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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM HISTÓRIA DAS REVOLUÇÕES E MOVIMENTOS SOCIAIS EDUARDO ALVES SIQUEIRA SINDICALISMO NO SETOR PÚBLICO: A greve de 2006 dos servidores municipais de Maringá MARINGÁ - PARANÁ 2018

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁCENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIACURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM HISTÓRIA DAS REVOLUÇÕES E MOVIMENTOS SOCIAIS

EDUARDO ALVES SIQUEIRA

SINDICALISMO NO SETOR PÚBLICO:A greve de 2006 dos servidores municipais de Maringá

MARINGÁ - PARANÁ2018

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EDUARDO ALVES SIQUEIRA

SINDICALISMO NO SETOR PÚBLICO:A greve de 2006 dos servidores municipais de Maringá

Trabalho de conclusão do Curso de Especializa-ção em História das Revoluções e dos Movi-mentos Sociais – EAD, apresentado a Universi-dade Estadual de Maringá, como requisito para aobtenção do título de ESPECIALISTA EM HIS-TÓRIA DAS REVOLUÇÕES E DOS MOVI-MENTOS SOCIAIS.

Orientador: Prof. Dr. Reginaldo Benedito Dias

MARINGÁ - PARANÁ 2018

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DEDICATÓRIA

Dedico esta monografia a todos os trabalhadores e

trabalhadoras, especialmente aos servidores e

servidoras municipais de Maringá, que sofrem na

pele a truculência de governos e patrões

desacostumados ao diálogo e à democracia.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço, em primeiro lugar e de forma especial, a minha amada família: a minha

esposa Gisele, a meu filho Davi e a meus pais Nilton e Clotilde, que tiveram que compreender

minhas constantes ausências durante o último ano e, ainda assim, me deram amparo afetivo e

emocional para concluir o trabalho.

Agradeço a todos os funcionários, dirigentes e ex-dirigentes do Sismmar, que me

franquearam o acesso ao arquivo da entidade e me esclareceram várias dúvidas, contribuindo

muito para o desenvolvimento da pesquisa, especialmente a Iraídes Baptistoni, Maria da

Conceição Franco (Zica), Priscila Guedes e Paulo Vidigal.

Agradeço aos servidores da Gerência de Patrimônio Histórico da Secretaria de Cultura

de Maringá, liderada pelo historiador João Laércio, que me auxiliaram na busca dos jornais da

época da greve de 2006.

Agradeço também ao professor-orientador-historiador Reginaldo Benedito Dias, que

me municiou com grande parte da bibliografia utilizada na monografia e me contou,

pessoalmente ou por Whatsapp, episódios importantes da história do Sindicato e de Maringá.

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RESUMO

Nas últimas décadas, é visível a crise de confiabilidade e credibilidade por que passam os

sindicatos no Brasil e, em particular, os sindicatos do setor público. Esta monografia irá

debater, com base nos autores estudados, a importância da atividade sindical a partir do

surgimento das associações dos servidores públicos no final dos anos 1970. O objetivo central

será recordar a origem do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Maringá

(Sismmar) no contexto do “novo sindicalismo” e recontar a história da greve deflagrada pela

categoria em 2006. Ficará evidenciado o papel essencial que os sindicatos ainda

desempenham nos dias atuais, sobretudo na defesa e conquista de direitos trabalhistas. Papel

que vem sendo subestimado pela sociedade, em função da perda de força e representatividade

das entidades sindicais.

Palavras-chave: Sindicalismo. Sindicalismo do setor público. Novo Sindicalismo. Sindicato

dos Servidores Públicos Municipais de Maringá (Sismmar). Greve de 2006 dos servidores

municipais de Maringá.

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ABSTRACT

In the last decades, it is clear the crisis of reliability and credibility for what the unions pass in

Brazil, particularly the public sector unions. This monograph will debate the union activity

importance from the emergence of the civil servant’s associations in the late 1970s, based on

the studied authors. The main purpose will be recover the origin of the Labour Union of

Municipal Civil Servants of Maringa (Sismmar, in Portuguese) on the “new unionism”

context and retell the history of the strike broken out by the category in 2006. It will

demonstrate the essential role that unions still play nowadays, especially on defence and

achievement of labour rights. Role that is being underestimated by society, because of the loss

of strength and representativeness of the union entities.

Keywords: Labour unionism. Public sector unionism. New unionism. Labour Union of the

Municipal Civil Servants of Maringa (Sismmar). Strike of 2006 of the Civil Servants of

Maringa.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ________________________________________________________ 09

2. SINDICALISMO NO SETOR PÚBLICO ___________________________________ 11

2.1. Breve histórico do movimento sindical ________________________________ 11

2.2. O novo sindicalismo do setor público _________________________________ 16

2.3. Direito de greve no setor público ____________________________________ 24

3. A GREVE DE 2006 DOS SERVIDORES MUNICIPAIS DE MARINGÁ _________ 33

3.1. Prólogo: o Sismmar _______________________________________________ 33

3.2. Diário da greve __________________________________________________ 40

3.3. Epílogo: desdobramentos da greve __________________________________ 83

4. DESAFIOS DO SINDICALISMO NO SETOR PÚBLICO ____________________ 102

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ____________________________________________ 108

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS _____________________________________ 113

7. ANEXOS _____________________________________________________________ 123

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1. INTRODUÇÃO

Nos dias atuais é visível a crise de confiabilidade por que passa o sindicalismo no

Brasil de modo geral e, em particular, o sindicalismo do setor público, em virtude do

descrédito e dos preconceitos que se alastraram na sociedade a respeito do tema. É nesse

contexto que a monografia irá rediscutir a importância do sindicalismo, a partir do surgimento

das entidades sindicais dos servidores públicos no final dos anos 1970. Mais especificamente,

o trabalho pretende resgatar a origem do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de

Maringá (Sismmar) e recontar a história da greve deflagrada pela categoria em 2006.

Na primeira parte, o trabalho discorrerá sobre os primórdios da atividade sindical no

Brasil e no mundo, sobre o advento do “novo sindicalismo” no setor público e sobre a

evolução do direito de greve da categoria. Em seguida, percorrerá a história do Sismmar e da

greve de 2006. Nesta seção, serão narradas as causas, os fatos e as consequências da greve dos

servidores públicos municipais.

O objetivo central, além de recuperar a história do movimento grevista, será

demonstrar como ela se situa na perspectiva maior da crise geral do sindicalismo nas últimas

três décadas. Ao dar relevo aos acontecimentos que estão na memória daqueles que

participaram direta ou indiretamente da greve de 2006, ficará evidenciado o importante papel

da atividade sindical na conquista e manutenção de direitos trabalhistas. Papel que vem sendo

subestimado pela sociedade, em função da perda de força e representatividade das entidades

sindicais.

No intuito de reproduzir os anseios, conceitos e preconceitos de diferentes setores da

sociedade (servidores, população, imprensa, gestores e parlamentares), com relação à greve de

2006, levou-se em conta todo o espectro de documentos escritos e não escritos encontrados no

decorrer da pesquisa. Para fundamentá-la, foram observados os pressupostos da Escola de

Annales, bem como as contribuições de Michel Foucault para a análise de documentos

históricos, apresentadas no artigo Documento/monumento: a ampliação dos materiais de

pesquisa utilizados pela historiografia, de Verônica Karina Ipólito e Ângelo Priori.

Entende-se, como os autores, que a historiografia deve dar voz às classes sociais

dominantes, dominadas, marginalizadas ou excluídas, e confrontar as diferentes versões para

que o resultado reflita de modo mais fiel os eventos do passado. É necessária, portanto, a

apresentação dos discursos presentes nas diversas fontes de pesquisa. Tais discursos, sejam

eles representativos de quem está no poder ou testemunhos de setores marginalizados da

sociedade, podem se extraídos de qualquer registro sonoro, visual ou textual.

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Assim, em um primeiro momento, foram copiados, escaneados ou fotografados os

documentos específicos sobre o Sismmar e a greve de 2006: leis, estatutos, artigos, matérias

jornalísticas, processos administrativos, livros, cartas, comunicados, ofícios, cartazes,

panfletos, registros audiovisuais etc. Essa etapa principiou com uma vasta busca na Internet,

com ênfase nos canais de comunicação que cobriram diariamente os eventos da época: sites

de jornais e do Sindicato; Blog do Rigon e Factorama; e páginas do Youtube. Depois, com

autorização da entidade, esquadrinhou-se o arquivo físico do Sismmar. No acervo da Gerência

de Patrimônio Histórico da Secretaria de Cultura de Maringá, foram exploradas as reportagens

de 2006, 2007 e 2008 do jornal O Diário do Norte do Paraná1 sobre a greve de 2006. Por

último, registraram-se os depoimentos de servidores, dirigentes e ex-dirigentes sindicais.

Infelizmente, os representantes da Administração Municipal na época, embora tenham sido

procurados, não se dispuseram a colaborar com a pesquisa.

Na segunda fase, foram consultados os textos de Arnaldo José França Mazzei

Nogueira, Augusto César Buonicore, Cézar Guedes, Jorge Blascoviscki Vieira, Maurício

Sardá de Faria e Sidney Jard da Silva, que embasaram a discussão sobre o sindicalismo do

setor público e as relações de trabalho no Brasil. Os estudos do professor-orientador

Reginaldo Benedito Dias, por sua vez, possibilitaram a narração de episódios importantes da

história política de Maringá. A pesquisa ainda contou a contribuição valiosa do ex-dirigente

sindical e ex-servidor municipal, Paulo Vidigal, que disponibilizou o trabalho acadêmico que

fez sobre a greve de 2006, na área do Direito. Sua monografia norteou o exame das normas

relativas aos direitos de greve e associação sindical, encontradas na legislação brasileira e nas

convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

Com todo o material reunido, os procedimentos de leitura, análise e fichamento se

inspiraram nas técnicas sugeridas por Umberto Eco no livro Como se faz uma tese em

Ciências Humanas e no artigo O projeto de pesquisa: o conteúdo e seus itens, de Célia Maria

Marinho de Azevedo. Ambos forneceram subsídios para desenvolver a metodologia e a

redação do presente trabalho de conclusão de curso.

Como resultado final, a monografia pretende oferecer o registro fidedigno de um fato

histórico extremamente relevante para a história de Maringá e do Sismmar. Um registro da

greve de 2006 que sirva, inclusive, como ponto de partida para novas pesquisas, ainda mais

aprofundadas.

1 A escolha de O Diário, como paradigma da imprensa maringaense, justifica-se por ser o jornal impresso demaior circulação no município, sem entrar no mérito da qualidade.

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2. SINDICALISMO NO SETOR PÚBLICO

2.1. Breve histórico do movimento sindical

Antes de falar sobre o sindicalismo no setor público, é importante traçar uma rápida

genealogia do movimento sindical no Brasil e no mundo. Sua gênese pode ser localizada na

Inglaterra da segunda metade do século XVIII, na esteira das profundas transformações que

acompanharam a 1ª Revolução Industrial.

O liberalismo de Adam Smith e os preceitos do capitalismo, ainda embrionário,

dominavam o pensamento político-econômico ocidental na época da transição da Idade

Moderna para a Idade Contemporânea. Essas correntes serviram de base teórica para a

exploração intensiva do trabalho assalariado pela burguesia emergente. Os conceitos de

propriedade privada, estado-mínimo e livre-mercado deram ampla liberdade para que

proprietários de fábricas e terras ditassem suas próprias regras nas relações entre empregado e

empregador, contando com a omissão deliberada das autoridades do Estado.

Tal liberdade, sobretudo no meio urbano, possibilitou grande margem de lucro ao

empresariado da época. Assim, tornou-se rotina nas fábricas a existência de situações

degradantes de trabalho: jornadas de 12 a 16 horas diárias; falta de equipamentos de proteção

e condições mínimas de higiene; exposição a doenças, incêndios e explosões; trabalho infantil

e de mulheres grávidas, baixos salários etc.

Para reagir a esse quadro, como aponta Amauri Mascaro Nascimento (2011 apud

VIDIGAL, 2014), surgiram em Londres as primeiras associações de trabalhadores, as trade-

unions, voltadas primeiramente à reivindicação de melhores salários e redução das jornadas

de trabalho. Essas agremiações inglesas se espalharam pela Europa e originaram os sindicatos

da atualidade.

A partir da Revolução Francesa, a classe trabalhadora ganhou novos aliados contra a

hegemonia do pensamento liberal-capitalista no Ocidente. As doutrinas socialistas,

comunistas e anarquistas, com destaque para o socialismo científico de Karl Marx e Friedrich

Engels, fundamentaram as lutas sociais do operariado e dos camponeses. A crescente pressão

exercida pelas organizações de trabalhadores impeliu os Estados-Nações europeus a editarem

as primeiras leis trabalhistas já no início do século XIX, tendo a Inglaterra como pioneira. O

advento das leis interrompeu a política não intervencionista adotada pelos governos nas

relações de mercado e trabalho. Assim, os abusos cometidos pelos patrões passaram a ser

coibidos, também, pelas vias legais.

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De acordo com Sérgio Pinto Martins (2002 apud VIDIGAL, 2014), a legislação

trabalhista, que se aprimorou desde então, contribuiu para impulsionar o movimento do

“constitucionalismo social” após a 1ª Guerra Mundial. No cerne do movimento, os países

foram estimulados a inserir em suas constituições nacionais preceitos básicos de direitos

humanos e direito do trabalho. Nascimento (2011 apud VIDIGAL, 2014) afirma que o

constitucionalismo social motivou a fundação da Organização Internacional do Trabalho

(OIT), em 1919, na cidade de Genebra, órgão formado por representantes de trabalhadores,

empregadores e países-membros da Organização das Nações Unidas (ONU).

No Brasil desse período, havia apenas normas avulsas sobre a questão trabalhista.

Entre elas, as leis que tratavam de sindicatos rurais (1903) e urbanos (1907); Ministério do

Trabalho (1930); trabalho feminino (1932); Justiça do Trabalho (1939); salário mínimo (1936)

(NASCIMENTO, 2011, apud VIDIGAL, 2014). Destas, vale destacar as leis que autorizaram

a criação de sindicatos rurais2 e urbanos3, nas quais o direito de sindicalização dos

trabalhadores do setor privado foi oficialmente reconhecido.

Não se deve esquecer que a legislação apenas legalizou movimentos que já existiam na

prática. Com o fim da escravidão e a gradual substituição da mão de obra escrava por mão de

obra assalariada, os governos brasileiros, imperial e republicano, em vez de apenas absorver a

força de trabalho dos negros libertados, patrocinaram a vinda em massa de imigrantes

europeus para trabalhar nas fazendas e na incipiente indústria brasileira. Na bagagem dos

imigrantes, principalmente italianos, portugueses e espanhóis, chegaram também as ideias

políticas e filosóficas cultivadas em seus países de origem.

A união dos trabalhadores urbanos europeus e a disseminação da ideologia anarquista

entre os brasileiros frutificaram na corrente do “anarcossindicalismo” em São Paulo. A

modalidade sindical se caracterizou pela mobilização do operariado diretamente nas fábricas.

Foram criadas, no período, agremiações informais em diversos bairros da capital paulista,

conhecidas como Ligas Operárias. Imigrantes europeus, brasileiros e ex-escravos se reuniam

nas ligas para discutir e propor melhorias dentro das fábricas. A organização dos operários

paulistas, contra as mazelas da recente industrialização, culminou na primeira greve geral do

2 BRASIL. Decreto nº 979, de 06 de janeiro de 1903. Faculta aos profissionais da agricultura e industriasruraes a organização de syndicatos para defesa de seus interesses. Rio de Janeiro, RJ, jan. 1903. Disponívelem: <http://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/decreto/antigos/d0979.htm> Acesso em: 09 fev. 2018.

3 BRASIL. Decreto nº 1.637, de 05 de janeiro de 1907. Crea syndicatos profissionaes e sociedadescooperativas. Rio de Janeiro, RJ, jan. 1907. Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1900-1909/decreto-1637-5-janeiro-1907-582195-publicacaooriginal-104950-pl.html> Acesso em 09 fev. 2018.

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Brasil, em 1917, movimento que se espalhou rapidamente para outros estados (SIQUEIRA,

2017).

Para responder à ebulição dos movimentos populares e sindicais na primeira metade

do século XX, o então presidente Getúlio Vargas sancionou a Consolidação das Leis

Trabalhistas (CLT)4 em 1943, compilando de forma estratégica as leis já existentes e

adicionando novos dispositivos.

A CLT significou um grande marco para o Direito do Trabalho no Brasil. O Decreto-

Lei regulamentou minuciosamente a relação entre empregados e empregadores no setor

privado, definindo o papel do Estado como mediador, conciliador e árbitro de eventuais

conflitos trabalhistas.

Em seu artigo 511, reafirmou o direito de associação sindical dos trabalhadores rurais

e urbanos, e o estendeu para profissionais liberais, autônomos e, inclusive, empregadores,

com a finalidade de “estudo, defesa e coordenação dos seus interesses econômicos ou

profissionais”. Na mesma direção, a OIT editou em 1949 a Convenção nº 98, dispondo sobre

os direitos de sindicalização e negociação coletiva do trabalhador, ratificada pelo Brasil em

1952.

Em contrapartida, a CLT impôs também uma série de restrições ao exercício desse

direito e normas rigorosas para o funcionamento das entidades sindicais. Os sindicatos, por

exemplo, deviam solicitar seu registro junto ao Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio

para serem ou não reconhecidos pelo Estado. Havia, ainda, muitas outras regras a serem

seguidas. O artigo 521 da CLT (atualizado em 1946) estabelece:

Art. 521 – São condições para o funcionamento do Sindicato: a) proibição de

qualquer propaganda de doutrinas incompatíveis com as instituições e os interesses

da Nação [...]; d) proibição de quaisquer atividades não compreendidas no art. 511,

inclusive as de caráter político-partidário [...].

Aqui, vê-se claramente que a proibição de “propaganda de doutrinas incompatíveis

com as instituições e os interesses da Nação” e de “atividades de caráter político-partidário”

traduzia a disposição de Vargas para controlar e reprimir qualquer manifestação contrária ao

seu governo. Vale recordar que o Brasil ainda convivia com o ideário oligárquico da

República Velha, simultaneamente à propagação das ideologias de esquerda no seio da classe

4 BRASIL. Decreto-Lei nº 5.452, de 01 de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Rio deJaneiro, RJ, mai. 1943. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm>. Acessoem: 09 fev. 2018.

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trabalhadora. Entre os dois polos, situava-se o governo personalista e centralizador de Getúlio

Vargas, aliciando, equilibrando e debelando como pôde as forças de oposição.

A CLT concebeu um modelo de organização sindical ao mesmo tempo parceiro,

dependente e subserviente aos ditames estatais. Como prevê o artigo 521 (atualizado em

1966), “em circunstâncias que perturbem o funcionamento de entidade sindical ou motivos

relevantes de segurança nacional”, o Ministério do Trabalho podia intervir imediatamente nos

sindicatos.

Instituiu também a contribuição sindical obrigatória, deduzida da receita das empresas

e do salário dos trabalhadores e repartida pelo Estado entre centrais sindicais, confederações,

federações e sindicatos de base. A contribuição favoreceu historicamente o surgimento dos

chamados “pelegos”: sindicalistas que atuam em conformidade com o interesse de patrões e

governantes para obter vantagens pessoais, em detrimento da categoria profissional

representada.

Apesar dos inúmeros avanços sociais e trabalhistas, a Lei desenhou um sistema

autoritário e corporativista para o trabalho no setor privado, conferindo poderes quase

ilimitados ao Estado para mediar, resolver ou reprimir qualquer conflito entre empregados e

empregadores.

Como sintoma do autoritarismo, os servidores públicos foram relegados na CLT. O

artigo 7º declara expressamente que os preceitos da Lei não se aplicam aos “funcionários

públicos da União, dos Estados e dos Municípios”, nem “aos servidores de autarquias

paraestatais”. Quanto ao direito de sindicalização, o artigo 566 (reformulado em 1985)

arremata: “Não podem sindicalizar-se os servidores do Estado e os das instituições

paraestatais”, com exceção dos “empregados das sociedades de economia mista, da Caixa

Econômica Federal e das fundações criadas ou mantidas pelo Poder Público” 5. Deixar a

grande maioria dos servidores fora da CLT era sinal de que o governo desejava manter um

controle cerrado sobre a máquina estatal.

5No setor público brasileiro, coexistem dois regimes de contratação de pessoal: o estatutário e o celetista. O

regime estatutário consiste em leis específicas (estatutos) que regulam as relações de trabalho em todos os níveis

da administração pública. Do estatuto dos servidores federais emanam as regras que norteiam os estatutos

estaduais e municipais. Paulo Vidigal (2014) aponta três características que o distinguem: a “estabilidade após

três anos de efetivo exercício”, o “regime próprio de previdência social” e as “garantias para desempenho de

mandato eletivo”. O regime celetista, por sua vez, diz respeito aos servidores contratados sob as normas da CLT

para trabalhar principalmente em empresas públicas, sociedades de economia mista e atividades temporárias,

respeitando, ao mesmo tempo, os princípios da administração pública.

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Nas palavras de Maurício Sardá Faria (2009),

No mesmo processo em que busca recuperar esse movimento autônomo dos

trabalhadores para o interior de uma estrutura sindical de Estado, ao mesmo tempo

em que isola e liquida o anarcossindicalismo pelas vias da oficialização e da

verticalização (sem abandonar o meio usual da repressão), o corporativismo

varguista busca construir ideologicamente uma nova relação entre capital e trabalho

em que o Estado assume como papel central a regulação e harmonização dos

conflitos de classe. Uma vez situado o Estado acima das classes, torna-se

incompatível aos funcionários estatais almejarem uma forma de organização similar

à classe trabalhadora.

Já o modelo sindical concebido na Constituição Federal de 1988 inaugurou uma nova

fase do sindicalismo no Brasil, acenando para o horizonte democrático que se descortinou na

época. Em sintonia com os fundamentos de cidadania, valorização do trabalho e livre

iniciativa, a Carta estabelece:

Art. 8º – É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte: I – a lei

não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o

registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a

intervenção na organização sindical; [….] III – ao sindicato cabe a defesa dos

direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões

judiciais ou administrativas; […] VI – é obrigatória a participação dos sindicatos nas

negociações coletivas de trabalho […].

De forma simples e direta, a Constituição descreve no artigo acima as diretrizes

básicas para a formação de um sindicato. Ela confere, pela primeira vez, ampla liberdade e

segurança às entidades e dirigentes sindicais, pois veda de forma categórica a possibilidade de

intervenção do Poder Público e protege os diretores contra eventuais demissões durante o

exercício do mandato. Os critérios de organização só serão melhor desenvolvidos no Código

Civil de 2002, no capítulo sobre as associações de direito privado, categoria na qual estão

enquadrados os sindicatos.

Essas e outras conquistas, consignadas na Carta, são o corolário das lutas históricas

dos movimentos sociais e da classe trabalhadora brasileira, desde os anarcossindicalistas do

início do século XX, até os metalúrgicos do ABC e os professores paulistas em 1978.

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2.2. O novo sindicalismo no setor público

Uma vez que era proibida a sindicalização dos servidores públicos, restava-lhes a

alternativa de constituir associações profissionais, de caráter recreativo, esportivo, cultural

e/ou assistencial. Foram nelas que os trabalhadores do Estado começaram a organizar as

demandas em comum da categoria, contando apenas com a mensalidade de seus associados

(FARIA, 2009).

Arnaldo Mazzei Nogueira (1999, p. 69) acrescenta que, mesmo representando os

interesses corporativos do funcionalismo público, as associações “não tinham qualquer

perspectiva de mobilização coletiva e estabeleciam com o Estado uma relação de

subserviência e colaboração”.

Não obstante, como observa Cézar Guedes (1994, p. 409), elas se multiplicaram a

partir da década de 1950 e preencheram a lacuna que havia na legislação trabalhista sobre o

direito de associação sindical no setor público. Ainda segundo o autor, a primeira experiência

bem-sucedida de articulação geral dos servidores ocorreu em 1952, “quando foram criadas a

Confederação dos Servidores Públicos do Brasil e a União Nacional dos Servidores Públicos

do Brasil”.

Após um período de retração, dois eventos em 1978 marcaram a história do

movimento sindical no Brasil, inaugurando a fase do “novo sindicalismo”: a greve dos

metalúrgicos do ABC paulista (setor privado) e a greve dos professores da rede estadual de

ensino de São Paulo (setor público).

O ano foi emblemático, especialmente no setor público, pois deflagrou um processo

inédito de organização dos servidores e representou uma mudança de paradigma dentro das

antigas associações. Elas deixaram de ser organicamente assistenciais para assumir o papel de

entidades sindicais, fazendo, inclusive, oposição política à Ditadura Militar. Os professores da

rede pública ocuparam a vanguarda do movimento que nascia, a exemplo dos metalúrgicos na

região metropolitana de São Paulo (NOGUEIRA, 1999, p. 52-53)

A greve dos professores abriu caminho para a organização de outras categorias do

funcionalismo que não possuíam cultura de ação sindical, como a dos médicos. O fato refletia

uma tendência mundial de sindicalização dos “assalariados de classe média” 6 (FARIA, 2009).

6 Entenda-se como assalariado de classe média, resumindo Augusto César Buonicore (2002), os profissionais

urbanos que realizam trabalho assalariado, intelectual e não manual, ligado principalmente ao setor de serviços:

médicos, engenheiros, bancários, advogados, contadores, auxiliares administrativos etc.

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O associativismo no setor público apresentava particularidades típicas do novo

sindicalismo no Brasil. À semelhança dos anarquistas da Greve de 1917, os novos

sindicalistas mobilizavam os trabalhadores diretamente em seus locais de trabalho, sem que o

movimento tivesse natureza institucional. Sua atuação se caracterizava por uma “prática

sindical mais localizada e mobilizadora, buscando uma articulação nacional”. A proibição do

direito de greve e sindicalização no serviço público “fez com que a iniciativa e a prática

sindical tivessem aí um tom altamente politizado. Estavam em questão a liberdade de

organização e expressão, a luta pelas liberdades democráticas” (GUEDES, 1994, p. 409), tão

vilipendiadas durante a Ditadura.

A experiência dos professores paulistas revela

uma prática de auto-organização dos trabalhadores muito frequente no Brasil no

final dos anos 70. Neste período, o movimento das oposições sindicais,

desenvolvido nas principais categorias profissionais, não poucas vezes ultrapassava

as entidades sindicais para levar à diante os processos de luta de forma autônoma e

com ampla participação das bases, enfrentado nesses embates, além dos patrões e

dos governos, as próprias direções dos sindicatos ou associações profissionais

(FARIA, 2009).

A paralisação foi conduzida por um comando de greve alheio à cúpula dirigente do

atual Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (APEOESP), que

na época era contrário à greve. O movimento envolveu cerca de 80% da categoria e

repercutiu, em seguida, nas greves dos educadores do Paraná, Brasília, Rio de Janeiro, Rio

Grande do Sul e Minas Gerais (NOGUEIRA, 1999, p. 53).

Sidney Jard da Silva (2005) reforça que, superado o período assistencialista, as

associações de servidores passaram a participar ativamente da reorganização do movimento

sindical no Brasil. Ou como pontua Jorge Blascoviscki Vieira (2007), “os servidores públicos

não só adentraram a cena política em conjunto com os demais atores do sindicalismo, como

também estiveram presentes em todos os momentos gerais marcantes para o novo

sindicalismo”.

Havia uma clara “diversidade política e ideológica” nas entidades do funcionalismo.

As associações do novo sindicalismo, especificamente, eram comandadas por lideranças de

esquerda, que defendiam “políticas socializantes” e faziam “oposição política aos governos”

(NOGUEIRA, 1999, p. 58).

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Junto com bancários e metalúrgicos, os servidores formaram o eixo fundamental para

a criação da Central Única dos Trabalhadores (CUT), em 1983, durante o 1º Congresso

Nacional da Classe Trabalhadora (Conclat), em São Bernardo do Campo. Assim como as

associações, a CUT não existia legalmente (FARIA, 2009). O reconhecimento formal das

centrais sindicais só foi regulamentado em 2008, através da Lei Federal nº 11.648.

No decorrer dos anos 1980, os trabalhadores estatais tiveram representação cada vez

maior na Central. Esta aglutinava não apenas sindicatos oficiais, mas também as organizações

independentes do funcionalismo e os grupos de oposição dentro do movimento sindical. Com

algumas exceções, “o novo sindicalismo dos funcionários públicos é filiado à CUT”

(NOGUEIRA, 1999, p. 55).

Após décadas de atividade clandestina, o direito de sindicalização do servidor público

foi finalmente assegurado na Constituição de 1988. O artigo 37, inciso VI, preconiza: “é

garantido ao servidor público civil o direito à livre associação sindical”. A condição de

legalidade não alterou o modus operandi do movimento. Por outro lado, multiplicaram-se

sindicatos novos ou recém-legalizados e suas formas de organização (NOGUEIRA, 1999, p.

56). Em 1990, para se ter uma ideia, foram criados 400 sindicatos no setor público, 239 no

comércio e 237 na indústria (SILVA, 2005).

O direito de sindicalização dos servidores já era tema da Convenção nº 151 de 1978 da

OIT, acerca das relações de trabalho na administração pública. O Brasil a ratificou somente

em 2010, como sinal da relutância dos governos em reconhecer o exercício da liberdade

sindical na esfera pública.

A Assembleia Nacional Constituinte de 1987, apesar do debate que se instalou,

rejeitou a expressão “trabalhador público” para designar os servidores, embora eles já

tivessem com o Estado uma relação típica de “empregado/empregador”, semelhante à do setor

privado. Entre outras questões, o status de trabalhador público pressupunha

a afirmação de uma identidade coletiva que desvinculava os empregados no

aparelho estatal tanto da imagem do funcionário patrimonialista, quanto da figura do

burocrata do tipo weberiano. Ao mesmo tempo, procurava incluir os empregados da

administração pública dentro da concepção mais ampla de classe trabalhadora

(SILVA, 2005 apud NOGUEIRA, 1999).

A Assembleia, contudo, também rejeitou a expressão “funcionário público”, que

poderia remeter à caricatura tradicional do trabalhador pequeno-burguês, preguiçoso e

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privilegiado com altos salários. Os deputados constituintes optaram, então, pelo termo

“servidor público” para chegar a um consenso com os oposicionistas.

Mas, afinal, de onde surgiu a necessidade do “funcionário patrimonialista”, ou do

“burocrata weberiano”, de se organizar em sindicatos e fazer parte da classe

trabalhadora geral? Antes de responder, é necessário levantar alguns aspectos do

funcionalismo público no período anterior a 1988.

As políticas de nacional-desenvolvimentismo no Brasil, que remontam à Era Vargas e

se estendem pela década de 1970, transformaram o Estado não só em provedor do bem-estar

social e mantenedor da ordem, mas também em produtor de bens e mercadorias. Os objetivos

eram, a priori, o desenvolvimento industrial e a independência econômica do país em relação

às potências mundiais.

Surgiram, nesse contexto, empresas estatais como a Petrobras, onde convivem dois

tipos de assalariados do Estado: o servidor ligado ao setor produtivo e o servidor voltado à

prestação de serviços públicos básicos.

Os trabalhadores do “setor produtivo estatal” são responsáveis pela produção direta de

bens, produtos e serviços comercializáveis, principalmente nas empresas públicas e

sociedades de economia mista. Suas relações de trabalho são regidas pela CLT (GUEDES,

1994, p. 414).

A segunda categoria realiza tarefas análogas às dos assalariados de classe média:

profissionais liberais, autônomos, prestadores de serviços, funcionários de escritório, entre

outros. É formada por trabalhadores do setor público, que atuam na administração direta do

Estado, sob regime estatutário (GUEDES, 1994, p. 405). Eles são responsáveis pela prestação

de serviços e execução de políticas públicas destinadas à população, em diversas áreas:

educação, saúde, segurança, esporte, saneamento, habitação etc .

No final da década de 1970, os servidores começaram a sofrer os primeiros ataques

por parte dos governos militares. Iniciou-se, no período, uma política de ajuste fiscal,

contenção de gastos públicos, demissões e cortes salariais que lhes acarretou uma crescente

defasagem do poder aquisitivo nas décadas seguintes. Fato que já vinha ocorrendo há algum

tempo nas potências capitalistas, por ocasião da crise mundial do petróleo.

Os anos 1980, como se sabe, ficaram conhecidos como “década perdida” na América

Latina. A queda brusca do preço das commodities e o galope da dívida externa devastaram a

economia dos países latino-americanos, que dependiam quase que exclusivamente da

exportação de produtos primários para alavancar o Produto Interno Bruto (PIB).

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Nesse contexto de crise generalizada, alguns intelectuais resgataram e atualizaram os

princípios do liberalismo de Adam Smith para responder ao colapso das economias

capitalistas. Os estudos originaram o “neoliberalismo”, cujo postulado se ampara na

globalização dos mercados; na reafirmação das liberdades individuais e da propriedade

privada; na privatização de empresas estatais; nas leis abstratas do livre-mercado; na

concepção de um estado-mínimo, não intervencionista. O neoliberalismo encerrou, de certo

modo, a hegemonia do “estado de bem-estar social”, ou do welfare state keynesiano, no

pensamento econômico mundial.

Diante das investidas contra o funcionalismo no Brasil, em nome da recuperação

econômica, formou-se gradualmente entre os servidores uma consciência de classe. Eles

passaram a se enxergar, também, como parte da classe trabalhadora geral. As políticas de

austeridade fiscal e redução do Estado aprofundaram a “proletarização dos servidores

públicos e a precarização das relações de trabalho”. Tais políticas ocasionaram demissões,

perdas salariais e extinção de direitos trabalhistas, tendo como parâmetro, cada vez mais, os

critérios de produtividade do setor privado (FARIA, 2009).

O contexto de crise econômica e redemocratização política nos anos 1980 foram

determinantes

para despertar nos trabalhadores dos serviços públicos a busca pelas formas

clássicas de associação e organização sindical e também de novas identidades de

classe com os demais trabalhadores. Em torno dessa questão concorrem diversos

outros fatores, mas o essencial, no caso do Brasil, foi a combinação da crise

econômica, crise do Estado e transição política, que provocou o arrocho salarial e a

deterioração das condições de trabalho dos funcionários públicos (NOGUEIRA,

1999, p. 54).

