universidade federal da bahia faculdade de … · deixado pelo governo fernando henrique cardoso...

103
UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO ALBERTO ÁLVARO VASCONCELOS LEAL NETO A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL INTEGRADA AO ENSINO MÉDIO NO GOVERNO LULA: UMA ANÁLISE À LUZ DA CATEGORIA TRABALHO. Salvador 2010

Upload: vunguyet

Post on 09-Feb-2019

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

FACULDADE DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

ALBERTO ÁLVARO VASCONCELOS LEAL NETO

A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL INTEGRADA AO ENSINO MÉDIO NO GOVERNO LULA: UMA ANÁLISE À LUZ DA CATEGORIA TRABALHO.

Salvador 2010

Page 2: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

ALBERTO ÁLVARO VASCONCELOS LEAL NETO

A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL INTEGRADA AO ENSINO MÉDIO NO GOVERNO LULA: UMA ANÁLISE À LUZ DA CATEGORIA TRABALHO.

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação, Faculdade de Educação, Universidade Federal da Bahia, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Educação. Orientadora: Prof.ª Dr.ª Maria Regina Filgueiras Antoniazzi

Salvador

2010

Page 3: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

UFBA/ Faculdade de Educação – Biblioteca Anísio Teixeira

L435 Leal Neto, Alberto Álvaro Vasconcelos. A educação profissional integrada ao ensino médio no Governo Lula: uma análise à luz da categoria trabalho / Alberto Álvaro Vasconcelos Leal Neto. – 2010. 102 f.

Orientadora: Profa. Dra. Maria Regina Filgueiras Antoniazzi.

Dissertação (mestrado) – Universidade Federal da Bahia. Faculdade de Educação, Salvador, 2010.

1. Ensino profissional. 2. Trabalho. 3. Ensino médio. 4. Educação para o

trabalho. I. Antoniazzi, Maria Regina Filgueiras. II. Universidade Federal da Bahia. Faculdade de Educação. III. Título.

CDD 373.246 – 22. ed.

Page 4: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

ALBERTO ÁLVARO VASCONCELOS LEAL NETO

A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL INTEGRADA AO ENSINO MÉDIO NO GOVERNO LULA: UMA ANÁLISE À LUZ DA CATEGORIA TRABALHO.

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação, Faculdade de Educação, Universidade Federal da Bahia, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Educação.

Aprovada em 18 de junho de 2010.

Banca Examinadora

Maria Regina Filgueiras Antoniazzi – Orientadora____________________________ Doutora em Ciências Sociais pela Universidade Federal da Bahia, Salvador-Bahia-Brasil. Universidade Federal da Bahia

Luciano Sérgio Ventin Bomfim___________________________________________ Doutor em Filosofia pela Universitaet Gesamthochschule Kassel, Alemanha. Universidade do Estado da Bahia

Gaudêncio Frigotto____________________________________________________ Doutor em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Universidade Estadual do Rio de Janeiro

Page 5: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

A Jorge e Teresa, meus pais, por me darem a oportunidade de existir. Marina, minha companheira, por me ensinar o caminho dos livros.

Page 6: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

AGRADECIMENTOS

É fundamental agradecer a todos aqueles que direta ou indiretamente contribuíram para a materialização dessa dissertação. Assim agradeço: A meus pais, Jorge e Teresa, por me mostrarem que o mais importante nessa vida é fazer o bem as outras pessoas. A meus avós, Alberto e Rosalva, pelo carinho, atenção e constante incentivo. A Marina por tudo: pelo apoio incondicional desde o início do processo seletivo do mestrado em 2007, pelo amor, carinho e atenção nesses oitos anos de relacionamento. A minha irmã, Danielle, que apesar de distante geograficamente sempre esteve ao meu lado nessa caminhada. A minha querida e maravilhosa orientadora, Maria Regina Filgueiras Antoniazzi, pela dedicação, atenção, carinho e cuidado em todas as etapas do mestrado. Aos professores Gaudêncio Frigotto e Luciano Bomfim por aceitarem, prontamente, o convite para participarem da avaliação desta dissertação. A minha tia Terezinha, além de minha madrinha, minha guardiã no uso da língua portuguesa. A Amparo e Zorildo pelo apoio fundamental na infra-estrutura doméstica. Ao Lemarx e todos os seus integrantes, Francisco, Sandra, Luciana, Camilo, Manuela, Bárbara, Eduardo, Yuri, Simone, Bernardo e Rilmar por me mostrarem que outra forma de sociabilidade é possível. A Edenice, Chico e Lisiane, pessoas maravilhosas que apareceram a pouco tempo na minha vida e que espero que continuem para sempre. Ao Programa de Pós-Graduação em Educação e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela concessão de bolsa para a realização do mestrado.

Page 7: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

O mundo dividido em pobres e ricos é também o da divisão entre privilegiados e espoliados; gente que tem bens e acessos a outros bens, materiais e simbólicos, e gente desprovida e excluída, maltratada e sofrida. Na lógica dessa divisão social, geralmente se explica a condição de pobre e da pobreza como a da falta de, ou só ter pouco de; por exemplo; baixo nível educacional ou analfabeto, logo trabalho ou emprego de baixa remuneração. Raramente as pessoas compreendem ou explicam que se é pobre exatamente porque não teve acesso à educação e aos meios de produção; porque historicamente foi excluída da participação na riqueza socialmente produzida. Eis, então, as razões de sermos desiguais e desigualmente participarmos da vida no planeta e nele, no lugar em que estamos.

Gey Espinheira, 2003

Page 8: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

RESUMO

Esta dissertação analisa a trajetória de objetivação da proposta de educação profissional integrada ao ensino médio no Governo do presidente Lula da Silva – no período de janeiro de 2003 a dezembro de 2008 – à luz da categoria trabalho. Partindo da revisão da literatura pertinente às áreas de Filosofia, Sociologia e Economia do Trabalho, juntamente com a produção acadêmica realizada por pesquisadores da área de Trabalho e Educação, destacamos a centralidade dessa categoria ao longo da história humana e como têm sido realizadas as conexões entre Trabalho e Educação no interior da escola de nível médio, com ênfase para a sociedade capitalista, hoje hegemônica. Em seguida, a partir da análise dos documentos oficiais, (leis, decretos, documento-base, etc.) que fundamentam e dão base jurídico-institucional para a materialização da proposta de educação profissional integrada ao ensino médio, nos seis anos do governo Lula, sinalizamos as possibilidades e os limites de efetivação dessa proposta, tendo em vista o legado deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então adotadas em prol da integração entre formação básica e formação específica. Por fim, ao realizamos uma síntese da trajetória dessa modalidade de educação, verificamos que apesar do discurso e de algumas ações favoráveis a integração entre educação profissional e ensino médio, a objetivação dessa política pública no Governo Lula processa-se mediante um percurso ambíguo, marcado pelos antagonismos de classe, e que em sua essência não conseguiu modificar o horizonte produzido pela reforma educacional brasileira empreendida a partir da década de 1990. Palavras-chave: Trabalho. Educação Profissional. Ensino Médio. Educação Integrada.

Page 9: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

ABSTRACT

This dissertation analyzes the trajectory of achievement of the proposal of professional education integrated with High School in President Lula’s government – in the period from January 2003 to December 2008 – in the perspective of work category. Starting from the review of the literature concerning the fields of Philosophy, Sociology and Work Economy, along with the academic production developed by researchers in the field of Work and Education, we emphasized the centrality of this category throughout human history and how connections between Work and Education in the inside of high schools have been accomplished, underlining the capitalist society, which is hegemonic nowadays. Afterwards, through the analysis of official documents (laws, decrees, base-documents etc) which found and provide the judicial-institutional basis to the fulfillment of the professional proposal integrated with high school, in the six years of Lula’s government, we indicated the possibilities and the limits in the effectiveness of this proposal, considering the legacy left by Fernando Henrique Cardoso’s government (FHC) and the measures adopted until it in benefit to the integration between basic formation and specific formation. Finally, as we made a synthesis of the trajectory of this education framework, we noticed that, in spite of the discourse and of some favorable actions to the integration between professional education and high school, the fulfillment of this public policy in Lula’s government occurs through an ambiguous way, marked by class antagonisms, and that, in its essence, it could not change the horizon produced by the Brazilian educational reform endeavored from the 1990’s. Keywords: Work. Professional Education. High school. Integrated Education.

Page 10: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ANPED Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação

BID Banco Interamericano de Desenvolvimento

CEB Câmera de Educação Básica

CLT Consolidação das Leis do Trabalho

CNE Conselho Nacional de Educação

DCNEM Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio

DEM Democratas

FHC Fernando Henrique Cardoso

FGTS Fundo de Garantia por Tempo de Serviço

FMI Fundo Monetário Internacional

GT Grupo de Trabalho

IDEB Índice de Desenvolvimento da Educação Básica

LDB Lei de Diretrizes e Bases

MEC Ministério da Educação

PROEP Programa de Expansão da Educação Profissional

PSDB Partido da Social Democracia Brasileira

PT Partido dos Trabalhadores

PFL Partido da Frente Liberal

SEB Secretaria de Educação Básica

SEMTEC Secretaria de Educação Média e Tecnológica

SETEC Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica

SENAC Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial

SENAI Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial

OPEP Organização dos Países Exportadores de Petróleo

Page 11: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

SUMÁRIO

f.

1 INTRODUÇÃO................................................................................................ 12

2 TRABALHO E SOCIEDADE.......................................................................... 16

2.1 DO TRIPALIUM AO TRABALHO ENQUANTO VOCAÇÃO...........................

16

2.2 DO INTERCÂMBIO ORGÂNICO COM A NATUREZA AO TRABALHO ASSALARIADO...............................................................................................

19

2.3 TRANSFORMAÇÕES NO CAPITALISMO A PARTIR DOS ANOS 1970 E OS EFEITOS PARA A CLASSE TRABALHADORA.......................................

25

2.4 TRABALHO E O NOVO CICLO CAPITALISTA..............................................

29

3 TRABALHO E EDUCAÇÃO...........................................................................

34

3.1 O DEBATE EM TORNO DOS FUNDAMENTOS ONTOLÓGICO-HISTÓRICOS..................................................................................................

34

3.2 ESCOLA E TRABALHO NO BRASIL A PARTIR DO SÉCULO XX................

40

3.3 A REFORMA DO ENSINO MÉDIO E DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO BRASIL NOS ANOS 1990..............................................................................

45

4 A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL INTEGRADA AO ENSINO MÉDIO NO GOVERNO LULA: UMA ANÁLISE À LUZ DA CATEGORIA TRABALHO..

52

4.1 O LEGADO DO GOVERNO FHC...................................................................

54

4.2 O PRIMEIRO MANDATO DO PRESIDENTE LULA E AS PRIMEIRAS AÇÕES EM TORNO DA INTEGRAÇÃO........................................................

60

4.3 O SEGUNDO MANDATO E A EMERGÊNCIA DE NOVAS MEDIDAS EM TORNO DA INTEGRAÇÃO............................................................................

67

4.4 CONCEPÇÕES E PRINCÍPIOS DA INTEGRAÇÃO: PROBLEMATIZANDO O DOCUMENTO BASE DO MEC...................................................................

75

5 CONSIDERAÇÕES........................................................................................ 82

REFERÊNCIAS.............................................................................................. 88

APÊNDICES................................................................................................... 96

Page 12: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

Apêndice A – Relação de Documentos Oficiais 97

Apêndice B – Cronologia da Integração no governo Lula 99

Page 13: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

12

1 INTRODUÇÃO

A vida social é essencialmente prática. Todos os mistérios que seduzem a teoria para o misticismo encontram a sua solução racional na práxis humana e no compreender desta práxis. (MARX, 1982, p.3).

Ao analisarmos a história da educação escolar brasileira, identificamos que a

independência entre formação geral e formação específica para o trabalho tem sido

uma das suas principais marcas.

Reflexo da propriedade privada1 e da divisão da sociedade em classes

sociais2, essa separação tem se materializado em nosso país a partir de um modelo

dualista de educação. Modelo que segundo Frigotto e Ciavatta (2004, p.21) oferece,

“por um lado uma educação propedêutica destinada a preparar o educando para o

acesso a níveis superiores de ensino, e por outro, uma formação de caráter técnico-

profissionalizante centrada no ideário da preparação para atender o mercado de

trabalho”.

Em linhas gerais, essa tem sido a direção dada à educação profissional e ao

ensino médio, desde as primeiras propostas de estruturação e organização do

sistema escolar brasileiro, no início do século XX.

Não o bastante, apesar das inúmeras reformas realizadas durante esse

período3, e as particularidades de cada momento histórico, a dualidade estrutural

tem permanecido como a categoria de análise por excelência da configuração do

sistema escolar no Brasil, tanto no último século quanto na primeira década do

século XXI.

Entretanto, com a eleição do representante do Partido dos Trabalhadores

(PT) para presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva, em outubro de 2002,

criou-se uma série de expectativas por parte de muitos educadores que lutavam por

1 Frigotto (2005, p.62) destaca que é crucial que se distinga a propriedade que temos de determinados objetos ou coisas que são para uso de quem as possui – casa, carro, terra, etc.com a propriedade privada que no capitalismo é utilizada como capital para incorporar trabalhadores assalariados que produzam para quem tem este capital. 2 No Manifesto do Partido Comunista (1848) Marx destaca que a sociedade capitalista se divide cada vez mais em duas grandes classes (fundamentais), burgueses e proletários, sendo que a principal característica da primeira é a propriedade dos meios de produção social e a segunda, por não disporem de meios próprios de produção são obrigados a vender a única propriedade que dispõem, a força de trabalho para sobreviver. Vale destacar que além das classes fundamentais o próprio Marx aponta uma múltipla gradação das posições sociais no interior da estruturação da sociedade. 3 Em relação às reformas do ensino secundário, no século XX, confira Kuenzer (2007).

Page 14: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

13

um projeto educacional comprometido com a classe trabalhadora em relação a

possíveis mudanças estruturais na sociedade e na educação brasileira.

No âmbito educacional, por exemplo, esperava-se que ao assumir a

presidência, Lula da Silva desse início à materialização de um conjunto de princípios

e metas contidos no seu programa político para a educação denominado Uma

Escola do Tamanho do Brasil.

Este documento, ao realizar um diagnóstico crítico da política educacional

empreendida nos oitos anos do governo Fernando Henrique Cardoso (FHC),

destacava a necessidade da defesa de uma educação básica gratuita e laica, a se

efetivar na esfera pública do Estado democrático. Ao mesmo tempo em que

defendia a criação de uma escola unitária como forma de contribuir para a

superação do dualismo da organização social brasileira, com reflexo no sistema

educacional.

Diante das observações preliminares, e considerando nossas inquietações

em relação aos rumos da política pública brasileira para a educação básica e

profissional, elegemos como objetivo dessa dissertação analisar a trajetória de

objetivação da proposta de educação profissional integrada ao ensino médio no

Governo do presidente Lula da Silva - no período de janeiro de 2003 a dezembro de

2008 - à luz da categoria trabalho.

A opção pela análise dessa trajetória, a partir da categoria trabalho, justifica-

se pelo fato da sociedade brasileira estar inserida no contexto hegemônico da

mundialização do capital, cujo modo de reprodução centra-se na mercadoria

trabalho, isto é, trabalho humano. Assim, a categoria trabalho para nosso estudo é

central em três sentidos: enquanto mediação de primeira ordem, cuja finalidade é a

reprodução individual e societal; enquanto força de trabalho que reproduz o capital e

enquanto mediação na formação profissional.

Nessa perspectiva, ao destacarmos a centralidade do trabalho para a

explicação da vida social em suas diversas dimensões, dentre elas, a dimensão da

educação, vamos de encontro a uma série de discursos produzidos no interior das

universidades, principalmente por autores europeus4 das décadas de 1980 e 1990,

que colocavam em questão a sua centralidade.

4 Cf. Claus Offe, O trabalho como categoria sociológica fundamental? (1989) e André Gorz, O declínio da relevância do trabalho e a ascensão de valores pós-econômicos (1993).

Page 15: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

14

Ao mesmo tempo, ao tomarmos como referência a categoria trabalho e sua

relação com os processos educativos formais, não podemos deixar de salientar o

extenso debate de ideias que vem ocorrendo no interior do próprio meio acadêmico

sobre a polissemia dessa categoria e suas possíveis relações/implicações com as

práticas educativas no contexto da escola pública de nível médio brasileira.

Isso posto, para alcançarmos o objetivo assumido nessa dissertação,

escolhemos inicialmente como caminho metodológico a revisão da literatura

pertinente às áreas da Filosofia, Economia e Sociologia do Trabalho juntamente com

a produção acadêmica que vem sendo realizada pelos pesquisadores das

universidades brasileiras, expressa, por exemplo, no Grupo de Trabalho (GT09),

Trabalho e Educação, da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em

Educação (ANPED). Essa revisão foi determinante para a elaboração dos dois

primeiros capítulos e para o aprofundamento de algumas questões relacionadas ao

papel do trabalho ao longo da história da humanidade e como estão sendo

realizadas as conexões entre Trabalho e Educação no interior da escola de nível

médio, com destaque para a sociedade capitalista, hoje hegemônica.

Paralelamente à revisão da literatura, realizamos um levantamento e

catalogação dos documentos oficiais5 (Leis, Decretos, Resoluções, Pareceres, etc.)

que dão fundamento e servem de referência para a objetivação da proposta de

Educação Profissional Integrada ao Ensino Médio no governo Lula. Essa

catalogação contribuiu para a elaboração de uma Cronologia da Integração6 que

envolveu o período de janeiro de 2003 a dezembro de 2008.

A escolha desse período deve-se a nossa tentativa de compreendermos o

percurso da integração - educação profissional técnica e ensino médio - em dois

momentos do governo do presidente Lula. O primeiro momento que está

diretamente relacionado aos quatro primeiros anos desse governo e o segundo

período que compreende a primeira metade do segundo mandato, que tem

significado a continuidade das políticas de integração iniciadas nos quatro anos

anteriores.

A partir da Cronologia da Integração, elaboramos o terceiro (e último) capítulo

dessa dissertação, onde procuramos a analisar o percurso da integração –

educação profissional e ensino médio – nos seis anos de governo Lula, e como a

5 Cf. Anexo A 6 Cf. Anexo B

Page 16: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

15

categoria trabalho tem sido apropriada pelo discurso oficial para a objetivação dessa

proposta.

Contudo, como acreditamos que não poderíamos analisar essa proposta sem

levar em consideração o contexto da educação escolar brasileira, primeiramente

realizamos uma breve síntese das ações do governo FHC no que diz respeito à

educação profissional e o ensino médio como forma de subsidiar a discussão.

Por fim, nas Considerações, procuramos fazer uma síntese da trajetória

percorrida nos três capítulos, indicando as possibilidades e limites da proposta de

educação profissional integrada ao ensino médio no governo Lula. E, em que

medida ela tem contribuído para a superação ou manutenção da lógica da

independência entre formação geral e formação específica, na escola pública de

nível médio brasileira.

Page 17: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

16

2 TRABALHO E SOCIEDADE

A história foi pela primeira vez colocada sobre as suas bases reais; o facto [sic] palpável, mas sobre o qual até aqui se passou totalmente por cima, de que os homens, antes de tudo, têm de comer, beber, abrigar-se e vestir-se, portanto, têm que trabalhar, antes de lutar pela dominação, fazer política, religião, filosofia, etc. – este facto [sic] palpável acedeu agora finalmente ao seu direito histórico. (ENGELS, 1985, p.92).

A consolidação do modo de produção capitalista, na passagem do século

XVIII ao século XIX, fez com que pela primeira vez na história do pensamento

ocidental o trabalho passasse de objeto secundário da reflexão filosófica a objeto

privilegiado tanto da Filosofia quanto das Ciências Humanas7.

Até então, seja pelos filósofos gregos da Antiguidade, seja pelos pensadores

da Idade Média à atividade que a modernidade passou a convencionar por trabalho

era vista como uma atividade inferior, degradante, ou seja, uma atividade que

deveria ser realizada apenas por pessoas que formavam os estratos inferiores da

sociedade. Visão essa que foi reforçada à medida que o Cristianismo tornou-se a

religião dominante da sociedade ocidental. Quem não se lembra de uma das

famosas passagens bíblicas: “tu comerás o teu pão com o suor do teu rosto”.

Contudo, como partimos do suposto que não existe uma noção a-histórica do

trabalho e que a mesma está diretamente relacionada à história da própria

humanidade e suas formas sociais concretas, neste capítulo, buscaremos discorrer,

sumariamente, sobre alguns significados atribuídos a essa palavra para em seguida

tratarmos das transformações em curso no modo de produção capitalista e os seus

efeitos paras aqueles(as) que vivem, única e exclusivamente da venda da sua força

de trabalho.

2.1 DO TRIPALIUM AO TRABALHO ENQUANTO VOCAÇÃO

Na introdução do seu livro Epistemologia e Sociologia do Trabalho François

Vatin (1999, p.15) ao tratar da defesa do trabalho faz a seguinte afirmação: “tornou-

6Uma discussão sobre as diferenças entre a Filosofia e as Ciências Humanas pode ser encontrada em Chauí (1997).

Page 18: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

17

se banal recordar que o termo trabalho provém do latim tripalium, que designa um

instrumento de tortura”. Para em seguida complementá-la:

Mais isto é apenas uma meia verdade, pois o tripalium é, em primeiro lugar, um banal tripé (instrumento de três pés), que pode, é certo, servir de apoio (no sentido próprio e figurado) à tortura, mas também, e em primeiro lugar, conter grandes animais quando lhe são prestados cuidados ou colocadas ferraduras. Assim, o trabalho começou por designar, numa acepção técnica que se manteve até os nossos dias, este inocente (grifo nosso) instrumento do criador e do ferrador. Foi somente através do verbo (tripaliare: fazer sofrer no tripalium) e não do substantivo, que surgiu o significado moderno de punição. (VATIN, 1999, p.15).

A citação de Vatin, sobre o significado inicialmente atribuído a palavra

trabalho no Ocidente, é emblemática para entendermos o percurso histórico que tem

levado até hoje muitas pessoas a relacionarem o ato de trabalhar a ideia de punição,

sofrimento, e não como uma necessidade vital de existência e reprodução dos seres

humanos. Para o professor português, este significado de punição está diretamente

relacionado à tradição judaico-cristão que por muitos séculos associou o trabalho a

um fardo, a um sacrifício.

Basta recorrermos a algumas passagens do Antigo Testamento, primeira

grande parte da Bíblia Cristã, para comprovarmos essa relação. Na Gênesis, por

exemplo, no momento que o Senhor Deus fala com a mulher, que posteriormente

Adão dará o nome de Eva, sobre o fato de ela ter dado a Adão o fruto proibido assim

destaca o trabalho. “[...] Eu multiplicarei os trabalhos dos teus partos. Tu parirás teus

filhos em dor e estarás debaixo do poder do teu marido e ele te dominará”.

(GÊNESIS, I, 3, verbete 16, p.5).

Em seguida, o mesmo Senhor Deus reforça essa ideia da negatividade do

trabalho ao dizer agora a Adão:

[...] Pois que tu destes ouvidos a voz de tua mulher, e comeste do fruto da árvore, de que eu te tinha ordenado que não comesses; a terra será maldita por causa da tua obra: tu tiras dela o teu sustento à força de trabalho. 18 Ela te produzirá espinhos e abrolhos: e tu terás por sustento as ervas da terra. 19 Tu comerás o teu pão no suor do teu rosto, até que te retornes na terra, de que foste formado. Porque tu és pó, e em pó te hás de tornar. (GÊNESIS, I, 3, verbetes 17-19, p.5).

Entretanto, como reafirmamos que os significados das palavras são

construções históricas, a mesma atividade que a tradição judaico-cristã qualificou

Page 19: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

18

como negativa, no decorrer do desenvolvimento do pensamento ocidental passou a

ter outras significações.

O sociólogo polonês Zygmunt Bauman8, apesar de questionar a centralidade

do trabalho na sociedade contemporânea, ao resgatar o pensamento ocidental dos

séculos XVIII-XIX, destaca que as noções que foram fornecidas pelo pensamento

econômico da época colocaram a ideia do trabalho como a principal fonte de

riqueza, ou seja, “a riqueza vem do trabalho, que é a principal, talvez a única fonte

de riqueza”. (2008, p.29).

Max Weber9, sociólogo alemão, ao analisar o tipo ideal de conduta religiosa

que contribuiu para o desenvolvimento do capitalismo em países como a Inglaterra

destaca a ideia do trabalho como vocação. Nessa perspectiva, o trabalho segundo

Weber (2002, p.133) seria “o melhor meio e, muitas vezes o único, de obter a

certeza da graça.” Como o próprio autor destaca a visão do trabalho como vocação

tornou-se uma característica do trabalhador moderno, assim como a correspondente

atitude diante da aquisição por parte do empresário.

Diante das três concepções apresentadas, i) o trabalho enquanto sofrimento,

ii) o trabalho enquanto principal fonte de riqueza e iii) o trabalho enquanto vocação

não podemos deixar de enfatizar duas afirmações que Mercure e Spurk (2005)

trazem na lntrodução da coletânea O Trabalho na História do Pensamento

Ocidental: a primeira nos diz que o conteúdo e o sentido da palavra trabalho varia

enormemente conforme as culturas e as épocas. Já a segunda ressalta que não

existe noção a-histórica do trabalho, ou seja, que as formas do agir que

circunscrevem mal ou bem essa realidade assim como as palavras que a designam

de maneira abstrata, são primeiro e acima de tudo construções históricas.

Além das afirmações de Mercure e Spurk (2005), devemos acrescentar que a

noção do trabalho no decorrer de sua história no pensamento ocidental, tem

percorrido uma dialética que normalmente envolve dois sentidos opostos:

positividade - negatividade, ou seja, em uma mesma realidade social um sujeito

pode reconhecer o trabalho que realiza como algo penoso, sofrido enquanto outro

pode reconhecer o mesmo ato de trabalho como sendo uma atividade prazerosa,

digna de reconhecimento social.

