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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOCE - UNIVALE FACULDADE DE DIREITO, CIÊNCIAS ADMINISTRATIVAS E ECONÔMICAS FADE GERALDO MAGELA DA COSTA RESPONSABILIDADE CIVIL NA ODONTOLOGIA: PROFISSÃO COM OBRIGAÇÃO DE MEIO OU DE RESULTADO? GOVERNADOR VALADARES 2009

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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOCE - UNIVALE FACULDADE DE DIREITO, CIÊNCIAS ADMINISTRATIVAS E ECONÔMICAS

FADE

GERALDO MAGELA DA COSTA

RESPONSABILIDADE CIVIL NA ODONTOLOGIA: PROFISSÃO COM OBRIGAÇÃO DE MEIO OU DE RESULTADO?

GOVERNADOR VALADARES2009

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GERALDO MAGELA DA COSTA

RESPONSABILIDADE CIVIL NA ODONTOLOGIA: PROFISSÃO COM OBRIGAÇÃO DE MEIO OU DE RESULTADO?

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Vale do Rio Doce, como requisito indispensável para obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador: Afrânio Hilel Terra

GOVERNADOR VALADARES2009

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GERALDO MAGELA DA COSTA

RESPONSABILIDADE CIVIL NA ODONTOLOGIA: PROFISSÃO COM OBRIGAÇÃO DE MEIO OU DE RESULTADO?

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Vale do Rio Doce, como requisito indispensável para obtenção do título de Bacharel em Direito.

Governador Valadares, ______ de __________________ de 2009.

Banca Examinadora:

Professor Afrânio Hilel TerraUniversidade Vale do Rio Doce

Professor

Professor

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente agradeço a Deus, que com seu amor incondicional, me sustentou até aqui.

Toda a honra e toda glória sejam dadas a Ele;

A minha família, que sempre foi meu esteio em todos os momentos, que me impulsionou para

mais esta conquista;

Aos amigos que conquistei ao longo desta graduação, que caminharam comigo lado a lado,

com sinceridade, me incentivando para alcançar esta vitória;

A todos os educadores que tive ao longo da minha graduação, pelo ensino consciente,

comprometido com a minha formação acadêmica;

A todas as pessoas que contribuíram direta ou indiretamente para o meu sucesso.

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Dedico esta vitória primeiramente a Deus,

pois, sem Ele, nada poderia eu fazer. À

minha amada esposa Sandra e ao meu

filho Lucas, pelo incentivo, amor e

compreensão em todos os momentos. Por

me ajudarem a realizar mais esta grande

conquista.

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“Grande é a importância da

responsabilidade civil, nos tempos atuais,

por se dirigir à restauração de um equilíbrio

moral patrimonial desfeito e à redistribuição

da riqueza de conformidade com os ditames

da justiça, tutelando a pertinência de um

bem, com todas as suas utilidades,

presentes e futuras, a um sujeito

determinado”.

Gonçalves

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RESUMO

A presente pesquisa tem como objetivo analisar o instituto jurídico da Responsabilidade Civil, tendo em vista os vários procedimentos odontológicos da modernidade. O que se observa é que os atendimentos odontológicos em suas diversas especialidades, se expandem, e, por conseguinte aumentam as demandas jurídicas advindas dos atendimentos nos consultórios dentários. Assim, O eixo deste estudo foi analisar, as situações que ensejam o dever do Cirurgião dentista de reparar os danos que o mesmo porventura ocasionar ao seu paciente. Foi dado um enfoque especial à questão da Odontologia se é uma profissão com obrigação de meio ou de resultado. Cabe ao operador do direito identificar as situações que configuram a obrigação de indenizar, prestando à parte lesada a efetiva tutela jurisdicional.

Palavras Chave: Responsabilidade Civil. Cirurgião dentista. Culpa Stricto Sensu. Profissão com obrigação de meio e de Resultado.

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ABSTRACT

This study aims to analyze the legal institution of civil liability, in view of the many dental procedures of modernity. What is observed is that the dental care in their various specialties, expand, and, therefore increase the legal demands arising from the dental care. Thus, the axis of this study was to analyze the situations that resulted in the duty of the dental surgeon to repair the damage that it probably lead to his patient. He was given a special focus on the question of Dentistry is a profession which must be middle or result. It is the operator of the right to identify situations that make up the obligation to indemnify the injured party by providing effective judicial protection.

Key words: Civil Liability. surgeon dentist. Blame Left Unity. Professional obligation of means and results.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO............................................................................................ 9 2 UM RECORTE HISTÓRICO DA RESPONSABILIDADE CIVIL................. 11

2.1 ASPECTOS GERAIS DA RESPONSABILIDADE CIVIL............................ 13 2.2 TEORIAS SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL................................... 162.3 ELEMENTOS CARACTERIZADORES DA RESPONSABILIDADE CIVIL 19

3 DA CULPA COMO FUNDAMENTO DA OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR... 213.1 A CULPA STRICTO SENSU....................................................................... 223.2 RESPONSABILIDADE CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL.............. 26

4 OBRIGAÇÃO DE MEIO E DE RESULTADO............................................. 284.1 RESPONSABILIDADE PROFISSIONAL..................................................... 334.2 O CIRURGIÃO DENTISTA E SEU REGULAMENTO................................. 36

4.2.1 Código de Ética do Cirurgião Dentista.................................................... 36 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................ 39

REFERÊNCIAS........................................................................................... 41

1 INTRODUÇÃO

A presente pesquisa visa analisar a Responsabilidade Civil, mais

especificamente no que concerne ao cirurgião-dentista e ao dever de indenizar seus

pacientes/clientes pelos danos por ele causados. Procurar-se-á conceituar, dentro

da responsabilidade civil geral, a responsabilidade subjetiva e objetiva, ou seja, a

presença ou não da culpa na conduta do agente causador do dano, não

dispensando o ato lesivo, o dano e o nexo causal.

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Neste contexto, buscar-se-á observar até que ponto a Odontologia pode ser

vista como profissão com obrigação de meio ou de resultado. Daí a escolha do tema

“Responsabilidade Civil na Odontologia: Profissão com obrigação de Meio ou de

Resultado?”.

Convem aqui esclarecer que as obrigações de resultado são aquelas que o

profissional garante final com êxito de suas atividades, e as obrigações de meio são

aquelas que o profissional tomará todas as providências para o resultado positivo da

atividade, mas não garante que será possível atingi-lo.

Mediante aos evidentes avanços tecnológicos, os quais, tanto podem ser

benéficos quanto minuciosos e/ou perigosos para a vida humana, insere-se o

presente estudo, que objetiva salientar as responsabilidades advindas desse

processo, no tangente à Odontologia face aos variados procedimentos

odontológicos da modernidade.

Necessário é pontuar que tendo em vista essa nova tendência, de todo

cidadão lesado em seu direito buscar reparação do dano que lhe foi causado,

tornou-se a relação paciente/profissional da área odontológica, mais centrada na

qualidade dos serviços, podendo os profissionais, responderem administrativamente,

civilmente e criminalmente pelos seus atos profissionais

É interessante destacar que era mais habitual a responsabilização dos

profissionais da área médica por qualquer eventual dano ocasionado à saúde do

paciente. Atualmente, os Cirurgiões Dentistas, também, se vêm constantemente

envolvidos em demandas dessa natureza.

