universidade de sÃo paulo instituto de fÍsica de … · a luz refletida passa então pela cubeta...

118
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO INSTITUTO DE FÍSICA DE SÃO CARLOS ANDERSON ROBERTO DE OLIVEIRA Polarímetro diferencial baseado na reflexão interna São Carlos 2016

Upload: voxuyen

Post on 09-Feb-2019

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

UNIVERSIDADE DE SO PAULO

INSTITUTO DE FSICA DE SO CARLOS

ANDERSON ROBERTO DE OLIVEIRA

Polarmetro diferencial baseado na reflexo interna

So Carlos

2016

ANDERSON ROBERTO DE OLIVEIRA

Polarmetro diferencial baseado na reflexo interna

Tese apresentada ao Programa de Ps-

Graduao em Fsica do Instituto de Fsica de

So Carlos da Universidade de So Paulo, para

obteno do ttulo de Doutor em Cincias.

rea de concentrao: Fsica Aplicada

Orientador: Prof. Dr. Srgio Carlos Zilio

Verso Corrigida

(Verso original disponvel na Unidade que aloja o Programa)

So Carlos

2016

A Iahweh, antes de tudo e de todos,

simplesmente por ser Deus.

AGRADECIMENTOS

A Deus, pela graa e misericrdia.

Aos meus pais, Claudemir e Rita, e ao meu irmo, Douglas, pelo amor recproco e apoio

incondicional.

minha namorada, Karen, pelo companheirismo, amor, amizade, sinceridade, cumplicidade,

respeito e por ser o amor da minha vida.

Ao Prof. Dr. Srgio Carlos Zilio pelos nove anos de orientao acadmico-cientfica, pela

pacincia, pela amizade, pelos valores transmitidos e pelo exemplo de seriedade e

profissionalismo com relao carreira acadmica.

Aos Profs. Drs. Cleber Renato Mendona, Lino Misoguti e Leonardo De Boni, pela amizade,

pelo companheirismo, pelo apoio, pelas discusses e pelos momentos de descontrao.

Aos tcnicos de laboratrio Andr Romero e Marcos Cardoso.

Aos amigos e companheiros do Grupo de Fotnica do IFSC, Otuka, Vincius, Chico, Jordan,

Renato, Caio, Emerson, Oriana, Franciele, Tiago, P.H., Jonathas, Juliana, Ruben, Nathlia,

N, Velma, Pi e Link.

Aos funcionrios do Instituto de Fsica de So Carlos, do servio de Ps Graduao e da

Biblioteca pelo atendimento sempre cordial e eficiente.

Aos amigos Du, Pops, Valdemar, Flavinho, Patrcia, Talitha, Maria Luiza, Eskeleto, Kaka,

Caio, Rebeca, Valdo, Gostosa, Espiozinho, Pirata, Taffarel, Cora.

minha segunda famlia, em Bauru: Dona Sandra, Dona Mara e Seu Oswaldo.

Aos times de Futsal e Futebol do CAASO nas pessoas dos atletas B2, Militar, Matheus,

Marco, Gordo, Adam, Gui, Fronha, Calota, Perigo, Furlan, Kelvin, Ricardinho, Edson,

Maminha, Cirilo, Salsicha, Cassiano, Mino, Chico, Sikeira, Bodelho, Luiz, Jaca (professor),

Adauto, Renato, Flvio, Meia, Deda, Goiaba, Bruno, Zanata, Breno, Clovis e tantos outros

com os quais dividi quadras e campos lutando pela vitria e reconhecimento do CAASO na

rea dos esportes.

todas as pessoas que no esto listadas aqui mas estiveram presentes em minha vida e, de

alguma forma, contriburam para a realizao deste trabalho e para a minha formao moral e

intelectual.

CAPES pelo apoio financeiro.

A cincia toda observao, toda exatido,

toda verificao experimental. Perceber os

fenmenos, discernir as relaes, comparar

as analogias e as dessemelhanas, classificar

as realidades, e induzir as leis, eis a cincia;

eis, portanto, o alvo que a educao deve

ter em mira.

Rui Barbosa

RESUMO

OLIVEIRA, A. R. Polarmetro diferencial baseado na reflexo interna. 2016. 116 p. Tese

(Doutorado em Cincias) Instituto de Fsica de So Carlos, Universidade de So Paulo, So

Carlos, 2015.

Neste trabalho apresentamos uma nova tcnica para a medida da rotao da polarizao da luz

por uma substncia que possui atividade ptica. O sistema utiliza um LED, dois

polarizadores, um prisma de vidro semicilndrico, uma cubeta, uma CCD e um computador

para anlise de dados. Luz proveniente do LED passa pelo primeiro polarizador, cujo eixo de

transmisso se encontra a 45, e incide no prisma pelo lado semicilndrico, ocorrendo reflexo

na sua base, num ngulo prximo do ngulo crtico. Devido ao tamanho finito do feixe e o

formato curvo da superfcie do prisma, vrios ngulos de incidncia so observados na base

da lente semicilndrica. A luz refletida passa ento pela cubeta e depois por um analisador,

cujo eixo se encontra paralelo ao primeiro polarizador, e ento o sinal captado pela CCD.

De forma alternativa, a cubeta pode ser posicionada aps o primeiro polarizador, antes do

prisma. Quando a cubeta preenchida com gua, observa-se na CCD uma interferncia

destrutiva exatamente no ngulo crtico caracterizado por um mnimo de intensidade nesse

ngulo. Se uma substncia opticamente ativa utilizada para preencher a cubeta, a posio

desse mnimo alterada dependendo do ngulo de rotao da polarizao imposto pela

substncia. Uma calibrao necessria e pode ser feita utilizando-se solues de

concentrao conhecida de sacarose ou frutose, por exemplo. O aparato obtido foi utilizado

para medir a rotao causada por uma amostra normal (0,26 g/ml) de solues de sacarose e

frutose e apresenta uma preciso de 0,04. Equivalentemente, a preciso em concentrao de

0,001 g/ml ou aproximadamente 0,1% (m/m). Isso corresponde a uma preciso que uma

ordem de grandeza acima dos aparelhos comerciais e tcnicas mais comuns utilizadas

atualmente. Em contrapartida, o custo da montagem experimental duas ordens de grandeza

menor que os mesmos aparelhos comerciais. A produo de uma gama de ngulos de

incidncia devido focalizao na superfcie cilndrica do prisma substitui a necessidade de

se produzir rotao no eixo de polarizao do analisador aps a passagem da luz pela amostra

opticamente ativa, como ocorre em alguns aparelhos comercializados. Este dispositivo, por

ser de baixo custo, compacto e de fcil manuseio, de grande importncia porque pode ser

utilizado na indstria sucroalcooleira para a medida da quantidade de sacarose em cana e

tambm na indstria farmacutica para a identificao de substncias opticamente ativas

dextrogiras ou levgiras.

Palavras-chave: Polarimetria. ngulo crtico. Substncias opticamente ativas. Reflexo total

interna. Dispositivos pticos.

ABSTRACT

OLIVEIRA, A.R. Differential polarimeter based on internal reflection. 2016. 116 p. Tese

(Doutorado em Cincias) Instituto de Fsica de So Carlos, Universidade de So Paulo, So

Carlos, 2015.

In this thesis we present a novel technique for measuring light polarization rotation caused by

an optically active substance. The system is composed by a LED, two polarizers, a semi

cylindrical glass prism, a cuvette, a linear CCD camera and a computer for data analysis.

Light from the LED passes through the first polarizer, whose transmission axis is set at 45.

After that, the linear polarized light enters the prism by the semi cylindrical face, occurring

reflection in the flat face at critical angle approximately. Several incidence angles are

accessed due to the beams finite size and the shape of the semi cylindrical lens. The reflected

light passes through the cuvette and then through the analyzer, whose transmission axis is set

parallel to the first polarizer. Finally, the light is detected by the CCD. When the cuvette is

filled up with water, a destructive interference at the critical angle is observed, characterized

by a narrow valley centered at this angle. If the cuvette is filled up with an optically active

substance, the center of this valley is shifted depending on the substance, its concentration and

the optical path travelled by the light in the substance. A calibration is needed and is

performed using a set of solutions of known concentrations. Our apparatus was used to

measure the angle rotation caused by a normal solution (0,26 g/ml) of sucrose and fructose

solutions and has a precision of 0,04. It corresponds to a precision that is one order of

magnitude above most used commercial apparatus and developed techniques. In contrast, the

cost of our experimental setup is two orders of magnitude less than the same commercial

devices. The production of a range of angles of incidence due to focusing on the cylindrical

surface of the prism replaces the need of producing a rotation of the analyzer polarization axis

after the light passes through the optically active sample, as it happens in some commercial

devices. Since this device has a low cost, is compact and easy to handle, it may be of great

importance for applications in the pharmaceutical industry to identify enantiomers, and in the

sugar industry for measuring sugar content in sugar cane juice.

Keywords: Polarimetry. Critical angle. Optical active substances. Total internal reflection.

Optical devices.