7Cf. Ascensão e queda do trabalho. In______. A sociedade individualizada: vidas contadas e histórias vividas, 2008. 8Cf. A ética protestante e o espírito do capitalismo, 2002.

Page 20: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

19

Por outro lado, Frigotto (2009a) ao discutir a polissemia da categoria trabalho

nos alerta que na sociedade capitalista o cerne da questão do trabalho não está na

disputa semântica abstraídas das relações sociais, mas na disputa entre os

interesses de classe que somente podem ser apreendidos em sua historicidade

dentro de uma concepção dialética e no campo das contradições e não das

antinomias.

Contudo, como nesta seção não temos a pretensão de esgotarmos o debate

em torno dos significados atribuídos ao vocábulo trabalho, a seguir, recorreremos a

algumas formulações do filósofo alemão Karl Marx (1818-1883) e de autores

marxistas, para ampliarmos a discussão em torno da centralidade do trabalho no

capitalismo contemporâneo.

2.2 DO INTERCÂMBIO ORGÂNICO COM A NATUREZA AO TRABALHO ASSALARIADO

Ao partirmos do pressuposto que o trabalho constitui o fundamento do ser

social, e que, portanto, é através do trabalho que os homens e mulheres se

diferenciam dos demais animais, não poderíamos deixar de recorrer ao legado

deixado por Karl Marx e por autores que utilizam o seu referencial de análise para

compreendermos a centralidade dessa categoria.

Crítico da Economia Política Clássica10, o filósofo alemão, no decorrer de sua

vida produziu uma vasta obra11, cuja uma de suas principais contribuições esteve na

busca sistemática em desvelar as relações sociais histórico-concretas emergentes

da sociedade capitalista e na demonstração que após o surgimento da propriedade

privada dos meios de produção a história da humanidade tem se movido a partir da

oposição e da luta de classes.

Em relação à sua análise sobre o trabalho, nos apropriamos de algumas

passagens contidas no Livro I de O Capital, mais especificamente, no Capítulo V,

onde Marx procurou analisar o processo de trabalho e o processo de produzir mais-

10Segundo Marx (2003, p.103) “economia política clássica é toda economia que, desde W.Pettty, investiga os nexos causais das condições burguesas de produção, ao contrário da economia vulgar, que trata apenas das relações aparentes [...]”. 11Entre as principais obras de Marx além do O Capital podemos destacar O Manifesto do Partido Comunista de 1848 e a Contribuição a critica da economia política editada em 1859.

Page 21: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

20

valia como forma de explicitarmos porque o trabalho é central para a compreensão

da história humana.

Deste modo, tomemos literalmente a passagem em que Marx (2003, p.211-

212) define o trabalho:

Antes de tudo, o trabalho é um processo de que participam o homem e a natureza, processo em que o ser humano, com sua própria ação, impulsiona regula e controla o seu intercâmbio material com a natureza. Defronta-se com a natureza com uma de suas forças. Põe em movimento as forças naturais do seu corpo – braços e pernas, cabeças e mãos -, a fim de apropriar-se dos recursos da natureza, imprimindo-lhes forma útil a vida humana. Atuando assim sobre a natureza externa e modificando-a, ao mesmo tempo modifica sua própria natureza. Desenvolve as potencialidades nela adormecidas e submete ao seu domínio o jogo das forças naturais. Não se trata aqui das formas instintivas, animais, de trabalho. Quando o trabalhador chega ao mercado para vender a sua força de trabalho, é imensa a distância histórica que medeia entre a sua condição e a do homem primitivo com a sua forma ainda instintiva de trabalho. Pressupomos o trabalho sob forma exclusivamente humana. Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e a abelha supera mais de um arquiteto ao construir sua colméia. Mas o que distingue o pior arquiteto da melhor abelha é que ele figura na mente sua construção antes de transformá-la em realidade. No fim do processo do trabalho aparece um resultado que já existia antes idealmente na imaginação do trabalhador [...].

A extensa citação de Marx procura demonstrar que em sua dimensão

ontológica, o trabalho constitui-se como atividade humana de produção e

reprodução da existência. Ou seja, sem o intercâmbio com a natureza, não há

qualquer possibilidade de reprodução social, pois é através do trabalho enquanto

atividade teleológica de primeira ordem que se verifica a capacidade humana de

intervenção na natureza externa (mundo exterior) e na sua própria natureza (mundo

interior).

Assim, dando continuidade a exposição sobre o processo de trabalho que

pode ser realizado em qualquer formação social Marx (2003, p. 218) acrescenta:

O processo de trabalho que descrevemos em seus elementos simples e abstratos, é atividade dirigida com o fim de criar valores-de-uso, de apropriar os elementos naturais às necessidades humanas; é condição necessária do intercâmbio material entre homem e a natureza; é condição natural eterna da vida humana, sem depender, portanto, de qualquer forma dessa vida, sem antes comum a todas as suas formas sociais.

Nessa perspectiva apresentada por Marx, destacamos o sentido filosófico do

trabalho atribuído por Druck12 (2000, p. 11-12) que o eleva à condição de:

12 Vale destacar que o pensamento de Druck (2000) está baseado nas formulações do próprio Marx.

Page 22: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

21

Essência dos homens, se entendermos que trabalho é a capacidade que todo homem tem de transformar a natureza de transformar a sua própria vida, de criar, de pensar, de refletir, de produzir. A atividade humana, a realização de alguma coisa, a criação, a transformação, a busca para satisfazer as necessidades de sobrevivência é a realização de uma atividade produtiva. É através dessa atividade essencialmente humana – o trabalho planejado e racionalmente pensado – que os homens se relacionam com a natureza, se relacionam como outros homens e se diferenciam dos animais.

Entretanto, o próprio Marx faz observações com relação à insuficiência desta

abordagem ontológica do trabalho apresentada no início do Capítulo V de O Capital

para a crítica do capitalismo, pois, segundo o filósofo alemão, com a emergência

desse modo de produção há uma intensificação da divisão social do trabalho e a

separação entre trabalho intelectual e trabalho manual.

Diante das particularidades históricas do capitalismo Marx (2003, p. 218)

acrescenta que:

O processo de trabalho quando ocorre como processo de consumo da força de trabalho pelo capitalista apresenta dois aspectos característicos. O trabalhador trabalha sob o controle capitalista a quem pertence seu trabalho. O capitalista cuida em que o trabalho se realize de maneira apropriada e em que se apliquem adequadamente os meios de produção, não se desperdiçando matéria-prima e poupando-se o instrumental de trabalho.

A partir desta citação, podemos indicar uma das principais características das

relações de trabalho no modo de produção capitalista que é a relação de compra e

venda da força de trabalho. Característica que já tinha sido destacada pelo próprio

Marx (1982b, p.155) em obrar anterior ao Capital - Trabalho Assalariado e Capital13-

na seguinte passagem:

A força de trabalho nem sempre foi uma mercadoria. O trabalho nem sempre foi trabalho assalariado, isto é trabalho livre. O escravo não vendia a sua força de trabalho ao proprietário de escravos, assim como o boi não vende os seus esforços ao camponês. O escravo é vendido, com a sua força de trabalho, duma vez para sempre, ao seu proprietário. É uma mercadoria que pode passar das mãos de um proprietário para as mãos de um outro. Ele próprio é uma mercadoria, mas a força de trabalho não é uma mercadoria sua. O servo só vende uma parte da sua força de trabalho. Não é ele quem recebe um salário do proprietário da terra: pelo contrário, o proprietário da terra que recebe dele um tributo. O servo pertence à terra, rende frutos ao dono da terra. O operário livre, pelo contrário, vende-se a si mesmo, e, além disso, por partes. Vende em leilão oito, dez, doze, quinze horas da sua vida, a quem melhor pagar, ao proprietário das matérias-primas, dos instrumentos de trabalho e dos meios de vida, isto é, ao capitalista. O operário não pertence nem a um

13 Esta obra apareceu sobre a forma de uma série de artigos a partir de abril de 1849.

Page 23: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

22

proprietário nem a terra, mais oito, dez, doze, quinze horas da sua vida diária pertencem a que as compra.

Contudo, é necessário esclarecer, nesse momento, a diferença apontada por

Druck (2000, p.13) entre trabalho e força de trabalho. Para a autora:

Força de trabalho é o potencial, é a capacidade física e intelectual que os homens e as mulheres têm para realizar o trabalho, e que é oferecido no mercado em troca de salário. Já o trabalho é a realização de uma determinada força, de uma determinada capacidade humana, física, intelectual que todo homem tem, ou a realização da força de trabalho.

Nesse sentido, dando continuidade ao pensamento de Druck (2000), que está

amparado pelas formulações de Marx, o trabalho que produz valores de uso

qualitativamente necessários para a existência humana, portanto não se constitui

como mercadoria, consequentemente, não é comprado ou vendido em um mercado

específico. O trabalho que constitui enquanto mercadoria na sociedade capitalista,

na verdade é o trabalho assalariado, alienado14, trabalho este que produz valores de

troca.

Assim, cabe estabelecer outra distinção, desta vez entre trabalho no sentido

filosófico-ontológico, essência dos homens, e o trabalho assalariado enquanto

relação social predominante no capitalismo ocidental. Enquanto o primeiro está

presente em qualquer formação social histórico-concreta conforme destaca Marx

(2003), Druck (2000), sendo, portanto, uma categoria fundante do mundo dos

homens (Lessa 2002, 2007) o segundo constitui-se na forma predominante do modo

de produção capitalista.

Como se observa, o trabalho assalariado no capitalismo:

[...] foi se consolidando como relação social hegemônica durante séculos, assumindo diferentes formas concretas, resultantes das relações de forças, expressão das lutas sociais e políticas do movimento operário do mundo inteiro. Assim, dos primórdios do capitalismo industrial através da cooperação, da manufatura até a chegada à grande indústria e o estabelecimento da fábrica o trabalho assalariado apresentou conteúdos diferentes: mais precário, menos precário, mais protegido, menos protegido, com ou sem estabilidade, mais qualificado ou menos qualificado, bem remunerado ou mal remunerado e essas características foram conformando diferentes padrões de trabalho assalariado. É a partir da identificação dessas transformações no trabalho assalariado que se pode pensar o que é propriamente um emprego, que conceitualmente não é a mesma coisa que trabalho assalariado, mais a forma mais concreta e hegemônica que este assumiu. Assim, emprego pode ser definido como uma relação de compra e

14Uma importante exposição sobre as características do trabalho alienado pode ser encontrada nos Manuscritos econômico-filosóficos de Karl Marx.

Page 24: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

23

venda da força de trabalho mediada por um contrato (formal ou informal) entre empregadores e trabalhadores. (DRUCK, 2000, p, 22).

A citação de Druck nos ajuda a compreender como no desenvolvimento do

modo de produção capitalista o emprego - relação de compra e venda da força de

trabalho mediada por um contrato formal ou informal - tornou-se a forma dominante

do trabalho assalariado na sociedade capitalista dos séculos XX e inicio do século

XXI. Tanto que é costumeiramente usado como sinônimo do mesmo.

Nesta dissertação não utilizamos essas categorias enquanto sinônimos, pois

entendemos que trabalho assalariado vai além de uma relação social de compra e

venda da força de trabalho. Ou seja, ele constitui-se em um dos fundamentos do

modo de produção capitalista, enquanto que o emprego veio a ser a sua expressão

mais recente.

Todavia, como no capitalismo a maioria dos trabalhadores precisa vender a

sua força de trabalho para (sobre)viver, o emprego formal15 tornou-se objeto de

interesse e constante busca por partes dos trabalhadores, ao mesmo tempo em que

se transformou em motivo de lutas e disputas entre os mesmos, os governos e os

capitalistas no que diz respeito as suas formas de regulamentação.

Assim, o mercado de trabalho então formado pelas relações de compra e

venda da força de trabalho como destaca Borges (2003, p.26) passa a ser:

Estratégico na estrutura econômica das sociedades capitalistas [...], pois, constituiu-se por isso mesmo, num espaço de relações sociais fundamentais para a estruturação dessas sociedades, na medida em que a posição que nelas ocupam os indivíduos vai ser fortemente determina pelas relações que eles mantêm com este mercado e/ou pela posição que nele ocupam.

Além de ser estratégico na estrutura econômica das sociedades capitalistas,

não podemos deixar de ressaltar o significado social, simbólico, que a participação

ou não participação nesse mercado passa a ter na vida das pessoas que dele

precisam fazer parte para (sobre)viver. Para muitas delas, a inserção no mercado de

trabalho contribui de forma significativa para a construção de suas histórias de vida,

tanto familiar quanto profissional.

15Entre as características do emprego formal na sociedade brasileira podemos destacar: salário regular, férias, décimo-terceiro salário, repouso remunerado, Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), no caso dos trabalhadores regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), licença maternidade para as mulheres e aposentadoria por idade ou tempo de contribuição.

Page 25: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

24

Contudo, conforme destaca Pochmann (2008, p.9) “o pleno emprego não é

norma geral do funcionamento das economias de mercado”. O que se torna mais

evidente em momentos de crise, característica do capitalismo dos séculos XX e XXI,

onde o fantasma da ampliação do desemprego e de recessão econômica volta a

preocupar trabalhadores, governos e empresas de diversas partes do mundo.

Nesse sentido, é válido considerar o que Filgueiras16 (2007, p.88) destaca na

sua breve análise sobre a história do modo de produção capitalista ao afirmar que:

O capitalismo é um modo de produção anárquico e instável por sua própria natureza; característica esta que se expressa através de repetidas crises de maior ou menor grau de intensidade, flutuações cíclicas mais ou menos violentas e, às vezes, longos períodos de estagnação. Entre esses eventos podem ser destacados, só para se ficar nos exemplos mais óbvios e conhecidos, a grande crise de 1929 e as reiteradas crises mais recentes das décadas de 1990 e 2000: o ataque à libra (1992-1993) e as crises do México (1994-1995), da Ásia (1997), da Rússia (1998), do Brasil (1999), da Argentina (2002) e, por fim, a atual crise imobiliária nos EUA (2007).

Assim, o que se percebe é que o capitalismo, historicamente, é um sistema

marcado por repetidas crises17 que com maior ou menor grau de intensidade afetam

desde o interior das empresas e suas formas de gestão e organização do trabalho,

passando pelas normas de regulamentação dos mercados (inclusive o mercado de

trabalho) até o interior das famílias e seus hábitos de vida.

Dessa forma, destacaremos a seguir algumas transformações ocorridas no

interior da sociedade capitalista, a partir década de 1970, e suas consequências

para aqueles(as) que vivem da venda sua força de trabalho. Ao mesmo tempo,

evidenciaremos as particularidades do Brasil, pois acreditamos que apesar das

crises do capitalismo estarem tomando projeções cada vez mais mundiais, em

virtude dos processos de globalização, as mesmas apresentam especificidades

nacionais, regionais e setoriais.

16 Cf. Crise do mercado imobiliário dos EUA e suas implicações para a economia brasileira. Artigo publicado na Revista Conjuntura & Planejamento v. 156, jul./set. 2007. 17 Isso não quer dizer que os conteúdos das crises também sejam repetidos. A história tem demonstrado que os seus conteúdos têm variado ao longo do tempo.

Page 26: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

25

2.3 TRANSFORMAÇÕES NO CAPITALISMO A PARTIR DOS ANOS 1970 E OS EFEITOS PARA A CLASSE TRABALHADORA

Não há como negar que após a Segunda Guerra Mundial, mesmo com todas

as suas consequências negativas, o mundo capitalista avançado vivenciou uma fase

impar em sua história. Fase esta que compreendeu o final dos anos 1940 até o início

da década de 1970, também conhecida como os anos dourados do capitalismo18.

Apesar dos anos dourados terem levado algum tempo para se fazer perceber,

pois os benefícios reais do processo de recuperação só começarem a ser sentidos,

por exemplo, na Grã-Bretanha, em meados da década de 1950 e em outros países

da Europa Ocidental e no Japão na década de 1960 (HOBSBAWM, 1995) esse

período marcou uma série de conquistas por parte dos países centrais19. Dentre

essas conquistas podemos citar a retomada do crescimento econômico através do

aumento da produção e do comércio mundial e significativos avanços no campo da

ciência e tecnologia o que representou um grande salto para a continuidade do

sistema.

Contudo, ao fazer um panorama desse período Hobsbawm (1995, p.264)

destaca que “havia mais no Grande Salto do que apenas isso. Havia uma

substancial reestruturação e reforma do capitalismo e um avanço espetacular na

globalização e internacionalização da economia”.

Para o historiador inglês, essa reestruturação do capitalismo:

produziu uma “economia mista”, que ao mesmo tempo tornou mais fácil aos Estados planejar e administrar a modernização econômica e aumentou enormemente à demanda. As grandes histórias de sucesso econômico em países capitalistas no pós-guerra, com raríssimas exceções (Hongkong) são histórias de industrialização sustentadas, supervisionadas, orientadas e às vezes planejadas e administradas por governos: da França e Espanha na Europa a Japão, Cingapura e Coréia do Sul. Ao mesmo tempo, o compromisso político de governos com o pleno emprego e – em menor medida – com a redução da desigualdade econômica, isto é, um compromisso com a seguridade social e previdenciária, pela primeira vez proporcionou um mercado de consumo de massa para bens de luxo que agora podiam passar a ser aceitos como necessidades. (HOBSBAWM, 1995, p.264).

18 Cf. Eric Hobsbawm, Era dos Extremos (1995). 19 Segundo Hobsbawm (1995), no caso dos EUA considerando o avanço e o tamanho da economia seu desempenho durante os anos dourados não foi tão impressionante quanta a taxa de crescimento de outros países que partiram de uma base bem menor.

Page 27: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

26

Não o bastante, nos anos 1960 à medida que o capitalismo se reestruturava e

a internacionalização da economia avançava tornava-se possível à expansão do

modelo taylorista/fordista de produção e organização do trabalho para outros países,

sejam eles centrais ou periféricos. Enquanto isso, nos EUA, berço do modelo, o

mesmo “ampliava-se para novos tipos de produção, da construção de habitações à

chamada junk food”. (HOBSBAWM, 1995, 259).

Assim, à medida que o taylorismo/fordismo se expandia e tornava-se uma

referência em termos de gestão e organização da produção e do trabalho, em

alguns países europeus formaram-se os chamados Estados de Bem Estar Social20

que de certa forma contribuíram não apenas para o bem-estar dos seus cidadãos,

mas, também, para evidenciar o amplo processo de reforma pela qual passava o

capitalismo ocidental naquele momento.

Entretanto, apesar das diversas conquistas obtidas pós-1945 os anos

dourados do capitalismo não duraram por muito tempo. Segundo o próprio

Hobsbawm (1995, p.393) “a história dos vinte anos após 1973 é a de um mundo que

perdeu suas referencias e resvalou para a instabilidade e a crise”.

Pinto (2007, p.50) ao analisar os aspectos que contribuíram para a crise do

capitalismo a partir desse período destaca que:

Na esfera da economia, no plano macroeconômico as contas externas da maioria dos países foram altamente desequilibradas em meio aos choques ocasionados pelo súbito aumento geral dos preços do petróleo pela Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), em 1973 e em 1979, bem como às sucessivas valorizações e desvalorizações do dólar praticamente impostas pelos EUA a partir de então, como em 1978 e 1985. Como decorrência desse quadro, iniciaram-se as primeiras grandes variações nas taxas de câmbio das economias nacionais, acentuando a internacionalização e o já crescente volume de investimento em capitais financeiros, que por meio da tecnologia microeletrônica aplicada à informação, passaram a especular sobre essas flutuações cambiais.

Em seguida, Pinto (2007, p.51) complementa afirmando que:

Tal instabilidade macroeconômica gerou grande cautela nos investimentos produtivos industriais que, desde então, vinham se arrefecendo nos países capitalistas centrais, a par do crescimento das atividades nos setores de

20 Pinto (2007, p.49) caracteriza o Estado de Bem Estar Social como sendo “um modelo de governo em que a iniciativa pública, por meio dos aparelhos estatais, é concebida como pilar fundamental não apenas nas áreas de saúde, educação e segurança, mas também quanto às políticas previdenciárias, de emprego e de renda da classe trabalhadora; no âmbito do mercado, o Estado assume ainda o papel de um agente essencial na condução do desenvolvimento econômico, seja através de intervenções reguladoras nas políticas comerciais, financeiras e industriais, seja constituindo empresas em pontos estratégicos da cadeia produtiva”.

Page 28: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

27

serviços, que agregam desde comércio, finanças, saúde, etc. até novas atividades relacionadas a entretenimentos. Na concorrência imposta pelo deslocamento do consumo a esses novos segmentos, acirrada pelo baixo crescimento (se comparado aos índices do pós-1945 até o final dos anos 1960), a indústria redirecionou suas estratégias de padronização em larga escala, para a crescente agregação tecnológica, maior qualidade e personalização dos seus produtos.

Já Antunes (1999, p.29-30), ao se referir à crise estrutural do capital21, aponta os

seguintes traços como os mais evidentes:

1) queda da taxa de lucro, dada dentre outros elementos causais, pelo aumento do preço da

força de trabalho, conquistado durante o período pós-45 e pela intensificação das lutas

sociais dos anos 60, que objetivavam o controle social da produção;

2) o esgotamento do padrão de acumulação taylorista/fordista de produção [...], dado pela

incapacidade de responder à retração do consumo que se iniciava;

3) hipertrofia da esfera financeira, que ganhava relativamente autonomia frente aos capitais

produtivos, o que também já era expressão da própria crise estrutural do capital e seu

sistema de produção;

4) a maior concentração de capitais graças às fusões entre as empresas monopolistas e

oligopolistas;

5) a crise do welfare state ou do Estado do bem-estar social, acarretando a crise fiscal do

Estado capitalista e a necessidade de retração dos gastos públicos e sua transferência para o

capital privado;

6) incremento acentuado de privatizações, tendência generalizada às desregulamentações e à

flexibilização do processo produtivo, dos mercados e da força de trabalho, entre tantos

outros elementos contingentes que exprimiam esse novo quadro crítico.

Diante dessa nova crise, Hobsbawm (1995, p.396) sinaliza que “os problemas

que tinham dominado a crítica ao capitalismo antes da guerra e que a Era de Ouro

em grande parte eliminara durante uma geração – ‘pobreza, desemprego em massa,

miséria, instabilidade’ – reaparecem depois de 1973”. A emergência de tais

problemas, mais uma vez, passaram a impor um clima de insegurança e incerteza

que de fato, posteriormente, veio a contribuir para o enfraquecimento dos padrões

políticos então vigentes.

Contudo, Antunes (1999, p.31) destaca que no interior da própria crise do

modo de produção capitalista se iniciou um amplo processo de:

21 Cf. Ricardo Antunes, Os Sentidos do Trabalho, 1999.

Page 29: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

28

Reorganização de seu sistema ideológico de dominação, cujos contornos mais evidentes foram o advento do neoliberalismo, com a privatização do Estado, a desregulamentação dos direitos do trabalho e a desmontagem do setor estatal, da qual a era Tatcher-Reagan foi expressão mais forte; a isso se segue também um intenso processo de reestruturação da produção e do trabalho com vistas a dotar o capital do instrumental necessário para tentar repor os patamares de expansão anteriores.

Pinto (2007, 51-52) corrobora com a análise de Antunes afirmando que:

Tais mudanças colocaram em questionamento o sistema taylorista/fordista sob o qual a produção industrial estava organizada até então, pelo menos nos seus principais segmentos e na maioria dos grandes centros mundiais como os EUA e alguns países europeus. Ou seja, sob as novas condições de mercado colocadas pelo contexto dos anos 1970, a produção em série e em larga escala fundamentada em unidades produtivas altamente verticalizadas de grande contingentes de trabalhadores especializados, em sua maioria semiqualificados, tornou-se uma camisa de força para o crescimento

Ao mesmo tempo, uma vez que a crise afetou o mundo da produção de bens

e serviços, o capital passou a ter um maior interesse por experiências alternativas ao

taylorismo/fordismo, que naquele contexto já encontrava dificuldades em responder

às novas necessidades oriundas do seu processo de reorganização.

Portanto, como consequência da reorganização do capital, novos processos

de trabalho, possibilitados em grande medida pelos avanços tecnológicos iniciados

na Era de Ouro – automação, robótica, microeletrônica, etc. - passaram a mesclar-se

ou até mesmo a substituir os processos de base taylorista/fordista cujo toyotismo foi

a principal manifestação.

Entretanto, diferentemente do taylorismo/fordismo que emergiu e expandiu-se

em um período de crescimento econômico expressivo, o toyotismo ou modelo

japonês de gestão e organização da produção e do trabalho surgiu:

Em um contexto de crescimento lento, em meio a um mercado interno que, se por um lado visava o consumo de praticamente todos os tipos de bens e serviços, mostrando-se diversificado, por outro se caracterizava pela pequena expansão. (PINTO, 2007, p.73).

Nesse sentido o Japão, país extremamente afetado pela Segunda Guerra,

após uma série de ajustes, ensaios e adaptações que ocorreram entre o intervalo de

1947 até o início da década de 1970 passou a disseminar, para além de suas

fronteiras, um novo modelo de gestão e organização da produção e do trabalho, que

a partir da crise dos anos 1970 assumiu lugar central no Ocidente.

Page 30: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

29

A emergência desse modelo, guardada as devidas especificidades de cada

empresa, região ou nação deve ser apreendida enquanto estratégia do capital para

superar sua própria crise, juntamente com o conjunto de transformações que vão

desde as formas de inserção da classe trabalhadora na estrutura produtiva até as

suas formas de representação sindical e política.

