicialmente,
quero registrar meu agradecimento a Deus por ter me capacitado, protegido e permitido que eu
não estivesse sozinha neste momento que é prazeroso, mas ao mesmo tempo difícil e espinhoso.
Ele pôs em meu caminho pessoas muito especiais que foram importantes pra mim nesta etapa.
Desta forma, agradeço:
Ao professor Valdiney Veloso Gouveia, meu orientador, por todos os ensinamentos
acadêmicos e de vida que pude compartilhar, não apenas durante estes dois anos de mestrado, mas
por cinco anos, período em que estive trabalhando no núcleo de pesquisa Bases Normativas do
Comportamento Social (BNCS). Do convívio neste núcleo de pesquisa, levo comigo muitos
momentos agradáveis de aprendizagem, companheirismo, amizade, crescimento acadêmico e
pessoal logrados também nos momentos difíceis que de igual forma fazem parte de nossa vida e
das relações interpessoais onde quer que estejamos.
Aos professores Joseli Bastos da Costa e Genário Alves Barbosa que colaboraram na etapa
final desta pesquisa, em especial ao professor Joseli (Joca) pelos momentos de discussão e
amizade e por ter sido o leitor desta dissertação.
A Estefânea, Tatiana, Paloma, Sandy, Marcílio, Alessandra, Deliane, Marina, Adriana,
Maria Luíza, Kdu, Walberto, Gislene, Viviane, Waleschka, Giovani, Karla e Patrícia que
estiveram presentes na formação anterior do BNCS. Dentre estes, estão não só ex-colegas de
trabalho, mas pessoas que continuarão fazendo parte da minha vida mesmo que não seja possível
estarmos perto fisicamente. Aos que em parceria com alguns dos citados anteriormente, agora
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compõem o BNCS: Poliana, Jane, Carlos, Diógenes e Thiago, com os quais convivi durante um
período de tempo pequeno, mas, pude compartilhar momentos agradáveis.
A minha família, em especial ao meu amado marido Paulo Chaves que além de um esposo
amoroso, é um grande amigo, companheiro, conselheiro e que acima de tudo me apoiou neste
período sabendo compreender os momentos de ausência e me acolher nos momentos de
dificuldades! Aos meus pais, Vandir e Fátima, que sempre estiveram ao meu lado, apoiando e
torcendo pelo meu sucesso. Eles são as pessoas com quem aprendi as lições mais valiosas da
minha vida de amor a Deus e ao próximo. Aos meus irmãos, Rebeca, Júnior, Walber e a Nívia e
seu marido Davi, pelo companheirismo e apoio, sobretudo de ordem emocional que me dedicaram
e dedicam. Aos meus queridos avós Anízio e Nina que tão carinhosamente torcem por mim e me
apóiam. Aos meus amigos Sandrinho e Renata que acompanharam de perto o desenvolvimento
deste trabalho, sendo indispensável a ajuda que me deram principalmente na “reta final!” Estes
são dois amigos daqueles bem especiais que Deus nos concede e que parecem mais anjos
enviados por Ele do que meros amigos humanos.
As secretárias do mestrado Vitória e Graça pela amizade, simpatia e disposição em ajudar
e por fim, mas não menos importante, agradeço aos 366 participantes desta pesquisa, que
concordaram em responder aos questionários como também aos diretores das escolas públicas e
privadas que concordaram em nos ceder alguns horários para a execução desta pesquisa.
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Compromisso Convencional: Fator de proteção para as condutas
Agressivas, Anti-sociais e de Uso de Álcool? RESUMO - A presente dissertação objetiva principalmente verificar em que medida o comprometimento dos adolescentes com a sociedade convencional (adoção dos valores normativos e ajustamento escolar) poderia prevenir a apresentação dos comportamentos agressivos, anti-sociais e de uso de álcool. Em linhas gerais, a hipótese do compromisso convencional defende que o comprometimento com a sociedade convencional representada por grupos normativos que são responsáveis diretamente pela transmissão dos valores sociais, age como um fator de proteção para as condutas de risco. Desta forma, considera-se que o ajustamento escolar e os valores humanos declarados pelos adolescentes podem refletir sua inclusão em uma sociedade normativa e esta por sua vez, pode regular e restringir práticas arriscadas. Quanto às condutas de risco, estas são entendidas como quaisquer comportamentos que aumentem a probabilidade de uma pessoa sofrer algum tipo de dano (por exemplo, físico, psicológico). Especificamente, considera-se na presente pesquisa as seguintes condutas de risco: 1) condutas agressivas, 2) uso potencial de álcool e 3) condutas anti-sociais. Para atingir os objetivos propostos, contou-se com a participação de 366 estudantes do ensino médio de ambos os sexos, sendo a maioria do sexo feminino (55,5%). As idades variaram de 11 a 17 anos (M = 14; DP = 1,75) e foram considerados estudantes tanto escolas públicas (45,4%) e privadas (54,6%), distribuídos entre as 6ª e 8ª séries do ensino fundamental (28,1% e 37,2%, respectivamente) e 2° ano do ensino médio (34,7%), todos da cidade de João Pessoa. Os alunos receberam um livreto contendo as seguintes medidas: Questionário dos Valores Humanos (Gouveia, 1998); Escala de Adaptação Escolar (Conduct Problems Prevention Research Group - CPPRG, 1997); Escala de Atitudes frente a Escola (Cheng & Chan 2003); Escala de Condutas anti-sociais (Seisdedos, 1988); Potencial uso de álcool (Coelho Júnior, Gontiès & Gouveia 2003) e Questionário de agressão (Buss & Perry, 1992). Os participantes foram abordados em sala de aula e lhes foi informado do caráter voluntário e confidencial de suas respostas. Os resultados obtidos indicaram que os participantes podem ser caracterizados como pouco agressivos; verificando-se um índice de agressão física maior para os alunos do sexo masculino; pessoas que admitem um baixo nível de comportamentos anti-sociais, verificando-se uma maior incidência nos estudantes do sexo masculino e para aqueles que fazem parte da escola pública; pouco envolvimento abusivo de bebidas alcoólicas, sobretudo para as mulheres; alunos adaptados as normas e ao convívio interpessoal na escola, o que foi evidenciado em maior grau nos alunos do ensino privado, bem como com atitudes favoráveis a esta instituição, sendo estas atitudes evidenciadas primordialmente pelas alunas. Estes caracterizam-se ainda como pessoas que dão importância aos valores de experimentação e aos normativos, verificando-se que os homens valorizam mais os primeiros. Finalmente, verificou-se que o compromisso com a sociedade convencional mostrou-se uma variável relevante para a prevenção das condutas de risco estudadas, destacando-se, entretanto, a importância de se entender melhor o papel dos valores humanos e do ajustamento escolar para a explicação das condutas agressivas, anti-sociais e de uso de álcool. Palavras-chave: Compromisso convencional, Condutas de risco, Adolescentes.
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Conventional Commitment: Protective Factor to Aggressive and Anti-
social Behavior, and Alcohol Use? ABSTRACT – The main goal of this dissertation is to verify how the commitment that adolescents have with the conventional society (adoption of normative values and scholar adjustment) could to prevent the aggressive and antisocial behavior and alcohol use. In a general way, the hypothesis of conventional commitment asserts that the commitment with the conventional society represented by normative groups that are directly responsible for the social values transmissions, acts like a protective factor to risk behaviors. In that way, consider it that the scholar adjustment and human values reported by teenagers can reflect your inclusion in a normative society and this, in turn, can regulate and restrain risk practices. In regard to risk behavior, these are understood like certain behaviors that increase the likely of a person can suffer some kind of damage (for instance, physical, psychological). Specifically, consider it in the present research the follow risk behaviors: 1) aggressive behaviors, 2) potential alcohol use and 3) antisocial behavior. To attain the proposed goals, counted it with the participation of 366 students of High School from both sexes, being most female (55,5%). The ages were between 11 and 17 years (M = 14; DP = 1,75) and consider it students from public (45,4%) and private (54,6%) school, distributed among 6ª and 8ª grades from Middle School (28,1% and 37,2%, respectively) and 2ª grade from High School (34,7%), all from João Pessoa. The students received a book contained the follow measures: Human Values Questionnaire (Gouveia, 1998); Scholar Adaptation Scale (Conduct Problems Prevention Research Group - CPPRG, 1997); Attitudes toward School Scale (Cheng & Chan 2003); Antisocial Behavior Scale (Seisdedos, 1988); Potencial Alcohol Use Scale (Coelho Júnior, Gontiès & Gouveia 2003) and Aggression Questionnaire (Buss & Perry, 1992). The participants were approached in their classes and was communicated that their participation will be spontaneous and their responses will be confidential. The obtained results pointed that the participants can be characterized like less aggressive; verifying it a high level of physical aggression from male students; in case of people that assume a low level of antisocial behavior, was verified a higher incidence in male students from public school; little abusive involvement with alcoholic beverage, above all for women; students adapted to norms and social contact in school, that was evidenced in a larger number of private school students, as well as favorable attitudes related of this institution, being these one evidenced mainly from female students. These one characterized it like people that give importance to experimentation and normative values, verifying it that male students valorize more the first ones. Finally, verified it that the commitment with conventional society showed it as being a relevant variable to prevention of studied risk behaviors, focused it that the importance of understand better the role of human values and of scholar adjustment to explain aggressive and antisocial behavior, and alcohol use. Key-words: Convention commitment, Risk behaviors, Teenagers.
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ÍndiceÍNDICE DE QUADROS _______________________________________________________ 11
ÍNDICE DE FIGURAS________________________________________________________ 12
LISTA DE TABELAS _________________________________________________________ 13
Introdução __________________________________________________________________ 14
Capítulo I - Condutas de Risco __________________________________________________ 20
1.1 - AGRESSÃO _________________________________________________________ 21 1.1.1 - Definição do Termo__________________________________________________ 21 1.1.2 - A natureza da agressão_______________________________________________ 23 1.1.3 - Teorias sobre a Agressão – Perspectivas teóricas clássicas __________________ 25
1.1.3.1 - A Etologia e a Psicanálise: Valorização do conceito de Instinto _______________ 25 1.1.3.2 - Teoria da Frustração-Agressão_________________________________________ 31 1.1.3.3 - A Teoria da Aprendizagem Social ______________________________________ 33 1.1.4 - Teorias sobre a Agressão – Perspectivas Teóricas Recentes __________________ 35
1.1.4.1 - Cognitivismo Neo-Associacionista _____________________________________ 35 1.1.4.2 - Processamento da Informação Social____________________________________ 37 1.1.4.3 - Interacionismo Social________________________________________________ 40 1.1.4.4 – Modelo Geral da Agressão ___________________________________________ 41
1.2 - USO DE ÁLCOOL____________________________________________________ 43 1.2.1 - O Alcoolismo_______________________________________________________ 45
1.3 - CONDUTAS ANTI-SOCIAIS___________________________________________ 51
Capítulo II – Compromisso Convencional _________________________________________ 58 2.1 - AJUSTAMENTO ESCOLAR___________________________________________ 59 2.1.1 - Ajustamento escolar: considerações teóricas______________________________ 60 2.1.2 - Ajustamento escolar e condutas de risco _________________________________ 69
2.2 - VALORES HUMANOS________________________________________________ 71 2.2.1 - Valores Humanos: contribuições filosóficas e sociológicas___________________ 71 2.2.1.1 - Valores Materialista e Pós-materialistas________________________________ 75 2.2.2 - Contribuições da psicologia ao estudo dos Valores Humanos_________________ 77 2.2.2.1- Milton Rokeach: Valores Instrumentais e Terminais _______________________ 79 2.2.2.2 - Estrutura e Conteúdo dos Valores Humanos segundo a perspectiva de Schwartz 82 2.2.2.3 - Tipologia dos Valores Humanos Básicos________________________________ 88
Capítulo III - Método_________________________________________________________ 96 3.1- DELINEAMENTO E HIPÓTESES ______________________________________ 97 3.2 - Amostra ____________________________________________________________ 98 3.3 - Instrumentos_________________________________________________________ 98 3.4 - Procedimento _______________________________________________________ 102 3.5 - Análise dos Dados ___________________________________________________ 103
Capítulo IV – Resultados______________________________________________________ 104
4.1 – PADRÕES PSICOMÉTRICOS DAS ESCALAS VALIDADAS _____________ 105
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4.1.1 - Estrutura Fatorial da Escala de Adaptação Escolar _______________________ 105 4.1.2 - Validade de Construto da Escala de Atitudes frente a Escola ________________ 112
4.2 - AGRESSÃO, USO DE ÁLCOOL, CONDUTAS ANTI-SOCIAIS, AJUSTAMENTO ESCOLAR E VALORES HUMANOS: PONTUAÇÃO MÉDIA DOS ADOLESCENTES_______________________________________________________________________ 114
4.3 - RELAÇÃO ENTRE OS CONSTRUTOS ESTUDADOS: VALORES HUMANOS, AJUSTAMENTO ESCOLAR E CONDUTAS DE RISCO ______________________ 125
Capítulo V – Discussão _______________________________________________________ 132
5.1 - COMPROVAÇÃO DOS PARÂMETROS PSICOMÉTRICOS ______________ 134
5.2 - AGRESSÃO, USO DE ÁLCOOL, CONDUTAS ANTI-SOCIAIS, AJUSTAMENTO ESCOLAR E VALORES HUMANOS: PONTUAÇÃO MÉDIA DOS ADOLESCENTES_______________________________________________________________________ 137
5.3 - RELAÇÃO ENTRE OS CONSTRUTOS ESTUDADOS: VALORES HUMANOS, AJUSTAMENTO ESCOLAR E CONDUTAS DE RISCO ______________________ 146
Capítulo VI – Conclusão ______________________________________________________ 154
6.1 – LIMITAÇÕES DA PESQUISA _________________________________________ 155
6.2 – PRINCIPAIS CONTRIBUIÇÕES DA PESQUISA _________________________ 158
6.3 - APLICABILIDADE DA PESQUISA_____________________________________ 161
6.4 - POSSIBILIDADES DE PESQUISAS FUTURAS __________________________ 166
Capítulo VII – Referências ____________________________________________________ 168
ANEXOS __________________________________________________________________ 185
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ÍNDICE DE QUADROS Quadro 1: Classificação das drogas mais utilizadas no Brasil ___________________________44
Quadro 2: Conversão em unidades de álcool por doses de bebidas alcoólicas_______________47
Quadro 3: Efeitos do álcool no corpo______________________________________________ 48
Quadro 4: Tipos motivacionais, Metas e Valores específicos___________________________ 84
Quadro 5: Interesses a que cumprem os Tipos Motivacionais___________________________ 87
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ÍNDICE DE FIGURAS
Figura 1. Estrutura Bidimensional dos Tipos Motivacionais____________________________85
Figura 2. Modelo Funcional dos Valores Humanos___________________________________92
12
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Estrutura Fatorial da Escala de Adaptação Escolar__________________________ 107
Tabela 2: Estrutura Fatorial da Escala de Adaptação Escolar - Fator Geral_______________ 111
Tabela 3: Estrutura Fatorial da Escala de Atitudes frente a Escola_____________________ 113
Tabela 4: Médias e Desvios-padrão nos fatores de Agressão em função do sexo e do tipo de
escola ____________________________________________________________ 115
Tabela 5: Análises Multivariadas e Univariadas dos fatores de Agressão em função do sexo
e do tipo de escola___________________________________________________ 116
Tabela 6: Médias e Desvios-padrão das Condutas Anti-sociais em função do sexo e do tipo
de escola__________________________________________________________ 118
Tabela 7: TWO – WAY Análise de Variância das Condutas Anti-sociais em função do sexo
e do tipo de escola___________________________________________________ 118
Tabela 8: Médias e Desvios-padrão nas medidas do Ajustamento Escolar em função do sexo
e do tipo de escola__________________________________________________ 121
Tabela 9: Análises Multivariadas e Univariadas das medidas do Ajustamento Escolar em
função do sexo e do tipo de escola______________________________________ 121
Tabela 10: Médias e Desvios-padrão nos valores Experimentação e Normativo em função do
sexo e do tipo de escola______________________________________________ 123
Tabela 11: Análises Multivariadas e Univariadas das medidas dos Valores de
Experimentação e Normativo em função do sexo e do tipo de escola __________ 123
Tabela 12: Regressão Linear múltipla das Condutas Agressivas, tendo como preditores os
fatores da Adaptação Escolar__________________________________________ 128
Tabela 13: Regressão Linear múltipla das Condutas Anti-sociais, tendo como preditores os
fatores da Adaptação Escolar__________________________________________ 129
13
Introdução
14
As condutas agressivas, anti-sociais e o uso de álcool adotados por adolescentes têm
preocupado pais, professores e dirigentes políticos, compreendendo ainda temas-chave em
diversas pesquisas na atualidade. Por exemplo, nos últimos anos tem sido amplamente
documentada a magnitude da agressividade juvenil e o rumo que este fenômeno tem tomado
(Adalbjarnardotti & Rafnsson, 2002; Ding, Nelsen & Lassonde, 2002; Engels & Bogt, 2001;
Hawkins, Catalano & Miller, 1992; Herrenkohl & cols., 2000; Patterson, DeBaryshe & Ramsey,
1989; Saner & Ellickson, 1996).
Mas, quais os motivos que levam um adolescente a se envolver em situações que rompem
com as normas sociais? (por exemplo, apresentar comportamentos violentos, anti-sociais e usar de
forma abusiva substâncias psicoativas, como o álcool). Neste âmbito, indaga-se igualmente por
que alguns adolescentes se envolvem em tais situações enquanto outros não o fazem. Muitas
questões poderiam ainda ser levantadas a este respeito, não existindo contudo, respostas simples à
elas. Entretanto, mesmo considerando as dificuldades, alguns pesquisadores têm procurado
identificar os fatores envolvidos nos comportamentos agressivos, anti-sociais e no uso de álcool.
Alguns pesquisadores apontam que os adolescentes têm possivelmente uma tendência
natural para transgredir normas e regras sociais (Coelho Júnior, 2001). A propósito, Herrenkohl e
cols. (2000) assinalam que, nos Estados Unidos, as estatísticas de prisões revelam que é mais
comum nesta fase de desenvolvimento as pessoas cometerem ou serem vítimas de violência
interpessoal, em comparação a indivíduos adultos. Meneghel, Giugliani e Falceto (1998) advogam
que as mortes de maior peso social são causadas pela violência, principalmente, porque atingem
indivíduos em idades produtivas. No caso específico do Brasil, pesquisas recentes têm
demonstrado que as condutas agressivas aparecem dentre as principais causas de mortalidade
entre os adolescentes (ver Gomide, 2000). Dados censitários do Brasil indicam que as causas
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externas (agressivas) são responsáveis por 20,9% das mortes entre os homens e 5,6% entre as
mulheres; estas porcentagens são algo superiores em se tratando da região Nordeste: 23% e 6,1%,
respectivamente (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2003). Estes são indicadores
suficientes para demandar a atenção dos pesquisadores sobre os fatores que podem influenciar a
apresentação de tais comportamentos por parte de adolescentes.
Parece mesmo plausível falar em um aumento epidêmico de “fenômenos agressivos” na
sociedade, e isso tem sido enfocado constantemente pela mídia, na qual diferentes jornais e
noticiários televisivos apresentam, quase diariamente, variadas formas de expressão das condutas
agressivas e anti-sociais (Formiga, 2002; Gouveia, Coelho Júnior, Gontiès, Andrade & Andrade,
2003). Estudar seus antecedentes deveria ser prioritário, pois permitiria, por exemplo, desenvolver
políticas e delinear programas de prevenção e controle de alguns problemas sérios que são
correlatos durante a adolescência, a exemplo do uso / envolvimento com drogas (Coelho Júnior,
2001; Romero, Luengo & Sobral, 2001).
No que se refere às condutas anti-sociais, Vasconcelos (2004) aponta que as pesquisas
recentes sobre esta temática, freqüentemente comparam os adolescentes institucionalizados com
os não institucionalizados, assumindo que os primeiros apresentam um maior indício de condutas
anti-sociais do que os últimos. No entanto, este é um procedimento que tem se mostrado limitado,
pois o fato de nunca ter estado em uma instituição de reeducação não quer dizer, necessariamente,
que o adolescente não poderá apresentar condutas deste porte.
Quanto ao uso de drogas, especificamente do álcool, verifica-se que existe na literatura um
vasto número de estudos (para um resumo, ver, por exemplo, Coelho Júnior, 2001), os quais
procuram elencar suas causas e conseqüências. No entanto, comumente, nos meios de
comunicação de massa é veiculada a noção do álcool como algo brando, uma droga “mais leve”,
de uso “normal e natural”. Portanto, não se acentua, por exemplo, que esta também é,
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efetivamente, uma droga, que se não for moderadamente utilizada pode desencadear dependência
e mesmo tolerância (estes termos serão melhor explicados no capítulo seguinte).
Outro aspecto relevante é a relação apontada por estudos recentes entre o uso de álcool e
as condutas de risco, como a agressão e o comportamento anti-social (Adalbjarnardottir &
Rafnsson, 2002; Barnes, Welt & Hoffman, 2002; Friedman, 1998; Grunbaum, Basen-Enguist &
Pandey, 1998; Hunt & Laidler, 2001; La Rosa, Lambert & Gropper, 1990; Sussman, Dent &
Stacy, 1999; Wagner, 1996; Windle, 1990). Neste sentido, Hawkins, Catalano e Miller (1992)
indicam alguns fatores que podem favorecer (denominados de Fatores de Risco) ou inibir
(Fatores de Proteção) condutas de risco como uso de álcool, drogas e problemas
comportamentais entre adolescentes. Dentre os fatores de proteção apresentados por estes autores
estão: 1) a forte atração pelos pais; 2) o comprometimento escolar; 3) o envolvimento regular em
atividades religiosas; e 4) a crença prescritiva nas normas e valores da sociedade. Neste marco,
vários estudos têm apontado que o comprometimento com a sociedade convencional parece ser
particularmente importante para a prevenção de condutas de risco como as estudadas nesta
pesquisa (Benda & Corwyn, 2000; Petraitis, Flay & Miller, 1995; Sussman, Dent & McCullar,
2000; Tarter, 1988). Esta hipótese do compromisso convencional defende que o compromisso
com grupos normativos (por exemplo, familiares, pais e professores) os quais são responsáveis
diretamente pela transmissão dos valores sociais que garantem a harmonia social, agem como um
fator de proteção de condutas de risco. Assim, entende-se que o ajustamento escolar e os valores
humanos adotados pelos adolescentes podem refletir sua inclusão em uma sociedade normativa e
esta por sua vez, pode regular e restringir práticas arriscadas.
Frente ao exposto, pensou-se em considerar a temática dos comportamentos de risco,
entendidos aqui como aqueles anti-sociais, agressivos e de uso de álcool, considerando a
possibilidade de explicá-los a partir de variáveis normativas de comprometimento convencional,
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como são os valores humanos e o ajustamento escolar. Deste modo, procurou-se organizar o
marco teórico da presente dissertação em dois capítulos principais. No Capítulo I são tratadas as
condutas de risco, procurando defini-las constitutivamente e apresentar alguns estudos que
analisam diferentes variáveis na sua explicação. Considerando a presumível importância da
hipótese do compromisso convencional, para explicar tais condutas, o Capítulo II é dedicado à
apresentação das considerações teóricas relevantes acerca dos valores humanos e do ajustamento
escolar. A respeito dos valores se dará destaque ao modelo teórico dos valores básicos, que servirá
de referência principal para tratar este tema. Neste capítulo, expõem-se também os objetivos
específicos da presente dissertação.
O método consta no Capítulo III, o qual engloba o delineamento e as hipóteses do estudo,
além da amostra, os instrumentos e procedimento empregados, bem como uma breve exposição
das análises estatísticas realizadas. No Capítulo IV são apresentados os resultados obtidos.
Primeiramente, dar-se-á destaque para a validade de construto de duas medidas que por falta de
informações sobre a adequação de tais medidas para o contexto brasileiro, carecem de provas: a
Escala de adaptação escolar e a Escala de atitudes frente a escola. Posteriormente, se
demonstrada a adequação de empregá-las, procurar-se-á conhecer em que medida suas pontuações
se correlacionam com indicadores de condutas de risco. Em seguida, são apresentados os
resultados referentes ao poder preditivo das variáveis do compromisso convencional (valores e
ajustamento escolar) frente às condutas de risco consideradas.
As discussões dos resultados obtidos serão apresentadas no Capítulo V. Neste instante,
serão discutidos os resultados observados, apontando as semelhanças e diferenças dos resultados
obtidos em pesquisas anteriores a esta. Finalmente, no Capítulo VI figuram as conclusões. Neste
momento, procurar-se-á antever ou estimar as limitações potenciais da pesquisa, bem como suas
principais contribuições e eventuais possibilidades de aplicação. Embora este não seja seu
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propósito último, o esforço em pensar eventuais formas de aplicabilidade dos resultados da
presente pesquisa, é sem dúvida, uma consideração relevante que poderá arrojar luz às práticas
que visam amenizar o impacto de condutas de risco por adolescentes no contexto em que esta
pesquisa se insere. Este capítulo será encerrado com a indicação acerca de variáveis que poderão
ser consideradas em estudos futuros, indicando questões que podem merecer a atenção de
pesquisadores.
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Capítulo I - Condutas de Risco
20
O objetivo geral da presente dissertação é verificar em que medida o comprometimento
dos adolescentes com a sociedade convencional poderia prevenir a apresentação dos
comportamentos agressivos, anti-sociais e de uso de álcool. Em termos gerais, a hipótese do
compromisso convencional defende que o compromisso com a sociedade convencional
representada por grupos normativos que são responsáveis diretamente pela transmissão dos
valores sociais, age como um fator de proteção para as condutas de risco.
As condutas de risco por sua vez, são entendidas como quaisquer comportamentos que
aumentem a probabilidade de que uma pessoa possa sofrer algum tipo de dano (por exemplo,
físico, psicológico). Neste primeiro momento, entretanto, demanda-se definir mais
especificamente o que são estas condutas, tratadas aqui como construtos latentes mensurados a
partir de três atributos ou categorias comportamentais, a saber: 1) as condutas agressivas, 2) o uso
potencial de álcool e 3) as condutas anti-sociais. Assim, são apresentadas a seguir algumas
considerações acerca de cada um deles. Salienta-se ainda que o capitulo seguinte é voltado para a
apresentação das variáveis que compõem o compromisso convencional nesta pesquisa, os valores
humanos e o ajustamento escolar.
1.1 - AGRESSÃO
1.1.1 - Definição do Termo
Entre os psicólogos sociais não há consenso quanto a uma definição satisfatória do termo
agressão. Este é utilizado em várias situações e com os mais diversos sentidos, podendo indicar
desde um comportamento confiante, vigoroso e empreendedor a um que magoa, fere ou destrói
(Myers, 2000). Alguns autores apontam que uma melhor solução para o impasse conceitual que
rodeia o termo agressão poderia ser alcançada através da adoção de uma definição
multidimensional (Andrade, 2003; Coelho, 1983; Jonson, 1979; Storr, 1976), a qual englobaria os
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seguintes fatores: 1) comportamental, pois ser agressivo significaria agir de uma forma a ferir
alguém; 2) intencional, já que o agressor tem por intenção machucar o outro, o que estabelece,
portanto, a diferença entre agressão e mero acidente; 3) motivacional, no qual o indivíduo possui
motivo(s) subjacente(s) ao ato; e 4) situacional, tendo em vista que a interpretação do ato como
agressivo ou não vai depender do julgamento moral, no contexto social da ocorrência da agressão
(por exemplo, o pai que bate em seu filho pode ser julgado de diferentes formas, dependendo da
cultura na qual está inserido).
De acordo com Andrade (2003), embora heurística, esta conceituação da agressão ainda
não é a mais completa, pois deixa de mencionar, por exemplo, a tendência de tomar-se como
paradigma a situação psíquica do agressor, como a raiva e o envolvimento emocional durante o
ato de agir agressivamente. Esta mesma autora assevera ainda que um aspecto que apresenta
diferentes posicionamentos entre os teóricos é a forma como as pessoas externalizam a agressão.
Aponta-se que o indivíduo pode simplesmente manter o desejo de agressão internamente e não
expressar nenhuma conduta agressiva ou, por outro lado, expressá-la de diversas formas.
Para Myers (2000) a Psicologia divide a agressão humana em dois tipos, os quais são
chamados de agressão “hostil” e “instrumental”. A primeira deriva da raiva, tendo como único
objetivo ferir alguém com o fim de vingança. Já a agressão instrumental também visa fazer mal a
alguém, porém é guiada pelo princípio de usar a agressão como meio para alcançar um fim
específico. Esta segunda categoria seria conceituada como uma categoria de violência justificada
ou institucionalizada, pois é aceita pela sociedade, dependendo dos fins idealizados. De fato, é o
que ocorre no dia-a-dia, quando por exemplo, um policial mata ou espanca um assaltante e é
aplaudido pelo público em geral por retirar mais um “mal-feitor” do convívio social. Buss e Perry
(1992), por sua vez, apontam que a agressão pode ser manifesta de quatro formas: a) agressão
física: bater, empurrar, chutar, esmurrar alguém; b) agressão verbal: palavrões, insultos, palavras
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de afrontas, ou de qualquer outro tipo que chegue a ferir ou magoar outrem; c) raiva: expressa
reações de fúria, dificuldade de controlar o temperamento e fácil irritação, deixando-a
transparecer; e d) hostilidade: reflete, principalmente, condutas de desconfiança em relação aos
outros. Esta definição multidimensional da agressão, elaborada por Buss e Perry (1992), será a
adotada no presente estudo.
Outro impasse quanto à definição do termo agressão diz respeito à diferenciação deste
conceito de outro muito próximo: violência. Teoricamente discute-se se estes são conceitos
homólogos, e se não são, o que os diferencia e se há uma relação de hierarquia entre eles. Diante
destas questões, Anderson e Bushman (2002) propõem uma revisão sobre a temática apontando
que de fato estes termos devem ser encarados como diferentes. Neste sentido, estes autores
consideram o comportamento agressivo como aquele direcionado para outro indivíduo que
represente uma ação imediata para ferir, em que o perpetrador acredite que irá atingir o alvo (o
outro) e que este se motive a esquivar. Já o comportamento violento indica a agressão cuja meta
consiste em um dano extremo (por exemplo, a morte). Explicam ainda que toda violência é uma
agressão, mas nem toda agressão pode ser classificada como violência. A propósito, exemplificam
que uma criança empurrando outra de um triciclo é um ato de agressão, porém não de violência.
Estes impasses conceituais citados não são os únicos em torno da temática ora abordada.
Neste sentido, apresentam-se a seguir mais dois aspectos de discórdia entre os teóricos: (1) a
natureza da agressão e (2) as diversas teorias mais freqüentemente empregadas no embasamento
dos estudos científicos nesta área.
1.1.2 - A natureza da agressão
A discussão acerca da natureza da agressão humana tem sido travada entre filósofos,
teóricos e cientistas sociais há algum tempo (Myers, 2000). Vários posicionamentos, muitos deles
23
antagônicos, vêm sendo então defendidos. Pode-se citar, por exemplo, o filósofo francês Jean
Jacques Rousseau (1712 – 1778), o qual defendia a natureza humana como fundamentalmente
“boa” (ou seja, o homem seria um “bom selvagem”) sendo, entretanto, esta natureza, pervertida
pela sociedade. Assim, embasado em tal visão, postulou que a própria sociedade imbuída de seus
valores e normas era responsável pelos males sociais, inclusive pela agressão. Já o filósofo inglês
Thomas Hobbes (1588 – 1679) assume uma visão oposta, indicando o homem como um ser bruto
com um enorme potencial explosivo, considerando então as leis da sociedade como extremamente
essenciais para diminuir e controlar o potencial agressivo das pessoas (para uma discussão das
idéias destes filósofos, ver Cabral, 1996; Gadotti, 1996; Myers, 2000).
Mas, qual será de fato a natureza da agressão? Kristensen, Lima, Ferlin, Flores e
Hackmann (2003) apontam que dentre os pressupostos teóricos que procuram responder a tal
questão, há pelo menos oito perspectivas, divididas em dois blocos: 1) Perspectivas teóricas
clássicas e 2) Modelos integrativos mais recentes. As teorias clássicas são: a) Etologia, derivada
das postulações evolucionistas de Darwin (1872); b) Psicanálise, proposta por Freud (1920); c) A
hipótese da Frustração-Agressão defendida por Dollard e cols (1939); e d) Aprendizagem Social,
perspectiva desenvolvida por Bandura e cols (1973). Em contrapartida, os modelos integrativos
mais recentes, são: e) Cognitivismo neo-associacionista proposto por Berkowitz (1988/1998); f)
Processamento da informação, desenvolvido por Click e Dodge (1994) e Huesmann (1988/1998);
g) Interacionismo social, de Tedeschi e Felson (1994); e finalmente, h) Modelo geral de agressão,
de Anderson e Bushman (2002).
Estas teorias influenciam significativamente a Psicologia tanto na realização de pesquisas
quanto no modo de intervenção clínico. Sendo assim, procura-se a seguir oferecer uma breve
exposição de cada uma, possibilitando uma melhor compreensão acerca desta temática.
24
1.1.3 - Teorias sobre a Agressão – Perspectivas teóricas clássicas
1.1.3.1 - A Etologia e a Psicanálise: Valorização do conceito de Instinto
Apesar da Etologia e da Psicanálise serem dois arcabouços teóricos distintos, verificam-se
na literatura alguns pontos em comum entre ambas como, por exemplo, a visão de que o impulso
agressivo é inato e, por isso, inevitável. Deste modo, no que se refere à natureza da agressão,
alguns autores classificam estas teorias como fazendo parte de um único bloco explicativo: a
perspectiva instintiva (Para um resumo, ver Coelho, 1983). Obviamente, isso não quer dizer que
estas teorias defendam exatamente a mesma visão para a natureza agressiva humana, sendo por
isso, relevante delimitar a relação entre etologia e psicanálise no tocante ao estudo da agressão.
Assim, apresentam-se neste tópico, de forma sucinta, os principais postulados convergentes e
divergentes destas perspectivas teóricas.
No que se refere a etologia, os nomes de Niko Timbergen, Konrad Lorenz, Karl von Frish
e Seymour Benzer são conhecidos como seus fundadores, os quais ficaram famosos por suas
pesquisas sobre as causas próximas do comportamento, tendo até mesmo recebido pelo conjunto
de suas obras, o prêmio Nobel de medicina de 1973. A Etologia é definida por Lorenz como
sendo o ramo da Biologia voltado para o estudo comparado do comportamento humano e animal
baseado no fato de que existem mecanismos comportamentais que evoluem filogeneticamente
exatamente como ocorre com os órgãos (Lorenz, 1995). Esta perspectiva foi fortemente
influenciada pelo pressuposto evolucionista de Darwin de que há uma continuidade entre o
comportamento humano e animal, ou seja, estes são homólogos, pois “dividem sua similaridade
em descendentes comuns de ancestrais que possuem” (Lorenz, 1995, p.121). No entanto, apesar
de Darwin apontar essa homologia em 1872, (em sua monografia “The Expression of emotion in
man and animals”) o primeiro teórico a conseguir uma prova sólida desta afirmação Darwiniana
foi Eibl-Eibesfeldt a partir de experimentos realizados em 1973 (Lorenz, 1995).
25
Neste sentido, Eibl-Eibesfeldt objetivava demonstrar que alguns padrões de
comportamento independem da influência ambiental e da aprendizagem. Para verificar tal
proposição em animais, realizavam-se experimentos baseados na técnica de isolamento social.
Com seres humanos, no entanto, essa técnica não poderia ser aplicada. Assim, este autor realizou
um experimento com crianças portadoras de deficiências visual e auditiva de nascença, através da
análise de filmagens, comprovando que essas crianças possuíam um repertório praticamente
inalterado de expressões faciais, mesmo sem ver e ouvir tais expressões em outros seres humanos.
Além desse experimento, Eibl-Eibesfeldt (de 1967 a 1968) realizou um estudo trans-cultural a fim
de verificar se haveria diferença na expressão das emoções humanas. Assim, observou e filmou
representantes de diversas culturas, em situações padronizadas tais como: saudações, despedidas,
expressando sentimentos de tristeza, e de prazer verificando que os padrões essenciais para
expressar emoções eram idênticos em todas as culturas estudadas variando apenas quanto a sua
expressão quantitativa, o que segundo ele era reflexo do controle exercido pela tradição. Diante
disto, Lorenz aponta que é “um escândalo científico que alguns autores continuem defendendo
que toda a expressão humana é determinada culturalmente” (Lorenz, 1995, p.30).
Baseado nesta visão biológica, Lorenz desenvolveu uma série de estudos e postulações
teóricas acerca do comportamento agressivo verificado nos homens e animais. Neste sentido,
conceitua tal comportamento como um impulso biologicamente adaptativo, regido pelo “instinto
de agressão”, apontando que nos animais este é utilizado com a finalidade de organizar a vida e
não de destruí-la, ou seja, a agressão é percebida como adaptadora e não como auto-destrutiva,
servindo assim a sobrevivência do indivíduo e da espécie. Em resumo, para a prespectiva ora
apresentada, a função do comportamento agressivo animal é de preservação, sendo regulado pelos
instintos de hierarquia, territorialidade e defesa da prole (Halfpap, 1999; Kristensen & cols, 2003).
