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UNIVERSIDADE DE ÉVORA ESCOLA DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA DEPARTAMENTO DE MEDICINA VETERINÁRIA CLÍNICA E CIRURGIA DE ANIMAIS DE COMPANHIA Daniela Alexandra da Silva Martins Orientação: Drª. Margarida Fragoso Costa Professor Dr. Luís Lima Lobo Mestrado Integrado em Medicina Veterinária Relatório de Estágio Évora, 2015

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UNIVERSIDADE DE ÉVORA

ESCOLA DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA

DEPARTAMENTO DE MEDICINA VETERINÁRIA

CLÍNICA E CIRURGIA DE ANIMAIS DE COMPANHIA

Daniela Alexandra da Silva Martins

Orientação: Drª. Margarida Fragoso Costa

Professor Dr. Luís Lima Lobo

Mestrado Integrado em Medicina Veterinária

Relatório de Estágio

Évora, 2015

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UNIVERSIDADE DE ÉVORA

ESCOLA DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA

DEPARTAMENTO DE MEDICINA VETERINÁRIA

CLÍNICA E CIRURGIA DE ANIMAIS DE COMPANHIA

Daniela Alexandra da Silva Martins

Orientação: Drª. Margarida Fragoso Costa

ProfessorDr. Luís Lima Lobo

Mestrado Integrado em Medicina Veterinária

Relatório de Estágio

Évora, 2015

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Agradecimentos

Em primeiro lugar, o meu maior agradecimento vai para a minha família. Para os meus

pais que suportaram a minha vida escolar, incentivando-me sempre a dar o melhor de mim e

para os meus irmãos, em especial à minha irmã Paula, que se mostrou sempre disponível para

mim, nestes duros meses de desenvolvimento da dissertação.

Um agradecimento especial à Drª Margarida, minha orientadora, pela paciência,

disponibilidade e amizade demonstrada. É, sem dúvida, um exemplo de profissionalismo a

seguir e a grande responsável pelo meu interesse em hematologia, sendo uma professora

extraordinária. Um muito obrigada ao Dr. Luís Lobo, por me ter permitido realizar o estágio final

de curso no Hospital Veterinário do Porto e pela partilha de conhecimentos.

Gostaria de agradecer a toda a equipa do HVP, sem exceção. Aos médicos que muito

contribuíram para minha instrução enquanto médica veterinária: Dr. Nuno, Dr. Luís, Dr.

Amândio, Drª Odete, Drª Cátia, Drª Carla e Drª Tatiana. Às auxiliares, em especial à

Natividade, Graciete, Carla, Carolina, Vânia, Sara, Sandra Cardoso, Sandra Ribeiro e Bárbara,

por toda a ajuda e pelos bons momentos que me proporcionaram. Ao António e à Sara

Pacheco, que apesar do curto período de tempo que passaram comigo, sempre me ajudaram

quando necessário.

Um enorme agradecimento à Patrícia e ao Gonçalo, dois médicos veterinários

fantástico, com os quais eu aprendi e me diverti em igual proporção. Um obrigada especial à

Patrícia, pela ajuda e tempo despendido comigo na elaboração desta dissertação. És um

exemplo profissional e pessoal a seguir.

Aos meus amigos de sempre: Elisa, Mariana, Tiago, Cátia, Filipa e Pedro, que sempre

me apoiaram, compreendendo a minha constante indisponibilidade e ajudando-me na

conclusão desta revisão e em tudo o que podiam. Um muito obrigada por fazerem parte da

minha família.

Um agradecimento à minha família de Évora, Galerinha, por todos os momentos que

passamos juntos. São como uma verdadeira família, sempre presentes nos bons e nos maus

momentos, apoiando-me incondicionalmente. Gostaria de deixar um agradecimento especial à

Clara, João, Andreia e Mónica que foram as primeiras pessoas que me acolheram, quando eu

mais precisava. Um agradecimento também muito especial à Carolina Tendon, uma fonte de

inspiração e de força para o dia-a-dia. Farás para sempre parte da nossa família.

Um agradecimento muito especial à minha afilhada, Daniela Almeida, ao meu afilhado,

Hernâni Tondela e à pseudo afilhada, Daniela Clemente, que me transmitem o espirito de

Évora, não obstante da distância que nos separa. Pela ajuda que me dão e sempre deram, o

meu muito obrigada.

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Um agradecimento especial e com carinho ao Pedro, Diana e Joana, que muita

paciência tiveram para comigo, ajudando-me sempre no que era necessário. Obrigada pelos

momentos destes cinco anos.

Os meus agradecimentos finais vão para o melhor grupinho de estágio alguma vez

formado. Carolina Carrujo, muito obrigada, contigo enfrentei uma nova etapa da minha vida e

não poderia ter sido em melhor companhia. És mais um exemplo na minha vida. Catarina

Paiva, muito obrigada, foste um grande apoio nestes meses árduos de dissertação e foste

também uma grande companhia em momentos de descontração, redescobri em ti uma grande

amiga. Filipa Belo, muito obrigada por teres entrado de rompante na minha vida, és uma

pessoa maravilhosa e não podia estar mais feliz por pertenceres à minha família. Filipe Pinto,

muito obrigada, és uma das melhores pessoas que conheço e foi uma experiência única poder

conhecer-te verdadeiramente após cinco anos de faculdade. Flávia Martins minha irmã de

nome e coração. És uma pessoa fantástica e é virtualmente impossível uma pessoa sentir-se

em baixo contigo por perto, um muito obrigada pela amizade e paciência demonstrada. Paula

Martins, muito obrigada, deste cor à nossa vida com a tua presença e estiveste sempre

disponível para qualquer situação se assim nos facilitasse. Obrigada por todos os momentos

proporcionados. Rui Alvites um agradecimento diferente e especial, por que uns sofrem mais

que outros. Pelos incessantes favores, pelas conversas, gritarias, saídas, debates, opiniões,

amizade e simplesmente pela presença, o meu muito obrigada. Não imaginaria a minha vida

sem te ter conhecido.

Os amigos são a família que se escolhe e eu não podia ter escolhido melhor.

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Resumo

O relatório aqui desenvolvido foca-se nos seis meses de estágio curricular realizado no

Hospital Veterinário do Porto em clínica e cirurgia de animais de companhia. Este teve início a

1 de Agosto de 2014 e terminou a 31 de Janeiro de 2015, tendo-se realizado sob a orientação

da Dra. Margarida Fragoso Costa e do Professor Dr Luís Lima Lobo, diretor clínico da

instituição.

O mesmo encontra-se dividido em duas partes, tendo a primeira a finalidade de

descrever as atividades acompanhadas no hospital através de uma descrição estatística dos

casos acompanhados pela autora. A segunda parte engloba uma revisão bibliográfica sobre o

tema “Medicina transfusional felina” e a exposição e referente discussão de dois casos clínicos

sobre o tema, observados no período de estágio.

Palavras-chave: transfusão sanguínea, gato, banco de sangue, componentes

sanguíneos.

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iv

Abstract – Small animal medicine and surgery

This report focuses on the six months of curricular internship that took place at Hospital

Veterinário do Porto in general clinic duties and pet surgery. It began at August 1st 2014 and

ended at January 31st 2015, under the guidance of Dr. Margarida Fragoso Costa as well as Dr.

Luís Lima Lobo, the institution’s clinical director.

The aforementioned is divided in two parts, having the first the objective of describing

the activities accompanied by the author. The second part covers a bibliographical review on

the theme "feline transfusional medicine" and the exposure and discussion of two clinical cases,

related to the subject, which were observed during the internship.

Keywords: blood transfusion, cat, blood bank, blood components.

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Índice geral

Agradecimentos ........................................................................................................................ i

Resumo ..................................................................................................................................... iii

Abstract ..................................................................................................................................... iv

Índice geral ................................................................................................................................ v

Índice de gráficos, tabelas, figuras e quadros ........................................................................... viii

Lista de abreviaturas, siglas e símbolos .................................................................................... xi

I. Introdução ........................................................................................................................... 1

II. Relatório descritivo do estágio – Casuística ................................................................... 1

1. Hospital Veterinário do Porto ............................................................................................. 1

2. Análise das atividades desenvolvidas ............................................................................... 2

3. Distribuição dos casos por espécie animal ........................................................................ 3

4. Distribuição da casuística por área clínica ......................................................................... 3

4.1. Medicina preventiva .................................................................................................. 4

4.1.1. Vacinação ........................................................................................................ 4

4.1.2. Desparasitação ................................................................................................ 6

4.1.3. Identificação eletrónica .................................................................................... 7

4.2. Clínica médica............................................................................................................ 7

4.2.1. Dermatologia .................................................................................................... 8

4.2.2. Gastroenterologia e glândulas anexas ............................................................. 9

4.2.3. Hematologia ..................................................................................................... 11

4.2.4. Nefrologia e urologia ........................................................................................ 12

4.2.5. Cardiologia ....................................................................................................... 12

4.2.6. Doenças infetocontagiosas e parasitárias ........................................................ 14

4.2.7. Neurologia ........................................................................................................ 16

4.2.8. Pneumonologia ................................................................................................ 17

4.2.9. Sistema musculosquelético .............................................................................. 19

4.2.10. Oncologia ......................................................................................................... 20

4.2.11. Sistema reprodutor........................................................................................... 21

4.2.12. Oftalmologia ..................................................................................................... 22

4.2.13. Endocrinologia ................................................................................................. 23

4.2.14. Otorrinolaringologia .......................................................................................... 25

4.2.15. Odontoestomatologia ....................................................................................... 26

4.2.16. Toxicologia ....................................................................................................... 26

4.3. Clínica cirúrgica.......................................................................................................... 27

4.3.1. Cirurgia de tecidos moles ................................................................................. 27

4.3.2. Cirurgia ortopédica ........................................................................................... 29

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4.3.3. Cirurgia odontológica ....................................................................................... 29

4.3.4. Cirurgia oftálmica ............................................................................................. 29

4.3.5. Neurocirurgia ................................................................................................... 30

4.3.6. Outros procedimentos realizados sob sedação/anestesia ............................... 31

4.4. Imagiologia ................................................................................................................. 31

4.5. Outros procedimentos médicos.................................................................................. 32

III. Monografia – Medicina transfusional em gatos............................................................... 33

1. Introdução .......................................................................................................................... 33

2. Banco de sangue ............................................................................................................... 34

2.1. Nota histórica ............................................................................................................. 34

2.2. Programa de dadores ................................................................................................ 35

2.3. Recrutamento felino ................................................................................................... 37

3. Tipificação sanguínea ........................................................................................................ 39

3.1. Grupo sanguíneo felino .............................................................................................. 39

3.2. Métodos rápidos de tipificação ................................................................................... 41

4. Prova cruzada maior e menor ........................................................................................... 44

5. Colheita de sangue ............................................................................................................ 46

5.1. Sistemas de colheita .................................................................................................. 47

5.2. Sedação/anestesia ..................................................................................................... 49

5.3. Procedimentos de colheita ......................................................................................... 50

6. Processamento em hemocomponentes e armazenamento ............................................... 52

6.1. Sangue total .............................................................................................................. 53

6.2. Concentrado de eritrócitos ......................................................................................... 54

6.3. Plasma ....................................................................................................................... 55

6.3.1. Plasma fresco congelado ................................................................................. 56

6.3.2. Plasma congelado............................................................................................ 56

6.4. Outros componentes sanguíneos .............................................................................. 57

7. Indicações para transfusão ................................................................................................ 58

7.1. Sangue inteiro e concentrado de eritrócitos ............................................................... 58

7.2. Plasma fresco congelado e plasma congelado .......................................................... 61

7.3. Xenotransfusões ........................................................................................................ 63

7.4. Soluções de hemoglobina .......................................................................................... 63

7.5. Autotransfusão ........................................................................................................... 64

8. Reações transfusionais ..................................................................................................... 67

9. Casos Clínicos ................................................................................................................... 70

9.1. Caso clínico I – “Pinchie” ........................................................................................... 70

9.1.1. Identificação ..................................................................................................... 70

9.1.2. Anamenese ...................................................................................................... 70

9.1.3. Exame físico .................................................................................................... 70

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vii

9.1.4. Preparação para recolha e análises................................................................. 71

9.1.5. Recolha sanguínea .......................................................................................... 72

9.1.6. Pós colheita ..................................................................................................... 73

9.1.7. Discussão ........................................................................................................ 74

9.2. Caso clínico II – “Simba” ............................................................................................ 76

9.2.1. Identificação ..................................................................................................... 76

9.2.2. Anamnese ........................................................................................................ 76

9.2.3. Abordagem primária......................................................................................... 76

9.2.4. Tratamento inicial ............................................................................................. 76

9.2.5. Abordagem secundária .................................................................................... 77

9.2.6. Tratamento ....................................................................................................... 78

9.2.7. Evolução .......................................................................................................... 79

9.2.8. Discussão ........................................................................................................ 83

IV. Considerações finais ......................................................................................................... 86

V. Bibliografia ......................................................................................................................... 87

VI. Anexos ................................................................................................................................ a

1. Anexo I. Análises anuais da “Pinchie” - Propriedade do HVP ......................................... a

2. Anexo II. Componente de primeira escolha e componentes alternativos a utilizar em

situações específicas ...................................................................................................... c

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viii

Índice de gráficos, tabelas, figuras e quadros

Gráficos Páginas

Gráfico 1. Distribuição dos casos pelas espécies animais (Fr(%)) (n=822) .................... 3

Tabelas

Tabela 1. Distribuição da casuística em função das diferentes áreas médicas

(n=1511) .......................................................................................................................... 4

Tabela 2. Distribuição de procedimentos no âmbito da medicina preventiva

(n=206) ............................................................................................................................ 4

Tabela 3. Distribuição da casuística em função das diferentes áreas de clínica

médica (n=985) ............................................................................................................... 7

Tabela 4. Distribuição da casuística em função das diferentes afeções

dermatológicas observadas (n=122) ............................................................................... 8

Tabela 5. Distribuição da casuística em função das afeções observadas na área

de gastroenterologia e glândulas anexas (n=111) .......................................................... 10

Tabela 6. Distribuição da casuística em função das afeções observadas na área

de hematologia (n=104) .................................................................................................. 12

Tabela 7. Distribuição da casuística em função das afeções observadas na área

de nefrologia e urologia (n=83) ....................................................................................... 12

Tabela 8. Distribuição da casuística em função das afeções cardíacas observadas

(n=76) .............................................................................................................................. 13

Tabela 9. Distribuição da casuística em função das afeções infetocontagiosas e

parasitárias observadas (n=72) ....................................................................................... 14

Tabela 10. Distribuição da casuística em função das afeções observadas na área

de neurologia (n=65) ....................................................................................................... 16

Tabela 11. Distribuição da casuística em função das afeções observadas na área

de pneumologia (n=62) ................................................................................................... 17

Tabela 12. Distribuição da casuística em função das afeções observadas no

sistema musculosquelético (n=53) .................................................................................. 19

Tabela 13. Distribuição da casuística em função das afeções observadas em

oncologia (n=47) ............................................................................................................. 20

Tabela 14. Distribuição da casuística em função das afeções observadas no

sistema reprodutor (n=42) ............................................................................................... 22

Tabela 15. Distribuição da casuística em função das afeções observadas na área

de oftalmologia (n=37)..................................................................................................... 23

Tabela 16. Distribuição da casuística em função das afeções endocrinológicas

observadas (n=36) .......................................................................................................... 23

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ix

Tabela 17. Distribuição da casuística em função das afeções observadas na área

de otorrinolaringologia (n=30) ......................................................................................... 26

Tabela 18. Distribuição da casuística em função das afeções observadas na área

de odontoestomatologia (n=29) ....................................................................................... 26

Tabela 19. Distribuição da casuística em função dos agentes de intoxicação

observados na área de toxicologia (n=16) ...................................................................... 27

Tabela 20. Distribuição da casuística em função das diferentes áreas cirúrgicas

(n=320) ............................................................................................................................ 27

Tabela 21. Distribuição da casuística em função dos diferentes procedimentos

cirúrgicos realizados na área de cirurgia de tecidos moles (n=188) ................................ 28

Tabela 22. Distribuição da casuística em função dos procedimentos cirúrgicos

realizados na área de cirurgia ortopédica (n=22) ............................................................ 29

Tabela 23. Distribuição da casuística em função dos procedimentos odontológicos

realizados (n=15) ............................................................................................................ 29

Tabela 24. Distribuição da casuística em função dos procedimentos realizados na

área de cirurgia oftálmica (n=10) ..................................................................................... 30

Tabela 25. Distribuição da casuística em função dos procedimentos cirúrgicos

realizados na área de neurocirurgia (n=10) ..................................................................... 30

Tabela 26 Distribuição de outros procedimentos realizados sob anestesia/sedação

(n=75) .............................................................................................................................. 31

Tabela 27. Distribuição da casuística em função dos diferentes meios de

diagnóstico imagiológico (n=655) .................................................................................... 32

Tabela 28. Resultados relevantes do hemograma da “Pinchie” ...................................... 71

Tabela 29. Primeiros resultados do hemograma, análises bioquímicas e ionograma

realizados ao “Simba” ..................................................................................................... 78

Tabela 30. Resultados do hemograma do “Simba” após quatro a cinco horas do

início do tratamento (apenas parâmetros gravemente alterados) ................................... 80

Tabela 31. Resultados relevantes do hemograma de controlo do “Simba” ..................... 81

Tabela 32. Resultados relevantes do hemograma de controlo – dia 3............................ 82

Tabela 33. Resultados relevantes do hemograma de controlo – dia 5............................ 82

Figuras

Figura 1. Radiografia torácica (projeção lateral). Demonstra características

clássicas de asma felina, incluindo hiperinsuflação e padrão brônquico ......................... 19

Figura 2: Radiografia lateral de fratura de coluna com transecção completa da

medula ............................................................................................................................ 20

Figura 3. Reconstrução tridimensional de fratura de coluna com transecção

completa da medula, a partir de imagem obtida por TAC ............................................... 20

Figura 4. Felídeo recém-nascido com anomalia anatómica congénita ........................... 22

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x

Figura 5. Radiografia torácica lateral, após colocação de pacemaker ............................ 28

Figura 6. Radiografia torácica lateral com evidência de hérnia diafragmática ................ 28

Figura 7 e 8. Proptose ocular .......................................................................................... 30

Figura 9 e 10. Canídeo com laceração extensa, após atropelamento ............................ 31

Figura 11. Acupuntura com electroestimulação .............................................................. 32

Figura 12. Separação dos componentes sanguíneos segundo a sua densidade ........... 33

Figura 13. Teste de tipificação em cartão. Resultado positivo para A ............................. 42

Figura 14. O conjunto comercial RapidVet®- H Feline contém os componentes

necessários à realização do teste ................................................................................... 42

Figura 15. O quick test A+B; Alvedia® contém todos os componentes necessários

à realização do teste de tipificação ................................................................................. 43

Figura 16. Teste de tipificação RapidVet®-H IC .............................................................. 44

Figura 17. Hemaglutinação positiva observada por microscopia (40x). .......................... 45

Figura 18. Conjuntos comerciais de prova cruzada maior e menor ................................ 46

Figura 19. Separação de sangue total em hemocomponentes ....................................... 53

Figura 20. Extração do plasma para um saco satélite por meio de um separador de

plasma ............................................................................................................................. 55

Figura 21 e 22. Realização de uma autotransfusão ........................................................ 65

Figura 23. Material necessário para a colheita sanguínea .............................................. 71

Figura 24. “Pinchie” em decúbito ventral e dorso-flexão cervical e já com a

assepsia cirúrgica do local realizada ............................................................................... 72

Figura 25. Dádiva de sangue da “Pinchie” ...................................................................... 73

Figura 26. Reposição de fluídos após dádiva de sangue ................................................ 73

Figura 27. Preparação do material necessário e subsequente transfusão de

plasma ............................................................................................................................. 80

Quadros

Quadro 1. Testes de triagem de patogéneos core e recomendados em zonas

endémicas, a realizar em todos os felinos candidatos a dadores de sangue .................. 38

Quadro 2. Guia, passo a passo, para uma transfusão sanguínea .................................. 60

Quadro 3. Terapia por componentes em gatos ............................................................... 66

Quadro 4. Categorização e descrição das diferentes reações transfusionais ................. 68

Quadro 5. Identificação da “Pinchie” ............................................................................... 70

Quadro 6. Exame físico realizado à “Pinchie” ................................................................. 70

Quadro 7. Identificação do “Simba” ................................................................................. 76

Quadro 8. Exame físico como avaliação secundária realizado ao “Simba” ..................... 77

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xi

AAHA – American Animal Hospital

Association

ACD – Ácido-citrato-dextrose

ACTH – Hormona adenocorticotropica, do

inglês, adrenocorticotropic hormone

AF – Asma felina

AINE – Anti-inflamatório não esteroide

ALP – Fosfatase alcalina, do inglês, Alkaline

phosphatase

ALT – Alanina aminotransferase

AS-1 – Adsol

AS-5 – Optisol

AST – Aspartato aminotransferase

BC – Bronquite crónica

bpm – batimento por minuto

CE – Concentrado de eritrócitos

CID – Coagulação intravascular disseminada

CP – Concentrado de plaqueta

CPD – Citrato-fosfato-dextrose

CPDA – 1 – Citrato-fosfato-dextrose-adenina

CPP – Criopressipitado

CS – Criossobrenadante

DAAP – Dermatite alérgica à picada da

pulga

EH – Enteropatia hemorrágica

ELISA – Testes imunoenzimáticos, do inglês,

enzyme-linked immunosorbent assay

FeLV – Vírus da leucose felina, do inglês,

feline leukemia vírus

Fi – Frequência absoluta

Fic – Frequência absoluta de canídeos

Fie – Frequência absoluta de exóticos

Fif – Frequência absoluta de felinos

Fr- Frequência relativa

HAC – Hiperadrenocorticismo

HAD – Hiperadrenocorticismo adreno-

dependente

HHD - Hiperadrenocorticismo hipofisário-

dependente

IER –Exigência de energia para doença do

inglês, Illness energy requirement

IFI – Imunofluorescência indireta

Ig – Imunoglobulina

IM – Intramuscular

IV – Intravenoso

LBA – Lavagem bronco-alveolar

MAT – Teste de aglutinação microscópica,

do inglês, microscopic agglutination test

NeuAc – N-acetilneuramínico

NeuGc – N-glicolilneuramínico

PC – Plasma congelado

PCR - Polymerase chain reaction

PDA – Persistência de ducto arterioso

PFC – Plasma fresco congelado

PO – Por via oral, do latim, per os

PRP – Plasma rico em plaquetas

rpm – Rotações por minuto

RPM – Respirações por minuto

SAG-M – Cloreto de sódio-adenina-glucose-

manitol, do inglês, sodium chloride-adenine-

glucose-mannitol

SC – subcutânea

SDBD – Supressão a doses baixas de

dexametasona

ST – Sangue total

STA – Sangue total armazenado

STF – Sangue total fresco

TRC – Tempo de repleção capilar

vWD – Doença de von Willbrand, do inglês,

von Willbrand disease

vWF – Fator de von Willbrand, do inglês, von

Willbrand factor

WSAVA – World of Small Animal Veterinary

Association

Lista de abreviaturas, siglas e símbolos

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1

I. Introdução

O presente relatório descreve o estágio curricular realizado no Hospital Veterinário do

Porto, nas áreas de clínica e cirurgia de animais de companhia, e cujo principal objetivo foi a

aplicação dos conhecimentos teóricos e práticos adquiridos ao longo do mestrado integrado. O

mesmo realizou-se num período de seis meses, compreendidos entre 1 de Agosto de 2014 e

31 de Janeiro de 2015. O documento encontra-se dividido em dois grandes temas: a primeira

parte constitui uma descrição estatística da casuística observada ao longo do período de

estágio, enquanto na segunda, numa revisão bibliográfica, se explora o tema “Medicina

transfusional felina” e se demonstra a sua importância com recurso à descrição de dois casos

clínicos acompanhados durante o estágio.

Com o desenvolvimento da urbanização, o gato tornou-se num animal doméstico

apelativo para o proprietário moderno. Devido às suas peculiaridades anatómicas, fisiológicas e

comportamentais, o gato exige muitas vezes, por parte do médico veterinário, conhecimentos e

cuidados diferentes daqueles exigidos pelos cães, mesmo que na maioria das vezes as duas

espécies sejam estudadas e abordadas de forma inespecífica. Este relatório de estágio aborda

um tema em franca expansão na medicina veterinária e felina, as transfusões sanguíneas. Este

foca-se em tópicos fulcrais como programas de dadores, recrutamentos e dádivas em bancos

de sangue, processamento e armazenamento do sangue recolhido, indicações para transfusão

e reações transfusionais, todos eles sob o prisma felino, explorando, ainda, os cuidados

específicos e necessários nesta espécie.

II. Relatório descritivo do estágio - casuística

1. Hospital Veterinário do Porto

O Hospital Veterinário do Porto (HVP) foi fundado em 1998, tendo sido considerado um

dos primeiros hospitais de referência veterinária a nível nacional pela variedade de serviços

prestados. Pertence, desde Março de 2012, ao OneVet Group, uma rede de clínicas e hospitais

veterinários de referência a nível nacional. A integração nesta rede permitiu a um maior número

de animais e a uma maior área geográfica, o acesso a meios de diagnóstico e tratamentos

avançados. Estando a informação de cada animal integrada num sistema de bases de dados

comum a todas as unidades a nível nacional, a facilidade na partilha de casos entre médicos

veterinários de diferentes especialidades e o acesso permanente aos dados de cada doente

garantem uma prestação de serviços ímpar.

O HVP abre ao público em dois horários de funcionamento, sendo eles o horário diurno

das nove às 20 horas e o horário de urgência ou noturno das 20 às nove horas da manhã.

Estes horários sucedem-se de segunda a sábado, durante todo o ano. Todos os domingos e

feriados funcionam em regime de urgência, com disponibilidade de recursos limitada e tarifas

especiais. O hospital dispõe de variadas especialidades médicas e cirúrgicas, incluindo a

anestesia/cirurgia, cardiologia, comportamento animal, cuidados intensivos, dermatologia,

oncologia, endocrinologia, estomatologia, fisioterapia, gastroenterologia, imagiologia,

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ortopedia/traumatologia, nefrologia, neurologia, nutrição, oftalmologia, reprodução, obstetrícia e

inseminação artificial. Por fim, não sendo considerada uma verdadeira especialidade, a

medicina transfusional e os serviços associados prestados pelo HVP, permitem a utilização de

sangue e seus derivados no local e a sua distribuição por diversas clínicas e hospitais.

As instalações do HVP foram projetadas com o intuito de garantir funcionalidade,

eficiência e organização no trabalho, sendo estas constituídas por uma sala de espera com

receção para os clientes, três consultórios comuns e um consultório adaptado a gatos, sala de

radiologia, laboratório de análises clínicas, unidade de cuidados intensivos, salas de cirurgia e

preparação cirúrgica, sala de quimioterapia, banco de sangue, sala de ecografia, sala de

tomografia axial computorizada (TAC), sala de mínima invasão e um internamento dividido em

três zonas para separação de cães, gatos e doenças infectocontagiosas. O corpo clínico é

constituído por vários médicos veterinários capazes de dar resposta a problemáticas de

diferentes áreas de intervenção mas que se encontram responsáveis por áreas de

especialidade médica específicas. Deste fazem parte o Dr. Luís Lobo, diretor clínico e

responsável pelos serviços de cardiologia e hematologia; Dr. Nuno Proença, responsável pelas

áreas de ortopedia/traumatologia e neurologia/neurocirurgia; Dr. Amândio Dourado,

responsável pelos serviços de anestesia/analgesia e cuidados intensivos; Dra. Odete Vaz,

responsável pela área de oftalmologia e ecografia; Dra. Tatiana Lima, responsável pela área da

dermatologia e análises laboratoriais; Dra. Patrícia Cruz, responsável pelo banco de sangue e

pela área de medicina dentária; Dr. Gonçalo Petrucci, responsável pela área de oncologia.

Além destes existem médicos veterinários colaboradores que prestam serviços específicos e

menos solicitados, de acordo com a necessidade. Integram-se neste grupo a Dra. Cátia Sá,

responsável pela área de fisioterapia e reabilitação animal e a Dra. Carla Monteiro, responsável

pela área de clínica e cirurgia de animais exóticos e silvestres.

2. Análise das atividades desenvolvidas

Durante todo o estágio, a estagiária teve a possibilidade de acompanhar todas as áreas

e tarefas realizadas integradas na rotina clínica do HVP. Por uma questão de organização, os

vários estagiários foram divididos em diferentes grupos de tarefas, numa sequência de rotação

semanal, distribuindo-se pelos serviços de medicina interna e internamento, consultas, cirurgia

e serviços de urgências. A atividade laboral dos estagiários baseava-se num horário semanal

com três turnos diferentes, de segunda a sexta-feira. O primeiro turno iniciava-se às nove da

manhã e terminava às 17 horas, com interrupção das 13 às 14 horas para almoço; o segundo

turno tinha início às nove da manhã e término às 20 horas, com pausa para almoço das 14 às

16 horas; por fim, o horário regime de urgência iniciava-se às 20 e prolongava-se até às nove

horas da manhã do dia seguinte. Os fins-de-semana e feriados obedeciam a um esquema

diferente sendo realizadas, pelo estagiário, 24 horas ininterruptas ou ainda um turno das nove

às 20 horas, sendo este apenas aplicável ao dia de sábado.

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Sob a alçada de todos os médicos veterinários supramencionados e com a rotação de

serviços a que foi sujeita, foi possível à estagiária contactar com diferentes tarefas no decorrer

do estágio, permitindo-lhe consolidar conhecimentos e desenvolver competências que se

revelarão úteis na sua atividade profissional futura. A estagiária teve a oportunidade de auxiliar

em múltiplos procedimentos cirúrgicos, tanto no cargo de anestesista como de ajudante na

cirurgia, pôde intervir e participar em diferentes tipos de consultas e ainda auxiliou ativamente

na monitorização e tratamento de animais internados e sob cuidados intensivos. Além disso,

auxiliou e procedeu à realização de diversos exames complementares de diagnóstico como

radiologia, ecografia abdominal e cardíaca, eletrocardiografia, TAC e exames laboratoriais.

Procede-se de seguida, a uma descrição pormenorizada da casuística acompanhada

pela autora no decorrer do período de estágio.

3. Distribuição dos casos por espécie animal

Como referido, o corpo clínico do HVP recebe, acompanha e trata uma elevada

variedade de espécies de animais de companhia, nomeadamente cães, gatos e espécies

exóticas como leporídeos, aves e roedores. O gráfico 1 mostra a distribuição da casuística

entre as diferentes espécies, aglomerando-se todos os animais exóticos e silvestres num só

grupo. Nesta contagem apenas se consideraram os animais que foram efetivamente

acompanhados pela autora, não se procedendo à contagem total de doentes recebidos e

trados no HVP no período considerado.

