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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO ANA BEATRIZ GOMES CARVALHO A EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA PERSPECTIVA DOS ESTUDOS CULTURAIS JOÃO PESSOA 2009

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBACENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

ANA BEATRIZ GOMES CARVALHO

A EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA PERSPECTIVA DOS ESTUDOS CULTURAIS

JOÃO PESSOA

2009

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ANA BEATRIZ GOMES CARVALHO

A EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA PERSPECTIVA DOS ESTUDOS CULTURAIS

TESE APRESENTADA NO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA, NA LINHA DE PESQUISA ESTUDOS CULTURAIS DA EDUCAÇÃO, COMO REQUISITO PARCIAL PARA OBTENÇÃO DO TÍTULO DE DOUTOR EM EDUCAÇÃO.

ORIENTADORA

Sônia de Almeida Pimenta

JOÃO PESSOA

2009

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Ana Beatriz Gomes Carvalho

A EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA PERSPECTIVA DOS ESTUDOS CULTURAIS

Tese apresentada no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal da Paraíba na linha de pesquisa Estudos Culturais da Educação, como requisito parcial para obtenção do título de doutor em Educação.

Aprovado em 17 de Agosto de 2009.

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________PROFª DRA. SÔNIA DE ALMEIDA PIMENTA (UFPB)

ORIENTADORA

_______________________________________PROFª DRA. MIRIAM DE ALBUQUERQUE AQUINO (UFPB)

______________________________________PROF. DR. LUIZ PEREIRA DE LIMA JUNIOR (UFPB)

______________________________________PROF. DR. SÉRGIO PAULINO ABRANCHES (UFPE)

______________________________________PROF. DR. WALTER MATIAS DE LIMA (UFAL)

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Para as minhas filhas, Illa, Ingrid e Amariah que durante este período tiveram uma mãe que

trabalhava com educação a distância, lecionava educação a distância, estudava e pesquisava sobre

educação a distância, exercia o papel de mãe a distância, mas com amor presencial e incondicional.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos que contribuíram de forma direta ou indireta para que este trabalho fosse realizado e, como faço parte de um todo, não poderia me dividir em partes, companheira, mãe, filha, irmã, professora e aluna, no momento dos agradecimentos. Especialmente, quero registrar o meu profundo agradecimento aqueles, sem os quais, este trabalho não existiria:

À minha família, que sempre apostou em mim e fez com que a sua admiração me levasse ao desejo de superar os desafios;

À minha orientadora, Profª Dra Sônia Pimenta, que fez da orientação um trabalho de parceria e amizade gratificante, vibrando com cada descoberta e propondo críticas e sugestões com clareza e docilidade, prova de que é possível ser professor comprometido, competente e humano;

À Prof. Eliane Moura da Universidade Estadual da Paraíba, que apoiou a realização deste trabalho provendo os meios para que eu pudesse ser professora, coordenadora e doutoranda;

À Prof. Dra Adelaide Dias, Coordenadora do PPGE, pela sua brilhante atuação na coordenação, repleta de garra e comprometimento;

Aos membros da banca pelas contribuições para a melhoria deste trabalho - todas acatadas - melhorando sensivelmente a estrutura desta pesquisa;

Aos professores do PPGE, pelas valiosas contribuições na construção do meu percurso teórico e metodológico;

Aos amigos que tive a oportunidade de conhecer na Universidade, Alásia Santos e Cristiano Ferronato, por sua contribuição nas leituras e no apoio para as minhas angústias;

Às minhas companheiras da Universidade Estadual da Paraíba, Graça Barros, Iolanda Barbosa, excelentes amigas que compartilharam minha luta e me apoiaram;

À Divanira Arcoverde, em quem eu confio plenamente para revisar os meus textos, inclusive este, sem mudar o meu estilo;

Ao meu companheiro, João Torquato, que me fez pular de mais uma ponte em nossa caminhada.

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“A web é para ligar pessoas, a web 2.0 é para ligar pessoas, pessoas compartilhando, trocando, colaborando... Nós precisamos repensar algumas coisas, precisamos repensar os direitos autorais, repensar a autoria, repensar a identidade, repensar a ética, repensar a estética, repensar a retórica, repensar o ato de governar, repensar a privacidade, repensar o comércio, repensar o amor, repensar a família e repensar nós mesmos”.

Michael Wesch, em A Máquina Somos Nós, 2007

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RESUMO

A educação a distância é implementada no ensino superior como uma modalidade que surge para propiciar a formação de professores em exercício, assim como a formação de novos professores para Educação Básica, configurando-se como uma política pública de expansão de vagas nas instituições públicas. A fundamentação que alicerçou a política pública de educação a distância foi a avaliação realizada pelo Sistema de Avaliação Básica que apontou a deficiência de qualidade da escolarização, servindo de base para uma série de ações do Governo Federal. Na busca pela melhoria da Educação Básica, foi realizado o Programa Pró-Licenciatura, para a criação de cursos de Graduação (Licenciaturas) na modalidade a distância para formação e qualificação do professor que atua em sala de aula na rede pública, sem nível superior (ou quando apresenta nível superior em uma área diversa da que efetivamente atua). Este estudo tem como objeto a educação a distância como instrumento de mudança paradigmática na formação de professores atuantes na rede pública, na perspectiva do campo dos Estudos Culturais, através do Programa Pró-Licenciatura, de modo a compreender as novas dimensões deste processo que estão para além da incorporação de conteúdos e novas técnicas. Para tanto, utilizamos a pesquisa documental a partir do referencial teórico-metodológico dos Estudos Culturais, o qual é fundamental para a compreensão destas configurações econômicas e sociais, já que os processos culturais estão intimamente vinculados com as relações sociais, assim como a cultura envolve poder. Ao final da análise dos documentos oficiais, listas de discussão e projeto político-pedagógico, concluímos que a política pública do Pró-Licenciatura apresenta elementos que do campo dos Estudos Culturais, uma vez que a sua proposta foi construída em um contexto de participação e discussão com diversos representantes das instituições públicas de ensino superior, propõe uma formação de professores que não se limita ao conteúdo específico e estabelece contextos culturais, tanto do aluno quanto do professor, considera o professor como sujeito capaz de efetivar mudanças no ambiente escolar e produzir conhecimento e não apenas reproduzi-lo, contempla a diversidade, o multiculturalismo e as identidades.

Palavras-chave: Educação a Distância, Formação de Professores, Estudos Culturais, Políticas Públicas, Tecnologias da Informação e Comunicação

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ABSTRACT

The evaluation made by the Evaluation Basic System pointed how poor the education quality is, as a base for many actions of the Federal Government and searching to improve Basic education, the Pro-Graduate Program was done to create the Graduate Courses (Undergraduate) in the distance mode for training and qualifications of the teacher who works in the classroom in the public network, without graduation (or graduated in a different area they actually work). Our study object is distance education as an instrument of paradigm shift in training teachers working on the public area, in the perspective of Cultural Studies, through the Pro-Graduate Program in order to understand the new dimensions of this process are beyond the incorporation of the content and new techniques. Wanting to understand, interpret and explain the paradigmatic construction reference, implementation and evaluation of the program to graduate distance education teacher. To use both the documentary research from the theoretical and methodological reference of Cultural Studies, which is essential to understand these economic and social settings, because cultural processes are extremely linked to social relations, as well as culture involves power. In the end, is believed that this public policy was developed in the field of Cultural Studies as a way to accommodate diversity, multiculturalism and identity.

Key-words: Distance Education, Teacher Training, Cultural Studies, Public Politics, Information Technology and Communication

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LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1: CINCO GERAÇÕES DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA...............................73FIGURA 2: ESTRUTURA DA GESTÃO INICIAL DA UNIREDE...............................100FIGURA 3: ATUAL ESTRUTURA ORGANIZACIONAL DA UNIREDE...................101FIGURA 4: HISTÓRICO DAS MENSAGENS DO YAHOO GRUPOS UNIREDE NORDESTE 2........................................................................................................................105FIGURA 5: NOTÍCIA PUBLICADA NO PORTAL DA SEED/MEC............................114FIGURA 6: ESTRUTURA DA RESOLUÇÃO CD/FNDE N° 34.....................................119FIGURA 7: CONFIGURAÇÃO DA NOVA CAPES........................................................136FIGURA 8: A UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL NA CAPES...........................137FIGURA 9: SISTEMA DE ARTICULAÇÃO DA UAB....................................................140FIGURA 10: ESTRUTURA DO ANEXO III DA RESOLUÇÃO CD/FNDE N° 34......148

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LISTA DE QUADROS

QUADRO 1: CONTRASTE ENTRE O FORDISMO E A ACUMULAÇÃO FLEXÍVEL...................................................................................................................................................59QUADRO 2: PERÍODO HISTÓRICO E CURSOS A DISTÂNCIA.................................68QUADRO 3: HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA NO BRASIL (ATÉ 1980)...................................................................................................................................................77QUADRO 4: HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA NO BRASIL (A PARTIR DE 1990)...................................................................................................................................81QUADRO 5: RESULTADO DA RESOLUÇÃO CD/FNDE N° 34.................................................................................................................................................131QUADRO 6: INSTITUIÇÕES PRESENTES NO I ENCONTRO PEDAGÓGICO DO PROGRAMA PRÓ-LICENCIATURA / UAB...................................................................203

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LISTA DE SIGLAS

ACERP – Associação de Comunicação Educativa Roquette-PintoADUSP – Associação dos Docentes da USPANFOPE – Associação Nacional pela Formação de ProfessoresANPED – Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em EducaçãoANDES-SN – Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino SuperiorANDIFES – Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino SuperiorCAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de Ensino SuperiorCEAD – Centro de Educação a DistânciaCCP – Comitê de Coordenação PolíticaCECIERJ – Fundação Centro de Ciências e Educação Superior a Distância do Estado do

Rio de JaneiroCEDERJ – Centro Universitário de Ensino a Distância do Estado do Rio de JaneiroCG – Comitê GestorCRUB – Conselho de Reitores das Universidades BrasileirasDVD – Do Inglês Digital Vídeo DiscEAD – Educação a DistânciaFNDE – Fundo Nacional de Desenvolvimento da EducaçãoICDE – Conselho Internacional de Educação a DistânciaIES – Instituições de Ensino SuperiorIFES – Instituições Federais de Ensino SuperiorINEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio TeixeiraLDBEN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação NacionalLMS – Learning Managemant SystemMEC – Ministério da EducaçãoNTE – Núcleo de Tecnologia EducacionalOCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento EconômicoOMC – Organização Mundial do ComércioONG – Organização Não GovernamentalPDE – Plano de Desenvolvimento da EducaçãoPED – Programa de Ensino a DistânciaPL – Projeto de LeiPPP – Projeto Político-PedagógicoPNE – Plano Nacional de EducaçãoPNUD – Programa das Nações Unidas para o DesenvolvimentoPROCAD – Projeto de Capacitação de DocentesPRÓ-LICENCIATURA – Programa de Formação Superior para Professores da Educação

BásicaPROINFO – Programa de Informática nas Escolas PúblicasPRONTEL – Programa Nacional de Tele-EducaçãoPUC-MINAS – Pontifícia Universidade Católica de Minas GeraisREGESD – Rede Gaúcha de Ensino Superior a Distância

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RNP – Rede Nacional de PesquisaSAEB – Sistema de Avaliação da Educação BásicaSAPIENS – Sistema de Acompanhamento de Processos das Instituições de Ensino SuperiorSEB – Secretaria de Educação BásicaSEED – Secretaria de Educação a DistânciaSESU – Secretaria de Ensino SuperiorSINAES – Sistema Nacional de Avaliação da Educação SuperiorSINEAD – Sistema de Radiodifusão EducativaTIC – Tecnologia da Informação e ComunicaçãoTVE – Televisão EducativaUAB – Universidade Aberta do BrasilUENF – Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy RibeiroUERJ – Universidade do Estado do Rio de JaneiroUEMA – Universidade Estadual do MaranhãoUEPB – Universidade Estadual da ParaíbaUEPG – Universidade Estadual de Ponta GrossaUESC – Universidade Estadual de Santa CruzUFF – Universidade Federal FluminenseUFMG – Universidade Federal de Minas GeraisUFMT – Universidade Federal do Mato GrossoUFRJ – Universidade Federal do Rio de JaneiroUFRN – Universidade Federal do Rio Grande do NorteUFRRJ – Universidade Federal Rural do Rio de JaneiroUFS – Universidade Federal de SergipeUFSC – Universidade Federal de Santa CatarinaUFSM – Universidade Federal de Santa MariaUFU – Universidade Federal de UberlândiaUNB – Universidade de BrasíliaUNC – Universidade do ContestadoUNED – Universidade Nacional de Educação a DistânciaUNEMAT – Universidade do Estado de Mato GrossoUNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a CulturaUNIASSELVI – Centro Universitário Leonardo da VinciUNICS – Centro Universitário Diocesano do Sudoeste do ParanáUNIFRAN – Universidade de FrancaUNIJUI – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do SulUNIMONTES – Universidade Estadual de Montes ClarosUNIREDE – Universidade Virtual Pública do BrasilUNIRIO – Universidade Federal do Estado do Rio de JaneiroUNIS – Centro Universitário do Sul de MinasUNIT – Universidade TiradentesUNIUBE – Universidade de UberabaUNIVALE – Universidade do Vale do Rio DoceUNOPAR – Universidade Norte do ParanáZPD – Zona de Desenvolvimento Proximal

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SUMÁRIO1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................18

1.1 CONTEXTUALIZANDO O TEMA E A CONSTRUÇÃO DO PERCURSO.....................................................191.2 A EDUCAÇÃO BÁSICA COMO QUESTÃO CENTRAL DA DISCUSSÃO..................................................201.3 AS PREMISSAS DA PESQUISA E A ESTRUTURA DO TRABALHO........................................................231.4 NUVEM DE TAGS DO CAPÍTULO...............................................................................................27

2 CONSTRUINDO OS REFERENCIAIS TEÓRICO- METODOLÓGICOS: O CAMPO DOS ESTUDOS CULTURAIS E A EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA ..................28

2.1 A ESCOLHA DO CAMPO TEÓRICO.............................................................................................292.2 CONTEXTUALIZANDO A DISCUSSÃO: SOBRE O FOCO DA PESQUISA..................................................312.3 CONSTRUINDO A TEORIA: O CAMPO DOS ESTUDOS CULTURAIS E A EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA...........332.4 ANOTAÇÕES SOBRE O PERCURSO METODOLÓGICO.......................................................................392.5 REFERÊNCIAS DOS DOCUMENTOS UTILIZADOS NA PESQUISA.........................................................422.6 SOBRE AS IMAGENS E NUVENS DE TAGS DOS CAPÍTULOS.............................................................432.7 NUVEM DE TAGS DO CAPÍTULO...............................................................................................45

3 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA E AS MUDANÇAS NA SOCIEDADE INFORMACIONAL................................................................................47

3.1 A SOCIEDADE INFORMACIONAL .............................................................................................483.2 CAPITAL, TRABALHO E EDUCAÇÃO..........................................................................................513.3 A CRISE NO FORDISMO E O SURGIMENTO DA ACUMULAÇÃO FLEXÍVEL..........................................543.4 A FLEXIBILIDADE NA PRODUÇÃO, NO TRABALHO E NA EDUCAÇÃO................................................603.5 UM PANORAMA DO HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA E SUA RELAÇÃO COM O MODO DE ACUMULAÇÃO............................................................................................................................653.6 BREVE HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA NO BRASIL.......................................................743.7 O ENSINO SUPERIOR A DISTÂNCIA NO BRASIL.........................................................................793.8 AS ENTIDADES DE CLASSE E A EAD NO ENSINO SUPERIOR.........................................................873.9 NUVEM DE TAGS DO CAPÍTULO...............................................................................................92

4 POLÍTICAS PÚBLICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES A DISTÂNCIA: O PRÓ-LICENCIATURA E A UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL..........................93

4.1 A CONCEPÇÃO DO PRÓ-LICENCIATURA....................................................................................944.2 A FORMAÇÃO DA UNIREDE...............................................................................................964.3 O CONSÓRCIO UNIREDE NORDESTE ORIENTAL.................................................................102

4.3.1 O espaço de diálogo do Consórcio Nordeste Oriental: a lista de discussão........1054.4 A PUBLICAÇÃO DOS EDITAIS DO PRÓ-LICENCIATURA...............................................................1134.5 OS RESULTADOS DA CHAMADA PÚBLICA ATRAVÉS DE EDITAL....................................................1234.6 CONSIDERAÇÕES SOBRE CRIAÇÃO DA UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL (UAB).......................1324.7 NUVEM DE TAGS DO CAPÍTULO.............................................................................................141

5 A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA MODALIDADE A DISTÂNCIA: ASPECTOS CULTURAIS NO USO DAS TECNOLOGIAS DIGITAIS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO................................................................................142

5.1 UNINDO OS PONTOS: UM OLHAR SOBRE O CAMPO DOS ESTUDOS CULTURAIS NO DOCUMENTO DO PRÓ-LICENCIATURA E A PRÁTICA DA EAD PARA A FORMAÇÃO DOCENTE................................................1435.2 A ANÁLISE DO ANEXO III NO CAMPO DOS ESTUDOS CULTURAIS...............................................1455.3 O PROFESSOR QUE QUEREMOS: UM OLHAR SOBRE A PROPOSTA DO PRÓ-LICENCIATURA PARA A PRÁTICA DOCENTE E SUAS IDENTIDADES...................................................................................................150

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5.4 A ESCOLA QUE QUEREMOS: UM OLHAR SOBRE A DIMENSÃO CULTURAL DA ESCOLA........................1585.5 UM OLHAR SOBRE AS PROPOSTAS DOS PROJETOS POLÍTICO-PEDAGÓGICOS.....................................1645.6 A INSERÇÃO DAS TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO.............................................1745.7 ENTRE O DITO E O FEITO NO USO DAS TECNOLOGIAS NA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA..........................1825.8 O CONCEITO DE APRENDIZAGEM COLABORATIVA NA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA..............................190

5.8.1 A aprendizagem nos ambientes virtuais e o domínio dos dispositivos tecnológicos........................................................................................................................................1925.8.2 A Web 2.0 como espaço de autoria e compartilhamento na rede.........................198

5.9 O QUE ENCONTRAMOS, COMO ESTAMOS E PARA ONDE VAMOS: FINALIZANDO O PERCURSO DA PESQUISA COM O RELATO DA SITUAÇÃO ATUAL DO PRÓ-LICENCIATURA..........................................................201

5.9.1 O relato de experiências do Pró-Licenciatura......................................................2045.10 NUVEM DE TAGS DO CAPÍTULO...........................................................................................217

6 CONCLUSÃO: REFLEXÕES SOBRE O PERCURSO DA PESQUISA E AS POSSIBILIDADES DE NOVOS CAMINHOS..................................................................218REFERÊNCIAS....................................................................................................................223

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1 INTRODUÇÃO

Dan Perjovschi . What Happened to us?

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1.1 Contextualizando o tema e a construção do percurso

É impossível dissociar o percurso de construção desta pesquisa da minha

trajetória profissional, iniciada a partir das premissas de formação de uma nova

sociedade informacional e globalizada que se desenhava no final da década de

1980. Nesse admirável mundo novo, surgia no nosso cotidiano um vento de

mudanças positivas provocadas por mudanças políticas econômicas no país que

ensaiava tomar uma posição de destaque no cenário mundial, até então relacionado,

apenas com os aspectos positivos e sinais de prosperidade enquanto o senso

comum associava tudo o que era brasileiro ao atraso, subdesenvolvimento e

mediocridade. Durante a minha pesquisa no mestrado, muitos duvidavam da

existência da globalização como um fenômeno real que pudesse provocar

mudanças na produção, no mercado e no cotidiano brasileiro. A acumulação flexível

e o surgimento da sociedade informacional ainda eram incipientes e poucos estudos

tratavam do assunto. Terminado o mestrado, iniciei uma série de atividades

profissionais em empresas, através da Educação a Distância (EAD), chamada no

âmbito corporativo de e-learning e pude, finalmente, relacionar o mundo da

produção e do trabalho com a educação e as tecnologias. Era um cenário promissor

incentivado por experiências realizadas no exterior que comprovavam a eficácia da

EAD em um novo cenário no mundo do trabalho.

Com a abertura das políticas governamentais para a implementação de

cursos a distância nas Instituições de Ensino Superior, uma nova realidade foi

construída e participei ativamente deste processo na concepção e implementação

de cursos superiores em nível de graduação na Paraíba. O compartilhamento de

ideias e a construção de um ideal para a EAD com outras instituições de ensino

superior propiciou um diálogo rico extremamente importante para a definição do

perfil de EAD que seria mais adequado à nossa realidade nos Estados Nordestinos.

Neste momento, o principal modelo existente era o CEDERJ no Rio de Janeiro,

Estado no qual eu nasci e vivi por quase toda a minha vida. Estava claro desde o

início, que a realidade na qual o CEDERJ construiu a sua proposta de trabalho era

bastante diferenciada do contexto nordestino.

Pensar na implementação de cursos a distância já seria uma tarefa complexa

e, desenvolver cursos voltados para a formação de professores, exigia não apenas

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um olhar na estrutura da EAD, mas sim, um profundo conhecimento da realidade

educacional local, com todas as singularidades da cultura, cartografia e geografia.

Neste segundo momento da minha trajetória profissional e pessoal, pude relacionar

meu curso de graduação, Licenciatura em Geografia, meu mestrado com as suas

questões sobre a produção, inovações tecnológicas, o trabalho e a educação.

Felizmente, a aproximação com a construção da proposta de educação a distância,

fez com que eu refletisse sobre a condução do processo e estivesse atenta aos

desafios do percurso e aos eventuais desvios que foram realizados. O constante

questionamento gerou uma série de inquietações sobre os (des)caminhos da EAD e

sobre os limites e as possibilidades das propostas apresentadas. Foi exatamente

neste cenário, pensando na possibilidade de transformar a realidade social, através

da educação, que esta pesquisa foi iniciada.

1.2 A Educação Básica como questão central da discussão

A busca pela melhoria da educação básica é, sem dúvida, o princípio

norteador das ações de qualificação dos professores. A avaliação realizada pelo

Sistema de Avaliação Básica apontou a deficiência de qualidade da escolarização,

servindo de base para uma série de ações do Governo Federal. A implementação do

Programa Pró-Licenciatura, objeto do nosso estudo, é um programa que tem como

objetivo a criação de cursos de Graduação (Licenciaturas) na modalidade a distância

para formação e qualificação do professor que atua em sala de aula na rede pública,

sem nível superior (ou quando apresenta nível superior em uma área diversa da que

efetivamente atua). Os indicadores educacionais relativos à formação de

professores, que se encontram nas salas de aula das escolas públicas no Brasil,

sinalizam para a necessidade de se desenvolver projetos de formação acadêmica

para esse educador, de modo que haja mudanças na qualidade da educação básica

ofertada na rede pública de ensino.

O documento que apresenta as diretrizes conceituais e metodológicas do

Programa Pró-Licenciatura contém questões que não se restringem somente aos

aspectos técnicos da formação docente. Observamos que vários elementos neste

documento apresentam princípios subjetivos, permeando comportamentos e atitudes

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docentes que não seriam possíveis de contemplação em currículos ou conteúdos

dissociados dos aspectos culturais.

Embora a opção pela modalidade a distância seja justificada por aspectos

pragmáticos relacionados aos custos, localização geográfica e inclusão tecnológica,

as questões relacionadas ao processo de mediação pedagógica, por meio do uso

maciço das novas tecnologias de informação e comunicação (NTIC’s), podem ser

usados como um importante dispositivo na construção de novos paradigmas de

formação e atuação dos professores na Educação Básica. Afinal, no momento em

que atingimos níveis bastante elevados de desenvolvimento tecnológico, devemos

capitalizá-los para a educação, melhorando o perfil acima apresentado no que tange

à formação dos educadores, e, consequentemente, contribuindo para o

desenvolvimento econômico, social e cultural do país. O desenvolvimento de cursos

na modalidade a distância, instituiu a utilização de tecnologias da informação como

agregado indissociável de sua proposta pedagógica.

A análise da formação de professores, nesta modalidade, alicerçada na

mediação pedagógica por novas tecnologias e as possibilidades de mudança

paradigmática na atuação docente, poderá abrir caminhos para a compreensão das

estratégias governamentais para a educação brasileira e as necessidades reais de

mudanças paradigmáticas e culturais nas escolas.

As inovações tecnológicas provocaram um impacto sem precedentes em

nossa sociedade, na segunda metade do século XX. Chamamos a sociedade em

que vivemos hoje de sociedade de informação, conceito que define bem a existência

de fluxos tão complexos de ideias, produtos, dinheiro, pessoas, que estabeleceu

uma nova forma de organização social. O fato é que verificamos claramente as

transformações na organização do trabalho, na produção, nos mecanismos de

relacionamento social, no acesso à informação. O fenômeno da globalização

provocou mudanças profundas nas relações econômicas e sociais nas mais

distantes localidades do mundo, provocando um curioso paradoxo entre o global e

local, constituindo-se uma disputa entre a influência exercida pelo mundo

globalizado, em razão da mídia e da nova ordem econômica e o local, com sua

expressão máxima na historicidade e importância do visto e experimentado para os

indivíduos na sua formação cultural e cidadã.

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O referencial teórico-metodológico dos estudos culturais é fundamental para a

compreensão destas configurações econômicas e sociais. Os processos culturais

estão intimamente vinculados com as relações sociais, especialmente, com as

relações e formação de classe, assim como a cultura envolve poder. A cultura não é

um campo autônomo nem externamente determinado, mas um local de diferenças e

de lutas sociais (SILVA, 2000). O impacto das novas tecnologias provoca

transformações também na apreensão do conhecimento, pois não basta definir

apenas o que estudar, mas também como estudar. Está relacionado com as

estratégias e metodologias propostas para a disseminação da informação e do

conhecimento. Ou, em última análise, como transformar a quantidade de

informações acessíveis com o advento das novas tecnologias da informação e da

comunicação em conhecimento sistematizado, significativo e passível de utilização e

de reestruturações.

A cultura contemporânea é caracterizada por vários autores como uma

transição da modernidade para a pós-modernidade (HARVEY, 1993). A

modernidade é o período de afirmação do indivíduo e da consolidação de uma

economia centrada na produção. A pós-modernidade se caracteriza pela

instabilidade conceitual com a passagem da produção industrial para uma sociedade

de serviços, a qual valoriza a heterogeneidade dos segmentos de consumo e a

personalização na relação com o consumidor.

A reflexão sobre o papel e as características da escola dentro deste novo

mundo híbrido, visto como um espaço em mudança nas novas configurações

culturais possibilita a análise de elementos subjetivos que permeiam e constrói a

escola como instituição e as perspectivas reais de quebra dos seus paradigmas. O

foco da aprendizagem contextualizada até recentemente estava voltado para as

particularidades sociais, econômicas e culturais de um grupo de alunos. Com a

globalização, este conceito de realidade foi expandido e os conceitos de

comunidade, lugar, espaço e tempo foram redimensionados, não comportando mais

um conceito de identidade cultural estável. “Se nos estudos culturais a cultura é uma

arena, um campo de luta em que o significado é fixado e negociado, as escolas, sua

maquinaria, seus currículos e práticas são parte deste complexo” (COSTA, 2005,

p.34). Assim, é preciso investigar as relações de poder que permeiam esta arena,

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considerando a produtividade e positividade do poder, sua capacidade de produzir

subjetividades e identidades.

Apesar da definição e do objetivo geral do Pró-Licenciatura estarem focados

apenas na questão da qualificação do professor (e seu consequente prejuízo ao seu

desempenho) e sua relação direta com a qualidade da Educação Básica, o

documento completo apresenta outros conceitos muito mais complexos. Ao

analisarmos o documento com as propostas conceituais e metodológicas do

Programa, observamos que dos seis eixos que estruturam a proposta, apenas um

está restrito ao campo da competência disciplinar, relacionada ao domínio dos

conteúdos e técnicas. Os demais estão fundamentados em mudanças culturais

profundas, alicerçados em elementos que compreendem as subjetividades que

permeiam os estudos culturais.

Ao conectar em seus eixos a compreensão de uma escola (na visão do

professor) como um espaço social, sensível à história e à cultura locais com uma

ação afirmativa de inclusão digital, por meio da viabilização da apropriação dos

educados das tecnologias de comunicação e informação, nos parece que a decisão

em formar professores através da modalidade a distância não é apenas uma opção

fundamentada em questões operacionais (tempo, limites geográficos e custos).

Embora estes elementos façam parte da viabilidade técnica para a implementação

de cursos na modalidade a distância (não podemos menosprezar os aspectos

econômicos e jurídicos), a inserção desta metodologia com o forte agregado

tecnológico, inerente ao seu desenvolvimento, pode, na verdade, ter sido a premissa

mais importante para a decisão estratégica de sua implementação.

1.3 As premissas da pesquisa e a estrutura do trabalho

As estratégias para a formação de professores (sempre enunciadas em

caráter de mudança, transformação ou construção), apresentam a estratégia do

programa para alcançar seus objetivos de transformação, por intermédio de dois

itens intitulados “a escola que queremos e o professor que queremos”. Ao propor

que o professor deverá “viabilizar o desenvolvimento de novas e mais complexas

estruturas e relações com o mundo real e com o conhecimento”; ou que “para um

país justo e igualitário, não se pode reforçar a cultura do individualismo e da

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ambição por status econômico, em detrimento dos princípios éticos e de cidadania”

(MEC, Anexo III, 2005) estão agregados elementos do campo dos estudos culturais

que são complexos, para uma posterior avaliação de sua aplicabilidade.

Esta concepção de aprendizagem implementa o conceito de acessibilidade,

tratado aqui como o obstáculo maior hoje na sociedade do conhecimento: um mundo

dividido entre os que possuem acesso à informação e os que estão excluídos deste

processo. A questão é: uma vez garantindo a acessibilidade aos professores,

mudando completamente os paradigmas de sua formação, conseguiremos

transformar sua atuação no ambiente escolar? Estaremos construindo uma nova

forma não apenas de atuação do professor, mas sim, de gestão escolar? A opção

por uma metodologia a distância garante as transformações nos processos

individuais?

A formação do professor em uma modalidade com inserção tecnológica,

embutida na própria metodologia de um curso na modalidade a distância, poderá

propiciar uma diferença significativa em sua atuação na Educação Básica. Ao fazer

o curso de Licenciatura na disciplina em que efetivamente atua, o professor que já

exerce essa atividade, possivelmente acumulará, não apenas o conteúdo específico

que leciona, mas também, inúmeras possibilidades pedagógicas que permitam uma

atuação mais efetiva, inserida realmente em uma sociedade de informação e

conhecimento. Assim, os professores atuantes nos mais remotos municípios do

interior da Paraíba, por exemplo, travarão conhecimento com a Internet, software

livre, descobrindo as inúmeras possibilidades que o acesso à informação permite, ao

mesmo tempo em que desenvolverão um conceito de autonomia na aprendizagem

na construção de sua própria aprendizagem.

A nossa hipótese para esta pesquisa é que o Pró-Licenciatura, como política

pública de educação a distância, apresenta estratégias de mudança paradigmática

nas concepções e práticas educacionais dos professores que estão, efetivamente,

em sala de aula, a partir de elementos do campo dos Estudos Culturais, propondo a

formação destes professores na modalidade a distância com o propósito de

promover mudanças na escola, a partir dos pressupostos da ética, da cultura, da

formação de redes sociais, da diversidade e do contraponto global/local.

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Para tanto, é de extrema importância para a compreensão da prática de EAD,

como uma modalidade de ensino, entender as mudanças ocorridas na produção que

são um reflexo da transformação no padrão de acumulação econômica. O enfoque

na relação intrínseca entre o padrão de acumulação vigente e as práticas de EAD já

foi elaborado por diversos autores (BELLONI, 2003; NEGROPONTE, 1999;

PETERS, 1983). Segundo Belloni (2003), este debate é crucial já que estes modelos

têm influenciado, não apenas na elaboração dos modelos teóricos, mas nas próprias

políticas e práticas de EAD, no que diz respeito, tanto às estratégias desenvolvidas,

como à organização do trabalho acadêmico e de produção de materiais

pedagógicos.

Estas mudanças se traduziram em um modelo de organização do trabalho e

da produção que acabaram por impactar a educação aberta. Segundo Belloni, “os

modelos da sociologia industrial penetraram no campo da educação aberta e houve

grande influência com significativo impacto em suas concepções e estratégias

educacionais” (2003, p. 18).

No dizer dessa autora, as demandas na formação inicial e continuada mudam

substancialmente, apontando para duas grandes tendências: a reformulação radical

dos currículos e métodos de educação, privilegiando a multidisciplinaridade e a

aquisição de habilidades de aprendizagem, e a oferta de formação continuada ligada

aos ambientes de trabalho, numa perspectiva de aprendizagem ao longo da vida.

Lévy (1999) sintetiza esta necessidade ao afirmar que o uso das tecnologias

digitais e das redes de comunicação interativa estão amplificando e provocando

profundas transformações na relação com o saber. O prolongamento de

determinadas capacidades cognitivas humanas é redefinido, em razão do suporte

tecnológico, colocando em questão o funcionamento das instituições e a divisão do

trabalho, que estão inseridos agora nas possibilidades de criação coletiva,

aprendizagem cooperativa e colaboração em rede.

O que se discute aqui é ainda mais complexo, pois, a escola não precisa

modificar-se para acompanhar o novo modo de produção, mas sim, porque as

formas de aprendizagem se modificaram e todos os paradigmas anteriores não

funcionam mais e, quando aplicados, dificultam a ação fim da escola: possibilitar a

aprendizagem.

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O nosso objeto de estudo é a educação a distância como instrumento de

mudança paradigmática na formação de professores atuantes na rede pública, na

perspectiva dos Estudos Culturais, através do Programa Pró-Licenciatura, de modo

a compreender as novas dimensões deste processo que estão para além da

incorporação de conteúdos e novas técnicas. Pretendemos compreender, interpretar

e explicar os referenciais paradigmáticos do processo de construção, implementação

e avaliação do programa de formação de professores Pró-Licenciatura. É necessário

definir as questões político-ideológicas que desenharam as ações de Estado na

implementação do Projeto Pró-Licenciatura e avaliar a potencialidade e obstáculos

encontrados no Pró-Licenciatura e as dimensões reais das estratégias

governamentais para mudança dos paradigmas culturais e seus desdobramentos no

ambiente escolar.

O trabalho está estruturado em cinco capítulos, que contemplam o percurso

de surgimento da educação a distância, contextualizando a modalidade e relatando

o processo de implementação do Programa Pró-Licenciatura. No primeiro capítulo

apresentamos a introdução com ao detalhamento do nosso percurso, justificando a

escolha do tema e a estrutura do trabalho.

O segundo capítulo trata do nosso referencial teórico-metodológico com a

contextualização do foco da pesquisa, o tipo de pesquisa escolhida e a construção

da teoria no campo dos Estudos Culturais e Educação a Distância.

O terceiro capítulo traz os pressupostos teóricos da educação a distância com

sua contextualização histórica e econômica na sociedade informacional. Neste

capítulo, abordaremos a relação entre capital e educação ao longo da história em

cenários construídos, a partir do modo de produção vigente e apresentaremos o

panorama histórico da educação a distância no mundo e no Brasil.

No quarto capítulo, apresentamos a construção do Programa Pró-Licenciatura

como política pública de formação de professores na modalidade a distância, desde

os movimentos iniciais com a formação dos consórcios como instrumento de

articulação para a definição das políticas governamentais, até a análise dos

resultados dos editais publicados.

No quinto e último capítulo, tecemos uma reflexão sobre a formação de

professores estruturada na mediação pedagógica por tecnologias digitais e sua

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relação com a construção de identidades, propiciadas por elementos da cultura,

analisadas a partir do documento com os referenciais teóricos e metodológicos do

Pró-Licenciatura, as concepções de aprendizagem que fundamentam os Projetos

Político-Pedagógicos e um panorama da situação atual dos cursos implementados

no âmbito do Pró-Licenciatura, apontando os seus desafios e possibilidades. E,

finalmente, encerramos nosso trabalho com as conclusões da pesquisa e a proposta

de possíveis encaminhamentos.

1.4 Nuvem de tags do capítulo

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2 CONSTRUINDO OS REFERENCIAIS TEÓRICO- METODOLÓGICOS: O CAMPO DOS ESTUDOS CULTURAIS E A

EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA

Dan Perjovschi . What Happened to us?

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2.1 A escolha do campo teórico

O pesquisador que tem como seu foco de pesquisa a educação a distância

encontra uma diversidade de elementos que pode ser resolvida, a partir da escolha

de um deles para análise, com base nos pressupostos já conhecidos: teoria da

comunicação, relações sociológicas ou antropológicas do indivíduo em sociedade,

teorias da aprendizagem ou referenciais tecnológicos. Todos estes elementos

precisam e devem ser pesquisados neste campo de conhecimento, já que o

aprofundamento dos estudos vem trazendo uma melhoria significativa nos cursos

realizados a distância, seja a partir da inclusão de novas “ferramentas”, seja a partir

de mudanças na perspectiva da aprendizagem.

A escolha em pesquisar a Educação a Distância na perspectiva dos Estudos

Culturais foi realizada, enfatizando a necessidade de introduzir um aspecto

diferenciado na pesquisa sobre a Educação a Distância, ou especificamente, sobre

as possibilidades de uso das tecnologias no campo da educação, enfocando

elementos relacionados com a identidade e a cultura. Esta abordagem não se revela

uma opção muito fácil durante o percurso de construção do trabalho, pois como

afirma Costa (2005), o campo de pesquisa dos estudos culturais é um campo que

não se entrega facilmente e a própria noção de teoria é questionada. Nesta

perspectiva, acrescentamos mais um elemento. Este campo não se revela com

facilidade aos olhos do pesquisador; ele exige um aprofundamento intenso de seus

conceitos antes que possibilite a realização de sua prática. Isto significa que

adequação e coerência são as palavras-chave neste processo e nenhuma estrutura

fora de seus pressupostos pode ser inserida sem prejuízo para os resultados da

pesquisa.

Esse aprofundamento nada mais é do que escolher e acreditar nos

pressupostos do campo de pesquisa que está se abraçando, não apenas porque é

um tema da “moda” ou aparentemente mais fácil de responder às questões da

pergunta da pesquisa. É necessário realmente vivenciar estes pressupostos no

percurso da pesquisa, já que o convencimento dos resultados não estará pautado

em um dado estatístico ou em uma resposta única e inequívoca.

Assim, a proposta de uma pesquisa relacionando a Educação a Distância e

seus pressupostos no campo dos Estudos Culturais (EC), parecia, em um primeiro

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momento, um movimento viável e necessário para a elaboração de um olhar que

estivesse voltado para o sujeito, aluno desta modalidade de ensino, ou para as

motivações na construção de uma política pública desta envergadura, considerando

também o perfil do governo que implementou estas políticas. Porém, durante o

processo de construção dos referenciais teóricos e metodológicos, a complexidade

dos Estudos Culturais, enquanto campo de pesquisa, propiciou o desenvolvimento

de uma série de reflexões sobre estas escolhas e as possibilidades diversas de

caminhos para a realização do trabalho proposto.

Quando pensamos na estrutura deste capítulo, nossa maior inquietação

estava relacionada com as dificuldades que o campo de pesquisa dos Estudos

Culturais apresenta aos pesquisadores. A fertilidade, diversidade e amplitude deste

campo de pesquisa revelam as suas estruturas complexas, escorregadias,

nebulosas e exigentes quando definitivamente decidimos apropriá-lo. As dificuldades

que constatamos na estruturação da pesquisa, na definição dos conceitos e

categorias de análise, fomentaram uma série de reflexões e inquietações que

buscamos apresentar ao longo deste texto, na perspectiva de compartilhar este

processo de construção e decisão com outros pesquisadores que escolheram trilhar

o mesmo caminho. Quanto maior era a dificuldade de estabelecer as conexões entre

o meu foco de pesquisa e o campo dos Estudos Culturais, mais vislumbrávamos a

importância e a infinitude desta prática. Assim como aquele que quer compreender

não pode se entregar às suas opiniões prévias e ignorar a opinião do texto, a

formação de uma consciência formada hermeneuticamente tem que se mostrar

receptiva desde o princípio para a alteridade do texto, ou seja, não apenas ouvir,

mas também, enxergar o outro. Este tem sido nosso maior exercício durante esta

trajetória: Compreender filosoficamente que o importante é confrontar a verdade do

outro com as nossas próprias opiniões prévias, estabelecendo um diálogo constante,

em que não existem vencedores e vencidos, mas simplesmente aqueles que

transformam e são transformados, a partir de suas práticas. Escrever este capítulo

não foi importante porque nos fez ver onde pretendíamos chegar, mas sim, porque

nos apontou de onde devíamos partir.

São estas reflexões que trabalharemos neste capítulo, cujo objetivo é realizar

uma reflexão sobre as contribuições teóricas dos Estudos Culturais como campo de

pesquisa e a apresentação de um breve relato do percurso metodológico adotado.

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2.2 Contextualizando a discussão: sobre o foco da pesquisa

Detalharemos a seguir, alguns aspectos do foco de nossa pesquisa para

contextualizar as escolhas teóricas e metodológicas realizadas para o

desenvolvimento deste estudo. O Programa Pró-Licenciatura, objeto do nosso

estudo, é um programa que tem como objetivo a criação de cursos de Graduação

(Licenciaturas) na modalidade a distância para formação e qualificação do professor

que atua em sala de aula na rede pública, sem nível superior (ou quando apresenta

nível superior em uma área diversa da qual efetivamente atua). Os indicadores

educacionais relativos à formação de professores, que se encontram nas salas de

aula das escolas públicas no Brasil, sinalizam para a necessidade de se desenvolver

projetos de formação acadêmica para esse educador, de modo que haja mudanças

na qualidade da educação básica ofertada na rede pública de ensino.

O documento que apresenta as diretrizes conceituais e metodológicas do

Programa Pró-Licenciatura contém elementos que não se restringem somente aos

aspectos técnicos da formação docente. Observamos que vários critérios neste

documento apresentam princípios subjetivos, permeando comportamentos e atitudes

docentes que não seriam possíveis de contemplação em currículos ou conteúdos

dissociados dos aspectos culturais da prática pedagógica.

Embora a opção pela modalidade a distância seja justificada por questões

pragmáticas relacionadas aos custos, localização geográfica e inclusão tecnológica,

os aspectos relacionados ao processo de mediação pedagógica, por meio do uso

maciço das tecnologias de informação e comunicação (TIC’s), podem ser usados

como um importante dispositivo na construção de mudanças na formação e atuação

dos professores na Educação Básica. Afinal, no momento em que atingimos níveis

bastante elevados de desenvolvimento tecnológico, devemos capitalizá-los para a

educação, melhorando o perfil acima apresentado, no que tange à formação dos

educadores e, consequentemente, contribuindo para o desenvolvimento econômico,

social e cultural do país. O desenvolvimento de cursos na modalidade a distância

instituiu a utilização de tecnologias da informação como agregado indissociável de

sua proposta pedagógica.

É possível afirmar que a criação dos cursos de graduação a distância, em

diversas áreas, permite um processo de inclusão de indivíduos que não teriam outra

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possibilidade de realizar um curso em nível superior. A flexibilidade dos horários, a

não obrigatoriedade da frequência diária, a utilização do computador como

“ferramenta”, entre outros elementos, amplia consideravelmente o leque de pessoas

que pode incluir-se em um processo de formação institucional.

Apesar da definição e do objetivo geral do Pró-Licenciatura estarem focados

apenas na questão da qualificação do professor (e seu consequente prejuízo ao seu

desempenho) e sua relação direta com a qualidade da Educação Básica, o

documento completo apresenta outros conceitos muito mais complexos. Ao

analisarmos o documento com as propostas conceituais e metodológicas do

Programa, observamos que dos seis eixos que estruturam a proposta, apenas um

está restrito ao campo da competência disciplinar, relacionada ao domínio dos

conteúdos e técnicas. Os demais estão fundamentados em mudanças culturais

profundas, alicerçados em elementos que compreendem as subjetividades que

permeiam os estudos culturais.

A ênfase na formação dos conteúdos de sua área está explicitada apenas no

primeiro eixo. A formação teórica sólida e consistente está associada de forma direta

com os princípios políticos e éticos que dependerão, exclusivamente, do ambiente

cultural no qual o professor estiver inserido. A proposta de formar um educador

capaz de “propor e efetivar as transformações político-pedagógicas na escola” é

uma afirmação contundente de que as estruturas organizacionais e pedagógicas das

escolas hoje não são adequadas ao que parte das políticas públicas consideradas

aceitáveis para uma educação de qualidade.

Ao conectar em seus eixos a compreensão de uma escola (na visão do

professor) como um espaço social, sensível à história e às culturas locais com uma

ação afirmativa de inclusão digital (através da viabilização da apropriação dos

educados das tecnologias de comunicação e informação) nos parece que a decisão

em formar professores na modalidade a distância não é apenas uma opção

fundamentada em questões operacionais (tempo, limites geográficos e custos).

Embora estes elementos façam parte da viabilidade técnica para a implementação

de cursos na modalidade a distância (não podemos menosprezar os aspectos

econômicos e jurídicos), a inserção desta metodologia com o forte agregado

tecnológico inerente ao seu desenvolvimento, pode, na verdade, ter sido a premissa

mais importante para a decisão estratégica de sua implementação.

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2.3 Construindo a teoria: o campo dos Estudos Culturais e a Educação a Distância

Ao iniciar o processo de aprofundamento dos referenciais teóricos escolhidos,

nos deparamos com a complexidade do próprio campo de pesquisa dos Estudos

Culturais. A complexidade está estruturada na própria fundamentação teórica e na

escolha metodológica, já que o campo dos Estudos Culturais questiona o próprio

sentido de teoria, se contrapondo aos modelos existentes e buscando novos olhares

e perspectivas sobre a pesquisa científica. Surgem dúvidas em conceitos

considerados sólidos, como cultura, identidade, sujeito, globalização, fronteiras,

entre outros, que são tratados em abordagens diversificadas, em que as certezas

foram substituídas por questionamentos. A questão central era descobrir no campo

dos Estudos Culturais, quais os conceitos fundamentais que deveríamos nos

apropriar e aprofundar para servir como fundamentação das nossas análises neste

estudo.

Surge aqui uma questão interessante dos Estudos Culturais. A história de

vida dos autores faz parte da construção de suas estruturas teóricas, não estão

como em outros campos do conhecimento, separados por um modelo científico que

ignora as influências recíprocas entre o sujeito e o objeto. Neste campo de pesquisa,

o que somos, nossa trajetória, nossa bagagem, nosso histórico e nossas atitudes

fazem parte da construção do nosso objeto de pesquisa. Assim, o histórico pessoal

de Raymond Williams é decisivo para a construção de seu conceito de cultura e

todas as inferências realizadas a partir daí, da mesma forma que a vida de Stuart

Hall alicerça sua discussão sobre identidade pós-colonialismo.

Considerando este aspecto dos Estudos Culturais, a busca por uma relação

direta entre as questões relativas ao nosso estudo, a educação a distância, a partir

do pró-licenciatura e as experiências de Williams e Hall com a educação de Jovens

e Adultos e sua formação nos movimentos sociais, é o primeiro elo estabelecido no

aprofundamento das leituras dos dois autores. Segundo Hall (2003), no ensaio

intitulado “The Future of Cultural Studies” de 1989, Williams coloca as raízes dos

Estudos Culturais nos primórdios do movimento para a educação de adultos.

Encontramos em Williams as considerações necessárias sobre o conceito de cultura

e na leitura de Hall, verificamos as nuances e possibilidades do conceito de

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identidade. Os dois conceitos são fundamentais na construção do referencial teórico

desta pesquisa e sobre eles trataremos a seguir.

Williams estruturou suas reflexões com referência na classe trabalhadora,

incomodado com a visão do pensamento marxista sobre as questões relacionadas

com a mídia, a literatura e a comunicação. Como um dos fundadores da nova

esquerda, seu ponto de partida foi a teoria marxista, com a qual ele reinterpretou as

questões relacionadas com a cultura, embora a considerasse como parte dos modos

de produção. Para o autor, a cultura é um elemento fundamental que não pode estar

subjugada às questões econômicas e políticas, e considerada “todo um modo de

vida de um grupo social conforme a estruturação pela representação e pelo poder”

(WILLIAMS, 1961, p. 16).

Neste contexto, o uso dos termos “prática social” e “produção cultural” são

entendidos como um sistema de significações que ampliou a interpretação do termo

e incluiu dimensões como “modo de vida global, sistemas de significações e

atividades artísticas e intelectuais” (ARAÚJO, 2004, p. 4). A ideia então é inversa ao

pensamento do Romantismo que associava a cultura ao saber da elite ou dos

privilegiados. Para Williams, a cultura é ordinária porque está em toda a sociedade e

em toda mente.

Os autores com os quais Williams dialoga e estabelece pontes e

fundamentações apontam para o teor do corpo de seu trabalho. Estão presentes

Lukács, Lefebvre, Gramsci e Bakhtin, além de Marx, que fundamentam a elaboração

de uma teoria materialista da cultura, de forma que concepções marxistas e

estruturalistas foram superadas.

Para esta pesquisa, é particularmente interessante a associação que Williams

estabelece entre a cultura de massa e as questões relativas ao processo de

industrialização e urbanização, principalmente porque ele não suprime as questões

relativas ao modo de acumulação e o conceito de cultura. Na verdade, ele amplia

esta perspectiva, possibilitando a realização de inferências e relações importantes

quando analisamos a educação a distância em um contexto de inclusão.

No primeiro capítulo de nosso trabalho, desenvolvemos o histórico e os

pressupostos da educação a distância, a partir das relações apontadas por Marx

sobre a destituição do poder sobre o trabalho realizada pelo capitalismo no processo

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de industrialização. Ao afirmar que a industrialização foi veementemente rejeitada,

tanto no que diz respeito à produção por máquina, quanto às relações sociais que o

sistema fabril dava lugar (ARAÚJO, 2004), é colocado em pauta que o conceito de

cultura em massa está relacionado com a estrutura do modo de produção, e a

relação do trabalhador neste contexto de produção. Assim, é possível apresentar o

histórico da educação a distância e seu papel na sociedade moderna, a partir do

conflito existente entre os trabalhadores e o capitalista que engendrou alternativas

para a formação do trabalhador, privado por inúmeras razões, da oportunidade de

realizar seus estudos em um modelo padrão oferecido pelas sociedades capitalistas.

Outro aspecto importante para ser trabalhado – com base no conceito de

cultura mais amplo – é a relação entre cultura e educação, elemento importante para

responder a pergunta central desta pesquisa. Ao pressupor que a educação a

distância – através do programa governamental Pró-Licenciatura – objetivava

promover mudanças na cultura das escolas (e dos professores), é essencial discutir

não somente o conceito de cultura como também trazer a discussão sobre a cultura

escolar. Ao discutir a questão da cultura neste contexto, surge a necessidade de

aprofundar o segundo elemento que estrutura a nossa pesquisa, o conceito de

identidade.

Para elaborar as questões relativas ao conceito de identidade, encontramos

em Stuart Hall uma abordagem muito interessante sobre o descentramento da

identidade do sujeito ou deslocamento. Para Hall (2006), o deslocamento ou

descentramento dos movimentos teóricos sobre os estudos da cultura no campo de

pesquisa dos Estudos Culturais aconteceu com o surgimento da chamada “virada

lingüística” ou a descoberta da discursividade, da textualidade. Ele ressalta que a

metáfora do discursivo da textualidade representa um deslocamento que está

sempre implícito no conceito de cultura.

Há sempre algo descentrado no meio cultural, na linguagem, na textualidade,

na significação; há algo que constantemente escapa e foge à tentativa de ligação,

direta e imediata com outras estruturas. E ainda, simultaneamente, a sombra, a

estampa, o vestígio daquelas outras formações, da intertextualidade dos textos em

suas posições institucionais, dos textos como fontes de poder, da textualidade como

local de representação e de resistência, nenhuma destas questões poderá jamais

ser apagada dos Estudos Culturais (HALL, 2006, p. 199).

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Este aspecto é fundamental no desenvolvimento de nossa pesquisa porque

reafirma a possibilidade de uso dos estudos culturais na análise do discurso, por

intermédio da interpretação dos textos como fonte de poder para a realização de

mudanças, dialogando ou não com seus pares. Para Hall, nunca foi possível

teoricamente, no campo dos Estudos Culturais, dar conta das relações de cultura e

seus efeitos. Para tanto, a ideia de tensão é um elemento essencial, principalmente

quando tratamos do discurso governamental e seus impactos nos sujeitos afetados

por ele, tanto quanto na prática como pesquisadora com o reconhecimento dos

limites que precisaremos assumir no nosso estudo. Afinal, segundo Hall, os Estudos

Culturais têm chamado a atenção não apenas devido ao seu desenvolvimento

teórico interno, por vezes estonteante, mas por manter questões políticas e teóricas

numa tensão não resolvida e permanente (HALL, 2006, p. 200).

Quanto ao conceito de identidade nesta pesquisa, ele surge como um aspecto

do sistema de representação, no qual seus processos de moldagem e remodelagem

são determinados, a partir de mudanças provenientes da globalização e da

compressão espaço-tempo. São os deslocamentos propostos por Hall (2006), ao

afirmar que a moldagem e a remodelagem de relações espaço-tempo no interior de

diferentes sistemas de representação têm efeitos profundos sobre a forma como as

identidades estão localizadas e representadas.

Neste contexto, conseguimos estabelecer nossa identificação completa com o

campo dos Estudos Culturais, uma vez que todas as identidades estão localizadas

no espaço e no tempo simbólico, e o impacto da globalização sobre as identidades

está exatamente centrado no fato de que todos os sistemas de representação

apresentam coordenadas espaciais e temporais. Nesta pesquisa, temos dois eixos a

tratar na perspectiva da globalização que motivou a implementação dos programas

de educação a distância na educação superior no Brasil, e na compressão espaço-

tempo que a educação a distância, enquanto modalidade, provoca nos alunos e sua

relação com estas alterações de identidade na construção da aprendizagem.

No caso da globalização, trazemos a visão de Oliveira (2001, p. 87),

afirmando que no decorrer dos anos 90, o debate sobre educação e

desenvolvimento “esteve pautado pela exigência de responder ao padrão de

qualificação emergente no contexto de reestruturação produtiva e de globalização da

economia, ocupando lugar de destaque nas políticas educacionais”. As discussões

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que ocorreram explicitam a necessidade de serem pensadas alternativas para

problemas estruturais da educação brasileira. A preocupação central, contudo, não

estava limitada à formação da força de trabalho para lidar com as inovações

tecnológicas e organizacionais. Incluíram também questões políticas como

financiamento, controle e gestão da educação pública e cultural, a partir das

mudanças da reestruturação econômica e da necessidade de mudança do

paradigma educacional na sociedade da informação.

