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0 UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ CENTRO DE HUMANIDADES ESPECIALIZAÇÃO EM FORMAÇÃO DE TRADUTORES ERMELINDA LOPES DA SILVA ANÁLISE DO PROCESSO TRADUTÓRIO DO CONTO “EL AVIÓN DE LA BELLA DURMIENTE”, DE GABRIEL GARCÍA MÁRQUEZ FORTALEZA – CEARÁ 2013

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ CENTRO DE HUMANIDADES

ESPECIALIZAÇÃO EM FORMAÇÃO DE TRADUTORES

ERMELINDA LOPES DA SILVA

ANÁLISE DO PROCESSO TRADUTÓRIO DO CONTO “EL AVIÓN DE LA BELLA DURMIENTE” ,

DE GABRIEL GARCÍA MÁRQUEZ

FORTALEZA – CEARÁ 2013

1

ERMELINDA LOPES DA SILVA

ANÁLISE DO PROCESSO TRADUTÓRIO DO CONTO “EL AVIÓN DE LA BELLA DURMIENTE” ,

DE GABRIEL GARCÍA MÁRQUEZ

Monografia apresentada ao Curso de Especialização em Formação de Tradutores do Centro de Humanidades da Universidade Estadual do Ceará, como requisito parcial para a obtenção do título de especialista em Formação de Tradutores. Orientadora: Prof.ª Ms. Edilene Rodrigues Barbosa.

FORTALEZA – CEARÁ 2013

2

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação

Universidade Estadual do Ceará

Biblioteca Central CENTRO DE HUMANIDADES

Bibliotecário Responsável – Dóris Day Eliano França – CRB-3/726

S586a Silva, Ermelinda Lopes da.

Análise do processo tradutório do conto “El avión de La bella durmiente”, de Gabriel García Márquez. / Ermelinda Lopes da Silva. – 2013.

CD-ROM. 63f. ; 4 ¾ pol.

“CD-ROM contendo o arquivo no formato PDF do trabalho acadêmico, acondicionado em caixa de DVD Slim (19 x 14 cm x 7 mm)”.

Monografia (especialização) – Universidade Estadual do Ceará, Centro de Humanidades, Curso de Especialização em Formação de Tradutores do POSLA da Uece, Fortaleza, 2013.

Orientação: Profa. Ms. Edilene Rodrigues Barbosa.

1. Conto. 2. Tradução. 3. Dificuldades. 4. Estratégias I. Título.

CDD: 418.02

3

4

RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo realizar um estudo do processo tradutório do conto “El avión de la bella durmiente”, do escritor colombiano Gabriel García Márquez. Tal estudo se baseia no exame das dificuldades de ordem lexical, semântica e sintática encontradas durante a tradução do texto original. Para a solução de tais problemas nos apropriamos de algumas estratégias de tradução propostas por Nida (1964), García Yebra (1983) e Peter Newmark (1995). Durante a análise, descrevemos os procedimentos realizados e os níveis de tradução explorados com a finalidade de conseguirmos um bom resultado. Nossa tradução passou pelas fases de compreensão e de expressão sugeridas por Yebra (1983), o que nos assegurou um melhor entendimento do texto original. Através de uma pesquisa descritiva de natureza qualitativa, realizamos as escolhas que nos pareceram mais adequadas à realidade do gênero textual conto. Dessa forma, verificamos que a tradução de boa qualidade é consequência de um árduo trabalho interpretativo aliado ao conhecimento linguístico e ao uso de estratégias específicas por parte do tradutor. Palavras-chave: Conto. Tradução. Dificuldades. Estratégias.

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RESUMEN

El presente trabajo tiene por objetivo realizar un estudio del proceso traductorio del cuento “El avión de la bella durmiente”, del escritor colombiano Gabriel García Márquez. Tal estudio se basa en el examen de las dificultades de orden lexical, semántica y sintáctica encontradas durante la traducción del texto original. Para la solución de tales problemas nos apropiamos de algunas estrategias de traducción propuestas por Nida (1964), García Yebra (1983) y Peter Newmark (1995). Durante el análisis, describimos los procedimientos realizados y los niveles de traducción explorados con la finalidad de que consigamos un buen resultado. Nuestra traducción pasó por las fases de comprensión y de expresión sugeridas por Yebra (1983), lo que nos aseguró un mejor entendimiento del texto original. Por medio de una investigación descriptiva de naturaleza cualitativa realizamos las escojas que nos parecieron más adecuadas a la realidad del género textual cuento. De esa forma, verificamos que la traducción de buena calidad es consecuencia de un arduo trabajo interpretativo aliado al conocimiento lingüístico y al uso de estrategias específicas por parte del traductor. Palabras clave: Cuento. Traducción. Dificultades. Estrategias

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LISTA DE QUADROS

Estratégias de Peter Newmark - Quadro 01............................................... 19

Dificuldades de ordem lexical - Quadro 02................................................ 26

Quadro 03.......................................................................................... 27

Quadros 04 a 06................................................................................ 28

Quadros 07 a 09................................................................................ 29

Quadros 10 a 13................................................................................. 30

Quadros 14 e 15................................................................................. 31

Quadros 16 a 18................................................................................. 32

Quadros 19 a 22................................................................................. 33

Quadros 23 a 25................................................................................. 34

Dificuldades de ordem semântica - Quadros 26 a 28................................. 35

Quadros 29 a 32................................................................................ 36

Quadros 33 a 35................................................................................ 37

Quadros 36 a 39................................................................................ 38

Quadros 40 a 43................................................................................ 39

Dificuldades de ordem sintática - Quadros 44 e 45................................... 40

Quadros 46 a 48................................................................................ 41

Quadros 49 a 51................................................................................ 42

Quadros 52 a 54................................................................................ 43

Quadros 55 a 57................................................................................ 44

Quadro 58......................................................................................... 45

Síntese da análise – Quadro 59................................................................... 45

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO.............................................................................................................8 2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA..............................................................................10

2.1 GÊNEROS TEXTUAIS..................................................................................10

2.1.1 O GÊNERO TEXTUAL CONTO..................................................................11

2.2 A TRADUÇÃO E SUAS DEFINIÇÕES.......................................................13

2.2.1 A TRADUÇÃO E O BOM LEITOR.............................................................16

2.3 ESTRATÉGIAS DE TRADUÇÃO................................................................17 3. METODOLOGIA.......................................................................................................21

3.1 TIPO DE PESQUISA ADOTADO................................................................21

3.2 O AUTOR DO CONTO..................................................................................21

3.2.1 A PRODUÇÃO LITERÁRIA DE GARCÍA MÁRQUEZ...... .....................22

3.3 CONSTITUIÇÃO DO CORPUS....................................................................23

3.4 INSTRUMENTOS UTILIZADOS.................................................................24

3.5 TRATAMENTO DOS DADOS.....................................................................24 4. ANÁLISE DO CONTO - AS DIFICULDADES DA TRADUÇÃO.. ......................26 4.1 SÍNTESE DA ANÁLISE.................................................................................47 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS.....................................................................................48 REFERÊNCIAS..........................................................................................................49 ANEXOS......................................................................................................................51

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1. INTRODUÇÃO

O objetivo deste trabalho é analisar o processo de tradução, da língua espanhola para a

língua portuguesa, do conto “El avión de la bella durmiente”, do escritor colombiano Gabriel

García Marquez. Executamos a tradução do conto com o propósito de descrevermos as ações

tradutórias realizadas e empregarmos as estratégias pertinentes. Assim, partiremos da

exposição dos principais problemas encontrados, bem como apresentaremos e defenderemos

nossas escolhas, baseadas nos estudos de alguns dos principais teóricos em tradução.

Sabemos que o conto é um dos gêneros textuais literários mais traduzidos e

valorizados, principalmente no ambiente escolar ou acadêmico. Geralmente, o gosto pela

leitura inicia-se durante a infância, muitas vezes através do contato com os famosos contos de

fada e tende a crescer com os passar dos anos, fazendo-se necessário o acesso a obras em seu

idioma de origem e, como consequência, gerando o interesse por línguas estrangeiras e

técnicas de tradução.

Logo, percebemos a necessidade da produção de um material que discutisse as

principais dificuldades encontradas na tradução de um conto em língua espanhola e quais

estratégias deveriam ser adotadas para que obtivéssemos uma tradução de qualidade.

Escolhemos o conto “El avión de la bella durmiente”, primeiramente, pelo fato de ser

uma criação de García Márquez, um verdadeiro gênio na arte da narrativa. Neste conto breve,

a desventura de um viajante hispano-americano é retrada de forma natural e com riqueza de

detalhes. Trata-se de um texto bastante rico, em que se pode explorar tanto aspectos

linguísticos, como textuais e culturais.

A motivação pela análise do processo tradutório desse conto surgiu da necessidade da

adoção de técnicas que facilitassem o trabalho dos tradutores, uma vez que muitos desses

profissionais não se sentem seguros ao realizar suas atividades de tradução. Por esta razão,

Essa análise se destina, principalmente, a estudiosos em tradução e a professores e aprendizes

de língua espanhola para que observem os procedimentos empregados e passem a traduzir de

modo mais confiante e responsável, preocupando-se tanto com o texto original, quanto com o

leitor do texto traduzido.

Este exame será bastante relevante para os estudos de tradução, pois se baseia nas

investigações de importantes teóricos e servirá de apoio para o desenvolvimento de projetos e

pesquisas relacionados à tradução literária no meio acadêmico.

No primeiro capítulo, trabalharemos a noção de gênero textual e apresentaremos as

características mais comuns do gênero textual conto e sua importância para a tradução, uma

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vez que julgamos essencial a qualquer tradutor conhecer as peculiaridades do gênero textual a

ser traduzido. Discutiremos sobre tradução e suas particularidades, sua relação com a boa

leitura e estratégias que podem ser empregadas durante o ato tradutório, visto que é necessário

entender o conceito de tradução para realizar uma boa interpretação e aplicar as estratégias

devidas. No segundo capítulo, através do relato dos métodos de tradução, indicaremos

algumas táticas para facilitar a execução da tradução, tendo como referência as estratégias

assinaladas por Peter Newmark (1995). No terceiro capítulo, apresentaremos uma análise das

principais dificuldades que surgiram durante o processo tradutório, bem como a solução que

julgamos ser a mais conveniente para cada problema.

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2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Neste capítulo, trabalharemos alguns conceitos importantes para a análise da tradução

do conto “El avión de la bella durmiente”. Primeiramente, falaremos sobre gêneros textuais e

sua relevância. Em seguida, restringir-nos-emos às especificidades do gênero textual conto.

Posteriormente, explanaremos sobre a tradução e suas definições. Por fim, discutiremos

algumas estratégias de tradução do gênero conto.

2.1 Gêneros textuais

Para que possamos realizar uma tradução de qualidade é imprescindível que saibamos

o que são gêneros textuais e qual a sua funcionalidade. Todo tradutor é também um leitor. No

entanto, o tradutor é um leitor que vai além. O tradutor é um leitor que além de dominar uma

língua estrangeira é capaz de interpretar e criticar o que lê. O bom tradutor conhece bem as

características estruturais e textuais daquilo que lê. Ele deve sempre conhecer o gênero textual

que irá traduzir, pois dessa forma interpretará melhor sua mensagem, seu contexto de uso, seu

público alvo, seus aspectos estruturais e culturais; todos esses elementos devem ser levados

em conta no ato tradutório.

Segundo Bakhtin (1979, p. 280), os gêneros textuais são:

[...] tipos relativamente estáveis de enunciados, marcados sócio-historicamente, que estão direcionados às diferentes situações sociais, e que, por isso, apresentam uma grande variedade, incluindo desde o diálogo oral cotidiano a uma tese de doutoramento. Apresentam conteúdos, propriedades funcionais, estilo e composição característicos.

Como podemos notar, os gêneros textuais são instrumentos linguísticos que fazem

parte de nosso cotidiano e que promovem as mais diversificadas situações comunicativas.

Eles possuem um caráter social-discursivo e histórico. Marcuschi (2002, p. 19) é outro

importante teórico que caracterizou os gêneros textuais como:

[...] eventos textuais altamente maleáveis, dinâmicos e plásticos. Surgem emparelhados a necessidades e atividades sócio-culturais, bem como na relação com inovações tecnológicas, o que é facilmente perceptível ao se considerar a quantidade de gêneros textuais hoje existentes em relação a sociedades anteriores à comunicação escrita.

Marcuschi (2002, p. 30) ainda aborda sobre a flexibilidade dos gêneros, ele afirma que:

Os gêneros não são entidades naturais como as borboletas, as pedras, os rios e as estrelas, mas são artefatos culturais construídos historicamente pelo ser humano. Não podemos defini-los mediante certas propriedades que lhe devam ser necessárias

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e suficientes. Assim, um gênero pode não ter uma determinada propriedade e ainda continuar sendo aquele gênero. Por exemplo, uma carta pessoal ainda é uma carta, mesmo que a autora tenha esquecido de assinar o nome no final e só tenha dito no início:‘querida mamãe’.

É relevante ressaltar que são inúmeros os gêneros textuais existentes, sejam eles orais

ou escritos. Podemos citar como exemplos a carta, a crônica, o bilhete, a bula, o discurso, a

palestra, o e-mail, etc. Cada gênero possui suas características, sua funcionalidade. Através do

contato com os diferentes textos da vida cotidiana podemos, com o passar do tempo,

reconhecer as propriedades e a função social de cada um deles, como afirmou Koch (2009, p.

54):

Todos nós falantes/ouvintes, escritores/leitores, construímos, ao longo de nossa existência, uma competência metagenérica, que diz respeito ao conhecimento de gêneros textuais, sua caracterização e função. É essa competência que nos propicia a escolha adequada do que produzir textualmente nas situações comunicativas de que participamos. Por isso, não contamos piada em velório, nem cantamos hino de nosso time de futebol em uma conferência acadêmica, nem fazemos preleções em mesa de bar.

A competência metagenérica proposta por Koch também é construída durante o

processo tradutório. À medida que lemos e traduzimos determinado gênero textual mais nos

acercamos do texto e de suas peculiaridades, o que aperfeiçoa nossas traduções.

Outro ponto interessante a ser destacado é que assim como nossa sociedade passa por

transformações os diferentes gêneros textuais também se modificam e/ou evoluem, isso

acontece conforme as necessidades comunicativas vigentes. Vejamos outra declaração de

Koch (2006, p. 101):

[...] os gêneros, como práticas sociocomunicativas, são dinâmicos e sofrem variações na sua constituição, que, em muitas ocasiões, resultam em outros gêneros, novos gêneros. Basta pensarmos, por exemplo, no e-mail ou no blog, práticas sociais e comunicativas decorrentes das variações (“transmutações”) da carta e do diário, respectivamente, propiciadas pelas recentes invenções tecnológicas.

Dessa forma, para que exerçamos bem o nosso papel de tradutores faz-se necessário

que conheçamos as particularidades do gênero textual a ser traduzido, bem como o contexto

sociocomunicativo em que está inserido. Em nosso caso, trabalharemos com o gênero conto.