Os canídeos surgem como a espécie predominante, apresentando uma frequência

relativa (Fr) de 55,8%, seguindo-se o gato com 42,8% e, por fim, os animais exóticos, com

apenas 1,3%.

4. Distribuição da casuística por área clínica

Para fácil gestão e compreensão dos dados expostos, os casos clínicos acompanhados

foram agrupados em três grandes áreas, sendo elas a medicina preventiva, clínica médica e

clínica cirúrgica. Tendo em conta esta divisão, serão apresentados os valores referentes à Fr,

frequência absoluta (Fi), Fi referente à espécie canina (Fic), Fi referente à espécie felina (Fif) e,

42,8%

55,8%

1,3%

Felideos

Canideos

Exoticos

Gráfico 1 – Distribuição dos casos pelas espécies animais (Fr(%)) (n=822)

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sempre que justificável, a Fi parcial referente aos animais exóticos (Fie), para cada uma das

áreas mencionadas.

É importante justificar a disparidade entre a totalidade dos casos e o número de animais

observados. Esta deve-se ao facto de ser possível contabilizar o mesmo animal mais que uma

vez, desde que este apresente e seja intervencionado para mais que uma afeção. Como é

possível verificar na tabela 1, foi na área de clínica médica que se acompanhou o maior

número de casos, tendo uma Fr de 65,2%. Os casos da área de medicina preventiva foram os

menos acompanhados, obtendo-se uma Fr de apenas 13,6%.

Tabela 1 – Distribuição da casuística em função das diferentes áreas médicas (n=1511)

Área Fr Fi Fic Fif Fie

Medicina preventiva 13,6% 206 158 44 4

Clínica médica 65,2% 985 660 318 7

Clínica cirúrgica 21,2% 320 196 123 1

Total 100,0% 1511 1014 485 12

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic – Frequência absoluta de caninos; Fif

– Frequência absoluta de felinos; Fie – Frequência absoluta de animais exóticos

4.1. Medicina preventiva

A área de medicina preventiva é de grande importância na prática da medicina

veterinária atual, sendo um ponto-chave comum entre saúde animal e a saúde pública. Dentro

desta área incluem-se todos os atos médicos de imunização ativa (vacinação), desparasitação

interna e externa e identificação eletrónica (tabela 2).

Tabela 2 – Distribuição dos procedimentos no âmbito da medicina preventiva (n=206)

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic – Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felinos; Fie – Frequência absoluta de animais exóticos

4.1.1. Vacinação

A utilização de vacinas em medicina veterinária progrediu, de uma aventura

experimental, para uma prática rotineira e relativamente segura (McVey & Shi, 2010). Esta

prática é bastante importante já que previne e controla a transmissão de doenças, tanto entre

animais da mesma espécie como em animais de espécies diferentes, incluindo-se neste último

grupo a prevenção de doenças transmissíveis ao homem. A luta contra as zoonoses

transmitidas por cães e gatos envolve um conjunto de medidas sujeitas a legislação específica,

Procedimento Fr Fi Fic Fif Fie

Vacinação 49,0% 101 77 22 2

Desparasitação 42,2% 87 64 21 2

Identificação eletrónica 8,7% 18 17 1 0

Total 100% 206 158 44 4

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que visam a disciplinação dos proprietários, permitindo o controlo e futura irradicação destas

doenças (Portaria nº421/2004 de 24 de Abril). Atualmente está já enraizada, na maior parte dos

proprietários, a necessidade impreterível de vacinar os seus animais, representando esta

prática 49% dos casos de medicina preventiva acompanhados.

O Vacination Guideline Group (VGG) da World of Small Animal Veterinary Association

(WSAVA) reviu, em 2010, as diretrizes para vacinação em cães e gatos. Nestas subdividiram-

se as vacinas em duas grandes categorias: vacinas recomendadas (core) e opcionais (non-

core). Nas primeiras incluem-se as vacinas contra o vírus da esgana, o adenovírus canino e o

parvovírus canino, no caso do cão; nos gatos incluem-se as vacinas contra o parvovírus felino,

o calicivírus felino e o herpesvírus felino tipo 1. A vacina contra o vírus da raiva está incluída

nesta categoria, estando recomendada para ambas as espécies, em zonas onde seja

considerada endémica (Day et al., 2010). A sua administração é obrigatória em cães em todo o

território nacional, conforme disposto no Decreto-lei nº 314/2003, de 17 de Dezembro.

O VGG considera como vacina core aquela que todos os cães devem receber com vista

à sua proteção contra doenças infeciosas de significância global, aplicando-se o mesmo

também para a espécie felina. Pelo contrário, as vacinas non-core devem ser administradas

dependendo da área geográfica e tendo em conta as doenças endémicas da zona, como é

exemplo a vacina com valência contra a leishmaniose (Day et al., 2010).

A American Animal Hospital Association (AAHA), além da divisão em vacinas core e

non-core, classifica ainda as vacinas como infeciosas e não infeciosas. As vacinas infeciosas

são aquelas que infetam as célula do hospedeiro de forma a induzirem uma resposta

imunológica, como por exemplo as vacinas atenuadas, virulentas, biomodificadas ou vetores

virais modificados. Pelo contrário, as vacinas não-infecciosas são aquelas que não possuem

poder de infeção, sendo exemplo destas as vacinas mortas. (Welborn et al., 2011).

Tendo em conta as guidelines da AAHA, é recomendado em todos os animais com

menos de 16 semanas a administração inicial de três doses vacinais. A primeira dose deve ser

administrada entre as oito e nove semanas de idade e a segunda dose três a quatro semanas

depois. A última dose deve ser administrada entre as 14 e as 16 semanas, sendo necessário

um reforço da vacina um ano após esta última administração. No entanto, as vacinas core

infeciosas, não só possuem elevada eficácia como fornecem a maior duração de imunidade,

podendo esta manter-se até cinco anos ou mesmo durante toda a vida do animal. Assim, de

momento é recomendado um intervalo de três anos para a revacinação em cães adultos que

receberam vacinas core infecciosas virais e um reforço anual no caso de vacinas core

infecciosas bacterianas. Em cães com mais de 16 semanas são apenas administradas duas

doses iniciais, com três a quatro semanas de intervalo entre si e, por fim, procede-se à

vacinação anti-rábica e colocação de microchip, com o mesmo período de intervalo. O reforço,

como no anterior, é administrado um ano após a última vacinação, seguindo os próximos o

esquema já referido. (Welborn et al., 2011).

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O HVP segue o esquema vacinal aconselhado pela AAHA para cães, sendo iniciado às

oito semanas com a aplicação de uma vacina pentavalente e com ação contra o vírus da

hepatite infeciosa canina, esgana, parvovírus, vírus da parainfluenza e leptospirose, com

realização de dois reforços com três semanas de intervalo entre si. Três a quatros semanas

após a administração da terceira dose, é administrada a vacina da raiva e realizada a

colocação do microchip.

A vacinação contra a leishmaniose pode ser realizada três semanas após a vacinação

antirrábica. Só devem ser vacinados animais testados com resultados negativos e com idade

superior a seis meses. O procedimento de vacinação é semelhante ao descrito anteriormente,

com a administração de uma primeira dose e dois reforços separados entre si por três

semanas. Para animais que fiquem alojados em hotel, é administrada a vacina contra a

traqueobronquite infecciosa, duas a três semanas antes da estadia, se a vacina for injetável, e

três a quatro dias antes, se for intranasal.

A vacinação na espécie felina segue um esquema vacinal semelhante à referida

anteriormente, diferenciando-se no género de vacina aplicada. Neste caso, a vacina é trivalente

e inclui o calicivírus felino, o parvovírus felino e o vírus da rinotraqueíte felina. É ainda

recomendado, aos proprietários de gatos com acesso ao exterior, a administração de uma

vacina contra o vírus da leucose felina (FeLV), considerada non-core pela WSAVA. Tal como

no caso da leishmânia, apenas são vacinados gatos com serologias negativas.

4.1.2. Desparasitação

Quando um cachorro ou gato jovem se apresentam à primeira consulta no HVP, além

da instituição de um plano vacinal, é também estabelecido um plano para desparasitação

interna e externa.

Em cães, recorre-se maioritariamente a um ectoparasiticida em comprido (bravecto®)

que contém fluralaner. Este medicamento veterinário é um inseticida e acaricida sistémico que

proporciona eliminação de pulgas e ixodídeos durante um período de 12 semanas, exceto no

caso do ixodídeo Rhipicephalus sanguineus contra o qual a proteção dura apenas 8 semanas.

São ainda utilizados alguns produtos spot-on, como por exemplo o activyl tick plus®, que

contém na sua formulação permetrina e imidocarb. Para gatos, o ectoparasiticida mais

vulgarmente utilizado é o activyl®, sendo um produto spot-on à base de indoxacarb e

aconselhando-se a sua aplicação mensal. De uma forma geral, é iniciada a desparasitação

externa após os 3 meses de idade, tanto para cães como para gatos.

A desparasitação interna é feita à base de comprimidos de milbemicina oxima e

praziquantel (milbemax®) e é repetida mensalmente até aos seis meses de idade, repetindo,

posteriormente, a administração a cada quatro ou seis meses, dependendo do risco de infeção

a que o animal é sujeito.

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4.1.3. Identificação eletrónica

Por sistema, o microchip é colocado na região cervical lateral esquerda, sendo

posteriormente efetuada a leitura para confirmar se houve ou não dano na sua introdução. As

informações do microchip são registadas no Sistema de Identificação e Recuperamento Animal

(SIRA), sendo apenas possível a vacinação antirrábica aos cães detentores de identificação

eletrónica, conforme previsto na legislação. Segundo o artigo 6º do Decreto-lei 313/2003, de 17

de Dezembro, desde um de Julho de 2004 é obrigatória a identificação eletrónica em cães

perigosos ou potencialmente perigosos, cães utilizados em ato venatório e cães de exposição,

e, sem exceção, em todos aqueles que nasceram após um de Julho de 2008. De momento,

esta identificação não é obrigatória para a espécie felina. Reunidas todas estas condições, é

então possível licenciar o animal junto da Junta de Freguesia correspondente à sua residência

segundo a Portaria nº 421/2004 de 24 de Abril.

4.2. Clínica médica

Para fins de organização, subdividiram-se os casos de clínica médica em diferentes

áreas de especialidade (tabela 3). Estas estão dispostas por ordem decrescente de Fr,

evidenciando assim as áreas com maior ocorrência. A dermatologia, com uma Fr de 12,4%, a

gastroenterologia e glândulas anexas, com uma Fr de 11,3% e a hematologia, com uma Fr de

10,6%, foram as três áreas com maior incidência, sendo a toxicologia, com uma Fr de 1,6%, a

área menos representada.

Tabela 3 – Distribuição da casuística em função das diferentes áreas de clínica médica (n=985)

Área médica Fr Fi Fic Fif Fie

Dermatologia 12,4% 122 89 31 2

Gastroenterologia e glândulas anexas 11,3% 111 73 37 1

Hematologia 10,6% 104 47 57 0

Nefrologia e urologia 8,4% 83 42 41 0

Cardiologia 7,7% 76 58 18 0

Doenças infetocontagiosas e parasitárias 7,3% 72 45 26 1

Neurologia 6,6% 65 57 7 1

Pneumologia 6,3% 62 38 24 0

Sistema Musculosquelético 5,4% 53 36 16 1

Oncologia 4,8% 47 36 11 0

Sistema reprodutor 4,3% 42 34 7 1

Oftalmologia 3,8% 37 28 9 0

Endocrinologia 3,7% 36 24 12 0

Otorrinolaringologia 3,0% 30 25 5 0

Odontoestomatologia 2,9% 29 21 8 0

Toxicologia 1,6% 16 7 9 0

Total 100% 985 660 318 7

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic – Frequência absoluta de caninos; Fif

– Frequência absoluta de felinos; Fie – Frequência absoluta de animais exóticos

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4.2.1. Dermatologia

A dermatologia ocupa-se do diagnóstico e tratamento clínico das doenças que

acometem o maior órgão do corpo de um animal – a pele. Na tabela 4 é possível observar as

afeções acompanhadas pela autora, tendo sido a dermatite alérgica à picada da pulga e a

piodermatite traumática as patologias mais incidentes, representando 13,9% e 12,3% de Fr

respetivamente. Pelo contrário, foram quatro as afeções com menor incidência – dermatite

alérgica por contacto, dermatite por lambedura acral canina, granuloma eosinofílico e fístula

anal – tendo sido registado apenas um caso por patologia, correspondendo estes a uma Fr de

0,8%.

Tabela 4 – Distribuição da casuística em função das diferentes afeções dermatológicas

observadas (n=122)

Afeção clínica Fr Fi Fic Fif Fie

Dermatite alérgica à picada da pulga 13,9% 17 7 10 0

Piodermatite traumática 12,3% 15 14 1 0

Sarna sarcótica 9,8% 12 10 2 0

Abcessos subcutâneos 9,0% 11 6 4 1

Angioedema 8,2% 10 4 6 0

Dermatite atópica 8,2% 10 10 0 0

Alterações cutâneas devidas a endocrinopatias 6,6% 8 8 0 0

Sarna demodécia 5,7% 7 6 0 1

Dermatofitose 4,1% 5 1 4 0

Intertrigo 3,3% 4 3 1 0

Hipersensibilidade alimentar 2,5% 3 3 0 0

Impactação dos sacos anais 2,5% 3 3 0 0

Foliculite 2,5% 3 3 0 0

Higroma 1,6% 2 2 0 0

Impetigo 1,6% 2 2 0 0

Furunculose 1,6% 2 1 1 0

Piodermatite profunda interdigital 1,6% 2 2 0 0

Enfisema subcutâneo 1,6% 2 1 1 0

Dermatite alérgica por contacto 0,8% 1 1 0 0

Dermatite por lambedura acral canina 0,8% 1 1 0 0

Granuloma eosinofílico 0,8% 1 0 1 0

Fístula perianal 0,8% 1 1 0 0

Total 100,0% 122 89 31 2

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic – Frequência absoluta de caninos; Fif

– Frequência absoluta de felinos; Fie – Frequência absoluta de animais exóticos

A pioderma pode ser classificada como primária ou secundária dependendo da causa

predisponente. A causa primária é rara e acontece em peles aparentemente saudáveis e sem

doenças óbvias subjacentes. A pioderma secundária desenvolve-se consequentemente a

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outras doenças de pele ou mesmo secundariamente a um problema sistémico (Cobb et al.,

2005).

A piodermatite traumática (PT), também designada piodermatite aguda húmida ou hot-

spot, é, como o próprio nome o indica, uma afeção traumática da pele, sendo neste caso auto

infringida. É relativamente comum no cão, sendo no entanto rara em gatos. Acredita-se que é

provocada por um ciclo vicioso no qual o animal se coça insistentemente numa zona com

prurido, sendo este secundário a uma doença pruriginosa de pele subjacente – especialmente

alérgica – e, por isso, categorizada como uma pioderma secundária. A lesão característica

parece resultar do trauma contínuo provocado pelas lambeduras, mordeduras e arranhaduras,

não havendo ainda explicação para o facto de esta lesão ser bem delimitada. A intensidade do

trauma provocado não é um fator preponderante, uma vez que um trauma severo, auto infligido

por alguns cães, pode não resultar no aparecimento da doença. Ainda assim,

surpreendentemente, um trauma mínimo poderá ser suficiente para criar lesões com estas

características. Em cães esta patologia é muitas vezes secundária à dermatite alérgica à

picada da pulga (DAAP), estando ocasionalmente envolvidas afeções como outras causas de

alergia de pele, otites externas e saculites. Em gatos, a PT, clínica e histopatologicamente

semelhante à dos cães, tem sido descrita como uma manifestação secundária em quadros de

DAAP, especialmente na região lombossagrada (Gross et al., 2005).

A lesão clínica característica da PT é um desenvolvimento rápido de uma placa

levemente elevada, eritematosa, exsudativa e alopécica, apresentando-se bem delimitada e

tendo sido, como já referido, autoinfligida (Gross et al., 2005).

O tratamento desta lesão inclui a tricotomia e limpeza da região com soluções

antissépticas, como a clorohexidina, sendo a sedação e analgesia frequentemente

necessárias. É fundamental haver um controlo da inflamação e prurido identificados e, por fim,

identificar, controlar ou resolver a causa subjacente. O prurido é muitas vezes controlado

através do uso de corticosteroides sistémicos e com tratamento tópico, sendo este último

utilizado muitas vezes como único tratamento em pequenas lesões. Está ainda indicada a

utilização de anti-inflamatórios não esteroides (AINE) no controlo da dor, nunca em

combinação com corticosteroides, e antibioterapia sistémica se forem notórias pápulas

eritematosas na periferia da lesão (Wellington, 2015). Um estudo comparou a utilização de um

tratamento tópico com um tratamento sistémico e ambos apresentaram bons resultados ao

sétimo dia (Cobb et al., 2005).

A maioria das lesões respondem rápida e completamente ao tratamento tópico e/ou

sistémico. A PT pode reaparecer se a patologia predisponente não for devidamente tratada ou

eliminada (Wellington, 2015).

4.2.2. Gastroenterologia e glândulas anexas

A gastroenterologia foi a segunda área com maior número de ocorrências e, como se

pode verificar na tabela 5, distribuiu-se por variadas e diversas patologias. A gastroenterite em

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geral foi a afeção com maior número de casos, com 20,7% de Fr, seguindo-se, imediatamente,

pela enteropatia hemorrágica (EH) e por ingestão de corpo estranho, ambos com 9 % de Fr.

Tabela 5 – Distribuição da casuística em função das afeções observadas na área de

gastroenterologia e glândulas anexas (n=111)

Afeção clínica Fr Fi Fic Fif Fie

Gastroenterite

hemorrágica 9,0% 10 10 0 0

parasitária 6,3% 7 5 2 0

Indiscrição alimentar 6,3% 7 5 2 0

Gastrite/gastroenterite

crónica inespecífica 4,5% 5 4 1 0

aguda inespecífica 0,9% 1 1 0 0

Dilatação e torção gástrica 9,9% 11 11 0 0

Ingestão de corpo estranho 9,0% 10 6 4 0

Hepatite 6,3% 7 5 2 0

Lipidose hepática 5,4% 6 0 6 0

Pancreatite 5,4% 6 2 4 0

Fecaloma 5,4% 6 3 2 1

IBD* 4,5% 5 3 2 0

Colangio-hepatite 2,7% 3 0 3 0

Invaginação intestinal 2,7% 3 1 2 0

Insuficiência pancreática exócrina 2,7% 3 1 2 0

Megacólon 2,7% 3 2 1 0

Peritonite 2,7% 3 2 1 0

Prolapso retal 2,7% 3 3 0 0

Úlceras gástricas/intestinais 2,7% 3 3 0 0

Megaesófago 1,8% 2 2 0 0

Mucocélio biliar 1,8% 2 1 1 0

Shunt porto-sistémico hepático 1,8% 2 0 2 0

Estenose pilórica 0,9% 1 1 0 0

Hemoabdomén por hemorragia hepática 0,9% 1 1 0 0

Atresia do ânus 0,9% 1 1 0 0

Total 100,0% 111 73 37 1

Legenda: *IBD – inflammatory bowel disease; Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência

absoluta; Fic – Frequência absoluta de caninos; Fif – Frequência absoluta de felinos; Fie –

Frequência absoluta de animais exóticos

A EH ocorre em cães e é caracterizada por émese aguda e profusa e diarreia

hemorrágica com consequente hipovolémia. Foi registada uma predileção por cães de raças

pequenas sendo os poodles toy e miniatura e Schnauzers miniatura as mais afetadas. Embora

esta síndrome não possua etiologia conhecida tem sido sugerido, devido ao começo acelerado

dos sinais clínicos, que uma reação de hipersensibilidade de tipo 1 a componentes alimentícios

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e endotoxinas bacterianas sejam causa incitante. Propõe-se que as enterotoxinas de

Clostridium perfrigens, as tóxinas Clostridium dificile A&B e a E. Coli

enteropatogénica/enterotóxigénica possam estar envolvidas na patogénese desta doença. A

diarreia hemorrágica reflete a destruição do epitélio protetor da barreira intestinal resultando na

translocação de bactérias residentes, pertencentes à flora normal do trato digestivo (German,

2005; Unterer et al., 2011; Cook, 2015).

Estes animais apresentam, tipicamente, hemoconcentração (por exemplo, um

hematócrito maior que 55%) com concentrações de proteínas totais plasmáticas normais. A

presença de um rápido desenvolvimento dos sinais clínicos em conjunto com

hemoconcentração marcada permite um diagnóstico presuntivo. Pode ainda ser detetada

trombocitopenia e azotémia renal ou pré-renal em animais severamente afetados (Willard,

2014; Cook, 2015).

Deve ser iniciada fluidoterapia agressiva para tratar ou prevenir o choque, coagulação

intravascular disseminada (CID) secundária a hipoperfusão e falência renal secundária a

hipovolémia. Antibióticos parenterais, como a ampicilina (30 mg/Kg, intravenosa (IV) a cada

oito horas) e enrofloxacina (10 mg/Kg, IV lento, a cada 24 horas), são vulgarmente utilizados

para prevenir a proliferação bacteriana, embora a sua utilização empírica seja questionável. Se

o animal se tornar seriamente hipoalbuminémico, a utilização de colóides ou plasma pode ser

necessária. É indispensável realizar o tratamento de suporte e correção dos desequilíbrios

eletrolíticos, visto que o animal encontrar-se-á, certamente, hipocalémico devido à perda de

potássio por vómitos e diarreia. Com o intuito de controlar estas duas condições o tratamento

deve incluir fármacos antieméticos, tais como, maropitant (1 mg/Kg, por via subcutânea (SC) a

cada 24 horas) e/ou metoclopramida (1,1 a 1,2 mg/Kg/24horas IV em infusão continua),

antiácidos (como a famotidina a 0,5 mg/Kg IV ou SC a cada 12 horas ou o pantoprazole a 0,7

mg/Kg IV a cada 24 horas) e protetores gástricos como sucralfato (250 a 1000 mg/cão, por via

oral (PO), a cada 8 horas), este último deve ser iniciado apenas quando os vómitos tiverem

cessado. Não deve ser fornecida comida enquanto os vómitos não estiverem controlados.

Assim que o estiverem, começa-se a fornecer água em pequenas quantidades, várias vezes ao

dia. Logo que este demonstre apetite é benéfico a introdução de uma dieta altamente digestível

(Willard, 2014; Cook, 2015).

O prognóstico é favorável para a maioria dos animais que recebem cuidados médicos

atempadamente. Animais tratados inadequadamente podem morrer devido a colapso

circulatório, CID, e ou falência renal (Willard, 2014).

4.2.3. Hematologia

A hematologia é a especialidade médica que estuda e trata as doenças do sangue e de

órgãos hematopoéticos. No entanto, a maioria das patologias observadas, que se encontrariam

categorizadas nesta área, são secundárias a afeções primárias. Deste modo, foi decidido pela

autora que a subdivisão desta área seria realizada, apenas, em categorias gerais, sendo estas

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a anemia não regenerativa, 56,7%, a anemia regenerativa, 40,4%, e, tendo sido a única

doença autoimune presente, a anemia hemolítica imunomediada, representando apenas 2,9%

dos casos totais de hematologia, como se observa infra, na tabela 6.

Tabela 6 – Distribuição da casuística em função das afeções observadas na área de

hematologia (n=104)

Afeção clínica Fr Fi Fic Fif

Anemia não regenerativa 56,7% 59 26 33

Anemia regenerativa 40,4% 42 19 23

Anemia hemolítica

imunomediada 2,9% 3 2 1

Total 100,0% 104 47 57

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic - Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felinos

4.2.4. Nefrologia e urologia

A nefrologia e a urologia constituíram 8,4% da totalidade dos casos, de clínica médica,

observados. Dentro desta área, a doença renal crónica obteve a irrefutável maioria de 47%,

tendo sido diagnosticada em 18 felídeos e 21 canídeos (tabela 7).

Tabela 7 – Distribuição da casuística em função das afeções observadas na área de nefrologia e

urologia (n=83)

Afecção clínica Fr Fi Fic Fif

Doença renal crónica 47,0% 39 21 18

Infeção do trato urinário inferior 13,3% 11 5 6

Urolitíase 12,0% 10 6 4

Obstrução urinária 10,8% 9 3 6

Insuficiência renal aguda 6,0% 5 2 3

Rim poliquístico 3,6% 3 0 3

Incontinência urinária 2,4% 2 2 0

Hidronefrose 2,4% 2 1 1

Megaureter 1,2% 1 1 0

Pielonefrite 1,2% 1 1 0

Total 100,0% 83 42 41

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic - Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felinos

4.2.5. Cardiologia

Analisando a tabela 8 podemos verificar que as duas afeções cardíacas que se

destacaram foram a doença degenerativa mixomatosa da válvula mitral e a cardiomiopatia

hipertrófica, apresentando uma Fr de 26,3% e 14,5% respetivamente. Foi ainda possível o

acompanhamento de algumas patologias mais raras, como um defeito no septo interatrial, que

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neste caso particular era praticamente inexistente, não havendo divisão entre os átrios, e a

patologia denominada cor triatriatum dexter. Esta última é uma anomalia congénita que

consiste numa divisão do átrio direito em dois compartimentos, formando um coração triatrial e

causada pela persistência da válvula direita do seio venoso (Yarrabolu et al., 2007).

Tabela 8 – Distribuição da casuística em função das afeções cardíacas observadas (n=76)

Afeção clínica Fr Fi Fic Fif

Doença degenerativa mixomatosa da válvula

mitral 26,3% 20 20 0

Cardiomiopatia hipertrófica 14,5% 11 0 11

Cardiomiopatia dilatada 10,5% 8 7 1

Doença degenerativa mixomatosa da válvula

tricúspide 10,5% 8 7 1

Insuficiência cardíaca congestiva 9,2% 7 4 3

Bloqueio atrioventricular 6,6% 5 5 0

Ducto arterioso persistente 6,6% 5 5 0

Efusão pericárdica 3,9% 3 3 0

Estenose da válvula mitral 2,6% 2 1 1

Estenose da válvula pulmonar 2,6% 2 2 0

Tromboembolismo 2,6% 2 1 1

Defeito de septo interventricular 1,3% 1 1 0

Defeito de septo interatrial 1,3% 1 1 0

Cor triatriatum dexter 1,3% 1 1 0

Total 100,0% 76 58 18

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic: Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felinos

A persistência do ducto arterioso (PDA) é caracterizada pela existência de um shunt

entre a artéria aorta e a pulmonar que, apesar de normalmente estar presente em fetos, deve

involuir e encerrar-se totalmente nas 24 horas seguintes ao nascimento. A sua persistência

(encerramento incompleto) resulta num canal, de tamanho variável, em que o seu diâmetro

determina a quantidade e a direção do fluxo sanguíneo que atravessa o shunt e, por

conseguinte, o impacto que esta afeção provoca no paciente. É a cardiopatia congénita mais

comum em cães, ocorrendo num cão em cada mil. Dentro desta espécie é mais comummente

encontrada em cadelas de raça pura (Buchanan, 2015). É, no entanto, infrequente em gatos

(MacPhail, 2013).

Normalmente, os animais jovens com esta anomalia são assintomáticos ou apresentam

apenas uma ligeira intolerância ao exercício. A queixa mais comum em animais sintomáticos,

com fluxo sanguíneo da esquerda para a direita através do shunt, é tosse, dificuldade

respiratória ou ambos, resultantes de edema pulmonar. Animais com o fluxo contrário (da

direita para a esquerda), também designado como PDA reverso, podem ser assintomáticos ou

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podem apresentar intolerância ao exercício e fraqueza dos membros posteriores durante o

exercício. (MacPhail, 2013).

Ao exame físico, o achado mais proeminente associado com PDA é caracterizado por

um sopro continuo (som de maquinaria) com melhor audição do lado esquerdo no local da

base do coração ou na região da axila esquerda (MacPhail, 2013). No entanto, o

ecocardiograma é o exame complementar de escolha para confirmar o diagnóstico e avaliar o

impacto da PDA e a presença de lesões associadas (Gournay, 2011).

Cães muito jovens, que sejam sintomáticos e não respondam ao tratamento

anticongestivo devem ser submetidos a cirurgia corretiva para encerramento da PDA, por

toracotomia, se inferiores a cinco quilos de peso, e por técnica de transcateterização se

superiores. Sendo assintomáticos, podem ser operados assim que obtiverem um bom peso, de

forma a ser realizada a cateterização (Gournay, 2011).

Bobinas intravasculares, plugs vasculares e oclusores do ducto são utilizados hoje em

dia, rotineiramente, para oclusão da PDA. Estas técnicas têm a vantagem de não requererem

toracotomia, possuindo menor risco de complicações. Os cães que não são tratados

desenvolvem frequentemente falência cardíaca congestiva e edema pulmonar, morrendo 70%

destes antes de completarem um ano de idade (MacPhail, 2013)

4.2.6. Doenças infetocontagiosas e parasitárias

Esta subdivisão inclui todas as doenças infecto-contagiosas, independentemente da sua

etiologia – bacteriana ou víria –, e parasitárias (tabela 9). A leptospirose e a parvovirose foram

as doenças com maior incidência, apresentado, respetivamente, uma Fr de 15,3% e 13,9%.

Tabela 9 – Distribuição da casuística em função das afeções infetocontagiosas e parasitárias

observadas (n=72)

Afeção clínica Fr Fi Fic Fif Fie

Leptospirose 15,3% 11 11 0 0

Parvovirose 13,9% 10 10 0 0

Panleucopénia felina 9,7% 7 0 7 0

Síndrome de coriza 11,1% 8 0 8 0

Traqueobronquite infeciosa 8,3% 6 6 0 0

Coccidiose 6,9% 5 4 1 0

Leishmaniose 6,9% 5 5 0 0

Leucemia felina 5,6% 4 0 4 0

Erliquiose 4,2% 3 2 1 0

Esgana 4,2% 3 3 0 0 Imunodeficiência felina 4,2% 3 0 3 0

Babesiose 2,8% 2 1 1 0

Giardiose 2,8% 2 2 0 0

Dirofilariose 1,4% 1 1 0 0

Mixomatose 1,4% 1 0 0 1

Toxoplasmose 1,4% 1 0 1 0

Total 100,0% 72 45 26 1

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic: Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felinos; Fie – Frequência absoluta de animais exóticos

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A leptospirose é um problema médico e veterinário e constitui a zoonose mais difundida

em todo o mundo (Fraga et al., 2015). Clinicamente, é comum no cão e rara no gato, podendo

em ambos os casos ocorrer infeção subclínica e ser os animais a fonte de transmissão da

doença (Schuller et al., 2015).