Quanto à expressão de comportamentos agressivos nos seres humanos, Halfpap (1999) indica que
26
esse mesmo instinto agressivo responsável pela sobrevivência animal parece não se configurar
igualmente nos seres humanos, significando assim que houve uma certa alteração nos rumos
esperados, ou seja, a agressão vista como um subsídio à sobrevivência passa a representar uma
ameaça.
Entretanto, a postulação teórica a respeito da agressão formulada por Lorenz é, segundo
Halfpap (1999), sustentada em dois elementos básicos, a saber: a) tanto os homens quanto os
animais são dotados de agressão e esta é reservada à sobrevivência do indivíduo e,
conseqüentemente, da espécie e b) a agressão pode ser enquadrada numa espécie de modelo
hidráulico represado, ou seja, é manifesta por razões internas devido ao acúmulo de energia do
impulso agressivo represada interiormente, servindo assim para explicar os impulsos assassinos e
cruéis do homem. Em relação aos impulsos represados, Lorenz postula ainda que, mesmo em
situações nas quais não se encontrem ou produzem estímulos externos, a energia do impulso
agressivo que foi represada é tão grande e significativa que poderá explodir sem motivo aparente.
Um lugar onde se verifique uma grande concentração de pessoas pode, por exemplo, favorecer
esse tipo de comportamento agressivo que, para Lorenz, configura-se como padrões de
coordenação motora e seus fatores determinantes são de origem genética. Neste sentido, para o
autor ora mencionado, a agressão não é uma reação aos estímulos externos, antes se configura
como resultado de uma excitação que é elaborada internamente e vai ser liberada
independentemente dos estímulos externos. Sendo assim, a espontaneidade do instinto é que a
torna perigosa (Halfpap, 1999).
Contudo, em oposição a Lorenz, Tinbergen em 1968 defende que a agressão presente nos
seres humanos é, por um lado, semelhante à de várias espécies de animais, uma vez que entra em
conflito com a sua própria espécie, mas, por outro lado, dentre as diversas espécies que se
27
entregam à luta, é a única que assassina em massa, podendo assim ser visto como o único
elemento desajustado no seio da sua própria sociedade (Halfpap, 1999).
Todos os conceitos acima abordados têm sido alvos de várias críticas direcionadas,
principalmente, à sua aplicação teórica e prática no contexto científico, apontando-se, por
exemplo, a simplificação dos mecanismos agressivos, os quais são determinados na perspectiva
etológica unicamente pela característica biológica, ou seja, pelo instinto agressivo (Kristensen &
cols, 2003).
Em contrapartida, Freud, apesar de inicialmente não considerar o estudo da agressão em
suas teorizações, sofre influência dos acontecimentos da Primeira Guerra Mundial e verifica que
há no ser humano uma força destrutiva (Mergaee & Hokanson, 1976). Em três estudos sobre a
sexualidade (1905/1989), Freud propõe que na fase sádico-anal ocorre o desenvolvimento de um
componente de crueldade da pulsão sexual, que não significava, portanto, causar dor ou
sofrimento ao outro, mas não levar em conta o sofrimento deste outro. Freud considera esse
fenômeno como normal uma vez que de acordo com a perspectiva psicanalítica, a empatia com a
dor do outro é uma característica que só se desenvolve mais tardiamente. Com esta proposição
teórica, Freud parte do pressuposto de que a agressividade humana começa a se formar desde
cedo, durante o desenvolvimento do indivíduo (Kristensen & cols, 2003).
Depois de considerar a existência e influência desta força destrutiva no comportamento
humano, Freud defende como fonte biológica da motivação humana, além da força ou pulsão
(Trieb) de vida, denominada Eros, outro conjunto de impulsos que denominou instintos de morte
ou Thanatos. O Eros refere-se ao conjunto das pulsões que criam e mantém a unidade e a
harmonia, a saber: as pulsões sexuais e de auto-conservação. Já as pulsões de morte - thanatos
voltam-se, inicialmente, para o interior, tendendo a auto-destrutividade e secundariamente
dirigem-se ao exterior, sob a forma da pulsão de agressão ou de destruição. Em suma, a pulsão de
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morte torna-se pulsão de agressão quando desviada para os outros, para o mundo externo,
expressando-se através da agressividade e destrutividade, ou seja, refere-se ao desejo de morrer
voltado para objetos que não a ele mesmo, que obriga, coage e força cada um a destruir, subjugar
e matar. É válido ressaltar ainda que segundo o que dispõe a literatura, apesar do Thanatos
expressar pulsões inversas daquelas que compõem o Eros, a pulsão agressiva ou de destruição,
age em favor do Eros porque ao voltar esta energia para a destruição de outro objeto, há uma
inibição da auto-destruição preservando-se assim seu próprio eu ou Self (Kristensen & cols,
2003; Mergaee & Hokanson, 1976; Shultz & Shultz, 2002).
Tanto para Lorenz quanto para Freud a agressividade humana é instintiva e se alimenta de
uma fonte de fluxo ininterrupto de energia, não se configurando desta forma como resultado de
uma reação a estímulos externos. Halfpap (1999) expõe que para Lorenz a energia voltada a um
ato instintivo se acumula continuamente nos centros neurais relacionados com esse padrão de
comportamento, e, caso ocorra um acumulo de energia suficiente, é possível que se desencadeie
uma explosão, mesmo que não se tenha presente no momento um estímulo ambiental. Contudo,
tanto o homem quanto o animal encontram na maioria dos casos estímulos que liberam a energia
represada do impulso agressivo, não tendo que esperar de forma passiva até que um estímulo
adequado apareça. Em outras palavras, isto significa para Lorenz que o homem desenvolve
mecanismos a fim de encontrar os estímulos que sirvam para a liberação da energia represada em
vez de constituir mecanismos para as causas da agressão. É válido ressaltar que por ser resultado
da interação de forças inatas, não é possível extinguir o comportamento agressivo, mas este pode
ser amenizado através de práticas socialmente construtivas. Dois exemplos clássicos são a prática
de esportes e as diversas expressões artísticas, que podem ter intenções preestabelecidas de
amenizar as tensões e a própria agressão (Halfpap, 1999).
29
Em suma, frente ao exposto, aponta-se que os modelos teóricos descritos concordam em
pelo menos três pontos básicos: 1) a agressão é instintiva, ou seja, é um fenômeno inato; 2) é
impulsionada por uma energia interna do organismo, levando-o a emitir comportamentos
agressivos; e 3) essa energia armazenada precisa ser descarregada através de algumas atividades
sociais que atuem como uma válvula de escape para que não se acumule, chegando a explodir
(Coelho, 1983; Halfpap, 1999; Kristensen & cols, 2003; Mergaee & Hokanson, 1976; Myers,
2000).
No que se refere aos pontos divergentes entre a teoria psicanalítica de Freud e a
perspectiva etológica de Lorenz, figura principalmente, o entendimento da função da agressão,
uma vez que, como antes discutido, a etologia a vê como tendo uma função adaptadora e a
psicanalítica, destrutiva. Assim, para os etólogos a agressão é necessária para que se organize e
preserve a vida e para Freud, esta é o maior impedimento à evolução da civilização, sendo
constantemente ameaçada de desintegração. Por outro lado, afirma que sem a agressão o homem
se sentiria desconfortável e que é inútil tentar eliminá-la, pois é uma característica psicológica da
civilização. Outro aspecto divergente refere-se à prática de pesquisa de ambos autores, pois
enquanto Lorenz volta-se para o estudo comparativo entre o comportamento dos animais e dos
homens (detendo-se mais ao comportamento animal), Freud desenvolve seus estudos unicamente
com seres humanos, não compartilhando assim da visão de que haveria uma continuidade entre o
comportamento dos homens e dos animais.
Por fim, ressalta-se que apesar da reconhecida importância científica das postulações
teóricas da etologia e da psicanálise, ambas perspectivas não representam a “palavra final” para o
entendimento da agressão. Destarte, outras explicações teórico-científicas são verificadas, as quais
são mencionadas a seguir.
30
1.1.3.2 - Teoria da Frustração-Agressão
Segundo Myers (2000), a frustração pode ser entendida como qualquer coisa que impeça o
alcance de um objetivo, aumentando de intensidade especialmente em três situações: 1) quando a
motivação para alcançar um objetivo é muito forte; 2) quando se espera receber gratificações; e 3)
quando o bloqueio ocorre por completo.
A publicação da monografia Frustration and aggression, de Dollard e cols., em 1939,
pode ser considerada, do ponto de vista teórico, como o ponta pé inicial para a análise
sociopsicológica da agressão. Neste trabalho, tais autores criticaram principalmente o conceito
desenvolvido por Freud de energia psíquica, uma vez que ele não especifica se esta energia era
real ou metafórica. Se a energia psíquica fosse entendida como metafórica, não poderia ser
verificada empiricamente, não sendo possível assim averiguar se tal energia aumentava diante da
frustração ou se diminuía quando a pessoa expressava sua agressividade (cartarse). Assim, os
autores antes mencionados postulam, ao invés do conceito de instinto de morte e agressivo, a idéia
de incidências de frustração como antecedentes motivacionais aos comportamentos agressivos
(Johnson 1979; Kristensen & cols, 2003).
De acordo com esta perspectiva, deveria-se partir do pressuposto básico de que a agressão
é sempre conseqüência da frustração, ou seja, todo comportamento agressivo pressupõe a
existência de frustração, sendo, entretanto, equivocado afirmar que sempre que houver frustração
virá em seguida um comportamento agressivo. A frustração pode levar a diversos números de
respostas e dentre elas figura a instigação de alguma forma de agressão (Kristensen & cols, 2003;
Mergaee & Hokanson, 1976). Mergaee e Hokanson (1976) apontam que a afirmação de que nem
sempre quando ocorre frustração vem em seguida um comportamento agressivo, foi observada em
estudos envolvendo tanto crianças quanto adultos, onde a frustração é seguida por uma aparente
31
aceitação e um ajustamento a situação não ocorrendo dessa forma a manifestação de
comportamentos agressivos.
Mas, por que nem sempre a ocorrência de frustração gera um comportamento agressivo?
Mergaee e Hokanson (1976) defendem que isso ocorre devido ao fato de os seres humanos serem
instruídos desde pequenos, através do processo de socialização, a suprimir e controlar as reações
agressivas de forma a não expressá-las diante de um acontecimento frustrante. Entretanto, isso
não significa que tais tendências tenham sido anuladas, podem apenas ter sido disfarçadas,
reprimidas ou temporariamente desviadas de seu objetivo. E como explicar o fato da agressão
(que como exposto acima é sempre resultado de uma frustração) nem sempre ser direcionada à
fonte causadora de frustração? De acordo com os autores previamente citados, esta transferência
se dá principalmente quando outras pessoas podem desaprovar ou punir tal comportamento, sendo
a agressão então direcionada para outros alvos mais seguros ou que resultem em menor
probabilidade de punição do indivíduo perpetrador da agressão. Assim, em síntese, a manifestação
da agressão depende, dentre outros fatores, da posição hierárquica ocupada pelo possível agressor
e pelo alvo a quem esta agressão seria direcionada. Em contrapartida, a intensidade com que a
agressão é expressa vai variar de acordo com fatores como: a força despendida para se chegar a
um determinado objetivo, o valor que lhe é atribuído e o grau de interferência (Kristensen & cols,
2003).
Devido ao fato da expressão catártica do comportamento agressivo reduzir a energia
negativa causada pela frustração, outro aspecto relevante considerado em alguns experimentos
clássicos diz respeito à possibilidade de haver também uma diminuição da energia agressiva e da
ocorrência de um novo comportamento agressivo. Entretanto, grande parte dos resultados
observados demonstra exatamente o contrário, ou seja, as reações catárticas aumentam ainda mais
a incidência de comportamentos agressivos. Pode-se citar, por exemplo, o estudo realizado por
32
Bushman Baumeiter e Stack em 1999, no qual observou-se que a exposição a mensagens pró-
catárticas bem como a oportunidade de expressar fisicamente a raiva, aumentavam a
probabilidade de expressão de futuros comportamentos agressivos ao invés de favorecer seu
relaxamento e a redução da raiva (Kristensen & cols, 2003). Em contraste às teorizações até aqui
apresentadas, Albert Bandura propõe uma visão diferente da agressão humana, tirando o foco de
qualquer fator interno, ressaltando, desta forma, a influência e determinação ambiental no
comportamento agressivo. Esta perspectiva teórica é exposta a seguir.
1.1.3.3 - A Teoria da Aprendizagem Social
A teoria da Aprendizagem Social, proposta por Albert Bandura em 1973, opõe-se à visão
de que a agressão depende de impulsos internos e/ou inatos, como também a idéia de que os
comportamentos agressivos são frutos da frustração. Assim, aponta que atos extremamente
agressivos não podem sem espontâneos, antes, para que sejam executados, é necessário que haja
aprendizado e treino. Desta forma, tal comportamento é aprendido tanto pela observação dos
outros (aprendizagem por modelação ou vicariante) quanto através da experimentação de suas
conseqüências, ou seja, diante de uma situação agressiva faz-se uma avaliação dos custos e
benefícios potenciais e, caso os benefícios sejam maiores, ela optará pela agressão. As pessoas
eleitas como o modelo a ser imitado podem ser tanto os membros da família quanto de
determinada subcultura (ambiente social fora do lar) e, inclusive, dos meios de comunicação de
massa (Kristensen & cols, 2003; Myers, 2000). Os critérios priorizados pelas pessoas na seleção
do modelo são principalmente a inteligência e o status, sendo mais provável que uma pessoa que
ocupe uma hierarquia superior à delas, seja eleita.
Neste sentido, diversos experimentos têm sido realizados, tanto com crianças quanto com
adultos, a fim de verificar se o comportamento agressivo pode mesmo ser socialmente aprendido,
33
e, se assim puder, quais os fatores que influenciam de fato o comportamento de modelação
(Johnson, 1979). Myers (2000) destaca a importância do reforço na aquisição ou aprendizagem
deste comportamento, afirmando que tanto em relação a animais quanto a pessoas, há indícios
experimentais de que quando há o reforço, é bem provável que o comportamento agressivo seja
aprendido e utilizado pelo sujeito. Este autor cita, como exemplo, a tendência maior de jogadores
de hóquei, cujos pais aplaudem seus comportamentos agressivos durante o jogo, em assumir um
estilo de jogo mais agressivo. Aponta também o exemplo de crianças que agem de forma
agressiva conseguindo assim intimidar outras crianças, e que, provavelmente por isso, tornam-se
cada vez mais agressivas.
Diante disto, aponta-se que a maior causa da agressão para a perspectiva da aprendizagem
social, é o reforço oferecido pelo ato, e além dele, há pelo menos mais três processos que estão
interligados e desencadeiam a aprendizagem vicariante da agressão: 1) a atenção às dicas ou
pistas que são dadas ao indivíduo; 2) a decodificação das informações para que sejam
representadas na memória; e 3) a transformação destas representações em padrões de imitação de
comportamentos. Por fim, uma questão importante a ser comentada diz respeito à influência da
punição na diminuição do comportamento agressivo. A este respeito, ressalta-se o estudo
realizado por Bandura e Walters no final da década de 1950, o qual demonstrou que ao contrário
do que se imaginava, a punição física aplicada em crianças leva-as a um aumento no
envolvimento em brigas, agindo assim como um reforçador para o comportamento agressivo
(Kristensen & cols, 2003).
Em resumo, as teorias descritas previamente representam uma contribuição importante
para o estudo da agressão no campo das Ciências Sociais. Fundamentando-se no aspecto
situacional da agressão, pode-se postular que ela é um comportamento definido social ou
culturalmente, no sentido de que tanto as pessoas de um modo geral quanto os cientistas,
34
categorizam-na basicamente pela comparação das ações agressivas com o conjunto das normas
sociais existentes (Coelho, 1983). Vale salientar ainda que vários fatores contribuem para as
diferenças individuais no comportamento agressivo, sugerindo ser esta um produto da interação
de fatores de predisposição precoce com experiências específicas de aprendizagem. Assim, os
padrões característicos do comportamento agressivo são fortemente estabelecidos através de um
processo de aprendizagem social consolidado até a idade adulta (Huesmann & Guerra, 1997).
Nesta perspectiva, torna-se importante compreender como e porque as sociedades estabelecem
normas do que deve ou não ser considerado agressão. Como os indivíduos começariam a aceitá-
las como uma conduta correta e se essa aceitação favoreceria ou não ao surgimento de condutas
agressivas. Ademais, ressalta-se ainda que os estudos científicos acerca da agressão têm crescido
significativamente, no entanto, percebe-se que os impasses conceituais quanto, por exemplo, à
definição, natureza, fatores que influenciam ou desencadeiam a agressão, permanecem. Isto pode
ser verificado nas teorias elaboradas recentemente, segundo propõem Kristensen e cols, (2003). É
válido ressaltar que a análise disposta a seguir é, sobretudo, fruto do trabalho destes autores.
1.1.4 - Teorias sobre a Agressão – Perspectivas Teóricas Recentes
1.1.4.1 - Cognitivismo Neo-Associacionista
Os estudos acerca da agressão realizados de acordo com a perspectiva denominada de
Cognitivismo neo-associacionista têm como representante principal o nome de Berkowitz e suas
teorizações acerca da influência do afeto negativo no comportamento agressivo. A teoria neo-
associacionista procura explicar e estudar a agressão levando em consideração alguns construtos
postulados por perspectivas teóricas clássicas, como, por exemplo, o conceito de frustração-
agressão. No entanto, nesta utilização, há uma preocupação em reformular ou aprimorar tais
35
conceitos. Desta forma, Berkowitz parte do conceito de frustração-agressão como sendo o não
recebimento de uma gratificação esperada, postulando que situações desagradáveis acabam
desencadeando um afeto negativo, e este, por sua vez, desencadeia tendências de luta e fuga que
configuram uma rede de componentes emocionais, cognitivos, fisiológicos e motores que estão
associativamente ligados. Desta forma, esta perspectiva teórica defende que haveria uma relação
causal entre o afeto negativo e a expressão do comportamento agressivo.
A agressão é então classificada de acordo com duas perspectivas: agressão reativa (ou
afetiva) e agressão instrumental. A primeira, diz respeito a reações agressivas que são provocadas
por estímulos aversivos indicando que haveria uma propensão inata de atacar impulsivamente a
fonte do estímulo aversivo ou mesmo um outro alvo qualquer. De acordo com esta visão, um
indivíduo tende a apresentar uma diminuição do comportamento agressivo logo após ter emitido
uma resposta agressiva, no entanto, isto não quer dizer que a pessoa será menos agressiva quando
for estimulada numa próxima vez. A agressão instrumental, por sua vez, não se trata de uma
reação, mas de um comportamento apreendido com o objetivo de alcançar recompensas e evitar
punições. Este sistema agressivo se estabelece a partir do anterior (agressão reativa), entretanto,
autores como Tedeschi e Felson apontam que o sistema de agressão reativa é mais significativo e
característico para auxiliar a compreensão da agressão humana.
Em contrapartida, Dodge e Coie, em 1987, levaram em consideração os dois sistemas
agressivos ora abordados (agressão reativa e instrumental) e apontaram que, na verdade, em
ambos os processos cognitivos envolvidos apresentam mecanismos semelhantes, mesmo levando
em consideração que os objetivos de cada um são diferenciados. Neste sentido, Bushman e
Anderson defendem que deveria-se favorecer a elaboração de paradigmas ou modelos teóricos
inovadores, abandonando assim essa discussão dicotômica entre os dois sistemas ora abordados.
Segundo propõem Bushman e Anderson, poder-se-ia desta forma contribuir mais
36
significativamente para a emergência de uma segunda geração de paradigmas a respeito da
agressão. Na proposta teórica destes autores, denominada de modelo geral da agressão, enfatiza-se
como as estruturas de conhecimento formadas influenciam no comportamento agressivo
objetivando também estabelecer uma ligação entre agressão reativa e instrumental. Este modelo
teórico será discutido no último tópico adiante.
Em resumo, percebe-se que o cognitivismo neo-associacionista de Berkowitz enfatiza a
influência do afeto negativo no comportamento agressivo e procura identificar duas formas de
expressão que este comportamento assume, agressão reativa e instrumental, conceitos estes que
também serão utilizados por outros autores. Um outro modelo emergente na literatura que
também enfatiza a influência dos aspectos pessoais e situacionais no comportamento agressivo é
conhecido como modelo do Processamento da informação social. Este será discutido no tópico
seguinte.
1.1.4.2 - Processamento da Informação Social
Este modelo surge por volta de 1950 e 1960 com a finalidade de contribuir para explicação
do comportamento social. Entretanto, tal modelo vai de fato ganhar força teórica no estudo do
comportamento agressivo a partir da década de 1980, reconhecendo-se como principais
representantes dois conjuntos de teóricos, a saber: a) Kenneth Dodge e Nicki Crick e b) Rowell
Huesmann e cols. Estes autores propuseram abordagens um pouco distintas quanto ao
entendimento e estudo do comportamento agressivo. No que se refere ao primeiro grupo de
autores antes mencionados, verificam-se dois modelos descritos a seguir.
O primeiro modelo foi formulado a partir de estudos voltados ao ajustamento social em
crianças levando em consideração quatro processos mentais básicos: 1) a codificação dos
estímulos situacionais (ambientais); 2) a representação e interpretação de tais estímulos; 3) a
37
busca mental por possíveis respostas; e 4) a seleção de uma resposta. Partindo do primeiro modelo
citado, o segundo leva em consideração às mudanças ocorridas na própria ciência cognitiva,
elaborando um modelo estruturado de forma cíclica. Este apresenta modificações e inovações
necessárias que são: 1) a codificação dos estímulos internos e externos (não se consideram assim
apenas os estímulos ambientais); 2) a interpretação e representação mental de tais estímulos; 3) a
seleção de um objetivo; 4) a construção ou acesso à resposta; 5) a decisão da resposta; e 6) a
realização do comportamento. O caráter cíclico desse modelo é verificado uma vez que com a
realização do comportamento (passo 6) ocorre uma contribuição para a codificação dos estímulos
internos e externos (passo 1) e, assim, recomeça-se o processo antes descrito.
Em contrapartida, diferente das postulações apresentadas por Dodge e cols (primeiro
grupo de autores mencionado) o outro conjunto de autores liderados por Huesmann ofereceu
inicialmente um modelo centrado na aprendizagem observacional, apresentando num segundo
momento um modelo que denominaram de modelo unificado de processamento da informação
para a agressão. Neste, Huesmann e cols pretendem abarcar tanto o modelo baseado na
aprendizagem por observação quanto à postulação cíclica elaborada por Dodge e cols. Assim,
para Huesmann o processamento da informação social é entendido a partir de quatro pontos
básicos: 1) a percepção da hostilidade frente a situações ambíguas (sendo mais provável ocorrer
esta percepção em crianças agressivas); 2) a aquisição, recuperação e permanência dos scripts
(cognições desenvolvidas na infância e que uma vez cristalizadas tornam-se resistentes a
mudanças) e dos esquemas mentais para o comportamento social; 3) avaliação e seleção do script
(uma vez ativado poderá não ser empregado se for avaliado negativamente); e, finalmente, 4) a
interpretação que o indivíduo faz das respostas oferecidas pelo ambiente a suas ações.
Como pode ser observado na descrição exposta acima, Huesmann e cols utilizam alguns
termos diferenciados na sua postulação teórica acerca da agressão. Assim, neste momento, faz-se
38
necessário definir melhor tais termos. Primeiramente, é valido ressaltar que o script mental sugere
ao sujeito que eventos ocorridos num determinado ambiente podem se repetir e isso pode gerar
estratégias de como a pessoa deveria se comportar e reagir a essas repetições de eventos e quais
seriam os possíveis resultados dos seus comportamentos. No que se refere ao segundo ponto
descrito acima (aquisição, recuperação e permanência dos scripts), ressalta-se que as primeiras
experiências de aprendizado vivenciadas pelas crianças são muito importantes na aquisição dos
esquemas mentais, compostos pela interação entre fatores biológicos e ambientais e estes vão
servir de base tanto para o processamento cognitivo quanto para o comportamento propriamente
dito. Além deste aspecto, aponta-se ainda a observação de comportamentos e a aplicação do
reforço. A ativação de esquemas mentais, por sua vez, pode ocorrer devido à lembrança de ações
recentes e ao estado emocional atual da pessoa. Por fim, a permanência ou não de um script está
diretamente relacionada a quanto o seu uso produzirá no sujeito conseqüências agradáveis, fator
constituinte da aprendizagem instrumental.
Em suma, percebe-se que existem dois conceitos-chave elaborados na perspectiva de
estudo do processamento da informação social. O primeiro, defendido por Crick e Dodge diz
respeito à representação do evento, ou seja, a como o comportamento agressivo seria influenciado
pela representação que o individuo elabora (interna e externamente) dos eventos que o rodeiam.
Vale salientar ainda que este modelo possui um caráter cíclico, uma vez que a última etapa
identificada o comportamento agressivo em si, desencadeia a primeira etapa, codificação dos
estímulos internos externos, e dessa forma, o processo é recomeçado. Já o segundo conceito-
chave, proposto por Huesmann e cols, refere-se à aquisição, recuperação e permanência de um
comportamento apreendido em uma situação semelhante à vivenciada atualmente (script),
ressaltando-se, dessa forma, a importância das primeiras experiências de aprendizado vivenciadas
39
pela criança. Um outro modelo atualmente defendido, que também leva em consideração a
avaliação do sujeito, é a perspectiva do interacionismo social. Esta será descrita a seguir.
1.1.4.3 - Interacionismo Social
James T. Tedeschi e Ricard B. Felson são os principais representantes desta abordagem
denominada de Interacionismo social. Em seus estudos, estes autores utilizam algumas
terminologias diferentes das mencionadas até o momento, objetivando atingir uma maior
adequação à proposta teórica por eles apresentada. Assim, Tedeschi e Felson não adotam, por
exemplo, os termos “sujeito” e “comportamento agressivo”, preferindo, teoricamente a utilização
das terminologias “ator” e “ação coerciva”, respectivamente, pois segundo o que postulam os
autores citados, estes termos possuem uma maior identificação com a literatura sobre poder,
conflito, justiça e identidades sociais. Ademais, Tedeschi e Felson ressaltam ainda que o termo
“agressão” tende a direcionar a análise focalizando apenas aspectos internos (psicológicos e
biológicos) e, desta forma, ignorando os objetivos sociais dos atores ao agir de forma coercitiva.
Dentre as diversas definições adotadas para o termo “agressão” figura a idéia de que este
termo refere-se a intenção de causar dano. Entretanto, dada a pouca precisão da palavra
“intenção” procura-se defini-la no contexto da tomada de decisão, ou seja, de uma ação que é
escolhida. Por este motivo, a principal preocupação de Tedeschi e Felson é averiguar porque as
pessoas decidem se comportar de forma coercitiva. Parte-se de uma análise baseada num modelo
de decisão de acordo com o qual o ator examina quais são os meios alternativos para chegar a um
dos três objetivos seguintes: 1) controlar o comportamento de outros atores; 2) restaurar a justiça;
e 3) assegurar e proteger identidades. A fim de atingir estes objetivos, os atores direcionam suas
escolhas em função das recompensas esperadas bem como dos custos e da probabilidade de
resultados. Frente ao exposto, aponta-se que neste modelo o foco é mais individual uma vez que
40
suas postulações baseiam-se na decisão do ator em agir ou não de forma coerciva. Em
contrapartida, o último modelo exposto na presente dissertação, denominado de modelo geral da
agressão, volta-se mais para uma proposta integrativa procurando abarcar tanto fatores pessoais
quanto os situacionais (ambientais). Este será apresentado a seguir.
1.1.4.4 – Modelo Geral da Agressão
Reconhecida como sendo uma das mais recentes tentativas de integração teórica acerca da
agressão humana, o Modelo Geral da Agressão (GAM – General Aggression Model), proposto
pelo grupo de Anderson e Bushman, procura verificar os efeitos da mídia violenta no
comportamento agressivo, principalmente através de pesquisas experimentais (Anderson &
Bushman 2001, 2002; Bushman & Anderson, 2001). O GAM foi utilizado em diversos estudos
levando em consideração diferentes categorias da mídia, podendo-se citar, por exemplo, o efeito
de filmes violentos em pensamentos e sentimentos agressivos (Anderson 1997) e de vídeo games
violentos no pensamento e comportamento agressivo (Bushman & Anderson, 2002).
Em linhas gerais, o GAM enfatiza, segundo Kristensen e cols, (2003), três subtipos de
estruturas voltadas para o conhecimento, a saber: 1) os esquemas perceptivos; 2) os esquemas
pessoais; e 3) os scripts comportamentais. Estas estruturas são de fato formadas devido às
experiências dos sujeitos e na medida em que são utilizadas, a tendência é que se tornem
automatizadas e se associem aos estados afetivos e, dessa forma, orientem o comportamento do
sujeito frente às questões ambientais. Segundo Anderson e Bushman, este modelo focaliza a
pessoa inserida na situação (ou episódio), configurando-se em um ciclo de interação continuada.
Esta visão é respaldada adequadamente na perspectiva da psicologia social que defende o
conhecimento e os padrões sociais como sendo resultado da interação entre as questões pessoais e
41
situacionais, que determinam o significado psicológico dos eventos e assim influenciam as
reações das pessoas aos eventos ou episódios futuros.
O Modelo Geral da Agressão baseado em estruturas do conhecimento tem sido empregado
no conhecimento e na compreensão de comportamentos agressivos que envolvem diversos
fatores, sendo indicado como um modelo que possibilita a realização da ligação entre a agressão
reativa e instrumental. Existem três aspectos que são centrais neste modelo: 1) os inputs referentes
à pessoa, ou seja, o traço de personalidade, sexo, crença, atitudes, valores objetivos e scripts e os
que se referem à situação, a saber: incentivos, provocações, uso de drogas, dor, desconforto, dicas
ou estímulos ambientais agressivos; 2) o estado interno atual em que a pessoa se encontra, suas
cognições e afetos, por exemplo; e 3) os resultados advindos do processo de avaliação, se
imediata, secundária ou controlada, e também dos processos de decisão. Este modelo é
classificado como cíclico na medida em que os resultados finais dos processos de decisão servem
como entrada, ou como um recomeço para um próximo episódio agressivo.
Em resumo, aponta-se que estas perspectivas elaboradas recentemente apresentam
contribuições inovadoras ao estudo da agressão. O cognitivismo de Berkowitz enfatiza a
influência do afeto negativo no comportamento agressivo, procurando também identificar duas
formas de expressão: a agressão reativa e a instrumental. O modelo do processamento da
informação, por sua vez, enfatiza os conceitos de representação do evento (nos estudos de Crick
& Dodge) e de scripts (nas postulações elaboradas por Huesmann & cols). O terceiro modelo
apresentado, o interacionismo social, desenvolve suas postulações teóricas baseando-se no
modelo de decisão sobre as ações coercivas elaborado pelos atores (ou indivíduos), percebendo-se
dessa forma um foco muito mais individual nos estudos desenvolvidos sobre este paradigma. O
modelo geral da agressão pauta-se numa visão integrativa ao estudar tanto a influência dos fatores
pessoais quanto dos situacionais no comportamento agressivo. Como visto, o conceito-chave
42
desta perspectiva, pauta-se nas estruturas de conhecimento para percepção, interpretação, tomada
de decisão e ação.
Apesar do grande avanço teórico que a temática da agressão tem vivenciado, percebe-se
que ainda persistem divergências e lacunas teóricas a respeito dos fatores que influenciam o
comportamento agressivo, de qual é de fato a sua natureza bem como qual é a definição mais
adequada para o entendimento deste termo. No entanto, apesar destas divergências teóricas, é
visível a relevância e atualidade da temática considerada aqui como um fator de risco. Assim,
compreende-se que a presente dissertação pode apresentar contribuições relevantes ao estudo da
agressão, longe de se propor, no entanto, a solucionar todas estas lacunas teóricas ora discutidas,
ou oferecer uma nova abordagem. É válido ressaltar ainda que além do comportamento agressivo,
são considerados no presente trabalho outros dois fatores de risco: o potencial uso de álcool e as
condutas anti-sociais, que são abordados a seguir.
1.2 - USO DE ÁLCOOL
O termo álcool tem origem na palavra árabe Kuhl, significando “pó muito fino” (Coelho
Júnior, 2001). Caracteriza-se por ser um líquido incolor que pode se evaporar, e por ter um odor
semelhante ao do éter. Esta substância é encontrada em bebidas ditas alcoólicas, que possuem
entre 0,5 a 75,5% de seu volume composto por álcool. São classificadas em três categorias: a)
Fermentáveis: produzidas através de grãos e frutas; b) Destiladas: aquelas que são obtidas através
da destilação de bebidas fermentadas; e c) Compostas: são combinações entre bebida fermentável
e destilada e contém substâncias aromatizantes (Silva & D’Albuquerque, 1990). O álcool é uma
droga que pode ser utilizada sem problemas dependendo da dose, da freqüência e das
circunstâncias em que é ingerida. Seu uso inadequado, entretanto, pode trazer conseqüências
maléficas tanto a nível orgânico como psicológico e social. Pesquisas recentes têm demonstrado
43
que o álcool é a droga mais utilizada no Brasil, como se constata no Quadro 1 (Fonte:
Cebrid/Unifesp1, 2003).
Quadro 1. Classificação das drogas mais utilizadas no Brasil PREFERÊNCIA
TIPO DE DROGA PORCENTAGEM Álcool 68,7 Tabaco 41,1 Maconha 6,9 Solventes (cola de sapateiro, por exemplo) 5,8 Orexígenos (estimulantes de apetite) 4,3 Benzodiazepínicos (controlam a ansiedade) 3,3 Cocaína 2,3 Xaropes (Codeína usada para tose) 2,1 Estimulantes 1,5
Como pode ser observado no quadro previamente apresentado, o álcool é utilizado por
mais de 2/3 dos brasileiros (68,7%), número bastante expressivo que pode indicar um possível
crescimento no número de casos de alcoolismo. Este é caracterizado principalmente pelo
desencadeamento no indivíduo de dois processos: a dependência e a tolerância ao álcool. A
dependência é definida pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como um estado mental e
muitas vezes físico, que ocorre devido à interação entre um organismo vivo e uma droga.
Caracteriza-se por um comportamento que sempre inclui uma compulsão de ingerir a droga para
experimentar seu efeito psíquico e, às vezes, evitar o desconforto causado por sua ausência
(Graeff, 1989). A tolerância, por sua vez, é um estado de adaptação ao consumo de uma
substância, como o álcool por exemplo, e por isso o indivíduo tende a aumentar a dosagem de tal 1Cebrid/Unifesp - Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas. Funciona no Departamento de Psicobiologia da UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo) e auxilia a população através de cursos, palestras e reuniões científicos sobre Drogas. Publica livros, faz levantamentos sobre o consumo de drogas, por exemplo, entre estudantes e meninos de rua. Mantém um banco de trabalhos científicos brasileiros sobre o abuso de drogas e publica um Boletim trimestral. É constituído por uma equipe técnica multidisciplinar, composta de especialistas nas áreas de medicina, sociologia, farmácia-bioquímica, psicologia e biologia.
44
substância pouco a pouco a fim de poder obter os efeitos produzidos no começo do consumo, ou
seja, é a acomodação do organismo a uma certa toxidade (Chesta, Ferreira, Leiva, Urrea &
Vallejos, 2002).
A dependência possui sinais e sintomas específicos. De modo geral, pessoas dependentes
do álcool, por exemplo, perdem o controle sobre o uso, apresentando também sintomas devido à
abstinência e tolerância. Para evitar o surgimento de tais sintomas, os usuários passam a
consumir a substância constantemente em doses cada vez maiores e a privilegiar o consumo a
outras coisas que antes valorizavam. Mas o que é de fato o alcoolismo? É uma doença? As
pessoas alcoolistas podem decidir parar de beber sem nenhum problema? A seguir, tenta-se
indicar possíveis respostas a tais questões.
1.2.1 - O Alcoolismo
O alcoolismo é um grande problema de saúde pública, e tal como aponta Masur (1990),
apesar de o álcool ser uma substância que existe há muito tempo na história da humanidade, o
alcoolismo como entidade nosológica não existe há tanto tempo assim. No contexto brasileiro, de
acordo com Silva e D’Albuquerque (1990), estima-se que parte expressiva da população adulta é
alcoolista, sofrendo assim de graves problemas orgânicos como a cirrose hepática, por exemplo.
Conforme descreve Graeff (1989), o álcool é uma substância rapidamente absorvida a
partir do estômago e do intestino e se distribui de forma uniforme pela água do corpo. Num
intervalo de meia hora a duas horas do início da ingestão, é atingido o nível mais alto de
concentração da droga no organismo. Do total que é absorvido, 95% é metabolizado no fígado,
principalmente por oxidação. Nas primeiras doses alcoólicas as pessoas podem se sentir enjoadas
e com uma sensação de desconforto, no entanto, com o desenvolvimento da tolerância a esses
efeitos desagradáveis, aparece um efeito estimulante dando a sensação de euforia e bem-estar
45
associada à diminuição da tensão psicológica. Este autor indica a existência de três padrões
básicos de alcoolismo: 1) ingestão de grandes quantidades de bebidas alcoólicas todos os dias; 2)
consumo exagerado, mas realizado apenas no fim de semana; e 3) longos períodos de abstinência,
alternados com outros de consumo elevado e continuado, que têm a duração de semanas ou até
meses.