LISTA DE FIGURAS

Figura 1.1 - Desenho esquemtico da montagem experimental desenvolvida.............. 24

Figura 2.1 - (a) Polarizao elptica direita. A defasagem entre as componentes de

polarizao s e p est dentro do intervalo 0 < < . (b) Polarizao elptica esquerda, para valores de defasagem dentro do intervalo

< < 2.............................................................................................. 32

Figura 2.2 - (a) Polarizao circular direita, com defasagem entre as componentes

s e p de =

2 e (b) polarizao circular esquerda, cuja defasagem

entre as componentes de =3

2.............................................................. 33

Figura 2.3 - Polarizao linear. O campo oscila sobre a linha nos quadrantes 1 e 3 do

plano da figura quando a defasagem entre as componentes s e p for nula,

= 0, e sobre a linha nos quadrantes 2 e 4 do plano quando = . Nesta figura, o vetor de propagao perpendicular ao plano da figura,

apontando para fora do mesmo.................................................................. 34

Figura 2.4 - ndice de refrao em funo da frequncia. As regies de disperso

normal se caracterizam pelo crescimento do ndice de refrao com a

frequncia. Na disperso anmala, o ndice de refrao decresce com o

crescimento da frequncia.......................................................................... 38

Figura 2.5 - Coeficiente de absoro em funo da frequncia da luz. A frequncia

em que h o pico de absoro coincide com a frequncia 0.................... 40

Figura 2.6 - Volume V, delimitado pela superfcie S, sobre a interface entre dois

meios 1 e 2................................................................................................. 41

Figura 2.7 - Superfcie A, delimitada pela curva C, sobre a interface entre os meios 1

e 2............................................................................................................... 43

Figura 2.8 - Incidncia oblqua de uma onda plana em uma interface entre dois

meios dieltricos. Os vetores 1, 1 e 2 so os vetores de propagao

da onda incidente, da refletida na interface de volta ao meio 1 e da

transmitida para o meio 2, respectivamente............................................... 46

Figura 2.9 - Incidncia oblqua de onda com polarizao perpendicular ao plano de

incidncia em interface entre dois meios. Nessa situao, a conveno

escolhida foi tal que os campos eltricos apontam para o mesmo

sentido, entrando no plano da figura.......................................................... 50

Figura 2.10- Incidncia oblqua de onda com polarizao paralela ao plano de

incidncia em interface entre dois meios. Nessa situao, a conveno

escolhida foi tal que os campos induo magntica apontam para a

mesma direo, saindo do plano da figura................................................. 52

Figura 2.11- Mdulo de rp e rs em funo do ngulo de incidncia para a reflexo da

luz na interface entre um vidro SF10 (1 = 1,72) e o ar (2 1). Para esta simulao, o comprimento de onda da luz considerado foi de 589

nm............................................................................................................... 55

Figura 2.12- Diferena entre as fases ganhas pelas ondas s e p ao serem refletidas em

uma interface entre dois meios de ndice 1 = 1,72 e 2 = 1. Para esta simulao, o comprimento de onda da luz considerado foi de 589 nm..... 56

Figura 2.13- Perfil de intensidades em funo do ngulo de incidncia considerando-

se a interferncia entre as ondas s e p refletidas em uma interface vidro

(1 = 1,72) e ar. Para esta simulao, o comprimento de onda da luz considerado foi de 589 nm......................................................................... 59

Figura 2.14- Polarizao linear deslocada de 45 por um ngulo ............................... 60

Figura 2.15- Perfis de intensidade da interferncia entre as componentes s e p de uma

onda linearmente polarizada a (45+) aps a reflexo em uma interface

entre vidro e ar e, em sequncia, aps a transmisso por um polarizador

com eixo de transmisso a 45 em funo do ngulo de incidncia para

= -3, -2, -1, 0, 1, 2 e 3 com n2/n1= 1/1,727221. Para esta

simulao, o comprimento de onda da luz considerado foi de 589

nm............................................................................................................... 61

Figura 2.16- ngulo de reflexo do mnimo de intensidade na reflexo de uma onda

linearmente polarizada a (45 + ) em uma interface entre vidro (SF10, Schott) e ar em funo de . Para esta simulao, o comprimento de

onda da luz considerado foi de 589 nm...................................................... 62

Figura 2.17- Espectro tpico de um LED amarelo de banda larga.................................. 63

Figura 2.18- ndice de refrao em funo do comprimento de onda do vidro SF10

considerando os coeficientes de Sellmeier da Tabela 2.1.......................... 64

Figura 2.19- Perfis de intensidade da luz policromtica linearmente polarizada a

(45 + ) aps a reflexo na interface entre vidro (SF10, Schott) e ar e aps o analisador em funo do ngulo de incidncia para = 0, -1, -2 e

-3............................................................................................................... 65

Figura 2.20- Posio do mnimo de intensidades em funo de para fonte de luz de

banda larga. O experimento aqui sendo feito consiste da reflexo de

uma onda policromtica linearmente polarizada a (45 + ) e sequencialmente a transmisso por um polarizador com eixo de

transmisso a 45....................................................................................... 65

Figura 2.21- Comparao do perfil de intensidades aps o analisador para luz

monocromtica de comprimento de onda de 596 nm (linha vermelha) e

luz policromtica (linha preta)................................................................... 66

Figura 3.1 - Desenho esquemtico da montagem experimental com o laser como

fonte de luz. Nessa montagem, a cubeta posicionada aps o

polarizador e antes do prisma semi cilndrico............................................ 75

Figura 3.2 - (a) Desenho esquemtico da montagem experimental com LED como

fonte de luz e (b) fotografia da montagem experimental vista de um

ponto superior. Nesta montagem, a cubeta posicionada aps o prisma

semi cilndrico e antes do analisador......................................................... 75

Figura 3.3 - Perfil de intensidades tpico obtido na CCD nas proximidades mnimo... 76

Figura 3.4 - Painel frontal do programa em LabVIEW construdo para a observao

e anlise dos dados captados pela CCD. Cada caixa vermelha desenhada

na figura representa um objeto do painel pelo qual fornecido um

parmetro ao programa ou ento observado um dado captado pela

CCD............................................................................................................ 77

Figura 3.5 - Desenho esquemtico da variao lateral da posio do mnimo de intensidades relacionada a uma mudana do ngulo de sada do mnimo de intensidades.............................................................................. 83

Figura 4.1 - Rotao da polarizao da luz imposta pelo polarizador de entrada em

funo da posio relativa do mnimo de intensidades. A curva

vermelha o ajuste parablico que fornece os parmetros da calibrao.. 86

Figura 4.2 - Medida da rotao da polarizao provocada pelas amostras da Tabela

4.1 em funo da concentrao. Os tringulos azuis correspondem aos

valores da rotao da polarizao obtidos para cada amostra

considerando-se a calibrao feita pela rotao do polarizador de

entrada. Os pontos vermelhos so os valores esperados. A montagem

experimental esquematizada na fig. 3.1.................................................. 87

Figura 4.3 - Campo induo magntica no centro do solenoide em funo da

corrente aplicada. A reta vermelha representa o ajuste de calibrao........ 88

Figura 4.4 - Rotao da polarizao da luz imposta pelo cristal de TGG em funo

da posio do mnimo de intensidades. A curva vermelha o ajuste

parablico que fornece os parmetros da calibrao.................................. 89

Figura 4.5 - Medida da rotao da polarizao provocada pelas amostras da Tabela

4.2 em funo da concentrao. Os pontos vermelhos correspondem aos

valores da rotao da polarizao obtidos para cada amostra

considerando-se a calibrao feita com o cristal de TGG. Os pontos

pretos so os valores esperados. A montagem experimental

esquematizada na fig. 3.1 com a adio de um solenoide e um basto

cilndrico de TGG entre o polarizador de entrada e a cubeta..................... 90

Figura 4.6 - Estudo da posio do mnimo em funo do tempo com amostra fixa na

configurao com laser como fonte de luz................................................. 92

Figura 4.7 - Rotao da polarizao da luz imposta pelas solues de sacarose em

funo da posio do mnimo de intensidades relativa situao onde a

cubeta de 1 cm de comprimento preenchida com gua destilada. Os

pontos pretos numerados de 1 a 7 representam as solues preparadas

nas propores 0, 5, 10, 15, 20, 25 e 30% (m/m), respectivamente, e so

usados para calibrar o sistema. A linha vermelha representa o ajuste

linear feito utilizando os pontos pretos e fornece os parmetros de

calibrao. O ponto vermelho representa a soluo normal (0,26 g/cm3)

e usado para testar a preciso e exatido do sistema............................... 94

Figura 4.8 - Rotao da polarizao da luz imposta pelas solues de frutose como

funo da posio do mnimo de intensidades relativa situao em que

a cubeta de 1 cm de comprimento preenchida com gua destilada. Os

pontos pretos representam as solues preparadas nas propores de 0,

5, 10, 15, 20, 25 e 30% (m/m) e so usadas para calibrar o sistema. A

linha vermelha representa o ajuste linear feito utilizando os pontos

pretos e fornece os parmetros de calibrao. O ponto vermelho

representa a soluo normal (0,26 g/cm3) e usada para testar a preciso

e exatido das medidas nesse sistema........................................................ 96

Figura 4.9 - (a) Temperatura obtida por meio do termopar como funo do tempo.

(b) Posio do mnimo de intensidades obtido pelo programa em

LabVIEW como funo da temperatura. A linha vermelha representa

um ajuste parablico que serve de guia para a anlise da posio mdia

do mnimo de intensidades......................................................................... 97

Figura 4.10- Figura esquemtica do efeito do desalinhamento do sistema. Quando o

feixe provindo do LED desalinhado, a posio do mnimo de

intensidades deslocada de uma distncia que depende dos ndices de refrao do vidro e do ar, da amplitude do desalinhamento e da distncia

da CCD ao prisma...................................................................................... 99

SUMRIO

1 Introduo .................................................................................................................................... 19

2 Fundamento terico .................................................................................................................... 25

2.1 Equaes de Maxwell........................................................................................................... 25

2.2 Equao de onda em meio dieltrico linear isotrpico ..................................................... 26

2.3 Ondas planas monocromticas ........................................................................................... 27

2.4 Polarizao da luz ................................................................................................................ 30

2.4.1 Polarizao elptica ............................................................................................................ 31

2.4.2 Polarizao circular ...................................................................................................... 32

2.4.3 Polarizao linear .......................................................................................................... 33

2.5 Disperso cromtica da luz ................................................................................................. 34

2.5.1 ndice de refrao .......................................................................................................... 37

2.5.2 Absoro ......................................................................................................................... 39

2.6 Condies de contorno na interface entre dois meios dieltricos .................................... 40

2.7 Reflexo e refrao na interface entre dois meios dieltricos .......................................... 45

2.8 Reflexo e coeficientes de Fresnel ....................................................................................... 48

2.8.1 Reflexo para onda s ..................................................................................................... 50

2.8.2 Reflexo para onda p ..................................................................................................... 52

2.9 O ngulo de Brewster e o ngulo crtico ............................................................................ 53

2.10 A fase adquirida na reflexo ............................................................................................... 55

2.11 Interferncia entre as polarizaes refletidas: onda monocromtica com polarizao

linear a 45 ............................................................................................................................ 57

2.12 Interferncia entre as polarizaes refletidas: onda monocromtica com polarizao

linear levemente deslocada de 45 ...................................................................................... 59

2.13 Interferncia entre as polarizaes refletidas: onda policromtica com polarizao

linear levemente deslocada de 45 ...................................................................................... 62

2.14 Dependncia da posio do mnimo com a temperatura .................................................. 67

2.15 Atividade ptica ................................................................................................................... 68