De outro modo, pode-se dizer que a resistência contra as medidas dos governos

Figueiredo/Sarney, a formação de uma consciência de classe e os avanços político-sociais da

Constituição de 1988 foram os grandes propulsores do sindicalismo no setor público.

Contudo, outros fatores também merecem destaque.

Em primeiro lugar, a estabilidade e as melhores condições de trabalho no Estado

“favorecem a sindicalização e a participação no movimento sindical, comparativamente ao

setor privado com alto índice de rotatividade e de economia oculta e informal” (NOGUEIRA,

1999, p. 62). Outro ponto diz respeito à negação das práticas de nepotismo e clientelismo

como critério para contratar e promover os servidores na carreira (FARIA, 2009). A

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necessidade de racionalizar a burocracia estatal, por conta do aumento de pessoal e do alcance

dos serviços públicos, contribuiu para minar essas práticas (NISBET, 1978 apud

NOGUEIRA, 1999, p. 69). Foram adotados, em obediência à Constituição, os concursos

públicos e os planos de carreira, com regras claras para a progressão funcional. A falência do

modelo de “troca de favores” levou alguns servidores a procurar proteção e segurança não

mais no gabinete das chefias, mas sim na porta dos sindicatos.

Ainda em alta no limiar da década de 1990, a taxa de sindicalização dos trabalhadores

públicos começou a cair nos anos seguintes. As reformas estruturais implementadas pelos

governos de Fernando Collor, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso (FHC) aceleraram

o processo de privatização das estatais e terceirização dos serviços públicos, seguindo a

cartilha do Consenso de Washington7. Paralelamente ao desmonte da máquina pública,

buscou-se “estancar a ofensiva dos sindicatos de funcionários públicos, tendo em vista o

diagnóstico de que a organização sindical no Estado invade e abala as estruturas estatais”

(VIEIRA, 2007).

Se os anos 1980 foram uma “época de ouro” para o sindicalismo do setor público,

a década de 90, ao contrário, assinala uma inflexão na tendência ascendente do

número de greves, número de grevistas e número de jornadas não trabalhadas em

função das greves no setor público. […] Conforme consta no boletim do DIEESE nº

193, no ano de 1996, aumentaram as “dificuldades nas negociações coletivas em

comparação com anos anteriores” em função das políticas de contenção de despesas

públicas e privatização das estatais (SILVA, 2005).

Mesmo em tal cenário, Silva (2005) informa que a greve dos petroleiros em maio de

1995 alavancou uma grande mobilização dos trabalhadores do setor público contra a quebra

dos monopólios estatais e as reformas administrativa e previdenciária do Governo FHC.

Insurgiram-se através de sindicatos vinculados à CUT: petroleiros, telefônicos, ferroviários,

7A estratégia neoliberal funciona da seguinte forma. Reduz-se a quantidade de serviços públicos prestados

exclusivamente por servidores para, em seguida, reduzir o próprio número de servidores, mediante programas de

demissão voluntária, aposentadorias e suspensão de concursos públicos. Com a diminuição do funcionalismo e o

avanço das privatizações, os sindicatos são golpeados pela perda de filiados e pela insegurança nascida entre os

demais. Propaga-se, então, o justo receio dos servidores de terem prejudicadas sua remuneração, suas condições

laborais e sua estabilidade no cargo, já que os trabalhadores do setor privado costumam realizar tarefas

semelhantes por salários menores. Logo, participar de uma entidade sindical pode acabar sendo motivo de

perseguição ou até de exoneração.

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eletricitários, funcionários de universidades, trabalhadores da saúde, da previdência, entre

outros servidores federais e estaduais.

Sobre a política para o funcionalismo no período, ficou registrado:

O atual governo FHC esboça uma política que, guardadas as devidas proporções,

significa certa continuidade da política de Collor no que se refere aos funcionários

públicos e ao Estado, principalmente por esboçar uma política nada negociadora,

com elementos autocráticos e por criar um jogo de “queda de braço” nesse campo. O

enfrentamento com os petroleiros e as […] demissões esboçadas para os demais

funcionários do setor público demonstram essa ausência de sensibilidade com os

trabalhadores. [...] Alguns fatos, sem entrar no mérito, são autoexplicativos: […] a

degradação salarial nos serviços públicos e sociais e ausência de reajustes para o

serviço público federal desde janeiro de 1995; a reforma administrativa anunciando

o fim da estabilidade no emprego […] e extinguindo a sustentação financeira dos

líderes associativos e sindicais; a imagem negativa do funcionário público na

sociedade; a precarização e terceirização do trabalho no setor público em geral e a

recente reforma previdenciária, que amplia a tributação para grande parte dos

servidores públicos ativos e inativos (NOGUEIRA, 1999, p. 59; 66-67).

A partir da eleição de Luís Inácio Lula da Silva (PT), em 2002, criou-se a expectativa

de que o ex-líder sindical e metalúrgico frearia o desmantelamento estatal e, à frente da

presidência, implementaria políticas socializantes que proporcionassem condições mais

dignas de emprego e renda aos trabalhadores em geral. Os setores mais combativos do

sindicalismo, diante da ambiguidade política e ideológica do Governo Lula, viram-se em uma

encruzilhada, sobretudo os mais afinados com a CUT: de um lado, participar de um governo

que flertava com o mercado financeiro e arriscar sua representatividade nos meios social e

sindical; de outro, não participar de um governo que conjugava os ideais da esquerda e

fortalecer a oposição e seu projeto neoliberal.

O caderno de resoluções do VII Congresso do Sindicato dos Servidores Públicos

Municipais de Maringá (Sismmar), realizado em novembro de 2007, ilustra parte dos embates

sindicais no setor público durante os anos 2000. No capítulo que analisa a conjuntura

nacional, a categoria aprovou a seguinte tese:

Diante dos acontecimentos da realidade, não é mais possível defender a tese de que

Lula é um governo dos trabalhadores. Lula, apesar da origem pobre e operária,

governa para os patrões. Nesse sentido, não difere em nada de FHC […].

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Em relação à previdência pública, em 2003, num golpe violento aos

servidores públicos, acabou com a aposentadoria por tempo de serviço, passou a

cobrar previdência dos aposentados e do 13º salário dos trabalhadores da ativa e

ampliou de 7% para 11% a nossa contribuição para a previdência (Capsema).

[…] A política salarial para os servidores públicos também continuou a

mesma de FHC: arrocho e desqualificação do servidor público. Durante a greve do

funcionalismo federal, em 2006, Lula chegou ao cúmulo de oferecer 0,1% de

reposição, quando as perdas chegavam a quase 50%. E, agora, em 2007, superou seu

antecessor, apresentando projeto que pretende acabar com as greves no serviço

público (Sismmar: “Caderno de Resoluções do VII Congresso do Sismmar”, 10-

11/11/2007).

Guardando semelhanças com as medidas de austeridade fiscal do governo de Michel

Temer, a partir de agosto de 2016, o que estava em jogo naquela época, além da reforma da

previdência, eram as reformas sindical, universitária e trabalhista. Aliás, o foco da reforma

sindical era justamente regulamentar o direito de greve no serviço público, assunto do

próximo capítulo deste trabalho. Adiante, sobre o papel da CUT no Governo Lula e as

dissidências no mundo sindical, o caderno relata:

[…] os trabalhadores passaram a se organizar por fora da CUT, pois ela não

encampava as principais lutas contra o Governo – o que foi considerado por muitos

como uma traição. Diante disso, abriu-se uma imensa crise. Ao longo dos ataques do

Governo e do silêncio da Central, o movimento se dividiu em dois: por um lado os

que estavam contra as reformas neoliberais do Governo e por outro os que ainda

mantinham ilusões no Governo e na CUT.

Os sindicatos […] estavam na CUT, mas para lutarem contra as reformas

foram obrigados a lutarem contra a própria CUT, braço do Governo no movimento

sindical. Para tentar reaglutinar os lutadores, foi criada a Coordenação Nacional de

Lutas (Conlutas), uma coordenação que aglutinaria sindicatos e movimentos, mesmo

os que estivessem atuando por dentro da CUT, com o objetivo de fortalecer a luta

contra as reformas.

[…] Com tudo isso, manifestações importantes foram realizadas,

principalmente dos servidores públicos. Os servidores na conjuntura atual,

juntamente com os estudantes, assumiram o papel de protagonistas nas lutas contra o

governo: os professores, os controladores de voo, os trabalhadores do Ibama,

Correios, bancos públicos, servidores de todas as esferas fizeram greves, em grande

parte para defender o que estavam perdendo.

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As divergências ideológicas e de condução da política nacional entre as centrais e seus

sindicatos atravessaram os governos petistas de Lula (2003-2010) e Dilma Roussef (2011-

2016). Mas, para o objetivo deste tópico, não convém aprofundá-las, nem adentrar as

especificidades do sindicalismo a partir do Governo Temer, ainda muito recentes e nebulosas.

As questões discutidas até aqui são suficientes para se ter uma ideia geral das lutas

empreendidas pelos trabalhadores do setor público na tessitura dos governos.

2.3. Direito de greve no setor público

A reboque do direito de sindicalização, a Constituição de 1988 legalizou o direito de

greve no serviço público civil, excluindo mais uma vez os militares. Após várias décadas, os

movimentos de greve dos trabalhadores estatais deixaram de ser um crime, passível de prisão

ou punições, para encontrar guarida na ordem constitucional:

Art. 37 – A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da

União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios

de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao

seguinte: […] VI – é garantido ao servidor público civil o direito à livre associação

sindical; VII – o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos

em lei específica (atualizado em 1998) […] (BRASIL, 1988).

No setor privado, tal direito e suas limitações já não eram uma novidade na legislação

brasileira e foram referendados no artigo 9º da Constituição. Além do permissivo legal para a

paralisação coletiva e voluntária do trabalho, ficou prevista a elaboração de uma lei que

discorreria sobre as restrições ao direito de greve em serviços essenciais e as ações que

poderiam ser consideradas ilegais e abusivas.

Embora o tema seja objeto de regulamentação nos últimos séculos, há notícias de

paralisações no mundo desde eras longínquas. Os escravos da Antiguidade e, depois, os

servos da Idade Média já ousavam cruzar os braços para tentar melhorar suas condições de

vida e trabalho. Todavia, foi no desenrolar da 1ª Revolução Industrial, na França, que se

popularizou o termo “greve”, com o sentido que lhe atribuímos hoje:

Grève em francês quer dizer cascalho, areal. Antes da canalização do Rio Sena, em

Paris, as cheias do rio depositavam pedras e gravetos numa praça, a qual se

denominou Place de Grève. Nesse lugar se reuniam os trabalhadores à procura de

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emprego. Com o surgimento das paralisações do trabalho, os trabalhadores passaram

a reunir-se na mesma praça em que faziam greve. Daí passou-se a usar em francês o

nome grève para denominar as paralisações dos trabalhadores [MARTINS, 2002

apud VIDIGAL, 2014].

No Brasil, desde a 1ª República, o direito de greve veio sendo tratado como um delito.

O Código Penal de 1890 trazia, no artigo 205, as penas de multa e prisão para quem aliciasse

os empregados de algum estabelecimento a interromper seu trabalho “sob promessa de

recompensa ou ameaça”. Adiante, no artigo 206, aquele que provocasse a suspensão do

trabalho para “impor aos operários ou patrões aumento ou diminuição de serviço ou salário”

também seria detido (VIDIGAL, 2014).

Durante a presidência de Getúlio Vargas, as penalidades ao exercício da greve

sofreram alterações. A Lei nº 38 de 1935 e o Decreto-Lei nº 431 de 1938, que definiam os

“crimes contra a ordem política e social”, ainda a tratavam como delito, punindo com prisão

quem incitasse a greve em serviços públicos. (MARTINS, 2002 apud VIDIGAL, 2014)

Curiosamente, ambas as leis estabeleciam apenas a perda do cargo aos funcionários públicos

que organizassem paralisações por iniciativa própria.

No Decreto-Lei nº 1.237 de 1939, que instituiu a Justiça do Trabalho, e na CLT de

1943, a cessação coletiva do trabalho poderia acarretar aos envolvidos as penas de

afastamento, demissão, perda de mandato sindical ou prisão, contanto que fosse deflagrada

“sem prévia autorização do tribunal trabalhista” (MARTINS, 2002 apud VIDIGAL, 2014).

Nos casos de paralisação de serviços públicos, a punição deveria ser aplicada em dobro.

A greve no setor privado deixou de ser crime e se converteu em direito somente na

Constituição de 1946. Em 1964, a Lei que regulamentou o artigo 158 da Constituição

estendeu o direito de greve também aos celetistas do setor público:

Lei nº 4.330/1964. […] Art. 4º – A greve não pode ser exercida pelos funcionários e

servidores da União, Estados, Territórios, Municípios e autarquias, salvo se se tratar

de serviço industrial e o pessoal não receber remuneração fixada por lei ou estiver

amparado pela legislação do trabalho (BRASIL, 1964).

A Constituição de 1967 reiterou o direito de greve aos trabalhadores do setor privado,

mas, em sentido contrário, o proibiu ao funcionalismo público, sem distinção entre

estatutários e celetistas. Na mesma linha, a Lei de Segurança Nacional de 1978 previu pena de

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reclusão a quem promovesse ou incitasse a suspensão do trabalho em serviços públicos ou

atividades essenciais, definidas em lei específica (MARTINS, 2002 apud VIDIGAL, 2014).

A situação denotava a mudança de direção que a legislação sofreu a partir do Regime

Militar, sobretudo nos “anos de chumbo". Como sinal do recrudescimento, foram suprimidas

penas mais brandas como o afastamento, a demissão ou a cassação do mandato sindical

daqueles que, de alguma forma, comprometessem o funcionamento das atividades públicas. A

necessidade de manter um Estado forte e autoritário não permitia aos militares tolerar que os

trabalhadores desse mesmo Estado se rebelassem contra a ordem estabelecida.

Como visto no subcapítulo anterior, a partir de 1978, as greves capitaneadas pelos

metalúrgicos do ABC paulista e professores da rede estadual de São Paulo, com pautas

políticas e salariais, pressionaram fortemente as bases já fragilizadas da Ditadura. Em

conjunto com os movimentos sociais e a campanha pelas Diretas Já, a CUT e os setores mais

avançados do novo sindicalismo contribuíram de modo decisivo para acelerar o processo de

redemocratização do país na década de 1980.

Os esforços conjugados da sociedade culminaram na formação da Assembleia

Nacional Constituinte, que elaborou e promulgou a Constituição de 1988. Como frutos da

participação ativa do funcionalismo na luta pelas liberdades democráticas, os direitos de

associação sindical e greve dos trabalhadores estatais finalmente se consolidaram. Conforme a

Carta, a greve no serviço público civil será exercida “nos termos e nos limites definidos em lei

específica” (artigo 37, inciso VII).

Paulo Vidigal (2014) observa que, decorridos trinta anos da Constituição,

a lei específica a que se refere o inciso VII do Art. 37, que regularia o exercício do

direito de greve dos servidores públicos, ainda não foi criada. Paira sobre o tema

uma lacuna legislativa. Em decorrência disso, o Poder Judiciário tem aplicado por

analogia a Lei 7.783/89 (Lei de Greve) para regular a greve de servidores públicos.

A Lei nº 7.783 de 1989 regulamenta, de forma originária, os “serviços ou atividades

consideradas essenciais, impondo novas restrições à realização de greves” no setor privado

(FARIA, 2009). Em consonância com a previsão constitucional, o artigo 16 dispõe que os

termos e limites ao direito de greve do servidor público serão definidos em lei complementar.

A Lei de Greve derivou da Medida Provisória nº 59/1989 e continua em vigor nos dias

atuais. Na sentença proferida em um Mandado de Injunção de 2007, o Supremo Tribunal

Federal (STF) estabeleceu que ela “deve ser aplicada aos conflitos e às ações judiciais que

envolvam a interpretação do direito de greve dos servidores públicos civis enquanto não for

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promulgada uma lei específica”. Quanto à “lacuna legislativa”, existem projetos de lei no

Senado que buscam disciplinar a matéria (VIDIGAL, 2014).

A Lei se destina originalmente aos trabalhadores do setor privado porque resulta do

parágrafo 1º do artigo 9º da Constituição, no capítulo sobre os direitos sociais da coletividade:

Art. 9º – É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir

sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele

defender. § 1º – A lei definirá os serviços ou atividades essenciais e disporá sobre o

atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade (BRASIL, 1988).

Contudo, na ausência da legislação específica, o STF decidiu estender a aplicabilidade

da Lei nº 7.783/1989 às greves do funcionalismo, por conta de uma certa analogia entre os

setores público e privado nesse aspecto. Ela prescreve uma série de exigências para que uma

greve seja considerada legal e não abusiva.

No artigo 2º, o exercício legítimo do direito de greve é entendido como “a suspensão

coletiva, temporária e pacífica, total ou parcial, de prestação pessoal de serviços a

empregador.

A “cessação coletiva do trabalho” só será permitida se a negociação das demandas

trabalhistas entre empregado e empregador, ou servidor e gestor público, fracassar (artigo 3º).

Porém, antes de ser deflagrada, a entidade sindical deve convocar uma assembleia geral, na

forma do respectivo estatuto, para definir as reivindicações da categoria profissional

representada e deliberar sobre uma possível paralisação do trabalho (artigo 4º). Em caso de

deliberação pela greve, a entidade patronal ou, diretamente, os patrões e chefes do Poder

Executivo deverão ser notificados da decisão com antecedência mínima de 48 horas (artigo 3º,

parágrafo único).

Aos sindicatos e grevistas, a Lei autoriza o uso de métodos pacíficos para convencer

os trabalhadores a aderirem à greve. Poderão ser arrecadados recursos financeiros destinados

à manutenção do movimento. Os empregadores, públicos ou privados, estão proibidos de

coagir seus subordinados a retornarem ao trabalho involuntariamente. Estão proibidos, ainda,

de impor obstáculos à divulgação dos atos e acontecimentos da greve nos locais de trabalho.

Por outro lado, os grevistas não podem bloquear, sob ameaça de violência ou agressão, o

acesso dos trabalhadores que desejem trabalhar, nem danificar a propriedade de ente público

ou privado (artigo 6º). Ou seja, os tradicionais “piquetes” são permitidos, contanto que sejam

pacíficos e não violem os direitos fundamentais de outro indivíduo.

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Conforme o artigo 7º, seguidas as normas da Lei, a participação no movimento

paredista “suspende o contrato de trabalho, devendo as relações obrigacionais, durante o

período, ser regidas pelo acordo, convenção, laudo arbitral ou decisão da Justiça do

Trabalho”. Traduzindo para o setor público, as obrigações mútuas entre gestores e servidores,

celetistas ou estatutários, ficam suspensas no transcorrer da greve. Todavia, como será

aprofundado em outro momento, a Justiça do Trabalho não tem competência legal para

resolver os conflitos dentro da administração pública, fato que tem gerado inúmeras

complicações às greves do funcionalismo.

O parágrafo único do mesmo artigo dispõe: “É vedada a rescisão de contrato de

trabalho durante a greve, bem como a contratação de trabalhadores substitutos, exceto na

ocorrência das hipóteses previstas nos artigos 9º e 14”. Aqui, entra-se em um dos pontos

fulcrais da Lei de Greve: a essencialidade (artigo 7º, parágrafo único).

Enquanto durar o movimento, o sindicato da categoria ou, na ausência deste, uma

comissão de negociação precisa designar uma equipe mínima de trabalhadores para garantir a

continuidade dos serviços considerados essenciais ao bem-estar da população. A definição da

equipe, da quantidade de membros e de quais atividades essenciais serão mantidas dependerá

de um acordo com o empregador ou com a entidade patronal que o representa. Não havendo

acordo, é facultado ao empregador contratar novos funcionários para realizá-las ou contratar

os serviços de uma empresa privada. A terceirização, nesses casos, tornou-se bastante comum

na esfera estatal (artigo 9º).

No artigo 10, estão listados os serviços e atividades essenciais, segundo os critérios da

Lei:

Art. 10 – São considerados serviços ou atividades essenciais: I – tratamento e

abastecimento de água; produção e distribuição de energia elétrica, gás e

combustíveis; II – assistência médica e hospitalar; III – distribuição e

comercialização de medicamentos e alimentos; IV – funerários; V – transporte

coletivo; VI – captação e tratamento de esgoto e lixo; VII – telecomunicações; VIII

– guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais

nucleares; IX – processamento de dados ligados a serviços essenciais; X – controle

de tráfego aéreo; XI – compensação bancária (BRASIL, 1989).

A questão da essencialidade reaparece no artigo seguinte. Porém, a recomendação de

um pacto formal entre sindicatos, empregadores e trabalhadores para manter as atividades

essenciais é colocada de modo mais enfático. As partes, agora, ficam “obrigadas, de comum

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acordo, a garantir, durante a greve, a prestação dos serviços indispensáveis ao atendimento

das necessidades inadiáveis da comunidade”. O parágrafo único do artigo 11 esclarece: “São

necessidades inadiáveis da comunidade aquelas que, não atendidas, coloquem em perigo

iminente a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população”. E, dessa vez, caso não haja

acordo, o Poder Público terá a responsabilidade de assegurar o cumprimento da essencialidade

(artigo 12).

Vale notar que o rol de atividades essenciais descritas no artigo 10 não esgota as

possibilidades e tem caráter apenas ilustrativo. Tendo em vista que a Lei foi pensada para a

iniciativa privada, é compreensível que o serviço de segurança pública, atribuição primordial

do Estado, esteja fora da lista. Mas o critério de analogia adotado para interpretar o direito de

greve do funcionalismo permitiria, em tese, incluí-la entre os serviços essenciais, pois a falta

de segurança pública coloca em “perigo iminente” a saúde e a sobrevivência da população. De

qualquer forma, o direito de greve de policiais militares e civis ainda é tão controverso que

não convém abordá-lo neste trabalho.

Além do propósito de atender às “necessidades inadiáveis da comunidade”, a Lei traz

outro conceito para definir a essencialidade. No artigo 9º, os serviços e atividades essenciais

são aqueles “cuja paralisação resultem em prejuízo irreparável pela deterioração irreversível

de bens, máquinas e equipamentos”, ou que sejam “essenciais à retomada das atividades da

empresa quando da cessação do movimento”. Esse ponto diz respeito, principalmente, aos

objetivos finalísticos de uma empresa ou entidade pública. Uma fábrica não pode prescindir

de suas máquinas e equipamentos em boas condições para entrar em operação, assim como

um órgão público de saúde não pode prestar atendimento satisfatório à população com

aparelhos e utensílios médicos danificados.

Se a greve envolver a interrupção de serviços essenciais, a entidade sindical ou a

comissão de negociação dos trabalhadores fica obrigada a comunicar o fato às instâncias de

representação patronal com antecedência mínima de 72 horas (artigo 13).

Apesar do cuidado ao tratar do tema, “a Lei nº 7.783/89 não estipula um percentual

mínimo de trabalhadores necessários para manutenção dos serviços e atividades essenciais

durante a realização da greve” (VIDIGAL, 2014). Tradicionalmente, o percentual que se

convencionou adotar corresponde a 30% do total da equipe que trabalha em cada área

essencial.

Entre as restrições, a Lei proíbe a prática do lock-out. Segundo o artigo 17, ela

consiste na “paralisação das atividades, por iniciativa do empregador, com o objetivo de

frustrar negociação ou dificultar o atendimento de reivindicações dos respectivos

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empregados”. Na ocorrência de lock-out, os grevistas têm assegurado o direito de receber os

salários normalmente. É comum acontecer

nas greves de servidores públicos a abstenção por parte do ente público de realizar

acordos com o sindicato/trabalhadores para fixar um percentual de servidores para

atendimento das atividades essenciais. Essa abstenção merece atenção por parte do

sindicato ou trabalhadores, pois pode motivar o Poder Judiciário a declarar a

abusividade da greve pela inobservância do art. 11 da Lei (VIDIGAL, 2014).

O artigo 14 informa que o abuso do direito de greve se configura pela “inobservância

das normas contidas na presente Lei, bem como a manutenção da paralisação após a

celebração de acordo, convenção ou decisão da Justiça do Trabalho”. O artigo seguinte

acrescenta: “A responsabilidade pelos atos praticados, ilícitos ou crimes cometidos no curso

da greve será apurada, conforme o caso, segundo a legislação trabalhista civil ou penal”.

Portanto, qualquer deslize, seja por desobediência às regras, seja por depredação de

propriedade alheia, por exemplo, pode ensejar a declaração de ilegalidade e abusividade da

greve pelo Poder Judiciário.

É válido registrar que a Lei nº 7.783/89 não contempla as greves por motivação

política e de solidariedade a outras categorias profissionais. Limita-se a regular a suspensão

do trabalho resultante do vínculo direto entre empregado e empregador, sobretudo em

questões salariais. As greves políticas e de solidariedade pressupõem, na maioria das vezes, a

inexistência do vínculo empregatício. Assim, não é possível, em termos legais, que os

trabalhadores de uma empresa paralisem o serviço para obter benefícios aos trabalhadores de

outra empresa. Da mesma forma, não é lícito aos servidores de uma prefeitura entrar em greve

contra uma decisão do governo federal. Caso contrário, é facultado ao ente empregador

descontar os dias parados do salário dos grevistas, com respaldo da Justiça. Esses

movimentos, cruciais para a evolução do direito do trabalho no Brasil, não oferecem qualquer

proteção jurídica aos participantes. A circunstância ajuda a compreender a índole das leis que

tratam do direito de greve no país. Nota-se que o objetivo é quase sempre proibir, restringir ou

controlar as manifestações que coloquem em xeque a burocracia estatal e a ordem burguesa.

Voltando ao tema da Justiça do Trabalho, quando se fala em “acordo, convenção ou

decisão”, a Lei de Greve remete ao seu papel constitucional de mediar, conciliar e julgar os

conflitos de trabalho, especialmente no setor privado. A atribuição já constava no artigo 643

da CLT e reafirmou-se no artigo 114 (atualizado em 2004) da Constituição:

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Art. 114 – Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: I – as ações oriundas

da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da

administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e

dos Municípios; II – as ações que envolvam exercício do direito de greve. […] § 1º

Frustrada a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitros. § 2º Recusando-se

qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas,

de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a

Justiça do Trabalho decidir o conflito […] (BRASIL, 1988).

Embora a Carta estenda essa competência ao setor público em geral, o Supremo

Tribunal Federal (STF) concluiu, em Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) de 1992,

que os efeitos da norma atingem apenas os trabalhadores da iniciativa privada e os servidores

estatais regidos pela CLT. A Adin nº492-1 questionava a validade do artigo 240 do Estatuto

dos Servidores Públicos Civis da União, das Autarquias e das Fundações Públicas Federais

(Lei nº8112/1990). A Suprema Corte julgou-o inconstitucional porque atribuía ao servidor

estatutário os direitos de negociação coletiva e ajuizamento de ações na Justiça do Trabalho.

Na interpretação dos ministros, tais direitos só caberiam aos celetistas. Em trecho do

processo, a subprocuradora-geral da República na época, Odília Ferreira, lembrou que o STF

e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já haviam reconhecido a prerrogativa da justiça comum

para julgar as contendas no Estado (STF, 1992).

Normalmente, a negociação coletiva entre empregados e empregadores no setor

privado dá origem aos acordos e convenções coletivas de trabalho8, documentos com valor

jurídico-normativo. Nessa etapa, é obrigatória a participação de sindicatos patronais e

profissionais (artigo 8º, inciso VI, da Constituição). Fracassada a negociação, as entidades

sindicais podem instaurar uma ação de dissídio coletivo9 na Justiça do Trabalho, havendo ou

não suspensão das atividades.

O STF entendeu que os mesmos direitos não valem para os servidores estatutários.

Não exclui, todavia, a possibilidade de se estabelecer um diálogo entre as partes para resolver

8 CLT. Art. 611 – Convenção Coletiva de Trabalho é o acordo de caráter normativo, pelo qual dois ou maisSindicatos representativos de categorias econômicas e profissionais estipulam condições de trabalho aplicáveis,no âmbito das respectivas representações, às relações individuais de trabalho. § 1º É facultado aos Sindicatosrepresentativos de categorias profissionais celebrar Acordos Coletivos com uma ou mais empresas dacorrespondente categoria econômica, que estipulem condições de trabalho, aplicáveis no âmbito da empresa oudas acordantes respectivas relações de trabalho (BRASIL, 1943).

9 Dissídio coletivo é uma ação judicial decorrente do conflito trabalhista, levada para apreciação e julgamento daJustiça do Trabalho.

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os conflitos de trabalho na esfera pública. Na análise de Raimundo Simão de Melo (2006,

apud VIDIGAL, 2014),

não obstante tenha o STF, na mencionada ADIn 492-1, negado o direito de

negociação coletiva ao servidor público [...], tal deve ser considerado em relação a

assinatura de instrumentos normativos, com força de lei, que são resultado de um

processo negocial. Porém, não está proibindo o diálogo social entre os entes

públicos e os sindicatos de servidores públicos na busca da necessária solução dos

conflitos coletivos de trabalho. Esse diálogo pode levar à assinatura de um

“protocolo de intenções”, pelo qual se compromete o ente público a apresentar um

projeto de lei ao Poder Legislativo com as reivindicações dos servidores […].

No decorrer deste trabalho, será evidenciado como a falta de uma legislação específica

e um foro exclusivo para julgar as greves do funcionalismo pode prejudicar as reivindicações

da categoria. De qualquer forma, as greves no Estado alcançaram grande destaque na história

do Brasil e ainda ocupam a vanguarda do movimento sindical na atualidade.

No princípio do novo sindicalismo, elas se distinguiram pela “longevidade”. A

paralisação de vários setores causou a perda de muitas jornadas de trabalho no período. Uma

vez que agiam por fora da estrutura sindical oficial, as organizações dos servidores nasceram

“desembaraçadas dos seus vícios corporativos” e levaram mais adiante “a liberdade e a

democracia sindicais, pelo menos nesse primeiro momento” (FARIA, 2009).

Como nas greves entre 1978 e 1988, as pautas do funcionalismo público são

basicamente “econômicas e políticas”. Talvez, até “mais políticas” do que as da classe

trabalhadora em geral, porque surgem no interior do Estado e interferem diretamente nas

obrigações da administração pública em relação à sociedade. Se for analisada

a dinâmica do movimento grevista, dada pela longevidade das greves, sobretudo

salariais, negociações difíceis e morosas, longas jornadas não trabalhadas, poucas

conquistas econômicas, envolvendo setores estratégicos, como saúde e educação,

entre outros, pode-se afirmar que o sentido da liberdade sindical no Estado e da

garantia da atividade sindical é bem mais complexo e abrangente (NOGUEIRA,

1999, p. 56).

Devido à paralisia dos serviços públicos, o prejuízo das greves acaba sendo

“socializado” com toda a população. Elas costumam durar mais porque, tradicionalmente, se

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trava uma disputa “em que servidores públicos e governo procuram responsabilizar uns aos

outros pelo desgaste junto à população” (GUEDES, 1994, p. 411).

Serão narrados, no capítulo seguinte, a formação do Sindicato dos Servidores Públicos

Municipais de Maringá (Sismmar) e os eventos da greve de 2006, na qual alguns dos

elementos que definem as paredes na burocracia estatal, como a longevidade, as demandas

político-econômicas, o prejuízo social, a troca de acusações, as brigas judiciais, estiveram

fortemente presentes.

3. A GREVE DE 2006 DOS SERVIDORES MUNICIPAIS DE MARINGÁ

3.1. Prólogo: o Sismmar

O Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Maringá (Sismmar) nasceu na

esteira do novo sindicalismo no Brasil. Como relata o texto de apresentação no site da

entidade,

Antes da Constituição de 1988, os servidores públicos não tinham direito à

sindicalização. Havia associações que cumpriam, à revelia da lei, o papel de

sindicatos. Em Maringá, a categoria dos professores municipais já havia formado em

1987 uma associação com o objetivo de lutar pelos interesses da categoria. No ano

seguinte, com a nova Constituição, se tornou possível o registro legal das entidades

sindicais e nasce então o Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Maringá

(Sismmar, xxxx).

O Sismmar foi fundado em 28 de novembro de 1988, quase dois meses após a

promulgação da Constituição Federal. O texto informa que a assembleia de fundação, no

Auditório da Biblioteca Municipal [Bento Munhoz da Rocha Neto], contou com

aproximadamente 200 servidores. Na data, aprovou-se o estatuto da entidade e foi eleito

presidente o professor da rede municipal, Claudemir Romancini, que era filiado ao Partido

dos Trabalhadores (PT). Seguindo a tendência dos sindicatos do setor público, o Sismmar se

filiou à CUT já no ano seguinte.

O site também cita “lutas históricas” empreendidas pelo Sindicato desde sua criação:

as greves de 1989 e 2006; as campanhas da trimestralidade e contra a privatização das escolas

municipais e da coleta de lixo no início dos anos 1990; e a revisão do Plano de Carreira,

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Cargos e Remuneração (PCCR) de 1998. Ironicamente, parte dessas lutas só teve desfecho

nos últimos anos e ainda reverberam em 2018. Aliás, muitas peças do xadrez político da

década de 1990 retornaram em outras posições a partir dos anos 2000.

Embora já existisse desde 1967, a Associação dos Funcionários Municipais de

Maringá (AFMM) não cumpria o papel de defender os interesses sociais, políticos e

econômicos dos associados. Os componentes da história de formação do Sismmar, como a

abertura de uma associação de cunho sindical, a falta de amparo legal, o pioneirismo dos

professores, a regularização pós-1988 e a filiação à CUT, denotam a sintonia dos servidores

maringaenses com o novo sindicalismo dos trabalhadores públicos.

A primeira greve da categoria ocorreu de 16 a 22 de março de 1989. Segundo o Jornal

do Sismmar, de abril daquele ano, o movimento reivindicava reajuste salarial de 127%, com

base na Lei da Trimestralidade, contra os 58% propostos pelo então prefeito Ricardo Barros

(1989-1992), eleito pelo Partido da Frente Liberal (PFL) e filho do ex-prefeito Sílvio

Magalhães Barros I (1973-1977). É preciso recordar que a inflação em 1989 ultrapassou os

1.500%. Por isso, a fim de evitar a corrosão dos salários, os reajustes eram feitos

trimestralmente, levando-se em conta o índice oficial do período.

