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Universidade Estadual de Londrina Departamento de Ciências Sociais Projeto de pesquisa Ideologias “inerentes” e “derivadas” dos atuais movimentos populares latino-americanos Eliel Ribeiro Machado 2008

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Universidade Estadual de Londrina Departamento de Ciências Sociais

Projeto de pesquisa

Ideologias “inerentes” e “derivadas” dos atuais movimentos populares latino-americanos

Eliel Ribeiro Machado

2008

Projeto de Pesquisa: Ideologias “inerentes” e “derivadas” dos atuais movimentos populares latino-americanos

1

Eliel Ribeiro Machado*

Resumo

Com a implantação das políticas neoliberais no subcontinente latino-americano a partir dos anos 1990, diversos movimentos populares passaram a contestar os efeitos dessas políticas sobre as suas condições sociais de existência. Quase ao mesmo tempo, o movimento proletário tradicional entrou em refluxo político-ideológico, suas organizações sindicais e partidárias perderam força contestatória. Levando-se em consideração os diversos movimentos que passaram à dianteira da oposição ao neoliberalismo, procura-se investigar quais são as ideologias “inerentes” e “derivadas” dos sem-terra e sem-teto brasileiros, dos cocaleros bolivianos e dos piqueteros argentinos. A importância dessa pesquisa está duplamente determinada: de um lado, esses movimentos enfrentaram as políticas neoliberais praticamente sozinhos e recaiu sobre eles toda a fúria repressiva dos seus respectivos Estados nacionais; de outro, embora pertencentes às classes populares e se confrontarem de forma difusa com o capital, organizam-se em torno de demandas “emergenciais” que dizem respeito à sobrevivência física de seus integrantes, o que os aproxima de uma mesma base social. Por isso mesmo, busca-se examinar as ideologias “inerentes” e “derivadas” impulsionadoras de suas lutas e se guardam potencialidades para ultrapassarem as bandeiras imediatas e para lutarem por transformação social de longo alcance.

I. Fundamentação teórico-metodológica

I.1. Introdução

A fundamentação teórico-metodológica é abordada neste projeto a partir do

recorte do próprio objeto que nos propomos pesquisar: as ideologias “inerentes” e

“derivadas” de alguns movimentos populares latino-americanos (sem-teto e piqueteros,

sem-terra e cocaleros) que pautam suas lutas contra as políticas neoliberais implantadas

na América Latina desde meados dos anos 1990. Em linhas gerais, são movimentos com

uma base social relativamente próxima (subempregados ou desempregados urbanos e

rurais e campesinato pobre), pertencentes, genericamente, às classes populares.

Organizam-se, muitas vezes, a partir de conjunturas sociais, econômicas e políticas

peculiares, que tornam suas demandas específicas (emprego, reforma agrária, reforma

* Professor de Ciência Política da Universidade Estadual de Londrina (UEL), coordenador do Grupo de Estudos de Política da América Latina (GEPAL), pesquisador Núcleo de Estudos de Ideologias e Lutas Sociais (NEILS) e membro do GT Historia Reciente do Conselho Latino-americano de Ciências Sociais (CLACSO).

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urbana etc.). Alguns deles associam a estes problemas questões étnicas, como os

camponeses bolivianos (cocaleros), a exemplo de outros, como os zapatistas, os

indígenas equatorianos e peruanos. As condições sociais draconianas as quais estão

submetidos os colocam praticamente no mesmo patamar de luta: reivindicam do Estado

(e não mais do patrão) o atendimento de suas necessidades básicas. Só paralisam a

produção de mercadoria quando trazem para as suas mobilizações o proletariado

tradicional, organizado nos partidos e sindicatos. Caso contrário, o máximo que

conseguem é paralisar a sua circulação, ao bloquearem estradas e vias de acesso.

Não obstante a relativa homogeneidade social e política desses movimentos,

procuramos detectar se há elementos ideológicos comuns entre eles. Em outras palavras:

se as lutas operárias tradicionais, tão fortes ao longo do século XX, tinham uma relação

com o capital parecida (produtores diretos de mercadoria), praticamente as mesmas

formas de organização (sindicatos e partidos operários) e os mesmos objetivos (luta

contra o capital), os “novos” deserdados do capital também se organizam de forma

similar (decisões por assembléias, horizontalidade, ação direta, ocupações de terra e

fábricas) e se voltam para o Estado, ao reivindicarem terra (reforma agrária), crédito

(para o plantio ou produção) e trabalho (formação de cooperativas). Se as principais

lutas operárias tradicionais ocorreram no “chão de fábrica”, as dos movimentos

populares, em geral, ocorrem com as ocupações de terra e de fábricas, marchas,

bloqueio de estradas etc.

A despeito do refluxo das lutas operárias tradicionais do final do século XX para

cá, o proletariado “puro” – para utilizar uma expressão leninista – continua sendo aquele

que se choca diretamente com o capital.1 Muito provavelmente perdeu força política

neste confronto, seus sindicatos e partidos entraram em crise ideológica, mas, pela

própria natureza da acumulação capitalista, permanece sendo o produtor direto de mais

valor. O problema é que as principais lutas contra a implantação das políticas

neoliberais na América Latina foram (e são) encabeçadas por outros sujeitos que, ou não

são diretamente pertencentes ao núcleo “duro” das relações capital/trabalho ou, se são,

confrontam o capital de forma difusa.

1 Não há uma preocupação neste projeto em precisar historicamente a atuação política e ideológica das organizações proletárias tradicionais a partir de seus sindicatos e partidos políticos. Mas somente a de constatar que, com os golpes militares que assolaram a América Latina nos anos 1960/1970, houve um refluxo importante e, nos anos 1990, as principais lutas foram assumidas pelos chamados “novos” movimentos sociais, que optamos, teoricamente, por considerá-los como pertencentes às classes populares e, em conseqüência, organizados a partir delas.

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Ao colocarmos em voga a “atuação” política de setores pertencentes às classes

populares, é preciso refinarmos teoricamente quem são os sujeitos que as compõem,

todavia esta não é uma tarefa fácil, exatamente pela diversidade de sua composição

social, política ideológica, pelo fato de nem todos se confrotarem diretamente com o

capital.

Não obstante Gramsci designe esses setores como componentes das classes

subalternas, ele destaca que eles têm uma história desagregada e episódica:

É indubitável que, na atividade histórica destes grupos, existe uma tendência à unificação, ainda que em termos provisórios, mas esta tendência é continuamente rompida pela iniciativa dos grupos domintantes e, portanto, só pode ser demonstrada com o ciclo histórico encerrado, se este se encerra com sucesso. Os grupos subalternos sofrem sempre a iniciativa dos grupos dominantes, mesmo quando se rebelam e insurgem: só a vitória “permanente” rompe, e não imeditamente, a subordinação. Na realidade, mesmo quando parecem vitoriosos, os grupos subalternos estão apenas em estado de defesa, sob alerta (pode-se demonstrar esta verdade com a história da Revolução Francesa, pelo menos até 1830) (Gramsci, 2002, p. 135).

Não é muito difícil apreender alguns desses aspectos apontados nos atuais

movimentos populares latino-americanos que, como ressaltamos anteriormente, não são

constituídos exclusivamente pelo proletariado tradicional: lutas episódicas, tendência à

unificação, mas de forma mais provisória ou até mesmo pontual. Basta observar, por

exemplo, o movimento piquetero2 argentino dividido em mais de meia centena de

pequenas organizações e em constante processo de surgimento, fusão e/ou dissolução

(Carvalho, 2008).3 Outro exemplo são os sem-teto brasileiros, subdivididos também em

diversas organizações. Para citar algumas, destacamos o Movimento de Moradia do

Centro (MMC), o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e a União dos

Movimentos de Moradia (UMM). Talvez tão ou mais importante que isso, é observar

que ambos são compostos por subempregados ou desempregados, entretanto,

desenvolvem lutas distintas: enquanto os piqueteros lutam por trabalho, os sem-teto

lutam por moradia. Segundo Boito Jr.,

2 Embora exista a tradução em português – piqueteiro, aquele participa do piquete de greves –, optamos, propositalmente, por não adotá-la, pelo simples motivo de que não tem o mesmo significado político entre nós. 3 Agradeço a María Sol Martín por me chamar a atenção de que esta divisão só é pertinente quando se considera a organização territorial do “movimento” por bairros, pois, de fato, eles se organizam a partir de “coordenações” aglutinadoras de diversos “MTDs” (movimentos de trabalhadores desempregados), conforme o espectro político-ideológico aos quais estão filiados. Entretanto, mesmo quando se leva em consideração esta questão, detectamos que há um número elevado de organizações, embora nem todas com peso político considerável (Cavalcante, 2008).