2.1.1 O gênero textual conto

O “conto”, segundo o dicionário Aurélio (2004), é uma narração falada ou escrita;

narrativa pouco extensa, concisa, e que contém unidade dramática, concentrando-se a ação

num único ponto de interesse. Massaud Moisés (1997), teórico da Literatura, afirma que o

gênero conto remonta aos tempos bíblicos, sendo o relato do conflito entre Caim e Abel um

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bom exemplo. Conforme o autor, em língua portuguesa, o conto aparece em 1575, com

narrativas de Gonçalo Fernandes Trancoso, as popularíssimas Histórias de Trancoso, que,

publicadas têm o título de Contos e Histórias de Proveito e Exemplo.

Segundo Alfredo Bosi (1974), outro estudioso da Teoria Literária, o conto cumpre a

seu modo o destino da ficção contemporânea. Posto entre as exigências da narração realista,

os apelos da fantasia e as seduções do jogo verbal, ele tem assumido formas de surpreendente

variedade.

Julio Cortázar (2006, p. 151), brilhante escritor argentino, compara o conto à

fotografia. Cortázar afirma que o conto descreve fragmentos precisos da realidade:

[...] o fotógrafo ou o contista sentem necessidade de escolher e limitar uma imagem ou um acontecimento que sejam significativos, que não só valham por si mesmos, mas também sejam capazes de atuar no espectador ou no leitor como uma espécie de abertura, de fermento que projete a inteligência e a sensibilidade em direção a algo que vai muito além do argumento visual ou literário contido na foto ou no conto. (p.. 151-152)

Como podemos notar, o gênero conto caracteriza-se por sua brevidade. O conto possui

a peculiaridade de expressar de forma concisa a complexidade da vida humana. Pelo fato de

vivermos em uma sociedade marcada pela pressa, pela velocidade na transmissão e busca de

informações, as narrativas breves geram interesse e vêm alcançando um destaque cada vez

maior no cenário da literatura e da tradução modernas. No campo da tradução literária o conto

é um dos gêneros textuais mais traduzidos e valorizados.

Vejamos o que Gabriel García Marquez (1992) afirma, no prólogo de Doce cuentos

Peregrinos, sobre o gênero conto:

O esforço de escrever um conto curto é tão intenso como o de começar um romance. Pois no primeiro parágrafo de um romance é preciso definir tudo: estrutura, tom, estilo, longitude, e às vezes até o caráter de algum personagem. O resto é o prazer de escrever, o mais íntimo e solitário que se possa imaginar, e se a gente não fica corrigindo o livro pelo resto da vida é porque o mesmo rigor de ferro que faz falta para começá–lo se impõe na hora de terminá–lo. O conto, por sua vez, não tem princípio nem fim: anda ou desanda. 1

Observa-se que o gênero conto é marcado por sua concisão, em termos de extensão,

mas apesar de curto não podemos considerá-lo como um texto simples. O próprio García

Márquez asseverou que a produção de um conto exige bastante esforço. Logo, a tradução

desse gênero deve ser interpretada como algo complexo, que requer estudo e preparo. O 1 El esfuerzo de escribir un cuento corto es tan intenso como empezar una novela. Pues en el primer párrafo de una novela hay que definir todo: estructura, tono, estilo, ritmo, longitud, y a veces hasta el carácter de algún personaje. Lo demás es el placer de escribir, el más íntimo y solitario que pueda imaginarse, y si uno no se queda corrigiendo el libro por el resto de la vida es porque el mismo rigor de hierro que hace falta para empezarlo se impone para terminarlo. El cuento, en cambio, no tiene principio ni fin: fragua o no fragua. (Tradução nossa)

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tradutor, assim como o autor do texto, é também um criador e deve empenhar-se ao máximo

para que sua tradução não desande.

Antes de iniciarmos com o exame da tradução do conto de García Márquez é

fundamental que compreendamos alguns conceitos sobre tradução.

2.2 A tradução e suas definições

Existem inúmeras definições de tradução. Uma delas é a proposta por Bordenave

(1987), que afirma que a tradução é uma atividade humana realizada através de estratégias

mentais empregadas na tarefa de transferir significados de um código linguístico para outro.

A tradução, para Newmark (2006, p. 19) “muitas vezes – embora não sempre –, é verter a

outra língua o significado de um texto no sentido pretendido pelo autor. […] A tradução não é

somente um mero transmissor de cultura, mas também um transmissor da verdade, uma força

de progresso”. 2

Segundo Nida e Taber (1969), traduzir significa encontrar o equivalente mais próximo

e mais natural, enquanto que para Catford (1965), traduzir consiste em substituir material

textual de uma língua (língua original) por material equivalente em outra língua (língua da

tradução).

Georges Mounin (1975, p. 22), em sua obra Os problemas teóricos da tradução,

define a tradução como uma operação linguística “pois comporta, basicamente, uma série de

análises e de operações especificamente dependentes da língua e susceptíveis de serem mais e

melhor esclarecidas pela ciência linguística aplicada corretamente do que por qualquer

empirismo artesanal.”

O processo tradutório é realmente uma importante operação linguística que se realiza

de forma contínua em nosso cotidiano. Octavio Paz (1990, p. 09), renomado tradutor e

diplomata mexicano, nos demonstra que a tradução é um fenômeno que também acontece de

forma bastante natural:

[...] aprender a falar é aprender a traduzir: quando uma criança pergunta a sua mãe o significado desta ou daquela palavra, o que realmente pede é que traduza para a sua linguagem a palavra desconhecida. A tradução dentro de uma língua não é, nesse sentido, essencialmente diferente da tradução entre duas línguas, e a história de todos os povos repete a experiência infantil.

2 […] es verter a otra lengua el significado de un texto en el sentido pretendido por el autor. […] la traducción no es sólo un mero transmisor de cultura, sino también un transmisor de la verdad, una fuerza de progreso”. (Tradução nossa)

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A tradução está entre nós há milênios, ela se faz mais presente em nossa vida do que

imaginamos. Segundo Barbosa (2004), “no mundo de hoje, na aldeia global forjada pelos

meios de comunicação de massa, a tradução se torna corriqueira, cotidiana e fundamental nos

mais variados campos do conhecimento e das atividades do homem”. Ela é uma necessidade

de nossa geração e cumpre diversos papéis sociais, como bem ilustrou Else Vieira (1996, p.

146):

Dentre os seus papéis, a tradução preenche uma necessidade, pois o público terá acesso ao texto; permite a expansão de uma língua; confere autoridade a uma língua; introduz novos recursos na literatura receptora; pode constituir uma ameaça à identidade de uma cultura; pode ser usada como meio de subversão de autoridade; pode exercer um papel importante na luta entre ideologias rivais ou poéticas rivais; pode conferir uma certa imunidade na medida em que os ataques à poética dominante podem passar como traduções; pode conferir a autoridade inerente a uma língua de autoridade a um texto originalmente escrito em outra língua que não a tem; por um efeito cumulativo, a tradução estabelece um cânone translinguístico e transcultural.

Como podemos notar, a tradução é uma atividade muito importante e que deve ser

realizada com muita responsabilidade. Entendemos a tradução como um procedimento

complexo, que requer conhecimento linguístico, textual e histórico-cultural. É um trabalho

que demanda dedicação, uma ciência que exige estudo e uma arte que deve ser valorizada.

Os estudos de tradução são marcados por algumas áreas de tensão. Dentre elas

podemos mencionar o modelo de Newmark (1995) que apresenta a oposição entre a tradução

semântica e a tradução comunicativa; o modelo de Nida (1964) que se detém na divergência

entre a “equivalência formal” e a “equivalência dinâmica”; e o modelo de Catford (1965) que

está associado ao conflito entre a tradução livre, a literal e a palavra-por-palavra.

Conforme Peter Newmark (1995, p.70), o problema central originário do traduzir é a

questão da escolha entre uma tradução livre ou literal. Desta forma, para facilitar o trabalho

do tradutor, o autor distingue dois métodos de tradução: a tradução semântica e a tradução

comunicativa.

A tradução semântica é aquela em que o foco recai sobre a Língua Original, o autor

original e seu público. É considerada uma tradução literal e fiel. Já a tradução comunicativa se

caracteriza por sua ênfase na Língua de Tradução e no leitor. Ela trata de reproduzir o

significado exato do original, de tal forma que tanto o conteúdo como a linguagem resultem

facilmente aceitáveis e compreensíveis para os leitores. A tradução comunicativa é livre e

idiomática.

Em nosso trabalho, em alguns momentos do processo tradutório, demos preferência à

tradução comunicativa e em outros utilizamos a tradução semântica. Podemos afirmar que, de

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maneira geral, a maioria dos textos requer uma tradução mais livre e idiomática que uma

tradução fiel, por seu caráter menos rígido e por sua preocupação com o leitor da Língua de

Tradução. No entanto, cabe ressaltar que, em tradução, não existe método certo ou errado, e

sim, método adequado a um determinado contexto. Podemos escolher o método adequado a

partir do momento em que compreendemos o texto e sua função social, o contexto em que

está inserido, o público a que se destina, entre outros fatores.

O modelo de Eugene Nida apresenta a tensão entre a “equivalência formal” e a

“equivalência dinâmica”. Segundo Nida (1964, apud. BARBOSA, 1990, p.34):

A equivalência formal é centrada no conteúdo e na forma do texto original. Neste tipo de tradução, a preocupação está em manter a correspondência estilística, a correspondência de frase para frase e de conceito para conceito entre texto na língua original e texto na língua da tradução. Encarada com esta orientação formal, a tradução precisa gerar um texto na língua traduzida que corresponda o mais possível aos diversos elementos linguísticos e extralinguísticos contidos no texto da língua da tradução. Já a equivalência dinâmica tem como meta atingir uma total naturalidade na expressão do texto original na língua da tradução e tenta transpor o texto na língua original para a língua traduzida de tal modo que o leitor encontre no texto da língua traduzida modos de comportamento e outros elementos extralinguísticos relevantes em sua própria cultura; não insiste que ele compreenda padrões culturais do contexto da língua original a fim de poder compreender a mensagem.

Catford (1965, apud BARBOSA, 1990, p.38-39) explana a divergência entre a

tradução livre, a palavra-por-palavra e a literal:

A tradução livre é não limitada, total; a tradução palavra-por-palavra é limitada à ordem da palavra, é aquela em que se procura encontrar equivalentes da língua original na língua traduzida na ordem (plano) da palavra; e a tradução literal situa-se a meio termo entre as duas, pois, parte de uma tradução palavra-por-palavra, mas efetua alterações necessárias, de acordo com as normas de uso da língua da tradução, fazendo com que possa ser uma tradução efetuada na ordem do grupo ou mesmo da oração.

Observamos que existem diferentes modelos ou métodos de tradução, cada um com

suas peculiaridades e relevância. Tais modelos devem ser empregados de forma conveniente,

de maneira que a tradução, de fato, atinja o seu objetivo. Vale ressaltar a regra de ouro

proposta por Valentín García Yebra (1994, p. 344): “a regra de ouro para toda tradução é, a

meu ver, dizer tudo o que diz o original, não dizer nada que o original não diga, e dizer tudo

com a correção e naturalidade que permita a língua a que se traduz.” 3

3 “la regla de oro para toda traducción es, a mi juicio, decir todo lo que dice el original, no decir nada que el original no diga, y decirlo todo con la corrección y naturalidad que permita la lengua a la que se traduce” (Tradução nossa)

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2.2.1 A tradução e o bom leitor É inegável que a tradução é uma atividade humana, uma operação linguística de

extrema importância em nossa sociedade. Embora muitos considerem o ato de traduzir como

algo simples, traduzir é uma tarefa bastante complexa e que requer uma série de habilidades.

Uma das principais habilidades do bom tradutor é ser, antes de tudo, um bom leitor. Vejamos

o que afirma García Yebra (1984, p.31) sobre a diferença existente entre o leitor comum e o

leitor tradutor:

[...] Mas há uma diferença notável entre o leitor comum e o leitor-tradutor. O leitor, enquanto tal, chega ao término de sua viagem quando captou o conteúdo do texto. O que lê como tradutor, ao contrário, tem desde o começo a intenção de não deter-se nessa meta: pensa empreender posteriormente o caminho inverso, na mesma direção seguida pelo autor, só que por outro terreno: este caminho irá desde o conteúdo do texto original até os signos linguísticos capazes de expressá-lo, mas na língua de chegada, que costuma ser a própria língua do tradutor, a da comunidade linguística a que pertence.4

A habilidade de compreender um texto em sua totalidade e ser capaz de interpretar

seus signos linguísticos ao ponto de expressá-los através de outros signos é própria do leitor

tradutor. De acordo com Roman Jakobson (1971, p. 64-65), em Aspectos linguísticos da

tradução, distinguimos três maneiras de interpretar um signo verbal. Ele pode ser traduzido

em outros signos da mesma língua, em outra língua, ou em outro sistema de símbolos não-

verbais. Essas três espécies de tradução devem ser diferentemente classificadas:

1. A tradução intralingual ou reformulação (rewording) consiste na interpretação dos signos verbais por meio de outros signos da mesma língua. Ocorre quando é utilizada a paráfrase, a sinonímia ou o circunlóquio; 2. A tradução interlingual ou tradução propriamente dita ‘consiste na interpretação dos signos verbais por meio de alguma outra língua. Quando traduzimos do inglês para o português, por exemplo; 3. A tradução intersemiótica ou transmutação consiste na interpretação dos signos verbais por meio de sistemas de signos não-verbais. Por exemplo, da arte verbal para a música, dança, cinema ou pintura.

Reconhecer e entender os tipos de tradução propostos por Jakobson é essencial, pois

traduzimos não só o que está em outro idioma, traduzimos também em nossa própria língua,

traduzimos uma ideia, uma imagem. Traduzir é interpretar. Vimos anteriormente que todo

4 [...] Pero hay una diferencia notable entre el lector común y el lector-traductor. El lector, en cuanto tal, llega al término de su viaje cuando ha captado el contenido del texto. El que lee como traductor, en cambio, tiene desde el comienzo la intención de no detenerse en esa meta: piensa emprender a continuación el camino inverso, en la misma dirección seguida por el autor, sólo que por otro terreno: este camino irá desde el contenido del texto original hasta los signos lingüísticos capaces de expresarlo, pero en la lengua terminal, que suele ser la lengua propia del traductor, la de la comunidad lingüística a la que pertenece. (Tradução nossa)

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bom tradutor é um bom leitor e, desse modo, tem a capacidade de realizar os procedimentos

técnicos de tradução de forma adequada e obter, assim, uma boa tradução.

García Yebra (1984, p.30) assevera que o processo de tradução consta sempre de duas

fases: a fase de compreensão do texto original e a fase de expressão de sua mensagem, de seu

conteúdo, na língua receptora ou terminal:

1. Na fase da compreensão do texto original, o tradutor desenvolve uma atividade semasiológica (termo derivado do grego, que significa «relativo ao sentido, ao significado», sema). Ou seja, nesta fase, o tradutor busca o conteúdo, o sentido do texto original. 2. Na fase da expressão, a atividade do tradutor é «onomasiológica» (outro termo derivado do grego, que quer dizer «relativo ao nome», ónoma). O tradutor busca agora na língua de chegada as palavras, as expressões para reproduzir nesta língua o conteúdo do texto original.5

Essas duas etapas descritas por Yebra asseguram uma tradução de qualidade, uma vez

que a atividade tradutória se inicia através da recepção e compreensão de um determinado

código linguístico e se concretiza por meio de uma fase reprodutora, em que com os

elementos da língua receptora ou terminal, se constrói um novo texto e se expressa ou

transfere a mensagem ou conteúdo do texto original.