Segundo Antunes (2006) tais transformações começaram a ser percebidas,

somente, por volta dos anos 1980 entre outros motivos pela: i) tendência à redução

do operariado industrial nas sociedades capitalistas avanças com maior ou menor

repercussão em áreas industrializadas do Terceiro Mundo, ii) expressiva expansão

do assalariamento no setor de serviços e iii) crescente incorporação de mulheres no

mercado trabalho, o que alterou significativamente a sua dinâmica e a sua

composição.

Paralelamente, nesse mesmo período, também ocorreu à ampliação do

trabalho parcial, temporário, precarizado, possibilitado em grande medida pelo

avanço dos processos de terceirização/subcontratação da força de trabalho, pela

flexibilização das leis trabalhistas e pela reorganização dos diversos segmentos da

economia que contribuíram de forma significativa para a desestruturação do

mercado de trabalho assalariado.

Diante das transformações ocorridas no interior do sistema capitalista a partir

da década de 1970, a seguir apresentaremos algumas reflexões acerca das formas

assumidas pelo trabalho, nesse novo ciclo de reprodução do capital.

2.4 TRABALHO E O NOVO CICLO CAPITALISTA

Como vimos na seção anterior, à década de 1970 marcou um novo ciclo de

mudanças do capitalismo ocidental que em maior ou menor intensidade vem

afetando as mais diversas relações de produção e de consumo em todo mundo e,

consequentemente, o cotidiano daqueles que vivem da venda da sua força de

trabalho. Tais mudanças podem ser sintetizadas nas seguintes palavras:

terceirização, flexibilização e precarização. (DRUCK; FRANCO, 2007).

É neste quadro de mudanças, influenciado em grande medida pelas novas

formas de gestão e organização da produção, que a discussão em torno do trabalho

deve estar inserida. Simultaneamente, não podemos perder de vista que cada

Page 31: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

30

região, país, Estado possui suas especificidades, dificultando, assim, certas

generalizações.

Desse modo, partiremos do pressuposto que o trabalho contratado,

regulamentado, estável, herdeiro da tradição fordista-taylorista vem se deteriorando

e que em seu lugar novas formas de trabalho têm emergido - trabalhos parciais,

precários, temporários cuja instabilidade é uma de suas principais marcas.

Bauman (2008, p.35-36), apesar de questionar a centralidade do trabalho na

sociedade contemporânea, aponta elementos importantes para compreendermos

essa nova configuração do trabalho no capitalismo:

Essa situação mudou e o ingrediente crucial da mudança é a nova mentalidade de “curto prazo” que veio substituir a de “longo prazo”. Casamentos “até que a morte” nos separe passaram a ser uma raridade: os sócios não esperam mais ficar muito tempo na companhia uns dos outros. De acordo com os últimos cálculos, um jovem norte-americano com um nível moderado de educação espera mudar de emprego pelo menos onze vezes durante sua vida – e essa expectativa de mudança de emprego certamente continuará crescendo antes que a vida laboral da atual geração termine. “Flexibilidade” é o slogan do dia, e quando aplicado ao mercado de trabalho significa fim do emprego “como o conhecemos”, trabalhar com contratados de curto prazo, contratos precários ou sem contratos, cargos sem estabilidade e com cláusula de “até novo aviso”.

Nesse contexto apresentado por Bauman, Antunes (2007, p.17) destaca que:

O trabalho estável torna-se então, (quase) virtual. Estamos vivenciando, portanto, a erosão do trabalho contratado e regulamentado, dominante no século XX, e vendo sua substituição pelas diversas formas de “empreendedorismo”, “cooperativismo”, “trabalho voluntário”, “trabalho atípico”. O exemplo das cooperativas talvez seja ainda mais eloqüente, uma vez que, em sua origem, elas nasceram como instrumentos de luta operária contra o desemprego e o despotismo. Hoje, contrariamente, os capitais vêm criando falsas cooperativas como forma de precarizar ainda mais os direitos do trabalho.

Além disso, outra tendência que não podemos deixar de ressaltar é a

crescente desregulamentação dos mercados de trabalho em todo mundo e o

consequente desmonte da legislação social protetora do trabalho assalariado,

socialmente protegido. No caso do Brasil, Borges (2007, p.81-82) aponta dois

momentos de desestruturação do mercado de trabalho nacional:

O primeiro corresponde aos anos de 1980, etapa da crise do modelo de industrialização na substituição de importações e voltado para o mercado. Nesse período, a interrupção das elevadas taxas de crescimento do PIB, a crise da dívida e a inflação descontrolada traduziram-se, no mercado de trabalho, no aumento da proporção de ocupados fora de uma relação de

Page 32: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

31

emprego com cobertura social, em perdas salariais e na concentração de renda a favor das empresas e também entre os próprios trabalhadores. Mas, apesar de tudo isso, a maior parte das conquistas dos trabalhadores foi preservada, dentre outras razões porque o esgotamento do modelo de desenvolvimento coincidiu com o colapso do regime autoritário e com o fortalecimento das organizações dos trabalhadores (sindicatos, centrais sindicais e partidos). O segundo e mais importante [...] iniciou-se em 1990 e estendeu-se por toda a década, adentrando o século XXI, quando a nova configuração desse mercado vai se tornado clara, apesar dos elevados níveis de incerteza que marcam o atual estágio do capitalismo.

Diante dessa nova configuração do sistema capitalista, Antunes (2007, p.16)

destaca a exigência de um trabalhador de novo tipo. Trabalhador que:

Deve ser mais ‘polivalente’, ‘multifuncional’, diverso do trabalhador que se desenvolveu na empresa taylorista e fordista. O trabalhador que cada vez mais as empresas buscam não é mais aquele fundamentado na empresa taylorista e fordista, mas o que se gestou na fase da ‘desespecialização multifuncional, ‘do trabalho multifuncional’, que em verdade expressa a enorme intensificação dos ritmos, tempos e processos de trabalho. E isso ocorre tanto no mundo industrial como nos serviços, para não falar do agronegócio.

Como exemplo dessa intensificação dos ritmos, tempos e processos de

trabalho no século XXI podemos citar diversos casos em que trabalhadores são

contratados para ocupar um determinado posto de trabalho – segurança, recepção,

limpeza, etc., só que em função das “necessidades” da empresa passam a realizar

outras atividades – office boy, manutenção de móveis e equipamentos, etc., até

então não previstas no contrato e sem remuneração adicional para isso.

Do mesmo modo, a flexibilização do trabalho e do trabalhador passa a ser

características desse novo modelo societário baseado na instabilidade, incerteza,

imprevisibilidade e riscos. A ela (flexibilização), juntam-se as diversas formas de

precarização que tem levado milhões de trabalhadores a perdas de direitos e a

realizar trabalhos em condições cada vez mais adversas. Sem falar nas formas de

trabalho escravo e de trabalho infantil que continuam ampliando-se ao redor do

mundo.

Não obstante, no caso do Brasil, Borges (2007 p.89) acrescenta que:

Outro elemento no atual processo de precarização das relações e das condições de trabalho está em que ele atinge segmentos até então pouco expostos às formas precárias e inseguras de trabalho, como é o caso dos trabalhadores mais escolarizados, que tinham no emprego formal sua principal forma de inserção. A partir dos anos 1990, entre os ocupados com o ensino médio completo, a proporção de “empregados com carteira assinada caiu de 61% em 1992 para 58,3% em 2005 e aumentou de 6,3%

Page 33: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

32

para 14,9% o percentual dos “sem carteira”. No mesmo período, aqueles que tinham formação universitária também sofreram queda na proporção de “empregados com carteira assinada” (de 76,5% para 68,2%) e aumento de 5,3% para 11,1% do contingente em empregos precários.

Pochmann (2008, p.41-42)22 reforça esse dado apresentado por Borges

(2007) a partir da análise dos dados do IBGE/PNAD.

Nas décadas de 1970 e 1980, no Brasil, ter maior escolaridade era garantia de menor risco de ficar desempregado. Para o segmento da força de trabalho com doze ou mais anos de estudo, a taxa nacional de desemprego era 44,6% menor do que a verificada entre trabalhadores com até oito anos de escolaridade. Tal fenômeno se modificou posteriormente: a partir da década de 1990 a relação entre a taxa nacional de desemprego do segmento com escolaridade equivalente ao ensino básico e a taxa nacional de desemprego do segmento com escolaridade equivalente aos ensinos médio e superior passou a ser decrescente; em 2004, a taxa nacional de desemprego do estrato da população economicamente ativa com maior escolaridade ultrapassou a dos trabalhadores com menos anos de estudo. Assim, a taxa nacional de desemprego do segmento da população economicamente ativa com nível educacional equivalente ao ensino básico passou a ser quase a metade da taxa nacional de desemprego da força de trabalho com escolaridade equivalente ao ensino médio. Quinze anos antes (1989), essa relação era praticamente equivalente.

De acordo com Pochmann, diferentemente da experiência internacional que o

desemprego, em virtude dos crescentes investimentos em novas tecnologias, tem

convergido para os trabalhadores com menos escolaridade, no caso do Brasil esse

fenômeno tem acontecido de maneira inversa, pois a taxa de desemprego tem

aumentado mais para os trabalhadores com maior escolaridade. A justificativa para

essa anomalia, segundo o economista, está no fato que “educação embora

fundamental para a disputa no mercado de trabalho, não é suficiente, por si só, para

garantir emprego e salário digno. Outras variáveis estão em jogo, como o ritmo de

crescimento econômico e a forma de inserção do Brasil na economia mundial”.

(POCHMANN, 2008, p.44).

Ao mesmo tempo, não podemos deixar de destacar outra tendência em curso

nas relações de trabalho contemporâneas que é a expansão do trabalho feminino

nos mais diferentes segmentos do mercado de trabalho.

Todavia, Antunes (2007, p.19) ao abordar essa tendência destaca que:

Esta expansão do trabalho feminino tem, entretanto, um movimento inverso quando se trata da temática salarial23, onde os níveis de remuneração das

22 Cf. Márcio Pochmann, O emprego no desenvolvimento da nação, 2008.

Page 34: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

33

mulheres são em média inferiores àqueles recebidos pelos trabalhadores, o mesmo ocorrendo em relação aos direitos sociais e do trabalho que também são desiguais. No Brasil, o salário médio das mulheres está em torno de 60% do salário dos trabalhadores.

Para exemplificar essa diferenciação salarial entre gêneros no mercado de

trabalho, podemos citar o caso da categoria profissional dos (as) trabalhadores/as

domésticos/as. Segundo dados da OIT (2008, p.4):

A remuneração dos/as trabalhadores/as domésticos/as é muito reduzida, tanto para os homens, quanto para as mulheres. Entretanto, mesmo em um setor ainda bastante precário do mercado de trabalho, as desigualdades de gênero e raça reproduzem a lógica do mercado de trabalho mais amplo: os homens brancos seguem auferindo os maiores rendimentos, seguidos dos homens negros e, por fim, das mulheres brancas e negras, nesta ordem. As mulheres negras estão na situação mais desfavorável, mesmo sendo maioria na categoria. Em 1995, recebiam o equivalente a 55,4% dos rendimentos dos homens brancos. Em 2006, essa diferença diminui, apesar de continuar bastante elevada: as mulheres negras passam a receber 66,4%. Os rendimentos das mulheres brancas, em 1995 e em 2005, equivaliam a, respectivamente, 64,5% e 75,5% dos rendimentos dos homens brancos; para os homens negros, os valores eram 69% e 87,3% dos rendimentos dos homens brancos, nos mesmos períodos.

Diante dos elementos expostos até aqui, podemos indicar que a questão do

trabalho e da classe trabalhadora, no interior da sociedade capitalista do século XX

e início do XXI, deve ser apreendida no próprio movimento (contraditório) desse

modo de produção e reprodução social. O que no âmbito da relação Trabalho e

Educação, objeto do próximo capítulo, não será diferente.

23 Nos EUA, somente em janeiro de 2009 o presidente Barack Obama assinou a primeira lei que prevê a igualdade salarial entre homens e mulheres.

Page 35: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

34

3 TRABALHO E EDUCAÇÃO

Toda sociedade vive porque consome; e para consumir depende da produção. Isto é, do trabalho. Toda sociedade vive porque cada geração nela cuida da formação da geração seguinte e lhe transmite algo da sua experiência, educa-a. Não há sociedade sem trabalho e sem educação. (KONDER, 2000, p.112).

No capítulo anterior, procuramos demonstrar que o trabalho constitui o

fundamento ontológico do ser social, ou seja, para poder existir e se reproduzir os

homens e mulheres, primeiramente, precisam transformar matérias naturais em

produtos que atendam às suas necessidades. E essa transformação é realizada a

partir da atividade que denominamos trabalho.

Do mesmo modo, afirmamos que em cada momento histórico uma

determinada forma de trabalho será a base de uma determinada forma de

sociabilidade e destacamos o trabalho assalariado como relação social dominante

na sociedade capitalista.

Entretanto, ao considerarmos o trabalho como categoria fundante do ser

social e o trabalho assalariado como relação dominante na sociedade capitalista,

não podemos deixar de reconhecer que a vida social em suas diferentes formas

históricas é muito mais do que trabalho. Por se tratar de uma categoria social, o

próprio trabalho apenas pode existir, se estiver articulado a outras categorias, dentre

elas, a educação.

Assim, neste capítulo, a partir do resgate de elementos que compõem a

história humana, buscaremos demonstrar como a relação trabalho e educação vem

se constituindo ao longo do tempo e como no desenvolvimento, do modo de

produção capitalista do século XX e a primeira década do século XXI, a instituição

Escola passa a ter um lugar de destaque na formação da força de trabalho.

3.1 O DEBATE EM TORNO DOS FUNDAMENTOS ONTOLÓGICO-HISTÓRICOS

Nas últimas décadas, frequentemente, a ideologia dominante tem atribuído ao

sistema educacional brasileiro à responsabilidade pela falta de trabalhadores

qualificados para atender às necessidades do desenvolvimento sócio-econômico do

país. Tal raciocínio linear, a nosso ver, tem provocado uma série de interpretações

Page 36: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

35

abstratas e reducionistas da realidade, que dificilmente se sustentam quando

trazidas à luz do conjunto das relações sociais concretas e suas múltiplas

determinações.

No que diz respeito ao nosso objeto de investigação, a relação trabalho e

educação, por se tratar de um objeto que ainda padece de imprecisões, acreditamos

que o resgate dos seus elementos ontológico-históricos é indispensável para

compreendermos as raízes dessa relação e suas possíveis implicações no âmbito

da escola de nível médio.

Entretanto, como fazer síntese não é uma tarefa fácil, ao passo que pode

conduzir a interpretações equivocadas e que não se sustentam frente à realidade

objetiva, nesta seção optamos por sinalizar como a relação trabalho e educação

vem sendo problematizada por Dermerval Saviani (2007), Lucília Machado (2005),

Sérgio Lessa (2007) e Ivo Tonet (2009) em alguns de suas análises publicadas

recentemente.

Apesar dos quatro autores partirem do legado deixado por Marx e

defenderem a centralidade do trabalho enquanto fundamento do ser social, Lessa e

Tonet possuem pontos de divergência em relação a Saviani e Machado no que diz

respeito à relação trabalho e educação. São estes pontos de divergência que

procuramos explicitar, com o intuito de tanto estimular o debate em torno da relação

trabalho e educação quanto nos auxiliar na análise da proposta de educação

profissional integrada ao ensino médio no governo Lula a ser realizada no capítulo

seguinte.

Deste modo, partiremos do suposto que trabalho e educação são atividades

especificamente humanas, o que rigorosamente falando, significa dizer que somente

o gênero humano (homem e mulher) trabalha e educa. Tal afirmação, todavia, nos

remete a duas questões trazidas por Saviani (2007 p.153): “quais são as

características do ser humano que lhe permitem realizar as ações de trabalhar e de

educar? Ou: o que é está inscrito no ser do homem que lhe possibilita trabalhar e

educar”?

Anteriormente, afirmamos que a essência humana é produzida pelo trabalho.

Independente das formas históricas que se apresenta (trabalho livre, trabalho

escravo, trabalho servil, trabalho assalariado), os seres humanos necessitam

estabelecer, primariamente, um intercâmbio orgânico com a natureza, pois a

mesma, por si só, não é capaz de garantir a existência humana. “A existência

Page 37: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

36

humana não é garantida pela natureza, não é uma dádiva natural, mas tem que ser

produzida pelos próprios homens, sendo, pois, um produto do trabalho”. (SAVIANI,

2007, p.154).

Para sustentar esse pressuposto, recorremos, primeiramente, a Marx (2003),

quando o mesmo enfatiza que antes de tudo o trabalho é um processo de que

participam o homem e a natureza, e que é através do trabalho que o ser humano

pode apropriar-se dos recursos da natureza a fim de possibilitar a sua própria

existência. Por outro lado, não podemos deixar de reconhecer como o próprio Marx

(2003, p.213) fez que “quando o trabalhador chega ao mercado para vender a sua

força de trabalho, é imensa a distância histórica que medeia sua condição e a do

homem primitivo com a sua forma ainda instintiva de trabalho”.

Nesse sentido, apesar de considerarmos o trabalho a categoria fundante do

ser social, reafirmamos que o próprio trabalho enquanto categoria social não pode

existir se não estabelecer mediações com outras categorias, entre as quais se

encontra a educação.

Por essa ótica, Lessa (2002, p.27) ao analisar a centralidade ontológica do

trabalho a partir das contribuições da Ontologia do ser social de Lukács destaca que

“o próprio trabalho [...] apenas pode existir como partícipe de um complexo

composto, no mínimo, por ele (o trabalho), pela fala e pela sociabilidade (o conjunto

das relações sociais)”. Em seguida, também enfatiza essa necessidade da

articulação do trabalho com outras categorias sociais ao destacar que:

A relação dos homens com a natureza requer com absoluta necessidade, a relação entre homens. Por isso, além dos atos de trabalho a vida social contém uma enorme variedade de atividades voltadas para atender às necessidades que brotam do desenvolvimento das relações dos homens entre si [...]. Essa relação, contudo, em nada esmaece a distinção essencial entre os atos de trabalho e o restante da práxis social, o primeiro permanecendo, com todas as mediações necessárias o momento fundante do ser social.(LESSA 2002, p.28-29).

Seguindo essa mesma linha de análise Tonet (2009, p.7) em artigo sobre

Marxismo e Educação destaca que:

Embora o trabalho seja fundante, é apenas um dos momentos da realidade social. Além dele, muitos outros momentos fazem parte dela. Alguns como a socialidade, a linguagem, a educação, o conhecimento integrarão o ato do trabalho. Outros surgirão na medida em que, a partir do incremento das forças produtivas, a sociedade se tornar mais complexa, exigindo outras atividades que não aquelas voltadas à produção dos bens materiais [...].

Page 38: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

37

Deste modo, Lessa (2007) e Tonet (2009), procuram demonstrar a natureza

fundante da categoria trabalho e a natureza fundada da categoria educação. O que

para os autores não implica nenhuma valoração entre essas categorias, mas, tão

somente uma constatação de um fato ontológico.

Portanto, essa relação fundante-fundada entre trabalho e educação para

Lessa (2007) e Tonet (2009) deve ser compreendida à medida que diferentemente

dos demais animais, os seres humanos precisam aprender a realizar as atividades

necessárias a sua existência. Em decorrência dessa necessidade emerge a

necessidade da educação, entendida como um processo de aquisição de

conhecimentos, habilidades, comportamentos, valores, etc., que são indispensáveis

à participação da vida social.

Segundo Tonet (2009, p.9):

Esta abordagem deixa muito clara a diferença essencial entre trabalho e educação. Como já vimos antes, trabalho é a única categoria que faz a mediação entre o homem e a natureza. Só ele tem a função social de produzir os bens materiais necessários à existência humana. A educação, por sua vez, é uma mediação entre os próprios homens, ainda que ela possa estar relacionada, de modo mais próximo ou mais longínquo com o próprio trabalho.

Todavia, no interior do marxismo não existe um consenso na tese defendida

por Lessa (2007) e Tonet (2009) no que diz respeito à relação fundante-fundada do

trabalho e da educação.

Machado (2005) ao fazer uma reflexão sobre a constituição do campo de

pesquisa trabalho-educação e do seu objeto de estudos traz perspectiva

parcialmente distinta à apresentada pelos autores. Para autora,

Trabalho e Educação não são dois objetos do pensamento que possam ser classificados, a rigor, como elementos ou noções simples. Um já contém o outro antes mesmo de colocados em associação. O Trabalho ao ir ao encontro da Educação já traz Educação dentro dele e vice-versa: a Educação ao ir ao encontro do trabalho também já leva o Trabalho dentro de si. (MACHADO, 2005, p.129).

Perspectiva semelhante à apresentada por Machado (2005) pode ser

encontrada no texto de Saviani Trabalho e educação: fundamentos ontológicos e

históricos (2007).

Page 39: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

38

Nesse texto, Saviani defende a tese que no ponto de partida a relação

trabalho e educação constitui-se em uma relação de identidade. Para o filosofo -

educador:

Os homens aprendiam a produzir sua existência no próprio ato de produzi-la. Eles aprendiam a trabalhar trabalhando. Lidando com a natureza, relacionando-se uns com os outros, os homens educavam-se e educavam as novas gerações. A produção da existência implica o desenvolvimento de formas e conteúdos cuja validade é estabelecida pela experiência, o que configura um verdadeiro processo de aprendizagem. Assim, enquanto os elementos não validos pela experiência são afastados, aqueles cuja eficácia a experiência corrobora necessitam ser preservados e transmitidos às novas gerações no interesse da continuidade da espécie (SAVIANI, 2007, p.154).

Nessa perspectiva de análise, nas comunidades primitivas, a educação

coincidiria totalmente com o fenômeno descrito, pois, por não haver divisão em

classes, nessa forma de organização social, os homens no processo de apropriação

coletiva dos meios de produção educavam-se e educavam as novas gerações, ou

seja, todo o ato de trabalho seria um ato educativo.

Portanto, Saviani (2007, p.155) destaca que nessas condições a “educação

identificava-se com o trabalho e com a vida. A expressão “educação é vida” e não

preparação para a vida, reivindicada muitos séculos mais tarde, já na nossa época,

era, nessas origens remotas, verdade prática”.

Não obstante, ao estabelecer a relação de identidade entre trabalho e

educação, Saviani (2007, p.155) destaca que antes da emergência histórica da

sociedade de classes havia uma unidade entre trabalho e educação, pois a mesma

“estava identificada plenamente com o processo de trabalho”. Assim, somente com o

desenvolvimento da produção, que induziu a divisão do trabalho e

conseqüentemente a apropriação privada da terra, foi possível pela primeira vez a

emergência histórica da separação entre trabalho e educação.

Segundo Saviani (2007) é no momento em que se desenvolve a divisão dos

homens em classes – proprietários e não proprietários - portanto que ocorrerá a

divisão também na educação.

Nesse sentido, para o autor, somente:

A partir do escravismo antigo passaremos a ter duas modalidades distintas e separadas de educação: uma para a classe proprietária, identificada como a educação dos homens livres, e outra para a classe não proprietária, identificada como a educação dos escravos e serviçais. A primeira centrada nas atividades intelectuais, na arte da palavra e nos exercícios físicos de

Page 40: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

39

caráter lúdico ou militar. E a segunda, assimilada ao próprio processo de trabalho. (SAVIANI, 2007, p. 155).

Saviani (2007, p.155), também destaca que tal acontecimento, a divisão dos

homens em classes sociais “é de fundamental importância na história da

humanidade, tendo claros efeitos na própria compreensão ontológica do homem”,

pois pela primeira vez na história humana, abre-se à possibilidade histórica de uma

classe viver sem trabalhar.

No âmbito da relação trabalho e educação, a mesma citação destaca que

essa divisão em classes foi à responsável pela cisão na unidade da educação que

até então estava “identificada plenamente com o processo de trabalho.”

Contudo, é essa unidade entre trabalho e educação que Lessa (2007) e Tonet

(2009) questionam, porque para ambos os autores, as categorias trabalho e

educação possuem funções sociais específicas, mas que de uma forma ou de outra

necessitam vincular-se desde o momento original do ser social. O que não é a

mesma coisa que afirmar que possuem uma relação de identidade.

Vale destacar que Lessa destina uma seção do seu livro Trabalho e

proletariado no capitalismo contemporâneo24 (2007) somente para tentar demonstrar

possíveis contradições existentes na tese defendida por Saviani em torno da relação

de identidade entre trabalho e educação.

Portanto, a nosso ver, é nesse aspecto que estão as principais divergências

entre Lessa (2007) e Tonet (2009), que defendem uma relação de necessidade

entre trabalho e educação, e Saviani (2007), que tem como ponto de partida a

relação de identidade entre as duas categorias. Para os dois primeiros, se

considerarmos a perspectiva inicial de Saviani da educação identificada plenamente

ao processo de trabalho, teremos ao mesmo tempo que considerar a educação

como trabalho, o que para ambos tal desdobramento causa sérios problemas à tese

do trabalho enquanto categoria fundante.

Entretanto, como o propósito desta dissertação não é esgotar o debate

acadêmico acerca dos fundamentos ontológicos da relação trabalho e educação,

mas tão somente trazê-lo à tona, passaremos a seguir a discutir a relação trabalho e

educação sob a mediação da escola brasileira de educação básica.

24 Cf. a seção: Saviani: educação como trabalho.

Page 41: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

40

3.2 ESCOLA E TRABALHO NO BRASIL A PARTIR DO SÉCULO XX

Com o advento do modo de produção capitalista, que sucedeu, no Ocidente,

ao modo de produção feudal, a relação trabalho e educação passa a sofrer novas

determinações.

Baseada em uma economia de mercado, onde o lucro é a força motriz, em

uma complexa divisão social e técnica do trabalho e na produção voltada para a

troca, o capitalismo a partir da revolução industrial, disseminou novas relações de

produção, onde a relação trabalho assalariado e capital ganhou centralidade.