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os desempregados e subempregados engrossaram também os movimentos dos sem-teto. Os trabalhadores sem-teto são pessoas empregadas com baixo salário ou desempregadas. No que respeita à situação de moradia, são inquilinos ameaçados de despejo, moradores de cortiço, moradores de favela e moradores de rua. O seu principal instrumento de luta é a ocupação de edifícios e de terrenos desabitados (2002, p. 36).

Modonesi, ao analisar a questão das classes subalternas em Gramsci,

compreende a dominação de classe como contraparte superestrutural da exploração:

[Gramsci] entiende la dominación como una relación de fuerzas en permanente conflicto y define a los dominados como subalternos, proponendo y esbozando su caracterización, caracterización de las que, de aquí en adelante, llamará sistemáticamente clases subalternas (o grupos subalternos) y que empieza a tomar forma, en estas primeras líneas, a partir de los siguientes distintivos: pluralidad, disgregación, carácter episódico de su actuar, débil tendencia hacia la unificación “a nível provisonial” (Modonesi, 2008, pp. 40-41).

Embora os movimentos populares tendam à unificação, mesmo provisória, as

classes dominantes procuram impedir que isto ocorra, pois representam riscos à própria

dominação. Mais do que isso, a atuação destes movimentos ocorre nos limites

“estabelecidos” pelas classes dirigentes – para usar uma expressão gramsciana – e só

podem ser ultrapassados quando as classes subalternas se tornarem “Estado”:

Sua história, portanto, está entrelaçada à da sociedade civil, é uma função “desagregada” e descontínua da história da sociedade civil e, por este caminho, da história dos Estados ou grupos de Estados. Portanto, deve-se estudar: 1) a formação objetiva dos grupos sociais subalternos, através do desenvolvimento e das transformações que se verificam no mundo da produção econômica, assim com sua difusão quantitativa e sua origem a partir de grupos sociais preexistentes, cuja mentalidade, ideologia e fins conservam por um certo tempo; 2) sua adesão ativa ou passiva às formações políticas dominantes, as tentativas de influir sobre os programas destas formações para impor reivindicações próprias e as conseqüências que tais tentativas têm na determinação de processos de decomposição e de renovamento ou de nova formação; 3) o nascimento de novos partidos dos grupos dominantes, para manter o consenso e o controle dos grupos sociais subalternos; 4) as formações próprias dos grupos subalternos para reivindicações de caráter restrito e parcial; 5) as novas formações que afirmam a autonomia dos grupos subalternos, mas nos velhos quadros; 6) as formações que afirmam a autonomia integral etc. (Gramsci, 2002, pp. 139-140).

Como se vê, o autor oferece algumas pistas teóricas importantes, quase um

roteiro de investigação. Todavia, apontamos anteriormente para a necessidade de refinar

teoricamente melhor os principais sujeitos que compõem os movimentos populares

latino-americanos, pertencentes às classes subalternas apontadas por Gramsci.

Arriscamos a dizer que uma parte importante não se confronta diretamente com o

capital, portanto, não é produtora direta de mais valor: são os pequenos proprietários de

terra (campesinato pobre), pequenos lojistas (ambulantes) e pequenos consumidores

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urbanos, que, em tese, não exploram força de trabalho ou são, no máximo, patrões de si

mesmos. Explicitemos um pouco melhor.

Estamos lidando, grosso modo, com “três” sujeitos que não se pode “fracioná-

los” sem correr riscos. Os sem-teto (Brasil) e os piqueteros (Argentina) compõem o que

podemos designar como o “subproletariado”, apoiando-nos nas contribuições de Singer

(1981).4 Já os sem-terra (Brasil) e os cocaleros (Bolívia) compõem o “semiproletariado”

rural.5 E, por fim, o operário industrial compõe o proletariado tradicional, de acordo

com Marx e Engels no Manifesto do partido comunista.

Desses três setores, a presente pesquisa se ocupará primordialmente dos “dois”

primeiros (“subproletariado” e “semiproletariado”) devido ao papel político-ideológico

desempenhado por estes no enfrentamento às políticas neoliberais nos anos 1990.

Ainda sobre esses sujeitos, algumas palavras: eles não são exatamente aquele

definido por Marx e Engels no Manifesto do partido comunista. Por um lado, pode ser

que também não acertamos na compreensão daquele compêndio pelo seu grau de

abstração ao tratar das classes sociais (burguesia e proletariado) e da luta de classes

(burguesia versus proletariado), especialmente no papel político atribuído ao

proletariado (tradicional) como a única classe verdadeiramente revolucionária. Mas, por

outro, ao acreditarmos que ele não desapareceu, os movimentos populares que se

apresentam como anti-sistêmicos – compostos predominantemente pelos

“subproleriado” e “semiproletariado” – desempenham um papel político-ideológico

importante no processo de transformação social, desde que aliados ao primeiro. Mesmo

assim, suas lutas têm limites.

4 Para Singer, os “subproletários” urbanos são os assalariados de baixa renda (“peões” da construção civil, bóias-frias etc.), autônomos de baixa renda (engraxates, vendedores de rua) e não-remunerados (pessoas que trabalham para os produtores simples de mercadoria). O que diferencia o proletariado do “subproletariado” é sua inserção mais ou menos regular no mercado de trabalho e nível salarial (Singer, 1981, pp. 128-133). Acrescentamos, por nossa conta, a falta de organização política e sindical, algo comum entre os trabalhadores “subproletarizados”. 5 Em termos conceituais, consideramos o campesinato pobre (sem-terra e cocaleros) como pertencente ao “semiproletariado” rural que “constitui, ao lado do proletariado propriamente dito, uma ampla força de trabalho a serviço do capital em seu processo de expansão” (Germer, 2002, p. 269). Um pouco mais adiante o autor afirma que o “semiproletariado” é constituído por produtores semi-autônomos, “pois a propriedade da terra de demais recursos produtivos que eventualmente possui, os obriga a recorrer ao trabalho assalariado, fora do seu pequeno estabelecimento, a fim de complementar a manutenção familiar. Assim, mais da metade deles [refere-se ao Brasil] não é proprietária da terra que trabalha, submetendo-se ao pagamento de renda em diversas formas, renda esta que caracteriza, não um aluguel ou renda capitalista, mas um excedente do produto do trabalhador, que ele transfere ao proprietário da terra” (Germer, 2002, p. 271).

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Os camponeses pobres – indígenas ou não –, ao reivindicarem uma melhor

distribuição de terras (a reforma agrária), no fundo, reivindicam meios de produção,

afinal, necessitam produzir para sobreviver. Organizados em cooperativas, produzem

para o “mercado”, que os submete à sua lógica. Em O 18 Brumário de Luis Bonaparte,

Marx (s/d, p. 224) afirma que “sobre diferentes formas de propriedade, sobre as

condições sociais de existência, ergue-se toda uma superestrutura de sentimentos,

ilusões, maneiras de pensar e concepções de vida distintas e particularmente

constituídas. A classe inteira os cria e os forma sobre a base de suas condições materiais

e das relações sociais correspondentes”. Em outras palavras: como lutar pelo socialismo

e, ao mesmo tempo, reivindicar meios de produção, mesmo sob controle dos

trabalhadores? Isto é contraditório? Ao conquistarem a propriedade (terra, “fábrica

ocupada”), mesmo organizada em cooperativas, e ao se submeterem às leis de mercado,

não passam a defendê-la e, com isso, “retroalimentam” algo que condenam sob o

capitalismo (a propriedade privada)?6

Há ainda outro aspecto a ser observado. Segundo Mouriaux, esses setores

populares organizam-se em torno dos movimentos de “urgência”,

em função da deterioração da situação de um grande número de assalariados, do aparecimento ou do reaparecimento da mendicância – porque o pauperismo do século XIX não é estranho ao que nós conhecemos –, o retorno dos sem-abrigo, dos desmunidos. As lutas de urgência se desenvolveram para dar abrigo, comida, restabelecer a eletricidade, porque quando se deixa de pagar a eletricidade ela é cortada. Portanto, são lutas para que as pessoas consigam sobreviver (Mouriaux, 2002, p. 155).

É possível propor, grosso modo, a seguinte ilação: se, de um lado, estabelecem

lutas de “urgência”, que dizem respeito à própria sobrevivência física de seus

componentes, de outro, o movimento proletário tradicional estabeleceu (e estabelece,

mesmo que em menor escala), lutas “estruturais” que, do ponto de vista imediato,

objetivam ultrapassar os limites da sobrevivência física de seus membros. Portanto, em

tese, a despeito das incursões conjunturais das classes dominantes sobre as organizações

operárias, setores do proletariado propuseram-se à superação do capitalismo.7 De modo

algum, sugerimos que as lutas proletárias tradicionais não tiveram também um viés

economicista ou imediatista. Resta-nos saber, entretanto, quais são as potencialidades

dos movimentos de “urgência” para ultrapassarem a luta pelas necessidades imediatas e

6 Em outro lugar, ao discutirmos a atuação política do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), sugerimos que o foco da luta seja o acampamento, pois, até ali não estão envolvidos com a “propriedade”, como nos assentamentos (Machado, 2o. sem. 2006/ 1o. sem. 2007).