Dessa forma, nota-se a importância de atentarmos para a diferença

existente entre profissão com obrigação de meio ou de resultado, para assim

,proceder à análise do caso.

Cabe, portanto, aos operadores do direito averiguar todos os aspectos que

permeiam a responsabilidade civil do Cirurgião dentista para, a partir daí, se chegar

às inferências cabíveis.

Assim, aplicar-se-á, no presente trabalho de conclusão de curso, a vertente

jurídico-teórica, compreendendo os aspectos conceituais, ideológicos e doutrinários

de determinado campo a que se pretende pesquisar.

O tema, objeto de estudo foi divido em 4 capítulos, sendo que o primeiro

tem como objetivo introduzir o trabalho sobre o tema escolhido. No segundo será

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destacado e também discutido o conceito da Responsabilidade civil, os elementos

caracterizadores da responsabilidade civil entre outros.

No terceiro e quarto capítulo far-se-á análise teórica sobre a questão a

questão da culpa stricto sensu, a Odontologia como profissão de meio e de

resultado, entre outros assuntos relativos ao tema, buscando inferências sobre o

assunto abordado e então, passaremos às considerações finais da presente

pesquisa.

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2 UM RECORTE HISTÓRICO DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Segundo teoria clássica, a responsabilidade civil se assenta em três

pressupostos: um dano, a culpa do autor e a relação de causalidade entre fato

culposo e mesmo dano.

Entretanto, em tempos remotos nem sempre foi assim, o fator culpa não era

considerado. O dano provocava reação imediata, o que acabava por criar uma

situação brutal, desordenada e ilimitada, não havendo regras, por ainda não imperar

o direito. Assim, prevalecia a chamada vingança privada, a forma mais comum de se

resolver as questões entre as partes, de forma primitiva e selvagem. Era pagar o mal

com o mal. Caso a reação não pudesse acontecer de imediato, sobrevinha a vindita

meditada, que fora posteriormente regulamentada, resultando na lei de talião1 (lex

talionis), olho por olho, dente por dente.

Posteriormente, surge o período da composição, no qual, o prejudicado

passa a ser compensado economicamente por possíveis danos sofridos, não

existindo ainda o cogitar da culpa.

Mais adiante, com a existência de soberana autoridade, é vedada pelo

legislador à vitima fazer justiça com as próprias mãos. Assim a composição

econômica, que antes era voluntária, passa então, a ser obrigatória, e ademais

tarifada.

Dessa forma, o Estado assumiu a função de punir. Ao passar para o Estado

a ação repressiva, surgiu a ação de indenização, tomando então, a responsabilidade

civil lugar, ao lado da responsabilidade penal.

De acordo com Gonçalves (1938, p. 4) a diferenciação entre a “pena” e a

“reparação” somente começou a ser esboçada ao tempo dos romanos, com a

distinção entre os delitos públicos e os delitos privados,

1 Os primeiros indícios da lei de talião foram encontrados no Código de Hamurabi, em 1780 a.C., no reino da Babilônia. Essa lei permite evitar que as pessoas façam justiça elas mesmas, introduzindo, assim, um início de ordem na sociedade com relação ao tratamento de crimes e delitos. O mais simples exemplo é o princípio do "olho por olho, dente por dente”. Nesse caso, a regra era que a punição deveria ser exatamente igual ao crime. http://pt.wikipedia.org. Acesso em 18/08/2009.

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Em 572, da fundação de Roma, um tribuno do povo denominado Lúcio

Aquilio, originou uma lei de ordem penal conhecida como lei Aquilia, cujos objetivos

eram assegurar o castigo à pessoa que causasse um dano a outrem, obrigando-a a

ressarcir os prejuízos dele decorrente e punir o escravo que causasse algum dano

ao cidadão, ou ao gado de outrem, fazendo-o reparar o mal causado.

O direito Francês aprimorou as idéias românicas, e a partir daí,

estabeleceram-se alguns princípios que exerceram sensível influência nos demais

povos, a saber:

• Direito à reparação sempre que houvesse culpa, ainda que leve,

separando-se a responsabilidade civil (perante a vítima) da

responsabilidade penal (perante o Estado);

• A existência de uma culpa contratual (a das pessoas que descumprem

as obrigações) e que não se liga nem a crime nem a delito, mas se

origina da imperícia, negligência e imprudência.

A noção da culpa in abstracto e a dinstinção entre culpa delitual e culpa

contratual são oriundas do Código de Napoleão. A partir daí, a definição de que a

responsabilidade civil se funda na culpa, propagou-se nas legislações do mundo

todo.

Com a Revolução Industrial, na qual houve uma multiplicação dos danos,

surgiram novas teorias inclinadas sempre a oferecer maior proteção às vítimas.

Como se pode observar, em todos os tempos o dano foi combatido pelo

lesado. Entretanto a forma de combate foi se alterando, sofrendo modificações de

acordo com o pensamento da época em que ocorria o dano. No entanto, essa forma

de combate não permanece estática, mas sim em contínua evolução, exigida pelo

dinamismo da própria sociedade, que está sempre a buscar um direito mais justo e

eficiente

Portanto, a trajetória da responsabilidade civil é fato interessante para o

presente estudo, pois revela grandes avanços na jurisprudência atual, e que merece

enfoque em nosso ordenamento jurídico, para que cada vez mais, faça valer o

direito e a justiça acima de tudo.

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2.1 ASPECTOS GERAIS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Analisar a responsabilidade civil requer, primeiramente, uma breve definição

do termo “responsabilidade” para termos uma melhor compreensão do assunto em

tese. Assim, responsabilidade significa responder pelos seus atos, mas essa

definição pouco esclarece. O termo responsabilidade encerra a idéia de obrigação,

não sendo independente, de qualquer premissa.

Segundo o vocabulário jurídico, a palavra “responsabilidade” é originária do

vocábulo responsável, do verbo responder, do latim respondere, que tem o

significado de responsabilizar-se, vir garantido, assegurar, assumir o pagamento do

que se obrigou, ou ato que praticou.

A responsabilidade civil tem sua origem advinda de diversos fatores, dentre

eles, destaca-se o descumprimento obrigacional, a desobediência de uma regra

contratual ou, simplesmente, o fato de não se respeitar um preceito normativo que

regula a vida em sociedade

Neste sentido, Venosa (2007, P.1) observa que:

Em princípio, toda atividade que acarreta um prejuízo gera responsabilidade ou dever de indenizar. Haverá por vezes, excludentes, que impedem a indenização. O termo responsabilidade é utilizado em qualquer situação na qual alguma pessoa, natural ou jurídica deva arcar com as conseqüências de um ato, fato ou negócio danoso. Desse modo, o estudo da responsabilidade civil abrange todo o conjunto de princípios e normas que regem a obrigação de indenizar.

De acordo com o autor, os princípios da responsabilidade civil buscam

restaurar um equilíbrio patrimonial e moral violado, tendo em vista que um prejuízo

ou dano não reparado é um fator de inquietação social. A sociedade contemporânea

busca alargar o direito de ressarcimento, alcançando novos horizontes, a fim de que,

cada vez menos, restem danos irressarcidos.

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Gonçalves (2007, p. 3) cita que “A tendência de não deixar irressarcida a

vítima de atos ilícitos sobrecarrega os nossos pretórios de ações de indenização das

mais variadas espécies”.