2.16 Efeito Faraday ...................................................................................................................... 70

3 Materiais e mtodos .................................................................................................................... 73

3.1 Montagem experimental...................................................................................................... 73

3.2 O software em LabVIEW.................................................................................................... 76

3.3 Calibrao e medida ............................................................................................................ 78

3.3.1 Calibraes e medida utilizando Laser como fonte de luz ......................................... 79

3.3.2 Calibrao e medida utilizando LED como fonte de luz ............................................ 81

3.4 Dependncia da posio do mnimo de intensidades com a temperatura ....................... 82

4 Resultados e discusses ............................................................................................................... 85

4.1 Medidas na configurao com laser como fonte de luz ..................................................... 85

4.1.1 Calibrao por rotao do polarizador de entrada e medida de amostras .............. 85

4.1.2 Calibrao com cristal de TGG e medida de amostras .............................................. 87

4.1.3 Problemas e dificuldades ............................................................................................... 91

4.2 Medidas na configurao utilizando LED como fonte de luz ........................................... 92

4.2.1 Calibrao e medida utilizando amostras de sacarose ............................................... 92

4.2.2 Calibrao e medida utilizando amostras de frutose ................................................. 95

4.3 Estudo da dinmica da posio do mnimo como funo da temperatura ..................... 97

5 Concluses ....................................................................................................................................... 101

Referncias .................................................................................................................................... 103

APNDICE A As relaes vetoriais, a notao de Einstein e o tensor de Levi Civita ........ 107

APNDICE B Nmeros complexos ......................................................................................... 113

19

1 Introduo

As grandezas fsicas primrias associadas ao campo eletromagntico so sua

intensidade, comprimento de onda, coerncia e polarizao. A polarimetria a parte da ptica

responsvel pelo estudo desta ltima. Historicamente, as primeiras observaes a respeito da

polarizao da luz se deram em 1669 com o fsico e matemtico dinamarqus Erasmus

Bartholinus. 1-2

Nesse ano, Bartholinus descobriu a dupla refrao da luz em um cristal de

espato da Islndia (uma variedade de calcita), embora ainda no estivesse ciente do fenmeno

da polarizao. Muitos anos depois, em 1808, tienne Louis Malus descobriu a polarizao da

luz por reflexo. 2-4

Ele observou que a luz do sol refletida em uma janela produzia duas

imagens ao atravessar um cristal de calcita. A intensidade relativa das imagens variava

conforme o cristal era girado em torno do eixo definido pela direo de incidncia da luz no

cristal. Essa observao foi usada como base para sua conhecida Lei de Malus, que relaciona

a intensidade da luz transmitida por um polarizador ao quadrado do cosseno do ngulo entre o

eixo de transmisso do polarizador e a direo da polarizao da luz linearmente polarizada.

Em 1811, Dominique Franois Jean Arago, um fsico e astrnomo francs, observou a

possibilidade de produzir rotao no plano de polarizao da luz linearmente polarizada

(atividade ptica) utilizando um cristal de quartzo. 2,4

Logo em seguida, em 1815, Jean

Baptiste Biot, estudou a atividade ptica de amostras lquidas. 4-6

Nesse mesmo ano, David

Brewster descobriu a relao entre o ndice de refrao e o ngulo de incidncia para o qual a

luz refletida na interface entre dois meios linearmente polarizada2 (alguns anos antes, Malus

j havia postulado a existncia de tal ngulo para a reflexo da luz na superfcie da gua). Em

1828, William Nicol inventou o prisma de Nicol, o primeiro filtro polarizador de fcil

manuseio1. Em 1832, Fresnel deduziu as leis que relacionam as fraes de luz refletida e

transmitida com o ngulo de incidncia em uma interface entre dois meios transparentes. 3-4

Curiosamente, Fresnel baseou seu estudo em modelos do mecanismo de vibrao do ter

(meio no qual se acreditava que a luz se propagava). Em 1845, Michael Faraday descobriu o

efeito que leva seu nome e relaciona a rotao da polarizao da luz linearmente polarizada

presena de um campo magntico. 2-3

Em 1850, Ludwig Ferdinand Wilhelmy utilizou a

polarimetria para o estudo da inverso do acar do caldo de cana. 1 Em 1873, James Clerk

Maxwell conjecturou que a luz uma onda eletromagntica a partir de algumas consideraes

tericas. 2-3

J em 1928, Edwin Herbert Land construiu os primeiros polarizadores dicroicos

do tipo folha. 6

20

A instrumentao para a determinao do plano de polarizao da luz teve inicio com

a utilizao do princpio da polarizao por reflexo. 1 Malus desenvolveu um aparato que

utilizava dois espelhos. O primeiro era posicionado em um ngulo apropriado para produzir

luz linearmente polarizada. O feixe era direcionado ao segundo espelho, que tinha duas

possibilidades de configurao: paralela ao primeiro espelho ou girado de 90 no eixo da

direo do feixe de luz em relao configurao paralela. No primeiro caso o segundo

espelho no causava efeito algum na luz refletida pelo primeiro espelho. No segundo caso,

nenhuma luz era refletida pelo segundo espelho. Em seu estudo, Malus associou as direes

do segundo espelho s direes dos pontos cardeais. Embora fosse de fcil construo e

determinasse qualitativamente bem o plano de polarizao, a polarizao da luz por reflexo

era ineficiente e a determinao precisa do plano de polarizao era quase impossvel. Um

grande avano foi obtido quando Biot construiu seu aparato substituindo o segundo espelho

da montagem de Malus por um cristal de espato da Islndia para atuar como analisador. O

cristal era posicionado de forma que a luz proveniente do espelho polarizador produzisse

somente uma imagem aps atravessar o espato da Islndia. Quando uma amostra opticamente

ativa era posicionada entre o espelho e o cristal, duas imagens eram produzidas aps o

analisador. Bastava ento girar o cristal de forma a produzir novamente uma imagem nica.

Com isso, o ngulo de rotao causado pela amostra era igual ao ngulo que o espato da

Islndia era rodado para que houvesse apenas uma imagem transmitida. O aparato de Biot

ainda possua limitaes quanto exatido das medidas devido qualidade da luz linearmente

polarizada produzida pelo espelho. A inveno do prisma de Nicol contribuiu para contornar

esse problema e, em 1842, Ventzke utilizou dois destes prismas para construir seu aparato,

sendo um deles usado como polarizador e o outro como analisador. O modo de

funcionamento do instrumento era semelhante ao construdo por Biot: os prismas eram

posicionados de forma que nenhuma luz era transmitida pelo analisador; quando uma amostra

opticamente ativa era posicionada entre os prismas, observava-se uma intensidade transmitida

no nula e o analisador era girado para extingui-la. Desde ento, o desenvolvimento de

aparelhos comerciais tem se dado com poucas variaes em relao ao aparato de Ventzke.

Os primeiros aparelhos comerciais utilizavam um motor ligado ao analisador para a rotao

automatizada do mesmo no intuito de extinguir o feixe transmitido. Mais recentemente foram

adicionados componentes para compensao da rotao da polarizao causada pelas

amostras, como cristais de materiais que apresentam efeito Faraday. Atualmente, so

comercializados polarmetros que possuem uma clula de Faraday utilizada para modular a

21

direo de oscilao da luz que incide na amostra de forma a aumentar a preciso da medida

polarimtrica. 7

A medida da rotao da polarizao da luz tem inmeras aplicaes em vrias reas.

Na indstria sucroalcooleira, a polarimetria apresenta um papel importantssimo na

determinao da qualidade das amostras de suco da cana de acar. De acordo com o

Conselho dos Produtores de Cana de Acar, Acar e lcool (CONSECANA), a qualidade

da cana est relacionada a um fator conhecido como Acar Total Recupervel (ATR). 8 Este,

por sua vez, depende de alguns fatores, entre eles duas importantes grandezas: o brix e a pol

do caldo. O brix definido como a porcentagem em massa dos slidos solveis dissolvidos

em soluo. Por exemplo, uma soluo preparada com 20 g de slidos solveis em 80 g de

gua destilada possuir brix igual a 20. No caso do caldo de cana, o principal slido solvel

a sacarose, contendo em menores quantidades a frutose e a glicose, entre outros. 9 A medida

do brix feita utilizando-se um refratmetro: o ndice de refrao de uma soluo aquosa

pode ser transformado em brix utilizando-se uma tabela de converso como, por exemplo, a

fornecida pelo ministrio de agricultura dos EUA. 10

A pol o teor de sacarose aparente do

caldo. dado como uma porcentagem em unidades de massa. 8 Ela obtida atravs de uma

equao em que esto envolvidos o brix e a leitura sacarimtrica da soluo. Esta ltima

resultado de uma converso linear envolvendo a medida da rotao da polarizao da luz

linearmente polarizada causada pela amostra de caldo de cana. Na Escala Internacional de

Acar (International Sugar Scale ISS), uma leitura sacarimtrica de 100 Z definida

como a rotao da polarizao da luz linearmente polarizada da linha verde do istopo de

mercrio 198

Hg quando esta atravessa uma clula de 20 cm contendo soluo de sacarose em

gua destilada concentrao de 0,2600 g/ml (conhecida como soluo normal), a 20C.

Nessas condies, 100 Z corresponde a uma rotao de 40,777. 11

Em outros comprimentos

de onda, o ponto de 100 Z corresponde a outras rotaes devido disperso da rotao

especfica. Uma leitura de 0 Z corresponde rotao causada por gua destilada, ou seja,

uma rotao nula. No intervalo entre 0 e 100 Z, a escala linear com a concentrao da

amostra. Em geral, para indstria do etanol, quanto maiores o brix e a pol, melhor a

qualidade da cana.

Na indstria farmacutica, a polarimetria utilizada para a caraterizao e

determinao da pureza de compostos, tais como analgsicos, aminocidos, cocana, entre

outros. 12-16

Essas substncias apresentam isomeria ptica. Ismeros pticos so dois

compostos que apresentam a mesma frmula molecular, mas suas estruturas espaciais so a

imagem especular uma da outra. So chamados de enantimeros e tm a capacidade de rodar

22

o plano de polarizao da luz para lados diferentes. Podemos usar como exemplo a

talidomida. Essa substncia apresenta dois ismeros pticos: a talidomida (S) que levgira

(roda o plano da polarizao da luz no sentido anti-horrio) e a talidomida (R), que

dextrgira (roda o plano de polarizao da luz no sentido horrio). Fisiologicamente, o

enantimero (S) da talidomida est associado m formao de fetos, enquanto o

enantimero (R) tem funo analgsica sedativa. 17

Nesse sentido, a polarimetria mostra-se

importante para anlise estrutural das substncias e separao de enantimeros

potencialmente prejudiciais em misturas racmicas.