A dependência alcoólica tem inicio geralmente na juventude, tendendo a se estender por
muitos anos, diminuindo apenas na sexta ou sétima década da vida das pessoas (Graeff, 1989).
Este é, sem dúvida, um problema que assola gerações inteiras e assim o uso abusivo do álcool tem
ademais sérias conseqüências sociais. Apresentam-se a seguir alguns números a respeito de danos
ligados ao alcoolismo, publicado no diário de São Paulo, dia 26 de agosto de 2003 (ver Nicastri &
cols., 2003):
• Motoristas alcoolizados são responsáveis por 65% dos acidentes fatais em São Paulo;
• 45% dos adolescentes entre 13 e 19 anos envolvidos em acidentes de trânsito, tinham
ingerido alguma bebida alcoólica (pesquisa realizada em cinco capitais do país);
• O abuso do álcool causa cerca de 350 tipos de doenças físicas e psíquicas;
• O alcoolismo é a terceira doença que mais mata no mundo;
• No Brasil, 90% das internações em hospitais psiquiátricos por dependência de drogas
acontecem devido ao álcool;
• Um em cada dez usuários de álcool se torna dependente da droga;
Mas, qual a quantidade de álcool que pode ser ingerida sem que haja maiores danos ao
usuário? A OMS aponta como aceitável o consumo de álcool de até 21 unidades para os homens e
14 unidades para as mulheres. O cálculo semanal dessas unidades permite assim determinar o uso
de baixo risco, uso nocivo e a dependência para os homens e as mulheres. E como se pode medir
46
em unidades a quantidade de álcool de uma bebida alcoólica? Nicastri e cols. (2003) apontam que
a convenção de uma determinada quantidade de álcool em unidades de bebida se dá de forma que
uma unidade equivale a 10 gramas de álcool. Assim, para saber o quanto de álcool tem uma
determinada bebida alcoólica, é preciso multiplicar a quantidade de unidades por sua
concentração alcoólica. A fim de exemplificar tal convenção, apresenta-se no Quadro 2 a
conversão em unidades para algumas bebidas alcoólicas mais utilizadas.
Quadro 2. Conversão em unidades de álcool para doses de bebidas alcoólicas
Unidades de álcool em cada dose de bebida
Bebida Volume Concentração Quantidade de Álcool (Volume x Concentração)
Gramas de Álcool (volume de álcool x 0,8*)
Unidade de álcool 1 U = 10g
Vinho Tinto 90 ml 12% 11 ml 8,8 g 0,88
Cerveja 350 ml 5% 17 ml 13,6 g 1,36
Destilado 50 ml 40% 20 ml 16,0 g 1,60
Nota: * A quantidade de álcool em gramas é obtida a partir da multiplicação do volume de álcool contido na bebida pela densidade
do álcool (d = 0,8).
É de reconhecida importância se conhecer a concentração de álcool em cada dose de uma
bebida alcoólica, a fim de poder identificar-se os efeitos que uma determinada quantidade de
álcool ingerida pode causar em uma pessoa. Alguns desses efeitos são apresentados pela
Secretaria Municipal de Transportes de São Paulo e Médicos (2003), os quais podem ser
visualizados no Quadro 3 a seguir.
47
Quadro 3. Efeitos do álcool no corpo Quantidade de álcool por litro de sangue
(em gramas)* Efeitos 0,2 a 0,3 g/l. Equivalente a um copo de cerveja, um cálice pequeno de vinho, uma dose de uísque ou outra bebida destilada.
As funções mentais começam a ficar comprometidas. A percepção de distância e velocidade é prejudicada.
0,3 a 0,5 g/l. Dois copos de cerveja, um cálice grande de vinho, duas doses de bebidas destiladas.
O grau de vigilância diminui, assim como o campo visual. O controle cerebral relaxa, dando sensação de calma e satisfação.
0,51 a 0,8 g/l. Três ou quatro copos de cerveja, três copos de vinho, três doses de uísque.
Reflexos retardados, dificuldades de adaptação da visão a diferenças de luminosidade, superestimação das possibilidades e minimização de riscos e tendência à agressividade.
0,8 a 1,5 g/l. A partir dessa taxa, as quantidades são muito grandes e variam de acordo com o metabolismo, o grau de absorção e as funções hepáticas de cada indivíduo.
Dificuldades de controlar automóveis, incapacidade de concentração e falhas na coordenação neuromuscular.
1,5 a 2,0 g/l Embriaguez, torpor alcoólico, dupla visão. 2,0 a 5,0 g/l Embriaguez profunda. 5,0 g/l Coma alcoólica. Nota: * Estes indicadores baseiam-se na ingestão de álcool por um indivíduo que pese 70 kg.
Além dos efeitos acima apresentados, o uso abusivo do álcool causa em média 350 tipos
de doenças em seus usuários (ver Nicastri & cols., 2003). Dentre estes, apresentam cinco tipos de
doenças mais freqüentes (Cruz, 2003): (a) Diminuição das funções cerebrais: consumido por
muito tempo, o álcool provoca danos à memória como esquecimento de fatos recentes. Na
dependência é comum a dificuldade de aprendizagem e concentração; (b) Câncer: a bebida
inflama a parede que reveste o esôfago, o estômago e o pâncreas, aumentando assim as chances
de surgirem tumores malignos nestes órgãos; (c) Males cardíacos: com o tempo, o álcool provoca
uma lesão no miocárdio, uma estrutura muscular. Se for comprometida, gera alterações no ritmo
dos batimentos. Há chances de ocorrer uma arritmia grave e até uma parada cardíaca. Isso poderá
elevar também a pressão arterial; (d) Cirrose: a bebida alcoólica provoca a morte das células do
fígado podendo levar a uma lesão séria no órgão. Se a situação evoluir, existe o perigo de surgir
um tumor; (e) Risco na gravidez: não se conhece ainda qual o limite de álcool permitido nesse
período. Por isso os especialistas não recomendam beber durante a gestação. Sabe-se que as
48
grávidas dependentes podem ter bebês com problemas de saúde, como dificuldades motoras; e (f)
Impotência: o consumo excessivo prejudica o sistema nervoso central e causa depressão,
diminuição da libido e perda da função sexual.
Mas, quais são de fato as explicações a respeito das causas do alcoolismo? Porque existe
um certo número de pessoas na sociedade que chegam a beber de forma abusiva a ponto de se
tornarem alcoolistas? Em meio às teorias clássicas que se propõem a responder tais
questionamentos, existem três vertentes, a saber: 1) Biológica, 2) Psicológica e 3) Sócio-cultural.
A seguir, apresenta-se uma breve descrição desenvolvida por Masur (1990) a respeito de cada
uma destas vertentes.
1) Vertente Biológica. Esta vertente parte do pressuposto de que o desenvolvimento ou
não do alcoolismo depende de características biológicas inatas. Assim, pessoas pré-dispostas
geneticamente ao alcoolismo se começarem a beber, inevitavelmente, tornar-se-ão alcoolistas ao
passo que as pessoas não pré-dispostas, mesmo que bebam, nunca desenvolverão o alcoolismo. O
fenômeno definido como “Perda do controle” é um conceito básico nesta abordagem, segundo o
qual ocorrem reações fisiológicas provocadas por uma quantidade inicial de álcool. Tal vertente
aponta que o indivíduo não tem controle sobre a quantidade de álcool que ingere, pois está sujeito
a mecanismos fisiológicos que foram ativados por esta substância. Fundamentado nesta visão
seria equivocado afirmar que o exagero de ingestão das bebidas alcoólicas se deva a “fraqueza de
caráter ou a falta de vergonha do sujeito” (julgamentos moralistas). O alcoolista é vítima de uma
doença e o alcoolismo se deve, então, a causas puramente fisiológicas. Estudos experimentais
foram realizados com o objetivo de verificar se esta hipótese era comprovada cientificamente. Os
resultados, no entanto, demonstraram que a dificuldade em controlar a quantidade de álcool que
uma pessoa ingere não ocorre apenas devido a fatores genéticos, mas é também influenciada por
fatores ambientais e cognitivos. Em síntese, as pesquisas neste campo sugerem que as possíveis
49
diferenças biológicas entre alcoolistas e não-alcoolistas não quer dizer que existam determinações
genéticas ao desenvolvimento do alcoolismo, sendo esta apenas uma primeira condição.
2) Vertente Psicológica. Esta vertente divide-se em duas suposições: (a) o alcoolismo é
determinado por certos traços de personalidade e (b) os alcoolistas são pessoas que aprenderam a
lidar com problemas existenciais através dos efeitos do álcool. No que se refere à primeira
proposição, as pesquisas realizadas para verificá-la demonstram que não há dados consensuais
que possam definir um tipo de personalidade característico dos alcoolistas; portanto, parece mais
conveniente supor que as características comuns observadas não são determinantes para o
consumo de álcool, mas sim seu próprio resultado, isto é, a pessoa não tem determinada
personalidade e daí consome álcool, mas sim o consumo desta substância acaba por moldar tipos
específicos de traços de personalidade. Já em relação à segunda afirmação, que estabelece que a
perda de controle é determinada também por fatores cognitivos e ambientais, esta tem sido
plenamente respaldada por dados empíricos.
3) Vertente Sócio-cultural. A vertente sócio-cultural parte do pressuposto de que as
normas culturais influenciam significativamente a dependência ou a não-dependência alcoólica.
Pode-se citar como exemplo o que ocorre com as pessoas da cultura judaica, na qual se encontram
poucos casos de embriaguez e de alcoolismo mesmo sendo muito freqüente o consumo de álcool.
Uma possível explicação seria o fato de o consumo de álcool estar sempre ligado a reuniões e
cerimônias religiosas, influenciando os mais ortodoxos a associar o beber a uma atitude ritual.
Dito de outro modo, o ato de beber seria apenas simbólico, não estando ligado à fuga de
problemas e tensões, o que é encorajado em outras culturas. Isso pode ser uma explicação de
menor ocorrência tanto da embriaguez quanto do alcoolismo. Assim os estudos realizados nessa
vertente têm demonstrado a importância da cultura na relação estabelecida com o consumo de
álcool.
50
Com base no exposto acima, Masur (1990) aponta que não há uma explicação universal
acerca do alcoolismo. A autora defende que todas as pessoas que bebem têm possibilidades
potenciais de se tornarem alcoolistas. A maior ou menor probabilidade vai depender da interação
entre os diferentes fatores de vulnerabilidade, sendo que a identificação desses fatores seria de
grande importância para a elaboração de programas de prevenção primária do alcoolismo.
Ninguém pode questionar, não obstante, que o envolvimento, o uso e o abuso de álcool na cultura
brasileira pode se constituir em um fator de risco de comportamentos desviantes, como atestam os
dados anteriormente citados. Contudo, outros podem ser igualmente preocupantes. Neste sentido,
considere-se a seguir o terceiro e último construto que aparece como um fator de risco, a saber: as
condutas anti-sociais.
1.3 - CONDUTAS ANTI-SOCIAIS
Ao menos fora do Brasil, verifica-se que a literatura a respeito do tema condutas anti-
sociais é consideravelmente vasta (ver Petraits, Flay & Miller, 1995). No entanto, apresentar uma
definição adequada para o termo em questão não é uma tarefa simples. Há na literatura diversas
perspectivas teóricas, desde modelos biologicistas, comportamentalistas e psiquiátricos até
abordagens mais amplas (Meneghel, Giugliani & Falceto, 1998). Rhee e Waldman (2002), por
exemplo, explicam que o comportamento anti-social tem sido estudado e operacionalizado desde
três grandes perspectivas: (1) numa perspectiva psiquiátrica, que usa os conceitos de desordem de
personalidade anti-social (ASPD) e desordem de conduta (DC); (2) em termos de violação da lei
e/ou das normas sociais; e (3) através do conceito de agressão.
A este respeito, encontram-se as distinções propostas por Scaramella, Conger, Spoth e
Simons (2002) que parecem ser menos confusas e poderiam ser enquadradas na segunda
perspectiva de Rhee e Waldman (2002) descrita acima. Esses autores esclarecem que inicialmente
51
faz-se necessário estabelecer uma distinção entre dois termos muito tênues, a saber, as condutas
anti-sociais e delitivas. O primeiro termo pode ou não incluir violações legais, enquanto que a
delinqüência se refere mais especificamente a violações do código penal, como o roubo, o
vandalismo ou a violência, podendo, neste sentido, também ser classificada como um
comportamento criminal (Mills, Kroner & Forth, 2002). Ou seja, o termo “condutas anti-sociais”,
faz referência a todas as condutas consideradas socialmente indesejáveis, que podem afetar o
bem-estar social, mas sem causar necessariamente danos físicos a outras pessoas; elas dizem
respeito apenas as “travessuras” dos adolescentes ou simplesmente à busca de romper com
algumas regras sociais. Por exemplo, sabe-se da norma de limpeza das ruas ou do respeito com os
colegas no que se refere a certas brincadeiras, porém estas condutas não são praticadas por alguns
adolescentes (ver Formiga, 2002; Pimentel, 2004; Vasconcelos, 2004).
Todavia, é válido ressaltar ainda que o comportamento anti-social só difere do delitivo
quando o primeiro é considerado no sentido estrito; no caso, representando comportamentos que
ferem a norma social, mas não uma norma jurídica. Por outro lado, quando se considera o
comportamento anti-social no sentido lato, este termo engloba o delitivo. Pode-se, pois, incluir as
condutas delitivas na categoria geral de comportamentos anti-sociais, já que essas além de serem
delitivas são também anti-sociais. No entanto, nem todo o comportamento anti-social como
“fazer brincadeiras chatas” ou chegar propositadamente atrasado em uma reunião social pode ser
classificado como delitivo, pois não é considerado criminoso.
Diante destas postulações ora apresentadas e dos objetivos propostos na presente
dissertação, pode-se indagar: quais fatores são preponderantes aos adolescentes para a
apresentação de condutas anti-sociais? A este respeito, encontram-se na literatura diversos
estudos que procuram explicar a origem de tais comportamentos nos adolescentes salientando
distintas causas possíveis: biológicas, psicológicas, sociais, econômicas e culturais (Formiga,
52
2002; Meneghel, Giugliani & Falceto, 1998; Palácios, 1995; Pimentel, 2004; Rhee & Waldman,
2002; Vasconcelos; 2004).
Desde os estudos de Stanley Hall, considerado por grande parte dos autores como o
fundador da “Psicologia da Adolescência” (1904) até postulações da Psicanálise principalmente
com Ana Freud, Peter Blos e Erik Erikson defendeu-se que o adolescente vive em meio a
turbulências fisiológicas psicológicas e sociais e estas possivelmente seriam as responsáveis pelo
comportamento “inadequado” dos adolescentes. Neta direção, Pfromm Neto (1979) afirma que
todas estas modificações ocorrendo na vida do adolescente levam-no a repercussões psicológicas
que vão influenciar a conduta e vida social. Estes reflexos psicológicos podem aparecer
inicialmente no conflito com os pais. A grande questão para o adolescente é ser “diferente”, o que
o leva a assumir uma identidade segundo seu grupo de pares. Isso, presumivelmente, provoca sua
entrada numa vida sóciocultural diferente daquela a que vinha tendo antes no círculo familiar.
Em oposição a esta idéia, figura principalmente as postulações da antropóloga Margaret
Mead realizadas em 1928 e às pesquisas de John Coleeman em 1980. Com base em suas
pesquisas realizadas em Samoa (Oceania) Mead propõe que a vivência ou não de conflitos na
adolescência é influenciada pela estrutura sócio-cultural na qual o adolescente está inserido.
Especificamente, encontrou em suas pesquisas em Samoa, que naquele contexto, os adolescentes
não apresentavam qualquer manifestação de tensões, dificuldades ou conflitos especiais. Assim,
defende que nem todos os adolescentes, experienciam esta fase como conflituosa (Coll, Marchesi
& Palácios, 2004).
Destarte, no tocante as condutas apresentadas pelos adolescentes, sejam socialmente
desviantes ou não, abordar o processo de socialização parece ser algo crucial. A propósito, Ortega
(1997, p. 109) indica que este é “o processo de aquisição dos motivos, valores, normas,
conhecimentos e condutas que necessita o indivíduo para comportar-se como a sociedade exige”.
53
É neste processo que vai sendo moldada a identidade da pessoa mediante o que o grupo
determina. Segundo este autor, o processo de socialização é composto por três fases, que
acompanham o desenvolvimento psicofísico dos indivíduos. A primeira fase, chamada de
socialização primária, dá-se exatamente na infância, onde a criança adquire a “personalidade
básica”, que é proporcionada principalmente pela família, agente socializador primário. A
segunda fase, socialização secundária, culmina com o fim da puberdade, sendo a mais importante
para o presente estudo. A terceira e última fase, socialização terciária, sucede quando o indivíduo
está na velhice e geralmente encontra dificuldade de adaptação ao ambiente que lhe circunda.
A socialização secundária possui como características a anunciação da fase adulta e a
presença de uma elevada freqüência de agentes socializadores por causa da grande quantidade de
grupos sociais com os quais os indivíduos vão tendo contato. Na adolescência, o grupo de amigos
é o principal grupo de identificação, ocorrendo um certo afastamento por parte dos adolescentes
em relação aos seus pais; dentre outros motivos, tal afastamento deve-se ao fato de os
adolescentes se mostrarem críticos com os valores dos seus pais (Coelho Júnior, 2001).
Outro fator relevante a socialização secundária está o efeito e/ou influência da mídia
(massmedia). Este é um agente socializador que pode não ser muito sadio no sentido de que as
pessoas mantêm contato com a programação ofertada de maneira unidirecional, ou seja, o
indivíduo não tem condição de conversar e interrogar aquilo a que está sendo exposto (Coelho
Júnior, 2001).
Neste sentido, Krcmar e Valkenburg (1999) associaram a atividade de assistir a uma mídia
violenta com o aumento da justificativa dos atos agressivos e alertaram ainda que exposições a
conteúdos agressivos trazem conseqüências para todo público, seja infantil, adolescente e até
mesmo adulto. Ortega (1997) acrescenta que muitas horas à frente da TV acabam provocando a
54
facilitação do consumo, o conformismo social, a conformação de atitudes de passividade, entre
outros fatores tidos como negativos na formação do adolescente.
Além destas questões ora comentadas acerca da socialização secundaria, ou seja, da
influência dos amigos e da mídia, os estudos associados à fase da adolescência envolvem ainda
temáticas como sexualidade, agressividade, condutas socialmente desviantes e transgressão de
normas, bem como suas implicações na vida social. Durante muito tempo se imaginou que os
adolescentes transgressores eram apenas aqueles das classes sociais mais baixas, posteriormente
esta idéia foi refutada.
Mas, no que se refere ao cenário onde os adolescentes apresentam como maior freqüência
às condutas anti-sociais aponta-se que, geralmente, a escola é este ambiente de maior incidência.
Isto se dá possivelmente devido as exigências prescritas pela sociedade moderna, onde o
adolescente passa grande parte do seu tempo diário em tal instituição (Herrenkehl & cols 2000;
Saner & Ellickson, 1996). Suficiente evidência empírica demonstra a importância do contexto
escolar não apenas no tocante às condutas anti-sociais, mas também às outras condutas de risco
estudadas na presente dissertação: o uso de álcool e os comportamentos agressivos (Allison &
cols, 1999). Neste sentido, verifica-se que há uma crescente onda de comportamentos agressivos
praticados no domínio escolar por crianças e adolescentes, fato que vem atraindo cada vez mais a
atenção de pesquisadores, sobretudo, nos Estados Unidos (Burnett, 1998). Talvez esses índices
tenham sido a principal motivação do Governo Federal do Brasil quanto à criação, em junho de
1999, de uma comissão de especialistas a fim de elaborar diretrizes de combate à violência escolar
(Pimentel, 2004).
É válido ressaltar ainda que os fatores de risco aqui abordados para o comportamento de
adolescentes possuem um duplo padrão moral, ou seja, são combatidos e desencorajados por
alguns grupos sociais (por exemplo, a maioria dos pais, das instituições de ensino e religiosas) e
55
apoiados e incentivados por outros (por exemplo, os pares de iguais). Neste sentido, dentre as
variáveis relevantes para a explicação dos comportamentos anti-sociais é possível identificar a
influência dos modelos sociais, formados por pessoas importantes para o adolescente, além da
família e dos familiares, como os amigos e a associação com pares desviantes (Dishion, Patterson,
Stoolmiller & Skinner, 1991; Vitaro, Brendgen & Tremblay, 2000; Vuchinich, Bank & Patterson,
1992; Whright & Cullen, 2001). De acordo com os autores citados, pressupõe-se que, conforme o
tipo de relação que o adolescente estabeleça com os grupos de referência, aqueles que servem
para a modelagem do comportamento social constituem-se os fatores de risco ou proteção para as
condutas de risco aqui abordadas.
Como mencionado na introdução, vários resultados de pesquisas apóiam a hipótese do
compromisso social com a sociedade convencional, segundo a qual o compromisso com grupos
normativos (por exemplo, familiares, pais e professores), que assumem a função de transmissão
dos valores sociais e que garantem a harmonia social, é considerado como um fator de proteção
das condutas de risco (Benda & Corwyn, 2000; Petraitis, Flay & Miller, 1995; Sussman, Dent &
McCullar, 2000; Tarter, 1988). Advoga-se que este compromisso tem início com o processo de
identificação grupal que pode ser entendido como a “importância subjetiva do grupo para o
indivíduo” (Kiesner, Cadinu, Poulin & Bucci, 2002, p. 197). Destarte, frente ao exposto, percebe-
se a relevância do presente estudo ao considerar o ajustamento às normas escolares e a adoção de
valores normativos dois dos fatores que podem inibir a manifestação dos comportamentos de risco
estudados.
Assim, diante do conteúdo abordado neste capítulo, a título de organização do texto, serão
discutidas no capítulo seguinte as duas variáveis que neste estudo são entendidas como
representantes do compromisso convencional e que assim antecedem as condutas de risco, a
56
saber: o ajustamento escolar e os valores humanos. Em seguida expõem-se os objetivos
específicos propostos na presente dissertação.
57
Capítulo II – Compromisso Convencional
58
2.1 - AJUSTAMENTO ESCOLAR
Segundo o que aponta Sisto e Pacheco (2002), dentre os diversos problemas educacionais
encontrados no contexto brasileiro, figura o ajustamento dos alunos às questões escolares. No
ambiente da escola, o aluno tem uma gama de normas específicas as quais precisa se adaptar o
que nem sempre é tão simples, uma vez que diversos fatores, tanto pessoais quanto ambientais
estão envolvidos nesse processo.
Os autores antes mencionados abordam em seu estudo o ajustamento do sujeito aos
diversos grupos sociais que participa e, dentre eles, figura a instituição escolar. Neste sentido, o
ajustamento é entendido como o comportamento resultante do conflito ou da interação entre as
necessidades, os desejos, os motivos individuais e as regras, as expectativas e as normas sociais,
existindo uma certa “pressão ambiental” que prevê comportamentos “adequados” para cada
contexto. Em outras palavras, refere-se à percepção da conduta de si mesmo em relação a uma
convivência harmoniosa com outros indivíduos no sentido de ajustar-se a uma norma de conduta.
O ajustamento para os autores citados, no entanto, não diz respeito a uma qualidade do sujeito,
mas a uma classe de conduta e a um estado emocional em relação ao seu meio ambiente ou a
diversos ambientes sociais aos quais pertence (Sisto & Pacheco, 2002).
Quando se revisa o estudo desta temática na Psicologia, percebe-se que um número
considerável de pesquisadores tem demonstrado interesse sobre esta temática. Em uma busca
realizada no IndexPsi (2005) identificaram-se 62 documentos entre artigos e teses cuja palavra-
chave era ajustamento escolar, e numa consulta a outro buscador, o Science Direct online (2005),
também sem especificar intervalo de tempo, verificaram-se 494 artigos. No entanto, quando se
verifica a incidência de estudos que abarquem as variáveis estudadas na presente dissertação,
percebe-se um considerável decréscimo. No IndexPsi (2005) não foram encontrados registros de
estudos com as palavras-chave ajustamento escolar e agressão; ajustamento escolar e condutas
59
anti-sociais; e, por fim, com os vocábulos ajustamento escolar e uso de álcool. Já no buscador
Science Direct online (2005) verificaram-se para o mesmo conjunto de vocábulos especificados
acima os seguintes resultados: 17, 6 e 15 artigos, respectivamente.
Estes índices revelam que apesar do interesse dos pesquisadores em desenvolver estudos
acerca do ajustamento escolar, poucos abarcam a relação desta variável com as condutas de risco
adotadas nesta dissertação. Neste sentido, pensa-se que a presente pesquisa pode contribuir para
ampliar o conhecimento a respeito da temática em questão, não tendo, no entanto, o objetivo de
esgotar ou dar a palavra final no que é preciso conhecer sobre o ajustamento escolar e os
comportamentos agressivos, anti-sociais e de uso de álcool. Destarte, apresenta-se a seguir uma
breve exposição acerca do ajustamento escolar e de como esta variável é tratada no presente
estudo.
2.1.1 - Ajustamento escolar: considerações teóricas
No que se refere especificamente à dimensionalidade do construto ajustamento escolar,
verifica-se na literatura vigente que este é caracterizado por alguns autores como sendo
unidimensional (ver Caredeo, 2004). Entretanto, na presente dissertação admite-se tal construto
como sendo uma variável latente, o que é coerente com as postulações de Cheng e Chan (2003).
Tais autores, interessados em estudar as atitudes frente à escola, observam que estas são
influenciadas por diferentes aspectos os quais convergem na direção de um mesmo fenômeno, por
exemplo, o engajamento, o envolvimento, o compromisso, o prazer e a vinculação escolar. Assim,
na dissertação ora apresentada tem-se em conta duas medidas específicas para medir o
ajustamento escolar, a saber: adaptação escolar e atitudes frente à escola. A seguir, especificam-
se como estas variáveis são entendidas e estudadas na literatura.
60
• Adaptação Escolar – Estudos Recentes
Em linhas gerais, esta medida refere-se as dificuldades acadêmicas e disciplinares dos
adolescentes dentro da escola, assim como contempla as dificuldades nas relações interpessoais
potenciais com seus colegas e professores. Mas quais são as variáveis que contribuem para a
emergência de problemas relacionados a não-adaptação a escola? Corrigan (2003) realizou nos
Estados Unidos uma série de estudos contemplando esta variável e verificou que estas
dificuldades acadêmicas, disciplinares e de relacionamento com colegas e professores foram mais
fortemente verificadas nos adolescentes caracterizados como sendo de alto risco do que naqueles
ditos da “população normal”. Israelashvili (1997), por sua vez, comprovou que as expectativas de
resultados dos jovens estavam diretamente correlacionadas com sua pontuação em uma medida de
adaptação escolar. Já Aunola, Stattin e Nurmi (2000) realizaram um estudo com 1185
adolescentes de ambos os sexos e verificaram que a adaptação escolar se correlacionou
diretamente com a auto-estima; e o fez inversamente com as estratégias de realização
inadequadas, denominadas de evitação de tarefas e expectativas pobres, e com os comportamentos
anti-sociais, variável que é estudada também na presente pesquisa. Vale a pena salientar ainda que
a adaptação escolar se configurou na pesquisa de Aunola, Stattin e Nurmi (2000) como um
mediador parcial entre as estratégias de realização e a externalização dos problemas
comportamentais dos adolescentes que participaram da pesquisa.
Sharma, Mcgue e Benson (1996), por sua vez, apontam que o não ajustamento emocional
é uma questão que pode desencadear diversas problemáticas comportamentais, dentre elas a não
adaptação a escola. Neste estudo, os autores objetivaram verificar se meninos e meninas adotados
diferiam dos não adotados quanto ao nível de ajustamento emocional e escolar. Os resultados
demonstraram que esta diferença só foi confirmada no caso dos meninos, sendo que os
61
pertencentes a categoria de adotados apresentaram menor índice de adaptação escolar do que os
não-adotados.
Além destes estudos ora apresentados, Sisto e Pacheco (2002) descrevem em seu artigo
uma breve revisão das pesquisas dispostas na literatura sobre o ajustamento escolar, apontando
pelo menos cinco variáveis que mais freqüentemente figuram na literatura sobre este construto, as
quais seguem dispostas abaixo:
a) Gênero: No que se refere ao gênero, verifica-se, por exemplo, que num regime de aula
tradicional, ou seja, não integral, as meninas demonstram ser mais adaptadas, orientadas à
tarefa, cooperativas, e estabelecer um melhor relacionamento com os pares do que os
meninos;
b) Comportamento adaptativo e nível de inteligência: Pessoas com inteligência
classificada como “normal” tendem a apresentar um maior índice de comportamento
adaptativo do que as pessoas que apresentam dificuldades de aprendizagem;
c) Amizade: Os grupos de amizades podem, na verdade, tanto trazer benefícios à vida
escolar dos alunos quanto também provocar alguns prejuízos a adaptação e/ou
desempenho escolar dos mesmos. Estas questões foram, sobretudo, analisadas nos estudos
de Ladd, Kochenderfer e Coleman, em 1996;
d) Egocentrismo, adaptação e status sociométrico (nível de aceitação dos pares): Quanto
às variáveis mencionadas, encontram-se relações entre egocentrismo e status grupal, para
os meninos, e ajustamento na classe, para ambos os gêneros segundo o que apresentam
Burka e Glenwick. Morgan, já em 1978, apontava que crianças rejeitadas pelos seus pares
(ou seja, com baixo status sociométrico) apresentavam dificuldades psicomotoras, sendo
freqüentemente verificados comportamentos de impulsividade/agressão,
imaturidade/depressão, introversão/distração e hostilidade/agressividade, o que não se
observa nas crianças aceitas. Ainda quanto a este aspecto, Vitaro, Gagnon e Tremblay
(1990) demonstram que pessoas com status de rejeição estável têm mais características
62
socialmente desfavoráveis, no entanto, não apresentam comportamentos mais agressivos
do que seus colegas com status de rejeição transitório. Hatzichristou e Hopf (1996)
observaram ainda que os alunos identificados como fazendo parte do grupo de pessoas
rejeitadas apresentam fortes dificuldades acadêmicas e na relação com os pares,
caracterizando-se como pessoas que apresentam padrões agressivos e anti-sociais, de
timidez/isolamento e de tristeza; e
e) Família: Diversos fatores familiares têm sido analisados a fim de averiguar o quanto
estão relacionados ou não com a adaptação escolar. Algumas pesquisas indicam, por
exemplo, que o divórcio, o luto, os momentos de transição, as dificuldades econômicas, a
perda de emprego e a violência doméstica apresentam uma relação direta com as
dificuldades de adaptação escolar ou menor competência. Pianta e Nimetz (1991) levaram
em consideração a relação que os pais estabelecem com seus filhos e observaram que esta
relação influencia significativamente a conduta interpessoal da criança com outras pessoas,
principalmente com o professor. Ademais, observa-se a relação entre a variável tamanho
da família ou ordem de nascimento dos filhos na adaptação escolar como também o
ambiente familiar, o ajustamento e os traços de personalidade.
Um outro aspecto considerado no estudo acerca da adaptação escolar diz respeito ao
informante da pesquisa. Sisto e Pacheco (2002) apontam que de 51 pesquisas analisadas sobre
adaptação escolar, 38 (74,5%) levam em consideração a avaliação realizada pelo professor quanto
à adaptação dos alunos, sendo que em 9 (17,6%) são colhidas informações apenas do professor.
Quanto aos alunos, os mesmos autores revelam que estes aparecem como informantes em 41
pesquisas (80%), sendo que em 29 (56,8%) suas informações são comparadas com as dos
professores. Ressalta-se ainda que em quatro estudos conta-se com a participação de observador e
em dois os pais são considerados. Neste contexto, um aspecto que se destaca é que, na maioria
dos casos, o sujeito foi diagnosticado como mal-ajustado pelo professor com base nos
comportamentos disruptivos e agressivos. Davis (1978) é um dos autores que compara a avaliação
63
dos alunos com a avaliação feita pelo professor a respeito da adaptação escolar dos alunos. Este
autor aponta que os meninos (38%) apresentam muito mais problemas de adaptação escolar do
que as meninas (12%). Entretanto, um número maior de meninas se percebia com problemas de
adaptação na classe.
Além destas postulações a respeito da adaptação escolar, faz-se necessário neste momento
apresentar, de forma sucinta, o que apontam os estudos dispostos na literatura acerca das atitudes,
uma vez que, relembrando ao leitor, o ajustamento escolar é entendido na presente dissertação
como sendo uma variável latente, operacionalizada pelos construtos: adaptação escolar e atitude
frente à escola.
• O estudo das Atitudes - Considerações Teóricas
Classicamente na Psicologia Social, o estudo das atitudes configura-se como um tema
amplamente discutido e abordado desde os estudos de Thomas e Znaniecki, em 1918, e de
Allport, em 1935, até os dias de hoje como, por exemplo, Albarrecín, Johnson e Zanna (2005).
Verifica-se na literatura análises tanto no nível de estudos intrapessoal e interpessoal quanto intra
e intergrupais. Apesar da reconhecida relevância e importância teórica, não há um consenso entre
os autores a respeito de uma definição adequada para as atitudes. Entretanto, verifica-se na
literatura que todas salientam um aspecto em comum: uma visão pró ou contra um determinado
objeto de julgamento. Dentre as definições elaboradas para este construto, pode-se citar, por
exemplo, que as atitudes refletem “uma organização duradoura de crenças e cognições em geral,
dotada de carga afetiva pró ou contra um objeto social definido, que predispõe a uma ação
coerente com as cognições e os afetos relativos a este objeto” (Rodrigues, Assmar & Jablonski,
2001, p. 98).
64
Embora os autores apresentem divergências quanto à definição das atitudes, tendem a
concordar com as postulações de Hovland e Mandell, os quais propuseram em 1960 que as
atitudes são constituídas por três componentes básicos: o cognitivo, o afetivo e o comportamental.
O primeiro refere-se às crenças, informações acerca dos objetos atitudinais e aos demais
componentes cognitivos. O afetivo, por sua vez, diz respeito aos sentimentos pró ou contra um
objeto social que para alguns autores, como Fishbein e Ajzen, por exemplo, configura-se como o
único elemento característico das atitudes sociais. Para estes autores, as crenças e
comportamentos associados às atitudes são apenas elementos pelos quais se pode medi-las, não
sendo, porém, parte integrante dela. Por último, o componente comportamental é identificado pela
maioria dos psicólogos sociais, os quais defendem que há nas atitudes um componente ativo,
instigador de comportamentos que são coerentes com as cognições e os afetos relativos aos
objetos atitudinais (Lima, 2000; Rodrigues, Assmar & Jablonski,2001).
A relação entre atitude e comportamento tem sido intensamente verificada por diversos
estudos. Alguns deles apontam que uma vez que as atitudes possuem um componente
comportamental que instiga o indivíduo a agir de forma coerente com as cognições e os afetos que
possui acerca de um determinado objeto; elas podem ser consideradas como preditoras adequadas
do comportamento (ver Rodrigues, Assmar & Jablonski, 2001). Entretanto, outros autores como
La Píere, por exemplo, demonstram que nem sempre os indivíduos comportam-se de forma
coerente com as atitudes que possuem. No entanto, isto não significa dizer que não há relação
entre atitudes e comportamento. Tal como aponta Triandis, é necessário que se entenda que as
atitudes envolvem o que as pessoas pensam, sentem e como elas gostariam de se comportar frente
a um objeto atitudinal. O comportamento não é apenas determinado pelo o que as pessoas
gostariam de fazer, mas também pelo o que elas pensam que devem fazer, ou seja, pelas normas
65
sociais, pelos hábitos, e também pelas conseqüências esperadas do seu comportamento
(Rodrigues, Assmar & Jablonski, 2001).
Ainda quanto à relação entre as atitudes e o comportamento, destacam-se os estudos de
Fishbein e Ajzen. Estes autores apresentaram o modelo de ação racional, propondo que as
atitudes e as normas subjetivas influenciam a intenção de se comportar de uma determinada
maneira e esta intenção, por sua vez, induz a um determinado comportamento sendo considerada
por isto, uma variável adequada na predição comportamental (Lima, 2000; Rodrigues, Assmar &
Jablonski,2001). Tal como aponta Lima (2000), no ambiente social o indivíduo freqüentemente se
depara com objetos, pessoas ou eventos que requerem uma posição favorável ou desfavorável
frente aos mesmos. Esta posição é baseada nas crenças, nos valores, nos sentimentos ou nas
experiências, muitas vezes traduzindo-se em comportamentos diferenciados. Neste sentido,
afirma-se que as atitudes não nascem num vazio social, sendo, portanto, uma construção
individual do sujeito de caráter aprendido, o que assenta as atitudes num nível subjetivo. Assim,
as atitudes são relacionadas com diversos construtos, como, por exemplo, as crenças e os valores
humanos.