O prefeito chegou a acionar o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) em Curitiba para

se pronunciar sobre legalidade da greve. Mas, tendo em vista que o julgamento dos impasses

na administração pública não eram de sua competência, o TRT apenas emitiu um parecer

acerca do índice de inflação a ser considerado no cálculo. As negociações tiveram a mediação

do Arcebispo de Maringá, Dom Jaime Luiz Coelho, de pastores e alguns vereadores. Os

grevistas se concentravam na Praça da Prefeitura. Entre as atividades, promoveram orações e

um “abraço” ao Paço Municipal.

No dia 22 de março, após avanços e recuos, o prefeito apresentou nova proposta de

reajuste, que foi defendida pelo Sindicato e aprovada em assembleia, decretando assim o fim

da greve. O sucesso do movimento fez com que a data-base dos servidores fosse transferida

para o mês de março de cada ano. Nos dizeres do Jornal,

a greve foi amplamente vitoriosa. Um grande saldo a ser considerado é aquele que

sentimos diretamente no bolso, ou seja, o reajuste conseguido com o movimento é

muito maior, para a grande maioria dos servidores, do que aquele proposto

inicialmente pelo prefeito. Mas, longe de ser um presente, foi conquistado com

muita luta, com a presença da categoria na praça e com a organização dada pelo

Sindicato. E este é o nosso maior saldo (SISMMAR, 1989).

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Na sequência, o texto identifica um obstáculo à atividade sindical no Estado: a

fragmentação do trabalho. Os funcionários públicos em geral, e particularmente na Prefeitura

de Maringá, estão divididos em uma infinidade de setores e secretarias, conforme o cargo e a

função que ocupam na hierarquia. Existem assessores, coordenadores, professores, médicos,

gerentes, diretores, espalhados pelas Secretarias de Educação, Saúde, Habitação, Segurança,

Assistência Social etc. Há também uma significativa desigualdade salarial entre eles, que

repercute em grandes desigualdades socioeconômicas. Essa diferenciação contribui para

desunir o funcionalismo e justificam sua falta de “tradição de lutas coletivas”.

Apesar das dificuldades do período, o site do Sismmar registra que a greve de 1989

teve adesão de 80% a 90% de um total aproximado de três mil servidores municipais. O

Jornal daquele ano estimava em dois mil o número de filiados nos primeiros quatro meses da

fundação.

A inserção do Sindicato no novo sindicalismo corroborou-se com a participação na

greve geral contra o Plano Verão e a “política de arrocho” do Governo Sarney em 1989. O

movimento organizado pela CUT e Central Geral dos Trabalhadores (CGT) aconteceu nos

dias 14 e 15 de março daquele ano. Em Maringá, mobilizou diversas categorias dos setores

público e privado. A greve geral foi tão determinante para a união do funcionalismo municipal

que serviu de gatilho à paralisação dos servidores já no dia 16 de março. Segundo o Jornal,

as passeatas superaram as expectativas, conseguindo fechar o comércio por onde

passava, e obtendo a adesão espontânea de milhares de pessoas que se concentraram

depois na Praça Raposo Tavares, numa das maiores manifestações da história da

Cidade (SISMMAR, 1989).

O texto discute, em seguida, o tema da contribuição sindical. De modo taxativo, a

diretoria se coloca contra o desconto obrigatório em folha, afirmando que a utilização do

recurso seria definida pelos servidores em assembleia. O entendimento era de que a

contribuição sindical é nociva ao sindicalismo, porque favorece o surgimento de dirigentes

“pelegos”. Facilita, ainda, a sobrevivência de sindicatos que não realizam “trabalho de base”,

isto é, a tarefa de convencer trabalhadores em seus locais de trabalho a se filiarem e pagar

mensalidades voluntariamente. Trabalho este que aumenta a representatividade, a autonomia

financeira e o poder de negociação dos sindicatos nas disputas trabalhistas. As direções que

comandaram o Sindicato a posteriori manifestaram a mesma compreensão. Na atualidade, o

dinheiro é repartido entre os servidores filiados.

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Além dos assuntos mencionados, o periódico traz informações e esclarecimentos sobre

índices de inflação, dissídios coletivos, congresso da CUT e criação do Departamento

Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (DIEESE). O Jornal do Sismmar

nº01, de abril de 1989, contextualiza aquele tempo de modo muito fiel, exibindo fotografias

que retratam com vivacidade os dias da greve.

Durante o governo de Ricardo Barros, o Sismmar passou por outros momentos

marcantes de sua história. Os embates da época foram contaminados pelo cenário político

nacional e internacional. De um lado, estudiosos e políticos defendiam neoliberalismo como

panaceia para superar a crise dos anos 1980 e adentrar os anos 1990 com desenvolvimento

econômico e social. De outro, os que mantinham a convicção na retomada do “Estado de

bem-estar social” a fim de debelar a crescente desigualdade social no Brasil, em harmonia

com sindicatos e movimentos sociais e, ainda, com os princípios da Constituição de 1988.

A seguir, estão reproduzidos alguns relatos do historiador maringaense Reginaldo

Benedito Dias (1995, p. 4; 6) sobre o período:

Quem conhece a história de Maringá e acompanhou de perto a sucessão municipal

de 1988 deve ter ficado surpreso quando o prefeito Ricardo Barros (PFL) anunciou,

nos primeiros meses de 1989, que a prioridade imediata de sua recém-empossada

administração era promover ampla privatização dos serviços públicos. […] Até

1989, momento em que o Executivo anunciou a deflagração da privatização, não se

tem notícia de insatisfação popular para com a qualidade dos serviços públicos

municipais. […] O tema da privatização, longe de ser reivindicado pela população,

foi introduzido mais por influxos dos debates ideológicos nacionais, com os quais o

novo prefeito estava sintonizado, do que por demandas locais de inversão no padrão

da gestão pública. […] A introdução da privatização foi anunciada com bastante

convicção no início da nova Administração, que logo se intitulou “Administração

Liberal”.

O programa da autodenominada Administração Liberal se concatenava com as

políticas de desestatização e enxugamento da máquina pública, iniciadas na curta presidência

de Fernando Collor de Mello (1990-1992) e retomadas por Fernando Henrique Cardoso

(1995-2003).

O então prefeito de Maringá desencadeou a onda privatizante pela terceirização do

serviço de coleta de lixo. Houve a contratação de uma empresa privada para realizar a coleta

mediante contrato de prestação de serviços, com metodologia e prazo determinados. O passo

seguinte foi a terceirização do ensino público municipal por meio de um sistema complexo de

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“escolas cooperativas”10. As medidas foram implementadas de forma autocrática, sem um

amplo debate com a comunidade maringaense. Para justificá-las, a administração valeu-se do

argumento discutível de que “os serviços públicos seriam, por natureza, perdulários e

ineficientes, enquanto os serviços da iniciativa privada seriam sempre mais eficientes e

baratos” (DIAS, 1995, p. 6).

Visando frear a política neoliberal de Ricardo Barros, surgiu um movimento popular

conjugado no Fórum Maringaense em Defesa do Patrimônio Público, entidade formada por

diversas agremiações, associações, partidos políticos e sindicatos, entre eles, o Sismmar.

Embora apresentasse suas medidas como “verdadeira revolução na gestão pública”, com uma

pesada campanha de marketing para demonstrar resultados positivos, o prefeito não conseguiu

disfarçar a situação precária das contas públicas. O pagamento do funcionalismo estava

atrasado, assim como o pagamento de fornecedores e das próprias escolas cooperativas

(DIAS, 1995, p. 25).

Outro legado da Administração Barros para o serviço público foi o processo da

trimestralidade. Conforme o site do Sismmar, em 1990, o prefeito revogou a Lei que obrigava

o Município a reajustar trimestralmente o salário dos servidores, por conta dos astronômicos

índices de inflação da época. O Sindicato ingressou com uma ação judicial que buscava

reparar as perdas salariais de quase 3.800 servidores municipais. Apesar da vitória final do

Sismmar na Justiça, em 2014, o acordo para quitar os prejuízos da trimestralidade só foi

celebrado em outubro de 2017, pelo atual prefeito de Maringá, Ulisses Maia, personagem que

reaparecerá algumas vezes ao longo da monografia.

As polêmicas em torno das privatizações e o deficit das contas públicas ajudaram a

sepultar a candidatura de Miro Falkembach (PFL), aliado de Barros no pleito municipal de

1992, e eleger com folga seu adversário político: o ex-prefeito de Maringá entre 1983 e 1988,

Said Felício Ferreira (PMDB). Ademais, a Justiça anulou as licitações que viabilizaram a

contratação das cooperativas de ensino, julgando-as inconstitucionais. O desfecho da gestão

de Ricardo Barros, hoje ministro da Saúde do Governo Temer, entrou para o anedotário da

cidade:

10 Segundo Dias (1995, p. 10), “o modelo de privatização consistia na contratação de empresas que, constituídaspor professores e profissionais do meio educacional, receberiam toda a infraestrutura necessária (prédios,carteiras etc.) e mais um custo por aluno atendido, suficiente para cobrir despesas, pagamento de pessoal egarantir uma margem de lucro. […] As empresas escolares receberam o nome de escolas cooperativas. Tentava-se legitimar o nome ‘cooperativa’ através da exigência de que o corpo de sócios das empresas fosse compostopor profissionais que atuariam na escola e que houvesse, no mínimo, 50% do quadro dos trabalhadores da escolano corpo dos sócios […]”.

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A “quebra” dos cofres públicos expôs, nos últimos dias de dezembro, o prefeito a

um enfrentamento com os servidores do município que, estando com o pagamento

de seu 13º atrasado, deflagraram uma contundente e insólita greve. Já no primeiro

momento do movimento, os servidores ocuparam e controlaram as dependências do

prédio em que se localizava o gabinete do prefeito. Para esquivar-se do choque com

os grevistas, o prefeito chegou a fugir por uma janela que não estava sendo

controlada, fato noticiado nacionalmente pela Rede Globo de Televisão (DIAS,

1995, p. 28).

Desse modo, encerra-se o primeiro grande ciclo de lutas do Sismmar. Entretanto, no

xadrez da política maringaense há diversos paralelismos. Eis que, nas eleições de 2004, vence

o candidato do Partido Progressista (PP), Sílvio Magalhães Barros II, filho de Sílvio Barros I

e irmão de Ricardo. O fato apenas realçou a conhecida hereditariedade política dos Barros.

Ele já havia disputado as eleições de 1996, perdendo para Jairo Gianotto (PSDB). Nas

eleições de 2000, a cunhada Cida Borghetti Barros concorreu à Prefeitura pelo PP, todavia, foi

derrotada por José Cláudio Pereira Neto (PT). Em 2004, Cida chegou a ser cotada novamente,

mas o PP lançou Sílvio como candidato na coligação com o Partido da Social-Democracia

Brasileira (PSDB).

À revelia das pesquisas eleitorais, que apostavam em João Ivo Caleffi (PT) e Dr.

Batista (PTB) no segundo turno, Sílvio Barros II conquistou votos para prosseguir no páreo.

O candidato do PP vinha atrás de Caleffi nas pesquisas do segundo turno. Contudo, tendo a

seu favor recursos para a campanha, estratégias de marketing, o apoio da imprensa e do

empresariado local, Sílvio reagiu e sagrou-se vencedor, ao lado do vice Carlos Roberto Pupin

(PDT) (DIAS, 2008, p. 202; 212-214).

Caleffi havia assumido a Prefeitura em 2003, após a morte de José Cláudio por câncer

no intestino. O candidato petista à reeleição fez parte de uma coligação com o Partido

Humanista da Solidariedade (PHS) e o Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Caleffi foi

escolhido, na chapa com o vice Rubem Almeida Mariano, para concorrer à Prefeitura no lugar

do ex-secretário municipal, Ênio Verri, também do PT (DIAS, 2008, p. 198). Logo, a

coligação representou a alternativa de esquerda nas eleições daquele ano.

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A eleição de Sílvio Barros II em 2004 significou a retomada da política privatista de

Ricardo Barros, que na época era deputado federal pelo Paraná. Nas conjunturas nacional e

estadual, o presidente Luís Inácio Lula da Silva (PT) e o governador paranaense Roberto

Requião fundamentavam seus governos em princípios sociais-democráticos. Maringá se

situava, então, no centro de uma “queda de braço” ideológica que ultrapassava suas fronteiras.

Ironicamente, Sílvio se comprometeu com as seguintes propostas na campanha de 2004:

No final de 2005, aconteceu a eleição para a diretoria do Sismmar (quadriênio 2005-

2008). Duas chapas principais estavam na disputa: uma ligada ao PT e à CUT, que tentava a

reeleição; outra ligada ao Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU) e à Central

Sindical e Popular – Coordenação Nacional de Lutas (CSP-Conlutas), entidades que se

formaram a partir de dissidências do PT nacional e da CUT.

Venceu a chapa PSTU-Conlutas, em uma campanha eivada de ataques à gestão cutista

anterior. A presidência ficou a cargo da servidora da Secretaria de Assistência Social, egressa

do movimento estudantil, Ana Pagamunici, cuja posse seria em 29 de novembro de 2005. A

postura da nova gestão do Sindicato, intitulada Trabalhadores em Luta, se apresentou desde o

início de franca oposição ao governo de Sílvio Barros II.

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Passados alguns dias da posse, o jornal Hoje, de 14 de dezembro de 2005, estampou

na manchete de capa: “Começa greve na Saúde de Maringá”. Os servidores já tinham

aprovado em assembleia o indicativo de greve, exigindo a regulamentação definitiva da carga

horária dos profissionais da Secretaria de Saúde. Deliberou-se enfim pela paralisação na

Assembleia de 13 de dezembro daquele ano. No mesmo dia, assistiram à sessão da Câmara

Municipal de Maringá para saber se a Administração havia apresentado o projeto de lei que

resolveria o impasse e, ao mesmo tempo, pressionar os vereadores em prol da causa do

funcionalismo.

O imbróglio começou, segundo matéria do jornal O Diário do Norte do Paraná

(09/12/2005), quando o prefeito Sílvio Barros II assinou um decreto que obrigava os

trabalhadores da Saúde a cumprir a carga horária legal para a qual foram contratados,

amparado no relatório de uma auditoria do Tribunal de Contas do Estado (TCE-PR). Alguns

funcionários (médicos, dentistas, enfermeiros etc.) cumpriam jornada de trabalho reduzida,

fruto de um acordo informal celebrado há 15 anos com o ex-prefeito Said Ferreira.

A nova diretoria do Sismmar abriu o mandato encampando, de imediato, a greve da

Saúde, que durou apenas um dia. E já no primeiro mês de 2006 organizou um protesto contra

a terceirização do Hospital Municipal. O jornal Hoje relatou:

Com palavras de ordem e faixas, cerca de 40 entidades protestaram ontem, nas

proximidades do Terminal Urbano, contra a terceirização do Hospital Municipal de

Maringá. Os manifestantes responsabilizaram o governo municipal pelo

sucateamento da saúde pública. As entidades ali representadas ainda cobraram a

falta de diálogo com o prefeito Sílvio Barros sobre a proposta de entrega da

administração do Hospital à iniciativa privada. […] O secretário municipal da

Saúde, Antonio Carlos Figueiredo Nardi, explicou à reportagem do Hoje que

pretende se inspirar no modelo paulista de contrato de gestão hospitalar para

aumentar a eficiência do HM (JORNAL HOJE, 26/01/2006).

Estava configurado, assim, o clima de rivalidade entre Sismmar e Prefeitura que

culminou na greve dos servidores municipais em 2006, assunto do próximo capítulo.

3.2. Diário da greve

Superados os primeiros embates na área da Saúde, o novo ingrediente para a greve foi

a campanha salarial de 2006. O Sismmar oficiou o prefeito, em 08 de fevereiro daquele ano,

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reiterando o pedido de reunião para tratar do pagamento das progressões funcionais e da

reposição da inflação acumulada em 2005. Informou, ainda, que estava marcada a Assembleia

Geral dos servidores no dia 18 de fevereiro (sábado), a fim de apreciar as propostas do Poder

Executivo. A data-base da categoria tinha vencido em janeiro.

A resposta na íntegra, assinada pelo chefe do Gabinete do Prefeito (Gapre), Benivaldo

Ferreira, foi a seguinte: “De ordem do Exmo. Sr. Prefeito Municipal, em resposta ao seu

Ofício nº51/2006 – Sismmar, informamos que o assunto ali contido estará apto a ser enfocado

em tempo oportuno, qual seja, após o fechamento do balanço” (Ofício nº154/06-Gapre).

Mesmo sem reunião com o prefeito, a categoria realizou a Assembleia e aprovou a

primeira pauta de reivindicações:

- Reposição das perdas salariais dos servidores municipais, equiparada ao percentual

do salário mínimo nacional, que será de 16,67%, distribuídos da seguinte forma:

4,98% de reposição salarial (que é o índice das perdas acumuladas no ano de 2005,

segundo IPC da FIPE) e 11,69% de reajuste salarial;

- Publicação imediata do edital com resultado da avaliação dos servidores para fins de

progressão funcional e início imediato do pagamento da progressão salarial aos

servidores que já foram avaliados;

- Criação de uma comissão para discussão e implementação da proposta de revisão do

PCCS (ou PCCR) da Administração Direta, Indireta e do Magistério, apresentada

pelo Sismmar no ano de 2003;

- Regulamentação, em lei, da jornada diferenciada de trabalho dos servidores da

Saúde, conforme o que estava sendo desenvolvido há mais de 10 anos e conforme as

normativas das Conferências Nacional, Estadual e Municipal de Saúde;

- Pelo fim do projeto que prevê parceria com entidades privadas, terceirização ou

privatização do Hospital Municipal;

- Manutenção dos servidores que participam das comissões de negociação com a

Administração Municipal e das manifestações reivindicatórias da categoria em seus

locais de trabalho, e fim de qualquer possibilidade de perseguição aos servidores por

suas convicções ideológicas (Ofício nº65/06-Sismmar).

O Sismmar solicitou, no mesmo ofício, uma reunião com o Executivo e a comissão de

trabalhadores eleita na Assembleia, com o objetivo de abrir a negociação da campanha

salarial. O jornal Folha de Londrina, de 21 de fevereiro (terça-feira), repercutiu o resultado da

Assembleia de sábado no Cine-Teatro Plaza. Enfatizou na matéria que o funcionalismo

ameaçou entrar em greve se o prefeito não sinalizasse o atendimento das reivindicações. A

presidente do Sindicato, Ana Pagamunici, declarou em entrevista ao jornal que “desde o início

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de janeiro os sindicalistas estão tentando, sem sucesso, ser recebidos na Administração para

negociar os tópicos da pauta”. Quanto ao atraso na data-base da categoria, o secretário de

Administração à época, Ademar Schiavone, alegou ter havido um problema no sistema de

informática da Prefeitura, motivo pelo qual sua equipe não finalizou o “balanço das contas”

no início do ano.

No decorrer da pesquisa, foram encontrados vários ofícios que narram a comunicação

entre Sismmar e Prefeitura antes da deflagração da greve de 2006. Em um deles, o Sindicato

confirma a participação no encontro agendado pelo Executivo, via telefone, para o dia 09 de

março. Todavia, ele não aconteceu. No final do mês, houve uma Assembleia Geral

Extraordinária no Auditório Joubert de Carvalho (Biblioteca Municipal). Diante da ausência

de proposta por parte da Administração, os servidores deliberaram por mais uma tentativa de

reunião no prazo de três semanas, pois outra assembleia já estava marcada.

Após um hiato no mês de abril, o Sismmar voltou a oficiar a Prefeitura em 16 de maio,

requerendo a indicação de membros para compor a comissão que a representaria nas

negociações. O segundo ponto solicitava, em caráter urgente, o agendamento de uma reunião.

O Sindicato encerrou o documento recordando que vários ofícios foram enviados e não

obtiveram retorno. A primeira resposta, encontrada durante a pesquisa, veio no dia seguinte e

pedia que o Sismmar informasse o nome de três servidores que integrariam a comissão de

negociação.

Conforme depreende-se de um ofício de 02 de junho da Secretaria de Administração, a

reunião finalmente aconteceu em 31 de maio. O secretário da pasta apresentou a proposta

oficial nos seguintes termos:

1) Implantar, a partir de 01 de junho de 2006, o salário mínimo de R$450,00,

com a concessão de abono diferenciado aos servidores que ganham menos que esse

valor;

2) Efetuar o pagamento de 40% do Abono de Natal [13º salário], que será

incluso no salário de junho;

3) Efetuar o pagamento integral da reposição salarial, que é um direito do

servidor, e que, segundo os dados do IPC da FIPE, é de 4,53%, em duas parcelas,

acrescidas no salário de todos os servidores no percentual de 2,24% no salário de

julho e de 2,24% no salário de agosto/2006. Obs.: anexo, estamos enviando a Vossa

Senhoria cópia da mensagem e do projeto de lei que está sendo enviado hoje, dia 02,

para a Câmara Municipal de Maringá, para ser votado, em regime de urgência, na

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sessão do dia 06 de junho, em primeira discussão, desde que seja aprovado pelos

servidores na assembleia da categoria;

4) Conforme já explicamos a Vossa Senhoria, o edital com o resultado das notas

abrangendo todos os mais de 4.600 servidores que têm direito à progressão

funcional até o dia 30/11/2005, já está sendo entregue pessoalmente a cada um e, até

o dia 28 de julho, esperamos ter o resultado dos valores que cada servidor tem a

receber, para que, a partir do mês de agosto, possamos iniciar as negociações para o

pagamento da progressão [...];

5) Noticie-se ainda que já nomeamos a comissão para estudar as propostas de

alteração do Plano de Cargos e Salários e do Estatuto do Magistério, cuja cópia está

em suas mãos (Ofício nº297/06-Seadm).

Além do projeto de lei em regime de urgência, a Prefeitura distribuiu panfletos para

divulgar a proposta nos locais de trabalho. Na mesma data, o Sismmar protocolou na

Secretaria de Administração o seguinte expediente:

O Sismmar [...] coloca-se à disposição para negociar o estabelecimento do

funcionamento dos serviços essenciais, ainda que pese a negativa de Vossa Senhoria

para tanto (conforme telefonema no dia 02/06/06, às 10h10), desconsiderando a

notificação de deflagração da greve, informada através do Ofício nº175/06-Sismmar,

encaminhado ao Exmo. Prefeito Municipal, e da publicação em jornal de circulação

da cidade no dia 02 de junho de 2006.

Solicitamos, mais uma vez, que seja agendada reunião para estabelecer os

serviços essenciais e que a negativa por parte da Administração seja formalizada,

para preservar os preceitos legais do movimento paredista (Ofício nº176/06-

Sismmar)

A preocupação da Entidade Sindical era atender às exigências da Lei de Greve,

estudadas no capítulo 2.3 deste trabalho, no tocante ao prazo para notificar o empregador

antes da paralisação e ao acordo para definir os serviços considerados essenciais. Outro ponto

a destacar se refere à negativa do prefeito em reconhecer o comunicado da greve e o pedido

para negociar a essencialidade. A recusa da Administração pode ter configurado a prática do

lock-out, expressamente vedada na Lei de Greve. Em resposta ao ofício reproduzido acima, o

secretário de Administração justificou que a notificação foi desconsiderada por entender que

já estavam em processo de negociação. Nas palavras dele, não havia “razão para existir a

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greve, ainda mais que o Sr. Prefeito Sílvio Barros atendeu integralmente ao que é de direito do

servidor” (Ofício nº 298/06-Seadm).

O jornal O Diário noticiou, ainda em 02 de junho, que a Prefeitura organizou uma

grande reunião com os funcionários que ocupavam cargos de chefia, comissionados e

efetivos11, no Auditório Dona Guilhermina, região central de Maringá. Cerca de 1,5 mil

pessoas compareceram, segundo o jornal. O objetivo era mobilizar os chefes de setor para

difundir entre os subordinados a proposta oficial do prefeito. A presidente do Sismmar

afirmou na matéria que havia pressão do Executivo para “intimidar os funcionários, além da

dificuldade do Sindicato em afixar material sobre a mobilização nos setores de trabalho e até

de conversar com os funcionários durante o expediente”.

Um dos argumentos para negar o reajuste de 16,67%, aprovado pelos servidores em

assembleia, eram os limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), de 2000,

quanto ao gasto da Administração Pública com pessoal: limite de alerta (48,6%, art. 59),

limite prudencial (51,3%, art. 22) e limite máximo (54%, art. 20). Nas campanhas salariais do

funcionalismo, tradicionalmente, a LRF é utilizada como pretexto para rejeitar propostas de

reposição inflacionária e aumento salarial. A Prefeitura alegava em 2006 que, se fosse elevada

em 16,67%, com base no reajuste do salário mínimo nacional, a folha de pagamento

ultrapassaria o limite máximo de 54%, incorrendo na série de restrições e medidas

determinadas pela LRF nesse caso.

Em 03 de junho (sábado), o Sismmar comunicou ao prefeito que a categoria decidiu,

em Assembleia na mesma data, não aceitar a proposta da Administração. O expediente do

Sindicato reforçou a notificação de greve “no dia 05/06/06, a partir das 00h00”, feita através

do Ofício nº175/2006-Sismmar, de 01 de junho. Reiterou também o pedido de reunião para

tratar da essencialidade, acrescentando que o Sismmar já estava em contato com os chefes dos

setores essenciais a fim de organizar uma escala de trabalho mínima durante a greve.

A manchete de capa do jornal O Diário de 04 e 05 de junho (domingo/segunda) trazia:

[Título] Servidor municipal pára a partir de segunda-feira. [Subtítulo] Assembleia da

categoria realizada no sábado decidiu entrar em greve a partir da meia-noite de

domingo. Trabalhadores querem reajuste de 16,67%, mas Prefeitura oferece 4,53%

em duas vezes. [Abaixo da foto de capa] Depois da assembleia que votou a favor da

11 Os servidores em cargo de comissão ou comissionados (CC) são aqueles de livre nomeação e exoneração, cujaindicação parte dos chefes dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário para exercer atribuições de chefia eassessoramento. Por sua vez, os servidores efetivos com função gratificada (FG) são trabalhadores aprovados emconcurso público que, por decisão dos chefes dos Três Poderes, foram escolhidos para desempenhar funções dechefia, com gratificação nos salários.

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paralisação do funcionalismo a partir de segunda-feira, servidores municipais fazem

passeata pela Avenida Brasil, no Centro (JORNAL O DIÁRIO, 04-05/06/06)

A reportagem contextualizou o movimento e apresentou quais questões estavam em

pauta. Uma delas era a indignação suscitada nos servidores quando o prefeito Sílvio Barros II

encaminhou sua proposta de reajuste à Câmara Municipal, em forma de projeto de lei, sem

debatê-la antes com a categoria. O Sismmar reafirmou que Sílvio não teria reconhecido o

indicativo de greve, nem se dispôs a um a acordo sobre o funcionamento dos serviços

essenciais.

Segundo a reportagem, “mais de cem pessoas ficaram em pé” na Assembleia de

sábado. Cerca de 90% dos presentes eram trabalhadores da Secretaria de Educação, enquanto

a segunda categoria mais representada integrava a Secretaria Municipal de Serviços Públicos

(extinto SAOP12). Apenas 40 servidores votaram contra a greve, sob o argumento de que era

necessário “definir um planejamento para a paralisação e a abertura de um calendário de

negociação com a Administração”. Encerrada a Assembleia, o funcionalismo saiu em passeata

pela Avenida Brasil. Na segunda-feira (05/06) seria formado, com representantes do Sindicato

e dos servidores em geral, o Comando de Greve, responsável pela organização dos atos da

paralisação. Ficou definido unilateralmente pelo Sismmar que 30% dos serviços do Cemitério

Municipal, Secretaria de Trânsito, Hospital Municipal e da coleta de lixo seriam mantidos.

O primeiro dia da greve repercutiu bastante no dia seguinte, 06 de junho (terça-feira).

Como é de praxe no jornalismo, as edições dos jornais são finalizadas na noite em que

acontecem os fatos e distribuídas no dia seguinte.

A coluna de informes do jornal O Diário desse dia trazia relatos de um servidor da

Secretaria de Fazenda que teria sido agredido “a pontapés” por um grevista em piquete,

quando tentava retornar ao Paço Municipal após o horário de almoço. Segundo nota da

Prefeitura, escolas e postos de saúde foram trancados com correntes e cadeados. Enquanto

isso, os vereadores da base aliada de Sílvio Barros II se reuniram no gabinete do então

presidente da Câmara, John Alves Corrêa (PMDB), para discutir a greve do funcionalismo,

sem a presença dos vereadores de oposição.

O Diário dedicou a terceira página inteira à paralisação, apresentando um panorama

dos principais acontecimentos do primeiro dia. Na reportagem de Juliana Daibert, de 06 de

junho, vinha o título: “Greve não atinge todos os setores da Prefeitura”. De acordo com as

12 O Serviço Autárquico de Obras Públicas (SAOP) foi extinto em 19 de dezembro de 2005, através da LeiComplementar nº591, que transformou-o em Secretaria Municipal de Serviços Públicos (atual Semusp), órgãoligado à Administração Direta do Município.

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informações, a adesão foi maior entre os servidores das Secretarias de Educação, Serviços

Públicos e Trânsito. O prefeito decidiu manter em tramitação na Câmara o projeto de lei que

estabelecia a reposição de 4,53% da inflação de 2005 na folha do funcionalismo, mesmo

tendo sido rejeitada em assembleia pela categoria. Como reflexo da tensão entre Prefeitura e

grevistas,

Silvio Barros deixou a Câmara bastante irritado e mal conversou com a imprensa.

Disse apenas que não vai negociar com o Sindicato em greve e vai esperar a decisão

da Justiça sobre a legalidade do movimento. Até o final da tarde, a única ação

ajuizada pela Prefeitura havia sido um Interdito Proibitório (Autos 431/06). A

liminar pedida e concedida ainda de manhã pela juíza Carmen Ramajo, da 3ª Vara

Cível, foi cassada por volta das 14h30. Por algumas horas, a liminar garantiu o

acesso de funcionários e contribuintes na Prefeitura e em alguns locais onde havia

piquete, como aconteceu na Secretaria de Serviços Públicos (JORNAL O DIÁRIO,

06/06/06).

Por seu turno, os servidores em greve percorriam as secretarias municipais na tentativa

de convencer mais colegas a interromper o trabalho. Houve violência em alguns locais. Uma

professora da Escola Municipal Jesuína Jesus de Freitas alegou ter sofrido agressão na perna.

Outras cinco profissionais registraram denúncia de agressão na Delegacia da Mulher quando

tentavam entrar em uma escola da Vila Santa Isabel. O blog de notícias do jornalista Ângelo

Rigon relatou que a secretária da Mulher, Terezinha Beraldo Pereira, irmã do ex-prefeito José

Cláudio, teria chutado uma auxiliar de serviços gerais que tentou barrá-la ao entrar no Paço

ontem pela manhã. Terezinha afirmou, em emissora de rádio, ter sido agredida verbalmente

pelos grevistas.

Ainda segundo O Diário, os servidores decidiram em Assembleia, no final da tarde do

dia 05, permanecer em greve por tempo indeterminado e realizar passeata no Centro. Ao

descrever o quadro geral do primeiro dia, a matéria fez um retrato da paralisação em diversos

setores da Prefeitura. O Sismmar contabilizou a participação de aproximadamente dois mil

servidores.

Em algumas unidades básicas de saúde (UBS), foram encontrados “cadeados colados

com superbonder” e portas lacradas. Na maioria das UBS e no Hospital Municipal, os

serviços foram paralisados apenas parcialmente. O secretário de Saúde, Antônio Carlos Nardi,

comemorou que, na visão dele, “nem 5% dos funcionários da Saúde interromperam o

trabalho”.

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A secretária de Educação, Norma Deffune, constatou problemas em quase todos os 50

centros municipais de educação infantil (CMEIs) daquela época. Das 36 escolas municipais,

em seis delas os funcionários aderiram à greve.

A Administração apurou que 20% dos trabalhadores da Secretaria de Serviços

Públicos cessaram o trabalho no dia anterior. Portando faixas, os servidores realizaram um

manifesto na entrada da Secretaria. O acesso ao setor de abastecimento estava fechado com

cadeado, mas foi liberado ainda de manhã para as ambulâncias do Serviço de Atendimento

Móvel de Urgência (SAMU). O setor mais afetado da Secretaria foi a coleta de lixo. Apenas

30% dos funcionários da coleta continuaram trabalhando, com o objetivo de respeitar a

essencialidade do serviço. O restante ficou mobilizado na Praça Renato Celidôneo (Praça da

Prefeitura). O Jornal também relatou as reclamações dos moradores vizinhos ao Paço

Municipal sobre o barulho feito pelos grevistas.

A presidente do Sismmar, Ana Pagamunici, concedeu rápida entrevista a O Diário:

Ao jornal Folha de Londrina, de 06 de junho, a presidente estimou entre 60% e 70% a

adesão à greve, em um quadro de aproximadamente 7,4 mil servidores na época. Quanto aos

piquetes organizados em frente ao Paço, assegurou: “São piquetes pacíficos para sensibilizar

os servidores. Não há ameaça ou coação contra quem quer trabalhar”. Acrescentou que se

sentia indignada com a presença de um funcionário designado pela Administração para filmar

as assembleias.

O prefeito Sílvio Barros contestou as declarações da presidente do Sindicato à Folha

de Londrina. Em sua ótica, os serviços públicos funcionaram normalmente e a paralisação

seria “puramente política”. Alegou que as despesas com pessoal estavam no limite da LRF e

não poderia conceder aumento maior que a inflação acumulada em 2005. O prefeito sustentou

que o Comando de Greve tinha a colaboração de pessoas não ligadas à Administração: “É por

isso que eles reclamam quando mando gravar as assembleias e dizem que estão sendo

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perseguidos”. Comunicou que as provas foram juntadas à ação judicial que questionava a

legalidade da greve. A presidente esclareceu que as pessoas citadas por Barros eram

representantes de sindicatos de outras categorias, apoiadores da causa do funcionalismo

público municipal. Sobre os piquetes, o prefeito protestou: “Eles dizem que o piquete é

pacífico, mas não deixam os servidores passar e já houve até agressões”.