Ainda de acordo com Gonçalves (2007, p. 3)

O tema é, pois, de grande atualidade e de enorme importância para o estudioso e para o profissional do direito. Grande é a importância da responsabilidade civil, nos tempos atuais, por se dirigir à restauração de um equilíbrio moral patrimonial desfeito e à redistribuição da riqueza de conformidade com os ditames da justiça, tutelando a pertinência de um bem, com todas as suas utilidades, presentes e futuras, a um sujeito determinado.

Pode-se dizer que esse é um desiderato que a complexidade da vida

moderna coloca sempre em foco. Os danos a serem reparados são aqueles de

índole jurídica, muito embora possam ter conteúdo, também, de cunho moral,

religioso, social, ético, entre outros, somente merecendo reparação do dano as

transgressões dentro dos princípios obrigacionais.

Neste contexto, Venosa (2007, p.2) ressalta o seguinte:

O estudo da responsabilidade civil é parte integrante do direito obrigacional, sendo a reparação dos danos algo sucessivo à transgressão de uma obrigação, dever jurídico ou direito. Sob esse prisma, pode-se divisar um dever jurídico primário ou originário, “cuja violação acarreta um dever jurídico sucessivo ou secundário, que o de indenizar o prejuízo”.

Reportando-nos ao Código Civil de 1916, de acordo com o autor acima

citado, essa questão foi tratada de modo desordenado, visto que os artigos 159 e

160 traçaram os fundamentos da responsabilidade contratual e, posteriormente, na

parte especial, em vários dispositivos, disciplina novamente o assunto. Esse fato

explica-se porque, no final do século XIX e início do Século XX, quando elaborado o

diploma, a matéria ainda não havia atingido um estágio de maturidade teórica e

jurisprudencial.

Cabe aqui ressaltar que o estudo da responsabilidade civil é especialmente

dinâmico, surgindo a cada momento novas teorias e linhas de pensamento na

doutrina e jurisprudência, advindo não só do pensamento jurídico, como também,

das novas necessidades sociais. Acrescente-se que o instituto da responsabilidade

civil é algo contemporâneo, pois surge pela primeira vez no final do séc. XVIII, no

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âmbito do direito revolucionário francês. Sua primeira formulação expressa está no

código Francês, espalhando-se daí para todas as codificações posteriores.

Venosa (2007, p.2) observa ainda que:

O atual Código Civil, embora mantendo a mesma estrutura do diploma anterior, trata da responsabilidade civil com mais profundidade, embora sem a amplitude que seria desejável, nos arts. 927 ss. A definição de ato ilícito é fornecida pelo art. 186: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral comete ato ilícito.”

Observa-se que a possibilidade de indenização pelo dano exclusivamente

moral foi acrescentado, assim como fora apontado pela Constituição de 1988, algo

há muito reclamado pela sociedade e pela doutrina e sistematicamente repelido até

então pelos tribunais.

Neste sentido, de forma ampla, Noronha (2003, p. 429) esclarece que

a responsabilidade civil é sempre uma obrigação de reparar danos causados à pessoa ou ao patrimônio de outrem, ou danos causados a interesses coletivos ou transindividuais, sejam estes difusos, sejam coletivos stricto sensu.

Gonçalves (2007, p.1) ressalta que:

Toda a atividade que acarreta prejuízo traz em seu bojo, como fato social, o problema da responsabilidade. Destina-se ela a restaurar o equilíbrio moral e patrimonial provocado pelo autor do dano. Exatamente o interesse em restabelecer a harmonia e o equilibrio violados pelo dano constitui a fonte geradora da responsabilidade civil.

Portanto, a responsabilidade civil considera, primordialmente, o dano, o

prejuízo, o desequilíbrio patrimonial, embora em sede de dano exclusivamente

moral, o que se tem em mira é a dor psíquica ou o desconforto comportamental da

vítima. No entanto, é básico que, se não houver dano ou prejuízo a ser ressarcido,

não temos porque falar em responsabilidade civil. Simplesmente não há porque

responder. A responsabilidade civil pressupõe um equilíbrio entre dois patrimônios

que deve ser restabelecido.

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2.2 TEORIAS SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL

Responsabilidade Civil Subjetiva e Objetiva

A responsabilidade civil, conforme fundamento de sua gênese, poderá ser

subjetiva ou objetiva, caracterizando-se como subjetiva a responsabilidade que tem

como requisito a culpa do agente. Deverá nesse caso concreto, ser comprovada a

existência da culpa para gerar a obrigação de indenizar. O causador do dano deverá

ter agido com culpa lato sensu, ou seja, dolo ou culpa stricto sensu (imperícia,

imprudência e negligência), esses são elementos essenciais para configurar o dano

indenizável advindo da responsabilidade civil subjetiva.

De acordo com Diniz (1998, p.34), a responsabilidade civil está relacionada

com

(...) a aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato próprio imputado, de pessoas por quem ele responde, ou fato de coisa ou animal sob sua guarda (responsabilidade subjetiva) ou ainda de simples imposição legal (responsabilidade objetiva).

A lei determina que, em situações específicas, a obrigação de reparar o

dano independe da verificação da existência de culpa do agente. Essa é a

modalidade de responsabilidade civil objetiva, isto é, em determinados casos

prescinde e não exige comprovação da culpa para que ocorra o dever de indenizar o

dano. Na responsabilidade civil objetiva basta ocorrer o dano e haver o nexo de

causalidade para nascer à obrigação de indenizar.

Segundo Dias (1944, p. 94-95), a distinção entre responsabilidade civil

subjetiva e objetiva deve ser analisada “no sistema da culpa, sem ela, real ou

artificialmente criada, não há responsabilidade: no sistema objetivo, responde-se

sem culpa, ou melhor, esta indagação não tem lugar”.

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Portanto, em consonância com o autor, deve-se averiguar a presença ou

não da culpa. Se tiver o dever de indenizar independente da existência da culpa, o

agente infrator responderá objetivamente segundo determinação legal.

Deve-se ter consciência que o instituto da responsabilidade civil está

permeado pelo princípio de que todo aquele que causar dano a outrem é obrigado a

repará-lo. O Código Civil brasileiro de 2002, em seu artigo 186, como já citado

anteriormente, positivou esse princípio para se caracterizar a responsabilização civil.

Sendo assim, o art. 186 estabelece “Aquele que, por ação ou omissão voluntária,

negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que

exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

Observa-se no artigo acima citado, a presença da possibilidade de

tipificação do dano moral como ato ilícito passível de indenização, baseando-se nos

seguintes pressupostos, a saber:

√ Conduta humana (ação ou omissão);

√ Culpa ou dolo do agente;

√ Relação de causalidade (nexo de causalidade entre a ação e omissão e

o dano);

√ A existência do dano sofrido pela vítima.

Apesar do direito positivo brasileiro ter priorizado a responsabilidade civil

objetiva, deve-se atentar para a importância essencial de averiguar a culpa como

elemento essencial da responsabilidade civil em alguns casos concretos.