Em relação à compressão espaço-tempo na educação a distância, podemos

afirmar que a criação dos cursos de graduação em diversas áreas permite um

processo de inclusão de indivíduos que não teriam outra possibilidade de realizar um

curso em nível superior. A flexibilidade dos horários, a não obrigatoriedade da

frequência diária, a utilização do computador como “ferramenta”, entre outros

elementos, amplia consideravelmente o leque de pessoas que podem incluir-se em

um processo de formação institucional. A compressão da distância e a ampliação do

tempo de estudos provocam um movimento que é uma característica interessante

na Educação a Distância. A distância física é encurtada pelas tecnologias de

comunicação que conectam professores, alunos e tutores fisicamente distantes. A

ampliação do tempo de estudo está diretamente relacionada com a “quebra” da

temporalidade, já que o aluno pode acessar o material em diversos momentos,

inclusive de madrugada e aos domingos. As orientações e aulas estão no ar

ininterruptamente e cabe ao aluno aproveitar o momento mais adequado para

interagir com o material.

A questão mais inquietante é que a maior vantagem da Educação a Distância

é também a razão do insucesso dos alunos. A flexibilidade propiciada pela

metodologia, que é o principal atrativo para os alunos que almejam estudar em seu

tempo livre ou não ter a obrigação de frequentar a sala de aula todos os dias, acaba

por tornar-se o maior obstáculo no desenvolvimento da aprendizagem. A

compressão espaço-tempo ou a redefinição destas duas categorias tão essenciais

ao ser humano provoca uma dificuldade em lidar com o tempo (que sempre parece

mais longo do que é de fato) e com as distâncias (a não exigência presencial

provoca o isolamento e sensação de abandono no aluno). Harvey já sinalizava para

o impacto das mudanças destas duas categorias em nossas vidas quando afirmava

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que “compressão o tempo-espaço sempre cobra o seu preço da nossa capacidade

de lidar com as realidades que se revelam à nossa volta” (1993, p. 275).

Tanto o conceito de globalização como as redefinições nos conceitos de

temporalidade e espacialidade podem levar a pesquisa para um debate sobre a pós-

modernidade, um conceito controverso, mas apropriado por vários teóricos para

explicar/justificar algumas das mudanças na sociedade. Temos Antonhy Giddens,

com As Consequências da Modernidade (1990), Henri Lefebvre com A Vida

Cotidiana no Mundo Moderno (1991), Edward Soja com Geografias Pós-Modernas

(1993), David Harvey com Condição Pós-Moderna (1993) e Jean-François Lyotard

com O Pós-Moderno (1986), entre outros autores que podem fornecer a

fundamentação teórica para um aprofundamento da questão.

É possível encontrar vestígios marxistas no corpo do texto, sobretudo no

terceiro capítulo, mas a existência desses lampejos teóricos está relacionada com a

nossa formação marxista consistente na graduação e no mestrado, posteriormente

deslocada com a assimilação dos Estudos Culturais. Eles também apontam um

processo de formação, maturação e libertação de algumas amarras teóricas que são

características dos Estudos Culturais que encontram suas origens no pensamento

marxista. Hall (2006b) dedica um capítulo do seu livro Da Diáspora: Identidades e

Mediações Culturais para tratar sobre a influência do marxismo dos Estudos

Culturais, já que existe uma certa convergência em alguns aspectos. Isso não quer

dizer que exista uma aproximação teórica possível, o próprio autor adverte que “em

nenhum momento os estudos culturais e o marxismo se encaixaram perfeitamente,

em termos teóricos” (HALL, 2006b, p. 191). Não existia espaço no pensamento

marxista para as questões relacionadas com a cultura, ideologia, linguagem e o

simbólico.

Diante do percurso proposto aqui, evidenciamos as escolhas teóricas nas

quais pautamos o desenvolvimento da nossa pesquisa. Relatamos a seguir, as

definições epistemológicas para discutir a questão da educação a distância e a

formação de professores na perspectiva dos estudos culturais.

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2.4 Anotações sobre o percurso metodológico

A escolha metodológica para desenvolver a nossa pesquisa recaiu sobre a

pesquisa documental, já que a questão central deste estudo está relacionada com

uma política pública específica. Quando o objeto foi delimitado e as questões

centrais da tese surgiram, ficou evidente que a documentação necessária para

fundamentar as questões propostas não poderia ser utilizada apenas como um

material subjacente ao tema, a documentação era o tema. Segundo Lankshear e

Knobel (2008), a pesquisa educacional baseada em documentos pode construir

interpretações para identificar ou construir os significados.

Os pesquisadores freqüentemente se engajam na pesquisa baseada em documentos para investigar os tipos de significados construídos através dos textos. Isso revela o tipo de trabalho ideológico que os textos podem realizar e como eles podem posicionar-se, encorajando-nos, como leitores, para ver e abordar o mundo – ou fragmentos dele- de certas maneiras em vez de outras. Este propósito é alcançado reunindo textos relevantes para a área de interesse do pesquisador, e depois submetendo-os a algum tipo de interpretação através da análise textual. Isso implica o processo de declarar que o texto – ou o corpus de texto – gera alguns significados e alguns efeitos desses significados (LANKSHEAR; KNOBEL, 2008, p. 105).

Uma vez decidido que a pesquisa seria fundamentada na documentação

relativa ao Pró-Licenciatura, enquanto uma política pública de formação de

professores na modalidade a distância, nos deparamos com uma quantidade

considerável de documentos sobre o assunto que incluíam, além dos documentos

oficiais do MEC, uma série de outros documentos relativos ao processo de

construção e implementação do programa. Este aspecto é fundamental no trabalho,

uma vez que consideramos como uma premissa básica para compreender o Pró-

Licenciatura na perspectiva dos Estudos Culturais, a intensa rede de comunicação

estabelecida entre diversos sujeitos envolvidos com a educação superior no país e

as inúmeras contribuições que foram realizadas para a construção deste programa.

Foi muito importante manter o foco de análise dos documentos na perspectiva dos

Estudos Culturais, uma vez que o tipo de análise textual empregada deve ser

“coerente com a perspectiva teórica adotada pelo pesquisador que, por sua vez,

deve ser coerente com a estrutura conceitual e teórica do problema da pesquisa”

(LANKSHEAR; KNOBEL, 2008, p. 105). Buscamos, então, aplicar uma análise

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textual que produzisse uma interpretação dos documentos para responder a questão

original da pesquisa.

Nesta perspectiva, foi essencial uma divisão temporal entre o antes, o

durante e o depois da implementação do programa. O recorte temporal estabelecido

para a pesquisa foi o período entre 2003 e 2006, sendo o marco central o edital do

MEC n° 001/2004: a primeira chamada pública para as instituições que desejavam

ofertar cursos na modalidade a distância. Isso não significa que outros eventos

importantes realizados nos anos subsequentes não tenham sido referenciados.

Buscamos reunir neste estudo todas as informações relevantes sobre o Pró-

Licenciatura, sendo que o marco temporal evidencia apenas o foco central da

pesquisa, mas não é absolutamente limitado por ele.

O ano de 2003 pode ser considerado como preparatório para a elaboração da

proposta do programa, por meio de intenso diálogo com as representantes das

instituições; o ano de 2004 foi destinado à publicação do edital, avaliação das

propostas e divulgação dos resultados e, finalmente, os anos de 2005 e 2006,

destinados ao processo de implementação dos cursos até a criação da Universidade

Aberta do Brasil, que encerra as ações do Pró-Licenciatura ao abarcar os cursos do

programa em sua estrutura.

O primeiro passo para começar a organizar a pesquisa foi selecionar, dentre

estes documentos, os que poderiam ser considerados válidos e os que deveriam ser

descartados. O critério nesta seleção estava relacionado com a importância do

documento em relação ao tema pesquisado e a sua origem (baseado em um

princípio de autoridade e credibilidade do documento). O método mais eficiente para

organizar a documentação foi estabelecer diferentes níveis de importância para cada

um deles e trabalhar com esta classificação no decorrer da pesquisa. Assim, embora

a análise central da pesquisa esteja focada nos documentos oficiais publicados pelo

MEC, outros documentos também são importantes para fundamentar alguns dos

pressupostos da pesquisa.

Um outro dado importante que precisa ser abordado é que não consideramos

como documento apenas os textos materializados de forma impressa, uma vez que

a pesquisa aborda as inovações tecnológicas, foram importantíssimos os

documentos que circularam através de listas de discussão (oficialmente criadas e

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gerenciadas pelas Instituições de Ensino Superior - IES), vídeos com entrevistas e

declarações realizadas e disponibilizadas, através de veículos oficiais e as telas das

plataformas de aprendizagem e gerenciamento dos cursos a distância. Em resumo,

todas as formas de comunicação sobre o assunto, devidamente registradas e

disponibilizadas em ambientes oficiais ou com credibilidade comprovada, foram

utilizados na pesquisa.

Esta diversidade das mídias documentais utilizadas pode ser justificada por

dois aspectos. O primeiro é o próprio escopo teórico no campo dos Estudos

Culturais que possibilita utilizar e discutir diferentes mídias sejam elas de massa ou

não como uma expressão legítima do pensamento de um determinado grupo. O

segundo é a riqueza de informações disponíveis em canais de comunicação novos

naquele momento que eram plenamente utilizados em função da própria

característica dos integrantes do grupo, já que todos se apropriavam com

desenvoltura do uso das tecnologias digitais.

Uma vez determinado os diferentes níveis dos documentos disponíveis, torna-

se essencial listar os elementos estruturantes da questão central da pesquisa e

analisar, em cada um deles, o contexto em que estes elementos aparecem e qual o

seu efeito na constituição do programa. Um exemplo prático é a construção do

conceito de identidade do aluno dos cursos a distância oferecidos, que foi discutido

de forma intensa durante o processo de elaboração do edital, durante a seleção dos

projetos (a partir das orientações para elaboração dos projetos) e, posteriormente,

na definição do perfil dos candidatos ao vestibular destes cursos.

Outro aspecto importante na definição do percurso metodológico foi o recorte

territorial da pesquisa. A pesquisa enfoca um programa nacional, e todos os

elementos relacionados com sua elaboração e divulgação foram considerados de

aspecto nacional, mas quando foi necessário caracterizar o processo de

implementação dos cursos a distância nas instituições no âmbito do Pró-Licenciatura

e analisar os projetos político-pedagógicos, reduzimos o recorte para o chamado

Consórcio Nordeste Oriental, que compreende os estados de Alagoas, Pernambuco,

Paraíba e Rio Grande do Norte. A necessidade do nosso interesse maior era

verificar o processo de implementação de uma política pública na nossa região de

atuação, em locais que apresentam baixos Índices de Desenvolvimento Humano e

sérios problemas na formação de professores que atuam na rede pública.

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A escolha deste recorte territorial não compromete o resultado da pesquisa,

pois, ele poderia ter sido feito de forma aleatória, mas considerando a necessidade

de se retratar os bolsões de baixo índice de desenvolvimento e marcar o movimento

constante do global e o local, como um dos efeitos perversos da globalização,

optamos por uma seleção intencional do recorte territorial como uma ação política

que não pode ser descontextualizada do pesquisador no campo de estudos que

estamos inseridos.

2.5 Referências dos documentos utilizados na pesquisa

O documento central para o desenvolvimento desta pesquisa é a

RESOLUÇÃO/CD/FNDE/ Nº 34, publicado em 9 de agosto de 2005. O documento

com nove páginas na sua estrutura principal estabelece os critérios e os

procedimentos para a apresentação, seleção e execução de projetos de cursos de

licenciatura para professores em exercício nas redes públicas nos anos/séries finais

do ensino fundamental e/ou no ensino médio, na modalidade de educação a

distância. Esta Resolução possui nove anexos organizados da seguinte forma:

Anexo I, referente às condições de elegibilidade; Anexo II referente às

especificações técnicas do projeto do curso; Anexo III, referente aos aspectos e

diretrizes teórico-metodológicas e conceituais do Pró-Licenciatura; Anexos IV

referente ao processo seletivo; Anexo V referente aos critérios para análise e

pontuação dos projetos; Anexo VI apresenta a tabela de pontuação do corpo

docente; Anexo VII referente à apresentação da proposta; Anexo VIII apresenta o

calendário do processo seletivo; e Anexo XIX apresenta uma minuta de declaração

de compromisso da Secretaria de Educação do Estado com o programa, informando

o número de docentes em exercício sem a habilitação necessária. O foco das

atenções na pesquisa ficou concentrado no corpo da Resolução n° 34 e no Anexo

III, considerados o corpus documental desta pesquisa.

Para construir o percurso de implementação do Pró-Licenciatura utilizamos a

versão prévia dos editais, relatórios de assessoria, documento com os referenciais

de qualidade na EAD, atas de reuniões realizadas para formação de consórcios, a

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constituição da UNIREDE (e todos os documentos com o seu histórico e registros da

fundação), notícias publicadas pelo governo federal, resultados de seleção e propos-

tas publicados no Diário Oficial da União. As notícias publicadas em jornais de gran-

de circulação só foram utilizadas quando o objetivo era mostrar a polêmica de um

determinado assunto ou a abordagem utilizada pela imprensa para tratar um tema.

Um dos materiais mais interessantes utilizados no trabalho foi o resgate da

troca de mensagens eletrônicas realizadas no período de 2003 a 2006, na lista de

discussão criada pelos professores participantes do Consórcio Nordeste Oriental

que trata de várias questões que não estavam restritas apenas ao recorte geográfico

do grupo. Pelo contrário, muitas contribuições foram trocadas e diversas articulações

foram realizadas em várias regiões do país por meio desta lista.

Os Projetos Político Pedagógicos das IES, apresentações de slides realizadas

em eventos oficiais, assim como atas desses eventos também serviram de subsídio

para o desenvolvimento da pesquisa. O objetivo na seleção dos documentos era

retratar o discurso oficial sobre o Pró-Licenciatura e a fala dos envolvidos

diretamente ao Programa, analisando o grau de intencionalidade e participação de

cada um.

2.6 Sobre as imagens e nuvens de Tags dos capítulos

Para finalizar este capítulo é preciso falar um pouco sobre a escolha das

imagens, o texto da epígrafe e as nuvens de tags inseridas ao final de cada capítulo.

Na realização de um trabalho científico tivemos a preocupação constante de seguir

com rigor as normas da ABNT, mas era impossível não sentir uma certa inquietação

diante das amarras do modelo proposto, principalmente por escolher o campo dos

Estudos Culturais como opção teórica, campo esse que se recusa a limitar, a

circunscrever, que questiona as certezas disciplinares, que designa as

apresentações totalizantes de narrativas subjetivas e que recusa autoridade

absoluta (SANCHES, 1999, p. 194).

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Para amenizar esta inquietação com a forma, era preciso revelar algo que

indicasse ao leitor de forma inequívoca que esta tese estava, de forma definitiva,

inserida no campo dos Estudos Culturais, muito além da indicação contida no seu

título. Além disso, era necessário estabelecer uma ponte com as questões

tecnológicas não através de figuras que retratassem um universo tecnológico da

ficção científica, mas que o questionasse, levasse à reflexão, enfim, abordasse o

tema de forma contundente e crítica. Assim, escolhemos fragmentos de algumas

produções para atingir o nosso intento.

A epígrafe do trabalho é a reprodução do texto que está na parte final do

vídeo realizado pelo Professor Assistente da Universidade do Kansas, Michael

Wesch, sobre Etnografia Digital e publicado no YouTube em 2007. O vídeo era um

experimento do Professor Wesch com os seus alunos do curso de Antropologia

Cultural na Universidade do Kansas. O vídeo atingiu a marca de 100.000

visualizações em cinco dias e foi premiado em 2008. Tem duração de quatro

minutos e meio e fala sobre o impacto da tecnologia na nossa forma de nos

relacionar com o mundo, com os outros e com nós mesmos. Por isso o título “A

máquina somos nós”.

As normas da ABNT permitem a inserção de uma epígrafe no início de cada

capítulo, mas optamos por uma imagem no lugar de um texto. As imagens que estão

na abertura de cada capítulo fazem parte de um ousado projeto realizado no MOMa

de Nova York pelo artista, escritor e cartunista romeno que trabalha exclusivamente

com desenho, realizado nas paredes, no teto ou no chão dos espaços. Ele chamou

a atenção do mundo da arte com a sua instalação no pavilhão romeno na Bienal de

Veneza em 1999. Tem tido, desde então, um percurso de crescente e acelerado

reconhecimento internacional.

Dan Perjovschi reduziu ao essencial quer o processo de trabalho, quer o material que usa nos seus projectos. De sítio para sítio, de país para país, de continente para continente, transporta apenas cadernos de apontamentos e de desenhos e marcadores de tinta permanente. O seu método de intervenção, extremamente simples e directo, constituiu-se a partir de um princípio de depuração e de economia. A ferramenta exclusiva do artista é o desenho; contudo, não falamos de desenho no sentido convencional do termo. Passamos a explicar: Dan Perjovschi desenha directamente nas paredes, no tecto ou no chão dos espaços em que intervém, dispensando, assim, mesmo a folha de papel, suposto mínimo denominador comum quando falamos dessa prática ancestral. Menos

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é mais, portanto. Menos bagagem, menos material, menos objectos, menos peso, mais acuidade, mais sentido crítico, mais limpeza, mais clarividência, mais lisibilidade (CULTURGEST, 2007).

As imagens retratadas aqui fazem parte de um projeto chamado What

happened to us? A expressão tanto significa uma interrogação sobre os dias de hoje

na sociedade informacional, como também uma crítica ao belicismo norte-

americano. O trabalho é uma instalação categorizada como Permanent Marker on

Wall, que teria como tradução livre “marcador permanente na parede”.

E, finalmente, optamos por apresentar uma nuvem de tags ao final do capítulo

com as palavras mais recorrentes de cada etapa da tese. As nuvens de tags são

muito utilizadas nos blogs e em outros websites, e são uma lista hieraquizada das

palavras que foram categorizadas pelo autor. A freqüência com que uma

determinada palavra aparece no conjunto de textos do website é proporcional ao

tamanho da fonte. Assim, a nuvem de tags pode ser utilizada aqui como uma rápida

visualização das palavras-chave de cada capítulo e a sua incidência no texto. Cada

nuvem é diferenciada das demais e retratam exatamente o fio condutor de cada

capítulo. No site do Ministério da Cultura (MINC) encontramos a afirmação de que

existem outras possibilidades no uso das tags.

Existem outras formas de utilização das tags que envolvem a classificação aberta ou cooperativa, que convida os usuários do site a ‘taguear‘ livremente os conteúdos disponibilizados. Algo assim como uma dinâmica taxonômica emergente — nativa da rede — complementar às hierarquias classificatórias propostas pelas arquiteturas de informação tradicionais (MINC, 2009).

Mesmo considerando que a nuvem de tags é apropriada para a publicação na

web, apropriamo-nos deste artifício com a intenção de mostrar que existem

inúmeras possibilidades nas representações, sejam elas em mídias diferenciadas ou

em novas abordagens sobre a lógica da formatação do texto.

2.7 Nuvem de tags do capítulo

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3 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA E AS MUDANÇAS NA SOCIEDADE INFORMACIONAL

Dan Perjovschi . What Happened to us?

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3.1 A Sociedade Informacional

A revolução tecnológica da informação é a base para a consolidação de uma

sociedade informacional, estando relacionada com a apropriação da tecnologia em

benefício do fluxo contínuo de informação. A tecnologia pode ser compreendida,

segundo Castells (2003), como o uso de conhecimentos científicos para especificar

as vias de se fazerem as coisas de uma maneira reproduzível. Neste aspecto,

somente a tecnologia não é responsável por uma revolução informacional. O autor

deixa bem claro em sua obra que as tecnologias da informação devem ser

compreendidas como um “conjunto convergente de tecnologias em microeletrônica,

computação (hardware e software), telecomunicações/radiodifusão e optoeletrônica”

(CASTELLS, 2003, p. 67).

Para o autor, o que caracteriza a atual revolução tecnológica não é a

centralidade de conhecimentos e informação, mas a aplicação desses

conhecimentos e dessa informação que gera conhecimentos que são

retroalimentados de forma contínua, criando novas formas de inovação e uso.

Assim, os computadores, programas, sistemas de comunicação e programação

genética são amplificadores e extensões da mente humana que alteraram,

fundamentalmente, o modo pelo qual nascemos, vivemos, aprendemos, trabalhamos

e produzimos. A modificação em nosso modo de viver e em nossa compreensão

sobre a organização da sociedade é iniciada a partir do mundo do trabalho, já que

nele são inseridas as primeiras inovações tecnológicas que não modificam apenas a

técnica da produção, mas também, alteram a organização das firmas, a sua

estrutura e a divisão do trabalho.

Este forte agregado tecnológico é que foi inserido em todos os níveis do

cotidiano moderno: trabalho, lazer, produção e, finalmente, educação, a ponto de ser

impossível adiar mais o debate sobre a necessidade de inserir as inovações

tecnológicas no contexto educacional. De fato, a compreensão do conceito de

sociedade informacional é essencial para o nosso trabalho porque propõe uma

dimensão muito mais ampla do uso da tecnologia e sua apropriação por todos os

indivíduos da sociedade, afetando todas as instâncias do cotidiano, incluindo a

forma de aprender e transmitir o conhecimento.

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Considerando essa perspectiva da sociedade informacional, é necessário

aprofundar a nossa pesquisa nas mudanças que ocorreram dentro do modo de

produção e acumulação, uma vez que estes foram os pressupostos de

transformação de toda a sociedade, que passou de analógica para digital em menos

de meio século (NEGROPONTE, 1999). O processo de transformação tecnológica e

sua surpreendente expansão estão relacionados com a capacidade de criar uma

interface entre campos tecnológicos que utilizam uma linguagem digital na qual a

informação pode ser gerada, armazenada, recuperada, processada e transmitida

(CASTELLS, 2003).

A mudança que ocorre com o advento da sociedade informacional é iniciada e

consolidada no campo da acumulação e no modo de produção, modificando as

formas de produzir e trabalhar que interferem diretamente na educação. Esta

relação direta entre educação e trabalho existe desde que as escolas foram

inventadas pelo sistema capitalista, nas quais os sistemas de organização da

produção são apropriados e reproduzidos no campo da educação. Especificamente,

a educação a distância tem as suas origens e crescimento estreitamente vinculados

ao processo de acumulação e as relações entre capital e trabalho, já que como

modalidade, é criada exatamente para atender à demanda específica dos

trabalhadores sem formação ou pessoas que estavam, por inúmeras razões,

excluídas da educação formal.

O histórico da educação a distância reproduz o processo de tensão entre o

capital e o trabalho, em movimento constante de separação entre o intelectual e o

manual pela organização industrial e o desejo de apropriação do conhecimento dos

trabalhadores. Esta tensão, consolidada posteriormente no surgimento das

Universidades a distância, como um movimento de fortalecimento de grupos sociais,

foi também se modificando diante no novo contexto da sociedade informacional, por

meio de uma apropriação eficaz das tecnologias da informação e da comunicação

em benefício da acessibilidade ao conhecimento.

Neste novo contexto, (re) surge a educação a distância, mas apesar de uma

possível releitura desta modalidade em um contexto mais aberto e tecnologicamente

aprimorado, não é possível esquecer a sua relação de ambiguidade e tensão com o

modo de produção vigente. Entendemos como ambiguidade as duas possibilidades

de uso da modalidade a distância que, tanto pode ser utilizada como instrumento de

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condicionamento e reprodução da força de trabalho pelas forças hegemônicas,

como também pode ser um instrumento de formação e libertação dos trabalhadores

que a utilizam para transpor as barreiras de exclusão da educação formal. Assim, é

impossível compreender esta modalidade de ensino sem estabelecer as relações

com a produção e o padrão de acumulação capitalista. Neste sentido, é importante

compreender como o capital vem apropriando-se e servindo-se da educação para a

manutenção e reprodução de sua força de trabalho e as contradições inerentes a

este processo.

Neste aspecto, Belloni (2003) reflete sobre a estreita relação entre o modo de

acumulação e o estabelecimento da educação a distância como modalidade, de

modo a contribuir para a compreensão da evolução da educação a distância no

último século. De outro modo, autores trabalham com a construção de uma espécie

de linha do tempo da educação a distância, classificando-a em gerações distintas de

acordo com o componente tecnológico utilizado. Embora didática esta presunção

isola os dispositivos tecnológicos de sua estratégia pedagógica e,

consequentemente, não considera a sua contextualização social e econômica.

A abordagem que nos propomos a fazer sobre a educação a distância neste

capítulo não é histórica, como costuma ser utilizada em outros trabalhos que tratam

da mesma temática. Diversos outros autores já discorreram sobre a história da

educação a distância e sua evolução para justificar a sua configuração na sociedade

de informação. A idéia de construção de uma linha do tempo da educação a

distância, não nos ajuda a discutir elementos relacionados com os aspectos

subjetivos. É preciso compreender o que está registrado nas entrelinhas do

surgimento da educação a distância, a sua aplicação em diversos contextos

históricos, e quais as conseqüências da sua apropriação por diversos segmentos.

Este movimento nos leva a compreender, inclusive, o preconceito que cercou a

educação a distância nas últimas décadas do século XX. Se este preconceito foi

reconfigurado ou suprimido de alguma forma, é preciso investigar quais foram os

elementos que contribuíram para isso e quais os grupos que se apropriaram do

discurso tecnológico da educação a distância para configurar o panorama que

conhecemos hoje.

Diante do exposto, como iremos discutir os pressupostos teóricos da

educação a distância sem utilizar o seu histórico ou uma linha do tempo linear? A

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nossa proposta é trazer as relações econômicas dos principais movimentos de

utilização da educação a distância enquanto modalidade educacional e considerar

em quais modelos econômicos ela estava inserida e quais os grupos que se

apropriaram de sua flexibilidade metodológica para promover a formação de

indivíduos que estavam, por diferentes razões, fora do processo de educação

formal. Para construir este percurso, é essencial detalhar as mudanças no modo de

acumulação que mudaram a relação de trabalho e a forma de apreensão do

conhecimento. Consideramos como pertinente ao nosso trabalho, diante do aumento

vertiginoso dos cursos a distância, tomar como ponto de partida a reflexão sobre a

quem a educação a distância pode beneficiar e quais são os limites e possibilidades

deste benefício? São exatamente estas questões que trataremos a seguir.

3.2 Capital, trabalho e educação

Não pretendemos estabelecer aqui uma discussão sobre a origem da escola

moderna ou as motivações para a sua criação e continuidade. Como o nosso tema

aborda uma modalidade de educação considerada como marginal e paliativa ao

ensino regular, julgamos interessante inserir referências sobre a relação entre o

capital industrial incipiente do século XIX e sua relação com a educação,

especificamente tratados por Marx, na sua obra mais conhecida, O Capital. Esta

referência não se constitui em uma opção epistemológica; é apenas uma forma de

ilustrar o processo de exclusão do grupo considerado como força de trabalho pelo

capital no processo de construção da educação formal. Este movimento, apontado

de forma sucinta neste texto, foi reproduzido nas décadas seguintes, sendo a

principal razão da inexistência de um projeto de universalização da educação.

A apropriação da educação pelo capital não é uma característica do século

XX. Ela está intrinsecamente ligada ao surgimento do capital industrial e faz parte de

sua lógica de expropriação dos meios de produção da classe trabalhadora. Marx já

afirmava, ao discorrer sobre a legislação fabril inglesa, como as crianças eram

afastadas da escola para trabalhar na manufatura fabril.

As disposições da lei fabril relativas à educação fizeram da instrução primária condição indispensável para o emprego de crianças. Seu sucesso demonstrou, antes de tudo, a possibilidade de conjugar educação e ginástica com trabalho manual, e conseqüentemente o

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trabalho manual com educação e ginástica. Os inspetores de fábrica logo descobriram, através dos depoimentos dos mestres-escolas, que as crianças empregadas nas fábricas, embora só tivessem meia freqüência escolar, aprendiam tanto e muitas vezes mais que os alunos regulares que tinham freqüência diária integral. [...] Entre outras coisas, mostra ele como o dia escolar monótono, improdutivo e prolongado das crianças das classes superiores e médias aumenta inutilmente o trabalho do professor. Que desperdiça o tempo, a saúde e a energia das crianças de maneira infrutífera e absolutamente prejudicial. (MARX, 1989, p. 553 e 554).

A indústria moderna, ou o capital industrial, transforma as relações sociais de

produção a ponto de, em certas zonas rurais da Inglaterra, os pais serem proibidos

de mandar seus filhos à escola, sob pena de morrerem de fome. É interessante

observar que as leis fabris analisadas por Marx nesse capítulo também tratam dos

dispositivos que regulamentam e proíbem a existência das oficinas e do trabalho em

domicílio – uma ação do capital para estruturar a produção social. No século XVIII é

bem significativo que os diferentes ofícios tivessem a denominação de mistérios e a

indústria moderna transformou este conhecimento organizado sob a forma de

mestre e aprendiz em ciência da tecnologia, decompondo o processo de produção,

desconsiderando a intervenção da mão humana no processo de produção.

Esta ciência da tecnologia – que destituiu a formação do artífice,

desestruturando relações de trabalho e aprendizagem seculares – foi sistematizada

de forma a ser aprendida em um espaço formal: a escola que, a partir deste

momento, restringia-se aos grupos que interessava ao capital controlar. A

emergência e difusão da escola como instituição surge da relação das elites com a

tecnologia. É neste contexto que a escola passa a ser vista tanto como instrumento

produtor, quanto como capacidade de controlar a riqueza e o poder. Deste modo, a

escola é concebida dentro de um quadro ideológico definido, a partir da cultura das

forças dominantes.

Na transição do século XIX para o século XX, a burguesia sustenta e participa

do poder, mas sabe que sua continuidade depende de estar bem informada para

agir em conformidade com o momento e necessita dominar os saberes que lhe

asseguram a administração do poder. É sobre esta concepção burguesa que são

construídos os pilares do pensamento político, filosófico e da educação. Um bom

exemplo é como os liberais promoveram a idéia de que o indivíduo não é definido

pela condição social de seu nascimento, mas pela sua vontade e capacidade

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individual. Esta dimensão é cuidadosamente colocada nos princípios da cultura e até

mesmo da religiosidade fundamentada no pensamento da reforma calvinista,

retomados na perspectiva econômica na obra Ética Protestante e o Espírito do

Capitalismo, de Weber.

Diante deste quadro, o acesso à informação como condição de transpor

barreiras sociais e econômicas não é prerrogativa da atual sociedade informacional,

embora o nível de demanda seja realmente diferenciado. Estamos considerando que

desde a Revolução Industrial até a implementação do fordismo e do taylorismo como

modelos de produção capitalista, a formação dos indivíduos em um contexto de

educação formal esteve direcionada para adequar-se às demandas da produção,

incluindo um expressivo percentual de pessoas que ficariam à margem do sistema,

ou seja, sem conseguir incluir-se no processo educacional. A educação não era, per

si, um diferencial significativo para o trabalho, quando muito serviria como elemento

de classificação para o exercício das funções. Da mesma forma que não existia

espaço para todos os indivíduos tornarem-se proprietários dos meios de produção,

também não havia espaço para todos tornarem-se chefes ou supervisores das linhas

de produção. Ao trabalhador comum, com baixo nível de escolaridade, estava

reservado o trabalho braçal da linha de produção.

Uma visão crítica e devastadora da inserção deste trabalhador nas fábricas

americanas – berço da linha de produção taylorista e fordista – está no filme

“Tempos Modernos” de Chaplin, que conseguiu traçar uma perspectiva quase

visionária do que acontecia naquele momento na economia norte-americana. Os

princípios fordistas são essenciais para a compreensão da educação a distância,

não apenas porque criou a demanda da flexibilidade no processo de formação, mas

também, porque a impregnou em seus princípios didáticos e formativos.

A partir da análise de Peters (1983) sobre o surgimento da educação a

distância e a sua relação com a produção industrial de bens e serviços, Belloni

(2003) estruturou algumas considerações sobre a contribuição dos paradigmas

econômicos na concepção da educação a distância. O ponto de partida da análise

estava relacionado com o avanço tecnológico nos meios de transporte e

comunicação e as experiências de educação a distância, considerada por ele como

uma forma industrial de educação, fundamentada nos princípios da racionalização,

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divisão do trabalho e produção de massa, que levará ao processo de reestruturação

do ensino, através da mecanização e automação.

A análise não estava focada na contextualização do processo produtivo e nas

suas consequências para a sociedade; nem sequer questionava outra possibilidade

de realização desta educação industrial. A análise estava centrada na metodologia e

nas práticas utilizadas, as quais reproduziam o contexto de organização e

hierarquização das fábricas. Sendo assim, reiteramos o questionamento realizado

no início deste capítulo: Considerando esta apropriação do modo de produção

capitalista, quem era beneficiado pela educação a distância neste contexto? O

capitalista desejoso de uma formação barata que não consumisse as horas de

trabalho dos funcionários da linha de produção ou o trabalhador excluído da escola

formal que desejava se apropriar do conhecimento para superar a sua condição e

progredir no sistema? Uma análise dos objetivos dos primeiros cursos e algumas

definições posteriores sobre o conceito de educação a distância pode nos dar alguns

elementos para responder a questão. Mas antes de prosseguirmos com estas

questões, precisamos detalhar as concepções do modo de acumulação e regulação

que estamos adotando neste trabalho para fundamentar a nossa análise sobre o

contexto da educação a distância na sociedade de informação.

3.3 A crise no fordismo e o surgimento da Acumulação Flexível

Durante a década de 1990, era possível encontrar no contexto acadêmico da

época um intenso debate acerca das transformações no modo de produção na

transição do século XX para o século XXI. A mudança no padrão de acumulação

podia ser observada, inicialmente, por uma nova estratégia de mobilidade do capital,

verificada a partir de alterações no padrão interno de produção e organização do

trabalho das firmas. É a passagem do modelo fordista/taylorista para um modelo

flexível e a necessidade de detalhar o regime de produção fordista, sua crise e os

métodos de gerenciamento criados por Taylor que decorrem do estabelecimento de

um paradigma e seu posterior contraponto, que é o surgimento da acumulação

flexível. A inserção da acumulação flexível no regime fordista, a partir do momento

em que este cede espaço e permite a penetração de um tipo de produção

completamente diferente, pode ser entendida por intermédio de sua crise.

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Esta crise no modo de produção (e na organização do trabalho) foi percebida

posteriormente em outras esferas da sociedade, inclusive no campo da educação. A

era das incertezas, a globalização, pós-modernidade, fim da história, entre outros

temas recorrentes na época, traduziam as inquietações e a ansiedade enquanto um

novo modelo de sociedade era delineado. Elaboramos aqui um recorte sobre a

complexidade dos temas tratados na época porque eles são fundamentais para a

construção da compreensão sobre as mudanças na sociedade informacional e a sua

relação com os paradigmas educacionais em transformação.

A preocupação com a pós-modernidade e as mudanças no território podem

ser caracterizadas como “uma reestruturação cultural, política e teórica

contemporânea, destacando a reafirmação do espaço que está complexamente

entremeada com ela” (SOJA, 1993, p. 11). Vários autores defendem a idéia do

surgimento de um novo tipo de sociedade, em que a velocidade das informações é

tão grande que colocaria o historicismo em um papel secundário, de modo que a

ênfase maior seria dada ao espaço. Assim, o espaço surge como local concreto;

logo, materialização das complexas transformações sociais que estão ocorrendo.

Para o nosso trabalho, o conceito de pós-modernidade terá um papel crucial quando

tratarmos da educação a distância na perspectiva dos estudos culturais. Os

aspectos relacionados com a diversidade e multiculturalidade encontram

reverberação contínua nas discussões sobre a sociedade pós-moderna.

Afinal, a flexibilidade no modo de produção, a produção industrial sob

demanda, adequada ao consumidor, o uso das redes como instrumento de

comunicação, aliam-se com os pressupostos da pós-modernidade. Para Gottdiener

(1990), existem diversas perspectivas teóricas sobre a reestruturação e nem todas

são compatíveis. Alguns autores defendem a teoria da regulação, outros enfatizam a

nova divisão do trabalho, embora todos compartilhem da idéia de que existe uma

crise que está provocando mudanças no capitalismo e está reorganizando as

estruturas espaciais. O fundamental é que o autor, apesar de não concordar com a

abordagem de um novo padrão de acumulação, reconhece que esta reestruturação

existe e transforma vários setores da produção e do trabalho.

A acumulação flexível pode ser caracterizada pelos estoques menores,

produtos segmentados e maior tecnologia informacional, mas, sobretudo, “está

apoiada na flexibilidade dos processos de trabalho, produtos e padrões de consumo”

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(HARVEY, 1993, p. 140). O principal aspecto desse tipo de acumulação relaciona-se

com a capacidade de informação, mais ágil e de menor custo, que permite maior

interação entre os setores, inclusive viabilizando a rede das empresas

subcontratadas1.

Para Lipietz e Leborgne (1990), o regime de acumulação é determinado pela

compatibilidade entre o modo de transformação, produção, distribuição e uso,

enquanto o modo de regulação pode ser entendido como um conjunto de normas,

instituições, mecanismos que ajustam os comportamentos individuais à lógica do

regime de acumulação. É preciso considerar outros elementos, como a constituição

de um paradigma tecnológico sobre o qual se apoiam os princípios gerais de

organização do trabalho e da produção e a esfera política que inclui os grupos

sociais, destacando-se o bloco hegemônico. Para os autores, cria-se um triângulo

entre bloco hegemônico, regime de acumulação e modo de regulação, constituindo-

se, assim, a base que sustenta o modelo de desenvolvimento. Nesse aspecto, existe

uma total articulação/interação entre estes elementos, pois a existência de um bloco

hegemônico pressupõe que existem relações de compromisso entre esse bloco e os

demais segmentos sociais.

O fato de existir articulação sincronizada com a sociedade é um dos

elementos-chave que contribuiu para a solidez do regime fordista durante todos

estes anos. Nesse regime, todos os segmentos sociais estavam vinculados à base,

e muitas vezes, o regime controlava as insatisfações de um determinado grupo,

cedendo em um ponto menos importante, a fim de que o modelo continuasse

funcionando. Embora não haja uma harmonia no funcionamento, a existência de um

equilíbrio é fundamental, mesmo que o regime seja “balançado” por algumas crises

periodicamente. Este modelo de ajuste contribui para a explicação do crescimento

expressivo da cultura do sindicato organizado, na década de 1970.

A idéia de progresso está profundamente arraigada ao modelo fordista: o

progresso da técnica (que permite aumento de produtividade), o progresso da

qualidade de vida (e consequente aumento do consumo) e o progresso do Estado,

que cada vez mais deveria desenvolver sua capacidade de prover e garantir o pleno-

emprego e o aumento do consumo. A “quebra” deste modelo aconteceu pela

1 Utilizaremos D. Harvey e A. Lipietz como autores que definem e conceituam os elementos relacionados com o fordismo e a acumulação flexível.

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ocorrência de diversos fatores simultâneos. A baixa produtividade, a revolta dos

trabalhadores em relação à alienação, a internacionalização dos mercados, o

surgimento de uma nova forma de produção mais eficiente (o modelo japonês).

Esses foram fatores determinantes que comprometeram a vigência do modelo.

A crise do modelo fordista pode ser explicada por vários fatores. Podemos

falar em crise de oferta, crise do “Welfare State”, queda de produtividade e

crescimento, contrapondo um aumento nos custos e nos salários reais, e a

saturação dos mercados. Para Lipietz (1991), as altas nos salários reais

continuaram enquanto o custo de capital fixo crescia em relação ao número de

assalariados. Nessas condições, as taxas de lucros das firmas tendem a diminuir. As

firmas reagiram a essa queda de lucratividade repassando alguma parte do custo ao

preço final de seus produtos. Quando a elevação de preços ultrapassava os salários,

a demanda era reprimida, diminuindo a atividade de certos setores.

O compromisso fordista foi abalado pela dificuldade de se sustentar a “rede

de segurança”, e o Estado-providência passou a transferir os encargos sociais

(provocados pelo desemprego) para os setores produtivos da sociedade. Quando

esses encargos tornaram-se pesados para a parcela ativa da sociedade, a própria

existência do Estado-protetor passou a ser questionada. A impossibilidade de

sustentação do Estado Keynesiano – um dos pilares para a continuidade da

acumulação capitalista – evidenciou a crise no padrão fordista de acumulação. É

importante ressaltar que a uma das garantias essenciais do Estado-providência era

a oferta de uma educação universal de qualidade, que propiciava o ingresso e a

permanência no mercado de trabalho.

As políticas keynesianas tinham se mostrado inflacionárias à medida que as despesas públicas cresciam e a capacidade fiscal estagnava. Como sempre fora parte do consenso político fordista que as redistribuições deviam se fundamentar no crescimento, a redução do crescimento significava inevitavelmente problemas para o Estado do bem-estar social e do salário social. Os governos de Nixon e de Heath tinham reconhecido o problema e no período 1970-1974, iniciando lutas contra o trabalho organizado e reduções das despesas governamentais (HARVEY, 1993, p.157).

Mesmo os governos que não possuíam tendência conservadora, ao

chegarem ao poder, tiveram de enfrentar o mesmo problema. Já não era mais

possível controlar a insatisfação dos setores produtivos da sociedade que, sem

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dúvida, estavam fartos de arcar com o peso dos benefícios sociais de outros. Além

disso, as próprias contradições inerentes ao capitalismo já apareciam. Para Harvey,

elas possuem sua expressão na rigidez.

Havia problemas com a rigidez dos investimentos de capital fixo em larga escala e de longo prazo em sistemas de produção em massa que impediam muita flexibilidade de planejamento e presumiam crescimento estável em mercado de consumo invariante. Havia problemas de rigidez nos mercados, na alocação e nos contratos de trabalho (especialmente no chamado setor monopolista). E toda tentativa de superar estes problemas de rigidez encontrava a força aparentemente invencível do poder profundamente entrincheirado da classe trabalhadora - o que explica as ondas de greve e os problemas trabalhistas do período de 1968-1972. (HARVEY, 1993, p. 135).

Para Harvey (1993), não está claro se os novos sistemas de produção e

marketing, caracterizados pela flexibilidade da produção e do trabalho, garantem a

conceituação de um novo regime de acumulação associado a uma virada cultural

para a pós-modernidade. Esse autor alerta para o perigo de se confundir mudanças

transitórias e efêmeras com transformações mais profundas de caráter político-

econômico. Apesar de haver necessidade de um cuidado maior na análise deste

processo transformativo, são claras as alterações no padrão de acumulação do pós-

guerra e as práticas atuais, conforme quadro a seguir:

FORDISMO ACUMULAÇÃO FLEXÍVEL

Produção em massa; Produção em pequenos lotes;

Uniformidade na produção Produção flexível e variedade de tipos de produto;

Grandes estoques; Sem estoques;

Produtos defeituosos ocultados nos estoques;

Controle de qualidade integrado ao processo;

Produção voltada para os recursos; Produção voltada para a demanda;

Redução dos custos através do controle de salários. Otimização da produção.

Realização de uma única tarefa; Múltiplas tarefas;

Pagamento pro rata; Pagamento pessoal (bonificações);

Alto grau de especialização nas tarefas; Eliminação da demarcação de tarefas;

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FORDISMO ACUMULAÇÃO FLEXÍVEL

Pouco ou nenhum treinamento no trabalho; Longo treinamento no trabalho;

Organização vertical do trabalho; Organização mais horizontal do trabalho;

Ênfase na redução da responsabilidade do trabalhador

Ênfase na co-responsabilidade do trabalhador.

QUADRO 1: Contraste entre o fordismo e a acumulação flexívelFonte: Harvey, 1989, p. 167-168

Assim, a mudança no padrão de acumulação está estreitamente vinculada

não apenas a uma mudança no setor produtivo, mas em mudanças na própria

sociedade e em todos os elementos a ela ligados.

La difusión del nuevo paradigma significa entonces mucho más que un cambio de orientación y basamento técnico; modifica el marco regulatorio socioinstitucional, influye en los estilos de vida y de consumo, y define un tipo de práctica productiva y organizativa (GATTO, 1989, p. 63).

A definição do autor para o novo paradigma produtivo é bastante semelhante

aos pressupostos elaborados por Castells (2003) para fundamentar a caracterização

da sociedade informacional e a revolução tecnológica informacional. Assim como

Gatto (1989), Castells (2003) também compreende que o novo paradigma

tecnológico é muito mais do que uma mudança no padrão tecnológico, ele está

relacionado com a própria existência dos indivíduos na sociedade. Surge, nesse

momento, a expressão “flexibilidade”, a qual parece resumir o conceito essencial

desse novo paradigma de acumulação. A flexibilidade está relacionada com as

alternativas encontradas pelas firmas para a superação dos problemas que a rigidez

do fordismo não conseguiu resolver. É a flexibilidade na versatilidade dos produtos

fabricados, em sua quantidade, em seus estoques, nos projetos etc... Trabalha-se

com estoques menores, produtos segmentados e diferenciados, o que faz com que

a qualidade e a versatilidade desses produtos sejam primordiais. Através dessas

diferenciações procura-se evitar os mercados saturados (TAVARES, 1991). Com

base nestes elementos, vamos detalhar os desdobramentos da acumulação flexível

no trabalho e na produção.

A introdução das novas tecnologias neste paradigma pode ser caracterizada

pela revolução tecnológica com novos produtos que “redefinem o próprio significado

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de automação” (LIPIETZ; LEBORGNE, 1990, p. 78). A conceituação deste novo

paradigma tecnológico faz-se necessária para entendimento do que realmente

mudou com a introdução destas tecnologias no processo de produção e

desenvolvimento do trabalho. A partir desse ponto é que a sutileza dessas

alterações precisa ser observada. Como minimizar a importância deste novo

elemento na mudança da força de trabalho?

3.4 A flexibilidade na produção, no trabalho e na educação

Como já comentamos anteriormente, a introdução das inovações tecnológicas

transforma o processo de trabalho, tornando-o incompatível com o fordismo. O

taylorismo separou o desenvolvimento do trabalho intelectual do manual, mas como

se operariam esses métodos quando são introduzidas máquinas sofisticadas para

serem operadas por trabalhadores desqualificados? Obviamente, a inserção das

novas tecnologias tem de ser acompanhada de um mínimo de capacitação do

empregado que será o usuário do sistema. Trata-se de juntar o que o taylorismo

separou, ou seja, os aspectos manuais e intelectuais do trabalho (LIPIETZ;

LEBORGNE, 1990). A única alternativa viável para permitir esta reunificação seria

uma reeducação da força de trabalho. Visando a este objetivo, as firmas incorporam

o modelo japonês, com uma filosofia de trabalho baseada na educação dos

indivíduos envolvidos no trabalho. Neste momento, torna-se claro que a expansão

da educação a distância, devidamente renovada com características tecnológicas

mais avançadas, torna-se um fato decisivo neste cenário.

Para Braverman (1987), a necessidade de se pormenorizar os princípios

tayloristas está em seus princípios elementares mais conhecidos, como aceleração,

cronômetro etc, porque além destas trivialidades, há uma teoria que expressa de

modo contundente o modo capitalista de produção. Justamente por esse motivo,

achamos necessário estabelecer alguns destes princípios, pois é essencial um

parâmetro para se entender melhor as transformações ocorridas com a acumulação

flexível.

Frederick Taylor (1856-1915) foi um engenheiro norte americano, pioneiro da

organização racional do trabalho. Suas teorias são conhecidas com o nome de

taylorismo e são consideradas como um marco no processo de elevação da

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produtividade no trabalho na fábrica moderna, mas também são criticadas pelo

movimento operário porque propiciaram o aumento da exploração dos

trabalhadores. Independente das diversas teorias que possam surgir sobre a crise

do modelo taylorista, é preciso deixar claro que o taylorismo domina o mundo da

produção, enquanto o que foi mudado depois disso refere-se à seleção, ao

adestramento etc... Partindo então da premissa de que o domínio do taylorismo na

produção perdurou até recentemente, podemos explicitar alguns pontos básicos de

seu método.

O que Taylor buscava não era a melhor forma de trabalhar, mas sim, o

aumento da produção e o controle do trabalho. O outro aspecto dos princípios

tayloristas, e que talvez tenha sido sua contribuição, foi a mudança na essência

desse controle. Não se tratava apenas da interferência direta na divisão de tarefas,

mas também na forma de execução destas tarefas.

O fordismo surge com a associação do taylorismo à linha de montagem,

transformando todo o aparato produtivo e redefinindo a estrutura da produção e do

trabalho. O taylorismo surge com a separação entre o trabalho intelectual (de

concepção) e o trabalho manual (de execução), executores não-qualificados,

destinados a tarefas repetitivas. A ideia de Taylor era justamente separar o

conhecimento do manejo, reduzindo o número de empregados com acesso ao

know-how, enquanto ampliava a quantidade de trabalhadores executores. O

argumento central de Taylor era para idealização de melhores formas de trabalho

que custa tempo e dinheiro, e que só o possuidor de capital poderia dispor do tempo

de trabalho. Os possuidores do tempo de trabalho (os trabalhadores) nada mais

podiam fazer além de vender este tempo para sua subsistência. Os trabalhadores

deveriam, então, perder não só o seu controle sobre as máquinas (os meios de seu

trabalho), mas, fundamentalmente o controle sobre o seu próprio trabalho. Não resta

dúvida de que a ideia fundamental era baratear o valor da força de trabalho,

diminuindo seu preparo e conhecimento, e aumentando a sua produtividade.

A gerência moderna estabeleceu-se dentro destes princípios tayloristas, com

ligeiras modificações que sugerem apenas um aperfeiçoamento do objetivo final de

Taylor. Para Braverman (1987), seria uma total separação entre o trabalho

intelectual e “a utilização deste monopólio do conhecimento para controlar cada fase

do processo de trabalho e seu modo de execução”. É preciso ressaltar que não

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apenas o trabalho físico estava sujeito a este controle, mas também o trabalho

intelectual; logo, toda a fábrica estaria dentro dos mesmos princípios de controle do

trabalho.

Henry Ford (1863-1947) foi um industrial norte-americano pioneiro na

produção de automóveis que revolucionou a indústria de automóveis, adotando a

produção em série e introduzindo em 1913, a linha de montagem móvel. É

considerado como uma figura paradoxal e controversa, porque reduziu a jornada de

trabalho, introduziu a participação dos trabalhadores no lucro das empresas e fixou o

salário mínimo mais elevado de seu tempo, embora combatesse os sindicatos. As

ideias de Ford complementam os princípios tayloristas com base na concepção de

que a revolução na produção levaria à superprodução. Assim era preciso criar uma

demanda correspondente, ampliando os mercados. A solução óbvia para esse

impasse seria o aumento do poder aquisitivo dos trabalhadores. Daí a idéia de

produção em massa e de “consumo em massa”. É interessante observar neste

ponto que enquanto as propostas tayloristas viam o aspecto da produção

isoladamente, Ford preocupava-se com o escoamento dessa produção por meio da

necessidade de criação de novos mercados, ou melhor, de novos consumidores.

Ford via no aumento do poder aquisitivo dos trabalhadores um aumento na

demanda e, consequentemente, nos lucros, enquanto alguns capitalistas desejavam

aumentar os seus lucros, reprimindo o poder aquisitivo de seus trabalhadores,

através da contenção dos salários. E é justamente essa insistência na criação de

novos mercados o que Harvey considerou especial em Ford.

A separação entre gerência, concepção, controle e execução (e tudo o que isso significava em termos de relações sociais hierárquicas e desabilitação dentro do processo de trabalho) também já estava muito avançada em muitas indústrias. O que havia de especial em Ford (e que, em última análise, distingue o fordismo do taylorismo) era a sua visão, seu reconhecimento explícito de que produção em massa significava consumo em massa, um novo sistema de reprodução da força de trabalho, uma nova política de controle e gerência do trabalho, uma nova estética e uma nova psicologia, em suma, um novo tipo de sociedade democrática, racionalizada, modernista e populista (HARVEY, 1993, p. 121).

Para Lipietz (1991), o regime de acumulação fordista pode ser resumido nos

seguintes itens: produção em massa, extremando as funções entre os idealizadores

e os executores com mecanização crescente (aumentando a produtividade);

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repartição do valor agregado (aumento do poder aquisitivo do trabalhador paralelo a

sua produtividade) e taxas de lucros estáveis, com plena utilização das máquinas e

do pleno emprego do trabalhador. Assim, o modelo fordista conseguia articular

plenamente a ideia de produção em massa e consumo em massa.

Os modos de regulação implantados no pós-guerra objetivavam manter o

compromisso entre os empresários e os trabalhadores na busca de uma produção

em massa e de um consumo de massa. O Estado surge como um controlador da

conjuntura econômica, responsável pela manutenção das regras preestabelecidas

entre empresários e funcionários. A consolidação do fordismo não passou pela

invocação dos grupos dominantes, também as conquistas realizadas pelos

trabalhadores tiveram um peso decisivo. Foram estas conquistas que possibilitaram

a criação de um welfare state, e possivelmente contrabalançaram os aspectos

negativos do fordismo para os trabalhadores, evitando sua ruptura.

Os ganhos conquistados pelos trabalhadores, ao longo destes anos, são

considerados como entraves ao desenvolvimento do capitalismo em épocas de

crise. A opção por uma produção mais flexível, utilizando mão-de-obra flexível, foi a

solução encontrada pelos capitalistas como forma de superar os entraves causados

pelo excesso de taxas nos trabalhadores fixos nas empresas.

Assim, um aspecto importante da flexibilidade é a forma como ela

desestrutura o poder da classe trabalhadora, fragmentando-a e diminuindo seu

poder de luta. Esta segmentação pode ser observada na existência crescente de

trabalhadores temporários e nas altas taxas de rotatividade (TAVARES, 1991). A

fragmentação produtiva é utilizada pelas grandes empresas como estratégia de

crescimento concentrada em suas atividades principais, além de reduzir e limitar os

conflitos de trabalho.

As perdas para os trabalhadores mostram-se mais contundentes com relação

aos benefícios anteriormente conquistados: seguro desemprego, aposentadoria e

pensão, entre outros. Não há dúvida de que os trabalhadores que fazem parte desse

processo de flexibilidade estão mais desprotegidos. A perda desse tipo de proteção

nem sempre é notada nos salários, que em alguns casos é pouco menor do que o

salário oferecido por uma grande empresa consolidada, assim como o desemprego

não é, por si só, um indicador seguro de profundas transformações. A flexibilidade

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no processo de trabalho rompe com as garantias dos trabalhadores e desarticula

seu poder de luta e negociação no trabalho.