Diante do desenvolvimento da indústria e da maquinaria e do progressivo

deslocamento do eixo do processo produtivo do campo para a cidade, novas formas

de gestão e organização da produção e do trabalho são estabelecidas, e a escola

passa a ocupar posição de destaque na formação da força de trabalho.

Inicialmente, destinada a ser o lugar do ócio, do tempo livre, espaço por

excelência dedicado ao desenvolvimento das atividades intelectuais, a arte da

palavra e os exercícios físicos de caráter lúdico militar, a escola, à medida que as

relações capitalistas se difundem, torna-se a principal forma de educação.

Segundo Saviani (2007, p. 159):

Se a máquina viabilizou a materialização das funções intelectuais no processo produtivo, a via para objetivar-se a generalização das funções intelectuais na sociedade foi a escola. Com o impacto da Revolução Industrial os principais países assumiram a tarefa de organizar sistemas nacionais de ensino, buscando generalizar a educação básica.

Diríamos então que, com o advento da indústria moderna e a crescente

divisão social e técnica do trabalho emergiu a necessidade de todos os membros da

sociedade possuir o domínio das funções intelectuais, cuja leitura e a escrita são

componentes elementares.

Nesse aspecto, sinalizamos a iniciativa dos países de capitalismo mais

avançado, que desde a segunda metade do século XIX, buscaram implementar a

escola pública, universal e gratuita sob a égide do Estado.

Porém, ao mesmo tempo, reforçamos que tal iniciativa deve ser

compreendida à luz das necessidades advindas das novas relações de produção, e

não simplesmente por uma ação espontânea dos Estados em oferecer educação

para o seu povo.

Page 42: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

41

Romanelli (1996, p.59) ao analisar as novas exigências educacionais

provocadas pelo capitalismo de base industrial destaca que:

As mudanças introduzidas nas relações de produção e, sobretudo, a concentração cada vez mais ampla da população em centros urbanos tornaram imperiosa a necessidade de se eliminar o analfabetismo e dar um mínimo de qualificação para o trabalho a um máximo de pessoas. O capitalismo, notadamente, o capitalismo industrial engendra, a necessidade de fornecer conhecimentos a camadas cada vez mais numerosas, seja pelas exigências da própria produção, seja pelas necessidades do consumo que essa produção acarreta.

Contudo, apesar dos avanços ocorridos com o desenvolvimento do

capitalismo, não podemos perder de vista que esse modo de produção mantém sob

novas bases a divisão da sociedade em classes – proprietários e não proprietários -

o que implicará diretamente o tipo de educação e de escola que será oferecido no

seu interior.

Kuenzer (1997, p.12) ao tratar da relação trabalho e educação, com destaque

para o caso brasileiro, afirma que:

Se a divisão social e técnica do trabalho é condição indispensável para a constituição do modo capitalista de produção, à medida que rompendo a unidade entre teoria e prática, prepara diferentemente os homens para que atuem em posições hierárquicas e tecnicamente diferenciadas no sistema produtivo, deve-se admitir como decorrência natural deste princípio a constituição de sistemas de educação marcados pela dualidade estrutural. No Brasil, a constituição do sistema de ensino não se deu de outra forma.

Assim, a dualidade estrutural da educação escolar no Brasil ganha destaque

à medida que, no início do século XX, a educação diretamente articulada ao trabalho

passa a se estruturar como um sistema diferenciado e paralelo ao sistema regular

de ensino. Sob o argumento do constante aumento da população nas cidades e da

necessidade de “facilitar” às classes proletárias os meios para vencer as dificuldades

de existência, o governo brasileiro, através do presidente Nilo Peçanha, promulgou o

Decreto 7.566, de 23 de setembro de 1909. Este decreto criou em cada uma das

capitais dos Estados uma Escola de Aprendizes Artífices destinada ao ensino

profissional, primário e gratuito.

Conforme destaca o seu art. 2º a criação das Escolas de Aprendizes Artífices

teve como finalidade “formar operarios e contra-mestres, ministrando-se o ensino

prático e os conhecimentos technicos necessários aos menores que pretendiam

aprender um ofício [...]”. (BRASIL, 1909, p.1).

Page 43: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

42

No entanto, Cunha (2000, p.94) ao analisar a criação das Escolas de

Aprendizes Artífices destaca que não era somente essa a preocupação do governo

brasileiro naquele momento histórico. Segundo o autor:

Em 1909, o Brasil passava por um surto de industrialização, quando as greves de operários foram não só numerosas, como articuladas, umas categorias paralisando o trabalho em solidariedade a outras, lideradas pelas correntes anarco-sindicalistas. Neste contexto, o ensino profissional foi visto pelas classes dirigentes como um antídoto contra a “inoculação de idéias exóticas” no proletariado brasileiro pelos imigrantes estrangeiros, que constituíam boa parte do operariado.

Outro aspecto destacado por Cunha (2000, p.95) é o uso do ensino

profissional enquanto estratégia política na década 1930:

Todas as escolas de aprendizes artífices se situavam nas capitais dos estados, com a exceção do Rio de Janeiro, que teve a sua localizada em Campos, cidade natal do presidente da República. A localização de cada escola na capital do estado (com a mencionada exceção do Rio de Janeiro) mostra uma preocupação mais política do que econômica. A população estava muito desigualmente distribuída pelas unidades da Federação, assim como as atividades manufatureiras, que se concentravam no Distrito Federal e em São Paulo. O primeiro já dispunha de uma instituição do mesmo tipo que o segundo veio a receber, em igualdade de condições com estados onde a atividade manufatureira era incipiente, como os do norte, do nordeste e do centro-oeste. Essa preocupação política se manifestou, ainda, na localização de cada escola sempre na capital do estado, sede do poder político, mesmo quando as atividades manufatureiras concentravam-se em outra cidade, como Juiz de Fora (e não Belo Horizonte), em Minas Gerais; e Blumenau (e não Florianópolis), em Santa Catarina.

Dessa forma, podemos destacar que por detrás de “auxiliar” as classes

proletárias a vencer as dificuldades de existência, estava o uso do ensino

profissional enquanto mecanismo de controle e disciplinamento dos setores

populares.

Manfredi (2002) reforça esse argumento quando destaca que paralelamente à

construção do sistema escolar público, o governo brasileiro procurou desenvolver

um tipo de educação apartado do ensino secundário e superior, sob o pretexto da

necessidade de formação da força de trabalho para atender as novas exigências do

modo de produção.

Esse pretexto torna-se questionável à medida que Cunha (2000) destaca que

foi somente a partir da década de 1940, que a demanda da economia brasileira por

Page 44: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

43

trabalhadores qualificados surge como preocupação objetiva, ou seja, três décadas

após a criação das primeiras Escolas de Aprendizes Artífices.

Nessa perspectiva, é possível notar que a dualidade estrutural da educação

escolar brasileira tem no Estado o principal órgão legitimador. Desde então, as

políticas educacionais promovidas por ele, apesar das inúmeras reformas e

tentativas de superar a dualidade no decorrer do século XX e primeira década do

século XXI, na verdade tem reforçado a independência entre atividades manuais e

atividades intelectuais e a constituição de um sistema escolar desigual tanto nas

oportunidades de acesso quanto da distribuição dos saberes produzidos.

Um exemplo que reforça o caráter dual da educação escolar brasileira, nas

primeiras décadas do século anterior, está no incentivo por parte do governo federal

da institucionalização de um sistema nacional paralelo de formação profissional

financiado pelas empresas. Tal iniciativa possibilitou a criação do Serviço Nacional

de Aprendizagem Industrial – SENAI – (1942) e posteriormente do Serviço Nacional

de Aprendizagem Comercial – SENAC - em (1946).

Kuenzer (1997, p.14), ao fazer um breve balanço da educação para o trabalho

nas primeiras décadas do século XX, reforça a questão da dualidade estrutural

quando afirma que:

Até essa época, portanto, verifica-se que a educação para o trabalho é atribuição específica de um sistema federal de ensino técnico, complementado por um sistema privado de formação profissional para a indústria e para o comércio, através do SENAI e do SENAC. Ambos se desenvolvem paralelamente ao sistema regular de ensino, articulando-se a este através de um mecanismo duvidoso, representado pela “continuidade em cursos relacionados”, só tardiamente definido (1953).

Destarte, é nesse paralelismo de sistemas de ensino que vai se constituindo

a etapa final da educação básica25 no Brasil. De um lado, um conjunto de escolas de

ensino profissional que raramente se preocupava com a formação teórica dos seus

estudantes, pois suas propostas curriculares davam ênfase às atividades práticas, o

aprender fazendo, e do outro lado um conjunto de escolas de ensino secundário cuja

preocupação estava na preparação dos estudantes para o ingresso em cursos de

nível superior.

25 A partir da LDB 9.394/96, o ensino médio passa a ser considerado a etapa final da educação básica.

Page 45: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

44

Essa situação não chegou a alterar-se com a primeira Lei de Diretrizes e

Bases da Educação Nacional, LDB 4.024/1961. Embora tal lei tenha propiciado um

avanço significativo ao incorporar ao sistema regular de ensino os cursos técnicos

de nível médio, estabelecendo equivalência plena entre os cursos propedêuticos e

profissionalizantes, manteve-se a independência entre “a educação propriamente

dita” e a formação profissional como se fossem duas coisas distintas.

Assim, permanecendo a lógica do sistema praticamente inalterada, em 1964

com a instauração do golpe militar de Estado, retomou-se o período de

transformações nos rumos da sociedade brasileira, que no caso da educação para o

trabalho refletiu-se na Lei. 5.692/1971.

Segundo Kuenzer (1991, p.9):

Em termos estruturais, a Lei 5.692/1971 pretendeu romper com a dualidade, substituindo os antigos ramos propedêutico e profissionalizante por um sistema único – por onde todos passam independentemente de sua origem de classe – cuja finalidade é a qualificação para o trabalho através da habilitação profissional conferida pela escola.

Nessa direção, o governo militar ao propor a universalização da escola de

segundo grau profissionalizante, pelo menos no texto da lei, pretendeu superar no

interior da escola um problema que está na base da sociedade de classes e que diz

respeito à apropriação privada dos meios de produção e a relação desigual entre

capital e trabalho.

Assim, como historicamente há um interstício entre o discurso e a prática,

mesmo com a suposta “homogeneidade” do sistema de ensino imposto pela lei,

continuaram a existir diferentes tipos de escola, que permaneceram reproduzindo

em seu interior a independência entre a preparação para o vestibular e a preparação

para o trabalho antes do ensino superior.

Desta forma, diante de diversos fatores de ordem estrutural e conjuntural e da

inviabilidade de implantação de uma escola única de profissionalização obrigatória

em 1982 é sancionada a lei 7.044. Esta lei extinguiu ao nível formal, algo que nunca

chegou a existir na realidade brasileira, a universalização da profissionalização ao

nível de segundo grau.

Para Kuenzer (1991), a referida lei ao substituir o objetivo do ensino de

segundo grau de qualificar para o trabalho pela expressão genérica “preparação

Page 46: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

45

para o trabalho” provocou uma efetiva “contra-reforma” nesse grau de ensino, pois

onze anos depois reeditou a concepção vigente antes de 1971.

Logo, a velha dualidade, que na prática não deixou de existir, segundo a

autora, retornou dessa vez sem os constrangimentos impostos pela lei. Ao mesmo

tempo em que o período que se estendeu da entrada em vigor da Lei 5.692/71 às

alterações impostas pela Lei 7.044/82 tornou ainda mais ambíguo e precário o

ensino secundário na rede pública de ensino.

Por outro lado, nesse mesmo período (anos 1980), com o enfraquecimento

das bases do regime militar o tema do trabalho como princípio educativo, da

politecnia, e da escola unitária26 - temas que integram a tradição socialista - foram

sem dúvida um dos mais recorrentes entre os teóricos da educação, sobretudo

aqueles que pertenciam à área de trabalho e educação e que tinham como

referencial teórico o legado deixado por Marx e pelo filósofo italiano Antonio

Gramsci.

Entretanto, com a queda do mundo de Berlim em 1989 e o declínio das

experiências consideradas de socialismo real houve um enfraquecimento em relação

à defesa dos princípios que integram a tradição socialista, ao mesmo tempo em que

emergiram uma série de noções, dentre elas as de competência, que passaram a

ser incorporadas pelo discurso pedagógico compatível com a lógica do capital.

Nessa direção, a reforma educacional brasileira, iniciada a partir da

aprovação da LDB 9.394/96, insere-se nesse novo ciclo de reprodução do capital,

cujo discurso no âmbito da educação está amparado na ideologia da pedagogia das

competências. A seguir, destacaremos alguns pontos dessa reforma no âmbito do

ensino médio e da educação profissional.

3.3 A REFORMA DO ENSINO MÉDIO E DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO BRASIL NOS ANOS 1990

No dia que completaria trinta e cinco anos de existência a Lei 4.024, de 20 de

dezembro de 1961, mais conhecida como primeira LDB, deixou de existir. Em seu

lugar passou a vigorar a LDB 9.394/1996 que apesar de todas as modificações

26 Uma discussão mais ampla sobre esses temas pode ser encontrada em Saviani (2003 e 2007).

Page 47: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

46

ocorridas desde então, continua a ser o instrumento jurídico-político que direciona os

rumos da educação em nosso país.

Resultado de mais de uma década de debates, disputas e negociações dentro

e fora do Congresso Nacional27, a atual LDB introduz-se em um contexto marcado

por significativas mudanças na economia e na política brasileira. A abertura

progressiva da economia ao capital internacional, a busca pelo controle da inflação e

pela estabilização da moeda juntamente com o processo de implantação de um

conjunto de políticas neoliberais fizeram com que o Brasil se inserisse no novo ciclo

de (re)produção do capital.

Esse novo ciclo, fundamentado nos processos de automação e

informatização da produção, na incorporação de novos métodos de gestão e

organização do trabalho, cujo toyotismo é a principal expressão, e na instabilidade

do emprego socialmente protegido passou a exigir a adequação da oferta

educacional às novas demandas impostas pela lógica do capital.

Kuenzer (1999, p.2), ao analisar as novas relações de produção nesse

período destaca que:

A memorização de procedimentos - necessária a um bom desempenho em processos produtivos rígidos - passa a ser substituída pela capacidade de usar o conhecimento científico de todas as áreas para resolver problemas novos de modo original, o que implica domínio não só de conteúdos, mas dos caminhos metodológicos e das formas de trabalho intelectual multidisciplinar, o que exige educação inicial e continuada rigorosa, em níveis crescentes de complexidade. A essa competência científico-tecnológica articula-se a demanda por competência ética, na dimensão de compromisso político com a qualidade da vida social e produtiva. Ao mesmo tempo exigem-se novos comportamentos, em decorrência dos novos paradigmas de organização e gestão do trabalho, onde as práticas individuais são substituídas por procedimentos cada vez mais coletivos, onde se compartilham responsabilidades, informações, conhecimentos e formas de controle, agora internas ao trabalhador e ao seu grupo.

A citação de Kuenzer (1999) é emblemática para compreendermos como a

ideologia do novo ciclo de (re)produção do capital impõe ao trabalhador e as

instituições educacionais uma série de exigências em relação a sua participação

nessa realidade emergente. Ao mesmo tempo em que salienta a necessidade de

uma “nova ética” pautada na coletividade em detrimento das práticas individuais. O

que de fato é uma verdadeira contradição se levarmos em consideração que no

capitalismo, o individualismo se constitui em um dos seus fundamentos.

27 Cf. A trajetória da Nova LDB. In______ Saviani (1999).

Page 48: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

47

Assim, é no contexto descrito que a Lei 9.394/96 tornar-se-á a referência para

a implementação da reforma do ensino médio e da educação profissional na

sociedade brasileira. Reforma que no âmbito da última etapa da educação básica

atribuiu as seguintes finalidades:

I - a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino

fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos;

II - a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar

aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de

ocupação ou aperfeiçoamento posteriores;

III - o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o

desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico;

IV – a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos,

relacionando a teoria com a prática, no ensino de cada disciplina (BRASIL, 1996, p. 11).

Logo, além de observar as finalidades dispostas pela Lei 9.394/96, a partir

das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (DCNEM) instituídas em

junho de 1998, as escolas deveriam organizar seus currículos de modo a:

I – ter presente que os conteúdos curriculares não são fins em si mesmo, mas meios

básicos para constituir competências cognitivas ou sociais, priorizando-as sobre as

informações;

II – ter presente que as linguagens são indispensáveis para a constituição de

conhecimentos e competências;

III – adotar metodologias de ensino diversificadas que estimulem reconstrução do

conhecimento e mobilizem o raciocínio, a experimentação, a solução de problemas e

outras competências cognitivas superiores;

IV – reconhecer que as situações de aprendizagem provocam também sentimentos e

requerem trabalhar a afetividade do aluno. (BRASIL, 1998, p.2).

Já no que diz respeito à Educação Profissional, por se tratar de um capítulo à

parte da educação básica, a mesma deverá conduzir o educando ao permanente

desenvolvimento de aptidões para vida produtiva, a partir da sua integração a

Page 49: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

48

diferentes formas de educação sob as dimensões do trabalho, da ciência e da

cultura.

Nessa perspectiva, a LDB 9.394/96 destaca que a relação entre o ensino

médio e a educação profissional só deve ocorrer à medida que seja atendida a

formação geral do educando. Portanto, só depois de atendido esse requisito o

ensino médio poderá preparar os estudantes para o exercício de profissões técnicas,

ou seja, formá-lo para uma ocupação.

Segundo MEC (2000a, p.5), a justificativa para essa decisão está no fato de

que a partir da década de 1990 “a formação do aluno deve ter como alvo principal a

aquisição de conhecimentos básicos, a preparação científica e a capacidade de

utilizar as diferentes tecnologias relativas às áreas de atuação”. Por isso,

diferentemente do que ocorrera na década de 1970 quando se buscou a

profissionalização compulsória no ensino médio, a nova proposta governamental

indica a formação geral, em oposição à formação específica; o desenvolvimento de

capacidades de pesquisar, buscar informações, analisá-las e selecioná-las; a

capacidade de aprender, criar, formular, ao invés do simples exercício de

memorização.

No entanto, ao analisar o projeto oficial de reforma do ensino médio e técnico

Manfredi (2002, p.128-129) destaca que:

Na concepção proposta, o ensino médio terá uma única trajetória, articulando conhecimentos e competências para a cidadania e para o trabalho sem ser profissionalizante, ou seja, “preparando para a vida”. A Educação Profissional, de caráter complementar, conduzirá ao permanente desenvolvimento das aptidões para a vida produtiva e destinar-se-á a alunos egressos do ensino fundamental, médio e superior, bem como ao trabalhador em geral, jovem e adulto, independentemente da escolaridade alcançada.

A citação de Manfredi já deixa claro quais eram as verdadeiras intenções do

governo federal quanto ao ensino médio e a educação profissional. Entretanto, para

não deixar dúvidas, em abril do ano seguinte (1997), ou seja, menos de quatro

meses da entrada em vigor da segunda LDB 9.394/96, o presidente FHC sancionou

o Decreto 2.208/97. Este decreto passou a regulamentar o parágrafo segundo do

artigo 36 e os artigos. 39 a 42 do Capítulo III, que tratava exclusivamente da

Educação Profissional, ao mesmo tempo em que efetivou a independência entre

ensino médio e educação profissional técnica.

Page 50: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

49

Para deixar ainda mais explícita a não vinculação entre ambos foram

elaboradas Diretrizes Curriculares Nacionais independentes para o ensino médio e o

ensino técnico em 1998 e 1999; respectivamente. E no ano seguinte, 2000, também

foram publicados Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio e

Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Profissional Técnica de Nível

Médio.

Tais medidas contribuíram ainda mais para a desarticulação entre ensino

médio e educação profissional, à medida que ampliaram o hiato entre a formação

básica e a formação específica como se ambas pudessem ser realizadas de forma

independente. Ao mesmo tempo em que reforçaram a penetração das ideias

neoliberais na educação escolar brasileira.

Outro aspecto que se destaca nessa reforma do ensino médio e da educação

profissional técnica de nível médio é a emergência da noção de competência em

detrimento da noção de qualificação profissional. Segundo Ramos (2006, p.62), a

emergência da noção de competência é justificada à medida que:

A crise do emprego, acompanhada do fim da ilusão planificadora e dos novos métodos de gestão, contribui para a deterioração do conceito de qualificação, na sua dimensão conceitual, tanto no que se refere à dificuldade de repertoriar o conteúdo dos empregos quanto à sua relação com os diplomas e com as perspectivas de desenvolvimento de uma carreira linear e crescente, possibilitado pelo sistema de classificação vigente. Ao lado da retração do emprego industrial, ampliam-se as atividades de serviço, em relação aos quais os métodos e parâmetros clássicos de investigação da qualificação dos postos de trabalho não se adéquam plenamente. O emprego industrial também se reconfigura em função da automação – gestão de eventos e polivalência realçam o valor do trabalho real em detrimento da prescrição – tornando as características dos empregos mais instáveis.

A autora prossegue sua análise observando que:

Os motivos apontados anteriormente – crise do emprego, fim da ilusão planificadora, novos métodos de gestão colocaram também a dimensão social da qualificação em cheque. A liberação tendencial dos códigos de classificação, de carreira, salário e exercício profissional em relação aos diplomas ou a especialização comprovada e validada, promovem novos modos de regulação do mercado de trabalho, destacando o livre mercado das negociações. Isto porque os referidos parâmetros reguladores – normalmente coorporativos e classistas – perdem a legitimidade. Em oposição a competência é apresentada como um bem privado que se deve permutar no mercado ativo e bem informado. Assim, os modos de negociação, paritárias, nacionais e classistas, sobre os quais repousava a qualificação, perdem a importância. (RAMOS, 2006, p.63).

Page 51: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

50

Não o bastante, a noção de qualificação profissional à medida que era vista

apenas enquanto relação direta entre formação escolar e posto de trabalho passou a

ser fortemente questionada. Em outras palavras, a relação entre educação escolar e

emprego socialmente protegido é tensionada, pois passou a existir uma “distância”

entre as necessidades educacionais demandadas pela produção de bens e serviços

e o tipo de educação oferecida pelas instituições educacionais.

Por outro lado, a noção de competência converteu-se em alternativa do

capital a crise do emprego socialmente protegido, ao mesmo tempo em que foi

incorporada como uma “necessidade” das novas formas de trabalho assalariado

baseadas no ideário da flexibilização28.

Dessa forma, no âmbito do ensino médio e da educação profissional, a

valorização e disseminação do conceito de competência fizeram com que o MEC

(2000b, p. 7) proclamasse uma mudança no seu foco central. Os currículos da

educação profissional, por exemplo, de:

Tradicionalmente, entendido como uma grade disciplinar preestabelecida, obrigatoriamente reproduzida pelas escolas, passa a ser um conjunto de situações-meio, organizado de acordo com uma concepção criativa local e particular, voltado para a geração de competências, estas sim estabelecidas, para cada área profissional, pelas mencionadas Diretrizes.

Novamente, Ramos (2006) destaca que a reforma curricular promovida a

partir da década de 1990 visava naquele momento re-orientar a prática pedagógica

que até então estava organizada em torno da transmissão dos conteúdos para uma

prática voltada para a construção de competências.

Assim, tanto nas Diretrizes Nacionais para o Ensino Médio (1998) quanto nos

Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Profissional de Nível Técnico

(2000) foram estabelecidos como um dos princípios norteadores do currículo o

desenvolvimento de competências.

Diante dessa mudança de foco dos conteúdos para as competências o

governo federal, sob o intermédio do MEC, busca ajustar a educação média

brasileira às “necessidades” das novas tecnologias e das mudanças na produção de

bens e serviços. Ao mesmo tempo em que atribui à escola a função de integrar os 28 Para Thebaud-Mony e Druck (2007) flexibilização deve ser compreendida como processo que tem condicionantes macroeconômicos e sociais derivados de uma nova fase de mundialização do capital, hegemonizado pela esfera financeira, cujo significado para aqueles que vivem da venda da força de trabalho tem sido marcado por algumas noções, tais como: instabilidade, incerteza, insegurança, imprevisibilidade, adaptabilidade e riscos.

Page 52: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

51

seus estudantes ao mundo contemporâneo nas dimensões fundamentais da

cidadania e do trabalho, conforme prioriza a LDB/96.

Por outro lado, vale observar que a noção de competência segundo Hirata

(1994) é uma noção oriunda do discurso empresarial, que marcada política e

ideologicamente pela sua origem deixa ausente a ideia de relação social que até

então definia o conceito de qualificação.

Desta forma, é possível supor que a apropriação da noção de competência

pelo discurso pedagógico oficial, na reforma do ensino médio e da educação

profissional da década de 1990, tem como finalidade legitimar a necessidade de

adequação da educação escolar as regras do mercado. Ou, como afirma Silva

(2008, p.122) “as proximidades entre competências e competição - a formação para

a competitividade - desvelam a falaciosidade do discurso e traz à tona a intenção

mal disfarçada de sujeição da educação escolar à ordem econômica.”

Assim, no próximo capítulo, partiremos para a apreciação da proposta de

educação profissional integrada ao ensino médio no governo Lula tomando como

referência essa realidade que emerge do reordenamento da lógica capitalista.

Page 53: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

52

4 A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL INTEGRADA AO ENSINO MÉDIO NO GOVERNO LULA: UMA ANÁLISE À LUZ DA CATEGORIA TRABALHO

Ao tratarmos no capítulo anterior da relação trabalho e educação,

constatamos que no decorrer dos últimos cem anos de história da educação escolar

brasileira, a independência entre formação geral (conhecimentos gerais) e formação

profissional (conhecimentos específicos) tem sido uma de suas principais

características.