Nesse sentido, Pereira (1999, p. 391) afirma que

A abolição total do conceito da culpa vai dar num resultado anti-social e amoral, dispensando a distinção entre o lícito e o ilícito, ou desatendendo à qualificação da boa ou má conduta, uma vez que o dever de reparar tanto corre para aquele que procede na conformidade da lei, quanto para aquele outro que age ao seu arrepio

Em resumo, a responsabilidade civil não deve assentar exclusiva e

simplesmente na culpa ou no risco fixado em lei, pois as relações sociais e os casos

concretos mostram que a adoção de um critério único seria ineficiente para dar uma

prestação isonômica aos jurisdicionados.

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Apesar de se observar uma tendência de prevalência da responsabilidade

civil objetiva nos julgados dos tribunais brasileiros, não se deve pensar em substituir

completamente a responsabilidade civil subjetiva pela objetiva, mas que há uma

necessidade de completar e integrar essas duas modalidades de responsabilidade

para conseguir trazer uma justiça que trate os desiguais na medida das suas

desigualdades.

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2.3 ELEMENTOS CARACTERIZADORES DA RESPONSABILIADADE CIVIL

Para se responsabilizar juridicamente um Cirurgião dentista por um fato

danoso a um paciente, deve existir a presença dos elementos caracterizadores da

responsabilidade civil que são:

√ Conduta

√ Dano

√ Nexo de causalidade

acrescidos de um quarto pressuposto, o Ato Lesante (ação ou omissão –

comportamento humano).

Se em instante algum o Cirurgião dentista agiu com imprudência, imperícia

ou negligência ao atender o paciente, tendo realizado os procedimentos os quais se

propunha executar corretamente, é evidente que não poderá atribuir ao mesmo o

evento danoso. Dessa forma não há o que indenizar, visto que o profissional agiu de

forma correta e decente, tanto na área patrimonial, como moral.

Ao paciente de atendimento odontológico cabe o ônus de comprovar que o

cirurgião dentista, pelo seu proceder ou pela técnica empregada, deu azo aos danos

sofridos, pois a odontologia é uma atividade que, na sua relação contratual de

prestação de serviços odontológicos aos pacientes, tem, como regra geral, por

objeto destes contratos, obrigações de meios e não de resultado.

Neste sentido, cita-se jurisprudência do TJMG:

BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais-TJMG. Ementa: AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS - TRATAMENTO DENTÁRIO - RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DO DENTISTA - NÃO-COMPROVAÇÃO DA CONDUTA CULPOSA - IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. - Para o reconhecimento do pedido de indenização decorrente de conduta de cirurgião-dentista, faz-se necessária a comprovação dos requisitos ensejadores da responsabilidade civil, quais sejam: o dano, a culpa (negligência, imprudência ou imperícia) e o nexo de causalidade. - Cumpre ao autor, conforme determinado pelo art. 333, I, do CPC, comprovar os fatos constitutivos de seu direito, sob pena de improcedência do pedido.

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(...) Já o requerido Geraldo Santana Gomes, em seu depoimento pessoal, afirmou que "o autor recebeu a recomendação devida após a extração dos dentes; manteve vários contatos com o autor e nestes contatos o autor dizia que estava fazendo o tratamento devido com uma dentista de sua confiança; o autor procurou a Drª Simone, indicada pela servidora Denise, concordando o depoente com a profissional indicada, tendo acreditado que o autor estava fazendo o tratamento indicado; (...)" (ff.101/102).

Assim, as provas existentes nos autos não permitem conclusão no sentido de que o requerido tenha agido com negligência, imprudência ou imperícia; mas, sim, o abandono do tratamento dentário por parte do próprio autor, ora apelante.

Competia ao autor o ônus da prova referente ao fato constitutivo de seu direito (art. 333, I, do CPC), pelo que, ausente a comprovação da conduta culposa requerido, sucumbe a pretensão indenizatória.

Com tais razões, nega-se provimento ao recurso, mantendo-se a d. sentença hostilizada (...)

Portanto, em inexistindo esta prova, não há, pois, como se responsabilizar

civilmente o profissional desta área se este, inclusive, conseguir demonstrar, em

juízo, que agiu de acordo com os procedimentos técnicos recomendados para o

caso. Logo, não se demonstrando que qualquer dano ocorrido com o paciente tenha

decorrido da falta de diligência (ausência da prova de culpa) do cirurgião dentista,

não há porque se responsabilizar, nos tribunais, este profissional pela lesão

porventura sofrida pelo paciente.

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3 DA CULPA COMO FUNDAMENTO DA OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR

A culpa é elemento caracterizador da responsabilidade civil, que é

permeada por aspectos como ação ou omissão do agente, a relação de causalidade

e o dano experimentado pela vítima. Entretanto, seu conceito é complexo, por isso

depreende da análise apurada para se chegar a qualquer inferência nos casos

concretos.

Segundo Gonçalves (2007, p. 15) “alguns autores para definir a culpa,

inspiram-se numa concepção moral de culpabilidade. Consideram somente o

aspecto subjetivo: se o agente podia prever e evitar o dano, se quisesse, agindo

livremente.”

Na doutrina clássica, culpa consiste no desvio de um modelo ideal de

conduta, representado, por vezes, pela boa fé, outras pela diligência do pai de

família.

Outros, como os irmãos Mazeaud, adotam o critério objetivo na definição da culpa, comparando o comportamento do agente a um tipo abstrato, o bonus paterfamilias. Se da comparação entre a conduta do agente causador do dano e o comportamento de um homem médico, fixado como padrão (que seria moral), resultar que o dano derivou de uma imprudência, imperícia ou negligência do primeiro - nos quais não incorreria o homem-padrão, criado in abstracto pelo julgador - caracteriza-se a culpa. (GONÇALVES 2007, p.16).

Pode-se obter uma melhor compreensão do tema através da afirmação de

que o indivíduo, em sociedade, deve estar atento à realidade do convívio social,

evitando quaisquer práticas que possam causar danos a outrem.

Contudo, limitar-se a esse conceito, seria reduzir a questão da culpa a uma

abstenção de ações potencial ou efetivamente perigosas para outrem. Muito

embora, também, quando o indivíduo em sociedade se vê compelido a agir, a

desempenhar alguma atividade, haverá de fazê-lo considerando as regras ou

técnicas a elas inerentes, bem como empregar sua atenção e cuidado em toda

atividade ou tarefa da qual possa potencialmente resultar riscos à vida, saúde ou

patrimônio de terceiros.

Assim, para fazer avançar juridicamente uma ação de indenização por

danos materiais e morais, decorrentes de possível má prestação de serviço

odontológico, há que estar comprovado que o paciente/cliente foi submetido a

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procedimento odontológico em que o Cirurgião dentista não tenha cumprido a

contento com o contratado em decorrência de um comportamento culposo. Contudo,

inexistirá obrigação de indenizar quando o Cirurgião dentista no exercício de sua

profissão não teve uma conduta culposa, ou seja, não atuou com imperícia,

imprudência ou negligência.

A responsabilidade civil dos Cirurgiões dentistas, de forma genérica, está

fundada na teoria da culpa. Dessa forma, pode-se observar que a culpa deriva da

negligência, imperícia ou imprudência.

Em suma, o erro odontológico deriva das condutas culposas em sentido

estrito (culpa stricto sensu) e, por essa razão, faz-se necessário examinar,

detalhadamente, em que consiste cada uma dessas modalidades.