Em nosso trabalho com o conto El avión de la bella durmiente, tivemos o cuidado de

realizar uma tradução intralingual e interlingual, bem como passar pelas fases de

compreensão e expressão da mensagem ou texto. Realizamos esses procedimentos sempre

lembrando das palavras de Yebra (1983) quando afirma que o tradutor deve levar em conta

que a língua tem seu próprio gênio. Cada uma se caracteriza por certos traços, certas

qualidades, seja na formação de palavras, seja na ordem dos elementos na frase, seja na

maneira de encadear as orações, seja nas particularidades dos diversos gêneros literários, nas

formas estilísticas e aspectos culturais. O tradutor deve respeitar o gênio da língua da

tradução, assim como o autor deve respeitar o da língua original.

2.3 Estratégias de tradução

O trabalho com o gênero textual conto, assim como qualquer outro gênero literário,

requer de seu tradutor o entendimento que diferentes aspectos devem ser levados em conta na

5 1. En la fase de la comprensión del texto original, el traductor desarrolla una actividad semasiológica (término derivado del griego, que significa «relativo al sentido, al significado», séma). Es decir, en esta fase, el traductor busca el contenido, el sentido del texto original. 2. En la fase de la expresión, la actividad del traductor es «onomasiológica» (otro término derivado del griego, que quiere decir «relativo al nombre», ónoma). El traductor busca ahora en la lengua terminal las palabras, las expresiones para reproducir en esta lengua el contenido del texto original.(Tradução nossa)

18

tradução de um texto. Não é apenas o sistema gramatical que deve ser valorizado, todos os

sistemas ou aspectos (culturais, estruturais, textuais, fonológicos, etc.) devem ser igualmente

estimados durante o processo tradutório. Vejamos o que Susan Bassnett (2005, p. 102)

assevera sobre o texto literário:

A incapacidade de muitos tradutores de entender que um texto literário é composto de uma série complexa de sistemas existentes em uma relação dialética com outras séries fora de seus limites tem frequentemente levado à ênfase em aspectos particulares de um texto em detrimento de outros.

Assim sendo, todo tradutor deve analisar os diferentes aspectos de um texto de forma

igualitária, para posteriormente deter-se a um aspecto em particular. Se traduzimos uma

poesia, por exemplo, primeiramente, analisamos todo o texto, seu léxico, sintaxe, aspectos

fonológicos, estrutura, aspectos culturais, etc. Em seguida, nos dedicaremos ao sistema ou

aspecto que mais se destaca no texto trabalhado. Na poesia, geralmente, o que se destaca são

aspectos sonoros, como a rima, além do trabalho com o vocabulário (que, juntos, são aspectos

estilísticos).

Para traduzir textos literários é importante, entre outras coisas, conhecer suas

características e o tema de que trata o original. Para isso, resulta imprescindível que o tradutor

disponha de um preparo suficiente para resolver problemas de ordem lexical, semântica e

sintática que possam surgir no texto a ser traduzido. Segundo o dicionário da Real Academia

Española (RAE):

1. Problemas lexicais: São concernentes ao vocabulário, conjunto das palavras de um idioma, ou das que pertencem ao uso de uma região, a una atividade determinada, a um campo semântico dado. 2. Problemas semânticos: Referem-se à significação das palavras. Relativos ao estudo do significado dos signos linguísticos e de suas combinações, desde um ponto de vista sincrônico ou diacrônico. 3. Problemas sintáticos: São pertencentes ou relativos à sintaxe, parte da gramática que ensina a coordenar e unir as palavras para formar as orações e expressar conceitos.6

Para atuar de forma satisfatória o tradutor deve ser capaz de solucionar os diferentes

problemas supracitados e realizar as escolhas pertinentes. Ele não somente deve saber que há

uma lista inesgotável de ferramentas, mas também como e quando usá-las, já que traduzir

consiste também em utilizar a ferramenta certa para encontrar a palavra adequada. Em outras

6 1. Problemas lexicales: Concernientes al vocabulario, conjunto de las palabras de un idioma, o de las que pertenecen al uso de una región, a una actividad determinada, a un campo semántico dado. 2. Problemas semánticos: Se refieren a la significación de las palabras. Relativos al estudio del significado de los signos lingüísticos y de sus combinaciones, desde un punto de vista sincrónico o diacrónico. 3. Problemas sintácticos: Pertenecientes o relativos a la sintaxis, parte de la gramática que enseña a coordinar y unir las palabras para formar las oraciones y expresar conceptos. (Tradução nossa)

19

palavras, para obter traduções de qualidade que atendam às expectativas de um público-alvo é

necessário saber manejar as fontes especializadas de informação adequadas para a tradução

deste texto em particular.

Peter Newmark (1995, p. 117-129) nos apresenta uma série de importantes

procedimentos de tradução, os quais podem ser visualizados no quadro abaixo:7

NOME DEFINIÇÃO EXEMPLOS TRANSFERÊNCIA A transferência (emprunt, préstamo,

trascripción) é o processo de transferir uma palavra da língua original ao texto da língua traduzida à medida que se utiliza como procedimento translatório.

Pizza, sándwich, tour, caché, perestoika, glasnost, saudade, cappuccino…

NATURALIZA ÇÃO

Procedimento que segue logicamente a transferência e consiste em adaptar uma palavra da língua original à pronúncia e morfologia normais da língua da tradução, e, além disso, nessa ordem.

“Majorismo”, “líder”, ”chequeo”, “Edimburgo”, “cheque”, “estrés”,“gol”.

EQUIVALENTE CULTURAL

É a tradução aproximada de um termo cultural da língua original por outro termo cultural da língua da tradução.

Cricket ou baseball geram “el fútbol” em espanhol, ou le cyclisme em francês, e tea-break, “la hora del café”; He met her in the pub: “La encontró en el bar”

TRADUÇÃO DIRETA ou through translation

Tradução literal de colocações correntes, de nomes de organizações, dos componentes de palavras compostas e talvez de locuções.

Supermarket => Supermercado Conscientious objector => Objetor de consciencia =>” OTAN”: NATO (ing.), OTAN (fr.), etc.

TRANSPOSICÕES ou shifts

Procedimento de tradução que implica uma mudança na gramática ao passar um texto da língua original à língua da tradução.

“La casa blanca”: the white house "Furniture” => muebles “Advice” => consejos

MODULAÇÃO Tipo de variação feita mediante uma mudança de ponto de vista, de perspectiva e, muitas vezes de categoria de pensamento.

Don’t delay => Date prisa No tiene nada de tonto => He’s extremely intelligent

TRADUÇÃO RECONHECIDA

Consiste em recorrer a uma tradução já comumente aceita de um termo, embora às vezes não se ajuste a seu verdadeiro significado.

Intelligence Service => Servicio de Inteligencia del Ejército (quando deveria ser Servicio de Información Militar) Ciencia-ficción = > (quando deveria ser ficción científica o fantasía científica).

7 Adaptação do texto de Peter Newmark 1995. (Tradução nossa)

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REDUÇÃO E EXPANSÃO

Processos bastante imprecisos que, a vezes, se executam intuitivamente.

Computer science => Informática Science linguistique=> linguística Life-giving =>Vivificante

SINONÍMIA Serve para descrever um procedimento que consiste em adotar um equivalente próximo na língua de tradução para uma palavra da língua original dentro de um contexto, exista ou não um equivalente exato.

kind person: “persona amable”, “akward: “difícil”.

Quadro 1

As estratégias propostas por Peter Newmark desempenham um papel de grande

relevância durante o ato tradutório. Elas nos auxiliam na obtenção de um melhor resultado,

uma vez que asseguram a permanência no texto traduzido de todos os elementos textuais,

contextuais, culturais, estilísticos e expressivos que compõem o texto fonte.

O processo de tradução é marcado por uma reflexão constante, em que selecionamos

os termos mais pertinentes, para que evitemos problemas posteriores. Em nosso trabalho, por

termos trabalhado com um texto curto, sem gírias, termos científicos e regionalismos,

utilizamos principalmente as estratégias de sinonímia, tradução reconhecida, modulação e

transposição.

21

3. METODOLOGIA

Este trabalho é resultado de uma pesquisa descritiva, de natureza qualitativa, em que

analisamos, de forma pormenorizada, as técnicas utilizadas na tradução do conto “El avión de

la bella durmiente” e tomamos como parâmetros de investigação as teorias de Peter Newmark

(1995).

3.1 Tipo de pesquisa adotado

Realizamos uma pesquisa descritiva que, segundo Prodanov e Freitas (2009, p.63), “é

aquela em que o pesquisador apenas registra e descreve os fatos observados sem interferir

neles”. Neste trabalho tivemos o cuidado de apresentar os problemas encontrados na tradução

do conto de Gabriel García Márquez e, através de estratégias propostas por Peter Newmark,

utilizar as escolhas adequadas. Registramos os procedimentos e descrevemos algumas teorias

de importantes teóricos da tradução.

A abordagem empregada foi a qualitativa, que é assim definida por Prodanov e Freitas

(2009, p. 81):

Na abordagem qualitativa, a pesquisa tem o ambiente como fonte direta de dados. O pesquisador mantém contato direto como ambiente e o objeto de estudo em questão, necessitando um trabalho mais intensivo de campo. Nesse caso, as questões são estudadas no ambiente em que elas se apresentam sem qualquer manipulação intencional do pesquisador.

Mantivemos contato direto com o conto El avión de la bella durmiente, nosso objeto

de estudo, que passou por leituras e releituras, uma análise minuciosa que resultou em uma

tradução de boa qualidade, tendo em vista as técnicas empregadas.

3.2 O autor do conto

Gabriel García Márquez, famoso e importante escritor, jornalista, editor e militante

político colombiano, apelidado carinhosamente de Gabito, nasceu em Aracataca, Colômbia,

no dia 6 de março de 1927. Filho de Eligio García e Luiza Santiaga Márquez.

Qualificado como o artista popular do século XX, García Marquez não somente é o

escritor em língua espanhola que goza de mais prestigio no mundo, como também é o mais

lido. Estas duas circunstâncias foram possíveis graças a seus extraordinários dotes narrativos.

22

Desde seu primeiro conto La tercera resignación publicado em 1947 e escrito quando

tinha vinte anos, até os últimos reunidos em Doce cuentos peregrinos, publicados em 1992,

transcorreram quarenta e cinco anos nos quais García Márquez demonstra ser mestre desse

gênero textual, por sua habilidade tanto no manejo da trama como em sua capacidade de

converter o absurdo e o insólito em atos cotidianos.

A primeira edição de Doce Cuentos Peregrinos foi editada em 1992. O livro inclui os

seguintes contos: «Buen viaje, señor Presidente» (1979), «La santa» (1981), «El avión de la

bella durmiente» (1982), «Me alquilo para soñar» (1980), «Solo vine a hablar por teléfono»

(1991), «Espantos de agosto» (1980), «María dos Prazeres» (1989), «Diecisiete ingleses

envenenados» (1980), «Tramontana» (1982), «El verano feliz de la señora Forbes» (1981),

«La luz es como el agua» (1978) e «El rastro de tu sangre en la nieve» (1981).

A obra nos situa em uma Europa convertida em um cenário mítico muito diferente ao

continente americano, mostrando o absurdo que supõe a vida no cosmo europeu através das

desventuras dos latino-americanos na Europa, perseguidos pela incompreensão, a solidão ou a

morte. A fantasia mostrada com naturalidade e a precisão e riqueza de detalhes convertem

cada história em uma falsa crônica totalmente convincente. A partir desta credibilidade na

abordagem, García Márquez consegue enfatizar o drama que o desenlace de seus textos

apresenta.

3.2.1 A produção literária de García Márquez

Sua primeira obra ficcional é La Hojarasca, lançada em 1955; depois é publicada a

ficção El coronel no tiene quien le escriba, de 1961, seguida pelo seu livro mais célebre, Cien

Años de Soledad, publicado em 1967.

Sua criação Relato de un náufrago, embora anterior aos livros já citados, foi publicada

inicialmente no jornal “El Espectador”, sendo editada na forma de livro bem depois, sem o

conhecimento do próprio autor. Outras de suas publicações são Crónica de Una Muerte

Anunciada e El Amor en los Tiempos del Cólera, entre várias obras de ficção e de não ficção.

Seu clássico literário Cien Años de Soledad é respeitado pela crítica como um marco da

literatura da América Latina, pioneiro em um estilo que seria conhecido como Realismo

Mágico. Em 1982 ele conquista o Prêmio Nobel pelo conjunto de sua obra.

Em 2002, Gabriel García Márquez lança Vivir para Contarla, autobiografia na qual

ele envereda após descobrir que está com um câncer linfático, o qual vem tratando na Ilha de

Cuba. Em 2004 publica Memorias de mis putas tristes, obra em que o autor narra, em

primeira pessoa, a história de um ancião e sua paixão por uma adolescente.

23

3.3 Constituição do corpus

O conto em questão foi selecionado da obra Doce cuentos peregrinos, de Gabriel

García Márquez (1992).

Escolhemos esse conto por ser um texto de enredo interessante, em que pudemos

explorar aspectos lexicais, semânticos e sintáticos de maneira muito eficiente.

No prólogo da obra supracitada o autor esclarece:

Os doze contos deste livro foram escritos no curso dos últimos dezoito anos. Antes de sua forma atual, cinco deles foram crônicas de jornal e roteiros de cinema, e um foi série de televisão. Outro contei, há quinze anos, em uma entrevista gravada, e o amigo a quem contei o transcreveu e publicou, e agora tornei a escrevê–lo a partir dessa versão. Foi uma rara experiência criativa que merece ser explicada, nem que seja para as crianças que querem ser escritores quando forem grandes saberem desde agora como é insaciável e abrasivo o vício de escrever.8

Doce cuentos peregrinos apresenta um tema central: histórias que partem do cotidiano

ao extraordinário, de personagens de origem estrangeira ambientadas em continente europeu.

Cada história é protagonizada por indivíduos latino-americanos, com o resultado imprevisível

que se deriva do confronto entre culturas eternamente paralelas e diversas.

No conto em questão, é descrita a experiência e a inquietação de um sujeito que viaja

em um avião de Paris a Nova York sentado junto à mulher mais bela que havia visto em sua

vida, a qual dormiu sem despertar-se um só momento durante as oito horas e doze minutos

que durou o voo. Nessa viagem o narrador contempla a formosa passageira, da cabeça aos

pés, durante várias horas e realiza um jantar solitário dizendo a si mesmo tudo o que teria dito

a ela se estivesse acordada.

Um dos motivos para a escolha desse conto se deu pelo fato da nova roupagem dada à

personagem Bela Adormecida resultando numa intertextualidade que agrega a realidade dos

valores atuais a um elemento do imaginário infantil. Além disso, trata-se de um texto

interessante e bastante rico em elementos lexicais, semânticos e sintáticos, em que as diversas

estratégias tradutórias puderam ser bem executadas.