Reflexo da propriedade privada e da divisão da sociedade em classes sociais

essa independência tem se materializado no Brasil a partir de um modelo dualista de

educação. Modelo que segundo Frigotto e Ciavatta (2004, p.21) oferece “por um

lado uma educação propedêutica destinada a preparar o educando para o acesso a

níveis superiores de ensino, e por outro, uma formação de caráter técnico-

profissionalizante centrada no ideário da preparação para atender o mercado de

trabalho”.

Dando continuidade a esse legado, constatamos também que, em meados

dos anos de 1990, o governo do presidente FHC deu início a mais um conjunto de

reformas na educação escolar em nosso país. Reformas, que sob os princípios da

lógica neoliberal, no âmbito do ensino médio e da educação profissional estabeleceu

por meio de decreto a independência curricular entre educação profissional e ensino

médio, ou seja, entre formação para o trabalho e formação geral.

Isso posto, não podemos deixar de considerar que nas últimas décadas é no

ensino médio, etapa final da educação básica, que tem se tornado explícita a

problemática em torno da relação entre educação e preparação para o trabalho. Por

possuir uma natureza de mediação entre educação fundamental e educação

profissional, este nível de ensino tem apresentado inúmeras tensões e contradições

em virtude da sua dupla função: preparar para a continuidade em estudos de nível

superior e/ou o ingresso no mercado de trabalho. Sem contar que, no caso da

realidade educacional brasileira, mais de 50% dos jovens entre 15 e 17 anos não

estão matriculados nessa etapa da educação básica e milhões de adultos não

concluíram o ensino médio, o que configura um grande déficit de educação formal

em nosso país.

Nesse sentido, também destacamos que os dois mandatos do presidente

FHC (1995-1998; 1999-2002) ficaram caracterizados pelo desenvolvimento de uma

Page 54: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

53

nova institucionalidade tanto para o ensino médio quanto para a educação

profissional, fortemente influenciada pelos ideais neoliberais e pela pedagogia

baseada na lógica das competências.

Todavia, com a eleição para a presidência da República do representante do

Partido dos Trabalhadores (PT) Luiz Inácio Lula da Silva em 2002, criou-se por parte

de muitos educadores que lutavam por um projeto educacional comprometido com a

classe trabalhadora uma série de expectativas em relação à superação da lógica

que separava a educação básica da educação profissional. Ao mesmo tempo em

que se vislumbrou a possibilidade de integração entre ensino médio e ensino

técnico, a partir de uma proposta de educação integrada sob os princípios do

trabalho, da ciência, da tecnologia e da cultura.

É essa possibilidade de educação integrada denominada pelo MEC de

Educação Profissional Técnica de Nível Médio integrada ao Ensino Médio que

pretendemos discutir no decorrer desse capítulo.

Partindo do suposto, que para analisarmos a possibilidade de educação

integrada proposta pelo governo Lula, temos que levar em consideração a realidade

brasileira, no primeiro momento, será realizada uma breve síntese das ações do

governo anterior resgatando algumas medidas que negavam implícita e/ou

explicitamente a possibilidade de integração, com destaque para o Decreto

2.208/97.

Em seguida, a partir de uma Cronologia da Integração29, que compreendeu

o período de janeiro de 2003 a dezembro de 200830, serão analisadas as principais

medidas legais adotadas pelo governo Lula visando promover à integração ensino

médio e educação profissional técnica.

Por fim, a partir da análise das Concepções e dos Princípios31 para a

integração, procuramos identificar como a dimensão trabalho está referenciada

nesse documento e como tem sido projetada a integração - formação geral e

formação específica – pelo discurso oficial.

29 Cf. Anexo A 30 Período este referente ao primeiro mandato e primeira parte do segundo mandato do presidente Lula. 31 Cf. MEC, Documento Base: Educação Profissional Técnica de Nível Médio Integrada ao Ensino Médio, Brasília, 2007.

Page 55: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

54

4.1 O LEGADO DO GOVERNO FHC

Conforme destacamos na seção 3.3 dessa dissertação, durante os anos de

1995 a 2002, o Brasil foi governado pelo então representante da coligação PSDB-

PFL32 Fernando Henrique Cardoso (FHC). Tendo como principal bandeira da sua

eleição (1994) e reeleição (1998) a estabilidade econômica e o controle da inflação,

os seus dois mandatos foram marcados pela implantação de um conjunto de

medidas neoliberais no Brasil.

Entre as principais medidas neoliberais implantadas, durante os oito anos do

seu governo, podemos destacar: a redução da participação do Estado na economia

com a privatização de diversas empresas estatais; a flexibilização e a

desregulamentação do mercado de trabalho com a precarização legal da

contratação de trabalhadores e a manutenção das altas taxas de juros ao lado da

abertura ao capital financeiro internacional, com destaque para o capital volátil,

especulativo. Tais medidas contribuíram tanto para o processo de subordinação

consentida do Brasil ao capital internacional quanto para o agravamento da sua

dependência em relação aos centros hegemônicos do capitalismo.

Como não poderia deixar de acontecer, a educação escolar não ficou isenta a

essas medidas. Sob o marco de uma nova Lei de Diretrizes e Bases, LDB 9.394/96,

aprovada após mais de 7 anos de tramitação no Congresso Nacional33, iniciou-se

um amplo processo de reforma da educação brasileira em todos os seus níveis.

Reforma que segundo Manfredi (2002, p. 133) deve ser entendida como “a

legitimação de um entre os vários projetos de educação que vinham sendo

discutidos na sociedade desde os debates sobre a LDB”.

Em relação ao ensino médio e a educação profissional, sob a justificativa da

necessidade da melhoria da oferta educacional e sua adequação às novas

demandas econômicas e sociais oriundas do novo ciclo de desenvolvimento

capitalista, o conjunto de reformas iniciou-se com a entrada em vigor do Decreto

2.208 em 23 de abril de 1997. Este decreto, ao regulamentar o § 2º do artigo. 36 e

os artigos 39 a 42 da LDB estabeleceu uma nova institucionalidade tanto para o

ensino médio quanto para a educação profissional à medida que promoveu no

interior da lei a sua separação legal.

32 Em 2007 o PFL deu lugar ao Partido Democratas. 33 Para a compreensão da trajetória da LDB 9.394/96 no Congresso Nacional ver Saviani (1999).

Page 56: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

55

Frigotto, Ciavatta e Ramos (2005a) ao fazerem um balanço da escola pública

brasileira no início do século XXI, destacam que a entrada em vigor do Decreto

2.208/97 foi, na verdade, a regressão mais profunda no âmbito do ensino médio e do

ensino técnico nas últimas décadas. Ao restabelecer, mesmo que em outros termos,

o dualismo (independência entre formação geral e formação específica) e ao

assumir como ideário pedagógico à pedagogia das competências para a

empregabilidade, este decreto deu continuidade à modernização conservadora,

baseada na lógica do capital.

Nessa direção, ao definir em seu artigo 5º que “a educação profissional de

nível técnico deveria ter organização curricular própria e independente do ensino

médio” (BRASIL 1997a, p.1) o Decreto 2.208/97 impediu qualquer possibilidade legal

de integração curricular entre a educação profissional e o ensino médio, ou seja,

entre formação geral e formação profissional. Nesse sentido, negou o artigo 39 da

LDB 9.394/96 que permitia essa possibilidade.

Dessa forma, a educação profissional de nível técnico a partir de então, só

poderia ser oferecida de forma concomitante, com matrículas independentes, ou de

forma subseqüente para aqueles que já tivessem concluído o ensino médio.

Portanto, o princípio da independência e não o da integração entre os cursos de

ensino médio e os cursos de educação profissional estava na base da referida

reforma.

Vale destacar que no próprio texto da LDB 9.394/96 essa separação estava

legitimada à medida que o ensino médio inseria-se no Capítulo II, que tratava da

educação básica, e a educação profissional de nível técnico estava no Capítulo III,

que tratava especificamente da educação profissional.

Deste modo, seguindo a lógica da independência e não da integração, em 14

de maio do mesmo ano, o então ministro da Educação e do Desporto Paulo Renato

Souza editou a Portaria 647/97 que tratava da implantação dos princípios da reforma

na rede federal de educação tecnológica, em um prazo de quatro anos. O que mais

nos chamou a atenção ao analisarmos essa portaria é a redução para o ano

seguinte (1998) do número de matrículas no ensino médio na rede federal. De

acordo com o seu artigo 3º:

As instituições federais de educação tecnológica ficam autorizadas a manter ensino médio, com matricula independente da educação profissional oferecendo o máximo de 50% do total de vagas (grifo nosso) oferecidas

Page 57: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

56

para os cursos regulares em 1997, observando o dispositivo na Lei n.º 9394/96. (BRASIL, 1997b, p.2).

Por outro lado, a mesma portaria autorizou em seu artigo. 2º o incremento do

número de matrículas na educação profissional, mediante a oferta de:

i. Cursos de nível técnico, desenvolvidos concomitantemente com o ensino

médio;

ii. Cursos de nível técnico destinados a egressos de nível médio por via regular

ou supletiva;

iii. Cursos de especialização e aperfeiçoamento para egressos de cursos de

nível técnico;

iv. Cursos de qualificação, requalificação, reprofissionalização de jovens,

adultos e trabalhadores em geral, com qualquer nível de escolarização

(BRASIL, 1997b, p.2)

Tais medidas, mais uma vez deixam explícitas as intenções do governo FHC

em promover uma reforma da etapa final da educação básica baseada na lógica da

independência entre ensino médio e ensino técnico, a partir da autonomia curricular

entre os cursos. Sem contar que nesse mesmo período há o desmantelamento

quase que por completo de educação profissional de nível técnico nas redes

estaduais de ensino que até então ofereciam essa modalidade.

Nessa direção, cinco meses após entrar em vigor a Portaria 647/97 e

considerando a necessidade de implementar o Programa de Reforma da Educação

Profissional (PROEP), o mesmo ministro editou uma nova Portaria, a de nº 1.005/97,

onde destacava a necessidade de utilização de financiamento externo, através de

operação de crédito junto ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), para

a efetivação dessa reforma.

Mais uma vez estava clara a opção do governo FHC em promover uma

reforma na educação escolar brasileira voltada para a racionalidade neoliberal onde

as instituições de ensino deveriam se subordinar às demandas do setor produtivo e

ao receituário proposto pelas instituições internacionais tais como BID e FMI.

Instituições que historicamente têm influenciado diretamente à elaboração das

políticas públicas do Estado brasileiro.

Oliveira (2003, p.19), ao analisar a relação entre neoliberalismo e educação

destaca que:

Page 58: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

57

Ao pensar a escola sob uma ótica empresarial na qual a palavra de ordem é produtividade, a qualidade na educação – que é uma questão também de ordem política – passa a ser pensada a partir de uma racionalidade instrumental, provocando, na prática, a implementação de medidas negativas para a realidade escolar.

Assim, sob essa mesma lógica, no ano seguinte (1998) foram instituídas as

Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (DCNEM) através da

Resolução 3/1998 da Câmara de Educação Básica (CEB). Apesar dessa Resolução

defender em seu artigo 12 que não deveria haver a dissociação entre formação geral

e preparação básica para o trabalho no ensino médio, a mesma indicava que esta

preparação básica não poderia ser confundida com formação profissional. Ou seja,

caso o estudante do ensino médio tivesse o interesse e/ou necessidade de ao final

da educação básica possuir uma habilitação profissional de nível técnico, o mesmo

só poderia obtê-la caso realizasse um curso de educação profissional na forma

concomitante, provavelmente em outra instituição de ensino, com matrícula e

projetos pedagógicos distintos. Orientação improvável de acontecer, tendo em vista

a difícil realidade da maioria dos estudantes que freqüentam as escolas públicas de

ensino médio em nosso país.

Não o bastante, o ensino médio, de acordo com o parágrafo 2º do artigo 12 da

Resolução 3/1998, só poderia preparar para o exercício de profissões técnicas, à

medida que atendesse “a formação geral” do educando, que de modo genérico

incluía a “preparação básica para o trabalho”.

Kuenzer (1997) ao investigar a relação entre educação e trabalho no Brasil,

antes mesmo da aprovação da LDB de 1996, destaca que desde a Lei 7.044/1982,

que extinguiu ao nível formal a escola única de profissionalização e substituiu o

objetivo da qualificação profissional por uma expressão genérica preparação para o

trabalho, que permanece na atual LDB, vivenciamos uma contra-reforma nesse nível

de ensino. Contra-reforma que reafirma o compromisso com a classe detentora dos

meios de produção e com a dualidade da escola brasileira.

Outro aspecto importante a ser destacado na Resolução 3/1998 é a

consolidação na educação de nível médio do paradigma das competências. De

acordo com o artigo 4º da resolução, as propostas pedagógicas das escolas e os

seus currículos, a partir de então, deveriam incluir competências básicas, conteúdos

e formas de tratamentos dos conteúdos previstas pelas finalidades do ensino médio

estabelecidas pela LDB 9.394/96. Esse novo paradigma conforme destacamos no

Page 59: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

58

capítulo anterior está diretamente relacionado à crise do emprego socialmente

protegido e a emergência do ideário da empregabilidade como nova estratégia para

a inserção/permanência no mercado de trabalho.

É importante precisarmos o significado de empregabilidade, que segundo o

Dicionário da Educação Profissional (2000, p.141) refere-se às “condições subjetivas

de inserção e permanência dos sujeitos no mercado de trabalho e, também, às

estratégias de valorização e negociação de sua capacidade de trabalho.” Este

conceito, proveniente do ambiente empresarial, tem referenciado um conjunto de

políticas de formação profissional e discursos de empresários, sobretudo, quando

centra dos indivíduos a responsabilidade do desenvolvimento de estratégias para

sua integração ao mercado de trabalho.

Retomando a discussão em torno do paradigma das competências na

educação básica e profissional, Silva (2008) ao discutir a relação entre a formulação

de políticas educacionais e sua apropriação pelas instituições educativas, destaca

que o apelo à noção de competências na reforma curricular empreendida pelo

governo FHC esteve marcado por um discurso que insistia na necessidade de

adequação da escola às demandas dos setores produtivos, ao mesmo tempo em

que depositavam nos indivíduos a responsabilidade pelo seu sucesso ou fracasso

escolar.

Deste modo, passados os quatro primeiros anos do governo FHC (1995-

1998) em outubro de 1998 o mesmo é reeleito e a reforma do ensino médio e da

educação profissional é confirmada/reafirmada por mais quatro anos.

Assim, dando continuidade à referida reforma, um ano e meio após a entrada

em vigor das DCNEM, em dezembro de 1999 a CEB instituiu, através da Resolução

4/1999, um novo conjunto de diretrizes, só que dessa vez para a educação

profissional de nível técnico.

Esse conjunto de diretrizes, mais uma vez legitimou a independência entre

educação profissional e ensino médio à medida que assumiu como primeiro princípio

norteador da educação profissional de nível técnico “a independência e articulação

com o ensino médio”. (BRASIL, 1999, p.1). Ao mesmo tempo em que consolidou o

paradigma das competências como um dos princípios norteadores dessa

modalidade de ensino.

Dentro desse contexto, se no caso do ensino médio as competências

requeridas eram as básicas, tais como “dominar a norma culta da Língua

Page 60: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

59

portuguesa” no caso da educação profissional além das competências básicas

passaram a ser requeridas competências profissionais gerais34 - comuns aos

técnicos de cada área - e competências profissionais específicas - de cada

qualificação ou habilitação.

Há, portanto, mais uma vez a intenção do governo brasileiro em consolidar na

educação escolar uma concepção de formação humana restrita, que se fundamenta

na lógica do ajuste às novas necessidades impostas pelo processo de

reestruturação da organização e gestão do trabalho.

Diante dos fatos expostos, esse foi o legado educacional deixado pelos oito

anos do governo FHC. Legado que possibilitou a construção de uma nova

institucionalidade da educação média baseada na independência e não na

integração entre os ensinos médio e profissional, ao mesmo tempo em que

proporcionou a emergência do paradigma das competências enquanto eixo

estruturador da educação escolar brasileira em todos os seus níveis.

Destarte, o paradigma das competências, conforme destacam pesquisadores

da área de trabalho e educação tais como: Frigotto (2005), Ramos (2006) e Kuenzer

(1999) constitui-se no aparelho ideológico justificador para a crise do emprego e

para o atual contexto de mundialização do capital e das novas formas de

organização do trabalho baseadas no ideário da flexibilização.

Ainda nessa mesma linha de raciocínio dos autores citados anteriormente,

Paiva35 (2008), afirma que no contexto de financeirização da economia, da

terceirização de muitas atividades industriais, do crescimento do setor terciário

(serviços) e do crescimento da informalidade, está havendo uma vitória do capital

sobre o trabalho. Nesse sentido, disposições e virtudes adquirem mais peso que a

proficiência específica; não basta ter conhecimento, mas ter interesse, motivação,

criatividade. Não se trata de qualificar para o trabalho em si, mas para a vida na qual

se insere o trabalho, com flexibilidade para enfrentar o emprego, o desemprego e o

autoemprego e com desenvoltura para lidar com as muitas “idades” de tecnologia no

entendimento e uso das máquinas modernas.

34 De acordo com o Art. 6º da Resolução 4/1999 entende-se por competência profissional a capacidade de mobilizar, articular e colocar em ação valores, conhecimentos e habilidades necessários para o desempenho eficiente e eficaz de atividades requeridas pela natureza do trabalho. 35 Cf. Qualificação, crise do trabalho assalariado e exclusão social. In: GENTILI e FRIGOTTO (Orgs.). A cidadania negada: políticas de exclusão na educação e no trabalho.

Page 61: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

60

Por isso, mais uma vez, é nesse contexto que emerge o conceito de

competência, que supõe um atendimento mais estrito às necessidades do capital e

exige preparo adequado aos novos tempos: flexibilidade e adaptação ao mercado de

trabalho, pois este demanda exatidão, rapidez de resposta e capacidade para lidar

com novas linguagens, um conjunto de skills que começa com a “alfabetização

tecnológica” e termina na naturalização da fragmentação, precarização e

intensificação do trabalho, na abdicação de direitos e na aceitação do risco e da

incerteza como elementos constituintes explícitos do mundo do trabalho, por

conseguinte da organização da vida.

Portanto, da análise das diretrizes e políticas de educação profissional e do

ensino médio no governo FHC, podemos constatar que foi privilegiado um conjunto

de estratégias como forma de deslocar para a área educacional, o conflito entre

capital e trabalho. Através da pedagogia das competências se buscou obscurecer a

realidade, marcada pela ampliação das desigualdades sociais e pela incapacidade

das políticas públicas neoliberais em contribuir para a superação desse quadro.

3.2 O PRIMEIRO MANDATO DO PRESIDENTE LULA E AS PRIMEIRAS AÇÕES EM TORNO DA INTEGRAÇÃO

Em 2003, após três tentativas fracassadas, chega à presidência da República

Luiz Inácio Lula da Silva. Tendo assumido como objetivo de governo a construção

de uma Escola do Tamanho do Brasil36, compromisso explicitado em sua campanha

eleitoral, o presidente eleito estabeleceu como prioridades na área educacional a

expansão do sistema e a elevação de seus níveis de qualidade.

No âmbito do ensino médio e da educação profissional, por se tratar de um

compromisso assumido com os educadores progressistas, criou-se a expectativa em

relação à revogação do Decreto 2.208/97 que até então impedia qualquer

possibilidade de integração curricular entre os ensinos médio e técnico e que,

portanto, reafirmava a dualidade estrutural da educação escolar de nível médio.

Apesar das expectativas geradas em relação à revogação do Decreto

2.208/97, ao analisarmos dois documentos assinados por Lula, o primeiro - Carta ao

Povo Brasileiro - publicado no dia 22 de junho de 2002 e o segundo - Compromisso

36 Cf. Documento – Uma escola do tamanho do Brasil, agosto de 2002.

Page 62: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

61

com a Mudança - publicado no dia da vitória nas urnas eletrônicas, 28 de outubro de

2002, podemos identificar alguns indícios de como seriam processadas essas

mudanças ao longo do primeiro mandato.

Em ambos os documentos, o presidente Lula reafirma o compromisso de não

realizar mudanças sem o consentimento daqueles que o elegeram. Ou seja, desde o

início, o seu governo teria como marca o entendimento e a negociação, o que, de

alguma forma, coloca em dúvida à possibilidade de mudanças estruturais na

economia e por consequência nas formas de sociabilidade da sociedade brasileira.

Por essa razão, vimos que o ano de 2003, ao invés de ter ficado

caracterizado como o ano da revogação do Decreto 2.208/97 e da reabertura da

possibilidade de integração curricular, entre os ensinos médio e técnico, ficou

caracterizado como o “período de construção” tanto para a política de ensino médio

quanto para a política de educação profissional. Segundo o então secretário de

Educação Média e Tecnológica, Antônio Ibañez Ruiz (2003, p.5), “por princípio, a

equipe que assumiu a SEMTEC não iniciaria mudanças sem, antes, equacionar a

problemática que constituía o ensino médio”.

Essa opção política assumida pelo governo Lula, praticamente negou a luta

dos educadores progressistas e toda a produção de conhecimentos até então

realizada pelos teóricos da área de Trabalho e Educação37. Nessa direção, a

SEMTEC iniciou em 2003 um processo de discussão junto aos diversos setores da

sociedade civil organizada, educadores e movimentos sociais com o intuito de

identificar os limites e possibilidades de uma nova política para o ensino médio e

para a educação profissional.

No caso do ensino médio, foi realizado no período de 4 a 6 de junho de 2003,

em Brasília, o Seminário Nacional “Ensino Médio: construção política” cujo objetivo

foi de discutir a realidade da etapa final da educação básica e propor novas

perspectivas para esse nível de ensino. O resultado desse seminário foi a

publicação, em fevereiro de 2004, do livro Ensino Médio: ciência, cultura e trabalho,

que ao ser publicado, pretendeu devolver “à sociedade de forma sistematizada um

conhecimento por ela produzido, cuja essência deveria ser apropriada pelo governo,

pois potencializaria transformações historicamente desejadas”. (RUIZ, 2004, p.6).

37 Dentre outros destacamos a produção acadêmica de: G. Frigotto, A. Kuenzer, M. Ramos, P. Nosella, L. Machado, M. Ciavatta, D. Saviani, V. Paiva.

Page 63: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

62

Também em Brasília, só que dez dias após o primeiro seminário, foi realizado

o Seminário Nacional de Educação Profissional: concepções, problemas e

propostas, que resultou na publicação, naquele mesmo ano, do documento Proposta

em discussão: políticas públicas para a Educação Profissional e Tecnológica, que

buscou “resgatar as concepções e princípios gerais que deveriam nortear a

educação profissional e tecnológica, baseados no compromisso com a redução das

desigualdades sociais, o desenvolvimento socioeconômico, a vinculação à educação

básica e a uma escola pública de qualidade”. (BRASIL, 2004a, p.6).

Cabe destacar que esses dois seminários e os seus respectivos documentos

representaram o marco da discussão sobre a integração entre ensino médio e

educação profissional no início do governo Lula. Ao mesmo tempo em que

colocaram em evidencia que existiam duas concepções de educação profissional,

uma delas ancoradas nos princípios do Decreto 2.208/97. O que deixava explícito

que a superação da lógica da independência – ensino médio e ensino técnico -

instituída pelo governo FHC, não seria uma tarefa fácil de ser alcançada.

Face a essa realidade contraditória, e após uma série de debates, o governo

Lula, em julho de 2004, optou por uma nova regulamentação, o Decreto 5.154/04, ao

invés de realizar, através do Conselho Nacional de Educação (CNE), a

regulamentação dos artigos 36 e 39 a 42 da LDB/96, como forma de (re) estabelecer

a possibilidade de integração curricular entre ensino médio e educação profissional.

Frigotto, Ciavatta e Ramos (2005b, p. 1090) ao analisarem a política de

educação profissional no governo Lula no período de janeiro de 2003 a julho de

2005 destacam que:

A opção por um novo decreto que revogasse o 2.208/97, em vez da simples regulamentação pelo Conselho Nacional de Educação dos artigos 36 e 39 a 42 da LDB, ou de uma lei específica para educação profissional, teve, entre outras razões, a consciência que as forças conservadoras ocupariam espaços para valerem seus interesses, tanto no Conselho Nacional de Educação quanto no Congresso.

Diante desse dado de realidade, a opção assumida pelo governo Lula pôs em

evidência os limites da democracia representativa quando estão em jogo as relações

de poder entre as classes sociais. Ao mesmo tempo em que reforça o argumento

exposto anteriormente de que o presidente Lula não daria início a mudanças

estruturais, logo após assumir o poder político, tendo em vista que havia assumido

Page 64: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

63

como compromisso o entendimento e a negociação e não a ruptura com o modelo

de desenvolvimento instituído pelo governo FHC.

Outro aspecto que identificamos nesse contexto, e que persiste no segundo

mandato do presidente Lula (2007-2010), diz respeito à permanência da lógica da

independência, pois logo após a promulgação do Decreto 5.154/04, houve uma

separação explícita, quando no próprio MEC a Secretaria de Educação Básica

(SEB) ficou responsável pela política do ensino médio e a Secretaria de Educação

Profissional e Tecnológica (SETEC) pela política de educação profissional.

Esse fato representa, no mínimo, um contra-senso se pensarmos na

materialização de uma política consistente de integração entre o ensino médio e a

educação profissional técnica de nível médio. Ou seja, ao invés de contribuir para o

fortalecimento da SEMTEC e da política de integração o governo,

contraditoriamente, optou pela dissociação entre as políticas, ensino médio e

educação profissional, cada qual sob responsabilidade de uma secretaria, o que em

nossa análise contribui para a efetivação de uma política inconsistente entre

educação básica e profissional.

Com efeito, outra ação que reforça a inconsistência das medidas iniciais

adotadas para a materialização de uma política de integração está no fato do

governo anunciar três dias após a promulgação do Decreto 5.154/04 o Programa

Escola de Fábrica. Programa estruturado em um modelo restrito de aprendizagem

profissional e que dificilmente contribuiria para o desenvolvimento da integração

ensino médio e ensino técnico naquele momento.