As novas tecnologias não são simplesmente substituidoras da força de

trabalho. Se assim o fossem, não haveria muitas dificuldades na análise desse

processo. Para Castells (1986), a designação de alta tecnologia não se refere a uma

indústria, a uma atividade ou a um invento. É preciso entender que é um processo,

uma forma específica de produzir, a partir da base fundamental, que é a informação.

As inovações traduzidas em produtos de ponta de microeletrônica processam as

informações muito mais velozmente, reduzindo o custo de transmissão e permitindo

descentralização e personalização no modo de trabalho e produção.

A disseminação da informação é o elemento essencial para o entendimento

das transformações ocorridas na produção. O controle da produção e do trabalho

passa a outro patamar com o uso de computadores de forma intensiva. Não só a

organização interna nas empresas é modificada, facilitando o acúmulo de funções, a

diversificação do trabalho etc, mas também a organização externa é profundamente

alterada, propiciando o repasse de atividades através de firmas subcontratadas, que

são agora monitoradas de forma mais eficiente.

Ainda segundo Lipietz e Leborgne (1990), dois aspectos precisam ser

ressaltados com relação à introdução dessas novas tecnologias: 1) a revolução

tecnológica não se restringe apenas aos produtos, ela também transforma o

processo de trabalho; 2) a gestão da fábrica pode ser modificada e o princípio do

just in time estendido às relações dentro do estabelecimento, entre os

estabelecimentos de uma mesma firma, e entre as firmas e os subcontratados.

A respeito desses aspectos, podemos fazer algumas considerações, entre

elas: a mudança no processo de trabalho transforma não apenas utilização da força

de trabalho, mas também é organização desta força de trabalho dentro das firmas e

dentro do próprio território. Sem querer estender mais este assunto, podemos dar o

exemplo de trabalhadores que só vão ao local de trabalho periodicamente,

trabalhando em casa, com microcomputadores, ligados diretamente à empresa. A

principal observação feita com relação a este tema é o não rompimento total com o

modelo vigente anteriormente. Sem dúvida, estamos vivenciando um sistema no

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qual ambos os processos convivem, e esta não-ruptura acaba provocando

dificuldade na observação desses elementos como estruturas diferenciadas.

A flexibilidade na produção e no trabalho estendeu os seus princípios e

estrutura para outros campos da sociedade. Podemos afirmar que o fordismo foi

mais do que um modo de produzir e trabalhar, se constituiu em um modo de vida,

com a influência de sua lógica no lazer, na organização das cidades, na estrutura

das moradias etc. A educação estruturou a dimensão pedagógica e organização das

escolas profundamente influenciada pela eficiência e cientificidade taylorista,

observados em elementos como o uso do uniforme, os horários com sinalizadores

sonoros, a compartimentação do conteúdo, a ênfase na disciplina e passividade,

todos presentes na escola moderna. Assim, a sua influência no campo da educação

é mais um elemento, e na educação a distância, a visibilidade tornou-se maior.

3.5 Um panorama do histórico da Educação a Distância e sua relação com o modo de acumulação

O efeito das novas tecnologias no modo de produção e no trabalho pode ser

considerado devastador. A revolução tecnológica modificou, na essência, a forma de

produzir e trabalhar, no processo de reinvenção do capitalismo. Aos trabalhadores,

não foi perguntado se concordavam com as mudanças implementadas ou se o

modelo adotado era mais adequado às suas necessidades e aspirações. A criação

de uma nova demanda por um trabalhador totalmente diferenciado do perfil do

trabalhador fordista, alienado, braçal, substituível, passivo etc, trouxe novas

demandas para o campo da educação. Neste contexto, a educação a distância

também se transforma e é apropriada para os novos tempos da sociedade de

informação, por ser flexível e utilizar o aparato tecnológico de forma efetiva. Ao

analisarmos o contexto histórico da educação a distância ao longo dos últimos cem

anos, não nos surpreendemos com sua facilidade de adaptação, mas para

completar este percurso em nosso raciocínio, precisaremos realizar algumas

reflexões sobre o papel da educação a distância nos diferentes contextos históricos.

Encontramos em diversos trabalhos sobre Educação a Distância uma

retrospectiva histórica, objetivando contextualizar o leitor diante do panorama atual

da EAD no mundo e no Brasil. Para esta pesquisa, esta retrospectiva histórica é

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pouco produtiva, pois não acrescentaria nenhum fator novo ou fundamentação ao

nosso tema. O que nos interessa, de fato, é o panorama histórico devidamente

contextualizado na conjuntura econômica da época, para traçar um paralelo entre a

criação dos cursos na modalidade a distância e as necessidades do sistema

econômico. Por esta razão, vamos apresentar um panorama geral do histórico da

Educação a Distância, contextualizando-o aos aspectos econômicos que permitirão

o estabelecimento das relações intrínsecas entre o modo de acumulação e o tipo de

educação adotado ao longo do percurso histórico.

A Educação a Distância, na estrutura que conhecemos, existe desde o século

XIX, embora alguns autores estabeleçam relações com a rede de comunicação

existente na Grécia antiga. Consideramos este paralelo um exagero, uma vez que

não é possível associar qualquer sistema de comunicação existente no passado (ou

mesmo no presente) com os princípios da EAD, embora seja possível identificar em

momentos diversos da história, a necessidade de transmitir conhecimento de forma

não somente presencial.

Segundo Lobo Neto (1995) o registro mais antigo que se tem de um curso na

modalidade a distância pode ser encontrado no anúncio publicado na Gazeta de

Boston, no dia 20 de março de 1728, pelo professor de taquigrafia Cauleb Phillips

que afirmava que “toda pessoa da região, desejosa de aprender esta arte, pode

receber em casa várias lições semanalmente e ser perfeitamente instruída, como as

pessoas que vivem em Boston” (LOBO NETO, 1995, p.36).

Podemos encontrar vários outros indícios da existência do ensino por

correspondência em vários países da Europa no final do século XVIII e início do

século XIX, mas a modalidade a distância como modelo de educação formal, só

surge na segunda metade do século XIX. São cursos de línguas, mineração,

negócios que surgem na Europa, e ao final da Primeira Guerra Mundial estas ações

foram intensificadas, indicando que havia uma demanda social significativa por

educação.

Durante este período, o modelo de comunicação utilizado era a

correspondência, mas é muito interessante observar que, da mesma forma que hoje,

as inovações tecnológicas também intensificaram o uso da EAD e possibilitaram a

criação de outros modelos, o desenvolvimento e a acessibilidade aos novos meios

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de comunicação, como rádio e a televisão, incrementaram outras experiências de

educação a distância, embora o material impresso sempre tenha servido como

instrumento principal para a aprendizagem.

A Educação a Distância esteve presente em diversos momentos do processo

educacional nos últimos séculos, mas sempre esteve relegada a um plano menor,

como uma modalidade secundária ou de segunda categoria. Nunca fez parte dos

centros de excelência da academia e vários fatores podem explicar esta

compreensão, apesar de em vários países ser a única alternativa para o

prosseguimento dos estudos principalmente por questões geográficas (clima

inóspito, dificuldade de transporte, grandes distâncias, localidades isoladas etc.).

Segundo Litwin (2001), a institucionalização da educação a distância é relativamente

recente.

No final do século XIX, instituições particulares dos Estados Unidos e na Europa, ofereciam cursos por correspondência destinados ao ensino de temas e problemas vinculados a ofícios de escasso valor acadêmico. É provável que essa origem da educação a distância tenha fixado uma apreciação negativa de muitas de suas propostas. Além disso, o fato de ter-se transformado em uma segunda oportunidade de estudo para pessoas que fracassaram em uma instância juvenil, não evitou essa depreciação, mas imprimiu-lhe um novo selo. Transcorreram várias décadas para que a educação a distância se estabelecesse no mundo dos estudos como uma modalidade competitiva perante as ofertas de educação presencial (LITWIN, 2001, p. 15).

A autora estabelece a década de 60 como um marco na superação dos

preconceitos em relação à educação a distância, a partir da criação das

universidades a distância que competiam com as da modalidade presencial. No

breve histórico observamos que as dificuldades e obstáculos na disseminação do

processo educacional foram os elementos propulsores das soluções encontradas

com a educação a distância para superar as adversidades.

Entre 1728 e até a década de 1960, os cursos oferecidos na modalidade a

distância objetivavam ensinar alguma profissão, línguas e formação de professores.

Estas três linhas apresentam vários aspectos em comum com a época e as

necessidades locais. A necessidade de formar os indivíduos em profissões

específicas está relacionada com a ausência de mão-de-obra necessária em várias

áreas como taquigrafia, estenografia, mineração, engenharia etc. São cursos que

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tinham como objetivo preencher as vagas existentes na área, voltadas

especificamente para o crescimento industrial e incremento do setor de serviços

correspondente. O ensino de línguas (Francês, Inglês, etc.) estava relacionado à

existência de diversas colônias pelo mundo e a necessidade de afirmação e

expansão dos países que ainda concentravam sua supremacia na conquista e

domínio dos territórios. A formação de professores pode ser atribuída ao movimento

de homogeneização do ensino nestes países, uma vez que a autonomia dos distritos

e localidades poderia ser minimizada através de materiais de formação continuada.

Outro aspecto interessante é a existência de cursos direcionados aos alunos com

dificuldade de aprendizagem, como um reforço ou uma medida complementar para

melhorar o desempenho dos alunos.

Neste aspecto, já temos alguns dados que caracterizaram a criação de cursos

a distância, a formação técnica específica para os que não tinham nenhuma

formação ou ocupação e como um instrumento compensatório para os alunos que

não conseguiam acompanhar os estudos na escola regular. Os fatores geográficos,

isolamento, grandes distâncias, questões climáticas, acabaram diluídos diante da

caracterização dos cursos, gerando com isso as raízes do estigma do rótulo de

educação de categoria inferior que acompanha a educação a distância deste os

seus primórdios.

PERÍODO NÚMERO DE PAÍSES ÁREAS PREDOMINANTES DOS CURSOS

De 1728 a 1960 12

• Estenografia• Taquigrafia• Engenharia• Línguas• Apoio aos alunos• Formação continuada de professores• Cursos oferecidos por universidades em línguas, reforço e formação de professores.

De 1961 a 1990

+ de 30, além da criação de 4 instituições transnacionais.

• Superior nas mais diversas áreas, incluindo pós-graduação, MBA, etc.

QUADRO 2: Período Histórico e Cursos a DistânciaFonte: Autoria própria, adaptado de Berbat, 2006.

Analisando o número de cursos e suas especificidades, verificamos que a

partir da década de 1960, o número de instituições que implementam a educação a

distância aumenta significativamente, e os objetivos de seus cursos também se

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transformam, como podemos observar no quadro anterior. São implementados

diversos cursos superiores nas mais diferentes localidades, do Reino Unido com a

Open University até a Índia com a fundação da Universidade Nacional Aberta Indira

Gandhi. São diversas iniciativas que não apenas acompanham as mudanças no

padrão de acumulação da época, mas também, traduzem os inúmeros movimentos

e anseios dos movimentos pelos direitos civis característicos da época.

A criação da Open University, com um modelo complexo que utilizava meios

impresso, televisão e cursos intensivos, produziu cursos acadêmicos de qualidade,

cujos egressos competiam pelos postos de trabalho com os graduados da

universidade presencial (LITWIN, 2001). O estudo da Open University será

fundamental no nosso trabalho como elemento que relaciona as ações de educação

a distância e os estudos culturais.

Segundo Belloni, desde a década de 80 que duas orientações teóricas ou

filosofias predominantes sobre a educação a distância coexistiram pacificamente

não apenas no campo da educação, mas também no campo da educação a

distância. Uma estava voltada para o estilo fordista da educação em massa, e o

outro, com uma proposta de educação mais aberta e flexível mais adequada às

novas exigências sociais (2003, p. 11).

De acordo com Maia e Mattar (2007, p. 5), a educação a distância acabou

recebendo denominações diversas em diferentes países, como estudo ou educação

por correspondência (Reino Unido); estudo em casa e estudo independente (EUA);

estudos externos (Austrália); telensino ou ensino a distância (França); estudo ou

ensino a distância (Alemanha); educação a distância (Espanha); Teleducação

(Portugal) etc. As diferentes denominações apontam para o fato de que a

compreensão e a definição de educação a distância pode variar se consideramos as

metodologias e estratégias aplicadas em diferentes países. Esta parece ser a razão

para a dificuldade de conceituação da educação a distância ao longo das décadas:

durante muito tempo esta modalidade de ensino foi definida pelo que ela não é, e

não pelos seus pressupostos básicos. A definição de Peters (1983) aponta para a

ambiguidade do conceito de educação a distância.

Estudo a distância é um método racionalizado (envolvendo a definição de

trabalho) de fornecer conhecimento que (tanto como resultado da aplicação de

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princípios de organização industrial, quanto pelo uso intensivo da tecnologia que

facilita a reprodução da atividade objetiva de ensino em qualquer escala) permite o

acesso aos estudos universitários a um grande número de estudantes

independentemente de seu lugar de residência e ocupação (PETERS, 1983, p. 111).

Nesta passagem fica claro que a estrutura pedagógica do conhecimento que

será oferecido deverá, por definição, seguir os princípios da organização industrial.

Mas que princípios seriam estes? Provavelmente o autor está se referindo aos

modelos de Taylor e Ford da organização do modo de produção, com sua esteira

mecânica, medição do tempo de trabalho por meio do cronômetro, divisão das

tarefas em módulos etc. A transposição dos elementos da produção para o processo

educacional não é tarefa de simples execução. É necessária uma fundamentação

pedagógica para a organização deste trabalho, não basta apenas remodelar a

informação no contexto do trabalho. Um bom exemplo desta dificuldade é o preparo

de materiais específicos para jovens e adultos, sempre um desafio para quem atua

neste segmento de ensino.

O que o autor está propondo em sua definição de educação a distância é a

organização de um processo de aprendizagem que esteja contextualizado e

integrado ao modo de produção e o trabalho produtivo fordista, incluindo a

apropriação do “uso intensivo de tecnologia”, que embora esteja relacionado com a

reprodução da atividade educativa em larga escala, também poderia ser

considerado como um elemento estratégico para capacitar os alunos em linguagens

e instrumentos próprios do meio produtivo.

A transposição do modelo produtivo para outras esferas da sociedade,

especificamente na educação, surge como consequência direta do paradigma

industrial e das quatro dimensões da modernidade que, segundo Giddens (1991),

inspirava as ações do Welfare State, a saber: saúde, educação, transporte e

habitação (BELLONI, 2003, p. 13). Evans e Nation (1993) trazem uma contribuição

importante ao afirmar que a lógica do consumo de massa utilizada por Ford na

produção de suas fábricas, vai se estender para a educação com a oferta de

educação, traduzidas na universalização do ensino fundamental e depois do ensino

secundário e nas estratégias implementadas, onde o uso de tecnologias é um

elemento essencial para o sucesso deste modelo. Para os autores, é o marco do

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surgimento da tecnologia educacional como uma nova disciplina que irá transpor os

processos educacionais para os modelos industriais.

É importante ressaltar que a influência do modelo fordista não se restringiu à

educação a distância. O modo de gestão e organização desta modalidade

possibilitou maior visibilidade aos aspectos gerenciais de sua estrutura, assim como

a especificidade dos seus cursos também facilitou a incorporação de princípios da

organização fordista. Litwin (2001) define algumas características da educação a

distância que, assim como Peters (1983), aponta para a industrialização da

modalidade.

Outro traço comum dos projetos nesta modalidade é a ênfase especial dada à

eficácia dos aspectos organizacionais e administrativos: ágeis mecanismos de

inscrição, distribuição eficiente dos materiais de estudo; informação precisa,

eliminando muitas barreiras burocráticas do ensino convencional; atenção e

orientação aos alunos, tanto no período inicial do estudo como no seu transcurso

(LITWIN, 2001, p. 14).

O distanciamento da educação a distância como modelo de formação

propiciou o desenvolvimento de uma compreensão equivocada de que a educação a

distância estava distanciada do modelo de educação formal, como se os diversos

elementos que constituem a organização social não interferissem em determinados

espaços educacionais formais. A escola esteve sujeita aos impactos do modelo

fordista e vários elementos podem ser encontrados ainda hoje que nos remetem ao

fordismo e o taylorismo: o tempo das atividades, o uso dos uniformes, a divisão dos

conteúdos em disciplinas separadas, a hierarquização e controle, a disposição das

salas de aula com alunos enfileirados, entre outros elementos mais sutis e menos

óbvios que constroem as relações de poder dentro do espaço escolar. Associar a

influência do fordismo como o aspecto mais negativo da educação a distância, é

dissociar toda a sociedade de seu contexto produtivo, incorporando a ideia

equivocada de que o espaço da escola é um espaço à parte.

As ideias de Taylor e Ford estavam contextualizadas com a ideia de que seria

possível moldar o comportamento humano, especificamente, os trabalhadores. A

inexistência de exigências na formação do trabalhador na época estava

fundamentada, além das questões econômicas, ao fato de que qualquer trabalhador

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poderia ser moldado e formado para as atividades fins que executaria na firma, com

o apoio das ferramentas tecnológicas. Charles Chaplin mostrou com uma poesia

singular o tratamento que era reservado aos funcionários no seu filme Tempo

Modernos (1936), especificamente no trecho em que uma máquina de alimentação é

apresentada aos donos da fábrica como forma de otimizar o tempo que o

trabalhador gastava para almoçar. O que há de visionário no filme do Chaplin, além

das questões pertinentes ao cinema como uma obra de arte, é a profunda crítica

social realizada, que por meio da pantomima e da sutileza dos detalhes revelam o

quão desumano era a relação dos capitalistas com os trabalhadores em um

momento em que o mundo todo enaltecia o progresso da ciência e os avanços

tecnológicos da modernidade.

A aplicação dos modelos industriais na educação a distância não foi vitória do

progresso e da técnica sobre a educação e muito menos a insurgência dos

trabalhadores em relação aos processos de formação. Foi apenas a extensão do

que já acontecia em outras áreas como mais um negócio a ser oferecido. O

industrialismo instrucional (EVANS; NATION, 1993) não está restrito apenas à

aplicação de modelos industriais e behavioristas, na perspectiva de um aluno

passivo considerado como objeto e público de massa, ele também afeta o professor.

Proletarização, desqualificação, divisão do trabalho, democratização do espaço de

trabalho e produção nova são aspectos da educação industrializada que trazem

implicações igualmente para o professor e para o estudante (RENNER, 1995, p.

292).

Porém, da mesma forma com que a educação a distância conseguiu se

apropriar de forma mais rápida e flexível das mudanças que aconteciam na linha de

produção e na sociedade durante o fordismo, as mudanças de configuração com o

surgimento da acumulação flexível também foram apropriadas novamente, no

contexto do uso das tecnologias digitais de informação e comunicação. A

classificação da educação a distância em gerações distintas, associadas com o

aparato tecnológico predominante (MOORE, 2007), reflete de forma didática as

formas de apropriação tecnológica na educação a distância.

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FIGURA 1: Cinco gerações de educação a distânciaFonte: Moore, 2007, p. 26.

Segundo o autor, “a educação a distância evoluiu ao longo de cinco gerações,

identificáveis pelas principais tecnologias de comunicação empregadas” (MOORE,

2007, p. 47). Cada geração está associada ao uso da ferramenta tecnológica da

época, resultando na seguinte definição:

1. A primeira geração de estudo por correspondência/em casa/ independente proporcionou o fundamento para a educação individualizada a distância.

2. A segunda geração, de transmissão por rádio e televisão, teve pouca ou nenhuma interação de professores com alunos, exceto quando relacionada a um curso por correspondência.

3. A terceira geração – as universidades abertas – surgiu de experiências norte-americanas que integravam áudio/vídeo e correspondência com orientação faca a face, usando equipes de cursos e um método prático para a criação e veiculação de instrução em uma abordagem sistêmica.

4. A quarta geração utilizou a teleconferência por áudio, vídeo e computador, proporcionando a primeira interação em tempo real de alunos e instrutores a distância. O método era apreciado especialmente para treinamento corporativo.

5. A quinta geração, a de classes virtuais on-line com base na Internet, tem resultado em enorme interesse e atividade em escala mundial pela educação a distância, com métodos construtivistas de aprendizado em colaboração, e na convergência entre texto áudio e vídeo em uma única plataforma de comunicação (MOORE, 2007, p. 47-48).

Embora a classificação da educação a distância em cinco gerações facilite a

visualização da evolução tecnológica e a sua apropriação, existe um equívoco nesta

Correspondência 1ª

Transmissão por rádio e televisão

Universidades abertas

Teleconferência

Internet/web

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estrutura que traduz a ideia de linearidade e substituição. Fica a noção de que a

correspondência foi substituída por algo mais moderno, a televisão e o rádio, que foi

substituído pela teleconferência etc. Os cursos a distância sempre utilizaram

“ferramentas” diversas, e ainda hoje, apesar de toda a revolução das tecnologias

digitais, encontramos cursos que utilizam o material impresso como base, embora

todos utilizem diferentes recursos. O importante nesta afirmação é que a proposta

da educação a distância enquanto uma modalidade diferenciada, é justamente o seu

uso de diversas mídias em função da aprendizagem.

A tecnologia não é apenas substituída ao longo do tempo. Existem uma

reflexão e pesquisas no sentido de se apropriar da tecnologia em benefício da

aprendizagem na educação, o que em alguns momentos, pode desvirtuar

completamente o uso de um determinado artefato tecnológico, e este é, em última

análise, o grande diferencial da educação a distância. Assim, não basta apenas

utilizar a internet, é preciso desenvolver uma “ferramenta” adequada para esta

utilização, e temos como exemplo, os ambientes virtuais de aprendizagem. O

material impresso pode ser reinventado em seu significado e formas de utilização,

quando combinado com diferentes mídias, como um CD, por exemplo. Estes

elementos apontam para uma questão interessante em nosso trabalho. Não é a

caracterização do dispositivo tecnológico que irá definir as práticas pedagógicas,

mas sim, o seu uso como instrumento de formação em diferentes contextos é que

promoverá uma aprendizagem diferenciada.

De fato, em função de fatores como o modelo de EaD seguido, os apoios

políticos e sociais disponíveis, as necessidades educativas da população, o

desenvolvimento das tecnologias de comunicação e informação, há grande

diversidade de formas metodológicas, estruturais e projetos de aplicação para essa

modalidade de educação.

3.6 Breve Histórico da Educação a Distância no Brasil

Os estudos recorrentes sobre o desempenho dos alunos nas escolas públicas

refletem sempre os debates sobre a qualidade do ensino. Após a universalização da

Educação Básica, buscamos a melhoria de qualidade no ensino da escola pública e

termos como eficácia, eficiência, aprendizagem e até mesmo produtividade são

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encontrados com facilidade nos documentos governamentais. Segundo Oliveira

(2001),

No decorrer dos anos 90 o debate sobre educação e desenvolvimento esteve pautado pela exigência de responder ao padrão de qualificação emergente no contexto de reestruturação produtiva e de globalização da economia, ocupando lugar de destaque nas políticas educacionais. As discussões que ocorreram explicitam a necessidade de serem pensadas alternativas para problemas estruturais da educação brasileira, passando pela reforma dos sistemas públicos de ensino (OLIVEIRA, 2002, p. 105).

A preocupação central, contudo, não estava limitada à formação da força de

trabalho para lidar com as inovações tecnológicas e organizacionais. Incluíram

também questões políticas como financiamento, controle e gestão da educação

pública e cultural, a partir das mudanças da reestruturação econômica e da

necessidade de mudança do paradigma educacional na sociedade da informação.

Provavelmente, um dos maiores entraves ao processo de adaptação do

sistema público de educação ao novo padrão de acumulação e produção, esteja

vinculado aos processos lentos de mudança dos paradigmas para a construção

efetiva de um novo modelo de educação. Esta mudança de paradigma está

associada ao desenvolvimento de um novo paradigma cultural, envolvendo a

inclusão das mudanças ocorridas na sociedade para dentro da escola.

O Brasil assumiu o compromisso com outros nove países em 1990 para

garantir a melhoria e universalização da educação básica, e para tanto, uma série de

medidas foram tomadas neste período. Mesmo assim, o próprio MEC admite a

limitação destas mudanças,

De fato, os progressos educacionais realizados pelo Brasil na segunda metade da década de 90 foram notáveis. Mesmo assim, estes avanços não foram suficientes para satisfazer adequadamente as demandas existentes, até porque as exigências da sociedade mudaram, acompanhando as transformações tecnológicas. Hoje, já não basta garantir a universalização do ensino compulsório, que no Brasil é de oito anos. Para uma cidadania plena e uma vida produtiva, exige-se, no mínimo, doze anos de escolaridade básica. (MEC/INEP, 2000).

Percebemos claramente a preocupação não apenas com a duração do

período de escolarização, como também, com a qualidade. Nesse sentido, a

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universalização precisa ser acompanhada de um aproveitamento efetivo do que é

oferecido pela escola. Trata-se de colocar a escola pública (que apresenta estrutura

e práticas do século XIX), em um contexto de inovação tecnológica e flexibilidade de

uma sociedade de informação no mundo globalizado. Ou seja, implementar

mudanças culturais na esfera escolar que, como Instituição, realiza as mudanças

paradigmáticas de forma lenta, resistindo na absorção de novos elementos e

conceitos que precisam de uma adaptação mais rápida, acompanhando o ritmo

acelerado da sociedade informacional.

Ainda segundo Oliveira (2001), nos anos 1990, procurou-se perceber em que

medida as reformas educacionais – que tiveram como objetivo garantir a oferta de

educação básica para todos – não estariam respondendo às exigências de

adequação das condições gerais de produção impostas pelo atual processo de

reestruturação capitalista. Embora se procure estabelecer uma conexão entre o as

necessidades de mudança na educação e as mudanças no paradigma de produção

globalizada, traduzida pela empregabilidade, nos parece que a política de Estado

mais pertinente seria a busca de uma educação para a cidadania. Para realizar uma

educação plena neste aspecto, precisamos de professores autônomos, críticos e

com uma percepção clara da constituição da sociedade em que vivemos hoje.

O surgimento da educação a distância no Brasil seguiu os mesmos caminhos

de outros países, embora tenham sido implementadas algumas ações de caráter

assistencialista que contribuíram ainda mais para a disseminação do preconceito.

Mesmo que se considere que a educação a distância no Brasil só tenha surgido em

1939, com o ensino por correspondência oferecido pelo Instituto Monitor e, dois anos

depois, com o Instituto Universal Brasileiro (1941), sabemos que já em 1904, houve

uma primeira tentativa de educação a distância no Brasil, com a instalação da filial

de uma escola norte-americana na cidade do Rio de Janeiro, a qual oferecia cursos

de idiomas por correspondência. Os Institutos Monitor e Universal Brasileiro são

considerados os pioneiros da modalidade a distância no Brasil, através do ensino

por correspondência e foram criados para atender a demanda do processo de

industrialização brasileiro.

Em 1941, surgiu o Instituto Universal Brasileiro, outra instituição a oferecer cursos por correspondência no Brasil, exatamente no momento em que o Brasil iniciava a sua substituição de importações com a implantação do parque industrial

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brasileiro. Analisando o quadro histórico da educação a distância no Brasil, é possível observar que até o final da década de 1960, as ações de educação a distância no Brasil estavam voltadas para a oferta de cursos de curta duração, profissionalizantes que focavam um público com pouca escolaridade que necessitava entrar no mercado de trabalho. É importante lembrar que a partir de 1964, foi instaurada a ditadura militar no Brasil e os cenários da política educacional foram determinados em função das questões ideológicas e das políticas de Estado que se desejava praticar na época.

1922/1923 Rádio Sociedade do Rio de Janeiro – Fundação Roquete Pinto

1939 Fundado o Instituto Rádio Monitor – Cursos Profissionalizantes

1939 Exército e Marinha – Cursos por correspondência

1941 Instituto Universal Brasileiro – Cursos por correspondência, ligados a formação profissional básica.

1967/1974Projeto SACI/INPE – Tele-educação via Satélite, com material por rádio e impresso, para o ensino fundamental e “treinamento” de professores.

1969 TVE do Maranhão – Cursos de 5a a 8a Série, televisivo e impresso.

1970 Projeto Minerva – Usava o Rádio em Rede Nacional

1970 Fundação Roberto Marinho – Fundação Padre Anchieta e TV Cultura de SP – Educação Supletiva a Distância – Telecurso 1º e 2º Grau

1974 TVE do Ceará – Cursos de 5ª a 8ª Série, televisivo e impresso.

1976SENAC – Sistema Nacional de Tele-educação, cursos através de material instrucional (em 1995, já havia atendido mais de dois milhões de estudantes).

1979Centro Educacional de Niterói – Módulos Instrucionais em cursos do ensino fundamental e médio para jovens e adultos e qualificação técnica.

1979 Colégio Anglo Americano – Rio de Janeiro – Cursos por correspondência, em nível de ensino fundamental e médio.

1979 UNB – Cursos através de Jornais e Revistas. No ano de 1989 é lançado o CEAD e também o Brasil EAD.

QUADRO 3: Histórico da Educação a Distância no Brasil (Até 1980)Fonte: Adaptado de Berbat, (2008).

No início da década 1970, enquanto no cenário mundial, a educação a

distância começava a realizar um forte movimento com a abertura de várias

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universidades para a oferta de ensino superior, a política pública para a EAD

naquele momento foi de implementar o Projeto Minerva, com o objetivo de atender à

Lei nº5.692/71, de 11 de agosto de 1971, (Capítulo lV, artigos 24 a28) que dava

ênfase à educação de adultos. De fato, a regulamentação desta modalidade

aparece, pela primeira vez, com o advento da Lei nº 5692, que vinculava a educação

a distância ao ensino supletivo. O parecer nº 699/72 determinava a extensão desse

ensino, definindo claramente as funções básicas do ensino supletivo: suplência,

suprimento, qualificação e aprendizagem. O projeto pretendia utilizar o rádio para

atingir o homem, onde ele estivesse, ajudando-o a desenvolver suas

potencialidades, tanto como ser humano, quanto como cidadão participativo e

integrante de uma sociedade. O Projeto Minerva nasceu no Serviço de Radiodifusão

Educativa do Ministério da Educação e Cultura e do ponto de vista legal foi ao ar

tendo como escopo um decreto presidencial e uma portaria interministerial de nº

408/70, que determinava a transmissão de programação educativa em caráter

obrigatório, por todas as emissoras de rádio do país.

Não resta dúvida de que o projeto Minerva estava fundamentado na

concepção fordista de ensino de massa e surge, ao mesmo tempo, em que o

Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral), foi criado pela Lei número 5.379,

de 15 de dezembro de 1967, propondo “a alfabetização funcional de jovens e

adultos, visando conduzir a pessoa humana a adquirir técnicas de leitura, escrita e

cálculo como meio de integrá-la a sua comunidade, permitindo melhores condições

de vida” (BELLO, 1993).

No período de 1970-1980 foram criados cursos que ofereciam a possibilidade

de concluir a Educação Básica (Fundamental e Médio) na modalidade a distância. A

estrutura modular com apoio de tutoria foi amplamente utilizado nos cursos

supletivos do Estado e se fosse possível traçar um paralelo entre as ações

implementadas em outros países no mundo e a realidade da educação a distância

no Brasil, seria possível afirmar que o processo evolutivo da modalidade em território

nacional estava associado ao nível de atuação e não ao aparato tecnológico ou

estratégias pedagógicas utilizadas. De fato, o segmento de educação superior no

Brasil só começará a discutir a implementação da educação a distância no Brasil em

meados da década de 90, influenciado por uma série de movimentos internacionais

que discutiam a questão da educação nos países emergentes e resultaram em uma

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série de compromissos e acordos estabelecidos pelos países para a melhoria da

educação básica.

3.7 O Ensino Superior a Distância no Brasil

A compreensão das políticas públicas nos últimos dez anos, especificamente,

as políticas de educação a distância estão associadas a fatores internacionais que

determinaram em diferentes momentos do Estado brasileiro, a escolha das

estratégias para a formação de professores. Nos anos noventa, ocorreu uma série

de acordos internacionais no campo da educação que, segundo Vieira (2001), estão

associados a três variáveis.

A primeira diz respeito à definição de uma agenda internacional para a educação, materializada em diversos eventos como: (Conferência Mundial de Educação para Todos, Jontien, Tailândia (1990); a Conferência de Nova Delhi (1993); e as reuniões do Projeto Principal da América Latina e do Caribe, que contemplam pautas de interesses comuns discutidos por Ministros de Educação da região, a exemplo da Conferência de Kingston, Jamaica (1996). Nesses eventos são elaboradas declarações de intenções e recomendações com as quais se comprometem os países signatários dos diferentes acordos firmados. Fazendo-se representar em todos esses encontros, o Brasil torna-se, portanto, sócio da agenda definida em tais cenários. A segunda variável, que expressa as políticas internacionais para a educação, se traduz em propostas firmadas no contexto da retomada de uma visão que articula a educação ao desenvolvimento, em moldes semelhantes à teoria do capital humano. Mais do que um simples revival, esta tendência se firma também a partir do desenvolvimento da chamada revolução do conhecimento, que assinala a centralidade do papel exercido pela educação, na definição de um novo panorama mundial (VIEIRA, 2001, p. 61).

A terceira variável está relacionada com a presença de organismos

internacionais como Unicef e o Banco Mundial, no desenvolvimento e financiamento

de projetos na área de educação. Ainda segundo a autora, no contexto da

cooperação internacional, o fórum de discussão das políticas governamentais de

educação da América Latina e Caribe foi fundamental para viabilizar avanços na

superação do analfabetismo, universalização da educação básica e melhoria da

qualidade em educação.

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Para Dourado (2001), as reformas na educação foram estruturadas em

premissas neoliberais, enfatizando o trinômio produtividade, eficiência e qualidade

total. As ações conduzem não apenas para mudanças na estrutura curricular e

pedagógica da escola, mas enfocam também a questão da gestão. A

descentralização e reorganização dos sistemas são tão importantes para as

reformas propostas quanto as estruturas curriculares.

A partir da década de 1990 consolida-se um processo de reforma do Estado com mudanças no papel social da educação e da escola em toda a América Latina. O Brasil intensifica as ações políticas e reformas educacionais em sintonia com a orientação de organismos internacionais, cuja tradução mais efetiva é expressa pela nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (DOURADO, 2001, p. 50).

A busca pela qualidade na educação, em alguns momentos associada ao

conceito de qualidade total japonês (TCQ), levantou a discussão sobre os elementos

que compõem a estrutura educacional, gestores, professores, sistema de

financiamento etc. A discussão sobre a qualidade da formação e da ação docente foi

inevitável, e a necessidade de criação de políticas públicas para estruturar a

formação docente fez parte da reforma proposta. Segundo Dourado (2001), a tônica

do modelo proposto era a melhoria dos indicadores educacionais que estaria

relacionado com a titulação do quadro docente. A exigência de formação em nível

superior para os professores, por força do Decreto Presidencial nº 3.276, de 6 de

dezembro de 1999, mobilizou educadores de todo país, provocando o surgimento de

diversos cursos de formação de professores em serviço em todos os Estados do

país.

As políticas de formação inicial e continuada de docentes são intensificadas

utilizando duas modalidades distintas: a criação do curso normal superior e a

formação em serviço na modalidade a distância ou semipresencial. Para Dourado

(2001, P.54), essas políticas de formação privilegiavam o aligeiramento e

constituíram um componente intrínseco das políticas educacionais em sintonia com

os organismos multilaterais.

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1991Fundação Roquete Pinto – Programa - Salto para o Futuro – Destinado à Formação Continuada de Professores do Ensino Fundamental.

1992UFMT/FAE/NEAD – Programa em Nível de Licenciatura Plena para a Educação Básica e Serviços de Orientação Acadêmica.

1993 SENAI – EAD – Oferece cursos sobre Qualidade Total para Empresas

1995MULTIRIO – RJ – Cursos em nível fundamental e médio, através de programas televisivos e de material impresso.

1995 Início da Programação da TV Escola – MEC

1995/96Formação do Laboratório de EAD do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção da UFSC.

1997 Escola Brasil – Programa de Rádio – Voltado para o Ensino Fundamental

1999 Curso de Atualização para Professores – Instituto de Geografia da UERJ

1999 UNIREDE – Consórcio de 70 Instituições Públicas de Ensino Superior

2000Consórcio CEDERJ – Parceria entre o Governo do Estado do RJ (Fundação CECIERJ) e a UFF, UENF, UNIRIO, UFRRJ, UERJ e UFRJ.

2005 Lançamento do edital 001/200 do Pró-Licenciatura.

2006 Criação da Universidade Aberta do Brasil – UAB

QUADRO 4: Histórico da Educação a Distância no Brasil (a partir de 1990)Fonte: Autoria própria, adaptado de Berbat, 2008.

A partir da década de 1990, observamos uma mudança na característica dos

cursos a distância no Brasil com o surgimento e multiplicação de cursos voltados

para o ensino superior relacionados com a formação de professores. O quadro

retrata a conjuntura econômica daquele momento, comprovando que a ingerência

das agências realmente estava se consolidando durante a chamada “década da

educação” (1997-2007). Neste sentido, as mudanças de descentralização e gestão

dos sistemas, começariam pelo próprio papel do Ministério da Educação, conforme

observamos em Berbat (2008).

Conforme o documento intitulado Planejamento Político-Estratético (1995-1998), o papel do Ministério da Educação deverá deixar de ser um órgão executor para assumir um caráter de formulador e articulador de políticas públicas, atuando preferencialmente no nível político-estratégico do sistema educacional do país. As tecnologias são colocadas como essenciais no processo de construção de novas

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diretrizes educacionais, com o uso da televisão, o computador, ligado na rede mundial de computadores (Internet). O Ministério da Educação implanta o canal de TV para o atendimento ao sistema educacional, precisamente como estratégia na formação de professores, o programa TV Escola inicia sua operação ainda em 1995 (BERBAT, 2008, p. 103).

Com a promulgação da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

(LDB - nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996) – a qual traz em seu bojo uma enorme

flexibilidade do sistema de ensino, propiciando a criação de novas modalidades de

cursos, de modo a incorporar novos conteúdos, práticas pedagógicas e

procedimentos de avaliação – a modalidade de educação a distância ganha força e

regulamentação própria, através do decreto nº 2.494 de 10 de fevereiro de 1998. Na

própria LDB, em seu artigo 87º, parágrafo 3º, inciso III, das disposições transitórias,

está posto e estabelecido que o poder público deve “realizar programas de

capacitação para todos os professores em exercício, utilizando também, para isso,

os recursos da educação a distância”.

É preciso esclarecer que as iniciativas de educação a distância existiram

antes da década de 1990, nos mais diversos níveis, mas sempre foram ignoradas ou

desestimuladas pelo poder público por força da legislação vigente. A decisão de

formar professores em serviço em diferentes localidades do país fomentou a

implementação da modalidade a distância como alternativa para a execução das

metas propostas pelo governo. Alguns programas foram precursores da formação de

professores na modalidade a distância, como o Projeto Logos, planejado em 1973,

pelo DSU/MEC e implementado em 1977, para habilitar professores em atuação nas

séries iniciais do 1º grau; seu grande desafio era habilitar professores em atuação

nas séries iniciais do 1º grau, sem retirá-los da sala de aula. Esses professores

possuíam níveis de escolaridade variados, sendo exigida a 4ª série do 1º grau, com

escolaridade mínima. Alcançar professores dispersos pelo país, muitos deles

isolados em zonas rurais, de difícil acesso, sem estradas e energia elétrica, com

recursos de transporte e comunicação muito escassos não era uma tarefa fácil e

exigiu estudos detalhados, de forma a desenvolver uma metodologia que atendesse

a esses alunos. O projeto foi executado em parceria com o CETEB e estima-se que

passaram pelo Projeto mais de 200 mil professores, em 19 unidades da Federação.

Em 1982, 60 mil professores já haviam sido habilitados pelo Projeto.

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A partir destas experiências isoladas e no contexto dos acordos internacionais

(que já acreditavam na educação a distância como modalidade de formação no

ensino superior) foi criada, em 1995, a Secretaria de Educação a Distância – SEED

no MEC, com o objetivo de “levar para a escola pública toda a contribuição que os

métodos, técnicas e tecnologias de educação a distância podem prestar à

construção de um novo paradigma para a educação brasileira”. Inicialmente, a

SEED viabiliza projetos isolados com o intuito de fomentar o uso dos dispositivos

tecnológicos como a televisão, o vídeo (e, posteriormente, o DVD), o computador,

entre outras mídias, em benefício da educação.

É interessante observar que o primeiro dispositivo utilizado para viabilizar a

formação de professores a distância foi a televisão com a criação da TV Escola em

1995, um canal de televisão transmitido por via satélite através de antenas

parabólicas, para a formação continuada dos professores da Educação Básica. Além

da criação do canal com o intuito de realizar a formação, foi criado simultaneamente,

o curso TV na Escola e os Desafios de Hoje para atender a uma demanda de

professores brasileiros para qualificarem-se e integrarem a TV a práticas

pedagógicas. O objetivo do curso era capacitar os professores para o uso das

tecnologias e diferentes mídias em sala de aula, integrando as ações instrumentais

do uso do vídeo e da TV ao processo pedagógico. Foi neste período em que as

escolas receberam os chamados kits tecnológicos com antena parabólica, televisão

e vídeo (DVD) para equipar as escolas e viabilizar a participação dos professores

nos programas de formação governamentais. A distribuição destes kits nas escolas

públicas é um importante indicador das políticas governamentais do período, que

pretendiam desenvolver outros programas de formação e capacitação continuada a

partir desta estrutura tecnológica implantada.

O programa um Salto para o Futuro foi uma espécie de experimento para o

desenvolvimento de material de formação continuada via televisão. A fase

experimental do Programa Salto para o Futuro teve início em 1991, concebido e

produzido pela Fundação Roquette-Pinto, hoje, Associação de Comunicação

Educativa Roquette-Pinto (ACERP) para atender às diretrizes políticas do Governo

Federal, a fim de fomentar programas de Educação a Distância, com o

financiamento do FNDE. Em 1992, já com abrangência nacional, passou a chamar-

se Um Salto para o Futuro. Em 1995, denominando-se Salto para o Futuro, foi

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incorporado à grade da TV Escola, ocupando uma das faixas da programação do

canal. O programa conjuga os recursos da Educação a Distância como a utilização

de material impresso, recursos tecnológicos como TV, fax, telefone e Internet a

momentos presenciais, nas telessalas de recepção organizada, nas quais, com a

mediação de um orientador de aprendizagem, os professores discutem e participam

com questões que são constituintes do programa. O grande diferencial do programa

e, provavelmente, a razão do seu sucesso entre os professores, é o fato de ser

realizado ao vivo, com uma estrutura pensada para a participação interativa dos

professores, organizados em telessalas, nos mais diversos pontos do país.

Dois anos depois, em 1997, foi criado por força da portaria do MEC/N° 522,

de 9 de Abril de 1997, o Programa Nacional de Informática na Educação -

PROINFO, em todas as Unidades Federadas do Brasil que aderiram ao Programa,

promovendo a capacitação de professores da rede pública, implementando os

Núcleos de Tecnologia Educacional (NTE) nos Estados para oferecer os cursos aos

professores e alunos da rede pública. Estas ações estão explicitadas no objetivo do

programa, conforme citado na portaria do MEC.

Promover o desenvolvimento e o uso da telemática como ferramenta de enriquecimento pedagógico, visando: A melhoria da qualidade do processo de ensino e aprendizagem, viabilizando a educação voltada para o progresso científico e tecnológico bem como, contribuir par que o educando possa exercer o seu papel de cidadão na sociedade globalizada do Século XXI, e inclusive, a valorização dos educadores (MEC, 1999).

Outro importante marco no desenvolvimento de ações de formação de

professores a distância foi o PROFORMAÇÃO, criado em 1997 pela Secretaria de

Educação a Distância – SEED/MEC –, o Fundo de Fortalecimento da Educação –

FUNDESCOLA –, por meio de parcerias com os estados e municípios. O objetivo do

programa era a habilitação de professores sem a titulação mínima legalmente

exigida, como estratégia para melhorar o desempenho do sistema de Educação

Fundamental em todas as regiões do país. O PROFORMAÇÃO iniciou sua oferta

nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

Os financiadores do programa revelam que a sua implementação estava

vinculada aos organismos multilaterais. O Programa foi financiado pelo

FUNDESCOLA que administra recursos oriundos do Banco Mundial. O Programa

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das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), desde o lançamento do

PROFORMAÇÃO, tem sido parceiro da Secretaria de Educação a Distância (SEED)

na execução do Programa. A partir de 2002, o Fundo Nacional de Desenvolvimento

da Educação (FNDE) assumiu o financiamento do programa por meio de convênio

com a Secretaria de Educação a Distância – SEED/MEC.

Todas as ações governamentais em relação às políticas públicas de

educação a distância não passaram despercebidas pelos professores pesquisadores

das instituições públicas. Estes professores tinham uma concepção clara de como a

educação a distância deveria ser estruturada para promover a inclusão, ao mesmo

tempo em que resistiam aos modelos internacionais de educação a distância na

perspectiva de investimentos privados. Assim, foram criados dois consórcios em

2000, que embora de caráter diferenciado em seus propósitos operacionais, tinham

em comum o desenvolvimento de uma proposta de educação a distância voltada

para a oferta de cursos em nível superior para a formação de professores. Neste

contexto, surge o CEDERJ e a UNIREDE, ambos com um papel fundamental no

desenvolvimento das ações governamentais em educação a distância, seja como

fonte inspiradora, seja como instrumentos de resistência aos modelos propostos.

O Consórcio CEDERJ reúne o Governo do Estado do Rio de Janeiro por

intermédio da Fundação CECIERJ e as seis Universidades públicas sediadas no

Estado, Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ); Universidade Estadual

do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF); Universidade Federal do Estado do Rio

de Janeiro (UNIRIO); Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); Universidade

Federal Fluminense (UFF); Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ).

Esse Consórcio foi elaborado em 1999, através do documento gerado por uma

comissão formada por dois membros de cada universidade juntamente com a SECT

– Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia. De acordo com o documento

institucional, o convênio foi assinado pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro e

pelos Reitores das Universidades Consorciadas no dia 26 de janeiro de 2000. As

Prefeituras Municipais que sediam os polos regionais do CEDERJ, modelo que

inspirou o desenvolvimento da UAB em associação com os municípios. Segundo o

documento do consórcio,

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a metodologia de educação a distância permite o acesso ao sistema daqueles que vêm sendo excluídos do processo educacional superior público por morarem longe das universidades ou por indisponibilidade de tempo nos horários tradicionais de aula. A modalidade de educação a distância contribui para a formação de profissionais sem deslocá-los de seus municípios. Outro aspecto relevante é a carência de professores do Ensino Médio, principalmente nas áreas de Ciências e, especialmente, no interior do Estado. Os objetivos do CEDERJ são: contribuir para a interiorização do ensino superior público, gratuito e de qualidade no Estado do Rio de Janeiro; concorrer para facilitar o acesso ao ensino superior daqueles que não podem estudar no horário tradicional; atuar na formação continuada, a distância, de profissionais do Estado, com atenção especial para o processo de atualização de professores da rede estadual de Ensino Médio; aumentar a oferta de vagas em cursos de graduação e pós-graduação no Estado do Rio de Janeiro (CEDERJ, 2000).

O modelo desenvolvido pelo CEDERJ influenciou profundamente todas as

Universidades que desenvolveram os seus programas de educação a distância, não

apenas no modelo pedagógico ou na gestão operacional, mas também no

desenvolvimento de materiais didáticos, considerado por muitas instituições como o

maior entrave na implementação dos cursos a distância.

No mesmo ano, foi criado o Consórcio UNIREDE que se diferencia da

proposta do CEDERJ por não operacionalizar cursos a distância, mas sim articular

as ações de educação a distância desenvolvidas por instituições públicas, mantendo

uma interlocução constante com o governo federal no sentido de direcionar as

políticas públicas em educação a distância no ensino superior. Nós iremos nos

aprofundar nos princípios do consórcio da UNIREDE no próximo capítulo. Neste

momento, é importante registrar a criação da UNIREDE, que em seu documento de

criação estabelece,

A UNIREDE foi um consórcio interuniversitário criado em dezembro de 1999 com o nome de Universidade Virtual Pública do Brasil. Seu lema foi dar início a uma luta por uma política de estado visando a democratização do acesso ao ensino superior público, gratuito e de qualidade e o processo colaborativo na produção de materiais didáticos e na oferta nacional de cursos de graduação e pós-graduação (UNIREDE, 1999).

Em outras localidades do país, diversos cursos de formação de professores

em nível de graduação foram criados, como o Curso Veredas em Minas Gerais, a

criação do NEAD na Universidade Federal do Mato Grosso, a iniciativa da UFAL em

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Alagoas, todos com cursos de formação de professores em exercício, que

significava na prática, aulas nos finais de semana e a organização de tarefas e

atividades para os dias úteis. Algumas instituições caracterizaram a oferta de

formação em serviço como educação a distância, outras utilizaram a metodologia,

mas não a nomenclatura (o que pode ser explicado pelo preconceito que ainda

existia naquele momento em relação à modalidade).

O projeto Veredas, por exemplo, foi oferecido aos professores da 1ª à 4ª série

do ensino fundamental, em exercício nas redes públicas de Minas Gerais no período

de 2002 a 2005. Implementado e coordenado pela Secretaria de Estado da

Educação de MG, foi desenvolvido na modalidade a distância e em serviço, por meio

da Rede Veredas - integrada por 18 instituições de ensino superior que atuaram

como agências formadoras. O projeto formou 13.749 professores e foi organizado na

forma de um curso de graduação plena.

3.8 As entidades de classe e a EAD no ensino superior

Todas as ações realizadas para implementação de cursos na modalidade a

distância, por iniciativa governamental ou por iniciativa das próprias universidades,

retratam um movimento que não é consensual em todos os níveis de

representatividade no campo da educação superior. Existem diversos conflitos, não

apenas entre as instituições que apóiam e outras que são contra, mas também,

dentro das próprias instituições e em outros casos, de acordo com a alternância dos

dirigentes das instituições.

É o caso da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de

Ensino Superior (Andifes), por exemplo, que a partir de uma determinada gestão

passou a apoiar a EAD e realizou uma série de medidas no processo da

institucionalização dos cursos a distância dentro das IFES. Em entrevista com o

reitor Paulo Speller, vice-presidente da Andifes, encontramos algumas colocações

interessantes. Segundo o reitor, foi criada uma comissão de educação a distância

que passou a ser muito concorrida na gestão corrente da ANDIFES.

Eu fiz uma defesa, há dois anos, na Andifes, da inclusão de um parâmetro do ensino a distância na matriz. Mas todos acharam prematuro e pediram para adiar a discussão. Então, quando

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assumimos a gestão da Andifes, o reitor Oswaldo e eu, em maio do ano passado, decidimos criar uma comissão para tratar somente deste assunto. Era uma forma de colocar na pauta a educação a distância. A Comissão apareceu e as pessoas, interessantemente, manifestaram-se, querendo participar. A Comissão de Educação a Distância da Andifes é, hoje, uma das mais concorridas. Há muitos dirigentes que não são membros da Comissão, que é formada por oito integrantes, participando das reuniões, porque estão interessados, têm projetos, possuem alguma turma na modalidade (Entrevista com o Reitor Speller, Portal da Andifes, 2006).

Na defesa da criação da UAB, que teve a Andifes como parceira, o Reitor

Speller faz uma observação interessante sobre o interesse dos professores e das

próprias universidades em participar do projeto.

Além disso, o Presidente Lula sancionou a Lei nº 11.273, de 6 de fevereiro de 2006, que cria bolsas de estudo e de pesquisa para professores envolvidos na educação a distância, tutores e participantes de cursos ou programas de formação inicial. Isso deve acabar com o desestímulo, o desinteresse que a maioria dos professores tinha pela educação a distância, porque existe agora uma bolsa, que chega a R$ 1.200,00 - além do salário - para professores envolvidos no projeto. Assim, o município entrou com a estrutura física, o estado deu um apoio financeiro, a universidade ofereceu o curso e o governo colocou as bolsas. A partir daí, o programa se torna atraente. É uma estratégia inteligente e outras iniciativas, como o programa do curso de Administração da Universidade Aberta, apoiado pelo Banco do Brasil, estão surgindo (Portal da Andifes, 2006).

Na afirmativa, é possível interpretar que o interesse dos professores no

projeto está vinculado à remuneração recebida pela participação nos projetos, da

mesma forma que poderíamos supor que o interesse das IES em participar dos

projetos está no financiamento governamental para a implementação dos cursos a

distância. Mais adiante, ele afirma que não existe pessoal técnico e professores

suficientes para suprir a demanda que está sendo criada pela implementação dos

cursos, “a liberação das vagas docentes exclusivamente para a Educação a

Distância já é um começo, mas precisamos ampliar muito mais o quadro pessoal,

porque a falta de docentes está sendo uma grande barreira para expandir a

educação a distância”.

O posicionamento da ANDES (Associação Nacional dos Docentes do Ensino

Superior) é bem diferente em relação ao assunto. José Vitório Zago, do Sindicato

Nacional dos Docentes de Instituições de Ensino Superior (Andes-SN), afirma que a

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entidade tem discordâncias com a concepção da Universidade Aberta. "Nós

achamos absurdo que o formador do ensino básico ser formado à distância. O futuro

professor, ao invés de ter contato com o seu professor e seus colegas, vai ter

contato com a máquina", critica.

Na entrevista com a professora Milena Martinez, ex-diretora do ANDES-SN,

realizada pela Assessoria de Imprensa da ADUFU-SS, publicada no informativo de

agosto de 2006, ela deixa claro o posicionamento da entidade em relação ao

movimento do governo federal para a implementação da educação a distância,

especialmente o contexto da UAB.

A educação a distancia faz parte da reforma da educação superior, expressa, portanto, as condicionalidades impostas no processo de ajuste estrutural aos países periféricos, cuja lógica perversa é a do empresariamento da educação, uma vez que segundo a OMC a educação está inserida no setor de serviços. A UAB e os consórcios se assemelham mais a uma Fábrica, pois enfatizam a alta produção de cursos promovendo uma interação ampla atuando também com empresas que não são exclusivamente estatais assim como com as demais instituições de educação superior, sejam públicas ou privadas. A OMC faz referência as universidades corporativas como uma importante área de expansão internacional, já que as empresas multinacionais tendem a desenvolver programas de ensino de produção local para o seu pessoal. As estatais estão seguindo esta tendência. A contratação de serviços educacionais pode ser encaminhada através de instituições nacionais ou internacionais (Entrevista publicada no Informativo da ADUFU-SS, em agosto de 2006).