No cão, a doença tem origem em infeções pelas espécies Leptospira interrogans e

Leptospira kirschneri. As serovariedades que mais infetavam os cães antes da introdução da

vacinação, há 30 anos atrás, eram as serovariedades icterohaemorrhagiae e canicola. Com a

introdução da vacinação bivalente, contra estas, suspeita-se de uma envolvência mais difusa

de serovariedadess, incluindo a Grippotyphosa, Pomona, Bratislava e Autumnalis. Como

referido, normalmente o gato não desenvolve doença, mas os serovares Canicola,

Grippotyphosa, e Pomona já foram identificadas nesta espécie (Sykes et al., 2011).

A leptospirose pode surgir de forma subclínica, aguda ou crónica. Os sinais clínicos em

infeções agudas podem ser inespecíficos e incluem letargia, depressão, desconforto e rigidez

abdominal, anorexia, vómitos, hiperestesia muscular e pirexia. Se por um lado podem estar

associados a falha renal com manifestações de poliúria e polidipsia, com ou sem azotémia,

oligúria ou anúria, por outro, estando relacionados com insuficiência hepática, podem

manifestar-se sob a forma de icterícia, alterações na coagulação ou a conjugação de ambos.

Em situações hiperagudas, a leptospirose é caracterizada por fenómenos de choque, colapso

vascular e morte rápida. Outros sinais clínicos associados a esta doença incluem uveíte, aborto

ou nados mortos e hemorragia pulmonar (Nemzek et al., 2015).

Os parâmetros analíticos estão normalmente alterados. Hematologicamente é comum

encontrar anemia; a nível bioquímico há normalmente evidência de doença renal, com ureia e

creatinina aumentada, ou doença hepática, manifestando-se através do aumento de alanina

aminotransferase (ALT), aspartato aminotransferase (AST), fosfatase alcalina (ALP) e

hiperbilirrubinémia que ocorre quase exclusivamente com azotémia. O aumento da atividade da

ALP e bilirrubina total no soro são mais frequentes do que aumentos registados na ALT

(Schuller et al., 2015).

A pesquisa de anticorpos para diagnóstico de leptospirose baseia-se no teste de

aglutinação microscópica (MAT). Num cão com suspeita desta doença, a melhor forma de

confirmar uma infeção recente é utilizar amostras agrupadas para este teste, colhidas com uma

ou duas semanas de diferença. Um aumento de quatro vezes em relação ao valor inicial ou

títulos superiores a 1:800 em cães inicialmente negativos é muito sugestivo de leptospirose. A

utilização de apenas uma amostra é desaconselhada devido ao tempo de seroconversão e à

interferência de anticorpos vacinais. Em consequência, apesar de títulos superiores a 1:800

serem muito sugestivos de doença, estes não confirmam o diagnóstico (Sykes et al., 2011;

Schuller et al., 2015).

O tratamento tem como objetivos a eliminação da leptospira, manutenção da perfusão

renal e do output urinário, prevenção do desenvolvimento e da propagação da doença e a

abordagem às patologias associadas a esta, como seja a lesão renal, a insuficiência hepática,

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a CID e uveíte. Em casos agudos deve ser introduzida, assim que possível, doxiciclina na dose

de 5 mg/Kg, PO ou IV a cada 12 horas, ou 10 mg/Kg, PO, a cada 24 horas, durante duas

semanas. Esta deve ser utilizada como antimicrobiano inicial já que trata tanto a leptospirémia

como elimina o estado de portador. Ainda assim, este medicamento atinge a sua maior

concentração na bílis, sendo excretada nas fezes e podendo ainda ocorrer concentrações

supra terapêuticas no soro de doentes com doença hepática. Nestes casos devem ser

utlizados, inicialmente, antibióticos beta-lactâmicos como a penincilina (25,000 a 40,000 U/Kg

IV a cada 12 horas) ou a ampicilina (20 mg/Kg IV a cada seis horas) para combater a

leptospirémia, e logo que possível prosseguir com o tratamento de duas semanas com

doxiciclina. O tratamento deve ser complementado com fluidoterapia adequada e monitorização

da produção de urina. Pacientes com poliúria podem exigir maiores volumes de fluídos,

contrariamente a pacientes oligúricos ou anúricos que podem sofrer sobrecarga de volume e

necessitar da realização de diálise. A taxa de sobrevivência de cães com leptospirose clínica

encontra-se entre os 70% e os 85% (Acierno, 2015; Schuller et al., 2015).

4.2.7. Neurologia

A neurologia é a especialidade médica responsável por todos os distúrbios referentes ao

sistema nervoso. Esta está envolvida, especificamente, no tratamento e diagnóstico de todas

as categorias de doenças que envolvem os sistemas nervoso central, periférico e autónomo,

incluindo os seus revestimentos, vasos sanguíneos e músculos efetores (Reed, n.d.). Através

da análise da tabela 10 podemos concluir que a afeção mais observada foi a hérnia discal,

apresentando esta um Fr de 23,1%, e as menos observadas foram a encefalopatia hepática,

hidrocefalia e hemiparesia, com apenas 1,5% de Fr.

Tabela 10 – Distribuição da casuística em função das afeções observadas na área de neurologia

(n=65)

Afeção clínica Fr Fi Fic Fif Fie

Hérnia discal 23,1% 15 15 0 0

Epilepsia secundária 15,4% 10 9 1 0

Epilepsia primária 12,3% 8 8 0 0

Traumatismo crânio-encefálico 10,8% 7 3 4 0

Síndrome vestibular central 7,7% 5 4 1 0

Síndrome de cauda equina 7,7% 5 5 0 0

Síndrome cognitivo geriátrico 6,2% 4 4 0 0

Discoespondilite 4,6% 3 3 0 0

Síndrome vestibular periférico 4,6% 3 3 0 0

Polirradiculoneurite 3,1% 2 2 0 0

Encefalopatia hepática 1,5% 1 0 1 0

Hidrocefalia 1,5% 1 1 0 0

Hemiparesia 1,5% 1 0 0 1

Total 100,0% 65 57 7 1

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic: Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felinos; Fie – Frequência absoluta de animais exóticos

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4.2.8. Pneumonologia

Analisando a tabela 11 apresentada seguidamente podemos concluir que as afeções

mais acompanhadas nesta área foram a contusão e o edema pulmonar, ambos apresentando

uma Fr de 24,2%.

Tabela 11 – Distribuição da casuística em função das afeções observadas na área de pneumologia

(n=62)

Afeção clínica Fr Fi Fic Fif

Contusão pulmonar 24,2% 15 9 6

Edema pulmonar 24,2% 15 10 5

Efusão pleural 11,3% 7 4 3

Asma felina 9,7% 6 0 6

Bronquite crónica 8,1% 5 4 1

Pneumonia por aspiração 6,5% 4 3 1

Pneumotórax 6,5% 4 3 1

Pneumonia 3,2% 2 1 1

Colapso da traqueia 1,6% 1 1 0

Aspiração de corpo estranho 1,6% 1 1 0

Hemotórax 1,6% 1 1 0

Pneumomediastino 1,6% 1 1 0

Total 100,0% 62 38 24

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic: Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felinos

Baseado no tipo de resposta inflamatória, ocorrida na doença bronquial felina, duas

formas principais foram descritas em gatos: bronquite crónica (BC) e asma felina (AF).

(Kirschvink et al., 2006). A BC está descrita como uma inflamação neutrofílica do trato

respiratório inferior, acompanhado por edema e hipertrofia da mucosa respiratória e produção

excessiva de muco, enquanto a AF representa uma reação de hipersensibilidade – induzida por

células-T – caracterizada por inflamação eosinofílica das vias aéreas e broncoconstrição. Têm

sido discutidas várias etiologias para a doença inflamatória do trato respiratório inferior felina,

incluindo fármacos, substâncias ambientais e toxinas, exercício, stress, alergénios e infeções

(Schulz et al., 2014).

A asma pode ser diagnosticada em gatos de todas as idades (variando entre as idades

de um a quinze anos), sendo diagnosticada mais frequentemente em gatos jovens ou de meia-

idade (média de quatro anos). Não há predileção por raças nem sexos, estando no entanto os

gatos siameses sobrerrepresentados (Venema & Patterson, 2010). Os gatos que se

apresentam a uma consulta, ou a uma emergência, por um episódio de dispneia agudo

potencialmente fatal – status asthmaticus -, têm normalmente uma história pregressa de tosse

(80%), muitas vezes descrita pelos donos como uma tentativa falhada de expelir bolas de pelo,

espirros (60%), ruído respiratório (40%), taquipneia e dificuldade respiratória (Miller, 2011; Nafe

& Reinero, 2015).

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Tradicionalmente tem-se utilizado a informação recolhida no exame físico, imagiologia

– radiografia torácica e broncoscopia – e lavagem broncoalveolar (LBA) para fazer um

diagnóstico em ambiente clinico (Venema & Patterson, 2010). A radiografia torácica (figura 1)

pode apresentar padrão brônquico ou broncointersticial, hiperinsuflação pulmonar e lobo

pulmonar colapsado (normalmente o lobo medial direito). Apesar de poder demonstrar uma, ou

mais das alterações descritas, a radiografia torácica pode apresentar-se normal (Nafe &

Reinero, 2015). Além disso, pode ainda descartar algumas patologias cardíacas ou

respiratórias produtoras de tosse, tais como, pneumonia, insuficiência cardíaca, neoplasias, e

dirofilariose, tendo em conta as diferenças radiográficas produzidas por estas doenças em

relação às mencionadas supra para a asma (Padrid, 2005). A broncoscopia não está

diretamente ligada à obtenção do diagnóstico (Padrid, 2005) porém, é comum visualizar-se

acumulamentos excessivos de muco na bronquite. O diagnóstico é feito com base no resultado

da citologia do LBA consoante a neutrofilia ou eosinofilia presente, anteriormente descritas.

Podem ser realizadas coprologias ou desparasitações empíricas com o intuito de descartar

causas relacionadas com parasitas (Nafe & Reinero, 2015).

A terapia corrente está direcionada para a supressão da inflamação responsável por

estes sinais clínicos e para a dilatação das vias aéreas inferiores de forma a melhorar a

oxigenação (Venema & Patterson, 2010). Em casos agudos, o stress e o manuseamento do

animal devem ser minimizados, devendo em primeira instância colocar-se o animal a oxigénio.

É recomendada a utilização de broncodilatadores inaláveis, como por exemplo, albuterol

pressurizado através de câmara de expansão com máscara própria para este animal ou ainda

em solução para nebulização (albuterol a 0,5% na dose de 0,1 a 0,25 ml diluídos em 2ml de

solução salina). Durante uma crise (status asthmaticus) o albuterol pressurizado pode ser

utilizado a cada meia hora durante quatro a seis horas. De forma a ser possível obter um efeito

mais duradouro devem ser adicionados broncodilatadores por via parenteral. Para este fim,

pode ser utilizada a terbutalina na dose de 0,01 mg/kg por via intramuscular (IM) ou SC a cada

quatro a oito horas. Com o intuito de diminuir a inflamação devem ser administrados

glucocorticoides. É utilizado sucinato de sódio de prednisolona (1 a 2 mg/kg IV lento) ou

dexametasona (0,2 a 0,5 mg/Kg IV ou IM). Os glucocorticoides administrados por inalação não

atuam rápido o suficiente para serem utilizados num caso agudo (Padrid, 2005; Nafe &

Reinero, 2015).

Sendo a asma de caracter crónico o animal necessita de medicação em eventuais

recaídas ou mesmo de manutenção. São utilizados broncodilatadores (teofilina, aminofilina ou

terbutalina em diferentes doses) sendo a via de administração oral a ideal. Levalbuterol é

preferível como brocodilatador inalante administrado mais que duas a três vezes por semana

em detrimento de albuterol visto que este exacerba a eosinofilia. A administração oral de

glucocorticoides é a preferencial sendo administrada na dose de 2 mg/kg PO a cada 24 horas.

A fluticasona – glucocorticoide inalante – de 220 µg é utilizada em manutenção a longo prazo

sendo administrada de 12 em 12 horas, é recomendado ainda que se sobreponha com a

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terapia de córtico PO, já que pode levar duas semanas a surtir efeito. Esta deve ser

administrada para a câmara de expansão e, posteriormente, deixar o animal inspirar cerca de

dez vezes (Nafe & Reinero, 2015).

Os pacientes diagnosticados recentemente devem marcar uma consulta de controlo,

sete a dez dias depois, de forma a confirmar a eficácia da medicação. A partir desta data, é

essencial que sejam acompanhados pelo médico veterinário pelo o resto da vida (Padrid,

2005).

4.2.9. Sistema musculosquelético

Tabela 12 – Distribuição da casuística em função das afeções observadas no sistema

musculosquelético (n=53)

Afeção clínica Fr Fi Fic Fif Fie

Politraumatizado 18,9% 10 4 6 0

Espondilose 15,1% 8 8 0 0

Displasia da anca 7,5% 4 4 0 0

Fratura de costelas 5,7% 3 2 1 0

Fratura de fémur 5,7% 3 1 2 0

Luxação coxofemoral 5,7% 3 2 1 0

Rotura do ligamento cruzado anterior 5,7% 3 3 0 0

Fratura da bacia 3,8% 2 1 1 0

Fratura de mandibula 3,8% 2 1 1 0

Fratura de tíbia/fíbula 3,8% 2 1 1 0

Fratura de coluna (figura 2 e 3) 3,8% 2 2 0 0

Luxação temporo-mandibular 3,8% 2 0 2 0

Fratura de metacarpo/metatarso 3,8% 2 1 1 0

Luxação da rótula 3,8% 2 2 0 0 Osteoartrite 3,8% 2 2 0 0

Claudicação sem causa determinada 1,9% 1 1 0 0 Fratura da carapaça 1,9% 1 0 0 1

Fratura de rádio/ulna 1,9% 1 1 0 0

Total 100,0% 53 36 16 1

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic: Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felinos; Fie – Frequência absoluta de animais exóticos

Figura 1: Radiografia torácica (projeção lateral). Demonstra características clássicas de

asma felina, incluindo hiperinsuflação e padrão brônquico, retirado de (Padrid, 2005)

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Conforme se verifica, pela análise da tabela 12, os pacientes politraumatizados foram os

mais acompanhados nesta área, apresentando uma Fr de 18,9%. Esta situação pode ser

justificada pelo elevado número de casos de atropelamentos acompanhados, decorrente da

elevada sinistralidade registada na cidade do Porto.

4.2.10. Oncologia

A oncologia é o ramo da ciência médica dedicado ao estudo, diagnóstico e tratamento de

tumores. Segundo a análise da tabela 13 é possível concluir que o hemangiossarcoma

esplénico foi o tumor mais incidente, apresentando 12,8% de Fr.

Tabela 13 – Distribuição da casuística em função das afeções observadas em oncologia (n=47)

Afeção clínica Fr Fi Fic Fif

Hemangiossarcoma esplénico 12,8% 6 5 1

Osteossarcoma 10,6% 5 4 1

Linfoma 10,6% 5 4 1

Mastocitoma cutâneo 8,5% 4 4 0

Lipoma 8,5% 4 2 2

Adenocarcinoma mamário 8,5% 4 3 1

Tumores intracranianos 6,4% 3 3 0

Melanoma 6,4% 3 2 1

Hemangiossarcoma cardíaco 4,3% 2 2 0

Tumores pulmonares 4,3% 2 1 1

Epúlides 4,3% 2 2 0 Plasmocitoma extramedular 4,3% 2 0 2

Fibrossarcoma esplénico 2,1% 1 1 0

Adenoma mamário 2,1% 1 0 1

Tumor das células de Leydig 2,1% 1 1 0

Carcinoma folicular da tiroide 2,1% 1 1 0

Adenoma do córtex adrenal 2,1% 1 1 0

Total 100,0% 47 36 11

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic: Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felinos

Figura 2: Radiografia lateral de fratura de

coluna com transecção completa da medula

– Propriedade intelectual do HVP

Figura 3: Reconstrução tridimensional de

fratura de coluna com transecção completa

da medula, a partir de imagem obtida por

TAC – Propriedade intelectual do HVP

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21

O hemangiossarcoma é o tumor de baço com maior relevância no cão. Hemangiomas

e hematomas podem também afetar o baço podendo ser difícil a distinção clínica e

histopatológica entre estas três condições, principalmente se o hemangiossarcoma resultar em

hemorragia (Dobson, 2011).

São atribuídas diferentes definições a estas condições: os hemangiossarcomas,

também designados angiossarcomas e hemangioendoteliomas, são neoplasias malignas que

se desenvolvem a partir dos vasos sanguíneos; os hemangiomas são tumores benignos de

vasos sanguíneos dilatados; um hematoma é um intumescimento ou uma massa de sangue

(normalmente coagulado) confinado a um órgão, tecido, ou espaço pela sua infiltração,

independentemente da razão. É um tumor maligno comum no cão (Fossum & Caplan, 2013).

Num estudo recente sobre hemoperitoneu espontâneo em gatos, foi descoberto que 46%

tinham neoplasia abdominal, e que hemangiossarcoma era o diagnóstico mais comum entre

estas (18 em 30 equivalente a 60%) (Culp et al., 2010).

Os esquemas de categorização desta neoplasia diferem largamente conforme o

considerado - o tamanho do tumor ou a metastização para os linfonodos regionais. Uma

modificação levada a cabo pela Organização Mundial de Saúde tem sido a mais investigada.

Esta define o estágio I como um hemangiossarcoma confinado ao baço, o estágio II como um

hemangiossarcoma esplénico ruturado ou com metástases ganglionares e, por fim, o estágio III

como um hemangiossarcoma com metástases à distância (Wendelburg et al., 2015).

A remoção cirúrgica do tumor, através de esplenectomia, é o tratamento de escolha

para esta patologia. Considerações pré-operatórias devem incluir a correção de problemas

hematológicos ligados à coagulação, através de administração de hemocomponentes, se

necessário, e suporte circulatório apropriado através de fluidoterapia (Dobson, 2011).

Os resultados obtidos por Göritz et al., em 2013, e por Wendelburg et al., em 2015,

sugerem que o tempo de sobrevivência do animal pode ser prolongado pela administração de

quimioterapia como tratamento adjuvante à esplenectomia. Os protocolos quimioterápicos

utilizados nestes estudos incluíram: doxorrubicina; vincristina, doxorrubicina e ciclofosfamida;

ou quimioterapia metronómica com ciclofosfamida.

4.2.11. Sistema reprodutor

Na tabela 14 encontram-se distribuídos os casos referentes ao sistema reprodutor,

encontrando-se subdivididos em andrologia – afeções específicas de machos – e ginecologia e

obstetrícia – afeções específicas de fêmeas. Pela análise da mesma podemos verificar que, no

geral, a afeção clínica predominante é a piómetra, sendo que, no caso particular dos machos, a

afeção preponderante é a hiperplasia benigna prostática. Ainda no âmbito desta área, foi

possível à estagiária, acompanhar um caso peculiar de distocia, devido a má formação fetal

(figura 4), resolvido, posteriormente, por intervenção cirúrgica (cesariana). Apesar da anomalia

apresentada, o felídeo nasceu vivo e sobreviveu ainda durante dois dias, acabando por morrer

no final deste tempo.

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22

Tabela 14 – Distribuição da casuística em função das afeções observadas no sistema

reprodutor (n=42)

Área Afeção clínica Fr Fi Fic Fif Fie

An

dro

log

ia Hiperplasia prostática 14,3% 6 6 0 0

Criptorquidismo 9,5% 4 3 1 0

Quisto prostático 7,1% 3 3 0 0

Balanopostite 4,8% 2 2 0 0

Prostatite 4,8% 2 2 0 0

Gin

eco

log

ia e

ob

ste

tríc

ia

Piómetra 26,2% 11 7 3 1

Distocia 9,5% 4 2 2 0

Pseudogestação 4,8% 2 2 0 0

Eclampsia 4,8% 2 2 0 0

Inseminação artificial 7,1% 3 3 0 0

Metrite 4,8% 2 1 1 0

Prolapso vaginal 2,4% 1 1 0 0

Total 100,0% 42 34 7 1

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic: Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felinos; Fie – Frequência absoluta de animais exóticos

.

4.2.12. Oftalmologia

Como é possível observar na tabela 15, a conjuntivite foi a afeção mais recorrente,

apresentando uma Fr de 27%, tendo sido, ainda, maioritária nos gatos (Fif de 8) e minoritária

nos cães (Fic de 2).

Figura 4: Felídeo recém-nascido com anomalia anatómica

congénita – Propriedade intelectual do HVP

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Tabela 15 – Distribuição da casuística em função das afeções observadas na área de

oftalmologia (n=37)

Afeção clínica Fr Fi Fic Fif

Conjuntivite 27,0% 10 2 8

Catarata 18,9% 7 6 1

Úlcera da córnea 13,5% 5 5 0

Esclerose nuclear 10,8% 4 4 0

Entrópio 5,4% 2 2 0

Prolapso da glândula da terceira pálpebra 5,4% 2 2 0

Queratoconjuntivite seca 5,4% 2 2 0

Ectrópio 2,7% 1 1 0

Uveíte 2,7% 1 1 0

Perfuração da córnea 2,7% 1 1 0

Prolapso da íris 2,7% 1 1 0

Hifema 2,7% 1 1 0

Total 100,0% 37 28 9

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic: Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felinos

4.2.13. Endocrinologia

A análise da tabela 16 permite concluir que a diabetes mellitus e o hiperadrenocorticismo

foram as patologias endócrinas mais vezes observadas, obtendo respetivamente 33,3 % e

27,8% de Fr.

Tabela 16 – Distribuição da casuística em função das afeções endocrinológicas observadas

(n=36)

Afeção clínica Fr Fi Fic Fif

Diabetes mellitus 33,3% 12 8 4

Hiperadrenocorticismo 27,8% 10 10 0

Hipertiroidismo 22,2% 8 0 8

Hipotiroidismo 8,3% 3 3 0

Diabetes insípidus nefrogénica 2,8% 1 1 0

Diabetes insípidus central 2,8% 1 1 0

Hiperestrogenismo 2,8% 1 1 0

Total 100,0% 36 24 12

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic: Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felinos

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24

O hiperadrenocorticismo (HAC) é uma patologia resultante da produção ou

administração excessiva de glucocorticóides e é uma das endocrinopatias mais comummente

diagnosticadas em cães, sendo raramente descrita em gatos (Herrtage, 2004). Embora sem

predisposição sexual comprovada, parece existir uma maior tendência para o seu

desenvolvimento em fêmeas. No geral, esta patologia ocorre com igual frequência entre raças

puras e animais cruzados (Behrend, 2015).

Como referido, o HAC pode ter origem iatrogénica ou espontânea. Este último caso

pode estar associado com a secreção inapropriada da hormona adenocorticotropica (ACTH)

pela hipófise - HAC hipofisário-dependente (HHD) - ou estar associada com uma desordem

primária da adrenal - HAC adreno-dependente (HAD) (Herrtage, 2004).

Fisiologicamente a ACTH tem uma secreção pulsátil, encontrando-se a frequência e

amplitude desta tipicamente aumentada em cães com HHD. A superprodução crónica de ACTH

leva a uma elevação na produção de cortisol e, eventualmente, a uma hiperplasia

adrenocortical. Por outro lado, visto que o HAD é normalmente causado por tumores adrenais,

o feedback de inibição da ACTH é ineficaz na diminuição dos níveis hormonais. O excesso de

cortisol, independentemente da causa, leva à manifestação de sinais clínicos específicos que

incluem poliúria, polidipsia, polifagia, abdómen pendular e alopécia. Além disso, o

aparecimento de outros sinais, não tão específicos, como hepatomegalia, letargia, fraqueza

muscular, anestro, obesidade, atrofia muscular, respiração ofegante, atrofia testicular,

hiperpigmentação, calcinose cútis, paralisia do nervo facial, pele fina e hematomas também é

comum (Behrend & Greco, 2011; Behrend, 2015).

O diagnóstico de HAC depende de sinais clínicos identificados e dos achados

laboratoriais, sendo necessário excluir a administração exógena de glucocorticoides e testar a

função adrenal. Na avaliação analítica são frequentes as alterações nos parâmetros hepáticos

e é possível encontrar alterações hematológicas compatíveis com leucograma de stress.

Apesar de a hiperglicemia ser comum, apenas 10% dos cães apresentam diabetes mellitus

concomitantemente. A urianálise pode revelar baixa densidade, proteinúria, hematúria, piúria e

ainda bacteriúria (Behrend & Greco, 2011; Gallagher, 2014).

Os testes de função adrenal podem ser divididos em testes de triagem e testes de

diferenciação. Os primeiros são utilizados para confirmar a existência de HAC e os seus

resultados podem ou não ser consistentes com o diagnóstico da doença. Estes incluem o ratio

cortisol/creatina, o teste de estimulação com ACTH e a supressão a doses baixas de

dexametasona (SDBD). O ratio cortisol/creatina apresenta baixa especificidade (20% a 40%)

sendo o teste de estimulação de ACTH o detentor da maior especificidade (60% a 90%) e

permitindo, assim, diferenciar entre HAC espontâneo e iatrogénico. Ainda assim, o SDBD é o

teste de triagem mais escolhido em cães com HAC endógeno por possibilitar a identificação de

HHD. Para a realização deste teste é necessário a recolha de sangue para a obtenção de linha

basal endógena de cortisol, seguida da administração de dexametasona na dose de 0,01 a

0,015 mg/Kg por via endovenosa. Após quatro e oito horas desta administração, são colhidas

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25

amostras de sangue. Se às quatro horas o cortisol for 50% menor que a linha basal, o teste é

consistente com HHD. Do mesmo modo, pode ser compatível com este diagnóstico se às oito

horas o cortisol for 50% menor do que a linha basal, mas maior do que o nível normal tabelado.

A falta de supressão pode ter origem tanto num HHD como num HAC (Behrend, 2015).

Os testes de diferenciação são utilizados para determinar se estamos perante HHD ou

HAC. Para além do já referido SDBD, existem ainda testes de medição da ACTH endógena e

supressão a doses altas de dexametasona. É concebível que após o teste de SDBD se recorra

à ecografia para distinção destas patologias (Gallagher, 2014). Adrenais com anatomia

alterada, com tamanhos aumentados ou com diferenças de tamanho entre si e a presença de

estruturas nodulares, por vezes calcificadas, são indicativas de HAD (Behrend, 2015).

A cirurgia é o procedimento de eleição em animais com adenomas adrecorticais ou

pequenos carcinomas, sendo desaconselhada em casos de risco elevado para o doente

(Behrend & Greco, 2011). O maneio médico é a abordagem mais comum no HHD mas também

pode ser usado em HAD se a adrenalectomia não for opção. O trilostano e o mitotano são os

fármacos vulgarmente utilizados e possuem uma eficácia semelhante no tratamento de HHD e

HAD. O trilostano atua através da inibição da 11-β-hidroxisteróide dihidrogenase, inibindo

desse modo a produção de progesterona e seus produtos finais, como o cortisol e a

aldosterona. Embora esta varie consoante a fonte consultada, recomenda-se uma dose inicial

de 3 a 6 mg/Kg PO a cada 24 horas. A monitorização deste tratamento deve incluir uma

avaliação dos sinais clínicos e a realização de testes de estimulação com ACTH 3 a 6 horas

após a administração para controlo dos níveis de cortisol. Os períodos de controlo devem

manter-se constantes, iniciando-se 10 a 14 dias após a administração e repetindo-se volvidos

30 dias. O mitotano continua a ser o fármaco de eleição no tratamento desta endocrinopatia,

independentemente da presença de HAD ou HDD. Trata-se de um agente adrenocorticolítico

seletivo e destrutor das regiões fasciculata e reticulata. Este fármaco deve ser administrado

inicialmente numa dose de 20-25 mg/Kg, PO, de 12 em 12 horas. Após a administração, de

forma idêntica ao fármaco anterior, deve realizar-se um teste de estimulação com ACTH para

confirmar a manutenção dos níveis de cortisol dentro dos valores de referência. Animais com

HAC devem ser submetidos a avaliações periódicas nas quais se realize controlos analíticos e

se avaliem os efeitos da medicação no animal, de modo a efetuar os ajustes necessários nas

doses aplicadas (Behrend & Greco, 2011; Gallagher, 2014).

4.2.14. Otorrinolaringologia

A tabela 17 permite concluir que a afeção mais incidente nesta área foi a estenose das

narinas, apresentando 23,3% de Fr.

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Tabela 17 – Distribuição da casuística em função das afeções observadas na área de

otorrinolaringologia (n=30)

Afeção clínica Fr Fi Fic Fif

Estenose das narinas 23,3% 7 7 0

Otite externa bacteriana 20,0% 6 4 2

Otite externa Malassesia 13,3% 4 4 0

Otohematoma 13,3% 4 4 0

Alongamento do palato mole 10,0% 3 3 0

Otite otodécica 6,7% 2 0 2

Corpo estranho nasal 3,3% 1 1 0

Paralisia laríngea 3,3% 1 1 0

Otite externa mista 3,3% 1 1 0

Pólipos nasofaríngeos 3,3% 1 0 1

Total 100,0% 30 25 5

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic: Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felinos

4.2.15. Odontoestomatologia

Pela análise da tabela 18 é possível concluir que a patologia mais observada nesta área

foi a doença periodontal, com um Fr de 62,1%.

Tabela 18 – Distribuição da casuística em função das afeções observadas na área de

odontoestomatologia (n=29)

Afeção clínica Fr Fi Fic Fif

Doença periodontal 62,1% 18 14 4

Fenda do palato 13,8% 4 3 1

Necrose da língua 10,3% 3 2 1

Gengivoestomatite crónica felina 6,9% 2 0 2

Abcessos 3,4% 1 1 0

Fístula infraorbitária 3,4% 1 1 0

Total 100,0% 29 21 8

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic: Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felinos

4.2.16. Toxicologia

Por último, a toxicologia – área com menor ocorrência de entre todas as integrantes na

clínica médica, com apenas 1,6% de Fr – encontra-se subdividida por agente de

intoxicação, na tabela 19.

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Tabela 19 – Distribuição da casuística em função dos agentes de intoxicação observados na área de toxicologia (n=16)

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic: Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felinos

4.3. Clínica cirúrgica

A clínica cirúrgica surge atrás da clínica médica em termos da frequência de casos

acompanhados (Fr de 21,2%). A análise da tabela 20 permite verificar que a cirurgia de tecidos

moles foi a área com maior ocorrência da clínica cirúrgica, apresentando uma Fr de 58,8%. Foi

ainda incluído na clínica cirúrgica outros procedimentos, para os quais é necessário a utilização

de sedação/anestesia, podendo alguns não ser considerados verdadeiros procedimentos

cirúrgicos.