Na astronomia, a polarimetria amplamente utilizada como tcnica complementar

espectroscopia e fotometria. Tem aplicaes no estudo da radiao emitida por corpos

celestes, 18-19

no estudo das propriedades do campo magntico interestelar, 20

deteco de luz

espalhada para a determinao da distribuio de matria no entorno das estrelas, 21

determinao da estrutura de blazares, 22

entre muitas outras.

H muito tempo a atividade ptica de compostos em soluo tem sido quantificada por

meio da medida da rotao do plano de polarizao da luz linearmente polarizada transmitida

por uma amostra lquida. 23

Durante os anos, vrias tcnicas polarimtricas foram

desenvolvidas. Podemos dividi-las em dois tipos: as por transmisso e as por reflexo. As

tcnicas por transmisso envolvem a captao da luz aps atravessar a amostra. As por

reflexo envolvem a anlise do sinal luminoso aps uma reflexo em alguma superfcie de

algum componente da montagem experimental, no sendo este componente necessariamente a

clula que contm a amostra opticamente ativa. Essa reflexo pode se dar antes ou depois da

propagao pela soluo. Dentro de cada um desses dois grupos, podemos ainda destacar dois

subgrupos baseados no tipo de deteco. So chamadas tcnicas por deteco heterdina e por

deteco homdina. Polarmetros baseados em deteco heterdina, tanto no modo de

transmisso24-28

quanto no de reflexo29-30

traduzem rotao ptica em diferena de fase, o que

os torna mais rpidos25

e driblam a necessidade de um tempo de integrao maior para

melhoria da preciso. 31

Isso geralmente feito por meio de uma modulao da fonte de luz e

separao do feixe em duas partes: uma usada como referncia e outra usada para provar a

amostra. Subsequentemente, provoca-se interferncia entre os feixes gerados. A modulao

tem a vantagem de ajuda a reduzir efeitos de instabilidade da fonte. 32

As tcnicas

homdinas23,33-37

no usam interferncia entre feixes. Elas medem diretamente a rotao do

plano de polarizao da luz. Como exemplo, Zhou et al.23

propuseram uma forma de medir

rotaes pticas no modo de reflexo. Luz linearmente polarizada de um LED colimada por

uma lente e direcionada a uma cubeta num determinado ngulo de incidncia. A cubeta

23

preenchida com glicose. O feixe atravessa a soluo opticamente ativa e parte refletida na

ltima superfcie da cubeta. Essa poro de luz atravessa a amostra uma segunda vez. Em

seguida, as componentes de polarizao paralela (p-) e perpendicular (s-) ao plano de

incidncia so separadas por um cubo divisor de feixes polarizados. A razo entre a diferena

de intensidades das componentes e a intensidade total da luz incidente relacionada ao ngulo

de rotao imposto pelo meio opticamente ativo. Num outro exemplo, em um trabalho

recente, Ribeiro et al. 37

desenvolveram um polarmetro no modo de transmisso baseado na

deteco das intensidades das componentes s e p da luz previamente separadas por um prisma

de Glan-Taylor ou, alternativamente, um prisma de Wollaston. A luz linearmente polarizada a

45 tem sua polarizao rodada ao atravessar uma amostra opticamente ativa. Em seguida, a

incidncia no prisma separa as componentes e cada uma delas direcionada a um detector. A

razo entre as intensidades medidas em cada detector permite a determinao do ngulo de

rotao da polarizao. Assim como essa, as demais tcnicas, tanto por reflexo quanto por

transmisso, por deteco heterdina ou no, tambm possuem uma boa resoluo

(geralmente melhor que 2.10-3

). Apesar disso, elas tm em comum a presena de

equipamentos de alto custo, elevada complexidade e tamanhos considerveis, como

amplificadores lock-in, retardadores, moduladores acusto pticos ou eletro pticos, alm de

prismas e divisores de feixe.

Juntamente com a polarimetria, a refratometria forneceu os primeiros mtodos para a

investigao da estrutura de molculas orgnicas sem causar a destruio da amostra a ser

examinada. 1 Muitas so as tcnicas refratomtricas existentes como, por exemplo, pela

medida do ngulo de desvio mnimo, 38-39

do ngulo de Brewster, 40-41

interferometria, 42-43

medida do ngulo crtico, 44-47

entre outros. Refratmetros baseados no desvio mnimo em um

prisma e nos ngulos crtico e de Brewster, tais como os refratmetros de Abbe e Pulfrich

foram discutidos na literatura. 48

Zilio 47

props um refratmetro simples e barato que se

baseia na diferena de fase adquirida pelas componentes da luz paralela e perpendicular ao

plano de incidncia quando estas sofrem uma reflexo interna. Definindo a luz incidente com

polarizao a 45 e posicionando aps a reflexo um polarizador com seu eixo de transmisso

paralelo polarizao inicial da luz, o perfil de intensidades transmitido por esse analisador

ir apresentar uma interferncia destrutiva exatamente no ngulo crtico. A medida desse

ngulo est diretamente ligada ao ndice de refrao relativo entre os meios envolvidos na

reflexo interna. 49-50

A tcnica apresentada por Zilio tem vrias aplicaes em sensores

pticos, como sensor de vcuo e umidade, medida do coeficiente de extino em amostras

trbidas, anlise de pureza de amostras de hidrocarbonetos, entre outros. Entretanto, existem

24

outras aplicaes ainda no exploradas pela tcnica e que so de interesse em sensores

pticos. A polarimetria uma delas.

Neste trabalho apresentamos uma nova tcnica no heterdina no modo de reflexo

para a medida da rotao do plano de polarizao da luz linearmente polarizada causada por

amostras opticamente ativas. O aparato experimental composto por um LED, dois

polarizadores, um prisma semicilndrico, uma cubeta, uma cmera CCD e um computador

para anlise de dados. A montagem experimental bastante semelhante proposta por Zilio47

com a adio de uma cubeta a ser preenchida com amostra opticamente ativa, como mostra o

esquema da fig. 1.1.

Figura 1.1 - Desenho esquemtico da montagem experimental desenvolvida.

Fonte: Elaborada pelo autor.

Luz proveniente do LED atravessa o polarizador, cujo eixo de transmisso se encontra

a 45, e incide na base do prisma, pelo lado cilndrico, com ngulo prximo ao ngulo crtico.

Aps a reflexo, a luz atravessa a cubeta que contm soluo aquosa de substncia

opticamente ativa. Um analisador posicionado aps a cubeta com seu eixo de transmisso

paralelo ao primeiro polarizador. Alternativamente, a cubeta pode ser posicionada antes do

prisma e aps o primeiro polarizador sem produzir alterao no perfil de intensidades

transmitido. Este observado na CCD e possuir um mnimo de fcil deteco cuja posio

na cmera depender do ngulo de rotao da polarizao da luz imposta pela amostra

presente na cubeta. Por meio dessa posio, pode-se determinar, por exemplo, a concentrao

da amostra no caso de uma soluo pura conhecida. Uma calibrao necessria e pode ser

feita utilizando-se amostras conhecidas de sacarose e frutose, por exemplo. Essa nova tcnica

pode ser utilizada na indstria sucroalcooleira para a medida sacarimtrica das amostras de

caldo de cana para a determinao da qualidade da matria prima com uma resoluo dentro

dos limites propostos pela Consecana8 e a um custo mais baixo. Aplica-se ainda na indstria

farmacutica na anlise de misturas racmicas para eventual separao de enantimeros por

ser sensvel aos diferentes sinais da rotao da polarizao imposta por substncias

dextrgiras e levgiras.

25

2 Fundamento terico

Neste captulo apresentamos as bases tericas que fundamentam o desenvolvimento

experimental. Apresentamos as equaes de Maxwell s quais as ondas eletromagnticas

devem obedecer. A partir delas, estabelecemos as leis de propagao de ondas

monocromticas e deduzimos o carter transversal das oscilaes do campo eletromagntico.

Estudamos o carter vetorial dos campos eletromagnticos introduzindo o conceito de

polarizao da luz. Demonstramos algumas propriedades dos meios dieltricos, tais como o

ndice de refrao e a absoro de luz a partir do modelo do oscilador harmnico amortecido

forado. Atravs do estudo da interao da luz na interface entre dois meios dieltricos,

demonstramos as leis de reflexo e refrao (lei de Snell) e os coeficientes de reflexo de

Fresnel partindo da aplicao das condies de contorno dos campos eltrico e induo

magntica na interface entre dois meios dieltricos no condutores e no magnticos. A partir

desses coeficientes, definimos os ngulos de Brewster e crtico. Apresentamos um mtodo

para a determinao da polarizao linear da luz em condies especiais de polarizao e

ngulo de incidncia na interface entre os meios. Esse mtodo se baseia na diferena de fase

adquirida pelas componentes de polarizao paralela e perpendicular ao plano de incidncia

na reflexo e posterior interferncia entre essas componentes aps a reflexo. Um perfil de

intensidades produzido e tem como caracterstica a presena de uma regio de mnimo de

fcil deteco que est relacionada polarizao da luz incidente. Apresentamos um breve

estudo da dependncia da posio do mnimo no perfil de intensidades em relao

temperatura. Aplicamos esse mtodo para a medida da rotao da polarizao da luz causada

por solues de substncias que apresentam quiralidade. Definimos a origem da atividade

ptica pela diferena do ndice de refrao para as polarizaes circulares direita e esquerda.

Por fim, apresentamos o efeito Faraday que ocorre em alguns materiais quando sujeitos a um

campo magntico: h a induo de atividade ptica no meio.

2.1 Equaes de Maxwell

A luz tem natureza eletromagntica. Por esta razo, ela deve obedecer s equaes de

Maxwell. Estas consistem de generalizaes de algumas observaes experimentais e so as

equaes fundamentais dos campos eletromagnticos. 51-52

A forma diferencial dessas

equaes dada por:

26

= 0 (2.1)

= (2.2)

=

(2.3)

= +

(2.4)

onde chamado campo induo magntica, o campo de deslocamento, a densidade

volumtrica de cargas livres, o campo eltrico, o campo magntico e a densidade

de corrente. A equao (2.1) conhecida por representar a inexistncia de monopolos

magnticos. A expresso (2.2) a conhecida Lei de Gauss. J a equao (2.3) chamada Lei

de Faraday. Por fim, a equao (2.4) a Lei de Ampre com a adio da corrente de

deslocamento feita por Maxwell.