As crenças são as informações acerca dos objetos que podem ser comprovadas ou não, e
que contribuem para a formação do componente cognitivo das atitudes. Os valores, por sua vez,
possuem um caráter normativo e por isso norteiam os comportamentos e as atitudes. São
entendidos como categorias gerais dotadas, de forma análoga às atitudes, de componentes
cognitivos, afetivos e de predisposição comportamental, diferindo, portanto, das atitudes por sua
generalidade. Um conjunto pequeno de valores pode abarcar uma quantidade considerável de
atitudes (Rodrigues, Assmar & Jablonski,2001). O valor conhecimento, por exemplo, envolve
atitudes em direção a escola, aos ensinamentos dos professores, aos livros, as pesquisas em
bibliotecas ou na internet, ao tempo dedicado aos estudos em casa, a leitura de outras fontes de
66
informação, como os jornais, revistas, televisão etc. Rokeach em 1969 defende que o estudo dos
valores deve receber maior ênfase na Psicologia Social visto que devido a sua generalidade e ao
número reduzido em que se apresentam, possibilitam ao psicólogo social maior facilidade de
estudo do que as atitudes, que são inúmeras e bastante específicas. A característica de
generalidade dos valores e de especificidades das atitudes faz com que uma mesma atitude possa
derivar de dois valores distintos (Lima, 2000; Rodrigues, Assmar & Jablonski,2001). Assim, por
exemplo, uma pessoa pode ter uma atitude favorável à escola por valorizar conhecimento, e outra
por valorizar obediência.
Mas, como as atitudes são formadas? Encontra-se na literatura que esta formação se dá
através dos componentes cognitivo e afetivo. A formação das atitudes a partir dos componentes
cognitivos ocorre quando alguém obtém informações acerca do objeto atitudinal e isso facilita a
formação da atitude (Lima, 2000). Por exemplo, aprendemos que é bom ir à escola para obtermos
conhecimentos necessários a fim de lograr êxito na carreira profissional que desejamos seguir, e
assim formamos uma atitude positiva frente a esta instituição.
Através do componente afetivo, por sua vez, as atitudes se formam por uma experiência
emocional acerca do objeto atitudinal (Lima, 2000). Pode-se citar como exemplo a seguinte
situação: toda vez que um indivíduo chega na escola, seus colegas o tratam mal, não demonstram
respeito ou qualquer intenção de tê-lo como amigo. Neste contexto, o indivíduo possivelmente
acabará formando uma atitude negativa em relação a sua escola. Assim, considerar as atitudes no
estudo a respeito do ajustamento escolar parece ser uma questão relevante uma vez que estas
podem indicar a intenção dos alunos em se comportar de forma ajustada ou não as normas e
atividades acadêmicas da escola como também quanto ao relacionamento interpessoal com os
colegas e professores.
67
Frente a breve exposição realizada até o momento acerca das atitudes, verifica-se que esta
temática de fato tem sido estudada e desenvolvida satisfatoriamente no campo da Psicologia.
Entretanto, as pesquisas voltadas ao conhecimento das atitudes dos alunos frente a escola ainda
são escassas. Em uma consulta realizada no buscador Science Direct online (2005), sem
especificar intervalo de tempo, verificaram-se mais de 10.000 artigos a respeito das atitudes. No
entanto, quando se buscam as incidências de estudos a respeito das atitudes dos estudantes frente
a escola, percebe-se que há um considerável decréscimo, pois apenas 19 artigos foram
encontrados e mesmo assim, consideram aspectos bem específicos, como por exemplo: 1) o
estudo das atitudes dos estudantes israelitas de ensino médio frente a crianças com necessidades
especiais (Brook & Galili, 2000) e 2) o estudo das atitudes dos estudantes de medicina frente a
promoção e prevenção de saúde. Mesmo quando se especificam os termos estudados na presente
pesquisa encontram-se poucos artigos, também específicos: 1) atitudes frente a escola e agressão:
18 artigos; 2) atitudes frente a escola e condutas anti-sociais: 3 artigos; e 3) atitudes frente a
escola e uso de álcool não foram encontrados artigos.
Especificamente no que se refere a presente pesquisa, as atitudes dos estudantes frente a
escola são entendidas como a percepção e avaliação que os adolescentes formam acerca da escola,
das atividades nela desenvolvidas e do seu papel na sua vida. Nesta temática, figuram os estudos
realizados por Cheng e Chan (2003), os quais observaram que tais atitudes estavam diretamente
correlacionadas com a participação em atividades extra-curriculares (rs = 0,22, p < 0,001), pegar
livros emprestados na biblioteca (rs = 0,20, p < 0,001) e estudar com outros colegas da escola (rs =
0,18, p < 0,001). Observou-se ainda uma relação inversa com gazear aulas (rs = - 0,20, p < 0,001)
e argumentar sem respeito com professores (rs = -0,18, p < 0,001). Heaven, Makb, Barry e
Ciarrochi (2002), por sua vez, verificaram a influência dos traços de personalidade e da percepção
dos vínculos parentais nas atitudes e na performance acadêmica de adolescentes do ensino médio
68
frente a escola. Neste estudo, os autores verificaram que a atitude positiva frente a escola se
mostrou inversamente relacionada com o traço de personalidade psicoticismo (r = - 0,51, p <
0,01) e diretamente com agradabilidade (r = 0,45, p < 0,01) e conscienciosidade (r = 0,50, p <
0,01) e com vínculos maternos (r = 0,28; p < 0,01) e paternos (r = 0,20; p < 0,05).
Por fim, aponta-se que as duas variáveis descritas previamente (adaptação escolar e
atitudes frente a escola) permitem avaliar o que aqui se denominou de ajustamento escolar, e
embora teoricamente correlacionadas, cada uma considera um aspecto específico deste construto,
por isso, em lugar de tratá-las separadamente, decidiu-se considerá-las como seus indicadores.
Assim, espera-se que cada uma destas perspectivas possa contribuir com informações relevantes
para aprimorar o conhecimento a respeito do ajustamento do aluno a escola. Finalmente, no tópico
seguinte são apresentadas algumas considerações teóricas a respeito da relação entre o
ajustamento escolar e as condutas de risco aqui abordadas, isto é, comportamento agressivo, anti-
social e uso de álcool.
2.1.2 - Ajustamento escolar e condutas de risco
Embora não sejam demasiados os estudos empíricos que visem verificar como se
relacionam e influenciam o ajustamento escolar e os comportamentos de risco, de acordo com a
hipótese do compromisso convencional, estima-se que o maior ajustamento tende a evitar tais
comportamentos (Petraitis, Flay & Miller, 1995). Na direção desta argumentação, Simons-
Morton, Crump, Haynie e Saylor (1999) observaram que um índice de problemas
comportamentais (por exemplo, fumar, beber, usar drogas ilícitas, brigar) se correlacionou
inversamente com ajustamento escolar (r = - 0,43, p < 0,001), compromisso com a escola (r = -
0,42, p < 0,001) e clima escolar (r = - 0,39, p < 0,001). Além disso, encontraram que o
ajustamento escolar variou em função do nível escolar (F = 20,87, p < 0,001), sendo maior para
os respondentes inseridos nas primeiras séries do ensino fundamental.
69
Parece plausível assim esperar que os comportamentos de risco aqui abordados (agressão
uso de álcool e condutas anti-sociais) sejam mais prováveis entre os adolescentes que
demonstram pouco ajustamento com a escola, isto é, que têm atitudes menos favoráveis e que não
estão adaptados a sua escola. Neste sentido, figuram, por exemplo, os estudos de Herrenk e cols
(2000) que apontam cinco fatores como estando relacionados a apresentação de condutas de risco
em adolescentes, a saber: 1) individual; 2) familiar; 3) escolar; 4) dos pares; e 5) da comunidade.
Especificamente no domínio escolar, os referidos pesquisadores encontraram evidências de que o
baixo desempenho e comprometimento acadêmico, bem como a baixa aspiração escolar,
influenciam significativamente a incidência dos comportamentos de risco, tais como:
comportamento violento, uso de droga e condutas anti-sociais.
Nesta mesma direção, figura um extenso artigo apresentado por Hawkins, Catalano e
Miller (1992) a respeito dos fatores de risco e de proteção para o uso de álcool (e outras drogas) e
para problemas comportamentais em adolescentes. Dentre os fatores de risco apontados são
elencados: o fracasso escolar, as atitudes favoráveis ao uso de substâncias ilícitas, a iniciação
precoce no uso dessas substâncias, a disponibilidade da droga e a rejeição dos pares. No que se
refere aos fatores de proteção, os mesmos autores indicam que o comprometimento escolar, a
forte atração pelos pais, o envolvimento regular em atividades religiosas e a crença prescritiva nas
normas e nos valores da sociedade podem inibir a manifestação das condutas de risco antes
mencionadas. Destes, dois são levados em conta no presente estudo: o comprometimento escolar,
entendido aqui como o ajustamento do adolescente as normas da escola, e a influência dos valores
normativos.
Destarte, em consonância com estes estudos ora apontados, mesmo não sendo um dos
objetivos desta dissertação estudar a fundo todos os fatores de risco e de proteção para as
condutas agressivas, anti-sociais e de uso potencial de álcool, acredita-se que quanto mais
70
comprometido ou ajustado as normas da escola bem como quanto mais orientado pelos valores
normativos, menos tendência o adolescente terá de apresentar as condutas de risco aqui
abordadas. Neste sentido, na presente pesquisa procura-se averiguar se estes fatores podem atuar
como proteção e, por sua vez, o não ajustamento escolar e a priorização dos valores de
experimentação podem agir como dois dos diversos fatores que influenciam a manifestação das
condutas de risco. Dando continuidade, apresentam-se a seguir as considerações teóricas a
respeito valores humanos, que é a segunda variável entendida aqui como componente do
compromisso convencional.
2.2 - VALORES HUMANOS
Os valores humanos configuram-se como um tema extremamente especulado nas Ciências
Sociais por desempenharem um papel importante no processo seletivo das ações humanas
(Rokeach, 1973). Estes têm sido de fundamental importância na explicação do comportamento
das pessoas, dada sua capacidade de orientar tanto as escolhas quanto as atitudes humanas. Assim,
faz-se mister apresentar um breve histórico acerca dos valores humanos, ressaltando as
contribuições ao tema na Filosofia e Sociologia, para em seguida expor como este tema tem sido
tratado na Psicologia, que merece uma exposição desde as contribuições de Rokeach até a
tipologia aqui utilizada.
2.2.1 - Valores Humanos: contribuições filosóficas e sociológicas
O interesse pelo estudo dos valores não é algo exclusivo da Psicologia, sendo suas
concepções influenciadas principalmente pela Filosofia e Sociologia. Historicamente, a Filosofia
desenvolveu distintas teorias sobre os valores as quais serviram de arcabouço teórico para a
explicação do comportamento humano em diversas disciplinas, a exemplo da Psicologia,
Sociologia e Antropologia. Considerando a área em que se insere a presente dissertação,
71
apresentam-se a seguir as escolas filosóficas que mais contribuíram para o estudo dos valores na
Psicologia, segundo advoga Garcés-Ferrer (1988). É válido ressaltar que a análise disposta é,
sobretudo, fruto do trabalho deste autor.
Garcés-Ferrer (1988) destaca três grandes escolas filosóficas: (1) a escola do Subjetivismo
do valor; (2) a Neokantiana; e (3) a Fenomenológica. A primeira baseia-se no pressuposto de que
os valores não têm consistência; as coisas e os objetos não são valiosos em si mesmos, antes, sua
valoração depende das relações com o sujeito que o valora. Raymond Polin, um dos
representantes deste pensamento, admitiu que o valor é a renovação incessante e a criação
permanente do homem, descartando qualquer fundamentação real dos valores, pois segundo ele o
valor se reduz ao subjetivo e se projeta quando a consciência busca algo futurístico. Nesta mesma
escola, figura o nome de Christian Ehrenfels, o qual retoma a idéia da relação entre objeto e
sujeito, acrescentando, porém, que a importância de um valor é determinada pela intensidade do
desejo do individuo. Assim, o valor e a desejabilidade são a mesma coisa, sendo esta considerada
a base para os estudos posteriores que consideram a característica socialmente desejável dos
valores.
Neste sentido, fica claro que os representantes desta escola não apóiam a concepção
objetiva dos valores (segundo a qual a valoração de um objeto depende das preferências
individuais), mas, ao contrário, propõem que são os atos de agrado ou desagrado das demais
pessoas que fundamentam os valores. Desta forma, ao afirmar que tem valor o que é desejável, a
Teoria Subjetivista contrapõe-se ao que defende à Teoria Absolutista: o valor é o fundamento de
todos os atos, sendo desejável o que é valioso. Esta contribuição subjetivista acerca dos valores é
resgatada, por exemplo, por Clyde Kluckhohn na Antropologia, ao considerar os valores humanos
como concepções do desejável.
72
A segunda escola filosófica, lembrando, a Neokantiana, parte da idéia básica de que os
valores são normas a priori da razão, não correspondendo assim ao sujeito singular, mas ao
mundo transcendental, sendo o respeito a norma a única coisa realmente de valor. Nesta corrente
filosófica os valores transcendem a história e não são realidades nem física nem psicológica. Um
dos representantes desta corrente filosófica é Enrique Rickert. Este advoga que a pessoa humana é
relativa e os valores são eternos. Elabora uma estrutura teórica distinguindo três tipos de valores:
(a) bens do futuro: refere-se a um todo que jamais se consegue; (b) bens do presente: restringe-se
a um espaço finito, representado pela beleza e felicidade; e (c) bens eternos: dizem respeito aos
valores religiosos.
Ademais, na escola Neokantiana são destacadas ainda as idéias de Hugo Munsterberg, que
divide os valores em duas áreas, uma compreendendo os valores vitais e a outra os valores
culturais. Estas duas áreas respondem a exigência de “identidade” que se alcança quando
confluem quatro vertentes valorativas: os valores lógicos, estéticos, éticos e metafísicos. Para este
autor o valor é atemporal, eternamente valioso e normativo, sugerindo que o sistema de valores
reside na consciência moral e normativa.
Por último, destaca-se a contribuição da terceira escola, a Fenomenológica. Contrapõe-se
ao empirismo das escolas Subjetivista e Neokantiana, no sentido de que o valor não se define
como uma reação subjetivista em relação a estímulos externos; nem como uma forma apriorística.
Por outro lado, de forma análoga à escola Neokantiana, designa um caráter ideal ao valor que se
capta por meio de uma intuição emocional de ordem superior: “a estimativa”. Apontam-se duas
contribuições principais desta escola, a de Marx Scheler e a de Ortega e Gasset.
Uma das contribuições de Scheler diz respeito à enumeração de cinco regras ou critérios
gerais da hierarquia dos valores, que são: (1) a duração, ou seja, uma coisa é mais estimada
quanto mais duradoura é; (2) a satisfação que os valores produzem; (3) o caráter absoluto ou
73
relativo do valor; (4) sua indivisibilidade; e (5) que os valores sejam ou não fundamentais. No
cerne destes critérios distingue uma tipologia dos valores, apontando que existem valores de
pessoas e coisas e valores de disposição de ânimo, ação e êxito.
Ortega e Gasset, por sua vez, elaboraram uma teoria em que, por meio dos valores, tentam
valorizar a vida. Apontaram que os valores são qualidades ideais e independentes do sujeito.
Além de ressaltar seu caráter hierárquico, adotam uma concepção polar dos valores ao afirmarem
que associado a cada valor positivo está seu correspondente negativo. Além disso, propuseram
uma axiologia que agrupa os valores em: (1) úteis; (2) vitais; (3) religiosos; e (4) espirituais
(compostos por valores intelectuais, morais e estéticos).
Estas concepções a respeito dos valores, provenientes da Filosofia, servem para
compreender algumas das formulações teóricas desenvolvidas no campo da Psicologia. Nesta
mesma direção, apresentam-se também algumas contribuições importantes de sociólogos aos
estudos dos valores humanos. Segundo Ros (2001), muitos sociólogos se dedicaram a esta
temática, destacando-se principalmente a obra de Tomas e Znanieck, como também as teorizações
de Talcott Parsons.
A relevância da obra de Tomas e Znanieck na Psicologia Social se deveu, principalmente,
ao fato de estes autores terem contribuído ao esclarecimento do conceito de atitude, bem como
dos estudos acerca da relação entre atitudes e valores. Para eles o conceito de atitudes engloba as
dimensões comportamental e emocional, acrescentando, entretanto, o aspecto cognitivo à
definição, ou seja, as pessoas, através de um processo cognitivo, captam a situação e decidem
como devem atuar. Em relação aos valores, especificamente, destacam que enquanto as atitudes
são intra-subjetivas, os valores são intersubjetivos e permitem uma conexão entre a estrutura
social e as atitudes. Tomas e Znanieck são considerados os precursores dos estudos que
relacionam os valores a metas, atribuindo a esses, conseqüentemente, um caráter motivacional.
74
Tais autores destacam cinco motivos subjacentes aos valores: (1) reconhecimento social; (2)
segurança; (3) resposta; (4) competência; e (5) novas experiências (ver Ros, 2001).
A segunda contribuição importante da Sociologia é fornecida por Talcott Parsons. Este
trata principalmente do conceito de ação, e afirma que esta se realiza cada vez que os atores
tentam alcançar metas. Parsons aponta que a pessoa se encontra motivada a atuar, guiada por três
critérios, a saber: (1) cognitivos; (2) avaliativos; e (3) orientações valorativas. Diferentemente de
Tomas e Znaniecki, adota a concepção de Kluckhohn na qual os valores instigam o
comportamento, são socialmente desejáveis e se organizam hierarquicamente.
Para Parsons são os valores que obrigam as pessoas a respeitarem as normas vigentes
numa sociedade. Segundo ele, os valores possuem três aspectos: o cognitivo, o avaliativo e o de
responsabilidade pessoal frente as conseqüências de suas ações tanto para a pessoa como para a
sociedade. Ainda, deve-se a Parsons a separação dos conceitos de valores e normas, haja vista os
valores serem mais abstratos, servindo de reflexão apenas para a ação, enquanto que as normas
apontam o que fazer em situações específicas. Em suma, o que se conhece hoje a respeito dos
valores humanos na Psicologia fundamentou-se, principalmente, em ensaios teóricos e estudos
empíricos realizados em diversas áreas das Ciências Humanas e Sociais.
2.2.1.1 - Valores Materialista e Pós-materialistas
Na atualidade, Ronald Inglehart é provavelmente o autor de maior peso no tema dos
valores humanos nas Ciências Sociais e Políticas (Gouveia, 1998). Inglehart (1977, 1991) defende
que os valores humanos apresentam pelo menos três utilidades práticas: (1) estudar as condutas
dos indivíduos; (2) indicar de forma eficaz o nível de vida de uma população; e (3) conhecer os
estilos e hábitos de uma sociedade e/ou cultura. Para tanto, propõe uma teoria sobre os valores
humanos fundamentada na idéia de escassez e socialização, admitindo como ponto de partida a
75
teoria da hierarquia das necessidades básicas de Maslow (1954 / 1970). A propósito, define duas
dimensões básicas através das quais busca identificar as mudanças geracionais e comparar as
culturas nacionais: o materialismo e o pós-materialismo. O primeiro termo diz respeito à
satisfação de necessidades mais básicas e de segurança, isto é, refere-se a valores materiais, e o
pós-materialismo, por sua vez, origina-se a partir da satisfação materialista, desencadeando os
valores espirituais.
Neste sentido, Gouveia (1998) aponta que a crescente tendência à diminuição de valores
religiosos e tradicionais na sociedade possibilita a substituição de valores materialistas, próprios
de sociedades baseadas na escassez, por outros valores pós-materialistas, característicos das
sociedades que têm logrado maiores níveis de segurança. Assim, levando em consideração à
Hipótese da Convergência, o desenvolvimento econômico das sociedades acaba por influenciar a
mudança gradual de valores. As sociedades onde não estão satisfeitas as necessidades de
segurança (física ou econômica) assumem como padrão valorativo, predominantemente, o
materialismo. Contrariamente, as sociedades mais ricas, denominadas sociedades industriais
avançadas, pontuam mais na dimensão valorativa denominada de pós-materialismo (Inglehart,
1991). De acordo com Formiga (2002), estas conjeturas, em princípio simples, não
necessariamente correspondem a realidade. É possível, por exemplo, que em países ricos ou
pessoas que na atualidade gozem de estabilidade, siga-se dando importância a orientação
materialista.
Nesta perspectiva, são as mudanças de comportamentos que os indivíduos vão
armazenando com suas experiências que servem de base para estas orientações valorativas.
Especificamente, a mudança de valores materialistas para os pós-materialistas tem sido
fundamentada em duas hipóteses que estão interligadas, segundo o que propõe Inglehart (1991): a
de escassez e a de socialização. A fim entender as prioridades valorativas dos indivíduos, é
76
preciso que se entenda o processo de socialização pelo qual passaram, ou seja, o período e o
contexto em que estes foram socializados, correspondendo aos anos de infância e adolescência.
Tal processo seria a forma de os indivíduos captarem as prioridades dos valores de sua cultura
com o estado socioeconômico ao qual faz parte. Complementar a este aspecto, a hipótese da
escassez sugere que a escassez do ambiente socioeconômico em que vivem os indivíduos pautaria
suas prioridades valorativas. Portanto, alguém que viveu em um contexto de escassez, por
exemplo, durante uma guerra, pode seguir dando importância a segurança física e econômica,
ainda que tenha garantida a satisfação destas necessidades.
Por fim, no que se refere a dimensionalidade dos valores, Inglehart verificou, através de
uma análise dos Componentes Principais, que os indicadores dos valores materialistas se
agrupavam no pólo positivo de um continuum, ao passo que, no pólo negativo, agrupavam-se os
indicadores dos valores pós-materialistas, pressupondo assim, uma dimensão bipolar. Contudo,
esta dimensionalidade tem sido criticada, pois outros estudos sugerem dimensões distintas (ver
Pereira, 2000).
2.2.2 - Contribuições da psicologia ao estudo dos Valores Humanos
Na perspectiva psicológica, o interesse pelo estudo dos valores humanos começou a
ganhar força de fato nas décadas de 1950 e 1960, contexto em que florescia a busca por técnicas
de pesquisa mais refinadas para mensurar as atitudes. Entre os anos de 1960 e 1970 destaca-se a
expressiva contribuição de Milton Rokeach, postulando que os valores humanos seriam uma
representação cognitiva das necessidades humanas. Entretanto, foi nos anos 1980 que ocorreu de
fato um grande salto no estudo dos valores humanos devido, principalmente, as pesquisas trans-
culturais realizadas por Geert Hofstede e, em seguida, por Shalom House Schwartz e seus
colaboradores (Lima, 1997).
77
A partir desse contexto, várias pesquisas foram executadas visando aprimorar o estudo dos
valores humanos a fim de esclarecer, por exemplo, quais valores os indivíduos de diferentes
culturas priorizam, dando margem assim ao estabelecimento de tipologias universais, as quais
visam resumir as prioridades axiológicas que guiam a vida das pessoas. A seguir, apresenta-se um
resumo de dois dos principais modelos teóricos sobre esta temática: (a) Rokeach: Valores
Instrumentais e Terminais; e (b) A perspectiva de Schwartz sobre a estrutura e conteúdo dos
Valores. Finalmente, descreve-se a tipologia dos valores humanos postulada por Gouveia, que
será a adotada na presente dissertação. Antes, contudo, dispõe-se um resumo acerca da teoria das
necessidades básicas de Maslow que, em grande medida, tem dado suporte as listas de valores
apresentadas por estes autores.
Maslow (1954 / 1970) elaborou uma teoria a respeito da motivação, fundamentado em sua
experiência holística e dinâmica com pacientes na clínica, baseada em autores como Freud,
Fromm, Horney, Reich, Jung e Adler. Segundo sua teoria, os seres humanos têm sete tipos de
necessidades, organizadas de acordo com a seguinte hierarquia: (a) fisiológicas – comida, bebida,
desejo sexual; (b) de segurança – estabilidade, proteção e estrutura; (c) de pertença e amor –
intimidade, contato e família; (d) de conhecimento – entender, explicar, ter iniciativa; (e) estética
– busca ativa da beleza; (f) de estima – auto-respeito e auto-estima e (g) de auto-realização –
realizar, desenvolver o que a pessoa pode chegar a ser. Para este autor, estas necessidades
obedecem a hierarquia que é apresentada (de menor a maior independência biológica), de tal
forma que somente se sobe na escala para satisfazer novas necessidades quando as mais básicas
estiverem satisfeitas. Há, portanto, algumas exceções a este princípio hierárquico: (1) para
algumas pessoas a auto-estima é mais importante do que o amor, mas a busca pela assertividade é
um meio utilizado para obter amor mais do que auto-estima; (2) outras pessoas possuem um nível
de aspiração muito baixo e, por isso, não necessariamente experimentarão necessidades de ordem
78
superiores quando suas necessidades mais básicas estiverem satisfeitas e (3) as pessoas que têm
uma necessidade satisfeita durante muito tempo tendem a minimizar sua importância.
Não é correto postular, no entanto, que para que uma pessoa satisfaça uma necessidade
“superior”, é preciso que tenha satisfeito totalmente a necessidade básica antecedente. Portanto, a
emergência de uma nova necessidade não é abrupta, mas ocorre de forma gradual, a medida que a
necessidade anterior vai sendo satisfeita. Apesar de ser um aspecto central da sua teoria, a
hierarquia das necessidades tem sido pouco considerada nos modelos teóricos acerca dos valores.
Parece mais relevante neste contexto a própria lista de necessidades deste autor e, em alguns casos
(por exemplo, Gouveia, 2003; Inglehart, 1991), sua compreensão sobre a existência apenas de
valores positivos, admitindo que o ser humano é essencialmente de natureza benévola. Direta ou
indiretamente, estas idéias são contempladas nas teorias descritas a seguir.
2.2.2.1- Milton Rokeach: Valores Instrumentais e Terminais
Milton Rokeach é um dos teóricos mais conhecidos no que se refere aos valores humanos.
Isso ocorre porque este autor estabeleceu critérios que possibilitam o desenvolvimento de
pesquisas empíricas sobre o tema, que podem ser observados em sua obra clássica The Nature of
Human Values (1973), como também por elencar cinco pressupostos básicos a sua teoria
valorativa, a saber: (1) o número de valores que uma pessoa possui é relativamente pequeno; (2)
independentemente da cultura na qual estejam inseridas, as pessoas possuem os mesmos valores,
diferenciando apenas o grau de importância atribuído a cada um deles; (3) os valores são
organizados em sistemas de valores; (4) os antecedentes dos valores podem ser determinados pela
cultura, pela sociedade e por suas instituições, além da própria personalidade dos indivíduos; e (5)
as manifestações dos valores se dão em fenômenos considerados dignos de serem estudados e
79
entendidos pelos cientistas sociais. Com base nestes pressupostos, este autor chega a seguinte
definição:
“Um valor é uma crença duradoura de que um modo específico ou um estado
final de existência, que é pessoal ou socialmente preferível a um oposto ou
contrário modo de conduta ou estado final de existência. Um sistema de valor é
uma organização duradoura de crenças referentes a modos de conduta ou
estados finais de existência ao longo de um contínuo de relativa importância”
(Rokeach, 1973, p. 5).
De acordo com esta perspectiva teórica, os valores humanos são classificados de duas
formas: (1) valores instrumentais: são adotados como um meio para alcançar o que é desejável; e
(2) valores terminais: dizem respeito àqueles valores que são propriamente o desejável. Estes são
entendidos pelo autor como sendo, respectivamente, os modos de conduta e os estados finais de
existência, indicados no conceito acima. Os valores instrumentais são divididos em morais e de
competência. Os primeiros remetem a uma perspectiva interpessoal, e sua transgressão provoca
sentimentos de culpa. Já os de competência independem da moralidade e sua violação leva a
pessoa a experimentar sentimentos de vergonha ou de inadequação pessoal. Analogamente, os
valores terminais apresentam duas vertentes de classificação, os valores intrapessoais que são
centrados no indivíduo; e os interpessoais que se centram na sociedade.
A fim de mensurar os valores humanos, Rokeach desenvolveu a Rokeach Value Survey
(RVS), que é composta por 36 valores, os quais são divididos em 18 instrumentais e 18 terminais,
como seguem:
80
Valores instrumentais: valente, educado, intelectual, honrado, obediente, lógico,
imaginativo, capaz, alegre, autocontrolado, capaz de perdoar, capaz de amar,
responsável, independente, limpo, ambicioso, liberal e serviçal.
Valores terminais: felicidade, auto-respeito, tempo livre, salvação, segurança
familiar, satisfação com a tarefa realizada, uma vida confortável, amizade verdadeira,
harmonia interna, maturidade, um mundo de paz, igualdade, reconhecimento social,
amor maduro, segurança nacional, um mundo de beleza, liberdade e uma vida
excitante.
Rokeach selecionou os 18 valores instrumentais de uma lista contendo 555 traços de
personalidade presentes no vocabulário psicológico, e os valores terminais, por sua vez, foram
elencados com base na literatura sobre valores, na sua experiência pessoal e num levantamento
realizado com 100 pessoas de uma cidade dos Estados Unidos. Visando chegar a lista final dos
valores, foram descartados os que eram semanticamente idênticos e mantidos os que
demonstraram relevância cultural e adequação ao conceito de valores adotado. Cada valor é
operacionalizado através de uma frase e pede-se aos participantes da pesquisa que ordene-os de
acordo com o grau de importância que lhes atribuem. A RVS foi adaptada ao contexto brasileiro
por Harmunt Günther e utilizada para verificar, por exemplo, diferenças valorativas com as
variáveis idade, gênero e nível sócio-econômico (Milfont, 2001).
Diante desta breve exposição a respeito da teoria de Rokeach, percebe-se que sua
contribuição aos estudos dos valores humanos é inquestionável. No entanto, algumas críticas são
apontadas na literatura, tanto a sua teoria quanto a forma de mensuração adotada. Gouveia (1998),
por exemplo, indica que Rokeach estabelece uma distinção entre o conceito de valores e o de
atitudes e normas sociais, não o fazendo, porém, com o de crenças ao reduzir em sua definição os
valores a elas, o que impossibilita uma maior delimitação do tema. Semelhantemente, comenta
que a metodologia utilizada por Rokeach na escolha dos valores é outro aspecto que merece
81
destaque, pois baseia-se nas suas próprias convicções e, além disso, aponta que a divisão proposta
em valores instrumentais e terminais não se confirma em resultados de pesquisas posteriores.
Outras críticas podem ser ainda pontuadas. Por exemplo, não é explícita uma referência a
natureza humana; o pesquisador não tem certeza se o sujeito considera todos os valores ou apenas
alguns deles ao responder seu instrumento; e, agregado a isso, a utilização de uma forma de
mensuração ordinal na medição dos valores não dá margem a realização de análises estatísticas
mais rigorosas. Levando em consideração tais aspectos, Shalom H. Schwartz propôs a teoria dos
tipos motivacionais, procurando solucionar algumas das críticas realizadas a teoria de Rokeach
(Maia, 2000). Este modelo teórico é considerado com maior atenção a seguir.
2.2.2.2 - Estrutura e Conteúdo dos Valores Humanos segundo a perspectiva de Schwartz
Schwartz e seus colaboradores construíram uma Tipologia da Estrutura e do Conteúdo dos
Valores Humanos visando obter um arcabouço valorativo que fosse universal, ou seja, que
apresentasse tanto validade intra quanto inter-cultural. Assim, a partir dos resultados encontrados
nas pesquisas realizadas com 88 amostras de 44 países distintos puderam verificar que sua
estrutura valorativa apresentava, aproximadamente, a mesma configuração nas culturas
consideradas (Tamayo & Schwartz, 1993). Os valores humanos são entendidos por Schwartz e
Bilsky (1987, 1990) como concepções do desejável que influenciam a maneira das pessoas
selecionarem suas ações e avaliarem os eventos. Na construção de sua teoria, estes autores
agregam os elementos que são consensuais ao menos nas teorias de Kluckhohn e Rokeach, a
saber: (1) a idéia de que os valores são conceitos ou crenças; (2) que são estados finais ou
comportamentos desejáveis; (3) transcendem as situações específicas; (4) são utilizados como
guia na seleção ou avaliação de comportamentos ou eventos; e (5) são ordenados conforme sua
importância relativa. Entretanto, Schwartz e seus colaboradores procuram contemplar em sua
82
teoria alguns aspectos não apontados pelos autores antes mencionados, como, por exemplo, a
necessidade de construir uma teoria que defina adequadamente o conteúdo dos valores (Andrade,
2001).
Neste sentido, a teoria de Schwartz distingue três fontes teóricas principais dos valores,
entendidas como requerimentos humanos universais: (1) as necessidades humanas (organismo
biológico); (2) os motivos sociais (interação); e (3) as demandas institucionais (bem-estar e
sobrevivência dos grupos). Desta forma, aponta os valores humanos como sendo objetivos ou
metas, e seu conteúdo é distinguido pelos tipos motivacionais que eles expressam. Sendo assim,
outras características dos valores são reconhecidas: (a) servem a interesses de alguma entidade
social; (b) podem motivar a ação dando-lhe direção e intensidade emocional; (c) funcionam como
padrões para julgar e justificar as ações; e (d) são adquiridos tanto pela socialização do grupo
dominante como pelas experiências singulares dos indivíduos.
Baseado nestas considerações teóricas, Schwartz desenvolve uma teoria apontando o
conteúdo e a estrutura básica dos valores humanos, especificando teoricamente três aspectos: (1)
as dimensões conceituais necessárias para definir os valores humanos; (2) os diferentes domínios
de conteúdos dos valores distinguidos por pessoas de todas as culturas, e os exemplos de valores
típicos de cada domínio; e (3) algumas das relações estruturais entre os diferentes domínios de
valores (Andrade, 2001; Maia, 2000).
Os valores e os domínios motivacionais propostos por Schwartz e Bilsky (1987) derivaram
principalmente dos 36 valores propostos por Rokeach (1973). No que se refere aos tipos
motivacionais, foram propostos inicialmente sete e após alguns estudos empíricos passaram a
configurar-se dez grupos de valores. Cada tipo motivacional é definido por seus objetivos ou
metas centrais, seguidos pelos valores específicos que fundamentalmente os representam, como
pode ser observado no Quadro 4 disposto abaixo.
83
Quadro 4. Tipos motivacionais, metas e valores específicos Tipos
Motivacionais Metas Valores específicos
Poder Status social e prestígio, controle ou domínio sobre as pessoas e os recursos.
Poder social, autoridade, riqueza.
Realização Sucesso pessoal pela demonstração de competência segundo os padrões sociais.
Bem sucedido, capaz, ambicioso, influente.
Hedonismo Gratificação sensual e prazer para si mesmo. Prazer, apreciar a vida.
Estimulação Excitação, novidade e desafio na vida. Ousadia, vida variada, vida excitante.
Autodireção Independência de pensamento e de ação, criando, explorando.
Criatividade, liberdade, independência, curiosidade, escolhendo seus próprios objetivos, inteligente.
Universalismo Compreensão, estima, tolerância e proteção para com o bem-estar de todas as pessoas e da natureza.
Mente aberta, justiça social, igualdade, um mundo em paz, um mundo de beleza, protegendo o meio ambiente.
Benevolência Preservação e aumento do bem-estar das pessoas com quem se tem contato pessoal freqüente.
Prestativo, honesto, que perdoa, leal, responsável e verdadeiramente amigo.
Tradição Respeito, compromisso e aceitação dos costumes e das idéias que a tradição cultural ou a religião fornecem.
Humilde, aceita sua porção na vida, devoto, respeito às tradições.
Conformismo Impede as ações, inclinações e impulsos que possam fazer mal ou causar sofrimento aos outros ou que violem as expectativas ou normas sociais.
Polidez, auto-disciplina, honrar seus pais e os mais velhos.
Segurança Segurança, harmonia e estabilidade da sociedade, dos relacionamentos ou da própria pessoa.
Segurança da família, segurança nacional, moderação, proteção da imagem pública.
Conforme explicam estes autores, um valor específico representa um tipo de valor se as
pessoas, ao agirem, pretenderem atingir determinado objetivo central, de maneira que seu
comportamento está exprimindo este valor. O conjunto destes valores é encontrado
presumivelmente em qualquer cultura, devendo ser, segundo o que defende a teoria de Schwartz,
passiveis de classificação em ao menos um dos dez tipos motivacionais antes descritos. Esta
tipologia dos valores permite que novos valores singulares possam ser acrescentados, sendo uma
vantagem contar com uma concepção dos valores como dimensões ou construtos latentes,
representados pelos tipos motivacionais (Schwartz & Bilsky, 1987).
84
Outra questão que merece ser destacada na teoria de Schwartz diz respeito as relações
dinâmicas entre os próprios tipos motivacionais de valores. Schwartz (1992) esclarece que,
quando se age tomando um dos valores como objetivo, as conseqüências práticas, psicológicas ou
sociais podem ser conflitantes ou compatíveis com um outro valor que se persiga. Tomando esta
idéia como base, este autor propôs uma estrutura complexa que padroniza as relações de conflito e
compatibilidade entre os valores. Esta estrutura é circular, e nela os valores que são conflitantes se
situam em direções opostas a partir do centro da figura, sendo que aqueles que são compatíveis
situam-se ao lado um do outro ao longo do círculo (ver Figura 1).