Tabela 20 – Distribuição da casuística em função das diferentes áreas cirúrgicas (n=320)

Clínica cirúrgica Fr Fi Fic Fif Fie

Cirurgia de tecidos moles 58,8% 188 108 79 1

Cirurgia ortopédica 6,9% 22 14 8 0

Cirurgia odontológica 4,7% 15 10 5 0

Cirurgia oftálmica 3,1% 10 9 1 0

Neurocirurgia 3,1% 10 10 0 0

Outros procedimentos sob anestesia/sedação

23,4% 75 45 30 0

Total 100,0% 320 196 123 1

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic: Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felinos; Fie – Frequência absoluta de animais exóticos

4.3.1. Cirurgia de tecidos moles

A maioria dos procedimentos cirúrgicos, realizados em cirurgia de tecidos moles, foram a

ovariohisterectomia eletiva e a orquiectomia, apresentando, respetivamente, uma Fr de 36,7%

e 16,0% (tabela 21). Além do auxílio prestado, pela estagiária, na realização destes processos,

Agente de intoxicação Fr Fi Fic Fif

Paracetamol 25,0% 4 1 3

Dicumarínicos 18,8% 3 1 2

Permetrinas 18,8% 3 0 3

Metilxantinas 12,5% 2 2 0

Ibuprofeno 12,5% 2 1 1

Intraconazol 6,3% 1 1 0

Hipoclorito de sódio 6,3% 1 1 0

Total 100,0% 16 7 9

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tanto a nível de anestesia como ajudante cirúrgica, foi ainda possível à mesma desempenhar o

papel de cirurgiã, sempre acompanha de ajuda médica especializada, em cirurgias eletivas.

Tabela 21 – Distribuição da casuística em função dos diferentes procedimentos cirúrgicos

realizados na área de cirurgia de tecidos moles (n=188)

Procedimento cirúrgico Fr Fi Fic Fif Fie

Ovariohisterectomia eletiva 36,7% 69 25 44 0

Orquiectomia 16,0% 30 11 19 0

Nodulectomia 8,0% 15 10 5 0

Ovariohisterectomia devido a piómetra 5,3% 10 7 2 1

Gastropexia por dilatação e torção gástrica 4,8% 9 9 0 0

Mastectomia regional 4,3% 8 6 2 0

Laparotomia exploratória 3,7% 7 6 1 0

Esplenectomia 2,7% 5 4 1 0

Enterotomia 2,7% 5 3 2 0

Cesariana 2,1% 4 3 1 0

Mastectomia radical 2,1% 4 3 1 0

Colocação de pacemaker (figura 5) 1,6% 3 3 0 0

Correção do ducto arterioso persistente 1,6% 3 3 0 0

Enterectomia 1,6% 3 2 1 0

Recessão do palato mole 1,6% 3 3 0 0

Valvuloplastia 1,1% 2 2 0 0

Biópsia hepática 1,1% 2 2 0 0

Cistotomia 1,1% 2 2 0 0

Resolução de prolapso rectal 0,5% 1 1 0 0

Herniorrafia diafragmática (figura 6) 0,5% 1 1 0 0

Rinoplastia 0,5% 1 1 0 0

Tiroidectomia 0,5% 1 1 0 0

Total 100,0% 188 108 79 1

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic: Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felinos; Fie – Frequência absoluta de animais exóticos

Figura 6: Radiografia torácica lateral com

evidência de hérnia diafragmática –

Propriedade intelectual do HVP

Figura 5: Radiografia torácica lateral, após

colocação de pacemaker – Propriedade

intelectual do HVP

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4.3.2. Cirurgia ortopédica

Como é possível verificar pela análise da tabela 22, o procedimento cirúrgico mais

realizado foi a osteossíntese da tíbia/fíbula, apresentando uma Fr de 27,3%.

Tabela 22 – Distribuição da casuística em função dos procedimentos cirúrgicos realizados na área de

cirurgia ortopédica (n=22)

Procedimento cirúrgico Fr Fi Fic Fif

Osteossíntese da tíbia/fíbula 27,3% 6 4 2

Amputação de membro posterior 13,6% 3 1 2

Osteossíntese do fémur 13,6% 3 2 1

Osteossíntese do rádio/ulna 13,6% 3 1 2

Amputação de cauda 9,1% 2 1 1

Osteossíntese da coluna 9,1% 2 2 0

Amputação de membro anterior 4,5% 1 1 0

Recessão da cabeça do fémur 4,5% 1 1 0

Osteossíntese da bacia 4,5% 1 1 0

Total 100,0% 22 14 8

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic: Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felino

4.3.3. Cirurgia odontológica

Na tabela 23 encontram-se distribuídos os procedimentos cirúrgicos realizados na área

de odontologia, tendo sido realizadas, apenas, destartarizações e extrações dentárias,

apresentando, respetivamente, uma Fr de 80% e 20%.

Tabela 23 – Distribuição da casuística em função dos procedimentos odontológicos realizados

(n=15)

Procedimento cirúrgico Fr Fi Fic Fif

Destartarização 80,0% 12 8 4

Extração dentária 20,0% 3 2 1

Total 100,0% 15 10 5

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic: Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felinos

4.3.4. Cirurgia oftálmica

A tabela 24 permite concluir que o procedimento cirúrgico mais realizado na área de

cirurgia oftálmica foi a enucleação, apresentando uma Fr de 30%.

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Tabela 24 – Distribuição da casuística em função dos procedimentos realizados na área de cirurgia oftálmica (n=10)

Procedimento cirúrgico Fr Fi Fic Fif

Enucleação 30,0% 3 2 1

Flap da conjuntiva 20,0% 2 2 0

Queratotomia lamelar superficial 20,0% 2 2 0

Resolução de prolapso da íris e sutura corneal 10,0% 1 1 0

Resolução de proptose seguida de tarsorrafia

(figura 7 e 8) 10,0% 1 0 1

Correção de ectrópio 10,0% 1 1 0

Total 100,0% 10 8 2

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic: Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felinos

4.3.5. Neurocirurgia

No que concerne à área de neurocirurgia, apenas foram realizados dois procedimentos

cirúrgicos, sendo estes a hemilaminectomia e a minihemilaminectomia (tabela 25).

Tabela 25 - Distribuição da casuística em função dos procedimentos cirúrgicos realizados na

área de neurocirurgia (n=10)

Procedimento cirúrgico Fr Fi Fic

Hemilaminectomia 90,0% 9 9

Minihemilaminectomia 10,0% 1 1

Total 100,0% 10 10

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic: Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felinos

Figura 7 e 8: Proptose ocular – Propriedade intelectual do HVP

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4.3.6. Outros procedimentos realizados sob sedação /anestesia

Estão incluídos neste grupo de procedimentos, todos aqueles que, embora sejam

realizados sobre o efeito de sedação/anestesia não são considerados verdadeiros

procedimentos cirúrgicos. Pela análise da tabela 26 podemos verificar que os procedimentos,

deste género, mais realizados foram a sutura de lacerações, com Fr de 25,3%, e a drenagem

de abcessos, com Fr de 21,3%. Foi ainda possível à estagiária observar um caso de

traqueostomia temporária, sendo este um procedimento raro e, por esse motivo, apenas

visualizado uma vez (Fr de 1,3%).

Tabela 26 – Distribuição de outros procedimentos realizados sob anestesia/sedação (n=75)

Procedimento Fr Fi Fic Fif

Sutura de lacerações (figura 9 e 10) 25,3% 19 11 8

Drenagem de abcessos 21,3% 16 10 6

Colheita de LCR 20,0% 15 15 0

Colocação de dreno torácico 13,3% 10 4 6

Colocação de tubo nasogástrico 9,3% 7 2 5

Colocação de cateter de diálise peritoneal 5,3% 4 1 3

Colocação de tubo alimentar de esofagostomia 4,0% 3 2 1

Traqueostomia temporária 1,3% 1 0 1

Total 100,0% 75 45 30

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic: Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felinos

4.4. Imagiologia

A imagiologia é um meio de diagnóstico complementar muito utilizado no dia-a-dia de um

hospital, como se pode verificar pelo número de casos apresentados na tabela 27.

Figura 9 e 10: Canídeo com laceração extensa, após

atropelamento – Propriedade intelectual do HVP

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Tabela 27– Distribuição da casuística em função dos diferentes meios de diagnóstico imagiológico (n=655)

Procedimento cirúrgico Fr Fi Fic Fif Fie

Radiografia simples 52,5% 346 212 122 12

Ecografia abdominal 24,9% 164 94 69 1

Ecocardiografia 10,3% 68 29 39 0

Tomografia axial computorizada 5,6% 37 37 0 0

Laringotraqueobroncoscopia 2,3% 15 12 3 0

Mielografia 1,5% 10 10 0 0

Fluoroscopia 1,1% 7 7 0 0

Diagnóstico de gestação 0,6% 4 3 1 0

Endoscopia 0,6% 4 2 2 0

Otoscopia 0,6% 4 4 0 0

Total 100,0% 659 410 236 13

Legenda: Fr – Frequência relativa; Fi – Frequência absoluta; Fic: Frequência absoluta de caninos; Fif –

Frequência absoluta de felinos; Fie – Frequência absoluta de animais exóticos

4.5. Outros procedimentos médicos

Além do referido, no decorrer do estágio, foram efetuados vários procedimentos médicos

que, devido à vulgaridade com que eram realizados, se tornaram impossíveis de ser

contabilizados. Fazem parte integrante destes procedimentos as citologias e as histopatologias,

as urianálises tipo I, II e III, as analíticas sanguíneas, os testes rápidos imunoenzimáticos

(ELISA), especificamente, para vírus de imunodeficiência felina (FIV), FeLV e leishmânia,

eletrocardiogramas, punções aspirativas por agulha fina e medições de pressões arteriais.

Embora, com uma frequência não tão elevada, são incluídos ainda neste ponto todas as

cistocenteses e algaliações, transfusões de sangue e plasma, tipificações sanguíneas e provas

cruzadas, sessões de quimioterapia, sessões de diálise peritoneal, abdominocenteses,

ressuscitações cardiopulmonares e acupuntura com electroestimulação (figura 11).

Figura 11: Acupuntura com electroestimulação – Propriedade

intelectual do HVP

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III. MONOGRAFIA - Medicina transfusional em gatos

1. Introdução

O gato doméstico tem ganho destaque como animal de companhia adotado por um

grande número de lares a nível mundial. Paralelamente, a mudança de mentalidade dos

proprietários relativamente à necessidade de cuidados médicos prestados a gatos, fez com que

esta espécie tenha muito mais representatividade na prática clínica veterinária, exigindo

maiores e melhores conhecimentos do médico veterinário sobre a mesma (Pereira & Buzin,

2012).

Em medicina veterinária, as transfusões sanguíneas podem ter um papel vital em

situações críticas e de emergência. Assim, tal como acontece nos seres humanos, este

procedimento pode salvar a vida do animal. Todavia, transfusões de sangue em felinos devem

ser realizadas com precaução, uma vez que existem algumas dificuldades práticas associadas.

Se comparadas a transfusões sanguíneas em caninos, a colheita e armazenamento de sangue

dos felinos, acarreta um maior risco de complicações, seja para o dador seja para o recetor.

(The World Small Animal Veterinary Association., n.d.).

O sangue, sendo um fluido circulante, desempenha inúmeras funções vitais no

organismo e representa cerca de oito a 10% do peso total de um animal. Estas incluem:

Regulação do equilíbrio hídrico, do pH, da pressão osmótica, e da temperatura;

Respiração, transporte de nutrientes e hormonas, excreção de resíduos

metabólicos;

Defesa (imunidade) (Rastogi, 2007).

O sangue é composto por células (eritrócitos, leucócitos e plaquetas) e por plasma. O

plasma é a parte líquida do sangue sendo neste componente onde se encontram suspensas as

referidas células e outras substâncias dissolvidas, que usam o sangue como meio de

transporte. A proporção de células vermelhas, relativamente ao plasma, é denominada de

hematócrito e é uma medida com grande significado clínico. Este obtém-se pela centrifugação

do sangue e pela separação deste nos seus componentes, supra mencionados, de acordo com

a sua densidade - figura 12. As células vermelhas, ocupam a parte inferior, denominando-se

100 %

Hematócrito (%)

Figura 12 – Separação dos componentes sanguíneos segundo

a sua densidade – adaptado de (Mohammed, 2012)

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hematócrito, os leucócitos e plaquetas - buffy coat -, encontram-se imediatamente a seguir e,

finalmente, o plasma encontra-se a ocupar a parte superior. O PCV é o componente mais útil

para reconhecer alterações fisiológicas no sangue (Reece, 2009).

Um animal saudável é capaz de manter a homeostasia, variando pouco o hematócrito e

apresentando concentrações constantemente normais. A anemia é uma patologia

caracterizada por uma redução das células vermelhas em circulação, seja qual for a sua causa.

Os gatos são particularmente suscétiveis ao desenvolvimento desta patologia, pois os seus

eritrócitos têm uma vida útil mais reduzida (70 dias), quando comparados a mamíferos de

outras espécies (como é o caso dos cães e do Homem em que a vida útil é de 110 a 120 dias),

podendo evoluir rapidamente. Existem várias causas para o seu aparecimento tais como,

exposição a toxinas, neoplasias, inflamação crónica, insuficiência renal, causas infecciosas e

disfunção de medula óssea. No entanto, os gatos, em geral, lidam muito bem com anemias

ligeiras a moderadas, não demonstrando sinais clínicos até o hematócrito estar gravemente

baixo (Simpson, 2013).

Porém, a decisão de transfundir um paciente anémico não deve ter por base a leitura

isolada do hematócrito. Os sinais clínicos associados a anemia devem também ser

considerados e incluem fraqueza, letargia, taquicardia, taquipneia e pulso femoral fraco. Assim,

acima de tudo, o estado clínico do animal ditará a altura certa para iniciar a administração de

sangue. (Ferreira, et al., 2008a). Por estas, e outras, razões é necessário, cada vez mais, uma

procura de soluções específicas para esta espécie.

2. Banco de sangue

2.1. Nota histórica

A transfusão sanguínea é definida como uma terapia intravenosa com sangue inteiro ou

hemocomponentes (Abrams-Ogg, 2000). Embora simples, o estabelecimento desse termo,

prolongou-se no tempo. Os primeiros passos foram dados em 1656, por Christopher Wren,

quando este utilizou uma pena com uma bexiga acoplada para demonstrar, que a

administração de substâncias por via intravenosa, em animais, tinha efeitos sistémicos. Só

passados dez anos, em 1666, foi realizada a primeira transfusão sanguínea com sucesso, por

Richard Lower, transfundindo sangue de um cão para outro. Este acontecimento levou Samuel

Pepys a especular sobre os potenciais benefícios de transfusões entre seres humanos,

afirmando que “sangue de má qualidade pode ser reparado emprestando sangue de um corpo

melhor” (Janatpour & Holland, 2007),

A primeira transfusão sanguínea documentada, entre seres humanos, foi feita no ano de

1818. Mas esta prática só começou a ascender nos anos vinte e trinta quando os

anticoagulantes foram introduzidos no mercado, permitindo o armazenamento e

desenvolvimento de bancos de sangue (The World Small Animal Veterinary Association., n.d.).

O uso de citrato de sódio como anticoagulante, usado pela primeira vez por Albert Hustin em

1914, e o desenvolvimento do armazenamento refrigerado, por Richard Weil, permitiram a

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criação de um “depósito de sangue”, levado a cabo por Oswald Hope Robertson na Grã-

Bretanha, durante a primeira guerra mundial. Com a chegada da segunda guerra mundial, a

prática de banco de sangue começou a crescer, devido à sua grande necessidade. Estabelece-

se, assim, em 1940, o primeiro banco de sangue nos Estados Unidos por Benard Fantus, em

Chicago (Abrams-Ogg, 2000; Janatpour & Holland, 2007). É durante este período, entre 1900 e

1950, que a ciência e a prática transfusional atingem o seu auge de desenvolvimento (Boulton,

2015).

Inicialmente, os bancos de sangue, envolviam exclusivamente a colheita,

armazenamento e administração de sangue inteiro. Estes continham elementos celulares

maduros já no seu estágio final de desenvolvimento, sem potencial para mais expansão e

mitoses, incluindo eritrócitos, plaquetas e granulócitos. As células vermelhas foram os primeiros

componentes celulares aos quais foram implementados métodos padronizados e confiáveis de

colheita, armazenamento e administração. Foram, entretanto, desenvolvidos métodos de

separação dos hemocomponentes, para que estes pudessem ser armazenados e

administrados individualmente (Janatpour & Holland, 2007).

Em 1950 foi caracterizado pela primeira vez um sistema de grupos sanguíneos felino,

com 2 tipos de sangue e anticorpos pré existentes. No entanto, só em 1962, assumiram a

terminologia de A e B, reconhecida atualmente. O terceiro grupo sanguíneo, AB, foi descrito,

apenas, em 1980 (Knottenbelt, 2002; Hohenhaus, 2004).

Com o aumento da procura de cuidados veterinários, por parte dos proprietários de

gatos, e a disponibilidade de hemocomponentes específicos para esta espécie, o recurso a

transfusão de sangue tem-se tornado uma prática cada vez mais comum nos últimos 10 anos.

Assim, este procedimento tornou-se um componente importante no cuidado médico e cirúrgico

na espécie felina (Weingart et al. 2004; Weltman et al. 2014).

2.2. Programa de dadores

Existem várias restrições e precauções a serem tomadas na escolha de um dador de

sangue felino, tornando-se difícil encontrar um candidato adequado em situação de

emergência. Assim, torna-se necessário o acesso a animais previamente testados e que

preencham todos requisitos para efetuarem dádivas de sangue, uma vez que todas as

transfusões devem ter origem numa fonte saudável. (Gibson, 2007).

Existem várias opções quanto à origem dos dadores, decidindo cada clínica, a melhor

forma, consoante as suas necessidades. A forma mais simples de assegurar o acesso a

dadores de sangue é manter esses animais na clínica. Algumas clínicas mantêm um pequeno

grupo de gatos exclusivamente para dádivas de sangue, existindo alguma controvérsia em

relação ao bem-estar animal. O número de animais mantidos na clínica depende das

necessidades prévias, sendo, na maioria dos casos, suficiente, um a dois gatos (Abrams-Ogg,

2000; Yagi, 2013).

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Outra solução, praticada por algumas clínicas e hospitais com serviço de banco de

sangue, é manter um registo, devidamente atualizado, de todos os proprietários dispostos a

voluntariar o seu animal como dador. Desta forma é possível antever situações de

necessidade, nas quais os candidatos aprovados serão recrutados. (The World Small Animal

Veterinary Association., n.d.). É vantajoso compilar uma lista com potenciais dadores, como por

exemplo, animais pertencentes a trabalhadores do hospital ou a clientes que preencham os

requisitos necessários (Tasker, 2013).

Este programa de dadores assenta então na ideia de proprietários voluntariarem os seus

animais em troca de benefícios, tais como, exames gerais periódicos gratuitos, vacinações,

desparasitações e comida/brinquedos para animais (Abrams-Ogg, 2000). Seminários para

clientes, reuniões com o clube de treino, mensagens ilustrativas sobre o tema colocadas na

recessão do hospital, e artigos em jornais locais, podem aumentar a consciência do público

para a necessidade de dadores felinos, assim como caninos, e levar mais pessoas a

voluntariarem os seus animais (Gibson, 2007).

Existem alguns métodos bastante criativos para atrair dadores promovendo o altruísmo

do proprietário, embora requeiram algum investimento. Acessórios para o animal que digam

“eu doei sangue hoje”, autocolantes para o carro com “O meu animal pode dar sangue. O que

pode fazer o teu?”. Além destas ideias, Yagi, 2013 afirma ainda que uma das suas exposições

preferidas, relativas a este assunto, foi ter visto uma exibição de fotografias intitulada “wall of

heroes”. Confessa que não só foi inspirador ver que todos aqueles animais tinham doado

sangue, salvando certamente a vida de outros, mas também que este estabelecimento lhes

tinha dedicado toda uma parede, a fim de reconhecer a sua contribuição. Mesmo não

considerando o aspeto sentimental, esta é uma ótima forma de passar a palavra a outros

clientes, dizendo que animais também precisam de transfusões de sangue e a única forma de

o obter é através de outros animais. Este autor conclui com uma pergunta para os médicos

veterinários: «quantas vezes já vos foi perguntado “Onde arranja sangue para os animais?”».

Os proprietários destes animais são avisados para se dirigirem à clínica caso seja

necessário sangue fresco, e/ou esteja na altura da doação periódica para banco de sangue.

Embora seja possível efetuar recolhas sanguíneas com apenas quatro semanas de intervalo,

os gatos, principalmente os com proprietários, não devem doar sangue mais que uma vez a

cada dois meses. Apesar destes programas serem seguros, na prática acarretam alguns riscos

para o dador felino, associados com a sedação e subsequente colheita de sangue, que deve

ser cuidadosamente ponderado em relação ao potencial ganho do recetor. Ao contrário de um

ser humano, um gato dador não pode dar o seu consentimento para a recolha de sangue,

neste caso é o seu proprietário a tomar esta decisão. Sendo assim, é essencial que todos os

riscos presentes sejam explicados de forma clara ao cliente, para que seja obtido o seu

consentimento, por escrito, antes do gato ser usado para dádiva de sangue (Abrams-Ogg,

2000; Barfield & Adamantos, 2011; Tasker, 2013; The International Society of Feline Medicine.,

n.d.-a).

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2.3. Recrutamento felino

Existem vários critérios a ser cumpridos para que um gato seja considerado adequado

como dador (The International Society of Feline Medicine., n.d.-a). Estes devem ser saudáveis,

sem acesso ao exterior e devem ter um temperamento fácil para bom manuseamento e

contenção. Animais com um temperamento mais difícil podem ser utilizados, recorrendo-se a

sedação. Todavia este método acarreta efeitos secundários, que se tornam indesejáveis,

principalmente para animais com proprietários. Todos os dadores devem possuir um regime

vacinal completo e desparasitação interna e externa regular e apropriada à região onde se

inserem. As informações relevantes sobre a vacinação felina ideal, encontram-se descritas nas

guidelines da European Advisory Board on Cat Diseases, abordando a prevenção contra o

parvovírus (panleucopénia) (Truyen et al., 2009), herpesvirus (Thiry et al., 2009), calicivirus

(Radford et al., 2009), coronavírus (Addie et al., 2009), raiva (Frymus et al., 2009), clamídia

(Gruffydd-Jones et al., 2009), Bordetella bronchiseptica (Egberink et al., 2009), FIV (Hosie et

al., 2009) e FeLV (Lutz et al., 2009). Além disso, é recomendado um período mínimo de um

mês após a vacinação, cirurgia de rotina (como por exemplo, castração) ou qualquer

tratamento médico, antes de ser efetuada uma colheita de sangue. Felinos com medicações de

carater crónico, incluindo AINE’s, não devem ser utilizados como dadores (Abrams-Ogg, 2000;

Barfield & Adamantos, 2011; The International Society of Feline Medicine., n.d.-b).

Idealmente, o gato dador deve ter um peso superior a cinco Kg, já que desta forma

experiencia menos efeitos secundários dependentes do volume de sangue recolhido. No

entanto, podem ser utilizados gatos com peso superior a quatro Kg, idade mínima de 1 ano e

máxima de 8, sendo a idade máxima ideal de cinco anos. São preferíveis animais que tenham

vivido toda a sua vida na mesma casa, desde muito jovens, já que assim temos acesso à

história clínica completa, diretamente do proprietário. É também preferível que os gatos

dadores nunca tenham viajado e façam prevenção contra parasitas cardíacos caso habitem em

zonas endémicas, embora a utilização de sangue infetado não transmita o parasita. Devem

ainda ter um índice de condição corporal normal (quatro ou cinco em nove). (Tasker, 2013;

Pennisi et al., 2015; The International Society of Feline Medicine., n.d.-a).

O gato candidato a dador, que apresente as características anteriormente descritas,

deve ser submetido a um exame completo de saúde para verificar a sua aptidão para o efeito.

Este exame deve incluir a recolha completa da história clínica do animal, exame físico

completo, com medição das pressões arteriais, e, idealmente, uma ecocardiografia para

pesquisa de doença cardíaca oculta. Deve ser recolhido sangue para a realização de um

hemograma completo, com a realização de esfregaço de sangue, tendo este, como finalidade,

a avaliação morfológica dos vários componentes e pesquisa de hemoparasitas. A partir do

sangue recolhido devem ainda realizar-se análises bioquímicas para pesquisa de doença renal

ou hepática. Para um exame mais completo, deve ser recolhida urina de forma a ser

descartada doença renal (Barfield & Adamantos, 2011; The International Society of Feline

Medicine., n.d.-a, n.d.-b)

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Atualmente, a informação sobre agentes infecciosos sanguíneos é de fácil acesso,

principalmente os transmitidos por vetores (Vilhena et al., 2013). Em 2005, numa conferência

sobre pesquisa de doenças infecciosas em cães e gatos, dadores de sangue, a American

College of Veterinary Internal Medicine adotou critérios básicos para selecionar agentes

patogénicos a serem testados (Wardrop et al., 2005). Tendo em conta estes critérios, um painel

de testes sugerido por Pennisi et al. (2015) engloba as informações descritas no quadro 1.

Quadro 1: Testes de triagem de patogéneos core e recomendados em zonas endémicas, a

realizar em todos os felinos candidatos a dadores de sangue, adaptada de (Tasker, 2013;

Pennisi et al., 2015; The International Society of Feline Medicine., n.d.-a)

A pesquisa de Coronavirus e Toxoplasma sp. não é obrigatória devido ao baixo risco de

transmissão (Barfield & Adamantos, 2011). As condições ambientais do gato podem ser tidas

em atenção, visto que um animal apenas de interior e sem coabitantes, pode usufruir de um

período mais alargado entre a realização dos testes necessários (Tasker, 2013).

Estes testes devem ser realizados com a periodicidade de seis meses a um ano, ou seja,

o animal não terá que os efetuar em todas as recolhas dentro deste período. Ainda assim, um

conjunto de testes especificados no ponto cinco, deve ser sempre realizado imediatamente

Doença Testes

Doenças

infecciosas não

vetoriais

FeLV (core)

O teste de PCR1)*

é o ideal, embora em

casos de emergência possa ser

efetuado um teste rápido.

FIV (core) Pesquisa de anticorpos anti FIV no

soro/plasma1)

Doenças

infecciosas

vetoriais

Mycoplasma haemofelis;

Candidatus Mycoplasma

haemominutum;

Candidatus Mycoplasma

turicensis;

(core)

PCR sanguíneo

Bartonella sp. (core) Pesquisa de anticorpos anti-Bartonella

por **IFI

Cytauxzoonoses; ehrlichioses,

anaplasmoses

Só é necessário pesquisa destes

parasitas em zonas endémicas - PCR

Legenda: *PCR = polymerase chain reaction;

**IFI:Imunofluorescência indireta;

1) Num período de

três meses após a exposição, antes de qualquer dádiva, o animal deve ser testado mesmo com

resultados negativos prévios

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antes de cada recolha. Animais com hematócritos tendencialmente baixos, não devem ser

aceites como dadores (Barfield & Adamantos, 2011)

Devido à existência de anticorpos naturais contra outros grupos sanguíneos felinos, é

essencial que tanto o grupo sanguíneo dos gatos dadores como o dos recetores seja

conhecido (Gibson, 2007).

3. Tipificação sanguínea

As incompatibilidades de tipos de sangue são potencialmente responsáveis por

isoeritrólise neonatal e reações transfusionais fatais em gatos. (Tasker, 2013) Uma política

rigorosa com o procedimento de tipificação e crossmatching e cuidadosa monitorização,

minimizam o risco de uma reação adversa e maximizam os benefícios de uma transfusão

(Godinho-Cunha et al., 2011). A tipificação sanguínea categoriza o sangue em grupos de

acordo com o antigénio presente na membrana dos eritrócitos (Knottenbelt, 2002). Todos os

gatos, quer dadores, quer recetores, têm que passar por este processo.

3.1. Grupos sanguíneos felinos

O sistema de grupo sanguíneo AB felino foi descrito pela primeira vez há mais de três

décadas e está associado a dois antigénios eritrocitários (Hourani et al., 2014). Estes variam

tanto dentro como entre as diversas espécies e, portanto, os tipos de sangue de cães, gatos e

seres humanos, não são comparáveis (Barfield & Adamantos, 2011). Assim sendo, mesmo

usando a mesma nomenclatura, ABO, o sangue do ser humano não tem relação serológica

com o do gato (Hohenhaus, 2004).

Os grupos sanguíneos A e B são transmitidos por geração mendeliana simples, em que

os alelos que codificam para tipo A ou tipo B ocupam o mesmo locus. O tipo A é dominante

sobre B, sendo genotipicamente, homozigótico (A/A) ou heterozigótico (A/b). O tipo B é

obrigatoriamente homozigótico (b/b). A presença de antigénios tipo A e tipo B, num feto, pode

ser detetada aos 38 dias de gestação (Hohenhaus, 2004; Barfield & Adamantos, 2011). O tipo

AB é raro e é expresso por um terceiro alelo recessivo quanto a A e dominante quanto a B.

Estudos de acasalamentos mostraram que o tipo AB não é simplesmente o resultado de um

cruzamento entre um gato tipo A e um tipo B, sendo inclusive raro esse acontecimento, mas

sim um tipo A portador do raro alelo AB (Ab/A). Portanto o fenótipo AB é genotipicamente Ab/b

ou Ab/Ab. Contudo este padrão de heritabilidade não se demonstrou em todos os casos de

gatos AB, o que leva a crer que existem mais mecanismos de transmissão deste tipo

sanguíneo. (Griot-Wenk & Giger, 1995; Knottenbelt, 2002; Davidow, 2013).

A nível molecular, o antigénio tipo A é caraterizado por gangliosídeos que exprimem

ambos ácido N-glicolilneuramínico (NeuGc) e ácido N-acetilneuramínico (NeuAC) ou apenas

NeuAC exprimindo concomitantemente a enzima hidroxilase do ácido CMP-N-

acetilneuramínico capaz de converter NeuAc em NeuGc. Gatos tipo A que sejam

homozigóticos e heterozigóticos diferem ligeiramente na quantidade destes gangliosídeos. Por

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outro lado, o tipo B apenas possui antigénios composto por NeuAc. Finalmente, o tipo AB é

composto por quantidades semelhantes de NeuAc e NeuGc, assim como duas formas

intermediárias de gangliosídeos (Marques et al., 2011).

À semelhança com o sistema de sangue do ser humano ABO, todos os tipos A e B

felinos, têm anticorpos naturalmente existentes – anti-A e anti-B – não existindo dador universal

para esta espécie (Tocci & Ewing, 2009). Os anticorpos anti-A são aparentemente fortes

hemolisinas e hemaglutinas, sendo predominantemente da classe imunoglobulina (Ig) M,

existindo algumas IgG. Os anticorpos anti-B são fracas aglutininas IgM e fracas hemolisinas

com igual proporção entre IgM e IgG. Para além da força de ligação dos anticorpos anti-A ser

mais forte, a sua concentração em circulação é maior em comparação com o baixo título de

anticorpos anti-B (Knottenbelt, 2002; Hohenhaus, 2004).