A União Nacional dos Estudantes apresenta justificativa semelhante para

fundamentar a sua posição contrária a expansão da EAD no país. Na tese

apresentada no 50° Congresso Nacional da UNE. A criação da educação a distância

é abordada no mesmo parágrafo que rejeita a criação dos centros universitários. Os

estudantes utilizam o projeto de Lei como referência legal da ação governamental

para instituir políticas públicas no ensino superior.

A qualidade do ensino superior está ameaçada com a iniciativa do PL (Projeto de Lei nº 7.200/06) em legalizar o ensino à distância e os centros universitários. O EaD seria utilizado na graduação e na pós-graduação (mestrado e doutorado), equivalendo-se ao modelo presencial. Essa iniciativa traz sérios riscos ao falho sistema educacional brasileiro. Ao legalizar o ensino à distância, o MEC abre o setor educacional ao capital estrangeiro, colocando-o na rota dos acordos da OMC (Organização Mundial do Comércio). A formação

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de qualidade também é atingida, pois há a possibilidade de cursos de mestrado e doutorado à distância serem reconhecidos por

As ações de resistência contra a educação a distância relatadas aqui não

foram modificadas ao longo dos anos, pelo contrário, elas foram fortalecidas

principalmente pelo enfoque da precarização das relações de trabalho dos

professores tutores e prestadores de serviço. Em junho de 2009 a Universidade de

São Paulo (USP) enfrenta uma greve de funcionários e alunos na qual uma das

reivindicações dos grevistas é a não implantação de cursos a distância na

Universidade,com a criação da Univesp. Em artigo publicado no jornal Folha de São

Paulo em 20/06/09, o vice-presidente da Associação dos Docentes da USP (Adusp),

expõe o seguinte argumento.

No Brasil, é comum atribuir relação intrínseca e biunívoca entre ensino à distância (EàD) e tecnologias de informação e comunicação (TIC), modernas ou não. Ledo engano, pois tais tecnologias não caracterizam nem sequer são exclusivas do EàD. A incorporação das TIC no ensino presencial, por sinal, é modesta, entre outros motivos, porque faltam às instituições de ensino recursos para prover a infraestrutura necessária. Por outro lado, a prática do EàD no país apresenta características negativas: 1) cursos modulares, aligeirados; 2) reduzida carga de ensino presencial, nem sempre conduzida por professores (substituídos por monitores e tutores); 3) fragmentação do processo de ensino: planejamento, elaboração, acompanhamento e avaliação realizados por pessoas distintas; e 4) precarização do trabalho dos docentes, monitores e tutores, todos submetidos a contratos temporários (Folha de São Paulo, seção Tendências e Debates, publicado em 20/06/09 ).

Foi publicada uma opinião favorável no mesmo jornal, mas é interessante que

uma greve seja deflagrada também sob o argumento de resistência aos cursos a

distância, principalmente quando praticamente todas as IFES possuem algum tipo

de iniciativa na modalidade. O argumento do professor Gil da Costa Marques,

professor titular do Instituto de Física da USP, coordenador de Tecnologia da

Informação da USP e membro do conselho da Univesp, segue a linha de

apropriação das tecnologias em favor da educação de qualidade.

Assim, urge encontrar mecanismos institucionais visando à incorporação das novas tecnologias tanto no apoio ao ensino presencial quanto na ampliação de cursos de extensão e de graduação.Há uma demanda crescente pelo ensino de qualidade. Há, por outro lado, no modelo atual de ensino, uma limitação de recursos materiais e humanos que impede o atendimento cabal

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dessas demandas. Com a evolução das ferramentas voltadas para o ensino, a modalidade à distância se torna uma alternativa viável para atender boa parte da demanda reprimida. Portanto, a questão do uso das novas tecnologias não é se devemos utilizá-las para ampliar a oferta de cursos, mas como fazê-lo e em que ritmo. O uso das novas tecnologias no ensino pode representar uma mudança de paradigma. Trata-se de uma forma de democratização do ensino e uma alternativa de inclusão social para aqueles que, por conta da sua condição social ou localização geográfica, não têm acesso ao ensino presencial. Pode a universidade pública furtar-se à pesquisa, à disseminação e ao uso de um instrumento tão promissor? Podemos oferecer cursos à distância sem que se perca a comprovada qualidade do ensino presencial? (Folha de São Paulo, seção Tendências e Debates, publicado em 20/06/09).

Todas as ações realizadas até o ano de 2004, embora isoladas e

desarticuladas de um projeto maior, foram decisivas para a consolidação de um

programa governamental de educação a distância. Apesar de não ser o objetivo

deste trabalho, é possível vislumbrar algumas diferenças entre a política

governamental realizada na época do governo de Fernando Henrique Cardoso e do

governo Lula. As estratégias e ações do governo FHC estavam relacionadas com

um projeto neoliberal, com forte ação de agências internacionais que participavam

ativamente de programas governamentais, seja no financiamento direto, seja nas

orientações e objetivos. No governo Lula, algumas destas ações mantém a

continuidade, ainda que os atores tenham sido modificados e a interlocução com

diversos segmentos da educação tenha sido intensificada. Embora a política do

governo retrate o segmento da sociedade que está representado, não é possível

descontextualizar as questões econômicas do setor produtivo que perpassam as

ações e estratégias das políticas educacionais, muito mais do que um simples pano

de fundo. As necessidades do capital continuam prementes, estão na pauta do dia e

estabelecem as prioridades do modelo educacional. Algumas ações vão refletir a

anuência ao modelo econômico, outras evocarão a resistência, em um movimento

complexo que retrata as dualidades, ambiguidades e duelo de forças existentes em

nossa sociedade.

No nosso trabalho, consideramos que todas essas ações relatadas neste

capítulo foram fundamentais para a definição e consolidação de uma política pública

maior de educação a distância. Como marco da ação governamental no ensino

superior, o Programa Pró-Licenciatura que analisaremos no capítulo a seguir é a

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primeira ação de uma política de governo, que pretendia se tornar, nas palavras de

um dos mentores do programa, uma política de Estado.

3.9 Nuvem de tags do capítulo

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4 POLÍTICAS PÚBLICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES A DISTÂNCIA: O PRÓ-LICENCIATURA E A UNIVERSIDADE

ABERTA DO BRASIL

Dan Perjovschi . What Happened to us?

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4.1 A concepção do Pró-Licenciatura

Neste capítulo, apresentaremos o Programa Pró-Licenciatura desde a sua

concepção até a operacionalização das ações para a implementação dos cursos

estabelecendo as conexões e relações que o caracterizam como um campo de

correlação de forças que expressam representações sobre educação. O processo

de criação do Programa Pró-Licenciatura é bastante complexo, estruturado, a partir

de uma intensa interlocução com diversos grupos de instituições de ensino superior

públicas, que já haviam se organizado desde 2000 em consórcios2. Ao analisar a

trajetória de construção do Programa Pró-Licenciatura, observamos que a

representação de diversos segmentos e a interlocução contínua com a SEED/MEC

propiciou que o modelo final da discussão refletisse o interesse de diversos grupos,

sobretudo os que defendiam a educação pública, gratuita e de qualidade. Esta

interlocução não foi fácil, os sujeitos envolvidos no processo não deixaram de agir

de acordo com os seus próprios interesses, o Estado não flexibilizou as suas ações

apenas em função da interlocução, assim como os professores das IES também não

abriram mão de determinados elementos ao longo do processo.

Essa correlação de forças esteve presente em todos os momentos de criação

do Programa e, justamente por ter permitido um debate amplo sobre o assunto

naquele momento, expressa um movimento democrático de construção de um

programa. Isso não significa que todos os envolvidos participaram da discussão ou

que o resultado final tenha sido o mais adequado para todos. A nossa observação

sobre o espaço democrático, criado com a possibilidade de interlocução, está

relacionada com o fato de que, no governo FHC, notadamente pautado em um

projeto neoliberal, as condutas de elaboração de programas e estratégias

permeavam o discurso da autoridade técnica das grandes agências internacionais

que apresentavam um projeto claro em nível mundial. Assim, pensar em

organização de consórcios, diálogos com o poder público e representatividade de

pessoas que não estavam associadas ao governo federal, constituiu-se em uma

novidade no cenário das políticas públicas voltadas para a educação. Não

pretendemos afirmar que a facilidade de interlocução estava relacionada

diretamente com o perfil do Estado naquele momento, seria necessário um trabalho

2 A questão de formação de consórcios na educação a distância no Brasil está apresentada no Capítulo 3 deste trabalho.

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mais aprofundado neste foco para qualquer conclusão neste sentido, mas podemos

afirmar que o fato de ser um programa na modalidade a distancia em nível superior,

com poucas experiências realizadas em território brasileiro, facilitou bastante a

disponibilidade para o diálogo. Não era apenas uma questão de querer fazer a

educação a distância, era também uma questão de saber como. É neste contexto

que a diversidade e a multiplicidade de concepções e tendências sobre a EAD é

fundamental para a construção de propostas a partir do diálogo e da compreensão

de que existem diferentes perfis de instituições, alunos, organizações etc.

O primeiro edital para financiamento público de cursos em nível superior na

modalidade a distância é realizado por meio da Chamada Pública n° 1/2004, lançado

em julho de 2004 para os cursos de licenciatura em Pedagogia, Física, Química,

Matemática e Biologia. Neste edital somente poderiam concorrer as universidades

públicas, organizadas em consórcios, com um projeto único que pudesse ser

utilizado em todas as instituições participantes. O edital não determinava as

diretrizes pedagógicas dos cursos, número de vagas ou valores máximos por aluno,

mas estipulava algumas condições de elegibilidade que proporcionaram muitas

discussões entre as instituições participantes da UNIREDE. É interessante tecer

algumas reflexões sobre a organização de consórcios para a modalidade a

execução de cursos a distância.

As razões para o pré-requisito de organização das instituições em consórcios

para concorrer aos editais publicados pelo MEC não estão claras nos documentos

oficiais. Encontramos alguns indícios de contenção de custos ou otimização de

recursos, mas de forma definitiva, a justificativa não está inserida em nenhum dos

documentos. Da mesma forma, não estão claras as razões que justifiquem a

organização do CEDERJ em um consórcio ou mesmo da UNIREDE.

Especificamente no caso da UNIREDE, ela poderia se caracterizar como uma

organização não-governamental ou uma associação de pesquisa, já que não

objetivava executar nenhum curso, mas sim, articular as políticas de educação a

distância no país. É provável que a idéia de articulação tenha acontecido em função

do pequeno número de professores pesquisadores que trabalhava com educação a

distância naquele momento, exigindo uma articulação de várias instituições públicas

para o estabelecimento de uma única ação. Uma outra justificativa seria a

necessidade de organização em consórcios para evitar a entrada maciça de

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instituições internacionais que já haviam mostrado interesse em operar com

educação a distância no Brasil, notadamente as instituições privadas, organizadas

em grupo. O fato é que esta exigência foi colocada já no primeiro edital de

financiamento de cursos e obrigou as instituições públicas a não apenas se

organizarem em consórcios, mas desenvolverem projetos únicos que pudessem ser

aplicados em todas as instituições participantes.

Este foi um movimento bastante complexo e nada desprezível em termos de

grandiosidade para superar barreiras culturais de décadas, as quais mantinham as

universidades públicas em seus nichos de atuação e pesquisa, com pouca

colaboração, interação e troca efetiva. Apesar do estranhamento inicial, os

representantes das instituições públicas se uniram por proximidade geográfica ou

afinidade acadêmica para construir um modelo possível de educação a distância em

cursos de nível superior. É preciso lembrar que, neste momento, não existiam

modelos a serem seguidos, com exceção do CEDERJ no Rio de Janeiro que já

acumulava uma experiência inicial, tanto na organização do consórcio, quanto na

implementação de cursos a distância. Consideramos este movimento extremamente

importante para a construção da educação a distância no Brasil, no modelo que

conhecemos hoje. Portanto, vamos detalhar a seguir a constituição do consórcio

UNIREDE e exemplificaremos a dinâmica de um consórcio regional, o Nordeste

Oriental, constituído por instituições públicas dos Estados de Sergipe, Alagoas,

Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte.

4.2 A formação da UNIREDE

Como já vimos no capítulo anterior, a UNIREDE foi formada como um

consórcio interuniversitário com o nome de Universidade Virtual Pública do Brasil. A

idéia central do consórcio era lutar por uma democratização do acesso ao ensino

superior público, gratuito e de qualidade, bem como socializar as experiências,

materiais e outras formas de cooperação entre as instituições públicas de nível

superior. O documento de criação da UNIREDE é iniciado da seguinte forma.

Os representantes das 18 universidades presentes a I Reunião da Universidade Virtual Pública do Brasil, nos dias 2 e 3/12 em Brasília, UnB, estão conscientes de que já é hora do sistema público de ensino superior ocupar e ampliar seu espaço, partindo para uma

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ação arrojada, inovadora, responsável e concreta, como resposta às desigualdades e injustiças no campo da educação superior (Ata do documento de criação da UNIREDE, 1999).

Fica claro no teor de abertura do documento, que os associados acreditavam

que a educação a distância era um importante instrumento de inclusão no ensino

superior e que o atual modelo de ingresso e permanência no ensino superior estava

distorcido, gerando desigualdades e injustiças no campo da educação superior. O

chamado objetivo principal do consórcio também explicita esta compreensão.

Reuniu em um consórcio 82 instituições públicas de ensino superior e 07 consórcios regionais, com o objetivo principal de democratizar o acesso à educação de qualidade por meio da oferta de cursos a distância nos níveis de graduação, pós-graduação e extensão, sob a forma de ensino regular gratuito e educação continuada (Histórico da UNIREDE, 2007).

No mesmo documento com informações sobre o histórico da UNIREDE, é

possível verificar a intensa capacidade de articulação política e inserção do

consórcio, por meio dos apoios recebidos inicialmente, o que mostra que o

movimento estava consolidado antes mesmo de se instituir como um consórcio ou

associação. Havia financiamento para a pesquisa em educação a distância e no

próprio desenvolvimento e consolidação do consórcio, condição que está expressa

no corpo do documento.

A UNIREDE contou desde o início, com o apoio da Comissão de Educação/ Frente Parlamentar de Educação a Distância da Câmara Federal na pessoa do Deputado Federal Werner Wanderer do Paraná, dos Ministérios da Educação e Cultura – MEC, Ciência e Tecnologia – MCT e de órgãos como a Financiadora de Estudos e Projetos - FINEP e, especialmente, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq/ MCT que disponibilizaram bolsas DTI, para apoiar o desenvolvimento da UNIREDE nos polos (Histórico da UNIREDE, 2007).

Apesar de o contexto neoliberal em que estavam inseridas as políticas

educacionais no momento de formação do consórcio, houve uma mobilização no

sentido de investir na pesquisa e desenvolvimento de ações voltadas para educação

a distância por pesquisadores que integravam um movimento que visava garantir a

estruturação de um modelo de política pública em educação a distância sob a

perspectiva do interesse público. A justificativa para este movimento é a capacidade

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de mobilização e articulação política dos idealizadores do consórcio e o interesse do

governo em realizar experiências em educação a distância com o aval acadêmico e

científico dos professores pesquisadores das principais IES do país.

No corpo do documento que relata o histórico da UNIREDE, encontramos

uma passagem que ressalta a importância do consórcio nas instituições das políticas

públicas nos últimos anos, constituindo-se muito mais do que uma simples rede de

influência. Na verdade, os editais, o modelo e a estrutura de educação a distância

foram amplamente discutidas com o membros do consórcio.

Não resta dúvida de que o consórcio inovou, rompeu barreiras e inúmeras resistências fruto principalmente de preconceitos e interesses privatistas tendo com a luta e o apoio institucional dos reitores e diretores das instituições públicas afiliadas ou parceiras, contribuindo na construção da história recente da educação a distância do país. Um dos papéis importantes dos representantes da UNIREDE, foi a proposição de políticas públicas, fundamentadas em estudos realizados e apresentados ao Ministério da Educação e que deram suporte ao surgimento de Programas hoje implantados em todo o país, como o Prolicenciatura 1 e 2 e a própria UAB – Universidade Aberta do Brasil, de cujo estudo e concepção de sua estrutura, contou com a participação ativa de representantes do Comitê Gestor e Conselho de Representantes da UNIREDE (Histórico da UNIREDE, 2007).

Ao analisarmos o estatuto social da UNIREDE, constituída como sociedade

civil sem fins lucrativos, verificamos que a finalidade é promover o desenvolvimento

científico e tecnológico e tem como objetivos:

a) desenvolver, mediante parcerias com instituições públicas e privadas, projetos de ensino, pesquisa e extensão ligados à Educação a Distância;b) promover estudos e pesquisas na área da Educação a Distância e suas relações com a sociedade;c) incentivar e realizar atividades de avaliação de estratégias e de impactos econômicos e sociais das políticas, programas e projetos científicos e tecnológicos relacionados à Educação a Distância nas suas mais variadas formas;d) difundir informações, experiências e projetos de Educação a Distância à sociedade;e) promover a interlocução, articulação e interação entre os mais variados setores para a proposição de políticas públicas que visem a democratização do acesso à educação por meio da Educação a Distância; ef) atuar na melhoria dos programas e dos cursos ofertados pelas instituições associadas, no sentido de implementar medidas e

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padrões de qualidade em Educação a Distância (Art. 4° do Estatuto Social da UNIREDE, 2007).

As ações propostas nos objetivos da UNIREDE podem ser resumidas em dois

focos: a interlocução como espaço de implementação de projetos na modalidade a

distância e um instrumento de regulação das ações de educação a distância

desenvolvidas dentro das IPES, a partir de determinados conceitos e fundamentos

estabelecidos como aceitáveis pelos integrantes do consórcio. Para executar os

objetivos propostos, o documento que traz o histórico da UNIREDE afirma que o

consórcio:

[...] continua tendo um importante papel para consolidação de três eixos que poderão contribuir para garantia da qualidade acadêmica dos programas de EaD, e deste modo, com a manutenção de um sistema de rede, ajudar no processo de consolidação das políticas públicas para uma Educação a Distância de qualidade de todo o sistema público brasileiro:1)Avaliação e acompanhamento de processos e projetos de EaD, junto às instâncias do MEC, 2)Organização da Associação UNIREDE com caráter de sociedade científica, 3)Cooperação e interlocução inter-institucional visando contribuir com políticas públicas e com a filosofia do trabalho em rede (Histórico da UNIREDE, 2007).

É interessante observar que pelos menos um dos eixos citados já é

executado pelo poder público, não se tornando claro como uma associação civil

poderia intervir nas políticas de acompanhamento e avaliação dos projetos de

educação a distância. A configuração inicial da gestão da UNIREDE nos oferece

alguns indícios de como os limites entre as atribuições do consórcio e a ação do

Estado ainda se encontram confusos.

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FIGURA 2: Estrutura da Gestão Inicial da UNIREDE

Fonte: Autoria própria, com dados do documento Histórico da UNIREDE.

A garantia de participação no Conselho Consultivo de representantes do

poder público e autarquias revela o caráter articulador do consórcio que buscava

agir de forma efetiva nas configurações das políticas públicas fortalecido pela

organização dos representantes da IPES em consórcios regionais, distribuídos

geograficamente, agregando interesses na oferta de cursos a distância. A

dependência do financiamento público para o desenvolvimento de pesquisas e

manutenção da própria organização pode ser compreendida como uma fragilização

do consórcio, o qual ainda não consegue garantir a sua total independência do

poder público. A relação de dependência está explicitada no trecho do documento

onde a justificativa para a extinção dos polos de apoio criados em 2002, foi o fim das

bolsas DTI-CNPq que financiavam o pessoal dos polos existentes na Universidade

Federal do Mato Grosso (orientação pedagógica), Universidade de Brasília (Gestão),

Universidade Federal da Bahia (assessoria em avaliação) e Universidade Federal do

Rio de Janeiro (comunicação).

Além do Comitê Gestor e dos conselhos citados, foram criados polos de apoio, que foram transformados em janeiro de 2002 em assessorias de avaliação na UFBA, de orientação pedagógica na

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UFMT, de gestão na UnB e de comunicação na UFRJ. Por questões estratégicas e técnicas, essas assessorias ficaram localizadas em diferentes regiões/ instituições consorciadas. Estes foram extintos em 2005 com a extinção das bolsas DTI-CNPq (Histórico da UNIREDE, 2007).

De fato, no próprio documento que relata o histórico da UNIREDE, fica claro

que as reuniões do comitê gestor eram realizadas de acordo com a demanda de

interlocução com os órgãos públicos, e que estes apoiaram a criação do consórcio

desde o início.

O Comitê Gestor se reunia, preferencialmente, quando surgia necessidade de interlocução com os ministérios, autarquias federais e o poder legislativo, que apoiou a UNIREDE desde a sua criação e o Conselho de Representantes uma vez em cada semestre, podendo ser convocado quando havia matéria relevante (Histórico da UNIREDE, 2007).

FIGURA 3: Atual Estrutura organizacional da UNIREDEFonte: Estatuto da UNIREDE, 2006.

A atual estrutura organizacional da UNIREDE está bem mais enxuta, não

existindo mais a configuração de três conselhos. A mudança mais significativa foi a

retirada do conselho consultivo com seus representantes de órgãos públicos e

autarquia. Na estrutura atual o Conselho de Representantes é constituído pelo

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Presidente da UNIREDE e por um representante de cada Instituição Pública de

Ensino Superior associada, eleito nos termos definidos no Regimento Interno. O

Comitê de Coordenação Política (CCP) será composto pelo Presidente e pelo Vice-

Presidente da UNIREDE, por membros do CR representantes de cada Regional da

UNIREDE, um representante das instituições federais, um das instituições estaduais

e um das instituições de educação tecnológica, eleitos nos termos do Regimento

Interno. As regionais estão divididas segundo as regiões do IBGE:

I.Região Norte: Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima e

Tocantins;

II.Região Nordeste: Ceará, Maranhão, Alagoas, Bahia, Paraíba, Pernambuco,

Rio Grande do Norte, Sergipe e Piauí;

III.Região Centro-Oeste: Distrito Federal, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso

do Sul;

IV.Região Sudeste: Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo;

V.Região Sul: Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina.

A configuração da UNIREDE em regionais permitiu a interlocução de

praticamente todas as instituições do país interessadas em desenvolver ações de

educação a distância. O diálogo entre os participantes das regionais nos primeiros

anos de atuação do consórcio comprova que a configuração da UNIREDE como

uma associação civil foi construída de forma coletiva, a partir da contribuição de

todos. A participação dos integrantes dos Consórcios Regionais na discussão sobre

o conteúdo do primeiro edital para EAD publicado pelo MEC, embora não

determinante e nem sempre em consenso, indica que o caminho da interlocução

estava aberto entre o governo (representado pela SEED/MEC) e os participantes. É

sobre este diálogo que vamos tratar no próximo tópico.

4.3 O Consórcio UNIREDE Nordeste Oriental

O Consórcio UNIREDE Nordeste Oriental foi criado oficialmente a partir da I

Reunião da Regional Nordeste Oriental nos dias 3 e 4 de abril de 2003, em João

Pessoa, Paraíba. Segundo a memória da reunião, participaram da reunião 37

representantes de suas respectivas instituições, assim especificados: Carmen

Moreira de Castro Neves (SEED/MEC), Waldimir Pirró e Longo e Selma Dias Leite

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(CG/UNIREDE), 30 representantes de 10 IPES (6 IFES, 3 Universidades Estaduais

e o CEFET/PB. Das 11 IPES convidadas, faltou a UFRPE) e 1 representante de

cada uma das 4 Secretarias Estaduais de Educação presentes (das 5 convidadas,

faltou a SEC/SE). Vale salientar que 3 das 10 IPES presentes (são elas: UEPB,

CEFET/PB e UFCG), convidadas, porém ainda não consorciadas à UNIREDE,

manifestaram intenção de fazê-lo.

Esta reunião foi a consolidação das articulações anteriores realizadas pela

UNIREDE enquanto consórcio nacional, resultado do esforço intenso de alguns

representantes das IPES que tinham interesse em desenvolver atividades em EAD.

Neste aspecto, temos alguns professores das universidades públicas que estavam

extremamente empenhados e comprometidos em realizar as ações de articulação

em nível regional e iniciar a sistematização do conhecimento e das experiências

existentes até aquele momento.

A presença de um representante da SEED/MEC no evento com os indicativos

da proposta clara do governo federal mostram que o modelo de articulação e

estrutura desenvolvida pela UNIREDE com extensão para as suas regionais, seguia

uma orientação do MEC não apenas para a construção de futuros editais, mas

também, para as possibilidades de parcerias com as instâncias estaduais e

municipais para a formação de professores. Vamos extrair algumas passagens da

síntese dos encaminhamentos registrados na memória da reunião para refletir sobre

os indícios do modelo democrático na fala dos envolvidos no processo.

Avaliação unânime entre os presentes da importância da regionalização da UNIREDE e, neste contexto, consenso em relação à criação do Consórcio Regional Nordeste Oriental, a ser constituído pelas IPES dos seguintes estados, como proposto pelo Comitê Gestor daquele consórcio nacional: RN, PB, PE, AL e SE (Memória da I Reunião do Consórcio Nordeste Oriental, 2003).

A decisão de organizar regionalmente o consórcio em uma configuração

geográfica com cinco Estados, caracterizados como Nordeste Oriental, foi uma

decisão realizada na instância nacional da UNIREDE, provavelmente mantendo os

Estados que possuíam representantes com maior capacidade de articulação e

proximidade nos relacionamentos entre si. Acordados sobre a “importância da

regionalização da UNIREDE”, os participantes deram inicio aos procedimentos

legais de constituição do consórcio e é interessante observar que embora a decisão

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de abrangência geográfica tenha sido tomada na UNIREDE Nacional, o instrumento

jurídico para constituição do documento de celebração do convênio é elaborado

pelos próprios integrantes do grupo, que passam a dividir as tarefas para

sistematizar a ação.

Outras duas ações são essenciais para a compreensão do processo de

organização do consórcio: a pesquisa e sistematização dos materiais desenvolvidos

dentro das IPES (cursos, materiais, programas, bibliotecas digitais/virtuais etc.) para

oferta regional e/ou nacional (socialização do uso dessa produção) e os

encaminhamentos para a articulação entre os diversos órgãos do governo, em nível

federal e estadual.

Articulações, no âmbito de cada Estado, das IPES locais e Secretarias Estaduais de Educação e de C&T, com vistas à questão da formação de professores, em especial, e de outras possíveis parcerias, via EAD, no novo contexto da regionalização da UNIREDE e da clara sinalização de apoio do MEC. O resultado dessas articulações deve circular na lista de discussão da Regional Nordeste Oriental dentro de, no máximo, 60 dias. Responsáveis: todas as IPES de um mesmo Estado articulando-se, primeiramente, entre si e, em seguida, com as respectivas Secretarias estaduais de Educação e de C&T. Divulgar o resultado do andamento dessas articulações na lista de discussão (Memória da I Reunião do Consórcio Nordeste Oriental, 2003).

Na segunda reunião realizada pelo consórcio Nordeste Oriental, foi assinado

o convênio com os representantes das instituições participantes, em evento

realizado também em João Pessoa, Paraíba, no dia 30 de junho de 2003. Segundo

o documento de síntese de resultados da reunião, participaram da solenidade de

assinatura coletiva do convênio de Cooperação Interinstitucional que oficializou a

criação do Consórcio Regional Nordeste Oriental:

a) Secretário de Educação e Cultura do Governo do Estado da Paraíba; Secretária de Educação e Cultura do Município de João Pessoa; reitores (UFRN, UERN, UFPB e UEPB); diretor geral (CEFET/PB); vice-reitores (UFCG e UFAL); e representantes com autorização para assinatura do Convênio (UFPE e UPE). As assinaturas dos dirigentes da UFRPE e da UFS serão providenciadas via Correios, em razão da ausência dos mesmos à solenidade;b) Representantes institucionais e/ou suplentes junto à UNIREDE das nove Instituições Públicas de Ensino Superior (IPES) acima referidas;

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c) Sub-secretária de Educação do Estado da Paraíba e outros integrantes da Secretaria; Vice-reitor da UEPB; pró-reitores e outros integrantes da administração superior, diretores de centro, professores e alunos da UFPB (Memória da II Reunião do Consórcio Nordeste Oriental, em 02/07/2003).

O documento de convênio não traz nenhuma novidade aos propósitos e

objetivos da UNIREDE já tratados neste capítulo, mas confirma o nível de

articulação dos participantes que conseguiram a adesão de onze instituições

públicas nos cinco Estados que constituíam o Consórcio.

4.3.1 O espaço de diálogo do Consórcio Nordeste Oriental: a lista de discussão

Um dos encaminhamentos, a partir da primeira reunião foi a criação de uma lista de discussão na Internet, especificamente no Yahoo Grupos, onde todos os participantes discutiram o processo de articulação, a constituição jurídica, a elaboração das portarias e leis sobre educação a distância, o desenvolvimento de cursos, participação em editais, entre outros assuntos. Foram 1.262 mensagens no período de 10 de abril de 2003 até 17 de outubro de 2005, quando foi oficialmente desativada. (Figura 4).

FIGURA 4: Histórico das mensagens do Yahoo Grupos UNIREDE Nordeste 2Fonte: Lista de discussão do Yahoo Grupo, 2008.

Vamos reproduzir alguns trechos das mensagens para mostrar como o

processo de construção foi realizado, por intermédio do compartilhamento de

informações, troca de experiências, em uma verdadeira rede colaborativa.

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Dias 20 e 21 do corrente mês, na UnB, a SEED/MEC promoveu o Seminário "Plataforma para Educação a Distância, via Internet", do qual participaram o Secretário de Educação a Distância do MEC, Prof. João Carlos Teatini, Diretores e coordenadores da SEED, gestores do Proinfo, representantes da UNIREDE (profa. Selma Leite), SESu, SEMTEC, CAPES, MCT e de vários representantes de IES públicas (integrantes do Conselho de Representantes da UNIREDE). Após mesa redonda que abordou o tema "Concepção pedagógica e desenho do ambiente", a cargo dos Profs. José Valente (Unicamp), Elisabeth Almeida (PUC-SP) e Léa Fagundes (UFRGS), foram apresentadas as plataformas e-Proinfo (desenvolvida pela SEED/MEC), Polvo (UDESC + SEED) e da UNESP, bem como foram apresentados aspectos da plataforma Teleduc, desenvolvida pela Unicamp. Na sequência, reunidos em plenária e em grupos de trabalho, os participantes apresentaram suas observações e recomendações, abordando não somente aspectos relacionados à temática do evento (dentre as quais destacaria a importância de se conceber e utilizar ditas plataformas em consonância com a abordagem pedagógica intrínseca aos conteúdos ou cursos a serem ministrados - e a do construtivismo foi a predominante - e, também, em função do público alvo, as condições objetivas para uso intensivo da Internet etc.), mas, também, aspectos relacionados a outras questões, tão ou, às vezes, mais importantes para a EAD, neste momento, para o País, quais sejam: regulamentação federal (restritiva, precisa ser modificada); investimentos (recursos humanos, redes, equipamentos etc.); reforçar consórcios públicos estaduais, regionais e nacional (UNIREDE); integração intra (SESu+SEED+SEMTEC+SEF+CAPES) e interministerial (MEC+MCT, por exemplo); apoio da classe política à EAD; etc. No encerramento, informou o Secretário Teatini terem sido realizadas reuniões da SEED, SEF e SEMTEC com o BID, em paralelo ao evento realizado na UnB, com vistas a possível financiamento para EAD, com resultados promissores. Na mesma direção, informou a realização de reuniões, nos últimos meses, do MEC com o MCT, sobre o FUST, em decorrência do que haverá audiência pública no Congresso dia 11 de junho. Discute-se com o BB e CEF possibilidade de linha de financiamento para aquisição de equipamentos por professores de IES públicas e de redes públicas (estaduais e municipais). Ainda segundo o Secretário Teatini, elabora-se proposta de nova regulamentação sobre EAD para ser discutida, proximamente, com outras secretarias do MEC, CAPES e CNE. Até o final de junho deste ano, a SEED deverá divulgar edital para financiamento voltado à produção de materiais educacionais virtuais (bolsas de I.C. para alunos, equipamentos para IES e bolsas padrão PET para docentes dessas IES). Uma boa fonte de consulta prévia relacionado ao referido edital é o programa RIVED, cujo Manual poderá ser solicitado pelas IES interessadas (Mensagem enviada para a lista de discussão em 23 de Maio de 2003, 9:55 am).

O conteúdo desta mensagem evidencia que os participantes sabiam da

importância do fortalecimento dos consórcios para eventuais financiamentos

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governamentais da educação a distância, mas não tinham claro como e quando isso

iria acontecer. Em relação ao decreto, fica claro na mensagem a seguir que a minuta

circulou em amplo debate entre os professores da área para discutir a

regulamentação de EAD no país, considerada restritiva pelos participantes da I

Reunião do Consórcio Nordeste Oriental. Assim, é possível compreender a

ansiedade dos envolvidos diante da publicação do decreto de regulamentação.

Não sei se vocês já receberam a minuta do Decreto proposto pela SEED para regulamentação da EaD. A cópia me foi entregue pelo meu Reitor, que a recebeu na reunião da Andifes. Estou deixando-a disponível no item "Arquivo" da nossa página da Lista Yahoogroups. Como o servidor de mail da Universidade esta fora do ar, e estou escrevendo diretamente o Yahoo, não posso mandá-lo anexado. Acho que a gente devia começar uma discussão sobre esse texto e, quem sabe, incluí-lo na pauta do nosso III Encontro. Tem umas coisas meio esquisitas...Comentem, por favor (Mensagem enviada para a lista de discussão em 16 de Julho de 2003 7:07 pm).

Em 2003, havia duas questões importantes, sendo discutidas nos consórcios

regionais, uma relacionada com o processo de regulamentação da educação a

distância, que gerava insegurança em todas as instituições por conta das

indefinições do processo de credenciamento, e outra relacionada com a possível

publicação de editais tanto pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, quanto pelo

MEC. Neste momento, pelo discurso dos envolvidos, fica claro que a expectativa

estava direcionada para o MCT, provavelmente em função das características

intrínsecas da EAD e o uso das tecnologias. Com a possibilidade de publicação de

um edital para produção de materiais e desenvolvimento de cursos, a questão da

estrutura do consórcio é intensificada.

Vamos nessa. Achei ótima a tua idéia de enviarmos um projeto da Regional, mesmo que, à época, ainda não estejamos habilitados. Marcamos a presença da região e, de certa forma, estaríamos opinando no tocante à restrição imposta pelo edital. E que, para os próximos, também sejamos consultados. Temos condições, sim, de elaborar um projeto "massa"! E, quem estiver iniciando ou já se encontrar no meio do caminho do credenciamento, vamos agilizar o processo. Isso poderia ser utilizado nas argumentações, justificativa, relevância do projeto. Dentro dessa idéia, me parece fundamental que todas as IPES da Regional, sem exceção, interessadas no edital (e quanto maior esse número, melhor), enviássemos um único projeto, com ações cooperativas entre nós. Me parece muito importante, também, envolvermos no projeto, o quanto antes, as Secretarias de Educação dos nossos estados e/ou municípios, na

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perspectiva da oferta, pelo projeto, dos cursos (Ciências Naturais e Matemática) para professores das redes públicas, o que daria mais força à proposta, por tudo aquilo que vimos discutindo nestes últimos meses. Este é um teste de fogo! (Mensagem enviada para o grupo de discussão em18 de Julho de 2003, 11:55 am).

O lançamento de um edital do CTINFRA 01 em 2003, para o desenvolvimento

de materiais em educação a distância, gerou a primeira crise na relação do

consórcio com o governo. O edital especificava que apenas estariam habilitadas

instituições ou consórcios que, na data do encerramento do prazo para envio das

propostas (29/agosto), estivessem credenciadas pelo MEC para oferta de cursos de

graduação a distância em Ciências Naturais Física, Química e Biologia) e/ou

Matemática. Obviamente que naquele momento pouquíssimas instituições estariam

dentro dos critérios estabelecidos pelo governo. Isso repercutiu em uma grande

insatisfação e, até mesmo, frustração dos participantes, que se posicionaram na

lista. A resposta de um dos participantes resume a pequena crise que se instalou.

Gostei do seu desabafo. Acho que a indignação é o melhor antídoto contra o marasmo. Lembro-me de Henfil, que orientava para que tivéssemos os nossos minutos diários de indignação, como forma de não se render. Agora, a briga, minha amiga, será eterna. Em nenhum momento vamos ter nada de mão beijada. Em qualquer governo que esteja aí. Porque os caras estão perto das estruturas de poder e vão, naturalmente, fazer pressão, a pressão que lhes interessa. Compete a nós ficarmos eternamente vigilantes e mobilizados para fazer frente a isso. É a lei da selva, minha amiga, os maiores querendo engolir os menores. O que não podemos é deixar que nossa indignação nos imobilize. O recuo do MCT somente ocorreu porque houve grita geral. Os caras também não são burros para montarem uma coisa assim tão acintosamente dirigida e deixar ficar, quando todo mundo percebeu. Bom, acredito que temos que seguir com a luta. Quero informar que aqui na universidade estamos já nos mobilizando. Fizemos uma reunião de emergência e definimos que temos condições prévias de oferecer a licenciatura em Física. Tanto porque o grupo é mais mobilizado, quanto porque temos aqui um mestrado em ensino de Física, o que facilita as coisas. O reitor está convocando uma reunião com eles e nós, para colocarmos o desafio e ver se eles topam. A gente aposta que sim. Depois disso farei um relato mais detalhado do que estamos pensando e passarei para todos, tá? Hoje estou juntando a legislação pertinente aos pedidos de credenciamento e autorização. Posso deixar disponível para todos, aqui em nossa Lista (Mensagem enviada para a lista de discussão em 21 de Julho de 2003, 10:58 am)

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O movimento contrário aos pré-requisitos estabelecidos no edital gerou uma

resposta da UNIREDE, contemporizando a discussão e sinalizando para uma

revisão no edital e em possibilidades futuras de novos editais.

Atendendo a ponderações das consorciadas o MEC deverá alterar o Edital CTInfra 01 da Finep para permitir que cursos, cujos processos estão em andamento para credenciamento, sejam contemplados. Lembro que este é o primeiro exercício de funcionamento integrado da nova UNIREDE. Outros editais virão e nós acabaremos por realizar o nosso sonho: Aumentar o acesso ao ensino público em todo território nacional! (Mensagem enviada para a lista de discussão em 22 de Julho de 2003, 9:35 am).

Realmente, o edital foi republicado, mas neste momento fica evidenciado que

existia um confronto entre as instituições que estavam participando das iniciativas de

construção de uma proposta de educação a distância no país e as universidades

mais antigas que pareciam ter privilégios em relação ao financiamento público para

o desenvolvimento de suas ações. A UNIREDE é chamada a se posicionar diante

das regras que contemplavam um número restrito de universidades que já se

caracterizavam por realizar projetos financiados pelo governo federal.

Depois de me indignar profundamente com as tais alterações no Edital, hoje, com a cabeça mais fria, queria fazer algumas considerações. Claro que vamos discutir essas coisas todas no nosso III Encontro, mas poderíamos ir "esquentando as baterias" por aqui, não era? Acho que esse remendo no Edital foi uma perfumaria muito da mal feita. Sem desconhecer que com a abertura para 'Educação básica' amplia muito mais o espectro dos possíveis candidatos, vejamos o seguinte: educação básica é ensino fundamental + ensino médio, não é isso? Ora, ensino médio já estava razoavelmente contemplado com as licenciaturas das áreas específicas. Então, o que entra mesmo é Pedagogia (seres iniciais) e o Normal Superior. Assim, fica contemplado praticamente todo mundo, porque são esses os cursos que estão credenciados (há 1 ou 2 com administração, contábeis, economia). E entram as "importantes": MT e MS, PR, o Projeto Veredas inteiro. Ou seja, ficam de fora as que estão sempre de fora. A minha questão básica é: o que a UNIREDE Nacional tem a dizer daquele formulário que nos fez preencher e que serviria de subsidio para "negociações" de financiamento de infra-estrutura???? O que a UNIREDE tem a dizer com relação ao seu discurso de abril, quando o MEC iria financiar justamente a implantação dos polos, onde houvesse abertura de novas vagas???? Novas vagas, essa era a palavra de ordem! Agora o que vemos é o financiamento de polos onde já ocorre cursos, e que não implica necessariamente em "novas vagas". Afinal, qual a política da UNIREDE??? Acho que temos que continuar denunciando essa exclusão (digital??). Acho que temos que continuar cobrando

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da UNIREDE Nacional a coerência do seu discurso. Se eles defenderam as posições que nos informaram e foram vencidos nas negociações, que nos digam. Ou vai ficar parecendo que "como consegui o meu quinhão, me calo". E parece que eles todos conseguiram seu quinhão. Aposto um picolé de limão como uma das que estavam com o pedido de credenciamento pronto em 18/07 era a UnB (Mensagem enviada para a lista de discussão em 5 de Julho de 2003, 3:59 pm).

Analisando as mensagens da lista de discussão do Yahoo Grupos (UNIREDE

Nordeste2), observamos o engajamento de alguns participantes que realmente

estavam dispostos a lutar pela democratização dos recursos e expansão da

educação a distância em áreas do país que, até então, não seriam contempladas de

outra maneira. A alocação de recursos para Universidades públicas no Nordeste

sempre esteve aquém do solicitado e do necessário, política que se traduz no

número de cursos, programas de pós-graduação etc. Não pretendemos analisar

neste trabalho as disparidades regionais da política educacional, mas é necessário

refletir sobre a importância da organização do consórcio regional nordeste oriental e

suas demandas, colocadas em vários momentos de forma incisiva pelos

participantes, para o recebimento de recursos através dos editais do governo

federal. É possível afirmar que as universidades maiores e com mais prestígio

político (como o caso nomeado pelo participante na mensagem acima), não

precisariam da organização em consórcios para garantir a distribuição de recursos

para os seus projetos. Porém, no caso das universidades da região nordeste,

notadamente as universidades que faziam parte do Consórcio Nordeste Oriental, a

participação das discussões como um grupo organizado foi essencial para a

conquista dos financiamentos públicos. O resultado do comentado edital do

CTINFRA/EAD financiado pela Finep exemplifica bem a distribuição dos recursos:

TABELA 1: Resultado do edital CTINFRA/EAD

Instituição Recurso Percentual do Edital(Valor total 4 milhões)

UFAL R$ 201.096,00 5,0%

CEDERJ R$ 1.374.414,00 34,3%

UFOP R$ 345.500,00 8,6%

UFC R$ 577.766,00 14,4%

UESC R$ 76.050,00 1,9%

UFMT R$ 791.060,00 19,8%

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Instituição Recurso Percentual do Edital(Valor total 4 milhões)

UFPel R$ 244.152,00 6,1%

UFSC R$ 389.962,00 9,7%

Fonte: Autoria própria a partir dos dados do FINET, 2003.

Após o posicionamento do participante sobre o papel da UNIREDE na luta

pela distribuição equitativa de oportunidades para todas as IPES, em todas as

regiões do país, um representante do comitê gestor da UNIREDE envia uma

mensagem para a lista de discussão com o seguinte texto:

Retorno ao assunto do Edital da Finep para apoio aos polos de ensino à distância: 1 - Os recursos alocados provêm do MCT que assim inicia uma parceria conosco acertada com o Secretário Executivo, Dr. Wanderley de Souza. 2 - Os recursos, embora valiosos, são modestos e visam ajudar a implantação de polos de apoio ao EAD, preferencialmente para aqueles cujos cursos já estão autorizados ou em fase de autorização. 3 - Adicionalmente, o cumprimento ao Edital constitui-se no primeiro exercício de montagem de projetos pelos consórcios regionais. 4 - A sugestão é que, independentemente do número de universidades envolvidas nos polos constantes dos projetos enviados, o consórcio regional participe como um todo na apresentação dos mesmos. 5 - Outros editais serão publicados, na medida em que evoluam a institucionalização da UNIREDE pelo MEC, sua orçamentação e consolidação da sua estrutura. 6 - Lembro por oportuno: a) o custo baixo e compatível com as disponibilidades nacionais apresentadas pela UNIREDE ao MEC, só serão viáveis se, efetivamente, trabalharmos em consórcio e não isoladamente; b) o custo de uma universidade trabalhando isoladamente em EAD será forçosamente mais caro, menos eficiente e de menor abrangência; c) trabalhando em parceria nas três esferas do poder (federal, estadual e municipal) o consórcio público é imbatível, insuperável por qualquer iniciativa privada que não terá o mesmo poder de articulação e nem tampouco de qualidade; d) trabalhando cooperativamente da maneira proposta não só atenderemos melhor as demandas da sociedade, como otimizaremos o uso dos recursos alocados pelo MEC, MCT, etc. ao empreendimento; e) finalmente, fica a convicção de que estamos vivenciando uma experiência única no mundo quanto ao arranjo espacial, organizacional, financeiro e político, e não se pode ser modesto: o Brasil é muito grande. Ressalto o irrestrito apoio que temos recebido do MEC através do Prof. Teatini, Secretário da SEED, assim como de toda a sua equipe. A parceria com a SEED tem sido altamente proveitosa e estabelecida em alto nível de confiança e de convergência de propósitos (Mensagem do representante da UNIREDE enviada para a lista de discussão em 11 de Agosto de 2003, 9:29 pm).

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O teor da mensagem acima aponta para a existência de alguns acordos entre

os representantes do governo federal e o comitê gestor da UNIREDE, sobretudo,

com indicativos de financiamento público para as instituições que estivessem

organizadas no formato de consórcio, colocado como condição fundamental para

“otimizar os recursos alocados”, embora esteja claro que a constituição de um

consórcio público tinha como objetivo também fazer frente à iniciativa privada.

Embora essa compreensão estivesse clara e evidenciada na fala do representante

da UNIREDE, nem todos os participantes das demais regiões tinham o mesmo

conhecimento das condições estabelecidas, a partir da interlocução entre os

representantes das duas entidades. A insegurança diante das diretrizes que

estavam sendo construídas naquele momento dizia respeito não apenas ao papel do

governo federal, mas também colocava em dúvida a capacidade de

compartilhamento de algumas decisões do próprio comitê gestor da UNIREDE, que

parecia centralizar algumas informações e encaminhamentos, característica que

parece negativa, mas que enfatiza o caráter plural e colaborativo da UNIREDE.

Agora que parece que nossa UNIREDE vai ser detonada em troca de uma Universidade Aberta (?), nem sei se minhas encucações ainda têm sentido. De qualquer maneira, aqui vão. A questão principal é uma discussão sobre o real papel da UNIREDE, ou do nosso consórcio, em menor escala. Se tomamos o CEDERJ como uma forma de organização em consórcio de universidades públicas, para ofertar ensino superior a distância (ou seja, a mesma organização e objetivos nosso), o que vimos lá foi uma bem montada estrutura para viabilizar os cursos promovidos pelas consorciadas. O CEDERJ não promove, ele mesmo, os cursos, apenas os viabiliza e gerencia. E faz isso com uma boa grana investida pelo governo do estado do Rio de Janeiro. Se isso pode ser um modelo, nosso consorcio não promoveria cursos, mas os viabilizaria. Ocorre, no entanto, um pergunta óbvia: com que dinheiro? Quem banca? As IPES? Como, se estamos sem dinheiro até para nos deslocarmos para reuniões importantes? O MEC? Será essa então a idéia por trás da tal UNAB? Se for, por que não fica explicito? Ou está explicito e só eu não percebi, tal qual marido traído?Essas questões todas ficaram na minha cabeça porque fui uma das que mais torrou o saco de vocês nas ultimas reuniões, cobrando a urgência em organizamos cursos. Porque na minha cabeça, até então, seria nosso consorcio que promoveria os cursos. Me penitencio (viu, Frei Sergio?!), mea culpa, mea culpa, mea máxima culpa. Agora percebo que esta coisa não é assim tão simples. Que estamos em um processo de construção de nossa identidade. E as coisas se complicam ainda mais quando, no meio desta construção, já nos dão outro modelo, outra cara (Mensagem enviada para a lista de discussão em 19 de Agosto de 2003, 9:53 am).

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A questão da identidade não está clara para os participantes das regionais

por várias razões distintas, mas sem dúvida, uma delas estava relacionada com a

construção ainda incipiente de uma política pública de educação a distância, que

iniciava as suas experiências, através do lançamento de editais de baixo valor como

uma forma de avaliar os processos e encaminhamentos para a consolidação de uma

política de educação a distância. Os conteúdos das mensagens mostram que havia

uma percepção dos integrantes da UNIREDE que o Consórcio poderia ser

consolidado como uma agência centralizadora de recursos dos projetos de

educação a distância para posterior repasses entre as instituições associadas. Isso,

sem dúvida, possibilitaria um poder efetivo para a UNIREDE, mas o governo federal

parecia ter também seus próprios planos de criação de uma Universidade Aberta,

com os mesmos propósitos da UNIREDE (fato que acabou se consolidando em

2006, com a criação da Universidade Aberta do Brasil).

O que nos interessa de fato, na interlocução entre os representantes das

IPES no Consórcio UNIREDE Nordeste Oriental, é ressaltar que as políticas públicas

de educação a distância que foram consolidadas, através do Programa Pró-

Licenciatura, foram construídas, a partir da participação dos sujeitos envolvidos, que

apesar dos diferentes graus de participação e articulação, tiveram um espaço

democrático para a construção de suas propostas de educação a distância, e

romperam em determinados momentos, com a hegemonia de segmentos acadêmico

que sempre estiveram no controle da distribuição de recursos, concentrando

institucionalmente e geograficamente as ações de pesquisa e desenvolvimento da

educação.

4.4 A publicação dos editais do Pró-Licenciatura

No ano de 2003 foram publicados alguns editais, como o Seit/MEC Proifen

para formação de professores do Ensino Médio que serviram como ensaio para um

edital maior para as licenciaturas publicado em 2004. O primeiro edital publicado

especificamente voltado para os cursos de graduação em licenciatura, foi a

chamada pública 01/2004, publicado em junho de 2004, para as instituições

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interessadas em oferecer cursos de graduação a distância nas áreas de Matemática,

Física, Química e Biologia e Pedagogia. Além da interlocução do edital nas listas

dos consórcios regionais, o MEC disponibilizou o edital na sua página da Internet

com o objetivo de recolher sugestões para a versão final do edital, como

observamos nesta chamada na imprensa:

FIGURA 5: Notícia publicada no portal da SEED/MEC Fonte: SEED/MEC, 2004.

A consulta pública para a realização de ajustes ao edital socializava as

preocupações do governo federal em pavimentar a aceitação dos cursos de

formação de professores realizados a distância, ao mesmo tempo em que construía

garantias de que a discussão não estava restrita ao segmento de ensino superior

público. De fato, algumas instituições privadas tinham interesse no financiamento

público, notadamente as fundações e as universidades confessionais que poderiam,

por força da lei, receber algum tipo de financiamento do governo federal. Foram

selecionados oito grupos, entre 39 universidades, situados nos Estados do Rio de

Janeiro, Rio Grande do Norte, Minas Gerais, Amapá, Rio Grande do Sul, Santa

Catarina, Bahia, Pernambuco, Pará, Alagoas, Paraná e Distrito Federal. As

propostas das Universidades contemplaram o oferecimento de 17.585 vagas para a

chamada Universidade do Século XXI, com financiamento de 14 milhões de reais

distribuídos entre as instituições de acordo com os respectivos planos de trabalho.

O resultado da chamada pública foi uma espécie de prova de fogo da

organização dos consórcios, já que muitas instituições não foram contempladas com

seus projetos, mas estavam obrigadas a executar as ações como polo dos projetos

vencedores. Especificamente no caso do Consórcio Nordeste Oriental, a título de

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exemplo, duas instituições tiveram seus projetos contemplados: a Universidade

Federal do Rio Grande do Norte, com os cursos de Licenciatura em Matemática,

Física e Química e a Universidade de Pernambuco (Estadual), com o curso de

Licenciatura em Ciências Biológicas. Nos termos de cooperação técnica que

constava no documento do convênio, assinado pelas onze instituições participantes,

todas deveriam contribuir para a implantação dos cursos em suas respectivas

instituições, mas de fato isso não ocorreu. Por diferentes razões, que variaram

desde mudanças no cargo de reitor (com a consequente mudança nos

representantes das instituições), até o desinteresse em contribuir para uma ação

que não traria retorno efetivo, seja através de financiamento ou prestígio, várias

instituições se afastaram do processo durante a implementação dos cursos. No caso

do Consórcio Nordeste Oriental, os polos só foram efetivados nos espaços da

Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Universidade de Pernambuco,

Universidade Estadual da Paraíba e Universidade de Alagoas. A Universidade

Federal de Pernambuco participou do projeto, oferecendo o curso de especialização

para os tutores, em todos os Estados do Consórcio. Ou seja, apenas cinco das onze

instituições oferecerem seus espaços para a implantação dos cursos.

No ano seguinte, em 2005, o MEC realizou um processo seletivo para as

instituições interessadas em ofertar cursos de licenciatura a distância, chamado de

Pró-Licenciatura (Fase 2). Este documento trazia algumas diferenças significativas

em relação ao edital anterior, com pressupostos metodológicos e orientações

pedagógicas bem definidas e comunicadas com antecedências para os

interessados.

A Resolução/CD/FNDE/nº 34, de 9 de agosto de 2005, estabelece os critérios

e os procedimentos para a apresentação, seleção e execução de projetos de cursos

de licenciatura para professores em exercício nas redes públicas nos anos/séries

finais do ensino fundamental e/ou no ensino médio, na modalidade de educação a

distância, fundamentada na constituição federal – art. 205, 206, 208 e 211; lei nº

4.320, de 17 de março de 1964; lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993; lei nº 9.394, de

20 de dezembro de 1996; lei complementar nº 101, de 04 de maio de 2000; lei nº

10.172 de 9 de janeiro de 2001; lei nº 10.934, de 11 de agosto de 2004; lei nº

10.837, de 16 de janeiro de 2004; instrução normativa nº 01 da secretaria do tesouro

nacional, de 15 de janeiro de 1997, e alterações posteriores. O objetivo disposto no

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capítulo I, Art. 2º, deixava claro o público, a forma, a duração e os critérios de

elegibilidade da IES.

Ofertar cursos de licenciatura, com duração igual ou maior que a mínima exigida para os cursos presenciais, na modalidade de educação a distância para formação inicial de professores em exercício nas redes públicas nos anos/séries finais do Ensino Fundamental e/ou no Ensino Médio, sem licenciatura na disciplina em que estejam exercendo a docência. A implantação e/ou execução dos projetos aprovados na seleção se dará por meio de transferência voluntária de recursos financeiros ou de descentralização de créditos orçamentários às Instituições de Ensino Superior (IES) públicas, comunitárias ou confessionais (MEC/FNDE, Resolução CD/FNDE nº 34/2005).