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ingressarem em lutas por mudanças “estruturais”.8 Daí a importância de se estudar as

ideologias “inerentes” e “derivadas” presentes nos movimentos populares latino-

americanos mais importantes na atualidade.

Para discutir essas questões, apoiamo-nos, basicamente, em dois trabalhos:

Ideologia e protesto popular, de George Rudé (1982) e De l’idéologie, de Badiou &

Balmès (1976). Há outros autores que também contribuem e merecerão um tratamento

mais adequado à medida que esta pesquisa for avançando, como Christopher Hill

(1987), O mundo de ponta-cabeça: idéias radicais durante a revolução inglesa de

1640; Edmundo Moniz (1978), A guerra social de Canudos; Clovis Lugon (1976), A

República “comunista” cristã dos guaranis: 1610-1768; George Rudé (1998), La

multitud en la historia: los disturbios populares en Francia e Inglaterra 1730-1848.9

Trata-se de autores que se ocuparam teórica ou historicamente das classes

subalternas, mas a principal contribuição depreendida dessas elaborações é perceber que

o surgimento do proletariado “puro” não eliminou a sobrevivência de outras classes

subalternas.10 Ou seja: procuramos debater em que medida a luta pela repartição

igualitária dos meios de produção (terra, instrumentos de produção), típicas das classes

ligadas à pequena propriedade e à pequena produção, tem potencialidade anti-

capitalista, uma vez que, de um lado, estas classes se apresentam como defensoras do

socialismo e, de outro, o proletariado “tradicional” encontra-se em refluxo.

Assim, pretende-se estudar como a ideologia popular é atualizada pelos

movimentos populares no atual estágio de desenvolvimento do capitalismo latino-

americano, pois eles são impulsionados pela fusão de dois elementos essenciais dos

quais apenas um é próprio às classes populares,

sendo o outro imposto de cima por um processo de transmissão e adoção de fora. Destes, o primeiro é o que eu chamo de elemento “inerente”, tradicional, baseado na experiência direta, na tradição oral, na memória folclórica e não aprendido ouvindo-se sermões ou discursos ou lendo livros. Nessa fusão, o segundo elemento é o repertório de

7 Não podemos desconsiderar o papel do Estado burguês e a correlação de forças nesse processo. 8 Retomaremos esta discussão mais adiante. 9 Além desses, há outros autores que, em campos teóricos relativamente distintos, tratam do tema e são importantes por conta do resgate teórico ou histórico das lutas populares, como Ianni (1980), Jancsó (1996), Mattoso (1990), Ruy (1970) e Saes (1990). 10 Ainda sobre esses autores, pretendemos investigar se faz ou não sentido sustentar a permanência das “invariantes comunistas”, propostas por Badiou & Balmès (1976), presentes em algumas experiências históricas das classes subalternas – por exemplo: a “socialização” dos meios de produção em Belo Monte durante a Guerra de Canudos ou entre os Guaranis; ou as propostas de igualdade social dos alfaiates na revolta de 1798 – e “compará-las” – guardando as devidas diferenças históricas – com as dos movimentos populares objetos desta pesquisa. Mais adiante explicitamos sumariamente o que são as “invariantes comunistas”.

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idéias e crenças “derivadas” ou tomadas de empréstimo a outros, que, com freqüência, adquire a forma de um sistema mais estruturado de idéias, políticas ou religiosas, como os Direitos do Homem, Soberania Popular, Laissez-faire e os Direitos Sagrados de Propriedade, Nacionalismo, Socialismo ou várias versões da justificação pela Fé. Portanto, é importante observar duas coisas: não existe uma tabula rasa no lugar da mente, onde se possam inscrever novas idéias e onde não houvesse idéias antes (...); também não existe qualquer coisa como uma progressão automática das idéias “simples” para as mais sofisticadas. (...) Mas é igualmente importante compreender (...) que não há nenhuma Muralha da Babilônia dividindo os dois tipos de ideologia, de modo que não se pode descrever simplesmente a segunda como sendo “superior” ou de mais alto nível do que a primeira. Há, de fato, uma coincidência considerável entre elas. Por exemplo, entre as crenças “inerentes” de uma geração, e como parte de sua cultura básica, há muitas derivadas originalmente de outras crenças externas, por gerações anteriores [grifos no original] (Rudé, 1982, p. 25).

O autor chama a atenção de que não se trata apenas de receptividade, pois elas

estão em constante interação. Melhor ainda: “As idéias derivadas, ou mais

‘estruturadas’ [são], com freqüência, uma destilação mais sofisticada da experiência

popular e das crenças ‘inerentes’ do povo. Assim, não há, de fato, um tráfego numa só

direção, mas uma constante interação entre elas” (Rudé, 1982, p. 26).

A ideologia “inerente” tem um papel importante nas lutas populares: nos

movimentos camponeses (cocaleros e sem-terra), por exemplo, pode levá-los a lutar por

reforma agrária, já que a ideologia popular estabelece a crença do seu direito à terra; os

“subproletários” urbanos (piqueteros e sem-teto) podem ser motivados a lutar pelo

direito ao trabalho digno. Evidentemente que ela, por si mesma, não leva os

trabalhadores à revolução, mas incita-os “a greves, motins por alimentos, rebeliões

camponesas (...) e até mesmo a um estado de consciência da necessidade de mudança

radical (...)” (Rudé, 1982, p. 30).

Se por si mesma ela não leva à revolução, o passo seguinte só pode ser dado se

for suplementada pelos elementos “derivados”: as idéias políticas, filosóficas ou

religiosas que, em diferentes graus de sofisticação, são absorvidas pela cultura mais

especificamente popular (Rudé, 1982, p. 30).

De forma cuidadosa, o autor observa, a partir de levantes, rebeliões e motins do

século XVIII, que o processo de fusão de idéias “inerentes” e “derivadas” “ocorreu em

etapas e em diferentes níveis de sofisticação” (Rudé, 1982, pp. 30-31), mas não vamos

recuperá-los aqui. Entretanto, é importante ressaltar que, de um modo ou de outro,

essas noções “derivadas” se fundiam nas noções e crenças “inerentes”, e a nova ideologia popular tomou forma como um amálgama das duas. Não é surpresa que esse processo se tenha desenvolvido mais rapidamente nas cidades do que nas aldeias, e muito mais depressa em épocas de revolução (das quais a maioria dos meus exemplos

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foram extraídos) do que em tempos de calma social e política. Mas devemos ressaltar que, se a mistura resultante tomou uma forma militante e revolucionária, ou uma forma conservadora ou contra-revolucionária, isso dependeu menos da natureza dos recipientes, ou das crenças “inerentes” de que partiam, do que da natureza das crenças “derivadas”, complicadas pelas circunstâncias então predominantes (...). O que pretendo dizer é que há três fatores, e não apenas dois, a serem considerados: o elemento “inerente” que, como dissemos antes, era a base comum; o elemento “derivado”, ou externo, que só podia ser efetivamente absorvido se o terreno já estivesse preparado; e as circunstâncias e a experiência que, em última análise, determinavam a natureza da

combinação final [grifos nossos] (Rudé, 1982, pp. 32-33).

Daí a relevância das “circunstâncias e experiências históricas”: o elemento

“inerente” é a base comum sobre a qual se desenvolve o elemento “derivado” em que as

“circunstâncias e a experiência” concorrem como precipitadoras de processos

revolucionários. Dessa maneira, não basta que as classes populares sejam portadoras de

crenças “inerentes” ou “derivadas” se, sob determinadas circunstâncias revolucionárias,

não forem impulsionadas a avançarem em direção à transformação social. A

preocupação do autor em saber o quanto uma experiência revolucionária representa um

avanço na ideologia popular faz sentido.

Em maior ou menor medida, alguns movimentos populares nos anos 1990

imprimiram derrotas políticas importantes à implementação do projeto neoliberal. Se

levarmos em conta os três elementos que compõem a “ideologia popular”, esses

movimentos ampliaram suas bases de sustentação e empreenderam grandes

mobilizações sociais, a despeito de toda a ofensiva política, ideológica e repressiva dos

aparelhos policiais. Contra eles, ainda atuaram exemplarmente os grandes meios de

comunicação televisivos e impressos. Mesmo assim, vários setores populares foram

ganhos para as suas causas. Esses foram capazes politicamente de engendrar as próprias

circunstâncias que impulsionaram o crescimento de suas mobilizações, num momento

em que os governantes, sob a égide ideológica do “pensamento único”, afirmavam o fim

da luta de classes, dos movimentos sociais contestatórios, dos sindicatos, partidos etc.