8 Los doce cuentos de este libro fueron escritos en el curso de los últimos dieciocho años. Antes de su forma actual, cinco de ellos fueron notas periodísticas y guiones de cine, y uno fue un serial de televisión. Otro lo conté hace quince años en una entrevista grabada, y el amigo a quien se lo conté lo transcribió y lo publicó, y ahora lo he vuelto a escribir a partir de esa versión. Ha sido una rara experiencia creativa que merece ser explicada, aunque sea para que los niños que quieren ser escritores cuando sean grandes sepan desde ahora qué insaciable y abrasivo es el vicio de escribir. (Tradução nossa)

24

3.4 Instrumentos utilizados

É inegável afirmar que a primeira e mais importante estratégia de tradução que

realizamos foi a leitura eficaz do texto original. Newmark (1995, p. 27) enfatiza que:

Entender o texto requer duas leituras, uma geral e outra detalhada e profunda. A primeira serviria para compreender o original. Aqui terão que consultar enciclopédias, manuais ou artigos de pesquisa para poder captar o tema e os conceitos, tendo sempre em conta que para o tradutor o primeiro vem a função e logo a descrição.9

Com relação aos recursos utilizados na realização da tradução fizemos uso de

dicionários monolíngues, bilíngues e visuais de língua espanhola, dicionários de língua

portuguesa, bem como, os recursos da internet, como o site da Real Academia Española, o

site de busca Google, a enciclopédia virtual Wikipédia e os fóruns de pesquisa do site

wordreference.

Segundo Krieger (2006), em determinados textos, grande parte dos termos são

unidades poliléxicas, também chamadas de sintagmas terminológicos, o que dificulta o

trabalho dos tradutores que passam a atuar como verdadeiros “pesquisadores – exploradores”

das linguagens especializadas.

Dessa forma, percebe-se a dificuldade em reproduzir na totalidade, sem lacunas

linguísticas, o que foi expresso na língua fonte. Essa tradução eficiente e natural foi proposta

por Nida e Taber (1969, apud MOJOLA & WENDLAND, 2003, p.07), os quais diziam:

“traduzir consiste em reproduzir com o máximo de naturalidade o equivalente mais próximo à

mensagem da língua-fonte, primeiramente em termos de significado e, depois, em termos de

estilo”.

3.5 Tratamento dos dados

Os métodos de tradução propostos por Peter Newmark (1995) foram essenciais para a

execução da tradução do conto de Gabriel García Márquez. O conhecimento de tais técnicas

nos proporcionou maior autonomia durante a realização do trabalho, pois sabíamos que os

procedimentos empregados tinham fundamentação teórica baseada em estudos linguísticos e

socioculturais.

9 Entender el texto requiere dos lecturas, una general y otra detallada y profunda. La primera serviría para comprender el original. Aquí tendrán que consultar enciclopedias, manuales o artículos de investigación para poder captar el tema y los conceptos, teniendo en cuenta siempre que para el traductor lo primero es la función y luego la descripción. (Tradução nossa)

25

Além do conhecimento e aplicação de tais estratégias, para que nossa tradução fosse

satisfatória, o conto El avión de la bella durmiente passou pelos quatro níveis de tradução

propostos por Peter Newmark (1995): o nível textual, o nível de referência, o nível coesivo e o

nível da naturalidade. No nível textual analisamos o texto em si, suas unidades mínimas de

tradução, palavras e orações. O nível textual é o nível linguístico. Quando trabalhamos o nível

do texto convertemos a gramática da língua original nos equivalentes “disponíveis” na língua

traduzida, e traduzimos as unidades léxicas pelo sentido que nos parece mais apropriado

dentro do contexto da oração.

O nível de referência se entende como o contexto em que está inserido o texto. Este

nível serve de suporte para esclarecer as dúvidas e os problemas que surjam no nível textual e,

para isso, é necessário que façamos as seguintes perguntas sobre o texto: de que trata? Onde?

Como? Quando? Por quê?

O nível coesivo compreende as relações e conexões estabelecidas no interior do texto,

através de seus conectivos. Neste nível também se compreende o modo como o texto está

organizado.

O nível da naturalidade implica que o produto da tradução reúna as características que

o texto fonte possua, em outras palavras, que seja escrito de acordo com o estilo da área, com

uma linguagem própria do tema que se trate e com o nível de formalidade correspondente,

utilize o sistema linguístico da língua de chegada e que não retenha indícios de ter sido escrito

em outra língua.

No próximo capítulo passaremos a apreciação do processo tradutório do conto El

avión de la bella durmiente.

26

4. ANÁLISE DO CONTO - AS DIFICULDADES DA TRADUÇÃO

Neste capítulo faremos uma exposição das principais dificuldades encontradas no

processo de tradução do conto “El avión de la bella durmiente”, do escritor colombiano

Gabriel García Marquez, bem como, apresentaremos e defenderemos nossas escolhas,

baseados nos estudos de alguns dos principais teóricos da tradução.

Na realização da tradução de tal conto, primeiramente, executamos a leitura do texto

fonte como um todo e observamos que não se tratava de um texto complexo ou de difícil

compreensão. Deparamo-nos com um texto de fácil entendimento, bastante simples, com

praticamente a ausência de expressões idiomáticas, regionalismos ou figuras linguagem.

No entanto, ainda assim tivemos algumas dificuldades durante a feitura da tradução do

conto de García Márquez, dificuldades estas que nos levaram a recorrer a alguns estudiosos da

tradução como: Peter Newmark (1995), John Catford (1965), Engene Nida (1964) e García

Yebra (1983). Na busca de uma tradução de boa qualidade nos pautamos em algumas de suas

teorias com objetivo de alcançar as escolhas corretas. Buscamos no decorrer do processo

tradutório focalizar o texto alvo pois, naturalmente, a tradução é determinada pelo propósito a

que ela servirá. Contudo, Tentamos não prejudicar o texto fonte. Passamos também pelo

processo de tradução intralingual.

As dificuldades encontradas serão divididas em: 1. Dificuldades de ordem lexical, 2.

Dificuldades de ordem semântica e 3. Dificuldades de ordem sintática. Apresentaremos as

estratégias adotadas em cada dificuldade, assim como mencionaremos os níveis de tradução

que tiveram maior enfoque.

1. Dificuldades de ordem lexical

Como vimos no capítulo 2 deste trabalho, os problemas lexicais são aqueles que estão

relacionados ao vocabulário do texto a ser traduzido. Apresentaremos, nos quadros abaixo,

alguns fragmentos do conto de García Márquez e nossa tradução. Teceremos alguns

comentários sobre as dificuldades, estratégias e níveis de tradução empregados, bem como

outras possibilidades de tradução.

Texto Original Texto Traduzido

Estaba vestida con un gusto sutil: chaqueta de lince, blusa de seda natural con flores muy tenues, pantalones de lino crudo, y unos zapatos lineales del color de las bugambilias. (Ver anexos, p. 53, linhas 6-8)

Estava vestida de maneira sutil: jaqueta de lince, blusa de seda natural com flores muito tênues, calças de linho cru, e umas sapatilhas da cor das buganvílias.

Quadro 2

27

Poderíamos ter utilizado em vez de tênues a palavra delicadas, mas preferimos adotar

o termo original para que o texto permanecesse com um tom culto e clássico. O nível da

naturalidade, sugerido por Newmark (1995), teve grande enfoque nesse fragmento.

Uma tradução mais mecanicista ou literal, seguindo a teoria de Catford (1965) –

teórico que buscou probabilidades de equivalência para fins prescritivos – , traduziria o termo

como sapatos lineares ou sapatos rasos, seria possível o uso desses equivalentes em língua

portuguesa, porém optamos por utilizar sapatilhas, o que facilitaria a compreensão do termo

pelo leitor. Assim, utilizamos a estratégia da tradução reconhecida proposta por Peter

Newmark (1995).

Decidimos utilizar a estratégia de sinonímia para a palavra bugambilias. O uso da

sinonímia foi adequado, pois, do contrário, o leitor perderia uma informação relevante, já que

as flores do gênero bougainvillea são conhecidas em todo o mundo. Segundo o site

Wikipédia:

bugamvilia é um arbusto trepador sul-americano, da família das Nictagináceas, com folhas ovais ou elípticas, brácteas de diversas cores e flores pequenas. Nativas da América do Sul, essas angiospermas recebem vários nomes populares, como primavera, três-marias, sempre-lustrosa, santa-rita, ceboleiro, roseiro, roseta, riso, pataguinha, pau-de-roseira e flor-de-papel.10

A tradução do termo original por um destes nomes populares distanciaria os leitores

do texto de partida. O nível adotado foi também o referencial, já que tivemos a preocupação

de buscar informações sobre os vegetais do gênero bougainvillea.

Texto Original Texto Traduzido

[…] cuando la vi pasar con sus sigilosos trancos de leona, mientras yo hacía la cola para abordar el avión de Nueva York […](Ver anexos, p. 53, linhas 8-10)

[…] quando a vi passar com seus sigilosos passos elegantes, enquanto eu fazia fila para embarcar o avião de Nova York […]

Quadro 3

Aderimos aqui o método comunicativo proposto por Newmark (1995) e, em lugar de

utilizar a expressão literal passos de leoa ou passos largos, empregamos apenas o adjetivo

elegantes, já que o termo quer transmitir a ideia de elegância, charme e imponência que a bela

demonstrava ao caminhar.

O mesmo se deu quando usamos o termo embarcar por se tratar de uma expressão

reconhecida e usual na língua de chegada. Assim, a estratégia da tradução reconhecida e o

10 Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/Bougainvillea> Acesso em: 15 de janeiro de 2013.

28

nível de naturalidade de Peter Newmark, foram empregados. Poderíamos ter utilizado as

expressões subir no avião, entrar no avião de Nova York.

Texto Original Texto Traduzido

Fue una aparición sobrenatural que existió sólo un instante y desapareció en la muchedumbre del vestíbulo. (Ver anexos, p. 53, linhas 10-11)

Foi uma aparição sobrenatural que existiu somente um instante e desapareceu na multidão do saguão.

Quadro 4

Aqui também nos deparamos com um caso de tradução reconhecida. Adotamos uma

tradução comunicativa, como propôs Newmark (1995), e demos ênfase à língua alvo e ao

leitor (nível da naturalidade). Poderíamos ter adotado o termo vestíbulo, mas preferimos

saguão por ser mais usual em língua portuguesa.

Texto Original Texto Traduzido

[…] y había camiones de carga alineados a la orilla, y automóviles humeantes en la nieve. (Ver anexos, p. 53, linhas 13-14)

[…] e havia caminhões de carga alinhados nas margens, e automóveis fumegantes na neve.

Quadro 5

Nesse caso, adotamos a estratégia da sinonímia e o nível textual de Newmark (1995),

uma vez que realizamos uma conversão de forma intuitiva e mecânica. Seria possível explicar

o termo no texto (automóveis lançando fumaça, lançando vapor, fumaçando, etc.), mas dessa

forma estaríamos subestimando o conhecimento do leitor, como se este não fosse capaz de

realizar a tradução intralingual proposta por Jakobson (1971). Assim, preferimos a exatidão

linguística.

Texto Original Texto Traduzido

Yo estaba en la fila de registro detrás de una anciana holandesa que demoró casi una hora […](Ver anexos, p. 53, linhas 16-17)

Eu estava na fila de registro atrás de uma anciã holandesa que demorou quase uma hora[…]

Quadro 6

Aqui também adotamos a estratégia da sinonímia e a o nível textual. Se utilizássemos

o termo velha, a frase soaria de forma depreciativa. Seria possível utilizar idosa ou senhora,

mas optamos pela precisão, para manter os efeitos de sentido pretendidos pelo autor.

29

Texto Original Texto Traduzido

[…] hasta que la empleada me bajó de las nubes con un reproche por mi distracción. (Ver anexos, p. 53, linhas 18-19)

[…] até que a funcionária me fez descer das nuvens com uma crítica por minha distração.

Quadro 7

Na Espanha o termo empleado(a) pode referir-se a um funcionário público ou a um

empregado qualquer, dessa forma tivemos, como nos demais casos, uma preocupação com a

língua alvo, ou seja, a língua portuguesa e seus leitores, conforme enfatizou o teórico Nida

(1964), quando nos apresentou o conceito da equivalência dinâmica, que tem como meta

atingir uma total naturalidade na expressão do texto original. Por isso não utilizamos

empregada, já que no Brasil, costumamos relacionar esse termo à empregada doméstica.

Logo, preferimos utilizar o termo funcionária. Os níveis referencial e de naturalidade foram

aplicados.

Texto Original Texto Traduzido

— Me da lo mismo — le dije con toda intención—, siempre que no sea al lado de las once maletas. (Ver anexos, p. 53, linhas 23-24)

— Tanto faz – lhe disse com toda intenção., desde que não seja ao lado das onze maletas.

Quadro 8

Nesse caso e expressão onze maletas, qualifica a anciã holandesa e provoca o riso no

leitor do texto. Não poderíamos, portanto, substituir onze maletas por anciã holandesa ou

senhora holandesa. Utilizamos o nível textual de Newmark (1995).

Texto Original Texto Traduzido

Sólo entonces me advirtió que el aeropuerto acababa de cerrarse y todos los vuelos estaban diferidos. (Ver anexos, p. 53, linhas 32-33)

Somente então me advertiu que o aeroporto acabava de fechar-se e todos os voos estavam adiados.

Quadro 9

Utilizamos a estratégia da tradução reconhecida e o nível da naturalidade propostos

por Peter Newmark (1995), visto que o adjetivo adiados é mais popular na língua de chegada

do que o adjetivo diferidos.

30

Texto Original Texto Traduzido

Afuera encontré un espectáculo sobrecogedor. (Ver anexos, p. 54, linha 46)

No lado de fora me deparei com um espetáculo impressionante.

Quadro 10

Mais uma vez empregamos a estratégia da tradução reconhecida e o nível da

naturalidade. Aqui seria possível empregar os adjetivos surpreendente, incrível.

Texto Original Texto Traduzido

[…] y aun en las escaleras, tendidas por los suelos con sus animales y sus niños, y sus enseres de viaje. (Ver anexos, p. 54, linhas 47-48)

[…]e inclusive nas escadas, estendidas no chão com seus animais e suas crianças, e seus utensílios de viagem.

Quadro 11

Optamos por utensílios por ser um substantivo usado com maior frequência na língua

portuguesa para referir-se a viagem. Coisas de viagem seria um termo muito vago,

instrumentos de viagem seria muito técnico. Usamos a tradução reconhecida e o nível da

naturalidade.

Texto Original Texto Traduzido

[…] también la bella debía estar en algún lugar en medio de aquellas hordas mansas […] (Ver anexos, p. 54, linhas 50-51)

[…] também a bela devia estar em algum lugar em meio daquelas hordas mansas […]

Quadro 12

Preferimos manter o termo hordas, já que esse substantivo mantém a sofisticação da

linguagem culta presente no texto. O nível tradutório adotado foi o textual. Poderíamos

utilizar os substantivos multidão, tropa.