A liminar expedida pela juíza Carmen Lúcia Rodrigues, da 3ª Vara Cível de Maringá,

nos Autos nº431/2006 de Interdito Proibitório, vedava taxativamente o bloqueio da entrada

dos prédios públicos municipais e determinou que os grevistas mantivessem uma distância

mínima de 50 metros desses locais. Estabeleceu, ainda, multa diária de R$ 10 mil a R$ 20 mil

em caso de descumprimento da ordem judicial.

O jornalista Andye Iore, um dos responsáveis pelo blog maringaense Factorama,

também escreveu sobre o assunto para a Gazeta do Povo. Conforme a reportagem, entre os

incidentes mencionados acima, a Administração acusou os grevistas de terem cortado os

cabos do caixa eletrônico e dos telefones da Secretaria de Serviços Públicos.

A comunicação via ofício entre Sindicato e Administração, no dia 06 de junho, se

limitou a notificar o prefeito sobre o cumprimento da essencialidade no Hospital Municipal

Drª Thelma Villanova Kasprowicz. Anexo ao documento, seguiu a ata de uma reunião com

dirigentes sindicais, Comando de Greve, membros da Administração e o diretor do Hospital.

Diante da recusa do Executivo em negociar, infringindo a Lei de Greve,

o Comando de Greve entendeu que, para a Administração Pública, o Hospital

Municipal não é um serviço essencial, mas em respeito à população, o Comando de

Greve decidiu manter os serviços de urgência e emergência com número mínimo de

funcionários, aprovando para tanto a escala de funcionamento acordada com a

direção do Hospital Municipal em dezembro de 2005, quando ocorreu a última

greve da Saúde, uma vez que não houve aumento sensível no quadro de funcionários

(SISMMAR, Ata de Reunião, 06/06/06).

O fato, segundo o Sismmar, seria informado à Procuradoria Regional do Trabalho.

Junto com os documentos, foram encontradas também as escalas de trabalho montadas, onde

estavam relacionados os servidores e os horários em que trabalhariam de 07 a 25 de junho no

Hospital.

Na matéria de 07 de junho (quarta-feira), de O Diário, o jornalista Leonardo Filho

relatou que três dos onze caminhões da Secretaria de Serviços Públicos vinham realizando a

coleta de lixo desde o início da greve. As áreas centrais eram priorizadas devido à grande

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concentração de edifícios, em detrimento dos bairros mais afastados que já começavam a ter

acúmulo de lixo nas ruas.

Embora houvesse piquetes nos centros de educação infantil e escolas municipais, a

Secretaria de Educação recomendou aos pais que levassem os filhos normalmente às aulas de

07 de junho. Contudo, os pais receberam o seguinte comunicado da direção da Escola

Municipal Octávio Periotto:

Outro problema verificado foi a queda do sistema de Internet do Paço Municipal. Na versão

do Executivo, os grevistas teriam cortado o cabeamento da rede. Um oficial de Justiça

entregou à presidente do Sindicato, na mesma data, o mandado de reintegração de posse

emitido pela juíza Carmen Lúcia Rodrigues. O advogado do Sismmar, Avanílson Alves

Araújo, declarou que apresentaria um recurso (agravo de instrumento) contra a determinação

judicial.

A troca de acusações e processos judiciais prosseguiu ao longo de toda a greve. De um

lado, o prefeito culpava o Sindicato pelos atos de violência e vandalismo registrados. De

outro, o Sindicato rebatia veementemente as acusações. É importante frisar que não cabe neste

trabalho julgar qual lado estaria certo e qual lado estaria errado. Será priorizada aqui a

narração dos fatos documentados e a exposição do comportamento da imprensa, da Prefeitura

e do Sindicato, com relação ao movimento.

O retrato da greve na Educação, de acordo com a Secretaria, mostrava que 28% dos

funcionários das escolas municipais e 44% dos funcionários dos CMEIs aderiram à

paralisação. O jornalista Paulo Pupim informou que os grevistas acompanharam a sessão de

06 de junho da Câmara de Vereadores. O objetivo era protestar contra o projeto de lei do

Executivo sobre a reposição salarial de 4,53%, que poderia entrar em regime de urgência na

pauta de votação. O líder do prefeito na Câmara, Dorival Dias (PSDB), foi vaiado e, como

reflexo das rixas partidárias na política maringaense, provocou: “Eu só queria identificar os

simpatizantes do PT e já consegui”. Em seguida, o vereador Humberto Henrique (PT)

lamentou a “falta de humildade” de Sílvio Barros. O vereador Mário Verri (PT) chegou a

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dizer na tribuna: “o nosso prefeito não tem controle emocional nenhum”. Procurada pela

reportagem do Jornal, a assessoria de Sílvio não atendeu as ligações nem se pronunciou a

respeito.

Na matéria de 07 de junho, da Folha de Londrina, o jornalista Fábio Cavazotti

reproduziu a reação do prefeito acerca dos conflitos do dia anterior: “Absolutamente

chocante”. A Administração acusou os grevistas de terem organizado piquetes ilegais e

agredido outros servidores com “mordidas”. Em nota oficial, afirmou que até mesmo pais de

alunos sofreram agressões na entrada dos CMEIs. Todas as ocorrências foram levadas à

Polícia Civil, segundo a nota.

A Administração procurou minimizar o impacto da greve perante a opinião pública.

Difundiu o discurso de que o trabalho nas secretarias municipais não foi afetado e ocorreu

“dentro do previsto”. No entanto, o secretário de Serviços Públicos, Diniz Afonso, admitiu os

efeitos negativos na coleta de resíduos, pois o lixo já se acumulava nas ruas. Apesar dos

prejuízos, a Administração descartou qualquer possibilidade de apresentar nova proposta. O

secretário de Administração, Ademar Schiavone, decretou: “Com os grevistas não vamos

negociar. Estamos no limite da Lei de Responsabilidade Fiscal”.

Na edição de 08 de junho (quinta-feira) de O Diário, o jornalista Leonardo Filho

informou que, no dia anterior, os grevistas dissolveram os piquetes e fizeram um ato no

Hospital Municipal para atrair mais adeptos à greve. Formaram, no Paço Municipal, uma

corrente com 700 pessoas, que percorreram o local em silêncio e depois se reuniram de mãos

dadas em torno da Prefeitura. Em alguns pontos de concentração dos grevistas, como na

Secretaria de Serviços Públicos, a Polícia Militar (PM) acompanhou a entrada dos servidores

que não participavam do movimento.

O Sindicato acionou a Procuradoria Regional do Trabalho para mediar as negociações.

Segundo o advogado do Sismmar, os grevistas foram orientados a não “radicalizar” os atos.

Estava planejada a retomada de piquetes pacíficos em algumas secretarias. Sete boletins de

ocorrência foram abertos na 9ª Subdivisão da Polícia Civil de Maringá (9ª SDP), de acordo

com a reportagem de Leonardo Filho. Alguns ônibus do transporte escolar, por medida de

segurança, ficaram no pátio da Delegacia à disposição dos motoristas que não estavam em

greve.

O número de caminhões da coleta disponíveis subiu para cinco, e o número de

trabalhadores, de 18 para 30. O secretário de Trânsito, Valdir Pignata, estimou que apenas 22

dos 85 funcionários permaneceram em serviço. A paralisação provocou a queda de 50% do

valor auferido com a cobrança de estacionamento rotativo (EstaR). O cabeamento do sistema

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de rede do Paço Municipal foi restaurado, restabelecendo parcialmente o atendimento do setor

de arrecadação de tributos. Na avaliação da secretária Norma Deffune, a adesão à greve

aumentou na Educação. No Hospital Municipal, 30 servidores, do total de 329 na época,

paralisaram, enquanto as unidades de saúde funcionaram normalmente. Assim foi o balanço

do terceiro dia de greve (07/06), na matéria de O Diário.

Ainda no dia 08 de junho, o Sindicato oficiou o Prefeito sobre a decisão da categoria

na última Assembleia. As demandas iniciais foram resumidas no documento:

O Sismmar [...] vem à presença de Vossa Excelência informar que, em Assembleia

realizada no dia 05 de junho de 2006, a categoria decidiu permanecer em greve até

que as reivindicações sejam atendidas. Nossas reivindicações são:

1. Reajuste salarial de 16,67% [...];

2. Pagamento imediato da progressão funcional;

3. Implementação imediata do PCCS;

4. Fim das perseguições aos servidores;

5. Não desconto dos dias parados na greve;

6. Não utilização da greve como expediente de retaliação contra qualquer servidor,

especialmente os funcionários em estágio probatório (Ofício nº 183/2006-

Sismmar).

O jornalista Leonardo Filho, na edição de 09 de junho (sexta-feira) de O Diário,

relatou que, no dia 08, o procurador do Trabalho de Maringá, Fábio Aurélio da Silva Alcure,

se prontificou a mediar um acordo entre Prefeitura e grevistas, convidando as partes para uma

audiência em 14 de junho.

No campo da Educação, a maioria dos centros de educação infantil e das escolas

municipais atendia parcialmente. Apenas dois CMEIs estavam com os portões trancados e

aulas suspensas. Na Escola Municipal Jesuína de Jesus, a mãe de uma aluna afirmou que os

grevistas não deixavam ninguém entrar e, no tumulto, até uma criança foi empurrada. Em

entrevista a O Diário, o secretário Antônio Carlos Nardi garantiu que, apesar da paralisação, o

atendimento nas unidades de saúde e no Hospital Municipal ocorreu dentro da normalidade.

Perguntado pela reportagem a respeito do quarto dia de greve (08/06), o advogado do

Sismmar, Avanílson Araújo, lamentou que a Administração tenha judicializado a greve dos

servidores logo no início, antes de estabelecer um diálogo permanente com a categoria. Sobre

os supostos atos de violência dos grevistas, o advogado assegurou que, mesmo havendo fatos

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isolados, não se tratava de determinação do Comando de Greve nem do Sindicato. Ademais,

pelo clima de tensão, houve, naturalmente, provocações e agressões de ambos os lados.

O Blog do Rigon noticiou, em 09 de junho, que a lataria e o retrovisor de um veículo

da equipe de O Diário teriam sido danificados pelos grevistas na última terça-feira (06/06). O

incidente não foi relatado no Jornal. Na análise do blogueiro, o Jornal reduziu o espaço

dedicado à greve a partir de então. O texto continua:

Do caminhão de som que auxilia o movimento, vários servidores sugeriram que O

Diário não tem divulgado corretamente a greve. Circula entre os grevistas a

informação de que, dos R$ 102.012,68 gastos por Silvio II nos primeiros quatro

meses deste ano somente com a publicação de atos oficiais, R$ 94.012,68 foram

para O Diário – valor maior do que o destinado em todo o ano passado. O número

não inclui os valores recebidos com a veiculação de campanhas publicitárias. Silvio

II gastou mais de R$ 2 milhões e 553 mil com publicidade de janeiro de 2005 a abril

deste ano (BLOG DO RIGON, 09/09/06).

Como se percebe na postagem acima, a hostilidade entre Prefeitura e grevistas

contaminou também a imprensa local. O jornalista Andye Iore, por exemplo, publicou em seu

blog Factorama o texto “A democracia é uma farsa”:

Muito me espanta o prefeito Silvio Barros ir a programas radiofônicos ou televisivos

e dizer que há democracia na Prefeitura de Maringá. Em março, quando apurava o

uso de máquinas públicas em obras particulares, o prefeito se recusou a falar

comigo. O fato se repetiu no início da greve dos servidores quando tentei, por dois

dias seguidos, falar com o prefeito através de sua assessoria de imprensa e nem

resposta tive. [...] O mais estranho é o prefeito ir ao Programa do Toledo, na rádio

Cultura AM, às 6h, e no Jornal da Manhã, na TV Band, às 7h. Como uma disposição

de acordar tão cedo para falar com a imprensa não se repete a outros órgãos?

(FACTORAMA, 09/09/06)

A edição de 10 de junho (sábado) do jornal O Diário forneceu um quadro geral do

quinto dia de greve (09/06), sob o título “Lixo fica acumulado nas ruas”. Leonardo Filho, que

vinha sendo escalado para cobrir a greve do funcionalismo público municipal, anunciou que a

Prefeitura contrataria trabalhadores terceirizados para operar a coleta de lixo. “Serão 96

homens que vão trabalhar em três turnos nos 11 caminhões da Secretaria de Serviços

Públicos”, escreveu o jornalista. Conforme a reportagem, em alguns bairros o serviço não era

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realizado desde segunda-feira. A empresa responsável pelos terceirizados teria o prazo de 60

dias para atuar na coleta.

O advogado do Sismmar manifestou, de pronto, que acionaria o Ministério Público por

entender que a terceirização era irregular, visto que 30% do serviço estava sendo mantido

pelos servidores. A intenção de Avanílson Araújo encontrava respaldo nos artigos 9º e 11 da

Lei de Greve, segundo os quais o Poder Público só poderia terceirizar serviços essenciais na

ausência de acordo entre as partes envolvidas na greve, ou a partir do descumprimento da

essencialidade pactuada. No caso em estudo, a Administração se negou a discutir a

manutenção das atividades essenciais com o Sindicato. E, na ausência do acordo, os próprios

grevistas se comprometeram a manter 30% do serviço de coleta de lixo, considerado essencial

por ambas as partes.

No distrito de Iguatemi, os servidores em greve abordaram um caminhão da coleta

para tentar convencer o colega motorista a paralisar o trabalho. A Polícia Militar foi chamada,

porém, não houve confronto e os grevistas liberaram o local sem resistência. O prefeito Sílvio

Barros ordenou que os caminhões fossem estacionados na Praça da Catedral. O secretário de

Serviços Públicos, Diniz Afonso, justificou: “É para mostrar que os caminhões estão à

disposição da coleta, mas os funcionários não querem trabalhar”. Conforme a reportagem, os

grevistas caminharam do Paço à Praça da Catedral para protestar contra a ordem do prefeito.

A situação nas Secretarias de Educação e Saúde permanecia estável, com atendimento

parcial. Paralelamente, a Administração resolveu atacar o movimento pela via judicial. A

Procuradoria-Geral do Município (Proge) ingressou com uma ação declaratória de ilegalidade

e abusividade da greve na Justiça Comum.

O procurador-geral Laércio Fondazzi argumentou a existência de irregularidades na

Assembleia que deliberou pela paralisação, entre elas, a contagem dos votos de aposentados e

crianças. Outra falha alegada pelo Executivo concerne à notificação da greve, que, na análise

do procurador, teria sido protocolada horas antes de seu início, contrariando o prazo mínimo

de 48 horas previsto na Lei de Greve. Fondazzi declarou ao Jornal: “O Sindicato protocolou

uma notificação antes, mas dizendo que continuava negociando, o que invalidou essa

notificação”. Além disso, a Administração considerou abusivos e ilegais os piquetes que

bloquearam o acesso de munícipes e servidores não grevistas aos prédios públicos. O

Sismmar preferiu aguardar a comunicação pelo oficial de Justiça antes de se pronunciar. O

prefeito concedeu a seguinte entrevista a O Diário:

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A cobertura do sexto dia de greve (10/06), em O Diário (11-12/06), ficou a cargo do

jornalista Eduardo Xavier. Segundo a reportagem, a Prefeitura pretendia definir, ainda no fim

de semana, a empresa que realizaria o serviço de coleta em caráter emergencial, com

caminhões e combustível fornecido pela própria Administração. O secretário de Serviços

Públicos estimou que o acúmulo de lixo nas ruas passava de 1,5 mil toneladas, conforme o

cálculo de 300 toneladas por dia.

No domingo (11/06), o Comando de Greve se reuniria para avaliar a primeira semana

do movimento e planejar as próximas ações. A maior adesão de grevistas, naquele momento,

se dava nas Secretarias de Educação, Serviços Públicos, Saúde e Trânsito. A presidente do

Sismmar reiterava que 70% dos servidores municipais estavam “de braços cruzados”. Ao

passo que a Prefeitura reduzia a estimativa para 20%, no intuito de enfraquecer a greve

perante a opinião pública. Apesar dos boatos de que os paredistas iriam boicotar a Campanha

de Vacinação contra a Paralisia Infantil naquele ano, o fato não ocorreu e as crianças foram

vacinadas normalmente em todas as unidades de saúde do Município. Questionada pelo Jornal

sobre a postura do prefeito frente a greve, Ana Pagamunici asseverou: “De total desrespeito

com o movimento e com o Sindicato dos Servidores. Ele não dialoga”.

O oitavo dia da greve (12/06), narrado por Leonardo Filho em O Diário de 13 de

junho (terça-feira), se destacou pela notícia de que a empresa Ponta Grossa Ambiental ficaria

responsável pela coleta de lixo a partir daquela segunda-feira. Revoltados com a situação, os

grevistas impediram, logo de manhã, os funcionários terceirizados de sair com os caminhões

da Prefeitura, que estavam no pátio da Polícia Ambiental de Maringá. De acordo com o

repórter, cogitou-se acionar a PM para garantir a retirada dos veículos, mas a estratégia não

funcionou. O secretário de Serviços Públicos, Diniz Afonso, atribuiu ao Sindicato e a

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grevistas mais radicais a culpa pelas quase duas mil toneladas de lixo acumuladas nos bairros:

“Infelizmente, os grevistas não deixam nossas equipes trabalharem. Vamos tentar colocar

equipes durante a noite e madrugada”.

Um oficial de Justiça da 3ª Vara Cível de Maringá e a Polícia Militar monitoravam as

ações no local e, a cada incidente, registrava-se um boletim de ocorrência. À reportagem de O

Diário, a Prefeitura lembrou que os bloqueios poderiam ensejar multa diária de R$ 20 mil. O

advogado do Sismmar afirmou que a contratação da Ponta Grossa era ilegal, pois os grevistas

estavam respeitando a essencialidade da coleta de lixo. Disse, ainda, que recorreria na Justiça

contra as multas aplicadas ao Sindicato. Sobre a reunião com a Procuradoria do Trabalho na

quarta-feira, o procurador-geral Laércio Fondazzi alertou que, se os piquetes continuassem, a

Administração dificilmente cederia ao diálogo.

Leonardo Filho contou que cerca de 30 mães de alunos do CMEI Aparecida Fortunata

Bartalini Seneme, no Parque Itaipu, protestaram no local contra a greve do funcionalismo

público. Uma delas declarou: “Não trabalho há quase dez dias. Tenho dois filhos na creche e

não tenho com quem deixar. Sou diarista e não tenho como pagar alguém para cuidar dos

meus filhos”. Na área da Saúde, a adesão à greve tinha aumentado, principalmente no

Hospital Municipal, segundo levantamento da Administração.

No dia 13 de junho (terça-feira), o Blog do Rigon relatou um incidente na Vila

Esperança. Lideranças do movimento grevista teriam impedido um trator de recolher o lixo

acumulado nas calçadas. A PM chegou no local, com cachorros, para permitir que os

funcionários da Ponta Grossa Ambiental realizassem a coleta. Na tarde deste dia, um morador

do Parque Hortência teria despejado uma carriola cheia de lixo em frente ao Paço Municipal,

conclamando mais pessoas a fazer o mesmo, sob aplausos dos servidores em greve. Como

resposta à provocação, a Prefeitura comunicou que moradores do Jardim Industrial deixariam

lixo na porta do Sismmar.

Na matéria de 14 de junho de O Diário, Leonardo Filho veiculou a informação de que

o juiz da 5ª Vara Cível, Siladelfo Rodrigues da Silva, indeferiu a ação declaratória de

ilegalidade e abusividade da greve, impetrada pela Prefeitura. O diretor do Procon na época,

Ulisses Maia, criticou a reação do Sismmar: “O juiz não decidiu nada liminarmente. O

Sindicato, mal intencionado, anda divulgando que a greve foi considerada legal, mas não foi”.

Por outro lado, o advogado Avanílson Araújo destacou: “Com certeza nós estamos mais

tranquilos agora. Isso faz cair por terra todas as declarações do prefeito que afirmava

ilegalidade da greve”.

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A audiência entre Sismmar e Prefeitura na Procuradoria do Trabalho estava marcada

para a tarde daquela quarta-feira (14/06). De acordo com o Jornal, embora o prefeito tenha

confirmado a participação, sua assessoria justificou uma possível ausência de Sílvio Barros

devido às ações “radicais” dos grevistas. Avanílson Araújo, porém, estava otimista com a

reunião: “Estamos enviando ofício todos os dias, pedindo para que ocorra uma negociação

pacífica”. A Prefeitura negou qualquer tentativa de acordo por parte do Sindicato.

Enquanto isso, a coleta de lixo continuava sendo o setor mais prejudicado pela

paralisação, mesmo com 30% dos servidores em atividade. A Prefeitura já havia solicitado às

Promotorias de Meio Ambiente e Saúde Pública a abertura de um inquérito civil contra o

Sismmar.

Na manhã do dia 14, o prefeito se reuniu com empresários, autoridades, diretores da

Associação Comercial e Empresarial de Maringá (Acim), líderes religiosos, secretários e

vereadores da base aliada, no Maringá Clube. O objetivo era discutir o andamento e os

prejuízos da greve.

No dia 15 de junho (quinta-feira), feriado de Corpus Christi, o Blog do Rigon

divulgou uma notícia inusitada. Duas servidoras, postadas em uma janela do Paço Municipal,

anunciavam ao microfone: “Atenção, servidores, […] não houve nenhuma decisão da Justiça

de Maringá sobre a legalidade da greve. O despacho do juiz está à disposição de todos nos

murais da Prefeitura”. As circunstâncias indicavam que o ato seria uma estratégia da

Administração para desmobilizar o funcionalismo.

Na edição de feriado do jornal O Diário (15-16/06), um colunista escreveu a seguinte

nota, sem assinatura:

Falta bom senso, sobra provocação. A impressão é que o vírus da arrogância e da

intransigência tomou conta de alguns setores de Maringá. Servidores municipais em

greve hostilizam e agridem os que não aderiram ao movimento; a Administração

Municipal, inábil, se nega ao diálogo com justificativas pífias; a Procuradoria do

Trabalho aciona a Polícia Federal para retirar repórteres de um prédio público;

populares se atracam com grevistas… Em prevalecendo provocações, só resultarão

radicalismos. E nada será resolvido (O DIÁRIO, 15-16/06/06).

Em reportagem da mesma edição, Leonardo Filho informou que, pela primeira vez em

dez dias, Prefeitura e Sindicato “sentaram para tentar negociar o fim da greve”. Contudo, a tão

aguardada audiência em 14 de junho não aconteceu. Representantes do Executivo declararam

que só entrariam em negociação se pudessem filmá-la. O procurador do Trabalho, Fábio

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Aurélio Alcure, negou o pedido e, na falta de um acordo, encerrou a reunião. “Por causa de

uma fita os interesses da comunidade são deixados de lado. Percebe-se que a Prefeitura é

quem não quer conversa”, queixou-se o advogado do Sismmar, Avanílson Araújo.

Participaram da audiência o vereador Humberto Henrique (PT) e o presidente da

subseção local da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-Maringá), Aírton Kenji Ueda. No

lugar do prefeito, esteve presente a comissão eleita no encontro do Maringá Clube, formada

pelo secretário de Gestão, José Luiz Bovo; o procurador jurídico do Município, Laércio

Fondazzi; e o diretor do Procon, Ulisses Maia.

Conforme a reportagem, ao saberem do encontro no Maringá Clube, na manhã do dia

14, os grevistas se deslocaram até o local com um carro de som. Ulisses Maia revelou no

evento que os servidores em greve sofreriam descontos pelos dias não trabalhados. Ana

Pagamunici falou ao Jornal sobre os episódios recentes:

Quanto à situação do lixo, o secretário de Serviços Públicos alertou que o problema

vinha se agravando perto de escolas e clubes sociais, em razão das festas juninas. De acordo

com Diniz Afonso, os funcionários da Ponta Grossa Ambiental realizavam a coleta em

caminhões basculantes improvisados, sobretudo nos pontos mais críticos da cidade.

Mais casos de violência foram verificados pelo Jornal. Na manhã do dia 14 de junho,

nas proximidades da Secretaria de Serviços Públicos, um vigia em greve foi atropelado por

um Ford Fiesta com adesivo da Secretaria de Saúde, segundo testemunhas. O SIATE socorreu

o servidor e levou-o para o Hospital Metropolitano de Sarandi. A assessoria de imprensa da

Prefeitura garantiu que o vigia se jogou no capô do veículo. O motorista do Fiesta acabou não

sendo identificado.

Na noite de terça-feira (13/06), um grupo de homens, dirigindo carro e motocicletas,

barrou a coleta do lixo no Jardim Industrial e Parque Itaipu. O serviço seria executado pelos

próprios munícipes, a partir de um acerto com a Prefeitura. Armado com pedaços de madeira,

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segundo O Diário, o grupo entrou em confronto com os moradores. Testemunhas disseram

depois à PM que os agressores eram “grevistas da Prefeitura”. As pessoas feridas registraram

queixa na 9ª SDP de Maringá. A reportagem tentou contato com o Sismmar, mas não obteve

retorno.

De forma súbita, aconteceu na tarde de 16 de junho (sexta-feira) uma reunião entre

Prefeitura e Sindicato. A sessão no Gabinete do Prefeito resultou na assinatura de um “termo

de pré-acordo”. No documento assinado pelo prefeito Sílvio Barros e pela presidente do

Sismmar, Ana Pagamunici, as partes se comprometeram a respeitar algumas condições

bilaterais antes de restabelecer o processo de negociação:

1) Da parte dos servidores públicos municipais, haverá a liberação total dos portões

da SAOP para todos os equipamentos e máquinas e ainda a garantia do número

mínimo de 30% dos servidores sob comando da Administração, em respeito à

essencialidade do serviço, até o término das negociações […]:

a) A liberação dos portões, máquinas e pessoal se dará 30 minutos antes da

realização da reunião de negociação a ser agendada entre as partes, ficando

condicionada à realização desta ao efetivo cumprimento da medida.

2) Da parte da Prefeitura do Município de Maringá, ficam assegurados na pauta de

reivindicações da categoria os seguintes pontos iniciais:

a) A Prefeitura se dispõe a discutir mecanismos de compensação ou ajuste salarial

que estejam dentro dos limites constitucionais, além dos 4,53% de reposição do

índice.

b) A Prefeitura se dispõe a rediscutir com o sindicato o assunto relativo a servidores

pagos pela Administração, colocados à disposição do Sismmar.

c) A constituição imediata de uma comissão de negociação dentro de critérios justos

para os servidores estáveis, com finalidade de discutir, elaborar e apresentar

proposta de revisão do Plano de Carreira, Cargos e Salários e do Estatuto da

categoria.

d) Ao final da negociação, será discutida a forma de compensação aos grevistas dos

dias parados.

O termo de pré-acordo foi notícia em O Diário, no dia 17 de junho (sábado), 13º dia da

greve. O jornalista Leonardo Filho confirmou a liberação dos 11 caminhões da coleta de lixo

por parte dos grevistas, no final da tarde do dia anterior. Havia grande expectativa, de ambas

as partes, quanto ao fim da greve.

O Jornal deu destaque novamente aos transtornos gerados pelo acúmulo de lixo. Os

moradores entrevistados se diziam muito aborrecidos com o mau cheiro. A situação piorava

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quando animais de rua reviravam os sacos e espalhavam o lixo pelas calçadas. Além do

problema sanitário, a greve continuou ocasionando problemas policiais. Uma servidora da

Secretaria de Serviços Públicos, que pretendia trabalhar, acusou ter sido agredida por um

grevista. A reportagem apurou que os confrontos entre grevistas e não grevistas acarretaram

aproximadamente 20 inquéritos policiais até aquele momento. Mas nenhuma prisão foi

decretada.

A correspondência entre Prefeitura e Sindicato, no dia 17, indicava que a negociação

realizada na noite anterior não prosperou. Para compreender a tensão envolvida no processo,

vale reproduzir o teor dos documentos. Primeiro, um trecho da carta assinada pela comissão

de negociação da Prefeitura:

Considerando que foi assinado um termo de pré-acordo para abertura do processo de

negociação entre o Sismmar e a Prefeitura do Município de Maringá, cujo teor foi

dado ao conhecimento de toda a população através da imprensa, e que o Sindicato

decidiu unilateralmente desconsiderá-lo ao interromper a coleta de lixo às 23h00 do

dia 16 de junho, fica entendido que a Prefeitura voltará à mesa de negociações assim

que as horas paradas da coleta sejam compensadas.

No caso do Sismmar não concordar com o cumprimento daquilo que foi

assinado, todos os pontos que foram NEGOCIADOS ficarão sob suspeita, pois, se as

condições mínimas para a conversação não são honradas, não há certeza de que o

que for acordado na sequência será cumprido por parte do Sindicato (Comissão de

Negociação da Prefeitura, 17/06/06).

No mesmo dia, a comissão que representava os trabalhadores e o Sismmar respondeu:

1) Na perspectiva do comando de greve, houve um retrocesso na pauta pré-acordada

para o início das conversações, em especial, no que diz respeito à proposta concreta

de recuperação das perdas salariais da categoria, uma vez que os representantes da

Prefeitura não trouxeram sequer um estudo de impacto financeiro ou a alternativa de

qualquer outra medida que pudesse contemplar o pleito dos servidores,

demonstrando uma falta de seriedade e comprometimento em solucionar

rapidamente o conflito estabelecido há quase duas semanas.

2) Por outro lado, em outros pontos sinalizados na pauta pré-acordada, a resposta

oferecida pela Prefeitura traduziu-se em um discurso ideológico de interferência na

autonomia da Entidade Sindical, principalmente, quando se tentou discutir o retorno

dos diretores sindicais liberados.

3) Ainda durante a tentativa de conversação, os representantes do Comando de

Greve receberam informações de que os caminhões liberados para o serviço estavam

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sendo retomados, à força, através de utilização da empresa de segurança privada

“Kamilus”, que funciona irregularmente na cidade, fato que não será tolerado para o

possível reinício das negociações.

A comissão concluiu o documento afirmando que, devido à falta de um “proposta concreta”

da Administração, considerou suspenso o acordo. Por esse motivo, a coleta de lixo foi mais

uma vez interrompida.

A coluna de informes de O Diário publicou nota sem assinatura, na edição de 18 e 19

de junho (domingo e segunda-feira), dizendo que as negociações haviam retornado à “estaca

zero”. Apesar da expectativa de solução do conflito, no entender do colunista, Prefeitura e

Sindicato

voltaram a criar um falso impasse, numa marcação de posição absolutamente

desnecessária. Ora, se volta a faltar bom senso e sobrar intransigência, quem

continuará arcando com o ônus é justamente a população, que vê o lixo se acumular

cada dia mais em frente às suas casas (O DIÁRIO, 18-19/06/06).

Na reportagem principal, o jornalista Leonardo Filho cobriu os bastidores da última

reunião. Sobre a quebra do pré-acordo, Ulisses Maia, um dos membros da comissão de

negociação da Prefeitura, declarou: “Eles não estão cumprindo o que combinamos”. Foi

assinado um documento entre o prefeito e o Sismmar liberando a coleta. Desse jeito fica

difícil tentarmos negociar com o Sindicato”. A presidente do Sismmar, Ana Pagamunici,

garantiu que 30% do serviço estava sendo mantido e justificou: “Na verdade, a coleta parou às

23 horas porque é o horário de encerramento do trabalho dos coletores”. Ana ainda afirmou:

“o prefeito devia ter participado da reunião de ontem (sexta-feira) até o final. Por isso que as

negociações continuam demoradas”. De acordo com a reportagem, os principais pontos de

concentração dos grevistas eram na Secretaria de Serviços e no Hospital Municipal.

No dia 19 de junho, o Sismmar divulgou uma moção de solidariedade ao jornalista

Andye Iore, no site recém-lançado da entidade. Em reportagem de junho para o Jornal Hoje

de Maringá (sem data), ele havia denunciado que um grupo de quase 50 pessoas, algumas

encapuzadas, agrediu grevistas reunidos na garagem de ônibus da Prefeitura, de madrugada, e

retirou os veículos. Na moção, o Sindicato presta solidariedade a Andye Iore pela “corajosa”

investigação a respeito dos seguranças da empresa Kamillus, contratados pela Ponta Grossa

Ambiental para escoltar os caminhões da empresa. Segundo relato em seu blog Factorama,

eles andavam armados com revólveres e cassetetes. Andye contou que, na madrugada de 19

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de junho, seu veículo foi fechado por três motocicletas no Centro da cidade. Mesmo depois de

identificar-se, os seguranças continuaram a ameaçá-lo. O documento concluiu:

Esse trágico episódio reafirma as denúncias feitas pelo Sismmar durante a

greve, período no qual vários servidores foram intimidados, um atropelado,

três espancados e outros ameaçados com armas por esses mesmos

seguranças. Repudiamos essa prática truculenta, antidemocrática e ditatorial

que pretende intimidar os servidores de se manifestarem e a imprensa de

fazer seu trabalho de cobertura dos fatos (Sismmar, 19/06/06).

A comissão criada para coordenar a escala da essencialidade comunicou ao Ministério

Público, na mesma data a ocorrência de condutas antissindicais dentro do Hospital Municipal.

O diretor e um enfermeiro, na perspectiva da comissão, estavam boicotando a escala para

prejudicar os grevistas e favorecer os não grevistas. Os servidores em greve eram designados

para trabalhar em dias e horários diferentes daquilo que foi acertado com a diretoria do

Hospital, enquanto os não grevistas recebiam folgas nesses mesmos dias e horários, inclusive

nos finais de semana.

Ainda no dia 19, o Gabinete do Prefeito respondeu a um ofício de 08 de junho do

Sismmar. A Administração apresentou no documento uma proposta reformulada para os

servidores:

1) Reposição integral da inflação 2005 de 4,53% (em duas parcelas: julho e agosto).

Em razão de limitações legais da Constituição Brasileira e da Lei de

Responsabilidade Fiscal, o Município de Maringá está impedido de oferecer reajuste

salarial maior […].

2) Iniciar o pagamento da progressão e dos atrasados a partir do mês de novembro

de 2006 […].

3) Iniciar os trabalhos de revisão do PCCS do magistério e dos demais servidores a

partir de julho/2006 […].