2.2 Equao de onda em meio dieltrico linear isotrpico

As leis de propagao da luz em qualquer meio tambm devem ser obtidas a partir das

equaes de Maxwell. Em particular, consideremos um meio dieltrico ideal ( = 0), no

magntico e no condutor ( = 0 ). Nessas condies, = 0 e = + 0 = so

chamadas as relaes constitutivas dos campos no meio em questo, com = sendo a

polarizao do meio. Formalmente, esta ltima relao vlida no domnio das frequncias e,

em particular, no domnio do tempo no caso de uma onda monocromtica, sendo esta a

situao que consideramos. As constantes 0 , 0 , e so, respectivamente, a

permeabilidade do vcuo, a permissividade do vcuo, a permissividade do dieltrico e a

susceptibilidade do dieltrico. Podemos ento obter uma equao de onda para o campo

tomando o rotacional da Lei de Faraday:

( ) =

( ) ( ) 2 =

(0

)

27

2 02

2= 0

(2.5)

onde utilizamos a relao vetorial ( ) = ( ) 2 (ver Apndice A). Tambm

utilizamos as relaes constitutivas, a Lei de Gauss com densidade de cargas livres nula e a lei

de Ampre com a densidade de corrente nula.

Da mesma forma, para o campo induo magntica , podemos encontrar uma

equao de ondas ao tomar o rotacional da Lei de Ampre, utilizar as relaes constitutivas e

a Lei de Faraday.

2 02

2= 0

(2.6)

Uma vez que o dieltrico considerado no magntico e no condutor, o campo

magntico obedece a uma equao de ondas idntica s equaes para os campos e . As

equaes (2.5) e (2.6) mostram que os campos e so ondas que se propagam no espao

tridimensional dentro do meio e cuja velocidade de propagao, , dada por:

=1

0

(2.7)

Se o meio em questo for o vcuo, a velocidade de propagao da onda a velocidade

da luz em tal meio, dada por = 1 00 . Podemos ento definir o ndice de refrao do

meio como sendo a razo entre a velocidade da luz no vcuo e a velocidade da luz no meio:

=

0

(2.8)

2.3 Ondas planas monocromticas

Precisamos agora encontrar solues para as equaes (2.5) e (2.6). Essas solues

devem satisfazer primeiramente as equaes de Maxwell. Vamos considerar, por

simplicidade, somente a equao para o campo eltrico. Uma soluo simples da equao de

28

onda envolve assumir que a luz monocromtica, ou seja, a oscilao temporal possui

frequncia nica, que chamaremos . Utilizando o formalismo de variveis complexas (ver

Apndice B), podemos escrever o campo eltrico real como sendo a parte real de:

( , ) = ( ) (2.9)

Consideremos agora que a permissividade do dieltrico possa ser reescrita como

= 0. A constante chamada coeficiente dieltrico ou constante dieltrica. O ndice de

refrao, ento, pode ser escrito como = . As constantes , e geralmente so

grandezas complexas. Por simplicidade, aqui consideraremos todas elas como escalares reais.

Mais adiante, no estudo da disperso cromtica em um dieltrico na seo 2.5, consideramos

o ndice de refrao complexo, cuja notao , e o ndice de refrao, , a parte real de .

Substituindo a (2.9) na (2.5), obtemos uma equao para ( ):

2 ( ) + 002 ( ) = 0 (2.10)

Esta equao anloga de um oscilador harmnico cujas solues linearmente

independentes so obtidas escolhendo os diferentes sinais da expresso seguinte:

( ) = 0 (2.11)

sendo que o mdulo do vetor dado por:

| | = 00 =

(2.12)

Podemos definir ainda o comprimento de onda, , como sendo:

=2

(2.13)

Portanto, podemos escrever o campo ( , ) como:

29

( , ) = 0( ) (2.14)

A expresso (2.14) representa duas ondas planas. Ondas planas so caracterizadas pelo

fato de que, em um determinado instante de tempo, a fase da onda a mesma em todos os

pontos de cada plano perpendicular direo de propagao, definida pelo vetor . Se

tomarmos o sinal de menos na expresso, obtemos uma onda plana monocromtica

propagante, no sentido positivo definido por . Ao tomar o sinal positivo, a expresso

representa uma onda plana monocromtica contra-propagante, ou seja, no sentido contrrio ao

definido pelo vetor .

Analogamente, para o campo podemos encontrar uma soluo da equao de onda

que consiste de uma onda plana monocromtica dada por:

( , ) = 0( ) (2.15)

O coeficiente 0 pode ser considerado arbitrrio e depende das condies iniciais. O

coeficiente 0 relacionado a 0 por meio das equaes de Maxwell. A aplicao das

equaes de Maxwell nas expresses (2.14) e (2.15) resulta nas seguintes condies:

= 0 0 = 0 (2.16)

= 0 0 = 0 (2.17)

=

0 = 0

(2.18)

=

0 = 0 0

(2.19)

Podemos extrair algumas informaes importantes das equaes acima. As equaes

(2.16) e (2.17) nos dizem que os campos eltrico e induo magntica no possuem

componente na direo do vetor , ou seja, so perpendiculares direo de propagao. J a

expresso (2.18) nos permite concluir que os vetores 0 e 0 tambm so perpendiculares

30

entre si, pois 0 pode ser obtido do produto vetorial de e 0. Essa mesma informao pode

ser obtida da (2.19). Definindo o versor que d o sentido de propagao da onda como

, podemos reescrever as duas ltimas expresses de uma forma que relaciona os

campos eltrico e induo magntica de uma forma mais simples:

0 =

0

(2.20)

0 =

0

(2.21)

onde substitumos a velocidade da luz no vcuo, a definio do ndice de refrao (2.8), e o

mdulo do vetor (2.12).

2.4 Polarizao da luz

O prximo passo no estudo do campo eltrico da luz a anlise da natureza vetorial

dos campos e suas amplitudes. Primeiramente, definimos o plano de polarizao da luz como

sendo o plano determinado pela direo do campo eltrico e a direo de propagao da luz.

Para simplificao, consideraremos somente o campo eltrico de uma onda propagante:

( , ) = 0( ) = 0

( )

Consideremos tambm trs versores ortogonais entre si, , e . O versor

escolhido por ser o que d a direo da propagao da onda. A denominao dos demais

versores ficar clara mais adiante. De acordo com a equao (2.17), 0 = 0. Portanto,

podemos decompor a amplitude 0 do campo nas direes de e da seguinte forma:

0 = +

Tanto quanto podem ser nmeros complexos. Podemos reescrever essas

amplitudes em termos do produto de seus mdulos pela exponencial complexa de uma fase:

31

= ||

= ||

possvel ainda fazer uma mudana na origem dos tempos para escolhermos, por

exemplo, = 0 , de forma que a fase da componente p seja a defasagem entre as

componentes. Com isso, reescrevemos o campo eltrico como:

( , ) = (|| + ||)( ) = ||

( ) + ||( )

Para melhor analisar a polarizao, consideremos a parte real da expresso acima.

Vale lembrar que a parte real que representa o campo eltrico real:

( , ) = || cos( ) + || cos( ) (2.22)

Partindo da expresso (2.22), vamos analisar o comportamento do vetor campo

eltrico para os intervalos de valores de e alguns casos especiais.

2.4.1 Polarizao elptica

Consideremos dois intervalos de valores de : 0 < < e < < 2 . Para

esses valores, a expresso (2.22) representa um campo cuja polarizao chamada elptica.

Para valores de no hemisfrio superior do ciclo trigonomtrico, o vetor campo eltrico gira

no sentido horrio, sendo esta polarizao conhecida como elptica direita. Quando

assume qualquer valor no hemisfrio inferior do ciclo trigonomtrico, a polarizao

chamada elptica esquerda, pois o campo, e consequentemente o plano de polarizao, gira

no sentido anti-horrio. Em ambos os casos, o mdulo do campo eltrico nunca se anula.

Essas situaes so esquematizadas na fig. 2.1. A direo de propagao, , perpendicular

ao plano da figura, apontando para fora da mesma.

O tamanho dos semieixos maior, a, e menor, b, e a inclinao, , do semieixo maior

dependem dos mdulos das amplitudes das componentes s e p e da defasagem entre elas, ,

por meio das seguintes expresses: 53

32

tan 2 = 2||||

||2 ||2

cos (2.23)

2 + 2 = ||2+ ||

2 (2.24)

= |||| sin (2.25)

Figura 2.1 (a) Polarizao elptica direita. A defasagem entre as componentes de polarizao s e p est

dentro do intervalo 0

33

( , ) = [ cos( ) sin( )] (2.26)

em que o sinal de (+) escolhido quando a defasagem de 2 e o sinal de (-) aparece

quando a defasagem de 3 2 .

Figura 2.2 (a) Polarizao circular direita, com defasagem entre as componentes s e p de p=/2 e (b)

polarizao circular esquerda, cuja defasagem entre as componentes de p=3/2.

Fonte: Elaborada pelo autor.

2.4.3 Polarizao linear

Ocorre quando = 0 ou = . No primeiro caso, as componentes s e p oscilam

em fase. No segundo, a componente p ganha um sinal negativo na equao (2.22). Assim,

podemos escrever o campo como:

( , ) = (|| ||) cos( ) (2.27)

em que o sinal de (+) escolhido quando a defasagem nula e o sinal de (-) aparece quando a

defasagem de . O campo eltrico, portanto, oscilar sobre a linha definida pelo vetor

(|| ||) que um vetor no plano definido pelos versores e , formando um ngulo

com a direo de , como esquematiza a fig. 2.3.

A amplitude do campo oscilar entre 0 e o valor mximo dado por ||2 + ||2

para ambos os valores de . A direo de propagao, , perpendicular ao plano da figura,

apontando para fora da mesma. O ngulo facilmente obtido observando-se a figura:

34

tan =||

||

(2.28)

Figura 2.3 Polarizao linear. O campo oscila sobre a linha nos quadrantes 1 e 3 do plano da figura quando a

defasagem entre as componentes s e p for nula, p=0, e sobre a linha nos quadrantes 2 e 4 do plano

quando p=. Nesta figura, o vetor de propagao perpendicular ao plano da figura, apontando

para fora do mesmo.