Ao lado dos discursos conservadores, forte repressão policial aos que teimavam em

“fazer luta de classes”.

De posse dessas contribuições, agregamos outras que se referem, do ponto de

vista ideológico, ao que se poderia considerar “comum” às lutas das classes subalternas

contra as classes dominantes ao longo da história. Dito de outro modo: mais do que uma

elaboração teórica, trata-se da “prática” coletiva inerente às classes subalternas:

referimo-nos à produção em bases coletivistas. Os próprios Marx e Engels, no

Projeto de Pesquisa: Ideologias “inerentes” e “derivadas” dos atuais movimentos populares latino-americanos

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Manifesto do partido comunista, sugerem isso ao afirmarem que as concepções teóricas

dos comunistas “são apenas a expressão geral das condições reais de uma luta de classes

existente, de um movimento histórico que se desenvolve sob os nossos olhos. A

abolição das relações de propriedade que têm existido até hoje não é uma característica

peculiar e exclusiva do comunismo” (1988, p. 88).

É algo que também encontramos em José Carlos Mariátegui (1975), marxista

latino-americano do início do século XX, que, com originalidade, faz uma análise da

sociedade peruana de seu tempo ao se referir às lutas do campesinato indígena contra o

latifúndio e ver nele um aliado em potencial do proletariado industrial para a construção

do socialismo. Este camponês guardava a tradição do “comunismo incaico”, portanto,

pré-científico, mas o colocava disposto a lutar pelo “comunismo científico”, ao lado do

proletariado moderno.

Após a débâcle do “socialismo soviético”, em 1988, e a queda do Muro de

Berlim, em 1989, falar de “comunismo” parece algo extemporâneo; pesquisar sobre,

então, parece desproposital. Mas indicamos algo distinto: embora não defendam aquilo

que se convencionou chamar de “socialismo real”, os movimentos populares atuais, em

geral, defendem a igualdade social, práticas coletivas de produção e vêem no Estado um

inimigo de seus projetos socializadores.11 Trata-se, para alguns autores, de uma

aspiração universal das classes subalternas, de um “programa comunista universal”

composto por aquelas “invariantes”. Entretanto, estas formulações ideológicas são

constantemente regeneradas pelo processo de unificação das grandes revoltas populares,

em todos os tempos: “toutes les grandes révoltes de masse des classes exploitées

sucessives (esclaves, paysans, prolétaires) trouvent leur expression idéologique dans des

formulations égalitaires, antiproprietaires et anti-étatiques” (Badiou & Balmès, 1976, p.

66).12 Essas formulações não possuem um caráter de classe definido, mas sintetizam a

aspiração universal dos explorados a ultrapassarem todo o princípio da exploração e da

opressão. Elas nascem sobre o terreno da contradição entre as massas e o Estado.13

11 Para Badiou & Balmès (1976), as chamadas “invariantes comunistas” são compostas por três elementos ideológicos reivindicados ao longo da história pelas classes subalternas, portanto, têm um caráter de classe indefinido: idéias igualitárias, antiproprietárias e antiestatais. 12 As bandeiras de luta dos atuais movimentos sociais são exemplares. Stedile & Fernandes afirmam o seguinte sobre o MST: “Desde o começo sabíamos que não estávamos lutando contra um grileiro. Estávamos lutando contra uma classe, a dos latifundiários. Que não estávamos lutando apenas para aplicar o Estatuto da Terra, mas lutando contra um Estado burguês” (1999, pp. 35-36). 13 No original: “Les invariants communistes n’ont pas un caractère de classe défini: ils synthétisent l’aspiration universelle des exploités au renversement de tout principe d’exploitation et d’oppression. Ils

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11

É por isso que afirmamos, inicialmente, que os movimentos populares que

pesquisamos voltam suas lutas para o Estado e não diretamente para o capital. Este é

afetado indiretamente, ao ter a circulação da mercadoria bloqueada temporariamente, a

terra ocupada por sem-terra ou a fábrica ocupada por trabalhadores subempregados ou

desempregados. Mas as demandas por terra, crédito e trabalho são destinadas ao Estado

burguês. Isso coloca a luta de classes em outro patamar, pois estes mesmos movimentos,

a despeito de toda a mobilização social empreendida, vão até um determinado limite.

As “invariantes comunistas” se confrontam, no plano ideológico da luta de

classes, com as idéias antigas e, por isso mesmo, correm o risco de serem “apropriadas”

pelas classes opressoras do momento, mas que se apresentam como revolucionárias.

Caso isso ocorra, o seu conteúdo político e ideológico é “esvaziado” e passa a ter o

significado atribuído pela nova classe dominante: “Par exemple, la guerre des paysans

et son reflet ideológique de type communiste ouvrent la voie à l’égalitarisme abstrait de

la bourgeoisie ascedante” (Badiou & Balmès, 1976, p. 70). As “invariantes comunistas”

serviram inclusive para o triunfo da burguesia que as apresentava como suas bandeiras

também: a burguesia revolucionária francesa, em ascensão política, “incorporou” a

bandeira de luta dos camponeses pobres – a igualdade, principalmente econômica – ao

seu programa político, mas, uma vez no poder, transformou-a em direito formal –

“todos são iguais perante a lei”. A base material da igualdade foi, portanto, diluída no

aspecto legal da dominação de classe. A igualdade econômica passou à “igualdade

política”.

Teoricamente, problematizamos a questão nos seguintes termos: os sem-terra,

cocaleros, sem-teto e piqueteros se organizam, grosso modo, em bases horizontais,

defendem práticas coletivas de produção e direcionam suas reivindicações para o Estado

que, quando não consegue coptá-los, procura inviabilizar economicamente os resultados

de seus empreendimentos. Se estas “invariantes” compõem, ao longo da história, as

ideologias “inerentes” e/ou “derivadas” das classes subalternas, o proletariado moderno

se “reapropria” delas em sua luta pelo “comunismo científico”, como fez durante a

Comuna de Paris de 1871, cujos princípios norteadores da sociabilidade proposta eram a

igualdade social, a coletivização dos meios de produção e a construção de um semi-

Estado. Portanto, ao contrário das revoluções burguesas que, ao se apoiarem nas

naissent sur le terrain de la contradiction entre les masses et l’Etat” [grifos dos autores] (Badiou & Balmès, 1976, p. 67).

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ideologias “inerentes” e “derivadas” das classes populares, deram a elas um conteúdo

favorável aos seus interesses burgueses, o proletariado procurou concretizá-las. Por

outro lado, mesmo quando deixadas sob o protagonismo do “subproletariado” ou do

“semiproletariado”, suas bases são preservadas: basta observarmos como são

organizados os acampamentos dos sem-terra ou dos sem-teto ou os bairros populares

onde se organizam o movimento piquetero argentino – as decisões mais importantes são

tomadas por assembléia com a participação de todos os envolvidos; procura-se praticar

a igualdade de gênero, raça ou cor; os mandatos dos representantes são por delegação;

procura-se inviabilizar práticas burocratizadas e que levam à profissionalização dos

dirigentes, entre outras.

Antes de examinarmos os limites e contradições das lutas populares contra a

implantação das políticas neoliberais nos anos 1990, abordaremos de forma sumária os

significados mais gerais dessas políticas, uma vez que elas não são objeto desta

pesquisa, mas também não podemos desconsiderar os seus efeitos mais perversos sobre

as classes populares. Evidentemente que nem as formas e menos ainda os efeitos dessas

políticas ocorreram de maneira homogênea nos diversos países da região.

Em linhas gerais, os ideólogos neoliberais foram os críticos mais ferozes ao

chamado Welfare state, no caso dos países avançados, e ao nacional-populismo, no caso

dos países latino-americanos. O neoliberalismo, portanto, “ocorre como resultado da

crise do nacional-populismo e da derrota do socialismo” (Petras, 1998, p. 16). Seus

principais pontos são: “Estabilização (de preços e das contas nacionais); privatização

(dos meios de produção e das empresas estatais); liberalização (do comércio e dos

fluxos de capitais); desregulamentação (da atividade privada) e austeridade fiscal

(restrições aos gastos públicos). Tais políticas têm sido implementadas em diversos

graus e de várias formas na América Latina” [grifos nossos] (Petras, 1998, p. 18).

Para os zapatistas,

el neoliberalismo, en tanto estrategia del capitalismo, se caracteriza por la internacionalización de una política económica basada en la explotación extrema del ser humano. Dicha explotación se lleva a cabo principalmente, por empresas transnacionales y por el control del sistema financiero internacional a través de los organismos internacionales tales como el Fondo Monetario Internacional y el Banco Mundial. (...) A nivel mundial la implantación de la política neoliberal ha consistido en la desregulación del trabajo, la pérdida del poder adquisitivo de los salarios de los trabajadores, el aumento del desempleo y una consecuente pobreza (EZLN, 1996, p. 93).