Portanto, essas primeiras medidas adotadas pelo governo Lula demonstram

que a integração - ensino médio e educação profissional - não foi uma prioridade no

início do seu governo, pois as ações até então adotas pouco contribuíram para a

superação do legado deixado pelo governo FHC.

Na verdade, com a entrada em vigor do Decreto 5.154/04 o que se viu foi uma

falta de compreensão por parte de diversas instituições ofertantes de Educação

Profissional Técnica de Nível Médio em relação às orientações contidas no referido

Decreto, principalmente aquelas que deveriam oferecer a educação profissional de

forma integrada ao ensino médio.

Esse descompasso entre o conteúdo do decreto e as ações implementadas,

impulsionou o CNE, através da Câmara de Educação Básica, a emitir em caráter de

urgência, em 8 de dezembro de 2004, o Parecer 39/2004 “com vistas a orientar os

Page 65: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

64

sistemas de ensino e as escolas na imediata implantação no referido decreto, a

partir de 2005”. (BRASIL, 2004c, p.2).

O Parecer 39/2004, cujo relator foi Francisco Cordão38, destacava que a

integração entre a educação profissional e o ensino médio deveria ocorrer a partir

das finalidades do ensino médio contidas na LDB/96. O que isso significava?

Significava, exatamente, a independência, pois defendia o princípio da

simultaneidade (grifo nosso), que não é sinônimo de integração, muito pelo

contrário, pois os estabelecimentos deveriam oferecer ao longo do ensino médio a

educação profissional técnica de nível médio.

Em oposição a esta concepção Frigotto, Ciavatta e Ramos (2005b) destacam

que a proposta de integração até então defendida pelos educadores progressistas

nega o princípio da simultaneidade, que segundo os autores está de acordo com

aquilo que se manifesta permanentemente no parecer: o da independência entre os

cursos. Ao mesmo tempo, reiteram que a sobreposição de disciplinas consideradas

de formação geral e de formação específica ao longo de um curso não é integração,

assim como não é integração a adição de mais um ano de estudos profissionais aos

três de ensino médio.

Também, cabe destacar que Ramos (2005, p.122) ao problematizar sobre as

Possibilidades e desafios na organização do currículo integrado salienta que: “a

integração exige que a relação entre conhecimentos gerais e específicos seja

construída continuamente ao longo da formação, sob os eixos do trabalho, da

ciência e da cultura”. O que em nossa análise vai de encontro ao princípio da

simultaneidade defendido por Cordão no Parecer 39/2004.

Assim, apesar de reconhecer a forma integrada como uma das três

alternativas possíveis de organização da educação profissional o Parecer 39/2004

além de reafirmar a lógica da independência entre ensino médio e educação

profissional, sob o princípio da simultaneidade, a reforça com a manutenção da

atualidade das Diretrizes Curriculares Nacionais instituídas pelo governo FHC tanto

para o ensino médio quanto para a educação profissional técnica.

De acordo com o Parecer 39/2004 em relação às Diretrizes Nacionais tanto

do ensino médio quanto da educação profissional, o que se fazia necessário naquele

momento era apenas:

38 “Curiosamente” Francisco Cordão também foi o relator do Decreto 2.208/97 que impediu a possibilidade de integração curricular entre ensino técnico e ensino médio.

Page 66: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

65

Fazer uma ou outra alteração nas respectivas resoluções das Diretrizes Curriculares Nacionais, definindo orientação complementar referente a eventuais pontos de divergência de interpretação ou de organização entre as orientações básicas do revogado Decreto nº 2.208/97 e do vigente Decreto nº 5.154/2004. (BRASIL, 2004c, p.3).

Fora esses pontos de divergência de interpretações, as Diretrizes Curriculares

continuavam perfeitamente válidas. Em outras palavras, em sua essência os

pressupostos da educação profissional e do ensino médio baseados no modelo

neoliberal deveriam ser mantidos.

Portanto, seguindo a perspectiva de “ajustes” e não de mudanças estruturais,

em fevereiro de 2005, foi instituída a Resolução 1/2005 que atualizou as Diretrizes

Curriculares de acordo com o Decreto 5.154/04. Entre os principais ajustes

promovidos por esta resolução estão:

a) a inclusão de um terceiro parágrafo no artigo 12 da Resolução 3/1998 com a

seguinte redação:

§ 3º A Articulação entre a Educação Profissional Técnica de nível médio e o

Ensino Médio se dará da seguinte forma:

I. Integrada no mesmo estabelecimento de ensino, contando com única

matrícula;

II. Concomitante no mesmo estabelecimento de ensino ou em instituições

distintas, aproveitando as oportunidades educacionais disponíveis, ou

mediante convênio de intercomplementariedade; e

III. Subseqüente oferecida somente a quem já tenha concluído o Ensino Médio.

b) à atualização da nomenclatura dos cursos e programas de Educação Profissional

nos seguintes termos:

I. Educação Profissional de nível básico passaria a denominar-se formação

inicial e continuada de trabalhadores;

II. Educação profissional de nível técnico passaria a denominar-se Educação

Profissional Técnica de nível médio;

III. Educação Profissional de nível tecnológico passaria a denominar-se

Educação Profissional Tecnológica, de graduação e de pós-graduação.

Page 67: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

66

c) explicitação das cargas horárias dos cursos de Educação Profissional técnica de

nível médio realizados de forma integrada com o ensino médio que deveriam ter

suas cargas horárias totais ampliadas para um mínimo de 3.000 horas para as

habilitações profissionais que exigem um mínimo de 800 horas; de 3.100 horas para

aquelas que exigem mínimo de 1.000 horas e 3.200 para aquelas que exigem

mínimo de 1.200 horas. (BRASIL, 2005).

Apesar da Resolução 1/2005 contribuir para tornar mais explícita à

possibilidade da forma integrada, na prática, não identificamos alterações

substanciais em relação à lógica de organização da educação profissional e do

ensino médio, e à ampliação na oferta de cursos na forma integrada na maioria dos

Estados brasileiros, seja nas respectivas redes estaduais de ensino, seja na rede

federal.

Com isso, o governo Lula ao manter válidas as orientações estabelecidas

pelo governo FHC dá continuidade, dessa vez sob um novo marco legal, o Decreto

5.154/04 e a Resolução 1/2005, a independência entre educação profissional e

ensino médio, ao mesmo tempo em que reforça o paradigma das competências e a

lógica da empregabilidade na educação média brasileira.

Seguindo essa linha de análise, Frigotto Ciavatta e Ramos (2005a, p.14)

destacam que:

Passada mais da metade do mandato do governo Luiz Inácio Lula da Silva, o que se explicita cada vez mais é a continuidade da política econômica monetarista centrada no ajuste fiscal e a reedição de políticas focalizadas no campo social e educacional. No plano político, a cada dia aprofunda-se a divisão do campo da esquerda, que poderia dar uma base para mudanças nas estruturas que gera a desigualdade social e educacional.

Outro aspecto que não podemos deixar de destacar ao analisarmos os

documentos oficiais publicados no primeiro mandato do presidente Lula é à

ausência, nesses documentos, da definição de fontes de financiamento público para

dar suporte à materialização da política de integração. O que a nosso ver, além de

ser um contra-senso é mais um elemento que deixa explícito que essa política não é

uma prioridade do governo.

Diante dos aspectos apresentados, podemos considerar que as medidas

adotadas nos quatro primeiros anos do governo Lula (2003-2006) apesar de abrirem

a possibilidade de integração curricular entre ensino médio e educação profissional

Page 68: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

67

não foram suficientes para promover a superação da lógica anterior instituída a partir

do Decreto 2.208/97.

Portanto, ao ser reeleito em outubro de 2006, o presidente Lula e o seu

governo passaram a dispor de mais quatro anos para colocar em prática o

compromisso assumido em campanha de potencializar a oferta de educação

profissional integrada ao ensino médio sobre os princípios do trabalho, da ciência,

da tecnologia e da cultura.

3.3 O SEGUNDO MANDATO E A EMERGÊNCIA DE NOVAS MEDIDAS EM TORNO DA INTEGRAÇÃO

Ao analisarmos os quatro primeiros anos do governo Lula (2003-2006)

constatamos que as medidas até então adotadas em torno da materialização de

uma política de integração - educação básica (ensino médio) e educação

profissional (ensino técnico) - baseada nos princípios do trabalho, da ciência e da

cultura foram marcadas por um percurso ambíguo, fortemente influenciado pelas

relações assimétricas de poder entre as classes sociais e pela estrutura dual a qual

está inserida a educação escolar brasileira.

Partindo dessa perspectiva, apesar do Decreto 2.208/97 ter sido substituído

por um novo Decreto, que reabriu a possibilidade de integração curricular, o que

observamos na prática foi que o conjunto de medidas adotadas não provocou

alterações substanciais no que diz respeito à superação da lógica instituída nos oito

anos do governo FHC.

Na verdade o que se viu, com a manutenção da validade das Diretrizes

Curriculares Nacionais tanto para o ensino médio quanto para a educação

profissional, após a edição do Decreto 5.154, foi à continuidade da política curricular

do governo anterior, que promovia a independência entre educação profissional e

ensino médio.

Com efeito, novamente, Frigotto, Ciavatta e Ramos (2005b) ao analisarem a

política de educação profissional e do ensino médio técnico nos primeiros dois anos

e meio do governo Lula destacam dois importantes pressupostos para

compreendermos os motivos que contribuíram para a manutenção da política

anterior. O primeiro pressuposto adverte que a mudança da materialidade estrutural

da sociedade brasileira, em que o campo educacional é apenas uma particularidade,

Page 69: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

68

move-se de forma lenta, como expressão da natureza de poder das classes sociais.

Já o segundo pressuposto destaca que a luta por mudanças mais profundas, como

consequência, efetiva-se numa travessia marcada por intensos conflitos e no terreno

da contradição.

Diante desses dois pressupostos, continuamos a nossa análise das ações em

torno da política de integração só que dessa vez levando em consideração os dois

anos seguintes à reeleição do presidente Lula, ocorrida em outubro de 2006.

De início, destacaremos duas metas contidas no seu programa de governo -

Lula Presidente39 - e que estão diretamente relacionadas aos rumos que o ensino

médio e a educação profissional deveriam tomar nos próximos quatro anos. A

primeira meta diz respeito à continuidade da reestruturação do ensino médio,

iniciada em 2004 com a entrada em vigor do Decreto 5.154. E a segunda vincula-se

à ampliação do ensino técnico e tecnológico nesse mesmo período.

Tendo em vista a objetivação dessas duas metas, a primeira ação no âmbito

da política educacional após a sua reeleição foi à promulgação, no dia 24 de abril de

2007, do Decreto 6.094. Este Decreto ao dispor sobre a implementação do Plano de

Metas Compromisso Todos pela Educação estabeleceu como principal objetivo para

a elevação da qualidade da educação básica à articulação entre a União,

Municípios, Estados e o Distrito Federal a partir de um conjunto de vinte e oito

diretrizes contidas no referido decreto.

Por se tratar de compromisso e não de uma obrigação, os Estados,

Municípios e o Distrito Federal deveriam aderir voluntariamente ao Plano de Metas

proposto pelo governo federal a partir da assinatura do termo de adesão, na forma

descrita pelo Decreto 6.094/07. O que ao mesmo tempo, implicaria a assunção da

responsabilidade de promover a melhoria da qualidade da educação básica

conforme as diretrizes contidas no Plano.

Nessa direção, ao aderirem ao Plano de Metas os entes federados, também

estariam cientes que o cumprimento das metas constantes no termo de adesão seria

atestado pelo MEC que utilizaria o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica -

IDEB40 - como indicador objetivo para verificação do cumprimento das metas

definidas.

39 Cf. Lula Presidente. Programa de governo 2007-2010. 40 O IDEB foi criado em 2007 para medir a qualidade da educação básica. Maiores informações sobre esse indicador podem ser encontradas no endereço eletrônico: http://portalideb.inep.gov.br/.

Page 70: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

69

Todavia, embora o texto da lei destacasse que a adesão ao Plano de Metas

deveria ocorrer de forma voluntária, na prática, dificilmente, os Estados, Municípios e

o Distrito Federal que não assinassem o termo de compromisso conseguiriam obter

assistência técnica ou financeira complementar da União para o desenvolvimento de

programas voltados para a melhoria da qualidade da educação básica.

Esse aspecto pode ser comprovado, por exemplo, no âmbito das ações

voltadas à integração – ensino técnico e ensino médio - à medida que analisamos o

Programa Brasil Profissionalizado, instituído pelo Decreto 6.302 de 12 de dezembro

de 2007 e que tem como principal finalidade à expansão de matrículas no ensino

médio integrado à educação profissional e tecnológica nas redes públicas estaduais

de ensino.

De acordo com artigo 3º do Decreto 6.302/07, somente poderiam apresentar

propostas para a obtenção de assistência financeira, os Estados, o Distrito Federal e

os Municípios que tivessem aderido formalmente (grifo nosso), ao Plano de Metas

Compromissos Todos pela Educação. Ou seja, caso um Estado como a Bahia ou

Acre, por exemplo, quisessem apresentar uma proposta, cujo objetivo fosse o

estímulo à oferta de educação profissional integrada ao ensino médio, e ainda não

tivesse aderido formalmente ao Plano de Metas a proposta não poderia ser

submetida à análise, pois a mesma estava condicionada à assinatura do termo de

adesão. O que acreditamos ser um contra-senso tendo em vista que a educação

pública de qualidade é um direto subjetivo de qualquer ser humano. E que, portanto,

não pode estar condicionada, apenas, a aceitação das regras pré-estabelecidas pelo

governo federal.

Por outro lado, não podemos deixar de reconhecer que foi somente a partir da

entrada em vigor do Plano de Metas Compromissos Todos pela Educação, que se

tornou possível o desenvolvimento de um conjunto de ações voltadas para busca da

melhoria da qualidade da educação básica brasileira no segundo mandato do

presidente Lula.

No caso específico das ações voltadas à política de integração, o programa

Brasil Profissionalizado, por exemplo, foi o primeiro programa de governo, desde

janeiro de 2003, destinado a potencializar a oferta de educação profissional

integrada ao ensino médio nas redes estaduais de ensino a partir da prestação de

assistência técnico-financeira pela União.

Page 71: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

70

Ao estabelecer uma meta de investimentos na ordem de 900 milhões de

reais para o período de duração do programa, que se estende de 2008 até 2011, o

governo federal também estabeleceu oito objetivos a ser alcançados. Tais objetivos

são apresentados a seguir:

I - expandir o atendimento e melhorar a qualidade da educação brasileira; II - desenvolver e reestruturar o ensino médio, de forma a combinar formação geral, científica e cultural com a formação profissional dos educandos; III - propiciar a articulação entre a escola e os arranjos produtivos locais e regionais; IV - fomentar a expansão da oferta de matrículas no ensino médio integrado à educação profissional, pela rede pública de educação dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, inclusive na modalidade à distância; V - contribuir para a construção de novo modelo para o ensino médio fundado na articulação entre formação geral e educação profissional; VI - incentivar o retorno de jovens e adultos ao sistema escolar e proporcionar a elevação da escolaridade, a construção de novos itinerários formativos e a melhoria da qualidade do ensino médio, inclusive na modalidade de educação de jovens e adultos; VII - fomentar a articulação entre a educação formal e a educação no ambiente de trabalho nas atividades de estágio e aprendizagem, na forma da legislação; VIII - fomentar a oferta ordenada de cursos técnicos de nível médio. (BRASIL, 2007b, p.1).

Ao analisarmos tais objetivos, identificamos que a partir do programa Brasil

Profissionalizado há uma tentativa por parte do governo federal em retomar as

ações voltadas ao desenvolvimento da educação técnica integrada ao ensino médio

baseada na construção de um novo modelo de ensino fundado na articulação entre

formação geral e educação profissional. Contudo, não identificamos nos oitos

objetivos contidos no Decreto 6.302/07 à reafirmação dos princípios do trabalho, da

ciência e da cultura enquanto dimensões indissociáveis do projeto de integração, o

que a nosso ver abre a possibilidade para a construção de projetos alternativos em

relação à integração educação profissional e ensino médio.

Nessa direção, simultaneamente a entrada em vigor do programa Brasil

Profissionalizado, o MEC, através da SETEC, publicou pela primeira vez um

documento que tratava dos princípios e pressupostos para a concretização da

proposta de integração. Este documento, intitulado Educação Profissional Técnica

Page 72: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

71

de Nível Médio Integrada ao Ensino Médio41, segundo a SETEC, emergiu da

necessidade de contextualizar os embates que estavam na base da formação

integral do trabalhador tendo como princípios norteadores o trabalho, a ciência e a

cultura e a construção de um projeto político pedagógico integrado. Ou seja, quase

três anos e meio após entrar em vigor o Decreto 5.154/04, o MEC publicou um

documento oficial com o intuito de tornar explícito, para as instituições e sistemas de

ensino, os princípios e diretrizes que seriam a base para a implementação da

proposta da educação profissional integrada ao ensino médio. O que consideramos

ser mais uma contradição, e a reafirmação do primeiro pressuposto apresentado por

Frigotto, Ciavatta e Ramos (2005b) que destaca a forma lenta como ocorre à

mudança na materialidade estrutural da sociedade brasileira.

Entretanto, não podemos deixar de considerar que apesar da retomada das

ações em torno da integração, o Programa Brasil Profissionalizado, único programa

de financiamento e assistência técnica até então destinado a ampliar a oferta de

educação profissional técnica de nível médio, não tem por pretensão atender todas

as escolas de ensino médio das redes públicas estaduais interessadas em promover

a integração.

De acordo com os artigos 2º e 3º do Decreto que o institui, o programa

somente prestará assistência técnica e financeira ao Distrito Federal e aos Estados

que tiverem aderido formalmente ao Plano de Metas Compromisso Todos pela

Educação e que tenham suas propostas selecionadas e aprovadas pelo comitê

técnico criado especificamente para fins do programa.

Além disso, se consideramos somente a relação entre a perspectiva de

atendimento do programa, 800 mil estudantes, e o número de estudantes

matriculados nas escolas estaduais de ensino médio, 7.177.377 de acordo com

Censo da Educação Básica de 2008, vimos que caso a meta inicial seja alcançada,

somente poderão optar por cursos integrados cerca de 11% dos estudantes. O que

acreditamos limitar a constituição de um projeto educacional voltado para a

construção de um novo modelo para o ensino médio fundado na integração entre

formação geral e educação profissional.

Outro aspecto que nos chamou à atenção em relação ao percurso

controvertido das ações do governo Lula em busca da integração diz respeito à

41 Algumas partes desse documento serão objeto de análise específico na próxima seção.

Page 73: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

72

publicação, em março de 2008, da Portaria 386. Esta portaria, ao deliberar pela

constituição de um grupo de trabalho interministerial com a finalidade de “realizar

estudos e formular proposições visando à reestruturação, melhoria e expansão do

ensino médio” (BRASIL, 2008a, p.1) coloca novamente em discussão os rumos da

etapa final da educação básica no Brasil. O que acreditamos, mais uma vez, negar a

produção de conhecimentos já realizada, especialmente, no âmbito da área de

Trabalho e Educação, com destaque para a ANPED, ao passo que coloca em

dúvida a implantação dos pressupostos para a educação integrada contidos no

documento Base publicado pelo próprio MEC em dezembro de 2007.

Deste modo, em julho de 2008, como resultado da criação do Grupo

interministerial, o MEC, em parceria com a Secretaria de Assuntos Estratégicos da

Presidência da República, publicou um novo documento, Reestruturação e

Expansão do Ensino Médio no Brasil. Este documento, ao tratar da integração –

educação profissional e ensino médio – aponta a possibilidade de dois modelos (grifo nosso) para a etapa final da educação básica.

O primeiro modelo denominado de “Ensino médio integrado” parte do

pressuposto que a organização curricular do ensino médio deva ser baseada na

integração entre os princípios do trabalho, da ciência e da cultura, sem, contudo, que

haja a formação profissional nesse nível de ensino. Ou seja, do ponto de vista do

currículo os componentes técnicos deveriam ser desenvolvidos de forma integrada

aos diversos conhecimentos, sem que fosse vinculada a uma habilitação profissional

técnica de nível médio.

No segundo modelo denominado de “Ensino Médio integrado Profissional”, o

currículo teria duas possibilidades de organização: A primeira possibilidade “Ensino

Médio com Educação Profissional Técnica de Nível médio” teria como proposta uma

organização curricular baseada na integração entre conhecimentos gerais e

conhecimentos técnicos mediante a vinculação direta a uma habilitação profissional.

Já a segunda, “Normal Médio”, o próprio documento não deixa explícito como

ocorreria essa possibilidade de integração.

A publicação desse documento coloca mais uma vez em discussão a

identidade do ensino médio, se deve ou não ser profissionalizante, ao passo que

põe em questão todos os esforços até então realizados para a implantação da

educação profissional técnica integrada ao ensino médio nas escolas pertencentes

às redes estaduais de ensino.

Page 74: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

73

Com base no exposto, identificamos que, após a publicação do documento

Reestruturação e Expansão do Ensino Médio no Brasil foi elaborado pelo governo

federal outro Programa, denominado de Ensino Médio Inovador 42 com a finalidade

de estabelecer mudanças significativas no Ensino Médio não profissionalizante

(grifo nosso), através do desenvolvimento de inovações curriculares.

A propósito, cabe lembrar que diferentemente do programa Brasil

Profissionalizado, que visa estimular a oferta de educação profissional integrada ao

ensino médio nas redes estaduais, o Programa Ensino Médio Inovador visa

desenvolver “experiências curriculares inovadoras” numa perspectiva abrangente de

formação integral. Ou seja, este programa busca atingir os cursos de ensino médio

não profissionalizantes que continuam a conter o maior número de matrículas nas

escolas brasileiras.

Desta maneira, acreditamos que o governo federal ao lançar dois programas

voltados para a construção de “um novo modelo para o ensino médio” demonstra

mais uma vez a sua falta de clareza em relação aos rumos da política para essa

etapa de ensino e sua integração com a educação profissional. Ao passo que

reforça a dualidade histórica entre ensino propedêutico e ensino profissionalizante.

Diante desse percurso contraditório, paralelamente à publicação do

documento voltado à reestruturação e expansão do ensino médio, o presidente Lula

sancionou uma nova Lei, a de n.º 11.741/08. Esta lei, ao propor alterações nos

dispositivos da LDB 9.394/96 visa redimensionar, institucionalizar e integrar as

ações da educação profissional técnica de nível médio, da educação de jovens e

adultos e da educação profissional e tecnológica.

Entre as principais alterações na LDB 9.394/96 voltadas para o fortalecimento

da política de integração está o acréscimo no Capítulo II do Título V, da seção IV-A

que contém os artigos 36-A, 36-B, 36-C e 36-D. Esta seção denominada de

“Educação Profissional Técnica de Nível Médio” busca reafirmar no texto da LDB/96

que o ensino médio poderá preparar para o exercício de profissões técnicas a partir

de um currículo integrado.

No entanto, mais uma vez, torna-se claro, que mais importante do que a

publicação de uma nova lei, decreto, está à necessidade de uma ação política

concreta do governo em conjunto com as instituições e sistemas de ensino tendo em

42 O Programa Ensino Médio Inovador não será objeto de análise dessa dissertação, pois somente foi publicado em 2009.

Page 75: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

74

vista a materialização dessa política nas escolas de ensino médio no Brasil. Caso

contrário, continuará a ser mais uma política focalizada, de alcance limitado, com

prazo de validade determinado e que não contribuirá para uma efetiva mudança

estrutural da educação escolar brasileira.

Finalmente, como última medida adotada pelo governo Lula, na primeira

metade do seu segundo mandato, encontra-se a publicação da Lei 11.892, de 29 de

dezembro de 2008. Esta lei instituiu a Rede Federal de Educação Profissional e

Tecnológica e criou os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia.

No que diz respeito à política de integração, a Lei 11.892/08 definiu como um

dos objetivos dos recém-criados Institutos Federais “ministrar educação profissional

técnica de nível médio prioritariamente (grifo nosso) na forma de cursos integrados

para concluintes do ensino fundamental e para o público da educação de jovens e

adultos”. (Brasil, 2008d, p.2). Ou seja, entre as duas formas possíveis de educação

profissional técnica de nível médio43 o governo federal optou por fomentar em sua

rede de escolas a oferta de cursos integrados de modo a conduzir o estudante ao

final do ensino médio a uma habilitação profissional técnica.

Assim, à medida que definiu como prioridade a oferta de cursos na forma

integrada a Lei 11.892/08 também deliberou que os Institutos Federais, no

desenvolvimento de sua ação acadêmica, em cada exercício, deverão garantir o

mínimo de 50% de suas vagas para atender a esses cursos. O que indica, mais uma

vez, a opção do governo federal em oferecer em suas instituições educacionais a

educação profissional técnica integrada ao ensino médio.

Por outro lado, essa opção pelos cursos integrados dificilmente será seguida

pela maioria das escolas estaduais de ensino médio, haja vista o Programa Brasil

Profissionalizado ter um alcance limitado tanto de recursos financeiros quanto de

assistência técnica para a implementação da proposta. Além disso, não

identificamos nenhuma medida legal (lei, decreto, etc.) que garanta recursos

financeiros para a manutenção e ampliação da educação profissional integrada ao

ensino médio nas escolas públicas estaduais após o prazo de encerramento do

Programa Brasil Profissionalizado.

Portanto, essa tem sido a trajetória da política de educação profissional e

ensino médio nos dois anos seguintes a reeleição do presidente Lula. Trajetória

43 De acordo com o Art. 36-C a educação profissional técnica de nível médio articulada poderá ser desenvolvida de duas formas: I) integrada; II) concomitante.