3.1 A CULPA STRICTO SENSU

• Negligência - pode ser entendida como descuido, desatenção, descaso,

omissão displicente, ou seja, poderá ser entendida como a falta de cuidados e

precauções que a profissão exige.

Portanto, pode-se afirmar que age com negligência o Cirurgião dentista que

não se precaveu em evitar a fratura de uma lima endodôntica velha dentro do canal

de dente, visto que ela deveria ser substituída por outra nova, ou até mesmo o

ortodontista que deveria fazer exames radiográficos preventivos e não o fez. O

implantodontista que observa que o implante instalado não logrou sucesso, tendo

uma osteointegração deficiente devido a uma osteoporose que devia ter sido

previamente diagnosticada e não foi; o Cirurgião dentista que deveria aguardar o

prazo para recuperação do paciente para iniciar uma próxima intervenção e não

espera o momento adequado para atuar.

Kfoury Neto (2002) traz numerosos exemplos de conduta negligente, a

saber:

• Cirurgião dentista clínico geral que deixa de dar o devido encaminhamento a

paciente que necessita de urgente intervenção cirúrgica;

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• erro grosseiro por negligência de Cirurgião dentista clínico geral que, sem

identificar os sintomas de um grave abscesso periapical, desconsidera

sintomas evidentes e revela absoluto descaso pelo paciente, dispensando-o;

• Cirurgião dentista clínico geral que, diante de caso grave, permanece fechado

no seu consultório odontológico, limitando-se a prescrever medicamento

através de sua auxiliar de consultório, sem contato direto com o paciente;

• negligência reconhecida dos Cirurgiões dentistas, de Pronto socorro, que

substimaram a gravidade dos ferimentos buco-maxilo-faciais sofridos por um

paciente, vítima de atropelamento, que o examinam superficialmente,

prescrevem medicação insuficiente ou realizam atos técnicos inadequados ou

intempestivos e, alguns dias depois, o paciente exibe extensas áreas de

necrose de estruturas que poderiam ter sido salvas se tratadas

oportunamente.

Ainda em consonância com Kfoury Neto (2002, p. 35), os casos de

negligência são numerosos na jurisprudência, posto que a distração faz parte da

natureza humana e vão do erro do profissional desatento que prescreve um

medicamento por outro – digestivo enzimático em vez de antinflamatório com

enzimas, até os esquecimentos de uma gaze ou algodão em uma cirurgia periapical,

ao fechar o retalho e obturar o canal.

Sendo assim, toda vez que o profissional da saúde bucal tiver a obrigação

de agir ou de ser omisso e não faz, será negligente.

• Imprudência - na qual, há culpa comissiva. Age com imprudência o

profissional que tem atitudes não justificadas, precipitadas, sem usar de cautela. É o

agir pelo qual o agente, tendo possibilidade de prever a ocorrência de evento

danoso, não o faz, provocando então, a ocorrência lesiva. Aprevisibilidade da

ocorrência do evento lesivo é característica dessa modalidade culposa. No campo

médico, a dificuldade pode residir em distinguir a imprudência da imperícia.

Pode-se dizer que erro odontológico decorrente de conduta imprudente é

quando o profissional resolve realizar em metade do tempo cirurgia que, pela sua

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complexidade, é realizada em mais tempo e, nessa intempestividade, acarreta dano

ao paciente.

• Imperícia - será configurada quando o Cirurgião dentista, sem a devida

qualificação técnica, ou seja, sem os conhecimentos necessários para desenvolver

tal intervenção faz o atendimento fora do ramo de sua competência, causando dano.

É a falta de observação das normas, o despreparo prático da profissão. Com efeito,

o cirurgião dentista, ao se definir por determinado procedimento inadequado para o

caso, age com imperícia, pois não conhece a fundo o risco que ele envolve, ou

porque, tendo perfeita consciência do risco, resolve avançar a sua ação além dos

limites da licitude.

A exemplo, pode-se dizer que age com imperícia o Cirurgião dentista que

formado como clínico geral, sem experiência, tenta realizar uma cirurgia que deveria

ser encaminhada para um especialista de área específica.

Permite-se então, trazer à colocação alguns exemplos de erros

odontológicos advindos da imperícia:

• é imperito o Implantodontista que, colocando implantes ósteo-

integrados bilaterais na mandíbula de paciente desdentado há longo tempo,

não atenta para a aproximação do canal neural da borda alveolar, e provoca

lesão no nervo mandibular;

• é imperito o Implantodontista que, colocando implantes agulhados

de Scialon, transfixa o maxilar;

• é imperito o Cirurgião dentista que, ao realizar uma prótese total,

modifica a dimensão vertical e, como conseqüência, provoca alterações na

mímica, na superfície do rosto do paciente ou disfunção da articulação

têmporo-mandibular.

Além da classificação da culpa por meio da negligência, imprudência e

imperícia tem-se também, outros três graus de divisão da culpa. Podendo dividi-la

em:

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• Grave quando ela se aproxima do dolo, por serem causadas por total

desconhecimento dos elementos mínimos que o profissional liberal não

pode desconhecer e ignorar;

• Leve que poderia ser evitada com aplicação de medidas preventivas que

poderiam ser tomadas. Nesse caso, coloca-se como parâmetro quais

seriam as atitudes que deveriam ser tomadas por um homem médio, ou

seja, utiliza-se do bom senso para aferir o que um profissional mediano faria

em determinado caso;

• Levíssima, identifica-se com a sutileza, sendo necessária uma

atenção extrema para ser evitada.

Os doutrinadores colocam que, independente do agente (neste caso o

Cirurgião dentista) ter agido com dolo ou culpa, ao causar dano ao paciente será

obrigado a indenizá-lo, independente se foi culpa por imprudência, negligência ou

imperícia ou se foi grave, leve ou levíssima, este último servirá de auxilio para o juiz

determinar o quantum indenizatório, pois não seria justo que um agente que ocorreu

com uma culpa levíssima arcasse com as mesmas obrigações de indenizar de um

profissional que atuou com dolo ou culpa grave.

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3.2 RESPONSABILIDADE CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL

Ao descumprir uma obrigação contratual, uma pessoa pode causar prejuízo

a outrem, o que pode gerar uma ação com fins indenizatórios, como já se tem

observado atualmente em nossos tribunais, principalmente quando se trata de danos

relativos à saúde humana.

Vale aqui ressaltar que a prestação dos serviços odontológicos, se dá de

forma contratual, isto é, pela responsabilidade contratual. No momento em que o

paciente comparece ao consultório de um Cirurgião dentista, a fim de submeter-se a

tratamento odontológico, está estabelecido um contrato tácito entre ambos. Esse

contrato, a princípio, não é escrito, mas exsurge da confiança que decorre da

simples relação profissional-paciente. Há, portanto, uma responsabilidade contratual,

de natureza civil.

A respeito da responsabilidade extracontratual, Gonçalves (2007, p. 26) observa que:

Quando a responsabilidade não deriva de contrato, diz-se que ela é extracontratual. Neste caso, aplica-se o disposto no art. 186 do Código Civil. Todo aquele que causa dano a outrem, por culpa em sentido estrito ou dolo, fica obrigado a repará-lo. É a responsabilidade derivada de ilícito extracontratual, também chamada aquiliana. Na responsabilidade extracontratual, o agente infringe um dever legal, e, na contratual, descumpre o avençado, tornando-se inadimplente. Nesta existe uma convenção prévia entre as partes que não é cumprida. Na responsabilidade extracontratual, nenhum vínculo jurídico existe entre a vítima e o causador do dano, quando este pratica ato ilícito.