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13

A questão que se coloca, portanto, é o modo pelo qual esse regime acumula

capital e, em conseqüência, as mudanças provocadas na estrutura de classes. Em relação

ao primeiro tema, Chesnais afirma que

esse modo baseia-se nas transformações da “relação salarial” e em um agravamento muito forte da taxa de exploração (níveis de salário, duração dos contratos, “flexibilidade” da contratação e condições de trabalho nas empresas). Mas seu funcionamento é ordenado sobretudo pelas operações e pelas escolhas de formas de capital financeiro mais concentradas e mais centralizadas do que em qualquer período anterior de capitalismo (Chesnais, 1997, p. 21).

Além disso, as políticas neoliberais favorecem prioritariamente três setores ou

complexos industriais,

fortemente imbricados, [que] ocupam aí uma posição central por razões relativas ao caráter decisivo da “informação” e do “marketing” na concorrência capitalista mundializada e, simultaneamente, à projeção planetária da ideologia da qual depende o enraizamento de “hábitos” indispensáveis à estabilidade mínima desse regime de acumulação globalizada. São o setor financeiro, o complexo de indústrias situadas na conexão da informática e das telecomunicações e, enfim, as conhecidas como de “comunicação” e de cultura mercantilizada (a “multimídia”) (Chesnais, 1997, p. 21).

Esse processo de acumulação capitalista baseado no capital financeiro, nada

mais é do que sua valorização sob a forma de dinheiro e se deve graças “à longa fase de

acumulação ininterrupta dos ‘gloriosos trinta’ (uma, se não a mais longa de toda a

história do capitalismo)” (1997, p. 24).

Em relação ao impacto na estrutura de classes há vários estudos sobre isso, mas

optamos por nos remeter ao exposto por Petras:

A política neoliberal é o resultado da ascensão de uma nova classe de capitalistas transnacionais latino-americanos que possuem enormes investimentos e contas bancárias nos Estados Unidos e Europa, e que são proprietários de indústrias exportadoras e de bancos ligados aos circuitos internacionais. Esses grupos controlam e determinam a estratégia externa que os intelectuais e dirigentes definem como sendo “a única alternativa”. Tal classe surgiu da economia mista, protegida e financiada com recursos públicos durante as décadas de 1950 e 1960. (...) O capital local ou nacional foi espremido pelas importações baratas, ou compensado pela mão-de-obra barata (redução salarial e legislação social) ou pela desregulamentação que permitiu a “informalização” do trabalho, empregando mão-de-obra sem quaisquer benefícios sociais (Petras, 1998, p. 31).

Para o que nos interessa mais de perto, o autor afirma que

o impacto dos livres mercados sobre o trabalho assalariado polarizou a força de trabalho em um sistema de três camadas. Os técnicos qualificados, assalariados, profissionais liberais, pesquisadores, gerentes, advogados, ligados às empresas e bancos multinacionais e fundações estrangeiras enriqueceram. Esses segmentos da força de trabalho capazes de se conectar à extremidade superior dos circuitos financeiros e

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14

comerciais externos tornaram-se os mais fortes defensores dos regimes neoliberais, especialmente da sua variante eleitoral civil. Abaixo, encontra-se uma gama estável de funcionários públicos e privados e de operários, a maioria dos quais tem uma mobilidade descendente, com padrões de vida em declínio e serviços sociais deteriorados. Explorados no trabalho, incluem-se aí o grande número de professores mal remunerados, funcionários da área da saúde pública, bem como aqueles empregados das grandes indústrias. São categorias que estão encolhendo, à medida que um número cada vez maior de seus membros é transformado em trabalhadores temporários, com empregos rotativos ou sazonais. Na base, está o setor da força de trabalho mais numeroso e que mais rápido cresce, onde se incluem os trabalhadores da economia informal, sem emprego fixo ou quaisquer benefícios sociais, fazendo qualquer “bico” por menos de um salário mínimo, ou “autônomos”: um número cada vez maior de trabalhadores rotativos na indústria têxtil e em outras fábricas de bens de consumo; trabalhadoras que realizam trabalhos “caseiros”, “facções”; uma multidão de agricultores e pescadores safreiros, e de outros empregados da área extrativista vegeal; operários temporários mal remunerados no setor da construção civil e dos serviços domésticos. (...) Bem abaixo de toda a estrutura social encontra-se o crescente exército de lumpemproletários engajados em atividades ilegais como o tráfico de entorpecentes, contrabando, assassinatos e assaltos. O crime está fugindo ao controle nas principais cidades latino-americanas com o advento das políticas do livre mercado (Petras, 1998, p. 32).

O avanço da hegemonia neoliberal na América Latina não eliminou as

resistências populares. Ao contrário, as classes populares se mobilizaram em diversos

recantos do subcontinente, ora com mais força, ora com menos, mas procuraram resistir

à espoliação do capital sob a roupagem financeira. O pano de fundo dessas resistências

foi a demanda por uma melhor distribuição da riqueza socialmente produzida e pela não

perda de direitos sociais historicamente conquistados.

I.2. Limites e contradições das lutas anti-sistêmicas

Para colocarmos em relevo a atuação político-ideológica dos movimentos

populares, é preciso ter em conta que lutaram sob o efeito do refluxo do proletariado

tradicional, como dissemos anteriormente. Recai sobre aqueles movimentos (sem-terra,

piqueteros, cocaleros, sem-teto) toda a carga ou fúria repressiva do Estado capitalista,

uma vez que são os principais sujeitos que procuraram (ou procuram) impedir que o

neoliberalismo avançasse (ou avence) plenamente nesta parte do globo. Mais uma vez,

queremos apenas destacar o papel político-ideológico do proletariado “tradicional” ao

longo do século XX, o que não significa que atuou com homogeneidade, mas, em seu

nome foram feitas revoluções, levantes, insurreições, greves gerais e marchas; partidos e

sindicatos de massa foram organizados e, contra seu avanço, golpes de Estado foram

Projeto de Pesquisa: Ideologias “inerentes” e “derivadas” dos atuais movimentos populares latino-americanos

15

dados. Já as lutas atuais também têm marcas dramáticas: ocupações de terras, fábricas,

levantes, motins, bloqueios de vias públicas, massacres e prisões.14

Quando comparamos a atuação política do proletariado “tradicional”,

“subproletariado” e “semiproletariado”, do ponto de vista teórico e sob certo grau de

abstração, deparamo-nos com o seguinte paradoxo: o proletariado “tradicional” não

espera por uma reapropriação individual de parte da fábrica e da maquinaria, mas aspira

a uma igualdade de consumidor para que todos tenham acesso à riqueza socialmente

produzida, já que está integrado a um processo de trabalho altamente socializado. Trata-

se de uma consciência pré-revolucionária. Já o “subproletariado”, mas principalmente o

“semiproletariado”, luta pela repartição igualitária dos meios de produção (instrumentos

de produção, terra), algo próprio das classes ligadas à pequena propriedade e à pequena

produção.15

Algumas contribuições teóricas de Mariátegui (1975) poderão ajudar nestas

reflexões, ao considerar, por exemplo, que o proletariado tradicional, sujeito do

“comunismo científico”, deve ter como aliado o campesinato indígena.

Com base na realidade peruana de seu tempo, ele sugere que o camponês

indígena tem um papel importantíssimo contra a expansão do latifúndio e, não só,

conserva elementos do “comunismo incaico”, cujo regime preserva a socialização dos

meios de produção.16 Estas questões não estão imunes a alguns problemas: boa parte

dos principais sujeitos que se opuseram (e se opõem) à implantação do neoliberalismo

na América Latina, encontra-se “fora” do núcleo “duro” das relações capitalistas de

produção – o campesinato pobre – ou não tem força política suficiente para confrontá-

lo, como é o caso do “subproleteriado”. Qual é, então, o alcance de suas lutas, já que

não podem paralisar o capital, ou seja, a produção de mais valor?

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), ao empunhar a

bandeira da reforma agrária, reivindica distribuição de terra sob o controle dos

trabalhadores sem-terra. Isto é, reivindica meios de produção na medida em que sua

14 Essas mesmas questões recebem outro tratamento teórico e político em Alain Badiou (2000, p. 17): depois de afirmar que o que está em crise é a idéia de uma subordinação política ao Estado por meio dos partidos e que a idéia da revolução pertence ao século XIX, descarta a organização partidária, mas defende que os movimentos não devem abominar todo e qualquer tipo de organização. Para ele, o que está em voga é a política não partidária, ou seja, a prática política não subordinada ao Estado. 15 A inspiração teórica está em Saes (1998, pp. 145-172) e em Badiou & Balmès (1976). 16 Mariátegui não reduz o “comunismo científico”, típico da sociedade industrial, ao “incaico”, próprio das tradições indígenas.