Page 76: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

75

marcada por uma série de ambigüidades que ora buscam promover a integração -

ensino técnico e ensino médio - a partir dos princípios do trabalho, da ciência e da

cultura ora reforçam a dicotomia entre formação geral e formação específica na

última etapa da educação básica.

4.4 CONCEPÇÕES E PRINCÍPIOS DA INTEGRAÇÃO: PROBLEMATIZANDO O DOCUMENTO BASE DO MEC

Ao percorrermos a cronologia da integração - educação profissional e ensino

médio - nos seis anos do governo Lula (2003-2008), identificamos a publicação pelo

MEC, através da SETEC, em dezembro de 2007, do Documento Base Educação

Profissional Técnica de Nível Médio integrada ao Ensino Médio.

Este documento, conforme consta na sua Apresentação emergiu da

necessidade, identificada por parte do governo federal, de “uma ação política

concreta de explicitação (grifo nosso), para as instituições e sistemas de ensino,

dos princípios e diretrizes do ensino integrado à educação profissional” (BRASIL,

2007c, p.4). Ao mesmo tempo em que se propôs a apresentar a contextualização

das discussões que estiveram na base da opção do governo Lula pela “formação

integral do trabalhador” de acordo com as orientações contidas no Decreto.

5.154/04.

Sob a Coordenação Editorial de Dante Henrique Moura44 e texto do mesmo

autor em parceria com Sandra Regina de Oliveira Garcia45 e Marise Nogueira

Ramos46 o documento, além da Apresentação que citamos anteriormente, dispõe da

seguinte estrutura:

Introdução

1. Panorama da Educação Profissional e do Ensino Médio: (des)construções a partir da

década de 1980

1.1 Antecedentes históricos

44Professor do Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte e membro da ANPED (GT -09 Trabalho e Educação) e da ANPAE. 45Professora da Universidade Estadual de Londrina, mas, desde 2003 ocupa o cargo de Chefe do Departamento de Educação e Trabalho da Secretaria de Estado da Educação do Paraná. 46Professora Adjunta da Universidade Estadual do Rio de Janeiro e do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro, Campi de Nilópolis. No período de 2003-2004 ocupou o cargo de Diretora do Ensino Médio da SEMTEC.

Page 77: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

76

1.2 A Última Etapa da Educação Básica e a Educação Profissional na Constituinte de

1988 e na Gênese da LDB (Lei n.º 9.394/1996)

1.3 A Reforma da Educação Profissional da Segunda Metade dos Anos 1990: o

Decreto n.º 2208/1997 e o PROEP

1.4 Uma Nova Chance para a Integração entre o Ensino Médio e a Educação

Profissional: o Decreto n.º 5.154/2004

2. Por uma Política Pública Educacional de Integração entre Ensino Médio e a Educação

Profissional Técnica de Nível Médio

2.1 A Articulação entre as Políticas Setoriais do Estado Brasileiro

2.2 A Necessária Interação entre o MEC e os Sistemas de Ensino

2.3 Quadro Docente Próprio

2.4 Financiamento

3. Concepções e Princípios

3.1 Formação Humana Integral

3.2 Trabalho, Ciência, Tecnologia e Cultura como Categorias Indissociáveis da

Formação Humana

3.3 O Trabalho como Princípio Educativo

3.4 A pesquisa como princípio educativo: o trabalho de produção do conhecimento

3.5 A Relação Parte-totalidade na Proposta Curricular

4. Alguns Fundamentos para a Construção de um Projeto Político-Pedagógico Integrado

Tendo em vista o objetivo dessa dissertação, optamos por enfatizar nessa

subseção a análise das origens e significados das concepções e princípios da

integração defendidos pelo Documento, juntamente com as contradições existentes

entre o discurso oficial e a tentativa de materialização de uma política pública

educacional comprometida com a formação dos jovens e adultos da classe

trabalhadora.

Assim, partimos do suposto que as Concepções e Princípios contidos no

Documento têm sua gênese nas lutas sociais dos anos de 1980, que no âmbito

educacional foram orientadas pela defesa de um sistema público e gratuito de

educação e por uma concepção de formação humana baseada na integração entre

conhecimentos gerais e conhecimentos específicos em seus múltiplos aspectos

(humanísticos e científico-tecnológicos).

Nessa direção, ao analisarmos a concepção de formação humana integral

apresentada pelo Documento, noção esta que está baseada na defesa de que a

Page 78: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

77

educação geral deva se tornar “parte inseparável da educação profissional em todos

os campos onde se dá a preparação para o trabalho: seja nos processos produtivos,

seja nos processos educativos [...]” (BRASIL, 2007c, p. 41) vimos que esta

perspectiva, apropriada e reproduzida pelo discurso oficial, está diretamente

relacionada à ideia de formação humana defendida pelos educadores progressistas

no decorrer do processo de elaboração da LDB 9.394/96 e que foi negada tanto pelo

Decreto 2.208/97 quanto pela Portaria 647 do mesmo ano. Formação esta que

estava fundada do trabalho como princípio educativo e na concepção de politecnia.

Da mesma forma, ao reproduzir uma síntese das principais ideias contidas no

artigo A formação integrada: a escola e trabalho como lugares de memória e

identidade (2005) de Maria Ciavatta, o MEC resgata a discussão em torno do que é

ou do que possa vir a ser essa formação integrada, ao mesmo tempo em que coloca

em evidência as disputas presentes, historicamente, no interior da sociedade

brasileira em torno da concepção de educação escolar.

No artigo supracitado, a autora destaca a importância da reflexão acerca da

concepção da formação integrada partindo da controvérsia que se apresenta entre

as leis e as suas compreensões e materializações pelas instituições escolares.

Nessa perspectiva, o Documento almeja esclarecer que a ideia de formação humana

integral busca superar a dicotomia existente entre teoria e prática, entre o “pensar” e

o “executar”. Do mesmo modo que defende o trabalho como princípio educativo

como possibilidade de superar a dicotomia existente na sociedade capitalista entre

trabalho manual/trabalho intelectual.

Além desta concepção sintetizada por Ciavatta (2005), o Documento também

se apropria da análise desenvolvida por Ramos (2005) que sinaliza que o Trabalho,

a Ciência, a Tecnologia e a Cultura devem ser tratadas como categorias indissociáveis (grifo nosso) da formação humana, partindo do entendimento do

trabalho, como a mediação ontológica e histórica da vida humana.

Diante desse entendimento, o Documento destaca que a apreensão da

relação de indissociabilidade entre essas categorias é, também, a compreensão do

trabalho como princípio educativo, pois o trabalho proporciona o entendimento do

processo histórico de produção da existência humana.

Assim, mais uma vez compreender o trabalho como princípio educativo,

nessa perspectiva, não é sinônimo de vê-lo como simples execução de tarefas, mas

como uma categoria que nos permite compreender o processo histórico de

Page 79: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

78

desenvolvimento da humanidade, tendo a ciência, tecnologia e cultura como

algumas de suas dimensões.

Nesse sentido, ao considerar a indissociabilidade das categorias e o trabalho

enquanto princípio educativo, o documento discute a adequação do mesmo à

proposta curricular, demonstrando a necessidade da elaboração de um currículo em

que “componentes e conteúdos curriculares permitam fazer relações sincrônicas e

diacrônicas cada vez mais amplas e profundas entre os fenômenos que se quer

apreender e a realidade em que eles se inserem”. (BRASIL, 2007c, p. 50). Ou seja,

defende-se a relação parte-totalidade na proposta curricular da educação

profissional integrada ao ensino médio, unindo conhecimentos gerais e específicos

correspondentes à formação básica e profissional, pondo em foco a necessidade da

interdisciplinaridade como princípio norteador do currículo.

No entanto, partindo da apreciação das Concepções e Princípios contidos no

Documento e das ações do governo Lula, no sentido de promover a integração,

podemos afirmar que apesar do discurso oficial reproduzir a síntese das ideias

defendidas pelos educadores progressistas, na prática, o modelo educacional

desenvolvido até então tem negado a materialização de uma política pública

consistente de integração educação profissional - ensino médio.

Essa negação é percebida, claramente, a partir do momento em que o

governo mantém válidas as mesmas diretrizes, que estão na base da reforma do

ensino médio e da educação profissional promovida pelo governo FHC, na década

de 1990. Diretrizes que consolidaram na educação escolar brasileira o ideário da

pedagogia das competências, em que a concepção instrumental da formação

humana é priorizada em detrimento do princípio da totalidade, da indissociabilidade

entre as categorias trabalho, ciência e cultura e do trabalho enquanto princípio

educativo.

Além disso, por constituir-se apenas em uma proposta o Documento Base

publicado pelo MEC não é, portanto, de cumprimento obrigatório pelas instituições e

sistemas de ensino. O que permanece obrigatório e que dever ser seguido são as

orientações contidas nas Resoluções 3/1998 e 4/1999, respectivamente.

Resoluções, que conforme destacamos na seção 3.3 desta dissertação têm como

fundamento atender aos interesses da lógica capitalista, em que a educação deve

se ajustar ao sistema econômico, através de mecanismos de adaptação e

cooptação, e consolidar um perfil de currículo baseado no modelo de competências.

Page 80: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

79

Com isso, percebe-se, então, que a apesar do MEC publicar um documento

que pretende potencializar uma ação política concreta de explicitação de princípios e

diretrizes radicalmente opostos à lógica das competências, na prática, por não ter

caráter prescritivo e normativo, o mesmo tende a ter um alcance limitado quanto a

sua apropriação pelas instituições e sistemas de ensino. Sem contar que menos de

um ano após a sua publicação, o próprio MEC em parceria com a Secretaria de

Assuntos Estratégicos da Presidência da República publica outro documento,

Reestruturação e Expansão do Ensino Médio no Brasil, que propõe a criação de

escolas públicas de ensino médio integrado não profissional, ou seja, propedêuticas.

Assim, se levarmos em consideração que o documento base publicado

anteriormente (2007) apontava a profissionalização como uma condição necessária

para que os jovens e adultos pudessem se situar no sistema produtivo, a criação de

novas escolas de ensino médio não profissionalizantes torna-se um contra-senso à

medida que elas já são a maioria das escolas públicas existentes no Brasil.

Por sua vez, a publicação do documento Reestruturação e Expansão do

Ensino Médio no Brasil reforça o percurso ambíguo que a política de ensino médio e

educação profissional vem sendo desenvolvida no interior do governo Lula. Ao

mesmo tempo em que demonstra o não avanço desse governo em relação a

mudanças estruturais na sociedade e na educação.

Nessa perspectiva, Frigotto47 (2009b, p.14) ao fazer uma síntese histórica dos

quase sete anos do governo Lula nos mostra que:

O discurso de posse, em 2002 do atual governo do ex-metalúrgico Luiz Inácio Lula da Silva, eleito por uma base social herdeira das lutas contra-hegemônicas, se pautou pela ênfase na erradicação da pobreza absoluta de quarenta milhões de brasileiros, dando-lhes o direito de animal da natureza de comer três refeições por dia. O programa de forte impacto midiático e de apelo internacional denominou-se Fome Zero. Ao longo do primeiro governo, estes e outros programas com este intuito, para dar-lhe maior racionalidade e controle, se condensaram no Programa Bolsa Família. No âmbito dos jovens da classe trabalhadora, criou-se uma Secretaria com status de Ministério para articular sob o Projovem, mais de cinco dezenas de programas, projetos e ações espalhadas pelos diferentes ministérios e destinadas a estes jovens. Passados quase sete anos de governo, pode-se afirmar que tais políticas e programas atingiram seu objetivo de enfrentar a miséria absoluta, mas se converteram num ovo de serpente, porque não houve mudança estrutural do projeto dominante da classe burguesa brasileira. A opção que vem se solidificando é a do nacional desenvolvimentismo conservador, que ao contrário de ruptura com a classe dominante e seu projeto societário, governa condicionado por ela.

47 Cf. Educação para “inclusão” e a “empregabilidade”: promessas que obscurecem a realidade.

Page 81: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

80

Ao resgatarmos essa citação de Frigotto buscamos sinalizar que mesmo

sendo eleito por uma base contra-hegemônica, o governo Lula tem optado por

realizar uma política conciliatória com os interesses do capital. O que tem

contribuído para a manutenção da sua lógica, e para a realização de políticas

públicas de trabalho e educação, por exemplo, de alcance restrito quando se pensa

na emancipação dos jovens e adultos da classe trabalhadora.

Nessa direção, também podemos reafirmar a validade da tese defendida por

Kuenzer (2005) da Exclusão Includente e Inclusão Excludente como nova forma de

dualidade estrutural, no âmbito da relação trabalho e educação, na sociedade

brasileira contemporânea.

Elaborada pela autora a partir de mais de duas décadas de pesquisas, esta

tese procura demonstrar como no atual estágio de desenvolvimento do modo de

produção capitalista, baseada na acumulação flexível, se aprofunda a divisão entre

os que possuem os meios de produção e os que vendem sua força de trabalho. Ao

mesmo tempo em que se promove cada vez mais “a separação entre trabalhadores

e dirigentes, entre trabalho intelectual e trabalho instrumental”. (KUENZER, 2005,

p.91).

Nesse sentido, a autora destaca que:

Do ponto de vista do mercado, os estudos que vêm sendo realizados nos permitem concluir que está em curso um processo que pode ser caracterizado como ‘exclusão includente’. São identificadas várias estratégias para excluir o trabalhador do mercado formal, no que ele tinha direitos assegurados e melhores condições de trabalho, e, ao mesmo tempo, são colocadas estratégias de inclusão do mundo do trabalho, mas sob condições precárias [...]. A esta lógica que estamos chamando de exclusão includente corresponde outra lógica, equivalente e em direção contrária, do ponto de vista da educação. [...] a inclusão excludente, ou seja, as estratégias nos diversos níveis e modalidades da educação aos quais não correspondam os necessários padrões de qualidade que permitam a formação de identidades autônomas intelectual e eticamente, capazes de responder e superar as demandas do capitalismo [...]. (KUENZER, 2005, p.92).

Portanto, partindo da tese da Exclusão Includente e Inclusão Excludente e da

síntese histórica apresentada por Frigotto (2009b), podemos afirmar que as medidas

e ações realizadas até então pelo governo Lula em torno da integração - educação

profissional e ensino médio - encontram-se inseridas na lógica de preservação das

Page 82: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

81

relações sociais capitalistas, reafirmado, mais uma vez, os limites de sua efetivação

quando considerados os fundamentos dessa forma histórica de sociabilidade.

Isto, porém, não significa negar completamente essas medidas e ações, pois

a categoria da contradição nos ajuda a compreender que no interior da sociabilidade

capitalista encontra-se a possibilidade histórica de sua superação.

Page 83: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

82

CONSIDERAÇÕES

Ao chegarmos ao final dessa dissertação nada mais oportuno do que

realizarmos uma síntese da nossa trajetória, como forma de apontarmos as

possibilidades e os limites da execução de um estudo, que teve pretensão de

analisar a trajetória de objetivação da proposta de educação profissional integrada

ao ensino médio, no governo Lula, à luz da categoria de trabalho.

Diante da complexidade do objeto de pesquisa e das múltiplas possibilidades

de investigação, optamos por efetivar esse empreendimento - individual e coletivo -

numa perspectiva histórica a partir do legado deixado por Marx no século XIX e por

autores contemporâneos que em suas análises recorrem ao materialismo histórico-

dialético como caminho para compreender o real em seus diferentes aspectos e

contradições.

Desse modo, ao recorrermos à concepção materialista da história,

entendemos como Marx (1982a, p.1) na segunda tese sobre Feuerbarch que:

A questão de saber se ao pensamento humano pertence a verdade objectiva [sic] não é uma questão da teoria, mas uma questão prática. É na práxis que o ser humano tem de comprovar a verdade, isto é, a realidade e o poder, o carácter [sic] terreno do seu pensamento. A disputa sobre a realidade ou não realidade de um pensamento que se isola da práxis é uma questão puramente escolástica.

Logo, partindo do pressuposto de que a apreensão do real só pode ser

efetivamente realizada no campo da práxis e em determinado tempo e contextos

históricos, iniciamos o percurso dessa dissertação com a problematização da

relação Trabalho e Sociedade, com destaque para as particularidades da sociedade

capitalista do século XX e começo do século XXI.

Nesse primeiro eixo, buscamos indicar que com a consolidação do modo de

produção capitalista, o trabalho passou de objeto secundário da reflexão filosófica a

objeto privilegiado, tanto da Filosofia quanto das Ciências Humanas. Ao mesmo

tempo em que o vocábulo passou a ser utilizado com várias significações que vão

desde a ideia de dor e sofrimento, produto da tradição judaico-cristã, a ideia de

emprego.

Entretanto, ao sinalizarmos a polissemia da categoria trabalho

compartilhamos com o ponto de vista de Frigotto (2009a, p.168) que adverte que:

Page 84: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

83

O cerne dessa questão não é uma disputa semântica abstraída das relações sociais. Mas, na sociedade capitalista é uma disputa de classe que somente pode ser apreendida em sua historicidade dentro de uma concepção dialética e no campo das contradições e não das antinomias.

Nessa direção apontada por Frigotto, resgatamos a concepção ontológica do

trabalho em Marx – intercâmbio material entre o homem e a natureza – com o intuito

de demonstrarmos que quaisquer que sejam as formas de sociedade, dentre elas a

capitalista, o trabalho enquanto criador de valores-de-uso estará na base da

existência humana.

Por outro lado, reconhecemos também que o trabalho ao longo da história

humana não pode ser apreendido somente na sua dimensão ontológica, mas

também na sua forma histórica. Desta forma, procuramos destacar como o trabalho

assalariado, alienado, criador de valores de troca tornou-se a forma predominante

nas relações sociais capitalistas, a partir do século XIX.

Com isso, o emprego definido como “uma relação de compra e venda da

força de trabalho mediada com um contrato (formal ou informal) entre empregadores

e trabalhadores” (DRUCK, 2000, p. 22) assumiu lugar central na relação entre

trabalho assalariado e capital. O que em diferentes países, seja no Norte ou no Sul,

tem provocado uma série de disputas em torno dos direitos sociais oriundos do

trabalho.

Por conseguinte, ao continuarmos a problematização da relação Trabalho e

Sociedade, também evidenciamos que as transformações econômico-sociais

decorrentes da crise do sistema capitalista, a partir dos anos de 1970, levaram a

reestruturação do sistema e a novas formas de gestão e organização do trabalho

baseadas no ideário da flexibilização. Sendo o modelo japonês, o toyotismo,

guardadas as devidas especificidades de cada empresa, região ou nação, o seu

maior símbolo.

Desse modo, ao destacarmos a emergência do modelo japonês enquanto

alternativa encontrada pelo capital para reorganizar o seu processo de acumulação,

não poderíamos deixar de sinalizar, simultaneamente, o movimento mundial de

flexibilização e precarização do trabalho. Esse movimento tem contribuído tanto para

a deteriorização do emprego socialmente protegido quanto para incidência de novas

formas de trabalho - trabalhos precários, parciais - cuja instabilidade, a incerteza e a

imprevisibilidade estão entre suas principais características.

Page 85: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

84

Não o bastante, particularmente no caso brasileiro, procuramos destacar,

que, a partir da década de 1990, o processo de precarização das relações e das

condições de trabalho estendeu-se a segmentos que até então eram poucos

expostos a essas formas precárias. Esses segmentos correspondem aos

trabalhadores com mais escolaridade e que tinham no emprego formal a sua

principal forma de inserção.

Diante da exposição dessa realidade, partirmos para o segundo eixo -

Trabalho e Educação - com a finalidade de compreendermos o debate em torno dos

fundamentos ontológico-históricos dessa relação juntamente com as possíveis

mediações existentes entre a escola, enquanto instituição educativa, e o trabalho

enquanto mediação do homem com a natureza.

Por se tratar de um debate que ainda está em curso e que não é consensual,

optamos por sinalizá-lo a partir da perspectiva de quatro autores que apesar de

partirem do legado de Marx possuem pontos de desacordo no que diz respeito aos

fundamentos da relação trabalho e educação.

Assim, destacamos que enquanto Lucília Machado (2005) e Dermerval

Saviani (2007) defendem uma relação de identificação entre trabalho e educação,

Sérgio Lessa (2007) e Ivo Tonet (2009), por não compartilharem desse ponto de

vista, defendem uma relação de necessidade entre ambas as categorias.

Contudo, em nossa análise, não consideramos que as duas perspectivas

apresentadas sejam antagônicas, mas, sim, divergentes, pois embora sigam

caminhos interpretativos diferentes partem do mesmo pressuposto: o trabalho

enquanto essência dos homens.

Por outro lado, indicamos a necessidade de ampliação desse debate no

âmbito educacional, tendo em vista o imperativo de apropriação por parte dos

educadores das mediações histórico-sociais dessa relação, ao mesmo tempo em

que é de fundamental importância o entendimento de como tem sido estabelecida

nas sociedades de classes a conexão entre trabalho e educação no âmbito da

escola.

Após a sinalização do debate em torno dos fundamentos ontológico-históricos

da relação trabalho e educação, continuamos o segundo eixo destacando o papel

que a Escola assume no modo de produção capitalista de base industrial e a

posição de destaque que passa a ocupar na formação/preparação da força de

trabalho. Sem deixar de considerar, todavia, que esse modo de produção mantém

Page 86: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

85

sob novas bases a propriedade privada dos meios de produção e a divisão da

sociedade em classes sociais - proprietários e não proprietários desses meios.

Com isso, ao tratarmos da relação Escola e Trabalho no Brasil, procuramos

evidenciar como a dualidade estrutural tem sido uma categoria fundamental para a

compreensão das propostas de estruturação e organização do nosso sistema

escolar de ensino. Ao mesmo tempo em que a apreensão desta categoria nos

permite compreender o porquê de na história da educação escolar brasileira a

independência entre formação geral e formação específica para o trabalho ter sido

uma de suas principais características pelo menos nos últimos cem anos.

Nesse contexto, ao considerarmos as políticas educacionais promovidas pelo

Estado, no decorrer dos séculos XX e XXI, vimos que essas políticas na verdade

têm contribuído para a legitimação da dualidade e para a conservação de um

modelo dualista de educação. Ou seja:

Enquanto os de melhores condições econômicas terão a possibilidade de se qualificarem para o prosseguimento dos estudos, aos setores mais carentes e excluídos estabeleceu-se um padrão de educação que não relaciona teoria e prática, comprometendo diretamente a formação destes indivíduos enquanto cidadãos. (OLIVEIRA, 2007, p.31).

Deste modo, ao destacarmos a reforma do ensino médio e da educação

profissional no Brasil dos anos 1990, verificamos que além da dualidade do sistema

de ensino persistir sob novas bases, a mesma insere-se no contexto de

reorganização do capitalismo global tendo como eixo norteador os pressupostos do

neoliberalismo.

Assim, nos oito anos do governo FHC (1995-2002) sob a justificativa da

necessidade de adequar a educação às novas demandas do setor produtivo,

percebemos a incorporação pelo discurso pedagógico de uma série de noções

oriundas do discurso empresarial, dentre elas a noção de competência.

Contudo, é preciso ter clareza que a incorporação da noção de competência,

como princípio norteador da reforma curricular do ensino médio e da educação

profissional, faz parte do processo de adequação da formação escolar aos

imperativos postulados pelo processo de reestruturação da produção que

permanecem, de qualquer modo, vinculados à lógica do capital, e que, portanto

devem ser questionados.

Page 87: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

86

Nesse aspecto, sinalizamos a importância da apropriação da obra de Ramos,

A Pedagogia das Competências (2006), como meio para compreendermos e

questionarmos os vínculos teóricos dessa noção juntamente com suas implicações

sobre as instituições educativas e sobre a formação dos estudantes.

Nessa direção, iniciamos o terceiro (e último) eixo dessa dissertação -

resgatando o legado deixado pelos oito anos do governo FHC com destaque para as

conseqüências geradas no âmbito do ensino médio e do ensino técnico, a partir da

entrada em vigor do Decreto 2.208/97.

Este Decreto, conforme vimos em diversas passagens do item 4.1, foi o

instrumento jurídico-político utilizado pelo governo FHC tanto para promover a

independência entre ensino médio e ensino técnico quanto para incorporar no

âmbito da última etapa da educação básica e da educação profissional a lógica das

competências nas formulações dos currículos dos respectivos cursos. O que mais

uma vez demonstrou o compromisso desse governo com o ideário pedagógico do

capital (nacional e internacional) e com a lógica da dependência externa.

Por sua vez, ao adentrarmos a análise da proposta de educação profissional

integrada ao ensino médio no governo Lula, verificamos que desde o seu início em

2003 as ações voltadas para a integração foram marcadas por um percurso

ambíguo.

Entre essas ambigüidades, destacamos a substituição do Decreto 2.208/97

pelo Decreto 5.154/04 ao invés da simples regulação pelo CNE dos artigos 36 e 39 a

42 da LDB 9.394/96, e a manutenção tanto das Diretrizes Curriculares do ensino

médio quanto dos Referenciais Curriculares da educação profissional instituídos pelo

governo FHC.

Desta forma, apesar da revogação do Decreto 2.208/97 e da abertura da

possibilidade de integração curricular entre ensino médio e técnico, o que vimos nos

primeiros quatro anos do governo Lula (2003-2006) foi à continuidade de políticas

focalizadas no campo social e educacional e a falta de clareza em relação aos

pressupostos que deveriam nortear a implantação da educação profissional

integrada ao ensino médio nas escolas públicas.

Esse continuísmo da política educacional do governo anterior se tornou ainda

mais evidente à medida que Francisco Cordão, relator do Parecer 39/2004, destacou

o princípio da simultaneidade como forma de relacionamento entre educação

Page 88: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

87

profissional e ensino médio, a partir do Decreto 5.154/04. O que mais uma vez

reafirma o princípio da independência e não o da integração entre os cursos.

Por outro lado, em outubro de 2006, o presidente Lula foi reeleito e passou a

dispor de mais quatro anos para realizar a tentativa de integração entre ensino

médio e ensino técnico.