Texto Original Texto Traduzido

Las colas se hicieron interminables frente a los siete restaurantes, las cafeterías, los bares atestados […](Ver anexos, p. 54, linhas 53-54)

As filas se tornaram intermináveis diante dos sete restaurantes, as cafeterias, os bares abarrotados […]

Quadro 13

Nesse caso seria possível traduzir o termo por lotados, cheios, atestados. Não

adotamos o adjetivo atestados, pois o termo não é usado de forma corriqueira na língua de

chegada. Tampouco optamos por lotados ou cheios, já que nos pareceram termos muito

modernos. Empregamos a estratégia da tradução reconhecida e o nível da naturalidade.

31

Texto Original Texto Traduzido

[…] empezó a levantarse de la muchedumbre un olor de rebaño. (Ver anexos, p. 54, linha 57)

[…] começou a levantar-se da multidão um cheiro de rebanho.

Quadro 14

Ao traduzirmos este fragmento nos lembramos das palavras de García Yebra (1984) ao

afirmar a importância de uma leitura analítica do texto original, passando pelas fases de

compreensão e de expressão para a aquisição de um bom resultado tradutório. Na fase de

compreensão, analisamos a palavra “olor” e nos demos conta de que, em espanhol, ela pode

designar cheiro, mas também odor. Cabe ao tradutor, na fase de expressão, empregar o termo

mais adequado. Optamos por cheiro de rebanho, uma vez que não são todos os que

consideram o cheiro de rebanho como um mau cheiro. Logo, empregamos a estratégia da

tradução reconhecida e os níveis de referência e de naturalidade. Também poderiam ser

utilizados os substantivos odor ou catinga, este último seria considerado bastante regional.

Texto Original Texto Traduzido

Lo único que alcancé a comer en medio de la rebatiña fueron los dos últimos vasos de helado de crema en una tienda infantil. Me los tomé poco a poco en el mostrador, mientras los camareros ponían las sillas sobre las mesas a medida que se desocupaban, y viéndome a mí mismo en el espejo del fondo, con el último vasito de cartón y la última cucharita de cartón, y pensando en la bella. (Ver anexos, p. 54, linhas 58-62)

Tudo o que consegui comer em meio à disputa foram os dois últimos copos de sorvete de creme em uma lanchonete infantil. Tomei-os pouco a pouco no balcão, enquanto os garçons colocavam as cadeiras sobre as mesas à medida que se desocupavam, e vendo-me a mim mesmo no espelho do fundo, com o último copinho de sorvete e a última colherzinha descartável, e pensando na bela.

Quadro 15

Não podemos esquecer do nível de naturalidade sugerido por Peter Newmark (1995).

O nível da naturalidade implica que a tradução reúna as características que o texto fonte

possua e que não retenha indícios de ter sido escrito em outra língua. Assim, optamos pela

aproximação da tradução com o leitor.

Como o termo rebatinha não é usual em língua portuguesa, optamos por disputa.

De forma literal, a palavra tienda seria traduzida por loja, no entanto, o que nos

resultou mais prudente foi adotar a palavra lanchonete.

Seria possível usar o termo mostrador ou mesa, mas balcão foi o elemento mais

apropriado nesse contexto. A palavra cartón em língua portuguesa significa papelão. Todavia,

no Brasil não existem as expressões “tomar sorvete em copinho de papelão” ou “comer algo

com uma colherzinha de papelão”. Dessa forma, utilizamos a estratégia da tradução

32

reconhecida e adotamos os termos copinho de sorvete e colherzinha descartável, visto que são

comumente aceitos.

Texto Original Texto Traduzido

[…]la bella estaba tomando posesión de su espacio con el dominio de los viajeros expertos. (Ver anexos, p. 54, linhas 66-67)

[…]a bela estava tomando posse de seu espaço com o domínio dos viajantes experientes.

Quadro 16

Nesse caso, trabalhamos com um termo heterossemântico, popularmente conhecido

como “falso amigo”. Milani (2006) afirma que heterossemânticos são palavras que possuem

semelhança ortográfica e/ou fonética em português e em espanhol, mas que apresentam

significado diferente nos dois idiomas. Assim, um tradutor pouco experiente poderia traduzir,

erroneamente, “expertos” por espertos. O nível de tradução empregado foi o da naturalidade.

Outras possibilidades de tradução seriam os adjetivos: hábeis, práticos, entendidos.

Texto Original Texto Traduzido

Pues sólo quiso un vaso de agua, y le pidió al sobrecargo […] (Ver anexos, p. 55, linha 72)

Pois só quis um copo de água, e pediu ao comissário […]

Quadro 17

A tradução literal desse termo seria carregador. Todavia, no texto esse profissional

executava inúmeras tarefas, inclusive atendendo aos passageiros que estavam no avião, por

isso optamos por utilizar comissário. O uso da estratégia de tradução reconhecida e dos níveis

referencial e de naturalidade foi essencial.

Texto Original Texto Traduzido

Su voz grave y tibia arrastraba una tristeza oriental […] (Ver anexos, p. 55, linha 74)

Sua voz grave e morna arrastava uma tristeza oriental […]

Quadro 18

Aqui decidimos usar a sinonímia para aproximarmos o leitor ao texto de origem. O

leitor deve construir sentido através do adjetivo morna, que revela, metaforicamente, uma voz

indiferente e pouco afetuosa. O nível tradutório utilizado foi o textual.

33

Texto Original Texto Traduzido

[…] y sacó dos pastillas doradas de un estuche[…] (Ver anexos, p. 55, linha 76)

[…] e tirou dois comprimidos de um estojo[…]

Quadro 19

Nesse caso adotamos o recurso da tradução reconhecida e o nível da naturalidade. Se

mantivéssemos o termo pastilhas o leitor brasileiro poderia associá-lo a pastilhas de menta ou

hortelã para a garganta. Mas o texto nos apresenta comprimidos para dormir. Seria também

aceitável empregar o termo pílulas.

Texto Original Texto Traduzido

[…]se puso el antifaz de dormir[…] (Ver anexos, p. 55, linha 80)

[…]pôs a máscara de dormir[…]

Quadro 20

Aqui, empregamos o substantivo máscara por ser mais usual. Seria possível também o

uso da palavra antiface. Usamos a tradução reconhecida e os níveis textual e de naturalidade.

Texto Original Texto Traduzido

[…]y fue reemplazado por una azafata cartesiana que trató de despertar a la bella para darle el estuche de tocador y los auriculares para la música. (Ver anexos, p. 55, linhas 87-88)

[…]e foi substituído por uma aeromoça cartesiana que tratou de despertar a bela para dar-lhe o estojo de toucador e os fones para a música.

Quadro 21

Nesse caso, priorizamos a sinonímia, a exatidão dos termos. Levamos em

consideração que se trata de um texto de linguagem culta, que foi escrito em 1982. O nível de

tradução usado foi o textual. Outras possíveis traduções seriam metódica e estojo de

maquiagem.

Texto Original Texto Traduzido

«Saber que duermes tú, cierta, segura, cauce fiel de abandono, línea pura, tan cerca de mis brazos maniatados», pensé, repitiendo en la cresta de espumas de champaña el soneto magistral de Gerardo Diego. (Ver anexos, p. 56, linhas 105-107)

<<Saber que você dorme, certa, segura, leito fiel de abandono, linha pura, tão perto de meus braços atados>>, pensei, repetindo na crista de espuma de champanhe o soneto magistral de Gerardo Diego.

Quadro 22 Optamos por braços atados por ser mais habitual que braços maniatados.Empregamos

o nível da naturalidade.

34

Texto Original Texto Traduzido

Creo que dormí varias horas, vencido por la champaña y los fogonazos mudos de la película, y desperté con la cabeza agrietada. Fui al baño. Dos lugares detrás del mío yacía la anciana de las once maletas despatarrada de mala manera en la poltrona. (Ver anexos, p. 56, linhas 119-121)

Acho que dormi várias horas, vencido pelo champanhe e os clarões mudos do filme, e despertei com a cabeça rachada. Fui ao banheiro. Dois lugares atrás do meu, jazia a anciã das onze maletas acomodada de má maneira na poltrona.

Quadro 23

O termo fogonazos não poderia ser traduzido por fogos, por referir-se a um filme, por

isso utilizamos clarões. Também seria possível utilizar claridade ou luz intensa.

A cabeça agrietada foi traduzida por rachada, mas também seria admissível fissurada,

ou até mesmo estalando. Não adotamos o verbo estalar para aproximar o texto traduzido do

original, mostrando a ideia de exagero referindo-se a uma cabeça dolorida.

O verbo jazer possui o sentido de estar deitado imóvel, morto ou como se fosse morto

(dormia profundamente). Preferimos manter o verbo original para causar mais impacto no

leitor. Nesses casos os níveis textual e de naturalidade foram aplicados.

Texto Original Texto Traduzido

«Carajo», me dije, con un gran desprecio. (Ver anexos, p. 56, linha 136)

<<Caralho>>, disse a mim mesmo, com um grande desprezo.

Quadro 24

O termo carajo, assim como na língua portuguesa, além de referir-se ao órgão sexual

masculino, é uma interjeição que pode denotar surpresa, indignação, espanto, raiva,

admiração, etc. Preferimos utilizar a sinonímia, mas seria possível empregar outros termos

mais “amenos”, como puxa, porra ou merda. O nível utilizado foi o textual.

Texto Original Texto Traduzido

[…]enderezó la poltrona, tiró a un lado la manta, se sacudió las crines que se peinaban solas con su propio peso[…] (Ver anexos, p. 57, linhas 141-142)

[…]endireitou a poltrona, pôs a manta de lado, sacudiu as madeixas que se penteavam sozinhas com seu próprio peso[…]

Quadro 25

Nesse caso, poderíamos utilizar os termos ajeitou e crinas. O termo crinas poderia

soar depreciativo em língua portuguesa, por estar mais associado à crina de animais, como o

cavalo ou o leão. Trabalhamos com a estratégia de tradução reconhecida e os níveis de

referência e de naturalidade.

35

2. Dificuldades de ordem semântica

Sabemos que as dificuldades de ordem semântica dizem respeito à significação das

palavras e de suas combinações entre si. Observemos as traduções e análises que seguem:

Texto Original Texto Traduzido

Era bella, elástica, con una piel tierna del color del pan[…] (Ver anexos, p. 53, linha 4)

Era bela, elástica, com uma pele tenra da cor do pão[…]

Quadro 26

Semanticamente, tal termo diz respeito a uma pele clara e pálida, como o pão.

Utilizamos, pois, a estratégia da sinonímia e o nível textual. Utilizamos aqui a equivalência

formal proposta por Nida (1964), que é centrada no conteúdo e na forma do texto original.

Neste tipo de tradução, a preocupação está em manter a correspondência de estilos e de

conceitos da língua original para a língua de tradução.

Texto Original Texto Traduzido

Estaba vestida con un gusto sutil: chaqueta de lince, blusa de seda natural[…] (Ver anexos, p. 53, linhas 6-7)

Estava vestida de maneira sutil: jaqueta de lince, blusa de seda natural

Quadro 27

Outra vez priorizamos a exatidão e utilizamos a sinonímia e o nível textual. Também

cogitamos o uso dos termos jaqueta de couro, jaqueta de couro de lince. No entanto, por uma

questão de estilo, o termo empregado denota maior sofisticação e delicadeza, como se a bela

usasse pele de lince. O termo couro poderia denotar agressividade.

Texto Original Texto Traduzido

[…] mientras yo hacía la cola para abordar el avión de Nueva York[…] (Ver anexos, p. 53, linhas 9-10)

[…] enquanto eu fazia fila para embarcar o avião de Nova York[…]

Quadro 28

Fazer fila é um termo bastante comum em língua portuguesa. A estratégia da

sinonímia foi adotada, assim como o nível textual. Pensamos também na possibilidade das

expressões: esperava minha vez, formava fila, entrava na fila.

36

Texto Original Texto Traduzido

Empezaba a aburrirme cuando vi la aparición instantánea que me dejó sin aliento […] (Ver anexos, p. 53, linhas 17-18)

Começava a chatear-me quando vi a aparição instantânea que me deixou sem respiração […]

Quadro 29

Utilizamos a estratégia da tradução reconhecida e o nível textual. Aqui também seria

possível: sem fôlego, ofegante.

Texto Original Texto Traduzido

[…] hasta que la empleada me bajó de las nubes con un reproche por mi distracción. (Ver anexos, p. 53, linhas 18-19)

[…] até que a funcionária me fez descer das nuvens com uma crítica por minha distração.

Quadro 30

A sinonímia foi o recurso ideal. Empregamos também o nível textual de tradução.

Outra possibilidade seria: chamou minha atenção.

Texto Original Texto Traduzido

[…] y me preguntó qué asiento prefería: fumar o no fumar. (Ver anexos, p. 53, linhas 21-22)

[…] e me perguntou que assento eu preferia: fumante ou não fumante.

Quadro 31

Fumante ou não fumante é uma tradução reconhecida da língua portuguesa. Fumar ou

não fumar soaria muito estranho. Optamos pela naturalidade da estrutura linguística. Nessa

situação também aplicamos a estratégia da transposição, por realizarmos uma mudança na

estrutura gramatical que passou de verbo para adjetivo.

Texto Original Texto Traduzido

— Me da lo mismo — le dije con toda intención (Ver anexos, p. 53, linha 23)

— Tanto faz – lhe disse com toda intenção

Quadro 32

Outro exemplo de estratégia de tradução reconhecida, por ser totalmente aceita. Aqui

empregamos também a estratégia da transposição, além dos níveis de naturalidade e de

coesão. Outras possibilidades seriam: dá no mesmo, me dá igual.

37

Texto Original Texto Traduzido

[…]y hasta la música enlatada parecía tan sublime y sedante como lo pretendían sus creadores. (Ver anexos, p. 54, linhas 38-39)

[…]e até a música enlatada parecia tão sublime e sedante como o pretendiam seus criadores.

Quadro 33

Utilizamos a estratégia da sinonímia. Música enlatada é o mesmo que música

artificial, música gravada, música de baixa qualidade. Utilizamos os níveis textual e de

referência.

Texto Original Texto Traduzido

[…]contemplando las fábricas glaciales, los vastos sementeros de Roissy devastados por los leones. (Ver anexos, p. 54, linhas 43-44)

[…]contemplando as fábricas glaciais, as vastas sementeiras de Roissy devastadas pelos leões.

Quadro 34

De acordo com o dicionário da RAE e com o dicionário Aurélio, sementeiras são

terras semeadas. Segundo o site da Wikipédia:

Roissy-en-France (ou simplesmente Roissy) é uma comuna francesa, situada no departamento de Val-d'Oise na região de Île-de-France. Um quarto do Aeroporto de Paris - Charles de Gaulle (Principal aeroporto da França), mas nenhum dos terminais está localizado no território da comuna de Roissy-en-France, que deu o seu nome original para o aeroporto. Mais tarde renomeado Aeroporto Charles de Gaulle, em França o aeroporto ainda é comumente referido como Aeroporto de Roissy. O resto do aeroporto fica em território do município de Tremblay-en-France e várias outras comunas. 11

Dessa forma, tivemos a obrigação de manter o termo, por tratar-se de um nome

próprio internacionalmente reconhecido. Empregamos os níveis de tradução textual e de

referencia sugeridos por Newmark (1995), uma vez que as informações são melhor

interpretadas quando analisamos o contexto em que está inserido o texto.