Universalismo Benevolência
Tradição
Conformidade
Segurança
Poder Realização
Hedonismo
Estimulação
Autodireção
AUTO-TRANSCENDÊNCIA
AUTO-PROMOÇÃO
AB
ERTU
RA
À M
UD
AN
ÇA
CO
NSER
VAÇ
ÃO
Figura 1. Estrutura Bidimensional dos Tipos Motivacionais (adaptado de Schwartz, 1992)
Como pode ser observado na Figura 1, a estrutura apresenta ainda duas dimensões
bipolares básicas de ordem superior. Cada pólo diz respeito a um tipo de valor de ordem superior
85
que combina dois ou mais dos dez tipos motivacionais. Uma das dimensões põe em oposição a
Abertura à Mudança (Autodireção e Estimulação) à Conservação (Conformidade, Tradição e
Segurança); a outra opõe a Auto-Transcendência (Universalismo e Benevolência) à Auto-
Promoção (Realização e Poder). Cabe destacar que o Hedonismo está relacionado tanto com a
Abertura à Mudança como com a Auto-Promoção (Schwartz, 2001).
Empiricamente, esta tipologia tem sido testada a fim de averiguar o quanto os domínios
motivacionais, seus conteúdos, seus valores típicos e sua estrutura de relações representam o uso
que as pessoas fazem dos valores. Mais precisamente, Schwartz utiliza a Smallest Space Analysis
(SSA) para distinguir a extensão pela qual as diferenças apontadas pela teoria correspondem às
que as pessoas fazem em diferentes sociedades ao avaliarem a importância relativa de seus
valores (ver Schwartz, 1994). Este procedimento, além de querer demonstrar a universalidade
desta tipologia, pretende justificar a adequação dos tipos motivacionais para interpretar e predizer
o impacto dos valores (como variável independente) sobre as atitudes e o comportamento, além
dos efeitos de diferentes variáveis sociais e estruturais (econômicas, políticas, religiosas, étnicas e
familiares) sobre os valores como variáveis dependentes (Schwartz & Bilsky, 1987).
Para completar a caracterização da teoria dos valores apresentada por Schwartz, não se
pode deixar de enfatizar o fato de que este autor considera que os valores, enquanto metas,
procuram atender a interesses específicos, quais sejam: interesses individualistas (por exemplo,
prazer, independência), interesses coletivistas (por exemplo, igualdade, responsabilidade) ou
interesses mistos (por exemplo, sabedoria, um mundo de beleza) (Schwartz, 1990; Schwartz &
Bilsky, 1990). Estas se tratam de dimensões relevantes para a diferenciação de valores tanto no
nível de análise social como individual. Neste sentido, a importância dada aos valores é
influenciada sistematicamente pelo interesse ao qual servem. No Quadro 5 apresenta-se um
resumo deste aspecto da teoria.
86
Quadro 5: Interesses a que cumprem os tipos motivacionais
Interesse Dimensão de Ordem Superior Tipo Motivacional
Individualista Abertura à mudança
Auto-Promoção
Autodireção, Estimulação,
Hedonismo, Poder, Êxito
Coletivista Conservação
Auto-Transcendência
Conformidade, Tradição
Benevolência
Misto Conservação
Auto-Transcendência
Segurança
Universalismo
Andrade (2001) aponta que Schwartz e Bilsky baseiam-se nas conclusões de Hofstede de
que os membros de uma sociedade variam substancialmente na ênfase que dão ao individualismo
e ao coletivismo, e isso afetaria a avaliação que o indivíduo faz sobre qual interesse determinado
valor estaria servindo. A classificação dos valores em individualistas, coletivistas e mistos não é
unânime na literatura, embora haja uma certa convergência.
A teoria de Schwartz e seus colaboradores teve larga repercussão no mundo acadêmico e é
hoje em dia alvo de muitas pesquisas dentro da Psicologia Social. Entretanto, alguns autores
tecem críticas aos fundamentos e postulados teóricos da sua proposta. Por exemplo, Molpeceres
(1994) descreve que
“Em ocasiões, tem-se a impressão de que não há, subjacente a proposta de
Schwartz, uma concepção elaborada do homem como ser social, senão uma
hábil revisão da literatura psicológica e sociológica. Neste sentido, pois, não é
uma teoria em si, mas uma plataforma útil para a elaboração teórica [..]” (p. 76).
Também se pode observar que, tal como Rokeach, Schwartz não possui uma teoria para
elaborar sua lista de valores. Não obstante, é mais criterioso ao identificar os tipos motivacionais e
procurar definir seu conteúdo. Assim, frente aos modelos existentes e reconhecendo a necessidade
87
de diferenciar os valores de outros construtos com os quais costumam ser confundidos, Gouveia
(1998) pensou na possibilidade de elaborar uma tipologia alternativa. Talvez seu aspecto mais
inovador seja assumir a natureza humana como benévola, e identificar uma teoria específica a
partir da qual deriva sua lista de valores. Este modelo servirá, nesta dissertação, de base teórica
para compreender os valores, exigindo assim que se faça um maior aprofundamento.
2.2.2.3 - Tipologia dos Valores Humanos Básicos
Gouveia (2003) apresenta sua tipologia dos valores humanos básicos, conceituando-os como:
“Categorias de orientação consideradas como desejáveis,
baseadas nas necessidades humanas e nas pré-condições para
satisfazê-las, adotadas por atores sociais, podendo variar quanto
a sua magnitude e aos elementos que as constituem” (p. 433).
Este autor fundamenta-se na Teoria das Necessidades de Maslow, para formular seu
modelo acerca das prioridades valorativas. No entanto, dada a controvérsia sobre a adequação dos
postulados da sua hierarquia de necessidades, a teoria de Maslow não é plenamente aceita, mas
sim sua lista de necessidades. Maslow fundamenta esta teoria em ao menos três pressupostos
básicos, a saber: (1) as necessidades humanas são universais; (2) são neutras ou positivas; e (3) o
indivíduo é um todo integrado e organizado. Além de dar ênfase a teoria das necessidades básicas
que, relembrando, é constituída por sete grupos de necessidades: fisiológicas, de segurança, de
amor e de pertença, cognitivas, estéticas, de estima e de auto-realização (Maslow, 1954 / 1970),
Maslow também sugere que existem algumas pré-condições para que estas necessidades sejam
satisfeitas.
88
Partindo destas considerações, Gouveia (1998) propôs o modelo conhecido como Valores
Humanos Básicos, o qual vem sofrendo alterações recentes, em função das evidências empíricas e
de seus aprimoramentos teóricos (Gouveia, 2003; Gouveia, Fischer & Milfont, 2006, no prelo).
Atualmente, os valores básicos se resumem a 18, tendo sido inicialmente proposto um conjunto de
22 (Gouveia, 1998) e posteriormente de 24 valores. Todos os valores caracterizam-se por serem
terminais (para mais detalhes, ver Rokeach, 1973), de forma a expressar algum substantivo. Estes
valores são apresentados a seguir:
01. Sobrevivência: representa as necessidades mais básicas, como comer ou beber, cuja privação
duradoura resultaria letal. Sua relevância parece evidente como um princípio-guia de pessoas ou
culturas socializadas em um contexto de escassez ou que não dispõem na atualidade dos recursos
básicos.
02. Sexualidade: representa a necessidade fisiológica que o organismo tem de sexo. Mostra-se
como um padrão de orientação, sobretudo para jovens adolescentes ou pessoas que foram ou são
privadas desse estímulo.
03. Prazer: corresponde à necessidade que o organismo tem de satisfação, entendida em termos
amplos (comer, beber, divertir-se, etc.). Ainda que este valor esteja relacionado ao anterior, sua
especificidade radica em não ter uma fonte única e definida de satisfação.
04. Emoção: representa as necessidades fisiológicas de ter excitação e buscar experiências
arriscadas. As pessoas que o adotam dão ênfase ao aspecto risco e são menos dadas a conformar-
se às regras sociais.
05. Estabilidade pessoal: a necessidade de segurança é parcialmente representada por este valor.
Acentua ter uma vida organizada e planejada. Quem assume esta orientação procura assegurar sua
própria existência.
06. Saúde: também representa a necessidade de segurança. A idéia é de procurar não estar doente.
Seria alguém que percebe o drama pessoal da incerteza que a doença implica, estando, portanto
orientado a buscar um nível ótimo de saúde que não ameace sua existência.
89
07. Religiosidade: mais um que representa a necessidade de segurança. É independente de
preceito religioso, abarcando conteúdo como: crer em Deus como o salvador da humanidade ou
cumprir a vontade de Deus. Busca-se a certeza das coisas e a harmonia social suficiente para uma
vida tranqüila.
08. Apoio social: igual aos três valores antes descritos, este também representa a necessidade de
segurança. A ênfase é em obter ajuda quando a necessite e sentir que não está só no mundo.
Significa encontrar apoio no seu contexto social, sem que exatamente exista implicação e relação
íntima.
09. Afetividade: este valor e o seguinte representam a necessidade de amor e afiliação. Neste
acentuam-se as amizades íntimas, as relações familiares e próximas, com troca de carinhos,
afetos, prazeres e tristezas. Corresponde a uma esfera mais íntima da vida social.
10. Convivência: diferente do anterior que descreve relações pessoa-pessoa com uma ênfase no
aspecto íntimo, este valor se centra na dimensão pessoa-grupo e tem um sentido socializador:
fazer parte de grupos sociais, conviver com os vizinhos.
11. Êxito: a necessidade de estima é representada por este valor e pelos dois seguintes. Seu
conteúdo destaca a idéia de ser prático e alcançar as metas auto-impostas. As pessoas que o
adotam têm claro um ideal de triunfo, e tendem a se orientar nesta direção.
12. Prestígio: este valor tem de próprio a importância que se atribui ao contexto social; não é uma
questão de ser aceito pelos demais, mas sim reconhecido publicamente. Neste sentido, quem o
adota reconhece a importância dos demais, ainda que seja para seu proveito próprio.
13. Poder: define a noção de poder social (ter poder para influenciar aos demais e controlar as
decisões) e autoridade (saber que é o chefe de uma equipe). É menos social que o anterior; quem
dá importância a este valor pode prescindir da noção de poder legitimamente constituído.
14. Maturidade: a necessidade de auto-realização é representada por este valor. Trata de descrever
um sentido de auto-satisfação ou cumprimento como ser humano (desenvolver todas suas
capacidades). A pessoa que o considera importante como um princípio-guia tende a apresentar
uma orientação social que transcende a pessoa ou o grupo em concreto.
15. Tradição: este valor e o seguinte representam a pré-condição de disciplina no grupo ou na
sociedade para satisfazer as necessidades humanas básicas. Neste caso específico, sugere a idéia
90
de se conformar com os padrões morais seculares, favorecendo um mínimo de harmonia
necessária no âmbito social. A pessoa deve respeitar os símbolos e padrões culturais.
16. Obediência: destaca-se com este valor a importância de cumprir seus deveres e obrigações do
dia a dia e respeitar aos seus pais e aos mais velhos. É uma questão de conduta do indivíduo, que
deve assumir um papel e se conformar à hierarquia social tradicionalmente imposta.
17. Conhecimento: as necessidades cognitivas são representadas por este valor. Tem um caráter
extra-social, não compreendendo exatamente o interesse de obter benefícios pessoais. Pretende-se
ter conhecimentos atuais e sobre temas pouco conhecidos.
18. Beleza: este valor representa as necessidades de estética. Compreende uma orientação global
sem interesses muito delimitados enquanto aos benefícios. Dois dos seus elementos são: ser capaz
de apreciar o melhor da arte, da música e da literatura, e ir a museus ou exposições onde possa
ver coisas bonitas.
Os valores humanos são explicados através das funções a que servem, por isso, o modelo
proposto por Gouveia, Fischer e Milfont (2006, no prelo) é chamado de Modelo Funcional dos
Valores Humanos. Estes valores são organizados em três critérios de orientação (Pessoal, Central
e Social) e dois tipos de motivadores (Materialista e Humanistas) os quais se combinam para
formar seis tipos de funções psicossociais que orientam a vida dos indivíduos. Recentemente,
Gouveia (2004; Gouveia, Fischer & Milfont, 2006, no prelo) propõe uma nova estrutura de
apresentação dos valores humanos em forma de hexágono, de maneira que as relações entre as
suas funções são proporcionais à distância entre as mesmas, como pode ser visto na Figura 2 que
é disposta abaixo.
91
Suprapessoal
Existência
RealizaçãoNormat
ivaExperim
entaçãoInter
acion
al
Soci
al
Pessoal
Materialista
Humanista
Cen
tral
Figura 2. Modelo Funcional dos Valores Humanos
No meio desta figura, a seta na vertical indica os valores centrais, estando no lado inferior
aqueles considerados como mais materialistas, ou seja, os valores de existência (estabilidade
pessoal, saúde e sobrevivência), e no superior os humanistas, que são os valores suprapessoais
(beleza, conhecimento e maturidade). Os valores materialistas são assumidos por pessoas que
tendem a pensar em contextos específicos, ter uma visão pragmática da vida com pouca abertura.
Tratam-se de pessoas com idéias mais concretas, orientadas a hierarquização e a manutenção do
status quo. Já os valores humanistas são adotados por pessoas que comumente não possuem um
marco rígido de referência, são mais abertas ao novo, flexíveis e preocupadas em soluções mais
igualitárias para os problemas sociais.
A seta na horizontal, por sua vez, indica à esquerda os valores sociais figurando acima os
interacionais (afetividade, apoio social e convivência) e abaixo os normativos (obediência,
religiosidade e tradição), e à direita os valores pessoais: os de realização (êxito, poder e
92
prestígio) e os de experimentação (emoção, prazer e sexual). Na Figura 2 as relações entre as
funções estão expressas pelas distâncias entre elas. É possível a compatibilidade de todos os
valores, especialmente em pessoas com maior bem-estar subjetivo, todavia, tem-se observado que
algumas funções possuem maior relação com umas do que com outras. Destarte, funções
adjacentes são mais relacionadas do que as funções alternadas ou opostas. Por exemplo, pessoas
que dêem importância a valores suprapessoais são mais prováveis a darem também importância a
valores de experimentação ou interacionais do que aos demais (Gouveia, 2004).
Ademais, apresenta-se a seguir uma descrição mais detalhada a cerca dos critérios de
orientação (Pessoal, Central e Social) e das seis funções psicossociais propostas na tipologia dos
valores humanos ora discutida:
Valores Pessoais. As pessoas que enfatizam esta categoria dão prioridade aos próprios
benefícios. Dividem-se em duas funções psicossociais, as quais são: (1) valores de
experimentação (emoção, prazer e sexual), nos quais os indivíduos buscam enfrentar situações
com alto teor de adrenalina ou limite, assim como buscar satisfação sexual; e (2) valores de
realização (êxito, poder e prestígio), que consistem em ressaltar a realização, o sentimento de ser
importante e poderoso, sendo as pessoas com este padrão de valores aquelas que costumam
manter relações pessoais contratuais, com o fim de obter benefícios.
Valores Centrais. A expressão “valores centrais” é utilizada indicando o caráter adjacente
destes valores, visto que eles figuram entre os outros dois critérios de orientação. Estes são
compatíveis tanto com os valores pessoais como com os sociais. Apresentam-se divididos nas
duas seguintes funções psicossociais: (1) valores de existência (estabilidade pessoal, saúde e
sobrevivência), os quais caracterizam-se por expressar uma preocupação pela garantia da própria
existência orgânica; e (2) valores suprapessoais (beleza, conhecimento e maturidade), os quais
definem a situação social na qual a pessoa pode obter seus objetivos independentemente de sua
93
condição social ou grupo afiliativo. Estes últimos descrevem alguém maduro, com preocupações
menos materiais, enfatizando a importância de todas as pessoas, não exclusivamente dos
indivíduos que compõem o grupo de pertença.
Valores Sociais. Quem assume o padrão de valores sociais orienta-se em direção aos
demais. Seu comportamento pode traduzir o desejo de se sentir considerado, assegurar sua
aceitação e integração no seu grupo, ou manter um nível indispensável de harmonia entre os
diversos atores sociais de um contexto específico. Suas funções psicossociais são: (1) valores
normativos (religiosidade, tradição e obediência), que põem ênfase na vida social, nos
comportamentos socialmente corretos e no respeito pelos símbolos e padrões culturais que
prevaleceram durante anos; e (2) valores interacionais (afetividade, apoio social e convivência),
cujo foco de atenção se dá nas demais pessoas. Portanto, sua especificidade enquanto conjunto
fundamenta-se no interesse por sentir-se querido, ter amizades verdadeiras e uma vida social
ativa.
Na presente pesquisa, os valores humanos são adotados como um dos fatores que
compõem a hipótese do compromisso convencional, uma vez que, são critérios de orientação
desejáveis que inibem ou protegem o indivíduo de apresentar condutas indesejáveis e que desta
forma, podem atuar como inibidores das condutas de risco estudadas. Entretanto, serão levadas
em consideração na presente pesquisa, duas das seis funções psicossocias previamente descritas: a
normativa e a de experimentação. Isso se dá porque, relembrando, as pessoas que priorizam os
valores normativos, a saber: religiosidade, tradição e obediência, enfatizam fortemente os
comportamentos que são tidos como socialmente corretos e aceitáveis, de acordo com os símbolos
e padrões culturais estabelecidos e que prevaleceram durante anos, e, por isso, seja pouco
provável que venham a assumir comportamentos agressivos, anti-sociais e de uso de álcool. Em
contrapartida, aquelas que priorizam os valores de experimentação (emoção, prazer e sexual),
94
buscam na maioria das vezes enfrentar situações imbuídas de um alto teor de adrenalina ou de
limite. Assim, possivelmente, seja mais provável que estas pessoas admitam se comportar de
forma agressiva, anti-social bem como fazer uso de drogas, como o álcool. Em suma, de maneira
parcimoniosa, este estudo considera importante levar em conta os valores normativos e o
ajustamento escolar como dois construtos que representam o compromisso convencional.
Desta forma, como se depreende do marco teórico, o objetivo geral deste estudo é verificar
em que medida o comprometimento dos adolescentes com a sociedade convencional (adoção dos
valores normativos e ajustamento escolar) poderia prevenir a apresentação dos comportamentos
agressivos, anti-sociais e de uso de álcool. Especificamente, pretende-se, pois:
1) Comprovar a adequação psicométrica de duas medidas: Escala de Adaptação Escolar
(Conduct Problems Prevention Research Group, 1997) e Escala de Atitudes frente a
Escola (Cheng & Chan, 2003). A escolha destes instrumentos se deu em razão dos
adequados parâmetros psicométricos apresentados nos estudos originais. Destarte, por não
terem sido encontradas medidas equivalentes na realidade brasileira, decidiu-se adaptá-las;
2) Conhecer as pontuações dos adolescentes nas medidas empregadas, procurando compará-
las em função do sexo e do tipo de escola em que estudam; e
3) Verificar o quanto os valores humanos e o ajustamento escolar explicam os
comportamentos de risco.
95
Capítulo III - Método
96
3.1- DELINEAMENTO E HIPÓTESES
A presente dissertação pauta-se em delineamento de tipo correlacional. Neste sentido, são
consideradas como variáveis antecedentes o ajustamento escolar e duas funções psicossociais dos
valores humanos: experimentação e normativa. Como variável critério, são adotadas as condutas
de risco, mensuradas pelas condutas anti-sociais, o uso potencial de álcool e os comportamentos
agressivos. Com base na revisão da literatura realizada acerca dos temas em questão e diante dos
objetivos antes mencionados, são apresentadas as seguintes hipóteses:
• Valores Humanos e Condutas de Risco
Hipótese 1: A função psicossocial de experimentação explicará diretamente às condutas
agressivas.
Hipótese 2: A função psicossocial de experimentação explicará diretamente às condutas anti-
sociais.
Hipótese 3: A função psicossocial de experimentação explicará diretamente o uso potencial de
álcool.
Hipótese 4: A função psicossocial normativa explicará inversamente às condutas agressivas.
Hipótese 5: A função psicossocial normativa explicará inversamente às condutas anti-sociais.
Hipótese 6: A função psicossocial normativa explicará inversamente o uso potencial de álcool.
• Ajustamento Escolar e Condutas de Risco
Hipótese 7: A adaptação escolar explicará inversamente as condutas agressivas.
Hipótese 8: A adaptação escolar explicará inversamente as condutas anti-sociais.
Hipótese 9: A adaptação escolar explicará inversamente o uso potencial de álcool.
Hipótese 10: A atitude positiva frente a escola explicará de forma inversa as condutas agressivas.
97
Hipótese 11: A atitude positiva frente a escola explicará de forma inversa as condutas anti-
sociais.
Hipótese 12: A atitude positiva frente a escola explicará de forma inversa o uso potencial de
álcool.
3.2 - Amostra
A fim de atingir os objetivos propostos contou-se com a participação de 366 adolescentes,
de ambos os sexos, sendo 162 do sexo masculino (44,3%), 203 feminino (55,5%) e um
participante que não informou o sexo. As idades variaram de 11 a 17 anos (M = 14; DP = 1,75).
Consideraram-se tanto aqueles de escolas públicas (45,4%) quanto privadas (54,6%), distribuídos
entre as 6ª e 8ª séries do ensino fundamental (28,1% e 37,2%, respectivamente) e 2° ano do ensino
médio (34,7%), todos da cidade de João Pessoa. A amostra é de tipo acidental (de conveniência) e
não probabilística, sendo incluídos os estudantes que, presentes em sala de aula, concordaram em
fazer parte do estudo. Independentemente da amostra, as seguintes regras de exclusão dos
participantes foram adotadas: 1) não responder a uma das medidas; 2) deixar mais de 10% dos
itens de uma medida sem resposta; 3) responder de forma diferente ou utilizando escala diferente
da proposta no estudo; e 4) apresentar idade inferior a 11 ou superior a 17 anos.
3.3 - Instrumentos
Os participantes receberam um livreto composto pelos seguintes instrumentos:
• Questionário dos Valores Básicos. Utilizou-se a versão composta por 24 valores
propostos por Gouveia (1998). Dentre os valores estudados estão: prestígio (saber que muita
gente lhe conhece e admira; quando velho receber uma homenagem por suas contribuições);
apoio social (obter ajuda quando a necessite; sentir que não está só no mundo). Os respondentes
98
indicam a importância que cada valor tem como um princípio-guia na sua vida, utilizando uma
escala de resposta de 1 (Totalmente não Importante) a 7 (Extremamente Importante). No fim do
questionário devem indicar o valor mais e o menos importante de todos, os quais recebem as
pontuações 0 e 8, respectivamente. Estas pontuações substituem as previamente anotadas (Anexo
I). Tais valores são agrupados segundo o critério de orientação adotado: pessoal, central e social.
Informações recentes sobre os seus parâmetros psicométricos estão disponíveis em Gouveia,
Fischer e Milfont (2006).
• Escala de Adaptação Escolar. Este instrumento foi desenvolvido pelo Conduct Problems
Prevention Research Group (CPPRG) (1997), compondo-se de 20 itens que avaliam a percepção
que os adolescentes têm acerca de sua adaptação a escola. Especificamente, cada um dos itens
corresponde a uma afirmação acerca de sua experiência escolar (por exemplo, Minha escola é um
lugar onde as pessoas me tratam bem; Acontecem coisas ruins comigo na escola). Para respondê-
los, a pessoa emprega uma escala de cinco pontos, variando de 1 = Completamente falso a 5 =
Completamente verdadeiro. Os parâmetros psicométricos deste instrumento foram comprovados
em uma amostra de participantes estadunidenses de 11 anos (n = 463; destes, 387 eram da
população normal e 155 de alto risco). Neste contexto, observaram-se índices de consistência
interna em torno de 0,71 (Corrigan, 2003). Nenhuma pesquisa foi encontrada no Brasil em que
esta escala tenha sido empregada, demandando que se comprove sua adequação. Sua tradução
para o Português foi realizada por dois psicólogos bilíngües. Em seguida, contou-se com a
participação de 30 estudantes de escolas públicas e privadas do ensino fundamental da cidade de
João Pessoa, de ambos os sexos, com o fim de comprovar sua validade semântica, isto é, se as
instruções de como respondê-los, o formato da escala de resposta e o conteúdo dos itens eram de
fácil compreensão. Após os ajustes necessários, a versão experimental em português ficou
composta pelo mesmo número de itens do estudo original (Anexo II).
99
• Escala de Atitudes frente a Escola. Esta foi originalmente proposta por Cheng e Chang
(2003), reunindo nove itens (por exemplo, Acredito que a escola pode ajudar a me tornar uma
pessoa madura; A vida escolar é tediosa e desinteressante), respondidos em escala tipo Likert, de
cinco pontos, com os seguintes extremos: 1 = Discordo totalmente e 5 = Concordo totalmente.
Seus autores reúnem prova da adequação desta medida como unifatorial, com saturações entre
0,50 e 0,67. Análises fatoriais confirmatórias também apóiam esta dimensionalidade: CFI
(Comparative Fit Index) 0,94 e RMSR (Root Mean Square Error of Approximation) = 0,068. Seu
Alfa de Cronbach médio, considerando as diferentes amostras, ficou em 0,81. Por não ter sido
identificado estudo prévio no Brasil em que esta medida tenha sido empregada, faz-se necessário
comprovar seus parâmetros psicométricos. A tradução para o Português da presente medida foi
realizada por dois psicólogos bilíngües. A fim de comprovar sua validade semântica, contou-se
com a participação de 30 estudantes de escolas públicas e privadas do ensino fundamental da
cidade de João Pessoa, de ambos os sexos. Realizadas às modificações pertinentes, a versão em
português ficou composta pelo mesmo número de itens do estudo original (Anexo III).
• Escala de Condutas Anti-sociais. Esta medida corresponde a um fator do instrumento
proposto por Seisdedos (1988), denominado de Escala de Condutas Anti-sociais e Delitivas.
Originalmente este instrumento é composto por 40 itens que são distribuídos em dois fatores, a
saber: (1) Condutas Anti-sociais, que compreende uma medida de um conjunto de
comportamentos tipicamente de jovens e adolescentes que desviam de normas sociais, não
expressando, entretanto, qualquer forma de delito (por exemplo, Jogar lixo no chão mesmo
quando há perto um cesto de lixo; Tocar a campainha na casa de alguém e sair correndo) e (2)
Condutas Delitivas, cujos itens referem-se a comportamentos delitivos, que infringem a lei,
caracterizando uma conduta prejudicial a alguém ou mesmo a sociedade como um todo (por
exemplo, Roubar coisas de um lugar público; Conseguir dinheiro ameaçando pessoas mais
100
fracas). Para cada frase, os participantes devem indicar qual a freqüência que apresentam o
comportamento no seu dia a dia, utilizando uma escala de resposta com onze pontos, tendo os
seguintes extremos: 0 = Nunca e 10 = Sempre. A fim de atender os objetivos propostos na
presente dissertação, utilizaram-se os 20 itens que compõem o primeiro fator: Condutas Anti-
sociais (Anexo IV). Formiga (2002) procurou adaptar esta medida ao contexto brasileiro, tendo
sido observados parâmetros psicométricos satisfatórios. Por exemplo, para o fator aqui
considerado, este autor descreve uma análise fatorial exploratória (Componentes Principais) na
qual todos os itens desta medida apresentaram cargas fatoriais de pelo menos 0,35, e consistência
interna (Alfa de Cronbach) de 0,86. Através de uma análise fatorial confirmatória, Vasconcelos
(2004) comprovou igualmente a adequação desta estrutura, χ² / g.l. = 1,78; GFI = 0,91, AGFI =
0,90 e RMSEA = 0,04.
• Questionário de Potencial Consumo de Álcool. Compreende um fator do POSIT
(Questionário de Triagem de Problemas de Adolescentes), criado originalmente pelo NIDA
(National Instictute of Drugs Abuse) nos Estados Unidos e, posteriormente, validado no México
por Mariño e cols. (1998). Este fator é composto por 17 itens que medem o uso potencial de
álcool e de maconha, entretanto, no presente estudo os itens foram modificados a fim de medirem
apenas o uso potencial do álcool para os quais os respondentes dispõem de duas alternativas de
resposta: sim vs. não (por exemplo, Seus familiares ou amigos lhe disseram alguma vez que deve
diminuir o uso de bebidas alcoólicas? As bebidas alcoólicas o induziram a fazer algo que
normalmente não faria, como desobedecer alguma regra ou lei, ou a hora de chegar em casa ou
mesmo ter relações sexuais com alguém?). A adaptação desta sub-escala para o contexto
brasileiro foi realizada por Coelho Júnior, Gontiès e Gouveia (2003), os quais demonstraram sua
validade de construto; por exemplo, apresentou eigenvalue de 8,66, explicando 10,7% da
variância total, com consistência interna (Alfa de Cronbach) de 0,80 (Anexo V).
101
• Questionário de Agressão. Foi elaborado originalmente em língua inglesa por Buss e
Perry (1992), compondo-se de 29 itens que, teoricamente, avaliam a agressão em quatro
dimensões, a saber: agressão física (por exemplo, Se alguém me bater, eu o bato de volta; Uma
vez ou outra não consigo controlar a vontade de bater em outra pessoa), agressão verbal (por
exemplo, Quando as pessoas me aborrecem é possível que eu fale o que realmente penso delas;
Não consigo ficar calado quando as pessoas discordam de mim), raiva (por exemplo, Tenho
dificuldade em controlar meu temperamento; Às vezes fico nervoso(a) sem nenhuma boa razão e
não consigo me controlar) e hostilidade (por exemplo, Desconfio de pessoas estranhas que são
amigáveis demais; Sei que “amigos” falam de mim pelas costas). Tais itens são respondidos em
uma escala de cinco pontos, tipo Likert, com os seguintes extremos: 1 = Discordo totalmente e 5
= Concordo totalmente (Anexo VI). A adaptação desta escala para o contexto brasileiro foi
realizada por Gouveia, Chaves, Peregrino, Branco e Golçalves (no prelo), os quais demonstraram
sua validade de construto.
Por último, além dos instrumentos antes apresentados, com o propósito de caracterizar a
amostra de respondentes, foram incluídas no final seis perguntas de natureza demográfica: sexo,
idade, classe social; auto-percepção enquanto estudante (amplitude de 1 = Péssimo a 5 = Ótimo),
média escolar no bimestre em Português e Matemática e horas-extras de estudo, sem contar com o
período que o aluno está no colégio (Anexo VII).
3.4 - Procedimento
Embora as respostas tenham sido dadas individualmente, a aplicação dos instrumentos foi
realizada de forma coletiva em sala de aula. Para tanto, contou-se com a participação de
aplicadores previamente treinados que foram instruídos a controlar os fatores que possam
comprometer as respostas dos participantes. Tais colaboradores interferiram o mínimo possível
102
neste processo. A todos os participantes informou-se que sua participação seria voluntária, não
sendo necessário que se identificassem. A propósito, assegurou-se o anonimato das informações
obtidas, indicando que estas seriam tratadas estatisticamente no seu conjunto. O tempo de resposta
necessário para que os adolescentes respondessem aos questionários foi de aproximadamente 30
minutos.
3.5 - Análise dos Dados
Além das estatísticas descritivas (tendência central e dispersão), também comprovou-se a
consistência interna através do Alfa de Cronbach das escalas adaptadas (escala de ajustamento
escolar e escala de atitudes frente à escola). Foram realizadas ainda comparações de médias, teste
t de Student e análises de variância (ANOVA e MANOVA) para verificar a existência de
diferenças em função do sexo e do tipo de escola no que diz respeito às condutas de risco. Por
fim, efetuaram-se análises de regressões com a finalidade de testar as hipóteses do estudo acerca:
(a) dos valores humanos e das condutas de risco (Hipóteses 1 a 6), (b) do ajustamento escolar
(adaptação escolar e atitudes frente à escola) e das condutas de risco (Hipóteses 7 a 12).
103
Capítulo IV – Resultados
104
A fim de facilitar a compreensão dos leitores, os resultados obtidos são apresentados em três
tópicos principais, procurando seguir uma ordem de complexidade. Inicialmente, apresentam-se
os padrões psicométricos das escalas de Adaptação Escolar (Conduct Problems Prevention
Research Group - CPPRG, 1997) e de Atitudes frente a Escola (Cheng & Chan, 2003). Em
seguida, são verificadas as pontuações médias dos adolescentes nas medidas empregadas,
comparando-as em função do sexo e do tipo de escola em que estudam. Posteriormente, procurar-
se-á conhecer as relações encontradas entre os construtos estudados, averiguando-se assim as
hipóteses formuladas.
4.1 – PADRÕES PSICOMÉTRICOS DAS ESCALAS VALIDADAS
Visando atingir o primeiro objetivo proposto na presente dissertação, procurou-se aferir a
adequação psicométrica de duas medidas: Escala de Adaptação Escolar e Escala de Atitudes
frente a Escola. Os resultados destas análises são dispostos a seguir nos tópicos abaixo. Deve-se
ressaltar que as demais escalas utilizadas no presente estudo foram previamente validadas para o
contexto no qual esta pesquisa se insere.
4.1.1 - Estrutura Fatorial da Escala de Adaptação Escolar
Inicialmente, verificou-se através da análise paralela que para a Escala de Adaptação
Escolar seria mais adequada a organização dos itens numa estrutura composta por quatro fatores.
Entretanto, antes de conhecer através da análise fatorial se esta indicação era de fato viável,
procurou-se comprovar a possibilidade de se realizar uma análise de Componentes Principais
(PC), através dos indicadores KMO (Kaiser-Meyer-Olkin) e do Teste de Esfericidade de Bartlett.
O primeiro trabalha com as correlações parciais das variáveis, devendo ser aceitos os índices
iguais ou superiores a 0,60 (Tabachinick & Fidell, 2001). O segundo, por sua vez, verifica se a
105
matriz de covariância se configura ou não como uma matriz identidade. Os resultados obtidos
apóiam a utilização da análise fatorial nesta escala, uma vez que o KMO foi de 0,76, e o Teste de
Esfericidade de Bartlett permitiu rejeitar a hipótese dessa matriz ser identidade, verificando-se um
χ2 (365) = 1277,209, p < 0,001.
Realizou-se ainda a recodificação dos itens que estavam medindo na direção oposta, ou
seja, a não adaptação escolar, uma vez que além de ser preciso averiguar a validação desta medida
através da análise fatorial, faz-se necessário verificar a precisão deste instrumento através do Alfa
de Cronbach, sendo indispensável para esta segunda análise garantir que os itens estejam
medindo na mesma direção. Os itens recodificados foram: 1 (O ano escolar tem sido difícil), 4
(Alguns colegas têm batido ou zombado de mim), 7 (Os trabalhos escolares têm sido realmente
difíceis), 8 (Tenho tido dificuldades em fazer amigos), 9 (Alguns colegas têm me influenciado a
fazer coisas erradas), 10 (Tenho me metido em alguns problemas este ano), 12 (Não tenho feito
bem as tarefas escolares), 13 (Não tenho tido muitos amigos), 14 (Alguns colegas têm me
incomodado / aborrecido este ano), 15 (Os professores estão me marcando porque tenho
quebrado as normas da escola), 16 (Os professores não têm se preocupado com os alunos), 18
(Coisas ruins têm acontecido comigo na escola) e 20 (Estou tendo problemas neste ano por
quebrar as regras da escola). Depois de seguido este procedimento, todos os itens passaram a
medir na mesma direção, significando assim que quanto maior a pontuação do adolescente nesta
medida, maior seria também o seu nível de adaptação escolar. Tendo sido observados estes
critérios iniciais, realizou-se uma PC, utilizando rotação varimax, tal como indicado nos estudos
de Gremaud (2000) e Corrigan (2003). Com o fim de interpretar os fatores, consideram-se os itens
que apresentassem cargas fatoriais maiores que |0,30| em um único fator, ou seja, foram
desconsiderados os itens que obtiveram saturações significativas (acima de |0,30|) em mais de um
fator e que apresentassem cargas fatoriais menores que |0,30|.
106
Três possibilidades de sumarização dos itens foram averiguadas: 1) a estrutura composta
por quatro fatores tal como apontada pela análise paralela; 2) a composição de três fatores tal
como observado por Gremaud (2000) e Corrigan (2003) e, por fim, 3) a possibilidade de se contar
com uma pontuação total dos itens através de uma organização unifatorial. Destas três opções, os
resultados apontaram não ser viável a estrutura de três fatores. A seguir, na Tabela 1 são dispostos
os resultados referentes a estrutura com quatro fatores e, posteriormente, na Tabela 2 a estrutura
unifatorial.