Além da definição do público alvo, professores em exercício sem a formação na área em que efetivamente atua, os critérios de elegibilidade das IES (públicas, comunitárias ou confessionais, pré-definidas pelo critério de descentralização orçamentária que proíbe a transferência de recursos públicos para instituições privadas através de descentralização), e a duração dos cursos (igual ou superior aos cursos presenciais), o documento já sinalizava nos seus objetivos que estaria blindado contra eventuais críticas das instituições privadas e dos detratores da educação a distância que viam como um “aligeiramento” dos cursos de formação de professores.

Uma informação importante que a Resolução n° 34 evidencia, é a forma como seria consolidada a política pública de educação a distância no país. Enquanto no edital anterior as únicas informações que indicavam a estrutura de EAD eram a obrigatoriedade da organização em consórcios e a orientação para formação de professores em alguns cursos específicos, o processo de seleção de 2005 enumera de forma clara a complexidade das articulações propostas para a educação a distância no país. A segurança de publicação de uma resolução que revela a dimensão e a complexidade das políticas públicas em EAD é proveniente de diversas ações realizadas nos anos anteriores: a experiência do CEDERJ, os projetos isolados para formação de professores desenvolvidos por várias instituições públicas, a criação da UNIREDE e a execução de editais menores no período de 2003/2004 que sinalizaram para o sucesso da estrutura.

Em relação ao modo de articulação, temos duas esferas em diferentes níveis que aumentavam significativamente o risco do desenvolvimento de projetos nesta linha. A primeira esfera está relacionada com a própria organização governamental

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que estabeleceu uma articulação entre a SEED, a SEB e o FNDE, ou seja, para funcionar o projeto dependia do funcionamento da máquina em três instâncias, com atribuições e responsabilidades distintas. Na segunda esfera, estava a articulação dos consórcios das instituições com as secretarias Estaduais e Municipais de educação, que tinham pouca atribuição de execução, mas eram responsáveis por atestar a demanda de professores sem formação em exercício em seus respectivos sistemas. Para apresentar de forma mais visualmente mais estruturada, elaboramos um mapa conceitual sobre a estrutura do documento para facilitar a compreensão na análise da Resolução n° 34.

FIGURA 6: Estrutura da Resolução CD/FNDE n° 34

Fonte: Autoria própria, com base no documento.

Um outro aspecto interessante do documento de seleção foi a incorporação

de dois anexos que tratavam das questões de elegibilidade e organização das IES

interessadas. Para corrigir eventuais distorções e problemas no relacionamento

entre as IES participantes, o documento já definia no critério de elegibilidade a

necessidade de estar em parceria com outras instituições, por conta do consórcio

formalmente constituído, a existência de uma única instituição como proponente e a

exigência de um plano de trabalho com as atribuições de cada uma, incluindo as

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respectivas planilhas orçamentárias. Na chamada pública de 2004, a instituição

ofertante que venceu o edital centralizava o recebimento de todos os recursos,

sendo a única responsável pela elaboração das planilhas e posterior repasse para

as demais IES parceiras. Esse critério causou muitos problemas entre as instituições

e foi devidamente corrigido no edital seguinte, com a publicação do Pró-Licenciatura

Fase 2.

Poderão candidatar-se a esta seleção as Instituições de Ensino Superior (IES) públicas, comunitárias ou confessionais, organizadas em parcerias, que preencham as seguintes condições:1 - constituir-se formalmente por um documento de parceria que contenha:1.1 - definição da IES representante da parceria e de suas responsabilidades. 1.2 - identificação de cada IES parceira e sua personalidade jurídica; 1.3 - assinatura do dirigente máximo de cada IES parceira;1.4 - definição da distribuição de ações, recursos e co-responsabilidades das instituições que formam a parceria para fins de planejamento e execução do(s) projeto(s) de curso(s); 1.5 - definição das IES responsáveis pela emissão dos diplomas (MEC, Anexo III da Resolução CD/FNDE n° 34, 2005).

No anexo III, as exigências sobre a proposta pedagógica dos cursos estavam

detalhadas com o documento de Orientações Conceituais e Metodológicas do Pró-

Licenciatura3 e os Referenciais de Qualidade em EAD indicados como

fundamentação. As exigências para o projeto incluíam o uso didático de tecnologias

de informação e comunicação, estratégias de interação, relação numérica

tutor/aluno, linguagens, materiais e mídias utilizadas, entre outros elementos

específicos da modalidade a distância.

As exigências de previsão de recursos também foram aumentadas com a

exigência de um cronograma físico-financeiro de execução de cada IES e “planilha

de custos do projeto como um todo, definindo o apoio financeiro, com a

discriminação da data e do valor de cada parcela da ação prevista, em consonância

com o cronograma de desembolso anual”.

O Anexo III da Resolução n° 34, é o foco central em nossa análise do Pró-

Licenciatura no campo dos Estudos Culturais já que ele apresenta dois aspectos

surpreendentes. O primeiro é como um documento público no formato de uma

3 A Resolução n° 34 e o seu Anexo III, compõem o corpus documental de análise da pesquisa que será aprofundada no capítulo 5 deste trabalho.

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resolução, o texto principal do documento busca uma linguagem padronizada é bem

semelhante ao edital do Proifen publicado em 2003, particularmente os itens

chamados de “a escola que queremos” e o “professor que queremos”. O

estabelecimento de diretrizes conceituais e metodológicas sobre o perfil dos cursos

de licenciatura a distância, estabeleceu um padrão determinado para os projetos

político-pedagógicos das propostas enviadas ao MEC. As instituições interessadas

sabiam de antemão que deveriam cumprir não apenas o critério elegibilidade e

previsão orçamentária dos cursos, mas também seguir as orientações relacionadas

com o perfil político de seus cursos, já as diretrizes norteadoras do Pró-Licenciatura

estavam evidenciadas no item 3.4 do Anexo III (grifo nosso).

Direcionado a professores em exercício; permita que mantenham suas atividades como professores como também valorize essa atuação; a experiência dos professores deve ser ponto de partida para a reflexão sobre a prática pedagógica; o curso a ser desenvolvido deverá ser concebido como uma etapa de um processo de formação continuada; o curso a ser oferecido será estruturado na modalidade de Educação a Distância, de forma a permitir que os educadores nele matriculados mantenham seus vínculos profissionais; os professores-alunos terão acesso às Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) com a possibilidade de usar, no mínimo, computadores com acesso à INTERNET e à programação da TV Escola; são objetivos do Programa - muito além da diplomação dos professores-alunos - a melhoria da qualidade de ensino na escola em que atuam e a ampliação das possibilidades de aprendizado por seus alunos; serão envidados esforços buscando estimular os demais profissionais da escola em que atua o professor-aluno desse Programa a participarem de programas de formação inicial ou continuada; e deve-se prestar especial atenção, neste sentido, aos gestores de escola (diretores, coordenadores, entre outros), estimulando sua participação em cursos de formação para gestores, como, por exemplo, os oferecidos pela Rede de Formação de Professores (MEC, Anexo III, Resolução do Pró-Licenciatura, 2005).

A proposta do Anexo III da Resolução n 34 está estruturada em seis grandes

eixos que perpassam questões pertinentes ao campo dos Estudos Culturais, já que

propõem a discussão de aspectos relacionados com a ética, cultura, diversidade etc.

Apenas um deles aborda diretamente os conteúdos, mas mesmo assim confere o

adjetivo contextualizado ao conteúdo, apesar da definição e do objetivo geral do Pró-

Licenciatura estar focado na questão da qualificação do professor (e seu

conseqüente prejuízo ao seu desempenho) e sua relação direta com a qualidade da

Educação Básica.

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O documento apresenta dados numéricos sobre a formação de professores

no Brasil que objetivam fundamentar a necessidade de um programa de formação

emergencial realizado na modalidade a distância como um caminho viável devido ao

número de professores existentes sem a qualificação necessária, efetivamente

atuando em sala de aula.

TABELA 2: Funções docentes no Ensino Fundamental por região – Formação do Professor

Fonte: MEC, Anexo III da Resolução CD/RNDE nº 34, 2005.

No quadro correspondente ao Ensino Médio também se verifica uma situação

semelhante, com cerca de 56 mil das funções docentes sem habilitação legal, o que

equivale a 14,74% do total no Brasil. Mesmo considerando a dificuldade de

confiabilidade dos dados (o sistema não consegue ainda identificar a duplicidade

nas informações dos professores que atuam simultaneamente em diferentes redes,

como o município e o Estado, ou em dois municípios, por exemplo), o quantitativo de

professores sem formação, atuando em sala de aula, é bastante significativo.

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TABELA 3: Funções docentes no Ensino Médio por região – Formação do Professor

Fonte: MEC, Anexo III da Resolução CD/RNDE nº 34, 2005.

Embora integrante do documento como fundamentação para as diretrizes

propostas na chamada pública para as IES interessadas, as políticas de seleção e

implementação dos cursos não seguiram o perfil dos dados apresentados. De

acordo com o quadro, as regiões com maior número de professores sem o nível de

escolaridade necessário eram a região Nordeste e a região Norte. Na distribuição de

recursos e financiamento de cursos, essas regiões não foram privilegiadas em

nenhum dos três editais lançados especificamente para as licenciaturas a distância

(Elaboração de materiais, Pró-Licenciatura Fase 1 e Fase 2), como veremos a

seguir, na análise dos resultados do processo de seleção da chamada pública

através de edital.

4.5 Os resultados da chamada pública através de edital

O critério de seleção das propostas de cursos a distância do Pró-Licenciatura

Fase 2, foi definido na Resolução/CD/FNDE/nº 34 que especifica as condições de

aprovação através de um processo de seleção, julgamento, pontuação e

classificação dos projetos por uma comissão designada formalmente pela SEB e

SEED, como vemos no art. 4°, do capítulo III.

O processo seletivo ocorrerá em duas etapas, de acordo com os critérios e as determinações estabelecidas nos Anexos IV, V e VI desta Resolução. A primeira consistirá na elegibilidade das IES pela

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Comissão de Elegibilidade, designada formalmente pela SEB e pela SEED, e constituirá etapa eliminatória para o prosseguimento do processo seletivo. A segunda consistirá na seleção, julgamento, pontuação, classificação e aprovação dos projetos dos cursos pela Comissão de Seleção e Julgamento, designada formalmente pela SEB e pela SEED (MEC, Resolução CD/FNDE n 34, 2005).

Segundo Leite et al (2007), as comissões de avaliação foram criadas por

força de portarias ministeriais para a composição das comissões e subcomissões.

Foram convidados pesquisadores das diversas áreas de conhecimento apontadas

pela comissão que possuíam formação e experiência em EAD, formando-se a

assim, subcomissões que possuíam especialistas nas áreas específicas e

especialistas em EAD. A maior parte dos pesquisadores das áreas específicas

também trabalhava e desenvolvia pesquisas em EAD, e esta multiplicidade de

olhares enriqueceu sobremaneira os trabalhos das Comissões e propiciou espaços

de discussão teórico-filosófico-paradigmático-prático extremamente significativos

para as avaliações e a construção dos pareceres” (LEITE et al, 2007, p. 3).

No evento da ABED em 2007, foi apresentado um artigo intitulado

“Comissões dinâmicas de avaliação de propostas de EAD: abordagem inovadora

para a análise de projetos de formação de professores em exercício”, no qual os

seus autores trabalharam como avaliadores, em pelo menos duas das três

Comissões de Avaliação instituídas pela SEED/MEC, para avaliar os projetos do

Pró-Licenciatura.

A organização do trabalho de avaliação dos projetos foi realizada por meio da

criação das subcomissões, por área específica de trabalho, com intensa colaboração

entre as subcomissões, e a eleição de um presidente para coordenar os trabalhos

das subcomissões e garantir que o sistema de pontuação fosse equilibrado entre

todos os avaliadores. Ainda segundo Leite et al (2007), a dinâmica estabelecida

promoveu interdependência e valorização das competências para atingir os objetivos

propostos, configurando uma espécie de inteligência coletiva presencial. Neste

sentido, a troca de informações, impressões, métodos, materiais etc, entre as

subcomissões permitiu também reuniões espontâneas e o estabelecimento de

intensas relações de troca e de cooperação entre os integrantes, complementados

por sessões plenárias.

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123

Na visão dos avaliadores, os projetos apresentaram vários problemas que se

conflitavam com as orientações da resolução. Um deles está relacionado com a

organização em consórcio e segundo Leite et al (2007), uma primeira análise

mostrou que vários projetos haviam sido feitos de forma independente, sem a devida

integração e diversas parcerias pareciam existir somente com a finalidade de

atender a uma exigência do edital, e não de fato. Nestes casos, não era possível

visualizar como os proponentes iriam articular-se, por não haver definição clara dos

papeis de cada um dos parceiros.

Em relação ao papel da tutoria nos projetos, os avaliadores afirmam que

apesar da preocupação expressiva com o atendimento dos alunos e com a

necessidade de realizar um processo de capacitação, esta não estava clara sem

muitas vezes definir-se sequer a duração desse processo, estrutura e tópicos a

serem abordados, e qual instituição integrante da parceria seria a responsável por

essa atividade. O papel do tutor era em alguns casos o de animador do grupo e/ou

elemento de superação de problemas no estudo.

Para os autores, as propostas eram, em geral, baseadas em cursos

presenciais transpostos para a modalidade EAD, evidenciada pelo uso excessivo de

momentos presenciais, poucas mudanças nas ementas e nas atividades propostas,

uso de transcrições dos termos presentes no edital, declarações genéricas sem

articulação entre os elementos serviço, indefinição dos papeis dos docentes

envolvidos, entre outras lacunas. Os avaliadores ainda apontaram no artigo alguns

problemas no próprio sistema de pontuação dos projetos.

Algumas propostas inovadoras foram feitas como, por exemplo, o uso de um tema-gerador para o desenvolvimento das atividades didático-pedagógicas do curso. Embora possuísse algumas falhas, como a necessidade de uma melhor articulação entre a concepção teórica com a grade e as atividades propostas, o projeto era bastante promissor. Acabou sendo mal classificado, pois perdeu pontos, por exemplo, no número de vagas ofertadas. Isto foi observado em outros casos, ou seja, aqueles projetos que apresentavam propostas inovadoras eram extremamente tímidos na oferta de vagas, o que fazia com que bons projetos fossem mal classificados pelas regras do edital. Esse ponto, em particular foi amplamente debatido pelas Comissões de Avaliação, tendo em vista que alguns projetos aproveitavam-se de brechas no edital, buscando reforçar aspectos do projeto que forneceriam maior pontuação final, fazendo com que propostas com elementos didático-pedagógicos fracos ficassem bem classificadas (LEITE; BARBETA; MUSTARO, 2007, p. 3).

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124

Dois pareceres emitidos pelos avaliadores para duas instituições públicas que

concorreram neste edital parece corroborar a versão e o detalhamento apresentado

no trecho do artigo. Temos dois casos distintos, um curso que foi aprovado e outro

reprovado no processo seletivo e podemos observar que as questões colocadas no

parecer final trazem exatamente as questões abordadas pelos autores no artigo.

O projeto em sua totalidade continua muito próximo a um projeto tradicional presencial dado seus aspectos pedagógicos – fundamentais para a transposição de qualidade de um curso de EaD. Em especial destacamos as questões de organização curricular; do sistema de tutoria com ênfase na tutoria presencial, dos materiais rígidos e do sistema de avaliação que, embora incorpore as palavras processual e formativa, enfatiza os aspectos pontuais deixa dúvidas como incorporarão o sistema formal rígido existente nas universidades (Parecer emitido em Campinas, em 17/12/1005).

É importante ressaltar que as pessoas que assinam o parecer não são os

mesmos autores do artigo, embora o discurso e o foco sejam exatamente o mesmo.

Outros elementos também foram abordados no parecer, como o sistema de tutoria

(atribuições de tutores e professores formadores) com ênfase no presencial; o uso

de recursos didáticos e ferramentas das TIC não resolvidos, uma vez que a proposta

não apresenta com clareza os objetivos e as dinâmicas dos momentos presenciais e

a distância; o não aproveitamento das facilidades das TIC, no que diz respeito ao

uso proposto de materiais impressos (o que encarece e engessa as atividades

sugeridas); as questões metodológicas (dinâmica das interações e, sobretudo, a

demanda inerente ao formato proposto que exigirá sucessivos deslocamentos dos

alunos até o polo). A conclusão final do parecer para este curso é a seguinte:

Diante do exposto acima e no que nos compete, as lacunas apresentadas até o presente momento neste projeto comprometem a sua execução sobretudo em sua dimensão pedagógica. Desta maneira, não somos favoráveis pela implementação do projeto, uma vez que este não atende aos requisitos da ,Resolução/CD/FNDE/Nº 34. No entanto, se assumidas as ressalvas e considerações assinaladas, o projeto poderá ser apresentado em nova chamada (Parecer emitido em Campinas, em 17/12/2005, grifo nosso).

Nos parece que os critérios de seleção consideraram a consolidação das IES

em experiências práticas de educação a distância que acabaram penalizando as

instituições que buscavam implementar novos cursos e não possuíam experiência

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125

acumulada em EAD. Outra questão é que houve nas trocas realizadas entre os

avaliadores, um critério comparativo entre os projetos, que também pode ter

penalizado algumas instituições que apresentaram projetos mais sólidos em virtude

de sua experiência anterior, mesmo que não tivesse nenhum aspecto inovador. Em

outro parecer, neste caso favorável, o texto de avaliação é até mais crítico do que o

outro, apesar do resultado final.

O projeto apresenta algumas fragilidades no que se refere a sua organização curricular. Em determinado momento, apresenta uma carga horária de 2830 (página 20), em outra página demonstra 3075 horas. Há disciplinas sem bibliografia e com autor não correspondente a obra mencionada. O componente curricular relativo ao estágio não apresenta regras claras e não explicita a forma de cumprimento e acompanhamento discente, bem como a consideração da experiência docente no cálculo das 400 horas, como requer a legislação vigente. Nota-se uma certa similaridade do currículo proposto para EaD com um elaborado para um curso na modalidade presencial. A estrutura proposta para a operacionalização do curso está apresentada de forma pouco minuciosa e apresenta detalhes apenas no que diz respeito as funções dos tutores (Parecer emitido em Brasília, em 05 de outubro de 2005).

O objetivo da apresentação destes dois exemplos foi justamente apontar os

critérios relacionados com aspectos subjetivos complexos na construção da

modalidade a distância, enquanto uma política pública que utilizou uma grande

diversidade de sujeitos e normas na operacionalização de sua proposta. O resultado

final privilegiou um grande número de Instituições e uma razoável diversidade de

cursos, embora a distribuição geográfica não tenha sido intensificada nas áreas mais

carentes, e sim fragmentada em praticamente todo o território nacional, seja pelas

IES representantes, seja através das consorciadas. Na publicação do resultado,

estava explícito no Art°. 2 que as instituições teriam cinco dias úteis, a partir da

publicação, para a interposição de recurso junto ao MEC questionando o resultado

do processo seletivo, embora estivesse claro que só seria considerado o recurso

tempestivo coerente com o objeto de avaliação da Comissão de Seleção e

Julgamento. Não temos informação de quantas instituições entraram com algum tipo

de recurso e qual o resultado desta interposição.

Listamos no quadro seguinte, as instituições contempladas e seus respectivos

cursos, observando que as Universidades confessionais foram contempladas neste

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processo de seleção. É possível verificar a fragmentação territorial das instituições

contempladas, bem como a diversidade de cursos propostos no quadro. A partir da

análise dos pareceres de aceitação e recusa dos cursos, considerando os critérios

abordados, verificamos uma opção por cursos que atendessem o perfil mais próximo

do documento que estipulou os objetivos, eixos e perspectiva do Pró-Licenciatura,

inserido neste perfil a diversidade institucional e geográfica dos futuros cursos a

distância.

Se considerarmos um quantitativo simples, número de instituições por cursos,

podemos verificar que existe um padrão entre quatro e cinco instituições por curso,

com exceção do curso de Letras que abarca uma série de habilitações

diferenciadas, apresentando doze instituições para a oferta. A concentração de

instituições contempladas está nas regiões do Centro-Sul, com apenas quatro

instituições fora do eixo centro-sul (três na região Norte, e apenas uma na região

Nordeste). Isso não significa que a área de atuação fosse restrita ou que outras IES

não tenham sido contempladas. É importante lembrar que o resultado mostra

apenas o nome da IES representante, mas todas elas estavam organizadas em

consórcios, com uma área de atuação territorial bastante ampla.

Estava claro no edital e na proposta do Pró-Licenciatura que a organização

em consórcios promoveria uma redistribuição destes cursos, através dos convênios

e a organização das parcerias por intermédio dos polos de apoio em outros Estados.

Neste momento, a consolidação real destes consórcios e parcerias não foi avaliada

de forma mais aprofundada pelo MEC. Posteriormente, verificamos que muitas

instituições que se declararam parceiras tinham apenas sinalizado um desejo e o

documento assinado constituía-se muito mais em uma carta de intenção do que em

uma parceria real de fato.

Ao analisarmos a situação de todos os cursos e as suas respectivas

instituições em 2009, verificamos que todas as condições construídas apresentaram

resultados diferentes, reflexo da complexidade nas estruturas internas das

Universidades e do grau de organização dos consórcios e equipes de gestão da

EAD.

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127

QUADRO 5: Resultado da Resolução CD/FNDE n° 34

Fonte: Diário Oficial da União, 02/02/2006.

Condição Curso Instituição RepresentanteCiências Biológicas Universidade Federal de GoiásFísica Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Abertura de Novas Turmas em Cursos Existentes1º Período

MatemáticaUniversidade Federal de PelotasUniversidade Federal de Santa CatarinaUniversidade Federal do Rio Grande do Norte

Química Universidade Federal do ParáUniversidade Federal do Rio Grande do Norte

Artes - Artes Visuais Universidade Federal do Rio Grande do SulArtes - Musica, Artes Visuais e Teatro Universidade de BrasíliaArtes - Música Universidade Federal do Rio Grande do SulArtes - Artes Visuais Universidade Federal do Espírito SantoArtes Visuais Universidade do Contestado

Geografia

Universidade Estadual de Ponta GrossaUniversidade Federal de Santa MariaUniversidade Federal do Rio Grande do NortePontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Abertura de Novos Cursos - 2º Período História

Universidade Estadual de Ponta GrossaUniversidade Estadual de MaringáPontifícia Universidade Católica do Rio de JaneiroPontifícia Universidade Católica de Minas GeraisUniversidade do Oeste de Santa Catarina

Letras – Língua Portuguesa eEspanhola

Universidade Estadual de Ponta Grossa

Letras - Língua Espanhola Universidade Federal de Santa MariaLetras - Língua Inglesa Universidade Federal do Rio Grande do SulLetras - Língua Portuguesa Universidade Federal de Santa MariaLetras – Língua Portuguesa e Inglesa Universidade Estadual de MaringáLetras - Língua Inglesa Universidade Federal de Santa CatarinaLetras – Língua Inglesa e Espanhola Universidade do Oeste de Santa CatarinaLetras - Língua Portuguesa Universidade Estadual de Montes ClarosLetras - Língua Portuguesa Centro Universitário de Jaraguá do Sul

Letras – Língua Portuguesa Universidade de Brasília

Letras - Língua Inglesa Universidade Federal do Pará

Letras - Língua Portuguesa e Inglesa Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Ciências Biológicas

Universidade Estadual de MaringáUniversidade Federal de Minas Gerais Universidade Federal do Rio Grande do Sul Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Educação Física

Universidade Estadual de Ponta GrossaUniversidade Federal do Espírito SantoUniversidade de BrasíliaUniversidade Federal do Amazonas

3º Período - Abertura de Novos Cursos

Física

Universidade Estadual de MaringáUniversidade Federal de GoiásUniversidade Federal do Espirito SantoUniversidade Federal do Rio Grande do Sul

Matemática

Universidade do Sul de Santa CatarinaUniversidade Federal de Santa MariaPontifícia Universidade Católica de Minas GeraisUniversidade Federal de Ouro PretoUniversidade Federal de Rondônia

Química Universidade Federal de Minas GeraisPontifícia Universidade Católica de Minas GeraisUniversidade Federal do Rio Grande do SulUniversidade Federal do Espírito SantoUniversidade Federal de Santa Catarina

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128

É importante ressaltar que o Pró-Licenciatura foi substituído por uma nova

proposta, a Universidade Aberta do Brasil (UAB), constituindo uma mudança

profunda na proposta governamental de educação a distância, mas essa

substituição não foi motivada por uma avaliação do programa anterior ou por

necessidade de adequação ou melhoria na estrutura dos editais anteriores. Não é

objetivo deste trabalho discutir as questões políticas e estratégicas que motivaram a

criação da UAB, na verdade o recorte temporal do nosso trabalho é encerrado

exatamente com a criação da UAB. Porém, para apresentar um breve panorama da

situação atual dos cursos do Pró-Licenciatura contemplados nos editais anteriores,

vamos tecer algumas considerações sobre a transição entre as duas propostas,

assunto do próximo tópico.

4.6 Considerações sobre criação da Universidade Aberta do Brasil (UAB)

Durante a reconstituição do processo de construção do Pró-Licenciatura como

uma proposta de política pública para a EAD no país, evidenciamos o intenso

diálogo realizado com vários IES e representantes da educação básica. Esse

diálogo durou de 1999 (ano de criação da UNIREDE) até 2005, quando foram

implementadas novas diretrizes nas políticas públicas de EAD. Não é possível

determinar um único fator para justificar as mudanças, apenas temos alguns indícios

que apontam para a desestruturação da equipe gestora da modalidade na

SEED/MEC, mudança nos cargos do governo, incluindo aí a nomeação do Professor

Carlos Eduardo Bielschowsky, em maio de 2007. É importante lembrar que até

aceitar o convite do ministro da Educação, Fernando Haddad, Bielschowsky

presidiu a Fundação Cecierj (Centro de Ciências e Educação Superior a Distância

do Estado do Rio de Janeiro) e o consórcio CEDERJ (Centro de Educação a

Distância do Estado do Rio de Janeiro) desde a fundação, em 2002. O modelo do

CEDERJ foi usado como referência em muitos projetos apresentados na seleção do

Pró-Licenciatura e sua estrutura é bastante semelhante ao modelo da UAB.

A criação da UAB ocorre em junho de 2006, ao mesmo tempo em que seu

projeto piloto do Curso de Administração a distância iniciava as atividades. Naquele

momento, a articulação para a implementação do curso nas IES públicas, estava

fundamentada no chamado Fórum das Estatais e na possível existência da

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Universidade Aberta do Brasil. Em dezembro de 2005 foi publicado um edital,

chamado posteriormente de Edital UAB 1, seis meses antes da criação oficial do

Sistema. No próprio site do MEC, encontramos a seguinte informação sobre a

criação da UAB:

A UAB foi criada em 2005 no âmbito do fórum das estatais pela educação e teve seu primeiro edital lançado em dezembro do mesmo ano. Este edital, chamado de UAB1, foi destinado às Universidades Federais para envio de propostas de oferta de cursos de educação superior (Graduações, seqüenciais, lato sensu e stricto sensu) com foco em cursos de formação de professores e aos municípios e governos de estado para o envio de propostas de criação polos de apoio presencial (UAB/MEC, 2009).

A informação equivocada é reproduzida em vários textos acadêmicos que

tratam sobre o assunto (BERBAT, 2007; COSTA, 2008), gerando uma associação

direta que considera todos os cursos existentes hoje como legítimas criações da

UAB. É fato que existia o Fórum das Estatais e foi a partir dele que a proposta do

sistema UAB foi construída, mas é bastante preocupante a existência de editais

publicados enquanto o “sistema” UAB não existia concretamente. Não pretendemos

nos aprofundar em questões legais sobre a aplicação de recursos e origem do

orçamento, os documentos indicam que os editais da UAB lançados em 2005,

estavam inseridos no contexto do Pró-Licenciatura (embora o programa não tenha

sequer sido mencionado). Como o primeiro curso criado através do Fórum das

Estatais, foi o Bacharelado em Administração a distância, financiado pelo Banco do

Brasil, em regime de repasse direto para as IES, não foi necessário repasse direto

de recurso no âmbito da UAB no período.

O documento de criação do Sistema Universidade Aberta do Brasil, através

do Decreto n° 5.800, assinado em 8 de junho de 2006, decreta em seu Art.1o, “Fica

instituído o Sistema Universidade Aberta do Brasil-UAB, voltado para o

desenvolvimento da modalidade de educação a distância, com a finalidade de

expandir e interiorizar a oferta de cursos e programas de educação superior no

País”.

Embora mais adiante, no corpo do decreto, esteja explicitada a necessidade

de ampliação do acesso ao ensino superior e redução das desigualdades de oferta

de ensino superior entre as diferentes regiões do País, os fundamentos teóricos ou

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metodológicos, bem como o aprofundamento das articulações necessárias, não

estão evidenciados no texto.

É necessário retomar a questão do Projeto Piloto, mesmo que brevemente. O

primeiro item do parágrafo único que inicia o Decreto 5.800, afirma que “o objetivo

da UAB é oferecer, prioritariamente, cursos de licenciatura e de formação inicial e

continuada de professores da educação básica” (Decreto n° 5.800, 2006, p.1). Nos

causa estranhamento, portanto, que o curso do Projeto Piloto da UAB seja um curso

de Bacharelado em Administração e não um curso de Licenciatura, mas

considerando as questões operacionais tratadas anteriormente, é possível

compreender a razão principal. Outro fato importante, é que tanto o Projeto Político-

Pedagógico do curso da Administração a distância implementado nas Universidades

participantes como todo o material pedagógico, é único, desenvolvido inicialmente

pela Universidade Federal de Santa Catarina e posteriormente pelas demais

Universidades parceiras. Isso significa que um único projeto, com suas bases

conceituais e teóricas e grade curricular, foi utilizado em Instituições que estavam

localizadas desde o Rio Grande do Sul até o Amazonas.

Está claro que essa medida foi adotada para beneficiar a mobilidade entre os

funcionários do Banco do Brasil (patrocinador do Projeto Piloto) entre as IES, já que

estava previsto no acordo que seria possível a transferência de alunos em todas as

Universidades do Brasil que implementaram o curso. Assim, não existe diversidade,

seja ela curricular, cultural, teórica ou pedagógica. É um pacote pronto e acabado

que representa muito bem o modelo proposto por Peters (1983) para a educação

fordista.

O Edital UAB 1, publicado em dezembro de 2005, também apresenta uma

modificação profunda na política de EAD no país. Enquanto no Pró-Licenciatura o fio

condutor da análise dos cursos selecionados era o Projeto Político-Pedagógica e

sua proposta de ação, no contexto da UAB o único critério era a articulação com os

municípios, responsáveis a partir de então pela estrutura e manutenção dos polos.

As IES seriam responsáveis pela parte acadêmica de produção dos materiais, oferta

de disciplinas e certificação. Isso significa, de forma bem direta, que os pequenos

municípios do interior que se dispusessem a ofertar um pólo para os cursos a

distância deveriam prover a estrutura física com equipamentos, livros, pessoal,

laboratórios etc. Considerando a realidade da educação brasileira nas pequenas

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131

cidades e o montante de recursos que nunca é suficiente para o desenvolvimento de

uma educação realmente de qualidade, é uma surpresa verificar que setenta

municípios aderiram ao projeto, e uma constatação óbvia que poucos cumpriram

com o compromisso firmado.

Diante desse quadro, o MEC foi obrigado a intervir no processo e garantir que

equipamentos, livros e bolsas seriam fornecidos para garantir a continuidade da

proposta inicial. Ou seja, o projeto idealizado no Fórum das Estatais terminou

assumindo uma configuração bastante semelhante ao Pró-Licenciatura, com o

detalhe de que não eram mais as IES públicas que gerenciavam os processos e sim

os gestores Estaduais/Municipais.

Vários fatores poderiam ser usados para justificar a constituição da UAB

nesses termos, mas não nos interessa o aprofundamento sobre o Sistema UAB. De

fato, o que nos interessa em nossa pesquisa é delimitar e detalhar o momento de

interseção do Pró-Licenciatura com o Sistema Universidade Aberta. Durante o

período de 2006 até 2009, as duas políticas públicas de EAD ocorreram de forma

separada, praticamente uma ignorando a outra, embora existissem instituições que

possuíam cursos nas duas modalidades. Finalmente, em abril de 2009, em um

Encontro realizado em Brasília, houve o comunicado de migração do Pró-

Licenciatura para o Sistema UAB, decretando-se o fim do primeiro e a incorporação

da estrutura física pelo segundo. Ao final do próximo capítulo, retomaremos assunto

com o relato dos princípios dessa proposta e o posicionamento das IES

participantes. Para dar continuidade ao modelo de política pública, proposto pela

UAB, é necessário apresentar a sua configuração atual na CAPES.

A abertura do I Encontro Pedagógico do Programa Pró-Licenciatura/UAB foi

realizada pelo diretor de educação a distância da UAB/CAPES, com a apresentação

do panorama atual da UAB e sua nova configuração dentro da CAPES. Segundo o

diretor, foi aprovado no Congresso Nacional o novo papel da CAPES para cuidar da

Educação Básica. Este papel é considerado novo porque, tradicionalmente, a

CAPES era responsável pela pós-graduação no país, sendo um órgão de fomento e

regulação da pesquisa acadêmica. Uma das justificativas apresentadas para esta

nova configuração foi o resultado de um estudo que afirmava que embora o

desenvolvimento das pesquisas sobre educação no Brasil seja produtivo, os

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132

indicadores da Educação Básica não apontam para uma articulação entre o

conhecimento produzidos nas IES e sua aplicabilidade nas escolas.

Foi apresentada então, a nova estrutura da CAPES que inseriu em suas

diretorias, segmentos voltados para o desenvolvimento da Educação Básica e

Educação a Distância.

FIGURA 7: Configuração da nova CAPES Fonte:Material apresentado no I Encontro Pedagógico do Programa Pró-Licenciatura/UAB

Vale lembrar que a primeira ação de educação a distância realizada pelo

governo foi desenvolvida dentro da Secretaria de Educação a Distância,

SEED/MEC. Posteriormente, a segunda fase do Pró-Licenciatura foi realizada na

Secretaria de Educação Básica, em parceria com a SESU, (Secretaria de Ensino

Superior) e FNDE. Nesta nova configuração apresentada, é criada uma diretoria de

EAD na CAPES, estruturada em quatro coordenações, retratadas na figura a seguir.

É impossível não perceber o uso constante da palavra “nova” como um eufemismo

para identificar as ações propostas, “nova CAPES”, nova modalidade, nova proposta

etc.

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133

FIGURA 8: A Universidade Aberta do Brasil na CAPES.Fonte: Material apresentado no I Encontro Pedagógico do Programa Pró-

Licenciatura/UAB

A Universidade Aberta do Brasil é uma articulação entre os polos de apoio

presencial (responsabilidade dos Municípios e Estados) e os cursos de graduação e

pós-graduação (responsabilidade de Instituições Públicas de Ensino Superior), em

regime de colaboração pública. Segundo os dados apresentados no evento, o edital

da UAB do período 2006-2007, implementou 291 polos e o edital de 2007-2008

selecionou 271 polos, com 70% de implementação até março de 2009.

A prioridade da UAB é a formação inicial e continuada de professores e

formação de administradores públicos, o que mostra a contradição entre as

prioridades estabelecidas e a sua execução, já que o curso piloto da UAB é um

bacharelado em Administração, voltado para os funcionários do Banco do Brasil e a

demanda social. A divergência do foco principal das diretrizes governamentais de

educação a distância pode ser explicada, por força da decisão da própria criação da

UAB realizada no âmbito do Fórum das Estatais para financiamento de cursos a

distância para os seus funcionários. De fato, o financiamento do curso de

Administração nas 18 Universidades Federais e 07 Universidades Estaduais, é

realizado, em sua maior parte, pelo Banco do Brasil que financia cada funcionário

matriculado nos curso, diretamente a IES. É possível afirmar que o projeto piloto da

UAB foi um “balão de ensaio” para a configuração e consolidação do modelo

proposto.

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As metas para o crescimento da EAD são bastante ambiciosas, pois o

governo pretende chegar ao número de 850 polos até o final de 2011, com 700.000

alunos matriculados. É interessante observar que ao contrário do Programa Pró-

Licenciatura, não existia um documento com as diretrizes ou as concepções

teóricas, metodológicas e pedagógicas da Universidade Aberta do Brasil até março

de 2009. Enquanto o documento do Pró-Licenciatura com as suas diretrizes

conceituais e metodológicas apresenta dezesseis páginas, o conteúdo da

Universidade Aberta do Brasil, encontrado no site, diz o seguinte:

O Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB) tem como prioridade a formação de professores para a Educação Básica. Para atingir este objetivo central a UAB realiza ampla articulação entre instituições públicas de ensino superior, estados e municípios brasileiros, para promover, através da metodologia da educação a distância, acesso ao ensino superior para camadas da população que estão excluídas do processo educacional.O Sistema Universidade Aberta do Brasil foi criado pelo Ministério da Educação em 2005 no âmbito do Fórum das Estatais pela Educação com foco nas Políticas e a Gestão da Educação Superior sob 5 eixos fundamentais:1. Expansão pública da educação superior, considerando os processos de democratização e acesso.2. Aperfeiçoamento dos processos de gestão das instituições de ensino superior, possibilitando sua expansão em consonância com as propostas educacionais dos estados e municípios;3. A avaliação da educação superior a distância tendo por base os processos de flexibilização e regulação em implementação pelo MEC;4. As contribuições para a investigação em educação superior a distância no país.5. O financiamento dos processos de implantação, execução e formação de recursos humanos em educação superior a distância.Tendo como base o aprimoramento da educação a distância, o Sistema UAB visa expandir e interiorizar a oferta de cursos e programas de educação superior. Para isso, o sistema busca fortes parcerias entre as esferas federais, estaduais e municipais do governo (Apresentação da UAB, Portal Oficial do MEC).

Além do texto de apresentação da UAB, existe uma espécie de aviso no qual

é afirmado que o Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB) não propõe a criação

de uma nova instituição de ensino, mas sim, a articulação das já existentes. Para

explicar o funcionamento da UAB é utilizado um diagrama com a configuração das

articulações realizadas.

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135

FIGURA 9: Sistema de articulação da UABFonte: Material apresentado no I Encontro Pedagógico do Programa Pró-

Licenciatura/UAB

A proposta do governo para o futuro da EAD é a incorporação dos cursos pela

estrutura formal das IES públicas, na qual o ideal seria que o curso estivesse dentro

dos departamentos, com colegiado e eleições para coordenação de curso, etc. Esta

incorporação fará com que as Universidades deixem de receber recursos

descentralizados para o projeto específico e incorporem os alunos da EAD no seu

contingente orçamentário.

Sobre a migração, foi proposta a incorporação do Pró-Licenciatura para os

polos da UAB, com a apropriação apenas da estrutura física, considerando que os

cursos do pró-licenciatura estão acabando e não terão uma nova chamada, com a

seguinte configuração: financiamento pela SEED com Diretrizes do Sistema UAB

(relacionadas com a gestão financeira e a articulação dos polos); gestão nas IES

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136

integrada ao Sistema UAB e migração de parte dos Polos do Pró-Licenciatura para o

Sistema UAB, no âmbito do Plano de Ações Articuladas (PAR4).

O processo de migração dos cursos não foi detalhado nem esclarecido, mas

nos relatos realizados pelos participantes representantes das IES, que abordaremos

no último capítulo, ficou claro que esta migração terá que ser discutida de forma

mais aprofundada, sem perdas financeiras ou na autonomia dos cursos.

A existência de um modelo hegemônico de Educação a Distância reprime as

experiências inovadoras, engessa o currículo e uniformiza a diversidade. Esta ação

gera ressentimentos nos gestores, professores, tutores e alunos, que buscam a

flexibilidade na educação a distância e encontram a imobilidade. Nós iremos retomar

esse assunto no próximo capítulo, associando toda a experiência de construção do

Pró-Licenciatura aos novos caminhos da educação no contexto da sociedade

informacional na qual, elementos como pós-modernidade, cibercultura e inovação,

propõem a existência de um novo paradigma.

4.7 Nuvem de tags do capítulo

4 O Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) condicionou o apoio técnico e financeiro do Ministério da Educação à assinatura, pelos estados e municípios, do plano de metas Compromisso Todos pela Educação. Depois da adesão ao Compromisso, os municípios devem elaborar o Plano de Ações Articuladas (PAR). Todos os 5.563 municípios, os 26 estados e o Distrito Federal aderiram ao Compromisso.O PAR é o planejamento multidimensional da política de educação que cada município deve fazer para um período de quatro anos — 2008 a 2011. O PAR é coordenado pela secretaria municipal de educação, mas deve ser elaborado com a participação de gestores, de professores e da comunidade local (MEC, 2009).

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5 A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA MODALIDADE A DISTÂNCIA: ASPECTOS CULTURAIS NO USO DAS

TECNOLOGIAS DIGITAIS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO

Dan Perjovschi . What Happened to us?

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5.1 Unindo os pontos: um olhar sobre o campo dos Estudos Culturais no documento do Pró-Licenciatura e a prática da EAD para a formação docente

O percurso realizado até aqui buscou construir as etapas de implementação

do Programa Pró-Licenciatura como política pública para a formação de professores

da Educação Básica, apontando a sua singularidade nesse processo de construção,

intensamente dialogado com as diversas entidades, instituições e representantes da

rede pública de ensino. A complexidade do percurso pode ser observada na

necessidade de relatar os movimentos dos sujeitos envolvidos e as suas estratégias

que, em alguns momentos, se caracterizavam pelo apoio e colaboração e, em outros

momentos, como resistência às propostas apresentadas. A análise desse

movimento é fundamental para a nossa compreensão da EAD como uma estratégia

governamental para promover mudanças na educação, mudanças essas que

perpassam a questão cultural e que aqui foram sinalizadas, a partir das inovações

das permanências em relação às categorias fundamentais para a reflexão no campo

da EAD: tecnologias, avaliação, projeto político-pedagógico, tutoria e materiais

didáticos.

É exatamente sobre a questão cultural que trataremos neste capítulo,

entendendo que o cerne de qualquer discussão sobre as mudanças paradigmáticas

mediadas pelo uso das tecnologias precisa ser pensado sobre a perspectiva do

campo dos Estudos Culturais. A dimensão tecnológica e suas consequências para a

sociedade são quase sempre analisadas na perspectiva da técnica e das relações

que se estabelecem entre o ser humano e o artefato tecnológico. É uma concepção

de tecnologia como estranha ao homem, e não produto de sua construção, e, por

essa estranheza, produz “impactos” na vida cotidiana, considerada estável e

equilibrada antes do advento das tecnologias. (LÉVY, 1999).

Uma abordagem também equivocada é a compreensão da tecnologia como

um processo de evolução da sociedade, associada à modernidade (ou pós-

modernidade) como o único caminho possível para o ser humano. Neste contexto, a

educação também deveria estar inserida no processo de modernização, ou inovação

tecnológica, sempre na perspectiva de um processo contínuo de progresso e

melhoria. Aqui, o uso dos artefatos tecnológicos também é compreendido como algo

externo ao homem, e não como uma criação sua. Separamos a cultura da técnica e

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do econômico porque é mais fácil reduzir a complexidade em elementos estanques

e não tratar do tema em uma perspectiva mais ampla.

Mesmo supondo que existam três entidades – técnica, cultura e sociedade -, em vez de enfatizar o impacto das tecnologias, poderíamos igualmente pensar que as tecnologias são produtos de uma sociedade e de uma cultura. [...]Encaramos as tendências intelectuais como atores porque há grupos bastante reais que se organizam ao redor destes recortes verbais ou então porque certas forças estão interessadas em nos fazer crer que determinado problema é puramente técnico ou é puramente cultural ou ainda puramente econômico. As verdadeiras relações, portanto, não são criadas entre a tecnologia (que seria da ordem da causa) e a cultura (que sofreria os efeitos), mas sim entre um grande número de atores humanos que inventam, produzem, utilizam e interpretam de diferentes formas as técnicas (LÉVY, 1999, p. 23).

Na perspectiva reducionista a esferas isoladas, a resistência dos professores

ao uso da tecnologia é uma questão de treinamento ou conhecimento da ferramenta,

a política pública em investir na modalidade a distância é uma questão de reduzir

custos, a estagnação da escola frente às mudanças é um problema da cultura

escolar. Neste caso, o entendimento é que estes elementos que compõem a

dinâmica da educação não estão relacionados, ou quando é admitida esta relação

sempre se atribui um caráter depreciativo ou subjacente ao quadro principal do

problema.

Encontramos na proposta de um programa de formação de professores a

distância um forte agregado tecnológico e todos os desdobramentos que o uso das

tecnologias pode produzir, mas não é apenas a existência dos artefatos tecnológicos

que irão produzir apropriações distintas desse conhecimento. É preciso definir como

será o seu uso e, consequentemente, que tipo de apropriação (da tecnologia e da

informação) estamos propondo realizar.

É exatamente no cerne desta questão que acreditamos ser preciso uma

análise centrada não apenas na questão tecnológica per si, mas sim, em todos os

elementos e percursos que foram construídos para instituir uma possibilidade de

mudança através da EAD. A concepção de que a EAD como modalidade, com sua

fundamentação e seus aspectos metodológicos, poderia ser uma alternativa para

formar professores de forma mais contextualizada, utilizando os artefatos da

sociedade informacional, não poderia ser um pressuposto fundamentado na própria

caracterização da modalidade. O resultado poderia ser uma linha de raciocínio

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simplificada. Se a EAD usa a tecnologia como base para a ação pedagógica e assim

reduz os custos com a educação, a consequência imediata é que os professores

dominarão as tecnologias digitais e os custos serão muito menores do que no

presencial. O risco que se corre com esta lógica é que podemos considerar como

domínio das tecnologias digitais ser um dos usuários de programas proprietários da

Microsoft, como Word, Excel, Power Point5, sem que nenhuma mudança conceitual

ou na prática pedagógica dos professores seja realmente modificada. Com a

premissa de custos menores, pode-se criar uma percepção de que é necessário

cortar custos sempre, mesmo que sejam os investimentos em bibliotecas,

laboratórios, ou mesmo no pagamento dos professores.

A partir da análise do Anexo III da Resolução nº 34 e de outros documentos

complementares (Referenciais de qualidade e PPP), vamos apresentar a dimensão

do campo dos estudos culturais (diversidade, cidadania, ética, multiculturalidade

etc). A articulação entre as propostas do Anexo III da Resolução nº 34, que servirão

como elementos norteadores dos projetos com o resultado final de cada PPP, e as

concepções de aprendizagem que estão delineadas nestes, é o movimento

fundamental para compreendermos a verdadeira dimensão da política pública na

proposta do Pró-Licenciatura como instrumento de transformação na educação.

5.2 A análise do Anexo III no campo dos Estudos Culturais

A resolução do Pró-Licenciatura chamada de RESOLUÇÃO/CD/FNDE/Nº 34,

DE 9 DE AGOSTO DE 2005, estabelecia os critérios e os procedimentos para a

apresentação, seleção e execução de projetos de cursos de licenciatura para

professores em exercício nas redes públicas nos anos/séries finais do ensino

fundamental e/ou no ensino médio, na modalidade de educação a distância. O texto

da resolução define os critérios de elegibilidade das IES e os aspectos

procedimentais para financiamento e implementação dos cursos. É um texto técnico

que não se diferencia em nada dos outros documentos desta natureza, mas nos dois

primeiros parágrafos do Artigo 2 da Resolução estão estipuladas referências aos

documentos chamados de anexo à Resolução, especificamente o Anexo III,

conforme segue:5 Estamos nos referindo ao software proprietário e a ação do mercado para a criação de novos

usuários que disseminarão a necessidade de aquisição de um determinado software em detrimento de outros que, além de gratuitos, apresentam códigos abertos e permitem a sua costumização.

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§ 1º Apenas serão aceitos os projetos de cursos de licenciatura nas disciplinas que compõem a Base Nacional Comum dos Currículos do Ensino Fundamental e Ensino Médio.§ 2º Para cada curso ofertado, a IES deverá observar as especificações técnicas do Projeto, bem como as Propostas Conceituais e Metodológicas do documento Pró-Licenciatura descritas respectivamente nos anexos II e III desta Resolução (Resolução/CD/FNDE/Nº 34, 2005, p.2).

O Anexo III da Resolução nº 34, intitulado Pró-licenciatura: propostas

conceituais e metodológicas é uma espécie de referencial com as diretrizes teórico-

político-metodológicas que subsidiaram a construção de todos os Projetos Político-

Pedagógicos (PPP) dos cursos de licenciatura a distância apresentados como

proposta das IES públicas. O documento é composto dos seguintes elementos: área

de atuação, o programa, a escola que queremos, o professor que queremos,

estrutura e estratégias do Pró-Licenciatura, diretrizes metodológicas e pedagógicas,

projeto político-pedagógico, operacionalização e avaliação. Todos esses elementos

são abordados, a partir de um enfoque diferenciado em relação ao texto técnico da

Resolução da qual faz parte. Enquanto na Resolução n° 34, o texto está disposto de

forma objetiva, contemplando - através de artigos e parágrafos - as necessidades de

melhoria na Educação Básica, com base em uma política pública voltada para a

certificação de professores da rede. O Anexo III traz toda a sua fundamentação em

conceitos e categorias do campo dos Estudos Culturais. Como a estrutura do Anexo

III apresenta as mesmas categorias repetidamente ao longo dos tópicos, com várias

caracterizações e definições enumeradas, vamos usar novamente o recurso do

mapa conceitual para permitir uma melhor visualização da sua organização.

É necessário evidenciar que o texto da Resolução n° 34 (e seu Anexo III)

apresenta peculiaridade em relação aos demais documentos de natureza legal.

Nessa peculiaridade, com aspectos subjetivos relacionados com práticas políticas e

éticas específicas, reside o interesse como objeto de análise e construção de nossa

pesquisa e precisa ser detalhado e analisado em seus pormenores para evidenciar

nossos pressupostos. Vamos retomar o primeiro aspecto do Anexo III, os seis eixos

que alicerçaram as ações propostas e aprofundar a nossa discussão acompanhando

os principais elementos do documento.

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FIGURA 10: Estrutura do Anexo III da Resolução CD/FNDE n° 34Fonte: Autoria própria a partir do Anexo III

O Anexo III inicia o seu texto com o argumento de que o desafio central da

educação básica já foi quase cumprido, e que a “valorização da escola, do

magistério e o investimento no trabalho docente são fatores fundamentais e

urgentes para a reestruturação do sistema educacional brasileiro”. No texto não fica

especificado qual o conceito de valorização que está sendo utilizado nem qual o tipo

de reestruturação seria necessário para o sistema educacional.

Existem várias leituras possíveis. Poderíamos considerar a valorização da

escola e do magistério como mais investimentos em equipamentos e salários e a

reestruturação como leis e mudanças nos mecanismos de financiamento. Mais

adiante encontramos a afirmativa que é preciso “investir na qualidade de forma a

garantir que a escola seja um espaço em que, de fato, se ensine com eficiência e

eficácia, onde os alunos aprendam e construam os conhecimentos e as habilidades

condizentes com sua faixa etária”. Para alcançar esses objetivos foi organizada uma

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série de elementos estruturados em seis eixos que serão comentados ao longo

deste capítulo, a partir da análise dos tópicos com os sugestivos títulos “a escola

que queremos e o professor que queremos”. Os seis eixos norteadores do Anexo III,

apresentados logo no início do texto, são:

1° Eixo: A formação consistente e contextualizada do educador nos conteúdos de sua área de atuação;2° Eixo: a formação teórica, sólida e consistente sobre educação e os princípios políticos e éticos pertinentes à profissão docente;3° Eixo: a compreensão do educador como sujeito capaz de propor e efetivar as transformações político-pedagógicas que se impõem à escola; 4° Eixo: a compreensão da escola como espaço social, sensível à história e à cultura locais;5° Eixo: a ação afirmativa de inclusão digital, viabilizando a apropriação pelos educadores das tecnologias de comunicação e informação e seus códigos;6° Eixo: o estímulo à construção de redes de educadores para intercâmbio de experiências, comunicação e produção coletiva de conhecimento. (MEC, Anexo III da Resolução CD/FNDE n° 34, 2005).

A ênfase na formação dos conteúdos de sua área está explicitada apenas no

primeiro eixo citado. A formação teórica sólida e consistente está associada de

forma direta com os princípios políticos e éticos que, dependerão, exclusivamente,

do ambiente cultural no qual o professor estiver inserido. A proposta de formar um

educador capaz de “propor e efetivar as transformações político-pedagógicas na

escola” é uma afirmação contundente de que as estruturas organizacionais e

pedagógicas das escolas hoje não são adequadas ao que parte das políticas

públicas considera aceitável para uma educação de qualidade.

Ao conectar em seus eixos a compreensão de uma escola (na visão do

professor) como um espaço social, sensível à história e à cultura locais, com uma

ação afirmativa de inclusão digital, através da viabilização da apropriação dos

educados das tecnologias de comunicação e informação, nos parece que a decisão

em formar professores na modalidade a distância não é apenas uma opção

fundamentada em questões operacionais (tempo, limites geográficos e custos).

Embora estes elementos façam parte da viabilidade técnica para a implementação

de cursos na modalidade a distância (não podemos menosprezar os aspectos

econômicos e jurídicos), a inserção desta metodologia, com o forte agregado

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tecnológico inerente ao seu desenvolvimento, pode, na verdade, ter sido a premissa

mais importante para a decisão estratégica de sua implementação.

Apenas o primeiro eixo “formação consistente e contextualizada do educador

nos conteúdos de sua área de atuação” é centrado na formação específica do

educador em relação ao domínio dos conteúdos, assim mesmo com a ressalva de

ser contextualizada, ou seja, uma formação consistente, mas fora de uma

possibilidade de contextualização dos conteúdos também não é desejada. Os

demais eixos serão comentados ao longo deste capítulo, mas antes é preciso

comentar a estrutura proposta no Anexo III. Logo no sumário já é possível identificar

a estrutura de um projeto, com apresentação, tópicos do desenvolvimento e

avaliação.

Os tópicos “a escola que queremos e o professor que queremos”, indicam

desde o princípio que o objetivo principal do programa é promover uma mudança

profunda na escola. Durante o restante do texto, alguns elementos reveladores

surgem apontando para as questões centrais que estão colocadas de forma explícita

e outras subjacentes que aparecem nas explicações ou nos tópicos caracterizadores

de uma determinada categoria. Com podemos observar, são muitas inferências que

necessitam de reflexões sobre a proposta alicerçada no Anexo III e, novamente, é

preciso ressaltar o caráter diferenciado da proposta já que se trata de um documento

público, anexado a uma resolução normativa.