4) Não reconhecemos acusação de perseguição de servidores, não é prática desta

Administração.

5) Considerando a necessidade de fechamento da folha no dia 20, para pagamento

dia 30, em havendo aceitação da presente proposta pela assembleia dos servidores e

a greve sendo encerrada na data de hoje, a Administração se compromete a

descontar metade dos dias parados nas férias e a outra metade deverá ser

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compensada pelo servidor em horas de trabalho na mesma proporção dos dias

parados. No caso de não aprovação para encerramento da greve hoje, infelizmente o

desconto integral dos dias parados terá que ser feito na folha de junho […] (Ofício

nº833-Gapre, 19/06/06).

Em nota de 21 de junho, nos informes de O Diário, consta que a Secretaria de

Administração instaurou processo administrativo contra a servidora Maria da Conceição

Franco, conhecida como Zica. A pedagoga foi acusada de distribuir panfletos com críticas ao

prefeito Sílvio Barros, em março de 2006, no Centro Municipal de Educação Infantil Laura

Parente Bossolan. O texto se intitulava “Desmonte da saúde pública de Maringá”.

Outra notícia veiculada nesse dia, tratou da polêmica sobre a terceirização da coleta de

lixo. Consoante reportagem de Paulo Pupim, a Prefeitura decidiu firmar novo contrato

temporário com a Ponta Grossa Ambiental. O objeto seria disponibilizar mais 96

trabalhadores para atuar no serviço. Paralelamente, o prefeito enviaria um projeto de lei à

Câmara Municipal pedindo autorização para privatizar definitivamente a coleta, mediante

contrato de concessão. Revoltados, os grevistas acompanharam a sessão do Poder Legislativo,

a fim de saber se o projeto entraria ou não na pauta, o que não ocorreu. Mesmo assim,

apelaram aos vereadores para que rejeitassem de imediato a matéria. Os servidores alegaram

ao Jornal:

O problema da coleta não será resolvido com a privatização. […] A solução virá

com o fortalecimento do setor público, a valorização do servidor e as melhorias das

condições de trabalho e de salários pagos aos atuais coletores municipais (O Diário,

21/06/06).

Embora o secretário de Serviços Públicos, Diniz Afonso, tenha assegurado que apenas

a coleta seria terceirizada naquele momento e que nenhum servidor seria demitido, a

assessoria de imprensa da Prefeitura comunicou, em 20 de junho, que os serviços de poda,

roçada e varrição também seriam terceirizados. De acordo com a reportagem, 160 servidores

trabalhavam na coleta. O jornalista lembrou que o ex-prefeito Ricardo Barros havia adotado a

mesma medida entre 1989 e 1992. No entanto, foi revogada por seu sucessor, Said Ferreira,

sob a justificativa de que o valor pago pela tonelada de lixo coletada era muito elevado.

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Em outra matéria de 21 de junho, Leonardo Filho relatou que cerca de 1,2 mil

servidores recusaram a segunda proposta da Administração, na Assembleia de 20 de junho

(terça-feira) no Auditório Dona Guilhermina. Apenas duas pessoas discursaram a favor, mas a

plateia ouviu de costas. Ao saber da decisão, o secretário Ademar Schiavone avisou que os

dias de greve seriam descontados irreversivelmente. O advogado do Sismmar entrou com um

mandado de segurança preventivo na Justiça para tentar impedir os descontos. Na sessão de

terça-feira da Câmara, os vereadores decidiram intermediar uma reunião entre Prefeitura e

servidores. Porém, não definiu-se data porque o prefeito estava em viagem.

Segundo dados da Administração, 1,7 mil servidores sofreriam descontos salariais em

função da greve. Do total de grevistas, 60% eram da Secretaria de Educação; 25%, da

Secretaria de Serviços Públicos. Somente dois caminhões da Ponta Grossa Ambiental estavam

em operação. No 17º dia do movimento, estimava-se em 4,6 mil toneladas a quantidade de

lixo na cidade. Outra preocupação do Executivo eram as chuvas, pois estas levavam água

contaminada do lixo até os córregos. O jornalista encerrou o quadro geral informando que o

juiz Abílio de Freitas determinou a intervenção da Polícia Militar para liberar os caminhões da

Secretaria de Serviços Públicos.

Pela estimativa do Sindicato, o movimento grevista teria alcançado a adesão de 75%

do funcionalismo municipal. De acordo com o Boletim de Greve nº6, publicado no site da

entidade, os servidores rejeitaram a proposta da Administração, na Assembleia de 20 de

junho, por tê-la considerado idêntica à proposta anterior, já reprovada na Assembleia de 05 de

junho. O Sismmar publicou uma carta aos movimentos sociais, organizações e entidades de

direitos humanos no site, em 22 de junho, denunciando os casos de violência protagonizados

pelos seguranças da Kamillus.

Na edição de 22 de junho (quinta-feira), O Diário se concentrou novamente na questão

do saneamento. Leonardo Filho entrevistou uma médica sanitarista da 15ª Regional de Saúde

de Maringá. Ela enumerou as doenças que o acúmulo de lixo nas ruas poderia causar, devido à

proliferação de ratos, insetos e outros bichos, entre elas, a gastroenterite, a leptospirose e a

hepatite A. Procurado pela reportagem, o secretário Diniz Afonso se mostrou preocupado com

a grande quantidade de resíduos gerados pelas festas juninas e festas da Copa do Mundo de

2006. Ele calculou que 350 toneladas de lixo se acumulavam a cada dia na cidade.

O Centro de Mídia Independente (CMI), um portal nacional de notícias na Internet,

reverberou as denúncias de violência feitas pelo Sismmar contra Prefeitura de Maringá. O

CMI chegou a relatar que o prefeito Sílvio Barros se retirou dez minutos após o início da

última reunião entre as partes. No mesmo horário, os carros dos membros do Comando de

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Greve foram fechados por seguranças armados, encarregados de tomar os caminhões dos

grevistas e colocá-los a serviço da Ponta Grossa Ambiental.

A reportagem de 23 de junho (sexta-feira) de O Diário informou que a Prefeitura

firmou novo contrato com a Ponta Grossa Ambiental, a fim de disponibilizar mais 10

caminhões para a coleta. Em resposta ao jornalista Murilo Gatti, o prefeito descartou a

possibilidade de decretar estado de emergência no município. Sílvio Barros cobrou o

cumprimento das liminares judiciais por parte dos grevistas, antes de retomar as negociações:

Primeiro, os grevistas terão que demonstrar que são pessoas dignas de viver em

Maringá, que é uma cidade ordeira. Para isso, precisam cumprir com o que

acordaram e respeitar as determinações judiciais. Depois sentamos para conversar. É

só marcarem o dia e o horário (O Diário, 23/06/06).

O prefeito lembrou que, além dos dias descontados, os servidores em greve teriam

prejudicados também a progressão funcional e outros benefícios da carreira. Quanto à

reposição salarial de 4,53%, reiterou que não poderia conceder reajuste maior, pois o

percentual oferecido já ultrapassaria o limite prudencial da LRF. Não obstante, comprometeu-

se a manter bancar o reajuste e aumentar a arrecadação do Município para evitar penalidades

do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR).

Na madrugada do dia anterior (22/06), 20 viaturas e 40 soldados da PM tentaram

liberar os caminhões coletores da Secretaria de Serviços Públicos, mas encontraram os pneus

murchos. Para impedir a retirada de outros caminhões, os grevistas formaram um cordão de

isolamento e acenderam uma fogueira em frente ao portão da Secretaria. Na versão da

Prefeitura, eles teriam murchado os pneus. O Comando de Greve negou a acusação e garantiu

que a ação foi executada por desconhecidos para denegrir o movimento. Segundo Murilo

Gatti, os servidores empilharam sacos de lixo diante da Secretaria e interditaram a rua com os

detritos deixados ali pelos moradores do Jardim América. A presidente do Sismmar se

pronunciou:

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O Blog do Rigon informou, em 23 de junho, que o vereador Valter Viana havia

apresentado requerimento em regime de urgência na sessão do dia anterior. O expediente

solicitava antecipação das férias escolares na rede municipal de ensino, com o objetivo de

evitar o contato dos alunos com o lixo acumulado nas imediações de escolas e CMEIs.

Com a chegada dos dez caminhões e o reforço de mais trabalhadores da Ponta Grossa

Ambiental, o problema da coleta começou a ser resolvida, conforme matéria de 24 de junho

(sábado) de O Diário. Ao jornalista Murilo Gatti, a Administração Municipal previu que a

situação seria normalizada em, pelo menos, uma semana. A presidente do Sismmar, Ana

Pagamunici, comentou a declaração do prefeito Sílvio Barros sobre a reposição da inflação de

4,53%: “Se um reajuste pode superar o limite da Lei de Responsabilidade Fiscal, deveriam

demitir alguns funcionários de cargos de confiança e, principalmente, os parentes”. A

presidente salientou que as reivindicações do funcionalismo não se resumiam ao reajuste.

Havia também a pauta das progressões, da revisão do PCCR e do fim das perseguições,

motivo de muita reclamação por parte dos servidores municipais. Prefeitura e Sindicato ainda

participaram de uma reunião sobre a greve, em 23 de junho, com os promotores Maurício

Kalache e Elza Sangali, na Promotoria da Saúde.

“Minha casa virou um lixão”, protestou um comerciante entrevistado pela reportagem.

O munícipe contou que, ao retornar de viagem na madrugada de quarta-feira, deparou-se com

uma “montanha de lixo” na calçada de sua residência. Vizinhos afirmaram que “pessoas de

colete verde” foram os responsáveis pelo ato. O comerciante, morador da Vila Esperança,

disse que acionaria a Justiça por causa do constrangimento.

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O Diário narrou que dois motociclistas atacaram “a pontapés” um carro da Ponta

Grossa Ambiental nas proximidades do Cemitério Municipal. O motorista da empresa

registrou denúncia na 9ª SDP. Na madrugada do dia 23, dois ônibus de transporte escolar

tiveram os pneus murchados e os bicos de ar danificados por pessoas não identificadas. Outro

fato relatado na mesma edição dizia respeito à proliferação de ratos e baratas pela cidade. A

coordenadora do setor de zoonoses e pragas da Secretaria de Saúde alertou: “O lixo é o

alimento e há hoje uma explosão de alimentos. […] Quanto mais alimentos disponíveis maior

será a população de ratos”.

Entrando no 20º dia da paralisação, os servidores realizaram Assembleia no sábado, 24

de junho. O site do Sismmar divulgou o resultado da Assembleia e, ao mesmo tempo, fez uma

longa reflexão sobre o desenvolvimento da greve. No texto, o Sindicato recorda que o prefeito

usou a mídia para dizer que só voltaria a negociar se os grevistas cumprissem as

determinações judiciais e sua parte nos acordos. Em contrapartida, o autor indaga: “Será que

podemos confiar na palavra do prefeito?”. E emenda: “Vejamos algumas promessas que o

prefeito Sílvio Barros II fez durante sua campanha eleitoral”:

O prefeito prometeu em sua campanha que os servidores teriam a “livre escolha do

banco para recebimento do salário”. Mas por que ainda somos obrigados a depositar

em apenas um banco, escolhido pela Prefeitura?

O prefeito prometeu que “os reajustes salariais serão concedidos

integralmente na data-base da categoria, de acordo com o índice da inflação”. Mas

por que então o Prefeito não pagou até agora nosso reajuste?

O prefeito Sílvio Barros II prometeu em sua campanha que “não haverá

privatização em nenhuma área durante a Administração Sílvio Barros”. Então, por

que o Prefeito está tentando privatizar o Hospital Municipal, a merenda escolar e

principalmente a coleta de lixo?

[…] Nós cumprimos com nosso acordo no dia 16 de junho, abrindo os

portões da SAOP para que o Prefeito negociasse. Sabem o que o prefeito fez? Saiu

da reunião 10 minutos depois de começar e deixou sua equipe de negociação

sozinha, sem fazer nenhuma proposta por escrito, sem atender nenhuma de nossas

reivindicações […].

Um dia antes da Campanha da Vacina, a Administração afirmou nos meios

de comunicação que os servidores iriam boicotar a Campanha. Sabe o que

aconteceu? Todos os servidores da Saúde foram vacinar as crianças, mesmo estando

em greve […].

Agora o prefeito está dizendo que os servidores furaram os pneus dos

caminhões. Mas como os servidores fariam isso se a greve é do lado de fora dos

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portões da SAOP? Por que razão iriam furar os pneus se precisamos dos caminhões

para garantir os serviços essenciais?

E, assim, as inverdades vão ganhando boa parte da imprensa, preocupada

com os negócios, não com a verdade. São raros os veículos que guardam o tom de

imparcialidade e menos ainda os que preservam um perfil de compromisso social e

com o direito dos trabalhadores (Sismmar, 24/06/06).

A Assembleia decidiu, no mesmo sábado, que todos os caminhões coletores e

servidores da Secretaria de Serviços Públicos retornariam ao trabalho, na expectativa de que o

prefeito voltasse a negociar com a categoria. O Comando de Greve se reuniu imediatamente

com representantes da Administração para definir um acordo, registrado em ata, sobre o

funcionamento da coleta de lixo a partir daquele momento.

A coluna de informes de O Diário, de 25 e 26 de junho (sábado e domingo), publicou

nota em que o prefeito mostrava desconfiança com relação ao acordo: “Eles não são muito de

cumprir o que falam. Só acredito vendo. Só papel assinado não vale”.

Na mesma edição, a reportagem “Greve pode estar perto do fim”, assinada por Elaine

Utsunomiya, informa que o Comando de Greve e a comissão da Prefeitura voltariam à mesa

de negociação na manhã de terça-feira (27/06), no Tribunal do Júri do Fórum de Maringá, a

convite do Ministério Público. Além dos vereadores, participariam também os promotores de

Justiça Maurício Kalache e Elza Sangale. Diante do iminente retorno dos servidores da

Secretaria de Serviços Públicos, a Administração acelerou a retomada da coleta para dar conta

das quase 5 mil toneladas de lixo espalhadas pela cidade.

O domingo foi marcado por provocações de ambos os lados. O Sismmar publicou em

seu site, no dia 26 de junho (segunda-feira), o texto “Um desafio ao prefeito Sílvio Barros II”:

O prefeito Silvio Barros II superou neste domingo, dia 25 de junho, os limites do

populismo. Desacostumado ao trabalho árduo que afeta a maioria dos trabalhadores

do país, ele substituiu por um dia o ar-condicionado pelo calor das ruas, a empáfia

habitual pela humildade forçada e o conforto do seu prédio pelo odor fétido dos

lixos acumulados por sua Administração. [...] A operação é tão simples que o

prefeito sacrificou seu domingo para limpar umas duas ou três cestas de lixo,

acompanhado por seus cargos de confiança, que outrora ameaçavam os servidores

na greve. Segundo o prefeito, os trabalhadores da SAOP provavelmente “estavam

cansados” em função da greve e por isso não foram trabalhar. Conclusão: o prefeito

foi trabalhar no lugar deles. Uma vez que o prefeito afirmou ser capaz de substituir o

papel dos coletores, fica uma questão a ser respondida: serão os coletores capazes de

substituir o papel do prefeito? Queremos lançar esse desafio: o prefeito irá trabalhar

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não um dia, mas durante um ano no lugar dos coletores e os coletores irão

administrar a cidade por um ano no lugar do prefeito (Sismmar, 26/06/06).

O texto prossegue com uma lista de compromissos que os servidores assumiriam se o

desafio fosse aceito, entre eles, a promessa de que o prefeito não sofreria perseguição em caso

de greve. No mesmo tom, seguiu-se nova postagem:

Enquanto o ex-prefeito Ricardo Barros inventava uma nova modalidade esportiva:

“o salto em janelas”, o prefeito Silvio Barros II está tentando criar o “arremesso de

lixos”. Pensa que limpar as ruas de Maringá é um esporte para quem não tem o que

fazer aos domingos. Durante sua prática esportiva, o prefeito declarou a um

jornalista que o Sindicato “assinou um acordo” dizendo que os coletores

trabalhariam no domingo. Para desmentir mais uma vez o prefeito, reproduzimos

abaixo o documento original [Acordo para Funcionamento da Coleta de Lixo,

24/06/06] assinado pelo gerente da Coleta de Lixo, onde estão registrados os dias e

horários em que os coletores iriam trabalhar. Mais uma vez o Sindicato cumpre sua

parte no acordo, abrindo os portões da SAOP. Será que o prefeito irá descumprir

mais uma vez a sua parte? Veremos na terça-feira… (Sismmar, 26/06/06).

O Sindicato distribuiu um panfleto em 27 de junho (terça-feira), no qual solicitava

doações de alimentos a um fundo de solidariedade criado para atender aos trabalhadores em

greve. No documento, a entidade contextualizou a situação dos grevistas, ameaçados de sofrer

descontos no salário de junho.

O Diário do dia 27 anunciou: “Hoje é o dia D da paralisação”. O jornalista Murilo

Gatti escreveu que a reunião do Fórum naquela manhã seria mais importante para os

maringaenses do que as partidas da Copa do Mundo. Na Assembleia de segunda-feira (26/06),

na Praça da Prefeitura, cerca de 1,5 mil servidores já haviam ratificado a decisão de aguardar

a negociação do dia seguinte, antes de definir as próximas ações. Em três dias de coleta, uma

tonelada de resíduos foi recolhida, segundo avaliação do Secretário de Serviços Públicos.

Diniz Afonso contou que o prefeito Sílvio Barros e ocupantes de cargo comissionados

trabalharam cinco horas no domingo e encheram um caminhão com sete toneladas de lixo.

Apesar da expectativa, a tentativa de acordo fracassou novamente. Murilo Gatti conta

na reportagem de 28 de junho (quarta-feira) que, na reunião mediada pelos juízes Abílio de

Freitas e Carmen Ramajo, a Administração sugeriu duas consultas: uma ao Tribunal Superior

Eleitoral (TSE), sobre a limitação de reajustes salariais a funcionários públicos em ano

eleitoral; e outra ao TCE, acerca das restrições da LRF. À revelia do Sindicato, a Prefeitura

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resolveu efetuá-las e aguardar a resposta antes de retomar a negociação. “Fiquei bastante

decepcionado porque sou obrigado a agir dentro da lei. Se agir fora, independente do prejuízo

com a imprensa, tem as ações e processos. O Ministério Público é absolutamente impiedoso”,

se defendeu Sílvio Barros. O prefeito também criticou a conduta dos grevistas: “Fazem tudo o

que a lei não permite, como piquetes e o bloqueio dos bens públicos”.

Sobre a negociação, a presidente do Sismmar declarou:

A proposta da Prefeitura é uma clara atitude de quem não está interessada em

resolver a questão da greve. Foi um desrespeito à Justiça e aos promotores […].

Juridicamente sabemos que a Lei [Eleitoral] não se aplica aos municípios [sem

eleições naquele ano]. Isso é um desrespeito à população que quer ver o fim da

greve. É falta de vontade para resolver o problema (O Diário, 28/06/06).

O portal Tribuna do Paraná, no mesmo dia, questionou Ana Pagamunici a respeito da

última reunião: “Eles não só retiraram a proposta de 4,53%, como apresentaram uma proposta

de reajuste de 0,39% […]. Nós entendemos que a Prefeitura não quer acabar com a greve.

[…] Os servidores sentem-se palhaços”.

Os grevistas realizaram em 28 de junho (quarta-feira), na Praça da Prefeitura, uma

Assembleia para debater os rumos do movimento. Ficou deliberado que fariam, naquela

manhã, uma ocupação pacífica e simbólica do Paço, cantando o Hino Nacional de mãos

dadas. A partir desse ponto, a greve avançou para seu clímax.

Pelo blog Factorama, o jonalista Fábio Linjardi informou que aproximadamente 500

servidores foram até o Gabinete do Prefeito de manhã, a fim de protestar contra os descontos

nos salários. Os grevistas tentaram entrar no local, mas a Polícia Militar foi chamada. Sílvio

Barros, que estava reunido com os promotores de Justiça Maurício Kalache e Mônica Louise

de Azevedo, deixou o gabinete pela saída de emergência que levava até a garagem do Paço

Municipal, lembrando a fuga de Ricardo Barros em 1989.

Entrevistado horas depois pela CBN, rádio administrada por membros da família

Barros em Maringá, o prefeito disse que alertou os promotores sobre a possibilidade de

“quebradeira”, caso houvesse desconto no salário dos grevistas. Sílvio Barros disparou:

Olha, isso só vai terminar na hora em que a sociedade maringaense decidir que

pessoas desordeiras, descumpridores da lei e da ordem, pessoas que não respeitam o

Executivo, nem o Legislativo, nem o Judiciário, portanto, não respeitam a

democracia, pessoas que não respeitam a população e nem sequer respeitam o

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servidor que eles dizem defender […], a nossa sociedade decidir que nós não

queremos essas pessoas na nossa cidade, acabou. Esse tipo de gente não é bem-

vinda à sociedade de Maringá. […] A nossa imprensa não pode incentivar, estimular

um movimento grevista desse tipo, a greve é um direito legítimo, mas dentro da lei e

da ordem, pra isso que existe lei (Rádio CBN, 28/06/06).

De acordo com Fábio Linjardi, o prefeito também concedeu entrevista ao programa

Dia a Dia, da Rádio Cultura:

A primeira coisa que fiz foi ligar para o governador [Roberto Requião] e pedir para

que a força policial atuasse […]. Eu quero a prisão daqueles que comandaram essa

invasão. Eles foram filmados, fotografados e não são servidores […]. Eles querem

colocar o Comando de Greve em meu gabinete […]. O governador ficou injuriado.

Ele não aceita esse tipo de atitude e me disse que estava ligando para o comando da

Polícia [Militar], determinando a desobstrução do Paço Municipal (Factorama,

28/06/06).

O blogueiro contou que uma porta de vidro, entre a Assessoria de Imprensa e o

Gabinete do Prefeito, foi quebrada durante a ocupação. Os grevistas acusaram os seguranças

privados pelos danos. A Prefeitura, por outro lado, imputou a culpa aos grevistas. O jornalista

Andye Iore fotografou para o Factorama toda a movimentação daquele dia e escreveu:

Os grevistas retiraram as cadeiras do Paço e sentaram no chão esperando que a

Polícia Militar cumprisse a reintegração de posse. Mesmo com o cansaço, eles

permanecem conversando e cantando. Alguns servidores se sentiram intimidados e

reclamaram ao serem fotografados pela P2 [policiais à paisana]. Os policiais

improvisaram uma base na rampa entre o primeiro e segundo piso do Paço e se

movimentam constantemente fazendo pressão psicológica contra os grevistas

(Factorama, 28/06/06).

Mais tarde, relatou que os móveis da sala de espera do Gabinete ficaram destruídos. Havia

aproximadamente 30 policiais dentro do Prefeitura. Padres celebraram uma missa no local. Os

grevistas se acomodaram no térreo do Paço durante a noite. Às 20 horas, um major da PM

chegou para cumprir a ordem judicial de reintegração de posse.

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O Sismmar publicou uma extensa carta em seu site, no dia 28, em que sintetizava

todos os acontecimentos da greve até a ocupação do Paço Municipal. O texto conta que os

servidores entraram de mãos dadas na Prefeitura, cantando o Hino Nacional:

Enquanto isso, pessoas alheias ao movimento começaram a quebrar os vidros do

Gabinete do Prefeito para comprometer a mobilização dos servidores. Nenhum

servidor quebrou nada. Ao contrário, caminharam no Paço sem que nenhum

incidente fosse relatado. Quando chegaram ao Gabinete do Prefeito, os vidros já

estavam quebrados e os responsáveis teriam fugido pela porta dos fundos, conforme

relataram várias testemunhas (Sismmar, 28/06/06).

O Sindicato fez um apelo aos movimentos sociais, organizações de direitos humanos,

entidades sindicais, instituições e autoridades para que manifestassem apoio à causa do

funcionalismo municipal. O pedido se justificava, segundo o Sismmar, porque os meios de

comunicação apresentavam as notícias de forma unilateral e distorcida: “O prefeito Sílvio

Barros II (PP) permanece impunemente atacando os servidores nas rádios, televisão e jornais

da cidade e região, falando inverdades e se recusando a negociar uma melhor proposta à

categoria”.

Foi encontrada durante a pesquisa a degravação dos programas televisivos que

reportaram os fatos de 28 de junho. O documento estava assinado por um perito ad hoc da

Comissão Especial de Processo Administrativo Disciplinar (CEPAD), instaurada em julho

para apurar a responsabilidade pelos incidentes daquele dia.

O programa de Airton Costa, na RIC TV/Record, teve a presença de Willy Taguchi,

vice-prefeito de Maringá no mandato de Ricardo Barros (1989-1992). Taguchi clamava para

que autoridades independentes ajudassem a mediar e resolver o conflito entre Prefeitura e

servidores. Airton Costa respondeu ironicamente: “Mas nem o arcebispo deu conta e ele foi lá

conversar e não resolveu […]”.

O segundo programa transcrito foi o Maringá Urgente, da TV Maringá/Band. Dentre

os destaques da edição, o apresentador Eduardo dos Santos relatou que a ida dos grevistas ao

Gabinete do Prefeito se deu por causa de uma declaração de Sílvio Barros em uma emissora

de rádio, naquela manhã. De acordo com alguns servidores, o prefeito teria ofendido os garis

dizendo que eles não eram trabalhadores. O repórter Índio Maringá informou em seguida:

“[…] eles resolveram então vir conversar com o prefeito frente a frente e mostrar para o

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prefeito que eles estão trabalhando, que são sérios e querem trabalhar, mas querem um salário

digno […]”. Na edição, comentou-se também sobre os vidros e móveis quebrados:

Eduardo dos Santos: “Agora teve um caso grave que aconteceu, inclusive uma

funcionária da Prefeitura ligou no meu celular desesperada pedindo socorro pra

gente tentar apressar a chegada da polícia lá, porque acusaram os grevistas de

estarem quebrando tudo [...]”. Índio Maringá: “Olha as duas vidraças quebradas ali,

uma na antessala e outra na sala de imprensa, e os grevistas e os manifestantes, eles

têm a fita do momento em que um segurança da Prefeitura, eles teriam essa fita”.

Eduardo dos Santos: “Eles teriam essa fita? Mas não deram para nós?”. Índio

Maringá: “Não, eles não deram para nós, mas teriam, segundo a Ana Pagamunici,

[...] eles têm a fita onde um dos seguranças […] teria quebrado as vidraças para

chamar atenção da polícia e jogar a culpa nos manifestantes, eles garantem que não

foram eles que quebraram. […] A Prefeitura nega, nega veementemente, e diz que

eles teriam quebrado, […] agora a polícia está no local e a fita vai ser requisitada

pela polícia pra saber realmente quem quebrou aí essas vidraças”. […] E tem outra

denúncia grave, Eduardo, […] seguranças armados estariam na antessala do prefeito,

e há toda uma tensão porque não é para nenhum manifestante abrir nenhuma sala,

porque pode acontecer o pior […]” (PMM/CEPAD: “Laudo Pericial de

Degravação”, 26/10/06).

Em meio à desordem instalada no Paço Municipal, a presidente do Sismmar, Ana

Pagamunici, concedeu entrevista ao repórter Guilherme Mendes, do programa Aqui Agora

(TV Tibagi/SBT). Ela voltou a afirmar que pessoas ligadas à Administração teriam danificado

o patrimônio público para criminalizar o movimento: “[…] amanhã, o prefeito vai sair na

televisão dizendo que foi a gente que quebrou; quero que a população saiba que quem

quebrou esse vidro foi gente da Administração, […] nós estamos aqui ordeiros e pacíficos”.

O Laudo Pericial de Degravação da CEPAD também transcreveu os programas de 29

de junho (quinta-feira). A começar pelo programa Aqui Agora, da TV Tibagi/SBT, o

apresentador Oseias Miranda introduziu as informações desde a noite do dia anterior (28/06):

“De posse do mandado de reintegração de posse, a Polícia foi acionada para fazer a

desocupação do prédio da Prefeitura, houve confusão e alguns dos manifestantes que

resistiram tiveram que ser retirados à força”. A repórter no local comunicou que a tropa de

choque da PM havia chegado às 12h15min. Centenas de policiais foram destacados para

cumprir o mandado. Vale reproduzir aqui alguns trechos do laudo, em que o perito traduz as

imagens da reportagem:

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Perito ad hoc: “Em relação às imagens mostradas durante a fala da repórter, temos,

às 01h12, o mandado de reintegração de posse sendo lido pelo oficial de justiça

Frank Marcos Sakiyama […]. Os grevistas cantam o Hino Nacional. Às 01h15,

temos os primeiros grevistas sendo levantados pelos policiais para serem retirados

do Paço. […] Às 01h50, [...] a presidente do Sismmar, Ana Pagamunici, resiste aos

policiais e começa a declarar em alto som para os policiais soltarem ela, […], e com

isso uma confusão começa a se generalizar onde grevistas que a apoiam vão em

socorro de sua líder e os policiais pedem calma para eles […]. A presidente do

Sismmar continua gritando, e isso causa um tanto de apreensão entre os policiais e

os grevistas. Às 02h14, Ana Pagamunici continua resistindo aos policiais e alguns

grevistas vão em seu socorro novamente porque ela grita que os policiais a estão

machucando [...]. Às 02h42, vemos a servidora Elizete Maria Brito da Silva [...]

sendo levada por um policial, olha para a presidente do Sismmar sendo carregada

por policiais e fala, olhando para a câmera: ‘Essa é a justiça’; e repete: ‘Essa é a

justiça’ […]. Vemos um grevista [...] que se recusa a sair e se mantém inerte, sendo

que dois policiais tiveram de carregá-lo. Às 03h02, vemos o servidor Alex Pires de

Souza [...] sendo retirado do Paço algemado e levado por três policiais. […] Às

03h13, vemos a servidora Patrícia Lofrano Zani, que estava vestida com uma blusa

de frio preta […], sendo retirada da Prefeitura, sendo carregada por três policiais,

dois a seguram pelos braços e uma policial, as pernas. Às 03h22, vemos o ônibus da

Polícia Militar parado e vários grevistas dentro dele e ainda vários entrando [...]. Às

03h33, vemos o servidor Odair Nespolo [...], que apoia sua mão em uma das janelas

do ônibus. O mesmo clama por socorro, ao ouvir uma manifestante, que não aparece

na cena, gritando que tem alguém passando mal [...]. Às 03h41, vemos o ônibus da

Polícia saindo e levando cerca de 40 grevistas para depor na delegacia”

(PMM/CEPAD: “Laudo Pericial de Degravação”, 26/10/06).

De volta ao estúdio, Oseias Miranda informou que a Polícia Civil tinha solicitado na

manhã de 29 de junho a prisão temporária de doze pessoas. O pedido seria encaminhado para

análise do Ministério Público. Cerca de 40 grevistas, que resistiram à ao mandado da Justiça,

acabaram detidos pela PM e levados à 9ª SDP. Após prestarem depoimento e assinarem um

termo circunstanciado, foram liberados pela Polícia Civil.

O programa Paraná TV, da RPC/Globo, calculou que 230 policiais, de diversos

batalhões da região, participaram da operação na madrugada. Segundo a repórter Anelise

Camargo, os grevistas detidos ainda responderiam criminalmente por desobediência a ordem

judicial.

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Sobre os eventos do dia anterior, o jornal O Diário de quinta-feira (29/06) expôs na

manchete de capa: “Grevistas tomam Prefeitura”. Além dos incidentes já relatados, a

Administração anunciou ao jornalista Murilo Gatti que 15 servidores, supostamente

responsáveis pelo vandalismo, responderiam a processo administrativo disciplinar. Ana

Pagamunici rebateu as acusações: “Entramos para fazer um ato cívico, mas quando passamos

próximo ao Gabinete fomos agredidos pelos vigilantes da Prefeitura”. Um tenente da PM

presenciou o momento em que arremessaram uma cadeira no vidro, porém, não conseguiu

identificar a pessoa em razão do tumulto no local. Assustados com a situação, os funcionários

que trabalhavam no Paço começaram a ser dispensados a partir das 10h30min. “Percebi a

aproximação em torno da sala e ouvi vozes e palavras de ordem. Depois escutei o ruído de

vidros quebrando e batidas nas paredes do gabinete”, disse o promotor Maurício Kalache, que

estava reunido com Sílvio Barros naquele instante.

No final da tarde de quarta-feira (28/09), os manifestantes entraram em acordo com a

Polícia Militar e abandonaram o Gabinete do Prefeito para se concentrar no térreo do Paço

Municipal. Segundo O Diário, os grevistas receberam o apoio de sindicalistas do setor público

de Cascavel, Campo Mourão e Foz do Iguaçu. Por sua vez, a Associação dos Municípios do

Setentrião Paranaense (Amusep) condenou a ocupação e manifestou solidariedade a Sílvio

Barros. Murilo Gatti estimou que 1,5 mil servidores estiveram no prédio da Prefeitura.

O então delegado-chefe da 9ª SDP abriu inquérito policial para investigar a

depredação do patrimônio público. Durante a tarde, ele e outros policiais se instalaram na

Proge, com o propósito de ouvir testemunhas e analisar imagens de câmeras de vídeo. O

delegado apurou a suspeita de cinco crimes: dano qualificado, atentado contra a liberdade de

trabalho, crime de perigo, crime de paralisação de trabalho de interesse coletivo e formação

de quadrilha.

O Diário comunicou que o mandado de reintegração de posse, expedido pela juíza

Carmen Ramajo, foi entregue à PM perto das 17h30min do dia 28. Os policiais aguardavam

reforço dos batalhões de outras cidades para cumpri-lo, pois as tentativas de desocupação

pacífica não tinham prosperado. Nesse ínterim, a coleta de lixo na cidade era realizada

somente pela Ponta Grossa Ambiental. Questionado se a Administração tomaria providências

contra os servidores que participaram da ocupação, o prefeito Sílvio Barros respondeu: “Aos

baderneiros, desordeiros, cidadãos que nem merecem viver em Maringá, e, aliás, alguns nem

vivem, esperamos que eles sejam presos pelo quebra-quebra na Prefeitura. Eu também vou

pedir a demissão deles”.