Contudo, ao analisarmos as ações promovidas em prol da integração nos dois

anos seguintes à reeleição do presidente Lula, constatamos que a ambigüidade

continua a ser a sua principal marca.

No âmbito do MEC, por exemplo, em um curto espaço de tempo foram

lançados dois programas voltados para a reestruturação do ensino médio, o Brasil

Profissionalizado e o Ensino Médio Inovador. Sendo que o segundo coloca em

dúvida a integração à medida que de forma genérica propõe estabelecer “mudanças

significativas” no ensino médio não profissionalizante através do desenvolvimento de

inovações curriculares. O que consideramos abrir caminho, novamente, para o

reforço da independência entre o ensino médio e o ensino técnico.

Por fim, esse conjunto de ações ambíguas, nos seis anos do governo do

presidente Lula, nos deixa uma série de dúvidas e incertezas em relação à

materialização de uma política consistente de integração entre educação profissional

e ensino médio, sob os princípios do trabalho, da ciência da tecnologia e da cultura,

em uma sociedade marcada pela elevada desigualdade econômico-social e pelos

antagonismos de classe.

No entanto, como a realidade é dinâmica acreditamos que possibilidades

existem, o que demandará um compromisso coletivo das forças sociais

comprometidas com a superação da dualidade de classes, que é condição

necessária para a superação da dualidade educacional.

Page 89: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

88

REFERÊNCIAS ANTUNES, Ricardo L. C. Os sentidos do trabalho: ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. São Paulo: Boitempo, 1999. (Coleção Mundo do Trabalho). ______. Adeus ao trabalho?: ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. 11. ed. São Paulo: Cortez; Campinas: Editora Unicamp, 2006. ______. Dimensões da precarização estrutural do trabalho. In: DRUCK, Graça; Franco, Tânia (orgs.). A perda da razão social do trabalho: terceirização e precarização. São Paulo: Boitempo, 2007. p.13-22. BAUMAN, Zygmunt. A ascensão e queda do trabalho: In______. A sociedade individualizada: vidas contadas e histórias vividas. Tradução de José Gadel. Rio do Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2008. BORGES, Ângela M.C. Desestruturação do mercado de trabalho e vulnerabilidade social: a região metropolitana de Salvador na década de 90. 2003.374 f. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2003. ______.Mercado de Trabalho: mais uma década de precarização. In: DRUCK, Graça; Franco, Tânia (orgs.). A perda da razão social do trabalho: terceirização e precarização. São Paulo: Boitempo, 2007. p.81-94. BRASIL. Decreto n.º 7.566, de 23 de setembro de 1909. Crea nas capitaes dos Estados das Escolas de Aprendizes Artífices. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/setec/arquivos/pdf3/decreto_7566_1909.pdf>. Acesso em: 30 mar. 2008. ______. Lei n.º 4024, de 20 de dezembro de 1961. Fixa as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 27 dez. 1961. ______. Lei n.º 5.692, de 11 de agosto de 1971. Fixa diretrizes e bases para o ensino de 1° e 2º graus, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 12 ago. 1971. ______. Lei n.º 7.144, de 18 de outubro de 1982. Altera dispositivos da Lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971, referentes a profissionalização do ensino de 2º grau. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 19 out. 1982.

Page 90: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

89

______. Lei n.º 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 dez. 1996. ______. Decreto n.º 2.208, de 17 de abril de 1997. Regulamenta o § 2º do art. 36 e os artigos 39 a 42 da Lei 394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 18 de abr. 1997a. ____. Portaria n.º 646/97, de 14 de maio de 1997. Regulamenta a implantação do disposto nos artigos 39 a 42 da Lei Federal n.º 9.394/96 e no Decreto Federal n.º 2.208/97 e dá outras providências (trata da rede federal de educação tecnológica). Diário Oficial da União, Brasília, DF, 15 de mai. 1997b. ______. Portaria n.º 1005, de 10 de setembro de 1997. Implementa o Programa de reforma da educação profissional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 11 de set. 1997c. ______. Resolução n.º 3, de 26 de junho de 1998. Institui as diretrizes curriculares nacionais para o ensino médio. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 27 de jul. 1998. ______. Resolução n.º 4 de 8 de dezembro de 1999. Institui as diretrizes curriculares nacionais para a educação profissional de nível técnico. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 9 de dez. 1999. ______. MEC. Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio, Brasília, DF, 2000a, 109p. ______. MEC. Referenciais curriculares nacionais da educação profissional de nível técnico. Brasília, DF, 2000b, 127p. ______. MEC. Proposta em discussão: políticas públicas para a educação profissional e tecnológica. Brasília, DF, 2004a. 70p. ______. Decreto nº. 5.154 de 23 de julho de 2004. Regulamenta o § 2º do art. 36 e os arts. 39 a 41 da Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, Diário Oficial da União, Brasília, DF, 2004b.

Page 91: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

90

______. Parecer 39, de 8 de dezembro de 2004. Aplicação do decreto n.5.154/2004 na Educação Profissional Técnica de nível médio. Brasília, DF, 2004c. ______.Resolução n.º 1, de 3 de fevereiro de 2005. Atualiza as diretrizes curriculares nacionais pelo Conselho Nacional de Educação para o ensino médio e para a educação profissional técnica de nível médio às disposições do decreto 5.154/2004. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 2005. ______. Decreto n.º 6.094, de 24 de abril de 2007. Dispõe sobre a implementação do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação [...].Diário Oficial da União Brasília, DF, 25 abr. 2007a. ______. Decreto n.º 6.302, de 12 de dezembro de 2007. Institui o Programa Brasil Profissionalizado. Diário Oficial da União, DF, 12 dez. 2007b. ______. MEC. Educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio. Documento base. Brasília, DF, 2007c. Disponível em: < http://portal.mec.gov.br/setec/arquivos/pdf3/doc_referencial.pdf >. Acesso em 01 mar. 2009. ______. MEC. Censo 2008 indica tendências da educação. Disponível em: < http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/educacenso_2008.pdf>. Acesso em 25. mar. 2009. ______. Portaria n.º 386 de 25 de março de 2008. Constitui grupo de trabalho interministerial com a finalidade de realizar estudos [...] visando à reestruturação, melhoria e expansão do Ensino Médio. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 25 mar. 2008a. ______. Reestruturação e expansão do ensino médio no Brasil. Brasília, DF, julho de 2008b, 30p. ______. Lei n.º 11.741 de 16 de julho de 2008. Altera dispositivos da Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996[...] Diário Oficial da União, Brasília, DF, 17 jul. 2008c. ______. Lei n.º 11.892 de 29 de dezembro de 2008. Institui a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica [...]. Diário Oficial da União, DF, 30 dez. 2008d.

Page 92: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

91

CIAVATA. Maria. A formação integrada: a escola e o trabalho como lugares de memória e identidade. FRIGOTTO, Gaudêncio; CIAVATTA, Maria; RAMOS, Marise Ensino médio integrado: concepções e contradições. São Paulo: Cortez, 2005. p. 83-105. CHAUÍ, Marilena. Convite à filosofia. São Paulo: Ática, 1997. CUNHA, Luiz A. O ensino industrial manufatureiro no Brasil. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, n.14, mai/ago. 2000. DA SILVA, Luiz I. L. Carta ao povo brasileiro. São Paulo, 22 de jun. de 2002. Disponível em: <http://www.iisg.nl/collections/carta_ao_povo_brasileiro.pdf>. Acesso em 03 mar. 2009. ______. Compromisso com a mudança. São Paulo, 28 de out. de 2002. Disponível em:<http://www.pt.org.br/portalpt/images/stories/arquivos/compromissocomamudanca.pdf>. Acesso em: 25 de nov. 2008 DRUCK, Graça. Algumas considerações teóricas sobre o trabalho na sociedade capitalista. In: DSS e economia solidária: debate conceitual e relatos de experiências. Pernambuco, Escola de formação sindical CUT Nordeste, 2000. p. 11-23. DRUCK, Graça; Franco, Tânia (orgs.). A perda da razão social do trabalho: terceirização e precarização. São Paulo: Boitempo, 2007. (Coleção Mundo do Trabalho). ENGELS. Friedrich.Karl Marx. In: BARATA-MOURA, José (Coord.). et al. Marx e Engels: obras escolhidas. Lisboa: Editorial Avante, 1985. p.92. (tomo. 3). FILGUEIRAS, Luiz. A crise do mercado imobiliário dos EUA e suas implicações para a economia brasileira. Conjuntura & Planejamento, v. 156, p. 88-93, 2007. FRIGOTTO, Gaudêncio. A polissemia da categoria trabalho e a batalha das ideias nas sociedades de classe. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, v.14, n. 40, jan./abr.2009. ______.Educação para a “inclusão”e a “empregabilidade”: promessas que obscurecem a realidade. In: CANÁRIO, Ruy; RUMMERT, Sonia. Mundos do Trabalho e aprendizagem. Lisboa: Educa. Formação, 2009.

Page 93: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

92

FRIGOTTO, Gaudêncio; Ciavatta, Maria. A busca de articulação entre trabalho, ciência e cultura no ensino médio. In______. Ensino médio: ciência, cultura e trabalho. Brasília: MEC, SEMTEC, 2004. FRIGOTTO, Gaudêncio; CIAVATTA, Maria; RAMOS, Marise. Apresentação In______. Ensino médio integrado: concepções e contradições. São Paulo: Cortez, 2005a. ______.A gênese do Decreto n. 5154/2004: um debate no contexto controverso da democracia restritiva. In______. Ensino médio integrado: concepções e contradições. São Paulo: Cortez, 2005b. ______. A política de educação profissional no governo Lula: um percurso histórico controvertido. Educação & Sociedade. Campinas, SP, v. 26, n.92, Especial out. 2005c, p. 1087-1113. GÊNESIS. In: Bíblia Sagrada. Tradução de Padre Antônio Pereira de Figueiredo. Erechim, Rio Grande do Sul, 2000. GORZ, André. O declínio da relevância do trabalho e a ascensão de valores pós-econômicos. Socialismo do futuro, n. 6, 1993. p. 25-31. HIRATA, Helena. Da polarização das qualificações ao modelo de competências. In: FERRETI, C. et al. Novas Tecnologias, trabalho e educação: um debate multidisciplinar. Petrópolis, Vozes, 1994. HOBSBAWM, Eric. Era dos extremos: o breve século XX, 1914-1991. Tradução de Marcos Santarrita. 2. ed. São Paulo: Companhia da Letras, 1995. KONDER, L. A construção da pedagógica do SESC Rio. Rio de Janeiro, Editora SENAC, 2000. KUENZER, Acácia Z. Educação e trabalho no Brasil: o estado da questão. Brasília, DF, INEP, REDuc, 1991. 125p. ___.Ensino de segundo grau: o trabalho como princípio educativo. 3 ed. São Paulo, Cortez, 1997. 167p.

Page 94: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

93

______. Educação Profissional: categorias para uma Nova Pedagogia do Trabalho. Revista da Formação Profissional. Boletim Técnico do Senac, Curitiba, v. 1, p. 19-29, 1999. ______. Exclusão includente e inclusão excludente. A nova forma de dualidade estrutural que objetiva as novas relações entre educação e trabalho. In. LOMBARDI, José C; SAVIANI, Dermeval; SANFELICE, José L. Capitalismo, trabalho e educação. 3 ed. Campinas, SP: Autores associados, 2005. ______. Ensino médio e profissional: as políticas do Estado neoliberal. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2007. – (Coleção Questões de Nossa Época, v.63). LESSA, Sérgio. Mundo dos homens: trabalho e ser social. São Paulo: Boitempo Editorial, 2002.

______.Trabalho e proletariado no capitalismo contemporâneo. São Paulo: Cortez, 2007. MACHADO, Lucília. Trabalho-educação como objeto de investigação. Revista Trabalho & Educação, MG v.14, 2005, p.127-136. MANFREDI, Silvia Maria. Educação profissional no Brasil. São Paulo: Cortez, 2002. (Coleção Docência em formação). MARX, Karl.Teses sobre Feurbach.In: BARATA-MOURA, José (Coord.). et al. Marx e Engels: obras escolhidas. Lisboa: Editorial Avante, 1982a. p.3. (tomo. 1). ______. Trabalho assalariado e capital. In: BARATA-MOURA, José (Coord.). et al. Marx e Engels: obras escolhidas. Lisboa: Editorial Avante, 1982b. p.151-177.(tomo. 1). ______. Manuscritos econômico-filosóficos. São Paulo: Martin Claret, 2003. ______. O capital: crítica da economia política. 21 ed. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2003 (v.1). MARX, K; ENGELS, F. Manifesto do Partido Comunista. São Paulo: Boitempo, 1998.

Page 95: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

94

MERCURE, Jean; SPURK, Jan (orgs.). O trabalho na história do pensamento ocidental. Tradução de Patrícia Chittoni R. Reuillard; Sônia Guimarães Taborda. Petrópolis, RJ: Vozes, 2005. OFFE, Claus. Trabalho como categoria sociológica fundamental?. In______. Trabalho e sociedade: problemas estruturais e perspectivas para o futuro da sociedade do “trabalho”. Rio de Janeiro: Tempo brasileiro, 1989. Parte I, Cap I, p.13-41. OIT. Mais trabalho decente para trabalhadoras e trabalhadores domésticos no Brasil. Brasília, DF, 2008. OLIVEIRA, Ramon. A (des) qualificação da educação profissional brasileira. São Paulo: Cortez, 2003. (Coleção questões da nossa época, v. 101). PAIVA, Vânilda. Qualificação, crise do trabalho assalariado e exclusão social. In. GENTILI, Pablo; FRIGOTTO, Gaudêncio (Orgs.) A cidadania negada: políticas de exclusão na educação e no trabalho. 4 ed. São Paulo,Cortez; [Buenos Aires, Argentina]: CLACSO, 2008. PARTIDO DOS TRABALHADORES. Uma escola do tamanho do Brasil. Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/me001806.pdf>. Acesso em: 20 nov. 2008. ______. Lula presidente: programa de governo 2007-2010. Disponível em:<www.pt.org.br/portalpt/download.php?file=dados/bancoimg/>. Acesso em 20 mar. 2010. PINTO, Geraldo Augusto. A organização do trabalho no século 20: taylorismo, fordismo e toyotismo. São Paulo: Expressão Popular, 2007. POCHMANN, Márcio. O emprego no desenvolvimento da nação. São Paulo: Boitempo, 2008. (Coleção Mundo do Trabalho). RAMOS, Marise N. Possibilidades e desafios na organização do currículo integrado. In: RAMOS, Marise; FRIGOTTO, Gaudêncio; CIAVATTA, Maria.(Orgs.) . Ensino Médio Integrado: concepção e contradições. São Paulo: Cortez, 2005; p. 106-127.

Page 96: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

95

______.A pedagogia das competências: autonomia ou adaptação? 3. ed. São Paulo: Cortez, 2006. ROMANELLI, Otaíza de Oliveira. História da educação no Brasil. 18. ed. Petrópolis, Rio de Janeiro, 1996. RUIZ, Antônio I. Apresentação In. FRIGOTTO, Gaudêncio. CIAVATTA, Maria (Orgs.). Ensino Médio: ciência cultura e trabalho. Brasília: MEC, SEMTEC, 2004. SAVIANI, Dermeval. A nova LDB: Trajetória, limites e perspectivas. 5 ed. Campinas, SP: Autores Associados, 1999. (Coleção educação contemporânea). ______. O choque teórico da politecnia. Revista Trabalho, educação e saúde, v.1, n.1, p.131-152, 2003. ______. Trabalho e educação: fundamentos ontológicos e históricos. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, v.12, n.34, jan/abr. 2007. SILVA, Monica R. da. Currículo e competências: a formação administrada. São Paulo: Cortez, 2008. THÉBAUD-MONY, Annie; DRUCK, Graça. Terceirização: a erosão dos direitos dos trabalhadores na França e no Brasil. In: DRUCK, Graça; FRANCO. Tânia. A perda da razão social e do trabalho: terceirização e precarização. São Paulo: Boitempo, 2007. TONET, Ivo. Marxismo e Educação. Maceió, mar. de 2009. Disponível em: <http://www.ivotonet.xpg.com.br/arquivos/MARXISMO_E_EDUCACAO.pdf. >Acesso em: 20 jun. 2009. VATIN, François. Epistemologia e sociologia do trabalho. Tradução de Maria João Batalha Reis. Lisboa, Portugal: Instituto Piaget, 1999. WEBER, Max. A ética protestante e o espírito do capitalismo. São Paulo: Martin Claret, 2002.

Page 97: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

96

APÊNDICES

Page 98: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

APEN

DIC

E A – R

elação de Docum

entos Oficiais

RELA

ÇÃ

O D

E DO

CU

MEN

TOS O

FICIA

IS

N.º

Tipo N

.º D

escrição M

ês A

no N

º. pág.

01 C

onstituição

Capítulo III – D

a educação, da cultura e do desporto, Seção I - Da Educação

10 1988

4 02

Lei 9.394

Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional 12

1996 22

03 D

ecreto 2.208

Regulam

enta o § 2 º do art. 36 e os arts. 39 a 42 da Lei nº. 9.394, de 20 de dezem

bro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.

04 1997

3

04 Portaria

646

Regulam

enta a implantação do disposto nos artigos 39 a 42 da Lei Federal

nº. 9.394/96 e no Decreto Federal nº 2.208/97 e dá outras providências (trata

da rede federal de educação tecnológica). 05

1997 4

05 Portaria

1.005 Im

plementa o Program

a de Reform

a da Educação Profissional –PRO

EP 09

1997 2

06 Parecer

17 Estabelece as diretrizes operacionais para a educação profissional em

nível nacional.

12 1997

10 07

Parecer 15

Trata das Diretrizes C

urriculares Nacionais para o Ensino M

édio 06

1998 65

08 R

esolução 3

Institui as Diretrizes C

urriculares Nacionais para o Ensino M

édio 06

1998 8

09 Parecer

16 Trata das D

iretrizes Curriculares N

acionais para a educação de Nível Técnico

07 1999

36

10 R

esolução 4

Institui as Diretrizes C

urriculares Nacionais para a Educação Profissional de

Nível Técnico

1999

33 11

Lei 10.172

Aprova o Plano Nacional de Educação e dá outras providências.

2001

13

12 D

ocumento

- Program

a de Governo Lula. U

m Brasil para todos. C

rescimento, Em

prego e Inclusão Social.

2002

72 13

Docum

ento -

Um

a escola do tamanho do Brasil

08 2002

56

14 D

ocumento

- Proposta em

discussão: políticas públicas para a educação profissional e tecnológica

04 2004

70

97

Page 99: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

R

ELAÇ

ÃO

DE D

OC

UM

ENTO

S OFIC

IAIS

N.º

Tipo N

.º D

escrição M

ês A

no Nº.

pág.

15 D

ecreto 5.154

Regulam

enta o § 2º do art. 36 e os arts. 39 a 41 da Lei n.º 9.394, de 20 de dezem

bro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, e dá outras providências.

07 2004

3

16 Parecer

39 Aplicação do D

ecreto nº 5.154/2004 na Educação Profissional Técnica de nível m

édio e no Ensino M

édio. 12

2004 12

17 R

esolução 1

Atualiza as

Diretrizes

Curriculares

Nacionais

definidas pelo

Conselho

Nacional de Educação para o E

nsino Médio e para a Educação Profissional

Técnica de nível médio às disposições do D

ecreto nº 5.154/2004. 02

2005 2

18 D

ocumento

Program

a de governo Lula 2007-2010

2006 34

19 D

ecreto 6.302

Institui o Programa Brasil Profissionalizado

12 2007

2

20 D

ocumento

- D

ocumento Base: Educação Profissional Técnica de N

ível Médio integrada ao

Ensino Médio

12 2007

59

21 Parecer

11 Proposta de instituição do C

atálogo Nacional de C

ursos Técnicos de Nível

Médio

06 2008

13

22 Lei

11.741

Altera dispositivos da Lei no 9.394, de 20 de dezem

bro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para redim

ensionar, institucionalizar e integrar as ações da educação profissional técnica de nível m

édio, da educação de jovens e adultos e da educação profissional e tecnológica.

07 2008

3

23 R

esolução 3

Dispõe sobre a instituição e im

plantação do Catálogo N

acional de Cursos

Técnicos de Nível M

édio. 07

2008 2

24 Portaria

870 Aprovação do C

atálogo Nacional de C

ursos Técnicos 07

2008 1

25 D

ocumento

- C

atálogo Nacional de C

ursos Técnicos

2008 250

26 Lei

11.892

Institui a Rede Federal de Educação Profissional, C

ientífica e Tecnológica, cria os institutos Federais de Educação, C

iência e Tecnologia, e dá outras providências.

12 2008

3

98

Page 100: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

99

APÊNDICE B - Cronologia da integração Educação Profissional e Ensino Médio

no Governo Lula48

Período 2003 a 2008

2003

4 a 6 de Junho

Seminário Nacional “Ensino Médio: construção política” – Brasília.

Objetivo: discutir a realidade do ensino médio brasileiro e novas

perspectivas na construção de uma política para esse nível de

ensino. Resultado: elaboração do livro Ensino Médio: Ciência, Cultura e Trabalho;

16 a 18 de Junho

Seminário Nacional de Educação Profissional: concepções,

experiências, problemas e propostas (específico da educação

profissional) - Brasília. Objetivo: Discussão dos rumos da educação

profissional a partir do documento base: Políticas públicas para a Educação Profissional e Tecnológica. O resultado foi à

publicação de um novo documento no ano seguinte.

2004

Abril

Publicação do documento - Proposta em discussão: Políticas públicas para a Educação Profissional e tecnológica.

23 de Julho

Entrada em vigor o Decreto 5.154 que passa a regulamentar o § 2º

do art. 36 e os artigos. 39 a 41 da Lei n.º 9.394, de 20 de dezembro

de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação

nacional, e dá outras providências. Este decreto abriu a

possibilidade da integração Ensino Médio e Educação Profissional.

08 de dezembro

Aprovação do Parecer CNE/CEB n.º 39/2004 que trata da aplicação

do Decreto 5.154 na Educação Profissional técnica de nível Médio

e no Ensino Médio. Este parecer teve origem na nova realidade

48Esta cronologia não leva em consideração a legislação e os documentos produzidos para a Educação Profissional integrada ao ensino médio na modalidade de jovens e adultos

Page 101: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

100

ditada pelo novo decreto e na necessidade de orientar os sistemas

de ensino e as escolas na imediata implantação do referido

instrumento jurídico.

2005

11 de março

Entra em vigor a Resolução 1/2005 que atualiza as Diretrizes

Nacionais definidas pelo Conselho Nacional de Educação para o

Ensino Médio (Resolução 3/98) e para a Educação Profissional

técnica de Nível Médio (Resolução 4/99) às disposições do

Decreto 5.154/2004.

2006 Divulgação do programa de governo Lula 2007-2010 que entre

outros aspectos trata das diretrizes para a Educação em nosso

país.

2007

13 de Dezembro

Entra em vigor o Decreto 6.302 que institui o Programa Brasil

Profissionalizado. Programa este com vistas a estimular o ensino

médio integrado à educação profissional, enfatizando a educação

científica e humanística, por meio da articulação entre formação

geral e educação profissional no contexto dos arranjos produtivos

e das vocações locais e regionais.

Dezembro

(Sem identificação

de data)

Publicação do documento base: Educação Profissional técnica de Nível Médio integrada ao ensino médio. Objetivo:

contextualizar os embates que estão na base da opção pela

formação integral do trabalhador, expressa no Decreto 5.154/2004,

juntamente com a apresentação dos pressupostos para a

concretização dessa oferta, suas concepções e princípios e alguns

fundamentos para a construção de um projeto político pedagógico

integrado.

Page 102: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

101

2008

12 de Junho

Aprovação do Parecer 11 que trata da proposta de instituição

do Catálogo Nacional de Cursos técnicos. O objetivo desse

catálogo é servir de mecanismo de organização e orientação

da oferta nacional dos cursos técnicos de nível médio. Cumpre

também, subsidiariamente, uma função indutora ao destacar

novas ofertas em nichos tecnológicos, culturais, ambientais e

produtivos, propiciando uma formação técnica contextualizada

com os arranjos socioprodutivos locais, gerando novo

significado para formação, em nível médio, do jovem brasileiro.

Junho

Publicação do Catálogo Nacional de Cursos Técnicos

9 de Julho

Entra em vigor a Resolução n. 3 que Dispõe sobre a instituição

e implantação do Catálogo Nacional de Cursos Técnicos de

Nível Médio. Essa resolução institui a alteração da

organização dos cursos técnicos; os mesmos passam a partir

desta data a serem organizados por eixos tecnológicos ao

invés de áreas profissionais.

16 de Julho

Entra em vigor a Lei 11.741 que altera dispositivos da Lei n.º

9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as

diretrizes e bases da educação nacional, para redimensionar,

institucionalizar e integrar as ações da educação profissional

técnica de nível médio, da educação de jovens e adultos e da

educação profissional e tecnológica.

16 de Julho

Editada a portaria de n. 870 que aprova o Catálogo Nacional

de Cursos Técnicos de Nível Médio, elaborado pela Secretaria

de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da

Educação.

29 de Dezembro

Entra em vigor a Lei 11.892 que Institui a Rede Federal de

Educação Profissional, Científica e Tecnológica, cria os

Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, e dá

outras providências. Entre os objetivos dos institutos federais

Page 103: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … · deixado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) e as medidas até então ... considering the legacy left by Fernando Henrique

102

está. I – ministrar educação profissional técnica de nível médio

prioritariamente na forma de cursos integrado. A mesma lei

destaca em seu artigo 8º que no desenvolvimento de sua ação

acadêmica os Institutos Federais deverão garantir, em cada

exercício, o mínimo de 50% de suas vagas em cursos

integrados (normal e proeja).