5.3 O professor que queremos: um olhar sobre a proposta do Pró-Licenciatura para a prática docente e suas identidades

Embora possa parecer óbvio que o professor é o foco do programa em função

do próprio objetivo da proposta, está claro no Anexo III que o professor é a figura

central na melhoria da qualidade na educação básica, compreendida aqui como

possível por meio de movimentos de transformação e mudança. O Anexo III vai

além, ao afirmar que o papel do professor é de promover mudanças efetivas na

escola, como sujeito catalisador de todas as possibilidades de transformação da

cultura escolar e da própria sociedade. Algumas das ações propostas no Anexo III,

como parte do fazer docente, poderiam ser consideradas como uma extrapolação

das funções do professor, a exemplo de realizar intervenções na comunidade,

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articular ações com os movimentos sociais, entre outras que trataremos mais

adiante.

O princípio do primeiro eixo, “formação consistente e contextualizada do

educador nos conteúdos de sua área de atuação”, é centrado na formação

específica do educador em relação ao domínio dos conteúdos, assim mesmo com a

ressalva de ser contextualizada, ou seja, uma formação consistente, mas fora do

contexto, também não é desejada.

O Anexo III deixa claro também que o objetivo do programa é muito maior do

que a certificação ou a formação conteudista do professor, compreendendo como

qualidade uma dimensão que ultrapassa os muros da escola. Outro aspecto

importante é que o Pró-Licenciatura é apresentado como um primeiro passo no

processo de formação continuada, a base e os alicerces para um projeto de

formação profissional contínua que prevê, inclusive, cursos em nível de mestrado e

doutorado.

O curso a ser desenvolvido deverá ser concebido como uma etapa de um processo de formação continuada. Por um lado, estará articulado a outras iniciativas de formação permanente de educadores de forma que a diplomação seja apenas um momento pontual no processo de formação desses professores e não um ponto terminal (MEC, Anexo III, Resolução do Pró-Licenciatura, 2005).

O segundo eixo, “a formação teórica, sólida e consistente sobre educação e

os princípios políticos e éticos pertinentes à profissão docente”, trata de uma

questão bastante delicada, a formação docente relacionada com princípios políticos

e éticos, que só pode ser compreendida e traduzida em sua dimensão plena se

considerarmos os aspectos políticos e éticos de cada grupo e contexto social. A

proposta do programa é que o professor, através da formação sólida e

contextualizada, com princípios políticos e éticos bem definidos, poderá atuar como

protagonistas na construção de uma nova escola, uma nova comunidade escolar e,

consequentemente, uma nova sociedade, sempre a partir da abordagem do local

para o global. O local aqui é entendido como uma articulação entre a comunidade e

o contexto do professor e a totalidade de uma sociedade inserida no contexto da

globalização.

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A proposta de formação permanente6 se coaduna com a meta do Pró-

Licenciatura, isto é, desenvolver meios e estratégias para valorizar a escola a partir

de sua própria comunidade escolar em que o professor, juntamente com os outros

membros desta, construirá a escola. Assevera o documento;

O Programa deve desenvolver meios e estratégias para que os educadores nele envolvidos sejam capazes de propor e construir a escola que se faz necessária em cada região, em cada comunidade. Mas os professores não são os únicos protagonistas dessa tarefa, já que a educação resulta da participação de toda a comunidade escolar: direção, professores, estudantes, funcionários, pais e mães. A todos cabe, portanto, dar forma ao projeto ideal de escola que é peculiar a cada comunidade (MEC, Anexo III, Resolução do Pró-Licenciatura, 2005).

Neste aspecto, o multiculturalismo compreendido como “uma variedade de

articulações, ideais e práticas sociais” (HALL, 2006, p. 50), está presente na

proposta, mas não como uma única doutrina ou estratégia política, mas sim como

uma série de processos e estratégias políticas sempre inacabados. Isso não

significa que o multiculturalismo deva ser um princípio ético-político consolidado ou

aceito por todos os segmentos, pelo contrário, é justamente na sua controvérsia que

reside a sua importância.

Não se busca construir um projeto único, ignorando a diversidade e as especificidades de cada região, estado e comunidade. Ao contrário, o que se espera é que a escola, em cada local, assuma contornos próprios a partir do diálogo com a realidade em que está inserida. A autonomia da escola para construir o seu projeto político-pedagógico deve ser mais do que respeitada, estimulada. E os responsáveis por elaborar e colocar em prática esse projeto são os educadores (MEC, Anexo III, Resolução do Pró-Licenciatura, 2005).

A variedade dos ideais e das práticas sociais nos leva a pensar as

identidades sociais como construídas no interior das representações culturais, como

resultado de um processo discursivo e dialético, como afirma Hall (1997, p.35), de

identificação que permite que nos posicionemos no interior das definições que os

discursos culturais (exteriores) nos fornecem ou que nos subjetivemos (dentro

deles).

6 Entendida como formação no trabalho e pelo trabalho.

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147

Ainda no trecho acima citado do Anexo III, é possível observar a importância

dos educadores7. Esta importância se manifesta, sobretudo, na construção da

autonomia da escola, requerendo dos professores um posicionamento ético e

político que vai além das ações práticas para a transformação, configurando-se,

claramente, a partir da elaboração e proposição do Projeto Político da escola. É

emblemático o trecho “o professor que queremos é um profissional capaz de

contribuir para a construção dessa escola, preparado para propor e implementar as

ações necessárias à sua transformação”. Para tanto, são relacionadas competência

e habilidades que o professor deve possuir e grifamos os trechos na passagem a

seguir que, ao nosso ver, expressam a construção de novas identidades docentes.

1. formação teórica ampla e consistente, visão contextualizada dos conteúdos de sua área de atuação, de forma a garantir segurança em seu trabalho e viabilizar o estabelecimento de parcerias com vistas ao desenvolvimento de ações e à produção interdisciplinar; 2. formação ampla e consistente sobre educação e sobre princípios políticos e éticos pertinentes à profissão docente; 3. compromisso ético e político com a promoção e o fortalecimento da cidadania; 4. formação que permita entender a gestão democrática como instrumento para a mudança das relações de poder nas diversas instâncias do sistema educacional;5. domínio das tecnologias de informação e comunicação;6. freqüente comunicação com pares e com instituições de ensino e de pesquisa, inclusive com professores e pesquisadores de Instituições de Ensino Superior;7. capacidade de se manter permanentemente atualizado tanto em questões educativas como as de sua área de conhecimento e da produção científica e cultural;8. visão clara sobre quem são seus alunos e o espaço cultural em que se encontram estudantes e escola; 9. capacidade e segurança para migrar do papel de reprodutor de conhecimento produzido por terceiros para o de produtor de conhecimento, autor de seu projeto profissional e de bens culturais (incluindo propostas pedagógicas e materiais de apoio à educação);10. compreensão dos processos de aprendizagem de modo a ser capaz de trabalhar as diferenças individuais e necessidades especiais dos estudantes (MEC, Anexo III, Resolução do Pró-Licenciatura, 2005).

O uso das expressões “ampla” e “consistente”, em todos os momentos que se

faz referência ao conteúdo específico ou a formação docente, seguidas sempre

estão sempre contextualizadas. Esta conexão pode ser compreendida como uma 7 Grupo que compreende os professores – por nós aqui tomados como o todo.

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148

estratégia para deixar claro que a qualidade do professor não está centrada na sua

formação técnica, ou que o conteúdo não é a preocupação central do Anexo III. Ela

é necessária sim, mas não é a mais importante competência do professor. Um

docente com mais fragilidades nos conteúdos, mas que apresente uma visão de

mundo mais ampla e maior carga de leitura, poderá ter uma atuação mais efetiva do

que outro que domine os aspectos técnicos de sua disciplina efetiva, mas apresente

limitações em outras dimensões do trabalho docente. Assim, na abordagem do

Anexo III, o professor deverá ter uma formação teórica sólida, desde que ampla,

contextualizada e interdisciplinar.

No item 2, encontramos termos complexos como política e ética, que trariam

como consequência, o fortalecimento da cidadania. A proposta do Pró-Licenciatura

pressupõe que o professor - com um processo de formação voltado para o

fortalecimento da ação política e da ética como instrumentos de mobilização e

consolidação de sua própria cidadania - poderia tornar estes instrumentos tão

inerente à sua prática como indivíduo, que esta seria traduzida, de forma também

inerente à sua prática, como professor no contexto de sala de aula e da escola. É

uma suposição que não considera os diferentes espaços de atuação, dependendo

do contexto onde o professor está inserido; o que torna variável a intensidade do

perfil de sua cidadania. De qualquer forma, indica que uma das correntes teóricas

que fundamentam a proposta do Pró-Licenciatura é uma ação pedagógica voltada

para a educação cidadã.

Ainda sobre as competências estabelecidas para os professores,

encontramos a comunicação entre pares, compreensão do espaço cultural e

produção cientifica e cultural, incluindo a autoria legítima de materiais e artefatos

culturais. A proposta é que o professor abandone o seu papel de reprodutor e torne-

se produtor dos seus materiais. Cabe aqui uma reflexão sobre as múltiplas

identidades necessárias para que o professor abarque todos os níveis de

competência proposto no Anexo III. Analisando todos os dez itens propostos para o

“professor que queremos” podemos identificar o professor conteudista, o

politicamente atuante, o comunicador, o comprometido com a cultura, ética e a

política, sociólogo, o pesquisador e produtor de conhecimento acadêmico, o produtor

cultural, o especialista em necessidades especiais, o engajado, o contestador, o

autor de projetos, livros e outros materiais), apenas para citar algumas identidades

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que podemos atribuir aos diferentes agentes transformadores da escola. Uma

pergunta importante diante da questão do professor que queremos, é que professor

é este de fato ou, melhor ainda, em que campo de formação estamos

trabalhando para construir todas as identidades do professor. Para aprofundar

melhor a questão, é importante elaborar com mais propriedade o conceito das

identidades em nosso trabalho.

O conceito de identidades formulado por Hall (2006) surge em contraponto ao

sujeito iluminista, para o qual se apresentava uma idéia de identidade única,

imutável e que nascia e se desenvolvia ao longo da existência do indivíduo. O

segundo conceito de identidade apresentado pelo autor estabelece a noção de

sujeito sociológico com uma concepção de interação entre o sujeito e a sociedade

que é construída, mas sempre como uma projeção de nós mesmos nas identidades

culturais, ao mesmo tempo em que internalizamos seus significados e valores.

Assim, ocupamos o nosso espaço na sociedade, a partir de uma ligação do sujeito à

estrutura.

No contexto da pós-modernidade, segundo Hall (2006), o sujeito com uma

identidade unificada e estável está se tornando fragmentado, composto não de uma

única, mas várias identidades, algumas vezes contraditórias e não resolvidas (HALL,

2006, p.12). Os contextos sociais estáveis que serviam como referência e

identificação, nos quais era possível projetar as nossas identidades culturais,

tornaram-se variáveis e problemáticos.

Esse processo produz o sujeito pós-moderno, conceptualizado como não tendo uma identidade fixa, essencial ou permanente. A identidade torna-se uma “celebração móvel”: formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam (HALL, 2006, p.12-13).

Assim, temos dentro de nós identidades diferentes que aparecem em

diferentes momentos e à medida que os sistemas de significação e representação

cultural se multiplicam, somos confrontados por uma multiplicidade desconcertante e

cambiante de identidades possíveis, com cada uma das quais poderíamos nos

identificar – ao menos temporariamente (HALL, 2006, p13). Este aspecto é definitivo

para consolidar a proposta de que é possível que o professor apresente diversas

identidades, e que estas surjam diante de diferentes situações enfrentadas no

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cotidiano da escola. Da mesma forma que, para Hall, a existência de uma identidade

unificada durante toda a nossa vida é uma fantasia cômoda para criar uma história

sobre o nosso “eu”, a nossa concepção de uma única identidade para o professor –

e não podemos considerar como sinônimos de organizador, disciplinador, orientador,

entre outros, como diversas identidades – pode ser apenas uma criação cômoda

para encaixar um determinado perfil na figura do professor. Um exemplo concreto

desta afirmativa está no documentário de Amanda e Monik, um curta metragem

realizado pelo diretor André Costa que conta a vida de um travesti que é professor

de História na Educação Básica, em um pequeno município de Pernambuco. O

surpreendente no documentário é justamente o relato dos alunos e pais ao defender

o excelente trabalho desenvolvido pela “professora”. Surpreendente porque o

expectador do filme não esperava um olhar de normalidade diante de uma situação

considerada controversa, já que no imaginário da identidade do professor da escola

pública não cabe a imagem de um travesti.

Para compreender a existência de várias identidades é necessário

compreender também que as identidades modernas estão sendo descentradas, ou

deslocadas e fragmentadas. Este conceito de deslocamento está fundamentado nas

descontinuidades da modernidade, que não significa a ruptura completa e sua

substituição por outro modelo, mas sim, por um processo sem fim de rupturas e

fragmentações internas (HARVEY, 1993, p.12). Segundo Laclau (1990), uma

estrutura é deslocada quando o centro é deslocado, não sendo substituído por outro,

mas por uma pluralidade e centros de poder. Para o autor, as sociedades da

modernidade tardia, como é o nosso caso, são caracterizadas pela diferença, já que

são atravessadas por diferentes divisões e antagonismos sociais que produzem uma

variedade de posições de sujeito, isto é, identidades para os indivíduos.

Esta abertura para novas identidades significa que é possível, no processo de

formação docente, ampliar diversas dimensões no campo de atuação do professor

com as suas diferentes identidades e noção de pertencimento. De fato, a sensação

de pertencimento, mesmo que temporária, seria um importante instrumento para

consolidar o comprometimento com determinadas causas ou ideais. A postura de

resistência do professor diante dos entraves considerados como internos, embora

esteja sempre relatado no nível da função docente com expressões como “isso eu

não faço porque não faz parte do meu serviço”, vai mais além do que uma simples

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limitação no campo do trabalho. Ao construir e acreditar na existência de apenas

uma identidade docente, todos os elementos externos à escola, mesmo que

comprometam a aprendizagem dos alunos (que é a atividade fim do professor e da

escola) - sejam eles relacionados com a violência, fome, drogas, dinheiro - são

considerados pelo professor como um fator fora do seu controle e, como tal, fora da

sua identidade docente.

O professor disciplinador é capaz de impor regrar ao aluno traficante dentro

de sala de aula, porém se sentirá limitado ou impotente fora dela, mas de fato, a

tensão da violência ao lidar com um indivíduo potencialmente perigoso deveria estar

em toda a dimensão da escola ou mesmo da comunidade. É um fato curioso, pois a

maior parte dos professores estabelece limites territoriais para a sua atuação, seja

ela mais branda ou rigorosa, quase sempre respeitando os limites da sua sala de

aula “na minha sala eu permito isso, na minha sala não pode aquilo etc”.

Esta abertura para novas identidades significa que é possível, no processo de

formação docente, ampliar diversas dimensões no campo de atuação do professor

com as suas diferentes identidades e noção de pertencimento. De fato, a sensação

de pertencimento, mesmo que temporária, seria um importante instrumento para

consolidar o comprometimento com determinadas causas ou ideais. A postura de

resistência do professor diante dos entraves considerados como internos, embora

esteja sempre relatado no nível da função docente com expressões como “isso eu

não faço porque não faz parte do meu serviço”, vai mais além do que uma simples

limitação no campo do trabalho. Ao construir e acreditar na existência de apenas

uma identidade docente, todos os elementos externos à escola, mesmo que

comprometam a aprendizagem dos alunos (que é a atividade fim do professor e da

escola) - sejam eles relacionados com a violência, fome, drogas, dinheiro - são

considerados pelo professor como um fator fora do seu controle e, como tal, fora da

sua identidade docente.

O professor disciplinador é capaz de impor regrar ao aluno traficante dentro

de sala de aula, porém se sentirá limitado ou impotente fora dela, mas de fato, a

tensão da violência ao lidar com um indivíduo potencialmente perigoso deveria estar

em toda a dimensão da escola ou mesmo da comunidade. É um fato curioso, pois a

maior parte dos professores estabelece limites territoriais para a sua atuação, seja

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ela mais branda ou rigorosa, quase sempre respeitando os limites da sua sala de

aula “na minha sala eu permito isso, na minha sala não pode aquilo etc”.

O foco na escola busca assegurar que o investimento feito na formação do docente resulte em melhoria real na qualidade do ensino oferecido nas escolas das redes públicas. Assim, serão envidados esforços buscando estimular os demais profissionais da escola em que atua o professor-aluno desse Programa a participarem de programas de formação inicial ou continuada. Havendo um número significativo de docentes da escola envolvidos em programas de formação, ampliam-se as possibilidades de que as inovações tratadas em cada um desses programas possam ser experimentadas na escola com menor resistência por parte dos colegas, tanto do corpo docente como dos gestores. [...] Deve-se prestar especial atenção, neste sentido, aos gestores de escola (diretores, coordenadores, entre outros), estimulando sua participação em cursos de formação para gestores, como, por exemplo, os oferecidos pela Rede de Formação de Professores. Junto a esses se deve, também, buscar que apoiem os professores em formação viabilizando espaços para a experimentação de suas novas descobertas (MEC, Anexo III, Resolução do Pró-Licenciatura, 2005).

Este texto do Anexo III já apresenta o indicativo de outras políticas públicas

que seriam implementadas posteriormente, como a Escola de Gestores (concebida

também na modalidade a distância), realizada em parceria com as IES públicas. A

iniciativa da Escola de Gestores é a formação continuada específica de

coordenadores e diretores das escolas da rede pública municipal e estadual. O

movimento de transformação, embora focado na escola, propõe um trabalho intenso

de formação dos indivíduos e, que nela atuam de modo a consolidar outras

dimensões à cultura que perpassa na escola. Não utilizamos aqui o termo cultura

escolar ou cultura da escola por uma compreensão que a dimensão cultural é muito

mais ampla. Vamos abordar as questões que permeiam a escola como uma

estrutura organizacional e sua função social no campo dos Estudos Culturais no

próximo tópico.

5.4 A escola que queremos: um olhar sobre a dimensão cultural da escola

A ideia de mudança - seja na dimensão da produção, do trabalho ou da

educação - sempre perpassa a noção de uma cultura que precisa ser modificada. No

texto sobre Estudos Culturais de Frow e Morris (2008), esta questão é abordada,

citando a fórmula da retórica neoliberal de que os problemas econômicos precisam

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de soluções “culturais”, referindo-se a um complexo de expectativas, costumes e

valores sociais que afetam os nossos métodos de trabalho e não a um conjunto de

obras-primas ou a um domínio do prazer estético (FROW e MORRIS, 2008, p.315).

Ainda segundo os autores, a cultura propriamente dita é imaginada como um meio

plástico que as elites sociais politicamente poderosas podem reprocessar e

remodelar à vontade. O contexto neoliberal da produção e do trabalho compreende

a cultura como um meio de transformação do comportamento nas práticas de

trabalho, do cotidiano e da própria organização familiar. É uma perspectiva bastante

utilizada nas grandes corporações na qual o desempenho e a lógica do trabalho

devem ultrapassar os espaços da própria empresa e ser estendido ao ambiente

familiar, no qual os filhos e conjugues ornam-se uma espécie de passivo da

empresa, uma vez que estão contemplados nas ocasiões festivas, nos benefícios de

planos de saúde e alimentação etc. Nesse aspecto, os Estudos Culturais

contemporâneos também estabelecem uma conexão direta com o trabalho, mas

livre da subordinação à produtividade econômica e sem o moralismo e determinismo

da retórica neoliberal, como podemos observar na afirmativa a seguir:

Nesse contexto, também, a cultura é imaginada em uma conexão direta com o trabalho e sua organização; com as relações de poder e de gênero no local de trabalho, no lar, no bairro, na rua. Com os prazeres as pressões do consumo; com as complexas relações de classe e de parentesco através das quais forma-se uma noção do eu e do pertencimento; e com as fantasias e os desejos por meio dos quais as relações sociais são desenvolvidas e ativamente influenciadas (FROW; MORRIS, 2008, p. 316).

Esta abordagem é importante porque nos leva a refletir sobre as forças que

exercem o poder dominante de controle e de modelagem sobre a cultura. Hall (1997)

levanta a questão do papel do Estado, que em razão de suas políticas legislativas,

pode determinar a configuração da cultura, ou seria o mercado, a política e a

economia, através de sua “mão oculta” que de fato determinam os padrões de

mudança cultural?

Por que deveríamos nos preocupar em regular a “esfera cultural” e por que as questões culturais têm estado cada vez mais frequentemente no centro dos debates acerca das políticas públicas? No cerne desta questão está a relação entre cultura e poder. Quanto mais importante – mais “central” – se torna a cultura, tanto mais significativas são as forças que a governam, molda e regulam (HALL, 1997, 16).

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Quando pensamos na regulação das políticas públicas na cultura, o primeiro

indicativo é a comunicação, por meio das rádios e emissoras de TV. Porém, Hall

(1997) também questiona se o Estado “governa” a cultura, através do sistema

educacional, do arcabouço legal, do processo parlamentar ou por intermédio de

procedimentos administrativos. A importância de saber como a cultura é modelada,

controlada e regulada é que ela também regula nossas condutas e ações sociais.

Quando pensamos na dimensão da cultura da escola, como um conjunto de práticas

sociais e procedimentos, do mesmo modo que a cultura empresarial é uma forma de

influir, moldar, governar e regular, como os empregados se sentem e agem nas

organizações, podemos concluir que, uma vez que a cultura regula as práticas e

condutas sociais, é importante saber quem regula a cultura. No nosso caso, na

análise do Anexo III que retrata a política pública específica para formação de

professores a distância, sustentamos a tese de que a dimensão da cultura deixa de

estar subjacente ao corpo das diretrizes e normas (já que toda prática social tem

uma dimensão cultural), e assume um local de destaque na constituição dessa

política pública específica.

Cabe ressaltar que os cursos integrantes desse Programa deverão estar em consonância com as políticas educacionais do Ministério da Educação para o Ensino Fundamental e Ensino Médio. Além dessas, devem ser consideradas as políticas que dispõem sobre a inclusão escolar e social, o que significa possibilitar a acessibilidade curricular do aluno com necessidades especiais nas diferentes áreas do conhecimento, bem como as políticas que tratam das diversidades culturais e étnico-raciais brasileiras que permitem uma inclusão escolar mais igualitária. Outrossim, os referidos cursos podem ser elaborados de modo a atender a formação específica para professores que atuam em escolas do campo (MEC, Anexo III, Resolução do Pró-Licenciatura, 2005).

Apesar de garantir que os preceitos básicos legais da educação básica

devam ser mantidos, o Anexo III ressalta que o foco é a inclusão social e escolar,

considerando não apenas as necessidades especiais, mas também, a diversidade

em níveis sociais e étnicos como forma de aumentar as possibilidades reais de

equidade.

O percurso construído até aqui não pretende sistematizar um conceito de

cultura escolar ou cultura da escola, mas sim, ampliar a concepção de cultura em

diversos níveis da prática social, inclusive nas políticas de formação dos sujeitos da

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escola. Compreender este processo político fundamentado na cultura ou deixar

emergir novas identidades docentes se dá, sobretudo, porque não se pode pensar a

escola como um local que está isolado do contexto da sociedade, ou imune ao

processo de transformação que ocorre ao nosso redor, da mesma forma que não se

pode pensar que a escola é uma continuidade “natural” do que acontece na esfera

social. Se o processo fosse realizado de forma tão direta, a escola incorporaria os

avanços e as mazelas que acontecem em seu locus social e, de fato, o que se

verifica é que a escola determina quais são os elementos que são aceitos e os que

não são nesta transitoriedade.

Todos nós queremos o melhor para nossos filhos. Mas o que é a educação senão o processo através do qual a sociedade incute normas, padrões e valores – em resumo a “cultura” - na geração seguinte na esperança e expectativa de que, desta forma, guiará, canalizará, influenciará e moldará as ações e as crenças das gerações futuras conforme os valores e normas de seus pais e do sistema de valores predominantes na sociedade? O que é isto senão regulação - governo da moral feito pela cultura? (HALL, 1997, p. 40).

Assim, voltando ao Anexo III, no terceiro eixo, “a compreensão do educador

como sujeito capaz de propor e efetivar as transformações político-pedagógicas que

se impõem à escola”, a proposta é uma visão do educador como um sujeito

transformador da própria ação político-pedagógica dentro da escola, sinalizando

para uma necessidade de mudança nas propostas político-pedagógicos das

instituições escolares. É uma afirmativa que aponta para a constatação de que as

atuais práticas não estão cumprindo de forma efetiva os seus propósitos e que, nas

estratégias de formação docente, é necessário potencializar o desejo de mudança

dos professores.

Uma outra questão que permeia a afirmativa é a imobilidade ou morosidade

no processo de transformação nas escolas, como se o espaço escolar estivesse

engessado em princípios sólidos que resistem às modificações provocadas pelas

mudanças, sejam elas teóricas, na esfera das políticas públicas, ou até mesmo da

legislação. Ora, se existe uma renovação constante dos professores, mesmo que

em percentual quantitativamente menor que o total de docentes da escola, era de se

supor que ocorreriam mudanças ao longo do tempo, no sentido de renovação das

práticas pedagógicas ou escolhas teóricas. De fato, não é o que se verifica na

prática, independente do número de professores recém-formados que entrem na

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escola, ainda que estejam impregnados de todas as possibilidades pedagógicas

inovadoras, pouco ou quase nada é transformado. Assim, a menção clara ao

processo de mudança como foco central do Anexo III, apesar de parecer

redundante, evidencia uma preocupação premente com os rumos da escola.

Na mesma perspectiva, encontramos o 4° eixo, “a compreensão da escola

como espaço social, sensível à história e à cultura locais”, com uma referência ao

espaço escolar como um espaço social sensível à história e à cultura locais.

Podemos afirmar que a escola vai muito além da sensibilidade aos processos

históricos e culturais, ela é a própria expressão de ambos, refletindo e reproduzindo

todos os seus elementos. Segundo Araújo (2004), a escola faz a história, contudo

não sabe que a faz. Este autor assevera que:

A escola ao colocar dentro do espaço de uma sala de aula saberes para que pessoas, na condição de alunos, os conheçam, está trazendo a estrutura de sentimento que viabilizou a produção daquela cultura para dentro da sala de aula, ainda que no plano do inconsciente. [...] A cultura não tenho dúvida (e os antropólogos já comprovaram há muito), se faz em meio aos modelos inconscientes, mas a cultura escolar – que se dá no plano da historicidade, em uma instituição social politicamente definida – não pode trabalhar no plano do inconsciente, mas do consciente (ARAÚJO, 2004, p. 9).

Esta é uma questão muito apropriada porque ao invés de tratar a cultura

escolar como uma “entidade” indefinida, autônoma e onipresente, estamos

considerando que existe uma regulação de fato e, ao identificá-la, podemos

considerar as possibilidades de transformá-la. Um caminho apontado no Anexo III do

Pró-Licenciatura e ampliar os espaços da escola para uma interseção com a

comunidade, através de articulações que supõem um movimento duplo: tanto a

escola influenciaria a comunidade com aspectos da sua cultura, como também seria

influenciada por ela, amenizando o distanciamento que costuma existir entre elas.

Em documento elaborado pela Unesco também encontramos concordância com essa afirmação e se ressalta, ainda, a importância especial que tem a escola como ambiente social nos países em desenvolvimento. A escassez de espaços públicos de lazer, cultura e convivência social saudável para crianças e jovens faz recair sobre a escola, com grande freqüência, a responsabilidade de ser a única referência positiva de sociabilidade e formação para esse grupo. Esse fato traz vantagens e desafios para as escolas. Cabe-nos, portanto, perguntar não só que escola queremos, mas o que fazer de

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modo a contribuir para que ela cumpra o seu papel (MEC, Anexo III, Resolução do Pró-Licenciatura, 2005).

O papel aqui não é algo vago ou indefinido, pelo contrário, da mesma forma

que os pressupostos do “professor que queremos” foram elencados, também

encontramos no Anexo III os elementos necessários “para a escola que queremos”.

1. construir conhecimentos e competências e ampliar as já construídas ao longo da vida de seu alunado, viabilizando o desenvolvimento de novas e mais complexas estruturas e relações com o mundo real e com o conhecimento;2. oferecer a seus alunos sólida formação que os prepare, não só para seguir sua vida escolar, como para realizar as escolhas que a vida apresenta, a cada instante. Muito mais do que oferecer conteú-dos compartimentados por "áreas do saber", o ensino deve ter como foco as diversas dimensões da formação humana: a cognitiva, a cul-tural, a ética, a sóciopolítica e a afetiva. Para um país justo e igualitá-rio, não se pode reforçar a cultura do individualismo e da ambição por status econômico, em detrimento dos princípios éticos e de cida-dania; 3. oferecer educação que valorize tanto as dúvidas como as respos-tas e que leve os estudantes a desenvolver visão crítica do mundo real, do próprio conhecimento e de seus meios de produção;4. levar os alunos a entender o conhecimento humano como instru-mento de comunicação e de intervenção no mundo real;5. estar firme e vivamente ligada à comunidade em que se insere, trazendo para o universo da escola as questões cotidianas do meio em que se encontra. O que não significa um processo artificial de contextualização das disciplinas que ali são lecionadas, mas que os conhecimentos trabalhados tenham sentido e significado a partir da clareza de sua função social;6. contribuir para a inclusão digital oferecendo a estudantes e profes-sores acesso às chamadas TIC, Tecnologias de Informação e Comu-nicação, gerando competência para que sejam tanto leitores como autores nesses meios (MEC, Anexo III, Resolução do Pró-Licenciatu-ra, 2005).

Basicamente, os seis elementos caracterizadores da escola que queremos

evidenciam a preocupação com a função social da escola, propondo uma

perspectiva de formação e intervenção na realidade social, possível, através de uma

formação realizada em horizontes mais amplos, que extrapolam o caráter

conteudista ou formador para o mercado de trabalho. Aliás, este aspecto da

formação para o mercado, não está inserido em nenhum dos aspectos seja na

caracterização do professor ou da escola.

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As estratégias para a formação de professores (sempre enunciadas em

caráter de mudança, transformação ou construção), apresentam a estratégia do

programa para alcançar seus objetivos de transformação, por meio de dois itens

intitulados “a escola que queremos e o professor que queremos”. Ao propor que o

professor deverá “viabilizar o desenvolvimento de novas e mais complexas

estruturas e relações com o mundo real e com o conhecimento”; ou que “para um

país justo e igualitário, não se pode reforçar a cultura do individualismo e da

ambição por status econômico, em detrimento dos princípios éticos e de

cidadania”, estão agregados elementos subjetivos que são complexos para uma

posterior avaliação de sua aplicabilidade.

No Anexo III do Pró-Licenciatura são definidos critérios de avaliação para

implementação durante o processo de formação com o objetivo de “viabilizar o

acompanhamento ágil e minucioso de todas as etapas do processo e garantir a

eficiência em sua avaliação e a rapidez das intervenções que se fizerem

necessárias”. Embora não esteja detalhado que tipo de avaliação será realizada,

uma vez que ela ainda está em construção, está definida em linhas gerais uma

avaliação que

para controle, tanto interno como externo, da eficiência e da eficácia do trabalho, serão realizados diagnósticos ao início do Programa para avaliar: a) o conhecimento do professor-aluno sobre o conteúdo com que trabalha, sobre temas educacionais e capacidade de expressão escrita e de compreensão de texto; b) o domínio do conhecimento que apresentam alunos da escola em que atua o professor-aluno (MEC, Anexo III da Resolução CD/FNDE n° 34, 2005).

A operacionalização das ações e propostas em todos os itens da “escola que

queremos” precisa estar em consonância com os projetos político-pedagógicos que

foram desenvolvidos para os cursos de licenciatura no âmbito do Pró-Licenciatura.

Além dos elementos que já foram comentados aqui, o Anexo III apresenta um item

que contempla especificamente o Projeto Político-Pedagógico. É sobre a

configuração destes projetos, tanto na intenção do Anexo III, quanto na sua

aplicabilidade que vamos tratar a seguir.

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5.5 Um olhar sobre as propostas dos projetos político-pedagógicos

A identificação das bases epistemológicas e teóricas, assim como o discurso

e o interdiscurso, existentes nos documentos oficiais não costuma ser tarefa fácil.

Existem pesquisas que se dedicam exclusivamente (e exaustivamente, eu diria) a

analisar as diferentes dimensões em que esses elementos surgem nos discursos

oficiais. No caso do documento da nossa pesquisa, ocorre o contrário. As bases

teóricas estão explicitadas em todos os níveis de sua proposta, restando muito

pouco para desvelar como o não dito. É possível questionar se os idealizadores do

documento tinham clareza de seus propósitos ou se tinham certeza de como chegar

aos seus objetivos, mas o que eles pretendiam ao construir o documento do Pró-

Licenciatura ficou explicitado no texto. Um bom exemplo da intencionalidade

explicitada no documento está logo nos primeiros parágrafos, ainda na introdução

com a seguinte passagem:

Qualquer iniciativa que vise melhorar a qualidade do ensino deve eleger a escola como agente transformador. É o que afirmam diversos autores, entre eles Enguita (2004, p.46): “... as nações não nascem, mas se fazem... O principal instrumento deste processo é a escola, que serve para estender à massa da população o que sem ela não seria nada mais do que cultura da elite, ou de uma elite... (MEC, Anexo III, Resolução do Pró-Licenciatura, 2005).

Na nota de rodapé encontramos a referência ao autor citado no texto, cujas

obras referem-se ao poder de transformação social da escola, evidenciando que a

proposta do programa estava diretamente voltada para uma possível transformação

da escola, através dos professores. Por essa razão, a figura do professor é central

no documento, é por ele e com a ajuda dele que se pretende transformar a escola,

compreendida como locus e instrumento de transformação social. O uso dos termos

“a escola que queremos” e o “professor que queremos” não é uma mera apropriação

criativa, é sim um elemento determinante, no qual o sujeito do verbo “queremos” é o

próprio governo, representante de determinados grupos sociais atuando em razão

de uma política pública. Mas não somos ingênuos em acreditar que o uso de uma

determinada estrutura teórica ou a apropriação de determinados conceitos são

suficientes para garantir uma vontade de mudança, seja ela de qualquer natureza. A

ingenuidade não cabe em um trabalho de caráter científico e buscamos aprofundar a

análise do documento neste capítulo exatamente para não deixar dúvidas sobre os

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propósitos contidos na proposta. E é exatamente na análise da proposta para o

Projeto Político Pedagógico e sua posterior concretização nos cursos elaborados

para concorrer ao edital, que podemos encontrar elementos importantes para

ratificar a nossa perspectiva de análise.

As orientações estabelecidas no documento para a elaboração dos Projetos

Políticos Pedagógicos podem ser consideradas como bastante ambiciosas, quando

pensamos na realidade dos alunos e das IES públicas. Não se trata de não apostar

na possibilidade de mudanças ao longo do processo de formação, mas sim, de

supor que estas mudanças não acontecerão ao longo do processo, porém na

construção do próprio projeto. Os aspectos mais frágeis do documento estão

concentrados justamente na avaliação e na caracterização do PPP. Embora não

tenha efeito determinante, já vimos no quarto capítulo que o processo de seleção

das IES por intermédio dos editais, considerou a articulação dos projetos com as

orientações contidas no documento. A caracterização do Projeto Político Pedagógico

está apresentada da seguinte forma:

Está voltado para a construção de uma escola capaz de promover a formação integral dos alunos, educando-os para o exercício consciente da cidadania e adotando a perspectiva de articulação entre as áreas de conhecimento; possui foco na formação da identidade do professor; articula explicitamente teoria pedagógica e prática docente ao longo do curso; tem forte orientação interdisciplinar; apresenta discussão pertinente a questões inerentes ao jovem e ao adolescente; trata os diversos conteúdos de forma contextualizada; inclui no sistema de avaliação diferentes formas e instrumentos de avaliação formativa e somativa, inclusive valorizando a prática como educador do professor-aluno; usa material didático com suportes variados (mídias) entre eles, pelo menos, material impresso, inclusive livros publicados, material em vídeo (não obrigatoriamente desenvolvido para o Programa) e material em meio digital; leva, gradualmente, o educador a produzir material que viabilize compartilhar sua experiência. O que se busca é o desenvolvimento de capacidade de expressão e representação em algum meio que viabilize a troca com pares (MEC, Anexo III da Resolução CD/FNDE n° 34, 2005).

Os elementos citados no documento, como orientação para a caracterização

dos projetos político-pedagógicos, servem como uma referência dos indicadores

para uma possível aprovação no processo de seleção das IES que desejavam

apresentar seus projetos para aprovação e financiamento do MEC. Alguns dos

aspectos caracterizadores citados são recorrentes no documento com os

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referenciais de qualidade da EAD publicado pelo MEC em 2005. Porém, é no

relatório da Comissão Assessora para Educação Superior a Distância, publicado em

2002, que encontramos referências explícitas para a elaboração de projetos de

educação a distância.

Os dois documentos abordam o tema na mesma linha conceitual, e

considerando a similaridade no nome dos assessores dos dois documentos, é

provável que o relatório tenha servido de inspiração para a elaboração do Anexo III.

O projeto de educação à distância desenvolvido deve ser coerente com o projeto pedagógico e não pode ser uma mera transposição do presencial, pois possui características, linguagem e formato próprios, exigindo administração, desenho, lógica, acompanhamento, avaliação, recursos técnicos, tecnológicos e pedagógicos condizentes com esse formato. Em outras palavras, a educação a distância tem identidade própria, não estando limitada a uma concepção supletiva do ensino presencial (Relatório da comissão assessora para educação superior a distância, MEC, 2002).

Nos aspectos caracterizados do projeto político-pedagógico estão detalhados

os percursos necessários para que se construa uma proposta que realmente

alcance os objetivos do programa. Nesse item estão contemplados elementos que

serão utilizados posteriormente no processo de avaliação das propostas

encaminhadas para o MEC, e a aprovação (ou não) dos projetos dependerá da sua

articulação eficiente. Ainda no mesmo item, o documento separa as estratégias que

levam e possibilitam o professor-aluno a construir a sua aprendizagem. No primeiro

caso, o projeto político-pedagógico deverá levar o professor:

a. manter um registro regular por escrito de suas atividades, um diário de bordo ou portfólio, onde constarão a evolução de seu aprendizado, as descobertas que realizou, as experiências que vivenciou etc: será uma memória viva de seu processo; b. desenvolver, ao longo do curso, uma monografia e pelo menos um produto em suporte ou meio de comunicação não exclusivamente textual, como, por exemplo, animação, simulação ou hipertexto (MEC, Anexo III da Resolução CD/FNDE n° 34, 2005).

Os elementos apontados sugerem estratégias para que o professor possa

desenvolver a sua produção e são utilizadas palavras como portfólio, diário de

bordo, animação, simulação e hipertexto como referenciais de orientação

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pedagógica das atividades, sem o detalhamento do seu uso. Mais adiante, o termo

possibilitar é usado para designar as seguintes ações do professor-aluno:

a. ampliar sua formação no conteúdo específico de sua disciplina; b. atualizar-se nos conteúdos, tratando dos temas contemporâneos da pesquisa em sua área; c. aprofundar-se em questões pedagógicas, sócioculturais e temas contemporâneos, tais como juventude, cidadania, gestão democrática, entre outros, sempre buscando aproximar teoria e prática; d. experimentar e aprimorar práticas de ensino-aprendizagem; e. estabelecer vínculos entre os conteúdos das diversas áreas do conhecimento; f. criar propostas concretas de integração das diferentes áreas do conhecimento; g. tratar o conhecimento de forma contextualizada, tendo em conta a realidade social e cultural de sua região; h. produzir materiais de apoio à prática docente; i. discutir o papel social da escola e suas relações com a comunidade; j. criar propostas de intervenção social da escola; k. trabalhar com tecnologias de informação e comunicação (MEC, Anexo III da Resolução CD/FNDE n° 34, 2005).

Como podemos observar, são ações bastante arrojadas e também

ambiciosas se consideramos o conservadorismo predominante nos projetos político-

pedagógicos dos cursos voltados para a formação de professores. Porém, como

seria a sua aplicação efetiva? Seria possível identificar os elementos citados no

documento nos projetos apresentados pelas IES participantes? Poderíamos

encontrar elementos do campo dos Estudos Culturais nas propostas pedagógicas?

Para encontrar respostas às questões aqui colocadas, escolhemos o Projeto

Político-Pedagógico da Universidade Federal do Rio Grande do Norte,

especificamente o curso de Licenciatura em Matemática a distância, mantendo o

recorte do Consórcio Nordeste Oriental proposto no percurso metodológico da

pesquisa. Não pretendemos realizar uma análise extensa de todos os elementos

presentes no referido projeto, o nosso foco é buscar apenas os elementos citados no

documento, observando como eles foram apropriados na construção do PPP

específico do curso, na sua relação direta com os aportes teórico-metodológicos

aqui privilegiados.

No curso de Licenciatura em Matemática da Universidade Federal do Rio

Grande do Norte, a proposta do projeto político pedagógico está fundamentada no

desenvolvimento de temas geradores na perspectiva de Paulo Freire. O foco é na

multidisciplinaridade, com objetivo claro de buscar o diálogo com outras

licenciaturas. O tema escolhido para o desenvolvimento das estratégias de

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aprendizagem foi o semi-árido, não apenas no contexto físico da seca, mas também,

em todas as matizes culturais em que ela se apresenta.

A seca e a falta de um manejo adequado dos recursos hídricos são costumeiramente apontadas pela população como uma das causas das mazelas sociais que atingem a região. Faz parte do discurso e da compreensão da sua própria situação, entender que ocorre fome porque o que se planta não “vinga” por falta de água. Assim, em uma região tradicionalmente agrícola, não ter como sobreviver da agricultura significa não ter outra fonte de renda. O resultado natural é a migração para os espaços urbanos: a seca agindo como fator de expulsão e as oportunidades dos grandes centros, como fator de atração. É nesta realidade que os futuros professores, graduados por este curso, irão atuar. Seca e água foi, então, o tema gerador escolhido para nortear os conteúdos deste currículo. Seca, por ser o tema local apontado como gerador de problemas de vida; água, como uma questão mais global, que avança na questão específica da seca. As respostas às questões problematizadas serão buscadas nos conteúdos específicos da área (UFRN, 2004, p.10).

A inserção do tema gerador é realizada não apenas considerando os aspec-

tos físicos da questão, como se poderia esperar de um curso na área de exatas. O

tema é tratado com foco no seu arcabouço cultural, na vivência e no senso comum.

A expressão “vinga”, é um bom exemplo do tratamento, assim como a relação entre

o semi-árido e a questão da fome dos movimentos migratórios. Uma opção como

essa aponta para a certeza de que nenhum conhecimento técnico-científico será

apropriado e reproduzido se estiver descontextualizado da realidade, entendida aqui

como o contexto cultural. Para tanto, é necessário definir um percurso para atingir os

objetivos da aprendizagem e a escolha no projeto está sustentada nas questões

problematizadoras para realizar a contextualização necessária com os conteúdos

apresentados. Na aplicação da problematização da questão, surge a perspectiva da

aprendizagem adotada. Como veremos adiante, a concepção de aprendizagem ado-

tada no PPP é fundamental para manter a coerência e a eficácia no processo de en-

sino-aprendizagem. Nesse caso específico, além da opção por temas geradores fun-

damentados na perspectiva freireana e as questões problematizadoras, o elemento

central para a construção da aprendizagem é a cooperação e colaboração.

O PPP aborda uma perspectiva de aprendizagem cooperativa e/ou

colaborativa como estratégia para a construção da autonomia individual, com ênfase

no referencial coletivo. É um paradoxo interessante abordado no projeto, a partir do

reconhecimento que a modalidade necessita do desenvolvimento da autonomia,

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para alcançá-la é necessário o referencial do grupo social, uma vez que a

metodologia adotada como referência é a dialógica freireana. O diálogo é mantido

ao longo do processo de aprendizagem e a função do tema gerador não é apenas

motivar ou iniciar a problematização sobre o assunto. Ele é utilizado para a

organização curricular e as disciplinas são escolhidas seguindo dois eixos

norteadores: a apreciação das questões surgidas, a partir do tema gerador, e as

indicações explicitadas nas diretrizes curriculares do MEC. Vejamos como a

estratégia é aplicada nas disciplinas do primeiro semestre.

Elegeu-se o primeiro semestre como aquele que fará o aluno refletir sobre sua realidade. A disciplina “Ciências da Natureza e Realidade”, como pode ser visto em sua ementa, propõe atividades eminentemente práticas, de levantamento de dados e informações sobre a realidade local do aluno, buscando compreender os problemas ambientais acarretados pela seca. Do mesmo modo, a disciplina “Educação e Realidade” propõe uma aproximação concreta com a realidade social e cultural, visando compreender os conflitos ambientais. Ressalte-se que o termo “conflito” aparece aqui com o seu significado sociológico, de problemas que são percebidos como tal pela população (UFRN, 2004, p.11).

A proposta de aproximação da realidade social e cultural vai ao encontro das

propostas do documento do MEC, abrangendo as questões ambientais mesmo as

que não estão compreendidas de forma clara para a população. A busca de dados e

informações, com a consequente problematização, pode despertar no aluno

questionamentos que provavelmente sequer estavam explícitos em seu cotidiano. A

orientação contundente no documento para o desenvolvimento da produção

acadêmica e prática do professor-aluno é contemplada de forma bastante

estruturada no PPP, ao assegurar que a instrumentação do ensino, “deverá

capacitar o aluno a leitura crítica de livros e textos científicos, o desenvolvimento de

materiais instrucionais, teóricos e experimentais, próprios para o ensino fundamental

e médio habilitando-o a transpor o seu aprendizado para sala de aula” (UFRN, 2004,

p.11).

Na estrutura curricular estão previstas 200 horas de atividades de caráter

científico-cultural, que abrangem vários elementos contidos no documento do MEC,

tais como presença em vídeo-conferência, colaboração em feira de ciências,

apresentação de seminários, participação em mini-cursos, apresentação de

trabalhos em Congressos, desenvolvimento de projeto de Extensão Universitária,

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desenvolvimento de projeto de ensino de Matemática, publicação de artigo em

periódicos indexados, publicação de artigos em revistas ou jornais de divulgação

local ou regional, monitoria, trabalho de campo, atividades culturais, entre outras

atividades. A referência as atividades de pesquisa e extensão é um dado

interessante, já que uma das grandes lacunas na modalidade a distância é

justamente a inexistência de atividades de pesquisa e extensão com os alunos.

Os elementos do item “professor que queremos” também é contemplado no

PPP, uma vez que a formação do curso tem como objetivo formar um perfil de

professor de Matemática que, além do domínio do conteúdo específico, também

deverá apresentar:

Visão de seu papel social de educador e capacidade de se inserir em diversas realidades com sensibilidade para interpretar as ações dos educandos; visão da contribuição que a aprendizagem da Matemática pode oferecer à formação dos indivíduos para o exercício de sua cidadania; visão de que o conhecimento matemático pode e deve ser acessível a todos, e consciência de seu papel na superação dos preconceitos, traduzidos pela angústia, inércia ou rejeição, que muitas vezes ainda estão presentes no ensino-aprendizagem da disciplina (UFRN, 2004, p. 7).

Outros aspectos relacionados com a transformação da escola e da própria

prática do professor também são abordados no PPP, em consonância com as

orientações do documento, sobretudo, no item “a escola que queremos”.

Elaborar propostas de ensino-aprendizagem de Matemática para a educação básica; analisar, selecionar e produzir materiais didáticos; analisar criticamente propostas curriculares de Matemática para a educação básica; desenvolver estratégias de ensino que favoreçam a criatividade, a autonomia e a flexibilidade do pensamento matemático dos educandos, buscando trabalhar com mais ênfase nos conceitos do que nas técnicas, fórmulas e algoritmos; perceber a prática docente de Matemática como um processo dinâmico, carregado de incertezas e conflitos, um espaço de criação e reflexão, onde novos conhecimentos são gerados e aperfeiçoados continuamente (UFRN, 2004, p. 8).

Não podemos esquecer que o PPP refere-se ao curso de Matemática, na

área das ciências exatas, cujo perfil esteve sempre associado com processos rígidos

de formação e pouca flexibilidade na aprendizagem. O PPP propõe de forma clara,

que a ênfase da aprendizagem seja estabelecida em conceitos, e não em fórmulas,

em clara alusão aos métodos tradicionais de memorização da disciplina. Mais do

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que um novo modelo para ensinar e aprender Matemática, o PPP propõe a

construção de uma visão crítica do professor, em relação aos conteúdos e as

propostas curriculares da disciplina na Educação Básica. É interessante que a

palavra conflito aparece pela segunda vez no PPP, a primeira referindo-se aos

conflitos ambientais e a segunda, referindo-se aos conflitos da prática docente.

Poderíamos perceber o conflito pontuado no projeto como um processo de

transição, entre o conservador e o inovador, entre a estrutura existente e uma nova

proposta a ser construída, tanto em relação ao conteúdo e as práticas da disciplina,

como também a escola e os próprios professores. Há também espaço para a

compreensão do conflito na implementação de uma modalidade que propõe uma

formação diferenciada para um público que não apresenta pré-requisitos para o

enfrentamento de uma nova forma de aprender de forma tranquila e indiferente. Na

formação apresentada, exatamente por questionar paradigmas e ser nova para

todos os envolvidos (professores e alunos), existirá também o conflito, seja na

adaptação, aceitação ou na configuração dos novos caminhos propostos da

aprendizagem mediada por tecnologias.

A inserção da tecnologia está prevista no PPP para ser realizada, a partir do

contato do aluno com os materiais, uma vez que foi previsto o uso de materiais em

mídias diversas para complementar o material impresso. Aliás, o uso do material

impresso é justificado no projeto devido às condições sócio-econômicas do público

alvo do curso, embora seja assegurado que novas mídias seriam incorporadas

durante o desenrolar das atividades do curso.

A separação física entre os sujeitos faz ressaltar a importância dos meios de aprendizagem. Os materiais didáticos devem ser pensados e produzidos dentro das especificidades da educação a distância e da realidade do aluno para o qual o material está sendo elaborado. Da mesma maneira, os meios onde esses materiais serão disponibilizados. Aqui entende-se que a realidade do nordeste brasileiro ainda vai comportar principalmente material impresso, áudio e vídeo. No entanto, não se pode deixar de ter em conta o avanço dos meios informáticos e digitais, sobretudo como uma tecnologia que facilita em grande medida a comunicação, a troca e a aquisição de informação. É neste sentido que, mesmo investindo preferencialmente em materiais impressos, não se pode abrir mão de projetar também a elaboração de materiais para web, ou a utilização de mídias digitais, como o CD-ROM (UFRN, 2004, p. 26).

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Um aspecto importante sobre os materiais desenvolvidos é o processo de

validação que foi pensado pela Instituição. A ideia é que os materiais sejam

desenvolvidos pelos professores das disciplinas e validados por meio de três ações:

utilização nos cursos presenciais da UFRN, sobretudo em turmas do PROBÁSICA

por estarem inseridas em uma realidade semelhante a que se quer alcançar; oferta

de cursos de atualização para professores da rede pública de ensino e em estudos

feitos pelos alunos do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências.

A avaliação das disciplinas proposta está nos princípios da avaliação

formativa e continuada, englobando várias atividades. No corpo do texto fica

expresso o desejo de realizar uma avaliação diferenciada, mas com a preocupação

de seguir os princípios normativos da Universidade, mesmo que não sejam os mais

adequados para a modalidade. Assim, a proposta prevê a avaliação realizada,

sugerindo diferentes atividades, mas atreladas ao sistema de auferir notas, previsto

na Resolução da UFRN.

Auto-avaliação, através de exercícios disponíveis ao final de cada unidade do programa, de modo que o próprio aluno tenha condições de saber do seu desempenho; avaliações individuais escritas, presenciais, sendo duas por cada período letivo; avaliação individual feita pelo tutor presencial, onde se observará o andamento do processo de aprendizagem, da motivação, do empenho do aluno, muito mais do que a aquisição de conteúdos; avaliação das atividades grupais feitas pelo tutor presencial, onde se observará o funcionamento do grupo e dos indivíduos dentro do grupo, bem como o rendimento dos processos coletivos. Esta avaliação será feita sempre que a disciplina desenvolver atividades desta natureza; avaliação final sob a forma de um trabalho escrito monográfico ou relato de pesquisa desenvolvida a partir dos dados da realidade do aluno (UFRN, 2004, p. 24).

Procuramos discutir neste tópico os aspectos relacionados com a construção

de um Projeto Político-Pedagógico como resultado das proposições realizadas no

documento de análise do Pró-Licenciatura. O PPP ainda é o ponto frágil na

elaboração dos cursos na modalidade a distância porque não clarificam as

propostas um processo diferenciado de aprendizagem e costuma aparecer colagens

de diferentes propostas pedagógicas. Sabemos que a análise de um só projeto não

pode retratar a realidade de todos, mas o nosso objetivo ao realizar esse percurso

era mostrar que existe a viabilidade em se desenvolver propostas diferenciadas,

mesmo que elas não atendam com sucesso todos os pressupostos de um curso de

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excelência em EAD. A proximidade entre o documento do Anexo III do MEC e as

referências no corpo do Projeto Político-Pedagógico da UFRN são muitas e apontam

para uma decisão em seguir as orientações contidas no documento.

Existem muitas pesquisas concentradas em aspectos pontuais da EAD, como

os ambientes virtuais, a interatividade, os professores, o uso das tecnologias e as

suas ferramentas. O que pretendemos mostrar aqui, é que todos esses elementos

não devem existir de forma isolada dentro de um curso a distância, eles precisam

estar ligados de forma direta e inequívoca com o Projeto Político-Pedagógico dos

cursos. Buscar compreender o uso das tecnologias sem analisar qual o enfoque e as

ações previstas no respectivo PPP, é sugerir que alguns elementos podem surgir de

forma isolada e dissociada do resto na EAD. Todos os cursos realizados na

modalidade a distância estão vinculados a determinadas concepções de

aprendizagem. Compreender essas concepções e como elas se estruturam dentro

dos projetos é um passo importante para analisar as práticas realizadas na EAD,

como veremos a seguir.