Tabela 1. Estrutura Fatorial da Escala de Adaptação Escolar FATORES Conteúdo dos Itens I II III IV rit h2
18. Coisas ruins têm acontecido comigo na escola. 0,70* 0,08 0,10 0,10 0,44 0,46 15. Os professores estão me marcando porque
tenho quebrado as normas da escola. 0,66* 0,18 0,22 0,01 0,50 0,52 10. Tenho me metido em alguns problemas este ano. 0,63* 0,18 0,23 -0,01 0,46 0,48 20. Estou tendo problemas neste ano por quebrar as
regras da escola. 0,58* 0,03 0,19 0,01 0,41 0,38 04. Alguns colegas têm batido ou zombado de mim. 0,53* -0,03 -0,22 0,29 0,29 0,42 09. Alguns colegas têm me influenciado a fazer coisas erradas. 0,51* -0,05 0,15 0,17 0,38 0,32 11. Tenho gostado das novidades na escola. - 0,03 0,72* 0,18 0,04 0,34 0,56 19. A escola tem sido divertida. 0,07 0,65* 0,04 0,21 0,41 0,48 17. Os alunos terão sucesso em minha escola. - 0,03 0,64* 0,07 0,13 0,39 0,43 05. Tenho me mantido fora de problemas. 0,13 0,35* 0,10 -0,18 0,14 0,18 02. Tenho dado conta de minhas atividades escolares. 0,05 0,21 0,70* -0,17 0,35 0,57 12. Não tenho feito bem as tarefas escolares. 0,23 -0,08 0,67* 0,20 0,49 0,55 01. O ano escolar tem sido difícil. 0,19 0,06 0,57* 0,25 0,37 0,43 13. Não tenho tido muitos amigos. 0,07 -0,16 0,18 0,75* 0,34 0,60 08. Tenho tido dificuldades em fazer amigos. 0,01 0,10 0,10 0,71* 0,38 0,53 14. Alguns colegas têm me incomodado / aborrecido este ano. 0,29 0,04 -0,18 0,41* 0,18 0,29 03. Tenho tido um bom relacionamento com meus amigos. 0,23 0,37 0,05 0,46 ---- 0,40 06. Tenho tido um bom ano escolar. 0,27 0,33 0,51 0,00 ---- 0,44 07. Os trabalhos escolares têm sido realmente difíceis. 0,03 0,11 0,28 0,28 ---- 0,17 16. Os professores não têm se preocupado com os alunos. 0,43 0,46 -0,26 0,10 ---- 0,48 Número de Itens 6 4 3 3 Eigenvalue 4,01 1,67 1,50 1,41 % Variância Total 13,47 10,40 10,10 9,47 Alfa de Cronbach (α) 0,68 0,52 0,59 0,44 Nota: rit = Correlação item-total; h2 = Comunalidade; * = Item considerado para interpretação do fator.
107
Como pode ser observado nesta tabela, a estrutura composta por quatro fatores mostrou-se
adequada, apresentando eingevalues (valores próprios) acima de 1 e explicando conjuntamente
43,44% da variância total. Dos vinte itens que compõem a escala, quatro deles não se mostraram
adequados, itens 03, 06, 07 e 16, uma vez que (com exceção do item 07 que não saturou
adequadamente em nenhum dos fatores) apresentaram saturações significativas em mais de um
fator o que os caracteriza como itens ambíguos. Desta forma, tais itens não foram considerados
em análises subseqüentes. Os índices de correlação item-total observados variaram de 0,18
(Alguns colegas têm me incomodado / aborrecido este ano) a 0,50 (Os professores estão me
marcando porque tenho quebrado as normas da escola) o que revela uma correlação adequada
dos itens com o instrumento total. Os quatro fatores resultantes da análise dos componentes
principais podem ser descritos como segue:
Fator I - Êxito nas Atividades Disciplinares e nos Relacionamentos estabelecidos na
escola. Este fator ficou composto por seis itens, com saturações variando de 0,51 (Alguns colegas
têm me influenciado a fazer coisas erradas) a 0,70 (Coisas ruins têm acontecido comigo na
escola). Vale a pena lembrar que todos os itens que compõem o fator foram recodificados, uma
vez que estavam medindo a não adaptação escolar. Desta forma, apesar de originalmente os itens
expressarem dificuldades acadêmicas e nos relacionamentos com outros alunos e com os
professores, devido a recodificação efetuada, quanto mais alta for a pontuação do participante
nesses itens, significará que este declarou ter mais facilidade nas atividades disciplinares e nos
relacionamentos estabelecidos na escola. Assim, considerando o conteúdo dos seus itens com
máxima carga fatorial, emerge a idéia de alguém que esteja vivenciando situações agradáveis na
escola, estabelecendo um bom relacionamento com professores que não estejam tendo
dificuldades em se adequar as normas escolares procurando se manter fora de problemas na escola
108
e que tenha um bom relacionamento com os colegas. Este fator explicou 13,47% da variância
total, com eigenvalue de 4,01; sua consistência interna (Alfa de Cronbach) foi 0,68.
Fator II – Ambiente Escolar Agradável. Um conjunto de quatro itens compôs este fator,
apresentando saturações entre 0,35 (Tenho me mantido fora de problemas) e 0,72 (Tenho gostado
das novidades na escola). Estes expressam uma situação de harmonia entre o aluno e a escola,
demonstrando que o aluno tende a se sentir bem com as novidades promovidas pela escola, e a
acreditar no sucesso dos alunos que fazem parte de sua escola. Refletem ainda uma pessoa que
tem procurado preservar essa harmonia se mantendo fora de problemas escolares. Com um
eigenvalue de 1,67, este fator explicou 10,40% da variância total; seu Alfa de Cronbach no
entanto, aponta uma fraca consistência (α = 0,52).
Fator III - Êxito nas Atividades Acadêmicas. Este fator ficou composto por três itens,
com saturações variando de 0,57 (O ano escolar tem sido difícil) a 0,70 (Tenho dado conta de
minhas atividades escolares). Vale a pena lembrar que dois dos itens que compõem o fator (itens
01 e 12) foram recodificados, uma vez que estavam medindo a não adaptação escolar. Desta
forma, apesar de originalmente os itens mencionados expressarem dificuldades acadêmicas, dada
a recodificação efetuada, quanto mais alta for a pontuação do participante nesses itens, significará
que este declarou ter mais facilidade de cumprir com suas tarefas acadêmicas propostas pela
escola. Assim, considerando o conteúdo dos seus itens com máxima carga fatorial, emerge a idéia
de alguém que tem dado conta de suas tarefas escolares sem problemas e que tem experienciado
um ano escolar agradável. Este fator explicou 10,10% da variância total, com eigenvalue de 1,50;
sua consistência interna (Alfa de Cronbach) apresentou um índice limítrofe de 0,59.
Fator IV – Relação agradável com outros Alunos. Faz parte desse fator um conjunto de
três itens os quais apresentaram cargas fatoriais entre 0,41 (Alguns colegas têm me incomodado/
109
aborrecido este ano) e 0,75 (Não tenho tido muitos amigos). Relembrando, todos os três itens que
compõem o fator foram recodificados, pois, estavam medindo a não adaptação escolar. Assim, de
forma análoga ao discutido nos Fatores I e III, apesar de originalmente os itens expressarem
dificuldade de relacionamento entre os alunos, dada a recodificação efetuada, quanto mais alta for
a pontuação do participante nesses itens, significará que este declarou ter mais facilidade de
estabelecer um relacionamento agradável com os outros alunos da escola, ou seja, de um modo
geral este fator expressa alguém que tem facilidade de fazer amigos e de se relacionar bem com
eles. A explicação da variância total deste fator foi de 9,47%, seu eigenvalue 1,41 e a consistência
interna foi obtida através do Alfa de Cronbach, evidencia uma fraca consistência (α = 0,44). Vale
salientar que estes quatro fatores demonstraram uma correlação direta e moderada entre si,
(Fatores 1 e 2: r = 0,19; Fatores 1 e 3: r = 0,34; 1 e 4: ; 2 e 3: r = 0,25; Fatores 2 e 4: 0,15 e
Fatores 3 e 4: r = 0,22, todas a um p < 0,01) tal como observado por Gremaud (2000). Dando
continuidade, apresenta-se a seguir na tabela 2 a segunda estrutura possível para esta escala, a
saber, unifatorial.
110
Tabela 2. Estrutura Fatorial da Escala de Adaptação Escolar - Fator Geral Conteúdo dos Itens FATOR GERAL rit h2
15. Os professores estão me marcando porque tenho quebrado as normas da escola. 0,63* 0,50 0,40 10. Tenho me metido em alguns problemas este ano. 0,57* 0,44 0,33 06. Tenho tido um bom ano escolar. 0,56* 0,45 0,31 18. Coisas ruins têm acontecido comigo na escola. 0,54* 0,40 0,29 03. Tenho tido um bom relacionamento com meus amigos. 0,52* 0,43 0,27 01. O ano escolar tem sido difícil. 0,50* 0,37 0,25 20. Estou tendo problemas neste ano por quebrar as regras da escola. 0,50* 0,37 0,25 12. Não tenho feito bem as tarefas escolares. 0,49* 0,39 0,24 09. Alguns colegas têm me influenciado a fazer coisas erradas. 0,46* 0,35 0,21 19. A escola tem sido divertida. 0,44* 0,35 0,20 16. Os professores não têm se preocupado com os alunos. 0,42* 0,30 0,17 13. Não tenho tido muitos amigos. 0,40* 0,32 0,16 11. Tenho gostado das novidades na escola. 0,39* 0,27 0,15 04. Alguns colegas têm batido ou zombado de mim. 0,38* 0,28 0,14 02. Tenho dado conta de minhas atividades escolares. 0,37* 0,30 0,14 08. Tenho tido dificuldades em fazer amigos. 0,37* 0,28 0,13 17. Os alunos terão sucesso em minha escola. 0,35* ----- 0,12 05. Tenho me mantido fora de problemas. 0,22 ----- 0,05 07. Os trabalhos escolares têm sido realmente difíceis. 0,29 ----- 0,09 14. Alguns colegas têm me incomodado / aborrecido este ano. 0,29 ----- 0,08 Número de Itens 17 Eigenvalue 3,93 % Variância Total 20,10 Alfa de Cronbach (α) 0,77 Nota: rit = Correlação item-total; h2 = Comunalidade; * = Item considerado para interpretação do fator.
Na tabela exposta acima, pode-se verificar que a estrutura unifatorial para a escala de
adaptação escolar é uma outra possibilidade de sumarização dos dados que se mostra adequada.
Esta estrutura apresentou um eingevalue (valor próprio) acima de 1, explicação de 20,10 % da
variância e uma consistência interna (Alfa de Cronbach) moderada: α = 0,77. O fator geral
observado pode ser descrito como segue:
Fator Geral de Adaptação Escolar. Como pode ser observado na tabela exposta acima,
neste fator geral figuram 17 itens os quais apresentam cargas fatoriais significativas variando de
0,35 (Os alunos terão sucesso em minha escola) a 0,63 (Os professores estão me marcando
porque tenho quebrado as normas da escola). Relembrando, na forma original de apresentação
111
dos itens, a maioria deles estava medindo a não adaptação escolar e por isso foram recodificados,
tal como discutido anteriormente na exposição da estrutura com quatro fatores. Neste sentido,
considerando os itens com maior carga fatorial, eles parecem refletir uma situação agradável na
escola tanto no relacionamento interpessoal professor-aluno e aluno-aluno quanto em relação as
atividades acadêmicas e disciplinares que o aluno vivencia na escola. Em fim, reflete um aluno
que não apresenta dificuldades de se adequar as normas e regras da escola, e que acredita no
sucesso futuro que os alunos da escola obterão.
Em suma, tendo sido apresentados os resultados referentes a validade da escala de
adaptação escolar, expõe-se a seguir, os resultados referentes a validação realizada para a outra
medida que compõe o construto ajustamento escolar, a atitude frente a escola.
4.1.2 - Validade de Construto da Escala de Atitudes frente a Escola
De modo análogo aos procedimentos descritos na verificação da validade da escala de
adaptação a escola, procederam-se os passos básicos para se verificar a validade de construto
desta medida. Assim, verificou-se através da análise paralela que em consonância ao obtido no
estudo de Cheng e Chan (2003) seria mais adequada uma estrutura unifatorial para a medida em
questão. Verificou-se ainda os seguintes índices: KMO = 0,81, e o Teste de Esfericidade de
Bartlett que apresentou um χ2 (36) = 594,313, p < 0,001; os quais suportam tal análise estatística.
Igualmente ao procedimento adotado para a escala de adaptação escolar, procedeu-se a
recodificação dos itens que estavam medindo na direção oposta. São eles: 4 (Considero sem
importância as coisas que tenho feito na escola), 5 (A vida escolar é chata e desinteressante.) e 8
(Se tivesse oportunidade de escolher, deixaria a escola e conseguiria um emprego). Em seguida,
realizou-se uma análise de Componentes Principais (PC), considerando-se para a interpretação
112
dos fatores, unicamente os itens que apresentassem cargas fatoriais iguais ou maiores que |0,30|.
Os resultados desta análise podem ser verificados na Tabela 3 abaixo.
Tabela 3. Estrutura Fatorial da Escala de Atitudes frente a escola Conteúdo dos Itens FATOR GERAL rit h2
9. Sinto que sou parte da escola. 0,75 0,57 0,56 2. O colégio tem me dado um sentido de realização pessoal. 0,68 0,51 0,46 3. Empenho-me bastante para aprender muitas coisas. 0,64 0,48 0,41 1. Acredito que a escola pode me ajudar a ser uma pessoa madura. 0,63 0,45 0,40 6. Participo ativamente da vida escolar. 0,63 0,46 0,40 5. A vida escolar é chata e desinteressante. 0,61 0,46 0,37 8. Se tivesse oportunidade de escolher, deixaria a escola e conseguiria um emprego. 0,42 0,31 0,18 4. Considero sem importância as coisas que tenho feito na escola. 0,39 0,27 0,15 7. Vale a pena ir à escola, mesmo que isso não me ajude a conseguir um emprego. 0,35 0,22 0,12 Número de Itens 9 Eigenvalue 3,05 % Variância Total 33,87 Alfa de Cronbach (α) 0,73 Nota: rit = Correlação item-total; h2 = Comunalidade
Como pode ser observado na tabela 2 acima, a escala de atitudes frente a escola
configura-se como uma medida unidimensional, tendo o valor próprio acima de 1, e uma
explicação de 33,87% da variância total; sua consistência interna (Alfa de Cronbach) foi 0,73.
Todos os nove itens da escala demonstraram saturações significativas, variando de 0,35 (Vale a
pena ir a escola, mesmo que isso não me ajude a conseguir um emprego) a 0,75 (Sinto que sou
parte da escola). Os índices de correlação item-total obtidos também foram adequados variando
de 0,22 a 0,57 para os mesmos itens citados na verificação das saturações fatoriais acima.
Considerando os itens desta medida, emerge a idéia de alguém que tem sentimentos, cognições e
predisposições comportamentais positivas frente a escola, ou seja, alguém que se sente parte da
escola, que acredita na ajuda que a escola pode lhe oferecer e que declara participar de fato das
113
atividades escolares. Estes resultados são bastante semelhantes aos encontrados originalmente por
Cheng e Chan (2003). Dando continuidade, apresenta-se a seguir os resultados referentes ao
segundo objetivo específico proposto na presente dissertação: conhecer as pontuações dos
adolescentes nas medidas empregadas, procurando compará-las em função do sexo e do tipo de
escola em que estudam.
4.2 - AGRESSÃO, USO DE ÁLCOOL, CONDUTAS ANTI-SOCIAIS, AJUSTAMENTO
ESCOLAR E VALORES HUMANOS: PONTUAÇÃO MÉDIA DOS ADOLESCENTES
• Agressão
Com a finalidade de testar o segundo objetivo proposto nesta pesquisa, procurou-se
cumprir dois procedimentos específicos: 1 - caracterizar os adolescentes verificando suas
pontuações médias em relação as escalas de respostas dos diferentes instrumentos utilizados
(questionários de: agressão; condutas anti-sociais; ajustamento escolar e valores) e 2 - verificar se
os participantes se diferenciam nos construtos estudados em função do sexo e do tipo de escola
em que estudam. Especificamente, o questionário de agressão utilizado, varia de 1 = Discordo
Totalmente a 5 = Concordo Totalmente, avaliando assim o grau de discordância/concordância dos
participantes às condutas agressivas descritas. No que se refere ao primeiro procedimento antes
descrito, realizou-se uma MANOVA para medidas repetidas a fim de verificar se as médias dos
estudantes nos quatro fatores de agressão apresentavam diferenças estatisticamente significativas
em relação a mediana teórica da escala (3).
Os resultados demonstram que foi observado um efeito multivariado entre os fatores de
agressão e o ponto médio teórico da escala de resposta [Lamda de Wilks = 0,57; F (4,334) =
62,54, p < 0,001]. O teste de Post Hoc realizado demonstrou índices de significância adequados
(intervalo de confiança ajustado: Bonferroni; p < 0,05), para as diferenças de média obtidas. Desta
114
forma, os participantes apresentaram um nível de agressão física (M = 2,44, DP = 0,77; p <
0,001) menor do que o ponto médio da escala (3); assim como de Raiva (M = 2,84, DP = 0,90; p
< 0,01). No fator hostilidade (M = 3,12, DP = 0,77; p < 0,05) verifica-se que a média dos
adolescentes é estatisticamente superior ao ponto mediano. No que se refere à agressão verbal,
também verificou-se que a média obtida foi inferior ao ponto médio da escala, no entanto, o nível
de significância do teste de Post Hoc revela que esta diferença não foi estatisticamente
significativa (M = 2,97, DP = 0,95; p < 1,00).
Em seguida, realizou-se uma MANOVA (2 x 2), objetivando verificar se os adolescentes
apresentariam diferenças estatisticamente significativas nos fatores de agressão (agressão física,
verbal, raiva e hostilidade), considerando como variáveis independentes o gênero (masculino e
feminino) e o tipo de escola (pública ou privada). Esta técnica estatística permite verificar a
relação entre diversas categorias de variáveis independentes discretas (VI’s) em relação a diversas
categorias de variáveis dependentes métricas (VD’s) (Tabachnick & Fidel, 2001; Hair, Anderson,
Tatham & Black, 2003). A seguir, dispõem-se primeiramente na tabela 4 as pontuações médias e
desvios-padrão dos estudantes nos fatores de agressão em função do sexo e do tipo de escola. Em
seguida, são apresentados os resultados da MANOVA.
Tabela 4: Médias e Desvios-Padrão nos fatores de Agressão em função do sexo e tipo de escola FATORES DE AGRESSÃO AGF AGV RAV HOST Grupos M DP M DP M DP M DP Sexo Feminino 2,27 0,71 3,03 0,95 2,92 0,91 3,19 0,77 Masculino 2,70 0,79 2,90 0,93 2,74 0,88 3,03 0,76 Tipo de Escola Pública 2,45 0,78 2,90 0,97 2,77 0,93 3,06 0,77 Privada 2,43 0,75 3,05 0,92 2,90 0,87 3,17 0,75 Notas: AGF: Agressão Física; AGV: Agressão Verbal; RAV: Raiva e HOST: Hostilidade.
115
Os resultados obtidos apontam que os homens declararam apresentar um maior nível de
agressão física do que as mulheres e estas, por sua vez, pontuaram mais alto do que os homens
nos outros três fatores. Já em relação ao tipo de escola, verifica-se que os alunos da escola pública
obtêm média um pouco maior no fator agressão física, e aqueles da escola privada pontuam maior
nos outros três tipos de agressão considerados. No entanto, será que estas diferenças de médias
são de fato significativas? Os resultados da MANOVA apresentados na tabela 5 abaixo permitem
responder a tal indagação.
Tabela 5: Análises Multivariadas e Univariadas dos fatores da Agressão em função do sexo e tipo de escola ANOVA MANOVA AGF AGV RAV HOST Variáveis F (4, 330) F (1, 333) F (1, 333) F (1, 333) F (1, 333) Sexo (S) 15,57*** 24,47*** 2,27 3,24 3,62 Escola (E) 2,04 0,52 2,99 1,84 1,95 S x E 0,62 0,81 0,31 0,16 0,10 Notas: Manova = análise de variância multivariada; ANOVA = análise de variância univariada; ***p< 0,001; AGF: Agressão Física; AGV: Agressão Verbal; RAV: Raiva e HOST: Hostilidade.
Como pode ser observado na tabela acima, a diferença de média verificada para a variável
sexo em relação a agressão física, foi a única estatisticamente significativa. Assim, de fato, na
expressão da agressão física verifica-se que os homens (M = 2,70, DP = 0,79) são mais
agressivos do que as mulheres (M = 2,27, DP = 0,71). Nos outros fatores, apesar das mulheres
apresentarem médias superiores as dos homens, esta diferença não é significativa, logo a
expressão de comportamentos que revelem agressão verbal, raiva e hostilidade independem do
sexo. No que se refere a variável tipo de escola, os resultados dispostos acima revelam que,
diferente do que se verifica geralmente no senso comum, a adoção de comportamentos agressivos
116
não está relacionada ao tipo de escola que o adolescente faz parte. Desta forma, a manifestação de
comportamentos agressivos seja na sua expressão física, verbal, raiva e hostilidade independe do
tipo de escola na qual o aluno está inserido. Por último, verifica-se que o efeito de interação entre
sexo e tipo de escola foi testado, no entanto, como visto na tabela acima, estas variáveis não
interagem.
Em suma, no que se refere à agressão, verifica-se que os participantes deste estudo podem
ser considerados como pessoas pouco agressivas visto que as médias obtidas nos fatores agressão
física, raiva e hostilidade foram significativamente menores do que o ponto médio teórico da
escala. Evidencia-se também que os alunos do sexo masculino apenas na agressão física,
mostram-se mais agressivos do que as mulheres e por isso, a expressão de comportamentos
agressivos a nível verbal, de raiva e hostilidade independem do sexo do adolescente. Outro
achado relevante diz respeito a variável tipo de escola, pois diferente do que se afirma usualmente
no senso comum a adoção de condutas agressivas seja física, verbal, raiva ou hostil independem
do tipo de escola em que o aluno se encontra inserido, ou seja, pública ou privada. Dando
continuidade, apresenta-se a seguir os resultados referentes as condutas anti-sociais.
• Condutas Anti-sociais
No que se refere as condutas anti-sociais, a escala de resposta varia de 0 = Nunca a 10 =
Sempre, avaliando assim a freqüência de apresentação destas condutas por parte dos respondentes.
A média empírica obtida foi inferior ao ponto mediano teórico da escala (5) (M = 2,56; DP =
1,52) e esta diferença verificada foi estatisticamente significativa [t (356) ≥ - 30,31, p < 0,0001].
Em seguida, calcularam-se as médias e desvios-padrão dos respondentes nesta escala em função
do sexo e do tipo de escola. A tabela 6 demonstra os resultados obtidos.
117
Tabela 6: Médias e Desvios-Padrão das Condutas Anti-sociais em função do sexo e tipo de escola CONDUTAS ANTI-SOCIAIS
Grupos M DP Sexo Feminino 2,18 1,21 Masculino 3,04 1,73 Tipo de Escola Pública 2,80 1,80 Privada 2,36 1,21
Como pode ser observado na tabela acima, os homens demonstram assumir um maior
número de comportamentos anti-sociais (como, por exemplo, jogar lixo no chão mesmo quando
há por perto um cesto de lixo; tocar a campainha na casa de alguém e sair correndo) do que as
mulheres, e os alunos da escola pública uma maior incidência de comportamentos anti-sociais do
que aqueles da escola privada. A fim de verificar se estas diferenças de médias apresentadas eram
de fato significativas, realizou-se uma TWO - WAY ANOVA. Os resultados desta análise são
apresentados abaixo na tabela 7.
Tabela 7: TWO - WAY Análise de Variância das Condutas Anti-sociais em função do sexo e do tipo de escola Variáveis df SS MS F
Sexo (S) 1,00 70,73 70,73 33,89*** Escola (E) 1,00 21,12 21,12 10,12** S x E 1,00 3,12 3,12 1,50 Total 3,55 853,35
Notas: **p < 0,01; ***p< 0,001;
Os resultados acima apontam que as diferenças de médias verificadas anteriormente entre
homens e mulheres e entre os alunos de escola pública e privada são de fato estatisticamente
significativas. Isso significa que os estudantes do sexo masculino assumem comportamentos anti-
sociais em maior grau do que as mulheres e que os da escola pública admitem ser mais anti-
118
sociais do que aqueles de escola privada. Não houve efeito de interação entre as variáveis sexo e
tipo de escola como pode ser visualizado pelo valor do F apresentado na tabela 7. A seguir,
apresentam-se os resultados referentes ao potencial uso de álcool.
• Potencial uso de Álcool
Em relação a esta medida, solicitou-se aos participantes que indicassem o quanto
apresentavam ou não algumas condutas relacionadas ao uso de álcool. Desta forma, atribuíram-se
os valores: 0 = para a apresentação da conduta e 1 = para a não apresentação. Sendo assim,
assim, quanto maior a pontuação do participante nesta medida menor seu envolvimento com
bebidas alcoólicas. A média empírica verificada (M = 0,94; DP = 1,15) indica que os participantes
declararam não apresentar problemas devido ao uso abusivo do álcool. Ademais, procurou-se
verificar se haveria diferenças nas respostas dos adolescentes levando em consideração as
variáveis sexo e tipo de escola. As médias dos alunos apontam uma igualdade entre os estudantes
de escola pública (M = 0,94, DP = 0,13) e privada (M = 0,94, DP = 0,17).
Quanto ao sexo, observou-se que as mulheres apresentaram uma maior média do que os
homens nesta variável. Afim de verificar se esta diferença era de fato significativa, realizou-se um
teste t de studant. Os resultados demonstraram que as mulheres apresentam uma maior média (M
= 0,97, DP = 0,10) do que os homens (M = 0,90, DP = 0,20) no posit (t = -3,54, p < 0,001), o que
significa que elas declararam menos comportamentos abusivos em relação ao álcool do que os
homens, como por exemplo: Ter dificuldade por consumir bebidas alcoólicas na escola; Causar
algum dano a alguém sob o efeito de álcool; Sentir alguma vez que era dependente ao álcool (ver
anexo 5). A seguir são apresentados os resultados referentes ao ajustamento escolar.
119
• Ajustamento Escolar
Relembrando, o ajustamento escolar foi aqui definido como um construto latente
mensurado a partir de duas variáveis observáveis: adaptação escolar e atitudes frente a escola.
Em relação a adaptação escolar, a escala de resposta varia de 1 = Completamente Falso a 5 =
Completamente Verdadeiro, a fim de verificar o quanto as situações descritas eram verdadeiras
ou não para os participantes da pesquisa. Levando em consideração a estrutura unifatorial da
escala, observou-se uma diferença estatisticamente significativa em relação ao ponto mediano
teórico (3) [M = 4,01, DP = 0,54; t (350) = -35,24, p < 0,001].
Ao considerar a segunda estrutura fatorial possível para esta escala, ou seja, aquela
composta por quatro fatores, percebe-se com base na MANOVA para medidas repetidas que
foram identificadas diferenças estatisticamente significativas nas médias obtidas para cada fator
[Wilks' Lambda = 0,57; F = 62,54 p < 0,0001]. Analogamente a pontuação referente ao fator
geral, foram verificadas médias superiores a mediana teórica da escala (3) em todos os fatores:
fator I - Êxito nas Atividades Disciplinares e nos Relacionamentos estabelecidos na escola (M =
4,33, DP = 0,72 ); fator II – Ambiente Escolar Agradável (M = 3,80, DP = 0,81); fator III -
Êxito nas Atividades Acadêmicas (M = 3,76, DP = 0,81 ) e por último, fator IV - Relação
agradável com outros Alunos (M = 4,01, DP = 0,82). Isto indica que os alunos participantes da
presente pesquisa declaram está bem adaptados a escola que fazem parte.
No que se refere a segunda medida que compõe a variável ajustamento escolar, ou seja, o
questionário de atitudes frente a escola, esta apresenta uma variação em sua escala de resposta
que vai de 1 = Discordo Totalmente a 5 = Concordo Totalmente. A média empírica dos
respondentes nesta medida foi de 3,97 (DP = 0,70) e se mostrou estatisticamente superior ao
ponto mediano teórico da escala de resposta (3), [t (361) ≥ 26,38, p < 0,001]. As médias e
120
desvios-padrão dos estudantes nas medidas do ajustamento escolar (adaptação escolar e atitudes
frente a escola) em função do sexo e do tipo de escola são apresentadas abaixo.
Tabela 8: Médias e Desvios-Padrão nas medidas do Ajustamento Escolar em função do sexo e tipo de escola AJUSTAMENTO ESCOLAR Adaptação Escolar Atitudes frente a Escola Grupos M DP M DP Sexo Feminino 4,10 0,54 4,06 0,67 Masculino 4,01 0,55 3,87 0,69 Tipo de Escola Pública 3,98 0,58 3,93 0,66 Privada 4,13 0,51 4,01 0,70
A fim de averiguar se estas diferenças nas médias dos estudantes apontadas acima eram
estatisticamente significativas, procedeu-se uma Análise de variância Multivariada (MANOVA).
Os resultados seguem abaixo.
Tabela 9: Análises Multivariadas e Univariadas das medidas do Ajustamento escolar em função do sexo e tipo de escola ANOVA
MANOVA Adaptação Escolar Atitudes frente a Escola Variáveis F (2, 345) F (1, 346) F (1, 346) Sexo (S) 3,52* 2,57 7,05** Escola (E) 3,63* 7,10* 1,43 S x E 0,06 0,06 0,05 Notas: MANOVA = análise de variância multivariada; ANOVA = análise de variância univariada; **p< 0,01; *p< 0,05.
Os resultados dispostos na tabela nove apontam que entre as médias dos alunos do sexo
masculino e feminino verifica-se diferença significativa para as atitudes frente a escola, o que não
121
ocorre em ralação a adaptação escolar. Assim, está ou não adaptado as normas e ao convívio
interpessoal na escola independe do sexo dos alunos, no entanto, em relação as atitudes escolares
verifica-se que as mulheres apresentam atitudes mais favoráveis a escola do que os homens. No
que se refere ao tipo de escola, aponta-se que alunos da escola pública apresentam-se como menos
adaptados à escola do que aqueles do ensino privado, não havendo, entretanto, diferenças
significativas ligadas às atitudes frente à escola. Logo apresentar ou não atitudes positivas frente a
escola independe do tipo de ensino em que os alunos estão envolvidos, se público ou privado.
Por último ressalta-se que não houve efeito de interação entre as variáveis sexo e tipo de
escola quanto a adaptação escolar e as atitudes frente a escola. Dando continuidade, apresentam-
se a seguir os resultados referentes aos valores humanos.
• Os valores humanos
Em relação aos valores humanos, foram verificadas as pontuações dos participantes
unicamente nas duas funções psicossociais propostas no modelo teórico adotado, a saber,
experimentação e normativo. Lembrando, esta escala de resposta varia de 0 = Totalmente não
importante a 8 = Extremamente importante, tendo o ponto mediano de 4. Os resultados
demonstraram que tanto na função de experimentação [M = 4,72, DP = 1,10; t (363) = 12,66, p <
0,001] quanto na normativa [M = 5,70, DP = 0,97; t (363) = 33,33 p < 0,001] os participantes
apresentaram médias significativamente superiores ao ponto mediano teórico da escala (4). As
médias e desvios-padrão dos estudantes nos valores de experimentação e normativos em função
do sexo e do tipo de escola são apresentados a seguir na tabela 10.
122
Tabela 10: Médias e Desvios-Padrão nos Valores de Experimentação e Normativos em função do sexo e tipo de escola FUNÇÕES VALORATIVAS Experimentação Normativa Grupos M DP M DP Sexo Feminino 4,42 0,98 5,72 0,88 Masculino 5,00 1,11 5,66 1,10 Tipo de Escola Pública 4,76 1,10 5,63 0,96 Privada 4,69 1,10 5,74 0,97
Objetivando verificar se estas diferenças de médias dos estudantes nas funções valorativas
como se apresenta na tabela 10 eram de fato estatisticamente significativas, procedeu-se uma
MANOVA. Os resultados seguem abaixo.
Tabela 11: Análises Multivariadas e Univariadas das medidas dos Valores de Experimentação e Normativos em função do sexo e tipo de escola ANOVA
MANOVA Experimentação Normativa Variáveis F (2, 356) F (1, 357) F (1, 346) Sexo (S) 21,63*** 43,35*** 0,25 Escola (E) 0,94 1,10 0,99 S x E 1,18 1,83 0,35 Notas: MANOVA = análise de variância multivariada; ANOVA = análise de variância univariada; ***p< 0,001
Como pode ser visualizado acima, unicamente as diferenças de médias obtidas em relação
as variáveis sexo e aos valores de experimentação mostraram-se significativas. Assim, pode-se
afirmar que os alunos do sexo masculino que participaram desta pesquisa atribuem maior
importância do que as mulheres aos valores de experimentação (estimulação, emoção, prazer e
123
sexual). Ou seja, eles valorizam mais do que elas a busca pela descoberta e apreciação de novos
estímulos, a vivência ou experimentação de situações com alto teor de adrenalina ou limite e
também a busca pela satisfação sexual. Neste sentido, verifica-se a priorização dos valores
normativos independe do sexo do aluno, e de forma análoga, o tipo de escola que o aluno faz
parte, não interfere na importância atribuída tanto para os valores de experimentação quanto para
os normativos.
Em resumo, percebe-se que os participantes desta pesquisa apresentam uma orientação que
permite descrevê-los como:
Pouco agressivos, exceto quanto a hostilidade, e diferentes quanto a expressão da
agressão física uma vez que os alunos do sexo masculino apresentam um maior índice
nesta categoria do que as mulheres;
Pessoas que admitem um baixo nível de comportamentos anti-sociais, verificando-se
uma maior incidência nos estudantes do sexo masculino e naqueles que fazem parte da
escola pública;
Pouco envolvimento abusivo de bebidas alcoólicas, sobretudo para as mulheres;
Alunos adaptados as normas e ao convívio interpessoal na escola, o que foi
evidenciado em maior grau nos alunos do ensino privado, bem como com atitudes
favoráveis a esta instituição, sendo estas atitudes evidenciadas primordialmente pelas
alunas.
Por fim, caracterizam-se ainda como pessoas que dão importância aos valores de
experimentação e aos normativos, verificando-se que os homens valorizam mais os
primeiros.
124
Destarte, depois de caracterizar os participantes desta pesquisa, procura-se apresentar no
tópico seguinte o quanto os construtos estudados na presente dissertação estão relacionados, o que
permite verificar as hipóteses formuladas na presente pesquisa.
4.3 - RELAÇÃO ENTRE OS CONSTRUTOS ESTUDADOS: VALORES HUMANOS,
AJUSTAMENTO ESCOLAR E CONDUTAS DE RISCO
• Os Valores Humanos e as Condutas de Risco
No primeiro conjunto de hipóteses formuladas na presente dissertação (Hipóteses 1 a 6),
procurou-se prever como os valores humanos, especificamente as funções de experimentação e
normativa explicariam as condutas de risco aqui consideradas (agressão, condutas anti-sociais e
uso de álcool). Realizaram-se assim análises de regressões múltiplas fixando-se o método
stepwise. Os resultados obtidos demonstraram que os valores de experimentação configuraram-se
como preditores frágeis para as condutas agressivas, explicando 3% de sua variância total
(R²Ajustado = 0,03; p < 0,001). O valor do Beta apontou uma relação direta e significativa com a
variável critério (β = 0,17 ; p < 0,001), o que permitiu corroborar a hipótese antes formulada
(Hipótese 1).
De forma análoga ao observado para as condutas agressivas, os resultados obtidos para as
condutas anti-sociais revelaram que os valores de experimentação apresentaram uma baixa
explicação destas condutas (5%), (R²Ajustado = 0,05; p < 0,001), sendo observado através do valor
do Beta uma relação direta e significativa com a variável critério (β = 0,22 ; p < 0,001), o que
permitiu corroborar a segunda hipótese formulada. Em seguida, para o potencial uso de álcool,
verificou-se que os valores de experimentação predizem 2% de sua variância total. Entretanto,
permitiu-se corroborar a terceira hipótese uma vez que foi verificada uma relação direta entre a
variável antecedente e conseqüente (β = 0,15 ; p < 0,001).
125
Para a função normativa, observou-se que esta explicou 4% da variância total das
condutas agressivas (R²Ajustado = 0,04; p < 0,001). A direção desta explicação foi observada
através do valor do Beta, o qual apontou uma direção inversa e significativa entre as variáveis em
questão (β = - 0,20 ; p < 0,001), sendo assim corroborada a hipótese formulada (Hipótese 4). No
que se refere as condutas anti-sociais, verificou-se que os valores normativos apresentaram um
nível de explicação razoável (14%) para a explicação da variância total desta medida (R²Ajustado =
0,14; p < 0,001). A direção observada foi negativa e significativa (β = - 0,37 ; p < 0,001) o que
está na direção hipotetizada anteriormente (Hipótese 5). Por fim, percebeu-se que os valores
normativos contribuíram com 7% para a explicação do uso potencial de álcool (R²Ajustado = 0,07; p
< 0,001) sendo a direção desta explicação negativa (β = - 0,27; p < 0,001). Estes resultados
permitem corroborar a sexta hipótese.
Em suma, de forma geral pode-se supor que possivelmente priorizar os valores de
experimentação pode ser um dos fatores relacionados a apresentação das condutas de risco
estudadas. Enquanto que assumir os valores normativos como princípio guia pode ser um fator
que iniba a manifestação de comportamentos agressivos, anti-sociais e de potencial uso de álcool.