Texto Original Texto Traduzido

[…] Gentes de toda ley habían desbordado las salas de espera […] (Ver anexos, p. 54, linhas 46-47)

[…] Pessoas de todos os tipos tinham transbordado as salas de espera […]

Quadro 35

O termo empregado foi o mais habitual na língua de chegada. Utilizamos a estratégia

de tradução reconhecida e o nível de naturalidade. Também poderíamos usar: gente de todo

tipo, gente de tudo quanto é tipo.

11 Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/Roissy-en-France> Acesso em: 15 de janeiro de 2013.

38

Texto Original Texto Traduzido

Y apenas si intenté en mi media lengua un saludo indeciso que ella no percibió. (Ver anexos, p. 54, linhas 67-68)

E apenas tentei em minha meia língua uma saudação indecisa que ela não percebeu.

Quadro 36

No exemplo anterior optamos por uma tradução bem literal, adotando a sinonímia e o

nível textual. Outra possibilidade de tradução: minha pronúncia imperfeita.

Texto Original Texto Traduzido

Su voz grave y tibia arrastraba una tristeza oriental. (Ver anexos, p. 55, linha 74)

Sua voz grave e morna arrastava uma tristeza oriental.

Quadro 37

Tradicionalmente, a cultura oriental é marcada por seu conservadorismo, autoritarismo

e perfeccionismo. Os orientais, geralmente, são vistos como pessoas tristes, tímidas e

fechadas. Essa tristeza oriental apresentada no texto foi traduzida por um sinônimo em língua

portuguesa. Cabe ao leitor interpretar o porquê dessa tristeza da protagonista do texto. Desse

modo os níveis tradutórios utilizados foram o textual e o de referência.

Texto Original Texto Traduzido

Terminada la cena apagaron las luces, dieron la película para nadie […] (Ver anexos, p. 55, linha 97)

Terminado o jantar, apagaram as luzes, exibiram um filme para ninguém […]

Quadro 38

O verbo dar não poderia ser empregado na tradução para a língua portuguesa por ser

pouco usual nesse contexto. Outras possibilidades seriam: mostraram, propagaram,

expuseram. Usamos a tradução reconhecida e o nível de naturalidade.

Texto Original Texto Traduzido

las orejas perfectas sin puntadas para los aretes[…] (Ver anexos, p. 56, linha 103)

[…]as orelhas perfeitas sem os furinhos para brincos[…]

Quadro 39

Aqui optamos pelo usual em língua portuguesa. Buracos ou orifícios não seriam

palavras adequadas para descrever um furinho tão delicado, como o da orelha de uma mulher.

Outra vez temos a estratégia da tradução reconhecida e o nível de naturalidade.

39

Texto Original Texto Traduzido

Dos lugares detrás del mío yacía la anciana de las once maletas despatarrada de mala manera en la poltrona. (Ver anexos, p. 56, linhas 120-121)

Dois lugares atrás do meu, jazia a anciã das onze maletas acomodada de má maneira na poltrona.

Quadro 40

“Despatarrar” significa abrir excessivamente as pernas. No caso da anciã, ela estava

“despatarrada de mala manera”, ou seja, ela se encontrava em uma posição nada educada,

nada elegante. Nesse caso, empregamos acomodada de má maneira, o que nos pareceu mais

conveniente. No entanto, outras possibilidades existem: sentada com as pernas abertas,

acomodada de forma inconveniente, arreganhada. Logo a estratégia usada foi a da tradução

reconhecida e os níveis de referência e de naturalidade.

Texto Original Texto Traduzido

[…] y por un instante disfruté de la dicha mezquina de no recogerlos. (Ver anexos, p. 56, linhas 123-124)

[…] e por um instante desfrutei da oportunidade mesquinha de não os apanhar.

Quadro 41

Nesse caso poderíamos utilizar: momento mesquinho, tacanho, egoísta. Temos aqui a

estratégia de tradução reconhecida e o nível de naturalidade.

Texto Original Texto Traduzido

Salí en estampida, con la ilusión de que sólo las turbulencias de Dios despertaran a la bella[…] (Ver anexos, p. 56, linhas 128-129)

Saí em disparada, com a ilusão de que somente as turbulências de Deus despertariam a bela […]

Quadro 42

Aqui também seria possível adotar o termo: rapidamente. Empregamos a tradução

reconhecida e a naturalidade.

Texto Original Texto Traduzido

Sólo entonces caí en la cuenta de que los vecinos de asiento en los aviones, igual que los matrimonios viejos, no se dan los buenos días al despertar. (Ver anexos, p. 57, linhas 138-140)

Só então me dei conta que os vizinhos de assento nos aviões, como os casais velhos, não se dizem bom-dia ao despertar.

Quadro 43

Aqui temos um exemplo de estratégia de transposição. Conforme Newmark (1995) a

transposição é a variação gramatical que acontece ao efetuarmos a tradução. O nível de

naturalidade também foi enfocado. Outras formas de tradução seriam: notei, percebi.

40

3. Dificuldades de ordem sintáctica

Os problemas de ordem sintáctica se referem às regras que regem a construção de

frases nas línguas naturais. Segundo Borba (1971), a sintaxe é a parte da gramática que estuda

a disposição das palavras na frase e das frases no discurso, incluindo a sua relação lógica,

entre as múltiplas combinações possíveis para transmitir um significado completo e

compreensível. Vejamos as seguintes análises tradutórias:

Texto Original Texto Traduzido

«Esta es la mujer más bella que he visto en mi vida» (Ver anexos, p. 53, linha 8)

<<Esta é a mulher mais bela que já vi na minha vida>>

Quadro 44

O “pretérito perfecto compuesto”, segundo Milani (2006) se usa para narrar ações em

um passado recente que ainda perduram real ou psicologicamente no momento em que se fala.

No exemplo acima, é mencionado um acontecimento ou experiência única na vida do sujeito.

A construção se dá pela junção do presente do indicativo do verbo “haber” mais o particípio

do verbo principal “ver”. Adotamos a estratégia da transposição e a da tradução reconhecida,

assim como o nível de naturalidade. As possíveis traduções da estrutura seriam: Esta é a

mulher mais bela que vi / tenho visto em minha vida.

Texto Original Texto Traduzido

A modo de disculpa le pregunté si creía en los amores a primera vista. (Ver anexos, p. 53, linhas 19-20)

Como modo de desculpa lhe perguntei se acreditava nos amores à primeira vista.

Quadro 45 “A modo de” é uma locução prepositiva que significa: como forma de, a maneira de.

“Si creía (pretérito imperfecto de indicativo)” é o mesmo que se cria, no entanto, o

uso do verbo crer não é tão habitual na língua de chegada, por isso optamos pelo verbo

acreditar. Trabalhamos com a sinonímia e com os níveis textual, de coesão e de naturalidade.

41

Texto Original Texto Traduzido

Marcó en la tarjeta de embarque el número del asiento y me la entregó con el resto de mis papeles[…] (Ver anexos, p. 53, linhas 30-31)

Marcou no cartão de embarque o número do assento e me entregou com o resto dos meus papéis[…]

Quadro 46

Os pronomes complemento são abundantemente empregados em espanhol, o que

constitui uma característica importante do idioma. Em “me la entregó”, me é objeto indireto e

se refere a mim, para mim; “ la” é objeto direto e faz referência a “tarjeta” . A regra da língua

espanhola é que os pronomes átonos estejam sempre nesta ordem: primeiro vem o objeto

indireto e depois o objeto direto. Nesse caso, executamos uma transposição. O nível que

usamos foi o da naturalização. Outra possível tradução seria entregou-mo, forma totalmente

arcaica.

Texto Original Texto Traduzido

De pronto se me ocurrió que aquel era un refugio adecuado para la bella[…] (Ver anexos, p. 54, linhas 39-40)

De repente, me veio à cabeça que aquele era o refúgio adequado para a bela[…]

Quadro 47

“De pronto” é uma locução adverbial temporal que significa prontamente,

repentinamente. De repente é a estrutura mais comum em língua portuguesa.

Uma construção típica da língua espanhola é o uso da partícula “se” para expressar

involuntariedade, ou seja, ausência de participação do sujeito na realização de uma ação. Na

frase “se me ocurrió” o primeiro pronome (se) supõe a ausência de participação do sujeito na

ação verbal, e o segundo pronome (me) se refere à pessoa afetada pela ação verbal.

Poderíamos traduzir essa frase por me ocorreu. Realizamos uma transposição e empregamos o

nível de naturalidade.

Texto Original Texto Traduzido

Lo único que alcancé a comer en medio de la rebatiña[…] (Ver anexos, p. 54, linhas 58-59)

Tudo o que consegui comer em meio à disputa[…]

Quadro 48

O “artículo neutro lo” é específico da língua espanhola. Por isso, o estudante

brasileiro deve estar atento para não confundi-lo com o artigo definido o da língua portuguesa.

De acordo com Milani (2006) o “artículo neutro lo” é invariável e se usa para substantivar

42

adjetivos e advérbios, além de cumprir outras funções gramaticais. No exemplo acima, lo

substantiva o adjetivo único. Traduzimos a expressão lo único por tudo, já que nos pareceu

bem usual na língua portuguesa. A estratégia da transposição foi aqui empregada, assim como

o nível de naturalização. As outras possíveis traduções seriam:

O único que alcancei comer […]

A única coisa que consegui comer […]

Texto Original Texto Traduzido

Me los tomé poco a poco en el mostrador[…] (Ver anexos, p. 54, linha 59)

Tomei-os pouco a pouco no balcão[…]

Quadro 49

Em “me los tomé”, me é objeto indireto e se refere a mim, para mim; “los” é objeto

direto e faz referência a “copinhos de sorvete”. Seria possível traduzir o termo por: tomei eles

(impróprio segundo a norma culta). Mais uma vez temos a transposição e o nível textual e de

naturalidade

Texto Original Texto Traduzido

«Si alguna vez escribiera esto, nadie me lo creería» (Ver anexos, p. 54, linha 67)

<<Se alguma vez escrevesse isto, ninguém acreditaria em mim.>>

Quadro 50

Em “me lo creería”, me é objeto indireto e se refere à em mim; “lo” é objeto direto e

faz referência a “esto”. Temos nesse exemplo a transposição, a tradução reconhecida e o nível

de naturalidade. As possíveis traduções seriam:

Ninguém me creria

Ninguém me acreditaría

Texto Original Texto Traduzido

Cogí una copa para ofrecérsela a ella, pero me arrepentí a tiempo. (Ver anexos, p. 55, linhas 71-72)

Peguei uma taça para oferecer a ela, mas me arrependi a tempo.

Quadro 51

Nesse caso, como o verbo “ofrecer” está no infinitivo, ocorre o fenômeno da ênclise.

Dessa forma, os complementos aparecem pospostos ao verbo, sempre obedecendo a

sequência: objeto indireto, objeto direto.

43

Em “ofrecérsela” , se é objeto indireto e se refere à a ela, para ela; “ la” é objeto direto

e faz referência à “taça”. A outra possibilidade de tradução seria oferecê-la. As estratégias

empregadas foram a transposição e a tradução reconhecida. Além disso usamos o nível

textual.

Texto Original Texto Traduzido

El sobrecargo había desaparecido tan pronto como despegamos […] (Ver anexos, p. 55, linhas 86-87)

O comissário havia desaparecido assim que decolamos […]

Quadro 52

Milani (2006) afirma que o “pretérito pluscuamperfecto” se utiliza para expressar uma

ação passada anterior a outra ação passada. Ele é formado pelo pretérito imperfeito do verbo

“haber” mais o particípio do verbo principal, como ocorre em: “había desaparecido”. Outra

tradução aceitável seria: desaparecera.

“Tan pronto como” é uma locução adverbial de tempo que corresponde a assim que,

logo que. Aplicamos a transposição e o nível de naturalidade.

Texto Original Texto Traduzido

Se instaló como para vivir muchos años[…] (Ver anexos, p. 54, linhas 67-68)

Se instalou como se fosse viver muitos anos[…]

Quadro 53

Nesse caso, optamos traduzir por como se fosse viver (ideia de condição). Também

seria possível: como para viver. Temos outro caso de transposição e de naturalidade.

Texto Original Texto Traduzido

[… ] primero en un francés inaccesible y luego en un inglés apenas más fácil[…] (Ver anexos, p. 55, linhas 72-73)

[…] primeiro em um francês inacessível e logo em um inglês um pouco mais fácil […]

Quadro 54

Segundo o dicionário da Real Academia Española (RAE), a palavra “apenas” pode

significar:

“1. Advérbio de negação: dificilmente, quase não. 2. Advébio de intensidade:

escassamente, somente 3. Conjunção temporal: em quanto, ao ponto que.”

44

No exemplo acima utilizamos a estratégia da modulação. Newmark (1995) afirma que

a modulação é uma mudança de ponto de vista ou de categoria. Outra possível tradução do

termo, também aplicando a modulação seria: em um inglês menos difícil.

Texto Original Texto Traduzido

[…] sin quitarse los zapatos, se puso el antifaz de dormir[…] (Ver anexos, p. 55, linha 80)

[…] sem tirar os sapatos, pôs a máscara de dormir[…]

Quadro 55

Nessa situação, poderíamos empregar sem retirar e colocou. Adotamos a sinonímia e

o nível textual.

Texto Original Texto Traduzido

[…] me fue imposible escapar ni un instante al hechizo de aquella criatura de fábula que dormía a mi lado. (Ver anexos, p. 55, linhas 85-86)

[…] me foi impossível escapar um só instante ao feitiço daquela criatura de fábula que dormia ao meu lado.

Quadro 56

Nesse caso utilizamos a estratégia da tradução reconhecida e o nível da naturalidade.

Também poderíamos empregar: Não consegui escapar nem um instante.

Texto Original Texto Traduzido

[…] y aun así me reprendió porque la bella no se hubiera colgado en el cuello el cartoncito con la orden de no despertarla. (Ver anexos, p. 55, linhas 90-91)

[…] e inclusive assim me repreendeu porque a bela não havia pendurado no pescoço um cartãozinho com a ordem de não despertá-la.

Quadro 57

Dentre os diversos usos do “pretérito pluscuamperfecto de subjuntivo” ele é utilizado

quando já se está falando no passado, para referir-se a algo também passado, mas com uma

anterioridade da ação. Ele é formado pelo pretérito imperfeito do subjuntivo do verbo “haber”

mais o particípio do verbo principal, como ocorre em: “hubiera colgado”. Outra tradução

aceitável seria: não tinha posto. As estratégias empregadas foram a tradução reconhecida e a

transposição. Utilizamos também o nível da naturalidade.

45

Texto Original Texto Traduzido

[… ]y se los puse en el regazo[…] (Ver anexos, p. 56, linha 131)

[…] os coloquei em seu regaço[…]

Quadro 58

Em “se los puse”, se é objeto indireto e se refere de ella (holandesa), para ella; “los”

é objeto direto e faz referência a “los lentes”.