5.6 A inserção das tecnologias de informação e comunicação

Uma questão inquietante que motivou a realização dessa pesquisa estava

relacionada com as reais motivações para o governo optar por implementar cursos

na modalidade a distância. As justificativas óbvias apontadas na época por pessoas

que eram contra a EAD não respondiam às questões complexas que estavam

relacionadas com a EAD. O argumento mais óbvio estava centrado no barateamento

do ensino superior, na precarização das relações de trabalho e na economia que o

Estado faria ao implementar cursos a distância. Embora o custo aluno seja menor do

que o presencial, esta relação reside no fato da estrutura da EAD ser muito mais

enxuta na atual conjuntura do que nas IES públicas. É preciso ressaltar que os

cursos a distância até o presente momento estão focados apenas no ensino, não

são realizadas ainda atividades de pesquisa e extensão que, por consequência,

diminuem o custo aluno em comparação com o ensino presencial. Por outro lado,

não é possível insistir na afirmativa de barateamento considerando que a

implementação de cursos a distância exige uma infra-estrutura tecnológica que inclui

equipamentos, conexões e desenvolvimento de soluções bastante consideráveis. A

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produção de materiais impressos e em diferentes mídias também requer

investimento em pessoal especializado e equipamentos. Assim, a questão da

diminuição dos custos não explicaria a opção pela EAD.

Exatamente em função das especificidades da EAD, em relação ao uso das

tecnologias, buscamos no documento as referências diretas e subjacentes ao

objetivo mais amplo em relação ao seu uso pelos professores durante o seu

processo de formação. Afinal, como a tecnologia é abordada nas diretrizes de uma

proposta de cursos de graduação a distância para formação de professores? O

caráter de inovação é sempre simplista, pois existe uma tendência em se afirmar

que o uso das tecnologias “inova” o processo educativo, mas este processo quase

nunca é detalhado ou apresentado com começo, meio e fim. A inovação não é um

processo natural do desenvolvimento de uma sociedade e tampouco o será na

educação mediada por tecnologias. Pelo contrário, o uso da tecnologia vem se

tornando um dispositivo de poder (FOUCAULT, 2005) apropriado por sujeitos dentro

da escola que determinam a sua inserção, tanto do ponto de vista da quantidade do

seu uso (horários e pré-requisitos para utilização dos equipamentos), quanto para a

qualidade do seu uso (restrição ao acesso de sites e softwares).

A partir desses pressupostos, voltamos ao documento e o que encontramos

nele sobre a questão do uso das tecnologias. O 5° eixo aborda a questão da

inclusão digital, uma questão complexa que vem sendo tratada como política pública

fora dos espaços escolares, afirmando que “a ação afirmativa de inclusão digital,

viabilizando a apropriação pelos educadores das tecnologias de comunicação e

informação e seus códigos” (MEC, Anexo III, Resolução do Pró-Licenciatura, 2005).

Mais adiante, no item sobre as diretrizes pedagógicas do programa, está reafirmada

a necessidade do uso das tecnologias como condição essencial para a escolha da

modalidade a distância como estratégia de formação de professores.

[...] os professores-alunos terão acesso às Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) com a possibilidade de usar, no mínimo, computadores com acesso à INTERNET e à programação da TV Escola. Uma das finalidades explícitas do Programa é ser uma ação de inclusão digital, viabilizando que os professores venham a ser proficientes nos códigos e linguagens das chamadas TICs (MEC, Anexo III, Resolução do Pró-Licenciatura, 2005).

A proposta apresentada para o uso das tecnologias no Anexo III já se mostra

problemática no próprio conceito de inclusão digital e em seu contexto de

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apropriação das tecnologias por educadores. Para discutir essa questão, buscamos

em Bonilla (2004) a conceituação do que seja a inclusão digital. Esta autora parte do

diagnóstico sobre esta questão em vários países do mundo e também no Brasil,

para em seguida considerar que:

A inclusão digital está sendo vista como a capacidade da população inserir-se no contexto das tecnologias de informação e comunicação como consumidora de bens, serviços e informações, o que demanda apenas a oferta de treinamento para a aquisição de competências básicas para o manuseio dessas tecnologias (BONILLA, 2004, p. 7).

Esta mesma autora questiona o que está sendo chamado de inclusão - uma

vez que, estar inserido na sociedade informacional significa aceitar que existe uma

forma hegemônica, um único discurso possível do mundo no qual estar incluído -

significa ser consumidor de produtos, bens, serviços e informações. Santos (2001)

argumenta que existe uma contradição básica no capitalismo que, ao mesmo tempo

em que ele gera exclusão, necessita reintegrar ao sistema pelo menos uma parte

dos excluídos para garantir a continuidade do sistema econômico. Para Bonilla

(2004), é preciso escapar deste modelo inclusão/exclusão e pensar a inclusão digital

como algo mais abrangente, que implique em que aquele que está incluído é capaz

de participar, questionar, produzir, decidir, transformar; é parte integrante da

dinâmica social em todas as suas instâncias (BONILLA, 2004, p.8). Para a autora,

trabalhar a inclusão digital nesta perspectiva exige vontade e ação política, que vai

além da equidade na acessibilidade ao aparato tecnológico. A tecnologia por si só

não produz nada, é o seu uso e sua apropriação, sobretudo no aspecto ideológico

que fará a diferença.

Não basta a universalização do acesso às tecnologias. Esta é uma condição necessária, mas insuficiente. É preciso investir na democratização do uso, ou seja, na participação efetiva da população, de forma que tenham a capacidade não só de usar e manejar o novo meio, mas também de aprender, prover serviços, informações e conhecimentos, articular redes de produção que permitirão e potencializarão a emergência do novo, a proposição, a efervescência da diversidade (BONILLA, 2004, p. 3).

Se a inclusão digital já é um conceito controverso no âmbito da sociedade

informacional, quando pensando no interior da escola, ou a partir dela, a situação

assume uma dimensão muito mais complexa. Constantemente encontramos o

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discurso da resistência do professor ao uso da tecnologia, mas nem mesmo essa

resistência é devidamente caracterizada. Se não discutimos como e para que usar

as tecnologias, torna-se difícil afirmar que existe resistência dos professores nesta

ou naquela direção. Podemos encontrar o controle no uso por parte dos gestores,

com suas restrições e imposições de regras de conduta na utilização dos

equipamentos e não podemos considerar apenas os computadores nessa situação,

mesmo os equipamentos de áudio, vídeo e até mesmo os retroprojetores estão

inseridos no mesmo quadro. Por outro lado, afirmar que um professor é resistente

porque se recusa a usar o laboratório de informática para ensinar digitação para os

seus alunos não significa que seja resistente da mesma forma que o professor que

aceita realizar este tipo de atividade, pois não está contribuindo em nada para a

inserção dos alunos no universo digital.

Muitas escolas hoje, no Brasil, já possuem laboratórios equipados com computadores, e com conexão Internet, mas quem normalmente os utiliza é um professor específico da área de tecnologia. A maioria dos professores das escolas não faz uso desses laboratórios para trabalhar com os alunos, porque não existe, por parte das instituições, uma política de inserção dos mesmos nesse contexto. Não é oportunizado aos professores tempo para estudar, discutir, analisar as potencialidades do uso das tecnologias na educação. Também não são oportunizadas condições para que interajam com elas. Toda proposta depende da iniciativa particular de cada um. Acredita-se que cada professor deve buscar por conta própria sua inserção, e que isto é o suficiente (BONILLA, 2004, p. 11).

Em relação aos equipamentos necessários para a estrutura dos polos, o

documento é bem específico na descrição da estrutura mínima necessária para

atingir os objetivos propostos. Mesmo tendo sido elaborada em 2005, antes das

ações que possibilitaram a existência de uma curva descendente nos preços dos

equipamentos, a lista apresentada no documento já revela preocupação não apenas

com o uso dos artefatos digitais, mas também, com a produção de materiais, uma

vez que inclui placa de captura de vídeo, som, gravador de DVD, digitalizador de

imagens e webcam.

Laboratório de informática ligado à INTERNET com os seguintes equipamentos: i. computadores em rede e equipados com, pelo menos, porta USB, CD-Rom, placas de som, alto falantes e microfone. Cada laboratório deve ter, pelo menos, um equipamento dotado de placa de captura de vídeo (amadora) e um vídeo-cassete ou DVD; ii. pelo menos um computador deve ter placa de fax modem

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para ser utilizado como acesso emergencial à internet e como aparelho de fax sempre que necessário; iii. pelo menos um computador deve ter gravador de DVD; iv. pelo menos uma impressora no laboratório, se possível duas: uma PB a laser e uma colorida a jato de tinta; v. um digitalizador de imagens (scanner); vi. uma webcam (MEC, Anexo III, Resolução do Pró-Licenciatura, 2005).

Outra questão interessante é que a compreensão no Anexo III sobre as

tecnologias digitais não estava restrita ao uso dos computadores e seus

equipamentos periféricos. A televisão e o DVD são também contemplados no

processo, incluindo a programação da TV a cabo, a produção da TV Escola e o uso

de acervo de filmes. Considerando que a TV Escola foi uma das primeiras ações

governamentais para o desenvolvimento da formação a distância, nada mais

coerente do que a sua inserção e aproveitamento dos materiais desenvolvidos na

EAD.

Sala de TV com acesso à TV Escola e às tevês abertas. Se for tecnicamente possível na região, será disponibilizado acesso às tevês a cabo. Essa sala deve estar equipada com o kit básico da TV Escola. Deve incluir um DVD player e um gravador de DVD ou dois videocassetes para permitir cópia e edição do material em vídeo, a ser usado em sala de aula pelo professor. Serão aproveitados centros, espaços em escolas ou aqueles que já disponham de parte desses recursos os quais deverão ser adaptados e otimizados para atender à estrutura esperada pelo Programa (MEC, Anexo III, Resolução do Pró-Licenciatura, 2005).

A abordagem do uso das tecnologias na formação do professor está

contextualizada não apenas com o uso das ferramentas para a sua aprendizagem,

mas também, para proporcionar meios para que ele se aproprie do uso das

tecnologias para o desenvolvimento de novas práticas em sala de aula. Assim, não

basta fornecer o conhecimento específico dos artefatos tecnológicos, é necessário

pensar ainda durante o processo de formação, em que como todos os artefatos

poderão ser apropriados e utilizados na sala de aula. Como os professores no

programa continuam exercendo as suas atividades em sala de aula, o processo

pode ser experimentado e revisto a todo instante. Uma vez apresentado um desafio,

procedimento ou uma determinada técnica, o professor poderá executá-la e

observar os aspectos positivos e negativos, compartilhando com os seus colegas a

sua experiência.

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Na proposta de formação concomitantemente com a prática profissional, nós

podemos pensar em dois aspectos distintos. Um é que o professor por já exercer

uma prática pedagógica consolidada, encontre mais dificuldades e resistências em

elaborar mudanças. Outro é que as propostas de atividades e reflexões realizadas

no curso sejam tão motivadoras que levem o professor a refletir sobre a sua prática

e deseje não apenas modificar o seu próprio processo de trabalho, mas que também

motive outros colegas a fazê-lo. É possível que existam os dois perfis em todas as

turmas do programa, no entanto, é fato que dificilmente um professor durante o seu

processo de formação fique indiferente ou não realize algumas das propostas

apresentadas.

Diante das estratégias apresentadas no contexto do uso das tecnologias na

educação, podemos afirmar que o documento propõe uma ação diferenciada. O eixo

seis finaliza a proposta geral do documento com a afirmativa “o estímulo à

construção de redes de educadores para intercâmbio de experiências, comunicação

e produção coletiva de conhecimento” (MEC, Anexo III, Resolução do Pró-

Licenciatura, 2005).

Será disponibilizado ambiente virtual de aprendizagem para promover a interação não só entre os professores-alunos como entre esses e os tutores e entre os próprios tutores. Este ambiente disponibilizará tanto o material criado ou adquirido para ser utilizado no curso como a produção dos professores-alunos. Um dos focos de todo o trabalho desenvolvido pelos professores-alunos deve ser a criação de materiais para serem publicados no sítio e que propiciem a socialização e interação com seus pares. Essa experiência de troca continuada e regular deve contribuir para que o processo de formação ultrapasse os limites tanto temporais com espaciais e de público do curso. Recomenda-se o ambiente e-Proinfo (MEC, Anexo III da Resolução CD/FNDE n° 34, 2005).

Antes de detalhar a questão da formação de redes no contexto da formação

de professores, é preciso lembrar que a elaboração deste documento foi realizada

no ano de 2005, e como a publicação foi realizada em agosto, é bem provável que a

sua construção tenha se iniciado bem antes. Mesmo considerando 2005 como ano

base da produção das questões sobre o uso das tecnologias, já contabilizamos

quatro anos completos desde a sua publicação. Em termos de desenvolvimento

tecnológico, não é exagero dizer que os quatro anos correspondem a uma década

na relação inovação/obsolescência. Assim, verificamos que o documento é bastante

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arrojado na proposta de hardware e justifica a construção superficial das ações para

a formação de redes. Mesmo assim, pensar na formação de redes, sobretudo as

sociais, no contexto de 2005, quando todas as experiências de EAD existentes no

Brasil estavam atreladas aos princípios da educação tecnológica, é realmente um

aspecto bastante positivo da proposta.

O trecho do documento selecionado anteriormente trata de uma questão

muito importante que está além da formação das redes. Estamos nos referindo ao

processo de criação e compartilhamento da produção realizada, algo ainda

incipiente quando pensamos na nossa formação cultural proprietária. A ideia de

compartilhamento ultrapassa a esfera apenas da troca entre os professores-alunos

do curso, ela deseja e propõe que essa troca seja realizada entre diferentes

pessoas, de diversos lugares, em qualquer tempo. Ou seja, é um sentido mais

amplo de que o modelo de formação proposta não está restrito apenas ao grupo de

professores oficialmente matriculados, mas que extrapola esse público e se aplica

em todos aqueles que estão envolvidos com educação.

A formação de uma grande teia encontra a sua viabilidade nos usos das

tecnologias digitais, já definida por Castells (2003), como uma “transformação

tecnológica que se expande mediante uma linguagem digital comum na qual a

informação é gerada, armazenada, recuperada, processada e retransmitida”

CASTELLS, 1999, p.68). Essa reflexão é muito importante porque não se trata de

“treinar” o professor para ser apenas um consumidor dos produtos tecnológicos

disponíveis no mercado, mas sim, utilizar a tecnologia como um instrumento de

colaboração e compartilhamento de informação através da formação de redes. É

uma proposta mais ampla para reunir as questões do emponderamento através da

informação diretamente vinculada à educação, no qual as redes de informação são

viabilizadas pelo uso da tecnologia, como afirmam Pretto e Amadeu (2008).

O poder, a cultura, a educação e as formas de distribuição de riqueza foram atentamente observados por ativistas e pesquisadores dos fenômenos contemporâneos, deixando claro, como pode ser visto nos textos, a impossibilidade do poder existir longe das tecnologias, demandando de todos uma mudança no olhar sobre as novas dependências, sobre o que está em jogo nas redes de informação (PRETTO; AMADEU, 2008, p. 8).

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175

Entra em cena um elemento que não aprofundamos durante o nosso estudo,

as relações de poder que são estruturadas, a partir das configurações nas redes de

informação. Para o acesso à rede, partimos do domínio dos artefatos tecnológicos,

compreendidos como um dispositivo de poder, no qual os professores estabelecem

relações repletas de ambiguidades. Embora não seja o foco do nosso trabalho, é

importante tecer algumas considerações sobre a questão, justamente porque a

perspectiva deste estudo é reunir os pressupostos do uso da tecnologia,através da

EAD na perspectiva dos Estudos Culturais. Isso significa que a nossa compreensão

sobre o uso das tecnologias digitais e todas as consequências inerentes ao seu

processo de apropriação e reprodução, necessita estar contextualizadas no aporte

cultural. É preciso acabar com a repetição contínua sobre a resistência do professor

ao uso das tecnologias como fator decisivo no sucesso do seu uso nas escolas.

Essa afirmação já foi tão usada para justificar o fracasso das políticas públicas

implementadas (ou a sua ausência), que já podemos considerá-la como um clichê. É

essencial pensar no uso das tecnologias como uma apropriação cultural, na qual

todas as questões relacionadas com a disputa pelo conhecimento e o poder estão

no centro da discussão.

O que não se discute é que os movimentos de resistência não estão

relacionados com a tecnologia em si, poucos são os professores que desconhecem

completamente a existência do computador que é utilizado para as suas atividades

fora da escola. Se um grupo de professores resiste em aprender a usar a planilha

do programa Excel da Microsoft, por exemplo, e repassar esse conhecimento aos

seus alunos, isso não significa que ele seja resistente às inovações. É provável que

ele não perceba a aplicabilidade do seu uso, ou mesmo desconheça os caminhos

para utilizá-lo em sala de aula. Mais ainda, pode ser que o professor se recuse a

consumir determinados produtos e reproduzir esse consumo, assim como muitos

alunos na escola desejam produzir materiais e não utilizar os laboratórios de

informática para digitar textos no Word for Windons. Encontramos também muitas

escolas que controlam o acesso dos professores aos equipamentos como forma de

coerção de todos, alunos e professores, na tentativa evidente de manter o que é

considerado importante pelos alunos, centrado na mão dos dirigentes da

comunidade escolar. Esse procedimento não está relacionado com o domínio das

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tecnologias digitais, e sim com uma lógica perversa de apropriação dos bens

materiais e imateriais, através com a disponibilidade dos equipamentos na escola.

Para compreender a dimensão da cultura no uso das tecnologias digitais, é

necessária uma reflexão sobre a construção dos Projetos Político Pedagógicos dos

cursos realizados a distância, incluindo a percepção existente nesses projetos sobre

a condução de apropriação e reprodução, assim como as consequências efetivas

para a prática do professor. Nesse aspecto, precisamos pensar em como pode ser

desenvolvida a prática de formação de redes e autoria, que deveriam estar

presentes no corpo dos projetos pedagógicos, como orientadores das abordagens

utilizadas e de suas práticas. É exatamente sobre isso que trataremos no tópico

seguinte.

5.7 Entre o dito e o feito no uso das tecnologias na educação a distância

Os pressupostos para o uso das tecnologias na educação a distância estão

focados em diversas mídias (vídeo, áudio, teleconferência etc), mas a principal

ferramenta utilizada é o Ambiente Virtual de Aprendizagem. Embora apresentado de

forma explícita como um importante instrumento de transformação para os

professores e para a escola, o objetivo principal na proposta do Pró-Licenciatura

para o seu uso nos cursos a distância pode encontrar a mesma disposição nos

Projetos Político-Pedagógicos elaborados pelas IES. Ou ainda, a proposta pode

existir de forma arrojada e inovadora nos projetos e não ser realizada na prática.

Pensar no uso das tecnologias na aprendizagem, especificamente o uso dos

Ambientes Virtuais significa propor a interatividade e interação como foco principal

nesse processo. A realidade apontada por diversos autores (PRIMO, 2005; LEMOS,

2008) mostra que os alunos ainda encontram muitas dificuldades na interação e

navegação em ambientes virtuais de aprendizagem e as propostas para motivar os

alunos e intensificar a aprendizagem via web não atingem os níveis de eficácia

desejados.

É preciso refletir sobre esta dificuldade não como uma incompatibilidade entre

o usuário e a máquina que precisa de “capacitação” ou “treinamento”, mas sim, nas

concepções de aprendizagem que estruturam o uso destas tecnologias e sua

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transposição para a prática pedagógica. O uso destes dispositivos tecnológicos não

substitui ou invalida a necessidade de uma estratégia cuidadosamente elaborada

pelos professores envolvidos no processo. O que se observa atualmente, de forma

generalizada, é que os projetos político pedagógicos dos cursos a distância propõem

uma linha de atuação sócio-interacionista, construtivista, centrada no aluno etc, mas

muitas das estratégias utilizadas no uso destas tecnologias estão profundamente

impregnadas de aspectos que remetem a propostas diametralmente opostas.

Esta mistura de concepções pedagógicas não é característica da educação a

distância; o presencial sofre a mesma ambiguidade. A questão é que a inserção da

tecnologia na aprendizagem, por razões relacionadas com a sua própria estrutura

(cartesiana, fixa, mecânica), acaba por remeter sua prática aos conceitos mais

conservadores da aprendizagem. É difícil pensar no uso destes artefatos

tecnológicos sem relacionar conceitos importantes sobre a aprendizagem de

“máquinas de ensinar” de Skinner, por exemplo.

Neste contexto, vamos relacionar três teóricos da aprendizagem cujos

pressupostos estão presentes, de forma direta ou subliminar, em vários projetos

político-pedagógicos de cursos a distância8, resgatando os elementos que se

referem ao uso das tecnologias e mecanismos de aprendizagem, para uma análise

das estratégias utilizadas no uso da tecnologia na educação a distância.

Representando a corrente teórica da tecnologia educacional temos Skinner e sua

concepção de máquinas de ensinar; para refletir sobre as inovações tecnológicas na

educação abordamos Lévy, seu conceito de ecologia cognitiva e groupware; e, para

finalizar, apresentamos a contribuição de Vygotsky como a referência explícita mais

frequente nos projetos político-pedagógicos, através da sua concepção com ênfase

na zona de desenvolvimento proximal e a construção do conceito de aprendizagem

colaborativa.

Os múltiplos usos de dispositivos tecnológicos na aprendizagem estão

inseridos em princípios da teoria da aprendizagem desenvolvidos no início do século

XX, sendo de extrema importância para a compreensão e aplicação destes usos,

uma releitura cuidadosa destas teorias comportamentais, sobretudo, sua

contextualização e influências de outros segmentos da ciência. A importância da

8 Não buscamos as referências explicitadas no corpus teórico destes documentos, mas sim a proposta de aprendizagem que usualmente costuma permear as concepções de aprendizagem contidas nos projetos.

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obra de Skinner é inegável sob diversos aspectos das teorias comportamentais,

sendo um teórico que constantemente é reavaliado e estudado, a partir de novos

enfoques e abordagens, como, por exemplo, a teoria do reforço a exemplo do

feedback em ambientes virtuais. A análise do seu contexto histórico permite a

realização de uma série de inferências para a compreensão do uso das tecnologias

na educação hoje, como veremos a seguir.

Vamos iniciar o nosso percurso com Skinner que baseou suas teorias na

percepção do reforço positivo e negativo com respostas durante o desenvolvimento

da aprendizagem, com base na análise das condutas observáveis. O processo de

aprendizagem poderia ser classificado em respostas operantes e estímulos de

reforço, a partir de técnicas de modificação de conduta na sala de aula. Ou seja, a

aprendizagem ocorre em função da mudança de comportamento que se constitui

como resultado de uma resposta aos estímulos que ocorrem no meio. O cerne na

teoria de Skinner é o reforço, como motriz para a mudança do comportamento do

indivíduo. A diferença do condicionamento operante na teoria de Skinner, em

relação às teorias behavioristas anteriores9, está na idéia de que os indivíduos

podem emitir respostas, e não somente obter respostas.

Diante da perspectiva behaviorista, Skinner elabora uma proposta de ensino-

aprendizagem mediada pela tecnologia, criando as máquinas de ensinar como um

meio de instrução programada para o desenvolvimento da aprendizagem. A

definição para máquinas de ensinar para Skinner é “um equipamento que cria

condições rápidas e aperfeiçoadas para um estudo efetivo”. A estrutura e operação

das máquinas são estruturadas em um sistema de fill the blanks, ou “completar as

lacunas”. Os alunos encontram dois espaços na máquina, um espaço com a questão

a ser resolvida e outro para o preenchimento da resposta correta. Ao acionar o

mecanismo, o aluno recebe imediatamente a resposta correta, sabendo se acertou

ou não a questão. Em sua explicação sobre as máquinas de ensinar, Skinner afirma

que “quando um exame só é corrigido e devolvido depois de uma demora de horas

ou dias, o comportamento do aluno não se modifica apreciavelmente. O resultado

imediato, fornecido pelo aparelho de auto-avaliação, entretanto pode ter um efeito

educativo” (SKINNER, 1972, p.29).

9 As teorias behavioristas ou comportamentalistas consideravam que todo o comportamento humano pode ser mensurado ou analisado, e, portanto, passível de modificação através da relação estímulo-resposta.

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179

Em relação aos professores, ele estabelece uma análise bastante singular ao

perceber as relações de poder em que estavam estabelecidas as bases entre

professores e alunos no ensino tradicional. Para Skinner, os professores

estabeleciam metas irreais e não mostravam os percursos corretos aos alunos para

o desenvolvimento da aprendizagem, induzindo-os ao erro. Ele afirma que “a

pretexto de ensinar a pensar criamos situações confusas e difíceis e depois

elogiamos os alunos que as conseguiram vencer” (SKINNER, 1972, p.50). Embora

não se aprofunde nas motivações dos professores, ele propõe que os recursos

instrumentais sejam utilizados para realizar as tarefas consideradas mecânicas e

repetitivas dos professores, deixando a máquina realizar o processo de reforço da

aprendizagem, através do feedback imediato ao aluno. Ao professor caberia o

desenvolvimento “dos contatos intelectuais, culturais e emocionais daquele tipo todo

especial que testemunham a sua natureza do ser humano” (SKINNER, 1972, p. 25).

É surpreendente que ainda hoje seja feita a mesma pergunta que se fazia

naquela época: será que as máquinas substituirão os professores? Uma das

maiores preocupações dos professores do ensino presencial em relação à educação

a distância, é se esta modalidade substituirá os professores, ou se a tecnologia irá

acabar com a função do professor. Skinner já afirmava que não, realizando uma

explicação bastante similar as que são usadas nos dias de hoje para justificar o uso

dos computadores nas escolas, “elas são equipamento para o uso dos professores,

poupando-lhes tempo e labor. Ao delegar certas funções mecanizáveis as máquinas,

o professor emerge no seu próprio papel como um ser humano indispensável”

(SKINNER, 1972, p.54).

Skinner afirma, entretanto, que o papel do professor mudará porque a

instrução das máquinas afetará as práticas tradicionais, vislumbrando a

possibilidade do ensino individualizado em substituição ao ensino por grupos ou

classes. Na proposta das máquinas de ensinar, até mesmo as notas assumirão um

novo significado, já que apontarão até aonde o aluno foi durante seu percurso de

aprendizagem. Para ele, a auto-instrução permite que as notas sejam um elemento

motivador e não repressor do processo de aprendizagem do aluno, mas é

necessário considerar aqui que ele propõe a construção de materiais

individualizados visando aproveitar as diferenças individuais.

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As críticas ao modelo das máquinas de ensinar são extremamente pertinentes

e todas estão corretas, entretanto, o que propomos aqui é resgatar as preocupações

de Skinner no campo da educação e suas propostas para solucionar os problemas

da época através de artefatos tecnológicos. Observamos durante este resgate que

vários questionamentos realizados nos dias de hoje, quanto ao uso dos

computadores na aprendizagem, são bastante semelhantes aos que foram

realizados em meados do século passado. O estranhamento às propostas de

Skinner naquele momento histórico era compreensível, considerando o modelo de

educação utilizado e o conhecimento tecnológico da época.

Continuando o nosso percurso, escolhemos a obra “As Tecnologias da

Inteligência: O futuro do pensamento na era da informática”, de Pierre Lévy para dar

continuidade a nossa reflexão sobre as teorias da educação e o uso das tecnologias.

Para Lévy, no final do século XX emerge um conhecimento por simulação que

permite a aplicação da tecnodemocracia, estabelecendo que a técnica é uma

questão política, especificamente no que diz respeito às interfaces informáticas.

Lévy desenvolve o conceito de ecologia cognitiva, a partir da idéia de que existe um

coletivo pensante homens-coisas, que é “dinâmico e povoado por singularidades

atuantes e subjetividades mutantes” (LÉVY, 2004, p.11).

Lévy constrói a fundamentação de seu estudo com base na imagem, dos

sentidos e do hipertexto, ou seja, usa como ponto de partida a comunicação e suas

representações e modificações em nossa sociedade. A linguagem surge como um

ponto de partida, uma referência para todas as demais mudanças ocorridas na

sociedade a partir das mudanças em seu modo de produção e surgimento da

sociedade informacional. Lévy também expressa sua preocupação com a fluidez e

mudanças no contexto da linguagem.

Lévy estava particularmente interessado nas novas configurações dos fluxos

de informações, já que para ele emissores e receptores sistematizam as idéias em

novas modelizações sistêmicas e cibernéticas de comunicação. Neste sentido, o

hipertexto sinaliza para mudanças profundas na estrutura cognitiva dos leitores, já

que a forma de apreensão do conhecimento é realizada tendo como fonte uma nova

estrutura que permite ampliar em níveis infinitos a quantidade de informação

recebida. Assim como Skinner, Lévy também não despreza a dimensão audiovisual,

tanto que afirma que “ao entrar em um espaço interativo e reticular de manipulação,

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181

de associação e leitura, a imagem e o som, adquirem um estatuto de quase-textos”.

Existem diversas definições de hipertexto, e não trataremos destes conceitos neste

momento. A definição de Lévy para hipertexto é que “o hipertexto é um conjunto de

nós ligados por conexões. Os nós podem ser palavras, páginas, imagens, gráficos,

seqüências sonoras, documentos complexos que podem eles mesmos ser

hipertexto” (LÉVY, 2004 ,p.37).

Para realizar esta nova forma de comunicação por meio do uso do hipertexto,

é necessário o equipamento, no caso os computadores pessoais. Aqui já cabe uma

observação fundamental no desenvolvimento de nossa reflexão. Apresentamos na

seção anterior deste trabalho uma proposta centrada no equipamento, na

construção da máquina e no seu uso para a aprendizagem. A abordagem de Lévy

sobre o uso da tecnologia na aprendizagem já aponta a máquina como um elemento

coadjuvante no processo, um pano de fundo ou ferramenta que não é, nem poderia

ser, o elemento principal no processo.

Em relação ao uso da máquina, Lévy estabelece o desejo e a subjetividade

como elementos que estão profundamente implicados em agenciamentos técnicos.

Para ele, “há toda uma dimensão estética ou artística na concepção das máquinas

ou dos programas, aquela que suscita o envolvimento emocional, estimula o desejo

de explorar novos territórios existenciais e cognitivos”. (LÉVY, 2004, p.56 e 57).

Esta visão bastante diferenciada da tecnologia no âmbito da subjetividade,

considerando os aspectos mais etéreos da dimensão humana (arte, sonhos, cultura

etc), é realmente inovadora. Até então, o uso da informática estava restrito aos

elementos concretos da produção humana, entendida como binária, rígida, restritiva

e centralizadora, uma oposição entre o homem e a máquina. Para Lévy, o

desenvolvimento de interfaces amigáveis reinventou a microinformática,

desenvolvendo uma complexa rede flutuante, onde não existe separação entre a

técnica e o uso. Neste aspecto, a consequência direta desta afirmação é que nós

não estamos em oposição à máquina, nós fazemos parte dela, ao estarmos

imbricados dentro desta rede como usuários e como construtores da própria técnica,

já que a criação/desenvolvimento e uso/aplicação formam um único hipertexto.

A construção do conceito de ecologia cognitiva está estruturada, com foco na

ideia de groupware, grupos de trabalho que compartilham suas opiniões e

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descobertas para o desenvolvimento de um determinado trabalho. De fato, a

compreensão do conhecimento enquanto uma construção coletiva como única via

possível, vem sendo apropriada por diversos setores que tratam da relação humana

com o saber, a partir da equidade de oportunidades e acessibilidade à informação. É

um sentido razoavelmente distinto do que se acreditava ser a apreensão do

conhecimento em outras teorias da aprendizagem. A existência de um cognitivo

coletivo não está relacionada apenas com a tecnologia, pode ser considerada em

qualquer forma de conhecimento humano, mas é evidenciada pelo uso das

tecnologias, que possibilitaram o armazenamento, gerenciamento e

compartilhamento destas informações. Por esta razão, Lévy encontra tanta

propriedade em desenvolver este conceito imerso no campo da tecnologia na

aprendizagem.

Partindo desse princípio, Lévy propõe que toda instituição é uma tecnologia

intelectual, e os processo sociais são atividades cognitivas, com base no

pressuposto de que os sujeitos individuais não apenas transmitem ou reproduzem

as estruturas de sua cultura, eles também as reinterpretam de acordo com seus

interesses e projetos. Assim, as coletividades cognitivas se auto-organizam, se

mantêm e se transformam através do envolvimento permanente dos indivíduos,

assim como as técnicas de comunicação e processamento das representações

também fazem parte delas e desempenham papel essencial.

Para finalizar a nossa reflexão sobre as concepções de aprendizagem e o uso

das tecnologias, trazemos a contribuição de Vygotski, para o qual o processo de

construção do indivíduo começa biologicamente. Ele não nega a importância da

biologia (ao resgatar a filogênese – história biológica, e a ontogênese–história do

homem). As duas linhas aparecem com o nascimento do indivíduo até se cruzarem

e a linha biológica vai desaparecendo, predominando a linha cultural. O

desenvolvimento cultural supera a condição biológica rapidamente. A relação entre

os objetos do mundo e o desenvolvimento da consciência é a mediação.

Para ele, o conhecimento primeiro está fora do sujeito, é na interação e

relação entre o sujeito e os outros sociais que você vai internalizar os conceitos

acerca do mundo. O conhecimento vai do social para o individual. No processo de

internalização, por meio das trocas sociais, ela reconstrói os conceitos do mundo, ao

mesmo tempo, atuando e sendo influenciada pelo outro.

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Vygostky cria as zonas de desenvolvimento proximal (as ZDP), afirma que o

desenvolvimento real é a capacidade de resolver problemas sozinho, o

desenvolvimento proximal é a solução dos problemas com ajuda de outro. Os

processos avaliativos só consideram o desenvolvimento real, o proximal que se

refere às possibilidades de aprendizagem potenciais do sujeito. O professor é uma

figura fundamental neste processo de desenvolvimento, ele é um mediador da

construção da aprendizagem potencial, cabe a ele ser um sistematizador do

conhecimento. (=aprendizagem significativa ou aprendizagem que adianta o

desenvolvimento humano). Em Vygostky a mediação pedagógica nunca é mediada

por um objeto, sempre é uma pessoa. Poderíamos supor então que para ele, não

existiria a aprendizagem mediada por computador, quem media a aprendizagem é

uma outra pessoa, daí a importância do professor.

Esta perspectiva está estruturada na ideia de uma mediação por computador

relacionada com as máquinas de ensinar de Skinner, no sentido de que a própria

máquina estabelece a mediação, ao passo de que a proposta do uso da tecnologia

como mediação hoje, está relacionada com uma ferramenta de intermediação entre

dois sujeitos. Para nos aproximar desta ideia do uso de um artefato tecnológico na

construção da aprendizagem, podemos reproduzir o pensamento de Vygostsky

quanto ao uso do ábaco. “El empleo de procedimientos artificiales viene a ser una

descarga para la actividad natural del niño, provocando en él una reacción positiva y

cambiando sensiblemente su actitud ante el trabajo” (VYGOTSKI, 1995, p.260).

Por associação, poderíamos afirmar que o mesmo processo é válido para o

uso de computadores em ambientes virtuais de aprendizagem, desde que se

considerasse a possibilidade de comunicação e colaboração durante este processo.

Deveríamos esperar uma reação positiva na aprendizagem mediada por tecnologia.

Vygostky (1995) afirma que a aprendizagem se realiza sempre em um

contexto de interação, através da internalização de instrumentos e signos levando a

uma apropriação do conhecimento. Esse processo promove o desenvolvimento e a

aprendizagem precede o desenvolvimento. Ao compreender desta forma as relações

entre aprendizagem e desenvolvimento, Vygostky confere uma grande importância à

escola (lugar da aprendizagem e da produção de conceitos científicos); ao professor

(mediador desta aprendizagem); às relações interpessoais (através das quais este

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processo se completa). A aprendizagem é um processo de construção

compartilhada, uma construção social.

Esta compreensão é fundamental para a construção de um conceito de

aprendizagem colaborativa, e embora não seja um conceito novo, adquiriu uma

perspectiva inovadora no contexto das tecnologias na educação, principalmente

quando atrelado ao conceito de rede, como discutiremos a seguir.

5.8 O conceito de aprendizagem colaborativa na educação a distância

A aprendizagem colaborativa, chamada por alguns autores como

aprendizagem cooperativa, é conceituada por diferentes autores de forma

praticamente similar, e todos os conceitos estão fundamentados, a partir da zona de

desenvolvimento proximal de Vygostky e na proposta de operações em conjunto

encadeadas logicamente, de Piaget. A ideia é apropriar-se dos dois conceitos e

relacioná-los para sua aplicação no uso das tecnologias na aprendizagem,

especificamente, no que se refere aos ambientes virtuais de aprendizagem ou

softwares educativos em rede.

Como conceito, podemos citar Araújo e Queiroz (2005), por exemplo:

“Aprendizagem colaborativa é um processo onde os membros do grupo ajudam uns

aos outros para atingir um objetivo acordado”. Na definição de Campos et al (2003,

p. 26) essa aprendizagem pode ser definida como “uma proposta pedagógica na

qual estudantes ajudam-se no processo de aprendizagem, atuando como parceiros

entre si e com o professor, com o objetivo de adquirir conhecimento sobre um dado

objeto”. Já Siqueira e Alcântara (2003, p. 23) propõem que “a aprendizagem

colaborativa é um processo de reaculturação que ajuda os estudantes a se tornarem

membros de comunidades de conhecimento cuja propriedade comum é diferente

daquelas comunidades a que já pertence”.

Estes conceitos transmitem a ideia de que a aprendizagem colaborativa é um

processo de construção do conhecimento em parceria, mas as estratégias utilizadas

para este fim, não se restringem apenas ao processo de internalização e

reprocessamento da nova informação adquirida. Ao detalhar as estruturas que

possibilitarão a aprendizagem neste processo, Campos, citando Slavin (2003),

afirma que “as perspectivas relacionadas à motivação têm foco na recompensa ou

objetivo sob o qual os estudantes operam; ou seja, é criada uma situação, em que

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os membros do grupo só conseguem realizar seus objetivos pessoais se o grupo

como um todo for bem sucedido" (CAMPOS et al, 2003, p.29). Nesta citação, o que

seria este propósito se não a teoria do reforço de Skinner?

Mais adiante, no mesmo texto, o autor propõe sua fundamentação teórica

resumindo as propostas de Piaget (a aprendizagem ocorrerá a partir da

reestruturação das estruturas cognitivas internas), Bruner (a aprendizagem por

descoberta com enfoque na exploração de alternativas) e Vygotsky (a interação

social ou sociointeracionista). Além destas três fundamentações, o autor ainda traz o

“método de projetos”, modelando-se nas ideias de Dewey, como forma de

articulação entre as distintas áreas do conhecimento (CAMPOS et al, 2003, p.38).

Nesta perspectiva, o professor é caracterizado como “facilitador” na aprendizagem

colaborativa, mas a pergunta realmente central é como articular todas estas

concepções pedagógicas em único projeto pedagógico?

Neste aspecto, a definição de Paloff e Pratt (2002, p.141), nos parece mais

adequada ao entender que “quando os alunos trabalham em conjunto, isto é,

colaborativamente, produzem um conhecimento mais profundo, e ao mesmo tempo,

deixam de ser independentes para tornarem-se interdependentes”. São muito

interessantes também os pressupostos de Christiansen e Dirckincki-Holmfeld (1995),

ao considerem que o desenvolvimento da colaboração exige um ambiente e um

modo de estudar que permita ao grupo formular um objetivo em comum; estimulem

o uso de problemas, interesses e experiências pessoais (como fator de motivação) e

assumam o diálogo como o meio fundamental de investigação. Aqui temos dois

elementos diferenciados surgindo, a ideia do diálogo – que nos remete para uma

proposta freireana de educação e a aprendizagem significativa como motor da

aprendizagem.

A colaboração enquanto estratégia de aprendizagem só fará sentido se

houver alguma significação para o aluno em sua construção da aprendizagem. Outro

aspecto fundamental nesta proposta é a negociação durante o desenrolar do curso,

entre professores e alunos. Afinal, a colaboração não pode ser realizada apenas

entre alunos, mas sim, entre todos que participam do processo. Em alguns casos,

observamos que o conceito de aprendizagem colaborativa restringe o processo,

apenas entre os alunos, como se o professor não fizesse parte do processo, sendo

inclusive chamado de “facilitador”. No contexto de aprendizagem colaborativa

defendida por Paloff e Pratt (2003), a negociação das diretrizes de um curso é

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estratégia fundamental do início do curso até a avaliação final. Mais uma vez, esta

concepção nos remete a Paulo Freire na perspectiva de diálogo também com o

professor, que participa do processo na perspectiva de aprender algo com seus

alunos e não apenas ensinar.

Na educação a distância, a heterogeneidade é um fato em qualquer curso ou

grupo que se pretenda analisar, sobretudo pela dispersão geográfica. Como uma

novidade relativamente recente na educação, professores e alunos envolvidos no

processo sempre têm muito a aprender. Invariavelmente, o planejamento de um

curso, por mais cuidadosamente elaborado que tenha sido, necessitará de ajustes a

adaptações durante o percurso. Basicamente, muitas estratégias que costumam

funcionar muito bem no presencial, não obtêm o mesmo sucesso na educação a

distância. O professor, condutor do processo, precisa estar aberto a aprender muitas

coisas não apenas no que se refere ao uso das tecnologias, mas, principalmente,

sobre como seus alunos aprendem no ambiente virtual. É nesse sentido que a

aprendizagem colaborativa precisa ser compreendida e aplicada. Todos são

aprendentes na construção de uma nova metodologia, buscando estratégias e ações

de aprendizagem realmente eficazes. O foco é o sucesso do aluno, a partir do ponto

onde ele se encontrava e onde ele conseguirá chegar e não necessariamente a

transmissão de uma quantidade volumosa de informação.

5.8.1 A aprendizagem nos ambientes virtuais e o domínio dos dispositivos tecnológicos

Estar inserido à sociedade informacional significa, necessariamente, estar

conectado em uma complexa rede que faz com que acontecimentos ocorridos em

localidades distantes tenham um impacto real em nosso cotidiano. Os indivíduos que

não têm acesso à informação estão marginalizados nesta sociedade, considerada

uma nova modalidade de exclusão, chamada de exclusão digital.

A educação a distância, como uma das modalidades de ensino-

aprendizagem, é possibilitada pela mediação dos suportes tecnológicos digitais e de

rede, seja esta inserida em sistemas de ensino presenciais, mistos ou

completamente realizada, através da distância física. Não mais com ênfase no

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autodidatismo, mas sim, na construção coletiva do conhecimento, mediada pela

tecnologia de rede.

Em cursos a distância, a interatividade e a comunicação multidirecional são

possíveis devido à adoção destas ferramentas, que oferecem subsídios para que os

participantes dos cursos possam se comunicar. Possibilitam ainda a integração

desses recursos em um único ambiente de aprendizagem, favorecendo a adoção e

compreensão da linguagem audiovisual.

O foco da nossa abordagem está centrado no uso da tecnologia na educação

a distância que está estruturada no uso de ambientes virtuais de aprendizagem,

como principal ferramenta de comunicação e informação em todos os projetos

político-pedagógicos implementados atualmente. Assim, é interessante uma breve

definição dos ambientes virtuais e algumas considerações sobre sua estrutura

pedagógica, para alinhavar as concepções de aprendizagem relacionadas no texto.

Escolhemos o Moodle como modelo para nossa discussão sobre ambientes virtuais,

por duas razões: sua popularidade nas universidades públicas e sua concepção

pedagógica, definida por seus idealizadores como sociointeracionista.

O ambiente virtual de aprendizagem é uma plataforma que gerencia os

elementos de aprendizagem de um curso realizado na modalidade a distância. Cada

plataforma apresenta seus instrumentos próprios de gerenciamento. A plataforma

mais utilizada nas universidades públicas brasileiras é o Moodle, um sistema de

gerenciamento de aprendizagem (LMS – Learning Management System) ou

ambiente virtual de aprendizagem de código aberto, livre e gratuito. Os usuários

podem baixá-lo, usá-lo, modificá-lo e distribuí-lo, seguindo apenas os termos

estabelecidos pela licença.

O Moodle mantém-se em desenvolvimento por uma comunidade que

abrange participantes de todas as partes do mundo.

Essa comunidade, formada por professores, pesquisadores, administradores

de sistema, designers instrucionais e, principalmente, programadores, mantém um

portal na Web que funciona como uma central de informações, discussões e

colaborações.

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O desenvolvimento do ambiente Moodle foi norteado por uma “filosofia de

pedagogia socioconstrucionista (Social Constructivism). O sócioconstrucionismo

defende a construção de ideias e conhecimentos em grupos sociais de forma

colaborativa, uns para com os outros, criando assim uma cultura de

compartilhamento de significados” (Documento Moodle, 2008). Também no mesmo

documento encontramos uma abordagem interessante: a proposta de

“comportamento conectado e separado”.

Esta ideia observa mais a fundo as motivações das pessoas numa discussão. Comportamento separado é quando alguém tenta permanecer 'objetivo' e 'factual', e tende a defender suas próprias idéias usando a lógica para encontrar furos nas idéias dos seus oponentes. Comportamento conectado é uma abordagem mais empática que aceita a subjetividade, tentando ouvir e fazer perguntas num esforço para entender o ponto de vista do outro. Comportamento construído ocorre quando uma pessoa é sensível a ambas as abordagens e é capaz de escolher uma delas como apropriada à situação em que se encontra. Em geral, uma quantidade saudável de comportamento conectado dentro de uma comunidade de aprendizagem é um estimulante poderoso para a aprendizagem, não apenas aproximando as pessoas, mas promovendo reflexões mais profundas e re-exame das crenças existentes (Documento Moodle, 2008).

Na proposta citada existiria uma possibilidade de progressão no

comportamento do indivíduo, embora a existência dos três comportamentos não

esteja relacionada a nenhum tipo de linearidade. Está claro que esperamos que os

alunos adquiram um comportamento construído, quanto maior a freqüência deste

tipo de comportamento no ambiente, mais favorecida será a aprendizagem. Porém,

não está claro se esta classificação está relacionada apenas como uma forma de

identificação para a ação do professor ou apenas como uma avaliação do

comportamento efetivo na rede.

O Moodle apresenta várias ferramentas de comunicação, de avaliação, de

disponibilização de conteúdos e de administração e organização. Os materiais

didáticos podem ser disponibilizados por meio de páginas de texto simples, páginas

Web e links para arquivos ou endereços da Internet. As ferramentas de avaliação

disponíveis no Moodle são avaliação de curso, pesquisa de opinião, questionário,

tarefas e trabalhos com revisão. As ferramentas permitem, respectivamente, a

criação de avaliações gerais de um curso; pesquisas de opinião rápidas,

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questionários, tarefas para os alunos onde podem ser atribuídas datas de entrega e

notas e por fim trabalhos com revisão onde os participantes podem avaliar os

projetos de outros participantes e exemplos de projeto em diversos modos.

O posicionamento dos idealizadores do ambiente Moodle, em relação ao

sócio-construtivismo, é, sem dúvida, uma inovação, se considerarmos a concepção

pedagógica de outros sistemas existentes. Porém, embora o ambiente virtual

forneça ferramentas que permitam o desenvolvimento de colaboração e propostas

de construção do conhecimento, ele também possibilita que todos os pressupostos

da teoria de Skinner sejam aplicados em um ambiente tecnológico atualizado. Ele

possui diversas ferramentas como a lição (onde o aluno só poderá passar para a

etapa seguinte se acertar as questões propostas) ou o questionário onde o tempo é

medido como categoria de avaliação (quanto mais rápido o aluno realiza a tarefa,

maior é sua nota), que podem ser associadas à teoria do reforço ou estímulo-

resposta.

Podemos afirmar que embora existam ferramentas que possibilitem a

realização de uma aprendizagem colaborativa ou significativa, existem também

ferramentas que possibilitam exatamente o oposto, o que nos leva a concluir que a

concepção pedagógica dos professores e idealizadores do curso é que definirão o

seu perfil. Embora essa afirmativa pareça óbvia, é preciso ressaltar que muitos

professores acreditam e disseminam a idéia de que, apenas pelo fato de utilizar um

ambiente idealizado, a partir de uma proposta sócio-construtiva, todas as estratégias

pedagógicas utilizadas em seus cursos, estão necessariamente inseridas no mesmo

contexto, o que não se corresponde à realidade.

Esta é uma outra preocupação que o uso de tecnologias na educação vêm

trazendo para nossas discussões, o quanto a roupagem tecnológica está

mascarando práticas conservadoras, autoritárias e ultrapassadas de educação.

Embora o foco deste artigo seja a educação a distância, podemos incluir estas

mesmas preocupações na educação presencial.

Não existe um consenso sobre qual o melhor caminho para enfrentar os

inúmeros obstáculos no desenvolvimento da aprendizagem, principalmente,

mediado por tecnologias. Lévy (1999) nos fornece algumas pistas nesta direção

quando afirma que o uso das tecnologias digitais e das redes de comunicação

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interativas provoca uma ampliação e mutação na relação com o saber. Segundo

Litto (2003), se o educador tenta transpor suas técnicas de sala de aula para o

ambiente virtual, pode facilmente entediar seus alunos e assistir a uma grande

evasão em seus cursos.

A utilização das TIC´s apenas para oferecer ao aluno uma forma diferenciada

de apresentar conteúdos pode não ser suficiente para garantir a motivação do aluno.

Segundo Almeida (2000), é preciso criar um ambiente que favoreça a aprendizagem

significativa ao aluno, ''desperte a disposição, para aprender disponibilize as

informações pertinentes de maneira organizada e, no momento apropriado, promova

a interiorização de conceitos construídos''.

É preciso ter claro os objetivos na utilização de um ambiente virtual de

aprendizagem na EAD. Estes objetivos estão relacionados ao conceito que cada

instituição estabelece para o seu Ambiente Virtual. O ambiente virtual não

pressupõe, necessariamente, a realização da aprendizagem na plataforma. Isso vai

depender de uma série de fatores, nem todos eles passíveis de controle. Litto

(2003), afirma que:

Existe a pobreza dos ambientes virtuais de aprendizado: quem procura um curso não presencial quer interatividade, quer se sentir desafiado. É preciso que os organizadores dos cursos pensem em criar objetos de aprendizado estimulantes, como animações, simulações, formas que façam o aluno a entender a concretização daquele conhecimento (LITTO, 2003, p.45).

Segundo Carvalho (2007), as principais formas de utilização de um Ambiente

Virtual são as seguintes:

1. Foco nas ferramentas de aprendizagem: a única forma de contato entre alunos e professores é através do ambiente. As ferramentas (aulas virtuais, atividades, textos etc.) são utilizadas em substituição aos encontros presenciais (inexistentes).

2. Foco na comunicação e complementação da aprendizagem: o ambiente é utilizado como uma forma de criar uma conexão institucional entre os participantes e para disponibilizar estratégias complementares de aprendizagem, através das ferramentas disponíveis no ambiente. São utilizadas para enviar e receber atividades, orientar a aprendizagem e fomentar a discussão sobre os temas da disciplina entre os alunos e professores.3.

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Foco na comunicação: são ambientes criados apenas para a comunicação entre os participantes, não apresentando materiais ou propostas de atividades. É o caso dos cursos a distância com o projeto pedagógico estruturado apenas no material impresso (CARVALHO, 2007, p.8).

A forma de utilização do ambiente virtual em consonância com o projeto

político-pedagógico do curso é fundamental para o estabelecimento da estrutura

sobre a qual o aluno-aprendiz irá interagir no AVA. O conceito de maior ou menor

interatividade, assim como a frequência e intensidade no acesso realizado serão

proporcionais ao objetivo das ferramentas disponibilizadas. É relativamente comum

encontrarmos AVA’s pouco explorados pelos alunos, em função da inexistência de

demanda pedagógica estabelecida pelo curso. Por outro lado, encontramos cursos

que são estruturados totalmente on-line, mas que não conseguem atingir a

participação desejada dos alunos no AVA.

A dissonância entre os objetivos propostos nos AVA’s e sua eficácia na

aprendizagem encontra suas raízes nas concepções de aprendizagem escolhidas

para fundamentar a prática pedagógica do curso. Se estes percursos são confusos,

utilizando diferentes concepções de forma simultânea e, muitas vezes, conflitantes,

o resultado aparecerá na dificuldade do aluno em lidar com a estratégia de

aprendizagem proposta, e o que é mais grave, ficará mascarada como uma

dificuldade em lidar com a tecnologia. A preocupação dos idealizadores dos cursos a

distância está frequentemente centrada na capacitação para o uso de Ambientes

Virtuais, que não serão, necessariamente, superadores dos obstáculos

apresentados. Neste momento, inserimos a preocupação de Lévy com o conceito de

ecologia cognitiva e posteriormente, a cibercultura. Afinal, como se capacitam alunos

e professores na realização da interação, interatividade, busca, investigação e

navegação sem a construção de uma cultura digital (ou cibercultura)? Não estamos

nos referindo aqui ao uso das ferramentas e da tecnologia de forma adequada, mas

sim, ao desenvolvimento de uma concepção de aprendizagem que estabeleça com

clareza a sua proposta metodológica e epistemológica para que todos, aluno,

professores, coordenadores, diagramadores, enfim, todos os envolvidos no processo

possam conhecer as diretrizes que movem as estratégias de aprendizagem de

qualquer curso proposto.

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5.8.2 A Web 2.0 como espaço de autoria e compartilhamento na rede

O conceito da Web.2.0 surge pela primeira vez em 2004, com o objetivo de

criar uma sustentabilidade teórica para as mudanças que estavam ocorrendo na

rede mundial de computadores. Em artigo publicado em 2005, O´Reilly inicia uma

série de reflexões sobre um fenômeno que estava acontecendo nos últimos anos,

com o surgimento do Napster em 1999, o Blogger no mesmo ano e a criação da

Wikipédia em 2001. Podemos afirmar que com o surgimento destas ferramentas na

rede, observamos uma mudança de paradigma que deram origem ao conceito de

escrita colaborativa. Apesar dos inúmeros questionamentos acerca da terminologia,

não resta dúvida que as características da web existente hoje são muito diferentes

da web que existia em 2000. Os espaços para a produção e publicação de

conteúdos, facilmente realizados pelos internautas, eram muito limitados até o

surgimento destas novas ferramentas, existindo de fato, uma necessidade de

mudanças para que o internauta superasse uma atuação passiva, transformando-se

em um colaborador ativo do ciberespaço. Lévy (2004) sintetiza esta necessidade ao

afirmar que,

o uso crescente das tecnologias digitais e das redes de comunicação interativa acompanha e amplifica uma profunda mutação na relação com o saber. Ao prolongar determinadas capacidades cognitivas humanas (memória, imaginação, percepção), as tecnologias intelectuais com suporte digital redefinem seu alcance. E algumas vezes até mesmo sua natureza. As novas possibilidades de criação coletiva distribuída, aprendizagem cooperativa e colaboração em rede oferecida pelo ciberespaço colocam novamente em questão o funcionamento das instituições e os modos habituais de divisão do trabalho, tanto na empresa como nas escolas. (Lévy, 2004, p. 98).