Estes resultados, no entanto, são melhor comentados no capítulo seguinte dedicado as discussões.
A seguir, apresentam-se os resultados referentes a relação entre o ajustamento escolar e as
condutas de risco.
• O Ajustamento Escolar e as Condutas de Risco: Analisando o poder preditivo da
adaptação escolar
Como mencionado ao longo desta dissertação, optou-se por considerar o ajustamento
escolar como uma variável latente mensurada a partir da adaptação escolar e das atitudes frente a
escola. Os resultados que serão apresentados neste momento dizem respeito a relação entre a
126
primeira medida do ajustamento citada, e as condutas de risco. Neste sentido, a fim de verificar as
hipóteses elaboradas para as variáveis em questão, realizaram-se análises de regressão múltipla
fixando-se o método stepwise. A primeira hipótese desse conjunto (Hipótese 7), previa que a
adaptação escolar explicaria inversamente as condutas agressivas.
Os resultados dessa análise demonstraram que a escala de adaptação escolar, tratada
como variável antecedente configurou-se como uma variável preditora adequada para as condutas
agressivas, explicando 10% de sua variância total (R²Ajustado = 0,10; p < 0,001). O valor do Beta
permitiu corroborar a hipótese antes formulada (Hipótese 7), revelando que o modelo explicativo
demonstrado apresentou uma relação inversa e significativa com a variável critério (β = - 0,32 ; p
< 0,001). Assim, quanto mais adaptado as normas escolares e ao convívio interpessoal com os
professores e outros alunos da escola, possivelmente menor será a possibilidade do adolescente se
comportar de forma agressiva.
A fim de verificar quais os fatores da adaptação escolar estariam de fato contribuindo
para a explicação das condutas agressivas, realizou-se uma outra análise de regressão
considerando os quatro fatores que compõem esta medida (Fator I - Êxito nas Atividades
Disciplinares e nos Relacionamentos estabelecidos na escola; Fator II – Ambiente Escolar
Agradável; Fator III - Êxito nas Atividades Acadêmicas; Fator IV – Relação agradável com
outros Alunos). Os resultados desta análise podem ser visualizados na tabela que se segue.
127
Tabela 12: Regressão Linear Múltipla das Condutas Agressivas, tendo como preditores os fatores da Adaptação Escolar
Condutas Agressivas
Preditores R2 ajustado F Beta t
Fator 1 0,11 F(1; 329) = 43,96*** -0,34 -6,63***
Fatores 1 e 4 0,14 F(2; 328) = 27,87*** -0,17 -3,24***
Notas: Fator 1 = Êxito nas Atividades Disciplinares e nos Relacionamentos estabelecidos na escola; Fator 4 = Relação agradável com outros Alunos; ***p < 0,001
Na tabela acima, verifica-se que dos 4 fatores da escala de adaptação escolar tratados
como variáveis antecedentes, os fatores 1 (Êxito nas Atividades Disciplinares e nos
Relacionamentos estabelecidos na escola) e 4 (Relação agradável com outros alunos)
configuram-se como variáveis preditoras das condutas agressivas, explicando conjuntamente 14%
da variância total (R = 0,38 ; R²Ajustado = 0,14; p < 0,001). O primeiro fator apresentou uma
contribuição maior para o modelo explicativo (R²Ajustado = 0,11; p < 0,001), representando 11% da
variância das condutas agressivas. O valor do Beta permite verificar que de forma análoga ao
obtido com a estrutura unifatorial antes discutida, os dois modelos explicativos aqui demonstrados
(Modelo 1: fator 1 e Modelo 2: fatores 1 e 4) apresentam uma relação inversa e significativa
com a variável critério (β = - 0,34 ; p < 0,001; Modelo 1); (β = - 0,17 ; p < 0,001; Modelo 2).
Desta forma supõe-se que os alunos bem-sucedidos nas questões disciplinares estabelecidas na
escola bem como nos relacionamentos com as pessoas que também fazem parte da escola,
possivelmente apresentarão um menor índice de comportamentos agressivos.
Dando continuidade, os resultados obtidos a respeito da adaptação escolar e das condutas
anti-sociais revelaram que a adaptação escolar explicou adequadamente 21% da variância total
referente as condutas anti-sociais (R²Ajustado = 0,21; p < 0,001). A direção desta relação foi
observada através do valor do Beta (β) o qual demonstrou uma relação inversa e significativa
128
entre a adaptação escolar e as condutas anti-sociais (β = - 0,46; p < 0,001), corroborando desta
forma a Hipótese 8. Igualmente ao procedimento adotado para as condutas agressivas, procurou-
se verificar quais fatores da adaptação escolar se mostravam adequados na explicação das
condutas anti-sociais. Os resultados obtidos foram:
Tabela 13: Regressão Linear Múltipla das Condutas Anti-sociais, tendo como preditores os fatores da Adaptação Escolar
Condutas Anti-sociais
Preditores R2 ajustado F Beta t
Fator 1 0,17 F(1; 345) = 72,22*** -0,42 -8,50***
Fatores 1 e 2 0,22 F (2; 344) = 50,79*** -0,24 -4,94***
Fatores 1, 2 e 3 0,23 F (3; 343) = 36,64*** -0,13 -2,58***
Fatores 1, 2, 3 e 4 0,24 F (4; 342) = 29,02*** -0,14 -2,83***
Notas: Fator 1 = Êxito nas Atividades Disciplinares e nos Relacionamentos estabelecidos na escola; Fator II – Ambiente Escolar Agradável; Fator III - Êxito nas Atividades Acadêmicas; Fator 4 = Relação agradável com outros Alunos; ***p < 0,001.
Nesta tabela, observa-se que os quatro fatores da escala de adaptação escolar fizeram
parte da equação de regressão, explicando conjuntamente 24% da variância total referente as
condutas anti-sociais (R²Ajustado = 0,24; p < 0,001). Os valores do Beta (β) obtidos para os quatro
modelos explicativos possíveis, demonstraram uma relação inversa e significativa entre está
adaptado a escola e apresentar comportamentos anti-sociais.
No que se refere a Hipótese 9, previu-se que a adaptação escolar explicaria inversamente
o uso potencial de álcool. Assim, igualmente ao procedimento efetuado para as condutas
agressivas e anti-sociais, realizou-se inicialmente uma análise de regressão múltipla,
considerando como preditor o fator geral da adaptação escolar. Os resultados obtidos revelaram
não ser possível a verificação de relação entre estas variáveis em questão. Em seguida, procurou-
se averiguar, como se configurava a predição dos fatores da adaptação escolar na explicação do
129
uso potencial de álcool. Assim, realizou-se uma análise de regressão múltipla considerando os
quatro fatores que representam a escala de adaptação escolar.
De acordo com o obtido nos resultados, unicamente o fator I da escala de adaptação
escolar fez parte do modelo explicativo para o potencial uso de álcool. O nível de predição
verificado foi de 3% (R²Ajustado = 0,03; p < 0,001). O valor do Beta revela que esta explicação se dá
de forma oposta (β = - 0,05 ; p < 0,001). Dando continuidade expõe-se a seguir os resultados
referentes as atitudes frente a escola.
• O Ajustamento Escolar e as Condutas de Risco: Analisando o poder preditivo das
atitudes frente a escola
Em relação as atitudes frente a escola e as condutas de risco, formularam-se três hipóteses
as quais previam uma explicação oposta destas condutas pelas atitudes escolares (ver Hipóteses
10, 11 e 12). Os resultados demonstram que as atitudes frente a escola configuraram-se como uma
variável de baixa predição para as condutas agressivas, explicando 2% de sua variância total
(R²Ajustado = 0,02; p < 0,05). Verifica-se ainda que o valor do Beta aponta uma direção oposta
dessa explicação (β = - 0,44; p < 0,001) o que corrobora a hipótese 10 formulada.
Observaram-se parâmetros similares quanto as condutas anti-sociais e a atitude frente a
escola. Relembrando, postulou-se que a atitude positiva frente a escola explicaria de forma
inversa as condutas anti-sociais (Hipótese 11), o que foi corroborado. A atitude frente a escola
apresentou um índice explicativo das condutas anti-sociais de 16% (R²Ajustado = 0,16; p < 0,001) e
através do valor do Beta (β = - 0,89; p < 0,001), verificou-se que estas variáveis encontram-se
inversamente relacionadas, ou seja, quanto mais os estudantes possuem uma atitude favorável
frente à escola, possivelmente tenderão a apresentar menos comportamentos considerados como
anti-sociais.
130
Por fim, as atitudes frente à escola explicaram 4% da variância total do uso potencial de
álcool (R²Ajustado = 0,04; p < 0,001). Esta explicação se deu de forma inversa (β = - 0,21; p <
0,001), tal como se previa (ver Hipótese 12).
131
Capítulo V – Discussão
132
A presente dissertação teve como objetivo principal verificar em que medida o
comprometimento dos adolescentes com a sociedade convencional (adoção dos valores
normativos e ajustamento escolar) poderia prevenir a apresentação dos comportamentos
agressivos, anti-sociais e de uso de álcool. Assim, foram propostos três objetivos específicos: 1)
Comprovar a adequação psicométrica de duas medidas: Escala de Adaptação Escolar e Escala de
Atitudes frente à Escola; 2) Verificar as pontuações dos adolescentes nas medidas empregadas,
procurando compará-las em função do sexo e do tipo de escola e finalmente, 3) Verificar o quanto
os valores humanos e o ajustamento escolar explicam os comportamentos de risco. Espera-se que
estes objetivos tenham sido alcançados.
Antes de iniciar a discussão dos resultados, faz-se necessário apontar que as condutas de
risco aqui estudadas configuram-se como comportamentos bastante complexos, pois, tratam-se de
problemáticas multidimensionais. Verifica-se na literatura diversos estudos que procuram explicar
tais comportamentos salientando distintas causas possíveis: biológicas, psicológicas, sociais,
econômicas e culturais para os comportamentos agressivos (ver, por exemplo, Andrade 2003;
Freud; Halfpap, 1999; Johnson 1979; Kristensen & cols, 2003; Lorenz, 1995), anti-sociais
(Formiga, 2002; Meneghel, Giugliani & Falceto, 1998; Palácios, 1995; Pimentel, 2004; Rhee &
Waldman, 2002; Vasconcelos; 2004) e de uso de álcool (ver principalmente coellho Júnior
(2001); Masur, 1990), o que explica em parte, a força preditiva dos valores humanos e do
ajustamento escolar para as condutas de risco consideradas. É preciso considerar ainda que
explicar ou identificar as causas destes comportamentos configura-se como uma atividade
complexa, uma vez que tais condutas possuem um “duplo caráter”, ou seja, são frequentemente
desencorajadas por boa parte dos pais, familiares e instituições educacionais, por exemplo, e ao
mesmo tempo são vistas em alguns grupos sociais, de círculos de amizades e até mesmo na
escola, como comportamentos desejáveis que representam um certo status ou demonstram poder.
133
Assim, quiçá um dos grandes desafios seja anterior a explicação de suas causas: conseguir definir
como se caracterizam de fato tais condutas.
Frente a exposição levantada, considerou-se que os valores humanos e o ajustamento
escolar seriam duas variáveis relevantes a explicação de tais condutas e que representariam o
compromisso dos adolescentes com a sociedade convencional. Estas relações foram discutidas na
revisão da literatura realizada ao longo desta dissertação. Antes de comentar os resultados
apresentados a respeito da relação destas variáveis, discutem-se a seguir as características
psicométricas das medidas utilizadas na avaliação do ajustamento escolar.
5.1 - COMPROVAÇÃO DOS PARÂMETROS PSICOMÉTRICOS
Com base nos resultados pode-se ressaltar que as medidas consideradas apresentam
parâmetros psicométricos adequados, sendo possível sua utilização em pesquisas futuras.
Entretanto, não se pretende afirmar que os resultados aqui obtidos possam ser generalizáveis para
além do escopo da amostra considerada. Como exposto no método tratou-se de uma amostra não
probabilística. Novos estudos poderiam ser úteis para confirmar a adequação dos índices aqui
obtidos. Em relação as escalas, especificamente, apresentam-se algumas considerações abaixo.
• Escala de Adaptação Escolar
No período em que a presente pesquisa foi delineada, não foi encontrado nenhum
instrumento que avaliasse a adaptação dos estudantes a escola para o presente contexto. Desta
forma, procurou-se verificar em que medida esta escala, desenvolvida e testada originalmente
pelo Conduct Problems Prevention Research Group (CPPRG) (1997) seria adequada para avaliar
a adaptação escolar dos estudantes no contexto em que esta pesquisa se insere.
134
Os resultados demonstraram que os itens no presente contexto se agruparam de forma
distinta do que se verificou nos estudos de Gremaud, (2000) e Corrigan (2003). A versão
estadunidense conta com uma estrutura fatorial compota por três dimensões: 1) Relação com os
outros alunos 2) Dificuldades Acadêmicas e Disciplinares e 3) Aspectos gerais acerca da escola e
dos professores, enquanto que na presente pesquisa verificou-se ser viável duas estruturas
fatoriais: uma composta por quatro fatores: 1) Êxito nas Atividades Disciplinares e nos
Relacionamentos estabelecidos na escola; 2) Ambiente Escolar Agradável; 3) Êxito nas
Atividades Acadêmicas; 4) Relação agradável com outros Alunos; e outra unifatorial denominada
de Adaptação Geral.
Quanto aos índices de consistência interna (Alfa de Cronbach) verificados na estrutura
composta por quatro fatores (α1 = 0,68; α2 = 0,52; α3 = 0,59 e α4 = 0,44), ressalta-se que segundo
Pasquali (2003), o número de itens que compõem um fator afeta consideravelmente sua
fidedignidade. Assim, quanto maior for o número de itens por fator, maior será o seu índice de
precisão, já que o erro tenderá a zero de acordo com o teorema de Bernoulli. Neste sentido, o
aumento da fidedignidade associado ao aumento do número de itens paralelos (ou seja, itens que
meçam o mesmo traço latente do fator) é verificado através da fórmula de Spearman-Brown (para
maiores esclarecimentos, ver Pasquali, 2003, p 222-223):
n r tt rTT =
1 + (n-1)rttOnde, rTT:Fidedignidade do teste aumentado; rtt: Fidedignidade do teste original; n: número de vezes em que o teste original foi aumentado.
135
Desta forma, considerando, por exemplo, o índice de consistência interna obtido para o
Fator IV (Relação agradável com outros Alunos: α4 = 0,44), verifica-se através da fórmula de
Spearman-Brown que se fossem acrescidos 3 itens a este fator, o Alfa de Cronbach passaria de
0,44 para 0,61 o que seria um aumento considerável na precisão do fator. Assim, acredita-se que
seria adequado em pesquisas futuras a inclusão de itens paralelos nesta escala a fim de se
averiguar se este impasse com os índices de precisão seriam solucionados. Dando continuidade,
dispõe-se a seguir os comentários acerca da escala de atitudes frente a escola.
• Escala de atitudes frente a escola
No que se refere a escala de atitudes frente à escola desenvolvida originalmente por
Cheng e Chan (2003), verificou-se na presente pesquisa, tal como observado no estudo original,
que esta medida se estruturou adequadamente de forma unifatorial, contando com a participação
de todos os itens. Como pode ser visualizado nos resultados apresentados, os itens demonstraram
saturações adequadas (variando de 0,35 a 0,75) e consistência interna moderada (α = 0,73). Desta
forma, os resultados aqui obtidos possibilitam confirmar a validade e fidedignidade desta medida
para o contexto em que se insere a presente dissertação. Ressalta-se ainda que os instrumentos
direcionados a medir os comportamentos agressivos, o uso de álcool e os valores humanos, foram
previamente validados. A seguir, dispõem-se os comentários a respeito das relações entre as
variáveis consideradas.
136
5.2 – AGRESSÃO, USO DE ÁLCOOL, CONDUTAS ANTI-SOCIAIS, AJUSTAMENTO
ESCOLAR E VALORES HUMANOS: PONTUAÇÃO MÉDIA DOS ADOLESCENTES
Um número considerável de estudos tem procurado verificar a diferença no nível de
comportamentos agressivos entre homens e mulheres (ver, por exemplo, Buss & Perry, 1992;
Harris, 1996; Lahey & cols., 2000; Lancelotta & Vaughn, 1989; Tomada & Schneider, 1997).
Neste sentido, Buss e Perry (1992), autores do questionário de agressão utilizado na presente
dissertação, verificaram para o contexto estadunidense, pontuações mais altas para os homens do
que para as mulheres no fator geral da agressão e em três dos quatro fatores específicos
(agressão física, verbal e hostilidade). A dimensão afetiva da agressão, ou seja, o fator raiva foi o
único que não se mostrou significativo naquele contexto. Outros estudos utilizando o questionário
de agressão proposto por Buss e Perry (1992) foram realizados em diferentes culturas e grupos de
pessoas os quais encontraram resultados semelhantes quanto aos índices de agressão para homens
e mulheres. Pode-se citar, por exemplo:
O estudo de Willimas, Boyd, Cascardi e Poythress (1996) realizado numa amostra de
presidiários estadunidenses. Nesta pesquisa, os homens apresentaram um maior nível de
agressão física (M = 24,1, DP = 7,7) do que as mulheres (M = 20,8, DP = 7,6) [F (1,98) =
8,67, p < 0,05]. Não foram indicadas diferenças significativas para os outros fatores;
Na Alemanha, Collani e Werner (2005), verificaram diferenças entre homens e mulheres
quanto a agressão, considerando duas amostras: a) População geral. Os homens
obtiveram maior índice de agressão física do que as mulheres [M = 15,5 (homens); M =
14,0 (mulheres); t (215) = 2,97, p < 0,01] e estas, maior nível de raiva [M = 15,9
(mulheres); M = 14,8 (homens); t (410) = - 2,32, p < 0,02] do que os homens; b) Amostra
mista: participantes da população geral e estudantes. Na pontuação geral da agressão
137
os homens obtiveram médias superiores (M = 70,4, DP = 14,9) do que as mulheres (M =
67,4, DP = 14,2) [t (390) = 2,02, p < 0,04]. O mesmo se observou para dois fatores
específicos: na agressão física - homens (M = 18,5, DP = 6,6) e mulheres (M = 14,9, DP =
4,7) [t (394) = 6,30, p < 0,001]; na agressão verbal - homens (M = 14,8, DP = 3,6) e
mulheres (M = 14,4, DP = 3,6) [t (399) = 2,06, p < 0,04];
Na Espanha García-León e cols. (2002), observaram que os homens (amostra composta
por estudantes universitários) apresentaram médias superiores (M = 13,2, DP = 5,5) a
obtida pelas mulheres (M = 11,0, DP = 4,0) na agressão física [F (1,370) = 16,61, p <
0,001] e verbal: homens (M = 22,8, DP = 5,4) mulheres (M = 21,1, DP = 4,4) [F (1,363) =
7,94, p < 0,01]. Enquanto que as mulheres pontuaram mais alto (M = 28,7, DP = 7,0) do
que os homens no fator raiva (M = 24,9, DP = 7,3) [F (1,359) = 17,64, p < 0,001];
Por fim, os resultados obtidos na Itália com uma amostra de estudantes universitários e de
ensino médio, por Fossati, Maffei, Acquarini e Di Ceglie (2003), descreveram a pontuação
dos homens como mais alta do que a das mulheres na agressão física [F (1,951) = 109,10,
p < 0,001]. Não sendo verificada diferença significativa nos outros fatores.
Em resumo, estes estudos indicam que os homens apresentam maiores índices de agressão
do que as mulheres nos fatores: agressão geral (2 estudos: 1 - Buss & Perry 1992 nos Estados
Unidos; 2 - Collani & Werner 2005, na Alemanha); agressão física (todos os estudos
mencionados acima), agressão verbal (3 estudos: 1 - Buss & Perry 1992, nos Estados Unidos; 2 -
Collani & Werner 2005, na Alemanha e 3 - García-León & cols. 2002; na Espanha) e em
hostilidade (1 estudo: Buss & Perry 1992). Enquanto que as mulheres aparecem como mais
138
agressivas do que os homens unicamente no fator raiva (2 estudos: 1 - Collani & Werner 2005,
na Alemanha ; 2 - García-León & cols. 2002, na Espanha).
Os resultados obtidos na presente dissertação apontam uma direção similar ao observado
nos estudos comentados acima, que os homens (M = 2,70, DP = 0,79) apresentam maior
pontuação em agressão física do que as mulheres (M = 2,27, DP = 0,71) [F (1,33) = 24,47, p <
0,001]. Especificamente, observa-se que igualmente ao verificado nas pesquisas de Willimas,
Boyd, Cascardi e Poythress (1996) com uma população carcerária dos Estados Unidos e por
Fossati, Maffei, Acquarini e Di Ceglie (2003) na Itália, o fator agressão física foi o único
significativamente diferente entre homens e mulheres.
Estes resultados parecem ser consoantes com outras pesquisas realizadas no Brasil. As
informações do Ministério da Saúde (MS, 2004) indicam que em relação aos homicídios, por
exemplo, há fortes indícios de que os homens aderem mais a este comportamento do que as
mulheres, na razão aproximada de 10:1 homicídios. Recentemente, numa consulta ao MS (2006),
verificou-se que os homens são responsáveis por mais de 50% dos atos de violência no Brasil.
Nesta direção, estudos como os realizados pelo departamento de biologia do Instituto Oswaldo
Cruz, têm procurado entender as causas da agressão.
Mas, o que leva de fato os homens a se comportarem de forma mais agressiva do que as
mulheres? Esta, no entanto, não é uma pergunta tão simples de se responder. Como mencionado
no inicio deste capitulo de discussão, este é um comportamento multideterminado e assim,
encontrar suas causas deve demandar um esforço dos pesquisadores em desenvolver sucessivas
pesquisas a fim de verificar quais fatores de fato contribuem e quais não são tão importantes nesta
explicação. Neste sentido, a presente pesquisa procurou apontar o quanto os valores humanos e o
ajustamento escolar podem contribuir na explicação destas condutas. A discussão específica sobre
esta relação é apresentada no tópico seguinte (sobre a relação entre os construtos estudados).
139
Além da influência do sexo nos comportamentos agressivos procurou-se averiguar o
quanto o tipo de escola (pública ou privada) influenciaria nas condutas agressivas. Neste sentido,
verifica-se que as pesquisas voltadas ao estudo da agressão ou violência na escola ainda são
escassas. Sobre este aspecto, Sposito (2001) apresenta uma revisão das pesquisas que estudam a
violência escolar no Brasil, sobretudo nos centros urbanos, a partir da década de 1980. Nesta,
aponta que considerando os trabalhos de pós-graduação, por exemplo, tem crescido o número de
pesquisas nas ciências sociais a respeito da violência, não sendo encontradas, no entanto,
pesquisas voltadas especificamente para a violência escolar. Os seguintes números são relatados
pela autora:
1 - Dentre as 8.667 teses e dissertações produzidas entre 1980 e 1998 em toda a pós-
graduação em Educação no Brasil, verifica-se que somente nove investigaram o tema da violência
escolar;
2 - Nas Ciências Sociais, a autora considera a produção de onze Programas de pós-
graduação (abarcando centros de intensa produção como Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais,
Santa Catarina e Rio Grande do Sul). Nestes, verifica que no mesmo período descrito acima
nenhuma dissertação ou tese de doutorado foi defendida sobre o tema, de uma relação total de
2.495 pesquisas desenvolvidas;
3 - Quanto as pesquisas desenvolvidas pelo poder púbico a autora expõe dados entre 1980
e 2000, verificando que nesse espaço de vinte anos nenhum programa nacional de combate a
violência escolar foi de fato posto em prática. Especificamente, ressalta que a FAPESP, principal
agência de pesquisas do estado de São Paulo, lançou no início de 1996 um programa especial de
pesquisas sobre a escola pública. Entretanto, até fevereiro de 2001 foram contemplados 65
projetos de um total de 279 inscrições. Nenhuma destas propostas encaminhadas teve como tema
a violência escolar.
140
Em meio a esta escassez na literatura a respeito da agressão escolar, verifica-se que a
UNESCO tem procurado desenvolver pesquisas a este respeito. Em 2004, Abramovay e Rua,
consultoras do banco mundial e da UNESCO respectivamente, organizaram a quarta edição do
livro: Violências nas escolas. Este é fruto de pesquisas realizadas pela UNESCO em 14 estados do
Brasil (Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Distrito Federal, Goiás, Mato grosso,
Pará, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Santa Catarina e São Paulo) e abarca as
seguintes temáticas: 1 - Revisão da literatura a respeito da violência na escola; 2 - O ambiente
escolar; 3 - O funcionamento e as relações sociais na escola; 4 - A escola e as variáveis exclusão
social e racismo; 5 - As violências verificadas nas escolas apontando os perpetradores e as vítimas
e por último, 6 - As repercussões e as soluções alternativas para a questão da violência na escola.
Percebe-se assim, um esforço em procurar entender os fatores relacionados a violência na
escola. No entanto, apesar da citada pesquisa considerar tanto escolas públicas quanto privadas na
composição da amostra, não foi objetivo dela averiguar se haveria diferenças no nível de agressão
manifestado pelos alunos de ambos contextos. Neste sentido, acredita-se que a presente pesquisa
pode representar uma contribuição relevante.
Em relação aos comportamentos agressivos, esta dissertação procurou verificar se o tipo
de escola na qual o aluno está inserido influenciaria o nível de comportamento agressivo
apresentado. Os resultados obtidos ressaltam que para a amostra considerada, a adoção de
comportamentos agressivos independe da variável tipo de escola. Este achado é importante
principalmente por colocar em cheque uma máxima que ainda parece vigente, sobretudo no senso
comum: a de que a agressão escolar está ligada diretamente as condições econômicas
desfavoráveis e, por conseguinte as escolas públicas. Recomenda-se, no entanto, que em estudos
futuros a variável tipo de escola possa ser analisada em conjunto com alguma medida que avalie a
classe social adequadamente para assim averiguar a influência destas duas variáveis frente à
141
agressão. Ademais, é preciso considerar ainda as diferentes situações de ensino público e privado,
sobretudo em relação ao turno pesquisado. Nesta dissertação, optou-se por trabalhar com
adolescentes de 11 a 17 anos sendo desta forma considerados os turnos diurnos. Sugere-se que em
pesquisas futuras sejam considerados também a população escolar jovem e adulta que freqüenta a
escola no período noturno, para assim averiguar se em todos os turnos, tanto nas escolas públicas
quanto privadas o padrão de agressão se diferencia.
Em relação a segunda conduta de risco estuda, as anti-sociais, é válido relembrar que
estas se referem ao não cumprimento de normas sociais que pautam o convívio das pessoas no
dia-a-dia e não a transgressão de normas legais (às leis). São condutas que têm como uma das
características o fato de incomodarem, mas sem que causem necessariamente danos físicos a
outras pessoas. Pode-se citar como exemplos de tais condutas: responder mal a um superior ou
autoridade (no trabalho, na escola ou na rua); arrancar ou pisar flores ou plantas em parques ou
jardins; incomodar pessoas desconhecidas ou fazer desordens em lugares públicos. Na presente
dissertação verificou-se que tanto a variável sexo, quanto tipo de escola contribuíram para as
diferenças adotadas nestes comportamentos. Como pode ser visto nos resultados, os homens
assumem um maior grau de comportamentos anti-sociais (M = 3,04, DP = 1,73) do que as
mulheres (M = 2,18, DP = 1,21) [F = 33,89, p < 0,001]. Neste mesmo contexto, a pesquisa
realizada por Vasconcelos (2004) aponta o mesmo padrão de diferença entre homens e mulheres
[F = 15,89, p < 0,001].
Mas, porque estas diferenças entre homens e mulheres ocorrem? Uma explicação provável
pode está relacionada aos fatores envolvidos no processo de socialização, visto que a menina é
comumente educada para o diálogo, enquanto que o menino é educado para a ação (Schneider,
2001).
142
Quanto ao tipo de escola, os resultados apontaram que os alunos da escola pública
admitem ser mais anti-sociais (M = 2,80, DP = 1,80) do que os da escola privada (M = 2,36, DP =
1,21) [F = 10,12, p < 0,05]. Diversos fatores podem está relacionados a este aspecto, uma vez que
como discutido ao longo desta dissertação, as condutas anti-sociais são multideterminadas. No
entanto, três fatores podem ser importantes: o contexto familiar; a organização estrutural da
escola; e a participação ou a cobrança dos pais na escola. Estas são variáveis que podem ser
consideradas futuramente em estudos a respeito das condutas anti-sociais.
Por fim, a terceira variável considerada para medir as condutas de risco foi o uso
potencial de álcool. Os resultados a este respeito revelaram diferença significativa unicamente
nas médias para a variável sexo. Verificou-se que as mulheres declararam ter menos problemas
como: perder dias de aula ou chegar atrasado por ter consumido álcool; discutir seriamente com
amigos ou familiares pelo uso que faz de bebidas alcoólicas; e ter dificuldade de relacionamento
com os amigos devido as bebidas alcoólicas que consome, do que os estudantes do sexo
masculino. Este resultado é bastante coerente com o que se encontra na literatura a respeito das
diferenças entre homens e mulheres quanto ao consumo/abuso de álcool (ver, por exemplo,
Nolen-Hoeksema, 2004).
É válido ressaltar que apesar de se encontrar um menor número de casos de mulheres que
tenham problemas devido ao uso abusivo do álcool, os fatores considerados de risco neste
envolvimento abusivo, são na verdade, mais similares do que diferentes para homens e mulheres.
Ainda assim, as mulheres são menos suscetíveis aos fatores de risco que levam ao envolvimento
abusivo de álcool. Entretanto, quando as mulheres apresentam problemas devido ao uso abusivo
de álcool as conseqüências são mais danosas do que as verificadas para os homens. Pode-se citar
como exemplo, dois aspectos: a) as mulheres têm mais problemas de saúde do que os homens
devido ao consumo abusivo de álcool. Baixas doses de álcool para mulheres dependentes causam
143
efeitos negativos no funcionamento cognitivo e motor e problemas reprodutivos em maior grau do
que nos homens; 2 - os homens sofrem menos sanções sociais do que as mulheres, e este pode ser
possivelmente um dos fatores que acabam inibindo as mulheres de desenvolverem a dependência
alcoólica (Nolen-Hoeksema, 2004).
Dando continuidade discute-se a partir desse momento a influência das variáveis sexo e
tipo de escola para as duas variáveis consideradas como antecedentes neste estudo: o
ajustamento escolar e os valores humanos. Relembrando, para avaliar o ajustamento do aluno a
escola utilizaram-se duas variáveis observáveis: a adaptação escolar e as atitudes frente a escola.
No que se refere a adaptação escolar verificou-se que a variável sexo parece não ser
decisiva, visto que os adolescentes do sexo masculino e feminino não se diferenciaram nesta
medida. Por outro lado, para a variável tipo de escola, percebeu-se que os alunos da escola
privada apresentaram uma maior adaptação escolar do que aqueles da escola pública. No que se
refere as atitudes frente a escola, verificou-se exatamente o inverso: houve diferença
significativa para a variável sexo, sendo as mulheres as que apresentaram um maior índice e já em
relação ao tipo de escola, não foi verificada diferença significativa. Num primeiro momento, estes
resultados parecem apresentar uma contradição teórica, pois segundo o que propõe a literatura
acerca das atitudes, estas são caracterizadas como uma predisposição comportamental. Assim,
seria coerente esperar que uma maior atitude frente a escola (medida atitudinal), levasse a uma
maior adaptação escolar (comportamento propriamente dito).
Entretanto, tal como apresentado na discussão teórica desta dissertação a respeito das
atitudes, ao assumir uma atitude não significa que fatalmente o sujeito irá se comportar de forma
coerente com ela. Existem outros fatores que devem ser considerados tal como aponta Triandis a
respeito dos achados de La Píere. Aquele autor ressalta que faz-se necessário entender que as
atitudes envolvem o que as pessoas pensam, sentem e como elas gostariam de se comportar frente
144
a um objeto atitudinal. Assim, o comportamento não é apenas determinado pelo o que as pessoas
gostariam de fazer, mas também pelo o que elas pensam que devem fazer, ou seja, as normas
sociais, os hábitos, e também as conseqüências esperadas pelo seu comportamento (Rodrigues,
Assmar & Jablonski, 2001).
Dentro desta perspectiva, verifica-se que não há inconsistência teórica no fato das
mulheres apresentarem uma atitude favorável a escola, mas em contrapartida não expressarem
comportamentos que as caracterizem como adaptadas as normas e relacionamentos interpessoais
vivenciados na escola. Da mesma forma, aponta-se que embora os homens não assumam atitudes
positivas ou favoráveis a escola, podem assumir comportamentos que os caracterize como
adaptados uma vez que possivelmente, eles estejam levando em consideração as normas sociais,
ou também as conseqüências esperadas pelo seu comportamento.
Por último, no que se refere as funções psicossociais dos valores humanos consideradas,
experimentação e normativa, verificou-se que unicamente para os valores de experimentação
foram encontradas diferenças significativas quanto a variável sexo. Nesta, conforme o esperado,
os homens apresentaram pontuações maiores do que as mulheres. Este resultado pode está
diretamente relacionado ao aspecto de socialização uma vez que freqüentemente, observa-se que
ainda hoje os homens são mais incentivados do que as mulheres a buscarem a descoberta de
novos estímulos, a enfrentarem situações com alto teor de adrenalina ou limite como também a
buscarem satisfação sexual.
Para os valores normativos, apesar das mulheres apresentarem uma maior média do que os
homens, esta diferença não foi significativa. Além desta, verificou-se que embora os estudantes da
escola pública tenham declarado valorizar mais os valores de experimentação e os da escola
privada os normativos, esta diferença também não foi significativa. Quanto ao primeiro aspecto,
dada as mudanças historicamente verificadas no papel da mulher dentro da sociedade, talvez, ela
145
esteja deixando de dá uma maior ênfase do que os homens para valores como: religiosidade,
tradição e obediência. Isto não quer dizer necessariamente que as mulheres no atual contexto
deixaram de enfatizar a vida social, de priorizar os comportamentos socialmente corretos e
respeitar símbolos e padrões culturais. Pode apenas ser um indício de que estas não assumem com
mais intensidade do que os homens estes valores adotando-os como princípio-guia para sua vida.
A seguir, dispõem-se as discussões a respeito das relações verificadas entre os valores e as
condutas de risco como também a respeito do poder preditivo do ajustamento escolar para estas
condutas.
5.3 - RELAÇÃO ENTRE OS CONSTRUTOS ESTUDADOS: VALORES HUMANOS,
AJUSTAMENTO ESCOLAR E CONDUTAS DE RISCO
No tocante aos construtos estudados, procurou-se verificar como os valores humanos e o
ajustamento escolar (variáveis antecedentes) estavam relacionados com as condutas de risco:
agressão, uso de álcool e condutas anti-sociais (variáveis conseqüentes). Neste sentido, foram
estabelecidos dois conjuntos de hipóteses. O primeiro buscando apontar o poder preditivo dos
valores humanos em relação às condutas de risco (Hipóteses 1 a 6) e o segundo referente ao
quanto o ajustamento escolar (adaptação escolar e atitudes frente a escola) poderia ser entendido
como preditor adequado das condutas de risco (Hipóteses 7 a 12). Os resultados obtidos são
discutidos nos tópicos a seguir.
• Os Valores Humanos e as Condutas de Risco
No que se refere a explicação das condutas de risco (agressão, condutas anti-sociais e uso
potencial de álcool) por parte dos valores (experimentação e normativo), os resultados permitiram
corroborar as hipóteses elaboradas. Especificamente, verificou-se que a função psicossocial de
146
experimentação apresentou uma explicação positiva e significativa para as condutas de risco e que
os valores normativos o fizeram de forma inversa.
No tocante a primeira conduta de risco considerada, a agressão, verificou-se que os
valores de experimentação se configuraram como preditores frágeis, dada a explicação de 3% da
variância total das condutas agressivas (R²Ajustado = 0,03; p < 0,001) sendo, entretanto, sua relação
com esta medida direta e significativa (β = 0,17 ; p < 0,001). Assim, uma vez que os valores
humanos são aqui definidos como critérios de orientação para as condutas pode-se supor que os
adolescentes que priorizam os valores de experimentação possivelmente podem está mais
propensos a adotar condutas agressivas.
Quanto aos valores normativos, verificou-se uma explicação inversa e significativa com a
agressão, sendo esta explicação pouco expressiva (R²Ajustado = 0,04; p < 0,001; β = - 0,20 ; p <
0,001). Desta forma, dá prioridade aos valores normativos pode levar a pensar que seja um dos
fatores que levam os adolescentes a não assumirem comportamentos agressivos. Ou seja, este
pode ser um indicador de que assumir como princípio guia a ênfase na vida social, na busca de
estabilidade do grupo, nos comportamentos socialmente corretos e no respeito pelos símbolos e
padrões culturais, pode contribuir um pouco para a inibição dos comportamentos agressivos.