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Pela informação de Andye Iore, no Factorama, cerca de 200 policiais militares

executaram a ordem judicial, por volta da 00h20min do dia 29 de junho. O advogado do

Sismmar, Avanílson Araújo, saiu algemado por um policial sem identificação no uniforme. Os

grevistas lotaram a sessão da Câmara Municipal no mesmo dia. Antes de o presidente do

Legislativo, John Alves (PMDB), iniciá-la, Ana Pagamunici proferiu um discurso inflamado

contra a operação policial da madrugada. Segundo o jornalista, o pedido de prisão temporária

de 12 pessoas derivou de investigação da Polícia Civil. Elas foram identificadas através de

fotografias, analisadas no escritório improvisado da Procuradoria Jurídica.

O Blog do Rigon informou na quinta-feira (29/06) que a PM se dirigiu à Secretaria de

Serviços Públicos para dissolver a concentração de grevistas e desobstruir o prédio. O

jornalista replicou uma nota do blog de Ronaldo Nezo, na qual o secretário de Administração

estimou que 1.713 servidores receberiam menos da metade de seus salários por causa da

greve. O número partiu de uma avaliação dos registros de folha-ponto.

Na mesma data, o Blog do Rigon reproduziu um manifesto da advogada Jacheline

Batista Pereira, integrante do Conselho Permanente de Direitos Humanos do Paraná. O texto

dialoga com a trajetória conturbada dos 25 dias de greve. A advogada lembrou que os

representantes de movimentos sociais, organizações não governamentais, sindicatos e da

Igreja Católica permaneceram no Paço Municipal até que houvesse tranquilidade entre os

grevistas, diante da iminente operação da Polícia Militar:

Logo após a retirada do local das entidades e organizações de apoio aos funcionários

públicos, a tropa de choque da Polícia Militar do Estado do Paraná, atendendo ao

comando do governador Requião e do secretário de Segurança Pública do Paraná,

em conluio com o prefeito Sílvio Barros II, cercou a Prefeitura com mais de 100

policiais e cachorros e iniciaram uma verdadeira sessão de horrores contra os

servidores municipais (Blog do Rigon: “Da luta dos trabalhadores do serviço

público de Maringá à barbárie”, 29/06/06).

Jacheline Batista considerou ilegal a detenção do advogado do Sismmar em pleno

exercício da função. Em sua opinião, o escritório improvisado pela Polícia Civil na Prefeitura,

para fotografar e filmar manifestantes, parecia o Serviço Nacional de Informações (SNI),

órgão de inteligência da Ditadura Militar.

Os eventos da desocupação foram narrados pelo jornal O Diário em 30 de junho

(sexta-feira). O jornalista Fábio Linjardi informou que o micro-ônibus do 10º Batalhão de

Apucarana teve os bancos rasgados e peças quebradas. Apesar dos testemunhos de violência

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na operação policial, um capitão da PM julgou “excelente” a reintegração: “Usamos um

grande efetivo para não ter que usar a força policial”. Além do contingente de Maringá, foram

destacados policiais de Paranavaí, Londrina, Apucarana, Cruzeiro do Oeste, Campo Mourão e

Jacarezinho. Uma servidora do Hospital Municipal afirmou ter sido agredida por um dos

PMs: “Chutaram a minha perna, olha como está roxa”. Em torno de 27, dos 46 detidos, foram

acusados de depredar o micro-ônibus da PM, entre eles, o advogado Avanílson Araújo.

A Polícia Civil confirmou o pedido de prisão de 12 servidores ao juiz da 1ª Vara

Criminal, Cláudio Camargo Santos. A solicitação seria apreciada antes pelo Ministério

Público. O Diário divulgou os nomes. Na lista, constavam membros do Comando de Greve,

dirigentes sindicais e lideranças do PT, com destaque para a presidente do Sismmar, Ana

Pagamunici; Luiz Steinle de Araújo, que se tornaria vereador em 2016; e Iraídes Fernandes

Baptistoni, atual presidente do Sismmar, desde 2011.

A Administração Municipal declarou que tentaria exonerar os funcionários que

supostamente participaram da depredação do Gabinete do Prefeito, entre eles, a presidente do

Sismmar, Ana Pagamunici. “Temos o registro de tudo o que aconteceu. Identificamos os

responsáveis através da Polícia […]. Vamos instaurar um processo administrativo para a

demissão dos responsáveis pelo vandalismo”, completou o secretário de Administração,

Ademar Schiavone.

No final da tarde de sexta-feira (30/06), o Sindicato divulgou no site que o pedido de

prisão temporária de 12 servidores foi indeferido pelo juiz da 1ª Vara Criminal. A promotora

de Justiça do Ministério Público, Arisângela Cristina Tibeletti Vargas da Silva, emitiu parecer

considerando que os grevistas se reuniram “por motivos diversos do cometimento de crimes,

pois se tratam de funcionários públicos reunidos em greve, em que há reivindicações de classe

em relação à Administração Pública”.

Conforme a publicação, desde o início o prefeito Sílvio Barros julgava o movimento

como fruto de interesses alheios ao funcionalismo municipal, catalisados por um grupo

político. Outra tese da Administração sustentava a ilegalidade da greve, mesmo sem um

julgamento definitivo da Justiça. Para ilustrar, o Sindicato reproduziu as palavras do secretário

Ademar Schiavone à imprensa: “independente da greve ser legal ou não, os dias parados serão

descontados”. O texto continua:

O pedido de prisão temporária dos servidores é apenas o coroamento de uma política

de intransigência, que procura condenar dirigentes sindicais, servidores do Comando

de Greve e pessoas solidárias ao movimento, como forma de intimidar a categoria e

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pôr um fim à greve na base da truculência (Sismmar: “Prisão de trabalhadores

municipais é negada pela Justiça”, 30/06/06).

A Assembleia realizada na sexta-feira (30/06) deliberou pela continuidade da paralisação e

instituiu, ainda, o dia 29 de junho como “Dia de Luto e Luta pelo Respeito e Dignidade dos

Servidores Municipais de Maringá”, a ser lembrada anualmente pela categoria.

Em postagem do Factorama, Andye Iore comparou a ação policial no Paço com outras

operações envolvendo sem-terras. O jornalista cita três casos em que majores da PM

comandaram reintegrações pacíficas de fazendas, após muitas horas de negociação. Um deles

liderou a desocupação da Prefeitura, que durou cerca de 20 minutos. Mesmo com um efetivo

de 230 policiais, alguns grevistas tiveram que ser arrastados e carregados até o micro-ônibus

da PM. Fábio Linjardi, que também escrevia para o Factorama, chegou a publicar uma

enquete no blog:

O Blog do Rigon divulgou, em 30 de junho, um trecho do parecer do Ministério

Público sobre o pedido de prisão de 12 servidores, no qual a promotora responsável pelo caso

reconhece a necessidade de apurar o “vandalismo” no Paço Municipal: “[…] porém,

entendido como ato isolado, sem ânimo determinado para prática reiterada de crimes, que

possa justificar a verificação da ocorrência de crime de quadrilha”. O jornalista também

transcreveu parte do despacho do juiz Cláudio Camargo dos Santos, da 1ª Vara Criminal:

O juiz destacou que ‘a simples leitura do artigo 1º da Lei 7960/89 demonstra a

impossibilidade de se acolher a requisição do Dr. Delegado de Polícia’, que ‘os

representados têm endereço fixo e conhecido, por se tratarem de pessoas envolvidas

com o Comando de Greve’ e que ‘não se vislumbra, nem de longe, que a segregação

temporária seja imprescindível para as investigações’ (Blog do Rigon: “Justiça não

acolhe pedido de prisão dos grevistas”, 30/06/06).

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Na reportagem de 01 de julho (sábado), O Diário retrata os efeitos da greve na rede

municipal de ensino. De acordo com Fábio Linjardi, o movimento alterou o calendário escolar

de 46% dos quase 15 mil alunos do ensino fundamental. Os dias de aula perdidos seriam

repostos aos sábados e durante as férias, conforme a realidade de cada estabelecimento

afetado pela greve. Nos centros de educação infantil, 63% das crianças não tiveram

atendimento. A diretora de ensino Elizabeth Marques afirmou que algumas mães ficaram com

receio de levar seus filhos às escolas e CMEIs, após o episódio do Paço Municipal, temendo

que as ocupações se espalhassem. Relatou, inclusive, que parte dos servidores retornou ao

trabalho um dia depois do incidente.

A Administração nomeou na sexta-feira (30/06), através da Portaria nº334/2006-

Gapre, a comissão que conduziria os processos administrativos contra os funcionários que

participaram da ocupação. “A população exige isso. Há milhares de pessoas que anseiam

trabalhar na Prefeitura e outros que não querem. A essas, vamos dar a oportunidade de

procurar outra atividade”, justificou o prefeito Sílvio Barros. Segundo a reportagem, cerca de

400 pessoas decidiram na Assembleia de 30 de junho manter a paralisação por mais alguns

dias: “Ana transmitiu aos servidores que o fim da greve, nesta semana, seria desonroso, uma

vez que os grevistas foram retirados pela Polícia de dentro da Prefeitura, à força [...]”. De

qualquer forma, a presidente do Sismmar admitiu que as negociações voltaram à “estaca

zero”.

O Sindicato fez em seu site, no dia 03 de julho (segunda-feira), um apelo à “população

maringaense”, pedindo doação de dinheiro e/ou alimentos aos grevistas cujos salários foram

descontados. Entre justificativas e ataques à Administração, a entidade questiona: “Você sabia

[…] que o dinheiro gasto com propaganda, cargos de confiança e empresas privadas dariam

para pagar a reposição dos servidores?”. Embora a informação contida na pergunta não seja

totalmente exata13, o prefeito Sílvio Barros recebeu muitas críticas do funcionalismo pelo

aumento dessas despesas durante sua gestão. Ao final, o recado: “Você pode não concordar

com a greve, mas não pode deixar que centenas de pais e mães de família morram de fome

por causa do prefeito”.

Fábio Linjardi informa, na edição de 04 de julho (terça-feira) de O Diário, que o

contrato de 30 dias com a Ponta Grossa Ambiental custaria 1,1 milhão ao Município,

incluindo a mão de obra e os caminhões. Com o retorno gradual dos coletores, a situação da13 É preciso lembrar que o reajuste de 16,67% foi negado pela Administração sob o argumento de que asdespesas com recursos humanos extrapolariam os limites da Lei de Responsabilidade Fiscal. Ainda que aPrefeitura economizasse com propaganda e terceirizações, a reivindicação poderia ser novamente negada, combase no mesmo argumento. Por outro lado, a redução dos cargos de confiança possibilitaria um reajuste maior,pois diminuiria os gastos com pessoal em relação à receita corrente líquida, em conformidade com a LRF.

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coleta de lixo voltou a se normalizar. Os descontos salariais, o fim dos piquetes e falta de

negociação com o Executivo contribuíram para reduzir o número de grevistas, sobretudo nas

Secretarias de Educação e Serviços Públicos. Estava programada uma Assembleia no mesmo

dia (04/07) para deliberar sobre o destino do movimento.

Segundo a reportagem, o Sismmar recolheu os extratos bancários dos servidores que

sofreram descontos. Em troca, entregava-lhes uma cesta básica, comprada com recursos de

um fundo de greve. “Precisamos de doações […]. Quem puder doar qualquer tipo de alimento

e até dinheiro para os servidores, é bem-vindo”, disse Ana Pagamunici. O secretário de

Administração, Ademar Schiavone, declarou encerrada a negociação com o Sindicato e

descartou a possibilidade de restituir os valores descontados, referentes a 16 dias de

paralisação. O Diário promoveu uma enquete com quatro trabalhadores da Prefeitura: “Você

vai permanecer em greve ou voltar ao trabalho?”. Dos quatro entrevistados, dois continuariam

na paralisação.

Em matéria de Murilo Gatti, consta que o projeto de lei protocolado em 21 de junho na

Câmara de Vereadores, visando terceirizar 100% da coleta de lixo, foi arquivado. A

Administração recuou e decidiu pleitear a terceirização de apenas parte do serviço, conforme

o coordenador de Políticas Públicas e Meio Ambiente, Jurandir Guatassara Boeira.

O fim da greve foi decretado na manhã de 04 de julho, em Assembleia da categoria.

Mesmo assim, os servidores resolveram se manter em estado de greve e continuar os protestos

contra a Administração.

Ângelo Rigon divulgou em seu blog a realização do “Ato contra a Violência e contra a

Fome”, organizado pelo Sismmar, a partir das 15 horas do dia 04. Os convites foram

espalhados pela Internet e, além de apresentações culturais, estava prevista a participação de

diversas autoridades. No local haveria barracas para arrecadar alimentos e colher assinaturas

em um manifesto, cujo objetivo seria mostrar ao prefeito o apoio da população e das entidades

representadas à causa do funcionalismo público municipal.

Em 05 de julho, a Administração enviou um ofício ao Sindicato, em tom provocativo:

Em atenção ao Ofício 198/06, é preciso, inicialmente, obter alguns esclarecimentos,

pois o expediente carece de clareza.

1) Processo de criminalização: esta Administração não tem conhecimento do que

representa essa palavra utilizada no item 1 do ofício. Aguardamos os

esclarecimentos.

2) Cortar salário:

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a) A MM. Juíza de Direito, Dra. Carmen Lúcia Rodrigues Ramajo, nos autos sob

nº489/2006, de Mandado de Segurança impetrado pelo Sismmar, pleiteando

que não houvesse desconto dos dias parados, decidiu pelo indeferimento da

petição inicial e denegou liminarmente a segurança pleiteada.

b) O promotor de Justiça, Dr. Mauricio Kalache, avisou ao prefeito e à própria

presidente do Sismmar, na reunião realizada no dia 23 de junho, na sala da

Promotoria Pública, de que, se o prefeito não fizesse o desconto dos dias

parados, estaria passível de ação do Ministério Público por ato de improbidade

administrativa.

c) O Sismmar recusou formalmente as propostas da Administração que

consideravam a compensação dos dias parados para o não desconto.

3) Negociação encerrada: é preciso relembrar que, na parte final da Audiência

Pública realizada no dia 27 de junho, no Fórum de Maringá, com a presença de dois

juízes de Direito, cinco promotores de Justiça, um representante da Igreja Católica

(Monsenhor Almeida) e vereadores, o Sismmar manifestou expressamente que

aquilo era o “fim das negociações”. O prefeito, por sua vez, informou que, por parte

da Administração, a negociação não estava encerrada, cabendo, portanto, a Vossa

Senhoria a reabertura das negociações, preferencialmente sob mediação do Poder

Judiciário […] (Ofício 907/06-Gapre, 05/07/06).

O fim da greve foi noticiado pelo jornal O Diário somente na quarta-feira (05/07).

Segundo Fábio Linjardi, os servidores voltariam ao trabalho no dia seguinte, sem nenhuma

das reivindicações atendidas. “Quem acha que essa foi a última greve do governo Sílvio

Barros está enganado”, ameaçou a presidente do Sismmar, Ana Pagamunici. Às 17 horas,

estava programada uma manifestação na Praça Raposo Tavares. A intenção era alertar o

prefeito sobre a possibilidade de uma nova paralisação. A presidente reconheceu que os

descontos salariais ajudaram a selar o fim da greve: “Contra a polícia, a gente até pode se

defender. Mas sem os salários, não dá”.

Logo após o fim do movimento, Sílvio Barros anunciou que a primeira parcela de

40% do 13º salário seria paga já no mês de julho. Além disso, o prefeito encaminhou, na

mesma data, um projeto de lei à Câmara Municipal para ser votado em sessão extraordinária,

no qual estabelecia o valor de R$450,00 como o “salário mínimo” do funcionalismo. Estas

medidas já haviam sido propostas anteriormente, mas acabaram rejeitadas pela categoria em

assembleia.

A Secretaria de Educação concebeu de imediato um calendário para reposição das

aulas perdidas. O Sismmar, todavia, recorreu à Justiça contra a reposição na forma pretendida

pela Prefeitura. O advogado Avanílson Araújo explicou à reportagem que os profissionais da

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Educação só aceitariam compensar as aulas se recebessem pelas horas-extras ou se lhes

fossem restituídos os valores descontados de seus salários: “Nós queremos repor as horas. Se

o prefeito cortou o salário, está determinando que não sejam repostas as aulas”. A um público

de aproximadamente 400 pessoas, o advogado declarou na última Assembleia: “É bom que o

prefeito saiba que vai levar milhares de ações por danos morais, por chamar os servidores de

vagabundos e baderneiros”. Ulisses Maia concedeu entrevista a O Diário:

Segundo o Blog do Rigon, o então presidente nacional da Conlutas e do PSTU, José

Maria de Almeida, conhecido como Zé Maria, esteve em Maringá na tarde do dia 05,

acompanhado de um dirigente da CUT e da presidente do Sismmar, para entregar a Sílvio

Barros um documento com as demandas do funcionalismo. Alegando outro compromisso, o

prefeito não se encontrou com Zé Maria, que acabou sendo recebido pelo chefe do Gabinete

do Prefeito, Benivaldo Ramos Ferreira, e o diretor do Procon, Ulisses Maia. Este havia escrito

um artigo polêmico para O Diário, em 30 de junho, no qual associava os motivos da greve à

relação entre Sismmar e Conlutas:

Maringá assistiu assustada a cena da invasão do Paço Municipal e do quebra-quebra.

Procurando uma explicação, vemos que tudo está explícito em um documento

escrito pelo próprio Sismmar, à disposição na internet, no site da Conlutas […].

Analisando o documento, destacamos alguns pontos e ideias: “Desde a

fundação de nosso Sindicato, queremos contribuir nessa construção com algumas

propostas, por uma alternativa de luta, classista, democrática, antiburocrática e

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anticapitalista. […] É preciso assumir as reivindicações da classe de forma

consequente, e, por pequenas que sejam, cada vitória ajudará a Conlutas a ganhar

autoridade real entre os trabalhadores […]. A Conlutas deve resgatar os métodos de

luta abortados pela burocracia sindical nos últimos anos, como as greves, os

piquetes, as paralisações, as ocupações de fábricas e a greve geral”.

Esse documento está no site da Conlutas e segue assinado pela presidente e

demais diretores do Sismmar de Maringá. Isso explica porque a greve na Prefeitura

teve início. O Sindicato sabe, desde abril, que o limite oferecido pelo prefeito é o

possível e o legal. [...] O Sindicato está usando os servidores municipais para

defender a bandeira da Conlutas. Não estão interessados nos direitos dos servidores

[…] (O Diário: “Quem o Sismmar está defendendo”, 30/06/2006).

Andye Iore escreveu para o site da Gazeta do Povo, em 05 de julho, que a greve de

2006 foi a mais longa da história de Maringá, superando a paralisação de 12 dias na gestão de

Ricardo Barros, em 1990. A Assembleia decisiva aconteceu no salão da Paróquia São Miguel

Arcanjo, perto do antigo aeroporto da cidade. O Comando de Greve apresentou um balanço

das ações para cerca de 800 pessoas. O jornalista relatou que 90% dos presentes votaram a

favor do retorno ao trabalho na quinta-feira (06/07). O Sismmar estimou um gasto de R$ 50

mil na paralisação, com verba proveniente do fundo de greve e das doações recebidas. A

questão dos descontos seria debatida na Justiça, segundo o advogado do Sindicato, pois não

havia declaração de ilegalidade da greve.

Ao jornalista Roger Pereira, do site Tribuna do Paraná, Ana Pagamunici reafirmou: “A

recusa do prefeito em negociar, a tentativa de criminalizar o movimento e o desconto dos dias

paralisados do pagamento dos servidores enfraqueceram o movimento. Vamos voltar ao

trabalho e esperar o momento certo para retomar a greve”. A coluna de informes de O Diário,

de 06 de julho, chegou a publicar a seguinte nota:

Os servidores municipais não se dão por vencidos. O sindicato da categoria

(Sismmar) organiza uma nova assembleia para o próximo dia 29. Quer avaliar a

possibilidade de retorno à greve. O recuo do movimento grevista ainda não foi bem

digerido pelos sindicalistas. Sabem que o fim da greve representou uma vitória da

Administração Municipal. Não houve nenhum ganho, somente o desconto dos dias

parados nos salários de 1.700 servidores (O Diário: Informe Diário, 06/07/06).

O prognóstico não se concretizou. Apesar de paralisações pontuais ao longo dos anos,

os servidores municipais voltaram a vivenciar a experiência de uma greve geral somente em

2016, dez anos depois.

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3.3. Epílogo: desdobramentos da greve

As consequências da greve de 2006 foram muitas. As lembranças e os traumas

continuam firmes na memória de quem participou, como gestor ou servidor, daqueles longos

30 dias de paralisação. O Sindicato custou a admitir o resultado e, como reflexo, prosseguiu

com as ações de protesto contra a Administração Municipal.

O “Ato contra a Violência e contra a Fome”, em 05 de julho, teve a cobertura da

jornalista Carla Guedes, de O Diário:

Com faixas pretas nos braços, em símbolo de luta, os servidores municipais

reuniram 400 pessoas, ontem, na Praça Raposo Tavares, para o Ato contra a

Violência e contra a Fome, que teve apoio de líderes sindicais e entidades que lutam

pelos direitos dos trabalhadores. “A população está do nosso lado. Já temos várias

assinaturas em um abaixo-assinado para cobrar entendimento entre Prefeitura e

Sismmar”, disse Ana Pagamunici, presidente do Sindicato dos Servidores. [...] O

coordenador da Conlutas, José Maria, esteve no evento e disse que as reivindicações

são legítimas e necessárias. “Não admitiremos que o servidor público seja tratado

como quadrilha” (O Diário: “Prefeitura e Sismmar tentam acordo”, 06/07/06).

A fotografia de Douglas Marçal para a reportagem mostrava a presença de um caixão

no ato. Em outras imagens do evento, divulgadas por Ângelo Rigon, é possível identificar

frases e palavras como “diálogo”, “liberdade de expressão” e “Sílvio Barros matou a

democracia”, escritas em folhas de sulfite. Em uma das fotografias, um manifestante exibia

um panfleto com a imagem do prefeito sobre o caixão.

Em 12 de julho de 2006, Sílvio Barros participou de um debate na OAB de Maringá, a

convite do presidente da subseção local Aírton Kenji Ueda, com público aproximado de 120

pessoas, entre advogados e assessores do prefeito, segundo O Diário. A matéria não assinada,

de 14 de julho (sexta-feira), revelou: “Sílvio Barros não escondeu a irritação em alguns

momentos do debate. Seu semblante mudava toda vez que se referia ao Sindicato dos

Servidores Municipais, o Sismmar. Idem para o assunto greve”. Sobre a paralisação, o

prefeito reafirmou:

Foi motivada e convocada baseada numa reposição salarial que a Constituição do

Brasil não permite que seja dada e ponto final. O Sindicato já tinha em mãos a

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certidão do Tribunal de Contas do Estado atestando que o nosso limite de

comprometimento da folha de pagamento com a arrecadação já superava 50% em

dezembro [de 2005]. Se o limite constitucional é de 54%, como é que se pretende

uma reposição de 16%?” (O Diário: “Debate na OAB”, 14/06/06).

Ao longo de julho, o Sismmar continuou recebendo doações em dinheiro e alimentos.

O Sindicato dos Trabalhadores da Justiça Federal do Paraná, regional de Maringá, por

exemplo, doou mais de 500 litros de leite aos servidores municipais que tiveram os salários

descontados.

O advogado e mestrando em Ciências Sociais, Avanílson Araújo, publicou um texto no

site do Sismmar, em 21 de julho de 2006. O artigo era um desagravo às afirmações do prefeito

Sílvio Barros de que os grevistas precisavam “provar que são dignos de morar em Maringá” e

também deviam cumprir as determinações judiciais antes de se entabular qualquer

negociação.

Araújo mencionou três casos em que o descumprimento de leis e ordens judiciais

foram perpetrados por autoridades municipais. O primeiro evocava a dívida acumulada de 200

milhões (na época) da trimestralidade, quando o ex-prefeito Ricardo Barros deixou de cumprir

a lei que previa o reajuste trimestral da remuneração dos trabalhadores do Município. O

segundo se referia à recusa do presidente da Câmara Municipal em 2006, John Alves Corrêa

(PMDB), de obedecer à ordem judicial que determinava a abertura de uma Comissão

Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar o suposto superfaturamento na compra de 20

laptops. Por último, citou a contratação sem licitação, pela Prefeitura, da empresa

Transresíduos para executar obras no “lixão” de Maringá, considerada ilegal pelo Poder

Judiciário. O advogado reflete:

Em qual destes casos a força policial será utilizada para fazer valer as decisões

judiciais? Pois bem, o que os trabalhadores fazem ao questionar a legalidade, dentro

da ordem burguesa, nada mais é do que exercitar um direito de colocar em xeque a

legitimidade de determinado ato (judicial ou administrativo). Ou seja, ainda que se

pudessem enquadrar as ações dos grevistas dentro da perspectiva da desobediência

civil, o seu objetivo seria de demonstrar que o emprego coercitivo do aparelho de

Estado não se justifica em atos desta natureza. […] O que os trabalhadores fazem

numa greve é demonstrar as próprias contradições desta sociedade dividida em

classes e mascarada sob o manto da igualdade jurídica, afinal, o prefeito pode, o

presidente da Câmara pode, o deputado federal pode, só os trabalhadores não podem

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se organizar e reivindicar direitos (Sismmar: “Só os trabalhadores não podem”,

21/07/06).

A animosidade entre Prefeitura e Sindicato se acentuou muito com a publicação da

Portaria nº334/2006-Gapre, no Órgão Oficial do Município de 14 de julho de 2006. O

documento nomeava três membros para compor a Comissão Especial de Processo

Administrativo Disciplinar (CEPAD), que conduziria os processos contra 32 servidores que

participaram da ocupação do Paço Municipal. Eles foram acusados de “insubordinação grave

em serviço” e “dilapidação do patrimônio municipal”, com fundamento no artigo 187, incisos

VI e X, do Estatuto dos Servidores Públicos Municipais de Maringá (Lei Complementar

nº239/1998).

Entre os processados, seguindo a linha dos pedidos de prisão, constavam membros da

gestão Trabalhadores em Luta (2005-2008) do Sismmar: Ana Pagamunici, Lino Gregório de

Souza, Priscila Guedes da Luz e o ex-diretor Paulo Emerson Vidigal; e militantes do PT e

futuras dirigentes sindicais: Patrícia Lofrano Zani, Cibele Cristina Telles Campos, Maria da

Conceição Franco (Zica) e Iraídes Fernandes Baptistoni.

Em depoimento à CEPAD, em 19 de outubro de 2006, a supervisora educacional

Iraídes Baptistoni fez um extenso relato de sua atuação no dia da ocupação do Paço

Municipal. Enquanto esteve na parte externa do local, perto da meia-noite de 29 de junho, se

disse surpreendida com a quantidade de policiais, cães e tropa de choque que chegaram para

efetuar a reintegração. Testemunhou, em seguida, pessoas saindo sozinhas do Paço, algumas

acompanhadas ou carregadas por policiais, e outras, devidamente escolhidas, sendo presas sob

golpes de cassetete na cabeça e nas pernas.

O Blog do Rigon replicou uma nota do Sismmar sobre os 32 processos

administrativos:

Dando continuidade a sua política de criminalizar o movimento sindical, a

Administração Municipal, agora, abriu processo administrativo contra 32 servidores

e, ainda, ameaça abrir outros. Sobre esses fatos, temos a dizer o que segue:

A responsabilidade maior pela duração da greve, sem dúvida, foi da

Administração Municipal […]. Em vez de investir numa solução negociada, a

Administração preferiu levar a greve ao esgotamento e criminalizá-la.

[…] Esta greve foi a primeira em que os servidores foram acusados de formação

de quadrilha e execrados com pedido de prisão preventiva, requerimento

providencialmente negado pelo juiz. Em Maringá, nunca se viu uma greve

municipal resultar na instauração de processos administrativos.

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[…] Esse método de criminalização do movimento sindical vem sendo usado

para “limpar o terreno” de manifestações de oposição de toda a natureza. Basta

olhar a lista dos indiciados. É fato visível a olho nu o indiciamento das principais

lideranças do sindicato, além de servidoras e servidores que esposam divergência

com a linha da administração (Blog do Rigon: “Protesto contra perseguição aos

servidores”, 27/07/06)

O Sindicato difundiu inúmeras cartas, panfletos e abaixo-assinados, buscando

esclarecer a sociedade sobre os fatos relativos à greve e angariar apoio para a defesa do

funcionalismo. Na mesma direção, o PT lançou o manifesto “Cadê a coerência do Prefeito?”,

assinado por Rubem Almeida Mariano. O partido o enviou também a organizações nacionais

e internacionais, como a OIT. Dentre os destaques, o documento questiona a conduta de Sílvio

Barros ante os processos e o pedido de prisão de 12 funcionários:

São dois pesos e duas medidas. Persegue, irracionalmente, servidores exemplares e

acoberta perigosamente maus servidores de carreira ou CC, como são os casos do

diretor do SAOP, o qual liberou de maneira irregular máquinas públicas para prestar

serviço em propriedade particular; do seu motorista, o qual foi flagrado fazendo

compras com a sua família no centro de Maringá, em horário de serviço, com carro

oficial do Município; e do superintendente do Aeroporto, o qual foi preso pela

Polícia Federal e, ainda, responde processo por suspeita de participação em um

mega-esquema de sonegação (PT: “Cadê a coerência do prefeito?”, julho de 2006).

Sílvio Barros chegou a realizar reuniões setoriais com os funcionários para falar sobre

o movimento grevista e a reposição dos dias parados14, na tentativa de driblar a influência do

Sindicato. Ângelo Rigon acompanhou um dos encontros de manhã, no Cine-Teatro Plaza, e

adiantou que o diretor do Procon Ulisses Maia seria elevado a chefe do Gabinete do Prefeito.

Dirigentes do Sismmar estavam no local divulgando a Assembleia de 29 de julho. O jornalista

relatou assim o final do evento:

A presidente Ana Pagamunici se manifestou algumas vezes, mas quando ela falava o

pessoal do som aumentava muito o volume do microfone do prefeito. […]

Terminada a fala, Sílvio II agradeceu e desligou o microfone e então foi vaiado.

Algumas pessoas protestaram por que só o prefeito é quem falava. Numa de suas

falas, quando as pessoas se manifestavam ele disse: “Durante a greve vocês falavam

14 Jornal O Diário: “Sílvio negocia desconto dos dias parados”, 22/07/06.

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o que queriam no caminhão de som, agora é a minha vez” (Blog do Rigon: “Prefeito

fala a servidores e é vaiado”, 24/07/06).

Assembleia do dia 29 aconteceu, mas o retorno à greve não foi aprovado pela

categoria. Os cerca de 300 trabalhadores preferiram permanecer em estado de greve, com

chance de retomá-la a qualquer tempo. Durante a Assembleia, foi aprovado o lançamento de

uma “campanha contra as perseguições”. O ato estreou com uma panfletagem no Terminal

Urbano e na Prefeitura. Um comentário da servidora Zery Monteiro sobre o evento no Cine-

Teatro Plaza foi reproduzido pelo Blog do Rigon:

A frase dita por Lima Barreto: “o Brasil não tem povo, tem platéia”, sempre me

incomodou. Afinal, como a gente pode ficar assistindo tanta coisa acontecendo [...]

sem fazer nada. [...] Quando me falaram que eu não havia ganhado nada com a

greve, eu disse que “sim, claro que ganhei, apesar das dificuldades, meu marido e

meus filhos me olham com orgulho, eu sou uma vencedora, afinal atravessei um

pântano que é a política de Maringá, carreguei um peso morto que é o servidor não

grevista e aguentei um monte de sanguessugas que são os CCs. Eu consegui

atravessar, claro que eu venci”. O Plaza não estava cheio de servidores, mas estava

lotado de cidadania (Blog do Rigon: “Estava lotado de cidadania”, 29/07/06).

O cenário pós-greve prosseguiu dessa forma, entre ataques e contra-ataques de ambos

os lados, principalmente na esfera judicial. Os processos administrativos, segundo o Sismmar,

começaram viciados. O prefeito já tinha declarado à imprensa, em várias ocasiões de 2006,

que demitiria os 32 servidores.

Quase um ano depois, Sílvio Barros publicou 26 decretos de demissão por

insubordinação grave, 02 por depredação de patrimônio público e 04 advertências, em 25 de

maio de 200715. A tese que embasou a decisão partiu da Comissão Especial de Processo

Administrativo Disciplinar (CEPAD). Os integrantes entenderam que a “invasão” do prédio

da Prefeitura, a depredação do Gabinete, o descumprimento de ordem judicial e a resistência à

ação policial justificavam os pareceres da CEPAD16.

O Sismmar havia promovido, um mês antes, um ato público em frente ao Paço

Municipal contra as demissões, que eram tidas como certas. Segundo o site da entidade, o

protesto de 19 de abril teve a participação de parlamentares, religiosos e sindicatos de várias

partes do Brasil. Formou-se uma comissão para tentar sensibilizar o prefeito Sílvio Barros, no

15 Jornal O Diário: “Sílvio Barros oficializa 28 demissões”, 26/05/07.16 Jornal O Diário: “Sindicância sobre a greve decide pela demissão de 28”, 24/04/07.

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sentido de arquivar os processos e desistir das demissões. Participaram representantes do

Sindicato Nacional dos Docentes do Ensino Superior (Andes), CUT e Conlutas; os

parlamentares Tadeu Veneri (PT), Humberto Henrique (PT), Mário Verri (PT), Profª. Josete

(PT), Belino Bravin (PP) e Alberto Abraão (PV)17.

Eles foram atendidos nesse dia pelo vice-prefeito, Carlos Roberto Pupin. Uma nova

reunião com Sílvio Barros ficou agendada para 24 de abril. No entanto, mesmo após o

encontro, o chefe do Executivo permaneceu irredutível e reafirmou que seguiria o parecer da

CEPAD. Restaria aos processados apresentar recursos administrativos. O advogado do

Sismmar, Avanílson Araújo, garantiu que, se fracassasse a via administrativa, tentaria também

evitar as demissões pela esfera judicial18.