O risco de uma reação transfusional é muito maior para um gato de tipo sanguíneo B

que recebe sangue tipo A, visto que, como mencionado anteriormente, a maioria de gatos tipo

B têm altos títulos de anticorpos anti-A, o que resulta numa rápida hemólise dos eritrócitos do

dador. Os sinais de uma reação transfusional aguda hemolítica podem acontecer após um gato

tipo B ter recebido tão pouco como 1ml de sangue tipo A. (Gibson, 2007; Weinstein et al.,

2007). O soro de gatos tipo AB não possui anticorpos, nem hemolisinas, nem hemaglutininas.

(Hohenhaus, 2004; Barfield & Adamantos, 2011).

O tipo A é o grupo de sangue felino predominante em todo o mundo, embora a

prevalência do tipo A, B e AB difira, dentro da população felina, entre gatos de raça pura e

gatos sem raça definida (Marques et al., 2011). O fenótipo AB só aparece em raças em que o

tipo B foi identificado, sejam puras ou indefinidas. Parece não existir relação entre sexo e

coloração da pelagem, com o tipo de sangue (Hohenhaus, 2004). Foi efetuado um estudo

retrospetivo, por Marques et al. em 2011, sobre a frequência dos tipos de sangue A, B e AB em

gatos domésticos de pelo curto, em Lisboa. Foram incluídos neste teste um total de 515 gatos,

com idades compreendidas entre os 5 meses e os 21 anos. As frequências relativamente aos

tipos de sangue A, B e AB foram respetivamente: 97,5% (n=502), 2,1% (n=11), e 0,4% (n=2).

Estão descritos outros grupos sanguíneos na literatura mas que não são determinados

rotineiramente (Spada et al., 2014; The International Society of Feline Medicine., n.d.-b).

Weinstein et al., em 2007, documentou a descoberta de um novo antigénio, de eritrócitos, em

gatos domésticos de pelo curto e designou-o como antigénio Mik. Estes descreveram a

existência de incompatibilidades nas provas cruzadas realizadas entre quatro gatos recetores,

todos com grupo sanguíneo tipo A Mik negativo, e trinta gatos dadores também tipo A, mas Mik

positivos. Foi também relatado pelos autores uma reação transfusional hemolítica aguda, após

uma transfusão de sangue de tipo-específico para um recetor Mik negativo. Os resultados

sugerem a existência de uma alta prevalência de anticorpos, naturalmente existentes, contra o

antigénio Mik nos gatos recetores Mik-negativo. Estes anticorpos não foram identificados

através dos métodos tradicionais de tipificação. Apesar da existência de anticorpos para além

dos anti-A e anti-B ainda não ter sido estabelecida, é possível que tais anticorpos, à

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semelhança dos anticorpos contra o antigénio Mik, possam levar a reações transfusionais ou à

diminuição da eficácia dos eritrócitos transfundidos (Weltman et al., 2014).

3.2. Métodos rápidos de tipificação

Como já descrito, a tipificação é um passo importante e fundamental, havendo várias

formas de a realizar. Por um lado pode ser enviada uma amostra de sangue em tubo de EDTA,

para um laboratório comercial, a fim de se proceder a tipificação por métodos mais fidedignos

embora mais dispendiosos, como por exemplo os testes em GEL e em TUBO. (Proulx &

Waddell, 2012). Alternativamente a este método, várias marcas de testes rápidos estão

disponíveis para o uso na prática clínica. É exemplo disto, os testes em cartão (Rapid Vet®-H

Feline; dms laboratories) e o teste por imunocromatografia (quick test A+B; Alvedia® e

RapidVet®-H IC; dms laboratories) (Barfield & Adamantos, 2011).

Rapid Vet®-H Feline

Para a realização deste teste, apenas se deve utilizar sangue em tubo com EDTA, sendo

cerca de 0,5 ml uma quantidade adequada (Tasker, 2013).

Estes cartões possuem dois poços destinados a tipificação e um terceiro com a função

de controlo (figura 13):

1. Poço A: depende de uma reação de aglutinação utilizando soro anti-A para detetar

tipo A (Tasker, 2013)

2. Poço B: existe aglutinação na presença de antigénio tipo-B, através de um reagente

anti-B (como os anticorpos anti-B de um gato tipo-A têm fracas ligações e títulos baixos o

reagente anti-B utilizado é uma lectina de Triticum vulgaris) (Knottenbelt, 2002; Gurkan et al.,

2005; Barfield & Adamantos, 2011; Seth et al., 2011)

3. Poço de autoaglutinação: não contém reagentes anti-A nem anti-B e apenas é

acrescentada uma solução salina ao sangue inteiro. É um poço que serve como controlo, para

assegurar que o sangue não aglutina espontaneamente, já que daria falsos resultados AB

positivos (Tasker, 2013).

Os resultados são obtidos por visualização de aglutinação e leitura direta. Sendo assim,

se houver aglutinação no poço A estamos perante um gato com tipo sanguíneo A e sendo B se

a aglutinação ocorrer no poço correspondente ao tipo sanguíneo B. Para o resultado ser AB, é

necessário existir aglutinação no poço A e B sem aglutinação no poço controlo, não sendo este

o método mais fiável para tipificar gatos com este tipo de sangue. Alguns gatos exibem auto

aglutinação devido a fatores intrínsecos do seu próprio soro. Nesse caso deve ser efetuada

uma lavagem celular para que, posteriormente à centrifugação, seja possível descartar-se o

sobrenadante que contém o soro do animal. Pode ainda ser enviada uma amostra sanguínea,

a fim de ser tipificada em laboratório e de forma a ser obtido um resultado mais fidedigno (dms

laboratories Inc, 2012a).

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42

É um teste rápido e fácil de utilizar, com instruções simples. O conjunto comercial (figura

14) é composto por todo o material necessário à tipificação, incluindo uma garrafa de diluente,

pipetas plásticas, pequenas espátulas de madeira e os cartões de teste.

Quick test A+B; Alvedia®

Um estudo recente, inframencionado, demonstrou que este teste é ligeiramente melhor

que o teste em cartão Rapid vet®-H Feline. Além disso, pode ser mais fiável em gatos com

auto aglutinação (Tasker, 2013).

O sistema baseia-se na migração de células vermelhas numa tira de papel. Esta possui

uma membrana, submetida a tratamento especial com um tampão de fluxo, que permite a

migração através de capilaridade.

Dois anticorpos monoclonais específicos para os antigénios A e B, foram impregnados

na membrana. Estes anticorpos irão reter glóbulos vermelhos A e/ou B, formando uma banda

vermelha na zona da tira destinada. A leitura é direta, sendo que, observando-se apenas uma

linha na zona designada A, o gato tem sangue tipo A, observando-se na zona designada para

B, o gato tem sangue tipo B. No entanto, quando surgem ambas as linhas, estamos perante um

gato AB. Para o teste ser válido, tem ainda que aparecer uma linha na zona destinada ao

controlo (parte superior da tira com a letra “C”). Se esta linha não aparecer, o teste deve ser

descartado e repetido (Animal Blood Resources Internacional, 2015).

Figura 14: O conjunto comercial RapidVet®-

H Feline contém os componentes

necessários à realização do teste. Uma

garrafa de diluente (A), pipetas plásticas (B),

pequenas espátulas de madeira (C) e os

cartões de teste (já retirados da pelicula

protetora) (D) – adaptado de (dms

laboratories Inc, 2012a)

A C

D

B

Figura 13: Teste de tipificação em

cartão. Resultado positivo para A

– Propriedade intelectual do HVP.

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43

Para a realização deste teste, é possível utilizar sangue em tubos com EDTA, citrato-

fosfato-dextrose (CPD), ácido-citrato-dextrose (ACD) ou heparina, ou ainda sangue de cordão

umbilical. Se a amostra a ser tipificada provier de um gato com anemia severa (hematócrito

menor a 14%), esta deve ser centrifugada e algum do plasma descartado de forma a

ressuspender as células vermelhas (Tasker, 2013). O conjunto comercial quick test A+B;

Alvedia® (figura 15) contém todos os componentes necessários à realização do teste de

tipificação, sendo eles uma garrafa de diluente, uma vareta de papel (doseador), poços de

mistura, tira de papel com parte plástica de proteção e tampa de encaixe (com as letras

referentes ao tipo de sangue A e B e ao controlo C). Contém também um folheto com as

indicações de utilização (Animal Blood Resources Internacional, 2015).

Um estudo levado a cabo por Seth et al., em 2011 comparou a facilidade e precisão de

cinco métodos de tipificação comercialmente disponíveis, incluindo: testes de aglutinação em

cartão, imunocromatografia, teste laboratorial em GEL e dois testes utilizados na universidade

da Pensilvânia, teste em SLIDE e TUBO, este último considerado gold standard. Quando

comparados com o teste em TUBO os resultados em SLIDE e GEL atingiram mais de 99% de

concordância, enquanto que o teste de cromatografia atingiu 95% e o de cartão apenas 91%.

Em 2011, Barfield & Adamantos afirmaram que apesar de o quick test A+B; Alvedia® não ter

sido incluído neste teste, este era semelhante ao teste em GEL que demonstrou ser bastante

fiável na tipificação sanguínea de felinos. Os cartões demonstraram não ter resultados

concordantes quando ambos os poços aglutinavam. Caso tal suceda, a amostra deve seguir

para um laboratório a fim de ser confirmado o resultado, como já mencionado.

Figura 15: O quick test A+B; Alvedia® contém todos os componentes necessários à

realização do teste de tipificação. Uma garrafa de diluente (A), uma vareta de papel

(doseador), poços de mistura (B), tira de papel com parte plástica de proteção (C) e

tampa de encaixe (com as letras referentes ao tipo de sangue A e B e ao controlo C) (D).

Folheto com as indicações de utilização (E) – Propriedade intelectual do HVP

A

B

C

D

E

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Foi ainda efetuado, recentemente, um estudo sobre o teste de imunocromatografia dos

laboratórios dms (RapidVet®-H IC) (figura 16), atribuindo-lhe uma taxa de concordância de

resultados de 96,1%. Os autores concluíram que, dada a sua taxa de concordância e facilidade

de utilização, assim como os seus requisitos de armazenamento convenientes, este teste pode

ser recomendado na prática clínica diária (Hourani et al., 2014).

4. Prova cruzada maior e menor

O teste de reação cruzada é realizado para determinar a compatibilidade entre os

componentes do sangue do dador com os do destinatário. O seu objetivo principal é permitir a

seleção de unidades de sangue, de um gato dador, que forneçam o benefício máximo e danos

mínimos para o recetor. Existem duas provas cruzadas (maior e menor) e são realizados in

vitro (Weinstein & Sink, 2014):

Prova cruzada maior: testa a existência de anticorpos presentes no

soro/plasma do gato recetor, contra os eritrócitos do dador. Um resultado incompatível, desta

prova, pode resultar numa reação transfusional aguda hemolítica, onde os eritrócitos

transfundidos são destruídos pelos anticorpos do recetor (Tocci & Ewing, 2009; The

International Society of Feline Medicine., n.d.-b) Deve ser sempre realizada, antes de uma

transfusão de sangue inteiro ou concentrado de eritrócitos entre felinos, seja ou não a primeira

transfusão do gato recetor (Hohenhaus, 2004; Tocci & Ewing, 2009; Spada et al., 2014).

Prova cruzada menor: testa a existência de anticorpos presentes no

soro/plasma do gato dador contra os eritrócitos do recetor. Uma incompatibilidade, desta prova,

acarreta menos riscos de uma reação transfusional. (Knottenbelt, 2002; The International

Society of Feline Medicine., n.d.-b).

As provas cruzadas, maior e menor, podem ser realizadas na própria clínica, sendo

necessária para a sua realização:

Colher sangue do dador para um tubo com anticoagulante de EDTA (ou utilizar o

excesso de sangue existente nos sacos de colheita, próprio para utilizar nesta prova)

Centrifugar a amostra a 3000 rotações por minuto (rpm) durante dez minutos

Figura 16: Teste de tipificação RapidVet®-H IC. A – Teste positivo para tipo sanguíneo A; B – Teste

positivo para tipo sanguíneo B; C – Teste positivo para tipo sanguíneo AB adaptado de (dms

laboratories Inc, 2015)

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Descartar o sobrenadante (plasma e buffy coat)

Adicionar solução salina (NaCl 0,9%) para precipitar e ressuspender os eritrócitos.

Este preparado (lavado) pode ser repetido até três vezes.

Ressuspender os eritrócitos em solução salina (NaCl 0,9%) de forma a obter-se uma

solução de 3 a 5%.

Colocar uma a duas gotas desta suspensão numa lâmina de vidro.

Adicionar uma a duas gotas de plasma (heparinisado) do recetor

Verificar ao microscópio a ocorrência de hemaglutinação (figura 17).

o A hemaglutinação não deve ser confundida com a presença de pilhas de

eritrócitos (rouleaux), sendo estas uma ocorrência fisiológica (Ferreira et al.,

2008a).

Este processo pode ser repetido para a realização de uma prova cruzada menor,

substituindo os eritrócitos do dador pelos do recetor, e o plasma do recetor pelo do dador

(Barfield & Adamantos, 2011).

A escolha de hemocomponentes com provas cruzadas compatíveis é um esforço feito de

forma a prolongar a vida útil e a eficácia dos eritrócitos in vivo (Weinstein & Sink, 2014).

Um estudo retrospetivo, sobre a influência da prova cruzada no hematócrito, após

transfusão de hemoconcentrado em felinos, Weltman et al (2014) conclui que gatos submetidos

a transfusões em que a prova cruzada maior era compatível, obtinham um aumento

significativo no hematócrito pós transfusão, em relação à dose administrada, (1,02 +/- 0,51%

ml/Kg) comparativamente a gatos que receberam transfusões de tipo de sangue específico,

mas com provas cruzadas maiores incompatíveis (0,738 +/- 0,65% ml/Kg). Embora as

diferenças na eficácia entre estes possa advir de vários fatores, é possível que as provas

cruzadas com resultado negativo demonstrem incompatibilidade, devido a antigénios presentes

que não pertençam ao grupo AB, o que levou a uma melhor eficácia no grupo com prova

Figura 17: Hemaglutinação positiva observada por microscopia (40x), adaptado de (Weinstein & Sink,

2014)

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cruzada compatível. Todos os gatos neste estudo receberam transfusões de sangue de tipo

específico, para que os anticorpos AB não fossem tidos em conta quanto a resultado positivo

ou negativo da prova cruzada maior.

O antigénio Mik foi descrito em três felinos, dadores de sangue tipo A, que nunca

tinham recebido uma transfusão, afirma Weinstein et al., (2007). Transfusões inadvertidas de

dadores Mik-positivos para recetores Mik-negativos resultaram numa reação transfusional

aguda hemolítica, demonstrando a relevância clínica de antigénios e anticorpos não-AB. É

também sugerido que a incompatibilidade de provas cruzadas seja devido a antigénios que não

pertençam nem ao sistema AB nem ao grupo Mik (Weingart et al., 2004). Tocci & Ewing

afirmam que independentemente do tipo de sangue do paciente uma prova cruzada em adição

à tipificação sanguínea é recomendada. As conclusões tiradas por Weinstein, et al., 2007 e

seus colegas apoiam a recomendação da realização de prova cruzada previamente a uma

transfusão independentemente do tipo de sangue e da existência ou não de história passada

de transfusões.

O dms laboratories, inc® têm à disposição conjuntos comerciais (figura 18), de prova

cruzada maior (A) e menor (B), da marca RapidVet®-H Companion Animal Crossmatch. Tal

oferece uma abordagem mais padronizada tanto para o procedimento em si como para a sua

interpretação, no entanto, este requer material específico para a sua realização (necessária

uma centrifuga específica) (dms laboratories Inc, 2012b; Weinstein & Sink, 2014).

5. Colheita de sangue

Antes de se proceder à colheita de sangue, o animal deve ser submetido a vários

exames a fim de confirmar que continua apto como dador. Em primeiro lugar deve ser pesado,

para comprovar que continua com um peso mínimo aceitável. De seguida, deve ser recolhida

uma história pregressa pormenorizada e ser feito um exame físico completo, com especial

atenção ao sistema cardiovascular e respiratório, visto que, provavelmente irá ser sedado, ou

mesmo anestesiado, para facilitar a recolha. Gatos com alterações relevantes no exame físico,

A B

Figura 18: Conjuntos comerciais de prova cruzada maior (A) e menor (B) Retirado de (dms laboratories

Inc, 2012b)

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tais como, sopros cardíacos e ritmo de galope à auscultação, não devem ser utilizados (Griot-

Wenk & Giger, 1995; Gibson, 2007; Barfield & Adamantos, 2011; Lucas et al., 2015).

Após a confirmação, por parte do veterinário que realizou o exame físico, de que o

animal está apto, deverá ser efetuado um hemograma para confirmar que o hematócrito e os

leucócitos se encontram dentro dos parâmetros exigidos. A amostra de sangue, para este

teste, deve ser obtida através da veia cefálica para assegurar um trauma mínimo às veias

jugulares que serão utilizadas, posteriormente, na colheita de sangue. O hematócrito deve ser

superior a, pelo menos, 30% (preferencialmente 35%) e a hemoglobina superior a dez g/dl para

assegurar que o dador não se tornará anémico após efetuar a dádiva. As proteínas totais

também podem ser medidas, de forma a enquadrar o parâmetro anterior. Se o animal tiver

acesso ao exterior, deve ser efetuado um teste para FIV e FeLV antes de cada recolha. Se

algum dos parâmetros testados estiver alterado, o gato não deve ser utilizado na dádiva de

sangue e deve proceder-se uma investigação de problemas subjacentes (Tasker, 2013; Yagi,

2013; Lucas et al., 2015; The International Society of Feline Medicine., n.d.-b).

A colocação de um cateter venoso, de 20 a 22 gauges, poderá ser feita neste momento,

antes da indução anestésica do felino, podendo optar-se, assim, por administrar os fármacos

anestésicos por via intravenosa, a fim de reduzir o tempo de indução. Isto será possível,

apenas, na presença de um animal dócil e que permita o manuseamento. Podendo, ainda, ser

colocado, imediatamente, após o gato dador ser sedado (Tasker, 2013).

A colheita de sangue deve ser feita numa sala própria, numa zona tranquila, e que não

seja local de passagem. Deve ter uma mesa de tamanho adequado, para manter os animais

em decúbito lateral ou esternal aquando da recolha. O acesso a esta sala deve ser controlado,

para que não haja interrupções durante o procedimento (Lucas et al., 2015).

5.1. Sistemas de colheita

Antes de o dador ser trazido para a sala de colheita, já todo o material deve estar

disposto de forma a ser utilizado. É necessária uma equipa com três/quatro pessoas, composta

por um técnico responsável pela venipuntura, um técnico que mantenha o animal em decúbito

lateral, esternal ou dorsal e que vigie a anestesia, e mais dois assistentes que poderão ajudar

na manutenção da anestesia e na recolha do sangue (Lucas et al., 2015).

O peso do gato dador é um fator importante em relação ao volume que pode ser

recolhido em cada dádiva de sangue. O volume total de sangue de um gato é cerca de 66

ml/Kg, portanto um gato de quatro e cinco Kg tem, aproximadamente, 260 e 330 ml,

respetivamente. É normalmente seguro fazer uma colheita de 15-20% do valor total de sangue

(66 ml para um gato de cinco Kg), no entanto, posteriormente, é sempre necessário a

administração de cristaloides IVpara a prevenção de hipovolémia. Uma colheita inferior a 10%

do volume, por norma, não requer terapia com cristaloides. É comum ser recolhido um volume

de sangue compreendido entre 50 a 60 ml. Uma recolha superior a 20% pode causar uma

hipovolémia com magnitude suficiente para comprometer a saúde do dador. Finalmente,

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considerando que o volume total de sangue diz respeito à massa magra corporal do dador, não

é aconselhada a realização de recolhas de grandes volumes em pacientes obesos (Abrams-

Ogg, 2000; Helm & Knottenbelt, 2010b; Tasker, 2013; Spada et al., 2015; The International

Society of Feline Medicine., n.d.-b).

O procedimento de colheita de sangue nos gatos está associado a um maior risco de

contaminação do que no cão ou no ser humano. Nestes animais, o volume de sangue e o

diâmetro das agulhas utilizadas na sua recolha são reduzidos, obrigando a taxas de colheita

pequenas que impossibilitam fluxos de sangue ideais, por gravidade, para o interior do saco de

recolha. Não se podendo recorrer a um sistema fechado, utilizam-se sistemas abertos

alternativos constituídos por uma seringa e por uma pequena extensão com torneira de três

vias (Pennisi et al., 2015). Um sistema aberto é, por definição, aquele que possui um ou mais

locais adicionais por onde possa ocorrer contaminação bacteriana durante a colheita ou

processamento, contrariamente a um sistema fechado, em que a única exposição do saco de

colheita ao ar, antes da transfusão, acontece quando a tampa é retirada da agulha para punção

venosa. Além disso, atualmente, sistemas fechados – pré-preparados “tudo em um” e

esterilizados como tal – não estão disponíveis para gatos. Embora conjuntos comerciais de

colheita de sangue para gatos possam ser adquiridos, o anticoagulante não é incluído

previamente, não sendo, consequentemente, considerados verdadeiros sistemas fechados

(Barfield & Adamantos, 2011). É crucial que cada fase do processo seja realizada sob

condições de assepsia de forma a evitar contaminação de sacos de sangue. A presença de

endotoxinas bacterianas pode ser causa de reações hipertérmicas imediatas ou mesmo de

choque séptico potencialmente fatais para o gato recetor (Gibson, 2007; Pennisi et al., 2015).

Existem, também, sistemas de recolha semifechados que reúnem, num único conjunto, o

material necessário para que o manuseamento de seringas e agulhas seja mínimo, prevenindo

contaminações desnecessárias. Estes sistemas são compostos por uma agulha borboleta de

19 gauges, seringa de 60ml e saco de sangue de 60-100ml, ligados por um conector com

válvula de três vias. Estes sistemas são designados apenas como semifechados, pois o risco

de contaminação continua a ser maior comparativamente a um sistema fechado, devido à

necessidade de introdução de anticoagulante na seringa (Yagi, 2013).

A colheita sanguínea deve ser realizada através de uma seringa de 50 ml acoplada a

uma agulha borboleta, de 19 gauges ou uma agulha de 21 gauges, interligadas através de um

tubo conetor em T com uma válvula de três vias. Podem ainda ser usadas, em vez da seringa

de 50 ml, seis seringas de dez, ou três de 20 ml, sendo preferível a primeira opção, visto que

acarreta uma menor contaminação. Cada seringa deve já conter o anticoagulante necessário à

recolha e devem encontrar-se devidamente fechadas, através de uma agulha, de forma a

manter a assepsia (Helm & Knottenbelt, 2010b; The International Society of Feline Medicine.,

n.d.-b).

De referir que as soluções anticoagulantes mais utilizadas são o ACD, o CPD ou o

citrato-fosfato-dextrose-adenina (CPDA-1). A maioria de sistemas fechados, comercialmente

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vendidos, contem CPD ou CPDA-1, enquanto que o ACD é mais utilizado em sistemas abertos

devido ao volume reduzido. O volume de anticoagulante utilizado e a duração de

armazenamento do produto varia consoante a composição deste e do método de colheita. É

utilizado 1 ml de ACD para cada 7 a 9 ml de sangue, enquanto o CPD e o CPDA-1 são

tipicamente utilizados numa razão de 1ml de anticoagulante para 7 ml de sangue. A utilização

de outros anticoagulantes, como por exemplo, citrato de sódio e heparina não são

recomendados (Griot-Wenk & Giger, 1995; Gibson, 2007).

5.2. Sedação/anestesia

Devido aos problemas associados ao manuseamento e contenção do dador, e a

importância da assepsia e da necessidade do trauma causado às suas veias, ser o mínimo

possível, é necessário muitas vezes, recorrer à sedação do gato dador para colheita de

sangue. Em vários bancos de sangue, muitos são mesmo anestesiados, visto que qualquer

movimento brusco pode tornar o produto inútil. É conveniente que o dador seja submetido a um

jejum de 12h antes de ser anestesiado (Couto et al., 2005; Iazbik et al., 2007; Killos et al.,

2010; Aubert et al., 2011; Lucas et al., 2015; Spada et al., 2015).

Existe uma variedade de protocolos que podem ser utilizados, incluindo administrações

parenterais, de combinações de quetamina/midazolam/butorfanol,

diazepam/quetamina/butorfanol, tiletamina/zolazepam ou através de anestéticos voláteis como

sevoflurano ou isoflurano através de máscaras, embora a utilização de anestesia volátil esteja

associada a depressão cardiovascular (bradicardia e pressões arteriais baixas) (Barfield &

Adamantos, 2011; Lucas et al., 2015).

Em 2005, cinco protocolos anestésicos para aplicação em colheitas de sangue em gatos,

foram comparados entre si, sendo eles: quetamina; midazolam e quetamina; medetomidina

com o uso de atipamezole para reversão anestésica; acepromazina e butorfanol; e sevoflurano.

É de enfatizar que todos demonstraram vantagens e desvantagens. O protocolo com

acepromazina e butorfanol não provocou boa sedação, não sendo possível a conclusão da

recolha de sangue (colheitas inferiores a 50 ml). A utilização de medetomidina, isoladamente,

provocou bradicardia e vasoconstrição, o que dificultou a colheita e colocou o dador em risco,

assim , foi necessária a adição de quetamina e atropina de forma a contrariar os efeitos

secundários da medetomidina. A quetamina, utilizada per si, provocou boa sedação, sendo, no

entanto, fraco analgésico, o que tornou os animais agressivos em colheitas posteriores. Estas

são apenas algumas das desvantagens apresentadas. Após a avaliação dos diferentes

protocolos, os autores consideram que a anestesia volátil com sevoflurano é a mais segura

para imobilizar gatos dadores numa recolha de sangue, além da utilização de máscara para a

sua administração não interferir com o procedimento de colheita. Além dos supracitados,

embora não abordado especificamente neste estudo, a utilização de isoflurano em detrimento

de sevoflurano, é considerada uma boa alternativa, tendo já sido utilizado, com sucesso, por

dois dos autores em prática privada (Doutores Troyer e Feeman). Apesar dos períodos de

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indução e recuperação serem mais longos em comparação com sevoflurano, a dose de

indução e manutenção é menor (Couto et al., 2005).

Em 2010, foram novamente, comparados dois protocolos anestésicos utilizados em

colheitas sanguíneas em gatos, desta vez, quetamina/midazolam/butorfanol IM e sevoflorano e

oxigénio. Foram comparadas as variáveis hemodinâmicas durante, e a qualidade de

recuperação após, a anestesia. Os autores concluíram que ambos os protocolos

demonstravam hipotensão durante a recolha. No entanto, devido ao protocolo com anestesia

fixa ter sido associado a episódios de hipertermia (40% dos gatos incluídos neste protocolo) e o

período de recuperação ter sido mais prolongado, estes autores recomendam o uso de

sevoflurano como protocolo preferencial (Killos et al., 2010).

Um estudo realizado em 2015, por Spada et al., sobre o uso de tiletamina e zolazepam,

para provocar sedação em gatos nas dádivas de sangue, afirma que esta combinação

apresenta como vantagens o facto de ser pouco dispendioso, acessível e fácil de administrar

(mesmo por via IM, os dadores demonstraram pouca reação à injeção). Em média, os animais

demoraram menos de cinco minutos a atingir um nível apropriado de sedação, mesmo tendo

sido administrada, por via IM, a doses baixas – 2,5 mg/Kg para ambos os fármacos –

apresentando estes uma sedação adequada durante todo o procedimento. Os autores deste

estudo concluíram que esta combinação anestésica é aparentemente segura e bem tolerada

por dadores felinos (Spada et al., 2015).

É sugerido que cada clínica/hospital desenvolva um protocolo seguro com o qual se sinta

confortável e que funcione com os seus animais (Gibson, 2007).

5.3. Procedimentos de colheita

Tendo reunidas todas as condições e materiais necessários à colheita descritos

anteriormente, pode então proceder-se à recolha. A assepsia deve estar sempre em primeiro

lugar durante todo o procedimento. É escolhida a veia jugular esquerda ou direita, tendo em

conta a veia utilizada na última recolha, e é preparada a região como se de uma cirurgia se

tratasse, com tricotomia da área, um por um cm, e assepsia do local. Estando este passo

concluído, o técnico responsável pela venipuntura executa uma lavagem de mãos como se

fosse realizar uma cirurgia, sendo o uso de gorro e de luvas esterilizadas recomendado (Lucas

et al., 2015; Pennisi et al., 2015).

A forma da colheita depende do decúbito escolhido para a realização da mesma. Esta

pode ser realizada com o gato em decúbito esternal (Gibson, 2007; Barfield & Adamantos,

2011), lateral (Lucas et al., 2015) ou dorsal (Tasker, 2013; The International Society of Feline

Medicine., n.d.-b).

Estando o animal em decúbito esternal, o técnico responsável pela venipuntura retira a

tampa da agulha, aplica pressão sobre a veia jugular, de forma a esta se tornar visível, e faz

venipuntura, em sentido cranial. É função do assistente abrir a válvula de três vias antes da

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veia ser puncionada e encher a seringa de sangue, até perfazer 50 a 60 ml, assim que

possível. Durante e após a colheita é necessário que este faça movimentos de rotação com a

seringa, misturando o sangue e o anticoagulante. Se forem usados sistemas com mais que

uma seringa, a válvula de três vias deve ser devidamente fechada sempre que há troca de

seringas e estas devem sempre ser fechadas o mais rapidamente possível, recorrendo ao uso

de agulhas (Barfield & Adamantos, 2011; Tasker, 2013).

Em decúbito dorsal, enquanto o técnico, que irá realizar a venipuntura, mantém o

pescoço do felino estendido, segurando-lhe a cabeça, é outro técnico que aplica pressão sobre

a veia jugular e tanto neste decúbito, como em decúbito lateral, é usual, a agulha ser inserida

em sentido caudal, apontado para a base do pescoço. Além das diferenças práticas

apresentadas, alguns autores (Tasker, 2013; The International Society of Feline Medicine., n.d.-

b) defendem que o decúbito dorsal é a posição ideal para a realização da recolha, pois permite

uma boa visualização da veia jugular e boa assepsia. Após o volume necessário ser atingido, é

retirada a pressão à veia jugular, fechada a válvula de três vias, ficando esta direcionada para

a agulha, e aplicada pressão, por meio de uma gaze, no local de venipuntura. Após a aplicação

destas medidas pode, então, ser retirada a agulha, mantendo pressão no local e a anestesia

deve ser descontinuada (Lucas et al., 2015).