Demos preferência ao verbo colocar por ser mais habitual na língua portuguesa. A

estrutura os pus em seu regaço soaria estranha, com certa eufonia. Logo, trabalhamos aqui

com transposição e tradução reconhecida. Empregamos o nível de naturalidade.

4.1 Síntese da análise

Como podemos verificar, a maior quantidade de dificuldades em nossa análise foi de

ordem lexical, em que obtivemos 24 ocorrências (ver quadro 59).

Os problemas lexicais exigiram, principalmente, o uso de dicionários visuais e do

Google imagens. As estratégias de tradução reconhecida e sinonímia foram as mais utilizadas,

além do nível de naturalidade. As ocorrências foram muitas, mas não tão complicadas quanto

as dificuldades de ordem semântica.

Os problemas semânticos foram aqueles em que a busca de informações em sites

especializados, como o da Real Academia Española – RAE e o wordreference foram mais

utilizados, uma vez que adotamos bastante o nível de referência.

As dificuldades sintáticas foram solucionadas com o uso de diferentes gramáticas de

língua espanhola. Além de inúmeras transposições, trabalhamos também com uma

modulação.

Observemos o quadro síntese:

Dificuldades Ocorrências Níveis de tradução mais

empregados

Estratégias de

tradução mais

adotadas

Lexicais 24 Naturalidade, textual e de

referência

Tradução reconhecida e

sinonímia

Semânticas 18 Naturalidade, textual e de

referência

Tradução reconhecida e

sinonímia

Sintáticas 15 Naturalidade e textual Transposição e

tradução reconhecida

Quadro 59

46

Em nossa tradução tivemos uma grande preocupação com o leitor e, por isso,

trabalhamos bastante com o nível da naturalidade. Podemos afirmar que o conto traduzido,

apesar de curto, é bastante rico. Apesar de ser um texto isento de expressões idiomáticas,

termos técnico-científicos ou regionalismos, não podemos afirmar que sua tradução foi fácil,

pois estávamos atentos a todos os detalhes, para que nenhuma informação fosse perdida, para

que a mensagem criada pelo autor estrangeiro fosse bem transmitida ao leitor.

Logo, esperamos que essa análise auxilie os estudiosos em tradução a conseguirem

bons trabalhos de tradução.

47

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Traduzir um texto não é um trabalho simples como muitos pensam. A prática da

tradução, por envolver muitos procedimentos técnicos e processos mentais, é uma tarefa árdua

e que requer responsabilidades. Ao mesmo tempo em que técnicas têm que ser dominadas por

parte do tradutor, este deve estar apto a resolver os frequentes impasses que surgem durante o

ato tradutório.

Como observamos, a tradução não se caracteriza pela mera substituição de termos;

traduzir é comunicar de forma coerente, é construir sentido em um outro idioma. A tradução é

um processo em que as palavras e ideias passam por uma complexa transformação.

Para se chegar a uma tradução eficaz, o tradutor, antes de tudo, deve ser um bom leitor

e conhecer profundamente o gênero textual a ser traduzido. Ele precisa estar sempre atento às

estruturas da língua de chegada e da língua de partida. Deve também saber que, no momento

da tradução, aparecerão problemas de ordem lexical, semântica e sintática, e que existem

diferentes estratégias a ser utilizadas de acordo com cada tipo de dificuldade. Além do uso de

estratégias é fundamental que o texto a ser traduzido passe pelos quatro níveis de tradução

propostos por Peter Newmark (1995): o nível textual, o nível de referência, o nível coesivo e o

nível da naturalidade. Conhecendo as técnicas adequadas, o tradutor executará seu trabalho

com mais segurança e eficiência.

Analisamos o gênero textual conto e vimos que sua tradução é de extrema

importância, uma vez que, por se tratar de uma narrativa breve, o conto estimula o gosto pela

leitura, o desenvolvimento da imaginação, memória e reflexão. O conto proporciona o

aprimoramento da língua materna ou estrangeira, assim como o anseio por conhecer a

literatura e a cultura mundial.

Assim, o objetivo de nosso trabalho - analisar o processo tradutório de um conto - foi

alcançado, já que confirmamos que uma boa tradução é consequência de uma intensa

atividade de interpretação textual aliada ao conhecimento linguístico e ao uso de estratégias

específicas por parte do tradutor. Nossa pesquisa contribuirá para os estudos de tradução e

servirá de apoio para futuras investigações relacionadas ao ensino e aprendizagem da língua e

da literatura espanhola e hispano-americana.

48

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51

ANEXOS

52

53

EL AVIÓN DE LA BELLA DURMIENTE 1 2

Autor: Gabriel García Márquez 3

Era bella, elástica, con una piel tierna del color del pan y los ojos de almendras verdes, y tenía 4

el cabello liso y negro y largo hasta la espalda, y una aura de antigüedad que lo mismo podía 5

ser de Indonesia que de los Andes. Estaba vestida con un gusto sutil: chaqueta de lince, blusa 6

de seda natural con flores muy tenues, pantalones de lino crudo, y unos zapatos lineales del 7

color de las bugambilias. «Esta es la mujer más bella que he visto en mi vida», pensé, cuando 8

la vi pasar con sus sigilosos trancos de leona, mientras yo hacía la cola para abordar el avión 9

de Nueva York en el aeropuerto Charles de Gaulle de París. Fue una aparición sobrenatural 10

que existió sólo un instante y desapareció en la muchedumbre del vestíbulo. 11

Eran las nueve de la mañana. Estaba nevando desde la noche anterior, y el tránsito era 12

más denso que de costumbre en las calles de la ciudad, y más lento aún en la autopista, y 13

había camiones de carga alineados a la orilla, y automóviles humeantes en la nieve. En el 14

vestíbulo del aeropuerto, en cambio, la vida seguía en primavera. 15

Yo estaba en la fila de registro detrás de una anciana holandesa que demoró casi una 16

hora discutiendo el peso de sus once maletas. Empezaba a aburrirme cuando vi la aparición 17

instantánea que me dejó sin aliento, así que no supe cómo terminó el altercado, hasta que la 18

empleada me bajó de las nubes con un reproche por mi distracción. A modo de disculpa le 19

pregunté si creía en los amores a primera vista. «Claro que sí», me dijo. «Los imposibles son 20

los otros». Siguió con la vista fija en la pantalla de la computadora, y me preguntó qué asiento 21

prefería: fumar o no fumar. 22

— Me da lo mismo — le dije con toda intención—, siempre que no sea al lado de las 23

once maletas. 24

Ella lo agradeció con una sonrisa comercial sin apartar la vista de la pantalla fosforescente. 25

— Escoja un número — me dijo,—: tres, cuatro o siete. 26

— Cuatro. 27

Su sonrisa tuvo un destello triunfal. 28

— En quince años que llevo aquí — dijo primero que no escoge el siete. 29

Marcó en la tarjeta de embarque el número del asiento y me la entregó con el resto de 30

mis papeles, mirándome por primera vez con unos ojos color de uva que me sirvieron de 31

consuelo mientras volvía a ver la bella. Sólo entonces me advirtió que el aeropuerto acababa 32

de cerrarse y todos los vuelos estaban diferidos. 33

— ¿Hasta cuándo? 34

54

—Hasta que Dios quiera — dijo con su sonrisa—. La radio anunció esta mañana que 35

será la nevada más grande del año. 36

Se equivocó: fue la más grande del siglo. Pero en la sala de espera de la primera clase 37

la primavera era tan real que había rosas vivas en los floreros y hasta la música enlatada 38

parecía tan sublime y sedante como lo pretendían sus creadores. De pronto se me ocurrió que 39

aquel era un refugio adecuado para la bella, y la busqué en los otros salones, estremecido por 40

mi propia audacia. Pero la mayoría eran hombres de la vida real que leían periódicos en inglés 41

mientras sus mujeres pensaban en otros, contemplando los aviones muertos en la nieve a 42

través de las vidrieras panorámicas, contemplando las fábricas glaciales, los vastos 43

sementeros de Roissy devastados por los leones. Después del mediodía no había un espacio 44

disponible, y el calor se había vuelto tan insoportable que escapé para respirar. 45

Afuera encontré un espectáculo sobrecogedor. Gentes de toda ley habían desbordado 46

las salas de espera, y estaban acampadas en los corredores sofocantes, y aun en las escaleras, 47

tendidas por los suelos con sus animales y sus niños, y sus enseres de viaje. Pues también la 48

comunicación con la ciudad estaba interrumpida, y el palacio de plástico transparente parecía 49

una inmensa cápsula espacial varada en la tormenta. No pude evitar la idea de que también la 50

bella debía estar en algún lugar en medio de aquellas hordas mansas, y esa fantasía me 51

infundió nuevos ánimos para esperar. 52

A la hora del almuerzo habíamos asumido nuestra conciencia de náufragos. Las colas 53

se hicieron interminables frente a los siete restaurantes, las cafeterías, los bares atestados, y en 54

menos de tres horas tuvieron que cerrarlos porque no había nada qué comer ni beber. Los 55

niños, que por un momento parecían ser todos los del mundo, se pusieron a llorar al mismo 56

tiempo, y empezó a levantarse de la muchedumbre un olor de rebaño. Era el tiempo de los 57

instintos. Lo único que alcancé a comer en medio de la rebatiña fueron los dos últimos vasos 58

de helado de crema en una tienda infantil. Me los tomé poco a poco en el mostrador, mientras 59

los camareros ponían las sillas sobre las mesas a medida que se desocupaban, y viéndome a 60

mí mismo en el espejo del fondo, con el último vasito de cartón y la última cucharita de 61

cartón, y pensando en la bella. 62

El vuelo de Nueva York, previsto para las once de la mañana, salió a las ocho de la 63

noche. Cuando por fin logré embarcar, los pasajeros de la primera clase estaban ya en su sitio, 64

y una azafata me condujo al mío. Me quedé sin aliento. En la poltrona vecina, junto a la 65

ventanilla, la bella estaba tomando posesión de su espacio con el dominio de los viajeros 66

expertos. «Si alguna vez escribiera esto, nadie me lo creería», pensé. Y apenas si intenté en mi 67

media lengua un saludo indeciso que ella no percibió. Se instaló como para vivir muchos 68

55

años, poniendo cada cosa en su sitio y en su orden, hasta que el lugar quedó tan bien dispuesto 69

como la casa ideal donde todo estaba al alcance de la mano. Mientras lo hacía, el sobrecargo 70

nos llevó la champaña de bienvenida. Cogí una copa para ofrecérsela a ella, pero me arrepentí 71

a tiempo. Pues sólo quiso un vaso de agua, y le pidió al sobrecargo, primero en un francés 72

inaccesible y luego en un inglés apenas más fácil, que no la despertara por ningún motivo 73

durante el vuelo. Su voz grave y tibia arrastraba una tristeza oriental. 74

Cuando le llevaron el agua, abrió sobre las rodillas un cofre de tocador con esquinas 75

de cobre, como los baúles de las abuelas, y sacó dos pastillas doradas de un estuche donde 76

llevaba otras de colores diversos. Hacía todo de un modo metódico y parsimonioso, como si 77

no hubiera nada que no estuviera previsto para ella desde su nacimiento. Por último bajó la 78

cortina de la ventana, extendió la poltrona al máximo, se cubrió con la manta hasta la cintura 79

sin quitarse los zapatos, se puso el antifaz de dormir, se acostó de medio lado en la poltrona, 80

de espaldas a mí, y durmió sin una sola pausa, sin un suspiro, sin un cambio mínimo de 81

posición, durante las ocho horas eternas y los doce minutos de sobra que duró el vuelo a 82

Nueva York. 83

Fue un viaje intenso. Siempre he creído que no hay nada más hermoso en la naturaleza 84

que una mujer hermosa, de modo que me fue imposible escapar ni un instante al hechizo de 85

aquella criatura de fábula que dormía a mi lado. El sobrecargo había desaparecido tan pronto 86

como despegamos, y fue reemplazado por una azafata cartesiana que trató de despertar a la 87

bella para darle el estuche de tocador y los auriculares para la música. Le repetí la advertencia 88

que ella le había hecho al sobrecargo, pero la azafata insistió para oír de ella misma que 89

tampoco quería cenar. Tuvo que confirmárselo el sobrecargo, y aun así me reprendió porque 90

la bella no se hubiera colgado en el cuello el cartoncito con la orden de no despertarla. 91

Hice una cena solitaria, diciéndome en silencio todo lo que le hubiera dicho a ella si 92

hubiera estado despierta. Su sueño era tan estable, que en cierto momento tuve la inquietud de 93

que las pastillas que se había tomado no fueran para dormir sino para morir. Antes de cada 94

trago, levantaba la copa y brindaba. 95

— A tu salud, bella. 96

Terminada la cena apagaron las luces, dieron la película para nadie, y los dos 97

quedamos solos en la penumbra del mundo. La tormenta más grande del siglo había pasado, y 98

la noche del Atlántico era inmensa y límpida, y el avión parecía inmóvil entre las estrellas. 99

Entonces la contemplé palmo a palmo durante varias horas, y la única señal de vida que pude 100

percibir fueron las sombras de los sueños que pasaban por su frente como las nubes en el 101

agua. Tenía en el cuello una cadena tan fina que era casi invisible sobre su piel de oro, las 102

56

orejas perfectas sin puntadas para los aretes, las uñas rosadas de la buena salud, y un anillo 103

liso en la mano izquierda. Como no parecía tener más de veinte años, me consolé con la idea 104

de que no fuera un anillo de bodas sino el de un noviazgo efímero. «Saber que duermes tú, 105

cierta, segura, cauce fiel de abandono, línea pura, tan cerca de mis brazos maniatados», pensé, 106

repitiendo en la cresta de espumas de champaña el soneto magistral de Gerardo Diego. Luego 107

extendí la poltrona a la altura de la suya, y quedamos acostados más cerca que en una cama 108

matrimonial. El clima de su respiración era el mismo de la voz, y su piel exhalaba un hálito 109

tenue que sólo podía ser el olor propio de su belleza. Me parecía increíble: en la primavera 110

anterior había leído una hermosa novela de Yasunari Kawabata sobre los ancianos burgueses 111

de Kyoto que pagaban sumas enormes para pasar la noche contemplando a las muchachas 112

más bellas de la ciudad, desnudas y narcotizadas, mientras ellos agonizaban de amor en la 113

misma cama. No podían despertarlas, ni tocarlas, y ni siquiera lo intentaban, porque la esencia 114

del placer era verlas dormir. Aquella noche, velando el sueño de la bella, no sólo entendí 115

aquel refinamiento senil, sino que lo viví a plenitud. 116

— Quién iba a creerlo — me dije, con el amor propio exacerbado por la champaña— 117