Necessário é, esclarecer que existem algumas situações em que a

responsabilidade civil do cirurgião-dentista não resulta, nem admite qualquer tipo de

contrato, como nos casos do atendimento de emergência, quando o paciente trazido

em uma ambulância desde o local do sinistro, e precisa ser submetido a uma

intervenção cirúrgica buço-maxilo-facial, sem condições de escolher o profissional e,

estabelecer um liame opcional e, muito menos, assinar qualquer tipo de contrato.

Muito embora, o profissional não se exima da responsabilidade, tem-se então, um

caso de responsabilidade extracontratual, ou aquiliana.

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O fundamento de tal discussão, se a responsabilidade é contratual ou

extracontratual, sobre a obrigação de indenizar, está intrinssicamente ligada à

natureza da obrigação que o profissional assumirá, isto é, se de meio ou de

resultado, da qual trataremos no capítulo que se segue.

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4 OBRIGAÇÃO DE MEIO E DE RESULTADO

O reconhecimento do tipo de obrigação assumida pelo profissional da

odontologia revela-se útil e importante, na medida em que será, ou não, o

profissional cobrado pelo procedimento utilizado, e pelo objetivo a ser alcançado.

Ao conceituar o termo obrigação, na atualidade, os juristas fazem a

distinção entre o seu sentido lato e estrito.

Em sentido lato, o termo obrigação do latim obligatio, tem o significado de

vínculo que liga o homem, livre e capaz, ao cumprimento de um dever imposto pela

sociedade. Significa que a obrigação se reveste da nossa noção de dever jurídico,

entendido como a imposição legal para que as pessoas apresentem

comportamentos certos e determinados, sem os quais haverá sanções legais já

previstas nas normas.

No sentido estrito mais técnico, o termo obrigação tem significado jurídico.

Nesta, a obrigação é conceituada como um vínculo jurídico que permite a uma

pessoa exigir de outra, uma prestação determinada que satisfaça seu interesse

juridicamente protegido.

Isto ocorre porque tecnicamente, o vínculo jurídico dá a uma das partes da

relação jurídica o poder de exigir um comportamento e, a outra parte o dever de

apresentar tal comportamento

Assim, a obrigação só pode existir quando encontramos duas partes, com

direitos e deveres, existindo entre elas um vínculo jurídico a entrelaçar esses direitos

e deveres.

Após esta breve explanação sobre o termo “obrigação”, interessa agora,

conceituar a distinção entre obrigação de meio e obrigação de resultado, também

conhecidas como obrigações determinadas e obrigações de prudência e diligência

Afirmam os doutrinadores que, quando falamos em obrigação de meio ou de

resultado, no campo da responsabilidade civil, é comum concluir que estamos

cuidando da responsabilidade profissional na área de saúde.

A teoria que busca diferenciar a obrigação de meio daquela que colima um

resultado foi esboçada no Direito Romano e desenvolvida pela doutrina italiana,

francesa e alemã.

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René Demogue (apud Stoco, 2001, p.114) nos esclarece sobre a matéria

dizendo que:

(...) é obrigação de meio quando a própria prestação nada mais exige do devedor do que pura e simplesmente o emprego de determinado meio sem olhar o resultado. Como exemplo cita os serviços profissionais do médico que se obriga a usar de todos os meios indispensáveis para alcançar a cura do doente, porém sem jamais assegurar o resultado, isto é, a própria cura.

Consequentemente, a obrigação é de meio quando o profissional assume

prestar um serviço ao qual dedicará cuidado e empenho exigidos pelas

circunstâncias, de acordo com o seu título, com os recursos de que dispõe e com o

desenvolvimento atual da ciência, sem se comprometer com a obtenção de um

resultado, ou seja, se compromete a atuar com lisura, correção, prudência,

dedicação e técnica, sem garantir um resultado, isto é, impõe-se-lhe apenas que

observe a obligatio ad diligentian.

Não se pode deixar de reconhecer que os Cirurgiões dentistas, em sua

maioria, compromete-se a atuar usando toda técnica e conhecimento disponíveis na

tentativa da cura, significando que, no exercício profissional, tem obrigação de meio.

Ele tem compromisso com a cura, mas não tem obrigação de curar.

Para o ministro do Superior Tribunal de Justiça Carlos Alberto Direito (2002,

p.33):

A responsabilidade civil do médico não se pode ser analisada sob o ângulo exclusivamente técnico, uma vez que sempre se devem considerar as circunstâncias peculiares ao exercício da profissão.Não se pode generalizar, pois cada caso tem a sua especificidade. Em nenhum momento, o juiz pode trabalhar fora do problema em si mesmo, fora daquela situação em que ocorreu a lesão. Por isso, é que se pode ter sempre a consideração de que o médico não pode assumir, em nenhuma circunstancia, a responsabilidade objetiva.

Mesmo com o novo Código Civil, a responsabilidade do dentista e do

médico continua sob a égide de responsabilidade subjetiva, em que não basta existir

o dano, é preciso provar a culpa pelo dano.

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Ainda de acordo com o ministro acima citado:

A orientação hoje vigente na França, na doutrina e na jurisprudência, se inclina por admitir que a obrigação a que está submetido o cirurgião plástico não é diferente daquela dos demais cirurgiões, pois corre os mesmos riscos e depende da mesma álea, Seria, portanto, como a dos médicos em geral, uma obrigação de meio. A particularidade reside no recrudescimento dos deveres de informação, que deve ser exaustiva, e de consentimento, claramente manifestado, esclarecido, determinado. (DIREITO, 2002)

Ademais, Faz-se necessário ressaltar que toda intervenção sobre o corpo

humano é sempre aleatória, isto é, cada organismo reage de diferentes formas ao

mesmo tipo de tratamento.

Não bastasse tal fundamentação, para afastar a cirurgia estética do campo

das obrigações de resultado, o Código de Defesa do Consumidor estipulou,

expressamente, no art. 14, § 4º, verbis: “A responsabilidade pessoal dos

profissionais liberais será apurada mediante a verificação da culpa”.

Tal regra não separa o ato cirúrgico em obrigação de meio ou de resultado,

e nenhum esforço é preciso para evidenciar que a interpretação que situa a questão

ainda no campo das obrigações de resultado, não tem lastro na lei, repetindo

apenas a jurisprudência anterior ao Código de Defesa do Consumidor, enxergava a

dicotomia. Mas, com o advento do Código de Defesa do Consumidor, insistir nessa

direção, significa criar grave disparidade na própria lei, que impõe ser a

responsabilidade pessoal do profissional liberal, sem exceção, apurada mediante a

verificação da culpa.

Consoante tal entendimento, o tratamento odontológico no âmbito das

obrigações é uma obrigação de meio, e a responsabilidade pessoal dos profissionais

liberais é subjetiva, necessitando ser apurada mediante a verificação da culpa,

conforme dispõe o art. 159 do Código Civil de 1916, que tem seu correspondente no

art. 186 do Código Civil de 2002.

Por conseguinte, há de se apurar se o profissional agiu com negligência,

imprudência ou imperícia.