Imediatamente após a colheita, o sangue terá de ser depositado num saco próprio, sem

anticoagulante. Podem ser utilizados sacos de sangue próprios para felinos, de

aproximadamente 50 ml, ou sacos de sangue humano, de 150 ml, de onde se tenha retirado,

previamente, o anticoagulante (Helm & Knottenbelt, 2010b).

Uma vez terminada a recolha de sangue, o dador de sangue deve ser mantido sob

observação até completa recuperação anestésica e os fluídos perdidos devem ser repostos

para evitar hipovolémia. A fluidoterapia pode ser iniciada durante ou imediatamente após a

recolha sanguínea e deve ser administrado, pelo menos, o dobro do volume retirado, num

período de tempo que varia com os vários protocolos disponíveis. Um destes é administrar 90

ml de solução salina por via subcutânea imediatamente antes da colheita, e infundir, através do

cateter colocado, 60 a 90 ml de cristaloides durante 15 a 20 minutos, podendo ser iniciado um

pouco antes do final da recolha (equivalendo, este protocolo, a um volume duas a quatro vezes

superior ao valor de sangue recolhido) (Helm & Knottenbelt, 2010b). Outros protocolos

possíveis é a administração de solução isotónica (como por exemplo, lactato de ringer e NaCl

0,9%) a uma taxa de 60 ml/h, durante três horas ou de cerca de 100 ml durante as próximas,

uma a duas horas (Barfield & Adamantos, 2011; The International Society of Feline Medicine.,

n.d.-b).

O dador deve ser monitorizado atentamente (temperatura, respiração e cor das mucosas

a cada duas horas), e assim que tiver recuperado da anestesia deve ser alimentado. Pode ter

alta ao fim de oito a doze horas. É necessário registar toda a informação relevante sobre a

dádiva de sangue, como data, sedação, veia jugular utilizada, volume recolhido, qualidade e

tempo de recuperação, sobre a colheita para futura referência (Tasker, 2013). O controlo das

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pressões arteriais pode ser um cuidado adicional apesar de não ser obrigatório. Em 2007, um

estudo levado a cabo por M. Cristina Lazbik e colegas, sobre os efeitos da colheita de sangue,

para transfusão, na pressão arterial, frequência cardíaca, e hematócrito, concluiu que colheitas

de uma unidade de sangue (mais ou menos 50 ml) em gatos adultos, com peso superior a

cinco Kg, levam a diminuições nestes três parâmetros, mas aparentemente, sem significado

clinico (Iazbik et al., 2007).

O sangue recolhido pode ser administrado fresco, imediatamente após a colheita, ou

seguir para armazenamento (Yagi, 2013).

6. Processamento em hemocomponentes e armazenamento

O sangue é constituído por vários componentes, como já referido, e a transfusão destes

componentes específicos pode ter vantagens distintas (Helm & Knottenbelt, 2010a). O recurso

à terapia com hemocomponentes, torna-se benéfico devido à capacidade de fornecer

tratamento específico para várias doenças, eliminando riscos desnecessários de transfusão,

tornando eficiente o uso de recursos biológicos limitados, visto que vários pacientes poderão

receber tratamento a partir de uma única unidade de sangue. Há ainda uma diminuição do

risco de hipervolémia para o animal, uma vez que o volume de um componente específico a

administrar é sempre menor do que o de sangue inteiro, e aumento do tempo de vida útil de

outros componentes, como por exemplo o plasma, que aumenta imenso o seu prazo de

validade ao ser separado de um componente mais instável (eritrócitos) (Ferreira et al., 2008a;

Erhabor & Adias, 2011).

A separação de hemocomponentes deve ser considerada por qualquer estabelecimento

que armazene sangue proveniente de dádivas. No entanto, este processo requer equipamento

adicional e um investimento financeiro considerável. Não obstante, esta separação facilita o

controlo logístico das reservas disponíveis e permite administrações direcionadas, nas quais

apenas os componentes necessários são fornecidos ao animal (Yagi, 2013).

Apesar do potencial para salvar vidas, este procedimento acarreta alguns riscos. Para

além da necessidade de fazer uma escolha apropriada, entre os vários produtos sanguíneos,

vários passos têm de ser tomados para que o produto se encontre nas condições necessárias

de administração ao paciente (Chiaramonte, 2004). A figura 19 demonstra algumas das etapas

necessárias para serem obtidos os vários produtos sanguíneos.

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Apesar do sangue poder originar todos os componentes representados na figura 19, em

gatos os mais utilizados são o sangue total (ST), concentrado de eritrócitos (CE), plasma fresco

congelado (PFC) e plasma congelado (PC), sendo este acontecimento justificado pela

dificuldade de obtenção dos restantes, devido a pequenos volumes de recolha (Castellanos et

al., 2004; Rozanski & Laforcade, 2004).

6.1. Sangue Total

O sangue total pode ser utilizado fresco (STF) ou após ter sido armazenado (STA). O

sangue é considerado fresco quando administrado durante as primeiras quatro a seis horas,

após a colheita, e contém eritrócitos, leucócitos, plaquetas e fatores de coagulação, incluindo

os termolábeis. Após seis a oito horas, o produto é obrigatoriamente armazenado, sendo

considerado STA, deixando de conter plaquetas viáveis – não sobrevivem à refrigeração –,

leucócitos e fatores de coagulação termolábeis (Chiaramonte, 2004; Ferreira et al., 2008a;

Helm & Knottenbelt, 2010a; Kisielewicz & Self, 2014). Segundo alguns autores, o STF, pode

ser administrado até 24 horas sem prejuízo da qualidade dos constituintes, excluindo-se os

fatores de coagulação termolábeis, que se tornam inviáveis (Ferreira et al., 2008a; Ferreira,

2015).

Desde que começou a ser possível armazenar o sangue recolhido, em 1915, com a

descoberta de citrato de sódio, um grande progresso tem sido feito para melhorar a

esterilidade, qualidade e tempo de vida deste produto (Obrador et al., 2015). Se o sangue

obtido de uma colheita não for utilizado nas primeiras seis a oito horas, deve ser armazenado a

Figura 19: Separação de sangue total em hemocomponentes. CE – concentrado de

eritrócitos; PFC – plasma fresco congelado; CPP – crioprecipitado; CS –

criosobrenadante; PRP – plasma rico em paquetas; CP – concentrado de plaquetas. –

adaptado de (Gibson, 2007)

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uma temperatura compreendia entre 1 e 6 ºC, durante 21 a 28 dias, se em CPDA-1, e até 30

dias se em ACD. Este produto não contém plaquetas viáveis, leucócitos ou fatores de

coagulação termolábeis (fibrinogénio, fator VIII e fator von Willbrand (vWF), deixando de ser

apropriado para tratar casos de doença de von Willebrand (vWD), hemofilia A e

trombocitopénia (Chiaramonte, 2004; Gibson, 2007; Yagi, 2013; Kisielewicz & Self, 2014).

Nas guidelines da Food and Drug Administration, define-se tempo de vida de

armazenamento como o número de dias após a colheita, em condições adequadas de

armazenamento, que garantam que 24h após a transfusão ainda haja 75% de eritrócitos

viáveis em circulação e se registe menos que 1% de hemólise. Existem cada vez mais

evidências de que quanto maior o período de armazenamento, maior o comprometimento

funcional dos eritrócitos no que toca ao transporte de oxigénio, originando um maior número de

consequências clínicas para o recetor. (Castellanos et al., 2004; Obrador et al., 2015).

Os eritrócitos envelhecem mais rapidamente durante a refrigeração do que in vivo. Estes

desenvolvem lesões de armazenamento, o que modifica a sua morfologia, enfraquece a

membrana lipídica e a rigidez celular. Algumas substâncias, que desempenham funções

importantes no transporte de oxigénio, sofrem um declínio acentuado ao fim de apenas uma

semana de armazenamento. No entanto, o impacto clinico deste acontecimento tem sido difícil

de comprovar, visto que, teoricamente, os níveis destas substâncias são rapidamente

restaurados após a transfusão de sangue. Assim, não existe, neste contexto, uma vantagem

real na transfusão de sangue fresco em relação ao sangue armazenado. (Abrams-Ogg &

Schneider, 2010; Helm & Knottenbelt, 2010a).

O sangue deve ser armazenado num frigorífico dedicado a produtos sanguíneos,

evitando contacto com material químico e biológico e diminuindo as flutuações de temperatura

por aberturas desnecessárias (Ferreira, 2015). Para este efeito estão disponíveis câmaras

frigoríficas com termómetros e alarme incorporados. Contudo, no caso da inexistência de

alarme, o termómetro deve ser controlado diariamente. Os sacos devem ser colocados

verticalmente, com espaço entre si, de forma a existir circulação de gases e frio. Como

consequência desta posição, o ST sedimenta, separando-se nos seus componentes. Por isto é

necessário que haja uma mistura regular – duas vezes por semana – da porção pobre em

nutrientes (eritrócitos), com a porção rica (plasma), durante o armazenamento. A equipa

encarregue pelo armazenamento sanguíneo, deve ser treinada e especializada para que a

realização dos procedimentos seja no menor tempo possível (Vaught, 2006; Gibson, 2007;

Yagi, 2013; Abrams-Ogg & Schneider, 2010).

6.2. Concentrado de eritrócitos

Este componente obtém-se recorrendo à centrifugação refrigerada de ST, a 4100 rpm,

durante dez minutos, separando os eritrócitos do plasma (Chiaramonte, 2004; Ferreira et al.,

2008a). Por outro lado, Barfield & Adamantos, 2011 sugerem uma centrifugação a 3800 rpm, a

10ºC, durante 12 minutos. No caso dos gatos, as unidades de sangue são pequenas em

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relação ao tamanho padrão dos recipientes das centrífugas, acarretando alguma dificuldade na

realização da técnica e requerendo a inserção de uma parte plástica e preenchimento adicional

para assegurar uma melhor estabilidade. Por vezes recorre-se à fixação da unidade de sangue

felina a um saco de sangue canino vazio (Lucas et al., 2015).

Este concentrado é constituído por eritrócitos, leucócitos e um volume residual de

plasma, chegando, o seu hematócrito a atingir valores de 65% para gatos (Ferreira et al.,

2008a; Ferreira, 2015). À semelhança de ST, este componente, pode permanecer armazenado

durante 21 dias, de um a seis ºC de temperatura, sendo possível acrescentar soluções

nutritivas, como cloreto de sódio-adenina-glucose-manitol (SAG-M), Adsol (AS-5) ou Optisol

(AS-1), que prolongam o tempo de armazenamento até 35 a 42 dias. A utilização deste

componente após o tempo descrito pode resultar em reações transfusionais (Helm &

Knottenbelt, 2010a; Kisielewicz & Self, 2014; Ferreira, 2015). As soluções nutritivas diminuem a

hemólise in vitro, ao estabilizarem a membrana dos eritrócitos através da ação do manitol ou

do citrato. Atuam também de forma a melhorar a taxa de transfusão, reduzindo o tempo de

administração, ao diminuírem a viscosidade dos eritrócitos armazenados (Harris & Hillyer,

2007).

6.3. Plasma

Como já mencionado, o plasma é a parte líquida do sangue onde se encontram

dissolvidas muitas substâncias. Recorrendo à centrifugação refrigerada a parte mais densa do

sangue sedimenta, podendo ser separada do sobrenadante, designado plasma (Brooks, 2010).

O saco deve ser retirado de dentro da centrífuga na posição vertical e deve ser notória a

separação dos componentes, caso isto não se verifique, deve voltar a ser centrifugado. De

seguida é colocado no separador de plasma e gentilmente comprimido, para que o plasma se

desloque do saco de colheita para um saco satélite (figura 20). Todo o processo deve ser

realizado com o máximo de assepsia possível, devendo o técnico lavar as mãos antes de

manipular o material (Lucas et al., 2015).

Figura 20: Extração do plasma para um saco satélite por meio de um separador de plasma

– Propriedade intelectual do HVP

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Após realização da transferência do plasma, os tubos do saco de sangue são clampados

recorrendo a anilhas de alumínio e a um instrumento de clampagem manual. Seladores

térmicos, mais eficazes, substituem o mecanismo anterior, fundindo o plástico do tubo. Este

último é muito dispendioso quando comparado com o primeiro, tornando-o numa opção menos

viável (Yagi, 2013).

O plasma pode ser transfundido imediatamente como plasma fresco, mas é

normalmente congelado e armazenado como PFC, para subsequente transfusão ou

processamento adicional (Brooks, 2010). Dependendo do tempo de armazenamento o plasma

é categorizado como PFC ou PC.

6.3.1. Plasma fresco congelado

Depois de devidamente separado e processado o plasma, é então armazenado. Deve

ser refrigerado, no máximo, nas seis horas seguintes após a recolha, de forma a estar

completamente congelado até um máximo de oito horas (Yagi, 2013). Se este período for

cumprido, este hemocomponente é categorizado como PFC e é composto por albumina,

globulinas e fatores de coagulação termoestáveis, dependentes da vitamina K (II, VII, IX, X) e

termolábeis (V e VIII) (Ferreira, 2015). Tem validade de um ano armazenado, a uma

temperatura inferior a -18ºC (Brooks, 2010; Helm & Knottenbelt, 2010a; Lucas et al., 2015),

existindo autores que defendem a utilização de uma temperatura inferior a -20ºC (Chiaramonte,

2004; Yagi, 2013).

6.3.2. Plasma congelado

Como mencionado anteriormente o PFC tem durabilidade de um ano, refrigerado a uma

temperatura inferior a -18ºC, nas seis horas seguintes à colheita. Aquando do término deste

prazo o hemocomponente perde a maioria dos fatores de coagulação termolábeis – fator V e

VIII – sendo designado de plasma congelado (Ferreira, 2015). Apesar deste facto, um estudo

recente, em cães, levado a cabo por Urban et al., 2013 identificou que, embora a atividade dos

fatores VIII e X fosse menor no PC, após cinco anos de armazenamento, em relação ao PFC

com apenas um ano, o produto mantinha-se hemostaticamente ativo, baseado nos achados

tromboelastográficos (Urban et al., 2013 citado por Kisielewicz & Self, 2014).

Embora tenha perdido estes fatores, o PC retém proteínas hemostáticas com atividade

variável e continua a ser uma boa fonte de albumina e globulinas. Em adição ao ano que

esteve congelado como PFC, pode permanecer refrigerado mais quatro anos, perfazendo um

total de cinco. Também é considerado PC qualquer unidade de PFC que tenha sido

descongelada para utilização e tenha permanecido em refrigeração, a cerca de quatro ºC, por

mais de 24 horas antes da transfusão. Caso a unidade não tenha sido aberta e haja

desistência da transfusão pode voltar a ser congelada, passando então a designar-se PC

(Chiaramonte, 2004; Brooks, 2010).

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Os produtos de PC devem ser manipulados com cuidado já que facilmente sofrem

roturas. Se possível, é recomendado armazená-los em recipientes protetores, de forma a evitar

lesão nos sacos de plasma. Os sacos podem ser armazenados verticalmente, sendo detetada

facilmente alguma descongelação. Congeladores próprios são preferíveis, evitando a

contaminação com produtos químicos e biológicos e flutuações de temperatura. É necessária

especial atenção se as arcas frigoríficas utilizadas forem simples eletrodomésticos, visto que

atingem apenas a temperatura mínima de congelação do plasma, podendo ainda ter ciclos de

descongelação automáticos (Yagi, 2013; Ferreira, 2015).

6.4. Outros produtos sanguíneos

Como ilustrado na figura 19 além dos produtos sanguíneos anteriormente referidos

existem outros hemocomponentes com menor importância na medicina transfusional felina. O

plasma rico em plaquetas (PRP), de onde se obtém o concentrado de plaquetas (CP), o

crioprecipitado (CPP) e o criossobrenadante (CS) são alguns destes componentes. Este facto

deve-se à pouca disponibilidade destes produtos ou mesmo à sua inexistência, decorrentes da

dificuldade de obtenção em volumes tão pequenos quanto aqueles recolhidos em gatos. Por

este motivo não se procederá a uma descrição pormenorizada deste tema.

Raramente é preparado PRP felino devido à sua necessidade clínica limitada e

também a dificuldades tecnológicas, como supra citado. É mais provável a administração de

STF no caso de trombocitopenias ou trombopatias, em gatos com hemorragias severas.

Contudo já foi descrita a preparação de PRP nesta espécie, com as plaquetas a exibirem boa

eficácia in vivo após a transfusão (Cowles et al., 1992; Holcomb et al., 2008; Abrams-Ogg &

Schneider, 2010).

Os CP têm sido preparados por centrifugação de unidades agrupadas de PRP em gatos

(Callan et al., 2000), no entanto não está documentado o armazenamento à temperatura

ambiente ou criopreservação. Estes concentrados são ideais para transfusões profiláticas de

plaquetas, tendo um volume pequeno comparativamente com o STF e PRP, podendo ser

utilizados para aumentar rapidamente o número de plaquetas circulantes. (Abrams-Ogg, 2003).

O CPP é obtido através do descongelamento lento e centrifugação de PFC.

Posteriormente, o sobrenadante é removido e o sedimento restante é uma forma de

concentrado com fator de coagulação VIII, vWF e fibrinogénio. É finalmente congelado,

podendo ser armazenado durante um ano a -30ºC. Este produto é a escolha de primeira linha

no tratamento profilático de hemorragias ativas em cães com hemofilia A e vWD. É

recomendada a utilização de uma unidade de CPP para cada 10 Kg de peso corporal

(Davidow, 2013). A utilização de produtos sanguíneos mais simples em detrimento de STF ou

PFC minimiza os riscos de reações adversas e sobrecargas de volumes.

Ainda não se encontra disponível comercialmente soro de albumina felino liofilizado para

uso terapêutico, no entanto está documentada a utilização de soro de albumina humano no

gato (Mathews & Barry, 2005). A sua administração é uma boa alternativa às transfusões de

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plasma, uma vez que nestas são necessários grandes volumes para aumentar a concentração

de albumina sérica. No entanto, o seu elevado custo e o facto de se tratar de uma transfusão

heteróloga com elevado risco de reações anafiláticas, colocam entraves ao seu uso (Ferreira et

al., 2008a).

7. Indicações para transfusão

7.1. Sangue inteiro e concentrado de eritrócitos

Como já mencionado anteriormente o STF, STA e CE são compostos por diferentes tipos

de elementos, estando a sua utilização específica indicada para pacientes com diferentes tipos

de necessidades. Deverá ser utilizado, STF, quando há hemorragias graves ativas associadas

a coagulopatias ou inflamações severas, CID, síndrome de resposta inflamatória sistémica,

trombocitopenia e trombopatias, hemofilia, vWD, anemia não regenerativa, problemas

financeiros que permitam apenas uma transfusão e em hemorragias severas com hipovolémia

associada em que mais de 30% do total de sangue foi perdido – traumáticas, intra-cirúrgica,

rotura de tumores ou intoxicações por dicumarínicos (Helm & Knottenbelt, 2010a; Kisielewicz &

Self, 2014; Ferreira, 2015).

Durante o armazenamento, a concentração de fatores de coagulação V e VIII diminui,

tornando-se assim a escolha de STA inapropriada para pacientes com vWD e/ou hemofilia A.

As plaquetas não sobrevivem à refrigeração, portanto este produto também não é uma boa

escolha no tratamento de pacientes com trombopatias. Tendo em conta estas exceções, as

indicações para STA são semelhantes a STF (Chiaramonte, 2004).

A infusão de CE vai aumentar a capacidade de oxigenação através do aumento do

número de eritrócitos circulantes. Este contém, apenas, uma pequena percentagem de plasma,

tendo um efeito mínimo na pressão oncótica (5 mmHg comparado com 20 mmHg em sangue

inteiro) sendo uma opção mais segura em pacientes propensos a sobrecargas de volume,

como por exemplo, disfunção renal e cardíaca. Apresenta, ainda, as vantagens de possuir

menor concentração de citrato e menos proteínas com potencial antigénico, comparativamente

a ST. Está indicado no uso de pacientes anémicos que estejam normovolémicos e não

necessitem de fatores de coagulação (Chiaramonte, 2004; Ferreira et al., 2008a; Helm &

Knottenbelt, 2010a).

O volume de sangue a ser administrado depende do grau da anemia, estado clinico, e do

peso do animal (Griot-Wenk & Giger, 1995), sendo maioritariamente utilizada a seguinte

fórmula (Weingart et al., 2004; Ferreira et al., 2008a; Rothrock, 2015):

Volume a ser administrado (ml) = Peso (Kg) x K x (Hct desejado% – Hct do paciente%),

Hct do dador%

onde K é uma constante de 90 ml para cães e 66 ml para gatos e Hct designa hematócrito.

As publicações veterinárias existentes anteriormente a 2004, tal como Chiaramonte,

2004, referem que transfusões de 20ml/Kg de ST aumentam o hematócrito em cerca de 10% e

transfusões de um ml/Kg de CE aumentam 1%.

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59

Weingart et al., em 2004 compararam, retrospetivamente, o aumento expectável do

hematócrito com o seu aumento real em 91 gatos transfundidos com 163 transfusões de ST.

Estes autores descobriram que em 22,6% das transfusões, o aumento real do hematócrito era

menor do que o expectável, tendo em conta a dose administrada. Os autores afirmaram que

teria de existir um aumento expectável de 1% por cada 2ml/Kg de sangue administrado,

contrariamente ao afirmado pelas publicações prévias (Weingart et al., 2004 citado por

Weltman et al., 2014).

Ainda em 2004, Castellanos et al. baseados nos resultados do seu estudo, afirmaram

que a administração de, aproximadamente, 10 ml de ST aumentava 1,1% o hematócrito do

recetor, enquanto que a administração do mesmo volume, de CE, aumentava 2,1%. Baseados

nos dados limitados que possuíam, geraram duas fórmulas para calcular o volume de ST e CE

a transfundir em gatos:

Volume de ST (ml) = aumento desejado no hematócrito (%) X peso (Kg) x 1,7

Volume de CE (ml) = aumento desejado no hematócrito (%) X peso (Kg)

Atualmente, como principio básico temos que uma transfusão de dois ml/Kg, de ST, irá

aumentar o hematócrito do recipiente em 1% e o nível de hemoglobina em 0.3 g/dl, assumindo

um dador com 30% de hematócrito. Por outro lado, a transfusão de dois ml/Kg, de CE,

aumenta 2% o hematócrito do recetor e o nível de hemoglobina em 0.6 g/dl (Helm &

Knottenbelt, 2010a; Barfield & Adamantos, 2011).

Em 2014 foi publicada uma avaliação de cinco fórmulas utilizadas para prever o

hematócrito após a transfusão em gatos anémicos. Estes autores concluíram que nenhuma foi

identificada como sendo muito precisa nesta previsão. No geral, a fórmula 1 (volume

transfundido = aumento desejado no hematócrito x 2 x Peso corporal do recetor) teve o melhor

desempenho, com pouco desvio em todos os grupos, sendo ainda de fácil utilização. No

entanto, o aumento real do hematócrito poderia ir até, mais ou menos, 8% mais do que o

hematócrito esperado (Reed et al., 2014).

Antes de iniciar uma transfusão sanguínea é necessário ter todo o material pronto a

utilizar e terem sido tomadas todas as precauções descritas até então, como por exemplo,

tipificação sanguínea e prova cruzada. Segundo Chiaramonte em 2004 os produtos

sanguíneos refrigerados devem ser aquecidos, até atingirem a temperatura ambiente, antes de

serem administrados. Deve, no entanto, evitar-se o aquecimento excessivo, visto que, precipita

e desnatura proteínas, destruindo fatores de coagulação e diminui a capacidade das células

vermelhas de transportarem oxigénio. Ainda assim, o aquecimento sanguíneo gera riscos por si

só e não deve ser utilizado sem que as indicações clínicas o justifiquem (Iserson & Huestis,

1991).

Mais recentemente, Proulx e Waddell, 2012 afirmam que o aquecimento de unidades

refrigeradas é necessário apenas em neonatos, pacientes hipotérmicos, ou recetores de

grandes volumes de sangue, visto que, o aquecimento pode levar a danos membranares e

hemólise, devendo ser evitado. Afirma ainda que, o sangue nunca deve exceder a temperatura

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60

de 37ºC, podendo ficar à temperatura ambiente durante dez a quinze minutos sem

aquecimento ativo. No entanto, este tempo não deve ser excedido visto que de contrário pode

resultar em crescimento bacteriano. Este autor elaborou um documento com a descrição,

passo a passo, dos procedimentos necessários para a realização de uma transfusão,

encontrando-se resumidos no quadro 2.

A transfusão de todos os produtos sanguíneos deve ser concluída no máximo de

quatro horas, a fim de prevenir a proliferação bacteriana (Helm & Knottenbelt, 2010a).

Quadro 2 - Guia, passo a passo, para uma transfusão sanguínea - adaptado de (Chiaramonte, 2004;

Helm & Knottenbelt, 2010b; Barfield & Adamantos, 2011; Proulx & Waddell, 2012; Ferreira, 2015)

Passo

nº Procedimento Observações

0 Material necessário:

unidade de sangue,

sistema de transfusão,

folha de monitorização do

paciente, termómetro,

aparelho de medição de

pressões arteriais

Os sistemas de transfusão têm um filtro incorporado, normalmente, de

150 a 260 mícrones. Existem filtros com poros de 18 mícrons, no entanto

não são recomendados, pois provocam hemólise in vitro e facilmente

obstruem.

Quando o sangue é recolhido através de uma seringa, como é o caso

dos gatos, há um aumento do risco de formação de microtrombos,

tornando a utilização deste filtro é imprescindível (Helm & Knottenbelt,

2010b).

1 Fazer inspeção visual da

unidade sanguínea.

Aquecê-la, ou não, tendo

em conta o que foi

mencionado

anteriormente

Verificar se a unidade é a correta a administrar e se tem cor e

consistência normal. Não transfundir se apresentar uma cor escura, se

tiver coágulos ou aparência anormal (Chiaramonte, 2004).

Sangue com contaminação bacteriana normalmente tem uma aparência

castanha ou púrpura, devido à desoxigenação, hemólise e formação de

metahemoglobina.

2 Unir o sistema de

transfusão à unidade de

sangue, deixando o

sangue correr para extrair

o ar. Finalmente conectar

o sistema com o cateter

do paciente.

Idealmente, o sangue deve ser administrado pelas veias cefálica ou

jugular (via central) através de um cateter. Em pacientes pediátricos ou

severamente hipotensos, pode ser administrado na fossa trocantérica do

fémur ou no grande tubérculo do úmero, utilizando um cateter

intravenoso de 18 a 20 gauges como cateter intraósseo - 80-95% das

células em circulação após cinco minutos. Poderá também ser utilizada a

via intraperitoneal (50% em circulação após 24h e 70% após 48-72h), no

entanto reduz o tempo de vida das células transfundidas (Helm &

Knottenbelt, 2010b; Barfield & Adamantos, 2011; Ferreira, 2015).

3

Monitorizar o paciente

através de folha própria

Monitorizar padrões fisiológicos e reações adversas, incluindo febre,

hipotensão, urticária, prurido, pigmentúria, vómitos e tremores.

Registar sinais vitais aos zero minutos (antes de começar), após 20

minutos com uma taxa menor, aumentar a taxa na inexistência de sinais

de reação, e monitorizar após 1h, 2h e 3h do início da transfusão (ver a

quadro 3 com informação sobre taxas de administração) (Ferreira, 2015).

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61

4 Quando terminada a

transfusão limpar o

sistema com NaCl 0,9%,

antes de ser iniciada

outra infusão ou

administração de

fármacos.

O uso de outros produtos, que não cristaloides isotónicos, está

desaconselhado. A utilização de soluções hipotónicas causa hemólise e

soluções que contêm cálcio, tal como lactato de ringer, podem superar as

propriedades anticoagulantes do citrato e levar a formações de coágulos.

Idealmente, alimentação e fármacos estão suspensos durante a

transfusão. Se houver grande necessidade de administração de fluidos

ou medicação, durante a transfusão, deve ser utilizado outro acesso

venoso.

5 Confirmar o hematócrito e

as proteínas totais uma a

seis horas após a

transfusão.

Se não houver hemorragia ou hemólise é esperado que 70% das células

se mantenham em circulação. Se se obtiver uma leitura demasiado cedo

após a transfusão, o equilíbrio de fluídos compartimental pode estar

incompleto, levando a leituras incorretas de hematócritos altos. Deve-se

aguardar um período mínimo de 30 a 60 minutos após a transfusão.

6 Monitorizar o paciente

após a transfusão

O paciente deve ser monitorizado atentamente durante pelo menos 60

minutos após a transfusão. O estado do animal em relação ao balanço de

fluidos deve ser reavaliado, principalmente em pacientes com doença

cardíaca instável.

Deve-se voltar à fluidoterapia instituída anteriormente à transfusão ou

iniciar uma de acordo com o estado do animal.

7.2. Plasma fresco congelado e plasma congelado

A transfusão de PFC fornece proteínas hemostáticas, minimizando o risco de

sensibilização ou sobrecarga de volume em detrimento de ST (Chiaramonte, 2004). Está

indicado em hemorragia por deficiência dos fatores de coagulação, deficiências em proteínas

plasmáticas, CID e necrose pancreática severa (Davidow, 2013). Além das indicações supra

mencionadas, Ferreira, 2015 afirma que também deve ser administrado PFC como meio de

transmitir imunidade passiva, uma vez que este componente contém imunoglobulinas, podendo

ser administrado a animais com panleucopénia, sépsis, parvovirose e hipoalbuminémia

neonatais por défice de colostro.

A principal diferença entre o PFC e o PC é a deficiência em fatores de coagulação

termolábeis (Brooks, 2010). No entanto, este produto contém os fatores de coagulação

termoestáveis – dependentes da vitamina K – prontamente disponíveis, tornando-o o produto

de eleição para o tratamento de coagulopatias secundárias a toxicoses por rodenticidas

anticoagulantes de longa ação e hemofilia B. Do mesmo modo, pode ser utilizado como fonte

de albumina. Apesar da hipoalbuminémia estar correlacionada com o aumento da mortalidade,

tanto em animais como no ser humano, a indicação para transfusão de plasma, nestes casos,

é controversa devido ao grande volume necessário e à pouca durabilidade da albumina

transfundida em circulação (Chiaramonte, 2004; Davidow, 2013; Ferreira, 2015).