Yo, anciano japonés a estas alturas. 118

Creo que dormí varias horas, vencido por la champaña y los fogonazos mudos de la 119

película, y desperté con la cabeza agrietada. Fui al baño. Dos lugares detrás del mío yacía la 120

anciana de las once maletas despatarrada de mala manera en la poltrona. Parecía un muerto 121

olvidado en el campo de batalla. En el suelo, a mitad del pasillo, estaban sus lentes de leer con 122

el collar de cuentas de colores, y por un instante disfruté de la dicha mezquina de no 123

recogerlos. 124

Después de desahogarme de los excesos de champaña me sorprendí a mí mismo en el 125

espejo, indigno y feo, y me asombré de que fueran tan terribles los estragos del amor. De 126

pronto el avión se fue a pique, se enderezó como pudo, y prosiguió volando al galope. La 127

orden de volver al asiento se encendió. Salí en estampida, con la ilusión de que sólo las 128

turbulencias de Dios despertaran a la bella, y que tuviera que refugiarse en mis brazos 129

huyendo del terror. En la prisa estuve a punto de pisar los lentes de la holandesa, y me hubiera 130

alegrado. Pero volví sobre mis pasos, los recogí, y se los puse en el regazo, agradecido de 131

pronto de que no hubiera escogido antes que yo el asiento número cuatro. 132

El sueño de la bella era invencible. Cuando el avión se estabilizó, tuve que resistir la 133

tentación de sacudirla con cualquier pretexto, porque lo único que deseaba en aquella última 134

hora de vuelo era verla despierta, aunque fuera enfurecida, para que yo pudiera recobrar mi 135

libertad, y tal vez mi juventud. Pero no fui capaz. «Carajo», me dije, con un gran desprecio. 136

57

«¡Por qué no nací Tauro!». Despertó sin ayuda en el instante en que se encendieron los 137

anuncios del aterrizaje, y estaba tan bella y lozana como si hubiera dormido en un rosal. Sólo 138

entonces caí en la cuenta de que los vecinos de asiento en los aviones, igual que los 139

matrimonios viejos, no se dan los buenos días al despertar. Tampoco ella. Se quitó el antifaz, 140

abrió los ojos radiantes, enderezó la poltrona, tiró a un lado la manta, se sacudió las crines que 141

se peinaban solas con su propio peso, volvió a ponerse el cofre en las rodillas, y se hizo un 142

maquillaje rápido y superfluo, que le alcanzó justo para no mirarme hasta que la puerta se 143

abrió. Entonces se puso la chaqueta de lince, pasó casi por encima de mí con una disculpa 144

convencional en castellano puro de las Américas, y se fue sin despedirse siquiera, sin 145

agradecerme al menos lo mucho que hice por nuestra noche feliz, y desapareció hasta el sol de 146

hoy en la Amazonia de Nueva York. 147

148

Junio 1982.149

58

O AVIÃO DA BELA ADORMECIDA 1

Autor: Gabriel García Márquez 2

Tradução: Ermelinda Lopes da Silva 3

Era bela, elástica, com uma pele tenra da cor do pão e os olhos de amêndoas verdes, e 4

tinha o cabelo liso e negro até as costas, e uma aura de antiguidade que podia ser tanto da 5

Indonésia como dos Andes. Estava vestida de maneira sutil: jaqueta de lince, blusa de seda 6

natural com flores muito tênues, calças de linho cru, e umas sapatilhas da cor das buganvílias. 7

<<Esta é a mulher mais bela que já vi na minha vida>>, pensei, quando a vi passar com seus 8

sigilosos passos elegantes, enquanto eu fazia fila para embarcar o avião de Nova York no 9

aeroporto Charles de Gaulle de Paris. Foi uma aparição sobrenatural que existiu somente um 10

instante e desapareceu na multidão do saguão. 11

Eram nove horas da manhã. Estava nevando desde a noite anterior, e o trânsito era 12

mais denso que de costume nas ruas da cidade, e mais lento ainda nas rodovias, e havia 13

caminhões de carga alinhados nas margens, e automóveis fumegantes na neve. No vestíbulo 14

do aeroporto, em contrapartida, a vida seguia em primavera. 15

Eu estava na fila de registro atrás de uma anciã holandesa que demorou quase uma 16

hora discutindo o peso de suas onze maletas. Começava a chatear-me quando vi a aparição 17

instantânea que me deixou sem respiração, desse modo não soube como terminou a discussão, 18

até que a funcionária me fez descer das nuvens com uma crítica por minha distração. Como 19

modo de desculpa lhe perguntei se acreditava nos amores à primeira vista. <<Claro que 20

sim>>, me disse. <<Os impossíveis são os outros>>. Seguiu com a vista fixa na tela do 21

computador, y me perguntou que assento eu preferia: fumante ou não fumante. 22

— Tanto faz – lhe disse com toda intenção., desde que não seja ao lado das onze 23

maletas. 24

Ela agradeceu com um sorriso comercial sem afastar a vista da tela fosforescente. 25

— Escolha um número – me disse, - : três, quatro ou sete. 26

— Quatro. 27

Seu sorriso teve um fulgor triunfal. 28

— Em quinze anos que levo aqui, o senhor é o primeiro que não escolhe o sete. 29

Marcou no cartão de embarque o número do assento e me entregou com o resto dos 30

meus papéis, olhando-me pela primeira vez com uns olhos cor de uva que me serviram de 31

consolo enquanto voltava a ver a bela. Somente então me advertiu que o aeroporto acabava de 32

fechar-se e todos os voos estavam adiados. 33

— Até quando? 34

59

— Até que Deus queira – disse com seu sorriso -. O radio anunciou que esta manhã 35

teremos a maior nevada do ano. 36

Equivocou-se: foi a maior do século. Mas na sala de espera da primeira classe a 37

primavera era tão real que havia rosas vivas nos vasos e até a música enlatada parecia tão 38

sublime e sedante como o pretendiam seus criadores. De repente, me veio a cabeça que aquele 39

era o refúgio adequado para a bela, e a busquei nos outros salões, estremecido por minha 40

própria audácia. Mas a maioria eram homens da vida real que liam periódicos em inglês 41

enquanto suas mulheres pensavam em outros, contemplando os aviões mortos na neve através 42

das vidraças panorâmicas, contemplando as fábricas glaciais, as vastas sementeiras de Roissy 43

devastadas pelos leões. Depois do meio dia não havia um espaço disponível, e o calor se 44

tornou tão insuportável que escapei para respirar. 45

No lado de fora me deparei com um espetáculo impressionante. Pessoas de todos os 46

tipos tinham transbordado as salas de espera, e estavam acampadas nos corredores sufocantes, 47

e inclusive nas escadas, estendidas no chão com seus animais e suas crianças, e seus utensílios 48

de viagem. Pois também a comunicação com a cidade estava interrompida, e o palácio de 49

plástico transparente parecia um imensa cápsula espacial encalhada na tormenta. Não pude 50

evitar a ideia de que também a bela devia estar em algum lugar em meio daquelas hordas 51

mansas, e essa fantasia me infundiu novos ânimos para esperar. 52

Na hora do almoço tínhamos assumido nossa consciência de náufragos. As filas se 53

tornaram intermináveis diante dos sete restaurantes, as cafeterias, os bares abarrotados, e em 54

menos de três horas tiveram que fecha-los porque não havia nada para comer nem beber. As 55

crianças, que por um momento pareciam ser todas as do mundo, se puseram a chorar ao 56

mesmo tempo e começou a levantar-se da multidão um cheiro de rebanho. 57

Era o tempo dos instintos. Tudo o que consegui comer em meio à disputa foram os 58

dois últimos copos de sorvete de creme em uma lanchonete infantil. Tomei-os pouco a pouco 59

no balcão, enquanto os garçons colocavam as cadeiras sobre as mesas à medida que se 60

desocupavam, e vendo-me a mim mesmo no espelho do fundo, com o último copinho de 61

sorvete e a última colherzinha descartável, e pensando na bela. 62

O voo de Nova York, previsto para as onze da manhã, saiu às oito da noite. Quando 63

por fim consegui embarcar, os passageiros da primeira classe já estavam em seu lugar e uma 64

aeromoça me conduziu ao meu. Fiquei sem fôlego. Na poltrona vizinha, junto a janelinha, a 65

bela estava tomando posse de seu espaço com o domínio dos viajantes experientes. <<Se 66

alguma vez escrevesse isto, ninguém acreditaria em mim.>>, pensei. E apenas tentei em 67

minha meia língua uma saudação indecisa que ela não percebeu. Instalou-se como para viver 68

60

muitos anos, pondo cada coisa em seu lugar e em sua ordem, até que o lugar ficou tão bem 69

disposto como a casa ideal onde tudo estava ao alcance da mão. 70

Enquanto o fazia, o comissário nos levou o champanhe de boas vindas. Peguei uma 71

taça para oferecer a ela, mas me arrependi a tempo. Pois só quis um copo de água, e pediu ao 72

comissário, primeiro em um francês inacessível logo em um inglês um pouco mais fácil, que 73

não a despertasse por nenhum motivo durante o voo. Sua voz grave e morna arrastava uma 74

tristeza oriental. 75

Quando lhe levaram a água, abriu sobre os joelhos um cofre de toucador com cantos 76

de cobre, como os baús das avós, e tirou dois comprimidos dourados de um estojo onde 77

levava outras de cores diversas. Fazia tudo de um modo metódico e parcimonioso, como se 78

não existisse nada que não estivesse previsto para ela desde seu nascimento. Por último, 79

baixou a cortina da janela, estendeu a poltrona ao máximo, cobriu-se com uma manta até a 80

cintura sem tirar os sapatos, pôs a máscara de dormir, deitou-se de lado na poltrona e de 81

costas para mim, e dormiu sem uma só pausa, sem um suspiro, sem uma mínima mudança de 82

posição, durante as oito horas eternas e os doze minutos de sobra que durou o voo a Nova 83

York. 84

Foi uma viagem intensa. Sempre acreditei que não existe nada mais belo na natureza 85

que uma mulher bonita, de modo que me foi impossível escapar um só instante ao feitiço 86

daquela criatura de fábula que dormia ao meu lado. O comissário havia desaparecido assim 87

que decolamos, e foi substituído por uma aeromoça cartesiana que tratou de despertar a bela 88

para dar-lhe o estojo de toucador e os fones para a música. Repeti-lhe a advertência que ela 89

havia dado ao comissário, mas a aeromoça insistiu para ouvir dela mesma que tampouco 90

queria jantar. Teve que confirmar com o comissário, e inclusive assim me repreendeu porque 91

a bela não havia pendurado no pescoço um cartãozinho com a ordem de não despertá-la. 92

Fiz um jantar solitário, dizendo-me em silêncio tudo que teria dito a ela, se estivesse 93

acordada. Seu sono era tão estável que em certo momento tive a inquietude que aqueles 94

comprimidos não fossem para dormir e sim para morrer. Antes de cada gole, levantava a taça 95

e brindava. 96

—À tua saúde, bela. 97

Terminado o jantar, apagaram as luzes, mostraram um filme para ninguém, e nós dois 98

ficamos sozinhos na penumbra do mundo. A maior tormenta do século havia passado, e a 99

noite do Atlântico era imensa e límpida, e o avião parecia imóvel entre as estrelas. Então a 100

contemplei palmo a palmo durante várias horas, e o único sinal de vida que pude perceber 101

foram as sombras dos sonhos que passavam por sua fronte como as nuvens na água. Tinha no 102

61

pescoço uma corrente tão fina que era quase invisível sobre sua pele de ouro, as orelhas 103

perfeitas sem os furinhos para brincos, as unhas rosadas da boa saúde e um anel liso na mão 104

esquerda. Como não parecia ter mais de vinte anos, me consolei com a ideia de que não fosse 105

um anel de noivado e sim de um namoro efêmero. <<Saber que você dorme, certa, segura, 106

leito fiel de abandono, linha pura, tão perto de meus braços atados>>, pensei, repetindo na 107

crista de espuma de champanhe o soneto magistral de Gerardo Diego. Em seguida estendi a 108

poltrona na altura da sua, e ficamos deitados mais próximos que numa cama de casal. O clima 109

de sua respiração era o mesmo da voz, e sua pele exalava um hálito tênue que só podia ser o 110

próprio cheiro de sua beleza. Eu achava incrível: na primavera anterior tinha lido um bonito 111

romance de Yasumari Kawabata sobre os anciões burgueses de Kyoto que pagavam somas 112

enormes para passar a noite contemplando as moças mais bonitas da cidade, nuas e 113

narcotizadas, enquanto eles agonizavam de amor na mesma cama. Não podiam despertá-las, 114

nem tocá-las, e nem tentavam, porque a essência do prazer era vê-las dormir. Naquela noite, 115

velando o sono da bela, não apenas entendi aquele refinamento senil, como o vivi na 116

plenitude. 117

— Quem iria acreditar — me disse, com o amor-próprio exacerbado pelo champanhe. 118

— Eu, ancião japonês a estas alturas. 119

Acho que dormi várias horas, vencido pelo champanhe e os clarões mudos do filme, e 120

despertei com a cabeça rachada. Fui ao banheiro. Dois lugares atrás do meu, jazia a anciã das 121

onze maletas acomodada de má maneira na poltrona. Parecia um morto esquecido no campo 122

de batalha. No chão, no meio do corredor, estavam seus óculos de leitura com o colar de 123

contas coloridas, e por um instante desfrutei da oportunidade mesquinha de não os apanhar. 124

Depois de desafogar-me dos excessos de champanhe surpreendi-me no espelho, 125

indigno e feio, e assombrei-me por serem tão terríveis os estragos do amor. De repente o 126

avião foi a pique, ajeitou-se como pôde, e prosseguiu voando a galope. A ordem de voltar ao 127

assento acendeu. Saí em disparada, com a ilusão de que somente as turbulências de Deus 128

despertariam a bela, e que teria de refugiar-se em meus braços fugindo do terror. Na pressa 129

estive a ponto de pisar nos óculos da holandesa, e teria me alegrado. Mas voltei sobre meus 130

passos, os recolhi, os coloquei em seu regaço, agradecido de repente por ela não ter escolhido 131

antes de mim o assento número quatro. 132

O sono da bela era invencível. Quando o avião se estabilizou, tive que resistir à 133

tentação de sacudi-la com um pretexto qualquer, porque a única coisa que desejava naquela 134

última hora de voo era vê-la acordada, mesmo que estivesse enfurecida, para que eu pudesse 135

recobrar minha liberdade e talvez minha juventude. Mas não fui capaz. <<Caralho>>, disse a 136

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mim mesmo, com um grande desprezo. <<Por que não nasci Touro?>> Despertou sem ajuda 137

no instante em que os anúncios de aterrissagem se acenderam, e estava tão bela e louçã como 138

se tivesse dormido num roseiral. Só então me dei conta que os vizinhos de assento nos aviões, 139

como os casais velhos, não se dizem bom-dia ao despertar. Ela também não. Tirou a máscara, 140

abriu os olhos radiantes, endireitou a poltrona, pôs a manta de lado, sacudiu as madeixas que 141

se penteavam sozinhas com seu próprio peso, tornou a pôr o cofre nos joelhos, e fez uma 142

maquiagem rápida e supérflua, o suficiente para não olhar para mim até que a porta foi aberta. 143

Então pôs a jaqueta de lince, passou quase que por cima de mim com uma desculpa 144

convencional em puro castelhano das Américas, e foi sem nem ao menos se despedir, sem ao 145

menos me agradecer o muito que fiz por nossa noite feliz, e desapareceu até o sol de hoje na 146

Amazônia de Nova York. 147

Junho 148

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