Fonte: Elaborada pelo autor.

2.5 Disperso cromtica da luz

de interesse compreender tambm qualitativamente como a resposta de um meio

dieltrico na presena do campo eletromagntico da luz. Por esta razo, precisamos estudar

como a luz interage com esse meio. Para isso, utilizaremos o modelo clssico para o

tratamento dos tomos do material. Esse modelo considera o tomo como um ncleo fixo e o

eltron preso ao ncleo por uma fora restauradora proporcional ao deslocamento do ponto

de equilbrio. Por simplificao, consideramos o campo eltrico oscilante em uma nica

direo, equivalente direo do deslocamento . Alm disso, h uma fora dissipativa

proporcional velocidade do eltron e o campo eletromagntico responsvel por uma fora

externa. Este o modelo do oscilador harmnico amortecido forado. Sendo a carga do

eltron , a fora eletromagntica exercida pelo campo da luz dada pela fora de Lorentz: 51

= ( + ) (2.29)

De acordo com a relao (2.20), o mdulo do campo induo magntica menor que o

mdulo do campo eltrico por um fator . Como da ordem de 1 e a velocidade da luz

muito maior que as velocidades tpicas que o eltron assume nesse modelo clssico,

conclumos que a fora exercida pelo campo desprezvel frente fora que o eltron

35

experimenta pela presena do campo . Desta forma, podemos escrever a equao diferencial

que determina a posio do eltron por meio da segunda lei de Newton:

2

2+

+ 0

2 =

(2.30)

onde a massa do eltron, est relacionado fora dissipativa e 0 a frequncia natural

do oscilador suposto pelo modelo. Um desenvolvimento mais rigoroso leva em conta uma

correo do campo local e est disponvel em livros-texto de eletromagnetismo. 51-52

Na

expresso acima, o campo eltrico pode ser escrito de acordo com a equao (2.14), ( , ) =

0( ).

Vamos analisar o argumento da exponencial do campo. Em particular, estamos

interessados na variao da fase da luz causada pela propagao em distncias da ordem do

deslocamento do eltron de seu ponto de equilbrio. O termo a ser analisado, portanto, .

Para um tomo tpico, os deslocamentos do eltron so da ordem de 1 . A onda

eletromagntica que consideramos aqui tem sua frequncia na regio visvel do espectro. A

luz de cor verde, por exemplo, se encontra prximo ao centro dessa regio espectral e tem

comprimento de onda de cerca de 5000 . Como o mdulo do vetor de propagao

inversamente proporcional ao o comprimento de onda, seguindo a equao (2.13), conclumos

que 1. Portanto, podemos considerar que o campo eltrico no varia espacialmente na

regio em que se encontra o eltron. Assim, simplificamos o campo de forma que a equao

diferencial possa ser reescrita como:

2

2+

+ 0

2 =

0

(2.31)

A soluo desta equao obtida supondo um deslocamento () da forma:

() = 0 (2.32)

Substituindo essa soluo na (2.31) e manipulando o resultado para possibilitar a

separao das partes real e imaginria de forma simples, encontramos:

36

0 =0

(02 2) +

(02 2)2 + 22

(2.33)

Considerando ento o deslocamento do eltron, podemos calcular o dipolo eltrico

induzido no tomo:

=20

(02 2) +

(02 2)2 + 22

(2.34)

Seja a densidade volumtrica de tomos no meio. A polarizao do mesmo pode

ser expressa da seguinte forma:

=2

(02 2) +

(02 2)2 + 22

0

(2.35)

Nesta expresso, separamos o termo 0 para identificar a proporcionalidade do

campo eltrico na expresso da polarizao de forma mais fcil. Pelas relaes constitutivas,

= . Portanto, a susceptibilidade expressa por:

=2

(02 2) +

(02 2)2 + 22

(2.36)

Por meio de uma manipulao algbrica simples das relaes constitutivas e da

frmula (2.8), podemos relacionar o ndice de refrao e a susceptibilidade da seguinte forma:

= 1 +

0

(2.37)

Aqui, expressamos o ndice de refrao como para ressaltar o carter complexo

dessa grandeza. Particularizando essa expresso para uma situao em que a razo entre a

susceptibilidade e a permissividade do vcuo muito menor que a unidade, podemos fazer a

seguinte aproximao para o ndice de refrao complexo:

37

1 +

20 (2.38)

O ndice de refrao propriamente dito a parte real de . A parte imaginria, , d

origem absoro de luz pelo meio enquanto h propagao. Assim, podemos escrever:

= + (2.39)

2.5.1 ndice de refrao

Tomando a parte real da expresso (2.38) e considerando a expresso da

susceptibilidade (2.36), conclumos que:

= () = 1 +2

20

(02 2)

(02 2)2 + 22

(2.40)

Caractersticas importantes do ndice de refrao podem ser extradas dessa expresso.

A primeira delas a dependncia com a frequncia e, consequentemente, com o comprimento

de onda. Isso chamado de disperso cromtica do ndice de refrao. Frequncias diferentes

da luz experimentaro ndices de refrao diferentes. Desta forma, as diferentes cores de luz

tero velocidades de propagao diferentes dentro do dieltrico. Portanto, quando um pulso de

luz de banda larga se propaga em um meio com disperso cromtica, h um alargamento

temporal do pulso devido s diferentes velocidades de propagao.

A segunda caracterstica mais facilmente analisada ao observarmos a fig. 2.4 que

representa um grfico qualitativo da dependncia do ndice de refrao com a frequncia. No

grfico, possvel notar a existncia de duas regies em que o ndice de refrao cresce com o

aumento da frequncia (ou diminuio do comprimento de onda) e uma regio em que h

diminuio de com o incremento da frequncia.

A regio no entorno da frequncia 0 na qual o ndice de refrao decresce com o

aumento da frequncia (intervalo destacado em cinza no grfico) conhecida como regio de

disperso anmala. Para os demais intervalos, o ndice de refrao cresce com o incremento

da frequncia, caracterizando a disperso normal. Em nosso experimento, trabalhamos na

regio de disperso normal.

38

Figura 2.4 ndice de refrao em funo da frequncia. As regies de disperso normal se caracterizam pelo

crescimento do ndice de refrao com a frequncia. Na disperso anmala, o ndice de refrao

decresce com o crescimento da frequncia.

Fonte: Elaborada pelo autor.

Outra caracterstica importante est relacionada frequncia 0. Esta, como veremos

mais a frente, a frequncia de absoro do material. Geralmente se encontra na regio do

ultravioleta para os materiais transparentes e representa a frequncia de transio atmica. Em

meios compostos por molculas, 0 pode ser uma frequncia de vibrao molecular, tendo

comprimentos de onda na regio do infravermelho.

Geralmente um material possui mais de uma frequncia 0. Isso no contemplado

pelo modelo clssico do oscilador harmnico amortecido forado. Para fins experimentais,

comum utilizar-se uma relao emprica vlida em certas regies do espectro, em particular a

janela do visvel, e que leva em conta algumas das frequncias de absoro do material. A

frmula em questo conhecida como equao de Sellmeier e dada por : 50

2() = 1 +1

2

2 1+

22

2 2+

32

2 3+

(2.41)

Os coeficientes e so chamados coeficientes de Sellmeier e so determinados

experimentalmente; o comprimento de onda da luz no vcuo. Esta frmula vlida para

frequncias longe dos picos de absoro. Estes so dados por . A equao de Sellmeier

utilizada com um nmero limitado de termos, geralmente at o ndice = 3. Os valores dos

coeficientes podem ser encontrados em tabelas de catlogos de vidros, como o da Schott. 54

39

2.5.2 Absoro

A parte imaginria do ndice de refrao complexo na equao (2.38) dada por:

= () =2

20

(02 2)2 + 22

(2.42)

A consequncia da existncia de uma parte imaginria do ndice de refrao

observada quando analisamos a fase que o campo eltrico adquire ao se propagar. Para

simplificar o estudo, consideremos que a luz se propaga em uma determinada direo, por

exemplo, a direo . Assim, podemos escrever o campo eltrico como:

( , ) = 0() = 0

onde o mdulo do vetor de propagao dado pela equao (2.12). importante notar que

o ndice de refrao da expresso para o ndice de refrao complexo. Com isso, podemos

escrever o argumento da exponencial do campo eltrico como:

=

= ( + )

Portanto, o campo eltrico pode ser escrito da seguinte forma:

( , ) = 0(

)

12

(2.43)

sendo que a constante , chamada de coeficiente de absoro, dada por:

= 2

(2.44)

Substituindo a expresso para dada pela (2.42), encontramos:

=2

0

2

(02 2)2 + 22

(2.45)

40

A primeira informao importante a ser extrada a atenuao exponencial da

amplitude do campo eltrico conforme este se propaga pelo dieltrico. Isso se d pela

absoro da luz pelo meio. Como a intensidade do campo eltrico proporcional ao quadrado

da amplitude do campo, a atenuao da intensidade durante a propagao pode ser escrita de

forma a reproduzir a conhecida Lei de Beer:

() = 0 (2.46)

Outras informaes podem ser obtidas ao analisarmos o grfico do coeficiente de

absoro em funo da frequncia da luz, mostrado na fig. 2.5:

Figura 2.5 Coeficiente de absoro em funo da frequncia da luz. A frequncia em que h o pico de

absoro coincide com a frequncia 0.

Fonte: Elaborada pelo autor.

A largura do pico de absoro maior quanto menor for o fator de amortecimento . A

absoro maior para frequncias na regio prxima da frequncia natural do oscilador. O

formato da curva que representa conhecido como Lorentziana.

2.6 Condies de contorno na interface entre dois meios dieltricos

At aqui analisamos a polarizao e a propagao de uma onda eletromagntica plana

monocromtica em um nico meio dieltrico, alm da resposta desse meio presena do

campo eletromagntico da luz. A partir de agora vamos estudar o que ocorre quando esta onda

incide na interface entre dois meios dieltricos 1 e 2, definidos pelas permissividades 1 e 2,

respectivamente. Na interface, os campos eltrico e magntico devem obedecer a certas

41

condies de contorno que devem ser deduzidas a partir das equaes de Maxwell. Para obter

essas condies, consideremos a interface, I, esquematizada na fig. 2.6 e o volume V,

delimitado pela superfcie S, localizado em parte no meio 1 e em parte no meio 2.