A via de eleição para a administração do plasma é a via endovenosa, visto que 100%

dos componentes entram em circulação imediatamente. O cateter de 16 a 20 gauges deverá

ser colocado no máximo até 24 horas antes da transfusão. Alternativamente em animais muito

jovens ou pacientes com comprometimento circulatório, poderá utilizar-se a via intraperitoneal,

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no entanto, o tempo até entrar em circulação é bastante superior. Existe, ainda, a possibilidade

de ser utilizada a via intraóssea (Brooks, 2010; Ferreira, 2015).

Os sacos com plasma devem ser retirados do congelador com cuidado visto que este

produto é quebradiço devido ao processo de congelamento (Brooks, 2010; Helm & Knottenbelt,

2010b). Deve ser rejeitado qualquer saco de plasma que, à inspeção, esteja danificado ou

apresente artefactos. A pigmentação avermelhada deste não constitui risco para a sua

administração, visto a quantidade de hemoglobina livre ser bastante baixa (Ferreira, 2015).

A transfusão de plasma segue, de uma forma semelhante, os passos apresentados

anteriormente para o ST e CE. Algumas das diferenças estão infra mencionadas e são, por

exemplo, relativas ao aquecimento ou à prova cruzada utilizada (prova cruzada menor, neste

caso). Deve ser feita uma transfusão de plasma entre dadores e recetores com o mesmo tipo

de sangue. Segundo Spada et al. em 2014 gatos com tipo de sangue AB são bons dadores de

plasma, visto, não possuírem anticorpos anti-A e anti-B.

Dependendo da urgência com que se necessita do plasma são utilizadas diferentes

formas de descongelamento. Idealmente, o plasma é descongelado à temperatura ambiente,

sendo esta a forma mais demorada. Se este for necessário de uma forma mais urgente, deve

ser colocado dentro de outro saco, a fim de proteger o saco inicial e os locais de entrada deste,

e então colocado em banho maria a uma temperatura sempre inferior a 37ºC. Este método,

geralmente, leva 25 a 35 minutos (Chiaramonte, 2004; Helm & Knottenbelt, 2010b; Davidow,

2013). A temperatura deve ser comprovada por um termómetro. Finalmente, segundo

Chiaramonte, em 2004, aquando de uma emergência, pode ser considerado descongelar o

plasma no micro-ondas. Esta afirmação é baseada no trabalho de Hurst, Turrentine e Johnson

em 1987 sobre este assunto. Estes autores descobriram que a utilização do micro-ondas para

descongelar plasma canino podia ser útil, no entanto este processo deteriorava os fatores de

coagulação I (fibrinogénio), VIII, e/ou vWF, mantendo inalterado o tempo da protrombina e o

tempo de tromboplastina parcialmente ativada. Pelo contrário, segundo Davidow, 2013, o

micro-ondas não deve ser utilizado devido ao potencial dano das proteínas; Todos os produtos

devem encontrar-se a temperatura ambiente antes de serem transfundidos – entre 21º e 37ºC

(Helm & Knottenbelt, 2010b).

O volume a transfundir de plasma para repor fatores de coagulação é de 10 a 20 ml/Kg

(Ferreira et al., 2008a; Helm & Knottenbelt, 2010b). Sendo utilizada a fórmula seguinte para o

cálculo mais preciso do volume necessário de plasma para repor a albumina (Ferreira, 2015):

Volume de plasma (ml) = Peso do recetor x 4,5 x (Albumina desejada – Albumina atual

g/l).

A taxa utilizada está descrita no quadro 3. Todas as transfusões de sangue, ou produtos

sanguíneos, devem ficar completas no máximo de quatro horas a fim de evitar proliferação

bacteriana (Ferreira et al., 2008a; Barfield & Adamantos, 2011; Davidow, 2013). O anexo II

ilustra as sugestões do Banco de Sangue Animal Lda para utilização apropriada de

hemocomponentes perante situações específicas.

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7.3. Xenotransfusões

A primeira xenotransfusão – transfusão realizada entre espécies diferentes – foi levada a

cabo por Jean-Baptiste Denis em 1667 em que sangue de bezerro foi administrado a cães,

sendo mais tarde, sangue de bezerro e borrego transfundido a pessoas (Roux et al., 2007).

Vários estudos envolvendo a transfusão de sangue de cães para gatos foram documentados

em 1960 (Bovens & Gruffydd-Jones, 2013). Mais recentemente, em 2014, Weingram reportou

um caso em que a xenotransfusão salvou a vida a um gatinho com um mês de idade. A

decisão final em relação à utilização deste procedimento, como tratamento, foi tomada pelos

donos do animal, uma vez que estes apresentavam restrições monetárias.

Numa primeira transfusão deste tipo não ocorrem reações adversas agudas, visto que,

os felinos não possuem anticorpos naturais contra os antigénios específicos dos eritrócitos

caninos. No entanto, dentro de quatro a sete dias, após a transfusão, são produzidos

anticorpos contra estes antigénios, demonstrado por testes de aglutinação e hemólise in vitro

(Kisielewicz & Self, 2014).

Segundo Bovens & Gruffydd-Jones 2013, a vida útil das células vermelhas transfundidas

não atingiu os quatro dias. Adicionalmente, a repetição deste tipo de transfusão, seis dias após

a primeira, resultou em reações anafiláticas que se mostraram fatais em mais de 66% dos

casos.

O risco de transmissão de agentes patogénicos associado com a xenotransfusão,

usualmente de canídeos para felídeos, é teoricamente zero para FIV, FeLV e haemoplasmas

felinos, podendo ter alguma relevância na transmissão de infeções vetoriais, visto que algumas

são comuns às duas espécies (Pennisi et al., 2015). A xenotransfusão de um dador canino

para um recetor felino pode ser considerada numa emergência em que não exista mais

nenhuma alternativa viável, como inexistência de sangue felino compatível ou soluções de

hemoglobina, desde que o felino nunca tenha recebido sangue canino anteriormente. Este

método pode proporcionar tempo crucial para a execução de procedimentos diagnósticos ou

aquisição de produtos sanguíneos adequados (Kisielewicz & Self, 2014; Pennisi et al., 2015).

7.4. Soluções de hemoglobina

Os produtos de sangue alternativos com base na hemoglobina têm sido utilizados em

humanos desde de 1960 (Barfield & Adamantos, 2011) e têm o benefício em relação a outros

produtos, tais como CE, por não acarretarem riscos de transmissão de doenças infecciosas

(Chiaramonte, 2004). Pela razão descrita, existe o interesse em desenvolver estas soluções

livres de células que se aproximam da capacidade da hemoglobina celular para transportar e

fornecer oxigénio (Goodnough et al.,1999; Winslow, 2007).

Esta solução resulta de hemoglobina ultrapurificada e polimerizada, obtida a partir de

sangue de bovinos, ao qual são retirados os eritrócitos (Kisielewicz & Self, 2014).

Comercialmente, está disponível como oxyglobin®, sendo dispendioso e a sua disponibilidade

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intermitente, no mercado, nos últimos anos (Roux et al., 2008). Apenas se encontra licenciado

para utilização em cães apesar de a sua utilização em gatos estar documentada e já ser

estudada há mais de dez a quinze anos (Helm & Knottenbelt, 2010a; Kisielewicz & Self, 2014).

Tem sido utilizada, em gatos, predominantemente para controlar a anemia em

situações de emergência, obtendo um aumento eficiente da concentração de hemoglobina

(Weingart & Kohn, 2008). O seu uso requer alguma precaução visto induzir um grande

aumento da pressão oncótica intravascular que poderá facilmente originar sinais de

hipervolémia, em particular, em animais desta espécie com doença cardiorrespiratória ou do

sistema nervoso central, ou disfunção renal oligúrica (Ferreira et al., 2008a; Helm &

Knottenbelt, 2010a).

Tem, como principal vantagem, a melhoria temporária dos sinais clínicos de anemia,

tendo outras vantagens como boa durabilidade e fácil armazenamento. Esta solução é

armazenada em sacos de 125 ml e dura três anos à temperatura ambiente, porém uma vez

aberta deve ser utilizada nas 24 horas seguintes devido à oxidação da hemoglobina em

metahemoglobina. Tem ainda a vantagem de não ser necessária tipificação ou prova cruzada,

e como já mencionado anteriormente, não acarreta risco de transmissão de infeções (Muir &

Wellman, 2003; Roux et al., 2008). Como a sua viscosidade é baixa proporciona um aumento

da circulação microvascular, com uma libertação de oxigénio mais eficiente a nível tissular

(Chiaramonte, 2004; Plunkett & Mans, 2013). No entanto, apresenta um tempo de ação inferior

ao tempo de semi-vida dos eritrócitos, estando mais indicada nos casos de anemia aguda

regenerativa (Ferreira et al., 2008a). A transfusão desta solução é, ainda, uma forma de

xenotransfusão (Kisielewicz & Self, 2014), podendo originar reações adversas devido ao seu

potencial antigénico (Ferreira et al., 2008a).

Devido à sua potente atividade vasoativa e risco de sobrecarga de volume em gatos

pode causar edema pulmonar, sendo a dose inicial de administração relativamente mais baixa

do que no cão, 5 ml/Kg. A taxa de administração depende assim do estado do animal, variando

de 0,5 ml a 2 ml/Kg/h. A hemoglobina nos gatos atinge o valor normal entre 10 e 15 g/dl,

podendo ser repetida a administração sob monitorização cuidadosa. Após a administração,

esta solução causa descoloração das mucosas, da esclera e urina, tornando difícil a avaliação

clínica (Chiaramonte, 2004; Helm & Knottenbelt, 2010a).

7.5. Autotransfusão

Este procedimento pode ser uma opção viável em caso de emergência e consiste na

colheita, filtração e subsequente reinfusão de sangue do próprio gato (figura 21 e 22) (Barfield

& Adamantos, 2011).

Este procedimento apenas está indicado quando há perda de sangue para uma das

grandes cavidades – torácica ou abdominal – sem outra fonte de células vermelhas disponíveis

ou sem tempo suficiente de as obter (Chiaramonte, 2004). No entanto, o sangue perdido para

estas cavidades e a sua transfusão está contraindicada se se encontrar contaminado com

urina, bactérias, bílis, e na presença de neoplasia difusa (Rozanski & Laforcade, 2004).

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O sangue é colhido das cavidades, de forma estéril, através de material apropriado. De

seguida, este é introduzido num recipiente estéril de soro ou num saco de colheita sanguínea,

sendo retransfundido através de um sistema com filtro apropriado (Barfield & Adamantos, 2011;

Henderson, 2015). Um anticoagulante, como por exemplo ACD, deve ser utilizado, num ratio

de 1:7, com o intuito de prevenir fenómenos de coagulação (Barfield & Adamantos, 2011), no

entanto, esta utilização pode não ser necessária se a efusão estiver presente há já várias horas

(Rozanski & Laforcade, 2004). Após uma hora de contacto com as serosas, todos os fatores de

coagulação foram ativados e já ocorreram fenómenos de fibrinólise, levando a uma redução em

número e função das plaquetas e a uma desfibrinação total do sangue, que se torna incapaz de

coagular. A utilização de anticoagulantes é, no entanto, recomendada sempre que haja uma

hemorragia ativa (Abrams-Ogg, 2000).

Como qualquer outro procedimento, este apresenta vantagens e desvantagens. As suas

vantagens incluem compatibilidade antigénica, visto que, obviamente, não há rejeição por parte

do animal às próprias células, não existe risco de transmissão de doenças, o produto encontra-

se normotérmico, há balanço do pH, está imediatamente disponível e é económico. Pelo

contrário tem, como desvantagens, o potencial para hemólise, formação de coágulos,

desenvolvimento de coagulopatias ou CID, e sepsis (Chiaramonte, 2004).

Devido ao crescimento recente dos bancos de sangue e ao melhoramento da

disponibilidade de variados produtos sanguíneos, a necessidade por autotransfusão teve um

declínio nos últimos anos. No entanto, continua a ser uma alternativa em prática de emergência

(Rozanski & Laforcade, 2004).

Figura 21 e 22 – Realização de uma autotransfusão –

Propriedade intelectual do HVP

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Quadro 3 - Terapia por componentes em gatos, adaptado de (Chiaramonte, 2004; Ferreira et al., 2008a;

Helm & Knottenbelt, 2010a; Davidow, 2013)

Sangue

Total

Fresco

Contém: Eritrócitos, leucócitos, plaquetas e todos os fatores de coagulação

Indicações: Hemorragias graves ativas associadas a coagulopatias ou inflamações

severas, CID, síndrome de resposta inflamatória sistémica, trombocitopenia e

trombopatias, hemofilia, vWD, anemia não regenerativa, problemas financeiros,

conseguindo apenas realizar uma transfusão, e hemorragias severas (perdido> 30% do

volume sanguíneo) com hipovolémia associada

Dose:

(o

hematócrito desejado é geralmente mais 10% do que o hematócrito do paciente; de

uma forma geral, considera-se 15-20 % no gato)

Nota: Pode ainda ser calculado, sem muita precisão, como 12 a 20 ml/Kg

Velocidade: Primeiros 20 minutos --------------0,25 ml/Kg/h

Normovolémia ---------------------5-10 ml/Kg/h

Hipovolémia ------------------------até 22 ml/Kg/h (Não recomendada nos gatos)

Risco de sobrevolémia-------------1-4 ml/Kg/h

(insuficiência renal e/ou cardíaca; anemia não regenerativa)

Segundo Rothrock (2015) em gatos com risco de sobrevolémia foi sugerida a taxa de 2 ml/Kg/h e

para outros gatos uma taxa máxima de 3 a 4 ml/Kg/h se tolerado.

Armazenado

Contém: Eritrócitos, leucócitos e fatores de coagulação termoestáveis

Indicações: Excetuando as patologias onde são necessários fatores de coagulação

termolábeis e plaquetas, as indicações são semelhantes às anteriores

Dose e velocidade: Igual à anterior

Concentrado de eritrócitos

Contém: Eritrócitos, leucócitos e um volume residual de plasma

Indicações: Anemias normovolémicas, animais anémicos com risco de sobrevolémia,

anemias hemolíticas, não regenerativas e hemorragias severas.

Dose e velocidade: Igual à anterior

Plasma Fresco

congelado

Contém: Albumina, globulinas e todos os fatores de coagulação

Indicações: défice de fatores de coagulação termolábeis – hemofilia A (↓fator VIII),

vWD, fator V e CID. Acrescentam-se ainda todas as indicações, infra mencionadas, de

plasma congelado

Dose: 10 a 20 ml/Kg/dia – para fatores de coagulação

Para repor albumina: Volume de plasma (ml) = Peso do recetor x 4,5 x (Albumina

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desejada – Albumina atual g/l).

Nota: atenção à sobrecarga de volume em gatos

Velocidade: 5-10 ml/Kg/h, sendo aconselhado não ultrapassar os 6 ml/Kg em gatos

Congelado

Contém: Albumina, globulinas e fatores de coagulação termoestáveis

Indicações: Coagulopatias congénitas (hemofilia B e C), associadas a insuficiência

hepática ou a intoxicação por dicumarinicos; expansão do volume circulatório,

comprometimento da imunidade passiva e hipoalbuminémia (enteropatias, nefropatias,

hepatopatias, ou queimaduras).

Nota: não é adequado, a longo prazo, como fonte de proteína, limitando-se a reduzir possíveis

edemas secundários a pressões oncóticas reduzidas.

Dose e velocidade: Igual à anterior

Solução de hemoglobina

Contém: hemoglobina ultrapurificada e polimerizada, obtida a partir de sangue de

bovinos

Indicações: Qualquer tipo de anemia, principalmente quando mais nenhum

hemocomponente está disponível

Dose: 5 a 10 ml/Kg – podendo ser elevado até 30 ml/Kg em alguns casos, no entanto é

necessário ter em atenção a possibilidade de sobrecarga

Velocidade: 0,2 a 5 ml/Kg/h

Nota: As doses e velocidades de administração neste quadro são apenas um guia. A taxa de administração pode ser

aumentada ou reduzida consoante as individualidades do paciente. Do mesmo modo a dose total pode ser alterada

consoante as necessidades do paciente. A transfusão de todos os produtos sanguíneos deve ser concluída no máximo

de quatro horas, a fim de prevenir a proliferação bacteriana.

8. Reações transfusionais

Estas dizem respeito a reações adversas que podem ocorrer durante ou após uma

transfusão de sangue inteiro ou de qualquer outro produto sanguíneo. As reações

transfusionais podem ser classificadas, quanto à sua origem, em imunomediadas ou não-

imunomediadas e, quanto ao momento da sua ocorrência, em agudas ou retardadas. Como

facilmente se depreende das suas denominações, as reações agudas podem manifestar-se

segundos após o início da transfusão enquanto as retardadas se manifestam em períodos de

tempo muito superiores, de horas a dias, depois do início da mesma (Rothrock, 2015). Estas

reações e manifestações são alvo de maior atenção no quadro 4.

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Quadro 4 – Categorização e descrição das diferentes reações transfusionais, adaptado de (Ferreira, et

al 2008b)

Imunomediadas

Reações Imunogénio Descrição

Agudas

Eritrócitos

Em gatos as reações hemolíticas agudas podem ocorrer logo na primeira transfusão, sendo especialmente graves nos casos de transfusão de sangue tipo A para gatos tipo B. Estas são mediadas por complexos anticorpo-antigénio e definem-se como reação de hipersensibilidade tipo II.

Plaquetas e

leucócitos

A incompatibilidade entre leucócitos e plaquetas do dador e do recetor requer a presença de anticorpos já formados no recetor, sensibilização esta devida a transfusões ou gestações prévias. A sua incidência pode ser reduzida através do uso de filtros leucorredutores.

Proteínas

plasmáticas

A maioria das reações agudas contra proteínas plasmáticas são reações anafiláticas de hipersensibilidade tipo I, ocorrendo através da interação de imunoglobulinas E e mastócitos. A complexidade e heterogeneidade do plasma torna possível uma grande variedade de reações adversas.

Retardadas

Eritrócitos

Nos gatos a reação hemolítica retardada mais comum é a isoeritrólise neonatal. A doença consiste na existência de uma resposta inflamatória à ingestão de anticorpos contra o tipo sanguíneo do neonato no colostro. Devido à ocorrência de anticorpos naturais, a doença pode ocorrer em mães primíparas. Os gatos tipo B têm anticorpos anti-A em grandes títulos; como tal, a doença ocorre principalmente em ninhadas tipo A ou AB, com mães tipo B.

Plaquetas

Embora raro, está descrito o aparecimento de trombocitopenia aguda uma semana após a transfusão, denominada púrpura póstransfusional. Esta é acompanhada de trombocitopenia que pode persistir por 10 dias a 2 meses. Reação, normalmente, autolimitante.

Não imunomediadas

Reações Causas Descrição

Agudas

Contaminação

microbiana

A contaminação microbiana da unidade de sangue pode ocorrer por bacterémia subclínica do dador ou devido a processos inadequados de colheita, armazenamento ou administração do sangue. As bactérias mais frequentemente identificadas são a Yersinia enterocolitica, Serratia spp. e Pseudomonas spp.:estes agentes são gram negativos que usam o citrato como fonte de carbono para o seu crescimento a baixas temperaturas.

Hipervolémia

Os produtos sanguíneos difundem-se lentamente do espaço intravascular para o extravascular, como tal, a administração rápida ou de grande volume de sangue pode levar a hipervolémia. Este risco é maior em gatos, animais jovens, geriátricos e pacientes com doença cardiopulmonar ou insuficiência renal.

Toxicidade por

citrato

Pode surgir após a administração de transfusões massivas (velocidade e/ou volume elevado) ou administração de unidades com volume de sangue inferior ao da capacidade da bolsa de armazenamento. Este anticoagulante atua como quelante do cálcio podendo levar a hipocalcémia. O risco de toxicidade é maior em pacientes com patologia hepática, visto diminuir a metabolização do citrato.

Hipotermia

A hipotermia resulta da administração de sangue refrigerado a gatos, pacientes muito jovens, geriátricos ou de pequenas dimensões. No caso de transfusões massivas de sangue refrigerado ou transfusões a animais anestesiados, podendo também afetar animais adultos.

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Microembolismo

pulmonar

O microembolismo pulmonar pode surgir após a administração de sangue com mais de 7 dias de armazenamento, podendo ser provocado por microagregados de leucócitos, plaquetas ou fibrina. Estes podem passar através do filtro do sistema de transfusão e serem infundidos, alojando-se e obstruindo os vasos pulmonares.

Retardadas

Agentes

infecciosos

A transmissão de doenças infecciosas poderá ocorrer caso os dadores não sejam corretamente testados contra os agentes infecciosos passíveis de transmissão por via sanguínea. A sintomatologia é retardada, estando sujeita ao período de incubação dos vários agentes.

Hemocromatose

A hemocromatose é uma deposição excessiva de ferro nos tecidos sob a forma de hemossiderina. Os órgãos mais afetados são o fígado, pâncreas e miocárdio, comprometendo gradualmente as suas funções.

Hiperamonémia

Apenas descrita em medicina humana. Esta resulta da formação de amónia durante o armazenamento dos eritrócitos e consequente administração ao recetor durante a transfusão. As complicações ocorrem em insuficientes hepáticos, visto a metabolização da amónia estar comprometida. Como tal, deve evitar-se a administração de sangue com mais de 2 semanas a estes pacientes.

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9. Casos clínicos

9.1. Caso clinico – “Pinchie”

No presente caso clínico descreve-se uma recolha de sangue, realizada em âmbito de

rotina do banco de sangue do HVP, a uma gata incluída na lista de dadores do mesmo. Esta

dádiva de sangue foi realizada no dia 20 de Agosto de 2014, tendo sido a sétima colheita

realizada neste animal desde o seu registo neste programa. O sangue foi recolhido com o

objetivo de ser conservado e utilizado posteriormente, tendo sido armazenado sob a forma de

sangue inteiro devido às informações relativas ao hematócrito do mesmo.

9.1.1. Identificação (Quadro 5)

9.1.2. Anamnese

A idade de cinco anos da “Pinchie” permite a esta ser dadora de sangue. Com o objetivo

de confirmar se o animal detinha a vacinação e a desparasitação em dia, foi analisada a

caderneta individual do animal, cedida pela proprietária. Todos os parâmetros se encontravam

em conformidade, sendo a data da última desparasitação externa cinco de Agosto de 2014 e

interna, quatro de Julho de 2014. - Faz desparasitação interna com milbemicina oxima e

praziquantel (milbemax®) e desparasitação externa com imidaclopride (advantage®). - A sua

última vacinação foi no dia dois de Agosto de 2014 referente à vacinação core e no dia sete de

Janeiro de 2014 para a leucose felina.

Por fim, a proprietária afirmou que a sua gata se encontrava saudável, não lhe tendo

detetado qualquer alteração comportamental nos últimos dias.

Tendo em conta que o animal preenchia todos os requisitos fundamentais para proceder

à recolha de sangue, incluindo as análises anuais necessárias normais e dentro do período de

validade exigido (realizadas pela última vez a 08/05/2014 – anexo I) realizou-se um exame

físico completo (quadro 6).

9.1.3. Exame físico

Quadro 5 – Identificação da “Pinchie”

Nome “Pinchie” Nascimento 12/06/2009

Espécie Felino Sexo Fêmea/ovariohisterectomia

Raça Siamês Tipo sanguíneo A

Quadro 6 – Exame físico realizado à “Pinchie”

Peso 4,300Kg FR 20 RPM**

Mucosas Rosadas e húmidas Hidratação ≥95%

TRC ≤ 2 Segundos Auscultação torácica Normal

FC e Pulso 184 bpm*; forte,

simétrico e síncrono Pressões arteriais***

1)PS:122;

2)PAM: 82;

3)PD: 60

Legenda: *bpm – batimentos por minuto; **RPM – respirações por minuto; ***Valores de referência: PS: 112-166; PAM: 72-126; PD: 52-102;

1)PS: Pressão sistólica;

2)Pressão arterial média;

3)Pressão diastólica

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9.1.4. Preparação para recolha e análises

Encontrando-se todos os parâmetros do animal dentro dos valores fisiológicos,

procedeu-se à colocação de cateter na veia cefálica esquerda e, ainda, à recolha de uma

amostra sanguínea para realização de hemograma (tabela 28). Foi eleita a veia cefálica

esquerda para cateterização, já que, na dádiva anterior, tinha sido utilizada a veia do membro

anterior oposto.

Após a obtenção dos resultados das análises e encontrando-se estes valores dentro

dos intervalos fisiológicos, iniciou-se o processo de recolha.

O material necessário à colheita foi preparado antecipadamente, incluindo um sistema

de colheita aberto com uma seringa de 50 ml, extensão pequena com válvula de três vias e

uma agulha de 20 gauges. Esta seringa continha 7 ml de anticoagulante CPDA-1, introduzidos

manualmente. Além deste sistema, foi preparada uma seringa com 60 ml de NaCl a 0,9%,

aquecido, previamente numa estufa a 37ºC, e ainda uma seringa contendo a sedação a

administrar ao animal, como ilustrado na figura 23.

Tabela 28 – Resultados relevantes do hemograma da “Pinchie”

Parâmetros Valores Valores de referência

Parâmetros Valores Valores de referência

Leucócitos ( ) 6,3 5,5 – 19,5 Plaquetas ( ) 154 100-514

Granulócitos ( ) 7 2,1 - 15 Hemoglobina (g/L) 151 93-153

Monócitos ( ) 0,2 0-1,9 Hematócrito (%) 48,8 28-49

Linfócitos ( ) 3,6 0,8-7 Eritrócitos ( ) 9,9 4,6 - 10

Figura 23: Material necessário para a colheita sanguínea. A- Seringa com 60 ml de cloreto de

sódio; B – Sistema de recolha aberto com anticoagulante; C – seringa com fármacos para

sedação - Propriedade intelectual do HVP

A

B C

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O protocolo de sedação utilizado no HVP para recolhas sanguíneas em banco de

sangue é a combinação dos fármacos diazepam (valium®) e quetamina (imalgene®) ambos na

dose de 0,5 mg/Kg. Foi administrado à “Pinchie”, metade do volume total, IV, sendo

adicionados incrementos de 0,05 ml até se observar o efeito pretendido. A indução demorou

cerca de dois a três minutos, encontrando-se um técnico a controlar os seus sinais vitais desde

o início da administração destes fármacos. O local de punção foi preparado cirurgicamente,

realizando-se tricotomia sobre a veia jugular direita, a igual distância do ângulo da mandibula e

do manúbrio, prosseguindo-se com a desinfeção do local utilizando clorohexidina e álcool. De

seguida, o técnico posicionou o animal adequadamente para procedimento de colheita –

decúbito esternal (figura 24). Com o intuito de garantir um procedimento asséptico, o técnico

responsável pela venipuntura desinfetou as suas mãos, lavando-as três vezes com

clorohexidina e passando álcool no final.

9.1.5. Recolha sanguínea

Uma vez reunidas as condições, foi então iniciada a recolha propriamente dita. O técnico

responsável pela venipuntura identificou o trajeto da veia jugular através da realização de

garrote, puncionando-a num único movimento preciso. O técnico auxiliar realizou a colheita por

pressão negativa, puxando, de forma constante e sem interrupções, o êmbolo da seringa de 50

ml (figura 25). Foi colhido um volume de sangue de 43 ml, perfazendo na totalidade, sangue

mais anticoagulante, os 50 ml necessários.

Uma vez obtido este volume, o técnico aplicou pressão na zona da venipuntura por meio

de uma compressa embebida em água oxigenada e, finalmente, retirou a agulha mantendo a

pressão durante cinco minutos. Com a válvula de três vias já fechada, a seringa foi agitada

várias vezes, cuidadosamente, de forma a realizar uma boa mistura entre o sangue e o

anticoagulante.

Figura 24: “Pinchie” em decúbito ventral e dorso-flexão cervical e já com a assepsia cirúrgica do

local realizada - Propriedade intelectual do HVP

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Finalmente, executou-se a passagem do conteúdo da seringa para um saco de 150 ml

desprovido de anticoagulante. Procedeu-se também à completa selagem da unidade através

de clamps de alumínio, após se ter garantido a ausência de ar, e posterior identificação do

saco.

Enquanto a preparação da unidade era levada a cabo, o auxiliar iniciou a reposição de

fluidos à “Pinchie”. Embora a descrição do conteúdo desta seringa já tenha sido mencionada,

esta apenas foi preparada aquando da sua necessidade de forma a garantir os 37º C de

temperatura do fluido. A “Pinchie” foi colocada em decúbito lateral e foram administrados 60 ml

de NaCl 0,9%, num período de cerca de 20 minutos, através do cateter colocado inicialmente,

como ilustrado na figura 26.

9.1.6. Pós colheita

Na hora seguinte à recolha, a “Pinchie” foi monitorizada cuidadosamente, apesar da

reversão quase completa da sedação. Foi dada mais importância à temperatura e à cor das

mucosas, tendo sido também controlada, com menor regularidade, a frequência cardíaca e

respiratória. Todos estes parâmetros se mantiveram normais. Decorrida uma hora após o final

da colheita, foi fornecido alimento à “Pinchie”, tendo esta recusado enquanto se manteve

internada

Figura 26: Reposição de fluídos após dádiva de sangue - propriedade

intelectual do HVP

Figura 25: Dádiva de sangue da “Pinchie” -Propriedade intelectual

do HVP

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É de referir que toda a informação relevante – peso, veia jugular e sedação utilizada,

observações e ainda uma previsão da próxima dádiva – é registada no plano de doações,

tendo este um caráter individual para cada dador.

9.1.7. Discussão

Esta dádiva de sangue foi realizada no dia 20 de Agosto de 2014, tendo sido a sétima

colheita realizada neste animal desde que se encontra registada no programa de dadores de

banco de sangue do HVP. Todas as colheitas são realizadas numa sala própria para este fim,

localizada longe do internamento e não sendo local de passagem regular. Este facto permite

uma colheita calma e sossegada, proporcionando um ambiente propício para os dadores

felinos e caninos.

Apesar desta dadora ainda preencher os requisitos necessários para o ser, não se

encontra incluída na categoria de dadora ideal, já que segundo Tasker, 2013 estes devem

pesar mais de 5 Kg e terem idades máximas de cinco anos. De acordo com Barfield &

Adamantos, 2011 é necessária a utilização de animais com um regime vacinal completo e é,

ainda preferível, que seja aguardado um período mínimo de um mês, posterior a vacinações e

outros procedimentos, para se proceder à recolha, o que não aconteceu neste caso, uma vez

que o animal recebeu o reforço vacinal anual no dia dois de Agosto de 2014. Excetuando as

condições supramencionadas, todo o resto se encontrava dentro das conformidades: idade,

peso, análises anuais com bons resultados e dentro da validade, desparasitação interna e

externa, vacinação e exame físico normal. Apesar da proprietária da “Pinchie” realizar a

desparasitação interna e externa regularmente, de seis em seis meses, a desparasitação

externa deveria ser realizada a cada mês, segundo o recomendado pelo fabricante do produto

utilizado.