Segundo Cobo e Pardo (2007), a educação é uma das disciplinas mais

beneficiadas com o surgimento das novas tecnologias, especialmente as

relacionadas com a Web 2.0. Por esta razão é fundamental conhecer e aproveitar a

bateria de novos dispositivos digitais que abrem inexploradas potencialidades.

Alguns autores já usam o termo “aprendizagem 2.0” e um dos principais benefícios

destas novas aplicações da web, de uso livre que simplificam tremendamente a

cooperação entre pares, responde ao princípio de não requerer do usuário uma

alfabetização tecnológica avançada. Estas ferramentas estimulam a

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experimentação, reflexão e geração de conhecimentos individuais e coletivos,

favorecendo a construção de um ciberespaço de inter criatividade que contribui para

criar um espaço de aprendizagem coletiva.

É interessante observar que as possibilidades de aprendizagem colaborativa

com a Web 2.0 surgem como uma resposta à tradicional estrutura estática da

Internet com poucos emissores e muitos receptores (como a televisão), começando

a adotar uma nova plataforma onde as aplicações são fáceis de usar e permitem

que haja muitos emissores, muitos receptores e uma quantidade significativamente

mais alta de intercâmbios e cooperação. Esta mudança no número de emissores e

receptores permitiu o surgimento das redes colaborativas de conhecimento, onde

vários assuntos são colocados em discussão, e novos paradigmas para a

compreensão das mudanças na sociedade do conhecimento são estruturados de

forma contínua.

Os cursos de licenciatura a distância usam ambientes virtuais de

aprendizagem como plataformas de comunicação com seus alunos, apresentando

uma estrutura com diversas ferramentas bastante similares aos outros formatos de

produção e publicação de textos e imagens, usados na web. Mesmo considerando

que os projetos pedagógicos dos cursos a distância ainda não conseguem

contemplar todos os elementos da aprendizagem colaborativa, a existência de uma

rede de alunos conectados muda a percepção e a atuação acadêmica destes

alunos.

Mais importante do que o uso estrutural destas ferramentas é a sua

concepção de colaboração e compartilhamento, elementos que ainda não estão

internalizados na prática do professor como deveriam. Neste aspecto, o conceito de

aprendizagem colaborativa embora bem estruturado do ponto de vista acadêmico,

ainda está em estágio embrionário em sua aplicação pedagógica nas escolas. Ao

lidar com este conceito em sua prática enquanto aluno de um curso a distância, o

professor que continua exercendo suas atividades em sala de aula, pode iniciar

reflexões importantes sobre o processo de ensino-aprendizagem, as estratégias

avaliativas (porque e como avaliar), e sobre o próprio processo de educação como

um todo.

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Para Cobo e Pardo (2007), apresentam quatro propostas de aprendizagem,

sendo as três primeiras de Johnson (1992) e a última de Lundvall (2002):

1 Aprender fazendo: são as ferramentas de ensaio-erro, onde o aluno pode intuitivamente desenvolver sua aprendizagem;2 Aprender Interativamente: promovidas pelas plataformas de gestão de conteúdo, possibilitam a interatividade entre os usuários, são exemplos postar conteúdo em um blog ou wiki,enviar um voice e-mail, usar o chat ou correio eletrônico;3 Aprender buscando: é o processo de investigação, seleção e adaptação que amplia e enriquece o conhecimento de quem o realiza. Em um universo de grande quantidade de informação disponível, torna-se essencial aprender como e onde buscar conteúdos educativos.4 Aprender compartilhando: o intercâmbio de conhecimento e experiências permite aos estudantes participar ativamente da aprendizagem colaborativa, já que ter o acesso à informação não significa aprender, por isso a criação de instrumentos que promovam o compartilhamento de objetos de aprendizagem contribui para enriquecer o processo educativo. Exemplos: ambientes virtuais, podcasts, vídeos, entre outros (COBO; PARDO, 2007, p. 53).

Os recursos online da Web 2.0, além de otimizarem a gestão da informação,

também favorecem a formação de redes de inovação e conhecimento com base na

reciprocidade e na cooperação. A renovação permanente dos conhecimentos não só

exigem novas competências no uso das tecnologias, mas também habilidades e

orientação para o processamento cada vez maior dos volumes de informação

(COBO; PARDO, 2007). A formação dos professores através da modalidade a

distância, permite um processo de consolidação da cultura digital, A modalidade a

distância, por sua concepção e estrutura, já absorve o aluno dentro desta sociedade

informacional, que obrigatoriamente fará uso das ferramentas tecnológicas, que vão

sendo aprimoradas ao longo de sua aprendizagem. Ao contrário do professor da

escola pública que pode escolher utilizar ou não as tecnologias disponíveis, ao estar

como aluno do curso de graduação, ele é obrigado a familiarizar-se com estas

ferramentas, sendo condição básica para o avanço em seus estudos.

Neste aspecto, não se trata de transpor o ensino presencial para um modelo

virtual com todas as limitações e problemas de uma sala de aula convencional, mas

sim, empreender uma nova estrutura de aprendizado, completamente distinta da que

utilizávamos no modelo anterior ao surgimento da sociedade de informação. Essas

mudanças na condução de um processo de formação docente desdobram-se na

prática educativa individual, e a medida que são multiplicadas, podemos ter uma

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amplitude ainda maior no impacto destas práticas. Constatamos que as escolas,

sobretudo nos bolsões de exclusão distantes dos grandes centros, ainda não

absorveram os elementos inerentes a um novo modelo de sociedade informacional.

São modelos educativos que ainda privilegiam a memorização, que praticam

avaliações quantitativas e excluem o aluno muito cedo do ambiente escolar. São

propostas de educação baseadas no principio fordista da massificação e reprodução

da força de trabalho. Os professores e alunos desta realidade social e econômica

não percebem em seu cotidiano os efeitos da globalização e da sociedade de

informação. O pouco que conseguem absorver desta realidade não é apropriado em

seu benefício, mas sim utilizado como mais um elemento de exclusão. A formação

dos professores na modalidade a distância, incorpora elementos essenciais da

aprendizagem colaborativa promovendo uma mudança paradigmática fundamental,

tornando o professor um autor e condutor no seu processo de aprendizagem.

5.9 O que encontramos, como estamos e para onde vamos: finalizando o percurso da pesquisa com o relato da situação atual do Pró-Licenciatura

Como já dissemos aqui, o Pró-Licenciatura foi implementado como uma

política governamental de educação a distância de forma aberta em relação ao

modelo de EAD proposto pelas IES envolvidas. Cada instituição organizou a

estrutura do seu curso de forma diferenciada, considerando o perfil da sua clientela,

a localização geográfica, a fundamentação do seu projeto político pedagógico e os

recursos humanos disponíveis. No momento em que os editais foram lançados não

havia um modelo único de EAD, apenas alguns referenciais de qualidade que

serviam como norteadores para as IES e não reguladores.

A diversidade de propostas e estruturas diferenciadas deveria ser

compreendida como um elemento positivo no contexto das ações governamentais,

embora dificultasse o controle e a determinação dos referenciais avaliativos. Com a

mudança nas diretrizes de educação a distância, a partir da criação da UAB, o

modelo foi padronizado e a existência de cursos com propostas diferenciadas

causou estranhamento na atual equipe de educação a distância do MEC.

Com o objetivo de levantar as informações necessárias, com base no

pressuposto de que seria realizada uma migração dos polos do Pró-Licenciatura

para a UAB, a Coordenação Geral de Articulação Acadêmica e Coordenação Geral

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de Supervisão e Fomento convocou todos os coordenadores das instituições que

ofertam cursos do Pró-Licenciatura para um encontro. Assim, em abril de 2009, a

Diretoria de Educação a Distância da CAPES realizou o I Encontro Pedagógico do

Programa Pró-Licenciatura / UAB, na cidade de Brasília – DF. Segundo o

documento assinado pelo Diretor de Educação a Distância, Celso Costa, o encontro

era direcionado para os coordenadores dos cursos de Artes Visuais, Educação

Especial, Educação Física, Espanhol, Geografia, História, Inglês, Libras, Música,

Normal Superior, Pedagogia e Teatro apoiados pelo Programa, bem como o

Coordenador UAB Geral ou Adjunto das IES que oferecem o curso, com os

seguintes objetivos:

− Oportunizar a interação e integração entre os Coordenadores de Cursos apoiados pelo Pró-Licenciatura e os Coordenadores UAB das IES.

− Integrar os Cursos de Artes Visuais, Educação Especial, Educação Física, Espanhol, Geografia, História, Inglês, Libras, Música, Normal Superior, Pedagogia e Teatro ao Sistema Universidade Aberta do Brasil e aos Fóruns de Área.

− Discutir o desenvolvimento e aplicação dos cursos.− Apresentar e discutir as diretrizes de gestão financeira

do Pró-Licenciatura na Diretoria de Educação a Distância – DED/ CAPES (Convite oficial do DED/CAPES/MEC assinado no dia 10/03/2009).

Embora o foco principal estivesse centrado na proposta de integração, as

atividades propostas nos dois dias de encontro foram direcionadas para a

apresentação do sistema Universidade Aberta do Brasil, a proposta de migração dos

cursos do Pró-Licenciatura para o sistema UAB e a divisão em grupo de trabalho

para relatar a situação atual dos cursos. Embora a proposta de migração estivesse

na pauta, pouco foi esclarecido neste sentido, ficando aberto como este processo

será realizado e em que condições. Abordaremos no próximo item a proposta

apresentada do sistema UAB e os objetivos reais da reunião, já que neste momento,

as duas propostas de educação a distância do governo federal foram aproximadas.

Na palestra de abertura do Encontro, foram apresentados dados da UAB e

informações sobre o Pró-Licenciatura, como número de polos e alunos atendidos no

âmbito do Programa. São 35 000 alunos distribuídos em 285 polos com 48 cursos

diferentes. É importante salientar que o Pró-Licenciatura teve dois editais e depois

não foi criada nenhuma possibilidade de implementação de novos cursos.

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As informações que vamos apresentar em seguida foram registradas na ata

do I Encontro Pedagógico do Programa Pró-Licenciatura / UAB, realizado nos dias

28 e 29 de abril de 2009, no qual os representantes das IES apresentaram a

situação de seus cursos. Todas as instituições que ofertam cursos no programa

estavam presentes ao encontro e as apresentações foram encaminhadas com os

seguintes direcionamentos:

a) Condições de infraestrutura / recursos / humanos /técnica/

administrativo / pedagógica / financeira para encerramento dos cursos em

andamento;

b) Material didático (produção, elaboração, impressão e

distribuição);

c) Tutoria (papel/função/atribuição do tutor/tutoria);

d) Avaliação (modelos, dificuldades, indicadores).

ÁREA INSTITUIÇÃO

Educação Física UNIR/UNB/UNIFAP/UFES/UFRN/UFAM/UFRN

Geografia UEPG/UFRN/UFSM/UFPel/UCS/CEFET-RS/UEPB

História UEPG/PUC-Rio/UERJ

Normal Superior/Pedagogia UEM

Pedagogia UFRGS

Artes e Música UFGS / UDESC / UFES/ UFBA/ UNIR

Letras Libras UFSC

Música UFG/ UFMA/UFRGS/ UNB/ UNIMONTES/UNIR

Letras Espanhol UEPG/UFSM/UFPel/CEFET

Letras Inglês UFRGS

Educação especial UFSM

QUADRO 6: Instituições Presentes no I Encontro Pedagógico do Programa Pró-Licenciatura / UAB

Fonte: Ata do I Encontro Pedagógico do Programa Pró-Licenciatura / UAB, 2009.

O relato dos participantes foi extremamente interessante porque apontou que

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as questões que estão no cerne das discussões sobre educação a distância hoje,

são comuns a todas as instituições que estão realizando cursos a distância e

precisam de caminhos inovadores para transpor as suas dificuldades.

5.9.1 O relato de experiências do Pró-Licenciatura

No depoimento dos representantes da IES, é possível avaliar que existem

diferentes níveis de apropriação da educação a distância do ponto de vista

organizacional, metodológico e até mesmo conceitual. A maior parte das IES

apresenta problemas na elaboração do material didático e na formação dos

professores que atuam como tutores. Algumas questões de caráter legal da EAD,

como modalidade, ainda não estão solucionadas e ainda persiste uma dúvida de

como consolidar estes cursos dentro da estrutura existente seja como departamento,

núcleo ou secretaria. A fragilidade na estrutura dos cursos é evidenciada no

depoimento, como no caso a seguir.

A UEPG (Universidade Estadual de Ponta Grossa), que oferta os cursos de Licenciatura em Geografia e História, relatou problemas gerais da universidade, tais como legislação interna, o que fazer com os alunos reprovados, recuperação dos alunos evadidos. Eles têm dez polos, mas a frequência aos polos é muito baixa, os alunos costumam acessar nas suas escolas. O problema é que a conexão das escolas é muito ruim e os alunos encontram dificuldades em acessar o material, apenas 15% tem computador com conexão em casa. A instituição optou por um sistema de entrega do material impresso pelo correio diretamente para o aluno e os materiais levam mais de quarenta dias para chegar. Muitas vezes são devolvidos porque não existe uma pessoa em casa para receber. O sistema escolhido pela instituição foi de entrega do material didático pelo correio diretamente para o aluno, mas o sistema está com problemas porque a entrega tem levado 40 dias para entregar. Muitos fascículos voltam pelo correio porque não tem ninguém em casa para receber. Os tutores viajam aos polos e existe uma escolha randômica, um rodízio para não criar vínculo afetivo. Tutores lançam as notas no ambiente e o mesmo tutor a distância atende as duas disciplinas. 20 minutos de vídeo por disciplina. Eles estão com muitos problemas porque os professores tutores têm entrado sistematicamente na justiça contra a Universidade e a justiça tem optado sempre em favor dos tutores. A Avaliação das disciplinas é realizada através de provas de múltipla escolha no fim do semestre para todas as disciplinas. No curso de Historia o material didático é apresentado em três versões (fascículos, áudio e vídeo), além dos materiais postados na plataforma. O sistema de acompanhamento dos alunos está prejudicado porque houve um direcionamento nos esforços para estruturar o curso enquanto os alunos ficaram sem apoio. A

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avaliação também é realizada através de provas presenciais simultâneas (seis provas de disciplinas diferentes no mesmo dia), mas a experiência foi muito ruim. Existe uma nova proposta para realizar as avaliações de forma mais fragmentada. Também estão estudando a possibilidade de provas agendáveis na plataforma por disciplina quando o aluno estiver preparado e solicitar (flexibilização e adequação ao tempo de aprendizado do aluno). 50% avaliação de conteúdo (prova), 40% plataforma, 10% seminário avaliador (Ata do I Encontro Pedagógico do Programa Pró-Licenciatura / UAB, 2009).

Neste caso, não foi encontrada solução para a estrutura da EAD no interior da

própria universidade, existem problemas na logística (tanto na entrega de materiais

quanto no uso do ambiente virtual) e as questões trabalhistas com a contratação de

tutores vem dificultando o andamento das questões pedagógicas. A instituição

apresenta estruturas diferenciadas para cada curso, e alguns iniciaram as atividades

sem sequer apresentar uma estrutura de suporte aos alunos de forma eficiente. As

dificuldades na avaliação estão exigindo uma revisão no modelo avaliativo proposto

inicialmente (provas exclusivamente objetivas) que aponta para a fragilidade do

projeto político pedagógico do curso.

Uma questão que ficou evidenciada neste encontro é a diversidade nas

estruturas dos cursos, inclusive na definição do polo de atendimento aos alunos.

Algumas instituições criaram centros de atendimento de maior porte em locais

centralizados e distribuíram os polos de apoio com estrutura menor e em maior

número para agregar os municípios vizinhos. Estes polos apenas servem como local

de distribuição de material e atendimento dos alunos pelos tutores presenciais.

A Universidade Estadual de Maringá que oferta os cursos de Pedagogia e Letras, apresenta uma estrutura diferenciada. São seis polos que congregam os municípios ao redor e cinquenta e nove CEADs (Centro de Educação a Distância) que apresentam uma estrutura mais robusta. O pólo é uma referência de organização de tutores e material didático. Os tutores presenciais são distribuídos para atender aos 1.800 alunos, não têm tutores a distância. A comunicação inicial era feita por videoconferência, mas hoje é por webconference e são gravadas aulas das disciplinas. Como material impresso são produzidos livros com capítulos escritos por professores da UEM e de outras instituições. A evasão é baixa (em trono de 17%) e o principal problema foi a intimidade que se gerou em relação tutores/alunos, já que o sistema da Universidade concede laureas acadêmicas para alunos com notas muito altas o que gerou uma crise no ensino presencial porque o maior número de alunos contemplados foi da EAD, levantando a suspeição de que houve protecionismo (Ata do I Encontro Pedagógico do Programa Pró-Licenciatura / UAB, 2009).

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É interessante observar que a preocupação com a lisura na interação entre os

tutores e os alunos é evidenciada novamente no caso da UEM. Esta é uma das

crises que ainda não foi resolvida na organização da EAD, pois o tutor ou é

esvaziado de suas funções ou vigiado de perto em nome de uma lisura no processo

avaliativo que não é justificada de forma coerente. No ensino presencial, o professor

mais preparado para avaliar o aluno é aquele que acompanha o seu

desenvolvimento de perto. Na EAD, parece ser o contrário, o professor mais

preparado é aquele que está longe, sem vínculos afetivos consolidados. Esta

preocupação tem a sua origem nos preconceitos que permeiam a EAD como uma

modalidade que facilitará a aprendizagem e o sucesso do aluno.

A UFSM (Universidade Federal de Santa Maria) apresenta uma estrutura em rede composta por oito universidades parceiras em seis cursos, distribuídos em vinte e um polos. Todas as universidades participam de todos os cursos. Cada colegiado é composto por representantes das universidades que compõem com mais força aquele curso. Houve dificuldade para preencher as vagas ofertadas porque os candidatos não se encaixavam no perfil exigido pelo edital. Material didático: edital publicado para confecção de cadernos didáticos, um para cada disciplina (totalizando cinquenta e quatro cadernos). Os professores formadores (que não eram os que produziam os caderno) podem produzir novas atividades. É realizado um encontro presencial por semestre no polo por disciplina, e o professor formador visita todos os polos. A avaliação é por prova presencial realizada nos polos e enviada para o professor corrigir. No início do semestre faz-se uma reunião com tutores, coordenadores e professores formadores. Avalia-se o que passou e se prepara para o próximo. A maior dificuldade foi a oferta da disciplina de libras. Como trabalhar libras a distância? Foi contornado com a ida mais frequente dos professores aos Polos e foram contratados pelas prefeituras tutores surdos. No curso de Geografia, a UFSM faz parte da REGESD (Rede Gaúcha de Ensino a Distância). São 171 alunos distribuídos em 7 polos, com 18 tutores a distância, sendo 3 por disciplina, e 8 presenciais (30 para cada disciplina), os tutores são selecionados por disciplinas. Cada instituição atende determinados polos. Não conta com material impresso, todo material é disponibilizado on-line na plataforma. O curso de Espanhol tem estrutura similar e a construção do material didático é realizada por professores pesquisadores com contribuição dos tutores. Existe uma equipe multidisciplinar para a produção do material didático, com capacitação dos professores pesquisadores e revisão por vários profissionais da equipe, pedagogos, diagramadores, design instrucional e, finalmente para correção de texto (Ata do I Encontro Pedagógico do Programa Pró-Licenciatura / UAB, 2009).

A organização em redes ou sistemas de EAD institucionalmente constituídos

é um desafio importante na consolidação da modalidade como construção coletiva, e

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201

não uma iniciativa isolada. A formação de redes permite a troca de experiências,

compartilhamento de informações e materiais e divisão de tarefas. Um dos aspectos

recorrentes na abordagem pedagógicas dos cursos propostos é a falta de ousadia e

inovação na execução das propostas. É possível observar que muitas IES optam por

uma avaliação presencial com questões objetivas e em outros formatos de avaliação

igualmente rígidos. Por esta razão, a proposta da UFRGS em seu curso de

Pedagogia, é realmente surpreendente.

O curso de Pedagogia da UFRGS, no Pro-Licenciatura I, inaugurou a tendência de material na web. O curso é oferecido para professores em serviço, com vestibular especial. São 5 polos, 25 professores e 60 tutores e grande acompanhamento, com índice evasão em torno de 12%. O currículo é composto com interdisciplinas e um Seminário Integrador, e a metodologia é interativa. Existe uma dificuldade na formação desses professores para trabalharem com essa metodologia diferenciada. Estratégia de formação: especialização e reunião pedagógicas. Superação da tendência conteudista na formação. O material didático foi construído antes do curso começar e sempre é revisitado e reconstruído. A avaliação é processual com acompanhamento de perto do aluno. Trabalham com portfólio, e existe uma experiência negativa com provas. Do portfólio saem os trabalhos que são submetidos a exame de banca em encontros presenciais, chamados de Workshop de Avaliação e a criação de vínculos de trabalho/formação é valorizada, na linha de comunidade de aprendizagem. Articulação teoria e prática. Parte-se de uma atividade de coleta de dados sobre determinado tema. Essa situação/dados é problematizada e enriquecida. Nos Fóruns o professor acompanha e auxilia a mediação do tutor. Faz meta leitura do que acontece e dá instruções gerais. Temos quase 80% de alunos com computador em casa, motivados em adquirir o equipamento a partir do curso e a dificuldade inicial foi fazer a alfabetização digital. O curso promoveu a inclusão digital (Ata do I Encontro Pedagógico do Programa Pró-Licenciatura / UAB, 2009).

A proposta é inovadora não apenas na avaliação, mas, sobretudo, nas

concepções de aprendizagem e no papel dos professores tutores, com definições de

funções e atribuições bem diferenciadas dos demais cursos. Ao contrário de outras

propostas que buscam uma suposta neutralidade nas relações entre

professores/tutores/alunos, o curso promove exatamente o contrário, a consolidação

de vínculos, por acreditar que é a partir desta relação que será realizada a

aprendizagem. A especificidade geográfica e distribuição no território apareceram

como um elemento determinante na condução do curso no caso da UFAM.

O curso de Educação Física da UFAM (Universidade Federal do Amazonas) foi idealizado para atender alunos em 10 polos. A idéia inicial era a formação em serviço, mas a realidade de 21 dias para

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deslocamento obrigou a adaptação e o redimensionamento da proposta inicial. Hoje são 17 Polos e o curso começou em setembro 2008. É preciso repensar a estrutura toda a estrutura. O material é apresentado em três tipos: impresso, vídeo e web. Todos os professores são doutores, mas com fragilidades para atuar na modalidade EAd. Esta fragilidade criou a necessidade de capacitação para esse fim por meio de especialização que prepara os professores pesquisadores para produção de material didático por módulos. A relação de alunos/tutores é de 25 alunos para tutores presenciais e 50 para tutores a distância. Os professores trabalham com tutores, mas também vão aos polos ocasionalmente. A prova é presencial, com avaliações formativas e uma prova final (como no presencial). Houve detecção de fraude na realização do trabalho e o problema com a acessibilidade ainda permanece, uma vez que a questão da instalação das antenas ainda não foi solucionada. O problema da falta de regularidade da bolsa faz com que tutores bons e engajados se desestimulem diante das condições de trabalho. O currículo é o mesmo do curso presencial (Ata do I Encontro Pedagógico do Programa Pró-Licenciatura / UAB, 2009).

Este é um exemplo claro de como a diversidade na realidade das instituições

não está restrita apenas ao campo da subjetividade, neste caso, a organização

social e cultural está tomada pelas referências ao espaço físico e as condições

naturais que envolvem o meio de transporte utilizado (os rios ou as vias fluviais) que

demandam até 21 dias para se chegar ao lugar de destino e até mesmo as

condições de conectividade prejudicadas pelo bioma da floresta amazônica. É difícil

acreditar que um modelo hegemônico definido em condições ideais do centro sul

pode ser ajustado à realidade regional, nesta situação.

O curso de Licenciatura em Geografia ofertado pela UEPB (Universidade Estadual da Paraíba) e UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte), partilha o material didático, mas os professores são de suas respectivas instituições. A base é o material impresso, estruturado em 12 aulas para cada disciplina. O professor autor não é necessariamente o professor formador. O tutor presencial não tira dúvida de conteúdo, é mediador, faz as pontes entre professor e aluno. Material impresso é o forte, construído com atividades e indicação de filmes. O tutor a distância faz o planejamento de atividades, interage na plataforma. A avaliação pode ser realizada por diversos suportes que são acionados pelo professor. A grande dificuldade é investir mais nas mídias e seu suporte, já que o aluno não consegue baixar arquivos pesados. Existe grande freqüência nos polos aos sábados (Ata do I Encontro Pedagógico do Programa Pró-Licenciatura / UAB, 2009).

A experiência relatada acima mostra que o compartilhamento integral do

material impresso não significa necessariamente uma uniformização na

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operacionalização pedagógica do curso. O mesmo material pode ser apropriado em

diferentes instituições, mesmo considerando que o perfil local seja semelhante. É

importante salientar que o material utilizado é construído de forma conjunta e o

projeto político pedagógico também foi organizado em parceria. É uma situação

bastante diferente do uso generalizado em todas as instituições sem a participação

efetiva na construção, como vem acontecendo no curso de Administração a

distância no âmbito da Universidade Aberta do Brasil (UAB).

A PUC Rio, em parceria com UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), oferece o curso de Licenciatura em História. Não trabalham no Rio de Janeiro e sim no Maranhão, Sergipe, Bahia e Ceará. Atendem cerca de mil alunos em vinte polos. O primeiro semestre foi difícil para promover a inclusão digital e descobrir como a Universidade ia lidar com a EAD. A proposta foi formulada pelos dois departamentos das Universidades envolvidas. O currículo tem forte marca da PUC, com salas virtuais, 15 aulas escritas, material impresso e disponível online. Não tem havido disponibilidade para fazer o material impresso chegar antes do início da disciplina. O forte tem sido a discussão virtual assíncrona nas salas virtuais. Nós não compactamos disciplinas, elas acontecem em quatro meses, e cada módulo com 5/6 disciplinas. Cada tutor trabalha com três disciplinas. Todos os tutores a distância são mestres ou doutores, alguns professores universitários. São acompanhados por interação web. Normalmente, o professor autor é um dos professores formadores. Tem sido estimulada a interação entre professores formadores e autores na elaboração das provas. Os alunos comparecem quinzenalmente aos polos, alternando 25 alunos num sábado, 25 no outro. O tutor presencial não tem obrigação de interação na web e a proposta do encontro presencial é de acompanhamento dos estudos, em cima dos relatos. Acompanhamento de perto dos tutores presenciais pela web. Coordenação acadêmica com os professore autores. Formação do tutor presencial é realizada duas vezes por semestre. Os professores acompanharão mais de perto o TCC, seminário de professores orientadores com os alunos. Estão começando o TCC no 5º período. Tem buscado buscar pelo menos uma vez por semestre fazer um “encontrão” presencial. Os tutores a distância fazem a correção das provas sob a orientação dos professores formadores (Ata do I Encontro Pedagógico do Programa Pró-Licenciatura / UAB, 2009).

Este foi um aspecto realmente surpreendente, um curso elaborado e

desenvolvido por Universidades no Rio de Janeiro e implementado em Estados do

Nordeste. É uma realidade bastante complexa, principalmente em um curso de

História em que deveriam ser privilegiadas as identidades regionais. As dificuldades

apresentadas pelos coordenadores são coerentes com a dificuldade de

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gerenciamento de uma ação desta natureza, mesmo considerando as parcerias

locais que foram realizadas.

A UNB (Universidade de Brasília) oferece o curso de Licenciatura em Educação Física, em parceria com a UFAP e UNIR. Existe uma aproximação da modalidade Ead com as práticas da universidade no presencial, tendo um único colegiado, mas dentro da universidade, a questão da EAD não está bem sedimentada. Não existe articulação entre as coordenações UAB e o Pró-Licenciatura, cada uma faz a sua parte e, às vezes, há estranhamentos. São 400 vagas, distribuídas em 2 polos em Brasília, 2 Polos em Rondônia e 1 no Amapá. O material didático é produzido pelos professores das universidades, a maioria da UnB. As atividades de aprendizagem estão na rede. Avaliação com provas presenciais e o tutor presencial dá bom suporte para os alunos nos seus estudos. O tutor a distância corrige os trabalhos, mas a responsabilidade do lançamento das notas é do professor formador, é ele que responde os recursos. O aluno preenche questionário sobre avaliação da disciplina (Ata do I Encontro Pedagógico do Programa Pró-Licenciatura / UAB, 2009).

O representante da UNB foi um dos poucos que verbalizou o desconforto

sobre a integração entre os cursos do Pró-Licenciatura e da UAB. O relato seguinte

é um belo exemplo de como é possível desenvolver propostas ousadas e

importantes socialmente na construção de um curso superior, referendada pela

apresentação da representante da Universidade que também é surda.

O curso de Letras Libras da UFSC já iniciou de forma diferenciada porque não existe na modalidade presencial. Iniciou em 2006, com 500 alunos com um percentual expressivo de surdos. Hoje, tem 1.400 alunos matriculados em duas entradas. Os polos estão localizados dentro das universidades federais de cada estado. O presencial será oferecido na UFSC, a partir desse ano, na maioria de alunos ouvintes, para formar intérpretes e não professores. As aulas são apresentadas a partir de vídeo conferências e cada pólo tem um intérprete. O índice de desistência é de 5% dos alunos, assim mesmo devido a dificuldade financeiras para freqüentar o pólo. As provas e atividades também são traduzidas em DVD e o aluno responde em papel e são levadas para correção na UFSC. Como coordenadora, visito os Polos e acompanho o desenvolvimento do curso. O maior problema é encontrar as pessoas capacitadas para trabalhar no curso (que dominem LIBRAS) e o pagamento delas porque a bolsa atrasa muito. É o primeiro programa da América Latina para formação de professores de Libras, em parceria com o MEC. Temos tutores formados em Pedagogia e Letras e com conhecimento profundo em Libras, mas a prioridade é que conheçam Libras. A formação é realizada duas vezes ao ano. Usam a plataforma Moodle para arquivamento de material (vídeos e texto), mas o material didático primordial é a vídeo conferência. Estão sendo amadurecidas as possibilidades de oferta de cursos para professores da rede, mas é um outro projeto. A ideia é que as escolas contratem os intérpretes que estamos formando já que a perspectiva é de

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formar professores de libras e também tradutores que podem atuar também na escola (Ata do I Encontro Pedagógico do Programa Pró-Licenciatura / UAB, 2009).

Outra grande surpresa na apresentação da UFES foi a constatação de que

mesmo tendo sido contemplada junto com as outras instituições em 2005, o curso só

foi iniciado efetivamente em novembro de 2008, apesar do repasse dos recursos ter

sido realizado ao mesmo tempo que as outras IES. Mesmo já realizando outros

cursos no âmbito da UAB, a Universidade apresenta muita dificuldade em relação ao

processo de divulgação, organização das disciplinas, elaboração do material

didático, o que indica que a experiência anterior não foi suficiente para consolidar as

práticas de educação a distância.

A UFES (Universidade Federal do Espírito Santo) oferece o curso de Educação Física que teve início em novembro 2008, com 800 vagas oferecidas e 510 alunos matriculados. O curso tem cinco anos de duração e uma metodologia de oferta de duas disciplinas por vez, mas já foi detectada a necessidade de prolongar o tempo pedagógico das disciplinas no ar por todo o módulo (oferta simultânea de todas as disciplinas do módulo). A avaliação é por portfólio e pecamos no início por muitas atividades solicitadas pela plataforma (a primeira disciplina pediu dezessete atividades!). O material didático é organizado em fascículos e temos tentado priorizar que o fascículo seja entregue no início da disciplina. Ele também é disponibilizado no ambiente virtual. Estamos correndo contra o tempo, não foi possível ainda exercitar possibilidade de aproveitamento de outros suportes (vídeo). Acompanhamento do curso contínuo: encontros semanais de formação e qualificação do exercício da tutoria. Relação da formação continuada propiciada pelo Pró-Licenciatura e a articulação com a pós-graduação. São 26 tutores presenciais, 25 a distância, por disciplina. Outra forma de avaliação é através das fichas de acompanhamento/avaliação dos alunos e relatórios semestrais dos tutores. Não trabalhamos com conceitos de aula e “tira dúvidas” e sim orientação acadêmica e problematização do conhecimento (Ata do I Encontro Pedagógico do Programa Pró-Licenciatura / UAB, 2009).

Os cursos de Artes Visuais, Música e Teatro realizados, em parceria com a

UFGS / UDESC / UFES/ UFBA/ UNIR, apresentaram como aspecto interessante no

desenvolvimento do seu trabalho a autoria colaborativa entre professores de

diversas instituições. É aberto um espaço no site para que cada um coloque as suas

contribuições. A equipe é liderada por um coordenador e o resultado é um e-book. O

professor que contribui assina um termo de cessão do material. Este modelo

interessou bastante aos representantes do MEC porque viabiliza a idéia de

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compartilhamento de materiais de forma irrestrita entre as IES que receberam

financiamento público, o que diminuiria os custos para a expansão de novos cursos.

Já no curso de música realizado em pareceria com a UFG/ UFMA/UFRGS/

UNB/ UNIMONTES/UNIR, que também iniciaram as atividades em Junho de 2008, o

convênio não tem a mesma funcionalidade de consórcio, porque a cooperação está

restrita ao desenvolvimento de uma grade curricular comum. Embora a UNB

desenvolva o material didático, cada instituição é livre para elaborar o seu próprio

material, assim como cada uma é responsável pela certificação.

Os relatos apresentados apontam para um nível complexo na diversidade e

pluralidade das concepções, estrutura e organização pedagógica dos cursos a

distância das IES envolvidas no Pró-Licenciatura. Na síntese apresentada pelo

grupo na ata do encontro, a diversidade ficou evidenciada como algo surpreendente

e positivo, que deve ser respeitado pelo governo federal. O documento de conclusão

da reunião revela a preocupação dos integrantes do Pró-Licenciatura com a

manutenção dos projetos na forma em que foram idealizados, e a garantia do

financiamento para a conclusão dos cursos dentro do modelo proposto,

aprofundamento das discussões sobre o papel da tutoria, e utilização do material

desenvolvido pelas IES com ressalvas.

Ficou evidenciado que o Pró-Licenciatura tem se efetivado através de experiências muito diferenciadas, ainda que com questões comuns e que precisam ser enfrentadas coletivamente e para as quais indicamos que sejam criados espaços (presenciais e virtuais) com tempo para desenvolvimento de questões específicas, que possibilitem o aprofundamento de discussão e sistematização dos seguintes pontos: − Questão: condições de infraestrutura/recursos humanos/ técnica/administrativo/pedagógica/financeira para encerramento dos cursos em andamento. Síntese do grupo: favoráveis a manutenção das condições para que os cursos em andamento terminem com a mesma configuração dos projetos que foram aprovados. Destaque: preocupação ao fato de ter havido cortes nas planilhas que hoje se revelam parte dos critérios de avaliação dos cursos/Polos. Sugestão: garantia das condições infraestrutura/recursos humanos/ técnica/administrativo/pedagógica/financeira acordadas durante os processos de implementação dos cursos. − Migrar deve ser aproveitar as experiências positivas construídas e redimensioná-las de acordo com a proposta da UAB (Ata do I Encontro Pedagógico do Programa Pró-Licenciatura / UAB, 2009).

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Ficou bastante claro que os integrantes estavam realmente preocupados com

os prejuízos que a migração para a UAB poderia acarretar aos cursos em

andamento, porque ficou evidenciado que as ações do Pró-Licenciatura se

caracterizaram pela flexibilidade na concepção, produção e implementação dos

cursos. Esta preocupação ficou registrada no documento, na afirmação de que

existe a “necessidade maior flexibilidade na gestão dos recursos, visando garantir a

produção do curso e de seus materiais (com suas formas de produção e

distribuição)”.

A resposta dos representantes do governo foi bastante evasiva, com a

afirmação de que “serão aproveitados os polos que forem interessantes

geopoliticamente para a UAB, que ofertarem a estrutura necessária e o que for

melhor de cada curso”. Aqui cabe uma reflexão sobre o discurso da qualidade que

permeou todo o encontro e sobre a necessidade de migração. O fato é que

nenhuma das IES presentes havia solicitado a migração para o sistema UAB. Pelo

contrário, a síntese do documento mostra a preocupação dos participantes com a

necessidade de migração e quase todos conhecem e possuem o sistema UAB em

suas Universidades. O interesse na apropriação dos polos do Pró-Licenciatura está

relacionado com a necessidade de se cumprir metas numéricas de expansão da

EAD, e os atuais gestores da UAB não consideram que outros modelos possíveis

possam ser utilizados na estrutura da UAB. Isso ficou bem claro na exposição que

foi realizada na abertura do encontro, que retratou apenas a estrutura da UAB e

todas as falas relacionadas com o Pró-Licenciatura estavam focadas em palavras

como precária, sem estrutura, falta de qualidade, entre outras questões.

Este discurso que já posiciona a ação governamental em relação aos cursos

do Pró-Licenciatura não foi estruturado em nenhum dado concreto ou apresentação

de situações que comprovassem a suposta precariedade. É interessante observar

que os cursos de Matemática, Física, Química, Geografia, Música e Artes, tanto no

Pró-Licenciatura Fase 1, quanto no Pró-Licenciatura Fase 2, receberam verbas

significativas para estruturar os seus laboratórios de atividades práticas. Os mesmos

cursos na UAB estão em luta contínua para convencer os financiadores da

importância dos laboratórios e, recentemente, os cursos de Química e Biologia

conseguiram verbas (bem modestas) para implementação, enquanto outros ainda

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não obtiveram sinalização de que terão as mesmas condições (como Geografia,

Artes, Música e Teatro).

Outra questão importante registrada na ata é a definição dos critérios de

qualidade, pois a maioria dos cursos sofreu cortes em suas planilhas e por esta

razão não compraram todos os livros e equipamentos que desejavam. Como o

governo fará a avaliação neste momento, se foi o próprio que restringiu os recursos,

como registrado na ata “a retirada de elementos importantes que foram cortadas ao

longo da negociação acabaram comprometendo o desenvolvimento do curso”. A

resposta dos representantes do governo é que algumas instituições receberam o

financiamento, mas não cumpriram as metas estabelecidas nas planilhas.

Verificamos aqui que uma questão que deveria ser tratada como desvio de dinheiro

público estava sendo confundida com avaliação e critérios de qualidade.

Outra questão que não ficou clara no processo de migração está relacionada

com o aproveitamento dos polos do Pró-Licenciatura. Na apresentação dos

representantes governamentais foram mencionados os problemas encontrados

pelos avaliadores nos polos, entre eles: polos inativos, infraestrutura inadequada,

ausência de livros, computadores insuficientes, polos sem conexão, material

impresso não disponibilizado, entre outras irregularidades. A avaliação apresentada

não se referia exatamente aos polos do Pró-Licenciatura, mas ficou claro que a

expectativa do MEC em relação a avaliação dos polos do Pró-Licenciatura era

exatamente essa. O gráfico a seguir mostra a situação dos polos do Pró-Licenciatura

em relação aos outros programas de EAD do governo.

FIGURA 11: Gráfico da Situação dos Polos do Pró-Licenciatura e Outros Programas

21381%

208% 2

1%

2710%

PROLIC/UAB

PROLIC/UAB E PILOTO

PROLIC/PILOTO

PROLIC

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Fonte: Material apresentado no I Encontro Pedagógico do Programa Pró-Licenciatura/UAB

Outro interesse governamental colocado no encontro foi a disponibilidade

para o uso do material desenvolvidos nas IES, uma vez que todos foram financiados

pelo MEC. O uso irrestrito esbarra em questões legais e várias orientações foram

fornecidas sobre a assinatura de acordos de cessão do material, preservando a

autoria. Existe ainda muita resistência dos professores na cessão dos direitos,

principalmente porque o material é desenvolvido em um contexto específico para um

determinado público alvo. A universalização do uso, incluindo recortes e adaptações

poderiam comprometer a qualidade do texto desenvolvido pelo autor, afetando a sua

credibilidade acadêmica. A síntese do grupo na ata registrou a posição dos

participantes sobre o assunto.

Questão: Estudar a possibilidade de disponibilização e utilização de material didático produzido por outras experiências de curso e não a imposição de implantação.Síntese do grupo: favoráveis a disponibilização sem prejuízos da possibilidade de criação e recriação de novos Materiais Didáticos.Sugestão: Garantir a manutenção dos financiamentos para produção, correção, revisão, tradução, atualização, pelos próprios autores. Garantir a possibilidade de produção de novos materiais didáticos dada a continuidade de produção do conhecimento. Por material didático entendemos toda a produção didática em diferentes suportes (impresso, vídeo, digital etc) (Ata do I Encontro Pedagógico do Programa Pró-Licenciatura / UAB, 2009).

O papel da tutoria, bem diversificado nas atribuições e funções nas IES, foi

colocado como um assunto complexo que precisa ser melhor discutido e revisado,

evidenciando que existe uma preocupação e descontentamento com o modelo que

está sendo utilizado hoje, seja nas suas concepções pedagógicas ou nas condições

de trabalho propostas. Na síntese do grupo, existe um entendimento que este papel

precisa de uma ressignifição urgente com possibilidade de flexibilização e adaptação

diante das diferentes realidades existentes.

Questão: necessidade de discussão aprofundada de ressignificação do papel/função/atribuição do tutor/tutoria, na medida em que, em algumas instituições, eles assumem e exercem claramente funções de professor. Aparecem aqui as diferentes concepções de tutoria/orientação/mediação acadêmica.Síntese do Grupo: respeitar os diferentes entendimentos/ configurações em curso, de modo a permitir que as experiências sejam sistematizadas e teorizadas.

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Sugestão: ampliação dessa discussão para outras afins (por exemplo, entre outras, explicitação do papel/função/atribuição do professor formador/professor pesquisador). Criação de eventos presenciais ou grupos de trabalho específicos para amadurecimento e encaminhamento da discussão e seus desdobramentos (Ata do I Encontro Pedagógico do Programa Pró-Licenciatura / UAB, 2009).

Os relatos dos cursos integrantes do Pró-Licenciatura evidenciam a

diversidade e pluralidade na concepção pedagógica dos seus cursos, que poder

sem mais conservadoras e reprodutoras dos cursos presenciais, ou mais ousadas

com uma apropriação mais efetiva das tecnologias na condução do seu processo

pedagógico. As diferentes concepções de tutoria, elaboração do material didático,

organização curricular, apontam para a necessidade de uma flexibilidade na

estrutura dos cursos a distância, exatamente da mesma forma que são realizados no

presencial. Se a diversidade dificulta o controle governamental e a implementação

de normas (legislativas e administrativas), ela também permite que a inovação se

revele e que novos caminhos na formação de professores sejam construídos e

realizados. A existência de um modelo hegemônico de EAD reprime as experiências

inovadoras, engessa o currículo e uniformiza a diversidade. Esta ação gera

ressentimentos nos gestores, professores, tutores e alunos, que buscam a

flexibilidade na EAD e encontram imobilidade. Foi exatamente esse percurso que

buscamos construir neste capítulo, associando toda a experiência de construção do

Pró-Licenciatura aos novos caminhos da educação no contexto da sociedade

informacional.

5.10 Nuvem de tags do capítulo

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6 CONCLUSÃO: REFLEXÕES SOBRE O PERCURSO DA PESQUISA E AS POSSIBILIDADES DE NOVOS CAMINHOS

Dan Perjovschi . What Happened to us?

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Esta pesquisa foi iniciada, a partir das nossas inquietações e dúvidas em

relação aos caminhos que estavam sendo construídos para a EAD, em diferentes

contextos ao longo da história. Um aspecto surpreendente é que o fato de estarmos

inseridos no processo de construção, em alguns momentos como atores, em outros

como expectadores, não foi um elemento facilitador pleno para a sistematização das

questões. Estar próximo ao objeto não significa, necessariamente, isenção ou

compreensão da totalidade que se apresenta sobre um determinado tema. Pelo

contrário, em alguns momentos, a necessidade de distanciamento pode até ser

bastante dolorosa, mas esse é um dos obstáculos que precisamos superar como

pesquisadores. Assim, de uma ideia surgiu a motivação para a pesquisa, que virou

um projeto e, finalmente, uma tese. Chegamos ao fim do percurso com muitas

questões esclarecidas, e o que não foi possível desvendar completamente, ficou

com a indicação de possíveis caminhos para outras pesquisas.

O caminho mais fácil para responder a nossa questão inicial sobre as

diferenças de uma política pública como o Pró-Licenciatura e a sua sucessora,

Universidade Aberta do Brasil, era realizar uma comparação entre as duas políticas,

estabelecendo as suas convergências e diferenças. Porém, a opção teórica por um

campo complexo,como os Estudos Culturais, não nos permitiria uma modelagem

simplista da questão. Era necessário reconstruir o seu percurso de criação,

colocando voz aos sujeitos que participaram de forma efetiva do processo, buscando

analisar todos os movimentos e qualificar as suas ações. Ao nos aprofundarmos,

cada vez mais, nos caminhos e estratégias utilizados para a implementação do Pró-

Licenciatura, encontramos a totalidade da proposta e desvelamos elementos que

sequer faziam parte de nossas questões iniciais. Neste sentido, a pesquisa ganhou

força, ganhando impulso e identidade ao longo do seu processo de construção. A

existência de um diálogo consistente entre professores das IES, representantes de

diversos setores da Educação Básica e o próprio governo, apontava para um

processo dialógico, no qual a pluralidade e diversidade estavam evidenciadas de

forma inequívoca.

O processo de pesquisa estaria bem simplificado se apontássemos apenas o

movimento de diálogo como algo harmonioso, linear e contínuo, entretanto, mais

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uma vez, o nosso referencial teórico nos obrigou a desvelar as relações de poder

que constituíam o diálogo, aparentemente equilibrado. Encontramos as resistências,

as ações hegemônicas e a necessidade de consolidação de estratégias que

garantiram a implementação de políticas mais abertas. Aqui cabe uma observação:

Estado é Estado, não importa o quão democrático se proponha a ser, será sempre

um representante de um determinado grupo que alcançou o poder, em um

determinado momento. Porém, a proposta de uma articulação entre todos os

interessados em construir o processo garantiu, não a aceitação de um modelo

elaborado pelos participantes, mas que as questões centrais fossem discutidas e

acordadas entre todos. Houve perda, a ação do Estado como regulador não deixou

de existir, contudo o diálogo estava posto e os resultados foram evidenciados nas

publicações e nos resultados dos editais.

O diálogo para a construção das editais e dos critérios de seleção das IES

apontava para relações de poder desiguais entre os diversos grupos que

participavam do processo, mas a orientação governamental para a organização dos

consórcios fortaleceu as vozes mais frágeis, apesar dos resultados iniciais não

favorecerem diretamente os grupos menores.

Por outro lado, o percurso mais amplo, no qual o debate na diversidade de

ideias foi privilegiado, não garantiu que as ações de implementação dos cursos de

Licenciatura a distância fossem realizados nos padrões de eficiência e eficácia

desejados. A análise da situação dos cursos, quatro anos depois da publicação dos

editais, aponta para a necessidade de muitos ajustes e modificações. Porém, os

resultados negativos estão relacionados, em sua grande maioria, com o próprio

descaso da política pública em propiciar a continuidade das experiências do que

propriamente com as singularidades e diversidades dos projetos. No resultado da

reunião para a proposta de migração dos cursos e polos do Pró-Licenciatura para a

UAB, foi unânime a percepção dos envolvidos sobre a riqueza e a multiplicidade das

propostas no âmbito do Pró-Licenciatura. Justamente da diversidade de proposta

surgiram ações interessantes e eficazes que podem modificar, não apenas a

concepção de EAD que temos hoje, mas apontar novos rumos também para os

cursos presenciais.

A não continuidade do Pró-Licenciatura exige uma reflexão cuidadosa sobre o

processo. Como foi mostrado neste trabalho, o Pró-Licenciatura é substituído pela

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Universidade Aberta do Brasil, a partir da realização de uma única reunião do Fórum

das Estatais, em agosto de 2005. Rapidamente é lançado um edital em dezembro

de 2005, mas a criação oficial da UAB só acontece em junho de 2006. Durante esse

processo, os cursos do Pró-Licenciatura continuaram seus trâmites de implantação,

devidamente assessorados pela SEED/MEC, mudando de órgão gestor com

freqüência (FNDE, SEB, SEED etc.). Em nenhum momento ao longo do processo foi

decretado o fim do Pró-Licenciatura, embora os problemas financeiros, no que diz

respeito ao repasse das verbas e pagamento de bolsas, tenham se tornado uma

constante para as IES participantes. Somente em abril de 2009, os representantes

do governo, agora na Diretoria de EAD da CAPES, comunicam o fim do Pró-

Licenciatura, através da proposta de migração para a UAB. Por força de um

processo de migração mal explicado, os polos serão apropriados pelo “Sistema

UAB” e os cursos finalizados. Não existe explicação plausível, o investimento

realizado não é justificado nem aproveitado, e, pior ainda, nos últimos dois anos, a

UAB foi considerada como a primeira e única iniciativa de EAD no país.

Como modelo pronto, a UAB representa determinados grupos que

compreendem a Educação a Distância como um paradigma hegemônico, no qual é

possível realizar matrículas em grande quantidade, apresentando números

surpreendentes no crescimento do Ensino Superior. O discurso é fundamentado em

números impactantes de polos, municípios atendidos, crescimento de matrículas e

cursos oferecidos. A qualidade existe como um discurso disciplinador para as IES

que não seguirem o padrão de qualidade determinado pelo MEC, incluindo a

concordância com o modelo proposto. Não existe um projeto pedagógico, não é

apresentada nenhuma fundamentação teórica para justificar as estratégias na

consolidação dos cursos e polos. Fala-se em “geopolítica” dos polos e se apresenta

diagramas que não traduzem uma política clara de EAD no ensino superior que

esteja dissociada do incremento nos números. Podemos afirmar, diante do discurso

governamental oferecido, que o modelo de EAD implementado atualmente

apresenta convergência com a proposta fordista no processo de educação de

massas, apesar da roupagem tecnológica com a qual foi revestida.

O fato é que toda inovação, sobretudo na educação, deve ser realizada com

cautela na experimentação de novas modalidades, especialmente, as que utilizam

forte agregado tecnológico, como é o caso da EAD. É preciso consolidar as

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propostas, criar a cultura digital, associar os recursos tecnológicos ao processo de

aprendizagem, adaptar os alunos ao novo ritmo de acesso à informação e avaliar

cada etapa cumprida, cada recurso utilizado. A validação do material utilizado é mais

do que necessária, é urgente, seja ele impresso ou em outras mídias. O incremento

de cursos superiores na modalidade a distância propiciou o surgimento de muitas

pesquisas na área, mas muito ainda precisa ser feito. O uso dos ambientes virtuais

de aprendizagem e todos os impactos provenientes da inserção das tecnologias na

aprendizagem ainda não foram avaliados suficientemente para que se possa

concluir os seus obstáculos e benefícios. Diante de um processo em construção, as

iniciativas são válidas e não faz sentido não apropriar as inovações tecnológicas e a

flexibilidade na aprendizagem para a formação de professores. Nada mais coerente

do que propor mudanças para quem pode transformar a realidade – a sua própria, a

de seus alunos, da escola e da sua comunidade – no contexto de um mundo em

constante transformação. O Pró-Licenciatura é uma proposta que possibilita a

construção na perspectiva da qualidade, já que a seleção de seus projetos analisa a

qualidade dos seus projetos, da equipe e da proposta do curso. Não estava

fundamentada em incremento de matrículas ou demandas de agentes públicos. A

implementação dos cursos a distância, com um processo de avaliação em paralelo,

é a garantia de que possíveis desvios poderão ser corrigidos em tempo hábil e

novas soluções poderão ser criadas durante o processo.

As razões para a substituição do Pró-Licenciatura não estão claras, temos

mais dúvidas do que respostas, principalmente, porque foi retirado um programa que

tinha uma fundamentação sólida na sua proposta e nos seus objetivos, assim como

um detalhamento profundo da sua operacionalização. A substituição por um

“sistema” que não consegue sequer apresentar uma definição para si mesmo,

esvaziado de qualquer referencial pedagógico ou metodológico, é realmente uma

surpresa. Como política pública, seria necessária uma análise nas relações internas

de poder e na conjuntura política. Como proposta de educação e melhoria na

formação de professores, é lamentável que retrocessos como esse ainda aconteçam

em um momento tão favorável no cenário político e econômico do país.

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________. Portaria nº 4.361, de 29/12/2004, dispõe sobre os processos de credenciamento, recredenciamento e descredenciamento de instituições de ensino superior, além de outros processos afins, deverão ser protocolizados por meio do SAPIENS/MEC.

________. Resolução/CD/FNDE nº 34, de 06/08/2005. Dispõe: sobre os critérios e os procedimentos para a apresentação, seleção e execução de projetos de cursos de licenciatura para professores em exercício nas redes públicas nos anos/séries finais do ensino fundamental e/ou médio, na modalidade de educação a distância.

________. Portaria nº 17, de 04/10/2005. Constitui a Comissão de Seleção e Julgamento, incumbida de realizar os procedimentos de seleção, julgamento, pontuação, classificação e aprovação dos projetos de curso de Língua Portuguesa, Língua Estrangeira, História, Geografia e Artes.

________. Portaria nº 18, de 04/10/2005. Constitui a Comissão de Seleção e Julgamento, incumbida de realizar os procedimentos de seleção, julgamento, pontuação, classificação e aprovação dos projetos de abertura de novas turmas em cursos existentes de Ciências Biológicas, Matemática e Química.

________. Portaria nº 20, de 19/10/2005. Constitui a Comissão de Seleção e Julgamento, incumbida de realizar os procedimentos de seleção, julgamento, pontuação, classificação e aprovação dos projetos de curso de Educação Física, Ciências Biológicas, Matemática, Química e Física.

________. Resolução nº 34, de 09/08/2005. Dispõe sobre os critérios e procedimentos para apresentação, seleção e execução de projetos de cursos do Programa Pró Licenciatura.

________. Resolução CNE/CP nº 1, de 17/11/2005 - Altera a Resolução CNE/CP nº 1/2002, que institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior, curso de Licenciatura de graduação plena.

________. Portaria nº 3185, de 15 de setembro de 2005 - Constitui a Comissão de Elegibilidade.

________. Propostas Conceituais e Metodológicas – Pró-Licenciatura. Secretaria de Educação a Distância - SEED. Brasília, 2005.

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