A demissão dos 28 servidores, sacramentada pelo prefeito em maio de 2007, foi a

consequência mais dura da greve. Além de outros obstáculos, a Administração dificultou o

acesso aos processos, cerceando a defesa dos acusados. O Sismmar e os servidores tiveram

que reivindicar ao chefe de gabinete na época, Ulisses Maia, as cópias que vinham sendo

sonegadas há 45 dias19. Depois da pressão, a Proge se comprometeu a fornecê-las no dia

seguinte à reunião com Maia20.

No intuito de sensibilizar a opinião pública, o Sindicato intensificou as ações de

conscientização e informação. Divulgou, por exemplo, a situação de duas servidoras

demitidas: uma auxiliar de enfermagem em licença-maternidade, mãe de uma filha e um bebê

recém-nascido; e uma educadora, mãe de dois filhos e grávida do terceiro21. Junto com uma

comissão dos demitidos, o Sismmar se reuniu com o arcebispo de Maringá, Dom Anuar

Battisti, pedindo apoio para a reintegração dos servidores e a campanha de arrecadação de

alimentos22. O chamado “movimento pela reintegração dos 28 servidores demitidos

injustamente” fez panfletagem na feira livre do Estádio Willie Davids, em um sábado, e

recebeu várias doações de alimentos dos feirantes23.

Uma questão fundamental, ainda sem resposta, tinha sido levantada há um ano atrás

no Boletim do Sismmar, intitulado “Maringá, crescendo com tirania”24. Na capa, havia em

primeiro plano a imagem de Adolf Hitler com o pé direito sobre outra imagem, em segundo

17 Sismmar: “Após ato público, prefeito marca reunião com o Sismmar”, 20/04/07.18 Jornal O Diário: “Sindicato vai tentar reverter demissões”, 26/04/07.19 Sismmar: “Chefe de Gabinete do Prefeito recebe Sismmar e demitidos”, 05/06/07.20 Sismmar: “Após pressão, procurador jurídico se compromete a entregar cópia dos processos”, 06/06/07.21 Sismmar: “Jumana e Patrícia demitidas pelo prefeito Sílvio Barros”, 09/06/07.22 Sismmar: “Comissão dos 28 demitidos, juntamente com o Sismmar, faz reunião com o arcebispo de Maringá”,09/06/07.23 Sismmar: “Feirantes são solidários com os demitidos”, 16/06/07.24 O título do boletim era uma paródia ao slogan da gestão de Sílvio Barros: “Maringá, crescendo com cidadania”.

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plano, que retratava uma assembleia lotada de servidores com as mãos levantadas. O

informativo resgata um episódio de 2006:

Após dizer que os servidores desconheciam as leis e, portanto, foram enganados

pelo Sindicato, é reproduzida uma montagem de fotos e vídeos […] que tenta

criminalizar o movimento e culpabilizar os servidores pelos vidros quebrados no

Paço Municipal. [...] Aliás, nenhum grevista aparece quebrando qualquer prédio

público. E, em seguida, desafia o Sindicato a provar que não foram os trabalhadores.

Ora, o ônus da prova é do acusador! Quem acusa é quem tem de provar. Afinal,

quem possui uma “Controladoria de Recursos Humanos”, encarregada de filmar,

gravar e acompanhar todos os atos dos servidores, é a Prefeitura (Boletim Sismmar:

“Maringá, crescendo com tirania”, 29/07/06).

Em contrapartida, a Administração fez sua própria campanha para justificar as

demissões. Em maio de 2007, distribuiu um informe de quatro páginas, assinado pela

assessoria de imprensa e pela Proge, contendo fotografias de pessoas encapuzadas, piquetes,

caminhões com pneus vazios, correntes, cadeados, móveis e vidros quebrados no Gabinete do

Prefeito. Em certo ponto, o texto questiona:

Quem participou da greve? A maioria dos servidores não aderiu à greve. No

entanto, mesmo querendo trabalhar e manter os serviços à população, foram

impedidos pelos piquetes dos grevistas. Essa foi a primeira ilegalidade da greve: a

lei estabelece que, no caso de uma greve, os trabalhadores que desejarem trabalhar

têm esse direito […]. Por que as demissões? Os processos administrativos não

foram abertos em razão da greve, mas por terem invadido a Prefeitura e terem se

recusado a obedecer a ordem judicial de desocupação. Piquetes, lixo nas ruas e

cidade sem serviços. Servidores que não serviram a população, que impediram os

colegas de trabalhar, furaram pneus de veículos, trancaram ruas com carros e

pessoas, fecharam escolas e creches com cadeados. Invadiram a Prefeitura,

desobedeceram ordem judicial: Maringá não merece e não aceita baderna e

desrespeito às leis (PMM: “Esclarecendo sobre a demissão de servidores”, maio de

2007).

O Sindicato contra-atacou com uma carta publicada no site da entidade:

No dia 25 de maio, o prefeito Silvio Barros II cometeu uma grande injustiça. Dos

mais de 4 mil que participaram da greve no ano passado, demitiu 28 servidores que

lutavam por seus direitos. [...] Trabalhadores que têm um salário baixíssimo, bem

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diferente do grande número de cargos de confiança que a Administração contratou

sem concurso. [...] Entre os demitidos estão a presidente do Sindicato, seis diretores

e pasmem: uma trabalhadora grávida e outra amamentando. [...] O prefeito, que era

o acusador, também foi o julgador, cumpriu sua promessa: ele mesmo assinou a

demissão dos 28 trabalhadores que lutavam pelos direitos de mais de 7 mil

servidores. [...] A verdade é que fomos demitidos oficialmente por “insubordinação

em serviço”, e não por danos ao patrimônio como o prefeito quer fazer acreditar.

Não há provas disso. Vale lembrar que repudiamos tais atos e somos os primeiros

interessados na identificação dos responsáveis. A pena de demissão por

insubordinação não se aplica a esse caso, pois não estávamos em serviços, e sim em

greve.

Em meio à “queda de braço”, a juíza Carmen Lúcia Rodrigues Ramajo, da 3ª Vara

Cível de Maringá, proferiu decisão liminar favorável ao Sismmar na “ação ordinária com

pedido de tutela antecipada” (Autos nº626/2007). Ou seja, o pedido de reintegração de 22

servidores demitidos foi deferido provisoriamente pela Justiça, até que a ação fosse julgada

em caráter definitivo. Os outros seis demitidos entraram com ações individuais.

No terceiro item do texto, a juíza fundamenta parte de sua decisão:

3 – [...] No caso, [há] indícios, ao menos do que se verifica dos autos até este

momento, de que as garantias fundamentais concernentes ao devido processo legal

não foram respeitadas, não tendo sido observados, nos processos administrativos que

culminaram com a exoneração dos servidores substituídos, os princípios da

impessoalidade (eis que o senhor Prefeito Municipal, que teria sido vítima da

insubordinação dos servidores foi quem decidiu pela punição a ser aplicada, com

base no relatório da comissão processante); da igualdade de tratamento, pois alguns

servidores envolvidos na alegada “invasão” do Paço e na “depredação do patrimônio

público” foram apenas advertidos (penalidade mais branda dentre as previstas em

lei), enquanto outros foram exonerados (penalidade mais severa), não obstante os

relatórios finais juntados aos autos demonstrem serem, praticamente, iguais; e da

proporcionalidade (medida entre o ato praticado pelos servidores e a punição

aplicada). Ademais, é questionável se os servidores em questão encontravam-se “em

serviço” quando do evento em que ocorreram as condutas questionadas, já que se

encontravam em greve. [...] Da mesma forma, verifico evidente perigo de dano

irreparável aos substituídos caso a liminar não seja concedida. Isso porque sua

reintegração implica o recebimento de seus vencimentos, verbas de natureza

alimentar (3ª Vara Cível de Maringá: Autos nº626, 15/06/07)

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Ao final, a magistrada determinou que os 22 funcionários fossem reintegrados a seus

cargos no prazo de cinco dias, a contar da notificação. Por força da liminar, a Prefeitura

expediu a Certidão nº260/2007, em que suspendia os “decretos exoneratórios” e reintegrava

os servidores listados a partir de 25 de junho de 2007. A Administração ainda ingressou com

um “agravo de instrumento” em segunda instância para recorrer da decisão. Contudo, os

juízes da 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) negaram provimento ao

recurso, através do Acórdão nº18771.

O Sismmar comemorou o retorno dos trabalhadores e realizou um ato público em

frente ao Paço Municipal na manhã de 26 de junho25. Também estiveram presentes os

representantes de centrais sindicais, movimentos sociais, sindicatos, autoridades religiosas e o

vereador Humberto Henrique. Os procuradores do Sindicato na ação judicial, Avanílson

Araújo e Eliana Ferreira (advogada da Conlutas), leram a certidão emitida pela Prefeitura.

Depois, como de praxe, os manifestantes subiram as rampas do Paço cantando o Hino

Nacional. Coincidentemente, os principais enfrentamentos da greve ocorreram nos meses de

junho, de 2006 e 2007.

Outra sentença favorável ao funcionalismo veio em 18 de julho 2007, quando o juiz da

6ª Vara Cível de Maringá determinou liminarmente a reintegração dos outros seis servidores

demitidos26. Esta sentença foi ratificada, em caráter definitivo, pelo juiz da 6ª Vara Cível,

Belchior Soares da Silva, em 12 de maio de 201127. E, por último, em 28 de agosto de 2017, o

juiz substituto da 1ª Vara da Fazenda Pública, Fabiano Rodrigo de Souza, declarou a nulidade

dos 32 processos administrativos nos seguintes termos:

2.2. Do mérito. [...] O próprio réu admite que os processos se originaram porque

desrespeitada a ordem judicial para desocupação do Paço Municipal, ensejando

grave insubordinação. Contudo, impende ressaltar que insubordinação é ato de

revolta, manifestação explícita de descumprir ordem recebida, expressando-se na

forma exacerbada de desrespeito, com consciente postura funcional contrária à de

obediência e de respeito exigidos para a regularidade do serviço público. E para que

haja insubordinação é necessária que a ordem tenha partido de superior hierárquico,

o que por certo não é o caso dos autos. Ou seja, não poderia ser instaurado um

procedimento administrativo pautado em grave insubordinação por descumprimento

a uma ordem judicial. Neste caso, eventualmente configuraria crime de

desobediência, hipótese já apurada pelo Juizado Especial Criminal desta Comarca,

conforme consta dos autos. Ante o exposto, observa-se que a demissão dos

25 Sismmar: “Reintegração dos demitidos, vitória de todos os trabalhadores”, 26/06/07.26 Sismmar: “Justiça determina reintegração de mais seis servidores”, 18/07/07.27 Sismmar: “Mais uma vitória”, 12/05/11.

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substituídos viola o princípio da legalidade, posto que o fato não se amolda às

condutas arroladas nos processos administrativos disciplinares que ensejaram as

demissões. [...]

3. Dispositivo. Ante o exposto, julgo PROCEDENTES os pedidos deduzidos nesta

ação ordinária proposta pelo Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de

Maringá – Paraná em face do Município de Maringá, para o fim de, confirmando a

antecipação de tutela conhecida, declarar a nulidade dos 32 procedimentos

administrativos disciplinares instaurados em virtude da greve do ano de 2006 e

condenar o réu ao pagamento de todos os vencimentos aos servidores-substituídos

desde a data de sua demissão até a data da efetiva reintegração, com os reflexos

legais, devendo ser acrescido de juros e correção monetária nos termos da

fundamentação. De resto, JULGO EXTINTO O PROCESSO COM RESOLUÇÃO

DO MÉRITO, a teor do art. 487, [inciso] I, do CPC.

As dirigentes do Sismmar durante a gestão Trabalhadores em Luta, Ana Pagamunici e

Priscila Guedes, divulgaram uma nota em 2017 comemorando a decisão recente28. Prestaram,

ainda, homenagem a uma das servidoras demitidas, que faleceu antes de conhecer o resultado

da ação judicial. Elas, porém, alertaram: “A Prefeitura Municipal ainda pode recorrer […].

Mas este processo é evidentemente um processo político […]. É preciso detê-lo, acatando a

decisão do juiz e não apresentando recurso”. No jornal do Sismmar, de maio e junho de 2007,

a entidade chegou a declarar na época: “Um governo forte não precisa demitir. Um governo

fraco, ao contrário, necessita de autoritarismo para se manter no governo”.

A greve dos servidores municipais gerou outra série de processos administrativos e

judiciais. Além dos já mencionados, continuou a tramitar desde 2006, sem resolução, os Autos

nº500 da ação de declaração de ilegalidade e abusividade do movimento grevista, sob

responsabilidade do juiz substituto da 5ª Vara Cível de Maringá, Abílio Freitas.

Em virtude dos incidentes na desocupação do Paço Municipal em junho de 2006,

instaurou-se um inquérito policial militar para investigar o possível crime de desobediência,

cometido por cerca de 45 pessoas. Em maio de 2008, eles foram absolvidos pelo magistrado

do Juizado Especial Criminal de Maringá, José Cândido Sobrinho:

Em verdade, a conduta dos réus não se subsumiu ao tipo penal incriminador pelo

qual foram denunciados (artigo 330, do Código Penal), pois [...] a ciência do autor

do fato para cumprimento da ordem judicial deve ser pessoal e inequívoca, o que

inocorreu na decisão sub judice, em que a ordem judicial foi endereçada ao

requerido, Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Maringá e demais

28 Blog do Rigon: “A vitória, 11 anos depois”, 01/09/17.

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grevistas, e o conhecimento da decisão, que concedeu o interdito proibindo a

invasão dos prédios públicos, [...] se deu através de oficial de justiça, de forma

genérica, não sendo direcionada a pessoa determinada e especificada. […] Posto

isto, [...] com base no art. 43, inciso I, do CPP [Código de Processo Penal],

acolhendo o respeitável parecer do Ministério Público, REJEITO A DENÚNCIA”

(Sismmar [site]: “Vitória dos trabalhadores”, 30/05/2008).

As servidoras Cibele Campos, Maria da Conceição Franco e Iraídes Baptistoni

processaram a Prefeitura por danos morais, alegando que foram indiciadas apenas por

questões ideológicas e que tiveram sua honra maculada pelas denúncias veiculadas na

imprensa, sobretudo quando figuraram na lista dos pedidos de prisão temporária da Polícia

Civil. No entanto, os juízes da 3ª Câmara Cível do TJ-PR julgaram improcedente a ação, em

dezembro de 2015.

Em 2008, o ex-dirigente do Sismmar, Paulo Vidigal, viu-se novamente ameaçado de

demissão via processo administrativo disciplinar29. O então auxiliar de enfermagem foi um

dos demitidos em 2007 e um dos 44 acusados no inquérito policial militar iniciado em 2006.

Segundo um panfleto da oposição do Sismmar, Vidigal vinha sendo perseguido por sua

participação ativa na campanha contra as privatizações do Hospital Municipal e da coleta de

lixo, bem como pela denúncia que fez ao Ministério Público sobre a falta de médicos e

ambulâncias para o SAMU. Exemplo disso, remete à agressão sofrida pelo servidor em um

evento promovido pela Prefeitura em agosto de 2006, denominado Espaço da Cidadania. Na

época, Paulo Vidigal afirmou ao Jornal Hoje que dois seguranças se sentaram a seu lado

durante o evento. Depois, na saída, junto com outros colegas, os seguranças o abordaram,

tomaram-lhe uma câmera fotográfica, agrediram-no e ainda fizeram ameaças30.

Por descumprir, em 11 ocasiões, a ordem judicial que proibia os piquetes violentos na

greve, a juíza Carmen Ramajo aplicou, em abril de 2008, multa de R$ 200 mil ao Sismmar. A

entidade asseverou que recorreria da multa31. No dia seguinte, publicou uma resposta em seu

site. O texto atacava a decisão da juíza e enumerava supostos casos de “abusos de poder” por

parte do prefeito Sílvio Barros:

Os abusos estão presentes na conduta do Governo Sílvio Barros II em relação aos

trabalhadores, desde o início do mandato. Em quase quatro anos, o atual prefeito

somente recebeu o sindicato duas vezes, uma na greve da Saúde em 2005, e outra na

29 Panfleto da oposição sindical Trabalhadores em Luta: “Colegas servidores(as)”, 2008.30 Jornal Hoje: “Servidor diz que foi agredido em evento”, 18/08/06.31 Jornal O Diário (site): “Abusos na greve de 2006 rendem multa de R$ 200 mil ao Sismmar”, 24/04/08.

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greve de 2006, sem apresentar qualquer solução para os problemas da categoria, que

acumula perdas salariais num percentual de 19% até o momento.

A extinção da assistência médica à saúde dos servidores (Capsema), pelas

mãos da caneta do Excelentíssimo Prefeito, sem qualquer debate ou diálogo com a

categoria, colocou em risco a saúde de muitos servidores. [...] Estamos enfrentando

filas enormes e chegamos a ficar até seis meses esperando uma única consulta.

A trimestralidade, uma ação que persiste há 17 anos, é o maior exemplo do

abuso dos governos em relação aos servidores. Desde 1995, a ação está ganha, mas

até o momento nenhum trabalhador recebeu o que lhe é devido. O Governo Silvio

Barros II, que se elegeu prometendo saldar essa dívida, abusou da boa fé dos

servidores, dizendo-lhes algo que não demonstra interesse em cumprir.

[...] Há cerca de dois anos estamos esperando um posicionamento da Justiça

contra os descontos abusivos feitos pela Prefeitura na remuneração dos grevistas,

que não se limitaram aos dias paralisados, estenderam-se para descontos de 12 dias

nas férias, no 13º salário, na suspensão do direito à licença-prêmio e da progressão,

contrariando uma liminar de legalidade da greve (Sismmar [site]: “Os abusos do

poder”, 25/04/08).

Outro desfecho favorável ao Sismmar se deu na sentença do juiz da 5ª Vara Cível,

Siladelfo Rodrigues da Silva, em junho de 200832. O veredito proibiu a Prefeitura de aplicar

penalidades funcionais aos grevistas, garantindo-lhes o direito integral a progressão, licença-

prêmio, quinquênio, férias, 13º salário e avaliação do estágio probatório, sob pena de multa de

R$ 10 mil em caso de descumprimento. Mais uma vez, a Administração recorreu ao TJ-PR.

O prefeito Sílvio Barros ainda se envolveu em outras polêmicas com a categoria

durante sua gestão. Acabou, por exemplo, com as eleições para diretores de escolas e CMEIs,

possibilitando ao chefe do Executivo indicar CCs para a função. Reduziu, de quatro para um,

o número de trabalhadores que poderiam ser liberados para exercer mandato classista no

Sindicato, mediante alteração no Estatuto33.

Em março de 2007, foi noticiado um caso de cerceamento da liberdade sindical,

envolvendo uma servidora filiada ao Sismmar e a diretora do CMEI Maria Doná Ferraz. A

servidora afirmou ter sido agredida no local ao tentar divulgar um seminário promovido pela

entidade sindical. Segundo a diretora, havia uma determinação da Prefeitura, desde a época da

greve, para proibir a entrada de pessoas que difundissem qualquer tipo de propaganda34. O

Sismmar fez um requerimento pedindo a abertura de processo administrativo contra a diretora

do CMEI.

32 Site do Sismmar: “29 de junho de 2008: Dia de Luta e Luto dos Servidores Municipais”, 26/06/2008.33 Site do Sismmar: “Vítima de visível perseguição política”, 22/05/2007.34 Requerimento Sismmar, 14/03/2007.

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Em maio de 2007, o Ministério Público moveu ação por improbidade administrativa

contra Sílvio Barros35. De acordo com o Sindicato, o processo decorreu da denúncia feita pela

entidade em abril de 2006, a respeito de alguns CCs que exerciam funções de servidores

concursados em locais diferentes da lotação original: o Gabinete do Prefeito.

A maior polêmica, entretanto, aconteceu em janeiro de 2007, quando a Administração

deixou de efetuar o repasse patronal de 8%, sobre a folha de pagamento, à Caixa de Pensão e

Aposentadoria dos Servidores Públicos Municipais de Maringá (Capsema)36, previsto na Lei

Complementar nº386/2001. A Justiça, porém, obrigou-o a cumprir a Lei em vigor. Não

obstante, a Capsema, que existia desde 1962 e vinha sendo gerida por um conselho de

funcionários de carreira, acabou extinta pela Lei Complementar nº 687, de 13 de novembro de

2007, e deu lugar ao Sistema de Atenção à Saúde dos Servidores do Município de Maringá

(Sama)37, sem qualquer debate com os principais interessados. Na prática, a Prefeitura abriu

caminho para privatizar o sistema de saúde do funcionalismo, contratando uma empresa

privada para administrá-lo. A medida foi aprovada pelos vereadores da base aliada do prefeito,

com maioria na Câmara Municipal, sob protestos da categoria

Para amenizar o clima de tensão, Sílvio Barros concedeu um reajuste salarial de 3%,

em abril de 2007, mais um abono de R$70,00 e outro abono variável para que o menor salário

da Prefeitura ficasse em R$500,00, sem nenhuma discussão ou resistência38. O Sismmar fez

questão de frisar que o reajuste era equivalente aos “termos da pauta de reivindicações que

deflagrou a greve”. A estratégia pode ser interpretada como forma de rebaixar a influência do

Sindicato e desmobilizar a categoria, exibindo uma suposta benevolência da Administração.

Desde junho de 2006 e no decorrer dos anos seguintes, diversos intelectuais,

autoridades e organizações nacionais e internacionais manifestaram, em discursos ou por

escrito, solidariedade aos grevistas e condenaram a postura antidemocrática do prefeito Sílvio

Barros na condução da greve.

Entre as autoridades, constam: os vereadores maringaenses Humberto Henrique e

Mário Verri, presidente do PT municipal Rubem Mariano, deputados estaduais Tadeu Veneri e

Prof. Luizão, deputado federal Dr. Rosinha, todos do PT; a vereadora maringaense Marly

Martin (DEM); Ivan Bernardo e Zé Maria do PSTU; Rafael Iatauro, chefe da Casa Civil do

Governo do Paraná; Anderson Carvalho, conselheiro da OAB-RJ; Luiz Gin, presidente da

Federação dos Trabalhadores nas Indústrias do Paraná; Alejandro Sanchez, representante da

35 Jornal do Sismmar: “Sismmar denuncia cargos de confiança”, maio/junho de 2007.36 Jornal do Sismmar: “Capsema: retorno do repasse é vitória da categoria”, maio/junho de 2007.37 Jornal do Sismmar: “Novo plano de saúde para o servidor é uma armadilha”, novembro/dezembro de 2007.38 Jornal do Sismmar: “Bate e assopra”, maio/junho de 2007.

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Frente Obrero Campesino do México; Emir Sader, sociólogo e cientista político; Alfredo

Cáceres, membro da Frente de los Trabajadores y Pueblo da Argentina; sindicalistas da

Espanha, Venezuela, Colômbia e de várias partes da Argentina.

A lista de entidades inclui: PT, PSTU, CUT, Conlutas, Sindicato dos Trabalhadores em

Educação Pública do Paraná (APP-Sindicato), Andes-SN, Sindicato dos Trabalhadores em

Estabelecimentos de Ensino de Maringá (Sinteemar), Associação dos Docentes da

Universidade Estadual de Maringá (Aduem), Associação de Reflexão e Ação Social (Aras

Cáritas), Coordenação Nacional de Lutas Estudantis (Conlute), Sindicato dos Servidores

Municipais de Londrina (Sindserv), Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH),

Associação dos Professores da Universidade Federal do Paraná, Confederação Nacional dos

Trabalhadores no Serviço Público Municipal (Confetam), Ong Maria do Ingá, Sindicato dos

Servidores Públicos Municipais de Teresina (Sindserm), Associação de Petroleiros do Paraná

e Santa Catarina, Associação dos Servidores Públicos de Formosa-GO, Sindicato dos

Municipários de Porto Alegre (Simpa), Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência

(SBPC), Centro de Estudos e Debates Socialistas do Rio Grande do Sul (CEDS), Sindicato

dos Metroviários de São Paulo, Sindicato dos Metalúrgicos de Santa Catarina, Associação dos

Produtores Rurais do Assentamento Bandeira, Sindicato Nacional dos Servidores Federais da

Educação Básica, Profissional e Tecnológica (Sinasefe), Associação de Servidores da USP,

Sindicato dos Servidores Estaduais da Saúde do Paraná (SindSaúde-PR), Partido Socialista de

los Trabajadores de Bogotá (Colômbia), entre outras organizações nacionais e latino-

americanas.

Por outro lado, os comentários na imprensa maringaense, ao longo desse período, em

sua maioria foram desfavoráveis ao funcionalismo público municipal. Em certos casos, houve

até incitação ao crime. Seguem alguns dos mais representativos:

Negociações Sismmar. Sou servidor público há 14 anos e, nesse tempo, nunca vi

negociação do Sismmar que realmente fosse positiva para o servidor. No último ano,

a administração fez uma proposta de reajuste salarial que foi rejeitada pelo atual

comando do Sismmar. O impasse perdurou por três meses até que, finalmente, o

sindicato apresentou à prefeitura a mesma proposta que ela já tinha oferecido. Com

isso, perdemos três meses de reposição salarial. O sindicato deveria refletir melhor

seu papel antes de se pronunciar pelos servidores e lhes causar prejuízo […]

(Comentário em O Diário: “Caixa Postal”, 03/06/2006).

Lado ruim da greve. Se eu fosse o prefeito, e se isso fosse possível, mandaria todos

esses grevistas embora e contrataria pessoal novo, já que a lista de espera é enorme.

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Nós, pais e contribuintes, sofremos demais com a paralisação nos serviços básicos,

como escola, creche, hospitais e coleta de lixo, resultado dessa baderna (Comentário

em O Diário: “Caixa Postal”, 07/06/2006).

Nova decoração. Maringá está tão bonita com os enfeites da Copa do Mundo. As

ruas estão todas coloridas de sacos plásticos: tem saco verde, amarelo, azul, branco e

tem até saco preto, que significa o “luto” da prefeitura. Quem passa por Maringá

acha até bonito, mas quem se diverte são os cachorros que reviram os lixos

amontoados nas calçadas (Comentário em O Diário: “Caixa Postal”, 18/06/2006).

Caça Grevistas. Eu acho que o prefeito deveria colocar todo o pessoal do sindicato

num paredão e meter tiro neles, quem sobrar vivo, leva um de misericórdia na

cabeça. Vão trabalhar cambada de vagaba (Comentário no site do Sismmar: “Às

organizações, movimentos e entidades de direitos humanos”, 22/06/2006).

Prefeito articulado. Gostaria de saber quanto a prefeitura gastou para o prefeito

Sílvio Barros falar, em horário nobre, na emissora mais cara da região, pois acredito

que não foi de graça. […] Ele gosta muito de argumentar, quase consegue me

comover (Comentário em O Diário: “Caixa Postal”, 27/06/2006).

População Maringaense. Acredito que o Dr. Brandão está completamente errado

em pedir a prisão de 12 pessoas… Isto é um absurdo, pois o que ele deveria fazer era

pedir a prisão de todos estes baderneiros! (Comentário no Blog do Rigon: “Sem

justificativa”, 30/06/2006).

Anônimo. É triste ver que a cada dia que passa os cidadãos de Maringá ficam mais

BURROS, porque só pode ser burrice achar que a culpa da greve é dos

trabalhadores, será que as pessoas não veem que se o Sílvio Barros atendesse às

reivindicações da categoria nada disso estaria acontecendo, e não comprem o

discurso dele de que não pode conceder o aumento em função da Lei de

Responsabilidade Fiscal, só pra população ficar ciente quase 20% dos servidores da

Prefeitura são CC's e FG's, se tirasse metade deles (ainda sobraria muito) dava pra

dar o aumento e ainda fazer algo de útil pra cidade que não seja propaganda dele

mesmo […] (Comentário no Blog do Rigon: “Sem justificativa”, 30/06/2006).

O advogado e vereador Homero Marchese, que atualmente responde por infração

ético-parlamentar em uma Comissão Processante na Câmara Municipal, também comentou

sobre a greve na época:

Greve interminável. Lamentável a greve. De repente, a população se viu refém de

um grupo pequeno, mas organizado, e passou a ter de suportar inconveniências

advindas do precário funcionamento do serviço público. Não bastasse o modo

escolhido para apresentar sua reivindicação aos dirigentes da cidade, o movimento

grevista parece revestir-se de motivação político-ideológica. Ao prefeito cabe não

abrandar diante da abusividade do movimento que enfrenta. Aos grevistas, é

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importante lembrar que as portas da iniciativa privada estarão sempre abertas

àqueles dispostos a enfrentar a instabilidade cotidiana da economia (Comentário em

O Diário: “Caixa Postal”, 02-03/07/2006).

A longa batalha pela empatia da opinião pública, travada entre Prefeitura e Sindicato,

interferiu no resultado de duas eleições no final de 2008. Em outubro daquele ano, Sílvio

Barros disputou a reeleição. Entre seus adversários, estavam figuras bastante conhecidas da

política municipal, com destaque para os sindicalistas Claudemir Romancini (PSOL) e Ana

Pagamunici (PSTU). Em detrimento da forte representação da esquerda no pleito municipal,

que incluía os candidatos Ênio Verri (PT) e o ex-prefeito João Ivo Caleffi (PMDB), o prefeito

se reelegeu no primeiro turno, com 57,04% dos votos39:

O resultado demonstra que, apesar da rejeição de parte significativa do funcionalismo,

a gestão de Sílvio Barros (2005-2008), obteve alta aprovação da sociedade maringaense. Vale

ressaltar que impopularidade do prefeito entre os servidores também não era unânime. Sílvio

Barros acabou sendo reconhecido por sanear as contas do Município e, ao contrário de outros

prefeitos, conseguiu garantir o pagamento regular dos fornecedores e do funcionalismo,

durante todo o mandato. Outro fator decisivo para a alta aprovação de seu governo diz

respeito à grande quantidade de obras realizadas no período, bem como os projetos faraônicos

que deixou como herança, nem sempre grata, aos sucessores.

Além disso, o peso negativo das greves no serviço público geralmente recai sobre os

próprios grevistas. Diferentemente de patrões e gestores públicos, os trabalhadores e

sindicatos não dispõem de recursos para divulgar o movimento e suas teses nos meios de

comunicação de massa. Porquanto os grandes órgãos de imprensa representam uma fatia

importante do empresariado, é previsível que esses canais se inclinem para o lado das elites

39 Site do Sismmar: “Resultado das eleições”, 07/10/2008

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político-econômicas. Não causa surpresa, então, o desfecho das eleições para a diretoria do

Sismmar em novembro de 2008.

Depois de uma disputa acirrada nas urnas, a chapa 03 (Pra Mudar), ligada à CUT e ao

PT, venceu no segundo turno a chapa 02 (Trabalhadores em Luta), ligada à Conlutas e ao

PSTU, que buscava a reeleição com Ana Pagamunici. A nova presidente para o mandato de

2008 a 2011 seria a supervisora educacional Patrícia Lofrano40. Posteriormente, devido a

irregularidades no exercício da função, Lofrano foi substituída pela vice-presidente Solange

Marega.

A gestão Trabalhadores em Luta se despediu fazendo um balanço do período em que

esteve à frente do Sindicato41. Na capa do jornal de novembro de 2008, destacou a greve da

saúde em 2005, a greve geral em 2006, a reintegração dos demitidos em 2007 e a campanha

pelo pagamento da trimestralidade em 2008. O texto faz um comparativo da situação deixada

pela gestão da CUT (1988-2005) e a entregue pela gestão da Conlutas (2005-2008), tecendo

inúmeras críticas à gestão cutista anterior. Em seguida, o informativo lista as ações

promovidas durante o mandato e aquelas que estavam em curso ou apenas planejadas, com

uma breve introdução: “As dificuldades e os equívocos foram muitos. Em parte por falta de

experiência de uma nova direção. Em parte pelo descaso e pelas dívidas que encontramos no

Sindicato”.

No VII Congresso do Sismmar, ficou evidente a rivalidade nacional entre as centrais

sindicais. A diretoria Trabalhadores em Luta conseguiu que fosse aprovada no evento a

filiação imediata à Conlutas. O caderno de resoluções contextualiza o nascimento da entidade:

A Coordenação Nacional de Lutas foi constituída em Goiás [Luziânia], em março de

2004, por 1.764 representantes de 269 sindicatos, como resposta à política traidora

da direção da CUT e com o objetivo de encaminhar a luta contra as reformas

neoliberais [do Governo Lula], principalmente as reformas da previdência, sindical e

trabalhista. A Conlutas nasceu como um movimento e protagonizou as principais

lutas contra as reformas. […] Em maio de 2006, no Congresso Nacional dos

Trabalhadores (Conat), os sindicatos e movimentos […] apontaram a necessidade

[…] transformá-la em uma entidade nacional de caráter sindical e popular, que

aglutinasse os sindicatos, os movimentos populares e os desempregados (Sismmar:

“Caderno de Resoluções do VII Congresso do Sismmar”, 10-11/11/2007).

40 CUT: “Eleições sindicais em Maringá”, 06/11/2008.41 Informativo do Sismmar: “Gestão Trabalhadores em Luta”, novembro de 2008

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Por ocasião da vitória cutista na eleição do Sismmar em 2008, o PSTU nacional

publicou uma nota em seu site:

O Sismmar integrou-se ao processo de construção de uma alternativa nacional,

rompendo com a CUT e construindo a Conlutas. A chapa também lamenta o

resultado e a vitória da CUT, que vai “retornar ao sindicato e ajudar Lula e seu

governo a implementar as políticas contra os trabalhadores” (PSTU: “Conlutas perde

no segundo turno dos servidores de Maringá”, 10/11/2008).

Assim, logo em fevereiro de 2009, cerca de 200 servidores aceitaram em Assembleia

na Biblioteca Municipal a refiliação à CUT42. A gestão Pra Mudar inaugurou também a

campanha salarial daquele ano. Alguns itens da pauta de reivindicações ecoavam a greve de

2006: revisão do PCCR, pagamento da progressão funcional, pagamento da trimestralidade e

anistia dos “prejuízos da greve”43. As perdas geradas pelo movimento paredista também foram

tema do VIII Congresso do Sismmar, em 22 e 23 de outubro de 2010.