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16

base social “necessita” deles para sobreviver. Como parte da luta pelo acesso à terra, o

movimento promove ocupações de latifúndios onde, em geral, participam milhares de

famílias sem-terra. Uma vez conquistada, inicia-se outro processo, o de produzir no

assentamento que, muitas vezes, se “descola” dos embates políticos iniciais

(acampamentos, marchas, ocupações de prédios públicos etc.) com o Estado burguês.

Não raro, estes embates chegam a ser físicos.17

Ora, a despeito de sabermos que o MST não tem força política para enfrentar a

sua situação de classe pauperizada a não ser reivindicando terra para sobreviver, este

acaba sendo um fator limitador da sua luta política e ideológica. Aquilo que serve como

motor de organização do proletariado em classe – o questionamento jurídico-político da

concentração da propriedade privada dos meios de produção em pouquíssimas mãos –

perde força política quando se torna assentado, pois é obrigado a produzir para o

“mercado” e, além disso, demonstrar a viabilidade econômica de suas cooperativas. Por

uma questão de princípio, os sem-terra defendem a propriedade coletiva sob controle

dos trabalhadores, mas, por outro lado, estão presos à lógica perversa do “mercado”.18 O

Estado burguês, por sua vez, procura inviabilizá-los de várias formas, sendo a mais

comum ao dificultar a liberação de créditos para o plantio e cultivo.19

Muito provavelmente estas observações servem para os cocaleros, a despeito das

especificidades políticas, econômicas e sociais da Bolívia e dos efeitos do

neoliberalismo naquela formação social. Trata-se também do campesinato pobre, ligado

à pequena propriedade rural e à pequena produção, mas que acrescenta à demanda por

terra a questão étnica. Embora parta de uma perspectiva teórica diferente da adotada

aqui, Urquidi assinala que “a caracterização mais justa dos cocaleiros talvez seja a da

heterogeneidade que entrecruza as experiências particulares de seus membros e a da

oposição sistemática que exerceu contra o governo, na sua posição de setor mais

organizado do campesinato” (2007, p. 198). E, um pouco mais adianta, acrescenta:

A base do movimento cocaleiro está no tripé do horizonte quíchua, os traços

17 Esta discussão está melhor sistematizada em um artigo publicado na revista ponto-e-vírgula, cujo título é MST: dilemas políticos e ideológicos do acesso à terra (Machado, 1º. semestre 2007, pp. 139-153). 18 Sabemos que os preços praticados pelo “livre” mercado são ditados pelos oligopólios e monopólios que dele participam. Isto sem falar que muitos produtos agrícolas, por exemplo, são commodities, determinados em bolsas de valores. 19 Um dos mecanismos mais “eficientes” do Estado burguês para isso é exercido pelo INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), que adota um modelo de reforma agrária voltado para a propriedade familiar. O MST, por sua vez, tem como princípio básico o estímulo à cooperação e ao trabalho coletivo da terra.

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17

comunitários e a disciplina sindical. Misturam-se as formas de organizativas e as estratégias de confrontação próprias dos setores avançados da classe proletária, com a demanda de terra, autonomia cultural e respeito aos valores tradicionais das comunidades indígenas. Aos métodos de insurgência do operariado mineiro juntam-se os da mobilização indígena, ocupando território em bloqueios de estradas e avançando e sitiando cidades (Urquidi, 2007, pp. 199-200).20

Diferentemente dos sem-terra e dos cocaleros, os sem-teto não enfrentam o

problema da produção para o mercado, mas suas questões passam pelas relações

capitalistas de produção, pois

à medida que se acumula capital, a situação do trabalhador, qualquer que seja seu pagamento, alto ou baixo, tem de piorar. (...) A acumulação da riqueza num pólo é, portanto, ao mesmo tempo, a acumulação de miséria, tormento de trabalho, escravidão, ignorância, brutalização e degradação moral no pólo oposto, isto é, do lado da classe que produz seu próprio produto como capital (Marx, 1985, p. 210).

Um pouco mais adiante, Marx se refere ao problema da habitação dos

trabalhadores:

Qualquer observador isento percebe que, quanto mais maciça a centralização dos meios de produção, tanto maior a conseqüente aglomeração de trabalhadores no mesmo espaço; que, portanto, quanto mais rápida a acumulação capitalista, tanto mais miserável a situação habitacional dos trabalhadores. As “melhorias” (improvements) das cidades, que acompanham o progresso da riqueza, mediante demolição de quarteirões mal construídos, construção de palácios para bancos, casas comerciais etc., ampliação de ruas para o tráfego comercial e de carruagens de luxo, introdução de linhas de bondes puxados por cavalos etc., expulsam evidentemente os pobres para refúgios cada vez piores e mais densamente preenchidos. Por outro lado, todos sabem que o preço alto das moradias está na razão inversa de sua qualidade e que as minas de miséria são exploradas por especuladores imobiliários com mais lucros e menos custos do que jamais o foram as minas de Potosí. O caráter antagônico da acumulação capitalista, e protanto das próprias relações capitalistas de propriedade, torna-se aqui tão palpável que mesmo os relatórios ingleses oficiais sobre esse assunto pululam de invectivas nada ortodoxas contra a “propriedade e seus direitos” (Marx, 1985, pp. 219-220).

Muito provavelmente este quadro tenha mais a ver com a realidade londrina do

século XIX que com a da capital paulista do século XXI, mas é também provável que

muitas coisas permanecem próximas. Ou, como afirma Benoit,

hoje, com a economia mundial globalizada, mais de metade da população mundial mora em submoradias. Famílias inteiras de quatro, cinco ou mais pessoas amontoam-se em casas de um ou dois cômodos, sem higiene e sem privacidade. Barracos e casas precárias, favelas e cortiços, quando nas as próprias ruas, foi a solução capitalista para a habitação da classe trabalhadora. (...) Portanto, parece pouco provável que o capitalismo

20 Em nota de rodapé, Urquidi (2007, p. 200) assinala que uma das principais características do movimento cocalero são “as caminhadas à sede do governo departamental ou nacional, conseguindo no percurso a filiação e o apoio das populações e cidades por onde passam. Uma característica de impacto da mobilização contemporânea foi organizar as caminhadas junto, ou exclusivamente, com cocaleras e seus filhos. Dessa forma, a ação da repressão torna-se mais difícil”.

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18

vá algum dia resolver o problema da moradia popular. Na verdade, a moradia é um problema estrutural do movo de produção capitalista (Benoit, 2000, p. 158).

Da mesma forma que se deve lutar pelo direito ao trabalho (ainda que alienado)

e a um salário (ainda que reduzido) como necessidades mínimas à sobrevivência, “a luta

pela moradia (junto com aquelas do direito ao trabalho e da defesa do salário) ao mesmo

tempo que é uma luta imediata e mínima da classe trabalhadora, é também uma

reivindicação transitória para além do capitalismo, pois jamais será satisfeita nem

mesmo parcialmente pelo modo de produção capitalista” [grifos no original] (Benoit,

2000, p. 159). No transcurso dessas lutas, há uma tendência, dentro de alguns

movimentos populares, de procurar limitar a reivindicação por moradia ao regime de

propriedade capitalista, ou seja, de transformar os trabalhadores em proprietários. Por

outro lado, há movimentos que combatem essa tendência pequeno-burguesa, como o

MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) e o MMC (Movimento de Moradia

no Centro).

Igualmente ocorre com os sem-terra o risco de tranformá-los em pequenos

proprietários rurais, os sem-teto não estão isentos do problema de passarem a ser

proprietários urbanos. Daí o desafio desses movimentos em mudar os valores dos

sujeitos envolvidos nessa luta. Por outro lado, os obstáculos com os quais se deparam

podem exercer um papel pedagógico importante:

[os sem-teto] são movimentos que lutam por um objetivo que colide com a política neoliberal e, são, potencialmente, movimentos transformadores, pois têm como obstáculo para a realização de seus interesses a urbanização capitalista excludente das metrópoles brasileiras. Os inimigos dos movimentos dos sem-teto são os grandes proprietários e rentistas do solo urbano e a reivindicação pela qual lutam aponta para a necessidade de uma ampla reforma urbana que mexeria com grandes interesses do capitalismo brasileiro (Boito Jr., 2002, p. 37).

Resta-nos saber, evidentemente, se as “ideologias populares” impulsionadoras

de suas lutas, no caso, a moradia, são também capazes de fazer brotar em suas

consciências valores socialistas e não pequeno-burgueses de apego à propriedade.