Figura 2.6 Volume V, delimitado pela superfcie S, sobre a interface entre dois meios 1 e 2.

Fonte: Elaborada pelo autor.

Consideremos S1 como sendo a rea da tampa do volume V, contida no meio 1; S2 a

rea do fundo do volume V, contida no meio 2; a rea do volume V que intercepta a

interface I; S3 a superfcie lateral de V, com parte no meio 1 e parte no meio 2; e h a altura do

volume. Podemos deduzir duas condies de contorno considerando essa figura. A primeira

obtida ao integrarmos a equao (2.1) no volume V delimitado pela superfcie S:

= 0

Utilizando o teorema do divergente (Teorema de Gauss), podemos transformar esta

integral de volume em uma integral de superfcie fechada:

= ()

= 0 1 11

+ 2 22

+ 33

= 0

Nesta expresso, a normal superfcie (1, 2 ou 3) e o campo induo

magntica no meio (1 ou 2). Para a superfcie S3, no explicitamos um ndice sobrescrito

42

para o campo pois essa superfcie tem partes em ambos os meios. Tomando agora o limite

em que a altura h tende a zero, a integral sobre a superfcie lateral se anula, pois a rea da

superfcie lateral tende a zero. Alm disso, as reas S1 e S2 coincidem geometricamente com

. Uma vez que 1 = 2 , podemos concluir que a componente normal do campo

induo magntica nos meios 1 e 2 deve ser contnua na interface entre os meios:

( 1 2)

= ( 1 2 )

= 0

1 = 2 (2.47)

onde definimos como sendo a componente normal do campo no meio .

A segunda condio de contorno surge ao se integrar a lei de Gauss, eq. (2.2) no

volume V da fig. 2.6:

=

Vale ressaltar aqui que estamos considerando dois meios dieltricos ideais, de forma

que a densidade de cargas livres nula. Novamente utilizando o teorema de Gauss, podemos

reescrever a expresso como:

= ()

= 0 1 11

+ 2 22

+ 33

= 0

Analogamente condio estudada para a induo magntica, ao se tomar o limite da

altura h tendendo a zero, a integral sobre a superfcie lateral do volume V se anula. Como

consequncia, a componente normal do campo deslocamento eltrico deve ser contnua na

interface:

1 = 2 A

11 = 22 (2.48)

43

onde utilizamos as relaes constitutivas para relacionar o campo deslocamento eltrico com

o campo eltrico por meio da permissividade eltrica do meio.

Outras duas condies de contorno podem ser deduzidas ao utilizarmos as leis de

Faraday e de Ampre. Precisamos agora considerar a fig. 2.7 que representa a superfcie A

delimitada pela curva C na interface entre os meios 1 e 2:

Figura 2.7 Superfcie A, delimitada pela curva C, sobre a interface entre os meios 1 e 2.

Fonte: Elaborada pelo autor.

Na figura, l o comprimento da curva C e h1 e h2 so as alturas das pores que esto

contidas nos meios 1 e 2, respectivamente. Integrando a lei de Faraday dada pela equao

(2.3) na superfcie A delimitada pelo caminho C, teremos:

( )

=

Na expresso acima, um vetor infinitesimal perpendicular rea A

(perpendicular ao plano da figura), de forma que as integrais representam o fluxo do

rotacional do campo eltrico por essa rea e o fluxo da derivada temporal do campo induo

magntica pela mesma rea. Por meio do teorema de Stokes, podemos transformar integral

que envolve o campo eltrico em uma integral de caminho fechado:

( )

=

()

=

Fazendo agora o limite no qual h1 e h2 vo a zero, a integral que envolve o campo se

anula, pois a rea A tende a zero. Alm disso, as partes da integrao do campo nos

44

caminhos de comprimento h1 e h2 tambm vo a zero, restando somente os termos da integral

nos trechos de comprimento l totalmente contidos nos meios 1 ou 2:

1

0

+ 2 0

= 0

Devemos notar aqui que o caminho da integrao paralelo interface, de forma que

o produto escalar de com a diferencial de caminho resultar no produto da componente

tangencial do campo eltrico com o elemento de caminho. Alm disso, o sentido do elemento

de caminho vetorial no meio 2 contrrio ao do meio 1. Assim:

( 1 2)

0

= 0

1 = 2 (2.49)

Essa expresso nos diz que a componente tangencial do campo eltrico deve ser

contnua na interface entre os meios.

A ltima condio de contorno demonstrada de forma anloga anterior, ao

integrarmos a lei de Ampre (2.4) sobre a superfcie A da fig. 2.7:

( ) =

+

O fluxo do rotacional do campo magntico pode ser transformado em uma integral de

caminho fechado por meio do teorema de Stokes. O fluxo da densidade de corrente nulo,

pois estamos considerando dois meios dieltricos ideais, de forma que = 0. Com isso:

( )

= ()

=

Da mesma forma que para a lei de Faraday, ao tomarmos o limite de h1 e h2

infinitesimalmente pequenos, o fluxo da derivada temporal do campo deslocamento se anula e

45

a integral de caminho do campo magntico se reduz aos trechos de comprimento l nos meios

1 ou 2:

1

0

+ 2 0

= 0

Como o caminho da integrao acima paralelo superfcie, o resultado das integrais

ser o produto da componente tangencial do campo magntico pelo comprimento l. E, uma

vez que a permeabilidade para ambos os dieltricos igual do vcuo, conclumos que:

1 = 2 (2.50)

Portanto, a componente tangencial do campo induo magntica deve ser contnua na

interface entre os dieltricos.

2.7 Reflexo e refrao na interface entre dois meios dieltricos

Consideremos a incidncia oblqua de uma onda plana num ngulo 1 formado entre a

direo do vetor 1 de propagao e a normal definida como um versor perpendicular

superfcie no sentido partindo do meio 2 para o meio 1. Seja 1 o vetor de propagao da

onda refletida na interface entre os meios e 1 o ngulo formado entre este vetor e a normal.

Vamos definir ainda o vetor 2 como sendo o vetor de propagao da onda monocromtica

que atravessa a interface e se propaga pelo meio 2 e o ngulo 2 entre o vetor de propagao

2 e o versor . O fenmeno de transmisso de uma onda numa interface entre dois meios

chamado de refrao. O plano definido pelos vetores e 1 chamado plano de incidncia e

corresponde ao plano da fig. 2.8. Podemos escrever os campos eltricos 1( , ), 1( , ) e

2( , ) dos feixes incidente, refletido na interface e transmitido para o meio 2,

respectivamente, da seguinte forma:

1( , ) = 1[ 1 ]

1( , ) = 1

[ 1 ] (2.51)

2( , ) = 2[ 2 ]

46

As amplitudes dos campos so grandezas vetoriais complexas, de forma que qualquer

defasagem que possa existir entre os campos estar embutida no carter complexo das

mesmas.

Figura 2.8 Incidncia oblqua de uma onda plana em uma interface entre dois meios dieltricos. Os vetores 1,

1 e 2 so os vetores de propagao da onda incidente, da refletida na interface de volta ao meio 1

e da transmitida para o meio 2, respectivamente.

Fonte: Elaborada pelo autor.

Devemos agora relacionar esses campos por meio das condies de contorno

estudadas no tpico anterior. A continuidade das componentes normal e tangencial dos

campos impe que os argumentos das exponenciais nas expresses (2.51) devem ser iguais

para qualquer instante de tempo na interface:

1 = 1 = 2 (2.52)

Utilizando a relao ( ) = ( ) ( ), e observando que = 1,

podemos reescrever o vetor arbitrrio :

= ( ) ( ) (2.53)

Vamos reescrever o vetor de acordo com a relao (2.53) e substitu-lo na expresso

(2.52). Como um vetor sobre a interface entre os dois meios, = 0, e a (2.52) fica:

1 [ ( )] = 1 [ ( )] = 2 [ ( )]

47

Utilizando a identidade vetorial [ ( )] = ( ) ( ) (ver

Apndice A), simplificamos a expresso acima:

( 1 ) ( ) = ( 1 ) ( ) = ( 2 ) ( )

Como a relao acima deve ser vlida para qualquer vetor sobre a superfcie,

conclumos que:

( 1 ) = ( 1 ) = ( 2 ) (2.54)

Pela definio de produto vetorial, o vetor ( 1 ) perpendicular ao plano de

incidncia, definido pelos vetores 1 e . Consequentemente, ( 1 ) e ( 2 ) so

perpendiculares a esse plano. Portanto, 1 e 2 tambm devem estar contidos no plano de

incidncia. Conclumos, ento, que , 1, 1 e 2 so coplanares, ou seja, os raios incidente,

refletido e refratado esto contidos no mesmo plano. importante notar que esta concluso

no trivial, apesar de a fig. 2.8 nos induzir a pensar dessa forma.

Analisemos agora os mdulos dos produtos vetoriais da equao (2.54):

| 1 | = | 1| sin 1 =1sin 1

| 1 | = | 1

| sin 1 =1sin 1

(2.55)

| 2 | = | 2| sin 2 =2sin 2

onde utilizamos as equaes (2.12) e (2.8) para substituir o mdulo dos vetores de

propagao. O ndice de refrao para os vetores 1 e 1 o mesmo, 1 , pois os feixes

correspondentes se encontram no mesmo meio. Comparando ento os termos que envolvem

esses dois vetores de propagao, encontramos:

1sin 1 =

1sin 1

1 = 1 (2.56)

48

Isto significa que o ngulo de incidncia (ngulo entre o feixe incidente e o versor

normal) igual ao de reflexo (ngulo entre o feixe refletido e o versor normal): esta a Lei

da Reflexo. Considerando agora a onda transmitida:

1sin 1 =

2sin 2

11 = 22 (2.57)

A relao (2.57) a famosa Lei de Snell da refrao.

2.8 Reflexo e coeficientes de Fresnel

Para definir completamente a onda refletida, precisamos determinar a frao refletida

do campo eltrico, isto , determinar a razo entre as amplitudes dos campos das ondas

refletida e incidente. Para isso, devemos utilizar as condies de contorno novamente.