Apesar de não ser a forma recorrentemente descrita na bibliografia, no HVP o cateter

é, por sistema, colocado sempre antes da administração de qualquer sedação. Isto é possível,

uma vez que um dos pré-requisitos utilizados nesta instituição consiste no facto de o gato ser

obrigatoriamente amigável ou, no mínimo, tolerar toda a manipulação necessária ao processo.

Desta forma, é possível administrar a sedação por via IV, tornando a indução mais rápida e

minimizando o stress do animal. Embora alguns estudos (Couto et al., 2005; Killos et al., 2010)

elejam a anestesia volátil como a forma preferível de indução anestésica em animais para

colheita de sangue, no HVP é utilizada anestesia fixa pela combinação de diazepam e

quetamina. Segundo a experiência dos técnicos responsáveis pelo banco de sangue desta

instituição, o protocolo anestésico utilizado é seguro e eficaz durante todo o procedimento de

colheita, sendo sempre utilizado, neste contexto, para esta espécie animal. Gibson, 2007

sugere que cada clínica/hospital deve desenvolver um protocolo com estas características e

com o qual se sinta confortável.

A unidade de sangue foi imediatamente preparada após a colheita, enquanto os

auxiliares cuidavam da paciente em recuperação. Foi decidido que esta unidade iria ser

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armazenada sem qualquer processamento, sendo, portanto, considerada uma unidade de

sangue inteiro. Esta decisão foi tomada tendo por base o hematócrito apresentado pela

“Pinchie”, sendo este relativamente alto, 48,8%, e não permitindo a obtenção de um volume

razoável de plasma.

Todas as normas foram cumpridas, tendo a colheita em si demorado apenas 10 a 15

minutos. Não ocorreu qualquer imprevisto em todo o processo descrito.

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9.2. Caso clínico – “Simba”

9.2.1. Identificação (Quadro 7)

9.2.2. Anamnese

O “Simba” deu entrada no HVP no dia 17 de Dezembro de 2014 com queixa de

prostração e apresentando mínima resposta a estímulos.

Sem história de doença prévia, o animal não era vacinado nem desparasitado. Por ter

acesso ao exterior, suspeitou-se de atropelamento, pese embora a inexistência de lesões

visíveis. Segundo os proprietários, as manifestações clínicas do “Simba” foram repentinas,

demonstrando este normalidade comportamental e de bem-estar no dia anterior.

9.2.3. Abordagem primária

Dada a história de um possível trauma e face ao estado não ambulatório do “Simba”,

procedeu-se de imediato a uma avaliação clínica do doente, seguindo a abordagem ABC:

A – Vias aéreas: vias aéreas desobstruídas mas presença de corrimento nasal

mucoso. Iniciou-se imediata suplementação com O2 através da colocação de uma máscara.

B – Respiração: presença de respiração autónoma. Frequência respiratória normal,

sem ruídos à auscultação.

C – Sistema cardiovascular: aumento do tempo de repleção capilar (TRC) (superior a

dois segundos), membranas mucosas pálidas e frias, taquicardia (frequência cardíaca superior

a 200 batimentos por minuto), pulso fraco, extremidades frias e depressão. Procedeu-se à

colocação de cateter intravenoso e à colheita de sangue para realização de hemograma e

análises bioquímicas.

As alterações registadas através da avaliação clínica do paciente foram compatíveis

com um estado de hipovolémia, que exigiu a execução de maneio de urgência do choque

hipovolémico.

9.2.4. Tratamento inicial

Procedeu-se de imediato a uma abordagem ao choque hipovolémico através da

administração do fluido isotónico lactato de Ringer, na taxa de choque para gatos, isto é, 55

mL/Kg/h, tendo-se administrado inicialmente um quarto deste volume, 13 ml/Kg, em 20

minutos, findo os quais se procedeu à reavaliação dos parâmetros de perfusão, que

permaneceram inalterados. Deste modo, administrou-se novo bólus de fluídos, de igual

Quadro 7 – Identificação da “Simba”

Nome “Simba” Idade Quatro anos

Espécie Felino Sexo Macho, fértil

Raça Europeu comum Peso 3,5 Kg

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volume, sem obtenção de resposta. Iniciou-se nova abordagem, desta vez com um bólus de

coloides, a 2,5 ml/Kg, em 15 minutos, obtendo-se uma ligeira resposta. Assim, procedeu-se a

administração de mais um bólus de coloides esperando permanência de resposta mais

favorável.

9.2.5. Abordagem secundária

A administração dos bólus de coloides permitiu a reversão de choque hipovolémico e a

estabilização clínica do animal. Procedeu-se a um exame clínico mais detalhado enquanto se

aguardava pelos resultados das análises clínicas. Os achados do exame clínico encontram-se

descritos no quadro 8.

Entretanto, obtiveram-se os resultados do hemograma, das análises bioquímicas gerais

e do ionograma, cujos resultados se encontram na tabela 29, com as devidas alterações

assinaladas.

Quadro 8: Exame físico como avaliação secundária realizado ao “Simba”

Inspeção visual Sem lesões aparentes. Região perianal conspurcada, com presença de

terra, palha e uma substância ressequida, provavelmente diarreia.

Temperatura 36.0º C – Com sinal de termómetro

Desidratação Entre 7 e 8%

Glicose 32 mg/dl – através de glicómetro veterinário

Pressões arteriais* PS: 109; PAM: 71; PD: 54

Sistema

cardiovascular

No que se refere, aos parâmetros de perfusão, foram avaliados de forma

contínua e persistente, tendo-se observado melhorias com os bólus de

fluidos e tratamento subsequente. A auscultação cardíaca revelou melhorias

a nível de frequência, tendo começado a reduzir após o primeiro bólus de

coloides – 180 bpm.

Avaliou-se ainda o traçado eletrocardiográfico do paciente, que se

encontrava com ritmo regular e sinusal.

Palpação

abdominal

Mostrava desconforto à palpação e demonstrava aumento da motilidade

intestinal.

Nota: Eram várias as pessoas que se encontravam a tratar deste animal, não sendo a ordem

descrita necessariamente a ordem pela qual o exame foi conduzido. Alguns dos parâmetros foram

tratados de imediato consoante a sua gravidade, como por exemplo, a medição da temperatura e

da glicose sanguínea.

Legenda: *Valores de referência: PS: 112-166; PAM: 72-126; PD: 52-102

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Finda a avaliação clínica detalhada do “Simba”, foi possível constatar a presença de

alterações em vários parâmetros, sendo os mais graves a hipoglicémia e a hipotermia. Em

relação aos parâmetros analíticos, a leucopénia severa destaca-se como alteração mais

preocupante, embora a diminuição do potássio também exigisse suplementação para correção

da hipocalémia. Devido a todos os sinais clínicos, à anamnese e à evidência de diarreia, a

principal suspeita recaiu sobre um quadro de panleucopénia, pelo que se iniciou tratamento de

suporte adequado.

9.2.6. Tratamento

Em primeiro lugar, procedeu-se ao aquecimento do animal colocando mantas e botijas

de água quente em seu redor. Uma vez que se encontrava a receber fluidoterapia, esta foi

também aquecida a uma temperatura de +/- 37ºC.

Tabela 29 – Primeiros resultados do hemograma, análises bioquímicas e ionograma realizados ao “Simba”

Parâmetros Valores Valores de

referência Parâmetros Valores

Valores de

referência

Leucócitos ( ) 2.0 ↓ 5.5 - 19.5 Hemoglobina (g/L) 158 ↑ 93 - 153

Linfócitos ( ) 1.5 0.8 - 7.0 Hematócrito (%) 54.1 ↑ 28 - 49

Monócitos ( ) 0.1 0 - 1.9 Volume corpuscular médio (fL) 45.6 39 - 52

Granulócitos ( ) 0.4 ↓ 2.1 - 15 Hemoglobina corpuscular

média (pg) 14.1 13 - 21

Linfócitos (%) 73.1 12 - 45 Concentração de hemoglobina

corpuscular média (g/L) 310 300 - 380

Monócitos (%) 6.9 2 - 9 RDW (%) 14.7 14 - 18

Granulócitos (%) 20.0 ↓ 35 - 85 Plaquetas ( ) 95 ↓ 100 - 514

Eritrócitos ( ) 11.88 ↑ 4.6 - 10

Análises bioquímicas Ionograma

Parâmetros Valores Valores de referência Parâmetros

Valores Valores de referência

ALT (U/L) 64 22-84 Sódio (Na) (mEq/L) 144 ↓ 147-156

ALP (U/L) 59 38-165 Potássio (K) (mEq/L) 3.0 ↓ 3.4-4.6

Creatina (mg/dl) 1.5 0.8-1.8 Cloro (Cl) (mEq/L) 110 107-120

Ureia (mg/dl) 19.1 17.6-32.8

Proteínas totais (g/dl) 7.0 5.7-7.8

Albumina (g/dl) 2.3 2.3-3.5

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Em segundo lugar, foi administrado um bólus de glicose na dose de 0,5 g/Kg por via

intravenosa. Para este fim, diluiu-se 5,8 ml de glicose a 30% em 24 ml de NaCl a 0,9%, tendo

sido o produto resultante administrado em aproximadamente quinze minutos, com uma

resposta positiva por parte do animal e melhorias do seu estado mental.

Foi acrescentado ao tratamento ampicilina (hiperbiótico®) a 22 mg/Kg a cada 8 horas,

metronidazol (metronidazol®) 10 mg/Kg, a cada 12 horas, ambos por via IV e enrofloxacina

(alsir®) a 5 mg/Kg, SC, uma vez por dia.

Empiricamente foi ainda acrescentado um protetor gástrico, ranitidina (zantac ®) 2,5

mg/Kg IV, diluído e lento, a cada 12 horas, e um antiemético pro-cinético, metoclopramida

(primperam ®) 0,5 mg/Kg IV, diluído e lento, a cada 8 horas.

9.2.7. Evolução

Dia 1 – 17/12/2014

Após a instituição do tratamento referido, o animal apresentou melhorias de estado

mental e na resposta à maioria dos estímulos externos, mas manteve a depressão do estado

mental.

A temperatura subiu lentamente, encontrando-se ao fim de três horas na ordem dos

40ºC. Para contrariar esta subida, retiraram-se todas as mantas da jaula, mantendo-se apenas

um resguardo. A temperatura foi monitorizada regularmente durante o resto do dia, mantendo-

se sempre superior a 39,6º.

A glicémia foi mensurada após a administração do bólus, encontrando-se a 231 mg/dl.

Esta, assim como a temperatura e as pressões arteriais, foi monitorizada regularmente e

manteve-se sempre a níveis normais. Como medida de urgência, estava indicado novo bólus

de glicose se a glicémia atingisse valores menores que 50 mg/dl e novo bólus de coloides se a

PAM atingisse valores menores que 60.

Uma vez estabilizado, o animal foi colocado numa jaula e submetido a fluidoterapia de

manutenção. Esta consistiu em cristaloides isotónicos (lactato de ringer) com adição de 30

mEq/L de cloreto de potássio para correção da hipocalémia e 2,5% de glicose, para

manutenção da glicémia. Devido às baixas pressões arteriais, opou-se também por manter os

coloides em taxa de manutenção. A taxa de manutenção dos cristaloides foi calculada tendo

em conta os fluidos necessários para manutenção em 24 horas e para correção da

desidratação. A este valor subtraiu-se a taxa de manutenção de coloides, ficando o animal a

receber cristaloides a uma velocidade de 15,1 ml/h e coloides a uma velocidade de 2,9 ml/h

(dose de 20 ml/Kg/dia).

Visto que o animal não apresentava vómitos, até à data, e não demonstrava interesse

pela comida, foi prescrito alimentação forçada por meio de uma seringa. Foram calculadas as

suas necessidades energéticas de manutenção através da fórmula: 30 x peso do animal + 70 =

175 Kcal. Este resultado foi por sua vez multiplicado por um fator de correção denominado

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illess energy requirement (IER) de valor 1,28. Obtendo-se um resultado de 224 Kcal diárias,

que por sua vez teriam de ser convertidas em gramas de ração húmida a administrar. Esta

quantidade foi dividida por cinco tomas diárias, sendo no primeiro dia administrado apenas um

terço das necessidades e no segundo dois terços. Pelo terceiro dia já eram administradas a

totalidade das necessidades diárias, correspondendo estas a 38g por toma.

Após quatro a cinco horas do início do tratamento foi realizado novo hemograma para

reavaliação dos parâmetros, já com redistribuição de fluidos, encontrando-se os resultados

descritos na tabela 30.

A albumina foi também mensurada tendo descido o seu nível para 1,5 g/dl.

Perante este hemograma, com diminuição acentuada de leucócitos, e esta albumina, foi

aconselhado aos proprietários uma transfusão de plasma (figura 27), tendo esta sido realizada

imediatamente após o consentimento dos mesmos.

Foi calculado um volume mínimo necessário de 35 ml, tendo em conta a dose de 10 a 20

ml/Kg, sendo a unidade máxima de plasma existente de 30 ml. Foi administrada apenas uma

Tabela 30 – Resultados do hemograma do “Simba” após quatro a cinco horas do início do

tratamento (apenas parâmetros gravemente alterados)

Parâmetros Valores Valores de referência

Parâmetros Valores Valores

de referência

Leucócitos

( ) 1.5 ↓↓ 5.5 - 19.5

Granulócitos

( ) 0.5 ↓↓ 2.1 - 15

A B C

Figura 27: Preparação do material necessário e subsequente transfusão de plasma. A –

descongelamento do plasma; B – Tipificação sanguínea, folha de monitorização de transfusão,

sistema de transfusão com filtro próprio; C – Transfusão de plasma – propriedade intelectual do

HVP.

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unidade de plasma, pelas razões explanadas na discussão. A transfusão demorou duas horas

e meia a três, tendo sido aplicada uma taxa menor nos primeiros vinte minutos e,

posteriormente, ter continuado a 18 ml/h (velocidade de 5 a 6 ml/Kg/h). Optou-se por realizar o

hemograma de controlo apenas no dia seguinte devido à existência de limite orçamental e

tendo em conta que o animal se encontrava estável.

Dia 2 – 18/12/2014

Durante a madrugada, o animal teve um episódio de diarreia com muco e sangue e um

vómito acastanhado. De forma a controlar os vómitos, foi acrescentado maropitant (cerenia®)

na dose de 1 mg/Kg, por via SC, a cada 24 horas, e manteve-se um período de jejum de quatro

horas, tendo-se repetido esta abordagem sempre que o animal apresentou novos episódios de

vómito.

O animal foi avaliado diariamente, às nove da manhã, com realização de exame físico e

mudança de penso de cateter. Encontrava-se deprimido, com as mucosas rosadas e húmidas

e TRC normal. Apresentava taquicardia (>200 bpm), hipertermia (39,5ºC) e taquipneia (80

RPM) apesar de apresentar uma auscultação torácica normal. Mantinha dor abdominal à

palpação. Durante este dia fez mais duas vezes diarreia com sangue, não tendo tido vómitos

possibilitando assim a administração de comida.

Foi realizado hemograma e albumina de controlo, encontrando-se os valores relevantes

representados na tabela 31.

Dia 3 – 19/12/2014

Mantinha-se deprimido tendo, no entanto, melhorado o seu estado geral. Encontrava-se

normotérmico (37,5ºC) com 170 bpm e 50 RPM de frequência cardíaca e respiratória,

respetivamente. Mantinha desconforto à palpação abdominal e o seu peso era agora de 3,250

Kg.

Apresentava-se hidratado, tendo sido, neste dia, reavaliada a taxa de manutenção de

cristaloides e reajustada de forma a incluir as perdas (vómitos e diarreias), passando para uma

velocidade de 16,5 ml/h. O paciente continuava com diarreia sanguinolenta. As pressões

arteriais eram controladas cerca de cinco vezes por dia tendo sido a PAM mais baixa registada

de 70.

Tabela 31 – Resultados relevantes do hemograma de controlo do “Simba”

Parâmetros Valores Valores de referência

Parâmetros Valores Valores de referência

Leucócitos ( ) 6.6 5.5 - 19.5 Granulócitos ( ) 2.5 2.1 - 15

Albumina 2.5 2.3-3.5

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Devido à medicação prolongada, aos vómitos e ao facto de se introduzir maior

quantidade comida, foi acrescentado esomeprazol (nexium ®), na dose de 7 mg/Kg, IV, a cada

24 horas.

Neste dia procedeu-se a novo hemograma e mensuração da albumina de controlo

encontrando-se os parâmetros de interesse na tabela 32.

Apesar dos valores diminuídos, o estado clinico do animal era favorável, não se tendo

tomado quaisquer medidas adicionais, à exceção da alimentação forçada regular.

Dia 4 – 20/12/2014

Neste dia as melhoras clínicas foram notórias. Ao exame físico todos os parâmetros se

encontravam dentro da normalidade, incluindo o estado mental. Apesar de continuar com

diarreia, esta já não continha vestígios de sangue e mostrava-se menos líquida.

Dia 5 – 21/12/2014

Começou a comer sozinho com bastante apetite e estava aparentemente confortável.

Foi realizado hemograma de controlo e albumina (tabela 33).

Apesar de estar bastante melhor foi decidido não dar alta ao “Simba” devido aos valores

relativamente baixos de alguns parâmetros. No entanto, ficou decidido que se o animal se

mantivesse clinicamente estável e confortável, teria alta condicionada no dia seguinte.

Dia 6 – 22/12/2014

O animal manteve-se clinicamente estável com episódios esporádicos de fezes

pastosas, tendo sido tomada a decisão de lhe dar alta. Foi prescrita enrofloxacina, PO com a

mesma posologia, durante mais quatro dias, tendo o resto da medicação sido descontinuada.

Tabela 32: Resultados relevantes do hemograma de controlo – dia 3

Parâmetros Valores Valores de referência

Parâmetros Valores Valores de referência

Leucócitos ( ) 11.2 5.5 - 19.5 Hemoglobina (g/L) 75 ↓ 93 - 153

Granulócitos ( ) 9.0 2.1 - 15 Hematócrito (%) 20.1 ↓ 28 - 49

Plaquetas ( ) 68 ↓ 100 - 514 Albumina 1.3 ↓↓ 2.3-3.5

Tabela 33: Resultados relevantes do hemograma de controlo – dia 5

Parâmetros Valores Valores de referência

Parâmetros Valores Valores de referência

Leucócitos ( ) 9.7 5.5 - 19.5 Hemoglobina (g/L) 80 ↓ 93 - 153

Granulócitos ( ) 7.6 2.1 - 15 Hematócrito (%) 21 ↓ 28 - 49

Plaquetas ( ) 70 ↓ 100 - 514 Albumina 1.9↓ 2.3-3.5

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9.2.8. Discussão

Quando o “Simba” deu entrada no HVP a principal suspeita dos proprietários recaía na

ocorrência de um atropelamento. Foi então tomada como primeira abordagem o método ABC,

que permite de forma sistematizada avaliar as vias aéreas, a respiração e o sistema

cardiovascular. É de extrema importância que o paciente seja avaliado rapidamente e por uma

equipa especializada de forma a ser possível salvar-lhe a vida (Crowe, 2006).

Esta avaliação permitiu identificar que o animal se encontrava em choque hipovolémico,

no entanto a identificação de gatos em choque pode ser um verdadeiro desafio, havendo

diferenças importantes comparativamente ao cão. Um cão em choque hipovolémico estaria

taquicárdico até entrar em fase descompensada e terminal. Pelo contrário, os gatos são mais

comummente encontrados com bradicardia ou com frequência normal, podendo esta última ser

considerada uma ligeira bradicardia em animais com pressões arteriais baixas. A hipotermia é

comum em gatos com esta síndrome. Esta impossibilita uma boa resposta adrenérgica,

impossibilitando por sua vez uma vasoconstrição compensatória à hipovolémia. Deste modo,

há um aumento do risco de sobrecarga de volume em pacientes em que a ressuscitação por

fluidos é feita sem resolução prévia da hipotermia (Murphy & Hibbert, 2013a). Mesmo assim, o

“Simba” apresentava sinais clínicos clássicos de choque e a hipotermia era ligeira tendo s ido

um dos primeiros parâmetros abordados.

O principal objetivo do tratamento do choque consiste na administração de oxigénio e

nutrientes para as células que se encontram metabolicamente ativas. A administração

endovenosa de fluídos é essencial na recuperação de animais que estejam em choque

hipovolémico ou distributivo (Balakrishnan & Silverstein, 2014), sendo as soluções cristaloides

isotónicas, como o lactato de ringer que foi administrado, considerado o tipo de fluido de

eleição para o efeito (Davis et al., 2013).

O protocolo de fluidoterapia utilizado neste caso para resolução de choque e posterior

manutenção é o mais aceitável, em gatos, segundo os estudos e as guidelines mais recentes.

Davis et al., em 2013 afirma que a taxa padrão de cristaloides isotónicos para choque é

essencialmente uma dose corresponde ao volume corporal completo de sangue, sendo no

caso dos gatos 50 a 55 ml/Kg. Deve começar-se por administrar 25% da dose anterior em vinte

minutos, reavaliando, posteriormente, a necessidade de administração de novo incremento de

igual percentagem. Em geral, se após a administração de 50% do volume de cristaloides

isotónicos não originar melhorias significativas, é necessário considerar a troca ou a adição de

coloides. Tendo em conta o intervalo da dose no gato, 10 a 20 ml/Kg/dia, é tipicamente

utilizada a dose 10 ml/Kg em bólus de 2,5 a 3 ml/Kg durante 10 a 15 minutos. Posteriormente

pode ser necessário ser mantido tanto coloides como cristaloides em taxas de manutenção.

A glicémia foi mensurada através de um glicómetro de forma a obtermos um resultado

rapidamente evitando o tempo necessário para ser obtida juntamente com as restantes

análises. Apesar de estar descrita apenas na segunda abordagem, foi medida assim que

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possível encontrando-se bastante diminuída. Esta hipoglicémia poderia ser indicativa de

sépsis, sendo o mais provável dentro deste quadro. Deve ser administrado um bólus, IV, de

glucose na dose de 0,5 g/Kg e posteriormente continuar em infusão continua a 2,5% em

cristaloides (Murphy & Hibbert, 2013b).

Numa abordagem secundária, uma vez que o animal se encontrava estabilizado,

procedeu-se a um exame clinico mais detalhado, recorrendo-se também a meios

complementares de diagnóstico, de modo a detetar alterações. As alterações detetadas e a

evidência de diarreia em conjunto com a história do animal – não vacinado com acesso ao

exterior – levou a um diagnóstico presuntivo de panleucopénia.

O sinal clinico mais relevante da infeção por panleucopénia é a diarreia. Esta tem origem

numa diminuição das vilosidades intestinais devida a uma perda, por vezes completa, de

células epiteliais. O vírus replica-se nas células de divisão rápida das criptas de Lieberkühn,

prejudicando a regeneração do epitélio intestinal. A severidade destas lesões correlaciona-se

com a taxa de renovação destas células e é agravada pela presença de coinfecções com vírus

intestinais, tais como coronavirus (Truyen et al., 2009).

Os animais diagnosticados com esta doença devem ser mantidos em isolamento e ser

submetidos a tratamento de suporte. O tratamento desta doença segundo as guidelines do

European Advisor Board on Cat Diseases (Truyen et al., 2009) inclui a reposição de fluídos,

antibioterapia de largo espetro com eficácia provada para gram-negativos e anaeróbios, dieta

altamente digestível, antieméticos e protetores gástricos, vitaminas de complexo B para

deficiência em tiamina, transfusões de ST ou plasma, alimentação parenteral parcial ou

completa e controlo de CID, caso esteja presente.

A antibioterapia de largo espetro utilizada é recomendada visto que a barreira intestinal é

normalmente destruída em quadros de panleucopénia, podendo as bactérias intestinais invadir

a corrente sanguínea. A bacterémia em combinação com a neutropénia existente pode levar a

choque endotóxico. (Truyen et al., 2009).

Outro aspeto digno de nota é a nutrição entérica precoce, que foi assegurada. Truyen et

al. (2009) afirma que a restrição de água e comida só deve ser aplicada se houver persistência

de vómito, portanto, a alimentação deve ser continuada ou recomeçada sempre que possível.

Esta ideia é apoiada por um estudo sobre os efeitos benéficos da alimentação entérica precoce

em parvovirose canina (Mohr et al., 2003). Uma alimentação com elevada digestibilidade é

preferível, no entanto, qualquer tipo de alimento é preferível a nenhum alimento (Truyen et al.,

2009).

A transfusão de plasma efetuada está recomendada e acarreta benefícios para vários

aspetos da doença. Um dos benefícios imediatos é o aumento da pressão oncótica em animais

com hipoproteinémia severas. No entanto, uma vez que a quantidade proteica de uma única

unidade de PFC é baixa, estas não devem ser utilizadas para elevar a concentração de

albumina (pouca durabilidade em circulação após transfusão) ou de outras proteínas, nem para

manter a pressão arterial nestes pacientes. A transfusão de plasma deve ser realizada em

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pacientes que exibam sinais de coagulopatias e de CID. Finalmente, esta transfusão está

também recomendada, com o intuito de fornecer imunoglobulinas e inibidores de protéases

séricas (Buriko & Otto, 2007; Truyen et al., 2009; Helm & Knottenbelt, 2010a; Ferreira, 2015).

Visto que o sangue é obtido de dadores vacinados, o plasma destes animais possui, ainda,

imunoglobulinas neutralizadoras do vírus, ajudando no combate da virémia (Pennisi et al.,

2015). A decisão de transfusão de plasma, ao “Simba” baseou-se na descida abrupta dos

leucócitos, necessitando estes de uma suplementação, beneficiando ainda de uma elevação

momentânea da albumina e consequente pressão oncótica. O plasma deve ser administrado

numa dose de 10 a 20 ml/Kg/dia podendo ser administrado a cada oito a doze horas, a uma

velocidade de 5 a 6 ml/Kg/h não excedendo a dose diária. Poderia ter sido utilizado em

alternativa ST (Buriko & Otto, 2007). Depois de calculado o volume necessário foi sugerido aos

proprietários a transfusão de duas unidades de plasma, não tendo sido possível devido a limite

orçamental.

Apesar de apenas ter sido administrado uma unidade de plasma as melhorias do

“Simba” foram notórias tendo os leucócitos aumentado até um nível normal, no decorrer de

apenas 24 horas. O seu prognóstico era reservado quando deu entrada neste hospital, tendo

melhorado com a evolução do tratamento e podendo afirmar-se que ao quarto dia de

internamento já apresentava bom prognóstico.

Esta doença afeta gatos de todas as idades apesar dos gatos muito jovens serem mais

suscetíveis. É, ainda, responsável por uma taxa de mortalidade elevada – mais de 90% em

gatos muito jovens - e mesmo por danos irreversíveis no sistema gastrointestinal. Tem uma

maior incidência em gatos com acesso ao exterior vito que, gatos com este estilo de vida estão

mais expostos a doenças parasitárias e infecciosas, assim como outros perigos - lutas, lesões,

toxinas e perderem-se ou ficarem presos. Devem ser implementadas medidas preventivas,

principalmente neste tipo de gatos, para redução de risco de doenças transmissíveis. Uma boa

prevenção inclui a vacinação e desparasitação apropriada. Deve ser administrada a primeira

dose às oito/nove semanas com posterior reforço, três a quatro semanas mais tarde. Pode ser

administrado um terceiro reforço a gatinhos que vivam num ambiente com altas incidências

desta doença, como abrigos e gatis. Finalmente, o seguinte deve ser administrado passado um

ano podendo os seguintes reforços serem administrados com intervalos de três ou mais anos

(Truyen et al., 2009; Datz, 2013).

Tendo em conta este caso clinico pode verificar-se que a transfusão de plasma é uma

arma poderosa no combate desta doença e pode ser a diferença entre o sucesso e o insucesso

do tratamento.

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86

III. Considerações finais

A abordagem ao tema “medicina transfusional felina” reflete o interesse da autora na

área da medicina felina e no tema em questão. Como inumeramente referido, enquanto

espécie, o gato não deve ser tratado de forma idêntica a um cão de pequeno porte, sendo

necessário conhecer bem as suas particularidades fisiológicas e os pormenores que fazem a

diferença nas diversas abordagens médicas. Este trabalho descreve assim cuidados e

procedimentos específicos para a espécie felina, particularmente em relação à colheita e

processamento sanguíneo.

Vulgarmente o gato não demonstra sinais clínicos de anemias ligeiras a moderadas,

sendo que quando se apresenta à consulta por este motivo, a sintomatologia é geralmente

muito grave e exige transfusões sanguíneas de emergência. Esta particularidade justifica a

importância do desenvolvimento do tema, uma vez que a rapidez de obtenção de produtos

sanguíneos e o conhecimento sobre como, quando e o que utilizar em cada situação, pode

determinar a eficácia da abordagem.

Após os seis meses de estágio curricular, é seguro afirmar que o HVP proporcionou

uma importante experiência a nível profissional que contribuiu para um aumento significativo do

leque de conhecimentos da autora, que serão fundamentais no futuro.

Além de permitir uma consolidação de conhecimentos prévios e o adquirir de destreza

prática através do contacto diário com variadas patologias a nível de internamento, consultas e

cirurgia, possibilitou ainda o contacto com diversas áreas nunca antes experienciadas, como

fisioterapia, cirurgia minimamente invasiva e meios de diagnóstico imagiológico como a

fluoroscopia e TAC. Por fim, o contacto com um banco de sangue moderno e eficaz tornou

possível à autora seguir de perto a gestão e os demais processos técnicos e burocráticos

essenciais ao funcionamento de banco de sangue, fomentando ainda mais o interesse

existente e permitindo um desenvolvimento desta revisão bibliográfica com conhecimentos de

causa.

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a

V. Anexos

1. Anexo I: Análises anuais da “Pinchie” - Propriedade do HVP

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b

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c

Sangue inteiro

Concentrado de eritrócitos

Plasma fresco congelado

Plasma Congelado/Criossob

renadante Criopressipitado Colóides

Concentrado de plaquetas

Anemia

Anemia com hipoproteinémia

Anemia hemorrágica (>30% volume total de sangue)

Anemia com coagulopatia

Pancitopénia

Intoxicação por dicumarínicos

CID

Hemofilia A (fator VIII)

Hemofilia B (fator IX)

Hemofilia C

Doença de von Willebrand

Intoxicação por warfarina

Trombocitopénia/trombopatia

Hipoproteinémia

Deficiência de protrombina

Deficiência em fibrinogénio

Sépsis

Hipoglobulinémia (parvovirose)

Hepatopatia com coagulopatia

Hepatopatia com anemia

Pancreatite

Isoeritrólise neonatal

Legenda: Componente de primeira escolha; componente alternativo

2. Anexo II: Componente de primeira escolha e componentes alternativos a utilizar em situações específicas, adaptado de Ferreira, 2015.