De modo parecido com os sem-terra, os piqueteros se deparam com o problema

da produção para o mercado ao reivindicarem, em geral, a formação de cooperativas de

produção sob direção democrática e controle dos trabalhadores cooperados. E para a

formação delas, o Estado é o alvo principal, pois passam a depender de subsídios

estatais para a construção dos seus empreendimentos populares (padarias, serralherias,

Projeto de Pesquisa: Ideologias “inerentes” e “derivadas” dos atuais movimentos populares latino-americanos

19

marcenarias, olarias etc.).21 O que não quer dizer que, indiretamente, o capital não seja

atingido, não só pela disputa por fundos públicos, mas também quando bloqueiam as

vias de acesso e dificultam a circulação das mercadorias, por meio dos chamados cortes

de ruta. É o momento quando assumem o controle parcial e temporário dos locais de

circulação do capital. Se não podem paralisar a produção do capital, dificultam

momentaneamente a sua circulação. Mas o dilema não se diferencia do dos sem-terra:

organizam a produção em bases socializadas, mas se submetem à lógica do mercado

capitalista.

II. Hipóteses

De certa maneira, as hipóteses que norteiam esta pesquisa estão presentes na

fundamentação teórica, mas as retomamos novamente para torná-las mais claras.

Propomos, nesta investigação, levantar dois campos hipotéticos de investigação,

dada a natureza político-ideológica dos movimentos populares latino-americanos: o

primeiro diz respeito ao “subproletariado” (sem-teto e piqueteros) e o segundo ao

“semiproletariado” (sem-terra e cocaleros). E, claro, como afirmamos acima,

buscaremos estabelecer, na medida do possível, pontos ideológicos (“inerentes” e

“derivados”) de contato entre ambos, a despeito de suas “diferenças”.

Em relação à atuação do “subproletariado”, levantamos a seguinte hipótese:

mesmo quando pautam suas lutas pelo direito ao trabalho digno ou genuíno (ideologia

“inerente”), avançam muito pouco em direção ao questionamento das relações

capitalistas de produção. Ou seja, será que os elementos centrais das relações

capitalistas de produção (exploração da força de trabalho por meio da extorsão de

sobretrabalho) estão presentes em suas bandeiras? Decorrente dessa questão, é possível

lançar uma hipótese secundária: se se confirma que não estão inseridos, podemos

deduzir que se deve ao fato de estarem afastados do movimento proletário tradicional,

algo que poderá ser verificado a partir da existência ou não de lutas conjuntas e

respectivas bandeiras em comum.

21 Lembramos que uma parte dos operários desempregados argentinos direcionou suas lutas pela “recuperação” de fábricas falidas, em geral, onde eram empregados antes da crise dos anos 2000. Uma das mais conhecidas é a FASINPAT (Fábrica Sem Patrão), fábrica de cerâmica, localizada em Neuquén, até hoje sob controle operário, mas que enfrenta judicialmente, como todas as demais, problemas de reintegração de posse, movidos pelos antigos proprietários. A luta dos ceramistas é pela expropriação estatal e controle dos trabalhadores.

Projeto de Pesquisa: Ideologias “inerentes” e “derivadas” dos atuais movimentos populares latino-americanos

20

Outra hipótese também pautada nas ideologias “inerentes” e “derivadas” diz

respeito à condição de classe: os sem-teto, por exemplo, organizam-se a partir de uma

demanda “extra” à exploração do capital. Dito de outro modo: mesmo que muitos sejam

trabalhadores subempregados ou desempregados, a luta principal é por moradia e não

necessariamente pela melhoria da condição de trabalho ou, em última instância, pelo

retorno à situação formal de trabalho com as garantias previstas na legislação social e

trabalhista (ou, se quisermos, pela recuperação dos direitos sociais e trabalhistas

suprimidos). Da mesma forma que a anterior, essas questões passam pela verificação da

existência ou não de lutas em conjunto com o proletariado mais tradicional, mesmo que

ocupe uma posição secundária.

Sobre as lutas do “semiproletariado”, as hipóteses têm inspiração principalmente

em Mariátegui, ao investigar, entre outras questões, os problemas da terra que envolvem

o campesinato indígena peruano: os índios, espoliados pelo latifúndio, podiam ser fortes

aliados do proletariado moderno (industrial) na luta pelo socialismo, pois, guardavam,

em suas tradições, características do “comunismo incaico”.

Das contribuições oferecidas por Mariátegui, depreendemos algumas que nos

parecem atuais para pensarmos os movimentos camponeses (sem-terra e cocaleros):

1. A estrutura fundiária na América Latina permanece concentrada em poucas

mãos, daí a urgência do combate aos latifúndios. Em que medida a luta

contra os latifúndios, protagonizada pelo campesinato pobre, pode se

transformar numa luta pelo socialismo, uma vez que seu protagonista está

ligado à pequena propriedade?

2. Os camponeses indígenas conservam elementos do “comunismo incaico”

(ideologia “inerente”) que não estão presentes nas sociedades divididas em

classes sociais antagônicas; ao mesmo tempo, por conta de suas condições

socioeconômicas, vêem-se obrigados a lutar pela distribuição de terras entre

os pequenos agricultores. Se não se confrontam diretamente com o capital,

como podem chegar ao “comunismo moderno”, típico do proletariado

industrial?

3. O proletariado industrial é o principal sujeito do “comunismo moderno”

defendido por Marx, cujos elementos sociais, políticos e ideológicos não são

exatamente os mesmos do “comunismo incaico”, nem poderiam sê-los. Que

Projeto de Pesquisa: Ideologias “inerentes” e “derivadas” dos atuais movimentos populares latino-americanos

21

potencialidade este sujeito tem para lutar pelo “comunismo moderno”, uma

vez que se encontra em refluxo?

Para justificar a relevância das hipóteses em torno dos limites e contradições dos

movimentos populares, adicionamos a seguinte constatação: é sintomático que nenhuma

das insurreições, rebeliões ou levantes organizados principalmente por estes

movimentos latino-americano, mesmo os que resultaram na derrubada de governos – De

La Rúa, na Argentina, em 2001; Carlos Mesa, na Bolívia, em 2005; Abdalá Bucaram,

1997, e Jamil Mahuad, em 2000, ambos do Equador –, transitou para o socialismo, seja

lá qual for o entendimento que se tenha desse regime.

Novamente, deparamo-nos com questões complexas e difíceis de responder.

Pretendemos, apenas, problematizar, teórica e politicamente, os limites dos movimentos

populares quando comparados com as potencialidades do sujeito que se confronta

diretamente com o capital, o proletariado tradicional, levando-se em conta o atual

estágio de desenvolvimento do capitalismo latino-americano.

III. Justificativa

As preocupações intelectuais e acadêmicas em torno da organização política e

ideológica das classes populares não são novas, principalmente se levarmos em conta

que não se trata apenas de uma temática própria do marxismo. Weber mesmo

demonstrou interesse intelectual, ao estudar, em 1892, os conflitos dos operários

agrícolas na Alemanha ao leste do Elba (Tragtenberg, 1985, p. 108).

Do ponto de vista mais imediato, os próprios acontecimentos que fizeram (e

fazem) parte da paisagem política, ideológica e social da América Latina, dos anos 1990

e 2000, merecem uma investigação mais sistematizada. Trata-se de um cenário

freqüente de insurreições, rebeliões, motins, ocupações (fábricas e terras), marchas

nacionais, bloqueios de estradas e pontes etc., cujos principais sujeitos compõem os

movimentos populares (urbanos e rurais).

Em países dependentes como os nossos, as políticas neoliberais se mostraram

mais favoráveis à acumulação do capital e desfavoráveis às classes subalternas. Desse

modo, o cenário político da América Latina se viu marcado por vários tipos de tensões

sociais e políticas. Senão, vejamos.

Projeto de Pesquisa: Ideologias “inerentes” e “derivadas” dos atuais movimentos populares latino-americanos

22

Na Argentina, o projeto neoliberal toma verdadeiro impulso a partir das duas

eleições consecutivas de Carlos Saúl Menem, do partido peronista. Este é um fato da

maior relevância, pois até mesmo o peronismo acabou se rendendo ao neoliberalismo.

Os resultados da política econômica do governo Menem não demoraram a aparecer:22

referimo-nos às altas taxas de desemprego. Diante de um quadro econômico sobremodo

desfavorável a amplas camadas populares, o território argentino foi cenário de grandes

manifestações ou rebeliões populares, conhecidas como puebladas.23 O ápice das

manifestações populares que tomaram conta da capital, em dezembro de 2001, foi o

refrão ecoado pela multidão na Plaza de Mayo, sede do governo federal: ¡Qué se vayan

todos! ¡Que no quede ni uno solo! E, De La Rúa se foi, levando consigo Cavallo.

No Brasil, com as eleições de Collor de Mello (1989) e de Cardoso (1994), o

projeto neoliberal foi recepcionado por um movimento social relativamente recente, o

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) que se destacou no cenário

nacional como principal opositor à implantação das políticas liberalizantes. Sua

principal bandeira é a reforma agrária e a arma de luta são as ocupações de terras

improdutivas.