A nova diretoria não encontrou facilidades, porém, conquistou certos avanços. Após

dois anos de negociações e assembleias, Prefeitura e Sindicato assinaram um acordo na 5ª

Vara Cível de Maringá, em dezembro de 2010, encerrando perdas e processos decorrentes da

greve44. Os servidores grevistas não seriam mais prejudicados em progressões funcionais e

licença-prêmio. E a data-base da categoria ficou estipulada para abril de cada ano45. Como

visto anteriormente, algumas ações judiciais só tiveram resolução a partir de 2009. O TJ-PR,

por exemplo, julgou improcedente a ação de reparação de danos movida pela Administração

contra o Sismmar, em função da queda de arrecadação do estacionamento rotativo (EstaR)46.

No final de 2011, a eleição para a diretoria do Sindicato47 selou a continuidade da

gestão cutista. A chapa de situação Pra Avançar venceu a chapa Renovação, de Priscila

Guedes. A presidência da gestão Pra Avançar (2011-2015) ficou a cargo da supervisora

educacional Iraídes Bapstistoni, que havia sido dirigente no mandato anterior.

A diretoria recém-empossada alcançou duas vitórias históricas no período, que

remontam às reivindicações da greve de 2006. A despeito dos conflitos político-ideológicos

com o prefeito Carlos Roberto Pupin (2013-2016), eleito com a benção da família Barros, os

servidores municipais enfim conquistaram a revisão do Plano de Carreira, Cargos e

42 Site do Sismmar: “Sismmar sai da Conlutas e se filia à CUT”, 16/02/2009.43 Site do Sismmar: “Organizando as demandas”, 10/03/2009.44 Site do Sismmar: “Fim do ano… Fim de processo da greve”, 31/12/2010.45 Câmara Municipal de Maringá: Lei Ordinária nº8514, de 01/12/2009.46 Site do Sismmar: “Mais uma vitória em relação à greve”, 27/01/2009.47 Site do Sismmar: “Três chapas inscritas para eleição do Sismmar”, 22/07/2011.

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Remuneração (PCCR Geral), através da Lei Complementar nº966, de 04 de dezembro de

2013; e do PCCR do magistério, Lei Complementar nº1019, de 15 de maio de 2015. A data-

base da categoria passou para março de cada ano, a partir de 2013. A aprovação dos projetos

na Câmara Municipal foi defendida de forma veemente pelos vereadores Humberto Henrique,

Mário Verri, Dr. Manoel Sobrinho e Ulisses Maia.

A presidente do Sismmar, Iraídes Baptistoni, acabou reeleita no final de 2015 para o

mandato até 2019, pela chapa Novos Rumos48. As servidoras Cibele Campos e Solange

Marega, que faziam parte da gestão Pra Avançar, concorreram juntas em outra chapa. Dez

anos depois, em 2016, Iraídes enfrentou uma nova greve, agora como presidente.

O movimento foi deflagrado porque o então prefeito Carlos Pupin se negou a cumprir

a Lei Municipal que previa a reposição anual da inflação dos últimos 12 meses, conforme o

Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC)49. O INPC daquele ano atingiu 11,08%. A

greve de 2016 teve adesão de aproximadamente sete mil servidores, quase 60% da categoria,

pela estimativa do Sindicato, e transcorreu de 29 de março a 03 de abril. Após disputas

judiciais, retaliações, manifestações e atos políticos, os grevistas saíram vitoriosos e

conseguiram o pagamento da reposição de forma parcelada. Não constam registros de nenhum

caso de violência durante os seis dias de paralisação.

2016 também foi ano de eleições municipais. Concorrendo com Sílvio Barros, o ex-

diretor do Procon, ex-chefe de gabinete, ex-secretário e ex-vereador Ulisses Maia venceu a

eleição para prefeito no segundo turno, de modo surpreendente. A exemplo de Ana

Pagamunici em 2008, Priscila Guedes concorreu à Prefeitura em 2016, pelo PSTU. Maia

havia se comprometido com as demandas do funcionalismo desde o último mandato de

vereador (2013-2016) e aproveitou-as como promessas em sua campanha eleitoral. Em 2017,

com o respaldo legal dos vereadores e do novo prefeito, o Sindicato e os servidores

alcançaram mais três conquistas históricas: o vale-alimentação, a revisão da lei contra o

assédio moral50 e o acordo final para o pagamento da trimestralidade.

Assim, fechou-se um ciclo dos desdobramentos da greve de 2006. As vitórias vieram

lentamente, não como dádivas de uma administração comprometida com seus colaboradores,

mas como resultado de um longo e persistente processo de luta do movimento sindical dos

trabalhadores públicos municipais de Maringá.

48 Site do Sismmar: “Resultado oficial das eleições do Sismmar para a gestão 2015/2019”, 09/12/2015.

49 Site do Sismmar: “Assembleia delibera pelo fim da greve e Câmara aprova lei com o reajuste de 11,08%”, 03/04/2016.50 A Lei Complementar nº1.103, de 29 de novembro de 2017, aperfeiçoou a redação da Lei Complementar nº435,de 18 de novembro de 2002.

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4. DESAFIOS DO SINDICALISMO NO SETOR PÚBLICO

Como visto no capítulo anterior, a greve de 2006 apresentou muitos dos elementos que

caracterizam os conflitos no setor público de maneira geral: longevidade, demandas político-

econômicas, prejuízo social, troca de acusações, brigas judiciais, disputas na imprensa pelo

monopólio da verdade.

Guedes (1994, p. 411) já observou que os prejuízos da paralisação de servidores da

administração direta são compartilhados por toda a sociedade, devido à suspensão de serviços

básicos até para a sobrevivência da população. Consequentemente, elas seriam mais longas

que as do setor privado, havendo, durante e ao final, “uma disputa em que servidores públicos

e governo procuram responsabilizar uns aos outros pelo desgaste junto à população”.

Vidigal (2014) entende que as greves do funcionalismo público são marcadas, via de

regra, por confrontos com os governos porque os chefes do Executivo geralmente se recusam

a negociar e reagem com ameaças, demissões, prisões e/ou processos judiciais, ao invés do

diálogo. Citando Melo (2006 apud Vidigal, 2014),

Ocorre que os administradores públicos não resolvem os problemas dos servidores

(em certos casos, nem “negociam” com eles as reivindicações) e também parece não

se preocuparem com o desconforto acarretado ao povo. Trata-se de uma questão mal

resolvida no nosso sistema de relações de trabalho no setor público.

Nogueira (1999, p.67) faz uma avaliação precisa sobre o problema ao tratar da greve

dos professores das universidades federais em 1998:

Foram aproximadamente 90 dias de greve de âmbito nacional e as relações com o

governo foram marcadas pela morosidade dos processos de negociação, desgaste do

movimento grevista e ausência de democracia. [...] Não houve repressão policial,

mas também não houve efetividade nas negociações trabalhistas, não surgiram

mecanismos sociais de solução – mediação ou arbitragem – do conflito e não houve,

de fato, democracia nas relações de trabalho dentro do estado democrático

constitucional. […] Diferentemente do setor privado, a especificidade desse

movimento é o seu significado diretamente político. Não do modo como se acusa o

movimento, pelo lado do governo, de que se trata de movimento partidário com fins

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políticos. É político porque está dentro do Estado, envolve diretamente a dimensão

pública, o contribuinte e a sociedade como um todo.

Mas, para além das rusgas naturais dos movimentos grevistas, o exercício do

sindicalismo no Estado enfrenta dificuldades que são intrínsecas à própria organização do

espaço público.

Nogueira (2005) sustenta que “as dificuldades das relações coletivas de trabalho no

setor público na instância do político são defrontar-se com um poder difuso de decisão entre o

Poder Executivo e o Poder Legislativo”. As mudanças periódicas de governo fazem com que

as conquistas obtidas anteriormente possam ser alteradas ou extintas a qualquer momento por

força de lei, em virtude da falta de convenções e acordos coletivos, ou mesmo da ausência da

Justiça do Trabalho para mediar, arbitrar e resolver os dissídios trabalhistas. Segundo o autor,

o Poder Legislativo deveria exercer este papel. Mas, em face da conjuntura atual do sistema

político-partidário, “o interesse pessoal de continuidade política prevalece sobre o interesse

público”.

Instaura-se, por consequência, uma relação de cumplicidade do Poder Legislativo com

o Poder Executivo, no intuito de manter a influência dos parlamentares junto aos chefes de

Estado, tendo em vista futuras vantagens eleitorais ou até mesmo formas de enriquecimento

ilícito. Silva (2005) declara: “o Estado é responsável pela persistência da 'estratégia de

confronto'”, por julgar que, embora tenham sido reconhecidos os direitos de greve e

organização sindical na esfera pública, “não há no aparelho estatal alternativas institucionais

para a resolução dos conflitos trabalhistas”.

Sobre o papel da Justiça do Trabalho nos dissídios do Estado, o procurador-geral da

República, Aristides Alvarenga, sustentou na Adin nº492-1 de 1992 (vide capítulo 2.3) que o

direito de negociação coletiva assegurado aos servidores civis da União pela Lei nº8.112/1990

é “incompatível com a sistemática adotada pela Constituição Federal, […] já que qualquer

vantagem atribuída ao servidor há de ser conferida por lei”. O ministro do STF, Carlos

Velloso, relatou trechos do parecer da subprocuradora-geral Odília Oliveira no processo:

a) o regime jurídico único tem caráter estatutário, objetivo, pois “os direitos,

deveres, garantias e vantagens dos servidores públicos – seu status, enfim – são

definidos unilateralmente pelo Estado-legislador, que pode, também unilateralmente,

alterá-lo a qualquer momento, sem se cogitar de direito do servidor à manutenção do

regime anterior;

[…]

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e) “o processo trabalhista é incompatível com o caráter estatutário do regime

jurídico dos servidores públicos e com a superioridade jurídica de que goza o Estado

nas relações dele derivadas. Não há lugar para a conciliação, que pressupõe a

capacidade de transigir e, como já se mostrou, o Estado não pode abrir mão de seus

privilégios, porque conferidos no interesse público, que é indisponível” […] (STF:

Adin nº492-1/DF, 12/11/1992).

Outro desafio a ser superado são os preconceitos contra o funcionalismo público e o

sindicalismo em geral. Guedes (1994, p. 418) analisa que a chamada “crise do Estado”,

caracterizada pelas iniciativas de reduzir sua atuação via cortes de investimentos públicos,

privatizações, terceirizações, suspensão de direitos sociais e trabalhistas etc., faz com que o

serviço público em si seja “alvo de críticas como se ali estivesse resguardado um conjunto de

trabalhadores privilegiados que não oferecem contrapartida à sociedade que lhes sustenta”. O

autor recorda que, nas eleições de 1989, Fernando Collor saiu vitorioso com seu discurso de

“caça aos marajás”, termo depreciativo para se referir aos funcionários públicos. No entanto,

Guedes considera injustas as críticas, pois, apesar do sucateamento deliberado dos serviços

públicos e do próprio Estado, este ainda é provedor de uma gama de “serviços e produção de

insumos cuja extinção representaria um retrocesso para a economia e a sociedade brasileiras”.

Parte do preconceito pode se atribuir ao fato de que, segundo Nogueira (2005),

não há no relacionamento coletivo dentro do Estado, nas atividades de

administração, controle e de prestação de serviços públicos, produção direta de valor

para acumulação de capital. Trata-se então de trabalho assalariado improdutivo nos

termos discutidos no capítulo inédito do Capital de Marx.

A essência do trabalho no serviço público direto não obedece aos “parâmetros

econômicos válidos para os demais assalariados no sistema de produção de mercadorias e de

valor”. A variação salarial não implica, em tese, na redução ou aumento dos lucros. A

prevalência de “critérios políticos sobre os critérios econômicos na definição das condições de

trabalho e salários” dificulta a atividade sindical nesse aspecto. Por outro lado, o viés político

do sindicalismo no Estado possibilita ao funcionalismo pugnar pela democratização das

decisões e do debate sobre a gestão e a qualidade dos serviços públicos, ou ainda rediscutir a

própria natureza e abrangência do Estado brasileiro. Nogueira (1999, p. 57) acrescenta:

O Estado político brasileiro contém estruturas internas marcadas pela autocracia,

autoritarismo e pelo controle de grupos particulares que obstaculizam a construção

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da esfera pública democrática não burguesa. Esta forma de poder presente no

Estado, apesar da democracia constitucional, não permite maior participação e

influência das camadas populares e trabalhadoras da sociedade nas decisões políticas

e administrativas, mostrando o limite do nível de democracia política conquistado.

[…] Isso reflete também na própria ausência de democracia no relacionamento entre

servidores e Estado, caracterizado por confrontos periódicos sobre assuntos

elementares das condições de trabalho e salário, principalmente nas áreas sociais da

educação e da saúde, entre outras, cuja consequência para aqueles que vivem do

trabalho na sociedade capitalista é sua exclusão da própria democracia.

O autor avalia que uma das estratégias para neutralizar a mobilização dos

trabalhadores do setor público consiste na pulverização da categoria em diversos cargos,

salários, classes, condições laborais, níveis de autoridade e poder. Essa forma de diferenciação

acontece também externamente, entre trabalhadores do setor privado e funcionários públicos,

ou entre assalariados da economia formal e informal. Em um Estado que se divide em

inúmeros departamentos, divisões e setores, administrados por pessoas que comandam e

outras que obedecem, os conflitos se tornam inevitáveis. Logo, poderá haver disputas

entre indivíduo e organização burocrática, conflitos interpessoais, entre grupos

sociais, entre diferentes posições hierárquicas, entre o pessoal da máquina

permanente e o pessoal temporário, abuso do poder estatal sobre os funcionários,

ausência de participação na decisão, entre muitos outros aspectos (NOGUEIRA,

2005).

Nogueira (2005) considera que as lutas do “pessoal do Estado” ocorrem de modo geral

em momentos de crises econômicas e estruturais. Contudo, não visam a priori mudanças na

burocracia estatal para melhor atender aos anseios da população, muito menos transformações

no atual regime democrático capitalista. Embora possua, em tese, o papel de árbitro e

mediador de conflitos na sociedade, “o Estado capitalista tem como função manter a ordem do

capital em detrimento das esferas sociais e coletivas”. O estudioso completa:

A organização sindical pressiona por mudanças nas velhas relações dentro do

Estado, mas está muito distante de representar o conjunto dos funcionários públicos

e de alterar suas práticas antigas baseadas na fragmentação por setores e segmentos,

no corporativismo de categorias, no conflito entre os níveis hierárquicos e

institucionais (NOGUEIRA, 2005).

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A CUT, ao representar os principais segmentos da classe trabalhadora, seria o espaço

ideal para discutir o “resgate do sentido do trabalho público e da transformação do Estado”.

Contudo, Nogueira (1999, p. 66) não enxerga entre os trabalhadores dos setores público e

privado “uma pauta de solidariedade e uma agenda estratégica de articulação claramente

definidas”.

O autor defende a importância da atividade sindical não só no sentido de buscar

melhores condições de trabalho e remuneração, mas também de incutir na classe trabalhadora

em geral a consciência política necessária para combater as tentativas de exploração pelo

patronato.

Porém, há situações em que os sindicatos não representam os interesses do trabalhador

e, pior ainda, servem como obstáculos. Em contraponto, ações efetivas e responsáveis dos

sindicatos muitas vezes não recebem o devido apoio dos trabalhadores da base (Nogueira,

2005). Tais circunstâncias levam o sindicato ao descrédito ou sugerem que determinada

categoria é incapaz de se organizar.

Do ponto de vista organizacional, as entidades sindicais apresentam problemas de

“superposição e duplicidade nas formas de representação”. A liberdade sindical, preconizada

pela Constituição, “não produz necessariamente o pluralismo sindical no caso do setor

público. O que existe é uma pluralidade entre associações e sindicatos e uma verdadeira

pulverização e fragmentação sindical” (Nogueira, 1999, p. 57).

A efetividade do sindicalismo no Estado depende muito da índole política dos

governantes: autocrática ou democrática. A postura democrática de um governo “legitima e

reconhece os sindicatos, o que muito contribui para a atuação dos sindicatos com as suas

bases e para a participação nos níveis institucionais”. Em contrapartida, um governo

autocrático pode emperrar a atividade sindical, “criando todo os tipos de dificuldades e

inclusive não reconhecendo o direito de livre associação sindical inscrito na Constituição

Federal” (Nogueira, 1999, p. 58-59).

De acordo com Nogueira (2005), os sindicatos do setor público têm se mostrado mais

combativos e vêm preservando as formas clássicas de ação do movimento sindical,

especialmente na organização das greves, na mobilização de grandes categorias e nas

negociações de pautas políticas, econômicas e sociais. Tal condição teria dois motivos

principais: “a defesa das categorias hoje muito ameaçadas pela ideologia e práticas

antiestatais e a defesa da esfera pública e a manutenção do status quo anterior, principalmente

do Estado de bem-estar social e dos direitos sociais”.

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Nesse aspecto, as lutas do setor público deveriam funcionar como elos de ligação com

o restante da classe trabalhadora. Mas, para o autor, o que ocorre é um paradoxo, “porque, ao

mesmo tempo que se mostra mais ativo, representa um movimento de retaguarda, defensivo e

estrategicamente posicionado na esfera da reprodução do sistema, não se colocando no centro

da acumulação e do progresso”. Ou seja, ao mesmo tempo que o sindicalismo dos servidores

se apresenta mais atuante, ele ainda faz parte de uma engrenagem social que reproduz a lógica

do sistema capitalista, sem conseguir abalá-lo. Ao passo que os sindicatos do setor privado já

estão há muito tempo “afastados de orientações anticapitalistas e socialistas e da estratégia de

confrontação” e vivem uma crise mais profunda em função do desemprego e do processo de

desindustrialização do país nas últimas décadas, que afeta diretamente suas bases (Nogueira,

2005)

Faria (2009) entende que o corporativismo dos funcionários públicos e a

desarticulação com os demais trabalhadores do setor privado, ou mesmo em relação aos

servidores celetistas, revelam as barreiras que separam as diversas categorias de trabalhadores

no Brasil.

Nogueira (1999, p. 56) acredita que, para superá-las, será necessária a “construção de

alianças com as classes que vivem do trabalho”, inclusive para legitimar o caráter essencial do

serviço público na vida de cada cidadão. Na avaliação do autor,

A ausência do chamado “estado do bem-estar social” no Brasil e a precariedade dos

serviços públicos, com destaque para os setores sociais, colocam problemas de

caráter estratégico que não descartam a luta pela transformação da natureza

capitalista e privatizante do Estado. […] É imperativo para o movimento sindical

dos funcionários combinar dupla questão: 1) a luta pela melhoria das suas condições

de trabalho e salário por meio de negociação ampla e transparente, viabilizando

também formas de participação nas políticas e na gestão do Estado em busca da

melhoria da qualidade dos serviços públicos; e 2) a luta pela transformação do

Estado, no sentido de ampliar a esfera pública não privada e não burguesa,

favorecendo o conjunto das classes trabalhadoras. (Nogueira, 1999, p. 65-66).

É importante salientar que as reflexões apresentadas aqui não esgotam as

possibilidades de representação e ação do movimento sindical dos trabalhadores públicos.

Elas apenas traçam um panorama histórico nacional dos obstáculos enfrentados pela

categoria, e não consideram possíveis exceções à crise do sindicalismo no mundo atual.

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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os desafios que se impõem ao sindicalismo no setor público, discutidos no capítulo

anterior, colocaram-se de forma bastante clara na greve dos servidores municipais de Maringá

em 2006. Infelizmente, os grevistas acabaram estigmatizados pela população e pelos próprios

colegas que não participaram da greve e se tornaram verdadeiros párias em seus locais de

trabalho. Do lado oposto, os políticos da família Barros foram ainda mais estigmatizados pelo

funcionalismo, diante do acúmulo de rixas históricas. Tal circunstância contribuiu, até certo

ponto, para decidir a eleição de 2016 em favor de Ulisses Maia. Uma parcela significativa dos

servidores fez uma explícita campanha “anti-Barros” naquele ano.

A duração de 30 dias foi considerada muito extensa e desgastante para as partes em

litígio. Os efeitos da paralisação afetaram toda a população maringaense. Já a

responsabilidade pelos prejuízos sociais, como a suspensão de grande parte da coleta de lixo e

a redução do atendimento na Educação e na Saúde, foi rechaçada tanto pela Prefeitura quanto

pelo Sindicato.

Era surpreendente a dificuldade que o então prefeito Sílvio Barros demonstrou de

dialogar com o Sismmar e o Comando de Greve, em detrimento dos inúmeros ofícios

enviados pela entidade solicitando reuniões. Do mesmo modo, FHC apostou na morosidade

das negociações para desgastar a greve dos professores federais em 1998, que se arrastou por

três meses. Em Londrina, no ano de 2006, os servidores municipais ficaram paralisados por

106 dias e a última parcela dos descontos arbitrários do período só foi quitada em 2017.

No caso de Maringá, o Poder Executivo conjugou, além da morosidade, a recusa em

negociar e a repressão para lidar com o movimento grevista. Sílvio Barros chegou a

abandonar uma reunião após dez minutos de seu início, deixando os representantes da

Prefeitura sem nenhuma proposta satisfatória para encerrar a paralisação. O Sismmar ainda

tentou negociar o funcionamento das atividades essenciais, em observância à Lei de Greve,

mas o prefeito se negou desde o início.

A repressão veio em forma de ameaças, retaliações, terceirização de serviços públicos,

agressões por parte de seguranças privados, a tentativa de forçar a prisão de grevistas após a

ocupação do Paço Municipal, a demissão de 28 servidores e as ações judiciais contra o

Sindicato. No entanto, a violência em certas ocasiões não foi exclusividade da Administração

Municipal. Foram registradas ocorrências policiais e relatos na imprensa, segundo os quais

parte dos grevistas impedia o acesso de servidores não grevistas aos locais de trabalho,

mediante ameaça ou agressão. Com maior e menor intensidade, os piquetes pacíficos ou

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violentos se mantiveram durante toda a paralisação, assim como a troca de acusações entre

Prefeitura e Sindicato.

De qualquer modo, algumas indagações ainda restam daquele período. Não seria

possível evitar a generalização da violência? Por que não dialogar com o Sindicato e acabar

com a greve o mais rápido possível para não prejudicar a população? Se era inviável o

reajuste pretendido pela categoria, em função da LRF, por que não apresentar uma proposta

razoável que contemplasse outros itens importantes da pauta de 2006, como o fim do assédio

moral e a revisão do plano de carreira? Sobre o assédio moral e as perseguições, a

Administração repetiu várias vezes que não ocorriam dentro da Prefeitura. Sobre o plano de

carreira, propôs na época formar uma comissão para discuti-lo, ignorando completamente a

minuta elaborada pelo Sismmar e relegando o PCCR para depois de sua gestão.

A disputa pelo discurso oficial da imprensa, como era de se esperar, pendeu para o

lado da Administração. Sílvio Barros possuía boas relações com o empresariado local e

injetava recursos públicos na mídia em forma de publicidade oficial e propaganda.

Consequentemente, ao prefeito ficou garantida a aparição regular nas rádios, na televisão e

nos jornais. Por outro lado, o Sismmar e os servidores em greve só dispunham do site

institucional, das redes sociais e do auxílio de blogs jornalísticos, tradicionalmente contrários

ao modus operandi político da família Barros.

Como exemplo da influência do poder econômico sobre a opinião pública, um grupo

apócrifo, autodenominado Movimento pela Defesa do Servidor Público de Maringá (MDSM),

patrocinou um outdoor comparando os reajustes concedidos ao funcionalismo público pelos

governos municipal, estadual e federal, nos termos da revisão anual prevista na Constituição:

Sílvio Barros: 6,5% (em um ano); Roberto Requião: 0,0% (em quatro anos); Lula: 0,1% (em

quatro anos). O outdoor ainda carregava a pergunta: “A quem interessa a greve?”. Em

seguida, citava provocativamente o site da Conlutas. A ligação do MDSM com a

Administração Municipal e a falta de representatividade junto ao funcionalismo era tão

suspeita quanto óbvia, arrisco-me a dizer. E o comparativo em si não considera o abismo

salarial existente entre servidores municipais, estaduais e federais. Portanto, a peça

publicitária de grande porte serviu apenas para confundir a população e jogá-la contra os

funcionários públicos.

A greve de 2006 se mostrou, então, um terreno fértil para analisar os problemas

inerentes ao sindicalismo do setor público. A diferenciação salarial entre os diversos cargos e

a divisão da categoria em uma infinidade de setores determinou diretamente sua capacidade

de organização. De forma geral, servidores com altos salários e melhores condições de

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trabalho dificilmente são solidários aos servidores que recebem baixos salários e, na maioria

das vezes, realizam as funções mais insalubres e perigosas da administração pública. O

inverso parece verdadeiro: as classes de baixa renda do funcionalismo também não se

solidarizam com as causas de classes mais altas, como procuradores, médicos, engenheiros,

arquitetos, auditores etc. O fato é que a adesão ao movimento grevista em Maringá

predominou nas Secretarias de Serviços Públicos, Educação e Saúde, pontos de grande

concentração de servidores e reconhecidos pela sobrecarga de trabalho.

A questão da adesão suscita uma dúvida comum às greves de maneira geral: os

sindicatos e trabalhadores paredistas representam a maioria ou a minoria dos trabalhadores

não paralisados? A resposta é complexa e difícil de mensurar. Por um lado, um grande

contingente de trabalhadores não entra em greve por discordar das reivindicações ou da

atuação dos grevistas e dos respectivos sindicatos. Por outro, esse mesmo contingente pode

até concordar com as demandas e a postura da entidade sindical, mas o medo de retaliação,

perseguição, demissão etc. faz com permaneçam em serviço durante as paralisações. Não

foram encontrados dados suficientes para uma análise precisa da representatividade do

Sismmar naquela época. Mas, de acordo com as fontes pesquisadas, a Prefeitura possuía cerca

de 7,5 mil servidores em seu quadro funcional. Do total, aproximadamente 3,5 mil eram

filiados ao Sindicato e 1,5 mil aderiram à greve de 2006.

Outro ponto fraco da atividade sindical no Estado, como visto anteriormente, concerne

à falta de uma instância única e legítima para mediar, arbitrar ou solucionar os conflitos de

trabalho. Na esfera privada esse papel é exercido pela Justiça do Trabalho, e os celetistas

ainda contam com a segurança jurídica dos acordos e convenções coletivas. Já no setor

público a responsabilidade se divide confusamente entre a Justiça Comum e o Poder

Legislativo.

Os processos judiciais decorrentes da greve de 2006, para se ter uma ideia, foram

julgados por varas cíveis, criminais e, inclusive, da fazenda pública de Maringá. Os onze

vereadores da base aliada do prefeito na Câmara Municipal pouco ou nada fizeram a favor ou

contra o movimento. Apenas chancelaram as decisões de Sílvio Barros, esmagando no voto os

quatro vereadores de oposição. A relação de cumplicidade entre Legislativo e Executivo

acabou sufocando as tentativas de mediação encabeçadas por Humberto Henrique (PT), Mário

Verri (PT), Dr. Manoel Sobrinho (PCdoB) e Marly Martin (PPL). A iniciativa do Ministério

Público do Trabalho, de mediar o conflito, também não deu resultado. A instituição não

possuía a prerrogativa de arbitrá-lo e decidi-lo.

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As caricaturas e os preconceitos disseminados na sociedade, sobre a suposta condição

privilegiada do funcionalismo público em geral, também prejudicam a organização dos

trabalhadores do Estado. Embora não seja o único fator envolvido, é notório que qualquer

reivindicação trabalhista, seja por meio de greve ou manifestações, pode ter ou não ter

sucesso em razão do apoio popular que determinada causa possui ou não possui. Entretanto,

para além dos preconceitos arraigados, a opinião pública tende a favorecer os gestores pela

influência política e econômica destes sobre os meios de comunicação de massa. Dessa forma,

a balança geralmente pesa contra os servidores que se manifestam e, pesa ainda mais, contra

os sindicatos da categoria.

Ressalvadas as especificidades de cada setor, a situação não é muito diferente na

iniciativa privada. A existência e a função dos sindicatos no Brasil são ignoradas, ou

simplesmente rejeitadas, por uma parcela significativa da sociedade, de todas as classes

sociais e faixas etárias. As entidades sindicais perderam representatividade junto aos

trabalhadores mais humildes, da base, do “chão de fábrica”, e mobilizá-los para alguma causa

se tornou um imenso desafio.

O horizonte negativo pode ser atribuído a pelo menos três fatores: 1) ao capitalismo

contemporâneo, que busca cortar na raiz, por meios políticos e jurídicos, qualquer tentativa de

organização da classe trabalhadora; 2) à discriminação aos sindicatos que a mídia ajuda a

difundir, em prol do avanço do capitalismo e do liberalismo econômico; 3) e, por último, à

própria perda de credibilidade que a atuação inócua de muitos sindicatos provocou.

Apesar dos impasses do sindicalismo na contemporaneidade, a instituição “sindicato”

continua sendo o espaço legítimo de proteção, defesa e conquista de direitos para a classe

trabalhadora em geral. A atividade sindical deve ser revalorizada e novamente encarada como

instrumento catalisador da vontade dos trabalhadores. O sindicalismo do setor público, em

especial, esbarra em outro problema ainda mais grave: a própria concepção de Estado está em

xeque no mundo atual. Portanto, a abrangência e os limites estatais precisam ser repensados e

reconstituídos de forma democrática.

Ao contrário do que se possa pensar, a greve de 2006 não foi apenas um movimento

corporativista dos servidores municipais de Maringá, em prol de ganhos econômicos. A greve

pleiteou o respeito a princípios constitucionais, dos mais básicos: liberdade sindical e direito à

honra, à imagem, à liberdade, com o fim do assédio moral. A gestão Trabalhadores em Luta

(2005-2008) pugnou sempre pela participação do funcionalismo nas decisões de governo, a

exemplo de outras gestões do Sismmar. A diretoria da época, além disso, estava concatenada

com a recomposição nacional das forças de esquerda, que romperam com o Governo Lula e a

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CUT em nome de um projeto verdadeiramente socialista para o país. A articulação com

PSTU, Conlutas e movimentos sociais era programática.

Como visto ao longo do trabalho, as ações do Sismmar em Maringá, antes, durante e

depois de 2006, mostraram que a união dos trabalhadores em torno de seu sindicato ainda é

necessária para lidar com a intransigência de governos autocráticos. As vitórias demoraram,

mas vieram. Infelizmente, chegou-se a um estágio no Brasil em que a luta sindical, de modo

geral, deixou de ser por direitos e benefícios para se limitar à manutenção de direitos e

benefícios já adquiridos. Esta monografia entende, com base nos autores estudados, que as

crises do sindicalismo no Brasil e do conceito de Estado podem ser enfrentadas pela atuação

em conjunto de sindicatos, movimentos sociais e setores politizados da sociedade,

comprometidos com a democratização autêntica das relações de poder e com a defesa

incansável do acesso de todo cidadão a serviços públicos de qualidade.

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6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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7. ANEXOS

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04/11/1988 - Edital da Assembleia de Fundação do Sismmar Abril/1989 – Jornal do Sismmar nº1 (Fotos: Edson Guitti e Márcio Damásio)

14/12/2005 – Jornal Hoje (Foto: João Mário Góes)

26/01/2006 – Jornal Hoje (Foto: João Mário Góes)

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04/06/2006 – Jornal O Diário (Foto: Douglas Marçal)

02/06/2006 – Jornal O Diário (Foto: Ivan Amorin)

04/06/2006 – Jornal O Diário (Foto: Douglas Marçal)04/06/2006 – Site do PSTU/Regional Maringá

09/06/2006 – Jornal O Diário (Foto: Douglas Marçal) 10/06/2006 – Jornal O Diário (Foto: Douglas Marçal)

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13/06/2006 – Jornal O Diário (Foto: Cléber França) 14/06/2006 – Jornal O Diário (Foto: Cléber França)

14/06/2006 – Jornal O Diário (Cléber França)

15/06/2006 – Jornal O Diário (Douglas Marçal)

18/06/2006 – Jornal O Diário(Foto: Douglas Marçal)

21/06/2006 – Jornal O Diário (Foto: Douglas Marçal)

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22/06/2006 – Factorama (Foto: Andye Iore)22/06/2006 – Jornal O Diário (Foto: Rafael Silva)

25/06/2006 – Jornal O Diário (Foto: Douglas Marçal) 27/06/2006 – Jornal O Diário (Foto: Ricardo Lopes)

27/06/2006 – Jornal O Diário (Foto: Douglas Marçal)

28/06/2006 – Jornal O Diário (Foto: Henri Jr.)

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28/06/2006 – Site do Sismmar (Foto: autoria desconhecida) 29/06/2006 – Jornal O Diário (Foto: Rafael Silva)

28/06/2006 - Factorama (Foto: Andye Iore)28/06/2006 - Factorama (Foto: Andye Iore)

28/06/2006 - Blog do Rigon (Foto: autoria desconhecida) 28/06/2006 – Site do Sismmar (Foto: autoria desconhecida)

28/06/2006 – Factorama (Foto: Andye Iore) 28/06/2006 – Factorama (Foto: Andye Iore)

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30/06/2006 – Jornal O Diário (Fotos: Ivan Amorin)

28/06/2006 - Factorama (Foto: Andye iore) 28/06/2006 - Factorama (Foto: Andye iore)

28/06/2006 - Factorama (Foto: Andye iore) 28/06/2006 - Factorama (Foto: Andye iore)

DESOCUPAÇÃO DO PAÇO MUNICIPAL – MADRUGADA DE 29/06/2006

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29/06/2006 - Factorama (Foto: Andye Iore) 30/06/2006 - Blog do Rigon (Foto: autoria desconhecida)

30/06/2006 - Blog do Rigon (Foto: autoria desconhecida)05/07/2006 – Jornal O Diário (Foto: Douglas Marçal)

05/07/2006 - Blog do Rigon (Foto: autoria desconhecida)

30/07/2006 – Jornal O Diário (Walter Fernandes)

26/06/2007 – Site do Sismmar (Foto: autoria desconhecida)

14/07/2006 – Jornal O Diário (Foto: Douglas Marçal)

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03/07/2006 – Blog do Rigon (Foto: autoria desconhecida)

30/06/2006 – Jornal O Diário

13/06/2006 – Jornal O Diário (Charge do Lukas)

15/06/2006 – Jornal O Diário (Charge do Lukas)

23/06/2006 – Jornal O Diário (Charge do Lukas)

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