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Nesse sentido, Lorenzetti (1998, p.8) afirma que:

A tese segundo a qual a obrigação contraída pelo médico centra-se apenas nos meios por ele empregados encontra-se amplamente superada. Os meios referem-se somente ao núcleo obrigacional. Deveres secundários de conduta, como o dever de informação e de seguridade, adquirem grande relevância para a aferição da responsabilidade. O núcleo não pode ser seccionado dos deveres acessórios e secundários. O vínculo obrigacional torna-se complexo e dinâmico. A culpa surge quando se omite a diligência devida, considerado esse complexo de elementos.

Posto está que, o paciente/cliente espera sempre um resultado, contudo

esse resultado pode não ser objeto da obrigação. Aqui reside a essência da

distinção principal entre obrigações de meios e de resultados.

Para Stoco (2004, p. 497), muito embora em algumas circunstâncias possa-

se falar em responsabilidade de meios, na maioria das vezes, esta se apresenta

como obrigação de resultado. De acordo com o citado autor, exceto quando a

atividade do CD se aproximar com aquela exercida pelo médico, ou seja, quando a

pessoa contratante é portadora de uma patologia, cuja cura não seja definida e nem

esteja ao alcance de quem quer que seja, segundo o atual estado da ciência, então

sua obrigação será apenas de meio.

No vasto campo da responsabilidade civil, o que interessa saber, portanto, é

identificar aquela conduta que reflete na obrigação de indenizar. Nesse âmbito, uma

pessoa é responsável quando suscetível de ser sancionada, independentemente de

ter cometido pessoalmente um ato antijurídico. Dessa forma, a responsabilidade

pode ser direta, se diz respeito ao próprio causador do dano.

Cabe aqui acrescentar que, determinadas especialidades da prática

odontológica se caracterizam por ter como objeto da relação contratual com o

paciente/cliente uma obrigação de resultado. Pode-se, ademais, admitir, com prévia

análise das circunstâncias do caso concreto, que os contratos de prestação de

serviços odontológicos contem, implícita, uma cláusula de incolumidade do paciente

consubstanciada no dever de cumprimento do tratamento necessário adequado,

sem causar o agravamento da situação ostentada pelo cliente.

Portanto, o contrato de prestação de serviços odontológicos constitui-se

numa obrigação de meio, ou, em certas ocasiões da atividade profissional

odontológica, dependendo do caso, de resultado.

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Em suma, na atualidade, não se constatou na jurisprudência uma

unanimidade de opinião, nem os legisladores e nem os juristas chegaram a um

acordo se a profissão de cirurgião dentista lhe impõe uma obrigação de meio ou de

resultado.

Nota-se que grande parte dos juristas entende que o Cirurgião dentista,

diferentemente do médico, tem obrigação de resultado, pois para eles a maioria dos

tratamentos odontológicos são passíveis de se prever um resultado final. Desta

maneira, os tratamentos dentários teriam como regra geral o comprometimento com

o resultado final, ficando o dentista responsável por, além de empregar todos os

recursos disponíveis, alcançar o fim esperado pelo seu paciente. Entretanto,

necessário é avaliar o caso concreto, visto que não se pode generalizar sob pena de

cometer injustiças.

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4.1 RESPONSABILIDADE PROFISSIONAL

Em tempos passados o médico assumia uma posição de proximidade com o

paciente, mantinha-se uma relação de confiança, de apego ao profissional que era

requisitado por toda família. Porém, com a modernidade, essa postura veio se

alterando, e hoje se mantem mais como uma relação de consumo, isto é, prestação

de serviços. Isso ocorre também com os profissionais das diversas áreas da saúde,

inclusive com o cirurgião dentista.

Observa-se um grande avanço nas especialidades odontológicas advindo

das novas tecnologias e, cada vez mais, o paciente/consumidor torna-se exigente e

conhecedor de seus direitos e por isso, ao sentir-se lesado, busca ressarcimento

pelos danos possivelmente sofridos.

Gonçalves (2007, p.214) cita que:

Com a evolução das relações sociais e o surgimento do consumo em massa, bem como dos conglomerados econômicos, os princípios tradicionais de nossa legislação privada já não mais bastavam para reger as relações humanas, sob determinados aspectos. E, nesse contexto, surgiu o Código de Defesa do Consumidor atendendo a princípio constitucional relacionado à ordem econômica

O Código de defesa do Consumidor, Lei n.º 8.078, de 11 de setembro de

1990, no seu art. 14, dispõe sobre a responsabilidade pelos danos causados aos

consumidores, por serviços prestados de maneira defeituosa. Esse artigo consagra

a responsabilidade objetiva dos fornecedores ou prestadores de serviço, isto é, não

se exige prova de culpa do responsável pelo serviço para que ele seja obrigado a

reparar o dano:

O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes e inadequadas sobre sua fruição e riscos. (CDC, Art.14)

Todavia, em relação aos profissionais liberais, entre os quais se incluem os

Cirurgiões dentistas, o § 4º do art. 14 da lei supracitada, mantém, como pressuposto

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da responsabilidade, a verificação da culpa. Vale dizer que, relativamente aos

cirurgiões-dentistas, por serem contratados com base na confiança que inspiram aos

seus clientes e respectivos familiares, não se aplica a teoria da responsabilidade

objetiva esposada pelo Código do Consumidor.

Assim, estes profissionais somente serão responsabilizados por danos quando ficar provada a ocorrência de culpa subjetiva, em quaisquer de suas modalidades: negligência, imprudência ou imperícia. (CDC, art. 14)

Oliveira (2000, p.15) ressalta que o direito brasileiro tem dado, cada vez

mais, importância para o ressarcimento dos danos causados aos consumidores por

profissionais da saúde. A crescente educação do consumidor, que é resultante da

maior difusão de métodos terapêuticos e a consciência do dano sofrido, leva o

paciente à busca de reparação pelo erro profissional.

Oliveira (2000) declara que os juristas nacionais pouco se preocupam com o

estudo da responsabilidade dos cirurgiões-dentistas, sendo este assunto, na maioria

das vezes, abordado superficialmente em trabalhos que tratam da responsabilidade

civil dos médicos. Entretanto, é importante que se reconheça a relevância da

atividade odontológica, que cada vez se enriquece mais com os constantes avanços

científicos, influenciando, de maneira singular, o desfecho jurídico em diferentes

circunstâncias.

O Código Civil revogado estabelecia expressamente a responsabilidade dos

médicos, cirurgiões, farmacêuticos, parteiras e dentista no artigo 1545. Contudo, o

Código Civil de 2002 não repetiu tal preceito, já que não se referiu, especificamente,

a estes profissionais em seu artigo 951. Fez apenas, remissão aos artigos 948, 949

e 950, que tratam, respectivamente do homicídio, lesão corporal ou outra ofensa à

saúde e de defeito incapacitante, estabelecendo que esses preceitos se aplicam no

caso de indenização devida por aquele que, ”no exercício da atividade profissional

por negligência, imprudência ou imperícia, cause morte ou lesões ao paciente”.

Artigo 951 Código Civil:

O disposto nos artigos 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício da atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão ou inabilitá-lo para o trabalho.