No México, o neoliberalismo ganha força com o governo de Miguel De La

Madri (1982-1988) e, em seguida, Carlos Salinas de Gortari (1988-1994), ao assinar o

Tratado de Livre Comércio com os Estados Unidos, deixando claro o engajamento do

país aos propósitos neoliberais. A resistência popular foi imediata: o Exército Zapatista

de Libertação Nacional (EZLN), de armas nas mãos, tomou 38 municípios no primeiro

dia de vigência do acordo (01/01/1994).

Em relação ao Equador, em 1986 os índios equatorianos fundaram a

Confederación de Nacionalidades Indígenas del Ecuador (CONAIE) e, quatro anos

22 O processo de concentração e centralização do capital no país chega a estarrecer. Segundo Ferrer, no faturamento total das primeiras 500 empresas industriais, as filiais estrangeiras aumentaram sua participação de 33,6% a 51% entre 1990 e 1995. Por sua vez, o setor bancário internacional foi um dos maiores beneficiados no governo Menem: 40% do sistema passaram a ser controlado por bancos estrangeiros que representam o dobro da praticada no Chile e México e quatro vezes maior em relação ao Brasil (Ferrer, 2001, pp. 93-94). Além dos banqueiros, o capital externo foi amplamente contemplado no setor petrolífero com a privatização da YPF (Yacimientos Petrolíferos Fiscales): a Repsol, empresa espanhola, controla 51% da produção de petróleo, 45,7% do gás e 2.350 estações de serviço que comercializam mais de 50% de combustíveis (Fuchs & Vélez, 2001, p. 191). 23 A mais conhecida de todas, ocorrida nos dias 19 e 20 de dezembro de 2001, sintetiza e exemplifica os resultados de uma década de neoliberalismo e de manifestações populares: trata-se das puebladas de Santiago del Estero, Cutral Co, Plaza Huincul, Tartagal, General Mosconi etc. Nelas foi forjado o principal instrumento de luta dos desempregados argentinos: o piquete, com bloqueios de rodovias, estradas, ruas e pontes.

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depois, em 1990, ocorre o primeiro levante popular: milhares de índios paralisaram as

estradas e acessos às principais cidades do país, exigindo do governo a solução para os

conflitos de terras. Em 1997, um novo levante indígena destitui o presidente Abdalá

Bucaram e, em 2000, depõem Jamil Mahuad. Em 2002, vence o coronel Lucio

Gutiérrez, apoiado pela CONAIE e outros movimentos sociais, mas renuncia em 2005

sob fortes protestos populares. Mais recentemente, a três de março de 2008, o atual

presidente Rafael Correa teve seu território violado pela Colômbia, que executou alguns

guerrilheiros das FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) juntamente

com civis, entre eles, estudantes mexicanos. A Colômbia, por sua vez, vive sob uma

guerra civil que se arrasta por mais de 40 anos, sem previsão de seu desfecho. De um

lado, as FARC-EP (Exército Popular) lutando em nome do socialismo e “controlando”

quase metade do território daquele país; de outro, estão o governo, os latifundiários, os

“paramilitares” e, como sempre, a CIA norte-americana.

Não é muito difícil detectar a sua presença em outras partes desse tão subjugado

continente: na Venezuela, a CIA forjou todos os meios disponíveis para destituir o

governo eleito de Hugo Chávez. Mesmo tendo sido sufragado pelo voto em pelo menos

duas oportunidades – nas eleições de 1998 e no plebiscito de agosto de 2004, que o

confirmou na presidência do país –, os Estados Unidos não param de acusá-lo de ditador

e aliado de Cuba. Quer dizer, seguem apostando na desestabilidade política do país.

E, por fim, uma palavra sobre a Bolívia: o movimento cocalero reúne mais de

500 sindicatos da região de Cochabamba, repartido em seis federações, dirigida, desde

1990, por um Comitê Coordenador, cuja presidência foi exercida por Evo Morales por

cinco mandatos consecutivos. Diante das investidas dos Estados Unidos de erradicar o

plantio da folha de coca no país, com o argumento de que alimenta o narcotráfico

internacional, observa-se pontos de confronto político dos cocaleros, reunidos naquelas

federações, e os governos que davam guarida à política norte-americana. O auge dos

confrontos entre os camponeses e o governo ocasionou a derrubada do então presidente

Gonzalo Sanches de Lozada, em 2003. Atualmente seu futuro político imediato parece

incerto, pois as oligarquias do rico departamento de Santa Cruz de la Sierra não

aceitaram a eleição, em 2005, de Evo Morales, líder camponês e indígena, do

Movimiento al Socialismo (MAS), e promovem uma ação separatista, denominada

“referendo da autonomia”, uma iniciativa ilegal, contrária à Constituição e à unidade

Projeto de Pesquisa: Ideologias “inerentes” e “derivadas” dos atuais movimentos populares latino-americanos

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territorial. As oligarquias bolivianas, com apoio dos EUA, estão se armando para um

possível enfrentamento armado.

Pode-se dizer que, se na América Latina há uma difícil convivência entre

neoliberalismo e democracia, esta última tem vivido momentos de agruras, um

verdadeiro mal-estar democrático. Torna-se difícil, portanto, fazer qualquer prognóstico

sobre até quando a “democracia procedimental” sobreviverá entre nós.

IV. Objetivos

Em linhas gerais, objetivamos apreender o atual estágio de desenvolvimento da

luta de classes na América Latina a partir da implantação de políticas de mercado e, ao

mesmo tempo, perceber os efeitos dessas políticas sobre as classes populares e suas

formas de organização.

Em termos mais específicos, supondo que o proletariado tradicional recuou nos

anos 1990 nas suas lutas anti-sistêmicas, estudar os movimentos populares latino-

americanos (cocaleros, piqueteros, sem-terra e sem-teto), sua composição social,

organização política e objetivos pelos quais lutam, procurando compreender que

“reapropriação” fazem dos elementos “inerentes”, “derivados” e das “experiências e

circunstâncias históricas” da “ideologia popular”. Além disso, pesquisar, no plano

ideológico, se permanecem as chamadas “invariantes comunistas”: movimentos anti-

estatais, anti-propriedade privada e pela coletivização dos meios de produção.

V. Procedimentos metodológicos/métodos e técnicas

Os procedimentos metodológicos estão, praticamente, delineados na

fundamentação teórico-metodológica. Por isso mesmo, ocupar-nos-emos apenas das

técnicas e métodos adotados nesta pesquisa.

Como dissemos anteriormente, pesquisaremos primordialmente como os

elementos “inerentes” e “derivados” constitutivos da ideologia popular são forjados a

partir da composição social, formas de luta e objetivos políticos dos cocaleros, sem-

terra, piqueteros e sem-teto.

Para tanto, recorreremos prioritariamente ao farto material bibliográfico que a

temática oferece. Uma parte considerável das investigações pode ser realizada por meio

da Internet, onde nos deparamos com inúmeros periódicos eletrônicos, revistas

acadêmicas, sítios dos próprios movimentos populares, partidos políticos e centrais

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sindicais. Sobre esse ponto, ressaltamos uma fonte bibliográfica importante no que diz

respeito às pesquisas voltadas para os movimentos sociais, bem como às diversas

formas de resistência a elas: trata-se da biblioteca virtual

(http://www.clacso.org/wwwclacso/espanol/html/biblioteca/fbiblioteca.html) do Conselho Latino-

Americano de Ciências Sociais (CLACSO) que dispõe, atualmente, de mais de quatro

mil textos completos. Pretendemos, com isso, tomar conhecimento e sistematizar esse

riquíssimo material. Estes textos são produzidos, normalmente, por autores ligados a

centros de pesquisa e/ou faculdades de ciências sociais e áreas afins de diversos países:

Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Cuba, Equador, El Salvador,

Guatemala, México, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela. Por fim, o próprio CLACSO

tem publicado e divulgado livros e revistas no Brasil, algo que tem aumentado

substancialmente dos últimos anos para cá.

VI. Contribuições esperadas

1. Com a presente pesquisa, esperamos consolidar nosso grupo de estudos do

Estado e lutas sociais na América Latina;

2. Esperamos agregar ao projeto estudantes de graduação e pós-graduação em

Ciências Sociais, com o objetivo de fortalecer seus conhecimentos

acadêmicos e intelectuais;

3. Esperamos, também, divulgar os resultados obtidos durante esses anos de

estudo, bem como publicá-los em revistas especializadas dentro e fora da

UEL.

VII. Local de realização/órgãos envolvidos

O local para a realização desta pesquisa é a própria UEL.

VIII. Cronograma

Desenvolveremos este projeto de pesquisa tendo como meta 36 meses, divididos

em dois períodos:

1) 24 meses para o levantamento bibliográfico, leituras e sistematização dos

dados;

2) 12 meses para a redação (publicação de artigo).

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