Faremos uso da continuidade das componentes tangenciais. Primeiramente, consideremos a

equao (2.49), que aqui nomearemos eq. (2.58):

1 = 2 (2.58)

Para definir a forma vetorial dessa relao, vamos reescrever o campo eltrico por

meio da expresso (2.53):

= ( ) ( )

Note que o primeiro termo direita da igualdade representa a projeo do campo

eltrico na direo normal superfcie. Portanto, o termo que envolve o produto vetorial

duplo deve ser a componente tangencial interface:

= ( ) (2.59)

49

No meio 1, o campo dado pela soma das ondas incidente e refletida. No meio 2, h

somente a onda refratada. Desta forma, a condio de contorno pode ser expressa da seguinte

forma:

[ ( 1 + 1)] = ( 2)

( 1 + 1) = 2 (2.60)

Note que nosso objetivo escrever 1 em termos de 1 e a relao (2.60) envolve uma

segunda incgnita, 2 . Portanto, necessitamos de outra equao que envolva as mesmas

variveis de forma a termos um sistema de equaes solucionvel. A outra equao obtida

da continuidade do campo induo magntica dada pela expresso (2.50), que aqui

nomearemos eq. 2.61:

1 = 2 (2.61)

Analogamente ao exposto no caso do campo eltrico, podemos reescrever essa

condio de contorno da seguinte forma:

( 1 + 1) = 2 (2.62)

Substituindo o campo induo magntica pelo campo eltrico de acordo com a

expresso (2.20), obtemos:

1 [(1 1) + (1

1)] =

2 (2 2)

Manipulando a expresso acima ao substituirmos o produto vetorial duplo pela relao

( ) = ( ) ( ) (ver Apndice A), conclumos que:

1[1( 1) 1( 1) + 1 ( 1

) 1( 1

)] =

= 2[2( 2) 1( 2)]

(2.63)

50

As equaes (2.60) e (2.63) formam um sistema com duas incgnitas, 1 e 2, em

termos do campo eltrico incidente, 1. Estamos interessados aqui somente no campo 1 .

Para determina-lo, devemos considerar duas situaes de polarizao dos campos: polarizao

perpendicular ao plano de incidncia, chamada de onda s, e polarizao paralela ao mesmo

plano, chamada de onda p. A reflexo de uma onda cuja polarizao arbitrria poder ser

escrita como a reflexo de um campo cuja polarizao a combinao das duas polarizaes.

Para efeito de simplicidade, vamos definir as amplitudes escalares dos campos eltricos como

1, 1 e 2.

2.8.1 Reflexo para a onda s

Essa situao pode ser esquematizada de acordo com a fig. 2.9. Por conveno, os

campos eltricos foram escolhidos no mesmo sentido, entrando no plano da figura (plano de

incidncia). A direo e sentido dos campos induo magntica ficam definidos pelo produto

vetorial dos versores de propagao e dos campos eltricos, de acordo com a equao (2.20).

Figura 2.9 Incidncia oblqua de onda com polarizao perpendicular ao plano de incidncia em interface entre

dois meios. Nessa situao, a conveno escolhida foi tal que os campos eltricos apontam para o

mesmo sentido, entrando no plano da figura.

Fonte: Elaborada pelo autor.

Como o campo eltrico perpendicular ao plano de incidncia, a amplitude do vetor

resultante do produto vetorial da equao (2.60) fornece:

1 + 1 = 2 (2.64)

51

Alm disso, os produtos escalares dos campos eltricos pelo versor normal se anulam

na equao (2.63), simplificando alguns termos. Observando a fig. 2.9, fcil notar que os

produtos escalares dos versores de propagao com o versor normal resultam em:

1 = cos( 1) = cos 1 (2.65a)

1 = cos 1 (2.65b)

2 = cos( 2) = cos 2 (2.65c)

Portanto, a (2.63) nos fornece:

1 cos 1(1 1) = 2 cos 22 (2.66)

Substituindo 2 da equao (2.64) na expresso acima e resolvendo para 1 em termos

de 1, obtemos:

1 =

1 cos 1 2 cos 21 cos 1 + 2 cos 2

1 (2.67)

Definindo o ndice de refrao relativo = 2 1 , utilizando a Lei de Snell (2.57) e a

relao fundamental da trigonometria (2 + 2 = 1), fcil mostrar que:

2 = 1 212

(2.68)

Com isso, podemos manipular a (2.67) de forma que:

1

1 =

cos 1 2 21

cos 1 +2 21

(2.69)

O fator conhecido como coeficiente de reflexo de Fresnel para a onda s.

52

2.8.2 Reflexo para a onda p

Consideremos a condio de polarizao esquematizada pela fig. 2.10. Os campos

induo magntica foram escolhidos no mesmo sentido, saindo do plano da figura, por

conveno. A direo e sentido dos campos eltricos ficam ento definidos pela equao

(2.21).

Figura 2.10 - Incidncia oblqua de onda com polarizao paralela ao plano de incidncia em interface entre dois

meios. Nessa situao, a conveno escolhida foi tal que os campos induo magntica apontam

para a mesma direo, saindo do plano da figura.

Fonte: Elaborada pelo autor.

Neste caso, no ocorrem as simplificaes causadas pela perpendicularidade do campo

eltrico com o plano de incidncia que ocorriam no caso anterior. Nota-se que os campos 1,

1 e 2 formam os ngulos ( 2 1) , ( 2 1) e ( 2 2) em relao normal,

respectivamente. Por esta razo, a amplitude do vetor resultante da equao (2.60) nos d:

11 11 = 22 (2.70)

Esta mesma expresso pode ser obtida geometricamente por meio da fig. 2.10 ao

projetarmos as componentes dos campos eltricos na direo perpendicular ao versor normal

e impormos a continuidade dessas componentes tangenciais interface entre os meios.

A relao (2.63) nos fornece a segunda equao do sistema para determinar 1 .

Utilizando as expresses (2.65) e observando a fig. 2.10 para determinar as projees dos

campos na direo do versor normal, encontramos a seguinte igualdade vetorial:

53

1[111 + 11 + 11

1 11] = 2[222 + 22] (2.71)

Essa igualdade deve ser satisfeita em todas as direes. Em particular, tambm deve

ser satisfeita na direo perpendicular normal, ou seja, tangencialmente superfcie.

Fazendo a projeo dos vetores nessa direo, obtemos:

1[121 + 1

21 + 121 + 1

21] = 2[222 + 2

22]

Utilizando a definio do ndice de refrao relativo, fcil manipular a relao acima

para obter:

2 =1

(1 + 1

) (2.72)

Podemos ento substituir o campo 2 da relao acima na expresso (2.70). Definindo

o fator como a razo entre as amplitudes 1 e 1, segue que:

1(1 1) =

2

(1 + 1)

1

1 =

1 21 + 2

(2.73)

Substituindo 2 por meio da (2.68), derivamos uma relao que depende somente

do ngulo de incidncia e do ndice de refrao relativo:

=21 +2 21

21 +2 21

(2.74)

O coeficiente conhecido como coeficiente de reflexo de Fresnel para a onda p.

2.9 O ngulo de Brewster e o ngulo crtico

Consideremos a partir de agora a reflexo interna da luz na interface entre dois meios,

ou seja, a reflexo numa interface tal que 1 > 2. Algumas observaes importantes podem

54

ser feitas a partir das eqs. (2.69) e (2.74). A primeira delas que o coeficiente nunca pode

ser nulo exceto quando 1 = 2 . Isso implicaria em dois meios com o mesmo ndice de

refrao ou ento a ausncia de interface. Consequentemente, tambm seria nulo.

A segunda observao que pode ser nulo em duas situaes. Uma delas ocorre

quando 1 = 2, como dito anteriormente. A outra condio ocorre quando 1 2 mas o

ngulo 1 tal que o numerador da expresso para nulo. Isso permite determinar esse

ngulo especfico, 1 = :

2 +2 2 = 0

= (2.75)

conhecido como ngulo de Brewster. Uma das consequncias da existncia desse

ngulo que se pode obter luz linearmente polarizada (polarizao s) por reflexo ao se

incidir luz monocromtica com 1 = na interface entre dois meios. Devemos notar

tambm que, se 1 > 2, passa a ser negativo para ngulos acima de .

A terceira observao importante a ser feita das eqs. (2.69) e (2.74) em relao ao

termo representado pela raiz quadrada em ambas as expresses. fcil observar que, acima

de um determinado ngulo, 1 = , os coeficientes de Fresnel tornam-se complexos devido

troca de sinal do argumento da raiz. Esse ngulo conhecido como ngulo crtico e pode ser

facilmente determinado:

= (2.76)

O ngulo crtico existe somente na reflexo interna, j que o ndice de refrao relativo

maior que 1 na reflexo externa (onde 1 < 2 ). Sua medida , portanto, diretamente

relacionada ao ndice de refrao dos meios 1 e 2. Com isso, conhecendo-se o ndice de

refrao do meio 2, pode-se obter o ndice de refrao do meio 1, por exemplo. Essa uma

informao importante uma vez que o ndice pode depender de vrios fatores como, por

exemplo, a umidade relativa, a temperatura, a presso, a composio do material, entre outros.

Portanto, a medida do ndice de refrao por meio da medida do ngulo crtico pode ser

utilizada para o desenvolvimento de sensores pticos.

55

2.10 A fase adquirida na reflexo

Um estudo mais aprofundado dos coeficientes de Fresnel revela outras caractersticas

interessantes da reflexo. Vamos analisar os valores que e podem assumir. A fig. 2.11

mostra um grfico do mdulo desses coeficientes em funo do ngulo 1 de incidncia

considerando um valor tpico de = 1 1,72 para a interface entre um vidro do tipo flint

(SF10, Schott) e o ar.

0 10 20 30 40 50 60

0,0

0,2

0,4

0,6

0,8

1,0

ngulo de incidncia ()

|rp|

|rs|

Figura 2.11 Mdulo de rp e rs em funo do ngulo de incidncia para a reflexo interna da luz na interface

entre um vidro SF10 (n1=1,72) e o ar (n21). Para esta simulao, o comprimento de onda da luz considerado foi de 589 nm.

Fonte: Elaborada pelo autor.

Como podemos ver pela figura, || uma funo crescente at o ngulo crtico, onde

seu valor 1. J || decrescente at o ngulo de Brewster, onde assume o valor zero, e

cresce rapidamente at o ngulo crtico, onde tem seu valor igual a 1. Acima do