Tremblay e Ewart (2005) verificaram um padrão de relação semelhante ao descrito acima
para os valores humanos e os comportamentos agressivos. Na citada pesquisa os autores
utilizaram a versão reduzida do questionário de agressão de Buss e Perry (1992) proposta por
Bryant e Smith (2001) e o questionário de valores de Schwartz. Os resultados revelaram que o
tipo motivacional de estimulação apresentou uma relação direta com a agressão física (r = 0,21, p
< 0,05) e verbal (r = 0,21, p < 0,05) e o de poder o fez com a agressão física (r = 0,22, p < 0,05).
Verificou-se ainda que o tipo motivacional de conformidade relacionou-se inversamente com a
agressão verbal (r = - 0,24, p < 0,05). Desta forma, dada a compatibilidade entre os valores de
147
estimulação (Schwartz) e poder (Schwartz) com os de experimentação (Gouveia) e assumindo a
compatibilidade dos valores de conformidade (Schwartz) com os normativos (Gouveia, 2003),
pode-se afirmar que estes resultados apontados pela pesquisa de Tremblay e Ewart (2005) são
consonantes com os obtidos na presente dissertação.
Ademais, verificou-se nesta dissertação que os adolescentes que assumem os valores de
experimentação como um princípio-guia para sua vida, podem ter uma tendência a se comportar
de forma anti-social (R²Ajustado = 0,05; p < 0,001; β = 0,22; p < 0,001). Em contrapartida, aqueles
que dão prioridade aos valores normativos possivelmente tendem a não aderirem aos
comportamentos anti-sociais (R²Ajustado = 0,14; p < 0,001; β = - 0,37; p < 0,001). Neste mesmo
contexto, verificaram-se resultados semelhantes nas pesquisas levadas a cabo por Formiga (2002),
Pimentel (2004) e Vasconcelos (2004). Os resultados obtidos por Romero, Sobral, Luengo e
Marzoa, (2001) para uma amostra espanhola, também apóiam os resultados apresentados na
presente pesquisa.
A terceira e última variável considerada para medir as condutas de risco foi o potencial
uso de álcool. De forma análoga ao apontado para os comportamentos agressivos e anti-sociais,
verificou-se que os valores de experimentação apresentaram uma explicação direta com o uso
potencial de álcool, sendo, no entanto, esta explicação um pouco fraca (R²Ajustado = 0,02; p <
0,001; β = 0,15 ; p < 0,001) enquanto que os valores normativos o fizeram de forma inversa
(R²Ajustado = 0,07; p < 0,001; β = - 0,27 ; p < 0,001). Destarte, no contexto considerado na presente
pesquisa, ser um usuário em potencial de substâncias alcoólicas parece está mais relacionado a
adolescentes que priorizam os valores de experimentação, ou seja, aqueles que buscam enfrentar
situações com alto teor de adrenalina ou limite bem como buscam a satisfação sexual; do que
àqueles que dão ênfase as normas sociais.
148
Estes resultados foram semelhantes aqueles obtidos na pesquisa desenvolvida por Coelho
Júnior (2001), neste mesmo contexto, que observou uma relação direta com os valores de
experimentação (r = 0,12, p < 0,001) e inversa para os normativos (r = - 0,25, p < 0,001). Além
desta, observa-se semelhança nos resultados encontrados por Tamayo, Nicaretta, Ribeiro e
Barbosa (1995), os quais consideraram uma amostra de 194 estudantes universitários. Destes, 92
foram indicados como pertencentes ao grupo de usuários de drogas (indicaram consumir álcool e
maconha ao menos uma vez por semana) e os demais 102 participantes, como não usuários. A
teoria dos tipos motivacionais de Schwartz (1992) foi utilizada como referencial teórico. Os
resultados obtidos apontaram que o grupo de usuários de drogas declarou dar mais importância (p
< 0,01) aos tipos motivacionais: hedonismo, estimulação, autodireção e universalismo e menos
importância a: conformidade e segurança em contraste aos jovens que se declararam como não
usuários de drogas.
Em síntese, evidenciou-se na presente dissertação que os valores de experimentação
podem ser uma das variáveis que promovem as condutas de risco estudadas enquanto que os
normativos, que destacam a manutenção do status quo, podem está inibindo a manifestação de
tais condutas, sobretudo daquelas anti-sociais.
Parte da literatura a respeito dos comportamentos dos adolescentes tem apontado que os
adolescentes apresentam uma necessidade flagrante em transgredir normas e em viver
perigosamente no limite das responsabilidades sociais (Castro, Valencia & Smart, 1979; Jersild,
1977; Leal, 1996). Assim, de acordo com estas afirmações seria coerente esperar que os
adolescentes naturalmente buscassem assumir os comportamentos de risco aqui descritos, talvez
como um tipo de ritual de iniciação. Isto também foi evidenciado nesta pesquisa, uma vez que
foram justamente os valores de experimentação que se relacionaram diretamente com as condutas
de risco estudadas. Assim, a decisão de não adotar ou se comportar de forma agressiva, anti-
149
social e de ser um usuário em potencial de álcool pode passar pela adoção ou priorização de
valores normativos, os quais assumem claramente uma conotação social, e visam a convivência
harmônica entre as pessoas. Dando prosseguimento, discutem-se a seguir o quanto o ajustamento
escolar é uma variável adequada para predizer as condutas de risco.
• O Ajustamento Escolar e as Condutas de Risco
Relembrando, o ajustamento escolar foi verificado através de duas medidas: a adaptação
escolar e as atitudes frente a escola. Uma vez que foi comprovada a adequação psicométrica
destas medidas, justifica-se considerá-las para compreender os antecedentes das condutas de risco
estudadas. Um conjunto de seis hipóteses foi elaborado a fim de verificar o poder preditivo das
medidas do ajustamento escolar para as condutas de risco estudadas. As três hipóteses iniciais
(Hipóteses 7, 8 e 9) previam que a adaptação escolar explicaria de forma inversa as condutas de
risco e, analogamente, as últimas hipóteses (Hipóteses 10, 11 e 12) apontavam que as atitudes
frente a escola seriam preditoras inversas dos comportamentos agressivos, anti-sociais e de uso
de álcool. Os resultados obtidos permitiram corroborar as hipóteses elaboradas.
Neste sentido, pode-se verificar que tanto a estrutura unifatorial da adaptação escolar
(adaptação geral) quanto aquela composta por quatro fatores, explicaram as condutas agressivas
adequadamente. No que se refere a estrutura unifatorial, averiguou-se um peso de explicação
razoável e uma relação inversa desta para com a conduta agressiva, o que leva a pensar que a
adaptação escolar pode agir como um fator de proteção para esta variável. Para a estrutura
composta por quatro fatores (Fator I - Êxito nas Atividades Disciplinares e nos Relacionamentos
estabelecidos na escola; Fator II – Ambiente Escolar Agradável; Fator III - Êxito nas Atividades
Acadêmicas; Fator IV – Relação agradável com outros Alunos) observou-se que os fatores 1 e 4
compuseram a equação de predição explicando inversa e razoavelmente as condutas agressivas
(ver tabela 12). Assim, a adaptação escolar, sobretudo em relação as atividades disciplinares e ao
150
relacionamento com as pessoas que compõem a escola parece atuar como uma variável que inibe
os comportamentos agressivos, ou seja, quanto mais adaptado as regras disciplinares e aos
relacionamentos interpessoais estabelecidos na escola, possivelmente o adolescente apresente um
menor índice de comportamentos agressivos.
Quanto as condutas anti-sociais, os resultados obtidos são satisfatórios tanto para a
configuração unifatorial, quanto para aquela de quatro fatores da escala de adaptação escolar.
Como pode ser visualizado nos resultados, a adaptação geral demonstrou um índice explicativo
razoável e uma direção inversa. Na estrutura de quatro fatores, observa-se que todos os fatores
fizeram parte da equação de regressão explicando inversamente tais condutas (ver tabela 13).
Destarte, a adaptação escolar figura na presente pesquisa como uma variável que pode inibir as
condutas anti-sociais dos adolescentes.
Em relação a terceira variável, o uso potencial de álcool, verificou-se que o fator I da
adaptação escolar (Êxito nas Atividades Disciplinares e nos Relacionamentos estabelecidos na
escola) demonstrou ser uma variável pouco explicativa para esta conduta. A relação negativa
também poderia indicar uma possível variável inibidora do uso potencial de álcool. Entretanto, os
resultados apresentados apóiam um nível baixo de explicação (3%) o que significa que esta
variável praticamente não contribui para o entendimento do uso potencial de bebidas alcoólicas
por parte dos adolescentes. Apesar de não ser estatisticamente expressivo, este é um indício
relevante, pois dentre a multiplicidade de fatores que estão relacionados ao uso de álcool, a
adaptação escolar é uma variável que pode ser minimizada, apontando-se assim a necessidade de
estudar outros fatores que possam está relacionados ao uso de álcool.
Quanto a segunda medida do ajustamento escolar, a atitude frente a escola, verificou-se
um nível preditivo pouco expressivo desta variável para com os comportamentos agressivos (2%)
e para o uso potencial de álcool (4%). No tocante as condutas anti-sociais, no entanto, observou-
151
se um peso de explicação razoável (16%). Em resumo, os resultados parecem apontar que a
adaptação escolar pode ser vista como uma variável preditora sobretudo, para as condutas
agressivas e anti-sociais e as atitudes frente a escola das condutas anti-sociais. Assim, está
adaptado as normas disciplinares e acadêmicas da escola bem como estabelecer um
relacionamento agradável com as pessoas que compõem a escola (ex: colegas, professores) parece
inibir as condutas agressivas e anti-sociais enquanto que possuir uma atitude positiva frente à
escola é uma das variáveis que pode explicar inversamente as condutas anti-sociais. Assim,
possivelmente, os adolescentes que declararam está adaptados a escola bem como apresentar uma
atitude positiva frente a esta instituição, ou seja, que não estão enfrentando problemas na escola
por não respeitarem suas normas, que se relacionam bem com professores e alunos, que se sentem
bem no ambiente escolar e que acreditam na escola, possivelmente tenham uma menor
probabilidade de apresentar comportamentos agressivos e anti-sociais.
Não foram encontrados estudos anteriores que averiguassem esta relação aqui estudada.
Entretanto, Barriga e cols (2002) consideram uma variável bastante próxima a adaptação escolar,
a saber, a performance acadêmica. Esta é vista como uma variável que pode atuar como um fator
de proteção, sobretudo para as condutas desviantes e agressivas. Na pesquisa que efetuaram,
ficou demonstrado, por exemplo, que a performance acadêmica se relacionou negativamente com
a expressão de comportamentos agressivos (r = - 0,33). Neste sentido, os resultados verificados
nesta dissertação parecem reforçar os achados de Barriga e cols (2002).
Como ressaltado no início deste capítulo de discussão, é importante ter em mente que as
condutas agressivas, anti-sociais e de uso de álcool envolvem diversos fatores na sua explicação,
o que é freqüentemente reafirmado pelos estudiosos na área. Intentou-se nesta pesquisa abarcar tal
problema através de uma conotação psicossocial considerando os valores humanos e o
ajustamento escolar como duas possíveis variáveis explicativas para as condutas de risco
152
estudadas. Os resultados ora discutidos, permitem apontar uma relação entre os valores humanos
e os comportamentos de risco, como também entre o ajustamento escolar e estas condutas,
sobretudo, as agressivas e anti-sociais. Desta forma, acredita-se ter atingido o objetivo principal
desta pesquisa, pois verificou-se que o compromisso convencional (priorização dos valores
humanos e ajustamento escolar) pode ser uma das variáveis, mas não a única, que atue como
preventiva para as condutas de risco estudadas. Enquanto que o não ajustamento escolar e a
priorização dos valores de experimentação podem ser vistos como duas das variáveis que
possivelmente favorecem a incidência das condutas agressivas, anti-sociais e de uso de álcool. A
seguir, dispõe-se o capítulo das conclusões, no qual procura-se elencar as principais limitações e
contribuições desta pesquisa, bem como sugestões de aplicabilidade dos resultados obtidos e de
temas que podem ser abordados em pesquisas futuras.
153
Capítulo VI – Conclusão
154
Falar criticamente da pesquisa desenvolvida apontando suas limitações, principais
contribuições e possíveis aplicações dos resultados é a temática que norteará este capítulo de
conclusão. Ao realizar um estudo empírico, por mais que o pesquisador se esforce, dificilmente
abarcará todas as variáveis envolvidas no fenômeno estudado, contará com instrumentos que não
apresentem limitações ou com uma amostra que seja de fato completamente representativa, tanto
numericamente falando quanto em relação as características dos prováveis participantes do
estudo. Desta forma, apresentam-se inicialmente as limitações observadas nesta pesquisa e em
seguida, as principais contribuições, aplicabilidade e sugestões para pesquisas futuras.
6.1 – LIMITAÇÕES DA PESQUISA
Duas instâncias metodológicas, a amostra e a instrumentação utilizada, são analisadas
destacando-se os aspectos que contribuíram para as possíveis fragilidades identificadas na
presente pesquisa. Quanto a amostra, ressalta-se que apesar da tentativa de balancear os
participantes em relação ao sexo e tipo de escola, percebeu-se que esta foi composta por um
número superior de mulheres, de escola privada e da 8ª série do ensino fundamental. Em estudos
futuros, sugere-se que além das variáveis sexo, tipo de escola e série estudada, se procure
equiparar os estudantes também de acordo com a idade e classe social.
Outra questão, diz respeito a consideração unicamente de adolescentes da população geral
de estudantes, ou seja, aqueles que não apresentam um histórico de comportamentos agressivos,
anti-sociais e de uso abusivo de álcool. Embora os participantes deste estudo possam apresentar
estas condutas de risco citadas, observou-se que suas pontuações médias foram abaixo da mediana
nas medidas empregadas. Desta forma, seria pertinente que em estudos futuros fosse levado em
consideração a participação de adolescentes infratores, tal como fizeram Buss e Perry (1992) para
medir a agressão e Gremaud (2000) e Corrigan, (2003) para medir o ajustamento escolar.
155
Ademais, ressalta-se que apesar do esforço em equiparar os estudantes de escolas públicas
e privadas, este fator não garante que tenham sido abarcados adolescentes de todas as classes
sociais, tampouco que estes sejam representantes fidedignos das classes baixa e alta ou “pobres” e
“ricos” respectivamente.
Reafirma-se ainda que não se pretendeu asseverar que os resultados aqui obtidos pudessem
ser generalizáveis para além do escopo da amostra considerada, pois, relembrando, tal como
apontado no método, tratou-se de uma amostra não probabilística. Assim, novos estudos poderiam
ser úteis a fim de verificar a adequação dos resultados aqui observados. Além deste aspecto, deve-
se alertar que a própria estrutura social e o ambiente em que os adolescentes vivem, entendidos
como contexto cultural, podem restringir as conclusões para contextos similares ao paraibano. Isto
porque possivelmente o entendimento e/ou envolvimento com os comportamentos de risco
estudados podem ser diferentes para adolescentes que convivem em uma sociedade mais pacata,
com poucos habitantes e menor exposição aos comportamentos agressivos, anti-sociais e de uso
abusivo de álcool do que aqueles que vivem em grandes centros urbanos, sendo testemunha e/ou
enfrentando diversas situações de risco.
No tocante aos instrumentos utilizados, ressaltam-se as seguintes limitações:
Escala das condutas anti-sociais. Apesar desta medida ser considerada válida e fidedigna
para o contexto em que esta pesquisa se insere e de ter sido utilizada recentemente em estudos
anteriores (ver Formiga,2002; Pimentel, 2004; Vasconcelos, 2004), ela apresenta algumas
dificuldades quanto a redação de seus itens. Pode-se citar, por exemplo, o fato de que alguns de
seus itens fazem menção a mais de um comportamento, o que os torna um pouco confusos, como
verificado nos itens: 02 - sair sem permissão (do trabalho, de casa ou do colégio) e 17 -
Trapacear (em provas, competição importante, gabarito de resultado, etc.). O primeiro item
apontado (02) pode gerar uma dúvida na resposta a ser dada pelo adolescente, porque, por
156
exemplo, ele pode sair freqüentemente sem permissão de casa mas não o fazer do trabalho ou
escola. Já no segundo (17), a questão parece ser um pouco mais expressiva uma vez que este item
que mede uma conduta anti-social se considerado o âmbito escolar, pode ser entendido como uma
conduta delitiva se os termos “competição importante” e “gabarito de resultado” forem
entendidos no contexto de concursos públicos, como o vestibular, o que é considerado uma
infração a lei e por isso este item deixa de refletir um comportamento anti-social e passa a
expressar uma conduta delitiva.
Questionário de Potencial Consumo de Álcool. Tal como apontado na descrição do
instrumento, o questionário utilizado para identificar o uso potencial de álcool por parte dos
adolescentes compreende um fator do POSIT (Questionário de Triagem de Problema de
Adolescentes). Os parâmetros psicométricos que asseguram a validade e precisão desta medida
para o contexto brasileiro (validade de construto), foram assegurados por Coelho Júnior (2001),
que se mostrou equivalente aos achados observados no contexto mexicano (Mariño & cols, 1998).
Entretanto, não foi ainda averiguada sua capacidade preditiva a respeito de identificar quem é de
fato usuário de droga (validade preditiva) para a realidade brasileira. Outro aspecto, diz respeito
as alternativas de resposta do instrumento (sim vs não). Talvez seria mais adequada uma escala de
resposta disposta de forma intervalar, o que daria mais possibilidades de posicionamento aos
participantes e auxiliaria o pesquisador no sentido de contar com pontuações intervalares.
Além destes aspectos ligados a metodologia, aponta-se a necessidade de se levar em
consideração outros aspectos que podem está relacionados aos construtos estudados. Por exemplo,
em relação ao ajustamento escolar, poder-se-ia averiguar contextos familiares dos adolescentes;
avaliação dos professores e/ou diretores da escola a respeito do ajustamento escolar dos
estudantes; uma medida que avaliasse a relação com os colegas e a influência desta relação no
ajustamento escolar, bem como a importância dos aspectos sócio-demográficos. Estas e outras
157
variáveis têm sido relacionadas na literatura a respeito desta temática (ver Sisto & Pacheco,
2002). Ademais, dada a conotação multideterminada, relatada ao longo desta dissertação para as
condutas de risco ora estudadas, existem diversas variáveis que podem ser consideradas no
entendimento de tais condutas em estudos futuros.
Poder-se-ia verificar empiricamente se a relação entre os valores humanos e as condutas
de risco são mediadas pelas variáveis busca de sensações e traços de personalidade, por exemplo;
ou em relação ao ajustamento escolar averiguar o quanto a identificação com alguns grupos
alternativos (hippies, punks, skinheads, headbangers, skatistas, sufistas e funkeiros) bem como
com grupos freqüentemente ligados a aspectos normativos (família, grupos religiosos, pais,
professores e autoridades religiosas) poderiam atuar como mediadores ou até mesmo preditores
negativos e positivos respectivamente para as condutas agressivas, anti-sociais e de potencial uso
de álcool.
Além destas variáveis citadas acima, deve-se entender melhor o efeito de variáveis
moderadoras como sexo, idade, cultura e aquelas consideradas mediadoras como os estilos e
práticas parentais, a influência dos valores parentais percebidos pelos filhos, pressões dos grupos
de pertença dos adolescentes e outras influências ambientais. Outras variáveis são ressaltadas no
tópico referente a possibilidade de pesquisas futuras.
6.2 – PRINCIPAIS CONTRIBUIÇÕES DA PESQUISA
Na presente dissertação, levou-se em consideração uma teoria específica dos valores
humanos cuja estrutura tem sido aperfeiçoada e comprovada em estudos recentes (Gouveia, 1998,
2001, 2003; Gouveia, Fischer & Milfont 2006, no prelo). Considerando este mesmo contexto,
estudos anteriores a este já tinham apontado a relação significativa entre a teoria dos valores
158
humanos básicos e os comportamentos agressivos (Andrade, 2003), anti-sociais (Formiga, 2002;
Pimentel, 2004; Vasconcelos, 2004) e de uso potencial de álcool (Coelho Júnior, 2001).
Evidenciou-se nesta dissertação que os valores normativos podem atuar na prevenção
destas condutas, sobretudo para as condutas anti-sociais e de uso potencial de álcool. Estas
relações encontram respaldo em estudos anteriores referentes aos valores humanos e os
comportamentos anti-sociais (Formiga, 2002; Pimentel, 2004; Romero, Sobral, Luengo &
Marzoa, 2001; Vasconcelos, 2004) e de uso potencial de álcool (Coelho Júnior, 2001; Tamayo,
Nicaretta, Ribeiro & Barbosa, 1995). Por outro lado, os valores de experimentação se
configuraram na presente pesquisa como fatores que podem promover as condutas de risco
estudadas, visto que apresentaram com estas uma relação direta e significativa. É importante
ressaltar que poucos estudos têm levado em consideração a influência desta variável nas condutas
de risco, no entanto, as poucas pesquisas realizadas apontam resultados que vão na mesma direção
dos que foram aqui evidenciados (Coelho Júnior, 2001; Formiga, 2002; Pimentel, 2004; Romero,
Sobral, Luengo & Marzoa, 2001; Vasconcelos, 2004; Tamayo, Nicaretta, Ribeiro & Barbosa,
1995). É válido ressaltar ainda que apesar da consistência teórica dos valores humanos, as funções
de experimentação apresentaram um baixo poder preditivo para as condutas de risco e os valores
normativos, por sua vez, configuram-se como mais expressivas para a explicação das condutas
anti-sociais e de uso potencial de álcool. Este entretanto, não é um dado que diminui a
importância ou relevância desta pesquisa, uma vez que considera-se que os resultados que não
foram expressivos também contribuem para o avanço no conhecimento das variáveis estudadas.
Ademais, os resultados aqui encontrados apontam para a importância de se levar em
consideração uma medida que avalie o ajustamento escolar e o quanto este é adequado na
explicação das condutas de risco. Evidenciou-se que, sobretudo para a explicação das condutas
agressivas e anti-sociais esta variável é pertinente, ao passo que para o entendimento do uso
159
potencial de álcool, esta se mostrou pouco explicativa, o que também é um dado relevante.
Comumente alguns pesquisadores tendem a ressaltar apenas os achados que comprovam
plenamente as relações teoricamente hipotetizadas, deixando de valorizar aqueles que não se
mostraram adequados as postulações formuladas antes da verificação empírica. Neste estudo,
prefere-se assumir que, de fato o ajustamento escolar diferente do imaginado teoricamente, se
mostrou como um construto que pouco contribui para a explicação do uso potencial de bebidas
alcoólicas, e que este é um dado relevante uma vez que dada a multiplicidade de fatores
relacionados a esta conduta, o ajustamento escolar é um que parece não ser tão expressivo para o
seu entendimento. Apesar destas questões ora ressaltadas, pode-se supor que o compromisso
convencional pode atuar como uma das variáveis de proteção para as condutas agressivas, anti-
sociais e de uso de álcool, enquanto que a priorização dos valores de experimentação e o não
ajustamento escolar podem ser variáveis que facilitem a emissão de tais condutas.
Em relação aos achados empíricos a respeito das condutas de risco considerando as
variáveis sexo e tipo de escola, averiguou-se que os homens são mais agressivos (apenas para a
agressão física), anti-sociais e potenciais usuários de bebidas alcoólicas do que as mulheres.
Quanto ao tipo de escola, diferente do comentado principalmente no senso comum, não foram
encontradas diferenças significativas na expressão de condutas agressivas e de uso potencial de
álcool entre os alunos da escola pública e privada. Ficou claro apenas que estes estudantes se
diferenciam quanto as condutas anti-sociais, sendo que os alunos da escola pública assumem
aderir em maior grau aos comportamentos anti-sociais do que aqueles da escola privada. Tal
como ressaltado na discussão destes resultados, sugere-se que em pesquisas futuras procure-se
averiguar estes resultados tendo em conta outras variáveis como o contexto familiar, a
organização estrutural da escola e a participação dos pais na escola.
160
6.3 - APLICABILIDADE DA PESQUISA
Apesar de não ser um objetivo previamente definido neste estudo, poder-se-ia pensar em
ações interventivas que procurassem promover tanto a adoção de valores normativos quanto o
ajustamento escolar nos adolescentes a fim de procurar contribuir para a prevenção das condutas
de risco estudadas, visto que estas variáveis apontaram uma relação inversa com tais condutas.
Obviamente, não se está afirmando que estas sejam as únicas variáveis que podem proteger os
adolescentes de aderirem a comportamentos agressivos, anti-sociais e de se tornarem potenciais
usuários de bebidas alcoólicas.
Uma intervenção que procurasse promover a adoção de valores normativos por parte dos
adolescentes parece ser uma iniciativa inovadora, embora não seja a única. Deve-se levar em
conta, por exemplo, o empenho do Departamento de Polícia Federal nesta cidade, que há alguns
anos vem procurando visitar escolas e falar abertamente com os adolescentes a respeito de usos de
drogas (dentre elas o álcool) e do perigo em aderir a outros comportamentos de risco o que
também merece crédito. Acredita-se que a intervenção referente aos valores humanos será mais
eficaz se considerar uma ação de cunho principalmente cognitivo a fim de modificar os esquemas
mentais dos adolescentes e levá-los a refletir a respeito dos problemas que podem advir da adoção
de comportamentos agressivos, anti-sociais de uso abusivo de álcool.
Neste sentido, poder-se-ia pensar em programas de intervenção que adotassem, por
exemplo, um método de auto-confrontação com os valores, visando buscar uma mudança na
direção de privilegiar os normativos, bem como poderia-se pensar em estratégias educativas.
Nesta direção, Coelho Júnior (2001) aponta que os pesquisadores do CEIS têm apontado
sugestões de atividades interventivas realizadas em sala de aula e/ou em ambientes apropriados na
escola onde possam ser utilizados recursos que visem favorecer a adoção de valores específicos
nos adolescentes. Para a promoção, por exemplo, do valor religiosidade, estes pesquisadores
161
consideram importante disponibilizar para os estudantes textos de distintas religiões que abordem
suas propostas teóricas principais bem como questionamentos ou pensamentos a respeito de
questões vitais aos sistemas religiosos como, por exemplo, a discussão sobre o sentido da vida ou
ainda apresentar vídeos, como “El arte y la fe”. Em todo caso, a idéia central seria investir em
informações cuja fonte fosse principalmente os valores humanos normativos.
Não é objetivo desta pesquisa defender que para ocorrer uma diminuição dos
comportamentos de risco entre os adolescentes seria adequado a promoção de intervenções
unidirecionais no sentido de incutir “na cabeça” dos adolescentes como eles deveriam se
comportar ou quais seriam os padrões de comportamentos “melhores” para eles. A proposta aqui
aventada está longe disso, até porque é sabido que em épocas onde a sociedade tinha um caráter
mais conservador do que o observado na sociedade atual, também se verificavam a incidência de
comportamentos agressivos, anti-sociais e de uso abusivo de álcool. O que de fato se propõe é
que os adolescentes sejam levados a pensar, refletir sobre os “pros e contras” destes
comportamentos de risco, como também a respeito dos possíveis benefícios que poderiam lograr
se passassem a valorizar a obediência, a religiosidade e a tradição. Defende-se assim que os
programas interventivos não podem perder de vista o respeito pela integridade do indivíduo
favorecendo a oportunidade de uma escolha consciente frente à adoção ou não das condutas de
risco mencionadas.
Outro aspecto importante seria a ampliação do espaço de debate que colocasse os
adolescentes como interlocutores e agentes de suas próprias preocupações e atividades. É de suma
importância que os indivíduos desta faixa etária possam eles mesmos, abordar e discutir as
temáticas mais importantes para eles, de maneira aberta e livre (ver Coelho Júnior, 2001).
Não obstante, apesar destas indicações serem relevantes, não se deve esquecer que sua
aplicação e a obtenção dos resultados esperados não é uma atividade simples e facilmente
162
atingível. Deve-se ter em mente, por exemplo, que uma informação e formação social do
adolescente perpassa por uma estrutura que procure viabilizar condições iguais para seus
familiares e pessoas que compõem seus ciclos de relações. Assim, seria importante pensar em
atividades que procurassem atingir também este público.
A Psicologia Social aponta algumas indicações que podem ser aliadas a prática
comunitária a fim de tratar a problemática das drogas (ver Coelho Júnior, 2001) e estas medidas
podem ser estendidas para as condutas de risco estudas nesta dissertação. Assim, partindo desta
referência, dispõem-se a seguir algumas formas de viabilizar uma educação voltada para os
valores humanos tanto no contexto escolar, quanto fora dele, levando em consideração as pessoas
que estão envolvidas no dia-a-dia dos adolescentes:
1 - Utilização do espaço da escola. Este espaço poderia ser utilizado a fim de promover
um debate criativo e atrativo ao adolescente o qual poderia ser estendido para os pais e familiares
dos alunos em eventos como: “o dia da família na escola”. Nesta oportunidade, poder-se-iam
propor salas de debates que procurassem dar espaço para os pais e filhos esporem suas opiniões e
questionamentos a respeito das condutas de risco e fatores preditivos identificados e discutidos
nesta dissertação. Estas poderiam ser facilitadas pelos professores e/ou psicólogos e psico-
pedagogos, bem como pelos próprios alunos da escola que atuassem de forma capacitada como
agentes facilitadores.
2 – Utilização de espaços físicos dos centros comunitários. Como anteriormente
mencionado, faz-se necessário considerar os grupos que os adolescentes estão inseridos neste
processo aplicativo proposto. Assim, visando a ampliação do debate para as populações
interessadas e/ou potencialmente sujeitas a este problema (adolescentes, pais, responsáveis,
autoridades legais etc.) seria viável a promoção de atividades que abarcassem os moradores dos
bairros;
163
3 - Contribuições de especialistas. Tanto nos ambientes escolares quanto nos
comunitários, seria importante dar oportunidade a especialistas nestas temáticas afim de que,
conjuntamente com a comunidade, esclarecessem os meios viáveis de prevenção das condutas de
risco considerando a especificidade das comunidades; e
4 - Cursos voltados as autoridades policiais. Como citado anteriormente, as autoridades
policiais têm nos últimos anos realizado palestras a respeito das condutas de risco ora discutidas.
Assim, seria interessante que estes profissionais contassem com orientações que lhes
proporcionassem melhores condições de tratamento e abordagem das comunidades que carecem
de auxílio, principalmente daquelas onde são identificados casos críticos de abuso de substâncias
alcoólicas, agressão familiar, dentre outras situações.
Não obstante, reconhece-se que a execução destas atividades envolve diversas
problemáticas, tais como: indisponibilidade de tempo dos pais e/ou responsáveis, falta de
estrutura nas escolas e/ou centros comunitários, bem como de pessoal que tenha possibilidade de
organizar esta atividade, sobretudo, considerando o espaço das escolas públicas nas quais
freqüentemente o quadro de professores não trabalha exclusivamente em uma única escola, por
razões economicamente conhecidas. Quanto a contar com a contribuição de especialistas, em
alguns casos, pode-se tornar inviável devido a algumas dificuldades econômicas vivenciadas pela
escola ou mesmo pela associação comunitária.
Apesar do conhecimento destes fatores que podem dificultar a execução das atividades
propostas, visando colocar em prática estas alternativas interventivas, alguns princípios podem ser
importantes:
1 - Planejamento e organização de projetos que visem viabilizar um processo de
intervenção para os valores humanos considerando tanto os ambientes escolares quanto aqueles
das comunidades que estão fora do alcance da escola; cuja temática seja a tendência dos
164
adolescentes em se comportar de forma agressiva, anti-social e de consumo abusivo de
substancias alcoólicas, respeitando, entretanto, as peculiaridades das comunidades nas quais o
público alvo se encontra inserido;
2 - Execução de cursos que possibilitem a formação e treinamento de agentes
comunitários, na própria região comunitária ou escolar que o projeto esteja sendo desenvolvido.
No âmbito escolar estes agentes devem ser os próprios adolescentes interessados em participar do
projeto interventivo. Deve ser proporcionado a estes agentes a possibilidade de refletirem e
obterem os conhecimentos adequados a respeito das variáveis em questão, enfatizando a
importância da adoção aos valores normativos e do ajustamento escolar como formas de
prevenção de tais condutas; e por fim,
3 - Dar a oportunidade dos agentes comunitários de colocarem em prática seus
conhecimentos teóricos. Estes podem atuar assessorando os especialistas na área. Seria mais
eficaz que estes agentes facilitadores fossem pessoas que exercessem alguma liderança, de
preferência de estilo democrático (ver Vala, 2000), na escola ou na comunidade. Esta deveria ter
capacidade de envolver o público-alvo e facilitar o trabalho do grupo fazendo com que cada
participante se sentisse responsável e importante para o sucesso do projeto interventivo.
Finalmente, ressalta-se que esta temática não se esgota com estes resultados e sugestões de
aplicações. Como enfatizado repetidas vezes ao longo deste trabalho, tem-se em mente que as
condutas agressivas, anti-sociais de uso de álcool envolvem outras tantas variáveis que não foram
incluídas neste estudo. Daí porque não se assume que estes achados devam ser encarados como a
palavra final sobre o que é preciso conhecer a respeito das condutas de risco. Neste contexto, esta
pesquisa não terá sido importante se não proporcionar questionamentos que possam se converter
em perguntas específicas que dêem origem a pesquisas futuras. Assim, acredita-se que o
pesquisador que esteja interessado em estudar a temática das condutas de risco apontadas, saberá
165
com base nos resultados observados como também dos eventuais equívocos cometidos, propor
novas pesquisas. Sendo assim, antecipam-se algumas propostas de futuras pesquisas listadas no
tópico abaixo.
6.4 - POSSIBILIDADES DE PESQUISAS FUTURAS
Os valores humanos e o ajustamento escolar demonstraram ser duas variáveis importantes
no estudo a respeito das condutas de risco. Entretanto, outras variáveis podem ser consideradas
em estudos futuros tais como:
• Percepção das práticas e valores parentais. A relação estabelecida entre pais e filhos é
uma questão que merece atenção. Especificamente em relação das práticas parentais, ressalta-se
que a forma como os filhos percebem seus pais pode influenciar significativamente na explicação
de comportamentos de risco por parte dos adolescentes. Neste sentido, Pasquali e Andrade (1986),
encontraram resultados que os permitiram afirmar que os jovens com comportamentos desviantes
(usuários de drogas e delinqüentes institucionalizados) perceberam seus pais mais negativamente
e menos centrados nos filhos do que aqueles da população não desviante ou população geral. No
que se refere aos valores, Schneider (2001), apontou neste contexto, que perceber os pais como
afetivos implica diretamente na transmissão dos valores normativos para os filhos. Desta forma,
quanto mais os filhos percebem que seus pais apresentam uma prática parental afetiva, maior a
chance de que os filhos priorizem tais valores que seus pais gostariam que apresentassem.
• A religiosidade e as condutas de risco. Tal como verificado nesta pesquisa e em
pesquisas anteriores (Coelho Júnior, 2001; Pimentel, 2004; Vasconcelos, 2004) valorizar a
religiosidade pode ser uma das variáveis que explique inversamente as condutas de risco. Assim,
seria interessante contar com uma medida que avaliasse especificamente a relação do fator
religiosidade e as condutas de risco.
166
• Os estilos musicais. Recentemente, Pimentel (2004) evidenciou uma relação inversa entre
a preferência por estilos de música “convencionais” (religiosa, clássica) e os comportamentos
desviantes dos jovens, e uma relação direta entre os estilos musicais “anti-convencionais” (heavy
metal, por exemplo) e as condutas anti-sociais. Para estudos futuros, sugere-se que se combine
esta variável com a preferência por estilos literários, cinematográficos e até mesmo de
programações televisivas, com as condutas de risco estudadas.
• Estudos Intra e Interculturais. Contar com a realização de estudos que considerem além
de amostras nordestinas outros contextos brasileiros parece ser bastante relevante. Talvez fosse
interessante comparar o quanto os diversos contextos do Brasil influenciariam na adoção ou não
de condutas de risco por parte dos adolescentes bem como averiguar se os resultados obtidos nesta
dissertação seriam ou não confirmados. Ademais, a realização de estudos transculturais seriam
igualmente relevantes. Embora, por exemplo, os fatores do questionário de agressão de Buss e
Perry (1992) apresentem no Brasil uma configuração bastante semelhante ao apontado nos outros
países em que este instrumento tem sido validado (Estados Unidos, Alemanha, Itália, Espanha,
dentre outros) pode ser importante averiguar as relações entre os outros construtos considerados
incluindo nesta análise a influência cultural, avaliando assim em que medida a correlação das
condutas de risco podem ser generalizada através das culturas com os valores humanos e o
ajustamento escolar. Além destas variáveis citadas, poder-se-ia incluir diversas outras.
Finalizando, aponta-se que os objetivos propostos foram aqui atingidos. Estudar os
comportamentos agressivos, anti-sociais e de uso potencial de bebidas alcoólicas é uma temática
relevante, atual e presente na realidade dos adolescentes. Entretanto, abarcar todas as variáveis
envolvidas não é viável em uma única pesquisa. Por isso, mais pesquisas precisam ser
desenvolvidas considerando além das variáveis sugeridas acima, outras tantas que posam
proporcionar um constante avanço no entendimento e explicação de tais comportamentos.
167
Capítulo VII – Referências
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