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Ao utilizar-se a expressão “paciente”, deixa-se evidente que a extensão da

responsabilidade constante no art. 951 diz respeito apenas aos profissionais da área

da saúde, estabelecendo que a responsabilidade destes profissionais ocorre por via

reflexa.

Loures (2002, p. 414) acredita que a vantagem da falta de enunciação em

relação aos profissionais, a que se aplica o artigo 951 do CC, repousa na

possibilidade de inclusão no elenco de profissionais; outros, como enfermeiros,

acumputuristas, fonoaudiólogos, fisioterapeutas etc.

O Código Civil de 2002 estabeleceu genericamente, a responsabilidade

destes profissionais mediante culpa, cabendo à vítima o ônus da prova

(Responsabilidade Subjetiva). Atente-se que esta responsabilidade rege-se apenas

pelas normas do CC/2002, já que o Código de Defesa do Consumidor/1990

aparentemente se abdicou de manter sob sua égide os profissionais liberais, como

se observa em seu artigo 14, § 4º:

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4.2 O CIRURGIÃO DENTISTA E SEU REGULAMENTO

A profissão do Cirurgião dentista está regulamentada pela Lei nº 5081, de

24/08/66, em substituição à Lei nº 1314, de janeiro de 1951.

Legalmente, então, o exercício da odontologia (clínica geral) é exclusivo dos

portadores de diplomas em cursos de graduação, após o registro do diploma nos

órgãos competentes (art. 2º). Os habilitados em Instituições estrangeiras poderão

exercer a profissão, após a revalidação do diploma e satisfeitas às demais

exigências (art. 3º).

O cirurgião dentista especialista, para se anunciar como tal, deve estar

autorizado, isto é, registrado e inscrito pelo Conselho Federal de Odontologia,

conforme regulamento pela Resolução CFO-185/93. Para obter o registro, deve

preencher alguns requisitos essenciais, todos com respeito a cursos na área de sua

especialidade.

4.2.1 Código de Ética do Cirurgião Dentista

Pode exercer a profissão de Cirurgião dentista o profissional formado em

curso superior, reconhecido no órgão de classe. O curso superior permite que ele

atue como clínico geral. Para as especialidades há regras próprias. O profissional

necessita de formação em cursos específicos e avançados como especialização,

mestrado e doutorado.

O controle se faz através do órgão de classe, neste caso, o Conselho

Regional de Odontologia - CRO.

Eticamente, o cirurgião dentista está vinculado a um código, aprovado pela

Resolução CFO-42, de 20/05/2003, alterado através da Resolução CFO-71 de

06/07/2006, que define obrigações e responsabilidades, em seu capítulo III, art. 5º.

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Art. 5º. Constituem deveres fundamentais dos profissionais inscritos:

I – zelar e trabalhar pelo perfeito desempenho ético da Odontologia e pelo prestígio

e bom conceito da profissão;

II – assegurar as condições adequadas para o desempenho ético-profissional da

odontologia, quando investido em função de direção ou responsável técnico;

III – exercer a profissão mantendo comportamento digno;

IV – manter atualizados os conhecimentos profissionais, técnico-científicos e

culturais, necessários ao pleno desempenho do exercício profissional;

V – zelar pela saúde e pela dignidade do paciente;

VI – guardar segredo profissional;

VII – promover a saúde coletiva no desempenho de suas funções, cargos e

cidadania, independentemente de exercer a profissão no setor público ou

privado;

VIII – elaborar e manter atualizados os prontuários de pacientes, conservando-os em

arquivo próprio;

IX – apontar falhas nos regulamentos e nas normas das instituições em que

trabalhe, quando as julgar indignas para o exercício da profissão ou

prejudiciais ao paciente, devendo dirigir-se, nesses casos, aos órgãos

competentes;

X – propugnar pela harmonia na classe;

XI – abster-se da prática de atos que impliquem mercantilização da Odontologia ou

sua má conceituação;

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XII – assumir responsabilidade pelos atos praticados;

XIII – resguardar sempre a privacidade do paciente.

Como se pode perceber, a exigência do órgão regulador dos profissionais

da Odontologia se desdobra em três vertentes básicas:

√ a primeira, na obrigação geral de prestação de serviços odontológicos

com diligência;

√ a segunda, na obrigação de fazer, mas exercendo o princípio da

liberdade terapêutica;

√ a terceira, a obrigação de atualização constante, a fim de que, com

novos conhecimentos teórico/práticos e com novos materiais e

equipamentos, tornar mais eficaz seu trabalho.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo do presente estudo foi apresentar uma contribuição teórica sobre

a Responsabilidade civil do Cirurgião dentista, quanto ao dever de indenizar seu

paciente/cliente por possível dano sofrido. Neste contexto, buscou-se observar até

que ponto a Odontologia pode ser vista, em nosso ordenamento jurídico, como

profissão com obrigação de meio ou de resultado.

Convem aqui ressaltar que a profissão do Cirurgião dentista, assim como

em outras profissões da área da saúde, estabelece uma ligação direta com o

homem, procurando sempre seu bem estar. É por esse motivo que esse tipo de

profissão acarreta riscos, tanto para o profissional, quanto para o seu paciente. Há

que se dizer, portanto, que a vida em sociedade requer cuidados, e acima de tudo,

exige-se cautela dos profissionais que lidam com alguns dos bens mais valiosos do

ser humano: a saúde e a vida.

Observou-se, ao longo da pesquisa, que o aumento das demandas judiciais

contra Cirurgiões dentistas foi resultado de vários fatores, dentre eles pode-se

destacar: a maior conscientização da população brasileira quanto aos seus direitos,

o melhor acesso ao judiciário, o avanço dos diplomas legais na tentativa de tutelar a

supremacia do interesse público, e, de forma específica, os direitos do consumidor;

o aumento de profissionais da Odontologia no mercado de trabalho, determinando

uma crescente intervenção odontológica e, por conseguinte o risco de erros e de

iatrogênias cometidas pelos Cirurgiões Dentistas.

Mediante ao exposto, pode-se dizer que não há uma definição exata se a

responsabilidade do profissional da odontologia é de meio ou de resultado, mas é

possível avaliar que se a obrigação for de resultado, o Cirurgião dentista, quando da

sua convocação para responder em juízo, deverá provar que conseguiu chegar ao

resultado prometido a paciente/cliente. De outra forma, caso seja considerado que a

obrigação do profissional é de meio caberá ao paciente/cliente o ônus de provar a

culpa do Cirurgião dentista.

A conclusão a que se chega é que, mesmo apesar dos escassos

posicionamentos existentes sobre o tema em foco, acredita-se que o caso concreto

deve ser analisado de forma minuciosa, para que se possa determinar qual espécie

de responsabilidade é adequada para o fato, ou seja, tanto pode haver obrigação de

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meio, quanto de resultado nas relações entre o Cirurgião dentista e seu

paciente/cliente.

Em suma, cabe aos operadores do direito estarem atentos e concatenados

com as evoluções que acontecem a todo momento, no mundo e em todas as áreas,

apontando o melhor caminho que as relações sociais devem tomar, para que elas

sejam harmônicas e tranqüilas, e, mediante questões, por vezes, tão delicadas que

é a discussão de um dano à saúde e de sua respectiva responsabilidade, devem

eles saber conferir de quem é realmente a responsabilidade civil de tal fato, para em

fim manter a ordem nas relações sociais.

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